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UNIVERSIDADE FEEVALE
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

FABIO ALEXANDRE KLEIN

COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL E DIREITO TRIBUTÁRIO: ENTRE


O INTERESSE PÚBLICO E A SEGURANÇA JURÍDICA

Novo Hamburgo

2021/01
2

FABIO ALEXANDRE KLEIN

COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL E DIREITO TRIBUTÁRIO: ENTRE O


INTERESSE PÚBLICO E A SEGURANÇA JURÍDICA

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado como requisito parcial para
obtenção do título de Bacharel em Direito
pela Universidade Feevale.

Orientador: Prof. Me. Gabriel Joner

Novo Hamburgo

2021/1
3

FABIO ALEXANDRE KLEIN

Trabalho de Conclusão do Curso de Direito, com o título COISA JULGADA


INCONSTITUCIONAL E DIREITO TRIBUTÁRIO: ENTRE O INTERESSE PÚBLICO
E A SEGURANÇA JURÍDICA, submetido ao corpo docente da Universidade Feevale,
como requisito necessário para a obtenção do Grau de Bacharel em Direito.

Encaminho o presente trabalho para avaliação de banca examinadora:

__________________________________________
Prof. Me. Gabriel Joner
Orientador

__________________________________________
Prof.
Banca Examinadora

__________________________________________
Prof.
Banca Examinadora

Novo Hamburgo, 11 de junho de 2021.


84

A Deus, por ter me permitido a vida;


Aos meus pais Fabio Davi e Maria Liduina, por terem me instruído e orientado
ao longo de minha trajetória;
Aos meus avós, pelos ensinamentos para que eu persistisse no caminho do
aprendizado.
5

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, agradeço aos meus pais Fabio Davi e Maria Liduina, que
foram e são à base de tudo aquilo que me tornei e que jamais pouparam esforços para
que pudesse seguir o caminho dos estudos. Especialmente, também, aos meus
queridos avós Flávio e Marli, por terem construído a minha visão de retidão e
honestidade.
De igual relevância, o meu especial agradecimento ao Professor Orientador
Gabriel Joner, que invariavelmente se fez presente durante essa jornada, me
ofertando total suporte acadêmico, técnico e didático, bem como me desenhou o
caminho a ser trilhado.
Mais do que necessário exalçar minha gratidão às minhas queridas amigas e
companheiras de curso, que se mantiveram ao meu lado ao longo dessa trajetória:
Greice Keli Corrêa, Diênifer Rudschinksi e Rebeca Jagger Cassanego – que por
inúmeras vezes foram meu esteio e maiores incentivadoras.
Ainda, gostaria de agradecer os meus colegas de estágio na Justiça Federal
na 3ª Vara Federal de Novo Hamburgo por todos os valiosos ensinamentos e por toda
atenção a mim franqueada.
A todos que, de alguma forma, direta ou indiretamente, contribuíram para a
conclusão desta etapa.
6

As dificuldades crescem à medida que nos


aproximamos do nosso objetivo.
(Die Schwierigkeiten wachsen, je naher man dem
Ziele kommt).

Johann Wolfgang von Goethe (escritor alemão,


1749-1832).
7

RESUMO

O princípio da segurança jurídica possui estreita relação com o Estado de Direito,


sendo um dos princípios basilares da Constituição de um país ao assegurar
estabilidade das relações entre as pessoas e o Estado. Propõe-se que a garantia
constitucional da coisa julgada é imprescindível ao Estado de Direito e, que, ao falar-
se em sua flexibilização quanto da coisa julgada inconstitucional impactaria em todo
sistema jurídico pátrio podendo levar à um grande desequilíbrio na aplicaç ão da lei,
gerando, assim, a insegurança jurídica. Tem-se por objetivo analisar os mais variados
impactos ao Estado Democrático de Direito frente ao fenômeno da coisa julgada
inconstitucional, demonstrando como a flexibilização desse instituto processual
repercute na segurança jurídica das relações entre a esfera pública e o capital privado.
Ademais, objetiva-se analisar quais os mecanismos podem ser utilizados pelo
contribuinte na tutela dos seus direitos, diante dos reflexos da flexibilização da coisa
julgada, por inconstitucionalidade. Portanto, conclui-se, que a coisa julgada
inconstitucional e a relativização da res iudicata permeiam o interesse público e a
segurança jurídica, tendo profundo impacto na seara tributária.

Palavras-chave: Coisa julgada. Flexibilização. Segurança jurídica. Tributário.


8

ABSTRACT

The principle of legal security is closely related to the rule of law, being one of the basic
principles of the Constitution of a country to ensure stability of relations between people
and the State. It is proposed that the constitutional guarantee of res judicata is essential
to the Rule of Law and that, when talking about its flexibilization regarding the
unconstitutional res judicata, it would have an impact on the entire Brazilian legal
system and could lead to a great unbalance in the application of the law, thus
generating legal insecurity. It aims to analyze the various impacts on the democratic
rule of law facing the phenomenon of unconstitutional res judicata, demonstrating how
the flexibility of this procedural institute affects the legal security of relations between
the public sphere and private capital. Furthermore, the aim is to analyze which
mechanisms can be used by the taxpayer to protect his rights, given the consequences
of the flexibilization of the res judicata, due to unconstitutionality. Therefore, we
conclude that the unconstitutional res judicata and the relativization of res judicata
permeate the public interest and legal security, having a profound impact on the tax
field.

Keywords: Res judicata. Flexibility. Legal certainty. Tax law.


9

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

1 ESTADO DE DIREITO E A BUSCA PELA SEGURANÇA JURÍDICA ........................................... 14

1.1 A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE ESTADO DE DIREITO: UM ITINERÁRIO HISTÓRICO... 15

1.2 O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E SUAS IMPLICAÇÕES PRÁTICAS ...................... 25

1.3 A COISA JULGADA E SEUS IMPACTOS NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO ............. 45

2. FLEXIBILIZAÇÃO DA COISA JULGADA E SEUS REFLEXOS NO DIREITO TRIBUTÁRIO ....... 58

2.1 HIPÓTESES DE FLEXIBILIZAÇÃO DA COISA JULGADA ......................................................... 59

2.2 A COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL E SEUS REFLEXOS NO DIREITO TRIBUTÁRIO .... 71

2.3 MECANISMOS PROCESSUAIS DE DEFESA DO CONTRIBUINTE ........................................... 80

CONCLUSÃO .................................................................................................................................. 94

REFERÊNCIAS ............................................................................................................................... 97
10

INTRODUÇÃO

O presente excerto monográfico tem por objetivo analisar os mais variados


impactos ao Estado Democrático de Direito frente ao fenômeno da coisa julgada
inconstitucional, demonstrando como a flexibilização desse instituto processual
repercute na segurança jurídica das relações entre a esfera pública e o capital privado
– com enfoque na seara tributária e, especialmente, na figura do contribuinte.
Em uma primeira abordagem, tenciona-se a compreensão da formação Estado
dentro dos moldes atualmente difundidos, se faz imprescindível para que se tenha
pleno entendimento de como essa forma jurídica representa uma das maiores
evoluções da humanidade, haja vista que as sociedades se portam e reportam –
atualmente – à lei maior, ou seja, ao texto constitucional.
Por isso, no primeiro capítulo faz-se um breve itinerário histórico do Estado de
Direito, desde a formulação da figura do Estado Constitucional até a concretização e
institucionalização do Estado Democrático de Direito nos moldes atuais, buscando
contextualizar as diversas formas de atuação do ente estatal, compilando as
características do Estado Moderno, Rule of law, L’État legal, Rechtsstaat, Always
under law, Welfare state e, por derradeiro, a fundação do Estado Democrático de
Direito.
O modelo inglês, Rule of law, nos remete à Magna Carta do Rei João Sem
Terra de 1215 que transcendera na proeminência das leis e costumes ingleses diante
a discricionariedade do poder monárquico – aqui caracterizando a primeira
manifestação do constitucionalismo; adiante, temos o L’État legal onde as leis
elaboradas deveriam ser concebidas como a expressão da vontade política geral e
dos imperativos constitucionais – demonstrando o sufrágio universal como primeiro
viés democrático do Estado; em solo germânico, exsurge o Rechtsstaat que garantiria
a liberdade jurídica dos seus cidadãos, comandada por ele próprio, de maneira que o
Estado poderia agir frente aos direitos subjetivos dos habitantes somente se a lei geral
assim permitisse – onde nitidamente encontra-se esboçada a normatividade
organizacional do Estado; nos Estados Unidos, apresentou-se o Always under law o
qual impreterivelmente se alicerçava na constituição para a estruturação do governo
e da sua limitação de atuação, primando pela transparência de seus atos e na
manutenção da essência do constitucionalismo norte-americano de priorizar a
11

representatividade dos tribunais em exercer a justiça em nome do povo – ou seja, ter


sua atuação pautada e indissociável da lei;
Basicamente, será possível observar que a inspiração liberal que o Estado de
Direito trouxe consigo, em resposta às ingerências do Estado, resultou no
estabelecimento de direitos que buscaram garantir a propriedade, a igualdade e a
legalidade, tendo incluso, posteriormente, parte do ideário social que visava a
implementação de garantias sociais ao cidadão – assim intencionando a promoção da
igualdade social, segurança e paz configurando o chamado Estado de bem-estar
social (Welfare state).
Deveras, a supremacia constitucional é o que permite o Estado de Direito
transformar-se em Democrático de Direito ou Constitucional de Direito, enaltecendo
os princípios da igualdade, da liberdade e da maioria.
Oportunamente, tem-se por escopo executar uma ampla abordagem sobre o
princípio da segurança jurídica como elemento fundamental do Estado de Direito ao
verificar suas implicações nas relações interpessoais entre cidadão e Estado, bem
como trazer a sua importância e funcionalidade dentro do ordenamento jurídico e na
efetiva prestação da tutela jurisdicional.
Por fim, o segundo capítulo visa analisar as consequências da flexibilização da
coisa julgada para o Direito Tributário, estabelecendo as possibilidades da sua
relativização e os impactos da coisa julgada inconstitucional no ordenamento jurídico,
com especial atenção ao controle de constitucionalidade – concreto ou abstrato – que
visa, em havendo controvérsia, compatibilizar a norma ordinária ou ato administrativo
com o texto constitucional. Uma vez que será por via do controle de
constitucionalidade que poderá haver declaração de inconstitucionalidade, de tal
maneira que afetará a coisa julgada a transformando em coisa julgada
inconstitucional.
Necessário colacionar que esse tipo de julgamento em sede de controle de
constitucionalidade – seja concreto ou abstrato – terá efeitos erga omnes (produzirá
efeitos para todos abstratamente) ou será inter partes (abrangendo somente as partes
materiais envolvidas), sendo excepcionalmente, sujeito à nulidade mitigada, com
eficácia ex nunc.
Nessa linha, explana-se que a declaração de inconstitucionalidade em controle
abstrato terá efeito retroativo (ex tunc) e para todos (erga omnes) sendo vinculante
12

aos órgãos da Administração Pública e do Poder Judiciário, que através da sentença


proferida em controle abstrato de constitucionalidade fará coisa julgada material e
vinculará as autoridades executoras da lei, sendo uma vez julgada inconstitucional.
Por outro lado, o controle concreto de constitucionalidade operacionalizará em
sentido diametralmente oposto, ou seja, com efeitos ex tunc e inter partes, ou seja,
retroagindo até a edição da lei com efeitos restritos às partes do processo.
Também, busca-se expor as possíveis soluções, ou seja, formas de defesa ao
contribuinte frente a esse fenômeno, nomeando as possibilidades legalmente
franqueadas ao contribuinte para que possa buscar a resolução de suas demandas:
ação rescisória, ação declaratória (ou querela nullitatis), embargos à execução e ação
revisional.
Consabido é que a relativização da coisa julgada é temática de alta relevância,
a qual frequentemente é discutida nos tribunais brasileiros ora com posicionamento
favorável, ora desfavorável. Essas diversas posições da jurisprudência e da doutrina,
demonstram a expressividade acerca do debate envolto sob a relativização do instituto
processual da res iudicata, haja vista influenciar valiosos princípios basilares do
Estado Democrático de Direito como: a legalidade, a igualdade e a seguranç a jurídica.
Esse debate acerca da relativização da coisa julgada inconstitucional se divide
em duas linhas doutrinárias: aqueles contrários e que veem com receio a flexibilização
da coisa julgada justamente pela falta de parâmetros, ou seja, de limites par a essa
pretensa flexibilização e; a favorável que defende a impossibilidade da existência de
decisão, norma ou ato que confronte os ditames constitucionais, em linhas breves,
casos que vão de encontro à primazia do texto constitucional.
Assim, através do presente estudo tem-se o intuito de compreender o
paradigma que envolve a discussão central deste trabalho: seria possível, em nome
da segurança jurídica e irretroatividade das decisões, manter uma decisão
nomeadamente inconstitucional em detrimento da manutenção da coisa julgada? Ou
ainda, relativizar a coisa julgada seria uma ofensa aos princípios fundantes do Estado
Democrático de Direito?
Para tanto, através das investigações e análises realizadas se buscará as
respostas para tais questionamentos, visando ponderar os mais diversos
posicionamentos doutrinários consuetudinários e da jurisprudência hodierna acerca
13

da coisa julgada inconstitucional e a flexibilização do instituto processual da res


iudicata.
14

1 ESTADO DE DIREITO E A BUSCA PELA SEGURANÇA JURÍDICA

O presente capítulo abordará como o princípio da segurança jurídica possui


estreita relação com o Estado de Direito, sendo um dos princípios basilares da
Constituição de um país ao assegurar estabilidade das relações entre as pessoas e o
Estado. Analisando a partir da figura estatal, emanada do Direito, a proposição do
estabelecimento de uma certa ordem para afirmar a segurança das relações entre os
próprios indivíduos e destes com o Estado. 1
Ainda buscará compreender como a ideia de segurança no Direito passou ao
longo da história por várias transformações, desde as primeiras sociedades politeístas
até a idade medieval, onde tinha-se a noção de uma segurança centrada no poder
divino superior e inexplicável.2
Far-se-á a partir de uma breve análise histórica a evolução das relações entre
indivíduo e Estado, que com o passar do tempo e o advento das ideias iluministas e
do racionalismo, fizeram surgir a figura do Estado como instituição amparada por um
poder externo, inviolável e tutelar. Sendo de tal maneira que a idealização de Estado
justo transcendera para o modelo de Estado jurídico baseado em um sistema
fundamentado pelo princípio da certeza, da permanência, das garantias e da
estabilidade. 3
Outro ponto que será objeto deste capítulo é o fato de que foi com o advento
do Estado moderno que o princípio da segurança jurídica obteve maior destaque e
importância por possibilitar equilíbrio, estabilidade e previsibilidade nas dinâmicas e
complexas relações sociais. Cumprindo referir que, a partir do poder de tutela do
Estado, a necessidade de prover segurança jurídica para a sociedade desenvolveu-
se ao longo dos séculos como forma de defesa do povo frente aos detentores do
poder.4

1
CAMPOS, Diogo Leite de; CAMPOS, Mônica Horta Neves Leite de. Direito Tributário. Belo
Horizonte: Del Rey, 2001, p.7.
2
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. As origens do estado de direito. Revista de Direito
Administrativo, Rio de Janeiro, v. 168, p. 11-17, fev. 1987. ISSN 2238-5177. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45514>. Acesso em: 07 set. 2020.
3
BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 6ª ed., revista e ampliada. São Paulo:
Malheiros Editores, 1996, p. 112.
4
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Visão Histórica da Segurança Jurídica. In: BOTTINO, Marco Túlio
(Org.). Segurança Jurídica no Brasil. São Paulo: Rg Editores, 2012, p. 99.
15

1.1 A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE ESTADO DE DIREITO: UM ITINERÁRIO


HISTÓRICO

Essencial que se paute o início do presente trabalho acadêmico pelo itinerário


histórico da construção do conceito de Estado de Direito e sua posterior modulação
em Estado constitucional de direito. Para isso, mister compreender o termo Estado,
que somente teve sua amplitude política enfaticamente personificada no século XVI,
por Nicolau Maquiavel em sua obra mais expressiva intitulada “O Príncipe”. Pois foi
ela, obra tida como fundadora da Ciência Política, que a magnitude da organização
política de um território foi arguida, como bem se exprime do primeiro parágrafo dessa
obra: ''Todos os estados – todos os domínios que tiveram e têm império sobre os
homens - foram e são ou repúblicas ou principados''.5
Para que se compreenda a ideia que o Estado de Direito traz consigo, é
imprescindível analisar o seu esteio basilar, a supremacia da lei sobre quaisquer
outros pilares da figura estatal, principalmente ante a autoridade pública. Que
prescreve em si, uma forma jurídica baseada na hierarquia das leis que limitará os
poderes do Estado, mas que também visa formular as diretrizes acerca das liberdades
públicas, da democracia bem como o próprio papel do Estado pelo Direito.6
O conceito de Estado de Direito contemporâneo, difere daquela concepção
idealizada na Roma antiga, no medievo ou ainda pelos ideários iluministas – que
resultaram na Revolução Francesa - passando por diversas acepções ao longo da
história. Todavia, como bem sintetiza o professor Manoel Ferreira Filho, a proposição
primária de que existe um direito que não é criado, mas sim descoberto pelos homens,
e de um direito que é superior aos governantes, os quais não o podem validamente
alterar,7 ainda exprime, muito superficialmente visto que advinda pela Antiguidade,
parte de sua atual idealização.

5
MACHIAVELLI, Nicollò Di Bernardo Dei. O Príncipe. Tradução de Marcelo Diogo. Barueri: Ciranda
Cultural, 2019. p. 07.
6
BEDIN, Gilmar Antonio. Estado de direito: tema complexo, dimensões essenciais e conceito. Revista
Direito em Debate, v. 22, n. 39, p. 144-152, 7 jun. 2013. Disponível em:
<https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/revistadireitoemdebate/article/view/1354>. Acesso em:
10 jun. 2020.
7
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. As origens do estado de direito. Revista de Direito
Administrativo, Rio de Janeiro, v. 168, p. 11-17, fev. 1987. ISSN 2238-5177. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45514>. Acesso em: 11 jun. 2020.
16

Essa tese inicial que perpassou a Antiguidade, se mostra não obstante daquilo
que buscava-se afirmar: a legalidade. Juntamente da implementação da legalidade, a
liberdade dos cidadãos aliada ao direito de manifestar-se era um dos objetivos da
criação da figura do Estado e de um plano normativo que o moderasse. Nesta senda,
referiu-se Montesquieu nos seguintes termos: "Todos os cidadãos, nos diversos
distritos, devem ter o direito a dar seu voto para escolher seu representante; exceto
aqueles que estão em tal estado de baixeza, que se considera que não têm vontade
própria".8 Exatamente, como foi possível observar na Grécia antiga, onde as
instituições atenienses separavam o direito do poder, numa clara interpretação de que
a partir do direito surgiriam as leis e deles os atos normativos, bem como quando
verificada a sua ilegalidade, as respectivas sanções. Tamanha era a importância da
Constituição da pólis, a lei suprema, que para anular uma proposta de lei ou votação
contrária aos princípios fundamentais da democracia ateniense, havia a previsão de
um processo punitivo por meio de uma ação específica – a chamada graphê
paranomon.9
O Estado moderno surge a partir do final da idade média, com um formato
absolutista, vinculado estritamente à figura de um soberano o qual decidia sobre todos
os assuntos de ordem pública. Ou seja, tinha todo o poder centralizado em si para que
suas decisões, balizadas pelos seus próprios interesses, fossem impostas a todos
com exceção do próprio Estado que não se submeteria à ordem jurídica, uma vez que
o Estado era personificação do monarca. À luz dos estudos de Montesquieu, Nelson
Juliano Cardoso Matos descreve:

Para tanto, Montesquieu asseverou que a fonte da opressão, isto é, a


fonte do ataque à liberdade individual é o poder (implicitamente, o
poder estatal). Mais uma vez contra doutrinas metafísicas ou
prescritivas, assegurou que o poder naturalmente (inevitavelmente)
abusará da liberdade, isto é, o poder naturalmente (inevitavelmente)
corrompe e que o governante tendo meios e necessidade agirá sem
considerar as liberdades dos súditos.10

8
MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat, Baron de la. O espírito das leis. Tradução de Cristina
Murachco. São Paulo: Martins Fontes, 1996, p. 171.
9
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. As origens do estado de direito. Revista de Direito
Administrativo, Rio de Janeiro, v. 168, p. 11-17, fev. 1987. ISSN 2238-5177. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45514>. Acesso em: 11 jun. 2020.
10
MATOS, Nelson Juliano Cardoso. O dilema da liberdade: alternativas republicanas à crise
paradigmática no direito: o caso da judicialização da política no Brasil. Tese de Doutorado –
Centro de Ciências Jurídicas / Faculdade de Direito do Recife, Universidade Federal de Pernambuco.
Recife, 2008, p. 191. Disponível em: < https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/4146>. Acesso em
12 jun. 2020.
17

Esse formato acabou por permitir abusos e concessão de privilégios a uma


minoria, o que gerou grande insatisfação por parte da populaç ão que não fazia parte
da nobreza e, foi essa contrariedade, que favoreceu a eclosão da Revolução Gloriosa
na Inglaterra e da Revolução Francesa. Portanto, visto que o modelo absolutista se
tornou insustentável e, à luz das teorias liberais, teve início a instauração de um novo
modelo de Estado que não teria mais a sujeição dos súditos ao arbítrio do monarca,
mas sim ao Estado possuidor de uma ordem normativa baseada em leis que seriam
provenientes da vontade da população e que limitariam o poder político visando à
liberdade do cidadão, calcada pela legalidade.11 Nesse diapasão, esclarece Paulo
Bonavides que:

Foi assim – da oposição histórica e secular, na Idade Moderna, entre a


liberdade do indivíduo e o absolutismo do monarca – que nasceu a
primeira noção de Estado de Direito, mediante um ciclo de evolução
histórica e decantação conceitual. [...] A pugna decide-se no
movimento de 1789, quando o direito natural da burguesia
revolucionária investe no poder o terceiro estado. 12

Em solo britânico, o instituto jurídico do rule of law, foi fruto do pensamento


inglês e consequência da Magna Carta de 1215 do Rei João Sem-Terra (como ficou
conhecido), e vinculou-se diretamente as proposições da Antiguidade e aos princípios
básicos do cristianismo medieval, este fortemente cultivado por Tomás de Aquino,
para estabelecer ao sistema jurídico anglo-saxão da common law 13 um “Império da
Lei”, que primava pela a igualdade perante a lei, a ausência do poder arbitrário do
governo e os princípios constitucionais advindos dos resultados de decisões judiciais,
onde os tribunais e juristas decidiam em virtude da total proteção dos indivíduos (civis)

11
MORAIS JUNIOR, João Nunes. Estado Constitucional de Direito: breves considerações sobre o
Estado de Direito. In: Revista de Direito Público, Londrina, v. 2, n. 3, p.119-136, set/dez 2007.
Quadrimestral. Disponível em:
<http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/11546/10249>. Acesso em: 13
jun. 2020.
12
BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 41.
13
“O common law ou “direito comum” muito se diferencia do sistema romano-germânico, pois é
originário de regras não escritas, que foram criadas inicialmente por juízes ingleses e lapidadas ao
longo do tempo. É um sistema baseado no direito costumeiro e na continuidade, razão pela qual é fruto
de uma grande evolução sem interrupções. Sua natureza está voltada à continuidade e à tradição, de
fato nem sempre foi igual, pois o contínuo não quer dizer imutável, entretanto, nunca houve razão para
desprezar os antigos costumes, nem há divisão histórica entre uma era pré ou pós-revolucionária.
Assim, o desenvolvimento deste sistema jurídico se deu de maneira ininterrupta, baseado no cotidiano
da sociedade inglesa”. In WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. A uniformidade e a estabilidade da
jurisprudência e o estado de direito - Civil law e common law. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 57, n.
384, 2009, p. 53-62.
18

contra as arbitrariedades procedentes do exercício do poder. A Magna Carta


promulgada em 15 de Junho de 1215 foi uma das principais manifestações de
limitação do exercício do poder político pelo monarca e do constitucionalismo formal,
embora não tenha impedido o Rei Carlos I de cobrar impostos não aprovados por
deliberação do parlamento britânico, consequentemente, originando a Petition of
Right14 – a lei que proibiu o rei de cobrar impostos não previamente deliberados e
aprovados pelo parlamento, bem como vedou a prisão sem justa causa – sendo
sucedida pela famosa Bill of Rights em 1689 que deu ao parlamento britânico a
prerrogativa exclusiva na criação das leis. Assim, sintetiza José Joaquim Gomes
Canotilho:

The rule of law significa, em primeiro lugar, na sequência da Magna


Carta de 1215, a obrigatoriedade da observância de um processo justo
legalmente regulado, quando se tiver de julgar e punir os cidadãos,
privando-os de sua liberdade e propriedade. Em segundo lugar, rule of
law significa a proeminência das Leis e costumes do país perante a
discricionariedade do poder real. Em terceiro lugar, rule of law aponta
para a sujeição de todos os actos do executivo à soberania do
parlamento. Por fim, rule of law terá o sentido de igualdade de acesso
aos tribunais por parte dos cidadãos a fim destes aí defenderem os
seus direitos segundo os princípios de direito comum dos ingleses
(Common Law) e perante qualquer entidade (indivíduos ou poderes
públicos).15

Com a Constituição da Federação dos Estados Unidos da América em 1787 e


a Declaração dos Direitos dos Estados Unidos de 1791, inaugurou-se o chamado
Constitucionalismo moderno, tutelado, no caso americano, pela aplicação do Always
under law, isto é, sempre sob a égide da Lei. Ou seja, esse modelo primava pela carta
magna como parâmetro da estruturação do governo e da sua limitação de atuação,
como também proporcionar a transparência de seus atos e manter a essência do

14
“A Petition of Rights foi iniciada por Edward Coke que tomou como base os estatutos e cartas
anteriores e afirmou três princípios: “Nenhum tributo pode ser imposto sem o consentimento do
Parlamento; Nenhum súdito pode ser encarcerado sem motivo demonstrado (a reafirmação do direito
de habeas corpus); Nenhum soldado pode ser aquartelado nas casas dos cidadãos, e a Lei Marcial
não pode ser usada em tempo de paz”. In: BEZERRA, Jeanne Almeida. Carta de Direitos Inglesa (Bill
of Rights, 1689): Um Importante documento na Constituição dos Direitos Humanos. Conteúdo
Jurídico, Brasília-DF: 22 nov. 2020. Disponível
em: <https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52502/carta-de-direitos-inglesa-bill-of-rights-
1689-um-importante-documento-na-constituicao-dos-direitos-humanos>. Acesso em: 12 jun. 2020.
15
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Almedina, 2003, p. 93-94.
19

constitucionalismo norte-americano da representatividade dos tribunais em exercer a


justiça em nome do povo sempre respeitando os direitos previstos na Constituição. 16
Antecedente ao formato germânico de Estado de Direito, ergueu-se no território
francês o conceito do L’État legal insculpido pela Revolução Francesa, ocorrida no
ano de 1789 em resposta ao absolutismo monárquico, arqueando uma forma de
hierarquia jurídica que tinha a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de
autoria da Assembleia Nacional Constituinte Francesa, no topo da pirâmide; na
sequência, tinha-se a constituição da França e em terceiro lugar as leis. Entretanto
esse formato acabou por transformar o Magistrado em simples aplicador da letra “fria”
da lei, em prol da garantia da democracia tinha-se a limitação do papel do juiz e do
Estado.17
Emerge, então, a concepção teórica do Estado de Direito clássico (ou liberal)
na Alemanha – Prússia à época - durante o século XIX, sob a nomenclatura de
Rechtsstaat18, uma espécie de modelo de governo em resposta ao absolutismo e o
despotismo esclarecido do Rei Frederico II, e oriundo do constitucionalismo alemão
por grande influência dos estudos do filósofo, Immanuel Kant. Adiante, dá-se a
corrente kantiana mérito por ter inspirado o movimento que deu início ao Estado de
Direito em solo germânico, certo que contribuiu para que fosse adquirida a noção da
importância de que as normas específicas modelem-se à normas justas priorizando
pela proteção da ordem e da segurança pública, diferente do Estado de Polícia em
que se têm controle e a regulamentação de tudo e de todos os setores. No modelo
alemão, portanto, o Rechtsstaat garantiria a liberdade jurídica aos seus cidadãos,
facultada por ele próprio, onde o Estado poderia agir frente aos direitos subjetivos dos
habitantes se a lei geral assim permitisse. Sendo que esse modelo também via a
necessidade da separação de funções do legislativo e executivo, tendo um forte
controle administrativo. No que tange a este estrito controle administrativo, Friedrich
von Hayek observa:

16
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Almedina, 2003, p. 94-95.
17
BEMVENUTI, Cássio Schneider. O estado liberal clássico e o surgimento do état legal na França: as
garantias individuais e a o papel do juiz no processo. Rev. Fac. Dir. Sul de Minas, Pouso Alegre, v.
31, n. 2: 223-236 jul./dez. 2015. Disponível em: <
https://www.fdsm.edu.br/adm/artigos/d8b626ca358b865d5d157af4b4e88dfe.pdf>. Acesso em 14 jun.
2020.
18
HAYEK, Friedrich von. Os fundamentos da liberdade. Tradução de Anna Maria Capovilla e José
Ítalo Stelle. São Paulo: Editora Visão, 1983. cap. 13, p. 236.
20

De fato, os teóricos alemães da época costumavam argumentar


explicitamente contra a "jurisprudência administrativa", no sentido em
que esse termo era ainda aceito na França; isto é, contra os
organismos quase judiciais da máquina administrativa,
fundamentalmente criados mais para velar pela execução da lei do que
para proteger a liberdade do cidadão.19

Nessas concepções vê-se muito claramente a grande influência do ideário


liberal, tal que construiu o chamado Estado Liberal de Direito, calcado pelo
condicionamento da força estatal ante a liberdade do cidadão regida pelo princípio da
legalidade, que nas palavras da obra elaborada por Lenio Luiz Streck e José Luis
Bolsan Morais: “apresenta-se como uma limitação jurídico-legal negativa, ou seja,
como garantia dos indivíduos-cidadãos frente à eventual atuação do Estado,
impeditiva ou constrangedora de sua atuação cotidiana”.20 À essa maneira, o Estado
Liberal de direito concentraria suas ações para garantir a seguranç a e a paz,
assegurando a ordem pública e abdicando ao máximo possível das intervenções
econômicas e sociais referentes aos cidadãos.21
Dada as características do Estado Liberal de Direito, com a forte preocupação
da preservação da propriedade privada e da liberdade do indivíduo, acabou por gerar
reivindicações ao poder público em relação as agendas sociais, que começavam a
ser cobradas pela população excluída dos ideários liberalistas, onde parte do povo
acabara de ter legitimada em suas mãos o poder soberano de participar das decisões
do Estado, visto o caráter da legalidade institucionalizado pela subsunção à lei.22 É
nesta seara que surge a figura do Estado Social para promover a extensão dos direitos
àqueles não possuidores de propriedade privada ou dependentes da elite empresarial,
bem como as mulheres que eram consideradas não independentes forçando o Estado
a implementar funções que promovessem a igualdade social, paz e segurança – o que
ficaria conhecido como o Welfare State23 ou Estado de bem-estar social – mas apenas

19
HAYEK, Friedrich von. Os fundamentos da liberdade. Tradução de Anna Maria Capovilla e José
Ítalo Stelle. São Paulo: Editora Visão, 1983. cap. 13, p. 240.
20
STRECK, Lenio Luiz; MORAIS, José Luis Bolsan. Ciência Política e Teoria Geral do Estado. 2. ed.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 91.
21
CHAUI, Marilena de Souza. Convite à filosofia. 6. ed. São Paulo: Ática, 1997, p. 402.
22
MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil. Teoria Geral do Processo. Volume I. 5. ed.
Curitiba: Revista dos Tribunais, 2012, p. 25-30.
23
“Esse modelo, como se conhece, funda-se no intervencionismo estatal, na regulação socioeconômica
do mercado privado, em uma determinada presença estatal no conjunto da economia, na
desmercantilização relativa de certos bens, valores e práticas. Tal modelo é que tem obtido sucesso
no continente europeu com respeito à construção e manutenção de uma sociedade que assegure a
dignidade da pessoa humana, os direitos individuais e sociais fundamentais, a valorização do trabalho
e especialmente do emprego; que seja, no possível, exemplo de sociedade livre, justa e solidária,
garantindo a erradicação da pobreza, da marginalização e a redução das desigualdades sociais e
21

efetivou-se após longos debates populares. Nesse ideário, João Nunes Morais Junior
sintetiza:

As lutas populares ampliaram os direitos civis: a participação política,


a fiscalização do Estado por meio de organizações sociais
(associações, sindicatos, partidos políticos), o direito à informação,
etc., e com isso criaram os direitos sociais (trabalho, lazer, saúde,
educação etc.) e os direitos das minorias (mulheres, idosos, negros,
índios etc.). Por fim, a expansão do regime democrático assegurou a
abertura ao campo social, à criação de novos direitos e à ampliação
dos direitos já existentes.24

Perquirido, resumidamente, este itinerário histórico, vê-se a inspiração liberal


que o Estado de Direito trouxe consigo, em resposta as ingerências do Estado, do
estabelecimento de direitos que buscavam garantir a propriedade, a igualdade e a
legalidade, tendo incluso, posteriormente, parte do ideário social que visava a
implementação de garantias sociais ao cidadão. Nesse seguimento, avançamos à
ideia de uma constituição escrita que abarcasse todos os direitos, bem como
limitadora dos poderes do Estado. A respeito desse tema, Lenio Luiz Streck explana:

Com efeito, a Constituição nasce como um paradoxo, porque, do


mesmo modo que surge como exigência para conter o poder absoluto
do Rei, transforma-se em um indispensável mecanismo de contenção
do poder das maiorias. É, pois, no encontro desses caminhos
contraditórios entre si que se desenha o paradoxo do
constitucionalismo. E é na construção de uma fórmula abarcadora
desses mecanismos contramajoritários que se engendra a própria
noção de jurisdição constitucional percorrendo diversas etapas, até o
advento do Estado Democrático de Direito. 25

Deveras, a supremacia constitucional é o que permite o Estado de Direito


transformar-se em Democrático de Direito ou Constitucional de Direito, desde que
enalteça os princípios da igualdade, da liberdade e da maioria. E, é juntamente destes,
com o condão de garantias institucionais e da separação dos poderes que devem
funcionar harmonicamente entre si, feita a base do Estado Democrático de Direito.
Quanto a importância dessa organização do Estado, Norberto Bobbio destaca:

regionais; que realize, em síntese, a ideia matriz de justiça social”. In: DELGADO, Mauricio Godinho;
DELGADO, Gabriela Neves. Constituição da República e Direitos Fundamentais - dignidade da
pessoa humana, justiça social e Direito do Trabalho. 4. ed. São Paulo: LTr, 2017, p. 47-48.
24
MORAIS JUNIOR, João Nunes. Estado Constitucional de Direito: breves considerações sobre o
Estado de Direito. In: Revista de Direito Público, Londrina, v. 2, n. 3, p.119-136, set/dez 2007.
Quadrimestral. Disponível em:
<http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/11546/10249>. Acesso em: 13
jun. 2020.
25
STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas. 4.
ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 77.
22

Desses mecanismos os mais importantes são: 1) o controle do Poder


Executivo por parte do Poder Legislativo; ou, mais exatamente, do
governo, a quem cabe em última instância o Poder Executivo, por parte
do parlamento, a quem cabe em última instância o Poder Legislativo e
a orientação política; 2) o eventual controle do parlamento no exercício
do Poder Legislativo ordinário por parte de uma corte jurisdicional a
quem se pede a averiguação da constitucionalidade das leis; 3) uma
relativa autonomia do governo local em todas as suas formas e em
seus graus com respeito ao governo central; 4)
uma magistratura independente do poder político.26

Colacionado a este tópico bem sintetizado por Norberto Bobbio, percebemos a


semelhança do descrito com o Estado brasileiro, dada a compreensão da importância
de uma organização e estrutura de Estado que deterá o poder uno e indivisível, ao
passo que distribuirá suas tarefas pelo formato da tripartição dos poderes pelas figuras
do Executivo, Legislativo e Judiciário atuando de forma autônoma e independente de
forma que estes irão compor um sistema de compensação e controle, ou seja, regular-
se-ão uns aos outros. Mas para que isso possa acontecer da maneira desejada, é
imprescindível a figura de uma Constituição, que nas palavras de Guilherme Peña de
Moraes a conceitua da seguinte maneira:

A Constituição é conceituada como sistema de normas jurídicas,


produzidas no exercício do poder constituinte precipuamente ao
estabelecimento da forma de Estado, da forma de governo, do modo
de aquisição e exercício do poder, da instituição e organização de seus
órgãos, dos limites de sua atuação, dos direitos fundamentais e
respectivas garantias e remédios constitucionais e da ordem
econômica e social.27

O Brasil apresenta-se como um Estado democrático de direito, visto que


subordinado à uma Constituição cidadã – como ficou conhecida - promulgada em 05
de outubro de 1988 onde abarcou diversos temas para que se pudesse reger uma
democracia, tal como se buscava. Ou seja, deu-se à lei caráter não apenas normativo,
mas sim instrumental com vistas à concretização dos valores sociais fixados em sua
elaboração.28 A esse modal, José Afonso da Silva descreve os princípios que
fundamentam o Estado Democrático de Direito:

26
BOBBIO, Norberto. Liberalismo e democracia. Tradução Marco Aurélio Nogueira. 6. ed. São Paulo:
Brasiliense, 2000, p 19.
27
MORAES, Guilherme Peña de. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2003, p. 61.
28
MORAIS JUNIOR, João Nunes. Estado Constitucional de Direito: breves considerações sobre o
Estado de Direito. In: Revista de Direito Público, Londrina, v. 2, n. 3, p.119-136, set/dez 2007.
Quadrimestral. Disponível em:
<http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/11546/10249>. Acesso em: 13
jun. 2020.
23

(a) princípio da constitucionalidade, que exprime, em primeiro lugar,


que o Estado Democrático de Direito se funda na legitimidade de uma
constituição rígida, emanada da vontade popular, que, dotada de
supremacia, vincule todos os poderes e os atos deles provenientes,
com as garantias de atuação livre de regras da jurisdição
constitucional;

(b) princípio democrático, que, nos termos da Constituição, há de


constituir uma democracia representativa e participativa, pluralista, e
que seja a garantia geral de vigência e eficácia dos direitos
fundamentais (art. 1);

(c) sistema de direitos fundamentais, que compreendem os individuais,


coletivos, sociais e culturais (títulos II, VII e VIII);

(d) princípio da justiça social, referido no art. 170, caput, e no art. 193,
como princípio da ordem econômica e da ordem social; [...] a
Constituição não prometeu a transição para o socialismo mediante a
realização da democracia econômica, social e cultural e o
aprofundamento da democracia participativa, como o faz a
Constituição portuguesa, mas com certeza ela se abre também,
timidamente, para a realização da democracia social e cultural, sem
avançar significativamente rumo à democracia econômica;

(e) princípio da igualdade (art. 5, caput, e I);

(f) princípio da divisão dos poderes (art. 2) e da independência do juiz


(art. 95);

(g) princípio da legalidade (art. 5, II);

(h) princípio da segurança jurídica (art. 5, XXXVI a LXXIII).29

Ao elencar estes princípios basilares, é nítido o caráter de legalidade que a


separação dos poderes que rege o Estado Democrático de Direito e, ainda no caso
da presente pesquisa, se faz imprescindível trazer em questão o princípio da
segurança jurídica que funciona como um conjunto de condições que tornam possível
à população uma espécie de previsibilidade das ações realizadas pelo Estado frente
ao império da lei.30 À corroborar, Maria Sylvia Zanella Di Pietro cita exemplos práticos
de aplicação do princípio da segurança jurídica na Constituição de 1988:

O exemplo clássico de aplicação do princípio da segurança jurídica é


o que decorre do art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal (CF) de
1988, segundo o qual “a lei não prejudicará o direito adquirido, a coisa
julgada e o ato jurídico perfeito”. No entanto, outros se multiplicam, tais
como (i) as regras sobre prescrição, decadência e preclusão; (ii) as que
fixam prazo para a propositura de recursos nas esferas administrativa
e judicial, bem como para que sejam adotadas providências, em

29
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 36. ed. São Paulo: Malheiros,
2013, p. 26.
30
SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros, 2006, p.
133.
24

especial a tomada de decisão; (iii) as que fixam prazo para que sejam
revistos os atos administrativos; (iv) a que prevê a súmula vinculante,
cujo objetivo, expresso no § 1º do art. 103-A da CF, é o de afastar
controvérsias que gerem “grave insegurança jurídica e relevante
multiplicação de processos sobre questão idêntica”; (v) a que prevê o
incidente de resolução de demandas repetitivas, que também tem o
objetivo expresso no art. 976, inciso II, do Código de Processo Civil
(CPC) de proteger a isonomia e a segurança jurídica.31

Os séculos de evolução e de avanços na seara jurídica, desde o Estado


Absolutista ao Estado de Direito e, atualmente Estado Constitucional de Direito
puderam ser analisados de forma a ter uma melhor compreensão dos acontecimentos
e fatos, que são resumidos por João Nunes Morais Junior da seguinte maneira:

A concepção liberal de Estado inicialmente pretendeu, e efetivamente


o fez, retirar o poder político das mãos do monarca (Estado absolutista)
e, para isso, apresentou a justificativa racional para a existência da
organização estatal, valendo-se principalmente das teorias
contratualistas de Locke e Montesquieu. Deste modo, ressaltou-se a
importância do Parlamento tendo em vista, agora, o governo de leis,
aprovadas pelos cidadãos e não mais provenientes do arbítrio do
monarca.32

Ainda, nesse sentido, reforça o processo da passagem do Estado Legislativo


ao Estado Constitucional de Direito:

A incorporação das conquistas históricas de direitos (liberdades,


prestações, democracia etc) nas constituições não possuía muita
efetividade tendo em vista que o poder decisivo estava na Assembleia
Legislativa. Em razão de tal circunstância (e da conjuntura), cada vez
mais se busca afirmar o caráter normativo da constituição a fim de lhe
dar efetividade. Em decorrência dessa afirmação de normatividade da
constituição, a relação entre poder político e direito teve um novo
enfoque: a passagem do Estado legislativo para o Estado
constitucional.33

Percorrido este breve itinerário histórico sobre a criação do conceito de Estado


de Direito, iremos no decorrer desta pesquisa abranger o caráter institucional da
segurança jurídica vinculada ao interesse público dentro do âmbito do direito tributário.

31
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. O STJ e o princípio da segurança jurídica. Revista do Advogado,
São Paulo, v. 39. n. 141. 2019, p. 160-166.
32
MORAIS JUNIOR, João Nunes. Estado Constitucional de Direito: breves considerações sobre o
Estado de Direito. In: Revista de Direito Público, Londrina, v. 2, n. 3, p.119-136, set/dez 2007.
Quadrimestral. Disponível em:
<http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/11546/10249>. Acesso em: 23
set. 2020.
33
MORAIS JUNIOR, João Nunes. Estado Constitucional de Direito: breves considerações sobre o
Estado de Direito. In: Revista de Direito Público, Londrina, v. 2, n. 3, p.119-136, set/dez 2007.
Quadrimestral. Disponível em:
<http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/article/download/11546/10249>. Acesso em: 23
set. 2020.
25

Bem como veremos que a construção do Estado de Direito como se deu ao longo dos
séculos, ainda reflete nos posicionamentos na atuação do Estado frente a esfera
administrativa e jurídica.

1.2 O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E SUAS IMPLICAÇÕES PRÁTICAS

Indiscutível o fato de que a segurança é um valor fundamental do sistema


jurídico, visto que a precípua função do direito é atuar em prol da estabilidade das
relações sociais, permitindo que a sociedade possa conviver pacificamente se
desenvolvendo de forma mais ordenada e equilibrada. Tal qual se faz a segurança
inerente ao Direito, Carmen Lúcia Antunes da Rocha qualifica essa segurança como
uma qualidade do sistema jurídico:

A segurança não é, contudo, valor, é qualidade de um sistema ou de


sua aplicação. Valor é a justiça, que é buscada pela positivação e
aplicação de qualquer sistema. O que é seguro pode não ser justo, mas
o inseguro faz-se injustiça ao ser humano, tão carente de certeza é ele
em sua vida.34

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, enuncia já em seu


art. 1º, ao inaugurar o Título I (Dos Princípios Fundamentais) que a República
Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito. 35 Assim, sob a égide
da supremacia da Constituição, surge a segurança jurídica como princípio elementar
do Estado de Direito como bem aponta José Joaquim Gomes Canotilho ao ressaltar
que “... desde cedo se consideravam princípios da segurança jurídica e da proteção
da confiança como elementos constitutivos do Estado de Direito”. 36

34
ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Coordenadora. Constituição e Segurança Jurídica: Direito
Adquirido, Ato Jurídico Perfeito e Coisa Julgada. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 168.
35
CF: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais
do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político”. In: Constituição da República Federativa
do Brasil: D.O. 5 de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 05 out.
2020.
36
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed.
Coimbra: Almedina, 2000. p. 256.
26

A segurança jurídica, ainda em seu ideal primário, foi pautada durante o Alto
Império Romano, quando Ulpiano teria esboçado os primeiros traços dessa ideia que
viria a ser citada anos mais tarde no Digesto37 de Justiniano, sobre a história de um
escravo nomeado pretor em Roma, conforme denota Almiro do Couto e Silva:

O exemplo mais antigo e talvez mais célebre do que acabamos de


afirmar está no fragmento de Ulpiano, constante do Digesto, sob o título
«de ordo praetorum» (D1.14.1), no qual o grande jurista clássico narra
o caso do escravo Barbarius Philippus que foi nomeado pretor em
Roma. Indaga Ulpiano: «Que diremos do escravo que, conquanto
ocultando essa condição, exerceu a dignidade pretória? O que editou,
o que decretou, terá sido talvez nulo? Ou será válido por utilidade
daqueles que demandaram perante ele, em virtude de lei ou de outro
direito?». E responde pela afirmativa. 38

Tendo por referência o equilíbrio constitucional que engendra o Estado


Democrático de Direito, as suas características principais podem ser divididas,
segundo Sylvia Calmes, em três categorias: a primeira seria ligada aos “elementos
constitutivos” (Konstitutionselemente) que o caracterizam, portadores da função de
determinação (Massgebung); a segunda categoria corresponderia aos seus
“elementos nomocráticos” (Nomokratie-Elemente) dotados da função de regulação
(Regelmass), onde, dentre eles, se destacam a vinculação geral à lei, a interdição do
arbítrio, a restituição da conformidade com o Direito, a segurança jurídica, a
submissão geral às decisões judiciais e a imparcialidade; e por fim, os “elementos
relativizadores” (Relationselemente) correspondente à função de adequação
(Angemessenheit).39
Sendo assim, emerge o princípio da segurança jurídica como um dos principais
pilares do Estado Democrático de Direito, uma vez que tem por sua natureza trazer

37
“O Corpus Juris Civilis, fruto da convocação de diversos juristas por Justiniano, uma grande
compilação das fontes existentes do direito romano, se divide em quatro livros. O primeiro é o Código,
que consiste em uma compilação das ordens imperiais anteriores a Justiniano. O segundo, que constitui
a parte mais importante e que vai gerar toda a recepção na Idade Média, é o Digesto ou Pandectas
que, por sua vez, compreende uma compilação de 1500 livros escritos por jurisconsultos do período
romano, existindo uma hierarquia entre as opiniões dos jurisconsultos. O terceiro são as Institutas, que
são um manual básico do ensino jurídico. O quarto são as Novelas, que são as decisões, os decretos
e leis formuladas por Justiniano”. In: RODRIGUES, Marcele Marques. O Ressurgimento do Direito
Romano na Baixa Idade Média. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF. Disponível
em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51510/o-ressurgimento-do-direito-romano-na-
baixa-idade-media. Acesso em: 08 out. 2020.
38
SILVA, Almiro do Couto e. O princípio da segurança jurídica (proteção à confiança) no direito público
brasileiro. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 237, p. 271-316, jul. 2004. ISSN 2238-
5177. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/44376>. Acesso em:
08 out. 2020.
39
CALMES, Sylvia. Du principe de protection de la confiance légitime en droits allemand,
communautaire et français. Paris: Dalloz, 2001, p. 89-92.
27

estabilidade para as relações jurídicas com o enfoque de proporcionar confiança para


a sociedade nos atos, procedimentos e condutas emanadas pelo Estado ou ainda, de
forma objetiva, assegurar a irretroatividade de novas interpretações da lei no âmbito
da Administração Pública. Destaca-se a segurança jurídica, nas palavras de Paulo de
Barros Carvalho, como algo implícito ao ordenamento regido pelos ditames
proclamados:

A segurança jurídica é, por excelência, um sobreprincípio. Não temos


notícia de que algum ordenamento a contenha como regra explícita.
Efetiva-se pela atuação de princípios, tais como o da legalidade, da
anterioridade, da igualdade, da irretroatividade, da universalidade da
jurisdição e outros mais.40

Quanto a relevância dos princípios dentro da ordem jurídica, Hugo de Brito


Machado assevera:

O princípio jurídico tem grande importância como diretriz para o


hermeneuta. Na avaliação e na aplicação dos princípios jurídicos é que
o jurista se distingue do leigo, que tenta interpretar a norma jurídica
com conhecimento simplesmente empírico.41

É nesse sentido que Gilmar Ferreira Mendes também abarca o instituto da


segurança jurídica, como um subprincípio do Estado de Direito ao afirmar: “Em
verdade, a segurança jurídica, como subprincípio do Estado de Direito, assume valor
ímpar no sistema jurídico, cabendo-lhe papel diferenciado na realização da própria
ideia de justiça material”.42
Articulado ao ideário do princípio da segurança jurídica como peça fundamental
do Estado Constitucional de Direito, sendo visto como um sobreprincípio, o Ministro
Celso de Mello destacou a imperiosidade da manutenção das relações e situações já
consolidadas com o decurso temporal, sendo categórico quanto ao tema em seu voto
proferido no julgamento do Recurso Extraordinário 646.313 AgR:

O postulado da segurança jurídica, enquanto expressão do Estado


Democrático de Direito, mostra-se impregnado de elevado conteúdo
ético, social e jurídico, projetando-se sobre as relações jurídicas,
mesmo as de direito público (RTJ 191/922), em ordem a viabilizar a
incidência desse mesmo princípio sobre comportamentos de qualquer

40
CARVALHO, Paulo de Barros. Tributo e Segurança Jurídica. In: LEITE, Salomão George (Org.). Dos
Direitos Constitucionais Considerações em torno das normas principiológicas da Constituição.
São Paulo: Malheiros, 2003, p. 360.
41
MACHADO, Hugo de Brito. Os Princípios Jurídicos da Tributação na Constituição de 1988. 5.
ed. São Paulo: Editora Dialética, 2004, p. 157.
42
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 8.
ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 382.
28

dos Poderes ou órgãos do Estado, para que se preservem, desse


modo, sem prejuízo ou surpresa para o administrado, situações já
consolidadas no passado. A essencialidade do postulado da segurança
jurídica e a necessidade de se respeitarem situações consolidadas no
tempo, especialmente quando amparadas pela boa-fé do cidadão,
representam fatores a que o Poder Judiciário não pode ficar alheio. 43

Adentrando ao campo do Poder Judiciário há manifestações acerca do princípio


da segurança jurídica por meio da jurisprudência, onde o Superior Tribunal de Justiça
remeteu-se ao princípio como “basilar na salvaguarda da pacificidade e estabilidade
das relações jurídicas, por isso não é despiciendo que a segurança jurídica seja a
base do Estado de Direito, elevada ao altiplano axiológico”.44
Essa segurança direcionada às relações jurídicas funciona de forma sistêmica,
podendo ter dupla função: objetiva e outra subjetiva. A natureza objetiva é aquela que
está vinculada aos limites à retroatividade das ações realizadas pelos órgãos do
Estado, englobando inclusive os atos emanados do poder legislativo e por outro lado,
a dimensão subjetiva atém-se à confiança da sociedade nos atos, condutas e
procedimentos oriundos do poder estatal – princípio da proteção à confiança.45 Quanto
a essa temática, indispensável fazer a diferenciação entre segurança jurídica e da
proteção à confiança, com base na raiz epistemológica dos termos – de sua
concepção germânica - uma vez que a segurança jurídica (Rechtssicherheit) é
vinculada ao caráter objetivo e a proteção à confiança (Vertrauensschutz) relacionada
ao cunho subjetivo. 46 O doutrinador português José Joaquim Gomes Canotilho
referenda acerca dos dois princípios:

Em geral, considera-se que a segurança jurídica está conexionada com


elementos objetivos da ordem jurídica – garantia de estabilidade
jurídica, segurança de orientação e realização do direito – enquanto a
proteção da confiança se prende mais com as componentes subjetivas

43
BRASIL. Supremo Tribunal Federal, RE 646.313 AgR, Relator Ministro Celso de Mello. Data do
Julgamento: 18 nov. 2014. Disponível em: <
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=7450363>. Acesso em 09 out.
2020.
44
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, REsp nº 658.130/SP, Relator Ministro Luiz Fux. Data do
Julgamento: 05 set. 2006. Disponível em: <
https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=200400525951&dt_publicacao=
28/09/2006>. Acesso em 09 out. 2020.
45
COUTO E SILVA, Almiro. O Princípio da Segurança Jurídica (Proteção à Confiança) no Direito
Público Brasileiro e o direito da Administração Pública de anular seus próprios Atos Administrativos: o
Prazo Decadencial do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União (Lei 9.784/99). Revista
Eletrônica de Direito do Estado, n. 2, v. 1, abr-jun. 2005, p. 27-28.
46
SOUZA, Victor Roberto Corrêa de. O princípio da proteção da confiança e o novo código de processo
civil brasileiro. Revista de Processo, São Paulo, v. 40, n. 247, p. 197-226, set. 2015. Disponível em:
<http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos
_produtos/bibli_boletim/bibli_bol_2006/RPro_n.247.08.PD>. Acesso em 10 out. 2020.
29

da segurança, designadamente a calculabilidade e previsibilidade dos


indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos atos.47

Ainda, aduz José Joaquim Gomes Canotilho que o princípio geral da segurança
jurídica pode ser, em sentido amplo, compreendido:

O indivíduo tem como direito poder confiar em que aos seus atos ou às
decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou
relações jurídicas alicerçados em normas jurídicas vigentes e válidas
por esses atos jurídicos deixados pelas autoridades com base nessas
normas se ligam os efeitos jurídicos previstos e prescritos no
ordenamento jurídico poderes.48

Cumpre mencionar que a partir da hierarquia normativa, é dever do Estado a


promoção e a aplicação de medidas que propiciem uma certa previsibilidade do direito
fazendo com que o ideário de Estado de Direito em si, se perfectibilize.49 Não obstante,
é preciso compreender que a segurança no direito pode ser, segundo José Afonso da
Silva, entendida de duas formas: a segurança do direito e segurança jurídica, uma vez
que a primeira torna a positividade do direito imprescindível – sendo explicitada pela
própria Constituição:

A segurança do direito, como visto, é um valor jurídico que exige a


positividade do direito, enquanto a segurança jurídica é já uma garantia
que decorre dessa positividade. Assim é que o direito constitucional
positivo, traduzido na Constituição, é que define os contornos da
segurança jurídica da cidadania.50

Por outra ótica, à luz dos ensinamentos de Humberto Ávila, a segurança jurídica
pode ser compreendida sobre três prismas: a segurança como fato – a capacidade de
previsibilidade e certeza dos possíveis imbróglios jurídicos; em segundo, a segurança
como valor – tipo de idealização do ordenamento jurídico balizado em uma aplicação
por um juízo valorativo anteriormente estabelecido; e terceiro, a segurança como uma
norma-princípio – pode ser vista como uma prescrição normativa dentro da norma
jurídica, de forma não explícita e sim reconhecível. 51

47
CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra:
Almedina, 2002, p. 256.
48
Ibidem, p. 257.
49
MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes Obrigatórios. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2011, p. 120.
50
SILVA, José Afonso da. Constituição e Segurança Jurídica. In: ROCHA, Cármen Lúcia Antunes
(coord.). Constituição e Segurança Jurídica: Direito Adquirido, Ato Jurídico Perfeito e Coisa
Julgada. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 17.
51
ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica: entre permanência, mudança e realização no direito
tributário. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 114-116 e 255.
30

Portanto, a aplicação da segurança jurídica se faz indispensável à manutenção


do Estado Democrático de Direito visto que ela possibilitará uma certa estabilidade na
ordem jurídica do Estado, bem como das relações jurídicas subsequentes – pautadas
pela confiança dos indivíduos na sociedade civil organizada. Vinculado ao ideal dessa
estabilidade, plausível seria afirmar que o gênero “princípio da segurança jurídica” lato
sensu, da forma como explanado e sistematizado anteriormente, isto é, decorrente da
confluência das três dimensões: previsibilidade, acessibilidade e estabilidade - poderia
ser bipartido em: a) o sentido objetivo, tido como a segurança jurídica stricto sensu,
confluindo à ordem jurídica, objetivamente considerada; b) o sentido subjetivo, assim
considerado a proteção da confiança depositada legitimamente pelos cidadãos nos
atos e promessas feitas pelo Estado, em suas mais variadas espécies de atuação. 52
Com essa dimensão subjetiva do princípio da segurança jurídica é possível observar
a sua amplitude que pode ser vista como a base do Estado Democrático de Direito,
sendo que nessa direção Eduardo Luiz Penariol colaciona:

Pois, quando analisamos o próprio sentido do estado de direito que tem


como condão principal propiciar o bem-estar do cidadão e o seu
desenvolvimento em sociedade, com a pacificação social, sendo,
portanto imprescindível a presença das consequências da aplicação do
instituto da segurança jurídica, em suas diversas dimensões visando
propiciar a estabilidade e sentimento de confiança para sociedade. 53

No dia 5 de outubro de 1988, foi promulgada a Constituição da República


Federativa do Brasil que trouxe grandes avanços à construção do Estado Democrático
de Direito, consagrando, especialmente em seu art. 5º e incisos, os chamados direitos
individuais e as garantias fundamentais, das quais se destacam as garantias
processuais como o direito ao contraditório e à ampla defesa, a inadmissibilidade de
provas ilícitas, não ser considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença

52
CALMES, Sylvia. Du principe de protection de la confiance légitime en droits allemand,
communautaire et français. p. 169. In: MAFFINI, Rafael. Princípio da proteção da confiança legítima.
Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André
Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício
Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível
em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/120/edicao-1/principio-da-protecao-da-confianca-
legitima>. Acesso em 12 out. 2020.
53
PENARIOL, Eduardo Luiz. A importância da aplicação do instituto da segurança jurídica, no âmbito
do Direito Processual Civil brasileiro, frente as frequentes alterações legislativas. In: Âmbito Jurídico,
Rio Grande, XV, n. 104, set 2012. Disponível em: < https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-
processual-civil/a-importancia-da-aplicacao-do-instituto-da-seguranca-juridica-no-ambito-do-direito-
processual-civil-brasileiro-frente-as-frequente-alteracoes-legislativas/>. Acesso em 19 out. 2020.
31

penal condenatória, dentre outros. E, é com essa percepção que Humberto Ávila
reitera acerca do princípio da segurança jurídica:

O princípio da segurança jurídica é construído de duas formas. Em


primeiro lugar, pela interpretação dedutiva do princípio maior do Estado
de Direito (art. 1º). Em segundo lugar, pela interpretação indutiva de
outras regras constitucionais, nomeadamente as de proteção do direito
adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (art. 5º XXXVI) e
das regras da legalidade (art. 5º, II, e art. 150, I), da irretroatividade (art.
150, III, ‘a’) e da anterioridade (art. 150, III, ‘b’).

Em todas essas normas, a Constituição Federal dá uma nota de


previsibilidade e proteção de expectativas legitimamente constituídas
e que, por isso mesmo, não podem ser frustradas pelo exercício da
atividade estatal.54

Na esfera dos preceitos da Carta Magna é perceptível a primazia do texto


constitucional pelo princípio da segurança jurídica, ainda que não de forma expressa
em seu conteúdo, mas sim implicitamente. Não por acaso, quando mencionado o
referido princípio, comumente remete-se a outros princípios como o da venire contra
factum proprium55 ou até mesmo da boa-fé administrativa. 56
Nesse diapasão, a previsão legal do art. 5º, em seu inciso XXXVI, da
Constituição Federal 57 comina que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato
jurídico e a coisa julgada objetivando firmar assim, principalmente, a segurança
jurídica da prestação jurisdicional. Sobre o referido dispositivo e a segurança jurídica,
Osmar Mendes Paixão Côrtes aduz:

No nosso entender, a referência constitucional à coisa julgada garante


o respeito absoluto à garantia, no sentido de não protegê-la apenas em
face de lei que possa desrespeitá-la, mas também decisões judiciais.
Isto porque a intenção da norma é a de, alcançando em nível
constitucional, assegurar a observância contra qualquer ataque, por
representar, a coisa julgada, instrumento de efetividade do valor
máximo segurança jurídica.58

54
ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 295.
55
“[...] venire contra factum proprium postula dois comportamentos da mesma pessoa, lícitos entre si e
diferidos no tempo. O primeiro — o factum proprium — é, porém, contrariado pelo segundo. Esta
fórmula provoca, à partida, reacções afectivas que devem ser evitadas”. In: CORDEIRO, António
Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Lisboa: Almedina, 2001, p. 745.
56
PENTEADO, Luciano de Camargo. Figuras parcelares da boa-fé objetiva e venire contra factum
proprium. Revista de Direito Privado, v. 27, 2006, p. 252-278.
57
CF: “Art. 5º, XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”
In: BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: D.O. 5 de outubro de 1988. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 21 out.
2020.
58
CÔRTES, Osmar Mendes Paixão. Súmula Vinculante e Segurança Jurídica. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2008, p. 35.
32

O sistema jurídico pátrio insere o princípio da segurança jurídica em


decorrência do princípio do Estado de Direito, o que fica claro através da leitura de
vários dispositivos constitucionais onde há a projeção de direitos e garantias
fundamentais através da previsão de limitações aos poderes.59 Compreende-se a
segurança jurídica como um valor fundamental e básico do ordenamento jurídico,
como explica Eurico Marcos Diniz de Santi:

A segurança jurídica é um valor fundamental que o ordenamento


jurídico persegue. O direito-em-si não apresenta essa segurança, se
apresentasse esse cânone seria desnecessário. Muito pelo contrário,
o direito convive com o risco, com a insegurança: todas as normas
jurídicas infraconstitucionais e constitucionais são, com exceção das
chamadas cláusulas pétreas e das normas individuais e concretas que
recebem o efeito da coisa julgada, susceptíveis de alteração, seja
mediante controle jurisdicional, seja mediante o exercício das
competências legislativa, judicial e administrativa. Por isso, a
determinação do direito só é aferível no horizonte do presente. A
segurança jurídica do futuro é garantir a estabilidade jurídica ao
presente, que se torna passado.60

Quanto a atuação do Poder Executivo fundamentada pelos preceitos da Carta


Magna, que atribuiu sua atividade primária à concretização dos mandamentos legais
do ordenamento jurídico por meio da edição de atos administrativos, atos normativos
ou contratos administrativos, há algumas delimitações que também buscam a
preservação da segurança jurídica: a proibição de revogar ou de anular atos anteriores
com base nos quais o contribuinte tenha praticado atos de disposição ou ainda, o
dever de edição de normas de transição quando da modificação abrupta de
entendimento – ou seja, sempre visando maior cognoscibilidade, confiabilidade e
calculabilidade do Direito. 61
No espectro da Administração Pública faz-se imprescindível a obediência a
outros dois princípios além da segurança jurídica: o da legalidade e da proteção da
confiança. Corrobora, nesse sentido, Lucas Rocha Furtado que:

[...] por mais contraditório ou sem sentido que possa parecer, o


princípio da segurança jurídica surge para conter ou limitar a aplicação
do princípio da legalidade administrativa, sobretudo em relação à

59
PAULSEN, Leandro. Segurança Jurídica, Certeza do Direito e Tributação: A concretização da
certeza quanto à instituição de tributos através das garantias da legalidade, da irretroatividade e da
anterioridade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 40-43.
60
SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e prescrição no Direito Tributário. São Paulo: Max
Limonad, 2000, p. 77.
61
ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica: entre permanência, mudança e realização no direito
tributário. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p.159-160.
33

possibilidade de a Administração Pública anular atos ilegais que


tenham, todavia, gerado benefícios favoráveis a terceiros. 62

Quanto aos atos administrativos, fundamental evidenciar o mecanismo


cominado no Decreto nº 70.237/72: a consulta administrativa. Em linhas gerais, a
consulta administrativa tem por mérito sanar questões pertinentes à incidência ou não
de certos tributos, de forma a propiciar ao contribuinte um meio de obter certeza do
direito, promovendo a segurança jurídica da transação e diminuindo o risco tributário,
além de conferir calculabilidade à atividade administrativa. 63
Ainda na seara do Poder Executivo atrelado ao princípio da segurança jurídica,
Almiro Couto e Silva compõe acerca da proteção individual e coletiva das relações
interindividuais, bem como dos indivíduos para com o Estado:

Nessa moldura, não será necessário sublinhar que os princípios da


segurança jurídica e da proteção à confiança são elementos
conservadores inseridos na ordem jurídica, destinado à manutenção
do status quo e a evitar que as pessoas sejam surpreendidas por
modificações do direito positivos ou na conduta do Estado, mesmo
quando manifestadas em atos ilegais, que possa ferir os interesses dos
administrados ou frustrar-lhes as expectativas.64

No âmbito do Poder Legislativo, como é possível perceber pela redação do


inciso XXXVI do art. 5º da Constituição Federal 65 que remete ao princípio da
irretroatividade das leis e está elencado no rol das garantias fundamentais, a primazia
pelo princípio da segurança jurídica resta evidenciada. Portanto, uma vez que o
princípio da irretroatividade da lei está amparado pelo arcabouço constitucional, este
confere proteção às inovações legislativas que culminem em alterações gravosas dos
efeitos jurídicos atinentes a fatos passados. 66

62
FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Direito Administrativo. Belo Horizonte: Ed. Fórum, 2007, p.
125.
63
ÁVILA, Humberto. Teoria da Segurança Jurídica. 4. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros,
2016, p. 476.
64
COUTO E SILVA, Almiro. O Princípio da Segurança Jurídica (Proteção à Confiança) no Direito
Público Brasileiro e o direito da Administração Pública de anular seus próprios Atos Administrativos: o
Prazo Decadencial do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União (Lei 9.784/99). Revista
Eletrônica de Direito do Estado, n. 2, v. 1, abr-jun. 2005, p. 30.
65
CF: “Art. 5º, XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”.
In: BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. D.O 5 de outubro
de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso
em 21 out. 2020.
66
PAULSEN, Leandro. Segurança Jurídica, Certeza do Direito e Tributação: A concretização da
certeza quanto à instituição de tributos através das garantias da legalidade, da irretroatividade e da
anterioridade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 113.
34

Entretanto, indispensável fazer menção que a não retroatividade da lei é algo


intrínseco ao Direito e seus princípios gerais e não algo exclusivo de previsão
constitucional, como bem elucida José Afonso da Silva:

Vale dizer, portanto, que a Constituição não veda a retroatividade da


lei, a não ser da lei penal que não beneficie o réu. Afora isto, o princípio
da irretroatividade da lei não é de Direito Constitucional, mas princípio
geral de Direito. Decorre do princípio de que as leis são feitas para
vigorar e incidir para o futuro. Isto é: são feitas para reger situações
que se apresentem a partir do momento em que entram em vigor. Só
podem surtir efeitos retroativos quando elas próprias o estabeleçam
(vedado em matéria penal, salvo a retroatividade benéfica ao réu),
resguardados os direitos adquiridos e as situações consumadas
evidentemente.67

Dessa forma, Humberto Ávila, bem preceitua que “A atitude anterior do


legislador vincula sua atividade posterior. O legislador, ao criar regras, vincula-se às
suas próprias decisões fundamentais anteriores na regulação da mesma matéria”. 68
Portanto, consagra-se a irretroatividade das leis como uma clara manifestação do
princípio da segurança jurídica – pode-se falar no sobreprincípio, tal que é inerente ao
ordenamento jurídico -, uma vez que demonstra propender à preservação das
situações decorridas com vistas a atribuir uma intangibilidade ao pretérito. 69
Com intuito da preservação da segurança jurídica, o Poder Legislativo cumpre
certos deveres como a determinabilidade das hipóteses de incidência de determinada
lei, da proibição de restrição de direito adquiridos, dos atos jurídicos perfeitos ou de
coisas julgadas, a proibição de legislação retroativa que atinja a confiança legítima,
além da obrigação de instituição de regras de transição ou cláusulas de equidade,
dentre outros. 70
Inclusive, indispensável trazer à baila o que a Lei de Introdução ao Código Civil
ressalta em seu artigo 6º: “a Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o
ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”. Para tanto, têm-se por ato
jurídico perfeito o que já resta consumado pela lei vigente ao tempo em que se ocorreu
(§ 1º do artigo 6º da LICC); como direito adquirido, os direitos que o seu titular, ou

67
SILVA, José Afonso da. Reforma Constitucional e Direito Adquirido. Revista de Direito
Administrativo, Rio de Janeiro, v. 213, jul. 1998, p. 121. Disponível em:<
http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/viewFile/47202/45410>. Acesso em 22 out. 2020.
68
ÁVILA, Humberto. O postulado do legislador coerente e a não-cumulatividade das contribuições. In:
ROCHA, Valdir de Oliveira. Grandes questões atuais do Direito Tributário. 11º volume. São Paulo:
Dialética, 2007, p. 178.
69
COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 68.
70
ÁVILA, Humberto. Teoria da Segurança Jurídica. 4. ed. rev. Atual. e ampl. São Paulo: Malheiros,
2016, p. 177.
35

terceiro por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo
pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem (§ 2º do artigo
6º da LICC; e, por fim, a coisa julgada como a decisão judicial da qual já não caiba
mais recurso (§ 3º do artigo 6º da LICC). 71 O Supremo Tribunal Federal no julgamento
da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 493-0/DF, sedimentou o seguinte
entendimento da proteção constitucional acerca da coisa julgada, do ato jurídico
perfeito e do direito adquirido:

[...] visa dar concreção e efetividade à necessidade de preservação da


segurança das relações jurídicas instituídas e estabelecidas sob a
égide do próprio ordenamento positivo. 72

Nesse seguimento, corrobora Joaquim José Gomes Canotilho sobre a relação


da segurança jurídica com a conceituação do ato jurídico perfeito, do direito adquirido
e da coisa julgada, reforçando que o princípio da confiança jurídica e da segurança
jurídica estão inerentemente atrelados ao Estado de Direito:

Os princípios da proteção da confiança e da segurança jurídica podem


formular-se assim: o cidadão deve poder confiar em que aos seus atos
ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições
jurídicas e relações, praticados ou tomadas de acordo com as normas
jurídicas vigentes, se ligam os efeitos jurídicos duradouros, previstos
ou calculados com base nessas mesmas normas. Estes princípios
apontam basicamente para: (1) a proibição de leis retroativas; (2) a
inalterabilidade do caso julgado; (3) a tendencial irrevogabilidade de
atos administrativos constitutivos de direitos. 73

Não obstante, na seara da legislação penal observa-se a impossibilidade da


retroatividade de nova lei incriminadora, ou seja, qualquer novo aspecto disciplinado
pelo Direito Penal e de cunho punitivo que possa ser considerada novatio legis in pejus
recairá sobre a regra geral da irretroatividade penal. 74 Entretanto, quando observada
a situação contrária, a nova lei penal mais benéfica – novatio legis in mellius -

71
CASALI, Guilherme Machado. Sobre o conceito de Segurança Jurídica. Disponível em:<
http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/bh/guilherme_machado_casali.pdf>.
Acesso em: 23 out. 2020.
72
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI nº 493-0/DF. Relator: Ministro Moreira Alves. Disponível
em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266383>. Acesso em 25
out. 2020.
73
CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito constitucional. 6. ed. Coimbra: Almeida, 1995, p. 373.
74
MORAES, Alexandre Rocha Almeida de. Lei penal no tempo. Enciclopédia jurídica da PUC-SP.
Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito
Penal. Christiano Jorge Santos (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, 2017. Disponível em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/420/edicao-1/lei-penal-
no-tempo>. Acesso em 25 de out. de 2020.
36

retroagirá para beneficiar o agente do fato. Dentro da temática da retroatividade da lei


mais favorável 75 ao agente, Cezar Roberto Bitencourt sinaliza:

[...] é indispensável investigar qual a que se apresenta mais favorável


ao indivíduo tido como infrator. A lei anterior, quando for mais favorável,
terá ultratividade e prevalecerá mesmo ao tempo de vigência da lei
nova, apesar de já estar revogada. O inverso também é verdadeiro, isto
é, quando a lei posterior foi mais benéfica, retroagirá para alcançar
fatos cometidos antes de sua vigência.76

Observando os ditames constitucionais, direitos e garantias fundamentais


assegurados aos indivíduos integrantes do Estado Democrático de Direito, é possível
depreender que o princípio da segurança jurídica é engendrado, no plano do Direito
Tributário, na figura do cidadão comum em face do ente estatal, ou seja, tem um ânimo
protetivo do contribuinte que nas palavras de Humberto Ávila acerca dessa
característica, denota:

Em razão disso [...], o Estado não pode valer-se do princípio da


proteção da confiança, no âmbito do Direito Tributário, para tornar
intangíveis determinados efeitos passados, tendo em vista que esse
princípio, nesse âmbito, serve ao contribuinte, e não ao Estado.77

No campo do Direito Tributário, o constituinte tratou de insculpir mecanismos


de limitação constitucional ao poder de tributar. Pode-se exprimir essa vontade do
constituinte a partir da leitura, ipsis litteris, do art. 150 da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988:

Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao


contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios:

I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem


em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de
ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente
da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

75
O Supremo Tribunal Federal consagrou sobre esse princípio o entendimento de que é possível a
retroatividade da lei, desde que seja com o fim de beneficiar o agente como visto no julgamento do HC
113717/SP: “A lei nova é lex in melius e por isso deve retroagir, por força do disposto no art. 5º, inc.
XL, da Constituição: a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar”. In: BRASIL. Supremo Tribunal
Federal. HC 113.717/SP. Relator: Ministro Luiz Fux. Data do Julgamento: 26 fev. 2013. Disponível em:
< http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=3512489>. Acesso em 25 out.
2020.
76
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral. 11. ed. Vol. 1. São Paulo:
Saraiva, 2007, p. 162.
77
ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica: entre permanência, mudança e realização no Direito
Tributário. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 150.
37

III – cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência


da lei que os houver instituído ou aumentado.78

Oriundo dos preceitos constitucionais, o poder de tributar é conferido aos entes


públicos com dispositivos limitadores que visam promover a segurança jurídica por via
dos princípios da legalidade e irretroatividade tributária. 79
Há de se falar nos institutos normativos da prescrição e decadência quando de
sua interação com o princípio da segurança jurídica, da proteção à confiança, da
legalidade entre outros resguardados em nossa Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988 no âmbito da administração pública. Cumpre inferir que o decurso
temporal – ou seja, com o passar do tempo – as situações e fatos se consolidam, as
memórias se perdem e as provas se esvaem e, por essa razão, o ordenamento jurídico
inclui a previsão de prazos limítrofes ao exercício de direitos (decadência), bem como
à busca da tutela jurisdicional (prescrição). Imprescindível aludir que os institutos da
decadência, prescrição, coisa julgada e ato jurídico perfeito, são fenômenos que visam
à concretização da segurança jurídica. 80 Carlos Roberto Gonçalves assim leciona
sobre a importância da prescrição para o Direito:

O instituto da prescrição é necessário, para que haja tranquilidade na


ordem jurídica, pela consolidação de todos os direitos. Dispensa a
infinita conservação de todos os recibos de quitação, bem como o
exame dos títulos do alienante e de todos os seus sucessores, sem
limite de tempo.81

Sinteticamente, a prescrição é a extinção da pretensão em razão da inércia de


seu titular pelo decurso de lapso temporal determinado, ou seja, na esfera processual
o que acaba por ser extinta é ação em si e não propriamente o Direito, que resta

78
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: D.O. 5 de outubro de 1988. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 25 out.
2020.
79
BARRETO, Simone Rodrigues Costa. Retroatividade. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso
Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito
Tributário. Paulo de Barros Carvalho, Maria Leonor Leite Vieira, Robson Maia Lins (coord. de tomo). 1.
ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível
em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/288/edicao-1/retroatividade>. Acesso em 27 out.
2020.
80
PAULSEN, Leandro. Segurança Jurídica, Certeza do Direito e Tributação: A concretização da
certeza quanto à instituição de tributos através das garantias da legalidade, da irretroatividade e da
anterioridade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 58.
81
GONÇALVES, Carlos Roberto. Curso de Direito Civil. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, v. 1, p.
516.
38

indene.82 Acerca dessa temática, Raphael Peixoto de Paula Marques ao citar a lição
de San Tiago Dantas, assevera:

Esta influência do tempo, consumido o Direito pela inércia do titular,


serve a uma das finalidades supremas da ordem jurídica, que é
estabelecer a segurança das relações sociais. Como passou muito
tempo sem modificar-se o atual estado das coisas, não é justo que se
continue a expor as pessoas à insegurança que o direito de reclamar
mantém sobre todos, como uma espada de Dâmocles. A prescrição
assegura que, daqui em diante, o inseguro é seguro; quem podia
reclamar não mais pode. De modo que o instituto da prescrição tem
suas raízes numa das razões de ser da ordem jurídica: estabelecer a
segurança nas relações sociais — fazer que o homem possa saber
com que conta e com o que não conta.83

Em outras palavras, o instituto da prescrição não se aplica tão somente ao


Direito Civil, mas também na esfera tributária onde dispõe de singularidades que a
distinguem da aplicada em outros ramos do ordenamento jurídico pátrio. Em suma, a
prescrição é oriunda da necessidade de estabilidade nas relações jurídicas. 84 A
matéria da prescrição que está disciplinada nos arts. 189 a 206 do Código Civil tem
como prazo geral o lapso temporal de 10 anos (art. 205), entretanto há também os
prazos especiais elencados no art. 206 do mesmo diploma legal. Ao tratar dos prazos
prescricionais, Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda colaciona:

Os prazos prescricionais servem à paz social e à segurança jurídica.


Não destroem o Direito, que é; não cancelam, não apagam as
pretensões; apenas, encobrindo a eficácia da pretensão, atendem à
conveniência de que não perdure por demasiado tempo a exigibilidade
ou a acionabilidade.85

A prescrição no âmbito do Direito Tributário está disciplinada no Código


Tributário Nacional, elencada em seu artigo 174 onde expressa que a constituição
definitiva do crédito tributário é o marco inicial do prazo prescricional de 5 anos para

82
MOURÃO, Licurgo. Prescrição e decadência: emanações do princípio da segurança jurídica nos
processos sob a jurisdição dos Tribunais de Contas. Fórum Administrativo - Direito Público - FA,
Belo Horizonte, ano 9, n. 102, ago. 2009. Disponível em:
<http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=61974>. Acesso em 12 nov. 2020.
83
MARQUES, Raphael Peixoto de Paula. O instituto da prescrição no Direito Administrativo.
Revista do Tribunal de Contas da União. jan./mar. 2003, p. 54-55.
84
MONTE, Júlio Cesar Araújo. Prescrição como instrumento legal de garantia de segurança jurídica e
a extinção do crédito tributário. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 16 nov. 2020. Disponível
em: <https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47220/prescricao-como-instrumento-legal-de-
garantia-de-seguranca-juridica-e-a-extincao-do-credito-tributario>. Acesso em: 16 nov. 2020.
85
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado: parte geral, Tomo VI. 4.
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974, p. 101.
39

a ação de cobrança do crédito tributário. 86 Pertinente se faz, mencionar a prescrição


intercorrente que trata-se da perda do direito de ação no decorrer da lide, por inércia
da parte autora, que não efetuou os atos necessários para o prosseguimento da ação
e a deixou paralisada por tempo superior ao limite cominado no CTN. 87 Não obstante,
Cássio Scarpinella fixa a prescrição intercorrente como “[…] a falta de impulso
processual pelo exequente que pode acarretar a perda da ‘pretensão’ à tutela
jurisdicional executiva”. 88
Por outra banda no instituto da decadência se tem, de acordo com Humberto
Ávila, um efeito jurídico integrado por uma regra infraconstitucional que demarca a
preponderância incondicional da segurança jurídica sobre a justiça: tal que mesmo o
contribuinte estando em débito, e sabendo que o deve, o transcurso de determinado
prazo opera para a perda do direito da Fazenda Pública de constituir o crédito
tributário. 89 Seguindo a esse modal, cumpre referir que a própria Constituição Federal
de 1988, reservou à lei complementar a competência para instituir normas gerais de
Direito Tributário no art. 146 90.
No contexto da Administração Pública, o instituto da decadência administrativa
cominado no art. 54 da Lei Federal nº 9.784/99, dispõe que decai em cinco anos o
direito de a Administração anular os atos administrativos de que decorram efeitos
favoráveis para os destinatários, salvo comprovada má-fé. Com efeito, a decadência
“é a extinção do direito pela inércia de seu titular, quando sua eficácia foi, de origem,
subordinada à condição de seu exercício dentro de um prazo prefixado, e este se

86
“Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data
da sua constituição definitiva”. In: BRASIL. Código Tributário Nacional (CTN). Lei nº 5.172 de 25 de
outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm>.
Acesso em 17 nov. 2020.
87
NOVO, Benigno Nuñez. A prescrição intercorrente em matéria tributária. Âmbito Jurídico, São
Paulo-SP: 01 mar. 2018. Disponível em: <https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-tributario/a-
prescricao-intercorrente-em-materia-tributaria/>. Acesso em 17 nov. 2020.
88
BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: Tutela Jurisdicional
Executiva, vol.3, 7. Ed., rev. E atual. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 86.
89
ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica: entre permanência, mudança e realização no Direito
Tributário. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 246-247.
90
“Art. 146. Cabe à lei complementar: I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária,
entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; II - regular as limitações constitucionais
ao poder de tributar; III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente
sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados
nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação,
lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários”. In: BRASIL. Constituição da República
Federativa do Brasil: D.O. 5 de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 18 nov.
2020.
40

esgotou sem que esse exercício se tivesse verificado”. 91 No que tange ao direito da
Fazenda Pública em constituir o crédito tributário, pelas modalidades de lançamento
de ofício e por declaração, estão disciplinadas no art. 173 do Código Tributário
Nacional. 92
Na seara tributária, a decadência refere-se à extinção de três direitos como bem
pontua Paulo de Barros Carvalho:

A decadência ou caducidade é tida como fato jurídico que faz perecer


um direito pelo seu não exercício durante certo lapso de tempo. Para
que as relações jurídicas não permaneçam indefinidamente, o sistema
positivo estipula certo período a fim de que seus titulares de direitos
subjetivos realizem os atos necessários à sua preservação, e perante
a inércia manifestada pelo interessado, deixando fluir o tempo, fulmina
a existência do direito, decretando-lhe a extinção.93

Diante do escorço anteriormente mencionado, acerca da decadência decidiu o


Supremo Tribunal Federal no julgamento do Mandado de Segurança 28.953, onde na
ocasião alinhavou o Ministro Luiz Fux:

No próprio Superior Tribunal de Justiça, onde ocupei durante dez anos


a Turma de Direito Público, a minha leitura era exatamente essa, igual
à da ministra Carmen Lúcia; quer dizer, a administração tem cinco anos
para concluir e anular o ato administrativo, e não para iniciar o
procedimento administrativo. Em cinco anos tem que estar anulado o
ato administrativo, sob pena de incorrer em decadência.

Eu registro também que é da doutrina do Supremo Tribunal Federal o


postulado da segurança jurídica e da proteção da confiança, que são
expressões do Estado Democrático de Direito, revelando-se
impregnados de elevado conteúdo ético, social e jurídico, projetando
sobre as relações jurídicas, inclusive, as de Direito Público.94

91
CÂMARA LEAL, Antônio Luiz da. Da prescrição e da decadência. 2. ed., Rio de Janeiro: Forense,
1959, p. 26.
92
"Art. 173 - O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco)
anos, contados: I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido
efetuado; II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o
lançamento anteriormente efetuado. Parágrafo único - O direito a que se refere este artigo extingue-se
definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a
constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória
indispensável ao lançamento." In: BRASIL. Código Tributário Nacional (CTN). Lei nº 5.172 de 25 de
outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm>.
Acesso em 18 nov. 2020.
93
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p.
313.
94
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 28.953/DF. Relatora Ministra Cármen Lúcia, Data do
Julgamento: 28 fev. 2012. Disponível em: <
https://jurisprudencia.s3.amazonaws.com/STF/IT/MS_28953_DF_1333232357230.pdf?AWSAccessK
eyId=AKIARMMD5JEAO67SMCVA&Expires=1623279335&Signature=9sZ98w8w%2BvqeoCJsXWeB
H%2FrmaTI%3D>. Acesso em 18 nov. 2020.
41

Sob esse jaez, cumpre inferir que o poder-dever 95 da Administração Pública de


invalidar os atos administrativos não é absoluto, vez que está aliado aos limites
instituídos por outros princípios conexos da atividade administrativa, incluindo,
aqueles que visam à devida garantia da segurança jurídica, à necessidade de
estabilização das relações sociais, à proteção da confiança e da boa-fé de terceiro
envolvidos. 96
Assegura, ainda, a Constituição da República Federativa do Brasil aos
cidadãos a obediência ao direito adquirido, ao ato jurídico perf eito e à coisa julgada.
Sendo o direito adquirido a determinação de que lei nova não poderá retroagir e
ofender o direito adquirido, como bem preceitua o art. 6º, § 2º da Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro - LINDB, de 4 de setembro de 1942, que dispõe: “§ 2º
Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa
exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição
preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem”. 97 Conceitua, também, De Plácido e
Silva sobre a temática do direito adquirido:

Por essa forma, direito adquirido quer significar o direito que já se


incorporou ao patrimônio da pessoa, já é de sua propriedade, já
constitui um bem, que deve ser juridicamente protegido contra qualquer
ataque exterior, que ouse ofende-lo ou turbá-lo. Mas, para que se
considere direito adquirido é necessário que: a) Sucedido o fato
jurídico, de que se originou o direito, nos termos da lei, tenha sido
integrado no patrimônio de quem o adquiriu; b) Resultando de um fato
idôneo, que o tenha produzido em face de lei vigente ao tempo, em que
tal fato se realizou, embora não se tenha apresentado ensejo para fazê-
lo valer, antes da atuação de uma lei nova sobre o mesmo fato jurídico,
já sucedido. O direito adquirido tira a sua existência dos fatos jurídicos
passados e definitivos, quando o seu titular os pode exercer. No
entanto, não deixa de ser adquirido o direito, mesmo quando o seu

95
“Enquanto pela tutela a Administração exerce o controle sobre outra pessoa jurídica por ela mesma
instituída, pela autotutela o controlo se exerce sobre os próprios atos, com a possibilidade de anular os
ilegais e revogar os inconvenientes ou inoportunos, independentemente de recurso ao Poder Judiciário.
É uma decorrência do princípio da legalidade/ se a Administração Pública está sujeita à lei, cabe-lhe,
evidentemente, o controle da legalidade. Esse poder da Administração está consagrado em duas
súmulas do STF. Pela nº 346, “a administração pode declarar a nulidade dos seus próprios atos”; e
pela nº 473, “a administração pode anular os seus próprios atos, quando eivados de vícios que os
tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivos de conveniência ou
oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação
judicial”. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 29. ed. rev., atual. e ampl. – Rio
de Janeiro: Forense, 2016, p. 101.
96
MOURÃO, Licurgo. Prescrição e decadência: emanações do princípio da segurança jurídica nos
processos sob a jurisdição dos Tribunais de Contas. Fórum Administrativo - Direito Público - FA, Belo
Horizonte, ano 9, n. 102, ago. 2009. Disponível em:
<http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=61974>. Acesso em 16 nov. 2020.
97
BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657.htm>. Acesso em 19 nov. 2020.
42

exercício dependa de um termo prefixado ou de condição


preestabelecida, inalterável a arbítrio de outrem.98

Por sua vez, Marcelo Henrique Giannini conceitua o ato jurídico perfeito como
“[...] à situação consumada, incorporada ao patrimônio jurídico ou à personalidade do
respectivo titular pelo fato de o direito ter sido efetivamente exercido (e ter produzido
seus efeitos) por atender aos requisitos exigidos pela legislação em vigor à época”.99
Não obstante, a coisa julgada qualifica a imutabilidade da norma jurídica
individualizada constante à parte dispositiva de uma sentença. Ou seja, a coisa
julgada é uma das formas de garantia processual, sendo também um preceito de
ordem fundamental, além de garantia individual alicerçada às cláusulas pétreas da
Carta Magna. 100 Conceituada nas palavras de Fabricio dos Reis Brandão da seguinte
forma:

A coisa julgada, como o próprio nome já diz, significa algo que já foi
julgado, é proveniente da expressão latina res judicata. A idéia (sic)
desse instituto é evitar que seja julgada uma mesma lide com o mesmo
objeto duas vezes ou mais, tornando o que foi decidido imutável e
indiscutível (princípio da segurança jurídica), e ainda evitando que
surjam decisões contraditórias, aumentando a confiabilidade do
sistema jurídico brasileiro. 101

O instituto da coisa julgada está intrinsicamente ligado ao princípio da


segurança jurídica, vez que após o trânsito em julgado da decisão que circundou o
mérito da causa, perfectibiliza-se a coisa julgada, vedando a possibilidade de
reapreciação. 102 Nessa linha, Luiz Rodrigues Wambier e Eduardo Talamini asseveram
que a coisa julgada estaria diretamente vinculada à imutabilidade das decisões:

Se algo se pode dizer genericamente a respeito da coisa julgada é que


se trata de um instituto ligado ao fim do processo e à imutabilidade
daquilo que tenha sido decidido. Trata-se de instituto que tem em vista
gerar segurança. A segurança, de fato, é um valor que desde sempre
tem desempenhado papel de um dos objetivos do direito. O homem
sempre está à procura de segurança e o direito é um instrumento que
se presta, em grande parte, ao atingimento desse desejo humano. Por

98
SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 1978, v. 2, p. 530.
99
GIANNINI, Marcelo Henrique. Aspectos do direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa
julgada. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 20 nov. 2020. Disponível
em: <https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41122/aspectos-do-direito-adquirido-ato-
juridico-perfeito-e-coisa-julgada>. Acesso em: 20 nov. 2020.
100
DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Processo Civil. Bahia:
JusPodivm, 2008, v. 2, p. 552.
101
BRANDÃO, Fabricio dos Reis. Coisa Julgada. São Paulo: Editora MP, 2005, p. 24.
102
LASCALA, Maria Carolina Florentino; FREITAS, Riva Sobrado de. A coisa julgada inconstitucional:
om breve estudo sobre a relativização do princípio da segurança jurídica em prol do ideal de justiça.
Revista da Faculdade de Direito de Uberlândia. v. 39: 169-186, 2011. Disponível em: <
http://www.seer.ufu.br/index.php/revistafadir/article/view/18492>. Acesso em 20 nov. 2020.
43

meio do direito, procura-se tanto a segurança no que diz respeito ao


ordenamento jurídico como um todo, quanto no que tange às relações
jurídicas individualizadas. É quanto a esta espécie de segurança que a
coisa julgada desempenha seu papel.

Ainda no diapasão da coisa julgada, há de se falar na sua subdivisão em formal


e material. A formal é fenômeno que se opera dentro do processo e afeta direitos e
faculdades processuais, ou seja, refere-se ao momento que não é mais possível a
interposição de qualquer recurso ou exaurida as vias recursais. 103 Basicamente, a
coisa julgada formal advém da impossibilidade de interpor recurso contra a sentença
proferida, independentemente de que se tenha ocorrido ou não julgamento do
mérito. 104 No que tange a coisa julgada material, esta decorre do julgamento do mérito
da causa tornando-se imutável a decisão judicial.
A corroborar, Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart apontam
esclarecimentos acerca da coisa julgada formal e material:

Quando se alude à indiscutibilidade da sentença judicial fora do


processo, portanto em relação a outros feitos judiciais, o campo é da
coisa julgada material, que aqui realmente importa e constitui,
verdadeiramente, o âmbito de relevância da coisa julgada. Já a
indiscutibilidade da decisão judicial verificada dentro do processo
remete à noção de coisa julgada formal. A coisa julgada formal, como
se nota, é endoprocessual, e se vincula à impossibilidade de rediscutir
o tema decidido dentro da relação jurídica processual em que a
sentença foi prolatada. Já a coisa julgada material é extraprocessual,
ou seja, seus efeitos repercutem fora do processo. 105

Importante ressaltar que ao se falar em coisa julgada no diapasão da segurança


jurídica, refere-se a coisa julgada material, e não unicamente formal. 106
Quando da coisa julgada inconstitucional, tema que será aprofundado nos
capítulos vindouros, esta deverá ter aferida sua infração à segurança jurídica, mas
principalmente a ofensa aos princípios constitucionais ocorrerá por meio do controle
de constitucionalidade realizado pelo Supremo Tribunal Federal ou por via de ação
rescisória declarando a nulidade da decisão judicial transitada em julgado. A respeito
dessa temática, Anizio Gavião Filho e Cristina Pasqual pontuam:

103
ALVES, André. Coisa Julgada: Alguns Aspectos Relevantes no NCPC. Estudos no novo CPC.
Disponível em: <https://estudosnovocpc.com.br/2017/04/18/coisa-julgada-alguns-aspectosrelevantes-
no-ncpc/>. Acesso em: 21 nov. 2020.
104
SANTOS, Ernani Fidélis. Processo de Conhecimento. São Paulo: Saraiva, 2011, p.723.
105
MARINONI; Luiz Guilherme. ARENHART; Sérgio Cruz. Processo de Conhecimento. Ed. Revista
dos Tribunais, 2012, p. 630.
106
COÊLHO, Marcus Vinicius Furtado. Garantias Constitucionais e Segurança Jurídica. Ed. Fórum.
2015, p.108.
44

Trata-se de uma ação por intermédio da qual a função jurisdicional é


provocada para o fim de desconstituir a sentença coberta pela coisa
julgada, prolatando-se um novo provimento jurisdicional para substituir
o desconstituído ou, simplesmente, desconstituindo-se o provimento
jurisdicional anterior. A Constituição Federal não indica,
expressamente, que a ação rescisória é a ação constitucional
adequada à desconstituição da sentença coberta pela coisa julgada. 107

Possível se faz observar que o princípio da segurança jurídica se “manifesta”


de diferentes maneiras em cada um dos três poderes: legislativo, executivo e
judiciário. Diante do ideário de um dos objetivos elementares do princípio da
segurança jurídica – a confiabilidade pela permanência de uma estabilidade
institucional –, tal que afirma Humberto Ávila ao referir: “[...] ao proteger a família, a
CF/88 está protegendo a segurança jurídica como segurança do direito e dos
direitos”. 108
Por consequência, a segurança jurídica mostra-se majoritariamente, no
entendimento doutrinário, como um sobreprincípio ligado a operação na ordem
tributária em prol da realização e da manutenção da previsibilidade, calculabilidade,
mensurabilidade e à proteção da confiança. 109 De tal forma que, Paulo Souto Maior
Borges, destaca a multiplicidade de alternativas de concretização da segurança
jurídica ao indagar:

Quais os valores que a segurança busca preservar, no âmbito do


sistema constitucional tributário? A irretroatividade? A legalidade? A
isonomia? A efetividade da jurisdição tributária, administrativa ou
judicial? Tudo isso junto e muito mais que isso.110

Assim sendo, é notável o caráter moderador do princípio da segurança jurídica


frente aos demais princípios concernentes ao Direito Tributário que, concatenados,
formam a segurança jurídico-tributária. Uma vez estabelecida a importância e o
significado do princípio da segurança jurídica, bem como de suas implicações no

107
PIRES GAVIÃO FILHO, Anizio; STRINGARI PASQUAL, Cristina. Coisa julgada, segurança jurídica
e ponderação. Revista Direito e Justiça: Reflexões Sociojurídicas, [S.l.], v. 15, n. 25, p. 47-67, out.
2015. ISSN 21782466. Disponível em:
<http://srvapp2s.urisan.tche.br/seer/index.php/direito_e_justica/article/view/1721>. Acesso em: 21 nov.
de 2020.
108
ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica: entre permanência, mudança e realização no direito
tributário. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 229.
109
BRITO, Mirella Barros Conceição. Segurança jurídico-tributária e proteção da confiança do
contribuinte no Estado de Direito. Revista Direito UNIFACS, ISSN 1808-4435, Salvador, ano 16, n.
131, mai. 2011. Disponível em: https://revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/1483/1164.
Acesso em: 21 nov. 2020.
110
BORGES, Souto Maior. O princípio da segurança jurídica na criação e aplicação do tributo. Revista
Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, n. 11, fev. 2002, p.1-2. Disponível
em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 22 nov. 2020.
45

contexto tributário, far-se-á um delineamento da matéria da coisa julgada e das suas


inferências sob o Estado Democrático de Direito.

1.3 A COISA JULGADA E SEUS IMPACTOS NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE


DIREITO

Antes de adentrar às raízes do fenômeno da coisa julgada e seus reflexos no


âmbito do mundo jurídico, indispensável se faz reforçar a concepção e as
características do Estado Democrático de Direito. Aludir-se-á do conceito idealizado
por Norberto Bobbio que, basicamente, entendia o Estado de Direito como um Estado
em que os poderes públicos são regidos e ordenados por normas gerais – leis
fundamentais ou constitucionais – e que deviam ser exercidos no âmbito das leis que
o regulamentam, sendo indene o direito do cidadão de recorrer ao juízo independente
para que lhe fosse reconhecido e afastado eventual abuso ou excesso de poder por
parte do ente estatal. 111
Com base nesse conceito e na abordagem realizada no capítulo anterior, pode-
se constatar que a figura do Estado de Direito surge para regulamentar as relações
interpessoais da sociedade ao buscar a implementação da organização e da ordem
por meio da Constituição. Congruente a esse ideário, Carlos Ari Sundfeld assevera:

Assim, definimos Estado de Direito como o criado e regulado por uma


Constituição (isto é, por uma norma jurídica superior às demais), onde
o exercício do poder político seja dividido entre órgãos independentes
e harmônicos, que controlem uns aos outros, de modo que a lei
produzida por um deles tenha de ser necessariamente observada pelos
demais e que os cidadãos, sendo titulares de direitos, possam opô-los
ao próprio Estado.112

Não obstante as concepções da doutrina liberal clássica acabaram, de certa


maneira, delineando as formas do Estado de Direito – com fulcro à proteção da
liberdade e de direitos fundamentais – aos “princípios” burgueses, como a iniciativa
privada, o direito à defesa da propriedade e as demais demandas vinculadas ao

111
BOBBIO, Norberto. Liberalismo e Democracia. Trad. brasileira de Marco Aurélio Nogueira. São
Paulo, Brasiliense, 1998, p. 19.
112
SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de direito público. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p.
38-39.
46

sistema capitalista. 113 Entretanto, os mecanismos de controle de juridicidade do poder


estatal advindos dessa nova roupagem da figura do Estado – intitulado de Direito –
visaram impedir ou obstaculizar o exercício arbitrário e ilegítimo do poder, bem como
a desencorajar o abuso ou o exercício ilegal do poder – proporcionado segurança
jurídica ao cidadão frente ao Estado – que para José Joaquim Gomes Canotilho surge
da necessidade do ser humano “‘planificar e conformar autônoma e responsavelmente
a sua vida”.114 Nessa linha, pelo prisma liberal, bem analisa Norberto Bobbio acerca
da liberdade e da segurança sob a égide da Constituição:

Os mecanismos constitucionais que caracterizam o Estado de direito


têm o objetivo de defender o indivíduo dos abusos do poder. Em outras
palavras, são garantias de liberdade, da assim chamada liberdade
negativa, entendida como esfera de ação em que o indivíduo não está
obrigado por quem detém o poder coativo a fazer aquilo que não deseja
ou não está impedido de fazer aquilo que deseja [...] nas relações entre
duas pessoas, à medida que se estende o poder (poder de comandar
ou de impedir) de uma diminui a liberdade em sentido negativo da outra
e, vice-versa, à medida que a segunda amplia a sua esfera de liberdade
diminui o poder da primeira.115

O Estado Democrático de Direito surge com o ímpeto de deter arbitrariedades


praticadas pelo ente público frente ao cidadão – assim fazendo do Direito uma antítese
ao arbítrio estatal – com o reconhecimento e a garantia dos direitos individuais. A
respeito dessa junção entre democracia e direito, José Afonso da Silva enfatiza:

O Estado Democrático de Direito concilia Estado Democrático e Estado


de Direito, mas não consiste apenas na reunião formal dos elementos
desses dois tipos de Estado. Revela, em verdade, um conceito novo,
que incorpora os princípios daqueles dois conceitos mas os supera, na
medida em que agrega um componente revolucionário de
transformação do status quo.116

Portanto o Estado de Direito atuará alicerçado nos princípios que o regimentam,


principalmente pautado pela legalidade, que assentará, junto de outros princípios, o
que é legítimo e ilegítimo – ou seja, o que é proibido e permitido. Para fixar e aplicar

113
NOVAIS, 2006, apud SCALABRIN, F.; RAATZ, I. O processo civil no Estado Democrático de Direito
na superação do modelo de processo do Estado Liberal. Revista Brasileira de Direitos
Fundamentais & Justiça, v. 5, n. 14, p. 269-296, 30 mar. 2021.
114
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Edições Almedina, 2002, p. 257.
115
BOBBIO, Noberto. Liberalismo e Democracia. Trad. brasileira de Marco Aurélio Nogueira. São
Paulo, Brasiliense, 1998, p. 20.
116
SILVA, José Afonso da. O Estado Democrático de Direito. Revista dos Tribunais, São Paulo, v.
635, p. 7-13, set/1988. Disponível em:
https://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/trail/document?docguid=Id266b2408e6d11e092d3000
0853f87ee#>. Acesso em 22 fev. 2021.
47

esses princípios, a Constituição surgiu como ferramenta reguladora das relações da


sociedade – seja entre Estado e cidadão ou entre os próprios civis – oportunizando
garantias individuais e fundamentais à manutenção da ordem e respeitos aos
princípios que a fundamentam, assim formando o constitucionalismo pelo condão do
princípio da segurança jurídica117. É sobre esse ideal de segurança que Humberto
Ávila pontua que: “O emprego da expressão “segurança jurídica” denota, pois, um
juízo prescritivo a respeito daquilo que deve ser buscado de acordo com determinado
ordenamento jurídico”. 118
Não obstante e adentrando a esfera constitucional, José Joaquim Gomes
Canotilho explana que o constitucionalismo “[...] é a teoria (ou ideologia) que ergue o
princípio do governo limitado indispensável à garantia dos direitos e dimensão
estruturante da organização político-social de uma comunidade”. 119
Dando sequência ao entendimento de José Joaquim Gomes Canotilho, é que
Manoel Gonçalves Ferreira Filho corrobora a ideia central da subsunção do ente
estatal frente à lei e os princípios regentes do Estado de Direito:

Num Estado submetido ao Direito, a atuação do Poder tem como pauta


a lei. Obedece ao princípio da legalidade. Entretanto, da legalidade
decorre como princípio também a igualdade. E ambos, legalidade e
igualdade, estão sob o crivo de uma justiça, daí o terceiro princípio,
garantidor dos demais da justicialidade.120

Com base na breve conceituação anterior, vê-se que o ideal do princípio da


igualdade no Estado de Direito vai além da igualdade formal ante a lei – ou seja, do
princípio da isonomia que como delimitou Friedrich Hayek “era usado livremente pelo
tradutor de Tito Lívio na forma anglicizada isonomy 121 para definir um estado de leis

117
Nesse diapasão, a lição de Pablo Ángel Gutiérrez Colantuono, ao tratar da segurança jurídica no
constitucionalismo moderno sintetiza: “Frecuentemente se le outorga a la seguridade jurídica el caráter
de principio general del derecho constitucional. Em este sentido, la regra general de que nadie puede
ser juzgado (penado, sancionado, sometido a processo u obligado a hacer o aceptar las consecuencias
de sua obrar) sin norma previa y certa – previsibilidade, em otros términos – abona la ideia de principio
general que se le assigna a la seguridade jurídica”. (COLANTUONO, Pablo Ángel Gutiérrez. Derechos
y Seguridad Jurídica. In: VALIM, Rafael; OLIVEIRA, José Roberto Pimenta; POZZO, Augusto Neves
dal (Org.). Tratado sobre o princípio da segurança jurídica no direito administrativo. Belo
Horizonte: Fórum, 2013, p. 157-167.
118
ÁVILA, Humberto. Teoria da Segurança Jurídica. 4. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros,
2016, p. 127.
119
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 6. ed.
Coimbra: Almedina, 1993, p. 47.
120
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estado de Direito e Constituição. 4. Ed. São Paulo:
Saraiva, 2007, p. 23.
121
“A isonomia como regra é alçada a categoria de princípio que tem como força impositiva afastar a
possibilidade de se criar leis instituindo privilégios em favor de alguns em detrimento de outros. É
48

gerais, aplicáveis igualmente a todos, e de responsabilidade dos magistrados” -,


abarcando ainda a uniformidade de tratamento e a proibição de discriminação. 122
Sobre a temática, Manoel Gonçalves Ferreira Filho destaca a relevância constitucional
do princípio da igualdade:

O primeiro significado, pois, do princípio constitucional de igualdade é


o da uniformização do estatuto jurídico para todos os homens. É a
igualdade perante o direito em geral, perante o direito como sistema. E
disto resulta a proibição de que, em razão de nascimento, raça, credo
religioso ou de convicções políticas, se estabeleça distinções quanto
ao estado jurídico ou se criem privilégios, de qualquer espécie.123

No tocante a igualdade material, Fernanda Duarte Lopes Lucas da Silva


considera que essa igualdade “[...] não consiste em um tratamento sem distinção de
todos em todas as relações. Senão, só aquilo que é igual deve ser tratado igualmente.
O princípio da igualdade proíbe uma regulação desigual de fatos iguais”.124
Aliado aos princípios constituintes do Estado de Direito, os valores da
previsibilidade, estabilidade e mensurabilidade também o compõem de forma a
possibilitar, precipuamente, o equilíbrio das relações entre Estado e indivíduo.
Nomeadamente, inclusive, conferir ao cidadão a certeza e previsibilidade dos atos
advindos da figura estatal. 125
Nesse sentido, mister se faz trazer o ensinamento de Anizio Pires Galvão Filho
e Cristina Stringari Pasqual que explicam o caminho que o cidadão, quando tenha seu
direito ou garantia negados ou impossibilitado de usufruí-lo, usará do processo judicial
para que o Estado, ao prestar a tutela jurisdicional, efetive a justiça ao caso concreto
conferindo ao cidadão o direito que pleiteia por meio de uma sentença – espécie de
provimento jurisdicional a partir do qual o Estado avigora, ou seja, confirma a norma
individual de uma situação jurídica concreta, dando solução ao conflito. E o caráter

condição essencial numa República a igualdade de tratamento. Aplicada essa diretriz em matéria
tributária significa dizer que a tributação deve recair sobre todos de maneira uniforme”. In: CHIESA,
Clélio. Isonomia. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo
Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Tributário. Paulo de Barros Carvalho, Maria
Leonor Leite Vieira, Robson Maia Lins (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/310/edicao-
1/isonomia>. Acesso em 20 mar. 2021.
122
HAYEK, Friedrich. Os fundamentos da liberdade. Tradução: Anna Maria Capovilla e José Ítalo
Stelle. Brasília: UNB/Visão, 1983, p. 185-186.
123
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estado de Direito e Constituição. 4. ed. São Paulo:
Saraiva, 2007, p. 28.
124
SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. Princípio constitucional da igualdade. 2. ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 42.
125
PORTO, Éderson Garin. Estado de Direito e Direito Tributário. Norma limitadora ao poder de
tributar. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 71.
49

definitivo do comando dessa sentença, é o elemento imprescindível à estabilidade das


relações jurídicas. Isso significa que, em situação análoga com as mesmas condições
fáticas e jurídicas, a relação concreta definida não mais poderá ser modificada. 126 Em
uma abordagem simplificada, os autores Marcelo Abelha Rodrigues e Thiago Ferreira
Siqueira sumarizam acerca da sentença no Novo Código de Processo Civil:

Em resumo, o Novo CPC continua a adotar a aptidão do


pronunciamento em encerrar o procedimento cognitivo como
característica fundamental da sentença. Faltando tal predicado, o que
teremos é uma decisão interlocutória. Desde que, é claro, o ato tenha
“natureza decisória” como exige o § 2º; caso contrário, continuamos a
ter, nos termos do § 3º, um despacho.127

Portanto, diante a explicação anterior e a corroborar: sentença é o produto da


manifestação da figura do Estado-juiz, ao efetivar sua função jurisdicional, e que visa
substancialmente resolver um conflito – ou seja, investida de cunho terminativo. Pois,
incumbe à jurisdição pôr a termo eventual litigância que fora posta sob sua tutela,
agindo conforme os princípios norteadores do Direito e da aplicação da lei cabível ao
caso. 128 Quanto a sua definição no Código de Processo Civil em seu artigo 203, § 1º,
sentença é "[...] o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts.
485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a
execução".129
Acerca da temática, Giuseppe Chiovenda estatui:

A sentença, em geral, é a provisão do juiz que, recebendo ou rejeitando


a demanda do autor, afirma a existência ou a inexistência de uma
vontade concreta de lei que lhe garanta um bem ou respectivamente a
inexistência ou existência de uma vontade de lei que garanta um bem
ao réu. Receber a demanda do autor significa atuar a lei a seu favor,
segundo os casos, de modo positivo ou negativo, isto é, afirmando a
existência de uma vontade de lei que garanta um bem ao autor ou

126
PIRES GAVIÃO FILHO, Anizio; STRINGARI PASQUAL, Cristina. Coisa julgada, segurança jurídica
e ponderação. Revista Direito e Justiça: Reflexões Sociojurídicas, [S.l.], v. 15, n. 25, p. 47-67, out.
2015. ISSN 21782466. Disponível em:
<http://srvapp2s.urisan.tche.br/seer/index.php/direito_e_justica/article/view/1721>. Acesso em: 21 mar.
de 2021.
127
RODRIGUES, Marcelo Abelha; SIQUEIRA, Thiago Ferreira. O conceito de sentença no processo
civil brasileiro: passado, presente e futuro. Revista eletrônica (do) Tribunal Regional do Trabalho da 9ª
Região, Curitiba, PR, v. 4, n. 39, p. 57-75, abr. 2015. Edição especial. Disponível em: <
https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/91494/2015_rodrigues_marcelo_conceito_s
entenca.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em 24 mar. 2021.
128
FARINHA, Ana Patrícia Lopes. Coisa Julgada em Matéria Tributária. Revista Jurídica da Seção
Judiciária de Pernambuco, n. 1, p. 15, 2008. Recife, Brasil. Disponível em:
<https://revista.jfpe.jus.br/index.php/RJSJPE/article/view/64>. Acesso em 22 mar. 2021.
129
BRASIL. Código de Processo Civil (2015). Código de Processo Civil Brasileiro. Brasília, DF:
Senado, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 25 mar. 2021.
50

negando a existência de uma vontade de lei que garanta um bem ao


réu.130

Na mesma linha, corroboram Marcelo Abelha Rodrigues e Thiago Ferreira


Siqueira ao conceituar que “um pronunciamento apenas poderá ser chamado de
sentença se ostentar cumulativamente duas características: (i) fundamentar-se nos
arts. 485 ou 487; e (ii) pôr fim à fase cognitiva do processo ou à execução”.131
De acordo com as ideias de Thereza Alvim e José Manoel de Arruda Alvim
Netto, é pela sentença como ato da autoridade estatal que se afigura o instituto da
coisa julgada. Nessa linha, compõem acerca da temática:

O instituto da coisa julgada se destina a tornar definitiva uma solução


dada pelo Poder Judiciário a determinada controvérsia que a ele tenha
sido submetida. É dividida, em geral, em duas espécies, a coisa julgada
formal e a coisa julgada material. A coisa julgada formal significa que,
em determinado processo, houve uma última decisão, por meio da qual
se colocou seu termo final, sem que contra ela tenha sido interposto
qualquer recurso. Constitui-se a coisa julgada formal em uma
imutabilidade do decisum somente no âmbito do processo em que foi
prolatado. Por sua vez, a coisa julgada material é a qualidade
de imutabilidade e indiscutibilidade, ou mais precisamente,
a autoridade, com a qual resta revestida uma determinada decisão de
mérito. Destina-se a coisa julgada material a garantir a segurança
extrínseca das relações jurídicas, impedindo qualquer outra decisão a
respeito da mesma lide.132

Indispensável referir-se a eloquente ponderação de José Carlos Barbosa


Moreira: “A coisa julgada é instituto de função essencialmente prática, que existe para
assegurar a estabilidade à tutela jurisdicional dispensada pelo Estado”. 133
Por meio da coisa julgada que surge a concretização do princípio da segurança
jurídica, ao passo que expressa a qualidade da imutabilidade do conteúdo do
comando da sentença de cognição exauriente de mérito, perfazendo imutável o

130
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. 3. ed. Tradução: Paolo
Capitanio. Campinas: Bookseller, 2002, p. 198.
131
RODRIGUES, Marcelo Abelha; SIQUEIRA, Thiago Ferreira. O conceito de sentença no processo
civil brasileiro: passado, presente e futuro. Revista eletrônica (do) Tribunal Regional do Trabalho
da 9ª Região, Curitiba, PR, v. 4, n. 39, p. 57-75, abr. 2015. Edição especial. Disponível em: <
https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/91494/2015_rodrigues_marcelo_conceito_s
entenca.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em 01 abr. 2021.
132
ALVIM, Thereza, ALVIM NETTO, José Manoel de Arruda. Coisa julgada. Enciclopédia jurídica da
PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.).
Tomo: Processo Civil. Cassio Scarpinella Bueno, Olavo de Oliveira Neto (coord. de tomo). 1. ed. São
Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível
em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/177/edicao-1/coisa-julgada>. Acesso em 02 abr.
2021.
133
BARBOSA MOREIRA, 1971, apud MOURÃO, Luiz Eduardo Ribeiro. Coisa Julgada e segurança
jurídica. In: AURELLI, Arlete Inês et al. (Coord.). O direito de estar em juízo e a coisa julgada -
Estudos em homenagem a Thereza Alvin. São Paulo: RT, 2014, p. 904.
51

resultado da atuação da função jurisdicional. Entretanto, sobrepuja José Carlos


Barbosa Moreira ao ressaltar: “A coisa julgada não se identifica com a imutabilidade
dos efeitos da sentença, pois as partes, tratando-se de direito disponível, podem abrir
mão da solução judicial dada à relação jurídica material controvertida”.134 Dessa
forma, contudo, obstaculiza às partes defronte da coisa julgada intentar novo
pronunciamento jurisdicional sobre a questão já resoluta. Dando continuidade ao
exposto, Anizio Pires Gavião Filho e Cristina Stringari Pasqual argumentam acerca do
efeito da coisa julgada:

A coisa julgada, contudo, não tem apenas essa função negativa, mas
também uma função positiva. A função negativa consiste em impedir
que a mesma lide seja novamente examinada em processo futuro – no
sentido de impedir outro julgamento a respeito de algo já
definitivamente decidido em processo anterior. Essa função está
assentada no princípio do bis in idem, caracterizando a consumação
da ação. O juiz resulta impedido de julgar novamente a mesma lide,
independentemente do resultado a que essa nova demanda possa
conduzir. A função positiva da coisa julgada significa que o juiz está
obrigado a reconhecer o julgado em todas as decisões sobre
demandas que o pressuponham. A coisa julgada impõe o conteúdo
imutável da sentença, impedindo que outro julgamento dele divirja. 135

Cuida-se, portanto, a coisa julgada de um atributo da sentença: a imutabilidade


do comando proferido em sua parte dispositiva. Ou seja, deve atuar como a
materialização da certeza acerca da questão decidida, evitando incertezas e
consolidando o entendimento sobre o caso julgado. Importante, ainda, citar Enrico
Tullio Liebman que ramificou o entendimento sobre a diferenciação entre a autoridade
da coisa julgada da eficácia da sentença, vejamos:

A eficácia da sentença deve, lógica e praticamente, distinguir-se da sua


imutabilidade. Aquela pode definir-se genericamente, como um
comando, quer tenha o fim de declarar, quer tenha o de constituir ou
modificar ou determinar uma relação jurídica.

Nisso consiste, pois, a autoridade da coisa julgada, que se pode definir,


com precisão, como a imutabilidade do comando emergente de uma
sentença. Não se identifica ela simplesmente com a definitividade e
intangibilidade do ato que pronuncia o comando; é, pelo contrário, uma
qualidade, mais intensa e mais profunda, que reveste o ato também em

134
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Eficácia da sentença e autoridade da coisa julgada. In:
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Temas de direito processual. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 112.
135
PIRES GAVIÃO FILHO, Anizio; STRINGARI PASQUAL, Cristina. Coisa julgada, segurança jurídica
e ponderação. Revista Direito e Justiça: Reflexões Sociojurídicas, [S.l.], v. 15, n. 25, p. 47-67, out.
2015. ISSN 21782466. Disponível em:
<http://srvapp2s.urisan.tche.br/seer/index.php/direito_e_justica/article/view/1721>. Acesso em: 01 abr.
de 2021.
52

seu conteúdo e torna assim imutáveis, além do ato em sua existência


formal, os efeitos, quaisquer que sejam, do próprio ato. 136

Antes de adentrar aos quesitos e peculiaridades da coisa julgada material e da


coisa julgada formal, imprescindível trazer o que comina a Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro – LINDB 137 quanto ao tema. Vejamos, ipsis litteris, o que
comina o art. 6º, § 3º, da referida legislação:

Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato


jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

[...]

§ 3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que


já não caiba recurso.138

Com base no mencionado artigo, Ada Pelegrini Grinover, Cândido Rangel


Dinamarco e Antônio Carlos de Araújo Cintra pontuam: “Configura-se a coisa julgada
formal, pela qual a sentença, como ato daquele processo, não poderá ser
reexaminada. É sua imutabilidade como ato processual, provindo da preclusão das
impugnações e dos recursos”. 139 Não obstante, há de se falar na função social da
coisa julgada material que visa, prioritariamente, proporcionar a segurança jurídica e
a certeza nas relações jurídicas visando concretizar a paz e a felicidade pessoal de
cada um dos jurisdicionados, de tal maneira que a coisa julgada é inviolável sob a

136
LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e Autoridade da Sentença e outros Escritos sobre a Coisa
Julgada. 4. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 50.
137
“A LINDB foi editada em 1942, pelo Decreto-Lei n. 4.657, de 04/09/1942, e, com alterações
posteriores, está em vigor até hoje. Com ela, se encerrou a vigência das antigas
Ordenações Portuguesas. Contém um conjunto de preceitos que regulam a vigência, a validade,
a eficácia, a aplicação, a interpretação e a revogação de normas no Direito Brasileiro, bem como,
delimita alguns conceitos como o ato jurídico perfeito, a coisa julgada e o direito adquirido. Consagra
a irretroatividade como regra no ordenamento jurídico, ao mesmo tempo que, define as condições para
a ocorrência de ultratividade e efeito de repristinação (fenômeno legislativo no qual há a entrada
novamente em vigor de uma norma efetivamente revogada, pela revogação da norma que a revogou)”.
In: DELLAGNEZZE, René. A Hermenêutica Jurídica. Parte 2. Breve Análise da Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro – LINDB. São Paulo: Âmbito Jurídico, 22 jul. 2019. Disponível em: <
https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-civil/a-hermeneutica-juridica-parte-2-breve-analise-da-
lei-de-introducao-as-normas-do-direito-brasileir-lindb/>. Acesso em 02 abr. 2021.
138
BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de Setembro de 1942. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657compilado.htm>. Acesso em 02 abr. 2021.
139
GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo.
Teoria geral do processo. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 306-307.
53

Constituição da República Federativa do Brasil em seu artigo 5º, inciso XXXVI 140, e do
Código de Processo Civil nos artigos 485, inciso V e 486 141.142
Nesse seguimento, oportuno citar José Miguel Garcia Medina e Tereza Arruda
Alvim Wambier que sobre a função social da coisa julgada sintetizam:

A coisa julgada é instituto cuja função é a de estender ou projetar os


efeitos da sentença indefinidamente para o futuro. Com isso, pretende-
se zelar pela segurança extrínseca das relações jurídicas, de certo
modo em complementação ao instituto da preclusão, cuja função
primordial é garantir a segurança intrínseca do processo, pois que
assegura a irreversibilidade das situações jurídicas cristalizadas
endoprocessualmente. Esta segurança extrínseca das relações
jurídicas gerada pela coisa julgada material traduz-se na
impossibilidade de que haja outra decisão sobre a mesma
pretensão.143

Nesse passo, a conceituação e a disciplina da coisa julgada estão sob a


incumbência da legislação infraconstitucional, especificamente remetendo-se aos
artigos 502 a 508 do Código de Processo Civil. Interessante se faz, especialmente,
trazer à voga o cominado pelos artigos 502, 505 e 508 da referida legislação:

Art. 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna


imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.

[...]

Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas


relativas à mesma lide, salvo:

I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio


modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a
parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;

140
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”; In: BRASIL.
Constituição da República Federativa do Brasil: D.O. 5 de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 03 abr.
2021.
141
“Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: [...] V - reconhecer a existência de perempção, de
litispendência ou de coisa julgada;
Art. 486. O pronunciamento judicial que não resolve o mérito não obsta a que a parte proponha de novo
a ação”. In: BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 03 abr.
2021.
142
MARINONI, Luiz Guilherme. Sobre a chamada “relativização” da coisa julgada material, p. 9-
11. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=85>. Acesso em
03 abr. 2021.
143
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. O dogma da coisa julgada:
hipóteses de relativização. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 21.
54

II - nos demais casos prescritos em lei.

[...]

Art. 508. Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão


deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte
poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido.144

Despiciendo diferir a coisa julgada formal da coisa julgada material, uma vez
que ambas detêm aplicações e significados diferentes. Por coisa julgada formal,
entende-se não haver mais a possibilidade de rediscussão da questão-objeto no
mesmo processo, em virtude do exaurimento das vias recursais – ou seja, a
perfectibilização da intitulada “preclusão máxima” – mesmo que esse instituto não
embargue a possibilidade da propositura de uma nova demanda sobre a questão. 145
Quanto a preclusão, Luiz Guilherme Marinoni compara-a com os institutos da
prescrição e a decadência – abordados no subcapítulo anterior – ao teorizar que:

[...] a preclusão consiste – fazendo-se um paralelo com figuras do


direito material, como a prescrição e a decadência – na perda de
“direitos processuais”, que pode decorrer de várias causas. Assim
como acontece com o direito material, também no processo a relação
jurídica estabelecida entre os sujeitos processuais pode levar à
extinção de direitos processuais, o que acontece, diga-se, tão
frequentemente quanto em relações jurídicas de direito material. A
preclusão é o resultado dessa extinção, e é precisamente o elemento
(aliado à ordem legal dos atos, estabelecida na lei) responsável pelo
avanço da tramitação processual.146

Não obstante, Enrico Tullio Liebman é catedrático sobre a coisa julgada formal:

Tornando imutável a decisão, como ato processual, a coisa julgada


formal é condição prévia da coisa julgada material, que é a mesma
mutabilidade em relação ao conteúdo do julgamento e mormente aos
seus efeitos. 147

Com efeito, adentra-se a coisa julgada material – inclusive vista como a


“verdadeira” coisa julgada, literalmente – haja vista ser aquela que confere a
impraticabilidade da rediscussão da questão-objeto arguida não somente em relação
ao mesmo processo, mas em toda e qualquer outra lide que envolva a mesma causa

144
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 04 abr. 2021.
145
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 7. ed. Bahia: JusPodivm, 2007, v. 1 e 2, p
478-480.
146
MARINONI, Luiz Guilherme Marinoni e ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do Processo de
Conhecimento. 3. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2004, p. 665.
147
LIEBMAN, Enrico Túlio. Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa
julgada. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 37.
55

petendi148. Dessa forma, os efeitos da sentença eligem a sua imutabilidade aliada a


oponibilidade afora da relação processual, sendo aplicável exclusivamente em
sentenças definitivas de caráter litigioso e que consistam em declarar, constituir,
condenar ou executar – salvo, ainda, as de natureza cautelar evidentemente
satisfativas. 149
Conciso ao exposto, Cândido Rangel Dinamarco atesta e ressalta:

A coisa julgada material não é instituto confinado ao direito processual.


Ela tem acima de tudo o significado político-institucional de assegurar
a firmeza das situações jurídicas, tanto que erigida em garantia
constitucional. Uma vez consumada, reputa-se consolidada no
presente e para o futuro a situação jurídico-material das partes, relativa
ao objeto do julgamento e às razões que uma delas tivesse para
sustentar ou pretender alguma outra situação. Toda possível dúvida
está definitivamente dissipada, quanto ao modo como aqueles sujeitos
se relacionam juridicamente na vida comum, ou quanto à pertinência
de bens a um deles. As normas e técnicas do processo limitam-se a
reger os modos como a coisa julgada se produz e os instrumentos
pelos quais é protegida a estabilidade dessas relações – mas a função
dessas normas e técnicas não vai além disso.150

Além disso, insta ressaltar a conceituação sintetizada por Luiz Eduardo Ribeiro
Mourão sobre a intitulada res iudicata151 – ou seja, a coisa julgada –, que por ele é
definida como uma situação jurídica característica da proibição de refazer a mesma
atividade jurisdicional e que para “[...] alcançar esse desiderato, vale-se o legislador
de duas técnicas processuais: (a) veda a repetição da demanda; (b) imutabiliza as

148
“Causa de pedir é termo que denota aquilo que dá ensejo ao pedido. Em rigor, é causa do (ato
de) pedir. Portanto, ela se dá em virtude do pedido, mais especificamente, sua razão de existir é
justificar a formulação dele. Embora logicamente a pós-ceda; gnosiologicamente, antecede-a: somente
é possível conhecer a causa a partir do pedido. Desse modo, é definindo pedido que se possibilita
definir causa de pedir. [...] Ora, se pedido é ato comunicativo contido num escrito (como a petição), seu
fundamento, a causa de pedir, também deve sê-lo. E isto exatamente pelo fato de ela não ser causa
eficiente (motora) do direito subjetivo (e seus consectários, como a pretensão e a ação) invocado pela
parte. Sua existência é devida ao pedido. Observe-se: devida. A causa de pedir é uma
necessidade normativa (deontológica), e não uma necessidade fática (ontológica). Enfim, porque há
um pedido, faz-se necessária uma causa que o justifique, tal como já se antecipou acima”. In: GOUVEIA
FILHO, Roberto P. Campos. Da ação e das ações – 6ª Parte, Causa de Pedir: um difícil conceito – 1ª
Parte. Revista Eletrônica Empório do Direito. Disponível em: <
https://emporiododireito.com.br/leitura/da-acao-e-das-acoes-6-parte-causa-de-pedir-um-dificil-
conceito-1-parte>. Acesso em 04 abr. 2021.
149
LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa
julgada. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 51-54.
150
DINAMARCO. Cândido Rangel. Relativizar a coisa julgada material. Revista da Procuradoria-
Geral do Estado de São Paulo, n. 55/56, 2001, p. 29.
151
“Res iudicata é, na realidade, o litígio julgado, ou seja, o litígio depois da decisão; ou mais
precisamente, levando em conta a estrutura diversa entre o latim e o italiano, o juízo dado sobre o
litígio, ou sejam, sua decisão. Em outras palavras: o ato e, por sua vez, o efeito de decidir, que realiza
o Juiz em torno do litígio”. In: CARNELUTTI, Francesco. Sistema de direito processual civil. São
Paulo: Classic Book, 2000, p. 406.
56

decisões judiciais transitadas em julgado”.152 Não obstante, Humberto Theodoro


Júnior define: “Apresenta-se a res iudicata, assim, como a qualidade da sentença
assumida em determinado momento processual. Não é efeito da sentença, mas a
qualidade dela representada pela ‘imutabilidade’ do julgado e seus efeitos”.153
Importante mencionar o exposto por José Arnaldo Vitagliano quanto a causa e
efeito principais da coisa julgada material e formal – confirmar que todas as alegações
e defesas cabíveis foram apreciadas e garantir a imutabilidade da sentença que
analisou o mérito ou a ação -, que colaciona:

[...] Exauridos e resolvidos os recursos manifestados contra a


sentença, ou não sendo manifestado nenhum, a sentença transita em
julgado. Com tal ocorrência, operam-se dois fenômenos simultâneos.
O primeiro é o advento da coisa julgada formal, isto é, a sentença,
como ato processual, torna-se imutável dentro da relação processual.
Este fenômeno só se faz presente dentro do processo. O segundo
fenômeno é a formação da coisa julgada material ou substancial. Esta,
que tem como pressuposto lógico a coisa julgada formal, caracteriza-
se pela imutabilidade dos efeitos declaratórios, condenatórios ou
constitutivos da sentença de mérito, chamados principais, como
imutáveis também se mostram os efeitos secundários da sentença.
Tais efeitos - principais e secundários – adquirem uma qualidade, que
é a sua imutabilidade. Fala-se assim em autoridade da coisa julgada.154

Com efeito, salutar utilizar-se do entendimento lecionado por José Frederico


Marques que bem sintetiza a função da coisa julgada como instituto jurídico:

A coisa julgada é qualidade dos efeitos da prestação jurisdicional


entregue com o julgamento final da res in judicium deducta, tornando-
os imutáveis entre as partes. Com a sentença definitiva não mais
sujeita a reexames recursais, a res judicanda se transforma em res
judicata, e a vontade concreta da lei, afirmada no julgado, dá ao
imperativo jurídico, ali contido, a força e a autoridade de Lex
especialis entre os sujeitos da lide que a decisão compôs.155

Diante o escorço realizado durante o presente subcapítulo, possível concluir


que o instituto da coisa julgada é constituinte – ou melhor dizendo, indissociável – do
princípio da segurança jurídica, visto sua pujante função de caráter constitucional ao
servir de esteio à estruturação do ordenamento jurídico brasileiro e, principalmente,

152
BARBOSA MOREIRA, 1971, apud MOURÃO, Luiz Eduardo Ribeiro. Coisa Julgada e segurança
jurídica. In: AURELLI, Arlete Inês et al. (Coord.). O direito de estar em juízo e a coisa julgada -
Estudos em homenagem a Thereza Alvin. São Paulo: RT, 2014, p. 904.
153
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do processo civil
e processo de conhecimento. 44. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. v. 1, p. 574.
154
VITAGLIANO, José Arnaldo. Coisa Julgada e Ação Anulatória. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2008, p. 64-
65.
155
MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. Campinas: Milenium,
1999, p. 343.
57

ao próprio Estado Democrático de Direito. Portanto, a imutabilidade das decisões


transitadas em julgado permite a estabilidade das relações jurídicas, não só por
propiciar a confiança do cidadão na tutela jurisdicional prestada pela figura estatal,
mas também pela proposição de manutenção da constitucionalidade e obediência à
definitividade da análise das matérias pelo Poder Judiciário.
58

2. FLEXIBILIZAÇÃO DA COISA JULGADA E SEUS REFLEXOS NO DIREITO


TRIBUTÁRIO

Aprofundar-se-á no presente capítulo os efeitos da flexibilização do instituto da


coisa julgada, haja vista a sua robusta imprescindibilidade à manutenção da
estabilidade das relações jurídicas que permeiam o cotidiano de nossa sociedade,
bem como através do escrutínio de tal flexibilização, buscar compreender os seus
reflexos no âmbito do direito e do Judiciário. Também, se buscará compreender o
fenômeno da flexibilização da coisa julgada através da análise de seu sentido
processual tanto como principiológico. 156
Ademais, no presente excerto iremos aprofundar o conhecimento sobre a coisa
julgada buscando perceber sua essência como solução ofertada pelo Poder Judiciário
a determinada controvérsia que a ele tenha sido trazido enquanto órgão e efetivo
prestador da tutela jurisdicional em nome do ente estatal. 157
Outro importante ponto a ser trazido no presente capítulo são as hipóteses do
cabimento dessa flexibilização da coisa julgada inconstitucional no diapasão do direito
tributário, além de visar expandir o entendimento acerca de sua relativização ante o
paradigma de proteção à coisa julgada mesmo considerada inconstitucional. 158
Não obstante, abordar-se-á os mecanismos de defesa do contribuinte ante a
flexibilização do instituto da res iudicata no âmbito do processo civil, bem como será
analisada sob o prisma de se buscar compreender mais especificamente seus
aspectos processuais e constitucionais, haja vista seu caráter garantidor da
estabilidade jurídica – ou seja, fundamental estruturante do princípio da segurança
jurídica. 159

156
FARINHA, Ana Patrícia Lopes. Coisa Julgada em Matéria Tributária. Revista Jurídica da Seção
Judiciária de Pernambuco, n. 1, p. 15, 2008. Recife, Brasil. Disponível em:
<https://revista.jfpe.jus.br/index.php/RJSJPE/article/view/64>. Acesso em 13 abr. 2021.
157
ALVIM, Thereza, ALVIM NETTO, José Manoel de Arruda. Coisa julgada. Enciclopédia jurídica da
PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.).
Tomo: Processo Civil. Cassio Scarpinella Bueno, Olavo de Oliveira Neto (coord. de tomo). 1. ed. São
Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em:
<https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/177/edicao-1/coisa-julgada>. Acesso em 13 abr. 2021.
158
ARAÚJO, Rossana Roberta de Sousa. Relativização da coisa julgada inconstitucional. Âmbito
Jurídico, Rio Grande, XVI, n. 117, out/2013. Disponível em: <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13772>. Acesso em: 13 abr. 2021.
159
MATHEUS, Ana Carolina Couto. Aspectos da coisa julgada inconstitucional. Rev. Ciên. Jur. e
Soc. da Unipar. Umuarama. v. 10, n. 1, p. 219-240, 2007. Disponível em: <
https://revistas.unipar.br/index.php/juridica/article/view/649>. Acesso em 13 abr. 2021.
59

2.1 HIPÓTESES DE FLEXIBILIZAÇÃO DA COISA JULGADA

A busca pela segurança é um grande desejo do ser humano, inerente à sua


existência, sendo o direito a forma pela qual se encontrou atingir esse objetivo. Assim
sendo, utiliza-se do direito no que concerne ao ordenamento jurídico quanto à
estabilidade das relações jurídicas para concretizar essa segurança.160
Essa busca pela estabilidade já podia ser observada no Direito Romano – e
mais do que isso, através da segurança e da certeza perseguir o ideal de justiça -, que
via o processo como forma da atuação da vontade da lei em relação a denominado
bem da vida – em latim res in iudicium deducta 161 -, sendo dividido em duas etapas as
quais eram sucedidas pela sententia. Os romanos tinham a visão de que somente
através da manifestação de vontade por parte do ente estatal – ao ter prolatada a
sentença pelo pretor -, que seria posto à termo a contestabilidade do bem tutelado.
Nesse sentido, Giuseppe Chiovenda pontua acerca do significado da coisa julgada:

Entendido o processo como instituto público destinado à atuação da


vontade da lei em relação aos bens da vida por ela garantidos,
culminate na emanação de um ato de vontade (a pronuntiatio iudicis)
que condena ou absolve, ou seja, reconhece ou desconhece um bem
da vida a uma das partes, a explicação da coisa julgada só pode divisar
na exigência social da segurança no gozo dos bens.162

Mister citar os ilustres doutrinadores processualistas italianos, Enrico Tulio


Liebman e Francesco Carnelutti, que travaram severa discussão acerca da temática
da coisa julgada: Liebmann afirmava que se a autoridade da coisa julgada vincula
exclusivamente as partes, a eficácia da sentença a todos se impõe e impõem-se
imediatamente, independente da verificação da sua validade;163 o veterano Carnelutti,
por sua vez, posicionava a coisa julgada como a solução de questões controversas e
defendia que a sua imutabilidade incidiria sobre a sua função de caráter declaratório

160
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil: Teoria Geral
do Processo e Processo de Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 625.
161
Chiovenda assinala que para os romanos “a coisa julgada mais não é que a res in iudicium deducta,
a dizer, o bem da vida disputado por litigantes, depois que a res foi iudicata, isto é, reconhecida ou
negada ao autor: res iudicata dicitur quae finem controversiarum pronunciatione iudicis accipit, quod
vel condenatione vel absolutione contingit”. In: CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito
processual civil. Tradução de Paolo Capitanio. Campinas: Bookseller, 1998, v. 1 e v. 2, p. 154.
162
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Tradução de Paolo Capitanio.
Campinas: Bookseller, 1998, v. 1 e v. 2, p. 447.
163
DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do Processo Civil Moderno, Tomo I, 4. ed.
Malheiros Editores, 2001, p. 293-294.
60

e não sobre seu caráter imperativo, tanto que o autor Celso Neves comenta que, para
Carnelutti, a coisa julgada detém mais de um significado: “[...] é a lide, depois de
julgada, ou, mais precisamente, o juízo expedido sobre a lide, isto é, sua decisão. Em
outras palavras, é o ato e o efeito de decidir sobre a lide”.164165 Quanto ao debate,
Cândido Rangel Dinamarco comenta:

A discordância evidencia-se tão pouco verbal, quanto mais


observamos que os dois autores partiam de premissas diametralmente
opostas, com referência ao fundamento quesito metodológico da
estrutura do ordenamento jurídico: enquanto Liebman formado na
escola De Chiovenda, manifestava uma sólida base dualística (o
ordenamento jurídico tem duas ordens diversas de normas,
substanciais e processuais, e estas nada têm a ver com a produção do
direito do caso concreto), fundava-se Carnelutti no pressuposto de que
o direito positivo substancial emana normas genéricas incompletas, as
quais só por obra da sentença se tornam um círculo fechado, sendo
ela um comando complementar (qualquer que seja esta, menos
dispositiva). Por isso, ele ensina que o juiz comanda para o caso
concreto como se fosse uma longa manus do legislador e louvava ao
legislador italiano a inclusão das normas referentes à coisa julgada no
Código Civil. Depois, afirmava que a imperatividade da sentença (coisa
julgada material) tem uma eficácia reflexa que atinge terceiros,
estranhos à relação processual em que esta foi pronunciada.166

Nessa senda, Eduardo Talamini se posiciona acerca do embate travado pelos


eminentes juristas italianos, no sentido de distinguir a coisa julgada segundo a qual
“não consiste propriamente na imutabilidade dos efeitos da sentença, mas na
imutabilidade do conteúdo do comando da sentença. Os efeitos da sentença
eventualmente se modificarão ou extinguirão”. 167
Com efeito, o instituto da coisa julgada é tido como um atributo indispensável à
manutenção do Estado Democrático de Direito, visto que representa uma das maiores
garantias processuais – elencado como preceito de ordem fundamental pela
Constituição - presentes no ordenamento jurídico. Pois, é por via desse instituto que
se estatui, prioritariamente, a estabilidade das relações jurídicas ao garantir a
imutabilidade e indiscutibilidade de decisão proferida já transitada em julgado. 168
Quanto à relevância da coisa julgada com o encerramento da atividade jurisdicional –

164
NEVES, Celso. Coisa Julgada Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1971, p. 370-374.
165
RAMOS, Luiz Gustavo de Oliveira. A coisa julgada e sua dimensão objetiva. 2010. 211 f.
Dissertação (Mestrado em Direito) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010.
Disponível em: < https://sapientia.pucsp.br/handle/handle/8982>. Acesso em 14 abr. 2021.
166
DINAMARCO, Cândido Rangel de. Relativizar a coisa julgada. ln: Meio Jurídico, ano IV, n. 43,
mar. 2001, p. 291.
167
TALAMINI, Eduardo. Coisa julgada e sua revisão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 33-34.
168
BRANDÃO, Fabricio dos Reis. Coisa Julgada. São Paulo: Editora MP, 2005, p. 24-25.
61

por meio de uma sentença terminativa ou resolutiva de mérito -, Cândido Rangel


Dinamarco delineia:

Em direito processual, coisa julgada é imutabilidade. Quando proferida


a sentença, ela própria e seus efeitos inda são mera proposta de
solução do litígio (sentenças de mérito), ou simplesmente proposta de
extinção do processo (terminativas), uma vez que ainda é possível a
substituição da sentença e a alteração do teor do julgamento, em caso
de recurso interposto pela parte vencida. Uma decisão judiciária só fica
imune a qualquer questionamento futuro, quando já não comporta
recurso.169

Tal é a relevância da coisa julgada no ordenamento jurídico, que esse instituto


se encontra consagrado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
em seu art. 5º, inciso XXXVI, aliado ao direito adquirido bem como o ato jurídico
perfeito – sendo os três integrantes da esfera dos preceitos fundamentais. 170 Sob o
prisma dos princípios fundamentais calcados pela Constituição, Tereza Arruda Alvim
Wambier e José Miguel Garcia Medina pontuam:

A coisa julgada, enquanto fenômeno decorrente de princípio ligado ao


Estado Democrático de Direito, convive com outros princípios
fundamentais igualmente pertinentes. Ademais, como todos os atos
oriundos do Estado, também a coisa julgada se formará se presentes
pressupostos legalmente estabelecidos. Ausentes estes, de duas,
uma: (a) ou a decisão não ficará acobertada pela coisa julgada, ou (b)
embora suscetível de ser atingida pela coisa julgada, a decisão poderá,
ainda assim, ser revista pelo próprio Estado, desde que presentes
motivos preestabelecidos na norma jurídica, adequadamente
interpretada.171

Como bem abordado no capítulo anterior, a coisa julgada se apresenta sob


uma única modalidade com aspectos diversos: a coisa julgada formal e a coisa julgada
material. Sendo a primeira referente a imutabilidade da sentença a qual não caiba
mais recurso e, findo o processo com a preclusão dos recursos, gerará efeitos
somente dentro do processo tendo alcançado a preclusão.172 Não obstante, imperioso

169
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 6. ed. rev. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2009, v. III, p. 300-301.
170
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: D.O. 5 de outubro de 1988. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 16 abr.
2021.
171
WAMBIER, Tereza Arruda Alvim e MEDINA, José Miguel Garcia. O Dogma da Coisa Julgada:
Hipóteses de Relativização. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 25.
172
“Sob o ponto de vista objetivo, a preclusão é um fato impeditivo, destinado a garantir o avanço
progressivo da relação processual e a obstar o seu recuo para fases anteriores do procedimento. Do
ponto de vista subjetivo, é a perda de uma faculdade ou direito processual que, por se haver esgotado
ou por não ter sido exercido em tempo e momento oportuno, fica praticamente extinto”. In: MARQUES,
José Frederico. Instituições de direito processual civil. Campinas: Millennium, 1999, v. II, p. 347.
62

destacar que a coisa julgada formal acaba por produzir efeitos similares ao da
preclusão haja vista que limita “as questões incidentalmente discutidas e apreciadas
ao longo do curso processual” tornem a serem rediscutidas judicialmente. 173 Por outro
lado, a coisa julgada material apresentar-se-á sob o jaez da imutabilidade dos efeitos
da sentença para fora do processo, impedindo de que se rediscuta a mesma causa. 174
Nessa mesma temática, José Afonso da Silva acerca da garantia fundamental
encartada no artigo 5°, inciso XXXVI, da Constituição Federal, ressalta o caráter da
coisa julgada material:

Dizemos que o texto constitucional só se refere à coisa julgada material


[...] porque o que se protege é a prestação jurisdicional definitivamente
outorgada. A coisa julgada formal só se beneficia da proteção
indiretamente na medida em que se contém na coisa julgada material,
visto que é pressuposto desta, mas não assim a simples coisa julgada
formal. Tutela-se a estabilidade dos casos julgados, para que o titular
do direito aí reconhecido tenha a certeza jurídica de que ele ingressou
definitivamente no seu patrimônio.175

Mister salientar que a coisa julgada sempre foi objeto relevante da história do
direito brasileiro – sendo visualizada como instrumento promotor da segurança jurídica
e da estabilidade das relações intersubjetivas -, se fazendo presente desde a
promulgação da Constituição de 1934, quando fora citada literalmente pela primeira
vez em um códex pátrio. Não obstante, a sua “raiz epistêmica” pôde ser encontrada
cominada na Carta Magna Imperial de 1824 que fazia em seu art. 179, inciso III,
expressa vedação a retroatividade legal. Entretanto, houve um período em que o
instituto fora suprimido pela Constituição de 1937, essa outorgada pelo Estado Novo,
a qual deixou de prever expressamente a irretroatividade legal e de proteger a coisa
julgada, sendo apenas mencionado pelo artigo 6º da até então denominada Lei de
Introdução do Código Civil, atualmente denominado como a Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro - LINDB. Os autores Fabio Resende Leal e Aline Mayara
Sapeli, acerca do tema ressaltam que com “[...] a Constituição de 1946, se
restabeleceu a proteção ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada,

173
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Direito
Processual Civil e Processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2005, v. 1, p. 552.
174
GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil. 6. ed. São Paulo:
Saraiva, 2010, v. 2, p. 21.
175
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 17. ed. São Paulo: Malheiros,
2000, p. 437.
63

expressamente indicados como direitos imunes à alteração vinda de lei


infraconstitucional (art. 141, § 3º)”.176
Ademais, a coisa julgada está ligada diretamente ao princípio da segurança
jurídica haja vista que, basicamente, contribui para que se forme um conjunto de
condições favoráveis às pessoas proporcionando uma espécie de previsibilidade das
possíveis sanções cabíveis de serem imputadas devido seus atos e de seus fatos à
luz do livre arbítrio institucionalizado no regime democrático. 177 Nesse sentido,
Humberto Theodoro Júnior arremata ao colocar que “[...] o processo é instrumento de
atuação do direito frente às situações litigiosas, valendo, por isso, como real veículo
de manutenção da paz social almejada pela ordem jurídica”. 178 Enfatiza João Alberto
de Almeida à respeito da imprescindibilidade de garantia da segurança pelo instituto
da coisa julgada:

Em busca pela perpetuação do resultado obtido no processo, pela


estabilidade e certeza do direito de gozar os bens da vida, constitui o
fundamento de ordem político-jurídica que sustenta a opção do
legislador pela adoção da coisa julgada. Qualidade, típica e única,
atribuída à sentença como ato emanado do Estado.179

Entretanto, mesmo que a primazia do ordenamento jurídico seja pela


segurança e estabilidade das relações jurídicas, há linha doutrinária que levanta a
possibilidade da relativização da coisa julgada quando esta ofenda os parâmetros
constitucionais, tendo em vista sua nulidade 180, como bem se extrai dos ensinamentos
de Humberto Theodoro Júnior e Juliana Cordeiro Faria:

Em relação ao princípio da intangibilidade da coisa julgada, que é uma


noção processual e não constitucional, traz como consectário a ideia
de submissão ao princípio da constitucionalidade. Isto nos permite a
seguinte conclusão: a coisa constitucional será intangível enquanto tal
apenas quando conforme a Constituição. Se desconforme, estar-se-á

176
LEAL, Fabio Resende; SAPELI, Aline Mayara. A história da coisa julgada e de sua desconsideração.
Revista Científica Eletrônica do Curso de Direito, ano II, n. 3 – janeiro de 2013. Disponível em:
<http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/5EzTMf6BQCZlw6g_2019-3-9-16-38-
52.pdf>. Acesso em 20 abr. 2021.
177
SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros, 2006, p.
133.
178
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Direito e processo: direito processual civil: aprimoramento e
modernização do Direito Processual. Rio de Janeiro: Aide, 1997, v. 5, p. 23.
179
ALMEIDA, João Alberto de. Aspectos constitucionais da coisa julgada. Tese (Doutorado em
Direito), Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006, p. 81.
180
NASCIMENTO, Carlos Valder do Nascimento (coord.). Coisa julgada inconstitucional. 3. ed. Rio
de Janeiro: América Jurídica, 2003, p. 13.
64

diante do que a doutrina vem denominando coisa julgada


inconstitucional.181

Para melhor compreensão, buscar-se-á de um caso paradigmático na seara


jurídica: a relativização da coisa julgada nas ações de investigação de paternidade.
Com a evolução científica e o surgimento do exame de DNA em meados da década
de 80, nasceu a discussão da possibilidade de relativizar a coisa julgada nas ações
de investigação de paternidade, fazendo com que a questão da imutabilidade da coisa
julgada fosse colocada em pauta e passasse a ser questionada, colocando à tona a
discussão sobre a relativização desse instituto. Vários foram os casos em que houvera
o reconhecimento da paternidade por indícios e provas meramente testemunhais em
sua maioria, fazendo com que fossem tomadas decisões errôneas, haja vista a
impossibilidade de averiguação da paternidade por via do exame de DNA –
principalmente pelo seu alto custa à época do seu surgimento por se tratar de uma
grande novidade científica -, sendo ainda fixados alimentos em favor do menor. Ocorre
que com o passar dos anos e a popularização do exame, as partes (geralmente o
suposto pai) buscava o direito a comprovação fática da paternidade em casos já
resolvidos e sentenciados, fazendo assim com que o judiciário rediscutisse o caso. À
luz da situação narrada, Carolina da Cunha Pereira França Magalhães comenta:

No caso em comento, o juiz de primeiro grau declarou ser o indivíduo


o pai da criança, baseando-se nos depoimentos das testemunhas e no
exame de fator RH. Sentindo-se injustiçado, o suposto pai interpôs
recurso de apelação, e a sentença foi mantida, transitando em julgado.
Anos mais tarde, nova ação de investigação de paternidade foi
proposta, levando o juiz primevo a extinguir o processo sem julgamento
do mérito, sob o fundamento da existência de coisa julgada e
impossibilidade de nova análise da questão. Por vários anos os
alimentos foram pagos à criança, sem, contudo, o suposto pai assumir
a paternidade socioafetiva. Quando o menino completou seus 18 anos,
foi procurado para que realizasse o exame de DNA para esclarecer a
persistente dúvida. Alguns dias depois veio o resultado negativo do
laudo pericial, obtendo o suposto pai a confirmação do que há tempo
sustentara. Diante do resultado do DNA, o indivíduo, suposto pai
declarado, viu-se no direito de questionar a sentença que determinou
a falsa paternidade atribuída a ele. 182

181
THEODORO JUNIOR, Humberto; FARIA, Juliana Cordeiro. A coisa julgada inconstitucional e os
instrumentos processuais para seu controle. In: NASCIMENTO, Carlos Valder do (coord.). Coisa
julgada inconstitucional. 2003, p. 142.
182
MAGALHÃES, Carolina da Cunha Pereira França. Da relativização da coisa julgada nas ações de
investigação de paternidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n.
4598, 2 fev. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/46204. Acesso em: 11 jun. 2021. Acesso
em 26 abr. 2021.
65

No âmbito dessa discussão, Marcus Vinicius Rios Gonçalves defende que a


coisa julgada deve ser priorizada e preservada – e assim é vista majoritariamente -,
entretanto quando verificado flagrante violação de direitos e garantias fundamentais,
o julgado não pode permanecer imune sob a premissa da “imutabilidade das
decisões”. Segundo o autor, a mitigação da coisa julgada material se dará, em
circunstâncias excepcionais, quando ela “contrariar valores que a ultrapassem em
importância”. É nessa linha que o autor comenta sobre os casos de investigação de
paternidade após a ascensão do exame de DNA:

Hoje os exames de DNA esclarecem, com elevadíssimo grau de


segurança, tais dúvidas. Há casos de ações julgadas procedentes em
que, depois de ultrapassado o prazo da ação rescisória, constatou-se,
por meio de exames de DNA, que o vencido não era pai do autor da
ação. No entanto, fora-lhe reconhecida a paternidade, da qual
advinham importantes consequências, de natureza patrimonial ou não,
como a obrigação de prestar alimentos, e as de natureza sucessória.
Essa é uma das situações em que se poderia relativizar a coisa julgada
(embora o STJ tenha decisões prestigiando, mesmo em casos assim,
a autoridade da coisa julgada, sob o argumento de que, a entender de
forma contrária, colocar-se-iam em risco a segurança das relações
jurídicas e a preservação da paz social). 183

Portanto, esse tema trouxe com força a discussão acerca da relativização da


coisa julgada uma vez que colocou em xeque a sustentação da imutabilidade do
julgado, advindo de meras presunções e apontamentos, consubstanciada numa
decisão judicial que formou uma verdade ficta, mas distante da verdade fática – ou
seja, indo de encontro com a concepção da coisa julgada tida como “presunção da
verdade” 184.
Entretanto, assim como Enrico Tulio Liebmann e Francesco Carnelutti travaram
profundos debates acerca do papel da coisa julgada, a relativização da coisa julgada
trouxe correntes doutrinárias que atuam em direções opostas: uma defende que a
flexibilização da coisa julgada não pode ser irretocável, ou seja, uma vez que o julgado
vá de encontro a princípios processuais basilares – como o da proporcionalidade,
legalidade e da instrumentalidade – esse poderá sim ser rediscutido; por outra banda,
têm-se que a modificação de algo anteriormente julgado e transitado em julgado
impactaria profundamente nos institutos da segurança jurídica e da figura processual,

183
GONÇALVES, M.V. R. Curso De Direito Processual Civil - Processo De Conhecimento E
Procedimentos Especiais. São Paulo: Editora Saraiva, 2021, v. 2. 9786555593563. Disponível em:
<https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786555593563/>. Acesso em 28 abr. 2021.
184
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. 3. ed. Tradução: Paolo
Capitanio. Campinas: Bookseller, 2002, p. 449.
66

uma vez que para essa corrente doutrinária a coisa julgada tem status de cláusula
pétrea. No diapasão dessa discussão, arrebata Luis Marcello Bessa:

Enquanto a corrente [...] apresentada entende que não se trata de


princípio, aqueles que discordam argumentam que a coisa julgada
seria verdadeira cláusula pétrea - assim não fosse, não haveria
necessidade de o legislador dispor expressamente sobre proteção tão
rígida, especialmente no art. 5° da Lei Maior, onde está elencada a
maioria dos direitos fundamentais previstos. Mas segurança jurídica e
intangibilidade da coisa julgada não se confundem. De fato, a segunda
existe para garantir a efetivação da primeira (esta sim, princípio
constitucional, cuja garantia no plano fático se dá por diversos outros
meios, a exemplo da formação de precedentes na jurisprudência).185

Pois nesse sentido favorável ao de flexibilização da coisa julgada, Luiz


Guilherme Marinoni comenta:

Em favor da “relativização” da coisa julgada, argumenta-se a partir de


três princípios: o da proporcionalidade, o da legalidade e o da
instrumentalidade. No exame desse último, sublinha-se o processo,
quando visto em sua dimensão instrumental, somente tem sentido
quando o julgamento estiver pautado pelos ideais de Justiça e
adequado à realidade. Em relação ao princípio da legalidade, afirma-
se que, como o poder do Estado deve ser exercido nos limites da lei,
não é possível pretender conferir a proteção da coisa julgada a uma
sentença totalmente alheia ao direito positivo. Por fim, no que diz
respeito ao princípio da proporcionalidade, sustenta-se que a coisa
julgada, por apenas um dos valores protegidos constitucionalmente,
não pode prevalecer sobre outros valores que têm o mesmo grau
hierárquico.186

E foi a partir das ações de investigação de paternidade que não tiveram o


exame pericial de DNA quando julgadas que emergiu a propensão da relativização da
coisa julgada material 187 no Brasil. A discussão foi levantada, pioneiramente, em solo
nacional pelo então Ministro do Superior Tribunal de Justiça, José Augusto Delgado,
que durante o julgamento do Recurso Especial nº 240.712/SP proferiu voto expondo

185
MARETTI, Luis Marcello Bessa. A intangibilidade da coisa julgada como princípio
constitucional – Divergências. Disponível em: <https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2577/A-
intangibilidade-da-coisa-julgadacomo-principio-constitucional-Divergencias>. Acesso em 30 abr. 2021.
186
MARINONI, Luiz Guilherme. Relativizar a coisa julgada material? Academia Brasileiro de Direito
Processual Civil – ABDPC. Disponível em: <
http://www.abdpc.org.br/abdpc/artigos/Luiz%20G.%20Marinoni(4)%20-formatado.pdf>. Acesso em 30
abr. 2021.
187
A possibilidade de relativização da coisa julgada material independentemente do uso da ação
rescisória faz parte do cenário jurídico nacional, nos excepcionais casos de sua admissão, uma vez
que “intimamente ligado ao princípio da segurança dos atos jurisdicionais, obviamente atinge a filosofia
do direito, configurando uma das principais questões jurídicas ainda sem solução ideal. Trata-se
precisamente da tensão existente entre a facticidade (Faktizität) e a validade (Geltung) do direito; a
tensão entre a justiça e a segurança”. In: MARINONI, Luiz Guilherme. Relativizar a coisa julgada
material? Doutrinas Essenciais de Processo Civil. São Paulo: RT, v. 6, out. 2011, p. 829.
67

sua predileção e defesa da relativização no sentido de “[...] que entende ser impossível
a coisa julgada, só pelo fundamento de impor segurança jurídica, sobrepor-se aos
princípios da moralidade pública e da razoabilidade nas obrigações assumidas pelo
Estado”. 188
Nessa baila, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Albino Zavascki,
alicerça compreensão acerca do significado de uma sentença inconstitucional:

A sentença é inconstitucional não apenas (a) quando aplica norma


inconstitucional (ou com um sentido ou a uma situação tidos por
inconstitucionais), mas também quando, por exemplo, (b) deixa de
aplicar norma declarada constitucional, ou (c) aplica dispositivo da
Constituição considerado não auto-aplicável, ou (d) deixa de aplicar
dispositivo da Constituição auto-aplicável, e assim por diante. Em
suma, a inconstitucionalidade da sentença ocorre em qualquer caso de
ofensa à supremacia da Constituição, e o controle dessa supremacia,
pelo Supremo, é exercido em toda amplitude da jurisdição
constitucional, da qual a fiscalização da constitucionalidade das leis é
parte importante, mas é apenas parte.189

Entretanto, in casu, gira-se em torno da flexibilização da coisa julgada material,


de forma que Gisele Santos Fernando Goés ressalta a sua importância para o
desenvolvimento de sua função social: “[...] a coisa julgada é um direito e garantia
fundamental, entretanto, acima de tudo, é um direito humano – direito do cidadão –
uma concretização do exercício da cidadania, de acesso à justiça, de previsibilidade
de término do conflito”. 190
Assim a coisa julgada acaba por apresentar peculiaridades no tocante a matéria
questionada no processo de onde resulta a decisão judicial a ser por ela afetada. As
modalidades utilizadas pelo sistema processual no sentido de serem protegidos
direitos mais relevantes por sua função social, tal como os do consumidor, do meio
ambiente e da livre concorrência, possibilitam a formação de coisa julgada
condicionada ao resultado do processo. 191

188
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 240.712/SP (1999/0109732-0). Relator
Ministro José Delgado. Data do Julgamento: 15 fev. 2000. Disponível em
<https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=199901097320&dt_publicacao
=24/04/2000>. Acesso em 30 abr. 2021.
189
ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2001, p. 332.
190
GÓES, Gisele Santos Fernandes. A “Relativização da Coisa Julgada: Exame Crítico (Exposição
de um Ponto de Vista Contrário). In: Relativização da Coisa Julgada, Enfoque Crítico, 2. ed. Salvador:
JusPodivm, 2008, p. 187.
191
ARMELIN, Donaldo; Flexibilização da Coisa Julgada. In: DIDIER JR. Fredie (Coord.). Relativização
da Coisa Julgada. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 83.
68

Sob esse prisma de garantia fundamental é que se faz possível compreender


a flexibilização da coisa julgada na concepção atual de processo que temos em nosso
ordenamento jurídico, o qual segundo Fredie Didier Jr. “deve estar adequado à tutela
efetiva dos direitos fundamentais (dimensão subjetiva) e, além disso, ele próprio deve
ser estruturado de acordo com os direitos fundamentais (dimensão objetiva)”. 192
Assim sendo, há de levar em consideração o condão constitucional da coisa
julgada que atua em favor da efetividade da segurança jurídica que prima,
basicamente, em estabelecer “o mínimo de previsibilidade necessária que o Estado
de Direito deve oferecer a todo cidadão, a respeito de quais são as normas de
convivência que ele deve observar e com base nas quais pode travar relações
jurídicas válidas e eficazes”.193
Pois bem, quando for verificado julgado em contraposição à Constituição, como
se fará a sua rediscussão e adequação aos ditames constitucionais? É possível fazer
sua “rescisão”? Qual o procedimento a ser seguido? O Código de Processo Civil de
2015 prevê dois “remédios” para essa situação: a ação rescisória194 e a ação
declaratória de inexistência (querela nullitatis). Assim, a rediscussão da sentença que
tenha manifestamente ofendido aos ditames da Constituição – e, possivelmente tenha
se oposto a entendimento perpetrado pelo Poder Judiciário nas discussões levadas
ao tribunais – poderá será realizada por meio da ação rescisória, entretanto sujeita
aos requisitos legais previstos na legislação ordinária, por exemplo a obediência ao
prazo decadencial, tal que seja possível concluir que uma vez, extrapolado esse limite

192
DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil e
processo de conhecimento. 13. ed. Salvador: JusPodivm, 2011, v. 1, p. 41.
193
GRECO, Leonardo. Eficácia da declaração erga omnes de constitucionalidade ou
inconstitucionalidade em relação à coisa julgada anterior. Revista Jurídica da Procuradoria-Geral do
Distrito Federal. V. 37. 2003. p. 99-114. Disponível em:
<http://revista.pg.df.gov.br/index.php/RJPGDF/article/view/12>. Acesso em 26 abr. 2021.
194
Não obstante, o art. 966 disciplinará o rito da ação rescisória nos seguintes termos:
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
I - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;
II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;
III - resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de
simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;
IV - ofender a coisa julgada;
V - violar manifestamente norma jurídica;
VI - for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser
demonstrada na própria ação rescisória;
VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de
que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;
VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos. [...]”. In: BRASIL. Lei nº 13.105, de 16
de Março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 29 abr. 2021.
69

temporal, resta prejudicado o pretenso ataque à decisão de conteúdo inconstitucional,


vide o entendimento perpetrado pelo STF no julgamento do Recurso Extraordinário nº
730.462/SP. O Ministro Teori Zavascki proferiu voto no referido julgamento
ressaltando:

Conforme asseverado, o efeito executivo da declaração de


constitucionalidade ou inconstitucionalidade deriva da decisão do STF,
não atingindo, consequentemente, atos ou sentenças anteriores, ainda
que inconstitucionais. Para desfazer as sentenças anteriores será
indispensável ou a interposição de recurso próprio (se cabível), ou,
tendo ocorrido o trânsito em julgado, a propositura da ação rescisória,
nos termos do art. 485, V, do CPC, observado o respectivo prazo
decadencial (CPC, art. 495). Ressalva-se desse entendimento, quanto
à indispensabilidade da ação rescisória, a questão relacionada à
execução de efeitos futuros da sentença proferida em caso concreto,
notadamente quando decide sobre relações jurídicas de trato
continuado, tema de que aqui não se cogita. 195

Não menos importante se faz mencionar o discutido por Pontes de Miranda,


cujo entendimento é no sentido da existência de sentenças nulas e inexistentes, ou
seja, não cabíveis de rescisão uma vez reconhecendo que “a sentença nula não
precisa ser rescindida. Nula é; e a ação constitutiva negativa pode ser exercida ainda
incidenter, cabendo ao juiz a própria desconstituição de ofício”.196 Com efeito, Luiz
Guilherme Marinoni comenta que se não se pretende menosprezar a importância da
coisa julgada, se torna inadmissível a utilização da ação rescisória “como um
mecanismo de uniformização da interpretação da Constituição voltado para o
passado”.197 Ao corroborar o entendimento da impossibilidade da flexibilização da
coisa julgada, Friedrich Lent é categórico:

É de todo inútil contestar depois o quanto tenha sido acertado o


reconhecido na sentença, assim como afirmar o quanto tenha sido
negado; os juízes dos sucessivos processos são vinculados pelo
provimento precedente e não podem dele se afastar. 198

195
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 730.462/SP. Relator Ministro Teori
Zavascki. Data do Julgamento: 29 mai. 2014. Disponível em: <
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=9343495>. Acesso em 28 abr.
2021.
196
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado da ação rescisória das sentenças e de
outras decisões. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1976, p. 194.
197
MARINONI, Luiz Guilherme. Relativizar a coisa julgada material? Academia Brasileiro de Direito
Processual Civil – ABDPC. Disponível em: <
http://www.abdpc.org.br/abdpc/artigos/Luiz%20G.%20Marinoni(4)%20-formatado.pdf>. Acesso em 01
mai. 2021.
198
LENT, Friedrich. Diritto processuale civile tedesco. Trad. ital. de Edoardo F. Ricci. Nápoles:
Morano, 1962, p. 239.
70

É nessa linha de pensamento que a segunda alternativa de relativização da


coisa julgada surge, pois a ação declaratória de nulidade – ou querela nullitatis – se
refere à ação ou impugnação pela qual se pretende atingir a declaração de uma
inexistência de direito, por vício em processo precedente, com fulcro no artigo 19,
inciso I, artigo 525, inciso I e artigo 917, inciso VI, que admitem a postulação
meramente declaratória da inexistência. Ainda, essa ação declaratória de nulidade
não está subsumida aos prazos processuais, ou seja, pode ser ajuizada a qualquer
tempo desde que seja em virtude de vício processual. 199 Ademais, o próprio STJ em
julgamento que teve como relator o Ministro José Augusto Delgado, reconheceu a
possibilidade da utilização da ação declaratória de nulidade no caso em que incorrer
“nulidade ipso iure da sentença [...] ferida de morte por impossibilidade
preponderantemente jurídica porque: a) a sentença conferiu aos autores direito
material que os mesmos não têm, sendo ilícito o seu objeto; b) [...] o objeto da
sentença é de execução impossível”. 200
Sustentam Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina, que a
querela nullitatis aplicar-se-ia mesmo nos casos em que a sentença proferida analisar
o mérito da causa, e essa conter vício grave – por exemplo a não ocorrência de citação
válida -, será considerada de pleno inexistente não sendo abarcada pela coisa julgada.
Por outro lado, caso seja passível de vício de nulidade absoluta – por exemplo em
casos de sentença proferida por juiz absolutamente incompetente – a sentença estará
angularizada sob a coisa julgada, permitindo apenas a sua rescisão por meio da ação
rescisória com respeito ao prazo decadencial cominado. 201
A linha doutrinária que defende a não flexibilização da coisa julgada
encabeçada, especialmente, por Humberto Theodoro Júnior observa o instituto como
um dogma incontestável – absolutamente intocável - aquele que garantirá a
imutabilidade da sentença, mantendo-a estável e não passível de rediscussão

199
GARDINAL, Ângela. A relativização da coisa julgada no processo civil brasileiro. Revista Jus
Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6373, 12 dez. 2020. Disponível em:
https://jus.com.br/artigos/87367. Acesso em: 4 maio 2021.
200
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 240.712/SP (1999/0109732-0). Relator
Ministro José Delgado. Data do Julgamento: 15 fev. 2000. Disponível em
<https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=199901097320&dt_publicacao
=24/04/2000>. Acesso em 04 mai. 2021.
201
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia. O dogma da coisa julgada:
Hipóteses de Relativização. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 212-213.
71

salvaguardando o princípio da segurança jurídica. 202 Por esse caminho refere-se


Moacyr Amaral Santos ao sintetizar a compreensão dessa linhagem doutrinária,
sendo uma vez “proferida a sentença e preclusos os prazos para recursos, a sentença
se torna imutável (primeiro degrau — coisa julgada formal); e, em consequência,
tornam-se imutáveis os seus efeitos (segundo degrau — coisa julgada material)”.203
Portanto, tais possibilidades ensejam a chamada flexibilização ou relativização
da coisa julgada, como bem preceitua Eduardo Couture ao considerar o cabimento da
rescisão de decisão oposta ao direito hodierno e positivado:

Entretanto, verdade é que, ainda assim, a necessidade de certeza deve


ceder, em determinadas condições, ante a necessidade de que triunfe
a verdade. A coisa julgada não é de razão natural. Antes, a razão
natural pareceria aconselhar o contrário: que o escrúpulo de verdade
fosse mais forte que o escrúpulo de certeza; e que sempre, em face de
uma nova prova, ou de um fato novo fundamental e antes
desconhecido, se pudesse percorrer de novo o caminho já andado, a
fim de restabelecer o império da justiça.204

Ante o delineado no presente subcapítulo, não se nega que a imutabilidade da


coisa julgada pode perpetuar, em determinados casos, situações não desejadas –
como decisões injustas. Entretanto, conforme o avanço da temática, se observará que
foi com o intuito de atenuar tais riscos que o ordenamento jurídico acabou ofertando
instrumentos capazes a contorná-los – a ação rescisória nos moldes atuais e a querela
nullitatis – seriam eles aptos a circundar várias das possíveis causas de decisões
ilegais ou eventualmente injustas, ainda que isso não seja suficiente. Mas, não
obstante, a mesma asserção não vale àquelas decisões que incutem alguma
inconstitucionalidade em si. Resta observar, em particular, a situação especifica das
decisões, sobre as quais se operou a coisa julgada, que contrariam os ditames
constitucionais.

2.2 A COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL E SEUS REFLEXOS NO DIREITO


TRIBUTÁRIO
Ao falarmos em Estado Democrático de Direito tem-se por primeira ideia a

202
CÂMARA, Alexandre Freitas. Relativização da Coisa Julgada Material. In: DIDIER JR, Fredie
(Coord.). Relativização da coisa julgada, JusPodivm, 2008, p. 17.
203
SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva,
1983, v. 3, p. 43.
204
COUTURE, Eduardo Juan. Fundamentos do direito processual civil. Trad. bras. de Rubens
Gomes de Souza. São Paulo: Saraiva, 1946, p. 329-330.
72

supremacia da Constituição dentro da organização da coisa pública – ou melhor


dizendo da República -, ou seja, um Estado que será pautado pelos ditames
constitucionais que buscam a garantia e a estabilidade das relações interpessoais,
seja entre os próprios indivíduos ou dos indivíduos para com a figura estatal. Portanto,
essa organização na forma de Estado Democrático de Direito é uma consequência da
busca pela limitação do poder político do Estado e a primazia pela lei resultado da
vontade geral da sociedade, que por meio de sua supremacia – haja vista a
Constituição ser a expressão máxima da lei fundamental – assegurar a todos os
integrantes do Estado tutela da segurança e da justiça como esteios basilares da
sociedade. Tanto assim é visto que José Joaquim Gomes Canotilho ressalta a
relevância da sobreposição da Carta Magna frente a legislação infraconstitucional:

A Constituição assume-se e é reconhecida como direito superior, como


‘lei superior’, que vincula, em termos jurídicos e não apenas políticos,
os titulares do poder. Através da subordinação ao direito dos titulares
do poder, pretende-se realizar o fim permanente de qualquer lei
fundamental – a limitação do poder.205

Pois bem, para que a Constituição cumpra o seu papel principal de guarnecer
a tutela jurisdicional – ou seja, de garantir a segurança em todos os aspectos -, utiliza-
se de outros ditames legais como a proteção ao direito adquirido, ao ato jurídico
perfeito e à coisa julgada que, combinados, dão contornos jurídicos ao direito
fundamental à segurança, como se depreende da leitura do fixado pelo art. 5º, XXXVI
da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 206.207
Haja vista já amplamente conceituados os institutos do princípio da segurança
jurídica, da coisa julgada e por último a possiblidade de sua flexibilização, bem como
anteriormente caracterizado o itinerário histórico que culminou ao modelo
contemporâneo de Estado Democrático de Direito, temos agora em questão da coisa

205
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e Teoria da Constituição. 3. ed.
Coimbra: Almedina, 1999, p. 1336.
206
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”; In: BRASIL.
Constituição da República Federativa do Brasil: D.O. 5 de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 07 mai.
2021.
207
LEAL, David Abdalla Pires; BONATO, Giovanni. Coisa julgada inconstitucional: os efeitos do controle
difuso de constitucionalidade no novo CPC e a segurança jurídica. Revista de Processo, Jurisdição
e Efetividade da Justiça. e-ISSN: 2525-9814, Curitiba, v. 2, n. 2, p. 106-125. Jul/Dez. 2016. Disponível
em: <https://indexlaw.org/index.php/revistaprocessojurisdicao/article/view/1600/2069>. Acesso em 07
mai. 2021.
73

julgada inconstitucional perante a seara tributária. E uma vez visto que para maioria
da classe doutrinária teria a coisa julgada status de cláusula pétrea, Adriana Zawada
Melo pontua:

Cláusulas pétreas, representam o núcleo inatingível de uma


Constituição, gravado como uma cláusula de eternidade (em alemão,
ewigkeitsgarantien), a fim de conferir uma força especial, frente às
eventuais reformas, aos princípios de maior importância na
manutenção da decisão política fundamental, base de determinada
Constituição. Essas cláusulas de garantia ou de irreversibilidade
gozam, como diz Oscar Vilhena Vieira, de uma
superconstitucionalidade (no sentido de possuir uma rigidez maior), o
que impede que os princípios alçados à condição de cláusulas
inatingíveis, de serem suprimidos ou desfigurados, podendo apenas
ser admitida a sua reestruturação ou ampliação.208

Com efeito, a coisa julgada terá o mesmo impacto e importância do já delineado


no subcapítulo anterior, entretanto no âmbito tributário dá-se maior relevância à sua
característica da imutabilidade ao tema discutido e decidido, assim alcançando a
primazia da segurança jurídica. Assim sendo, emerge como garantia ao cidadão, que
é “[...] sujeito passivo da obrigação tributária [...] expressa por meio de decisões
individuais e/ou coletivas, que declaram, por exemplo, a ilegalidade e/ou
inconstitucionalidade de uma figura tributária qualquer, ou a sua inexigibilidade [...]”. 209
Nessa senda, cumpre ressaltar a cláusula rebuc sic stantibus que nos permite
interpretar que os efeitos da coisa julgada produzida terão sua extensão somente
durante o interregno em que a relação jurídica objeto da análise judicial permanecer
inalterada. 210
Antes de adentrar à coisa julgada inconstitucional e seu impacto na seara
tributária, mister se faz realizar a diferenciação da relação jurídica tributária
instantânea da continuativa. Na primeira, “o fato tributável é autônomo, isto é, nele
residem todos os elementos de que necessita para determinar o valor do tributo a ser
pago, e o pagamento extingue não apenas o crédito tributário respectivo, mas a
própria relação obrigacional fisco-contribuinte”,211 sendo que nessas a posterior

208
MELO, Adriana Zawada. A Limitação Material do Poder Constituinte Derivado. Revista Mestrado
em Direito, Osasco, n. 1, junho 2008, p. 37.
209
ELALI, André; PEIXOTO, Marcelo Magalhães. Coisa Julgada em matéria tributária e sua possível
relativização na ordem jurídica: colisão de princípio? In: MARTINS, Ives Gandra; PEIXOTO, Marcelo
Magalhães; ELALI, André. (Coords.). Coisa Julgada Tributária. São Paulo: MP Editora, 2005, p. 25.
210
PORTO, Sérgio. Coisa Julgada Civil. 3. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 80-
81.
211
MACHADO, Hugo de Brito. Mandado de Segurança em Matéria Tributária: De acordo com a Lei
12.016/09. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2009, p. 209.
74

modificação fática em nada influi na sentença já proferida. Por sua vez, a relação
jurídica continuada – ou seja, de trato sucessivo – é aplicada aos impostos conhecidos
como Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) e o Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI), cujos o doutrinador Helenilson Cunha Pontes destaca:

[...] a relação jurídica tributária, entendida em sentido lato, caracteriza-


se pela sucessividade ou continuidade, de modo que toda vez que se
realiza o suporte fático da norma que estabelece o dever tributário
(principal e/ou instrumental) surge para o Estado o direito potestativo
de lançar tributo devido e/ou de exigir o cumprimento do dever
acessório. A sucessividade da relação tributária caracteriza-se pela
incidência repetida da mesma norma tributária; as incidências da
norma tributária, embora substancialmente iguais sucedem-se no
tempo; à medida que vão sendo realizados os suportes fáticos da
norma tributária, vão se materializando, em ato, as relações jurídicas
que, em potência, já estão definidas em lei.212

Nas relações jurídicas tributárias continuativas diferentemente das


instantâneas, a eficácia da sentença avança pelo tempo sendo que “ocorrendo [...]
alteração na anterior situação pelo advento, voluntário ou involuntário, de um fato, a
eficácia da decisão é frontalmente atingida”. 213 Já nas sentenças proferidas em
relações jurídicas continuativas resta evidente que a coisa julgada formada “é tão
indiscutível e imutável como o declarado em qualquer outra sentença de mérito. O que
se modifica, na espécie, não é a sentença, mas a relação jurídica material sobre a
qual a força da sentença tem de atuar”. 214 Dessa forma, a eventual possibilidade de
ulterior revisão de julgado oriunda de fatos supervenientes não extingue a coisa
julgada em si, inversamente, concretiza o formato da coisa julgada material exsurgida
a qual torna inevitável a sua revisão. 215
Com efeito, Teori Albino Zavascki explana acerca da eficácia da sentença sobre
uma relação jurídica continuativa – ou seja, uma sentença determinativa – que emerge
da norma jurídica e da situação fática:

Se ela afirmou que uma relação jurídica existe ou que tem certo
conteúdo, é porque supôs a existência de determinado comando

212
PONTES, Helenilson Cunha. Coisa julgada tributária e inconstitucionalidade. São Paulo:
Dialética, 2005, p. 125.
213
CRUZ E TUCCI, José Rogério. Tempo e Processo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1997,
p. 170.
214
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Coisa Julgada. Mandado de Segurança. Relação Jurídica
Continuativa. Contribuição Social. Súmula nº 239 do STF. In: MARTINS, Ives Gandra; PEIXOTO,
Marcelo Magalhães; ELALI, André. (Coords.). Coisa Julgada Tributária. São Paulo: MP Editora, 2005,
p. 175.
215
OLIVEIRA, Guilherme Botelho de. Coisa Julgada (sentença) Inconstitucional em Matéria Tributária.
Juris Plenum. Ano VI, n. 31. p. 39/67, jan. 2010, p. 45.
75

normativo (norma jurídica) e de determinada situação de fato (suporte


fático de incidência); se afirmou que determinada relação jurídica não
existe, supôs a inexistência ou do comando normativo, ou da situação
de fato afirmada pelo litigante interessado. A mudança de qualquer
desses elementos compromete o silogismo original da sentença,
porque estará alterado o silogismo do fenômeno de incidência por ela
apreciado: a relação jurídica que antes existia deixou de existir, e vice-
versa. 216

Nesse interim, a edição da Súmula nº 239 pelo Supremo Tribunal Federal


acerca da declaração indevida de cobrança num certo exercício não faz coisa julgada
em relação aos exercícios subsequentes trouxe uma grande discussão em âmbito
tributário sobre o alcance e os limites da coisa julgada em matéria tributária, de tal
forma que Rubens Gomes de Sousa posiciona-se:

A solução exata estaria em distinguir, em cada caso julgado, entre


decisões que tenham se pronunciado sobre os elementos permanentes
e imutáveis da relação jurídica, como a constitucionalidade ou
inconstitucionalidade do tributo, a sua incidência ou não-incidência na
hipótese materialmente considerada, a existência ou inexistência de
isenção legal ou contratual e o seu alcance, a vigência da lei tributária
substantiva ou sua revogação, etc. – e as que se tenham pronunciado
sobre elementos temporários ou mutáveis da relação jurídica, como a
avaliação de bens, as condições personalíssimas do contribuinte em
seus reflexos tributários, e outras da mesma natureza; à coisa julgada
das decisões do primeiro tipo há que atribuir uma eficácia permanente;
à das segundas, uma eficácia circunscrita ao caso específico em que
foram proferidas. 217

É nessa seara que a coisa julgada inconstitucional adentra, pois como em um


Estado Democrático de Direito será pautado pela sua Constituição e,
consequentemente, primar pela constitucionalidade de seus atos e organização, a
simples constatação de uma eventual inconstitucionalidade – seja uma decisão
judicial ou ato praticado pelo ente estatal – representa grave ofensa ao regime
constitucional. Portanto, a “coisa julgada não pode servir de empecilho ao
reconhecimento da invalidade da sentença proferida em contrariedade à Constituição
Federal” 218, haja vista que “a irrecorribilidade de uma sentença não apaga a
inconstitucionalidade daqueles resultados substanciais política ou socialmente

216
ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das Sentenças na Jurisdição Constitucional. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 106.
217
SOUSA, Rubens Gomes de. Coisa julgada (direito fiscal). In: SANTOS, J. M. de Carvalho.
Repertório enciclopédico do direito brasileiro. v. 9. Rio de Janeiro: Borsoi, 1947, p. 298.
218
THEODORO JÚNIOR, Humberto; FARIA, Juliana Cordeiro de. O tormentoso problema da
inconstitucionalidade da sentença passada em julgado. In: DIDIER JR, Fredie (Coord.). Relativização
da coisa julgada, JusPodivm, 2008, p. 216.
76

ilegítimos, que a Constituição repudia”. 219 A grande celeuma que circunscreve o


debate se dá pelo fato de que “se é possível a anulação de uma sentença transitada
em julgado, será, por dever de coerência, também ser aberta a possibilidade de
anular, a qualquer tempo, a decisão posterior que anulou a anterior. E assim
sucessivamente”. 220 Nessa linha, corrobora Sérgio Nojiri:

Se a questão já foi exaustivamente apreciada pelas instâncias


competentes, como decidir novamente a mesma questão? Os
parâmetros anteriormente adotados serviram? E no tocante às provas,
não haveria preclusão? E a reabertura do caso se daria por mera
insatisfação da parte vencida? Nesse caso, qual o grau de satisfação
legitimaria a reabertura do caso? Quantas vezes se poderia anular uma
decisão? Haveria um limite?221

Por assim dizer, o que mais causa espanto em parte da doutrina radicalmente
contrária a flexibilização da coisa julgada é a falta de parâmetros, ou seja, de limites
para essa pretensa flexibilização o que acabou desencadeando grandes debates
acerca do tema. O doutrinador Eduardo Talamini individualizou e classificou as
hipóteses de sentença (e coisa julgada) inconstitucional em cinco modalidades: a)
sentença calcada na aplicação de norma inconstitucional; b) sentença amparada em
interpretação não compatível com a Constituição; c) sentença baseada na indevida
afirmação de inconstitucionalidade de uma norma; d) sentença amparada na violação
direta de normas constitucionais ou cujo dispositivo viola diretamente normas
constitucionais e; e) sentença que, embora sem incidir em qualquer das hipóteses
anteriores, estabelece ou declara uma situação diretamente incompatível com os
valores fundamentais da ordem constitucional. 222 Em outra modulação acerca do
tema, Teori Albino Zavascki pontua:

A sentença é inconstitucional não apenas (a) quando aplica norma


inconstitucional (ou com um sentido ou a uma situação tidos por
inconstitucionais), mas também quando, por exemplo, (b) deixa de
aplicar norma declarada constitucional, ou (c) aplica dispositivo da
Constituição considerado não-auto-aplicável, ou (d) deixa de aplicar
dispositivo da Constituição auto-aplicável, e assim por diante.223

219
DINAMARCO, Cândido Rangel. Relativizar a coisa julgada material. Revista Forense. Rio de
Janeiro, v. 97, nº 358, 2001, p. 25.
220
NOJIRI, Sérgio. Crítica à teoria da relativização da coisa julgada. In: DIDIER JR, Fredie (Coord.).
Relativização da coisa julgada, JusPodivm, 2008, p. 362.
221
Ibidem, p. 320-321.
222
TALAMINI, Eduardo. Coisa e julgada e sua revisão. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2005, p. 406-414.
223
ZAVASCKI, Teori Albino. Inexigibilidade de sentenças inconstitucionais. In: DIDIER JR, Fredie
(Coord.). Relativização da coisa julgada, JusPodivm, 2008, p. 374.
77

Não obstante, os doutrinadores Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz


Arenhart pontuam de forma contundente e oponível à relativização da coisa julgada
ao comentar:

A “tese da relativização” contrapõe a coisa julgada material ao valor


justiça, mas surpreendentemente não diz o que entende por “justiça” e
sequer busca amparo em uma das modernas contribuições da filosofia
do direito sobre o tema. Aparentemente, parte de uma noção de justiça
como senso comum, capaz de ser descoberto por qualquer cidadão
médio (l’uomo della strada), o que a torna imprestável ao seu propósito,
por sofrer de evidente inconsistência, nos termos a que se refere
Canaris.224

Na mesma linha, Luiz Eduardo Castilho Girotto, partícipe da frente contrária a


relativização que observa a coisa julgada como “direito fundamental que, em hipótese
alguma, nem mesmo por meio de emenda constitucional, pode ser suprimido ou ter
seu valor alterado” 225, pontua:

Não há como se descaracterizar, pois, a proteção constitucional que


recai sobre a coisa julgada, máxime considerando-se que, ao atribuir
certeza às relações jurídicas e estabilizar as decisões que resolvem
conflitos de interesse, referido instituto apresenta-se como efetiva
expressão do princípio da segurança jurídica, adquirindo valor
fundamental para o Estado de Direito, como veículo de pacificação
social e alcance do bem comum.226

Pois, sob essa ótica, que se posiciona contrariamente à relativização da coisa


julgada, essa não pode ser alvo de “ponderações” por se tratar de um instituto não
passível de mensuração ou comparação, pois é “regra formal do próprio discurso
jurídico, cuja fundamentação é pragmático-transcendental. Sem coisa julgada não há
como falar em discurso jurídico e, por consequência, em Estado Democrático de
Direito”. 227
Com efeito, o fundamento da coisa julgada se encontra calcado nas bases do
Estado Democrático de Direito e com a não obediência a ela, “os litígios jamais

224
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Processo de
Conhecimento. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021, v. 2, p. 658.
225
LEAL, Fabio Resende; SAPELI, Aline Mayara. A história da coisa e de sua desconsideração. Revista
Científica Eletrônica do Curso de Direito - FAEF, Ano II, Número 3/Jan. 2013. Disponível em:
<http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/oXXWLVIVn5r2h8o_2013-12-4-17-29-
35.pdf>. Acesso em 14 mai. 2021.
226
GIROTTO, Luiz Eduardo Castilho. Coisa julgada inconstitucional em matéria tributária. Curitiba:
Juruá, 2009, p. 69.
227
MARINONI, Luiz Guilherme. Coisa julgada inconstitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2008, p. 184.
78

acabarão, renovando-se, a todo instante, sob o pretexto de ofensa a este ou aquele


princípio constitucional”.228
Tamanha é a relação da constitucionalidade com o direito tributário que
Leandro Paulsen afirma que o direito constitucional é indispensável “para a
compreensão do Direito Tributário, absolutamente condicionado constitucionalmente
no que diz respeito às possibilidades de tributação e ao modo de tributar, bem como
aos princípios que regem a tributação”.229 Assim sendo, dentro da esfera tributária a
doutrina menciona a congruência entre as suas disposições constitucionais e a coisa
julgada, ou seja, alçando a relação jurídico-tributária ao patamar dos direitos
fundamentais. Aduz, nesse ínterim, Helenilson Cunha Pontes:

Justamente pelo caráter “dramático” da relação entre indivíduo e


Estado, enquanto entre tributante, é que a aplicação dos direitos
fundamentais na relação jurídico-tributária assume indiscutível relevo.
Com efeito, a crescente invasão do Estado sobre a esfera das
liberdades individuais em busca de recursos tributários torna
indispensável a construção de uma doutrina que reconheça nos
direitos fundamentais a proteção necessária contra as agressões às
liberdades individuais.230

Entretanto, há certa dissonância entre os doutrinadores quanto a idealização


da coisa julgada ante a figura do contribuinte, visto que o predicado da simples
proteção do contribuinte não pode justificar a “divinização” da coisa julgada que venha
afrontar outros princípios constitucionais, mas sim oportunizar por meio do texto
constitucional pela aplicação dos princípios da boa-fé, da razoabilidade, da moralidade
e da previsibilidade, buscar “uma interpretação constitucional que não permita a
manutenção de coisa julgada que ofenda a Lei Fundamental, mas que também não
deixe o cidadão contribuinte desamparado de proteção e segurança, principalmente
nas questões tributárias”.231 Nesse ponto faz-se necessário ressaltar o entendimento
acerca da relação entre o princípio da isonomia tributária e a proteção da confiança,
como bem explana Maria do Socorro da Costa Gomes:

228
ASSIS, Araken de. Eficácia da coisa julgada inconstitucional. In: Relativização da coisa julgada –
Enfoque crítico. Salvador: JusPodivm, 2006, p. 36.
229
PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora.
2012, p.11.
230
PONTES, Helenilson Cunha. O direito ao silêncio no Direito Tributário. In: FISCHER, Octávio
Campos (Coord.). Tributos e direitos fundamentais. São Paulo: Dialética, 2004, p. 82.
231
BARBOZA, Estefânia Maria de Queiroz. Relativização da coisa julgada tributária inconstitucional x
princípio da segurança jurídica. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, n. 129, p. 35-49.
jun. 2006.
79

O princípio da proteção à confiança explica a eficácia da manifestação


consolidadora do princípio da isonomia tributária sobre as relações
continuativas, pois de um lado, assegura a confiança no ato
jurisdicional revestido pela coisa julgada; e de outro, em alterar as
situações consolidadas, opera apenas para o futuro, incidindo
imediatamente sobre as relações ainda não constituídas, dando-lhes a
regulação constitucional própria ao momento em que ocorreram. 232

No que tange ao alcance da coisa julgada em matéria tributária e a possível


colisão de direitos fundamentais – sendo de um lado a coisa julgada em si e do outro
os princípios tributários –, Hugo de Brito Machado sustenta:

A relativização de um direito fundamental, todavia, só se justifica em


face de outro direito fundamental. O aparente conflito entre eles é que
justifica a relativização de ambos, para que ambos possam subsistir,
na medida necessária à convivência das liberdades públicas. A
relativização é o recurso, sempre excepcional, necessário à própria
preservação dos direitos fundamentais que eventualmente se ponham
em conflito.233

Na mesma corrente, Leonardo Greco acerca da declaração de


constitucionalidade ou de inconstitucionalidade em controle concentrado de normas
pelo Supremo Tribunal Federal afirma que não poderia essa decisão atingir sentenças
anteriores e transitadas em julgado que tenham sido fundamentadas por
entendimento contrário ao STF. Sob essa premissa, assevera:

A segurança jurid ́ ica, como direito fundamental, é limite que nao ̃


permite a anulaçao ̃ do julgado com fundamento na decisão do STF. O
único instrumento processual cabível para essa anulação, quanto aos
efeitos já produzidos pela sentença transitada em julgado, é a ação
rescisória, se ainda subsistir o prazo para a sua propositura. 234

Deveras a questão acerca da coisa julgada inconstitucional em matéria


tributária e o debate doutrinário – e também no judiciário – se apresenta de forma
ambivalente: ora primando pela imutabilidade das decisões e sua plena
irretroatividade, ora possibilitando sua relativização em vistas da perfectibilização e

232
GOMES, Maria do Socorro Costa. Os limites da coisa julgada ante o princípio da igualdade
tributária. Dissertação (Mestrado em Direito Público e Econômico) – Universidade Presbiteriana
Mackenzie, São Paulo, 2015. Disponível em:
<http://tede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/1168/1/Maria%20do%20Socorro%20Costa%20Gomes.
pdf>. Acesso em 19 mai. 2021.
233
MACHADO, Hugo de Brito. Os direitos fundamentais do contribuinte e a efetividade da
jurisdição. 266 f. Tese (Doutorado em Direito). Programa de Pós-Graduação em Direito, Centro de
Ciências Jurídicas / FDR, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2009. Disponível em: <
https://repositorio.ufpe.br/bitstream/123456789/4003/1/arquivo5668_1.pdf>. Acesso em 20 mai. 2021.
234
GRECO, Leonardo. Eficácia da Declaração Erga Omnes de Constitucionalidade ou
Inconstitucionalidade. In: DIDIER JR, Fredie (Coord.). Relativização da coisa julgada, JusPodivm,
2008, p. 259-260.
80

aplicação dos direitos fundamentais e seus princípios corolários. Por assim dizer, o
embate acaba se originando do mesmo ponto controverso: teria um direito
fundamental maior importância do que outro? Manter a coisa julgada inconstitucional
sob o jaez da perpetração do princípio da coisa jurídica e ferir o princípio da isonomia
– ou até mesmo da legalidade ou igualdade – seria algo razoável? Como bem exposto
no presente subcapítulo, o embate continua e muito se estende sobre a intangibilidade
da coisa julgada, entretanto é preciso compreender e conhecer – enquanto não se
tem um posicionamento concreto – dos mecanismos presentes em nossa legislação
para a defesa do contribuinte ante essas situações.

2.3 MECANISMOS PROCESSUAIS DE DEFESA DO CONTRIBUINTE

Diante das incertezas e insegurança jurídica que circundam o embate acerca


da relativização da coisa julgada – aqui sob o enfoque tributário -, faz-se mais do que
necessária a existência de dispositivos que propiciem a defesa do contribuinte ante o
ente estatal no exercício de seu poder fiscal e executório.
Assim, as defesas cabíveis ao executado são divididas em três categorias
amplas: a) defesas típicas – aquelas defesas cominadas como faculdade do
executado, a exemplo da impugnação ao cumprimento de sentença e os embargos à
execução, sendo essas correlatas à relação jurídica processual executiva; b) defesas
atípicas (ou anômalas) – são modalidades que não encontram previsão normativa, tal
como a exceção de pré-executividade (de cunho endoprocessual), ou, ainda que
cominadas legalmente, não estejam taxadas como defesa do executado em si, como
por exemplo os embargos de terceiro; c) defesas heterotópicas – essas compõem-se
por meios autônomos de impugnação oponíveis pelos próprios litigantes ou de
terceiros com interesse na lide, tais como a ação rescisória, ação anulatória, revisão
criminal, querela nullitatis insanabilis, ação impugnativa declaratória ou
desconstitutiva e o mandado de segurança. Como bem assevera Fabrício Rocha
Bastos acerca da matéria de defesa:

A rigor, o devedor executado, bem como eventual terceiro poderão


utilizar qualquer meio processual de impugnação, desde que seja uma
forma lícita, com base no princípio do acesso à justiça (artigo 5º, inciso
81

XXXV da CR/1988). O executado poderá se insurgir, ainda, contra a


execução autônoma mediante arguição de suspeição ou impedimento
(artigo 917, §7º, CPC/2015) ou por meio de petição simples (artigo 917,
§1º, CPC/2015).235

Em suma, o Código de Processo Civil de 2015 prevê três possibilidades


legalmente cominadas destinadas à desconstrução da decisão judicial outrora
existente, válida e eficaz: a) a ação rescisória “comum” (art. 966) 236; b) a impugnação
com efeitos rescisórios no cumprimento de sentença (art. 525, § 12 e art. 535, § 5º);
e c) a ação rescisória “moderna” (art. 525, § 15 e art. 535, § 8º). É sob o lume da
desconstituição da coisa julgada que Alexandre Freitas Câmara enfatiza: “[...] a
ineficácia da sentença inconstitucional transitada em julgado poderá ser reconhecida
por qualquer meio idôneo, ou seja, por qualquer meio capaz de permitir que essa
questão seja suscitada em outro processo, como questão principal ou como questão
prévia”. 237
Adiante, é consabido que por algumas vezes haverá leis ou atos administrativos
que serão contrárias ao texto constitucional, ou na visão do excelso doutrinador Hans
Kelsen no sentido da proeminência constitucional, que vislumbra: “Quando se tem
fundamento para aceitar a validade de uma lei, o fundamento da sua validade tem de
residir na Constituição. De uma lei inválida não se pode, porém, afirmar que ela é
contrária à Constituição, pois uma lei inválida não é sequer uma lei”.238

235
BASTOS, Fabrício Rocha. Embargos à Execução. Revista do Ministério Público do Rio de
Janeiro nº 61, jul./set. 2016. Disponível em:
http://www.mprj.mp.br/documents/20184/1271410/Fabricio_Rocha_Bastos.pdf>. Acesso em 24 mai.
2021.
236
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
I — se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;
II — for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;
III — resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de
simulação ou
colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;
IV — ofender a coisa julgada;
V — violar manifestamente norma jurídica;
VI — for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser
demonstrada
na própria ação rescisória;
VII — obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de
que
não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;
VIII — for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.
[…]”. In: BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 22 mai. 2021.
237
CÂMARA, Alexandre Freitas. Relativização da Coisa Julgada Material. In: JÚNIOR, Fredie Didier
(Coord.). Relativização da coisa julgada, JusPodivm, 2008, p. 35
238
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução de João Baptista Machado. 6. ed. Coimbra:
Armenio Amado, 1984, p. 367.
82

É a partir dessa visão de que uma lei inválida sequer seria uma lei em si, que
emerge a imprescindibilidade de um mecanismo que vise efetivar a supremacia da
Constituição frente a eventuais leis ou atos administrativos que rompam com a
supremacia da Carta Magna. Nesse sentido, Gilmar Mendes aduz que “a Constituição
que não possuir uma garantia para anulação de atos inconstitucionais deixaria mesmo
de ser obrigatória”.239
Quanto à importância dessa previsão normativa que permite a efetivação do
texto constitucional e até de seu impacto no meio social, Luis Roberto Barroso
disserta:

Um dos fundamentos do controle de constitucionalidade é a proteção dos


direitos fundamentais, inclusive e sobretudo os das minorias, em face das
maiorias parlamentares eventuais. Seu pressuposto é a existência de valores
materiais compartilhados pela sociedade que devem ser preservados das
injunções estritamente políticas. A questão da legitimidade democrática do
controle judicial é um dos temas que têm atraído mais intensamente a
atenção dos juristas, cientistas políticos e filósofos da Constituição, e a ele se
dedicará um tópico desta exposição. 240

Destarte, o controle de constitucionalidade se dará pela constatação da


contradição do objeto da análise podendo ser por inconstitucionalidade formal ou
material e, subsequentemente, por ação ou omissão. A formal exsurge da
inobservância do processo de criação da espécie normativa, fora dos ditames
cominados no Título IV, Capítulo I, Seção VIII da CF (requisito formal objetivo), ou
ainda, por desrespeito às regras de legitimidade de início do processo legislativo da
formação/idealização da norma (requisito subjetivo).241
O controle de constitucionalidade realizado que importará na declaração de
inconstitucionalidade, que afetará a coisa julgada e a transforma em coisa julgada
inconstitucional, poderá se dar de duas formas: controle difuso (ou concreto) e pelo
controle concentrado (ou abstrato) de constitucionalidade. O primeiro poderá ser
exercido por qualquer membro do Poder Judiciário – juízes e tribunais – por intermédio
das ações tradicionais a exemplo do mandado de segurança, ação popular, habeas
corpus e por arguição da parte ou ainda reconhecida ex officio, em caráter incidental,
em qualquer ação. As decisões tomadas dentro do controle difuso de

239
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocência Mártires. Curso
de Direito Constitucional. São Paulo, 5ª edição, Saraiva, 2010, p. 1057.
240
BARROSO, Luís Roberto. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição
sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 27.
241
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 731-733.
83

constitucionalidade operam inter partes e tem eficácia ex tunc. 242 Nessa linha Luiz
Guilherme Marinoni assenta:

Frise-se que o juiz brasileiro tem o dever de negar aplicação à lei


inconstitucional, ainda que a questão constitucional não tenha sido
invocada pela parte. O juiz tem o dever de tratar da questão
constitucional de ofício ou sem qualquer requerimento do interessado.
Portanto, quando a alegação de inconstitucionalidade não é feita, a
aplicação da lei pelo juiz significa a admissão da sua
constitucionalidade.243

Hodiernamente o controle difuso (ou concreto) de constitucionalidade encontra-


se elencado no art. 102, III e alíneas da Constituição Federal, mesmo tendo
significativa redução de sua expressividade diante da clara expansão do controle
concentrado, ainda mantém considerável relevância no âmbito das discussões
judiciais. Prevê o mencionado dispositivo, cuja transcrição mister se faz, que:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a


guarda da Constituição, cabendo-lhe: [...]

III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em


única ou última instância, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta


Constituição.

d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

Mais do que oportuno trazer que tais “[...] efeitos do reconhecimento da


inconstitucionalidade pela via incidental são, em regra, inter partes, podendo atingir
terceiros na forma do art. 52, inc. X da CF, mediante resolução a ser expedida pelo
Senado Federal, que terá efeito erga omnes”.244

242
GOMES, Maria do Socorro Costa. Os limites da coisa julgada ante o princípio da igualdade
tributária. Dissertação (Mestrado em Direito Público e Econômico) – Universidade Presbiteriana
Mackenzie, São Paulo, 2015. Disponível em:
<http://tede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/1168/1/Maria%20do%20Socorro%20Costa%20Gomes.
pdf>. Acesso em 20 mai. 2021.
243
MARINONI, Luiz Guilherme. Coisa Julgada Inconstitucional. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010, p. 19.
244
AZEVEDO, Cláudia Regina de. Controle de constitucionalidade no direito brasileiro. Revista Jus
Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6509, 27 abr. 2021. Disponível em:
https://jus.com.br/artigos/79357. Acesso em 27 mai. 2021.
84

Por sua vez, o sistema de controle concentrado de constitucionalidade foi


incluso expressamente com o advento da Constituição vigente, promulgada em 1988,
a qual conferiu ao Supremo Tribunal Federal a competência para a guarda da
constituição, cabendo-lhe processar e julgar a ação direta de inconstitucionalidade de
lei ou ato normativo, bem como a ação declaratória de constitucionalidade ex vi lege
do art. 102, inciso I, alínea “a”. Então, através do controle concentrado – frise-se que
nos moldes brasileiros – somente os órgãos de cúpula do Judiciário poderão
reconhecer a inconstitucionalidade de leis, tanto no âmbito estadual, por meio do
Pleno do Tribunal de Justiça respectivo, seja em âmbito federal, por meio do Supremo
Tribunal Federal. Como bem sintetizado nas palavras de Cláudia Regina de Azevedo:

Perante o Supremo passou a ser possível, não só com a promulgação


da Constituição de 1988, como também com a edição de leis
posteriores regulamentando a matéria e adaptando-a às necessidades
locais, o ajuizamento de uma série de ações diretas com a finalidade
de se discutir a constitucionalidade de normas.245

Por outra banda, quando a afronta se der em face da Constituição Federal, o


controle concentrado ou abstrato se dará exclusivamente por pronunciamento do
Supremo Tribunal Federal em julgamento das ações específicas previstas
constitucionalmente: Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF,
Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIn, Ação Direta de Constitucionalidade –
ADC ou ainda por Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva – ADI. Em suma,
se restringe a apenas um órgão – o STF – a manifestação sobre a
inconstitucionalidade ou não do objeto em discussão, decisão essa que será
vinculante, ou seja, erga omnes e ainda com eficácia ex nunc. O Ministro do STF e
doutrinador Gilmar Mendes sobre o controle concentrado assevera:

Esse fato fortalece a impressão de que, com a introdução desse


sistema de controle abstrato de normas, com ampla legitimação e,
particularmente, a outorga do direito de propositura a diferentes órgãos
da sociedade, pretendeu o constituinte reforçar o controle abstrato de
normas no ordenamento jurídico brasileiro como peculiar instrumento
de correção do sistema geral incidente.246

Indissociável ao julgamento em sede de controle de constitucionalidade – seja


concreto ou abstrato – é ter especial atenção à sua operacionalização, que será erga

245
Ibidem.
246
MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional - O Controle Abstrato de Normas no Brasil e
na Alemanha. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 78.
85

omnes (produção de efeitos para todos abstratamente) ou inter partes (abrange


somente as partes materiais envolvidas).
Via de regra a declaração de inconstitucionalidade em controle abstrato terá
efeito retroativo (ex tunc) e para todos (erga omnes) sendo vinculante aos órgãos da
Administração Pública e do Poder Judiciário, que através da sentença proferida em
controle abstrato de constitucionalidade fará coisa julgada material e vinculará as
autoridades executoras da lei, sendo uma vez julgada inconstitucional, “não poderão
mais dar-lhe execução sob pena de arrostar a eficácia da coisa julgada, uma vez que
a declaração de inconstitucionalidade em tese visa precisamente atingir o efeito
imediato de retirar a aplicabilidade da lei”.247
Por outra banda, a declaração de inconstitucionalidade por meio do exercício
de controle concreto terá – salvo exceção prevista no art. 52, X da Constituição248 –
efeitos ex tunc e inter partes, ou seja, retroagindo até a edição da lei com efeitos
restritos às partes do processo.249 Entretanto, para que seja possibilitado o efeito erga
omnes nesses casos de controle difuso (ou concreto) o STF pode editar súmula
vinculante, sendo essa faculdade inclusa pela Emenda Constitucional nº 45/2004, que
incluiu o artigo 103-A na Constituição Federal com a seguinte redação:

Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por


provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após
reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que,
a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em
relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração
pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem

247
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 33. ed. São Paulo: Malheiros,
2011, p. 55.
248
“Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade,
bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos
crimes da mesma natureza conexos com aqueles;
II - processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de
Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-
Geral da União nos crimes de responsabilidade;
[...]
X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva
do Supremo Tribunal Federal”. In: BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: D.O. 5
de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 01 jun.
2021.
249
CHIMENTI, Ricardo Cunha [et al.]. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. rev. e atual. até a EC
64/2010. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 434.
86

como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida


em lei.250

Cumpre mencionar que, o STF, no julgamento da Reclamação 4335/AC


debateu se uma decisão tomada em sede de controle difuso poderia lastrear uma
eventual reclamação constitucional contra decisão judicial com entendimento
contrário, ou seja, se a referida espécie de provimento possuiria efeito vinculante
(eficácia erga omnes) tal como as decisões tomadas em controle concentrado. Acerca
desse debate, importante colacionar o texto elaborado pelo próprio relator do caso:

A divergência entre os votos que, de um lado, conheceram e deferiram


a reclamação e os que, de outro, não a conheceram ou a julgaram
improcedente, ficou polarizada em torno de um núcleo central, relativo
ao sentido e alcance que se deve conferir, ao dispositivo do art. 52, X
da Constituição, que arrola entre as competências privativas do
Senado Federal a de “suspender a execução, no todo ou em parte, de
lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo
Tribunal Federal” (CRFB/1988, art. 52, X). Segundo o voto do Ministro
relator, “é possível, sem qualquer exagero, falar-se aqui de uma
autêntica mutação constitucional em razão da completa reformulação
do sistema jurídico e, por conseguinte, da nova compreensão que se
conferiu à regra do art. 52, X, da Constituição de 1988”, o que
propiciaria a eficácia erga omnes das decisões do STF, reconhecendo
a inconstitucionalidade, mesmo quando proferidas no âmbito do
controle incidental. Os votos contrários, por sua vez, negam a
ocorrência dessa mutação, insuscetível de se operar por exclusiva obra
pretoriana. 251

Pois bem, diante do escorço acima realizado ao passar pelas divergentes


opiniões doutrinárias acerca da coisa julgada inconstitucional, faz-se imprescindível
no decurso do presente excerto trazer as cominações legais instituídas em nossa
legislação pátria acerca da temática, como bem comenta Fredie Didier Jr. que a
relativização “[...] com base na inconstitucionalidade é problemática, pois a qualquer
momento que a lei em que se fundou a decisão fosse reputada inconstitucional a
decisão poderia ser desconstituída. Com isso, malferir-se-ia frontalmente a garantia
da segurança jurídica”.252

250
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: D.O. 5 de outubro de 1988. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 01 jun.
2021.
251
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação Constitucional nº 4.335/AC. Relator Ministro
Gilmar Mendes. Data do Julgamento: 20 mar. 2014. Disponível em: <
http://www.stf.jus.br/imprensa/pdf/rcl4335eg.pdf>. Acesso em 01 jun. 2021.
252
DIDIER JR, Fredie; BRAGA, Paulo Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil.
Teoria da prova, direito probatório, teoria do precedente, decisão judicial, coisa julgada e antecipação
dos efeitos da tutela. 7. ed. Salvador, JusPodivm, 2012, v. 2., p. 584.
87

Na seara processual, aponta Heitor Vitor Mendonça Sica ao referir-se sobre o


texto legal:

O CPC 2015 se inspirou nos arts. 475-L, § 1º, e art. 741, parágrafo
único, do CPC de 1973 reformado, mas previu técnica um pouco
menos abrangente, tanto no art. 525, §§ 12 ao 15 – aplicável à
impugnação em geral; quanto no art. 535, §§ 5º a 8º – aplicável à
impugnação manejada pela Fazenda Pública – ambos com a mesma
redação. O primeiro dado relevante é o de que a defesa do executado,
a exemplo do que previa o CPC reformado examinado no item anterior,
continuou a ter nítida função rescindente parcial do título judicial,
por error in judicando, excluindo a sua exigibilidade, mas não afetando
os seus demais elementos eficaciais, em especial o comando
declaratório nele contido. Ademais, resta claro que triunfou a tese de
“objetivação” do controle difuso (isto é, a possibilidade de um simples
julgamento de processo subjetivo pelo STF, especialmente recursos
extraordinários, gerar eficácia ultra partes) […].253

Dado o exposto, adentra-se especialmente a situação do contribuinte na seara


tributária frente a coisa julgada inconstitucional pela análise de artigos específicos que
legislam a matéria, a exemplo do art. 16, §2º da Lei nº 6830/80 e no art. 917, incisos I
e VI do Código de Processo Civil.
Adiante, com foco na proteção do contribuinte ante o poder fiscal e executório
do ente estatal – e com o esgotamento das vias recursais -, emergem algumas
ferramentas legais para salvaguardar seu direito sob o prisma da coisa julgada com o
fim de “reparar a injustiça da sentença transitada em julgado, quando o seu degrau de
imperfeição é de tal grandeza que supere a necessidade de segurança tutelada pela
res iudicata”,254 a exemplo da ação rescisória, da querela nullitatis (ou ação
declaratória), dos embargos à execução ou ainda a ação revisional (amparada pelo
art. 505, inciso I do CPC).
A ação rescisória é um procedimento específico que terá cabimento no caso da
ocorrência das hipóteses taxativamente cominadas pelo art. 966 do CPC, tendo
efetivo cabimento quando por via dela verificar-se que “a sentença sujeita à rescisão
por violação à literal disposição de lei é aquela que envolve contrariedade estridente
com dispositivo, não englobando, assim, a interpretação razoável [...]”.255 Acerca da
referida ação, Nelson Nery Jr. exprime:

253
SICA, Heitor Vitor Mendonça. Comentários ao novo Código de Processo Civil. Antonio do Passo
Cabral e Ronaldo Cramer (Coords.). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 833-834.
254
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Direito
Processual Civil e Processo de Conhecimento. 52. ed. v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 723.
255
RÊGO, Bruno Noura de Moraes. Ação rescisória e a retroatividade das decisões de controle de
constitucionalidade das leis no Brasil. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2001, p. 72.
88

Para efeitos de admissibilidade da ação rescisória, a violação da CF


pode ter ocorrido por desatendimento a texto constitucional expresso,
a princip ́ io constitucional não positivado ou, ainda, por ofensa ao
espírito ou ao sistema da CF. Decisão inconstitucional transitada em
julgado não pode ficar imune ao controle jurisdicional da ação
rescisória. 256

No que tange ao rito da ação rescisória, Paulo Roberto Lyrio Pimenta pontua
que o julgamento do meio de impugnação à sentença – ou seja, da ação rescisória –
se dará por três fases:

[...] juízo de admissibilidade da ação, no qual se examina os


pressupostos processuais e as condições da ação; exame do pedido
de rescisão do julgado, em que o órgão ad quem decide pela rescisão
ou não da sentença (juízo rescindente) e, por fim, o rejulgamento da
causa, se for o caso (juízo rescisório). 257

Em suma, portanto, será admissível a ação rescisória desde que “tenha havido
infração da regra jurídica, ofensa ao direito em tese”.258 Todavia, mister se faz que
seja verificada violação da norma jurídica – e não interpretação diversa da letra da lei,
como bem preceitua a Súmula nº 343 do STF 259 - a ponto de ter a causa significante
impacto no resultado da demanda e, que a sua correta aplicação, seja bastante para
modificar o julgamento. 260
Dando sequência, importante ressaltar a possibilidade da desconstituição de
efeitos futuros de coisa julgada em relações de trato continuado que exige
procedimento legal típico, nomeado de revisão da sentença, ex vi lege do artigo 505,
inciso I, do CPC:

Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas


relativas à mesma lide, salvo:

256
NERY JÚNIOR, Nelson; DIDIER JR., Fredie (Org). [et al.]. Relativização da Coisa Julgada.
Salvador: JusPodivm, 2008, p. 300.
257
PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. Ação Rescisória e Modulação da Eficácia Temporal da Decisão
de Inconstitucionalidade. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Revista de Processo, vol. 153.
São Paulo: RT, 2007, p. 146.
258
MIRANDA, Pontes de. Tratado da Ação Rescisória. 2. ed. Campinas, SP: Bookseller, 2003, p. 302.
259
“Súmula nº 343 - Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão
rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”. In: BRASIL.
Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 343 do STF. Disponível em: <
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumarioSumulas.asp?sumula=1472>. Acesso em 01
jun. 2021.
260
GRECO, Vicente Filho. Direito Processual Civil Brasileiro. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, v. 2
p. 479.
89

I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio


modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a
parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;

II - nos demais casos prescritos em lei.

No âmbito desse sistema, a Fazenda Pública tem o direito reservado de


solicitar, a qualquer momento, a modificação de uma relação de trato continuado que
tenha sido designada como objeto da coisa julgada. Essa decisão sempre terá efeito
ex nunc, portanto, será efetiva a partir da data da decisão de revisão da coisa julgada
tendo excluído possível efeito retroativo. 261 Teori Zavaskci é categórico quanto a ação
revisional, no seguinte sentido: “[...] a ação de revisão é indispensável apenas quando
a relação jurídica material de trato continuado comportar, por disposição normativa, o
direito potestativo antes referido [...]”.262
Não obstante, o próprio Superior Tribunal de Justiça, em casos de obrigações
de trato continuado, tem optado por aplicar a disposição atual do artigo 505, inciso I,
do CPC, confirmando que “a sentença pode ser revista quando houver alteração no
estado de fato ou de direito que serviram de suporte para motivação da decisão
transitada em julgado”.263
Sob esse jaez, Heleno Taveira Torres disserta acerca do tema:
Destarte, a adoção da ação revisional opera-se nos limites da coisa
julgada cujo processo, em relações continuativas, sofre mudanças dos
suportes fáticos ou normativos, como se verifica com a introdução de
“tese jurídica” firmada em precedente, com força de repercussão geral,
pelo STF. E somente o juiz poderá determinar a extensão do alcance
da decisão do STF sobre a lide e as questões deduzidas em cada
processo.264

Adiante, apesar de perfunctório o posicionamento exarado pela PGFN no


Parecer nº 492/2011 que claramente incita ao Fisco realizar cobranças, ex officio, de
tributos baseados em lei declaradas constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal,

261
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança nº 11.045/DF, Relator Ministro Teori
Zavascki, Data do Julgamento: 03 fev. 2010. Disponível em: <
https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=6269
263&num_registro=200501646190&data=20100225&tipo=91&formato=PDF>. Acesso em 01 jun.
2021.
262
ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. 2. ed. rev. atual.
e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 139-140.
263
TORRES, Heleno Taveira. Limites à revisão de coisa julgada após decisão do Supremo Tribunal
Federal. In: Revista Consultor Jurídico, 03 de abril de 2019. Disponível em: <
https://www.conjur.com.br/2019-abr-03/consultor-tributario-limites-revisao-coisa-julgada-decisao-
supremo#sdfootnote3sym>. Acesso em 03 jun. 2021.
264
Idem.
90

relegando a coisa julgada por via de ato administrativo, o Poder Judiciário acaba por
não comungar desse modus operandi.265 Acerca do conteúdo amplamente discutido
no parecer feito pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional que objetivamente
visou defender que a desconstituição da relação jurídica e as consequentes alterações
fáticas ou jurídicas supervenientes ensejariam um “direito novo” – nesse sentido a
favor do Fisco -, Antônio Frota Neves conclui:

É, desse modo, objeto específico do referido Parecer, a relação jurídica


tributária, cuja hipótese de incidência, renova-se periodicamente, ou de
forma recorrente, como por exemplos são o IR (Imposto sobre a
Renda), o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), o ICMS
(Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), o ISS (Imposto
Sobre Serviços de qualquer natureza), dentre outros. E, ocorrendo
decisão do STF em sentido contrário ao que dava suporte a
determinado direito do contribuinte, esse direito deixa de existir,
nascendo para a Fazenda Pública novo direito. 266

Assim sendo, acaba translúcido o posicionamento doutrinário no sentido de que


simples decisão do STF, mesmo que em sede de repercussão geral, não tem o
condão de desconstituir, unicamente, a coisa julgada, de modo automático. Inclusive,
de tal forma manifestou-se o STF em julgamento ao proferir o seguinte acórdão,
colacionado ipsis litteris:

A superveniência de decisão do Supremo Tribunal Federal,


declaratória de inconstitucionalidade de diploma normativo utilizado
como fundamento do título judicial questionado, ainda que impregnada
de eficácia ‘ex tunc’ - como sucede, ordinariamente, com os
julgamentos proferidos em sede de fiscalização concentrada (RTJ
87/758 - RTJ 164/506-509 - RTJ 201/765) -, não se revela apta, só por
si, a desconstituir a autoridade da coisa julgada, que traduz, em nosso
sistema jurídico, limite insuperável à força retroativa resultante dos
pronunciamentos que emanam, ‘in abstracto’, da Suprema Corte.
Doutrina. Precedentes. - O significado do instituto da coisa julgada
material como expressão da própria supremacia do ordenamento

265
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região - TRF4 – Apelação/Reexame Necessário nº
5006618-44.2012.4.04.7100/RS. Relator Desembargador Otávio Roberto Pamplona. Data do
Julgamento: 16 jul. 2013. Disponível em: <
http://www2.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?acao=consulta_processual_resultado_pesquisa&txtValor=
5006618-
44.2012.4.04.7100&selOrigem=RS&chkMostrarBaixados=1&selForma=NU&hdnRefId=ec2fe1ad63ee
12ce99ff7cb2298c7e30&txtPalavraGerada=btxK >. Acesso em 03 jun. 2021.
266
NEVES, Antônio Frota. Tributário - O parecer PGFN/CRJ 492/2011 e os efeitos da coisa julgada
inconstitucional em face da segurança jurídica no Estado Democrático de Direito. Revista Brasileira
de Políticas Públicas, Brasília, v. 10, n. 1, 2013 p. 173-193. Disponível em:
<https://www.publicacoesacademicas.uniceub.br/RBPP/article/viewFile/2323/pdf>. Acesso em 03 jun.
2021.
91

constitucional e como elemento inerente à existência do Estado


Democrático de Direito.267

Ainda sob o viés da defesa do contribuinte ante o Fisco, há a possibilidade de


esse usar da ação declaratória (ou querela nullitatis), ou seja, a actio na qual o
contribuinte pretende a manifestação por parte do Poder Judiciário no que se refere
“a existência, do modo de ser, ou da inexistência, de uma relação jurídica, ou acerca
da autenticidade ou da falsidade de um documento (art. 19 do CPC/2015), a fim de
superar um estado de incerteza, de insegurança”.268 Indispensável fazer menção à
recepção da ação declaratória – ainda que não nomeada literalmente – pelo CPC, em
seu art. 525, § 1º, inciso I que possibilita ao executado oferecer impugnação por falta
ou nulidade da citação durante a fase de conhecimento do processo. 269
Por derradeiro, tem-se no bojo do processo de execução fiscal, regimentado
pela Lei nº 6.830/80, em seu art. 16, que prevê a figura dos embargos como meio de
defesa do executado. Conforme o disposto pelo § 2º do referido dispositivo, no prazo
dos embargos, o executado deverá alegar toda matéria útil à defesa, requerer provas
e juntar aos autos os documentos e rol de testemunhas, até três, ou, a critério do juiz,
até o dobro desse limite. 270 Inclusive manifestou-se o Superior Tribunal de Justiça nos
seguintes termos da decisão a seguir transcrita:

[...] 2. O art. 16, § 2º, da LEF deve ser lido com tempero. O que não é
permitido é, em defesa na execução fiscal, o executado apresentar
créditos que possui (indébitos tributários, créditos presumidos ou
premiais ou outros créditos contra o ente público exequente tais como:
precatórios a receber e ações diversas ajuizadas) a fim de abater os
créditos tributários em execução. No entanto, nada impede que alegue
a existência de compensações efetivamente já realizadas, efetivadas
e reconhecidas, em processo administrativo ou judicial, com os créditos
que são objeto da CDA, e que, por esse motivo, não poderiam ali estar
(compensações tributárias pretéritas). Hipótese em que o crédito
tributário veiculado na CDA foi incorretamente inscrito. [...]271

267
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº 592.912 AgR. Relator Ministro Celso de Mello. Data do
Julgamento: 03 abr. 2012. Disponível em: <
https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=3115776>. Acesso em 03 jun.
2021.
268
MIRANDA, Pontes de. Tratado das Ações, atualizado por Vilson Rodrigues Alves, Campinas:
Bookseller, 1998, t. I, p. 132.
269
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>.Acesso em 04 jun. 2021.
270
BRASIL. Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980. Dispõe sobre a cobrança judicial da Dívida
Ativa da Fazenda Pública, e dá outras providências. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6830.htm>. Acesso em 04 de jun. de 2021.
271
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.252.333/PE, Relator Ministro Mauro Campbell
Marques. Data do Julgamento: 28 jun. 2011. Disponível em: <
https://jurisprudencia.s3.amazonaws.com/STJ/IT/RESP_1252333_PE_1327360069375.pdf?AWSAcc
92

Com efeito, Fabrício Rocha Bastos aduz sobre os embargos à execução:


Os embargos à execução constituem modalidade típica de defesa do
executado através da propositura de verdadeira ação de conhecimento
com vistas a opor-se à demanda executiva em curso. Esta modalidade
típica de defesa poderá abrigar, como veremos mais adiante, todas as
matérias defensivas, substantivas ou adjetivas, para evitar o
prosseguimento da execução forçada. 272

Na sequência disso, é possível fazer menção ao art. 917, incisos II e VI, que
preconizam: “Art. 917. Nos embargos à execução, o executado poderá alegar: I -
inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; II - penhora incorreta ou
avaliação errônea; [...] VI - qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa
em processo de conhecimento”.273
Analogicamente, é possível visualizar que uma vez sendo a decisão do STF
proferida antes do trânsito em julgado da decisão exequenda nos termos do § 14 “[...]
não há qualquer distinção acerca do modelo do controle de constitucionalidade,
podendo ser tanto concentrado como o difuso, bem como a alegação de
inconstitucionalidade será aduzida por meio da impugnação à execução [...]”. 274
Ademais, sendo a decisão referida no § 12 do art. 525 proferida pelo Supremo Tribunal
Federal após o trânsito em julgado da decisão exequenda aplicar-se-á o disposto no
§ 15: “Se a decisão referida no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão
exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado
da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal”.275 Não obstante,
invariavelmente traz o CPC o seguinte:

Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu


representante judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para,

essKeyId=AKIARMMD5JEAO67SMCVA&Expires=1623270100&Signature=qzcl8AKH%2BAuMoAjgq8
rauDMALxc%3D>. Acesso em 04 jun. 2021.
272
BASTOS, Fabrício Rocha. Embargos à Execução. Revista do Ministério Público do Rio de
Janeiro nº 61, jul./set. 2016. Disponível em:
http://www.mprj.mp.br/documents/20184/1271410/Fabricio_Rocha_Bastos.pdf>. Acesso em 24 mai.
2021.
273
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>.Acesso em 04 jun. 2021.
274
GOMES, Maria do Socorro Costa. Os limites da coisa julgada ante o princípio da igualdade
tributária. Dissertação (Mestrado em Direito Público e Econômico) – Universidade Presbiteriana
Mackenzie, São Paulo, 2015. Disponível em:
<http://tede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/1168/1/Maria%20do%20Socorro%20Costa%20Gomes.
pdf>. Acesso em 05 jun. 2021.
275
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 06 jun. 2021.
93

querendo, no prazo de 30 (trinta) dias e nos próprios autos, impugnar


a execução, podendo arguir:

[...]

III — inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;

[...]

§ 5º Para efeito do disposto no inciso III do caput deste artigo,


considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título
executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado
inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em
aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo
Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em
controle de constitucionalidade concentrado ou difuso. [...].276

Como bem exposto, o art. 525, §14, e o art. 535, §7º, dispõem que a
impugnação terá cabimento apenas quando a decisão de inconstitucionalidade for
anterior à formação do título executivo, pois se ocorrer posteriormente ao trânsito em
julgado da sentença incorrerá na necessidade de ajuizamento de ação rescisória.
Portanto, isto é, a declaração de inconstitucionalidade pelo STF depois da formação
do título executivo (ou seja, após o trânsito em julgado da decisão exequenda), terá o
prazo da ação rescisória iniciado, e aqui está a novidade, do trânsito em julgado da
decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. 277
Assim, diante do amplamente exposto, é possível verificar como as nuances
acerca do debate sobre a relativização da coisa julgada impactam tanto na esfera
principiológica – de princípios constitucionais basilares, a exemplo da segurança
jurídica, da irretroatividade, da legalidade, da razoabilidade -, acabam também
adentrando de maneira relevante na seara tributária, vez que impõe ao contribuinte
possíveis dificuldades de ter o seu direito preservado e garantido dentro dos liames
fundamentais do Estado Democrático de Direito.

276
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 06 jun. 2021.
277
SAKAMOTO, Fábio Meneguelo. Ação Rescisória e Coisa Julgada Inconstitucional no Novo CPC.
Revista Jurídica ESMP-SP, v.9, 2016, p. 143-162. Disponível em: <
https://es.mpsp.mp.br/revista_esmp/index.php/RJESMPSP/article/view/297>. Acesso em 06 jun. 2021.
94

CONCLUSÃO

Diante do estudo desempenhado ao decorrer dessa monografia, trouxe-se


maior compreensão sobre a história da criação do conceito de Estado de Direito, bem
como se buscou entender a construção da figura do Estado ao longo dos séculos,
podendo verificar as diversas fases de sua atuação desde o absolutismo monárquico
até o advento da ampla participação popular no centro das decisões políticas de
governo e de Estado. E esta grande mudança do modelo operacionalizador do Estado
se deu pela vontade popular de impor limites às ingerências dos comandantes da
coisa pública, através de garantias e direitos positivados – através de uma
Constituição - que regimentariam as relações entre indivíduo e Estado.
A partir desse panorama, viu-se a imprescindibilidade da institucionalização dos
princípios constitucionais basilares do Estado Democrático de Direito, como a
irretroatividade, legalidade, igualdade, divisão dos poderes, coisa julgada e a
segurança jurídica.
Constatou-se, o notável caráter moderador do princípio da segurança jurídica
frente aos demais princípios concernentes ao Direito Tributário que, concatenados,
formam a segurança jurídico-tributária. Uma vez estabelecida a importância e o
significado do princípio da segurança jurídica, bem como de suas implicações no
contexto tributário, fez-se um delineamento da matéria da coisa julgada e das suas
inferências sob o Estado Democrático de Direito.
Diante o escorço realizado em um primeiro momento, foi possível concluir que
o instituto da coisa julgada é constituinte – ou melhor dizendo, indissociável – do
princípio da segurança jurídica, visto sua pujante função de caráter constitucional ao
servir de esteio à estruturação do ordenamento jurídico brasileiro e, principalmente,
ao próprio Estado Democrático de Direito.
Portanto, a imutabilidade das decisões transitadas em julgado permite a
estabilidade das relações jurídicas, não só por propiciar a confiança do cidadão na
tutela jurisdicional prestada pela figura estatal, mas também pela proposição de
manutenção da constitucionalidade e obediência à definitividade da análise das
matérias pelo Poder Judiciário.
E, sob o prisma da estabilidade e segurança jurídica, que emergiu a previsão
legal do art. 5º, em seu inciso XXXVI, o qual comina que a lei não prejudicará o direito
95

adquirido, o ato jurídico e a coisa julgada objetivando firmar, principalmente, a


segurança jurídica da prestação jurisdicional. Por essa razão, quando a coisa julgada
inconstitucional tiver aferida sua infração à segurança jurídica, principalmente por
ofensa aos princípios constitucionais, a análise do caso se dará por meio do controle
de constitucionalidade realizado pelo Supremo Tribunal Federal ou por via de ação
rescisória declarando a nulidade da decisão judicial transitada em julgada.
Ante o delineado nos excertos precedentes, não se nega que a imutabilidade
da coisa julgada pode perpetuar, em determinados casos, situações não desejadas –
como decisões injustas. Entretanto, conforme o avanço na matéria, restou observado
que foi com o intuito de atenuar tais riscos que o ordenamento jurídico acabou
ofertando instrumentos capazes a contorná-los – a ação rescisória nos moldes atuais
e a querela nullitatis – seriam eles aptos a circundar várias das possíveis causas de
decisões ilegais ou eventualmente injustas, ainda que isso não seja suficiente. Mas,
não obstante, imperioso ressaltar que a mesma asserção não vale àquelas decisões
que incutem alguma inconstitucionalidade em si.
Em um terceiro momento, pôde-se verificar, em particular, a situação específica
das decisões, sobre as quais se operou a coisa julgada, que contrariam os ditames
constitucionais e que ainda levantam questionamentos doutrinários e de
posicionamento jurisprudencial.
Deveras a questão acerca da coisa julgada inconstitucional em matéria
tributária e o debate doutrinário que a circunda – e também no Judiciário – se
apresenta de forma ambivalente: ora primando pela imutabilidade das decisões e sua
plena irretroatividade, ora possibilitando sua relativização em vistas da
perfectibilização e aplicação dos direitos fundamentais e seus princípios corolários.
Por assim dizer, constata-se que o embate acaba se originando do mesmo ponto
controverso: se teria um direito fundamental maior importância do que outro ou manter
a coisa julgada inconstitucional sob o jaez da perpetração do princípio da coisa jurídica
e ferir o princípio da isonomia – ou até mesmo da legalidade ou igualdade – seria algo
razoável?
Como bem exposto no presente trabalho acadêmico, o embate continua e muito
se estende sobre a intangibilidade da coisa julgada, entretanto buscou-se
compreender e conhecer – enquanto não se tem um posicionamento concreto – os
96

mecanismos presentes em nossa legislação para a defesa do contribuinte ante essas


situações.
Assim, diante do amplamente exposto, é possível verificar como as nuances
acerca do debate sobre a relativização da coisa julgada impactam tanto na esfera
principiológica – de princípios constitucionais basilares, a exemplo da segurança
jurídica, da irretroatividade, da legalidade, da razoabilidade -, acabam também
adentrando de maneira relevante na seara tributária, vez que impõe ao contribuinte
possíveis dificuldades de ter o seu direito preservado e garantido dentro dos liames
fundamentais do Estado Democrático de Direito.
97

REFERÊNCIAS

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