Você está na página 1de 1963

ISBN 9788553604470

Monteiro, Alexandre
Tributação da economia digital : desafios no Brasil, experiência internacional e novas
perspectivas / Alexandre Monteiro, Renato Faria, Ricardo Maitto. – São Paulo : Saraiva
Educação, 2018.
1. Direito tributário 2. Internet - Legislação 3. Comércio eletrônico - Impostos -
Legislação 4. Tributação - Tratados I. Título II. Faria, Renato III. Maitto, Ricardo.
18-0495 CDU 34:336.2:004.738.5

Índices para catálogo sistemático:

1. Direito tributário : Economia Digital 34:336.2:004.738.5

Diretoria executiva Flávia Alves Bravin

Diretora editorial Renata Pascual Müller

Gerência editorial Roberto Navarro

Consultoria acadêmica Murilo Angeli Dias dos Santos

Edição Eveline Gonçalves Denardi (coord.) | Bruna Gimenez Boani

Produção editorial Ana Cristina Garcia (coord.) | Carolina Massanhi | Luciana Cordeiro
Shirakawa | Rosana Peroni Fazolari

Arte e digital Mônica Landi (coord.) | Claudirene de Moura Santos Silva | Guilherme H.
M. Salvador | Tiago Dela Rosa | Verônica Pivisan Reis

Planejamento e processos Clarissa Boraschi Maria (coord.) | Juliana Bojczuk Fermino |


Kelli Priscila Pinto | Marília Cordeiro | Fernando Penteado | Mônica Gonçalves Dias |
Tatiana dos Santos Romão

Novos projetos Fernando Alves

Diagramação (Livro Físico) Muiraquitã Editoração Gráfica

Revisão Albertina Pereira Leite Piva

Capa Tiago Dela Rosa

2
Livro digital (E-pub)

Produção do e-pub Guilherme Henrique Martins Salvador

Data de fechamento da edição: 19-7-2018

Dúvidas?

Acesse www.editorasaraiva.com.br/direito

Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prévia
autorização da Editora Saraiva.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei n. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do
Código Penal.

3
Sumário

Apresentação

Parte I - TRIBUTAÇÃO E OS DESAFIOS DA ECONOMIA DIGITAL


NO BRASIL
SEÇÃO A - ASPECTOS RELACIONADOS À TRIBUTAÇÃO
DIRETA LOCAL E INTERNACIONAL
Estabelecimento permanente: legislação tributária brasileira e
desafios na economia digital
1. Introdução
2. O Conceito de Estabelecimento Permanente no Modelo de
Convenção da OCDE
3. A Tributação do Estabelecimento Permanente na Legislação
Tributária Brasileira
4. Os desafios da economia digital: a Ação n. 1 do BEPS
5. Estabelecimento Permanente no Brasil: Novos Rumos na
Economia Digital?
6. Conclusão
A tributação de IRRF na importação de cloud computing no Brasil e
as soluções analisadas na Ação 1 do BEPS
1. Introdução
2. Panorama Geral do BEPS em relação aos desafios da Economia
Digital
3. A contratação do Cloud Computing de fornecedores
estabelecidos em outros países
4. A tributação do IRRF nas remessas ao exterior na importação do
Cloud Computing – O exemplo do SaaS
5. Conclusões

4
As operações internacionais envolvendo software e o imposto de
renda
1. Introdução
2. Definição de software. Tipos de software. Propósitos com a sua
criação
2.1. Definição de software
2.2. Tipos de software
2.3. Finalidade da sua criação
2.4. Software como direito real do autor
3. Os diferentes negócios envolvendo software em transações
internacionais e o IRRF
4. Transações com software sob encomenda
5. Transações com software-produto
5.1. Cessão integral dos direitos de propriedade sobre o software
5.2. Cessão parcial de direitos de exploração econômica sobre o
software
5.3. Licença de uso do software (copyrighted article)
5.3.1. Licenças perpétuas
5.3.2. Licenças temporárias
5.4. Compra e venda de licenças de direito de uso (copyrighted
articles) para a distribuição no mercado interno
6. Transações com software adaptável (“customizável”)
Qualificação de operações envolvendo software no Brasil à luz dos
tratados contra a bitributação: visão da OCDE e a prática brasileira
1. Introdução
2. Software: conceito, tipos e características relevantes em função
das diferentes formas de comercialização
2.1. Objeto do estudo: software de aplicação
2.2. Variações conforme o contrato e a natureza jurídica do
rendimento

5
2.3. Observação sobre licenças de uso
3. Qualificação dos rendimentos relacionados a operações com
software à luz dos tratados contra a bitributação
3.1. Possíveis qualificações de rendimento com base na CM-
OCDE
3.2. Comentários Oficiais da OCDE à CM-OCDE
3.3. Posicionamento do Brasil
4. Considerações Finais
Com a cabeça nas nuvens e os pés no chão? A tributação
internacional da renda no ambiente de cloud computing
Introdução
1. Definição e modelos de “cloud computing”: novos tempos,
novos paradigmas
2. A tributação brasileira das remessas ao exterior para
remuneração do cloud computing
3. A qualificação dos rendimentos no contexto do cloud computing
para a aplicação dos acordos de bitributação e a questão dos
estabelecimentos permanentes
3.1. A qualificação dos rendimentos no contexto do cloud
computing
3.2. A questão do estabelecimento permanente
4. A solução acenada pelas autoridades fiscais brasileiras para os
rendimentos decorrentes de cloud computing
5. Considerações finais: apenas o início pela busca de soluções
Os princípios da tributação no Estado da fonte e no Estado da
residência e os impactos da economia digital no Brasil e no mundo
1. Introdução: economia digital e seus impactos no direito
2. Economia digital e seus impactos no Direito Tributário
2.1. Os princípios da tributação no estado da fonte e no estado da
residência
2.2. Desafios da economia digital para o princípio de fonte e
residência

6
3. Análise sob a perspectiva brasileira
4. Conclusões
Potenciais impactos tributários do CPC 47 nos negócios voltados à
economia digital
1. Introdução
2. Afinal, o que é a economia digital? Que atividades estão por ela
abrangidas?
2.1. Generalidades
2.2. As atividades na economia digital
3. Análise do CPC 47
3.1. Generalidades
3.2. Exame dos passos para reconhecimento da receita do CPC
47
3.2.1. Identificar as características do contrato
3.2.2. Identificar obrigações de desempenho
3.2.3. Determinar o preço da transação
3.2.4. Alocar o preço da transação
3.2.5. Reconhecer a receita
3.3. Contabilidade, Direito e o reconhecimento de receitas
3.3.1. Contabilidade e tributação
3.3.2. Conceito de receita para fins tributários
3.3.3. Conteúdos do CPC 47 frente ao Direito
4. Reflexos tributários das metodologias contábeis
4.1. Royalties
4.1.1. Tratamento jurídico-tributário
4.1.2. Tratamento contábil
4.2. Licenciamento
4.2.1. Tratamento jurídico-tributário
4.2.2. Tratamento contábil

7
5. Os negócios digitais e seus reflexos tributários
6. Outras questões controversas relacionadas à contabilização e
tributação de negócios na economia digital
7. Conclusões
Questões controversas relacionadas à contabilização de negócios na
economia atual e os seus possíveis reflexos tributários
1. Aspectos introdutórios
2. Breves considerações acerca dos objetivos da contabilidade
3. A estrutura conceitual básica da contabilidade adotada no Brasil
4. Os critérios para o reconhecimento de receitas contábeis
5. Os efeitos tributários do reconhecimento de receita contábil
6. Conclusões
Desafios da tributação doméstica de operações com software na era
da economia digital
1. Introdução
2. Qualificação das transações com software
2.1. Direito
2.2. Mercadoria
2.2.1. Aspectos gerais do software como mercadoria
2.2.2. Transferência via download do software como
mercadoria
2.3. Serviço
2.3.1. Obrigações de dar e de fazer
2.3.2. Software como serviço e a “computação em nuvem”
2.3.3. Novas tentativas de tributação do software pelo fisco
paulistano
3. Outros Aspectos Tributários: Regime do Lucro Presumido; PIS e
COFINS
3.1. Regime do lucro presumido
3.2. PIS e COFINS: regimes de apuração

8
3.2.1. Regime cumulativo
3.2.2. Regime não cumulativo
4. Conclusão
Preços de transferência e a criação de valor: distribuição de software
no Brasil
1. Introdução
2. Preços de transferência e a criação de valor
2.1. Análise funcional de preços de transferência na era pós-
BEPS
3. Economia Digital: Modelos de negócios e a criação de valor
3.1. Distribuição de software: intangíveis na realidade brasileira
3.2. Caso prático
3.2.1. Centralização no exterior
3.2.2. Reestruturação: vendas diretas no Brasil (Buy/Sell)
3.2.3. Conclusão do caso prático
4. Conclusão
A economia digital e as regras brasileiras de preços de transferência:
os problemas na aplicação dos métodos aos serviços, intangíveis e
direitos
Introdução
1. As regras brasileiras de preços de transferência
2. Da exclusão da aplicação das regras de preços de transferência
sobre royalties
3. A adequação das regras brasileiras de preços de transferência
para serviços e intangíveis no âmbito da economia digital
4. Conclusões
Transferências cross-border de direitos de uso sobre software de
prateleira: aquisição de mercadoria ou licenciamento? Tributação na
fonte e dedutibilidade de despesas
1. Introdução e definições

9
2. Natureza da contraprestação pelo uso do software
3. Dedutibilidade
3.1. Tratamento contábil de ativos intangíveis
3.2. Tratamento fiscal de ativos intangíveis
4. Conclusão
Tratamento jurídico-tributário do download de software no Brasil
1. Introdução
2. Os conceitos de “mercadoria” e “serviços” na economia digital
3. O download de software: aspectos jurídico-tributários
4. Reflexos na tributação sobre a renda
5. Conclusões
Aspectos da tributação decorrente da importação do cloud computing
no Brasil
1. Introdução
2. Conceito de Cloud computing e suas modalidades
3. Tributação da Economia Digital
3.1. A legislação tributária: definindo-se o cloud computing por
intermédio do conflito entre o ICMS e o ISS
4. Cloud computing e a tributação federal
4.1. As interpretações da RFB
4.2. As interpretações dos autores
5. Conclusão
Seção B - Aspectos relacionados à tributação sobre o consumo
Internet das Coisas à luz do ICMS e do ISS: entre mercadoria,
prestação de serviço de comunicação e serviço de valor adicionado
Introdução
1. O que é Internet das Coisas?
2. A Internet das Coisas e os Conflitos de Competência:
perspectivas à luz do ICMS versus ISS

10
3. A venda de mercadoria deixa de ser uma operação relativa à
circulação de mercadoria pelo fato de ter valor agregado (ser
inteligente)?
3.1. ICMS sobre Operações de Circulação de Mercadorias:
considerações acerca do seu critério material
3.2. Operações de circulação de mercadorias: bens corpóreos e
incorpóreos
4. É possível que em transações envolvendo objetos inteligentes
também haja uma prestação de serviço?
4.1. A atuação do legislador complementar: imposição da regra
tudo ou nada
4.2. A Internet das Coisas e o acirramento da alocação entre
ICMS e ISS
4.2.1. Roupas Inteligentes como exemplo de fácil solução
4.2.2. Chamada de Emergência Inteligente como exemplo de
difícil solução
4.3. Breves considerações sobre o problema da alocação das
obrigações na Contabilidade
5. Há prestação de serviço de comunicação ou serviço de valor
adicionado no âmbito da Internet das Coisas?
5.1. ICMS sobre a Prestação do Serviço de Comunicação:
considerações acerca do seu critério material
5.1.1. Do Imposto sobre Serviços de Comunicações antes de
sua aglutinação ao ICM
5.1.2. Da aglutinação do Imposto sobre Serviços de
Comunicações no ICM
5.1.3 Da busca por uma noção de cadeia de prestação
comunicativa
5.1.4. Do núcleo comum do critério material do ICMS-C às
controvérsias
5.2. ISS sobre Serviços de Valor Adicionado: breves
considerações acerca de sua definição
5.3. Internet das Coisas: ICMS-C ou ISS-SVA?

11
Conclusão
A Lei Complementar n. 157/2016 à luz da Constituição Federal:
aspectos relacionados à retroatividade e aos campos de incidência do
ICMS e do ISS na atividade de difusão de vídeos, áudio e textos pela
internet
1. Lei Complementar n. 157/2016 – Pontos Básicos
2. Planos Jurídicos: Validade, Vigência, Eficácia, Irretroatividade
3. Streaming (Difusão de vídeos, imagens, textos e sons pela
internet)
3.1 Considerações Jurídicas
3.2. Significado
3.3. Natureza Jurídica
3.4. ISS
3.5. ICMS
3.6. Imunidade
4. Conclusões
Determinação dos limites de incidência do ICMS na modalidade
“comunicação” e do ISS nas atividades de veiculação de
textos/imagens e divulgação de publicidade na internet
1. Introdução
2. O fato gerador do ICMS na modalidade de Comunicação
(posições doutrinárias, posição fazendária e nosso posicionamento)
3. Da incidência do ICMS nas atividades de veiculação de
textos/imagens e divulgação de publicidade na internet por contrato
oneroso prestado por meio das empresas do setor de internet
4. O Panorama da tributação pelo ISS antes e após a edição da Lei
Complementar n. 157/2016. A veiculação de textos/imagens e
divulgação de publicidade na internet por contrato oneroso estava e
continua inserida no campo de incidência do ICMS, conforme
preconiza o artigo 155, inciso II, da Constituição Federal/1988
5. Da não configuração da imunidade constitucional prevista na
alínea “d”, do inciso X, do artigo 155 da CF/88

12
6. Nossas Conclusões
E-Commerce: aspectos tributários sob a perspectiva brasileira
1. Introdução
2. O Comércio Eletrônico e o ICMS Devido na Origem
3. A Emenda Constitucional n. 87/2015 e a Tributação do ICMS no
Destino
4. O Convênio ICMS n. 93 e as Controvérsias da Tributação pelo
Estado de Destino
5. Conclusão
O Paradigma da Economia Digital e os Novos Conceitos de Serviço e
Mercadoria — Reflexos na Tributação
Introdução
1. Federação e Competências Tributárias na Constituição Federal
de 1988
2. Conceitos de Direito Privado e as Competências Constitucionais
3. Os conceitos de mercadoria e serviço no contexto da Economia
Digital e seu impacto tributário
Conclusão
ICMS sobre software: evolução do conceito constitucional de
mercadorias em face da inovação tecnológica
1. A Tributação na Economia Digital
2. Circulação de Mercadorias na Constituição Federal: tipos ou
conceitos?
3. Circulação de Mercadorias na Legislação Infraconstitucional:
Lei Complementar em matéria de ICMS
4. Da Interpretação da Legislação Tributária
5. A tributação de bens digitais no âmbito do Convênio CONFAZ
n. 106/2017: (in)constitucionalidade?
5.1. Evolução semântica de “mercadorias” no contexto da
economia digital
5.2. A circulação ou disponibilização de bens digitais

13
5.3. Adoção do critério de destino nas operações com bens
digitais
5.4. Atribuição de responsabilidade tributária por convênio
5.5. Analogia ou mera interpretação: nova incidência sobre bens
digitais?
6. Conflito Federativo Vertical: ICMS ou ISS sobre Bens Digitais
7. Considerações Finais
Tributação da economia digital e os conflitos de competência entre
ICMS e ISS
1. Introdução
2. Primeira aproximação do problema: dificuldade de
enquadramento dos negócios da economia digital no modelo
adotado pelo sistema constitucional tributário
3. A instauração do conflito de competências
4. Algumas reações do judiciário
5. Proposta conclusiva
Operações de Cloud Computing (SaaS, IaaS, PaaS etc.): ICMS vs.
ISS
1. Guerra Fiscal na Tributação de Software – ISS vs. ICMS
1.1. Conflito de competência para tributação entre os Municípios
e os Estados (serviço vs. mercadoria)
2. Materialidade da Tributação do Software pelo Município (Cloud
Computing como Serviço)
3. Materialidade da Tributação do Software pelo Estado (Cloud
Computing como Mercadoria)
4. Conclusão
A Tributação pelo ISS e pelo ICMS das Operações com Software
1. Introdução
2. Definição de Software
3. A Incidência do ISS e do ICMS nas Operações com Software
3.1. Considerações preliminares

14
3.2. ISS
3.3. ICMS
4. Controvérsias da Tributação de Software pelo ISS e pelo ICMS
5. Conclusões
O ISS e a exportação de serviços: conceito de resultado e o princípio
do destino nas atividades voltadas à economia digital
1. O ISS e as operações de exportação
1.1. Seu critério espacial e o princípio da territorialidade
2. O tratamento tributário dado às operações de exportação:
finalidade constitucional e o princípio do destino
3. Proposta conceitual: operação de exportação de serviços
4. O sentido e o alcance do artigo 2º da LC n. 116/2003:
compreensão do termo resultado
5. Análise crítica
5.1. Decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
5.2. Parecer Normativo n. 4, de 2016 e precedentes
administrativos do Município de São Paulo
6. Aplicação aos serviços relacionados à economia digital
7. Nossa conclusão
Jogando com o conceito de valor aduaneiro: um estudo sobre a
valoração aduaneira na importação de jogos eletrônicos
1. Introdução
2. O valor aduaneiro na importação de jogos eletrônicos: as normas
internacionais e a posição brasileira
2.1. Valoração aduaneira de bem incorpóreo no Direito
Internacional e no ordenamento jurídico brasileiro
2.2. O entendimento do Conselho Administrativo de Recursos
Fiscais (CARF)
2.3. O entendimento do Poder Judiciário no âmbito do Tribunal
Regional Federal da 3ª Região
3. Natureza jurídica dos jogos eletrônicos

15
3.1. A Lei Federal n. 12.485/2011 – Obras Audiovisuais
3.2. A Lei Federal n. 9.609/98 – Software
3.3. Opiniões de especialistas
3.4. Nossa opinião quanto à natureza jurídica
3.5. A cortina de fumaça em torno da Decisão 4.1
4. Considerações Finais
Aspectos tributários do download de software: equívocos comuns e
implicações decorrentes da edição do Convênio CONFAZ n.
181/2015
O conceito de software no ordenamento jurídico brasileiro
O software como mercadoria
As espécies de software
A tributação do software adquirido por meio digital (download)
A posição dos tribunais superiores
O Convênio ICMS n. 181/2015
Considerações Finais
Aspectos da tributação sobre o consumo no cloud computing
Introdução
1. Cloud computing
1.1. Delimitação do conceito de cloud computing, natureza
jurídica e principais espécies
2. Questões tributárias relativas ao cloud computing
2.1. Panorama global
2.1.1. Desafios gerais e tendências
2.2. Principais questões no ambiente norte-americano
2.3. A tributação sobre o consumo na Europa quanto às
transações realizadas na nuvem
3. O problema da tributação do cloud computing no Brasil
3.1. Controvérsias identificadas no cenário brasileiro

16
Conclusões
Seção C - Tributação de produtos ou negócios selecionados
ICMS sobre a divulgação de material publicitário na internet por
provedor
1. Considerações Iniciais
2. A atividade do provedor. A distinção necessária entre os
contratos: provedor e usuários e os contratos de divulgação de
publicidade
3. Regra Matriz do ICMS-Comunicação e a jurisprudência do STJ
3.1. A Ausência de Obrigação de Fazer no Contrato de Cessão
de Espaço Virtual
4. Síntese conclusiva
Tributação de atividades de streaming de áudio e vídeo: guerra fiscal
entre ISS e ICMS
1. Introdução
2. O Conceito Constitucional de Serviço de Comunicação
2.1. Serviço de comunicação não se confunde com serviços de
informática prestados pela internet
3. Alguns Serviços de Comunicação
3.1. Serviço de Acesso Condicionado (SeAC) – TV por
Assinatura
3.2. Serviço de Comunicação Multimídia (SCM)
4. Serviços Over The Top (OTT)
4.1. O que é o Serviço de Streaming?
4.1.1. Tipos e Exemplos de Serviços de Streaming
4.1.2. Televisão por Protocolo de Internet (IPTV – Internet
Protocol TV)
4.1.3. As Receitas das Empresas de Streaming
5. Papel da Lei Complementar Tributária (art. 146 da Constituição
Federal) a fim de prevenir o conflito entre Serviço de Qualquer
Natureza e o Serviço de Comunicação560

17
6. Conclusões
O alcance da imunidade tributária sobre os livros digitais e seus
acessórios
1. Introdução
2. Sobre a interpretação das imunidades tributárias
3. O alcance da imunidade de livros eletrônicos (e-books)
4. Sobre o alcance da imunidade aos acessórios (softwares
educativos)
5. Conclusões
IaaS, PaaS, SaaS e os reflexos tributários da Cloud Computing
desenvolvida no exterior
I. Introdução
II. As diferentes modalidades do Cloud Computing
III. As principais questões fiscais relacionadas ao Cloud
Computing no Brasil
III.1 Aspectos Gerais
III.2 A posição da jurisprudência a respeito da questão
III.3 Nosso entendimento quanto à tributação do Cloud
Computing (IaaS, PaaS, SaaS)
IV. Conclusões
Tributação de negócios desenvolvidos por meio de aplicativos
associados aos serviços de transporte
1. Introdução
2. A natureza jurídica da atividade econômica
3. Análise de aspectos relativos à tributação sobre o consumo no
Brasil
4. Conclusão
Tributação da atividade de armazenamento digital de dados
Introdução

18
1. Um pouco do histórico sobre a tributação das operações
realizadas pela internet
2. Algumas notas sobre a computação em nuvem (cloud
computing)
3. Trata-se, efetivamente, de um serviço?
4. Conceito de “local da prestação” e de “estabelecimento
prestador”
5. Dificuldades de ordem técnica
Considerações finais
Tributação de marketing digital por meio de websites: Caso Google
Adworks e o contraponto entre as perspectivas brasileira e
internacional
Introdução
1. Contexto geral: o mundo virtual ou digital3
2. Formas usuais de marketing digital7
2.1. Banners
2.2. Cookies
2.3. “Links Patrocinados”: Pay Per Click
3. Impulsionamento de campanhas na internet: AdWords26 e sua
natureza jurídica
3.1. Programa de Computador: o software
3.2. Licença de uso de software
4. Aspectos Tributários: impulsionamento de marketing digital
4.1. Tributação Direta38 nas operações cross-border
4.1.1. Royalties
4.2. Tributação indireta
4.3. AdWords: tributação indireta no mundo
5. Considerações finais
Regime Jurídico Tributário do VoIP
1. Introdução

19
2. Serviços VoIP: características técnicas
3. Modus Operandi dos Provedores de Serviços VoIP e Sistemática
de Medição desses Serviços
4. Hipótese Tributária do ICMS-Comunicação
5. Definição de “Serviço de Telecomunicação” e Hipótese de
Incidência Tributária
6. Não incidência do ICMS-Comunicação sobre os SVAs
7. Serviços de Voz sobre IP (VoIP)
8. Jurisprudência
Conclusões
Tributação de Data Center no Brasil
1. Introdução e Noções sobre Data Center
2. A Posição da RFB e do Fisco Municipal de São Paulo acerca do
Tema
3. Natureza Jurídica da Atividade de Acesso ao Data Center e sua
Distinção da Prestação de Serviços
3.1. Discussão sobre o Conceito de Prestação de Serviços para
Fins Fiscais
3.2. Natureza Jurídica do Data Center
4. Tributação do Data Center nas Relações Locais e Internacionais
4.1. Relações locais
4.1.1. IRPJ/CSLL
4.1.2. PIS/COFINS
4.1.3. ISS
4.2. Relações internacionais
4.2.1. IRRF
4.2.2. CIDE
4.2.3. PIS/COFINS-Importação
4.2.4. ISS
4.2.5. IOF

20
4.3 Outros comentários – Discussões recentes sobre o regime
tributário do data center
5. Conclusões
Breves Considerações sobre o Tratamento Legal, Contábil e Fiscal
das Moedas Virtuais
I. Introdução
II. Das Moedas Virtuais – Elementos Definidores, Experiência
Internacional e Disciplina Brasileira
II.1 Elementos Definidores
II.2 Breves Apontamentos sobre a Experiência Internacional
II.3 O tratamento na Legislação Brasileira
III. Do Tratamento Contábil e Fiscal Aplicável às Moedas Virtuais
III.1 Do Tratamento Contábil Atribuído às Moedas Virtuais
III.2 Do Tratamento Fiscal Atribuído às Moedas Virtuais
IV. Conclusão
IRF e IOF sobre remessas realizadas por empresas de intermediação
de pagamento e regulação do BACEN
1. Introdução
2. Imposto de Renda retido na Fonte
3. Imposto sobre Operações Financeiras na modalidade Câmbio
4. Conclusões
A Tributação de SaaS e SaaP no Brasil por ISS ou ICMS: Estudo de
Casos de Massively Multiplayer Online Games (MMOGs)
Introdução
1. Definições relevantes
1.1. IaaS e PaaS
1.2. SaaS e SaaP
1.3. MMOGs
2. Apresentação dos Três Casos de Estudo
3. Aspectos Tributários dos Três Casos de Estudo

21
3.1. Caso 1: MMOG, Jogador e Acesso a Área de Jogo
3.2. Caso 2: MMOG, Jogador e Pacote de Benefícios
3.3. Caso 3: Jogador, Jogador e Item de Jogo
Considerações Finais
Desafios na tributação dos programas de fidelização
1. Introdução
2. Principais controvérsias tributárias
2.1. A atipicidade da atividade desenvolvida pelas empresas
gestoras do programa de fidelização
2.2. O momento do reconhecimento da receita auferida pela
empresa gestora do programa de fidelização para fins de
tributação do PIS/COFINS
3. Conclusões e alternativas quanto aos desafios legislativos
Tributação das Aplicações Over-The-Top no Brasil: visão geral e
análise das atividades de transmissão de conteúdo audiovisual, envio
de mensagens e realização de chamadas de voz por meio da internet
1. Introdução
2. Delimitação do Conceito de Aplicações OTT
3. Interpretação Dinâmica da Lei Tributária
4. Visão Geral sobre a Tributação das Aplicações OTT no Brasil
5. Transmissão de conteúdo audiovisual por meio da internet
5.1. ICMS-Mercadoria
5.2. ICMS-Comunicação
5.3. ISS
6. Envio de mensagens multimídia e realização de chamadas de
voz pela internet
6.1. ICMS-Mercadoria
6.2. ICMS-Comunicação
6.3. ISS
7. Considerações finais

22
O Software as a Service (SaaS) e a tributação pelo ISS
1. Noções introdutórias: a inovação tecnológica e seus reflexos no
universo jurídico-tributário
2. A natureza jurídica do software, a sua proteção e o tratamento
conferido pela Lei n. 9.609/98
3. Contratos de licença de uso do software: a forma jurídica de
exploração econômica mais comum na disponibilização de
programas de computador pela internet
4. O Software as a Service (SaaS) como modelo de business no
licenciamento de uso do software
4.1. Da unicidade do negócio jurídico SaaP para a complexidade
do negócio jurídico SaaS
5. O licenciamento eletrônico de uso de software e o ISS
5.1. A licença de uso de software no formato tradicional
(Software as a Product) e o ISS
5.2. A licença de uso na modalidade Software as a Service
(SaaS) e o ISS
Tributação de software “embarcado” e os conflitos ICMS vs. ISS
1. Introdução
2. Análise jurídica dos conflitos ICMS vs. ISS: perspectiva
brasileira e a discussão sobre a fragmentação de contratos
2.1. Comentários sobre as formas contratuais de disponibilização
de software embarcado
2.2. Comentários pertinentes ao conflito de competência de ISS
e ICMS em casos de software embarcado: nossa visão sobre a
matéria
2.3. Comentários pertinentes ao conflito de competência de ISS
e ICMS em casos de software embarcado: evolução dos
precedentes administrativos sobre a matéria
3. Conclusão
Tributação de negócios desenvolvidos por meio de aplicativos
associados aos serviços de hospedagem no Brasil
1. Introdução

23
2. O modelo de negócio e suas atividades
3. A tributação da atividade
3.1. A tributação do consumo
3.1.1. A ausência de tributação sobre atividade marketplace e
a tributação da intermediação de contratos pelo ISS
3.1.2. Onde é devido o ISS sobre intermediação online de
contratos?
3.2. Tributação sobre a renda
4. Conclusões
Aspectos fiscais aplicáveis à cessão e disponibilização de dados
1. Introdução
2. Os diferentes modelos adotados nas operações de
disponibilização de dados
2.1. Disponibilização personalizada de dados (build to order)
2.2. Disponibilização de dados gerais para todos os clientes
(Plug and Play)
3. Questões específicas verificadas no âmbito da economia digital
4. Considerações adicionais relacionadas a operações cross-border
5. Aplicação de Tratados firmados para Evitar a Dupla Tributação
6. Conclusões

Parte II - Novas perspectivas: políticas fiscais para a tributação dos


negócios na Economia Digital e das novas tecnologias
Seção A - Economia Digital e Formas Alternativas de Tributação
Tributação e Novas Tecnologias: Reformular as Incidências ou o
Modo de Arrecadar? Um “SIMPLES” Informático
1. Introdução
2. Razões têm origem em ambos os campos
3. A tributação adequada
4. A relevância dos setores
5. Arrecadação unificada

24
6. Desafios supervenientes
7. Conclusão
Economia digital e a criação de um IVA para o Brasil
1. Introdução
2. Os novos modelos de negócios na economia digital e seus
impactos socioeconômicos
3. Economia digital e seus impactos tributários
4. O atual modelo de tributação do consumo no Brasil e a sua
incompatibilidade com a nova economia digital
5. A economia digital e a exigência de um IVA para o Brasil
6. Considerações Finais
Os desafios da tributação indireta do comércio eletrônico: estratégias
para a simplificação da arrecadação tributária em operações B2C
1. Introdução
2. Os princípios da Convenção de Ottawa e a estrutura fundamental
da tributação no comércio eletrônico
3. O princípio do destino e a complexidade da arrecadação de
tributos nas operações envolvendo serviços e intangíveis virtuais
4. Registro único de fornecedores e prestadores não residentes no
território do ente tributante: a experiência europeia
5. Conclusões: recomendações para o sistema tributário nacional
Reforma tributária: desafios da evolução da economia digital versus
complexidades da Federação brasileira
1. Introdução
2. Como chegamos aqui?
3. A acomodação pela repartição de receitas
4. Perspectivas internacionais92
5. Perspectiva interna
6. Propostas de reforma tributária
7. Conclusões

25
Jogos de realidade virtual e robótica: desafios para a tributação de
humanos no mundo virtual e robôs no mundo real
1. Tributação sobre jogos de realidade virtual
1.1. Transações no mundo virtual
1.1.1. World of Warcraft (jogos estruturados, de economia
híbrida)
1.1.2. Second Life (jogos desestruturados, de economia
aberta)
1.2. Propostas para tributação de jogos de realidade virtual
1.2.1. Tributação dentro do mundo virtual
1.2.2. Tributação na passagem do mundo virtual para o mundo
real
2. Tributação sobre robôs
2.1. Definição de robôs
2.2. Propostas para a tributação de robôs
2.2.1. A capacidade contributiva dos robôs (ou decorrente de
seu uso)
2.2.2. Tributos específicos sobre o uso ou propriedade de
robôs
Tributação direta vs. tributação indireta na economia digital:
reflexões sobre os impactos da concentração de tributos sobre o
consumo em detrimento da tributação sobre a renda para a
praticabilidade e justiça fiscal
1. Tributação do consumo: tendências e desafios da era digital nos
mercados internacionais e no Brasil
2. Tributação indireta. Praticabilidade vs. Capacidade Contributiva
e Justiça Fiscal
3. Conclusões
A Competitividade no Mercado Global e a Tendência à Migração
para um Sistema de Tributação Territorial
1. Introdução
2. A tendência de migração para um modelo de territorialidade

26
2.1. A competição fiscal internacional
2.2. As operações de inversão da estrutura societária
2.3. O impacto negativo para competitividade das empresas no
cenário global
2.4. Os benefícios socioeconômicos colaterais da repatriação de
lucros
3. Os problemas da migração para um regime de territorialidade
parcial
3.1. Ausência de conjunto sistemático e orgânico de regras para
a determinação da fonte dos rendimentos
3.2. Aprimoramento do conceito de estabelecimento permanente
ou a adoção de medidas substitutivas
3.3. O fortalecimento das regras de preços de transferência
4. Conclusões
Impressão 3D e sistema tributário disfuncional
Deveres instrumentais na economia digital: o Siscoserv e os limites
ao controle do comércio internacional de serviços
1. Considerações iniciais
2. Os deveres instrumentais no sistema tributário brasileiro e seus
limites normativos
3. A informatização fiscal e o pioneirismo do Brasil na exigência
de deveres instrumentais
4. O Siscoserv e o controle do comércio internacional de serviços
4.1. Considerações sobre a exigência das informações
relacionadas ao Siscoserv
4.2. Considerações sobre as penalidades impostas pelo
descumprimento dos deveres instrumentais relacionados ao
Siscoserv
5. Conclusão
Seção B - Economia digital, a Ação 1 do BEPS e a visão da ONU:
proposições e críticas

27
As estruturas de planejamento tributário adotadas pelas empresas de
tecnologia, as proposições da Ação 1 do BEPS e as iniciativas
legislativas dos países ao redor do mundo
1. Introdução
2. As principais estruturas de planejamento tributário adotadas
pelas empresas de tecnologia
2.1. Apresentação do tópico
2.2. Venda de produtos online para consumidores finais (online
retailer)
2.2.1. Descrição da estrutura
2.2.2. Principais efeitos tributários da estrutura para os países
envolvidos
2.3. Venda de publicidade pela internet (internet advertising)
2.3.1. Descrição da estrutura
2.3.2. Principais efeitos tributários da estrutura para os países
envolvidos
2.4. Venda de aplicativos online (internet app store)
2.4.1. Descrição da estrutura
2.4.2. Principais efeitos tributários da estrutura para os países
envolvidos
3. Iniciativas legislativas para combater os planejamentos
tributários agressivos
3.1. O Plano BEPS 1 e a visão da União Europeia
3.2. O diverted tax profit do Reino Unido
3.3. O equalization tax da Índia
3.4. Iniciativas legislativas na França e na Itália
4. Conclusões
Uma proposta para a modificação da Convenção Modelo da OCDE
em face da digitalização da economia
Introdução
1. O Relatório de 2015 da OCDE

28
1.1. Opção 1: Modificar o rol de isenções admissíveis, no artigo
5º, parágrafo 4º, da Convenção Modelo da OCDE, quando do
reconhecimento do status de estabelecimento permanente
1.2. Opção 2: Estabelecer um novo “nexo” (ou elemento de
conexão) para determinar a existência de um estabelecimento
permanente, baseado na existência de presença digital
significativa
1.3. Opção 3: Substituir os critérios para caracterização de um
estabelecimento permanente por um teste de “presença
significativa”
1.4. Opção 4: Criar impostos de incidência na fonte para
transações digitais
1.5. Opção 5: Introduzir um imposto sobre o fluxo de dados pela
internet (bandwidth ou bit tax)
2. Considerações gerais acerca das opções propostas
2.1. Considerações político-fiscais acerca do nexo negocial e da
substância econômica das atividades exercidas pela via digital
2.2. Valoração das transações a partir dos diferentes modelos
negociais
2.3. Mudanças à Convenção Modelo da OCDE
3. Conclusões
Operações de Inversão (Inversions) ou Redomiciliação Fiscal
(Reparanting) na Economia Digital
1. Introdução e escopo do artigo
2. Residência Fiscal e a Mobilidade dos Fatores Produtivos na
Economia Digital
3. Operações de Inversão (tax inversions) nos Estados Unidos
3.1. Origem e evolução no Sistema Tributário Americano
3.1.1. Caso McDermott
3.1.2. Caso Helen of Troy
3.1.3. Casos Pós-Helen of Troy
3.1.4. Section 7874 do IRC e seus desdobramentos

29
3.1.5. Estruturações e Inversão fiscal na Economia Digital
4. Regra brasileira de tributação de controladas e coligadas no
exterior (CFC) e Operações de Inversão Fiscal
4.1. Caso Magnesita451
4.2. Principais questões tributárias e perspectivas do cenário
digital
5. Síntese conclusiva
A aplicação dos acordos de bitributação aos negócios da economia
digital: as visões do Brasil, da OCDE e da ONU sobre software e
serviços técnicos
Introdução
1. A prestação de serviços técnicos e do software e sua qualificação
nos acordos de bitributação brasileiros
2. A perspectiva da OCDE
3. A perspectiva da ONU
4. Conclusões
Alocação da propriedade intelectual e a tributação dos royalties no
Projeto BEPS: o combate aos planejamentos tributários “abusivos” e
o “nexus approach”
1. Introdução
2. O que exatamente o Projeto BEPS busca coibir em relação à
alocação de ativos intangíveis?
3. Relatório BEPS e propriedade intelectual: coerência, “nexus
approach” e substância
3.1. Ação 5
3.2. Ações 8, 9 e 10
4. Impactos das recomendações do Projeto BEPS para estruturas
que segregam atividade econômica substantiva, tomada de decisão
e propriedade intelectual
5. Consequências para o Brasil
6. Conclusões

30
Parte III - Direito comparado: a tributação da economia digital sob a
perspectiva de outros países
Evolução da Tributação da Economia Digital na Alemanha
Introdução
1. A economia digital, o e-commerce e seus desafios tributários
2. Peculiaridades dos principais impostos alemães envolvidos no
comércio digital
2.1. Imposto sobre vendas (Umsatzsteuer, doravante designado
USt)
2.2. Imposto de Renda da Pessoa Física (Einkommensteuer,
doravante designado ESt) e o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica
(Körperschaftsteuer, doravante designado KSt)
3. Imposto sobre vendas (Umsatzsteuer – USt), o Imposto de Renda
(ESt) e o Imposto sobre Entidades (KSt) no e-commerce
3.1. Vendas offline e vendas online
3.2. A tributação de pagamentos pela utilização de software e de
bancos de dados, conforme § 13b da UStG e do § 50 da EStG552
3.3. Tributação dos negócios B2B e B2C no cloud computing
3.3.1. Imposto de renda (ESt) e da pessoa jurídica (KSt)
3.3.2. Imposto sobre vendas (USt)
4. Tributação limitada e desconto na fonte na disponibilização de
software e bancos de dados na Alemanha
Conclusão
As disputas de Cost Sharing Agreements envolvendo empresas de
tecnologia nos Estados Unidos
I. Introdução
II. O caso Veritas
III. O caso Amazon
IV. As Final Regulations emitidas em 2011
V. O Projeto BEPS e a reforma tributária dos Estados Unidos
VI. Conclusão

31
European VAT and the Digital Economy
1. Introduction
2. Overview of EU VAT System
3. Supplies of Digital Products
3.1. Concept of electronically supplied services
3.2. Place of supply
3.3. One Stop Shop
3.4. Intermediaries
4. Supplies of Goods Ordered Online
5. EU Initiatives Regarding Taxation of the Digital Economy
5.1. Expert Group of the Taxation of the Digital Economy
5.2. Strategy for the EU Digital Single Market
5.3. Modernising VAT for E-commerce
5.3.1. Expansion of the One Stop Shop
5.3.2. Simplified VAT rules for small businesses
5.3.3. Importation of low-value consignments
6. Conclusions
Canada: Taxing Global Digital Income in a Post-BEPS World
1. Introduction
2. Overview of BEPS and Global Digital Taxation
2.1. Background on Related OECD Reform Efforts
2.2. BEPS and Digital Taxation
3. BEPS Digital Tax Reforms
3.1. Tax Treaty Changes
3.2. Rejected BEPS Reforms
4. Impact of BEPS on Global Digital Taxation
4.1. Cross-border Structures with Digital Taxation
4.2. Impact of BEPS Reforms on Cross-border Structures

32
5. Conclusion
Taxation of the Digital Economy: A U.S. Subnational Perspective
1. Introduction
2. Direct Tax Issues
2.1. Nexus
2.2. Income Attribution
3. Indirect Tax Issues
3.1. Nexus
3.2. US State Strategies for Addressing the Distance Selling
Problem under the RST
3.2.1. Business-to-Business (B2B) Sales: Reverse Charge
(Direct Pay)
3.2.2. Business-to-Consumer (B2C) Sales
4. Conclusion
Australia’s Multinational Anti-Avoidance Law (2016): Treating the
symptom rather than the disease
1. Introduction
2. Background
3. Google’s “Double Irish” and “Dutch Sandwich” tax avoidance
structure
3.1. Subpart F of the US Tax Code
3.2. Google’s tax history in Australia
3.3. UK House of Commons Committee of Public Accounts:
Google, MNEs and tax morality
4. Australian Senate Economic References Committee inquiries
4.1. Google’s operations in Australia prior to MAAL
4.2. 2015 parliamentary inquiry
4.3. 2017 parliamentary inquiry
5. Australia’s Multinational Anti-Avoidance Law 2016
5.1. The scope of the MAAL

33
5.2. Definitions
5.3. Activities are undertaken in Australia and are directly
connected with the supply
5.3.1. Activities are undertaken in Australia
5.3.2. The foreign entity derives ordinary income or statutory
income from the supply
5.4. The principal purpose test
5.4.1. Obtaining a tax benefit
5.4.1.1. Having regard to certain factors
5.5. Additional matters for the MAAL
6. Multilateral instrument
7. Conclusion
Taxation of the Digital Economy: Argentina Perspective
1. Importance of the Digital Economy
2. Current Taxation of the DE in Argentina
2.1. Income Tax (IT)
2.1.1. General Sourcing Rules
2.1.2. Special Sourcing Rules
2.2. Value Added Tax (VAT)
2.3. Gross Turnover Tax (GTT)
3. International Context: BEPS and Country’s Experiments
3.1. Direct Taxation
3.2. Indirect Taxation
4. The Argentine Experiment
4.1. The DE on the Spot
4.2. The Argentine Tax Reform Bill
4.2.1. Direct Taxation
4.2.2. Indirect Taxation
5. What’s Next?

34
Taxation of the digital economy in France
Introduction
1. Questions raised by taxation of individuals
1.1. Cost-sharing issue
1.2. Compliance issues for income generated via online platforms
1.3. The distinction between professional and non-professional
income
2. Companies’ taxation in a global economy
2.1. Difficulties raised by the taxation of income
2.1.1. Issues raised by an activity exercised without material
presence in a State
2.1.2. A subsidiary: material presence separated from the main
activity?
2.2. Alternatives to the taxation of income
2.2.1. Reasons of a failure to introduce a diverted profits tax in
France
2.2.2. New approach to taxation of the digital economy
Conclusion
Taxation of Digital Economy: India Perspective
1. Introduction
2. Digital Economy in India
3. Historical Taxation of Digital Economy
3.1. Royalty
3.2. Fees for Technical Service (FTS)
3.3. Permanent Establishment (PE)
4. India’s approach
5. Action Taken by India
6. Concerns about Equalization Levy
6.1. What is the nature of Equalization Levy? Is it a direct or
indirect tax?

35
6.2. Is Equalization Levy a tax on income?
6.3. Burden of Equalization Levy
6.4. Is Equalization Levy beyond the purview of tax treaties?
6.5. Even though Equalization Levy is not incorporated in the
IITA, can treaty provisions apply?
6.6. How consistent is Equalization Levy with the present bilateral
tax treaties entered into by India?
7. Conclusion
Taxation of the Digital Economy: Japan Perspective
1. Personal income tax and corporate income tax
1.1. 2014 amendment from entire income principle to attributed
income principle
1.2. To be a PE or not to be a PE
1.2.1. Co-Location service near Tokyo Stock Exchange
1.2.2. Amazon
1.2.3. Internet auction: Tokyo High Court (28 January 2016)
1.3. Quasi general anti-avoidance rule for dealings of PEs
1.4. Virtual PE
2. Value added tax
2.1. Before the 2015 amendment
2.1.1. Destination principle for goods
2.1.2. Incomplete destination principle for services
2.1.3. Place of supply of services: Tokyo District Court (13
October 2010)
2.1.4. Tourists: Tokyo High Court (9 February 2016)
2.2. After the 2015 amendment: supply of service using electric
communication
2.2.1. B2B: reverse charge
2.2.2. B2C: registration

36
2.2.3. Incomplete destination principle after the 2015
amendment
2.2.4. 2017 amendment concerning bitcoins and other virtual
currencies
Challenges of the tax systems in the digital economy era: Mexico
perspective
1. Introduction
1.1. What’s the so called digital economy?
1.2. Which market offerings are included within such concept?
1.2.1. Sharing culture – P2P
1.2.2. Fintech
1.2.3. Crowdfunding
1.2.4. Software & Cloud as a service
2. Income Tax Considerations
2.1. Technical analysis of source rules contained in the domestic
law and their inability to tax the earnings proceeding from the
market to the hands of the offshore offerors
2.2. Technical analysis of the general structure of double taxation
treaties and the classification of income
2.3. Expected practical reactions from the Federal tax authorities
2.3.1. Permanent Establishment (PE)
2.3.2. Transfer pricing (TP)
2.3.3. United Nations Report
3. Value Added Tax Considerations
3.1. Importation of Services
3.2. Exportation of Services
4. Local (State) Tax Considerations
4.1. Diverse and non-organized types of reactions

37
Apresentação

O fenômeno de maior relevância para a economia mundial desde a


Revolução Industrial atende pelo nome de Economia Digital. A expressão
passou a ser utilizada a partir de meados da década de 1990 para se referir
às atividades econômicas desenvolvidas por meio do uso da tecnologia
digital, particularmente as transações realizadas em ambiente virtual.

O rápido desenvolvimento da tecnologia da informação e da


comunicação testemunhou o nascimento do cloud computing, das
atividades de transmissão de conteúdo audiovisual pela internet, da
impressão 3D, da nanotecnologia, da internet das coisas, da criação e
utilização das moedas virtuais e do processo de migração para uma
economia baseada em serviços e “funcionalidades”.

Nos modelos de negócio surgidos na era da Economia Digital, a ação


humana e a presença física no local onde a atividade é desenvolvida são
cada vez menos relevantes. Em meio aos efeitos da “economia
compartilhada”, o processo produtivo passa a ser mais integrado e os
intangíveis representam o grande componente de valor das empresas.

O surgimento dessa nova economia representa um grande desafio para


os sistemas tributários atuais, que foram moldados a partir da economia
tradicional, tendo como parâmetros a localização física dos contribuintes
(residência), a origem dos rendimentos (fonte) e já ultrapassada distinção
entre “mercadorias” e “serviços”.

38
É a partir desse contexto que sugiram iniciativas como o Projeto
BEPS, encabeçado pela OCDE e pelos países do G20, que tem como
propósito ampliar o debate acerca do tema e rever as regras tributárias em
caráter global. Em paralelo, vislumbram-se duas fortes tendências em
matéria de política fiscal: a criação de regras para tributar as atividades
empresarias desenvolvidas sem a necessidade de presença física da
empresa no mercado onde atua e uma progressiva redução das alíquotas do
imposto de renda corporativo.

No Brasil, o sistema de repartição de competências tributárias entre os


entes federativos criou um ambiente de “guerra fiscal”, no qual Estados e
Municípios tentam reinterpretar os conceitos de “mercadoria” e “serviços”,
em claro prejuízo à segurança jurídica e à geração de riqueza. Nesse
sentido, inúmeras dúvidas têm sido suscitadas em relação à qualificação
jurídico-tributária aplicada aos “produtos digitais”.

É nesse cenário que surgiu a ideia de criar uma obra abrangente sobre a
tributação da economia digital. Além de debater a forma de aplicação das
normas tributárias vigentes em face dessa nova realidade e de analisar os
produtos e serviços que surgiram com a Economia Digital, pretende-se
trazer ao conhecimento do público brasileiro os desafios e as soluções que
vêm sendo discutidas nas principais economias do mundo. O livro tem
também um caráter propositivo, na medida em que suscita a discussão
acerca da necessidade de reforma do sistema tributário brasileiro.

O aspecto inovador do livro é poder congregar, em uma única obra, as


visões de representantes das empresas, de especialistas em tributação e de
membros da administração tributária. Para tanto, foram selecionados
autores com ampla autuação nas questões tributárias ligadas à Economia
Digital, tanto no Brasil quanto no exterior. O resultado final se traduz

39
numa obra com um total de 70 artigos, divididos em três partes, sendo as
duas primeiras voltadas primordialmente para o direito brasileiro e a
terceira focada em direito comparado.

A Parte I do livro tem o propósito de discutir os principais desafios da


tributação da Economia Digital no Brasil, contemplando artigos sobre a
tributação direta (Seção A), indireta (Seção B) e sobre o regime tributário
aplicável a determinados produtos ou modelos de negócio previamente
selecionados (Seção C).

A Parte II contém duas seções. A Seção A representa um olhar para o


futuro: expõe a visão de diversos autores sobre possíveis alternativas para
a tributação da Economia Digital no Brasil, incluindo discussões sobre a
reforma do nosso sistema tributário. A Seção B apresenta uma abordagem
mais “global” da questão, na medida em que discute as proposições da
ONU e da OCDE (BEPS 1) acerca da tributação da Economia Digital.

Finalmente, a Parte III expõe ao leitor brasileiro a visão de outros


países sobre a tributação da Economia Digital, contando com a
colaboração de inúmeros autores estrangeiros (Canadá, EUA, França,
Japão, Austrália, Argentina, Índia, Holanda e México).

Em vista da natureza dos temas tratados e da complexidade em lidar


com autores de diversos países, optou-se por manter as colaborações dos
autores estrangeiros – que inclui grande parte dos artigos da Parte III – em
língua inglesa, idioma em que foram originalmente produzidas. Além
disso, para facilitar o acesso do leitor às fontes doutrinárias e
jurisprudenciais utilizadas no livro, optou-se por manter as referências
bibliográficas em notas de rodapé ao longo do texto.

40
A coordenação de uma obra de tamanha envergadura representou um
enorme desafio, já que envolveu um grupo de mais de 100 autores e
coautores, cujos artigos foram cuidadosamente revisados e uniformizados
pelos coordenadores. O resultado final, porém, não poderia ser mais
gratificante. A criteriosa escolha dos autores se traduziu em uma obra de
altíssimo nível técnico. Assim, os coordenadores não poderiam deixar de
reiterar o agradecimento a cada um dos autores pela sua inestimável
colaboração. Da mesma forma, agradecemos a Editora Saraiva por apoiar
o projeto e pelo gentil suporte de seu time editorial.

Estamos certos de que a presente obra terá um papel destacado na


bibliografia daqueles que pretendam estudar a tributação da Economia
Digital, seja no Brasil ou no exterior.

Boa leitura!

Os Coordenadores

Fevereiro de 2018

41
Parte I
TRIBUTAÇÃO E OS DESAFIOS DA
ECONOMIA DIGITAL NO BRASIL

42
Seção A
Aspectos relacionados à tributação direta local e
internacional

Estabelecimento permanente: legislação


tributária brasileira e desafios na economia
digital
João Francisco Bianco1 e Fabiana Carsoni Alves Fernandes da Silva2

1. INTRODUÇÃO

Tratados internacionais têm sido assinados desde meados do século


XIX com o objetivo de evitar a dupla tributação, que ocorre quando dois
Estados manifestam a pretensão de tributar a mesma renda, auferida pelo
mesmo contribuinte, durante o mesmo período de tempo. A dupla
tributação é aceita pela generalidade dos autores como sendo prejudicial à
troca internacional de bens, serviços, capitais e tecnologia e, portanto, um
obstáculo ao desenvolvimento das relações econômicas entre os países.

Se dois países decidem negociar um tratado é porque os seus residentes


estão sendo tributados em duplicidade nas suas atividades, e isso deve ser
evitado se os países quiserem expandir as suas relações comerciais e
financeiras. E a única forma de evitar a dupla tributação é fazer com que
um dos países envolvidos concorde em limitar, total ou parcialmente, a sua
capacidade de tributar. Assim, um dos países envolvidos terá que
necessariamente experimentar uma perda de arrecadação no curto prazo,
na expectativa de que essa perda seja compensada com o futuro aumento

43
de arrecadação decorrente do incremento das relações comerciais entre
ambos os países.

Agora suponha que o residente de um Estado desenvolva atividades


econômicas no outro Estado. Ambos os Estados teoricamente podem
tributar os lucros auferidos com essa atividade. E ambos os Estados têm
bons argumentos para justificar a sua pretensão impositiva. O Estado de
residência oferece a infraestrutura necessária para que o residente
desenvolva a sua atividade econômica. Além disso, somente o Estado de
residência tem a possibilidade prática de tributar o rendimento líquido
auferido pelo contribuinte, controlando a validade dos custos e despesas
incorridas. O Estado da fonte, por seu turno, também tem o direito de
tributar esse lucro porque o contribuinte está fazendo negócios nesse
Estado, auferindo renda ali, explorando aquele mercado. E deve pagar por
isso.

Como solucionar então essa típica situação de dupla pretensão


impositiva? Qual país deveria limitar sua capacidade de tributação?

Veremos adiante que, historicamente, o Estado da fonte tem sido o


prejudicado nessa verdadeira “queda de braço” entre os países. Isso porque
o Estado de residência tem reservado para si uma fatia maior do “bolo”
tributário. Com efeito, a tributação internacional, de um modo geral, esteve
desde o início centrada no princípio da residência. Prova disso é que a
Convenção Modelo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) contém muitos dispositivos que privilegiam a
tributação internacional baseada no princípio da residência3.

Ocorre que o desenvolvimento da economia digital trouxe dúvidas em


relação à suficiência e à compatibilidade das antigas regras de atribuição

44
de competência no Direito Tributário internacional, notadamente das
regras calcadas no princípio da residência. De fato, questiona-se se o
princípio da residência ainda se sustenta em um cenário econômico
globalizado e desmaterializado, no qual empresas multinacionais exercem
poucas funções no Estado da residência, mas acessam, de forma
substancial, o mercado consumidor do Estado da fonte.

Essas mudanças na forma de atuação das empresas multinacionais e as


dúvidas quanto à adequação das regras de atribuição de competência ainda
não foram suficientes para que a OCDE, ou os países desenvolvidos,
abandonassem esse verdadeiro dogma da tributação internacional baseado
no princípio da residência. É o que revela a demarcação do conceito de
estabelecimento permanente, feita pela OCDE em sua Convenção Modelo,
ainda baseada em conceitos incompatíveis com a nova realidade imposta
pela era digital.

Com isso, múltiplas discussões têm surgido quanto ao aprimoramento


dessas regras, ou sua substituição por alternativas que se mostrem viáveis e
compatíveis com a economia digital.

No presente estudo, analisaremos (i) o conceito de estabelecimento


permanente dado pela OCDE em sua Convenção Modelo; (ii) a sua
compatibilidade com a legislação brasileira; (iii) as propostas da OCDE
para resolver os problemas oriundos da economia digital, inclusive em
relação à adequação do conceito de estabelecimento permanente aos
negócios praticados na era digital; e (iv) a tendência do Brasil diante dos
desafios dessa nova realidade. Ao final, apresentaremos nossas
observações sobre os rumos dessas discussões no Brasil.

2. O CONCEITO DE ESTABELECIMENTO PERMANENTE NO MODELO


DE CONVENÇÃO DA OCDE

45
Antes de iniciarmos nossa exposição sobre o conceito de
estabelecimento permanente, cabe examinarmos o motivo pelo qual é
importante determinar o alcance exato dessa expressão. Para isso,
investiguemos o conteúdo do artigo 7º da Convenção Modelo da OCDE.

Dispõe o caput do art. 7º da Convenção Modelo da OCDE que “os


lucros de uma empresa de um Estado contratante só são tributáveis nesse
Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado
contratante por meio de um estabelecimento permanente aí situado”.

A análise do dispositivo acima transcrito demonstra que, como regra


geral, os lucros de uma empresa somente podem ser tributados pelo Estado
onde ela reside, e não onde ela exerce sua atividade. Assim, se uma
empresa sediada no Brasil vende mercadorias para um cliente na
Argentina, somente o Brasil poderá tributar o lucro auferido com a
operação. Isso porque, a despeito de a empresa brasileira exercer sua
atividade na Argentina, lá fazendo negócios e auferindo lucro, somente o
Brasil poderá tributar esses lucros, pois é aqui que se encontra a sede da
empresa.

Essa é a regra geral prevista no artigo 7º. Mas esse mesmo dispositivo
prevê que, excepcionalmente, o Estado onde a atividade é exercida – no
caso do exemplo, a Argentina – também pode tributar esse lucro desde
que, na Argentina, a empresa brasileira mantenha um estabelecimento
permanente.

Desse modo, a exata determinação da existência ou não de


estabelecimento permanente em um país é muito importante, pois esse será
o fator que determinará se a empresa deverá ou não pagar imposto sobre o
lucro auferido com a realização de sua atividade no Estado da fonte.

46
Estando caracterizada a existência do estabelecimento permanente, o lucro
por ele apurado poderá ser tributado pelo Estado da fonte de produção do
rendimento. Não estando caracterizada a sua existência, o Estado da fonte
ficará impedido de tributar o lucro auferido pela empresa.

A tributação pelo Estado da fonte se justifica, fundamentalmente, pelos


princípios da territorialidade e da fonte4.

O princípio da fonte é entendido e conceituado por muitos estudiosos


como o lugar em que a atividade é exercida, onde são utilizados os fatores
de produção, ou em que se situam os bens e direitos de que a renda provém
(fonte de produção), podendo também abranger o local de onde se
originam os recursos pagos ao beneficiário da renda situado no exterior
(fonte de pagamento)5.

Quer dizer: para a atribuição de competência ao Estado da fonte, é


necessário identificar-se uma relação de pertinência ou vinculação
econômica da riqueza produzida com o território do país. Para tanto, é
adequado considerar que o rendimento somente é produzido se uma pessoa
utilizar fatores de produção (trabalho e/ou capital) ou se ela detiver bens e
direitos no território do Estado da fonte. Por tal perspectiva, a tributação da
renda deve estar vinculada, tanto quanto possível, à utilização e, portanto,
também ao lugar onde esses fatores são utilizados ou onde a propriedade
se situa (princípio da territorialidade)6. Por essa mesma perspectiva, como
acrescentou Eric Kemmeren, somente indivíduos, e não coisas, são
capazes de gerar renda, situando-se o local de produção da riqueza onde a
atividade econômica se desenvolve7.

Para a aferição dessa pertinência ou dessa vinculação econômica e,


pois, para a construção de um conceito que permitisse a identificação da

47
“soberania tributária” do Estado da fonte, desenvolveu-se a ideia de
presença física, a qual passou a ser considerada como elemento
característico de um estabelecimento permanente. O referido elemento
representa, como anotaram Yariv Brauner e Andrés Baez, um
compromisso justo e legítimo para atender aos reclamos dos Estados
de fonte e de residência. Por esse conceito, o país da fonte somente pode
tributar o não residente se ele participar de forma significativa de sua
economia – e apenas na extensão dessa participação – revelando-se o
modelo de estabelecimento permanente baseado na presença física um
proxy aceitável para a delimitação da referida participação8.

Ver-se-á que a construção do conceito de estabelecimento permanente


desenhada pela OCDE, em grande parte, tem a tangibilidade como
pressuposto, estando assentada em critérios como presença física e
permanência temporal. Com efeito, o conceito de estabelecimento
permanente, traçado pela OCDE, pressupõe que a atividade econômica
seja exercida no território do Estado da fonte com certa intensidade,
corporificando-se em uma instalação de negócios de caráter estável9.

Sucede que esse conceito é insuficiente, quiçá incompatível com muitas


transações verificadas na economia digital, em que se vê acentuada
geração de riqueza sem grandes investimentos em bens materiais ou sem
relevante presença física. Daí as dificuldades que se apresentam nesse
cenário de globalização e, em especial, de digitalização.

Para permitir a compreensão dessas dificuldades e desses desafios,


vejamos, antes, como a OCDE, na Convenção Modelo, trata e define o
estabelecimento permanente10.

48
Nessa breve exposição, notar-se-á que a OCDE, na definição de
estabelecimento permanente, atribuiu competência tributária ao Estado da
fonte em conformidade com a vinculação do bem à sua economia (teoria
da pertença econômica11), limitando tal conceito nas hipóteses em que não
há, no território do Estado da fonte, instalações responsáveis por adquirir
ou realizar diretamente o lucro tributável, é dizer, instalações sem caráter
imediatamente produtivo (teoria da realização)12.

Pois bem, na Convenção Modelo da OCDE13, encontram-se dois tipos


de estabelecimentos permanentes, a saber: (a) o estabelecimento
permanente material, em que o exercício no exterior de uma atividade
empresarial é realizado por meio de meios materiais organizados
diretamente pelo agente econômico; e (b) o estabelecimento permanente
pessoal, em que a presença no exterior do empreendedor, para a realização
de sua atividade empresarial, não é feita de forma direta, mas por
intermédio de um agente ou representante.

O estabelecimento permanente material está definido no art. 5º, §§ 1º


a 4º, da Convenção Modelo da OCDE. Enquanto o § 1º do artigo fixa uma
definição geral, conceituando-o como “um local fixo de negócios,
mediante o qual uma empresa realiza, no todo ou em parte, sua atividade”,
os §§ 2º a 4º propõem uma lista exemplificativa do que pode e do que não
pode ser caracterizado como um estabelecimento permanente material.

Assim, o § 2º enumera a sede da administração, a sucursal, o escritório


ou a fábrica, e o § 3º menciona o canteiro de construção, de instalação ou
de montagem, cuja duração exceda doze meses, como hipóteses que se
enquadram no conceito geral de estabelecimento permanente material
(enumeração positiva), enquanto o § 4º menciona o armazém, o depósito

49
ou o escritório de compras como hipóteses que não se enquadram no
conceito (enumeração negativa)14.

Desses dispositivos da Convenção Modelo da OCDE, podemos extrair


as seguintes características do estabelecimento permanente material.

A primeira delas é o funcionamento do estabelecimento permanente


como um local de negócios, ou seja, um espaço físico determinado, onde
estão localizados os bens e equipamentos necessários ao desenvolvimento
da atividade da empresa. A simples posse por uma empresa não residente
de um bem imóvel em outro país, por exemplo, não caracteriza a
existência de um estabelecimento permanente se esse imóvel não for um
local onde se desenvolve a atividade da empresa.

A segunda característica do estabelecimento permanente é o fato de


esse local de negócios ser fixo ou estável, tanto no sentido de ser
permanente (não temporário) como no sentido espacial ou geográfico.

A terceira característica é a necessidade de haver uma relação de


pertinência entre esse local fixo de negócios e a atividade normal
desenvolvida pela empresa sediada no exterior, ou seja, é preciso que o
estabelecimento sirva como um instrumento para a realização das
operações próprias que constituem o objeto social da empresa.

Por fim, a quarta característica refere-se à demonstração de que o


estabelecimento detém capacidade de produzir rendimentos. Não bastam,
assim, para caracterizar o estabelecimento permanente material, tão
somente as características acima apontadas. É necessário que esse local de
negócios seja produtivo, no sentido de dispor de independência e
autonomia para gerar receitas.

50
Essa conclusão se impõe se considerarmos que a lista negativa de
estabelecimentos permanentes do § 4º enumera instalações de negócios
que não dispõem de autonomia suficiente para gerar rendimentos de forma
independente, tratando-se na verdade de locais onde são desenvolvidas
atividades meramente auxiliares da empresa sediada no exterior15.

Veja-se que a primeira e a segunda características revelam a


importância do elemento físico, material e tangível como critério
qualitativo de um estabelecimento permanente.

Por sua vez, o estabelecimento permanente pessoal está definido nos


§§ 5º e 6º do mesmo art. 5º, da Convenção Modelo da OCDE, segundo os
quais há estabelecimento permanente quando a empresa não residente
contrata um agente que, por força do contrato, detenha poderes especiais
de representação.

A principal característica do estabelecimento permanente pessoal,


portanto, é a existência – entre a empresa não residente e o agente – de um
vínculo contratual estável de representação, amplo o suficiente a ponto de
ser dispensável a presença física da empresa não residente no país da sede
do agente.

Assim, o estabelecimento permanente pessoal estará caracterizado


mesmo sem a existência de instalações materiais no país, desde que seja
possível concluir que a empresa não residente opera da mesma forma que
um residente local, mas por meio de um terceiro, detentor de amplos
poderes de representação, que o substitua para todos os efeitos comerciais.

A Convenção Modelo da OCDE prevê ainda a possibilidade de o agente


ou o representante atuar, em relação à empresa não residente, sob duas

51
formas distintas: a primeira, como agente dependente da empresa não
residente (§ 5º); e a segunda, como agente independente (§ 6º).

O agente dependente é aquele que efetivamente caracteriza o


estabelecimento permanente pessoal. É o representante da empresa não
residente que, em função dos poderes contratuais a ele outorgados, é
competente para operar em nome e por conta da empresa representada, e
exerce de fato esses poderes concluindo negócios e firmando contratos
com terceiros, relacionados com as atividades da empresa não residente, de
modo repetido e habitual16.

Já o agente independente, ainda que detenha plenos poderes de


representação, não pode ser caracterizado como um estabelecimento
permanente pessoal, conforme previsto no § 6º do art. 5º, se for
efetivamente independente, tanto jurídica como economicamente,
assumindo todos os riscos do desenvolvimento de sua atividade de
representação, e atuando no exercício regular das suas atividades sociais,
sem exclusividade e sem sujeição a orientações detalhadas da empresa não
residente.

Como se vê, do ponto de vista da tangibilidade, mencionada acima, o


estabelecimento permanente pessoal diferencia-se do material, na medida
em que não requer a presença física, embora requeira, para sua
configuração, um vínculo contratual de tal ordem que a presença física da
empresa não residente torne-se prescindível para viabilizar sua atuação no
país.

Para arrematar, cumpre dizer que, segundo o § 7º do art. 5º, da


Convenção Modelo, o fato de uma sociedade residente de um Estado
Contratante controlar ou ser controlada por uma sociedade que seja

52
residente do outro Estado Contratante, ou que exerça sua atividade nesse
outro Estado (quer por meio de um estabelecimento permanente quer de
outro modo), não é suficiente para fazer de qualquer dessas sociedades
estabelecimento permanente da outra17.

3. A TRIBUTAÇÃO DO ESTABELECIMENTO PERMANENTE NA


LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA BRASILEIRA

A legislação tributária brasileira não contém uma definição de


estabelecimento permanente18. No entanto, há normas isoladas prevendo a
incidência do imposto de renda em três hipóteses especiais que se
enquadram dentro do conceito de estabelecimento permanente visto no
tópico 3 deste estudo. São elas: (i) nos casos de funcionamento no país de
filiais, sucursais, agências ou representações de empresas estrangeiras; (ii)
nos casos de contrato de comissão ajustado entre comitente no exterior e
comissário no Brasil; e (iii) nos casos de venda direta no Brasil, realizada
por não residente, mas por intermédio de agente ou representante residente
ou domiciliado no país.

As filiais, sucursais, agências ou representações de pessoas jurídicas


domiciliadas no exterior são equiparadas às pessoas jurídicas sediadas no
país para efeitos de incidência do imposto de renda, conforme previsto no
inciso II do artigo 147 do Regulamento do Imposto de Renda de 1999
(Decreto n. 3.000, de 26 de março de 1999). A equiparação é aplicável
mesmo que a filial, a sucursal, a agência ou a representação não estiverem
formalmente registradas, nos termos do art. 146, § 1º, do mesmo
Regulamento19.

Isso quer dizer que os lucros auferidos pelas filiais, sucursais, agências
ou representações devem ser quantificados e tributados de acordo com as
mesmas regras aplicáveis às demais pessoas jurídicas sediadas no país.

53
A contabilidade deve ser escriturada regularmente, de acordo com a
legislação comercial e fiscal, espelhando exclusivamente as operações
desenvolvidas por elas próprias. Isso porque, sendo equiparadas a pessoas
jurídicas autônomas e independentes, somente as suas próprias mutações
patrimoniais é que devem ser objeto de registro. As operações realizadas
diretamente pela empresa estrangeira no país, portanto – sem a
participação das filiais, sucursais, agências ou representações –, não
integram os resultados por elas apurados.

Finalmente, todos os custos e despesas que possam ser diretamente


imputados às filiais, sucursais, agências ou representações, que tenham
sido por elas assumidos e que tenham sido devidamente incorridos, podem
ser deduzidos para fins de apuração do lucro tributável, na forma da
legislação vigente aplicável a todas as demais pessoas jurídicas, inclusive
as quotas de depreciação, amortização ou exaustão dos bens aqui situados,
além das provisões relativas às operações de suas dependências aqui
realizadas20.

O contrato de comissão está regulado pelos artigos 693 e seguintes do


Código Civil de 2002. Trata-se de contrato segundo o qual o comissário
adquire ou vende bens em seu próprio nome, mas por conta e ordem do
comitente. O vínculo jurídico no contrato de comissão, portanto, é
constituído diretamente entre o comissário e o terceiro interessado, sem
qualquer relação obrigacional entre este e o comitente. O comissário atua
em nome próprio, arcando com todos os direitos e obrigações decorrentes
da operação, para somente depois os direitos e deveres decorrentes do
negócio jurídico serem transferidos para o comitente no exterior.

O comissário não aufere lucro com o contrato de comissão, pois não há


diferença de preços na transferência da operação para o comitente. A

54
remuneração do comissário ajustada com o comitente, na verdade, é paga
sob a forma de comissões pela realização do negócio.

O rendimento auferido pelo comissário no Brasil não se confunde com


o lucro apurado pelo comitente no exterior. O primeiro será tributado
normalmente, seja ele pessoa física ou jurídica, sobre o valor das
comissões recebidas, pois se trata de um contribuinte residente ou
domiciliado no país, sujeito às regras de tributação previstas na legislação
aplicável. É permitida, na apuração da base de cálculo do imposto de
renda, a dedução dos gastos e das despesas necessárias à realização da
operação.

Já o comitente no exterior é equiparado à pessoa jurídica por força do


disposto no art. 147, III, do Regulamento do Imposto de Renda de 1999, e
deve oferecer à tributação os ganhos auferidos com as operações realizadas
por seus comissários no Brasil, de acordo com os seguintes critérios.

O lucro auferido pelo comitente no exterior – que remete mercadorias


em consignação a comissário, mandatário, representante ou agente no
Brasil, para que estes as vendam por sua conta e ordem – deve ser
calculado comparando-se o preço de venda da mercadoria no Brasil e o
valor relativo à sua importação, podendo ser deduzidas as despesas da
operação que correrem por conta do comitente no exterior, inclusive as
relativas à remuneração dos intermediários21.

O lucro assim apurado é submetido à tributação do imposto de renda


pelas alíquotas normalmente aplicáveis às pessoas jurídicas. Caso, no
entanto, não seja feita a apuração em separado dos lucros do comitente,
estes serão objeto de arbitramento, levado a efeito na forma prevista no art.
530, V, do Regulamento do Imposto de Renda de 1999.

55
Registre-se que o comissário deve lançar nos seus livros contábeis os
resultados das operações realizadas com o comitente no exterior de forma
segregada, separando adequadamente o seu próprio rendimento do lucro
do comitente.

Por fim, os lucros auferidos em função de vendas diretas – também


conhecidas como faturamento direto –, feitas pela empresa estrangeira,
mas por meio de agentes ou representantes no Brasil, são aqui submetidos
à tributação.

Esse regime de incidência do imposto ocorre somente no caso de o


agente ou representante ter poderes especiais de representação para atuar
em nome da empresa estrangeira, podendo vinculá-la para todos os fins de
direito na assunção dos direitos e de obrigações relativos à operação
ajustada, conforme determina o art. 539 do Regulamento do Imposto de
Renda de 1999.

Na hipótese de o agente ou representante desempenhar a função de


mero intermediário, aproximando as partes para posterior realização da
operação, ou atuar como coletor de pedidos ou propostas para
encaminhamento a empresa estrangeira ou mesmo desenvolver atividade
de mediação comercial, sem poderes para obrigar o vendedor do bem no
exterior, não há que se falar na tributação dos rendimentos da empresa não
residente.

O fato de o vendedor estrangeiro participar do capital social da empresa


que desempenhe as funções de agente ou representante no país não
autoriza, por si só, a presunção de que esta tenha poderes para obrigar
aquele. Nesse caso, somente por esse motivo, o lucro auferido pelo
residente no exterior não estaria sujeito à tributação no Brasil.

56
Como também não se justifica a aplicação desse regime de tributação
quando o agente ou representante no país eventualmente firmar contrato na
qualidade de procurador do vendedor não residente.

Estando presentes as condições vistas acima para a tributação do não


residente que realiza vendas diretas no Brasil, a base de cálculo do imposto
será sempre arbitrada, de acordo com os critérios de arbitramento previstos
no art. 532 do Regulamento do Imposto de Renda.

A partir das definições acima apresentadas, pode-se afirmar que há


compatibilidade entre a legislação brasileira e a Convenção Modelo da
OCDE no que tange ao conceito de estabelecimento permanente22.

Quer dizer: os conceitos de estabelecimento permanente material como


local fixo de negócios, que desenvolve uma atividade relacionada com a
matriz no exterior e que tenha capacidade independente de gerar negócios,
e de estabelecimento permanente pessoal, como o agente ou representante
dependente que tenha poderes para obrigar a empresa estrangeira na
contratação de operações com terceiros no Brasil, são compatíveis com a
legislação interna tributária brasileira.

Isso porque as filiais, sucursais, agências ou representações de que trata


o art. 147, II, do Regulamento do Imposto de Renda de 1999, enquadram-
se dentro do conceito de estabelecimento permanente material, como
instalação fixa de negócios. Por sua vez, os comissários como os agentes
ou representantes dependentes, com poderes para obrigar o vendedor
estrangeiro, enquadram-se igualmente dentro do conceito de
estabelecimento permanente pessoal.

57
Assim sendo, em matéria de caracterização do estabelecimento
permanente, nossa legislação apresenta adequação com os tratados
internacionais, embora não discipline o tema de forma idêntica ao disposto
do art. 7º da Convenção Modelo da OCDE23.

4. OS DESAFIOS DA ECONOMIA DIGITAL: A AÇÃO N. 1 DO BEPS

Dentre os principais objetivos da OCDE, traçados no projeto BEPS,


destacam-se as dificuldades inerentes à economia digital. A Ação n. 1 do
BEPS, dedicando-se a tratar dos desafios e das propostas de tributação na
era digital, apontou que a economia digital é assentada na utilização de
ativos intangíveis, no uso de dados (notadamente de dados pessoais) e na
adoção de múltiplos modelos de negócios, alguns deles envolvendo,
inclusive, produtos e serviços gratuitos, o que causa dificuldade na
identificação da jurisdição em que ocorre a criação de valor24.

Além disso, há que se salientar que os países com baixa tributação são
normalmente utilizados pelas empresas da economia digital para evitar ou
reduzir o pagamento de tributos aos países onde se desenvolvem as suas
atividades.

Assim, embora a baixa tributação, segundo a OCDE, não seja, por si só,
um indicador de defeitos no atual sistema, as especificidades da economia
digital exigem que se identifique como as empresas da economia digital
adicionam valor e geram seus lucros, determinando-se, assim, em que
medida é necessário adaptar as regras atuais para evitar a erosão da base
tributável e a realocação de lucros25.

Dado que na economia digital uma série de transações pode ser


realizada sem qualquer presença física, é facilmente constatável a
completa inadequação das regras atuais para a tributação de negócios dessa

58
natureza. Segundo a OCDE, o maior problema a ser enfrentado nesse caso
reside na definição de estabelecimento permanente. O conceito de
estabelecimento permanente, conforme demonstrado no tópico anterior,
abrangia – e continua a abranger – situações em que se verificava presença
física substancial no país da fonte, bem como situações em que o não
residente exercia negócios no país da fonte por meio de um agente
dependente. Mas, para a OCDE, como atualmente é possível estar
fortemente envolvido na vida econômica de outro país sem nele ter um
local fixo de negócios ou um agente dependente, a definição de
estabelecimento permanente traçada na Convenção Modelo tornou-se
inadequada para atingir os objetivos que dela eram esperados26.

Outra questão que se apresenta na economia digital, conforme relata a


OCDE, está relacionada à enumeração negativa de atividades que, por
presunção convencional, não configuram um estabelecimento permanente.
De fato, nas transações da era digital, faz-se necessário identificar se certas
atividades anteriormente consideradas preparatórias ou auxiliares (e,
portanto, beneficiadas pelas exceções à definição de estabelecimento
permanente), sendo componentes cada vez mais importantes das empresas
na economia digital, devem ser consideradas como suficientes para
autorizar a tributação pelo Estado da fonte, ou seja, para qualificar a
presença de um estabelecimento permanente. Assim, por exemplo, se a
proximidade com os clientes e, também, a necessidade de entrega rápida
dos produtos comercializados representarem componentes essenciais do
modelo comercial de um vendedor online, a manutenção de um armazém
local poderá constituir uma atividade central deste vendedor27, não
podendo ser qualificada como preparatória ou auxiliar, para os efeitos da
lista negativa contida no art. 7º da Convenção Modelo da OCDE.

59
Conforme dão conta os relatos da OCDE acima mencionados, sem
dúvida alguma, uma das principais discussões apresentadas durante os
trabalhos relativos à Ação n. 1 diz respeito à conceituação de
estabelecimento permanente. Seria necessária uma revisão desse conceito,
notadamente do estabelecimento permanente material, de modo a
eliminar, nas transações da economia digital, a noção de tangibilidade, ou
de presença física, vista no tópico anterior? Mais ainda, não seria
necessária uma revisão ou adaptação do princípio da fonte?

Essa realidade – é fácil perceber – levanta debates em torno da


dicotomia entre fonte e residência.

Várias foram as discussões do projeto BEPS visando contornar os


problemas inerentes à economia digital. Aliás, todas as ações do projeto
BEPS interconectam-se e interagem umas com as outras no tocante aos
desafios inerentes à economia digital28. Contudo nenhuma das proposições
debatidas na Ação n. 1 do BEPS acabou recomendada no relatório final da
OCDE, o que se justifica não apenas pelas dificuldades que o tema
apresenta, mas, sobretudo, pela falta de consenso entre os países sobre
como endereçar estas dificuldades29. Seja como for, para os fins deste
estudo, cabe avaliarmos, de forma breve, cada uma das proposições
debatidas durante os trabalhos relativos à Ação n. 1 em matéria de tributos
diretos, inclusive as proposições relativas à reformulação do conceito de
estabelecimento permanente, como seja:

•Alterar as exclusões contidas no § 4º do art. 5º da Convenção Modelo. Isto


porque algumas das atividades descritas nas alíneas “a” a “d” do § 4º, que
eram preparatórias ou auxiliares no contexto de outros modelos de negócios,
como descrito e exemplificado acima, podem ter se tornado funções essenciais
de certos negócios. Uma possível opção, de acordo com a OCDE, seria
eliminar o § 4º inteiramente. Outras opções seriam eliminar as alíneas “a” a
“d”, ou tornar sua aplicação sujeita à identificação de que a atividade realizada

60
é de natureza preparatória ou auxiliar, não constituindo elemento principal ou
central do negócio desenvolvido. Outra sugestão seria eliminar a palavra
“entrega” do art. 5º, § 4º, alíneas “a” e “b”, de sorte a excluir desses parágrafos
certos tipos de armazéns30.
•Novo nexo para a qualificação do estabelecimento permanente, baseado na
presença digital significativa. O objetivo seria estabelecer um nexo
alternativo para abordar situações em que certas atividades comerciais são
realizadas de forma totalmente digital. Sob essa proposta, poderia ser
qualificada a existência de um estabelecimento permanente em outro país
quando uma empresa envolvida em certas “atividades digitais totalmente
desmaterializadas” mantivesse “presença digital significativa” na economia de
outro país. Nesse caso, haveria estabelecimento permanente somente se
verificadas certas condições, como, por exemplo, nas hipóteses de: (i) o
desempenho da atividade principal requerer, integral ou substancialmente, o
uso de bens digitais ou de serviços digitais; (ii) nenhum elemento físico e
nenhuma atividade envolver a criação de bens e serviços e sua entrega; (iii) os
contratos geralmente serem concluídos remotamente via internet ou por
telefone; (iv) os pagamentos serem feitos unicamente por intermédio de
cartões de crédito ou outros meios de pagamentos eletrônicos, utilizando-se de
formas ou plataformas online ligadas ou integradas aos respectivos websites;
etc.31.
•Conceito de estabelecimento permanente baseado em “presença
significativa”. De acordo com esta proposta, passaria a ser realizado um teste
de “presença significativa” para caracterizar o estabelecimento permanente,
destinado a responder à mudança da natureza das relações com clientes na
economia digital, continuando a depender, em parte, da presença física. Este
teste pretende apurar, segundo a OCDE, a contribuição das relações com o
cliente para a agregação de valor. Os critérios para esse teste seriam: (i)
relacionamentos com clientes ou usuários que se estendem ao longo de seis
meses, combinados com alguma presença física no país, diretamente ou por
meio de um agente dependente; (ii) venda de bens ou serviços por meio do
envolvimento com clientes no país, incluindo (a) website redigido em língua
local; (b) entrega feita por fornecedores na jurisdição; (c) uso de serviços
bancários e outras instalações de fornecedores no país; ou (d) fornecimento de
bens ou serviços provenientes de fornecedores no país; (iii) fornecimento de
bens ou serviços a clientes do país envolvendo o uso de dados ou
contribuições de conteúdo de pessoas no país32.
•Instituição de imposto na fonte sobre transações digitais em determinados
pagamentos relacionados à aquisição de bens ou serviços. Para tornar esta
opção viável, especialmente nas transações envolvendo consumidores pessoas
físicas, as instituições financeiras teriam responsabilidade pela retenção do
tributo na fonte. Esta modalidade de tributação existiria independentemente de
qualquer modificação no conceito de estabelecimento permanente.
Alternativamente, o imposto poderia ser utilizado como ferramenta primária

61
de execução de novos padrões relacionados ao nexo necessário e suficiente
para a qualificação do estabelecimento permanente. Sendo este o caso, a
empresa não residente asseguraria a tributação em uma base líquida33, como
requer, por exemplo, o art. 7º da Convenção Modelo da OCDE.
•Instituição de um “Bit tax”. Neste caso, a tributação recairia sobre o uso da
banda larga dos sites. Tal imposto seria baseado no número de “bytes”
utilizados pelo site34.

As proposições da OCDE relacionadas à redefinição do conceito de


estabelecimento permanente carregam uma grande dificuldade de
aplicação, quer porque demandam uma adaptação coordenada das
legislações domésticas35 – e não apenas dos tratados –, quer porque
exigem um esforço do Estado da fonte para identificar a presença dos
critérios necessários à qualificação do estabelecimento permanente na
economia digital36. Esses fatores, por si só, comprometiam o sucesso das
aludidas proposições.

No mais, outro inconveniente dessas proposições é a falta de


reconhecimento de que os intangíveis e o comércio eletrônico exigem um
tratamento apropriado e diferenciado, não sendo suficiente a utilização de
antigos conceitos para tentar defini-los e enquadrá-los. Quer dizer: a
presença física, no contexto dessas transações, não pode ser o único
elemento para definir a competência do Estado da fonte37. É necessário
que se reconheça que o conceito de estabelecimento permanente do art. 5º
é inadequado e obsoleto para resolver os desafios da economia digital.

Diante dessas dificuldades, não é de se estranhar que as propostas de


ajuste ou redefinição do conceito de estabelecimento permanente não
tenham prosperado.

Na Convenção Multilateral dedicada a implementar, em tratados


bilaterais, medidas que previnam a erosão da base tributável e a realocação

62
de lucros, proposta pela OCDE, em conformidade com a Ação n. 15 do
BEPS, não foram adotadas, em sua inteireza e de forma suficiente, as
propostas relativas à readequação do conceito de estabelecimento
permanente para se ajustar à economia digital. Alterações foram feitas
nesse conceito, mas não de modo a reescrevê-lo ou redefini-lo. Tais
alterações tiveram como finalidade, apenas, evitar abusos praticados pelas
partes com o propósito de impedir a caracterização do estabelecimento
permanente, em linha com as sugestões da Ação n. 7 do BEPS (Preventing
the Artificial Avoidance of Permanent Status). Foram feitas modificações:
(i) nos contratos de comissão ou estratégias similares; (ii) na utilização das
isenções previstas para atividades específicas; e (iii) na divisão de
contratos entre diferentes contribuintes, ocorrida em situações concretas
para evitar o período de tempo exigido para a caracterização do
estabelecimento permanente no Estado da fonte38.

É bem verdade que, em relação ao item (ii), acima citado, o art. 13 da


Convenção Multilateral abordou a alteração da lista de atividades
auxiliares ou preparatórias, restringindo o alcance do art. 5º, § 4º, da
Convenção Modelo da OCDE, já que este dispositivo, ao trazer uma lista
negativa de atividades que, por presunção convencional, não configuram
um estabelecimento permanente, acabou permitindo a realização de
planejamentos tributários por (i) empresas que vendem produtos pela
internet, mas que precisam manter o estoque físico de produtos em
jurisdições estratégicas, para que a entrega ocorra em tempo hábil; ou (ii)
empresas que atuam ostensivamente na coleta de informações.

No entanto, como se nota, ainda que parte das alterações no conceito de


estabelecimento permanente abranja transações relacionadas à economia
digital, é certo que a Convenção Multilateral apenas se propôs a prevenir

63
algumas práticas abusivas, estando longe de resolver os inúmeros
problemas advindos da era digital.

Não à toa, diversos estudiosos passaram a sugerir propostas


alternativas, algumas delas não apresentadas na Ação n. 1, outras
decorrentes de uma abordagem evolutiva das proposições da OCDE na
referida ação. Assim, por exemplo:

•Yariv Brauner, referindo-se a sugestão anterior de Reuven Avi-Yonah39,


propôs uma tributação por “formulário” (formulary taxation)40, pela qual uma
porção do lucro tributável seria alocada a cada empresa do grupo em
conformidade com fórmula destinada a avaliar a contribuição econômica de
cada uma delas para a geração do lucro. Contudo esta solução requereria
coordenação – e desejo – dos países para adaptarem suas normas internas,
inclusive contábeis, revelando-se, assim, dificílima a sua implementação41;
•Alan Auerbach, Michael P. Devereux, Michael Keen e John Vella propuseram
critério conhecido por destination-based cash flow tax, pelo qual a renda das
pessoas jurídicas deve ser tributada com base no princípio do destino, de tal
modo que: (i) todas as despesas sejam dedutíveis de forma imediata (cash
flow), eliminando-se normas complexas a respeito de depreciação e espécies
de ativos; (ii) todas as exportações não sejam tributadas e (iii) todas as
importações sejam tributadas (destination-based). Uma das razões para este
regime, segundo os autores, consiste em concentrar a tributação no local em
que se situa o mercado consumidor. Contudo, como apontado pelos próprios
autores, o maior desafio dessa medida é sua implementação, pois seriam
necessárias mudanças significativas de conceitos e paradigmas da tributação
das pessoas jurídicas42;
•Peter Hongler e Pasquale Pistone afirmaram que, como a economia digital
permite a venda de bens e serviços sem presença física do vendedor ou do
prestador, a solução para os problemas atrelados à tributação desses negócios
seria uma nova e moderna dimensão do princípio da fonte que justificasse o
exercício do direito de tributar pelo Estado em que se situar o mercado a que
se referem os rendimentos oriundos de negócios digitais43. Por isso, os autores
sugeriram a criação de novas regras que delimitem a competência tributária no
cenário internacional, notadamente a criação de um novo conceito de
estabelecimento permanente, e não apenas a adaptação das regras atuais. Esse
conceito estaria lastreado, essencialmente, na identificação do mercado
consumidor no Estado da fonte, e não mais na ideia da utilização, por um ou
mais indivíduos, de fatores de produção para a geração da riqueza tributável44.
A solução, a todo rigor, atende ao pleito dos Estados de fonte cujo mercado
consumidor é acessado pelas entidades que atuam na economia digital. No

64
entanto, o novo conceito proposto pelos autores traz dificuldades de ordem
prática relacionadas à identificação dos requisitos necessários à qualificação
do estabelecimento permanente; e
•Yariv Brauner e Andrés Baez propuseram a instituição de um imposto de renda
na fonte, e não a remodelação do conceito de estabelecimento permanente,
dadas as dificuldades para a criação de um novo conceito. Conquanto os
autores tenham reconhecido que a solução não é suficiente para resolver todos
os problemas da economia digital, ainda assim ela se apresenta como uma
abordagem pragmática, simples e que carrega em si certeza, preferível à
solução incompleta vivida na atualidade45.

Essas breves colocações evidenciam que, não obstante os esforços da


Ação n. 1 do BEPS, os problemas da economia digital permanecem sem
solução, sendo duvidosos os próximos passos para o equacionamento
desses problemas.

5. ESTABELECIMENTO PERMANENTE NO BRASIL: NOVOS RUMOS


NA ECONOMIA DIGITAL?

Como visto no tópico 3 deste estudo, no que diz respeito


especificamente ao conceito de estabelecimento permanente, há uma
compatibilidade conceitual entre a legislação tributária brasileira e a
Convenção Modelo da OCDE. Por decorrência lógica desta afirmação, não
há dúvidas de que o Brasil não endereça, em sua legislação sobre a
tributação do estabelecimento permanente, de forma específica, os temas
relacionados à tributação na economia digital, não havendo sequer sinais
de que isso venha a ocorrer em um curto ou médio prazo46.

Prova disso é que, ao assinar, em 21 de julho de 2017, o Protocolo de


emenda à convenção entre a República Federativa do Brasil e a República
Argentina destinada a evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal
em matéria de impostos sobre a renda, o Brasil não acolheu nenhuma das
proposições atinentes à reformulação do conceito de estabelecimento
permanente, debatidas durante os trabalhos relacionados à Ação n. 1 do

65
BEPS. Timidamente, o protocolo adotou apenas parte das sugestões
contidas no texto da Convenção Multilateral da OCDE – a qual, como
visto no tópico 3, também não abordou convenientemente a problemática
da economia digital.

Não é de estranhar que o Brasil tenha caminhado nessa direção.


Diversas propostas apresentadas pela OCDE no projeto BEPS não são
atraentes à política fiscal brasileira. No mais, o Brasil, na esteira de outros
países em desenvolvimento, privilegiou – e continua a privilegiar –
exclusivamente a tributação baseada na incidência na fonte, mesmo
quando não qualificada a presença de um estabelecimento permanente.
Tanto é assim que a renda proveniente da prestação de serviços por não
residente, de maneira geral, é tributada pelo nosso País na fonte.

A vocação do Brasil para a tributação na fonte da renda oriunda da


prestação de serviços e, em especial, a tendência do fisco brasileiro de
tentar exercer sua “soberania tributária” nesta seara podem ser
identificadas mesmo nos casos em que há acordo celebrado pelo Brasil
com outros países para evitar a dupla tributação da renda.

Com efeito, o exercício da competência tributária brasileira,


independentemente da presença de um estabelecimento permanente em
território nacional, tem sido baseado no artigo 12 (royalties) dos tratados
celebrados pelo Brasil para evitar a dupla tributação.

Sobre o tema, o Ato Declaratório Interpretativo RFB n. 5, de 2014,


consolidou o entendimento do Parecer PGFN/CAT n. 2.363, de 2013, no
sentido de que a remuneração do serviço técnico ou de assistência técnica
poderá ser classificada no artigo 12 (royalties), na hipótese de existir
equiparação dos serviços técnicos aos royalties no respectivo protocolo. A

66
redação do ato é abrangente, de modo que ele inclui, também, os contratos
que não envolvam transferência de tecnologia. O mesmo ato determina
que a tributação será regida pelo artigo que trata de profissões
independentes ou de serviços profissionais ou pessoais independentes –
correspondente ao antigo artigo 14 da Convenção Modelo da OCDE –, nos
casos da prestação de serviços técnicos e de assistência técnica
relacionados com a qualificação técnica de uma pessoa ou grupo de
pessoas. Não se enquadrando em nenhuma das hipóteses anteriores, as
remessas para pagamento de serviços técnicos ficam sujeitas ao art. 7º dos
acordos internacionais de bitributação (lucro das empresas), que seguem a
redação da Convenção Modelo da OCDE, e não ao art. 21 dos tratados
(outros rendimentos) – que tem caráter residual e específico.

A despeito de eventuais críticas à abrangência da tributação na fonte


sobre serviços técnicos que não envolvam a transferência de tecnologia47,
conferida pelo citado Ato Declaratório n. 5, o fato é que a Receita Federal,
nesse particular, evoluiu no tratamento da matéria, pois revogou o
antecessor Ato Declaratório Normativo COSIT n. 1, de 2000, que
determinava, indistintamente, e de forma equivocada, a tributação das
remessas a título de remuneração pela prestação de serviços técnicos sem
transferência de tecnologia com fundamento no artigo 21 (outros
rendimentos).

Sem adentrar nos debates sobre os equívocos de intepretação do Ato


Declaratório Normativo COSIT n. 1, o que se pode afirmar é que, havendo
equiparação a royalty no protocolo, o Brasil adota a postura de tributar os
serviços técnicos, mesmo que não se verifique transferência de tecnologia,
e independentemente da configuração de um estabelecimento permanente
no País.

67
Outros países em desenvolvimento, à semelhança do Brasil, incluem
disposições especiais em seus tratados autorizando a tributação de serviços
técnicos no Estado na fonte, ainda que não se configure um
estabelecimento permanente. Essa postura revela uma tendência recente e
consistente, em tratados internacionais, de expandir os direitos do Estado
da fonte de exercer sua competência tributária, ao menos em matéria de
tributação da renda proveniente de serviços48.

Em resumo, não se vê, no Brasil, qualquer intenção ou tendência em


modificar as normas internas atuais que albergam a configuração de um
estabelecimento permanente, mesmo diante dos desafios que se
apresentam na economia digital. Isto se explica, fundamentalmente, pela
preferência do nosso país em tributar a renda do não residente na fonte –
esta, aliás, uma das soluções apresentadas durante os trabalhos
relacionados à Ação n. 1 do BEPS, adaptada e sugerida em estudo
apresentado por Yariv Brauner e Andrés Baez, em nome da segurança
jurídica e da praticabilidade.

6. CONCLUSÃO

Há vasta produção doutrinária estrangeira sobre os problemas


envolvendo a caracterização ou não de um estabelecimento permanente no
país da fonte. E é enorme a jurisprudência dos países desenvolvidos que
tratam sobre o assunto. A matéria, portanto, da forma como foi concebida
nos tratados que seguem a Convenção Modelo da OCDE, é complexa e de
difícil aplicação, o que é facilmente demonstrável pelo tempo dedicado ao
seu exame pela doutrina e pelos tribunais internacionais.

Além disso, esse regime de tributação baseado em conceitos antigos –


como a localização física da empresa – perdeu sentido diante da forma

68
como as atividades econômicas se desenvolvem na era da economia
digital. Em resumo, trata-se de legislação anacrônica, que exige urgente
renovação.

O Brasil, desde sempre, abriu mão da busca pela tributação dos lucros
auferidos por estabelecimentos permanentes aqui localizados. E direcionou
sua pretensão tributária à incidência na fonte sobre as remessas ao exterior
como remuneração pela prestação de serviços. Essa política era justificada
pela dificuldade de tributação dos lucros auferidos por estabelecimentos
permanentes no Brasil. E em termos práticos, fazia mais sentido tributar na
fonte a importação de serviços do que controlar o lucro auferido por
estabelecimentos permanentes no país.

Hoje em dia, em que o conceito de estabelecimento permanente como


local fixo de negócios tornou-se ultrapassado, o mundo se volta para a
tributação na fonte da renda auferida com a economia digital, exigida pelo
país onde se localiza o mercado consumidor dos produtos ofertados.
Exatamente como o Brasil sempre fez.

Se no passado, portanto, alguma crítica poderia ser feita à política fiscal


brasileira, hoje em dia nada há a reparar, pois a maneira mais prática,
simples e fácil de tributar a economia digital é mediante a exigência do
imposto retido na fonte sobre a remuneração percebida pelos seus
integrantes.

69
A tributação de IRRF na importação de cloud
computing no Brasil e as soluções analisadas
na Ação 1 do BEPS
João Dácio Rolim49 e Daniela Silveira Lara50

1. INTRODUÇÃO

A evolução dos negócios em plataformas digitais tem se tornado um


dos maiores problemas da tributação internacional, tendo em vista que as
regras tradicionais são de difícil aplicação para os negócios virtuais.

Isso ocorre, em grande medida, pois as empresas de tecnologia não


precisam estar fisicamente estabelecidas nos países consumidores de suas
atividades, o que tem gerado uma distorção da tributação entre os países de
residência e de fonte da renda. Essa nova forma virtual de transacionar
bens e serviços pode ter como consequência a dupla tributação entre países
ou permitir algumas formas de planejamento tributário em que há a dupla
não tributação, como o da “stateless income”51, o que vem preocupando os
governos dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, com a
consequente tomada de ações pela Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico (OCDE) em conjunto com as maiores
economias do mundo (G-20).

O avanço da tecnologia e a dificuldade de aplicação das regras


existentes de tributação internacional são bem representados pelo modelo
de cloud computing, em que o usuário acessa todos os serviços de software
pela internet, sem precisar ter infraestrutura física própria. Nesse tipo de
negócio, o provedor do serviço de cloud computing pode estar estabelecido
em qualquer país, não necessitando possuir estabelecimento no país fonte

70
da renda. Dessa forma, o elemento de conexão para a tributação
internacional definido pelo conceito de estabelecimento permanente do
atual modelo OCDE acaba por ser ineficiente para a justa alocação da
jurisdição tributária na Economia Digital.

Sendo assim, o presente artigo busca analisar, inicialmente, os pontos


principais que nortearam a análise dos desafios impostos pela Economia
Digital no âmbito da OCDE no que tange ao Plano de Ação para o
Combate à Erosão da Base Tributária e à Transferência de Lucros (BEPS –
Base Erosion and Profit Shifting Project).

Em seguida, será analisada a formatação da importação das atividades


de cloud computing, em especial do Software as a Service – SaaS, para,
depois, verificar como o Brasil vem enfrentando esse problema da
tributação de IRRF e CIDE, principalmente por ser um país mais
consumidor dessa tecnologia de outras jurisdições. Nesse ponto, será
analisado o posicionamento mais recente da Receita Federal do Brasil no
que tange a essa atividade, sendo traçado, ao final, um paralelo com as
soluções identificadas pela OCDE no âmbito do BEPS para a Economia
Digital.

2. PANORAMA GERAL DO BEPS EM RELAÇÃO AOS DESAFIOS DA


ECONOMIA DIGITAL

Em razão do processo de globalização que evoluiu com o incremento


das transações comerciais, tecnológicas e de pessoas e empresas entre
países, foi necessário adequar as regras de tributação internacional de
forma a garantir a eficiência do sistema fiscal para fomentar o crescimento
econômico e a interação entre os povos: o direito tributário internacional é,
portanto, o pilar que suporta o crescimento da economia global52.

71
Ao analisar de forma mais detida o texto da Convenção Modelo da
OCDE de acordos para evitar a dupla tributação, verifica-se que houve
uma tendência em priorizar a receita tributária no “Estado de Residência”
do fornecedor de serviços e de capital (passive income referente a
dividendos, juros e royalties), ou seja, nos países desenvolvidos e
exportadores de capital, em detrimento do “Estado Fonte” da renda,
normalmente, países em desenvolvimento, importadores de capital. Isso se
verifica pela regra geral de tributação dos lucros das empresas no Estado
de Residência do fornecedor, com a exceção para a tributação no Estado
Fonte da renda apenas quando o fornecedor possuir estabelecimento
permanente em seu território, elemento de conexão de exceção à regra
geral.

Por outro lado, a aplicação dos tratados contra dupla tributação fez com
que grandes conglomerados empresariais multinacionais passassem a
formatar novos negócios transnacionais e desenvolver planejamentos
tributários menos conservadores.

Além disso, a evolução da Economia Digital permitiu que as empresas


que desenvolvem negócios virtuais de bens intangíveis pudessem ter seus
estabelecimentos em jurisdições de baixa tributação sem qualquer
elemento de conexão com o Estado fonte da renda de sua atividade. Isso
abriu caminho, portanto, para a erosão da base tributária e para a
transferência de lucros para países com baixa tributação, em que o modelo
atual contra a dupla tributação, por estar defasado, acabou por resultar em
casos de stateless income e de dupla não tributação, externalidade negativa
que passa a ser de importância vital para os países que perderam suas
receitas tributárias.

72
Dessa forma, com a justificativa de melhoria da justiça fiscal, os países
do G20 requereram um estudo pela OCDE com a análise das causas e a
propositura de ações para combater a erosão da base tributária e a
transferência de lucros das empresas multinacionais para jurisdições com
baixa tributação da renda.

Assim surgiu, em 2013, o Plano BEPS – Base Erosion and Profit


Shifting Action Plan53, elaborado pela OCDE para os países do G20, em
que são traçados quinze planos de ação54, além do calendário com o
agendamento das tarefas e metodologia de trabalho, sendo, posteriormente,
ao longo de 2015, publicados relatórios específicos de análise e
recomendação de ação dos planos.

De forma geral, o plano de ação da OCDE é baseado em três pilares


para alcançar os objetivos do BEPS de evitar a erosão da base tributária e a
transferência de lucros das empresas multinacionais, quais sejam:
coerência na tributação internacional da renda das empresas
multinacionais; substância das operações empresariais para buscar
neutralidade e evitar planejamentos baseados apenas em redução fiscal; e
transparência tanto para as autoridades fiscais das jurisdições envolvidas
em relação às operações, quanto para os contribuintes que envolvam
segurança e previsibilidade para tomada de decisões. O intuito final é a
adequação das regras internas e internacionais de tributação para evitar a
dupla tributação ou a não dupla tributação nos negócios transnacionais,
ambas situações indesejadas para o desenvolvimento econômico dos
países.

Nesse contexto, diante da maior facilidade em empresas ligadas à


Economia Digital para a erosão tributária e transferência de lucros para
jurisdições com baixa tributação, foi criada uma Ação específica com o

73
intuito de abordar esses desafios na tributação internacional dessa
atividade.

Essa é a Ação 1 do BEPS que visa identificar a necessidade de


adaptação das regras tributárias nacionais e internacionais para impedir a
erosão da base tributária e a transferência de lucros das atividades das
empresas da Economia Digital para países com baixa tributação da renda.
Essa análise levou em consideração os diversos modelos de negócios do
setor de tecnologia para melhor qualificar seus rendimentos e a relação
dessas empresas com os países fonte da renda, tendo em vista que não há
necessidade de sua presença física no Estado consumidor de suas
atividades.

Em 2015, foi publicado pela OCDE o relatório final com as conclusões


do estudo da Ação 1, sendo a principal conclusão no sentido de que não é
possível criar regras específicas de tributação internacional para a
Economia Digital por estar se transformando na própria economia. Assim,
a separação da regra tributária poderia levar a uma divisão arbitrária entre
o que é ou não Economia Digital. No entanto, o relatório ressaltou que é
necessário o monitoramento da evolução da Economia Digital que pode
criar novos desafios para a tributação (internet das coisas, bitcoins etc.),
sendo suas características de mobilidade, volatilidade, dependência de
dados, diversos modelos de negócios multilaterais e tendência ao
monopólio e oligopólio, relevantes para a perspectiva tributária
internacional.

Com relação ao principal problema identificado na tributação


internacional da Economia Digital, qual seja, da dificuldade em determinar
onde há geração de valor agregado e onde são desenvolvidas as atividades
desse setor para se estabelecer o elemento de conexão para a competência

74
tributária, o relatório final apenas reconheceu que essa crescente
desnecessidade de presença física para o desenvolvimento dessas
atividades tem o condão de questionar se as regras baseadas no
estabelecimento permanente, dotado de presença física ou econômica,
permanecem adequadas.

Vale destacar, ainda, que a discussão sobre o elemento de conexão para


tributação da Economia Digital é o ponto fulcral para se definir a
adequação da jurisdição tributária dessa atividade no âmbito da Convenção
Modelo da OCDE. No entanto, o relatório final da Ação 1 apenas
esclareceu que a definição do estabelecimento permanente está sendo
tratada na Ação 7 (Preventing the Artificial Avoidance of Permanent
Establishment Status), no sentido de alterá-lo no contexto do art. 5º da
Convenção Modelo da OCDE, para que não sejam utilizadas suas
exceções como forma a evitar a tributação no país fonte da renda, por
exemplo no caso de fragmentação de atividades auxiliares, como de
logística e armazenamento de bens vendidos eletronicamente.

Ou seja, a dificuldade na tributação da Economia Digital permanece


mesmo após as conclusões da Ação 1 do BEPS, pois suas atividades se
baseiam apenas na presença digital no Estado consumidor, podendo
continuar a ter seus estabelecimentos em países de baixa tributação da
renda, não sendo tributada no Estado fonte da renda.

Essa discussão é mais ampla e passa pela adequação da justiça fiscal


entre os países desenvolvidos (membros da OCDE e que, portanto,
pretendem priorizar a tributação no Estado de Residência) e os países em
desenvolvimento (que tentam proteger a tributação da riqueza gerada em
seu território, Estado Fonte da renda). A própria justificativa de a
preponderância do critério da residência se justificar pela capacidade

75
contributiva se tornou ainda mais questionável pela troca de informações,
a pedido e automática, entre os países. Por outro lado, a justificativa da
preponderância para o país da fonte (ou seja, o princípio do benefício
proporcionado pelo país da fonte) ainda continua válida.

Entretanto, pela análise detida do Plano de Ação 1 do BEPS, pode-se


inferir que a preocupação da OCDE se volta à erosão da base tributária e
transferência de lucro para países de baixa tributação, deixando de lado, a
priori, o tema da justa alocação da renda tributária entre os países. Este
último aspecto, aliás, para ter efeito, principalmente na Economia Digital,
necessitaria de uma alteração do elemento de conexão da tributação, mais
vinculada à presença digital em seu território e não apenas à presença
física.

Nesse ponto, Schoueri55 alertou que a questão mais importante a ser


analisada, no que tange à tributação da Economia Digital, seria, realmente,
a “alocação da jurisdição entre os Estados, sendo notória a ausência de
comunhão de interesses entre os membros do G20. Diante da disputa pelo
poder de tributar, para o autor, os Estados deveriam negociar quais seriam
os novos elementos de conexão, aptos a garantir ao Estado da Fonte sua
parcela de jurisdição sobre a Economia Digital”.

Vale relatar que Brauner e Baez56, ao estudarem alternativas para os


desafios da tributação da Economia Digital, criticaram a Ação 1 do BEPS
exatamente por entenderem que a evolução tecnológica nos negócios
internacionais que ocorre cada vez mais no ambiente virtual, torna
anacrônica a exigência da presença física para a definição da jurisdição
tributária.

76
Nesse trabalho, os autores mencionaram o estudo da força-tarefa do
IBFD elaborada por Hongler e Pistone57, que sustentaram a alteração do
elemento de conexão para a definição da jurisdição tributária no caso da
Economia Digital para a presença digital.

Segundo entendemos, assim como a jurisprudência da Suprema Corte


americana evoluiu do critério de conexão referente ao interstate commerce
pela venda de produtos e serviços pela internet, no plano internacional ao
menos um approach similar poderia ser adotado58.

Brauner e Baez59 defenderam, ainda, uma alternativa complementar, de


possibilitar a tributação no Estado consumidor pelo imposto de renda
retido na fonte na remessa ao exterior para pagamento da atividade
desenvolvida sem presença física, mas com presença digital em seu
território.

A menor importância dada pelo BEPS para a justiça na alocação da


tributação para o Estado Fonte no caso da Economia Digital contrasta com
a própria necessidade de evitar que essas empresas se instalem em países
de reduzida tributação da renda e do próprio planejamento que culmina na
stateless income ou na não dupla tributação.

O relatório final da Ação 1, portanto, reconheceu que a Economia


Digital tem desafios próprios para o BEPS avaliando algumas propostas
específicas para tratar do problema, como: (i) inclusão da presença digital
no conceito de estabelecimento permanente como elemento de conexão
para tributação no Estado Fonte, (ii) cobrança de imposto de renda na
fonte para certos tipos de transações digitais; e (iii) introdução de um
tributo de equalização para garantir a tributação no país fonte da renda.
Entretanto, ao final, o relatório não recomendou a adoção dessas ações, por

77
entender que as medidas desenvolvidas no âmbito geral do BEPS teriam
impacto também na própria Economia Digital60.

Assim, pelo menos até a implementação das ações gerais do BEPS, seja
pelo acordo multilateral previsto na Ação 15, seja por alterações na
Convenção Modelo da OCDE para os tratados para evitar dupla tributação,
ou mesmo por alterações bilaterais dos tratados assinados pelo Brasil,
devemos analisar a tributação da Economia Digital de acordo com as
regras nacionais e os tratados atualmente existentes. É necessário, também,
acompanhar a evolução das tratativas do BEPS, principalmente no que
tange ao conceito de estabelecimento permanente e suas consequências
para a tributação nos países fonte da renda, como o Brasil.

Por fim, vale mencionar, que a Ação 1 analisou, em seu capítulo 4, os


novos modelos de negócio da Economia Digital, como comércio
eletrônico, meios de pagamento, e o cloud computing, dentre outros. No
próximo capítulo será discutida a forma de contratação do cloud
computing de fornecedores estabelecidos em outros países, para, em
seguida, verificar as dificuldades para a tributação na importação dessa
atividade, em especial, do Software as a Service – SaaS.

3. A CONTRATAÇÃO DO CLOUD COMPUTING DE FORNECEDORES


ESTABELECIDOS EM OUTROS PAÍSES

As operações da Economia Digital, que antigamente eram mais


centralizadas nas transações com software, feitas inicialmente por suporte
físico e depois por download, mais recentemente, passaram a ter novas
formatações como: o comércio eletrônico, o cloud computing, a internet
das coisas (IoT), a impressão 3D, os bitcoins, dentre outros. Essas novas
operações revolucionaram as relações entre fornecedores e consumidores,

78
sendo um grande desafio para as autoridades fiscais que utilizam
legislação obsoleta para tributar essas inovações tecnológicas.

Lembramos que o software é entendido, no Brasil, como propriedade


intelectual, bem móvel intangível, protegido pelos direitos autorais61 (Art.
2º da Lei n. 9.609/98 e art. 7º, XII da Lei n. 9.610/98), sendo sua
comercialização efetuada por contratos de licença de uso, de
comercialização ou de transferência de tecnologia (Lei n. 9.609/98, arts. 9º
a 11).

A classificação da natureza jurídica do software, inclusive para fins


tributários, foi decidida pelo STF, em 1998, quando do julgamento do RE
n. 176.62662, em que foi dividido nas seguintes categorias: (i) software
standard ou de prateleira que são os programas de computador
produzidos em série e comercializados no varejo, materializados por um
suporte físico, sendo classificados como “mercadorias” com incidência do
ICMS; (ii) software customizado que é um programa de computador base
que sofre alterações para atender demandas específicas do cliente e, por
isso, considerado como “prestação de serviço”, por conter uma “obrigação
de fazer” mais específica do que a “obrigação de dar”; e (iii) software por
encomenda, programa de computador desenvolvido para atender as
necessidades especiais do usuário, também entendido como de natureza de
“prestação de serviços” com a incidência do ISS para o STF.

Posteriormente, em 2010, o STF julgou a cautelar na ADIN n.


1.945/MT63 entendendo, de forma preliminar, que a aquisição do software
comercializado sem suporte físico, mas por download, ou transferência
eletrônica, não modificaria a sua natureza jurídica de mercadoria e,
portanto, com a incidência do ICMS.

79
Com a evolução da tecnologia, verificamos outras formas de
contratação de bens digitais, como o cloud computing, foco deste trabalho.

Ruparella explicou que a melhor definição de cloud computing é dada


pela agência de tecnologia do Departamento de Comércio dos Estados
Unidos, a National Institute of Standards and Technology (NIST), que
considerou cinco características essenciais para essa atividade: (i) amplo
acesso à rede ou possibilidade de consumo em qualquer lugar; (ii)
consumo do serviço de acordo com a demanda do usuário; (iii) pool de
recursos de infraestrutura, plataforma virtual e aplicações; (iv) recursos
compartilhados de forma a garantir escala horizontal; e (v) serviços
medidos ou pagos de acordo com o consumo64.

Millard e Hon65explicaram as principais categorias do cloud computing


conforme as camadas de atividade fornecidas pelo provedor, de acordo
com a categorização feita pela NIST, como sendo Infraestructure as a
Service (IaaS), Platform as a Service (PaaS) e Software as a Service
(SaaS).

Assim, resumidamente, o cloud computing é uma forma de prover


recursos de infraestrutura e software para os usuários, de forma
compartilhada e por demanda, via acesso pela internet. O que se vende é a
utilidade do recurso, evitando que o cliente tenha que despender capital
com custo e investimento em infraestrutura que é compartilhada entre
diversos usuários, com garantia de segurança e privacidade.

Veja que podemos entender as atividades ou camadas do cloud


computing como uma evolução da tecnologia do provedor que antes,
usualmente, por exemplo, disponibilizava o acesso ao software para o
cliente por suporte físico, com licença perpétua de uso, passando pela sua

80
aquisição via download, mas sempre com a instalação do software na
máquina, hardware, do cliente. Outro exemplo era o caso do provedor de
data center, em que o cliente contratava a disponibilização do local físico
para armazenamento de seus dados. O hardware poderia ser do cliente ou
locado pelo provedor.

Com o cloud computing o provedor passou a disponibilizar para o


usuário essas mesmas utilidades e outras, mas de forma virtual, ou seja, o
cliente não mais instala o software em sua máquina nem precisa de
infraestrutura física própria, mas acessa a infraestrutura ou o software na
“nuvem”, pela internet e por qualquer dispositivo, smartphone, tablet,
computador etc.

Há, portanto, uma alteração, inclusive, na forma de contratação, tendo


em vista que dependerá da utilidade pretendida pelo usuário. Assim, se
necessita apenas da infraestrutura virtual de armazenamento, o usuário
contrata o IaaS e paga pela capacidade utilizada de acordo com sua
demanda; se, além disso, também precisa do sistema operacional para o
desenvolvimento de suas próprias aplicações, o usuário contrata o PaaS;
mas se o que lhe interessa é a utilização do aplicativo, ou o software já
desenvolvido com a aplicação pelo provedor, mas hospedado na “nuvem”
de onde o acessa remotamente, o usuário contrata o SaaS.

Ou seja, se antes o cliente adquiria o hardware (estrutura física) e o


software (programa de computador) para utilização interna, própria, agora
esses dois elementos viraram insumos para as empresas de tecnologia que
prestam as atividades nos modelos de IaaS, PaaS e SaaS.

Apesar do termo “as a service”, na contratação das atividades de cloud


computing, o usuário adquire a utilidade final, a partir de sua demanda, e

81
paga pelo que usar ou pelo tempo disponível. Para Millard e Hon, “the use
of ‘as a Service’ emphasizes a change in focus, from obtaining products or
licenses, to renting the use of resources as services”66. Ademais, esses
recursos podem estar atrelados a uma licença de uso de software. Veja que,
normalmente, o usuário, ao contratar as atividades, concorda com os
“Termos de Uso” da empresa fornecedora e adquire, além do direito de
acesso à utilidade contratada, normalmente denominada de “serviço”, a
licença do software67, quando for o caso.

Vale mencionar, neste ponto, que o próprio STF tem avançado, mesmo
que lentamente, na análise da natureza jurídica de contratos complexos
para fins tributários, em que há o envolvimento de diversas obrigações,
não mais se limitando à separação dicotômica entre “obrigação de fazer” e
“obrigação de dar”, mas sim, na prevalência da análise da utilidade
contratada como forma de privilegiar o princípio da capacidade
contributiva para atribuir a competência tributária.

Essa conclusão pode ser verificada no recente julgamento do RE n.


651.703/PR68 em que o Supremo Tribunal entendeu pela possibilidade de
tributação pelo ISS sobre as atividades das operadoras de planos de saúde
que configura um contrato complexo.

Assim, há uma dificuldade para se delimitar a qualificação jurídica das


utilidades fornecidas pelos provedores de cloud computing, devendo ser
analisado, caso a caso, cada estrutura da atividade contratada pelo usuário,
licença de software, armazenamento puro, processamento de dados,
prestação de serviço etc., não bastando a análise apenas da documentação
suporte. Ademais, os fornecedores dessas atividades, bem como a própria
estrutura física desses provedores, podem estar fora do Brasil, por isso a
importância de se analisar a tributação na sua importação.

82
No caso, por exemplo, do Software as a Service – SaaS, há a aquisição
pelo usuário de um aplicativo final, desenvolvido pelo provedor,
normalmente disponibilizado para acesso por múltiplos usuários que
pagam pelo direito de uso por um período determinado. O provedor de
SaaS pode ter contratado o IaaS e o PaaS de outros provedores para
desenvolver o seu aplicativo que é comercializado para os usuários finais.
Um exemplo de SaaS são os aplicativos de conteúdo, desenvolvidos em
Plataformas e Infraestruturas próprias ou de terceiros, para a posterior
oferta ao mercado consumidor final.

Nessa situação, o cliente tem o direito de acesso ao aplicativo que é um


software instalado na “nuvem” e acessado via internet pelo usuário que,
normalmente, recebe uma licença de uso limitada e intransferível do
fornecedor no exterior, pagando um valor pelo seu tempo de utilização.

Nos casos em que o provedor do aplicativo se encontra no exterior,


conforme demonstrado, os acordos de dupla tributação no Modelo OCDE
privilegiam a tributação no Estado de Residência do fornecedor com
prejuízos para os países em desenvolvimento, como o Brasil, que tentam
tributar o Estado Fonte da renda.

Além disso, como ficou explicado, na Economia Digital, essa forma de


tributação facilita a erosão tributária e a dupla não tributação, tendo em
vista a desnecessidade de a empresa fornecedora possuir estabelecimento
físico ou econômico no país de consumo de seus produtos e serviços.
Apesar de essa questão ser um problema mundial, como demonstrado, o
Brasil sempre tentou “burlar” as regras dos acordos bilaterais com a
construção de teses para a tributação no país fonte da renda, como o caso
da recente conceituação dos serviços técnicos para aplicação da tributação
sobre royalties.

83
Se considerada a contratação do aplicativo pelo usuário brasileiro como
uma licença de uso de software, em uma operação de importação, as
remessas ao exterior serão tributadas, pelo Imposto de Renda e pela CIDE
(com exceções especificas para software), de forma diferente de uma
remessa ao exterior para pagamento de uma prestação de serviço,
principalmente, se entendido como um serviço técnico. É o que veremos a
seguir.

4. A TRIBUTAÇÃO DO IRRF NAS REMESSAS AO EXTERIOR NA


IMPORTAÇÃO DO CLOUD COMPUTING – O EXEMPLO DO SAAS

Neste capítulo, inicialmente será analisada a evolução do entendimento


da Receita Federal do Brasil vis-à-vis com a jurisprudência mais atualizada
e com os tratados contra a dupla tributação no Modelo OCDE, acerca da
tributação na importação de software e dos serviços técnicos, para que seja
possível interpretar o entendimento do fisco federal brasileiro sobre a
tributação na importação do SaaS na recente Solução de Consulta COSIT
n. 191/2017.

De forma geral, uma remessa ao exterior para pagamento de serviços


gerais prestados por empresa estrangeira, terá a tributação do Imposto de
Renda na Fonte (IRRF), conforme previsto no art. 685 do Regulamento do
Imposto de Renda (RIR/99); caso seja considerado um serviço técnico,
haverá a aplicação do art. 708 do RIR/99; e, em sendo royalties, o art. 710
do RIR/99. Deve, ainda, ser analisado se o país da empresa contratada tem
tratado contra dupla tributação com o Brasil, podendo haver a aplicação de
seus artigos desde que se trate de lucro, royalties, serviços técnicos e da
existência ou não de estabelecimento permanente no Brasil.

Além disso, incidirá a Contribuição de Intervenção no Domínio


Econômico prevista na Lei n. 10.168/2000 (CIDE-Royalties) nas remessas

84
ao exterior para pagamentos de prestação de serviços técnicos ou
assistência técnica, royalties ou de contratos que impliquem transferência
de tecnologia, sendo reduzida a alíquota do Imposto de Renda na Fonte,
nesses casos, para 15%. Vale ressaltar que, desde 2007, a lei isenta de
tributação da CIDE-Royalties a importação de licenças de uso e de
distribuição de software quando não houver transferência de tecnologia.

Fazendo uma rápida análise do entendimento da Receita Federal do


Brasil (RFB) quanto à tributação de software, verifica-se que,
recentemente, houve uma alteração da interpretação no que tange à
tributação do IRRF na importação de licença de distribuição de software
“de prateleira” ou standard, por revendedor no Brasil.

A Solução de Consulta COSIT n. 27/2008, que determinava a não


incidência do IRRF nas importações de licenças de distribuição de
software standard no Brasil, foi reformada pela recente Solução de
Divergência COSIT n. 18/2017. Nessa nova resposta de consulta da RFB,
foi relembrado que o software, por ser bem incorpóreo, protegido pelos
direitos autorais, pode ser comercializado de três formas distintas,
conforme estabelecido pelos artigos 9º a 11 da Lei n. 9.609/98, quais
sejam, contrato de licença de uso, contrato de licença de distribuição e
contrato de transferência de tecnologia.

Assim, a RFB fez uma distinção entre as licenças de uso de software


standard, que teriam sido consideradas como mercadorias pelo STF
quando do julgamento do RE n. 176.626/SP e, portanto, não incidente o
IRRF na sua importação, e as licenças de distribuição de software, que não
se confundiriam com o produto a ser distribuído, tendo seus pagamentos
natureza jurídica de royalties, tributados, portanto, pelo IRRF de acordo

85
com o art. 710 do RIR/99, mas com isenção pela CIDE-Royalties pelo §
1º-A do art. 1º da Lei n. 10.168/2000.

Neste ponto, vale apenas esclarecer que o conceito de royalties na


legislação brasileira, e considerado pela RFB, é dado pelo artigo 22, “d”,
da Lei n. 4.506/1964, segundo o qual são royalties todos os rendimentos
decorrentes do uso, fruição e exploração de direitos, tais como exploração
de direitos autorais, salvo quando percebidos pelo autor ou criador do
bem ou obra, aplicável, portanto, ao software por se tratar de direito de
autor.

Considerado esse conceito do art. 22 da Lei n. 4.506/64, a remuneração


da licença de distribuição de software, por se tratar de direito de autor,
poderia ser realmente considerada como royalty. No entanto, essa análise
deve ser efetuada no contexto do que foi decidido pelo STF nos casos
julgados sobre o tema, no RE n. 176.626/SP e na medida cautelar da ADIN
n. 1.945/MT. Isso porque, o STF não fez essa distinção para as licenças de
uso e de distribuição. O que foi analisado pelo Tribunal para se definir se a
natureza jurídica era de mercadoria, foi o modelo do software
comercializado. Assim, sendo software “de prateleira”, padrão,
independentemente do tipo de licença e da forma de transferência, a sua
natureza é de mercadoria, visto que disponibilizado para o público em
geral. Esse foi o liame utilizado para a definição dessa categoria de
software como mercadoria pelo STF. E na importação de mercadoria não
há incidência de IRRF.

Dessa forma, a conclusão da Solução de Divergência COSIT n. 18/2017


pode ser questionada diante da melhor interpretação do entendimento do
STF quanto à natureza jurídica do software.

86
Nos comentários às respectivas convenções modelo, a ONU e a OCDE
têm demonstrado essa mesma conclusão do STF no sentido de que o
licenciamento de software padrão para comercialização não configura
royalty, devendo ser tributado de acordo com o Artigo da Convenção que
trata de lucros das empresas.

No Direito Comparado, também encontramos interpretação nesse


sentido para a determinação da natureza jurídica na transação de aquisição
de software. A Corte de Apelação da Índia, por exemplo, em decisão de
201669, classificou a aquisição de licença de software para revenda, como
mercadoria, sendo que não configuraria royalty, por não haver a
transferência da propriedade intelectual, mas apenas a “venda” ou cessão
do direito de uso.

No mesmo sentido, em 2016, a decisão da Suprema Corte


Administrativa da Finlândia, ao analisar a aplicação do tratado contra a
dupla tributação com a China. No caso, a Corte finlandesa entendeu que,
como os pagamentos remetidos pela empresa chinesa eram para a
aquisição do direito de reprodução do software, deveriam ser enquadrados
como royalties, aplicando os comentários da OCDE sobre o Artigo 12
(royalties) para o contexto das plataformas digitais e aquisição de
software.

No que tange à importação de serviços técnicos, aplica-se o art. 708 do


RIR combinado com o art. 2º-A da Lei n. 10.168/2000 que determinam a
tributação pelo IRRF e pela CIDE-Royalties, devendo ser observadas as
disposições dos tratados contra a dupla tributação, se existente na
operação.

87
Vale lembrar que a RFB, com base no Ato COSIT n. 01/2000, até junho
de 2014, entendia que as remessas ao exterior para pagamento de serviços
técnicos sem transferência de tecnologia deveriam ter a incidência de
IRRF com base no art. 685, II do RIR/99 e, quando existente tratado para
evitar a dupla tributação, deveria ser aplicado o art. 21 do Tratado no
Modelo OCDE, considerando tais remessas como “Rendimentos não
expressamente mencionados”.

Por discordarem desse entendimento, os contribuintes ingressaram com


ações judiciais para requerer a aplicação do art. 7º dos Tratados no Modelo
OCDE, nos casos de remessas ao exterior para pagamento de serviços
técnicos sem transferência de tecnologia, tributando como “Lucro”,
entendido como “rendimentos auferidos”, no país de residência do
fornecedor, desde que não tivesse estabelecimento permanente no Brasil.
Assim, não deveriam incidir nessa transação nem o IRRF nem a CIDE.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar, em 17 de maio de 2012,


o RESP n. 1.161.467/RS, entendeu pela prevalência dos tratados sobre a
legislação interna brasileira, em conformidade com o art. 98 do CTN,
determinando a aplicação do art. 7º dos Tratados contra a dupla tributação,
no Modelo OCDE, para as remessas para pagamento de contratos de
prestação de serviços técnicos sem transferência de tecnologia.

Além da necessidade de acolher a decisão do STJ no RESP n.


1.161.467/RS, a intenção da Finlândia em denunciar o acordo de dupla
tributação com o Brasil acelerou a alteração de entendimento das
autoridades fiscais federais, sendo que, tomando por base o Parecer da
Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, PGFN/CAT n. 2.363/2013, em
20 de junho de 2014, foi publicado o Ato Declaratório Interpretativo n. 05
da RFB, que revogou o Ato COSIT n. 01/2000, modificando seu

88
entendimento sobre a aplicação dos tratados internacionais contra a dupla
tributação para a incidência do IRRF nas remessas ao exterior para
pagamento de contratação de serviços técnicos.

De acordo com o referido ADI n. 05/2014 da RFB, as remessas ao


exterior para pagamento de serviços técnicos e de assistência técnica sem
transferência de tecnologia passaram a ser enquadradas no art. 7º dos
Tratados no Modelo OCDE, que trata do “lucro das empresas”, caso não
exista Protocolo que iguale esses valores aos royalties (art. 12), ou que o
serviço não seja relacionado à qualificação técnica de uma pessoa ou
grupo, casos em que devem ser aplicados os artigos específicos,
respectivamente, de royalties e de profissões independentes.

Assim, a RFB, apesar de reconhecer o não enquadramento das remessas


ao exterior para pagamento de serviços técnicos e de assistência técnica
sem transferência de tecnologia no art. 21 dos Tratados no Modelo OCDE,
criou uma tese para defender, nos casos de existência de Protocolo Anexo,
a natureza jurídica de royalties, com a aplicação do art. 12 dos Tratados.

Se tomarmos como exemplo o Tratado contra a dupla tributação entre o


Brasil e a Espanha, verifica-se que o § 3º do art. 12 estabelece o conceito
de royalties como:

... as remunerações de qualquer natureza pagas pelo uso ou pela concessão do


uso de direitos de autor sobre obras literárias, artísticas ou científicas (inclusive os
filmes cinematográficos, filmes ou fitas de gravação de programas de televisão ou
radiodifusão), de patentes, marcas de indústria ou de comércio, desenhos ou
modelos, planos, fórmulas ou processos secretos, bem como pelo uso ou concessão
do uso de equipamentos industriais, comerciais ou científicos e por informações
correspondentes à experiência adquirida no setor industrial, comercial ou científico.

E no Protocolo Anexo ao Tratado, há a seguinte nota sobre o item: “A


expressão ‘por informações correspondentes à experiência adquirida no

89
setor industrial, comercial ou científico’, mencionada no parágrafo 3 do
Artigo 12, compreende os rendimentos provenientes da prestação de
serviços técnicos e assistência técnica”.

Vale esclarecer que a relação entre a nota do Protocolo e o artigo 12 do


Tratado deve ser interpretada no sentido de que a tributação por este artigo
só deve ser aplicada aos contratos de prestação de serviços técnicos e
assistência técnica relacionados com os contratos de transferência de
tecnologia, com remuneração por royalties, em uma relação de acessório e
principal. Nesse sentido, andou bem a jurisprudência do Tribunal Regional
Federal da 3ª Região70 ao julgar indevida a aplicação, pela Receita Federal,
do Artigo de Royalties do Tratado Brasil-Peru, quando a contratação é de
serviços técnicos sem relação com a remuneração de contratos de
transferência de tecnologia, por haver a prevalência do tratado sobre a
legislação interna, aplicando o art. 7º, que determina a tributação pelo
Lucro no Estado de Residência do fornecedor que não possui
estabelecimento permanente no Brasil.

Em 2015, o STJ voltou a decidir sobre a questão, ainda sob o enfoque


do Ato COSIT n. 01/2000, aplicando, novamente, o art. 7º do tratado para
evitar a dupla tributação, no caso, o Tratado Brasil-Espanha, para as
remessas ao exterior de pagamentos para prestação de serviços técnicos, na
situação em que o fornecedor não possui estabelecimento permanente no
Brasil71.

Importa também para o nosso estudo, a pretensa intenção da RFB em


conceituar “serviços técnicos” para justificar seu entendimento acerca da
aplicação dos Tratados contra dupla tributação, conforme ADI n. 05/2014,
primeiro com a IN n. 252/2002 e, atualmente, com a IN n. 1.455/2014. De
acordo com o art. 17, § 1º, II, “a”, dessa nova IN, serviço técnico é

90
a execução de serviço que dependa de conhecimentos técnicos especializados ou
que envolva assistência administrativa ou prestação de consultoria, realizado por
profissionais independentes ou com vínculo empregatício ou, ainda, decorrente de
estruturas automatizadas com claro conteúdo tecnológico.

Marco A. Greco e Sérgio André Rocha72, fazendo referência a


entendimento de Alberto Xavier, assinalaram que “em nenhum caso, a
prestação isolada de serviços técnicos sem a transferência de tecnologia
poderia gerar a equiparação a royalties eventualmente prevista no
protocolo de convenção celebrada pelo Brasil”.

E os comentários à Convenção Modelo da OCDE corroboram esse


entendimento, conforme esclarecem Frederico Fonseca e Ana Carolina
Garcia73:

Os comentários oficiais do Modelo de Convenção para evitar a Dupla


Tributação da OCDE são úteis na distinção entre os contratos de prestação de
serviços técnicos que envolvem transferência de tecnologia (“know how”), e os
contratos em que o prestador de serviços apenas “aplica” seus conhecimentos
tecnológicos sem transferi-los ao tomador de serviços: “A necessidade de se
distinguir esses dois tipos de pagamentos, isto é, pagamentos pelo know how e
pagamentos pela prestação de serviços, algumas vezes aumenta as dificuldades
práticas. Os seguintes critérios são relevantes para o propósito de se fazer essa
distinção:
– Contratos de know how envolvem informações do tipo descrito no parágrafo
11 que já existem ou envolvem o fornecimento daquele tipo de informação após o
seu desenvolvimento ou criação e incluem disposições específicas sobre a
confidencialidade daquela informação.
– Nos casos dos contratos de prestação de serviços, o prestador se compromete a
executar tarefas que podem requerer o uso de conhecimentos especializados e de
experiência, mas não transfere esses conhecimentos especializados e experiência
para a outra parte.

Dessa forma, considerando as próprias decisões do STJ que


determinaram a aplicação dos Tratados Internacionais sobre as normas
internas, verifica-se que a RFB não tem competência para determinar a
conceituação de serviços técnicos para fins de aplicação da tributação na

91
importação desses serviços, especialmente quando existente tratado contra
a dupla tributação firmado pelo Brasil com o país do fornecedor.

Essa conclusão é baseada, inclusive, no fato de que a Convenção


Modelo OCDE e seus Comentários, considera como royalties apenas os
serviços técnicos e de assistência técnica mencionados em Protocolos
Anexos que estejam conectados, em caráter acessório, a contratos de
transferência de tecnologia (know how). Assim, os contratos de prestação
de serviços que impliquem apenas aplicação de conhecimento devem ser
considerados no art. 7º, de “Lucros das Empresas” desses Tratados.

Retornando ao tema deste estudo, no cloud computing, como


explicitado acima, não há a transferência do software ou do hardware, mas
a sua disponibilização para o usuário que os acessa na “nuvem”, pela
internet.

Especificamente com relação ao Software as a Service – SaaS, o


fornecedor possui a posse e o controle do software que desenvolve para
disponibilizar o direito de acesso a diversos usuários, pela internet. O
usuário não tem controle, não recebe uma cópia do software e nem tem o
conhecimento sobre onde está instalado, visto que o acessa de forma
virtual. O interesse do usuário é pela aplicação do software, que pode ser
desde um aplicativo de conteúdo, a um aplicativo de armazenamento e
processamento de dados ou de algum outro serviço ou utilidade.

Analisando essa situação específica do SaaS, a Receita Federal do


Brasil recentemente emitiu a Solução de Consulta n. 191, de 23 de março
de 2017, entendendo haver a incidência do IRRF e da CIDE-Royalties
sobre essa atividade por classificá-la como “serviço técnico” no conceito
da IN n. 1.455/2014, como “serviços que dependem de conhecimentos

92
especializados em informática e que decorrem de estruturas automatizadas
com claro conteúdo tecnológico”.

No caso concreto, de acordo com os termos da solução de consulta, a


empresa brasileira consulente adquiriu autorizações de acesso e uso
remoto, de forma virtual, de dois SaaS de fornecedora localizada nos EUA
para serem repassados a usuários finais no Brasil, sendo faturado como
licença de uso de software. Os softwares dos aplicativos não são instalados
no computador dos usuários, estando hospedados em local desconhecido e
acessados na “nuvem”, pela internet. O primeiro aplicativo de SaaS é para
proteção de antivírus, e o segundo, para efetuar conferências,
treinamentos, compartilhamento de arquivos e projetos por meio da
internet em tempo real.

Para construir sua conclusão, a RFB entendeu que a transação se referia


à aquisição de autorizações de acesso virtual de uso do SaaS por meio de
senhas, para repasse aos usuários finais. Assim, entendeu a RFB que a
operação não teria natureza de venda de licença de uso de software
standard, mercadoria, sem incidência de IRRF e de CIDE-Royalties e nem
de licença de distribuição de software, sujeita à incidência apenas do
IRRF, conforme acima já tratado.

E prosseguiu a RFB afirmando, com base na documentação acostada


pelo contribuinte no caso, que “os pagamentos realizados a pessoas
jurídicas situadas no exterior, em contraprestação às autorizações de
acesso e uso de softwares por usuários residentes no território brasileiro,
tratam de operação de prestação de serviços”.

Assim, a RFB concluiu que, como o tratamento das informações é de


responsabilidade da empresa no exterior, que recebe pagamentos por

93
períodos mensais para que o usuário possa ter acesso às utilidades do
software, a operação teria característica de prestação de serviço técnico,
nos termos do art. 17, § 1º, II, “a”, da IN n. 1.455/2014, por “depender de
conhecimentos técnicos especializados e decorrer de estruturas
automatizadas com claro conteúdo tecnológico”. Por consequência, e por
não haver tratado contra a dupla tributação do Brasil com os Estados
Unidos, a RFB entendeu que deveria haver a incidência do IRRF,
conforme art. 3º da MP n. 2.159/2001 e CIDE-Royalties, com base no § 2º
do art. 2º da Lei n. 10.168/2000, por se tratar de serviço técnico e, por isso,
não ser possível se beneficiar da isenção da CIDE-Royalties na licença de
uso ou distribuição de software.

Alguns comentários críticos sobre o entendimento da RFB. Primeiro,


por ser uma operação realizada com fornecedor localizado nos Estados
Unidos que não possui tratado contra dupla tributação com o Brasil74, há
que se verificar realmente a legislação interna para que seja definida a
tributação. Para isso, é necessário determinar a natureza jurídica da
atividade para que possa ser conferida a incidência tributária.

No caso concreto avaliado, considerando apenas as informações


contidas no texto da consulta, é possível inferir que a empresa consulente é
atuante no ramo de comércio de software, sendo que, nessa operação,
adquire licenças de um aplicativo de software, para comercialização de
forma indistinta a diversos clientes. O fornecedor dos Estados Unidos
fatura as licenças de uso comercializadas, e os usuários finais, portanto,
adquirem essas licenças da empresa no Brasil.

Conforme já explicitado, software é programa de computador e no SaaS


se adquire a utilidade que, neste caso, é fornecida pelo próprio programa,
pelo software. E o acesso do usuário é feito por meio de licença de uso

94
limitada pelo período que contratar, sendo que adquire essa licença por
meio da empresa brasileira.

Lembramos que o software pode ser comercializado por meio de


licença de uso, licença de distribuição ou transferência de tecnologia. E
que o software standard, mesmo para a RFB, é aquele que é produzido em
série e comercializado no varejo, sem distinção, para qualquer usuário.
Dessa forma, apesar da limitação de informações encontradas na Solução
de Consulta, é possível inferir que, neste caso, a empresa, então
consulente, adquire licença de distribuição de software standard que será,
posteriormente, comercializado por meio de licença de uso para os
usuários finais no Brasil.

Caso assim a RFB entendesse, nessa operação de importação da licença


de distribuição do software da empresa americana pela empresa brasileira,
deveria haver a tributação pelo IRRF (Solução de Divergência COSIT n.
18/2017), como remuneração de direitos autorais, royalties, mas não pela
CIDE-Royalties em função da isenção para licença de software. Mas
conforme acima já explicitado, entendemos ser possível sustentar que,
mesmo na licença de distribuição de software standard, por não ter o STF
feito essa diferenciação da natureza do produto pelo tipo de licença, mas
pela forma de produção e comercialização, trataria de comercialização de
mercadoria, sem sujeição ao IRRF nem à CIDE.

O segundo comentário acerca da resposta da RFB diz respeito à


natureza de serviço técnico que foi atribuída ao SaaS, em função do
conceito estabelecido na IN n. 1.455/2014. Embora não tenha tratado
contra a dupla tributação com os Estados Unidos, conforme ficou
demonstrado, a Convenção Modelo OCDE e seus Comentários bem
explicam a diferença desse conceito de serviço técnico e assistência

95
técnica e a prestação de serviços gerais. Isso porque a prestação de serviço
técnico ou assistência técnica deve estar atrelada a um contrato de
transferência de tecnologia, como um acessório. E esse não é o caso do
SaaS.

Alberto Xavier75 nos auxilia nessa análise ao explicar, ainda com base
na definição da IN n. 252/2002, mas que serve também a nosso propósito,
que:

A linha de fronteira que separa os serviços de assistência técnica dos “serviços


puros” em geral está em que, enquanto neste último caso a prestação de serviços é o
objeto principal do contrato, no primeiro a prestação do serviço é meramente
instrumental relativamente ao objeto principal do contrato, que é a transmissão de
uma informação tecnológica (know how, assim considerado o contrato que tem por
objeto a transmissão de informações tecnológicas preexistentes e não reveladas ao
público, na forma de cessão temporária ou definitiva de direitos, para que o
adquirente as utilize por conta própria, e sem que o transmitente intervenha na
aplicação da tecnologia cedida ou garanta seu resultado). No contrato de prestação
de serviços em geral, as partes querem a própria execução de um determinado
serviço e não uma “assistência” na aquisição de uma informação tecnológica; no
contrato de assistência técnica, as partes querem uma informação tecnológica
através da prestação de um serviço complementar ou instrumental à transmissão do
know how. (...) Mais complexa se nos afigura a caracterização do conceito de
“serviços técnicos”, com vistas à sua distinção dos “serviços puros” em geral. (...)
Não nos parece, pois, ter qualquer fundamento legal ou doutrinário a definição de
serviços técnicos dada pela Instrução Normativa SRF n. 252/02, segundo a qual
“considera-se serviço técnico o trabalho, obra ou empreendimento cuja execução
dependa de conhecimentos técnicos especializados, prestados por profissionais
liberais ou de artes e ofícios” (art. 17, § 1º, II, “a”).
(...) A distinção entre serviços puros e serviços técnicos complementares de uma
transferência de tecnologia deve, pois, descortinar-se não na existência de
conhecimentos especializados, mas sim no objeto do contrato: no contrato de
prestação de serviços, ainda que envolvam conhecimentos especializados, estes não
se destinam a ser transmitidos ao contratante, mas meramente aplicados, por sua
solicitação, ao caso concreto.

Assim, entendemos a transação envolvendo o SaaS, no caso concreto


das utilidades ora analisadas, como importação de licença de distribuição
de software standard, de fornecedor localizado nos Estados Unidos, que

96
será revendido no Brasil, mas não como serviço técnico na concepção da
IN n. 1.455/2014 da RFB.

Caso a transação tivesse ocorrido com empresa situada em país com


tratado de dupla tributação com o Brasil, mesmo que houvesse Protocolo
Anexo com a remissão ao artigo de Royalties para os serviços técnicos e
assistência técnica, entendemos que não seria adequado aplicar a
tributação desse artigo. Isso porque, de acordo com as informações
disponíveis do caso analisado, além de se tratar de importação de
mercadoria, na concepção do STF para a licença de software standard, não
há contrato de transferência de tecnologia atrelado à atividade, mesmo que
considerada como serviço técnico, o que atrairia a aplicação do art. 7º do
Tratado, com a tributação no Estado de Residência do fornecedor.

Nesse tipo de transação digital, o problema da tributação está vinculado,


também, à desnecessidade de a empresa estrangeira possuir
estabelecimento permanente no território do país de consumo, sendo que a
aplicação da Convenção Modelo OCDE nos moldes atuais, levaria à
tributação apenas no Estado de Residência do fornecedor que pode estar
estabelecido em país de baixa tributação, trazendo todas as implicações
discutidas no âmbito do BEPS.

5. CONCLUSÕES

De forma resumida, podemos concluir que a tributação internacional


está intimamente ligada à soberania dos Estados. No entanto, aos Estados
interessa a maior globalização das empresas, que gera maior crescimento
econômico com o incremento das relações comerciais entre os países. Por
outro lado, a interação das legislações tributárias acabou por se traduzir em
externalidades negativas, como a dupla tributação e a consequente redução

97
dos negócios e do crescimento global, com a necessidade de criação de
regras globais para evitar a dupla tributação e fomentar o desenvolvimento
econômico. Surgem as convenções modelo, sendo as mais utilizadas, a da
OCDE e da ONU.

Com o avanço da Economia Digital, foi possível que as empresas se


utilizassem, também, dessas convenções para evitar a dupla tributação em
estruturas formatadas com o intuito de reduzir a tributação, transferindo-se
lucros para países com baixa ou nenhuma tributação. Verifica-se, portanto,
que o modelo atual de interação tributária entre os países precisa ser
revisitado para se adequar às modificações proporcionadas pela evolução
tecnológica, principalmente em relação à falta de presença física dessas
empresas nos Estados Fonte e seu estabelecimento em jurisdições com
baixa tributação, gerando situações de dupla não tributação ou stateless
income.

Para isso, foi criado o BEPS, plano de ação da OCDE com o objetivo de
buscar a justiça fiscal internacional por meio da análise e recomendação de
mecanismos a serem adotados pelos países para evitar a erosão da base
tributária e a transferência de lucros para países sem tributação da renda.
Especificamente quanto à Economia Digital, a Ação 1 do Plano BEPS visa
identificar os problemas e propor as soluções para os desafios da
tributação nesse setor.

Dentre essas novas transações da Economia Digital, encontra-se o cloud


computing, que é uma forma de prover utilidades virtuais sob demanda aos
usuários que envolvem recursos de infraestrutura e software. Essa nova
operação digital difere da simples comercialização de software standard
ou por encomenda, por meio de licenças de uso ou distribuição, pois o que

98
o usuário busca é a utilidade. Por isso, a sua natureza jurídica é
determinada caso a caso.

O Brasil vem tentando, há muito tempo, desviar-se da orientação


tributária dos países desenvolvidos, membros da OCDE, que privilegiam a
tributação no Estado de Residência dos fornecedores, com interpretações
elásticas e indevidas dos Tratados contra a dupla tributação, o que vem
gerando consequências ruins para a nossa economia, como a denúncia de
Tratados por alguns países, como a Alemanha, ou mesmo a não adoção
desse tipo de acordo com o Brasil, como os Estados Unidos.

No caso da tributação do software, foi demonstrado que, recentemente,


a Receita Federal do Brasil adotou posicionamentos contrários à melhor
interpretação dos Tratados contra a dupla tributação ou com as regras
atuais de tributação internacional entre países.

O primeiro foi a Solução de Divergência COSIT n. 18/2017, em que foi


feita uma diferenciação entre licença de uso e licença de software, com o
intuito de tributar a última pela IRRF. O segundo foi a caracterização
como serviço técnico, no conceito definido por uma Instrução Normativa,
da atividade de Software as Service – SaaS, pela Solução de Consulta
COSIT n. 191/2017, também com o intuito de tributar pelo IRRF e pela
CIDE a importação dessa atividade.

Sabemos que essa atitude das autoridades fiscais no Brasil está dentro
do escopo dos esforços dos países em desenvolvimento para evitar que a
tributação se concentre cada vez mais, e no caso da Economia Digital com
risco de maior erosão fiscal, nos países desenvolvidos ou mesmo em países
com baixa tributação. Todavia, por outro lado, o Brasil acaba por conflitar
com as próprias disposições dos Tratados internacionais que assinou com

99
outros países em busca de melhorar a captação de investimentos
internacionais.

Essa incoerência do governo brasileiro que primeiro assina acordos para


evitar dupla tributação com a aceitação das regras impostas pelos países
desenvolvidos de privilégio da tributação no Estado Residência do
fornecedor para, depois, suas autoridades fiscais criarem interpretações a
fim de impor a tributação na fonte nas importações brasileiras, tem
consequências contrárias a seus objetivos, pois instaura a insegurança
jurídica que afugenta os investimentos estrangeiros e acaba por fazer os
países desenvolvidos denunciarem os acordos com o Brasil.

Por outro lado, essa posição do Brasil de tentar tributar a fonte, apesar
de entrar em choque com a melhor interpretação da aplicação dos Tratados
contra a dupla tributação, está em linha com um dos objetivos principais
do BEPS e da Ação 1 de alcançar a justiça fiscal pela redistribuição da
receita tributária entre os países, respeitando a capacidade contributiva e
privilegiando a tributação no Estado fonte da renda.

Há, pelo menos em tese, uma intenção no Projeto BEPS de alteração do


elemento de conexão para a tributação, principalmente considerando a
Economia Digital em que o fornecedor não precisa possuir
estabelecimento físico no país consumidor para desenvolver suas
atividades, por exemplo, de cloud computing, sendo que sua infraestrutura
pode estar, inclusive, em país diferente de seu estabelecimento sede. Dessa
forma, estabelecer a tributação no Estado Fonte da renda seria a solução
principal para esses percalços e desafios a fim de evitar a erosão tributária
e a não dupla tributação.

100
No entanto, vimos que o relatório final da Ação 1, apesar de reconhecer
os desafios da tributação internacional da Economia Digital e estabelecer
boas propostas de solução – como a inclusão do novo elemento de
conexão, qual seja, da presença digital, no conceito de estabelecimento
permanente e a possibilidade de cobrança de imposto de renda no Estado
Fonte da renda para certos tipos de transações digitais –, não recomendou
a sua adoção, por entender que as demais Ações do BEPS já englobariam
essas questões.

Assim, é necessário acompanhar a evolução das demais Ações do


BEPS, como a possibilidade de assinatura do Acordo Multilateral previsto
na Ação 15 ou mesmo as possíveis alterações pontuais na Convenção
Modelo OCDE, principalmente no que se refere à alteração do elemento de
conexão no conceito de estabelecimento permanente para a tributação das
transações digitais.

Enquanto isso não ocorrer, certamente veremos novas ações judiciais


nos tribunais brasileiros para discutir a interpretação da Receita Federal do
Brasil com relação à importação de novas tecnologias, como o caso do
SaaS, que desrespeitam as determinações dos Tratados contra a dupla
tributação assinados pelo país, com consequências ruins para a nossa
economia e desarmônica com razoáveis standards internacionais.

101
As operações internacionais envolvendo
software e o imposto de renda
Gustavo Lian Haddad76 e Vinícius Nogueira77

1. INTRODUÇÃO

Em 5 de abril de 2017, a Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) da


Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Solução de Divergência n. 18,
por meio da qual foi reformada a Solução de Divergência Cosit n. 27/2008,
alterando o entendimento anterior da administração tributária quanto à
incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre
determinadas contraprestações atribuídas a residentes no exterior
envolvendo a licença de direitos de software.

Em 2008, a citada Solução de Divergência definia que os pagamentos


ao exterior como contraprestação pela aquisição de licenças de software
sob a modalidade de cópias múltiplas, conhecidos como “software de
prateleira”, não estariam sujeitas ao IRRF por se tratar, juridicamente, de
pagamento de preço pela aquisição de mercadoria, incompatível com o
conceito de renda tributável.

Essa Solução seguia a posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal


(STF) no julgamento do RE n. 176.626-378, em que a Corte assentou a
natureza de mercadoria das licenças de uso de software de prateleira e,
consequentemente, a incidência do Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS)79 nas operações de licenciamento de tal
tipo de software. Naquela oportunidade, o STF decidiu que o software de
prateleira, por ser comercializado em larga escala para uma pluralidade de
usuários, seria equiparável a mercadoria para fins de incidência do ICMS.

102
A partir da nova Solução de Divergência Cosit n. 18/2017, a RFB
passou a entender que os pagamentos remetidos ao exterior relacionados
ao licenciamento para comercialização ou distribuição de software de
prateleira teriam a natureza de royalties e, assim, estariam sujeitos à
incidência do IRRF à alíquota de 15%.

Para tanto, o órgão fazendário interpretou a legislação que regula o


software no país de modo a diferenciar o licenciamento de direito de uso e
o licenciamento de direito de distribuição/comercialização de software,
concluindo que a decisão do STF teria tratado apenas do primeiro tipo de
licença. Concluiu, ainda, que na relação entre a empresa estrangeira que
detém os direitos de propriedade intelectual sobre o software e o
adquirente brasileiro, haveria apenas uma cessão de direitos patrimoniais,
isto é, uma licença para comercialização. Somente quando realizadas as
operações internas com o software, de venda pelo adquirente brasileiro a
consumidores aqui localizados, é que se estaria diante de uma operação
comercial com licença de uso de software de prateleira.

Esse mesmo entendimento foi posteriormente ratificado pelo Ato


Declaratório Interpretativo RFB n. 7, de 21 de dezembro de 2017 (ADI
7/2017), segundo o qual “as importâncias pagas, creditadas, entregues,
empregadas ou remetidas a residente ou domiciliado no exterior em
contraprestação ao direito de distribuição ou comercialização de software
enquadram-se no conceito de royalties e estão sujeitas à incidência do
Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF) à alíquota de 15%”80.

Em que pese a bem articulada fundamentação adotada pela RFB, o


enfrentamento da questão merece análise mais detida, que considere a
natureza e os efeitos dos diversos tipos de negócios jurídicos que podem
ser celebrados tendo o software como objeto, para, então, concluir se a

103
operação envolve mercadorias, serviços, licença ou outro fenômeno.
Conclusões apriorísticas ou voltadas exclusivamente à nomenclatura dos
contratos e direitos envolvidos devem ser afastadas, ainda mais em se
tratando de setor da vida econômica em constante mutação e adaptação a
novas necessidades e funcionalidades.

Como já assinalou a Organização para a Cooperação e


Desenvolvimento Econômico (OCDE) em trabalho que examina o
tratamento tributário de operações internacionais envolvendo software:
“the fundamental economic characteristics of the [software] arrangements
may represent a transaction in goods, in services, in intellectual property,
or in a combination of all three”81.

No presente trabalho, pretende-se examinar a casuística das principais


operações envolvendo software para, a partir da identificação da natureza
jurídica e efeitos dos diferentes tipos de contrato comumente celebrados,
examinar a incidência do IRRF sobre contraprestações pagas ou creditadas
por fontes pagadoras brasileiras a não residentes em operações
internacionais.

Mais especificamente, na Parte 2 do presente trabalho analisaremos o


objeto software, as suas espécies, as finalidades de sua criação e a sua
natureza jurídica. Na Parte 3 faremos breve apresentação dos negócios
jurídicos comumente pactuados com vistas à circulação do software no
mercado, buscando demonstrar que as transações com software podem dar
azo aos mais variados arranjos contratuais, a depender das intenções das
partes, da realidade econômica subjacente à celebração dos contratos e do
tipo de software negociado. Nas Partes 4, 5 e 6 trataremos mais
detidamente de tais arranjos contratuais, buscando identificar suas notas
características, no quanto relevante, para examinar e concluir sobre a

104
incidência do IRRF nas contraprestações envolvidas nas mais diversas
operações com software sob encomenda, software-produto e software
customizável, sob a perspectiva do direito interno e dos tratados
internacionais para evitar a bitributação.

2. DEFINIÇÃO DE SOFTWARE. TIPOS DE SOFTWARE. PROPÓSITOS


COM A SUA CRIAÇÃO

2.1. Definição de software

O objeto central no presente trabalho é a tributação pelo IRRF dos


valores pagos ou creditados por pessoa residente no Brasil a beneficiário
não residente, como contraprestação relacionada a transações com
software.

Pois bem. Em primeiro lugar faz-se necessário identificar os contornos


jurídicos do objeto da prestação em análise, isto é, faz-se necessário
conceituar o software.

Bill Gates82 define software da seguinte forma: “It is a comprehensive


set of rules a machine can be given to ‘instruct’ it how to perform
particular tasks”. Software, assim, é um grupo de instruções lógico-
matemáticas que devem ser seguidas em ordem fixa (algoritmos) e que, se
dadas especificamente a um computador, permitem-no calcular a solução
(output) para um determinado problema (input).

O legislador brasileiro incorporou tais notas características. Segundo o


art. 1º, da Lei n. 9.609, de 19 de fevereiro de 1998, software ou programa
de computador é:

a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou


codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário
em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos

105
ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los
funcionar de modo e para fins determinados.

2.2. Tipos de software

O software pode ser classificado em três categorias distintas, à razão


inversa de sua operacionalidade pelo usuário final do computador83: (i)
firmware; (ii) sistemas operacionais; e (iii) programas aplicativos.

Os firmwares são programas inseridos dentro do próprio hardware, ou


seja, são instruções gravadas no próprio chip do computador e que se
prestam apenas à leitura (memória ROM84). Eles representam a forma mais
básica e elementar de programação, fornecendo instruções vitais para o
funcionamento do computador e servindo de base para que o computador
receba outros programas, de natureza operacional ou aplicativa. Não
analisaremos os programas firmware no presente trabalho, dado que não
costumam ser objeto de negociação em separado do hardware, além de
conferirem acesso limitado aos usuários.

Os programas operacionais são sistemas que gerenciam o


funcionamento da máquina, permitem a comunicação geral entre ela e seu
operador, escalonando entradas e saídas, e alocando seus recursos físicos
(sobretudo memória) de forma a permitir que unidades de processamento
recebam e executem as instruções de programas aplicativos
simultaneamente.

Os programas aplicativos, por sua vez, são aqueles relativos à execução


de tarefas específicas, que visam a solucionar os problemas do usuário do
computador. O número de programas aplicativos e sua variedade são tão
plurais quanto as demandas criadas pelos usuários, atingindo a casa dos
milhares.

106
A OCDE assim distinguiu os programas operacionais e os programas
aplicativos85:

(...) there are two kinds of software. System software is aimed at the operational
process of the computer itself (i.e., operational software), while application
software consists of programmes for using a computer to accomplish specific tasks.
These purposes may be specified by a single client/user, a group of client/users, or
may result from a marketing effort by the software developer.

2.3. Finalidade da sua criação

Independentemente do grau de sua operacionalidade (isto é, sistema


operacional ou aplicativo), o software pode ser produzido a fim de atender
às necessidades (i) de seu próprio desenvolvedor, sendo neste caso um
intangível necessário ao processo produtivo de bens, serviços ou outros
intangíveis; ou (ii) do mercado, isto é, de terceiros interessados em
adquirir ou usar o software, sendo este objeto ofertado pelo desenvolvedor
com a finalidade de obtenção de lucro.

Explica a OCDE86: “software may be developed for internal use, for


use by related (foreign) companies or for sale to third parties as part of
equipment, as a master copy, or as copied and canned software”.

Importa-nos, para os fins do presente trabalho, apenas a análise deste


segundo grupo, isto é, o software negociado nos mercados – diretamente,
em cópia para reprodução ou em cópias múltiplas para uso.

O software, quando ofertado ao mercado, pode ser desenvolvido em


larga escala, sem um usuário específico e previamente definido, ou pode
ser desenvolvido a pedido de um único usuário, para atender a suas
necessidades específicas.

107
Para o primeiro tipo usaremos a denominação de “software-produto”.
Preferimo-la à expressão “software de prateleira”, mais disseminada, por
melhor refletir o fato de se tratar de software desenvolvido para circular
como produto, ainda que não para ser vendido em massa no varejo.

O software-produto é desenvolvido para atender a necessidades


genéricas de um público não quantificado de consumidores potenciais,
ainda que de um setor ou segmento específico de atividade econômica.
Geralmente, como veremos adiante, a transferência desse tipo de software
se dá por meio da cessão de direito pelo qual o desenvolvedor do software
(cedente) confere ao cessionário o direito de utilizar o programa de
computador, perpetuamente ou por tempo determinado.

O ministro Sepúlveda Pertence, valendo-se das definições de Rui


Saavedra87, assim definiu o software-produto em seu voto no Recurso
Extraordinário n. 176.626-3:

os programas standard, observa o autor, “constituem, em regra, pacotes


(packages) de programas bem definidos, estáveis, concebidos para serem dirigidos a
uma pluralidade de utilizadores – e não a um utilizador em particular –, com vista a
uma mesma necessidade de uma mesma categoria de utilizadores (por exemplo, a
contabilidade dos escritórios de advogados). Mas possibilitam uma configuração
adequada para que cada utilizador, em concreto, encontre a solução para a sua
realidade específica – serão o “esqueleto” a que falta o “revestimento muscular”.
São como que “vestuário de pronto a vestir”. Este software “produto acabado”, é
aquilo que os franceses denominam progiciel, neologismo criado partindo dos
termos “produit” e “logiciel”. Alguns destes programas – dependendo da sua
compatibilidade – podem ser utilizados em diferentes equipamentos. São programas
fabricados em massa e, como são vocacionados a um vasto público, são até
comercializados nos hipermercados – daí que também se fale aqui de software “off
the shelf”. O seu desenvolvimento comercial chegou a proporções tais que
movimenta cifras de vários milhões. Alguns desses programas proporcionaram
fortunas aos seus criadores.

Ao segundo tipo damos o nome de software por encomenda, ou


software específico (tailor-made). O software por encomenda é produzido

108
conforme as especificidades informadas pelo adquirente, buscando atender
um tipo específico de máquina (hardware) e um tipo específico de
problema ou necessidade. Embora o tema venha a ser abordado mais
adiante, vale adiantar que a titularidade do software sob encomenda não
precisa ser transferida pelo criador ao encomendante, na medida em que a
lei de proteção ao software já estabelece que a propriedade sobre o
intangível nasce, na origem, sob a titularidade do próprio encomendante.
Portanto, nesse tipo de desenvolvimento de software não haveria a
necessidade de transferência de direitos entre o desenvolvedor e o
usuário/encomendante.

Conforme explica o Ministro Sepúlveda Pertence, “já os programas ‘por


encomenda’ ou ‘à medida do cliente’ são desenvolvidos a partir do zero
para atender às necessidades específicas de um determinado usuário”.
Assim também segue a diferenciação proposta pela OCDE88: “application
software consist of standard software with a wide range of applications or
may have special software (tailor-made for single users or to be applied by
the developer itself)”.

A bem da verdade, existe ainda um terceiro tipo de software que se


insere, na diferenciação proposta acima, entre o software-produto e o
software por encomenda. Trata-se do software adaptável que, embora seja
intrinsicamente um software-produto, desenvolvido a fim de atender a um
público genérico e não quantificado de usuários, permite certo grau de
especificação segundo as necessidades do usuário que o adquiriu. Assim,
embora este software não tenha sido especialmente desenvolvido segundo
especificações fornecidas por um usuário definido, ele possui certa
flexibilidade para que possa ser adaptado às necessidades do adquirente.

109
Como explica o Ministro Sepúlveda Pertence: “por fim, os ‘programas
adaptados ao cliente (customized) constituem uma forma híbrida entre os
programas standard e os programas à medida do cliente. Baseiam-se em
programas standard que são modificados para se adequarem às
necessidades de um cliente particular (customization). Essa adaptação
pode ser realizada tanto pelo fornecedor do programa como pelo próprio
utilizador”.

2.4. Software como direito real do autor

Independentemente da forma como é desenvolvido e dos objetivos do


criador com o seu desenvolvimento (isto é, uso interno ou
comercialização), todo e qualquer software é tratado pela legislação
brasileira – e por grande parte da legislação internacional – como
propriedade intelectual sujeita ao regime jurídico dos direitos autorais.

A Convenção que institui a Organização Mundial da Propriedade


Intelectual89 (OMPI) define propriedade intelectual como a soma dos
direitos relativos às obras literárias, artísticas e científicas, às
interpretações dos artistas intérpretes, às execuções dos artistas
instrumentistas, aos fonogramas e às emissões de radiodifusão, às
invenções em todos os domínios da atividade humana, às descobertas
científicas, aos desenhos e modelos industriais, às marcas industriais,
comerciais e de serviços, bem como às firmas comerciais e denominações
comerciais, à proteção contra a concorrência desleal, e a todos os outros
direitos inerentes à atividade intelectual nos domínios industrial, científico,
literário e artístico.

Ainda segundo a OMPI90, a regulação dos direitos de propriedade


intelectual os divide em dois grandes grupos, a saber: o Direito de

110
Propriedade Industrial e o Direito Autoral (copyrights).

O Direito de Propriedade Industrial volta-se à regulação das criações da


mente humana que representem utilidades comerciais e industriais, que
sinalizam informações aos consumidores e ao mercado em geral. Isto pode
se dar por meio de patentes (isto é, invenções, modelos de utilidade,
modelo industrial e desenho industrial) ou da própria marca do produto (de
indústria, comércio ou de serviço e de expressão, ou sinal de propaganda).

O Direito Autoral, por sua vez, é a espécie de propriedade intelectual


que tutela a criação e a utilização de obras intelectuais estéticas, seja na
literatura, nas artes ou na ciência.

A OMPI entende que os programas de computador estariam abarcados


pelo conceito de obras intelectuais de natureza artística, literária ou
científica e, portanto, sujeitos à tutela do direito autoral. Nas palavras da
Organização91:

Computer programs are a good example of a type of work not included in the
list in the Berne Convention, but that now qualifies as a production in the literary,
scientific and artistic domain within the meaning of Article 2. Computer programs
are protected under the copyright laws of a number of countries as well as under
the WIPO Copyright Treaty (WCT) (1996).

O legislador brasileiro houve por bem seguir o mesmo tratamento.


Assim, o art. 2º, da referida Lei n. 9.609/98, é claro ao definir que “o
regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é
o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos
vigentes no país, observado o disposto nessa Lei”.

Na mesma direção segue o enunciado do art. 7º, da Lei n. 9.610, de 19


de fevereiro de 1998 (Lei do direito autoral), segundo o qual: “são obras
intelectuais protegidas as criações do espírito expressas por qualquer meio

111
ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que
se invente no futuro, tais como: (...) XII – os programas de computador;
(...)”.

Os direitos autorais relativos aos programas de computador


compreendem os conteúdos moral e patrimonial (art. 22, da Lei n.
9.610/98). Os direitos morais visam proteger a obra enquanto ideia
produzida pelo espírito de seu criador, enquanto uma extensão de sua
personalidade (arts. 24 a 27 da Lei n. 9.610/98). Contudo, o art. 2º, § 1º, da
Lei n. 9.609/98, definiu que não se aplicam ao programa de computador as
disposições relativas aos direitos morais previstas pela Lei n. 9.610/98,
ressalvado o direito do autor de reivindicar a paternidade do programa de
computador e de se opor a alterações não autorizadas, quando estas
impliquem deformação, mutilação ou outra modificação do programa de
computador, que prejudiquem a honra ou a reputação dele, autor.

Os direitos patrimoniais, por sua vez, visam proteger os proveitos


econômicos que o autor retira, ou deveria retirar, da obra (arts. 28 a 45, da
Lei n. 9.610/98). Adicionalmente ao já previsto pela Lei do direito autoral,
a Lei n. 9.609/98 estabelece que a titularidade dos direitos patrimoniais
relativos à criação do empregado, prestador de serviços contratado ou
servidor de órgão público é do empregador ou contratante, cuja
responsabilidade limita-se ao pagamento do salário ou remuneração
conforme ajustado entre as partes (art. 4º, caput e § 1º).

De acordo com o art. 3º, da Lei n. 9.610/98, e o art. 83, II, do Código
Civil brasileiro, o direito autoral é um bem móvel e, assim sendo, a
propriedade sobre um software constitui um direito real. Por essa razão,
considerando os princípios da compatibilidade e da transmissibilidade dos
direitos reais92, o titular do direito autoral figura necessariamente como

112
único proprietário do software, podendo, contudo, transmiti-lo a terceiros
se assim quiser.

O Ministro Sepúlveda Pertence, em seu voto no RE n. 176.626-3,


citando Rui Saavedra, explica que:

o que individualiza o software em relação aos outros instrumentos a serviço da


informação – assevera Rui Saavedra, em preciosa monografia acadêmica
apresentada à Universidade de Coimbra – “é a sua natureza imaterial na medida em
que ele mesmo é constituído por informação – a qual não tem substância tangível, e
é, em si, um bem imaterial. O software apresenta-se, pois, como um produto,
simultaneamente, utilitário e imaterial. Sendo software um dos chamados ‘bens
informacionais’ ou ‘produtos da informação’ ele não pode ser objeto duma proteção
eficaz contra os actos dos não proprietários. Tal proteção só poderá relevar o direito
intelectual, ou seja, através da organização de um ‘direito de exclusivo’ a favor
daqueles que elaboram o software”. E continua: “é esse ‘direito de exclusivo’ – que
não e mercadoria, nem se aliena com o licenciamento de seu uso (...)”.

Portanto, o desenvolvedor do software pode negociar permissões de uso


com terceiros bem como a transferência total ou parcial dos próprios
direitos de propriedade sobre o software, dando azo a inúmeras formas de
relações jurídicas que tenham o software como objeto.

3. OS DIFERENTES NEGÓCIOS ENVOLVENDO SOFTWARE EM


TRANSAÇÕES INTERNACIONAIS E O IRRF

Como objeto de direito real de autor, oponível erga omnes, passível de


circulação e de transmissão in totum ou em parte, o software pode ser
objeto de negociações com diferentes conteúdos.

Cabe, para fins do presente estudo, examinar a natureza jurídica dos


principais tipos de transações envolvendo software, com ênfase nos
direitos e riscos que são efetivamente transferidos ou cedidos como
resultado de sua celebração. Tais aspectos são relevantes na caracterização
jurídica dos valores pagos em contraprestação e na determinação do
correspondente regime tributário93.

113
Como tratamos acima, as transações comerciais com software podem
ter como objeto um software-produto, software sob encomenda ou, ainda,
um software adaptável. A depender do tipo de software negociado entre as
partes, as formas jurídicas do negócio tendem a variar substancialmente.

Assim, operações com software por encomenda costumam envolver a


contratação de um serviço por parte do desenvolvedor, figurando o
encomendante como titular dos direitos de propriedade sobre o software
desde o início, nos termos da legislação aplicável.

As operações com o software-produto, por sua vez, envolvem maior


variedade nos negócios jurídicos possíveis, posto que o direito de
propriedade sobre a obra é de seu desenvolvedor, que pode, então,
transferir algumas de suas utilidades a terceiros (como o direito de uso), de
forma perpétua ou temporária ou, ainda, o próprio direito de propriedade
sobre o software, total ou parcialmente. Dessa forma, diferentemente dos
negócios envolvendo software sob encomenda, as transações com
software-produto dependem em grande medida de quais utilidades e
direitos são efetivamente transferidos como parte da transação.

Quanto aos negócios envolvendo software adaptável, posto que ele


envolve um mix entre a transferência de utilidades ou direitos relativos ao
software-produto e a prestação de serviços de adaptação do programa às
necessidades do contratante, as transações a ele relativas assumirão
características de negócios envolvendo software-produto e/ou prestação de
serviços, conforme as diferentes pactuações entre desenvolvedor e
usuário/adquirente.

Diante da diversidade de direitos envolvidos e da multiplicidade de


negócios jurídicos que lhes são correspondentes, analisamos abaixo cada

114
uma dessas figuras e os respectivos regimes de IRRF.

Para tanto, consideramos um quadrante fático em que o desenvolvedor


do software é uma pessoa jurídica não residente do Brasil, e a contraparte
que lhe paga ou credita contraprestações é uma pessoa jurídica residente
do Brasil.

4. TRANSAÇÕES COM SOFTWARE SOB ENCOMENDA

Neste tipo de transação o desenvolvedor elabora um software


especificamente para um único cliente, conforme suas especificações e
necessidades. Assim, o objeto do negócio jurídico não é a transferência de
direito ou da titularidade de software já desenvolvido, mas, isto sim, a
obrigação de se elaborar um determinado software mediante o pagamento
de contraprestação94.

O desenvolvedor não corre riscos de perecimento ou obsolescência em


razão do desenvolvimento do software, visto que ele já possui destinatário
certo. Adicionalmente, é possível que o cliente antecipe parte do
pagamento devido ao desenvolvedor para que ele possa arcar com os
custos de desenvolvimento do software.

A citada Lei n. 9.609/98 (“Lei do software”) estabelece que, nesse tipo


de operação, o encomendante figura como o único proprietário do
software, cabendo ao seu desenvolvedor apenas o direito de reivindicar a
paternidade moral do programa de computador e o direito de opor-se a
alterações não autorizadas, quando estas impliquem deformação,
mutilação ou outra modificação que maculem sua (do desenvolvedor)
honra ou reputação95.

115
Portanto, nesse tipo de negócio não costuma haver qualquer
transferência de propriedade entre o desenvolvedor do software e seu
encomendante. Esse direito é atribuído ao encomendante desde o início da
operação.

A obrigação do desenvolvedor, nesse caso, é uma verdadeira obrigação


de fazer, representativa de locação de serviços nos termos dos arts. 247 e
seguintes do Código Civil brasileiro.

Nesse caso, e qualquer que seja o conceito de serviços ou prestação de


serviços que se adote96, a remuneração devida pelo encomendante
residente do Brasil ao desenvolvedor não residente se submeterá ao
tratamento tributário aplicável à importação de serviços técnicos97.

Como tal, o IRRF será aplicável sobre os valores brutos pagos ou


creditados ao exterior à alíquota de 15%, assumindo que o desenvolvedor
não esteja localizado em país considerado pela legislação brasileira como
paraíso fiscal ou regime de tributação favorecido98.

Ademais, caberá observar eventuais limitações impostas pelos tratados


para evitar a bitributação celebrados pelo Brasil cujos protocolos remetam
os serviços técnicos ao regime de royalties previsto no tratado. É o caso,
por exemplo, daquele celebrado com Israel, cujo protocolo estende aos
rendimentos originários da prestação de assistência técnica e de serviços
técnicos o tratamento aplicável a royalties, resultando em limitação da
alíquota de IRRF aplicável a 10% nos termos do art. 12, item 2, alínea “b”,
do Tratado99.

5. TRANSAÇÕES COM SOFTWARE-PRODUTO

116
As transações com software-produto, por sua vez, ocorrem em
momento lógico posterior ao desenvolvimento do próprio software. O
criador da obra é o único detentor de direitos de propriedade sobre o
software e, assim, pode explorá-lo economicamente ou dispor de seus
direitos conforme sua conveniência.

O criador do software pode fornecer cópias da obra para que terceiros


possam usá-lo ou revendê-las a terceiros. O criador pode, ainda, ceder
direitos patrimoniais sobre o software para que terceiros o explorem
economicamente por um determinado período em determinada região, ou
mesmo transferir integralmente os direitos de propriedade sobre o
software.

Ao comercializar licenças de uso, o desenvolvedor não transfere


nenhum tipo de propriedade sobre o software aos usuários. Ao contrário, o
desenvolvedor apenas permite ao usuário utilizar o software,
disponibilizando uma cópia (copyrighted article100) que pode ser gravada
em meio físico ou acessada via download101.

Diferentemente da transferência do copyrighted article, o


desenvolvedor também pode negociar os próprios direitos que ele detém
sobre o software. Nesse caso, fala-se em cessão de direitos de propriedade
do software, que pode ser integral ou parcial. O adquirente, nesse caso,
passa a deter direitos sobre o software que lhe permitem explorá-lo
economicamente, geralmente durante determinado período e numa região
delimitada. Embora menos comum, também pode ser o caso de cessão
integral dos direitos de propriedade, de forma que o adquirente passa a ser
o único proprietário do software.

117
Tarcísio Queiroz Cerqueira102 apresenta a questão ao afirmar que a
“licença” é espécie do gênero “cessão”. A licença visa apenas permitir, em
caráter precário, o gozo das utilidades produzidas pelo software, isto é, o
seu uso pleno pelo usuário. A cessão, em contrapartida, visa transferir os
próprios direitos de propriedade sobre o intangível, no todo ou em parte103.

Contudo, e como referimos anteriormente, a RFB expressou


recentemente o entendimento104 no sentido de que valores pagos ou
creditados ao exterior para a aquisição de licenças de software-produto,
independentemente de serem para uso do adquirente ou para distribuição a
terceiros no mercado brasileiro, teriam sempre a natureza de remuneração
pelo licenciamento de uso de direitos autorais, caracterizando royalties
para fins fiscais.

Segundo tal posicionamento, que reformulou a visão anterior da própria


RFB que era baseada na jurisprudência do STF, o IRRF deve ser retido
quando o adquirente brasileiro paga valores ao não residente, proprietário
do software-produto, para aquisição de cópias para a revenda no país,
constituindo royalties para fins legais e fiscais brasileiros.

Ainda segundo as autoridades fiscais, somente a partir do momento em


que o software é “nacionalizado” e comercializado no Brasil é que as
operações com o software-produto passariam a se sujeitar ao tratamento
tributário geralmente aplicável às mercadorias.

Nesse sentido, pelo menos indiretamente, as autoridades fiscais


parecem ter adotado uma visão segundo a qual um distribuidor de software
brasileiro nunca estaria em uma posição legal na qual poderia
adquirir/importar uma mercadoria e pagar um preço para o não residente
desenvolvedor de software. Igualmente, um usuário de software que

118
fizesse um pagamento ao desenvolvedor não residente em função da
aquisição desse direito de uso também estaria remetendo royalties ao
exterior, ainda que se tratasse de preço pela aquisição de um software-
produto.

Data venia, a generalização do tratamento fiscal atribuído a toda e


qualquer transação internacional envolvendo software-produto descuida da
adequada qualificação jurídica dos negócios jurídicos executados entre as
partes e dos efeitos deles decorrentes, como demonstraremos abaixo.

A nosso ver, a qualificação jurídica e o respectivo tratamento tributário


serão distintos conforme os direitos e utilidades transferidos no negócio,
merecendo análise agrupada em quatro categorias que serão abordadas na
sequência:

(i) cessão (total) de direitos de propriedade sobre o software-produto;


(ii) cessão (parcial) de direitos de exploração econômica do software-produto;
(iii) licença de uso do software-produto (copyrighted article); e
(iv) compra e venda de licenças de uso de software-produto (copyrighted
articles).

5.1. Cessão integral dos direitos de propriedade sobre o software

As operações envolvendo a cessão integral dos direitos de propriedade


sobre o software, que não se limitam àqueles relativos apenas à reprodução
e à distribuição da propriedade intelectual, geralmente representam uma
operação de compra e venda de ativos, na medida em que o vendedor
deixa de possuir a totalidade dos direitos autorais sobre a obra,
remanescendo apenas os morais relativos à paternidade, transferindo-os de
seu patrimônio para o patrimônio do adquirente, que passa a ser o único
capaz de usar, explorar e dispor de todos os direitos relativos à obra105.

119
Por se tratar de uma transferência total, ela pode ser realizada uma única
vez pelo desenvolvedor do software, não se configurando transação
habitual de compra e venda de bens e serviços.

A cessão integral dos direitos de propriedade sobre o software se


aproxima, portanto, de uma relação de compra e venda de ativo não
circulante, sendo o valor pago pelo adquirente brasileiro um preço na
aquisição de bem ou direito106.

Nesta esteira é a manifestação da OCDE107, segundo a qual os


pagamentos pela aquisição dos direitos de propriedade do software não
envolvem a remuneração por direitos de uso ou de exploração econômica,
mas sim uma contraprestação pela transferência da totalidade dos direitos
de propriedade. Por essa razão, não poderiam ser considerados royalties.

A eventual incidência do IRRF, a nosso ver, deveria ser regida pelo art.
26, da Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003108, segundo o qual o
imposto incidiria sobre eventual ganho de capital auferido por não
residente ao alienar bens localizados no Brasil.

A aplicação de tal dispositivo comanda as seguintes características


principais no caso: (i) como corolário do princípio da fonte109, a incidência
pressupõe um bem (direito de propriedade do software) do não residente
localizado no Brasil (critério do locus rei site); e (ii) a base de cálculo deve
ser o ganho de capital, podendo o desenvolvedor deduzir do preço o custo
de aquisição do direito alienado para sua determinação.

Definir se determinado bem está localizado no Brasil para fins do citado


art. 26, da Lei n. 10.833/2003, é por vezes tarefa hercúlea, ainda mais no
caso de intangíveis. No caso presente, parece-nos adequado considerar que

120
o direito de propriedade do software adquirido pelo residente no Brasil não
seria bem aqui localizado se não tiver o registro ou uso no mercado
brasileiro.

Por outro lado, dúvidas podem surgir em relação ao software que já


esteja em aplicação e comercialização no mercado brasileiro, e cuja
propriedade seja integralmente adquirida por um residente. A questão aqui
é a de saber se o uso em território brasileiro, ainda que de software
integralmente desenvolvido fora do Brasil por não residente, atenderia ao
critério do locus rei site do art. 26, da Lei n. 10.833/2003.

Por outro lado, uma questão adicional decorre de possível concorrência


do art. 72, da Lei n. 9.430, de 27 de dezembro de 1996, incorporado ao art.
709, do Regulamento do Imposto de Renda (Decreto n. 3.000/99 ou
RIR/99)110, segundo o qual o IRRF incide sobre os pagamentos remetidos
ao exterior pela aquisição ou pela remuneração, a qualquer título, de
qualquer forma de direito.

Embora alocado em subseção do RIR/99 intitulada “Remuneração de


Direitos, inclusive Transmissão por meio de Rádio ou Televisão”, o
enunciado prescritivo do art. 72, da Lei n. 9.430/96, não limita a
materialidade da incidência nele prevista a valores pagos ou creditados a
não residentes pela remuneração de direitos, nela incluindo também
valores pagos pela “aquisição” de qualquer forma de direito, com elenco
exemplificativo iniciado pela locução “inclusive”.

Referido dispositivo foi utilizado pela RFB como base para determinar
a incidência de IRRF em valores pagos em parcela única pela aquisição de
direitos no exterior, ainda que sem conexão ou localização no Brasil,
relacionados à transferência em definitivo de intangível para o Brasil111.

121
Pois bem. Dentre os dois enunciados aparentemente aplicáveis – art. 26
da Lei n. 10.833/2003, que regula o IRRF sobre ganhos de capital na
alienação de bens e direitos localizados no Brasil, e o art. 72 da Lei n.
9.430/96, que regula o IRRF sobre valores pagos por suposta aquisição de
direitos –, parece-nos que deve prevalecer o primeiro.

A primeira razão para tal conclusão tem suporte no critério temporal:


ainda que houvesse antinomia aparente entre os dispositivos, aquele do art.
26 da Lei n. 10.833/2003 é posterior ao do art. 72 da Lei n. 9.430/96.

A segunda é de ordem sistemática, de coerência com o art. 43 do


Código Tributário Nacional (CTN). No caso da alienação de um direito
por completo, em que o alienante não mais tem como usufruir as utilidades
a ele relativas, é mais pertinente a noção de renda-acréscimo, e não de
renda-fonte, pelo que a tributação deveria se fazer pelo ganho de capital
auferido, melhor medida de acréscimo patrimonial, precisamente o que
resulta do regime do art. 26, da Lei n. 10.833/2003.

Ademais, ainda que pelo direito interno se concluísse pela aplicação do


art. 72 da Lei n. 9.430/96, haveria limitação para a tributação dos valores
brutos nas hipóteses em que haja tratado para evitar a bitributação
celebrado pelo Brasil com o país de residência do desenvolvedor-alienante.
Isso porque, no caso de uma alienação única de ativo não circulante, não
incluída no curso normal de operações comerciais habituais da entidade,
deve ser aplicado o art. 13 da Convenção Modelo, que regula a tributação
de ganhos de capital na alienação de bens e direitos situados num Estado
por residente do outro Estado112.

Enquanto na Convenção Modelo a competência para a tributação de tais


ganhos é exclusiva do país de residência do alienante, nos tratados

122
celebrados pelo Brasil (à exceção do tratado com o Japão) prevê-se em
regra a competência concorrente do país de residência e do país de fonte
(Brasil no caso).

Precisamente no exercício de tal competência insere-se o enunciado do


art. 26, da Lei n. 10.833/2003, que entendemos pertinente e
potencialmente aplicável à espécie.

Por fim, vale a ressalva de que o tratamento acima propugnado se aplica


na aquisição no direito de propriedade integral do software, com preço
único e definido pelo bem adquirido113, assumindo o adquirente todos os
ônus e bônus inerentes a sua propriedade e exploração econômica.

Se as características do negócio forem tais que, não obstante a


designação formal de transferência plena de titularidade, o alienante
continuar usufruindo, mesmo após a alienação, benefícios oriundos da
exploração econômica do software, não se estará mais diante de compra e
venda de direitos sujeita ao regime de ganho de capital, mas sim de licença
temporária com manutenção da fonte produtora da renda, com diferente
tratamento tributário.

Seria o caso, por exemplo, de uma situação em que o adquirente paga


ao alienante como preço de aquisição valores periódicos, por longo
período de tempo (próximo do próprio tempo de obsolescência do
software), correspondentes a parcela do resultado da exploração
econômica do software. Nesse caso estar-se-á, possivelmente, diante de
cessão parcial de direitos de exploração econômica do software-produto,
tratada a seguir.

5.2. Cessão parcial de direitos de exploração econômica sobre o software

123
As operações envolvendo a aquisição de direitos de reprodução e
comercialização de software por residente no Brasil comumente envolvem
a transferência, pelo desenvolvedor não residente, do direito à reprodução
e à comercialização das licenças de uso do software no Brasil.

Trata-se de cessão parcial porque o desenvolvedor continua titular


pleno dos direitos de propriedade sobre o software, apenas permitindo ao
cessionário o direito a reprodução para a criação de cópias a serem
vendidas em território brasileiro. O desenvolvedor mantém, assim, a
titularidade da fonte de produção da renda, recebendo contraprestação pela
cessão do direito de exploração econômica claramente caracterizada como
renda.

A contraprestação paga pelo cessionário costuma ser periódica, tendo


como base o número de cópias do software realizadas ou um percentual da
receita gerada com a exploração econômica do software (percentual sobre
a receita de venda das licenças de uso).

Tal contraprestação fica sujeita ao IRRF a ser retido pela fonte pagadora
brasileira, cabendo cogitar da aplicação de dois regimes jurídicos distintos,
ambos resultando na aplicação da alíquota de 15%.

O primeiro regime a se considerar é o aplicável a royalties. Estabelece o


art. 22, da Lei n. 4.506, de 30 de novembro de 1964114, que se consideram
royalties para fins fiscais “os rendimentos de qualquer espécie decorrentes
do uso, fruição, exploração de direitos”, incluindo aqueles de “exploração
de direitos autorais, salvo quando percebidos pelo autor ou criador da
obra” (alínea “d”).

124
Sendo o software objeto de direito real de autor, como explicamos no
item 2.4, a remuneração pelo direito a sua exploração econômica paga por
fonte brasileira caracteriza em princípio royalties, sujeita à alíquota de
IRRF de 15% a teor do que prevê o art. 710 do RIR/99115.

Dizemos “em princípio” porque a inclusão dos rendimentos de


exploração do direito de autor no conceito de royalties tem a ressalva
constante da alínea “d” do art. 22, da Lei n. 4.506/64. Fica afastada a
caracterização de royalties, nesse caso, quando os rendimentos são
percebidos pelo autor da obra.

Há controvérsia na jurisprudência sobre se a figura do autor para fins da


ressalva acima compreende apenas o criador pessoa física ou também o
desenvolvedor pessoa jurídica, que se utiliza da mão de obra contratada de
empregados e profissionais autônomos para a criação e o desenvolvimento
da obra. Tal ponto tem sido enfrentado para estabelecer os limites da
aplicação de regra que restringe a dedutibilidade, na apuração do lucro
real, de despesas de royalties pagos a sócios116, questão que foge aos
limites do presente trabalho117.

Em hipótese envolvendo pagamento de remuneração pelo direito de


reprodução e de comercialização de cópias de software, a RFB adotou a
posição de tratar-se de royalties sujeitos à alíquota de 15%118. Na situação
examinada, a fonte pagadora importava “cópia master” e a utilizava para
produzir cópias do software comercializadas no Brasil, pagando ao
desenvolvedor um percentual sobre a receita de vendas.

Acertou a RFB quando considerou que a situação cuida de efetiva


disponibilização de renda ao desenvolvedor. No entanto, os autores

125
chegam à conclusão quanto à aplicação da alíquota de IRRF de 15% por
fundamentos diversos.

Para os autores deste artigo, a remuneração paga ao desenvolvedor,


ainda que pessoa jurídica, pela cessão dos direitos à exploração econômica
do software não caracteriza royalties pela aplicação da ressalva constante
da parte final da alínea “d” do art. 22, da citada Lei n. 4.506/64.

Neste caso é o art. 72, da Lei n. 9.430/96, referido no item 5.1 acima,
que rege a incidência do IRRF, eis que o caso é claramente de
remuneração por qualquer forma de direito (no caso direito patrimonial de
autor), resultando igualmente na aplicação da alíquota de 15%.

Se no âmbito do direito interno pode haver controvérsia quanto à


caracterização dos rendimentos ora tratados como royalties, tal conflito
não existe nos tratados internacionais para evitar a bitributação.

A OCDE é firme em considerar que a remuneração pela exploração


comercial do software está incluída no conceito de royalties dos tratados,
ainda que se adote interpretação restritiva sobre o termo “uso” ou “direito
de uso” presente na cláusula de royalties da Convenção Modelo da
OCDE119:

the solution of these crucial differences of view must lie in the definitions of
royalties in paragraph 2 of Article 12: “the term ‘royalties’ as used in this Article
means payments of any kind received as consideration for the use of, or right to use,
any copyright [...] any patent […]”. On the broad interpretation, the mere purchase
of a product protected by copyright or a patent is likely to result in the payment of a
royalty as consideration for the use of the product. The narrower interpretation is
that “use” as referred to in the Model Convention is limited to use by an acquirer
who seeks to exploit commercially the intellectual property of another. A substantial
majority of the Committee took the firm view that the narrower interpretation was
correct. […]

126
Assim, a alíquota de IRRF de 15% pode ser reduzida se o beneficiário
for residente de país com o qual o Brasil tenha celebrado tratado para
evitar a bitributação que preveja limite inferior de alíquota para
rendimentos de royalties em geral ou para royalties de direito de autor em
particular. É o caso, por exemplo, dos tratados com Espanha120, França121,
Finlândia122, Israel123 e Japão124.

5.3. Licença de uso do software (copyrighted article)

A cessão do direito de uso é conferida pelo desenvolvedor ao usuário


por meio da disponibilização de uma cópia do software combinada com
uma licença de uso. Dessa forma, o que se negocia não são direitos de
propriedade sobre o software mas apenas suas utilidades, que são
disponibilizadas por meio da entrega de uma cópia em meio físico
contendo uma reprodução da obra ou por meio de download125.

Nesse tipo de licença, o usuário pode adquirir cópia do software para


uso por período indeterminado, denominada licença perpétua de uso do
software, ou, ainda, para uso por período definido de tempo, podendo ser
renovada a sua licença após o transcurso do tempo definido no contrato.

5.3.1. Licenças perpétuas

Quanto à licença perpétua de uso, quer nos parecer que o desenvolvedor


e usuário realizam verdadeira transação de compra e venda de bens126, na
medida em que o usuário adquire uma permissão de uso que lhe é
específica, assumindo todos os riscos e benefícios da aquisição daquela
cópia, principalmente o risco de obsolescência. Assim, embora o usuário
não adquira direitos de propriedade sobre o software em si, isto é,
enquanto propriedade intelectual, ele inegavelmente adquire propriedade

127
sobre a cópia recebida (copyrighted article), podendo utilizá-la
indefinitivamente.

Vale destacar que a própria RFB127 se manifestou no sentido de que a


posição do STF, sobre serem as transações envolvendo licença de uso de
software-produto negócio jurídico de compra e venda, seria aplicável às
operações envolvendo a aquisição do software pelo usuário final.

Embora na hipótese a RFB não tenha se manifestado sobre uma


transação que envolvia desenvolvedor não residente transacionando a
licença de uso diretamente com o usuário final, seria possível inferir, sob
uma perspectiva lógica, que o tratamento de mercadoria aceito pela RFB
na transação entre o distribuidor e o usuário final também seria adotado na
transação entre o desenvolvedor e o usuário final.

A OCDE segue tal linha, entendendo tratar-se a transferência perpétua


de direitos de uso veiculados por meio do copyrighted article como
operação de compra e venda entre as partes128.

Destarte, e em que pese a existência de posições em contrário129, é


possível concluir que o valor pago pelo adquirente de um copyrighted
article de software-produto em licença perpétua representa verdadeiro
preço em transação de compra e venda, e não renda ou royalties do
beneficiário, portanto não se sujeitando ao IRRF.

5.3.2. Licenças temporárias

Tal conclusão, entretanto, não se aplica quando o usuário adquire a


licença para uso por um período de tempo determinado.

Nesses casos o usuário não detém a propriedade sobre a cópia do


software adquirida, não podendo continuar a utilizá-lo após encerrado o

128
período da licença. O risco de obsolescência é mitigado na medida em que
o usuário possui acesso direto a patches, updates e upgrades durante o
prazo de vigência da licença. Assim, qualquer evolução tecnológica
introduzida no software pelo seu desenvolvedor torna-se disponível ao
usuário independentemente de contraprestação adicional.

Nesse caso fica afastada, a nossa ver, a caracterização da operação de


compra e venda, eis que a transferência da cópia, do copyrighted article,
não é definitiva, não tendo o usuário os privilégios e riscos típicos do
proprietário da cópia.

Para a OCDE, esse tipo de transação seria de difícil classificação,


embora reconheça a possibilidade de configurá-la como aluguel de bem
móvel130:

However, some companies do not operate by selling “infinite” licenses, but


rather by requesting annual payments for the use of their software. These annual
payments are often called royalties. The recommended treatment by SNA is to
classify these payments as rentals, and thus as intermediate consumption. But the
consequence is that if one software company changes its mode of payment from
“infinite” to annual royalties, this leads to a decrease of investment and, of GDP…
while, in fact, on an economic level, nothing has much changed, except for the mode
of payment.
The main specific economic characteristic of software does not lie in the fact
that it is “intangible” (i.e, the fact that you cannot “touch it” is not economically
significant). It is that copies of originals can be made at a cost that is near to zero.
This has an important consequence. If a parallel is made between the truck industry
and the software industry (both capital goods), the situation is quite different
regarding rentals. In the first case, whatever the mode of payment of the final user
of the truck, the truck will be recorded as GFCF: either it is the GFCF of the final
user, or the GFCF of the truck rental company. The situation is quite different for
software. Because copies of software are so easy and costless and its expected life
so short, there is no economic need for a “software rental industry”. The choice of
buying the software or of renting it, becomes purely the choice of a certain mode of
payment. Fortunately, the task force recommended that, even if, in the theory of
SNA, these payments should have been treated as rentals (and thus intermediate
consumption), in practice, they would be included in GFCF.

129
A argumentação da OCDE é impactante. De fato, o usuário de uma
licença temporária de software faz o pagamento para ter o direito de uso de
um bem por determinado período de tempo, aspectos que preenchem os
elementos do contrato de locação131, inclusive no direito privado
brasileiro.

Ocorre que, para a legislação tributária brasileira, tal conclusão – a de


tratar-se a contraprestação pela licença de uso temporária de software de
rendimento de aluguel – encontra restrições. O art. 21, da Lei n.
4.506/64132, qualifica como aluguel ou arrendamento apenas os
rendimentos pelo uso ou exploração de bens corpóreos, o que não é o caso
do software, direito de autor não corpóreo. E tal qualificação distinta do
direito privado é, como se sabe, plenamente possível ao direito tributário,
como admite o art. 109 do CTN.

Como já afirmamos anteriormente, rendimentos pagos ou creditados


pelo uso de bem intangível são qualificados pela legislação brasileira como
royalties133.

Assim, os rendimentos pagos ou creditados em consideração pela


utilização de um bem devem ser qualificados como de arrendamento (ou
aluguel) se esse bem for tratado como um ativo corpóreo para fins legais
ou como royalties se esse bem for não corpóreo, intangível. Uma vez que
o software é intrinsecamente um intangível, os rendimentos pagos ou
creditados a não residentes em contrapartida pela licença temporária de
uso seriam tratados como royalties para fins fiscais brasileiros, ficando
sujeitos à alíquota de 15% de IRRF prevista no art. 710 do RIR/99.

A única ressalva ao raciocínio acima desenvolvido é que, em se


tratando de rendimentos pagos ao próprio autor ou desenvolvedor do

130
software, direito autoral, o regime tributário aplicável não seria, a nossa
ver, o de royalties, por conta da ressalva constante da parte final da letra
“d” do art. 22, da Lei n. 4.506/64, de que tratamos no item 5.2 acima.

Aqui, novamente, tem lugar a incidência do art. 72, da Lei n. 9.430/96,


referido no item 5.1 acima, que prevê a aplicação de IRRF sobre
rendimentos relativos à remuneração de qualquer forma de direito (no caso
direito patrimonial de autor), resultando igualmente na aplicação da
alíquota de 15%.

O órgão regional da 10ª Região Fiscal da RFB adotou esse mesmo


entendimento em respostas a consultas nos anos de 2010134 e 2011135, que
enfrentaram especificamente o tratamento de IRRF aplicável no caso de
remuneração por licença temporária de uso de software-produto, afastando
a qualificação de “mercadoria” e propugnando pela aplicação do
dispositivo acima mencionado – art. 72 da Lei n. 9.430/96, que alcança a
remuneração por qualquer forma de direito.

Segundo a RFB, a licença temporária de uso de software-produto não


configura venda de mercadoria. Nesse caso, a remuneração correspondente
ocorre em razão da outorga de direito de uso temporário de programa de
computador (obra intelectual), constituindo acréscimo patrimonial do
titular dos direitos autorais sobre o software. Sendo assim, o rendimento
correspondente enquadra-se na hipótese do referido art. 72 (parte inicial),
qual seja, de remuneração de um direito. Ainda segundo a RFB, como os
rendimentos são percebidos pelo próprio detentor dos direitos autorais
sobre a obra (no caso, o software), isso afastaria o rendimento em tela do
conceito de royalty, a teor da regra exceptiva contida na parte final da
alínea “d” do art. 22 da Lei n. 4.506.

131
Por outro lado, nos casos em que o licenciador é residente em país com
o qual o Brasil celebrou tratado para evitar dupla tributação, o pagamento
pelo uso temporário do software não teria o tratamento de royalties caso se
adotasse a interpretação restritiva da OCDE no sentido de que somente a
remuneração pelo uso “econômico” do software configuraria royalties,
albergado pelo art. 12 da Convenção Modelo da OCDE.

Como indicamos anteriormente, a posição da OCDE é a de que o termo


“uso” deveria ser interpretado restritivamente, no sentido de que apenas a
remuneração pelo uso econômico do software seria remunerável por
royalties. Assim, a contraprestação pelo uso do software, enquanto gozo
de suas propriedades e funções, ainda que periódica, não representaria
royalties, posto que não remunera o direito de exploração econômica do
software, e sim receita componente do lucro das empresas (business
profits) de que trata o art. 7º da Convenção Modelo, afastando a tributação
pelo país da fonte.

Temos dificuldade em admitir essa interpretação restritiva. A definição


de royalties no art. 12 na Convenção Modelo, reproduzida no essencial nos
tratados brasileiros136, incorpora “pagamentos de qualquer natureza
efetuados em contrapartida pelo uso ou pelo direito ao uso de direitos”.
Nada há na definição que permita delinear a limitação a uso para
exploração comercial, como pretendeu fazer a OCDE. “Uso” pode ser para
a exploração comercial, para a utilização própria da fonte ou para outros
fins.

Se é certo que a cláusula de “lucro das empresas” está direcionada a


capturar aquele resultado da atividade operacional, habitual, das atividades
empresariais, também é assente que ela deve ser aplicada residualmente, se

132
o rendimento que compõe o lucro não estiver albergado nas disposições
mais especificas do tratado137.

Nesse sentido, a posição da OCDE parece estar mais influenciada por


um viés que privilegia a tributação da residência em detrimento da
tributação na fonte que por uma construção de hermenêutica a partir dos
enunciados prescritivos aplicáveis.

133
5.4. Compra e venda de licenças de direito de uso (copyrighted articles) para a
distribuição no mercado interno

Como visto acima, as operações envolvendo software podem não


envolver a cessão de direitos relativos à propriedade intelectual, mas, isto
sim, apenas à transferência de uma cópia do próprio software,
individualizado e corporificado numa licença de uso que, uma vez
adquirida pelo usuário final, confere-lhe a capacidade de usufruir de suas
utilidades.

O mesmo raciocínio poderia ser aplicado, a nosso ver, às operações de


aquisição e de distribuição de licenças de uso de software-produto, que
nada mais são do que cópias do software-produto (copyrighted articles).
Nesse tipo de transação, um distribuidor adquire as licenças de uso do
desenvolvedor e as revende aos usuários.

Note que, nas operações de distribuição de licenças de uso, o objeto do


negócio entre o desenvolvedor e o distribuidor, e entre este e o usuário
final, não é a cessão dos direitos patrimoniais sobre o intangível, isto é,
direitos de reprodução ou cópia do software, mas, isto sim, apenas a
transferência de uma cópia da licença de uso individualizada que sai do
patrimônio do desenvolvedor, passa pelo patrimônio do distribuidor, em
forma de estoque e, por fim, chega ao patrimônio do usuário, sendo certo
que o distribuidor não possui qualquer intenção de usar, ele mesmo, o
software adquirido do desenvolvedor. Ao contrário, pretende o distribuidor
apenas revendê-lo a terceiros com certa margem de lucro.

A transação entre o desenvolvedor e o distribuidor é, à toda evidência,


uma operação de compra e venda de cópias de copyrighted articles, cópias
do software juridicamente representadas pelas licenças de uso.

134
Nessas operações resta ainda mais evidente que o software deveria ser
tratado como uma mercadoria sujeita a compra e venda. O distribuidor
paga o preço pela aquisição e assume o risco de estoque, caso não o venda
aos usuários finais, e de crédito, caso o usuário final não honre suas
obrigações. O preço normalmente é fixado por unidade de cópia do
software adquirida.

Contudo, como já informado acima, por meio da Solução de


Divergência 18/2017 e, mais recentemente, do ADI n. 7/2017, a RFB
manifestou o entendimento de que o pagamento feito pelo distribuidor
brasileiro ao desenvolvedor não residente, inclusive na hipótese ora
tratada, teria a natureza de remuneração de direitos de exploração
comercial, caracterizando royalties para fins fiscais. Como já mencionado
acima, na Solução de Divergência 18/2017 a RFB é ainda mais categórica
ao afirmar que o entendimento do STF no RE 176.626-3 não seria
aplicável às transações com software-produto entre o desenvolvedor não
residente e o distribuidor brasileiro, mas apenas às transações entre este o
distribuidor brasileiro e seus clientes.

Com a devida vênia, não podemos concordar com essa interpretação da


RFB. As conclusões trazidas pelo Ministro Sepúlveda Pertence nos autos
do citado RE 176.626-3 parecem considerar um espectro muito mais
amplo de transações com software-produto, não se limitando apenas às
licenças de uso transferidas ao usuário final. Seria possível concluir a
partir de seu voto que, para o Ministro, o que importa seria distinguir as
operações com o exemplar do programa (mercadoria) daquelas relativas ao
próprio programa (propriedade intelectual). Nas próprias palavras do
Ministro: “o licenciamento, como disse, não se confunde com as operações

135
realizadas com o exemplar do programa”. E segue com o raciocínio
citando Rui Saavedra (p. 79, 80):

... quando o software standard é licenciado – a licença é uma permissão para


fazer algo que de outro modo seria ilícito –, há na verdade dois contratos: por um
lado, um contrato para que sejam fornecidas as manifestações físicas do software; e
por outro lado, um contrato para atribuição de uma licença de uso do software. O
contrato pelo qual o cliente é investido na posse do software será um contrato de
compra e venda ou de doação se a propriedade sobre os meios físicos for
transmitida ao licenciado; se não houver essa transmissão, tratar-se-á de um
contrato de locação ou, porventura, de comodato. Mas o contrato de licença subsiste
paralelamente, e é importante porque – como veremos – os produtores de software,
após a entrega do exemplar do software, continuam preocupados em proteger os
direitos de propriedade intelectual sobre o software por eles criado, e impor
restrições ao uso do software entregue.

Nessa linha de raciocínio, o preço pago pela aquisição ou importação de


software-produto não caracteriza royalty, por ser contraprestação em
operação com o exemplar do software (copyrighted article – na
terminologia usada acima), e não com o software em si.

Como comentamos anteriormente, a OCDE sustenta que pagamentos


em contrapartida para exploração de direitos comerciais, pelo direito de
reproduzir ou adaptar o software para a futura distribuição, caracterizam
renda sujeita a tributação na fonte, com o que concordamos e conforme
exemplificamos anteriormente (vide exemplo no item 5.2 acima)138. Mas
ela não trata especificamente da operação de compra e venda de
copyrighted articles por distribuidor que se coloca comercialmente entre o
desenvolvedor e o usuário final.

A remuneração pelo direito de uso comercial do software implica


aquisição de direitos patrimoniais sobre o software, que permitem ao
adquirente explorá-lo economicamente durante um determinado período
em determinada região. O adquirente é livre para produzir o número de
cópias do software que desejar, desde que respeite os limites espaciais e

136
temporais do contrato. Nesse caso ele não precisa necessariamente formar
um estoque de cópias do software, posto que pode reproduzi-lo sempre que
necessário para fazer frente à demanda.

A aquisição e a revenda do software, por outro lado, não envolvem a


aquisição de direitos patrimoniais sobre o software. Ao
adquirente/distribuidor cabe revender cópias do software
instrumentalizadas em licença de uso individualizadas. Assim, tanto a
relação comercial entre o desenvolvedor e o distribuidor como o próprio
objeto negociado estão relacionados a operações de compra e venda de
direitos. O distribuidor adquire as licenças de uso por um determinado
valor, buscando barganhar o preço, dado o volume da aquisição, e as
revende com uma margem de lucro. O distribuidor sofre os riscos de
formação de estoque e de obsolescência do software, riscos que são menos
aplicáveis aos adquirentes de direitos patrimoniais do software, que
geralmente recebem todos os patches, updates e upgrades relativos ao
software durante o período do contrato para que possam repassá-los ao
software reproduzido localmente.

Em outras palavras, o distribuidor não tem controle sobre o número de


cópias que serão produzidas, tendo de adquiri-las individualmente do
desenvolvedor na medida de suas necessidades comerciais.
Adicionalmente, na operação de revenda o distribuidor corre o risco de
estoque, pois adquire a licença de uso de software sem a certeza de
revendê-lo num curto espaço de tempo, havendo riscos de que o produto se
torne obsoleto antes mesmo de ser adquirido pelos usuários finais. Já na
operação de aquisição de direitos de exploração comercial, o adquirente
fica capacitado a produzir novas cópias do software e revendê-las no

137
mercado interno, remunerando o desenvolvedor pela cessão com base na
receita obtida com a venda (ou com base no número de cópias produzidas).

Retomando o raciocínio acima, quer nos parecer que as operações de


compra para revenda de licenças de uso de software-produto têm como
contraprestação o pagamento de preço ao desenvolvedor não residente, não
caracterizando royalties para fins dos tratados para evitar a bitributação
por não remunerar o uso ou o direito de uso do software pelo revendedor,
nem a exploração econômica do direito de autor.

Nesse caso, aplicar-se-ia o art. 7º da Convenção Modelo da OCDE,


reproduzida no essencial nos tratados celebrados pelo Brasil, pelo que
ficaria afastada a competência do país da fonte (Brasil no caso) para impor
retenção de IRRF sobre as receitas que comporão o lucro da empresa.

Em resumo, consideramos que há fundamento jurídico para contestar a


nova posição adotada pela RFB na mencionada Solução de Divergência n.
18/2017 e no ADI n. 7/2017, nos seguintes termos:

•no âmbito do direito interno, porque a contraprestação paga pelo distribuidor


pela aquisição de licenças perpétuas de software-produto – cópias ou
copyrighted articles – representa preço na aquisição de mercadoria, não se
subsumindo ao conceito de renda tributável; e
•no âmbito dos tratados para evitar a bitributação, quando aplicáveis, porque tal
contraprestação não caracteriza royalties, representando receita que compõe o
lucro do desenvolvedor, aplicando-se a cláusula de “lucro das empresas” (art.
7º) e afastando a competência impositiva do Brasil como país de fonte.

Com a disseminação das licenças temporárias de uso, será fundamental


examinar se o raciocínio acima também se aplica para o distribuidor que
adquire para revenda cópias de licenças temporárias de uso. A questão
jurídica a ser desenvolvida será a de saber se para ele, desenvolvedor, as
cópias ainda assim representam “mercadorias”, não obstante elas darem

138
direito a uso apenas temporário ao adquirente (usuário final). Tendo em
vista os limites deste artigo, nos dedicaremos a tal questão em outra
oportunidade.

6. TRANSAÇÕES COM SOFTWARE ADAPTÁVEL (“CUSTOMIZÁVEL”)

Como descrito no item 2 acima, as transações com software adaptável


costumam envolver dois componentes: (i) transação envolvendo licença de
uso de software-produto e (ii) prestação de serviços de adequação e
adaptação do software às necessidades específicas do usuário, prestados
pelo próprio desenvolvedor ou por terceiros.

A análise apresentada nos itens 4 e 5 do trabalho relativas aos negócios


tendo por objeto software por encomenda e software-produto serão
aplicáveis mutatis mutandis, sendo necessário segregar o tipo de utilidade
ou direito negociado entre o desenvolvedor e o adquirente (isto é, cessão
de direitos ou transferência do copyrighted article) das atividades relativas
a sua adaptação (isto é, o componente de serviço associado).

Ao componente da contraprestação relativo à cessão ou licença dos


direitos ou utilidades do software-produto será aplicável o tratamento
tributário de IRRF correspondente, a depender das características do
negócio jurídico e dos direitos e utilidades transferidos, aplicando-se as
considerações formuladas nos itens 5.1 e 5.4 acima. Assim é que poder-se-
á tratar de preço de aquisição de bem ou mercadoria não sujeito a IRRF,
ou de royalty ou remuneração de direitos, sujeitos a IRRF pela alíquota de
15% (ou inferior se houver redução por tratado para evitar a bitributação).

A contraprestação pelo componente de serviço de customização, por


outro lado, paga pelo adquirente brasileiro ao desenvolvedor ou a terceiros

139
não residentes, seria qualificada como remuneração pela prestação de
serviços técnicos para fins de incidência do IRRF.

Hipótese da qual também se pode cogitar será aquela em que o


desenvolvedor não residente transaciona cópia da licença de uso do
software-produto e também promove a respectiva adaptação. Nesse caso
será mister examinar a prevalência do conteúdo “licença” diante das
adaptações.

Se estas forem apenas ajustes ou adaptações para permitir a


operacionalização do software pelo usuário, sem representar mudança
substancial, as adaptações representariam meio ou instrumento para o fim
principal, que é a própria licença. Nesse caso, a nosso ver, estar-se-á diante
de transação com software-produto, com o respetivo tratamento fiscal
discutido nas seções do item 5 do presente artigo139.

Por outro lado, se as adaptações representarem em verdade o próprio


desenvolvimento de um software em função das necessidades do cliente,
aproximando-se de uma nova versão do produto, a contraprestação tende a
se aproximar de remuneração por prestação de serviços técnicos.

O exame das características da transação e das condições contratuais


será, assim, fundamental para a determinação do adequado regime de
IRRF.

140
Qualificação de operações envolvendo
software no Brasil à luz dos tratados contra a
bitributação: visão da OCDE e a prática
brasileira
Rodrigo Maito da Silveira140 e Antonio Carlos de Almeida Amendola141

1. INTRODUÇÃO

Nada impactou tanto o modo de vida do homem e as empresas quanto o


advento do software no século XX e início do século XXI. Considerando
as recorrentes inovações de aplicabilidade e uso, o software vem alterando
o comportamento de pessoas, empresas e da economia. Em decorrência
desse cenário em permanente evolução, nada mais natural que a tributação
do software gere, de forma contínua, inúmeras questões e desafios.

Qual critério deve ser utilizado para identificar, para fins tributários, a
natureza de um rendimento em um negócio envolvendo software? A
natureza do negócio jurídico celebrado? A finalidade do software? A
forma como o software é acessado e utilizado? O modo de pagamento? A
extensão do universo de usuários? A transferência da propriedade do
software? A identificação do titular do software como autor ou não?
Inúmeras são as possibilidades.

O objetivo deste artigo é tratar do enquadramento de transações


envolvendo software nos tratados para evitar a dupla tributação da renda,
em especial aqueles inspirados na Convenção Modelo da Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (CM-OCDE), como é o caso
dos tratados firmados pelo Brasil. Para tanto, é necessário qualificar os
rendimentos auferidos em tais operações. Apenas dessa forma é que se

141
poderá proporcionar ao contribuinte previsibilidade e segurança jurídica no
tratamento fiscal a ser aplicado à luz do tratado.

Deve-se ter em mente que a matéria em questão comporta inúmeras


controvérsias, não apenas em função das diferenças legislativas, nos mais
diversos países, no tocante ao tratamento que é dado ao software como
bem de propriedade intelectual, mas também em função das variadas
nuances que os arranjos contratuais envolvendo a alienação, a
transferência, o licenciamento ou a cessão de uso de softwares apresentam,
sobretudo à luz das constantes mudanças tecnológicas142.

2. SOFTWARE: CONCEITO, TIPOS E CARACTERÍSTICAS


RELEVANTES EM FUNÇÃO DAS DIFERENTES FORMAS DE
COMERCIALIZAÇÃO

No bojo do ordenamento jurídico brasileiro, o software é definido pelo


art. 1º da Lei n. 9.609/98 como:

a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou


codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário
em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos
ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los
funcionar de modo e para fins determinados.

A definição acima continua atual. Mesmo o software baixado em


download em computador privado, ou rodado em servidor do licenciante
ou de terceiro (com parte baixada em download, ou não), está contido em
um suporte físico. A computação em nuvem também demanda propriedade
e manutenção de hardware conectado à rede pela empresa que oferece
essa facilidade.

2.1. Objeto do estudo: software de aplicação

142
Como o software está presente em inúmeras situações, cabe aqui uma
primeira observação. O software objeto do presente trabalho é aquele que
constitui um bem em si mesmo e é objeto de contrato próprio com
remuneração específica correspondente. Em outras palavras, não se trata
aqui de software que constitui um meio, um instrumento ou uma
engrenagem para que outro bem funcione. Fora de dúvida, portanto, que
não são alcançados pela análise aqui realizada softwares incorporados em
bens tangíveis, que são indispensáveis para o adequado funcionamento dos
últimos, como aqueles embutidos em aeronaves, embarcações,
automóveis, telefones celulares, equipamentos, eletrodomésticos etc.143.

Nos termos utilizados pela Receita Federal do Brasil no Parecer


Normativo n. 79/75144, o software que constitui um bem em si mesmo
pode ser denominado como “software de aplicação” (sem necessariamente
implicar transferência de tecnologia, como aponta o referido Parecer), e o
software indispensável para a operacionalidade de outro bem (seja um
computador, um veículo ou um equipamento) pode ser denominado de
“software base”. O valor do software base compõe o preço do bem no qual
ele está embutido. Como mencionado no parágrafo anterior, o presente
artigo trata de enquadramento de rendimentos relativos a software de
aplicação nos tratados contra a bitributação.

Frise-se que se, na venda de um bem, é estipulado pelo vendedor que,


necessariamente, o software de aplicação deve ser adquirido em conjunto,
haverá alta probabilidade de esse software acabar por ser considerado
como um software base como se também fosse integrante e indispensável
ao funcionamento do bem, de tal modo que o seu valor estaria contido no
preço do bem e não seria objeto de uma licença em separado. Do mesmo
modo, na oferta de soluções tecnológicas em que o licenciamento de

143
software é combinado com serviços, como de treinamento, help desk,
atualização do software etc. (mesmo na ausência de um equipamento), é
bem provável que tal solução seja considerada, em sua inteireza, como
uma prestação de serviços.

Exceção a tais situações ocorre no caso de o contrato de fornecimento


de solução tecnológica (composta por hardware, software de aplicação,
equipamentos periféricos e outras soluções) estipular, individualmente, o
preço de cada item, hipótese na qual será possível aplicar o tratamento
tributável respectivo a cada um. As operações em questão devem ser
analisadas à luz das suas peculiaridades, sendo a estipulação de preço
individualizado um dos vários aspectos a serem considerados145.

2.2. Variações conforme o contrato e a natureza jurídica do rendimento

Um software de aplicação pode ser objeto dos mais distintos contratos,


tais como: uma licença de uso, um contrato de cessão, um contrato de
desenvolvimento de software, um contrato de distribuição do software,
dentre outros.

Na licença de uso, o licenciado adquire apenas e tão somente o direito


de usar o software. Em geral, o licenciante não autoriza o licenciado a
utilizar comercialmente o software ou utilizá-lo como plataforma para o
desenvolvimento de outro software. A remuneração do licenciante tem a
natureza de royalty, muitas vezes também denominada de license fee146-
147.

Há que se dizer que, em relação ao chamado software de prateleira (isto


é, software padronizado e comercializado em larga escala), o
posicionamento do fisco brasileiro consolidou-se na linha de que a
remuneração paga a não residente (licenciante) seria preço (e não

144
royalties), como na aquisição de mercadoria, concluindo-se não haver a
incidência de Imposto de Renda na Fonte – IRRF148. Todavia, esse
posicionamento parece ter sofrido alteração recentemente, voltando-se à
conclusão inicial de que o licenciamento de software ensejaria o
pagamento de royalties, tributável na fonte pelo imposto de renda149.

No contrato de distribuição de software, o titular do software autoriza,


mediante uma contraprestação, que o distribuidor promova a oferta do
software a terceiros em um dado território por um prazo definido.
Normalmente, no caso de uma oferta ser bem concluída, o usuário final
recebe uma licença de uso diretamente do titular do software (sem
qualquer valor devido ao referido titular), mas fica obrigado a pagar o
preço cobrado pelo distribuidor, sendo tal remuneração considerada como
uma receita operacional do distribuidor correspondente a preço de venda (e
não como royalties)150. Da mesma forma, a remuneração devida pelo
distribuidor ao titular do software constitui preço de venda (receita
operacional), integrante do lucro da empresa, e não royalties. Porém o
fisco federal vem entendendo que, no âmbito do contrato de distribuição, o
rendimento pago pelo distribuidor ao titular do software não residente no
país teria a natureza de royalties151.

Por sua vez, no contrato de cessão, o cedente transfere ao cessionário a


titularidade do código-fonte do software. Trata-se de uma compra e venda,
na qual o cessionário passa a deter a propriedade do software e de todos os
atributos a ela inerentes, podendo dispor e aplicar o software da forma que
lhe convir. Como o que se compra é uma tecnologia, nos termos do art. 11
da Lei n. 9.609/98, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial fará o
registro dos respectivos contratos, para que produzam efeitos em relação a
terceiros. Como em qualquer compra e venda, a remuneração do cedente

145
constitui preço. Nesse particular, ressalte-se desde já que, dependendo da
atividade econômica do cedente, esse preço pode ser considerado como
receita operacional ou ganho de capital. Se o cedente for empresa dedicada
ao desenvolvimento de software para um determinado setor da economia
(e.g., instituições financeiras), o preço na cessão do software constitui
receita operacional de tal empresa. Por outro lado, se o cedente for
empresa fora do segmento tecnológico, com o software utilizado em sua
atividade operacional, daí o preço configura recuperação de custo e,
potencialmente, ganho ou perda de capital152-153.

Já no contrato de desenvolvimento de software, o contratante é o


tomador de serviços que solicita ao prestador o desenvolvimento de um
software específico que apresente determinadas especificações e cumpra
certas funcionalidades, ambas geralmente prees-tabelecidas. Assim, em tal
contrato, acorda-se, desde o princípio, que o código-fonte a ser
desenvolvido será de propriedade do tomador. A remuneração do
prestador, naturalmente, é preço de serviços ou honorários154-155-156.

No caso de customização de software, ela ocorre quando o usuário


detentor da licença de uso contrata a própria licenciante ou terceiro para
fazer adaptações ao software, de tal sorte que o mesmo atenda melhor suas
necessidades. Trata-se de prestação de serviços, sendo a remuneração do
prestador preço ou honorários.

Mais recentemente, com a computação na nuvem (cloud computing),


outros tipos de contratos surgiram, como os de software como serviços
(Software as a Service – SaaS), nos quais o software é rodado no servidor
do próprio titular do software, cujo acesso é conferido ao usuário, sendo
que, em alguns casos, é necessário que o usuário faça download de parte
da solução, para que a mesma funcione adequadamente. Dessa forma, o

146
titular do software não só permite ao usuário acesso ao programa, mas
também proporciona os meios para uso, como servidor, espaço virtual para
armazenamento de dados, dentre outros. O tema ainda é controverso e
cada contrato específico deve ser analisado, mas já há manifestações
doutrinárias157 e fiscais158 no sentido de que o SaaS configura “serviços”,
de forma que a remuneração constituiria preço de serviços.

Há também, na atualidade, contratos de “plataforma como serviços”159


(Plataform as a Service – PaaS), nos quais o titular da plataforma
(combinação de hardware e software) permite que usuários/programadores
instalem nela seus aplicativos para que sejam acessados por usuários
finais160. Além disso, existem contratos em que os fornecedores oferecem
aos usuários/programadores ferramentas para criar e desenvolver o seu
software/aplicativo, hospedá-lo, operar sistemas etc. (v.g. Infraestructure
as a Service – IaaS).

Empresas de tecnologia vêm desenvolvendo, como um desdobramento


da computação na nuvem, a chamada fog computing, na qual dados são
processados em dispositivos ligados à rede (tablets, telefones, laptops
etc.), sem a necessidade de acesso ao servidor na nuvem. Dentre os
benefícios noticiados sobre o tema, que envolvem a descentralização de
arquivamento e hospedagem de dados, destaca-se a possibilidade de menor
utilização de banda larga da rede, com redução de custos, resposta/reação
mais rápida do sistema, possibilidade de acesso mesmo em momentos de
falha na rede etc.161.

É válido o registro de que as diversas modalidades de cloud computing,


Saas, PaaS e IaaS podem cobrir uma ampla variedade de diferentes
transações, sendo essencial, portanto, a análise de cada caso em particular
para averiguar a extensão da transferência de direitos de propriedade

147
intelectual e a natureza jurídica das respectivas remunerações
envolvidas162.

2.3. Observação sobre licenças de uso

Em geral, por força do art. 9º da Lei n. 9.609/98, o uso de software no


Brasil deve ser objeto de contrato de licença que, caso não exista, pode ser
subsidiariamente substituído pelo documento fiscal relativo ao
licenciamento. Cabe observar que, sob um contrato de licença de uso, a
natureza jurídica dos rendimentos gerados pode ser de royalties, ou de
remuneração de direitos autorais.

Nos termos do art. 22, “d”, da Lei n. 4.506/64, é classificada como


“royalty” a exploração de direitos autorais, salvo quando percebidos pelo
autor ou criador da obra, hipótese em que os rendimentos respectivos são
considerados como resultantes de trabalho (direitos autorais).

Ademais, e considerando a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal


(STF) focada no conflito de competência entre Estados e Municípios no
tocante à exigência do ICMS e do ISS, mesmo sob contratos de licença de
uso, um software poderia ser classificado como uma mercadoria ou
prestação de serviços. A Corte Suprema, em julgamento realizado há quase
duas décadas163, entendeu que os Estados não podem exigir o ICMS sobre
o licenciamento de software, exceção feita às situações em que o software
é materializado em um suporte físico (supporting device), produzido em
série e comercializado no varejo.

Em 2010, o STF indicou que essa conclusão pode ser revista, com a
possibilidade de exigência do ICMS sobre licenciamento de software,
ainda que este não esteja materializado em um suporte físico,

148
entendimento esse firmado em sede de ação cautelar, a ser eventualmente
confirmado quando do julgamento do mérito164.

Em 2012, o STF reconheceu a configuração de repercussão geral de


recurso extraordinário no qual se discute a constitucionalidade da
incidência do ISS sobre licenciamento de uso de software, ainda a ser
julgado165. Em suma, em linhas gerais, os Estados entendem que software
e outros bens digitais se enquadram no conceito de mercadoria para fins de
incidência de ICMS independentemente de estarem embutidos em um bem
material166, ao passo que os Municípios defendem167 a tributação, pelo
ISS, de operações de licenciamento de programas de computador e
streaming168.

3. QUALIFICAÇÃO DOS RENDIMENTOS RELACIONADOS A


OPERAÇÕES COM SOFTWARE À LUZ DOS TRATADOS CONTRA A
BITRIBUTAÇÃO

3.1. Possíveis qualificações de rendimento com base na CM-OCDE

Como já mencionado, o software nada mais é que um programa que


contém instruções a serem utilizadas por um computador (hardware),
podendo ser: (a) sistemas operacionais (software base) ou softwares de
aplicações específicas; (b) transferidos eletronicamente (via download),
mediante uma mídia (suporte físico) ou acessados em nuvem; (c)
transferidos como parte integrante de um hardware ou transferidos de
forma independente de um hardware; (d) padronizados ou customizados.

Nesse sentido, as peculiaridades das operações envolvendo software


ensejam diferentes possibilidades de qualificação do rendimento oriundo
dessas transações à luz dos tratados contra a bitributação.

149
As sempre precisas lições deixadas por Alberto Xavier não apenas
confirmam tal afirmação, mas denotam a importante constatação de que “a
determinação da natureza jurídica dos pagamentos relativos a programas
de computador resulta (...) da pluralidade de formas que podem revestir os
negócios jurídicos que os tenham por objeto, tendo em vista a extensão dos
direitos adquiridos”169. É dizer, a caracterização da remuneração paga em
contrapartida da licença ou cessão de software depende da natureza dos
respectivos direitos que o adquirente pode, nos termos do contrato
firmado, usar e explorar.

Como detalhado acima, a transferência de direitos relacionados a um


software pode ocorrer de várias formas, partindo-se da alienação da
totalidade dos direitos autorais de um programa de computador (cessão de
direitos, similar a uma compra e venda, com transferência de domínio e de
todos os atributos da propriedade), licenciamento de direito de uso do
software (o que não implica a alienação desse intangível), até a
conferência de direito de acesso de software em nuvem (o que também não
enseja a alienação do programa). A remuneração correspondente pode
também assumir diferentes modalidades. Com efeito, os pagamentos
nessas operações podem ser classificados como integrantes do lucro de
empresa, regulado pelo art. 7º, ou ganho de capital, nos termos do art. 13,
ou ainda como royalties, conforme o art. 12, todos da CM-OCDE.

3.2. Comentários Oficiais da OCDE à CM-OCDE

Embora, ao se referirem ao art. 7º170, estabeleçam o caráter residual


deste dispositivo quando não haja artigos que tratem de categorias
específicas de rendimentos (como, por exemplo, dividendos, juros,
royalties etc.), os Comentários à CM-OCDE acabam por indicar que em
determinadas circunstâncias, tais como nas operações envolvendo

150
software, os rendimentos correspondentes podem ser qualificados de
formas distintas a depender das características encontradas no caso
concreto171.

Ao versarem sobre o teor do art. 12, relativo à tributação de royalties, e


mais especificamente acerca do seu § 2º, que contempla a definição do
termo “royalties”, os Comentários à CM-OCDE172 atestam claramente
que, no tocante a operações envolvendo software, dificuldades podem
surgir na hipótese de transferência de direitos que possam ser considerados
como parte de um elemento de propriedade intelectual, quando tais direitos
sejam transferidos de um modo que seja apresentado como uma alienação.
Exemplo dessa situação seria a concessão de todos os direitos de um bem
de propriedade intelectual por um período limitado ou cujo uso esteja
circunscrito a uma região geograficamente delimitada, no bojo de uma
transação estruturada como uma venda.

Nessas circunstâncias, os Comentários indicam que a análise quanto à


qualificação do item de rendimento dependerá das respectivas
particularidades fáticas de cada caso e terá que ser conduzida com base na
legislação interna aplicável no tocante à propriedade intelectual ou mesmo
aos requisitos para que se verifique uma alienação.

Todavia, é irrelevante, para fins de qualificação do rendimento, como se


dá a transferência do software, se por meio de mídia (suporte físico), via
download ou mediante acesso em nuvem.

Em linhas gerais, o conceito de royalties abrangeria pagamentos


efetuados em conexão com a concessão de uso de informações industriais,
comerciais ou científicas decorrentes de experiências prévias
(consideradas como know-how, quando não passíveis de serem registradas

151
ou patenteadas, ou, ainda, quando não reputadas como categorias de
direitos de propriedade intelectual) e cujo uso possa gerar resultados
econômicos. Dessa forma, novas informações dessa mesma natureza,
quando obtidas como resultado da contratação de serviços, não devem ser
consideradas como contrapartida do pagamento de royalties.

Vale mencionar que, no contrato envolvendo a transferência de know-


how, o cedente não exerce qualquer aplicação prática das informações
correspondentes, não garantindo qualquer resultado ao licenciado em
função do uso dessas informações.

Os Comentários à CM-OCDE173 oferecem alguns critérios para


diferenciar os royalties relativos à transferência de know-how da
remuneração de serviços:

•a confidencialidade de informações é normalmente uma exigência existente em


um contrato de transferência de know-how;
•na prestação de serviços, o prestador emprega conhecimentos especiais,
técnicas e expertise, não sendo objeto da contratação a transferência desses
mesmos atributos ao tomador dos serviços;
•a prestação de serviços exige muito mais do prestador em termos de atividades
ou providências a serem adotadas e desenvolvidas, do que o contrato de
transferência de know-how, no qual meramente se fornecem informações ou
materiais já existentes.

É por tais motivos que, por exemplo, o pagamento por assessoria


prestada eletronicamente, por meio de redes de computadores ou mesmo
quando realizada automaticamente mediante uma base de dados que
proveja a usuários de softwares respostas ou orientações padronizadas e/ou
não confidenciais, não se caracteriza como royalties em função da
transferência de know-how, mas como remuneração por prestação de
serviços, qualificada, portanto, como lucro de empresa, nos termos do art.
7º da CM-OCDE. A criação de software conforme especificações do

152
cliente (encomenda) ou mesmo a customização de software (na qual pode
haver a alteração do código-fonte), por sua vez, também se caracterizam
como prestações de serviço, cuja remuneração se enquadra como lucro de
empresa, à luz da CM-OCDE.

Os Comentários à CM-OCDE174 também sugerem a qualificação como


lucro de empresa aos rendimentos provenientes de contratos de
distribuição em que a parte que recebe a transferência do software está
autorizada a efetuar múltiplas cópias do programa, mas apenas para uso no
seu próprio negócio, isto é, estariam vedadas cópias para terceiros.

Na mesma linha, seriam qualificados como lucro de empresa os


rendimentos provenientes de um contrato de distribuição de software, em
que o distribuidor paga pelo direito de distribuir cópias do software (sem
direito de reproduzi-lo), para posteriormente ofertá-lo no seu mercado de
atuação. Neste caso, o distribuidor não recebe uma licença de uso do
software (cuja contrapartida seria o pagamento de royalties), mas apenas
uma licença para revender o programa, observadas determinadas
condições (tais como o período e a área geográfica delimitados).

Para os chamados contratos mistos, cujo objeto contemple venda de


hardware, incluindo software específico para a operação do equipamento e
concessões de direito de uso de novas funcionalidades (atualização do
software, por exemplo), combinada com a prestação de serviços, os
Comentários à CM-OCDE sugerem a segregação e a alocação da
remuneração em diferentes modalidades, em conformidade com o
respectivo tratamento fiscal aplicável a cada uma das obrigações
assumidas175, salvo se houver um elemento que possa ser considerado
como o principal propósito do contrato, ao passo que outros elementos
teriam um caráter acessório. Neste último caso, sem prejuízo das

153
dificuldades práticas de se determinar qual parte é mais importante dentre
todos os elementos do contrato, os Comentários à CM-OCDE acabam se
curvando à ideia de preponderância, ou seja, de que o tratamento tributário
aplicável ao elemento mais importante deve prevalecer e ser igualmente
aplicado aos demais176.

Por outro lado, o pagamento feito em contrapartida à aquisição de


direitos limitados ou parciais sobre o software, em que não há a
transferência efetiva da integralidade da propriedade intelectual
correspondente ao código-fonte do software, possui a natureza de
royalty177, já que os referidos direitos estão relacionados ao uso do
programa de tal forma que, sem a licença inerente a essa transação, haveria
uma violação ao direito de propriedade intelectual.

Em outras palavras, o licenciamento do direito de uso de software


constitui uma forma de permitir ao licenciado usufruir as funcionalidades
do software, mas não dele dispor como se seu fosse. Como regra, portanto,
a remuneração pelo licenciamento de software qualifica-se como royalty,
de acordo com os Comentários à CM-OCDE178, e não como ganho de
capital ou lucro de empresa. Mas essa qualificação somente se confirma
como tal se as legislações internas dos países signatários contemplarem o
tratamento do software como uma modalidade de propriedade intelectual,
a exemplo do que ocorre no Brasil.

Na hipótese de transferência da titularidade plena e integral dos direitos


de propriedade intelectual correspondentes ao software, a qualificação da
respectiva remuneração será como lucro de empresa (quando a alienação
de software for uma atividade operacional) ou ganho de capital (na
hipótese em que a venda de software não componha o objeto social da
empresa), a depender das condições em que se der a transação.

154
Em conclusão, a qualificação como royalty está associada
essencialmente à existência de um arranjo contratual em que se paga pelo
direito de usar determinado bem de propriedade intelectual, sobretudo
quando tal uso tenha um condão econômico, isto é, seja destinado à
geração de resultados econômicos em favor do usuário/licenciado.

Diferentemente, a aquisição de bens de propriedade intelectual, cujo


uso não tenha o condão econômico, ou, ainda, a aquisição de cópias para
revenda (sendo o cliente final licenciado para usar o bem) não constituem
situações que ensejam a remuneração por royalties para fins de aplicação
dos tratados contra a bitributação. Os rendimentos correspondentes
deverão ser qualificados como lucro de empresa ou como ganho de capital,
a depender das circunstâncias concretas da operação.

Destaque-se, por derradeiro, que as posições e sugestões indicadas nos


Comentários à CM-OCDE não estão livres de questionamentos179,
servindo apenas como um norte na interpretação dos tratados contra a
bitributação. Como se sabe, a qualificação dos rendimentos, no caso
concreto, passa pela prévia interpretação do texto dos tratados. Eventuais
termos não definidos no tratado, e que não possam ser interpretados em
vista do contexto e da finalidade do referido acordo, acabam ensejando o
chamado reenvio ao direito interno dos países signatários, em
conformidade com o art. 3º, § 2º, da CM-OCDE, o que significa que tais
termos serão interpretados com base na legislação interna do Estado
contratante cuja tributação é aplicável180.

3.3. Posicionamento do Brasil

O entendimento prevalente da Receita Federal sobre a qualificação de


itens de rendimento em operações envolvendo software tem sido no

155
sentido de incluir a remuneração dentro do escopo do art. 12, permitindo-
se, com isso, a tributação na fonte desse rendimento nas hipóteses de
pagamentos efetuados em favor de não residentes. Exemplo desse tipo de
posicionamento por ser verificado na Solução de Divergência COSIT n. 4,
de 13 de maio de 2016, e na Solução de Consulta n. 6.026, de 13 de junho
de 2016.

Cabe lembrar que tais manifestações da RFB dizem respeito à


remuneração pelo licenciamento de uso de software, e não especificamente
à remuneração por atividades relacionadas, por exemplo, a cloud
computing, que, a julgar pelo teor do Ato Declaratório Interpretativo RFB
n. 7/2014, poderiam em tese ser caracterizadas como serviços.

Nesse particular, as autoridades fiscais brasileiras adotam o


posicionamento – questionável – de que serviços técnicos em geral – nos
quais se incluem, por exemplo, serviços de desenvolvimento ou
customização de software – seriam qualificáveis como royalties (e não
como lucro de empresa), por força da equiparação incluída nos protocolos
da maioria dos tratados contra a bitributação assinados pelo país (à
exceção daqueles firmados com Áustria, Finlândia, França, Japão e
Suécia). Tal desvio interpretativo dos tratados firmados pelo Brasil em
relação à CM-OCDE representa uma clara tentativa de ampliar o escopo
de aplicação do art. 12 e justificar a tributação na fonte de remessas de
valores que, de outro modo, não seriam qualificáveis como royalties.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em linhas gerais, e sem prejuízo de situações excepcionais (como é o


caso dos serviços técnicos, qualificados como royalties pelas autoridades
brasileiras) e aquelas envolvendo novas tecnologias (ainda não analisadas

156
nas esferas administrativa e judicial), o tratamento tributário, no Brasil, das
diversas operações envolvendo software, segue as diretrizes lançadas nos
Comentários à CM-OCDE.

No entanto, há que se reconhecer haver margem para divergências em


relação à qualificação do rendimento em determinadas situações
específicas, sobretudo se o Fisco federal deixar-se influenciar pelas
discussões atuais acerca da caracterização do software como serviço ou
mesmo como mercadoria, extrapolando a sua condição de bem intangível
de propriedade intelectual. De fato, o tema ainda está em evolução no
Brasil, dado que não existem análises mais aprofundadas, em especial
envolvendo modalidades mais modernas de contratação relacionadas a
software, seja por parte das autoridades tributárias, seja por parte das
Cortes administrativas ou judiciais.

157
Com a cabeça nas nuvens e os pés no chão?
A tributação internacional da renda no
ambiente de cloud computing
Luís Flávio Neto181 e Giácomo Paro182

INTRODUÇÃO
What is the Cloud? Where is the Cloud? Are we in a Cloud now? These are the
questions you have probably heard or even asked yourself. The term “Cloud
computing” is omnipresent. Cloud computing is technically borderless by nature,
but domestic, foreign tax regulations and compliance requirements are not. This
simple difference can give rise to complex and potentially significant tax issues for
business operating beyond their borders. What makes it more interesting (or
frustrating, depending on how you look at it!) is that there are still more questions
than definitive answers when it comes to taxation of Cloud computing transactions.
Piyush Gupta183

Muitos de nós têm acesso a músicas, fotos, músicas, filmes, textos,


correspondências e muitas outras coisas por meio de estruturas de “cloud
computing” (ou, em tradução livre, “computação na nuvem”). É comum
compramos roupas, alimentos, equipamentos esportivos, eletrodomésticos
e toda a sorte de produtos por meio de software que utiliza essa
plataforma. Amizades, relações profissionais ou mesmo amorosas são
adicionadas à vida das pessoas por aplicativos desenvolvidos e mantidos
nesse mesmo ambiente digital.

Hoje nada disso é obra de ficção científica, e em pouco tempo essa


descrição dos “novos tempos” certamente se tornará ultrapassada, pois as
inovações são constantes e assimiladas pela sociedade a uma velocidade
impressionante.

O legislador tributário, por sua vez, não tem acompanhado essa


exponencial revolução dos modelos negociais, dando ensejo a uma série de

158
discussões e incertezas. Assim como o avanço da economia digital não
identifica fronteiras, a incapacidade dos sistemas tributários para lhe
atribuir o adequado tratamento não parece ser um problema isolado de um
ou outro país, mas um desafio enfrentado pelas mais diferentes nações e
pelo Direito tributário internacional184.

De fato, uma série de pagamentos podem ser realizados ao exterior por


fontes brasileiras para a remuneração de atividades desenvolvidas no
ambiente de cloud computing, o que exige que se compreenda quais as
consequentes obrigações tributárias. Neste artigo, propõe-se uma breve
investigação quanto às normas tributárias que tutelariam os negócios em
questão, inclusive em face dos acordos internacionais para evitar a
bitributação da renda celebrados pelo Brasil.

O tópico “1” traz algumas definições técnicas quanto ao ambiente de


cloud computing, fundamentais para a identificação de suas consequências
tributárias, tanto no que se refere às normas exclusivamente brasileiras
quanto àquelas edificadas perante o Direito Tributário internacional.

O percurso adotado para a exposição deste ensaio leva em consideração


que os tratados de bitributação são vocacionados a cobrir o sistema
jurídico de dois diferentes Estados contratantes. As normas do acordo
internacional se sobrepõem total ou parcialmente às normas domésticas de
incidência tributária, levando-as, nessa parcela de contato, à sombra (ou
melhor, à não aplicação). As normas domésticas de incidência tributária
que permanecerem iluminadas (isto é, sem as limitações do tratado de
bitributação), por sua vez, devem ser aplicadas normalmente185. Disso
decorre que a análise para a aplicação dos acordos de bitributação pode
exigir, portanto, dois estágios: um atinente ao Direito doméstico dos
Estados contratantes (hipóteses de incidência tributária estabelecidas pelas

159
legislações nacionais) e, outro, atinente ao respectivo acordo internacional
(norma que irá se sobrepor à norma brasileira e delimitar a sua eficácia).

Neste artigo, primeiro serão analisadas as normas brasileiras de


incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre as remessas
ao exterior no contexto do cloud computing (tópico 2). Na sequência,
então, será analisada a aplicação dos acordos para evitar dupla tributação
nesse ambiente digital, especialmente com vistas a peculiaridades dos
tratados celebrados pelo Brasil (tópico 3). Entre as muitas perguntas que
podem surgir em face desse tema, podemos destacar duas que estão sob
holofotes da doutrina do direito tributário internacional: como qualificar os
rendimentos de cloud computing (“serviços” ou “royalties”) e como
reconhecer “estabelecimentos permanentes” nesse ambiente digital.

Por sua vez, o tópico 4 se dedica ao tratamento acenado pelas


autoridades fiscais brasileiras para os rendimentos decorrentes de cloud
computing, especialmente em face da Solução de Consulta COSIT n. 191,
de 23 de março de 2017, enquanto o tópico 5 traz considerações finais a
este estudo.

Spoiler alert: o estágio atual das discussões quanto à tributação


internacional do cloud computing conduz a mais perguntas do que
respostas, o que evidencia ser esse o momento para a incitação de um
amplo debate.

1. DEFINIÇÃO E MODELOS DE “CLOUD COMPUTING”: NOVOS


TEMPOS, NOVOS PARADIGMAS

Em um passado não tão distante, pessoas físicas e empresas buscavam


máquinas com alta capacidade de armazenamento e de processamento de
dados, com vistas a permitir a manutenção e utilização em seus dados e

160
software. Atualmente, contudo, há uma tendência cada vez maior pela
terceirização dessa capacidade de armazenamento, com um substancial
redimensionamento do espaço físico demandado, bem como a dispensa da
aquisição de equipamentos que rapidamente se tornam obsoletos e cuja
atualização demandaria periódica paralização das atividades186.

O cloud computing surge como uma alternativa ou mesmo como uma


evolução às formas tradicionais de armazenamento, acesso e
desenvolvimento de software e dados. Parte-se da concepção de utilização
compartilhada de recursos físicos e virtuais, como redes, servidores e
aplicativos, voltada ao fornecimento de serviços on-line padronizados ou
configuráveis sob demanda, que podem incluir, por exemplo, programas
de computador, gerenciamento e armazenamento de dados. Como o seu
fornecimento é on-line, os seus usuários podem acessar a sua estrutura a
partir de vários tipos de dispositivos com acesso à internet,
independentemente de sua localização187. Por sua vez, a empresa
contratada para a disponibilização da “nuvem” se socorrerá de uma rede de
servidores espalhados em muitas localidades, inclusive para garantir a
segurança do sistema.

Esse ambiente comporta essencialmente três modelos, de acordo com os


recursos oferecidos, quais sejam: Infrastructure as a Service (IaaS),
Plataform as a Service (PaaS) e Software as a Service (SaaS).

O IaaS consiste em um modelo de contratação pelo qual o usuário


demanda a utilização de espaço para armazenamento de dados, sem que
este desempenhe controle sobre a infraestrutura (a nuvem), seus sistemas
operacionais, aplicativos etc. No modelo PaaS, o usuário utiliza a estrutura
operacional da nuvem para desenvolvimento, teste e implementação de
aplicações, exercendo controle apenas sobre estas188. Por sua vez, no

161
modelo SaaS, o usuário acessa e faz uso de software que está na nuvem,
sem necessidade de aquisição de licença ou realização de download e sem
controle sobre a plataforma ou características fundamentais do software
que utiliza.

Nesse contexto, é possível identificar ao menos três atores distintos:


provedores, desenvolvedores e usuários. Em alguns casos, o provedor e o
desenvolvedor podem ser uma mesma entidade, enquanto, em outros, o
usuário pode ser o próprio desenvolvedor.

Por “provedor” designa-se o responsável pelo fornecimento e


manutenção de toda a estrutura da nuvem, necessária para armazenamento,
acesso e processamento de dados. O “desenvolvedor” utiliza o ambiente da
nuvem para produzir e armazenar as aplicações que serão utilizadas em
suas próprias atividades ou por outros usuários. Os “usuários”, então, são
aqueles que utilizam os aplicativos mantidos por desenvolvedores ou que
apenas se valem da nuvem para o armazenamento e acesso de dados.

Há, ainda, uma série de outros conceitos relacionados ao cloud


computing, os quais não se pretende esgotar nos estreitos lindes deste
ensaio, como “on-demand self-service”, “broad network access”,
“resource pooling”, “rapid elasticity”, “measured service” etc.189.

2. A TRIBUTAÇÃO BRASILEIRA DAS REMESSAS AO EXTERIOR


PARA REMUNERAÇÃO DO CLOUD COMPUTING

O legislador tributário brasileiro ainda não elaborou normas específicas


para fazer frente à nova realidade tratada neste estudo. As normas
reproduzidas pelo art. 685 do Decreto n. 3.000/99, contudo, há muito
determinam a incidência de IRRF sobre “os rendimentos do trabalho, com
ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços”, à alíquota de

162
25٪, na hipótese de seu pagamento, creditamento, entrega, emprego ou
remessa, “por fonte situada no País, a pessoa física ou jurídica residente no
exterior”.

Por sua vez, o art. 3º da Medida Provisória n. 2.159-70/2001 determina


a redução da alíquota de IRRF para 15% “sobre as importâncias pagas,
creditadas, entregues, empregadas ou remetidas ao exterior a título de
remuneração de serviços técnicos e de assistência técnica, e a título de
royalties, de qualquer natureza”190. Conforme consta da própria Medida
Provisória, tal redução de alíquota está vinculada ao início da cobrança da
CIDE prevista pela Lei n. 1٠.168/2٠٠٠, à alíquota de 1٠٪.

Como se pode observar, saber quais tributos brasileiros que em tese


incidiriam sobre a operação e a forma como estes seriam exigidos depende
da qualificação dos rendimentos envolvidos. Tratando-se de remuneração
relacionada a cloud computing, essa qualificação dependerá especialmente
do modelo de negócios envolvido, das específicas atividades relacionadas
e das características de cada contrato.

A título de exemplo, suponha-se que uma operadora de turismo contrate


duas empresas para a seleção de hotéis ao redor do mundo, com a
disponibilização de um canal de reservas a condições mais vantajosas
(B2B). Suponha-se, então, que a primeira empresa opere por meio de uma
estrutura tradicional, em que os seus funcionários, a partir de suas estações
de trabalho sediadas na Espanha, atenderiam às demandas de reservas por
meio de ligações telefônicas. Por sua vez, a segunda empresa, também
constituída na Espanha, operaria por meio de um software alocado na
nuvem (SaaS) e abastecido de informações diariamente por meio
funcionários localizados em diferentes países.

163
Em um outro exemplo, suponha-se que uma pessoa necessite de um
editor de texto para computadores e se depare com duas opções (B2C). A
primeira alternativa seria a compra de um software em uma livraria, que
lhe seria vendido em um CD de instalação ou por meio de um código para
o download pela internet. A segunda opção, por sua vez, seria o acesso de
um software desenvolvido por empresa estrangeira em ambiente de cloud
computing, sem a necessidade de qualquer download ou instalação (SaaS).

Em mais um exemplo, suponha-se que uma pessoa necessite de um


tênis. Ela poderia ir a uma loja física da sua cidade, experimentar os
modelos que desejar e decidir qual deles comprar. Outra alternativa seria
acessar o website de uma loja estrangeira mantido em ambiente de cloud
computing (SaaS), selecionar o modelo que mais lhe agradar, realizar a
compra on-line e aguardar a entrega em sua casa (B2B).

Embora uma série de controvérsias possam ser suscitadas em face


desses exemplos, parece plausível compreender que as remessas ao
exterior realizadas em cada um dos casos não devam ser qualificadas
necessariamente da mesma forma, o que pode ser determinante para a
identificação dos tributos incidentes e dos mecanismos de tributação
passíveis de adoção no Brasil.

Também é preciso distinguir diferentes estágios desse modelo de


negócio: há a remuneração percebida pelo provedor, em face pela
disponibilização e manutenção de toda a estrutura da nuvem para que os
diferentes aplicativos possam funcionar (B2B), bem como há a
remuneração paga aos desenvolvedores pelos usuários (B2B ou B2C).
Ademais, parece ser igualmente fundamental diferenciar a razão de ser do
contrato estabelecido entre o usuário e o desenvolvedor (contratação de
serviços, royalties, venda de mercadorias etc.).

164
Assim, ao menos duas perguntas podem ser fundamentais: Qual a razão
de ser do contrato? Na hipótese de remuneração pela prestação de um
serviço, trata-se de um serviço técnico ou de assistência técnica?

A resposta à primeira pergunta irá determinar a incidência ou não do


IRRF sobre as remessas e, em determinadas circunstâncias, a alíquota
aplicável (como no caso dos royalties, por exemplo). No entanto, caso a
resposta à primeira pergunta seja “remuneração por uma prestação de
serviços”, então somente a resposta à segunda pergunta determinaria a
aplicação da alíquota de 15% (serviços técnicos ou assistência técnica) ou
de 25% (serviços gerais).

Certamente questionamentos semelhantes estão sendo levantados em


diferentes jurisdições, tendo em vista que o cloud computing é, por
definição, um fenômeno que atravessa as mais variadas fronteiras. Assim,
por exemplo, com vistas ao sistema tributário de Singapura, Harvey
Koenig e Kah Chuan Ho191 distinguem hipóteses de rendimentos
decorrentes de serviços, locação, royalties e comercialização de
mercadorias, atribuindo consequências tributárias diferentes a cada uma.

3. A QUALIFICAÇÃO DOS RENDIMENTOS NO CONTEXTO DO CLOUD


COMPUTING PARA A APLICAÇÃO DOS ACORDOS DE
BITRIBUTAÇÃO E A QUESTÃO DOS ESTABELECIMENTOS
PERMANENTES

Os acordos de bitributação adotam um modelo de divisão do poder de


tributar aos Estados contratantes baseado na classificação atribuída ao
rendimento originado de uma operação internacional. A classificação do
rendimento em uma das cláusulas do acordo de bitributação (específicas,
gerais ou residuais) é passo necessário para se determinar qual (ou se

165
ambos) dos Estados contratantes exercerá a tributação sobre a renda em
questão.

Por sua vez, rendimentos qualificados como “lucros das empresas” ou


“royalties”, por exemplo, podem demandar a verificação da presença de
algum “estabelecimento permanente” no Estado da fonte.

Essas são as questões brevemente analisadas nos subtópicos seguintes.

3.1. A qualificação dos rendimentos no contexto do cloud computing

No contexto do cloud computing, é relevante analisar especialmente as


normas veiculadas nos arts. 7º (lucros das empresas) e 12 (royalties) dos
tratados de bitributação celebrados pelo Brasil, os quais seguem em boa
medida a estrutura da Convenção Modelo da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (CM-OCDE), com algumas
distinções.

O art. 7º da CM-OCDE estabelece que os lucros obtidos com uma


determinada atividade empresarial devem ser tributados pelo imposto de
renda exclusivamente no Estado de residência, salvo na hipótese de
atividade econômica desenvolvida por meio de um estabelecimento
permanente.

Esse artigo tem alcance amplo, englobando todos aqueles resultados


obtidos com a realização das atividades econômicas pelo residente de um
Estado contratante no outro Estado Contratante, que não estejam
enquadrados em categorias específicas de rendimentos192. Em seus
comentários sobre a Convenção Modelo, a OCDE opina que o art. 7º da
referida Convenção abrange também os rendimentos gerados da prestação
de serviços realizados por um não residente193.

166
Quando um acordo de bitributação é celebrado entre países com
marcantes diferenças econômicas, a opção pelo Estado de residência
adotada pelo art. 7º da CM-OCDE claramente beneficia países
desenvolvidos, onde estão instalados os entes produtores de bens,
tecnologia e prestadores de serviços, em detrimento da arrecadação
verificada nos países subdesenvolvidos194. Trata-se de fator relevante a ser
considerado quando da negociação dos tratados, mas, uma vez celebrado o
acordo nesses termos, pacta sunt servanda.

No caso, o Brasil adota essa mesma estrutura do art. 7º em seus acordos


de bitributação, embora a sua aplicação seja objeto de recorrentes
controvérsias entre a administração fiscal e os contribuintes.

Em 2012, o Superior Tribunal de Justiça analisou um caso195 no qual as


autoridades fiscais brasileiras pretendiam tributar rendimentos originados
de serviços técnicos, sem transferência de tecnologia, prestados por não
residentes a uma pessoa jurídica brasileira, qualificando-os sob o escopo
do art. 21 dos acordos aplicáveis (“outros rendimentos”), o que permitiria
a imposição do IRRF. Concluiu o Tribunal de Justiça que tais rendimentos
deveriam ser tratados como lucro dos prestadores, atraindo, assim, a
aplicação do art. 7º e, portanto, impossibilitando a imposição do IRRF pelo
Brasil. A mesma posição foi adotada no ano seguinte pela Procuradoria
Geral da Fazenda Nacional, no Parecer PGFN/CAT n. 2.362/2013.

Especialmente em relação aos royalties, os acordos celebrados pelo


Brasil se aproximam do art. 12 da Convenção Modelo da Organização das
Nações Unidas (CM-ONU), que autoriza a sua tributação também pelo
Estado da fonte, divergindo nesse ponto da política da CM-OCDE de
tributação exclusiva pelo Estado de residência196. Assim, por exemplo, na
hipótese em que um usuário localizado no Brasil realizar a remessa de

167
recursos ao exterior a título de remuneração por royalties, as autoridades
fiscais brasileiras seriam legitimadas à exigência de imposto de renda
mesmo se o país de residência do beneficiário for signatário de tratado
para evitar a bitributação.

A Lei n. 4.506/64, em seu art. 22, classifica como royalties os


rendimentos de qualquer espécie decorrentes do uso, fruição, exploração
de direitos, apresentando um rol destes. Contudo, para a aplicação dos
tratados celebrados pelo Brasil, deve ser considerada a definição de
royalties acordada com o outro Estado contratante e não aquela prevista na
Lei n. 4.506/64, que geralmente apresentam distinções. Trata-se, inclusive,
de decorrência do art. 98 do Código Tributário Nacional.

Ocorre que há independência a priori dos conceitos e categorias


componentes do Direito doméstico daqueles presentes em acordos de
bitributação. Assim, ensina Michael Lang197 que a adequada aplicação
desses tratados exige que os seus termos sejam interpretados sem a
consideração do Direito doméstico dos Estados contratantes, de forma
autônoma. Da mesma forma, Luís Eduardo Schoueri198 sustenta que “da
autonomia dos momentos de exame do direito interno e do acordo de
bitributação decorre, de um lado, a possibilidade de se examinarem um
acordo ou o outro, sem qualquer ordem de preferência e, como corolário, a
independência na aplicação de conceitos e categorias de direito tributário”.

A aproximação dos tratados brasileiros à CM-ONU faz com que a


definição de royalties conste no art. 12, § 3º, da generalidade dos nossos
tratados, pois os §§ 1º e 2º ficam reservados às regras de distribuição de
competência tributária entre os Estados da fonte e da residência acima
referidas. Assim, por exemplo, o tratado Brasil-Portugal199 dispõe da
seguinte forma:

168
Art. 12 (...)
3. O termo “royalties”, usado neste Artigo, significa as retribuições de qualquer
natureza atribuídas ou pagas pelo uso ou pela concessão do uso de um direito de
autor sobre uma obra literária, artística ou científica, incluindo os filmes
cinematográficos, bem como os filmes e gravações para transmissão pela rádio ou
pela televisão, de uma patente, de uma marca de fabrico ou de comércio, de um
desenho ou de um modelo, de um plano, de uma fórmula ou de um processo
secretos, bem como pelo uso ou pela concessão do uso de um equipamento
industrial, comercial ou científico e por informações respeitantes a uma experiência
adquirida no setor industrial, comercial ou científico.

Outra peculiaridade de boa parte dos acordos de bitributação celebrados


pelo Brasil é que seus protocolos preveem a equiparação dos “rendimentos
provenientes da prestação de serviços técnicos e assistência técnica” a
royalties, atraindo, portanto, a incidência das referidas regras do artigo 12.
Não é o caso, contudo, dos tratados celebrados com países como Áustria,
Finlândia, França, Japão e Suécia.

Nesse cenário, os rendimentos decorrentes de cloud computing podem


ser qualificados de variadas formas, com consequências diversas tanto para
a incidência de tributos brasileiros quanto para a atração de regras
presentes em acordos de bitributação. Se existente um tratado
internacional, a qualificação dos pagamentos realizados a residentes no
exterior como decorrentes de serviços ou de locação, por exemplo, pode
ensejar a incidência do art. 7º, o que afastaria a tributação brasileira,
ressalvada a presença de estabelecimento permanente. Se os rendimentos
em questão forem qualificados como royalties, a incidência do art. 12 de
eventual tratado permitiria a incidência de IRRF à alíquota de 15%200.
Especificamente no caso de serviços técnicos e de assistência técnica, caso
exista previsão específica de equiparação no protocolo do acordo de
bitributação, os rendimentos em questão também poderiam ser
qualificados como royalties, ensejando, assim, a aplicação das mesmas
regras.

169
Para a identificação da norma aplicável, parece ser necessária a análise
pormenorizada das relações estabelecidas nos contratos de cloud
computing (licença de uso, locação de espaço, suporte técnico, venda de
mercadoria etc.), verificando-se eventual predominância de cada uma delas
nas hipóteses de contratações complexas201.

3.2. A questão do estabelecimento permanente

Os tratados celebrados pelo Brasil adotam consistentemente as ressalvas


quanto à presença de estabelecimento permanente localizado no Estado da
fonte e relacionado aos rendimentos em questão, hipótese em que esta
jurisdição manteria a prerrogativa para o exercício da tributação.

A definição de “estabelecimento permanente” (ou “estabelecimento


estável”) deve ser colhida, em geral, do art. 5º dos Tratados de
bitributação. Em seu § 1º, o dispositivo geralmente apresenta elementos de
uma regra básica de reconhecimento, considerando-o como “instalação
fixa, através da qual a empresa exerça toda ou parte da sua atividade”202,
enquanto o seu § 2º colaciona uma relação dessas possíveis instalações
fixas, como local de direção, escritório, fábrica, entre outros (positive list).
O seu § 3º define quando construções ou locais de montagem se
enquadrariam nesse conceito. O seu § 4º, por sua vez, traz hipóteses que
não estão compreendidas nesse conceito, como depósitos, instalação
mantida unicamente para exercer atividades de caráter preparatório ou
auxiliar, entre outras (negative list). Os §§ 5º e 6º tratam de hipóteses em
que agentes sediados no território do Estado da fonte devem (§ 5º) ou não
(§ 6º) ser considerados estabelecimentos permanentes. Finalmente, o § 7º
traz uma cláusula subsidiária, que esclarece que relações societárias não
são, por si só, suficientes para a caracterização de um estabelecimento
permanente203.

170
A CM-ONU assume relevante importância para países em
desenvolvimento como o Brasil, distinguindo-se da CM-OCDE pela
adoção, por exemplo, de conceitos mais amplos de estabelecimento
permanente204. De fato, diversos acordos de dupla tributação celebrados
pelo Brasil possuem traços da CM-ONU, ainda que em geral se alinhem à
CM-OCDE, sem repetir qualquer desses modelos em sua integralidade. A
maior parte dos acordos de dupla tributação brasileiros205 adota a cláusula
do artigo 5(3) da CM-OCDE para a definição de estabelecimento
permanente, temperada com a previsão do período de seis meses (183 dias)
colhida da CM-ONU, a qual, na CM-OCDE, é de doze meses. O acordo
Brasil-China, embora único nesse sentido, adota em sua integralidade a
cláusula do artigo 5(3) da CM-ONU206 (estabelecimento permanente de
prestação de serviços). Por sua vez, a maior parte dos acordos
brasileiros207 adota o artigo 5(6) da CM-ONU, atinente ao estabelecimento
permanente de companhias seguradoras, sem correspondente na CM-
OCDE, embora também possua dispositivos semelhantes ao artigo 5 (5),
(6) e (7) desta. A segunda sentença do artigo 5(7) da CM-ONU, ausente na
CM-OCDE, foi adotada nos acordos celebrados com Chile, China, Índia e
México208.

A original concepção de estabelecimento permanente, como observam


Yariv Brauner e Pasquale Pistone209, representou uma forma de alocação
mais justa da exigência tributária, sob a concepção de que a presença de
instalações físicas estáveis no território de países diversos do Estado de
residência justificaria o exercício da tributação por aqueles outros Estados.

A OCDE há bastante tempo vem empenhando esforços para conciliar as


questões tributárias com os desafios decorrentes do desenvolvimento
tecnológico e da economia digital. Nesse sentido, é emblemática a

171
publicação, em 2003, do relatório “Implementation of the Ottawa Taxation
Framework Conditions”210, que recomenda a adoção de princípios básicos
para o tratamento dos novos modelos de comércio eletrônico que
emergiam desde a década de 1990, como neutralidade, eficiência, certeza,
simplicidade, equidade e flexibilidade. No contexto de então, tais
recomendações consideravam a presença física no âmbito territorial do
Estado da fonte como algo fundamental para a caracterização de um
estabelecimento permanente.

Essa mesma ideia esteve presente na forma como a OCDE


tradicionalmente tratou do comércio eletrônico nos seus comentários à sua
convenção modelo, excluindo a possibilidade da caracterização de
estabelecimento permanente se ausente uma parcela tangível do
empreendimento nos Estados que não correspondessem à sua residência.
Assim, websites, por si só, não apresentariam elementos tangíveis hábeis a
caracterizar um estabelecimento permanente, mas servidores poderiam
preencher os requisitos em questão (parágrafo 42.1 e seg. dos comentários
ao artigo 5º da CM-OCDE).

Contudo, justamente esse critério físico, originalmente utilizado para


assegurar o exercício mais justo das soberanias fiscais, passou a permitir
distorções em face do exponencial crescimento da economia digital,
tornando-se, em algumas hipóteses, verdadeiro obstáculo a esse objetivo.

De fato, no ambiente de cloud computing os desafios relacionados aos


estabelecimentos permanentes ganham novas cores. Nesse modelo de
negócio, em qualquer de suas modalidades, provedores, desenvolveres,
usuários e servidores não precisam estar fisicamente próximos. Assim,
para a instalação desses robustos equipamentos, as empresas podem
escolher jurisdições com baixa tributação ou, como parece ser o caso de

172
Singapura, que não considerem servidores estruturas suficientes para a
caracterização de estabelecimentos permanentes211.

Além disso, ainda que um determinado país compreenda que um


servidor localizado em seu território caracterize um estabelecimento
permanente, isso apenas representa o início de uma questão bastante
complexa. Ocorre que, inclusive para a segurança do sistema, essas
estruturas geralmente demandam a utilização de uma série de servidores
com localizações variadas, pelos quais os dados transitam de forma
constante. Como, então, quantificar a renda que deve ser alocada aos
servidores localizados em cada um dos países utilizados pela estrutura em
questão212?

Nos últimos anos, a OCDE passou a reconhecer que as normas dos


acordos de bitributação, forjadas em face de modelos negociais que tinham
como marca a presença física dos agentes de mercado, têm se mostrado
ineficientes em face dos avanços da economia digital. Nesse sentido, é
marcante o relatório produzido por esse organismo em 2005, intitulado
“Are the Current Treaty Rules for Taxing Business Profits Appropriate for
E-Commerce?”213.

Em seu plano de ações para fazer face à erosão das bases tributáveis
(Base Erosion and Profit Shifting – BEPS), a OCDE observa a necessidade
de se enfrentar o descompasso existente entre as previsões existentes na
convenção modelo e a evolução da forma como as empresas realizam os
seus negócios. Isso pode ser especialmente verificado na Ação 1, que tem
como escopo a economia digital e em que se constata que os novos
modelos de empreendedorismo moldados à economia digital permitem que
as empresas ganhem escala e acessem outros mercados sem
necessariamente estar fisicamente presente nestes, evidenciando, entre

173
outras coisas, a necessidade de reformulação das regras para a
caracterização de estabelecimentos permanentes.

4. A SOLUÇÃO ACENADA PELAS AUTORIDADES FISCAIS


BRASILEIRAS PARA OS RENDIMENTOS DECORRENTES DE CLOUD
COMPUTING

Alguns pronunciados da administração fiscal brasileira devem ser


considerados na análise da matéria.

A Coordenação Geral de Tributação da Receita Federal (COSIT)


recentemente foi consultada sobre a hipótese de o contribuinte desenvolver
atividade em que “comercializa autorizações de acesso e uso dos
intitulados Software as a Service (SaaS), que são adquiridos de
fornecedores estrangeiros para serem revendidos a usuários/clientes no
Brasil”, em que “os SaaS podem ser acessados de qualquer computador ou
dispositivo móvel pelos usuários, por meio de senha. As autorizações de
acesso aos sistemas ocorrem de forma remota, por meio da internet, onde o
usuário acessa banco(s) de dados que se encontram hospedados em locais
indeterminados, chamados de ‘nuvem’”. No caso, o contribuinte “adquiriu
para comercializar ‘autorizações de acesso’ de dois SaaS. O primeiro
oferece proteção para rede de usuários contra vírus, spam e demais
ameaças. O segundo permite a realização de conferências, reuniões,
treinamentos e projetos por meio da internet e compartilhamento de
informações em tempo real”. “Os dois softwares são oferecidos pelos
fornecedores também a diversos clientes indistintamente. Além disso, não
são produzidos sob encomenda e não se tratam de softwares de cópias
múltiplas (‘prateleiras’) que empresas compram e instalam como um
produto em seu próprio datacenter”.

174
Diante desse cenário, a Solução de Consulta COSIT n. 191, de 23 de
março de 2017, compreendeu tratar-se de um serviço técnico prestado em
favor de um cliente brasileiro, in verbis:

Saliente-se portanto que os serviços postos à disposição dos usuários


caracterizam-se como serviços técnicos, pois dependem de conhecimentos
especializados em informática e, além disso, conforme se depreende da sistemática
relatada pela consulente, os serviços decorrem de estruturas automatizadas com
claro conteúdo tecnológico, que os usuários acessarão à distância para usá-los nas
sua atividades empresariais, cabendo ao fornecedor do serviço prover a manutenção
e o suporte técnico para o funcionamento dos aplicativos disponibilizados.

Não se pode negar ser controversa a solução adotada, seja pela


qualificação da relação em questão como “prestação de serviços”, seja pela
caracterização destes como “serviços técnicos”.

Não há na lei tributária brasileira, em sentido estrito, parâmetros para a


diferenciação de serviços técnicos dos serviços em geral. A Instrução
Normativa (IN) RFB n. 1.455, de 6 de março de 2014, em seu art. 17,
pretendeu suprir essa lacuna da legislação, qualificando como “serviço
técnico a execução de serviço que dependa de conhecimentos técnicos
especializados ou que envolva assistência administrativa ou prestação de
consultoria, realizado por profissionais independentes ou com vínculo
empregatício ou, ainda, decorrente de estruturas automatizadas com claro
conteúdo tecnológico”.

Assim como já ocorria na pretérita Instrução Normativa RFB n.


252/2002, a novel IN não vinculou os serviços técnicos à transferência de
tecnologia ou qualquer caráter de complementaridade a outros objetos
contratuais. Na verdade, nos termos em que formulada, a referida norma
infralegal ajuda pouco na diferenciação de um determinado serviço como
técnico ou não, pois adota termos muito amplos.

175
A Solução de Consulta COSIT n. 191 parece acenar para o
entendimento de que todas as atividades desenvolvidas em ambiente de
nuvem, por decorrerem de “estruturas automatizadas com claro conteúdo
tecnológico”, seriam qualificadas sempre como “serviços técnicos”.

Como importante contraponto a essa generalização, Alberto Xavier214


apresenta um interessante exercício, em que procura construir o sentido
das expressões “assistência técnica ou serviços técnicos” no contexto dos
tratados celebrados pelo Brasil com cláusula de equiparação dessas
atividades a royalties, in verbis:

(...) A qualificação da remuneração por “assistência técnica ou serviços


técnicos” como royalty, por complementaridade ou acessoriedade, leva também a
concluir que somente podem ser qualificados como de “assistência técnica e
serviços técnicos” para efeito das Convenções, aqueles contratos que – seja qual for
a sua denominação – tenham caráter complementar ou instrumental de contratos de
transferência de capital tecnológico, não podendo de modo algum abranger os
contratos em que o objeto principal seja a prestação de serviços, ainda que de
conteúdo técnico, pois a remuneração destes não é, por natureza, royalty, mas
rendimento de trabalho autônomo (tratando-se de serviços pessoais) ou preço
constitutivo do lucro de empresa (tratando-se de serviços não especiais).

Vale observar que a Solução de Consulta COSIT n. 191, por tratar de


pagamentos realizados a provedor sediado nos Estados Unidos, não
abordou a aplicação de acordos de bitributação. No entanto, caso o
beneficiário dos rendimentos fosse residente em algum dos países com os
quais o Brasil possui acordo para evitar a bitributação e em que se
equiparou “serviços técnicos e assistência técnica” a “royalties” por meio
de protocolo, é possível supor que a solução adotada pela administração
fiscal seria a aplicação do art. 12 do Tratado em questão, de forma a ser
mantida a incidência de IRRF à alíquota de 15% e de CIDE à alíquota de
10%. O Ato Declaratório Interpretativo RFB n. 5, de 16 de junho de 2014,
em tese corroboraria esse entendimento administrativo215.

176
Pelo referido ato declaratório, a administração fiscal brasileira,
seguindo algo que já havia sido mencionado no Parecer PGFN n. 2.362,
esclarece qual é, no seu entender, o caminho adequado a ser percorrido
para classificação de um determinado rendimento entre as cláusulas dos
acordos de bitributação:

Art. 1º O tratamento tributário a ser dispensado aos rendimentos pagos,


creditados, entregues, empregados ou remetidos por fonte situada no Brasil a pessoa
física ou jurídica residente no exterior pela prestação de serviços técnicos e de
assistência técnica, com ou sem transferência de tecnologia, com base em acordo ou
convenção para evitar a dupla tributação da renda celebrado pelo Brasil será aquele
previsto no respectivo Acordo ou Convenção:
I – no artigo que trata de royalties, quando o respectivo protocolo contiver
previsão de que os serviços técnicos e de assistência técnica recebam igual
tratamento, na hipótese em que o Acordo ou a Convenção autorize a tributação no
Brasil;
II – no artigo que trata de profissões independentes ou de serviços profissionais
ou pessoais independentes, nos casos da prestação de serviços técnicos e de
assistência técnica relacionados com a qualificação técnica de uma pessoa ou grupo
de pessoas, na hipótese em que o Acordo ou a Convenção autorize a tributação no
Brasil, ressalvado o disposto no inciso I; ou
III – no artigo que trata de lucros das empresas, ressalvado o disposto nos
incisos I e II.

Por sua vez, coerentemente, caso o beneficiário dos rendimentos em


questão fosse residente de países como Áustria, Finlândia, França, Japão
ou Suécia, com os quais o Brasil possui acordos para evitar a bitributação
sem a referida equiparação em seus protocolos de “serviços técnicos e
assistência técnica” a “royalties”, é possível supor que a administração
fiscal qualificaria os rendimentos em questão sob o escopo do art. 7º.
Nessa hipótese, então, não haveria a incidência de IRRF sobre os referidos
rendimentos (STJ, REsp 1161467/RS; Parecer PGFN/CAT n. 2.362/2013).

Note-se que o Ato Declaratório Interpretativo RFB n. 5, de 16 de junho


de 2014, expõe o entendimento de que os rendimentos devem ser
qualificados sob o escopo do art. 14 dos acordos celebrados pelo Brasil

177
(“profissões independentes ou de serviços profissionais ou pessoais
independentes”) “nos casos da prestação de serviços técnicos e de
assistência técnica relacionados com a qualificação técnica de uma pessoa
ou grupo de pessoas”. Contudo, não parece ser esse o caso de atividades de
cloud computing.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS: APENAS O INÍCIO PELA BUSCA DE


SOLUÇÕES
Meanwhile, the problems have not disappeared and some important reactions
are occurring worldwide at the unilateral level, such as the Indian equalization levy
on services or the equivalent solutions adopted by other countries in the form of
excise duties. We understand that this is one of the few possible options for a quick
and unilateral defensive reaction that effectively protects tax sovereignty. However,
when this quick fix turns into an overall tax policy standard at the global or even
regional level, we believe that it may create more problems than it solves in each of
the countries that apply it. For this reason, we express concern as to suitability of
these types of measures to operate as quick fixes to the existing problems of
adapting taxation to the requirements of the new business models.
Yariv Brauner e Pasquale Pistone216

O estudo desenvolvido demonstra que a economia digital e, em


especial, o ambiente de cloud computing, fazem aflorar desafios para a
tributação internacional da renda, a exemplo da qualificação dos
rendimentos envolvidos e a identificação de estabelecimentos
permanentes.

A reformulação dos critérios para a identificação de estabelecimentos


permanentes (new PE nexus) tem sido intensamente debatida no âmbito no
Projeto BEPS217. Contudo, como bem observam Pasquale Pistone e Peter
Hongler218, a importância desse debate não reside apenas na contenção da
erosão tributária, mas decorre primordialmente dos novos modelos
negociais trazidos pela economia digital, que tornam necessária a revisão
dos critérios que até então vêm sendo utilizados para a distribuição das
competências tributárias em operações internacionais.

178
Em linhas gerais, a Ação 1 proposta pelo Projeto BEPS sugere a
discussão de parâmetros para a identificação de presença econômica
significativa do contribuinte no Estado da fonte, o que, em contraposição à
tradicional presença física exigida pelos milhares de acordos de
bitributação atualmente existentes, poderia ser considerado um elemento
de conexão caracterizador do estabelecimento permanente. Basicamente
três fatores, se combinados, evidenciariam a presença econômica
significativa naquele Estado capaz de caracterizar um estabelecimento
permanente: (i) receitas obtidas; (ii) presença digital e; (iii) número de
usuários alcançados219.

Em relação às receitas obtidas, a OCDE destaca três pontos


fundamentais que deveriam ser considerados: necessidade de identificação
das operações responsáveis pela sua geração (somente aquelas realizadas
de forma remota deveriam ser consideradas), a necessidade de se
estabelecer um limite de valor e, por fim, as dificuldades relacionadas à
verificação dessas operações e das receitas a elas atribuídas. Quanto à
presença digital do contribuinte, o Projeto BEPS destaca elementos como a
existência de um domínio local, de uma plataforma digital local, a
utilização da língua nativa, a conclusão da operação por meio de
ferramentas locais ou, ainda, a adoção da moeda oficial daquele Estado
para o estabelecimento de preço e condições de pagamento. Por fim, a
OCDE considera relevante o número de usuários ativos no Estado da fonte
medido mensalmente, o volume de contratos concluídos de maneira on-
line e de informações contratadas.

Outras opções apontadas pela OCDE visariam lidar com a


complexidade da atribuição de direitos no âmbito da economia digital sem
a necessidade da implementação de novos parâmetros de verificação da

179
presença do não residente no mercado consumidor. Foi sugerida a
imposição de tributos específicos sobre essas modalidades de negócios ou,
ainda, normas de equalization levy. A Índia pode ser citada como exemplo
da recente adoção desta medida220.

A própria OCDE, no entanto, reconhece que todas essas medidas


precisam ser objeto de adequada discussão.

Há uma série de dificuldades que dizem respeito ao custo de


administração e de fiscalização, constante evolução tecnológica,
flexibilidade dos domínios e plataformas digitais, necessidade de
conhecimento acerca de questões técnicas, identificação dos usuários,
problemas de isonomia, adequação a acordos comerciais, entre outras. Nos
comentários recebidos e divulgados pela OCDE221, pode-se notar que há
uma preocupação quanto às incertezas que seriam provocadas por essas
medidas, além do incremento de custos de conformidade e a necessária
revisão das normas de Direito Tributário internacional em geral, com o
possível desincentivo da inovação e novos modelos de negócios.

As propostas apresentadas nas ações do Projeto BEPS para equacionar a


tributação sobre a economia digital têm sido discutidas com atenção pela
doutrina do Direito Tributário internacional222. Nos estreitos lindes desse
ensaio, destaca-se o recente estudo publicado por Pasquale Pistone e Yariv
Brauner223.

Defendem os referidos professores dois caminhos que poderiam ser


adotados em conjunto ou isoladamente, seja por países da União Europeia
ou de fora desta. Em linhas muito gerais, o primeiro conduziria à adoção
de um conceito de estabelecimento permanente virtual no artigo 5(8) dos
acordos de bitributação ou mesmo do acordo multilateral proposto pela

180
OCDE (Multilateral Convention to Implement Tax Treaty Related
Measures to Prevent Base Erosion and Profit Shifting), de forma a
prescindir de instalações fixas para a caracterização deste, com a adoção
de critérios como número de usuários em um certo período e receitas
auferidas. Alternativamente, sustentam que o mesmo resultado poderia ser
alcançado afastando-se distinções tributárias entre os negócios tradicionais
e aqueles relacionados à economia digital, com uma interpretação
compreensiva dos acordos já celebrados, capaz de incluir no conceito de
estabelecimento permanente não apenas estruturas com efetiva presença
física, mas também cuja presença virtual possa ser evidenciada.

O segundo caminho sugerido, também em linhas muito gerais, seria a


adoção de um tributo na fonte por todos os países a uma alíquota padrão
(por exemplo, de 10%), cuja incidência sobre pagamentos realizados a
beneficiários não residentes ocorreria independentemente da modalidade
de negócios (se relacionados à economia digital ou não). Conforme
sugerido, a incidência do referido tributo respeitaria as hipóteses isentas e
seria alternativa, pois deveria ser assegurada aos beneficiários a opção de
sujeitar os seus rendimentos à tributação em bases líquidas (net taxation
scheme). Uma alíquota mais elevada poderia, ainda, ser adotada nas
hipóteses de beneficiários não identificados ou residentes em jurisdições
com regimes fiscais privilegiados.

Entre as diversas questões, dificuldades e ideias que vêm sendo


apresentadas, ao menos uma coisa parece certa. Nesse mundo digital, onde
as fronteiras parecem desaparecer, medidas unilaterais dos Estados, ainda
que de forma imediata possam servir para a proteção de suas soberanias
fiscais, são capazes de ensejar problemas no âmbito de políticas fiscais
globais, bem como criar obstáculos ao desenvolvimento de novos modelos

181
de negócios. Torna-se urgente a discussão e a adoção de medidas em
conjunto por parte dos Estados.

Com a apresentação de seu pedido formal de adesão à OCDE, o Brasil


dá sinais de sua intenção de participar da formulação de medidas conjuntas
como essas, bem como de alinhar-se a diversas diretrizes que não têm sido
efetivamente consideradas por muitos de nossos operadores do Direito
Tributário internacional.

Enquanto os referidos debates evoluem, devemos evitar que equívocos


como aqueles cometidos na interpretação dos termos “lucros das
empresas” (superados a partir da decisão do STJ no REsp n. 1161467/RS)
não voltem a se repetir na interpretação das expressões “serviços técnicos
e assistência técnica”, presentes nos protocolos de muitos dos tratados
celebrados pelo Brasil. A construção de sentido de tais termos deve ser
realizada a partir do contexto dos acordos de bitributação em que se
encontram inseridas, com atenção às normas de interpretação que regem o
Direito Tributário internacional224.

182
Os princípios da tributação no Estado da
fonte e no Estado da residência e os impactos
da economia digital no Brasil e no mundo
Matheus Bertholo Piconez225

1. INTRODUÇÃO: ECONOMIA DIGITAL E SEUS IMPACTOS NO


DIREITO

A migração da economia tradicional para a economia digital e a


importância desta última na economia mundial já são evidentes: veja-se,
por exemplo, que a maior empresa de táxis do mundo, Uber, não possui
frota própria; a maior empresa de mídia do mundo, Facebook, não cria
conteúdo de mídia; o maior varejista do mundo, Alibaba, não possui
estoque, nem lojas físicas; e o maior provedor de acomodação do mundo,
Airbnb, não possui nenhuma propriedade226.

Houve uma grande mudança com relação aos negócios tradicionais, em


que o componente físico e local era muito relevante. No final do século
XX, apesar da grande internacionalização das empresas e da forte presença
de multinacionais, a economia ainda era “real”, ou seja, as trocas físicas de
mercadorias predominavam. Atualmente, por outro lado, denota-se um
grande aumento no fluxo de informações, e uma parcela muito relevante
da economia agora se alicerça em bens intangíveis e conteúdo digital e
imaterial.

Embora o termo “economia digital” venha sendo utilizado desde a


década de 1990, não existe uma definição legal sobre o conceito. A
Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)
observa que “economia digital” é um termo geral227 utilizado para

183
descrever os mercados que se concentram em tecnologias digitais, que
visam facilitar o comércio de bens e serviços por meio do comércio
eletrônico. Portanto a economia digital não pode ser caracterizada como
uma parte separada da economia dominante.

No entanto, a economia digital pode ser caracterizada por um conjunto


de aspectos principais que a distinguem da economia tradicional, quais
sejam228:

•mobilidade: a economia digital possibilita maior mobilidade, em especial por


conta da importância dos intangíveis. Os direitos associados são facilmente
transmitidos para outras jurisdições (em especial as de baixa tributação), o que
permite uma redução de custos transacionais, maior competitividade com
relação a mercados locais e facilidade no intercâmbio de produtos;
•efeitos de rede: a massificação do acesso em rede permitiu a criação de
modelos de negócios multifacetados, em que grandes grupos de pessoas
interagem em plataformas, reduzindo custos marginais de produtos e preços, e
isso traz aspectos positivos e negativos. Por exemplo, como aspectos
positivos, podemos destacar as plataformas de mídia e a integração dos
sistemas de pagamentos, e, como negativos, a violação de privacidade dos
consumidores e o excesso de propaganda em plataformas digitais gratuitas; e
•uso das informações: a informação como bem de valor é uma característica
fundamental da economia digital. A grande capacidade de coleta, de
armazenamento e de tratamento de informações sobre clientes e hábitos de
consumo geraram o conceito de “big data” que pode agregar valor tanto no
âmbito privado quanto o público, mudando a forma como determinados
negócios geram valor.

Numa tentativa de se analisar a intersecção entre direito e tecnologia,


Arthur Cockfield e Jason Pridmore229 propuseram uma teoria sintética para
analisar situações em que as mudanças tecnológicas poderiam ameaçar
interesses e valores tutelados pelo direito.

Na visão desses autores, para determinar se uma mudança tecnológica


está prejudicando os interesses tradicionais protegidos pelo direito, deve-
se: (a) identificar o interesse tradicional protegido por lei (por exemplo,

184
segurança empresarial, proteção de direitos autorais etc.), recorrendo à
análise da doutrina tradicional aplicável à área de tecnologia afetada e, em
seguida; (b) avaliar se o direito está sendo indevidamente violado pela
respectiva mudança tecnológica.

Se a conclusão após essa análise preliminar determinar que a tecnologia


está ameaçando interesses tradicionais, o próximo passo é realizar uma
análise mais conceitual para: (a) examinar o contexto mais amplo da
mudança tecnológica e seus resultados adversos inesperados para o
interesse tradicional, bem como para outros interesses que a lei busca
proteger; e (b) encontrar soluções legais para proteger o interesse
tradicional que sejam flexíveis e permitam uma compatibilização de
ambos os interesses.

Assim, por exemplo, se uma determinada tecnologia viola o direito à


intimidade, deve-se sopesar se a liberdade para a utilização dessa nova
tecnologia deve ser restringida para proteger os direitos tradicionais à
privacidade. Um outro exemplo em ampla discussão são os aplicativos de
transporte coletivo: até que ponto as novas ferramentas digitais de
transporte violam os direitos tradicionais dos taxistas e detentores de
licenças e autorizações para transporte de passageiros?

E, para delimitar o tema do presente trabalho, quais seriam as


implicações (positivas e negativas) da economia digital no Direito
Tributário, em especial com relação ao sistema tributário tradicionalmente
posto? Até que ponto o Brasil consegue tributar negócios da economia
digital produzidos em plataformas globais de negócio?

Mais especificamente, as regras de tributação internacional da renda,


fundadas nos conceitos tradicionais de fonte e residência, são suficientes

185
para se tributar de forma equânime a renda decorrente da economia
digital? É o que será analisado nos tópicos a seguir.

2. ECONOMIA DIGITAL E SEUS IMPACTOS NO DIREITO


TRIBUTÁRIO

Na seara fiscal, os principais desafios levantados pela economia digital


relacionam-se com o fato de qual seria uma conexão considerada
suficiente entre o serviço prestado/atividade desenvolvida para a cobrança
de tributos, diretos e indiretos. Qual será o critério mais adequado para se
vincular determinado intangível ou atividade da economia digital a
determinada jurisdição?

A OCDE e a União Europeia estão investigando soluções para enfrentar


tais desafios, incluindo a possível existência de um estabelecimento
permanente quando uma empresa não residente em determinada jurisdição
realiza negócios por meios digitais, no contexto do projeto destinado a
prevenir a erosão de base e mudança de lucro entre jurisdições (Projeto
BEPS).

Além disso, a tributação do comércio eletrônico apresenta diversos


desafios tanto para contribuintes quanto para a administração no que diz
respeito à identidade dos consumidores e dos fornecedores e para a
verificação da ocorrência regular de tais transações230. Isso é
particularmente relevante na esfera fiscal pois pode dificultar a cobrança
de tributos sobre atividades negociais ou até mesmo entre residentes de
uma determinada jurisdição.

Por exemplo, uma plataforma digital pode facilmente se estabelecer


fora de uma determinada jurisdição onde realiza negócios, dificultando a
determinação de seu domicílio fiscal. E não é só. Plataformas de busca

186
recebem renda decorrente de empresas de comércio eletrônico para que
seus nomes apareçam nos resultados de busca. Tais empresas também
podem se beneficiar do tratamento dos dados, quando informações
relativas às buscas e hábitos dos usuários são vendidas a terceiros, para
fins de direcionamento de publicidade. A qual jurisdição essa renda deve
ser atribuída? Ao país dos consumidores, ao país onde a ferramenta foi
criada ou ao país de domicílio da empresa?

A criação de valor decorrente de tais atividades, suficiente para se atrair


a competência tributária para determinada jurisdição, é um tema de disputa
entre jurisdições, e a legislação tributária internacional ainda não
conseguiu endereçar a questão de forma satisfatória231.

O escopo do presente artigo limita-se a explorar as regras basilares de


Direito Tributário internacional de fonte e residência na repartição de
competências tributárias, e que podem ser impactadas pela economia
digital. Antes de se adentrar a análise dos impactos, é necessário expor
breves considerações sobre essas regras e o contexto na qual elas se
encontram inseridas.

2.1. Os princípios da tributação no estado da fonte e no estado da residência

O poder de tributar determinada renda em uma jurisdição é


tradicionalmente definido por meio do elemento material do fato gerador
que está ao alcance do poder de tributação desse estado232.

Sucede que referido poder de tributação é alicerçado no princípio da


soberania fiscal, qual seja, a capacidade de um determinado ente tributante
de perseguir sua política fiscal, sem restrições por influências externas.
Para se determinar a relação de determinado fato da vida com determinada
jurisdição e, consequentemente, aplicar-lhe os efeitos fiscais impositivos, a

187
jurisdição se vale do elemento de conexão, é “integrado na hipótese de
norma de conflitos – desempenhando a função de ‘lançar a ponte’ (na
célebre terminologia de Raape) entre o fato descrito pelo conceito-quadro
e o ordenamento jurídico aplicável”233.

Os fundamentos tradicionais de jurisdição para delimitar competências


no Direito internacional são a nacionalidade – as atividades, o interesse, o
status ou as relações dos cidadãos de determinado estado, dentro ou fora
dele – e a territorialidade, definida como a conduta que, total ou
substancialmente, ocorre dentro do território do estado.

A territorialidade é expandida para cobrir algumas condutas fora do


território de um estado que tenha um “efeito substancial” dentro dele234.
Para fins fiscais, a territorialidade é redefinida como o direito à tributação
das fontes dentro de sua jurisdição, o que é um conceito difícil de definir.
Mas o conceito de nacionalidade é redefinido de forma mais radical e
peculiar.

Com exceção dos Estados Unidos235, quase nenhum outro país no


mundo reivindica o direito de tributar os seus cidadãos em renda de fontes
localizadas fora do país quando estes vivem permanentemente nesse outro
país, pelo critério da nacionalidade.

Em vez disso, todos os países do mundo (incluindo os Estados Unidos)


adotaram um elemento de conexão mais amplo, a residência, que
geralmente implica uma mera presença física no país por um número
mínimo de dias. Em grande parte dos países, a presença física por 183 dias
em um dado ano geralmente é suficiente para sujeitar um indivíduo a uma
jurisdição tributária sobre a universalidade de sua renda durante esse ano,
como é o caso do Brasil.

188
Além disso, determinados países complementam a sua regra fiscal com
um teste de “domicílio fiscal”, que busca elementos mais subjetivos para
determinar a residência, como a localização da morada principal, laços
familiares e outros. Os dois testes (presença física e domicílio fiscal) foram
incorporados aos acordos internacionais contra a dupla tributação, e que
também é o caso dos acordos assinados pelo Brasil.

Logo, o conceito de residência não se limita a exigir, de forma objetiva,


a permanência física num dado local, mas também analisa o aspecto
subjetivo, que é a intenção do sujeito de se tornar residente em
determinada jurisdição236.

Tal conceito é tão amplo que, por vezes, não é raro que determinado
contribuinte esteja sujeito à tributação em um determinado ano por conta
de sua residência, e em outro, não. Além disso, é extremamente comum
surgirem situações de dupla residência fiscal.

E por que as regras de residência fiscal são tão abrangentes? Um dos


principais motivos é a facilidade com a qual cidadãos de determinada
jurisdição podem mudar sua residência a fim de recolher menos tributos.

Em linhas gerais, o fato de determinado contribuinte morar em um país


por um período superior a seis meses no ano calendário é considerado
suficiente para a tributação mundial de sua renda em determinada
jurisdição, tendo em vista os supostos benefícios usufruídos pelo
contribuinte nesse país.

A regra de residência é tão amplamente seguida e incorporada em tantos


tratados que pode ser considerada parte do Direito Internacional

189
consuetudinário, sendo incorporada nos modelos da OCDE e das Nações
Unidas.

Por outro lado, enquanto pode ser relativamente simples atribuir o


elemento de permanência física como elemento de conexão para pessoas
físicas, o assunto é um pouco mais controverso quando se trata da
residência das pessoas jurídicas e, na linha do problema aqui exposto, no
caso de tributação da renda obtida pelas empresas da economia digital.

Em linhas bem gerais, as pessoas jurídicas são consideradas residentes


com base no local de constituição (como é o caso do Brasil e dos EUA) ou
no local da efetiva administração ou controle (como é o caso de Reino
Unido). Cada abordagem possui suas vantagens e desvantagens. Enquanto
a regra do local de constituição é de mais fácil averiguação e
administração, é também mais fácil de ser manipulada. A regra do centro
de administração é mais difícil de se manipular, porém requer mais
recursos da administração tributária de determinada jurisdição para sua
fiscalização e controle, e está sujeita a um maior grau de incerteza na sua
aplicação237.

Por outro lado, se é verdade que o conceito de residência tem por


objetivo tributar o país onde reside o titular dos fundos fornecidos e que
aufere a renda dos capitais investidos, seja no país ou no exterior, a
tributação na fonte tem por objetivo atrair a competência tributária onde
ocorreu o negócio e onde se obtém a renda produzida pelo capital e pelo
trabalho.

Assim, o princípio da fonte, ao não tributar lucros produzidos fora do


país, favorece a neutralidade da importação de capitais, enquanto o

190
princípio da residência, tributando o lucro onde quer que ele tenha sido
produzido, favorece a neutralidade na exportação de capitais238.

Como o sistema tributário internacional opera, portanto, em termos de


fonte e residência como elementos de conexão? A explicação tem suas
origens na regra da “primeira mordida na maçã”, adotada pelas Liga das
Nações em 1923239, que é até hoje o princípio básico que rege situações de
dupla tributação sobre a mesma renda. Por meio de referida regra, o país
da fonte (território) tem prioridade para tributar a renda de suas fontes, e o
país de residência (nacionalidade) fica obrigado a eliminar a dupla
tributação pela concessão de uma isenção ou um crédito.

Muitas regras para se evitar o abuso de redomiciliação de empresas


foram desenvolvidas no mundo. A mais notável delas é a regra de
Controlled Foreign Corporations (CFCs), que determina a distribuição
automática de lucros de controladas e coligadas no exterior, regra que foi
introduzida no Brasil por meio do art. 1º da Lei n. 9.532/97,
complementada pelo art. 74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001 e
substancialmente alterada pelas regras veiculadas pela Lei n. 12.973/2014.

Assim, uma empresa brasileira integralmente controlada por sociedade


norte-americana é, em primeiro lugar, integralmente tributada aqui no
Brasil pelo imposto de renda da pessoa jurídica, porém seus lucros também
poderão ser tributados de forma automática nos Estados Unidos, que
deverão conceder os créditos e ajustes necessários a fim de se evitar que o
gravame fiscal inviabilize as atividades de seu jurisdicionado fora do seu
território. Tal regime ainda é alvo de crítica de países de fonte, geralmente
importadores de capital, eis que tais regras eliminam a possibilidade de se
conceder benefícios fiscais a investidores estrangeiros.

191
Portanto, enquanto os princípios de fonte e residência são importantes
para se delimitar e repartir as competências tributárias, eles não deixam
claro qual seria a extensão da competência do ente tributante. Existem
inúmeras formas de se combinar e limitar tais competências tributárias,
porém a distinção tradicional é a de estabelecer um princípio de tributação
universal de renda, segundo o qual todos os residentes de um país sejam
tributados por sua renda, independentemente de onde os rendimentos
sejam produzidos, ou adotar o princípio da territorialidade, limitando a
competência tributária apenas aos rendimentos decorrentes de fontes
localizadas dentro do território240.

Em linhas gerais, esses são os conceitos de fonte e residência


consagrados no Direito Tributário internacional. Porém, conforme será
abordado no tópico a seguir, o que fazer quando não há uma conexão clara
entre o negócio e o território, como é no caso da economia digital? Há
dúvidas quanto a se a atual estrutura de fonte e residência continua a ser
apropriada para lidar com as mudanças trazidas pela economia digital e os
modelos de negócio dela decorrentes e relacionar isso com uma adequada
alocação de competências tributárias entre os países de fonte e de
residência.

2.2. Desafios da economia digital para o princípio de fonte e residência

O sistema fiscal internacional não acompanhou o ritmo de


desenvolvimento tecnológico. Muitos países ao redor do mundo viram-se
prejudicados, na medida em que as empresas de comércio eletrônico e de
tecnologia evitam legalmente os impostos por meio de estruturas de
empresa cuidadosamente desenhadas. Por exemplo, uma gigante da
internet conseguiu reduzir sua carga tributária mundial quase à metade, de

192
forma lícita, transferindo 9,8 bilhões de dólares para as Bermudas, o que
representava cerca de 80% dos seus lucros antes dos impostos em 2011241.

Os mais alarmistas sustentam que o sistema atualmente adotado para a


tributação sobre a renda, que se alicerça nos conceitos de fonte e
residência, estão com os dias contados.

Como apontado no plano de ação 1 do BEPS242,

a economia digital é caracterizada por uma incomparável dependência de ativos


intangíveis, o uso maciço de dados (notadamente dados pessoais), o uso
generalizado de modelos comerciais plurilaterais que capturam valor de
externalidades geradas por produtos gratuitos e a dificuldade de se determinar a
jurisdição onde ocorre a efetiva criação de valor. Isso levanta questões
fundamentais sobre como empresas da economia digital agregam valor e obtêm
lucros, e como a economia digital se relaciona com os conceitos de fonte e
residência e a caracterização do lucro para fins do imposto sobre a renda.

Essa dinamicidade da economia digital vem trazendo grandes desafios


para a repartição de competências tributárias. Em outras palavras, as regras
atuais de fonte e residência são justas para se tributar de forma adequada a
economia digital? Há uma correlação entre tributação e agregação de
valor?

Para Edward Kleinbard243, o confronto das regras internacionais de


tributação fez surgir o fenômeno da “renda sem estado” (stateless income),
que é a renda obtida por um grupo multinacional oriunda de atividades
comerciais em país diferente do domicílio da empresa controladora, mas
que está sujeita a tributação (ou a não tributação) somente em uma terceira
jurisdição que não é nem a localização dos clientes, nem dos fatores de
produção que criam essa renda, nem do domicílio da empresa
controladora.

193
Em outras palavras, “renda sem estado” pode ser considerada a
movimentação da renda tributável dentro de um grupo multinacional de
uma jurisdição de alta tributação para uma de baixa tributação sem a
mudança da localização do capital e de atividades desempenhadas por
terceiro que geraram essa renda. A “renda sem estado”, na verdade, tem
como seu destino final um estado que não tem tributação, ou baixa
tributação.

A possibilidade de criação da “renda sem estado” não se confunde,


todavia, com a “mobilidade do capital”, entendida como a capacidade de
uma determinada pessoa ou empresa de livremente constituir seus
investimentos ou atividades de terceiros com o intuito de minimizar sua
carga tributária final. Trata-se da “elasticidade da oferta de um fator de
localização com relação à sua vantagem [fiscal] nessa determinada
localização”244.

A razão pela qual pode-se alcançar um desvio da tributação da


jurisdição onde ocorre, de fato, a criação do valor, na visão de Edward
Kleinbard, é um fenômeno decorrente das regras internacionais de
tributação, como por exemplo a tributação em separado de entidades de
um mesmo grupo, ou ainda regras gerais de dedutibilidade de despesas no
pagamento de juros, que permitem uma mobilidade de receitas e despesas
entre empresas do mesmo grupo econômico, localizadas em jurisdições
distintas.

Também, a “renda sem estado” aproveita-se das regras


internacionalmente adotadas de preços de transferência, que pressupõem
que partes relacionadas devem ser consideradas como entidades separadas
e independentes quando transacionam entre si (padrão “arm’s length”),
como se o capital da controladora e o da controlada (fornecido pela

194
controlada) fossem diferentes para fins de alocação de riscos tomados
pelas partes.

A falta de consenso internacional quanto às regras de fonte e de


residência possibilitam situações indesejáveis de não tributação. Por
exemplo, uma controlada de uma empresa norte-americana situada na
Irlanda pode ser considerada uma residente na Irlanda para fins do imposto
de renda norte-americano (pela regra do local de constituição), porém se a
administração dessa pessoa jurídica fica nas Bermudas, ela não é
considerada residente na Irlanda, pois este país utiliza o critério do local de
administração para fins de determinação da residência245.

De qualquer forma, a possibilidade de se criar situações de “renda sem


estado” tem como parcela de culpa a falta de concordância entre os países
para se criar normas que determinem, de forma eficaz, a tributação na
fonte, isto é, regras de Direito Internacional que atribuam de forma eficaz a
renda para uma determinada jurisdição, baseada na percepção da
contribuição econômica dessa jurisdição na produção da renda.

Essa falha, conforme apontado por Edward Kleinbard246, reflete a


ambiguidade econômica e comercial fundamental ao redor da
determinação do locus do valor adicionado por meio da exploração de
ativos intangíveis. Isso porque, por meio de ferramentas de planejamento
fiscal, é possível transferir rendas derivadas de intangíveis originalmente
registradas em uma jurisdição que tem um vínculo racional-econômico
com a produção dessa renda para outra jurisdição de baixa tributação.

Para complicar a questão, há uma sensível divisão de opiniões entre


países desenvolvidos e países em desenvolvimento sobre qual seria a
melhor abordagem na alocação de competências tributárias247.

195
Os países mais desenvolvidos – tipicamente exportadores de capital –
aplicam a residência ou princípio de jurisdição do domicílio, enquanto
países importadores de capital, em geral, tem interesse em aplicar o
princípio da fonte no exercício de sua competência tributária sobre os
eventos que acontecem dentro do seu território. Assim, se o critério da
residência é adotado como principal critério para se tributar a economia
digital, a grande parte das receitas derivadas de tais atividades serão
alocadas para os países desenvolvidos. Por outro lado, se o elemento de
conexão com determinada jurisdição tributária é o site do servidor ou,
ainda, onde o conteúdo eletrônico é consumido, seria possível que países
menos desenvolvidos obtenham rendas com base no fato de que a fonte
dessa renda está em suas respectivas jurisdições.

No entanto, o site do servidor é elemento suficiente para se estabelecer


a conexão capaz de autorizar a tributação dessa renda em determinada
jurisdição?

A eliminação de dupla tributação internacional daí decorrente, seja por


regras unilaterais de mitigação (e.g., crédito, isenção), ou medidas
bilaterais (tratados) não é tarefa simples, e ainda existem inúmeros pontos
controvertidos. A Convenção Modelo da OCDE é um modelo amplamente
utilizado por grande parte das civilizações ocidentais. Por outro lado, o
modelo proposto pelas Nações Unidas, tido como mais adequado para
países importadores de capital, não encontrou tanta aceitação.

Ainda que intangíveis já tivessem uma presença no comércio


internacional (patentes, marcas registradas etc.), na época em que os
princípios de fonte e residência foram inicialmente desenvolvidos, eles
eram relativamente menos importantes. Era possível identificar, com mais

196
facilidade, o domicílio fiscal das pessoas físicas ou jurídicas e qual
jurisdição tinha papel importante na geração da renda.

A fim de solucionar eventuais perdas de receita e outros desafios da


política tributária apresentados pelo comércio eletrônico global, alguns
estudiosos propuseram esforços de reforma, incluindo: (a) baixas, médias
ou elevadas alíquotas de imposto retido na fonte para pagamentos de
comércio eletrônico248; (b) testes qualitativos de presença econômica (isto
é, testes de fatos e circunstâncias) para permitir que os países de origem
tributem os pagamentos de comércio eletrônico, apesar da ausência de um
presença física nesse país249; (c) testes de presença econômica quantitativa
(por exemplo, permitindo que países de fonte imponham tributos caso o
contribuinte estrangeiro realizar vendas acima de 1 milhão de dólares)250;
(d) repartição global formular (global formulary apportionmnent251)252; e
(e) imposto global sobre transações para o comércio eletrônico
internacional253.

O Relatório Final da OCDE sobre a Ação 1 do Plano de Ação BEPS


(“Abordando os Desafios Fiscais da Economia Digital”) analisou os riscos
de BEPS que são potencializados no contexto da economia digital e
mostrou o impacto esperado das medidas desenvolvidas em todo o projeto
BEPS. O relatório reconheceu que a digitalização e alguns dos modelos de
negócios dali resultantes apresentam desafios para a tributação
internacional. Todavia o relatório concluiu que seria difícil, se não
impossível, “isolar” a economia digital do resto da economia para fins
fiscais, devido à natureza cada vez mais difundida da digitalização.

Por exemplo, uma plataforma de transporte coletivo possui elementos


altamente digitalizados (marca, aplicativo, plataforma online de
pagamento), porém o seu elemento principal é uma atividade convencional

197
(transporte de passageiros por motoristas). Assim, apesar de se tratar de
atividade claramente presencial (transporte de passageiros), não há mais
segregação entre o que é digital e o que é convencional, e a digitalização
da economia é um fenômeno observável como um todo.

O relatório também observou que a digitalização levanta uma série de


dúvidas relativas a tributos diretos e indiretos, tanto para os contribuintes,
quanto para a administração tributária. Em particular, esses desafios, na
área de tributos diretos, foram resumidos em três categorias254:

•Nexo. O aumento contínuo do potencial das tecnologias digitais e da


necessidade reduzida de presença física extensiva para se fazer negócios,
combinado com o crescente papel dos efeitos de rede gerados pelas interações
entre consumidor e rede, podem levantar questões sobre se as regras atuais
para determinar se o nexo com uma jurisdição para fins fiscais são
apropriados.
•Dados. A sofisticação das tecnologias da informação permitiu que as empresas
da economia digital reúnam e utilizem informações através das fronteiras num
grau sem precedentes. Isso levanta os problemas de como se atribuir valor à
criação de dados por meio de produtos e serviços digitais e de como
caracterizar, para fins fiscais, o fornecimento de dados de uma pessoa ou
entidade em uma transação como, por exemplo, o fornecimento gratuito de um
bem, como uma transação de troca, ou de outra forma.
•Caracterização. O desenvolvimento de novos produtos digitais ou meios de
entrega de serviços cria incertezas em relação à caracterização adequada dos
pagamentos feitos no contexto de novos modelos comerciais, particularmente
em relação à computação em nuvem (cloud computing).

Ao responder aos maiores desafios fiscais internacionais, o relatório de


2015 considerou uma série de opções de política fiscal. No contexto da
tributação direta, o relatório de 2015 considerou um novo conceito de
“presença econômica significativa”, a utilização de impostos retidos na
fonte sobre certos tipos de transações digitais e até mesmo uma “taxa de
equalização digital”. Todavia nenhuma dessas opções foi recomendada
para adoção, embora tenha sido reconhecido que os países poderiam
introduzir algumas dessas opções em suas leis nacionais como

198
salvaguardas adicionais contra o BEPS, desde que respeitassem os tratados
contra a dupla tributação existentes e as obrigações internacionais.

Em janeiro de 2017, o Quadro Inclusivo sobre o BEPS aprovou uma


nova frente de trabalho para o TFDE sobre tributação e digitalização,
segundo o qual se prevê que um relatório intermediário seja produzido até
o final de 2018 e um relatório final até 2020. Em julho de 2017, em sua
cúpula em Hamburgo, os Líderes do G20 reiteraram seu apoio ao trabalho
da OCDE sobre tributação e digitalização.

Assim, a falta de um consenso global sobre como responder aos


desafios fiscais associados à digitalização representa um problema
contínuo e crescente, no qual um número cada vez maior de países
começou a tomar medidas para a implementação de recursos unilaterais e
medidas domésticas não coordenadas destinadas a tributar atividades
digitalizadas e modelos de negócios altamente digitalizados.

Há uma dificuldade em se identificar quais seriam os efetivos impactos


da economia digital sobre as regras tributárias internacionais existentes e,
mais importante, há necessidade de um consenso internacional sobre essas
mudanças. Como apontado pelo professor Yariv Brauner255, “a grande
ilusão de um único sistema mundial de tributação que eliminasse todas as
ineficiências internacionais e auxiliasse todas as nações do mundo em
maximizar suas vantagens relativas é comumente aceita como utópica”.

Vários países já implementaram medidas unilaterais, como “impostos


sobre lucros desviados” (diverted profits tax) e “tributos de equalização”
(equalization taxes), enquanto muitos outros já anunciaram tais medidas
ou estão considerando apresentá-las em um futuro próximo256. Mais
recentemente, em Tallinn, após uma iniciativa de França, Alemanha, Itália

199
e Espanha, os Ministros das Finanças de dez países da União Europeia
(que também incluíram Áustria, Grécia, Portugal, Bulgária, Romênia e
Eslovênia) pediram que Comissão da UE explorasse opções compatíveis
com a legislação comunitária europeia com base no conceito de “imposto
de compensação” para se tributar empresas digitais.

Essas questões sumarizam as maiores dificuldades atualmente


encontradas para solucionar conflitos entre tributação e economia digital.

Infelizmente, as dúvidas acerca das medidas que podem ser adotadas


para se adequar as regras tradicionais de tributação internacional às
economias digitais são muitas, e ainda não há consenso internacional, nem
doutrinário, nem político, sobre o assunto. De fato, até mesmo o processo
de digitalização da economia está em constante evolução, e novos desafios
ainda surgirão, por exemplo, a tributação de inteligência artificial ou a
impressão 3D de mercadorias.

O que se deve, todavia, é buscar uma solução de compromisso que


otimize o sistema tributário internacional atual, compatibilizando os
interesses dos países tradicionalmente importadores e exportadores de
capital, sendo cediço que não há como uma jurisdição, de forma isolada,
encontrar soluções para os desafios trazidos pela economia tradicional.

Se há um consenso de que a tributação deve recair sobre a jurisdição


onde o valor é criado, há muita divergência sobre como medir essa criação
de valor, bem como realizar uma reforma no sistema tributário
internacional que tributa renda e não criação de valor ou consumo.

No atual sistema tributário, os países de fonte têm como desafio tributar


a renda decorrente do valor ali gerado, porém há um grande desafio fiscal

200
de atrair investimentos tanto domésticos quanto internacionais, e por essa
razão muitas vezes a tributação nesses países não é eficiente.

É fundamental que a tributação de negócios da economia digital seja


realizada de forma justa e equânime, alocando o imposto devido tanto aos
países de desenvolvimento/produção quanto aos países de consumo.

Em todos os casos, quando o imposto for atribuído ao país de consumo,


isso implica que uma parcela da base tributável dessa empresa foi
transferida para esse país, e as regras de repartição de competências devem
sempre se fiar nos princípios tributários internacionalmente adotados, em
especial a eliminação da dupla tributação sobre a mesma renda.

A discussão no âmbito da OCDE vem focando nos argumentos de por


que o país de consumo deve ter uma parcela das receitas tributadas em seu
território, porém é importante também justificar a exclusão desse tributo
do estado de desenvolvimento/produção. Uma proposta de se alocar uma
“renda significativa” para o país de consumo poderia envolver uma
mudança de paradigma para a instituição de um formulary apportionment.
Contudo, a OCDE manteve uma postura firme durante todo o Projeto
BEPS no sentido de que não teria a intenção de adotar esse sistema257.

De fato, a adoção desse regime deve ser acompanhada de profunda


transformação no sistema tributário atual e pode haver muita resistência
dos Estados. Em especial pelo fato de a jurisdição de
produção/desenvolvimento ter que concordar com a fórmula de repartição
que será aplicada e retirará da sua base imponível uma parcela da sua
renda. Só com um esforço conjunto de todos os países será possível se
criar um mecanismo mais equânime e que não resulte em dupla tributação.

201
Assim, conclui-se que, na linha do Relatório Final da Ação 1 do BEPS
de 2015, a economia digital não pode ser vista como uma parte separada
da economia e que não seria adequada a criação de regras específicas para
“modelos de negócio altamente digitalizados”, sob pena de violação aos
princípios da isonomia e da neutralidade em matéria tributária.

De fato, também é importante a análise de medidas unilaterais e não


coordenadas para se abordar a questão. O grande problema dessas medidas
é que elas são adotadas de forma separada da rede de tratados contra a
dupla tributação desses países. Essas medidas que são criadas de forma a
evitar os tratados enfraquecem a sua importância, retiram a certeza de uma
tributação justa e correta, gerando uma dupla tributação da renda, o que em
último grau desincentiva o comércio entre países258. Medidas unilaterais
devem sempre respeitar as disposições dos tratados contra a dupla
tributação.

Como se verá a seguir, o Brasil também não está livre do processo de


digitalização da economia, e os mesmos desafios a ele se aplicam.

3. ANÁLISE SOB A PERSPECTIVA BRASILEIRA

O imposto de renda brasileiro tem como regra principal o art. 43 do


Código Tributário Nacional, que determina que o seu fato gerador é a
aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica “de renda, assim
entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos” e
“de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos
patrimoniais não compreendidos no inciso anterior”.

A Lei Complementar n. 104/2001 acrescentou os §§ 1º e 2º ao referido


dispositivo, determinando que “a incidência do imposto independe da
denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição

202
jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção” e
que “na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei
estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua
disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo”.

Os conceitos de fonte e residência também foram incorporados ao


ordenamento jurídico pátrio, porém a definição de residente se deu de
forma negativa. O art. 12, da Lei n. 9.718/98, define que o não residente
será considerado residente no Brasil se, (i) ingressando com visto
temporário, (a) “trabalhar com vínculo empregatício, em relação aos fatos
geradores ocorridos a partir da data de sua chegada” (b) “por qualquer
outro motivo, e permanecer por período superior a cento e oitenta e três
dias, consecutivos ou não, contado, dentro de um intervalo de doze meses,
da data de qualquer chegada, em relação aos fatos geradores ocorridos a
partir do dia subsequente àquele em que se completar referido período de
permanência”; ou (ii) se ingressar no Brasil com visto permanente, em
relação aos fatos geradores ocorridos a partir de sua chegada.

Com relação às pessoas jurídicas, a regra contemplada foi a de local da


constituição (art. 27 do Decreto-Lei n. 5.844/43 e art. 147 do Decreto n.
3.000/99). Além disso, poderão ser tributados no Brasil os comitentes
domiciliados no exterior, quanto aos resultados das operações realizadas
por seus mandatários ou comissários no País (art. 76, da Lei n. 3.470/58).
Ou seja, as vendas diretas realizadas no Brasil por meio de mandatários,
agentes ou representantes de pessoas estabelecidas no exterior.

Com relação à tributação na fonte, as regras de tributação encontram-se


principalmente nos arts. 682 e 685 do Regulamento do Imposto de Renda
(Decreto n. 3.000/99), e, na visão de Alberto Xavier259, o Brasil só tributa
os rendimentos auferidos por residentes no exterior quando no território

203
nacional estejam localizados, simultaneamente, a fonte de produção
(atividade que dá origem à renda) e a fonte de pagamento (a fonte
pagadora deve ser residente no Brasil). Heleno Tôrres260, por sua vez,
defende uma aplicação ainda mais ampla da regra, sustentando que apenas
o requisito de a fonte de produção estar localizada no Brasil é necessário,
independentemente de o pagamento ter sido realizado por residente ou
não.

Ambos os autores concordam, todavia, que a regra comporta exceções.


É o caso do ganho de capital de não residente sobre a venda de bens no
Brasil (art. 26, da Lei n. 10.833/2003), ou ainda, serviços prestados por
residente no exterior.

E esse também foi o mecanismo consagrado pelos tratados que o Brasil


celebrou para eliminar a dupla tributação, que seguem, em sua grande
parte, as diretrizes da OCDE.

O Brasil, no entanto, não é imune aos problemas da digitalização. Por


se tratar de país eminentemente importador de capital, as regras de
tributação na fonte geralmente o auxiliam no recolhimento de tributos
decorrentes de atividades realizadas por residentes no exterior. E, como
apontado, há um desafio para o Brasil conseguir tributar de forma
adequada a renda decorrente da economia (digital ou convencional) de
forma a manter a atratividade do capital doméstico e externo.

E o problema da regra brasileira é o mesmo encontrado pelos demais


países: a fonte de produção (atividade que dá origem à renda) também
inclui em sua base as atividades online, realizadas por empresas
estrangeiras que não tenham nenhuma conexão com o Brasil?

204
Embora a incidência do imposto de renda na fonte seja bem abrangente,
é possível que determinadas rendas decorrentes de plataformas digitais
fujam à tributação no Brasil. Curiosamente, esse trabalho tem sido
realizado, indiretamente e de forma ineficiente, por meio da cobrança do
Imposto sobre Operações de Câmbio (IOF/Câmbio) à alíquota de 6,38%
sobre todas as transações realizadas com cartão de crédito ou débito (e
cartão pré-pago) em moeda estrangeira261. Enquanto o objetivo da regra é
desincentivar os gastos em viagens no exterior, o tributo de certa forma
funciona como uma tributação da renda derivada de aquisição de
conteúdos digitais, por exemplo. No entanto, o efeito negativo dessa
sistemática de cobrança é a tributação da renda em hipóteses em que não
há elemento de conexão suficiente com o país, como o simples fato de um
residente brasileiro utilizar um cartão de crédito para pagar um hotel no
exterior, por ele ter sido emitido por um banco brasileiro, o que gera
inevitáveis distorções no sistema.

Como apontado no capítulo anterior, a criação de regras brasileiras


específicas e unilaterais para se equacionar perda de receitas poderá criar
mecanismos ineficientes, que resultem em dupla tributação, e que poderá
trazer efeitos indesejáveis aos investimentos no país.

Um ponto de atenção é que o país carece de regra específica destinada a


evitar situações de abuso. Isso tem relação com a alteração promovida pela
Lei Complementar n. 104/2001, que incluiu o parágrafo único do art. 116
do CTN (Código Tributário Nacional)262. O intuito do referido dispositivo
teria sido o de inibir a prática da chamada elisão fiscal, assim entendido o
desenvolvimento de planejamento tributário pelo contribuinte, ainda que
dentro dos limites formais da legalidade.

205
Logo, o objetivo seria permitir que as autoridades fiscais questionassem
atos praticados pelo contribuinte que tenham eventualmente evitado ou
minimizado a carga tributária de suas operações, mesmo que esses atos
tenham obedecido à legislação vigente.

Entretanto, conforme preconiza o próprio dispositivo em referência, os


procedimentos necessários para a aplicação dessa norma ainda dependem
de elaboração de lei ordinária, a qual, até o presente momento, não foi
publicada. Dessa forma, a norma prevista no parágrafo único do artigo 116
do CTN ainda não poderia ser aplicada pelas autoridades fiscais. Portanto
essa imperfeição formal, por si só, impede a aplicação da citada norma.

Assim, diante da ausência de regra geral antiabuso, a legislação


tributária brasileira fica mais fragilizada aos riscos de BEPS trazidos pela
economia digital. Todavia, como já apontado anteriormente, as soluções
para as questões da economia digital não podem ser trazidas de forma
unilateral pelo Brasil, havendo necessidade de um consenso internacional
na compatibilização do sistema tributário internacional aos desafios
trazidos pela economia digital.

Existem ainda outras implicações trazidas pela economia digital,


relativas aos preços de transferência brasileiros, que adotam regras
atípicas, e que deveriam ser mais flexíveis e claras, em especial com
relação aos direitos intangíveis e pagamento de royalties, áreas sem dúvida
muito impactadas pela economia digital. Essas questões, porém, fogem do
escopo aqui delimitado.

4. CONCLUSÕES

Como já discutido, a economia digital revolucionou a forma pela qual


as pessoas realizam operações comerciais, com destaque para elevado

206
fluxo de informações e maior importância a conteúdos intangíveis.

O Direito Tributário internacional possui princípios que foram


introduzidos à época da economia tradicional e podem não mais acomodar
as mudanças tecnológicas trazidas no cenário da economia.

Uma das políticas possíveis de serem adotadas para acomodar a


tributação da economia digital seria manter as regras e conceitos de Direito
Tributário internacional como eles foram desenhados e estão em constante
evolução.

O regime de tributação internacional possui grande tradição e é produto


de muitos anos de desenvolvimento. Assim, países poderiam se mostrar
relutantes em alterar um sistema que lhes é familiar e que, apesar de suas
imperfeições, tem sido relativamente satisfatório na solução de conflitos
entre competências tributárias de diversas jurisdições.

Logo, sob uma perspectiva tradicional e histórica, há méritos em se


manter o status quo. No entanto questiona-se se o regime tributário
internacional conseguirá fazer frente aos desafios trazidos pela
digitalização da economia e se ainda continua sendo adequado para
repartir, de forma justa e racional, as competências tributárias de todas as
jurisdições. A lógica imbuída na contribuição de cada país para a produção
da renda atual pode não ser aplicável no contexto da economia digital. Isso
porque a intangibilidade e a natureza fluida da economia digital desafiam a
adequação ao sistema tributário tradicional de fonte e residência quando as
transações envolvem mais de uma jurisdição.

Existe uma certa dificuldade em se aplicar o sistema atual, isto é, em


atribuir ao país de fonte a “primeira mordida da maçã”, tributando a renda

207
ativa enquanto o país de residência tem prioridade em tributar rendas
passivas, porque o sistema atual pode não produzir um resultado que reflita
a substância econômica ou a localização da atividade econômica.

Como propostas para se solucionar o problema, poder-se-ia alterar


gradativamente a tributação de fonte para a residência ou, por outro lado,
reforçar ainda mais a tributação na fonte. Tal alteração, todavia, deve ser
acompanhada de um consenso internacional para que seja difundida e
amplamente reconhecida no Direito Tributário internacional.

O que se sabe é que existem ainda muitas dúvidas sobre quais são os
efetivos impactos da digitalização da economia e como ela vem alterando
as relações econômicas tradicionais, e que há uma necessidade de
cooperação internacional na área para se buscar a solução de problemas.

Na linha das conclusões do Relatório da Ação 1 do BEPS, a economia


digital não pode ser dissociada da economia tradicional, sendo certo que
medidas para se segregar operações com “alto conteúdo digital” poderão
ser anti-isonômicas.

Não há como se resolver os problemas da economia digital de forma


unilateral. Como já apontado, é pouco provável que se adotem políticas
radicais num futuro próximo, sendo certo que pequenas mudanças não
resolveriam com eficácia eventuais falhas do sistema.

Enquanto há um consenso de que a tributação deve ser eficiente,


tributando a renda onde há criação de valor e repelindo a criação de “renda
sem estado”, conforme termo cunhado por Edward Kleinbard, não há
consenso entre as jurisdições sobre qual seria a forma mais adequada de
repartir tais competências. A mudança de paradigma para a sistemática de

208
tributação formular ainda parece algo muito distante no cenário
internacional e exigiria mudanças fundamentais nas regras de fonte e
residência atualmente existentes para sua implementação.

Diante disso, o presente estudo não chega necessariamente a uma


conclusão para o problema, mas, sim, a uma dúvida sobre qual seria o
ponto de partida daqui em diante. As soluções propostas até o momento
ainda não foram perfeitas e eficazes, eis que, se por um lado podem trazer
uma repartição de competências tributárias mais equânime, podem trazer
inúmeras dificuldades na sua implementação.

De fato, não se pode ser ingênuo a ponto de se entender que uma


solução perfeita para o problema pode ser encontrada, diante de todo o
cenário do Direito Tributário internacional, mas há espaço para se alcançar
um regime mais justo e adequado, compatibilizando interesses de países
tradicionalmente importadores e exportadores de capital, que mitiguem as
distorções geradas pela digitalização da economia.

209
Potenciais impactos tributários do CPC 47
nos negócios voltados à economia digital
Elidie Palma Bifano263 e Bruno Fajersztajn264

1. INTRODUÇÃO

O exame atento do tema proposto indica a existência de três grandes


aspectos ou subtemas que devem ser analisados: (i) o conteúdo da
expressão economia digital; (ii) o tratamento contábil dos negócios
gerados na e pela economia digital, especialmente o reconhecimento de
receitas nas atividades de licenciamento; (iii) reflexos tributários dessa
contabilização. O assunto aparenta, desde já, na perspectiva de um
estudioso do Direito, ser complexo, visto que associa conteúdos
econômicos a conhecimentos tecnológicos.

De início, para determinação do que seja economia digital, é essencial


delimitar o que seja economia, como atividade, visto que essa mesma
designação também se aplica à Ciência da Economia. Os homens
satisfazem suas necessidades com bens, que se desdobram em bens,
propriamente ditos, e serviços. Denominam-se bens econômicos, os bens
sujeitos à escassez, objeto de compra/venda, troca, distribuição e outros,
sendo que a produção de bens econômicos se faz com o emprego de
recursos produtivos, capital e trabalho265. Os bens econômicos são
precificados. Em oposição aos bens econômicos, os bens livres são aqueles
que não se esgotam, não têm preço e estão ao acesso de todos como o ar, o
mar e similares. São agentes da economia, a família, a empresa e o
Governo.

210
A economia, atividade, como se observa, é a forma organizada pela
qual a sociedade resolve os problemas da escassez dos bens econômicos.
Nesse sentido, enfatiza Alvin E. Roth que a economia trata da alocação
eficiente de recursos escassos e como tornar esses recursos menos
escassos266. A escassez, pois, marca a economia e, no dizer de Carlos
Roberto M. Passos e Otto Nogami, é a preocupação básica da própria
Ciência Econômica267.

A economia brasileira, portanto, corresponde ao conjunto de atividades


desenvolvidas para atender às necessidades do povo brasileiro, melhor
alocando os recursos escassos. A atividade econômica é valor
constitucional, fundado na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tendo por fim a existência digna de todos.

O Título VII, da Constituição Federal, denominado Ordem Econômica


e Financeira, trata dos princípios gerais da atividade econômica, da política
urbana e do sistema financeiro nacional. Os princípios gerais da atividade
econômica estão dispostos a partir do artigo 170 e nos seguintes, os quais
delineiam de que forma se disporá dos chamados bens econômicos, que
permitem satisfazer necessidades humanas, mas que são escassos em
relação a essas necessidades, razão pela qual são objeto de especial
regulação constitucional.

Além disso, de acordo com o legislador constitucional, a atividade


econômica deve ser desenvolvida sob o pálio da soberania nacional, da
propriedade privada, da função social da propriedade, da livre
concorrência, da defesa do consumidor e do meio ambiente, buscando
reduzir as desigualdades, o pleno emprego e as empresas de pequeno porte
constituídas sob a lei brasileira. À época da edição da Constituição
Federal, 1988, a atividade digital e informacional ainda não estava

211
acessível aos cidadãos, nos termos hoje conhecidos, o que só viria a
ocorrer ao longo da segunda metade da década de 1990, com a instalação
dos primeiros provedores de acesso à internet no País.

Ora, se a economia recebeu a proteção constitucional, aqui descrita, é


de se entender que o seu exercício, qualquer que seja o meio legal adotado,
também está submetido a esses mesmos princípios, aqui se incluindo a
economia digital, representada por bens econômicos, nos termos já
descritos. Feitos esses breves comentários, cabe, agora, desvendar a
abrangência da chamada economia digital268.

2. AFINAL, O QUE É A ECONOMIA DIGITAL? QUE ATIVIDADES


ESTÃO POR ELA ABRANGIDAS?

2.1. Generalidades

Ensina Manuel Castells269 que a partir da invenção do transistor foi


possível a comunicação com e entre máquinas (semicondutores/chips),
passando-se, a seguir, pelo circuito integrado e pelo microprocessador ou
computador de um só chip, o qual permitiu, de sua vez, integrar
informações. Com isso, acrescenta, surgiu uma nova estrutura social
dominante, a sociedade em rede; uma nova economia, a economia
informacional/global; e uma nova cultura, a cultura da virtualidade real. A
lógica inserida nessa economia, nessa sociedade e nessa cultura está, hoje,
subjacente à ação e às instituições sociais em um mundo interdependente.
São características desse novo mundo: (i) revolução tecnológica que gerou
o informacionalismo como base material da sociedade; (ii)
informacionalismo como gerador de riqueza e criador de códigos culturais;
(iii) tecnologia da informação como ferramenta indispensável no processo
sócio econômico; (iv) formação de redes para o exercício de todas as
atividades sociais.

212
Esse avanço da tecnologia possibilitou a comunicação entre os homens
em tal dimensão que a grande riqueza do mundo atual é a informação, ou
seja, o objeto da comunicação. Nasce a economia digital na qual os bens
econômicos escassos são a informação e a tecnologia que a cerca. A
economia digital passa a ser a prioridade de todos os países desenvolvidos,
foco de investimento e de proteção.

Com o objetivo de detectar oportunidades e desafios nessa área, a


OCDE, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico,
órgão da União Europeia, vem desenvolvendo estudos voltados à
economia digital. Examina, particularmente, como os países da OCDE e as
economias associadas aproveitam as tecnologias da informação, suas
comunicações e a internet para cumprir os objetivos de suas políticas
públicas. O trabalho aporta informação aos responsáveis sobre a
formulação de políticas sobre as práticas regulatórias dos diversos países,
com o fito de maximizar o potencial da economia digital como motor da
inovação e do crescimento inclusivo270.

A OCDE identifica o que denomina pilares fundamentais das


estratégias nacionais de economia digital, a serem preservados, os quais
nos permitem dar a exata abrangência do que seja essa atividade, a saber:

1. Expandir as infraestruturas de telecomunicação e manter o caráter aberto da


Internet.
2. Promover o setor de tecnologia da informação e da comunicação e, em
particular, a sua internacionalização.
3. Incrementar os serviços de administração eletrônica, facilitando o acesso
aos dados e à informação do setor público (dados públicos abertos).
4. Reforçar a confiança na identidade digital, privacidade e segurança.
5. Favorecer a adoção da tecnologia da informação e comunicação por
empresas, em particular por pequenas e médias empresas em setores-chave como
saúde, transporte e educação.
6. Fomentar a inclusão digital, em especial entre a terceira idade e os grupos
sociais desfavorecidos.

213
7. Promover competências e habilidades relacionadas com as tecnologias de
informação e comunicação, básicas ou especializadas.
8. Responder aos desafios de carácter mundial, como a governança de Internet,
as mudanças climáticas e a cooperação para o desenvolvimento. (Grifamos.)

No trabalho, produzido pela OCDE, é possível distinguir tanto os bens


econômicos escassos, que povoam a economia digital, quanto os recursos
produtivos, capital e trabalho, para tanto utilizados, a saber:

(i) infraestrutura: recurso produtivo correspondente a um conjunto de elementos


que permitem o desenvolvimento da atividade e representado por servidores ou
computadores de grande porte, redes, softwares de aplicativos, espaço para
armazenamento de dados, sistemas de processamento e tratamento de dados, e-mail,
telefonia, além de serviços variados de apoio vinculados como a manutenção de
servidores e redes. A economia digital baseia-se em uma infraestrutura global de
telecomunicações271.
(ii) Internet: nome genérico que designa o conjunto de redes, os meios de
transmissão e comutação, roteadores, equipamentos e protocolos necessários à
comunicação entre computadores, bem como o “software” e os dados contidos
nestes computadores272. A Internet é recurso produtivo, mas seu acesso, oferta e
conteúdo é bem econômico fruto das atividades da economia digital.
(iii) Tecnologia da informação e da comunicação: conhecimento das técnicas ou
da maneira correta de se executar as tarefas voltadas à economia digital. É bem
econômico, mas pode ser recurso produtivo utilizado com a finalidade de permitir
transações na economia digital.
(iv) Serviços de administração eletrônica e acesso a dados. É bem econômico.
(v) Confiança na identidade digital e adoção/disseminação de tecnologia da
informação e da comunicação. Podem assumir as duas funções, de recurso
produtivo ou de bem econômico.
(vi) Inclusão digital, treinamento digital e governança na Internet. Podem
assumir as duas funções, de recurso produtivo ou de bem econômico.

Observe-se, além disso, que recursos produtivos e bens econômicos,


aqui citados, podem assumir a natureza de tangíveis (infraestrutura) ou
intangíveis (tecnologia) voltados aos clientes (serviços) ou à empresa
(treinamento), mas, no caso de serem bens econômicos, a sua principal
característica é que são escassos, precificados e, portanto, inserem-se na
proteção constitucional do art. 170 da Constituição Federal.

214
Por fim, o documento da OCDE contempla especial referência ao
Brasil, esclarecendo que na última década o tamanho e a importância da
economia digital brasileira vem crescendo, exponencialmente, em termos
de assinaturas, valor agregado, resultados e vagas. Paralelamente ao
crescimento dos salários e à demanda por bens e serviços, o Governo
brasileiro priorizou o segmento, melhorando a oferta de infraestrutura,
fomentando o setor de tecnologia e introduzindo a Lei n. 12.965, de 23 de
abril de 2014, Marco Civil da Internet.

A atividade econômica digital, posta nos termos acima, é fato


econômico, suscetível de registro contábil, quando desenvolvida por
empresa, além de inscrever-se dentre as hipóteses tratadas no art. 145,
parágrafo único, do Texto Maior, para fins de tributação pelos impostos.
Estes são os nossos novos desafios, mas não antes de um breve comentário
sobre as principais atividades que povoam esse mundo digital.

2.2. As atividades na economia digital

Neste passo cabe comentar acerca da infinidade de negócios que se


processam tanto por meio da internet quanto na internet, e a diferença é
sutil e de extrema relevância. Para fins deste estudo, descreve-se como
negócios por meio da internet aqueles que dela se valem apenas para sua
instrumentalização, ou seja, como se fora um simples balcão de lojista ou
um telefone, naqueles casos em que os clientes pedem seus produtos por
esses meios de contato e/ou comunicação. Na atualidade, como se sabe,
faz parte do cotidiano do cidadão a compra de utilidades pela internet.
Essas operações de compra e venda são tributadas pelos correspondentes
tributos sobre o consumo, como o Imposto sobre a Circulação de
Mercadorias e Serviços – ICMS, por exemplo, como tradicionalmente
sempre ocorreu.

215
Os negócios que se processam na internet têm natureza diversa, pois o
cliente tem acesso a um programa desenvolvido pelo fornecedor do bem
ou utilidade, mediante pagamento de uma assinatura e recebimento de uma
senha, assim adentrando em informações as quais utiliza a seu critério.
Essas informações são mantidas em bancos de dados e fornecidas nas
condições descritas em contrato. A operação pode ou não envolver
interatividade entre o assinante e o conteúdo disponibilizado, não
efetivando nem se comprometendo, a empresa detentora desses conteúdos,
a executar qualquer tarefa adicional a favor do assinante, além da
contratada.

A leitura de documento emitido pelo Sindicato das Empresas de


Internet do Estado de São Paulo permite dimensionar esse novo mundo.
Considerando-se que esse documento foi emitido em algum momento no
tempo e que a tecnologia não cessa de evoluir, é certo que hoje ele poderá
estar defasado. Confiram-se as atividades nele inseridas sob a rubrica de
empresas de Internet273:

... provedores de acesso à Internet, desenvolvimento de sites de qualquer


natureza incluindo-se provedores de conteúdo e informações, provedores de serviço
de aplicação; páginas e portais de busca e de hospedagem de site na Internet, sites
de hospedagem de vídeos, fotos e músicas na Internet, sites de correio eletrônico na
Internet; provedores de voz sobre Protocolo na Internet (VOIP), Internet banda
larga, Internet via rádio e Internet Via Banda Móvel (celular e outras); provedores
de hospedagem de sites com qualquer conteúdo e informações, tais como, mas não
somente: institucionais, páginas, portais de busca, de vídeos, fotos, músicas, correio
eletrônico, páginas e sites de intermediação de contratação de mão de obra, páginas
e sites de vendas e intermediação de vendas na Internet de qualquer natureza,
leilões, lojas virtuais, páginas e sites de entretenimento na Internet, atividades de
páginas e sites de jogos na Internet, sites e páginas de atividade de acesso à Internet,
páginas e sites de atividades de salas de “bate-papo” na Internet, empresas de
anúncios e publicidade online e empresas de segurança digital de segurança e
informática.

216
A atividade de acesso e oferta de conteúdo na internet vem regulada na
Norma n. 004/95, aprovada pela Portaria n. 148, de 3 de maio de 1995,
item 3, letras “e” e “f”, do Ministério das Comunicações, nos seguintes
termos: provedor de serviço de informações é a entidade que possui
informações de interesse e as dispõe na internet, por intermédio do serviço
de conexão à internet, que lhe é provido, enquanto o usuário de serviço de
informações é a pessoa que utiliza, por intermédio do serviço de conexão à
internet, que lhe é provido, as informações dispostas pelos provedores de
serviço de informações. As empresas que se dedicam a essa atividade
econômica são usualmente designadas como portais, provedores de
conteúdos e/ou serviços de informação pela internet, sites ou páginas
eletrônicas e todos contêm informações em linguagem própria, acessíveis
por protocolos específicos.

É interessante observar, por fim, que o Decreto n. 7.708, de 2 de abril


de 2012, que instituiu o Siscoserv, define tecnologia da informação ao
qualificar, em seu capítulo 15, os serviços de tecnologia da informação:

Capítulo 15 – Serviços de tecnologia da informação


Considerações Gerais
A expressão “tecnologia da informação” é tomada, na presente Nomenclatura,
como equivalente a aplicação de diferentes ramos da tecnologia para criar,
armazenar, trocar e usar informações, apresentadas nos mais diversos formatos, e
que, para tanto, faz uso de equipamentos para informática (hardware) e seus
dispositivos periféricos, programas de computador e seus recursos, sistemas de
telecomunicações, gestão de dados e informações.

Em seguida, inclui nesse conceito: serviços de consultoria, segurança,


suporte e desenvolvimento de programas e aplicativos (softwares); projeto,
desenvolvimento e instalação de aplicativos, programas e páginas
eletrônicas; serviços de criação, desenvolvimento, gerenciamento e
manutenção de infraestruturas, sua manutenção e aluguel (hospedagem),
inclusive o processamento de dados. É inegável a amplitude do mundo

217
digital o qual passamos a examinar no contexto do tema proposto, a receita
gerada por sua exploração.

3. ANÁLISE DO CPC 47

3.1. Generalidades

No cumprimento da tarefa que lhe foi delegada pela Lei n. 6.385, de 7


de dezembro de 1976, artigo 10-A, o Comitê de Pronunciamentos
Contábeis – CPC, editou o Pronunciamento Técnico Contábil n. 47 – CPC
47, que trata da receita de contrato com cliente. O CPC 47 correlaciona-se
às Normas Internacionais de Contabilidade, no caso ao IFRS 15, como
determinado pela Lei n. 11.638, de 27 de dezembro de 2007, que alterou a
Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, no que tange à escrituração
contábil e às demonstrações financeiras274.

O CPC 47, aplicável a partir de 1º de janeiro de 2018, substitui o CPC


30. O objetivo do CPC 47 é estabelecer os princípios que uma entidade
deve aplicar para apresentar informações úteis aos usuários de
demonstrações contábeis sobre a natureza, o valor, a época e a incerteza de
receitas e fluxos de caixa provenientes de contrato com cliente.

As principais diferenças entre o CPC 30, vigente até 31 de dezembro de


2017, e o CPC 47, no que tange às condições de reconhecimento da
receita, são as seguintes:

CPC 30
• Efetiva transferência, para o comprador, dos riscos e benefícios mais
significativos inerentes à propriedade dos bens
• Não envolvimento da entidade na gestão dos bens vendidos e tampouco efetivo
controle sobre tais bens
• Mensuração do valor da receita com confiabilidade
• Provável fluência, para o vendedor, de benefícios econômicos
• Mensuração confiável das despesas incorridas ou a serem incorridas, referentes
à transação

218
CPC 47
• Regras unificadas de reconhecimento de receitas
• Separação dos elementos da transação: preço, contraprestação, licenças,
opções, recompra e outros
• Efetiva transferência do controle de bens/serviços ao comprador
• Receita/despesa mensuráveis com confiabilidade
• Benefícios econômicos: provável que fluam para o vendedor

O reconhecimento da receita, consoante o CPC 47, deve obedecer a


uma metodologia que se desenvolve em cinco passos, a saber: (1)
identificar as características do contrato; (2): identificar as obrigações de
desempenho no contrato; (3) determinar o preço da transação; (4) alocar o
preço da transação e (5) reconhecer a receita consoante obrigação de
performance.

Para estabelecer o quanto esta metodologia contábil poderá afetar o


reconhecimento de receitas, na economia digital, é necessário examinar
atentamente cada uma das ações propostas e seu conteúdo.

3.2. Exame dos passos para reconhecimento da receita do CPC 47

3.2.1. Identificar as características do contrato

O CPC 47 orienta no reconhecimento de “receita de contrato com


cliente”. O cliente é definido como a parte que contratou com uma
entidade, obter bens ou serviços, produto de suas atividades ordinárias,
mediante contraprestação. Nesse contexto, a primeira obrigação ou
obstáculo que se apresenta para o contador é verificar no contrato quem é
o cliente, adotando uma necessária avaliação do relacionamento
fornecedor/cliente. A forma pela qual essa avaliação há de ser feita não é
determinada pelo CPC 47, tudo ficando a julgamento desse profissional.

Essa tarefa pode indicar algumas dificuldades, como é o caso de


contratos envolvendo diversas partes, de acordos de colaboração, as

219
chamadas parcerias, hoje muito comuns, dos contratos idênticos firmados
seguidamente, como se fossem um único contrato, dentre outras situações.
É conveniente, nas empresas, que essa tarefa seja feita em conjunto com
advogados, dada a repercussão jurídica que pode trazer, como adiante se
comentará.

Ao avaliar se a possibilidade de recebimento do valor da


contraprestação é provável, a entidade deve considerar apenas a
capacidade e a intenção do cliente de pagar esse valor da contraprestação
quando devido. O valor da contraprestação à qual a entidade tem direito
pode ser inferior ao preço declarado no contrato se a contraprestação for
variável, pois a entidade pode oferecer ao cliente uma redução de preço. A
entidade deve estimar o valor da contraprestação variável, utilizando
qualquer dos métodos propostos pelo CPC 47, para determinar sua
expectativa de melhor valor da contraprestação à qual tem direito ou o
valor esperado ou o mais provável. Nota-se como a contabilização levará
em conta o valor efetivamente praticado, em detrimento dos montantes
registrados nos contratos ou documentos de cobrança e/ou notas fiscais.

3.2.2. Identificar obrigações de desempenho

Obrigação de desempenho, do ponto de vista do CPC, é a promessa de


transferir ao cliente bem ou serviço (ou grupo de bens ou serviços) que
seja distinto, ou série de bens ou serviços distintos, substancialmente os
mesmos e que tenham o mesmo padrão de transferência para o cliente.
Para tanto, o contador deve: avaliar, no início do contrato, os bens ou
serviços prometidos ao cliente; verificar bens ou serviços distintos;
verificar se o cliente se beneficia do bem ou serviço, isolada ou em
conjunto com outros recursos que estejam prontamente disponíveis;

220
verificar se a promessa de transferir o bem ou o serviço ao cliente é
separadamente identificável de outras promessas contidas no contrato.

Na identificação da obrigação de desempenho é necessário verificar,


também, se houve a satisfação de obrigação de desempenho, isto é, a
transferência do bem ou do serviço, ou seja, do ativo prometido ao cliente.
Além disso, deve haver a transferência do ativo, ou seja, do bem ou
serviço prometido, mas somente quando ou à medida que o cliente obtenha
controle desse ativo. O reconhecimento da receita deve ser feito quando ou
à medida que a entidade satisfaça a obrigação de desempenho.

3.2.3. Determinar o preço da transação

Para fins do CPC, contraprestação é o montante a que a entidade espera


ter direito em troca da transferência dos bens ou serviços prometidos ao
cliente, excluindo quantias cobradas em nome de terceiros (por exemplo,
alguns impostos sobre vendas). O primeiro passo para tanto é verificar se
uma obrigação de desempenho foi satisfeita, hipótese em que o valor do
preço da transação deve ser reconhecido, ou à medida que ela for sendo
satisfeita, não devendo ser computadas as estimativas de contraprestação
variável quando houver a probabilidade de não ocorrerem. Deve ser
verificada a existência, expressa ou não, de componentes financeiros na
transação. Mais uma vez, fica claro o enfoque empírico e econômico na
regra de reconhecimento da receita, independentemente do que foi
contratado.

3.2.4. Alocar o preço da transação

Considera-se, para fins contábeis, como preço da transação: o valor da


contraprestação de cada obrigação de desempenho (bem ou serviço
distinto). Deve-se alocar o preço da transação a cada obrigação de

221
desempenho identificada no contrato, com base no preço de venda
individual, os descontos e a contraprestação que inclua valores variáveis e
alterações subsequentes no preço da transação, da mesma forma que no
início do contrato.

3.2.5. Reconhecer a receita

O reconhecimento de receita deve ocorrer quando da transferência de


controle de bens ou serviços prometidos a clientes, pelo valor da
contraprestação à qual a entidade espera ter direito em troca desses bens ou
serviços, cabendo verificar o momento adequado para isso.

Para tanto, a obrigação de desempenho deve estar satisfeita, o


bem/serviço (ativo) prometido, transferido, devendo ficar evidenciado que
o cliente controla esse ativo: usa o ativo e seus benefícios, tendo a
capacidade de evitar que outras entidades direcionem o uso do ativo e dele
obtenham benefícios, fluxos de caixa potenciais. Além da transferência de
controle, é essencial se ter uma mensuração confiável da receita bem como
os correspondentes benefícios econômicos.

Descritos os principais passos contábeis, para fins de reconhecimento


da receita, passa-se a examinar as inferências legais das determinações
contidas no CPC 47.

3.3. Contabilidade, Direito e o reconhecimento de receitas

As disposições da Lei n. 6.404/76 sobre matéria contábil são de


obrigatória observância por todas as entidades275 sujeitas à manutenção de
escrituração contábil, e pelos contadores, no País. O CPC tem, dentre
outras missões, operacionalizar as normas contábeis, inclusive editando
pronunciamentos, como é o caso do CPC 47, o qual será de irrestrita

222
aplicação por todas as entidades que preparam demonstrações contábeis. O
balanço patrimonial, apurado a partir da escrituração contábil, é uma
universalidade de direitos e obrigações, formando um bem coletivo, na
forma do art. 89 do Código Civil. Esse bem coletivo pode ser objeto de
relações jurídicas próprias, sendo que o balanço patrimonial assim como a
escrituração contábil de uma entidade são suporte para a apuração de
haveres em demandas envolvendo recuperações e falências de empresas,
cálculo de direitos e obrigações trabalhistas, cálculo para remuneração de
sócios bem como alguns tributos, como é o caso do Imposto sobre a Renda
– IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro – CSL subsidiando,
também, a apuração da base de cálculo do Programa de Integração Social
– PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social –
COFINS. Dessa forma, contabilidade, escrituração contábil e
demonstrações financeiras interessam, também, ao Direito, de forma geral.

A receita, tema do CPC 47, é o marco inicial da apuração de resultados


ou de lucros das empresas. Aos tributos que se valem da contabilidade
para formular sua base de cálculo muito interessa o conceito de receita,
seus critérios de apuração e seu registro. Nesse caso, a introdução do CPC
47, com a revogação do CPC 30, deve ser estudada com critério para se
determinar que impactos no cálculo dos tributos ele traz.

3.3.1. Contabilidade e tributação

A Exposição de Motivos da Lei n. 11.638, de 28 de dezembro de 2007,


que introduziu no Brasil os padrões contábeis internacionalmente aceitos
(IFRS), esclarecia que as mudanças nas regras contábeis não afetariam o
cálculo dos tributos e, tampouco, a arrecadação, determinando assim um
período de absoluta neutralidade fiscal das regras contábeis. De outro lado,
as normas tributárias não afetariam a contabilidade, devendo ser aplicadas

223
e controladas em separado. A adaptação da legislação tributária, após a
mudança dos padrões contábeis, se fazia necessária, pois como comentado,
diversos tributos são calculados a partir da contabilidade; essa adaptação
foi feita pela Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014.

Considerando-se que a Contabilidade retrata, sob metodologia própria,


a atividade econômica em uma certa entidade e que a atividade econômica
é extremamente dinâmica, é razoável afirmar que a Contabilidade também
é muito dinâmica, o que a leva a constantes mudanças, atualizações e
revisões de entendimentos. Por essa razão, o art. 58, da Lei n. 12.973,
tendo em vista a dinâmica da Contabilidade e no pressuposto de que as
novas práticas contábeis até então introduzidas, nela já estavam refletidas,
assim o determinou para o futuro:

Art. 58. A modificação ou a adoção de métodos e critérios contábeis, por meio


de atos administrativos emitidos com base em competência atribuída em lei
comercial, que sejam posteriores à publicação desta Lei, não terá implicação na
apuração dos tributos federais até que lei tributária regule a matéria.
Parágrafo único. Para fins do disposto no caput, compete à Secretaria da Receita
Federal do Brasil, no âmbito de suas atribuições, identificar os atos administrativos
e dispor sobre os procedimentos para anular os efeitos desses atos sobre a apuração
dos tributos federais.

Isso significa que o CPC 47, introduzido após a Lei n. 12.973/2014, é


neutro para fins fiscais, devendo a Secretaria da Receita Federal do Brasil
– RFB limitar-se, apenas, a determinar de que forma essa neutralidade
deverá ser expressada, implementada. É muito importante ressaltar que a
RFB deve apenas expedir norma de operacionalização, visto que não lhe
cabe neutralizar ou dar qualquer outro efeito diverso às normas contábeis,
para fins fiscais. Observe-se que o parágrafo único do art. 58 nada
acrescenta à neutralidade, visto que metodologias contábeis não podem
gerar reflexos tributários. Entenda-se esse comando, portanto, de alcance
muito limitado e, diga-se, até mesmo abundante.

224
Uma análise apressada da redação do parágrafo único poderia sugerir
que a RFB teria recebido competência para, por meio de ato normativo
infralegal por ela editado, neutralizar ou dar efeitos tributários aos novos
CPCs editados. Contudo, não é correto esse entendimento, por diversas
razões:

(i) o caput do art. 58 é claro ao estabelecer a neutralidade dos novos CPCs


emitidos após a publicação da Lei n. 12.973; o parágrafo único não poderia
contrariar o caput, sendo sua função, segundo a Lei Complementar n. 95, de
26 de fevereiro de 1998276, apenas complementar, esclarecer ou excepcionar
a regra inserida no caput;
(ii) não poderia ser diferente, eis que o art. 97 do Código Tributário Nacional
consagrou o princípio da legalidade estrita em matéria tributária, de tal sorte
que um ato normativo sem força legal, como é um pronunciamento do CPC,
jamais poderia criar novas obrigações tributárias;
(iii) o próprio parágrafo único do art. 58 da Lei n. 12.973 é claro no sentido de
que o ato da RFB será emitido “no âmbito de suas atribuições”, sendo certo
que tais atribuições são apenas no sentido de regulamentar a lei, por meio de
atos infralegais, que são normas complementares da legislação tributária, nos
termos do art. 100 do Código Tributário Nacional;
(iv) são atribuições da RFB, isto sim, criar obrigações acessórias, nos termos do
art. 16 da Lei n. 9.779, de 19 de janeiro de 1999277, o que significa caber às
autoridades fiscais regular a forma como devem ser realizados os ajustes
necessários à implementação da neutralidade.

Nesse contexto é que à RFB compete apenas definir como controlar,


por meio de lançamentos contábeis, controles extracontábeis, registros em
livros fiscais, dentre outros, a neutralidade que deflui do art. 58. Nada
mais.

3.3.2. Conceito de receita para fins tributários

A receita e seu reconhecimento contábil, tema central do CPC 47, é


objeto de diversas ciências, a saber: Contabilidade – fruto da venda de
bens e serviços; Ciência das Finanças – capital arrecadado para fazer
frente à despesa pública; Economia – entrada monetária em

225
entidade/patrimônio; e Direito – fruto das atividades sociais incorporado
em definitivo ao patrimônio da entidade. Ainda, receita é o primeiro passo
da formação do lucro societário, fruto da atividade empresarial, tendo sido
incorporada ao Direito Tributário em diversas situações como é o caso das
contribuições devidas ao PIS e à COFINS, da Contribuição Previdenciária
sobre a Receita Bruta – CPRB, dos tributos sobre o consumo (ICMS e
Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS) e do IRPJ e da CSL.
Por fim, são intermináveis as discussões, nos tribunais, em busca de uma
definição de receita.

Para fins da Lei n. 6.404, art. 187, receita é gênero com as espécies
receita bruta e receita líquida. A receita bruta corresponde ao fruto das
vendas de bens e serviços, objeto da atividade da entidade, enquanto a
receita líquida corresponde à receita bruta menos deduções de vendas,
abatimentos, impostos e custos. Para a Contabilidade (CPC
Pronunciamento Conceitual Básico (R1)) é este o conceito de receita:

4.25 (...) receitas são aumentos nos benefícios econômicos durante o período
contábil, sob a forma da entrada de recursos ou do aumento de ativos ou diminuição
de passivos, que resultam em aumentos do patrimônio líquido, e que não estejam
relacionados com a contribuição dos detentores dos instrumentos patrimoniais (...).

O art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977,


considera como receita bruta:

(...)
I – o produto da venda de bens nas operações de conta própria;
II – o preço da prestação de serviços em geral;
III – o resultado auferido nas operações de conta alheia;
IV – as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não
compreendidas nos incisos I a III.

O CPC 30, que tratava do reconhecimento de receita, vigente até 31 de


dezembro de 2017, qualificava em seu item 1 como receita o fruto da

226
venda de bens, da prestação de serviços, da utilização, por parte de
terceiros, de ativos da entidade que geram juros, royalties e dividendos.

Por fim, o Poder Judiciário, quando instado a pronunciar-se sobre o


tema, assim se manifestou: (i) Supremo Tribunal Federal – STF, RE
606.107278, sob o “prisma constitucional, receita bruta pode ser definida
como o ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de
elemento novo e positivo, sem reservas ou condições”; (ii) STF, RE
738757 e RE 683.334279, os conceitos de receita e de faturamento
convergem, correspondendo, ambos, à totalidade das receitas auferidas
com a venda de mercadorias, serviços, mercadorias e serviços.

Como se observa, há diferentes conceitos de receita para o Direito e


para a Contabilidade, visto que suas metodologias de abordagem e
reconhecimento não são iguais. A partir dessa afirmativa, é razoável
concluir que os critérios de reconhecimento da receita no Direito e na
Contabilidade também são diferentes, como se passa a examinar.

3.3.3. Conteúdos do CPC 47 frente ao Direito

O exame detalhado do CPC 47 indica o uso de conceitos que não têm


conteúdo jurídico, como é o caso da expressão “cliente”, uma vez que do
ponto de vista jurídico contratos envolvem partes, identificáveis mediante
interpretação de seu conteúdo, as quais assumem direitos e obrigações, de
forma expressa ou não. Juridicamente, a eventual dificuldade na
interpretação de um contrato leva a(s) parte(s) ao Poder Judiciário ou a
uma arbitragem, não ao exercício do dito subjetivismo responsável do
contador. Ainda, contrato é ato jurídico lícito, entre duas ou mais pessoas
(negócio jurídico) com o objetivo de adquirir, resguardar, transferir,
modificar ou extinguir direito. Os contratos regulam direitos e obrigações,

227
reputando-se perfeitos, acabados e obrigatórios quando estiverem
definidos partes, objeto e contraprestação.

Obrigação de desempenho tampouco é instituto/conceito jurídico,


equivalendo à prestação ou à obrigação contratada. Do ponto de vista
jurídico, o reconhecimento da receita se dá quando ela está incorporada ao
patrimônio da entidade pelo cumprimento da prestação contratada, em
caráter definitivo e não sujeita a condição. Tampouco, para fins jurídicos,
tem qualquer validade a constituição de provisão que ajusta a receita a seu
valor de realização, quando há um indício de que o comprador não honrará
seu compromisso. Para fins jurídicos e tributários, perdas no recebimento
de créditos só podem ser reconhecidas quando efetivas, ou nos termos dos
artigos 9º e seguintes da Lei n. 9.430, de 26 de dezembro de 1997, o que
naturalmente ocorre em momento posterior ao auferimento da receita.

Para fins jurídicos, o art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598 distingue a


atividade principal daquela do objeto social, a atividade meio e a atividade
fim, conceitos esses de suma importância jurídica para fins tributários.
Ainda, no que tange à tributação, a distinção do que é contratado, bens ou
serviços, gera reflexos muito diferentes, não podendo esses negócios ser
presumidos. Exemplo disso são os percentuais de presunção para fins de
tributação do IRPJ com base no lucro presumido, nos termos do art. 15, §
1º, da Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de 1995, transcrito adiante.

Por fim, quando se trata da oferta de bens móveis, a sua tradição é o


norte para reconhecimento de receita e emissão de documentos fiscais. No
que tange aos serviços, a sua disponibilização, a fruição pelo adquirente é
elemento jurídico de relevância.

228
O preço a ser pago, contrapartida da transferência de bem ou serviço,
gera os seguintes efeitos para fins fiscais: receita, para fins de IRPJ, CSL e
CPRB; faturamento, para fins de PIS e de COFINS; valor da operação
tributável, para fins de IPI e ICMS; preço do serviço tributável para fins de
ISS e ICMS.

A pretendida alocação contábil, em função da natureza da obrigação de


desempenho, como entendida pelo contador, não pode obstar a prevalência
do preço contratado, tampouco a alocação de preço pode afetar a
qualificação da atividade para fins de tributação. Os contratos, ainda que
similares, devem ser examinados individualmente, não prevalecendo, para
fins jurídicos, o critério contábil de que um conjunto de contratos similares
forma um único contrato, exceto se assim ajustado.

Do ponto de vista jurídico, há muitas situações em que a alocação de


preço, pela contabilidade, pode ensejar questionamentos das autoridades,
notadamente no que tange ao regime de apuração do PIS e da COFINS
(regimes cumulativo e não cumulativo), do IPI e do ICMS (substituição),
além do lucro presumido, como já mencionado. Em certas circunstâncias,
é necessária a segregação de negócios jurídicos envolvendo diferentes
transações (compra/venda e instalação/manutenção de bens; compra e
venda de bens e assistência técnica), o mesmo podendo ocorrer com
negócios que associam bens e serviços como licenças e royalties.

4. REFLEXOS TRIBUTÁRIOS DAS METODOLOGIAS CONTÁBEIS

É princípio de interpretação das normas tributárias que metodologia


contábil não pode gerar obrigação tributária, visto que ela somente decorre
de lei. O lançamento contábil tem grande valia na demonstração do fato
sobre o qual recai a tributação, mas tal registro, por si só, não cria a

229
obrigação tributária, a menos que a lei assim determine expressamente.
Assim, as regras do CPC 47 devem ser vistas com muitas reservas, para
fins tributários. Em primeiro lugar, porque o referido CPC impõe
justamente a implementação de lançamentos contábeis e, em segundo,
porque, no âmbito do IRPJ, CSL PIS e COFINS, o art. 58 da Lei n. 12.973
estabelece expressamente a sua neutralidade.

De se esclarecer, contudo, que esse pronunciamento menciona algumas


situações, em matéria de negócios digitais, as quais se examina,
recomendando a correspondente contabilização. É de suma importância
destacar, nesses casos, as divergências entre o Direito e a Contabilidade,
comentando-as, para fins de atendimento ao objetivo pretendido por este
estudo.

4.1. Royalties

4.1.1. Tratamento jurídico-tributário

O royalty é objeto do Direito Tributário sob dois diferentes enfoques:


(i) como rendimento ou receita e (ii) como custo ou despesa. Para fins
deste estudo interessa-nos o royalty como receita. A Lei n. 4.506, de 30 de
novembro de 1964, art. 22, trata dos royalties, em separado dos aluguéis
(art. 21), apenas no contexto da pessoa física sem que nenhuma outra
norma jurídica assim o tenha feito para as pessoas jurídicas, nos seguintes
termos: royalty é o rendimento decorrente da ocupação, uso ou exploração
de bens corpóreos. O art. 22, da Lei n. 4.506 relaciona, não de forma
taxativa, hipóteses de royalties, nos termos já comentados. O art. 23, da
mesma Lei n. 4.506, relaciona uma série de situações que classifica como
aluguéis ou royalties, desde que sejam rendimentos relacionados à
ocupação, uso, fruição ou exploração dos bens e direitos referidos nos arts.
21 e 22 da mesma lei. Os tratados internacionais, para evitar a dupla

230
tributação da renda, consideram o aluguel como uma espécie de royalty,
tal seria a similaridade desses institutos.

Ainda, dispõe o art. 45 do Regulamento do Imposto sobre a Renda,


aprovado pelo Decreto n. 3.000, de 6 de março de 1999, RIR/99, com
fundamento na Lei n. 7.713, de 22 de dezembro de 1988, art. 3º, § 4º, que
não se constituem em royalties os direitos autorais de obras artísticas,
didáticas, científicas, urbanísticas, projetos técnicos de construção,
instalações ou equipamentos, quando explorados diretamente pelo autor ou
criador do bem ou obra. Por fim, do ponto de vista jurídico, as bases de
contratação dos royalties a serem pagos, via de regra, se fazem
considerando o montante de vendas para as quais o bem ou direito cedidos
contribuíram.

A informação, na era digital, é processada, difundida e compartilhada


mediante o uso de dois instrumentos fundamentais: (i) o hardware, ou
equipamento tecnológico que permite a utilização de sistemas e aplicativos
que realizam tarefas, e também parte física de um computador280 e (ii) o
software, ou sistema operacional, inteligência que permite o uso do
equipamento, formado pelo conjunto de componentes lógicos do
computador, também software de sistema, ou, ainda, conjunto de dados ou
instruções, logicamente organizados que permitem o desempenho de certas
tarefas, também software de aplicação281. Ao que interessa a este estudo
nos ateremos, apenas, à regulação legal do software ou programa de
computador.

De acordo com a Lei n. 9.609, de 19 de fevereiro de 1988, o programa


de computador ou software é propriedade intelectual e pode ser objeto de
exploração comercial, por seu autor, ou por terceiros, na primeira hipótese
mediante recebimento de direitos autorais e, na segunda, mediante

231
cobrança de royalties (art. 2º). O uso comercial do programa de
computador, a cessão de uso, é objeto de contrato de licença ou
licenciamento, nos termos do art. 9º, da Lei n. 9.609, havendo muitas
variáveis pelas quais o licenciamento pode ocorrer. A remuneração pela
cessão de uso é receita que integra o lucro líquido e, como tal, deve ser
tributada pelo IRPJ e pela CSL apurados com base no lucro real. A receita
correspondente também pode ser tributada no regime do lucro presumido,
podendo o respectivo percentual a ser aplicado variar entre 32%, se for
considerado serviço, ou 8%, se classificado como outras receitas. A Lista
anexa à Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, alterada pela
Lei Complementar n. 157, de 29 de dezembro de 2016, considera como
sujeita à tributação pelo ISS a cessão de softwares, bem como o seu
licenciamento (item 1.06). Por fim, o faturamento do licenciamento ou
cessão sujeita-se à tributação pelo PIS e pela COFINS282.

4.1.2. Tratamento contábil

O item 58, do CPC 47, determina que a contraprestação em royalties


baseados em vendas ou em uso, que sejam prometidos em troca de licença
de propriedade intelectual, tenha sua receita reconhecida pela entidade
conforme o disposto no item B63. Esse item, por sua vez, determina que a
receita somente seja reconhecida quando (ou conforme) o último entre os
seguintes eventos ocorrer: (i) a venda ou o uso subsequente e (ii) a
obrigação de desempenho em relação à qual a totalidade ou alguns dos
royalties baseados em vendas ou baseados em uso que foram alocados
tiver sido satisfeita (ou parcialmente satisfeita).

De acordo com o item B63A, do CPC 47, a exigência de royalty com


base em vendas ou com base em uso, para registro de receita, deve ser
aplicada quando o royalty refere-se apenas à licença de propriedade

232
intelectual ou quando a licença de propriedade intelectual é o item
predominante ao qual o royalty diz respeito. Esclarece que a licença de
propriedade intelectual pode ser o item predominante, a que o royalty se
refere, quando a entidade tem expectativa razoável de que o cliente vai
atribuir significativamente mais valor à licença do que aos outros bens ou
serviços com os quais o royalty se relaciona. Por fim, o item 63B preceitua
que somente se o requisito do item B63A for atendido, a receita de royalty
com base na venda ou com base no uso deve ser reconhecida
integralmente, em conformidade com o item B63. Quando o requisito do
item B63A não for cumprido, os requisitos relativos à contraprestação
variável, tratados no CPC 47, devem ser aplicados para royalty com base
na venda ou no uso.

É interessante cotejar as determinações legais, para fins de IRPJ e CSL,


com aquelas previstas nas regras contábeis. Assim, como visto, a regra
contábil associa o reconhecimento da receita de royalties, pelo cedente, à
venda do bem, que foi produzido com base na licença concedida, ou seu
uso, ou ainda, a obrigação de desempenho em relação à qual a totalidade
ou alguns dos royalties foram alocados tiver sido satisfeita ou parcialmente
satisfeita. Essa determinação não parece ser muito diversa daquela prevista
para fins jurídicos e tributários, visto que nestes últimos casos o
reconhecimento da receita de royalties deve ser feito no momento em que
o cessionário disponibilize de forma definitiva o montante dos royalties
para o cedente, com base nos critérios acertados que, na verdade, estão
vinculados, via de regra, ao volume de venda de bens.

De forma diversa, a aplicação desse critério apenas à licença de


propriedade intelectual ou quando a licença de propriedade intelectual é o
item predominante ao qual o royalty diz respeito, não encontra reflexo

233
jurídico e tributário. Tampouco a consideração de a licença de propriedade
intelectual ser o item predominante, a que o royalty se refere, no caso de a
entidade ter expectativa razoável de que o cliente vai atribuir mais valor à
licença do que para os outros bens ou serviços com os quais o royalty se
relaciona, é fundamento para qualquer tipo de distinção no reconhecimento
da receita para fins tributários. Para fins de determinação das bases de
cálculo dos tributos que incidem sobre receita, é o contrato que deve
prevalecer, independentemente do tratamento contábil. Divergências
podem surgir quando a aplicação do referido item B63A implicar o
reconhecimento de receitas de royalties em situações às quais o
regramento jurídico-tributário impuser tratamento diferente. Como já
apontado, nesse caso, prevalecerá a regência jurídica do negócio praticado,
a par do tratamento contábil.

4.2. Licenciamento

4.2.1. Tratamento jurídico-tributário

Para fins jurídicos, como já se comentou, a cessão comercial de uso


pelo autor enseja a cobrança de direitos autorais, enquanto a exploração da
obra por terceiros envolve a cobrança de royalties. Ambas são formas de
autorização para a comercialização e se conformam à figura do
licenciamento.

4.2.2. Tratamento contábil

O tema é tratado nos itens de B52 a B56 do CPC 47 restando claro que,
para fins contábeis, a licença estabelece os direitos do cliente à
propriedade intelectual da entidade. As licenças de propriedade intelectual
podem incluir, mas não estão limitadas a, licenças de qualquer um dos
seguintes itens: (i) software e tecnologia; (ii) filmes, música e outras

234
formas de mídia e entretenimento; (iii) franquias; e (iv) patentes, marcas
registradas e direitos autorais.

O item B53 esclarece que, além da promessa de conceder licença (ou


licenças) ao cliente, a entidade também pode assumir o compromisso de
transferir outros bens ou serviços. Essas promessas podem integrar o
contrato ou decorrer de práticas comerciais da entidade, políticas ou
declarações específicas. Quando o contrato com o cliente incluir promessa
de conceder licença, além de outros bens ou serviços, a entidade deve
identificar cada uma das obrigações de desempenho no contrato. De outro
lado, se a promessa de conceder licença não for distinta de outros bens ou
serviços prometidos no contrato, a entidade deve contabilizá-la como uma
única obrigação de desempenho.

Para fins contábeis, portanto, se a licença não for distinta, a obrigação


de desempenho inclui a licença prometida, porém, se a licença for distinta
dos outros bens ou serviços prometidos no contrato, sendo a promessa de
conceder a licença obrigação de desempenho separada, a entidade deve
determinar se a licença é transferida ao cliente em momento específico no
tempo ou ao longo do tempo. Ao determinar isso, a entidade deve
considerar se a natureza da promessa da entidade ao conceder a licença ao
cliente é fornecer ao cliente: (i) direito de acesso à propriedade intelectual
da entidade que exista durante todo o período de licença; ou (ii) direito de
utilizar a propriedade intelectual da entidade que exista em momento
específico no tempo em que a licença é concedida.

Para fins jurídicos, é relevante determinar quais são as obrigações e os


direitos de cada uma das partes, tal como regidos pelo direito, pois se uma
parte se compromete a prestar/ceder direitos juntamente com bens que são

235
ofertados, pode haver duas diferentes ofertas de utilidades, submetidas a
incidências diversas. Mais adiante essas hipóteses serão comentadas.

5. OS NEGÓCIOS DIGITAIS E SEUS REFLEXOS TRIBUTÁRIOS

No que tange ao IRPJ e à CSLL apurados com base no lucro real, quer
nos parecer que do uso do CPC 47 não advirão impactos muito relevantes,
a princípio, eis que, tratadas individualmente, como royalties, ou
segregadamente, com base nos contratos, as receitas serão operacionais e
como tal irão compor o lucro líquido, o qual, por sua vez, é o ponto de
partida do lucro real e da base de cálculo da CSLL. Alguma divergência
poderá haver em relação ao valor da receita a ser reconhecida com base no
CPC 47, a qual pode ser registrada por valor inferior ao montante
contratado se a prática indicar determinados índices de inadimplência dos
clientes. Como já exposto, para fins de IRPJ e CSLL, a receita deve ser
reconhecida com base no valor do contrato, devendo eventual
inadimplência ser deduzida como “perdas no recebimento de créditos”,
segundo os requisitos do art. 9º da Lei n. 9.430, em período posterior ao
reconhecimento da receita. Pode haver então alguma divergência quanto
ao período de apuração em que a perda será deduzida. Mas a qualificação
das receitas em si, ou sua segregação em diferentes obrigações de
desempenho não gera impactos relevantes para os tributos sobre a renda,
que consideram em sua apuração a totalidade das receitas, seja qual for a
sua natureza.

Ainda no âmbito do IRPJ, mas quando apurado com base no lucro


presumido, o tratamento contábil poderá divergir do tributário, eis que a
segregação das receitas por diferentes ofertas de utilidades pode resultar na
aplicação de diferentes percentuais de presunção, calculados sobre a
receita bruta. Com efeito, assim dispõe o art. 15 da Lei n. 9.249:

236
Art. 15. A base de cálculo do imposto, em cada mês, será determinada mediante
a aplicação do percentual de 8% (oito por cento) sobre a receita bruta auferida
mensalmente, observado o disposto no art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, de 26 de
dezembro de 1977, deduzida das devoluções, vendas canceladas e dos descontos
incondicionais concedidos, sem prejuízo do disposto nos arts. 30, 32, 34 e 35 da Lei
n. 8.981, de 20 de janeiro de 1995.
(...)
§ 2º No caso de atividades diversificadas será aplicado o percentual
correspondente a cada atividade.

Repare-se como o § 2º impõe de forma peremptória o dever de


segregação em função da natureza da atividade desempenhada. Outra
interessante observação a ser feita é no sentido de que o dispositivo foi
alterado pela Lei n. 12.973 justamente com o objetivo de adaptá-lo às
novas regras contábeis, tendo sido preservada regra de segregação de
atividades. Tal segregação não deve ser aquela indicada na Contabilidade e
sim aquela constante nos contratados. Para que fosse diferente, a lei teria
que ter sido expressa, o que não ocorreu. Assim, mesmo que a
Contabilidade não segregue as receitas em atividades e elas sejam distintas
no que tange à respectiva modalidade contratual, ou ainda, mesmo que a
Contabilidade agrupe em uma única rubrica, por exemplo, a título de
royalties, receitas que contratualmente tenham sido ajustadas de forma
autônoma, os contratos é que devem reger a tributação.

Impactos relevantes também podem surgir em matéria de PIS e de


COFINS, eis que a determinação da aplicação de regimes cumulativos ou
não cumulativos, muitas vezes, se dá em razão do tipo de receita que é
auferida, nos termos do que dispõe o art. 10 da Lei n. 10.833, de 29 de
dezembro de 2003. Uma empresa que presta serviços de telecomunicações
tem suas receitas submetidas ao regime cumulativo das contribuições, ao
passo que as vendas de aparelhos ficam sujeitas ao regime cumulativo. A
aplicação do CPC 47 poderá, nesse contexto, gerar discussões sobre a
alocação das receitas em um e outro regime. O mesmo vale para empresas

237
que desenvolvem atividade na nuvem (cloud computing), como adiante se
comenta.

Isso também se aplica aos tributos chamados indiretos, como o ISS e o


ICMS. Tais impostos recaem sobre determinadas espécies de negócios
jurídicos, e a contabilidade é absolutamente irrelevante para fins de se
determinar se ocorre ou não o fato gerador. Se pelo CPC 47 determinados
serviços contratados à parte da venda de bens forem todos reconhecidos
como receitas de venda, isso não será relevante para fins de tributação pelo
ICMS e ou ISS. Eventual garantia estendida, por exemplo, é contrato
diferente oferecido pelo vendedor, que não se confunde com a venda do
bem. O ICMS incidirá sobre o preço de venda, sem a inclusão da garantia,
que é receita de outra natureza, ainda que a contabilidade eventualmente
determine o reconhecimento de ambos em uma única rubrica.

Ainda assim, a contabilidade, quando determinar a segregação em


rubricas, poderá trazer à tona discussões relativas à qualificação de certas
receitas para fins tributários. É sabido que, mesmo na perspectiva jurídica,
a segregação de atividades é tema controvertido, sendo conhecidos os
casos em que a segregação se dava apenas do ponto de vista formal, com
objetivo de economia tributária. Sem entrar no mérito da validade das
operações, o conhecido caso Kitchens, discutiu a possibilidade de
segregação da venda de móveis de cozinha e os serviços de montagem. A
Contabilidade, mesmo sem seguir o regime jurídico, não sendo
determinante, poderá expor questões de qualificação jurídica ao
reconhecer conjunta ou segregadamente as receitas. Embora o exemplo
citado não tenha relação com a economia digital, a referência se presta a
demonstrar alguns relevantes impactos do CPC 47 em matéria de
tributação.

238
De toda sorte, a RFB colocou em consulta pública, em 13 de setembro
de 2017, minuta de Instrução Normativa objetivando regular os efeitos do
CPC 47 para fins fiscais, o que ocorreu em 20 de dezembro de 2017, com
a edição de Instrução Normativa n. 1.771. No que tange ao
reconhecimento da receita de licenciamento, especialmente o
reconhecimento da promessa de transferir bens e serviços, além da licença
(itens B53 e B54 do CPC 47), esclarece que não se trata de novo critério
contábil, estando neutralizado, nos termos de art. 58 da Lei n. 12.973, na
apuração dos tributos federais. Somente o item B56, contraprestação
variável decorrente de promessa de conceder licença distinta dos outros
bens ou serviços previstos no contrato, portanto obrigação de desempenho
separada, é considerada como nova prática, também neutralizada para fins
fiscais.

É certo que o art. 58 da Lei n. 12.973 não se aplica ao ICMS e ao ISS,


mas ainda assim, na ausência dele, a contabilidade não será fator
determinante na definição do tributo devido. Isso porque tais tributos
incidem sobre negócios jurídicos, tal como regidos pelos respectivos
contratos, não sendo a contabilidade, claramente orientada por critérios
econômicos, competente para determinar a incidência de tributos. Ainda
mais sem lei expressa nesse sentido.

É relevante comentar que, em operações ditas mistas que envolvem o


fornecimento de bens e de serviços, portanto obrigação de dar, o ICMS
incide sobre o valor total da operação, quando mercadorias forem
fornecidas com serviços não compreendidos na competência dos
Municípios, nos termos do art. 155, da Constituição Federal. O ICMS
incide sobre o valor total da operação, se autorizado em lei complementar,
quando mercadorias forem fornecidas com serviços compreendidos na

239
competência dos Municípios, nos termos da Lei Complementar n. 87, de
13 de janeiro de 1997. O ISS envolve obrigação de fazer e incide sobre
serviços de qualquer natureza, definidos em lei complementar (art. 156,
Constituição Federal). Ressalvadas as exceções de lei, os serviços
mencionados na lista não ficam sujeitos ao ICMS, ainda que sua prestação
envolva fornecimento de mercadorias (Lei Complementar n. 116, de 31-7-
2003).

Dessa forma, ainda que a Contabilidade qualifique ou requalifique


certas transações, para fins de alocação de receita, essa metodologia
contábil não pode prevalecer para fins tributários, como se observa.

6. OUTRAS QUESTÕES CONTROVERSAS RELACIONADAS À


CONTABILIZAÇÃO E TRIBUTAÇÃO DE NEGÓCIOS NA ECONOMIA
DIGITAL

Como já mencionado, uma das mais relevantes questões a serem


examinadas para fins tributários, envolvendo softwares e seu
licenciamento, talvez resida no universo designado por cloud computing.

O mundo da internet, as ações e situações que nela se desenvolvem, é


usualmente designado por mundo virtual, sendo que o conceito de virtual,
quando aplicado à internet, é muitas vezes utilizado para indicar a ausência
de existência real. Esse não nos parece o total conteúdo do termo, devendo
ele ser visto, isso sim, como desconectado de espaço e tempo, uma vez que
essas dimensões operam no mundo do possível, enquanto a internet opera
no mundo do atual. A informação, na internet, é disponibilizada em tempo
real, de forma atual, presente. Com a evolução do mundo digital, a
informação vem deixando de ser armazenada junto a seus detentores
fazendo nascer o cloud computing ou computação nas nuvens.

240
De acordo com o NIST (National Institute of Standards and
Technology), agência governamental não regulatória da administração de
tecnologia do Departamento de Comércio dos Estados Unidos, o cloud
computing pode ser definido como:

Cloud computing is a model for enabling ubiquitous, convenient, on-demand


network access to a shared pool of configurable computing resources (e.g.,
networks, servers, storage, applications, and services) that can be rapidly
provisioned and released with minimal management effort or service provider
interaction. This cloud model is composed of five essential characteristics, three
service models, and four deployment models.

Ou seja, o cloud computing permite o compartilhamento da capacidade


de computadores por meio da internet. O universo do cloud computing é
composto pela infraestrutura (hardware) das empresas que oferecem
armazenamento de dados, associada a softwares que permitem aos
usuários de tais utilidades acessarem suas informações a qualquer tempo e
em qualquer lugar visto que elas, literalmente, não estão em lugar algum,
estando, porém, acessíveis em todos os lugares. É a desterritorialização da
informação.

O uso do cloud computing amplia-se cada vez mais, já que o fornecedor


dessas utilidades vale-se de tecnologias avançadas, computadores de
grande porte, aplicativos atualizados, serviços de telecomunicação
diferenciados, assim como dos instrumentos aplicativos de que dispõe,
permitindo o compartilhamento de seus custos, de forma a reduzi-los. Esse
modelo de negócio permite ainda, aos usuários, dispensar investimentos
em novas tecnologias, afastar a preocupação com a obsolescência e com o
uso de certos serviços públicos, como é o caso da energia elétrica e da
comunicação, uma vez que o fornecedor da utilidade cloud computing é
que deverá se preocupar com esses importantes itens do negócio virtual.

241
Ainda, de acordo com o NIST, há três grandes modalidades de
utilidades ofertadas em cloud computing: (i) Infrastructure as a Service ou
Infraestrutura como serviço – IaaS; (ii) Platform as a Service ou
Plataforma como serviço – PaaS e (iii) Software as a Service ou Software
como serviço – SaaS.

A Infraestrutura como Serviço – IaaS consiste na contratação, de acordo


com as necessidades do usuário, de meios tecnológicos que abrangem
hospedagem de capacidade computacional e armazenamento de dados.
Assim, de quanto nos interessa para este estudo, o contrato de IaaS
consiste em disponibilizar memória no servidor do provedor, mediante
remuneração paga pelo usuário e à medida de sua utilização. A
terminologia “serviço”, adotada neste contexto, deve ser recepcionada com
ressalvas, visto que a essência do negócio é ceder espaço em servidor para
armazenamento de dados, típico contrato de locação de coisas, no caso
cessão de uso de espaço virtual, obrigação de dar, tratado nos arts. 565 e
seguintes do Código Civil. Já o contrato de prestação de serviços é tratado
nos arts. 593 e seguintes do Código Civil, caracterizando-se como
obrigação de fazer. Este é o segmento dos data center e a controvérsia
sobre a sua tributação já está posta na medida em que se incluiu a atividade
de armazenamento como sujeita à incidência do ISS, item 1.03 da Lista de
Serviços283.

A Plataforma como Serviço – PaaS consiste na contratação de uso de


um ambiente que permite o desenvolvimento, implantação e
gerenciamento de aplicações. Sua principal vantagem é incluir sistemas
operacionais, ferramentas de desenvolvimento, sistemas de gerenciamento
de banco de dados, serviços de inteligência de negócios e outros, além da
infraestrutura necessária ao uso de sua aplicação. Cabe ao fornecedor

242
dessa utilidade obter todos os licenciamentos necessários à operação. A
hipótese aparenta ser de uma locação de estrutura ou cessão de uso e não
de prestação de serviços, embora o Fisco possa arguir que a essência desse
negócio está capturada no item 1.06, assessoria e consultoria em
informática, da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar n. 116.

Software como um Serviço (SaaS) consiste na contratação da aplicação,


o aplicativo, cabendo ao fornecedor manter infraestrutura, garantir
segurança e dar suporte para a aplicação contratada. Do ponto de vista
prático, funciona como um aluguel do bem. Na atualidade é a forma mais
difundida de uso do cloud computing, destacando-se: (i) serviço de e-mail
corporativo; (ii) ferramentas e instrumentos disponibilizados pelas
empresas de bens de informática, inclusive suas atualizações; (iii)
aplicativos de gestão de negócios, dados bancários, análise de negócios e
dados secretariais; (iv) sistema operacionais especializados por segmentos;
(v) o relacionamento com clientes (CRM). Cabem os mesmos
comentários, no que se refere ao ISS, apenas que em relação ao item 1.05,
podendo o Fisco arguir tratar-se de licenciamento e cessão de direitos, e
não de aluguel de bem.

Dentre as inúmeras aplicações da tecnologia cloud computing, o


streaming, forma de transmissão instantânea de dados de áudio e vídeo
através de redes, ganhou destaque, pois por meio desse serviço pode-se
assistir a filmes ou escutar música sem a necessidade de baixar o
programa, ou fazer o download, assim facilitando o acesso aos conteúdos
online e afastando a obrigação de manter arquivos284. O streaming insere-
se na categoria de serviços de comunicação multimídia, prestados pela
internet, na forma da Resolução n. 614, de 28 de maio de 2013, razão pela

243
qual é serviço de valor adicionado à telecomunicação, conforme a
Resolução n. 148, já referida.

O usuário vale-se desses conteúdos, protegidos por direitos de autor, na


internet, sem qualquer violação à lei, tendo o Superior Tribunal de Justiça
decidido que essa modalidade de distribuição de dados é fato gerador para
cobrança, pelo ECAD285, relativamente à exploração econômica do titular
do direito autoral (REsp. 1559264), nos seguintes termos:

A transmissão de músicas por meio da rede mundial de computadores mediante


o emprego da tecnologia streaming (webcasting e simulcasting) demanda
autorização prévia e expressa pelo titular dos direitos de autor e caracteriza fato
gerador de cobrança pelo ECAD relativa à exploração econômica desses direitos.

A Lista de Serviços sujeitos ao ISS contempla hipótese de


disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo,
imagem e texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros,
jornais e periódicos. A principal característica dessa atividade é, sem
dúvida, a cessão de bem, a exemplo de um aluguel, no caso a assinatura.
Novamente, as determinações legais em matéria de tributação não parecem
considerar a efetiva natureza do bem objeto do negócio jurídico sob
análise, nem tampouco a Resolução n. 148 da ANATEL.

Também de largo uso são os aplicativos de mobilidade urbana, que


prosperaram nas redes sociais, de forma espontânea, institucionalizaram-se
e, por fim, hoje são objeto do Projeto de Lei n. 28, de 2017, do Senado
Federal, já aprovado pela Câmara dos Deputados.

Essas novas modalidades de atividade devem ser colhidas pela


Contabilidade, que deverá qualificá-las, certamente colocando em debate a
existência ou não de oferta de bens ou serviços distintos, considerando a

244
prontidão para fornecer esses bens ou serviços, inclusive eventuais
atualizações não especificadas de softwares, nos termos do CPC 47.

Todas essas transações deverão ser examinadas, para fins tributários,


nos estritos termos das regras de incidência, não se podendo afirmar, de
antemão, como visto, que elas tenham características de serviço, no caso
do streaming, sujeito ao ISS, visto que a empresa fornecedora de utilidades
não se dispõe a oferecer esse tipo de utilidade a usuário determinado,
acessível que estão a todos. Além disso, questões como local da prestação
dos serviços e domicílio do prestador, tão relevantes na repartição de
competências tributárias entre os Municípios, surgem com toda força em
atividades como a do streaminig. Da mesma forma no caso dos
fornecedores de mobilidade, dado que há uma grande dificuldade de se
afirmar que tais atividades se inserem como transporte de natureza
municipal, quem as controla para tanto, sujeitas ao ISS, inclusive por não
se enquadrarem na Lei n. 12.468, de 26 de agosto de 2011, que regula a
profissão de taxista. É claro que os aplicativos de mobilidade atuam no
setor do transporte, mas há dúvidas sobre se as empresas que os operam
não são em si prestadoras do serviço, ou se são apenas facilitadoras da
atividade que é desempenhada pelos motoristas. E, por fim, como a
Contabilidade deverá capturar essa atividade, quando por trás do motorista
existe uma empresa?

7. CONCLUSÕES

Apesar de não haver impactos tributários, nos termos do art. 58 da Lei


n. 12.973, é certo que o novo sistema de contabilização poderá trazer à
tona algumas questões controvertidas, especialmente no que tange à
alocação de receitas. A qualificação de receitas para fins tributários, que é
relevante para fins de IRPJ e CSLL com base no lucro presumido, ou para

245
definir o regime de tributação das contribuições ao PIS e COFINS
(cumulativo ou não cumulativo), e ainda para definir a incidência do ISS e
do ICMS, sempre gerou controvérsias e discussões, eis que, já na
perspectiva jurídica e contratual, muitas vezes é difícil estabelecer uma
segregação precisa. O CPC 47, apesar de neutro para fins fiscais, pode
trazer ainda mais tais questões à tona, dado que estabelece forma peculiar
de contabilização de tais receitas.

No caso da economia digital, a questão é ainda mais controvertida, eis


que mesmo na perspectiva jurídica, é bastante nebulosa a definição do
regime tributário aplicável a tais atividades, dado o caráter inovador em
que se inserem atividades como as processadas na nuvem em geral, o
streaming, e os aplicativos de mobilidade, em especial, dentre outros.

Seja como for, não é a contabilização com base no CPC 47 que irá
determinar o regime tributário, seja porque o art. 58 da Lei n. 12.973
impõe sua neutralidade para tributos como IRPJ, CSLL, PIS e COFINS,
seja porque impostos como o ICMS e o ISS não incidem sobre fatos
contábeis e sim sobre negócios jurídicos, tal como regidos pelo Direito.

246
Questões controversas relacionadas à
contabilização de negócios na economia atual
e os seus possíveis reflexos tributários
Bárbara Melo Carneiro286 e Fernando Daniel de Moura Fonseca287

1. ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

Desde a edição da Lei n. 6.404/76 não se observa uma mudança tão


importante sobre a estrutura conceitual da contabilidade brasileira, com
reflexos relevantes sobre o lucro líquido do exercício, que representa o
ponto de partida para a determinação da base de cálculo do imposto de
renda de acordo com a legislação tributária. Essa alteração de paradigma
gera efeitos sobre as definições de ativo e passivo, repercutindo
diretamente sobre o patrimônio líquido (que nada mais é do que o
resultado decorrente da confrontação entre ativos e passivos) e irradiando
efeitos também sobre as definições de receita e despesa.

Em linhas gerais, a contabilidade atual se afasta de uma necessária


ocorrência de transações para o reconhecimento de ativos, relativizando a
obrigação de que o seu reconhecimento se dê em razão de um título
jurídico de propriedade. Ou seja, a contabilidade passa a adotar conceitos
relacionados à expectativa de ocorrência de eventos futuros, representados
por benefícios econômicos. Tendo em vista a adoção da abordagem do
balanço patrimonial, a modificação dos conceitos de ativos e passivos tem
impacto direto sobre o resultado do exercício. Dado que receitas são
aumentos nos benefícios econômicos, decorrentes da entrada de recursos,
ou do aumento de ativos ou da diminuição de passivos, e despesas, os
decréscimos nos benefícios econômicos, em razão da saída de recursos, ou

247
da redução de ativos ou assunção de passivos, há uma necessária
vinculação entre esses conceitos (ativo e passivo) e a definição de
resultado.

Observa-se, ainda, uma repercussão das referidas mudanças sobre o


patrimônio líquido. Sem uma definição que lhe seja própria, o patrimônio
líquido pode ser entendido como a representação numérica que resulta da
diferença entre ativos e passivos, fazendo com que muitos autores
cheguem ao ponto de criticar a adequação dessa expressão, que melhor
poderia ser substituída por ativo líquido (i.e., ativo líquido dos passivos).
Portanto, se ativos e passivos passam a contar com a forte presença do
fator expectativa, por meio da consideração de eventos futuros, o
patrimônio líquido também passa a estar “contaminado” por essa visão
prospectiva da realidade, que não se vincula à ocorrência de transações,
tampouco à existência de títulos jurídicos de propriedade.

De todo modo, convém ressaltar que, em razão de a nova estrutura


conceitual adotar a primazia conceitual dos ativos e conduzir à abordagem
do balanço patrimonial, o resultado do exercício passa a ser definido em
razão de aumentos nos benefícios econômicos, seja sob forma de entrada
de novos recursos, seja em decorrência de acréscimo ou decréscimo de
ativos e passivos. Dito de outra maneira, a contabilidade passa a enxergar a
realidade de forma diversa, por meio de uma visão mais voltada para o
futuro, ainda que para isso precise trabalhar com probabilidades acerca da
ocorrência de transações.

Esse contexto, naturalmente, abala a relação existente entre


contabilidade e Direito Tributário. Um registro contábil preocupado com o
futuro trabalha com expectativas, se baseia em avaliações fundamentadas
no valor justo de transações que se espera ocorrerão e não no preço

248
praticado em negócios jurídicos já realizados, ignora a necessidade da
propriedade em sentido jurídico e pode desconsiderar a forma jurídica
adotada sempre que ela conflitar com os efeitos econômicos que se espera
derivem da transação ocorrida. Portanto, a referência principal para o
registro contábil deixa de ser a ocorrência de negócios jurídicos e passa a
ser a visão da ciência contábil acerca da realidade econômica, resultado da
máxima accounting follows economics ou apenas accounting as
economics.

Enfim, rompe-se com o passado e atribui-se peso à sua relação com o


futuro. A contabilidade, portanto, passa a atribuir relevância, não apenas a
eventos ocorridos no passado, mas também à expectativa de ocorrência de
eventos futuros, migrando de uma função segundo a qual retratava eventos
patrimoniais já ocorridos para outra em que a se objetiva evidenciar as
expectativas de fluxos de caixa futuro, permitindo colocá-la como uma
importante ferramenta para a tomada de decisões (função preditiva da
informação contábil).

2. BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DOS OBJETIVOS DA


CONTABILIDADE

Em termos gerais, pode-se dizer que o objetivo da contabilidade é o


fornecimento de informações patrimoniais e suas variações quantitativas e
qualitativas288 relacionadas a uma dada entidade. Caso fosse possível
aguardar o encerramento das atividades econômicas desenvolvidas pela
referida entidade, a variação patrimonial poderia ser mensurada pela
contraposição da soma algébrica dos caixas que foram dela retirados e dos
caixas nela investidos ao longo de sua existência.

Ocorre que a demanda por informações, antes e durante o


desenvolvimento das atividades, acaba por requerer da contabilidade que a

249
variação patrimonial seja atribuída a uma determinada unidade de tempo,
no intuito de se evidenciar a performance da entidade.

A respeito desse aspecto, a contabilidade pode ser definida, então, como


a arte que se ocupa de dividir o histórico financeiro de uma entidade em
unidades específicas de tempo289. Sob a perspectiva quantitativa, sabe-se
que o tempo é uma variável que assume valores em uma escala contínua,
sendo, portanto, tarefa extremamente árdua a imputação de determinada
ocorrência patrimonial a um determinado período de tempo. Nesse
contexto, a contabilidade desenvolveu uma diversidade de sistemas e
métodos que visam imputar a um período a ocorrência de uma
determinada mutação patrimonial.

Evidencia-se, portanto, a necessidade de que seja superado o mito do


caráter absolutamente objetivo das demonstrações contábeis, muitas vezes
decorrente do fato de que o resultado prático da aplicação dos métodos
contábeis quase sempre se reverte em um dado numérico nas
demonstrações financeiras290. Essa visão acerca do processo contábil
contribui para a crença em torno de um procedimento com reduzidíssima
margem de discricionariedade, como em uma atividade de mera subsunção
do fato à norma.

A realidade revela, contudo, o caráter multiparadigmático da


contabilidade291. Seus conceitos fundamentais estão baseados em
determinadas convenções, que não podem ser tratadas como a única
possibilidade de percepção da realidade que lhes é subjacente292.

A contabilidade promove, por assim dizer, um recorte sobre a realidade,


capturando apenas os eventos que serão considerados relevantes para o seu
propósito e que serão reconhecidos e mensurados de acordo com

250
determinados critérios previamente definidos, o que pressupõe um certo
grau de discricionariedade. Dessas constatações deve decorrer uma
necessária limitação do escopo e da validade da informação contábil, algo
presente desde a criação do método das partidas dobradas, conforme
noticia a doutrina293.

A uma primeira vista, essas considerações parecem atentar contra a


ideia de um balanço consistente, resultado da aplicação do referido
método. Essa exatidão, contudo, é mera coerência interna e formal, algo
inerente ao registro contábil em partidas dobradas e que definitivamente
não elimina a possibilidade de imprecisões294. Atribuir excessiva
importância a essas propriedades equivale a reduzir a complexidade do
processo contábil à singela constatação de que o patrimônio líquido é igual
ao ativo menos o passivo. O resultado acaba sendo uma indesejada
confusão entre escrituração e ciência contábil295.

A verdade é que as regras contábeis são menos objetivas do que um


raciocínio intuitivo sugere296. Assim como ocorre com os enunciados
normativos no âmbito do direito, elas estão sujeitas a diferentes
interpretações ao longo do processo hermenêutico. O próprio regime de
competência, que é a base da escrituração contábil, nada mais é do que um
método de alocação discricionária da variação patrimonial no tempo,
baseado em determinados preceitos contábeis.

De acordo com Beaver297, trata-se de um regime que pode ser


considerado ambíguo e indefinido, dado que para quase todos os eventos
capazes de afetar as demonstrações financeiras há uma variedade de
métodos alternativos para a confrontação entre receitas e despesas. Ao
final, a questão acaba girando em torno de qual é o melhor momento para
o reconhecimento da variação patrimonial.

251
Dessa forma, faz-se necessário compreender qual seria o evento crítico
contábil298 que deflagraria o reconhecimento da variação patrimonial, no
intuito de tentar conferir maior racionalidade à vinculação da oscilação a
determinado período. Entretanto essa é a grande questão que se debate na
contabilidade atual: qual seria o evento crítico que desencadearia a leitura
do fato patrimonial pela contabilidade. Não obstante o desenvolvimento da
doutrina contábil, no intuito de se alinhar temporalmente os esforços às
realizações da entidade, impondo o reconhecimento conjunto de receitas e
despesas, os desafios continuam se perpetuando, tendo em vista,
justamente, a ausência de definição acerca do referido evento crítico
relacionado à confrontação de receitas e despesas, ou até mesmo o
reconhecimento do acréscimo ou da diminuição do valor dos ativos e
passivos.

Edwards e Bell299, por exemplo, defendiam o reconhecimento do ganho


de estocagem como um aperfeiçoamento do regime de competência. Nessa
perspectiva, o ganho ou a perda decorrente da simples manutenção do
ativo deveria ser atribuído ao período em que ele foi incorrido,
independentemente de a entidade ter transacionado com terceiros.
Ademais, na visão dos citados autores, computar o ganho de estocagem
apenas no momento da alienação do ativo seria distorcer o regime de
competência, ao atribuir a um período o ganho já ocorrido em momento
anterior.

Um consenso acerca do melhor critério a ser utilizado é algo


extremamente árduo, em função da diversidade de usuários das
informações contábeis e dos seus respectivos interesses. Além das
dificuldades conceituais e metodológicas que a própria contabilidade ainda
não conseguiu resolver, os avanços da economia digital inegavelmente

252
potencializam esses desafios. A facilidade e a simplicidade no acesso às
informações de mercado, a utilização de softwares que possibilitam a
leitura quase que imediata e desvinculada de altos custos sobre as
transações ocorridas, enfim, a nova dinâmica e fluidez das informações é
capaz de alterar as informações contábeis, na medida em que se facilita a
determinação do valor justo dos ativos e passivos.

Ademais, a economia digitalizada adiciona extrema facilidade em se


transacionar ativos e passivos, o que se traduz em maior liquidez do
patrimônio detido, principalmente no que concerne ao patrimônio
financeiro. Assim, reduzem-se os custos relativos à obtenção de
informação, à realização das transações e ao acesso aos mercados. Além
disso, a economia digitalizada fortalece a hipótese dos mercados
eficientes, segundo a qual os preços dos ativos refletem todas as
informações disponíveis300, consolidando a sensação de segurança dos
valores que são refletidos pelo mercado.

Nesse ponto, cabe abrir um parêntese. Essa hipótese não pode, contudo,
ser admitida como um axioma das ciências econômicas, embora não se
possa negar a importância desse modelo, dos trabalhos de seus adeptos e
das suas repercussões práticas, principalmente no âmbito dos mercados
financeiro e de capitais. Sem o objetivo de fugir ao objeto do presente
artigo, até mesmo em razão da absoluta incapacidade técnica dos seus
autores para lidar com questões econômicas, vale mencionar os trabalhos
de Eugene Fama301, laureado com o Prêmio Nobel de Economia em 2013,
exatamente em razão da sua tese em torno da hipótese da eficiência dos
mercados.

Em sentido diverso à hipótese da eficiência e da racionalidade dos


mercados, há uma linha da economia, também conhecida pelo nome de

253
economia comportamental (behavioral economics), que ganha cada vez
mais importância no cenário mundial. Em linhas gerais, procura-se
demonstrar que determinadas decisões são tomadas pelas pessoas com
base em critérios não totalmente racionais, pois diversos outros fatores são
levados em consideração pelos agentes econômicos ao fazer suas escolhas.
Por essa razão, especificamente em relação ao mercado de ações, não seria
possível estabelecer uma relação entre o preço de mercado dos papéis e o
valor intrínseco das companhias a eles relacionadas. Essa é a linha seguida
por autores como Robert Shiller302, igualmente laureado com o Prêmio
Nobel de Economia em 2013, e por Richard Thaler303, vencedor do mesmo
prêmio em 2017, entre tantos outros autores.

Essa mudança de paradigma fez com que a contabilidade reduzisse a


restrição em se adotar valores de saída para mensuração de ativos e
passivos. Consequentemente, mutações patrimoniais passaram a ser
registradas, a despeito de não se vincularem à ocorrência de uma
transação, o que gera uma maior aproximação em relação à economia e,
por consequência, um maior distanciamento em relação ao direito. Nesse
contexto, Nelson Carvalho304 afirma que as demonstrações financeiras
passam a se preocupar em estimar os fluxos de caixa futuros, por meio de
registros baseados em transações com conteúdo econômico de acordo com
a já mencionada máxima accounting follows economics. É o que se
convencionou chamar de primazia da essência sobre a forma, hoje parte
integrante (e inseparável) da fidedignidade da informação contábil,
conforme será visto logo na sequência.

3. A ESTRUTURA CONCEITUAL BÁSICA DA CONTABILIDADE


ADOTADA NO BRASIL

254
Para evidenciar os conceitos básicos utilizados pela contabilidade
brasileira, adotar-se como ponto de partida o “Pronunciamento Conceitual
Básico (R1) – CPC 00”, elaborado pelo Comitê de Pronunciamentos
Contábeis, e que possui correlação direta com a estrutura conceitual básica
do IFRS, representada por The Conceptual Framework for Financial
Reporting.

A estrutura conceitual é responsável por estabelecer os conceitos que


amparam as referidas estimativas, julgamentos e modelos. É dizer, a
contabilidade não pretende representar a realidade com exatidão, mas
propor uma visão baseada em estimativas alicerçadas em determinados
postulados. Nesse ponto, já se deve ter redobrada atenção em relação às
possíveis inconsistências entre as demonstrações financeiras e a base de
cálculo do imposto de renda, justamente em razão da premissa de que a
contabilidade leva em consideração diversos elementos subjetivos para
qualificar a realidade.

O CPC 00 também atesta que a performance financeira da entidade


deve ser refletida pelo regime de competência. De forma mais específica,
afirma que esse regime retrata “os efeitos de transações e outros eventos e
circunstâncias sobre os recursos econômicos e reivindicações da entidade
que reporta a informação nos períodos em que ditos efeitos são
produzidos, ainda que os recebimentos e pagamentos em caixa derivados
ocorram em períodos distintos”. (CPC 00_R1, OB17). É possível notar que
a performance não se vincula apenas à ocorrência de transações, sendo
igualmente possível que concorram o que se qualificou como “outros
eventos e circunstâncias sobre os recursos econômicos”, que representam
um inegável distanciamento em relação ao Direito Tributário,

255
especialmente se a premissa adotada pelo intérprete envolver a
necessidade de prévia realização para a existência jurídica de renda.

Quando se avança sobre os elementos das demonstrações contábeis, o


CPC 00 aponta como seus integrantes os ativos, os passivos e o patrimônio
líquido (CPC 00_R1, 4.4). De forma mais específica, a estrutura conceitual
define ativo como “um recurso controlado pela entidade como resultados
de eventos passados e do qual se espera que fluam futuros benefícios
econômicos para a entidade”.

Passivo, por sua vez, “é uma obrigação presente da entidade, derivada


de eventos passados, cuja liquidação se espera que resulte na saída de
recursos da entidade capazes de gerar benefícios econômicos”. Por fim, o
patrimônio líquido “é o interesse residual nos ativos da entidade depois de
deduzidos todos os seus passivos”. É evidente o vínculo com o passado,
mas a existência de ativos ou passivos possui íntima relação com a
expectativa de ocorrência de algo no futuro. Em outras palavras, o passado
continua sendo relevante, mas o conceito de ativos e passivos passa a se
vincular aos possíveis benefícios econômicos futuros, sempre baseados em
uma expectativa.

É interessante notar, como bem destacado na própria estrutura


conceitual, que as definições de ativo e de passivo apontam apenas para as
suas características essenciais, sem qualquer preocupação em especificar
os critérios a serem observados para o seu registro nas demonstrações
financeiras.

Merece destaque ainda maior a afirmação no sentido de que a avaliação


acerca do enquadramento de um determinado item como ativo, passivo ou
patrimônio líquido deve “atentar para a sua essência subjacente e não

256
apenas para a sua forma legal” (CPC 00_R1, 4.6). Mais especificamente
em relação aos ativos, há o expresso reconhecimento de que o seu registro
não está vinculado à ocorrência de transações, concorrendo igualmente
com elas o que se denomina de “outros eventos passados” (CPC 00_R1,
4.13).

No que toca aos passivos, reconhece-se que alguns deles somente


podem ser mensurados “por meio do emprego de significativo grau de
estimativa” (CPC 00_R1, 4.19). Nesse ponto, o distanciamento em relação
ao Direito Tributário é ainda mais evidente, pois há menção expressa ao
fato de que a essência, de acordo com a visão da contabilidade acerca da
realidade, deve prevalecer sobre a forma jurídica adotada.

Passando para o resultado, a estrutura conceitual básica define receitas


como

aumentos nos benefícios econômicos (...), sob a forma de entrada de recursos ou


do aumento de ativos ou da diminuição de passivos, que resultam em aumentos do
patrimônio líquido, e que não estejam relacionados com a contribuição dos
detentores dos instrumentos patrimoniais.

Acerca das despesas, elas foram definidas como diminuições

nos benefícios econômicos (...), sob a forma da saída de recursos ou da redução


de ativos ou assunção de passivos, que resultam em decréscimo do patrimônio
líquido, e que não estejam relacionados com distribuições aos detentores dos
instrumentos patrimoniais (CPC 00_R1, 4.25).

Verifica-se a intrínseca relação entre os conceitos dos elementos


patrimoniais e a probabilidade de futuros benefícios econômicos. Em razão
disso, “um ativo não deve ser reconhecido no balanço patrimonial quando
os gastos incorridos não proporcionarem a expectativa provável de geração
de benefícios econômicos para a entidade além do período contábil
corrente” (CPC 00_R1, 4.47). Da mesma forma, um passivo deve ser

257
reconhecido quando “for provável que uma saída de recursos detentores de
benefícios econômicos seja exigida em liquidação de obrigação presente e
o valor pelo qual essa liquidação se dará puder ser mensurado
confiabilidade” (CPC 00_R1, 4.46).

Merece destaque a nítida preocupação da estrutura conceitual em negar


qualquer possibilidade de que as demonstrações financeiras possam
representar uma visão exata acerca dos fatos patrimoniais.

Ao contrário, busca-se enfatizar a presença de estimativas, fruto de uma


determinada visão da contabilidade sobre a realidade, calcadas na utilidade
da informação (para determinados usuários) e na fidedignidade de sua
representação. Salta aos olhos a subjetividade que acompanha o processo
contábil, seja em razão da impossibilidade de uma representação objetiva
da realidade, seja em razão da liberdade de que dispõe o contador para
qualificar os fatos patrimoniais de acordo com os postulados definidos pela
contabilidade.

4. OS CRITÉRIOS PARA O RECONHECIMENTO DE RECEITAS


CONTÁBEIS

Até o final de 2017, as receitas provenientes de venda de bens,


prestação de serviços e utilização, por parte de terceiros, de outros ativos
da entidade eram reconhecidas, mensuradas e evidenciadas com base no
CPC 30 – Receitas.

As regras nele evidenciadas já retratavam os paradigmas adotados pelo


CPC 00, no sentido de que as receitas eram definidas como o aumento de
benefícios econômicos sob a forma de entrada de recursos ou aumento de
ativos ou diminuição de passivos que resulta em aumentos do patrimônio
líquido da entidade. Nos termos do CPC 30, receita seria definida como:

258
o ingresso bruto de benefícios econômicos durante o período observado no curso
das atividades ordinárias da entidade que resultam no aumento do seu patrimônio
líquido, exceto os aumentos de patrimônio líquido relacionados às contribuições dos
proprietários.

Com a revogação do CPC 30 – Receitas, entrou em vigor o CPC 47 –


Receita de Contrato com Cliente, que possui espectro de aplicação distinto
daquele CPC 30. O primeiro se aplicaria à contabilização de vendas de
bens305, prestação de serviços306 e utilização, por parte de terceiros, de
outros ativos da entidade307. Já o segundo tem sua aplicação relacionada às
receitas oriundas de contratos com clientes, que, nos termos do item 06, é
“a parte que contratou com a entidade para obter bens ou serviços que
constituem um produto das atividades normais da entidade em troca de
contraprestação”.

Não obstante o alcance do CPC 47 estar limitado às receitas oriundas de


contrato com clientes, não sendo aplicável às receitas oriundas de outras
fontes, as regras por ele evidenciadas não se afastam da estrutura
conceitual básica, a qual se vincula às expectativas de benefícios
econômicos futuros, conforme já destacado. Nos termos do novo
pronunciamento, a receita é conceituada como:

aumento nos benefícios econômicos durante o período contábil, originado no


curso das atividades usuais da entidade, na forma de fluxos de entrada ou aumentos
nos ativos ou redução nos passivos que resultam em aumento no patrimônio líquido,
e que não sejam provenientes de aportes dos participantes do patrimônio (Apêndice
A).

Novamente, é possível perceber a vinculação dos conceitos contábeis às


expectativas de benefícios econômicos. Veja-se que o valor a ser
reconhecido a título de receita será aquele que reflita a contraprestação à
qual a entidade espera ter direito em troca desses bens ou serviços. Dessa

259
forma, o montante a ser contabilizado como receita não está subordinado
ao preço praticado no negócio jurídico firmado entre as partes.

Para fins contábeis, além de considerar os termos dos contratos, a


entidade deve avaliar as práticas de negócio usuais para estimar o valor da
contraprestação à qual espera ter direito em troca da transferência dos bens
ou serviços prometidos ao cliente. É dizer: o montante a ser reconhecido a
título de receitas não decorre necessariamente do preço evidenciado no
negócio jurídico firmado entre as partes.

Em relação ao evento crítico que desencadeará o reconhecimento das


receitas nos contratos em que a contraparte seja classificada como cliente
(de acordo com os conceitos contábeis evidenciados no CPC 47), pode-se
dizer que a entidade deve reconhecer as receitas à medida que satisfizer a
obrigação de desempenho, sendo essa a transferência do ativo (bem ou
serviço) prometido ao cliente. Nesse ponto, cumpre ressaltar que a
transferência do ativo não se encontra vinculada à transferência jurídica,
mas sim à transferência de controle, que se refere à capacidade de
determinar o uso do ativo e de obter substancialmente a totalidade dos
benefícios dele provenientes, sendo esses os fluxos de caixa potencias.

Esses pontos ganham relevância no contexto do CPC 47, em virtude de


o reconhecimento da receita estar atrelado à identificação das obrigações
de desempenho, da determinação do preço da transação, do fato de alocar
o preço a cada obrigação de desempenho na proporção do preço individual
e de reconhecer a receita à medida que a obrigação for satisfeita.

Todos esses passos passam a interferir no critério temporal e na


mensuração da receita a ser reconhecida para fins contábeis. No tocante ao
reconhecimento de receitas oriundas do setor de tecnologia, especialmente

260
no que concerne ao licenciamento de propriedade intelectual, os grandes
desafios estão vinculados à identificação e à individualização da obrigação
de desempenho e à dificuldade em alocar o preço da transação.

Veja-se, por exemplo, o caso de uma determinada entidade que


desenvolva um software e se comprometa a (i) transferir a licença do
software; (ii) prestar o serviço de instalação do software; (iii) fornecer
atualizações; e (iv) dar suporte técnico por determinado período. Diversas
variáveis influenciarão no reconhecimento das receitas, tais como: (i) se a
entidade vende, separadamente, a licença, o serviço de instalação e o
suporte técnico; (ii) se a instalação impõe a adaptação do software aos
diferentes usuários e se o serviço pode ser prestado por outra entidade; (iii)
se a ausência de atualização impede o funcionamento do software; ou (iv)
se há alguma customização relevante para que o software funcione no
cliente.

Não se objetiva detalhar as controvérsias decorrentes de cada situação


detalhada acima. De qualquer forma, o CPC 47 impõe a identificação das
obrigações de desempenho, a determinação do preço da transação, a
alocação do preço às obrigações de desempenho identificadas, para que a
receita seja reconhecida na medida em que as obrigações forem satisfeitas.

Sem entrar nos critérios específicos que, em qualquer caso, dependerão


dos contratos firmados entre as partes, é importante ressaltar que, caso o
critério contábil se afaste do negócio jurídico firmado, este deve ser
observado para fins fiscais, por mais que o CPC 47 estabeleça parâmetros
para que seja determinada a natureza do compromisso da entidade,
específicos para identificar as obrigações de desempenho, bem como
quando ocorrerá a transferência de bens ou serviços ao cliente.

261
É dizer, por mais que as normas contábeis se aproximem da realidade
econômica, nada impede que a realidade jurídica seja distinta e imponha
critérios divergentes para se apurar a receita jurídica. Dessa forma, caso o
negócio jurídico firmado seja, por exemplo, de prestação de serviços, por
mais que haja entrega de mercadorias e que a contabilidade se valha desse
fato para segregar as transações e imputar determinada receita quando a
mercadoria for entregue, não há que se falar, para fins fiscais, em venda de
mercadoria.

Sendo assim, o negócio jurídico firmado somente pode ser afastado por
vícios jurídicos e nunca por interpretação econômica, segundo critérios
determinados pela norma contábil.

Em razão do exposto, não é preciso muito esforço para perceber que os


conceitos adotados pela contabilidade têm o potencial de gerar muitas
incompatibilidades com o Direito Tributário, demandando um esforço
adicional do legislador no sentido de depurar o resultado apurado em
conformidade com o padrão contábil internacional. De plano, verifica-se a
ruptura de um importante paradigma adotado pelo Direito Tributário, que
passa pelo reconhecimento de ativos e passivos patrimoniais
definitivamente incorporados ao patrimônio do contribuinte. Essa
“definitividade” se vincula a um fato passado e não pode ter como
referência a presunção de sua ocorrência no futuro, por mais provável que
ela se mostre.

5. OS EFEITOS TRIBUTÁRIOS DO RECONHECIMENTO DE RECEITA


CONTÁBIL

O presente cenário revela que se deve ter atenção redobrada na


interpretação das hipóteses de remissão realizadas pela lei tributária a
conceitos estruturados nos termos das ciências contábeis. Se antes esse

262
recurso fazia o mais absoluto sentido para fins de conformação da norma
tributária, em razão da conformidade de critérios contábeis e jurídicos
outrora existente, com a adoção de uma nova estrutura conceitual contábil,
a conclusão pode levar a um resultado diverso.

É preciso destacar que a relação entre tributação e contabilidade é


bastante antiga. A razão de ser desse fenômeno é quase intuitiva, pois
direito e contabilidade acabam se interessando por um conjunto de eventos
econômicos muito semelhantes, ainda que a sua qualificação dependa de
questões específicas de cada ciência. A despeito das divergências, a
contabilidade procura demonstrar a situação patrimonial de uma entidade e
suas mutações, enquanto o direito enxerga na variação positiva do
patrimônio manifestações de capacidade contributiva aptas a serem
tributadas. Em outras palavras, há uma identidade de objetos, ainda que
nem sempre os seus elementos sejam compreendidos de um mesmo modo,
o que leva a uma natural aproximação.

Nesse ponto, merece ressalva o argumento de que o ideal de uma


unidade conceitual decorreria do fato de que todos os conceitos acabariam
partindo de uma mesma realidade. É incontestável, contudo, que a
realidade pode ser enxergada de variadas formas, mesmo no que diz
respeito à ocorrência ou não de determinados eventos308. Portanto, é
incorreto falar-se em conceitos que partiriam de uma mesma realidade,
dado que a economia pode considerar determinadas circunstâncias
ignoradas pela contabilidade, como é o clássico exemplo do custo de
oportunidade, o mesmo ocorrendo em relação ao direito, em que o
principal distanciamento diz respeito ao referencial temporal. Enquanto a
economia busca trazer a valor presente o resultado de eventos futuros

263
ainda não ocorridos, mas que se espera ocorrer, o direito regula os efeitos
de fatos já definitivamente ocorridos no passado.

Em termos mais concretos, essa aproximação faz com que o resultado


do processo contábil seja usualmente adotado pelo legislador como ponto
de partida para a determinação das bases de cálculo dos tributos que
incidem sobre as receitas e sobre o lucro das pessoas jurídicas309.

De fato, admitindo-se que há um significativo nível de compatibilidade


na qualificação dos eventos econômicos pelas duas ciências, e
considerando que a contabilidade tem como “produto final” a evidenciação
do patrimônio por meio de demonstrações financeiras, a lógica aponta no
sentido da utilização desse resultado pelo Direito Tributário, devendo ser
realizados ajustes sempre que a qualificação atribuída ao dado econômico
pela contabilidade se revelar incompatível com esse ramo do Direito.

E é justamente no que diz respeito às incompatibilidades que a situação


pode variar substancialmente. Quando se fala em qualificação do dado
patrimonial pela contabilidade, não se pode deixar de considerar que no
âmbito da própria ciência contábil se observa a existência de diferentes
premissas e pressupostos, que levam a diferentes resultados.

E não se trata de diferenças rígidas, imutáveis. A evolução do


pensamento contábil, a sua adaptação a necessidades locais, bem como a
opção de cada país por convergir a um determinado padrão fazem com que
os distanciamentos em relação ao Direito Tributário aumentem ou
diminuam a depender das circunstâncias, mesmo que se admita a presença
de um arquivo básico de informações310.

264
Trata-se de uma questão de fundamental importância, pois
extremamente útil à compreensão de que a interação de Direito Tributário
e contabilidade deve ser analisada sempre com muita atenção, sob pena de
a norma tributária capturar elementos patrimoniais incompatíveis com
conceitos jurídicos. Não se pode ignorar o fato de que o direito tem
autonomia para elaborar as suas próprias definições, sem que para isso
esteja vinculado a eventuais qualificações levadas a efeito por outras
ciências, como é o caso da economia e da contabilidade.

A pluralidade de conceitos indica ausência de subordinação, uma vez


que renda e receita jamais poderão ser tidas como uma definição
especialmente afeita a uma dada ciência. Ainda que possam existir
semelhanças entre os conceitos jurídico, contábil e econômico (o que
ocorre em grande número), eles irão divergir se os pressupostos e objetivos
adotados se modificarem, o que implicará a existência de uma série de
definições certas, ainda que nenhuma delas possa ser considerada
verdadeira.

Em outros termos, a contabilidade busca antever resultados, o que tem


impacto direto sobre a forma como determinados ativos e passivos serão
registrados, e de que forma e em qual momento as suas mutações serão
reconhecidas. Desse modo, não há qualquer impedimento para que o
registro contábil esteja baseado em expectativas acerca da ocorrência de
transações, tampouco para que ele não se vincule à forma do negócio
jurídico celebrado, sempre que houver, sob a ótica contábil, uma
divergência entre substância econômica e forma jurídica.

Justamente por isso, não se cogita a possibilidade de que o padrão


IFRS, considerado em sua totalidade, sirva como ponto de partida para a
base de cálculo dos tributos que incidem sobre receitas e sobre o lucro.

265
Sem que sejam necessárias maiores digressões, admite-se uma evidente
diversidade de objetivos e parâmetros entre os critérios contábeis e fiscais,
o que tem como resultado um distanciamento natural, resultado da
relativização, pela contabilidade, de regras absolutamente caras ao Direito
Tributário, com especial destaque para a realização.

Ademais, a análise do cenário brasileiro não pode ignorar dois pontos


fundamentais verificados em outras jurisdições: (i) como regra, o padrão
IFRS é utilizado apenas em demonstrações financeiras consolidadas, que
não servem como referência para apuração do imposto de renda das
pessoas jurídicas, que se valem de demonstrações financeiras individuais;
(ii) não se cogita de uma irrestrita adoção das normas internacionais de
contabilidade para fins tributários.

Portanto, pode-se afirmar que a Lei n. 11.638/2007 não tinha (e nem


poderia ter) qualquer pretensão de natureza tributária em suas origens. O
objetivo declarado do legislador era inserir o Brasil no contexto global de
harmonização de práticas contábeis, de modo a reduzir a assimetria da
informação311, permitir uma maior comparabilidade entre demonstrações
financeiras e, por consequência, fomentar um incremento do fluxo de
investimento entre países. Justamente por isso, em momento algum
defendeu-se a superioridade do novo resultado contábil para fins
tributários. Em outras palavras, se as mudanças decorrentes dessa
convergência iriam gerar repercussões fiscais, diretas ou indiretas, elas não
haviam sido discutidas ou mensuradas.

O cenário descrito acima, de aparente subordinação da legislação


tributária ao resultado apurado segundo regras contábeis, pode causar
estranheza ao intérprete de hoje, mas fazia o mais absoluto sentido até 31
de dezembro de 2007.

266
Conforme já mencionado ao longo do presente trabalho, a realidade
brasileira demonstrava que a contabilidade era elaborada com base em
critérios que a colocavam em uma posição de elevada proximidade com
princípios essenciais ao Direito Tributário, de modo que os ajustes eram
realmente uma situação anormal.

Em razão disso, não havia qualquer impedimento a que a lei fizesse


remissão ao resultado apurado segundo os princípios de contabilidade
geralmente aceitos, cujo fundamento legal ainda hoje se encontra
positivado na Lei n, 6.404/76. Em outras palavras, era natural que o
legislador tivesse feito remissão ao resultado apurado segundo a
contabilidade e que os efeitos de eventuais modificações de práticas
contábeis, naquele contexto específico, tivessem repercussões tributárias
imediatas.

Essa situação precisa ser reavaliada, no entanto, sempre que as regras


contábeis forem objeto de alterações decorrentes de mudanças estruturais
na própria forma de compreensão da realidade. Dito de outro modo, toda
vez que o resultado contábil incorporar pressupostos contrários ao direito
positivo (e esse deve ser o limite), o ajuste (desvio) deve ser tido por
obrigatório e não dependerá de uma atuação do legislador nesse sentido,
uma vez que o seu fundamento de validade poderá ser buscado
diretamente junto ao conceito jurídico de renda.

De todo modo, não se pode negar que uma atuação prévia do legislador,
no sentido de prever a neutralidade dos efeitos tributários das novas
práticas contábeis deve ser visto com bons olhos, por colocar em compasso
de espera os possíveis reflexos que não tenham sido objeto de um estudo
mais aprofundado pela comunidade jurídica, garantindo uma menor
litigiosidade e maior segurança jurídica.

267
6. CONCLUSÕES

A modernização da economia e a facilidade de acesso aos mercados


muitas vezes podem fortalecer a hipótese de mercados eficientes e gerar a
falsa impressão de que se deva admitir como pressupostos da mensuração
de ativos, pela contabilidade, elementos como objetividade e certeza, ao se
adotar valores de mercado.

Partindo-se dessa premissa, não haveria óbices à adoção, pelo Direito


Tributário, de valores utilizados pela Contabilidade para fins de
mensuração da base de cálculo de um determinado tributo, uma vez que a
leitura contábil dos eventos patrimoniais evidenciaria uma situação mais
próxima da capacidade contributiva. Entretanto, em tempos de
questionamentos sobre a veracidade da hipótese de mercados eficientes,
principalmente em tempos de ascensão de teorias relacionadas ao
behavioral economics, evidencia-se a ausência de racionalidade do
comportamento dos mercados e a constatação de que os valores de
transações anteriores podem não evidenciar o verdadeiro valor de
determinado ativo.

Os valores de saída atualmente utilizados pela contabilidade, além de


não estarem desvinculados de subjetividade, retratam expectativas ativas
ou passivas de benefícios econômicos futuros.

Ocorre que, para fins de incidência do imposto de renda, a variação


patrimonial contábil oriunda de registros de performances futuras da
entidade não é condição suficiente para a configuração da hipótese de
incidência. Portanto, para fins de incidência tributária, faz-se necessário
que o acréscimo patrimonial ocorra por meio de negócios jurídicos

268
definitivamente realizados, motivo pelo qual as variações retratadas pela
contabilidade que evidenciem expectativas devem ser expurgadas.

269
Desafios da tributação doméstica de
operações com software na era da economia
digital
Paulo César Teixeira Duarte Filho312 e Arthur Pereira Muniz Barreto313

1. INTRODUÇÃO

Há 30 anos, o conceito jurídico de software era incluído no nosso


ordenamento pela Lei n. 7.646/87, sendo entendido como:

a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou


codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário
em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos
ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los
funcionar de modo e para fins determinados314.

Dez anos depois, a Lei n. 9.609/98, que a revogou e passou a regular a


proteção da propriedade intelectual do programa de computador, sua
comercialização, dentre outros, manteve em seu art. 1º a mesma redação.

Como se depreende de seu conceito, o software é, por essência, um bem


intangível, que pode ser materializado ou não em uma plataforma ou
suporte físico, este, quando presente, servindo como simples veículo. Esse
bem intangível pode ter duas funções básicas: controlar as tarefas de um
computador, sendo conhecido então como software de sistema; ou
executar as tarefas necessárias ao desenvolvimento do trabalho de quem o
utiliza, assim chamado o software aplicativo. Além disso, pode ser
desenvolvido de maneira estandardizada, em escala, tendo em vista um
público amplo, sendo conhecido por software de prateleira; ou sofrer
algum grau de customização, seja sobre um software pré-existente ou de

270
prateleira ou feito integralmente para atender as necessidades de um
determinado usuário, assim chamado o software por encomenda.

Todas essas nuances são importantes para entendermos o complexo


aranzel que se tornou a tributação das diversas transações com software.

No ano de 1998, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluía


julgamento paradigmático315 em que se discutia um dos principais vetores
para definir a tributação indireta aplicável a software: sua forma de
desenvolvimento e padronização – se por encomenda, customizado ou em
escala. Em análise negativa do conceito de licença ou cessão do direito de
uso, o STF veio a definir que a tributação do dito software “de prateleira”
seria pelo Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS),
equiparando esse tipo de software à mercadoria posta no comércio. O
posicionamento do STF pela possibilidade de incidência do ICMS foi
reiterado no ano seguinte, com base no precedente de 1998316. Mais de
uma década depois, o STF admitiu, pela primeira vez, que tal incidência
também existiria na comercialização de software com transferência via
transferência de dados pela internet (download)317.

A doutrina também buscou fazer uma diferenciação entre os tipos de


software, com base em seu desenvolvimento ou padronização – “de
prateleira” ou “por encomenda” –, sejam eles desenvolvidos para atender
as necessidades de certo cliente ou aqueles customizados, tomando como
base um software de prateleira e adaptando-o para as necessidades
específicas do usuário318.

Esses últimos tipos, dada sua característica de não estandardização,


mas, sim, de individualização do software de acordo com as necessidades
específicas do cliente, foram aproximados pela jurisprudência e por parte

271
da doutrina à figura da prestação de serviços, sendo, desta forma,
submetidos à tributação pelo Imposto sobre Serviços (ISS), e não pelo
ICMS. Não se nega que, em qualquer caso, o software possui natureza
imaterial, não se confundindo com o suporte que lhe permite a
distribuição; não obstante, a forma como era produzido tornou possível
indicar campos de incidência tanto de um, quanto de outro imposto319.

Como se verá, também o entendimento do fisco evoluiu paralelamente


ao desenvolvimento da economia digital, ainda que sem a adequada e
complementar evolução da legislação. Pareceres normativos, soluções de
consulta e instrumentos assemelhados são usados pelo fisco para
manifestar sua posição sobre o assunto, muitas vezes gerando conflitos de
competência dentre os entes federados, fazendo-se necessário definir seus
limites. A perda de referenciais, mesmo que altamente discutíveis como o
suporte físico no caso de download de software pela internet, leva também
à insegurança jurídica, seja pela dificuldade de o contribuinte entender
suas obrigações tributárias, de um lado, seja, de outro, pelo frequente
“oportunismo” das autoridades fiscais para buscar, na indefinição
conceitual, a possibilidade de aumento da arrecadação tributária.

Os fatos acima demonstram que, desde o início das discussões sobre


tributação de software, tanto o contribuinte, a jurisprudência, quanto a
doutrina e o próprio fisco tiveram que lidar com a dificuldade de buscar,
na base legal então vigente, categorias que permitissem o mais adequado
(ainda que não ideal) enquadramento da figura do software e suas
transações, que ganhou expressiva relevância nas últimas décadas, com o
acelerado desenvolvimento da economia digital. Apesar de as discussões
envolvendo software “de prateleira” ou outros tipos já somarem décadas,
os desafios da economia digital apenas amadurecem e tomam novas

272
formas, esgotando os modelos de discussão e impondo maiores desafios ao
intérprete.

Exemplo singelo de tal evolução é a possibilidade de download de


programas de computador, que já chegam ao usuário sem qualquer suporte
físico, outrora elemento determinante para a tributação, visto que seu valor
servia de parâmetro à base de cálculo do ICMS, por exemplo. Ademais, a
facilidade que a internet proporciona a seus usuários permite se pensar
mesmo em situações em que, pelo simples acesso a uma página eletrônica,
pode-se baixar os programas de preferência, já com especificações
desejadas, obtendo-se, assim, um software individualizado a gosto. A
maleabilidade do software e suas várias formas de se apresentar
demonstram serem insuficientes os critérios levantados até o momento
para sua tributação, sendo necessário repensar constantemente sua relação
com o sistema tributário.

O objetivo do presente artigo, portanto, é levantar os principais


elementos que, atualmente, permitem definir a tributação das operações
envolvendo software no Brasil, com base em uma visão crítica.

Não se buscará, pelo presente trabalho, fixar tese definitiva sobre o


correto enquadramento das operações com software nas categorias do
Direito Tributário; tentar-se-á, outrossim, sugerir alguns parâmetros e
premissas para a melhor aplicação da legislação.

2. QUALIFICAÇÃO DAS TRANSAÇÕES COM SOFTWARE

Há muita confusão sobre os aspectos tributários com as transações


envolvendo software. Fazendo uma leitura sistemática da jurisprudência e
da legislação tributária, podemos qualificar as operações com software e

273
suas consequências tributárias de três maneiras, que podem ou não andar
juntas:

a. Direito:
• cessão de direito: a cessão ou transferência definitiva de todos os direitos
patrimoniais sobre o bem, como marca, patente, tecnologia ou bem material
configurado em software, é remunerada por preço. É uma aquisição/venda e
não locação de um direito, é a aquisição/venda de direito próprio, não o direito
de uso de um direito alheio. Um exemplo: a Microsoft ceder a uma outra
empresa os direitos sobre o Windows, passando seu adquirente ou cessionário
a exercer todos esses direitos, como desenvolvimento do próprio software,
exploração econômica, exploração da marca etc.
• licença ou cessão de uso de direito: por seu lado, a remuneração pela licença
de exploração, por tempo determinado ou indeterminado sob condição, é
denominada royalty, praticamente um aluguel daquele direito ou a
transferência de parte dele, podendo ser oneroso ou gratuito. Exemplo disso é
a licença para distribuição ou reprodução de um software a um distribuidor em
outro país.
b. Mercadoria: por conta do tipo de padronização e desenvolvimento, o
software produzido em escala e direcionado a um número indefinido de
pessoas, é tratado como mercadoria, e as transações podem ser de dois tipos,
independentemente do meio de transmissão, se por via física ou não
(download). Embora a jurisprudência e grande parte da doutrina não façam
essa distinção, a nosso ver, as transações têm as seguintes naturezas:
• venda ou doação: a transferência (circulação econômica) dos direitos sobre
cópia de um software produzido em larga escala, seja essa transferência via
meio físico (pendrive, CD-Rom etc.) ou por download. Neste caso, pelo
entendimento da jurisprudência, há a transferência de uma mercadoria
acabada, independente e pronta para uso ou aplicação pelo adquirente. Em
nossa visão, a circulação de mercadoria só se concretiza, caso haja a
transmissão definitiva da cópia, sem limitação no tempo.
• locação ou comodato (cessão de uso): transferência dos direitos sobre cópia
de um software produzido em larga escala, seja por meio físico ou não, por
tempo determinado, tem natureza de locação ou comodato caso seja onerosa
ou gratuita, muito próxima da licença ou cessão de uso de direito, no item “a”
acima. A diferença, aqui, se dá pelo caráter do software de prateleira, tão e
somente neste caso. Sua remuneração se chama aluguel (próxima ao conceito
de royalties).
c. Serviço: o software customizado, aquele desenvolvido e produzido do início,
e aquele pré-existente ajustado, alterado ou atualizado, todos por encomenda
do usuário, têm natureza de serviço. A remuneração pelo serviço se chama
preço.

274
Para que se consiga determinar a incidência dos tributos sobre
transações com software, precisa-se, portanto, ter claro o tipo de:

a. desenvolvimento ou padronização do software, se de prateleira ou não; e


b. transação econômica envolvendo o software.

A seguir, comentamos sobre cada um desses itens.

2.1. Direito

Os direitos sobre o software, como vimos acima, podem ser explorados


economicamente de diversas maneiras, sendo as principais sua cessão e
sua licença. Enquanto a cessão pressupõe a transferência da titularidade do
direito de propriedade intelectual para um terceiro, seja de maneira
onerosa ou gratuita, a licença refere-se à transferência do direito de uso,
não da titularidade.

Na cessão, caso onerosa e caso ambas as partes, cedente e cessionário,


sejam residentes no país, incidirão apenas os tributos referentes à receita e
ao ganho de capital: sobre o ganho de capital, incidirão Imposto de Renda
das Pessoas Jurídicas – IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido – CSLL, para pessoa jurídica, e Imposto de Renda da Pessoa
Física – IRPF, para pessoa física; já sobre a receita oriunda da cessão do
direito, também podem incidir a Contribuição ao Programa da Integração
Social – PIS e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social
– COFINS, para a pessoa jurídica, dependendo da característica deste bem
no ativo da empresa. Se a cessão for gratuita, estamos diante de uma
doação e, portanto, podendo estar sujeita ao Imposto de Transmissão
Causa Mortis e Doação – ITCMD.

Quando se trata de licença, a remuneração assemelha-se a uma locação,


estando, assim, sujeita aos mesmos tributos: IRPJ e CSLL, para pessoa

275
jurídica, caso haja lucro; IRPF, para as pessoas físicas; PIS e COFINS
incidirão sobre a receita oriunda dessa transação.

No caso de transações internacionais envolvendo pessoas residentes no


Brasil, as características, obviamente, não se alteram. Contudo, os tributos
diferem.

No caso de cessão de software, em que a pessoa residente no Brasil


adquire o direito à titularidade desse bem imaterial, o pagamento do preço
está sujeito à incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte – IRRF, à
alíquota de 15% (art. 709 do Regulamento do Imposto de Renda de 1999 –
RIR/1999).

Já os pagamentos a residente no exterior pela licença do software – aí


inclui-se, por exemplo, o direito de comercializar ou distribuir o software –
têm natureza de royalties e, assim, estão sujeitos aos tributos atinentes.
Não se pode confundir a licença do direito e, com ela, o pagamento de
royalties, com o pagamento de remuneração por prestação de serviços, que
podem ou não acompanhar a licença; isso porque, muitas vezes, os
contratos envolvendo licença de uso de software incluem serviços
diversos, como assistência em instalação, treinamento, help-desk etc. Os
aspectos tributários sobre esses pagamentos são distintos e serão
examinados abaixo, em item próprio.

Essa é, também, a posição da Receita Federal do Brasil, como se pode


observar da Solução de Consulta Cosit n. 154/2016 e da Solução de
Divergência Cosit n. 18/2017. Por se tratar a remuneração pela licença de
royalties, haverá incidência de IRRF à alíquota de 15%, nos termos do art.
709 do RIR/1999. A incidência da CIDE, por seu lado, somente ocorrerá
no caso de transferência do código fonte320.

276
Além dos tributos acima especificados, em ambas as situações, cessão
ou licença, no momento da remessa o cessionário ou licenciado deverá
recolher, sobre a transação de câmbio, o IOF à alíquota de 0,38%.

Um problema surge, porém, em relação à licença do direito de uso do


software e à lista de serviços anexa à Lei Complementar n. 116/2003.

O item 1.05 da lista traz como “serviço” para fins de ISS o


“licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computador”.
Essa qualificação, em nosso entender, é absurda. Muitas vezes sim, a
licença do direito de uso está atrelada a uma prestação de serviço, como
aquela constante do item anterior da lista, o 1.04, que trata da “elaboração
de programas de computadores”, dentre outros. Contudo a licença e o
serviço não se confundem e devem ser considerados separadamente
também para fins tributários.

O dito licenciamento listado é, claramente, uma obrigação “de dar”.


Não se está mais a tratar da elaboração ou preparação do programa de
computador, mas, sim, de seu licenciamento, ou entrega do direito a
adquirente, predeterminado ou não. Essa entrega se formaliza por meio de
uma licença, que tem natureza distinta de uma prestação de serviços.
Como será discutido em relação ao item 1.04, logo abaixo, é comum que a
cobrança pelo software elaborado se dê de duas formas: sobre a confecção
e sobre a licença – e sobre esta segunda parte (inserida no item 1.05, da
lista de serviços), é inviável falar-se em incidência do imposto municipal.

Vale destacar que o tema quanto à constitucionalidade da incidência do


ISS sobre licenciamento de software, quando desenvolvido para clientes de
forma personalizada, está pendente de julgamento no STF, no âmbito do

277
Recurso Extraordinário n. 688.223, o qual teve repercussão geral
reconhecida.

Embora o STF ainda não tenha concluído se tal tributação é


constitucional, ressalta-se que o tribunal já discutiu, em outro contexto, a
questão ISS e a obrigação de dar.

A legislação que antecedeu a Lei Complementar n. 116/2003 (Decreto-


Lei n. 406/68), e que tinha sua própria lista de serviços tributáveis, incluía
o item “locação de bens móveis, inclusive arrendamento mercantil” (item
79). Tratando do item, o STF consolidou jurisprudência no sentido da não
incidência do ISS nesses casos, conforme Súmula Vinculante n. 31, do
tribunal, pela qual “É inconstitucional a incidência do Imposto Sobre
Serviços de Qualquer Natureza – ISS sobre operações de locação de bens
móveis”.

O STF já estendeu tal entendimento à cessão dos direitos de uso de


marca, por exemplo321. Em outro acórdão, o STF reconheceu a
repercussão geral da questão constitucional e assentou não incidir o ISS
sobre locação de bens móveis, incluídos aí os filmes, videoteipes,
cartuchos para games e assemelhados322. Não o fez, ainda, em relação ao
software, mas a semelhança entre as hipóteses é evidente. No caso de
licença do direito de uso de software, tem-se situação paralela à cessão dos
direitos de uso de marca, em que há, não obrigação de fazer, mas de dar.
Este, inclusive, foi o principal argumento usado pelo tribunal para fixar a
tese quanto à inconstitucionalidade da incidência do ISS sobre a locação
de bens móveis. Somente obrigação de fazer, esforço desenvolvido em
favor de outrem e tendente à produção de certa utilidade, é que pode ser
considerada serviço323.

278
Diante do exposto, tanto o item 1.04 quanto o 1.05 da lista de serviços
tributáveis que fazem referência a operações com software, levantam
questionamentos de duas ordens: primeiro, quanto à sua limitação aos
programas de computador elaborados sob encomenda (customizados); e,
segundo, no que diz respeito à possibilidade de incidência do ISS sobre a
parcela da remuneração pelo software que diz respeito à licença, não à
atividade de confecção, elaboração em si, e que se assemelha a uma
entrega de bem (obrigação de dar), ainda que imaterial.

2.2. Mercadoria

2.2.1. Aspectos gerais do software como mercadoria

Segundo o conceito legal de software, este “expressa” um “conjunto


organizado de instruções” que depende de aplicação em certos
equipamentos, como computadores, para que possa funcionar. A definição
menciona, ainda, o “suporte físico de qualquer natureza”.

O suporte físico permitia, assim, a “materialização” do programa,


tornando-o tangível, tal como um livro viabiliza, fisicamente, a veiculação
das ideias nele contidas, e que são obra intelectual, imaterial. O “Pacote
Office” da Microsoft, por exemplo, era até há pouco adquirido somente via
CD-ROM, em caixas vendidas em lojas físicas. Essa noção de software,
particularmente quando vendido a usuários de maneira uniforme e
padronizada, foi um dos elementos que o aproximaram da noção de
mercadoria, no sentido de bem móvel inserido no comércio, isto é, objeto
da atividade mercantil324: os CDs eram embalados em caixas, ficavam
dispostos em lojas, ao lado de mercadorias como canetas, papel,
impressoras, misturando-se entre elas.

279
Trata-se de uma aproximação problemática, quando se tem em mente
que não se está a adquirir, precisamente, um bem físico, mas, via de regra,
uma licença de uso daquele programa, ainda que tal licença não sofra
limitações temporais, por exemplo. Aquela matéria era apenas um veículo
para se chegar ao verdadeiro fim, à sua funcionalidade, imaterial. Essa
constatação leva alguns autores a questionar as distinções elaboradas pela
doutrina e pela jurisprudência, chegando à conclusão de que não há que se
comparar software a uma mercadoria, salvo transferência integral de todos
os direitos a ele inerentes, tal como se houvesse a transferência de
propriedade de certo bem, por exemplo325. Noutros casos, o que há,
apenas, é a concessão de uma licença, a qual é remunerada na forma de
royalties.

Como se viu, o STF decidiu repetidas vezes que o software deve ser
tratado como mercadoria, quando padronizado e produzido em escala,
chamando-o de “software de prateleira”, e, por via de consequência, as
transações com este tipo de software estariam sujeitas ao ICMS.

Postas tais premissas, é possível resgatar, para efeitos didáticos, a


clássica diferença entre obrigações “de dar” e obrigações “de fazer”,
muitas vezes utilizada para definir a extensão da competência dos entes
federados. Assim, no caso de obrigação de dar, o elemento determinante
da operação é a entrega de certo bem; por outro lado, no caso de
obrigações de fazer, o adquirente pretende que o prestador desempenhe
certa atividade que lhe resulte em alguma utilidade, a qual pode, ou não,
resultar na entrega, também, de mercadorias, a qual é, ainda assim,
meramente secundária diante da operação, quando vista como um todo.

Quanto a este ponto, Aires F. Barreto explica que a obrigação de dar


“consiste em vínculo jurídico que impõe ao devedor a entrega de alguma

280
coisa já existente” e, prosseguindo, anota que as obrigações de fazer
“impõem a execução, a elaboração, o fazimento de algo até então
inexistente326”.

No caso da comercialização de software de prateleira, tem-se que o


“produto” é entregue pronto e acabado aos consumidores; estes não
buscam, junto ao fornecedor, que lhe preste certa atividade utilitária
específica e personalizada, mas, tão somente, a aquisição de um programa
de computador padronizado e pronto para entrega. Daí surgir a ideia de se
aplicar, às operações envolvendo software de prateleira, a noção de
obrigação de dar, que é utilizada para definir os casos de incidência do
ICMS. Portanto, também por este motivo, os programas de computador
padronizados foram tratados como mercadorias, sendo, assim, sujeitos ao
imposto estadual.

Até recentemente, a padronização do software era fator determinante


para definir sua tributação.

Nem por isso, era tarefa simples determinar como sujeitar o software à
tributação indireta, já que é um bem intangível. Por esse motivo, ao
mesmo tempo que se buscou adequar um dos tipos de software à noção de
mercadoria, procurou-se estabelecer critério de base de cálculo, o que foi
feito a partir de seu suporte material.

Em São Paulo, por exemplo, o ICMS era calculado, no caso de


comercialização de programas de computador, tendo por base de cálculo
“o dobro do valor de mercado do seu suporte informático” (art. 50,
revogado, do Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo –
RICMS/00). Interessante notar que esse dispositivo fazia alusão ao

281
software “personalizado ou não”, o que dava margem a críticas pelo
possível alargamento da competência tributária do fisco estadual.

Já no âmbito federal, outros exemplos indicam o mesmo caminho. O


Imposto de Importação – II incide sobre importação de software, tendo
como base de cálculo o valor de seu suporte físico (art. 81, do
Regulamento Aduaneiro). Essa diretriz tem por fundamento o conceito de
valor aduaneiro, tendo sido adotada, por este motivo, também para fins da
Contribuição ao PIS-Importação e da Contribuição para o Financiamento
da Seguridade Social sobre Importações – COFINS-Importação, bem
como para o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI incidente nas
operações de importação de software. Há, inclusive, códigos tarifários
específicos para os suportes físicos, como o CD-ROM, usados para fins de
registro da Declaração de Importação.

Construiu-se, dessa maneira, a noção de que o software pode, sim, ser


tratado como mercadoria, desde que comercializado em larga escala e sem
a personalização típica das prestações de serviço; ademais, para que se
viabilizasse a tributação das operações envolvendo esse tipo de software,
era necessário tomar por base seu suporte físico: disquete, CD-ROM etc.
Essa noção permeou, portanto, a tributação tanto no nível estadual quanto
no federal.

Tomando o entendimento do STF como base, os presentes autores


podem até admitir certa aproximação de alguns tipos de software com
mercadorias para fins tributários, contudo dentro de requisitos mínimos e
imprescindíveis e diferenciando quando se tem circulação de mercadoria
tributada pelo ICMS, quando não:

a. requisito para ser tratado como mercadoria: que seja o software aquele
“de prateleira”, padronizado, comercializado de maneira uniforme no

282
mercado, como determina o STF;
b. circulação de mercadoria – software de prateleira sujeito ao ICMS: seja a
cópia de aplicação do software definitiva, não retornável, ou sua licença
concedida por prazo indeterminado;
c. locação ou licença de uso por prazo determinado – software de prateleira
não sujeito ao ICMS: nesta situação, haverá apenas a remuneração pelo uso
temporal de um direito, tal como se dá, por exemplo, na locação.

Na hipótese “c”, de licença de uso ou locação do software de prateleira,


a remuneração não sofreria incidência do ICMS e, como também não se
constitui um serviço, tampouco do ISS.

Admitimos que essa qualificação poderia levar à não tributação de


operações de licenças por prazos determinados, mas renováveis
indefinidamente, trazendo um desequilíbrio em relação às operações
descritas no item “b”, onde há circulação de mercadoria sujeita ao ICMS.
Entretanto não pode a interpretação do direito resultar em fato gerador
fictício, pela falta de tributo próprio sobre este tipo de operação. Há outros
instrumentos que podem ser usados, por exemplo pelo fisco, caso haja
abuso nas operações, apenas para se evitar ou desvirtuar a ocorrência do
fato gerador.

2.2.2. Transferência via download do software como mercadoria

Dito isso, um simples passo à frente no desenvolvimento e


comercialização dos programas de computador colocou em xeque todo
esse arcabouço: seu “descolamento” do suporte físico e o aumento
correspondente da relevância da internet na veiculação de conteúdos e
dados. Neste sentido, a possibilidade de download dos programas de
computador, a partir de um computador pessoal pela internet, sem
qualquer necessidade de veiculação via suporte físico, vem forçando fisco
e legislador a se reinventarem para definir a tributação do software.

283
De fato, na concepção do STF não é porque o software vem deixando
de ter suporte físico, que deixa também de poder ser mercadoria, ao menos
pela noção, acima discutida, de que, sendo “de prateleira”, é
comercializado como qualquer outro tipo de bem a um número indefinido
de consumidores327. Como já exposto, mesmo no caso de download, o que
ocorre é a entrega de cópia do software para uso do adquirente, atendidas
as condições definidas em contrato, de modo que, também aqui, na visão
da jurisprudência, favorece-se a aproximação do software de prateleira à
espécie de mercadoria. Contudo, sem o suporte físico, isto é, sem base de
cálculo, como tributar?

Um exemplo claro de como tal mudança de paradigma influiu na


tributação dos programas de computador na modalidade padronizada pode
ser verificado na Solução de Consulta RFB n. 5/2013, da Secretaria da
Receita Federal do Brasil. Nessa consulta, tratando da tributação das
importações de software, via download, o fisco federal reconheceu que, na
ausência de suporte físico, não haveria incidência, quando do pagamento
ao exterior, do II, IPI, PIS-Importação e COFINS-Importação. Ainda,
seguindo o entendimento tradicional, no sentido de que o software de
prateleira é mercadoria, decidiu-se pela não incidência, também, do IRRF
e da CIDE.

A falta de base legislativa para suportar a incidência de cada tributo


federal sobre a importação de mercadoria, como II, IPI, PIS-Importação e
COFINS-Importação também sobre a importação de software, transferido
por download, é o que, em nossa visão, ainda impede a Receita Federal de
cobrá-los, pois a justificativa de ser ou não mercadoria está, de certa
forma, sendo superada pela jurisprudência.

284
Do lado do ICMS, a situação se desenvolve de forma mais rápida. A
possibilidade de aquisição de software por download levou a mudanças na
legislação estadual. Fazendo referência à legislação paulista, o Governo do
Estado revogou a antiga previsão quanto à tributação de software pelo
dobro do valor de seu suporte físico. Tal mudança teve por objetivo alterar
a base de cálculo do ICMS no caso de operações envolvendo software, que
passou a seguir a regra geral, isto é, o valor da operação.

Na prática, como o valor do componente intangível é muito superior ao


do “CD-ROM”, por exemplo, o potencial de arrecadação do ICMS neste
âmbito teve repentino aumento. Destaque-se que o Estado implementou
redução de base de cálculo nessas operações, para reduzir a tributação ao
patamar de 5%, em consonância com o Convênio ICMS n. 181/15.

O Governo do Estado de São Paulo ainda não estava a exigir o ICMS


nas operações com software via download, aguardando regulamentação do
tema pelo Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ. No dia 6
de outubro de 2017, o CONFAZ publicou o Convênio n. 106, para
disciplinar “os procedimentos de cobrança do ICMS incidente nas
operações com bens e mercadorias digitais comercializadas por meio da
transferência eletrônica de dados”, e conceder isenção “nas saídas
anteriores à saída destinada a consumidor final”.

O Convênio n. 106 aproxima a tributação do software e de outros “bens


e mercadorias digitais” da nova realidade econômica digital. O Convênio
abrange os bens digitais “padronizados, ainda que tenham sido ou possam
ser adaptados” (cláusula primeira), o que parece restringir seu alcance ao
software de prateleira, mesmo que possua certa flexibilidade para
adaptação. Traz, ainda, toda a hipótese de incidência do ICMS nessas
operações, dispondo, por exemplo, que: o imposto é devido para o Estado

285
em que situado o adquirente do software (cláusula terceira); contribuinte é
a pessoa jurídica detentora da página eletrônica que venda o software,
sendo que deverá ter inscrição estadual nas Unidades Federadas em que
efetuar vendas (cláusula quarta), entre outros.

O Convênio n. 106 levanta uma série de questionamentos. Primeiro,


quanto à sua constitucionalidade. É possível afirmar que o Convênio criou
nova modalidade de incidência do ICMS? E nos casos em que os
programas de computador e outros bens digitais, tais como referidos no
Convênio n. 106, e desde que padronizados, já tinham resguardo das cortes
nacionais para serem qualificados como mercadorias sujeitas normalmente
ao ICMS, nos termos de sua previsão constitucional (CF/1988, art. 155,
II)? De outro lado, não caberia à lei complementar definir elementos como
contribuinte e local de ocorrência do fato gerador (CF/1988, art. 146, III,
“a”)? No mais, a isenção para operações anteriores àquelas com
consumidores finais poderia ter sido instituída por tal veículo normativo?
Há compatibilidade do referido Convênio com a Lei Complementar n.
87/1996 (“Lei Kandir”), por exemplo no caso de importação?328

Além dessas questões, surgem também dúvidas de ordem prática: uma


página eletrônica por meio da qual seja possível fazer o download de
programas, normalmente, é acessível a partir de qualquer unidade
federada. Quer isto dizer que as empresas que disponibilizam software
pela internet deverão possuir inscrição estadual em todos os Estados
brasileiros, mais o Distrito Federal?

A proposta fica ainda pior quando se pensa que, se o ICMS é devido


onde se realiza o download, terão as empresas, portanto, que apurar o
imposto devido a cada unidade federada, controlando a quantidade de
downloads efetuada em cada uma delas, aumentando os custos com

286
obrigações tributárias. Espera-se, como permite o Convênio, que os
Estados criem formas simplificadas, ou mesmo de dispensa, da inscrição
estadual.

Ademais, o que dizer de empresas que oferecem seus programas de


computador a partir de outros países? Do ponto de vista prático, embora
possa se aplicar o princípio de destino, impondo o recolhimento do tributo
pelo receptor do software, isso é, no mínimo, de difícil implementação
quando se trata de pessoas físicas, que fazem pagamentos via cartão de
crédito, muitas vezes sem individualização do item adquirido329. Isso quer
dizer que a empresa estrangeira deverá constituir subsidiárias ou filiais no
Brasil, ou ela própria ter inscrições estaduais pelos Estados?

Parte dessas questões parece ser solucionada pelo fato de o Convênio


ter isentado as operações prévias às com consumidores finais. A forma
como o Convênio trata a questão, portanto, parece levar à conclusão de
que, se uma pessoa adquirir certa licença de software com o propósito de
inseri-la no mercado, atribuindo-lhe função econômica (situação, logo,
diversa da aquisição de uma simples licença de uso), para subsequente
distribuição a outros clientes, não haverá incidência do ICMS na primeira
etapa, isto é, na operação de aquisição para revenda. Por outro lado, a
operação que destine o software a consumidor final, para seu próprio uso,
ficará sujeita ao imposto.

Por via de consequência, se, por um lado, o Convênio n. 106/2017 veio


para disciplinar tema que carecia de regulamentação mais atualizada,
consentânea com a moderna realidade tecnológica, por outro, trouxe novos
e complexos questionamentos que devem gerar novas disputas nos
tribunais, iniciando por sua própria possibilidade de existência e de
capacidade de regular tal matéria.

287
2.3. Serviço

Discutidas algumas das principais questões referentes ao software de


prateleira, ou padronizado, passa-se a discutir a questão quanto aos
programas de computador que tenham algum grau de personalização ou
“customização”.

2.3.1. Obrigações de dar e de fazer

Retomando a diferença quanto às obrigações de dar e de fazer, o


presente tópico trata das de segundo tipo, i.e. casos em que o fornecedor se
obriga, perante o adquirente, a desenvolver produto que lhe atenda às
necessidades específicas. Trata-se de obrigação de fazer que, não obstante,
envolve a entrega de um produto, qual seja, o software personalizado.

Neste ponto, merece menção o fato de que a Lei Complementar n.


116/2003, que institui, nacionalmente, as diretrizes e regras gerais do ISS,
inclui, na lista de serviços tributáveis, algumas atividades relacionadas às
operações com software.

Tendo por gênero o item 1 da lista de serviços (“Serviços de


informática e congêneres”), as operações com software, rapidamente
mencionadas no tópico 2.1 acima, encontram previsão nos subitens 1.04330
e 1.05331. Note-se que, em nenhum momento, faz-se diferenciação entre os
programas que sejam padronizados, ou não.

O primeiro subitem faz referência à atividade de elaboração de


software. O foco, portanto, é a atividade voltada à confecção do software,
sendo simples de se enquadrar, neste item, as operações com os programas
“por encomenda”, isto é, aqueles que são objeto de contratação junto a um

288
adquirente que almeje obter um software que seja compatível com seus
negócios, ou que atenda a necessidades específicas.

Trata-se de noção claramente equiparável à distinção entre software de


prateleira e customizado.

Contudo, o item 1.04 permite uma interpretação mais abrangente: se o


foco é a elaboração do programa, e não há nenhuma referência à sua
personalização, é perfeitamente admissível que se interprete tal dispositivo
como alcançando, também, qualquer programa de computador, mesmo
padronizado, já que o que se tributa é sua confecção.

Apesar de o programa elaborado, normalmente, ser transferido ao


encomendante via licença, a criação de um software “tailor made”
permite aproximar a atividade de uma prestação de serviço. Há que se
ressaltar, não obstante, que é comum haver a cobrança separada pelo
componente da atividade (serviço) e pela licença; somente sobre o
primeiro valor é que se admite a incidência do ISS.

2.3.2. Software como serviço e a “computação em nuvem”

Como vem sendo discutido no presente estudo, a tributação do software


passa pelo desafio de se adaptar à constante evolução tecnológica, que cria
novas modalidades de negócios, alheios à previsão legal, e que exigem do
intérprete verdadeiro exercício de adaptação, nem sempre frutífero.

Nesse contexto, nova funcionalidade que vem sendo oferecida no


mercado diz respeito ao armazenamento, de diversas formas, de dados de
clientes de maneira remota, em ambiente digital acessível por meio da
internet, também conhecido, popularmente, como “nuvem”. Daí a noção
de “computação em nuvem” ou cloud computing. No que é pertinente para

289
este trabalho, cumpre discutir brevemente o caso do software as a service
(SaaS), modalidade de hospedagem de dados online por meio de um
software específico. Trata-se de hipótese em que o cliente usufrui da
funcionalidade de um software, sem, no entanto, adquiri-lo. Paga-se uma
taxa ou mensalidade por seu acesso332.

Basicamente, o provedor da “nuvem” oferece ao cliente a oportunidade


de acesso ao software, o que parece se aproximar de uma obrigação de
fazer, mesmo porque é necessário garantir o funcionamento do software,
realizar atualizações etc. Contudo, a funcionalidade do software é
executada pelo próprio usuário, pois o detentor do software apenas permite
que o locatário usufrua de seu software por período determinado, contra
prestação de uma taxa ou mensalidade. O detentor do software, em
princípio, não presta qualquer serviço, embora o possa fazer como
assistência ao uso, ajustes etc. Esses serviços, quando existentes, são
extremamente secundários em relação ao negócio jurídico central, que é a
disponibilização da plataforma.

Nesse contexto, no SaaS não há entrega de bens, muito menos a venda


de qualquer mercadoria; por outro lado, embora possa haver serviços
secundários, como manutenção, assistência etc., não é, em essência, um
serviço, mas a disponibilização de uma plataforma para utilização pelo
assinante, uma locação de espaço ou de utilidades e instrumentos para uso
exclusivo do assinante: se há serviço, é do assinante para si mesmo. Posta
tal conclusão, não é evidente a possibilidade de incidência do ISS, por
exemplo, como querem os municípios brasileiros, em especial, o
Município de São Paulo. Além disso, mesmo que o fosse, nenhum dos
itens da lista de serviços tributáveis parece abranger a atividade.

290
Com efeito, em relação ao item 1.04, não há qualquer elaboração de
software dirigida ao cliente. Há, isso sim, disponibilização do ambiente
virtual previamente criado, ainda que seja possível, por exemplo,
“personalizar” a experiência de uso fornecendo maior capacidade de
armazenamento.

Quanto ao item 1.05, não há, exatamente, licença do software concedida


ao cliente. O que se paga é uma taxa pela hospedagem dos dados,
praticamente uma locação, e que pode variar, por exemplo, com o volume
armazenado. Destaque-se que o fisco municipal não tem o mesmo
entendimento, já tendo proferido soluções de consulta entendendo pela
incidência do ISS sobre a computação em nuvem333.

Outros itens da lista de serviços, que não se referem a qualquer forma


de exploração de software, tampouco têm aplicabilidade neste caso.

Conclui-se que não há como fazer incidir o ISS sobre a atividade de


SaaS, a não ser a serviços de assistência etc., caso em que devem ser
considerados separadamente. Vale ressaltar que, diante de tal dificuldade,
há um Projeto de Lei Complementar em tramitação no Congresso Nacional
com o objetivo, justamente, de alterar a lista de serviços tributáveis, para
que passe a contemplar tal serviço334.

Do ponto de vista do fisco federal, os pagamentos realizados ao exterior


a título de remuneração de SaaS, sofrem a incidência do IRRF à alíquota
de 15%, além de CIDE à 10%, pois são considerados serviços técnicos,
que dependem de conhecimentos especializados em informática e
decorrem de estruturas automatizadas com claro conteúdo tecnológico
(Solução de Consulta Cosit n. 191/2017). Esta não é nossa opinião, já
expressada acima: o ponto central do SaaS, embora o termo seja impróprio

291
se referindo a “services”, é a disponibilização, a locação da funcionalidade
do software ao cliente. Os eventuais serviços que a acompanham, são
secundários e não lhe retiram a essência.

2.3.3. Novas tentativas de tributação do software pelo fisco paulistano

Recentemente, para dar um exemplo que diz respeito ao Município de


São Paulo, a legislação que trata da tributação das operações envolvendo
software sofreu paradigmática alteração.

A Secretaria da Fazenda municipal publicou o Parecer Normativo n.


1/2017, segundo o qual “o licenciamento ou cessão de direito de uso de
programas de computação, por meio de suporte físico ou por transferência
eletrônica de dados (download de software), ou quando instalados em
servidor externo (Software as a Service – SaaS), enquadra-se no subitem
1.05 da lista de serviços (...)” (art. 1º). Ainda, dispõe o Parecer Normativo
que tal interpretação “independe de o software ter sido programado ou
adaptado para atender à necessidade específica do tomador (software por
encomenda) ou ser padronizado (software de prateleira ou off the shelf)”
(art. 2º).

O Parecer Normativo n. 1/2017 se autodetermina como “interpretativo”


(art. 3º). Não há dúvidas de que o fisco municipal teve a pretensão de
valer-se dos efeitos do art. 106, I, do Código Tributário Nacional, que
permite à lei aplicar-se a ato ou fato pretérito, em qualquer caso, quando
seja expressamente interpretativa. Em outras palavras: o fisco municipal
deverá fiscalizar os contribuintes que efetuaram a comercialização de
licenças de software, inclusive por download, e pretenderá fazê-lo,
também, em relação ao passado, dentro do prazo decadencial.

292
Ademais, é importante destacar que a pretensão fiscal se aplica,
expressamente, para qualquer tipo de software, seja aquele desenvolvido
de maneira customizada, ou não. Neste ponto, andou mais rigidamente o
fisco municipal, quando comparado ao estadual, que, por meio do
Convênio ICMS n. 106/2017, acima analisado, tratou apenas da incidência
do ICMS sobre programas de computador padronizados, mesmo que
passíveis de adaptação.

Além disso, a incidência do ISS, de acordo com o fisco municipal,


independe de haver, ou não, suporte físico. De certo modo, tal
posicionamento é coerente, inclusive com aquilo que foi dito acima: o fato
de haver, ou não, suporte físico, não deve ser determinante para alterar a
natureza jurídica do software sendo transmitido. Ocorre que, no caso do
ISS, admitir tal raciocínio, sem discriminação entre o software de
prateleira e o produzido por encomenda, é ampliar a competência tributária
do Município, por meio de uma indevida extensão de um conceito de
direito privado (serviço), violando-se, assim, o art. 110, do Código
Tributário Nacional335.

Comparando-se, assim, os recentes posicionamentos do fisco dos


Estados e dos Municípios, tem-se que surge uma importante margem para
conflito de competência entre o ICMS e o ISS, no que diz respeito à
tributação das operações envolvendo software.

3. OUTROS ASPECTOS TRIBUTÁRIOS: REGIME DO LUCRO


PRESUMIDO; PIS E COFINS

3.1. Regime do lucro presumido

A diferenciação entre os tipos de software e entre as diversas transações


promovidas pelas empresas com eles, tem impacto também em outros

293
tipos de tributos.

O Regime de Lucro Presumido para apurar e pagar o IRPJ e a CSLL é


diretamente influenciado pela distinção entre software de prateleira ou
customizado. Nessa modalidade de apuração do IRPJ e da CSLL, a
legislação prevê a incidência de tais tributos a partir de um percentual de
lucro presumido sobre a receita bruta da pessoa jurídica (Lei n. 9.249/95,
arts. 15 e 20).

No que diz respeito às operações com programas de computador, a


distinção entre software de prateleira e customizado é, mais uma vez, de
grande relevância. No primeiro caso, de programas padronizados, a se
entender que se trata de operações com mercadorias (reiterados, aqui, os
limites dessa aproximação), é com base nesta premissa que será definido o
percentual de lucro presumido aplicável. Deste modo, serão aplicáveis,
respectivamente, os percentuais de 8% e 12%, de modo que a tributação
efetiva, considerando uma alíquota conjunta, aproximada, de 34%, será de
6,8% sobre a receita bruta auferida no período (2,72% de IRPJ e 4,08% de
CSLL).

Esse entendimento já foi adotado pela Receita Federal, como se pode


observar na Solução de Consulta Cosit n. 123/2014. Referida consulta
adotou a diferenciação entre os tipos de software, chegando à conclusão de
que, para o software de prateleira, aplicam-se os percentuais para comércio
e indústria de 8% e 12%, e não o percentual que é especificamente voltado
às prestações de serviço.

Vale notar que a Solução de Consulta n. 123/2014 tratou apenas das


licenças de uso, comercializadas pela consulente em questão, de forma

294
coerente com o entendimento exposto na Solução de Divergência n.
18/2017, que equiparou tais casos à comercialização de mercadorias.

Já no caso de software customizado ou personalizado, situação na qual


se admite alguma equivalência com a noção de prestação de serviços336,
retoma-se o exposto na Solução de Consulta Cosit n. 123/2014, segundo a
qual, em regra, aplica-se o percentual de lucro presumido previsto para as
prestações de serviço em geral, isto é, 32%, tanto para o IRPJ, quanto para
a CSLL.

3.2. PIS e COFINS: regimes de apuração

Um outro assunto que merece referência, no que diz respeito à


tributação doméstica de operações envolvendo software, é a sua sujeição à
contribuição ao PIS e à COFINS (doravante, “as contribuições”). O tema
será discutido a partir das duas modalidades de apuração das
contribuições, isto é, os regimes cumulativo e não cumulativo.

Como se verá, para fins da incidência das contribuições, a distinção


entre software de prateleira ou customizado não tem a mesma relevância,
em comparação aos demais tributos pertinentes, acima discutidos.

3.2.1. Regime cumulativo

No regime cumulativo, as contribuições são calculadas, via de regra,


sobre a receita bruta da pessoa jurídica, à alíquota combinada de 3,65%,
não sendo admitido o registro de créditos.

Basicamente, compreende-se como receita bruta o faturamento de bens


e serviços; o resultado auferido nas operações de conta alheia; e outras
receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica.

295
Não parece haver grandes controvérsias no que diz respeito à incidência
das contribuições sobre operações com software, seja de prateleira ou por
encomenda. Em qualquer caso, o software será tratado como parte do
faturamento da empresa, de modo que as receitas decorrentes da atividade
ficarão sujeitas às contribuições.

3.2.2. Regime não cumulativo

No regime não cumulativo, as contribuições são calculadas à alíquota


combinada de 9,25%, sendo que se admite a exclusão, da base de cálculo,
de créditos específicos, listados na legislação pertinente (Leis n.
10.637/2002 e n. 10.833/2003). A base de cálculo é a receita bruta das
pessoas jurídicas, bem como todas as outras receitas auferidas.

Sendo o produto da venda de software, seja de prateleira ou


customizado, receita bruta da empresa, não há maiores dificuldades em se
definir que a incidência das contribuições deve ocorrer normalmente.

O principal aspecto a ser discutido quando às contribuições é a


possibilidade de crédito em relação às aquisições de software,
particularmente na modalidade de licença de uso. As leis que disciplinam
as contribuições estabelecem hipóteses restritas de creditamento, sendo,
para o presente caso, mais relevantes as seguintes hipóteses:

•bens adquiridos para revenda;


•bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na
produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda;
•bens incorporados ao ativo intangível, adquiridos para utilização na produção
de bens destinados a venda ou na prestação de serviços.

Quanto ao primeiro caso, tratando-se de pessoa jurídica que adquire a


licença de distribuição de um software (ex.: loja de informática que
adquire cópias de software e revende a seus clientes), parece ser possível

296
admitir o registro dos créditos, tal como se fosse um bem adquirido para
revenda. Quanto ao software obtido mediante licença de uso, e que pode
ter características de personalização, ou não, para uso próprio do
adquirente, esse item passa a ser inaplicável, sendo necessário avaliar as
outras hipóteses.

Em relação ao segundo item, a aplicação pressupõe a discussão a


respeito do conceito de insumo, para fins de crédito das contribuições337.
Admitindo-se interpretação mais abrangente, de que insumo é qualquer
despesa necessária às atividades da empresa, a aquisição de licenças de uso
de software que guardam relação com a atividade-fim da pessoa jurídica
poderia ser tratada como insumo, não havendo óbice ao creditamento
dessa despesa. Um bom exemplo é a aquisição por uma empresa de um
terceiro de módulos ou customização de um software mais complexo a ser
produzido pela adquirente e, posteriormente, vendido ou licenciado a seus
clientes.

Como se sabe, o entendimento do fisco é restritivo nessa matéria,


segundo o qual somente são insumos aqueles assim definidos conforme a
legislação do IPI, ou seja, aqueles itens diretamente aplicados na atividade
produtiva. Esse entendimento foi manifestado pelo fisco federal, por
exemplo, na Solução de Consulta n. 150/2012, que negou a possibilidade
de registro de créditos em relação à aquisição de software e sistemas
operacionais.

O STJ julgará, quanto a este assunto, o Recurso Especial n.


1.221.170/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos. A maioria parcial
é favorável aos contribuintes, pelo entendimento de que o conceito de
insumo atual deve ser alargado. O ministro relator, por exemplo,
posicionou-se no sentido de que o conceito de insumos baseado na

297
legislação do IPI é excessivamente restrito, adotando uma abordagem
pautada pelo critério das despesas necessárias à atividade da empresa,
típico da legislação do imposto de renda. Ainda que um critério tão amplo
não venha a prevalecer ao final do julgamento, há boas chances de que um
posicionamento favorável, mesmo que intermediário, seja o resultado
final.

Por fim, quanto ao último item, é necessário analisar os requisitos para


que um ativo possa ser contabilizado como intangível, nos termos do
Pronunciamento Contábil (CPC) n. 4, isto é:

•identificação: o ativo deve ser passível de separação do patrimônio da empresa


e vendido, transferido, licenciado, alugado, trocado; ou deve resultar de
direitos legais ou contratuais;
•controle: a empresa “controla” o intangível quando pode obter benefícios
econômicos futuros a partir dele, restringindo o acesso de terceiros a esses
benefícios;
•benefício econômico futuro: o benefício pode incluir as receitas decorrentes das
vendas ou prestações de serviço, redução de custos ou outros benefícios
decorrentes do uso do ativo. Neste sentido, o CPC 4 menciona expressamente
o uso de propriedade intelectual.

Deste modo, propriedade intelectual adquirida que possa ser explorada


para a obtenção de benefícios econômicos e que seja separável (um
software, marca, know-how, direito autoral, patentes etc.) pode ser
registrada como ativo intangível. Tem-se, assim, que a possibilidade de
crédito pressupõe, no mínimo, a autorização para firmar sublicenças com
terceiros, cobrando remuneração pertinente, como royalties.

Em suma, a conclusão a que se chega é que, quanto às contribuições, o


crédito das despesas de aquisição ou licenciamento de software é possível,
respeitados os requisitos acima e a forma correta de creditamento.

4. CONCLUSÃO

298
Buscou-se, com o estudo realizado, levantar os principais aspectos
relativos à tributação das operações envolvendo programas de computador,
particularmente doméstica, ainda que alguns comentários tenham sido
necessários em relação às operações internacionais envolvendo
consumidores brasileiros.

Como foi possível observar, décadas de estudos e jurisprudência se


sucedem, sem que se chegue a uma conclusão definitiva sobre a tributação
do software em suas diversas manifestações; favorece o cenário complexo
e desorganizado o fato de que, enquanto doutrina e jurisprudência tentam
se adaptar às novas realidades, essas já estão sendo sucedidas por outras,
como fica muito claro ao se analisar o impacto da possibilidade de
download de software às categorias e hipóteses tributárias até então
formadas pelos operadores do direito. Permeando todo esse contexto, há o
anseio da administração fazendária por adotar métodos interpretativos que
lhe permitam arrecadar mais tributos – o que acaba resultando em adoção
de critérios interpretativos, por vezes, até mesmo incoerentes entre o fisco
estadual, ou municipal, e o federal, por exemplo.

Tendo em vista que o tema continua sendo um desafio para os


estudiosos contemporâneos, é de grande relevância a distinção clara entre
os tipos de desenvolvimento do software e as formas de transação com
eles, qualificando-as como operações com mercadorias, serviços ou
direitos e, consequentemente, a tributação aplicável.

Assim, ainda importante é a diferença entre o dito software de


prateleira, ou padronizado, contraposto ao software confeccionado por
encomenda, personalizado ou customizado.

299
Viu-se que uma das principais marcas dessa distinção é o seu
“desrespeito” por parte do fisco estadual e municipal, o que se percebe
inclusive diante de recentes atos normativos expedidos pelas
administrações fazendárias que se, por um lado, tentam endereçar o tema
da tributação de software de maneira mais atualizada, criam margens até
mesmo para a sobreposição de competências tributárias, em particular
quanto ao ISS e o ICMS. Aguarda-se com grande expectativa o
julgamento, por parte dos tribunais superiores, de processos que serão
essenciais para solucionar tais impasses.

Na esfera federal, buscou-se abordar dificuldades práticas no


enquadramento das operações com software nas categorias tributárias
existentes, como no caso da aplicação dos percentuais de lucro presumido,
bem como da possibilidade de tomada de créditos da contribuição ao PIS e
da COFINS, por ocasião da aquisição de licenças de software.

Não há dúvidas de que o tema, já presente há tempo considerável no dia


a dia dos profissionais que lidam com o Direito Tributário, carece ainda de
estudos e discussões que permitam esclarecer as hipóteses e os limites à
incidência tributária, nas operações com software. Espera-se que o
presente estudo tenha contribuído para os debates que permeiam o assunto.

300
Preços de transferência e a criação de valor:
distribuição de software no Brasil
Alexandre Siciliano Borges338 e Igor Scarano Brandão339

1. INTRODUÇÃO

A discussão sobre os aspectos tributários da economia digital nunca foi


tão necessária quanto na atualidade. Ao redor do mundo, países
desenvolvidos e em desenvolvimento buscam adaptar ou alterar suas
regras tributárias para que a realidade econômica, fortemente influenciada
pelos negócios digitais, seja adequadamente capturada pela necessidade de
tributar dos Estados.

A maneira com que os consumidores se relacionam com os


fornecedores de bens e serviços vem mudando drasticamente com os
avanços tecnológicos da informatização, da comunicação e dos meios de
pagamento, em um mundo cada vez mais dependente de formas ágeis e
eficientes de comércio.

Neste panorama, não somente as distâncias diminuíram como também a


necessidade de pontos de venda físicos e de relacionamento presencial
entre fornecedores e clientes. Novos modelos de negócios globais surgiram
e novas maneiras de alocação de lucro dentro dos grupos multinacionais
também se tornaram possíveis. Na indústria de software, essa situação é
ainda mais acentuada, principalmente pelo fato de que as transações quase
sempre prescindem de um bem tangível, o que torna muito mais difícil a
percepção da riqueza gerada e, portanto, a adequada identificação da
capacidade contributiva.

301
Quando o assunto é preços de transferência, o princípio arm’s length340
continua a ser o padrão preconizado pelas diretrizes da OCDE
(Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico)341 que,
em sua nova versão, deu especial atenção para a relevância da alocação de
lucro com base na criação de valor. Ao relacionar a alocação de lucros
com a criação de valor no ambiente mencionado acima, deve-se falar sobre
transações envolvendo bens intangíveis e sua relevância para preços de
transferência.

Ao abordarmos as diretrizes da OCDE, iremos também fazer um elo


com a situação brasileira na análise de um caso prático hipotético. Embora
saibamos apontar os principais distanciamentos entre as regras brasileiras
de preços de transferência e as diretrizes da OCDE, somente quando
olhamos para uma indústria específica é que podemos refletir mais
profundamente sobre os impactos dessas diferenças.

A seguir, vamos explorar a nova redação das diretrizes da OCDE sobre


a criação de valor e a sua ligação com a alocação dos lucros de um grupo
multinacional na economia digital, usando a indústria de software como
pano de fundo.

2. PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA E A CRIAÇÃO DE VALOR

Não é novidade que nos últimos anos atenção especial tem sido dada
aos planejamentos tributários internacionais. Por diversas vezes, grandes
grupos multinacionais se viram envolvidos em notícias ao redor do mundo,
por conta de suas estratégias e opções tributárias, o que na maioria das
vezes causou enorme impacto negativo sobre a percepção pública de suas
marcas. Discussões em diversos âmbitos se desenvolveram, sendo que,
sem sombra de dúvida, as mais relevantes aconteceram no âmbito do

302
projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting) liderado pela OCDE com
o apoio dos países do G20.

No referido projeto, identificou-se que as diretrizes internacionais


existentes para regras de preços de transferência podem ser mal aplicadas
na prática, resultando em alocação de lucros não alinhada com as
atividades econômicas que produziram os lucros. Este é o principal
objetivo do projeto com relação à compreensão do princípio arm’s length e
à sua aplicação nos dias de hoje. As Ações 8-10 do projeto BEPS
procuraram analisar essa questão, para garantir que os resultados dos
preços de transferência estejam alinhados com a criação de valor342.

Como o termo “criação de valor” não possui um significado objetivo a


ponto de ser compreendido automaticamente e aplicado, exploramos a
seguir os principais aspectos da análise de preços de transferência, no que
diz respeito a este conceito.

2.1. Análise funcional de preços de transferência na era pós-BEPS

Assim como não é possível tratar de preços de transferência sem


mencionar o princípio arm’s length, também não é possível tratar da
aplicação deste princípio sem discutir a análise de comparabilidade. A
análise de comparabilidade é o cerne da aplicação do princípio arm’s
length, uma vez que ele se baseia numa comparação das condições em
uma transação controlada com as condições que teriam sido praticadas se
as partes fossem independentes e realizassem uma transação comparável
em circunstâncias comparáveis.

Existem dois aspectos fundamentais na análise de comparabilidade, e


neste trabalho iremos nos aprofundar apenas no primeiro aspecto, que é:
identificar as relações comerciais ou financeiras entre as empresas

303
associadas e as condições e circunstâncias economicamente relevantes
estabelecidas nessas relações, para que a transação controlada seja
delineada com precisão343. Essa escolha foi feita justamente porque o
interesse da presente reflexão está nas atividades economicamente
significativas que contribuem para a criação de valor.

As características economicamente relevantes – associadas aos fatores


de comparabilidade – que precisam ser identificadas nas relações
comerciais ou financeiras, entre as empresas vinculadas, para delinear com
precisão a transação real podem ser categorizadas da seguinte forma344:

•os termos contratuais da transação;


•as funções desempenhadas por cada uma das partes na transação, levando em
consideração os ativos utilizados e os riscos assumidos, incluindo como essas
funções se relacionam com a geração de valor mais ampla do grupo
multinacional ao qual pertencem as partes, as circunstâncias que envolvem a
transação e as práticas da indústria;
•as características da propriedade transferida ou dos serviços prestados;
•as circunstâncias econômicas das partes e do mercado em que as partes
operam; e
•as estratégias de negócios perseguidas pelas partes.

Como pode ser percebido na lista de fatores mencionados acima, a


análise funcional está no centro da avaliação das atividades econômicas
relevantes que contribuem para a criação de valor.

O principal ponto aqui é que em transações entre duas empresas


independentes, a remuneração geralmente reflete as funções que cada
empresa executa (levando em consideração os ativos utilizados e os riscos
assumidos). Portanto, ao delinear a transação controlada e determinar a
comparabilidade entre transações ou entidades controladas e não
controladas, é necessária uma análise funcional.

304
A análise funcional busca identificar as atividades e responsabilidades
economicamente significativas realizadas, os ativos utilizados ou
contribuídos e os riscos assumidos pelas partes nas transações, e tal análise
tem o foco no que as entidades realmente fazem e as contribuições que
elas trazem ao grupo econômico. Tais atividades econômicas relevantes
estão sempre relacionadas à tomada de decisões, principalmente as
estratégicas e quanto aos riscos de negócios. Nesse sentido, é necessário
compreender a estrutura e a organização do grupo multinacional, e como
tais atividades influenciam a maneira pela qual o grupo opera. Ou seja, é
importante entender de que modo o grupo é gerido como um todo, as
interdependências das funções desempenhadas pelas empresas no contexto
do grupo e a contribuição que as empresas associadas fazem para a criação
de valor.

Muitas vezes as relações de interdependência são bastante complexas e


sobrepostas, fazendo com que uma análise funcional efetiva seja
indispensável para que qualquer análise de preços de transferência seja
feita. Vale dizer também que, embora uma das partes possa exercer um
grande número de funções, é a relevância econômica dessas funções para
as partes envolvidas nas transações que é o mais importante345. Em outras
palavras, não se trata de uma análise meramente quantitativa, mas
principalmente qualitativa e voltada para as atividades que envolvam
decisões estratégicas e de tomada de risco.

A consequência prática dessa análise é que a entidade que concentra as


funções, os riscos e os ativos mais relevantes deve capturar o lucro
excedente depois que as entidades com as funções e os riscos limitados
sejam remuneradas adequadamente.

3. ECONOMIA DIGITAL: MODELOS DE NEGÓCIOS E A CRIAÇÃO DE

305
VALOR

A evolução vertiginosa da tecnologia da informação e comunicação têm


revolucionado modelos de negócios tradicionais, criando possibilidades de
mercados e negócios que não eram possíveis antes dessa revolução
tecnológica que vivemos.

A economia digital veio para mudar não somente as empresas que são
tipicamente consideradas como de tecnologia, mas também para mudar
como a economia tradicional funciona, fazendo com que vários aspectos
da cadeia de valor dos grupos multinacionais sejam transformados
completamente, como, por exemplo, o mercado de varejo que hoje é
disputado por lojas físicas e virtuais (e-commerce).

Como este assunto tende a ser muito abrangente e amplo, a fim de


delimitar o escopo deste artigo, será dado foco àquelas empresas que são,
tipicamente, de tecnologia e cujos principais “produtos” são os programas
de computador (software), assim entendidos como qualquer ferramenta
intangível que permita o funcionamento esperado de equipamentos e
utilidades, como os aplicativos de dispositivos móveis.

Os maiores grupos econômicos dessa categoria são norte-americanos,


como, por exemplo, Microsoft, Apple, Google, Facebook, Oracle, dentre
outros. Esses grupos possuem muitas coisas em comum, e uma delas em
específico chama a atenção: todos eles possuem centros de
desenvolvimento tecnológico como função econômica extremamente
relevante e concentrada em uma jurisdição. Sob o ponto de vista
econômico, não se pode negar que as principais atividades que geram valor
para esses grupos acontecem nos Estados Unidos. Tal situação é tão
relevante que muitos acreditam que as mudanças mais importantes trazidas

306
pelas ações 8-10 do projeto BEPS têm como um dos principais objetivos
limitar as possibilidades de planejamento tributário de grandes grupos de
tecnologia, que dependem de pesquisa e desenvolvimento tecnológico
intensivo.

Um dos efeitos combatidos pelo BEPS é a ausência da tributação nos


países dos consumidores, bem como a ausência de tributação efetiva nas
jurisdições em que os grupos tecnológicos estão estabelecidos. Em outras
palavras, coibir as situações em que a alocação dos lucros não teria sido
feita em conformidade com a criação de valor. A questão certamente não é
simples, mesmo porque, no caso de empresas norte-americanas, há ainda a
questão de que os Estados Unidos tributam a renda auferida fora do seu
território apenas quando repatriada e com a ausência de regras que
impeçam a prática de tax deferral.

No Brasil, por inúmeras razões, a situação é consideravelmente


diferente do que ocorre em outros países. O Brasil, historicamente, sempre
foi dependente de tecnologia desenvolvida no exterior e no caso da
indústria de software não é diferente, com apenas algumas exceções.
Sendo assim, invariavelmente grupos multinacionais buscam no Brasil um
mercado consumidor enorme, com milhões de consumidores jovens que,
notadamente, demandam mais e mais software e aplicativos. Ao se
estabelecer no país, algumas complicações são esperadas, e dentre elas está
um dos sistemas tributários mais complexos do mundo que inclui regras de
preços de transferência que não seguem o padrão internacionalmente
aceito e estabelecido pelas diretrizes da OCDE.

No caso da indústria de software, a situação se demonstra ainda mais


complexa do que na indústria tradicional de bens tangíveis. A
complexidade é, em boa medida, oriunda da inadequação de regras que

307
reflitam a realidade dos negócios das empresas de tecnologia. Por
exemplo, ainda que as regras brasileiras de preços de transferência sejam
aplicáveis às operações com bens, serviços e direitos, toda a
regulamentação tem como paradigma operações com bens tangíveis.
Transações envolvendo serviços e direitos, bens intangíveis por natureza,
são claramente tratadas da mesma forma que bens tangíveis, sem que haja
qualquer definição de regras separadas ou mesmo explicação ou
elucidação das regras comuns.

Nos casos de bens intangíveis, a situação se agrava por conta do


expresso afastamento das regras de preços de transferência para transações
envolvendo o pagamento de royalties346. Assim, caso a empresa do
exterior precise cobrar royalties da empresa brasileira, ela deverá observar
um conjunto de regras estabelecido na década de 1950, quando a internet e
a economia digital ainda nem existiam.

Nesse contexto, fazer um paralelo entre o avanço internacional no


sentido de buscar a alocação de lucros com base na criação de valor e o
ambiente tributário brasileiro em preços de transferência parece tarefa
quase impossível. A fim de explorar esses dois ambientes em uma situação
que pode ser comum no Brasil, trataremos a seguir do caso da distribuição
de software desenvolvido no exterior e comercializado no Brasil como um
modelo a ser avaliado. Ao final, ficará mais evidente que, se o Brasil
realmente pretende fazer parte da OCDE e se alinhar a padrões
internacionais em matéria de preços de transferência, muitos desafios estão
pela frente, inclusive na economia digital.

3.1. Distribuição de software: intangíveis na realidade brasileira

308
No caso da distribuição de software no Brasil, inevitavelmente
estaremos falando de transações envolvendo bens intangíveis. Uma
demanda comum das empresas organizadas no Brasil é a clara preferência
por transações domésticas, ou seja, as empresas ou pessoas físicas
residentes no Brasil, quando podem, evitam fazer pagamentos para o
exterior. Vários motivos surgem, dentre eles os tributários, haja vista a
difícil caracterização da transação que leva a incertezas tributárias.

Mesmo a OCDE admite que podem surgir dificuldades em uma análise


de preços de transferência como resultado das definições do termo
“intangível” que são demasiado estreitas ou muito amplas347.

Nas diretrizes da OCDE, a palavra “intangível” destina-se a abordar


algo que não é um ativo físico ou um ativo financeiro, que é capaz de ser
detido ou controlado para uso em atividades comerciais e cujo uso ou
transferência sejam compensados caso tivessem ocorrido em uma
transação entre partes independentes em circunstâncias comparáveis. Em
vez de se valer de definições contábeis ou jurídicas, o fundamento da
análise de preços de transferência em um caso envolvendo intangíveis
deve ser a determinação das condições que seriam acordadas entre partes
independentes para uma transação comparável348. Portanto, para a OCDE
a classificação contábil ou até mesmo jurídica é secundária, fazendo com
que a percepção e avaliação econômicas prevaleçam.

No caso da distribuição de um software produzido e de propriedade de


uma entidade no exterior, geralmente, não se trata da venda de direitos de
propriedade em si – como em uma transação de bens –, mas apenas a
cessão de direito de uso por tempo limitado. Os direitos limitados nos
intangíveis são comumente transferidos por meio de uma licença ou outro
acordo contratual similar. Esses direitos licenciados podem ser limitados

309
quanto ao campo de uso, prazo de uso, geografia ou outras formas. Tais
direitos limitados são intangíveis na exata acepção do conceito da
OCDE349. Sendo assim, tais transações são tratadas como operações
envolvendo intangíveis pela OCDE, devendo, portanto, se submeter às
diretrizes acerca deste tema.

De acordo com o princípio arm’s length, cada membro de um grupo


multinacional deve receber compensações pelas funções que executa. Nos
casos envolvendo intangíveis, isso inclui funções relacionadas ao
desenvolvimento, ao aprimoramento, à manutenção, à proteção e à
exploração de intangíveis. A caracterização da entidade ou entidades do
grupo que desempenham funções relacionadas ao desenvolvimento, ao
aprimoramento, à manutenção, à proteção e à exploração de intangíveis,
portanto, é uma das principais considerações na determinação de
condições das transações controladas350.

Existe a necessidade de garantir que todos os membros do grupo


multinacional sejam adequadamente compensados pelas funções que
realizam, os ativos que eles contribuem e os riscos que assumem. Isto
implica dizer que o proprietário legal de intangíveis somente deve ter o
direito de receber todo o lucro derivado da exploração desses intangíveis
se ele desempenhar todas as funções, contribuir com todos os recursos
utilizados e assumir todos os riscos relacionados ao desenvolvimento, ao
aprimoramento, à manutenção, à proteção e à exploração do intangível351.
No caso que estamos comentando, a empresa brasileira apenas é
responsável pela distribuição do software desenvolvido nos Estados
Unidos, no mercado nacional. Todas as demais funções são exercidas pela
controladora do grupo nos Estados Unidos.

310
Imagine que, em nosso caso, a subsidiária brasileira executa funções de
marketing e vendas que beneficiam o proprietário legal da marca
registrada e da tecnologia, que é sua vinculada no exterior. A maneira
escolhida para tal relação foi por meio de um acordo de distribuição e
comercialização. A OCDE orienta que, nesse caso, é necessário determinar
como o distribuidor deve ser compensado por suas atividades. Surge,
então, a dúvida: o distribuidor deve ser compensado apenas pelo
fornecimento de serviços de promoção e de distribuição ou ele também
deve ser compensado por aumentar o valor das marcas registradas e outros
intangíveis em virtude de suas funções desempenhadas, ativos usados e
riscos assumidos352? A análise desta questão requer uma avaliação dos
seguintes fatores:

•as obrigações e direitos implícitos nos registros legais e acordos entre as partes;
•as funções desempenhadas, os ativos utilizados e os riscos assumidos pelas
partes;
•o valor intangível antecipado a ser criado por meio das atividades do
distribuidor; e
•a compensação prevista para as funções desempenhadas pelo distribuidor
(tendo em conta os ativos utilizados e os riscos assumidos).

A fim de simplificar a análise, vamos considerar o caso em que o


distribuidor brasileiro atua apenas como um agente, sendo reembolsado
por suas despesas promocionais e sendo dirigido e controlado em suas
atividades pelo proprietário das marcas registradas e outros intangíveis de
marketing. Nesse caso, o distribuidor normalmente teria direito a uma
compensação adequada apenas às suas atividades de agente. Não assume
os riscos associados ao desenvolvimento posterior da marca e outros
intangíveis comerciais e, portanto, não teria direito a remuneração
adicional a esse respeito353.

3.2. Caso prático

311
3.2.1. Centralização no exterior

Vamos considerar que um determinado grupo norte-americano que


comercializa software possui operações em diversos países. Com interesse
no mercado consumidor brasileiro, começou a oferecer seu principal
software no mercado brasileiro via internet. Os consumidores brasileiros,
em sua maioria empresas, gostaram do software, mas surgiram
concorrentes nacionais com preços mais baixos e com cobranças
domésticas em Reais. A empresa, para não perder o mercado já
conquistado no Brasil e buscando expansão, resolveu abrir uma subsidiária
local354 para oferecer seu software nos mesmos moldes de seus
concorrentes locais, ou seja, faturamento local.

Antes da abertura da subsidiária (“SUB-BRA”), a empresa nos Estados


Unidos (Headquarters, “HQ”) possuía uma demonstração segmentada de
seu resultado, que representava o lucro operacional da operação brasileira,
como visto a seguir:

HQ $

Receita Líquida 1.000

Custos 400

Lucro Bruto 600

Margem Bruta 60%

Despesas Operacionais 350

P&D 150

Vendas & Marketing 120

Gerais & Adm. 80

Lucro Operacional 250

312
Margem Operacional 25%

Como pode ser percebido, a empresa demonstrava uma margem de


lucro operacional de 25% operando diretamente dos Estados Unidos.

3.2.2. Reestruturação: vendas diretas no Brasil (Buy/Sell)

No momento em que eram planejadas as operações brasileiras, agora


contando com uma subsidiária local, o modelo de remuneração desta
entidade foi questionado. A empresa norte-americana queria estar em
conformidade com as regras brasileiras, sem deixar de estar em
conformidade com o princípio arm’s length – que rege a regulamentação
norte-americana e internacional, como vimos.

Ao considerar que todas as receitas agora estariam no Brasil, mas


somente metade das despesas de vendas e marketing e metade das
despesas administrativas estariam efetivamente sendo incorridas no Brasil,
uma cobrança de royalties de distribuição foi pensada a fim de que a
subsidiária brasileira tivesse suas funções de distribuidor remunerada
segundo o princípio arm’s length. Depois de preparar um estudo de preços
de transferência para fins norte-americanos, a empresa chegou ao resultado
em que a subsidiária brasileira deveria ter uma margem operacional de 9%,
depois da cobrança dos referidos royalties. A seguir estão as
demonstrações de resultado das entidades segundo esta política:

Reestruturação – A

HQ $ SUB-BRA $

Receita Líquida 810 Receita Líquida 1.000

Custos 400 Custos –

Lucro Bruto 410 Lucro Bruto 1.000

313
Margem Bruta 51% Margem Bruta 100%

Despesas Operacionais 250 Despesas Operacionais 910

P&D 150 P&D –

Vendas & Marketing 60 Vendas & Marketing 60

Gerais & Adm. 40 Gerais & Adm. 40

Cobrança I/C – Cobrança I/C 810

Lucro Operacional 160 Lucro Operacional 90

Margem Operacional 20% Margem Operacional 9%

Como pode ser verificado, os royalties a serem pagos pela subsidiária


brasileira eram bastante representativos em comparação com a receita
gerada pelo mercado brasileiro, fazendo com que a maior parte do lucro da
operação ficasse com os Estados Unidos, lugar onde as atividades
econômicas relevantes na criação de valor aconteceram. O Brasil estava
sendo remunerado de maneira que suas funções e riscos limitados fossem
compensados. Tudo parecia de acordo.

Os executivos tributários do grupo nos Estados Unidos souberam que o


Brasil possuía regras diferentes das norte-americanas, e então eles leram
em um resumo na internet que os royalties pagos pela empresa do Brasil
somente seriam dedutíveis na base de cálculo do imposto de renda da
pessoa jurídica e da contribuição social sobre o lucro líquido (IRPJ/CSLL)
até o limite de 5% do total da receita líquida, para determinado ramo de
atividade. Como consideravam o pagamento na forma de royalties, eles
usaram essa regra para simular os efeitos. Abaixo se encontram os
resultados:

Reestruturação – B

314
HQ $ SUB-BRA $

Receita Líquida 50 Receita Líquida 1.000

Custos 400 Custos –

Lucro Bruto -350 Lucro Bruto 1.000

Margem Bruta -700% Margem Bruta 100%

Despesas Operacionais 250 Despesas Operacionais 150

P&D 150 P&D –

Vendas & Marketing 60 Vendas & Marketing 60

Gerais & Adm. 40 Gerais & Adm. 40

Cobrança I/C – Cobrança I/C 50

Lucro Operacional -600 Lucro Operacional 850

Margem Operacional -1200% Margem Operacional 85%

Aplicando tal metodologia, a situação ficou completamente fora do


esperado, porque, no entendimento deles, se a cobrança fosse maior que
5%, a dupla tributação certamente ocorreria devido à indedutibilidade da
despesa no Brasil355 e à tributação da renda nos Estados unidos. Por outro
lado, caso fosse mantida a cobrança de apenas 5% da receita, a entidade
brasileira ficaria com quase todo lucro da operação e os Estados Unidos,
país em que as funções economicamente mais relevantes aconteceram,
ficaria com um prejuízo enorme e nem seus custos estariam cobertos, o
que não fazia sentido na lógica internacional de preços de transferência.

Investigaram a questão mais a fundo e perceberam que existiam bases


jurídicas sólidas para sustentar que esse tipo de royalty pago pela
distribuição de software não era sujeito à limitação de 5٪ que haviam

315
utilizado. Como se tratava de uma transação intragrupo, entenderam que o
conjunto de regras usado para determinar o limite da dedutibilidade no
pagamento de royalties na distribuição de software foi o contido nas regras
de preços de transferência, da Lei n. 9.430/96 (e suas alterações).

Como não encontraram orientação alguma voltada para transações


envolvendo intangíveis, buscaram assemelhar as transações como se
fossem transações envolvendo bens. Neste caso a transação seria a compra
e venda de licenças de uso do software, como se fossem bens tangíveis –
mesmo que na prática não existisse meio físico, e os clientes utilizassem o
software diretamente na nuvem e pagassem pela utilização via assinatura
por tempo limitado.

Ao caracterizar os pagamentos como importação de direitos, por falta


de melhor enquadramento, a transação estaria sujeita às regras brasileiras
de preços de transferência356, e o método utilizado foi o Preço de Revenda
menos Lucro (PRL) com margem de 20%. Adicionalmente, incluiu-se uma
cobrança de royalties pelo uso da marca da empresa americana357, o que
resultou na seguinte simulação:

Reestruturação – C

HQ $ SUB-BRA $

Receita Líquida 810 Receita Líquida 1.000

Custos 400 Custos 800

Lucro Bruto 410 Lucro Bruto 200

Margem Bruta 51% Margem Bruta 20%

Despesas Operacionais 250 Despesas Operacionais 110

P&D 150 P&D –

316
Vendas & Marketing 60 Vendas & Marketing 60

Gerais & Adm. 40 Gerais & Adm. 40

Cobrança I/C – Cobrança I/C 10

Lucro Operacional 160 Lucro Operacional 90

Margem Operacional 20% Margem Operacional 9%

O resultado, como pode ser observado, foi uma adequação das regras de
preços de transferência das duas jurisdições. No Brasil, os custos
relacionados às compras de licenças foram deduzidos até o ponto em que o
PRL permite, e o limite de royalties de uso de marca foi limitado a 1%.
Nos Estados Unidos, a entidade norte-americana manteve a remuneração
desejada com base no estudo de preços de transferência que havia sido
feito, em que a subsidiária brasileira deveria ficar com margem
operacional de 9%.

3.2.3. Conclusão do caso prático

A utilização da abordagem em que se paga royalties ao exterior –


usando as regras de limitação da dedutibilidade estabelecidas na legislação
brasileira – não parece compatível com o princípio arm’s length no caso
em que a empresa brasileira recebe toda a receita doméstica do uso de
software e executa apenas atividades de rotina que não poderiam ser
consideradas como atividades econômicas relevantes na criação de valor
do intangível comercializado no país. A incompatibilidade surge por conta
do valor extraordinário que os intangíveis têm nesta indústria, algo que não
acontecia quando as regras de dedutibilidade de royalties foram
estabelecidas no Brasil.

317
A abordagem que emula a compra e venda de um bem tangível parece
mais razoável simplesmente pelo fato de que uma margem bruta de 20%
(exigida pela aplicação do método PRL) para distribuidores não é
descabida para uma série de setores, e esse pode ser o caso da indústria de
software. Isto ocorre porque as despesas operacionais comuns de
distribuidores tendem a ser parecidas (vendas, marketing e
administrativas) e possuem níveis de relevância semelhantes. No entanto,
pode acontecer que 20% de margem bruta seja muito mais ou muito menos
do que o necessário para que a entidade brasileira seja devidamente
recompensada pela criação de valor na cadeia que ela proporcionou. Caso
isso aconteça, infelizmente não existem alternativas realisticamente
aplicáveis, uma vez que dificilmente existiriam transações comparáveis a
esta com terceiros, para a aplicação do método dos preços independentes
comparados (PIC), bem como a consideração do custo de produção
contábil de um intangível, para a aplicação do método do custo de
produção mais lucro (CPL), não seria economicamente justificável.

4. CONCLUSÃO

No atual estágio da economia digital, grupos econômicos que atuam


exclusivamente na criação de software possuem modelos de negócio
consideravelmente diferentes das indústrias tradicionais de transformação.

A OCDE, com a intenção primordial de evitar planejamentos tributários


abusivos, atualizou as diretrizes de preços de transferência para que a
alocação do lucro acompanhe a criação de valor nos grupos
multinacionais. Tais alterações foram motivadas pela necessidade de
aproximar a remuneração dos intangíveis às funções de pessoas que
efetivamente estão envolvidas na geração deles.

318
As regras brasileiras que controlam as transações intragrupo
envolvendo intangíveis precisam ser revisitadas caso o Brasil queira se
juntar à abordagem apresentada pela OCDE, principalmente nos casos em
que a empresa brasileira atua como distribuidora com riscos limitados.
Utilizar as regras de dedutibilidade de royalties da década de 1950 para
remunerar a entidade que desenvolve, aperfeiçoa, mantém e protege
intangíveis que são comercializados no Brasil não parece ser capaz de
alocar o lucro da transação a quem majoritariamente contribuiu na cadeia
de valor.

A utilização do conceito de compra e venda (buy/sell) para aproximar


do resultado que seria obtido em uma avaliação segundo os moldes
estabelecidos pela OCDE pode ser uma alternativa, haja vista que a
remuneração baseada em uma margem bruta de 20% (PRL) pode refletir
mais fielmente o nível de remuneração esperado de um distribuidor,
inclusive na indústria de software. No entanto, pode ser que em muitos
casos a margem bruta de 20% não seja adequada para uma remuneração
arm’s length da operação brasileira.

Enfim, mesmo considerando algumas possibilidades, a ausência


explícita da busca pelo princípio arm’s length na legislação brasileira,
associada à completa alienação quanto à preocupação da alocação do lucro
relacionada à criação de valor, dificulta muito a compatibilização das
regras brasileiras com os princípios de preços de transferência,
internacionalmente revalidados pelo projeto BEPS.

319
A economia digital e as regras brasileiras de
preços de transferência: os problemas na
aplicação dos métodos aos serviços,
intangíveis e direitos
Diego Marchant358

INTRODUÇÃO

A economia digital pressupõe negócios em um mundo sem fronteiras,


em que uma pessoa de um país, por meio de sistemas conectados, pode
realizar transações em qualquer parte do mundo, sem sair de casa. Esse
cenário de transações on-line certamente traz impactos na seara tributária,
inclusive na área de controle de preços de transferência.

O objeto do presente trabalho é analisar a aplicação das regras


brasileiras de preços de transferência a este novo cenário da economia
digital. Além de discorrer sobre as normas atualmente vigentes,
analisaremos dois casos práticos sobre o tema.

1. AS REGRAS BRASILEIRAS DE PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA

Da mesma forma que ocorreu em diversos países, o Brasil introduziu o


controle de preços de transferência por meio da Lei n. 9.430/96 (Lei
9.430), que entrou em vigor a partir de 1º de janeiro de 1997.

O controle de preços de transferência deve ser observado nas transações


entre empresas do mesmo grupo ou cujo controle seja comum
(vinculadas). Tais regras visam verificar se as forças de mercado usuais
nas transações entre partes independentes estão presentes nas transações

320
entre partes vinculadas. Esse conceito é conhecido como princípio arm´s
lenght.

A despeito da prática internacional pautada nos Guidelines da


Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE),
a legislação brasileira optou por um critério legalista com margens fixas
em lugar do critério econômico, com margens variáveis, adotado pela
totalidade dos países que possuem tal legislação.

Ricardo Marozzi Gregório, ao comentar359 a sistemática brasileira de


preços de transferência, afirma que:

não há qualquer compromisso entre as margens fixadas pelo legislador e as


margens do princípio arm´s lenght que inspiram a disciplina no cenário
internacional. (...) A padronização perpetrada pelos mecanismos de praticabilidade
deveria obedecer, dentre outros, ao pressuposto da generalidade, isto é, deve ser
adequada para a maior parte dos contribuintes, de modo que eventuais discrepâncias
do padrão em relação à média da ocorrência dos fatos não podem ser excessivas.

A legislação brasileira possui como parâmetro apenas os três métodos


conhecidos como tradicionais pela OCDE, quais sejam:

(i) Preços independentes: consiste na comparação de transações


controladas com transações entre partes independentes.

No Brasil, este método é denominado, para operações de importação,


Método dos Preços Independentes Comparados (PIC)360. Especificamente
para operações envolvendo a importação de commodities, o método de
preços independentes é denominado Método do Preço sob Cotação na
Importação (PCI)361.

Para as exportações, a legislação brasileira apresenta o Método do


Preço de Venda nas Exportações (PVEx)362 e, para exportações

321
envolvendo commodities, o Método do Preço sob Cotação na Exportação
(PECEX)363.

(ii) Custo: a partir do custo de produção de um bem, serviço ou direito,


aplica-se determinada margem de lucro e encontra-se um preço
comparável para a transação controlada.

Para as importações, a legislação brasileira previu o Método do Custo


de Produção mais Lucro (CPL)364, ao passo que, para as exportações, está
disponível o Método do Custo de Aquisição ou de Produção mais Tributos
e Lucro (CAP)365.

(iii) Preço de revenda: através do preço de venda do bem, serviço ou


direito, extrai-se determinada margem de lucro de modo a determinar um
preço comparável para a transação controlada.

No Brasil, tal método é denominado Método do Preço de Revenda


menos Lucro (PRL)366 para o controle de preços de transferência nas
importações e Método do Preço de Venda por Atacado no País de Destino,
Diminuído do Lucro (PVA)367 ou Método do Preço de Venda a Varejo no
País de Destino, Diminuído do Lucro (PVV)368.

Na exposição de motivos da Lei n. 9.430, o legislador expôs uma


suposta inspiração nas práticas internacionais e nos preceitos estabelecidos
pela OCDE, consagrando também o princípio arm´s lenght.

No entanto, a prática tem demonstrado que o padrão brasileiro destoa


do padrão internacional na maioria dos casos, uma vez que desconsidera
aspectos materiais das atividades econômicas, adotando margens de
lucratividade fixas para todas as atividades sujeitas, independentemente de
se tratar de atividade com margem de lucro alta ou baixa. Certamente a

322
opção do legislador pela praticabilidade causa distorções para os
contribuintes que se encontram fora das médias estipuladas pelo legislador.

Além disso, muitos outros aspectos tornam a legislação brasileira


peculiar. Como exemplo, podemos citar a análise produto a produto e a
falta dos chamados métodos transacionais, os quais têm sido largamente
utilizados no cenário internacional.

2. DA EXCLUSÃO DA APLICAÇÃO DAS REGRAS DE PREÇOS DE


TRANSFERÊNCIA SOBRE ROYALTIES

Desde a edição da Lei n. 9.430, existe uma exclusão expressa da


aplicabilidade das regras de preços de transferência aos casos de royalties,
assistência técnica, científica, administrativa ou assemelhada,
permanecendo tais casos sujeitos às regras específicas de dedutibilidade
para fins do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição
Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Vejamos o art. 18, § 9º, abaixo
transcrito:

Art. 18
(...)
§ 9º O disposto neste artigo não se aplica aos casos de royalties e assistência
técnica, científica, administrativa ou assemelhada, os quais permanecem
subordinados às condições de dedutibilidade constantes da legislação vigente.

A legislação do IRPJ e da CSLL determina, em relação aos royalties,


regras específicas de dedutibilidade, previstas nos arts. 354 e 355 do
Regulamento do Imposto de Renda369.

Em relação a essas regras específicas de dedutibilidade de royalties,


destaca-se a necessidade de averbação do contrato no Instituto Nacional de
Propriedade Industrial (INPI) e a limitação dos royalties a um percentual
definido pelo Ministro da Fazenda, que estabeleceu coeficientes

323
percentuais que variam de 1% a 5%, considerados os tipos de produção ou
atividade, segundo o grau de essencialidade.

Esses limites foram estabelecidos pelas Portarias n. 436/58, n. 113/59,


n. 314/70 e n. 60/94 e são constantemente criticados por refletirem uma
realidade muito antiga e muito diferente da atual. Apenas a título
ilustrativo, na grande maioria dos países, os valores de royalties pagos
entre empresas do mesmo grupo são definidos caso a caso, após estudo
específico por meio de base de dados com operações entre terceiros.

Em um cenário de empresas multinacionais, certamente existe um


conflito entre a antiquada regra brasileira em comparação com a disciplina
do exterior, que é um tema de extrema importância em matéria de preços
de transferência e está sujeita a atualizações constantes.

Outro ponto importante diz respeito a quais tipos de contratos que o


INPI pode averbar, nos termos da Instrução Normativa INPI/PR n. 70, de
11 de abril de 2017 (IN 70/2017), em seu artigo 2º370.

Da análise da lista de contratos passíveis de averbação pelo INPI, nota-


se que todos têm por objeto a proteção da propriedade industrial e da
transferência de tecnologia.

Com efeito, outros tipos de contrato que incluam o pagamento de


royalties, mas que não impliquem proteção da propriedade industrial ou da
transferência de tecnologia, não são passíveis de averbação pelo INPI. São
os chamados casos de pagamento de royalties por direitos autorais, que
acontecem, por exemplo, nos casos de licenciamento do software sem o
fornecimento de código fonte.

324
Essa diferenciação foi, inclusive, reconhecida pela jurisprudência do
antigo Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, que
reconheceu que o pagamento de quantias (ou royalties) não se sujeita aos
limites de dedução do Regulamento do Imposto de Renda:

DIREITO AUTORAL – As quantias pagas a título de direito autoral não estão


sujeitas ao limite imposto pelo artigo 233 do RIR/80, obedecendo, portanto, as
regras gerais para dedução de despesas ou custos, pelos atributos de normalidade e
necessidade, respeitando-se o regime de competência (Ac. 1º CC 108-1.502/94 –
DO 17-4-97 e 2.045/95 – DO 7-5-97).

Neste ponto, devemos analisar a aplicação das regras de preços de


transferência às operações internacionais entre empresas multinacionais
que impliquem o pagamento de royalties por contratos não averbáveis no
INPI.

A despeito de ser possível defender que o artigo 9º da Lei n. 9.430


excluiria a aplicação das regras de preços de transferência para todo e
qualquer espécie de royalty, a nosso ver, parece razoável defender, com
base em uma interpretação sistemática das referidas regras, que as normas
de preços de transferência se aplicam às hipóteses de pagamento de
royalties entre empresas vinculadas em situações em que os contratos não
sejam passíveis de averbação no INPI.

Em relação às chamadas operações de exportação de tecnologia, o art.


3º da referida IN n. 70/2017 dispensa a averbação de contratos no INPI.
Para esses casos, entendemos serem aplicáveis os métodos de preços de
transferência para exportações.

3. A ADEQUAÇÃO DAS REGRAS BRASILEIRAS DE PREÇOS DE


TRANSFERÊNCIA PARA SERVIÇOS E INTANGÍVEIS NO ÂMBITO
DA ECONOMIA DIGITAL

325
Da leitura das normas brasileiras de preços de transferência, nota-se
uma clara inspiração nas atividades industriais na confecção das referidas
normas. São exemplos a constante utilização de termos como “planilha de
custos da empresa”, “tributos incidentes sobre as vendas” etc.

Diferentemente dos países que seguem as diretrizes da OCDE, a


legislação brasileira de preços de transferência não dispõe de regras
desenhadas para as operações que envolvam serviços, intangíveis e
pagamento de royalties.

Assim, resta aos interessados na legislação de preços de transferência


tentar aplicar os métodos disponíveis às referidas transações.

Para as operações que envolvam contratos não averbáveis no INPI, em


que a empresa brasileira pague remuneração pela prestação de serviços ou
royalties ao exterior, teríamos disponíveis os métodos aplicáveis às
importações: PIC, PCI, PRL e CPL.

Nessa situação, o método PIC estaria disponível aos casos em que seja
possível identificar operações envolvendo remuneração por serviços ou
intangíveis celebradas com terceiros, envolvendo serviços ou intangíveis
idênticos ou similares, como por exemplo uma desenvolvedora de software
que licencia seus produtos para terceiros.

Por outro lado, o método PCI estaria disponível aos casos envolvendo
intangíveis sujeitos a cotação na bolsa de mercadorias e futuros. Este seria
o caso de compra e venda de moedas virtuais (e.g. Bitcoins) entre
empresas do grupo, as quais começam a ter cotação em bolsas de
mercadorias e futuros, como a Chicago Mercantile Exchange (CME)371.

326
O método PRL, por sua vez, estaria disponível para situações que
envolvam a revenda de serviço/intangível ou a sua aplicação em outro
bem, serviço ou direito, os quais sejam vendidos a terceiros. Nesse caso, a
empresa deverá controlar os custos de revenda ou produção do item
vendido a terceiros, os quais são essenciais para a aplicação do método
PRL. Essa situação poderia ser ilustrada por um licenciamento, entre
empresas do mesmo grupo, de um aplicativo destinado a motoristas
independentes. Caso a subsidiária controle o custo dos serviços prestados a
terceiros, tecnicamente seria possível a aplicação do método PRL.

Finalmente, o método CPL estaria disponível para situações em que


fosse possível evidenciar o custo de produção do serviço ou intangível no
exterior. Nesse ponto devemos destacar duas dificuldades na aplicação do
método CPL.

Primeiramente, devemos diferenciar a contabilização de custos para


atividades industriais, que é o modelo seguido pelo legislador na
formatação do método CPL, da contabilização de custos de intangíveis,
que são bem diferentes, sendo inclusive objeto do Pronunciamento
Técnico CPC 04 do Comitê de Pronunciamentos Contábeis372.

Outro aspecto relevante diz respeito à documentação suporte do método


CPL segundo o entendimento da Secretaria da Receita Federal, externado
no Guia de Perguntas e Respostas da antiga Declaração de Informações
Econômico-Financeiras da Pessoa Jurídica (DIPJ)373:

Operações Internacionais / Item 042: Quais seriam os documentos hábeis para a


comprovação dos custos de produção dos bens e serviços importados, segundo o
Método do Custo de Produção mais Lucro (CPL), fornecidos por pessoa jurídica
vinculada, domiciliada no exterior?
Os documentos hábeis para a comprovação dos custos de produção dos bens e
serviços importados poderão ser as cópias dos documentos que embasaram os
registros constantes dos livros contábeis, tais como, faturas comerciais de aquisição

327
das matérias-primas e outros bens ou serviços utilizados na produção, planilhas de
rateio do custo de mão de obra e cópias das folhas de pagamentos, comprovantes de
custos com locação, manutenção e reparo dos equipamentos aplicados na produção,
demonstrativos dos percentuais e dos encargos de depreciação, amortização ou
exaustão utilizados e das quebras e perdas alocadas, observando-se o disposto no §
5º do artigo 15 da IN RFB n. 1.312, de 2012. Devendo ainda apresentar a cópia da
declaração do imposto sobre a renda entregue ao fisco do outro país, equivalente a
DIPJ do Brasil. Esclarece-se, outrossim, que qualquer documento de procedência
estrangeira, para produzir efeitos legais no País e para valer contra terceiros e em
repartições da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos
Municípios ou em qualquer instância, juízo ou tribunal, deve ser vertido em
vernáculo. Além disso, deve ser legalizado em seu país de origem, ou seja,
notarizado, consularizado e registrado em Cartório de Registro de Títulos e
Documentos.

Da análise da lista acima, nota-se que o cumprimento de todas as


obrigações documentais praticamente inviabiliza a aplicação do método
CPL.

Como alternativa, nos termos do artigo 43 da Instrução Normativa n.


1.312/12 (IN 1.312), o contribuinte pode se valer de: (i) publicações ou
relatórios oficiais do governo do país do comprador ou vendedor ou
declaração da autoridade fiscal desse mesmo país, quando com ele o Brasil
mantiver acordo para evitar a bitributação ou para intercâmbio de
informações, ou (ii) de pesquisas efetuadas por pessoa jurídica ou
instituição de notório conhecimento técnico ou publicações técnicas.

Outro aspecto que merece destaque é a possibilidade de utilização de


relatório de auditores independentes para fins de comprovação do custo de
produção de determinado bem ou serviço, conforme previsto na Solução
de Consulta COSIT n. 13/2013, transcrita a seguir:

Solução de Consulta Cosit n. 13 (...) Ementa: Para fins de comprovação de


preços de mercadorias importadas, admite-se a apresentação de relatório de
auditores externos independentes, em que for observado que o valor do custo de
aquisição das mercadorias foi registrado de acordo com a legislação brasileira,
juntamente com relatório enumerativo das faturas comerciais de aquisição dos
produtos pela empresa fornecedora vinculada. Quaisquer relatórios de procedência

328
estrangeira deverão ser traduzidos, notarizados, consularizados e registrados em
Cartório de Registro de Títulos e Documentos, em substituição das cópias de faturas
comerciais. A apresentação do relatório de auditores externos independentes para
fins de comprovação de preços não afasta a possibilidade de serem requeridos,
durante procedimento de fiscalização, quaisquer outros documentos, tais como
faturas comerciais de entrada de mercadorias, previstos pela legislação brasileira.

Em relação às operações em que uma empresa brasileira presta serviços


ou licencia intangíveis para empresa vinculada no exterior, entendemos
que as regras de preços de transferência para exportações seriam
aplicáveis.

Nesse caso, o método PVEX estaria disponível aos casos em que seja
possível identificar operações envolvendo remuneração por serviços ou
intangíveis celebradas com terceiros residentes ou domiciliados no
exterior, envolvendo serviços ou intangíveis idênticos ou similares, como,
por exemplo, uma desenvolvedora de aplicativos de celular que licencia
seus produtos para terceiros.

Por outro lado, método PECEX seria aplicável aos casos envolvendo
intangíveis sujeitos a cotação na bolsa de mercadorias e futuros, como é o
caso dos Bitcoins, que são cotados na CME.

Os métodos de revenda aplicáveis às exportações (PVA e PVV) seriam


passíveis de aplicação caso seja possível identificar operações envolvendo
os mesmos serviços ou direitos no mercado atacadista ou varejista no país
de destino.

Finalmente, em relação aos métodos de custo, merece destaque a


aplicação do método CAP, que se mostra mais viável nos casos em que
uma empresa brasileira presta serviços ou licencia intangíveis para uma
empresa vinculada no exterior. Tal viabilidade se deve à facilidade para a
empresa brasileira evidenciar os custos envolvidos na operação, com

329
informações que estão disponíveis nas demonstrações contábeis da
empresa brasileira. Um fator que complicaria a aplicação do método CAP
é a contabilização de custos de intangíveis, sujeita a regras contábeis
específicas positivadas no Pronunciamento Técnico CPC 04 do Comitê de
Pronunciamentos Contábeis.

4. CONCLUSÕES

Pelo acima exposto, podemos chegar à conclusão de que as regras


brasileiras de preços de transferência necessitam de atualização para
atender a realidade da economia digital.

Primeiramente, os métodos de preços de transferência não se mostram


adequados para a comprovação em casos envolvendo serviços e
intangíveis. Segundo a experiência internacional, tais transações
provocaram as autoridades fiscais a criarem diretrizes específicas para a
comprovação de valores de mercado para serviços e intangíveis.

Adicionalmente, as autoridades fiscais brasileiras deveriam criar regras


para fins de Imposto de Renda que venham a tributar as atividades
desempenhadas remotamente no mercado brasileiro. Possíveis alterações
poderiam ocorrer com a criação de regras efetivas para fins de definição do
conceito de estabelecimento permanente no território brasileiro e a efetiva
implementação da Ação 1 do BEPS374.

330
Transferências cross-border de direitos de
uso sobre software de prateleira: aquisição de
mercadoria ou licenciamento? Tributação na
fonte e dedutibilidade de despesas
Carlos Cornet Scharfstein375 e Juliana Vargas Sallouti376

1. INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES

Antes de nos aprofundarmos em qualquer discussão tributária


envolvendo software, é necessário delimitar alguns conceitos básicos.

O Cambridge Dictionary377 conceitua software como “instruções que


controlam o que um computador faz; ou um programa de computador”. De
forma semelhante, a Techopedia378 define software como “um conjunto de
instruções ou programas instruindo um computador a realizar tarefas
específicas”.

Esse conceito está em linha com o adotado pela Lei n. 9.609/98 (a


chamada Lei do Software), que, ao tratar da proteção da propriedade
intelectual de programa de computador e da sua comercialização no Brasil,
define software da seguinte forma:

Art. 1º Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de


instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de
qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento
da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados
em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins
determinados.

Depreende-se que um software não é um bem corpóreo, mas sim um


conjunto de instruções, normalmente escritas em meio eletrônico, que,

331
quando seguidas por um computador, trazem um resultado esperado pelo
usuário.

Há muitíssimas formas de se classificar e se subdividir os tipos de


software. Todavia, na seara tributária, as discussões travadas nas últimas
décadas conduziram à segregação do software em dois grandes grupos: o
software customizado e o não customizado.

Essa divisão ganhou corpo sobretudo com a decisão proferida pelo


Supremo Tribunal Federal (STF) no Recursos Extraordinário (RE) n.
176.626/SP, de 10 de novembro de 1998, que, ao analisar a incidência do
Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) na venda de software,
reconheceu que os programas de computador podem ser classificados em:
(i) software de “prateleira”, não customizado, que é feito de forma
padronizada e disponibilizado ao público em geral; e (ii) software
customizado, ou por encomenda, feito por solicitação de um cliente para
atender necessidades específicas379.

Neste artigo, abordaremos especificamente as operações envolvendo o


software tido como não customizado, ou seja, o chamado software de
prateleira (que, como se verá, se aproxima do conceito de “mercadoria”), e
nas quais não haja transferência do código fonte. O software customizado,
que é usualmente associado à prestação de serviços, ficará de fora do
escopo de análise. O mesmo se aplica a outras modalidades de software,
tais como o Software as a Service (SaaS).

Além disso, estudaremos especificamente os efeitos de tais operações


para fins do imposto de renda brasileiro, seja na modalidade fonte (IRF) ou
corporativa, neste último caso quanto à dedutibilidade de despesas.

332
Tendo sido delimitada a abrangência deste artigo, coloca-se a grande
questão: em uma aquisição internacional de software, na qual o cedente é
domiciliado no exterior, e o adquirente/usuário, no Brasil, como se deve
qualificar – jurídica e tributariamente – a operação? Seria a
contraprestação paga pelo usuário um tipo de royalty, ou preço de
aquisição de um ativo? A resposta a essa indagação traz consequências
tributárias bastante distintas380.

2. NATUREZA DA CONTRAPRESTAÇÃO PELO USO DO SOFTWARE

Ao definir o conceito de “royalties” para fins da legislação do imposto


de renda, o artigo 22, alínea “d”, da Lei n. 4.506/64, estabelece: “serão
classificados como ‘royalties’ os rendimentos de qualquer espécie
decorrentes do uso, fruição, exploração de direitos, tais como: (...)
exploração de direitos autorais, salvo quando percebidos pelo autor ou
criador da obra”. Ou seja, nos termos da Lei n. 4.506/64, a contraprestação
pela exploração de um direito autoral se qualifica como um royalty.

O artigo 2º da Lei do Software estabelece que o regime de proteção da


propriedade intelectual das obras literárias, previsto pela Lei n. 9.610/98, é
também conferido ao software. E a Lei n. 9.610/98 estabelece que os
programas de computador são obras intelectuais protegidas, nos seguintes
termos:

Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por


qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou
que se invente no futuro, tais como: (…)
XII – os programas de computador; (…)
§ 1º Os programas de computador são objeto de legislação específica,
observadas as disposições desta Lei que lhes sejam aplicáveis”.

No tocante ao instrumento jurídico utilizado para a transferência do


software, o artigo 9º da Lei do Software estabelece que o uso do

333
programa de computador no País será objeto de contrato de licença e,
no caso de inexistência do contrato de licença, o documento fiscal relativo
à aquisição servirá para a comprovação de regularidade de seu uso.

Por fim, o artigo 10 da Lei do Software estabelece que os direitos de


comercialização referentes a programas de computador também deverão
ser objeto de atos e contratos de licença de direito.

Pois bem. Uma vez que: (i) a propriedade intelectual do software é


tutelada pela legislação que protege os direitos autorais; (ii) a
contraprestação pela exploração de um direito autoral se qualifica como
um royalty; e (iii) via de regra, o uso do software será objeto de contrato
de licença, poder-se-ia concluir, à primeira vista, que a contraprestação
pela aquisição de um software seria necessariamente classificada como
royalties para fins fiscais.

Essa conclusão – que, em um primeiro momento, nos parece ser


simples e quase intuitiva – é também incompleta. Há aspectos adicionais
importantes a serem considerados.

Há muito que se trava um grande debate sobre a natureza jurídica da


contraprestação pelo uso do software – se preço de mercadoria, sujeito a
ICMS, ou se licenciamento, sujeito ao Imposto Sobre Serviços (ISS).

Ao analisar o conflito de competência entre Estados (no tocante à


incidência do ICMS) e Municípios (no tocante à incidência do ISS), a
jurisprudência majoritária dos tribunais superiores vem adotando o
entendimento de que o software não customizado, produzido em série e
comercializado no varejo (i.e., software de prateleira), deve ser

334
considerado “mercadoria”, cuja comercialização, portanto, estaria sujeita
ao ICMS381.

Aliás, no julgamento do RE n. 176.626/SP, o STF chegou a afirmar que


o software de prateleira não está sujeito ao ICMS, por lhe faltar o elemento
corpóreo, que seria essencial à caracterização de uma mercadoria. Todavia,
esse requisito (a corporeidade) foi aos poucos sendo ultrapassado: o
Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, primeiro no Recurso Especial
(REsp) n. 216.967/SP, de 28 de agosto de 2001, e depois no n. 633405/RS,
de 24 de novembro de 2004, que os programas de computador eram sim
mercadorias e, portanto, a comercialização deles se sujeitaria ao ICMS.

Nesses primeiros precedentes, o fato de o software de prateleira


normalmente ter um atributo físico (i.e., a famosa “caixinha” que podia ser
comprada nas lojas) talvez tenha influenciado na sua caracterização como
mercadoria. No entanto, até esse requisito com o tempo foi se tornando
dispensável.

Com efeito, no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de


Inconstitucionalidade n. 1.945/MT (ADI 1.945/MT), em 26 de maio de
2010, o STF decidiu liminarmente que é constitucional a cobrança de
ICMS sobre software adquirido por meio de transferência eletrônica de
dados (download), instituída expressamente por lei do Estado do Mato
Grosso.

Naquela ocasião, o STF decidiu que o meio físico, a existência de bem


corpóreo e mercadoria em sentido estrito não são relevantes para fins de
incidência do ICMS. Note-se que a ADI n. 1.945/MT ainda está pendente
de julgamento definitivo.

335
Bem mais recentemente, o Conselho Nacional de Política Fazendária
(CONFAZ) publicou o Convênio ICMS n. 106, de 29 de setembro de
2017, estabelecendo que as operações com software padronizado,
comercializado por meio da transferência eletrônica de dados (isto é, sem
caixinha), estão sujeitas à incidência do ICMS nos termos ali
estabelecidos.

Infelizmente, a questão está longe de estar pacificada: no anseio de


manter sua arrecadação, os municípios continuam a sustentar que as
transferências de software se sujeitam à incidência do ISS, sejam eles
customizados ou não. É o que disse o Parecer Normativo SF n. 1, editado
pela Prefeitura de São Paulo em 18 de julho de 2017 – que, em síntese,
estabeleceu que as transferências de software (inclusive de prateleira) se
enquadrariam (em regra) no subitem 1.05 da lista anexa à Lei
Complementar n. 116/2003.

Embora o foco da discussão acima seja a incidência do ICMS versus


ISS, o fato é que o entendimento dos tribunais superiores impactou por
muitos anos o posicionamento das autoridades fiscais federais sobre a
tributação das remessas ao exterior como contraprestação pela aquisição
ou licenciamento de software não customizado.

Com fundamento no posicionamento do STF382 referente à incidência


do ICMS sobre a comercialização de software de prateleira, as regiões
fiscais da Receita Federal do Brasil (RFB) responderam diversas consultas
afirmando que as remessas ao exterior para aquisição de software de
prateleira estariam livres da incidência do IRF, por se tratarem de
aquisições de mercadorias – e não pagamentos de royalties.

Em regra, tais consultas se referiam a duas situações distintas:

336
(i) a aquisição do direito de uso de um software, licenciado/cedido por um
residente no exterior (em geral, o produtor do software) para uma parte no
Brasil, que, na qualidade de usuário final, pretendia utilizar o programa de
computador para fins próprios, e que não podia nem pretendia comercializá-
lo para terceiros (a “licença de uso”); ou
(ii) a aquisição do direito de comercializar o software por uma parte no Brasil,
que tinha a intenção de vendê-lo ou licenciá-lo a terceiros, com lucro (a
“licença de comercialização”).

Um dos primeiros precedentes sobre o assunto foi a Solução de


Consulta 39/2002, da 5ª Região Fiscal, que, ao analisar a cessão de uma
licença de comercialização, disse que:

não incide o imposto de renda na fonte sobre as importâncias pagas, creditadas,


entregues, empregadas ou remetidas ao exterior, a título de aquisição de programa
de computador (software), quando a operação se equiparar à compra de mercadoria
(software de prateleira) para revenda.

Já na Solução de Consulta 46/2007, a 8ª Região Fiscal analisou uma


operação envolvendo uma licença de uso, e disse que:

não estão sujeitas à incidência do Imposto de Renda na Fonte as importâncias


pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas ao exterior pela aquisição de
programas de computador – software (por meio de download), para uso próprio,
quando forem produzidos em larga escala e de maneira uniforme e colocados no
mercado para aquisição por qualquer interessado, sem envolvimento de direitos
autorais, por se tratar de aquisição de mercadorias.

A bem da verdade, nem todos os precedentes da RFB proferidos à


época eram nesse sentido: em outra solução de consulta de alguns anos
antes, a mesma 8ª Região Fiscal afirmou que o pagamento de remuneração
pela licença de uso de programa de computador não customizado se
caracterizaria como pagamento de royalties e, portanto, estaria sujeito ao
IRF à alíquota de 15%.

Seja como for, a grande maioria dos pronunciamentos da RFB adotou o


entendimento de que não haveria a incidência do IRF nas remessas

337
relacionadas a software – fosse na aquisição de direito de uso ou de
comercialização. A matéria acabou chegando à Coordenação de
Tributação (COSIT), que, por meio da Solução de Divergência n. 27/2008
(SD 27/08), afirmou, no tocante às aquisições de direitos de
comercialização:

Entende-se, assim, que, conforme a legislação brasileira, as remessas ao exterior


realizadas como pagamento de aquisições de software, sob a modalidade de cópias
múltiplas, não se enquadram como remuneração de direitos autorais (royalties) e,
portanto, não estão sujeitas à incidência do imposto de renda na fonte.

Com esse entendimento, a COSIT afastou, inclusive, a aplicação da


Portaria do Ministério da Fazenda (MF) n. 181/1989, que determina incidir
IRF sobre rendimentos pagos a beneficiários no exterior na aquisição de
software, para distribuição no País ou uso próprio, sob a modalidade de
cópia única.

Repare-se que essa portaria do MF faz referência ao software de cópia


única, que é normalmente o caso do software customizado (e não o de
prateleira) – e no qual normalmente há um elemento de prestação de
serviço.

É curioso notar que todos esses precedentes fizeram referência às Leis


do Software e dos Direitos Autorais, que – como já dissemos –
determinam que a transferência de software se dá por meio de contratos de
licenciamento (e não de compra e venda). E, muito provavelmente, os
documentos relativos aos casos concretos evidenciavam esses fatos. Ainda
assim, as decisões entenderam que, no caso de software de prateleira (ou
de cópias múltiplas), ocorreria a aquisição de uma mercadoria e não o
pagamento de um royalty.

338
O entendimento adotado pela COSIT na SD 27/08, relativamente às
licenças de comercialização, não se manteve incólume por muito tempo:
em novembro de 2016, por meio da Solução de Consulta n. 154, a COSIT
decidiu que a remessa de recursos para beneficiário no exterior pela
licença de comercialização ou distribuição de software não customizado é
classificado como um pagamento de royalties e, portanto, se sujeita à
tributação do IRF à alíquota de 15%.

Esse entendimento foi “reconfirmado” pela Solução de Divergência n.


18, editada em março de 2017 (SD 18/17), que revogou a SD 27/08 e disse
que:

(i) as remessas ao exterior relacionadas à aquisição de software podem se referir


a (a) licenças de uso; (b) licenças de comercialização e (c) transferência de
tecnologia (nos dois primeiros casos, os direitos sobre o software ficam com
seu autor);
(ii) no caso da licença de comercialização, não se aplica o decidido pelo STF no
RE n. 176.626/SP, que tinha por objeto o direito de uso; ou seja, o pagamento
pelo direito de comercializar o software não se confunde com a aquisição do
direito de usar esse mesmo software; e
(iii) o direito de se comercializar um software é autorizado mediante uma
licença; logo, a natureza jurídica dos pagamentos feitos a esse título é de
royalties.

Como se vê, a SD 18/17 não endereçou de forma expressa a aquisição


de licença de uso de um software: o escopo dela era, primordialmente, o
direito de comercialização. E, sobre a aquisição de licença de uso, sinais
conflitantes foram emitidos: (i) por um lado, a SD 18/17 disse que a
existência de uma licença automaticamente leva à conclusão de que há
royalties sendo pagos; mas (ii) por outro, a SD 18/17 parece ter acatado a
jurisprudência do STF, segundo a qual o software de prateleira representa
uma mercadoria (embora não a tenha aplicado no caso concreto,

339
justamente por entender que essa jurisprudência não alcança as licenças de
comercialização).

Além disso, os precedentes mais antigos da RFB que versavam


expressamente sobre licenças de uso (dizendo que não havia IRF nesses
casos), não foram expressamente revogados pela SD 18/17.

Diante de toda essa celeuma, o entendimento que nos afigura mais


adequado – e que, a rigor, não conflita com a posição atual da própria RFB
– é o seguinte:

(i) O software de prateleira, de cópias múltiplas, representa uma mercadoria.


(ii) A aquisição de qualquer tipo de software se dá via licenciamento (a não ser
que se transfira o código-fonte). Esse fato decorre não apenas das disposições
da Lei do Software e da Lei dos Direitos Autorais, mas principalmente das
caraterísticas desse tipo de produto. Ao se baixar um software na internet, ou
se adquirir uma caixinha na loja, o consumidor não está efetivamente
adquirido o software: ele está obtendo uma licença para utilizá-lo. A leitura
dos termos e condições dos mais famosos programas de computador deixa
isso muito claro.
(iii) A despeito disso, na essência, a aquisição de uma licença sobre um
software de prateleira é muito simular à aquisição de uma mercadoria. Nesses
casos, poder-se-ia até dizer que a licença em si é a mercadoria.
(iv) Por isso, caso tal aquisição se dê no âmbito cross-border, não deveria haver
a incidência de IRF.

Se assim não fosse, cada usuário que adquirisse uma licença de uso do
exterior teria de reter o IRF incidente sobre o pagamento. E esse seria o
caso não apenas do software, mas também dos livros, filmes, músicas e
demais obras intelectuais – que são igualmente licenciadas. Chegar-se-ia,
assim, à situação no mínimo inusitada de o contribuinte ter que ir ao banco
pagar um DARF ao assistir um filme baixado na internet!

A aplicação automática desse raciocínio à aquisição de um direito de


comercialização (em contraposição ao de uso) nos parece um pouco mais

340
complexa (ainda que se trate de um software de prateleira). Afinal, nesses
casos, o adquirente não está interessado na mercadoria em si – mas sim em
explorar comercialmente um direito. Por isso, nesses casos, parece-nos que
os contribuintes teriam mais dificuldades de sustentar que não se trata de
um royalty.

De todo modo, mesmo neste último caso, há ao menos um precedente


favorável ao contribuinte do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais
(CARF) sobre a matéria. No Acórdão n. 1402-00404, de 27 de novembro
de 2011, analisou-se (para fins de dedutibilidade) se a remessa ao exterior
referente a licença de comercialização de software se qualificava ou não
como royalties. Por unanimidade de votos, a 2ª Turma da 4ª Câmara da 1ª
Seção acompanhou o voto do Conselheiro Carlos Pelá e decidiu que: (i) o
mero fato de a comercialização do software ser autorizada por licença não
identifica a natureza jurídica dos pagamentos como sendo royalties, pois a
existência da licença está relacionada à proteção do direito autoral; (ii) o
software feito em larga escala representa uma mercadoria; e (iii) em sendo
mercadoria, os pagamentos relacionados à sua aquisição (no caso, cuidava-
se de licença de comercialização) não são royalties.

3. DEDUTIBILIDADE

3.1. Tratamento contábil de ativos intangíveis

Conforme visto na seção anterior, é bastante razoável concluir que a


aquisição de uma licença de uso de um software seja encarada como
aquisição de uma mercadoria – em contraposição ao pagamento de um
royalty. Em sendo uma mercadoria, cabe analisar qual é o tratamento
contábil e fiscal apropriado.

341
Ao elencar os grupos de contas que compõem o ativo, o
Pronunciamento CPC n. 26 (CPC/26), emitido pelo Comitê de
Pronunciamentos Contábeis e aprovado pela Comissão de Valores
Mobiliários (CVM) em 13 de dezembro de 2011 por meio da Deliberação
n. 676, e pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC) em 2 de
novembro de 2011 (tornando-se, portanto, de observância obrigatória para
todas as pessoas jurídicas que mantenham escrituração contábil completa),
que trata da Apresentação das Demonstrações Contábeis, estabelece que o
grupo “não circulante” é subdividido em realizável a longo prazo,
investimentos, imobilizado e intangível (item 67A).

Os ativos intangíveis são disciplinados pelo Pronunciamento n. 4


(CPC/4), que os conceitua da seguinte forma:

Ativo intangível
9. As entidades frequentemente despendem recursos ou contraem obrigações
com a aquisição, o desenvolvimento, a manutenção ou o aprimoramento de recursos
intangíveis como conhecimento científico ou técnico, projeto e implantação de
novos processos ou sistemas, licenças, propriedade intelectual, conhecimento
mercadológico, nome, reputação, imagem e marcas registradas (incluindo nomes
comerciais e títulos de publicações). Exemplos de itens que se enquadram nessas
categorias amplas são: softwares, patentes, direitos autorais, direitos sobre filmes
cinematográficos, listas de clientes, direitos sobre hipotecas, licenças de pesca,
quotas de importação, franquias, relacionamentos com clientes ou fornecedores,
fidelidade de clientes, participação no mercado e direitos de comercialização.

Fica claro que, do ponto de vista contábil, um software (aí incluída a


licença de uso sobre o software) se qualifica como um ativo intangível. É
interessante notar que o CPC/4 faz referência às situações em que o
software está contido “em elementos que possuem substância física” – que
seria o caso, por exemplo, do suporte físico (a caixa à qual já nos
referimos) ou mesmo da documentação jurídica referente à licença de uso.
Nesses casos, a qualificação do ativo como sendo um intangível ou um
imobilizado deve se pautar pela significância de cada um desses itens:

342
4. Alguns ativos intangíveis podem estar contidos em elementos que possuem
substância física, como um disco (como no caso de software), documentação
jurídica (no caso de licença ou patente) ou em um filme. Para saber se um ativo que
contém elementos intangíveis e tangíveis deve ser tratado como ativo imobilizado
de acordo com o Pronunciamento Técnico CPC 27 – Ativo Imobilizado ou como
ativo intangível, nos termos do presente Pronunciamento, a entidade avalia qual
elemento é mais significativo. (...).

Em sendo o software (ou a licença a ele relativa) um ativo intangível, o


CPC/4 determina que seu reconhecimento inicial deve ser pelo custo de
aquisição, assim entendido o preço de compra acrescido de outros gastos
acessórios:

24. Um ativo intangível deve ser reconhecido inicialmente ao custo. (...)


27. O custo de ativo intangível adquirido separadamente inclui:
(a) seu preço de compra, acrescido de impostos de importação e impostos não
recuperáveis sobre a compra, depois de deduzidos os descontos comerciais e
abatimentos; e
(b) qualquer custo diretamente atribuível à preparação do ativo para a finalidade
proposta.

Por fim, o CPC/4 determina que a mensuração subsequente do ativo


intangível deve se basear na sua vida útil – e apenas ativos com vida útil
definida devem ser amortizados.

O CPC/4 estabelece que, quando houver incerteza na determinação da


vida útil, deve ser observada a prudência (item 93). São trazidos diversos
critérios para a determinação da vida útil de um intangível, dentre os quais
a obsolescência técnica e a data de vencimento do direito contratual de
utilizá-lo (itens 89 e 90). Ao tratar especificamente de software, o CPC/4
ressalta que, em razão de rápidas alterações tecnológicas, a vida útil pode
ser curta em razão de obsolescência:

92. Considerando o histórico de rápidas alterações na tecnologia, os softwares e


muitos outros ativos intangíveis estão suscetíveis à obsolescência tecnológica.
Portanto, muitas vezes será o caso de que sua vida útil seja curta. Reduções futuras
esperadas no preço de venda de item que foi produzido usando um ativo intangível
podem indicar a expectativa de obsolescência tecnológica ou comercial do bem,

343
que, por sua vez, pode refletir uma redução dos benefícios econômicos futuros
incorporados no ativo (Alterado pela Revisão CPC 08).

Uma vez definida a vida útil do intangível, o CPC/4 determina que a


amortização deve ser iniciada a partir do momento em que o ativo estiver
disponível para uso e deve refletir o padrão de consumo dos benefícios
econômicos futuros pela entidade. Caso tal padrão não possa ser
determinado com confiabilidade, o método linear é indicado (item 97, 98 e
98B):

98B. Na escolha do método de amortização adequado, de acordo com o item 98,


a entidade pode determinar o fator limitante predominante que é inerente ao ativo
intangível. Por exemplo, o contrato que estabelece os direitos da entidade sobre o
uso do ativo intangível pode especificar o uso do ativo intangível pela entidade
como número predeterminado de anos (ou seja, tempo), como número de unidades
produzidas ou como montante total fixo da receita a ser gerada. A identificação do
fator limitante predominante pode servir de ponto de partida para a identificação da
base adequada da amortização, mas outra base pode ser aplicada se refletir de forma
mais próxima o padrão esperado de consumo de benefícios econômicos. (Incluído
pela Revisão CPC 08).

Como se vê, é bastante provável que uma licença sobre um software


(seja de uso ou de comercialização) tenha vida útil definida, seja porque (i)
sua existência é contratualmente limitada no tempo ou (ii) embora não haja
limitação temporal, a obsolescência do software tornará a licença sem
valor depois de algum tempo. Diante disso, por uma razão ou por outra,
parece-nos que, em regra, o software registrado no ativo intangível estará
sujeito a amortização.

Resta, agora, determinar o tratamento atribuído a essa despesa de


amortização para fins do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas e da
Contribuição Social Sobre o Lucro (IRPJ/CSL).

3.2. Tratamento fiscal de ativos intangíveis

344
O artigo 58 da Lei n. 4.506/64 já estabelecia que a recuperação do
capital aplicado na aquisição de direitos cuja existência ou exercício tenha
duração limitada pode ser deduzida do lucro real. Embora à época não
existissem programas de computador, e o conceito de ativo intangível não
estivesse em voga, a lei mencionou textualmente os direitos autorais:

Art. 58. Poderá ser computada como custo ou encargo, em cada exercício, a
importância correspondente à recuperação do capital aplicado na aquisição de
direitos cuja existência ou exercício tenha duração limitada, ou de bens cuja
utilização pelo contribuinte tenha o prazo legal ou contratualmente limitada, tais
como:
a) patentes de invenção, fórmulas e processos de fabricação, direitos autorais,
licenças, autorizações ou concessões; (...)”.

Ao tratar da determinação da quota de amortização, o art. 58, § 1º, fez


referência ao “número de anos restantes de existência do direito”:

§ 1º A quota anual de amortização será fixada com base no custo de aquisição


do direito ou bem, atualizado monetariamente, e tendo em vista o número de anos
restantes de existência do direito, observado o disposto no § 1º do artigo 57 desta
lei383.

Portanto, na sistemática da Lei n. 4.506/64, a amortização de direitos


era tratada como uma despesa dedutível – contanto que a existência ou
exercício do direito fosse limitada no tempo. A quantificação dessa
despesa deveria levar em conta o número de anos restantes.

A Lei n. 4.506/64 também dispunha que a RFB fixaria, periodicamente,


o prazo de vida útil admissível para cada espécie de bem (art. 57, § 3º). Em
cumprimento a esse dispositivo, a RFB baixou a Instrução Normativa (IN)
n. 4/1985, nos seguintes termos:

O Secretário da Receita Federal, em exercício, no uso de suas atribuições, e,


com fundamento no disposto no artigo 202, § 1º, do Regulamento do Imposto de
Renda, aprovado pelo Decreto n. 85.45٠, de 4 de dezembro de 198٠,
RESOLVE:

345
I – Fixar em cinco anos o prazo de vida útil admissível para fins de depreciação
de computadores e periféricos (“hardware”);
II – Fixar em cinco anos o prazo mínimo admissível para amortização de custos
e despesas de aquisição e desenvolvimento de logiciais (“software”), utilizados em
processamento de dados.

Portanto, no regime da Lei n. 4.506/64, tem-se que: (i) a amortização de


direitos é dedutível desde que eles tenham prazo de existência ou exercício
limitado; (ii) cabia à RFB fixar o prazo de vida útil; e (iii) em
cumprimento dessa obrigação, a RFB limitou-se a dizer que o prazo
mínimo era de 5 anos.

A Lei n. 12.973/2014 retomou o assunto e, utilizando a nomenclatura


adotada pelas normas contábeis atuais, dispôs que a amortização de
direitos classificados no ativo intangível é dedutível do lucro real:

Art. 41. A amortização de direitos classificados no ativo não circulante


intangível é considerada dedutível na determinação do lucro real, observado o
disposto no inciso III do caput do art. 13 da Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de
1995.

A IN n. 1700/2017 foi no mesmo sentido, tendo sido acrescentada uma


referência explícita à observância das normas contábeis:

Art. 126. A amortização de direitos classificados no ativo não circulante


intangível, registrada com observância das normas contábeis, é dedutível na
determinação do lucro real e do resultado ajustado, desde que o direito seja
intrinsecamente relacionado com a produção ou comercialização dos bens e
serviços.

Parece-nos que, no tocante à amortização de software, o regime trazido


pela Lei n. 12.973/2014 e pela IN n. 1700/2017 não trouxe inovações
relevantes quando comparado com o regramento já previsto pela Lei n.
4.506/64 (a qual, ressalte-se, continua em vigor).

346
Em ambos os casos, apenas o software com vida útil limitada pode ser
submetido a amortização – e, em ambos, a amortização é tratada como
uma despesa dedutível, desde que a aquisição do software seja relacionada
às atividades da pessoa jurídica. No primeiro caso, a própria legislação
fiscal exigia, diretamente, que a existência ou exercício do direito fossem
limitados; no segundo, a legislação fiscal faz referência à normatização
contábil – que, como visto, determina que apenas intangíveis com vida útil
definida são amortizáveis.

A legislação fiscal não estabelecia, e nem estabelece, a obrigatoriedade


de se adotar o método linear de amortização. Na realidade, considerando
que a IN n. 1.700/2017 faz expressa referência às normas contábeis – e
que, como visto, o item 97384 do CPC/04 esclarece que a adoção de
amortização linear é residual –, parece-nos que atualmente há bons
argumentos para se sustentar que o critério de amortização adotado na
escrituração contábil deve surtir efeitos fiscais, seja ele linear ou não.

Todavia, há que se ter em mente que, muito embora a IN n. 1.700/2017


tenha consolidado os prazos de vida útil aplicáveis a diversos bens, os
programas de computador não foram mencionados – e, por isso, eles
continuam submetidos ao regramento previsto pela IN n. 4/85, que não foi
formalmente revogada e prevê um prazo mínimo de cinco anos.

Esse assunto foi bem discutido pelo CARF no Acórdão n. 1401001.607,


de 3 de maio de 2016, no qual os seguintes fatos (ocorridos em 2009)
foram analisados: determinada pessoa jurídica adquiriu licenças sobre
software (relacionado à elaboração de sua escrituração fiscal) e deduziu as
despesas a ele relacionadas de uma só vez, no ano da aquisição, sob o
argumento de serem elas necessárias e usuais.

347
O fisco glosou a dedução de tais despesas. Ao analisar o recurso do
contribuinte, o relator do acórdão, Conselheiro Antônio Bezerra Neto,
afirmou que:

i) dispêndios com a aquisição de softwares devem ser classificadas no ativo


intangível, e não levados a resultado;
ii) alguns ativos intangíveis até podem estar contidos em elementos que
possuem substancia física; nesses casos, deve ser aplicada a regra da
significância prevista pelo CPC/4;
iii) o software classificado no intangível pode ser amortizado – e as despesas
decorrentes de tal amortização são dedutíveis, nos termos do artigo 58 da Lei
n. 4.506/64; e
iv) todavia, a dedução está limitada a 20% por ano, conforme previsto pela IN
n. 4/85.

Como mencionado, esse precedente analisou fatos ocorridos antes da


vigência da Lei n. 12.973/2014 e da edição do CPC/4 (embora tenha sido
feita referência às disposições deste último). A despeito disso, em nossa
opinião, as conclusões a que o CARF chegou continuam valendo mesmo
no novo regime.

4. CONCLUSÃO

O software de prateleira, assim entendido aquele que não é feito sob a


especificação dos usuários e é distribuído em grande número, qualifica-se
como “mercadoria”, conforme já decidido pelo STF.

Em razão disso, e a despeito de a transferência de tal ativo normalmente


ocorrer mediante a celebração de licenças de uso, a contraprestação paga
pelos usuários se qualifica como preço de compra de uma mercadoria – e
não como royalties.

Justamente por se qualificar como preço, o pagamento de tal


contraprestação para um beneficiário no exterior não deveria se sujeitar à

348
incidência do IRF (que seria devido caso se tratasse de royalties).

Embora a posição da RFB sobre o assunto pareça ter vacilado ao longo


dos últimos quinze ou vinte anos, o fato é que os pronunciamentos da
COSIT no sentido de que a aquisição internacional de software provoca a
incidência do IRF se referiam primordialmente a licenças de
comercialização, e não licenças de uso. E, embora até existam precedentes
do CARF afirmando que licenças de comercialização de software de
prateleira também se qualificariam como “mercadorias”, reconhecemos
que a discussão nesses casos é um pouco mais difícil.

Uma vez definido que, para fins fiscais, a aquisição de uma licença de
uso de um software de prateleira equivale à aquisição de uma mercadoria,
as consequências para fins de dedutibilidade de despesas são praticamente
automáticas: o software adquirido (ou, melhor dizendo, a licença a ele
relativa) deve ser contabilizado como um ativo intangível pelo usuário – e,
como tal, estará sujeito a amortização pelo prazo de duração e/ou vida útil,
determinado de acordo com as regras contábeis (CPC/4).

Os encargos de amortização representam despesas dedutíveis para fins


de IRPJ e CSL – desde que, evidentemente, o software seja relacionado às
atividades do contribuinte. Todavia, a dedução de tais encargos é limitada
pelas taxas divulgadas pela RFB (atualmente fixadas em 20% ao ano).

Além desse tratamento nos parecer mais adequado do ponto de vista da


realidade dos fatos, as implicações tributárias dele decorrentes são menos
onerosas para o adquirente do software (i.e., o usuário) quando
comparadas com o pagamento de royalties, dado que: (i) não haveria IRF
sobre o pagamento por ele feito ao exterior, e (ii) ao longo do tempo, o

349
custo por ele incorrido seria (em regra) inteiramente dedutível do lucro
real e da base de cálculo da CSL.

350
Tratamento jurídico-tributário do download
de software no Brasil
Matheus Carneiro Assunção385

1. INTRODUÇÃO

A intensificação dos negócios jurídicos envolvendo bens e serviços


digitais ao longo dos últimos anos tem trazido enormes desafios para o
Direito Tributário brasileiro. Um deles é o enquadramento jurídico-
tributário das transferências eletrônicas de software.

O tema já foi enfrentado pelo Supremo Tribunal Federal386, mas ainda


suscita divergências no campo dos limites para o exercício das
competências tributárias dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios. É sobre tais divergências, concernentes aos conceitos de
“mercadoria” e “serviços” e seus impactos tributários – inclusive na
tributação sobre a renda – que buscaremos tratar nas linhas seguintes.

2. OS CONCEITOS DE “MERCADORIA” E “SERVIÇOS” NA


ECONOMIA DIGITAL

Os conceitos de “mercadoria” e “serviços” são essenciais para a


identificação dos limites constitucionais para o exercício das competências
tributárias previstas nos artigos 155, II e 156, III, da Constituição da
República387. Tais conceitos, arrimados no direito privado, não podem ser
alterados ao talante do legislador estadual, distrital ou municipal, haja vista
a previsão do art. 110 do Código Tributário Nacional388.

Em outras palavras: a liberdade para a especificação das hipóteses de


incidência do imposto sobre operações relativas à circulação de

351
mercadorias (ICMS) e do imposto sobre serviços de qualquer natureza
(ISSQN) é limitada, não podendo extrapolar o alcance semântico dessas
expressões. Cabe, porém, indagar: mas o que se entende por “mercadoria”
para fins de incidência do ICMS? O fornecimento de programas de
computador por meio de transferências eletrônicas de dados pode ser
considerado uma operação de circulação de mercadoria ou um serviço?

O conceito de mercadoria, no Direito Comercial, é historicamente


ligado à suscetibilidade de um bem móvel ser objeto de um contrato de
compra e venda mercantil389. Seriam, pois, “utilidades materiais postas à
compra e venda”390.

Na definição de Fran Martins, baseada no Código Comercial de 1850,


“chamam-se mercadorias as coisas que comerciantes adquirem com a
finalidade específica de revender”391. Para Pontes de Miranda, a expressão
“mercadoria”, enfim, há de ser recebida no sentido de qualquer bem,
corpóreo ou incorpóreo, “que possa ser alienado como elemento de
circulação comercial”392.

Esse aspecto finalístico também é ressaltado por Roque Antonio


Carrazza, para quem “a qualidade distintiva entre bem móvel (gênero) e
mercadoria (espécie) é extrínseca, consubstanciando-se no propósito de
destinação comercial”393. Nessa mesma linha, a jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que “a configuração da
hipótese de incidência do ICMS reclama a ocorrência de ato de mercancia,
vale dizer, a venda da mercadoria”394.

Note-se que não apenas bens corpóreos, mas também incorpóreos


podem ser objeto de atividade econômica organizada para a circulação no
mercado. A própria Constituição, aliás, qualifica como mercadoria a

352
energia elétrica (art. 155, § 3º), que é um bem intangível por natureza. Ou
seja, a tangibilidade não é requisito intrínseco às mercadorias, ao menos
para fins tributários.

Se, no passado, a circulação comercial de bens e a prestação de serviços


dependiam sobremodo de contatos presenciais, na economia digital as
trocas econômicas cada vez mais prescindem de corporalidade. Há
diversas situações sujeitas à tributação que se manifestam de forma
desmaterializada, em cessões de bens e prestações de serviços on line395.

Contudo, nada obstante as trocas virtuais no ciberespaço tenham se


tornado corriqueiras, pairam ainda incertezas sobre a possibilidade de
programas computacionais cuja distribuição no mercado não se encontra
vinculada a suportes tangíveis serem considerados mercadorias para fins
de incidência do ICMS, em função do regime jurídico de proteção da
propriedade intelectual a que se submetem e de diferenças específicas
entre aqueles comercializados de forma padronizada, em larga escala, e
aqueles customizados de acordo com as necessidades do adquirente.

3. O DOWNLOAD DE SOFTWARE: ASPECTOS JURÍDICO-


TRIBUTÁRIOS

A Lei n. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 (“Lei de Direitos Autorais”),


em seu art. 7º, XII, prevê que os programas de computador são obras
intelectuais protegidas independentemente do meio (físico ou intangível)
em que estejam expressas396. O art. 2º da Lei n. 9.609/98, por sua vez,
confere aos programas de computador o mesmo regime de proteção das
obras literárias.

O direito de propriedade intelectual protege a obra imaterial, vale dizer,


a criação do espírito (corpus mysticum), tendo importância secundária o

353
suporte físico (corpus mechanicum) no qual ela esteja incorporada. Em
verdade, a tecnologia digital tem desmaterializado o suporte físico das
obras intelectuais, permitindo a criação de um novo tipo de suporte, digital
e intangível, desterritorializado no ciberespaço397. Os downloads por meio
da internet possibilitam a reprodução ilimitada e simultânea de bens
digitais sem necessidade de entrega de suportes físicos. No entanto, não
implicam a transferência dos direitos patrimoniais sobre a obra,
disciplinados pelo contrato firmado entre as partes, com fundamento no
art. 49 da Lei n. 9.610/98398.

Em decorrência do tratamento normativo das operações econômicas


envolvendo direitos autorais, mesmo nos casos de transferência total de
titularidade sobre programas de computador, o que ocorre é um negócio
jurídico de cessão de direitos, que não se confunde com uma compra e
venda. Esta pode até existir nos casos de alienação envolvendo suportes
físicos para o programa, mas não acarreta a transferência de propriedade
sobre a criação intelectual. Em regra, o software não sofre transferência de
domínio, mas simplesmente tem seu uso licenciado pelo titular dos direitos
autorais.

A obra imaterial, representada por um conjunto organizado de códigos,


geralmente permanece sob o domínio do desenvolvedor (titular dos
direitos de autor), o qual autoriza a comercialização de suportes físicos
para fins de licenciamento. A licença realiza uma autorização de uso, mas
não gera transferência de direitos de direitos patrimoniais sobre a obra
intelectual399. Embora a Lei n. 9.609/98 utilize os termos
“comercialização”, “circulação comercial”, “venda” e “outras formas de
transferência”, a sugerir que cópias do programa, como mercadorias,
podem se submeter à cadeia de intermediação própria do comércio, não se

354
deve olvidar o regime jurídico de proteção da propriedade intelectual do
software. A depender do tipo de negócio jurídico envolvendo o programa
de computador, as consequências tributárias podem ser diversas.

Nada obstante conste da lista de serviços anexa à Lei Complementar n.


116/2003 o “licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de
computação”, deve-se distinguir o licenciamento desenvolvido
especificamente para certo usuário (“por encomenda”) do licenciamento
do chamado software “de prateleira” (“off the shelf”), vale dizer, de
programas disponibilizados em larga escala no mercado, de forma
padronizada, com base no entendimento firmado pelo Supremo Tribunal
Federal no julgamento do Recurso Extraordinário n. 176.626/SP.

Nesse precedente, assentou-se que a produção em massa para


comercialização e a revenda de exemplares do corpus mechanicum da obra
intelectual que neles se materializa não caracterizam serviços de
licenciamento ou cessão de direitos de uso da obra. De outra banda, a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que
“se tais programas de computação são feitos em larga escala e de maneira
uniforme”, sendo colocados no mercado para aquisição por qualquer um,
“passam a ser considerados mercadorias que circulam, gerando vários
tipos de negócio jurídico” e sujeitando-se à tributação pelo ICMS400. Tal
entendimento, porém, sedimentou-se na análise de casos concretos
envolvendo software com suportes físicos comercializados.

Tratando-se de operações de transferências eletrônicas (download), a


questão precisa ser examinada também com base em outros aspectos. Isso
porque os downloads de bens digitais geralmente não importam
transferências de titularidade sobre a obra intelectual (art. 37 da Lei n.
9.610/98), tampouco a alienação de suportes físicos.

355
Com efeito, as transferências digitais escapam à noção tradicional de
“circulação de mercadorias”, pois possibilitam a obtenção de softwares
diretamente por meio da internet, sem que ocorra qualquer mudança de
domínio sobre a utilidade em si mesma considerada (o “estoque” da
empresa que as comercializa no ciberespaço não diminui em função da
quantidade de aquisições).

Dadas as peculiaridades desses negócios, José Eduardo Soares de Melo


pontua que os bens digitais não consubstanciam as características de
âmbito legal e constitucional de mercadoria, lembrando que o software
representa um produto intelectual, objeto de cessão de direitos401. Elidie
Palma Bifano, a seu turno, considera que a atividade de download não se
caracteriza como operação sujeita ao ICMS, por carecer o bem digital das
características de mercadoria e por lhe faltar o corpus mechanicum402. Em
linha distinta, Guilherme Cezaroti observa que a corporalidade não é um
requisito intrínseco das mercadorias, podendo as cessões totais de direitos
de propriedade intelectual ser qualificadas como vendas de mercadorias
intangíveis, sujeitas ao ICMS403.

No julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de


Inconstitucionalidade n. 1.945, o Supremo Tribunal Federal tratou da
controvérsia, ao apreciar pedido de provimento jurisdicional para
suspender a eficácia de dispositivo da legislação do Estado do Mato
Grosso que previa a incidência do ICMS sobre operações com programas
de computador, “ainda que realizadas por transferência eletrônica” (art. 2º,
§ 1º, VI, da Lei n. 7.098/98).

O Ministro Relator Octavio Gallotti votou no sentido de suspender a


eficácia da expressão “ainda que realizadas por transferência eletrônica de
dados”, e de que fosse fixada a exegese de restringir a incidência do ICMS

356
às operações de circulação de cópias ou exemplares dos programas de
computador, produzidos em série e comercializados no varejo, não
abrangendo o licenciamento ou cessão de uso dos programas.

Após alguns anos de suspensão do julgamento em virtude de pedido de


vista, o Ministro Nelson Jobim, apresentou voto adotando o entendimento
de que o ICMS pode incidir sobre software adquirido por meio de
transferência eletrônica de dados. Posteriormente, o Ministro Ricardo
Lewandowski trouxe voto-vista acompanhando o Relator e registrando que
a possibilidade de incidência do ICMS sobre software adquirido mediante
transferência eletrônica de dados encontra dificuldades materiais e uma
série de obstáculos de ordem técnica, inerentes ao comércio eletrônico.

Entretanto, por maioria, o Plenário do STF reconheceu a possibilidade


de incidência do ICMS nas hipóteses de transferências eletrônicas de
software, constando da ementa do julgado a irrelevância da discussão
sobre a existência de bem corpóreo ou mercadoria em sentido estrito, e que
“o apego a tais diretrizes jurídicas acaba por enfraquecer o texto
constitucional, pois não permite que a abertura dos dispositivos da
Constituição possa se adaptar aos novos tempos, antes imprevisíveis”404.

Apesar de não ter ocorrido o exame do mérito, o posicionamento do


STF traz balizas para a hermenêutica constitucional de expressões
veiculadas na regra-matriz de incidência do ICMS, no que tange às novas
operações envolvendo transferências eletrônicas de dados típicas da
economia digital.

A abertura adotada pela Corte, reforçada com o entendimento de que o


conceito de “serviços de qualquer natureza” e seu alcance no texto
constitucional não é condicionado de forma imutável pela legislação

357
infraconstitucional, admitindo-se uma interpretação mais ampla,
desvinculada do conceito de “obrigação de fazer”405, traz novas
dificuldades para a demarcação dos espaços para o exercício das
competências tributárias previstas para o Estado, o Distrito Federal e os
Municípios. Dificuldades que já se refletem nos planos legislativo,
consultivo e jurisprudencial.

No Estado de São Paulo, o Decreto n. 61.522/2015 revogou o Decreto


n. 51.619/2007, que previa como base de cálculo do ICMS, para as
operações com programas de computador, o dobro do valor do suporte
informático (mídia). Por conseguinte, passou a ser possível a cobrança do
ICMS calculado com base no valor total da operação, cobrado do
adquirente do software, independentemente da forma de aquisição (meio
de mídia ou transferência eletrônica de dados, por download ou
streaming). O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao analisar
mandado de segurança impetrado com o objetivo de afastar da tributação
pelo ICMS a revenda de licença de programas de computador, entendeu
que o referido Decreto Estadual apenas adequou a hipótese de incidência
do ICMS à realidade atual, uma vez que o software “pode ser
comercializado por meio de transferência eletrônica, sem descaracterizar a
sua natureza mercantil”406.

A questão também foi levada ao Supremo Tribunal Federal, por meio


da ADI n. 5.576, proposta pela Confederação Nacional de Serviços – CNS.
Na sua petição inicial, a entidade sustenta que “tanto a elaboração de
programas de computador, quanto seu licenciamento ou cessão de direito
de uso são serviços e, como tais, pertencem ao campo de incidência do
ISS”407.

358
Na mesma linha de raciocínio, o Parecer Normativo SF n. 1, de 18 de
julho de 2017, da Secretaria de Finanças do Município de São Paulo, a
pretexto de “uniformizar a interpretação acerca do enquadramento
tributário dos negócios jurídicos de licenciamento ou cessão de direito de
uso de programas de computação”, seja por meio de suporte físico ou no
caso de transferência eletrônica de dados (download de software) ou
quando instalados em servidor externo (Software as a Service – SaaS),
consignou que tais negócios se inserem na previsão normativa da lista de
serviços veiculada pela legislação do ISSQN.

E vai além, afirmando que o enquadramento para fins de cobrança do


ISSQN “independe de o software ter sido programado ou adaptado para
atender à necessidade específica do tomador (software por encomenda) ou
ser padronizado (software de prateleira ou off the shelf)”. Nesse ponto,
parece ter ignorado o entendimento jurisprudencial firmado pelo STF e
pelo STJ, contribuindo para o aumento do grau de insegurança jurídica em
torno da tributação na economia digital.

4. REFLEXOS NA TRIBUTAÇÃO SOBRE A RENDA

O enquadramento normativo dos negócios jurídicos envolvendo


transferências eletrônicas de software tem também reflexos na tributação
sobre a renda das pessoas jurídicas.

No que tange ao regime do lucro presumido, de acordo com a Solução


de Consulta Cosit n. 123/2014, o desenvolvimento e edição de software
pronto para o uso (standard ou de prateleira) “classifica-se como venda de
mercadoria e o percentual para a determinação da base de cálculo do
imposto é de 8% sobre a receita bruta”. Por outro lado, o desenvolvimento
de software por encomenda “classifica-se como prestação de serviço e o

359
percentual para determinação da base de cálculo do imposto é de 32%
sobre a receita bruta” (arts. 518 e 519 do Decreto n. 3.000/99). Caso seja
desempenhada concomitantemente mais de uma atividade, “o percentual
de presunção correspondente deve ser aplicado sobre o valor da receita
bruta auferida em cada atividade”.

Na mesma linha de raciocínio, a Receita Federal do Brasil tem


entendido que as importâncias pagas ou creditadas por pessoa jurídica a
outra pessoa jurídica pelo licenciamento de programas de computador –
customizáveis ou não customizáveis – produzidos ou comercializados em
série, prontos para o uso, não desenvolvidos sob encomenda, escapam à
retenção do Imposto sobre a Renda na fonte, por não configurarem
remuneração de serviços de natureza profissional. Todavia, quando o
serviço de customização, prestado pelo licenciante, “mais do que simples
ajustes, produzir melhorias ou acréscimos de funcionalidades ao programa
customizável preexistente, implementados por solicitação do cliente, para
atender suas necessidades específicas”, a hipótese seria de retenção na
fonte408. A premissa subjacente a esse posicionamento é de que o
licenciamento de programas de computador “de prateleira”, de forma não
exclusiva, equivale a uma circulação de mercadorias, e não caracteriza
uma atividade de prestação de serviços.

O foco, portanto, permanece sobre a distinção entre o software


desenvolvido por encomenda e aquele do tipo “off the shelf”. Nesse
pormenor, o entendimento adotado pela RFB é mais um elemento de
dissonância na controvérsia sobre o alcance dos conceitos de “mercadoria”
e “prestação de serviços”. Uma dissonância que, cada vez mais, aumenta o
grau de insegurança do contribuinte em relação aos efeitos tributários de
transferências eletrônicas de software.

360
5. CONCLUSÕES

O tratamento jurídico-tributário do download de software no Brasil é


permeado de divergências conceituais que alimentam a litigiosidade e
prejudicam a busca de segurança jurídica no contexto da economia digital.

Nota-se uma dissipação dos conceitos tradicionais de “mercadorias” e


“serviços” em face da nova realidade de trocas econômicas no
ciberespaço. Essa realidade impõe a necessidade de se repensar a
adequação do modelo de tributação sobre o consumo de bens e serviços
digitais pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, de
maneira a evitar o exercício de competências tributárias não respaldadas
constitucionalmente.

É igualmente imperativo buscar-se a redução de dissonâncias


conceituais projetadas no exercício das competências tributárias da União,
notadamente no que tange à tributação das pessoas jurídicas dedicadas ao
desenvolvimento e licenciamento de programas de computador.

361
Aspectos da tributação decorrente da
importação do cloud computing no Brasil
Henrique Munia e Erbolato409 e Lucas Di Francesco Veiga410

1. INTRODUÇÃO

As controvérsias acerca da tributação de software411 não são novas e,


com a evolução da tecnologia, há atualmente um novo componente: o
acesso a partir da “nuvem”, comumente chamada de cloud computing,
diretamente em dispositivo eletrônico – computador, celular ou tablet.

Há quase duas décadas, o Supremo Tribunal Federal (STF) distinguiu o


software “de prateleira” dos realizados “sob encomenda” para usuário
específico. Este posicionamento ainda serve de parâmetro para o tema,
porém a realidade é que o cloud computing trouxe novos elementos sobre
o tema.

Esse cenário de insegurança jurídica aparece tanto nas operações


realizadas no Brasil, como também em operações transfronteiriças,
refletindo na incidência de tributos federais quando da importação de
software, a saber: o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição
para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) na importação, a
Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) e o Imposto
de Renda Retido na Fonte (IRRF).

Nesse contexto, o escopo do presente estudo é a análise das


modalidades de cloud computing e a subsunção destas ao sistema tributário
atualmente vigente no Brasil, notadamente no que toca aos aspectos
relativos à chamada “tributação direta” na importação de software.

362
2. CONCEITO DE CLOUD COMPUTING E SUAS MODALIDADES

A doutrina se baseia no Direito Internacional para fundamentar


conceitos, enquanto não existe uma lei específica no Brasil definindo a
natureza jurídica do cloud computing412.

O National Institute of Standards and Technology (NIST), agência


especializada do Departamento de Comércio dos Estados Unidos da
América para regular o desenvolvimento de tecnologias, define o cloud
computing como um modelo que permite o acesso de forma conveniente a
uma rede compartilhada de recursos de computação configuráveis (por
exemplo, redes, servidores, armazenamento, aplicativos e serviços), que
podem ser rapidamente provisionados e liberados com o mínimo esforço
de gerenciamento ou interação do provedor de serviços413.

Dessa maneira, é possível afirmar que a nuvem oferece praticidade ao


usuário que não queira instalar software, configurar sistemas e/ou
armazenar ou processar dados. Seguindo as definições do NIST para o
cloud computing, é possível ainda afirmar que ele possui as seguintes
características:

•fornecimento de recursos de computação, sob demanda específica,


automatizada e sem interação humana;
•disponibilização de recursos em rede, acessados por qualquer equipamento
com acesso à internet;
•capacidade de atender múltiplos usuários, sem que o usuário tenha controle dos
equipamentos e conhecimento da localização dos recursos fornecidos;
•recursos, a princípio, ilimitados e que podem ser adquiridos em qualquer
quantidade e hora; e
•recursos que podem ser medidos automaticamente pelo fornecedor.

Diante dessas características, na concepção do NIST, são três as


modalidades mais conhecidas de cloud computing, muito embora haja
outras, inclusive reportadas no Plano de Ação 1 do programa da

363
OCDE/G20 conhecido como Base Erosion and Profit Shifting Program
(BEPS)414:

•Infrastructure as a Service – IaaS (Infraestrutura como Serviço): consiste na


contratação de infraestrutura instalada em um ambiente virtual, fisicamente
localizada dentro da empresa fornecedora, sendo disponibilizada ao usuário
pelo tempo e espaço que forem necessários;
•Software as a Service – SaaS (Software como Serviço): fundamenta-se no
acesso remoto da internet aos recursos computacionais que são oferecidos sob
demanda exclusiva de um usuário, o qual não controla a infraestrutura; e
•Platform as a Service – PaaS (Plataforma como Serviço): possibilita a
implementação e desenvolvimento de outras aplicações na nuvem, vez que
oferece infraestrutura de colaboração entre desenvolvedores, com rede,
servidor, sistema operacional e linguagem de programação.

Após a definição do cloud computing e de suas modalidades, passamos


a analisar a legislação tributária brasileira pertinente ao tema.

3. TRIBUTAÇÃO DA ECONOMIA DIGITAL

A tributação da economia digital não é um desafio exclusivo do Brasil.


A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) possui plano de ação específico no âmbito do BEPS para
endereçar esta questão (Action Plan 1)415, vez que os avanços tecnológicos
cresceram mundial e exponencialmente, e a atenção das autoridades fiscais
globais também aumentou com o passar dos anos416.

No Brasil, a subsunção da hipótese de incidência descrita para um


evento supostamente tributável na internet raramente é isenta de
controvérsia e tem causado insegurança jurídica, dado que não há clareza
se determinada tecnologia está sujeita a tributação específica417, seja (i)
pela rápida evolução das tecnologias, (ii) pela demora do Poder
Legislativo em acompanhá-la, ou ainda (iii) pelo alto volume de trabalho
ou desinteresse por parte de quem fiscaliza empresas deste segmento418.

364
3.1. A legislação tributária: definindo-se o cloud computing por intermédio do
conflito entre o ICMS e o ISS

Ainda que a tributação indireta não seja objeto do presente estudo, há


que se esclarecer que a Constituição Federal (CF), em seus artigos 155 e
156, adotou termos como “operação” e “serviço”, “circulação” e
“mercadoria”, com base em figuras jurídicas definidas pelo Direito Civil e
é sob esta ótica que a Receita Federal do Brasil (RFB) também analisa os
conceitos que podem ensejar a tributação federal sobre o cloud computing.

Em síntese, atualmente a competência constitucional dos


Estados/Distrito Federal e dos Municípios para instituir, respectivamente,
o ICMS e o ISS, está atrelada à observância dos termos como “operação” e
“serviço” definidos pelo Direito Civil e Comercial, não podendo legislação
interna desses entes subverter um conceito diverso para que corresponda a
uma suposta “operação” ou um suposto “serviço”, pois extrapolaria
competência delegada pela CF, o que é vedado pelos artigos 109 e 110 do
CTN419.

Nesse sentido, os Estados/Distrito Federal possuem competência


tributária para cobrar o ICMS, nos termos previstos pelo artigo 155, inciso
II, da CF, intrinsicamente ligada à existência de operações relativas à
circulação de mercadorias e prestações de serviços de transporte
interestadual/intermunicipal e de comunicação, devidamente
regulamentada pela Lei Complementar n. 87/96 (LC n. 87/96).

As expressões “circulação” e “mercadorias” são utilizadas pela LC n.


87/96 como adjetivos do substantivo “operações”, delimitando sobre quais
negócios jurídicos terá alcance o ICMS. A “circulação” corresponde ao
nascimento da obrigação tributária para a incidência do ICMS, interpretada
pela movimentação física de um bem que acarrete transmissão de

365
propriedade. Já a “mercadoria” remete ao bem corpóreo resultante da
atividade empresarial de um produtor/industrial/comerciante, que será
distribuída para consumo. A “operação” é sinônimo de “negócio jurídico”
decorrente da vontade humana de criar, extinguir ou modificar direitos
e/ou relações jurídicas. Desta forma, toda operação que implique
transferência de propriedade de um bem móvel com intuito mercantil
(obrigação de dar), será fato jurídico tributário para incidência do
ICMS420.

Já os Municípios, nos termos previstos pelo artigo 156, inciso III, da


CF, possuem competência tributária para cobrar o ISS sobre serviços
incluídos na lista taxativa da Lei Complementar n. 116/2003 (LC n.
116/2003) e não compreendidos na competência dos Estados/Distrito
Federal.

Com efeito, o vocábulo “serviço” deve ser entendido como o resultado


da atividade humana de criação (obrigação de fazer) mediante contribuição
– aqui não incluída a locação de bens móveis, definida como exemplo de
“obrigação de dar”421 e relevante na análise dos autores. Nesta perspectiva,
em todo negócio jurídico manifestado por uma parte (prestador) que se
obrigue a fazer algo a outra (tomador) e pela qual será retribuída (preço),
ensejará a incidência do ISS.

Diante do contexto acima, há diferentes correntes de interpretação sobre


o cloud computing: “circulação” de “mercadoria” tributável pelo ICMS,
“prestação” de “serviço” tributável pelo ISS; e até outra que entende que
nenhum dos dois tributos seria aplicável.

De todo modo, diante dos conceitos jurídicos disponíveis na atual


legislação tributária em vigor brevemente expostos, qual seria a

366
consequência às operações transfronteiriças relacionadas ao cloud
computing?

Como se sabe, o cloud computing consiste em “meio” para que o


software seja acessado por seus usuários. A nuvem, dessa forma, é o meio;
a visualização ou o armazenamento de determinado conteúdo veiculado
por intermédio da nuvem é o fim almejado. O acesso ao software pelo
usuário, quando da disponibilização em nuvem pelo fornecedor, representa
a evolução tecnológica do “meio” para que o usuário tenha acesso ao
conteúdo que deseja.

Nada obstante, há que se ressaltar que a disponibilização de software


via cloud computing é realizada por intermédio de contratos de licença de
direito de uso422. Inclusive, ressalta-se que para nenhuma das modalidades
IaaS, SaaS e PaaS de cloud computing há transferência total ou parcial dos
direitos autorais (bem móvel incorpóreo) sobre os softwares ao usuário,
mas sim, e tão somente, do seu direito de uso.

Em decorrência disso, torna-se necessário saber como as modalidades


de cloud computing são oferecidas, a fim de se definir o tratamento
tributário aplicável. Dessa maneira, especificamente em relação às
modalidades IaaS, SaaS e PaaS de cloud computing, tem-se o seguinte:

•IaaS (Infrastructure as a Service): os contratos formalizados são para uso de


espaço em servidor externo ao ambiente do usuário, com a finalidade de
armazenamento de dados sem que o usuário tenha a necessidade de se
aparelhar com servidores à medida que opte por aumentar sua capacidade de
armazenamento digital (exemplos seriam a Amazon Web Services e o
Rackspace, que são softwares pay-per-use, onde se contrata a utilização de
servidores por um período determinado e depois, quando não mais for
necessário, cancela-se a utilização);
•SaaS (Software as a Service): os contratos pactuados são para acesso remoto,
pela internet, de software com propósito específico disponibilizado ao usuário
sem a instalação em máquina própria, pagando, ou não, pelos recursos

367
utilizados (exemplos seriam o Google Drive ou o Dropbox, que são softwares
de armazenamento em nuvem, que permitem o arquivo de documentos ou o
encaminhamento destes a terceiros, ou, então, o Netflix, o Paypal, o primeiro
para armazenamento de filmes e séries, o segundo uma plataforma para
realização de pagamentos); e
•PaaS (Platform as a Service): os contratos celebrados são para uso de
plataforma de computação sob medida ao usuário, com a possibilidade de
desenvolvimento e/ou implementação de aplicativos e isenção do usuário sob
administração e controle da infraestrutura para criação de novos aplicativos e
serviços auxiliares, por limitação ou inexistência de algum fornecedor em
modelo SaaS (exemplos seriam o Microsoft Azure e o Google App Engine, que
são softwares que permitem desenvolver aplicações fundamentais ao modelo
de negócio específico do usuário e que não são encontradas em SaaS já
existentes).

Considerando as características das modalidades IaaS, SaaS e PaaS de


cloud computing, percebe-se que existem, basicamente, duas operações
que podem acontecer individualmente ou em conjunto: a locação de
espaço virtual para armazenamento e/ou o licenciamento de direito de uso
de software (direitos autorais de software). Entretanto, considerando o
atual contexto legislativo, nenhuma das duas reúne características jurídicas
de “mercadoria” e nem podem ser consideradas um “serviço”423.

4. CLOUD COMPUTING E A TRIBUTAÇÃO FEDERAL

As definições apontadas para o cloud computing não se restrigem às


operações realizadas entre partes localizadas no Brasil, ainda mais
considerando que a maioria das empresas que oferecem o cloud computing
estão localizadas no exterior.

Como consequência, as considerações acerca da natureza jurídica


(locação de espaço virtual para armazenamento e/ou o licenciamento de
direito de uso de software) do cloud computing têm seu impacto em
relação aos tributos federais, no que se refere às operações
transfronteiriças.

368
4.1. As interpretações da RFB

A RFB, seguindo o entendimento adotado pelo STF, por meio de Ato


Declaratório Interpretativo n. 7/2014 (ADI n. 7/2014), determinou que
valores pagos, creditados, entregues ou remetidos por residente ou
domiciliado no Brasil, a uma empresa domiciliada no exterior, pela
disponibilização de infraestrutura para armazenamento e processamento de
dados para acesso remoto a data center, deveriam ser considerados, para
fins tributários, como uma prestação de serviços e não uma locação de
bem móvel, devendo incidir: PIS/COFINS-Importação, IRRF, e CIDE.
Esse era o entendimento da RFB, muito embora o ADI n. 7/2014 tratasse
de data centers e não de cloud computing, a princípio semelhantes, mas
que tecnicamente possuem características distintas424.

Posteriormente, por meio da Solução de Consulta n. 191/2017, a RFB


emitiu seu posicionamento acerca do tratamento tributário aplicável às
aquisições de software do exterior, onde foram apresentadas algumas
caraterísticas necessárias à classificação do SaaS:

•o assinante não adquire o software, mas tão somente acessa os recursos à


distância, por meio da internet, utilizando senhas previamente definidas;
•o assinante paga uma mensalidade não só relativa à licença de direito de uso,
mas também pela manutenção, atualização e suporte técnico em caso de
necessidade;
•o assinante não tem ingerência sobre a infraestrutura dos recursos
computacionais, bem como não tem o poder de modificar os programas
disponíveis; e
•os direitos autorais envolvidos não são objeto de comercialização.

Resumidamente, segundo o entendimento da RFB, para este tipo de


SaaS não haveria que se falar em efetiva transferência do software, mas,
apenas, no acesso aos recursos disponibilizados à distância. Assim, o
usuário não receberia o software para instalá-lo em seu próprio dispositivo

369
e caberia ao fornecedor prover a manutenção e o suporte técnico para o
funcionamento do software425.

Nesta oportunidade, a RFB houve por bem classificar a atividade como


um “serviço técnico” decorrente de estruturas automatizadas com conteúdo
tecnológico, nos termos do artigo 17, da Instrução Normativa RFB n.
1.455/2014426, estando os valores atinentes às aquisições de software no
exterior sujeitas à incidência do IRRF e da CIDE.

Em complemento, por meio da Solução de Consulta COSIT n.


499/2017, a RFB reiterou o entendimento anterior e determinou que:

as aquisições do exterior de autorizações de acesso e de uso de programas ou


aplicativos disponibilizados em computação em nuvem (cloud computing), também
conhecidos como Software as a Service (SaaS), devem ser objeto de registro no
Siscoserv427.

4.2. As interpretações dos autores

Não obstante a interpretação da RFB sobre cloud computing (ao menos


relação às situações analisadas por meios do ADI n. 7/2014 e das Soluções
de Consulta 191 e 499/2017), os autores entendem que as conclusões
foram incompletas ou equivocadas a partir das premissas adotadas
anteriormente, ou seja, o cloud computing como sendo a locação de espaço
virtual para armazenamento e/ou o licenciamento de direito de uso de
software (direitos autorais de software).

Frise-se que tais atividades podem ser prestadas, mas dentro do


contexto do suporte e/ou manutenção do software licenciado, seja via
download ou por meio do cloud computing. O que ocorre é que estas são
parte do licenciamento feito, ou seja, quando um fornecedor usa a
tecnologia para a produção de um software, o fim é o software em si e não
o suporte ou atividade necessária ao seu funcionamento. Financeiramente

370
eles compõem o preço do software licenciado, novamente via download ou
por meio do cloud computing.

Nesse sentido, a RFB na Solução de Divergência COSIT n. 18/2017


distinguiu licença de uso e licença de comercialização e/ou distribuição de
software, aplicando o entendimento pela incidência do IRRF a este último
tipo de licença na situação em que existe um intermediário no Brasil que
irá distribuir posteriormente as licenças de uso aos clientes finais.

E mais, foi analisada na Solução de Divergência COSIT n. 18/2017 e na


Solução de Consulta n. 191/2017 a situação em que (i) um residente ou
domiciliado no exterior, titular de um software, firma com uma empresa
brasileira um contrato de licença de direito de comercialização/distribuição
do software, e (b) a mesma empresa brasileira posteriormente vende as
licenças de uso do software a consumidores finais no Brasil.

Conforme é possível verificar, a RFB interpretou que há duas relações


jurídicas distintas e restringe sua análise à primeira etapa da operação,
entendendo que as importâncias pagas ao fornecedor localizado no exterior
em contraprestação pelo direito de comercialização ou distribuição de
software, para revenda a consumidor final, o qual receberá uma licença de
uso do software, são considerados royalties, sujeitos ao IRRF.

Diante desse contexto, por exclusão, percebe-se que o direito de


comercialização de software não se confunde, acertadamente, com a
licença de uso do respectivo software ao usuário final.

Nessa linha de raciocínio, como usualmente não há a transferência da


tecnologia, a remuneração pela licença de uso ou de direitos de

371
comercialização ou distribuição de software não sofre a incidência da
CIDE.

Finalmente, no mesmo sentido, não incidirá PIS/COFINS-Importação


sobre a remuneração paga a residentes ou domiciliados no exterior pela
importação de licenciamento de direito de uso de software; exceto quando
no contrato de licenciamento houver previsão de prestação de serviços (i.e.
manutenção e suporte técnico), sujeitos ao PIS/COFINS-Importação428.

Nesse sentido, na opinião dos autores, a tributação aplicável nas


operações transnacionais contratadas por meio do cloud computing
(modalidades IaaS, SaaS e PaaS) pode variar de acordo com o que for
contratado, podendo ser cumulativa ou exclusiva em caso de separação de
valor de cada item, da seguinte forma:429

Cloud computing (meio) /Objeto IRRF CIDE21 PIS/COFINS

Software Sim Não Não

Serviços não Intrínsecos Sim Sim Sim

Locação de Espaço Virtual Sim Não Não

5. CONCLUSÃO

O cenário mundial atual muito discute e exige segurança jurídica diante


da tributação que será aplicável nas evoluções tecnológicas que apontam
para a quarta revolução industrial.

O Brasil também está inserido nesse contexto e apresenta diversas


dificuldades diante do seu atual sistema tributário e jurisprudência para
poder definir conceitos e dar segurança jurídica aos contribuintes que
realizam operações oferecidas por meio de cloud computing.

372
Atualmente, a RFB entende que cloud computing engloba serviços que
dependem de conhecimentos especializados em informática e decorrem de
estruturas automatizadas com claro conteúdo tecnológico e, portanto,
estariam sujeitos à incidência do IRRF, da CIDE e do PIS/COFINS-
Importação.

Todavia os autores possuem interpretação diversa e entendem que cloud


computing (nas atuais modalidades, i.e. SaaS, IaaS e PaaS) deve ser
classificado como locação de espaço virtual para armazenamento e/ou o
licenciamento de direito de uso de software, sujeitos, destarte, apenas ao
IRRF.

Finalmente, de acordo com o demonstrado neste trabalho, somente no


caso de o cloud computing oferecer serviços não intrínsecos à sua
utilização e cobrados em separado é que deveria haver a incidência da
CIDE e do PIS/COFINS-Importação, além do IRRF.

373
Seção B
Aspectos relacionados à tributação sobre o consumo

Internet das Coisas à luz do ICMS e do ISS:


entre mercadoria, prestação de serviço de
comunicação e serviço de valor adicionado
1 2
Luís Eduardo Schoueri e Guilherme Galdino

INTRODUÇÃO

A evolução tecnológica tem surpreendido os mais otimistas. Dois


exemplos, hoje verificáveis no dia a dia, ilustram a transformação que
testemunhamos.

O primeiro exemplo consiste na “Chamada de Emergência Inteligente”,


a qual constitui mecanismo pelo qual o próprio automóvel conecta-se à
Central de Emergência em caso de acidente. Independe de qualquer ação
humana a transmissão de dados do veículo para a Central. Nessa conexão,
o veículo informa o local e a gravidade do acidente para que a Central
entre em contato com bombeiros e/ou polícia. Enquanto em alguns casos a
Central já vem embutida no próprio veículo, independendo de qualquer
novo instrumento contratual ou pagamento, noutros casos cabe ao
proprietário do veículo optar por tal atendimento, pagando valores
periódicos. Ainda neste último caso, feita a opção, o acionamento da
Central independerá de provocação humana.

374
Já o segundo exemplo é o de roupas dotadas de tecnologia que podem
informar o consumo diário de calorias, padrões de sono e até detectar
problemas de saúde mesmo antes de os sintomas se manifestarem3. Da
mesma forma que no exemplo acima, a mercadoria (roupa) compartilha
informações como aquelas relacionadas ao percentual de gordura, índice
de massa corporal, peso e pressão arterial, disponibilizando-as
oportunamente para diversas finalidades, como uma avaliação médica4.

Esses dois exemplos ajudam a ilustrar como a tecnologia está se


tornando mais sofisticada, acessível e compartilhável. E, quando
informações são partilhadas entre diversos objetos, sem depender de
provocação humana, a compreensão do estado de coisas torna-se mais
complexa5. Muito embora nossa experiência com a conectividade esteja
intrinsecamente relacionada a objetos com telas (televisões, computadores,
tablets e celulares), os quais dependem essencialmente das nossas ações
para receber, tratar e transmitir dados, os exemplos acima revelam a
existência de objetos inteligentes que trocam informações
independentemente de acionamento pelo ser humano6. À rede de tais
objetos denominou-se Internet das Coisas.

O impacto da Internet das Coisas não pode ser exatamente


dimensionado, já que seu desenvolvimento é incipiente e suas aplicações
constituem ainda versões limitadas. A interoperabilidade dos vários
objetos propicia uma infinidade de soluções eficientes para os problemas
existentes, ou até para questões que sequer, hodiernamente, são tratadas
como entraves7. Isso explica tanto seu crescimento vertiginoso8, dado que
seu potencial de impacto é elevado, como a impossibilidade de ainda
dimensioná-lo. Todavia os exemplos acima apresentados parecem
suficientes para evidenciar a gama de desafios jurídicos que podem ser

375
aventados em virtude da transformação das condições materiais causada
pela Internet das Coisas.

É inegável que a qualidade de vida será potencializada na medida em


que mercadorias com funções específicas trabalharão dados sem
intervenção humana, ganhando aplicações antes inimagináveis. Contudo, à
luz dos conceitos jurídicos tradicionais, podem surgir questões em relação
à natureza jurídica de transações envolvendo tais objetos. A questão que
permeia os exemplos reside na discussão acerca de onde encaixar os
produtos que integram e as relações que envolvem a Internet das Coisas.

Este artigo tem como objeto discutir possíveis implicações da tributação


indireta sobre a Internet das Coisas, levando-se em conta esse ponto
comum dos exemplos descritos acima. Embora outras questões atreladas à
tributação direta, sobretudo internacional, possam ser levantadas, como
atribuição de renda a um beneficiário e a existência de estabelecimento
permanente, este artigo tem como escopo apenas abordar a tributação
indireta. Mais especificamente, examinaremos se em tais exemplos pode-
se cogitar a incidência do Imposto sobre Serviços de qualquer natureza
(ISS) ou do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de
Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e
Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), sendo este restrito à circulação
de mercadorias ou envolvendo (também) serviço de comunicação (ICMS-
C). Para tanto, este artigo está dividido em cinco tópicos. Enquanto no
primeiro será abordada a definição do que seja Internet das Coisas, os
outros discutirão esse fenômeno à luz do ICMS e do ISS. Assim, no
segundo tópico, caberá introduzir a discussão e levantar três questões, a
serem respondidas, respectivamente, nos pontos seguintes.

1. O QUE É INTERNET DAS COISAS?

376
A Internet das Coisas é formada por quatro elementos, pois consiste em
uma rede de (i) objetos físicos (ou “coisas”) que se (ii) conectam à Internet
e/ou entre si, com (iii) capacidade de recolher e trocar dados, (iv) sem
necessariamente depender da ação humana9.

Posto restrita a alguns objetos e com limitadas aplicações, não se pode


dizer que a Internet das Coisas constitua fenômeno novo. Há mais de uma
década, existem celulares e computadores como exemplos de coisas que
coletam informações e se conectam entre si. Tampouco se pode dizer que a
sua idealização é de poucos anos atrás, uma vez que a expressão “Internet
das Coisas” (Internet of Things – IoT) já foi empregada em 1999 por
Kevin Ashton10. O que ocorreu recentemente foi o desenvolvimento da
visão expansionista que a envolve: novas fronteiras mercadológicas estão
sendo concebidas.

Embora estejamos acostumados com celulares, tablets ou notebooks,


esses objetos (quase) não trocam informações sem intervenção humana. É
preciso pensar como objetos com aplicações específicas podem coletar,
tratar ou transmitir dados a outros e para qual finalidade. Desse modo, é
sobretudo em virtude da independência da intervenção do homem que o
potencial de impacto da Internet das Coisas é mais recente. Afinal, a
Internet das Coisas compreende, em grande medida, diversos outros
objetos que, dotados de inteligência embutida, software e sensores, podem
detectar, coletar e comunicar diversas informações11. Relógios (e.g. Apple
Watch), escovas de dente, geladeiras, roupas, veículos, casas, prédios e
diversos dispositivos já estão sendo desenvolvidos. A premissa básica é a
de que utensílios comuns podem se tornar inteligentes, uma vez que, além
de transmitirem dados a outros objetos e a seus proprietários, também os
recebem, podendo usá-los para melhor executar suas funções específicas12,

377
tornando-se mais eficientes13. A Internet das Coisas pode, assim, constituir
uma expressiva extensão de dados, propiciando aos usuários uma gama de
utilidades14.

A comunicação entre os objetos pode ocorrer tanto por meio de


aplicativos e mensagens de texto, como por (mini)computadores e outras
ferramentas. Os sensores embutidos, a conectividade com a internet ou até
mesmo a tecnologia Bluetooth permitem uma variedade de formas de
transferência de informação15. Todavia o destaque da Internet das Coisas
está em transformar, sem depender de qualquer ação humana, as várias
transmissões de dados em interoperáveis16, i.e., possibilitar a conexão
onipresente17. Seja no ambiente privado, seja no espaço público, vários
dispositivos poderão detectar, coletar e transmitir diversos dados. Assim,
todos esses aparelhos tecnológicos conectados podem criar informações
(des)interessantes sobre o que se passa a seu redor, seus usuários e ter
algum nível de perceptividade18. Como diversos dados são gerados durante
o dia, de diversas maneiras, os objetos podem, ao trabalharem com essas
informações, tornar nossa vida mais simples e agradável19.

No entanto, por se tratar de fenômeno cuja expansão é recente, diversos


desafios jurídicos podem ser aventados. Além de questões relativas à
privacidade20, patentes21 dentre outras, podem-se levantar desafios
jurídicos no âmbito da tributação. Sob a perspectiva do Direito Tributário
brasileiro, tomando-se como base os exemplos da Chamada de Emergência
Inteligente e das roupas inteligentes, surge a dificuldade de se encaixarem
transações em torno dos objetos inteligentes como meras mercadorias,
prestações de serviços ou prestações de serviços de comunicação.

2. A INTERNET DAS COISAS E OS CONFLITOS DE COMPETÊNCIA:


PERSPECTIVAS À LUZ DO ICMS VERSUS ISS

378
A Constituição Federal atribui a cada uma das pessoas jurídicas de
direito público uma área própria para instituir seus tributos, a qual se
denomina competência tributária. Em virtude da fluidez própria dos tipos
escolhidos pelo constituinte, não é incomum que dois ou mais entes se
considerem intitulados a tributar determinada situação. Há, assim, o
chamado conflito de competência.

No caso de operações relativas à circulação de mercadorias e serviços


de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, a
competência para instituir imposto (ICMS) foi atribuída aos Estados nos
termos do art. 155, II, da Constituição. Por outro lado, seu art. 156, III,
conferiu competência aos Municípios para instituir imposto sobre serviços
de qualquer natureza (ISS), definidos em lei complementar, mas não
podendo abarcar aqueles compreendidos no âmbito da competência dos
Estados. Embora o próprio constituinte tenha cometido ao legislador
complementar a tarefa de fixar a fluidez presente na Constituição, este
pode se ver de mãos atadas ao se deparar com novas realidades como a
Internet das Coisas.

Tendo em vista que objetos inteligentes constituem, a priori,


mercadorias, mas realizam outras funções, sobretudo a transmissão de
dados, pode-se aventar a possibilidade de haver uma prestação de serviço
(“servicificação” das mercadorias, product-as-a-service). Assim, surge o
conflito entre os Estados e Municípios, já que os primeiros podem se ver
competentes para instituir ICMS, ao passo que os últimos, ISS. Ademais,
pode-se ainda cogitar que nessa transferência de informações haja uma
prestação de serviço de comunicação, atraindo a incidência de ICMS-C.
Diante disso, encontram-se três perguntas a serem respondidas: (3) a venda
de mercadoria deixa de ser uma operação relativa à circulação de

379
mercadoria pelo fato de ter valor agregado (ser inteligente)?; (4) É possível
que em transações envolvendo objetos inteligentes também haja uma
prestação de serviço?; (5) Há serviço de comunicação ou serviço de valor
adicionado no âmbito da Internet das Coisas?.

3. A VENDA DE MERCADORIA DEIXA DE SER UMA OPERAÇÃO


RELATIVA À CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA PELO FATO DE TER
VALOR AGREGADO (SER INTELIGENTE)?

Ao se pensar na Internet das Coisas, tomando como exemplos os carros


e roupas inteligentes, surge, sob a perspectiva da aquisição de tais objetos,
a questão acerca de uma possível desnaturação do conceito de mercadoria
em razão do seu valor agregado, i.e., do intangível (inteligência artificial)
ali presente.

Para abordar essa questão, faz-se necessário, antes, tratar do critério


material do ICMS relativo às “operações de circulação de mercadorias”.

3.1. ICMS sobre Operações de Circulação de Mercadorias: considerações


acerca do seu critério material

A Constituição de 1988 não criou essa expressão. Desde a edição da


Emenda Constitucional n. 18, de 1º de dezembro de 1965 (EC n. 18/65),
existia o então ICM, cuja hipótese tributária envolvia apenas “operações
relativas à circulação de mercadorias, realizadas por comerciantes,
industriais e produtores” (art. 12). Na verdade, a Constituição de 1988
apenas o aglutinou com outros impostos, de competência federal. Assim,
em nada se maculou o antecedente “operações de circulação de
mercadorias”; o ICMS apenas ganhou outras hipóteses como as
“prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de
comunicação”. Desse modo, o sentido da expressão “operações de
circulação de mercadorias” empregada pelo constituinte apresenta

380
contornos provenientes desde a origem desse tributo, i.e., antes mesmo da
Constituição de 1988. Embora tenha ele evoluído, principalmente no que
diz respeito ao aumento das hipóteses de sua incidência, sempre teve em
seu critério material operações relativas à circulação de mercadorias.

Nessa linha, o termo “operações” continua sendo entendido em uma


acepção específica, juntamente com a palavra “circulação”, não contendo
o sentido vulgar que poderia abranger praticamente qualquer negócio
jurídico. De maneira mais clara, uma operação relativa à circulação
implica, em geral, um ato de transmissão22, i.e., o que se tributa são as
várias etapas do ciclo econômico de um bem, em direção a seu consumo
final.

Todavia, não é qualquer ato de transmissão que atrai a incidência do


ICMS. Somente aqueles cujo objeto envolve uma mercadoria que
constituem seu critério material. Não há que se aventar, por exemplo, a
incidência do ICMS sobre a transmissão de posse ou propriedade de todo e
qualquer bem. Diferente de “produtos”, dos quais “mercadoria” constitui
espécie, esta supõe a existência de um ato de comércio. Assim, somente
será considerado mercadoria o produto sujeito a operação comercial
enquanto ato de distribuição, quer por produtor, quer por revendedor.
Nota-se que, em relação ao aspecto pessoal da incidência, a Constituição
de 1988 não o restringiu aos comerciantes, industriais e produtores como
faziam a EC n. 18/65 e as Constituições de 1967 e 1969. Preferiu deixar a
cargo da Lei Complementar a definição de seus contribuintes23.

No entanto a abertura ao legislador complementar não implicou a


incidência sobre qualquer bem existente no mundo transmitido por
qualquer pessoa. A manutenção do termo “mercadoria” conservou o

381
caráter mercantil da operação sujeita ao ICMS. Portanto seu vendedor
deve apresentar a intenção de colocar o bem à disposição do mercado24.

Esse aspecto da vontade em colocar o bem em comércio é relevante


para a adequada apreensão do conceito de mercadoria. Não só bens podem
receber tratamento distinto sob a perspectiva tributária na medida em que
passam a receber tratamento diferente pelo seu proprietário (e.g. bens
incorporados ao ativo permanente), mas também perdem o caráter de
mercadoria os bens que não têm valor enquanto tais, e sim em virtude de
outra atividade ali materializada. Se, por exemplo, um dentista faz uma
reparação em um dente, não é próprio dizer que o amálgama empregado
foi “vendido”, já que não houve transação de compra e venda; o paciente
recebe o amálgama como resultado de uma prestação de serviços
dentários.

3.2. Operações de circulação de mercadorias: bens corpóreos e incorpóreos

Embora já se pudesse cogitar preenchido o critério material do ICMS


presente na hipótese das operações de circulação de mercadorias, seu tipo
evoluiu no sentido de abarcar bens incorpóreos. Diante da nova realidade
(virtual) em que bens, corpóreos ou não, podem ser adquiridos por meio da
internet, o Supremo Tribunal Federal (STF) não ficou restrito à ideia de
que a Constituição de 1988 apresentasse limites rígidos, sobretudo,
incorporando conceitos jurídicos pré-constitucionais imutáveis.

É bem verdade que, em um primeiro momento, o STF manifestou-se


exigindo que mercadoria fosse algo material, corpóreo (corpus
mechanicum)25. Isso porque, influenciado pelo entendimento de que o
conceito de mercadoria estaria vinculado àquele do Direito Privado26, o
STF decidiu que caberia ICMS sobre a venda de softwares “de prateleira”

382
(standard), produzidos em série e comercializados no varejo, e não sobre
softwares adaptados ao cliente (customized), desenvolvidos para atender a
necessidades específicas de determinado usuário27. Nesse caso, conquanto
não tenha julgado bens digitais adquiridos pela internet, o STF utilizou, em
sua ratio decidendi, o critério do bem corpóreo para caracterizar incidência
do ICMS.

Somente em momento posterior foi que o STF afastou a necessidade de


haver suporte físico. Isso se deu com o julgamento de medida cautelar em
ação direta de inconstitucionalidade que tratou de lei estadual que incluiu
no âmbito de incidência do ICMS “operações com programa de
computador – software – ainda que realizadas por transferência eletrônica
de dados”28. Ao verificar a realidade (virtual), o STF decidiu que não há
motivo pelo qual diferenciar uma compra de mercadoria pela internet, já
que continua havendo circulação (virtual) de uma mercadoria que poderia
ser adquirida tal qual na compra de um suporte físico (e.g. CD-ROM e
disquete) que a contivesse.

Dessa forma, houve uma evolução do ICMS, pois sua incidência passou
a incluir mercadorias que tenham sido objeto de circulação, i.e., de
transmissão, seja ela virtual ou física.

Embora o afastamento da necessidade de um corpus mechanicum tenha


sido relevante para compreender as diversas operações que ocorrem no
âmbito virtual, não houve a separação entre o suporte físico e o que nele
contivesse para fins tributários. De maneira mais clara, poder-se-ia cogitar
que a mercadoria em si seria apenas o suporte físico, não compreendendo
também o intangível por ele veiculado. Entretanto, ao decidir que o
software “de prateleira” seria tributado em sua inteireza, suporte físico e
intangível nele presente, deixou claro que este integra a mercadoria29.

383
Aliás, essa já era a linha da jurisprudência do STF, que assim decidira
no caso das fitas cassetes com filmes30. Afinal, só se poderia cogitar sobre
incidência do ISS caso houvesse contratação para a gravação de fitas,
ainda que houvesse “o fornecimento do suporte físico exigido” para tal
prestação de serviço31, ao passo que sobre a comercialização de fitas
gravadas caberia o ICMS.

É bem verdade que o STF não abordou expressamente a discussão,


decidindo no sentido de que o ICMS incide, nos casos do software “de
prateleira” e nas fitas gravadas, tanto sobre o suporte físico quanto sobre o
intangível nele contido. Esse é, porém, o resultado final do seu
entendimento, pois incluiu o intangível no todo da mercadoria. Por
exemplo, no caso dos softwares “de prateleira”, o Ministro Sepúlveda
Pertence deixou claro não se tratar de um licenciamento ou de uma cessão
de direito de uso. Isso porque, segundo o Ministro, a posição do vendedor
de tais softwares “é a mesma do vendedor de livros ou de discos, que não
negocia com os direitos do autor”, mas apenas “com o corpus mechanicum
de obra intelectual que nele se materializa”32. O fato de o intangível (e.g.,
software e filmes) valer muito mais do que o suporte físico (e.g., CD-ROM
e fita cassete) não implica tratar-se de algo distinto de uma mercadoria.
Dessa forma, resta evidente a inexistência de qualquer separação da
incidência do ICMS sobre o suporte físico e sobre o intangível; incide ele
sobre ambos.

Tendo isso em vista, poder-se-ia concluir que as operações de


circulação de objetos inteligentes continuam sujeitas à incidência do ICMS
assim como as vendas de softwares de “prateleira”. Considerando-se que
haja um ato de mercancia, o fato de existir um sensor ou um computador
embutido no objeto não modificaria sua natureza de mercadoria. Afinal, a

384
única diferença entre um objeto comum e um dotado de inteligência
artificial seria que o último detém maior valor agregado (intangível), sendo
a venda de ambos sujeita à incidência do ICMS.

4. É POSSÍVEL QUE EM TRANSAÇÕES ENVOLVENDO OBJETOS


INTELIGENTES TAMBÉM HAJA UMA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO?

A depender do objeto e das funções por ele exercidas, todavia, a


resposta acima pode não ser tão óbvia. Pelo fato de objetos inteligentes
não só transmitirem dados, mas também verem as informações captadas ou
recebidas tratadas por outras máquinas, potencializando as suas funções
específicas ou tomando para si outras atribuições, pode ser que a empresa
vendedora também esteja prestando um serviço.

Desse modo, surge o problema de verificar se há uma ou mais


obrigações. Como em uma relação contratual pode haver mais de uma
obrigação, divisíveis, ainda que com uma única contraprestação (dinheiro),
é possível constatar dois fatos geradores distintos. Caso se chegue a essa
conclusão, aparece o entrave em se alocar o valor pago para cada
obrigação.

4.1. A atuação do legislador complementar: imposição da regra tudo ou nada

Ao seguir o mandamento constitucional (art. 156, III) de definir os


serviços de qualquer natureza, a Lei Complementar n. 116, de 31 de julho
de 2003 (LC n. 116/2003) valeu-se de uma definição enumerativa,
prevendo como hipótese tributária do ISS a prestação de serviços arrolados
por uma Lista Anexa. Dessa forma, estabeleceu que, salvo exceções
expressas na Lista, os serviços nela presentes não se encontram sujeitos ao
ICMS, “ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias”
(art. 1º, § 2º). Desnecessário dizer, como já esclarecemos acima, ser

385
imprópria tal redação, pois os produtos empregados na prestação de um
serviço, ao se materializarem no atividade executada, despem-se da
natureza de “mercadoria”; melhor teria andado o legislador complementar
se tivesse dito “ainda que sua prestação envolva o emprego de bens de
qualquer natureza”. Por outro lado, ao versar sobre o ICMS, a Lei
Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996 (LC n. 87/96), também
denominada “Lei Kandir”, estabeleceu sua hipótese tributária,
determinando sua incidência tanto sobre o “fornecimento de mercadorias
com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária
dos Municípios” (art. 2º, IV) quanto sobre o “fornecimento de mercadorias
com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços”, quando a
própria LC 116/03 expressamente previr a exigência do ICMS (art. 2º, V).
É claro que, na primeira hipótese, ainda que não prevista a incidência do
ICMS, sequer se poderia cogitar incidência do ISS por estar fora da
competência municipal, ao passo que, na segunda, existe uma busca pelo
acoplamento entre as incidências do ICMS e do ISS para contemplar as
situações concretas de modo a reparti-las, formando dois campos de
incidência distintos, sem bitributação.

Desse modo, fica claro que a divisão efetuada pelo legislador


complementar foi no sentido de atribuir, para cada obrigação, a regra do
tudo ou nada. Ou bem estamos diante de um fornecimento de uma
mercadoria com prestação de serviço ou de prestação de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação, sujeito ao
ICMS, ou de uma prestação de um serviço de qualquer natureza (ainda
que envolvendo um produto), sujeita ao ISS. Assim, cabe ao aplicador do
direito verificar no caso concreto e definir em qual campo de incidência
ela se encontra, se no do ICMS ou se no do ISS.

386
O raciocínio cartesiano acima proposto enfrenta obstáculo, entretanto,
quando se encontram relações jurídicas complexas, envolvendo mais de
um contrato, posto que coligados. Ainda sem entrarmos no campo da
Internet das Coisas, tomamos um exemplo mais corriqueiro. Consideremos
o caso de uma empresa que fornece, para uma festa, alimentos e bebidas, e
também o serviço de limpeza. Nessa hipótese, constata-se a existência de
duas obrigações distintas: de um lado, o fornecimento de mercadorias
(alimentos e bebidas), sujeito ao ICMS (art. 2º, I, da LC n. 87/96), e, de
outro, a prestação de serviços (limpeza), sujeita ao ISS (item 7.10 da Lista
Anexa). Ainda assim, é comum que seja feito o pagamento em um só
montante, sem qualquer discrímen acerca de qual parcela pertence a qual
obrigação. Surge, daí, o problema de se alocar quanto se refere ao
fornecimento de mercadorias e quanto à prestação de serviços.

4.2. A Internet das Coisas e o acirramento da alocação entre ICMS e ISS

Ao se pensar em exemplos da Internet das Coisas, existe um


acirramento desse entrave, pois haverá, para muitos objetos inteligentes, a
necessidade dessa alocação.

Quando exposta por Kevin Ashton, ficou evidente a ideia de que a


Internet das Coisas tornaria o estado de coisas mais complexo em virtude
de os objetos executarem algumas funções, distintas daquelas que, a
priori, seriam a eles atribuídas, independentemente da ação humana33.
Assim, ao se pensar em uma espécie de “servicificação” das mercadorias
(product-as-a-service), o exame da alocação entre prestação e entrega da
mercadoria torna-se mais incerto.

Nota-se: não é dizer que uma mercadoria em si prestaria um serviço por


executar sua função sem a provocação humana. Afinal, se uma mercadoria

387
pudesse prestar um serviço, admitir-se-ia um serviço sem a figura de um
prestador, pois não há um terceiro que realiza o serviço. E tanto para a
incidência do ICMS quanto para a do ISS faz-se necessária a existência de
um prestador. Se, para o ICMS, o próprio constituinte pressupôs uma
prestação – existência de um sujeito que detém o direito de exigir de
outrem o cumprimento da execução do serviço34 – para o ISS, o legislador
complementar optou, diante do silêncio do constituinte, por exigir a figura
do prestador. Afinal, além de definir o fato gerador do ISS exigindo uma
prestação (art. 1º), a LC n. 116/2003 elegeu o prestador do serviço como
seu contribuinte (art. 5º)35. Dessa forma, para fins de incidência de ISS e de
ICMS, é impossível uma prestação de serviço por uma mercadoria, pois
inexistiria o aspecto pessoal da hipótese tributária, qual seja, a figura do
prestador, necessariamente distinto do tomador do serviço. Portanto, o fato
de haver inteligência artificial não implica a prestação de um serviço pelo
objeto, mas apenas a execução de uma função, em geral, distinta da sua
específica.

Embora a “servicificação” das mercadorias não signifique que o objeto


em si preste um serviço, podem surgir dificuldades acerca do que se
adquiriu: se uma mercadoria; e/ou uma utilidade. Conforme se verá, a
conclusão vai depender sobremaneira do caso concreto; não existe uma
resposta uniforme que se possa cogitar para cobrir todas as situações no
âmbito da Internet das Coisas.

4.2.1. Roupas Inteligentes como exemplo de fácil solução

Vale, assim, um exemplo de fácil solução, qual seja, o das roupas


inteligentes. Na hipótese em que a empresa vendedora mantém um
aplicativo, por meio do qual cede, sem custos periódicos, ao consumidor
licença para utilizá-lo, recebendo este as informações captadas pela roupa,

388
inexiste qualquer prestação de serviços contratada pelo consumidor. Nessa
situação, não só a roupa constitui mercadoria, mas também a licença de
uso do software. Basta comparar com o download de um software,
conforme o precedente do STF narrado acima: adquirido o software, o
usuário tem acesso a atualizações sem por isso cogitar-se a incidência de
nova tributação (ISS). Conforme o entendimento pacificado pela Corte, a
operação está sujeita ao ICMS. Não vemos como distinguir esse
precedente do exemplo das roupas inteligentes, acima descrito. Portanto,
há apenas incidência de ICMS.

4.2.2. Chamada de Emergência Inteligente como exemplo de difícil solução

Contudo o mesmo não ocorre no exemplo da Chamada de Emergência


Inteligente. Retirando a hipótese em que não se cobra um custo adicional
(periódico) a ser pago ao vendedor do carro (espécie de opcional), situação
em que seria mais fácil visualizar a parcela da venda do serviço
contratado, resta a dificuldade em se distinguir o que foi adquirido quando
o próprio preço do carro inclui o acesso à Central. O fato de a
contraprestação pelo preço pago implicar a entrega de um carro não
significa que todo o montante deveu-se à compra de uma mercadoria. A
empresa vendedora deve suportar, durante período determinado, os custos
de manutenção para a realização do serviço pela Central de Emergência
com a informação transmitida pelo carro. Ao final do dia, haverá a
prestação de um serviço de monitoramento da situação em que se encontra
o carro, pois este pode enviar uma informação acerca da ocorrência de
alguma anormalidade. A posição da Central não será passiva (não será
mero armazenamento de dados), pois uma vez acionada a Central, caberá a
esta tomar as providências necessárias ao socorro. Em outras palavras, na
relação contratual entre vendedor do carro e consumidor, há tanto uma
obrigação de compra e venda de uma mercadoria (carro), sobre a qual

389
incide ICMS, quanto uma obrigação de prestação de serviços
(monitoramento e acionamento de emergência), sobre a qual incide ISS.
Deve-se, assim, alocar qual a parcela para cada um.

Situação semelhante pode ocorrer, por exemplo, com um sistema de


irrigação dotado de inteligência artificial.

Atualmente, é possível encontrar um sistema automatizado em que se


possa não só configurar os horários em que o jardim será irrigado, mas
também impedir, em razão de conter um sensor de chuva, que as plantas
sejam aguadas quando chove. No fornecimento dessa mercadoria, não se
cogitaria incidência de ISS por haver uma prestação de serviços como a
realização de irrigação pelo vendedor nos termos do item 7.02 da Lista
Anexa à LC n. 116/2003.

Entretanto, na hipótese de um sistema de irrigação dotado de


inteligência artificial, a conclusão não é tão certa assim. Supondo que haja
um sistema que aprenda com o passar do tempo qual o volume ideal de
água a ser despejada no jardim, programando-se para isso conforme a
umidade da terra e também em virtude de receber dados de outro aparelho
informando a previsão do tempo. Nesse caso, a própria máquina ajusta-se,
aprende com experiências passadas e procura se adequar, consoante dados
por ela recebidos de outro objeto, a situações futuras. Claramente, há uma
potencialização de sua função específica, qual seja, irrigar o jardim. Mais
uma vez, não há prestação de serviços, pois sequer se apresenta a figura do
prestador. Todavia, ainda assim, é possível cogitar, a depender do modelo
de negócios, uma prestação de serviços, cuja qualificação traz mais
dificuldade. Basta pensar na situação em que o vendedor, além de entregar
o sistema, fornece um serviço de monitoramento a fim de se verificar, por
determinado período, o adequado funcionamento desse sistema,

390
comparando com dados colhidos de outros sistemas instalados em outros
clientes, otimizando, daí, seu funcionamento. Nessa hipótese, a conclusão
é a mesma que na Chamada de Emergência Inteligente: encontram-se duas
obrigações. Enquanto a primeira consiste na entrega de uma mercadoria
(equipamento de irrigação), sujeita ao ICMS, a segunda é uma prestação
de serviços (monitoramento), sujeita ao ISS. Mais uma vez, há o problema
de se alocar a parcela para cada atuação do vendedor/prestador.

Essa dificuldade que já se encontrava fora do âmbito da Internet das


Coisas, tende a se tornar mais comum com os objetos inteligentes. Diante
de tal problema, a legislação tributária procura impor preços/valores
mínimos, também denominados de preço/valor de praça36, para determinar,
em relação ao fornecimento de mercadoria ou à prestação onerosa de
serviços, a base de cálculo para fins de incidência do ICMS e do ISS. Com
o advento de objetos inteligentes, a tendência é que o emprego de tais
expedientes torne-se frequente. A saída para os contribuintes perpassa a
necessidade de alocar contratualmente a monta para cada obrigação
realizada.

4.3. Breves considerações sobre o problema da alocação das obrigações na


Contabilidade

O problema da identificação de várias obrigações numa relação


contratual complexa não é exclusivo dos tributos indiretos. Dilema
semelhante é enfrentado pela Contabilidade. À entidade, impõe-se a
segregação da quantia recebida consoante a obrigação por ela pactuada, se
transferência de bens ou serviços, alocando também o custo para cada
categoria. Como primeiro passo, a entidade deve buscar o “preço de venda
individual” de cada obrigação, o qual consiste no preço “pelo qual a
entidade venderia o bem ou o serviço prometido separadamente ao

391
cliente”. Na hipótese de esse preço não ser “diretamente observável”, deve
a entidade estimá-lo, de acordo com determinados métodos, considerando
todos os “dados que estejam razoavelmente disponíveis à entidade”, como
“condições de mercado, fatores específicos da entidade e informações
sobre o cliente ou classe de clientes”37.

Tendo isso em vista, verifica-se que a Internet das Coisas acaba por
acirrar um problema já existente, qual seja, o conflito de competências
entre ICMS e ISS. Ao fim e ao cabo, as relações contratuais devem ser
segregadas caso apresentem mais de uma obrigação, pois podem implicar
a ocorrência de mais de um fato jurídico tributário. Assim, com o crescente
surgimento de objetos inteligentes, mais situações como a da Chamada de
Emergência Inteligente poderão implicar a alocação das parcelas relativas
à circulação de mercadoria e à prestação de serviço. Sem disposição
contratual a esse respeito, Fiscos estaduais e municipais procurarão impor
preços mínimos com o escopo de se chegar à base de cálculo do tributo em
questão.

Além disso, pode surgir dúvida se tais objetos inteligentes (e.g., roupas
e carros) são instrumentos de um serviço de comunicação ao executar suas
funções. Diante disso, alternativamente, poder-se-ia também cogitar que
tais atribuições não passariam de um serviço de valor adicionado, passível
de incidência do ISS.

5. HÁ PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO OU SERVIÇO DE


VALOR ADICIONADO NO ÂMBITO DA INTERNET DAS COISAS?

A Internet das Coisas pressupõe a conectividade entre objetos,


implicando, sobretudo, transmissão de dados máquina/máquina, não se
restringindo a homem/máquina. Assim, pode haver questionamento acerca

392
de tais transmissões envolverem ou não serviço de comunicação ou serviço
de valor adicionado.

Para tanto, convém antes buscar os significados de “prestação de


serviço de comunicação” e de “serviço de valor adicionado”, já que é
comum que, diante de situações concretas, o aplicador do direito tenha que
optar entre um serviço de comunicação (ICMS-C) e um serviço de valor
adicionado (ISS-SVA).

5.1. ICMS sobre a Prestação do Serviço de Comunicação: considerações


acerca do seu critério material

Antes da vigência da Constituição Federal de 1988, era de competência


federal a instituição do Imposto sobre Serviços de Comunicações38.
Todavia só foi a ele estendido o princípio da não cumulatividade quando
passou a integrar o antigo ICM, formando, consoante a atual Constituição,
o ICMS (art. 155, II).

5.1.1. Do Imposto sobre Serviços de Comunicações antes de sua aglutinação ao


ICM

Embora à luz das Constituições anteriores não houvesse a inclusão do


termo “prestação” acompanhando a expressão “serviços de
comunicações”, o Código Tributário Nacional, editado pela Lei n. 5.172,
de 25 de outubro de 1966 (CTN), já estabelecia a existência de um
prestador de serviço. Assim, mesmo antes da atual Constituição, era
necessário que houvesse um terceiro que executasse onerosamente tais
atividades. Além de estabelecer o preço do serviço como a base de cálculo
(art. 69) e o prestador do serviço como o contribuinte (art. 70), o CTN
definiu o critério material do antigo imposto sobre serviços de
comunicações. De acordo com seu art. 68, II, a prestação do serviço de
comunicações consiste na transmissão e recebimento, “por qualquer

393
processo, de mensagens escritas, faladas ou visuais”, ressalvando o caso de
prestação de serviço intramunicipal. Desse modo, já antes da Constituição
Federal de 1988, o tributo não incidia sobre a comunicação em si, mas
somente sobre a prestação de um serviço de comunicação. Portanto, apesar
de não se encontrar sujeita ao imposto a mensagem enviada pelo emissor,
mas, nos termos do CTN, sua transmissão e recebimento39, pressupõe-se a
existência de um terceiro, distinto do emissor e do receptor40, que realiza
onerosamente a comunicação.

Assim, o CTN deixou claro que o antigo Imposto sobre Serviços de


Comunicações só poderia incidir se houvesse um terceiro, alheio à relação
comunicativa, contratado onerosamente, que viabilizasse a transmissão e
também o recebimento de uma mensagem, seja ela escrita, falada ou
visual, sendo irrelevante o meio utilizado41. Nota-se, dessa forma, que, ao
pressupor que o prestador do serviço tivesse que transmitir e efetivamente
entregar a mensagem, não ficava evidente a possibilidade de uma cadeia
de prestadores de serviços de comunicação. Em outras palavras, não se
disciplinava o caso em que vários prestadores de serviço de comunicação
pudessem estar envolvidos no envio da mensagem do emissor ao
destinatário. Aliás, partindo do fato de que antes da Constituição Federal
de 1988 não vigorava o princípio da não cumulatividade para tal tributo,
fazia sentido que o CTN não precisasse regular a hipótese de uma cadeia
de prestadores de serviços de comunicação.

5.1.2. Da aglutinação do Imposto sobre Serviços de Comunicações no ICM

Promulgada a Constituição de 1988, o antigo Imposto sobre Serviços de


Comunicações deixou de ser de competência federal, ingressando na dos
Estados e do Distrito Federal, por fundir-se ao antigo ICM, surgindo o
ICMS. Esse é um ponto que merece ser ressaltado: no processo que

394
resultou de 1988, não se teve a criação de tributos novos, com uma
racionalidade econômica própria. Ao contrário, o constituinte partiu de um
sistema tributário preexistente (na realidade, surgido já com a EC n. 18/65)
e apenas cuidou de distribuir, entre as pessoas jurídicas de Direito Público,
os tributos que existiam. Em muitas ocasiões, tal processo implicou apenas
reprodução do que já havia no passado (como o Imposto de Renda ou o
Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana); noutras, houve
um desmembramento (o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis foi
dividido entre Municípios e Estados, conforme a onerosidade da
transferência); e noutros, finalmente, houve a fusão de impostos. É este
último o caso do ICMS, em que o constituinte de 1988 tomou o antigo
ICM e a ele acresceu os transportes e as comunicações, antes de
competência federal.

Sob tal perspectiva, torna-se relevante conhecer os contornos do antigo


Imposto sobre Serviços de Comunicações: posto que transferida a
competência para os Estados e agregada a característica da não
cumulatividade, os traços essenciais de sua hipótese tributária não foram
abandonados. Noutras palavras, examinar o antigo Imposto sobre Serviços
de Comunicações é passo relevante para se conhecer a abrangência do
ICMS que, afinal, o sucedeu.

Dada a continuidade do imposto, conquanto sob nova competência, não


surpreende não fosse necessária lei complementar a definir sua hipótese
tributária: esta já estava clara no CTN42. Importava, apenas, regular aquilo
que não existia no regime anterior: a não cumulatividade na prestação de
serviços de comunicação. É por isso que, com a promulgação da atual
Constituição, os atos normativos editados que trataram ou tratam dessa
matéria não se preocuparam em definir propriamente a prestação de

395
serviços de comunicação, mas em possibilitar que o tributo fosse exigido
nas várias etapas da cadeia de prestação comunicativa. Afinal, o art. 155, §
2º, I, da Constituição de 1988 estabeleceu a não cumulatividade tanto para
as operações relativas à circulação de mercadorias quanto para as
prestações de serviços alocadas ao ICMS.

5.1.3 Da busca por uma noção de cadeia de prestação comunicativa

Foi nesse sentido que o Convênio ICM n. 66, de 16 de dezembro de


1988 (Convênio n. 66/88)43, dispôs em seu art. 2º, X, que o fato gerador
compreenderia a “geração, emissão, transmissão, retransmissão, repetição,
ampliação ou recepção de comunicação de qualquer natureza, por qualquer
processo, ainda que iniciada ou prestada no exterior”. Ao seguir os ditames
do art. 34, §§ 5º e 8º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias,
o Convênio n. 66/88 teve como escopo suprir, até a edição de nova Lei
Complementar, lacunas presentes na legislação em virtude das mudanças
constitucionais44 como a possibilidade de haver várias etapas na prestação
do serviço de comunicação.

Da mesma forma, a LC n. 87/96 estabeleceu, em seu art. 2º, III, que o


ICMS-C incide sobre “prestações onerosas de serviços de comunicação,
por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a
transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de
qualquer natureza”. Percebe-se que, diferentemente do CTN, não se
encontra nesses atos normativos uma definição da hipótese tributária do
ICMS-C como o fazia o CTN. Entende-se que o conceito nele presente era
pressuposto. Afinal, já havia disciplina suficiente, no CTN, para se
conhecer o que seria uma prestação de serviços de comunicação. O que
faltava regular – e foi feito pelos referidos atos normativos – era a
possibilidade de existência da cadeia de prestadores de serviços de

396
comunicação e seus efeitos na não cumulatividade, isto sim uma novidade
de 1988.

Aliás, não há motivo pelo qual afastar a definição presente no CTN, já


que não houve revogação do art. 68, II. Com as edições do Convênio n.
66/88 e da LC n. 87/96, só restou evidente que a prestação do serviço de
comunicação pode ser dividida em etapas, havendo incidência do ICMS-C
em cada uma delas, compensando-se o que for devido com o montante
cobrado na anterior.

5.1.4. Do núcleo comum do critério material do ICMS-C às controvérsias

Há quem sustente inexistir definição de “prestação de serviço de


comunicação” em Lei Complementar – nada se comentando acerca do art.
68, II, do CTN, mas apenas se afirmando que a Lei Kandir meramente
indica os modos de se comunicar45; mesmo entre esses autores, entretanto,
não se põe dúvida acerca da existência de um núcleo comum do que seja o
critério material do ICMS-C. Assim, entende-se que esse tributo incide
sobre a prestação onerosa de um serviço de comunicação, a qual consiste
na veiculação de uma mensagem, de um emissor a um receptor. Desse
modo, não é possível cogitar um serviço de comunicação gratuito46,
tampouco a inexistência de um terceiro prestador47.

Conquanto haja esse núcleo comum, existem três questões controversas


que envolvem a extensão do critério material do ICMS-C.

A primeira (i) divergência compreende a necessidade ou não de haver a


efetiva execução do envio da mensagem. Enquanto para alguns autores
basta que haja a mera colocação dos meios à disposição do emissor48, para
a maioria faz-se necessária a efetiva execução do envio da mensagem49.
Assim, prevalece acertadamente o entendimento, refletido no STF e no

397
Superior Tribunal de Justiça (STJ), de que a prestação do serviço de
comunicação não consiste na manutenção do funcionamento do sistema de
comunicação, nos atos suplementares ou preparatórios à sua realização,
mas na consumação do serviço50.

Já a segunda (ii) dicotomia constitui a (in)determinação do receptor.


Embora vários autores sustentem a necessidade de o receptor ser
determinado pelo fato de a comunicação implicar um destinatário da
mensagem51, ao fim e ao cabo, o relevante é que exista um receptor que se
encontre “em condições de receber a mensagem que lhe é enviada” 52. O
fato de o receptor poder ser indeterminado não implica a inexistência de
uma transmissão. Ainda que indeterminado, a comunicação pressupõe um
destinatário. Obviamente que, se ninguém pode receber a mensagem,
inexiste comunicação, mas, se constatando tal possibilidade, é impossível
afastar a comunicação; os elementos que a compõem estarão presentes.

Por fim, há (iii) discussão acerca da necessidade de haver


bidirecionalidade na comunicação, também denominada de
bilateralidade53, que envolve a possibilidade de resposta pelo receptor
através do mesmo canal adotado pelo emissor.

Partindo do pressuposto de que não havia definição de comunicação


que a Constituição poderia ter adotado, os autores que sustentam a
exigência da bidirecionalidade fundamentam-se no emprego das
expressões “telecomunicações” e “radiodifusão” pela Constituição quando
esta dispõe acerca das competências regulatória e legislativa da União (art.
21, XI e XII, “a”, e art. 22, IV) e das atribuições do Congresso Nacional
(art. 48, XII). Alegam, dessa forma, que, por haver adotado ambas as
expressões, o constituinte teria distinguido comunicação da mera difusão.
Portanto esta não exigiria determinação do destinatário e interação para

398
com o emissor, ao passo que tais elementos constituiriam requisitos ao se
falar em comunicação54.

No entanto, assim como na determinação, não há que se impor o


requisito da bidirecionalidade.

Em primeiro lugar, havia, sim, um conceito anterior de “comunicação”,


aliás, de “prestação de serviço de comunicação” presente no CTN.
Definição essa que em nada exige a figura de um receptor determinado,
tampouco que este tenha participação ativa, mas somente que haja
transmissão e recebimento da mensagem. Aliás, ao julgar ação direta de
inconstitucionalidade acerca da incidência do ICMS sobre a prestação de
serviços de transporte aéreo, decidiu o STF que, como o ICMS foi
composto pelos antigos ICM, imposto sobre transportes, imposto sobre
comunicações, imposto sobre energia elétrica, combustíveis e
lubrificantes, e mineração, “[n]ão houve em momento algum referência à
perspectiva de se ampliar o escopo” dessas exações55. Decidiu, assim, que
não seria possível a incidência do ICMS sobre a prestação de serviços de
transporte aéreo porque a Constituição Federal de 1988 incorporou esses
impostos da forma como eram exigidos56. Por isso, parece-nos equivocada
a premissa de que partem os autores que sustentam a bidirecionalidade.

Em segundo, o termo (comunicação) em relação ao qual se busca um


significado não é utilizado como referência para a comparação. Adota-se
meramente como parâmetro uma “modalidade” ou “espécie” sua
(telecomunicações)57. Afasta-se de início que a radiodifusão e as
telecomunicações poderiam compreender exemplos da prestação de
serviço de comunicação, sendo empregadas separadamente apenas para
fins regulatórios.

399
Em terceiro, existem justificativas outras para a segregação de tais
expressões como é o caso da política governamental, pois a da
“radiodifusão sempre divergiu daquela destinada às telecomunicações”. A
título de exemplo, esta somente deixou de ser monopólio da União após a
edição da Emenda Constitucional n. 8, de 15 de agosto de 1995, ao passo
que os serviços de radiodifusão podiam, desde antes, “ser explorados por
particulares”58.

Em quarto, a racionalidade da imunidade prevista no art. 155, II, § 2º,


X, “d”, da Constituição não estava – conforme argumentam alguns autores
que sustentam a bidirecionalidade59 – em esclarecer que não haveria
incidência do ICMS-C pelo fato de, sob a perspectiva do destinatário, a
comunicação ser gratuita. A Emenda Constitucional n. 42, de 19 de
dezembro de 2003, que assim procedeu, teve como escopo imunizar a
prestação de serviço de comunicação em que os anunciantes (emissores)
pagam empresas de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção
livre e gratuita (prestadores) para que transmitam publicidade e
propaganda (mensagens) aos seus espectadores (destinatários). Mesmo
porque o próprio STF tem jurisprudência60 acerca da incidência do ICMS-
C sobre a radiodifusão, o que justificou a referida imunidade61. Caso
contrário, de nada ela valeria. Fosse a radiodifusão sujeita ao ISS,
inexistiria motivo para introduzir norma de não incidência (ainda que
expletiva).

Tendo em vista o exposto, o critério material do ICMS-C constitui toda


prestação onerosa de um serviço de comunicação, a qual exige a presença
de um terceiro, alheio à relação comunicativa, que veicule uma mensagem,
por qualquer meio, de um emissor a um receptor. Além de essa prestação
poder ocorrer em uma cadeia comunicativa em que o referido tributo pode

400
incidir em mais de uma etapa (art. 2º, III, da LC n. 87/96), não se faz
necessário que o receptor seja determinado, tampouco que tenha
participação ativa.

5.2. ISS sobre Serviços de Valor Adicionado: breves considerações acerca de


sua definição

A prestação de um serviço de comunicação difere, no entanto, da


hipótese em que terceiro dela se utiliza para realizar um serviço. A
contratação de um comunicador para a prestação de um serviço não torna
esta a prestação de um serviço de comunicação. Se o objetivo é se valer de
uma rede comunicativa – havendo, em geral, a contratação de um
prestador de comunicação – para conferir utilidade outra, esta não se
encontra mais no âmbito de incidência do ICMS-C, mas potencialmente no
escopo do ISS.

Tanto é assim que no âmbito dos serviços de telecomunicações, existe


discussão acerca do conceito de “serviços de valor adicionado” e de sua
distinção da prestação de serviço de comunicação para fins de incidência
do ISS-SVA ou do ICMS-C. Vale, assim, a sua definição presente no art.
61 da Lei n. 9.472, de 16 de julho de 1997, também denominada de Lei
Geral das Telecomunicações (LGT):

Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço


de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas
utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou
recuperação de informações.
§ 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações,
classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe
dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição.

Depreende-se da definição acima que, embora o serviço de valor


adicionado valha-se do serviço de telecomunicações, não constitui uma
espécie deste, tampouco um serviço de comunicação, pois seu escopo é

401
acrescentar uma utilidade àquele relativa ao acesso, armazenamento,
apresentação, movimentação ou recuperação de informações. Desse modo,
o serviço de valor adicionado é “autônomo” 62, agregando valor ao serviço
de telecomunicação e não implicando, em qualquer hipótese, a prestação
de um serviço de comunicação.

Como exemplos de serviço de valor adicionado, há o antigo “disque-


0900”, no qual a ligação em si (serviço de comunicação) vinha
necessariamente acompanhada de utilidade outra como informações sobre
clima, horóscopo, música etc. Vale citar ainda o serviço de auxílio à lista,
o de hora certa, identificador de chamadas e a chamada teleprogramada
(despertador). Não obstante tais exemplos encontrem-se, hoje, em desuso
devido aos smartphones, há outros dois mais atuais: a hospedagem de
sites; e o serviço de provimento de acesso à internet63.

Dado que os serviços de valor adicionado não constituem um serviço de


comunicação, mas apenas dele se valem, a incidência do ICMS-C não os
compreende. Estão no campo de incidência do ISS-SVA. Nota-se,
diferente da discussão tratada no ICMS-C, que o serviço de valor
adicionado não constitui uma etapa preparatória ou imprescindível à
ocorrência de um serviço de telecomunicação. Pelo contrário, sem este, é
impossível que ele seja executado. A causa para sua contratação não reside
no ato de realizar a outrem uma comunicação, mas de fruir da rede de
telecomunicações outra utilidade64. Portanto, o serviço de valor adicionado
tem como pressuposto justamente a existência de um serviço de
telecomunicação; seu prestador é um usuário deste, pois utiliza a sua
estrutura para realizar algo.

5.3. Internet das Coisas: ICMS-C ou ISS-SVA?

402
Apresentado o critério material do ICMS-C e o conceito de serviço de
valor adicionado, verifica-se que, no âmbito da Internet das Coisas, pode
haver tanto uma prestação de serviço de comunicação quanto um serviço
de valor adicionado.

Há quem sustente que não se poderia falar em comunicação “no sentido


utilizado pela Constituição, para fins de tributação pelo ICMS, entre
homem/máquina e máquina/máquina”, em razão de faltar, para a última,
“vontade própria” e também “capacidade de compreensão”, o que
implicaria a inexistência de “ato jurídico” a ser considerado65. Todavia, em
nenhum momento se cogita que a máquina preste um serviço de
comunicação ou esteja em algum polo da relação jurídica com o prestador.
Pelo contrário, a máquina apenas executa a função nela programada ou
desenvolvida: o ato jurídico dá-se entre outros agentes, podendo estar
envolvido para a sua transmissão um prestador de serviço de comunicação.

Isso pode ser visualizado no caso da Chamada de Emergência


Inteligente. Valendo-se do amparo de satélite, o automóvel envia os dados
à Central de Emergência que toma as medidas cabíveis. Como se pode
notar, existe uma comunicação máquina/máquina. Contudo, caso o satélite
não seja da empresa vendedora de veículos – hipótese em que haveria um
autosserviço e não uma prestação – terá que contratar um prestador de
serviço de comunicação a fim de que a mensagem possa ser transmitida do
carro para a Central. Sendo essa relação onerosa, não há fundamento para
se afastar a incidência do ICMS-C. Nota-se, entretanto, que a prestação
não é contratada pelo consumidor, mas por quem presta o serviço de
monitoramento do veículo. É a empresa vendedora que constitui a
tomadora do serviço de comunicação, ainda que em proveito de terceiro.
Dessa forma, o serviço prestado pela vendedora de carro não passa de um

403
serviço de valor adicionado, pois se vale da estrutura das telecomunicações
para oferecer uma utilidade relacionada à movimentação de informações.

Já no caso das roupas inteligentes, existe uma comunicação


máquina/máquina: entre o computador embutido na roupa e o celular. Isso
pode ocorrer valendo-se ou não da rede de telecomunicações (e.g., chips
telefônicos ou Bluetooth, respectivamente). Novamente, pode existir a
prestação de um serviço de comunicação caso a empresa vendedora
contrate onerosamente terceiro para que ocorra a transmissão dos dados
detectados pela roupa. Todavia, diferente do exemplo acima, acaba não
havendo serviço prestado pela empresa vendedora, pois há apenas a cessão
de licença de uso, sujeita ao ICMS consoante decisão do STF.

Apenas para afastar os argumentos contrários à ideia de que a


comunicação pode ocorrer máquina/máquina, lembramos que ela foi
prevista na hipótese tributária da Taxa de Fiscalização de Instalação das
estações móveis do Serviço Móvel Pessoal, do Serviço Móvel Celular ou
de outra modalidade de serviço de telecomunicações, estabelecido pelo art.
38 da Lei n. 12.715, de 17 de setembro de 2012. Coube, no entanto, ao art.
1º do Decreto n. 8.234, de 2 de maio de 2014, conceituar “sistemas de
comunicação máquina a máquina” como “os dispositivos que, sem
intervenção humana, utilizem redes de telecomunicações para transmitir
dados a aplicações remotas com o objetivo de monitorar, medir e controlar
o próprio dispositivo, o ambiente ao seu redor ou sistemas de dados a ele
conectados por meio dessas redes”. Nota-se, dessa forma, que essa
concepção não só indica que a comunicação máquina/máquina pode sim
ocorrer, como também a utilidade que a transmissão dessa informação
oferece tem feição de um serviço de valor adicionado. Afinal, vale-se da
rede de telecomunicações, podendo propiciar outras utilidades.

404
Tendo isso em vista, fica claro que a Internet das Coisas pode envolver
tanto uma prestação de serviço de comunicação quanto um serviço de
valor adicionado. Enquanto a constatação do primeiro vai depender de que
haja um terceiro executando onerosamente a transmissão de uma
mensagem, o segundo depende do uso da rede de telecomunicações a fim
de propiciar uma nova utilidade relacionada ao acesso, armazenamento,
apresentação, movimentação ou recuperação de informações.

CONCLUSÃO

Inobstante muitos sejam os desafios para o ambiente jurídico gerados


pela coleta, armazenamento e troca de dados por parte de vários objetos,
procurou-se abordar neste artigo possíveis implicações da tributação
indireta sobre a Internet das Coisas, sobretudo, sob a perspectiva do ICMS
e do ISS.

Constatou-se que a existência de objetos inteligentes provoca um


acirramento do conflito de competência entre ICMS e ISS. Exemplos
como o da Chamada de Emergência Inteligente poderão implicar a
alocação das parcelas relativas à circulação de mercadoria e à prestação de
serviço, podendo haver, caso inexista disposição contratual a respeito,
imposição por parte dos Fiscos estaduais e municipais de preços mínimos
com o escopo de se chegar à base de cálculo do tributo em questão.

Ademais, a Internet das Coisas pode envolver tanto uma prestação de


serviço de comunicação quanto um serviço de valor adicionado. Contudo,
isso vai depender do caso concreto, já que nem todas as relações
envolvendo objetos inteligentes podem implicar a existência de terceiro
executando onerosamente a transmissão de uma mensagem, tampouco o
emprego de utilidade valendo-se da rede de telecomunicações.

405
A Lei Complementar n. 157/2016 à luz da
Constituição Federal: aspectos relacionados à
retroatividade e aos campos de incidência do
ICMS e do ISS na atividade de difusão de
vídeos, áudio e textos pela internet
66
José Eduardo Soares de Melo

1. LEI COMPLEMENTAR N. 157/2016 – PONTOS BÁSICOS

A Lei Complementar n. 157, de 29 de dezembro de 2016, editada em 31


de maio de 2017 (LC n. 157/2016), introduziu modificações na LC n. 116,
de 31 de julho de 2003 (LC n. 116/2003), tratando sobre o Imposto sobre
Serviços de Qualquer Natureza (ISS), a matéria adstrita à Lei n. 8.249, de
2 de junho de 1992 (Lei de Improbidade Administrativa), e a Lei
Complementar n. 63, de 11 de janeiro de 1990, que dispôs sobre critérios e
prazos de crédito das parcelas do produto da arrecadação de impostos de
competência dos Estados e de transferências por estes recebidos,
pertencentes aos Municípios.

Destacam-se as situações jurídicas seguintes:

1) Novos serviços tributáveis


– Informática (itens 1.03, 1.04, 1.09);
– Cuidados especiais, estética, atividades físicas (item 6.06);
– Florestamento, reflorestamento etc. (item 7.16);
– Vigilância, segurança, monitoramento (item 11.02);
– Fonografia, fotografia, cinematografia e reprografia (item 13.05);
– Bens de terceiros (itens 14.05 e 14.14);
– Transporte de natureza municipal (item 16.01 e 16.02);
– Propaganda e publicidade (item 17.25);
– Funerários (itens 25.02 e 25.05).
2) Local da prestação de serviços
3) Contribuintes

406
4) Alíquota mínima
5) Incentivos fiscais.

2. PLANOS JURÍDICOS: VALIDADE, VIGÊNCIA, EFICÁCIA,


IRRETROATIVIDADE

A LC n. 157/2016 estabeleceu diversos prazos de aplicação de seus


preceitos, na forma seguinte:

Art. 6º Os entes federados deverão, no prazo de 1 (um) ano contado da


publicação desta Lei Complementar, revogar os dispositivos que contrariem o
disposto no caput e no § 1º do art. 8º-A da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho
de 2003.
Art. 7º Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação.
§ 1º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º do art. 8º-A da Lei Complementar n.
116, de 31 de julho de 2003, e no art. 10-A, no inciso IV do art. 12 e no § 13 do art.
17, todos da Lei n. 8.249, de 2 de junho de 1992, somente produzirão efeitos após o
decurso do prazo referido no art. 6º desta Lei Complementar.
§ 2º O disposto nos §§ 1º-A e 1º-B do art. 3º da Lei Complementar n. 63, de 11
de janeiro de 1990, produzirá efeitos a partir do primeiro dia do exercício
subsequente ao da entrada em vigor desta Lei Complementar, ou do primeiro dia do
sétimo mês subsequente a esta data, caso este último prazo seja posterior.

Examino os conceitos jurídicos e sua aplicação nas situações em exame


neste estudo.

Validade: significa juridicidade de preceito normativo em razão de ser


produzido pelo órgão competente, observado o devido processo
legislativo, consubstanciando legítimo conteúdo, de conformidade com o
interesse público. Não se trata de uma qualidade intrínseca, isto é, as
normas não são válidas entre si; dependem da relação da norma com as
demais normas do contexto do ordenamento no qual estão inseridas67.

Vigência: constitui requisito do ato jurídico decorrente de legítima


produção formal e material da norma. Entende-se que viger é ter força para
disciplinar, para reger, cumprindo a norma seus objetivos finais. A
vigência é a propriedade das regras jurídicas que estão prontas para

407
propagar efeitos, tão logo aconteçam, no mundo fático, os eventos que elas
descrevem68.

Eficácia: compreende a condição para a produção dos efeitos jurídicos


das normas. O fato gerador da obrigação tributária possibilita sua eficácia
jurídica permitindo sua exigibilidade, se a lei contiver todos os elementos
do tipo tributário e atender aos princípios e regras previstos na
Constituição Federal e na respectiva legislação. Entende-se referir à
aplicação ou execução da norma jurídica, sendo a regra enquanto momento
da conduta humana. O direito autêntico não é apenas declarado, mas
reconhecido, é vivido pela sociedade, como algo que se incorpora e se
integra na sua maneira de conduzir-se69.

Irretroatividade: tradicional diretriz normativa estabelece que “a lei


em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o
direito adquirido e a coisa julgada” (art. 6º, da Lei Federal n. 12.376, de
30-12-2000).

A Constituição Federal de 1988 (CF/88) veda a emissão de lei


retroativa que possa desprestigiar direitos e interesses dos cidadãos, ao
reiterar referida norma (art. 5º, XXXVI), que consagra as garantias dos
contribuintes, ao proibir a cobrança de tributos “em relação aos fatos
geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver
instituído ou aumentado” (art. 150, III, a).

A lei tributária, como regra, só pode incidir, gravar e onerar os fatos


futuros, mantendo íntima vinculação com o princípio da anterioridade,
com o escopo de permitir segurança e certeza às situações tributárias
concernentes às suas atividades e interesses.

408
O Código Tributário Nacional (art. 106, I e II) dispõe sobre os casos em
que a legislação será aplicada a situações pretéritas, como norma de
natureza interpretativa; e às situações de retroatividade benigna (exclusão
de situação infracional, minoração de penalidades), de conformidade com
a sistemática do Código Penal (art. 2º, § único).

Conclusões:

a) validade e vigência: a LC n. 157/2016 fora produzida pelo órgão


competente (Congresso Nacional), para os fins do disposto no art. 156, III,
da CF/88 (matéria reservada à competência dos municípios para dispor
sobre o ISS), cumprindo os requisitos formais e materiais;

b) eficácia: a produção de seus efeitos encontra-se basicamente


disciplinada no próprio texto da LC n. 157/2016 (arts. 6º e 7º);

c) irretroatividade: as modificações legislativas – que impliquem a


instituição de tributos (novos serviços) e de contribuintes e responsáveis
face à previsão de novo local da prestação do serviço; revogação de
benefícios fiscais; e majoração de alíquotas – não poderão ser aplicadas a
fatos pretéritos, de conformidade com o princípio da anterioridade.

Assim, nos termos da CF/88, as novas leis municipais deverão observar


o período nonagesimal (art. 150, III, c) e serem anteriores ao exercício
financeiro (art. 150, III, a). Para que os municípios possam exigir o ISS a
partir de 2018 sobre as novas atividades, devem publicar a respectiva lei
(municipal) até 30 de setembro de 2017.

Peculiarmente, face às alterações relativas ao deslocamento da


competência para o local do domicílio do tomador dos serviços (itens
XXIII, XXIV, XXV), os municípios onde se localizam os respectivos

409
prestadores dos serviços deixam de ter competência, a partir do momento
da publicação da LC n. 157/2016 (com aditamento em 30-5-2017), com a
consequente desoneração da sujeição passiva.

3. STREAMING (DIFUSÃO DE VÍDEOS, IMAGENS, TEXTOS E SONS


PELA INTERNET)

3.1 Considerações Jurídicas

A LC n. 157/2016 introduziu novo preceito na lista de serviços anexa à


LC n. 116/2003, na forma seguinte:

Item 1.09 – Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio,


vídeo, imagem e texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros,
jornais e periódicos (exceto a distribuição de conteúdos pelas prestadoras de
Serviço de Acesso Condicionado, de que trata a Lei n. 12.485, de 12 de setembro de
2011, sujeitas ao ICMS).

As mencionadas atividades inserem-se no âmbito da informática, cuja


oneração pelo ISS é sempre questionável porque nem sempre
compreendem a efetiva realização de um fazer, que teria a virtude jurídica
de caracterizar uma prestação de serviço.

Tradicional doutrina já havia ponderado que “serviço é qualquer


prestação de fazer (...) servir é prestar atividade a outrem; é prestar
qualquer atividade que se possa considerar ‘locação de serviços’,
envolvendo seu conceito apenas a locatio operarum e a locatio operis.
Trata-se de dívida de fazer, que o locador assume. O serviço é a sua
prestação”70.

Conceitua-se como serviço tributável do Município “o desempenho de


atividade economicamente apreciável, sem subordinação, produtiva de
utilidade para outrem, sob regime de direito privado com o fito de

410
remuneração, não compreendido na competência de outra esfera de
governo”71.

Observo que o denominado serviço de informática pode significar a


execução de atividade mediante a utilização de computadores no trato de
informações, concernente a trabalhos relacionados ao software
(elaboração, instalação, manutenção de programas etc.) e ao hardware
(instalação e manutenção de placas, redes etc.). Entretanto, a LC n.
116/2003 definiu essas atividades como aquelas referentes aos objetos
imateriais, não se atendo à parte física de computadores72.

A incidência do ISS nessas atividades sofrera objeção porque, por


exemplo, “nas operações de licenciamento ou cessão de direito de uso de
software”, apenas o direito de fruir ou dispor da propriedade intelectual
(patente ou direito autoral) é negociado: o direito de uso de obra.

Trata-se, portanto, de cessões parciais de direitos autorais entre autor


(cedente) e terceiro (cessionário), sendo considerados bens móveis,
firmando-se a conclusão seguinte:

O núcleo da licença de uso de software consiste na cessão, exclusiva ou não


exclusiva, gratuita ou onerosa, definitiva ou temporária, de direito autoral
patrimonial de uso de software, que é bem móvel por força de lei, de maneira que
nos parece indiscutivelmente claro que a licença de uso representa uma obrigação
73
de dar (de ceder o uso da coisa) e não uma obrigação de fazer .

A edição de software pode ser composta de (a) pagamento de direitos


autorais ao seu criador; (b) composição gráfica do manual para uso do
software; (c) encadernação manual; (d) serviços de processamento
eletrônico de cópia do software em suporte magnético e proteção da cópia;
(e) acondicionamento de materiais utilizados; e (f) garantia ao usuário final
da legitimidade e perfeito funcionamento do software editado.

411
Existindo controvérsia jurisprudencial sobre as implicações tributárias,
o STF assentara repercussão geral sobre a “incidência, ou não, de ISS em
contrato a envolver cessão ou licenciamento de programas de computador
(software), desenvolvidos para clientes de forma personalizada” (Tema
590 – RE 688.223).

3.2. Significado

Streaming (fluxo de mídia) é a tecnologia que permite a transmissão de


dados e informações, utilizando a rede de computadores, de modo
contínuo. Esse mecanismo é caracterizado pelo envio de dados por meio
de pacotes, sem a necessidade de que o usuário realize download dos
arquivos a serem executados.

No streaming de música, por exemplo, não se usa a memória física do


computador (HD), mas, sim, a conexão à internet para transmissão dos
dados necessários à execução do fonograma.

Desse modo, esta tecnologia permite a transferência de áudio ou vídeo


em tempo real sem que o usuário conserve uma cópia do arquivo digital
em seu computador, e é exatamente nesse ponto que reside a mudança de
paradigma, pois, diferentemente do que acontecia há poucos anos, o que
importa é o acesso, e não mais a propriedade ou a posse da mídia física
(seja vinil, CD ou qualquer outra forma de corporificação da obra) ou
virtual.

É gênero que se subdivide em várias espécies74:

a) simulcasting: transmissão simultânea de determinado conteúdo por meio de


canais de comunicação diferentes (rádio e televisão, simultaneamente) via
internet;
b) webcasting: o conteúdo oferecido pelo provedor é transmitido pela internet,
havendo a possibilidade ou não de intervenção do usuário na ordem de

412
execução.

A interatividade é outro critério de classificação das modalidades de


streaming, a saber:

a) não interativo: a recepção de conteúdos pelo usuário se dá em tempo real,


contínuo, da programação ou do evento disponibilizado na rede, em tempo e
modo predeterminados pelo transmissor da obra. Não há nenhuma
possibilidade de interferência do usuário no conteúdo, na ordem ou no tempo
da transmissão;
b) interativo: o fluxo de informação depende da ação do usuário, que determina
o tempo, o modo e o conteúdo a ser transmitido. No caso de músicas, por
exemplo, o usuário tem à sua disposição uma grande base de dados de obras
musicais e pode escolher quais gostaria de ouvir, a ordem e o momento,
montando listas de reprodução próprias, sem a vinculação a uma
programação predeterminada pelo provedor do conteúdo, como ocorre
normalmente nas transmissões radiofônicas.

Modalidades

a) You Tube – site de compartilhamento de vídeos musicais, programas de


televisão etc., enviados pelos usuários;
b) Netflix – provedora global de filmes e séries de televisão;
c) Spotify – serviço de música e vídeo em comercial. Possui biblioteca digital
sob demanda em que os usuários podem criar playlists;
d) Deezer – aplicativo que permite aos seus usuários desfrutar suas diversas
rádios temáticas, bem como ouvir diversas outras formas por músicas de suas
preferências.

3.3. Natureza Jurídica

Os mencionados bens não revestem a natureza de produto, mercadoria –


que implicariam um “dar” – e, muito menos, autênticos serviços que
teriam que se traduzir num “fazer”.

Na realidade jurídica, compreendem, a cessão de direitos autorais.

O próprio texto legal (item 1.09 da LC n. 157/2016) refere-se à


“disponibilização, sem cessão definitiva...”, enquadrando-se no âmbito dos

413
direitos autorais (Lei federal n. 9.610/98), estipulando as modalidades de
utilização da obra (artística, musical etc.), observando-se o seguinte:

Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra,


por quaisquer modalidades, tais como:
(...)
VIII – a utilização, direta ou indireta, da obra literária, artística ou científica,
mediante:
(...)
i) emprego de sistemas de fibras óticas, fios telefônicos ou não, cabos de
qualquer tipo e meios de comunicação similares que venham a ser adotados:
(...);
IX – a inclusão em base de dados, o armazenamento em computador, a
microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero;
X – quaisquer outras modalidades de utilização existentes ou que venham a ser
inventadas.

O STJ decidira que “a tecnologia streaming enquadra-se nos requisitos


de incidência normativa, configurando-se, portanto, modalidade de
exploração econômica de obras musicais a demandar autorização prévia e
expressa pelos titulares do direito”; e que, a exploração por meio da
internet, distingue-se das outras formas de uso de obras musicais e
fonogramas (ex: rádio e TV) tão somente pelo modo de transmissão,
tratando-se, rigorosamente, da utilização do mesmo bem imaterial, o que
implica na incidência de idêntica disciplina jurídica” (REsp n. 1.559.264-
RJ).

3.4. ISS

As atividades descritas no item 1.09, da lista de serviços anexa à LC n.


116/2003 (incluída pela LC n. 157/2016) – sob os aspectos formais e
materiais – passarão a sujeitar-se à incidência do ISS.

Entretanto não caracterizam negócio jurídico relativo a um fazer, já


tendo sido asseverado que, para tanto, deve haver ato de servir, prestar,

414
nela concebido, não havendo esforço humano envolvido na via direta ou
indireta, sendo impensável, pela ausência de permissivo constitucional, a
instituição de imposto sobre serviços em tal hipótese75.

Trata-se de cessão de direitos considerada como “a patente obrigação


de transferir, a outrem, créditos, pretensões, ações, faculdades e direitos
potestativos. Suas facetas são as mais variadas: sucessões universais
(causa mortis), sucessões contratuais, doações, cessões de créditos, sub-
rogações, fusões, incorporações”76.

Na realidade, “sua característica é a substituição de um dos


contratantes, ou do devedor ou do credor (depende da fase do contrato),
por terceiro. É dizer: o cedente (contratante originário) não presta nenhum
serviço ao cessionário, que simplesmente o substitui na relação
obrigacional”77.

Significa negócio jurídico com acentuada amplitude, em razão das mais


variadas espécies de cessão de direitos relativos a (i) promessa de venda e
compra; (ii) contrato de confissão de dívida; (iii) direitos minerários; (iv)
participação societária; (v) créditos decorrentes de condenação judicial;
(vi) administração e exploração comercial de imóvel; (vii) intermediação
de negócio em caráter exclusivo; (viii) direitos autorais; (ix) herança etc.,
conforme estudo em obra específica78. (Grifei.)

O exame da matéria jurídica implicara o entendimento de que, no


subitem 1.09, o que há é o licenciamento ao usuário do acesso a um
conteúdo digital (vídeo, áudio, imagem, texto etc.) que está armazenado
em um servidor; não há transferência definitiva ao usuário do conteúdo
digital que integra o acervo da empresa responsável pelo licenciamento,

415
que é o provedor de conexão e não a empresa que disponibiliza o
conteúdo79.

E oferece as precisas conclusões:

Pois bem, os arquivos digitais que compõem o conteúdo ao qual o usuário tem
acesso integram o gênero “obra intelectual” e os direitos que sobre eles podem ser
exercidos constituem direitos autorais.
Enquanto bens incorpóreos ou imateriais, tanto os arquivos digitais como os
direitos patrimoniais a eles relativos podem ser transmitidos mediante cessão.
O licenciamento dos direitos autorais relativos aos arquivos digitais corresponde
a uma cessão parcial dos direitos relativos a esses bens incorpóreos. No
licenciamento da empresa para os usuários é cedido apenas o direito de uso. Trata-
se, portanto, de uma simples cessão do uso.
E a cessão de uso, como se viu, envolve uma típica obrigação de dar.
Diga-se que a própria redação do subitem 1.09, ao se referir á
“disponibilização”, e à “cessão”, evidencia que se está diante de um obrigação de
80
dar, e não de uma obrigação de fazer .

Por conseguinte, plenamente questionável a previsão de incidência do


ISS sobre a “disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de
áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet”.

3.5. ICMS

O preceito normativo (item 1.09) estabelecera que fica sujeita ao ICMS,


a distribuição de conteúdo pelas prestadoras de Serviço de Acesso
Condicionado, de que trata a Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011.

Examina-se a mencionada Lei Federal (n. 12.485) que dispôs sobre a


comunicação audiovisual de acesso condicionado, extraindo os
dispositivos de maior interesse:

Art. 2º Para os efeitos desta lei considera-se:


(...)
VI – Comunicação Audiovisual de Acesso Condicionado: complexo de
atividades que permite a emissão, transmissão e recepção, por meios eletrônicos

416
quaisquer, de imagens, acompanhadas ou não de sons, que resulta na entrega de
conteúdo audiovisual exclusivamente a assinantes;
VII – Conteúdo Audiovisual: resultado da atividade de produção que consiste na
fixação ou transmissão de imagens, acompanhadas ou não de som, que tenha a
finalidade de criar a impressão de movimento, independentemente dos processos de
captação, do suporte utilizado inicial ou posteriormente para fixá-las ou transmiti-
las, ou dos meios utilizados para sua veiculação, reprodução, transmissão ou
difusão;
(...)
XXIII – Serviço de Acesso Condicionado: serviço de telecomunicações de
interesse coletivo prestado no regime de direito privado, cuja recepção é
condicionada à contratação remunerada por assinantes e destinado a distribuição de
conteúdos audiovisuais na forma de pacotes, de canais nas modalidades avulsa de
programação e avulsa de conteúdo programado e de canais de distribuição
obrigatória, por meio de tecnologias, processos, meios eletrônicos e protocolos de
comunicação qualquer.
Art. 92. A atividade de distribuição é regida pela Lei n. 9.472, de 16-7-97, e na
regulamentação editada pela Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel.

O provedor de acesso realiza um “serviço de valor adicionado”,


possibilitando a ligação com o mundo virtual, tendo o Regulamento Geral
dos Serviços de Telecomunicações destacado (art. 3º, III) que os referidos
serviços não constituem serviços de telecomunicações. (Grifei.)

Não se ignora a acirrada controvérsia instaurada sobre a tributação


destas atividades, pugnando-se pela não incidência do ICMS, nos termos
seguintes:

(...) os provedores de acesso á internet não configuram o “canal” realizador da


comunicação; não colocam á disposição dos usuários os meios e modos necessários
à transmissão e recepção de mensagens. Sua tarefa, por conseguinte, não é prestar
serviço de comunicação, mas tornar mais eficiente o serviço comunicacional
prestado por outra empresa. É simplesmente, um serviço de valor adicionado, ou
seja, serviço agregado a outro serviço, este sim de comunicação. Não pode, por tais
81
motivos, ser objeto de tributação pelo ICMS .
(...)
O provedor de acesso realiza uma liberação do espaço virtual, para possibilitar,
então, a comunicação entre duas pessoas. Embora seja a chave que destranca a porta
82
da internet, não é realidade virtual, sendo incabível a incidência do ICMS .
(...)

417
12.2. O provimento de acesso à internet pode ser considerado como uma
prestação de serviço que utiliza, necessariamente, uma base de comunicação (mídia)
preexistente e que viabiliza o acesso aos serviços prestados na rede mundial, por
sistemas específicos de tratamento de informações.
12.3. Os Estados e Distrito Federal não detêm competência tributária para
instituir o imposto sobre prestação de serviços de comunicação que incida sobre a
83
prestação de serviços de provimento de acesso á internet .

O STJ assentara as diretrizes seguintes:

Embargos de Divergência. Recurso Especial. Tributário. Serviço Prestado pelos


Provedores de Acesso á Internet. Artigos 155, II, da Constituição Federal, e 2º, II,
da LC n. 87/96. Serviço de Valor Adicionado. Artigo 61 da Lei n. 9.472/97 (Lei
Geral de Telecomunicações). Norma n. 004/95 do Ministério das Comunicações.
Proposta de Regulamento para o uso de Serviços e Redes de Telecomunicações no
Acesso a Serviços Internet. Artigo 21, XI da Constituição Federal. Não incidência
do ICMS.
(...)
O serviço prestado pelo provedor de acesso à Internet não se caracteriza como
serviço de telecomunicação, porque não necessita de autorização, permissão ou
concessão da União, conforme determina o artigo 21, IX, da Constituição Federal.
Não oferece, tampouco, prestações onerosas de serviços de comunicação (art. 2º,
III, da LC n. 87/96), de forma a incidir o ICMS, porque não fornece as condições e
meios para que a comunicação ocorra, sendo um simples usuário dos serviços
prestados pelas empresas de telecomunicações;
(...)
Como a prestação de serviços de conexão à Internet não cuida de prestação
onerosa de serviços de comunicação ou de serviços de telecomunicação, mas de
serviços de valor adicionado, em face dos princípios da legalidade e da tipicidade
fechada, inerentes ao ramo do direito tributário, deve ser afastada a aplicação do
ICMS pela inexistência na espécie do fato imponível.
Segundo salientou a douta Ministra Eliana Calmon, quando do julgamento do
recurso especial ora embargado, “independentemente de haver entre o usuário e o
provedor ato negocial, a tipicidade fechada no Direito Tributário não permite a
84
incidência do ICMS” . (Grifei.)

Em decorrência, o STJ consolidou a jurisprudência seguinte:

O ICMS não incide no serviço dos provedores de acesso á internet (Súmula


334).

Pondera-se que o provedor cria novas utilidades relacionadas ao acesso


cibernético, consistentes em armazenamento, apresentação, movimentação

418
e recuperação de informações, possibilitando os meios de perfazimento da
comunicação.

Entretanto não se vislumbram típicos serviços de comunicação, mas


atividades permitindo que os usuários se comuniquem com o mundo
virtual. Os provedores nada comunicam porque não detêm os
conhecimentos constantes da realidade virtual, mas apenas criam
condições para que ocorra ligação entre os dois pontos, mediante a
distribuição dos conteúdos audiovisuais.

Recentemente (5-10-2017) foi publicado o Convênio ICMS n. 106, de


29 de setembro de 2017, disciplinando os procedimentos de cobrança do
ICMS incidente nas operações com bens e mercadorias digitais
comercializadas por meio de transferência eletrônica de dados,
concedendo isenção nas saídas anteriores à saída destinada ao consumidor
final.

Destacam-se os aspectos seguintes:

Cláusula primeira. As operações com bens e mercadorias digitais, tais como


softwares, programas, jogos eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e
congêneres, que sejam padronizados, ainda que tenham sido ou possam ser
adaptados, comercializadas por meio de transferência eletrônica de dados
observarão as disposições contidas neste convênio.
(...)
Cláusula terceira. O imposto será recolhido nas saídas internas e nas importações
realizadas por meio de site ou de plataforma eletrônica que efetue a venda ou a
disponibilização, ainda que por intermédio de pagamento periódico, de bens e
mercadorias digitais mediante transferência eletrônica de dados, na unidade
federada onde é domiciliado ou estabelecido o adquirente do bem ou mercadoria
digital.
Cláusula quarta. A pessoa jurídica detentora de site ou de plataforma eletrônica
que realize a venda ou a disponibilização, ainda que por intermédio de pagamento
periódico, de bens e mercadorias digitais mediante transferência eletrônica de
dados, é o contribuinte da operação e deverá inscrever-se nas unidades federadas em
que praticar as saídas internas ou de importação destinados a consumidor final,
sendo facultada, a critério de cada unidade federada (...).

419
Cláusula sétima. Este convênio entra em vigor na data da publicação de sua
ratificação nacional no Diário Oficial da União, produzindo efeitos a partir do
primeiro dia do sexto mês subsequente ao da sua publicação.

O Convênio procura regular a incidência do ICMS nas operações com


bens e mercadorias digitais comercializadas por meio eletrônico, o que
parece aceitável pela circunstância do imposto também abranger as
operações mercantis com bens virtuais. Todavia, também trata da
tributação estadual no caso de disponibilização de bens constantes de
plataforma eletrônica (programas, jogos eletrônicos, aplicativos etc.), o
que parece ser questionável não só porque poderia invadir âmbito de
competência municipal (LC n. 116/2003, com a redação da LC n.
157/2016), e ser objetado por tipificar negócio jurídico distinto (“cessão de
direitos”).

Portanto, não há fundamento jurídico, técnico e jurisprudencial, para se


considerar a incidência do ICMS nas atividades previstas no item 1.09 da
lista de serviços anexa à LC n. 116/2003 (objeto da LC n. 157/2016).

3.6. Imunidade

A incidência do ISS sobre a “disponibilização, sem cessão definitiva, de


conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet” (item
1.09 da lista de serviços anexa à LC n. 116/2003, instituído pela LC n.
157/2016), respeita a imunidade de livros, jornais e periódicos.

A imunidade consiste na exclusão de competência das pessoas políticas


de direito público (abrangendo os Municípios) para instituir tributos
relativamente a determinados atos, fatos, pessoas, estados e situações,
expressamente previstas na Constituição Federal. Do mesmo modo que
outorga competências para instituir tributos sobre determinadas

420
materialidades, o próprio texto da CF/88 também estabelece outras
específicas situações que são afastadas dos gravames tributários.

O objetivo da imunidade é a preservação de valores considerados como


de superior interesse nacional, tais como a manutenção das entidades
federadas, o exercício de atividades religiosas, da democracia, das
instituições educacionais, assistenciais e de filantropia, o acesso às
informações, dentre outros. Define-se a imunidade tributária como

a exoneração, fixada constitucionalmente, traduzida em norma expressa


impeditiva da atribuição de competência tributária, ou extraível, necessariamente,
de um ou mais princípios constitucionais, que confere direito público subjetivo a
85
certas pessoas, nos termos por ela delimitados, de não se sujeitarem a tributação .

O regime formal da imunidade implica considerar os seguintes


pressupostos básicos: (i) é matéria sob reserva da Constituição; (ii) tem
voz dirigida às entidades tributantes, vedando a instituição de imposto e
alcançando indiretamente a competência tributária; (iii) não pode ser
recusada nem renunciada; (iv) não pode ser tida como um privilégio, um
favor ou um benefício fiscal; e (v) opera ope legis sem necessidade de
concessões, autorizações ou despachos86.

A CF/88 preceitua o seguinte:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias, asseguradas ao contribuinte, é


vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI – instituir impostos sobre:
(...)
d) livros, jornais, periódicos, e o papel destinado à sua impressão.

O objetivo da imunidade é proteger a divulgação de ideias,


conhecimentos, a livre expressão do pensamento, o acesso às informações

421
e cultura, veiculados por estes instrumentos, traduzindo procedimento
peculiar a um autêntico regime democrático.

A imunidade estabelecida pela Constituição é ampla, abrangendo os


serviços prestados pela empresa jornalística na transmissão de anúncios de
propaganda (RE 111.228-SP, 2ª. T., j. 9-6-87, RTJ 122/1.127).

Ponderável o argumento de que, para o prevalecimento da imunidade:

não interessa sua finalidade, o tipo de ideias veiculáveis, pois o constituinte


pretendeu evitar a manipulação da opinião pública por parte dos detentores do
poder, sob a alegação de que determinados tipos de publicação estariam protegidos
pela intenção legal, e outros não. Dessa forma, a liberdade de expressão, requisito
constitucional de um País democrático e livre, não poderia ser atingida por força de
87
uma eventual escalada tributária .

No âmbito da imunidade devem ser considerados os novos instrumentos


que transmitem ideias, conhecimentos etc., porque se inserem na mesma
moldura cultural veiculada pelos livros, jornais e periódicos, como é o
caso dos produtos decorrentes dos processos de informática (internet).

O desenvolvimento tecnológico implicou a utilização de diversificados


instrumentos – como CD-Roms, disquetes, pen-drives etc. –, de
transmissão e difusão de pensamentos, conhecimentos e informações, sons
e imagens, por intermédio de programas de computador.

A circunstância de não serem elaborados mediante a utilização de papel,


mas sim por meios eletrônicos, não pode constituir entrave ao pleno
enquadramento às regras imunizantes, porque, da mesma forma,
transmitem informações por meio de caracteres, sinais, sons ou imagens.

Elementar o pensamento de que tanto o livro (tradicionalmente


confeccionado com a utilização do papel) como o programa de

422
computador (emprego de tecnologia, natureza digital) operam idênticos
objetivos e efeitos, quais sejam, a transmissão de conhecimentos
implicadores da imunidade tributária, pelo fundamento de que possibilitam
a liberdade e a plena veiculação do pensamento.

Importante buscar a finalidade do preceito constitucional, o resultado


colimado pelo legislador, preservando as instituições e seus valores
fundamentais. No caso em pauta, é fácil perceber que a forma, o meio e o
instrumento de propagação e divulgação de ideias não podem jamais
interferir no desígnio constitucional, pois apenas interessa o fim a que se
destinam os livros, jornais e periódicos. É irrelevante o fato de serem
materializados em papel ou veiculados eletronicamente.

4. CONCLUSÕES

1. Não deveria incidir o ISS sobre as atividades de difusão de vídeos,


áudio e textos pela internet (novo item 1.09 da lista de serviços anexa à LC
n. 116/2003, objeto da LC n. 157/2016) pelo vício da
inconstitucionalidade, porque referidas atividades tratam de “cessão de
direitos autorais”, não caracterizando obrigação de “fazer” (“prestação de
serviços”).

2. Na hipótese de exigência do ISS sobre o streaming, deve ser


considerada a imunidade constitucional concernente a livros, jornais e
periódicos.

3. Não pode incidir o ICMS sobre a distribuição de conteúdo pelas


prestadoras de Serviços de Acesso Condicionado (Lei n. 12.485/2011),
porque essa atividade não constitui efetiva prestação de serviço de
comunicação.

423
4. A aplicação dos preceitos contidos na LC n. 157/2016 – atinentes à
inclusão de novos serviços tributáveis; local do domicílio do tomador dos
serviços; revogação de benefícios fiscais e majoração de alíquotas –
somente pode ocorrer a partir de 1º de janeiro de 2018, desde que a
legislação municipal tenha sido editada até 30 de setembro de 2017.

5. A deslocação da competência dos municípios – relativamente aos


serviços previstos nos itens XXIII, XXIV e XXV, da lista de serviços (com
a redação da LC n. 157/2016) –, para o local do domicílio do tomador
implica a imediata supressão da competência do município onde se
encontram os estabelecimentos dos prestadores de serviços.

424
Determinação dos limites de incidência do
ICMS na modalidade “comunicação” e do
ISS nas atividades de veiculação de
textos/imagens e divulgação de publicidade
na internet
88
Roberto Biava Júnior

1. INTRODUÇÃO

Um setor da economia muito importante na era da economia digital,


sem dúvida, é o que abrange as empresas que operam diversos serviços de
publicidade de textos e imagens na internet. Para obterem faturamento
nesse mercado digital, a maioria das empresas de internet obtém receitas
dos anunciantes que derivam da inserção de textos/imagens no ambiente
da internet, visando à sua veiculação, divulgação e publicidade por
contrato oneroso. Portanto o campo de discussão do presente artigo se
refere à tributação das atividades de veiculação de textos/imagens e
divulgação de publicidade na internet por contrato oneroso em face do
ICMS estadual na modalidade comunicação e do ISS municipal.

Recentemente, com a edição da Lei Complementar n. 157/2016 que


alterou a Lei Complementar n. 116/2003 (que trata das normas gerais do
ISS e sua harmonização em esfera nacional), retomou-se a necessidade de
discussão da determinação dos limites de incidência do ISS e do ICMS
nessas atividades de veiculação de textos/imagens e divulgação de
publicidade na internet por contrato oneroso.

O objetivo do presente artigo é analisar os limites traçados na


Constituição Federal e nas Leis Complementares (LC n. 116/2003 e LC n.

425
87/96) para a tributação dessas atividades desenvolvidas por essas
empresas do setor de internet, especificamente quanto ao campo de
incidência do ICMS-Comunicação (fato gerador do ICMS) e do ISS
(especialmente no que concerne à inserção – prevista no item 17.25 na
Lista de Serviços da Lei Complementar n. 116/2003).

Para tal análise das mudanças da Lei Complementar n. 157/2016 (que


também afetaram outros dispositivos da Lei Complementar n. 116/2003),
iremos delimitar nosso enfoque somente quanto às atividades de
veiculação de textos/imagens e divulgação de publicidade na internet por
contrato oneroso prestado por meio das empresas do setor de internet.

2. O FATO GERADOR DO ICMS NA MODALIDADE DE


COMUNICAÇÃO (POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS, POSIÇÃO
FAZENDÁRIA E NOSSO POSICIONAMENTO)

Antes de adentrarmos no mérito da prestação de serviço, ora em análise,


precisamos discutir as bases teóricas do fato gerador do ICMS na
modalidade de comunicação.

A Constituição Federal atribuiu aos Estados e Distrito Federal a


competência para tributar os serviços de comunicação (além do serviço de
transporte interestadual e intermunicipal) em seu art. 155, inciso II, e
deixou aos Municípios os serviços que não pudessem ser tributados pelo
ICMS, conforme se lê no artigo 156:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...)
II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços
de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as
operações e as prestações se iniciem no exterior (...)
(...)
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) III – serviços de
qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei
complementar.

426
Dessa forma, coube à Lei Complementar do ICMS (lei “Kandir”)
delimitar o que são as prestações de serviço de comunicação, tendo sido
feita essa delimitação de forma bastante abrangente. Ou seja, as prestações
de serviço de comunicação, que na definição da Lei Complementar n.
87/96 configuram-se como as “prestações onerosas de serviços de
comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a
recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de
comunicação de qualquer natureza”, constituem, exclusivamente, fato
gerador da exação estadual, estando, portanto, fora da competência
municipal do ISS.

Todavia algumas doutrinas cobram que o receptor tenha ciência da


mensagem enviada; que esses receptores sejam definidos e que haja
participação ativa do receptor respondendo a mensagem comunicativa.
Nesse sentido Roque Antonio Carrazza89 exige que haja uma interação
entre o emissor e o receptor da mensagem (que a recebe) e que estes
estejam perfeita e previamente identificados. Todavia, para outros
doutrinadores que adotam posição diversa, não se pode pressupor uma
participação ativa do destinatário, como é o caso de Aires F. Barreto,
Aliomar Baleeiro e Luciano Garcia Miguel.

Para o Professor Aires Barreto90, para haver serviço de comunicação, é


imprescindível que o meio seja fornecido por terceiros, em relação
comunicativa onerosa, e que o receptor compreenda a mensagem
transmitida, mas sem a exigência de que o receptor participe ativamente
(respondendo a mensagem). Luciano Garcia Miguel91 critica as doutrinas
que exigem esses critérios de resposta ativa quanto ao destinatário,
dizendo que tal interpretação levaria ao equívoco de considerar que, dentro
desses critérios, o único serviço de comunicação passível de ser tributado

427
pelo ICMS seria o de telefonia e acabaria por excluir da tributação todos
os demais serviços comunicacionais como a televisão por assinatura, a
banda larga etc., sendo que o legislador constitucional e complementar
teria adotado um critério econômico mais amplo e abrangente. Nesse
sentido, Aliomar Baleeiro92 adotou uma definição bastante ampla ao
interpretar o antigo Imposto Sobre Serviços de Transportes e de
Comunicações (que antecedeu o ICMS-Comunicação), então de
competência da União, propugnando que quaisquer modalidades que
importem em transmitir ou receber mensagens por qualquer processo
técnico de emissão de sons, imagens ou sinais, papéis etc. estão sob o
alcance do imposto sobre serviços de comunicação (na época de
competência federal).

Luciano Garcia Miguel93 frisa que de uma forma geral, as posições


doutrinárias, com o acréscimo de um ou mais elementos, estabelecem que
o serviço de comunicação consistiria na atividade de colocar, de forma
onerosa, à disposição do usuário os meios e modos necessários à
transmissão e recepção de mensagens e que outra condição amplamente
aceita pela maior parte da doutrina é de que o serviço seja prestado por um
terceiro que não se confunde nem com o emissor nem com o receptor da
mensagem.

Como ressalta Marco Aurélio Greco94 o prestador do serviço de


comunicação seria aquele que forneceria os respectivos meios para a
comunicação. Ou seja, o prestador é aquele que fornece não apenas
aqueles meios necessários ao transporte das mensagens, mas também
aqueles que tornam possível a instauração de uma relação comunicativa,
tais como interfaces, dispositivos, equipamentos etc. Dessa forma, presta
serviço de comunicação quem fornece o “ambiente de comunicação” e

428
assim, em função da diversidade de meios, podem existir distintos tipos de
serviço de comunicação. Para o Professor Alcides Jorge Costa95, da mesma
forma, o imposto é devido na ocorrência não da comunicação em si mesma
considerada, mas na prestação de serviços que possibilitem a comunicação
a distância; destaca, ainda, que não importam para a incidência do imposto
as diversas formas de comunicação (“a comunicação pode ser oral,
escrita, por gestos ou por meio de imagens”).

Nesse sentido, a posição da Consultoria Tributária do Fisco Paulista96 é


de que “prestar serviço de comunicação é fornecer um ambiente de
comunicação, é colocar à disposição de terceiros meios para que eles se
comuniquem. Entende-se que assim, e somente assim procedendo, alguém
fica sujeito à incidência do ICMS sobre serviços de comunicação”. Ou
seja, o Fisco Paulista adota o conceito doutrinário amplo de que o serviço
de comunicação se perfaz na atividade de colocar, de forma onerosa, à
disposição do usuário os meios e modos necessários à transmissão e
recepção de mensagens. Ou seja, independentemente da forma contratual
adotada, aquele que mesmo sem dispor dos meios, obrigar-se contratual e
onerosamente a fazer com que emissor e receptor possam se comunicar,
estará praticando a prestação de serviço de comunicação sujeita ao ICMS.

Em nosso posicionamento e entendimento, a prestação do serviço de


comunicação tributável pelo ICMS ocorre quando alguém colocar à
disposição de terceiro os meios necessários à comunicação, de forma
onerosa, sendo que existirá uma atividade por parte do prestador de serviço
e uma utilidade para o referido tomador do serviço. Pela ótica do prestador
de serviço de comunicação trata-se de uma atividade de colocar à
disposição do tomador os meios necessários para que sua mensagem
chegue ao destinatário. Há ainda o requisito de que deve haver a

429
onerosidade pela prestação de serviço. Assim, por exemplo, não há
possibilidade de ocorrência do fato gerador quando a própria empresa
presta o serviço para suas próprias filiais. Por fim, pela ótica do tomador
há uma utilidade objetiva, ou seja, independente da forma e da roupagem
jurídica estabelecida, o que importa é que sejam oferecidos ao tomador os
meios necessários à comunicação da sua mensagem; sejam os destinatários
identificados, identificáveis ou não plenamente identificados; sejam estes
destinatários proativos ou não, em relação a possibilidade de responder à
mensagem recebida.

Evidentemente que para as linhas doutrinárias que trazem o requisito de


que o destinatário (receptor) da mensagem seja necessariamente
identificado e que responda ativamente ao emissor da mensagem, por
adotarem um conceito muito restrito do que seja prestação de serviço de
comunicação, acabam por rejeitar97 a incidência do ICMS na veiculação e
divulgação de textos, imagens, desenhos e outros materiais de propaganda
e publicidade. De qualquer forma, já expusemos que para nosso
posicionamento98 não há necessidade de todos os destinatários estarem
plenamente identificados e nem é requisito do fato gerador do ICMS-
Comunicação que o destinatário responda ativamente ao emissor da
mensagem.

Por fim, o posicionamento da Fazenda Paulista (com o qual


concordamos) tem sido o de considerar a “veiculação e divulgação de
textos, imagens, desenhos e outros materiais de propaganda e publicidade”
como serviço de comunicação tributado pelo ICMS, por estarem
preenchidos os requisitos que traçamos em nossa posição doutrinária sobre
o fato gerador do ICMS-Comunicação. Assim, em diversas respostas a
consulta paulistas99, a veiculação publicitária, a título oneroso, é

430
considerada prestação de serviço de comunicação tributável pelo ICMS,
como ocorre na divulgação em meios como: placas do tipo “outdoors”;
“backlights”; “frontlights”; sítios da internet; folhetos e encartes
publicitários; comerciais em programação de TV por assinatura.

Também neste sentido, o posicionamento majoritário do Tribunal de


Impostos e Taxas de São Paulo100, em relação ao tema, entendendo, por
maioria, a Câmara Superior do TIT-SP que há a incidência do ICMS na
prestação de serviços de comunicação, na modalidade de veiculação de
publicidade na rede internet, e que, independentemente das formas
contratuais, o serviço de comunicação se configuraria na medida em que o
objetivo final nestes casos seria tornar público o conteúdo da mensagem
propagandística de seus clientes (emissores) a diversos receptores
(destinatários).

Seguiremos com o enfoque específico em relação aos sítios de internet,


especificamente em relação às atividades de veiculação de textos/imagens
e divulgação de publicidade na internet por contrato oneroso.

3. DA INCIDÊNCIA DO ICMS NAS ATIVIDADES DE VEICULAÇÃO DE


TEXTOS/IMAGENS E DIVULGAÇÃO DE PUBLICIDADE NA
INTERNET POR CONTRATO ONEROSO PRESTADO POR MEIO DAS
EMPRESAS DO SETOR DE INTERNET

Partindo-se da posição que traçamos em relação ao fato gerador do


ICMS na modalidade de comunicação, entendemos que há de fato a
incidência do ICMS nas atividades de veiculação de textos/imagens e
divulgação de publicidade na internet por contrato oneroso prestado por
meio das empresas do setor de internet.

Nesse sentido, concordamos com a posição do Fisco Paulista101 de que


as atividades de veiculação ou divulgação de publicidade de terceiros na

431
internet, quando realizadas onerosamente, são prestações de serviços de
comunicação e se sujeitam à incidência do ICMS. Isto porque a atividade
publicitária visa tornar públicas informações que pretendem influenciar
mercados consumidores, por meio dos diversos veículos de comunicação,
sendo, portanto, uma atividade comunicativa que visa atingir destinatários
determinados, determináveis ou mesmo indeterminados (mas destinatários
potenciais daquela mensagem). E, quando a publicidade é veiculada na
forma de serviço com contraprestação de serviços de terceiros, ocorre
prestação de serviço de comunicação.

Dessa forma, as atividades de veiculação ou divulgação de publicidade


de terceiros na internet, quando realizadas onerosamente, são prestações de
serviços de comunicação e se sujeitam à incidência do ICMS (arts. 1º, III,
e 2º, XII, ambos do Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo –
RICMS/SP). Há de se concluir que ocorre o fato gerador do imposto na
prestação onerosa de serviço de comunicação ao anunciante, prestado por
meio da disponibilização para o público da propaganda desse anunciante
no site do prestador na internet.

Para os sítios (sites) clássicos da internet que obtêm remuneração por


meio das atividades de veiculação ou divulgação onerosa de publicidade
de terceiros na internet (no ambiente de seu sítio virtual), deve haver
necessariamente a tributação do ICMS na modalidade comunicação.

Ademais, atualmente este mercado ganha novos serviços com


especificidades próprias, como é o caso dos grandes sítios (sites) de busca
de conteúdo na internet. Um exemplo interessante e inovador de
ferramenta/serviço nas atividades de veiculação de textos/imagens e
divulgação de publicidade na internet por contrato oneroso prestado por
meio das empresas do setor de internet são as ferramentas disponibilizadas

432
pelos principais sites de busca na internet a seus clientes, que consiste
numa plataforma sistêmica em que o cliente customiza sua informação
para ser exibida aos usuários de sua página na internet de forma que estes
textos e imagens patrocinados apareçam ao lado e acima dos resultados
numa busca na internet. Ou seja, o serviço de comunicação oneroso
consiste numa divulgação privilegiada das informações dos textos e
imagens escolhidos pelos contratantes.

Basicamente, embora para o usuário final o serviço de busca de


textos/imagens inseridos na internet possa ser buscado e aparecer na
listagem do buscador de forma gratuita, houve a contratação onerosa desta
solução consistente em exibir os links e informações (textos/imagens) do
contratante de forma privilegiada (ao lado e acima das demais pesquisas
feitas pelo usuário da internet). É evidente que a onerosidade do contrato
se justifica justamente pela posição privilegiada com que os links e
textos/imagens patrocinados do contratante irão aparecer nas buscas ao
usuário final (embora para o usuário final a pesquisa seja feita de forma
gratuita).

Desse modo, é patente que essas ferramentas não consistem apenas em


um sistema de gerenciamento de dados e manutenção de página eletrônica
ou de mera locação ou cessão de um espaço virtual, mas, principalmente,
são um sistema comunicacional que garante que os links e textos/imagens
patrocinados pelos contratantes irão ser comunicados onerosamente aos
usuários e destinatários finais (ainda que indeterminados ou
determináveis). Ou seja, os usuários que tiverem interesse em realizar
busca pela internet por meio de palavras-chave predefinidas pelo
contratante, receberão os anúncios patrocinados na sua tela de computador
(destinatários da comunicação).

433
Dessa forma, conclui-se que, quanto a este novo modelo de negócio
utilizado pelas empresas de internet (principalmente sites de busca) e
quanto à sua natureza jurídico-tributária, estes são sim serviços de
comunicação tributáveis pelo ICMS102 na modalidade de veiculação de
publicidade pela internet e não são meros serviços de gerenciamento,
organização de dados ou de cessão ou locação de espaço.

Assim, evidente que neste exemplo estão preenchidos os requisitos para


configuração do serviço de comunicação tributável do ICMS: (i) a
natureza da prestação do serviço é onerosa (os clientes pagam para ter seus
links e informações de textos/imagens divulgados a destinatários
determinados, indeterminados ou determináveis de uma determinada área
geográfica); (ii) há o uso de um canal de comunicação entre remetente e
destinatário da mensagem, que é a própria rede da internet e o site da
empresa de busca, que permite que lá sejam divulgados os links e a
informação em posições privilegiadas; (iii) e, por fim, há a transmissão de
uma mensagem, normalmente por sinais e signos direcionando os
destinatários ao endereço eletrônico dos ofertantes.

Dessa forma, as atividades de veiculação de textos/imagens e


divulgação de publicidade na Internet por contrato oneroso prestado por
meio das empresas do setor de internet preenchem todos os requisitos para
verificação do serviço de comunicação tributável pelo ICMS, pela
aplicação expressa dos dispositivos da própria lei estadual do ICMS e
especialmente da Lei Complementar n. 87/96103, em seus artigos 2º, inciso
II, e 12, inciso VII.

Por fim, notamos que essa intepretação justamente prestigia a atividade-


fim realizada pelas empresas do dinâmico setor de internet, justamente
porque a obrigação jurídica principal (independentemente de qual seja a

434
forma contratual adotada pelas empresas) é a de que deve haver a
divulgação privilegiada das informações (textos/imagens) dos contratantes
na internet, ficando evidenciada a prestação de serviço de comunicação na
modalidade de veiculação de publicidade e propaganda pela internet.

Todavia, por fim, deve ser analisado o argumento comumente lançado


pelas empresas de internet de que suas atividades estariam inseridas no
campo de tributação municipal do ISS, e se, após as mudanças da Lei
Complementar n. 157/2016, especialmente no que concerne à inserção
prevista no item 17.25 na Lista de Serviços da Lei Complementar n.
116/2003, subsiste a mesma interpretação.

4. O PANORAMA DA TRIBUTAÇÃO PELO ISS ANTES E APÓS A


EDIÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR N. 157/2016. A VEICULAÇÃO DE
TEXTOS/IMAGENS E DIVULGAÇÃO DE PUBLICIDADE NA
INTERNET POR CONTRATO ONEROSO ESTAVA E CONTINUA
INSERIDA NO CAMPO DE INCIDÊNCIA DO ICMS, CONFORME
PRECONIZA O ARTIGO 155, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL/1988

As empresas de internet que realizam atividades de veiculação ou


divulgação de publicidade de terceiros na internet costumam alegar que
haveria invasão de competência dos Estados em relação aos Municípios,
em ofensa ao disposto na Lei Complementar n. 116/2003. Eventualmente
algumas empresas de internet ainda alegam que as suas atividades seriam
de mera cessão de espaço a terceiros e que não configurariam serviço de
comunicação sujeito ao ICMS e nem sequer estariam sujeitas ao ISS nos
termos da Súmula 31 do STF104.

Não procedem essas alegações de que o serviço de comunicação na


modalidade de veiculação de publicidade de textos/imagens pela internet
estaria sujeito ao ISS.

435
Nesse sentido, alguns tribunais (a exemplo do TJ-SC e TJ-SP) têm se
posicionado no sentido de que a veiculação de publicidade seja pelo rádio,
televisão ou pela internet não está no campo da incidência do ISS:

TRIBUTÁRIO – ISS – RADIODIFUSÃO – AUSÊNCIA DE


COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE PREVISTA NO ROL
TAXATIVO DE SERVIÇOS ANEXO À LEGISLAÇÃO MUNICIPAL
(...)
2. A veiculação por meio de radiodifusão de anúncios e propagandas não se
enquadra como atividade sujeita à incidência do Imposto Sobre Serviços (AC n.
2007.019914-0, Relator: Des. Luiz Cézar Medeiros, julgamento em 03/12/2007 –
TJ-SC)” G.N.
“APELAÇÃO – ORDINÁRIA Declaração de inexistência de relação jurídico-
tributária e cancelamento dos créditos tributários constantes de autos de infração –
ISS Exercícios de 1997, 1998 e 1999 – Provedor de acesso à internet, hospedagem
de “web sites”, atualização de desenvolvimento de páginas eletrônicas para terceiros
e veiculação de propaganda em “cdrom” de acesso à internet – (...) – Não incidência
do tributo – Ausência de previsão no Decreto-lei 406/68 e alterações posteriores e
tampouco na Lei Complementar n. 116/2003 – Precedentes do STJ – Recurso
provido” (AC n. 0304023-04.2009.8.26.0000, Relator: Des. Rezende Silveira,
julgamento em 28/09/2017 – 15ª Câmara de Direito Público do TJ-SP).

Ademais, esta questão de divisar o que está na esfera dos “serviços de


comunicações” não é nova na corte máxima do judiciário. O próprio
Supremo Tribunal Federal – STF já tratou da questão no tempo em que a
tributação dos “serviços de comunicações” estava na competência
tributária federal. Notem neste ponto que em maio de 1979 o STF assim
decidiu:

Portanto, no setor de comunicação, transpostas as fronteiras municipais, o


imposto passa a ser, automaticamente, da União.
(...)
Nem se alegue não estar o município tributando a “comunicação”, mas a
“propaganda”, matéria constante do n. 35 da Lista de Serviços Tributáveis pelo
Município.
É que não resta dúvida de que a propaganda, por intermédio da televisão, é uma
forma de difusão e, portanto, está ela implícita na comunicação intermunicipal, cuja
competência tributária pertence à União.
Assim, pretender que a transmissão do texto de propaganda seja prestação de
serviços e que o valor dessa difusão seja onerado com o ISS é, sem dúvida, tributar

436
diretamente a comunicação por intermédio da telecomunicação.
Portanto, o que o Decreto-lei n. 834/69 quis foi mesmo suprimir da tributação
municipal a propaganda por meio de difusão pela televisão, a fim de ajustar o texto
ao dispositivo” G.N. (STF – RE 90749-1/BA – Rel. Min. Cunha Peixoto).

Deste modo, fica evidenciado que segundo antigo precedente daquela


corte máxima (STF), a veiculação de publicidade na televisão ou também
pela internet (na época era o que existia – em 1979 ainda não havia a rede
de computadores) são serviços de comunicação, pois visam comunicar e
transmitir um texto/imagem de propaganda, estando nos dias atuais, na
esfera de competência tributária estadual do ICMS-Comunicação. Apesar
de a decisão do STF ser do ano de 1979 (época em que o serviço de
comunicação era ainda de competência da União) e de não existir
jurisprudência atual da corte máxima após a CF/88, entendemos que o
precedente continua sendo aplicável aos dias atuais no conflito de
competência ICMS versus ISS, no sentido de afirmar a competência
estadual em tributar o ICMS na modalidade de comunicação na divulgação
e difusão de propaganda e publicidade.

Ou seja, não haveria a possibilidade de se dizer que a referida atividade


comunicacional estaria fora do campo de incidência do ICMS-
comunicação por estar inserida no campo do ISS. Veja que
tradicionalmente as empresas autuadas pelo ICMS alegam nos processos
administrativos tributários estaduais105 que na verdade a sua atividade
estaria inserida no ISS no item 17.06 da Lei Complementar n. 116/2003:

(...) Item 17.06 – Propaganda e publicidade, inclusive promoção de vendas,


planejamento de campanhas ou sistemas de publicidade, elaboração de desenhos,
textos e demais materiais publicitários (...).

Todavia, de maneira adequada, os precedentes de Consulta do Fisco


Paulista, como por exemplo a Resposta à Consulta n. 186/2005106,
demonstravam claramente que não havia o mencionado conflito de

437
competência já que caberia ao Município tributar a criação da propaganda
e sua elaboração artística, mas não a veiculação e divulgação que são
naturalmente atinentes ao serviço de comunicação tributável pelo ICMS:

6. Dessa forma, as atividades de veiculação ou divulgação de publicidade de


terceiros na internet, desde que realizadas onerosamente, são prestações de serviços
de comunicação e se sujeitam à incidência do ICMS, por força do disposto nos
citados artigos 155, II, da CF e do artigo 2º, III, da LC 87/96.
[...]
8. Especificamente em relação à atividade de publicidade e propaganda, o ISS
incide sobre as prestações de serviços relativas à “promoção de vendas,
planejamento de campanhas ou sistemas de publicidade, elaboração de desenhos,
textos e demais materiais publicitários”, conforme dispõe o item 17.06 da Lista de
Serviços anexa à Lei Complementar n. 116/2003.
9. Em síntese, a veiculação ou divulgação de publicidade, por qualquer meio,
são prestações de serviço de comunicação e, como tal, estão reservadas à tributação
pelo ICMS, competindo aos Municípios tributar a criação da propaganda, a
elaboração artística, o planejamento da divulgação, enfim, tudo o que, relativo à
propaganda e à publicidade, não diz respeito à veiculação e à divulgação [...]. G.N.

Por fim, houve recente alteração da Lei Complementar n. 116/2003 pela


Lei Complementar n. 157/2016, em especial com a inclusão do item 17.25
na lista de serviços do ISS, que inseriu novo item assim discriminado:

(...) 17.25 – Inserção de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e


publicidade, em qualquer meio (exceto em livros, jornais, periódicos e nas
modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção
livre e gratuita). (Incluído pela Lei Complementar n. 157, de 2016) (...)”.

Mas, na verdade, a modificação da Lei Complementar n. 116/2003 pela


Lei Complementar n. 157/2016 foi uma tentativa constitucionalmente
frustrada dos Municípios em passar para o campo da incidência do ISS (e
tirar do campo de tributação do ICMS) as atividades de veiculação de
textos/imagens e divulgação de publicidade na internet por contrato
oneroso. Ao contrário do que normalmente é alegado e interpretado pelas
empresas de internet, tal inserção de dispositivo legislativo só vem a
reforçar o entendimento de que para estas prestações de serviço

438
comunicacional nunca houve a incidência do ISS municipal, uma vez que
não houve nenhuma alteração nem na Constituição Federal, 1988, nem na
Lei Complementar n. 87/96 no que concerne à competência estadual para
tributar os serviços de comunicação.

Registre-se, ainda, que, conforme já frisamos ao longo do artigo, a


veiculação e divulgação de publicidade por contrato oneroso na internet
está inserida no campo de incidência do ICMS, conforme preconiza o
artigo 155, inciso II, da Constituição Federal/1988, cujo teor reproduzimos
a seguir:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(...)
II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de
serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as
operações e as prestações se iniciem no exterior;
(...).

Com fulcro na norma constitucional reproduzida acima, o RICMS/SP


(aprovado pelo Decreto n. 45.490/2000), por meio de seu artigo 1º, inciso
III, dispõe que o ICMS incide sobre a “prestação onerosa de serviços de
comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a
recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de
comunicação de qualquer natureza”.

De se ressaltar o disposto no artigo 156, inciso III, da Constituição


Federal/1988 que prevê a incidência do ISS sobre os serviços de qualquer
natureza definidos em lei complementar, desde que não compreendidos no
artigo 155, II, de maneira que, para serviços compreendidos no inciso II,
como é o caso sob análise, incide o ICMS e não o ISS:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:


(...) III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II,
definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 3, de

439
1993)

Dessa forma (conforme entendimento da Resposta de Consulta


14583/2016, de 27-1-2017, do Fisco Paulista), ainda que conste na Lista de
Serviços anexa à Lei Complementar n. 116/2003, incluído pela Lei
Complementar n. 157/2016, o item 17.25 (“17.25 – Inserção de textos,
desenhos e outros materiais de propaganda e publicidade, em qualquer
meio [exceto em livros, jornais, periódicos e nas modalidades de serviços
de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita]”),
a veiculação e divulgação de publicidade na internet por contrato oneroso
continua inserida no campo de incidência do ICMS, conforme preconiza o
artigo 155, inciso II, da Constituição Federal/1988, sendo portanto,
plenamente inconstitucional a cobrança pelo Fisco municipal do ISS nestas
prestações de serviço comunicacionais.

Ademais, esta discussão não seria sequer nova, sendo que anteriormente
já havia ocorrido uma tentativa frustrada de inserção do item 17.07 na
Lista de Serviços anexa à Lei Complementar n. 116/2003 (“Item 17.07 –
Veiculação e divulgação de textos, desenhos e outros materiais de
propaganda e publicidade, por qualquer meio – vetado”), e que tinha sido
objeto de veto presidencial embasado em sólidos fundamentos assim
expostos:

Razões Veto Presidencial (LC 116/03 – Item 17.07)


“O dispositivo em causa, por sua generalidade, permite, no limite, a incidência
do ISS sobre, por exemplo, mídia impressa, que goza de imunidade constitucional
(cf. alínea ‘d’ do inciso VI do art. 150 da Constituição de 1988). Vale destacar que a
legislação vigente excepciona – da incidência do ISS – a veiculação e divulgação de
textos, desenhos e outros materiais de publicidade por meio de jornais, periódicos,
rádio e televisão (cf. item 86 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei n. 406, de
31 de dezembro de 1968, com a redação da Lei Complementar n. 56, de 15 de
dezembro de 1987), o que sugere ser vontade do projeto permitir uma hipótese de
incidência inconstitucional. Assim, ter-se-ia, in casu, hipótese de incidência
tributária inconstitucional. Ademais, o ISS incidente sobre serviços de comunicação
colhe serviços que, em geral, perpassam as fronteiras de um único município.

440
Surge, então, competência tributária da União, a teor da jurisprudência do STF, RE
no 90.749-1/BA, Primeira Turma, Rel.: Min. Cunha Peixoto, DJ de 03.07.1979,
ainda aplicável a teor do inciso II do art. 155 da Constituição de 1988, com a
redação da Emenda Constitucional n. 3, de 17 de março de 1993 (...)” G.N.

Ainda que a nova redação do item 17.25 na lista de serviços do ISS


procure respeitar a imunidade constitucional dos livros, jornais, periódicos
e a imunidade das modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de
sons e imagens de recepção livre e gratuita, tal alteração legislativa não
poderia invadir a competência constitucional do ICMS e não poderia vir a
tributar a realidade econômica da prestação de serviço de comunicação,
que está adstrita exclusivamente ao campo constitucional do ICMS.

Assim, partindo-se da posição que traçamos em relação ao fato gerador


do ICMS na modalidade de comunicação com amparo na CF/88 e na Lei
Kandir, tem-se que há de fato a incidência exclusiva do ICMS nas
atividades de veiculação de textos/imagem e divulgação de publicidade na
Internet por contrato oneroso prestado por meio das empresas do setor de
internet, sendo que mesmo após a edição da Lei Complementar n.
157/2016, tais atividades continuam inseridas no campo de incidência do
ICMS, conforme preconiza o artigo 155, inciso II, da Constituição
Federal/1988.

5. DA NÃO CONFIGURAÇÃO DA IMUNIDADE CONSTITUCIONAL


PREVISTA NA ALÍNEA “D”, DO INCISO X, DO ARTIGO 155 DA CF/88

Por fim, deve ser refutado o clássico argumento das empresas de


internet de que estas atividades, ainda que insertas como serviço de
comunicação, estariam abarcadas pela imunidade constitucional das
modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de
recepção livre e gratuita prevista na alínea “d”, do inciso X, do artigo 155
da CF/88.

441
As empresas que fazem publicidade na internet costumam interpretar
que sua atividade não deveria ser tributada pelo ICMS, ainda que seja
considerada a veiculação de publicidade como serviço oneroso de
comunicação, pois o seu sítio (site na internet) seria de recepção livre e
gratuita pelos destinatários, e encontraria fundamento na alínea “d”, inciso
X, do artigo 155 da Constituição Federal para gozar de imunidade. Ou
seja, alegam que o acesso de qualquer cidadão a seu sítio na internet
demonstraria que caso se trate de serviço de comunicação, este se daria na
modalidade de radiodifusão sonoro e de sons e de imagem de recepção
livre e gratuita, albergado por esta imunidade constitucional.

Nesse sentido, entendemos que, em que pese o respeitável


entendimento das empresas de internet107, tal alegação no mérito não deve
prosperar e deve ser refutada pelos Fiscos Estaduais pelos seguintes
motivos:

a) O dispositivo constitucional é claramente destinado a albergar a


imunidade constitucional das emissoras de televisão abertas e das rádios.
Notem que a imunidade é aplicável aos casos em que o serviço de
comunicação é prestado por radiodifusão, o que não é o caso da veiculação
da publicidade na internet, já que as prestações de serviço de comunicação
destas empresas se utilizam da rede de computadores da internet, e não há
transmissão na modalidade por “radiodifusão”. Vejam como este ponto
está expresso em nossa Constituição Federal neste dispositivo:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(Redação dada pela Emenda Constitucional n. 3, de 1993)
(...)
II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de
serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as
operações e as prestações se iniciem no exterior; (Redação dada pela Emenda
Constitucional n. 3, de 1993)

442
(...)
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
X – não incidirá:
(...)
d) nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão
sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita; (Incluído pela Emenda
Constitucional n. 42, de 19.12.2003) G.N.

b) o dispositivo desta imunidade constitucional é claramente destinado


a albergar a imunidade constitucional apenas das emissoras de televisão
abertas e das rádios; ou seja, seria apenas aplicável aos casos em que o
serviço de comunicação é prestado na modalidade por radiodifusão, o que
não seria o caso da publicidade na internet, já que a prestação de serviço
de comunicação neste caso se utiliza da rede de computadores da internet,
e não há transmissão por “radiodifusão”, que é um conceito que está
definido em legislação setorial específica. Neste ponto, colacionamos
trecho de Resposta à Consulta Tributária n. 1356/1990 (constante do
Boletim Tributário da SEFAZ-SP)108 em que se esclarece com base nas
normas legais específicas o que são os serviços de comunicação na
modalidade por radiodifusão (na época da consulta havia a isenção paulista
na radiodifusão de sons e imagens de recepção livre e gratuita, que
posteriormente foi alçada ao status de imunidade pela Emenda
Constitucional n. 42, de 19-12-2003):

Resposta à Consulta Tributária 1356/1990


(...)
5. Para que a Consulente não fosse incluída no rol de contribuintes do imposto
([...]prestador de serviços de... e de comunicação – parágrafo 1º, item 2, artigo 7º da
Lei 6.374/89) como se infere da análise do citado inciso IX do artigo 2º da Lei
6.374/89, teria que se enquadrar como prestadora do serviço de radiodifusão,
expressamente excepcionado pelo legislador paulista.
6. Nesse sentido, as disposições específicas a seguir transcritas e extraídas da
legislação ordinária que regem os Serviços de Telecomunicações darão os subsídios
necessários para conceituar a radiodifusão – espécie do serviço de comunicação – a
que se refere a norma tributária:
6.1 – Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117, de 27-8-62):

443
“Art. 6º Quanto aos fins a que se destinam, as telecomunicações assim se
classificam:
a) (...)
d) serviço de radiodifusão, destinado a ser recebido direta e livremente pelo
público em geral, compreendendo radiodifusão sonora e televisão;
(...)
f) serviço especial, relativo a determinados serviços de interesse geral, não
abertos à correspondência pública e não incluídos nas definições das alíneas
anteriores, entre os quais: 1) o de sinais horários; 2) o de frequência padrão; 3) o de
boletins meteorológicos; 4) o que se destine a fins científicos ou experimentais; 5) o
de música funcional; 6) o de Radiodeterminação”.
6.2 – Regulamento Geral para execução da Lei 4.117 de 62, aprovado pelo
Decreto 52.026, de 20-5-63:
“Art. 1º Os serviços de telecomunicações em todo o território nacional, inclusive
águas territoriais e espaço aéreo, assim como nos lugares em que princípios e
convenções internacionais lhes reconheçam extraterritorialidade obedecerão aos
preceitos da Lei número 4.117, de 27 de agosto de 1962, no presente Regulamento
Geral, aos Regulamentos Específicos e aos Especiais.
§ 1º Os Regulamentos Específicos, referidos neste artigo, são os que tratam das
diversas modalidades de telecomunicações, compreendendo:
a) Regulamento dos Serviços de Telefonia;
b) Regulamento dos Serviços de Telegrafia;
c) Regulamento dos Serviços de Radiodifusão;
d) Regulamento dos Serviços de Radioamador;
e) Regulamento dos Serviços Especiais e dos Serviços Limitados;
f) Outros que se fizerem necessários.
§ 2º Os Regulamentos Especiais tratarão de assuntos referentes às
telecomunicações que não sejam objeto de Regulamento Específico.
§ 3º Os Regulamentos Específicos e os Especiais serão baixados por decreto do
Presidente da República.
“Art. 6º Para os efeitos deste Regulamento, os termos que figuram a seguir têm
os significados definidos após cada um deles.
(...)
26) Radiodifusão – é o serviço de telecomunicações que permite a transmissão
de sons (radiodifusão sonora) ou a transmissão de sons e imagens (televisão),
destinado a ser direta e livremente recebida pelo público.”
“Art. 41. Constituem modalidades dos serviços de telecomunicações:
a) Serviço de Telefonia Público (Interior ou Internacional);
b) Serviço de Telegrafia Público (Interior ou Internacional);
c) Serviço Público Restrito (Interior ou Internacional);
d) Serviços Especiais;
e) Serviço Limitado Interior;
f) Serviço de Radiodifusão;
g) Serviço de Radioamador.”

444
6.3 – Regulamento dos Serviços de Radiodifusão, aprovado pelo Decreto
52.795, de 31-10-63:
Art 1º Os serviços de radiodifusão, compreendendo a transmissão de sons
(radiodifusão sonora), e a transmissão de sons e imagens (televisão), a serem direta
e livremente recebidas pelo público em geral [..]” G.N.

Ou seja, da leitura, atenta das normas legais do setor de


telecomunicações anteriormente transcritas na resposta de consulta, sem
maior esforço, podemos concluir que a radiodifusão, por definição legal, é
o serviço de telecomunicações que permite e compreende a transmissão de
sons (radiodifusão sonora) e a transmissão de sons e imagens (televisão)
destinado a ser recebido direta e livremente pelo público em geral.

Portanto, a veiculação de textos/imagens e divulgação de publicidade na


internet por contrato oneroso está inserida no campo de incidência do
ICMS, conforme preconiza o artigo 155, inciso II, da Constituição
Federal/1988, e para estes serviços de comunicação não se dá a
configuração da imunidade constitucional prevista na alínea “d”, do inciso
X, do artigo 155 da CF/88.

6. NOSSAS CONCLUSÕES

Desse modo, concluímos em relação aos principais aspectos analisados


neste artigo que:

a) As prestações de serviço de comunicação, que na definição da Lei


Complementar n. 87/96 configuram-se como as “prestações onerosas de
serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão,
a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de
comunicação de qualquer natureza”, constituem, exclusivamente, fato
gerador da exação estadual, estando, portanto, fora da competência municipal
do ISS.
b) A prestação do serviço de comunicação tributável pelo ICMS ocorre quando
alguém colocar à disposição de terceiro os meios necessários à comunicação,
de forma onerosa, sendo que existirá uma atividade por parte do prestador de
serviço e uma utilidade para o referido tomador do serviço. Deve-se
considerar a “veiculação e divulgação de textos, imagens, desenhos e outros

445
materiais de propaganda e publicidade” como serviço de comunicação
tributado pelo ICMS, por estarem preenchidos os requisitos traçados sobre o
fato gerador do ICMS-Comunicação. Assim, correto o entendimento do Fisco
estadual em entender a veiculação publicitária, a título oneroso, como
prestação de serviço de comunicação tributável pelo ICMS, como ocorre na
divulgação em meios como: placas do tipo “outdoors”, “backlights”,
“frontlights”, sítios da internet, folhetos e encartes publicitários, comerciais
em programação de TV por assinatura.
c) Há, de fato, a incidência do ICMS nas atividades de veiculação de
textos/imagens e divulgação de publicidade na internet por contrato oneroso
prestado por meio das empresas do setor de internet. Isto porque a atividade
publicitária visa tornar públicas informações que pretendem influenciar
mercados consumidores, por meio dos diversos veículos de comunicação,
sendo, portanto, uma atividade comunicativa que visa atingir destinatários
determinados, determináveis ou mesmo indeterminados (mas destinatários
potenciais daquela mensagem). E, quando a publicidade é veiculada na forma
de serviço com contraprestação de serviços de terceiros, ocorre prestação de
serviço de comunicação. Dessa forma, as atividades de veiculação ou
divulgação de publicidade de terceiros na internet, quando realizadas
onerosamente, são prestações de serviços de comunicação e se sujeitam à
incidência do ICMS.
d) Em relação ao item 17.06 da Lei Complementar n. 116/2003 não haveria o
conflito de competência com o Fisco municipal, uma vez que caberia ao
Município tributar a criação da propaganda e sua elaboração artística, mas
não a veiculação e divulgação que são naturalmente atinentes ao serviço de
comunicação tributável pelo ICMS.
e) Houve recente alteração da Lei Complementar n. 116/2003 pela Lei
Complementar n. 157/2016, em especial com a inclusão do item 17.25 na
lista de serviços do ISS. Mas, na verdade, a modificação da Lei
Complementar n. 116/2003 pela Lei Complementar n. 157/2016 foi uma
tentativa constitucionalmente frustrada dos Municípios em passar para o
campo da incidência do ISS (e tirar do campo de tributação do ICMS) as
atividades de veiculação de textos/imagens e divulgação de publicidade na
internet por contrato oneroso. Tal inserção de dispositivo legislativo, só vem
a reforçar o entendimento de que para estas prestações de serviço
comunicacional nunca houve a incidência do ISS municipal, uma vez que não
houve nenhuma alteração nem na CF/88, nem na Lei Complementar n. 87/96
no que concerne à competência estadual para tributar os serviços de
comunicação.
f) De se ressaltar, ainda, o disposto no artigo 156, inciso III, da Constituição
Federal/1988 que prevê a incidência do ISS sobre os serviços de qualquer
natureza definidos em lei complementar, desde que não compreendidos no
artigo 155, II, de maneira que, para serviços compreendidos no inciso II
incide o ICMS e não o ISS. Dessa forma, ainda que conste na Lista de

446
Serviços anexa à Lei Complementar n. 116/2003, incluído pela Lei
Complementar n. 157/2016, o item 17.25 (“17.25 – Inserção de textos,
desenhos e outros materiais de propaganda e publicidade, em qualquer meio
[exceto em livros, jornais, periódicos e nas modalidades de serviços de
radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita]”), a
veiculação e divulgação de publicidade na internet por contrato oneroso
continua inserida no campo de incidência do ICMS, conforme preconiza o
artigo 155, inciso II, da Constituição Federal/88, sendo portanto, plenamente
inconstitucional a cobrança pelo Fisco municipal do ISS nestas prestações de
serviço comunicacionais.
g) Por fim, essas prestações de serviços de comunicação não estão abarcadas
pela imunidade constitucional das modalidades de serviços de radiodifusão
sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita prevista na alínea “d”,
do inciso X, do artigo 155 da CF/88. O dispositivo constitucional é
claramente destinado a albergar a imunidade constitucional das emissoras de
televisão abertas e das rádios, sendo que a imunidade é aplicável aos casos
em que o serviço de comunicação é prestado por radiodifusão, o que não é o
caso da veiculação da publicidade na internet.

447
E-Commerce: aspectos tributários sob a
perspectiva brasileira
109
Adma Felícia Barbosa Murro Nogueira

1. INTRODUÇÃO

Ao tratarmos da comercialização virtual de mercadorias tangíveis, é


possível que o leitor tenha a impressão de que não há muitas questões a
serem resolvidas, já que esse tipo de operação não constitui propriamente
uma novidade na seara tributária, sendo, inclusive, há algum tempo objeto
de tratamentos legais específicos.

Ainda que a celebração do contrato de compra e venda se dê online, o


fato é que as mercadorias têm de ser entregues ao comprador, ou a quem
ele indicar, de modo que devem sair de um estabelecimento comercial
físico e ser entregues também em um destino físico. A localização física
do estabelecimento onde as mercadorias se encontram estocadas, assim
como da localidade onde se encontra o seu respectivo destinatário, impacta
a tributação pelo ICMS110, imposto de competência dos Estados e do
Distrito Federal111, que tem como fato gerador as operações mercantis.

Pode-se dizer que até 2015, o sistema fixado pela Constituição Federal
de 1988 (CF/88) implicava concentração da tributação pelo ICMS nos
Estados onde estavam localizados os estabelecimentos físicos dos
vendedores virtuais. Independentemente de onde estivesse localizado o
consumidor final112 ou o destino da mercadoria por ele adquirida, o ICMS
era integralmente devido ao Estado de onde a mercadoria saísse (onde
estivesse localizado o estabelecimento físico do vendedor).

448
Embora, de um lado, esse sistema fosse favorável aos contribuintes, já
que suas obrigações relativas ao ICMS se restringiam ao Estado onde
estivessem localizados, era muito criticada por boa parte dos governos
estaduais. A tributação apenas na origem impedia a repartição do produto
da arrecadação do ICMS, que permanecia concentrada apenas em Estados
que, historicamente, são aqueles com maior capacidade de geração de
riqueza.

A alteração da tributação, iniciada em janeiro de 2016, além de maior


complexidade para que os contribuintes cumpram suas obrigações fiscais,
trouxe consigo também uma série de questões jurídicas: algumas já
existentes, que adquiriram outra roupagem, e outras surgidas com a nova
regra tributária, que dividiu a arrecadação do ICMS nas vendas a
consumidores finais (contribuintes ou não do imposto) entre os Estados de
origem e destino das mercadorias.

Nesse contexto, o presente artigo objetiva debater ambos os sistemas de


tributação (na origem e no destino) e as questões práticas deles derivadas,
decorrentes, de um lado, da complexidade das relações comerciais, como é
o caso, por exemplo, do comércio eletrônico de mercadorias, e, de outro,
do interesse arrecadatório dos Estados.

2. O COMÉRCIO ELETRÔNICO E O ICMS DEVIDO NA ORIGEM

Como já mencionado, até dezembro de 2015, era atribuída ao Estado de


origem das mercadorias a competência para tributação das operações
destinadas a consumidores finais. Apenas nas operações destinadas a
consumidores finais contribuintes do ICMS, é que era repartida a
arrecadação por meio do recolhimento da diferença entre a alíquota interna

449
da unidade federada de destino e a alíquota interestadual devida à unidade
de origem.

Eis o comando contido no artigo 155, § 2º, VII, da CF/88, aplicável até
31 de dezembro de 2015:

Art. 155. (...)


§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
VII – em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a
consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:
a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do
imposto;
b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;
VIII – na hipótese da alínea “a” do inciso anterior, caberá ao Estado da
localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota
interna e a interestadual (...). (Grifamos.)

Ao longo dos anos, a tributação na origem foi alvo de muitas críticas,


principalmente pelo fato de que esse modelo mantinha a receita da
tributação pelo ICMS concentrada em Estados mais desenvolvidos – e,
portanto, “estados fornecedores” – impedindo o crescimento daquelas
unidades federadas menos favorecidas – “estados consumidores”.

Com o avanço do comércio eletrônico, tais discussões ganharam ainda


mais corpo. As principais plataformas de venda eletrônica localizavam-se
nesses mesmos “Estados fornecedores” e, além de não gerarem receita
tributária aos Estados de destino, reduziam ainda mais suas arrecadações.
Além da venda não presencial, realizada exclusivamente pela internet, o
aprimoramento das plataformas eletrônicas fez com que muitas lojas
físicas também passassem a funcionar como meros showrooms, apenas
com itens de exposição, sendo a venda efetivada por meio do seu canal
eletrônico, com entrega direta no local determinado pelo consumidor.

450
Diante de tal cenário, alguns Estados passaram a argumentar que o
comércio eletrônico favorecia ainda mais a distorção da destinação do
ICMS originalmente vislumbrada pela CF/88, já que impossibilitava a
repartição desse imposto entre a unidade federada de origem e a de
destino. Algumas Fazendas Estaduais, inclusive, passaram a considerar
como local da operação, para fins de incidência do ICMS, aquele onde a
venda tivesse sido negociada e concluída (onde se localizava um
showroom), e não onde ocorresse a saída física da mercadoria.

No estado de Minas Gerais, por exemplo, foi incluída expressa


disposição no seu Regulamento do ICMS (RICMS), no sentido de que o
local da operação, para fins de incidência desse imposto, era o do
estabelecimento, naquele Estado, que efetuasse a venda, ainda que a
mercadoria fosse remetida ao adquirente por outro estabelecimento do
mesmo titular. Nesse sentido, eis o contido na alínea “m”, do inciso I, do
art. 61 do RICMS/MG, aprovado pelo Decreto n. 43.080/2002:

Art. 61. O local da operação ou da prestação, para os efeitos de cobrança do


imposto e definição do estabelecimento responsável, é:
(...)
m) o do estabelecimento, no Estado, que efetuar venda a consumidor final, ainda
que a mercadoria tenha saído de estabelecimento do mesmo titular localizado fora
do Estado diretamente para o adquirente (...).

Apesar desse posicionamento, a exigência do imposto a partir do local


onde é realizada a negociação das mercadorias já fora afastada pelo
Superior Tribunal de Justiça (STJ), inclusive por meio da sua Primeira
Seção, que decidiu que o ICMS deve ser recolhido, pela alíquota interna,
no Estado de onde tiver saído a mercadoria para o consumidor final, após a
sua fatura, ainda que a venda tenha sido negociada em outro Estado,
através de filial113.

451
No entanto, nem todas as operações envolvem apenas estabelecimentos
de um mesmo contribuinte, o que pode tornar mais complexa a análise
quanto à competência para cobrança do imposto. É dizer, a depender do
grau de participação desses showrooms na efetivação das operações de
compra e venda, conforme, inclusive, contratado entre as partes, em vez de
sua atuação caracterizar mera prestação de serviços, pode ser interpretada
como efetiva atividade de revenda, sendo apenas a entrega realizada por
terceiro, “por sua conta e ordem”.

Nesse sentido, é possível citar decisão da Segunda Turma do STJ, ao


analisar o AgRg no REsp 1.564.338/BA, que manteve decisão que
entendeu, a partir da análise contratual, que as concessionárias não
atuavam como meras intervenientes em vendas, via internet, realizadas por
determinada montadora junto aos consumidores. Conforme decidido,

(...) examinando detidamente as disposições contidas na “Convenção de Marca”


(fls. 26/31), bem como as cláusulas previstas no “Contrato de Venda” (fls. 33/36),
constata-se que, ao contrário do que afirma o Impetrante/Apelante, a participação
das concessionárias na operação de venda de veículos, via internet, a consumidores
finais, não é de mera interveniente, mas sim de verdadeira intermediária. E, com
efeito, aduza-se, em primeiro lugar, que, conforme se infere das Cláusulas IV.1.3,
IV.1.4 E IV.1.4.1 da “Convenção de Marca” (fls. 26/31) e Cláusula Sexta do
“Contrato de Venda” (fls. 33/36) o negócio jurídico é inclusive, dentro do próprio
114
estabelecimento comercial desta .

Assim, com o progressivo avanço dos canais de venda eletrônicos, os


Estados viram a necessidade de adotar outras medidas mais abrangentes,
com objetivo de “garantir” e “proteger” sua arrecadação. Dentre elas,
destacam-se: (a) a concessão unilateral de benefícios fiscais à operação de
e-commerce, com vistas a atrair a instalação, em seus territórios, de
centrais de distribuição de empresas dedicadas a esta atividade e, por outro
lado, (b) a cobrança da diferença entre as alíquotas interna e interestadual

452
nas entradas interestaduais de mercadorias, destinadas a consumidores
finais.

a. A concessão unilateral de benefícios fiscais ao E-Commerce

Como exposto, com vistas a garantir a receita tributária decorrente da


aquisição, por seus consumidores finais, de mercadorias fornecidas por
empresas localizadas em outras unidades da Federação e, cientes da
impossibilidade jurídica de se alterar a regra da tributação na origem,
senão por meio de emenda à CF/88, alguns estados passaram a conceder,
unilateralmente, benefícios fiscais relativos ao ICMS àqueles contribuintes
que instalassem, em seus territórios, estabelecimentos dedicados ao e-
commerce.

É caso, por exemplo, de Estados como Rio de Janeiro, Bahia e


Pernambuco, dentre outros, que editaram legislações internas concedendo
créditos presumidos de ICMS àqueles contribuintes dedicados à venda de
mercadorias a consumidores finais, via internet ou telemarketing. A título
ilustrativo, seguem as originais disposições introduzidas nas legislações
dos Estados citados acima:

Rio de Janeiro – Decreto Estadual n. 36.449, de 29 de outubro de 2004


(Redação original vigente de 30/10/2004 até 28/03/2005)
Art. 1.º Nas operações de saída interestadual de mercadorias para consumidor
final, resultante de vendas via internet ou serviço de telemarketing, realizadas por
central de distribuição cuja sede e central de atendimento (call center), própria ou
terceirizada, estejam localizadas no Estado do Rio de Janeiro fica autorizada a
concessão de crédito presumido de 6% (seis por cento) sobre Operações Relativas à
Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte
Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações – ICMS sobre o valor da Nota
Fiscal.
Parágrafo único. Entende-se por sede da empresa o local onde exerce sua
atividade principal e onde estejam concentrados a presidência, as vice-presidências,
as diretorias administrativa, financeira, técnica e comercial, bem como os centros de
pesquisa e desenvolvimento, caso existam.
Bahia – Decreto Estadual n. 7.799/10, de 9 de maio de 2000

453
(Redação original do art. 3º-G, acrescentado pelo Decreto n. 12.533, de
23/12/10, em vigor de 24/12/10 a 30/11/13)
Art. 3º-G. Nas saídas interestaduais de mercadorias comercializadas via internet
ou serviços de telemarketing, destinadas a pessoa jurídica não contribuinte do ICMS
ou a pessoa física, fica concedido crédito presumido de forma que a carga tributária
seja equivalente a 3% (três por cento) do valor da operação, constituindo-se como
opção do contribuinte em substituição à utilização de quaisquer outros créditos
fiscais vinculados às saídas dos produtos.
Pernambuco – Decreto Estadual n. 35.690, de 18 de outubro de 2010
(Redação original, em vigor de 18/10/2010 a 23/12/2015)
Art. 1º O Decreto n. 14.876, de 12 de março de 1991, e alterações, passa a
vigorar com as seguintes modificações:
Art. 36. Fica concedido crédito presumido:
XL – a partir de 1º de novembro de 2010, ao estabelecimento comercial varejista
que realize vendas diretas a consumidor final de outra Unidade da Federação,
exclusivamente por meio da Internet ou de telemarketing, de tal forma que a carga
tributária líquida seja equivalente ao resultado da aplicação do percentual de 2%
(dois por cento) sobre o valor da operação, vedada a utilização do crédito relativo à
aquisição da mercadoria objeto da referida operação, observado o disposto no § 20.
(ACR) (...)

O objetivo desses estados era: (i) garantir a arrecadação do ICMS nas


aquisições realizadas por seus consumidores internos; (ii) ter um
incremento na sua arrecadação, por meio da parcela – ainda que reduzida –
do imposto devido nas vendas a consumidores localizados em outras
unidades da Federação; e (iii) gerar empregos e renda em seu território.

É certo, contudo, que essa medida claramente afrontava (e afronta) o


texto constitucional, em especial o seu artigo 155, § 2º, inciso XII, alínea
“g”115, dando contorno a mais um viés da chamada Guerra Fiscal. Sem nos
alongarmos no tema, o fato é que a CF/88 delegou a lei complementar a
competência para regular a forma como os incentivos e benefícios fiscais
no âmbito do ICMS podem ser concedidos e a Lei Complementar, por sua
vez, exige que estes incentivos e benefícios sejam concedidos mediante a
celebração de Convênio entre os Estados (LC n. 24/75, art. 1º).

454
Diante disso, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem se manifestado, de
forma reiterada, no sentido de que “(...) revela-se inconstitucional a
concessão unilateral, por parte de Estado-membro ou do Distrito Federal,
sem anterior convênio interestadual que a autorize, de quaisquer benefícios
tributários referentes ao ICMS, tais como, exemplificativamente, (a) a
outorga de isenções, (b) a redução de base de cálculo e/ou de alíquota, (c)
a concessão de créditos presumidos, (d) a dispensa de obrigações
acessórias, (e) o diferimento do prazo para pagamento e (f) o cancelamento
de notificações fiscais”116.

A alteração da repartição do ICMS nas vendas a consumidores finais,


que será tratada mais adiante, reduziu de forma significativa o ganho
usufruído pelas empresas de e-commerce que se utilizaram dos referidos
benefícios fiscais. Isto porque, conforme será exposto, foi reduzida a
parcela do imposto devida ao Estado de origem da mercadoria e, portanto,
a parcela objeto da concessão de benefícios por este Estado. Alguns
Estados, inclusive, tiveram de adaptar os benefícios à nova realidade,
reduzindo ainda mais a parcela a ser arrecadada nas operações
interestaduais, com vistas à manutenção do e-commerce em seus
territórios.

Com a publicação da Lei Complementar n. 160117, de 7 de agosto de


2017, esses benefícios, ainda que convalidados, apenas poderão ser
usufruídos até o último dia do quinto ano subsequente à produção de
efeitos do convênio que os tenha convalidado (art. 3º, § 2º, III, da LC n.
160/2017), o que, certamente, gerará uma nova etapa de discussões a
respeito do tema.

b. O Protocolo ICMS n. 21/2011

455
Com objetivo de

i) repartir o ICMS devido nas vendas interestaduais, quando a mercadoria


tivesse sido adquirida por consumidor final, de forma não presencial por
meio de internet, telemarketing, ou showroom;
ii) realizar tal repartição por meio da destinação, à unidade de origem, do ICMS
apurado com base nas alíquotas interestaduais; e, à unidade de destino, da
parcela correspondente à aplicação da diferença entre a alíquota interna e a
alíquota interestadual; e
iii) exigir a diferença entre as alíquotas interna e interestadual mesmo nas
operações procedentes de unidades da Federação não signatárias do
Protocolo, alguns estados celebraram o Protocolo ICMS n. 21, de 1º de abril
de 2011. Trata-se de mais uma medida adotada pelos Estados, com vistas a
garantir arrecadação, que não encontrava qualquer respaldo na CF/88.

Como já exposto linhas atrás, a Carta Magna adotava a tributação na


origem como regra norteadora da repartição da receita do ICMS nas
vendas a consumidores finais. A exigência imposta pelos Estados
signatários do referido Protocolo ICMS, além de contrariá-la, também
ofendia o pacto federativo, impondo barreiras à livre comercialização de
mercadorias no território nacional e a vedação ao confisco, porquanto
impôs nova cobrança, pelo destino, de imposto já devido ao Estado de
origem.

Nesse sentido, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)


proposta pela Confederação Nacional do Comércio de Bens e Serviços
(CNC), o Plenário do STF declarou, em 17 de setembro de 2014, a
inconstitucionalidade do referido Protocolo, nos seguintes termos:

(...)
5. O ICMS incidente na aquisição decorrente de operação interestadual e por
meio não presencial (internet, telemarketing, showroom) por consumidor final não
contribuinte do tributo não pode ter regime jurídico fixado por Estados-membros
não favorecidos, sob pena de contrariar o arquétipo constitucional delineado pelos
arts. 155, § 2º, inciso VII, b, e 150, IV e V, da CRFB/88.
6. A alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte do ICMS, é
devida à unidade federada de origem, e não à destinatária, máxime porque regime

456
tributário diverso enseja odiosa hipótese de bitributação, em que os signatários do
protocolo invadem competência própria daquelas unidades federadas (de origem da
mercadoria ou bem) que constitucionalmente têm o direito de constar como sujeitos
ativos da relação tributária quando da venda de bens ou serviços a consumidor final
não contribuinte localizado em outra unidade da Federação.
7. O princípio do não confisco, que encerra direito fundamental do contribuinte,
resta violado em seu núcleo essencial em face da sistemática adotada no
cognominado Protocolo ICMS n. 21/2011, que legitima a aplicação da alíquota
interna do ICMS na unidade federada de origem da mercadoria ou bem,
procedimento correto e apropriado, bem como a exigência de novo percentual, a
diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna, a título também de
ICMS, na unidade destinatária, quando o destinatário final não for contribuinte do
respectivo tributo.
(...)
10. Os Estados membros, diante de um cenário que lhes seja desfavorável, não
detêm competência constitucional para instituir novas regras de cobrança de ICMS,
em confronto com a repartição constitucional estabelecida.
(...)
13. Os imperativos constitucionais relativos ao ICMS se impõem como
instrumentos de preservação da higidez do pacto federativo, et pour cause, o fato de
tratar-se de imposto estadual não confere aos Estados membros a prerrogativa de
instituir, sponte sua, novas regras para a cobrança do imposto, desconsiderando o
altiplano constitucional.
14. O Pacto Federativo e a Separação de Poderes, erigidos como limites
materiais pelo constituinte originário, restam ultrajados pelo Protocolo n. 21/2011,
tanto sob o ângulo formal quanto material, ao criar um cenário de guerra fiscal
difícil de ser equacionado, impondo ao Plenário desta Suprema Corte o dever de
expungi-lo do ordenamento jurídico pátrio.
15. Ação direta de inconstitucionalidade julgada PROCEDENTE. Modulação
dos efeitos a partir do deferimento da concessão da medida liminar, ressalvadas as
118
ações já ajuizadas .

3. A EMENDA CONSTITUCIONAL N. 87/2015 E A TRIBUTAÇÃO DO


ICMS NO DESTINO

A solução para uma adequada repartição da receita tributária nas vendas


interestaduais a consumidores finais não era passível de ser obtida pelas
unidades federadas, sem que houvesse uma efetiva alteração na sistemática
estabelecida pela CF/88.

Foi, então, por meio da Emenda Constitucional n. 87, de 16 de abril de


2015, que restou modificada a redação do artigo 155, § 2º inciso VIII, da

457
CF, alterando-se a competência para exigência do ICMS nas citadas
operações. Com efeito, desde janeiro de 2016, nas operações que destinem
bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do ICMS,
localizado em outra unidade da Federação, devem ser aplicadas:

i) a alíquota interestadual, a ser recolhida ao Estado de origem; e


ii) a diferença entre as alíquotas interna do Estado de destino e interestadual, a
ser recolhida para o estado de destino.

Confira-se a nova redação do mencionado dispositivo constitucional:

Art. 155. (...)


§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
VII – nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor
final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á
a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o
imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado
destinatário e a alíquota interestadual;
VIII – a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à
diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será
atribuída:
a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto;
b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto.
(Grifamos.)

A Emenda Constitucional n. 87/2015 também instituiu uma norma de


transição do regime de tributação na origem para o de tributação no
destino. Trata-se do art. 99119, acrescentado ao Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias. Por este dispositivo, a proporção da partilha
do valor do ICMS é gradativamente alterada, até que a diferença entre as
alíquotas seja integralmente recolhida em favor do Estado destinatário – o
que ocorre a partir do ano de 2019.

Embora constitua um primeiro passo para que a legislação seja


adequada à realidade comercial que vem se construindo ao longo dos anos,
a Emenda Constitucional n. 87 e, portanto, a alteração do regime de

458
tributação das operações realizadas junto a consumidores finais, está longe
de pôr fim às questões relativas ao comércio interestadual e, em especial,
àquelas derivadas do comércio eletrônico.

Nesse sentido, convém reproduzir trecho da dissertação de mestrado


apresentada por Maki Minato à Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo, citado por José Eduardo de Melo:

O local da operação e o conceito de estabelecimento para a tributação das


operações mercantis contratadas pela internet não recebera tratamento normativo
específico, envolvendo particularidades por envolver a comercialização e a
prestação de bens e serviços intangíveis, e pela desnecessidade de vinculação do site
a um ponto geográfico (Maki Minato, Guerra Fiscal: ICMS e o Comércio
Eletrônico. Tese de Mestrado apresentada à Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo, em 2014, p. 57, inédita).
Neste sentido, são apontadas situações em que a fixação do local da operação se
torna complexa:
(...)
a) Compra em loja virtual e entrega física por estabelecimento da empresa: o
local da operação é o do estabelecimento que dá saída física à mercadoria.
Conforme os artigos 11, inciso I, “a” e § 3º e 12, inciso I, da Lei Complementar n.
87/96, o ICMS é devido ao estado do estabelecimento que promove a saída física da
mercadoria, ainda que diverso do domicílio tributário indicado pelo estabelecimento
virtual contratado pelo adquirente;
b) Compra em loja virtual e saída física da mercadoria por armazém: o local da
operação é o do estabelecimento que transfere a propriedade da mercadoria,
independentemente do trânsito físico. Para a aplicação da regra prevista no artigo
11, alínea “c”, da Lei Complementar n. 87/1996, é necessário identificar o endereço
120
do estabelecimento virtual que realiza transferência da propriedade .

Embora algumas situações sejam passíveis de solução com base na


legislação vigente, como é o caso daquelas ilustradas acima, muitas
controvérsias ainda permanecem e outras vêm surgindo. Na medida em
que há uma contínua busca, pelas empresas, de soluções cada vez mais
eficientes para atrair consumidores, nem sempre tais soluções de amoldam
à legislação existente, sendo também necessária sua contínua atualização.

459
Em outras palavras, as operações comerciais passam a ser cada dia mais
complexas, e tal complexidade nem sempre é acompanhada pelo
necessário ajuste da normatização que deve lhe dar respaldo, seja em
relação ao cumprimento da obrigação principal, seja em relação às
obrigações acessórias.

Nesse sentido, é possível citar outras situações, ainda mais


controvertidas. É o caso, por exemplo, do consumidor domiciliado no
Estado “A” que, ao comprar uma mercadoria por meio de uma loja virtual,
indica endereço de entrega localizado no Estado “B”. Neste exemplo,
surge a dúvida acerca do Estado para o qual é devida a diferença entre as
alíquotas do ICMS: o Estado onde está localizado o destinatário jurídico
da aquisição, ou o Estado do destino físico? E quando este Estado “B” é o
mesmo onde está localizado o estabelecimento físico da loja virtual, de
onde sairão as mercadorias?

Alguns Estados têm adotado o “destino físico” como referência para


cobrança da diferença entre as alíquotas. É dizer, apenas quando ocorrida a
entrada física da mercadoria em seus territórios é exigida a diferença entre
as alíquotas interna e a alíquota interestadual. Neste sentido, pois, é assim
que Estados como São Paulo e Santa Catarina disciplinam a matéria:

São Paulo – Regulamento do ICMS – Aprovado pelo Decreto Estadual n.


45.490, de 30/11/2000 (parágrafo acrescentado pelo Decreto Estadual 61.744, de
23-12-2015)
Art. 52. As alíquotas do imposto, salvo exceções previstas nesta seção, são: (...)
§ 3º São internas, para fins do disposto neste artigo, as operações com
mercadorias entregues a consumidor final não contribuinte do imposto no
território deste Estado, independentemente do seu domicílio ou da sua eventual
inscrição no Cadastro de Contribuintes do ICMS de outra unidade federada.
(Grifamos.)
Santa Catarina – Regulamento do ICMS – Aprovado pelo Decreto Estadual n.
2.870, de 27-8-2001 (parágrafos acrescentados pelo Decreto Estadual n. 609, de
22-2-2016)

460
Art. 4º O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do
imposto e definição do estabelecimento responsável, é: (...)
§ 5º Na hipótese do inciso XV do art. 3º, consideram-se destinadas a este Estado
as operações nas quais o bem ou a mercadoria seja entregue, pelo remetente ou
121
por sua conta e ordem, ao destinatário em território catarinense . (Grifamos.)
Art. 26. As alíquotas do imposto, nas operações e prestações internas, inclusive
na entrada de mercadoria importada e nos casos de serviços iniciados ou prestados
no exterior, são: (...)
§ 4º Para fins do disposto neste artigo, são internas as operações com
mercadorias entregues a consumidor final não contribuinte do imposto em
território catarinense, independentemente do seu domicílio ou da sua eventual
inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS de outra unidade da Federação.
(Grifamos.)

Tal entendimento, contudo, não é uniforme. Algumas unidades


federadas não admitem essa regra (destino físico). É o que ocorre, por
exemplo, nos casos em que o consumidor informa, na compra virtual,
domicílio localizado no Distrito Federal, porém opta por retirar a
mercadoria em estabelecimento do contribuinte localizado em outro
Estado, sendo este estabelecimento o responsável, inclusive, pela emissão
do respectivo documento fiscal relativo à venda da mercadoria.

Em tal situação, de acordo com a legislação distrital, o diferencial de


alíquotas é devido ao Distrito Federal, sendo irrelevante se a mercadoria
efetivamente entrou em seu território:

Lei Estadual n. 1.254, de 8 de novembro de 1996 (com redação da Lei n. 5.546,


de 5-10-2015)
Art. 20. É devido ao Distrito Federal o imposto correspondente à diferença entre
a sua alíquota interna e a interestadual, em operações e prestações interestaduais
com bens ou serviços cujo adquirente ou tomador seja consumidor final,
contribuinte ou não do imposto, localizado no Distrito Federal.
§ 1º O disposto no caput aplica-se também na hipótese de aquisição de bens
ou contratação de serviços de forma presencial.
(...)
§ 3º O imposto de que trata o caput é também integralmente devido ao
Distrito Federal no caso de o bem adquirido ou de o serviço tomado por
destinatário não contribuinte do imposto, domiciliado no Distrito Federal, ser
entregue ou prestado em outra unidade federada (...). (Grifamos.)

461
Note-se, mesmo na hipótese de venda presencial, em que todas as
etapas da compra e venda são realizadas no estabelecimento do vendedor
(entrega da mercadoria, recebimento do preço e emissão do respectivo
documento fiscal), o Distrito Federal exige o recolhimento do diferencial
de alíquotas. Por certo, também o exige nas vendas virtuais em que, não
obstante o recebimento do preço seja efetuado por meio da loja virtual, a
entrega da mercadoria e a emissão do respectivo documento fiscal são
realizadas através de loja física, tal como numa venda presencial.

E o Distrito Federal não está sozinho em tal interpretação. Estados


como Maranhão e Paraíba, por exemplo, também publicaram legislações
que adotam o mesmo entendimento:

Maranhão – Lei Estadual n. 7.799 de 19 de dezembro de 2002 (alterada pela


Lei n. 10.328, de 30-9-2015)
Art. 5º (...)
§ 1º O imposto incide também:
(...)
VI – operações e prestações iniciadas em outra unidade da Federação que
destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do imposto, localizado
neste Estado, inclusive quando realizadas diretamente no estabelecimento
comercial do remetente. (Grifamos.)
Paraíba – Lei Estadual n. 6.379, de 2 de dezembro de 1996 (alterada pela Lei n.
10.507, de 18-9-2015)
Art. 3º (...)
§ 1º O imposto incide também:
(...)
VII – sobre as operações e prestações interestaduais que destinem mercadorias,
bens e serviços a consumidor final não contribuinte do imposto localizado neste
Estado, e corresponde à diferença entre a alíquota interna deste Estado e a alíquota
interestadual, inclusive quando realizadas diretamente no estabelecimento
comercial, exceto quando do autoconsumo. (Grifamos.)

É evidente em tais situações o conflito de competências, cuja solução


deveria ser objeto de lei complementar nacional que regulasse a forma pela
qual a nova regra constitucional deveria ser levada a efeito pelos Estados.

462
4. O CONVÊNIO ICMS N. 93 E AS CONTROVÉRSIAS DA TRIBUTAÇÃO
PELO ESTADO DE DESTINO

Na medida em que, desde a publicação da Emenda Constitucional n. 87,


não foi publicada lei complementar que estabelecesse as normas gerais a
serem observadas pelos Estados e pelo Distrito Federal na instituição da
nova tributação nas operações interestaduais com consumidores finais, foi
celebrado Convênio ICMS com vistas a, em tese, suprir tal lacuna. Trata-
se, pois, do Convênio ICMS n. 93, de 17 de setembro de 2015, em relação
ao qual, oportuno transcrever algumas de suas disposições:

Cláusula primeira – Nas operações e prestações que destinem bens e serviços a


consumidor final não contribuinte do ICMS, localizado em outra unidade federada,
devem ser observadas as disposições previstas neste convênio.
Cláusula segunda – Nas operações e prestações de serviço de que trata este
convênio, o contribuinte que as realizar deve:
I – se remetente do bem:
a) utilizar a alíquota interna prevista na unidade federada de destino para
calcular o ICMS total devido na operação;
b) utilizar a alíquota interestadual prevista para a operação, para o cálculo do
imposto devido à unidade federada de origem;
c) recolher, para a unidade federada de destino, o imposto correspondente à
diferença entre o imposto calculado na forma da alínea “a” e o calculado na forma
da alínea “b”;
(...)
§ 1º A base de cálculo do imposto de que tratam os incisos I e II do caput é
única e corresponde ao valor da operação ou o preço do serviço, observado o
disposto no § 1º do art. 13 da Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de
1996.
(...)
§ 2º Considera-se unidade federada de destino do serviço de transporte aquela
onde tenha fim a prestação.
(...)
Cláusula terceira – O crédito relativo às operações e prestações anteriores
deve ser deduzido do débito correspondente ao imposto devido à unidade
federada de origem, observado o disposto nos arts. 19 e 20 da Lei Complementar
n. 87/96.
(...)
Cláusula sexta – O contribuinte do imposto de que trata a alínea “c” dos incisos
I e II da cláusula segunda, situado na unidade federada de origem, deve observar a
legislação da unidade federada de destino do bem ou serviço.

463
Parágrafo único. As unidades federadas de destino podem dispensar o
contribuinte de obrigações acessórias, exceto a emissão de documento fiscal.
Cláusula nona – Aplicam-se as disposições deste convênio aos contribuintes
optantes pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e
Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte –
Simples Nacional, instituído pela Lei Complementar n. 123, de 14 de dezembro de
2006, em relação ao imposto devido à unidade federada de destino.
Cláusula décima – Nos exercícios de 2016, 2017 e 2018, no caso de operações
e prestações que destinem bens ou serviços a consumidor final não contribuinte
localizado em outra unidade federada, o imposto correspondente à diferença
entre a alíquota interna e a interestadual deve ser partilhado entre as unidades
federadas de origem e de destino (...)
§ 1º A critério da unidade federada de origem, a parcela do imposto a que
se refere o inciso II do caput deve ser recolhida em separado. (...). (Grifamos.)

Além de o Convênio não sanar os conflitos surgidos com a nova ordem


constitucional – como o ilustrado no subtópico acima122 – ainda gerou
outras controvérsias, tais como:

i) a fixação, por meio de Convênio ICMS, das normas gerais a serem


observadas pelos Estados na instituição e cobrança do diferencial de
alíquotas;
ii) a restrição à utilização do crédito de ICMS apropriado por ocasião das
mercadorias revendidas a consumidores localizados em outros Estados;
iii) a metodologia de cálculo fixada pelo Convênio versus a metodologia
imposta por algumas unidades federadas, o que dá ensejo a uma nova base de
cálculo que não tem previsão no Convênio e tampouco na Lei Complementar
n. 87/96;
iv) a exigência do diferencial de alíquotas inclusive naquelas operações
realizadas por contribuintes abrangidos pelo Simples Nacional, em desacordo
com o contido no artigo 146, III, d, da Constituição e na Lei Complementar
n. 123/2006;
v) o regime de substituição tributária e o consequente acúmulo de valores a
restituir por aqueles contribuintes que atuam no e-commerce e que realizam
operações interestaduais com mercadorias submetidas a este regime de
tributação no Estado de origem;
vi) a cobrança, pelos Estados de destino, dos adicionais do ICMS destinados aos
fundos estaduais de combate à pobreza;
vii) a não aplicação de benefícios fiscais internos, concedidos unilateralmente,
para fins do cálculo do diferencial de alíquotas, dentre outras questões.

464
Como não é possível, no presente artigo, esgotar todas as controvérsias
existentes em virtude da adoção, pela CF/88, da tributação pelo ICMS na
origem e, posteriormente, no destino, a análise, neste momento, será
restrita às duas primeiras questões apontadas acima.

a. Fixação das Normas Gerais em Matéria Tributária por meio de


Convênio

Compete a lei complementar, nos termos do artigo 146, da CF, dispor


sobre conflitos de competência e estabelecer normas gerais em matéria de
legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos


discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de
cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; (...).

Especificamente no âmbito do ICMS, trata-se de matéria reservada a lei


complementar, nos termos do artigo 155, § 2º, XII, da CF, aquela
pertinente à definição de seus contribuintes e à disciplina do regime de
compensação do imposto.

Como exposto, diante da ausência de lei complementar que dispusesse


sobre as regras gerais a serem observadas na nova forma de tributação –
pela origem e destino – nas vendas a consumidores finais não
contribuintes, os Estados, pautados na competência concorrente contida no
artigo 24 da CF/88123 e, ainda, nos artigos 102 e 199 do Código Tributário
Nacional124, celebraram o Convênio ICMS n. 93/2015, com o objetivo de
definir os “procedimentos” a serem observados pelos contribuintes, nas
operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final
não contribuinte do ICMS, localizado em outra unidade federada.

465
Primeiramente, há que se ressaltar que aos Convênios atribuiu-se
competência para delimitar hipóteses de concessão de isenções, benefícios
e incentivos fiscais, nos moldes do artigo 155, § 2º, XII, g, da CRFB/88 e
da Lei Complementar n. 24/75125.

Ademais, a celebração de um Convênio ICMS não tem o condão de


suprir a competência atribuída constitucionalmente à lei complementar.
Mais que isto, a competência estadual, quando exercida com fundamento
no mencionado artigo 24, deve sê-lo sempre por meio de lei estadual, e no
âmbito dos respectivos territórios, não sendo suficientes disposições
contidas em um Convênio, sob o pretexto de que se referem a
“procedimentos”, para suprir a ausência de normativo federal que trate das
normas gerais a serem observadas na instituição da cobrança do imposto
no âmbito de operações interestaduais.

É dizer, na medida em que a cobrança do ICMS no destino nas vendas a


consumidores finais implica relações que transcendem os limites
territoriais dos Estados, não há outro instrumento normativo capaz de
regular tal cobrança, que não a Lei Complementar (nacional) que, por
expressa atribuição constitucional, deve disciplinar, além das normas
gerais em matéria tributária, os conflitos de competência.

Nesse sentido, a propósito, convém citar Luís Eduardo Schoueri, ao


discorrer sobre manifestação do Supremo Tribunal Federal126 a respeito da
impossibilidade de os Estados, pautados no artigo 24, instituírem tributos
que, por sua natureza, implicam conflitos de competência a serem
dirimidos exclusivamente por meio de lei complementar:

Esta matéria foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento
do Recurso Extraordinário 136.215-RJ. No caso, examinava-se situação em que a
Constituição Federal conferira aos estados a competência para instituir um adicional
ao imposto de Renda e não havia lei complementar sobre o assunto. A indagação

466
era se, na falta desta, os Estados poderiam ou não instituir o referido adicional. No
julgamento, enfrentou-se o tema do limite da competência concorrente cumulativa,
já que havia matéria cujos efeitos extrapolavam os lindes dos poderes tributantes.
Afinal, em muitas situações, uma mesma matéria poderia ser alcançada por mais de
um Estado, simultaneamente, sendo necessário definir a quem caberia instituir o
imposto. Se ficasse para os Estados essa decisão, então haveria uma cumulação de
tributação. A contenda deveria ser decidida pela lei complementar, a quem cabe
dispor sobre conflitos de competência. Tais conflitos não podem ser resolvidos
unilateralmente. Basta imaginar o caso de um contribuinte que, no começo do ano,
resida em um Estado e, durante o ano, se mude para outro. Por tal razão, decidiu,
por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, como se lê em sua
emenda, pela “Impossibilidade de sua cobrança, sem prévia lei complementar (art.
146 da CF). Sendo ela materialmente indispensável à dirimência de conflitos de
competência entre os Estados da Federação, não bastam, para dispensar sua edição,
os permissivos inscritos no art. 24, § 3º, da Constituição e no art. 34 e seus
127
parágrafos do ADCT”(...) .

Roque Antonio Carrazza, ressalta, ainda, que mesmo nas hipóteses em


que é cabível lei estadual com vistas à fixação de normas gerais não
disciplinadas no âmbito nacional, esta “lei” a que se refere o Texto
Constitucional corresponde à “lei complementar”, porquanto é a esta
atribuída a competência para fixação de normas gerais em matéria
tributária. O ilustre doutrinador pondera que:

Melhor, enfim, entender e aplicar a aludida expressão em harmonia com o


sistema jurídico como um todo considerado – circunstância que nos reconduz à
ideia de que, à falta de lei complementar da União sobre normas gerais em matéria
de legislação tributária, é dado aos Estados-membros suprir a lacuna, desde que o
façam também por meio de lei complementar (agora, lei complementar estadual).
IV – Portanto, em matéria tributária, a União, no exercício de sua competência
concorrente, só pode estabelecer normas gerais (o que vem depois confirmado no
art. 146 do Diploma Magno).
Mas, se a União se omitir, isto é, deixar de estabelecer normas gerais em
matéria de legislação tributária, aos Estados é dado suprir a lacuna. Poderão, por
meio de lei complementar (estadual), veiculá-las, “para atender a suas
peculiaridades”. De qualquer forma, a lei complementar estadual só poderia
estabelecer normas gerais, observadas todas as restrições que procuramos apontar,
no presente capítulo. (...)
V – Todavia, o § 3º do art. 24 da CF só é aplicável quando a norma geral tiver
alcance local (“para atender suas peculiaridades”); não, portanto, quando estiver em
jogo o inter-relacionamento de vários Estados-membros. Assim, não é permitido a
qualquer deles estender sua manus fiscal sobre atuação havida fora do seu território,

467
já que, lá, suas leis não têm voga, por força do já estudado princípio da
territorialidade.
De qualquer forma, a lei complementar estadual só poderá estabelecer normas
128
gerais que observem as restrições acima apontadas .

Acrescente-se que a 1ª Turma do STF, ao analisar exigência do


diferencial de alíquotas (em operações entre contribuintes do ICMS), sem
previsão específica na Lei Complementar n. 87/96, também se manifestou
no sentido de ser imprescindível tal previsão a viabilizar a cobrança do
imposto pelos Estados:

(...) 1. É certo que a Constituição Federal prevê a cobrança da diferença de


alíquota em favor do Estado de destino nas operações interestaduais. Todavia, a
existência de previsão constitucional não basta para que o legislador estadual possa
fazer incidir o imposto nas aquisições de bens para o ativo fixo e material para uso e
consumo do estabelecimento. 2. A Lei Complementar n. 87/1996, ao cuidar do
momento da consumação do fato gerador do imposto, não cogitou do diferencial de
alíquotas. Tal hipótese de incidência foi prevista pelo Convênio n. 66/1988, mas
não foi confirmada pela norma geral. Nos termos do art. 34, § 8º, do ADCT, o
Convênio do Confaz não poderia prever uma nova materialidade para o ICMS
129
(...) .

Assim, quer parecer que o Convênio ICMS n. 93/2015, ao dispor sobre


o fato gerador, os contribuintes, a forma de apuração do ICMS devido à
unidade de origem e de destino e o regime de compensação deste imposto,
extrapolou sua competência normativa, invadindo terreno reservado
exclusivamente à lei complementar.

Sendo assim, não obstante a previsão constitucional quanto à


possibilidade de os Estados e o Distrito Federal exigirem o diferencial de
alíquota sempre que destinatários de mercadorias adquiridas para consumo
final por contribuintes ou não contribuintes do ICMS, tal previsão não se
sobrepõe àquela que exige, para que tal cobrança seja levada a efeito,
prévia lei complementar estabelecendo as normas gerais a serem
observadas pelos entes federados.

468
Nesse contexto, com vistas a afastar suas disposições, a Associação
Brasileira de Comércio Eletrônico (ABCOMM) ingressou com Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI n. 5.469), por meio da qual requereu
a suspensão dos efeitos das cláusulas 1ª, 2ª, 3ª, 6ª e 9ª do Convênio ICMS
n. 93/2015, sob o fundamento de que tais disposições ferem o princípio da
legalidade tributária e da reserva legal, impondo obrigação de pagamento
do tributo sem a prévia regulamentação por meio de lei complementar130.

b. A Impossibilidade de Compensação dos Créditos com ICMS-Partilha e


ICMS devido ao Destino

A Emenda Constitucional n. 87 nada dispôs a respeito do exercício do


direito à não cumulatividade do ICMS nos casos de vendas interestaduais a
consumidores finais. No entanto, o fato de ela não dispor a respeito, não
significa dizer que tal direito pode ser alterado ou mitigado pelos Estados.

O próprio Convênio ICMS n. 93/2015 estabelece em sua Cláusula


Terceira que “O crédito relativo às operações e prestações anteriores
deve ser deduzido do débito correspondente ao imposto devido à
unidade federada de origem, observado o disposto nos arts. 19 e 20 da
Lei Complementar n. 87/96”.

Um contribuinte, portanto, localizado no Estado “A”, ao adquirir uma


mercadoria destinada a revenda, tem o direito a apropriar-se do respectivo
crédito de ICMS, sob o amparo do artigo 155, § 2º, I, da CF/88. No
entanto, ao revender essa mercadoria a um consumidor localizado no
Estado “B”, apenas poderá compensar parte do ICMS devido com o
crédito apropriado. A outra parte, devida ao Estado “B”, deverá ser
integralmente recolhida.

469
Além disso, a depender do Estado onde esse contribuinte estiver
localizado, sequer será admitida a compensação escritural integral do
montante devido à origem. Isto porque, na medida em que o Convênio
ICMS determinou, no § 1º da sua Cláusula Décima, que a parcela do
imposto relativa à diferença entre as alíquotas devida à origem, no período
de transição (o chamado ICMS-Partilha), deve ser recolhida em separado,
a critério da unidade federada de origem, há Estados que passaram a
efetivamente exigir tal recolhimento, proibindo a sua compensação com os
créditos apropriados relativos às operações antecedentes.

O Estado do Paraná, por exemplo, inseriu ao parágrafo único do artigo


327-H, do seu Regulamento do ICMS (aprovado pelo Decreto Estadual n.
6.080/2012), disposição que veda a compensação do valor devido ao
Estado a título de ICMS-Partilha, com saldo credor existente na escrita
fiscal do contribuinte, conforme abaixo:

Art. 327-H. No caso de operações ou prestações que destinarem bens e serviços


a consumidor final não contribuinte do imposto localizado em outra unidade
federada, caberá ao Estado do Paraná, além do imposto calculado mediante
utilização da alíquota interestadual prevista no art. 15, a parcela do valor
correspondente à diferença entre essa e a alíquota interna da unidade federada
destinatária, na seguinte proporção:
(...)
Parágrafo único. A parcela do imposto de que trata este artigo:
(...)
III – não poderá ser compensada com eventuais créditos do imposto ou
saldo credor acumulado em conta gráfica. (Grifamos.)

Não há no Texto Constitucional autorização para que os Estados


permitam a compensação do crédito relativo à operação anterior, apenas
com o débito devido ao Estado de origem, apurado por meio da aplicação
da alíquota interestadual sobre a base de cálculo. A impossibilidade de
compensação do ICMS devido, seja ao Estado de origem, seja ao destino,

470
vai de encontro ao princípio da não cumulatividade do ICMS, que,
importante frisar, estabelece o seguinte:

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:


I – será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada
operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o
montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito
Federal; (Grifamos.)

As únicas exceções ao direito à não cumulatividade referem-se às


hipóteses de isenção e não incidência (art. 155, § 2º, II, da CF/88), o que,
certamente, não se aplica às operações em análise. Soma-se a isso o fato de
que, tal como já exposto, a Constituição atribui à lei complementar a
competência para disciplinar o regime de compensação do ICMS (art. 155,
§ 2º, XII, “c”). E este regime é exaustivamente disciplinado pela Lei
Complementar n. 87/96 que, por sua vez, assegura aos contribuintes o
direito à compensação (integral) do crédito do imposto cobrado na etapa
anterior com o débito devido (art. 19).

Portanto, na medida em que houve alteração tão somente na repartição


da tributação das operações que destinam mercadorias a consumidores
finais localizados em Estados distintos, não há que se falar em alteração
também no regime de apuração do ICMS, sendo certo que o princípio da
não cumulatividade permanece válido, devendo ser integralmente
respeitado pelos Estados quando da exigência tanto da parcela devida à
origem, quanto até mesmo, daquela devida ao destino.

5. CONCLUSÃO

A tributação nas operações interestaduais destinadas a consumidores


finais envolve, antes de tudo, o interesse arrecadatório de cada unidade
federada envolvida, o que faz com que, independentemente do modelo
adotado pelo Texto Constitucional, problemas práticos continuem a surgir,

471
prejudicando as operações comerciais, em especial aquelas relativas ao e-
commerce, e trazendo insegurança jurídica aos seus partícipes.

Uma possibilidade para a adequada repartição do ICMS sem prejuízo


aos direitos dos contribuintes seria, talvez, a criação de um fundo, uma
“conta-corrente” entre os Estados, por meio do qual os próprios entes
federados ficariam responsáveis pela apuração e repasse, ao final de cada
período, do quantum devido a cada um. Tal sistemática, exigiria que os
próprios Estados confrontassem suas diferenças interpretativas, sem que
isso, contudo, onerasse os contribuintes e consumidores.

No entanto, parece se tratar de possibilidade ainda longínqua, já que,


diante do histórico tributário nacional, não se vislumbra, ainda, um real
interesse dos entes tributantes em tornar a tributação mais clara e
atualizada, sendo o caminho mais recorrente aquele que lhes garante maior
arrecadação, ainda que se trate do mais controverso, ou até mesmo, do
caminho contrário ao sistema jurídico vigente.

Apesar disso, é importante que os problemas continuem sendo


identificados, enfrentados e discutidos, pois apenas assim será possível a
atualização e o amadurecimento do sistema jurídico tributário brasileiro,
de modo a tratar, adequadamente, os novos modelos de negócios surgidos
com o avanço da tecnologia e das formas de contratação.

472
O Paradigma da Economia Digital e os
Novos Conceitos de Serviço e Mercadoria —
Reflexos na Tributação
131 132
Carlos Augusto Daniel Neto e Leonardo Ogassawara de Araújo Branco

INTRODUÇÃO

O Direito se tornou conveniente refém de um utilitarismo tecnológico:


as crescentes utilidades decorrentes dos avanços computacionais,
científicos e tecnológicos são por demais atrativos para que a sociedade
não os abrace maternalmente – ao menos até que a próxima inovação
surja.

Na tentativa de ampliar seu alcance sobre as novas situações que é


chamado a regular, o Direito atua sempre em atraso: os avanços
tecnológicos são demasiado dinâmicos frente à necessidade de haurir a sua
autoridade de regras oriundas de fontes sociais, cuja produção encontra
empecilhos temporais – quando não políticos, constantes.

Se por um lado certos ramos do Direito possuem um instrumental mais


adequado para lidar com essa flexibilidade e adaptabilidade que a inovação
técnica demanda, a exemplo dos contratos cíveis, com a plena liberdade de
estipulação das cláusulas e caracterização de operações jurídicas, outros
ramos não gozam de igual capacidade adaptativa – e nisto o Direito
Tributário é um primoroso exemplo – pela sua orientação eminentemente
formal e garantista.

Na seara fiscal as inovações tecnológicas se colocam como fenômenos


dotados de substrato econômico e que, portanto, devem – pelo menos sob

473
uma perspectiva de política tributária e igualdade – estar sujeitas à
tributação, como todas as demais atividades. Todavia o problema reside
exatamente na condição de a tributação, dentro do sistema constitucional
tributário criado pela Constituição Federal de 1988, não poder ser
operacionalizada exclusivamente por meio da verificação da capacidade
econômica dos contribuintes envolvidos na atividade que se pretende
tributar – é preciso também que essa materialidade esteja prevista em uma
regra de competência tributária, que atribui poderes aos entes
federados para que instituam, por intermédio de lei, a exação sobre a
situação que se pretende alcançar.

Trata-se, portanto, de uma questão que envolve eminentemente a


distribuição de competências tributárias entre os entes federados – União,
Estados, Municípios e Distrito Federal – e os limites horizontais do seu
exercício, isto é, até onde a competência de um deles não invada a de outro
– tudo isto balizado pelas regras constitucionais e pela utilização da lei
complementar em matéria tributária, com a função de resolver conflitos de
competência intrafederativos133.

A questão estrutural indicada acima se desdobra em questões materiais


das mais diversas, decorrentes da proliferação de novas tecnologias,
exempli gratia:

•As plataformas como o Netflix, Amazon Prime, Deezer, Spotify e muitos


outros serviços de transmissão (streaming) de vídeos, músicas e imagens, no
tocante à sua subsunção ou não no conceito de serviços (definidos pela Lei
Complementar n. 116/2003), para fins de incidência do ISS – especialmente
134
após a alteração da lista anexa pela Lei Complementar n. 157/2017 .
•As atividades de download e licenciamento de programas de computador
(software), cuja tributação foi avocada pelos Estados por meio do Convênio
CONFAZ n. 106/2017, que regulamenta todo o procedimento de tributação
dessas materialidades, por meio do ICMS.

474
•O aumento exponencial das transações realizadas pelo e-commerce,
dificultando a determinação de quem seria o ente federado competente para
cobrar o tributo sobre a transação e, ainda mais complexo, o caso de
transações feitas inteiramente em ambiente de negócios virtual.

Por um lado, o que há é um quadro de grave insegurança jurídica135 para


os contribuintes, em razão: (i) da impossibilidade de conhecer com alto
grau de determinação os conteúdos possíveis dos textos normativos que
embasam a atividade tributária, isto é, a ausência de definições intensivas
de termos como “mercadoria”, “serviços”, “comunicação” etc., e (ii)
diante das novas tecnologias, justamente pela indeterminação mencionada,
instaura-se a uma incapacidade do cidadão de conhecer antecipadamente
os efeitos jurídicos que serão dados à sua atividade econômica136.

Por outro lado, há a dificuldade de conciliar regras de competência


elaboradas com a utilização de expressões que designavam certas coisas à
época da promulgação da Constituição, com a necessidade de se tributar
novas materialidades que sequer eram cogitadas naquele momento – o que
conduz à discussão dos limites semânticos dos conceitos constitucionais
utilizados na delimitação de competências, especialmente os conceitos de
“mercadorias” e “serviços” – e, consequentemente, impactando a própria
viabilidade ou não de se tributar essas atividades tecnológicas com as
materialidades existentes hoje.

Portanto o escopo deste trabalho é exatamente analisar a


compatibilidade entre os conceitos constitucionais de “mercadoria” e
“serviço” para fins tributários com os novos conceitos adaptados às
tecnologias atuais, com a finalidade de identificar a existência ou não de
suporte nas materialidades atualmente delineadas para que a tributação
alcance tais realidades econômicas.

1. FEDERAÇÃO E COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS NA

475
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

A Federação, no contexto brasileiro determinado pelo art. 1º da


CF/88137, pressupõe a autonomia recíproca da União, dos Estados, dos
Municípios e do Distrito Federal, sob a égide da Constituição Federal, que
atuam concomitantemente como o pacto (foedus, foederis) de união, de
associação entre os entes e o fundamento de constituição de pessoa com
quem eles se não confundem – a República Federativa do Brasil138.

Em razão disso, fala-se em ordem jurídica periférica (Estados e


Municípios) e central (União), além da ordem global (República
Federativa)139, cabendo frisar que a despeito da terminologia adotada, a
federação implica igualdade jurídica entre os componentes dessas
diversas ordens parciais, derivada da autonomia recíproca garantida
constitucionalmente.

Esta autonomia é veiculada por meio da repartição de competências as


mais diversas entre entes federados140, realizada pela Constituição Federal,
instrumento superior a todas as ordens jurídicas parciais e que a todas
submete – competências estas que serão a garantia de manutenção dos três
elementos essenciais a todos os membros da federação: autonomia
política, administrativa e financeira141.

Como bem pontuado por Geraldo Ataliba, só se pode considerar


realmente autônomo política e administrativamente o governo que possa
contar com fontes de receita suficientes ao cumprimento de seus desígnios
no exercício de sua autonomia142, e para tal função a CF/88 elegeu como
essencial um sistema complexo de discriminação de rendas143, que agrega
uma rígida distribuição de competências tributárias a um sistema de
repartição de rendas oriundas do exercício delas.

476
A competência tributária é espécie da competência legislativa, definível
como a aptidão de que são dotadas as pessoas políticas para expedir
regras jurídicas, inovando o ordenamento positivo, que, tomada em
sentido estrito, abrange o poder para criação de dois tipos de normas: (i) de
delimitação positiva do âmbito de incidência (normas tributárias stricto
sensu); e (ii) de delimitação negativa do âmbito de incidência (as isenções
tributárias). Naturalmente, essa competência não se restringe ao poder de
instituir/exonerar tributos, abrangendo um feixe de poderes que
correspondem aos seus elementos conaturais144.

Portanto, entre as leis tributárias exaradas pelos entes federados e a


CF/88 há uma relação de subordinação hierárquica tanto formal quanto
material. A formal diz respeito à adoção de procedimentos legislativos
previstos no corpo constitucional, sendo de pouca importância para o
escopo deste trabalho. Mais relevante é a hierarquia material entre a
competência e a lei, que pressupõe uma forma de validação, condicional
ou finalística, que tem o condão de imunizar a norma infraconstitucional,
como exemplarmente aduzido por Tércio Sampaio Ferraz Jr:

Ocorrendo a relação de imunização de dois modos, condicional e finalístico, a


validade será também condicional ou finalística. Na validade condicional, a norma
imunizante, por seu relato ou conteúdo, neutraliza diretamente o cometimento
(relação de autoridade) da norma imunizada, de tal modo que o relato ou conteúdo
desta independe dos fins a serem atingidos (o importante é que meios sejam
respeitados, ainda que os fins não sejam alcançados). Já na validade finalística, a
norma imunizante, por seu relato ou conteúdo, imuniza a relação de autoridade ou
cometimento da norma imunizada por meio da prescrição de fins que o conteúdo ou
relato da norma imunizada deva atingir. Ao contrário da primeira, nesta se
estabelece uma solidariedade entre meios e fins (é importante que os meios estejam
145
adequados aos fins, a fim de que estes sejam alcançados) .

Dentro do espectro de competências tributárias, visualizam-se os dois


modelos de validação: (i) o modelo condicional, no sentido de que a
exigência só será validamente exigida se atrelada a um determinado evento

477
que, não se verificando, invalida a exação – nesta hipótese o critério
fundamental envolve a relação de inclusão, ou seja, aferir se o fato
contemplado pela norma inferior está no âmbito semântico do conceito
utilizado na regra de competência; (ii) o modelo finalístico, no sentido de
que se justifica pela vinculação à busca de uma finalidade ou objetivo –
cria-se a exigência para atingir certo resultado – neste caso, o critério
envolve o elo entre o fim estipulado pela constituição e os meios adotados
para tanto, em uma relação de compatibilidade – ou seja, a lei será
constitucional porque sua previsão é compatível com a obtenção da
finalidade qualificada ou com o evento futuro nela considerada146.

As considerações feitas acima servem para delimitar exatamente o


problema que se enfrenta, qual seja, a determinação das condições de
validação condicional, por meio dos conceitos utilizados nas regras de
competência, das regras de incidência que pretendem tributar as atividades
econômicas de caráter eminentemente tecnológico que vêm surgindo
sucessivamente ao longo da última década.

Diante disso, as perguntas que devem ser feitas são: Os conceitos


econômicos de “mercadoria” e “serviço” são compatíveis com o conceito
constitucional tributário das mesmas expressões? Ou o conteúdo da regra
constitucional deriva do sentido que lhe der a legislação
infraconstitucional, mormente as leis complementares? E, em havendo
essa discrepância de sentido, cabe aos tribunais realizar essa conformação
semântica?

É o que se pretende enfrentar adiante.

2. CONCEITOS DE DIREITO PRIVADO E AS COMPETÊNCIAS


CONSTITUCIONAIS

478
Compulsando as competências listadas nos artigos 153 a 156 da CF/88,
verificamos claramente a adoção de conceitos típicos de Direito Privado
para a delimitação das competências tributárias (renda, mercadoria,
propriedade etc.).

A delimitação deles, todavia, é feita de duas formas distintas: (i) de um


lado, ela faz referência direta às figuras de Direito Privado, quando utiliza
os conceitos vigentes em outros ramos jurídicos, à época da promulgação
da CF/88, para determinar a materialidade que será atribuída a cada ente –
nesses casos, presume-se a incorporação prima facie dos conceitos
jurídicos utilizados pela Constituinte, salvo nos casos em que
expressamente se fez referência a outra definição distinta; ou (ii) doutro
giro, ela põe conceitos de forma indireta, de modo que, quando cotejados
com as demais materialidades existentes, têm seu contraste realçado
estruturalmente – por exemplo, ao atribuir ao Município a competência
para tributar as transferências onerosas de bens imóveis, automaticamente
se restringe o conceito de mercadoria para fins de ICMS, excluindo do seu
alcance bens imóveis sujeitos à mercancia147.

Esse efeito estrutural de as competências se contrastarem


reciprocamente deriva da excepcional rigidez de nosso sistema tributário
constitucional. A construção dos enunciados normativos por parte do
constituinte impacta diretamente a feição dessa normatização – se mais
plástica ou mais rígida. A forma como os dispositivos são elaborados
permite ao intérprete identificar um conjunto de normas que compõem o
sistema constitucional tributário de um ordenamento jurídico que, em
razão de sua supremacia hierárquica, assume tanto o papel de sistema
formal – de eficácia maior que a dos infrassistemas legais –, e um sistema

479
material – com especificidade de conteúdo e informadora de princípios,
valores e finalidades aplicáveis às normas tributárias148.

Essa variação quantitativa no grau de regulação constitucional da


tributação irá impactar diretamente a rigidez e a plasticidade do sistema
tributário. Esta última, na lição de Chiarelli, consiste na “capacidade de
uma Constituição se adaptar às variáveis necessidades dos tempos e das
circunstâncias”, por meio da utilização de fórmulas normativas sintéticas e
genéricas, dando larga margem ao seu desenvolvimento e integração
mediante leis ordinárias e interpretações variadas149.

Por outro lado, a rigidez é característica de um compromisso


constitucional com proteção e garantia, carreando no plano
constitucional diversas normas jurídicas e utilizando formulações mais
precisas e analíticas, com a finalidade de reduzir o campo de atuação do
legislador, ao passo que adota regras mais restritas para a alteração de
disposições constitucionais150.

A CF/88, afirma-se com segurança, possui a maior quantidade de


dispositivos em matéria tributária em uma Carta Magna, entre todos os
países do mundo151, o que deixa claro que a Constituinte cuidou de regular
minuciosamente diversos aspectos da tributação, desde a distribuição de
competências até as limitações constitucionais ao poder de tributar, sendo
reconhecida internacionalmente pela sua exemplar rigidez152.

Portanto, é preciso que se frise que as consequências dessa rigidez sobre


nosso sistema constitucional tributário não se esgotam nas condições
específicas de emenda à CF/88, imprimindo uma profunda e extensa
vinculação ao legislador ordinário. Cabe refletir brevemente sobre a

480
abertura horizontal e vertical153 desse sistema de competências tributárias,
frente à rigidez constatada.

Em relação à abertura horizontal, verifica-se que ela é inexistente –


distribuíram-se exaustivamente as competências tributárias, promovendo
um fechamento horizontal por meio da atribuição de competência
residual à União, para as demais materialidades que não estivessem
albergadas pelas regras existentes154. Entretanto, em relação à abertura
vertical, não há que se falar em fechamento absoluto, em razão da
impossibilidade de determinação semântica completa dos termos utilizados
nas regras de competência – o que se verifica, em rigor, são graus de
abertura, o que muito dista da situação de total abertura de sentido155.

Assim, deve-se considerar a possibilidade da existência de um núcleo


semântico nos conceitos empregados na Constituição, identificando-os seja
por meio do recurso a conceitos de Direito Privado incorporados pela
CF/88, seja por meio do esforço de inteligibilidade da resultante das
interações com outros conceitos, da busca de uma unicidade conceitual
interna ao texto constitucional e até mesmo de constrangimentos de
sentido implícitos decorrentes da aplicação de princípios constitucionais156.

De um lado, a aplicação não dispõe de um significado previamente


dado e, de outro, a construção de sentido não é uma atividade inteiramente
criativa: vale-se de um uso adotado pela comunidade de falantes, o que
possibilita se falar em uma interpretação não representacionalista e, ao
mesmo tempo, renegar-se a postura cética, que prima pela verdadeira
impossibilidade de produzir afirmações válidas. A interpretação cria de
acordo com um campo, mas, ao menos no jogo jurídico-tributário, em uma
sociedade em que vigora o primado do direito, não perde seu compromisso
com o Direito Positivo, e a isto chamamos referibilidade do sentido.

481
Essa abertura vertical relativa é corroborada pelo próprio Código
Tributário Nacional, em seu artigo 110157, tendo recebido reconhecimento
expresso do Supremo Tribunal Federal, que reiteradamente afirmou a
impossibilidade de se desconsiderar o sentido dos conceitos
constitucionais utilizados nas regras de competência. Veja-se, por
exemplo, trecho do voto do Ministro Marco Aurélio no julgamento do RE
n. 203.075-9, no qual se discutia a incidência de ICMS na importação feita
por pessoa física:

Costume dizer que o Estado tudo pode. O Estado legisla, o Estado executa a lei,
o Estado julga a aplicação da lei. Que o faça bem e, em se tratando de tributo, que
se atenha ao figurino constitucional. Este figurino, para mim – e não posso atribuir
ao legislador constituinte a inserção, na Carta, de termos inúteis – revela, em face
do que se contém na alínea “a”, inciso IX do § 2º do art. 155 da Carta de 1988, a
necessidade de ter-se, na importação, para que haja a transferência, como que em
passo de mágica, da obrigação tributária do vendedor para o comprador, como quer
a alínea “a” – na ponta, destarte, importando o bem, alguém que esteja estabelecido
158
no âmbito da mercancia .

Nessa esteira da consolidação constitucional de sentido das


materialidades utilizadas nas regras de competência, calha mencionar o
julgamento do RE n. 346.084, que discutiu a ampliação da base de cálculo
do PIS/Cofins por meio da Lei n. 9.718/98, reconhecendo ser
inconstitucional o § 1º do artigo 3º da Lei n. 9.718/98, no que ampliou o
conceito de receita bruta para envolver a totalidade das receitas auferidas
por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas
desenvolvida e da classificação contábil adotada.

Por fim, a título de arremate, é lapidar a frase consignada no voto


vencedor do RE n. 166.772-9: “o conteúdo político de uma Constituição
não é conducente ao desprezo do sentido vernacular das palavras, muito
menos ao do técnico, considerados institutos consagrados pelo Direito”.

482
Diante disso, pode-se afirmar que não possui o legislador plena
liberdade para desenhar os conceitos utilizados pela Constituição, ou
mesmo ampliá-los para além de seus compromissos semânticos básicos,
sob pena de se esvaziar de normatividade um sistema constitucional de
repartição de competências que, por sua própria estrutura, é dotado de
rigidez e densidade normativa elevadas.

Tais afirmações devem ser feitas, no entanto, com um grão de sal: os


conceitos são construídos no tempo lento da história e das interações
humanas – nem dados, nem determinados. Mas é justamente a trofolaxe
resultante dos embates (sociais e institucionais) que garante a estabilidade
conceitual e, logo, a segurança jurídica, compondo um arcabouço
conceitual que não pode ser desprezado pelos intérpretes e aplicadores159.
O sistema de referências dota de sentido o vocábulo constitucional, e a ele
chamamos compromissos básicos: assim, afirmar a existência de um
“núcleo semântico” não implica o apego a uma postura essencialista, que
enxerga o sentido por trás de um termo ou expressão, mas simplesmente se
reconhecer que, em um determinado campo, em um determinado
momento, um determinado sentido não pode ser colocado de lado, por
estas ou por aquelas razões.

Fixadas estas considerações, cabe agora analisar a forma como o


conceito de mercadoria e serviço têm sido tratados pelos Tribunais e a sua
compatibilidade ou não com as novas tecnologias que estão imbricadas na
chamada Economia Digital.

3. OS CONCEITOS DE MERCADORIA E SERVIÇO NO CONTEXTO DA


ECONOMIA DIGITAL E SEU IMPACTO TRIBUTÁRIO

Iniciaremos a análise a partir do conceito de software, em razão de uma


discussão recente entre o Estado de São Paulo e sua Capital, pela

483
competência para a tributação do licenciamento ou cessão de direito de uso
de programas de computador.

Em 2017, a LC n. 157/2017 incluiu diversas materialidades relativas a


software na lista anexa da LC n. 116/2003160, e em julho de 2017 o
município editou o Parecer Normativo SF n. 1, considerando seu
licenciamento e cessão de uso como serviço, seja por meio de suporte
físico ou por transferência eletrônica de dados (download), encontrando-se
sujeito ao ISS.

Por outro lado, o Estado, por meio da Decisão Normativa CAT n. 4, de


setembro de 2017, reconheceu a distinção tradicional161 entre software feito
sob encomenda – sujeito ao ISS –, e software de prateleira, que está
pronto e é vendido em larga escala, sujeitando-os ao ICMS. A
peculiaridade dessa decisão foi determinar que independentemente da
forma como sejam negociados, isto é, por meio físico ou digital, tanto por
download quanto por streaming, devem ser tributados pelo referido
imposto. Além disso, o Convênio CONFAZ n. 106 de 29 de setembro de
2017 cuidou de regulamentar os aspectos procedimentais, definindo
inclusive que o ICMS será cobrado pelo Estado onde se localiza o
destinatário final.

Ao julgar a questão da tributação do software pelo ICMS, em 1998, por


meio do RE n. 179.626, o Ministro Sepúlveda Pertence consignou
expressamente a sua impossibilidade sob dois argumentos: o primeiro seria
que “o conceito de mercadoria efetivamente não inclui os bens
incorpóreos, como os direitos em geral: mercadoria é bem corpóreo objeto
de atos de comércio ou destinado a sê-lo”; ao passo que o segundo seria a
inocorrência de alienação – ergo circulação – no licenciamento e na cessão
de direito de uso. Complementando esse julgamento, o RE n. 199.464 –

484
julgado em 1999 – veio a reconhecer a incidência do ICMS
exclusivamente na venda de software por meio de mídias físicas162.

Nessa linha andou a Lei do Software – Lei n. 9.609/98 – que no seu


artigo 7º163 prescreve expressamente que a comercialização dele se dá pelo
contrato de licença de uso, inclusive com menção expressa à existência de
validade técnica para a versão do software licenciado.

Entretanto, ao julgar a Medida Cautelar na ADI n. 1.945/MT, o STF


modificou seu entendimento, afastando o requisito de a mercadoria ser
corpórea, com a menção, por exemplo, da energia elétrica no âmbito de
incidência do ICMS, ao passo que também se afastou o requisito da
circulação física, por se entender que a compra e venda de bens por meio
do ambiente virtual, com o respectivo download seria uma nova realidade
que em nada diferiria de uma transação em meio físico164.

Há que se pontuar, brevemente, que não se cogita aqui da possibilidade


de o download de software ser tributado com base na materialidade do
ICMS-comunicação, haja vista que não há transmissão de mensagens entre
um emissor e um receptor, mas simplesmente fornecimento de dados
obtidos virtualmente, além de se dar diretamente entre o alienante e o
adquirente, sem intermediário que preste o serviço de comunicação165.

Voltando os olhos ao conceito de “mercadoria”, constata-se claramente


que o conceito tradicional “bem móvel sujeito à mercancia”166 é
incompatível com a noção de comércio virtual de software – como aduz
Hendrick Pinheiro, a possibilidade de consumo simultâneo (conexão em
rede), não excludente (enfeixado) e não rival (típico da economia de
abundância) afasta o download, como meio do comércio de bens
incorpóreos, do conceito tradicional de mercadoria e de circulação167.

485
Parece-nos, entretanto, que a linha da corporeidade do bem como
condição necessária de sua configuração como mercadoria não se sustenta
contemporaneamente, na linha exposta por Greco168 – parece
absolutamente claro que a configuração materialista da mercadoria foi
abandonada pela jurisprudência do STF – a exemplo o julgamento da
Medida Cautelar na ADI n. 4.389169, julgada pelo Pleno do Tribunal, no
qual se decidiu que a produção de embalagens sob encomenda seria objeto
de incidência do ICMS, ainda que se tratasse de um fazer, e não um dar
(que envolveria um bem corpóreo).

A abrangência de bens incorpóreos ao âmbito de incidência do ICMS


não nos parece ir contra o sentido semântico mínimo existente na CF/88 –
esse sentido está muito mais atrelado à noção de um ciclo de circulação
econômica de bens, conclusão essa que depreendemos da escolha da
materialidade (circulação de mercadorias) e do influxo da regra de não
cumulatividade, que aproxima o ICMS, sob o ponto de vista econômico,
de um tributo sobre o valor acrescido que busca onerar o consumo170.

Como dito anteriormente, diversos fatos influenciam direta e


indiretamente o conteúdo das regras de competência. Neste caso, os
influxos do conceito de mercadoria e da estrutura plurifásica adequada à
circulação do bem em um ciclo devem ser levadas em conta na
determinação da amplitude da competência dos Estados para a cobrança de
ICMS, abarcando assim tanto bens materiais quanto imateriais, desde que
a transmissão se dê dentro de uma cadeia de circulação171.

Em um contexto de Economia Digital, adotar a noção de ciclo de


comércio como ponto de apoio semântico da materialidade do ICMS nos
parece ser muito mais sólido do que o apego a concepções de mercadoria
ultrapassadas jurisprudencialmente.

486
Desse modo, pode-se firmar aqui que o conceito de mercadoria
tributável pelo ICMS é qualquer bem material ou imaterial cuja
transmissão se dê dentro de uma cadeia de circulação, e que não esteja
abrangido por outras competências constitucionais (a exemplo do ouro,
tributado pelo IOF).

Isso se comprova retomando, agora, a discussão sobre a tributação do


download de software pelos Estados. Apesar de os programas de computar
serem bens imateriais, a comercialização deles não se estrutura como
cadeia de circulação, e sim como uma transação direta entre o produtor
(detentor do direito autoral) e o consumidor (licenciado ao uso do
software), de modo que incluir tal situação na materialidade do ICMS seria
considerá-lo desprovido de sua natureza plurifásica e não cumulativa172, da
mesma forma, não há que se falar em transmissão do bem, mas
simplesmente disponibilização do mesmo para o seu uso, inclusive com o
estabelecimento de prazo de validade dessa autorização, conforme o artigo
7º da Lei n. 9.609/98. Assim, não há que incidir esse tributo sobre essas
operações.

Cabe verificar se o download de software deve ser tratado, afinal, como


serviço para fins de incidência do ISS – e nesse esforço tentar delimitar
elementos de um conceito de serviço para fins tributários frente ao
contexto atual.

A competência do ISS é definida de forma bastante peculiar no artigo


156, inciso III, da CF/88173, utilizando um conceito por exclusão das
materialidades de serviços abrangidos pelo artigo 155, inciso II, de
competência estadual, mas também os condicionando à definição por meio
de lei complementar. O saudoso Aires Barreto definia o conceito de
serviço tributável nos seguintes termos:

487
[serviço tributável é] o desempenho de atividade economicamente apreciável,
sem subordinação, produtiva de utilidade para outrem, sob regime de direito
privado, com fito de remuneração, não compreendido na competência de outra
174
esfera do governo .

A aproximação da noção de serviço a um “fazer” recebeu inclusive


guarida expressa do STF no julgamento do RE n. 116.121-3/SP, no qual se
discutia a incidência de ISS na locação de guindastes, onde se consignou
que o ISS somente poderia incidir sobre “obrigações de fazer”, cuja matriz
conceitual não se ajustaria à figura contratual da locação de bens móveis, e
que eventualmente embasou a Súmula Vinculante 31175 daquele Tribunal.

Todavia a jurisprudência do STF passou por uma modificação


expressiva nos últimos anos, com o julgamento do RE n. 547.245/SC, no
qual se discutiu a incidência de ISS sobre contratos de leasing, ocasião em
que o Ministro Joaquim Barbosa expressamente aduziu que a evolução
social tem levado à obsolescência conceitual, em especial a divisão entre
obrigações de “dar” e “fazer”, que deixa de ser relevante em prol de uma
consideração própria da função econômica e social da operação e a postura
dos sujeitos envolvidos, com menção ilustrativa à amplitude do conceito
de serviço do Código de Defesa do Consumidor.

Ratificando esse entendimento, o RE n. 651.703/PR julgou a incidência


de ISS sobre os planos de saúde e seguro saúde, no qual o relator – o
Ministro Luiz Fux – utilizou-se da expressão “serviços de qualquer
natureza” para traçar um paralelo com a expressão “proventos de qualquer
natureza”, enfatizando a natureza ampla dessa competência, a ponto de
abranger um conceito econômico de serviço176, e definindo-o da seguinte
forma:

O conceito de prestação de serviços não tem por premissa a configuração dada


pelo Direito Civil, mas relacionado ao oferecimento de uma utilidade para outrem,
a partir de um conjunto de atividades imateriais, prestadas com habitualidade e

488
intuito de lucro, podendo estar conjugadas ou não com a entrega de bens ao
tomador.

Não se trata, entretanto de uma posição nova. Há muito que Elizabeth


Carrazza afirmou que o conceito de serviço, a nível constitucional, não
estaria necessariamente ligado à venda de bem imaterial e que, em tese,
qualquer atividade consubstanciada na prestação ou fruição de uma
utilidade, material ou imaterial, pode ser objeto de tributação pelo ISS177.

De fato, não se pode dizer que o conceito invocado pelo STF


recentemente não recebe suporte na própria CF/88 – basta que se compulse
a doutrina especializada do Direito Administrativo, segundo a qual o
serviço público é historicamente definido como uma “atividade
consistente na oferta de utilidade ou comodidade material fruível
singularmente pelos administrados”178, diferenciando-se do serviço
tributável pelo ISS apenas por estar sujeito ao regime próprio de Direito
Público179.

A dificuldade de se adotar um conceito de serviço estritamente ligado à


obrigação de fazer é patente há muito tempo – basta que se relembre o já
mencionado RE n. 179.626, no qual se sustentou, entre outras coisas, que o
ISS incidiria apenas sobre o software feito sob encomenda, é dizer, um
legítimo dar, e não fazer.

A dicotomia de materialidades do ISS e do ICMS parece refletir a


transição de uma economia baseada no valor de troca, que estaria ligada
ao valor da mercadoria (abrangida pelo ICMS), para uma que priorize o
valor de uso, representado pela utilidade produzida (alcançada pelo
ISS)180.

489
Desse modo, diferentemente do ICMS, cuja materialidade se encontra
adstrita materialmente por diversos elementos estruturais (a exemplo da
necessidade de transmissão do bem dentro de um ciclo comercial e da não
cumulatividade), o ISS encontra uma regra de competência mais fluida,
não apenas pelo fato de o vocábulo “serviço” trazer suas restrições de
forma expressa, mas por essa condição estar ligada a uma cláusula
genérica (“de qualquer natureza”) que indica a adoção de um conceito
mais amplo e, nesse sentido, mais próximo de um sentido econômico.

Todavia, como restrições expressas, há que se ter em mente que o artigo


156, inciso III, da CF/88 não abrange os serviços já atribuídos aos Estados
e à União (serviços financeiros tributados pelo IOF), e que essa
competência só poderá ser exercida em relação aos serviços definidos
extensivamente na Lei Complementar (papel atualmente exercido pela LC
n. 116/2003).

At last but not least, há que se rememorar que o STF excluiu


expressamente do âmbito da competência dos Municípios as cessões de
direito de uso, ao julgar o caso da locação, e consolidou tal interpretação
do texto constitucional por meio da Súmula Vinculante 31 – disposição
dotada de força normativa formal e vinculativa em relação aos demais
órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas
esferas federal, estadual e municipal, por força do artigo 103-A da
CF/88181.

Somando-se isto ao artigo 489, parágrafo 1º, inciso V, do Novo Código


de Processo Civil, o qual determina que as súmulas sejam invocadas
levando-se em conta os “fundamentos determinantes” dos precedentes que
lhes deram origem, pode-se identificar aí uma terceira restrição ao
conceito constitucional de serviço.

490
Desse modo, parece-nos que o atual conceito constitucional de serviço
para fins de ISS é o de oferecimento de uma utilidade para outrem, a partir
de um conjunto de atividades imateriais definidas em lei complementar,
prestadas com habitualidade e mediante contraprestação, podendo estar
conjugadas ou não com a entrega de bens ao tomador, excluídos os
serviços abrangidos pelo artigo 155, inciso II, e artigo 153, inciso V, da
CF/88 e as atividades de cessão de direitos de uso.

Diante disso, voltemos à questão da tributação do download de software


pelo ISS: diante do artigo 7º da Lei do Software, já citada anteriormente,
resta clara a natureza do contrato de licenciamento como um contrato de
cessão de direito de uso, expressamente excluído do conceito de serviço
por súmula que dá uma manifestação vinculativa sobre o conteúdo da
norma de competência do ISS.

Dito isto, podemos concluir que não é possível se tributar o download


de softwares a partir da utilização de leis complementares com o fito de
“determinar” o conteúdo das competências do ICMS e do ISS, pois ambas,
em sua semântica constitucional, não suportam – atualmente182 – tal
materialidade. Nesse sentido, esse instrumento normativo esbarra na
limitação constitucional à abertura vertical das regras de competência.

Todavia a solução jurídica para a tributação da vasta gama de situações


que envolvem cessão de direito de uso reside, sim, na lei complementar,
mas na sua função específica do artigo 154, inciso I, da CF/88183, útil para
promover o fechamento horizontal das competências, por meio do
exercício da competência residual da União.

Uma vez consolidadas as concepções de “mercadoria” e “serviço”


suportadas atualmente pela CF/88, pode-se opinar com mais segurança

491
sobre o alcance ou não das competências do ICMS e do ISS sobre as
atividades econômicas emergentes no contexto da Economia Digital.

Atividades de streaming de vídeo e som, a exemplo do Netflix e


Deezer, são plataformas de acesso a dados que gozam de proteção de
direitos autorais, mediante contraprestação, para fins de execução daquele
material – o que se qualifica de modo absolutamente claro como uma
cessão do direito de uso daquele material.

Assim, essas atividades não se enquadram no conceito de serviço


abrangido pela CF/88, tendo a sua possibilidade de tributação
condicionada ao exercício de competência residual da União – como
ocorreu nos Estados Unidos, em que vários Estados buscaram formas
distintas de incluir essa materialidade nas hipóteses de incidência
tributária184.

Naturalmente, todas essas atividades que vêm eclodindo e se


popularizando recentemente são de uma complexidade que demandaria
maiores investigações acerca das suas naturezas jurídicas próprias, para
fins de determinação de quem teria competência para tributá-las. Não
obstante, a própria valoração dos elementos caracterizadores dessas
atividades pode se sujeitar também ao critério utilizado no RE n.
547.245/SC, com uma consideração da função econômica e social da
atividade, em lugar de seu regime jurídico técnico.

CONCLUSÃO

O sistema constitucional tributário brasileiro adotou uma estrutura


rígida, formal e materialmente, com a distribuição de competências
tributárias a todos os entes federados, com a finalidade de garantir a
autonomia financeira destes. Essa rigidez lhes impôs um fechamento

492
horizontal, por força da competência residual da União, e uma abertura
vertical moderada, que demanda uma validação condicional entre os
conceitos adotados pela constituição e as materialidades eleitas na
instituição dos impostos.

O conteúdo das regras de competência não é estanque, imutável, mas


deve ser construído com base na influência direta dos sentidos mínimos
assumidos pelas expressões dentro do contexto normativo em que elas se
inserem, mas também na influência indireta de constrangimentos
estruturais e de influxos principiológicos existentes. Essa construção
racional, por sua vez, é realizada pelos Tribunais, que cuidam de
cristalizar, em sua jurisprudência, o sentido dessas normas jurídicas.

As profundas modificações do cenário econômico ocorridas nas últimas


décadas, especialmente em razão do desenvolvimento da chamada
Economia Digital, fizeram eclodir diversas atividades econômicas que
atraíram a atenção dos Estados e dos Municípios, que pretenderam tributá-
las com o ICMS e o ISS, respectivamente, gerando conflitos de
competência.

Todavia os conceitos usualmente invocados para a delimitação dessas


competências, especialmente os conceitos de “mercadoria” e “serviço”, no
seu conteúdo tradicional, não eram capazes de dar soluções para a questão
do alcance do poder tributário dos entes federados, demandando uma
reformulação conceitual – dentro dos próprios limites da Constituição –
para se adequarem às novas realidades.

Diante disso, constatou-se na jurisprudência do Supremo Tribunal


Federal uma alteração no conteúdo desses conceitos mencionados, com a
adoção de conceitos mais adaptados às atividades que vêm surgindo, sem

493
que eclodam conflitos federativos nessa seara e sem contrariar regras
constitucionais.

Após refletir sobre essa reformulação conceitual, tomando como fio


condutor o caso da tributação de operações de download de software,
chegamos às seguintes conclusões:

•O conceito de mercadoria tributável pelo ICMS é qualquer bem material ou


imaterial cuja transmissão se dê dentro de uma cadeia de circulação mercantil,
e que não esteja abrangido por outras competências constitucionais (a exemplo
do ouro, tributado pelo IOF).
•O atual conceito constitucional de serviço para fins de ISS é o de oferecimento
de uma utilidade para outrem, a partir de um conjunto de atividades imateriais
definidas em lei complementar, prestadas com habitualidade e mediante
contraprestação, podendo estar conjugadas ou não com a entrega de bens ao
tomador, excluídos os serviços abrangidos pelo artigo 155, inciso II, e artigo
153, inciso V, da CF/88 e as atividades de cessão de direitos de uso.
•As demais hipóteses de atividades tecnológicas, não abrangidas pelos conceitos
anteriores (a exemplo do download de software e o streaming de vídeos),
demanda o exercício da competência residual da União, através de lei
complementar, para que possam ser tributados.

Portanto, o que se verifica é que as atuais regras de competências


existentes na Constituição Federal de 1988 são suficientes para abarcar as
novas materialidades decorrentes da Economia Digital, seja através da
adoção de conceitos mais sofisticados de mercadoria e serviço, seja através
do exercício da competência residual pela União.

494
ICMS sobre software: evolução do conceito
constitucional de mercadorias em face da
inovação tecnológica
185 186
Carlos Otávio Ferreira de Almeida e Lucas Bevilacqua

1. A TRIBUTAÇÃO NA ECONOMIA DIGITAL

A despeito de outros momentos históricos marcados por avanços


tecnológicos e reestruturação de valores tradicionais, não há dúvida de que
a economia de nossos dias registra enorme e célere modificação de
paradigmas há não muito fixados.

Com a globalização, a economia se tornou de tal forma fluida que


fronteiras geopolíticas se tornaram inaptas a fixar cerca aos fatores de
produção, o que desafia institutos relevantes quanto à conexão necessária
ao alcance da tributação de determinada jurisdição187.

Mais que isso, a digitalização da economia possibilitou um nível sem


precedentes de interação que, por meio das tecnologias de informação e
comunicação a preços viáveis, fomenta e reinventa os negócios. Mínima
ideia a este respeito resulta da constatação de que a Amazon.com, apenas
entre 2014 e 2016, registrou aumento de vendas líquidas de US$ 88,99
bilhões para US$ 135,99 bilhões188.

A incidência do tributo, autêntica receita derivada, requer a presença de


signos presuntivos de riqueza. Difícil imaginar que esse requisito não seja
atendido sob as sofisticadas trilhas da economia digital189. A extração de
receitas da tradicional economia talvez seja vitimada, senão pela
obsolescência, por drástica redução. Logo, em face das inúmeras

495
novidades que a digitalização fornece, restaria investigar se seria possível
separar a economia digital da própria economia para fins tributários.

Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento


Econômico (OCDE), não mais parece possível segregar a economia
digital da economia tradicional. O crescimento da primeira a vem
transformando na própria economia190. Se assim for, lícito que se viabilize
a incidência do tributo sobre a riqueza produzida em larga escala pelas
diversas manifestações do comércio eletrônico. Imaginar o contrário seria
escassear recursos importantes às diversas e igualmente complexas
demandas sociais, já que a fonte produtora desses recursos está na própria
economia, absorvida a tal ponto por sua versão digital que desta não se
pode mais dissociar.

Sob este prisma, o Estado fiscal, que se faz projetar em nossos dias, é
ameaçado pelas incertezas do paradoxo entre tributação e soberania
tributária. Se aquela decorre desta, fato é que a soberania, a seu turno,
necessita da arrecadação para manter-se politicamente sólida. Com efeito,
a tributação não se perfaz em objetivo final do Estado, mas em meio que
lhe faculta o cumprimento de suas finalidades sociais. Assim, por fiscal e
social afigura-se o Estado de nossos dias191.

Ante o plexo crescente de demandas que pressionam a coluna das


despesas, o equilíbrio orçamentário requer a suficiência de recursos para o
atendimento das necessidades avalizadas pelo legislador.

A premissa de inexistir razão tributária suficiente para estremar a


economia digital da tradicional não significa que estados e municípios
brasileiros, mais diretamente interessados na tributação sobre bens e
serviços digitais, estejam lidando com novos conceitos, processos e formas

496
de negócios – cloud computing, blockchain, streaming, download etc. –
sob as balizas ditadas pela Constituição Federal.

Decerto que a economia digital tem criado novos desafios à tributação


pelo VAT – Value added tax192, particularmente quando bens, serviços e
intangíveis são adquiridos por clientes particulares de fornecedores no
exterior193.

No Brasil, do mesmo modo, o comércio de bens digitais tem suscitado


muitas dúvidas, sobretudo após a publicação do Convênio 106, em 5 de
outubro de 2017, pelo Conselho Nacional de Política Fazendária
(CONFAZ), instituindo a cobrança do referido imposto sobre “operações
com bens e mercadorias digitais”, como software, programas, jogos
eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres, que sejam
padronizados, ainda que tenham sido ou possam ser adaptados,
comercializadas por meio de “transferência eletrônica de dados”.

O Convênio CONFAZ n. 106/2017194 demonstra que os Estados


intentam tributar, definitivamente, a economia digital, alcançando novas
formas de comercialização como download e, especialmente, streaming
(destaque para a atividade comercial de Netflix, Spotify e assemelhados).

Em vista da importância do tema e das atuais controvérsias a que dá


ensejo, este artigo tem por objetivo investigar a constitucionalidade da
incidência do ICMS proposta pelo Convênio n. 106, especialmente com
base na evolução semântica de “mercadorias” decorrente da profunda
inovação tecnológica de nossos dias. Pretende-se, assim, avaliar se a
materialidade do ICMS se aperfeiçoa com relação a operações realizadas
com bens e mercadorias digitais que sejam alvo de comércio por
transferência eletrônica de dados. Do mesmo modo, será objeto de análise

497
o conflito federativo vertical, entre Estados e Municípios, já que estes
alegam deter competência exclusiva para tributar software por meio da
incidência do Imposto sobre Serviços (ISS).

Conflitos verticais, em matéria de tributação na economia digital, se


repetem ante a indefinição do conceito de “mercadoria”. Nesse contexto,
convém refletir sobre as seguintes questões: seriam mercadorias
exclusivamente os bens corpóreos? Bens digitais sujeitos à incidência de
ICMS são exclusivamente os chamados “software de prateleira”? Qual a
diferença entre a aquisição de um software contido em um pen drive diante
daquele adquirido mediante download? O conceito constitucional de bens
digitais alcançado pelo STF, ao aplicar a imunidade aos livros eletrônicos,
se faz aplicável para o exercício do poder de tributar dos Estados por meio
do ICMS sobre software?

Essas intrincadas questões da tributação da economia digital já foram


postas ao STF, que possui concatenada jurisprudência acerca da evolução
do alcance semântico de “mercadoria”. Assim, fundamental compreender
as decisões do STF para concluir, ao final, acerca da (anti)juridicidade da
tributação de software pelos Estados ou Municípios desta Federação.

2. CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL:


TIPOS OU CONCEITOS?

A Constituição Federal atribui competência aos Estados e ao Distrito


Federal (DF) para instituir impostos sobre “operações relativas à
circulação de mercadorias” e sobre prestações de serviços de transporte
interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e
as prestações se iniciem no exterior (art. 155, II). A prestação de serviços
de transporte e a de comunicação, apesar de igualmente materialidades do

498
ICMS, não serão objeto das seguintes análises, restritas a operações
relativas à circulação de mercadorias.

Em sua costumeira precisão vernacular, Paulo de Barros Carvalho


confere à expressão “operações de circulação de mercadorias” o mesmo
significado de “transferência de sua titularidade”. Sob este prisma,
“operações” traduzem-se por atos ou negócios jurídicos capazes de
provocar a circulação de mercadorias. “Circulação”, a seu turno, seria a
passagem de uma esfera patrimonial a outra, aperfeiçoando-se a incidência
do ICMS por meio da circulação jurídica, lastreada em documentação de
respaldo, e não física. Já “mercadorias” seria “tudo aquilo susceptível de
ser objeto de compra e venda” ou, mais objetivamente, “coisa móvel,
corpórea, que esteja destinada ao comércio”195.

Nesse mesmo sentido a lição de Roque Carrazza, segundo a qual


“configura mercadoria o bem móvel corpóreo adquirido pelo comerciante,
industrial ou produtor, para servir de objeto de seu comércio, isto é, para se
revendido”196.

O impasse sobre o conceito de mercadoria é mesmo anterior à atual


expansão da economia digital e pode ser bem representado quando se
atesta a incidência do ICMS sobre energia elétrica, algo que não se
qualifica por bem corpóreo e tampouco se destina à revenda, mas antes ao
consumo final.

Destarte, o alcance de “mercadorias”, para efeito de incidência do


ICMS, parece ter sido indicado pelo próprio Constituinte de modo amplo,
ao determinar que, ressalvados o Imposto de Importação e o Imposto de
Exportação, nenhum outro imposto, que não o ICMS, poderá incidir sobre

499
operações relativas a energia elétrica (art. 155, § 3º). Indubitável, neste
contexto, que energia elétrica se alberga sob o conceito de “mercadorias”.

Quanto à “circulação”, observa-se que a energia elétrica deve antes


perpassar indispensáveis fases de geração, transmissão e distribuição para,
finalmente, ocorrer o consumo. Por essa razão, a tributação do ICMS-
energia elétrica tem peculiaridades, tornando-se bem distinta daquela que
usualmente ocorre com mercadorias sujeitas a estocagem e sucessivas
revendas do produtor, atacadista, varejista até atingirem o consumidor
final. Seria, portanto, a hipótese de incidência do ICMS-energia elétrica o
consumo final, somente possível após a superação de fases anteriores (de
circulação) que lhe são necessárias desde a geração e a distribuição da
energia elétrica. Somente com a disponibilização ao interessado,
desprezando-se fases prévias de circulação, aperfeiçoa-se uma só
incidência de ICMS no momento do consumo da energia elétrica pelo
destinatário final da rede disponibilizadora197.

Com base nessa determinação constitucional, entende-se que energia


elétrica, para fins de incidência do ICMS, está equiparada ao conceito de
“mercadorias”, independentemente da suposta necessidade de
corporeidade das coisas móveis. Do mesmo modo, a transferência
patrimonial capaz de configurar a “circulação” tem tratamento peculiar
neste caso, pois ignora diversas circulações para atingir apenas e tão
somente a última delas, ao consumidor final, que paga periodicamente
pelo consumo que faz da energia disponível em rede. Assim ocorre por
conta de indicação expressa do Constituinte para fazer incidir o ICMS,
também, sobre energia elétrica.

Contudo, a norma jurídica nem sempre se faz registrar no corpo escrito


das leis. Não raras vezes, o alcance da norma resulta do esforço

500
interpretativo que traz a lume o sentido implícito do objeto sob análise.
Surge, então, a legítima dúvida quanto ao alcance de “mercadorias”, em
face dos bens digitais comercializados eletronicamente, sobre os quais, em
1988, naturalmente, não seria possível ao Constituinte fazer-lhes expressa
menção.

Para se concluir a esse respeito, crucial reconhecer que, ao atribuir


competência aos Estados e ao DF para instituir imposto sobre “operações
relativas à circulação de mercadorias”, a Constituição Federal não
estabeleceu um conceito, mas apenas realizou mera aproximação
tipológica do objeto “mercadorias” e de sua respectiva “circulação”.

Tivesse havido uma aproximação conceitual de “mercadorias” pelo


Constituinte e não haveria a menor possibilidade de conflito federativo,
pois o conceito encerraria limites firmes sobre o objeto inserido no texto
constitucional. Muito ao contrário, a própria Carta Política designa, a lei
complementar, a tarefa de dispor sobre conflitos de competência em
matéria tributária entre os entes (art. 146, I). Ora, se assim ocorre é
justamente porque o Constituinte reconhece ter-lhes atribuído
competência, nos artigos 153 (União), 155 (Estados e DF) e 156
(Municípios), por meras aproximações tipológicas e não conceituais198.

Nessa esteira, forçoso observar que os tipos são eminentemente fluidos,


sem contornos demarcados. Ao escolher abstrair a realidade por meio de
tipos, o legislador opta por descrever, não definir, elementos
característicos de determinado objeto. Assim, é lícito ponderar que o tipo
está submetido, por sua própria natureza aberta, à constante evolução, ao
dinamismo mesmo com que os institutos podem, ao longo do tempo,
adquirir ou abandonar valores semânticos.

501
Logo, a Constituição Federal toma a realidade das “operações de
circulação de mercadorias” por aproximação tipológica, mas impõe ao
legislador complementar observar limites rígidos em sua tarefa de definir
fatos geradores de impostos, cabendo ao último abordar a mesma realidade
econômica, “operações de circulação de mercadorias”, por conceitos.

3. CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS NA LEGISLAÇÃO


INFRACONSTITUCIONAL: LEI COMPLEMENTAR EM MATÉRIA DE
ICMS

Uma das tarefas da lei complementar em matéria de ICMS está em


estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária,
especialmente sobre definição de tributos e de suas espécies, bem como a
dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes (CF, art.
146, III,“a”)199.

Para evitar maiores dúvidas quanto ao alcance das normas gerais, o


Constituinte definiu diversas matérias forçosamente submetidas à atuação
do legislador complementar. Assim, em matéria de ICMS, diversas ordens
jurídicas parciais, representadas pela atuação dos respectivos legisladores
ordinários dos Estados, não possuem competência para definir, por
exemplo, fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes do ICMS, por
estarem submetidas à ordem jurídica total.

Neste giro, a Constituição Federal e a lei complementar, integrantes da


ordem jurídica nacional, devem se fazer observar pelas ordens jurídicas
federal, estaduais, distrital e municipais. No caso do ICMS, resta claro que
o regramento trazido pela lei complementar exigirá a respectiva
conformação por parte das diversas ordens jurídicas estaduais, o que
deverá ocorrer pela atuação dos respectivos legisladores ordinários de cada
Estado200.

502
Desse comando constitucional se desincumbe a Lei Complementar n.
87/96 (Lei Kandir), autêntica lei nacional, ao dispor sobre materialidades,
contribuintes e responsáveis, bases de cálculo, momento da ocorrência do
fato gerador e local da operação ou prestação para efeitos de cobrança do
ICMS. Desse modo, assim prescreve a referida LC n. 87/96:

Art. 2º O imposto incide sobre:


I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento
de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares; (...).
(Grifamos.)

Em obediência ao disposto em lei nacional, à guisa de exemplo, a Lei n.


6.374/89 (atualizada pela Lei n. 10.619/2000) promulgada pelo Estado de
São Paulo, ao instituir o ICMS, sobre esse mesmo assunto, assim dispôs:

Art. 1º O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e


sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação – ICMS incide sobre:
I – operação relativa à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento
de alimentação, bebidas e outras mercadorias em qualquer estabelecimento; (...).
(Grifamos.)

Embora expresso na legislação estadual e nacional que a incidência do


ICMS se dá sobre a “circulação de mercadorias”, a pujante evolução
representada pelo comércio eletrônico desafia a referida expressão,
ensejando dúvidas que justificam as análises seguintes.

De se esperar que o legislador complementar definisse, não apenas


descrevesse, o objeto “mercadorias”, a fim de reduzir ao máximo as
dúvidas e respectivos conflitos decorrentes da mera aproximação
tipológica realizada pela Constituição Federal. Não é o que se constata, no
entanto. A LC n. 87/96 meramente repetiu o texto registrado na Carta
Política, ao se referir a “operações relativas à circulação de mercadorias”.

503
Diante das incertezas decorrentes da inércia do legislador
complementar, busca-se o conceito, a ideia de mercadoria, no âmbito
privado, daí resultando, em geral, coisa móvel, corpórea, submetida à
mercancia, que deverá circular sempre que houver transferência
patrimonial juridicamente.

Daí uma corrente menos afeta aos avanços da digitalização da economia


eventualmente evocar o artigo 110 do Código Tributário Nacional (CTN)
para assegurar que um conceito de Direito Privado permaneça nos limites
ali ditados, vedando ao Direito Tributário qualquer extensão ou alteração
do alcance importado para fins de imposição de tributos. Não obstante a
proibição do referido artigo represente fundamental garantia aos
contribuintes, a vedação de modo algum tem poder bastante para impedir o
mero exercício hermenêutico, especialmente se levado a efeito no bojo do
próprio Direito Privado.

Com efeito, o que se veda é a interpretação pelo filtro tributário da


definição, do conteúdo, ou do alcance de institutos, conceitos e formas de
Direito Privado, utilizados pela Carta Magna para definir ou limitar
competências tributárias. Neste caso, o Constituinte não se valeu de
qualquer conceito, mas de tipos para tratar de “mercadoria” e respectiva
“circulação”. A fluidez do tipo “mercadoria”, naturalmente, abrange as
mudanças do que se pode sujeitar à mercancia na era digital.

Desse modo, não parece haver óbice a que institutos típicos do Direito
Privado, sem qualquer edição de lei tributária no curso de dado lapso
temporal, ganhem novos contornos e dispam-se de outros anacrônicos, em
vista da consideração acerca da realidade subjacente pelo próprio
hermeneuta privatista. É justamente este o caso sob vistas, em que poderá
haver ampliação ou alteração de concepções, ideias, acerca de objetos com

504
séculos de trato jurídico, como ocorre, justamente, com as mercadorias,
pela mera inserção do objeto na realidade subjacente, mas nunca pela ação
da lei tributária.

Logo, caberia indagar se por “mercadorias”, atualmente, deve-se


entender o mesmo que o tipo constitucional descreveu em 1988, ou se o
tipo evoluiu para incorporar outras características decorrentes da
impressionante forma pela qual as pessoas passaram a comerciar, pagar
transações, encomendar objetos e, especialmente, consumir bens digitais.

Como o tipo, obviamente, evoluiu com a digitalização da economia e,


ainda com mais razão, pelo fato de que isso se deu sem qualquer
participação do legislador complementar tributário – que apenas
reescreveu o texto constitucional (“circulação de mercadorias”) na LC n.
87/96 –, o artigo 110 do CTN não tem qualquer efetividade sobre essa
questão, posto que garante situação diversa da presente.

Não deveria causar estranheza que a fluidez constitucionalmente


garantida ao gênero “mercadorias” conferisse a inclusão, nesse mesmo
tipo, daquelas de natureza digital. Ora, já assim funciona com a energia
elétrica, que vem sendo tributada pelo ICMS, naturalmente, a despeito de
seus contornos não evidenciarem, em absoluto, nenhuma corporeidade ou
tangibilidade. A circulação da energia elétrica também se dá de modo
muito peculiar, sem intuito de revenda e, ainda, sob pagamento periódico.

Logo, se a incidência do ICMS sobre bens comercializados fisicamente


era certa, como no caso dos LPs ou filmes suportados por fitas VHS, o
mero fato de tais bens se dobrarem a novas formas e concepções de
mercancia, tornando-se consumíveis digitalmente, teria o condão de lhes

505
desnaturar a essência de mercadorias? Um breve estudo da interpretação
da legislação tributária deverá auxiliar no deslinde dessa questão.

4. DA INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA

Entendeu o STF, no RE n. 330.817 e no RE n. 595.676, julgados em 8


de março de 2017, que a expressa imunidade sobre livros, jornais,
periódicos e o papel destinado à sua impressão deveria ser estendida a
produtos eletrônicos, tais como os livros eletrônicos, os suportes
exclusivos para leitura e armazenamento e os componentes eletrônicos que
acompanhem material didático.

Em outro dizer, o STF ignorou, por completo, a importância dada ao


papel pelo texto constitucional, assumindo que a vontade histórica do
legislador não estaria ali resumida. O voto do Min. Dias Toffoli, relator do
RE n. 330.817, estabeleceu uma distinção digna de registro entre corpus
mechanicum e corpus misticum. Enquanto o primeiro seria apenas o
continente, o suporte da obra, o último seria a própria essência da obra.
Nessa esteira, nenhum sentido faria a extensão da imunidade limitar-se,
meramente, ao suporte, e não à essência das obras.

Em suas conclusões, o Ministro relator asseverou: “As mudanças


históricas e os fatores políticos e sociais presentes na atualidade, seja em
razão do avanço tecnológico, seja em decorrência da preocupação
ambiental, justificam a equiparação do papel aos suportes utilizados para a
publicação dos livros”.

Como bem percebido pelo STF, a franca expansão da economia digital


não deve ser ignorada. Com ela, no entanto, surgem crescentes desafios ao
intérprete da legislação tributária. Assim como o alcance de “livro” parece
ter sido ampliado em face das inovações tecnológicas que alteraram o

506
comportamento das pessoas quanto ao comércio de livros, não se poderia
negar que o mesmo se dá com o comércio, por exemplo, de filmes e
músicas.

Se, antes, o comércio de livros exigia fosse o adquirente até a livraria


para buscar o objeto de seu interesse e, após encontrá-lo, efetivamente
pagar por sua aquisição em papel, transportando-o fisicamente, não era
diferente o ocorrido com o mercado de filmes ou de músicas. Há pouco
tempo não haveria outro modo de adquirir um filme/música senão
comparecendo a alguma loja para escolher a obra (corpus misticum)
veiculada por meio de uma fita VHS/LP ou, menos remotamente,
DVD/CD, todos esses, sem dúvidas, meros suportes (corpus mechanicum)
que avançaram em qualidade com a oferta de tecnologias novas.

Em respeito à coerência, não há justificativa para trato distinto, sob o


ponto de vista tributário, quanto à configuração do livro, da música ou do
filme veiculado por meio de download ou, mais modernamente, streaming.

Argumento contrário poderia se basear no fato de que o livro teve seu


conteúdo ampliado por ter sido objeto de interpretação de norma
imunizante, à qual se deve conferir tão ampla interpretação quanto
possível, ao passo que à norma impositiva sobre filmes ou músicas caberia
restringir a interpretação. Não se sustenta, no entanto, esta visão, pois que
a imunidade de livros é meramente objetiva, em nada decorrendo do
princípio da capacidade contributiva, mas de indução econômica ao setor
de produção cultural. Observa-se aqui o objeto, a coisa, e não a condição
das pessoas que realizam operações com livros, jornais, periódicos e o
papel destinado à sua impressão201.

507
Em observância, pois, à coerência, restaria analisar se músicas ou filmes
veiculados eletronicamente podem ser tidos por “mercadorias”, a ponto de
justificarem a incidência do ICMS sobre sua respectiva circulação.

A esse respeito, esclarece Ezio Vanoni que as normas tributárias devem


ser interpretadas com o objetivo de “atribuir ao preceito jurídico o valor
real que lhe compete na regulamentação das relações da vida que
constituem seu objeto: qualquer orientação apriorística do trabalho
interpretativo, a favor do fisco ou a favor do contribuinte, constitui uma
inadmissível limitação do processo lógico”202.

As relações comerciais submetem-se a constante evolução em vista da


digitalização e da globalização da economia. Assim, observar
“mercadorias” sob a lente do passado não auxilia na simples constatação
de que a era tecnológica não é mera “chuva de verão”. Ao contrário,
digitalização e mundialização da economia são fatores reais com os quais
deveremos conviver doravante. No âmbito da OCDE, os países têm
buscado preservar suas bases de arrecadação por meio de estudos que
possibilitem a incidência de tributos diretos e indiretos sobre o e-
commerce.

Assim como o que se entendia por livros há pouco tempo não mais se
coaduna com o valor semântico que lhe emprestam os dias atuais,
“mercadorias” não mais comportam a rigidez de representarem apenas
coisas móveis e corpóreas. Parece-nos que essa visão era apropriada para
indicar, dentre outras características, a oposição aos bens imóveis,
alcançados por tributos diversos que não o ICMS.

Doravante, no entanto, “mercadorias” estão sujeitas ao modelo como se


impõe o comércio de nossos dias e, como já visto acima, não há mais

508
como segregar a economia digital da tradicional, uma vez que a primeira,
cada vez mais, abarca a segunda. Logo, o valor real de “mercadorias”
exige do intérprete que sejam observadas as relações da vida de hoje.
Como são comercializados filmes e livros, atualmente, por meio
eletrônico, razão não parece haver para que a mesma obra, apenas por estar
contida em suporte físico, escape à incidência do ICMS por não se
caracterizar como “mercadoria”.

O processo de interpretação deve, minimamente, atenção a dois


elementos: o histórico, que busca a vontade do Estado contida na norma
sob exame por ocasião de sua promulgação; e o lógico em sentido estrito,
que “põe a lei em contato com a vida social, com as novas necessidades e
as novas orientações do pensamento, para definir o alcance da regra
jurídica no momento de sua aplicação”203.

Nesse sentido parece ter caminhado a unânime decisão do STF no caso


dos livros, sob o aspecto da consideração da realidade subjacente para
firmar a aplicação da norma. Reconhece-se a harmonia existente entre a
decisão do STF e a lição de Vanoni, para quem o conhecimento do espírito
que anima a lei é de vital importância para superar a imperfeita formulação
da norma, assim como para “vencer as incertezas que surgem sempre que
seja necessário trazer os fenômenos da vida prática, sempre diferentes e
variáveis, para debaixo do império de uma norma cuja formulação
permanece inalterada”204.

Imaginar o inverso seria exigir do Constituinte, assim como da


legislação infraconstitucional, reiteradas inserções nos textos da lei, à
medida que a economia digital criar novos institutos e realidades, o que
não se sustenta.

509
5. A TRIBUTAÇÃO DE BENS DIGITAIS NO ÂMBITO DO CONVÊNIO
CONFAZ N. 106/2017: (IN)CONSTITUCIONALIDADE?

Dado o caráter eminentemente nacional do ICMS, o CONFAZ foi


concebido como órgão suprafederativo, integrado por representantes do
DF e dos Estados, administrativamente integrado ao Ministério da
Fazenda, que se reúne regularmente com o objetivo de harmonizar as
diversas políticas fiscais de seus integrantes. Essa tarefa harmonizadora se
instrumentaliza por meio de convênios e protocolos que, respectivamente,
promovem a autorização para concessão de incentivos fiscais e a
uniformização de práticas fiscalizatórias.

Portanto convênios e protocolos decorrem do poder normativo do


CONFAZ e integram, indubitavelmente, a legislação tributária de ICMS,
em regulamentação à LC n. 87/96, que consubstancia norma geral a partir
da qual os Estados editam normas sobre ICMS em suas respectivas esferas
de competência.

Nesse contexto, foi publicado, pelo CONFAZ, o já mencionado


Convênio n. 106, instituindo a cobrança do ICMS sobre “operações com
bens e mercadorias digitais”, como software, programas, jogos eletrônicos,
aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres, que sejam padronizados,
ainda que tenham sido ou possam ser adaptados, comercializadas por meio
de transferência eletrônica de dados.

Dentre outras previsões, o Convênio n. 106 isenta as operações


anteriores à saída destinada ao consumidor final. A despeito de expressa
previsão na Lei Complementar n. 24/75 para a concessão de incentivos
fiscais em matéria de ICMS por meio de convênios, dúvidas surgem
quanto ao espectro regulador do indigitado Convênio n. 106 para além
desta incumbência.

510
Com efeito, nada indica violação ao ordenamento quanto à disciplina
das isenções concedidas a operações anteriores à saída destinada ao
consumidor final. No entanto, a mesma convicção não resulta da
disposição sobre questões como incidência do ICMS sobre bens e
mercadorias digitais transferidas eletronicamente; adoção do princípio do
destino; e indicação de responsabilidade tributária pelo recolhimento do
ICMS.

5.1. Evolução semântica de “mercadorias” no contexto da economia digital

Uma vez que o Convênio n. 106 autoriza a incidência do ICMS sobre


bens e mercadorias digitais, cabe relembrar que a discussão acerca da
incidência tributária sobre software remonta ainda à década de 1980,
quando houve grande celeuma quanto ao conceito e à própria
comercialização de software. A União editou a Lei n. 7.646/87 para definir
“software” como um conjunto organizado de instruções em linguagem
natural ou codificada, contido em suporte físico de qualquer natureza.

Por parte da doutrina, Arnold Wald registrou lição no sentido de que


software seria um conjunto organizado de instruções que resulta de um
esforço humano, apresentando, portanto, caráter de produto intelectual ao
qual corresponde um direito autoral do seu criador205. Nesse mesmo
sentido dispôs a Lei n. 9.609/98, verbis:

Art. 2º O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de


computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e
conexos vigentes no país, observado o disposto nesta lei.

A partir desse arcabouço normativo, tem-se que o desenvolvimento de


um software é integrado pelas seguintes etapas produtivas: (i) pagamento
dos direitos autorais a quem concebeu o software, (ii) diagramação e
composição gráfica do manual de uso do software em formato digital ou

511
físico, (iii) serviço de processamento eletrônico de cópia do software em
suporte magnético e proteção da cópia, e (iv) garantia do software ao
consumidor final.

O fornecimento do software ao mercado pode se realizar basicamente


de duas formas: (a) pela disponibilização de software específico ou
generalizado, aliada ou não à contratação de sua implantação; e/ou (b) pela
venda de software standard em lojas especializadas, com razão social de
comércio de produtos de informática, que incluem seus custos de
divulgação no preço final de oferta aos consumidores (software de
prateleira).

A partir de tal estruturação, as administrações tributárias conceberam o


entendimento de que apenas o software de prateleira se submete à
incidência do ICMS206; o que terminou acolhido pela jurisprudência do
STF207:

I. Recurso extraordinário: (...) II. RE: questão constitucional: âmbito de


incidência possível dos impostos previstos na Constituição: ICMS e mercadoria.
Sendo a mercadoria o objeto material da norma de competência dos Estados para
tributar-lhe a circulação, a controvérsia sobre se determinado bem constitui
mercadoria é questão constitucional em que se pode fundar o recurso extraordinário.
III. Programa de computador (“software”): tratamento tributário: distinção
necessária. Não tendo por objeto uma mercadoria, mas um bem incorpóreo, sobre as
operações de “licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de
computador” “matéria exclusiva da lide”, efetivamente não podem os Estados
instituir ICMS: dessa impossibilidade, entretanto, não resulta que, de logo, se esteja
também a subtrair do campo constitucional de incidência do ICMS a circulação de
cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série e
comercializados no varejo – como a do chamado “software de prateleira” (off the
shelf) – os quais, materializando o corpus mechanicum da criação intelectual do
programa, constituem mercadorias postas no comércio.

A doutrina assimilou o entendimento de que “a tipificação se


condiciona ao negócio jurídico realizado, ou seja, programa “standard”
(produto acabado) – ICMS – ou programas por encomenda, ou adaptado

512
ao cliente – ISS208, o que, inclusive, foi reiterado pelo STF ao corroborar a
incidência do ICMS sobre software de prateleira, i.e., aquele produzido em
série e comercializado no varejo209.

Transcorridas praticamente duas dezenas de anos, tempo suficiente para


uma revolução tecnológica, a legislação do Estado do Mato Grosso, que
prevê a incidência de ICMS sobre qualquer espécie de software, foi objeto
de julgamento em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)
perante o STF. Na ocasião, o Min. Gilmar Mendes advertiu com
propriedade que o “Tribunal não pode se furtar a abarcar situações novas,
consequências concretas do mundo real, com base em premissas jurídicas
que não são mais totalmente corretas”210.

Naquela ocasião, prevaleceu um novo entendimento acerca do tipo


constitucional “mercadoria”, cujo alcance passou a compreender tanto o
software de prateleira, quanto aquele comercializado por meio de
download, à medida que a qualificação de “mercadorias” prescinde de o
objeto sob análise se revestir da condição de bem corpóreo.

A doutrina tributária211, felizmente, também evoluiu: “a mutação do


conceito constitucional de mercadoria, diante da realidade atual, é
mandatória, sob pena de uma operação nitidamente mercantil ficar
excluída da competência tributária dos Estados”212.

Nesse cenário, dúvidas não há de que os Estados detêm poder de


tributar software independentemente do modo em que comercializados, o
que vai ao encontro das novas exigências da cada vez mais pujante
economia digital. No entanto, o entendimento até aqui alcançado não é o
bastante para extirpar as dúvidas em matéria de ICMS, considerando que a
Constituição apenas outorga aos Estados o poder de tributar. Este, a seu

513
turno, deverá ser exercitado mediante a edição de leis estaduais, sob a
égide de lei complementar incumbida, dentre outros, do mister de definir o
fato gerador e a obrigação, além de dirimir eventuais conflitos de
competência entre os Estados, cujas políticas tributárias harmonizam-se
por meio de convênios firmados perante o CONFAZ.

5.2. A circulação ou disponibilização de bens digitais

No âmbito do Convênio n. 106, mercadorias digitais circulam por meio


de transferência eletrônica de dados. Na doutrina tradicional, a circulação
pressuporia a transferência da posse ou da propriedade de mercadoria, de
uma para outra pessoa213. Como não houve aproximação conceitual de
“circulação” pelo Constituinte e nem definição do termo pelo legislador
complementar, não pode resultar incerteza sobre a sujeição do termo à
nova realidade global e digital da economia.

Antes, a própria negociação exigia dispêndio de tempo para o transporte


físico da mercadoria. Hoje, o simples toque numa tela pode resultar na
mesma disponibilização do bem sob forma digital. A alegação de que não
haveria circulação, mas mera licença para uso, o que configuraria um
serviço, não se sustenta. A circulação não pode ser analisada de modo
independente, mas apenas em conjunto com o termo “mercadorias”.

Logo, circulam mercadorias para incidência do tributo. Imaginar que


bens digitais não são mercadorias, mas objetos indefinidos sujeitos à
prestação de serviços, despreza a atuação do Constituinte e do legislador
complementar no esforço de descrever a materialidade do ICMS. Do
mesmo modo, rejeitar a atualização, por assim dizer, do tipo “circulação”,
ignorando a necessária realidade subjacente pela qual as pessoas,

514
atualmente, consomem bens digitais, para priorizar a mera literalidade,
tampouco parece razoável.

5.3. Adoção do critério de destino nas operações com bens digitais

O Convênio n. 106 define o local de recolhimento do imposto nas


saídas internas e nas importações realizadas por meio de site ou de
plataforma eletrônica que efetue venda ou a disponibilização, ainda que
por meio de pagamento periódico, de bens e mercadorias digitais mediante
a transferência eletrônica de dados, “na unidade federada onde é
domiciliado ou estabelecido o adquirente do bem ou mercadoria digital”.

A nosso ver, portanto, ultrapassando seu poder normativo, referido


Convênio fixa regra a partir do critério do destino, de modo que o ICMS
será devido ao Estado onde domiciliado ou estabelecido o adquirente da
mercadoria digital.

A despeito dos bons propósitos que orientaram a edição do Convênio n.


106, vislumbra-se vício material no tratar de matérias próprias de lei
complementar, já que a imposição do critério de destino termina por
representar norma de repartição de competência.

5.4. Atribuição de responsabilidade tributária por convênio

Além das disposições já comentadas, o Convênio n. 106 também faculta


aos Estados a atribuição de responsabilidade pelo recolhimento do ICMS:
(i) a quem ofertar, vender ou entregar o bem ou mercadoria digital ao
consumidor; (ii) ao intermediador financeiro (administradora de cartão de
crédito ou de outro meio de pagamento); (iii) ao adquirente do bem ou
mercadoria digital na hipótese de o contribuinte ou os responsáveis não
serem inscritos na unidade federada em que praticar as saídas internas ou a

515
importação a consumidor final (iv) à administradora de cartão de crédito
ou débito ou intermediadora financeira responsável pelo câmbio nas
operações de importação.

A Constituição reservou à lei complementar dispor sobre a obrigação


tributária e sobre a definição de contribuintes. Ora, a primeira se
concretiza pela relação bilateral entre sujeito ativo e sujeito passivo.
Assim, disposições dessa natureza não estão sob competência normativa
de qualquer norma que não a editada por lei complementar.

5.5. Analogia ou mera interpretação: nova incidência sobre bens digitais?

Lícito relembrar a impossibilidade de se criar nova incidência por meio


de analogia, conforme vedação do artigo 108, parágrafo 1º, do CTN, já que
não seria possível estender a incidência do ICMS sobre operações com
bens e mercadorias digitais, terminologia não veiculada pelo legislador,
mas apenas pelo Convênio n. 106.

A questão envolve a análise previamente feita, no sentido de que a


qualificação “digitais” não altera o alcance do que, em meio à economia
digital e, sobretudo, sob as novas formas de comércio que lhe são
consequentes, se deve entender por “mercadorias”.

A analogia é forma de integração do ordenamento jurídico. Assim,


aplica-se, unicamente, quando há lacunas pela inércia do legislador. Ora,
não é difícil perceber que seria inexequível a tarefa de compelir o
legislador a reeditar normas sob nova redação a cada avanço da vida
social, mormente a cada atualização promovida pelas tecnologias da
informação e da comunicação. Visto dessa forma, haveria incessante
necessidade da colmatação de lacunas para a efetiva integração da
legislação tributária.

516
Não é o que parece ocorrer no caso presente.

Há norma nacional disposta na Constituição Federal e em lei


complementar, assim como legislação ordinária estadual, dispondo sobre a
incidência do ICMS sobre “circulação de mercadorias”. O caso parece,
antes, ser de interpretação, e não de integração por ausência de norma,
como acima já se expôs. Sob esse prisma, não há sentido em eventual
alegação de imposição tributária lastreada em analogia, cuja aplicação
exige se aperfeiçoe o necessário preenchimento de lacunas.

A faina interpretativa, de modo diverso, deverá indicar o caminho a ser


dado, nesses dias de intensa comercialização eletrônica, de mudança dos
objetos levados a mercancia – antes em suportes físicos e hoje cada vez
mais desmaterializados – à aplicação segundo o espírito da norma, e não
meramente à letra.

Se se entender que o alcance de “mercadorias” não comporta evolução,


devendo-se restringir à coisa física, corpórea, deve-se manter coerência e
justificar por quais razões o mesmo não se aplica aos livros, antes
compreendidos como coisa física. Argumentos consistentes, neste sentido,
no entanto, parecem desconhecidos.

Não há falar em analogia para tributar o imprevisto, pois não se trata de


integração, mas de mera interpretação do alcance do dispositivo constante
não apenas da lei ordinária estadual, como da lei complementar, e até
mesmo do texto constitucional no sentido de dispor sobre circulação de
mercadorias nesses tempos de intensa complexidade tecnológica, capazes
de alterar, substancialmente, a forma pela qual se pratica (e será praticada)
a mercancia nos dias de hoje (e do porvir).

6. CONFLITO FEDERATIVO VERTICAL: ICMS OU ISS SOBRE BENS

517
DIGITAIS

A Lei Complementar em matéria de ICMS tem papel de destaque não


só em sua função de norma geral na definição do fato gerador (art. 146, III,
“a”), mas, do mesmo modo, no sentido de dirimir conflitos de competência
entre os entes federativos (art. 146, I), sejam conflitos horizontais, entre
entes de uma mesma esfera federativa, sejam conflitos verticais, entre
diferentes esferas de poder federativo.

Sabidamente, no caso de bens e mercadorias digitais transmitidos


eletronicamente, acumulam-se pretensões tributárias de Estados e
Municípios. Trata-se, pois, de caso de conflito federativo vertical, em face
da publicação do Convênio n. 106 e da Lei Complementar n. 157/2016,
cuja solução, nos termos do ordenamento vigente, exige atuação do
legislador complementar.

Embora a tributação sobre toda sorte de software, de prateleira ou não,


há algum tempo venha sendo instituída por muitos Estados, a maioria
desses concedia generosos incentivos fiscais, de modo que a tributação
pouco impactava o setor da tecnologia da informação (TI).

Foi com a publicação, pelo CONFAZ, do Convênio ICMS n.


181/2015214, que os Estados passaram a conferir novo tratamento ao setor
de TI, de modo que a incidência do ICMS passou a ter maior repercussão
nas vendas praticadas. Esse fato culminou na revisitação de alguns
questionamentos quanto ao ICMS sobre software.

Inegavelmente, o que mais contribuiu para recrudescer o conflito de


competências “ICMS versus ISS” na tributação da economia digital foi a
reforma na Lei Complementar n. 116/2003, promovida pela LC n.
157/2016. A nova lei complementar, além de prescrever a

518
‘’disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdo de áudio, vídeo,
imagem e texto por meio da ‘internet’, respeitada a imunidade de livros,
jornais e periódicos’’ como hipótese de incidência de ISS, ainda
reformulou alguns itens da lista de serviços de informática e congêneres
com destaque para os itens 1.04 e 1.05, verbis:

1.04 – Elaboração de programas de computadores, inclusive de jogos


eletrônicos, independentemente da arquitetura construtiva da máquina em que o
programa será executado, incluindo, tablets, smartphones e congêneres.
1.05 – Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação.

A Confederação Nacional de Serviços (CNS) ajuizou, perante o STF, a


ADI n. 5.659/MG e a ADI n. 5.576/SP215 em face de leis dos Estados de
Minas Gerais e São Paulo, respectivamente, que instituíram a cobrança de
ICMS sobre bens digitais. Para a CNS, tais leis são inconstitucionais por
usurpação da competência tributária dos Municípios, exclusiva para
alcançar software por meio do Imposto sobre Serviços (ISS)216.

Sinteticamente, a CNS invoca o fato de que os serviços de informática e


congêneres abrangem “licenciamento ou cessão de direito de uso de
programas de computação”, nos termos da LC n. 116/2003, item 1.05217,
assim como o previsto no artigo 2º, inciso V, da LC n. 87/96218, para
sustentar que o software está sujeito à incidência do ICMS somente
quando houver fornecimento de mercadorias, por meio de mídias com
suporte físico, aliado à prestação de serviços.

Embora a CNS tenha observado o novo texto trazido pela LC n.


157/2016, a cessão de direito de uso de programas de computação
(software) encontra-se inserida no tipo circulação, indissociável do tipo
mercadorias, portanto, integrante da materialidade do ICMS,
independentemente de ser obtida mediante aquisição “em prateleira” ou
por meio de download. Repare-se que a questão central não é a mera

519
transmissão ou cessão de direito de uso, mas a configuração básica do
consumo de mercadoria, e não de serviço.

Conflitos verticais (ICMS versus ISS) não são recentes na tributação da


economia digital219; no entanto, novos desafios deverão constantemente
surgir com a complexidade das relações comerciais em face do
desenvolvimento das tecnologias de informação. O primeiro passo para
dirimir tais conflitos, além da compreensão do conceito tipológico antes
visto de “mercadoria”, encontra-se na própria compreensão da
“informática”.

Oportuno, neste ponto, recordar Paulo de Barros Carvalho, que de há


muito leciona: “... a natureza mercantil de um bem não deflui de suas
propriedades intrínsecas, mas de sua destinação específica”220. Uma vez
que o software é bem digital desenvolvido para a destinação específica de
ser, sob alguma forma, posto em comercialização, dúvida não há de que se
consubstancie em mercadoria.

Uma melhor apreciação das ADIs que tratam das leis dos Estados de SP
e MG deverá ser realizada a partir da visitação da própria jurisprudência
do STF, com destaque para o entendimento alcançado recentemente no
julgamento acerca da abrangência da imunidade prevista no artigo 150,
inciso VI, letra “d”, aos livros, jornais e periódicos eletrônicos221. Naquela
ocasião, como visto anteriormente, o STF definiu que, não obstante o meio
em que circule a informação, seja físico ou eletrônico, o exercício do poder
de tributar resta vedado pela Constituição, cuja interpretação deve observar
a evolução tecnológica.

Assim, conclui-se que o Convênio n. 106 não inova ao redigir


“operações com bens e mercadorias digitais (...) comercializadas por meio

520
de transferência eletrônica de dados”, mas apenas exemplifica uma das
espécies do gênero “mercadorias”, aquelas qualificadas por digitais. Do
mesmo modo, apenas exemplifica “circulação”, registrando que
transferência eletrônica de dados é a forma pela qual circulam,
prioritariamente, bens da economia digital.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscou-se, neste artigo, investigar a constitucionalidade da incidência


do ICMS proposta pelo Convênio n. 106. De partida, registre-se que a
tributação de bens digitais não requer reforma constitucional, justamente
em razão de a Constituição ter abstraído da realidade a “circulação de
mercadorias” por mera aproximação tipológica, não conceitual.

Para conferir maior segurança jurídica à questão e dissipar controvérsias


decorrentes, seria recomendável que o texto da lei complementar
contemplasse um conceito mais preciso de “mercadorias” e, em
consequência, de “circulação”, para fazer incluir os bens digitais que,
efetivamente, passaram a circular por meio de transferência eletrônica de
dados. Não foi o ocorrido, no entanto, já que a LC n. 87/96 apenas repetiu
o texto constitucional, sem maiores definições.

Assim, a fluidez dos tipos “mercadorias” e “circulação”, como


usualmente ocorre com os tipos, passou a abranger as inovações lógicas da
realidade negocial, que, sob o império da globalização e digitalização
econômica, transformaram-se radicalmente, ensejando novas formas de
mercancia insuscetíveis de previsão pelo Constituinte em 1988.

Destarte, o Convênio n. 106, ao incluir em seu texto “operações com


bens e mercadorias digitais (...) comercializadas por meio de transferência
eletrônica de dados”, não invade a competência do legislador

521
complementar, mas apenas exemplifica uma das características da
concepção corrente de “mercadorias”: a digitalização. Do mesmo modo, o
Convênio, ao registrar a transferência eletrônica de dados, somente
exemplifica a forma pela qual circulam, prioritariamente, bens da
economia digital.

O Convênio, no entanto, extrapola seu poder normativo ao implantar o


critério de destino, assim como ao facultar ao legislador ordinário a
atribuição de responsabilidade tributária, matérias sob reserva de lei
complementar, por força do artigo 146, inciso III, da Constituição.

Por fim, a pretensão municipal de fazer incidir o ISS exigiria que a


materialidade contemplasse uma hipótese de “prestação de serviço”. Não é
este o caso, já que não se pode alterar a essência mesma das coisas, apenas
por terem sido modificadas pelos avanços da realidade subjacente. Assim,
mercadorias físicas que apenas assumiram novas formas de se sujeitar à
mercancia, não deixaram de ser mercadorias. Por dedução inversa,
serviços não contemplam circulação de mercadorias, apenas porque as
novas formas de circulação prescindem da entrega física e ensejam
contratos virtuais para a concessão de direito de uso. Tal interpretação
fulmina a atuação do Constituinte ao abstrair a realidade “mercadorias” e
“circulação” por aproximação tipológica, por isso mesmo sujeita a avanços
capazes de inserir novas características e remover as anacrônicas,
conforme as exigências do tempo presente.

522
Tributação da economia digital e os conflitos
de competência entre ICMS e ISS
222
Maurício Barros

1. INTRODUÇÃO

A chamada “economia digital”, expressão criada por Dan Tapscott223 há


pouco mais de vinte anos, refere-se à parcela da economia baseada em
tecnologia digital. As operações relacionadas a essa “nova economia”, que
cresceram exponencialmente em um curto espaço de tempo224 e atualmente
respondem por boa parte da produção mundial de riqueza, materializam-se
com o uso maciço de tecnologia da informação e de comunicação e
tendem a facilitar, baratear e potencializar o acesso a bens e serviços. Esse
crescimento exponencial vem impactando diversos segmentos da
economia nos últimos anos, a ponto de transformar radicalmente a vida das
pessoas e das empresas em diversos aspectos.

Essa nova realidade, além de forjar um mundo cada vez mais


interconectado, contribui acentuadamente para uma mudança nos hábitos
de consumo de indivíduos e empresas, que são atraídos pelas facilidades e
pelos baixos custos que novas operações trazem consigo. Do lado dos
indivíduos, o consumo compartilhado e/ou por tempo de uso, em oposição
à aquisição definitiva de produtos, ao lado da crescente utilização de redes
sociais pessoais e profissionais, tem trazido impactos profundos no
comércio, no transporte, nos relacionamentos interpessoais e até mesmo na
educação e nas relações de emprego. Do lado das empresas, a constante
opção por substituir investimentos em bens de capital (Capital
Expenditures ou CapEx) por despesas operacionais (Operational

523
Expenditures ou OpEx) bem como a crescente utilização de processos
automatizados e conectados (via Internet das Coisas) têm contribuído para
a redução de custos e ganhos de eficiência em um ambiente empresarial
globalizado e cada vez mais competitivo.

A título de exemplos, é fácil constatar que necessidades pessoais e


profissionais que antes eram supridas por meio da aquisição definitiva de
mercadorias (CDs de música, hardwares, software com mídias) vêm sendo
substituídas pela utilização efêmera e pagamento pelo uso limitado no
tempo, como é o caso dos serviços de streaming e de computação em
nuvem (infraestrutura e software como serviços). Também o
compartilhamento de bens vem moldando uma nova tendência de
otimização de tempo e recursos das pessoas, em clara mudança de cultura.

Essas novas operações desencadeiam uma série de discussões no


tocante à tributação, sobretudo em função da impossibilidade de os
poderes legislativo e judiciário acompanharem adequadamente a revolução
tecnológica. Vale lembrar que o já quase obsoleto download de software,
até hoje ainda não recebeu uma decisão definitiva do STF quanto ao seu
tratamento jurídico-tributário, sem falar do tormentoso ICMS sobre
serviços de comunicação, carecedor de definição clara desde 1988. Se não
tão novos negócios sofrem com essa insegurança, muito pior é a situação
dos novos negócios da economia digital.

A dificuldade se acentua em função de o sistema tributário nacional


basear-se, primordialmente, nos conceitos utilizados pelo constituinte
originário para definir e dividir a competência tributária em matéria de
impostos, com o intuito de prover recursos para os entes políticos
subnacionais. Nesse contexto, uma grande dificuldade tem sido observada
no tocante ao enquadramento de novos negócios da economia digital nos

524
conceitos de “mercadorias” e “serviços”, núcleos semânticos das
competências de Estados e Municípios para cobrar, respectivamente, o
ICMS e o ISS. Ultimamente, o conflito entre esses entes subnacionais tem
alcançado patamares nunca antes vistos, eis que uns e outros demonstram
total inflexibilidade quanto às suas posições, que nem sempre respeitam as
ordens constitucional e infraconstitucional vigentes.

É diante desse quadro de instabilidade e indefinições que o presente


artigo tem a intenção de tecer breves reflexões sobre os aspectos
tributários dos novos negócios da economia digital, com foco no conflito
de competência verificado entre Estados e Municípios para tributá-los. Por
uma questão de corte, não serão abordados os conflitos relacionados ao
ICMS-Comunicação e o ISS, sobretudo no tocante aos serviços prestados
pelas empresas de telefonia e de TV a cabo, ainda que tais negócios
também se insiram no contexto da economia digital.

2. PRIMEIRA APROXIMAÇÃO DO PROBLEMA: DIFICULDADE DE


ENQUADRAMENTO DOS NEGÓCIOS DA ECONOMIA DIGITAL NO
MODELO ADOTADO PELO SISTEMA CONSTITUCIONAL
TRIBUTÁRIO

A Constituição Federal de 1988 (CF/88) delimita e divide a


competência tributária para que os entes políticos subnacionais (União,
Estados, Distrito Federal e Municípios) instituam impostos de acordo com
as materialidades eleitas. Ao assim fazer, para o que interessa no presente
trabalho, o texto constitucional atribui as operações de circulação de
mercadorias e prestações de serviços de comunicação à competência dos
Estados e do Distrito Federal, a prestação de serviços aos Municípios e ao
Distrito Federal, e as operações não abrangidas por quaisquer das demais
materialidades previstas na CF/88 à União Federal, mediante o exercício
de competência residual. Essa demarcação espelha a opção do constituinte

525
originário de 1988 de promover o federalismo e a autonomia dos
Municípios, de modo a atribuir a cada esfera, dentro de uma pluralidade de
fontes de receitas, recursos suficientes para o desempenho de suas
competências administrativas em sentido lato. Por conta disso, o respeito a
essa demarcação é fundamental para a manutenção do pacto federativo
brasileiro e da própria República Federativa do Brasil, como deixam claro
os artigos 1º, caput, e 60, parágrafo 4º, inciso I, da Constituição Federal.

Entretanto, tendo em vista que a Constituição Federal utiliza termos


sem defini-los, não existe uma interpretação unívoca quanto à extensão das
regras de competência tributária no tocante a impostos, o que faz com que
o sistema tributário brasileiro sofra com certa instabilidade, sobretudo em
função do alto grau de judicialização das discussões. Em que pese essa
instabilidade, alguns conceitos doutrinários tiveram tamanha aceitação que
chegaram a ser absorvidos e aplicados pelos tribunais, de forma
incontroversa, ao longo de muitos anos, como ocorreu com os termos
nucleares das materialidades do ICMS e do ISS (respectivamente,
“mercadorias” e “serviços”).

Com efeito, sedimentou-se na doutrina clássica a ideia de que o signo


“mercadoria” deveria ser entendido como o bem móvel sujeito à
mercancia, ou seja, que está inserido no processo econômico mercantil225.
Nesse sentido, Roque Antonio Carrazza226 entende que “não é qualquer
bem móvel que é mercadoria, mas só aquele que se submete à mercancia.
Podemos, pois, dizer que toda mercadoria é bem móvel, mas nem todo
bem móvel é mercadoria. Só o bem móvel que se destina à prática de
operações mercantis é que assume a qualidade de mercadoria”. Em
semelhante sentido, nos idos de 1981 o Congresso de Direito Tributário

526
realizado em São Paulo, ao estremar as incidências entre ISS e ICMS,
concluiu o seguinte:

a) a prestação de serviços consiste numa obrigação tendo por objeto um fazer, a


obrigação mercantil consubstancia um dar;
b) o fato de a prestação de serviços requerer emprego de materiais, e/ou
equipamentos, não descaracteriza a obrigação de fazer; esta obrigação é unidade
incindível, não decomponível em serviço (puro) e materiais ou aparelhos;
c) as obrigações de fazer cujo conteúdo é a prestação de serviços, portanto, são
227
tributáveis exclusivamente pelo ISS, e não podem ser pelo ICM .

Em semelhante sentido, pontua Misabel Derzi nas notas às clássicas


lições de Aliomar Baleeiro228:

(...) tanto o IPI, como o ICMS são tributos da mesma família (fatos como
obrigação de dar), que não se confundem com prestações de serviços (exceto, é
claro, os serviços de transporte e de comunicação), como obrigação de fazer.
(...)
O fato gerador do IPI, é verdade, pressupõe um fazer anterior, mas prevalece a
obrigação de dar, pois o “ato de indústria” afasta toda espécie de produção pessoal
ou individualizada, artesanal, intelectual, artística ou científica.
(...)
Portanto, no fazer industrial para a venda, cria-se um produto-tipo, repetível,
representativo de uma série; por isso mesmo, sobrepõe-se-lhe o dar, o dar algo
padronizado e massificado. As necessidades atendidas são de massa, não as
específicas e individuais. No prestar serviços, que caracteriza o conceito nuclear do
fato gerador do ISS, o fazer é central, de tal modo que, mesmo corporificado em
materiais, o serviço executado ajusta-se às necessidades peculiares do usuário, daí a
sua personificação.
Parece-nos certo, portanto, que a incidência do ISS exclui a do ICMS, assim
como a do IPI. Onde houver obrigação de fazer, pode caber, como ensinou Geraldo
Ataliba, o imposto municipal sobre serviços, ISS, mas não IPI ou ICMS. Ao
contrário, onde houver obrigação de dar, pode caber a incidência do IPI e do ICMS,
mas não a do ISS. (Grifos originais.)

Como visto, também com relação ao ISS a doutrina clássica firmou um


entendimento bastante fechado, ao identificar uma correspondência entre
“prestação de serviços” e as chamadas “obrigações de fazer”. Nessa linha,
Geraldo Ataliba229 afirmava que “o ISS é imposto sobre a prestação de
serviços. Recai sobre a atividade de prestar serviços”, ao passo que, para

527
José Eduardo Soares de Melo230, “o cerne da materialidade da hipótese de
incidência do imposto em comento não se circunscreve a ‘serviço’, mas a
uma ‘prestação de serviço’, compreendendo um negócio (jurídico)
pertinente a uma obrigação de fazer, de conformidade com os postulados e
diretrizes do direito privado”.

Decerto, essa postura doutrinária identifica a materialidade do ISS


como uma atividade ou conduta humana desenvolvida em favor de um
terceiro, que com ela obtém uma utilidade, o que deriva para a
identificação da materialidade do ISS com as chamadas “obrigações de
fazer”. Nesse sentido, Marçal Justen Filho231 aponta que a prestação de
serviço tributável pelo ISS é aquela decorrente do esforço humano pessoal,
que configura “obrigação de fazer”, já que as “obrigações de dar” não
conduzem a um serviço prestado. Também Aires Fernandino Barreto232
segue a mesma linha, ao professar que o critério material possível do ISS
“é a conduta humana (prestação de serviço) consistente em desenvolver
um esforço visando a adimplir uma obrigação de fazer”.

Essas visões, embora predominantes, não contam com unanimidade por


parte da doutrina, havendo vozes que aceitam uma maior abertura
semântica das regras de competência tributária, de modo a abarcar novas
realidades. Nesse sentido, é a lição de Marco Aurélio Greco233:

Desta ótica, o software, em princípio, pode ser abrangido pelo conceito de


“mercadoria” utilizado pela Constituição Federal. Afirmo “em princípio”, pois a sua
configuração como “mercadoria” não é puramente ontológica (no sentido de
qualidade do objeto) mas supõe a natureza de uma atividade realizada por alguém
(“o comerciante”) que o tenha por objeto. Assim, o software poderá ser objeto de
puras prestações de serviço (por exemplo, o serviço de elaboração de programa por
encomenda) como poderá ser uma “mercadoria” se for objeto de uma atividade
comercial exercida mediante negociações no mercado que o tenham por objeto.

528
Embora trate do software antes da Lei Complementar n. 116/2003, a
posição de Marco Aurélio Greco é clara quanto à possibilidade de
enquadrar intangíveis no conceito de “mercadoria” para fins de incidência
de ICMS.

Com relação ao ISS, Bernardo Ribeiro de Moraes234, analisando o


imposto ainda no regime constitucional anterior, sustentava que a
competência tributária para a instituição do imposto municipal deveria ser
mais aberta, pois recaía não sobre a prestação de serviços, mas sobre os
serviços235, conceito mais amplo do que o de prestação de serviços e que
abrange todas as atividades de venda de bens imateriais, o que abre
margem para que o imposto incida sobre “bens imateriais que circulam”,
tais como locação de bens móveis. E prossegue o referido autor236:

A noção de serviço (objeto do ISS) não pode ser confundida com a de simples
“prestação de serviços” (contrato de direito civil, que corresponde ao fornecimento
de trabalho). O conceito de serviço nos vem da economia, do trabalho como
produto. De fato, o trabalho, aplicado à produção, pode dar como resultado duas
classes de bens: bens materiais, denominados material, produto ou mercadoria; e
bens imateriais, conhecidos como serviços. Serviço, assim, é expressão que abrange
qualquer bem imaterial, tanto atividades consideradas de “prestação de serviços”
(v.g.: atividade do médico, do advogado, do engenheiro, do corretor etc.) como as
demais vendas de bens imateriais (v.g.: atividade do locador de bens móveis, do
transportador, do albergueiro, do vendedor de bilhete da Loteria Federal etc.). (...)
Quem aluga um automóvel, na realidade não está fornecendo trabalho mas estará
fornecendo, a terceiros, um bem imaterial, ou melhor, um serviço (cessão de uso e
gozo da coisa). (...)
Assim, o ISS recai sobre serviços de qualquer natureza, entendendo-se como tal
a circulação (venda) de bens imateriais.

A posição de Bernardo Ribeiro de Moraes, claramente, aponta para a


incidência de ISS sobre serviços como bens imateriais, o que a torna
importante para as discussões atuais. Essa visão conta com suporte de
doutrina mais recente, como é o entendimento de Alberto Macedo237.

529
Em suma, as posições da doutrina mais clássica, que chegaram a ser
encampadas pelo Supremo Tribunal Federal de forma assistemática e em
distintos momentos238, convergem no sentido de que a incidência do ICMS
somente poderia afetar, à margem de serviços de comunicação e de
transporte interestadual e intermunicipal, operações de circulação de bens
corpóreos produzidos em massa e destinados à mercancia. Já o ISS estaria
restrito às chamadas “obrigações de fazer”, estremando-se do ICMS-
Mercadorias, justamente, porque esse decorre da circulação de bens
corpóreos no contexto de contratos que albergam “obrigações de dar”.

Desse modo, o cerne do problema, no tocante ao conflito entre ICMS e


ISS na economia digital, é justamente a transição entre um modelo de
consumo em massa de produtos, enquanto bens corpóreos objeto de
comércio, e de prestação de serviços considerados mais tradicionais ou
“humanizados”, para o consumo cada vez maior dos chamados bens
digitais239 e de serviços que utilizam máquinas e a rede de
telecomunicações como principais insumos, muitas vezes sem qualquer ou
com mínima intervenção humana. Dessa transição emerge a dificuldade
em enquadrar essas operações em mercadorias ou serviços, para fins de
incidência de ICMS ou ISS, ou ainda a necessidade de se reconhecer que
existe um verdadeiro vácuo legislativo para taxá-las. Embora não seja um
problema exclusivo do Brasil240, esse tem sido o ponto central de discussão
atualmente, o que tem levado, de um lado, autoridades estaduais e
municipais a travarem uma batalha em busca de arrecadação e, de outro, à
insegurança dos contribuintes quanto ao correto tributo a ser recolhido (se
é que algo deve ser recolhido), o que em nada ajuda no desenvolvimento
do país.

530
De fato, o exercício da competência tributária não pode permanecer
congelado pelas concepções existentes em 1988, pois, do contrário, ter-se-
ia um sistema tributário nacional disfuncional para o futuro. Nesse
espectro, deve ser admitida a absorção, pelas regras conformadoras da
competência tributária (desde que com ela – competência – compatíveis),
das mudanças sociais percebidas desde então e, principalmente, as que
surgirão no futuro, de modo que as mais variadas percepções de riqueza
sejam atingidas pela tributação e situações que claramente manifestam
capacidade contributiva sejam alcançadas pelo fisco. Essa evolução,
contudo, não pode permitir que a legalidade seja atropelada ou mesmo que
se aplique a capacidade contributiva de modo ativo sem qualquer reserva
legal, como se existisse no país um “estado permanente de sujeição
tributária”, na feliz expressão cunhada por Heleno Taveira Tôrres241. Pelo
contrário, a atualização semântica das regras de competência (tanto
positiva quanto negativa – imunidades) deve ser reconhecida (e aplicada
pelo legislador intermediário) sempre que o enquadramento de novas
realidades no texto constitucional seja fruto da mera evolução conceitual
sem que haja ruptura total com os termos242 empregados pelo texto
constitucional, como é o caso do livro eletrônico em relação à imunidade
dos livros. Não exatamente a realidade enquanto soma de fatos sociais,
mas como conformadora do âmbito normativo, que já compõe o plano
jurídico (processo de concretização normativa) e é formado pela parcela da
realidade a que se refere, de formas seletiva e valorativa, o programa
normativo (que, por sua vez, é construído do ponto de vista interpretativo
mediante a assimilação de dados linguísticos, dentre os quais o texto da
lei)243. Já situações que ensejariam interpretações extensivas das regras de
competência, como é o caso de estender a imunidade do papel e da tinta
destinada à impressão de livros a dispositivos de leitura de livros
eletrônicos, devem ser rechaçadas, seja para não onerar, seja para alargar

531
indevidamente competências tributárias. É uma linha tênue e com
considerável carga de subjetivismo que separa uma situação da outra, mas
nem por isso se deve permitir a abertura semântica irrestrita dos conceitos,
sob pena de se subverter completamente a divisão de competências
tributárias imposta pelo constituinte originário (afinal, ao repartir algo, o
constituinte se voltou ao estado de coisas corrente à época, sem qualquer
juízo de prognóstico).

Desse modo, deve haver aderência aos conceitos acolhidos pelo


constituinte em 1988, sem prejuízo da absorção de novas operações
naquilo em que sejam compatíveis com esses conceitos, de acordo com o
que definido pelo Supremo Tribunal Federal.

Merece atenção a análise, portanto, da forma como as novas realidades


vêm sendo absorvidas pelos órgãos produtores de direito, tanto pelos entes
tributantes quanto pelo Supremo Tribunal Federal, que dá a palavra final
com relação à interpretação das regras de competência tributária. Essa
avaliação será objeto dos dois próximos tópicos.

3. A INSTAURAÇÃO DO CONFLITO DE COMPETÊNCIAS

Já foi dito e reiterado neste texto que a legislação e a jurisprudência não


são capazes de acompanhar eficientemente a evolução tecnológica.
Entretanto, nos últimos anos, pôde ser percebido um movimento para, de
uma forma ou de outra, alcançar essas operações por meio da tributação,
sobretudo pela crescente importância da economia digital no contexto
econômico brasileiro.

Com efeito, as operações da economia digital que atingem


consumidores em massa apenas recentemente contaram com legislação
específica244. Até mesmo pela novidade, no início se aplicava a legislação

532
tributária geral no enquadramento dos primeiros fenômenos ligados à
tecnologia, como foi o caso do reconhecimento, por parte do Supremo
Tribunal Federal245, de que o chamado “software de prateleira”, produzido
em série e comercializado em mídias físicas, correspondia a mercadoria
para fins de incidência de ICMS. Da mesma forma, outros conteúdos
distribuídos em meios físicos foram considerados “mercadorias” pelo STF,
como foi o caso de fitas de videocassete246 e conteúdos distribuídos via
CD-Roms247.

Fugindo à regra do que vigia à época e considerada pioneira no assunto,


a Lei n. 7.098/98, do Estado do Mato Grosso, passou a prever a incidência
do ICMS sobre as operações com programas de computador – software –,
ainda que realizadas por transferência eletrônica de dados (art. 2º, § 1º),
quando essas operações ainda começavam a ser praticadas. Trata-se de
uma primeira manifestação, por parte da legislação tributária, no intuito de
fazer incidir o ICMS na circulação dos chamados “bens digitais”. Ante a
impropriedade de fazer incidir o ICMS sobre bens não corpóreos diante
dos padrões da época (e da forma como foi feito), essa lei foi alvo de ação
direta de inconstitucionalidade impetrada em 21 de janeiro de 1999, que
todavia aguarda julgamento.

Ocorre que, em 2003, foi publicada a Lei Complementar n. 116 (LC n.


116/2003), atual lei geral do ISS cuja lista de serviços tributáveis trouxe
uma série de inovações no tocante aos serviços ligados à tecnologia,
mormente com relação à criação de um item específico para os serviços de
informática e congêneres (item 1). Esse item, em sua versão original,
contava com a designação de novos serviços tributáveis pelo ISS, tais
como processamento de dados e congêneres (item 1.03), elaboração de
programas de computador, inclusive de jogos eletrônicos (item 1.04) e

533
licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação
(item 1.05).

O conflito de competência, contudo, foi instaurado/acentuado com a


publicação da LC n. 116/2003, embora um dos papéis das leis
complementares em matéria tributária seja o de, justamente, dirimi-los.
Isso ocorreu, principalmente, em função da posição já sedimentada do STF
quanto à sujeição do chamado “software de prateleira” ao ICMS, o que
instigou os Estados a não respeitar os ditames da então nova lei do ISS.

Isso porque, não obstante a vigência de uma legislação nacional


determinando a incidência do ISS sobre o licenciamento de software, os
Estados não se curvaram à nova lei. Tomando como exemplo o Estado de
São Paulo, até 31 de dezembro de 2015 vigeu no Estado o já revogado
Decreto n. 51.619/2007, que determinava que, na operação realizada com
softwares, personalizados ou não, o ICMS deveria ser calculado sobre uma
base correspondente ao dobro do valor de mercado do seu suporte
informático (mídia), o que afastava a incidência do ICMS sobre o
programa em si. Embora, aparentemente, tivesse a finalidade de
salvaguardar o programa de computador da incidência do imposto estadual
e apenas atingir o suporte físico (esse sim, uma legítima “mercadoria”), o
Decreto revogado já apresentava vícios, uma vez que (a) as operações com
softwares (personalizados ou não) estiveram sujeitas ao ISS e não ao
ICMS durante toda a sua vigência, conforme itens 1.04 e 1.05 da lista
anexa à Lei Complementar n. 116/2003; e (b) o fornecimento de
mercadorias (no caso, as mídias) com prestação de serviços somente pode
ser tributado pelo ICMS caso haja expressa menção, na legislação do ISS,
para que ocorra essa incidência, conforme artigo 2º, inciso V, da Lei
Complementar n. 87/96, o que não é o caso dos itens 1.04 e 1.05 da lista

534
anexa à LC n. 116/2003. A bem da verdade, o referido Decreto fora
instituído no intuito de “resguardar a competitividade da economia paulista
diante de políticas tributárias implementadas por Estados vizinhos”, bem
como obter a “ampliação de investimentos e à oferta de empregos (...)”
(conforme Ofício GS 88-2007), não respeitando a competência tributária
dos municípios como seria de se supor.

Vale anotar que, embora o aludido Decreto apenas alcançasse os


suportes físicos, a Secretaria da Fazenda de São Paulo (Sefaz/SP) sempre
adotou o entendimento de que as operações com software adquirido via
download estão inseridas no campo de incidência do ICMS, ficando à
margem da incidência do imposto estadual apenas pela inexistência de
suporte informático (cujo valor é exigido para compor a base de cálculo)
(Resposta às Consultas Tributárias ns. 234/2011 e 494/2011).

Contudo, em 30 de setembro de 2015, foi publicado o Decreto do


Estado de São Paulo n. 61.522, que revogou o Decreto n. 51.619/2007 e
introduziu cálculo específico da base de tributação do ICMS em operações
com programas de computador. O novo Decreto, ao revogar o regime
anterior, abriu flanco para que o Estado de São Paulo passasse a tributar
não apenas os suportes físicos, mas também os programas de computador,
tanto aqueles distribuídos por meio de mídia física quanto os adquiridos
via download.

Já em 29 de dezembro de 2015, houve nova reviravolta no tema, com a


publicação do Convênio ICMS n. 181/2015, que trata da incidência do
ICMS nas operações com software, programas de computador, aplicativos,
arquivos eletrônicos e congêneres. O referido Convênio foi assinado por
Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão, Mato
Grosso do Sul, Paraná, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio

535
Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e
Tocantins, que em tese ficaram “autorizados” a conceder redução de base
de cálculo nas citadas operações248, de forma que a carga tributária
corresponda ao percentual de, no mínimo, 5% (cinco por cento) do valor
da operação.

Na prática, a instituição do Convênio abriu margem para que também


os demais Estados signatários (além de São Paulo) cobrassem o ICMS
sobre o valor total das operações com software, programas de computador,
aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres, diferentemente do que
vinha ocorrendo na maior parte deles, que apenas exigiam o ICMS sobre o
valor das mídias e não dos programas em si, conforme o regramento
paulista anterior. Além disso, o Convênio permite que a incidência ocorra
ainda que os programas sejam ou possam ser adaptados e disponibilizados
por qualquer meio, inclusive nas operações efetuadas por meio da
transferência eletrônica de dados (download ou streaming).

Por sua vez, em 12 de janeiro de 2016, foi publicado o Decreto Estadual


de São Paulo n. 61.791, que regulamenta internamente o Convênio ICMS
n. 181/2015 e determina que a base de cálculo do ICMS nas citadas
operações, realizadas por qualquer meio, inclusive via download ou
streaming, ficou reduzida, de forma que a carga tributária corresponda ao
percentual de 5% (cinco por cento) do valor da operação. O Decreto
também estabelece que, até que ficasse definido o local de ocorrência do
fato gerador (para fins de determinação do estabelecimento responsável
pelo pagamento do imposto), o ICMS não seria cobrado nas operações
realizadas por meio de transferência eletrônica de dados (download ou
streaming).

536
O alargamento do campo de incidência do ICMS, portanto, foi brutal,
tendo a Consultoria Tributária da Secretaria da Fazenda de São Paulo249
chegado ao extremo de declarar que as operações envolvendo Software
como Serviço (Software as a Service ou SaaS250) também se sujeitam ao
imposto estadual, na medida em que acarretam operações envolvendo
software, que em seu entendimento são mercadorias. Em contrapartida, a
Prefeitura Municipal de São Paulo, que já havia se manifestado em
resposta a consulta251 alguns anos antes, formalizou uma resposta às
intenções estaduais de tributar operações de software na nuvem, conforme
o Parecer Normativo n. 1/2017.

Por outro lado, sem prejuízo da plena vigência do item 1.05 da lista
anexa à Lei Complementar n. 116/2003, após a publicação do Convênio n.
181/2015 foi publicada a Lei Complementar n. 157/2016, que alterou a
lista nacional de serviços tributáveis pelo ISS, mormente no tocante a
operações relacionadas à economia digital. Tais itens colidem frontalmente
com as disposições do Convênio ICMS n. 181/2015, ao determinar a
prevalência do ISS nas operações de “processamento, armazenamento ou
hospedagem de dados, textos, imagens, vídeos, páginas eletrônicas,
aplicativos e sistemas de informação, entre outros formatos, e congêneres”
(nova redação dada ao item 1.03) e “disponibilização, sem cessão
definitiva, de conteúdo de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da
internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos (exceto a
distribuição de conteúdo pelas prestadoras de Serviço de Acesso
Condicionado, de que trata a Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011,
sujeita ao ICMS) (novo item 1.09, incluído pela Lei n. 157/2016).

Não obstante a publicação da Lei Complementar n. 157 em dezembro


de 2016, em outubro de 2017 foi publicado o Convênio ICMS n.

537
106/2017, que traz as regras gerais para a cobrança do imposto nas
operações com software, programas, jogos eletrônicos, aplicativos,
arquivos eletrônicos e congêneres, que sejam padronizados, ainda que
tenham sido ou possam ser adaptados, comercializadas por meio de
transferência eletrônica de dados. Não se trata de uma completa inovação,
uma vez que o Convênio ICMS n. 181/2015 já apontava essas operações
como suscetíveis à incidência do imposto estadual. Contudo, ao confirmar
tais incidências, o Convênio revela uma enorme afronta do Confaz ao
Congresso Nacional, ante a insistência dos Estados de tributar operações
que já foram definidas, pelo parlamento brasileiro, como não sujeitas ao
ICMS. Além disso, ao definir contribuintes, momento de incidência e
outras regras gerais para a cobrança, o Convênio abre caminho para que
Estados que vinham suspendendo cobrança, tal como São Paulo, passem a
exigir o imposto.

Como visto, a guerra entre Estados e Municípios está declarada e, muito


provavelmente, os contribuintes poderão sofrer com autuações de ambos
os lados. Contudo, embora pareça frontalmente contrária à legislação, deve
ser destacado que a posição dos Estados encontra certo respaldo (ainda que
indefinido) no Poder Judiciário, como será visto no tópico a seguir.

4. ALGUMAS REAÇÕES DO JUDICIÁRIO

Conforme já comentado linhas atrás, a doutrina majoritária adotou o


entendimento de que mercadorias, para fins de ICMS, deveriam ser
consideradas bens corpóreos produzidos para consumo em massa e
destinados à mercancia, ao passo que os serviços deveriam corresponder às
operações cujo núcleo é uma obrigação de fazer. O STF acolheu esses
entendimentos, embora o tenha feito, com relação ao ISS, apenas após a
promulgação da Constituição de 1988, eis que, antes dela, reconhecia que

538
a locação de bens móveis poderia ser considerada “serviço” para fins de
incidência do imposto municipal252.

Entretanto, o STF já acenou com alguma flexibilização de sua


consolidada posição no tocante à tributação de serviços em sentido lato, de
modo a se aproximar de sua posição anterior. Tal ocorreu no julgamento
do leasing financeiro253, em que o tribunal, ao entender que a operação se
sujeita ao ISS, declarou que financiamento é serviço e que é irrelevante
haver uma compra para a descaracterização do serviço, porquanto toda e
qualquer prestação de serviços, em intensidades distintas, envolve a
utilização de algum bem. Essa posição não é isolada, eis que o abandono
da dicotomia “obrigações de dar” × “obrigações de fazer” se fez presente
também em caso envolvendo cessão de direito de uso de marca, típica
“obrigação de dar”, que o STF decidiu ser passível de ser tributada pelo
ISS254. Nesse caso, o voto do Ministro Gilmar Mendes (Relator) foi
categórico: “a cessão de direito de uso de marca não pode ser considerada
locação de bem móvel, mas serviço autônomo especificamente previsto na
Lei Complementar n. 116/2003”.

Uma posição mais aberta também foi percebida no recente julgamento


do Recurso Extraordinário 651.703, em cujo voto o Ministro Relator
aponta que o conceito constitucional de serviços deve ser desvinculado do
conceito de “obrigação de fazer” e que cabe à lei complementar defini-
lo255. Embora passível de críticas sob o ponto de vista metodológico e
tenha como pano de fundo questão já há muito pacificada (base de cálculo
do ISS nas atividades realizadas pelas operadoras de planos privados de
assistência à saúde – plano de saúde e seguro-saúde), fato é que essa
decisão manifesta certa tendência no STF de não mais identificar os
serviços tributáveis pelo ISS com as chamadas “obrigações de fazer”, o

539
que pode fazer com que novas operações sejam abarcadas pelo imposto
municipal apenas pelo fato de serem incluídas na lista de serviços
passíveis de tributação.

Por outro lado, o mesmo STF também já acenou com a possibilidade de


incidência de ICMS na circulação de bens não corpóreos (download de
software)256, ao ter identificado uma evolução no conceito de “mercadoria”
suficiente para abranger também a circulação eletrônica de bens digitais de
consumo em massa. Embora tenha se tratado de decisão de medida
cautelar e ainda esteja pendente o julgamento da constitucionalidade da
incidência do ICMS sobre o download de software (mérito da ADI), em
três dos votos contrários à concessão da medida liminar (Gilmar Mendes,
Eros Grau e Carlos Britto) houve a expressa menção à mutação da
realidade condicionando a nova interpretação do texto constitucional, tanto
com relação ao conceito de “mercadoria” quanto ao de “circulação”257.

Contudo esses entendimentos casuísticos do poder judiciário, sem uma


reflexão macro sobre o sistema tributário nacional como um todo,
embaralham a discussão, na medida em que o alargamento das
competências tributárias de Estados e Municípios, no altiplano da
interpretação/concretização das regras constitucionais de competência, tem
a tendência de agravar o conflito já instaurado entre ICMS e ISS no plano
de aplicação da lei a casos concretos, com a lavratura de vultosos autos de
infração. O raciocínio é simples: quanto mais os conceitos constitucionais
são alargados, maior é a zona cinzenta que, no plano pragmático,
fundamenta autuações conflitantes dos entes tributantes, quedando-se os
contribuintes nesse injusto fogo cruzado. Essa posição do STF quanto ao
download de software, aliás, acentuou ainda mais o conflito de
competências quanto às operações com programas de computador, eis que

540
os Estados têm insistido em afirmar a sujeição ao ICMS de tais operações
mesmo quando não há qualquer mídia envolvida, como restou consolidado
pelo Convênio ICMS n. 181/2015, não obstante a plena vigência do item
1.05 da lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003, que prevê a
incidência do ISS sobre o licenciamento ou cessão de direito de uso de
programas de computação258, há mais de treze anos, e novos itens incluídos
pela Lei Complementar n. 157/2016.

De todo modo, ainda não é possível garantir um posicionamento


definitivo da mais alta corte brasileira sobre a incidência do ICMS na
“circulação” de bens não corpóreos, considerando que a decisão sobre o
download de software foi proferida em sede liminar e não levou em conta
a publicação da Lei Complementar n. 116/2003, ocorrida após a
impetração da ação direta de inconstitucionalidade (que ainda aguarda
julgamento). Tampouco a definição dos serviços tributáveis pelos
municípios parece ter sido suficientemente pacificada, eis que a Súmula 31
do STF, que enuncia ser inconstitucional a incidência do ISS sobre
operações de locação de bens móveis com base, justamente, na tese
segundo a qual o imposto municipal somente pode incidir sobre operações
que se amoldem ao conceito de “obrigações de fazer”, segue vigente
mesmo diante dos posicionamentos posteriores que adotam linha diversa.

Diante do imbróglio, o que vem à mente como solução para esse tipo de
problema é o desenvolvimento de uma ampla reforma tributária apta a
redefinir alguns pontos e simplificar o sistema. Porém, ante o grande
esforço político necessário para que uma verdadeira reforma seja
aprovada, bem como a necessidade de se mexer em pontos delicados como
autonomia financeira de Estados e Municípios, nenhum deles propenso a
correr o risco de perder receitas (e poder), uma reforma que redefina

541
competências e traga maior segurança jurídica aos contribuintes, nos
próximos anos, não parece ser tarefa das mais simples de ser cumprida.

Por outro lado, o sistema tributário em vigor comporta soluções


imediatas para diversas questões envolvendo as operações inerentes à
chamada economia digital. É o que será visto no próximo e conclusivo
tópico.

5. PROPOSTA CONCLUSIVA

A proposta conclusiva deste texto parte da premissa de que a


Constituição Federal, ao delimitar e dividir a competência tributária para
que os entes políticos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios)
instituíssem impostos de acordo com as materialidades eleitas, fê-lo com
base no contexto normativo-social de 1988. Ao assim fazer, os núcleos
centrais dos conceitos de “operação de circulação de mercadorias” e de
“prestação de serviços”, adotados pelo constituinte originário, são aqueles
vigentes à época, pois não parece razoável que o constituinte pudesse fazer
uma divisão de algo incerto ou em aberto, já que a divisão federativa e a
autonomia municipal não são compatíveis com esse tipo de indefinição.
Reforça essa constatação o fato de a CF/88 ter relegado à União Federal a
competência para tributar as operações não abrangidas pelos demais
impostos, bem como para que o Congresso Nacional pudesse criar normas
para dirimir conflitos de competência. Essas são as cláusulas, por
excelência, para abranger as operações futuras que não se amoldam a
nenhum ou adotam traços de mais de um dos conceitos adotados pela
CF/88, de modo a acomodar, inclusive, novas operações inexistentes à
época. Essa constatação também parece ser a única capaz de atribuir à
CF/88 uma funcionalidade permanente em seu capítulo voltado ao sistema
tributário nacional, pois, do contrário, necessariamente o sistema quedaria

542
impraticável para o futuro, o que poderia levar a uma disrupção da própria
atividade tributária.

Com efeito, o conceito consolidado de “mercadoria”, vigente à época da


promulgação da CF/88, correspondia a bens corpóreos produzidos em série
e objeto de mercancia, na linha da majoritária doutrina sobre o tema. Tanto
é assim que a legislação vigente à época (art. 1º, do Decreto-lei n. 406/68),
assim como a atual (Lei Complementar n. 87/96), condicionava a
incidência do então ICM à “saída” das mercadorias do “estabelecimento”,
situação incompatível, obviamente, com bens incorpóreos. O próprio
Supremo Tribunal Federal confirmou esse entendimento, ao apontar, no
julgamento do Recurso Extraordinário 176.626259, que “o conceito de
mercadoria efetivamente não inclui os bens incorpóreos, como os direitos
em geral: mercadoria é bem corpóreo objeto de atos de comércio ou
destinado a sê-lo” (excerto do voto do relator do recurso, Ministro
Sepúlveda Pertence). Essa posição, adotada quando do julgamento das
operações envolvendo software em suportes físicos, foi confirmada na
decisão do Recurso Extraordinário 199.464260. Esse é o núcleo básico para
a incidência do ICMS-Mercadorias.

Ainda que a energia elétrica pudesse, em princípio, estar fora desse


conceito de “mercadoria” ligado à corporalidade, fato é que a incidência
do imposto estadual sobre a energia apenas foi admitida com a CF/88, e o
texto do art. 155, expressamente, a ela se refere em duas passagens. Desse
modo, ainda que a energia elétrica não se enquadre na acepção de “bem
corpóreo”, o simples fato de o texto constitucional atribuir a competência
tributária aos Estados para instituir o ICMS sobre operações que envolvam
energia elétrica já torna essa incidência um pressuposto no exercício da
competência tributária, ante a expressa menção constitucional. No mínimo,

543
há uma ficção constitucional de que energia elétrica é mercadoria, pela
expressa equiparação de ambos.

Por outro lado, a CF/88 atribui aos municípios e ao Distrito Federal a


competência para instituir imposto sobre “serviços de qualquer natureza,
não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar” (art.
156, III). O texto constitucional chama a atenção ao atribuir uma
competência que, aparentemente, excepciona as operações tributáveis via
ICMS, desde que essa competência seja exercida via lei complementar.
Embora a literalidade do texto possa levar à conclusão de que somente os
serviços de comunicação e transporte, presentes na competência do ICMS,
sejam referidos pelo artigo 156, uma leitura mais funcional pende para o
entendimento de que a menção é a toda a competência do ICMS, inclusive
à circulação de mercadorias e não apenas aos serviços mencionados no
artigo 155, já que o artigo 156 aponta “serviços de qualquer natureza”
“definidos em lei complementar”, o que confere uma grande margem para
a incidência do ISS. Desse modo, é possível afirmar que a incidência do
ISS, de certa forma, é residual à do ICMS, embora apenas possa ser
exercida se (i) a operação a ser tributada esteja prevista em uma lista de
caráter nacional, em função das necessárias segurança jurídica e
isonomia261 e (ii) não abarcar materialidades previstas para outros impostos
discriminados na CF/88.

Contudo essa relação de residualidade não é muito clara, tanto em


função das mudanças de posicionamento do STF com relação à
materialidade do ISS quanto em função da competência residual da União
Federal em matéria de impostos. Com relação ao primeiro ponto, tal ocorre
porque o STF, após admitir a incidência do imposto municipal sobre a
locação de bens móveis, firmou uma posição consolidada segundo a qual

544
apenas as “obrigações de fazer” seriam passíveis de tributação pelo ISS,
ainda que essa decisão tenha sido proferida por margem bastante apertada
(6 votos favoráveis × 5 votos contrários) e tenha inovado a posição do STF
quanto à matéria262. Desse modo, embora não houvesse a noção corrente,
quando do advento da CF/88, de que as obrigações de dar não poderiam
ser abrangidas pelo ISS, fato é que a posição do STF se consolidou nesse
sentido, tendo culminado na edição da Súmula Vinculante 31, embora essa
posição venha sendo posta à prova em julgados mais recentes. Por outro
lado, o aparente caráter residual da competência para a instituição do ISS
colide com a competência residual da União Federal, uma vez que,
logicamente, não é possível haver resíduo do resíduo. Logo, emerge uma
grande incerteza também com relação à materialidade do ISS, ante a
oscilação da jurisprudência do STF no tempo.

Por tudo isso, é possível concluir que o principal critério a estremar as


incidências do ISS e do ICMS é que a operação tenha por objeto o
fornecimento de mercadorias, entendidas essas como bens corpóreos
produzidos em massa e objeto de mercancia, tal como era a concepção
corrente em 1988. Tais operações, se isoladamente consideradas (ou seja,
o fornecimento de mercadoria é o único objeto do negócio jurídico), sem
sombra de dúvida, sujeitam-se apenas ao ICMS. A partir daí, qualquer
utilidade imaterial que seja agregada ao negócio, ou mesmo guarde traços
semelhantes aos do ICMS, pode desencadear distintas consequências
tributárias.

Nesse contexto, assume especial relevância a lei complementar,


instrumento capaz de absorver as evoluções da realidade social que não
existiam em 1988 e no contexto normativo-social da época. Isso porque a
lei complementar tributária é o instrumento por excelência para, diante de

545
situações que possam ser objeto da incidência de mais de um imposto,
dirimir eventual conflito de competências entre os entes subnacionais,
sobretudo pela falta de definições claras na Constituição Federal quanto à
incidência de cada imposto. Além disso, a lei complementar é o
instrumento apto a incorporar novas realidades no âmbito do imposto
sobre serviços, de modo a incluir novas atividades na lista de serviços
tributáveis pelos municípios, bem como alcançar situações que não se
amoldam à incidência das materialidades de impostos presentes na CF/88,
por meio do exercício da competência residual da União Federal.

A partir dessa constatação, se o Congresso aponta que uma determinada


operação está sujeita ao ISS (e, portanto, é “serviço” tributável pelos
Municípios, ainda que na modalidade de “congênere”), o imposto
municipal deve prevalecer mesmo que a operação não se amolde perfeita
ou puramente a uma “obrigação de fazer” e acarrete o fornecimento de
mercadorias (bens corpóreos). Nesses casos, a lei complementar
trabalharia no campo do conflito de competências. Por outro lado, caso
não conte com item na lista de serviços e envolva o fornecimento de
mercadorias, a tributação seria integralmente de competência dos
Estados263. Caso haja tanto fornecimento de utilidades não corpóreas
quanto de mercadorias, tudo se submeteria ao ISS (se previsto na lista),
desde que não houvesse ressalva quanto à incidência do ICMS sobre o
tangível, ou a ambos os impostos, se presente a ressalva264. Repito: ainda
que a operação não pudesse se amoldar, exatamente, ao conceito de
“prestação de serviços”, o fato de o mesmo instrumento normativo (lei
complementar) ser apto tanto para dirimir conflitos de competência quanto
para criar impostos residuais da União poderia determinar a prevalência do
ISS. De três, uma: (1) ou bem se trata de prestação de serviços que já seria
tributável pelo ISS, ou (2) a lei complementar agiu para (2.1) dirimir um

546
conflito de competências entre Estados e Municípios ou (2.2) preencher
uma lacuna de tributação – exercício da competência residual, ainda que
transferindo essa competência da União Federal para os Municípios. O
único senão, nesse raciocínio, seria o fato de o exercício da competência
residual dever se curvar à não cumulatividade. Contudo, a hipótese
sugerida não trata da criação de imposto residual, mas de assentamento de
conflitos de competência entre Estados e Municípios, razão pela qual a
inobservância desse limite (em prevalecendo o ISS) deve ser relativizada.

Por outro lado, caso a operação não seja contemplada na lista de


serviços tributáveis pelo ISS, nem mesmo como um “congênere”, e não
envolva o fornecimento de mercadorias em caráter definitivo, não haveria
que se falar em incidência de imposto sobre a operação, a não ser que
fosse exercida a competência residual da União Federal.

Não que seja vedado à lei complementar, com isso, decidir pela
incidência do ICMS mesmo em operações em que o fornecimento de
mercadoria não seja preponderante. Basta lembrar que os alimentos
servidos em restaurantes, hodiernamente, estão submetidos ao imposto
estadual e não ao ISS, em virtude de expressa previsão em lei
complementar265 devidamente chancelada pelo STF266, não obstante a
claríssima preponderância dos serviços oferecidos pelos restaurantes. Já
com relação às operações que tenham como objeto a comercialização de
bens digitais em massa, não há como negar que eles guardam muita
proximidade com seus predecessores corpóreos, como é o caso das
músicas e vídeos adquiridos via download e os CDs de música e DVDs
que sofreram disrupção. Nesse caso, seria extremamente radical negar por
completo sua proximidade do conceito de mercadorias, embora não seja
possível que os Estados instituam a cobrança diretamente, por meio de lei

547
interna (ou, o que é pior, via decretos e convênios interestaduais), pois de
“mercadorias”, em sua acepção clássica, não se trata e há uma
aproximação inegável à concepção de serviços, não na acepção de
“obrigação de fazer”, mas à visão mais aberta que, aparentemente, pode
ser retomada pelo STF.

Por tudo isso, a tributação de negócios da chamada economia digital


necessariamente deverá ser pautada na lei complementar, que deve
prevalecer sobre qualquer legislação local e mesmo sobre os instrumentos
normativos pretensamente de cunho nacional, como é o caso dos ilegais e
inconstitucionais convênios que pretendem fazer incidir o ICMS sobre tais
operações. Essa conclusão é ainda mais contundente no tocante aos
serviços que já constam na lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003 e
aos itens inseridos pela Lei Complementar n. 157/2016, cujo foco maior
foi, justamente, as operações relacionadas à tecnologia.

548
Operações de Cloud Computing (SaaS, IaaS,
PaaS etc.): ICMS vs. ISS
267 268
Rodrigo de Freitas e Bruno Akio Oyamada

1. GUERRA FISCAL NA TRIBUTAÇÃO DE SOFTWARE – ISS VS. ICMS

Ao longo dos últimos anos, conflitos têm sido travados de forma


recorrente entre os Estados e Municípios no que diz respeito à extensão da
competência tributária outorgada a cada um desses entes federativos pelo
constituinte, especialmente no que diz respeito ao alcance do Imposto
sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações
de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação (ICMS), de um lado, e do Imposto sobre Serviços (ISS), de
outro.

Com a evolução da tecnologia, novas situações que revelam a


existência de capacidade contributiva têm sido identificadas pelos Estados
e Municípios, dando margem ao surgimento de novas áreas de conflito
entre esses entes federativos.

Nesse contexto, tem ganhado relevância o tema do cloud computing, o


qual é descrito por Patrícia Peck Pinheiro269 da seguinte forma:

Cloud computing (computação em nuvem) é um modelo de disponibilização de


softwares e de infraestruturas de processamento e armazenamento de dados por
meio de uma rede (Internet). O princípio da nuvem de virtualização total e de
máxima disponibilidade dos dados, sendo irrelevante o local de acesso e o
dispositivo utilizado. Ou seja, desafia o modelo jurídico atual ainda baseado em
fronteiras físicas.

Em síntese, o cloud computing envolve a disponibilização de utilidades


(e.g., software, infraestruturas de processamento, armazenamento de

549
dados) que antes eram armazenadas no hardware de cada usuário, em um
ambiente virtual.

O National Institute of Standards and Technology270 (NSIT) indica


como características essenciais do cloud computing as seguintes:

•on-demand self-service – o usuário pode acessar as utilidades no ambiente


virtual automaticamente, sem qualquer necessidade de interação humana
com o provedor;
•broad network access – o usuário pode acessar as utilidades oferecidas no
ambiente virtual e em diferentes tipos de dispositivos (e.g., telefones celulares,
tablets e laptops);
•resource pooling – os recursos computacionais são agrupados para atender a
diversos usuários simultaneamente, com a atribuição e redistribuição dos
recursos físicos e digitais de acordo com a utilização dos usuários;
•rapid elasticity – as capacidades de oferecimento das utilidades são elásticas e,
em alguns casos, automáticas, atendendo de forma eficiente as demandas dos
usuários;
•measured service – o uso de recursos pode ser monitorado, controlado e
reportado, proporcionalizando transparência tanto para o provedor quanto para
o consumidor. A medição é essencial para a avaliação de uso da
infraestrutura, bem como para a gestão e a alocação de seus recursos aos
271
usuários finais .

Na atualidade, as companhias provedoras de serviços na nuvem,


indicam, em geral, como vantagens dessa tecnologia os seguintes fatores:

•Eliminação de capacidade ociosa e aumento de flexibilidade

A substituição da aquisição de hardware próprio e licenças perpétuas de


software pela contratação de utilidades na nuvem permite uma eliminação
da capacidade ociosa, bem como confere maior flexibilidade para atender
situações de pico, conforme ilustrado na imagem a seguir:

550
Remuneração “pay as you go” e desnecessidade de manutenção de
datacenter

Considerando que a remuneração pela utilização das utilidades no


ambiente virtual é efetuada de forma periódica e com base na quantidade
de recursos efetivamente utilizada, o usuário não paga valores referentes à
capacidade não utilizada, como geralmente ocorre nos casos de aquisição
de hardware próprio e licenças perpétuas de software. Além disso, são
eliminados dispêndios com a manutenção de datacenter. O exemplo a
seguir ilustra as vantagens financeiras que o cloud computing pode
propiciar:

•Economia de escala e redução do preço ao consumidor final

Ne medida em que o cloud computing agrega milhares de usuários e

551
atende as suas necessidades de forma conjunta, há um enorme potencial de
economia de escala, o que pode levar a uma redução do preço pago
exigido para se ter acesso às utilidades oferecidas no ambiente virtual,
conforme ilustrado a seguir:

Embora existam na atualidade diversas operações envolvendo o cloud


computing, as principais são as seguintes: (i) Software as a Service (SaaS);
(ii) Plataform as a Service (PaaS); e o (iii) Infrastructure as a Service
(IaaS).

O Software as a Service (SaaS) consiste em uma disponibilização em


ambiente virtual de softwares272 que podem ser acessados pelo usuário
em diversos aparelhos, sem que ele tenha, no entanto, qualquer acesso à
infraestrutura subjacente, incluindo os servidores, sistemas operacionais
etc.

Exemplo de SaaS é o G Suite oferecido pelo Grupo Google, por meio


do qual o usuário tem acesso a diferentes softwares em um ambiente
virtual, pagando um valor mensal de acordo com as utilidades que deseja
acessar (e-mail comercial, videoconferência e chamada de voz,
documentos, planilhas e apresentações, armazenamento na nuvem,
controles de segurança etc.)273.

552
O Plataform as a Service (PaaS), por sua vez, envolve a
disponibilização em ambiente virtual de uma plataforma de computação
que permite ao usuário o desenvolvimento e implementação de programas
e aplicativos274. Nesta vertente do cloud computing, em que pese o usuário
não gerenciar a infraestrutura, ele tem controle sobre as aplicações e
configurações do ambiente.

Pode ser citado como exemplo o Azure que, conforme indicado pelo
Grupo Microsoft, permite que o usuário acesse um conjunto diverso de
utilidades em ambiente digital, criando, implementando e gerenciado
aplicativos na rede global de datacenters da Microsoft275. Por meio dessa
plataforma, é possível substituir a estrutura física própria de hardware e
servidor, no qual estão instalados o sistema operacional e os aplicativos do
cliente, por uma plataforma toda utilizada na nuvem.

Por fim, no Infrastructure as a Service (IaaS) é oferecida em ambiente


virtual ao usuário uma infraestrutura na qual podem ser armazenados
dados de acordo com a necessidade de utilização. É o caso, por exemplo,
do Dropbox, que permite ao usuário armazenar documentos em ambiente
virtual e acessá-los, por meio da internet, em diferentes tipos de
dispositivos.

Apenas para fins didáticos, confira-se a seguir o gráfico no qual se


demonstram as utilidades oferecidas em cada uma das modalidades
analisadas até o momento:

Infrastructure as a
Platform as a Service Software as a Service
Service

Apps / Aplicativos Apps / Aplicativos Apps / Aplicativos


Hospedados Hospedados Hospedados

553
Ferramentas de
Ferramentas de Ferramentas de
Desenvolvimento,
Desenvolvimento, Desenvolvimento,
Gerenciamento de
Gerenciamento de dados, Gerenciamento de dados,
dados, Análise de
Análise de negócio Análise de negócio
negócio

Sistemas Operacionais Sistemas Operacionais Sistemas Operacionais

Servidores e Servidores e Servidores e


Armazenamento Armazenamento Armazenamento

Segurança / Firewalls de Segurança / Firewalls de Segurança / Firewalls


Rede Rede de Rede

Construção / Planta Física Construção / Planta Construção / Planta


do Data Center Física do Data Center Física do Data Center

Gerenciado pelo provedor do cloud computing.

Gerenciado pelo usuário

Diante dessas considerações preliminares, passa-se a analisar se


existiria a possibilidade de os Estados ou Municípios buscarem por meio
da exigência do ICMS ou do ISS, respectivamente, tributar as operações
de cloud computing.

1.1. Conflito de competência para tributação entre os Municípios e os Estados


(serviço vs. mercadoria)

O constituinte, ao delimitar a competência tributária dos entes


federativos, o fez de forma bastante rígida, elegendo situações de fato e de
direito que seriam passíveis de tributação por cada um dos entes
federativos.

554
Nesse contexto, foi conferido aos Municípios, nos termos do que dispõe
o artigo 156, III, da Constituição Federal, a competência para instituição
de imposto sobre serviços de qualquer natureza (com exceção dos serviços
de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, de
competência dos Estados):

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:


III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II,
definidos em lei complementar. (g.n.)

Desse modo, no que diz respeito ao tema que é objeto deste artigo,
torna-se primordial a análise acerca da possibilidade de as operações de
cloud computing serem enquadradas como serviços para fins de incidência
do ISS.

De acordo com Aires F. Barreto276, o constituinte, ao atribuir a


competência tributária aos Municípios para tributar serviços de qualquer
natureza, valeu-se de um conceito de Direito Privado, de modo que o ISS
somente pode alcançar situações que, de acordo com o Direito Privado,
possam ser qualificadas como serviços. Veja-se:

Em suma tendo a CF atribuído aos Municípios a competência para tributar


serviços, tem-se que:
a) os Municípios – e somente eles – podem tributar fatos abrangidos pelo
conceito de serviço (excetuados aqueles expressa e explicitamente atribuídos à
competência tributária dos Estados, ex vi do art. 155, II, da CF, quais sejam, os
serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação; e,
inversamente,
b) não podem os Municípios tributar fatos que não possam ser qualificados
como serviço, segundo as elaborações de Direito Privado.

Nesse mesmo sentido, é o entendimento manifestado por Humberto


Ávila277, o qual explica que, em razão de uma reserva constitucional
material, o termo “serviço” apenas pode se referir a uma obrigação de
fazer:

555
A reserva constitucional material é estabelecida indiretamente nos casos em que
a Constituição, implementando a sua divisão de competências no Estado Federal, ao
atribuir poder para uma entidade política tributar um fato, implicitamente atribui
poder para outra entidade política tributar fato diverso. (...)
Esse é também o caso da regra de competência para instituir o Imposto sobre
Serviços de Qualquer Natureza. Como o poder para tributar as vendas de bens e,
portanto, as obrigações de dar, foi atribuído aos Estados pela competência para
instituir o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias, a palavra “serviços”, na
regra de competência para tributar prestação de serviços, só pode ser conceituada
como uma obrigação de fazer.
Nesse sentido, é lícito afirmar que a Constituição pressupõe conceitos que não
podem ser desprezados pelo legislador ordinário.

O Supremo Tribunal Federal (STF) também adotou esse


posicionamento, decidindo que o ISS alcança tão somente operações que
se qualifiquem como serviço nos termos do Direito Civil, ou seja,
obrigações de fazer278. Esse posicionamento foi objeto da Súmula
Vinculante 31, por meio da qual o tribunal determinou a impossibilidade
de incidência do ISS sobre operações de locações de bens móveis, uma vez
que essas operações não envolvem uma obrigação de fazer:

Súmula Vinculante 31. É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços


de qualquer natureza – ISS sobre operações de locação de bens móveis.

Nesse sentido, vale destacar os seguintes trechos do voto proferido pelo


I. Ministro Celso de Mello no Agravo Regimental no Recurso
Extraordinário n. 446.003-03-PA, que serviu como um dos precedentes
representativos da referida Súmula, que evidenciam que esse
posicionamento decorre do entendimento adotado pelo STF no sentido de
que o ISS não pode alcançar atividades que não se enquadrem no conceito
de serviço previsto no Direito Civil:

Tenho para mim, Senhores Ministros, na mesma linha do entendimento de Aires


Fernando Barreto (“Revista de Direito Tributário”, vol. 38/192) e de Cléber
Giardino (“Revista de Direito Tributário, vol. 38/196), que a qualificação da
“locação de bens móveis” como serviço, para efeito de tributação municipal
mediante ISS, nada mais significará, caso permitida, senão o inadmissível
reconhecimento da possibilidade de arbitrária manipulação, por lei complementar,

556
da repartição constitucional de competências impositivas, eis que o ISS somente
pode incidir sobre obrigações de fazer, a cuja matriz constitucional não se ajusta a
figura contratual da locação de bens móveis.
Cabe advertir, neste ponto, que a locação de bens móveis não se identifica nem
se qualifica, para efeitos constitucionais, como serviço, pois esse negócio jurídico –
considerados os elementos essenciais que lhe compõem a estrutura material – não
envolve a prática de atos que consubstanciem um “prestare” ou um “facere”.

Entretanto, neste ponto é necessário ressaltar que o STF, quando do


julgamento do Recurso Extraordinário n. 651.703-PA, em sede de
repercussão geral, manifestou-se no sentido de que o alcance do termo
“serviço” para fins de incidência do ISS não estaria adstrito ao conceito
dado a esse termo pelo Direito Civil, de modo que a referida exação
poderia alcançar aquelas operações que, embora não envolvam uma
obrigação de fazer, contemplem o oferecimento de uma utilidade para
outrem279.

Tal conclusão foi alcançada pelo STF com base no entendimento de que
a Constituição, ao discriminar a competência tributária de cada um dos
entes federativos, valeu-se também de tipos e não apenas de conceitos, de
modo que o ISS poderia alcançar situações não contempladas no conceito
de serviço previsto no Direito Civil.

Contudo o entendimento exarado pelo STF não implica o total


abandono do entendimento que tem sido construído na jurisprudência da
corte, ao longo dos últimos anos, no sentido de que o ISS alcança tão
apenas operações que contemplem uma obrigação de fazer.

Isso porque a Súmula Vinculante n. 31 anteriormente mencionada, que


firmou o entendimento de que o ISS não incide sobre a locação de bens
móveis (uma vez que tal tributo pode alcançar tão somente as operações
que envolvem uma obrigação de fazer), continua vigente.

557
Passando agora à análise da delimitação de competência dos Estados,
dentro da divisão de materialidades passíveis de tributação, cumpre frisar
que o constituinte atribuiu a esses entes federativos a competência para
instituir imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias (e
sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e
de comunicação):

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...)
II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de
serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as
operações e as prestações se iniciem no exterior (...). (g.n.)

Ao tema que é objeto de análise deste artigo, cumpre verificar se as


operações de cloud computing poderiam ser enquadradas como operações
relativas à circulação de mercadorias, passíveis de tributação pela referida
exação.

De acordo com José Eduardo Soares de Melo280, o termo “operações”,


tal como empregado pelo constituinte na delimitação do alcance do ICMS,
refere-se à prática de ato jurídico com a transmissão de um direito (posse
ou propriedade):

“Operações” configuram o verdadeiro sentido do fato juridicizado, a prática de


ato jurídico como a transmissão de um direito (posse ou propriedade).

O termo “circulação”, por sua vez, predica que, para que seja possível a
incidência do ICMS, deverá haver a passagem da mercadoria de uma
pessoa para a outra, com base em um título jurídico.

Desse modo, à luz destas considerações iniciais, é possível concluir que


estão dentro do campo de competência dos Estados apenas as operações
que envolvam a transferência de posse ou propriedade de determinado bem

558
de uma pessoa a outra, decorrente de um ato jurídico de transmissão de
direito.

Além disso, deve-se destacar que a materialidade do ICMS também


pressupõe a definição do termo “mercadoria”, que pode ser conceituado
com o bem “corpóreo”281, que será objeto de transferência/circulação.

De fato, de acordo com os ensinamentos de Roque Antonio Carrazza282,


o termo “mercadoria” utilizado pelo constituinte na discriminação da
competência tributária dos Municípios diz respeito tão somente a bens
corpóreos submetidos à mercancia:

Não é qualquer bem móvel que é mercadoria, mas tão somente o bem móvel
corpóreo (bem material) que se submete à mercancia. Podemos, pois, dizer que
toda mercadoria é bem móvel, mas nem todo bem móvel é mercadoria. Só o bem
móvel que se destina à prática de operações mercantis é que assume a qualidade de
mercadoria.
Insistimos em que configura mercadoria o bem móvel corpóreo adquirido pelo
comerciante, industrial ou produtor, para servir de objeto de seu comércio, isto é,
para ser revendido. (g.n.)

Da conjugação dos conceitos de operação, circulação e mercadoria,


chega-se então ao núcleo da materialidade do ICMS, que corresponde a
uma “obrigação de dar” um bem corpóreo, caracterizada como “atividade
fim” do negócio jurídico subjacente, mesmo que existam obrigações de
fazer como “atividade meio” na operação283.

Ressalte-se, inclusive, que a Constituição Federal de 1988 prevê


expressamente que o ICMS incidirá também “sobre o valor total da
operação, quando mercadorias forem fornecidas com serviços não
compreendidos na competência tributária dos Municípios” (art. 155, IX,
“b”). Ou seja, ainda que o fornecimento de mercadorias contemple

559
serviços como atividades meio, tais ativos representam simples custos que
integrarão o preço da mercadoria.

No mesmo sentido, é importante citar também o artigo 1º, § 2º, da Lei


Complementar n. 116/2003, na qualidade de reguladora de conflitos de
competência em matéria tributária284, que estabelece a não incidência de
ICMS nos casos em que as prestações de serviço ocorram com o
fornecimento de mercadoria285.

Além dos potenciais conflitos nos casos (i) de mercadorias usadas como
insumos na prestação de serviço e (ii) de serviços como “atividades meio”
na venda de mercadorias, pode-se também vislumbrar conflitos quando o
Estado pretenda tributar como circulação de mercadoria uma atividade que
configure uma “obrigação de fazer”, o que não está na competência para
tributação pelo ICMS e representa uma invasão da competência dos
Municípios.

Da mesma forma, pode haver conflito quando o Município pretenda


tributar como serviço operações que se configurem como “obrigações de
dar”, o que é inconstitucional por não estar abrangido na competência para
tributação pelo ISS e também representa uma invasão na competência do
Estados (caso se trate de bens corpóreos).

Tecidas essas considerações iniciais sobre as materialidades do ISS e do


ICMS, passa-se a analisar as questões específicas referentes à tributação
das operações de cloud computing, considerando as características
concretas da atividade econômica expostas e a rígida repartição de
competências para tributação prevista na Constituição Federal.

2. MATERIALIDADE DA TRIBUTAÇÃO DO SOFTWARE PELO


MUNICÍPIO (CLOUD COMPUTING COMO SERVIÇO)

560
Conforme exposto anteriormente, para que possa haver tributação pelo
ISS das operações de cloud computing, deve-se analisar se tais operações
se qualificam como prestação de serviço nos termos em que definido pelo
Direito Civil, ou seja, como uma obrigação de fazer.

Nesse sentido, o Fisco Paulistano já se manifestou, inicialmente, por


meio da Solução de Consulta SF/DEJUG n. 40 de 1º de agosto de 2013 e,
recentemente, por meio do Parecer Normativo n. 1 de 18 de julho de 2017,
no sentido de que as operações de SaaS estariam abrangidas pela
incidência do ISS, pois se trataria de serviços expressamente previstos na
Lei Complementar n. 116/2003.

No referido parecer, as Autoridades Municipais afirmam que as


operações de SaaS se enquadrariam no item 1.05 da lista de serviços da
Lei n. 13.701/2003, podendo ainda haver o enquadramento de parte da
contratação nos subitens 1.03 e 1.07286-287:

1.03 – Processamento de dados e congêneres.


1.05 – Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação.
1.07 – Suporte técnico em informática, inclusive instalação, configuração e
manutenção de programas de computação e bancos de dados.

Desse modo, para que se possa aferir a validade de tal entendimento,


faz-se necessário analisar se as atividades de cloud computing
efetivamente são adequadas ao conceito de prestação de serviço.

Ademais, é importante ainda verificar se essas atividades estariam


elencadas na lista anexa da Lei Complementar n. 116/2003, já que,
conforme já reconhecido pelo STF, esta possuí caráter taxativo288. É o que
se passa a analisar.

•Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computador


(Item 1.05)

561
Ao analisar as operações SaaS, entendeu o Fisco Paulistano que estas se
enquadrariam na competência municipal para tributação pelo ISS em razão
de serem objeto de contratos de licenciamento ou cessão de direito de uso,
conforme Solução de Consulta SF/DEJUG n. 40 de 1º de agosto de 2013289
e Parecer Normativo n. 1 de 18 de julho de 2017290.

No mesmo sentido, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao


analisar caso envolvendo operação de SaaS com pagamentos mensais pelo
usuário, entendeu que caberia a exigência do ISS sobre as operações SaaS,
tendo em vista que se trata de contrato com previsão de licença de uso,
com natureza distinta do “software de prateleira”:

APELAÇÃO – ISS – SOFTWARE COMO SERVIÇO – “SaaS” –


MODALIDADE DE COMERCIALIZAÇÃO DE PROGRAMA DE
COMPUTADOR – RELAÇÃO JURÍDICA CONTINUADA –
CARACTERISTICA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO – ISS DEVIDO.
RECURSO NÃO PROVIDO. (...)
Dessa forma, os contratos que determinam esse novo tipo de modelo de negócio
são feitos de maneira padronizada, semelhante a um contrato de adesão, mas
prevendo algumas cláusulas que o caracterizam como prestação de serviço:
1) O licenciamento de uso é temporário, vigendo somente enquanto perdurar a
relação jurídica entre contratada e contratante, diferentemente do que ocorre com o
“software de prateleira”, cuja licença de uso, uma vez adquirida, não perde sua
validade. Tal previsão encontra-se na cláusula 1.1.2 do contrato apresentado pela
impetrante a fls. 40.
2) Em casos de atualização do programa, o modelo SaaS prevê uma relação
continuada entre cliente e fornecedor, que disponibiliza constantes atualizações do
software mediante o pagamento de mensalidade, diferentemente do que ocorre com
os “softwares de prateleira”, em que cada atualização é paga separadamente, quando
não sendo necessário adquirir novamente o programa. O contrato traz tais
disposições em sua cláusula 1.2.3 e ss, a fls. 40.
3) Outra característica desse modelo de negócio é a remuneração de acordo com
o número de pedidos captados (tratando-se no caso de plataforma para e-
commerce), estabelecendo uma relação de dependência entre as empresas, baseada
na otimização do software pela contratada de modo a efetivar cada vez mais vendas
para a empresa contratante. Verifica-se tal característica no anexo II preços e
condições de pagamentos, a fls. 52.
Assim, em que pese não se tratar de software personalizado, desenvolvido
individualmente para cada cliente, também não se caracteriza como “software de
prateleira”, de natureza jurídica de obrigação de dar. Assim, da análise da essência

562
do contrato firmado entre a empresa impetrante e suas clientes, fica patente tratar-se
de prestação de serviço, tributável pelo ISS, inclusive o licenciamento e a cessão de
uso do software.
(Apelação n. 0006496-32.2013.8.26.0053) (g.n.)

Em que pesem as manifestações acima expostas, passa-se a analisar as


características das operações de cloud computing e do SaaS em especial,
para se determinar se é possível a cobrança do ISS sobre tais operações
com base nesta rubrica.

Inicialmente, de acordo com o artigo 9º da Lei n. 9.609/98, “O uso de


programa de computador no País será objeto de contrato de licença”.
Conforme ensinamentos de Neide Bueno291, trata-se de modalidade de
negócio jurídico pelo qual o titular do direito de autor concede ao usuário
o direito de utilizar o software para determinadas finalidades,
assemelhando-se a uma locação, uma vez que consiste em uma permissão
de uso e gozo de coisa não fungível:

A licença de uso de software, prevista no artigo 9º da lei 9609/98, é modalidade


pela qual o titular do direito de autor concede ao usuário o direito de utilizar o
software para determinadas finalidades. Este tipo de contrato acorda a noção de
utilização individual mesmo que, na prática, possam existir licenças corporativas e
mundiais. O direito de uso não tem o sentido amplo de utilização ou exploração
econômica nos termos do artigo 29 da lei 9610/98, sendo o objeto de licença, via
de regra, o programa em código objeto que se assemelha com a locação (uso e
gozo da coisa não fungível). (g.n.)

Como se vê, o licenciamento de uso de software é atividade que, assim


como a locação de bens móveis, não contempla necessariamente um
serviço (obrigação de fazer), de modo que a pretensão dos Municípios de
tributar atividades de cloud computing, que envolvam o licenciamento de
software, com base no item 1.05 da lista anexa da Lei Complementar n.
116/2003 é inconstitucional.

563
Com efeito, embora esse item trate genericamente da atividade de
“licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação”,
o seu alcance está adstrito aos casos nos quais há o desenvolvimento de
um software sob encomenda, já que, nesta hipótese, haverá a necessária
verificação de uma obrigação de fazer.

Deste modo, é equivocado o entendimento constante do referido


Parecer Normativo n. 1/2017, no sentido de que haveria tributação das
operações de SaaS independentemente de serem programados ou
adaptados para necessidades específicas do tomador ou se são
padronizados:

Art. 2º O enquadramento tratado no artigo 1º deste parecer normativo independe


de o software ter sido programado ou adaptado para atender à necessidade
específica do tomador (“software por encomenda”) ou ser padronizado (“software
de prateleira ou ‘off the shelf’”).

Cumpre frisar que a Receita Federal do Brasil, por meio da Solução de


Consulta n. 262 – Cosit, de 29 de maio de 2017, também já se manifestou
no sentido de que a atividade de licenciamento, assim como a locação, não
pode ser qualificada como um serviço, tendo em vista que não consiste em
uma obrigação de fazer:

14 Restaria, então, examinar se a concessão de licença de uso e distribuição dos


mencionados softwares são considerados prestação de serviços, o que acarretaria,
quando o cedente for pessoa jurídica domiciliada no exterior, a incidência das
contribuições em questão sobre o pagamento, o crédito ou a remessa de valores
efetuados como contraprestação pelo serviço prestado. (...)
20 Infere-se a natureza jurídica similar a dar os contornos das figuras “aluguel” e
“royalties”. Ambos consistem em rendimentos, sendo o primeiro oriundo da
ocupação, uso ou exploração de bens corpóreos, e o segundo, oriundo do uso,
fruição ou exploração de direitos imateriais (bens incorpóreos). Ambos, entretanto,
diferenciam-se do rendimento pela prestação de serviços. Esta diferenciação está
fundamentada no fato de que a locação de bens, à qual se assemelha os royalties,
constitui típica obrigação de dar. Ao contrário dos serviços que possuem
característica de obrigação de fazer. (...)

564
22 Não é possível vislumbrar num licenciamento de softwares a presença de
uma obrigação de fazer, que caracteriza a prestação de serviços, a qual é realizada
com emprego da força humana que presta a realização, transformando materiais e
situações. Seu objeto trata-se de pura obrigação de dar, uma permissão para que
alguém use ou comercialize algo de que não detém a propriedade.

Diante do exposto, é possível concluir que a inclusão do subitem


“licença de uso” na lista de serviço não é suficiente, por si só, para que
seja estabelecida a cobrança do ISS sobre as operações de cloud
computing.

Isso porque, conforme já exposto, o constituinte, ao delimitar a


competência tributária dos Municípios, valeu-se de um conceito de Direito
Privado (reserva constitucional material), de forma que o ISS pode
alcançar tão somente operações que envolvam uma obrigação de fazer
(entendimento consubstanciado na Súmula Vinculante 31 sobre locação de
bens móveis).

No caso específico das operações de cloud computing, como visto, não


há em regra o desenvolvimento de software para atender às necessidades
específicas do cliente (“software por encomenda”), mas sim o
oferecimento de utilidades que se configuram como a disponibilização de
infraestrutura no ambiente virtual, que pode ou não estar acompanhada da
licença de uso de softwares padronizados, os quais em regra independem
de qualquer interação humana para viabilizar a sua utilização pelo usuário.

•Demais itens da lista (1.03 e 1.07)

Por fim, passa-se a analisar os seguintes itens previstos na lista anexa da


Lei Complementar n. 116/2003 que poderiam, no entender das
Autoridades Fiscais, dar ensejo à tributação das operações de cloud
computing:

565
1.03 – Processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos,
imagens, vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre
292
outros formatos, e congêneres .
1.07 – Suporte técnico em informática, inclusive instalação, configuração e
manutenção de programas de computação e bancos de dados.

De fato, ao analisar especificamente as operações de PaaS, o Fisco


Paulistano se manifestou sobre qualificação dessa atividade como serviço
de processamento de dados, por meio da Solução de Consulta SF/DEJUG
n. 40 de 1º de agosto de 2013:

6. De acordo com o “Guia do Usuário”, a Plataforma em Nuvem xxxxxxxxxx


oferece uma plataforma como serviço analítica completa de negócio, incluindo
inteligência de negócio, integração de dados e recursos de armazenamento de dados.
6.1. Ainda segundo o “Guia do Usuário”, os serviços em nuvem da consulente
projetados para oferecer aos clientes um ambiente para hospedar, transformar,
analisar e reportar dados através da estrutura de Business Intelligence da
xxxxxxxxxx e serviços de hospedagem na nuvem. Esses serviços oferecem um
menu de armazenamento de dados, integração de dados e recursos de comunicação.
Como assinantes da Plataforma em Nuvem xxxxxxxxxx os clientes são obrigados a
usar os serviços de Business Intelligence, mas os outros serviços da plataforma
estão disponíveis como opcionais. Os serviços de Business Intelligence fornecem o
acesso do cliente ao catálogo de produtos hospedados como um serviço em nuvem,
dos quais o cliente pode se beneficiar mediante solicitação.
7. Os serviços de plataforma em nuvem objeto dos documentos apresentados
enquadram-se no subitem 1.03 da Lista de Serviços do art. 1º da Lei 13.701, de 24
de dezembro de 2003, código de serviço 02682 do Anexo I da Instrução Normativa
SF/SUREM n. 8, de 18 de julho de 2011, relativo a processamento de dados e
congêneres, sujeitos à alíquota de 5%, conforme o disposto no art. 16, III, da Lei n.
13.701, de 24 de dezembro de 2003, acrescido pela Lei n. 14.668, de 14 de janeiro
de 2008.

Ainda, conforme mencionado anteriormente, o Parecer Normativo n.


1/2017 estabeleceu que as operações de SaaS se enquadrariam no item
1.05 da lista de serviços, mas que poderia haver o enquadramento de parte
da contratação nos subitens 1.03 e 1.07, o que também justifica a
necessidade de analisar a aplicabilidade de tais hipóteses às operações de
cloud computing.

566
Em relação à exigência do ISS sobre as operações de cloud computing
nas quais haja “processamento de dados e congêneres”, não é possível a
incidência do ISS com base no subitem 1.03, já que tal atividade, quando
presente nessas operações, será uma atividade meio para a obtenção da
utilidade final pretendida e não uma obrigação de fazer autônoma.

No mesmo sentido, quanto ao enquadramento dessas operações como


serviços de “suporte técnico em informática, inclusive instalação,
configuração e manutenção de programas de computação e bancos de
dados”, também não há espaço para exigência do ISS, uma vez que,
embora esse tipo de atividade possa estar presente nas operações de cloud
computing, seu enquadramento também será como atividade meio e não
atividade fim, de modo que não será cabível a exigência do ISS sob esta
rubrica293.

De fato, conforme já exposto, o usuário do cloud computing contrata do


provedor na nuvem utilidades oferecidas em ambiente virtual e não
serviços de processamento de dados ou suporte técnico. Nesse contexto,
somente haverá que se falar em incidência do ISS se o usuário contratar
isoladamente tais serviços vinculados às atividades de cloud computing.

Com efeito, embora as operações de cloud computing possam envolver,


por exemplo, o licenciamento de software, processamento de dados e a
prestação de serviços técnicos, é necessário se ter em mente que se trata de
operações complexas, que envolvem, na maior parte das vezes, o
oferecimento de diferentes utilidades, sem que haja qualquer divisão
dentro do contrato.

Portanto, em que pese as tentativas por parte dos Municípios de


enquadrar as operações de cloud computing em itens já existentes da lista

567
anexa da Lei Complementar n. 116/2003, não há nenhum item deste
diploma legal que trate dessas operações.

A corroborar o quanto exposto, é importante pontuar que atualmente


tramita o Projeto de Lei Complementar n. 171/2012, por meio do qual se
pretende alterar a lista anexa da Lei Complementar n. 116/2003 para que
seja incluído o item “1.09 – Computação em nuvem”, o que evidencia que
não há na lista anexa da Lei Complementar n. 116/2003 item que abarque
essas operações.

Diante dessas considerações, é possível concluir que as operações de


cloud computing, por não envolverem uma obrigação de fazer, mas tão
somente o oferecimento de utilidades ao usuário final em um ambiente
virtual, não podem ser qualificadas como serviços para fins de ISS.
Ademais, mesmo que tais operações sejam viabilizadas por meio de
“licença de uso”, verifica-se também que tal dispositivo não é suficiente
para fazer incidir o ISS obre operações que não configurem obrigações de
fazer, pois tal pretensão padeceria do mesmo vício de
inconstitucionalidade da tributação da locação de bens móveis.

3. MATERIALIDADE DA TRIBUTAÇÃO DO SOFTWARE PELO ESTADO


(CLOUD COMPUTING COMO MERCADORIA)

No que tange à possibilidade de se tributar as operações de cloud


computing por meio do ICMS, faz-se necessário verificar se há uma
efetiva “operação de circulação de mercadoria”, nos termos já delimitados
da materialidade prevista na Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, cumpre destacar a Decisão Normativa CAT n. 4, de 20


de setembro de 2017, por meio da qual o Estado de São Paulo declarou

568
que as operações de SaaS estariam dentro do campo de incidência do
ICMS. Veja-se:

1. Em relação aos softwares, é possível distinguir dois tipos de produtos: (i)


softwares desenvolvidos sob encomenda, em relação aos quais há preponderância
de serviços, já que produzidos especialmente para atender as especificidades do
contratante; e (ii) softwares prontos que, uma vez desenvolvidos, são vendidos em
larga escala, com pouca ou nenhuma adaptação às necessidades do consumidor que
os adquire.
2. Com base nessa distinção, a jurisprudência definiu que:
2.1. está sujeito ao ISS apenas o desenvolvimento de software sob encomenda,
isto é, os programas de computador elaborados de forma personalizada;
2.2. a ausência de personalização insere o software em uma cadeia massificada
de comercialização, outorgando-lhe natureza mercantil e, portanto, sujeito a
incidência do ICMS.
3. No que se refere à forma de comercialização, os softwares não personalizados
podem ter suas cópias distribuídas em larga escala por meio físico ou serem
negociados em meio digital, tanto por download como por streaming (utilização do
software “na nuvem”). Essa alteração, no entanto, não tem o condão de
descaracterizar a natureza de produto desse tipo de software (mercadoria). A
circunstância de o adquirente instalar o software (de loja física ou virtual) em sua
máquina (download) ou utilizá-lo “na nuvem” por meio de internet (streaming) não
descaracteriza a natureza jurídica da operação como comercialização de software
pronto.
4. Portanto, há incidência do ICMS nas operações com softwares, programas,
aplicativos, arquivos eletrônicos, e jogos eletrônicos, padronizados, ainda que sejam
ou possam ser adaptados, independentemente da forma como são comercializados.

Ainda, cabe mencionar o recente Convênio ICMS n. 106, de 29 de


setembro de 2017, por meio do qual o Conselho Nacional de Política
Fazendária – CONFAZ, dispôs sobre a incidência do imposto municipal
sobre as operações com “bens e mercadorias digitais”, em um evidente
exercício de autoproclamação por parte dos Estados acerca de sua alegada
competência para tributar essas operações, o que faz com que seja
necessária uma análise aprofundada das operações de cloud computing
para se aferir a legitimidade de tal tributação.

A nosso ver, um primeiro obstáculo à incidência do ICMS sobre as


operações de cloud computing decorre da ausência de transferência de

569
propriedade de qualquer tipo de bem nessas operações.

De fato, conforme já exposto, seja no SaaS, PaaS ou IaaS, é


disponibilizada ao usuário tão somente a capacidade de este acessar, em
ambiente virtual, determinadas utilidades, não havendo qualquer tipo de
transferência de propriedade de bem de qualquer natureza.

Nesse sentido, vale mencionar os ensinamentos de Roque Antonio


Carrazza294 que, ao analisar especificamente a comercialização tradicional
de software, concluiu que tal situação está fora do campo de incidência do
ICMS, na medida em que nesta operação não há a necessária transferência
de direito de propriedade sobre o bem digital295:

Convém acrescentar que nos negócios jurídicos (contratos) realizados com


softwares não se dá a transferência da propriedade dos direitos imateriais (direitos
autorais), mas, sim, a transferência da licença do direito de uso destes mesmos
direitos.

Vale repisar ainda que, nas operações envolvendo a disponibilização de


software na nuvem (i.e., SaaS), sequer há a obrigação de a empresa
detentora de programa fornecê-lo ao usuário, uma vez que ela apenas se
compromete a permitir o acesso do usuário a determinadas utilidades em
um ambiente virtual, o que distancia ainda mais essas operações do campo
de incidência do imposto estadual296.

Neste ponto, é interessante mencionar que a Receita Federal do Brasil


reconheceu, por meio da Solução de Consulta n. 191 – Cosit de 23 de
março de 2017, que nas operações de SaaS, os direitos autorais do
software não são objeto de comercialização, na medida em que o usuário
adquire tão somente o acesso aos recursos e ambiente digital:

Pode-se observar que no SaaS o usuário não tem ingerência sobre a


infraestrutura dos recursos computacionais, não tem o poder de modificar os

570
programas disponíveis. O fato é que, efetivamente, o usuário não adquire o
software, mas apenas acessa os recursos à distância, por meio da Internet, utilizando
senhas previamente definidas. Nesse contexto, observa-se que os direitos autorais
dos softwares envolvidos na prestação de serviços não são objeto de
comercialização, circunstância que, no presente caso, não foi sequer comentada pela
consulente.

Ademais, é necessário mencionar ainda a impossibilidade da incidência


do ICMS sobre as operações de cloud computing em decorrência da
ausência de qualquer mercadoria. No caso das operações de cloud
computing, embora haja atividade econômica, não há qualquer bem
corpóreo objeto de mercancia, razão pela qual, também por esta
perspectiva, não há possibilidade de se exigir o ICMS nessas situações.

Nesse contexto, vale a pena mencionar o entendimento de Eurico


Marcos Diniz e Ana Carolina Carpinetti297 que, ao analisarem as operações
com bens digitais, concluíram que a ausência de definição na
jurisprudência acerca da caracterização desses bens como mercadorias é
uma das dificuldades de se buscar tributar tais operações pelo imposto
estadual:

As questões a serem enfrentadas hoje dizem respeito à tributação das operações


de download de softwares, das operações com os chamados softwares como
serviços, da disponibilização de softwares para acesso remoto, entre muitos outros
temas que surgem com os novos modelos de negócio. (...)
No caso da tributação pelo ICMS dos bens digitais transferidos por meio
eletrônico vários aspectos podem ser questionados uma vez que não há definição na
jurisprudência acerca da caracterização de tais bens como mercadorias.

Mencione-se ainda que, conforme ressaltado por Gustavo Brigagão298


em estudo acerca da impossibilidade de exigência do ICMS sobre o
donwload de software, a Receita Federal do Brasil, por meio da Solução de
Consulta n. 149-Disit de 5 de agosto de 2013, afastou a incidência do IPI-
Importação nesta situação, em razão da inexistência de um bem corpóreo
que pudesse ser qualificado como mercadoria. Confira-se:

571
No caso do software transferido por meio eletrônico, sem a utilização de suporte
físico, verifica-se a inexistência de um bem material que pudesse ser entendido
como mercadoria.

É necessário ressaltar ainda que o STF, quando do julgamento do RE n.


176.626-3-SP, em 10 de novembro de 1998, decidiu pela impossibilidade
de exigência do ICMS sobre a comercialização de softwares não
materializados em um corpus mechanicum. Veja-se:

III. Programa de computador (“software”): tratamento tributário: distinção


necessária.
Não tendo por objeto uma mercadoria, mas um bem incorpóreo, sobre as
operações de “licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de
computador” – matéria exclusiva da lide –, efetivamente não podem os Estados
instituir ICMS: dessa impossibilidade, entretanto, não resulta que, de logo, se esteja
também a subtrair do campo constitucional de incidência do ICMS a circulação de
cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série e
comercializados no varejo – como a do chamado “software de prateleira” (off the
shelf) – os quais, materializando o corpus mechanicum da criação intelectual do
programa, constituem mercadorias postas no comércio.

Naquela oportunidade, embora o STF tenha entendido pela


possibilidade de os Estados exigirem o ICMS sobre “software de
prateleira”, ressaltou-se na decisão que somente estariam dentro do campo
de incidência deste imposto o software que, além de não customizado,
fosse comercializado em corpus mechanicum.

Com efeito, ao contrário do que tem sido defendido por alguns Estados,
o STF na referida decisão, não se posicionou no sentido de que seria
possível a incidência do ICMS sobre toda e qualquer operação envolvendo
software padronizado.

O entendimento firmado naquela ocasião foi no sentido de que, nos


casos envolvendo a comercialização de software contido em bem
corpóreo, existem dois negócios jurídicos distintos: (i) atividade de

572
licenciamento, sobre a qual nunca incide o ICMS; (ii) transferência de
propriedade de bem corpóreo, sobre a qual pode incidir o ICMS.

Neste sentido, vejam-se a seguir transcritos trechos do voto do Ministro


Sepúlveda Pertence que não deixam dúvida acerca do posicionamento
adotado pelo STF na referida decisão, acerca da impossibilidade de
exigência do ICMS sobre a atividade de licenciamento, tanto em razão da
ausência de mercadoria, quanto da inexistência de transferência do direito
de propriedade sobre o bem incorpóreo:

Ora, no caso, o que se pretende é a declaração de inexistência de relação jurídica


de natureza tributária entre a autora e o Estado, relativamente às operações de
“licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computador”: trata-se,
pois, de operações que têm como objeto um direito de uso, bem incorpóreo
insuscetível de ser incluído no conceito de mercadoria e, consequentemente, de
sofrer incidência do ICMS. (...)
É esse “direito exclusivo” – que não é mercadoria, nem se aliena com o
licenciamento de seu uso –, que se deve declarar fora do raio de incidência do
ICMS, como exatamente concluíra, nos lindes do pedido, a decisão recorrida. (...)
Seja qual for o programa, contudo, é certo, não se confundirão a aquisição do
exemplar e o licenciamento ou cessão do direito de uso, também presente até
quando se cuide de software “enlatado” ou “de prateleira”. (...)
O licenciamento, como disse, não se confunde com as operações realizadas com
o exemplar do programa. (...)
A distinção é, no entanto, questão estranha ao objeto desta ação declaratória,
reduzindo ao licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computar,
bem incorpóreo sobre o qual, não se cuidando de mercadoria, efetivamente não
pode incidir o ICMS; por isso não conheço do recurso: é o meu voto. (g.n.)

Não obstante, é necessário que se mencione que no julgamento da


liminar na ADI 1.945-MT, que trata da comercialização de software não
customizado via download, o STF exarou manifestação no sentido de que
a existência de um bem corpóreo seria irrelevante para fins de incidência
do ICMS:

8. ICMS. Incidência sobre softwares adquiridos por meio de transferência


eletrônica de dados (art. 2º, § 1º, item 6, e art. 6º, § 6º da Lei impugnada).
Possibilidade. Inexistência de bem corpóreo ou mercadoria em sentido estrito.

573
Irrelevância. O Tribunal não pode se furtar a abarcar situações novas, consequências
do mundo real, com base em premissas jurídicas que não são mais totalmente
corretas. O apego a tais diretrizes jurídicas acaba por enfraquecer o texto
constitucional, pois não permite que a abertura dos dispositivos da Constituição
possa se adaptar aos novos tempos, antes imprevisíveis.

Nesse contexto, poder-se-ia alegar que nas operações de cloud


computing a inexistência de um bem corpóreo seria irrelevante para se
determinar se essas situações estariam dentro da competência tributária
dos Estados.

Todavia, mesmo que se pudesse entender pela incidência do ICMS


sobre operações com bens incorpóreos, é evidente que ainda assim não
seria possível a exigência do imposto estadual sobre as operações de cloud
computing, já que nestas não há uma necessária transferência de
titularidade sobre qualquer bem, seja este corpóreo ou incorpóreo.
Ressalte-se, inclusive, a decisão liminar na ADI n. 1.945-MT que fixou “a
exegese no sentido de restringir a incidência do ICMS às operações de
circulação de cópias ou exemplares dos programas de computador,
produzidos em série e comercializados no varejo, não abrangendo, porém,
o licenciamento ou cessão de uso dos ditos programas.”

Diante dessas considerações, é possível concluir que as operações de


cloud computing não estão dentro do campo de competência do ICMS por
não envolverem a transferência de propriedade de bens corpóreos ou
incorpóreos, mas, quando muito, o licenciamento ou cessão de uso de
software.

4. CONCLUSÃO

Diante do que foi exposto, é possível afirmar que há hoje uma inegável
guerra fiscal travada entre Estados e Municípios pela tributação das
operações com bens digitais, entre as quais se incluem as operações de

574
cloud computing, que, sem dúvidas, são representativas de capacidade
contributiva e que, por um ideal de justiça, deveriam ser, em tese,
tributadas.

Contudo é necessário considerar que, conforme explica Luís Eduardo


Schoeuri299, ainda que o ideal fosse que todas as manifestações de
capacidade contributiva pudessem ser tributadas, no ordenamento jurídico
brasileiro, o constituinte optou por discriminar na própria Constituição
Federal os fenômenos econômicos passíveis de tributação por cada um dos
entes federativos, do que resulta que algumas manifestações de capacidade
contributiva não estejam incluídas na competência dos entes federativos.
Veja-se:

Assim é que quando se cogita de repartição do ônus tributário, importa


considerar, no sistema constitucional brasileiro, a repartição de competências
tributárias, já que o próprio constituinte tratou de identificar e alocar fenômenos
econômicos que serviriam àquele fim.
Vê-se, daí, um primeiro corte no ideal da capacidade contributiva. Afinal, se o
constituinte arrola fenômenos econômicos e os distribui entre pessoas jurídicas de
direito público, é imediato que a escolha não poderia ser exaustiva: outras situações
da vida, igualmente relevantes para identificar aqueles que teriam condições de
contribuir para os gastos comuns, são deixadas de lado.

Desse modo, não basta que haja uma manifestação de capacidade


contributiva para que seja possível tributá-la (como ocorre com a locação
de bens móveis, objeto da Súmula Vinculante 31). Será necessário
verificar se essa situação está inserida na competência de algum dos entes
federativos.

A nosso ver, em que pesem as recentes manifestações exaradas tanto


por parte dos Estados quanto dos Municípios autodeclarando a sua
competência para tributar essas operações, não é possível a exigência do
ISS ou ICMS sobre as operações de cloud computing, seja por não

575
configurarem prestação de serviço, seja por não configurarem operação de
circulação de mercadoria.

576
A Tributação pelo ISS e pelo ICMS das
Operações com Software
300 301
João Victor Guedes Santos e Camila Caçador Xavier

1. INTRODUÇÃO

Com o crescimento do comércio eletrônico e dos instrumentos virtuais,


as modalidades de software disponíveis no mercado estão evoluindo e,
com elas, as discussões acerca do tratamento tributário a se conferir às
operações que as envolvem também vêm se aperfeiçoando.

As maiores controvérsias atuais relacionadas à natureza dos diferentes


tipos de software afetam a tributação nos âmbitos estadual e municipal. A
incidência dos impostos indiretos sobre as operações com software
depende, diretamente, da compreensão de sua funcionalidade, seu modo de
utilização e de suas primordiais características, as quais poderão classificá-
lo, se for o caso, como mercadoria ou serviço passível de tributação.

A dificuldade encontrada quanto à classificação do software é agravada


pelos recorrentes e controvertidos posicionamentos das autoridades fiscais.
Ao longo dos anos, as discussões travadas sobre o tema sofreram
reviravoltas no âmbito da jurisprudência dos Tribunais Superiores e dos
atos normativos emitidos pelos Fiscos e, consequentemente, influenciaram
o tratamento tributário a ser conferido pelos contribuintes.

Com base na definição das principais modalidades de software, é


possível definir alguns parâmetros para análise da mais apropriada
tributação aplicável. Partindo de algumas premissas concretas, deve-se
retomar a análise dos conceitos de mercadoria e serviços para, então,

577
verificar a eventual tributação estadual e municipal incidente sobre as
operações com software.

No presente artigo, discutimos a evolução da jurisprudência tributária


com relação às diferentes modalidades de software, bem como os atos
normativos estaduais e municipais recentes sobre o tema.
Desafortunadamente, o surgimento de novas tecnologias não vem sendo
acompanhado com o devido cuidado pelas autoridades fiscais, seja pela
dificuldade na definição da natureza do software, seja por distorções nos
conceitos basilares de mercadoria e serviço.

2. DEFINIÇÃO DE SOFTWARE

O conceito jurídico de software no Direito brasileiro é trazido no


diploma legal que trata da proteção da propriedade intelectual de
programas de computador.

De acordo com o artigo 1º da Lei n. 9.609/98, software (ou programa de


computador) é a “expressão de um conjunto organizado de instruções em
linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer
natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento
da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos,
baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e
para fins determinados”.

Mediante a análise do referido conceito, conclui-se que software é,


genuinamente, um bem incorpóreo dissociado do suporte físico que o
contém.

A discussão sobre se o software pode ser considerado mercadoria é


antiga, tendo sofrido mudanças importantes no cenário jurisprudencial

578
brasileiro no decorrer das últimas duas décadas. O pano de fundo para a
discussão em comento sempre foi a possibilidade de incidência do Imposto
sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre operações
relativas a software e sua interrelação com a possível incidência do
Imposto sobre Serviços (ISS) nas mesmas transações.

No Recurso Extraordinário (RE) n. 176.626/SP, julgado pelo Supremo


Tribunal Federal (STF) em 1998, restou consignado o entendimento de
que, como regra geral, os programas de computador não têm “por objeto
uma mercadoria, mas um bem incorpóreo”, podendo apenas ser
considerados como tal quando, “materializando o mechanicum da criação
intelectual do programa, constituem mercadorias postas no comércio”.

De acordo com o entendimento adotado pelo STF no referido acórdão,


há cerca de duas décadas, apenas as “cópias ou exemplares dos programas
de computador produzidos em série e comercializados no varejo – [...]
‘software de prateleira’ (off the shelf)” poderiam ser entendidas como
mercadoria. A Suprema Corte então apresentou posicionamento de que
somente programas de computador estandardizados que tivessem suporte
físico, a exemplo de CD ou DVD, seriam tidos como mercadorias.

O conceito de mercadoria estaria atrelado, pois, ao fato de ser corpóreo


o bem, isto é, de o produto ser ao menos dotado de suporte físico.

Nesse sentido, o voto condutor do Ministro Relator Sepúlveda Pertence


no mencionado RE n. 176.626/SP asseverou que “o conceito de
mercadoria efetivamente não inclui os bens incorpóreos, como os direitos
em geral: mercadoria é bem corpóreo objeto de atos de comércio ou
destinado a sê-lo”.

579
Atualmente, porém, o STF vem se posicionando de maneira diversa
quanto ao tema.

Na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n.


1.945/MT, de relatoria do ministro Octavio Gallotti, a Suprema Corte
parece ter superado antigos paradigmas ao assentar, em julgamento
ocorrido em 2010, entendimento de que é irrelevante a existência de bem
corpóreo (ou “mercadoria em sentido estrito”) para que mercadoria em
sentido mais amplo exista302.

Importante, nesse contexto, o pensamento exteriorizado no voto-vista


do Ministro Nelson Jobim:

A pergunta fundamental, portanto, é essa: é possível a incidência de ICMS sobre


a circulação de mercadoria virtual?
A resposta, para mim, é afirmativa.
[...]
Existem, basicamente, duas formas, hoje, de aquisição de programa de
computador: uma delas se dá pela tradição material, corpórea de um instrumento
que armazena o mencionado programa.
Tratava-se de forma usual e a mais comum de aquisição de programa de
computador.
Entretanto, a revolução da internet demoliu algumas fronteiras por meio da
criação e aprimoramento de um “mundo digital”.

Nessa mesma linha se pronunciou o então Ministro Presidente Cezar


Peluzo nas discussões ocorridas durante o julgamento: “Em vez de se
comprar da prateleira, compra-se por transferência eletrônica. É a mesma
coisa. Isto é, se está na prateleira, se compra na prateleira; e se compra por
pedido eletrônico, é a mesma coisa. [...]. Em vez de comprar um CD e
instalar na máquina; entra na internet, compra e transfere diretamente para
a máquina. Em ambos os casos, a operação mercantil está caracterizada”.

580
Firmou-se, assim, novo entendimento no STF de que não mais se exige
o caráter corpóreo do bem para a ele ser passível a atribuição da natureza
de mercadoria, o que sobremaneira impacta a possível incidência do ICMS
sobre operações com software, conforme será discutido adiante.

Na Suprema Corte, fez-se a equiparação, para fins tributários, entre o


software adquirido com suporte físico para posterior download no
computador e o software adquirido em meio digital, com download
desvinculado de qualquer suporte físico. Novas tecnologias também
emergiram, como a transferência eletrônica de dados para utilização “na
nuvem”, via internet (streaming), situação que o posicionamento mais
atual do STF parece também alcançar.

Outro aspecto muito importante dos programas de computador sob a


perspectiva do Direito Tributário é a distinção existente entre software
“personalizado” e software “padronizado”.

O software personalizado (“sob encomenda”) é entendido como o


programa de computador encomendado com vistas a atender às
necessidades individuais de determinada pessoa ou grupo de pessoas. O
software padronizado (standard ou “de prateleira”) é o programa de
computador produzido uniformemente em larga escala, de modo a atender
a quaisquer pessoas, de maneira indiscriminada.

Sob esse prisma, terceira possível categorização de software que vem


adquirindo relevo é o denominado software “customizável”, que, mesmo
podendo estar sujeito a determinado grau de personalização, em princípio
caracteriza-se como programa de computador estandardizado, produzido
para atender a uma gama de clientes, e não a um encomendante em
específico, a não ser que tal customização ocorra de maneira a modificar

581
substancialmente as características do software, dando origem a um novo
produto.

Adotando essa mesma base conceitual ao tratar da incidência de tributos


federais sobre o licenciamento de programas de computador customizáveis
e não customizáveis, a Receita Federal, por meio da Coordenação-Geral de
Tributação (COSIT), trouxe o elucidativo esclarecimento a seguir:

25.2 É de notar-se que o software customizável não se confunde com programa


de computador sob encomenda. O primeiro, ainda que comporte certo grau de
personalização, é produto padronizado, pronto para uso, concebido e desenvolvido
para suprir as necessidades de potenciais clientes, ao passo que o segundo visa
atender a um prévio e determinado encomendante. Acrescente-se que a
característica de software customizável não se altera pelo fato de a empresa que o
desenvolve usualmente oferecer o sistema em módulos, divididos de acordo com
funcionalidades do negócio, na medida em que o produto final será resultado de um
ou mais desses módulos. (Solução de Consulta COSIT n. 130/2016.)

Na Resposta à referida Consulta, restou consignada a posição do Fisco


federal no sentido de que meros ajustes a produtos preexistentes para
atender a peculiaridades de determinado cliente não resultam na
personalização do software, que poderá mesmo assim manter a natureza de
software de prateleira. No entanto, caso sejam desenvolvidas melhorias ou
novas funcionalidades ao software, não se estará mais diante de meros
ajustes, mas de prestação de serviço autônomo, que dará origem a software
personalizado.

Esses são os conceitos principais relativos a software que permeiam


este estudo. Alinhamo-nos à atual posição do STF, no sentido de que é
possível haver mercadoria dissociada de qualquer suporte físico, de modo
que a possível incidência, seja do ISS seja do ICMS, sobre operações
relativas a software, dependerá, primordialmente, da natureza do programa
de computador (se personalizado, padronizado ou customizado), bem

582
como do próprio negócio jurídico levado a efeito (cessão temporária ou
definitiva do direito), conforme detalhado doravante.

3. A INCIDÊNCIA DO ISS E DO ICMS NAS OPERAÇÕES COM


SOFTWARE

3.1. Considerações preliminares

Traçada a distinção entre software de prateleira (“padronizado”) e


software sob encomenda (“personalizado”), passamos a analisar a
incidência do ISS e do ICMS em operações que os envolvem. A tributação
incidente sobre tais operações nunca foi tema pacífico, tendo sido
construída em meio a controvérsias e incertezas advindas da própria
Administração Pública, trazendo grande insegurança aos contribuintes.

De acordo com o artigo 156, inciso III, da Constituição Federal, os


Municípios poderão instituir o ISS em relação a serviços de qualquer
natureza definidos em lei complementar federal, à exceção de serviços de
comunicação e de transporte interestadual e intermunicipal, que são
tributáveis pelo ICMS.

Ao dispor sobre regras gerais em matéria de ISS, a Lei Complementar


n. 116/2003 (LC n. 116/2003) traz lista taxativa dos serviços passíveis de
tributação pelo imposto, esclarecendo que os referidos serviços, em
princípio, não podem estar sujeitos ao ICMS ainda que sua prestação
envolva fornecimento de mercadorias.

É nesse mesmo sentido que a Lei Complementar n. 87/96 (LC n.


87/96), ao apresentar regras gerais em matéria de ICMS, esclarece, em seu
artigo 2º, que não são tributáveis pelo imposto estadual os serviços
compreendidos na competência tributária dos municípios, tributáveis pelo
ISS.

583
Da análise das normas acima resulta que, embora em uma primeira
análise determinada operação possa estar potencialmente sujeita tanto ao
ISS como ao ICMS, o ordenamento tributário expressamente veda que os
dois impostos incidam sobre o mesmo evento, de modo que poderá haver,
apenas, sobre determinada atividade, a incidência de um desses impostos,
se e quando for aplicável.

Conjugando-se tais premissas às operações com programas de


computador, é evidente que somente por meio da análise da natureza de
determinado software e do negócio jurídico firmado será possível verificar
se a operação está sujeita ao ISS ou ao ICMS, ou a nenhum deles. Com
efeito, apenas examinando-se se existe, in casu, a prestação de serviço ou a
circulação de mercadoria, será possível concluir se a operação com
software está potencialmente sujeita a algum desses dois impostos.

3.2. ISS

No âmbito do ISS, no que tange a operações com software, cumpre


mencionar que a LC n. 116/2003 teve sua lista de serviços alterada pela
Lei Complementar n. 157/2016 (LC n. 157/2016).

Com as modificações, atualmente, a lista de serviços anexa à LC n.


116/2003 prevê a incidência do ISS sobre (i) processamento,
armazenamento ou hospedagem de dados [...]; (ii) elaboração de
programas de computadores, inclusive de jogos eletrônicos,
independentemente da arquitetura construtiva da máquina em que o
programa será executado [...]; e (iii) licenciamento ou cessão de direito de
uso de programas de computação.

Ainda que determinada atividade conste da lista, deverá,


necessariamente, corresponder a um efetivo serviço prestado a outrem para

584
que seja possível a incidência do ISS, em observância ao seu conceito
constitucional e legal. Não é raro, neste sentido, que sejam discutidas
perante o Poder Judiciário exclusões da lista de serviços anexa à LC n.
116/2003, por determinada atividade arrolada não traduzir, genuinamente,
um serviço.

Com efeito, serviço pressupõe uma obrigação de fazer, em


contraposição a uma mera obrigação de dar. O prestador deve oferecer ao
cliente uma prestação específica, personalizada e individualizada, caso
contrário de serviço não se tratará. Atividades que resultem em produtos
comercializados indistintamente para um rol variado de indivíduos, por
certo, não constituem serviços.

Desta feita, no âmbito do software, o ISS somente pode incidir nas


operações em que há efetiva prestação de serviços, a qual se daria por
meio da produção de software com especificidades exigidas pelo cliente ao
prestador (ou seja, software personalizado ou sob encomenda). É somente
nestes casos que emerge a obrigação de fazer, imprescindível para
incidência do imposto.

Esse entendimento está em consonância com as decisões dos Tribunais


Superiores. Com efeito, conforme o atual entendimento do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), software desenvolvido para clientes de forma
personalizada gera a incidência do ISS, por caracterizarem prestações de
serviços personalizados303. O referido posicionamento trilha a mesma
esteira do decidido por essa mesma Corte há cerca de duas décadas, em
1997, no julgamento do Recurso Especial (Resp) n. 123.022/RS.

3.3. ICMS

585
Já no âmbito do ICMS, o questionamento que se deve ter em mente
para analisar a possível incidência do imposto sobre as operações
relacionadas com programas de computador é se, além de ser enquadrado
como padronizado e disponibilizado a consumidores sem distinções
relevantes de características, o software pode ser caracterizado como
mercadoria cuja propriedade está sendo transferida a outrem.

Apesar de a definição de mercadoria, em princípio, soar simples, a


realidade é que, com o avanço das operações virtuais, o seu conceito
tradicional também foi bastante questionado e discutido, especialmente
quanto à necessidade de esta constituir, necessariamente, bem corpóreo, é
dizer, um objeto material em sentido estrito.

Como comentado, o STF304, ao se deparar no ano de 2010 com essa


controvérsia, reformou sua posição anterior e firmou entendimento de que
é possível exigir ICMS sobre a venda de software por meio de
transferência eletrônica de dados, ou seja, via download (ou streaming).
Com isso, concluiu o Tribunal pela irrelevância da existência de bem
corpóreo para a incidência do imposto, alterando o seu entendimento
anterior de que o ICMS somente incidiria quando da comercialização de
programas de computador se eles possuíssem suporte físico305.

O entendimento mais recente do Tribunal nos parece acertado. Em vista


da evolução do comércio eletrônico, julgamos que o conceito de
mercadoria não pode deixar de abarcar circunstâncias novas, para se
restringir a premissas que não mais estão amoldadas à atualidade. Hoje,
um mesmo programa de computador pode ser adquirido via download ou
streaming em meio ao ambiente digital, ou pela tradição material de bem
corpóreo que o armazena. Trata-se da mesma mercadoria, com diferentes
formas de apresentação e aquisição.

586
Outra premissa a ser avaliada nas operações com software para fins de
incidência do ICMS, após a caracterização de sua natureza como
mercadoria, é se ocorre a efetiva tradição do bem a terceiro, ou seja, a
transferência de sua titularidade. De fato, a operação mercantil de
circulação pressupõe que a titularidade da mercadoria seja alterada do
vendedor para o adquirente.

A venda do software difere, essencialmente, da cessão temporária do


direito de uso. Muitos dos contratos firmados em relação aos programas de
computador são contratos de licenciamento ou cessão de direito de uso, e
não contratos de compra e venda propriamente ditos, em que haveria a
transferência da titularidade de direitos.

A exemplo desse entendimento, em 2014, no julgamento do RE n.


540.829/SP, o STF se posicionou no sentido de que o ICMS incide sobre
operações relativas à circulação de mercadoria, nos termos do artigo 155,
inciso II, da Constituição Federal, a qual somente ocorre quando há efetiva
transferência de propriedade (de domínio) da mercadoria, o que não se
verificaria em determinadas operações de arrendamento mercantil, por
exemplo. Por meio desse julgado, reiterou-se que os conceitos de Direito
Privado não podem ser desnaturados pelo Direito Tributário, na forma do
artigo 110 do Código Tributário Nacional (CTN).

A jurisprudência nos Tribunais Superiores é pacífica nesse sentido,


tendo sido inclusive objeto da Súmula 166 do STJ, segundo a qual “não
constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de
um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”, justamente pela
ausência de circulação jurídica do bem (isto é, transferência da sua
titularidade legal).

587
Portanto, para que o ICMS seja devido, é imprescindível que o
adquirente do software não tenha apenas o direito de uso do programa de
computador por determinado lapso temporal, mas a sua efetiva
propriedade, nos exatos termos do artigo 11 da Lei n. 9.609/98306, o que
implica, inclusive, a transmissão do código-fonte, possibilitando que o
adquirente manuseie o software da maneira que desejar. Portanto, ainda
que o software possa ser qualificado como mercadoria (software de
prateleira), não se pode olvidar a natureza jurídica da operação praticada.

Sendo assim, independentemente de o software ser adquirido em via


física ou digital, por download ou streaming, a obrigação tributária quanto
ao ICMS somente pode surgir quando e se houver a transmissão de
titularidade da mercadoria, com a transferência dos direitos de uso, gozo e
fruição a ele relacionados (incluindo os direitos autorais), o que é possível
apenas com relação aos programas cuja exploração econômica não se
limite à cessão ou licenciamento temporário do direito relacionado ao seu
uso.

Dito isso, em movimento visando à legitimação da cobrança do ICMS


sobre operações com software, em âmbito estadual foi publicado, em
2015, o Convênio ICMS n. 181, o qual, confirmando a possibilidade de
tributação, autoriza determinados Estados, dentre estes São Paulo e Rio de
Janeiro, a conceder redução de base de cálculo do imposto. Nos termos de
sua cláusula primeira, os Estados signatários estão autorizados a reduzir a
base de cálculo do ICMS nas operações com softwares padronizados (de
prateleira), de modo que a carga tributária corresponda ao percentual
mínimo de 5%, inclusive nas operações realizadas mediante transferência
eletrônica de dados.

588
Tendo em vista o aludido Convênio, e com evidente intenção de tributar
tais operações, o Governo paulista editou o Decreto n. 61.791/2016307,
alterando o Regulamento do ICMS de São Paulo para prever a redução da
base de cálculo nas operações com software padronizado, de modo que a
carga tributária resulte em percentual de 5%. Contudo, em face do disposto
no artigo 37 das Disposições Transitórias308, suspendeu-se, por prazo
indeterminado, a cobrança do ICMS sobre transferências de dados via
download ou streaming até que ficasse definido o local de ocorrência do
fato gerador e, como consequência, o estabelecimento responsável pelo
pagamento do imposto.

Recentemente, o Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ)


publicou o Convênio ICMS n. 106/2017, com produção de efeitos em abril
de 2018309, visando disciplinar os procedimentos de cobrança do imposto
nas operações com mercadorias digitais comercializadas por meio de
transferência eletrônica de dados.

Dentre as mercadorias digitais abarcadas pelo Convênio em questão,


está o software padronizado, ainda que tenha sido ou possa ser adaptado
(“customizável”), comercializado por meio de transferência eletrônica de
dados. De acordo com esse Convênio, as transferências do software
anteriores à saída destinada ao consumidor final ficam isentas do ICMS.

O referido Convênio determina, ainda, que o imposto será recolhido,


nas saídas internas e nas importações realizadas por meio de site ou de
plataforma eletrônica que efetue a venda ou a disponibilização, mesmo que
por intermédio de pagamento periódico, de bens e mercadorias digitais
mediante transferência eletrônica de dados, na unidade federada onde é
domiciliado ou estabelecido o adquirente do bem ou mercadoria digital.

589
Portanto, por meio desse ato, foi definido o local do fato gerador do
imposto, conforme almejado pelo Estado de São Paulo, muito embora
julguemos que o Convênio n. 106/2017 não pode fazer as vezes de lei
complementar federal para determinação do local de ocorrência do fato
gerador do ICMS nos casos de operações com software adquirido por
transferências eletrônicas de dados, conforme será comentado adiante.

Diante deste cenário, nota-se que, independentemente da forma de


aquisição, existe previsão legislativa de que as operações com software de
prateleira sejam tributadas pelo ICMS. Não sendo imprescindível o suporte
físico para a caracterização da mercadoria, o software adquirido via
transferência eletrônica de dados pode ser tributado pelo imposto estadual
a partir de abril de 2018, ressalvada a questionável determinação do local
da incidência do fato gerador por instrumento diverso de lei complementar
federal. De qualquer maneira, não se pode olvidar a necessidade de haver
efetiva transferência de titularidade do software, condição sine qua non
para a incidência do imposto estadual.

4. CONTROVÉRSIAS DA TRIBUTAÇÃO DE SOFTWARE PELO ISS E


PELO ICMS

Em termos gerais, no que tange à tributação das operações com


software, o STF, no julgamento do RE n. 176.626/SP, e o STJ, no REsp n.
123.022/RS, firmaram entendimento de que estaria sujeita à incidência do
ICMS a circulação de softwares de prateleira (“off the shelf”), produzidos
em série e larga escala para comercialização no varejo. De outra maneira,
o ISS incidiria sobre as operações com software produzido sob
encomenda, com a finalidade de atender a necessidade de determinado
usuário, quando, então, estaria caracterizada a prestação de serviço.

590
De fato, a prestação de serviços pode claramente ser identificada nos
casos em que há o fornecimento de um software sob encomenda, sempre
que o contratado desenvolver o programa de computador conforme a
solicitação e especificações do adquirente.

Por outro lado, o fenômeno da obrigação de fazer não pode ser


identificado nos casos de circulação de softwares de prateleira, produzidos
e comercializados em massa para qualquer indivíduo, sem que tenha
havido solicitações específicas por parte dos adquirentes. Neste caso, a
obrigação é de dar, sendo que o conceito de mercadoria é o que sobressai
do negócio jurídico.

No entanto a determinação da natureza do software e a sua


correspondente tributação não é facilmente enquadrada neste raciocínio.
As operações com software seguem dando margem a diversas dúvidas
quanto ao seu tratamento tributário, que não são sanadas pelas normas
vigentes, pois, além de contraditórias quanto à competência tributária em
algumas situações, não acompanham o contínuo desenvolvimento de
novas formas de tecnologia.

Ao longo dos anos, com o avanço tecnológico do comércio eletrônico, é


possível dizer que as controvérsias quanto à incidência do ISS e do ICMS
sobre as operações com software estão longe de acabar. Cada nova
ferramenta virtual disponibilizada no mercado vem acompanhada de
discussões sobre a natureza e a tributação correlata, se como serviço ou
mercadoria, ou nenhum deles.

Atualmente, há legislações estaduais e municipais que apresentam,


inclusive, ilegais hipóteses de dupla tributação do ISS e do ICMS sobre a
aquisição de determinado software, em contradição com posicionamentos

591
consolidados dos Tribunais Superiores e em prejuízo à segurança jurídica e
à confiança do contribuinte na Administração Tributária.

•Parecer Normativo SF n. 1/2017 – Prefeitura de São Paulo

De acordo com o Parecer, o ISS incide sobre:

•licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação, por


meio de suporte físico ou por transferência eletrônica de dados (“download de
software”), ou quando instalados em servidor externo (“Software as a Service
– SaaS”),
•independentemente de o software ter sido programado ou adaptado para
atender à necessidade específica do tomador (software sob encomenda) ou ser
padronizado (software de prateleira).

Com o referido Parecer, a Municipalidade de São Paulo ignorou, por


completo, a jurisprudência firmada nos Tribunais Superiores quanto à
incidência do ICMS, e não do ISS, sobre a circulação do software de
prateleira, bem como os termos dos anteriormente abordados Convênios n.
181/2015 e n. 106/2017, que preveem a incidência do imposto estadual
sobre as operações com essa modalidade de software.

Ainda que o referido parecer esteja tratando de operações de


licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computador, e
o ICMS somente incida nos casos de venda, o fato é que o software de
prateleira, como visto, não envolve qualquer prestação de serviço.

Além disso, a previsão do Parecer Normativo SF n. 1/2017 quanto à


tributação pelo ISS das operações relacionadas com o denominado SaaS
(Software as a Service), que corresponde a modalidade de software
relativa a cloud computing (computação na nuvem), também é bastante
controversa.

592
Com efeito, trata-se de tecnologia que está se popularizando atualmente
nas empresas brasileiras, cuja tributação ainda não está claramente
definida. Apesar de o nome indicar ser um “software como serviço”, o fato
é que, pela análise da natureza de alguns destes SaaS, não predomina
genuína prestação de serviços.

A Prefeitura de São Paulo alega que o Parecer foi emitido como forma
de “uniformizar a interpretação” acerca do enquadramento tributário dos
negócios jurídicos de licenciamento ou cessão de direito de uso de
programas de computação, por meio de suporte físico ou por transferência
eletrônica de dados, ou quando instalados em servidor externo. No entanto,
em cenário de conflito de competência tributária quanto às operações com
software, o que se vê é justamente o efeito contrário do suposto intuito de
uniformização preconizado pela Prefeitura, com a instauração de maior
insegurança aos contribuintes.

Há dois aspectos altamente questionáveis no Parecer da Prefeitura de


São Paulo, a saber: (i) os contribuintes que realizarem operações com
software de prateleira poderão estar sujeitos à bitributação, uma vez que
dois entes tributantes, um estadual e outro municipal, estarão cobrando
tributos distintos sobre um mesmo fato gerador; e (ii) toda e qualquer
operação envolvendo SaaS, modalidade de software em que pode nem
mesmo predominar efetiva prestação de serviço, será tributada pelo ISS.

Vale dizer que o Parecer em questão revoga todas as Soluções de


Consulta anteriormente emitidas em sentido contrário, sendo, ainda,
impositivo e vinculante para as autoridades fiscais.

•Decisão Normativa CAT n. 4/2017 – Secretaria da Fazenda do Estado de São


Paulo

593
De acordo com a Decisão Normativa CAT n. 4/2017, podem ser
tributadas pelo ICMS as operações com software não personalizado, que
pode ter suas cópias distribuídas em larga escala por meio físico ou ser
negociado em meio digital, tanto por download como por streaming, que
se daria justamente com a utilização do software “na nuvem”310.

Ocorre que, em muitas das situações observadas na prática, as


operações com software de prateleira envolvem o mero licenciamento do
direito de uso do programa de computador. Não existe a efetiva
transferência de titularidade do software em si, com a entrega do código-
fonte para o adquirente.

Considerando que para a incidência do ICMS é imprescindível que


exista a transferência de titularidade do bem, o Fisco estadual deve buscar
a tributação da efetiva aquisição de software, seja em lojas físicas ou pela
internet (download ou streaming), tão somente nas situações em que exista
a circulação de todos os direitos de propriedade de uma pessoa para a
outra.

Na prática, sabe-se que o intuito da legislação estadual é alcançar toda e


qualquer operação envolvendo software independentemente de a dita
“comercialização” dar-se de maneira definitiva, não se traduzindo em mera
cessão temporária do direito de uso, o que também traz insegurança
jurídica e certamente poderá ser questionado pelos contribuintes.

•Convênio n. 106/2017 – CONFAZ

Como já dito, o Convênio n. 106/2017 foi publicado com o condão de


disciplinar os procedimentos de cobrança do ICMS incidente nas
operações com software comercializado por meio de transferência
eletrônica de dados.

594
No entanto, por meio de tal ato, o CONFAZ, além de definir o local de
incidência do ICMS nas aludidas operações, também definiu os
contribuintes e responsáveis pelo recolhimento do imposto, o que não lhe
cabe, porquanto tais matérias devem ser disciplinadas, privativamente, por
lei complementar.

De fato, somente lei complementar federal tem o condão de definir a


base de cálculo, o fato gerador e os contribuintes e responsáveis pelo
recolhimento do tributo, nos termos do artigo 146, da Constituição
Federal. Desse modo, a definição do local do fato gerador do ICMS, dos
contribuintes e dos responsáveis nessas operações com software jamais
poderia ter ocorrido por intermédio de Convênio, sendo tal ato, portanto,
eivado de inconstitucionalidade.

Diante de tal norma, o Estado de São Paulo, que estava aguardando a


regulamentação concernente à definição do fato gerador do imposto em
tais operações, pode cobrar o ICMS sem respaldo em lei complementar
federal, o que é absolutamente questionável.

•Customização ou Adaptação – Limites Subjetivos

Como anteriormente mencionado, as novas tecnologias trouxeram os


denominados softwares customizáveis, sujeitos a determinado grau de
personalização e produzidos para atender a um certo grupo de clientes.

Com efeito, em linha com o entendimento manifestado pelo Fisco


federal, este software não necessariamente é desenvolvido sob encomenda
e, apesar de comportar certo grau de customização, ainda se enquadraria
na categoria de software de prateleira (mercadoria) na medida em que a
customização implique meros ajustes, sem modificação da natureza do
programa.

595
Nessa situação, o enquadramento dos softwares customizáveis como de
prateleira está em consonância com o anteriormente citado Convênio
ICMS n. 106/2017, que trouxe os procedimentos de cobrança do ICMS nas
operações com mercadorias digitais comercializadas por meio de
transferência eletrônica de dados, incluindo neste rol os softwares
padronizados, ainda que tenham sido ou possam ser adaptados.

Vê-se, portanto, que o Convênio ICMS n. 106/2017, ao trazer o termo


“adaptados”, está efetivamente tratando da customização do software de
prateleira. Controvérsias podem surgir, no entanto, em relação a até que
ponto a customização não implica a necessária recaracterização do
software, de software padronizado para software personalizado. Há grande
subjetividade envolvida no conceito de customização.

Não são claros na legislação e na jurisprudência os limites que devem


ser respeitados para que um software customizável seja considerado de
prateleira, sem que tenha sua natureza alterada para software sob
encomenda, tributável pelo ISS, de modo que, a depender da situação,
podemos estar diante dos Fiscos estadual e municipal exigindo dois
tributos sobre a mesma operação.

5. CONCLUSÕES

A legislação tributária brasileira, certamente, não está devidamente


amoldada para tratar da tributação das novas tecnologias. Mesmo nas
situações que abrangem os conceitos básicos de software padronizado e
personalizado, ainda há intensa controvérsia quanto à incidência do ICMS
ou do ISS, saltando aos olhos, inclusive, posicionamentos antagônicos nos
atos emitidos pelas autoridades estaduais e municipais.

596
A segurança jurídica e a confiança do contribuinte na Administração
Pública são lesadas nas operações com software. O que se vê é a
instauração de verdadeira guerra fiscal entre os entes públicos para tributar
as operações envolvendo as novas figuras do software, por meio da
expedição de atos normativos por vezes ilegais, ou mesmo
inconstitucionais, no intento de garantir a arrecadação dos impostos.

Como se pode notar da análise efetuada, é comum que as operações


com software sejam tratadas de maneira indevida pelos Fiscos estadual e
municipal, ora como mercadoria ora como serviço, sem uma análise
adequada de sua verdadeira natureza do caso concreto. A análise das
características do software não pode ser realizada de forma isolada,
devendo-se também determinar a natureza do negócio jurídico praticado
(compra e venda, com transferência de propriedade, ou licenciamento ou
cessão temporária pelo direito de uso).

A variedade de modalidades de software hoje disponíveis é enorme, de


modo que o enquadramento desses instrumentos em categorias mais
amplas, que não comportam as peculiaridades de cada situação, como vem
ocorrendo com o denominado SaaS, não parece ser a melhor opção para se
definir a tributação.

De fato, certas lacunas e indefinições, hoje existentes na legislação,


além de acarretarem a insegurança jurídica dos contribuintes, prejudicam a
própria arrecadação dos Estados e Municípios, que têm editado normas
conflitantes entre si e também em desacordo com os conceitos basilares
preconizados na Constituição Federal. Diante do cenário legislativo atual,
impõe-se que os Fiscos estaduais e municipais revejam seus
posicionamentos relativos à tributação indireta das operações com

597
software, sob pena de aumento progressivo da já elevada judicialização do
tema.

598
O ISS e a exportação de serviços: conceito de
resultado e o princípio do destino nas
atividades voltadas à economia digital
311
Fernanda Ramos Pazello

O tema do presente artigo está diretamente relacionado à tese que


defendi quando da conclusão do meu mestrado, intitulada “Desonerações
tributárias das operações de exportação: a imunidade das contribuições
sociais e a isenção do ISS”312. Considerando o propósito da presente obra,
direcionarei meu olhar para a aplicação da desoneração tributária do
Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISS) sobre as operações de
exportação de serviços e seu impacto sobre os serviços atrelados à
economia digital.

Temos como objetivo verificar quando se dá a exportação de um


serviço para fins de aplicação da regra desonerativa do ISS prevista no
artigo 2º, inciso I e parágrafo único da Lei Complementar n. 116, de 2003
(LC n. 116/2003), bem como analisar com olhos críticos as posições
antagônicas dos entes tributantes (Municípios e Distrito Federal),
contribuintes e Poder Judiciário sobre o conceito de “resultado”, para que
possamos buscar parâmetros que contribuam na constatação da exportação
para as atividades da economia digital.

Podemos antecipar desde já que a questão acerca de onde se realiza um


serviço/seu resultado já é bastante controversa para os serviços
considerados tradicionais, com uma postura restritiva dos entes tributantes
(a exemplo do Parecer Normativo n. 4, de 2016, do Município de São
Paulo). Uma boa notícia é que há um Projeto de Lei do Senado, de n.

599
475/2017 (PLS n. 475/2017), aprovado em 14 de dezembro de 2017 no
Senado Federal, que busca pôr fim a essa controvérsia propondo a
alteração do artigo 2º da LC n. 116/2003, conforme mostraremos a seguir.

De qualquer forma, temos certeza de que o desafio proposto neste


trabalho ganha ainda mais relevo quando se procura aplicar os
conceitos/premissas que serão a seguir desenvolvidos para os serviços que
estão atrelados à economia digital, assim entendidas as atividades
econômicas desenvolvidas por meio do uso da tecnologia digital (ou seja,
transações realizadas em ambiente virtual), haja vista a dificuldade
aparente de se identificar as partes envolvidas (prestador e tomador), onde
se dá a prestação do serviço e seu resultado.

A economia digital vem ganhando cada vez mais importância para o


Direito, haja vista sua presença marcante na economia e seu constante
crescimento e, por outro lado, a dificuldade em se adequar os
conceitos/institutos tradicionais a essas novas tecnologias extremamente
voláteis. O Direito Tributário Internacional tem dado especial atenção à
economia digital por intermédio de estudos no âmbito da OCDE
(Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico),
notadamente por meio do Action Plan 1 do BEPS (Base Erosion and Profit
Shifting)313, na busca de peculiaridades da economia digital e critérios para
sua tributação.

Como exemplo de serviços da era digital, podemos citar (i) o cloud


computing (computação em nuvem), que se refere à utilização da memória
e da capacidade de armazenamento e cálculo de computadores e servidores
compartilhados e interligados por meio da internet, no qual as empresas
oferecem o serviço em nuvem para guarda de arquivos, informações,
imagens, vídeos, e-mails ou mesmo para permitir que empresas

600
compartilhem hardware; (ii) os serviços over the top (serviços OTT), que
são as atividades de transmissão de conteúdo audiovisual, mensagens e
voz por meio de plataformas IP314; (iii) as operações de marketing por meio
de websites ou inserção de propaganda on-line (denominada publicidade
on-line); (iv) os serviços de informática, que envolvem desenvolvimento
de sistemas, processamento de dados, programação, data center; (v) os
novos serviços de pagamento, em que empresas se colocam como
intermediárias do pagamento e apresentam vantagens como proteção à
fraude, maior velocidade nas transações; (vi) cessão e licença de uso de
software, dentre outros que já existem ou que ainda surgirão.

A par do conflito entre ISS e ICMS para alguns desses exemplos,


assumiremos que se trata de serviços que se encontram dentro da
competência tributária dos Municípios/Distrito Federal para a exigência do
ISS e traremos elementos para que seja possível identificar quando esses
serviços são exportados para fins de aplicação da norma de desoneração
tributária.

1. O ISS E AS OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO

O ISS é um imposto de competência dos Municípios e do Distrito


Federal, incidente sobre serviços de qualquer natureza previstos em lei
complementar, com exceção dos serviços de transporte interestadual e
intermunicipal e sobre os serviços de comunicação (art. 156, I, da CF/88).

O seu critério material, de acordo com José Eduardo Soares de Melo315,


é a prestação de serviço que compreenda um negócio jurídico pertinente a
uma obrigação de fazer de conformidade com os postulados e diretrizes do
Direito Privado. Só pode incidir ISS onde haja obrigação de fazer, ou seja,
onde há esforço humano a terceiros.

601
Assim, o fato gerador do ISS é a prestação de serviço entendida como
aquela atividade caracterizada como um esforço humano (obrigação de
fazer) empreendido por alguém (prestador do serviço) a outrem (tomador
do serviço), em decorrência da celebração de contrato que possua um
conteúdo econômico (preço do serviço). Já o critério temporal do ISS é o
momento da efetiva ocorrência da prestação do serviço, que se conclui
com a entrega do resultado do trabalho.

Os critérios de incidência do ISS encontram-se disciplinados na Lei


Complementar n. 116, de 2003 (LC n. 116/2003), com as alterações da Lei
Complementar n. 157, de 2016 (LC n. 157/2016). No que interessa ao
presente estudo, a LC n. 116/2003 excluiu a exportação de serviços da
incidência do ISS com fundamento no artigo 156, § 3º, inciso II, da
Constituição Federal de 1988 (CF/88)316, nos seguintes termos:

Art. 2º O imposto não incide sobre:


I – as exportações de serviços para o exterior do País;
II – a prestação de serviços em relação de emprego, dos trabalhadores avulsos,
dos diretores e membros de conselho consultivo ou de conselho fiscal de sociedades
e fundações, bem como dos sócios-gerentes e dos gerentes-delegados;
III – o valor intermediado no mercado de títulos e valores mobiliários, o valor
dos depósitos bancários, o principal, juros e acréscimos moratórios relativos a
operações de crédito realizadas por instituições financeiras.
Parágrafo único. Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços
desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento
seja feito por residente no exterior. (...)

Alguns doutrinadores tratam o artigo 156, § 3º, inciso II, da CF/88


como uma norma de estrutura que autoriza a lei complementar a isentar as
operações de exportação do ISS (isenção heterônoma – isenções
concedidas por pessoa diversa daquela que tem competência constitucional
para instituir o tributo) e, por outro lado, outros doutrinadores entendem
que se trata de uma norma de imunidade.

602
Filio-me à corrente que entende que se trata de uma norma
constitucional que autoriza a instituição de uma isenção heterônoma, pois
permite que a lei complementar exclua da incidência do ISS as operações
de exportação. Portanto referida norma depende de lei complementar
excluindo a incidência do ISS sobre as operações de exportação e
disciplinando suas condições. Sem a lei complementar, não há isenção do
imposto municipal317. Nesse sentido, confira-se o entendimento de Regina
Helena Costa, atual Ministra do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

(...) a norma constitucional deve exaurir a disciplina dos limites da situação de


intributabilidade para que se possa reconhecer a existência de imunidade. Ao
contrário, se a tipificação da situação não advier integralmente da Lei Maior seu
status não será de imunidade, mas somente de isenção. Para nós, as normas
constitucionais apontadas, em verdade, versam sobre hipóteses de isenção
heterônoma – quais sejam, aquelas outorgadas por pessoa política distinta daquela
competente para a instituição do tributo correspondente, posto não esgotarem o
318
perfil normativo da situação infensa à tributação [...] .

1.1. Seu critério espacial e o princípio da territorialidade

Cumpre-nos analisar mais detidamente o critério espacial do ISS, na


medida em que se mostra de fundamental importância para o presente
trabalho. A definição do critério espacial visa, em um primeiro momento,
evitar conflito de competência entre os Municípios, principalmente nas
hipóteses em que há vários Municípios envolvidos na prestação do serviço.

O artigo 3º da LC n. 116/2003 buscou evitar esse conflito, ao


estabelecer, como regra geral, que o imposto será devido no local do
estabelecimento prestador ou, na falta deste, no local do domicílio do
prestador. Ademais, estabeleceu hipóteses específicas em que o imposto
será devido no local da prestação de serviços. O artigo 4º da LC n.
116/2003 preceituou estabelecimento prestador como “(...) local onde o
contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo

603
permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou
profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de
sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de
representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas
(...)”.

Para fins metodológicos, adotaremos o critério espacial previsto na LC


n. 116/2003, ou seja, se o prestador for pessoa jurídica, o ISS será devido
no local do estabelecimento prestador, como regra; e, se for pessoa física,
o imposto será devido no local do domicílio do prestador, nos termos dos
artigos 3º e 4º da LC n. 116/2003. Ou seja, o elemento de conexão, em
regra, será a origem do serviço.

E nas hipóteses em que o serviço foi integralmente prestado no exterior


por prestador brasileiro a tomador estrangeiro? A nosso ver, a lei
municipal não pode alcançar fatos geradores ocorridos no exterior, uma
vez que as normas municipais não têm poderes extraterritoriais, tal como
reconhecido pelo Superior Tribunal Justiça319.

De acordo com o princípio da territorialidade, implícito na CF/88, as


pessoas políticas podem expedir normas com vigência dentro de seus
limites territoriais. Portanto a regra é que a norma jurídica colha apenas
fatos jurídicos que venham a ocorrer dentro de seu território. As exceções
ao princípio da territorialidade estão expressamente previstas na
Constituição Federal, tais como os lucros auferidos no exterior que são
tributados pelo Imposto de Renda (princípio da universalidade) e os
serviços prestados fora do Município (sujeito passivo da obrigação
tributária).

604
Em razão do princípio da territorialidade e da ausência de previsão
constitucional, a prestação de serviços integralmente no exterior a tomador
estrangeiro, cujo resultado lá se verifique, escapa à incidência do imposto
municipal, uma vez que o fato não ocorre nos limites territoriais do Brasil
(hipótese de não incidência tributária). Ressalte-se que nas hipóteses em
que o serviço apenas iniciou-se no exterior ou foi prestado no exterior, mas
o resultado (beneficiário direto) ocorreu no Brasil, há regra expressa da LC
n. 116/2003 determinando sua tributação pelo ISS320.

2. O TRATAMENTO TRIBUTÁRIO DADO ÀS OPERAÇÕES DE


EXPORTAÇÃO: FINALIDADE CONSTITUCIONAL E O PRINCÍPIO
DO DESTINO

Em razão dos diversos tributos indiretos sobre a produção e o consumo,


há um inevitável aumento do valor dos produtos ou serviços exportados, o
que prejudica a atuação do Brasil em relação ao comércio internacional.
Portanto é inquestionável que o sistema brasileiro precisa estar sempre
buscando instrumentos jurídicos adequados para garantir igualdade de
oportunidades aos exportadores brasileiros.

De certa forma, a nossa CF/88 preocupou-se em assegurar a redução da


carga tributária incidente sobre as operações de exportação, sejam as
exportações de produtos/mercadorias ou as exportações de serviços,
quando:

a) afastou a incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre


321
os produtos destinados ao exterior e do Imposto sobre Operações de
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre mercadorias para o
322
exterior e serviços prestados destinados ao exterior , com a manutenção e
aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações
anteriores;
b) estabeleceu caber à lei complementar excluir da incidência do ICMS outros
323
serviços ou produtos; e do ISS, exportações de serviços para o exterior ; e

605
c) impediu a incidência das contribuições sociais e de intervenção do domínio
324
econômico sobre as receitas decorrentes de exportação .

Com efeito, o afastamento da tributação das operações de exportação é


decorrência de finalidades já traçadas nas Constituições Federais anteriores
e que foram mantidas na Constituição Federal de 1988. Segundo Misabel
Derzi, ao atualizar o livro de Aliomar Baleeiro,

[...] a Constituição de 1988, abrigando as tendências das anteriores, é marcada


por duas características relevantes na política tributária, direcionadas ao
desenvolvimento: estímulo ao desenvolvimento industrial, voltado à exportação; e
incentivo ao desenvolvimento harmonioso da Federação, pela redução das
desigualdades regionais. Assim foram repetidas as imunidades que marcaram as
Constituições anteriores, das últimas décadas como a imunidade do imposto
incidente sobre a produção industrial destinada ao exterior (art. 153, § 3.º, III) e a
imunidade do imposto sobre a circulação desses mesmos produtos nas operações de
exportação (art. 155, § 2.º, X, a). Como registrou Aliomar Baleeiro, trata-se de uma
política destinada a impedir ou a atenuar a exportação de impostos, que afetam a
competitividade dos produtos nacionais no mercado externo, a obtenção de divisas e
o equilíbrio da balança de pagamentos. Coerentemente, tanto os créditos incidentes
sobre a produção ou a circulação nas etapas anteriores eram mantidos para
abatimento ou devolução, de modo que os produtos nacionais chegassem ao exterior
325
livres de tributos [...] .

Tal finalidade está expressa no artigo 3º da CF/88 quando assegura o


princípio do desenvolvimento econômico, ao prescrever que “constituem
objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...) II –
garantir o desenvolvimento econômico”. Ora, é sabido que o
desenvolvimento nacional depende de um resultado favorável do comércio
internacional, principalmente no que diz respeito à produção de
mercadorias e serviços, após a crescente integração das economias.

Portanto as desonerações tributárias relacionadas às operações de


exportação têm como fundamento o valor expresso na nossa CF/88, ou
seja, o desenvolvimento econômico do Brasil. Duarte Ivo Cruz nos
relembra que:

606
[...] o incremento da exportação significa, antes de mais, a expansão e
aperfeiçoamento do parque industrial, o desenvolvimento tecnológico da produção;
o incremento da comercialização respectiva; em suma – o reforço de uma
potencialidade de riqueza, de qualidade de vida, necessários ao bem-estar nacional
326
[...] .

Conforme ressaltado por John F. Due, em livro intitulado Tributação


indireta nas economais em desenvolvimento, citado por Heleno Taveira
Tôrres327, sempre que o preço da exportação incluir certo elemento fiscal,
prejudicando os exportadores, caberá ao Estado adotar medidas urgentes
para superar as inevitáveis distorções comerciais, sob pena de ocorrer um
desfavorecimento da posição dos produtores nacionais no mercado
internacional em relação às empresas de países que não impõem tributos.
Trata-se da adoção do princípio do destino (exportações são isentas e
importações são tributáveis), também seguido pelos países do Mercosul
(Argentina, Uruguai e Paraguai), bem como pelos países europeus328, em
certas situações.

É possível verificar que, no âmbito internacional, vigora o princípio de


tributação no destino, em que se aponta a competência tributária de um
tributo indireto para o país onde ocorra o consumo final. No caso de
serviços, também deve se exigir que a tributação ocorra no local onde
estabelecido o seu destinatário ou o beneficiário dos serviços. Dentro dessa
concepção, deve-se tributar o serviço onde esteja localizado o tomador que
usufruirá desse serviço, independentemente de quem seja a fonte pagadora.
Esse raciocínio é crucial para que se cumpra a finalidade constitucional de
diminuição da carga tributária dos serviços exportados, desenvolvimento
da exportação em benefício da economia nacional, dentro da concepção do
princípio do destino e nos termos do artigo 3º da CF/88 e do princípio da
neutralidade fiscal internacional.

No entanto, o que seria uma operação de exportação? Para que

607
possamos prosseguir no nosso objetivo, faz-se necessário delimitar o
conceito de operação de exportação, mais especificamente, de exportação
de serviço.

3. PROPOSTA CONCEITUAL: OPERAÇÃO DE EXPORTAÇÃO DE


SERVIÇOS

O verbo exportar é aplicável no sentido de remeter, deslocar do


território do exportador para outro. Em sua definição do vocábulo, De
Plácido e Silva assevera:

[...] Exportação. Derivado do latim exportatio, de exportare (levar para fora),


indica, na terminologia comercial e jurídica, todo ato de remessa de uma mercadoria
ou produto para o exterior, isto é, para fora do país em que foi produzida.
Tecnicamente, pois, o vocábulo exportação envolve, simples e puramente, o
sentido de saída de mercadorias para país estranho.
Desse modo, não se entende exportação, a circulação ou trânsito da mercadoria
dentro de um país, isto é, em seus limites territoriais, pois que exportar é mandar
para fora. E, juridicamente, para fora quer significar para outro país ou para país
estrangeiro.
Opõe-se, assim, à importação, que é a mercadoria ou o produto trazido para o
interior de um país. É o ato de trazer, para consumo interno, a mercadoria
estrangeira.
Nesta razão é que, na terminologia fiscal, direitos ou impostos de exportação
329
entendem-se direitos ou impostos de saída da mercadoria para o estrangeiro [...] .

As operações de exportação envolvem produtos ou serviços. Produto é


gênero do qual mercadoria é espécie, sendo o primeiro conceituado como
um bem móvel e corpóreo, e o segundo seria um bem móvel e corpóreo,
destinado ao comércio330. Serviço é um bem não corpóreo e que pode ser
definido como uma atividade caracterizada como um esforço humano
(obrigação de fazer) empreendido por alguém (prestador do serviço) a
outrem (tomador do serviço).

Assim, delimitaremos o conceito de operação de exportação a todo ato


de exportar, remeter produtos ou serviços para países estrangeiros,

608
incluídos os produtos das indústrias, dos estabelecimentos comerciais, dos
serviços, das artes ou matérias-primas nacionais. As partes envolvidas nas
operações de exportação são: (i) no caso de produtos, o exportador
brasileiro e o importador estrangeiro; e (ii) no caso de serviços, o prestador
brasileiro e o tomador estrangeiro.

Em ambas as hipóteses, entendemos que deve haver a remessa dos


produtos ou serviços para os países estrangeiros. No caso dos produtos,
por se tratar na maior parte das vezes de um bem corpóreo, a remessa do
produto ao exterior configura-se no momento do despacho aduaneiro e,
portanto, não há dificuldades em verificar a ocorrência da exportação. O
mesmo não se dá relativamente aos serviços, já que não é tão simples a
verificação da ocorrência da sua exportação, uma vez que se trata de um
bem incorpóreo.

Se o serviço foi prestado no exterior por prestador brasileiro,


evidentemente houve a exportação do serviço. No entanto, se o serviço foi
prestado no Brasil a tomador estrangeiro, como verificaremos se houve a
exportação do serviço? Inicialmente, é importante distinguir os serviços de
meio dos serviços de resultado. Nos serviços de meio, o contratado
brasileiro se obriga a fazer um determinado esforço, sem obrigação de
atingir um resultado. Nos serviços de resultado, o contratado brasileiro
deve atingir um determinado fim.

Conforme defenderemos até o fim deste trabalho e já antecipando nossa


premissa, entendemos que a única forma de se verificar se houve a
exportação de um serviço é verificando se o benefício gerado pela prática
daquela obrigação de fazer foi auferida por um tomador estrangeiro. Ou
seja, a ideia de beneficiário efetivo do benefício gerado pelo serviço
prestado é o que denota se houve uma exportação de serviço ou não.

609
Assim, (i) no caso de serviço de meio, os esforços empreendidos pelo
prestador brasileiro no Brasil devem visar ao benefício direto do tomador
estrangeiro, ainda que o resultado obtido não lhe seja favorável; e (ii) no
caso de serviço de resultado, o fim alcançado deve beneficiar diretamente
o tomador estrangeiro. Nesses casos, teremos uma exportação de serviço.

4. O SENTIDO E O ALCANCE DO ARTIGO 2º DA LC N. 116/2003:


COMPREENSÃO DO TERMO RESULTADO

Dúvidas surgem quando o serviço é prestado por prestador brasileiro no


Brasil a tomador estrangeiro, tendo em vista a necessidade de averiguar se
houve sua remessa ao exterior para configurar a exportação. Conforme
concluímos no item destinado à operação de exportação, o serviço será
exportado se seu resultado se verificar no exterior, ou seja, se o
beneficiário direto do serviço for o tomador estrangeiro.

No entanto, para fins de incidência do ISS, a compreensão do conceito


de exportação de serviços deve ser analisada em conjunto com o
esclarecimento previsto no parágrafo único do artigo 2º da LC n.
116/2003. O parágrafo único esclareceu que a isenção em questão não se
aplica aos serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se
verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior.

A nosso ver, o parágrafo único não encerra uma exceção à isenção


sobre a exportação de serviços, mas apenas um esclarecimento. A hipótese
aventada pelo parágrafo único não é de exportação de serviços. Ora, se
entendermos resultado como beneficiário da utilidade, é evidente que o
mero pagamento feito por residente no exterior não configura exportação
de serviços, no caso de o beneficiário da utilidade estar localizado no
Brasil. Portanto o parágrafo único apenas esclareceu.

610
A norma de isenção do ISS para a exportação de serviços, prevista na
LC n. 116/2003, cria um benefício à exportação de serviços e, ao mesmo
tempo, esclarece que o serviço não se considera exportado se o resultado
aqui se verificar.

Gabriel Lacerda Troianelli e Juliana Gueiros331 entendem que a intenção


do legislador complementar foi instituir uma “norma antielisão” do ISS,
impedindo a criação de mecanismos internacionais de planejamento fiscal
envolvendo o ISS. Ou seja, o fato de o pagamento do serviço ter origem no
exterior ou acontecer no exterior não altera a destinação do serviço.

Assim, é de fundamental importância a compreensão do termo


“resultado”. Resultado é consequência, efeito, seguimento. Ou seja, para
que haja efetiva exportação do serviço desenvolvido no Brasil, o serviço
não poderá ter consequências ou produzir efeitos no País. Os efeitos do
serviço devem se verificar no exterior.

Os autores exemplificam tal ideia das seguintes formas:

i) companhia aérea com sede na Alemanha, com rotas aéreas que transitam pelo
Brasil, sofre danificações em território nacional. Contrata serviços de
técnicos brasileiros para conserto do equipamento. O resultado imediato é o
conserto do equipamento para seguimento das atividades normais da
empresa. Ou seja, o resultado imediato do reparo da aeronave terá como
beneficiário a empresa alemã, produzindo seus efeitos na Alemanha.
Portanto, trata-se de uma exportação de serviços; e
ii) investidor residente nos Estados Unidos contrata uma empresa que
desempenha trabalhos para análise econômico-financeira do País. Com base
no relatório produzido por empresa brasileira, o investidor-contratante
resolve investir no Brasil ou não. Na hipótese, o resultado do serviço verifica-
se nos Estados Unidos, onde se encontra o verdadeiro beneficiário. O que
importa para definir se o serviço foi exportado ou não é o resultado imediato
do serviço, ou seja, quem se beneficiou do serviço. Não importa o resultado
mediato (decisão de investir no Brasil ou não).

611
O que se verifica é que há dois elementos vitais para a caracterização do
“resultado”: o beneficiário efetivo do serviço (que deve estar fixado no
exterior) e a delimitação dos efeitos imediatos (diretos) da prestação do
serviço, descartando os efeitos secundários. O beneficiário efetivo
(tomador do serviço) deve residir no exterior e existir como fonte
produtora no exterior para que haja exportação de serviço.

Assim, para definir o beneficiário efetivo, os autores importaram o


conceito previsto no Direito Tributário Internacional quando da análise das
cláusulas previstas nas convenções internacionais para evitar a dupla
tributação, no sentido de que o conceito de beneficiário efetivo pressupõe
que o beneficiário tenha residência em um dos Estados signatários da
convenção internacional, para evitar a dupla tributação, e que a pessoa
remunerada seja o beneficiário efetivo dos rendimentos.

Considerando tal acepção de beneficiário efetivo, os autores concluem


que a norma desoneradora do ISS sobre as exportações pretende que
somente seja considerada exportação de serviço se os resultados se
verificarem no exterior, ou seja, que o beneficiário daquele serviço esteja
localizado no exterior. Ademais, deve-se considerar somente o resultado
imediato e direto dos serviços, ou seja, o resultado que compunha o objeto
da requisição do serviço.

Já Marcelo Marques Roncaglia332, ao identificar o conteúdo semântico


de “resultado”, entende que esse seria o produto da prestação, ou seja, o
bem material ou imaterial obtido por intermédio do esforço humano.
Assim, a exportação do serviço se daria quando o resultado, ou seja, a
utilidade, fosse fruída no exterior. Portanto o que importa neste
entendimento é o local onde será fruído o resultado, assim entendido como
utilidade.

612
Enquanto Gabriel Troianelle e Juliana Gueiros entendem que o
resultado identifica-se com a ideia de beneficiário efetivo do efeito
imediato, Marcelo Roncaglia considera que o resultado identifica-se com a
ideia de onde se dá a fruição da utilidade.

Humberto Ávila333 também analisou a isenção em questão em parecer


elaborado a pedido de empresa brasileira e publicado na Revista Dialética
de Direito Tributário, ocasião na qual concluiu que não haverá isenção
quando a utilidade criada por meio do esforço humano se verificar no
território brasileiro. Ao contrário, haverá isenção quando a utilidade criada
por meio do esforço humano se der no exterior. Portanto o que interessa ao
autor é onde se deu a fruição do resultado (utilidade) para determinar a
ocorrência da exportação.

Luís Eduardo Schoueri334 também analisou o tema, definindo


“resultado” como “onde o serviço trouxe utilidade”. Assim, “na
contratação de um advogado em juízo, a utilidade dar-se-á no lugar onde
ocorre a lide; num serviço de topógrafo, no lugar onde estiver o terreno
etc.”335. Logo, para o autor, o resultado confunde-se com utilidade e, assim,
se a utilidade deu-se no Brasil, não há exportação de serviço,
independentemente de o beneficiário dessa utilidade ser estrangeiro ou
não.

No entanto, embora corroboremos com (i) a separação do serviço em


desenvolvimento e resultado; e (ii) importância de delimitar o conteúdo
semântico de “resultado” para verificar se o serviço foi exportado,
entendemos que “resultado” deve ser entendido como o beneficiário da
utilidade obtida pelo esforço humano empreendido para fins de
cumprimento da finalidade da norma de isenção em questão e o

613
esclarecimento previsto no parágrafo único do artigo 2º da LC n.
116/2003.

O entendimento que vincula o resultado do serviço à sua fruição no


exterior acaba por penalizar diversos serviços que foram prestados para
empresa no exterior mas cuja fruição não se deu necessariamente no
exterior ou, em outras ocasiões, não foi possível se verificar o local da
fruição por se tratar, por exemplo, dos serviços da era digital. Ou seja, a
vinculação do resultado à fruição dificultaria a análise para as atividades
vinculadas à economia digital, chegando inclusive a inviabilizar o conceito
de exportação para esses serviços.

Assim, defendemos que, se o benefício decorrente da utilidade obtida


com o esforço humano for usufruído por beneficiário situado no exterior,
configurar-se-á a exportação do serviço. Ao contrário, se o benefício for
usufruído por beneficiário situado no Brasil, então não estaremos diante de
uma exportação de serviços. Aplica-se, portanto, a regra do resultado no
destino, tal como bem destacado por German Alejandro San Martín
Fernández:

[...] Seria de uma ilogicidade flagrante a descaracterizar o ISS como tributo


neutro a não utilização do critério do resultado no destino, expresso para a isenção
das exportações, para fins de identificar quais os serviços provenientes do exterior
aptos a serem tributados pelos municípios. Daí a desoneração na exportação de
serviços depender da fruição material da prestação de serviços no exterior, mas
desde que o resultado da prestação, a utilidade material ou imaterial, seja
336
“consumida” fora do País [...] .

Conforme antecipamos no início deste trabalho, foi aprovado pelo


Senado Federal o PLS n. 475/2017, que propõe a seguinte redação ao
artigo 2º da LC n. 116/2003:

[...] Art. 2º (...)

614
I – As exportações de serviços para o exterior do País, quando os benefícios do
serviço se verificam em território estrangeiro e há ingresso de divisas no país.
Parágrafo único. Para fins do disposto no inciso I, o local onde os benefícios do
serviço são verificados independe do local onde o serviço é realizado. [...]

A nova redação mantém o afastamento da incidência do ISS nas


operações de exportação, mas destaca que a regra desonerativa aplica-se
somente se (i) os benefícios do serviços se verifiquem no território
estrangeiro; e (ii) haja ingresso de divisas no País. Além disso, esclarece
que a configuração da exportação do serviço independe do local onde o
serviço é realizado. Da Exposição de Motivos337, depreende-se que a
intenção do legislador foi aprimorar esse dispositivo legal buscando
estancar a dúvida sobre o conceito de “resultado” que, aliás, não aparece
mais na nova redação.

Note-se que a nova redação ainda depende de aprovação pela Câmara


dos Deputados para seguir para sanção do Presidente, mas
independentemente disso, acreditamos que alguns aspectos ali propostos já
poderiam ser considerados pelos aplicadores do direito na medida em que
não inova, mas busca dirimir dúvidas sobre a configuração da exportação
de serviços para fins de isenção do ISS. Olhando por esse prisma, vale
desde já destacar o esclarecimento do seu parágrafo único no sentido de
que a exportação independe do local onde o serviço é prestado. Esse
aspecto será essencial na análise crítica que passamos a fazer, ressalvando
desde já que, a nosso ver, a nova redação, se aprovada, continuará gerando
debate mas agora sobre o conceito de “benefício” e não o de “resultado”.

5. ANÁLISE CRÍTICA

5.1. Decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ)

O sentido e alcance da norma de isenção do artigo 2º da LC n. 116/2003


já foi objeto de análise pelo Superior Tribunal de Justiça em duas

615
oportunidades, uma em 2006 e agora, mais recentemente, em 2016.

Em agosto de 2006, a Primeira Turma do STJ analisou o serviço


relativo à retificação, reparo e revisão de motores e turbinas de aeronaves
estrangeiras, realizado por empresa brasileira a um tomador de serviço
situado no exterior (empresa aérea) e a abrangência da norma de isenção
do ISS prevista na LC n. 116/2003 (REsp 831.124/RJ).

O serviço analisado era o seguinte: turbinas e motores eram remetidos


do exterior para o Brasil e, após a prestação dos serviços de reparo, retífica
e revisão, eram devolvidos ao exterior para serem instalados nas aeronaves
das empresas aéreas contratantes dos serviços, que as utilizariam fora do
território nacional.

Por maioria de votos338, o STJ entendeu que o objetivo da contratação


da empresa brasileira era o efetivo conserto dos bens e que tal serviço foi
concluído no território brasileiro. Por esse motivo, referido serviço não
poderia ser qualificado como exportação de serviços, para fins de
incidência da norma de isenção do ISS.

O voto do Ministro Relator José Delgado considera que o resultado do


serviço é o conserto dos motores e turbinas. Assim, se tal conserto ocorreu
no Brasil, não houve exportação de serviço.

Considerando os argumentos que desenvolvemos acima, não


concordamos com essa conclusão, uma vez que (i) o beneficiário efetivo
do serviço é a empresa sediada no exterior; e (ii) o resultado imediato é o
conserto de aeronaves para que a empresa estrangeira possa retornar a suas
atividades, ou seja, os efeitos se deram no exterior e não no Brasil.
Portanto, ao contrário do que restou decidido pelo STJ, tal serviço

616
qualifica-se como exportação de serviço para fins de aplicação da norma
de isenção do ISS prevista na LC n. 116/2003.

No entender do voto do Ministro José Delgado, somente haveria


exportação de serviço se o conserto das aeronaves estrangeiras se desse no
exterior. Ora, se o serviço fosse realizado no exterior e o resultado lá
ocorresse, estaríamos diante de uma exportação de serviço, mas seria uma
hipótese de não incidência do ISS.

Mais recentemente, em outubro de 2016, o STJ voltou a analisar o


assunto em situação envolvendo elaboração de projetos de engenharia por
uma empresa brasileira a um contratante localizado no exterior (Agravo
em Recurso Especial n. 587.403/RS). Nesse julgamento, por unanimidade,
a Primeira Turma do STJ339 reconheceu a relevância do local em que
seriam obtidos os benefícios do serviço para concluir se tratar de uma
efetiva exportação de serviço, uma vez que o projeto de engenharia seria
executado na França (fruição/resultado do serviço). Na hipótese, levou-se
em consideração a real intenção do contratante de executar o projeto em
território estrangeiro.

A posição adotada neste último acórdão coaduna-se com o conceito de


“resultado” vinculado à fruição do serviço e, além disso, também estaria
em linha com a nova redação proposta pelo PLS n. 745/2017, que
condiciona a exportação de serviço a ser o benefício verificado no exterior.
Embora essa interpretação já seja um avanço, ainda acreditamos que o
resultado do serviço (ou o benefício do serviço) deve ser verificado
levando-se em consideração o beneficiário efetivo do serviço.

Ou seja, se o benefício do serviço prestado é auferido por beneficiário


no exterior (no caso empresa francesa), já estaríamos diante de uma

617
exportação de serviço, independentemente da confirmação de que o
produto do serviço foi executado no exterior ou no Brasil. Ora, o fato de o
produto do serviço não ser executado no exterior não retira a confirmação
de que o serviço foi prestado por brasileiro em prol de empresa
estrangeira. Portanto, se o benefício deu-se a beneficiário estrangeiro,
significa que houve exportação de serviço.

Essa ponderação é essencial para a análise das situações envolvendo


serviços atrelados à economia digital, tendo em vista a compreensão de
que a obrigação de fazer de alguém para outrem não necessariamente gera
um produto visível/corpóreo, mas normalmente é um intangível e não
necessariamente será executado.

5.2. Parecer Normativo n. 4, de 2016 e precedentes administrativos do


Município de São Paulo

Considerando a divergência quanto ao significado de “resultado” para


fins de aplicação da desoneração tributária de ISS para exportação de
serviços, o Secretário Municipal de Finanças e Desenvolvimento
Econômico do Município de São Paulo expediu o Parecer Normativo n. 4,
de 2016, estabelecendo que:

a) considera-se exportado o serviço quando a pessoa, o elemento material,


imaterial ou o interesse econômico sobre o qual recaia a prestação esteja
localizado no exterior; e
b) não configura exportação de serviço:
– de informática, se o sistema, programa de computador, base de dados ou
equipamento estiver vinculado a pessoa localizada no Brasil;
– de pesquisa e desenvolvimento, se a base pesquisada se encontrar em
território nacional;
– de intermediação e serviços de apoio técnico, administrativo, jurídico,
contábil e comercial, se uma das partes intermediadas, os bens ou interesses
econômicos estiverem no Brasil;
– de administração de fundos quaisquer, de consórcio, de cartão de crédito ou
débito e congêneres, de carteira de clientes, de cheques pré-datados e

618
congêneres, se houver investimento ou aquisição no mercado nacional

A par da falta de conceituação do que seria “elemento material”;


“elemento imaterial” e “interesse econômico”, não podemos concordar
com a interpretação/esclarecimento dado pelo parecer normativo em
questão, uma vez que conceitua resultado do serviço como sendo o local
onde é prestado o serviço, desconsiderando que o benefício seja auferido
por beneficiário estrangeiro.

A considerar esta premissa, o parecer normativo impõe restrição não


prevista na CF/88 e na LC n. 116/2003 e, assim, exige que a exportação de
serviço nessas hipóteses ocorra apenas quando o bem imaterial não estiver
no Brasil. No entanto, o fato de o programa de computador/base de
dados/equipamento/base pesquisada estarem no Brasil, não significa que o
prestador brasileiro não está prestando um serviço para um tomador
estrangeiro, já que o benefício continua sendo auferido por empresa
estrangeira, caracterizando a exportação de serviço.

Da mesma forma, mesmo que o investimento ou aquisição esteja no


Brasil ou os bens intermediados estejam em território nacional, o fato de a
empresa brasileira estar prestando serviço de administração ou
intermediação em benefício de tomador estrangeiro, sendo este, portanto, o
beneficiário do serviço prestado, não desnatura a natureza da operação
como sendo de exportação. Portanto, mais do que fruição do serviço em
território estrangeiro, o que importa é que o beneficiário efetivo do serviço
seja estrangeiro.

A proposta do PLS n. 745/2017 confirma o nosso entendimento no


sentido de que é irrelevante onde o serviço é prestado e, portanto, nos
parece claro que o parecer normativo ora analisado e que vem sendo

619
aplicado pelos acórdãos do CMT deve ser afastado por contrariar a CF/88
e a LC n. 116/2003, inovando no ordenamento jurídico e, mais ainda,
impondo condições ilegais para definir o que seria uma exportação de
serviço.

Para este trabalho, analisamos 3 (três) acórdãos do CMT/SP prolatados


nos Processos Administrativos ns. 6017.2016/0029007-7;
6017.2015/0002743-9; e 6017.2016/0030813-8, em que se analisou a
questão da exportação de serviço para as seguintes atividades: (i) projetos
de tecnologia da informação para empresa americana; (ii) assessoria
tributária em países situados na América do Sul; (iii) serviços de
administração financeira para diversos países; (iv) serviços de
administração comercial; (v) serviços administrativos prestados no Brasil
para empresas estrangeiras do mesmo grupo econômico; e (vi) serviços de
elaboração de programa de computadores (software), inclusive jogos
eletrônicos.

Em todos eles, é importante notar que a questão documental – contratos


celebrados, notas fiscais, evidências da prestação do serviço – foi
extremamente importante para que os julgadores pudessem identificar as
partes envolvidas, a natureza do serviço prestado e quem eram os
destinatários (beneficiários) do serviço. Da mesma forma ou até mais, a
prova será imprescindível na discussão relacionada aos serviços ligados à
economia digital, do que trataremos adiante.

Neste momento, é pertinente apenas trazer a distinção dos votos no


âmbito do CMT. Os votos que reconhecem a exportação de serviço levam
em consideração, em alguns momentos, o local da fruição do serviço
(princípio do destino) e, em outros momentos, o beneficiário efetivo do
serviço prestado; os votos que afastam a exportação entendem que o

620
resultado do serviço ocorre no local em que se encontra a pessoa ou bem
sobre o qual recai a ação do prestador, ou seja, onde se concretiza o
produto ou a utilidade gerada, independentemente de o beneficiário ou a
fruição ocorrer fora do Brasil. Ou seja, a divergência existe justamente na
concepção que se faz de resultado do serviço.

Novamente reiteramos nossa posição no sentido de que, considerando o


conceito de prestação de serviço, o resultado do serviço está relacionado
com o beneficiário efetivo do serviço, independentemente de o produto do
serviço ter se dado no Brasil, tendo em vista todos os aspectos defendidos
acima e confirmados pela nova redação da LC n. 116/2003, que aguarda
aprovação. Esta delimitação é essencial ao tratarmos dos serviços ligados à
economia digital pois, conforme veremos, de outra forma, nunca teremos a
exportação de serviços da economia digital, haja vista as peculiaridades
que mostraremos a seguir.

6. APLICAÇÃO AOS SERVIÇOS RELACIONADOS À ECONOMIA


DIGITAL

De acordo com o relatório da OCDE (Ação 1 do BEPS), a economia


digital possui seis características peculiares, a saber: mobilidade dos
intangíveis e dos usuários/consumidores, a dependência de dados, os
efeitos em rede, utilização de modelos empresariais de múltiplos lados,
tendência ao monopólio/oligopólio e volatilidade340.

A mobilidade dos intangíveis e dos usuários/consumidores pressupõe


que o produto em desenvolvimento possa ser alterado de forma
considerável ao longo do tempo, e os serviços possam ser adquiridos de
qualquer parte do mundo, para serem utilizados em um determinado local
diverso do domicílio do cliente. Ou seja, as funções empresariais são

621
exercidas de forma descentralizada, sendo que as atividades centrais são
exercidas em dada localidade, e a execução ocorre em ambiente diverso.

Já a dependência de dados representa que as empresas da área vêm


progressivamente coletando informações sobre os seus consumidores e
fornecedores, de forma personalizada ou não. Ademais, os efeitos em rede
significam que as decisões de um usuário podem gerar impactos nos
benefícios recebidos por outros usuários.

Por outro lado, o modelo empresarial de múltiplos lados significa um


mercado no qual grupos distintos de pessoas interagem por meio de um
intermediário ou uma plataforma, o que imprime flexibilidade ao negócio
(armazenamento duradouro da informação) e extensão, já que as partes do
negócio podem estar em países diferentes.

Ademais, a OCDE acredita que há uma tendência ao monopólio ou


oligopólio, pois poucas empresas dominam a tecnologia e este mercado; e,
por fim, a volatilidade é um elemento marcante da economia digital, haja
vista a crescente inovação e desenvolvimento de novos modelos de
negócios, com a constante produção de novos produtos.

Assim, para que possamos avançar no objetivo do nosso trabalho, é


importante que tenhamos em mente essas características da economia
digital, especialmente a mobilidade de usuários/consumidores; o modelo
empresarial de múltiplos lados e a volatilidade, pois precisarão ser
considerados dentro do contexto de cada um dos serviços para se verificar
se houve exportação ou não.

Não há dúvida de que será – como já é – um enorme desafio para todos


os players determinar se uma operação de serviço atrelado à economia

622
digital é uma exportação ou não, haja vista a dificuldade de identificar: (a)
o prestador do serviço e o tomador do serviço; (b) se o serviço está sendo
prestado em território brasileiro, pois se estiver sendo prestado no exterior,
estaremos diante de uma situação de não incidência do ISS em razão do
princípio da extraterritorialidade; e (c) quem é o beneficiário do serviço
prestado.

Para qualquer uma das três dificuldades, acreditamos que os contratos


firmados entre as partes, a descrição do serviço a ser prestado e as
evidências do serviço prestado contribuirão para que, em um primeiro
momento, se entenda de que serviço se trata e, depois, se confirmem as
partes envolvidas, onde o serviço está sendo desenvolvido pelo prestador e
quem está se beneficiando do serviço.

De antemão, entendemos que se a resposta para estas questões for que o


prestador é brasileiro e o tomador, estrangeiro; o serviço está sendo
prestado no Brasil e o beneficiário do serviço prestado está no exterior,
estaremos diante de uma exportação de serviço sujeito à isenção do ISS.

Assim, por exemplo, nos serviços relacionados à computação da


nuvem, na hipótese de (i) a empresa contratada para executar o serviço de
armazenamento das informações/dados/vídeos ser uma empresa brasileira
para prestar serviço para uma empresa que se encontra fora do Brasil; (ii) a
tecnologia utilizada pelo prestador estar no Brasil; e (iii) a empresa
beneficiada pelo serviço estar no exterior, estaremos diante de uma
exportação de serviço com isenção do ISS. Mas, por exemplo, se a
tecnologia utilizada pelo prestador estiver em outro país; ou os
funcionários que executam estiverem no exterior ou, ainda, se o
armazenamento se der no Brasil de dados de empresa estrangeira, há
alguma diferença? A nosso sentir, esses detalhes são importantes para que

623
se entenda o modelo de negócio, mas são irrelevantes quando se foca no
beneficiário do serviço prestado (em vez de olharmos o modus operandi).

Da mesma forma, (i) nas atividades de transmissão de conteúdo (OTT),


o prestador do serviço, ou seja, o transmissor, deverá ser empresa
brasileira contratada por empresa estrangeira, que se beneficiará da
transmissão; (ii) nos serviços de informática, que envolvem
processamento, programação ou desenvolvimento dos sistemas, a pessoa
beneficiária do serviço prestado, ou seja, que se beneficiou do
processamento, de uma programação de software ou de um sistema, deve
estar no exterior, independentemente de o serviço ter sido executado no
Brasil e de o beneficiário aplicá-lo no Brasil.

Queremos deixar claro que as conclusões expostas acima não trouxeram


propositadamente a complexidade dos serviços da economia digital, a
saber, a dificuldade de identificar onde está a empresa prestadora do
serviço de economia digital (local fixo do negócio); onde o serviço está
sendo executado; qual o produto do serviço prestado; onde está sendo
executado (e se está sendo executado). Ao contrário, tentam trazer
simplicidade à questão, ao concluir que identificado o beneficiário do
serviço e se este estiver no exterior, estaremos diante de uma exportação
de serviço não sujeito ao ISS. Este será o único esforço do aplicador do
direito se aceitar nosso conceito de resultado do serviço atrelado ao
beneficiário efetivo.

7. NOSSA CONCLUSÃO

Para fins de aplicação da regra de isenção do ISS para os serviços da


economia tradicional ou os serviços atrelados à economia digital,
defendemos que o termo “resultado” deve ser entendido como o

624
beneficiário da utilidade obtida pelo esforço humano empreendido, pois
somente assim estaremos assegurando a não exportação de tributos
(finalidade constitucional) e a observância do critério material e espacial
do tributo.

Considerar o termo “resultado” como local em que se encontra a


pessoa/bem sobre o qual recai a ação do prestador (onde se concretiza o
produto ou a utilidade gerada), como faz a Prefeitura de São Paulo; ou
como local onde se dá a fruição do serviço, como defendem alguns
doutrinadores e decisão do STJ, implica restringir a aplicação da regra de
isenção, uma vez que o fato de o serviço ser executado/aperfeiçoado no
Brasil ou de a fruição do benefício do serviço prestado se dar no Brasil não
significa que não houve a exportação de serviço.

A nova redação do artigo 2º da LC n. 116/2003, aprovada pelo Senado


Federal no PLS n. 745/2017 e que aguarda aprovação da Câmara dos
Deputados para seguir para sanção presidencial, resolve a questão do local
da prestação do serviço e afasta definitivamente o Parecer Normativo n.
4/2016, esclarecendo que é irrelevante o local onde o serviço é prestado
para fins de configuração da exportação. No entanto, embora tenha
retirado o termo “resultado”, traz agora o termo “benefício”, que ainda
poderá provocar debates sobre o que seria benefício para fins de aplicação
da regra isentiva ora em análise.

Assim, nossa conclusão é a de que:

1ª hipótese: se o serviço desenvolver-se no exterior por prestador


brasileiro, e o benefício for auferido pelo tomador estrangeiro, configura-
se exportação de serviço, mas não há incidência do ISS (hipótese de não
incidência);

625
2ª hipótese: se o serviço desenvolver-se no Brasil por prestador
brasileiro, e o benefício for auferido pelo tomador estrangeiro, configura-
se exportação de serviço, e aplica-se a norma de isenção do artigo 2º da LC
n. 116/2003;

3ª hipótese: se o serviço desenvolver-se no Brasil, e o seu benefício for


auferido por empresa brasileira, ainda que não seja a tomadora, não há
exportação de serviço, nos termos em que disposto pelo parágrafo único do
artigo 2º da LC n. 116/2003.

Os serviços atrelados à economia digital, como os serviços de


computação na nuvem, serviços OTT (transmissão de dados), publicidade
on line, serviços de informática, serviços de pagamento ou outros serviços
da era digital, possuem como características relevantes para este debate a
mobilidade dos usuários/consumidores, modelos empresariais de múltiplos
lados e a volatilidade, o que dificulta a identificação das partes envolvidas,
de onde o serviço está sendo executado e quem é o beneficiário do serviço,
mas os contratos firmados, a descrição do serviço prestado e suas
evidências podem contribuir para essa identificação.

O ponto crucial em qualquer das análises – que concordamos será uma


tarefa árdua – é a aceitação consciente da premissa de que o resultado do
serviço está atrelado ao beneficiário efetivo do serviço prestado. Se o
benefício está sendo auferido pelo tomador estrangeiro, estamos diante de
uma exportação de serviço devendo ser cumprida a finalidade
constitucional de não exportação de tributos.

626
Jogando com o conceito de valor aduaneiro:
um estudo sobre a valoração aduaneira na
importação de jogos eletrônicos
341 342
Carlos Eduardo de Arruda Navarro e João Vitor Kanufre Xavier da Silveira

1. INTRODUÇÃO

O presente ensaio está assentado no debate a respeito da valoração


aduaneira de jogos eletrônicos importados em suportes físicos. A ideia
principal do artigo é abordar a divergência interpretativa em torno da
natureza jurídica dos games e, consequentemente, da definição do valor
aduaneiro de tais bens.

Para tanto, trataremos daquelas que nos parecem ser as principais


questões que cercam o tema, dialogando com as manifestações de órgãos
oficiais e da doutrina especializada. A questão final que pretendemos ver
respondida é se o valor de aquisição de jogos eletrônicos pode ser incluído
no valor aduaneiro do suporte físico importado.

2. O VALOR ADUANEIRO NA IMPORTAÇÃO DE JOGOS


ELETRÔNICOS: AS NORMAS INTERNACIONAIS E A POSIÇÃO
BRASILEIRA

Antes de adentrar a análise propriamente dita dos posicionamentos em


torno da valoração aduaneira dos chamados games, convém retomar a
contextualização feita na introdução para evidenciar a relevância do tema.

Como se verá adiante, a jurisprudência estabeleceu uma divergência a


respeito da classificação dos jogos eletrônicos como software ou obras
audiovisuais. Tal distinção, vale adiantar, foi fundamental para se definir

627
se o valor pago pelos games deve ser incluído no valor de transação dos
suportes físicos importados, sejam eles CDs, cartuchos, DVDs, blue-rays
etc.

Para a discussão posta na jurisprudência, se os jogos eletrônicos


estiverem enquadrados como software, o seu valor aduaneiro seguirá os
ditames do caput do artigo 81 do Decreto n. 6.759/2009 (Regulamento
Aduaneiro)343. De acordo com esse dispositivo, o montante a ser declarado
– e sobre o qual recairão os tributos alfandegários no Brasil – é somente o
valor do suporte físico, ou seja, desconsidera-se o valor do bem intangível
ali gravado, conforme se lê abaixo:

Art. 81. O valor aduaneiro de suporte físico que contenha dados ou instruções
para equipamento de processamento de dados será determinado considerando
unicamente o custo ou valor do suporte propriamente dito (Acordo de Valoração
Aduaneira, Artigo 18, parágrafo 1, aprovado pelo Decreto Legislativo n. 3٠, de
1994, e promulgado pelo Decreto n. 1.355, de 1994; e Decisão 4.1 do Comitê de
Valoração Aduaneira, aprovada em 12 de maio de 1995).

Contudo, se os jogos eletrônicos forem classificados como obras


audiovisuais, não se aplicaria o previsto no caput do artigo 81 acima, mas
sim o disposto no parágrafo 3º do mesmo dispositivo, de modo que a base
de cálculo dos tributos alfandegários seria o valor total do game. Segue
transcrição do referido parágrafo 3º:

Artigo 81. (...).


§ 3º Os dados ou instruções referidos no caput não compreendem as gravações
de som, de cinema ou de vídeo.

Nesse contexto, portanto, essa dualidade foi tida como relevante para a
definição das bases de cálculo dos tributos incidentes sobre a importação
de bens no Brasil, tais como o Imposto de Importação, o IPI, a
Contribuição ao PIS e a Cofins.

628
Nos subtópicos subsequentes abordaremos as normas que tratam do
tema, assim como as posições (divergentes, diga-se) do Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) e do Tribunal Regional
Federal da 3ª Região (TRF3).

2.1. Valoração aduaneira de bem incorpóreo no Direito Internacional e no


ordenamento jurídico brasileiro

Antes de mais nada, é provável que o título do presente item cause


estranheza aos especialistas em tributação alfandegária, o que motiva esta
explicação preliminar. Não se está aqui a dizer que há valoração aduaneira
de bem incorpóreo; pelo contrário, sabe-se que valoração aduaneira está
associada exclusivamente a bens corpóreos objeto de importação e
exportação. O que se quer abordar no presente tópico, portanto, é a
possibilidade de inclusão, no valor aduaneiro de bens corpóreos (no caso,
suportes informáticos), o valor correspondente a bens incorpóreos,
notadamente o valor de jogos eletrônicos, que é o escopo do presente
ensaio344.

Pois bem. O artigo 1º do Acordo de Valoração Aduaneiro (AVA)


dispõe que o valor aduaneiro “de mercadorias importadas será o valor de
transação, isto é, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias
em uma venda para exportação para o país de importação”345.

Ao interpretar a aludida norma internacional, relativamente ao software


registrado em suporte físico, o Comitê de Valoração Aduaneira emitiu a
Decisão n. 4.1, recomendando que, na determinação do valor aduaneiro de
software fosse “considerado unicamente o custo ou valor do suporte físico
propriamente dito” e afirmando peremptoriamente que “o valor aduaneiro
não compreenderá o custo do valor dos dados ou instruções, desde que
estes estejam destacados do custo ou valor do suporte físico”346.

629
Essa orientação tem lugar no fato de que, embora o importador esteja
interessado especialmente (para não dizer exclusivamente) nos dados e
instruções gravados (software), a tributação aduaneira tem por interesse o
meio físico, que é o objeto essencial da própria importação347.

Em outras palavras, poder-se-ia dizer que, assim como na importação


de um DVD onde está gravado um parecer jurídico, a tributação aduaneira
recairá apenas sobre o valor do DVD (e não sobre o valor do serviço
jurídico cobrado do importador), do mesmo modo o valor cobrado pelo
objeto intelectual software também estará fora do conceito de valor
aduaneiro.

Aqui vale uma explicação conceitual importante: enquanto alguns


especialistas afirmam que a valoração aduaneira do software seria uma
exceção ao disposto no artigo 1º do AVA, temos posição diametralmente
oposta. Para nós, em vez de excepcionar a regra, a posição contida na
Decisão n. 4.1 a confirma, na medida em que reconhece a existência de
dois bens distintos: um corpóreo, sujeito a valoração aduaneira, que é o
suporte físico, e um incorpóreo, que é a produção intelectual (seja ela um
software ou um arquivo contendo um parecer jurídico, conforme exemplo
anterior).

Em resumo, portanto, nossa posição é clara no sentido de que o valor do


software jamais poderia ser incluído no conceito de valor aduaneiro, pois
ele é bem diverso do importado (suporte físico). Para fins aduaneiros, não
importa se um CD é “virgem”, se contém um software, um parecer jurídico
ou um projeto de engenharia; em todos os casos, o bem importado é
apenas o CD.

630
E não se diga aqui que, a despeito do reconhecimento de que software e
meio físico não se confundem, o valor do software poderia ser incluído no
conceito de valor aduaneiro, tal como ocorre com o frete internacional, os
juros (na venda financiada), o seguro internacional ou os serviços de
instalação e montagem realizados no país de importação, pois, em todos
estes casos, eventual inclusão de tais cobranças no valor aduaneiro da
mercadoria importada segue a lógica de que o principal (mercadoria) atrai
o acessório (frete, seguro etc.). Contudo, no caso do software, este é o
principal, não fazendo sentido alegar que o valor do principal deve seguir
o acessório (suporte físico).

Além disso, tanto a comercialização de uma licença de uso de software


é irrelevante para fins aduaneiros que, sendo o software transmitido por
qualquer outro meio (download, streaming, cloud computing etc.), a
discussão sobre valoração aduaneira se mostra absolutamente sem sentido,
evidenciando que o software é um bem, e o meio físico é outro
completamente diverso348. A confusão entre meio e fim, inclusive, é, a
nosso ver, uma das mazelas das discussões postas atualmente no cenário
doméstico em relação à tributação de software entre ICMS e ISS.

Em atenção à Decisão n. 4.1 do Comitê, o legislador pátrio, como não


poderia deixar de ser, previu, no artigo 20 do Decreto n. 2.498/98349, que o
valor aduaneiro de software importado em meio físico seria
exclusivamente o valor do meio físico. Isso foi respaldado na Solução de
Consulta DISIT/SRRF10 n. 95, de 9 de maio de 2012, onde se veiculou o
seguinte entendimento:

O Brasil adotou a prática de utilizar unicamente o custo ou valor do suporte


físico propriamente dito, sempre que este constar destacadamente do custo ou valor
do programa no documento de aquisição para a determinação do valor aduaneiro de
softwares, conforme tratado na Portaria MF n. 181, de 28 de setembro de 1989,
posteriormente no artigo 20 do Decreto n. 2.498, de 13 de fevereiro de 1998, no

631
artigo 81 do Decreto n. 4.543, de 26 de dezembro de 2002, e, atualmente, no artigo
350
81 do RA/2009 (...) .

Feitos tais esclarecimentos, é importante destacar que a regra acima


possui uma única exceção; há um único caso em que a valoração aduaneira
deve considerar a soma do valor do meio físico e do dado ali gravado. Tal
exceção consta do parágrafo 3º do artigo 81 do Regulamento Aduaneiro
(transcrito anteriormente), que se refere às gravações de som, cinema e de
vídeo.

Pelo exposto, pode-se afirmar que o sistema de valoração aduaneira


funciona da seguinte forma:

•o valor aduaneiro de um bem corpóreo, como regra, é o seu valor de transação


(primeiro método de valoração);
•o valor de transação de um CD ou DVD é o valor negociado por ele, o que não
inclui eventual remuneração paga pelo importador pela aquisição de um bem
intangível nele gravado, se o caso (art. 81, caput, do Regulamento Aduaneiro);
e
•na hipótese em que o dado gravado no CD ou DVD é uma gravação de som, de
cinema ou de vídeo, o valor aduaneiro será composto pela soma do valor do
bem físico e do dado (art. 81, § 3º, do Regulamento Aduaneiro).

O estudo da legitimidade da exceção, assim como das razões históricas


que levaram à criação de tal exceção, seria deveras interessante, mas, para
o propósito do presente artigo, o desafio é um tanto quanto mais modesto.
O que pretendemos é apenas nos manifestar sobre se os jogos eletrônicos
se subsumem à regra contida no artigo 1º do AVA (ratificada pelo caput
do art. 81 do Regulamento Aduaneiro e pela Decisão n. 4.1 do Comitê de
Valoração Aduaneira) ou à norma de exceção prevista no parágrafo 3º do
artigo 81 do Regulamento Aduaneiro.

2.2. O entendimento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF)

632
Em pesquisas realizadas junto ao sítio do CARF na internet351,
verificamos que o tribunal administrativo apenas se debruçou sobre o tema
de importação dos jogos eletrônicos uma única oportunidade, motivado
por recurso de ofício contra decisão de 1ª instância administrativa que
cancelava autuação fiscal lavrada.

Na autuação, a fiscalização incluiu, no valor aduaneiro do suporte


físico, o valor pago pelos jogos eletrônicos, com base no parágrafo 3º do
artigo 81 do Regulamento Aduaneiro. Quando do julgamento do recurso
de ofício, o CARF, em apertada votação, deu ganho de causa à
fiscalização, homenageando o voto condutor do Conselheiro Luís Eduardo
Garrossino Barbieri, restando vencido o voto do relator do recurso.

Anote-se que o voto do relator, Conselheiro Gilberto de Castro Moreira


Junior, entendeu que os jogos eletrônicos estariam enquadrados na
condição de software. Isso porque, além de conter gravações de som e
vídeo, haveria instruções aptas “a executar um algoritmo escrito em
linguagem de programação”, levando em consideração, inclusive, laudo e
parecer juntados no autos do processo administrativo352.

Além disso, aplicou o entendimento destacado nas Soluções de


Consulta SRRF/8ªRF/DIANA, n. 30 de 2008, n. 31 de 2007 e n. 32 de
2008, no sentido de que os jogos eletrônicos seriam “mídias ópticas,
gravadas com dados e instruções para fins de entretenimento”353.

Mas, como dito, esse entendimento restou vencido administrativamente,


em razão da divergência inaugurada pelo Conselheiro Luís Eduardo
Garrossino Barbieri. O voto divergente asseverou que, embora o artigo 81
do Regulamento Aduaneiro tenha respaldado a Decisão 4.1, proferida pelo
Comitê Técnico de Valoração Aduaneira, os jogos eletrônicos não

633
poderiam ser equiparados a software ou programa de computador
porque354:

•não conteriam, apenas e tão somente, um conjunto de instruções


disponibilizadas em linguagem codificada;
•conteriam sons, imagens e vídeos;
•não estariam condicionados, unicamente, ao emprego de “máquina automáticas
de informação e processamento de dados”;
355
•não teriam a função de acionar o funcionamento de computadores ; e
•os jogos eletrônicos causariam a impressão de movimento e visariam o
356
“entretenimento” , correspondendo à mesma finalidade dos CDs de músicas
e DVDs de filmes.

Com isso, entendeu o voto condutor que os jogos eletrônicos estariam


dentro da definição de obra audiovisual, em consonância com o artigo 1º,
inciso I, da MP n. 2.219/2001357-358.

Aduziu, ainda, que o RE n. 176.626-3/SP seria um precedente a orientar


a questão, pois, naquele julgado, o software de prateleira foi definido como
“mercadoria”, pronta a ser tributada pelo seu valor total, desenquadrando
da condição de licenciado ou cessionário o próprio comerciante, para fins
de tributação de ICMS.

Ainda, segundo o voto condutor da divergência, a Secretaria da Receita


Federal do Brasil emanou a Solução de Convergência COSIT n. 30, de 30
de maio de 2008, que negou “a condição de licenciado ou de cessionário
de licença de uso ao comerciante que importa cópias múltiplas de software
e as revende no mercado nacional”359. Isso, inclusive, corroboraria o
entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) no RE n. 176.626-3/SP.

Posto isso, haveria aparente consonância com a apuração do valor


aduaneiro, pelo valor da transação (meio físico acrescido do copyright fee),
em conformidade com o 1º Método de Valoração Aduaneira.

634
Vale destacar que, com o encerramento do caso no CARF, a questão foi
judicializada pelo contribuinte, tendo sido concedida tutela de urgência
para suspender a exigibilidade do crédito tributário. Os argumentos
utilizados neste caso serão abordados no tópico seguinte.

2.3. O entendimento do Poder Judiciário no âmbito do Tribunal Regional


Federal da 3ª Região

Como mencionamos anteriormente, com o encerramento do Processo n.


10880-727704/2011-80 junto ao CARF, o contribuinte vencido ajuizou
ação perante a 9ª Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo.

A Juíza Federal, ao apreciar a Medida Liminar, entendeu que haveria


fumus boni iuris no sentido de que os jogos eletrônicos devem ser
considerados software, para fins de sua valoração aduaneira. A decisão
levou em conta o que consta do Relatório Técnico n. 001.072/13, lavrado
pelo Instituto Nacional de Tecnologia (INT), afeto ao Ministério da
Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)360.

No Relatório Técnico em questão, os jogos eletrônicos foram


qualificados como software porque estariam dentro da definição estipulada
no artigo 1º da Lei de Software, uma vez que:

“A implementação de um software é feita através do emprego de linguagem de


programação tanto quanto os demais softwares” e porque “as tecnologias
empregadas no desenvolvimento destes aplicativos podem atingir um alto grau de
361
complexidade, exigindo a participação de programadores bem qualificados” .

Além do estudo do INT, mencionou a decisão que haveria um julgado362


de lavra da Desembargadora Federal Marli Ferreira a respeito do tema em
discussão363. Naquele julgado, o TRF3 afastou a ideia de que a finalidade
“entretenimento” é a premissa que coloca os jogos eletrônicos no patamar
de obras audiovisuais como DVDs de filmes e CDs de música. Isso

635
porque, segundo o entendimento do Tribunal Federal, existiriam
programas de computador que visariam entreter, sem que, com isso,
perdessem a natureza de software364.

A própria Lei de Software, segundo o Tribunal, não atrela nenhum


objetivo específico, tal qual o entretenimento, para os programas
classificados como software, o que facilitaria o enquadramento dos jogos
eletrônicos nessa classificação365. Ou seja, o TRF3 dispensou o requisito da
finalidade para enquadrar os jogos eletrônicos como software, pois a lei
não se pronuncia em relação a isso.

A Desembargadora Federal Relatora concluiu afirmando que “os jogos


de vídeo devem ser classificados como softwares, pois vedada a analogia,
nos termos da legislação aduaneira, de modo que o valor aduaneiro da
mercadoria (no caso os DVDs) será considerado unicamente com base no
valor do suporte físico”366.

Esses argumentos, então, serviram de base para a concessão de tutela de


urgência, com base no artigo 81, caput, e parágrafo 3º, do Regulamento
Aduaneiro.

Como se vê, portanto, o debate jurisprudencial atual gira em torno da


classificação dos jogos eletrônicos como software ou obras audiovisuais.
Diante disso, nos parece imperioso analisar a natureza jurídica dos games,
o que será feito a seguir.

3. NATUREZA JURÍDICA DOS JOGOS ELETRÔNICOS

Para que possamos analisar a natureza jurídica dos jogos eletrônicos,


partimos da própria dicotomia posta na atual discussão jurisprudencial
entre obra audiovisual e software.

636
Muito embora sejamos da opinião de que o problema de valoração
aduaneira poderia ser resolvido da maneira mais simples, sem tamanho
esforço, não seria razoável simplesmente ignorar a dualidade existente.
Pelo contrário, em respeito ao CARF e ao TRF3, tomamos tal dualidade
como ponto de partida, conforme se verá adiante.

3.1. A Lei Federal n. 12.485/2011 – Obras Audiovisuais

O artigo 2º, inciso VII, da Lei Federal n. 12.485/2011, apresenta a


definição de jogos eletrônicos como conteúdo audiovisual, notadamente o:

resultado da atividade de produção que consiste na fixação ou transmissão de


imagens acompanhadas ou não de som, que tenha a finalidade de criar a impressão
de movimento independente dos processos de captação, do suporte utilizado inicial
ou posteriormente para fixá-las ou transmiti-las, ou dos meios utilizados para sua
367
veiculação, reprodução, transmissão ou difusão .

A chamada indústria dos jogos eletrônicos também é objeto de


regulamentação por parte da Agência Nacional do Cinema (ANCINE)368,
que, em sua Análise de Impacto Regulatório (AIR) n. 1/2016/SEC, de 10
de novembro de 2016, cuidou de analisar os principais entraves para o
desenvolvimento da indústria de games no Brasil. Pelo subitem 1.6 do
primeiro capítulo do estudo, intitulado “Delimitação do Problema”, restou
claro que os jogos eletrônicos, para a referida agência reguladora,
pertenceriam ao setor da indústria audiovisual369.

A corroborar essa perspectiva, a ANCINE lançou em 2017 o edital


(PRODAV 14/2017) estabelecendo um certame cujo objetivo era de
“produção de jogos eletrônicos para exploração comercial em consoles,
computadores ou dispositivos móveis, visando à contratação de operações
financeiras de investimento”370.

637
Nessa toada, o próprio edital, em seu subitem 1.5, letra “a”, define jogo
eletrônico como “conteúdo audiovisual interativo cujas imagens são
alteradas em tempo real a partir de ações do(s) jogador(es)”371.

Em função disso, parece-nos que uma boa parte dos órgãos do Governo
Federal classifica os jogos eletrônicos como obras audiovisuais, em linha
com o artigo 2º, inciso II, da Lei Federal n. 12.485/2011. E, bem assim,
desloca a competência de regular e fomentar a atividade ligada aos games
à ANCINE que, grosso modo, regula as atividades cinematográficas e
videofonográficas.

Para ilustrar o impacto dessa decisão administrativa, convém destacar a


análise tributária feita pela ANCINCE, por ocasião da Análise de Impacto
Regulatório (AIR) n. 1/2016/SEC.

É que, em consonância com o entendimento prevalecente do CARF,


promovido pela ANCINE, mensurou a carga tributária372 que recairia sobre
os jogos eletrônicos em mídia física importados e sujeitos ao despacho de
importação373.

A ANCINE considerou o código NCM 8523.49.90, destinado a


suportes ópticos, cuja alíquota máxima seria de 16% (dezesseis por cento).
Segundo a Agência, o “valor aduaneiro total deve ser objeto de
tributação”, incluindo aí tanto a mídia física, quanto a parcela referente ao
licenciamento do jogo374.

A Agência elegeu como parâmetro o valor aduaneiro de 75% (setenta e


cinco por cento) do valor de varejo americano, o que, convertido, resultaria
no valor de R$ 144,45 (cento e quarenta e quatro reais e quarenta e cinco
centavos).

638
Outra premissa adotada pela ANCINE, relativamente ao ICMS, foi o
Convênio ICMS n. 181, de 28 de dezembro de 2015375, celebrado pelo
Conselho de Política Fazendária (CONFAZ), que autorizou os Estados a
reduzir a carga tributária sobre os jogos eletrônicos para o mínimo de 5%
(cinco por cento) do valor da operação, independentemente de por qual
meio o programa é comercializado.

A ANCINE, então considerando o valor aduaneiro, englobando as


mídias, sons e software, chegou a uma carga de tributária de importação no
valor de R$ 148,91 (cento e quarenta e oito reais e noventa e um centavos).

De mais a mais, destaca-se que a Portaria n. 230, de 1º de dezembro de


2011376, ao tratar das áreas de representação da Comissão Nacional de
Incentivo à Cultura, classificou os jogos eletrônicos como segmento
integrante da área audiovisual, conforme se depreende do seu artigo 1º,
inciso II, letra “k”:

Art. 1º Ficam assim distribuídos os segmentos culturais integrantes das áreas de


representação da CNIC, para os efeitos do § 3º do art. 18 e do art. 25 da Lei n.
8.313, de 1991:
(...)
II – audiovisual:
(...)
k) jogos eletrônicos; (...).

E, bem por isso, a partir de uma primeira leitura dos atos


governamentais, tudo leva a crer que os jogos eletrônicos seriam
enquadrados como obras audiovisuais, para fins de política regulatória e de
fomento. Contudo o debate não se encerra – e nem se poderia encerrar –
antes de nos debruçarmos sobre o exame do conceito de software.

3.2. A Lei Federal n. 9.609/98 – Software

639
O artigo 1º, caput, da Lei Federal n. 9.609/98, define programa de
computador como a:

expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou


codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário
em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos
ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los
377
funcionar de modo e para fins determinados .

Outra interpretação possível para os jogos eletrônicos é situá-los nos


programas de computador ou software, devido às suas instruções que
possibilitam (i) a interatividade e (ii) o aprendizado. Não à toa, os jogos
eletrônicos terão em sua composição um arco de compreensão do jogador
em relação ao jogo, o que é chamado de “curva de aprendizagem”378.

A proteção intelectual dos jogos eletrônicos a partir da lei de software


se deve ao “seu processo de desenvolvimento e algoritmos considerados
únicos, inovadores e criativos”379, o que, inclusive, os aproximaria de uma
obra literária (considerando, também, os roteiros que lhes são inerentes e o
código-fonte pelo qual são registrados)380.

Para fins criminais, inclusive, o próprio Tribunal de Justiça de São


Paulo (TJSP) classifica os jogos eletrônicos como um filo de programas de
computador, protegidos pela Lei do Software, a reclamar as sanções
trazidas no artigo 12 da Lei Federal n. 9.609/98.

Isso fica claro em um julgado de lavra da Desembargadora Daniela de


Carvalho Duarte, por ocasião do apelo n. 9110445-88.2007.8.26.0000, da
11ª Câmara Criminal do TJSP, segundo o qual:

Ao cabo da instrução, entretanto, a absolvição por insuficiência probatória é a


medida escorreita.
A primeira relaciona-se à apreensão de jogos de videogame e software
falsificados.

640
Não há dúvida de que esta mercadoria deve ser tida como espécie de programa
de computador, pois são jogos virtuais de entretenimento, produzidos
eletronicamente e reproduzidos por meio de um computador pessoal, em geral por
console específico de videogame.
Tais jogos e qualquer outro programa de computador se enquadram
perfeitamente ao conceito de programa de computador mencionado no art 1º da Lei
381
9.609/1998 (...) .

Em suma, a proteção dos jogos eletrônicos via lei de software é


assentada, em virtude de 3 (três) razões (sem prejuízo de demais aspectos
que deixaram de ser abordados):

•são comparáveis a programas de computadores;


•são comparáveis a obras literárias, eis que possuem roteiros próprios, estão
criptografados no código-fonte e possuem um processo criativo; e
•o software é essencial para desenvolver interatividade e aprendizado, pois
fornece instruções ao jogador.

Assim, parece-nos inegável que os jogos eletrônicos são um tipo de


software. Poderia, portanto, um bem (intangível) ser, ao mesmo tempo,
software e obra audiovisual? A resposta a essa pergunta pode estar na
doutrina especializada, conforme se verá adiante.

3.3. Opiniões de especialistas

Para Marcos Wachowicz, dentro do contexto de propriedade intelectual,


jogos eletrônicos ou digitais estão de fato dentro de um acirrado debate
entre aqueles que defendem o seu enquadramento em uma modalidade de
software e aqueles que os classificam como obra audiovisual382.

Ainda assim, o autor parte da premissa de que os jogos digitais estão


condicionados à educação e à comunicação. Este último aspecto, aliás, dá
base para os novos setores industriais “do software, de serviços de
informação, de mídia e processamento de conhecimentos habilitadores”383.

641
Wachowicz situa os games como bens informáticos, provenientes das
chamadas “Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs)”, estando
eles condicionados ao sistema informático, onde ele é nascido, elaborado e
emergido384.

Nesse contexto, o autor diferencia o software do jogo eletrônico.


Enquanto aquele oferece funcionalidades instrutivas (hardware) voltadas a
determinada função no computador, este proporciona interatividade aos
jogadores, mediante imagens, personagens, desenhos, deflagrados por
meios informativos (classificados como softwares e hardwares), podendo
ser acessados por outras plataformas385.

Não se nega também que todos os jogos eletrônicos, inclusive os


audiovisuais, devam ser albergados pela tutela jurídica dos bens de
propriedade industrial, até porque o desenvolvimento dos games parte de
um processo produtivo repleto de atores e agentes386.

Fato é que até mesmo a Lei de Propriedade Intelectual restringe a tutela


dos jogos eletrônicos (tidos como programa de computador) a um
“conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada”,
e aqui, o que mais nos interessa, inserida em “suporte físico”387.

Os games envolvem uma série de aspectos que se aproximam de obras


audiovisuais, tais como o design, o roteiro, a dramaturgia, o aspecto
artístico, o aspecto sonoro, sendo-lhes indispensável o conjunto de
funcionalidade instrutiva, assim denominado de software, ainda que a ele
seja atribuído um status de bem singular388.

Isso faz que sejam colocados em uma “classificação distributiva”, que


reconhece a complexidade dos jogos e privilegia uma visão um pouco

642
mais pragmática sobre o assunto389.

Segundo Tarcísio Vilton Meneghetti, a legislação aplicável à


Propriedade Intelectual situa os jogos eletrônicos como software, “por
trabalharem com programações, músicas, roteiros, vídeos, imagens em
geral”. Assinala o autor que os jogos eletrônicos são, por sua essência,
programas de computador, regulamentados pela Lei Federal n. 9.609/98,
tendo elementos que são protegidos pela Lei Federal n. 9.610/98390.

Meneghetti define software como um conceito que abrange os


programas de computador, mas que “acrescenta os documentos descritivos
e instrutivos acessórios, que visam comunicação com o operador humano e
não a máquina”391.

Traz ainda distinção entre três tipos de software: (i) software de


encomenda, como aquele produzido sob específicas diretrizes do
encomendante; (ii) software de prateleira, como aquele lançado no
comércio, sendo “o caso da maioria dos Jogos eletrônicos”; e (iii) o
software de nicho, direcionado a um grupo específico392.

O autor não refuta, porém, que os jogos eletrônicos estariam também


dentro do campo das obras audiovisuais, o que demandaria incluí-los em
uma “categorização própria”, para fins de direito autoral eminentemente393:

Jogos eletrônicos são protegidos tanto como obras audiovisuais como programas
de computador. Além disso, permitem proteções particulares de criações ligadas à
obra, como a trilha sonora, protegida enquanto composição musical, o roteiro e os
personagens, enquanto obra literária, os desenhos e o design do jogo, e assim por
diante. Tal como na obra cinematográfica há vários elementos sendo protegidos
individualmente e que não parecem atribuir maiores complicações. A grande
394
questão permanece na autoria da obra de jogo eletrônico em sua totalidade .

643
Nada obstante, Wachowicz assevera que os jogos eletrônicos não são
obras audiovisuais, embora tenham aspectos semelhantes, não podem ser
confundidos, nem em sua forma de criação, desenvolvimento e suas
ferramentas tecnológicas, nem em sua tutela jurídica de propriedade
intelectual. Veja-se:

A tutela jurídica necessária para os criadores e desenvolvedores de games, bem


como de todos que interagem no processo de produção, não se amoldam
linearmente aos que produzem uma obra audiovisual.
Daí decorre também a insuficiência de proteção jurídica para os jogos
educacionais, se forem linearmente comparados ou equiparados às obras
395
audiovisuais .

Daí a ideia de que não há uma posição peremptória sobre a natureza dos
jogos eletrônicos. Isso porque a natureza híbrida e ambivalente dos games
parece reforçar a ideia de uma classificação distributiva. Inclusive, em
termos de propriedade intelectual, a partir da leitura da discussão
doutrinária, os jogos eletrônicos teriam aspectos audiovisuais, literários e
de software a serem considerados.

3.4. Nossa opinião quanto à natureza jurídica

O debate travado no campo da propriedade intelectual serve para


afirmarmos que os jogos eletrônicos possuem contornos de:

•obras audiovisuais porque possuem aspectos sonoros e de vídeos, com um


conteúdo artístico;
•obras literárias criativas, pois possuem roteiro e código-fonte; e
•software, pois é ele que deflagra a interatividade e a aprendizagem do jogador.

Ignorar esses aspectos não nos parece adequado para nos posicionarmos
com olhar crítico sobre o tema. Assim, para fins de propriedade intelectual,
situá-los em um campo misto poderia ser uma boa escolha (embora não
seja a nossa pretensão opinar sobre esse assunto).

644
Em resumo, portanto, temos o entendimento de que os jogos eletrônicos
possuem características de software e de obras audiovisuais, sendo
impossível classificá-los exclusivamente como um ou outro.

A despeito disso, a grande questão que se apresenta é a irrelevância


dessa discussão para fins de definição do problema objeto do presente
artigo, conforme se abordará no item seguinte.

3.5. A cortina de fumaça em torno da Decisão 4.1

Por todo o exposto anteriormente, é possível afirmar que, para discutir a


tributação aduaneira sobre jogos eletrônicos, o contribuinte autuado fez um
esforço para situar os games na situação prevista na Decisão n. 4.1 do
Comitê de Valoração Aduaneira. Isso porque buscou classificar os jogos
eletrônicos como software eminentemente, fazendo um exercício
interpretativo que nos parece dispensável.

Noutros dizeres, o contribuinte fez um esforço para enquadrar os jogos


eletrônicos como software para atrair os efeitos da Decisão n. 4.1, quando
simplesmente poderia ter defendido que os jogos eletrônicos não
correspondem a obras audiovisuais, estas previstas no parágrafo 3º do
artigo 81 do Regulamento Aduaneiro.

A discussão, portanto, a nosso ver não deveria girar em torno da


Decisão 4.1, e sim da norma estabelecida no artigo 81, de modo que todos
os dados e processamento importados, que não forem gravações de
cinema, vídeo e áudio, serão enquadrados na regra do caput, e não na
exceção do parágrafo 3º, do artigo 81.

Neste contexto, a posição do TRF3 anteriormente indicada também se


equivoca ao levar em consideração a Decisão n. 4.1.

645
Isso porque, em nossa opinião, pouco importa se os jogos eletrônicos
são ou não “predominantemente” um software. O que deveria importar
para a resolução do caso é se os jogos eletrônicos estão ou não incluídos
no parágrafo 3º do artigo 81, pois, se não estiverem, naturalmente estarão
abarcados no caput, independentemente de sua natureza jurídica (se
software etc.).

Assim, se os jogos eletrônicos importados não são obras audiovisuais e,


sim, outro tipo de dados gravados em um suporte físico, o valor aduaneiro
será aquele correspondente à mídia que o carrega. A rigor, fosse um
parecer jurídico ou qualquer outro dado que não seja eminentemente
audiovisual, a regra do valor aduaneiro – e não a exceção – se aplica para
tributar o suporte físico.

O embate doutrinário dos autores de propriedade intelectual a respeito


da natureza jurídica dos jogos eletrônicos, inclusive, reforça a ideia de que
os jogos eletrônicos não são puramente obras audiovisuais, o que autoriza
o enquadramento dos games na regra do caput artigo 81 do Regulamente
Aduaneiro.

O CARF situou bem o debate porque buscou enquadrar os jogos


eletrônicos como obras audiovisuais. Entretanto este órgão utilizou
expediente estranho à legislação para aproximar os games de gravações de
cinema, som e vídeo, utilizando-se do critério “entretenimento”.

Nesse sentido, embora o CARF não tenha caído na cortina de fumaça


da Decisão n. 4.1, acaba solucionando mal a questão quando da subsunção
dos jogos eletrônicos ao parágrafo 3º, pois, em vez de analisar se os jogos
seriam aqueles tipos ali listados, amplia a disposição do parágrafo 3º como
se neste estivessem previstos “outros bens destinados ao entretenimento”.

646
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Parece-nos que o embate, para fins aduaneiros, sobre os jogos


eletrônicos registrados em mídia física deve ser limado ao que previsto nas
normas internacionais e locais.

Uma vez fixado que os games estão dentro de uma classificação


distributiva, considerando os seus diversos aspectos a serem albergados na
lei brasileira, temos argumentos sólidos de que o valor aduaneiro dos jogos
eletrônicos é de fato o valor do suporte físico.

Como visto, a classificação de jogos eletrônicos não foge da regra


trazida no caput do artigo 81 do Regulamento Aduaneiro para dados
eletrônicos gravados em um suporte físico. Aqui pouco importa se os jogos
eletrônicos são puramente software.

O que é relevante, para a discussão, é que eles não podem ser


enquadrados como simples obras audiovisuais, o que repele o disposto no
parágrafo 3º do artigo 81 do Regulamento Aduaneiro.

Dito de outra forma, se os jogos eletrônicos forem software, obras


literárias ou obras mistas (considerando a existência de instruções, código-
fonte, áudio, vídeo, roteiro etc.), os tributos alfandegários recairão sobre o
suporte físico, pois para o direito aduaneiro o que importa é a presença de
dados que não sejam pura e simplesmente obras audiovisuais. É assim que
a norma internacional deve ser interpretada.

Embora o TRF3, quando apreciou a matéria, tenha interpretado o artigo


1º da Lei de Software, para qualificar os jogos eletrônicos como software,
e tributá-los pelo valor aduaneiro, parece-nos que o tribunal acertou na

647
decisão final, mas errou nas razões de decidir, pois limitou a natureza
jurídica dos jogos eletrônicos ao software.

O CARF, quando se defrontou com o tema, embora tenha afastado bem


a Decisão n. 4.1, andou mal também, pois os games possuem uma
classificação distributiva que engloba seus diversos aspectos. O critério do
tribunal administrativo para aproximar os jogos eletrônicos às obras
audiovisuais, qual seja a finalidade de entretenimento, é frágil porque
transborda em muito no que foi considerado pelo legislador.

Desse modo, o argumento da fiscalização, que, historicamente, era


outro (conforme mencionado no tópico 3.1 quando citadas as Soluções de
Consulta de 2007 e 2008), parece mais ser retórico do que propriamente
uma interpretação adequada da lei.

Em suma, o caráter ambivalente dos jogos eletrônicos reforça a ideia de


que, em última análise, são dados incutidos em um suporte, tais como um
parecer jurídico ou uma fotografia, o que corrobora a nossa posição de que
os tributos alfandegários apenas podem recair sobre o valor do suporte
físico.

De mais a mais, o suporte físico é essencial para a operação de


importação dos jogos eletrônicos, de modo que faria sentido que o valor
aduaneiro fosse pautado pelo meio, corroborando a prática internacional.

A rigor, a discussão instaurada no presente ensaio serviu para


definirmos que os jogos eletrônicos não são obras audiovisuais, pura e
simplesmente, mas, em última análise, são dados, nesse caso, gravados em
um suporte físico, o que impõe à Receita Federal do Brasil o dever de
enquadrá-los na regra do caput do artigo 81, do Regulamento Aduaneiro.

648
Aspectos tributários do download de
software: equívocos comuns e implicações
decorrentes da edição do Convênio CONFAZ
n. 181/2015
396 397
Matheus Augusto Ferraz Rector e Raphael de Campos Martins

Houve uma época em que comprar e vender uma mercadoria se traduzia


na entrega de um bem ao outro, desejoso de tê-la em mãos. Nessa mesma
época, a circulação de bens se resumia à sua própria movimentação física
entre dois pontos distintos no espaço.

Se as operações comerciais de hoje guardam cada vez menos


semelhanças com aquelas realizadas no passado, cabe ao intérprete das
normas estender o seu alcance sobre fatos que, dada a velocidade das
mudanças em curso, as mesmas normas não conseguiram acompanhar.

O ambiente virtual, como verdadeiro centro de compras ao alcance das


mãos, vem ganhando cada vez mais importância em um caminho que
parece sem volta. E, se muitas transações comerciais pela web se afiguram
como meras transposições de local onde as vendas acontecem, outras se
revelam como situações absolutamente novas.

As relações comerciais envolvendo software, que no passado recente


pressupunham a utilização de suportes físicos (os já quase esquecidos
CDs), passaram a acontecer em ambiente virtual antes mesmo que o
Direito chegasse a uma definição concreta sobre a sua natureza. Afinal,
correspondem a mercadorias ou a obras intelectuais? Se mercadorias,

649
como superar o fato de que não dispõem de um corpus? Se obras
intelectuais, como defender que sejam passíveis de venda?

Embora incapazes de responder a tais questões, o fato é que diversos


Estados da Federação, encarnados na legitimidade ativa para exigir o
ICMS sobre a circulação de mercadorias, passaram a tributar as operações
com software, realizadas ou não em ambiente virtual. Instado a se
manifestar, o Judiciário debruçou-se sobre alguns aspectos do problema e
ignorou outros, como se isso não representasse sérios reflexos para a
segurança jurídica.

Neste trabalho nos propomos a discutir a natureza do software à luz da


legislação brasileira para que as conclusões sirvam de base à análise da
tributação, pelo ICMS, das operações com software realizados pela
transferência eletrônica de dados (download). Em especial, discorreremos
sobre o Convênio ICMS n. 181, celebrado no âmbito do CONFAZ
(Convênio ICMS n. 181/2015) e suas implicações, bem como sobre a
incorporação dos seus dispositivos pelas legislações estaduais.

O CONCEITO DE SOFTWARE NO ORDENAMENTO JURÍDICO


BRASILEIRO

O ponto de partida para iniciarmos uma análise dos eventos tributários


que cercam as transações com software no Brasil passa, necessariamente,
pela análise da Lei n. 9.609, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei do Software),
cujo projeto foi proposto em 1995 pelo Poder Executivo em um contexto
de rápida expansão das operações executadas por meio informático398.

O conceito jurídico de software foi introduzido no ordenamento


brasileiro pelo artigo 1º da Lei do software como sendo a

650
expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou
codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário
em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos
ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los
funcionar de modo e para fins determinados.

A definição que nos conduzirá a algumas conclusões mais adiante neste


trabalho é simples e não demanda maiores esforços interpretativos:
software é um conjunto organizado de instruções. É conhecimento
codificado em linguagem próxima à natural. Nada mais.

Se o conhecimento, por si só, nada representa se dele não se fizer uso


ou se não for transmitido a outrem, com o software não é diferente.

Embora necessariamente inserido em um suporte físico, tal qual o texto


de um livro pressupõe a existência de papel e tinta, o software possui
existência independente. Em outros termos, embora o suporte físico seja
requisito para que haja a transferência de titularidade ou uso do software,
ele constitui apenas um meio para se atingir tal objetivo.

Daí concluirmos que o software não corresponde aos CDs expostos em


gôndolas. Tratamos, pois, dos conhecimentos neles gravados e para cujo
uso foram atribuídos preços e determinadas condições.

Por mais etérea que tal ideia pareça, sua compreensão é de fundamental
relevância para as breves discussões que pretendemos propor neste tópico,
isto é, concluirmos se o software corresponde a uma mercadoria e se, de
fato, existem diversas espécies de software como se assentou na doutrina e
no Judiciário.

O SOFTWARE COMO MERCADORIA

651
A doutrina clássica define mercadoria como bem móvel, corpóreo,
sujeito à mercancia. A natureza mercantil de um bem não deflui, como
bem assevera Paulo de Barros Carvalho399, de suas propriedades
intrínsecas, mas de sua destinação específica. Nesse sentido, podemos
atribuir a um software colocado à “venda” em uma loja de departamentos a
natureza de mercadoria?

Temos para nós que a resposta é negativa.

Grande parte da doutrina, é sabido, refuta tal classificação por motivos


que entendemos não serem os mais acertados. Isso porque sustentam que
falta ao software a materialidade, a corporificação necessária a considerá-
lo mercadoria.

Não obstante concordemos que o software não é bem corpóreo, uma


vez que corpóreo é o seu suporte físico e não o conteúdo, entendemos que
tal definição não resiste ao tempo, porque cunhada em época na qual
sequer se poderiam supor as infinitas modalidades de relações comerciais
realizadas na atualidade.

E não se invoque o artigo 110400 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de


1966 (Código Tributário Nacional). Não estamos aqui diante de qualquer
alteração de conceito de Direito Privado, mas de legítima definição revista
em razão das próprias modificações decorrentes da evolução das
relações401.

Tratando-se de um conjunto de instruções organizadas pelo seu autor, a


Lei do software, com propriedade, estabeleceu em seu artigo 9º402 que o
uso do programa de computador no país será objeto de contrato de licença.
Com isso, atribuiu às relações comerciais com software o caráter exclusivo

652
de cessão ou licenciamento de uso e não de compra e venda, quando
livremente poderia tê-lo feito.

Daí porque concluirmos que falta ao software, para ser considerado


mercadoria, a sua circulação econômica ou jurídica: há apenas cessão ou
licenciamento de uso. Ausente uma venda, o entendimento não pode ser
outro.

Vale dizer, a opção legislativa de considerar o software como obra


intelectual e não mercadoria sujeita à compra e venda foi reafirmada com a
edição da Lei n. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, ou Lei do Direito
Autoral403.

No mesmo sentido, o Agreement on Trade-Related Aspects of


Intellectual Property Rights (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de
Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio), firmado no âmbito da
Organização Mundial do Comércio e ratificado pelo Brasil por meio do
Decreto n. 1.355, de 30 de dezembro de 1994, estabelece que “programas
de computador, em código-fonte ou objeto, serão protegidos como obras
literárias pela Convenção de Berna (1971)”.

Não há, portanto, segundo o Direito brasileiro, transferência da


titularidade jurídica do software. E não existem ressalvas.

O que se adquire, por meio gratuito ou oneroso, é o direito do


licenciado de vir a utilizar o programa de computador ou mesmo de
sublicenciá-lo. Há, pois, cessão de direitos, daí o porquê de não ser
possível se admitir que haja sua circulação e, por conseguinte, que possa o
software vir ser classificado como mercadoria.

AS ESPÉCIES DE SOFTWARE

653
É conhecida a distinção do software em espécies, para fins de
incidência do ICMS e do ISS, feita pela doutrina. Embora não seja objeto
de maior estudo neste trabalho, o tema não pode ser ignorado.

A construção doutrinária que acabou consagrada nos tribunais


superiores ignora a legislação de regência do software para atribuir à
atividade-meio – o desenvolvimento do programa de computador – o
condão de produzir efeitos jurídico-tributários. Em síntese, o entendimento
jurisprudencial atual divide o software em três espécies:

•software de prateleira ou standard – aquele transacionado em larga escala, da


mesma forma, a um número indeterminado de consumidores;
•software por encomenda – aquele desenvolvido especialmente para
determinado cliente, customizado, para fim específico; e
•software adaptado ao cliente – programas que correspondem a uma adaptação
de um software standard para atender às necessidades de um cliente.

Embora tais definições pareçam sensatas em uma primeira análise, não


resistem ao confronto com a realidade normativa.

Ora, se a própria Lei do Software estabelece, como demonstramos, que


a relação jurídica que regula está ao amparo do Direito Intelectual, com
maior razão concluímos que, para fins tributários, a existência de uma ou
mais espécies de software, classificadas em razão do seu desenvolvimento
desta ou daquela forma, é indiferente.

Ao defender a incidência do ICMS sobre o “software de prateleira”,


seus defensores ignoram que os programas de computador estão sujeitos,
no país, exclusivamente a contratos de licença. Logo, a inexistência de
transferência da titularidade jurídica do bem na cessão de direitos vai de
encontro à regra-matriz do ICMS estabelecida no artigo 155, II da
Constituição Federal:

654
Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: II –
operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações
e as prestações se iniciem no exterior.

No mesmo sentido, asseverou, com propriedade, Assunção404 (2009, p.


27) que:

(...) inexistindo circulação jurídica das obras intelectuais transmitidas


eletronicamente, vale dizer, mudança patrimonial, não se pode admitir a
caracterização da materialidade da norma de incidência do ICMS, com base na
significação corrente da expressão “circulação”, atrelada a atos de transferência de
domínio. Afinal, nem o processo de cópia das informações que compõem o bem
digital nem o negócio jurídico de licenciamento ou cessão parcial de uso ocasionam
deslocamento de direitos patrimoniais.

Aos defensores da incidência do ISS sobre o software customizado,


entendemos, não assiste melhor sorte. Sua defesa se baseia na taxatividade
da lista de serviços anexa à Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de
2003 (LC n. 116/2003), cujo item 1.05 estabelece a incidência do imposto
sobre o “licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de
computação”.

Ora, a cessão de direitos em nada se confunde com uma prestação de


serviços (obrigação de fazer), objeto do ISS inserido no artigo 156, II da
Constituição Federal405. Na cessão onerosa do direito de uso do software
observamos verdadeira obrigação de dar, cuja prestação consiste na
entrega da coisa (o direito, não o programa de computador em si)406.

Analisando o tema, Carrazza407 bem definiu que a remuneração que o


cedente recebe do cessionário não é preço de serviço algum408, razão pela
qual não há que se admitir a tributação pelo ISS seja qual for o nome que
se dê à espécie de software objeto de contrato de cessão de uso, com o que
concordamos.

655
Também não assiste melhor sorte ao argumento de que, em razão de o
artigo 4º409 da Lei do Software conferir ao contratante os direitos relativos
ao programa de computador desenvolvido pelo contratado, estaríamos
diante de prestação de serviços pura. Ora, é inconcebível se falar em
licenciamento a si mesmo (autolicenciamento) do software desenvolvido.
Entendemos, ao contrário, que aquilo que a lei pretende prestigiar é a
relação comercial entre contratante e contratado após o nascimento do
direito do autor, jamais impedir sua própria existência.

Ou seja: o direito de autor do contratado nasce com a obra intelectual,


mas, por disposição legal, é cedido ao contratante que passa a detê-lo.
Tanto é assim que, normalmente, os contratos de emprego em empresas de
tecnologia ou contratos de desenvolvimento de software preveem
expressamente que o autor cederá os direitos ao contratante410.

Isso posto, repisamos ser indiferente a classificação do software em


espécies distintas. A cessão de direitos de uso de software, seja qual for a
relação comercial precedente que liga o cedente e o cessionário, não está
sujeita à tributação pelo ICMS ou pelo ISS porque não se subsume às
respectivas hipóteses de incidência tributária411.

A TRIBUTAÇÃO DO SOFTWARE ADQUIRIDO POR MEIO DIGITAL


(DOWNLOAD)

Não há como ignorar o fato de que a tributação pelo ICMS nas


operações com software realizadas em grande escala tende a ocorrer, já
que comumente admitida pelo Judiciário. Assim, reconhecendo para fins
de debate a existência de uma verdadeira compra e venda entre o cedente
(“vendedor” ou “fabricante”) e o cessionário (“adquirente” ou
“consumidor”) com relação ao software, pretendemos, de forma mais

656
detalhada neste trabalho, estudar a incidência do ICMS sobre sua aquisição
por meio digital, o download.

O termo “comercializar”, vale dizer, foi utilizado diversas vezes pela


Lei do Software ao se referir às transações comerciais que envolvam o
licenciamento do direito de uso dos programas de computador.

O argumento comumente utilizado para se afastar a cobrança do ICMS


sobre softwares adquiridos por download passa pela pretensa inexistência
de suporte físico apto a fazer “circular” a mercadoria. Dessa forma, o
software standard não inserido em um CD-ROM, por exemplo, estaria
livre do espectro de incidência do tributo.

Tal argumento incorre em pelo menos dois equívocos, a nosso ver. A


uma, porque o vocábulo “circulação” corresponde à mudança de
titularidade do bem, o que não ocorre conforme mencionamos
anteriormente; a duas, porque a ideia de que no download inexiste suporte
físico não se sustenta, conforme veremos.

O artigo 1º da Lei do Software, ao defini-lo, condiciona sua existência a


um suporte físico de qualquer natureza. Sob tal definição, portanto, a
ausência de um suporte físico desnaturaria não apenas a operação
comercial sujeita à tributação, mas a própria existência do software como
tal.

Por mais absurda que pareça a conclusão acima, fato é que a tecnologia
ainda não avançou ao ponto de dispensar o suporte físico para o transporte
e utilização do software, de forma que, ao abrigo da definição legal,
podemos admitir que o programa de computador continuará existindo por
tempo indeterminado.

657
Por certo, o que inexiste no download é algo tão perceptível quanto um
CD-ROM, o que não basta para se concluir que o software, o conjunto
organizado de instruções dadas à máquina, não está inserido, gravado em
algo. Ao contrário, o que existe entre o computador do usuário final e o
servidor no qual está gravado originalmente o software é uma incontável
quantidade de suportes físicos espalhados pelo planeta formando aquilo
que se convencionou chamar web.

O que não ocorre, realmente, é a movimentação física desses suportes.


Ao final, para sua utilização, é indiscutível que o software está fisicamente
suportado no próprio computador do usuário (ou em outro, se falarmos de
rede ou, mais recentemente, nuvem) e que ali não chegou antes de passar
fisicamente, por meio de registros magnéticos, por diversos pontos412.

Nunca é demais voltar ao conceito de que o software é, por si só,


intangível. O suporte físico consistirá, sempre, em meio necessário para a
expressão das informações (conhecimento) dispostos em códigos de
programação.

A POSIÇÃO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES

Os tribunais superiores consolidaram suas posições no sentido da


incidência do ICMS sobre a comercialização de software de prateleira.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já há algum tempo


entende que a comercialização de softwares produzidos em larga escala no
varejo por terceiros configura genuína operação de circulação de
mercadorias. Por ocasião do julgamento do Recurso Especial n.
123.022/RS, o STJ assim decidiu413:

TRIBUTÁRIO. ICMS. ISS. PROGRAMAS DE COMPUTADOR


(SOFTWARE). CIRCULAÇÃO.

658
Se as operações envolvendo a exploração econômica de programa de
computador são realizadas mediante a outorga de contratos de cessão ou licença de
uso de determinado “software” fornecido pelo autor ou detentor dos direitos sobre o
mesmo, com fim específico e para atender a determinada necessidade do usuário,
tem-se caracterizado o fenômeno tributário denominado prestação de serviços,
portanto, sujeito ao pagamento do ISS (item 24, da lista de serviços, anexo ao DL
406/68).
Se, porém, tais programas de computação são feitos em larga escala e de
maneira uniforme, isto é, não se destinando ao atendimento de determinadas
necessidades do usuário a que para tanto foram criados, sendo colocados no
mercado para aquisição por qualquer um do povo, passam a ser considerados
mercadorias que circulam, gerando vários tipos de negócio jurídico (compra e
venda, troca, cessão, empréstimo, locação, etc.), sujeitando-se, portanto, ao ICMS.
Definido no acórdão de segundo grau que os programas de computação
explorados pelas empresas recorrentes são uniformes, a exemplo do “Word 6,
Windows”, etc., e colocados à disposição do mercado, pelo que podem ser
adquiridos por qualquer pessoa, não é possível, em sede de mandado de segurança,
a rediscussão dessa temática, por ter sido ela assentada com base no exame das
provas discutidas nos autos.
Recurso Especial improvido. Confirmação do acórdão hostilizado para
reconhecer, no caso, a legitimidade da cobrança do ICMS.

No leading case da matéria, objeto de análise pelo Supremo Tribunal


Federal no julgamento do Recurso Extraordinário n. 176.626/SP, o relator,
Ministro Sepúlveda Pertence, embora tenha admitido a incidência do
ICMS nas hipóteses de software de prateleira adquiridos pelos
comerciantes para revenda, situação em que “materializando o corpus
mechanicum da criação intelectual do programa, constituem mercadorias
postas ao comércio”, afastou a incidência do tributo estadual sobre o
licenciamento ou cessão do direito de uso sem que tenha ficado definida
qual sua base de cálculo nesta hipótese, conforme se verifica da respectiva
ementa. Confira-se:

(...) II. RE: questão constitucional: âmbito de incidência possível dos impostos
previstos na Constituição: ICMS e mercadoria. Sendo a mercadoria o objeto
material da norma de competência dos Estados para tributar-lhe a circulação, a
controvérsia sobre se determinado bem constitui mercadoria é questão
constitucional em que se pode fundar o recurso extraordinário. III. Programa de
computador (“software”): tratamento tributário: distinção necessária. Não tendo por
objeto uma mercadoria, mas um bem incorpóreo, sobre as operações de

659
“licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador” – matéria
exclusiva da lide –, efetivamente não podem os Estados instituir ICMS: dessa
impossibilidade, entretanto, não resulta que, de logo, se esteja também a subtrair do
campo constitucional de incidência do ICMS a circulação de cópias ou exemplares
dos programas de computador produzidos em série e comercializados no varejo –
como a do chamado “software de prateleira” (“off the shelf”) – os quais,
materializando o “corpus mechanicum” da criação intelectual do programa,
constituem mercadorias postas no comércio.

Como resultado, o que se verificou, na prática, é que os Estados foram


autorizados a tributar os programas de computador vendidos no varejo
sobre uma base de cálculo mal compreendida.

Diante disso, muitos Estados encontraram na tributação do “suporte


informático” a solução para não permitir que as operações comerciais com
software passassem incólumes pela sede arrecadadora. Analogamente, se a
tentativa de se tributar pelo ICMS o papel utilizado pelo advogado na
formalização de uma opinião legal não é razoável, tributar os CDs
tampouco nos parece.

Não há dúvida de que a relação comercial entre licenciador e licenciado


tem por objetivo, exclusivamente, o conteúdo intelectual (software),
jamais a peça plástica que lhe dá suporte material, cada vez mais
desnecessária ante as operações realizadas de início ao fim por meio
eletrônico.

Em decorrência das alterações na forma como as relações se


materializam, o Supremo Tribunal Federal foi instado a se manifestar na
Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.945/MT sobre a incidência do
ICMS nas operações com programas de computador realizadas de forma
eletrônica, conforme previsto pela Lei do Estado de Mato Grosso n. 7.098,
de 30 de dezembro de 1998, artigo 2º, § 1º, VI e artigo 6º, § 6º, verbis:

Art. 2º O imposto incide sobre:

660
(...) § 1º O imposto incide também:
(...) VI – sobre as operações com programa de computador – software –, ainda
que realizadas por transferência eletrônica de dados.
(...)
Art. 6º A base de cálculo do imposto é: (...)
§ 6º Integra a base de cálculo do ICMS, nas operações realizadas com programa
de computador – software – qualquer outra parcela debitada ao destinatário,
inclusive o suporte informático, independentemente de sua denominação.

Ajuizada em janeiro de 1999, foi proferida decisão em sede de


apreciação de medida liminar em maio de 2010. Em julgamento apertado
(6×4, ausente o Min. Joaquim Barbosa), o STF decidiu pelo indeferimento
da liminar, mantendo a aplicação da lei matogrossense tal como editada.
Confira-se a ementa:

Ação Direta de Inconstitucionalidade. Direito Tributário. ICMS. 2. Lei Estadual


7.098, de 30 de dezembro de 1998, do Estado de Mato Grosso.
Inconstitucionalidade formal. Matéria reservada à disciplina de lei complementar.
Inexistência. Lei complementar federal (não estadual) é a exigida pela Constituição
(arts. 146, III, e 155, § 2º, XII) como elo indispensável entre os princípios nela
contidos e as normas de direito local. (...) 8. ICMS. Incidência sobre softwares
adquiridos por meio de transferência eletrônica de dados (art. 2º, § 1º, item 6, e art.
6º, § 6º, ambos da Lei impugnada). Possibilidade. Inexistência de bem corpóreo ou
mercadoria em sentido estrito. Irrelevância. O Tribunal não pode se furtar a abarcar
situações novas, consequências concretas do mundo real, com base em premissas
jurídicas que não são mais totalmente corretas. O apego a tais diretrizes jurídicas
acaba por enfraquecer o texto constitucional, pois não permite que a abertura dos
dispositivos da Constituição possa se adaptar aos novos tempos, antes imprevisíveis
(...).

Nesta decisão, que caminhava bem até o reconhecimento da


irrelevância da ausência de suporte físico, foi contrariada a orientação
jurisprudencial até então adotada pela Corte Superior, que não admitia a
tributação sobre o licenciamento ou cessão do direito de uso. Como
resultado, restou mantida a tributação não apenas do valor do suporte
informático, mas também de “qualquer outra parcela debitada do
destinatário”.

661
A leitura dos votos proferidos no julgamento da ADI n.1.945/MT
denota que os Ministros, não obstante lapso temporal superior a 10 anos
entre a propositura da ação e o julgamento da sua liminar no já distante
ano de 2010, se limitaram a uma análise superficial do tema sob o
argumento de que apreciavam apenas a medida acautelatória.

Confira-se, a seguir, um quadro com o resumo dos votos proferidos no


julgamento da ADI n. 1.945/MT:

414

Deferiu a
Ministro Argumento
liminar?19

Não tributação da cessão ou licenciamento de direito de


Octavio
uso. Possibilidade de se tributar software de prateleira. RE Sim
Gallotti
176.626/SP e RE 199.464/SP.

Possibilidade de se tributar software de prateleira.


Nelson Jobim Equiparação de transações físicas (CDs) com as Não
eletrônicas (download) para fins de tributação.

Doutrina que defende a não incidência em razão de


Ricardo imunidade ou não incidência de ICMS sobre direito
Sim
Lewandowski autoral. RE 176.626/SP, RE 191.454/SP, RE 191.732/SP,
RE 199.464/SP e RE 285.870-AgR/SP.

Celso de
Adotou as razões do Min. Lewandowski. Sim
Mello

O fato de a transação ocorrer de forma eletrônica


Ayres Britto (circulação virtual) não afasta do software o conceito de Não
mercadoria.

Marco Ausência de previsão do fato gerador na Lei


Sim
Aurélio Complementar n. 87/96.

Gilmar
Razões de conveniência política. Não
Mendes

Adotou as razões do Min. Nelson Jobim e do Min. Gilmar


Dias Toffoli Não
Mendes.

662
Eros Grau Adotou as razões do Min. Dias Toffoli. Não

Cezar Peluso Havendo transferência de mercadoria, incide ICMS. Não

Assim, o STF adiou importante decisão sobre a tributação de software


comercializado por meio de downloads, de forma que a dúvida suscitada
com a propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade pelo Partido do
Movimento Democrático Brasileiro – PMDB permaneceu sem resposta
mesmo após a decisão na liminar. O fato de parte dos votos ignorarem o
download, e outra parte optar pela manutenção do status quo por razões
políticas, uma vez que a legislação mato-grossense já vigorava desde 1999,
não trouxe a solução que os Estados da Federação e os contribuintes
esperavam.

Tampouco é possível aferir, por interpretação dos votos, qual seria a


tendência do STF ao julgar futuramente o mérito da questão, mesmo
porque a composição do plenário estará renovada em mais de metade dos
ministros. O que não se duvida é que a confusão de conceitos e votos que
caracterizou o julgamento da liminar na ADI n. 1.945/MT, se repetida,
será extremamente frustrante aos contribuintes, mantendo a insegurança
jurídica hoje existente em relação ao tema.

O CONVÊNIO ICMS N. 181/2015

Publicado em 29 de dezembro de 2015 com o objetivo de diminuir a


tributação incidente sobre as operações com software de prateleira (dada a
usual interpretação de que os programas de computador customizados
materializam uma prestação de serviços sujeita ao ISS), o Convênio ICMS
n. 181/2015 autorizou 19 (dezenove) Estados da Federação a concederem
redução na base de cálculo das operações de modo que a carga tributária
corresponda a, pelo menos, 5% do valor da operação. Como condição para

663
o aproveitamento da carga reduzida, que possui caráter opcional, o
Convênio ICMS n. 181/2015 determinou o não aproveitamento, pelo
contribuinte optante, de créditos ou incentivos fiscais vinculados às
operações beneficiadas. Confira-se a sua redação:

Cláusula primeira – Ficam os Estados do Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas,


Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Paraná, Paraíba, Pernambuco,
Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São
Paulo, Tocantins autorizados a conceder redução na base de cálculo do ICMS, de
forma que a carga tributária corresponda ao percentual de, no mínimo, 5% (cinco
por cento) do valor da operação, relativo às operações com softwares, programas,
jogos eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres, padronizados,
ainda que sejam ou possam ser adaptados, disponibilizados por qualquer meio,
inclusive nas operações efetuadas por meio da transferência eletrônica de dados.
Cláusula segunda – O benefício previsto neste convênio será utilizado
opcionalmente pelo contribuinte em substituição à sistemática normal de tributação,
sendo vedada a apropriação de quaisquer outros créditos ou benefícios fiscais.
Cláusula terceira – Ficam as unidades federadas referidas na cláusula primeira
autorizadas a não exigir, total ou parcialmente, os débitos fiscais do ICMS, lançados
ou não, inclusive juros e multas, relacionados com as operações previstas na
cláusula primeira, ocorridas até a data de início da vigência deste convênio.
Parágrafo único. A não exigência de que trata esta cláusula:
I – não autoriza a restituição ou compensação de importâncias já pagas;
II – observará as condições estabelecidas na legislação estadual.
Cláusula quarta – Este convênio entra em vigor na data da publicação de sua
ratificação nacional, produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de 2016.

É de se notar que, não por coincidência, a alíquota mínima estabelecida


pelo Convênio ICMS n. 181/2015 é a mesma que normalmente incide
sobre o “serviço” de licenciamento de programas de computador a título
de ISS e cobrado pelos municípios. Trata-se, inequivocadamente, da
oficialização de uma verdadeira competição entre Estados e Municípios
pela tributação do software.

A norma autorizou, ainda, os mesmos Estados da Federação a não


exigirem, total ou parcialmente, débitos tributários decorrentes de
operações com software ocorridas até 30 de dezembro de 2015, estivessem

664
tais débitos lançados ou não e incluindo eventuais cobranças de multas e
juros.

A análise das legislações estaduais demonstra que a maior parte dos


Estados signatários do Convênio ICMS n. 181/2015 não incorporou às
suas respectivas legislações locais dispositivos relacionados à tributação
com software obtidos por meio de download. Mais do que isso, não são
todos aqueles que preveem tratamento específico destinado às operações
com software e, quando o fazem, comumente adotam como base de
cálculo o valor do seu suporte físico.

Recentemente, por ocasião da adição do Decreto Estadual n. 61.791, de


11 de janeiro de 2016, o Estado de São Paulo adotou a redução da base de
cálculo nas operações com software disponibilizados por qualquer meio,
fixando a carga tributária no patamar mínimo de 5% estabelecido pelo ato
emanado pelo CONFAZ por meio da alteração ao artigo 73 do Anexo II do
Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n. 45.490, de 30 de
novembro de 2000 (RICMS/SP)415. Por meio do mesmo ato legal, no
entanto, o legislador paulista optou por suspender a exigibilidade do
tributo até que fosse definido o local de ocorrência do fato gerador na
hipótese de transferência eletrônica de dados, o que acabou por se
materializar com a edição, pelo CONFAZ, do Convênio ICMS n. 106
(Convênio ICMS n. 106/2017), em 29 de setembro de 2017.

Nos termos do Convênio ICMS n. 106/2017416, que disciplinou os


procedimentos de cobrança do ICMS incidente nas operações com bens e
mercadorias digitais comercializados por meio de transferência eletrônica
de dados e concedeu isenção nas saídas anteriores àquela destinada ao
consumidor final, foi definida a competência para cobrança do imposto em
tais operações ao Estado da Federação onde está domiciliado ou

665
estabelecido o “adquirente” do software. Assim, a despeito da necessidade
de lei complementar para dirimir conflitos de competência e definir fatos
geradores, bases de cálculo e contribuintes responsáveis pelo pagamento
do ICMS, foi aberto o caminho que alguns Estados aguardavam para dar
início à cobrança do imposto estadual.

A suspensão da exigibilidade do ICMS levada a efeito por meio do


artigo 37 das Disposições Transitórias do RICMS/SP reflete, no mínimo, o
descompasso entre o sujeito ativo tributário e a dinâmica dos fatos. Se,
anteriormente, o que se tributava era o suporte informático (CD-ROM),
que jamais representou, nem por esforço interpretativo, uma aproximação
da valoração conferida à propriedade intelectual representada pelo
software (em um verdadeiro sinal de “melhor tributar algo do que não
tributar nada”), agora o sinal dado pelo legislador é de que o mais
relevante é positivar a incidência, ainda que não fosse possível concretizar
a cobrança.

Em 20 de setembro de 2017, a Coordenação da Administração


Tributária da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo editou a
Decisão Normativa CAT 04 para afirmar o seu entendimento de que há
incidência do ICMS nas sobreditas operações. Para tanto, admite
expressamente a posição adotada pela jurisprudência com relação às
operações que envolvem o desenvolvimento de software por encomenda,
sujeitas ao ISS e, de outro lado, defende a tributação pelo ICMS das
operações em que se verifica a comercialização em massa, ausente a
personalização (ainda que passíveis de adaptação). Segundo a norma:

a circunstância de o adquirente instalar o software (de loja física ou virtual) em


sua máquina (download) ou utilizá-lo “na nuvem” por meio de internet (streaming)
não descaracteriza a natureza jurídica da operação como comercialização de
417
software pronto .

666
O Estado do Rio Grande do Sul, em um movimento idêntico, adotou a
redução da base de cálculo autorizada pelo Convênio ICMS n. 181/2015,
estabelecendo a suspensão da exigibilidade do tributo na forma prevista
pelo Estado de São Paulo418.

Já o Estado do Ceará adotou uma solução legislativa interessante ao


editar o Decreto n. 31.903, de 18 de março de 2016, para incorporar o
texto do Convênio ICMS n. 181/2015 sem, contudo, modificar as
disposições constantes em seu regulamento do ICMS para definir o
percentual de redução da base de cálculo. Há, neste caso, verdadeira
“incorporação genérica” do disposto no convênio.

Diante da inércia dos demais Estados da Federação, é de se imaginar


que a maior parte deles ainda estivesse aguardando a definição do local de
ocorrência do fato gerador nas situações de transferência eletrônica de
software, o que veio a acontecer com a edição do Convênio ICMS n.
106/2017. Muito embora tal situação pareça, à primeira vista, revelar um
sujeito ativo consciente das suas limitações, o que nos parece, ao contrário,
é que demonstra uma indisposição ao debate sobre a atipicidade das
relações que envolvem as operações com software. E mais:
equivocadamente convencidos da sua legitimidade ativa e sedentos por
arrecadação, demonstram os Estados pouca preocupação com o estímulo
da economia digital.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Deste modo, como se pode perceber, a recente alteração legislativa


promovida, entre outras, pela Decisão Normativa CAT 04, insere-se em
um longo e complexo cipoal formado pela falta de comunicação entre a
legislação específica de Direito Privado e as normas de Direito Tributário

667
e pela carência de pronunciamentos jurisdicionais que efetivamente
busquem endereçar a questão de forma definitiva.

No cenário extensivamente descrito acima, percebe-se que vamos


caminhando, de crise em crise, com posições encampadas pelos Estados
que já nascem juridicamente equivocadas e no campo do estado da arte
patentemente defasadas.

A questão relativa à tributação indireta do software permanece sem uma


solução juridicamente satisfatória, e o estado atual do debate demonstra
que o interesse dos Estados da Federação continua sendo buscar uma
forma de obter legitimidade nos seus esforços arrecadatórios a despeito de
um regime legal que, nos dias de hoje, simplesmente não comporta a
transferência de titularidade desse tipo de bem, mas apenas a sua cessão.

668
Aspectos da tributação sobre o consumo no
cloud computing
419 420
Sérgio Papini de Mendonça Uchôa Filho e Iris Cintra Basilio

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como escopo a análise da tributação do consumo


no cloud computing (“computação em nuvem”).

Inicialmente, analisaremos o contexto fático da tecnologia envolvida


nas operações compreendidas no conceito de cloud computing, apontando
e distinguindo o que seriam SaaS, PaaS e IaaS.

Em seguida, contextualizaremos o panorama da tributação do consumo


no cloud computing no Direito comparado, notadamente nos Estados
Unidos (sales and use tax) e na Europa (IVA), enfrentando a qualificação
jurídico-tributária dos negócios resultantes da contratação de tais
operações, à luz das orientações e diretrizes internacionais sobre o tema.

Finalmente, buscaremos analisar se, a partir das normas brasileiras em


vigor, a contratação e o fornecimento nacional e internacional de
computação em nuvem, seja para armazenar ou processar dados, seja para
trabalhar com determinado programa, deve ser tributada pelo ICMS ou
pelo ISS ou por nenhum dos dois, a partir da legislação, jurisprudência e
doutrina existentes sobre a temática, bem como os critérios para
determinar os sujeitos ativos.

1. CLOUD COMPUTING

1.1. Delimitação do conceito de cloud computing, natureza jurídica e


principais espécies

669
O Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia, do Departamento de
Comércio dos Estados Unidos (NIST), define cloud computing como
sendo um modelo de acesso a uma rede compartilhada de recursos de
computação configuráveis (redes, servidores, armazenamento, aplicativos
e serviços, por exemplo) que podem ser rapidamente disponibilizados ao
usuário com o mínimo esforço de gerenciamento ou interação do provedor
de serviços421-422.

O termo computação na nuvem, então, denota423:

(...) toda tecnologia que permite a realização de uma atividade (i) sob demanda e
por autosserviço; (ii) com disponibilidade de recursos computacionais “infinitos”;
(iii) elasticidade e adaptabilidade rápidas dos serviços; (iv) eliminação do
compromisso de grandes investimentos em tecnologia iniciais (acesso barato e
racional aos recursos da tecnologia da informação); (v) possibilidade de pagamento
a curto prazo ou somente na proporção que o serviço for utilizado; (vi) acesso ao
serviço via internet por meio de múltiplos dispositivos eletrônicos (computador,
smartphone, tablet); (vii) agrupamento de recursos na mesma plataforma; e (viii)
serviços medidos e adaptados usuário a usuário.

Os serviços de computação na nuvem são usufruídos por uma grande


heterogeneidade de grupos sociais (de pequenas empresas a
multinacionais), com o intuito de otimizar a infraestrutura de TI,
diminuindo os custos relacionados à construção de uma base própria.
Pequenas empresas utilizam essas novas tecnologias para viabilizar
negócios até então financeiramente impossíveis de serem formados caso
dependessem da instalação de infraestrutura de TI privada424.

Dito isso, cinco características essenciais compõem tal modelo de


acesso. São elas: a) serviço sob demanda; b) acesso amplo à rede; c)
agrupamento de recursos; d) escalabilidade; e) serviço mensurado425.

Por se tratar de um serviço sob demanda, o usuário pode,


unilateralmente, suprir capacidades computacionais de acordo com sua

670
necessidade, tais como o armazenamento de rede, sem que se exija
interação humana com cada provedor de serviços. O amplo acesso à rede
garante que ferramentas e recursos sejam disponibilizados e acessados por
meio de mecanismos padronizados que viabilizam o uso de plataformas
heterogêneas de clientes426.

Com o agrupamento de recursos oferecido no ambiente da nuvem,


como armazenamento, processamento, memória e banda-larga, os recursos
computacionais do servidor são reunidos para servir a múltiplos usuários,
com diferentes recursos físicos e virtuais dinamicamente ordenados e
reordenados de acordo com a demanda de cada consumidor. Já a
escalabilidade pode ser conceituada como uma característica da
computação em nuvem que lhe confere elasticidade com rapidez quanto à
disponibilização de recursos e ferramentas, de acordo com a demanda do
usuário427. Por fim, os sistemas em nuvem automaticamente controlam e
medem os recursos utilizados pelos consumidores, conferindo
mensurabilidade e transparência a ambos, provedor e usuário428.

Os principais modelos de serviços oferecidos pela computação em


nuvem são os seguintes: SaaS (Software as a Service), PaaS (Platform as
a Service) e IaaS (Infrastructure as a Service).

Nesse sentido, o SaaS (Software as a Service) é um modelo de


distribuição de software que permite que os usuários acessem os
programas e aplicativos pela internet429. Fornece acesso diretamente às
aplicações do provedor da nuvem e, portanto, permite ao usuário a
conveniência de não ter que administrar a infraestrutura relacionada às
capacidades das aplicações.

671
O SaaS é mais que uma disponibilização pura e simples de software.
Envolve: (i) localização do software que se mantém do lado do provedor
de SaaS (pois seus aplicativos são instalados no local desse provedor); (ii)
ao lado desse provedor ficam também todos as atividades de “sobrecarga”,
que antes ficavam sob responsabilidade do departamento de TI da empresa
cliente do SaaS; (iii) manutenção dos aplicativos em funcionamento, dia
após dia; (iv) teste e instalação de patches (programa de computador
criado para atualizar ou corrigir um software); (v) gerenciamento de
atualizações; (vi) monitoramento de desempenho; (vii) diagnóstico de
falhas; (viii) resolução de problemas de TI relativos à segurança, à
confiabilidade, ao desempenho e à disponibilidade430.

Na modalidade PaaS (Platform as a Service), fornece-se aos usuários


plataforma mais estruturada para implantar suas próprias aplicações e
serviços. A capacidade de acesso fornecida ao consumidor é para
utilização de aplicativos por este criados, que utilizam programas,
linguagens, bibliotecas, serviços e ferramentas fornecidas pelo servidor,
sem que seja possível o controle da infraestrutura por parte do usuário
(rede, servidores, sistemas operacionais ou armazenamento). No entanto é
possível controlar e configurar as ferramentas no ambiente de
hospedagem.

As empresas que prestam o PaaS, oferecem os seguintes serviços: (i)


hospedam aplicações; (ii) disponibilizam ferramentas para que seus
clientes desenvolvam novos programas na nuvem; (iii) gerenciam
funcionalidades: (iii.1) administrando bancos de dados; (iii.2)
configurando servidores; e (iii.3) realizando fragmentação e
balanceamento de carga etc431.

672
O terceiro modelo (IaaS) fornece ao usuário processamento,
armazenamento, rede e outros recursos computacionais fundamentais,
conferindo-lhe a possibilidade de implementar e executar software de sua
livre escolha, incluindo sistemas operacionais e aplicativos.

Importante esclarecer que SaaS, PaaS e IaaS são termos da indústria da


computação e embora a palavra “serviço” apareça em cada termo, a
atividade de computação em nuvem resultante não será necessariamente
caracterizada como um serviço para fins tributários.

2. QUESTÕES TRIBUTÁRIAS RELATIVAS AO CLOUD COMPUTING

2.1. Panorama global

A despeito das inegáveis vantagens ao ambiente corporativo, a


computação em nuvem tem sido um desafio aos entes tributantes de todo o
mundo. O que costumava ser claramente a venda de bens móveis tangíveis
(software “de prateleira”) agora é digital, acessado remotamente e
atualizado instantaneamente432.

Isso significa que bens que antes eram tributados (filmes e músicas em
DVD, por exemplo), agora se transformaram em produtos, a princípio, não
sujeitos à tributação (streaming), o que está corroendo a base tributável
dos Estados e tem sido motivo de preocupação.

No panorama global, as empresas de tecnologia da informação estão na


primeira onda de negócios para sentir o impacto das novas regras fiscais e
em mudança na nuvem. O cenário de tributação tecnológica em constante
alteração cria incerteza e risco aos negócios, por um lado, e oportunidade,
por outro, exigindo diálogos que antecipam, atenuam ou capitalizam

673
eventos como novas regras de tributos sobre transações em nuvem ou a
integração da tecnologia da nuvem em operações comerciais433.

2.1.1. Desafios gerais e tendências

As controvérsias no ambiente internacional são inúmeras e estão


relacionadas, principalmente, ao reconhecimento e origem da receita, nexo
e alocação de recursos de diferentes atividades434, bem como a
legitimidade dos entes para a tributação. O caráter (natureza) da receita
(serviço, aluguel ou royalty) é uma das questões mais críticas.

Problemas no momento de contabilizar a receita gerada pelos serviços


de nuvem, especialmente na identificação de padrões adotados e custos
associados com esses serviços, são comuns. É frequente que haja
dificuldade na identificação dos múltiplos elementos dos contratos de
serviços de computação em nuvem, no potencial para contabilização de
arrendamento ou quando um operador está agindo em nome próprio ou em
nome de outro provedor de serviços435.

Ao comparar informações detalhadas sobre decisões fiscais entre países


diversos, o Guia Mundial de Impostos sobre computação em nuvem da
“Ernst & Young” identificou padrões internacionais importantes, como a
falta de clareza quanto ao tratamento do IVA dos serviços de computação
em nuvem e a adesão generalizada (mas não universal) à evolução da
orientação da OCDE436.

À medida que a economia incorpora novas tecnologias, os Estados têm


lutado para adaptar suas legislações ultrapassadas e transformá-las, tanto
quanto possível, em estruturas fiscais adequadas ao século XXI437. Eles
têm, portanto, se apressado para expandir (de forma precipitada e

674
inconsistente) a tributação sobre o consumo em seus territórios, para
incluir as atividades desenvolvidas no ambiente de computação em nuvem.

Fiscos e jurisprudência, para viabilizar a arrecadação tributária, têm se


afastado de premissas fundamentais relativas a tributos438. O Departamento
do Tesouro dos Estados Unidos, por exemplo, tem uma política de adaptar
os princípios existentes à nuvem em vez de criar regimes fiscais novos ou
adicionais439.

A tendência reflete que as leis tributárias locais não evoluíram o


suficiente para abordar especificamente a tributação dos serviços de
computação em nuvem, já que as leis geralmente são anteriores ao
surgimento e aumento da popularidade das tecnologias desse tipo de
computação440.

A indústria da nuvem tem sido cada vez mais alvo de governos e das
autoridades tributárias, que questionam se as empresas de tecnologia estão
pagando tributos suficientes441-442. Compreender se a lei está sendo
observada e munir-se de documentação suficiente é, pois, de suma
importância atualmente.

Quanto aos impostos sobre o consumo (impostos sobre vendas e IVA),


estes variam muito de Estado para Estado e de país para país, tanto em
relação à alíquota quanto ao tributo em si. As questões fiscais e os
impactos para a computação em nuvem e a economia digital continuam
dinâmicos em todas as jurisdições mundiais e continuarão a evoluir.

2.2. Principais questões no ambiente norte-americano

Nos Estados Unidos, sales and use taxes são tributos sobre o consumo
que, historicamente, incidem sobre as transações nas quais um comprador

675
e um vendedor trocam bens pessoais tangíveis. Ao longo do tempo, vários
Estados ampliaram suas bases tributárias para que serviços
especificamente enumerados também ficassem sujeitos a tal imposto443. No
entanto não há um padrão de tributação das transações realizadas no
ambiente da computação em nuvem, nos Estados Unidos.

O Estado de Nova York, por exemplo, tributa os serviços de SaaS,


aplicando a legislação local (Tax Law §§ 1101(b)(6); 1105(a), (b), (c))444,
que tem sido interpretada no mesmo sentido pelo Tribunal de Recursos
Tributários daquele Estado445. No que se refere ao IaaS, o Departamento de
Tributação e Finanças do Estado de Nova York manifestou entendimento
em 5 de agosto de 2014 no sentido de que alguns serviços fornecidos no
ambiente de nuvem (compreendidos no conceito de IaaS) não devem ser
tributados pelo sales and use tax local446. No entanto, mais recentemente,
em 6 de julho de 2017, aquele mesmo Departamento manifestou
entendimento contrário447, concluindo pela tributação de serviços
relacionados ao IaaS448. Importante mencionar que, em ambas as soluções
de consulta, os servidores dos peticionantes estavam localizados fora do
território de Nova York, mas os usuários se encontravam dentro daquele
Estado. Sendo assim, é possível afirmar que atualmente Nova York tributa
pelo sales and use tax serviços ofertados na nuvem, como o SaaS e o IaaS,
tomando como base o local em que se encontra o usuário dos serviços e
não a localização dos servidores do provedor de acesso ou a sede deste
mesmo provedor.

Com base na Lei n. 84 de 2016 (Ato 84), em vigor desde 1º de agosto


de 2016449-450, o Estado da Pensilvânia tributa as transações realizadas no
ambiente da nuvem. O Departamento de Receita da Pensilvânia, inclusive,
tem manifestado entendimento no sentido de serem tributáveis os serviços

676
de recuperação de arquivos451, os quais sequer estão expressamente
previstos na referida lei. Tal entendimento pode servir para tributar um dos
principais modelos de serviço oferecidos pela computação em nuvem,
como o SaaS.

O Estado de Massachusetts, por sua vez, emitiu solução de consulta em


8 de novembro de 2013, considerando não tributáveis as operações de
SaaS, realizadas a clientes localizados naquele Estado, quando o software
envolvido for aberto (gratuito), fornecido pelo cliente ou por terceiro, bem
como quando se tratar de serviço de armazenamento remoto de dados452.

Nos casos analisados, a tributação ocorreu no Estado onde o usuário


estava localizado, ainda que o servidor estivesse situado em território
diverso. Contudo o que se vê é que não há um padrão dos Estados norte-
americanos quanto à tributação dos serviços de computação em nuvem
pelo sales and use tax. A concessão de acesso remoto a software no
ambiente da nuvem é considerada, por alguns Estados, venda de bens
tangíveis, equivalente ao fornecimento de software de prateleira453. Há
ainda incertezas sobre o local da tributação.

O caótico grupo de técnicas utilizadas pelos Estados para caracterizar os


mais diversificados tipos de transações computacionais em nuvem pode
acarretar a múltipla tributação dos provedores e usuários de serviços454,
gerando diferentes abordagens sobre o tema e dificultando, assim, o
processo de compreensão das regras em vigor.

Dentro desse contexto, os Estados americanos têm adotado um Acordo


de Tributação Simplificada do Imposto sobre Vendas e Uso (SSUTA) para
simplificar e sincronizar seus códigos tributários pelo qual todos os tipos

677
de fornecedores, dos mais tradicionais aos que possuem negócios na
internet, possam facilmente recolher seus tributos sobre o consumo455.

O SSUTA resolve os principais problemas de complexidade


relacionados à tributação da computação em nuvem: a falta de
uniformidade entre os Estados. Trata-se de um simplificado e uniforme
código tributário com um dicionário nacional com definições comuns de
bens e serviços456.

Há, no entanto, ação pendente no Congresso para aprovação do SSUTA


como uma legislação padronizada para todos os 51 Estados, que
continuarão competentes para definir quais bens e serviços são tributáveis,
mas de acordo com os termos e definições acordados457. A ação do
Congresso se mostra essencial para os Estados implementarem o SSUTA,
o que facilitará a relação fisco-contribuinte nos Estados Unidos.

2.3. A tributação sobre o consumo na Europa quanto às transações realizadas


na nuvem

A Comissão Europeia aplica, amplamente, o conceito de serviços


eletrônicos ao processamento e transmissão eletrônica de dados para
atividades diversas, incluindo a entrega on-line de conteúdo e serviços
digitais, entre outros458.

A Diretiva 2006/112/EC revogou a Sexta Diretiva 77/388/CEE e


estabeleceu o sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado
(IVA). Seja bem ou serviço, de acordo com o art. 63 da Diretiva
2006/112/CE, “o fato gerador do imposto ocorre e o imposto torna-se
exigível no momento em que é efetuada a entrega de bens ou a prestação
de serviços”. E o art. 24 assevera que “entende-se por ‘prestação de
serviços’ qualquer operação que não constitua uma entrega de bens”.

678
Dentro desse contexto, Cannas salienta que como a maioria dos casos
de cloud computing não envolve bens tangíveis, eles não podem se
qualificar como entrega de bens, quando prestação de serviços se qualifica
como qualquer operação ou utilidade econômica que não constitua entrega
de bens459, não deixando tantas dúvidas sobre a qualificação daqueles casos
como prestação de serviços.

Contudo, uma vez que se reconhece a qualificação das operações de


cloud computing como prestação de serviços, surgem dúvidas sobre o local
do fato gerador do tributo, variando a solução em função de a operação ser
qualificada como B2B (business-to-business)460 ou prestação de serviços
B2C (business-to-consumer) por meio eletrônico461-462.

A mudança promovida pelo art. 58 da Diretiva 2008/8/EC, com efeitos


a partir de janeiro 2015, em função do disposto no Regulamento de
Execução (UE) n. 282/2011 do Conselho, de 15 de março de 2011, traz à
baila o caso de troca de documentos na nuvem, especificamente o
fornecimento de serviços ao consumidor a partir de um data center
localizado na União Europeia (ou seja, com recursos humanos e técnicos
em um país da UE, mesmo que tenha sua sede fora da Europa). No
passado, seria aplicada sobre os serviços eletrônicos a alíquota do IVA do
país da União Europeia em que o servidor estava situado. No entanto, a
União Europeia reverteu esse requisito em 2015, pelo que a mesma
empresa teve que começar a aplicar o IVA com base na localização dos
seus clientes463.

Dentro desse contexto, várias empresas multinacionais de tecnologia


tiveram que repensar seus modelos operacionais europeus e fazer
reconfigurações extensas em seus sistemas de planejamento de recursos

679
empresariais (ERPs) para se prepararem para essa nova realidade nos 28
Estados-membros da União Europeia464.

3. O PROBLEMA DA TRIBUTAÇÃO DO CLOUD COMPUTING NO


BRASIL

3.1. Controvérsias identificadas no cenário brasileiro

No território nacional, o quadro não é mais favorável. Por aqui, existe


relevante controvérsia a respeito de dois principais tributos que incidiriam
sobre as atividades realizadas por meio da computação em nuvem: ISS e
ICMS.

O primeiro questionamento é se estamos diante de uma operação


tributada pelo ISS, com fundamento no item 1.03 da lista anexa à Lei
Complementar n. 116/2003, incluído pela Lei Complementar n. 157/2016,
ou pelo ICMS, nos termos do Convênio ICMS n. 181/2015.

Em relação ao ISS, o item 1.03, por exemplo, trouxe as hipóteses de


“processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos,
imagens, vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação,
entre outros formatos, e congêneres”. No mesmo sentido, é o item 1.05,
que possibilita que se tribute a “disponibilização, sem cessão definitiva, de
conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet”.

Especificamente explorando a temática brasileira da tributação do SaaS,


Flora Almeida e Gilberto de Castro Moreira Junior465 alertam que, para a
incidência do ICMS, é necessária a presença de três núcleos duros ou
essenciais: “operação”, “circulação” e “mercadoria”. Comentam que o
núcleo “circulação” não é verificado na hipótese de SaaS, já que não há
troca de titularidade do bem. Desse modo, a tributação do fornecimento de
computação em nuvem dependeria da previsão na Lista Anexa à LC n.

680
116/2003. O item 1.05 (licenciamento ou cessão de direito de uso de
programas de computação) seria, portanto, uma alternativa para impedir
que o serviço de computação em nuvem não fosse tributado. Não obstante,
para os autores, a licença de uso prevista no item 1.05 abrange apenas
software de encomenda ou personalizados, e não software de prateleira.

Nesse contexto, o Secretário Municipal da Fazenda de São Paulo466


publicou o Parecer Normativo SF n. 1 de 18 de julho de 2017, intitulado
como norma interpretativa, ou seja, como um suposto ato uniformizador
do entendimento sobre a qualificação tributária do SaaS467. Define que “o
licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação,
por meio de suporte físico ou por transferência eletrônica de dados, ou
quando instalados em servidor externo (Software as a Service – SaaS),
enquadra-se no subitem 1.05 da lista de serviços”; independentemente “de
o software ter sido programado ou adaptado para atender à necessidade
específica do tomador (software por encomenda) ou ser padronizado
(software de prateleira)”.

Por outro lado, referido entendimento esbarra no disposto no Convênio


ICMS n. 181/2015468 e no Convênio n. 106/2017469, em linha com o quanto
decido pelo STF na ADI-MC 1945470-471. O contribuinte paulistano,
portanto, está “entre a cruz e a espada”: terá o ônus de discutir o conflito
de competência criado entre Estado e Município.

Ainda sobre o Parecer da Fazenda Municipal Paulistana, Frederico


Menezes Breyner, em artigo sobre o tema, assevera que o contribuinte fica
sem saber como seu contrato será qualificado pelo Fisco, uma vez que seu
parágrafo único do artigo 1º prevê que “a interpretação delineada no
caput472 não impede o (re)enquadramento das atividades envolvidas no
contrato de licenciamento de software nos subitens 1.03 (processamento de

681
dados e congêneres) e 1.07 (suporte técnico em informática, inclusive
instalação, configuração e manutenção de programas de computação e
bancos de dados), sujeitas às alíquotas de 5% e 3%, respectivamente.
Disso decorre que os contribuintes envolvidos com operações de SaaS, por
exemplo, que estiverem recolhendo o ISS à alíquota de 2%, considerando
o contrato como tendo um único objeto (licenciamento de software),
estarão vulneráveis à autuação fiscal, com base no desmembramento do
negócio473.

Nesse contexto de conflito de competências, Alberto Macedo alerta


sobre a impossibilidade de um conceito constitucional de mercadoria
virtual em prejuízo do conceito constitucional de serviço como bem
imaterial, decidido pelo STF no RE-RG 651.703 PR, em 2016. E, seguindo
a tônica, critica severamente a possibilidade de incidir ICMS no Software
as a Service (SaaS) por criar um regime de “circulação por tempo
determinado”, apontando, ainda, para o fato de que o bem imaterial no
licenciamento não seria o software em si, mas a sua utilização, afigurando-
se irrelevante, em seu entender, a existência ou não de suporte físico
apontada pelo STF no RE 176.626/SP474.

Conforme pondera Macedo475, com o que concordamos, é importante


considerar que as discussões atuais não são as mesmas da época da ADI-
MC n. 1.945/MT, que inclusive não foi julgada em definitivo, tendo sua
cautelar levado incríveis doze anos para ser julgada; e tampouco os
pressupostos da época do RE 176.626/SP, onde o licenciamento de
software demandava um suporte físico.

Na nossa visão, em que pese a redação ampla dos Convênios n.


181/2015 e n. 106/2017, que prevê a tributação pelo ICMS de “operações
com software”, entendemos que o modelo negocial de cloud computing,

682
regra geral, abrange muito mais do que o direito de uso de programa de
computador em nuvem, incluindo uma variedade de prestação de serviços,
a depender da modalidade SaaS, IaaS e PaaS, sendo, portanto, tributável
pelo ISS.

Nesse contexto, devemos indagar se o simples fato de o acesso ao


programa ocorrer por meio da estrutura da nuvem – em vez de por uma
mídia física ou digital, transferível para o hardware do usuário – seria
suficiente para afastar a existência de prestação do serviço. Imaginando a
ausência de uma customização ou personalização do programa de
computador em nuvem, lançado com um mínimo de esforço e interação de
provedores de serviços, não seria o caso de uma analogia com o “software
de prateleira”, afastando-se a caracterização da operação como serviço?
Haveria riscos de classificação da nuvem privada como hospedagem ou a
manutenção de um servidor como um aluguel ou venda de propriedade
pessoal tangível?

No que concerne ao tema do cloud computing, entendemos que estando


presentes as modalidades SaaS, IaaS e PaaS, já detalhadas acima, o(s)
serviço(s) é(são) perfeitamente identificável(is)476 e o tributo a ser cobrado
é o ISS. O fundamento para tal conclusão – pela tributação do ISS, no caso
da confirmação do contexto fático dos modelos negociais atualmente
conhecidos como cloud computing – está na natureza das próprias
operações, que em princípio envolvem o dever do contratado de não
apenas disponibilizar o acesso à infraestrutura desejada, ao software ou à
plataforma, mas também assegurar o correto funcionamento, atualizações,
aumento da capacidade de armazenamento de dados conforme a demanda,
além de outras funcionalidades previstas em contrato, oferecendo

683
utilidades econômicas que consistem em prestações de serviços eletrônicos
ou digitais em ambientes virtuais477.

Caso contrário, se não houver a disponibilização de quaisquer serviços,


sequer a disponibilização de serviços de manutenção ou assistência, seria o
caso de pensar na qualificação apenas como simples aluguel ou
licenciamento de direito de uso de software478. Nesse caso, a operação
deveria ser enquadrada no item 1.05 da Lei Complementar n. 116/2003,
seja o software de prateleira ou customizado a ser acessado por meio da
nuvem, uma vez que a lei não previu tal distinção.

Ademais, já explicamos acima que, se não há mudança de titularidade


do bem ou circulação jurídica, não haveria circulação jurídica do ICMS. O
próprio STF, ao enfrentar o tema da situação do “software de prateleira”
no REsp 176.626-3, distinguiu as situações em que haveria a circulação
jurídica (compra e venda do software) daquelas em que não haveria
(licenciamento do direito de uso, sem mudança da titularidade da
propriedade).

Logo, vários questionamentos exsurgem: (i) É possível a tributação de


ICMS de bens imateriais ou incorpóreos? (ii) Caso se conclua pela
impossibilidade, haveria tratamento anti-isonômico injustificado entre
venda de software de prateleira por meio físico, download de software não
customizado ou acesso a software não customizado por meio de nuvem
(todos com as mesmas funções)? A forma por meio da qual o negócio
jurídico se concretiza, seja via tradição física, seja por rede de dados se
enquadra em alguma distinção legal ou constitucionalmente estabelecida, a
exemplo das imunidades? (iii) A possibilidade de revenda da licença de
uso no “varejo virtual” é aspecto importante para caracterizar a circulação
jurídica da primeira operação (contrato de cessão de direito de uso)? (iv) E

684
a perpetuidade ou provisoriedade da licença cedida? (v) E a transferência
de código-fonte? Seria possível falar em circulação jurídica (para fins de
ICMS) nas licenças vendidas com transferência de tecnologia? São
questionamentos que deverão ser enfrentados pelos tribunais.

Nada obstante todo o exposto, diante da perda de arrecadação dos


Estados em detrimento dos Municípios, questionamentos como os
referidos no parágrafo anterior podem levar o STF a uma releitura dos
reflexos tributários sobre a cadeia de contribuintes envolvida com
contratos de cessão de uso de software, em especial as operações que não
abrangem customização ou serviços acessórios.

Assumida a tributação pelo ISS da cessão de uso de software por meio


do sistema de nuvem, há ainda o debate sobre o enquadramento de tal
licença na Súmula Vinculante 31 do STF. Sobre o tema, vale pontuar
apenas que a LC n. 116/2003 possui constitucionalidade presumida, e o
STF, em casos análogos (cessão da marca), afastou a incidência da Súmula
em reclamação ajuizada por contribuinte479-480.

Contudo, ainda que se admita que as operações mencionadas estão de


fato sujeitas ao ISS, como pretende a administração municipal de São
Paulo, vimos que o assunto está longe de se resolver e que um
direcionamento legal, em caráter nacional, precisa ser dado ao tema. Nesse
sentido, em nível nacional, há um projeto de lei complementar (PLC n.
171/12) que trabalha a possibilidade de que um nono serviço seja
adicionado ao item 1 da lista anexa à LC n. 116/2003, pretendendo deixar
clara a competência impositiva dos Municípios brasileiros nessa questão,
ao adicionar na Lista Anexa à LC n. 116/2003 os serviços de “computação
em nuvem”.

685
Na medida em que a competência dos Municípios para cobrar o ISS vai
se desenhando mais claramente, assumida a hipótese de que a tributação
deve se dar nos níveis municipais, seja nos termos do item 1.03 ou 1.05 da
Lista Anexa à LC n. 116/2003 ou de nova hipótese a ser aprovada nos
termos do PL n. 171/2012, como definir qual Município seria competente
para tributar? Ora, com a incidência do ISS, é fundamental analisar a
delimitação da competência dos Municípios. Sobre esse tema, são duas as
situações que merecem ser enfrentadas.

Em primeiro lugar, é preciso indagar sobre o caso de o prestador do


serviço estar localizado fora do Brasil. Nessa hipótese, seria necessário
considerar a (in)existência da presença da empresa no Brasil, de modo que
a análise acerca do conceito de estabelecimento permanente deveria ser
levada a cabo, no contexto das normas nacionais e internacionais481. A
propósito, grande complexidade pode advir em operações triangulares e
com data centers espalhados em mais de um país estruturados em nuvem.
Lança-se o desafio: qual(is) critério(s) deve(m) ser adotado(s) para tributar
nuvens sem fronteiras, hospedadas em provedores de diferentes lugares,
com diferenciais de tributação e alíquotas, evitando-se bitributação
inclusive em países sem acordo de bitributação?

Ademais, para os casos em que o prestador não está no Brasil, é


necessário confirmar se há importação de serviços, com impactos
tributários diretos sobre o ISS, o PIS e a COFINS. Vale ressaltar que
Receita Federal, na Solução de Consulta Cosit n. 191/2017, manifestou-se
no sentido de que as operações de cloud computing correspondem a
prestação de serviços técnicos, com claro conteúdo tecnológico.

Especificamente quanto ao ISS, deverão ser definidos com precisão os


limites da competência do Município importador para fins de retenção na

686
fonte dos valores pagos ao prestador de serviço localizado no exterior.

Seguindo tal linha de raciocínio, uma vez analisada a presença da


empresa no Brasil a partir do exame da qualificação de estabelecimento
permanente, sendo positiva a presença, é o momento de analisar os
impactos na tributação dos rendimentos advindos de tal atividade e, mais
especificamente para o que interessa no presente artigo, a incidência do
ISS. Ora, como definir qual município seria competente para tributar o
serviço? Deve-se considerar o local da prestação ou do estabelecimento
prestador?

Com efeito, para verificar o local onde o ISS deve ser cobrado, é
importante registrar a oscilação jurisprudencial dos Tribunais Superiores,
em especial do STJ. Cabe então fazer um breve resumo histórico sobre a
sujeição ativa do ISS482:

i) O Decreto-lei (DL) n. 406, de 31 de dezembro de 1968, criado com força de


lei complementar na vigência da Constituição anterior, elegeu três elementos
de conexão, ao regular a matéria: um para ser aplicado genericamente e dois,
em casos específicos. O referido ato legislativo determinou, como regra
geral, que o Município competente para cobrar o ISS seria aquele em que
situado o estabelecimento prestador ou, na sua falta, o local do domicílio do
prestador (o elemento de conexão, nessa hipótese, foi o da localização do
estabelecimento ou do domicílio do prestador).
ii) Entretanto, buscando afastar vícios decorrentes da guerra fiscal (quando
contribuintes procuravam fixar estabelecimentos nos Municípios com as
menores alíquotas), o STJ, em decisões de suas duas turmas, interpretou o
artigo 12 do DL n. 406/68 em suposta conformidade com o princípio
constitucional implícito da territorialidade, e firmou sua jurisprudência no
sentido de que, em qualquer hipótese, e não somente naquela expressamente
mencionada (construção civil), o ISS seria devido no local da efetiva
prestação do serviço, fato gerador do imposto.
iii) Em seguida, o DL n. 406/68 foi revogado, e a LC n. 116/2003 limitou-se a
aumentar, de duas para 22, as exceções à regra geral de que o Município
competente seria aquele em que localizado o estabelecimento prestador. Não
obstante, a LC n. 116/2003 foi suficiente para deflagrar nova oscilação
jurisprudencial sobre a matéria.

687
iv) A jurisprudência da 1ª Seção acabou por se firmar no sentido de que o
Município competente seria aquele em que localizado o estabelecimento
prestador, inverso ao que adotara anteriormente.
v) Posteriormente, em 2012, o STJ apontou que, quando da existência de
unidades profissionais em mais de um Município, todas participativas de
atividades que concorram para a prestação do serviço, deve-se atribuir tal
competência ao Município em que localizado o estabelecimento que exerça a
atividade que configure “o núcleo” da operação tributada, fato gerador do
imposto. Isso porque a 1ª Seção do STJ (Resp 1.060.210/SC, de 28 de
novembro de 2012) adotou entendimento no sentido de que seria competente
o Município onde “se comprove haver unidade econômica ou profissional da
instituição financeira com poderes decisórios suficientes à concessão e
aprovação do financiamento – núcleo da operação de leasing e fato gerador
do tributo”.
vi) O STF não reconheceu repercussão geral sobre o tema (Repercussão Geral
no Agravo de Instrumento 790.283, de 13 de agosto de 2010).

Dentro desse cenário, no caso de servidores localizados em data centers


espalhados por vários Municípios com estrutura compartilhada, onde são
prestados os serviços para fins de ISS?

Na nossa visão, a partir da oscilação jurisprudencial descrita acima,


para definir o aspecto espacial, o intérprete da LC n. 116/2003 deve levar
em conta três situações distintas: (i) caso em que o serviço é prestado por
empresas que comportem sede e ramificações, como os grandes
empreendimentos em geral. Nesse caso, de acordo com a orientação do
STJ, o imposto é devido no local do estabelecimento prestador (LC n.
116/2003, art. 3º), onde o contribuinte de fato desenvolve a atividade de
prestar serviços, ou seja, o estabelecimento que exerça a atividade que
configure “o núcleo” da operação tributada, sendo irrelevantes para
caracterizá-los as denominações de sede, filial etc. (LC n. 116/2003, art.
4º)483: (i.1) sendo o caso de vários servidores localizados em data centers
espalhados por vários Municípios com estrutura compartilhada, com
amparo no REsp 1.060.210/SC, entendemos que o local apropriado para se
tributar é aquele onde se comprove haver unidade econômica ou

688
profissional da empresa com poderes decisórios suficientes à contratação
das operações (núcleo da operação de cloud computing e fato gerador do
tributo); (ii) quando o serviço é prestado por quem não utiliza de
estabelecimento para realizar a atividade, como muitos profissionais
autônomos, hipótese em que o imposto é devido no local do domicílio do
prestador (LC n. 116/2003, art. 3º); (iii) e a última quando a hipótese se
encaixar nos 25 incisos (atualizados após a LC n. 157/2016) do art. 3º da
LC n. 116/2003, situação em que o imposto é devido no local onde o
serviço for efetivamente prestado.

Nota-se que a prestação de serviços de informática e congêneres (item


1, com os respectivos subitens) é tributada no lugar onde o fornecedor está
localizado, uma vez que tais serviços não estão previstos nos 25 incisos do
art. 3º da LC n. 116/2003 (atualizados após a LC n. 157/2016).

À luz do que foi exposto acima (vide, por exemplo, art. 58 da Diretiva
2008/8/EC), a tributação brasileira no local do estabelecimento dos
prestadores de serviços digitais (inclusive as de cloud computing, se aceita
a competência municipal para tributar o ISS) caminha na contramão da
tendência mundial de tributar o consumo onde ele de fato ocorre. Isso
porque a legislação prejudica a receita dos Municípios menores, que
deixam de tributar os serviços virtuais prestados em seus territórios. Sem
falar que é possível ao contribuinte instalar os servidores em Municípios
com baixa tributação, causando uma corrida ao fundo do poço (race to the
bottom), gerando prejuízo para todos os entes municipais484.

Contudo é verdade que a questão do combate à evasão fiscal parece ter


ganhado novos contornos com a LC n. 157/2016, que, ao menos no papel,
limitou a guerra fiscal ao estabelecer alíquota mínima de 2%, ao prever
vedação de concessão de incentivos fiscais e a consequente incidência de

689
improbidade administrativa do gestor que descumprir tais restrições. O
tempo dirá se os mecanismos de combate à evasão serão eficazes ou não.

CONCLUSÕES

A economia como um todo está se movendo a passos largos em direção


a serviços digitais. Em virtude da agilidade desse processo, as regras e
regulamentos fiscais tornaram-se rapidamente obsoletos e inadequados
para tributar operações dessa natureza, que não incluem bens tangíveis
nem possuem um meio físico de fornecimento.

Atualmente, os Governos tentam, de forma apressada e inconsistente,


expandir a tributação sobre o consumo de produtos oferecidos no ambiente
computacional da nuvem, na tentativa de minimizar os impactos em sua
arrecadação.

Os principais problemas verificados no cenário internacional foram a


diminuição da base tributável dos Estados face à transformação de bens
tangíveis em serviços que nem sempre se sujeitam à tributação, questões
relacionadas ao reconhecimento e origem da receita, nexo e alocação de
recursos de diferentes atividades, bem como a legitimidade dos entes para
a tributação.

Especificamente no ambiente norte-americano, verificou-se que os


Estados classificam transações similares de forma distinta, não havendo
um padrão de tributação das transações realizadas no ambiente da
computação em nuvem. A falta de uniformidade entre os Estados aumenta
o risco de múltipla tributação dos provedores e usuários dos serviços. Os
Estados têm lutado para adaptar suas legislações ultrapassadas e
transformá-las, tanto quanto possível, em estruturas fiscais adequadas à
realidade atual. As investidas para expandir (de forma precipitada e

690
inconsistente) a tributação sobre o consumo em seus territórios, para
incluir as atividades desenvolvidas no ambiente de computação em nuvem
fazem com que os Estados se afastem de premissas tributárias
fundamentais. Um Acordo de Tributação (SSUTA), no entanto, está em
votação no Congresso e visa uniformizar a legislação entre os diversos
Estados americanos.

A tributação em território europeu sobre operações em nuvem não


parece trazer tantas dúvidas em relação à qualificação dos rendimentos, em
virtude das Diretivas atualmente existentes, que classificam os casos de
cloud computing como prestação de serviços. As dúvidas que surgiam
quanto ao local do fato gerador do tributo foram minimizadas em virtude
de alterações legislativas em vigor desde o ano de 2015, quando se passou
a considerar como local da prestação do serviço aquele em que estão
localizados os usuários.

No Brasil, o conflito de competência entre Estados e Municípios quanto


à possível tributação pelo ICMS e ISS das transações computacionais em
nuvem pode ser considerado uma das questões mais importantes
atualmente.

Há normas estaduais e municipais que avocam a tributação, gerando


conflitos de competência e insegurança jurídica. No modelo negocial de
cloud computing, entendemos que, estando presentes as modalidades SaaS,
IaaS e PaaS, abrange-se uma variada gama de serviços ou utilidades
econômicas que devem ser tributadas pelos entes municipais. Algum
desconforto existe em relação ao acesso via nuvem a software não
customizado. Isso porque o STF decidiu pela tributação dos softwares de
prateleira quando da aquisição de CDs com conteúdo de softwares não
personalizados (software de prateleira) pelo ICMS, de modo que no

691
licenciamento de uso em regra não há circulação jurídica, o que afastaria a
tributação de ICMS, gerando potencial tratamento anti-isonômico entre
venda de software de prateleira por meio físico, download de software não
customizado ou acesso a software não customizado por meio de nuvem
(todos com as mesmas funções). Há ainda certa insegurança sobre o
espectro de aplicação da Súmula Vinculante 31. Não obstante, o fato é que
na LC n. 116/2003 há a previsão do item 1.05, com constitucionalidade
presumida. Vale mencionar que há um projeto de Lei Complementar que
visa inserir novo serviço à LC n. 116/2003, prevendo expressamente a
tributação dos serviços de computação em nuvem.

Finalmente, em virtude de alterações legislativas recentes, a prestação


de serviços de informática e congêneres (item 1, com os respectivos
subitens) é tributada no lugar onde o fornecedor está localizado. A
legislação nacional caminha, portanto, na contramão da tendência mundial
de tributar o consumo onde ele de fato ocorre, o que prejudica
sobremaneira a receita dos Municípios menores, que se encontram
impossibilitados de tributar os serviços virtuais prestados em seus
territórios.

692
Seção C
Tributação de produtos ou negócios selecionados

ICMS sobre a divulgação de material


publicitário na internet por provedor
485
Heleno Taveira Torres

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Empresas que atuam como provedores de acesso e de divulgação de


material publicitário na rede mundial de computadores têm suportado
fiscalizações com o propósito de cobrança de débitos do ICMS
supostamente incidentes sobre a atividade de inserção de material
publicitário na internet.

Como exemplo, no caso de São Paulo, de acordo com o entendimento


do Fisco Estadual, amparado na Resposta à Consulta Tributária n.
389/2004, de 17 de fevereiro de 2006, a atividade de inserção de material
publicitário em suas páginas na internet configuraria prestação de
serviço de comunicação e, portanto, estaria sujeita à incidência do ICMS.
Em evidente contradição, a base de cálculo adotada para a cobrança foi o
valor pago pelos clientes do provedor, para a veiculação de
publicidade e banners em seus sites na internet, o que não corrobora a
pretensa relação jurídica utilizada para compor o suposto fato gerador,
como acesso dos usuários, quando da oportunidade de acesso. Logo, já se
demonstra a impossibilidade técnica da exação.

693
Deveras, a inserção de publicidade na internet não constitui serviço de
comunicação tributável pelo ICMS, por não reunir os requisitos
necessários à sua configuração, mormente porque o prestador do serviço
de comunicação deve possuir infraestrutura própria e suficiente para a
realização da comunicação, além da capacidade de intermediar a
mensagem com o objetivo de alcançar o alvo receptor determinado.

Sobre o primeiro requisito, há jurisprudência do Superior Tribunal de


Justiça (STJ) acerca do tema. Esse Tribunal decidiu, no precedente EResp
n. 456.650/PR, posteriormente consolidado em súmula486, que a atividade
dos provedores de acesso à internet constitui um serviço complementar
ao serviço de telecomunicação prestado pelas empresas de telefonia, na
qualidade de serviço de valor adicionado, a teor do que dispõe a Lei
Geral de Telecomunicações (LGT)487, não sendo alcançado pela incidência
do ICMS por (i) não fornecer as condições e meios para que a
comunicação ocorra, e (ii) não ser prestado, normalmente, por empresa
possuidora de licença ou autorização, e infraestrutura para tanto, que não é
meramente de TI ou data center, mas a própria de telecomunicações,
conforme previsão do artigo 21, inciso XI, da Constituição Federal
(CF/88)488..

Corretamente, é de se concluir que, se o provimento de acesso à internet


é reconhecidamente um serviço de valor adicionado (e não de
comunicação) por depender da infraestrutura de telecomunicações, a
mesma sorte segue a atividade de inserção de publicidade, que é
igualmente carente dessa infraestrutura. Sua dependência, na verdade, é
dupla, porque reclama ainda o próprio serviço de provimento de acesso à
internet. O argumento é incontornável, ao adiantar claramente a
coincidência dos meios.

694
Uma vez que as empresas de telecomunicações já são tributadas pelo
ICMS, haveria, pois, dupla exigência de imposto sobre o mesmo fato, ao
cobrá-lo da atividade de inserção de material publicitário em páginas
eletrônicas ou aplicativos, como se esclarece facilmente.

Sobre os demais requisitos, vale repisar que o serviço de comunicação


tributável não equivale ao mero ato de comunicar, mas à sua concretização
em relação comunicativa, o que por sua vez pressupõe a identificação de
emissor, receptor de mensagem e, em específico, da interação onerosa
entre emissor e receptor, o que não se verifica na relação entre o usuário e
o provedor.

Assim, a não incidência do ICMS na veiculação de publicidade na


internet afirma-se pelos seguintes motivos:

i) a atividade dos provedores de acesso à internet é serviço de valor adicionado,


que não está sujeito à incidência deste imposto, nos termos da Súmula 334,
do STJ;
ii) a veiculação de publicidade na internet não é comunicação, pois não há um
alvo receptor determinado, tampouco interação entre o emissor e o receptor;
iii) há três relações distintas na atividade do provedor, as quais não se
confundem: (a) a relação jurídica com o anunciante, que paga a veiculação de
publicidade pelo provedor; (b) a relação jurídica entre o provedor e os
assinantes que contratam serviços específicos do provedor; e (c) a relação
fática entre o provedor e seus usuários livres, que têm acesso gratuito ao
conteúdo disponibilizado nos sites do provedor;
iv) eventual serviço de comunição, somente poderia ocorrer na relação entre o
provedor e os usuários indeterminados, que têm acesso gratuito (e poucos são
os pagos) ao site do provedor, logo, com ausência inconteste de base de
cálculo para cobrança do ICMS-Comunicação, ante o fato jurídico tributário
do “acesso” pelos usuários aos conteúdos;
v) quanto ao consumo de serviços de telecomunicações, os usuários que
acessam o site do provedor, por qualquer instrumento, já sofrem a incidência
do ICMS- Comunicação, na medida em que usam seus respectivos serviços
de acesso à internet (banda larga, internet discada, pacote de minutos pós-
pago ou pré-pago), sujeito ao ICMS ao longo de toda a etapa; e

695
vi) pelo fato de os usuários acessarem os sites do provedor de modo gratuito,
não há que se falar em incidência do ICMS, nos termos do art. 155, § 2º, X,
“d”, da CF/88, incluído pela Emenda Constitucional n. 42/2003, que dispõe
sobre a não incidência do ICMS: “nas prestações de serviço de comunicação
nas modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção
livre e gratuita”.

O provedor, na sua atividade de inserção de publicidade, de se ver, não


se compromete a elaborar material publicitário, ou mesmo a fornecer, em
condição onerosa, a comunicação entre o anunciante e seu público,
restringindo-se a efetuar mero contrato com os clientes anunciantes para
disponibilizar a cessão de espaço virtual. Não há, assim, transmissão de
conteúdo a um receptor específico, mas exposição de informação para o
público em gama indefinida de receptores. A comunicação propriamente
dita não se estabeleceria porque não há troca de informações entre os
interessados.

2. A ATIVIDADE DO PROVEDOR. A DISTINÇÃO NECESSÁRIA ENTRE


OS CONTRATOS: PROVEDOR E USUÁRIOS E OS CONTRATOS DE
DIVULGAÇÃO DE PUBLICIDADE

O serviço de telecomunicações, como serviço público posto à


disposição da exploração dos particulares, mediante concessão ou
permissão, sob regulação da ANATEL, implica uma compreensão das suas
atividades mais como meio de transporte de informações
(telecomunicações como sistema ou rede) – atividade de exploração de
redes (network operation). Daí o artigo 60, da LGT, definir o “serviço de
telecomunicações” como sendo “o conjunto de atividades que possibilita a
oferta de telecomunicação”. Esse serviço consistirá na colocação de meios
suficientes e eficazes para propiciar a vantagem humana de interação
comunicativa. Por isso mesmo, o respectivo artigo 69, no seu parágrafo
único, deixa bem definido o que quer dizer com “forma de
telecomunicação”, que será sempre “o modo específico de transmitir

696
informação, decorrente de características particulares de transdução, de
transmissão, de apresentação da informação ou de combinação destas,
considerando-se formas de telecomunicação, entre outras, a telefonia, a
telegrafia, a comunicação de dados e a transmissão de imagens”.

A compreensão da relação entre serviços e infraestrutura é fundamental


nessa matéria, mormente para entender as funções do regime de
interconexão, interna ou internacional. Serviços de telecomunicações a
serem prestados, como capacidade de transmissão, de encaminhamento ou
largura de banda são sempre prestados por uma determinada infraestrutura:
terminal – rede de acesso – rede local ou rede internacional, se for o caso.
Ora, exatamente para atingir esse fim, faz-se mister providenciar as
condições necessárias às obrigações de interconexão, local ou
internacional, sem as quais nenhum “serviço” existe. Interconexão, como
define a UE, é a ligação física e lógica das redes de telecomunicações
utilizadas por um mesmo ou diferentes operadores, de forma a permitir o
acesso e as comunicações entre os diferentes utilizadores dos serviços
prestados. A interconexão entre redes públicas tem como fundamento
permitir comunicações efetivas e contínuas no tempo, por meio físico, mas
sempre acompanhado de ligação lógica, para o intercâmbio ou conclusão
de chamadas. E seja qual for a definição utilizada, o que importa é vir a
ligação entre redes de telecomunicações como instrumento que possibilite
aos usuários de uma das redes comunicarem-se com usuários de serviços
de outra (i) ou acessar serviços disponíveis em outras (ii).

O artigo 146, da nossa LGT, deixa claro que “as redes serão
organizadas como vias integradas de livre circulação”, enquanto meios
predispostos para a veiculação de mensagens. Por isso, veio definida, no
parágrafo único, a “interconexão” como a “ligação entre redes de

697
telecomunicações funcionalmente compatíveis, de modo que os usuários
de serviços de uma das redes possam comunicar-se com usuários de
serviços de outra ou acessar serviços nela disponíveis”. Em virtude de
todas essas determinações, a LGT, no seu artigo 152, dispõe como
obrigações das prestadoras de serviços titulares das redes: garantir um
provimento da interconexão não discriminatório (i), sob condições técnicas
adequadas (ii), garantindo preços isonômicos e justos (iii), atendendo ao
estritamente necessário à prestação do serviço. Esse é o conteúdo dos
deveres subjetivos da titular da rede na relação jurídica de interconexão,
em face dos direitos subjetivos da tomadora de serviços de interconexão,
decorrente da função social da propriedade de rede pública de telefonia.

O “Provedor”, diferentemente, consiste num conjunto integrado de


computadores e software para permitir o “acesso”, pela conexão por meio
de linhas telefônicas, aos usuários, além de rádios ou linhas que conectam
o provedor à internet, para veicular as informações após conectado o
acesso, com fornecimento de e-mail, hospedagem de sites, segurança e
outros. E, assim, a depender da atividade que realizem, poderemos ter
“provedores de acesso” à internet, que são aqueles que viabilizam a
conexão à rede, o que fazem geralmente usando de operadoras de
telecomunicações, como dito acima; e “provedores de serviços” ou
conteúdos de internet, com prestações e utilidades adicionais. Não
necessariamente essas atividades coincidem num mesmo provedor. Nestes,
o usuário cadastra-se com um nome específico, realiza hospedagem de
página que já contenha “domínio” (servidor de web), obtém e-mail
(servidor de correio eletrônico), além de outras possibilidades, como bate-
papo on-line, comércio eletrônico e outros.

698
Para realizar as atividades de acesso, o provedor contrata com
operadora de telecomunicações a disponibilidade de terminais
(unidirecionais – só para receber chamadas) suficientes para permitir as
conexões necessárias, que, portanto, lhes prestam serviços de
telecomunicações e aqueles pagam às prestadoras pelo uso desse serviço,
sem qualquer diferença com que fazem os usuários em relação às linhas
que possui.

E para permitir acesso a outros servidores, inclusive internacionais, o


provedor deverá contratar com a Embratel (Backbone) conexão dedicada
de serviços Internet. A constituição de provedores não depende de
autorização ou licença da ANATEL ou de qualquer outro órgão regulador.
São típicas sociedades empresárias, e seu objeto consistirá nas atividades
de serviços de acesso e outras modalidades, descritas acima. Como se pode
verificar, os provedores, mesmo que participem da infraestrutura de
telecomunicações, não prestam serviços de comunicação. Antes, são
usuários de serviços de telecomunicações, para fornecer distintas
utilidades de serviços.

O contrato de acesso à internet é aquele mediante o qual o provedor


coloca à disposição do usuário todos os meios necessários para que este
possa ter acesso à rede, em determinadas condições, segundo um preço
ajustado entre eles. Adicionalmente, o provedor poderá agregar serviços,
facilidades e aplicações tecnológicas, como níveis adicionais de segurança,
acesso ilimitado, espaço disponível, arquivos de dados etc. O cumprimento
desses contratos fica sujeito a uma série de outros regimes jurídicos,
relativos à proteção da intimidade, direito de marcas ou de autor,
compromissos de segurança, restrições sobre conteúdos, a permitir a

699
observância e controle das atividades realizadas pelos usuários (acceptable
use policies).

Por sua vez, o contrato de alojamento de sites (Web site hosting) é um


típico contrato de locação de serviços, firmado entre um usuário que
pretende explorar os serviços de internet disponibilizados por um
determinado servidor e a operadora deste, por certo período. A tal efeito, o
provedor coloca à disposição do interessado espaço no servidor no qual
serão armazenadas as informações que constituirão o conteúdo do “site”,
mas não só, pois adiciona outras vantagens (segurança, velocidade de
acesso etc.), inclusive o acesso e conexão com a internet, para que as
pessoas possam acessar o conteúdo. Neste, caso o usuário não possua um
nome de domínio de segundo nível, a sua URL receberá o nome do
provedor, como se pode exemplificar do seguinte modo:
www.provedor.com.br/usuário.

Sabe-se que a internet permite a transmissão ou acesso a dados entre


computadores, mas isso depende de identificação destes e determinação
dos regimes que organizam os conteúdos transmitidos ou acessados.
Diante da imensa quantidade de dados trafegados na rede, impõe-se a
necessidade de organizar a qualificação e destinação dos dados. E
exatamente para isso serve a atribuição de endereços IP ou nomes de
domínios (DNS – Domain Name System), que não se confundem com
serviço de telecomunicações ou com as atividades de servidores, mas que
servem para identificação dos computadores conectados à rede, para
acesso às páginas Web ou correios eletrônicos (ex.: www.dominio.br), sem
necessidade de informar a cadeia numérica de IP.

A este propósito, certas entidades (como ISOC, IAB, IETF, IRTF,


IANA, ICANN etc.) têm como missão a organização das informações

700
veiculadas pela internet, especialmente aquelas patrocinadas por meio de
atribuição de protocolos TCP, para organização de conteúdos e endereços
IP que permitem identificar os computadores interligados na rede. E aqui,
sem qualquer dúvida, é onde poderemos verificar com maior clareza o que
seja a internet, tanto no seu aspecto institucional quanto no seu âmbito
funcional, sem confundi-la com serviços de telecomunicações ou com
provedores de acesso e de conteúdos.

Como indicado, o provedor é empresa de internet que, dentre outras


atribuições, atua (i) no provimento de acesso à internet, e (ii) na inserção
de material publicitário na internet.

A atividade de provimento vê-se definida na “Proposta de Regulamento


para o Uso de Serviços e Redes de Telecomunicações no Acesso a
Serviços Internet”, da ANATEL, que, no seu artigo 4º, já falava em
“conjunto de atividades que permite, dentre outras utilidades, a
autenticação ou reconhecimento de um usuário para acesso a Serviços
Internet”.489 O provedor presta o Serviço de Conexão à Internet (SCI)490.

Em termos gerais, o provedor é responsável por ligar o terminal do


usuário à rede mundial de computadores. Essa ligação, por sua vez, é
dependente de um meio de transmissão – uma linha telefônica, um satélite
ou substrato outro que possibilite a transmissão de dados491 –, este, um
serviço público de telecomunicações que necessita de autorização,
permissão ou concessão da União, nos termos do art. 21, XI, da CF/88.

Trata-se o Serviço de Conexão à Internet, como indicava a Norma n.


4/95, aprovada pela Portaria n. 148/95, do Ministério das Comunicações,
de serviço de valor adicionado, que a mesma definia, antecipando sua
consolidação na Lei Geral de Telecomunicações492, como “serviço que

701
acrescenta a uma rede preexistente de um serviço de telecomunicações,
meios ou recursos que criam novas utilidades específicas, ou novas
atividades produtivas, relacionadas com o acesso, armazenamento,
movimentação e recuperação de informações”.

Em razão disso, pacificou-se no Superior Tribunal de Justiça, a partir da


orientação firmada nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n.
456.650/PR493, e posteriormente cristalizada na Súmula 334 daquela corte,
o entendimento de que não incide ICMS sobre o serviço de provimento de
acesso à internet, uma vez que o serviço prestado pelo provedor:

i) não se caracteriza como serviço de telecomunicações, mas de serviço de valor


adicionado, não necessitando de autorização, permissão ou concessão da
União, conforme determina o art. 21, XI, da CF/88;
ii) não oferece prestações onerosas de serviços de comunicação (art. 2º, III, da
LC n. 87/96), de forma a incidir o ICMS, porque não fornece as condições e
meios para que a comunicação ocorra, sendo um simples usuário dos
serviços prestados pelas empresas de telecomunicações;
iii) o conceito de prestação de serviços de conexão à Internet é forma de direito
privado, que, nos termos do artigo 110, do Código Tributário Nacional
494
(CTN) , não pode ser alterado em sua definição, conteúdo ou alcance para
exigência de tributo.

Noutro giro, a atividade de inserção de publicidade realizada pelo


provedor tem por objeto transmitir as mensagens do anunciante para
terceiros. Nesta, o anunciante contrata com o provedor a exploração de
espaços publicitários no plano virtual – na forma de página da Internet, de
aplicativos para celular ou em redes sociais e afins –, que são postos à
disposição do anunciante em contrapartida a um determinado preço.

O questionamento, de modo direto, é se sobre esta atividade de inserção


de publicidade incide ICMS, na hipótese de prestação onerosa de serviço
de comunicação, nos termos do art. 2º, III, da LC n. 87/96.

702
A resposta é desenganadamente negativa.

Isso porque, na esteira dos parâmetros fixados na jurisprudência do


Superior Tribunal de Justiça ao decidir casos análogos – que vão além
daquele do provedor495 –, a atividade de inserção de publicidade na internet
não atrai incidência do tributo estadual porque (i) não se enquadra como
serviço de telecomunicação e, antes, depende dele, tal qual o serviço de
provimento de acesso à internet; (ii) tampouco configura serviço de
comunicação, no sentido relevante do direito tributário, porque (a) não se
verifica a concretização da atividade-fim de comunicação, em sentido
técnico-jurídico, mas de mera difusão de mensagem, que é comunicação
em sentido amplo; (b) o provedor não presta serviço de comunicação
também porque o “serviço” que presta não consiste em obrigação de fazer,
mas de “dar”; e (c) trata-se, de todo modo, de prestação gratuita entre
anunciante e usuário/cliente do provedor, quando a incidência tributária
pressupõe relação onerosa.

No exercício de sua atividade, portanto, há duas relações jurídicas que


envolvem o provedor, ambas bem identificadas: (a) a relação jurídica entre
o provedor e o contratante da divulgação de publicidade; e (b) a relação
entre o provedor e os usuários que acessam seus sites na internet, os quais
são (b.1) assinantes que pagam o acesso ao conteúdo do provedor e têm
direito a serviços vários, como antivírus, e-mail, espaço de armazenamento
de músicas e outros arquivos, assistência técnica, atendimento remoto,
cursos on-line e outras facilidades; e (b.2) os usuários que não pagam
qualquer valor ao provedor (a maioria), mas acessam seus sites e
igualmente têm acesso ao conteúdo veiculado, com contato direto com a
publicidade veiculada sem qualquer custo.

703
Geralmente o provedor oferece diversos serviços para os usuários,
mediante o pagamento de assinatura. Esses serviços restam passíveis da
incidência dos tributos de estilo. Nessas relações jurídicas, os assinantes
pagam por serviços específicos que são prestados pelo provedor. São
obrigações típicas de dar, contratos de prestação de serviços bem
delineados nos arts. 593 e s. do Código Civil.

Por outro lado, a relação entre os usuários que acessam livre e


gratuitamente o conteúdo do site do provedor na internet (b.2) é
meramente fática. Não é propriamente uma relação jurídica, pois não é
formalizada e não surte efeitos relevantes ao direito. O mero acesso de
conteúdo na internet, por si só, não gera efeitos e obrigações para o
usuário. É uma conduta fática, pela qual, milhares e milhares de pessoas,
diariamente, acessam a internet em busca de informação e recebem,
também, divulgação de material publicitário. Essas pessoas não têm
direitos ou obrigações em face do provedor, e vice-versa, salvo os deveres
deste de obedecer a todas as normas de Direito Privado, de manter a
conduta ética e o compromisso com a veracidade do conteúdo.

Essas duas relações acima envolvem o provedor (que faz a divulgação


da publicidade) e os usuários que acessam remotamente o site, que são os
destinatários indeterminados da publicidade. São relações inconfundíveis,
sem elementos que permitam qualquer quantificação de base de cálculo,
para os fins do critério material do ICMS-Comunicação.

Dessas características, tendo em vista a presença de um destinatário


indeterminado da publicidade, já se conclui que não há comunicação na
veiculação de publicidade, pois a comunicação, como veremos
detalhadamente a seguir, pressupõe um destinatário determinado e
específico.

704
O contrato de divulgação de publicidade, como regra, equivale a um
contrato de cessão de uso do espaço virtual, ou de locação desse espaço496.
A obrigação imposta ao provedor não é obrigação de fazer, mas sim
obrigação de dar, de ceder o seu espaço virtual para o anunciante.

Pelo contrato de divulgação de publicidade, o provedor não está


obrigado a prestar nenhum serviço. Tampouco está obrigado a comunicar.

O serviço prestado pelo provedor não é a formulação do material


publicitário – ou seja, não se trata de serviço de publicidade e propaganda
–, sendo estritamente a veiculação desse material, numa etapa posterior da
cadeia.

A prestação de serviço de publicidade envolve a atividade de estudo,


criação e execução de uma ideia, é dizer, está relacionada à formação e à
produção do conteúdo da mensagem, enquanto o serviço de veiculação
mira sua divulgação. Tal veiculação é, no contrato, identificada como
difusão.

A operação envolvida no contrato é a disponibilização de espaço virtual


(páginas de internet, celular, mídia exterior out-of-home, aplicativos de
redes sociais etc.), pelo provedor, para que a anunciante contratante possa
divulgar o material publicitário, o qual terá por público-alvo o conjunto de
indivíduos que acessarem aqueles espaços. É dizer, o destinatário segue
incerto: não é conhecido, tampouco identificável nominalmente ou mesmo
como número.

E é mesmo essa a proposta: passar determinada mensagem ao maior


número possível e indeterminado de pessoas. A única restrição, presuntiva,

705
é de um determinado gosto ou comportamento, o fim da publicidade, pelo
qual a oferta é mais provável em uma página que em outra.

O conceito de difusão, pois, difere do conceito de comunicação, que,


em seu sentido técnico-jurídico, pressupõe que sejam identificados quem
transmite e quem recebe a mensagem, em uma relação bilateral, na qual
emissor e receptor interagem. Isso só pode ocorrer quando há a
possibilidade de retorno pelo receptor.

Nas palavras de Hugo de Brito Machado:

É relevante ainda observar-se que a comunicação não se configura quando


alguém apenas transmite mensagens para pessoas indeterminadas, e destas não tem
retorno. Comunicação apenas acontece quando há retorno. Ela é necessariamente
bilateral. Embora em certos casos possa não haver retorno, há de haver sempre, pelo
menos, a possibilidade de retorno. Em outras palavras, os usuários de um serviço de
comunicação têm a seu dispor um instrumento que lhes permite transmitir e receber
497
mensagens .

No caso presente, o provedor não possui conhecimento sobre quem


acessa os seus espaços virtuais, ou consegue de qualquer modo aferir quem
efetivamente acessou a publicidade lá inserida. Tampouco existe qualquer
espaço de reação aberto ao usuário, para que ultime a relação comunicativa
e “devolva” a mensagem à emissora. Isso decorre do primeiro ponto: a
emissora não tem qualquer intenção de criar um canal singular, de
audiência do receptor – busca a relação unilateral.

Igualmente na lição de Roque Carrazza:

Não se confundem com os serviços de comunicação – não podendo, destarte, ser


tributados por meio do ICMS – os serviços de propaganda, ainda que levados a
efeito por empresas ligadas ao setor das comunicações. (...) a simples divulgação de
propaganda publicidade (por outdoors, banners, alto-falantes, emissoras de rádio,
emissoras de televisão, Internet, etc.) não tipifica prestação de serviço de
comunicação, seja porque a empresa que a realiza não coloca à disposição de

706
terceiros os meios e modos para que troquem mensagens, seja porque o destinatário
498
não é identificado, seja, ainda, porque não interage com o emissor .

Especificamente sobre a atividade de difusão, no exemplo daquela


prestada mediante rádio, pela qual comumente se veicula publicidade,
anota o mesmo Hugo de Brito Machado, alhures:

... a atividade de radiodifusão não se pode incluir no conceito jurídico de


comunicação. Enquanto esta estabelece uma ligação entre quem comunica e o
destinatário da comunicação, aquela consiste na expedição de mensagem a
destinatários diversos, não identificados. Consiste na difusão da mensagem e não no
499
envio desta a destinatário certo e determinado .

No mesmo sentido, arremata Edison Corazza:

O resultado buscado pelo tomador-anunciante e prestador de serviços não é


comunicação daquele com os seus potenciais consumidores. Não se trata de
contratação de transporte de informações com destino pré-especificado: o que se
500
busca com a prestação de serviço é a difusão, divulgação da mensagem .

É assente, pelo fato de o serviço de inserção de publicidade não possuir


destinatário certo e determinado e tampouco proporcionar a troca de
mensagens por meio do mesmo veículo entre emissor e receptor, a
consagrar a bilateralidade comunicativa, como possibilidade de retorno da
mensagem, não tem por objeto uma comunicação, em sentido estrito,
senão a difusão de uma mensagem: comunicação em sentido amplo. Ora,
dado que o fato jurídico do ICMS ocorre quando há comunicação, como
troca de mensagens simultâneas entre dois sujeitos ausentes, disso já se
extrairia que não há dita incidência tributária sobre essa atividade.

Para que não pairem dúvidas, é de se rememorar que a hipótese de


incidência do tributo paulista, na espécie, não se dá, de todo modo, sobre a
ação relevante de comunicar-se, mas sobre o serviço de comunicação.

707
Como se indicou no caso, já não se verifica a concretização da
atividade-fim de comunicação, em sentido próprio, entre os interlocutores,
a partir das atividades-meio (material publicitário inserto na internet)
colocadas à disposição dos usuários pelo prestador de serviço – o
provedor.

Em paralelo, não bastaria a simples colocação de meios à disposição ou


qualquer outro ato preparatório ou acessório da comunicação. O que
permitirá a incidência será sempre a “prestação do serviço”, ou seja, o
“fazer” mediante um conjunto de meios e infraestrutura disponíveis e em
funcionamento que permita concluir o ato de comunicação entre emissor e
receptor.

Como se depreende da leitura das condições gerais dos contratos


firmados pelo provedor, o “material publicitário é prévia e exclusivamente
elaborado pelo anunciante”, a quem é posto à disposição um espaço virtual
(“páginas de Internet, celular, mídia exterior out-of-home, aplicativos de
redes sociais...”) para difusão do material. Daí porque os preços previstos
no contrato variam em função do espaço publicitário escolhido, banners,
super-banners, retângulos médios, barras etc., como um “preço de
reserva”.

Os “fazeres” dizem com serviços técnicos, que servem ao fim de


“locar” espaços virtuais para que o anunciante difunda publicidade de seu
interesse. Uma vez “locado” o espaço, o provedor está obrigado a difundir
o material indicado pelo anunciante. Portanto, além de a ação relevante
não constituir tecnicamente comunicação, também não se está diante de
configuração de serviço de comunicação, mesmo no sentido amplo.

708
Mas, ainda que assim não fosse, haveria razão adicional para se afastar
a incidência de ICMS na espécie. É que, de modo decisivo, somente
coincidirão com o campo de incidência do ICMS aqueles serviços que se
prestem à efetiva concretização de um ato de comunicação entre os
utentes, a partir de alguma “prestação onerosa de serviços”501.

Nesse sentido, tem-se na Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de


1996, o serviço de comunicação tributável pelo referido Imposto, no seu
art. 3º, II, como “prestações onerosas de serviços de comunicação, por
qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a
retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer
natureza”. E, no seu art. 12, quanto ao critério temporal, prescreveu, no
inciso VII, que “considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no
momento: (...) VII – das prestações onerosas de serviços de
comunicação (...)”, além de estipular o preço do serviço, como sua base
de cálculo, no artigo 13, III.

Em poucas palavras: o serviço gratuito de comunicação não é


tributado502.

É exatamente este o caso presente. Nele, a relação onerosa dá-se entre


provedor e anunciante, mas esta não é uma relação comunicativa.

Em nenhum sentido evidencia-se o provedor como emissora da


publicidade, e o anunciante, sua receptora, ou vice-versa.

A pretendida “comunicação” dar-se-ia entre o anunciante e o usuário


dos espaços virtuais do provedor. Mas essa relação é, evidentemente,
gratuita: o usuário não paga pelo acesso, atual ou potencial, às

709
publicidades503. Pudera: já que não raro o usuário das páginas gostaria de
livrar-se delas.

Esta verdade não é alterada pela eventualidade de o usuário possuir


assinatura de um provedor de acesso, tal qual o provedor, pagando-lhe
valor mensal pela prestação de um pacote de serviços relacionados à
internet. O assinante não paga para ser objeto passivo das mensagens
difundidas. A conclusão não surpreende e é coerente com a definição de
comunicação acima adotada, que, por seus termos, exclui a de difusão.

Uma ligação telefônica que conecta duas partes é comunicação, porque


há emissor e receptor determinados que interagem, e o receptor pode
retornar a mensagem. Na difusão de publicidade isso não acontece, porque
não há receptor identificado, pelo que inexiste suporte à relação jurídica de
ônus, e não há interação entre emissor e o receptor indeterminado, pelo
que inexiste causa para uma prestação onerosa.

Como assevera Roque Carrazza:

Difundir é propagar uma mensagem, enviando-a a um número indeterminado ou


pelo menos, indeterminável de pessoas. Assim, na difusão, inexiste interação entre
o emissor e os receptores (público-alvo) e, por via de consequência não há nenhuma
504
remuneração entre eles para que a mensagem circule .

Esse já era o rationale identificado no art. 155, § 2º, X, “d”), da


Constituição Federal505. Tal aspecto não passou despercebido pela
jurisprudência.

Ao analisar a questão, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,


assim decidiu sobre o tema, in verbis:

O que, no entanto, impede a incidência do imposto nas operações de prestação


de serviços em discussão nos autos é o fato de ser livre e gratuito o acesso às
páginas da Internet por meio das quais a impetrante veicula a publicidade

710
contratada. Além de tal circunstância não ter sido contestada nem pelo impetrado
nem pela Fazenda do Estado, ela pode ser comprovada pelo simples acesso aos
sítios eletrônicos mencionados nos documentos trazidos com a inicial (cópias de
pedidos de inserção de publicidade).
Essa a razão pela qual o imposto não pode ser exigido em tais operações, uma
vez que a Emenda Constitucional n. 42/2003, de 19 de dezembro de 2003,
acrescentou ao artigo 155, § 2º, inciso X, da Constituição, a alínea “d”, que exclui a
incidência do imposto “nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades
de radiofusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita”. A esse
respeito, vale anotar que, ainda que o provimento do acesso à Internet seja oneroso
para o usuário, isso não desfigura o caráter “livre e gratuito” do acesso aos sites que
506
veiculam a publicidade, serviço de comunicação distinto daquele .

Esta decisão foi mantida pelo Superior Tribunal de Justiça, bem como
pelo Supremo Tribunal Federal, no RE 595.476/SP, Rel. Min. Carmem
Lucia, que negou seguimento ao recurso extraordinário da Fazenda
Estadual.

Temos, então, três tipos de relações distintas com os respectivos efeitos


jurídicos: (i) a relação jurídica de prestação de serviços, entre o provedor e
os assinantes que pagam por seus serviços; (ii) a relação fática entre o
provedor e os usuários que têm acesso ao seu conteúdo, de modo gratuito,
sem qualquer vínculo jurídico entre as partes e (iii) a relação jurídica entre
o provedor e os anunciantes que divulgam publicidade em seu sites na
internet, que não envolve obrigação de fazer, tampouco comunicação.

3. REGRA MATRIZ DO ICMS-COMUNICAÇÃO E A JURISPRUDÊNCIA


DO STJ

A resposta aos questionamentos formulados pelo provedor enseja,


necessariamente, esclarecimentos acerca dos pressupostos para a
incidência da norma impositiva do ICMS-Comunicação.

O artigo 155, II, da CF/88, prescreve a competência dos Estados e


Distrito Federal para instituir imposto sobre prestações de serviços de

711
comunicação, ainda que as prestações se iniciem no exterior. Neste, os
serviços de telecomunicações somente coincidirão com seu campo de
incidência quando se prestem à efetiva concretização de um ato de
comunicação entre os utentes, a partir de alguma “prestação onerosa de
serviços”. Esta sempre foi a orientação do nosso Legislador nacional e de
todos os tribunais. Contudo esse é entendimento que precisa vir bem
demonstrado.

De imediato põe-se o intérprete no desafio de identificar e qualificar,


com precisão, quais os limites do conceito de “comunicação” usado na
demarcação constitucional da competência tributária supradescrita e, bem
assim, sua relação com o conceito de “telecomunicação”.

A Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996, dando


cumprimento ao disposto no art. 155, § 2º, XII, veiculou as normas gerais
em matéria de ICMS, versando sobre os elementos ali exigidos, bem como
aqueles do art. 146, I e III, “a”, ambos da Constituição Federal, e assim
qualificou o serviço de comunicação tributável pelo referido Imposto, no
seu art. 3º, II, como sendo: “Prestações onerosas de serviços de
comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a
recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de
comunicação de qualquer natureza”.

Em vista dessa nova regra de qualificação material, é inequívoco que


somente justificam incidência tributária, no exercício de competências dos
Estados, os atos de prestações, a título oneroso, de serviços de
comunicação, quer dizer, de operações negociais que tenham “preço”
como contraprestação de uma colocação de quaisquer meios à disposição
dos interessados em promover atos de comunicação (i) e sem importar,
para tanto, a natureza e o conteúdo da comunicação (ii), ao se referir a

712
comunicação de qualquer natureza. Evidentemente, o elemento funcional
da comunicação deve estar garantido, e os meios devem ser aqueles aptos
à efetiva concretização do seu transporte, em típica prestação de serviço
que coincida com tal conceito.

O que efetivamente se deve identificar, para os fins de incidência do


ICMS-Comunicação, como motivo para justificar algum ato de aplicação,
é a presença da “prestação onerosa de serviço de comunicação”, quer
dizer, de mensagem de qualquer espécie e veiculada por quaisquer meios
que tenham condições efetivas para o provimento daquela finalidade.

Faz-se mister, portanto, que se opere um negócio jurídico que tenha por
objeto a prestação de serviço de comunicação, de caráter sinalagmático e
oneroso. Assim, não basta a simples colocação de meios à disposição ou
qualquer outro ato preparatório ou acessório da comunicação. O que
permitirá a incidência será sempre um ato de comunicação efetivamente
concretizado.

O conceito de “serviço de telecomunicação” é usado na Constituição


como “limite” ao exercício das competências impositivas. E repare-se bem
que não ousamos confundir o simples ato comunicacional com o negócio
jurídico de “serviço de telecomunicações”, que é o que a Constituição
qualifica como medida de competência ou de imunidade.

Para os desígnios da competência, não importa o ato natural de


comunicação, entre pessoas presentes; mas o ato comunicacional entre
ausentes, mediado por negócio jurídico que deve ter como “causa” jurídica
a prestação de serviços que permitam a concretização de tal propósito, seja
qual for o meio ou o conteúdo da mensagem. A simples circunstância de
uma pessoa comunicar-se com outra não faz nascer obrigação tributária,

713
sem que antes se tenha a prestação onerosa de meios, de modo a tornar
efetiva e concreta a comunicação que serve de motivo para a incidência
tributária. Tampouco a colocação de meios que não coincidam com o
aperfeiçoamento de tal efetivação da relação comunicacional pelos utentes
interessados. Meios e fins hão de coincidir na efetiva prestação de
serviços.

Conclui, portanto, que já no texto constitucional vigente, restou


contemplado, como critério material possível do ICMS-Comunicação fato
diverso da pura e simples comunicação, sob pena de a tributação recair
nos absurdos acima tratados. Importa, pois, perquirir a estrutura da norma
jurídica impositiva do tributo em foco507.

Hugo de Brito Machado, com correção, assenta que “o conceito de


comunicação é excessivamente amplo”. Não é, porém, a comunicação que
integra o âmbito de incidência do ICMS, mas o serviço de comunicação.
Isto quer dizer que o fato relevante, o fato que pode ser escolhido pelo
legislador para definir a hipótese de incidência desse imposto, é o serviço
de comunicação, e não a comunicação em si mesma. O fato de alguém
comunicar-se com outrem não pode ser definido como gerador do dever de
pagar o imposto508.

Sustentar entendimento diverso, como visto acima, findaria por permitir


a incidência de ICMS sempre que duas pessoas conversassem ou
simplesmente gesticulassem; considerando-se, neste último sentido, que,
de forma ampla, também existe comunicação por meio de sinais e
símbolos.

Assim, examinando-se o modo pelo qual foram estruturadas as aludidas


normas, consignadas no art. 155, II, da CF/88, e no art. 2º, III, da LC n.

714
87/96, bem se vê que, em se tratando do ICMS-Comunicação, ambas
gravitam sobre a “prestação de serviços de comunicação”.

Disto extraem-se algumas consequências, a saber:

i) O ICMS-Comunicação, porquanto associado a uma prestação de serviços,


somente poderá incidir sobre obrigações de fazer e não sobre obrigações de
dar. Ou seja: é preciso que uma pessoa, física ou jurídica, preste serviço de
comunicação a outra.
ii) Mais ainda, diante da exigência constitucional de amparar a tributação em
situações que revelem capacidade contributiva, o ICMS-Comunicação
somente poderá incidir sobre negócios jurídicos onerosos que tenham por
objeto serviços de comunicação; daí porque o exame da dinâmica da
incidência de tal tributo perpassará, sempre, uma análise detida dos contratos
firmados pelos sujeitos passivos da tributação – tal como feito, em tópico
antecedente –, com vistas a esclarecer o contexto fático-jurídico em que se
inserem as atividades do provedor.

Deveras, importa registrar que o conceito de comunicação, associado à


prestação onerosa de serviços em comento, revela-se restrito, o que será
esclarecido de forma minudente, em termos estritamente jurídicos, a partir
do próprio texto constitucional vigente no país.

Neste momento, antes de empreender uma busca na jurisprudência do


STJ acerca dos contornos da regra matriz de incidência do ICMS-
Comunicação, basta assentar que tal tributo só incidirá quando conjugados,
em determinada situação concreta: (a) um prestador do serviço de
comunicação (terceiro); (b) a onerosidade de tal prestação; (c) uma fonte
emissora; (d) uma fonte receptora determinada e apta a responder à
primeira; e (e) uma mensagem transmitida pelo prestador do serviço.

Nota-se que o STJ já afastou, acertadamente, a incidência do ICMS-


Comunicação sobre “os valores cobrados a título de acesso, adesão,
ativação, habilitação, disponibilidade, assinatura e outros serviços
suplementares e facilidades adicionais que otimizem ou apliquem o

715
processo de comunicação”. É o que se infere no julgamento do Recurso
Especial n. 402.047/MG, associado à Súmula 350 da referida Corte,
segundo a qual: “O ICMS não incide sobre o serviço de habilitação de
telefone celular”.

No citado Recurso Especial n. 402.047/MG, julgado em 4 de novembro


de 2003, a Primeira Turma do STJ, por unanimidade, sob a relatoria do
Ministro Humberto Gomes de Barros, deu provimento ao apelo do
contribuinte, reconhecendo a inexistência de relação jurídico-tributária,
pois a interpretação do artigo 2º, III, da LC n. 87/96, indica que somente
poderá haver a incidência de ICMS sobre serviços de comunicação stricto
sensu, os quais não contemplam os serviços meramente acessórios ou
preparatórios à comunicação propriamente dita, consignados, outrora, na
Cláusula Primeira do Convênio ICMS n. 69/98509.

Fez-se prevalecer, assim, o princípio da tipicidade cerrada, segundo o


qual a dilatação da base de cálculo do ICMS-Comunicação não poderia, à
míngua de lei, ser implementada validamente por Convênio.

Na oportunidade, convém destacar que o Ministro Humberto Gomes de


Barros questionou o conceito de “serviços de comunicação ou
telecomunicação” para os fins da incidência do ICMS, e concluiu que “Há
‘serviço de comunicação’ quando um terceiro, mediante prestação
negocial-onerosa, mantém interlocutores (emissor/receptor) em contato
‘por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a
transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de
qualquer natureza’”510. Ademais, assenta que “os meios necessários à
consecução deste fim não estão ao alcance da incidência do ICMS-
Comunicação”.

716
Por sua vez, o Ministro José Delgado levou em consideração o artigo
60, da LGT, afirmando que “os serviços necessários para que a
comunicação entre em fase de comunicação são autônomos e, para fins
tributários, com ela não se confundem”. Assim, aduz que não tipificam
prestações de serviços de comunicação as meras atividades-meio,
necessárias à sua concretização.

Em outra oportunidade, a Primeira Seção do STJ, em sede do Recurso


Especial n. 760.230/MG, sob a Relatoria do Ministro Luiz Fux, por
maioria, deu provimento ao apelo de pessoa jurídica prestadora de Serviço
Móvel Especializado, conhecido como Trunking – que consubstancia
serviço de comunicação por aparelhos de rádio em faixas de frequência
concedidas pela ANATEL e com conexão permitida aos sistemas públicos
de telefonia – por entender que, apenas sobre esta atividade-fim, incidiria
ICMS-Comunicação. No caso, o Estado de Minas Gerais cobrava tal
exação, em razão da locação de aparelhos, da manutenção das Estações
Rádio-Base, das torres de transmissão, do software de gerenciamento e
outros serviços similares.

O Ministro Luiz Fux confirmou ainda entendimento da Corte, no


sentido de que as atividades-meio não compõem a base de cálculo do
ICMS-Comunicação e fixou que os serviços complementares, indicados no
final do parágrafo antecedente, na medida em que, unicamente,
proporcionam as condições materiais necessárias à implementação do
serviço comunicacional, bem como a sua manutenção, não correspondem a
“fatos geradores da incidência do ICMS, porquanto, por si sós, não
possibilitam a emissão, transmissão ou recepção de informações, razão
pela qual não se enquadram no conceito de serviço comunicacional, mas,

717
antes, ostentam a natureza de atos preparatórios ou posteriores à atividade
tributada”.

Do seu voto, ademais, destaca-se passagem no mesmo sentido, segundo


a qual “o serviço de comunicação relevante juridicamente para fins de
tributação pelo ICMS é aquele decorrente de um contrato oneroso de
prestação de serviço, do qual resulte efetivamente uma relação
comunicativa entre emissor e receptor da mensagem”.

Com base na doutrina de Roque Antonio Carrazza, o referido Ministro


assevera, ademais, que “só quando o destinatário assume papel ativo,
contratando a prestação do serviço de comunicação e dele fruindo, por
meio do recebimento e do envio de mensagens a terceiro (que não o
próprio prestador), é que o ICMS pode incidir”. Mais ainda, debruçando-se
sobre as atividades “das programadoras de TV a cabo”, a Primeira Turma
do STJ, no Recurso Especial n. 761.989/MG, sob a Relatoria da Ministra
Denise Arruda, confirmou que estas não estariam incluídas no âmbito de
incidência do ICMS:

A produção de programas televisivos não constitui prestação de serviço de


comunicação, pois tal atividade, considerada isoladamente, não contempla a
“distribuição de sinais de vídeo e⁄ou áudio, a assinantes, mediante transporte por
meios físicos” (art. 2º da Lei 8.977⁄95). Assim, o ICMS, na hipótese de
prestações onerosas de serviços de comunicação, incide tão somente sobre a
prestação de serviço inerente à distribuição de sinais, por meio do qual se consolida
a relação entre o emissor e o receptor da informação.” (...) “As produtoras de
programas para TV a cabo ou comerciais que efetivamente não distribuem tais
programas por nenhum meio físico ao público em geral, mas apenas contratam
com a operadora⁄distribuidora de sinais de TV, não estão sujeitas ao recolhimento
de ICMS, uma vez que os serviços que prestam não estão previstos na Lei
Complementar n. 87⁄96”.

Em seu voto, a citada Relatora, registrou ser “(...) imperioso concluir


que o ICMS, na hipótese de “prestações onerosas de serviços de
comunicação”, incide tão somente sobre a prestação de serviço inerente à

718
distribuição de sinais, por meio do qual se consolida a relação entre o
emissor e o receptor da informação”. A pena é firme no decidir.

Digno de nota, também, é o julgamento do EREsp n. 456.650/PR, por


meio do qual foi fixada, na Primeira Seção do STJ, a distinção entre os
serviços de telecomunicação e os serviços de valor adicionado. Diante
da proximidade, permite-se analisá-lo, em separado, mais adiante, de
forma minudente, em tópico específico.

Merece destaque, por fim, o julgamento por meio do qual a Primeira


Seção do STJ pacificou o entendimento de suas duas Turmas, designadas
para examinar lides tributárias, e definiu que não incide ICMS sobre os
serviços acessórios ou suplementares aos serviços de comunicação, qual
seja o Recurso Especial n. 1.176.753/RJ, julgado na sistemática do artigo
543-C, do CPC, cuja ementa deve ser integralmente transcrita:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ICMS.


SERVIÇOS CONEXOS (SUPLEMENTARES) AO DE COMUNICAÇÃO
(TELEFONIA MÓVEL): TROCA DE TITULARIDADE DE APARELHO
CELULAR; CONTA DETALHADA; TROCA DE APARELHO; TROCA DE
NÚMERO; MUDANÇA DE ENDEREÇO DE COBRANÇA DE CONTA
TELEFÔNICA; TROCA DE ÁREA DE REGISTRO; TROCA DE PLANO DE
SERVIÇO; BLOQUEIO DDD E DDI; HABILITAÇÃO; RELIGAÇÃO. NÃO
INCIDÊNCIA DO ICMS.
1. A incidência do ICMS, no que se refere à prestação dos serviços de
comunicação, deve ser extraída da CF e da LC 87/96, incidindo o tributo sobre os
serviços de comunicação prestados de forma onerosa, através de qualquer meio,
inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a
repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza (art. 2º, III, da LC
87/96).
2. A prestação de serviços conexos ao de comunicação por meio da telefonia
móvel (que são preparatórios, acessórios ou intermediários da comunicação) não se
confunde com a prestação da atividade-fim processo de transmissão (emissão ou
recepção) de informações de qualquer natureza, esta sim, passível de incidência
pelo ICMS. Desse modo, a despeito de alguns deles serem essenciais à efetiva
prestação do serviço de comunicação e admitirem a cobrança de tarifa pela
prestadora do serviço (concessionária de serviço público), por assumirem o caráter

719
de atividade-meio, não constituem, efetivamente, serviços de comunicação, razão
pela qual não é possível a incidência do ICMS.
3. Não merece reparo a decisão que admitiu o ingresso de terceiro no feito, pois
o art. 543-C, § 4º, do CPC autoriza que o Ministro Relator, considerando a
relevância da matéria tratada em recurso especial representativo da controvérsia,
admita a manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na questão
jurídica central.
4. Agravo regimental de fls. 871/874 não provido. Recurso especial não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no art. 543-C do CPC, c/c a Resolução 8/2008 –
511
Presidência/STJ .

Não obstante, lembramos que aguarda julgamento no Supremo Tribunal


Federal o Recurso Extraordinário com Agravo ARE 782749-RG/RS, no
qual foi reconhecida a existência de repercussão geral no que concerne à
incidência de ICMS sobre a tarifa de “assinatura básica mensal”. Confira-
se a ementa:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMPOSTO SOBRE


OPERAÇÕES RELATIVAS À CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SOBRE
PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE INTERESTADUAL E
INTERMUNICIPAL E DE COMUNICAÇÃO – ICMS. INCIDÊNCIA SOBRE A
TARIFA DE “ASSINATURA BÁSICA MENSAL”. REPERCUSSÃO GERAL
CONFIGURADA.
1. Possui repercussão geral a questão relativa à incidência ou não do ICMS-
comunicação (Constituição, art. 155, II) sobre a tarifa denominada “assinatura
básica mensal”, paga pelo consumidor às concessionárias de telefonia, de forma
permanente e contínua, durante toda a vigência do contrato de prestação de
serviços.
512
2. Repercussão geral reconhecida .

Seguimos firmes, porém, no entendimento de que o ICMS-


Comunicação somente incide quando há efetiva transmissão de mensagem,
de forma onerosa, do emissor “A” ao receptor “B” (determinado), por um
terceiro contratado para tanto (o prestador do serviço de comunicação).
Atividades, pois, que não envolvem a consecução de uma efetiva relação
comunicativa refogem à hipótese de incidência da exação em foco, a
configurar analogia extensiva, vedada pelo art. 108, § 1º, do CTN.

720
3.1. A Ausência de Obrigação de Fazer no Contrato de Cessão de Espaço
Virtual

A Constituição Federal prescreve a incidência do ICMS sobre


“prestação de serviços de comunicação”, no que o termo “prestação”
define qualquer ato jurídico que tem como fim prover o fornecimento do
“serviço”, o que independe da forma ou da natureza dos atos ou negócios
jurídicos.

O conceito de “prestação de serviços”, como conceito de Direito


Privado, é o núcleo material da competência tributária, o qual deve ser
preservado e mantido segundo seu significado de base, ou seja, de acordo
com os critérios adotados pelo Direito Privado.

O sentido a ser atribuído ao termo juridicamente qualificado como


prestação de serviços, pela Constituição, para o exercício de competência
dos Estados, deverá ser aquele que a legislação de Direito Privado designa,
construído no artigo 593 e seguintes, do Código Civil.

Prestação de serviços define uma obrigação de fazer, negócio jurídico


pelo qual uma parte se obrigue a realizar um “fazer”513, mediante o
pagamento de contraprestação.

No Direito Privado, o contrato de prestação de serviço caracteriza-se


pela presença dos seguintes elementos: (a) o prestador (ou devedor) que é
contratado para prestar serviços, (b) o tomador (ou credor) em favor de
quem o serviço é prestado; (c) o objeto, que é a prestação de serviços,
trabalho ou atividade lícita, material ou imaterial e; (d) o pagamento de
contraprestação. Note-se que não estão abrangidos na disciplina do Código
Civil contratos sujeitos às leis trabalhistas ou a normas especiais514.

721
A prestação de serviço é tipo da obrigação de fazer, “por ela, o devedor
compromete-se a prestar uma atividade qualquer, lícita e vantajosa, ao seu
credor”, como explicou Álvaro Vilaça de Azevedo515.

A prestação de serviços de comunicação implica a efetiva transmissão


de uma mensagem do emitente para o receptor determinado. Pressupõe a
interação entre emissor da mensagem e o seu receptor, permitindo a
resposta do último.

Aquele que se obriga a ceder seu espaço virtual, não está vinculado à
obrigação de fazer. Ao contrário, obriga-se a dar, a ceder seu espaço por
tempo determinado para que o anunciante ali exponha sua publicidade.

Obrigações de dar não configuram prestação de serviços e, portanto,


não podem sofrer imposição do ISS, como reconhece o STF, a saber:

IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS (ISS) – LOCAÇÃO DE VEÍCULO


AUTOMOTOR – INADMISSIBILIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DA
INCIDÊNCIA DESSE TRIBUTO MUNICIPAL – DISTINÇÃO NECESSÁRIA
ENTRE LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS (OBRIGAÇÃO DE DAR OU DE
ENTREGAR) E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS (OBRIGAÇÃO DE FAZER) –
IMPOSSIBILIDADE DE A LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA MUNICIPAL
ALTERAR A DEFINIÇÃO E O ALCANCE DE CONCEITOS DE DIREITO
PRIVADO (CTN, ART. 110) – INCONSTITUCIONALIDADE DO ITEM 79 DA
ANTIGA LISTA DE SERVIÇOS ANEXA AO DECRETO-LEI N. 406/68 –
PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – RECURSO
IMPROVIDO. – Não se revela tributável, mediante ISS, a locação de veículos
automotores (que consubstancia obrigação de dar ou de entregar), eis que esse
tributo municipal somente pode incidir sobre obrigações de fazer, a cuja matriz
conceitual não se ajusta a figura contratual da locação de bens móveis.
516
Precedentes (STF). Doutrina .
IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS – CONTRATO DE LOCAÇÃO. A
terminologia constitucional do Imposto sobre Serviços revela o objeto da tributação.
Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo considerado contrato de
locação de bem móvel. Em Direito, os institutos, as expressões e os vocábulos têm
sentido próprio, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis,
práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância
517
inafastável – artigo 110 do Código Tributário Nacional .

722
Do último julgado, transcrevemos o irrepreensível voto do Min. Relator
Marco Aurélio: “Em síntese, há de prevalecer a definição de cada instituto,
e somente a prestação de serviços, envolvido na via direta o esforço
humano, é fato gerador do tributo em comento. Prevalece a ordem natural
das coisas cuja força surge insuplantável; prevalecem as balizas
constitucionais e legais, a conferirem segurança às relações Estado-
contribuinte; prevalece, alfim, a organicidade do próprio Direito, sem a
qual tudo será possível no agasalho de interesses do Estado, embora não
enquadráveis como primários”. E, nestes termos, no julgamento do RE n.
116.121-3 aqui tratado, o Plenário do STF declarou, incidentalmente, a
inconstitucionalidade do item do Decreto-lei n. 406/68, que autorizava a
instituição de ISS sobre “locação de bens móveis.” Tal entendimento foi
pacificado pela Súmula Vinculante 31, do STF, que estabelece:

É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza –


ISS sobre operações de locação de bens móveis.

Os contornos jurídicos da expressão prestação de serviço utilizada,


como visto, pelo legislador, na definição do critério material da hipótese
de incidência da norma impositiva de ICMS-Comunicação, resta firme no
STF.

Do exposto, o critério material da hipótese de incidência da norma


impositiva do ICMS-Comunicação envolve uma obrigação de fazer,
dotada de caráter oneroso, tendente à comunicação, no sentido estrito.

Cumpre recordar, neste particular, que a noção de “prestação”, no caso


dos serviços de comunicação, consistirá no adimplemento da obrigação de
fazer, representativa da utilidade esperada pelo usuário. Tratando-se,
destarte, da prestação de serviços de comunicação, imperioso que seja
efetivamente prestado o serviço, por um terceiro, em relação aos sujeitos

723
designados como emissor e receptor (determinados) de uma mensagem;
serviço, este, consistente no fornecimento de utilidades que facilite a
comunicação.

O provedor não se obriga a enviar mensagem do emissor a um receptor


determinado. Apenas cede espaço virtual para a colocação de banners, pop
ups, pop unders, anúncios flutuantes, anúncios unicast, links patrocinados
e outros518. Não há garantia de que o usuário efetivamente vai receber a
mensagem.

Portanto, os contratos de divulgação de publicidade firmados pelo


provedor não envolvem obrigação de “fazer”519, não tratam de “prestação
de serviço de comunicação”, logo não poderá ser indicado como fato do
ICMS.

Resta demonstrado que não há, no tema ora examinado, obrigação de


fazer por parte do provedor que permita a incidência do ICMS sobre a
atividade cessão do espaço virtual para publicidade na internet.

Vale resgatar, à luz do texto constitucional vigente, os limites do


conceito de serviços de “comunicação” (gênero) para demonstrar como a
orientação sedimentada no STJ, em caso envolvendo serviços de
“telecomunicação” (espécie do primeiro), revela-se, também, útil à
confirmação da não incidência do ICMS-Comunicação sobre a veiculação
de publicidade, pelos provedores de internet.

Em face dos critérios anteriormente apontados, indubitavelmente,


somente se justifica a incidência de ICMS sobre (i) os atos de prestação ou
obrigações de fazer, (ii) a título oneroso, (iii) de serviços de
comunicação; isto é, de operações negociais que tenham “preço”, como

724
contraprestação da colocação de meios à disposição de interessados em
promover atos de comunicação, os quais compreendem a efetiva
transmissão de mensagens entre uma fonte emissora e uma fonte receptora
determinada, sendo possível a resposta por meio desta última. Com efeito,
o elemento funcional da comunicação deve estar garantido e devem estar
presentes meios aptos à efetiva concretização do transporte da mensagem.

O serviço prestado pelos provedores de acesso à internet cuida,


portanto, de mero serviço de valor adicionado, uma vez que o prestador se
utiliza da rede de telecomunicações que lhe dá suporte para viabilizar o
acesso do usuário final à internet, por meio de uma linha telefônica.

Ademais, o provedor não fornece as condições e meios para que a


comunicação ocorra, sendo ela mesma, como visto nos dispositivos da
Portaria n. 148/95 e da Lei n. 9.472⁄97, simples tomadora ou usuária de
serviços prestados por empresas de telecomunicações, estas, sim,
contribuintes do ICMS-Comunicação. Neste toar, o julgamento dos
Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 456.650/PR não deixa
dúvidas: o provedor de acesso à internet libera espaço virtual para
comunicação entre duas pessoas, porém quem presta o serviço de
comunicação é a concessionária de serviços de telecomunicações, já
tributada pelo ICMS.

Limita-se o provedor, então, a executar serviço de valor adicionado,


acrescendo novas utilidades – dentre estas a veiculação de publicidade –
ao serviço prestado por concessionária de serviços de telecomunicações,
sujeitas, nesta qualidade, ao ICMS.

Trata-se de realidade a qual não se faz presente no caso da veiculação


de publicidade, por intermédio do provedor que: (i) além de dirigir a

725
público-alvo incerto (receptores indeterminados) os anúncios, postos no
seu espaço virtual por um anunciante (emissor), mediante a cessão do
mesmo (obrigação de dar); (ii) não possibilita que os primeiros respondam,
a este último, através do espaço do provedor, deixando, assim, de
perfectibilizar o ato comunicacional, referido na doutrina de Roque
Antonio Carrazza520; (iii) sequer dispõe da estrutura (canais físicos) para
propiciar o transporte de mensagens entre os anunciantes e os usuários do
provedor que, para tanto, evidencia-se tomador, ele mesmo, de um serviço
de telecomunicação; e (iv) não é remunerada, pelos receptores
(indeterminados), em função da publicidade que chega aos mesmos, o que,
por fim, retira a onerosidade, sem a qual não haverá, validamente,
tributação por ICMS (art. 2º, III, da LC n. 87⁄96).

4. SÍNTESE CONCLUSIVA

A atividade de veiculação de publicidade, promovida pelo provedor, no


espaço digital de seu provedor, não constitui prestação onerosa de serviço
de comunicação, de modo que escapa à materialidade constitucionalmente
prevista, no art. 155, II, da CF/88, para fins de definição da competência
tributária dos Estados-membros da federação brasileira e do Distrito
Federal.

A relação jurídica entre o provedor e o anunciante não envolve uma


prestação de serviços. Não é obrigação de fazer, mas sim obrigação de
ceder o espaço virtual para a publicidade do anunciante. Não há prestação
de serviços de comunicação nesta atividade, salvo a possibilidade de
emprego da analogia extensiva, vedada pelo art. 108, § 1º, do CTN.

O que se deve identificar, para os fins do ICMS-Comunicação, é a


presença da prestação onerosa de serviço de comunicação de qualquer

726
natureza, quer dizer, de mensagem de qualquer espécie e veiculada por
quaisquer meios que tenham condições efetivas para o provimento daquela
finalidade.

O que permitirá a incidência será a “prestação do serviço”, ou seja, o


“fazer” no sentido de transportar a mensagem para o seu destino,
permitindo concluir algum ato de comunicação entre emissor e receptor.

Para a competência constitucional do ICMS, não importa o ato natural


de comunicação, mas a “prestação de serviço de comunicação de qualquer
natureza”, na forma do art. 2º, III, da LC n. 87/96, mediado por negócio
jurídico que deve ter como “causa” jurídica a prestação de serviços que
permitam a concretização de tal propósito, seja qual for o meio ou o
conteúdo da mensagem.

A veiculação de publicidade na internet não é comunicação, pois não há


um alvo receptor determinado, tampouco interação entre o emissor e o
receptor. Prestação de serviço de comunicação somente sofrerá a
incidência do ICMS se for onerosa. O acesso livre e gratuito ao conteúdo
disponível nos sites do provedor é divulgação de imagens, cuja cobrança
de ICMS encontra óbice no art. 155, § 2º, X, “d”, da CF/88.

Os usuários que acessam o site do provedor, por qualquer instrumento,


já sofrem a incidência do ICMS-Comunicação, na medida em que usam
seus respectivos acessos à internet (banda larga, internet discada, pacote de
minutos pós-pago ou pré-pago, wifi etc.).

Ora, se o provedor, na qualidade de provedor de internet, não se revela


apto a desempenhar serviços de telecomunicação, carecendo para tanto,
inclusive, de licença da União, certamente, todas as funções a que der azo,

727
dentre elas a veiculação de publicidade, por meio da aludida cessão de
espaço virtual (obrigação de dar), amoldar-se-ão, por razões lógicas, à
condição de serviço de valor adicionado; modalidade esta que, nos
termos da jurisprudência pacificada do STJ, escapa ao âmbito de
incidência do ICMS-Comunicação.

Demonstrado que o provedor de internet não possui os meios


necessários – infraestrutura de telecomunicação – para o transporte de
mensagens e que este se vale, para tanto, de sistema de transporte de sinais
já existente, fica claro que tanto o provedor quanto os usuários são
tomadores de serviços de comunicação, o qual não é prestado pelo
provedor, mas por empresas de comunicação, concessionárias dos serviços
de telecomunicação; estas sim as únicas contribuintes do ICMS, sendo
tributadas à alíquota de 25%. Assim, independentemente de haver entre o
usuário e o provedor ato negocial, a tipicidade fechada do Direito
Tributário não permite a incidência do ICMS sobre os valores recebidos
dos usuários pelo provedor.

E, por fim, mencione-se que a única relação que envolve comunicação


(sentido amplo) é a relação fática entre o provedor e os usuários que
acessem seus sites, de modo livre e gratuito. Essa relação não poderia
sofrer a incidência do ICMS, por força do art. 155, § 2º, X, “d”, da CF/88,
incluído pela EC n. 42/2003, que veda a incidência do ICMS “nas
prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão
sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita”.

Não se reputa válido, portanto, qualquer lançamento de ICMS dirigido


diretamente ao provedor, porquanto este, ao veicular publicidade, dirige os
anúncios, postos no seu espaço virtual por um anunciante (emissor),
mediante sua cessão (obrigação de dar) a público-alvo incerto (receptores

728
indeterminados), sequer dispõe da estrutura (canais físicos) para propiciar
o transporte de mensagens entre os anunciantes e os usuários do provedor;
e, por fim, não é remunerado, por seus usuários, em função da publicidade
que chega até estes de modo gratuito.

729
Tributação de atividades de streaming de
áudio e vídeo: guerra fiscal entre ISS e ICMS
521
Alberto Macedo

1. INTRODUÇÃO

Importante aqui, de início, separar os problemas de conflito envolvendo


o ISS e o ICMS.

A tributação do consumo522 sobre as operações com software encontra-


se no escopo do conflito do ISS com o ICMS-Mercadoria, dado que
envolve a discussão sobre se o licenciamento de software subsumir-se-ia
ao conceito de serviço de qualquer natureza ou ao suposto conceito de
mercadoria virtual. Em prévio estudo, já pudemos concluir pela incidência
do ISS, dada a impossibilidade de, no atual ordenamento constitucional
tributário, existir a chamada mercadoria virtual523.

Já a tributação do consumo que envolve os serviços de streaming, este


sim o objeto do presente estudo, encontra-se no escopo de outro conflito,
qual seja, o do ISS com o ICMS-Comunicação.

O serviço de comunicação, cuja incidência do ICMS é prevista pelo


Constituinte no artigo 155, II, também é um bem imaterial, fazendo parte
do universo de serviços previstos no texto constitucional tributáveis pelos
impostos, composto este universo ainda por: (i) serviços financeiros e
securitários (tributáveis pelo IOF, art. 153, V, da Constituição Federal –
CF/88); (ii) serviços de transporte intermunicipal e interestadual
(tributáveis pelo ICMS, art. 155, II, CF/88); e (iii) serviços de qualquer

730
natureza, residuais em relação aos serviços anteriores, e desde que haja
previsão em lista (tributáveis pelo ISS, art. 156, III, CF/88)524.

Assim, o presente estudo pretende se debruçar sobre qual seria, em


termos constitucionais, o correto enquadramento do serviço de streaming
de áudio e vídeo; se se inclui no conceito de serviço de qualquer natureza,
ou no conceito de serviço de comunicação.

Dito de outro modo, pretende-se verificar se é constitucional a recente


inserção, na lista de serviços anexa à Lei Complementar n. 116, de 31 de
julho de 2003, do subitem 1.09, assim descrito:

1.09 – Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo,


imagem e texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e
periódicos (exceto a distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de
Acesso Condicionado, de que trata a Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011,
sujeita ao ICMS). (Incluído pela Lei Complementar n. 157, de 2016)

2. O CONCEITO CONSTITUCIONAL DE SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO

Na medida em que nossa missão aqui tem como uma das tarefas
delimitar o conceito constitucional de serviço de comunicação para fins de
tributação pelo ICMS (ICMS-Comunicação), nada mais correto do que
partir do dispositivo constitucional que nos apresenta sua materialidade:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: [...]
II – operações [...] sobre prestações de serviços de [...] comunicação, ainda que
[...] as prestações se iniciem no exterior (...) (Redação dada pela Emenda
Constitucional n. 3, de 1993.)

Posta a materialidade, debrucemo-nos sobre o texto constitucional para


investigarmos outros enunciados desse texto que nos ajudem na
demarcação da fronteira desse conceito, de serviço de comunicação, para
fins de tributação pelo ICMS-Comunicação.

731
Não temos aqui a pretensão de construir um apanhado histórico
normativo do conceito constitucional de serviço de comunicação no Brasil
anterior à Constituição de 1988. Nesse sentido, André Mendes Moreira
cumpriu com mestria essa incumbência525.

Apenas cabe registrar que esse conceito se alinha com o de serviço de


telecomunicação presente no artigo 60 – bem como com o do que não é
serviço de telecomunicação, e sim Serviço de Valor Adicionado (SVA),
presente no artigo 61 – ambos da Lei n. 9.472, de 16 de julho de 1997,
conhecida como Lei Geral de Telecomunicações (LGT). Esse conceito
seguiu a orientação histórica não só nacional, presente no Código
Brasileiro de Telecomunicações (Lei n. 4.117, de 27-8-1962), mas
internacional, presente nas normas da União Internacional das
Telecomunicações (UIT) e do Convênio Internacional de
Telecomunicações de Nairobi (Kenia, 1982)526.

Prevê o referido artigo 60:

Art. 60. Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a


oferta de telecomunicação.
§ 1º Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio,
radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de
símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer
natureza.
§ 2º Estação de telecomunicações é o conjunto de equipamentos ou aparelhos,
dispositivos e demais meios necessários à realização de telecomunicação, seus
acessórios e periféricos, e, quando for o caso, as instalações que os abrigam e
complementam, inclusive terminais portáteis.

Por sua vez, descreve o artigo 61 o conceito de Serviço de Valor


Adicionado – SVA:

Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço


de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas
utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou
recuperação de informações.

732
§ 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações,
classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe
dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição.
§ 2º É assegurado aos interessados o uso das redes de serviços de
telecomunicações para prestação de serviços de valor adicionado, cabendo à
Agência, para assegurar esse direito, regular os condicionamentos, assim como o
relacionamento entre aqueles e as prestadoras de serviço de telecomunicações.

Veremos, mais adiante, a semelhança entre o Serviço de Valor


Adicionado e um conceito que está cada vez mais sedimentado no
mercado, o Serviço Over The Top – Serviço OTT.

O artigo 21 da Constituição de 1988, por sua vez, previu, com a redação


dada pela EC n. 8, de 15 de agosto de 1995, que compete à União:

XI – explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os


serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização
dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais.
(Grifo nosso.)

O grifo destaca o fundamento de validade constitucional do que se


costumou chamar de “privatização das empresas de telecomunicações”
(regulamentado por meio da supracitada LGT), já que antes (conforme a
redação original do referido inciso) a rede pública de telecomunicações
deveria ser explorada pela União, diretamente ou mediante concessão a
empresas sob controle acionário estatal.

Já o artigo 22 diz:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: [...]


IV – águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão; [...]. (Grifos
nossos.)

Com relação a rádio (radiodifusão sonora) e a TV (radiodifusão de sons


e imagens), no Brasil, diferentemente de alguns países, esses serviços são
considerados serviços de telecomunicação.

733
A Lei n. 4.117/62 é clara em tratar os serviços de radiodifusão sonora
(rádio), e de sons e imagens (televisão), como espécie do serviço de
telecomunicação. Seguem alguns dispositivos a respeito:

Art. 6º Quanto aos fins a que se destinam, as telecomunicações assim se


classificam: (...)
d) serviço de radiodifusão, destinado a ser recebido direta e livremente pelo
público em geral, compreendendo radiodifusão sonora e televisão; (...).
Art. 32. Os serviços de radiodifusão, nos quais se compreendem os de televisão,
serão executados diretamente pela União ou através de concessão, autorização ou
permissão.

A Lei n. 9.472/97 revogou parcialmente a Lei n. 4.117/62, mas não os


seus preceitos relativos à radiodifusão (art. 215, I).

Então, podemos concluir que, de longa data, está arraigado em nosso


ordenamento, inclusive com incorporação constitucional desse conceito,
que os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens fazem parte do
conceito maior de serviço de telecomunicações, em que pese a separação
regulatória, mantendo-se os de radiodifusão regulados pela Lei n. 4.117/62
e os demais serviços de telecomunicações regulados pela Lei n. 9.472/97.

2.1. Serviço de comunicação não se confunde com serviços de informática


prestados pela internet

Diferentemente da regulamentação internacional a que se submete o


setor de telecomunicações, o setor de internet não possui um padrão
regulatório internacional, tendo se desenvolvido de forma livre, sem a
existência de um organismo internacional que o controle.

Esse fato é relevante para entender a distinção semântica entre o termo


“informática” e os termos “telecomunicações” e “radiodifusão”, presentes
no inciso IV do artigo 22 da Constituição de 1988, acima transcrito.

734
Essa distinção, evidenciada no supracitado dispositivo, entre
“informática” e “telecomunicações”, e obviamente entre seus respectivos
serviços, revela-se constitucionalizada, demonstrando que para o direito
pátrio prevaleceu a existência de regimes jurídicos distintos para essas
acepções.

Reforça esse argumento o fato de que não havia como, em 1988,


conferir um conceito de serviço de comunicação que abarcasse a internet,
tendo em vista que naquela época, de promulgação da Constituição
vigente, não havia como o constituinte originário ter conhecimento dos
detalhes da dinâmica comunicativa da rede mundial internet. Isso porque,
exatamente naquele ano, a internet se constituía, com a integração de redes
mundiais ao NSFNet (Network Science Foundation), surgido em 1986 no
meio acadêmico norte- americano, em decorrência, entre outros motivos,
da necessidade de criação de um critério lógico padronizado de transporte
de informações pelas redes daquele país (e posteriormente pelas redes do
mundo todo), cujos estudos se iniciaram em 1977527.

Além disso, se o constituinte derivado quisesse “consertar”


textualmente a acepção semântica dessa materialidade, após cinco anos da
vigência da Constituição de 1988, não falaria, em 1993 (pelo advento da
Emenda Constitucional n. 3) – quando os conhecimentos sobre a dinâmica
da rede mundial internet já estavam bem mais alcançáveis (afinal, naqueles
cinco anos, no ramo da informática, uma grande evolução no setor
ocorreu) – em serviços de telecomunicações, para conferir-lhe a imunidade
prevista na alteração do § 3º do artigo 155, CF/88528.

É seguindo essa linha que a LGT, em seu artigo 61, acima transcrito,
definiu serviço de valor adicionado (SVA).

735
Em síntese, o conceito constitucional de serviço de comunicação abarca
os serviços de telecomunicação, abrangidos aí a telefonia, o rádio, a
televisão e a TV por assinatura.

A Constituição de 1988 já refletia essa conceituação em seu artigo 22,


no qual a separação dos âmbitos de competência “telecomunicações” e
“radiodifusão” não infirma o exposto acima, sendo apenas uma relação de
gênero e espécie, respectivamente, entre ambas.

E a definição do conceito de SVA529 fazendo parte do conceito presente


no bojo do campo “informática” (no art. 22, IV, da Constituição) no
âmbito da internet, aliada ao fato de não se caracterizar como serviço de
telecomunicação e de radiodifusão, faz-nos concluir pela impossibilidade
de o streaming de áudio e vídeo ser tributado pelo ICMS.

3. ALGUNS SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO

3.1. Serviço de Acesso Condicionado (SeAC) – TV por Assinatura

É esse serviço que foi expressamente excluído da incidência do ISS no


subitem 1.٠9 da lista de serviços, dado que se trata de serviço de
telecomunicação, regulamentado pela ANATEL, assim como os demais
serviços de radiodifusão.

A TV por Assinatura é uma espécie de serviço de comunicação. Hoje é


regulada pela Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011, que dispõe sobre a
comunicação audiovisual de acesso condicionado, trazendo a definição do
conceito de Serviço de Acesso Condicionado (SeAC):

Art. 2º (...) XXIII – Serviço de Acesso Condicionado: serviço de


telecomunicações de interesse coletivo prestado no regime privado, cuja recepção é
condicionada à contratação remunerada por assinantes e destinado à distribuição de
conteúdos audiovisuais na forma de pacotes, de canais nas modalidades avulsa de
programação e avulsa de conteúdo programado e de canais de distribuição

736
obrigatória, por meio de tecnologias, processos, meios eletrônicos e protocolos de
comunicação quaisquer.

O SeAC unificou as regras para serviços semelhantes, que eram


diferenciados por tecnologia, e, entre outros serviços, prevê a transmissão
de conteúdo nacional na TV paga durante o horário nobre. Ele concentra
os seguintes serviços: (i) serviço TV a cabo; (ii) serviço de Distribuição de
Sinais Multiponto Multicanais (MMDS – Multichannel Multipoint
Distribution Service); (iii) serviço de Distribuição de Sinais de Televisão e
de Áudio por Assinatura Via Satélite (DTH – Direct-To-Home); e (iv)
Serviço Especial de TV por Assinatura (TVA).

No serviço de TV a cabo há um transporte, por meio físico (fibra ótica e


cabo coaxial), de sinais de áudio e/ou de vídeo para assinantes. Essa
definição do conceito de TV a cabo, que estava positivada na conhecida
Lei do Cabo (Lei n. 8.977, de 6-1-1995), em seu artigo 2º, foi revogada
pela Lei n. 12.485/2011. Exemplos desse serviço no mercado são NET,
SAT a CABO, Via Cabo, Cabo Telecom, Cabovisão.

O serviço MMDS é um serviço de TV por assinatura cujos sinais,


recebidos em pontos determinados numa área de prestação, são
transmitidos por meio de faixas de microondas. Exemplos de empresas que
prestam esse serviço são TVA, GVT, Lig TV, Mais TV, SMTV, Super I,
Super TV, TV Show.

O serviço DTH se vale de antenas parabólicas para a transmissão de


sinais de áudio e/ou vídeo aos seus assinantes. Exemplos: SKY, Oi TV,
Embratel.

No SeAC há uma relação jurídica onerosa, em que a empresa que


fornece esse serviço cobra por ele do assinante. Sendo um serviço de

737
comunicação, é tributável pelo ICMS.

3.2. Serviço de Comunicação Multimídia (SCM)

O SCM está sujeito à seguinte legislação: Resolução Anatel n. 272, de 9


de agosto de 2001 (Regulamento do serviço de Comunicação Multimídia,
revogado pela Resolução Anatel n. 614, de 28-5-2013); Resolução Anatel
n. 328, de 29 de janeiro de 2003 (Aprova os modelos de Termo de
Autorização para Exploração do Serviço de Comunicação Multimídia, de
interesse coletivo, também revogados pela Resolução Anatel n. 614/2013);
Resolução n. 295, de 19 de abril de 2002 (Destinar faixas de frequências
para uso do serviço de Comunicação Multimídia – SCM e do Serviço
Telefônico Fixo Comutado Destinado ao Uso do Público em Geral –
STFC); Decreto n. 7.175, de 13 de maio de 2010 (Institui o Programa
Nacional de Banda Larga – PNBL); e Resolução Anatel n. 574, 28 de
outubro de 2011 (Regulamento de Gestão da Qualidade do Serviço de
Comunicação Multimídia (RGQ-SCM).

O atual Regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia (Anexo I


à Resolução Anatel n. 614/2013), define o conceito de Serviço de
Comunicação Multimídia (SCM):

Art. 3º O SCM é um serviço fixo de telecomunicações de interesse coletivo,


prestado em âmbito nacional e internacional, no regime privado, que possibilita a
oferta de capacidade de transmissão, emissão e recepção de informações
multimídia, permitindo inclusive o provimento de conexão à internet, utilizando
quaisquer meios, a Assinantes dentro de uma Área de Prestação de Serviço.
§ 1º A prestação do SCM não admite a transmissão, emissão e recepção de
informações de qualquer natureza que possam configurar a prestação de serviços de
radiodifusão, de televisão por assinatura ou de acesso condicionado, assim como o
fornecimento de sinais de vídeos e áudio, de forma irrestrita e simultânea, para os
Assinantes, na forma e condições previstas na regulamentação desses serviços.
§ 2º Na prestação do SCM não é permitida a oferta de serviço com as
características do Serviço Telefônico Fixo Comutado destinado ao uso do público
em geral (STFC), em especial o encaminhamento de tráfego telefônico por meio da
rede de SCM simultaneamente originado e terminado nas redes do STFC.

738
§ 3º Na prestação do SCM é permitida a implementação da função de
mobilidade restrita nas condições previstas na regulamentação específica de uso de
radiofrequência.

O fato de a prestadora de SCM poder prestar serviço de provimento à


internet (caput do art. 3º) não quer dizer que o conceito de serviço de
comunicação abranja, a partir de então, o de SVA, mas apenas que tal
prestadora pode prestar tanto serviço de comunicação quanto serviço de
valor adicionado530.

O § 1º do supracitado artigo 3º também marca a diferenciação entre o


SCM e TV por Assinatura e Serviço de Acesso Condicionado, pois a
transmissão de sinais de áudio e vídeo pela prestadora de SCM somente
pode se dar de maneira eventual, mediante contrato ou pagamento por
evento, como no caso do sistema “pay per view”531.

Como o SCM não pode ser prestado de forma aberta a todos, mas
somente para assinantes, também não se confunde com o serviço de
radiodifusão, dado que a radiodifusão é um serviço aberto a todos,
independentemente de contratação532.

Dada a sua característica de serviço de comunicação, corroborada pela


existência de ampla legislação regulatória, requerendo inclusive
autorização para funcionamento, não se caracteriza como Serviço de Valor
Adicionado, o qual não requer autorização, concessão ou permissão para
funcionamento.

Em síntese, o conceito constitucional de serviço de comunicação


coincide com o de telecomunicação, abrangidos aí a telefonia, o rádio, a
televisão e a TV por assinatura, sendo esses serviços regulados pela
ANATEL, sob a égide: (i) da Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011
(serviço de acesso condicionado); (ii) da Lei n. 9.472/97 (Lei Geral de

739
Telecomunicações); e (iii) da Lei n. 4.117/62 (serviços de radiodifusão
sonora e de sons e imagens).

Se há alguma elasticidade semântica (sem alteração do texto


constitucional) do conceito de serviço de comunicação que possa ser feita,
ela não passa dos limites do conceito de telecomunicação, em que a
radiodifusão sonora e a de sons e imagens são espécies, não alcançando,
portanto, os serviços prestados por intermédio da internet, como veremos
adiante.

4. SERVIÇOS OVER THE TOP (OTT)

A expressão Over The Top (OTT), originalmente, veio como jargão do


setor de TV via internet, porque, visualmente, seu decodificador tinha a
aparência de uma caixinha que quase sempre ficava em cima dos
televisores, sendo os serviços mais conhecidos no Brasil Netflix, iTunes e
YouTube, concorrendo diretamente com a TV por Assinatura533. Hoje o
conceito é outro.

O BEREC (Body of European Regulators for Electronic


Communications), grupo de reguladores de Telecom da Europa, no
documento intitulado Report on OTT Services534 divulgado em fevereiro de
2016, propõe uma definição do conceito de serviço OTT, qual seja, um
“conteúdo, serviço ou aplicação que é provido para o usuário final da
Internet pública”. Incluindo nessa definição que o que é provido pode ser
também conteúdo, serviço ou aplicação, significa que qualquer coisa
provida na internet pública é um serviço OTT. Afirma o documento, ainda,
que esse provimento geralmente ocorre sem o envolvimento do provedor
de acesso à internet no controle ou distribuição do serviço535.

740
Nesse sentido, exemplos de serviços OTT seriam: serviços de voz
providos na internet, conteúdo baseado na Web (sites de notícias, mídia
social etc.), ferramentas de busca, serviços de hospedagem, serviços de e-
mail, serviços de mensageria instantânea, conteúdo de vídeo e multimídia
etc.536.

Geralmente, os serviços OTT são prestados por companhias focadas na


produção do conteúdo veiculado, e não no provimento de acesso à internet.

Recentemente, a ANATEL tem se posicionado no sentido de que só irá


interferir no relacionamento entre as empresas de internet que prestam
Serviço OTT e as empresas de Telecom quando for chamada ou na análise
caso a caso, apesar de defender que se deve utilizar a taxonomia adotada
pelo BEREC537.

O documento do BEREC lista quatro implicações dessa definição de


serviço OTT. Primeira: os serviços OTT referem-se a conteúdo que
usualmente se origina de uma terceira parte (o provedor de OTT), não
sendo oferecido pelo provedor de acesso à internet ao qual o usuário final
está conectado. Isso não impede que o provedor de acesso à internet
ofereça seu próprio serviço OTT ou faça parcerias com provedores de
serviços OTT538.

Segunda implicação: refere-se ao modo de entrega do serviço e, dessa


forma, não diz nada sobre a natureza do serviço em si.

Terceira implicação: o conceito de Serviço OTT não impede que tais


serviços sejam qualificados como de comunicação eletrônica, o que
aconteceria, por exemplo, num serviço de VoIP que se iniciasse ou

741
terminasse no Serviço de Telefonia Pública (PATS – Publicly Available
Telephone Service).

Quarta implicação: alguns Serviços OTT podem potencialmente


competir com serviços de comunicação eletrônica (ECS) (como serviços
de voz OTT e serviços de e-mails, enquanto outros, não (como Uber e
Airbnb).

Propõe o BEREC também uma taxonomia dos Serviços OTT tendo


como critérios se o serviço OTT “se qualifica como um ECS” ou “se
potencialmente compete com ECS”. A definição do conceito de ECS
(Electronic Communications Service), por sua vez, adveio da Diretiva
2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho539, conforme transcrito
a seguir:

“‘Serviço de comunicações eletrônicas’, o serviço oferecido em geral mediante


remuneração, que consiste total ou principalmente no envio de sinais através de
redes de comunicações eletrônicas, incluindo os serviços de telecomunicações e os
serviços de transmissão em redes utilizadas para a radiodifusão, excluindo os
serviços que prestem ou exerçam controlo editorial sobre conteúdos transmitidos
através de redes e serviços de comunicações eletrônicas; excluem-se igualmente os
serviços da sociedade da informação, tal como definidos no artigo 1º da Diretiva
98/34/CE que não consistam total ou principalmente no envio de sinais através de
redes de comunicações eletrônicas”.

Essa taxonomia classifica os Serviços OTT em OTT-0, OTT-1 e OTT-


2. Serviços OTT-0 seriam serviços de comunicação, enquanto serviços
OTT-1 e OTT-2 seriam outros serviços:

OTT-0: serviço OTT que se qualifica como um ECS (exemplos: OTT de voz
com possibilidade de fazer chamadas para PATS);
OTT-1: serviço OTT que não é um ECS mas potencialmente compete com um
ECS (OTT de voz e mensageria instantânea);
OTT-2: outros serviços OTT (exemplo: comércio eletrônico, streaming de vídeo
e de áudio).

742
Acompanhando o conceito proposto pelo BEREC, entendemos que os
streamings de áudio e de vídeo não são serviços de comunicação, para fins
de incidência do ICMS, até porque estão no conceito legal nacional de
Serviço de Valor Adicionado e, ainda, no Serviço de Valor Adicionado
que não concorre com o setor de telefonia.

A seguir, discorremos sobre alguns serviços OTT.

4.1. O que é o Serviço de Streaming?

Streaming é uma tecnologia de transmissão de áudio e/ou vídeo pela


internet, a qual permite que a transmissão de áudio e vídeo seja realizada
sem a necessidade de se fazer o download de todo o conteúdo a ser
transmitido antes de se ouvir a música ou assistir ao vídeo540. Trata-se de
um Serviço OTT.

A transmissão do conteúdo é feita de modo contínuo, enquanto a pessoa


está ouvindo/assistindo. Usa-se, assim, um sistema de buffer541, havendo
armazenamento do conteúdo aos poucos e a transmissão, sua reprodução,
para quem está ouvindo/assistindo, conseguindo-se assim equilibrar o
download do conteúdo e a exibição dele, por exemplo, para que todo o
conteúdo seja exibido sem cortes, seja ele streaming de áudio ou streaming
de vídeo.

O player (uma aplicação que executa o áudio ou vídeo) do dispositivo


(personal computer, smartphone, tablete etc.) do usuário do serviço de
streaming inicia a execução do arquivo de música ou vídeo, mas continua
coletando os pacotes de arquivo, que vão sendo baixados pelo streaming
(pacotes de reserva). Assim, ainda que haja eventuais pequenos atrasos na
obtenção de pacotes, o conteúdo é visualizado de forma contínua, sem
atrasos, dada a capacidade de o player interpretar o fluxo de arquivos.

743
4.1.1. Tipos e Exemplos de Serviços de Streaming

Há os serviços de streaming de vídeo gratuitos (em regra, remunerados


por anúncios), os atrelados ou empacotados (relacionados a canais de TV
por assinatura) e os pagos (por assinatura). Seguem alguns exemplos no
mercado.

Gratuitos: Crackle542 (de filmes gratuitos, com anúncios); Viki543 (com


enfoque em filmes de produção asiática; também na versão por assinatura);
TED544 (Technology; Entertainment; Design).

Atrelados: Sony Play545; TNT Go546; Fox Play547; HBO Go548.

Também oferecidos como grande novidade bundled são os serviços de


streaming de áudio Spotify e de vídeo Hulu (concorrente do Netflix)
oferecidos num pacote (Spotify Premium for Students, now with Hulu)549.

Pagos: Netflix550; Looke551 (plataforma brasileira concorrente do Netflix,


antigo NetMovies, que entregava DVDs em casa); Amazon Prime
Vídeo552; Oldflix553 (de filmes clássicos retrô de cinema e TV); Spotify554;
iTunes Store555; Deezer556.

4.1.2. Televisão por Protocolo de Internet (IPTV – Internet Protocol TV)

A IPTV utiliza uma tecnologia que permite a transmissão de sinais de


TV via internet, ou seja, via protocolo IP, mas tecnicamente funciona
também como um streaming.

O grande diferencial de uma IPTV em relação a um canal de TV que se


pode simplesmente assistir ao vivo pelo navegador de internet (WebTV) é
que, no caso da IPTV, o sinal da TV via internet é distribuído em redes

744
próprias, enquanto numa WebTV a distribuição do sinal se dá na vastidão
da internet.

Esse diferencial, de ter uma rede dedicada ao seu stream de vídeo,


garante à IPTV mais performance e entrega de imagem e som de alta
qualidade, enquanto na WebTV o sinal está sujeito a oscilações, variações
de velocidade da rede, travamentos e sobrecargas no site.

A IPTV é uma alternativa à TV por Assinatura pois permite consumo


sob demanda, em que se assiste ao que se deseja na hora em que se quer,
inclusive com a possibilidade de gravar programas para ver
posteriormente. Garante-se, assim, aos usuários da IPTV não apenas
qualidade de som e imagem, mas também recursos extras em
interatividade.

Ao contrário da WebTV, na IPTV não há a necessidade de um


computador para funcionar. A IPTV está associada ao consumo
principalmente em aparelhos de TV e set-top-boxes, embora seja possível
acessar sinais de TV do tipo em computadores e outros aparelhos com
software de IPTV. Alguns aplicativos de IPTV conhecidos são Kodi
(XBMC), Ace Stream, Wiseplay e Perfect Player557.

A principal diferença entre a IPTV e os serviços de streaming é que,


nestes últimos não há uso de um canal dedicado, sendo baseados em
plataformas multiuso, como computadores, SmartTVs, videogames,
celulares, tablets etc. Assim, a qualidade de imagem e áudio dos serviços
de streaming depende da rede à qual eles estão conectados.

Os custos com infraestrutura dos serviços de streaming em geral são


muito baixos, usando-se, muitas vezes, um sistema totalmente on-demand.

745
Além do baixo custo, apresentam grande versatilidade. Mas uma
dificuldade é a falta de garantia de qualidade de imagem e áudio que é
encontrada na TV.

A IPTV não é de um Serviço de Comunicação Multimídia (SCM), pois


não oferece uma grade linear (como as TVs por Assinatura), e sim vídeo
sob demanda, enquadrando-se sim como um Serviço de Valor Adicionado,
não podendo, nesse âmbito, estarem submetidas às regras da ANATEL558.

4.1.3. As Receitas das Empresas de Streaming

As empresas de streaming remuneram-se, em regra, das seguintes


formas: (i) por assinatura; (ii) transacional, podendo ser (ii.1) por tempo
limitado (aluguel ou rental); ou (ii.2) ilimitado (eletronic sell-through –
EST ou download to own – DTO); e (iii) por publicidade.

O modelo por assinatura (subscription video on demand – SVoD, no


caso de streaming de vídeos) é aquele em que o provedor cobra um valor
fixo e periódico do usuário, independentemente da quantidade de acessos
que este fizer ao conteúdo do catálogo.

No modelo transacional, o usuário paga pela fruição de um conteúdo


específico por tempo limitado ou ilimitado. No ilimitado, eletronic sell-
through (EST) ou download to own (DTO), o consumidor paga um valor
único para fazer o download do arquivo de mídia para salvar no disco
rígido. Mas o conceito desse modelo cada vez mais abrange a
possibilidade de o conteúdo ser usável somente por determinado período
de tempo, ou também não ser usável em plataforma concorrente559.

No modelo por publicidade (ad-suported), o provedor se financia, não


dos usuários do conteúdo que ele fornece, mas sim por meio de anúncios

746
publicitários na plataforma. Nesse caso, o prestador do serviço de
streaming se remunera de outro serviço, do serviço de inserção de
propaganda e publicidade, que ele presta para os anunciantes.

A composição dessa receita pode também ser mista, combinando-se os


modelos acima citados. Por exemplo, parte da receita advinda de
publicidade e parte de assinaturas.

5. PAPEL DA LEI COMPLEMENTAR TRIBUTÁRIA (ART. 146 DA


CONSTITUIÇÃO FEDERAL) A FIM DE PREVENIR O CONFLITO
ENTRE SERVIÇO DE QUALQUER NATUREZA E O SERVIÇO DE
560
COMUNICAÇÃO

A lei complementar tributária prevista no artigo 146 da Constituição


Federal de 1988 se veste como lei complementar nacional, pois ali se
apresenta sempre como reguladora de normas aplicáveis aos três entes da
Federação, indistintamente.

Dispõe o artigo 146, no que interessa à presente análise:

Art. 146. Cabe à lei complementar:


I – dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária,
especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos
discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de
cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;
(...).

No que interessa ao presente trabalho, a referida lei complementar


apresenta basicamente a função de estabelecer normas gerais:

i) para prevenir conflitos de competência em matéria tributária, entre a União,


os Estados, o Distrito Federal e os Municípios (art. 146, I); e

747
ii) para definir fato gerador dos impostos previstos na Constituição (art. 146, III,
“a”).

Tal entendimento se coaduna com o que Tércio Sampaio Ferraz Junior


chama de Federalismo Cooperativo, em que prevalece a colaboração dos
entes federativos, conferindo-se menor força à separação e independência
recíproca entre eles, com a principal finalidade de uniformizar as normas
gerais, que ele define como toda matéria que extravase o interesse
circunscrito de uma unidade da Federação, seja porque é comum (na
medida em que todos os entes têm o mesmo interesse) seja porque envolve
conceituações que, acaso particularizadas num âmbito autônomo,
acarretariam conflitos ou dificuldades no intercâmbio nacional561.

Quanto à alínea “a” do inciso III do artigo 146, não é possível aceitar a
sua literalidade na construção das normas jurídicas referentes ao
dispositivo. Se assim fosse, haveria certa antinomia jurídica, dado que os
fatos geradores dos impostos previstos na Constituição de 1988 já estão, de
certa forma, ainda que de maneira genérica (mais as suas materialidades),
previstos nos artigos 153 (competência da União), 155 (competência dos
Estados e do Distrito Federal) e 156 (competência dos Municípios). Nesse
sentido, Paulo de Barros Carvalho nos ensina:

Eis aí o aplicador do direito novamente atônito! Pensará: como é excêntrico o


legislador da Constituição! Demora-se por delinear, pleno de cuidados, as faixas de
competência da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e, de
entremeio, torna tudo aquilo supérfluo, na medida em que põe nas mãos do
legislador complementar a iniciativa de regrar os mesmos assuntos, fazendo-o pelo
gênero ou por algumas espécies que lhe aprouve consignar, esquecendo-se de que
as eleitas, como as demais espécies, estão contidas no conjunto que representa o
562
gênero .

De fato, qual sentido haveria em os Estados, o Distrito Federal e os


Municípios ficarem à mercê de uma lei complementar, por mais que se
rotulasse como nacional, para poderem exercer suas respectivas

748
competências tributárias, as quais foram outorgadas diretamente pela
Constituição563? Como ensina Misabel Abreu Machado Derzi:

O federalismo integrativo, já por si centralizador, não pode sufocar, de forma


nenhuma, a autonomia e a descentralização, enfim, a dissimetria a que se refere
Pontes de Miranda, sob pena de converter-se o país em verdadeira unidade
564
política .

Assim, o texto disposto no artigo 146, III, “a”, da Constituição Federal,


quando sopesado com o texto constitucional na sua integralidade, não só
na forma como foi tecida a repartição de competências tributárias mas
também com os princípios da Federação e da autonomia dos Municípios,
esmaece-se em sua força literal ensejando a construção de uma proposição
normativa pela qual só é possível admitir à lei complementar definir fato
gerador, base de cálculo e contribuinte dos impostos discriminados na
Constituição (art. 146, III, “a”) quando tal definição se prestar a prevenir
conflitos de competência tributária entre os entes da Federação (art. 146,
I), ou para regular limitações constitucionais ao poder de tributar (art. 146,
II).

Uma valoração mais forte que essa para as normas gerais do artigo 146,
III, “a”, mais próxima da literalidade do enunciado, feriria de morte a
autonomia dos Estados e Municípios ao ficarem sobremaneira dependentes
da lei complementar para poderem instituir seus impostos, quebrando a
harmonia do Sistema Tributário Nacional565.

Portanto o enunciado do artigo 146, III, “a”, não se apresenta como


nexo material fundante da validade das leis federais, estaduais e
municipais instituidoras dos seus respectivos impostos566, mas tem tão
somente a função de, em conjunto com o disposto no artigo 146, I, da
CF/88, ser fundamento de validade para a criação de lei complementar
tributária que previna conflito de competência tributária.

749
Alguns doutrinadores567 entendem ser efetivamente impossível existir
conflitos de competência, havendo, sim, não mais que aparentes conflitos
de competência. Roque Antonio Carrazza, por exemplo, afirma que “(...)
no plano lógico-jurídico, não há qualquer possibilidade de surgirem
conflitos de competência tributária entre a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios”568.

Isso depende do prisma sob o qual se observa. É claro que se falamos


como aplicadores do direito (juízes, por exemplo), de situação de
complexa análise jurídica sobre se determinado fato da vida se enquadra
na hipótese de incidência de um imposto ou na de outro, mas já
concluímos a atividade interpretativa decidindo a questão, para nós não
haverá mais conflito de competência algum para o caso, pois nossa decisão
interpretativa encerrou este conflito.

Mas não é disso que falamos quando afirmamos que existem potenciais
conflitos de competência tributária. A ideia do conflito de competência
surge quando o constituinte, em que pese ter constituído muitos
enunciados vertidos em texto constitucional sobre as hipóteses de
incidências tributárias dos impostos, reconhece que esse texto não é
suficiente – ainda que após laborioso e esforçado percurso gerador de
sentido569 das normas constitucionais – para sanar todas as legítimas
dúvidas que surgem sobre competência tributária. E essa ideia foi inclusive
positivada pelo constituinte por meio do artigo 146, I, da Constituição,
quando expressamente diz que cabe à lei complementar “dispor sobre
conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados,
o Distrito Federal e os Municípios”570.

750
Assim, a ideia aqui posta, de existência de potenciais conflitos de
competência, está no plano da norma geral e abstrata, e não no plano da
aplicação dessa norma571.

Voltando à alínea “a” do inciso III do artigo 146, temos que atentar que
a expressão “fato gerador” é uma expressão ambígua, a qual pode se
referir tanto ao que podemos chamar de fato gerador in abstracto (o
previsto hipoteticamente em lei, denominado hipótese de incidência
tributária por Paulo de Barros Carvalho572), quanto ao fato gerador in
concreto (o detectado como fato da vida, ocorrido em determinado
momento e local, cuja subsunção à norma – hipótese de incidência
tributária – consubstancia a incidência tributária).

Pois bem, quando o artigo 146, III, “a”, da CF/88 diz que cabe à lei
complementar definir fatos geradores, para prevenir conflitos de
competência (aqui já o combinando com o inciso I do mesmo artigo),
considerando-se que esses fatos geradores são as hipóteses de incidência
tributária; e que estas, por sua vez, são compostas por três critérios: (i)
critério material; (ii) critério espacial; e (iii) critério temporal, podemos
inferir que, se uma lei complementar estiver definindo critério material do
ISS com a finalidade de prevenir conflitos de competência tributária, desde
que trabalhando na região de penumbra, na fronteira entre os dois
conceitos constitucionais imprecisos, estará assim cumprindo justamente o
papel que a Constituição lhe conferiu, já que o critério material é parte do
todo, hipótese de incidência tributária.

Esse mecanismo, de a lei complementar trabalhar como definidora da


fronteira conceitual entre serviço de qualquer natureza e serviço de
comunicação (caso do presente estudo), é fundamental para a garantia do
Pacto Federativo e segurança jurídica do sistema na medida em que as

751
realidades da vida, quando se fala nessas duas materialidades, não
apresentam limites tão precisos entre si.

Exemplo claro dessa realidade é justamente o tema objeto do presente


trabalho: o serviço de valor adicionado, conforme regulado pelo
ordenamento, não se confundindo com serviço de telecomunicação, que,
como expusemos aqui, é sinônimo de serviço de comunicação para fins de
incidência do ICMS.

Desta forma, nesse caso, a definição estipulativa trazida pela Lei


Complementar n. 157, de 2016, com a inclusão do subitem 1.09 à Lista
Anexa de Serviços da Lei Complementar n. 116, de 2003, deve ser
inteiramente respeitada. Primeiro, porque a própria Constituição Federal
lhe conferiu essa competência; e segundo porque, como no presente caso,
a lei complementar trabalhou dentro de região de penumbra (insista-se,
desenhada pelo atual regime jurídico do setor). Querer desconsiderar a
definição por ela estabelecida para substituí-la por uma interpretação
puramente constitucional que ignore o papel do artigo 146 da própria
Constituição trará cada vez mais insegurança jurídica para o setor.

6. CONCLUSÕES

O conceito constitucional de serviço de comunicação, para fins de


incidência do ICMS, coincide com o dos serviços de telecomunicações,
abrangidos nestes os serviços de telefonia, de rádio (radiodifusão sonora),
de televisão (radiodifusão de sons e imagens) e de TV por assinatura, mas
não os Serviços de Valor Adicionado (SVA), que apresentam grande
similaridade com os serviços denominados OTT, serviços Over The Top.

Entre os serviços OTT encontram-se os serviços de streaming de áudio


e de vídeo, que se apresentam numa tecnologia de transmissão de áudio

752
e/ou vídeo pela internet, a qual permite que essa transmissão seja realizada
sem a necessidade de se fazer o download de todo o conteúdo a ser
transmitido antes de se ouvir a música ou assistir ao vídeo.

Além de a Constituição de 1988 ter incorporado os elementos do


conceito de comunicação acima expostos, incorporou, também, como
universo diverso, o conceito de serviços informáticos, que estão
intrinsecamente ligados aos Serviços de Valor Adicionado, ou seja, como
serviços distintos daqueles de comunicação.

E corroborando esse entendimento, dada a dificuldade de segregação


conceitual, à luz da tendência de convergência digital, a Lei Complementar
n. 116/2003, no cumprimento de seu papel de prevenir conflitos de
competência tributária (art. 146, I, c/c seu inciso III, “a”, da CF/88), previu
a incidência, pelo ISS, do serviço de streaming de áudio e vídeo no
subitem 1.09 da sua lista de serviços, com a alteração trazida pela Lei
Complementar n. 157, de 29 de dezembro de 2016.

753
O alcance da imunidade tributária sobre os
livros digitais e seus acessórios
573 574
Marcos Neder e Luciane Pimentel

1. INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 (CF/88) regulamenta as relações


tributárias entre o Fisco e o cidadão (seja pessoa física ou pessoa jurídica)
com relação à tributação de livros, jornais e periódicos, delimitando o
campo tributável colocado à disposição dos entes tributantes.

Toda interpretação do direito legislado, segundo afirma Alf Ross,


começa com um texto, isto é, com uma forma linguística escrita575. No
presente caso, o artigo 150, III, “d”, da CF/88 é bastante claro: «é vedado
instituir impostos sobre: (...) d) livros, jornais, periódicos e o papel
destinado a sua impressão». Ocorre que o vocábulo “livro” é vago. Há um
sentido convencional (de papel, impresso, encadernado e com capa) e um
segundo sentido que, por estar dentro do círculo de denotação possível da
palavra «livro», inclui livro eletrônico e seus acessórios.

Há quem sustente576 que tais inovações tecnológicas na área de ensino


vão ao encontro da finalidade almejada pela norma constitucional de
proteger valores relevantes para nossa sociedade, como a liberdade de
pensamento, de imprensa, do direito de crítica, estimulando a cultura, o
acesso à informação e a educação.

O manuseio de material didático por meio de mídias eletrônicas é um


fato relativamente recente. Em decorrência dos avanços na área
tecnológica, o compartilhamento de textos didáticos, que antes era feito

754
apenas em papel, passou a ser possível por meio de formas muito mais
eficientes tanto do ponto de vista da aprendizagem como na perspectiva do
acesso à informação.

A transmissão eletrônica dos dados das empresas para os usuários das


diversas esferas e vice-versa tornou-se uma realidade, beneficiando não só
as empresas do segmento de produção literária, mas também os próprios
usuários, que se favorecem da redução de custos dispendidos com a
edição, a transmissão e o armazenamento do material didático.
Paulatinamente, o mundo da avançada tecnologia demonstrou ser um
ambiente receptivo a melhorias no relacionamento entre autores e seu
público de leitores, complementando as técnicas e ferramentas tradicionais
disponíveis para a troca de informações. Num futuro próximo, essa
evolução sinaliza para a redução da quantidade de obras impressas que
hoje são disponibilizadas em meio físico ao público.

Nesse contexto, os operadores do direito passaram a se defrontar com


uma nova realidade que não estava presente quando o texto constitucional
foi concebido, em 1988. Como essa imunidade é objetiva, resta clara a
necessidade de se equacionarem novas questões que surgiram na
comunidade jurídica pátria com relação à interpretação do texto
constitucional.

Em 8 de março de 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF), no


julgamento conjunto dos Recursos Extraordinários n. 330.817/RJ577
(imunidade sobre E-Books e os suportes exclusivamente utilizados para
fixá-los) e n. 595.676578 (imunidade a bens e materiais eletrônicos que
cumprem função didática e informativa em auxílio aos livros e periódicos
impressos em papel), estendeu a referida imunidade para os livros
eletrônicos e os suportes próprios para sua leitura.

755
Este artigo busca justamente examinar a conotação e a denotação do
vocábulo “livro”, disposto no artigo 150, III, “d”, da CF/88, determinando
o sentido e o alcance dessa imunidade tributária, bem como busca
equacionar sua aplicação aos acessórios que compõem o material didático
eletrônico, a exemplo de aplicativos e de elementos que auxiliem a leitura
digital.

2. SOBRE A INTERPRETAÇÃO DAS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS

O conceito de imunidade não é pacífico na doutrina. Alguns autores,


como Amílcar de Araújo Falcão579 e José Souto Maior Borges580, entendem
que a imunidade é uma providência constitucional que impede a incidência
tributária, ou seja, seria uma hipótese de não incidência
constitucionalmente qualificada581. Já Luciano Amaro582 e Aliomar
Baleeiro583 consideram-na como exclusão do próprio poder de tributar ou
supressão da competência impositiva584. Paulo de Barros Carvalho585,
Roque Antonio Carraza586 e Fabiana Del Padre Tomé587, de forma diversa,
acreditam que são normas jurídicas, contidas no texto constitucional, que
demarcam, em sentido negativo, as competências tributárias das pessoas
políticas.

No presente trabalho, será adotado este último posicionamento, no


sentido de que as regras de imunidades são as que determinam a
incompetência das pessoas jurídicas de instituir tributos. Então, a
imunidade não exclui nem limita a competência tributária, pois ela é uma
norma que, conjugada com as demais, traça a competência tributária
constitucionalmente desejada. Elas são normas de estrutura, pois dispõem
sobre a produção, a modificação e a extinção de outras normas do
ordenamento jurídico.

756
As normas jurídicas, por serem objeto do mundo da cultura, estão
sempre impregnadas de valor, que variam de intensidade de norma para
norma. Tais valores podem ser encontrados de forma independente das
estruturas normativas, ou assentados em regra de forte hierarquia, como
limites objetivos. De modo que os valores sempre serão subjetivos,
cabendo ao intérprete graduá-los de acordo com suas ideologias. Já os
limites objetivos são regras objetivas que visam atingir certos fins, realizar
valores de forma indireta, sendo, portanto, ao contrário dos valores, de
fácil verificação.

Nesse contexto, pode-se concluir que as imunidades representam limite


objetivos, pois trazem um valor como um fim a ser alcançado, ou seja,
buscam a realização de princípios que a inspiram, tal como salienta Roque
Antonio Carraza588:

(...) a maioria das imunidades contempladas na Constituição é uma decorrência


natural dos grandes princípios constitucionais tributários, que limitam a ação estatal
de exigir tributos (igualdade, capacidade contributiva, livre difusão da cultura e do
pensamento, proteção à educação, amparo aos desvalidos etc.).

As imunidades existem para assegurar princípios fundamentais, de


modo que não devem ser interpretadas restritivamente, e sim de forma
ampla, considerando o contexto em que se encontram inseridas e a
finalidade que se busca atingir. Nesse mesmo sentido, Roque Antonio
Carraza entende que o bem jurídico tutelado pela imunidade tributária
deve ser interpretado de forma extensiva:

Além disso, a consagração, pelo texto Constitucional, de imunidades tributárias,


é invariavelmente a consequência lógica de um direito fundamental. Assim, para
salvaguardá-lo, pedem interpretação extensiva.

O próprio Poder Judiciário já tem se manifestado no sentido de atribuir


à norma imunizante um sentido amplo, de modo a assegurar os princípios

757
constitucionais que as justificam. É o que se pode verificar no voto do
Desembargador Federal Johonsom di Salvo, na Apelação Cível n.
0023707-30.2008.403.6100/SP589, ao tratar da imunidade tributária de
álbum de figurinhas (cromos):

A imunidade prevista no art. 150, VI, “d”, da Constituição Federal alcança


também os cromos adesivos, figurinhas ou “cards” integrantes dos livros ilustrados
por interpretação extensiva da imunidade tributária prevista no texto constitucional,
pois estes proporcionam o acesso à educação, à informação e à cultura, frisando-se
que a disposição constitucional expressa, não diferencia a qualidade do livro e não
estabelece condição ou restrição ao seu gozo.

Em outro trecho, explica o magistrado que:

interpretar restritivamente o artigo 150, VI, “d” da Constituição Federal, atendo-


se à mera literalidade do texto e olvidando-se da evolução do contexto social em
que ela se insere, implicaria inequívoca negativa de vigência ao comando
constitucional. In casu, a melhor opção ao intérprete é a interpretação teleológica,
buscando aferir a real finalidade da norma, de molde a conferir-lhe a máxima
efetividade, privilegiando, assim, aqueles valores implicitamente contemplados pelo
constituinte.

O Ministro Dias Toffoli, no julgamento do Recurso Extraordinário n.


385.091-DF590, esclarecendo a diferença entre a isenção e a imunidade,
dispôs que a imunidade deve ser interpretada de forma extensiva, ao
contrário da isenção, que deve ser restritiva:

A imunidade é uma garantia constitucional outorgada pela Carta Política que


impede o exercício da competência legislativa. A isenção é um favor fiscal
concedido pelo legislador ordinário. No caso da imunidade de que se trata, esta
Corte tem conferido interpretação extensiva nos diversos precedentes em que se
discute a compreensão do que seja o patrimônio, a renda e os serviços relacionados
com as finalidades essenciais das entidades contempladas no texto constitucional,
ao passo que tem interpretado restritivamente as normas de isenção.

Nesse mesmo sentido, a Segunda Turma do STF, em voto da Ministra


Ellen Gracie591, decidiu que a imunidade tributária sobre livros, jornais,
periódicos e o papel destinado à impressão dessas publicações tem por

758
finalidade evitar embaraços ao exercício da liberdade de expressão
intelectual, artística, científica e de comunicação, consagrada no inciso IX,
do artigo 5º, da CF/88, além de facilitar o acesso da população à cultura, à
informação e à educação, com a redução do preço final de tais produtos.

Dessa forma, tanto a doutrina como a jurisprudência estão alinhadas na


interpretação ampla dos enunciados prescritivos que tratam de imunidade
tributária. No caso da imunidade sobre livros, jornais, periódicos e o papel
destinado a sua impressão, o valor a ser protegido é a liberdade de
pensamento, de imprensa, do direito de crítica, de difusão da cultura, o
acesso à informação e à educação.

3. O ALCANCE DA IMUNIDADE DE LIVROS ELETRÔNICOS (E-


BOOKS)

No que se refere à delimitação da extensão da imunidade conferida aos


livros, é importante destacar que o STF vinha negando a aplicação da
imunidade aos insumos necessários à produção de livros, pois entendia que
estes não estavam compreendidos dentro do significado real da expressão
“papel destinado à sua impressão”592. A imunidade era interpretada de
maneira literal para atingir apenas os materiais similares ao papel, quais
sejam os filmes e os papéis fotográficos593.

Não obstante a não competência dos entes federativos para instituir


impostos sobre os referidos produtos, sua extensão sempre foi campo de
grande controvérsia nos diversos tribunais, mormente em razão do grande
avanço tecnológico que alterou significativamente os hábitos de difusão de
conhecimento e informações, sendo em grande parte realizados por meios
eletrônicos.

759
No STF, havia um debate sobre se os livros eletrônicos (e-books)
estariam compreendidos no conceito de “livro” e, dessa forma, poderiam
usufruir a imunidade tributária. A primeira corrente, utilizando o método
de interpretação literal, defendia que a imunidade alcançava somente
aquilo que podia ser compreendido dentro da expressão “livros, jornais,
periódicos e o papel destinado a sua impressão”. Neste sentido, tem-se a
decisão monocrática proferida pelo Ministro Eros Grau no julgamento do
Recurso Extraordinário n. 282.387/RJ594, em que se debatia a imunidade
dos impostos incidentes sobre a importação de CD-ROMs que
acompanham livros técnicos de informática:

A imunidade prevista no art. 150, VI, “d”, da Constituição, está restrita apenas
ao papel ou aos materiais a ele assemelhados, que se destinem à impressão de
livros, jornais e periódicos.

Num sentido contrário, os Ministros Marco Aurélio, Ayres Britto e


Cármem Lúcia595, numa interpretação teleológica, defendiam que o espírito
da Constituição é no sentido de favorecer a leitura de livros, jornais e
periódicos. Se o aparato tiver essa destinação, ele estará abrangido pela
imunidade. A imunidade deve ser interpretada de modo lato, segundo o
Min. Carlos Ayres Britto; ela tem base nos direitos fundamentais,
notadamente aqueles relacionados à liberdade de pensamento e de
expressão:

Ou seja, o espírito da Constituição é esse mesmo, é favorecedor da leitura dos


livros, jornais e periódicos. Se essa peça sobressalente tem essa específica serventia,
isto é, a destinação, o fim, a impressão nessas três dimensões, ela está abrangida
pela imunidade. A imunidade deve ser interpretada de modo lato, porque
favorecedor exatamente dessa leitura de livros, jornais e periódicos.

A interpretação teleológica da norma imunizante é também utilizada


pelo Min. Celso Antônio Bandeira de Mello596, ao dispor que:

760
É preciso ter presente, na análise do tema em exame, que a garantia da
imunidade estabelecida pela Constituição republicana brasileira, em favor dos
livros, dos jornais, dos periódicos e do papel destinado à sua impressão (CF, artigo
15٠,VI, “d”), reveste-se de significativa importância de ordem política-jurídica,
destinada a preservar e a assegurar o próprio exercício das liberdades de livre
manifestação do pensamento e de informação jornalística, valores em função dos
quais essa prerrogativa de índole constitucional foi conferida, instituída e
assegurada.

Recentemente, o Plenário do STF, no julgamento dos Recursos


Extraordinários n. 330.817/RJ597 e n. 595.676598, adotou a interpretação
finalista, e estendeu a imunidade para os livros eletrônicos e os suportes
próprios para sua leitura.

O Ministro Dias Toffoli, em seu voto, defendeu que o objetivo dos


Constituintes era baratear os custos de produção do livro e permitir a
difusão da cultura, ideias e pensamentos599: “ou seja, o constituinte não
objetivou conferir um benefício a editoras ou a empresas jornalísticas, mas
sim imunizar o bem utilizado como veículo do pensamento, da
informação, da cultura e do conhecimento”600.

Usando a interpretação sistemática e finalística dos dispositivos


correlatos a esse tema, em função de seu papel na concretização do Estado
Democrático de Direito e outros princípios constitucionais, o Ministro
explica que:

De tudo até aqui exposto, importa notar que a Corte, seja na Carta Federal de
1969, seja na Constituição Federal de 1988, para considerar como imune
determinado bem (livro, jornal ou periódico) tem voltado o olhar para a finalidade
da norma, de modo a maximizar seu potencial de efetividade.
Assim o foi na decisão de se reconhecerem como imunes: a) as revistas técnicas,
em razão da importância de suas publicações e da grande circulação (RE n.
77.867/SP); b) a lista telefônica, por seu caráter informativo e sua utilidade pública
(RE n. 101.441/RS); c) as apostilas, por serem simplificações de livros e veicularem
mensagens de comunicação e de pensamento em contexto de cultura (RE n.
183.403/SP); d) os álbuns de figurinha, por estimular o público infantil a se
familiarizar com os meios de comunicação impressos (RE n. 221.239/SP); e) mapas
impressos e atlas geográfico, em razão de sua utilidade pública (RE n. 471.022/RS).

761
A contrario sensu, não foram reconhecidos como imunes os calendários, por não
serem veículos de transmissão de ideias (RE n. 87.633/SP).

Além disso, o Ministro Dias Toffoli, cujo voto foi seguido pelos demais
Ministros, deixou claro que a imunidade tem por objetivo a difusão da
informação e da cultura, sendo irrelevante o seu suporte físico.

4. SOBRE O ALCANCE DA IMUNIDADE AOS ACESSÓRIOS


(SOFTWARES EDUCATIVOS)

Sob o ponto de vista lógico, a ideia de “acessoriedade” implica vínculo


de dependência. Com efeito, o adjetivo “acessório”, segundo registra o
Dicionário Aurélio601, significa: “1) O que está junto a coisa principal; 2)
Circunstância acidental; 3) Peça que completa ou melhora o
funcionamento de algo; 4) Peça ou adorno que se acrescenta ao vestuário;
5) Que se junta ou incorpora por acessão; 6) Que se pode dispensar; 7)
Que não é muito importante”. Todo elemento acessório carece, pois, de
existência autônoma. É impossível pensar no acessório sem se reportar ao
seu principal.

No caso em análise, os acessórios são os elementos que completam ou


melhoram o funcionamento dos livros eletrônicos, como, por exemplo, os
aplicativos, o software. São elementos que integram o livro, sendo
indissociáveis para o reforço do aprendizado da matéria, para a
assimilação e a fixação do conteúdo. De modo que os acessórios seguem o
principal, tendo também por função a difusão da informação e da cultura
contidas no livro.

Nesse sentido, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região602 decidiu que


a imunidade deve ser analisada de forma finalística, devendo ser estendida
aos seus acessórios:

762
CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO – IMUNIDADE – livros, jornais,
periódicos e o papel destinado a sua impressão – ART. 150, VI, D, DA CRFB/88 –
EXTENSÃO AO MATERIAL DEMONSTRATIVO QUE ACOMPANHA OS
FASCÍCULOS PERIÓDICOS DE CUNHO EDUCATIVO. 1. O ponto
controvertido cinge-se à apreciação do direito à imunidade prevista no art. 150, VI,
d, da CRFB/88, de modo a possibilitar o afastamento da incidência de imposto
sobre peças para montagem e funcionamento de laboratório de eletrônica que
acompanham os fascículos educativos relativos a curso de eletrônica, objeto de
importação pela apelante. 2. O escopo da norma constitucional em exame é garantir
a liberdade de comunicação e de pensamento, e, também, incentivar a divulgação
do conhecimento e a disseminação da cultura. 3. In casu, observa-se que as peças
que acompanham os fascículos têm nítido propósito educativo, destinando-se a
viabilizar uma melhor aprendizagem do material teórico. 4. Desta forma, o texto
constitucional deve ser interpretado de maneira teleológica, de forma a incluir as
amostras do kit no conceito de livros e periódicos da regra imunizante, pois são
peças indissociáveis para o reforço do aprendizado da matéria, assimilação e
fixação do conteúdo. 5. Além disso, os fascículos de nada servem sem as peças que
os acompanham. Tanto é assim que as peças não são comercializadas
separadamente, mas sim em conjunto, e adquirem feições de meros acessórios.
Portanto, aplica-se a regra de que o acessório segue o principal, inclusive na
extensão da imunidade. 6. Apelação interposta pela empresa impetrante provida,
para determinar à autoridade impetrada que proceda ao desembaraço aduaneiro da
mercadoria, independentemente do recolhimento de qualquer imposto.

Da mesma forma, o Ministro Roberto Barroso603, em relação a software


educativo, se pronunciou no sentido de que esse também estaria
contemplado pela imunidade:

MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. ADMISSIBILIDADE


QUANDO HÁ O RISCO DE LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO E DE SANÇÕES
PELA AUTORIDADE IMPETRADA. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA.
SOFTWARES EDUCATIVOS. BENEFÍCIO QUE NÃO SE DESTINA AO
INSTRUMENTO, MAS A SEU CONTEÚDO. RECONHECIMENTO.
APLICAÇÃO DO ARTIGO 150, VI, d, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
RECURSOS IMPROVIDOS.
O acórdão está alinhado com o entendimento firmado por esta Corte no
julgamento do RE 330.817 (Tema 593 da sistemática da repercussão geral) no
sentido de que “A imunidade tributária constante do artigo 150, VI, d, da CF/88
aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes exclusivamente
utilizados para fixá-lo”.

Ademais, o Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo604, ao


analisar a questão, decidiu que a enciclopédia digital (Barsa Linguaphone),

763
incluindo os seus acessórios, também goza da referida imunidade:

O cerne da questão ora controvertida está em saber se a obra produzida pela


autuada “BARSA LlNGUAPHONE”, composta de 07 livros, 12 fitas cassetes de
áudio, 02 fitas de vídeos, 01 CD-Rom e 01 estojo de papel, cuja venda foi feita
como um todo e não de forma individualizada, são alcançadas pela imunidade
tributária prevista no artigo 150, inciso VI, “d”, da Constituição Federal.
(...)
Também nesse sentido. a lição do i. Df. José Eduardo Soares Mello dispõe que
os processos tecnológicos para a elaboração dos livros, jornais e periódicos são
totalmente irrelevantes, como é o caso de programas de computador (CD-Rom),
disquetes, fitas cassete e demais elementos de informática, que também se encaixam
no âmbito imunitório, uma vez que atendem às mesmas finalidades dos apontados
veículos de comunicação. Trata-se de novos instrumentos que também transmitem
ideias e conhecimentos e que, numa interpretação tecnológica, inserem-se na
mesma moldura cultural veiculada aos livros (MELO, José Eduardo Soares. Curso
de direito tributário. São Paulo: Dialética, 1997).
(...)
A assertiva do Julgador Tributário de que a palavra “livro” mencionada na letra
“d”, no inciso VI, do artigo 150 da Constituição federal, se refere exclusivamente ao
papel impresso, desprezando o formato eletrônico, é arcaica e ultrapassada,
distanciados da realidade.
Demonstrado que o material didático é empregado nas várias etapas do ensino
de língua estrangeira, evidentemente, goza da imunidade tributária, não tendo como
restringir o alcance da norma, pois os livros têm idêntica finalidade.
Restringir esse alcance contraria o objetivo do legislador constituinte, cujo
espírito está dirigido no sentido de permitir a mais ampla divulgação de ideias e de
liberdade de informação, empregada a expressão como meio de difusão da cultura e
educação.
(...)
Dessa forma, verificado que o preceito constitucional que disciplina a imunidade
compreende todo tipo de livro e material didático, qualquer tentativa em contrário
constitui agressão ao texto maior, particularmente em face da própria sistemática do
ICMS que, admitido como tributável a obra produzida pela autuada “BARSA
LlNGUAPHONE”, estaria frustrando o alcance do mandamento constitucional.

O próprio STF, por meio do Recurso Extraordinário n. 595.676605, em


sede de repercussão geral, entendeu que a imunidade abrange também as
peças e os componentes a serem utilizados como material didático que
acompanhe as publicações:

O alcance da imunidade tributária, prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “d”,
da Constituição Federal, considerado o comércio de “bens e materiais eletrônicos”

764
que cumprem função didática e informativa em auxílio aos livros e periódicos
impressos em papel. Apenas os meios tradicionais de ensino e informação gozam da
imunidade ou os componentes eletrônicos, quando desempenham papel didático e
informativo complementar, em auxílio aos primeiros, também são abrangidos pela
norma constitucional? (Grifos nossos.)

Em seu voto, o Ministro Marco Aurélio se manifesta a favor da


extensão da imunidade para os acessórios, pois trata-se de elementos
indispensáveis ao conjunto didático, devendo ser considerados como parte
integrante do produto final:

Consoante assentado no acórdão recorrido, o Tribunal de origem concluiu pela


imunidade tributária relativa à aquisição, do exterior, de peças eletrônicas que
integram, juntamente com fascículos explicativos, material didático voltado ao
aprendizado de montagem de computadores. Julgou os aludidos elementos
indispensáveis à transmissão do conteúdo educacional, representando a dimensão
prática do curso, ao passo que os fascículos consubstanciam a parte teórica. Ante
essa premissa, entendeu estar-se diante de um conjunto integrado de cunho
educativo, de modo que a imunidade alcança o todo, inclusive os bens eletrônicos, a
despeito de não revestirem forma em papel.
(...)
Atua-se em sede excepcional à luz da moldura fática delineada pelo Tribunal de
origem, considerando-se as premissas constantes do acórdão impugnado. Há de se
realizar o enquadramento jurídico-constitucional relativo ao teor do próprio
pronunciamento atacado. É estreme de dúvidas, porquanto assentado na instância
soberana no exame dos elementos probatórios do processo, que a recorrida
comercializa publicações periódicas de cunho educativo – cursos de eletrônica –,
importando, para tal fim, os fascículos impressos e os elementos eletrônicos
discutidos. O Tribunal consignou que esses componentes não só acompanham o
material de ensino, mas o complementam, sendo utilizados para fins didáticos em
curso prático de montagem de computadores. Apontou haver uma unidade didática
envolvendo a parte teórica – os fascículos impressos – e a prática – os componentes
eletrônicos.
(...)
O acórdão não merece reparos. A extensão da imunidade tributária em favor
desses elementos justifica-se, a mais não poder, em razão de constituírem material
complementar ao conteúdo educativo. Não se trata de bens que possam ser
caracterizados como “brindes comerciais”, presentes apenas como forma de atrair a
aquisição do produto pelo público. Não são ornamentos. Representam,
inequivocamente, elementos indispensáveis ao conjunto didático, integrando o
produto final, acabado, voltado a veicular informações de cunho educativo atinentes
a cursos de montagem de computadores, comercializados pela recorrida. Fascículo
impresso e componentes eletrônicos são partes fisicamente distinguíveis, finalística

765
e funcionalmente unitárias. Tenho como atendido o pressuposto básico da
imunidade de que cuida a alínea “d” do inciso VI do artigo 150 da Carta da
República. (Grifos nossos.)

Verifica-se, portanto, que a interpretação dos Tribunais Superiores tem


estendido o alcance da imunidade dos livros aos seus acessórios, visto que
estes são elementos indispensáveis ao conjunto didático, integrando o
produto final, e que se voltam a veicular informações. Seriam, no dizer do
Ministro Marco Aurélio, mera manifestação prática do curso teórico
englobado pelo livro.

Deve-se, portanto, examinar o conteúdo dos acessórios incluídos no


material didático, de modo a verificar a sua integração e a sua
compatibilidade com o conjunto. Nesse sentido, eventuais aplicativos
devem complementar, sem inovar, a publicação disponibilizada.

5. CONCLUSÕES

Pelo exposto, pode-se concluir que as imunidades são normas de


estrutura que atingem diretamente a competência dos entes tributantes,
estabelecendo, juntamente com as demais regras da própria Constituição, a
competência de cada um dos agentes que participam do processo produtivo
das normas jurídicas de natureza tributária.

As imunidades são limite objetivos, pois não trazem um valor em si,


mas como um fim a ser alcançado, ou seja, buscam a realização de
princípios por eles tutelados.

A imunidade relativa aos livros, jornais, periódicos e o papel destinado


à sua impressão, prevista no artigo 150, VI, “d”, da CF/88, visa atender os
objetivos constitucionais de difusão da cultura e de divulgação do
pensamento.

766
Como as imunidades existem para assegurar princípios fundamentais,
elas devem ser interpretadas de forma ampla e extensiva, considerando o
contexto em que se encontram inseridas e a finalidade que buscam atingir.

Por todo o exposto, o vocábulo “livro” no texto constitucional deve ser


entendido de forma ampla, devendo a imunidade ser aplicada também aos
acessórios que integram o livro, desde que fundamentais à veiculação da
informação do conjunto didático.

767
IaaS, PaaS, SaaS e os reflexos tributários da
Cloud Computing desenvolvida no exterior
606 607
Luciana Rosanova Galhardo e Pedro Augusto do Amaral Abujamra Asseis

I. INTRODUÇÃO

Durante muitos anos a discussão quanto à tributação de software no


Brasil limitava-se essencialmente à resolução de uma dicotomia de
qualificações estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 1998,
quando do julgamento do Recurso Extraordinário n. 176.626/SP608.
Basicamente, a circulação de cópias ou exemplares de programas de
computador produzidos em série e comercializados no varejo (software de
prateleira) estaria sujeita ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS), ao passo que a venda de programas de computador
“customizados”, desenvolvidos de acordo com as solicitações e
necessidades específicas de um determinado cliente, era considerada como
prestação de serviço e se sujeitaria à incidência do Imposto sobre Serviços
(ISS).

Por um certo período, esse tipo de abordagem foi capaz de resolver


diversos conflitos. Desde então, contudo, a doutrina jurídica não foi capaz
de acompanhar a rapidez da evolução tecnológica e o desenvolvimento de
novos mecanismos computacionais. Não é mais frequente a utilização de
mídias físicas para a comercialização de software, como em 1998. Na
verdade, superada a era dos CDs e dos DVDs, no auge da era do streaming
e da computação na nuvem (cloud computing), é até raro encontrar meios
físicos para se aplicar o que restou decidido pela Suprema Corte naquele
precedente. Quase vinte anos depois de aparentemente resolvido o

768
conflito, portanto, o problema se põe novamente à mesa, e de uma forma
bastante conflituosa, como comentaremos ao longo deste trabalho.

Com o veloz desenvolvimento das chamadas “tecnologias


disruptivas”609, da crescente relevância da “economia compartilhada” e da
“economia digital”, o surgimento acelerado de criptomoedas e a maior
dependência de plataformas eletrônicas (websites, aplicativos e a própria
nuvem) para a viabilização da venda de produtos e da prestação de
serviços, não causa surpresa que nos últimos dez anos a lista de
companhias abertas mais valiosas do mundo tenha se deslocado dos
setores petroquímico e financeiro para o setor de tecnologia610.

Torna-se assim necessária a revisão desses posicionamentos “clássicos”


justamente para compatibilizá-los à dinâmica empresarial e econômica
contemporânea e também para estabelecer critérios mais claros para a
correta qualificação jurídica dessas atividades e respectiva tributação,
exatamente na linha do que o STF fez ao analisar a questão envolvendo a
tributação de softwares comercializados em meio físico no precedente
acima.

Neste trabalho pretendemos contribuir com esse objetivo por meio da


análise dos principais aspectos fiscais brasileiros relacionados às três
principais modalidades no âmbito da computação na nuvem (cloud
computing). São elas as Infraestruturas como Serviços (Infrastucture as a
Service – IaaS), as Plataformas como Serviços (Platform as a Service –
PaaS) e os Software como Serviços (Software as a Service – SaaS).

Mais especificamente, trataremos dos aspectos fiscais cross-border


possivelmente aplicáveis no Brasil em relação a esse assunto, no esteio de
duas Soluções de Consulta recentemente proferidas pela Coordenação-

769
Geral de Tributação da Receita Federal do Brasil (Cosit): (1) a Solução de
Consulta n. 191, de 23-3-2017, na qual tratou da possível incidência de
Imposto sobre a Renda na Fonte (IRF) e da Contribuição de Intervenção
no Domínio Econômico (CIDE) em contratos SaaS celebrados com não
residentes; e (2) a Solução de Consulta n. 499, de 10-10-2017, na qual a
Cosit se manifestou quanto à necessidade de registro de operações
envolvendo SaaS perante o Sistema Integrado de Comércio Exterior de
Serviços, Intangíveis e Outras Operações que Produzam Variações no
Patrimônio (Siscoserv).

Para tanto, a análise encontra-se dividida da seguinte forma: (i) esta


Introdução; (ii) comentários a respeito das características e natureza das
prestações realizadas sob as diferentes modalidades de cloud computing
(IaaS, PaaS e SaaS); (iii) comentários quanto ao tratamento fiscal
aplicável a essas relações jurídicas; e (iv) conclusão.

II. AS DIFERENTES MODALIDADES DO CLOUD COMPUTING

Cloud computing é o termo adotado para se referir à possibilidade de


utilização e de armazenamento de dados em um ambiente compartilhado e
interligado via internet, pelo qual o computador pessoal se torna um mero
canal de acesso à informação, independentemente da instalação de
programas ou armazenamento individual de dados em cada unidade de
processamento. É um mecanismo eficiente, dinâmico, flexível,
independente, mais rápido e, consequentemente, menos custoso para
promover a inserção de dados, a divulgação de conteúdo e o
gerenciamento/manutenção de informações, tornando-se atrativo para os
mais diferentes segmentos econômicos e uma importante ferramenta
empresarial.

770
Por outro lado, não se resume apenas a uma série de vantagens e
apresenta também limitações, dentre as quais se destacam: a dificuldade
para a customização de opções, a impossibilidade de manutenção absoluta
de sigilo, a confidencialidade e privacidade de seus usuários e/ou
conteúdo, bem como a restrição ao acesso em caso de suspensão de
conexão à internet.

Toda a dinâmica da computação em nuvem se baseia no critério de


utilização, sem que haja a efetiva transferência de propriedade de software
ou a necessidade de registro de uma licença de uso específica. Nesse
campo, embora haja diversas “subcategorias” e chegue-se ao ponto de
definir a expressão “Everything as a Service” (EaaS – tudo como um
serviço), destacam-se três principais formas de acesso à nuvem: IaaS,
PaaS e SaaS611:

•IaaS: envolve o fornecimento de infraestrutura computacional, com


contratação de um servidor virtual dentro de um datacenter, destinado à
utilização de capacidade de hardware – armazenamento, memória e
processamento. Esse tipo de serviço é cobrado de acordo com a utilização ou
pela reserva de recursos contratados;
•PaaS: nesse modelo há a contratação de uso de uma plataforma para
desenvolvimento e gerenciamento de aplicativos na nuvem, já incluídas
configurações de infraestrutura necessária para que esta plataforma esteja em
funcionamento, configurações como Sistemas Operacionais, servidores de
aplicação etc. Um servidor que hospeda websites, por exemplo, pode ser
qualificado como um fornecedor do tipo PaaS; e
•SaaS: as aplicações são disponibilizadas na nuvem e podem ser acessadas
pelos usuários finais via browser ou até mesmo por um aplicativo
disponibilizado pelo provedor. Nessa modalidade há a oferta de um produto
completo, e o acesso se dá mediante pagamento, não havendo aquisição e/ou
utilização mediante pagamento de licenças.

Embora essas três categorias não envolvam a efetiva transferência de


propriedade, mas apenas o direito de uso de uma aplicação em ambiente
comum (na nuvem), e todas as três façam clara referência à palavra

771
“serviço”, essa questão não se mostra tão simples, e manifestações
antagônicas já vêm sendo proferidas pelas autoridades fiscais. É o que
passaremos a comentar no item a seguir.

III. AS PRINCIPAIS QUESTÕES FISCAIS RELACIONADAS AO CLOUD


COMPUTING NO BRASIL

III.1 Aspectos Gerais

Como mencionado na Introdução, por muitos anos o tratamento fiscal


das operações relacionadas a software no Brasil dependia essencialmente
de sua qualificação como “de prateleira” ou “customizado”. Tanto o
Superior Tribunal de Justiça (STJ) quanto o Supremo Tribunal Federal
(STF) haviam se posicionado no sentido de que no caso dos primeiros, em
que um determinado programa era comercializado de forma ampla no
varejo, ter-se-ia uma circulação de bens sujeita à incidência do ICMS; ao
passo que o licenciamento de softwares desenvolvidos “sob medida”, de
forma customizada para o adquirente, seria qualificada como prestação de
serviço.

Em um contexto envolvendo diferentes jurisdições (cross-border), essa


qualificação, como regra geral, leva a consequências fiscais bastante
distintas uma da outra, com a possibilidade de incidência de diferentes
tributos em um e outro caso, como sintetiza a tabela abaixo:

Tributos usualmente
Tributos usualmente incidentes na importação de
incidentes na importação
mercadorias
de serviços

Imposto sobre a Renda


Imposto de Importação (II)
retido na Fonte (IRF)

Contribuição de
Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) Intervenção no Domínio
Econômico (CIDE)

772
Contribuições para o Programa de Integração Social e para o
Financiamento da Seguridade Social na importação PIS/COFINS-Importação
(PIS/COFINS-Importação)

ICMS ISS

Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) IOF

Constatando que muitos programas de computador passaram a ser


adquiridos por meio digital, via download, as autoridades fiscais estaduais
se reuniram no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária
(Confaz) para regulamentar a tributação das operações envolvendo tais
tipos de software (adquiridos sem suporte físico). Essa reunião levou à
publicação do Convênio n. 181, em 29 de dezembro de 2015, autorizando
a concessão de redução na base de cálculo do ICMS nas operações com
software, de tal forma que a carga tributária correspondesse ao percentual
de, no mínimo, 5% do valor da operação612.

A cobrança desse imposto estava inicialmente suspensa no Estado de


São Paulo, por exemplo. Apesar de ter internalizado referido convênio por
meio do Decreto n. 61.791/2016, o Fisco paulista esclareceu que não seria
exigido o imposto “até que fique definido o local de ocorrência do fato
gerador para determinação do estabelecimento responsável pelo
pagamento do imposto”.

Em 5 de outubro de 2017, foi então publicado o Convênio n. 106, que


disciplinou os procedimentos para cobrança do ICMS nas operações com
bens e mercadorias digitais e dispôs que o ICMS seria devido no Estado
onde estivesse domiciliado o adquirente do bem digital.

Inicialmente, seria possível afirmar que essa regulamentação não


alcançaria, especificamente, os casos de Cloud Computing, tais como o

773
IaaS, o PaaS e o SaaS, já que em nenhum desses casos haveria
efetivamente download de aplicações ou circulação de mercadorias. Não
foi bem assim o que ocorreu em relação a tal questão.

Poucos dias antes da publicação do Convênio n. 106, em 20 de


setembro de 2017, já havia sido publicada pelas autoridades fiscais de São
Paulo a Decisão Normativa CAT n. 4, confirmando o entendimento de que
as operações que envolvessem a utilização de software na nuvem (SaaS)
estariam sujeitas à incidência do ICMS.

De acordo com essa Decisão Normativa, (i) o formato de


comercialização dos softwares de prateleira (seja por meio físico ou em
meio digital) não tem o condão de descaracterizar a natureza de produto
desse tipo de software, que deve sempre ser tratado como uma mercadoria;
e (ii) mesmo que a utilização do software se dê “na nuvem” por meio da
internet, a natureza jurídica da operação é de comercialização de software
pronto, sujeita, portanto, ao ICMS.

Paralelamente às discussões travadas na esfera estadual quanto à


possibilidade de qualificação de softwares como mercadorias, ainda que
via download ou utilizados segundo o modelo SaaS, algumas
municipalidades também passaram a endereçar a questão, qualificando tais
atividades, contudo, como prestações de serviços sujeitas à incidência do
ISS.

No Município de São Paulo, chegou a ser publicado em 18 de julho de


2017 o Parecer Normativo n. 1, dispondo que as operações com software,
qualquer que seja a forma de contratação e operacionalização, estariam
sujeitas à incidência do ISS.

774
Nesse documento houve o reconhecimento da natureza híbrida das
operações de SaaS e da consequente possibilidade de fragmentação dos
contratos para que parte da contratação esteja enquadrada como

“processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos, imagens,


vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre outros
formatos, e congêneres” e parte como “suporte técnico em informática, inclusive
instalação, configuração e manutenção de programas de computação e bancos de
dados”.

Ainda que sob tecnologia distinta, voltou a haver, como se pode notar,
os mesmos tipos de conflito de qualificação e de competência tributária
que levaram às manifestações do STJ e do STF a respeito da tributação de
software no final da década de 1990.

III.2 A posição da jurisprudência a respeito da questão

Embora seja um tema relativamente novo, há duas manifestações na


jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP)
quanto ao tratamento fiscal aplicável aos SaaS. Trata-se dos casos “VTEX
Informática” (Apelação Cível n. 0006496-32.2013.8.26.0053, j. 25-9-
2014) e “Itautec” (Apelação n. 0018226-45.2010.8.26.0053, j. 15-9-2015),
que também envolveram a Prefeitura Municipal de São Paulo.

No primeiro precedente, a VTEX Informática ajuizou Mandado de


Segurança visando ter reconhecida a inexistência de relação jurídico-
tributária com o Município de São Paulo, sob a alegação de que, por
apenas disponibilizar software aos seus clientes, sem que houvesse cessão
de código-fonte, nem tampouco personalização de conteúdo, a empresa
não estaria sujeita à cobrança do ISS.

Ao analisar o caso, entretanto, concluiu o TJ-SP que o modelo de


negócios da VTEX Informática envolvia uma terceira modalidade de

775
comercialização de programas de computador, baseada no conceito SaaS.
No acórdão, o Tribunal admitiu que os SaaS dispensam a customização do
software, que o gerenciamento é feito de um ponto centralizado (sede da
empresa), e não a partir de cada cliente, que o fornecimento do programa
se aproxima muito mais do modelo “um para muitos” do que do modelo
“um para um” e que esses contratos apresentam características de contrato
de adesão.

A despeito desses elementos, entendeu ainda a turma que haveria claros


elementos de prestação de serviços nesses contratos, já que: (i) o
licenciamento de uso é temporário enquanto perdurar a relação jurídica, ao
contrário do que ocorre no caso de softwares “de prateleira”, que
apresentam prazos indeterminados após a aquisição; (ii) as atualizações
são fornecidas periodicamente de forma automática enquanto durar o
contrato, ao contrário do que ocorre nos programas “de prateleira”, cujas
atualizações devem ser adquiridas separadamente; e (iii) a remuneração se
dá conforme o volume de dados processados (pedidos captados). Com
isso, embora não se tratasse de um software personalizado, concluiu o TJ-
SP que haveria na relação SaaS uma prestação de serviços sujeita à
incidência do ISS.

Já no caso “Itautec”, a empresa havia ingressado com ação de repetição


de indébito contra a Prefeitura Municipal de São Paulo visando receber
valores recolhidos a título de ISS sobre a comercialização de softwares no
período de março de 2003 a setembro de 2007, sob a alegação de que os
produtos seriam comercializados de forma ampla e sem quaisquer tipos de
adaptação.

Em primeira instância considerou-se o pedido improcedente com base


no entendimento de que os produtos comercializados pela Itautec seriam

776
SaaSs sujeitos à incidência do ISS. Ao rever o caso, apesar de se tratar da
mesma turma que havia analisado o caso “VTEX Informática”, houve
alteração em relação à metade de sua composição, e o resultado dado pelo
TJ-SP acabou sendo diferente.

Sem avaliar se a qualificação dos programas de computador


comercializados pela empresa recorrente seriam SaaSs ou não, a turma
baseou seu entendimento nas posições proferidas pelo STJ e pelo STF na
década de 1990 e buscou avaliar quais softwares haviam sido
comercializados pela Itautec mediante efetiva adaptação e customização.
Os programas que não apresentassem essa característica seriam
considerados software “de prateleira”, não sujeitos ao ISS, com
possibilidade de restituição ao contribuinte.

Como se pode notar, trata-se de uma questão ainda controversa e que,


tendo sido pontualmente decidida em apenas dois casos de formas
distintas, não apresenta uniformização quanto ao entendimento.

No âmbito administrativo, embora não haja posicionamento do


Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) a respeito do
assunto, no ano de 2014 a Receita Federal do Brasil (RFB) chegou a
avaliar a qualificação das remessas realizadas ao exterior em razão da
contratação de datacenters, o que poderia, subsidiariamente, fundamentar
o regime de tributação aplicável aos IaaSs.

Por meio do Ato Declaratório Interpretativo n. 7, de 15 de agosto de


2014613, bem como da Solução de Divergência n. 6, de 3 de junho de
2014614, a RFB e a Cosit se posicionaram no sentido de que “a contratação
de um data center não se caracteriza como uma locação de bem móvel,
mas sim como uma típica prestação de serviços”.

777
Mais recentemente, a Cosit se manifestou especificamente sobre o
regime fiscal aplicável aos SaaS em duas oportunidades: na Solução de
Consulta n. 191, de 23 de março de 2017, e na Solução de Consulta n. 499,
de 10 de outubro de 2017.

Na primeira, as autoridades analisaram uma situação que envolvia a


comercialização do direito de clientes no Brasil acessarem dois tipos de
software (um para proteção para rede de usuários contra vírus e outro para
realização de conferências por meio da internet) diretamente na “nuvem”,
por meio de senhas de acesso remoto disponibilizadas pelo fornecedor
estrangeiro localizado nos Estados Unidos.

Na visão do Fisco Federal, as operações com SaaSs deveriam ser


caracterizadas como “serviços técnicos” pois: (i) os clientes não
adquiririam a propriedade do software e não poderiam modificá-lo, de
forma que o software permaneceria sob a administração da empresa
estrangeira e não haveria pagamento a título de direitos autorais; (ii) o
software seria instalado em um local desconhecido para o cliente e o
provedor é que seria responsável por assegurar o acesso contínuo por meio
da internet; (iii) as atividades de SaaSs seriam comumente combinadas
com serviços de manutenção, suporte técnico, serviços de hospedagem
etc.; e (iv) as operações dependeriam de conhecimentos especializados de
computação e programação de software processadas por meio de
infraestrutura automatizada com “claro conteúdo tecnológico”.

Adicionalmente, as Autoridades Fiscais Federais também apontaram


que: (v) os acordos relacionados aos SaaSs não poderiam ser considerados
acordos de licenciamento e/ou aquisição de direitos; e (vi) os pagamentos
feitos a título de remuneração de operações com SaaSs não podem ser
considerados como taxas de licença de uso de software. Com isso, as

778
remessas realizadas ao fornecedor nos Estados Unidos estariam sujeitas, de
acordo com a Cosit, ao IRF, à alíquota de 15%, e à CIDE, à alíquota de
10%.

Esse mesmo contribuinte apresentou, posteriormente, uma segunda


Consulta Formal à Receita Federal do Brasil, para que se manifestasse a
respeito da eventual necessidade de comunicação da contratação de SaaS
junto a não residentes no Brasil para fins fiscais perante o Siscoserv.

Nessa consulta, respondida em 10 de outubro de 2017 sob n. 499, a


Cosit chega inclusive a reconhecer, além do SaaS, as demais subdivisões
de Cloud Computing (IaaS e PaaS), antes de qualificar todas essas
modalidades como prestações de serviços baseadas no uso do poder de
processamento do prestador. Faz referência ao mesmo conteúdo da
Solução de Consulta n. 191, e conclui pela necessidade de registro desses
contratos perante o Siscoserv.

É válido mencionar que, por terem sido proferidas ambas na vigência da


Instrução Normativa n. 1.396, de 16 de setembro de 2013, o entendimento
das Soluções de Consulta n. 191 e n. 499 tem efeito vinculante no âmbito
da RFB e respalda o sujeito passivo que as aplicar, independentemente de
ser o consulente, desde que se enquadre na hipótese por elas abrangida.

III.3 Nosso entendimento quanto à tributação do Cloud Computing (IaaS,


PaaS, SaaS)

A questão, como visto, é bastante complexa, e a qualificação dos IaaS,


PaaS e SaaS, na visão das autoridades fiscais, poderia ser tanto de uma
prestação de serviços, quanto uma variação do modelo de circulação de
mercadorias sem suporte físico.

779
Contudo, considerando todas as questões acima apresentadas, quer nos
parecer que a qualificação mais apropriada para as atividades de Cloud
Computing se aproximaria da prestação de serviços, por não envolver,
essencialmente, uma circulação de mercadorias, tampouco uma licença
perpétua que possa ser considerada como um ato translativo de
propriedade de uma mercadoria.

Como não há o download do programa de computador pelo usuário, e a


compensação pelo direito de uso se daria conforme o acesso, volume de
dados, tempo de utilização da plataforma, referida prestação – o cerne
dessa relação jurídica, segundo a própria sistemática romanística de
qualificação da relação obrigacional (dare, facere, praestare615) – seria
análoga ao praestare ou ao facere, hipóteses que permitiriam a
qualificação como prestações de serviços. É o que vem manifestando a
doutrina jurídica616 e a jurisprudência dos próprios Tribunais Superiores617.

Assim, nos parece acertada a qualificação adotada pela Municipalidade


de São Paulo e pela Cosit, ao sinalizarem que a natureza jurídica dos
contratos envolvendo Cloud Computing corresponderia a uma forma de
prestação de serviços.

Contudo não podemos deixar de fazer certas críticas à conclusão


manifestada especialmente na Solução de Consulta n. 191, na medida em
que:

•a despeito de se qualificarem como prestações de serviços, as atividades de


Cloud Computing não poderiam ser consideradas como “serviços técnicos”.
Nos termos do art. 17, § 1º, II, “a”, da Instrução Normativa n. 1.455, de 6 de
março de 2014 (IN n. 1.455/2014), consideram-se “serviços técnicos” aqueles
que dependam de conhecimentos técnicos especializados ou que envolvam
assistência técnica administrativa ou prestação de consultoria, realizado por
profissionais independentes ou com vínculo empregatício ou, ainda,
decorrente de estruturas automatizadas com claro conteúdo tecnológico. Não é

780
o que ocorre com os IaaSs, PaaSs, SaaSs etc., nos quais se busca apenas a
utilização da infraestrutura, da plataforma ou do software originalmente
disponibilizado pelo fornecedor;
•a disponibilização de conteúdo, em si, não depende de conhecimentos técnicos
especializados ou de estruturas automatizadas com claro conteúdo
tecnológico. Aqui é importante diferenciar a montagem e o desenvolvimento
das plataformas IaaS, PaaS, SaaS, da própria liberação de seu conteúdo e
acesso ao público. A primeira atividade poderia, sim, envolver os conceitos de
que trata a IN n. 1.455/2014. Contudo a simples divulgação dessas plataformas
ao público, com cobrança pela utilização, mais se assemelha a uma cessão de
direito de uso de programa de computador;
•o Parecer Normativo n. 1/2017, emitido pelas autoridades fiscais de São Paulo,
parece ter identificado de forma mais acurada a natureza jurídica dessas
atividades, ao classificá-las como “atividades de licenciamento ou cessão de
direito de uso de programa de computador”; e
•especificamente no que diz respeito à possível incidência da CIDE sobre os
contratos envolvendo SaaS, não se pode deixar de considerar que a Cosit não
se posiciona quanto à aplicação do disposto na Lei n. 11.452, de 27 de
fevereiro de 2007 (Lei n. 11.452/2007), que afastou a incidência da CIDE às
remessas feitas por empresas brasileiras ao exterior em decorrência da
importação de licença de software nos casos em que não ocorra a efetiva
transferência da tecnologia.

Assim, quer nos parecer que, na condição de importações de serviços


correspondentes à cessão do direito de uso (de software, de plataforma, de
infraestrutura etc.), as contraprestações devidas por pessoas jurídicas
brasileiras a beneficiários não residentes no Brasil para fins fiscais
estariam sujeitas, como regra geral, à mesma incidência aplicável no Brasil
às importações de serviços.

IV. CONCLUSÕES

A computação na nuvem (cloud computing), com seus vários


desdobramentos (IaaS, PaaS, SaaS etc.), é uma das chamadas “tecnologias
disruptivas” que veio para ficar. Com sua crescente popularização e
adoção nos mais diversos segmentos empresariais, não demorará para
fazer ressurgir muitas das discussões já supostamente enfrentadas no

781
passado pela jurisprudência. Como visto, esses reflexos já se iniciaram,
ainda que pontualmente em alguns casos.

Em nosso entendimento, apesar de não se qualificarem precisamente na


dicotomia “softwares de prateleira” ou “softwares customizados”
tradicionalmente estabelecida pela jurisprudência, essa terceira via se
assemelharia a uma prestação de serviços, na medida em que a relação
jurídica se baseia no acesso ao ambiente eletrônico e na utilização do
programa, plataforma ou infraestrutura, e não em sua transferência como
mercadoria.

Corretamente se posicionaram, a nosso ver, a Municipalidade de São


Paulo e a Cosit em relação ao tema, qualificando os SaaS como prestações
de serviços. Contudo, há certamente alguns aspectos que ainda podem
gerar discussões, apenas evidenciando a complexidade do tema e a
margem para discussões pela doutrina e jurisprudência a respeito da
matéria.

782
Tributação de negócios desenvolvidos por
meio de aplicativos associados aos serviços
de transporte
618 619
Rodrigo Brunelli Machado e Nathalia Xavier da Silveira de Mello Brandão

1. INTRODUÇÃO

A evolução tecnológica tem promovido mudanças significativas em


diversos setores da economia, reinventando a atividade econômica e
criando a necessidade de revisão e adaptação das legislações que regulam
as relações consumeristas, trabalhistas, regulatórias e tributárias.

Muitas vezes o intérprete da legislação, em especial a tributária, procura


aplicá-la a negócios jurídicos não existentes à época de sua edição. Essa
tentativa, compreensível e, por vezes, necessária, em face da inexistência
de disciplina específica, deve ser feita com extrema cautela, sob pena de se
cometer injustiças ou criar incidências tributárias por analogia, o que é
vedado pelo art. 108, § 1º, do Código Tributário Nacional.

Esse risco é potencializado nos dias atuais, em que a velocidade das


mudanças nas relações jurídicas é cada vez maior, tornando-se
virtualmente impossível de ser acompanhada pela evolução legislativa.

A mobilidade urbana é um dos setores que vêm experimentando tais


mudanças, especialmente em razão do desenvolvimento de softwares com
funcionalidades que atendem diferentes tipos de usuários e que permitem
diferentes modelos de exploração da atividade econômica e, por isso, vem
enfrentando desafios jurídicos de naturezas diversas, tais como
regulatórios, trabalhistas e tributários.

783
O presente artigo tem por objetivo identificar os desafios relacionados à
tributação enfrentados pelas pessoas jurídicas que desenvolveram
aplicativos que permitem a conexão entre motoristas e passageiros
(pessoas físicas e jurídicas), que variam desde o conflito de competência
tributária entre Municípios e Estados, até a discussão quanto à natureza
jurídica da atividade explorada.

2. A NATUREZA JURÍDICA DA ATIVIDADE ECONÔMICA

As pessoas jurídicas de aplicativos de transporte são proprietárias e


licenciantes de softwares que permitem a conexão entre motoristas e
passageiros para concretização de serviço de transporte individual, privado
ou de táxi, conforme demonstram os trechos dos Termos de Uso
publicamente disponibilizados por algumas pessoas jurídicas do setor:

Pelos TERMOS DE USO são estabelecidas as condições gerais pelas quais o


TAXISTA se obriga ao utilizar o software a ele licenciado pela 99, o qual consiste
nas funcionalidades oferecidas pelo conjunto da plataforma tecnológica da 99, pelo
aplicativo da 99 para smartphones e tablets e pelo site http://www.99taxis.com,
620
daqui em diante chamado “APLICATIVO” . (Termos de Uso da 99
TECNOLOGIA. Grifou-se.)
Estes Termos de uso (“Termos”) regem seu acesso e uso, como pessoa física,
dentro do Brasil, de aplicativos, sítios de Internet, conteúdos, bens e também
serviços (os “Serviços”) disponibilizados pela Uber do Brasil Tecnologia Ltda. (...)
Os Serviços integram uma plataforma de tecnologia que permite aos(às)
Usuários(as) de aplicativos móveis ou sítios de Internet da Uber, fornecidos como
parte dos Serviços (cada qual um “Aplicativo”), providenciar e programar Serviços
de transporte e/ou logística e/ou compra de certos bens com terceiros provedores
independentes desses Serviços, inclusive terceiros fornecedores independentes de
transporte, terceiros fornecedores independentes de logística e terceiros
fornecedores independentes de bens, mediante contrato com a Uber ou
621
determinadas Afiliadas da Uber (“Prestadores Terceiros”) . (Termos de Uso da
UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.)
Estes Termos e Condições de Uso (“Termos de Uso”) regulam o acesso e
utilização dos serviços prestados através da plataforma tecnológica da CABIFY (...)
disponibilizados através do site www.cabify.com.br (“Site”) e aplicações de internet
(“Aplicativo”), em conjunto denominados a “Plataforma”.
(...)

784
1.1 Através da Plataforma, a Cabify disponibilizará ao Usuário devidamente
cadastrado um serviço de agenciamento de transporte individual de passageiros e de
entregas de objetos.
(...)
1.3 A aceitação dos Termos de Uso, a Cabify concede ao Usuário direito e a
licença limitados, não exclusivos e intransferíveis de acesso, uso e exibição da
Plataforma e de seu conteúdo conforme descrito neste instrumento, apenas para o
uso pessoal, por meio de qualquer dispositivo compatível (smartphones, tablets,
622
computadores, dentre outros) . (Termos de Uso da CABIFY AGÊNCIA DE
SERVIÇOS DE TRANSPORTE DE PASSAGEIROS LTDA.)

Como se nota, o ponto em comum dos três Termos de Uso é que


regulam a relação com seus usuários por meio do licenciamento do uso de
software, que é espécie do gênero programa de computador. Conforme
determina a Lei n. 9.609, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei de Propriedade
Intelectual), programas de computadores devem ser objeto de contratos de
licença, em consonância com sua natureza de direito autoral (art. 7º, XII623,
da Lei n. 9.610, de 19-2-1998) e com o art. 5º, XXVII624, da Constituição
Federal de 1988.

Na medida em que aplicativos são colocados à disposição dos usuários


por meio de outorga da licença, em análise preliminar, o modelo
econômico explorado pelas pessoas jurídicas titulares desses aplicativos de
transporte representa verdadeira obrigação de dar.

Nesse particular, curioso notar que os Termos de Uso da Cabify


utilizam uma redação ligeiramente diferente, ao afirmarem que a pessoa
jurídica disponibilizará, por meio da plataforma, “um serviço de
agenciamento de transporte individual de passageiros e de entregas de
objetos”, o que poderia induzir o intérprete a concluir que a atividade da
pessoa jurídica configura obrigação de fazer e, consequentemente,
prestação de serviço. A nosso ver, contudo, não há diferença suficiente

785
entre as atividades para justificar qualificações diferentes entre os negócios
jurídicos.

Sobre o tema, citamos Aires Barreto625:

Sendo a cessão de uso de software (cessão de direitos) negócio jurídico que,


diante de nossa ordem jurídica, configura obrigação de dar, segue-se,
necessariamente, que jamais poderia refletir “prestação de serviços” (que só pode
alcançar obrigações de fazer). Não há, pois, como subsumir a cessão de direito de
uso de software no conceito de serviço tributável, por via do ISS.
(...)
A lista veiculada pela Lei Complementar 116/2003 incorreu no erro palmar de
pretender incida ISS sobre a cessão de direitos, da espécie licença de uso, que não é
serviço (cf. subitem 1.05). Dispôs de modo contrário à Carta Magna, incorrendo em
flagrante inconstitucionalidade.

Pedro Anan Jr. e Eduardo Jacobson Neto626 seguem a mesma linha


interpretativa:

Como decidiu o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ao interpretá-lo (art. 156,


III, CF/88), a previsão em Lista Anexa à Lei Complementar é condição necessária,
e não suficiente, para que determinada atividade possa ser apanhada pelas normas
que instituírem este imposto.
Forte nestas premissas é que entendemos que o licenciamento do direito de uso
de software é, por disposição legal, equiparável à locação de bens móveis e, por
conseguinte, não passível de tributação pelo ISS: obrigações de dar, e não de fazer,
não podem ser apanhadas por este imposto.

Nesse contexto, ainda que o licenciamento ou cessão de direito de uso


de software esteja listado sob o código 1.05 da Lei Complementar n. 116,
de 31 de julho de 2003 (Lei n. 116/2003), falta-lhe a natureza de obrigação
de fazer, necessária à caracterização de serviços tributáveis pelo Imposto
sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS). Isto porque, ao tutelar o ISS, a
Constituição Federal627 demonstra claramente que sua incidência pressupõe
uma obrigação de fazer, com natureza mercantil e que constitua uma
atividade-fim.

O Tribunal de Justiça de São Paulo também se posicionou nesse

786
sentido. Vejamos:

Apelação. Ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária com


pedido cumulado de repetição de indébito. Imposto sobre serviços de qualquer
natureza. Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computador.
Não incidência do tributo. Obrigação de dar. Precedente do Superior Tribunal de
Justiça.
(...)
Frise-se: não incide ISS no que diz com receitas advindas de licenciamento ou
cessão de direito de uso de programas de computador, porquanto, a despeito da
inclusão de “serviço” com esse nome na lista anexa à Lei Complementar 116/03
(subitem 1.05), cuida-se de obrigação de dar, não de fazer. (Apelação n. 0118008-
64.2006.8.26.0053. 14ª Câmara de Direito Público. Desembargador Relator Geraldo
Xavier. Julgamento em 10.03.2016.)
APELAÇÕES. Ação Declaratória c/c Anulatória de Débito Fiscal – ISS Autos
de Infração (Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de
computador, descrito no item 1.05 da lista de serviços) Sentença de procedência dos
pedidos.
(...)
Do exposto, conclui-se que o ISS só incide sobre receita auferida com prestação
de serviço. E esta não se configura no licenciamento ou cessão de direito de uso de
programa de computador, conforme discriminado nos autos de infração. Nessa
toada, era de rigor reconhecer-se a inexistência de relação jurídico tributária do
autor com relação à Municipalidade. (Apelação n. 1017110-45.2014.8.26.0053. 14ª
Câmara de Direito Público. Desembargador Relator Cláudio Marques. Julgamento
em 17.03.2016.)
Ação de Repetição de Indébito – ISSQN – Não incidência Atividade de
comercialização de software que não comporta a exigência tributária – Obrigação
de dar Precedentes do STJ Restituição devida – Sentença mantida – Recursos
Improvidos.
(...)
Sendo a cessão de uso de software (cessão de direitos) negócio jurídico que,
diante de nossa ordem jurídica, configura obrigação de dar, segue-se,
necessariamente, que jamais poderia refletir “prestação de serviços” (que só pode
alcançar obrigações de fazer). Não há, pois, como subsumir a cessão de direito de
uso de software no conceito de serviço tributável, por via do ISS. (...) A lista
veiculada pela Lei Complementar 116/2003 incorreu no erro palmar de pretender
incida ISS sobre a cessão de direitos, da espécie licença de uso, que não é serviço
(cf. subitem 1.05). Dispôs de modo contrário à Carta Magna, incorrendo em
flagrante inconstitucionalidade. (Apelação n. 0014778-19.2010.8.26.0068. 18ª
Câmara de Direito Público. Desembargador Relator Burza Neto. Julgamento em
08.09.2016.)

787
De fato, a redação adotada pelo item 1.05 da lista anexa à Lei
Complementar n. 116/2003 – serviços prestados por meio da cessão de
direitos – contém uma incoerência: ou é serviço, obrigação de fazer, ou
cessão, obrigação de dar. Aparentemente, essa redação foi a forma
encontrada pelo legislador para tentar preservar a incidência do ISS sobre
cessão de direitos mesmo após a decisão do Supremo Tribunal Federal
(STF) no sentido da inconstitucionalidade da incidência do ISS sobre
locação de bem móveis, proferida em 11 de outubro de 2000, no
julgamento do Recurso Extraordinário – RE n. 116.121 (Tribunal Pleno,
Rel. p/ o Acórdão Min. Marco Aurélio), e que resultou na Súmula
Vinculante 31, nos seguintes termos:

É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza –


ISS sobre operações de locação de bens móveis.

A despeito disso, as autoridades fiscais municipais têm exigido das


pessoas jurídicas de aplicativos de transporte o ISS, ora enquadrando a
atividade como licenciamento de software, ora como serviços de
agenciamento e consultoria.

3. ANÁLISE DE ASPECTOS RELATIVOS À TRIBUTAÇÃO SOBRE O


CONSUMO NO BRASIL

O fato de não existir um entendimento consolidado por parte das


autoridades fiscais municipais insere as pessoas jurídicas em um cenário
de insegurança jurídica, sujeitando-as a custosas discussões com o fisco,
seja ele estadual ou municipal.

Parte da falta de unicidade no enquadramento decorre dos diversos


modelos de negócios adotados pelas pessoas jurídicas. Afastando-se do
modelo software-proprietário (os chamados software de prateleira), em
que se cobraria valor único, desigual e, em última instância até mesmo

788
desproporcional, aos usuários, independentemente da utilização do seu
software, as pessoas jurídicas têm adotado o modelo de licenciamento em
que precificam sua licença com base na utilização, nas funcionalidades e
no tipo de usuário (i.e., motoristas e passageiros).

O modelo de licenciamento não decorreu exclusivamente de uma


estratégia mercadológica, mas de imposição legal da Lei de Direitos
Autorais e da necessidade de constante atualização de seus aplicativos, de
modo a garantir a resolução de problemas técnicos, o desenvolvimento de
melhorias e o lançamento de novas funcionalidades que conferem maior
comodidade aos seus usuários.

Deste modo, ainda que todos os Termos de Uso demonstrem que a


exploração da atividade econômica se dá por meio de licenciamento do
software, o modelo de precificação varia conforme o perfil do usuário –
para os motoristas, em regra, a remuneração pela licença ocorre por meio
do pagamento de uma percentagem da corrida; enquanto, para os usuários,
em regra, ocorre pelo pagamento de uma taxa fixa por corrida.

Além disso, os aplicativos oferecem um regime diferenciado para


pessoas jurídicas em um formato que cobra uma comissão por corrida, mas
permite à pessoa jurídica o acesso a funcionalidades adicionais do
software, de modo que as pessoas jurídicas podem cadastrar centros de
custos, emitir relatórios, cadastrar funcionários que podem usar os serviços
do aplicativo, dentre outros.

O modelo diferenciado de precificação, como mencionado, enseja


questionamentos por parte dos fiscos municipais, que entendem haver,
especialmente nas licenças concedidas às pessoas jurídicas, prestação de

789
serviços de agenciamento de serviços de transporte ou até mesmo, em
alguns casos, serviço de consultoria.

Por exemplo, a Prefeitura Municipal de São Paulo, na Solução de


Consulta SF/DEJUG n. 30, de 24 de novembro de 2014, considerou que o
contrato celebrado entre os aplicativos de transporte e os taxistas era de
intermediação por meio de plataforma eletrônica, em troca de comissão
por corrida intermediada entre usuários e taxistas, devendo-se ser
enquadrado no subitem 10.02 da lista anexa à Lei Complementar n.
116/2003:

7. Os serviços prestados pela consulente tanto aos taxistas quanto às empresas


clientes enquadram-se no subitem 10.02 da Lista de Serviços constante do art. 1º da
Lei n. 13.701, de 24 de dezembro de 2003, referentes ao código de serviço 06157
do Anexo 1 da Instrução Normativa SF/SUREM n. 8, de 18 de julho de 2011,
relativo a agenciamento, corretagem ou intermediação de títulos em geral, valores
mobiliários e contratos quaisquer, incidindo o ISS sobre o valor das comissões e
taxas de administração cobradas.

Por outro lado, alguns dias depois, a Solução de Consulta SF/DEJUG n.


32, de 10 de dezembro de 2014, também da Prefeitura de São Paulo,
apresentou entendimento distinto ao sustentar que restava configurada a
prestação de serviço de licenciamento de software, visto que a atividade
consistia numa outorga de licença para utilização de software que
otimizava o contato entre taxistas e usuários pela qual era remunerada por
uma pequena taxa relativa a cada corrida. Vejamos o seguinte trecho:

6. As minutas de contrato apresentadas, bem como a descrição fornecida pela


consulente, demonstram que o objeto da contratação consiste essencialmente na
outorga de licença para a utilização de software desenvolvido para otimizar o
contato inicial entre taxistas e usuários, permitindo a utilização de uma plataforma
para que estes usuários contatem os taxistas para a prestação de serviços.
6.1. As empresas atuam basicamente na prestação de serviço de viabilização de
corridas de táxi por meio de uma base de táxis cadastrados e um aplicativo que
conecta o passageiro ao táxi mais próximo.

790
6.2. O modelo contratual da primeira empresa demonstra que é remunerada
substancialmente pela cessão de direito de uso do aplicativo e, adicionalmente, por
pequena taxa relativa a cada corrida efetivamente realizada. (...)
6.3. A atividade enquadra-se, portanto, nos serviços descritos pelo código 02798
do anexo 1 da Instrução Normativa SF/SUREM n. 08, de 18 de julho de 2011,
relativo ao subitem 1.05, do artigo 1º da Lei n. 13.701, de 24 de dezembro de 2003,
classificados como licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de
computação (...).

Em que pese haja similitude entre as características dos serviços


prestados pelas duas consulentes, o modelo de precificação adotado foi
decisivo para a obtenção de resultados distintos, o que, no caso concreto,
representou uma diferença de 3% na alíquota do serviço prestado para a
contribuinte, visto que, no Município de São Paulo, a atividade de
licenciamento de software tem alíquota de 2%, enquanto o de
agenciamento possui alíquota de 5%628.

Parece-nos equivocada a adoção de diferentes enquadramentos pelo


fisco paulistano com fundamento no modelo de precificação, visto que a
definição da natureza dos serviços prestados deve decorrer das
características da atividade econômica. Isto é, não se deve considerar as
funcionalidades de um software isoladamente para fins de tributação do
ISS, mas o fato de que a atividade consiste em elaborar um programa de
computador e licenciá-la aos usuários. No caso ora analisado, o software
permitirá o contato entre motoristas e passageiros, mas a funcionalidade
oferecida poderia ser qualquer outra (i.e., encomendar uma refeição,
realizar pagamentos, realizar chamadas de vídeos etc.).

Independentemente do modelo de precificação/remuneração adotado,


por expressa previsão legal, e em decorrência da natureza de direito autoral
que é legalmente prescrita ao software, as pessoas jurídicas de aplicativos
de transporte estão necessariamente cedendo onerosamente o uso de seu
software (sob um modelo distinto do de software-produto, como visto) e,

791
por isso, considerando o conceito de serviços para fins de ISS, não
estariam sequer prestando serviço.

Mais recentemente, a Prefeitura do Município de São Paulo editou o


Parecer Normativo n. 1, de 18 de julho de 2017, objetivando uniformizar a
interpretação acerca do enquadramento tributário dos negócios jurídicos de
licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação,
estabelecendo:

Art. 1º O Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de


computação, por meio de suporte físico ou por transferência eletrônica de dados
(“download de software”), ou quando instalados em servidor externo (“Software as
a Service – SaaS”), enquadra-se no subitem 1.05 da lista de serviços do “caput” do
artigo 1º da Lei n. 13.701, de 24 de dezembro de 2003.
Parágrafo único. O enquadramento a que se refere o “caput”, no tocante ao SaaS,
não prejudica o enquadramento de parte da sua contratação nos subitens 1.03 e 1.07
da lista de serviços do “caput” do artigo 1º da Lei n. 13.701, de 2003.
Art. 2º O enquadramento tratado no artigo 1º deste parecer normativo independe
de o software ter sido programado ou adaptado para atender à necessidade
específica do tomador (“software por encomenda”) ou ser padronizado (“software
de prateleira ou ‘off the shelf’”).
Art. 3º Este Parecer Normativo, de caráter interpretativo, é impositivo e
vinculante para todos os órgãos hierarquizados desta Secretaria, e revoga as
disposições em contrário bem como as Soluções de Consulta emitidas antes da
publicação deste ato e com ele em desacordo, independentemente de comunicação
aos consulentes.

A nosso ver, o Parecer Normativo não solucionou a discussão quanto à


natureza do serviço prestado pelos aplicativos de transporte, visto que, ao
analisar as questões ligadas aos contribuintes que licenciam software, o
fisco paulistano ora foca na funcionalidade oferecida pelo software, ora no
licenciamento do software per se. Observa-se que tal posicionamento não
tem sido restrito aos aplicativos de transporte:

9. O subitem 1.05 do artigo 1º da Lei n. 13.701, de 24 de dezembro de 2003, é


reprodução fidedigna do subitem 1.05 da lista de serviços anexa à Lei
Complementar Federal n. 116, de 2003 e define expressamente o licenciamento ou

792
cessão de direito de uso de programas de computação como atividade sujeita ao
ISS.
10. A definição legal não comporta nenhum tipo de distinção, razão pela qual o
ISS incide sobre quaisquer modalidades de licenciamento ou cessão de direito de
uso de programas de computação, independentemente do tipo de software
comercializado ou da denominação empregada.
11. Portanto, a concessão de licença de uso de Software de propriedade da
consulente, enquadra-se no subitem 1.05 da lista de serviços do art. 1º da Lei n.
13.701, de 24 de dezembro de 2003, relativo ao código de serviço 02798 do anexo 1
da Instrução Normativa SF/SUREM n. 08, de 18 de julho de 2011 – Licenciamento
ou cessão de direito de uso de programas de computação, inclusive distribuição.
(Solução de Consulta da Prefeitura de São Paulo n. 11, de 12 de abril de 2016)
1. Trata-se de Consulta Tributária formulada por ****, inscrita no CNPJ sob o n.
**** (“Consulente”), na qual informa ser prestadora de serviços de intermediação
comercial na venda de produtos de terceiros, promovendo a intermediação entre
anunciantes/vendedores e consumidores/compradores mediante a divulgação do
produto a ser vendido em seu sítio virtual na rede mundial de computadores.
(...)
8. O serviço de intermediação consiste na aproximação, pelo prestador de
serviço, do tomador do serviço com terceiro (que não participa da relação
prestacional), de modo que o tomador e o terceiro aproximado celebrem entre si
negócio jurídico, graças à aproximação efetuada pelo prestador, que recebe a
denominação de intermediário, ou corretor, a depender da espécie de intermediação
prestada. Ressalte-se que o tomador do serviço pode tanto ser o vendedor quanto o
comprador.
9. Portanto, o intermediador, prestador de serviço de intermediação, não é parte
na relação jurídica de compra e venda que se forma entre vendedor e comprador,
sendo que a relação jurídica da qual participa, seja com o vendedor, seja com o
comprador, é de prestação de serviço de intermediação – caracterizada pela
aproximação entre o tomador e um terceiro. A relação jurídica entre o prestador e o
tomador, portanto, é autônoma e diferente da relação jurídica entre o vendedor e o
comprador, embora venha a existir identidade entre o tomador do serviço e o
vendedor ou o comprador, conforme o caso.
10. Uma vez realizada a aproximação, ou seja, uma vez celebrada a compra e
venda de bem móvel ou imóvel, no caso do serviço descrito no item 10.05 da lista
do artigo 1º da Lei n. 13.701, de 2003, consumada está a intermediação e prestado
está o serviço, eis que reunidos todos os elementos necessários à sua ocorrência.
(Solução de Consulta da Prefeitura de São Paulo n. 22, de 07 de novembro de 2016)

Nota-se que, nas situações em que a atividade de licenciamento de


software é enquadrada como intermediação, o fisco promove a análise do
serviço do ponto de vista da funcionalidade do software. No caso dos
aplicativos de transporte, por exemplo, em vez de analisá-lo considerando

793
que é o programa de computação que, por meio de seus algoritmos, pode
ser utilizado por motoristas e passageiros para viabilizar a prestação de
serviços de transporte daqueles a estes, entende haver uma intermediação
propriamente dita entre o passageiro e motorista.

O equívoco persiste quando as autoridades fiscais pretendem


reclassificar as funcionalidades de tais aplicativos como serviços prestados
às pessoas jurídicas, enquadrando-as como consultoria apenas pelo fato de
que há emissão de relatórios mensais, ignorando o fato de que não há
qualquer participação dos aplicativos de transporte em tal emissão – trata-
se, apenas, de mais uma funcionalidade do software.

Ao tributar esses contribuintes com fundamento nas funcionalidades, o


fisco paulistano praticamente torna o código 1.05 da lista anexa à Lei
Complementar n. 116/2003 letra morta, visto que não há sequer um
software que não possua uma finalidade específica, o que, sob o ponto de
vista das autoridades fiscais, atrairia a incidência do ISS sob código
distinto.

Além da insegurança jurídica relacionada à incidência e, caso superada


essa questão, sob qual código se deve recolher o ISS, as pessoas jurídicas
de aplicativos de transporte enfrentam também a insegurança em relação
ao conflito de competência entre os Municípios e os Estados.

Isso porque, em 2015, o Conselho Nacional de Política Fazendária


editou o Convênio ICMS 181/2015, em que se aprovou a redução de
alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e sobre Prestações
de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação
(ICMS) para 5% sobre operações com software, programas, jogos
eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres,

794
disponibilizados por qualquer meio, inclusive mediante transferência de
dados (i.e., download).

Ou seja, não somente os Municípios, mas também os Estados entendem


que as operações com aplicativos e programas de computador estão sob
sua competência tributária. Ocorre que, como visto, os tipos de software
ora analisados são objeto de cessão de licença de uso bastante limitada, ou
seja, não se trata de mercadoria cuja titularidade é transferida no momento
do fato gerador. Ao contrário, a propriedade do software permanece com
as pessoas jurídicas que o elaboraram e que trabalham para criar novas
funcionalidades e promover melhorias.

O Superior Tribunal de Justiça reconhece que o software não possui


característica de mercadoria, conforme demonstra trecho da ementa do
Recurso Especial n. 443.119/RJ629:

Direito civil. Recurso especial. Ação de conhecimento sob o rito ordinário.


Programa de computador (software). Natureza jurídica. Direito autoral (propriedade
intelectual). Regime jurídico aplicável. Contrafação e comercialização não
autorizada. Indenização. Danos materiais. Fixação do quantum. Lei especial
(9610/98, art. 103). Danos morais. Dissídio jurisprudencial. Não demonstração.
– O programa de computador (software) possui natureza jurídica de direito
autoral (obra intelectual), e não de propriedade industrial, sendo-lhe aplicável o
regime jurídico atinente às obras literárias. (...).

No voto da Relatora Ministra Nancy Andrighi, resta claro que não há


que se falar em circulação de mercadorias na outorga de licença de
software:

O software, ou programa de computador, como disciplinado em leis específicas


(9.609/98 e 9.610/98), possui natureza jurídica de direito autoral (trata-se de “obra
intelectual”, adotado o regime jurídico das obras literárias, e não de direito de
propriedade industrial.
Esse entendimento resulta não apenas da exegese literal dos arts. 7º, inc. XII da
Lei n. 9.610/98 e 2º da Lei n. 9.609/98 e das expressivas contribuições de diversos
doutrinadores, mas também da interpretação, a contrario sensu, do dispositivo da

795
lei de propriedade industrial (Lei n. 9.279/96, art. 10, inc. V) que afasta a
possibilidade jurídica de se requerer a patente de programa de computador, por não
o considerar seja invenção, seja modelo de utilidade.
Se o direito de propriedade industrial, como positivado no Brasil, expressamente
rechaça proteção ao software, não resta outra solução senão a de aceitá-lo enquanto
modalidade de direito de propriedade intelectual (autoral), pois do contrário ficaria
o seu titular despido de qualquer proteção jurídica a reprimir atos de contratação.

Brigagão630, em artigo intitulado “ICMS não incide sobre download de


softwares”, demonstra partilhar da mesma interpretação:

De fato, quando determinado consumidor faz o download de um bem digital (um


filme, uma música, um jogo etc.), ele não passa a ser detentor daquele direito
autoral. Há apenas um licenciamento ou cessão do direito de uso daquele programa.
Nada mais. Só haveria que se falar na venda de um software se todos os direitos
inerentes àquele bem (de uso, gozo e fruição) fossem transferidos ao comprador.
Depreende-se disso que a negociação do software é, na verdade, uma negociação
do direito de uso a ele inerente, e não das informações digitais nele contidas. Ou
seja, ao fazer a venda de um software, o detentor do direito autoral não cede o
referido direito ao consumidor. Ao contrário, ele mantém o referido direito em seu
patrimônio, podendo continuar a ceder o seu uso a outras pessoas.

Nota-se, portanto, que tanto a pretensão de exigir ICMS sobre tais


aplicativos quanto a exigência de ISS são eivadas de inconstitucionalidade
e ilegalidade, visto que não pode a legislação desses tributos alterar a
natureza de direito autoral concedida pela Constituição Federal e
regulamentada pela Lei de Direitos Autorais.

Além disso, ainda que seja licenciado em larga escala, parece-nos que o
conceito de software de prateleira, conforme definido pelo STF no RE n.
176.626-3, já não se mostra suficiente para analisar a tributação dos
aplicativos de celulares, especialmente os que envolvem os serviços de
transporte, visto que permitem personalizações em relação às
funcionalidades, conforme se verifica da comparação entre as
funcionalidades oferecidas aos passageiros, aos motoristas e às pessoas
jurídicas.

796
Necessário, portanto, que a legislação brasileira seja atualizada,
regulando o novo modelo de negócio explorado por diversos contribuintes,
dentre eles os aplicativos de transporte, e garantindo o respeito ao
princípio da segurança jurídica. O cenário de incertezas não poderá ser
solucionado pelo Poder Judiciário isoladamente, visto que permite
decisões diferentes em relação a fatos semelhantes, por decorrer de
interpretações diferentes de uma legislação que não prevê as situações que
estão sendo analisadas.

4. CONCLUSÃO

O fato de o software ser comercializado por meio da cessão de licença


de uso pela sua natureza de direito autoral imposta pela legislação
específica, como ocorre com os aplicativos de táxi, demonstra que não há
uma prestação de serviço sobre o qual incidiria o ISS, tampouco a
circulação de mercadorias, sobre a qual incidiria o ICMS.

Ao contrário, há uma obrigação de dar, cuja incidência de qualquer


imposto precisa ser regulamentada em atenção aos limites propostos pela
Constituição Federal.

Para piorar a insegurança jurídica, não há sequer uma unicidade em


relação à intepretação das autoridades fiscais quanto à natureza do serviço
que supostamente tais pessoas jurídicas estariam prestando – ora os fiscos
municipais classificam como licenciamento de software, ora como
agenciamento de serviços de transporte e, por vezes, até como serviços de
consultoria.

Caso seja superada a discussão de ausência de prestação de serviço,


parece-nos que o item 1.05 da lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003
(i.e., de licenciamento de software) seria o mais adequado ao caso. Isto

797
porque não há qualquer ingerência ou atuação da proprietária do software
em relação à conexão entre passageiros e motoristas. Ou seja, a suposta
intermediação promovida pelas pessoas jurídicas de aplicativos de
transporte, na verdade, é uma funcionalidade do próprio software e não
uma prestação autônoma de serviços.

Os tempos mudaram e o formato de negócios envolvendo software


sofreu significativas alterações em razão da evolução tecnológica
experimentada pelo setor, de modo que é inadequado continuar adotando
os critérios de software de prateleira ou software customizável, com
fundamento na decisão do STF, que analisava questões distintas.

A legislação precisa ser revista, atualizada e adaptada para a nova


realidade de evoluções tecnológicas do setor de tecnologia. Ainda que seja
para incidir o ISS (ou o ICMS), tal exigência deve ser dar com respaldo na
Constituição Federal, de modo a garantir aos contribuintes a aplicação dos
princípios da segurança jurídica e da ordem econômica justa e razoável.

Desse modo, em vez de desestimular o desenvolvimento de novas


tecnologias, o Brasil buscará o chamado “fair share of tax”, mas respeitará
os princípios constitucionais balizadores de todo negócio jurídico no país.

798
Tributação da atividade de armazenamento
digital de dados
631 632
Hugo de Brito Machado Segundo e Raquel Cavalcanti Ramos Machado

INTRODUÇÃO

Em 29 de dezembro de 2016, foi promulgada a Lei Complementar n.


157/2016, com a finalidade de introduzir na legislação nacional sobre o
Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) normas destinadas a
combater a chamada “guerra fiscal” entre Municípios. Para tanto, reiterou
a fixação de alíquota mínima (2%) a ser observada pelos legisladores
municipais (até então já prevista no art. 88 do ADCT, por obra da EC n.
37/2002) e, de forma inovadora, cuidou de sanções de ordem pessoal, no
terreno da improbidade administrativa, para os que violarem suas
disposições.

Além do propósito inicial, a referida lei complementar aproveitou o


ensejo para de algum modo “atualizar” a lista de serviços anexa à Lei
Complementar n. 116/2003, nela introduzindo novos serviços antes não
previstos, pelo menos de forma expressa. Entre essas inovações, alterou-se
a previsão original de tributação do serviço de “processamento de dados”,
fazendo-se remissão agora a serviços de “processamento, armazenamento
ou hospedagem de dados, textos, imagens, vídeos, páginas eletrônicas,
aplicativos e sistemas de informação, entre outros formatos, e congêneres”
(item 1.03).

Neste estudo, pretende-se examinar, então, a possibilidade de incidência


do ISS sobre o serviço de “armazenamento digital de dados” e, ainda, do
serviço de “computação em nuvem” (cloud computing), gênero do qual ele

799
parece ser espécie. Pretendem-se analisar, primeiro, as dificuldades
jurídico-formais inerentes a essa nova modalidade de exação e, em
seguida, aspectos talvez mais relevantes, e problemáticos, ligados aos
aspectos técnicos ou factuais da tributação dessas novas realidades
advindas das novas tecnologias e da internet.

1. UM POUCO DO HISTÓRICO SOBRE A TRIBUTAÇÃO DAS


OPERAÇÕES REALIZADAS PELA INTERNET

Tão logo começou a se popularizar o uso da informática, colocou-se a


questão de saber como deveriam ser tributados os programas (software)
utilizados em seu âmbito. E, como se sabe, difundiu-se, não só no Brasil,
mas em outras partes do mundo, a ideia segundo a qual o software poderia
ser tributado como serviço, ou como mercadoria, a depender da forma
como fosse elaborado e comercializado.

Programas feitos por encomenda, com características próprias


solicitadas pelo encomendante, seriam o produto ou o resultado da
prestação de um serviço, devendo ser tributados como tal. No caso do
Brasil, isso conduziria à conclusão de que estariam sujeitos à tributação
pelo imposto municipal incidente sobre a prestação de serviços de
qualquer natureza (ISS).

Já o software escrito de maneira prévia, padronizada, e comercializado


de maneira não individualizada deveria ser tratado como mercadoria,
sobretudo porque sua venda ocorria, à época, por meio da venda do
suporte físico que o continha gravado ou armazenado (disquetes ou CDs).
Havia um corpus mechanicum a ser vendido, de modo a que se pudesse
cogitar de “coisas que se produzem para vender ou se compram para
revender com lucro”633, encaixando-se assim no significado então assente
da palavra mercadoria634.

800
Esse entendimento, acolhido pela jurisprudência, pelas administrações
tributárias e pela literatura especializada em diversas partes do mundo635,
orientou inclusive o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, como
se depreende do RE 176.626/SP, cujo julgamento deu-se há quase vinte
anos, em acórdão que restou assim ementado:

Programa de computador (“software”): tratamento tributário: distinção


necessária. Não tendo por objeto uma mercadoria, mas um bem incorpóreo, sobre as
operações de “licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de
computador”, “matéria exclusiva da lide”, efetivamente não podem os Estados
instituir ICMS: dessa impossibilidade, entretanto, não resulta que, de logo, se esteja
também a subtrair do campo constitucional de incidência do ICMS a circulação de
cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série e
comercializados no varejo, como a do chamado “software de prateleira” (off the
shelf), os quais, materializando o corpus mechanicum da criação intelectual do
636
programa, constituem mercadorias postas no comércio .

O Supremo Tribunal Federal adotou, em relação ao software, raciocínio


análogo ao aplicável a uma série de outras atividades, como, e.g., a
alfaiataria e a fabricação de medicamentos, as quais podem estar sujeitas
ao ISS, ou ao ICMS, a depender de saber se se trata de algo (um terno, um
medicamento) feito por encomenda atendendo às especificações do
consumidor, ou em larga escala e de maneira indistinta para ser vendido ao
público em geral. Subjaz, como parece claro, a ideia de que em um caso
existe uma “obrigação de fazer” algo para o contratante e, no outro, uma
“obrigação de dar” ao contratante algo previamente feito637.

Relacionada a esse assunto, mas com ele não exatamente se


confundindo, tem-se também a tributação do chamado e-commerce, ou do
comércio eletrônico, assim entendido aquele feito por meio da internet.

Quanto a esse ponto, a literatura especializada cuidou de estabelecer a


distinção entre comércio eletrônico direto e comércio eletrônico
indireto. O primeiro seria aquele realizado integralmente em ambiente

801
virtual, vale dizer, nele tanto a contratação, ou o acordo de vontades, como
a sua execução (e.g., entrega da “coisa” e pagamento do preço), dar-se-iam
por meio da internet ou meio virtual análogo. Já o segundo, o comércio
eletrônico indireto, consistiria naquele em que a contratação dar-se-ia por
meio eletrônico, mas a execução do contrato aconteceria em ambiente não
virtual, como é o caso de quando alguém, por meio de um site de vendas,
adquire uma garrafa de vinho, a qual terá de ser entregue no endereço do
comprador de forma “física” ou tradicional.

O comércio eletrônico indireto não oferece grandes desafios para o


Direito, sendo, em linhas gerais, o mesmo que é levado a efeito há séculos
entre comerciantes por meio epistolar.

Por meio de cartas, apesar do muito tempo que levavam para ir desde o
remetente ao destinatário, há muitos anos a humanidade realiza atos de
comércio. A tecnologia informática apenas incrementou o grau de
informação das partes em torno do negócio que estão a realizar e a rapidez
com que ele acontece, fator que aumentou exponencialmente esse tipo de
comércio e implicou, inclusive, no Brasil, alterações constitucionais nas
regras de distribuição do imposto estadual sobre operações relativas à
circulação de mercadorias e prestação de serviços de comunicação e de
transporte interestadual e intermunicipal (ICMS), aspecto que, todavia, por
não se comportar nos limites deste texto, não será examinado aqui
(Emenda Constitucional n. 87/2015).

Mais difícil é o disciplinamento, pelo Direito, do comércio eletrônico


direto, por uma série de fatores, alguns dos quais serão examinados a
seguir. O desenvolvimento da tecnologia tem feito com que se ampliem as
possibilidades desse tipo de atividade, levando inclusive à transformação
de atividades antes feitas de maneira não virtual. É o caso, só para citar

802
alguns exemplos, do mercado da música e da disponibilização de filmes,
assistindo-se a um rapidíssimo desaparecimento de lojas de venda de CDs
e de locadoras de DVDs ou outras modalidades de suporte físico de filmes
e músicas, os quais têm sido substituídos pela possibilidade de se
adquirirem músicas, livros, filmes etc., por meio da internet.

Com efeito, a tecnologia informática evolui com velocidade elevada, e,


se o Direito já tem dificuldade em acompanhar as mudanças no âmbito da
realidade factual que visa regular, isso se torna ainda mais acentuado em
relação a esse tipo de tecnologia.

Pouco tempo depois de consolidado o entendimento jurisprudencial


acima explicitado, sobre software “de prateleira” dotado de corpus
mechanicum e software feito “por encomenda”, esse já citado aumento na
velocidade em que se transmitem dados pela internet e a enorme difusão
em seu uso fizeram não só com que músicas e filmes se tornassem objeto
de negociação em ambiente virtual, mas os próprios programas ditos “de
prateleira” passaram a ser comercializados e “entregues” aos respectivos
compradores dessa maneira, vale dizer, sem recurso a suportes físicos que
pudessem ser equiparados ao que classicamente se entende por
mercadoria638.

Desapareceu, por outros termos, o corpus mechanicum, tornando-se


possível comprar determinado software (ou música, ou livro), e tê-lo
descarregado diretamente em seu próprio microcomputador (ou telefone
móvel, ou tablet, ou qualquer outro dispositivo eletrônico equivalente),
lançando novo desafio ao entendimento jurisprudencial que havia
encontrado nessa particularidade elemento justificador de sua conceituação
como mercadoria.

803
Nos Estados Unidos, no que tange ao sales tax, problema muito
semelhante foi colocado, tendo o Estado da Pensilvânia passado a entender
que o software escrito previamente, e disponibilizado à comercialização
para o público de forma não personalizada, o mesmo antes vendido por
meio de caixas contendo incontáveis CDs e hoje objeto de um download, é
tributável pelo imposto estadual sobre vendas, independentemente do
método de “entrega”639. Muitos dos Estados americanos têm seguido esse
entendimento, mas parte considerável tem, de maneira contrária, entendido
que a falta do suporte físico – a entrega do software por meio de mero
download – torna juridicamente impossível a exigência do imposto.
Considera-se, por isso mesmo, que é preciso buscar, naquele país, uma
solução nacional, sendo necessário que uma legislação federal disponha
sobre o assunto, para uniformizá-lo, inclusive no que tange a possíveis
conflitos de competência.

No Brasil, o Supremo Tribunal Federal, ainda em juízo liminar,


sinalizou no sentido de que o download pode, sim, ser incluído pelo
legislador estadual na definição de operação relativa à circulação de
mercadorias. Ainda em 2010, entendeu a Corte, ao denegar a medida
cautelar na ADI n. 1.945, ser possível a incidência do ICMS sobre o
comércio de softwares por meio de downloads feitos por meio da internet.

Na ocasião, o Ministro Jobim comparou a compra de programas por


meio da aquisição de disquetes ou CDs em lojas varejistas, sujeita, no
entendimento do STF, ao ICMS, e a atual compra de programas – ou, a
rigor, da licença para usar a cópia respectiva – por meio de download, e
afirmou que, para ele, substancialmente, não há diferença alguma a
justificar que o ICMS não seja exigido em ambas640. Houve, até mesmo, a
comparação, durante o julgamento, entre os programas transmitidos via

804
download ao fornecimento de energia elétrica, sendo a última submetida
normalmente ao ICMS.

O entendimento acima exposto, como dito, não parece ainda pacificado


no âmbito da Corte, que, pelo menos, o adotou coerentemente,
considerando incluídos na definição de livro, para efeito de aplicação da
regra imunizante veiculada pelo art. 150, VI, “d”, da CF/88, os chamados
livros eletrônicos (RE 330.817), seguindo a esteira da própria Lei
Complementar n. 157/2016, no que tange ao item 1.09641.

Pode-se suscitar, com a figura do download, possível equívoco no


próprio entendimento inicialmente adotado pelo STF, no que tange ao
ICMS, que era considerado devido por conta da presença de um corpus
mechanicum subsumível ao conceito de mercadoria. Afinal, ter-se-ia mero
contrato por meio do qual se transmite a licença de uso do software, de
forma definitiva ou temporária, o qual não seria passível de tributação pelo
ICMS, tampouco pelo ISS.

Aliás, a possibilidade de tudo se dar por meio de download, e, mais, de


a licença ser temporária, devendo ser renovada periodicamente (v.g., a
cada ano), faz emergir com mais clareza a dificuldade de se considerar
incidente o ICMS, o que não significa, porém, dizer que se trata de serviço
sujeito ao âmbito de incidência do ISS. Nem se alegue, em oposição, que
um desses dois impostos tem que ser devido, em razão do princípio da
capacidade contributiva, como se não fosse sequer concebível a existência
de fatos não abrangidos nos âmbitos de incidência dos impostos pré-
existentes: fosse assim, não existiria espaço para a chamada competência
residual, que não teria razão de ser.

805
De uma forma ou de outra, mesmo não estando ainda sequer pacificada
a forma como devem ser tributadas as operações de comercialização (ou
de licença) de software, surge, novamente a indicar a velocidade com que
a tecnologia se modifica e aprimora nesse particular, a chamada
computação em nuvem, ou cloud computing, gênero do qual o
armazenamento digital de dados parece ser uma espécie, e ao qual se
dedica o próximo item deste trabalho. Nele, torna-se possível ao usuário
utilizar um software sem tê-lo transferido para seu computador, e mesmo
sem que seu computador tenha de processar as informações
correspondentes, o que torna ainda mais difícil a aplicação de conceitos e
categorias forjados no seio de uma economia não digital.

2. ALGUMAS NOTAS SOBRE A COMPUTAÇÃO EM NUVEM (CLOUD


COMPUTING)

A computação em nuvem (cloud computing) consiste em uma estrutura


virtual por meio da qual se pode, de maneira remota, ter acesso a dados,
software, poder de processamento ou apenas espaço para gravação de
informações. Diz-se “nuvem” porque os dados, o software, o poder de
processamento ou o espaço para a gravação das informações não se
encontram no computador ou no dispositivo móvel do usuário, mas em
diversos servidores conectados em rede (ambiente virtual), aos quais o
usuário tem acesso remotamente, dando assim a impressão de que se
acham em uma “nuvem”.

Quando essa estrutura é posta à disposição de outra pessoa exigindo-se


o pagamento de um preço como contraprestação, tem-se atividade
econômica que se viabiliza pelo fato de que os usuários desejam pagar
para usar tal estrutura sem ter de arcar com os custos e as dificuldades
inerentes à sua implantação e à sua manutenção.

806
O leitor, se lê estas linhas em data não muito distante daquela em que
foram escritas (outubro de 2017)642, certamente conhece plataformas como
icloud, dropbox e onedrive, por meio das quais músicas, textos e fotos são
armazenados digitalmente, em meio virtual, podendo ser por seus usuários
acessados de qualquer dispositivo e em qualquer parte do globo, pela
internet. Esses são exemplos de computação por nuvem, mas há diversos
outros, não tão conhecidos do público em geral. A literatura especializada
enumera três formas básicas de computação em nuvem, a saber: (i) IaaS;
(ii) PaaS; (iii) SaaS643.

A modalidade IaaS designa a expressão Infrastructure as a Service, e


designa a oferta, aos consumidores ou usuários, de uma infraestrutura
acessível pela internet, por meio da qual eles podem utilizar poder de
processamento e espaço para armazenagem de dados. Como um “disco
virtual” e um “processador virtual”, cujo conteúdo será aquele ali inserido
pelo usuário, que paga para ter à disposição, de forma remota, a estrutura
de hardware.

PaaS, por sua vez, designa Platform as a Service, e, por meio dela, o
fornecedor da atividade ou o prestador do serviço disponibiliza, além da
estrutura para computação e armazenagem, ferramentas que os
desenvolvedores (de softwares, de aplicativos etc.) utilizam para elaborar e
disponibilizar suas próprias criações. Seria o caso de uma plataforma em
que autores poderiam escrever, editar e, em seguida, vender seus próprios
e-books, por exemplo.

Finalmente, no caso da SaaS, Software as a Service, o provedor do


serviço disponibiliza, em seus servidores, o próprio software (editores de
texto, de imagens, planilhas de cálculo etc.) que os usuários pagarão para
utilizar. Mas, diversamente do que ocorre quando o consumidor adquire

807
uma caixa contendo DVDs nos quais está gravado um jogo, ou um
processador de textos, ou, na sequência, quando o consumidor faz o
donwload de tais programas para a sua máquina, ficando com eles à sua
disposição para sempre, no caso da SaaS os programas não são
transferidos ao computador do usuário, que precisa acessar, remotamente,
os servidores do prestador do serviço para utilizá-los.

Tais atividades, com o avanço e a popularização de informática, que


permeia, com velocidade impressionante, cada vez mais e mais aspectos da
vida humana, seja pessoal ou profissional, nas esferas públicas ou
privadas, empresariais ou governamentais, assumem a cada ano
proporções maiores. Daí a preocupação das Fazendas, no mundo inteiro,
com sua tributação. Até porque muito do que se faz na economia dita
física, ou tradicional, está perecendo em virtude de substituições por
equivalentes virtuais. Veja-se o caso das diversões públicas (v.g., os
antigos estabelecimentos repletos de fliperamas, sujeitos ao ISS), que
passam a ocorrer por redes de nuvem como a PlayStation Network, por
meio da qual é possível jogar partidas de videogame com outras pessoas
nas mais diversas partes do mundo, sem sair de casa.

O mesmo pode ser dito das lojas de venda de LPs e de CDs,


substituídas por lojas virtuais como a iTunes Store, e, mais recentemente,
por tecnologias de streaming como Apple Music, Spotify ou Deezer,
apenas para citar alguns poucos exemplos. Com a migração das atividades
econômicas para o ambiente virtual, ou se pensam formas de tributá-las
nesse ambiente virtual, ou a arrecadação de tributos sofrerá decréscimo
considerável, e crescente, como, aliás, já está a ocorrer644.

O advento da computação em nuvem, por outro lado, tolda novamente o


cenário da tributação dessas realidades, pelo menos no Brasil, rapidamente

808
resenhada no item anterior deste texto. Principalmente no que tange à
chamada nuvem como software as service, se licencia o uso do software
de forma remota, sem transmissão definitiva dos conteúdos, o que afastaria
a incidência do ICMS (nem mesmo há o download), remetendo a que se
reanalise o tema, visto que no âmbito da nuvem a própria distinção entre
venda de software e prestação de serviço se torna bastante turva645. Tais
aspectos, porém, são aqui referidos apenas para ilustrar os desafios
trazidos pelas novas tecnologias a quem pretende encaixá-las em padrões
construídos por séculos à luz de realidades físicas; maior aprofundamento
neles e em suas especificidades, porém, não será levado a efeito, pois
fugiria ao propósito específico deste texto, voltado ao armazenamento
digital de dados (IaaS).

3. TRATA-SE, EFETIVAMENTE, DE UM SERVIÇO?

O principal questionamento que emerge, a partir da introdução do


“serviço de armazenamento digital de dados” na lista anexa à Lei
Complementar n. 116/2003, gira em torno da definição de serviço. Poder-
se-ia dizer, em oposição à validade da exigência, que não se trata de
serviço à míngua de uma “obrigação de fazer” por parte dos que exercem a
atividade, que se resumiria em colocar à disposição do usuário a estrutura
informática na qual seus dados serão gravados e acessados remotamente.

Sabe-se que houve, principalmente no Brasil, intensa discussão em


torno da significação da palavra “serviço”, defendendo-se conceito haurido
da doutrina construída em torno do Código Civil de 1916 para justificar a
possibilidade de o aludido imposto incidir apenas sobre atividades que
envolvam, como elemento central, obrigação de fazer por parte do
prestador ou de seus prepostos, sendo essa a distinção marcante entre esse
imposto e o ICMS. Julgando o RE 116.121-3/SP, em outubro de 2000, o

809
Supremo Tribunal Federal decidiu pela inconstitucionalidade da incidência
do ISS sobre locação de bens móveis, precisamente por entender que nos
contratos de locação não há obrigação de fazer, o que impossibilitaria sua
subsunção ao conceito de serviço.

Algum tempo depois, porém, o Supremo Tribunal Federal proferiu


julgados em sentido diverso, dando à palavra serviço significação mais
ampla, de modo a abranger o leasing (RE 547.245/SC), e os planos de
saúde (RE 651703). Tais julgados podem ser criticados, ainda que se
admita que a palavra serviço, usada pelo constituinte, não envolve um
conceito fechado e pré-definido de maneira apriorística e ontologicamente
objetiva.

Com efeito, ainda que se reconheça que o legislador complementar


pode dar maior ou menor amplitude ao significado de algumas palavras,
em sua difícil tarefa de delimitar melhor as fronteiras entre as esferas de
competência, para evitar que conflitem (CF/88, art. 146, I), sabe-se que
isso não deve ocorrer quando levar, precisamente, ao surgimento de tais
conflitos e sobreposições, como parece ser o caso do leasing e dos planos
de saúde, em relação ao IOF.

Seja como for, não parece necessário, aqui, adentrar questões


hermenêuticas ligadas à maneira pela qual se atribuem significados às
palavras, especialmente aquelas usadas na definição das competências
tributárias impositivas646, para constatar que, no caso do armazenamento
digital de dados, há serviço, ainda que adotado o conceito presente no
julgado que considerou inválida a incidência do ISS sobre locação.

De início, releva notar que a definição de serviço como algo que


envolve “obrigação de fazer”, com o avanço da informática, não precisa

810
necessariamente estar atrelada a um “fazer” exclusivamente humano.
Quando surgirem veículos que dispensam motorista e se deslocam
sozinhos, uma companhia de táxis que passe a levar e trazer seus
passageiros em carros automatizados será ainda uma prestadora de
serviços de transporte? Ou haverá a “locação” do veículo? Essa questão
mostra o quanto a realidade é fluida e contínua, não tendo a rigor as
distinções e as divisões departamentalizadas que nela a mente humana
artificialmente traça para melhor entendê-la. Na verdade, se o veículo
automatizado leva o usuário de um local para outro, pré-definidos,
contratando-se o resultado, e não apenas se deixando o carro à disposição
do usuário, parece claro que há serviço, mas de qualquer modo o exemplo
mostra o quanto a distinção se torna cada vez menos nítida.

No caso da nuvem, destinada ao armazenamento digital de dados,


servidores, máquinas, discos rígidos e diversos programadores, trabalham
para deixar à disposição do usuário uma plataforma que não só lhe permite
gravar e acessar remotamente seus dados pessoais, mas que mantém
sincronizados seus dispositivos, estando ainda à disposição para dirimir
eventuais problemas técnicos que surjam.

Músicas, fotos, textos, elaborados ou editados em um computador


conectado à plataforma dropbox, por exemplo, são sincronizados com
aqueles gravados na “nuvem” de maneira automática, e posteriormente
gravados, de forma também automática, em todos os outros dispositivos
(computadores, tablets, celulares) configurados pelo usuário como
devendo estar sempre conectados com a mesma estrutura. A guarda, a
feitura do backup e a sincronização são obrigações de fazer. A própria
estrutura, aliás, não é “locada” e “entregue” ao usuário, mas
disponibilizada de maneira remota, a ele e a inúmeros outros usuários,

811
cada um a utilizar dela uma fração, o que parece subsumir a atividade na
definição corrente de serviço, mesmo que se parta da mais restrita delas.

4. CONCEITO DE “LOCAL DA PRESTAÇÃO” E DE


“ESTABELECIMENTO PRESTADOR”

Admitindo-se a possibilidade de tributação do armazenamento digital


de dados por meio do imposto municipal sobre serviços, como aqui
fazemos, coloca-se então a questão de saber qual seria o Município
competente para a sua cobrança. O problema, que já é difícil em relação a
serviços mais tradicionais e sem qualquer relação com a informática,
torna-se praticamente insolúvel diante de um ambiente em que não existem
fronteiras geográficas.

Sabe-se que, atualmente, o critério utilizado pelo legislador


complementar brasileiro, a quem cabe dirimir conflitos de competência em
matéria tributária (CF/88, art. 146, I), é, como regra, o de considerar
devido o imposto no Município onde o prestador é estabelecido.
Superando problemas criados por fraudes praticadas por contribuintes, e
por uma equivocada interpretação dada pela jurisprudência aos
dispositivos aplicáveis, ainda à luz do Decreto-lei n. 406/68, a Lei
Complementar n. 116/2003 reiterou a disposição segundo a qual o local
em que se considera ocorrido o fato gerador do imposto é aquele onde
estiver estabelecido o contribuinte (art. 3º), mas esclareceu o que se deve
entender por estabelecimento, em artigo assim redigido:

Art. 4º Considera-se estabelecimento prestador o local onde o contribuinte


desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e
que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para
caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento,
sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a
ser utilizadas.

812
No caso do armazenamento digital de dados, porém, assim como nas
hipóteses de tributação em nuvem como um todo, e de diversos outros
serviços prestados exclusivamente pela internet, não é simples identificar o
local onde se acha a unidade econômica na qual se presta o serviço. Seria o
escritório onde os representantes ou prepostos da pessoa jurídica
prestadora do serviço podem ser encontrados? O endereço físico indicado
para fins de correspondência e registro junto a cadastros de contribuintes,
inclusive para registro do domínio do site correspondente? O local onde
estão os servidores nos quais os dados são armazenados? Note-se que
esses lugares podem não coincidir, sendo certo, sobretudo no último
exemplo, do local onde estão os servidores que armazenam digitalmente os
dados, que estes podem mesmo estar espalhados por diversas regiões do
globo, uns servindo de espelho ou de backup para os outros.

Assim, para efeito de aplicação do art. 4º da Lei Complementar n.


116/2003, deve ser considerado estabelecimento o local onde se encontram
as pessoas que trabalham para o prestador do serviço, representando-o, o
qual deverá ser por igual aquele indicado para efeito de correspondência e
de cadastro junto ao Fisco, bem como para o registro do domínio, ainda
que não seja ali o local em que se acham os respectivos servidores.

No caso de esse local situar-se no exterior, a Lei Complementar n.


116/2003 também apresenta uma solução, pelo menos no plano jurídico
abstrato, ao dispor que o “imposto incide também sobre o serviço
proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no
exterior do País” (art. 1º, § 1º). Assim, caso o prestador do serviço esteja
estabelecido no exterior, o que não é raro em se tratando de
armazenamento digital de dados, diante da irrelevância, para o
desenvolvimento da atividade, do local onde fisicamente está estabelecido

813
quem a exerce, seria possível considerar devido o imposto em razão da
importação do serviço, assumindo a posição de responsável tributário,
neste caso, o importador, e de sujeito ativo o Município onde ele, o
importador/tomador do serviço, estiver estabelecido ou domiciliado (art.
3º, I e art. 6º, § 2º).

Parece claro, contudo, que a maior dificuldade, no caso, não é de cunho


jurídico formal, mas técnica, ligada à realidade factual e à sua constatação
por parte de quem tiver de aplicar tais soluções normativas à prática.
Ainda que se entendesse que o ISS não pode incidir sobre o
armazenamento digital de dados, por não se considerar que a atividade
estaria englobada no conceito de serviço, essa dificuldade, como dito,
poderia ser resolvida com a instituição de um imposto residual, ou com a
modificação do âmbito de incidência do ISS por meio de emenda
constitucional.

Embora não seja simples editar atos normativos como uma lei
complementar ou uma emenda constitucional, tais feitos são bem menos
difíceis de serem levados a efeito que a identificação do local em que se
acha fisicamente estabelecido um agente econômico que oferece o
armazenamento digital de dados, e, pior, do que a verificação de que um
usuário, tomador do referido serviço, pagou por ele e está fazendo uso de
tal armazenamento, se tudo acontece no âmbito da internet.

5. DIFICULDADES DE ORDEM TÉCNICA

Em língua portuguesa, a palavra “pode” tem múltiplos significados,


alguns deles designados por palavras diferentes em outros idiomas.
Können e darfen, por exemplo, são dois verbos que em alemão designam
“poder”, mas, no primeiro caso, alude-se à possibilidade factual (alguém

814
que “pode” nadar porque “sabe” ou “consegue” ou “tem a aptidão para”
nadar), enquanto no segundo à possibilidade (ou impossibilidade) por
razões normativas (alguém que não “pode” nadar porque, embora seja
exímio nadador, está “proibido” de fazê-lo).

No caso da tributação das atividades de nuvem, a dificuldade não está


tanto na permissão jurídica (darfen), mas na possibilidade fática (können).

Na internet, é possível ao prestador desse serviço instalar-se onde bem


entender. Para o usuário, isso não faz grande diferença. Pode se
estabelecer, assim, em um paraíso fiscal, acessando, todavia, os mercados
consumidores de todos os demais países do globo. A solução de tributar o
consumidor, ou o usuário do serviço, como “importador” desse serviço,
ainda que não possuísse óbices jurídicos, encontraria dificuldades claras na
dificuldade operacional de Municípios saberem o que as pessoas fazem
quando navegam na internet, até por uma questão de privacidade e sigilo
de dados. Como saber se o cidadão acessa site pornográfico e paga para ter
acesso a certos “serviços” virtuais, por exemplo?

Poder-se-ia pensar em uma obrigação acessória das empresas


operadoras de cartão de crédito, as quais teriam de informar ao Município
onde estabelecido o portador do cartão eventuais gastos com sites que
prestam serviços virtuais tributáveis pelo ISS647. Embora o STJ já tenha
decidido, com razão, que as operadoras não podem ser responsáveis
tributárias por esse imposto648, poder-se-ia sustentar que a mera obrigação
acessória de informar esses pagamentos não seria vedada pela ordem
jurídica. Haveria, contudo, clara violação à intimidade do usuário do
cartão de crédito, e o que deveria ser exceção (o sigilo) tornar-se-ia regra
sem exceções (a divulgação da informação). Além disso, a solução teria
duração muito limitada, porquanto o uso de cripto-moedas, como o

815
bitcoin, esvaziaria por completo essa via de acesso à informação de que
teriam ocorrido possíveis fatos geradores.

A tributação do mero tráfego de bits, de forma semelhante à cobrança


de “pulso” pelas companhias telefônicas, que não raro é cogitada em
discussões dessa ordem, também não se mostra solução satisfatória,
porquanto divorciada inteiramente do princípio da capacidade contributiva.
Seria como tributar o ato de falar, apenas porque por meio de algumas
falas (sustentações orais, aulas, consultorias) desenvolvem-se a atividades
econômicas. Além de haver muito tráfego de dados pelos quais nada se
paga, é evidente que há conteúdos pelos quais se paga muito caro, e outros
de preço muito menor, o que evidencia a impropriedade de se tributarem
todos por uma alíquota específica incidente sobre a mera quantidade de
bits.

O que se assiste, na verdade, é ao crescimento exponencial do que


Marco Aurélio Greco649 chamou “mundo de bits”, no qual as “realidades”
têm valor não pelos átomos dos quais são compostas, mas pela informação
que carregam. Nele, as formas jurídicas moldadas através de milênios,
pensadas à luz do “mundo de átomos”, no qual as coisas valem pelo
material de que são feitas, muitas vezes não funcionam.

Na economia digital, dada a sua mobilidade e a total ausência de


fronteiras, talvez seja o caso de criar condições para que os agentes
econômicos queiram formalizar estabelecimentos nos países nos quais
possuem consumidores dos serviços que prestam, seja para que se facilite a
contratação de pessoas que auxiliarão nessa atividade, conhecendo a língua
e a cultura de cada local, seja para que possam demandar judicialmente
possíveis violações contratuais levadas a efeito por consumidores ali
residentes etc.

816
O agente que exerce atividade no âmbito digital (v.g., dropbox, netflix
etc.), ainda que inteiramente virtual a prestação do serviço, tem vantagens
(não relacionadas à tributação) em se estabelecer fisicamente em cada
grande mercado consumidor. É preciso, nesse cenário, que o ônus
tributário não seja alto a ponto de eliminar essa vantagem. Nesse caso, a
formalização de um estabelecimento físico ocorrerá, permitindo a
tributação aqui referida. A digitalização da economia, nesse contexto, não
deixa de funcionar como limite saudável ao poder de tributar dos Estados
soberanos, o que poderá ser bastante saudável em um futuro não muito
distante.

Talvez o desenvolvimento de atividades econômicas em ambiente


puramente virtual esteja a lançar desafio sem precedentes às
Administrações Fazendárias, e às entidades públicas às quais pertencem,
que se terão de adaptar e competir saudavelmente para atrair contribuintes
para seus territórios e levar a que se identifiquem e sejam transparentes no
que tange aos fatos economicamente relevantes que realizam. Pode-se
estar diante do surgimento de um novo tipo de Estado, que sucederá ao
Fiscal, o qual até pode continuar contando com o tributo como principal
fonte de custeio, mas não poderá valer-se apenas de sua soberania para
compelir seus cidadãos a satisfazê-lo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo que se verificou ao longo deste texto, pode-se concluir que a


atividade de armazenamento digital de dados tende, no Brasil, a ser
tributada como configurando a prestação de um serviço de qualquer
natureza, previsto na lista taxativa anexa à Lei Complementar n. 116/2003.

817
Há, parece claro, contrato no qual o prestador se obriga a disponibilizar
ao usuário uma estrutura on-line na qual seus arquivos fiquem
armazenados em segurança, sendo passíveis de serem acessados por meio
da internet de qualquer ponto do planeta.

Verifica-se, nesse contrato, uma obrigação de fazer, consistente na


manutenção da referida plataforma de armazenamento, o que se coaduna
até mesmo com a visão dita civilista do conceito de serviços, acolhida pelo
STF no julgamento referente à locação de bens móveis. Assim, as
disposições da Lei Complementar n. 157/2016, que expressamente
incluíram tal atividade na lista de serviços parecem constitucionais. E isso
para não referir a evolução na compreensão do significado da palavra
serviço que se tem observado na jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal. Como a nuvem parece mesmo ter criado uma zona sombreada
entre os campos de incidência do ISS e do ICMS, mostra-se pertinente à
lei complementar dirimir possíveis dúvidas, como fez no caso de
fornecimento de bebidas por bares e restaurantes, ou no caso das chamadas
operações mistas.

O grande desafio para a tributação de referidas atividades, na verdade,


não é jurídico-formal. Não se trata, portanto, apenas de saber se o
armazenamento digital de dados, no âmbito das chamadas “nuvens”, pode
ser considerado pelo legislador complementar como inserido na
competência tributária municipal, aspecto que nos parece solucionado,
mesmo porque seria mais cedo ou mais tarde contornado por meio de uma
emenda constitucional, ou de uma lei complementar que viabilizasse sua
tributação no âmbito da competência impositiva residual da União. Na
verdade, a maior dificuldade na tributação desse tipo de atividade, como
de resto ocorre com todas as que se verificam exclusivamente em ambiente

818
virtual, é técnico-informática, e diz respeito à localização de contribuintes
e identificação de fatos geradores, o que se tornará ainda mais
problemático com a popularização das chamadas criptomoedas, a exemplo
do bitcoin.

819
Tributação de marketing digital por meio de
websites: Caso Google Adworks e o
contraponto entre as perspectivas brasileira e
internacional
1
Luciana Ibiapina Lira Aguiar

INTRODUÇÃO

Este artigo tem por objetivo analisar a tributação de marketing digital


por meio de websites, especialmente as conhecidas pela expressão “ad”, a
partir da legislação brasileira vigente. O estudo será desenvolvido sob a
ótica das empresas que disponibilizam as plataformas “ad” para potenciais
anunciantes interessados e não sob a ótica dos sites parceiros (Rede de
Display). Plataformas “ad” são disponibilizadas por vários provedores,
mas esta pesquisa elegeu, como caso a ser estudado, as ferramentas
disponibilizadas pelo Google2.

A partir das análises desenvolvidas, serão levantados os aspectos que


inspiram maior atenção e que podem merecer aprimoramentos por parte da
legislação brasileira. Para tanto, seguindo a proposta desta obra, deverão
ser trazidas, na medida do possível, experiências internacionais que
possam ser comparadas à realidade brasileira.

3
1. CONTEXTO GERAL: O MUNDO VIRTUAL OU DIGITAL

A expressão Economia Digital refere-se às atividades econômicas


desenvolvidas por meio do uso de tecnologia digital, ou seja, transações
econômicas realizadas por meio da rede mundial de computadores
(“internet” ou “web”). Na economia digital, os bits armazenados em

820
computadores e que viajam por redes representam o meio pelo qual os
negócios são viabilizados.

No atual estágio da economia, os negócios realizados neste âmbito


estão entrelaçados na rotina da vida contemporânea, que já não mais
comporta separação entre “mundo real” e “virtual”. Mesmo quando se
deseja uma experiência real (em oposição à virtual) de compra, várias são
as atividades preliminares que são feitas via web, por meio de sites de
busca, ou mesmo em redes sociais. Trata-se, portanto, de um processo de
migração para uma economia baseada em serviços e funcionalidades que
relaciona negócios em rede, presença física, atividades econômicas
compartilhadas, “abrigos virtuais” de pequenos negócios, processos
produtivos mais integrados e colaborativos.

Logo no surgimento das primeiras atividades econômicas virtuais,


alguns estudiosos4 afirmavam que apenas o meio no qual os negócios
tradicionais se realizam havia mudado, mas as atividades econômicas
permaneciam as mesmas e, portanto, as leis tributárias já existentes seriam
capazes de regular as atividades virtuais ou digitais.

Essa afirmação, todavia, parece não resistir aos dias atuais. O


desenvolvimento dessa nova “Economia Digital” demonstra ser um grande
desafio para os sistemas legais e tributários de todo o mundo. Nesse
sentido, o sistema tributário brasileiro, também afetado pela evolução da
jurisprudência dos tribunais, apresenta ainda maiores dificuldades, na
medida em que confere ênfase à atividade industrial e comercial, à
mercadoria e serviços, num tempo em que a economia dá e dará cada vez
maior importância aos direitos e intangíveis.

821
E é no meio desse contexto que este artigo se propõe a compreender o
marketing digital desenvolvido por ferramentas tipo “ad”, tais como
AdWords do Google e os Social Ads5. A plataforma do Google AdWords e
os anúncios dentro das redes sociais permitem opções de segmentação para
garantir resultados mais eficientes e eficazes em campanhas de marketing
e estão cada vez mais presentes na vida de pequenas, médias e grandes
empresas, já superando as formas tradicionais de marketing, pelo menos
nos Estados Unidos, desde 20156.

7
2. FORMAS USUAIS DE MARKETING DIGITAL

Segundo a American Marketing Association, marketing é definido


como:

[o] processo de planejar e executar a concepção de ideias, produtos e serviços


definindo preço, promovendo e distribuindo-os para criar trocas que atendam aos
objetivos de satisfação e necessidades e a realização de desejos individuais e
8
organizacionais .

A origem e respectiva função social da atividade decorre da necessidade


de otimizar trocas e transações. Com sua evolução, o marketing passou a
ter novos segmentos como “marketing de relacionamentos” (estabelece
relacionamentos mutuamente satisfatórios no longo prazo), marketing
institucional (desenvolve marca ou nome de determinada empresa),
marketing de conteúdo (engaja público-alvo visando ao crescimento da
rede de clientes e potenciais clientes por meio da criação de conteúdo que
cria percepção positiva da marca9), entre outros.

Na era atual, a internet é a alma do marketing, e a publicidade on-line se


encontra em franco desenvolvimento. Se no início o marketing digital era,
fundamentalmente, um complemento do marketing off-line, atualmente o

822
espaço virtual encontrou novos mecanismos e se tornou estratégico para a
maioria das campanhas publicitárias.

É possível auditar e mensurar sua repercussão, selecionar o público-


alvo. Os custos são significativamente menores que os do marketing
tradicional, além de sua abrangência ser enorme. Em razão dessas
características, o marketing digital ganha a cada dia mais relevância10 na
estratégia de marketing das empresas.

A seguir serão brevemente relatadas as principais formas de marketing


digital, o que se faz buscando compreender as sutis diferenças deste para o
formato tradicional.

2.1. Banners

No início do marketing digital, o que se via na web eram banners, ou


seja, um link, exibido na forma de pequenos quadrinhos veiculados em
uma página da internet. Esta foi a primeira forma de marketing digital.

Por estar em um ambiente virtual, o banner representa a criação de


vínculos entre a página virtual na qual é exibido e a do anunciante, o que
se faz por meio de programação. Desse modo, o banner é um chamariz
para que o usuário clique na publicidade e seja redirecionado para o site do
anunciante. A princípio, a atividade parece ser idêntica à dos anúncios
veiculados no “mundo real”, mas a principal diferença é que a empresa
anunciante pode contar os “clicks” no banner, e se o negócio anunciado
também for virtual, pode-se até verificar quantos clicks se converteram em
compras. Essa condição se contrapõe, com vantagem, às publicidades
tradicionais.

823
Outra importante diferença está em como se veicula a publicidade e em
quem as veicula. Na publicidade tradicional, anúncios são veiculados em
outdoors, TV, rádio, jornal e revista, enquanto na digital, normalmente os
veículos são websites com grande volume de acessos e que, produzem
conteúdos, ou que podem aparentar, ao usuário, não ter necessariamente a
intenção de proporcionar negócios. É o caso de redes sociais, blogs ou
webpages de notícias. Portanto, qualquer detentor de uma página na web é
um potencial anunciante de propagandas digitais

Isso, por si, mostra uma enorme diferença não só na atratividade da


propaganda digital, mas também nas partes que se envolvem no negócio.
Os motores de busca, que só existem na internet, são capazes de relacionar
os assuntos objeto da navegação dos usuários e os anúncios que eles
poderão visualizar.

O modelo de remuneração também é um fator de distinção. Se, no


início, os anúncios eram precificados a valor fixo, sem relação entre o
número real, ou mesmo o esperado de visitantes do site, atualmente o
preço costuma estar relacionado a indicadores de eficiência, o chamado
modelo CPM (custo por mil impressões ou visualizações de página), entre
outras variações.

2.2. Cookies

Para que sejam celebrados negócios on-line, usualmente são requeridos


registros contendo dados do usuário (comprador em potencial). Também
são registrados os dados da transação, os caminhos por onde o usuário
passou até que chegasse no seu foco de interesse e tudo é armazenado
digitalmente, não em um servidor11, mas no navegador local12 do usuário.
Estes dados armazenados no navegador são chamados de “cookie”.

824
Segundo a Central de Proteção e Segurança da Microsoft, cookies são
“pequenos arquivos que os sites colocam no disco rígido do seu
computador quando você os visita pela primeira vez”13. O cookie funciona
como um cartão de identificação exclusivo do usuário, e tem por função
notificar o site quando este mesmo usuário voltar, sendo capaz de gerar
informação, em relação a um determinado usuário, sobre quantidade de
acessos a uma página, preferências, registro de produtos e serviços de
interesses e ainda personalizar páginas14. Os cookies também podem ser
usados para registrar a localização do navegador, de modo a exibir
anúncios direcionados para um país ou uma cidade específica15.

O cookie, tecnicamente, pode ser definido como um bloco de texto


(tags de identificação digital), cuja composição depende diretamente do
conteúdo do endereço web visitado. Os cookies podem ser usados para
rastrear páginas da web visitadas, dados de itens de interesse (p. ex., itens
inseridos em “carrinho virtual de compra”), o que é conhecido como
“trilha de clique”, provendo informações valiosas para criação de um perfil
do usuário, mostrando a ele o que lhe interesse e deixando de mostrar o
que parece não lhe interessar.

Quem nunca teve a experiência de ver anúncios, por exemplo, sobre


galochas infantis aparecendo no feed de notícias de um site de rede social,
não por acaso, logo após uma pesquisa sobre galochas infantis em outra
página da web? Obviamente não se trata de coincidência, e a relação é
estabelecida pelos cookies.

Isto ocorre porque as empresas de publicidade on-line inserem anúncios


em páginas web com os cookies marcados neles. Após o “clique”, os
cookies começam a criar a trilha de clique e, por conseguinte, o perfil do
usuário à medida em que ele se move de um site para outro. É assim que as

825
empresas de publicidade especializadas em mídia digital, criam um perfil
dos hábitos de navegação e usam-no para exibir anúncios em seus sites
parceiros. As informações obtidas a partir dos cookies, muitas vezes, são
compartilhadas entre diversas entidades na internet.

Resumindo, então, segundo Ricardo Prates Moraes16, no marketing pela


web os cookies são utilizados com alguns objetivos:

•Gravar e lembrar quem é cada internauta e ter acesso às informações


armazenadas, para poder entregar serviços ou produtos personalizados.
•Estimar o tamanho da audiência. Podem ser usados para medir a frequência de
utilização repetitiva das áreas de um site ou portal e, assim, ajudam a
alavancar a venda de publicidade baseada nos interesses e comportamentos do
usuário.
•Rastrear o progresso e número de cadastros em algumas promoções, concursos,
enquetes (pesquisas) e serviços.
•Analisar quais as áreas da rede os internautas visitam. Essa análise é feita para
entender a semelhança ou diferença dos hábitos dos usuários. Essa informação
17
pode ser usada para melhorar o conteúdo, banners, promoções .

2.3. “Links Patrocinados”: Pay Per Click

Em 2000, o Google apresentou seu primeiro programa de publicidade


chamado AdWords, que permitiu que os anunciantes colocassem seus
anúncios junto aos resultados da pesquisa18. Estes foram chamados de
“links patrocinados” e, no começo, apareciam no lado direito da página de
busca, demarcados por uma linha vertical que os separavam.

Atualmente, os links patrocinados aparecem nos primeiros resultados da


busca, com a indicação “ad” para identificar que se trata de um link
patrocinado. Os anúncios são eleitos como prioritários para divulgação
(exibição de forma privilegiada) em função do acordo comercial entre
anunciante e Google, e também podem constar ao lado, acima e/ou abaixo
dos resultados das buscas orgânicas.

826
Inicialmente, os anunciantes do AdWords pagavam com base no
número de vezes que seus anúncios apareciam ao lado da pesquisa de
resultados. Em 2002, o preço da transação passou a ser estabelecido em
função do “clique” (“pay per click”).

O Google AdWords pode ser definido como um programa de publicação


de anúncios, e os grandes atrativos, conforme o próprio site informa, são19:

•Minimizar as incertezas nos esforços de marketing;


•Tornar os esforços mensuráveis, confiáveis e flexíveis: mostra quantas pessoas
viram os anúncios e qual porcentagem delas clicou para acessar o website.
Com as ferramentas de acompanhamento, é possível até ver as vendas reais
que seu website está gerando como resultado direto de seus anúncios.

Em 2005, o Google iniciou o AdSense, que expandiu o alcance do


anunciante no AdWords para outros sites, que também utilizam “Pesquisa
Google”20. O programa Google AdSense exibe anúncios do Google
AdWords em outros websites (que não a página de busca do Google). A
partir desta etapa, os banners e as funcionalidades dos cookies passaram a
fazer parte do processo de marketing disponibilizado pelo Google.

Nesse caso, a relação negocial ocorre entre o Google e os editores da


web que recebem pelos anúncios (banners) exibidos em seus sites com
base nas impressões ou nos cliques de usuários, dependendo do tipo de
anúncio21. Assim, caso um visitante, em um “site parceiro”22, execute uma
pesquisa utilizando a “Pesquisa do Google” em busca de galochas infantis,
as lojas virtuais que vendem galochas infantis e que pagam por links
patrocinados terão seus anúncios veiculados para o visitante nas páginas
que ele usar. Os anunciantes (links patrocinados) pagarão ao Google, que
por sua vez dividirá as receitas com o site parceiro que exibiu o anúncio.

827
O AdSense é, portanto, um sistema no qual blogs e websites recebem a
contraprestação pela publicação/veiculação de anúncios criados no Google
AdWords. AdWords e AdSense são duas ferramentas de marketing
correlacionadas, na medida em que uma parte paga ao Google para criar e
publicar anúncio via Google AdWords, e o Google repassa percentual do
valor que lhe foi pago para o site de sua “Rede de Display” (sites
parceiros), que divulga o anúncio. Atualmente, portanto, somando-se os
dois programas, um anunciante poderá ter seus links patrocinados
divulgados da seguinte forma:

•Rede de Pesquisa: quando os clientes efetuam uma busca por palavras-chave, e


o Google exibe os anúncios de acordo com a busca realizada.
•Display: são anúncios em formato texto ou imagem que são exibidos em sites e
blogs parceiros do Google e que exibirão os anúncios de acordo com o
conteúdo ou até mesmo o perfil dos visitantes desses sites. Os anúncios podem
ser exibidos também dentro do Gmail ou página do Youtube.
•Remarketing: após acessar a loja virtual e não efetuar uma compra, o cliente
passará a visualizar anúncios relacionados ao produto visitado, aumentando
assim as chances de finalizar a compra, uma vez que já teve contato com a sua
23
loja anteriormente .

Assim, a página de resultados de Pesquisa Google deixou de ser a única


forma de divulgação do objeto anunciado, mas todo o mecanismo de
anúncio funciona de forma interligada. Os resultados da busca do usuário
desencadeiam os anúncios. A chave na programação é a palavra-chave de
busca, e as agências de marketing digital trabalham identificando essas
palavras porque isso, na verdade, é o principal para o sucesso ou fracasso
da estratégia de marketing. Se as palavras que as pessoas digitarem no
Google corresponderem às palavras-chave do anunciante, então o anúncio
será exibido.

Desse modo, banners, cookies e programas de computação usados


diretamente pelo interessado para definir sua estratégia da campanha

828
montam o conjunto de ferramentas e funcionalidades desse tipo de
marketing digital. O investimento para o interessado é mais baixo do que
em mídias tradicionais, sendo um meio, portanto, mais acessível a médias
e pequenas empresas que não poderiam fazer anúncios de outra forma em
função dos custos.

Por fim, deve-se mencionar que a exibição dos anúncios passa por um
processo prévio denominado “Leilão”, que acontece com cada pesquisa do
Google. Sempre que um anúncio estiver qualificado para exibição em uma
pesquisa, ele passa pelo leilão de anúncios, que irá determinar a sua
“posição de anúncio” na página24. Assim, quando alguém pesquisa na
página de busca Google, o sistema AdWords encontra todos os anúncios
cujas palavras-chave correspondem à pesquisa. A partir deles, o sistema
ignora aqueles que não são qualificados (p. ex., anúncios reprovados ou
segmentados para um país diferente). Dos restantes, apenas aqueles com
determinada classificação serão exibidos. A classificação do anúncio é
uma combinação do seu lance com a qualidade do seu anúncio, e o
impacto esperado de extensões e outros formatos de anúncio25.
26
3. IMPULSIONAMENTO DE CAMPANHAS NA INTERNET: ADWORDS
E SUA NATUREZA JURÍDICA

Após compreender a atividade complexa do marketing digital por meio


de banners, cookies e links patrocinados, definir a natureza jurídica do
impulsionamento de campanhas na internet (as “Ads”) passa a ser o
próximo desafio necessário à compreensão de sua tributação.

Nos Termos e Condições de uso do Google AdWords (“Termo”) é


possível encontrar a informação de que o Google Brasil Internet Ltda.
intermedia e representa a Google Inc. na venda do Programa de

829
Publicidade da Google Inc., no Brasil (“Programa”). O Termo, em suas
próprias palavras, tem por finalidade reger:

a participação da Contratante no programa de publicidade da Google Inc. e os


serviços (i) que sejam acessíveis através da conta designada à Contratante em
conexão com estes Termos ou (ii) que incorporem por referência estes Termos (em
27
conjunto, os “Programas”) .

O programa ao qual o Termo faz referência é assim descrito:

O Programa é uma plataforma de publicidade na qual o Contratante


autoriza o Google, agindo no melhor interesse da Google Inc., a utilizar
28
ferramentas automatizadas para formatar Anúncios . (Grifos nossos.)

A princípio, a empresa disponibiliza a licença para que o seu cliente


(que precisa se inscrever e aceitar os termos e condições de uso), por meio
de sua plataforma, acesse o Programa e descreva as características que
desejar para seu anúncio. O uso do Programa viabiliza a formatação de
anúncios (texto, vídeo ou combinações de ambos), opções de segmentação,
público-alvo, entre outros.

A partir desse ponto, o Google desenvolve diversas atividades no


sentido de garantir o fiel cumprimento das condições estabelecidas junto
ao contratante. Ainda em relação ao objeto do contrato, a Cláusula
Terceira do Termo assim descreve o seu escopo:

3. Fornecimento de Anúncios. (...) (b) A Contratante poderá utilizar um servidor


de Anúncios exclusivamente para fornecer ou rastrear os Anúncios sujeitos aos
Programas que permitam o fornecimento de Anúncios por terceiros, e apenas se o
servidor de Anúncios tiver sido autorizado pela Google Inc. e Google a participar
do Programa. O Google tomará todas as providências necessárias para a
implementação dos tags do servidor de anúncios da Contratante de forma a
29
torná-los substancialmente funcionais (...) . (Grifos nossos.)

Pela leitura dos termos, é possível compreender que há uma atividade


complexa, aparentemente composta por mais de um negócio jurídico. Para

830
o Google, ângulo pelo qual esta análise se desenvolve, certamente está
caracterizada a licença de uso de um programa de computador e, a
princípio, vislumbra-se a atividade de processamento de dados. O certo é
que há apenas um preço pago pelo conjunto deste negócio.

De maneira a desvendar a natureza deste negócio, portanto, o ponto de


partida é a definição legal de software ou programa de computador, para
então compreendermos a natureza do contrato de licença de uso e, por fim,
verificar se o processamento de dados, presente na composição de
funcionalidades que geram o resultado contratado, pode ser compreendido
como uma atividade autônoma nesse contexto e, em caso afirmativo, se
cabe na definição de prestação de serviço.

3.1. Programa de Computador: o software

Elisabeth Kanthack define software como “a reunião de programas e


procedimentos que efetuam o processamento de dados no computador”30.
Segundo Arnaldo Rizzardo, as seguintes atividades são fundamentais no
software, a saber: criação ou elaboração de programas de computação,
processamento ou aplicação de dados, o que requer um suporte físico
(hardware) no qual o programa deve ser instalado e o armazenamento de
dados31.

De acordo com o art. 1º, da Lei n. 9.609, de 19 de fevereiro de 1998


(Lei n. 9.609/98), programa de computador (software) é

a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou


codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário
em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos
ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los
funcionar de modo e para fins determinados.

831
De acordo com o art. 7º, XII, da Lei n. 9.610/98, programas de
computador têm natureza jurídica de direito autoral, o que torna o direito,
em si, inalienável (impossível de ser comprado e vendido), havendo
apenas a possibilidade de transacionar a licença de seu uso32. A legislação
brasileira, portanto, equipara o esforço humano intelectual para
desenvolvimento do software a um direito de autor, de forma a protegê-lo
moral e patrimonialmente. A sua exploração é assegurada com
exclusividade a quem o desenvolveu que pode, no entanto, permitir o seu
uso dentro de determinadas condições, fazendo disso uma atividade
mercantil.

A doutrina e a jurisprudência33 consagraram o entendimento acerca das


categorias de software explicadas por Rui Saavedra, em sua obra A
proteção jurídica do software e a internet34, a saber: software de prateleira,
software adaptado ao cliente e software sob encomenda.

3.2. Licença de uso de software

A Lei n. 9.609/98, em seu Capítulo IV (“Dos Contratos de Licença de


uso, de Comercialização e de Transferência de Tecnologia”), tipifica o
negócio em que o autor transaciona o direito de uso do software por ele
desenvolvido como “licença de uso” (art. 9º).

Desde o início dos estudos acerca da natureza dos programas de


computador e das formas de exploração do direito que deles decorrem,
houve significativa evolução na tecnologia, e as relações negociais que os
envolvem se tornaram muito mais complexas, como é possível ver a partir
da situação objeto do presente estudo. Atualmente, licenças de uso
costumam vir desacompanhadas de suporte físico e muitas vezes não

832
requerem nenhuma forma de download, mas decorrem de autorização para
acesso ao software pela internet ou na nuvem (cloud computing).

Os programas aqui estudados se encaixam neste perfil. AdWords e


AdSense são softwares que não requerem download e são capazes de gerar
processamento de informações e funcionalidades. Na busca da
compreensão desse mecanismo de marketing digital, os seguintes
requisitos parecem ser essenciais, a nosso ver:

i) Natureza material ou não do software: como já mencionado, o art. 1º, da


Lei n. 9.609/98 define software a partir de conceito amplo. É certo que se
trata de um direito, mas não é possível saber, apenas a partir da leitura do
dispositivo, se também envolve prestação de serviço ou se o software (na
verdade sua licença de uso) poderia ser interpretado como um bem móvel.
Diante dessa questão, a doutrina criou e a jurisprudência consagrou as
categorias “software de prateleira” e “software de encomenda”. O primeiro
foi entendido como uma mercadoria, e o segundo, como serviço, porque
vendido para usuário específico, a partir de suas especificações.
ii) Características do contrato que contribuam para a identificação de sua
natureza: para além dessa distinção, alguns doutrinadores argumentam que a
natureza jurídica do contrato que rege a relação do usuário com o software é
relevante e complementar, e esta parece ser uma ponderação acertada.
Seguindo as duas categorias acima mencionadas, entende-se como
“mercadoria”, compreendida em um conceito mais amplo do que um bem
material e corpóreo, o objeto de contrato firmado no modelo de adesão, ou
seja, contrato em que uma das partes (o usuário) aceita os termos propostos
pela outra parte, sem prévia discussão sobre as cláusulas já impostas pelo
detentor original do direito. Já no caso de software por encomenda (serviço),
os contratos têm suas cláusulas negociadas pelas duas partes, havendo
manifestações de vontades especificamente pactuadas, de modo que o
resultado será único para o contratante.
iii) Verificação de esforço humano para o resultado do negócio: neste ponto,
não se trata de verificar o esforço para o desenvolvimento do software. Este,
sem dúvida, ocorreu e representa um direito imaterial que está compreendido
na propriedade intelectual e que faz nascer o direito de autor, o qual não é
transferido ou negociado no contrato de licença. Trata-se de avaliar se o
resultado contratado pelo usuário do programa de computador (i.e.,
AdWords) depende de novas ações humanas de processamento e análise de
35
dados , por exemplo. Caso se trate de uma função desempenhada,
exclusivamente, pelo computador (servidor, utilitários etc.) e usuário, não

833
haverá ação humana por parte do contratado que se agregue a um
determinado resultado, necessária para a caracterização da prestação de
36
serviço .

A prestação de serviços é negócio previsto no Código Civil37 como


contrato sinalagmático, por meio do qual uma das partes se compromete a
uma obrigação, a qual deve depender da ação humana e para a qual
normalmente há contraprestação. Essas características parecem não estar
contempladas no negócio sob análise, uma vez que a funcionalidade do
AdWords decorre do processamento produzido pelo software instalado em
determinado equipamento (servidor, hardware).

A bem dizer, o anunciante utiliza o AdWords e, a partir dos seus inputs,


combinados com inputs de outros usuários vinculados à rede Google, o
próprio programa processa as informações e gera os resultados esperados.
Pela leitura do material disponível na página do AdWords, não se verifica a
intervenção humana (do contratado – Google) diretamente na execução do
objeto do contrato. Há atividades auxiliares como serviço de atendimento e
apoio para solução de dúvidas e problemas (suporte ao cliente), mas estas
não são atividades-fim e pelas quais se paga algo; são, tão somente,
complementos da contratação.

Conclui-se, portanto, que o Google é remunerado pela funcionalidade


que disponibiliza, a partir do uso de um programa e sem a intervenção
direta de esforços humanos empreendidos. Para quem usa, trata-se de
ferramenta, similar a um aplicativo ao qual se tem acesso a partir da web e
que funciona no sistema “do it yourself”.

4. ASPECTOS TRIBUTÁRIOS: IMPULSIONAMENTO DE MARKETING


DIGITAL
38
4.1. Tributação Direta nas operações cross-border

834
O Google adota, como regra geral, que as operações iniciadas nos
países da América do Norte sejam contratadas junto à empresa nos Estados
Unidos. Já nos demais casos, a contratação é realizada junto ao Google na
Irlanda. Para alguns países, no entanto, a empresa optou por manter apenas
operações locais no que toca ao AdWords e ao AdSense. Este é o caso do
Brasil, e, certamente, uma das razões para esta opção é de natureza
tributária.

Caso os anunciantes brasileiros tivessem, como única opção, contratar


com o Google na Irlanda significaria dizer que teriam que cumprir as
normas tributárias voltadas a operações internacionais (cross-border).
Nesse caso, caberia analisar as incidências usuais para dois tipos de
operação possíveis: remessa a título de direito autoral (caso a contraparte
fosse o Google autor) ou pagamento de royalties39 (caso a contraparte
fosse o Google detentor de licença do autor para exploração).

A seguir, será analisada a situação que seria a mais usual nesse tipo de
negócio: o pagamento de royalties.

4.1.1. Royalties

As remessas a título de royalties por licenciamento de uso de software


estão sujeitas à incidência de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF40) à
alíquota de 15%. Por sua vez, a contribuição de intervenção sobre o
domínio econômico instituída em pagamentos de royalties (CIDE-
Royalties), de acordo com o disposto no art. 1º, § 1º-A, da Lei n.
10.168/200041, não incide sobre a remuneração pela licença de uso ou de
direitos de comercialização ou distribuição de programa de computador,
salvo quando envolver a transferência da correspondente tecnologia.
Segundo exposto na recente Solução de Consulta de Divergência n.

835
18/201742, a transferência de tecnologia se caracteriza pelo fornecimento
do código-fonte e dos conhecimentos necessários para alterá-lo. Caso não
fique caracterizada essa transferência, incidirá somente o IRRF.

Em relação à incidência de PIS e COFINS importação, nos moldes


descritos na Lei n. 10.865/2004, por muitos anos foi acometida por enorme
polêmica. A Receita Federal, contudo, já afirmou que não incidem PIS e
COFINS na importação sobre valores pagos, creditados, entregues ou
remetidos para empresas no exterior a título de royalties43. Nesta
manifestação, foi elucidado que o licenciamento de software não se
confunde com o contrato de prestação de serviços, mas configura cessão
de direito de uso.

4.2. Tributação indireta

Já foi possível concluir que o marketing digital funciona de maneira


completamente diferente do marketing off-line. O que no marketing off-
line seria uma atividade mesclada pela criação do anúncio, seguida de sua
veiculação, no marketing digital se torna a aplicação de uma
funcionalidade disponibilizada por um software, o qual é acessado pelo
usuário a partir de um contrato de licença de uso. A ênfase está muito
menos na criação da campanha e muito mais na estratégia.

A disponibilização da funcionalidade AdWords ou AdSense não cabe,


evidentemente, na hipótese de incidência do Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços – ICMS44. Não há, aqui, subsunção do fato jurídico
(licença de uso) à norma legal que define o aspecto material do ICMS. É
uma hipótese legal prevista há décadas45 no sistema tributário brasileiro. O
tributo, tal qual conhecemos, teve suas regras estabelecidas diante de uma
outra realidade econômica e ainda mantém como fato gerador circulação

836
de mercadorias e a prestações de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações
se iniciem no exterior.

Pela natureza do impulsionamento de marketing digital, não parece


difícil afastá-lo das características de operações sobre as quais o ICMS
incide. Não há circulação de mercadoria, nem mesmo se desprezada a
necessidade de um suporte corpóreo para essa caracterização. Assim, seja
pela análise da utilidade, sejam pelas características jurídicas do contrato,
o AdWords não cabe na regra matriz de incidência do ICMS46.

Em relação ao Imposto sobre Serviços (ISS), previsto no art. 156 da


CF/88, a análise a seguir desenvolvida se baseia na jurisprudência formada
no Supremo Tribunal Federal (STF) a partir do RE 176.626/SP47, ainda
não alterada por aquele tribunal.

Há uma enorme controvérsia em torno do conceito “prestação de


serviços” no que toca a incidência do ISS. Estudiosos48 contemporâneos
entendem como superada a necessidade de o conceito se encaixar
perfeitamente numa “obrigação de fazer”49 e seguem a linha de que
serviços podem ser definidos por exclusão, ou seja, todo o produto da
atividade econômica que não seja bem material.

O STF, no julgamento dos RE 547.24550 e RE 592.90551, ao permitir a


incidência do ISS nas operações de leasing financeiro e leaseback
sinalizou que a interpretação do conceito de “serviços” no texto
constitucional tem um sentido mais amplo do que tão somente aquele
vinculado à “obrigação de fazer”.

837
Segundo o que ficou assentado no RE 651.703/SP, de 29 de setembro
de 201652, a finalidade do enquadramento da obrigação como de dar ou de
fazer

escapa totalmente àquela que o legislador constitucional pretendeu alcançar, ao


elencar os serviços no texto constitucional tributáveis pelos impostos (por exemplo,
serviços de comunicação – tributáveis pelo ICMS; serviços financeiros e
securitários – tributáveis pelo IOF; e, residualmente, os demais serviços de qualquer
natureza – tributáveis pelo ISS), qual seja, a de captar todas as atividades
empresariais cujos produtos fossem serviços, bens imateriais em contraposição
aos bens materiais, sujeitos a remuneração no mercado. (Grifos nossos.)

Pela leitura do texto transcrito acima, é possível concluir que o STF


estabeleceu um cenário de aparente rejuvenescimento da norma por meio
de intepretação dinâmica do texto constitucional. Contudo, conforme
apontado na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 1.945/201153, a
interpretação encontra seus limites a partir da hermenêutica, conforme
lecionado na doutrina de Carlos Maximiliano54.

Conforme restou definido no AI 246239 AgR55, a interpretação,


qualquer que seja o método hermenêutico, tem por objetivo definir o
sentido e esclarecer o alcance de preceito contido no ordenamento
positivo, não se confundindo com um ato de produção normativa. Assim,
incluir na hipótese de incidência do ISS todos os bens imateriais em
contraposição aos bens materiais, sujeitos a remuneração no mercado
parece não ser um caminho adequado, sob pena de o Judiciário invadir
competência do legislativo na produção de normas abstratas.

Apesar de haver dúvidas razoáveis sobre a abrangência da hipótese de


incidência nos termos pretendidos pelo recente RE 651.703 SP, a Lei
Complementar n. 157/2016 (LC n. 157/2016) introduziu novos itens à lista
anexa à Lei Complementar n. 116/2003 (LC n. 116/2003), visando
atualizar e aprimorar a redação dada anteriormente. Dentre os novos itens

838
da lista, para a atividade analisada neste estudo são destacados os
seguintes:

1.03 – Processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos,


imagens, vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre
outros formatos, e congêneres.
1.09 – Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo,
imagem e texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e
periódicos (exceto a distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de
Acesso Condicionado, de que trata a Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2٠11,
sujeita ao ICMS).
17.25 – Inserção de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e
publicidade, em qualquer meio (exceto em livros, jornais, periódicos e nas
modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção
livre e gratuita). (Grifos nossos.)

Pragmaticamente, a partir da leitura do texto transcrito, parece claro que


há a intenção de abranger todas as novas atividades desenvolvidas em
meio digital, tributando pelo ISS, inclusive as receitas auferidas a partir do
uso do AdWords e AdSense. Essa pretensão, no entanto, não parece a mais
adequada para que o sistema tributário brasileiro se construa em relação a
operações digitais de forma racional e juridicamente correta.

Nesse sentido, a análise desenvolvida por Wellington Antunes Maia56,


com foco em outros negócios digitais, parece adequada também para o
presente caso. O autor afirma que a atualização de definições
constitucionais não pode deformar o seu conteúdo original de modo a
causar evidente insegurança jurídica. Daí porque não se pode chamar de
prestação de serviços aquilo que não envolve atividade humana como
principal elemento da execução do objeto do negócio. Incluir na lista
anexa à LC n. 116/2003, atualizada pela LC n. 157/2016, novos tipos de
negócios que são mais adequados a outro tipo de intangível pode satisfazer
finalidades arrecadatórias, mas certamente não é a melhor solução jurídica

839
para que seja estabelecida a tributação indireta nessas transações, o que se
conclui com base no conteúdo do art. 11057 do Código Tributário Nacional.

A pesquisa junto a organismos internacionais demonstra que a


tributação indireta está dividida em bens corpóreos (sujeitos a Value Added
Tax – VAT) e tributação sobre comércio de serviços e intangíveis (sujeitos
a VAT ou GST – good and services tax), portanto a literatura internacional
não dá relevância para o conceito de serviço e simplifica a incidência
tratando os intangíveis (serviços e outros) de forma residual, ou seja, tudo
aquilo que não é uma mercadoria ou um bem corpóreo.

O exemplo tomado a partir de sistemas estrangeiros parece ser uma


maneira mais adequada de ajustar a nossa legislação para que direitos e
serviços possam ser tributados pela esfera municipal. Para isso, no entanto,
a norma constitucional teria que sofrer alteração já que não há previsão
constitucional para a tributação indireta de direitos, exceto pela
competência residual atribuída à União e prevista no art. 154, I da CF/88.

4.3. AdWords: tributação indireta no mundo

Diante da situação inusitada brasileira e da visão do Direito no exterior


quanto à tributação indireta de serviços e intangíveis, resta verificar as
soluções encontradas em outros sistemas tributários especificamente em
relação à atividade sob análise.

Os usuários do AdWords no mundo pagam suas contas ao Google em


Dublin, exceto em alguns países nos quais o Google só efetua negócios
locais, como é o caso brasileiro em que os negócios são sempre entre o
anunciante e o Google Brasil Internet Ltda.

840
Nesse sentido, as empresas baseadas no Reino Unido podem não ser
tributadas no IVA nas faturas emitidas pelo Google. No entanto, presentes
determinados requisitos, o IVA pode acabar incidindo por meio do
chamado “Mecanismo de cobrança reversa”58.

No quadro abaixo estão alguns exemplos de países, e a forma como a


operação é tributada, de acordo com as instruções contidas na própria
página do AdWords59.

País Tributação

Há a incidência de VAT (Taxes or Value Added Tax).


A Administración Federal de Ingresos Públicos (AFIP) concedeu à Google
Argentina Argentina isenção temporária de Imposto sobre a Renda (IR) e VAT, o que
significa que pagamentos efetuados ao Google Argentina não devem sofrer
retenções de tributos.

As vendas AdWords na Austrália estão sujeitas a GTS (Goods and Services


Tax) à alíquota de 10%.
Desde 1º-11-2016, a Google Australia Pty Limited passou a emitir
Austrália documentos fiscais para as transações locais, assim definidas aquelas cuja
contraparte tenha domicílio no País.
A regra tributária é aplicável a estes negócios desenvolvidos neste limite
territorial.

Há a incidência de GST em decorrência de uma nova lei tributária que


substituiu os impostos indiretos (imposto sobre serviços, imposto sobre o
valor adicionado, impostos especiais de consumo).
Índia O GST consiste em 3 tipos de impostos: o central, o estadual e imposto
integrado. A localização do Google que fornece os serviços e a localização
do anunciante (com base no endereço contido no Tax ID) determina qual
imposto será aplicado à operação.

O AdWords somente pode ser usado para fins comerciais no Japão. O


contrato comercial do Google AdWords é celebrado com o Google Asia
Japão Pacific Pte. Ltd., e há a incidência de imposto sobre o consumo (JCT), mas a
contraparte do Google (anunciante) é responsável por calcular e pagar o JCT,
de acordo com a Lei do Imposto sobre o consumo, alterada em 2015.

Da análise dos dados acima, chama atenção o caso da Índia, que


demonstrava questões semelhantes às brasileiras acerca da repartição de

841
competências para tributar aspectos de incidência. O país parece ter optado
pelo caminho a nosso ver adequado: reformar sua legislação de modo a
afastar ou mitigar polêmicas acerca da incidência de tributos nesse tipo de
operação e assim garantir maior segurança jurídica ao Fisco e aos
contribuintes.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É esperado que os negócios evoluam em uma velocidade maior do que


a legislação. Os negócios digitais não escapariam a essa regra. No que
tange à legislação tributária, nossas matrizes legais voltadas a bens
corpóreos ou a serviços parecem não estar atualizadas para esse mundo
digital, cujo principal objeto de negociação é um direito.

Buscando preservar a arrecadação, a LC n. 157/2016 pretendeu abarcar


negócios digitais, os quais podem compreender o impulsionamento de
marketing digital. O estudo desenvolvido demonstrou que a atividade é
complexa e envolve pelo menos as seguintes etapas: (i) a licença de uso do
software capaz de gerar os anúncios (AdWords e AdSense), (ii) o
processamento de dados de forma a garantir a exibição desses anúncios ao
público-alvo e, (iii) por fim, a veiculação dos anúncios, o que pode ocorrer
em página do Google ou de outros parceiros.

Em todas as etapas, percebe-se que, a partir de inputs do usuário há


execução de processamento pelo software que assim realiza as suas
funcionalidades, entregando o resultado esperado ao contratante, o que não
envolve substancial atividade humana.

Do ponto de vista da política fiscal, não parece que manter essas


modernas atividades à margem da tributação indireta seja razoável e justo.
Esta é a conclusão da maioria dos países consultados que demonstram

842
haver a incidência de algum tributo indireto sobre essas transações.
Contudo, é certo que essa mudança deve ser feita dentro da melhor
interpretação de nossa matriz tributária definida em nossa Constituição,
respeitando os institutos jurídicos do Direito Privado, em obediência ao
art. 110 do CTN e eliminando a nova possibilidade de controvérsia que
pode levar a longas disputas no judiciário.

Assim, o exercício da competência residual pela União, nos termos


previstos pela CF/88 (art. 154, I) deve ser uma solução a ser considerada,
em prol do rigor jurídico e da governança tributária, na medida em que o
ISS, utilizado para essa finalidade, não possui, a nosso ver, os contornos
constitucionais adequados.

843
Regime Jurídico Tributário do VoIP
60
Renato Vilela Faria

1. INTRODUÇÃO

Este artigo tem por objetivo analisar o regime tributário aplicável aos
prestadores ou provedores de serviços de Voz sobre IP (VoIP), mais
especificamente em relação à sujeição dessa modalidade de serviço à
tributação pelo ICMS incidente sobre os serviços de comunicação/serviços
de telecomunicação (ICMS-Comunicação).

Antes de passarmos à identificação do regime jurídico-tributário


aplicável, trataremos da identificação das caraterísticas técnicas e
conceituais do VoIP, dos serviços de telecomunicação e dos serviços de
valor adicionado (SVA), com destaque para o encaminhamento sobre os
temas trazidos tanto pela Lei Geral de Telecomunicações (LGT – Lei n.
9.472/97), quanto pelos comentários trazidos pela ANATEL (Agência
Nacional de Telecomunicações). Ao final, trataremos do regime tributário
constitucional do ICMS-Comunicação e seu possível desdobramento e
aplicabilidade sobre os serviços VoIP e SVA.

A administração tributária do Estado de São Paulo vem impondo aos


provedores desses serviços VoIP diversas fiscalizações e autuações
exigindo débitos fiscais relativos ao ICMS-Comunicação, supostamente
devidos sobre a totalidade dos serviços prestados por essas empresas.

A postura adotada pelo Fisco Paulista vem causando grave prejuízo e


insegurança jurídica a esses empreendedores e oferecendo risco ao regular
desenvolvimento de suas atividades, tendo em vista que a cobrança do

844
ICMS-Comunicação sobre os serviços em rede IP, como é o caso do VoIP,
pode não estar alinhada com a legislação vigente.

A manutenção desse tipo de exigência tem como contrapartida a


imposição de forte retração ou mesmo encerramento de parte das
atividades desses provedores de serviços VoIP ou mesmo de novas
tecnologias, não compreendidas ou bem dimensionadas, ou mesmo mal
interpretadas pela fiscalização. Ademais, no plano comercial dessas
empresas, a carga tributária do ICMS-Comunicação sequer está
dimensionada no âmbito do custo de seus serviços.

2. SERVIÇOS VOIP: CARACTERÍSTICAS TÉCNICAS

Os serviços VoIP são desenvolvidos com base na tecnologia


denominada Voice over Internet Protocol (voz sobre redes IP ou voz sobre
protocolos de internet), propiciando aos clientes/usuários o tráfego de
mensagens de voz e de dados sobre redes/sistemas de IP, via roteamento
ou conexão realizada pela internet.

Por meio de um software embarcado (on board) no aparelho ou outro


dispositivo qualquer utilizado pelo cliente/usuário, e a partir de uma rede
telefônica preexistente e pré-contratada por esse cliente/usuário, o
provedor VoIP consegue disponibilizar diversos serviços em uma rede IP,
amparado pela contratação, em paralelo, dos serviços de datacenter e
hospedagem de servidores (colocation ou cloud computing).

Utilizados cada vez mais em larga escala, os serviços VoIP possuem


capilaridade bastante extensa em termos de regiões geográficas que se
beneficiam dessa tecnologia, seja na totalidade do trajeto percorrido por
uma determinada “chamada telefônica”, seja apenas em uma parte, com
seu entrelaçamento ou interconexão com as chamadas redes telefônicas

845
tradicionais na “última milha” (ponta final), utilizando-se o jargão mais
comumente utilizado.

A tecnologia VoIP tem como objetivo otimizar, por meio da conexão à


internet, a emissão, transmissão e recepção de mensagens nas redes de
telecomunicações convencionais. Conforme será demonstrado, a
tecnologia VoIP empregada pelos provedores desses serviços permite, a
partir de uma rede preexistente, o estabelecimento de relações
comunicativas, (i) seja exclusivamente em ambiente IP, com a
consequente cobrança dos Serviços VoIP (ii) seja, ainda, como ocorre em
boa parte dos casos, de forma subsidiária, por meio da combinação desse
ambiente IP com uma rede de telecomunicações tradicional, com a
terminação do evento comunicativo por meio do uso de telefonia comum,
pela utilização (e correspondente cobrança) de serviços de interconexão
em Rede Pública. Neste último caso, a provedora dos serviços poderá ou
não ser a titular da rede telefônica, sobre a qual se apoia o VoIP, ou poderá
o provedor dos serviços VoIP valer-se da rede telefônica de outras
operadoras, com o correspondente repasse, entre operadoras, de parte do
pagamento realizado pelo usuário.

De forma mais específica, as atividades desempenhadas pelos


provedores de serviços VoIP compreendem as seguintes situações:

i) o estabelecimento de relação comunicativa entre clientes do próprio provedor


dos serviços VoIP, com utilização quase que exclusiva de sua rede IP,
necessariamente apoiado em uma rede telefônica preexistente;
ii) o estabelecimento de uma relação comunicativa entre clientes do próprio
provedor, com utilização parcial de sua rede IP, até o limite em que há
instalação de um POP (Point of Presence) para atender uma determinada
região onde são oferecidos os serviços desse provedor (igualmente sobre uma
rede preexistente), e, a partir desse ponto, a utilização de rede pública fora do
ambiente IP (interconexão), via licenças STFC (Serviço Telefônico Fixo
61 62
Comutado) ou SCM (Serviço de Comunicação Multimídia); e

846
iii) por fim, o estabelecimento de relação comunicativa entre clientes e não
clientes desse provedor, com a utilização parcial de sua rede IP (apoiado em
rede preexistente) e utilização parcial da rede de outras operadoras
(interconexão), onde não exista um POP do provedor VoIP.

Em qualquer cenário, a preexistência de uma rede de telecomunicações


convencional poderá não ser obrigatória na eventualidade de uma
determinada chamada ser realizada entre clientes do provedor, ou como
ocorre em determinados produtos oferecidos por esses provedores, como é
o caso do próprio VoIP, operado exclusivamente em ambiente de internet.
Nesses casos, a totalidade do serviço é desempenhado em rede IP63.

Em que pese o fato de uma parte significativa dos valores cobrados dos
clientes corresponder aos serviços prestados em rede IP, como
contraprestação pelos altos investimentos em tecnologia que representam
essa rede IP (e por corresponderem à maior parcela de “saltos” dentro da
cadeia eletroeletrônica que cada chamada desempenha dentro dessa rede
IP), esses serviços em rede IP somente permitem o estabelecimento de
uma relação comunicativa em função da preexistência de um sistema de
telefonia64.

Os serviços em rede IP, por si só, não possibilitam a emissão,


transmissão ou recepção de informações, deixando de enquadrar-se, por
isso, no conceito de serviço comunicacional definido para a hipótese
tributária do ICMS-Comunicação. Para a sua efetivação, já que tais
serviços são realizados em ambiente IP, o usuário deve conectar-se a um
sistema de telefonia ou outro meio eletrônico, este sim em condições de
prestar o serviço de comunicação.

Qualquer chamada que entra na rede de um provedor de serviço VoIP é


caracterizada como uma chamada IP, e assim caminha ou vaga pela rede

847
IP dos provedores VoIP, até o último ponto de conexão dessa rede IP (que
pode ser o destinatário da chamada). Uma das formas de medição dessa
chamada é a contagem do número de “saltos” que essa ligação realiza ao
longo da cadeia de circuitos e elementos ao longo da rede IP, até ser
entregue ao seu destinatário. Com isso, a natureza de uma determinada
chamada só é alterada quando há mudança para uma rede convencional de
telecomunicação, por meio dos procedimentos de interconexão com
operadoras, permissionárias ou concessionárias de serviços de
telecomunicações.

Ao término de cada período de medição do volume de serviços


utilizados por seus clientes, o provedor dos serviços cobra pela prestação
dos serviços de voz e dados efetivados em sua rede IP, por meio da
tecnologia VoIP. Quando há utilização simultânea de serviços de
interconexão, essa parcela pode ser lançada de forma segregada,
destacando-se o que corresponde a “Serviços VoIP, sob rede IP”, e a
parcela correspondente a “Serviços de Interconexão em Rede Pública”
(este sim base para cálculo do ICMS-Comunicação).

3. MODUS OPERANDI DOS PROVEDORES DE SERVIÇOS VOIP E


SISTEMÁTICA DE MEDIÇÃO DESSES SERVIÇOS

A quase totalidade das atividades dos provedores de serviços VoIP está


assentada na utilização da tecnologia de transmissão via protocolos de
internet. A infraestrutura, nesse caso, está apoiada em base digital
(mainframe), que geralmente é a mesma plataforma utilizada para a
prestação dos serviços específicos de acesso à internet. Em alguns casos,
há, ainda, a infraestrutura tradicional, fora daquele ambiente IP, que
permite a realização de serviços de telecomunicação propriamente ditos.

848
Como regra, a operacionalização da totalidade dos serviços oferecidos
por esses provedores VoIP é realizada sobre uma mesma base de
tecnologia, valendo-se integralmente de protocolos técnicos de Internet
(Internet Protocols). Os serviços prestados por esses provedores permitem
que os tráfegos de voz e de dados sejam despejados em uma nuvem virtual
(“nuvem IP”, geralmente denominada “Next Generation Networking” ou
“NGN”, conceito aplicável a plataformas inteligentes apoiadas em uma
rede IP com a oferta de multisserviços em um ambiente digital), a partir da
qual tais elementos são digitalmente processados e veiculados via
protocolos de Internet, por meio da conexão à internet.

Em razão de sua infraestrutura digital, o modelo de negócios


desenvolvido por esses provedores de serviços VoIP permite oferecer aos
seus clientes soluções completas, possibilitando que cada serviço seja
contratado de forma customizável, autônoma, divisível e, em alguns casos,
autoexecutável. Nesse universo, estão compreendidos os diversos serviços
e produtos no âmbito do gênero SVA (Serviço de Valor Adicionado), bem
como os serviços tradicionais de STFC e SCM (telefonia comum), desde
que o provedor tenha licença autorizativa da Anatel para tanto e,
principalmente, infraestrutura e tecnologias compatíveis com essa gama de
serviços.

Nos casos em que numa das pontas (remetente e destinatário) a


comunicação é estabelecida a partir de um equipamento IP, pode ser um
computador ou não65, e na outra ponta temos, por exemplo, um telefone
comum, o encaminhamento da chamada a usuários dos sistemas de
telecomunicações se dá mediante a contratação de interconexão de redes
junto a operadoras de telefonia habilitadas pela Anatel com atuação na
área de destino do receptor da mensagem em que não exista um POP

849
daquele provedor. A infraestrutura necessária ao estabelecimento da
relação comunicativa é disponibilizada pela concessionária ou
permissionária, configurando-se, esse pedaço, hipótese típica de prestação
de serviços de telecomunicações (prestados pela concessionária ou
permissionária), com a cobrança desses serviços de forma segregada, parte
como contraprestação pela utilização da rede IP (de um determinado
produto ou serviço assentado em algum protocolo IP, como é o caso do
serviço VoIP), e parte como serviço de Telecom propriamente dito.

Dessa forma, a plataforma operacional e técnica dos serviços prestados


pelos provedores VoIP implica o compartilhamento da mesma
infraestrutura física de equipamentos para a prestação tanto de serviços de
telecomunicações quanto dos SVAs, como é exemplo principal o VoIP.
Para melhor ilustrar as atividades exercidas por esses provedores,
reproduzimos a seguir figura representativa de um modelo de negócios
bastante utilizado:

850
Com base em tal modelo, o provedor VoIP presta aos seus clientes
serviços em rede IP, que podem, conforme o caso, ser segregados entre
serviços de telefonia comum e SVA. Para o modelo acima, há situações
em que não se vislumbra a chamada “última milha”, situação em que não
ocorre a chamada interconexão. Tais casos correspondem às situações
onde o serviço é inteiramente executado em ambiente IP.

Como se observa, no momento de entrada de uma determinada


chamada, na hipótese de ter sido realizada sob algum protocolo IP, haverá
a possibilidade de toda essa chamada ser executada em rede IP, assim
como ocorre com os serviços VoIP.

Seja qual produto ou serviço for, para fins de medição do consumo de


cada chamada, e como metodologia prática, objetiva e funcional, são
verificados, por meio de ferramentas e tecnologias eletroeletrônicas, os
“saltos” dentro daquela(s) nuvem(ens). Quanto maior o número de
“saltos”, maior, em termos de medição, a utilização da rede IP.

4. HIPÓTESE TRIBUTÁRIA DO ICMS-COMUNICAÇÃO

O artigo 155, inciso II, da Constituição Federal de 1988 (CF/88),


outorga aos Estados-membros e ao Distrito Federal competência tributária
para instituição do ICMS-Comunicação. Em conformidade com a CF/88, o
artigo 2º, inciso III, da Lei Complementar n. 87/96 (LC n. 87/96), dispõe
que o ICMS-Comunicação incide sobre “as prestações onerosas de
serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a
emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a
ampliação de comunicação de qualquer natureza”.

Dessa forma, em atenção à materialidade do imposto delineada na


CF/88, a tributação do ICMS-Comunicação só pode alcançar prestações de

851
serviços de caráter oneroso, desempenhadas por um terceiro, efetivamente
realizadas, cujo objetivo consista no processo de levar uma mensagem do
emissor ao receptor, por meio da disponibilização dos meios e
instrumentos necessários ao estabelecimento da relação comunicativa.

Nesse sentido, vale destacar o entendimento do Superior Tribunal de


Justiça (STJ) sobre o critério material do ICMS-Comunicação, ao decidir
que:

(...) 2. O serviço de conexão à Internet, por si só, não possibilita a emissão,


transmissão ou recepção de informações, deixando de enquadrar-se, por isso
no conceito de serviço comunicacional. Para ter acesso à Internet, o usuário
deve conectar-se a um sistema de telefonia ou outro meio eletrônico, este sim,
em condições de prestar o serviço de comunicação, ficando sujeito à incidência
do ICMS. O provedor, portanto, precisa de uma terceira pessoa que efetue esse
serviço, servindo como canal físico, para que, desse modo, fique estabelecido o
vínculo comunicacional entre o usuário e a Internet. É esse canal físico
(empresa de telefonia ou outro meio comunicacional) o verdadeiro prestador
de serviço de comunicação, pois é ele quem efetua a transmissão, emissão e
recepção de mensagens.
3. A atividade exercida pelo provedor de acesso à Internet configura na
realidade, um “serviço de valor adicionado”: pois aproveita um meio físico de
comunicação preexistente, a ele acrescentando elementos que agilizam o
fenômeno comunicacional.
4. A Lei n. 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações) ao definir, no art. 61, o
que é o serviço de valor adicionado, registra: “Serviço de valor adicionado é a
atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicação, que lhe dá suporte e
com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso,
armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de mensagens”. E
dessa menção ao direito positivo já se percebe que o serviço de valor adicionado,
embora dê suporte a um serviço de comunicação (telecomunicação), com ele
não se confunde.
(...)
(AgRg nos EDcl no Ag 883.278/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, j. 4-3-2008, DJe 5-5-
2008) (Grifos e destaques no original.)

Como é possível notar, na visão sustentada pelo STJ, configura-se a


prestação de serviços de comunicação tributada pelo ICMS-Comunicação
quando o prestador dos serviços opera como intermediador da

852
comunicação estabelecida entre o emissor e o receptor da mensagem,
disponibilizando os meios e instrumentos físicos necessários para
efetivação da comunicação, por meio da cobrança de tarifas em
contrapartida à remuneração dos serviços de telefonia.

Em outras palavras, o preço total cobrado na fatura, por compreender,


naturalmente, a totalidade dos custos incorridos por conta do contrato de
prestação de serviços firmado entre o provedor VoIP e seus clientes, não
corresponde, necessariamente, à medida que deverá servir de base de
cálculo para o ICMS-Comunicação (se houver alguma).

Assim como em uma prestação de serviço, sujeita ao Imposto Sobre


Serviços, há valores que não devem compor a base de cálculo, tais como
os custos de materiais empregados ou subempreitadas já tributadas, no
caso dos serviços de construção civil, na hipótese de fatura emitida por
provedores VoIP vislumbra-se situação análoga. A única base impositiva
do ICMS-Comunicação quanto aos serviços prestados pelas empresas de
VoIP é aquela que exclui os SVAs, tributando exclusivamente os serviços
de telecomunicação propriamente ditos, neste caso representados pelos
serviços de interconexão em rede pública.

Somente assim é atendida a correlação lógica que deve existir entre o


fato gerador e o montante sobre o qual deve incidir o imposto, visto que o
valor apurado por medição dos serviços em rede IP revela-se inadequado
para traduzir o valor real dos serviços tributáveis pelo ICMS-
Comunicação. Conforme será demonstrado, a despeito da variada gama de
serviços prestados por esses provedores, nossas Cortes Superiores
possuem entendimento bastante sólido de que os SVAs, a exemplo do
VoIP, não são alcançados pela tributação do ICMS-Comunicação.

853
5. DEFINIÇÃO DE “SERVIÇO DE TELECOMUNICAÇÃO” E HIPÓTESE
DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA

Em relação aos serviços de telecomunicações, a CF/88 atribuiu


competência privativa à União para legislar sobre o setor de
telecomunicações66. A definição do que deve ser entendido como “serviço
de telecomunicação” advém dá mencionada LGT (Lei n. 9.472/97). A
ANATEL, por sua vez, é o órgão que regulamenta as atividades no setor
de telecomunicações, e sempre deve observar o que é definido pela LGT.
Disso resulta que se a LGT define que o SVA não se confunde com os
serviços de telecomunicação, não pode a ANATEL contrariar tal previsão
normativa.

Segundo a LGT, a definição legal dos serviços de telecomunicações é a


transmissão, emissão ou recepção, por si só, de mensagens e informações
de qualquer natureza, por fio, rádio, eletricidade, meios óticos ou qualquer
outro processo eletromagnético, nos precisos termos da regulamentação da
ANATEL67.

A LGT não é uma norma de natureza tributária. Ela apenas define quais
são os serviços de telecomunicação. Assim, não caberia a ela tratar da
incidência do ICMS – Comunicação, fazendo as vezes de norma geral em
matéria tributária. Esta função coube às normas de Direito tributário (LC
n. 87/96, Lei Complementar n. 116/2003 e o Código Tributário Nacional –
CTN), nos exatos termos do artigo 146 da CF/88.

O CTN por sua vez, em seu artigo 110, determina que as normas de
direito tributário não podem alterar a definição, o conteúdo e o alcance de
institutos, conceitos e formas de Direito Privado. A despeito de o serviço
de telecomunicação ser serviço público (art. 175 da CF/88), à sua
definição se aplica o artigo 110 do CTN. Ou seja, a LGT definiu o

854
conteúdo, o alcance e o conceito dos serviços de telecomunicação, e a
norma tributária não pode alterá-los.

Sob a ótica do ordenamento jurídico vigente, deve-se compreender que,


em primeiro lugar, o legislador constituinte determinou que as normas
gerais sobre legislação tributária deveriam ser regulamentadas por meio de
Lei Complementar, e assim o fez por via do CTN; depois outorgou
competência aos Estados para cobrar o ICMS sobre os serviços de
telecomunicações, e assim o fez com base no artigo 155 da CF/88; por fim
houve a regulamentação pela LC n. 87/96 e pelas respectivas leis e
regulamentos estaduais.

A verificação da ocorrência do fato gerador deve se dar com base na


interpretação sobre o regime jurídico da hipótese de incidência definido
pelas normas constitucionais e infraconstitucionais acima destacadas. Se o
legislador constituinte definiu que o fato gerador do ICMS-Comunicação é
o “serviço de telecomunicação”, e o legislador federal delimitou,
separadamente, a extensão dos conceitos de “serviço de telecomunicação”
e “serviço de valor adicionado” e disse que o segundo não se confunde
com o primeiro, não há base jurídica para estender a interpretação ou
mesmo valer-se de analogias para equiparar os conceitos.

Conforme ensina Roque Antonio Carrazza68:

A hipótese de incidência possível deste ICMS é prestar serviços de


comunicação. Não é simplesmente realizar a comunicação. Portanto, o tributo só
pode nascer do fato de uma pessoa prestar a terceiros, mediante contraprestação
econômica (em caráter negocial), um serviço de comunicação. (...) Note-se que o
ICMS não incide sobre a comunicação propriamente dita, mas sobre a “relação
comunicativa”, isto é, a atividade de alguém, em caráter negocial, fornecer a
terceiro, condições materiais para que a comunicação ocorra. Mas não apenas isso:
é mister, ainda que a mensagem seja captada pelo destinatário (fruidor) do serviço.

855
Paulo de Barros Carvalho69, ao analisar o regime jurídico-tributário dos
provedores de acesso à internet, entende que a palavra “comunicação” é
ambígua, com um conteúdo identificável no plano cotidiano, como sendo
algo utilizado em ocasiões diversas e com sentidos variados, e um
conteúdo mais científico. O professor elucida que esse conteúdo científico
está relacionado com o processo de intercâmbio de uma mensagem entre
um emissor e um receptor, e que o processo comunicacional pode ser
esquematizado da seguinte forma: emissor => canal => mensagem =>
código => receptor. Ao diferenciar os planos “comunicação” e “prestação
de serviços de comunicação”, Paulo de Barros Carvalho assim sintetiza:

Prestar serviço de comunicação, por seu turno, consiste na atividade de colocar à


disposição do usuário os meios e modos necessários à transmissão e recepção de
mensagens, diferindo, nessa medida, da singela realização do fato comunicacional.
(...)
A prestação de serviço de comunicação só se verificará quando houver a junção
simultânea dos elementos constitutivos da prestação de serviço, de um lado, e do
processo comunicacional, do outro, de tal forma que a atividade exercida pelo
prestador tenha por escopo realizar a comunicação entre o tomador do serviço e a
terceira pessoa, mediante pagamento de um valor.

Com efeito, o prestador dos serviços de telecomunicações atua como


intermediador da relação havida entre o emissor e o receptor da
mensagem, disponibilizando os meios/canais para realização da
comunicação. Por tal razão, a prestação onerosa de serviços de
telecomunicações enquadra-se na hipótese tributária do ICMS-
Comunicação, sujeitando-se à respectiva exação.

6. NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS-COMUNICAÇÃO SOBRE OS SVAS

Além dos serviços de telecomunicações, a LGT definiu os serviços de


valor adicionado (SVA), que consistem na “atividade que acrescenta, a um
serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se
confunde novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento,

856
apresentação, movimentação ou recuperação de informações”70. Ainda de
acordo com a LGT, o SVA “não constitui serviço de telecomunicações,
classificando-se seu provedor como usuário do serviço de
telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a
essa condição”71.

Assim, de acordo com o conceito estabelecido no Direito Privado, os


SVAs podem ser definidos como as atividades que acrescentam uma
utilidade/benefício à relação comunicativa estabelecida sobre um sistema
de telecomunicação preexistente, ou seja, os SVAs utilizam os serviços de
telecomunicações como suporte, mas com eles não se confundem.

Dessa forma, o provedor de SVA não exerce atividade de intermediação


da relação comunicativa estabelecida entre o emissor e o receptor da
mensagem, não disponibilizando qualquer meio/instrumento suficiente à
realização da comunicação de forma independente de uma rede de
telecomunicações. O fornecedor de SVAs oferece aos seus clientes uma
tecnologia ou uma funcionalidade que otimiza a relação comunicativa
estabelecida nos sistemas de telecomunicações preexistentes e, assim,
cobra por isso.

Para André Mendes Moreira72, os SVAs não atraem a incidência do


ICMS-Comunicação, e a eventual sujeição ao ISS só seria possível a partir
de uma identificação clara na lista de serviços tributáveis. Sobre esse
possível alcance pelo ISS, o autor adverte que, na maioria das vezes, os
SVAs são serviços não prestados pelas operadoras telefônicas, as quais “se
limitam a fornecer a rede de telecomunicações para que os serviços sejam
prestados por um terceiro e a efetuar a cobrança dos mesmos na conta
telefônica, repassando posteriormente os valores ao efetivo prestador”.

857
Conforme veremos em mais detalhes no item 8, a jurisprudência do
STJ73 é firme no sentido da não tributação dos SVAs.

Geralmente, os serviços conexos com a prestação de serviço


remunerado de telecomunicação não constituem objeto principal do
contrato de prestação de serviços de telefonia, mas são dele dependentes,
circunstância que possibilita a inclusão das tarifas (adicionais)
correspondentes na própria conta de telefonia emitida pela concessionária,
pois somente ela, e não um terceiro, pode colocá-los à disposição do
assinante. Assim, em que pese esses provedores de serviços em rede IP
terem a flexibilidade de comercializar determinados serviços/produtos de
forma separada, como é o caso do VoIP, a prestação dos serviços onde tais
produtos são oferecidas dependerá da preexistência de uma rede de
telecomunicações.

No âmbito do STJ, consolidou-se a jurisprudência de que as tarifas


cobradas pela concessionária/empresa de telefonia a título de habilitação,
assinatura e de serviços suplementares não seriam tributadas, já que não se
inscrevem na descrição do fato gerador do imposto de que cuida o artigo
2º, inciso III, da LC n. 87/96, por constituírem atividades-meio,
preparatórias ou de natureza intermediária à prestação do serviço de
telecomunicação, funções essas que, em verdade, não desempenham
(Repetitivo STJ n. 472).

O mesmo tratamento dispensa-se aos serviços suplementares (e.g.,


Identificador de Chamadas, Transferência de Chamadas, Atendimento
Simultâneo, Conferência, Consulta e Transferência, Despertador,
Discagem Abreviada, Hora Certa, bloqueio de DDD e DDI, Troca de
Titularidade de aparelho, Conta Detalhada, mudança de endereço de
cobrança, Troca de número, Troca de plano, Secretária Eletrônica etc.)

858
que, sem dúvida, agregam valor à prestação dos serviços de comunicação,
muito embora sejam remunerados por um componente tarifário específico,
ou até mesmo por um preço específico, conforme as diferentes
modalidades de contratação para cada um desses produtos74.

Induvidosamente, a Constituição Federal, ao outorgar aos Estados e ao


Distrito Federal competência para instituir o ICMS-Comunicação (art. 155,
II, CF/88), já fornece a tônica indicativa da hipótese de incidência do
ICMS e, ao mesmo tempo em que esgota o enunciado de sua hipótese
tributária, delimita o aspecto material do imposto, ao definir aquilo que é
essencial no fato descrito pelo legislador, a ser considerado pelo intérprete
e pelo aplicador da Lei.

Ao excluir todo um universo de componentes tarifários (ou não) do


campo de incidência do ICMS-Comunicação, ao fundamento de que a
prestação dos serviços a que correspondem não constitui fato gerador do
imposto, atentou a jurisprudência para a relação indissociável existente
entre a descrição do núcleo da hipótese tributária e a definição de sua base
de cálculo, que, conforme vimos, deve guardar estreita relação com o fato
gerador definido pelo constituinte e pelo legislador complementar. Evita-
se, com isso, que a base de cálculo anteveja uma realidade econômica
distinta daquilo que se encontra previsto na legislação.

7. SERVIÇOS DE VOZ SOBRE IP (VOIP)

Conforme ventilado acima, os serviços de VoIP são desenvolvidos com


base em ferramentas denominadas “Voice over Internet Protocol” (voz
sobre redes IP), que propiciam o tráfego de mensagens de voz e de dados
(sinais elétricos-codificados ou dados multimídia) sobre redes/sistemas de
IP, via roteamento ou conexão realizada pela internet, e que igualmente

859
permitem o estabelecimento de uma relação comunicativa de forma
autônoma, neste caso, não necessariamente suportados em rede de
telefonia, preexistente tendo em vista a execução de tais serviços
exclusivamente em ambiente de internet.

A utilização da ferramenta VoIP tem como objetivo otimizar, por meio


da conexão à Internet (via protocolos IP), as relações comunicativas
estabelecidas em sistemas de telecomunicações preexistentes.

Em relação aos serviços de VoIP, vale destacar o posicionamento da


ANATEL75 a seguir transcrito:

O Voz sobre IP (VoIP) é um conjunto de tecnologias que usam a internet ou


redes IP privadas para a comunicação de voz, substituindo ou complementando os
sistemas de telefonia convencionais.
(..)
A Anatel, como Agência Reguladora do setor de telecomunicações, não
regulamenta o uso de tecnologias, mas os serviços de telecomunicações que delas se
valem.
Frente a esse cenário, a Agência entende que o uso do VoIP pode ser
considerado sob dois aspectos principais:
a) Comunicação de voz efetuada entre dois computadores pessoais ou similares,
utilizando programa específico e recursos de áudio do próprio equipamento e com
acesso limitado a usuários que possuam tal programa. Este caso, conforme
considerado internacionalmente, não constitui serviço de telecomunicações, mas
Serviço de Valor Adicionado (SVA) que utiliza a Internet como meio para
viabilizar a comunicação.
b) Comunicação de voz de forma irrestrita com acesso a usuários de outros
serviços de telecomunicações e numeração específica, recurso este objeto de
controle pelo órgão regulador brasileiro. Estas são características de um serviço de
telecomunicações de interesse coletivo para o qual é imprescindível uma
autorização prévia da Agência e cuja prestação deve estar em conformidade com a
regulamentação da Anatel.
(...)
Caso a provedora de VoIP forneça a infraestrutura e a respectiva capacidade de
transmissão e recepção de informações ao usuário, esta estará prestando um serviço
de telecomunicações e precisará de uma autorização prévia da Anatel para
desenvolver a sua atividade.
Por outro lado, um usuário de um serviço de telecomunicações (ex.: banda larga
ADSL, Cable Modem e 3G) pode contratar uma provedora de VoIP e utilizar o

860
serviço de telecomunicações como suporte para o uso da aplicação VoIP. Neste
caso específico, como a provedora de VoIP não prestará o serviço de
telecomunicações, não haverá a necessidade de uma autorização da Anatel para o
desenvolvimento da atividade, que estará caracterizada como Serviço de Valor
Adicionado. (Destacamos.)

Há, de fato, diversas espécies de serviços VoIP, mas uma circunstância


lhes é comum: o VoIP nada mais é que a conversão da voz em pacote de
dados que são transmitidos via protocolos de Internet (IP) ao receptor da
mensagem, usuário ou não de uma rede IP.

Trata-se de um serviço VoIP quando dois usuários de um programa de


computador (e.g., Skype) se comunicam por ele. Trata-se, também, de um
serviço VoIP (ou, como atualmente se diz, VoLTE – Voice over Long-
Term Evolution76) quando um usuário de uma rede de telecomunicação
móvel (celular) utiliza um aplicativo (Skype, WhatsApp, Viber, Facebook,
Facetime) para se comunicar. Trata-se, ainda, de um serviço VoIP quando
o usuário de programas como o Skype, ou a partir de um aparelho
conectado a uma rede IP com um software embarcado em seu dispositivo
telefônico, realiza a chamada a partir dessa rede IP, mas o receptor é um
usuário de uma rede de telecomunicação comum. De fato, esse último caso
é o exemplo mais comum entre os provedores de serviços VoIP.

Assim, a dúvida consiste em saber se há a prestação do serviço VoIP


quando o receptor é usuário de uma rede de telecomunicação comum. Em
nossa opinião, a resposta ao questionamento deve ser positiva.

Para suportar tal entendimento, vale pontuar: (i) entre o provedor de


serviços VoIP e os seus clientes há uma rede IP; (ii) quando o cliente desse
provedor realiza uma chamada, a informação (pacote de dados) é
transmitida ao sistema IP do provedor (backbone); (3) o provedor o
retransmite, tudo via protocolos de Internet, seja para o destinatário

861
daquela chamada, caso tenha um POP que assim permita, ou entrega essa
chamada a uma empresa concessionária de serviços de telecomunicações
ou, ainda, entrega a chamada a uma outra rede IP, que se encarrega de
levar/entregar a chamada ao destinatário final.

Os processos acima acontecem por meio de acordos globais de troca de


minutagem, transportes de tráfego, rede corporativa e terminação de
chamadas nos chamados tráfegos saintes, incluindo serviços de
hospedagem e de servidores (colocation), permitindo a entrega daquela
informação processada na rede IP do provedor VoIP, de tal forma que
esses intermediários convertem o pacote de dados para o sistema
analógico, permitindo que o receptor receba “voz” em vez de pacote de
dados (do contrário receberia apenas ruídos de internet, similar ao som da
internet discada).

Neste último percurso, que pode coincidir com a entrega da informação


a uma operadora de telecomunicações propriamente dita77, que converte
em voz o pacote de dados, é que está a rede de telecomunicação
preestabelecida. A rede de telecomunicação que dá suporte ao VoIP pode
existir tanto no início da transmissão da mensagem (first mile) como no
final (last mile). O serviço VoIP apenas complementará e adicionará
funções ao serviço de telecomunicação. Porém, sem a rede de
telecomunicação preexistente, o VoIP não será concluído.

Essa intersecção dos serviços VoIP e os serviços de telecomunicação


propriamente ditos não escaparam das lições de Roque Antonio Carrazza78,
cujo entendimento partilhamos, especialmente à luz da formação da base
de cálculo quando há uma parte a ser cobrada a título de VoIP e uma parte
como serviço de telecomunicação:

862
O serviço VoIP exige, para ser executado, a instalação de uma série de
equipamentos, interligados a sistemas de grande complexidade, que
necessariamente devem ser mantidos e gerenciados. Tais medidas, porém,
antecedem a prestação do serviço de comunicação, que se realiza somente ao serem
utilizados os telefones integrados ao STFC. Neste caso haverá incidência de ICMS,
mas sobre o serviço prestado pela empresa telefônica; e base de cálculo do tributo
será apenas o preço do serviço telefônico propriamente dito – excluído, portanto, o
do serviço Voz sobre IP (VoIP). Ressaltamos que, ao disponibilizar o serviço de
voz com acesso remoto, a empresa prestadora simplesmente estará colocando à
disposição do cliente o aparato necessário para que este, com maior comodidade e
com custos menores, frua da prestação do serviço de comunicação a cargo da
companhia telefônica. Logo, não se sujeitará sequer em tese, à tributação por meio
de ICMS.

Dessa forma, tomando a posição da ANATEL como ponto de partida, a


tecnologia VoIP caracteriza-se como típica espécie de SVA, mas também
pode ser empregada, de forma híbrida, na consecução de serviços de
telecomunicações.

Porém, mesmo nos casos em que o VoIP é empregado conjuntamente a


um serviço de telecomunicação, é imprescindível que se tenha em mente
que tais serviços são autônomos, na medida em que são realizados em
ambientes estruturais, tecnológicos e física e virtualmente diferentes, mas,
sob outra perspectiva, são também dependentes, na medida em que o
serviço VoIP, quando objetiva o estabelecimento de uma relação
comunicativa, não implementa tal serviço por si só, dependendo de uma
rede de telefonia preexistente. Sob a perspectiva de centros de custos da
empresa provedora de tais serviços, há separação total. Os serviços
realizados em ambiente IP, isto é, na nuvem, estão atrelados a uma base de
custo mensurada e apurada de forma diferente como ocorre com a
sistemática de tarifamento do serviço de telefonia tradicional.

Sob outra perspectiva, o provedor VoIP prestará SVA aos seus clientes
caso utilize os sistemas de telecomunicações apenas como suporte, na
condição de usuária, ofertando aos seus clientes um conjunto de

863
ferramentas para aprimorar/otimizar a relação comunicativa estabelecida
previamente nos sistemas de telecomunicações.

Nesse sentido, são hipóteses de SVA ofertadas pela provedora VoIP: (i)
a comunicação efetuada entre dois computadores pessoais conectados à
internet, pois a relação comunicativa se estabelece apenas via plataforma
IP, bem como (ii) a comunicação estabelecida, na origem (emissão), entre
um computador ou qualquer outro dispositivo identificado por um IP
(software embarcado) e, no destino (recepção), um telefone fixo ou móvel,
caso o encaminhamento da chamada pelo provedor VoIP a usuários dos
sistemas de telecomunicações seja efetuada mediante interconexão de
redes contratadas junto a operadoras de telefonia habilitadas pela Anatel.

Assim, é equivocada, e também ultrapassada, a visão do Fisco Paulista


de que somente o Skype seria uma modalidade de VoIP, deixando à
margem uma infinidade de situações e soluções tecnológicas que
propagam um serviço tecnológica e tecnicamente idêntico ao prestado
pelos provedores de serviços VoIP.

É plenamente possível que o serviço VoIP seja prestado de um aparelho


de telefone que se assemelhe (mas não é o mesmo) a um telefone “fixo”
convencional, identificado por um número IP. Ele tem apenas a aparência
física de um telefone “fixo” convencional, mas estruturalmente é diverso.
Situação similar ocorre com um aparelho celular (que se utiliza,
evidentemente, de um serviço de telecomunicação), em que o emissor,
tomando como base aplicativos como o Skype, Viber, WhatsApp, envia
mensagens de voz a um receptor. Não há, evidentemente, um serviço de
telecomunicação nessa mensagem enviada (e recebida). O serviço prestado
aqui nada mais é do que um SVA.

864
Os serviços VoIP dependem, sim, de uma rede de telecomunicação
preexistente. Essa rede preexistente possibilita a realização dos serviços
prestados por esses provedores, que, baseados em protocolos de Internet,
permitem a captação e transmissão de voz, convertida em pacotes de
dados, para posteriormente converter para o sinal analógico, com a entrega
de voz do outro lado. Por isso, então, a denominação: Voz sobre Protocolo
de Internet (Voice over Internet Protocol).

8. JURISPRUDÊNCIA

O enunciado n, 334 da Súmula do STJ dispõe sobre a não incidência de


ICMS para os serviços dos provedores de acesso à internet e não menciona
expressamente os serviços VoIP. Isto, por outro lado, não afasta a
aplicação dele ao caso sob análise, pois a lógica estabelecida nos
precedentes que formaram o enunciado é a mesma que se aplica ao VoIP.
E a lógica é simples: os provedores de acesso à internet não sofrem a
incidência do ICMS-Comunicação pelo fato de apenas agregarem valor à
telecomunicação, sem que com ela se confundam.

Vale lembrar, ainda, que os provedores de acesso à internet não são os


únicos exemplos de SVA. Há os serviços de “identificador de chamadas”,
“conferência telefônica” e o próprio VoIP79. A tributação de tais serviços já
foi, também, submetida à análise do STJ80.

No julgamento do Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no


Agravo de Instrumento n. 883.278/RJ, o Relator, Ministro Luiz Fux,
dispôs que: (i) SVA não se confunde com o serviço de telecomunicação
(art. 61 da LGT); (ii) o serviço de conexão à internet (e a internet,
inclusive) não possibilita, por si só, a transmissão ou a recepção de
informações, sendo, portanto, necessária uma rede de telecomunicação

865
preestabelecida (que, por sua vez, está sujeita ao ICMS); (iii) o provedor
de acesso à internet não efetua a comunicação, mas apenas a facilita; (iv)
portanto, não há serviço de telecomunicação ao provedor de acesso (que é
um SVA) e, assim, não há incidência de ICMS; (v) o ICMS-Comunicação
incidirá em relação àquele que estabelece a rede de telecomunicação em
que os provedores de acesso à Internet se baseiam.

Ou seja, a conclusão do Ministro Luiz Fux é na linha de que não há


telecomunicação nos serviços de provedores de acesso à internet, mas
apenas em relação àqueles que estabeleceram a rede de telecomunicação
em que os provedores se basearam. Trata-se de situação exatamente igual à
dos provedores de serviços VoIP, na medida em que estes apenas facilitam
a comunicação, mas não a prestam. O VoIP sempre se baseará em uma
rede de telecomunicação preestabelecida.

Em reforço da posição acima, pode-se mencionar também o voto do


juiz Fausto José Martins Seabra81, ao conceder a liminar em mandado de
segurança interposto por uma provedora de serviços VoIP:

Com efeito, não configura prestação de serviço de telecomunicações o serviço


de valor adicionado, isto é, “a atividade que acrescenta, a um serviço de
telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades
relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou
recuperação de informações” (art. 61, caput, da Lei n. 9.472/97).
No caso dos provedores de internet, o Colendo Superior Tribunal de Justiça
consolidou entendimento na Súmula 334, à luz da Lei de Telecomunicações, de que
não estão sujeitos ao recolhimento do ICMS, justamente porque executam serviço
de valor adicionado e não serviço de telecomunicações.
Igual raciocínio deverá ser adotado para o VoIP (Voice over internet Protocol).
Embora possa ser considerado sob os aspectos mencionados pelo impetrado
(serviços de telecomunicações ou serviço de valor adicionado), conforme as
informações e explicações disponibilizadas pela ANATEL em seu portal eletrônico
sobre essa atividade, vê-se que há prova documental produzida pela parte contrária
de que ela presta o VoIP na qualidade de provedora, para grupo determinado de
usuários (seus clientes), o que caracteriza serviço de valor adicionado, haja vista
que a autorização concedida pela ANATEL (fls. 42) é exclusivamente para o

866
serviço de comunicação multimídia (SCM), o qual não engloba as duas últimas
modalidades do VoIP citadas pelo impetrado e que dependem de autorização
específica da citada agência.

A análise dos precedentes jurisprudenciais revela a preocupação do


Judiciário em não autorizar a cobrança do ICMS, cuja imposição
certamente implicará (ou implicaria) a majoração do custo do serviço,
podendo inviabilizar a atividade desenvolvida pelas empresas, se
considerada a realidade do mercado.

A própria ANATEL considera o VoIP um SVA, por representar um


software que utiliza a internet como suporte para viabilizar a transmissão
de voz e imagens entre os usuários. Nessa cadeia de consumo, quem se
responsabiliza por recolher o ICMS, por efetivamente incorrer em fato
gerador, são as companhias de telefonia, que disponibilizam a banda larga
ou as redes 3G e 4G aos usuários.

CONCLUSÕES

O serviço VoIP, segundo a disposição da própria ANATEL82, é o


“conjunto de tecnologias que se valem da internet ou de redes de IP
privadas para a transmissão/comunicação de voz, substituindo ou
complementando os sistemas de telefonia convencionais”. Ou seja, com
base em um serviço de telecomunicação preexistente (já que é prestado
sempre com base em tecnologia IP), o VoIP otimizará a emissão,
transmissão e recepção de mensagens.

A ANATEL não define o que é telecomunicação ou o que é SVA, mas


as informações apresentadas ajudam a visualizar o porquê de o VoIP não
ser um serviço de telecomunicação. Os serviços VoIP sempre serão
desenvolvidos com base em rede de IP (rede de protocolos de internet),

867
exigindo, assim, para que se promova uma relação comunicacional entre
dois pontos, a preexistência do serviço de telecomunicação.

Na medida em que o VoIP é desenvolvido sobre rede e protocolos de


internet, esse serviço não se confunde com o serviço de telecomunicação,
mas se classifica como espécie de SVA, pois acrescenta utilidades,
facilidades e funcionalidades a um serviço de telecomunicações
preexistente.

O prestador de serviço VoIP, assentado em uma rede baseada em


protocolos de internet, facilitará (pois apresenta novas funcionalidades) a
comunicação entre o emissor e o receptor de uma mensagem (neste caso,
de voz). Quem presta o serviço de telecomunicação não será
obrigatoriamente o prestador de serviço VoIP, o que confirma a
dissociação dos serviços. Há, sim, prestação de serviço de
telecomunicação, mas ela será previamente estabelecida ao VoIP e com ele
jamais se confundirá, já que ela possibilitará que o VoIP seja prestado. A
telecomunicação preexistente possibilitará a comunicação, que, por sua
vez, será facilitada pelo serviço VoIP. Ou seja, haverá sim a incidência de
ICMS, mas somente sobre o serviço de telecomunicação, e não sobre o
serviço VoIP.

A parcela dos serviços em rede IP, dentre eles os serviços VoIP, cuja
natureza é de um típico SVA, naturalmente não é – e não deve ser –
alcançada pela tributação do ICMS-Comunicação. Isso se deve tanto em
razão da ausência de previsão legal nesse sentido, quanto em razão da não
regulamentação, até o momento, de tais serviços, em especial os serviços
VoIP, pela legislação tributária nacional e pela legislação do Estado de São
Paulo.

868
Tributação de Data Center no Brasil
83 84
Thais Meira e Andrea Oliveira

1. INTRODUÇÃO E NOÇÕES SOBRE DATA CENTER

A dificuldade inicial ao tratar do tema “data center” é entender sua


complexidade de funcionamento e os diversos elementos que o compõem.
Disso decorrem as discussões quanto a sua natureza jurídica e potencial
tributação aplicável.

Até há alguns anos, o data center remetia à ideia de grandes salas


dentro dos estabelecimentos das empresas, com equipamentos que
armazenavam e processavam os dados e informações daquelas entidades,
por meio de servidores e programas de computador (software).
Fisicamente, as salas de data center contavam com infraestrutura adaptada
para o armazenamento seguro das informações, tais como, refrigeração
adequada, controle de acesso restrito de empregados, no break para evitar
danos aos servidores.

Com o avanço da tecnologia, a maioria dos data centers passou a ter


acesso disponibilizado pela via remota, ou seja, passaram a ser contratados
espaços de terceiros, físicos ou virtuais, para a instalação dos data centers,
sendo possível acessar as informações de forma remota, sem a necessidade
de espaço nos próprios estabelecimentos dos contratantes.

No Brasil, tornou-se comum contratar empresas domiciliadas no


exterior que oferecessem data centers remotos.

Mais recentemente, os equipamentos que armazenam informações


passaram a ser cada vez menores, e grande parte da informação passou a

869
ser totalmente processada e armazenada de forma virtual – por computação
na nuvem ou cloud computing85 –, diminuindo-se consideravelmente os
custos da atividade, ainda que o nível de armazenamento de informações
tenha aumentado.

O preço a ser pago pelo usuário do data center costuma variar de


acordo com o tamanho da infraestrutura oferecida e/ou efetivamente
utilizada. No mercado de tecnologia, esse tipo de data center é intitulado
de IaaS (Infrastructure as a Service)86.

A importância de um data center fica nítida quando há, por exemplo,


um vazamento de dados de determinada empresa. Em razão do grande
volume de informações e da insegurança das empresas em perdê-las, seja
por uma falha nos equipamentos, falta de espaço ou casos fortuitos
(incêndio, por exemplo), a relevância do data center foi mudando e, hoje,
de fato, é imprescindível para grande parte das organizações.

Justamente em razão do uso de um espaço físico ou virtual de terceiros


para armazenamento das informações, há quem sustente que os valores
pagos para o uso de data center seriam semelhantes a aluguéis de bens,
devendo ser tributados como tal. Por outro lado, a Receita Federal do
Brasil (RFB), ao analisar as remessas feitas ao exterior para remunerar as
empresas que exploram tal atividade, já se posicionou no sentido de que
tais valores remetidos ao exterior deveriam ser classificados como
remuneração pela importação de um serviço. Os fiscos municipais, da
mesma forma, tentam enquadrar o data center em um dos itens de serviço
da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003 (LC n. 116/2003).

Essas posições divergentes decorrem, essencialmente, do fato de a


legislação tributária não ter acompanhado a evolução da tecnologia e de

870
não haver regulamentação da tributação desse tipo de atividade. É claro
que o nome IaaS traz consigo o termo “service”, mas será a
disponibilização do acesso ao data center, de fato, um “serviço” para fins
fiscais?

O que se busca no presente artigo é analisar a posição dos fiscos


(federal e municipal) sobre o tema, abordar a natureza jurídica das
atividades desenvolvidas pelos proprietários de data centers e enumerar as
possíveis implicações fiscais dessas atividades, tanto do ponto de vista da
contratação da atividade de data center no Brasil quanto no exterior
(relações locais e internacionais).

2. A POSIÇÃO DA RFB E DO FISCO MUNICIPAL DE SÃO PAULO


ACERCA DO TEMA

Em 2011, na Solução de Consulta n. 122, de 6 de maio de 2011, da 8ª


Região Fiscal, a RFB, ao analisar se os pagamentos (locais) feitos a uma
sociedade que oferecia acesso a data center deveriam sofrer retenções de
Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), Contribuição Social
sobre o Lucro Líquido (CSLL), Contribuição para o Programa de
Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da
Seguridade Social (COFINS) aplicáveis a “serviços profissionais”87,
entendeu que não deveria haver retenção, justamente porque tal atividade
não se enquadrava como “serviço profissional”88.

Também a Solução de Consulta n. 86, de 27 de março de 2012, da


mesma 8ª Região Fiscal, sob outro prisma, afastou a incidência de PIS e
COFINS sobre a importação de bens e serviços (PIS/COFINS-Importação)
em tal atividade. Para chegar a essa conclusão, as atividades que estão
relacionadas ao acesso ao data center, bem como sua remuneração, foram
segregadas em: (a) aluguel de equipamentos e (b) serviços prestados no

871
exterior para assegurar o funcionamento dos equipamentos. Com base
nessa segregação, o entendimento adotado seguiu a linha de que não
deveria haver incidência de PIS/COFINS-Importação (i) por se tratar de
aluguel, que não poderia ser equiparado a um serviço e (ii) pelo fato de os
serviços executados nos equipamentos terem seus resultados verificados
no exterior e, portanto, não restar configurada a importação de serviços
para fins de incidência dessas contribuições.

Por outro lado, a Solução de Consulta n. 99, de 29 de maio de 2013, da


9ª Região Fiscal, adotou a linha de que “as remessas para o exterior em
pagamento pela utilização remota de infraestrutura para processamento de
dados e armazenamento de informações em alta performance (data center)
constituem remuneração pela prestação de serviços técnicos” e, assim,
estariam sujeitas à incidência de Imposto de Renda Retido na Fonte
(IRRF), PIS/COFINS-Importação e Contribuição de Intervenção no
Domínio Econômico (CIDE)89.

Justamente em razão de entendimentos divergentes da RFB, foi emitida


a Solução de Consulta COSIT n. 6, de 3 de junho de 2014, em que se
concluiu que “a contratação de um data center não se caracteriza como
uma locação de bem móvel, mas sim como uma típica prestação de
serviços”90.

Para ratificar tal posicionamento, no mesmo ano, a RFB publicou o Ato


Declaratório Interpretativo (ADI) n. 7, de 15 de agosto de 2014,
declarando que (art. 1º):

os valores pagos, creditados, entregues ou remetidos por residente ou


domiciliado no Brasil para sociedade domiciliada no exterior, em decorrência de
disponibilização de infraestrutura para armazenamento e processamento de dados
para acesso remoto, identificada como data center, são considerados para fins

872
tributários remuneração pela prestação de serviços, e não remuneração decorrente
de contrato de aluguel de bem móvel.

Em razão dessa qualificação, o artigo 2º do ADI n. 7/2014 estabeleceu


que os valores relacionados à utilização de data center deveriam sujeitar-
se à incidência de IRRF, CIDE, PIS/COFINS-Importação. Os dispositivos
legais trazidos pelo ADI n. 7/2014 são a base para a tributação de
importação de bens e serviços91. Porém nenhum deles trata
especificamente de data center.

Embora o entendimento da RFB tenha se consolidado com relação à


contratação de acesso a data center de empresa domiciliada no exterior, se
tal posição for ampliada para as relações locais, a princípio, haveria a
incidência, do ponto de vista desse “prestador”, de (i) IRPJ e CSLL, à
alíquota combinada de 34% sobre o lucro líquido contábil ajustado, no
caso do lucro real, e sobre uma base presumida correspondente a 32% da
receita bruta auferida pelo contribuinte, no caso da opção pelo lucro
presumido; e (ii) PIS e COFINS sobre as receitas locais, que poderia variar
entre o regime cumulativo (3,65%) e o regime não cumulativo (9,25%), a
depender da natureza atribuída à receita e também da opção pelo lucro real
ou presumido92.

Com relação ao Imposto sobre Serviços (ISS), o Departamento de


Tributação e Julgamento (DEJUG) da Secretaria de Finanças da Prefeitura
de São Paulo emitiu a Solução de Consulta n. 40, de 15 de agosto de 2013,
tratando da tributação do ISS incidente sobre os serviços de data center, já
oferecidos na forma de cloud computing.

Segundo a consulta, uma empresa de tecnologia pretendia disponibilizar


a seus clientes operações de computação em nuvem, e um dos modelos
oferecidos seria a “plataforma como serviço”: disponibilização de uma

873
plataforma como um banco de dados, capaz de gerar relatórios e análises
de acordo com as necessidades do cliente93.

Nesse caso, a despeito de a empresa se manifestar no sentido de que tais


atividades não estariam sujeitas ao ISS, por não estarem listadas na lista de
serviços anexas à LC n. 116/2003, a conclusão do DEJUG foi de que essa
atividade se enquadrava no item 1.03 da lista de serviços do artigo 1º da
Lei Municipal n. 13.701, de 24 de dezembro de 2003, relativo a
processamento de dados e congêneres.

Posteriormente, em 2016, a LC n. 116/2003 foi alterada pela LC n. 157,


de 29 de dezembro de 2016, e o referido item 1.03 passou a ter redação
mais ampla, englobando: “processamento, armazenamento ou hospedagem
de dados, textos, imagens, vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e
sistemas de informação, entre outros formatos, e congêneres”.

A intenção do legislador foi alargar o item 1.03 acima referido para


englobar uma série de atividades de tecnologia no contexto de cloud
computing. No parecer emitido pela Comissão de Assuntos Econômicos,
que analisou o Projeto de LC n. 386/2012, o qual pretendia alterar diversos
dispositivos da LC n. 116/2003, discutiu-se a inclusão de um item
específico para cloud computing, com a discriminação inclusive do termo
IaaS (seria o novo item 1.09).

No entanto, chegou-se à conclusão de que as atividades de cloud


computing já estariam abrangidas pelo item 1.٠3, que trata do
processamento de dados e congêneres. Mais especificamente, alegou-se
que “não faz sentido que a discriminação dependa da tecnologia que está
sendo empregada na prestação, pois essa forma de diferenciação é muito

874
volátil”94. Logo, poderia haver sobreposição entre os itens 1.03 e 1.09 no
momento de se classificar determinado serviço.

Com base na modificação da LC n. 116/2003, os Municípios agora irão


revisar e atualizar as suas legislações. Em São Paulo, foi publicada a Lei n.
16.757, de 15 de novembro de 2017, alterando a Lei n. 13.701/2014,
passando a constar a nova redação do item 1.03. Uma das principais
alterações foi a equalização das alíquotas do ISS em relação a todos os
serviços de tecnologia da informação, que até então se alternavam entre
2% a 5%. Pela nova legislação, as empresas passarão a recolher 2,9% de
ISS para todas as atividades de informática. A nova alíquota passa a ser
vigente dentro de 90 dias após a publicação da lei95.

3. NATUREZA JURÍDICA DA ATIVIDADE DE ACESSO AO DATA


CENTER E SUA DISTINÇÃO DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

3.1. Discussão sobre o Conceito de Prestação de Serviços para Fins Fiscais

Qualquer das posições assumidas pelos Fiscos passa (ou deveria


passar), inicialmente, pela análise do conceito de “serviço”. Por bastante
tempo, essa discussão parecia ter se consolidado segundo a lógica de que a
prestação de serviço implicaria, necessariamente, uma “obrigação de
fazer”96.

Mais recentemente, no entanto, em uma decisão do Supremo Tribunal


Federal (STF) bastante polêmica (Recurso Extraordinário n. 651.703, de
29 de setembro de 2017), a discussão veio novamente à tona, tendo esse
tribunal se apoiado em um conceito mais econômico de serviço.

Na doutrina, a qualificação da prestação de um serviço como


“obrigação de fazer” algo em favor de alguém, oposta à “obrigação de
dar”, tem inúmeras manifestações97. Nesse sentido, José Eduardo Soares de

875
Mello ensina que “o cerne da materialidade da hipótese de incidência do
imposto em comento (ISS) não se circunscreve a “serviço”, mas a uma
“prestação de serviço”, compreendendo um negócio (jurídico) pertinente a
uma obrigação de “fazer”, de conformidade com os postulados e diretrizes
do direito privado98”.

Nas obrigações de fazer, a prestação pactuada entre as partes representa


uma atividade humana, ou seja, seu objeto consiste em atuação do devedor
que aproveita ao credor. No entanto, não é qualquer ato que traduz
vantagem a outrem que representa uma obrigação de fazer.

Certos atos, ainda que representem vantagem ao credor, não configuram


a execução de trabalho pelo devedor. Podem ser citadas, por exemplo, a
locação de imóveis, a obrigação de indenizar, a prestação de fiança, entre
outros. Assim, uma obrigação de fazer apenas pode ter por objeto atos que
representam a execução de um trabalho pelo devedor99.

Os serviços são prestados em conformidade com um contrato. O Direito


Civil define contrato como um acordo de vontades firmado entre duas ou
mais pessoas objetivando produzir efeitos jurídicos100. Os contratos de
prestação de serviços estão regulamentados pelo Código Civil, no artigo
594, segundo o qual “Toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material
ou imaterial, pode ser contratada mediante retribuição”.

Da análise desse artigo pode-se inferir, ainda que de forma breve, que o
contrato de prestação de serviço é bilateral (obrigações para ambas as
partes); é oneroso (obrigações e benefícios para as partes); é consensual
(acordo de vontades) e comutativo (equivalência de prestações e vantagens
mútuas).

876
Portanto a prestação de um serviço, para a legislação civil, é uma
obrigação de fazer, que não se confunde com o trabalho assalariado, pois o
prestador não está subordinado ao contratante, e não se confunde, ainda,
com a empreitada, já que o que se busca é o resultado, e, no caso do
contrato de serviço, o que se deve é a própria atividade, que
necessariamente exige esforço humano101.

O conceito do Direito Privado é aquele que deve ser seguido pelo


aplicador da legislação tributária, nos moldes do que dispõe o artigo 110
do Código Tributário Nacional (CTN), segundo o qual a lei tributária não
pode alterar conceitos do Direito Privado, dentre os quais, a nosso ver,
estaria o próprio conceito de serviço trazido pelo Direito Civil.

O artigo 110 do CTN é reflexo do princípio da estrita legalidade da


tributação, suportado pela Constituição Federal (art. 150, I). O aplicador da
legislação tributária não pode pretender tributar aquilo que não seja
“serviço”, à luz dos conceitos de Direito Privado, como se assim o fosse.
Se não estão presentes os requisitos que, na forma do Direito Civil,
caracterizam uma atividade como serviço, a legislação fiscal e o próprio
fisco não têm legitimidade para assim fazê-lo. É o que vem ocorrendo, no
entanto, em relação à qualificação da atividade de data center como
serviço.

Na recente decisão do STF (RE n. 651.703102), em que se adotou um


conceito de serviços mais amplo, concluiu-se que o método interpretativo
veiculado pelo artigo 110 do CTN serviria para interpretar apenas
conceitos tributários de estatura infraconstitucional. Os conceitos
constitucionais, por outro lado, deveriam ser interpretados de acordo com
sua finalidade. Segundo o STF, ainda que os conceitos do direito civil
tenham importante papel na atividade interpretativa dos conceitos

877
constitucionais tributários, entendeu-se que é essencial que se reconheça a
interação entre Direito e Economia, para que princípios como a igualdade,
a capacidade contributiva e a solidariedade sejam alcançados.

A partir dessa linha de raciocínio, o relator do caso, Ministro Luiz Fux,


propôs a adoção do conceito econômico de serviço, que está relacionado
ao oferecimento de uma utilidade (e não necessariamente ao fornecimento
de trabalho), podendo estar conjugada ou não com a entrega de bens,
inclusive imateriais. Portanto, segundo a decisão, a contraposição entre
obrigações de dar e de fazer para definir a incidência de tributos perde
importância103.

A adoção de um conceito elástico de serviço, extraído da economia, não


parece ser um critério suficientemente seguro, sobretudo tendo em vista a
rigidez da Constituição Federal na repartição das competências tributárias,
e a nítida preocupação do legislador constitucional em evitar conflitos de
competência entre os entes federativos104.

Nesse contexto, respeitado o artigo 110 do CTN, com base no fato de


que o data center representa a disponibilização de infraestrutura, seja ela
física e/ou virtual, para armazenamento e processamento de dados, que
podem ser acessados de forma remota pelo usuário, não haveria aqui
qualquer forma de prestação de serviço. Na mera “disponibilização”, não
há qualquer esforço humano que caracterize o ato, isto é, a obrigação de
fazer. Além disso, não é qualquer ato que traduz vantagem a outrem que
irá necessariamente representar uma obrigação de fazer e,
consequentemente, uma prestação de serviço, nos moldes do conceito
trazido pelo Direito Civil.

3.2. Natureza Jurídica do Data Center

878
No caso do data center, por trás da infraestrutura disponibilizada,
existem, de fato, diversas atividades, algumas delas serviços propriamente
ditos. No entanto, essas atividades (ou serviços) têm caráter de atividade-
meio e, a princípio, não são contratadas nem remuneradas de forma
individualizada pelo cliente do data center.

Pelo data center, o usuário apenas acessa e utiliza, por meio da internet,
recursos informáticos (equipamentos e/ou software) que armazenam e
processam seus dados. Esses recursos informáticos são sim adquiridos e/ou
licenciados pelo “proprietário” do data center junto a terceiros (e não pelo
usuário).

Não há, a princípio, a contratação direta de licença de uso de software,


de venda de produto ou de prestação de serviço. Mesmo a manutenção dos
equipamentos e do software é uma atividade desempenhada pelo
“proprietário/fornecedor” do data center em seu próprio benefício, uma
vez que faz parte de sua atividade-fim assegurar a qualidade da
infraestrutura disponibilizada ao usuário, sendo este último o núcleo
central da atividade em questão.

Alberto Xavier classifica as relações que norteiam essas atividades, no


âmbito do contrato de data center, como “relações internas”, que
englobam, por exemplo, a climatização do ambiente, o acesso à internet, a
geração de energia elétrica por meio de geradores, entre outros. Nesse
sentido, o autor sustenta a:

necessidade de distinguir as relações jurídicas externas que prendeu o Data


Center e os seus clientes, em que se estipula preço para a disponibilização de uso e
as relações jurídicas internas que se estabelecem entre o Data Center e terceiros,
tendo por objeto os denominados “serviços de apoio”, que são objeto de estipulação
contratual separada com os prestadores de serviços e fornecedores do data center e
que representam meras atividades-meio, de caráter instrumental em relação à
105
atividade-fim em que a “disponibilização de infraestrutura” se traduz .

879
Se serviço não é, seria possível classificar o data center como uma
espécie de locação da infraestrutura disponibilizada? A RFB, na Solução
de Consulta n. 86/2012, já comentada, havia entendido que parte da
remuneração ao data center era formada pelo aluguel de equipamentos.

A locação, no entanto, implica a cessão do uso e gozo de coisa não


fungível, mediante certa contribuição (art. 565 do Código Civil). Na
locação, há a posse da coisa locada por determinado tempo (conforme se
depreende do art. 574 do Código Civil). Ocorre que, no data center, a
disponibilização de infraestrutura não dá a posse para o usuário do espaço.
O usuário acessa de forma remota os documentos e informações
armazenadas, mas não há posse daquela infraestrutura. Portanto também
não nos parece juridicamente adequado restringir a relação jurídica sob
análise a mera locação.

Ainda que pudesse ser sustentado que há locação de espaço (mais


especificamente, do espaço físico onde ficam os equipamentos) ou dos
equipamentos, isso seria apenas um dos elementos que permitem o acesso
ao data center, não sendo preponderante para a atividade como um todo,
podendo ser entendida como mais uma das atividades-meio.

Também deve ser afastada a eventual qualificação da remuneração da


disponibilização do data center, para fins fiscais, como royalty, no sentido
da exploração de um direito de uso. De fato, o artigo 22 da Lei n. 4.506/64
classifica como royalties “os rendimentos de qualquer espécie decorrentes
do uso, fruição, exploração de direitos”. O mesmo artigo traz exemplos
desses rendimentos, dentre os quais estão o uso ou exploração de marcas e
invenções e a exploração de direitos autorais (exceto quando percebidos
pelo próprio autor).

880
A nosso ver, o contrato de data center, no entanto, não decorre
unicamente da exploração de um direito. O “proprietário” do data center
disponibiliza uma infraestrutura para armazenamento das informações,
mas essa infraestrutura não poderia simplesmente ser classificada como
um direito, que então seria explorado. Ademais, não se pode afirmar que
se trata, exclusivamente, de um software (direito autoral) que estaria sendo
licenciado para o usuário do data center.

O misto de atividades que envolve o acesso ao data center não permite


que seja dada uma classificação dos pagamentos efetuados por tal acesso
como royalty apenas pela exploração de um direito. O usuário do data
center paga pelo acesso e por ter seus dados e informações armazenados
naquela infraestrutura, esperando que estejam seguras e protegidas. O
usuário não contrata o data center sem pensar, além do espaço de que
precisa, na segurança das suas informações. Por isso, seria muito simplista
o entendimento de que o usuário paga por um direito de uso (isto é, paga
royalty).

Restaria ao contrato de data center a classificação como um contrato


inominado, atípico. Os pagamentos realizados no âmbito de tal contrato,
no entanto, como visto, não poderiam ser classificados como remuneração
pela prestação de serviços, aluguel ou royalties, e tampouco poderiam ter
seus elementos dissociados106.

Sob outro prisma, também se discute se, pela reunião de atividades que
compõem o data center, não seria necessário analisá-las de forma
individual e, a depender de sua natureza, aplicar o tratamento tributário
específico de cada atividade (se houver). Ou seja, segregar do contexto
amplo do data center o licenciamento de software, a locação de
equipamentos, a manutenção do software e dos equipamentos etc.107.

881
Discussão similar se verifica no caso das atividades que compõem um
contrato de franquia, também listada na LC n. 116/2003 como serviço
(item 17.08), e que tem uma natureza híbrida e complexa, por envolver
diversos elementos em um mesmo contrato, não sendo, por vezes, possível
dissociar cada um deles, inclusive a sua remuneração. Esses elementos vão
desde o direito de uso das marcas, know-how, assistência do franqueador
ao franqueado, cobrança de taxa de publicidade até o aluguel de
equipamentos. Ou seja, o contrato é complexo porque envolve obrigações
de dar, de fazer e de não fazer108.

Há precedentes que analisam se os pagamentos realizados no âmbito de


contrato de franquia poderiam ser classificados como remuneração pela
prestação de serviços ou, ainda, se seria possível atribuir um tratamento
tributário segregado para cada um dos elementos que compõem tal espécie
de contrato. A jurisprudência, no entanto, não é consolidada, havendo
casos em que a conclusão foi de que as atividades do contrato de franquia
eram indissociáveis, não sendo possível individualizá-las nem tratá-las
como serviço109; por outro lado, há decisões no sentido de que seria, sim,
possível realizar a segregação das atividades que compõem o contrato de
franquia, aplicando-se os respectivos efeitos tributários110.

Todavia, justamente em razão da complexidade do contrato de data


center, a nosso ver, não se poderia individualizar os itens que o compõem,
não havendo um serviço específico que pudesse ser tributado ou, se
houvesse, eles seriam apenas “atividade-meio” para a “atividade-fim” de
disponibilização de infraestrutura do data center.

Em face dessas considerações acerca da natureza jurídica do contrato de


data center, passa-se a analisar, na sequência, as possíveis implicações

882
tributárias de tal atividade, seja no âmbito de relações jurídicas
estabelecidas localmente ou em caráter internacional (cross-border).

4. TRIBUTAÇÃO DO DATA CENTER NAS RELAÇÕES LOCAIS E


INTERNACIONAIS

4.1. Relações locais

4.1.1. IRPJ/CSLL

No caso da opção pelo lucro presumido pelo “proprietário” do data


center, tendo como premissa que a disponibilização de data center não
implica prestação de serviço, seria possível sustentar que os percentuais de
presunção aplicáveis às contraprestações recebidas dos clientes são 8٪ e
12٪, respectivamente para IRPJ e CSLL (art. 15, caput, e art. 20, caput, da
Lei n. 9.249/95), ao contrário da regra específica de prestação de serviços
em geral, cujo percentual de presunção aplicável é de 32% (art. 15, § 1º,
III e art. 20, caput, da mesma lei)111.

Já no caso de empresa optante pelo lucro real, as contraprestações


recebidas seriam computadas como parte do lucro real e base de cálculo de
CSLL. Ademais, considerando a preponderância da atividade de
disponibilização de infraestrutura do data center e, portanto, a não
segregação dos elementos dessa atividade, na sistemática do lucro real, as
despesas referentes às atividades-meio ou “relações externas” incorridas
pelo proprietário do data center (locação de espaço, licenciamento de
software de terceiros, manutenção dos equipamentos e do próprio
software) seriam, a princípio, dedutíveis da apuração do lucro real e base
de cálculo de CSLL, observados os requisitos do artigo 299 do RIR/99112.

4.1.2. PIS/COFINS

883
Na opção pelo lucro presumido, não haveria dúvida de que as receitas
decorrentes da disponibilidade de acesso ao data center estariam sujeitas
ao regime cumulativo, à alíquota de 3,65%.

A princípio, pela sistemática do lucro real, o PIS/COFINS incidente


sobre a receita da atividade prestada localmente seria o do regime não
cumulativo, à alíquota de 9,25%, com a possibilidade de creditamento em
relação a determinadas despesas113.

Nesse caso, no entanto, também poderia haver discussão sobre a


alíquota aplicável. Isso porque a legislação estabelece que determinadas
receitas auferidas por empresas de tecnologia devem permanecer sujeitas
ao regime cumulativo, sujeito à alíquota de 3,65%. Dentre essas receitas,
estão justamente algumas relacionadas ao setor de informática.

O artigo 10, inciso XXV, da Lei n. 10.833/2003114, estabelece que


permanecem sujeitas ao regime cumulativo (alíquota de 3,65%) as

receitas auferidas por empresas de serviços de informática, decorrentes das


atividades de desenvolvimento de software e o seu licenciamento ou cessão de
direito de uso, bem como de análise, programação, instalação, configuração,
assessoria, consultoria, suporte técnico e manutenção ou atualização de software,
115
compreendidas ainda como softwares as páginas eletrônicas .

Assim, se há quem sustente que é possível segregar as atividades e a


respectiva remuneração daquilo que compõe o contrato de data center,
certamente seria possível sustentar que parte dessa receita seria sujeita à
tributação à alíquota de 3,65%, tal como a manutenção e outros serviços
relacionados ao software necessários ao armazenamento de dados do data
center. A favor dessa posição, a legislação que rege tais contribuições
reconhece a possibilidade de se aplicar os dois regimes, a depender da
natureza atribuída à receita116.

884
No entanto, conforme mencionado, a possível segregação das atividades
que compõem o data center não parece adequada. As possíveis atividades
e/ou elementos que resultam na disponibilização de infraestrutura para o
armazenamento de dados e de informações não são independentes e não
poderiam implicar remuneração apartada. Além disso, as relações de
licenciamento de software e sua manutenção são firmadas entre o
detentor/proprietário do data center e o licenciador, não envolvendo
propriamente o usuário do data center. É certo que o usuário pode se
beneficiar diretamente do uso do intangível em questão, mas, como
explicado anteriormente, o licenciamento de software não representa o
núcleo central da atividade relativa ao data center. Portanto, em nossa
visão, seria mais adequado sujeitar a totalidade da receita auferida, no caso
do lucro real, à alíquota de 9,25% (regime não cumulativo), já que tal
posição seria compatível com o caráter indissociável das diversas
atividades que compõem o contrato complexo de data center.

4.1.3. ISS

Com base na conclusão de que a disponibilização de data center não


representa prestação de serviço, pois faltam os elementos que a
caracterizem como tal, não haveria respaldo jurídico para a cobrança do
ISS.

No entanto, os Municípios já enquadravam a atividade de data center


na redação atual do item 1.03 (antes das modificações da LC n. 157/2017).
Agora, como há uma previsão mais abrangente, que inclui expressamente
as atividades na nuvem, os contribuintes que oferecem o acesso a data
center na forma de IaaS, e que quiserem questionar a cobrança do ISS,
deverão ingressar com ação judicial para discutir a não qualificação do

885
data center como um serviço, já que, a princípio, os Municípios terão
respaldo legal para efetuar tal cobrança.

4.2. Relações internacionais

4.2.1. IRRF

A legislação brasileira em relação à tributação na fonte prevê que o


IRRF seja cobrado sobre rendimentos de qualquer natureza, provenientes
de fontes localizadas no Brasil (e.g., juros, royalties, ganho de capital etc.),
sempre que sejam auferidos por indivíduos ou pessoas jurídicas residentes
ou domiciliadas no exterior (art. 682, I, do Decreto n. 3.000/99 – RIR/99).

Como regra geral, o pagamento, o crédito, a entrega, o emprego ou a


remessa de rendimentos de qualquer natureza de uma fonte brasileira para
um beneficiário residente no exterior estão sujeitos à imposição do IRRF.
Nesse caso, a alíquota aplicável a rendimentos em geral é de 15% (art.
685, I, do RIR/99)117. Essa alíquota é majorada para 25% quando o
beneficiário estiver domiciliado em jurisdição com tributação
favorecida118.

No caso dos países com os quais o Brasil firmou tratado para evitar
dupla tributação, a discussão pode tomar outra direção.

Como sustentado, a disponibilização de data center não representa


serviço ou cessão de direitos nem pode ser dissociada em seus elementos.
Assim, não haveria fundamento para qualificar a remuneração associada
ao data center como royalties à luz da definição contida no artigo 12 da
Convenção Modelo de OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico) ou mesmo em face da equiparação sugerida
pelo ADI n. 5, de 16 de junho 2014119.

886
Embora o Brasil não seja membro da OCDE, como os tratados
brasileiros são elaborados com inspiração na Convenção Modelo, valem
como referência interpretativa os Comentários da OCDE ao artigo 12, no
sentido de que, no caso de pagamentos associados a contratos mistos, se
não é possível segregar a remuneração de cada um dos seus elementos e se
um deles constitui o objeto principal do contrato, sendo os demais apenas
acessórios, todos os valores pagos devem ser tratados levando em
consideração apenas o objeto principal120.

No caso do acesso ao data center, ainda que haja elementos referentes a


serviço ou a royalties por licenciamento de uso de software, tais elementos
não representariam o objeto principal do contrato de data center, que é a
disponibilização de infraestrutura para armazenamento de dados.

Assim, a não qualificação como serviços técnicos e, consequentemente,


a não equiparação a royalties (nos casos dos tratados que trazem a
equiparação) permitem sustentar a aplicação do artigo 7º (Lucros), o qual
estabelece que “os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só
são tributáveis nesse Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade
no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente
aí situado”. A aplicação desse artigo se justifica porque ele tem o caráter
de “cláusula geral” na aplicação da Convenção Modelo, podendo ser
invocado nas situações em que o rendimento não tenha qualificação
específica em outros dispositivos da Convenção121.

Sendo aplicável o artigo 7º, portanto, não deveria haver a retenção de


IRRF nas remessas relacionadas ao data center contratado do exterior, na
medida em que a aplicação do tratado restringiria o exercício do poder de
tributar do país da fonte (Brasil). Nesse caso, os lucros poderiam ser

887
tributados apenas no Estado Contratante/País do proprietário do data
center.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacificou o entendimento acerca


da prevalência dos tratados sobre a legislação nacional, no caso de
enquadramento da remuneração à luz do artigo 7º, afastando a incidência
do IRRF122.

4.2.2. CIDE

De acordo com o art. 2º, § 2º, da Lei n. 10.168/2000, a CIDE é devida


“pelas pessoas jurídicas signatárias de contratos que tenham por objeto
serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes prestados
por residentes ou domiciliados no exterior, bem assim pelas pessoas
jurídicas que pagarem, creditarem, entregarem, empregarem ou remeterem
royalties, a qualquer título, a beneficiários residentes ou domiciliados no
exterior”, sendo a alíquota aplicável de 10% (§ 4º do mesmo artigo).

Novamente, considerando que a disponibilização de acesso ao data


center não pode ser entendida como prestação de serviços, ou mesmo
como forma de licenciamento de uso qualificada como royalty, não
deveria haver a incidência de CIDE.

Com efeito, a remuneração do acesso ao data center não pode ser


qualificada de forma genérica como royalty por exploração de direito de
uso, justamente em razão da complexidade e do caráter misto das
atividades que compõem o data center.

4.2.3. PIS/COFINS-Importação

A partir de 1º de maio de 2004, as transações de importação envolvendo


serviços e mercadorias estão sujeitas à incidência de PIS/COFINS-

888
Importação (Lei n. 10.865/2004). Na importação de serviços, a alíquota
aplicável é de 9,25% sobre o valor cobrado do serviço, também sendo
devido pela empresa brasileira “importadora” do serviço. No entanto,
como a disponibilização de acesso ao data center não representa um
serviço (e tampouco pode ser assemelhada à compra de mercadoria), não
haveria que se falar na incidência de PIS/COFINS-Importação.

4.2.4. ISS

O ISS também é devido na importação de um serviço pelo contribuinte


que o contrata junto a empresa estrangeira123. Se domiciliado no Município
de São Paulo, esse contribuinte que viesse a contratar a atividade de data
center no exterior, a princípio, estaria obrigado a efetuar a retenção do ISS
à alíquota de 5%, aplicável ao item 1.03 da lista de serviços do
Município124. Com base nas alterações promovidas recentemente, essa
alíquota passará a ser de 2,9% a partir de fevereiro de 2018125. Apesar de
ser sujeito à retenção, o ISS costuma onerar economicamente os
contribuintes que contratam os serviços no exterior na situação em que há
previsão de gross-up do tributo126.

Não obstante, pelas razões já expostas, entendemos que existem


fundamentos jurídicos para sustentar a não incidência de ISS sobre o
acesso ao data center.

4.2.5. IOF

O Imposto sobre Operações Financeiras sobre as operações de câmbio


(IOF/Câmbio) é devido na conversão de Reais em moeda estrangeira e
vice-versa. Portanto, na remessa do pagamento feita pelo usuário à
empresa domiciliada no exterior proprietária do data center, há incidência
do IOF/Câmbio, sendo aplicável, atualmente, à alíquota geral de 0,38%

889
(art. 15-B, do Decreto n. 6.306, de 14-12-2007). O IOF/Câmbio representa
um custo tributário da contratante do data center no Brasil.

4.3 Outros comentários – Discussões recentes sobre o regime tributário do


data center

Além da mudança na LC n. 116/2003, que autorizou os Municípios a


revisarem as suas legislações, com a cobrança de ISS sobre “serviços”
prestados na nuvem, dentre os quais o IaaS/data center, também há
expectativa de outras mudanças no setor.

Em setembro de 2017, foi aprovado pela Câmara dos Deputados um


projeto de lei (PL n. 6.413/2016) que visa a alterar a Lei n. 11.196, de 21
de dezembro de 2005 (Lei do Bem), para incluir as operações de data
center como beneficiárias do chamado Regime Especial de Tributação
para a Plataforma de Exportação de Serviços de Tecnologia da Informação
(Repes).

Atualmente, o Repes beneficia empresas exportadoras de software e de


prestação de serviços de informática. O regime concede benefícios fiscais,
como a suspensão da exigência de PIS/COFINS na importação de bens e
serviços e sobre a receita local auferida127.

Segundo o parecer da Câmara dos Deputados (emitido pela Comissão


de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática), o incentivo à
atividade e instalação de data centers no País “cria um ambiente mais
robusto para o desenvolvimento das sociedades de tecnologia de
informação e comunicação (TICs) e diminui a dependência de
infraestrutura estrangeira, além de possuir um componente estratégico em
relação à segurança da informação128”.

890
Aliás, aparentemente o estímulo a atividades envolvendo data centers
no País está intrinsecamente relacionado à segurança da informação. Nesse
sentido, é interessante notar, que, no âmbito regulatório, o Banco Central
do Brasil (BACEN) recentemente lançou um edital de consulta pública n.
57/2017 com proposta de resolução dispondo “sobre a política de
segurança cibernética e sobre os requisitos para a contratação de serviços
de processamento, armazenamento de dados e de computação em nuvem, a
serem observados pelas instituições financeiras e demais instituições
autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil”.

Um dos pontos mais interessantes (e polêmicos) da referida resolução é


a vedação à contratação de “serviços” relevantes de processamento, de
armazenamento de dados e de computação em nuvem prestados no
exterior (art. 11). Além disso, é previsto que as instituições que já
contrataram a prestação desses “serviços” devem apresentar ao BACEN
um cronograma para o retorno da execução desses serviços no País, sendo
o prazo máximo, para a execução plena dos serviços no País, 31 de
dezembro de 2021.

O edital está sob consulta pública até 21 de novembro de 2017, mas já


há bastante repercussão sobre as diretrizes da resolução, principalmente
quanto à interferência do BACEN na liberalidade de as instituições
financeiras optarem por contratar data centers no exterior. De todo o
modo, caso seja implementada a resolução na forma como está, é provável
que tenhamos mais discussões sobre a tributação da atividade de data
center desenvolvida no Brasil, a depender também do PL que expande o
REPES para esse tipo de atividade.

5. CONCLUSÕES

891
Com base nas nossas considerações no sentido de que o acesso a data
center não representa uma prestação de serviço e, também, por ser uma
atividade complexa que envolve diversos elementos, não é passível de
segregação (e.g., em locação, licenciamento, manutenção dos
equipamentos etc.), sendo um contrato inominado em que o objeto é a
disponibilização de infraestrutura para armazenamento de dados e
informações, mostra-se ilegítima, na contratação de data center do
exterior, a incidência da CIDE e PIS/COFINS-Importação, bem como a
tentativa de inclusão desse serviço na lista de serviços da LC n. 116/2003,
ao enquadrá-lo no item 1.03 (tanto na atual redação, quanto na nova,
modificada pela LC n. 157/2017), resultando na incidência de ISS.

Também pelo fato de os pagamentos realizados no âmbito de contrato


de data center não serem qualificados como remuneração pela prestação
de serviço ou royalty, no caso de contratação de acesso a data center cujo
beneficiário dos pagamentos esteja localizado em países que tenham
firmado tratado internacional com o Brasil, seria possível sustentar a
aplicação do artigo 7º (Lucros), afastando-se assim a eventual cobrança do
IRRF no Brasil.

Na hipótese de o data center ser contratado por empresa domiciliada no


País, pelas mesmas razões não concordamos com a incidência de ISS e,
caso a empresa adote o lucro presumido, entendemos que a alíquota
aplicável de presunção seguiria a regra geral de 8% (IRPJ) e 12% (CSLL),
e não a destinada à prestação de serviços (32%).

Finalmente, caso a empresa de tecnologia ofereça outros modelos de


“produto” na nuvem a seus clientes, além do IaaS, tais como o SaaS e o
PaaS, entendemos ser possível segregar a contratação e remuneração de
cada um desses “produtos” para que o respectivo tratamento tributário seja

892
aplicável de forma individualizada. Isso pode trazer impactos tributários
diferentes tanto na contratação do data center no País, como do exterior,
os quais devem ser analisados caso a caso.

893
Breves Considerações sobre o Tratamento
Legal, Contábil e Fiscal das Moedas Virtuais
129 130
Thiago Rufalco Medaglia e Eric Simões Visini

I. INTRODUÇÃO

De tão óbvias, maiores digressões sobre o impacto da revolução


tecnológica na economia e vida das pessoas se mostram absolutamente
desnecessárias. Distâncias foram reduzidas, fronteiras superadas e novas
realidades criadas. Mais interessante é a constatação de que um outro
elemento, de ordem puramente econômica, parece ter sido potencializado
por essa revolução: a redução de intermediários.

A evolução dos meios de comunicação permitiu o contato direto entre


os dois extremos de uma mesma cadeia. Mais: permitiu novos acessos,
novos campos e oportunidades, incluindo a “intangibilização” dos
estabelecimentos comerciais (isto é, a presença física se tornou
absolutamente desnecessária à realização de negócios em qualquer
localidade).

Essas mudanças tiveram sensível impacto em diversos campos, entre


eles o monetário/financeiro, criando aquilo que foi intitulado de peer-to-
peer exchange por uma equipe de pesquisa do Fundo Monetário
Internacional (FMI)131. Não é de todo errado dizer que, após alguns
milênios, a revolução tecnológica trouxe de volta o escambo (ainda que de
forma virtual) ao centro da prática econômica. Além disso, essa evolução
trouxe um questionamento do dogma, de mais de quatro séculos, de serem
os Estados os centros e exclusivos reguladores de políticas monetárias.

894
A verdade é que se mostra absolutamente impossível, com precisão,
definir e rotular diversos elementos trazidos pela (r)evolução tecnológica,
seja pela total inexistência de paradigmas, seja simplesmente pela contínua
mutação desses elementos. E exatamente no centro dessa temática é
encontrado aquilo que se convencionou chamar de “moedas virtuais”, e
mais especificamente as moedas criptografadas ou simplesmente
“criptomoedas”132.

É importante registrar que esse tópico é tema recorrente em diversas


discussões políticas, econômicas e jurídicas, que vão da necessidade (ou
não) de sua regulação à possibilidade de sua utilização como instrumento
de financiamento ao terrorismo133. Para os fins do presente artigo, embora
uma análise da natureza jurídica das moedas virtuais se faça indispensável,
o escopo fica limitado ao estudo do tratamento tributário a elas atribuída
pela legislação fiscal brasileira.

De toda forma, as moedas virtuais não são hoje apenas uma realidade
(existem algumas centenas de moedas virtuais), como claramente possuem
um enorme impacto econômico. A título meramente exemplificativo, cite-
se a mais popular dessas moedas: o Bitcoin. Essa moeda virtual foi
originalmente quantificada em 5 de outubro de 2009 e, na ocasião, US$
1,00 (um dólar dos Estados Unidos da América) equivalia a 1.309 Bitcoins
(em Reais, na cotação da época, R$ 1,00 equivaleria a 746 Bitcoins). Esse
valor foi definido naquela data com base numa equação que quantificava o
gasto com energia elétrica utilizada para ligar o computador que gerava os
Bitcoins134.

Em 6 de fevereiro de 2010, essa moeda virtual é levada a mercado. No


dia 3 de janeiro de 2017, a cotação da unidade do Bitcoin no mercado
brasileiro alcança aproximadamente R$ 4.100,00. Em março, a cotação do

895
Bitcoin supera o valor da onça do ouro. Em 30 de novembro desse mesmo
ano, os Bitcoins são “comercializados” em território nacional por R$
40.680,00 a unidade135.

Em termos numéricos, a mesma quantidade de Bitcoins que poderia ser


“adquirida” no final de 2009 por R$ 1,00 custaria mais de R$ 30,3 milhões
no final de novembro de 2017. Ainda em termos numéricos, um
investimento de R$ 11.500,00 feito com base na primeira quantificação do
Bitcoin, se realizado ao final de novembro de 2017 na cotação acima,
transformaria o investidor no homem mais rico do mundo, com patrimônio
superior a US$ 100 bilhões136.

Se a análise do impacto econômico das moedas virtuais se mostra


intrigante, não menos desafiadora é a definição dos respectivos impactos
legais e fiscais. Nesse contexto, o presente artigo buscará conceituar as
moedas virtuais para, na sequência, definir o tratamento contábil e fiscal a
elas atribuídos pela legislação brasileira. Nesse caminho, serão feitos
breves comentários acerca de como essa problemática está sendo
enfrentada por outras jurisdições e a sua aplicabilidade à realidade
brasileira. Para fins didáticos, o tópico de tributação será dividido em
subtópicos específicos para tratar das operações mais comuns envolvendo
as moedas virtuais.

II. DAS MOEDAS VIRTUAIS – ELEMENTOS DEFINIDORES,


EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL E DISCIPLINA BRASILEIRA

II.1 Elementos Definidores

Antes de buscar uma conceituação do que seriam as moedas virtuais,


cumpre registrar que esse tema encontra-se em constante mutação e
evolução. Por tal razão, a tentativa de se traçar um conceito universal de

896
moedas virtuais mostra-se simultaneamente fadada ao insucesso e
absolutamente desnecessária. Ademais, a própria definição do que seria
“moeda” já é um tema tormentoso, razão pela qual esse tipo de análise
excede consideravelmente o escopo do presente estudo137.

A definição mais óbvia de moedas virtuais parece ser:

representações digitais de valor, emitidas por desenvolvedores privados e


denominadas em sua própria unidade de registro. Moedas virtuais podem ser
obtidas, armazenadas, acessadas e transacionadas eletronicamente, e podem ser
utilizadas para uma variedade de propósitos, desde que as partes contratantes
138
concordem com o uso delas. (tradução livre) .

De forma semelhante, a Autoridade Bancária Europeia (EBA –


European Bankinng Authority) apresentou a seguinte definição: “Moedas
virtuais são definidas com uma representação digital de valor que não é
nem emitida por um banco central ou autoridade pública, tampouco
vinculada a uma moeda convencional, mas é utilizada por pessoas físicas
ou jurídicas como instrumento de permuta e podem ser transferidas,
armazenadas ou comercializadas eletronicamente” (tradução livre)139.

Tais definições, contudo, parecem ser demasiadamente abertas,


podendo nelas serem incluídos programas de recompensa (e.g., programas
de milhagens), descontos virtuais, bônus em aplicativos ou jogos
eletrônicos etc. Por essa razão, em vez de se buscar uma definição (um
limite fechado) às moedas virtuais, é mais prático e eficiente o uso de um
raciocínio tipológico, elencando os elementos comuns que devem existir
para que as representações digitais de valor possam ser consideradas como
moedas virtuais.

Embora esse debate esteja longe de um fim, para os fins do presente


estudo faremos uso, como elementos indispensáveis à caracterização de

897
moedas virtuais (aqui entendidas como criptomoedas), de cinco
características básicas, assim listadas pelo já mencionado grupo de estudo
do FMI: (i) as moedas virtuais representam valores digitalmente; (ii) não
possuem curso legal; (iii) são “conversíveis” no mundo real em bens,
serviços e até mesmo em moedas oficiais; (iv) são “descentralizadas”, isto
é, não respondem a uma autoridade central (embora outros modelos, ainda
que híbridos, pareçam estar surgindo); e (v) fazem uso de tecnologia
criptográfica para validação.

Mais tortuosa é a definição da natureza jurídica das moedas virtuais.


Por tal razão, dividimos os subtópicos que seguem de forma a analisar
separadamente, de forma sucinta, a experiência internacional e o atual
regramento brasileiro do tema.

II.2 Breves Apontamentos sobre a Experiência Internacional

Embora diversos países já tenham iniciado processos legislativos para


endereçar esse tema, uma homogeneização de conceitos ainda se encontra
distante. Ademais, os conceitos jurídicos próprios de cada país impedem
uma perfeita replicação de definições e práticas.

A essa definição, a primeira pergunta que merece ser respondida seria


se as moedas virtuais podem ser tidas como “moeda” propriamente dita
(na acepção legal da palavra). Embora o sistema monetário internacional,
após a derrocada do Sistema Bretton Woods em meados da década de
1970, tenha observado certa relativização quanto ao papel (e monopólio)
dos bancos centrais nos diversos sistemas monetários, a prática
internacional demonstra que a maioria dos países ainda restringe o
conceito de moedas àquelas emitidas, reguladas ou admitidas pelas
respectivas legislações internas.

898
A experiência internacional sugere que a maioria dos países não atribui
o caráter de “moeda” às moedas virtuais, embora exceções sejam
encontradas. Ademais, essa análise revela que foram poucas as jurisdições
que efetivamente editaram legislação tratando do tema, de forma que as
principais manifestações existentes são de órgãos governamentais (e não
propriamente na forma de leis).

A título ilustrativo, o mais óbvio exemplo parece ser o dos Estados


Unidos da América. A legislação desse país expressamente restringe ao
dólar o caráter exclusivo de moeda naquela jurisdição, impedindo que as
criptomoedas sejam assim qualificadas140.

Nesse contexto, o Internal Revenue Service editou em 2014 o Notice


2014-21, que esclarece como os princípios tributários gerais devem ser
aplicados às transações envolvendo moedas virtuais. Dito Notice, na seção
04, expressamente define as moedas virtuais como “propriedade”141.

A legislação do Reino Unido também não traz definição às moedas


virtuais. Contudo, na esfera fiscal, o HM Revenue and Customs (HMRC)
editou o Brief 9 (2014), publicado em 3 de março daquele ano, que foi
intitulado como “Bitcoin and other cryptocurrencies”. Indiretamente, dito
Brief parece “assemelhar” as moedas virtuais às moedas estrangeiras,
detalhando como os ganhos dessas operações devem ser tributados.

A Alemanha, em dezembro de 2013, por meio da Autoridade Federal de


Supervisão Financeira (Bundesamt für Finanzdienstleistungen, BaFin),
editou um comunicado reconhecendo que os Bitcoins são instrumentos
financeiros, caindo na categoria prevista no Artigo 1(11) do Código
Bancário (Kreditwesengesetz).

899
Diversos outros países seguiram tal exemplo, usualmente estabelecendo
que a legalidade dessas moedas virtuais não precisaria ser objeto de lei,
contudo diferenciando tal instrumento de moedas propriamente ditas.
Alguns desses países são: Dinamarca, Rússia, Suécia, Itália, Espanha,
França, Portugal, Grécia, Turquia, Países Baixos, dentre tantos outros142.

Interessante é a análise da posição adotada pela Austrália sobre o tema.


Embora as moedas virtuais não tenham sido objeto de regulamentação, no
Orçamento 2017-2018 publicado em junho de 2017 é expressamente
afirmado que não cabe tributação indireta (general sales tax) sobre as
moedas virtuais, na medida em que essas devem ser tratadas como
“dinheiro”.

A análise acima, contudo, revela uma tendência de aceitação do uso das


moedas virtuais, em contrapartida a sua consideração como um ativo
(normalmente financeiro), e não uma moeda propriamente dita. Revela
ainda que a maioria dos países parece entender desnecessária uma
regulação das moedas virtuais, tratando do tema exclusivamente na esfera
fiscal.

II.3 O tratamento na Legislação Brasileira

Assim como a maioria dos países anteriormente mencionados, a


legislação brasileira não propõe uma definição. Por tal razão, um estudo do
tema pressupõe a análise de diferentes diplomas, na tentativa de se traçar
um panorama da legislação brasileira aplicável ao tema.

Inicialmente, cumpre registrar que a Lei n. 9.069/95, resultado da


conversão da Medida Provisória n. 1.027/95, instituiu o “REAL” como a
unidade exclusiva do Sistema Monetário Nacional, determinando que essa
unidade passaria a ter curso legal em todo o território nacional.

900
Sendo o Real exclusivo, a legislação brasileira não reconhece as
moedas virtuais como moeda de referência, tampouco lhes impõe curso
legal. Por outro lado, a Lei n. 12.865/2013, que regula o chamado Sistema
de Pagamentos Brasileiro (SPB), traz definições importantes acerca dos
meios de pagamento aceitos no Brasil, incluindo uma definição do que
seria “moeda eletrônica”.

Os artigos 7º e 15 desse diploma ainda atribuem competência ao Banco


Central do Brasil (BACEN) para disciplinar o tema, devendo tal disciplina
seguir os parâmetros estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional
(CMN).

Em 2014, o BACEN editou o Comunicado n. 25.306, que


expressamente estabelece que as moedas eletrônicas tratadas pela Lei n.
12.865/2013 não se confundem com as moedas virtuais.

Mais recentemente, em 16 de novembro de 2017, o BACEN editou o


Comunicado n. 31.379, que busca alertar contra os riscos associados à
guarda e negociação das moedas virtuais. Esse novo comunicado parece
decorrer da constatação pelo BACEN de que o volume de transações
envolvendo moedas virtuais cresceu consideravelmente no último par de
anos. Dito Comunicado não inova em conteúdo, com exceção da
afirmação de que o uso de moedas virtuais não afasta a obrigatoriedade de
observância das regras cambiais brasileiras (conforme item 6).

De toda forma, ambos os Comunicados parecem se posicionar no


sentido de que o BACEN não considera as moedas virtuais como moeda
em sentido estrito, particularmente quando afirma “as chamadas moedas
virtuais não são referenciadas em reais ou em outras moedas estabelecidas
por governos soberanos” (item 5).

901
A título ilustrativo, convém ainda registrar a existência do Projeto de
Lei n. 2.303/2015, de autoria do deputado Áureo Lido Moreira Ribeiro
(SD-RJ), que trata especificamente da regularização das moedas virtuais
em território nacional. O texto em questão pretende classificar as
criptomoedas e os programas de milhagem aérea como arranjo de
pagamento sob a supervisão do Banco Central.

A análise acima revela que as moedas virtuais não podem ser


classificadas como moedas pela legislação brasileira, tampouco possuem
uma expressa definição legal que permita definir de plano sua natureza
jurídica.

Naturalmente, as moedas virtuais enquadram-se no conceito de bens


móveis, delimitado nos artigos 82 e 83 do Código Civil. Na medida em
que as moedas virtuais, nos termos anteriormente apresentados,
materializam representações digitais de valor que podem ser objeto de
“conversão” no mundo real em bens, serviços e até mesmo moedas
oficiais, elas possuem impacto e devem ser consideradas na mensuração da
posição patrimonial e financeira de seu detentor, perfazendo o conceito de
“ativo” previsto na legislação contábil brasileira.

Enquanto ativo, as moedas virtuais podem ser classificadas, conforme a


legislação societária, tanto como ativo circulante ou como investimento, a
depender da expectativa de realização desse ativo (art. 179, I e III, c/c art.
183, I, todos da Lei n. 6.404/76). Por fim, assemelham-se ao conceito de
“ativo financeiro” previsto no item 11 do Pronunciamento Técnico CPC
39, aprovado pela Deliberação CVM n. 604/2009.

Como tal, para os fins do presente estudo, as moedas virtuais devem ser
tratadas como ativos financeiros, devendo ser assim consideradas para fins

902
contábeis e fiscais. Aparentemente, esse entendimento é compartilhado
pela RFB, que assim se manifestou no diretório intitulado “Perguntas e
Respostas”, ao tratar de como as moedas virtuais devem ser declaradas
pelas pessoas físicas. Confira-se:

MOEDA VIRTUAL – COMO DECLARAR 447 — As moedas virtuais devem


ser declaradas?
Sim. As moedas virtuais (bitcoins, por exemplo), muito embora não sejam
consideradas como moeda nos termos do marco regulatório atual, devem ser
declaradas na Ficha Bens e Direitos como “outros bens”, uma vez que podem
ser equiparadas a um ativo financeiro. Elas devem ser declaradas pelo valor de
aquisição.
Atenção: Como esse tipo de “moeda” não possui cotação oficial, uma vez que
não há um órgão responsável pelo controle de sua emissão, não há uma regra legal
de conversão dos valores para fins tributários.
Entretanto, essas operações deverão estar comprovadas com documentação hábil
e idônea para fins de tributação.

É importante notar que, enquanto ativo financeiro, as moedas virtuais


podem ainda perfazer o conceito de instrumento financeiro previsto na
legislação societária e contábil. Tal circunstância pode gerar impactos na
forma de avaliação desse ativo e nos respectivos reflexos fiscais.

Finalmente, convém registrar que a conclusão acima não é alterada em


virtude do Ofício Circular n. 1/2018/CVM/SIN da CVM. Dito diploma
limita-se a dizer quais ativos financeiros podem compor a carteira de
fundo de investimento, não se destinando a conceituar o que seria um ativo
financeiro propriamente dito.

III. DO TRATAMENTO CONTÁBIL E FISCAL APLICÁVEL ÀS MOEDAS


VIRTUAIS

Definida a natureza jurídica das moedas virtuais, cumpre agora discutir


o tratamento contábil e fiscal a elas aplicável. A esse respeito, o presente
artigo se restringirá à análise desse tratamento às pessoas jurídicas.

903
III.1 Do Tratamento Contábil Atribuído às Moedas Virtuais

Considerando a natureza de ativo financeiro anteriormente explicitada,


a respectiva contabilização variam na medida em que as moedas virtuais
podem ser classificadas, conforme a legislação societária, tanto como ativo
circulante quanto como investimento (não circulante), a depender da
expectativa de realização desse ativo (art. 179, I e III, c/c art. 183, I, todos
da Lei n. 6.404/76).

Mais interessante é a prescrição encontrada nas alíneas do inciso I do


artigo 183, da Lei n. 6.404/76, que estabelece os critérios de avaliação de
ativos. Em linhas gerais, é estabelecido que os instrumentos financeiros
devem ser avaliados pelo seu valor justo, sempre que sejam destinados à
negociação ou estejam disponíveis para a venda, ou pelo custo de
aquisição e/ou emissão, nos demais casos.

Embora o registro pelo custo de aquisição e/ou emissão não apresente


grandes desafios ou reflexos (inclusive fiscais), o mesmo não pode ser dito
da avaliação a valor justo. O parágrafo 1º desse mesmo dispositivo
conceitua o que seria o valor justo aos instrumentos financeiros, como “o
valor que pode se obter em um mercado ativo, decorrente de transação não
compulsória realizada entre partes independentes”.

Assim, quando do registro da moeda virtual nas demonstrações


contábeis do adquirente, a respectiva avaliação deverá ser realizada a valor
justo, qualquer que seja o valor da operação e eventuais diferenças entre o
valor da operação e o respectivo valor justo da moeda virtual deverão ser
lançados a resultado (receita ou despesa).

Uma vez reconhecido, cumpre verificar se eventuais flutuações no


respectivo valor justo também devem ser refletidas nas demonstrações

904
contábeis; ou se até mesmo um controle de “variação cambial” deve ser
realizado, equiparando as moedas virtuais às moedas estrangeiras, se assim
fossem considerados.

Nesse passo, o Pronunciamento CPC 2 (R2) destina-se a tratar


especificamente dos efeitos das mudanças nas taxas de câmbio e conversão
de demonstrações contábeis. Em resumo, o regramento ali encontrado, nos
exatos termos do seu item 3, deve ser aplicado às transações que tenham
saldo em moeda estrangeira ou na conversão de resultados para uma
moeda de apresentação (isto é, a moeda do ambiente econômico principal
no qual a entidade opera).

Ato contínuo, ao se estabelecer que as moedas virtuais possuem


natureza de ativo financeiro, a aplicabilidade do Pronunciamento CPC 2
(R2) é afastada. Assim, não haveria que se falar em “variação cambial de
moedas virtuais”, prevalecendo o reconhecimento pelo seu valor justo.

III.2 Do Tratamento Fiscal Atribuído às Moedas Virtuais

A complexidade em determinar o tratamento tributário aplicável às


moedas virtuais é diretamente proporcional à dificuldade em se determinar
a natureza jurídica desse ativo virtual. Talvez seja por essa razão que a
OCDE, por meio do BEPS Action 1 – 2015 Final Report (Addressing the
Challenges of the Digital Economy), limitou-se a comentar a novidade e as
incertezas relacionadas às moedas virtuais, silenciando quanto aos
respectivos impactos na esfera fiscal143.

Nos termos anteriormente mencionados, outras jurisdições – tais como


os Estados Unidos, o Reino Unido, os países da Europa Continental e a
Ásia – posicionaram-se no sentido de que eventuais ganhos decorrentes da
comercialização de moedas virtuais devem ser tributados de forma

905
semelhante aos ganhos decorrentes de operações envolvendo outros ativos
financeiros.

No caso brasileiro, com exceção de uma única manifestação da RFB


sobre como os ganhos auferidos por pessoas físicas deveriam ser
tributados, não é encontrado nenhum dispositivo legal e/ou manifestação
de autoridades oficiais quanto ao tratamento tributário a ser atribuídos às
moedas virtuais144.

Naturalmente, o tratamento fiscal pode variar a depender da pessoa do


contribuinte (e o regime de tributação por ela adotado), do tipo de
operação (e a respectiva satisfação) realizada com as moedas virtuais e, até
mesmo, dos reflexos fiscais decorrentes dos controles contábeis
anteriormente delineados. Além disso, um fenômeno associado ao
nascimento das moedas virtuais é a aparição de negócios e fatos jurídicos
próprios desse universo, tais como as atividades de mineração
(cryptocurrency mining) e arbitragem (cryptocurrency arbitration) das
moedas virtuais.

Se as formas de utilização, realização e comércio das moedas virtuais se


mostram ilimitadas, a tentativa de traçar uma visão completa dos efeitos
fiscais a elas associados seria tarefa fadada ao insucesso. Por essa razão, os
subtópicos que se seguem buscam apresentar uma visão objetiva dos
principais reflexos fiscais das atividades mais comuns relacionadas às
moedas virtuais.

a) Tratamento Fiscal da Aquisição de Moedas Virtuais

Nos termos anteriormente explicados, ativos financeiros adquiridos,


sempre que destinados à negociação ou disponíveis à venda, devem ser

906
avaliados a valor justo. Nos demais casos, a avaliação é feita por meio do
custo de aquisição/emissão. Neste último caso, nenhum reflexo fiscal deve
ser verificado, eis que tal operação não implica trânsito pelo resultado
contábil da empresa (isto é, o valor do ativo corresponderá aquilo que foi
“consumido” para a sua aquisição/emissão).

Por outro lado, a avaliação a valor justo pode resultar em registro de


receita ou despesa contábil, sempre que o valor de aquisição for diverso do
valor de mercado atribuível a esse ativo financeiro. Como tal, cumpre
verificar os efeitos fiscais associados ao registro de receitas e despesas
decorrentes de avaliação a valor justo.

Com efeito, a avaliação a valor justo encontra disciplina no


Pronunciamento CPC 46, aprovado pela Deliberação CVM n. 699/2012.
Como já mencionado, é premissa da avaliação a valor justo que um ativo
ou passivo seja, na expressão encontrada no item 15 desse
pronunciamento, “trocado em uma transação não forçada entre
participantes do mercado para a venda do ativo ou a transferência do
passivo na data de mensuração nas condições atuais de mercado”.

Os efeitos fiscais decorrentes da avaliação a valor justo encontram


atualmente disciplina na Lei n. 12.973/2014 e na Instrução Normativa n.
1.700/2017 (IN n. 1.700). Os artigos 13 e 14 da Lei n. 12.973/2014
estabelecem respectivamente que ganhos e perdas decorrentes da avaliação
a valor justo não produzirão efeitos contábeis enquanto ainda não
realizados.

No caso específico dos ganhos, essa não tributação fica ainda


condicionada a evidenciação em subconta vinculada ao ativo. Noutros
termos, o ativo (moeda virtual) deve ser contabilizado pelo custo de

907
aquisição, e o “acréscimo” por força da avaliação a valor justo deve ser
contabilizado em subconta vinculada, em contrapartida a uma receita na
demonstração de resultados.

Mandamentos de igual racional são encontrados nos artigos 98 e 100 da


IN n. 1.700. Ditos dispositivos esclarecem que os ganhos decorrentes de
avaliação a valor justo devem ser tratados como exclusão temporária. A
tributação, ato contínuo, é postergada ao momento de realização, seja por
venda, por baixa ou operação equivalente.

Como tal, eventuais perdas ou ganhos associados à aquisição de moedas


virtuais e decorrentes da respectiva avaliação a valor justo permanecem
inertes para fins de apuração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica
(IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) até a
respectiva realização. Vale ainda mencionar que a legislação que disciplina
as Contribuições ao Programa de Integração Social (PIS)145 e ao
Financiamento da Seguridade Social (COFINS)146 também desonera de
tributação os ganhos decorrentes da avaliação a valor justo.

Tendo em vista a natureza das moedas virtuais, é de se presumir que as


mais comuns hipóteses de realização sejam a venda, perda ou permuta.
Passamos agora à análise dos reflexos fiscais por força da realização por
venda.

b) Tratamento Fiscal da “Venda” de Moedas Virtuais

Inicialmente, cumpre registrar que ao contrário do comércio de outros


ativos financeiros, a inexistência de definição da natureza jurídica das
moedas virtuais e do respectivo comércio faz com que tais atividades não
se encontrem atualmente sob o crivo do Sistema Financeiro Nacional

908
(SFN), podendo ser desempenhadas por pessoas físicas e jurídicas
“desreguladas”. Como tal, os regramentos aplicáveis aos atuantes no SFN,
incluindo as regras de natureza tributária, somente se mostram
eventualmente aplicáveis àqueles que atuem nesse segmento e também se
dediquem ao comércio de moedas virtuais.

Dito isso, é importante ainda registrar que uma das condicionantes da


tributação está diretamente relacionada ao objeto social desenvolvido pelos
contribuintes. Aqueles que têm como objeto social o comércio de ativos
financeiros, incluindo as criptmoedas, deverão tratar as receitas
decorrentes da negociação desses ativos como operacionais (venda de
ativo circulante), assim as tributando; por outro lado, aqueles que tratem
esse tipo de ativo como investimento financeiro de longo prazo deverão
tratar tal operação como venda de ativo não circulante, tributando o ganho
de capital eventualmente registrado147.

Àqueles que adotam o regime do lucro real, a renda tributável –


economicamente – será sempre a eventual diferença positiva entre o valor
de venda e o custo de aquisição, para fins de IRPJ e CSLL. Contudo, vale
lembrar que a Lei n. 13.169/2015 aumentou a alíquota da CSLL para as
instituições financeiras e assemelhadas, de forma que a carga tributária
efetiva para os contribuintes que se enquadram nessa categoria será
superior.

Não obstante, por se tratar de atividade desregulada, nada impede a sua


condução por empresas optantes pelo lucro presumido148. Nesse particular,
cumpre menção à recém-publicada Solução de Consulta n. 347, de junho
de 2017, que se posicionou no sentido de que a venda de participação
societária, por empresa que tenha esse objeto social e adote o lucro
presumido, deve ter a sua carga tributária calculada valendo-se de um

909
percentual de presunção de 32% (trinta e dois por cento). Ainda que o
entendimento em questão possa ser objeto de inúmeras críticas, é de ser
presumir que o mesmo raciocínio seria estendido ao comércio de moedas
virtuais.

Ademais, é importante recordar que a operação de venda implica a


realização do ganho ou perda eventualmente registrados em virtude da
avaliação a valor justo, nos termos do artigo 13 da Lei n. 12.973/2014. Por
outro lado, dita realização tende, como regra geral, a não causar aumento
de carga tributária, eis que o acréscimo ou decréscimo do valor do ativo
também deve ser levado em consideração no momento de quantificação do
lucro tributável.

Embora, para fins de IRPJ e CSLL calculados com base no regime do


lucro real, a carga tributária efetiva seja semelhante, tenha tal transação
natureza operacional ou venda de ativo não circulante, o mesmo não pode
ser dito ao PIS e COFINS. Isso porque a legislação que regula essas
contribuições expressamente estabelece que ganhos de capital decorrentes
da venda de ativos não circulantes não estão compreendidos nos
respectivos campos de incidência149.

No que se refere aos contribuintes que devam tratar ditas receitas como
“operacionais”, ainda que submetidos ao lucro real, o tratamento tributável
pode variar a depender das atividades desses contribuintes. Em resumo,
instituições financeiras e assemelhadas estão sujeitas a disciplina
específica ao recolhimento de PIS/COFINS, recolhendo-as observando as
exclusões de base de cálculo previstas no parágrafo 6º do artigo 3º, da Lei
n. 9.718/98. Aos demais, deve ser aplicada a geral aos respectivos regimes,
cumulativo ou não cumulativo.

910
Um ponto relevante envolvendo o comércio de moedas virtuais é que,
nos termos anteriormente adiantados, além de negociadas em moeda
efetiva, elas podem ser “convertidas” em bens, serviços e direitos. Além
disso, prática cada vez mais comum é a permuta de diferentes tipos de
moedas virtuais, criptomoedas ou não.

Vale aqui registrar que o tratamento em questão não se altera caso as


moedas virtuais sejam “vendidas” em contrapartida ao recebimento de
bens, serviços ou direitos diversos, situação semelhante a uma permuta ou
dação em pagamento. Noutros termos, ainda que a satisfação da operação
não seja realizada em moeda com curso legal, a tributação se dará nos
termos acima explicados.

c) Mineração de Moedas Virtuais (Cryptocurrency Mining)

Uma das mais interessantes novas figuras associadas às criptomoedas,


em especial ao Bitcoin, é a chamada “mineração” (cryptocurrency mining).
Numa linguagem pouco técnica e extremamente resumida, a mineração
materializa um procedimento pelo qual as criptomoedas são “geradas”. É
essa característica que levou à adoção desse sugestivo título (mineração).

Por meio desse procedimento, utiliza-se a capacidade de processamento


computacional para resolver complexos algoritmos (no caso dos Bitcoins,
esse algoritmo é intitulado de “Blocks”). Esse procedimento envolve a
compilação de transações recentes em blocos (por isso o título “Block”) e o
descobrimento de uma solução a uma “equação computacional”. Aquele
que primeiro resolver tal “equação” é autorizado a alocar esse bloco de
transações no “Blockchain” (corrente de blocos) e receber a “recompensa”,
que pode ser desde monetárias até as próprias criptomoedas.

911
A atividade de mineração de criptomoedas ainda não foi objeto de
grandes manifestações, em especial na seara fiscal. O único diploma
encontrado que trata especificamente dessa questão é o já mencionado
Notice 2014-21, editado pelo IRS dos Estados Unidos. Na Seção 4 desse
diploma, que traz perguntas e respostas sobre o tratamento fiscal aplicável
às moedas virtuais, as questões 8 e 9 tratam desse tema.

É interessante notar que a resposta à questão 8150 expressamente


estabelece que o recebimento de moedas virtuais decorrentes do processo
de mineração não só materializa renda tributável no momento do
recebimento dessa moeda, como tal valor tributável deve corresponder ao
valor de mercado desse ativo financeiro.

Por sua vez, a resposta à questão 9 estabelece que, se determinado


contribuinte se dedicar à atividade de mineração como negócio, esse
contribuinte deve ser tributado como se exercesse um “trabalho
autônomo”, regime tributário intitulado de self-employment tax, aplicável a
pessoas físicas que se dedicam a atividades comerciais de forma contínua e
como negócio. A legislação do self-employment tax considera que tal
rendimento decorre da prestação de serviços pessoais, mas que não pode
ser classificada como “salário”, pois inexiste uma relação de emprego151.

Feitos esses comentários iniciais, cumpre definir a natureza jurídica das


atividades de mineração de criptomoedas para, na sequência, determinar o
tratamento tributária a elas aplicável, conforme a legislação fiscal
brasileira.

Naturalmente, a atividade de mineração virtual é absolutamente sui


generis, não existindo uma regulação específica no Brasil. Dita atividade
não parece se enquadrar num conceito de prestação de serviço usual, pois

912
inexiste sinalagma típico unindo as partes (prestador e tomador). Da
mesma forma, o recebimento das moedas virtuais em “contrapartida” à
mineração não pode ser considerado uma doação, uma vez que o
beneficiário teve que atuar (e cumprir diversas condições) para assim ser
agraciado.

Longe de se buscar uma precisa e inquestionável definição, que foge ao


escopo do presente estudo, a figura mais próxima prevista na legislação
brasileira parece ser a promessa de recompensa, disciplinada pelos artigos
854 e seguintes do Código Civil. Trata-se, assim, de ato unilateral do
promitente, que se compromete “a recompensar, ou gratificar, a quem
preencha certa condição, ou desempenhe certo serviço, contrai obrigação
de cumprir o prometido” (vide art. 854).

Fiscalmente, o ativo recebido (moedas virtuais) deve ser contabilizado


em contrapartida a um lançamento no resultado (receita). Nos termos
anteriormente explicados, a avaliação desse ativo deve ser feita por meio
da metodologia do valor justo, para aqueles que o destinarem à
negociação152, ou pelo custo de aquisição, nos demais casos.

Como regra, ditas receitas compõem o lucro bruto definido no artigo 11


e seguintes do Decreto-Lei n. 1.598/77, estando assim no campo de
incidência do IRPJ e CSLL. Contudo, inexiste regramento que estabeleça
que o valor a ser oferecido à tributação deve ser o valor justo do ativo.

Com efeito, tanto a Lei n. 12.973/2014 como a IN n. 1.700 parecem ter


sido redigidas na premissa de que os ganhos e perdas decorrentes da
avaliação a valor justo estariam relacionados a uma operação onerosa, em
que seria facilmente determinável o valor incorrido na aquisição onerosa e

913
o valor justo. Essa diferença materializaria o ganho ou perda decorrente da
avaliação a valor justo.

No caso específico da mineração, não existe um “custo de aquisição”


propriamente dito, até mesmo porque o Pronunciamento CPC n. 48, em
seus itens 4.1.3 e 5.1.1, claramente determina que instrumentos financeiros
decorrentes de ativos financeiros semelhantes às moedas virtuais devem
ser avaliados a valor justo, quando da sua mensuração inicial. Ou seja, não
existe um ganho ou perda “por conta” da avaliação a valor justo, mas os
ganhos decorrentes das atividades de mineração devem ser quantificados
por tal metodologia.

A única situação semelhante prevista na legislação é encontrada no


parágrafo 5º do artigo 13, da Lei n. 12.973/2014, e no parágrafo 11 do
artigo 97, que estabelecem que a hipótese de exclusão de tributação do
ganho decorrente de avaliação de ativos a valor justo não se aplica “aos
ganhos no reconhecimento inicial de ativos avaliados com base no valor
justo decorrentes de doações recebidas de terceiros”. Ou seja, em caso de
recebimento de ativo financeiro por doação, não cabe a postergação da
tributação pelo IRPJ/CSLL.

A despeito do silêncio legislativo, aparentemente tal racional é aquele


que mais se aproxima dos objetivos da legislação. Com efeito, a exclusão
temporária da tributação das receitas decorrentes de avaliação a valor justo
objetiva evitar a tributação de renda não realizada. Assim, essa exclusão
busca sincronizar a tributação ao momento da realização, ainda que não
em forma de pecúnia.

Por outro lado, na atividade de mineração, o contribuinte efetivamente


recebe um ativo financeiro, podendo livremente dele dispor a qualquer

914
momento. Ato contínuo, existe sim uma realização, decorrente do
adimplemento da promessa de recompensa, nos termos da legislação civil.
Ou seja, o ganho auferido não é por conta da simples diferença da forma
de avaliação do ativo negociado (em comparação àquele que serviu para
quantificar a operação), mas decorre da própria operação. Nesse passo,
mostra-se razoável que o recebimento de moedas virtuais em recompensa à
atividade de mineração deva ser objeto de tributação quando da respectiva
contabilização a valor justo.

No que se refere ao PIS/COFINS, a mesma problemática é verificada.


Embora, nos termos anteriormente explicados, a legislação que disciplina
essas contribuições sociais expressamente estabeleça que os ganhos
decorrentes da avaliação a valor justo de ativos não integram as
respectivas bases de cálculo, dita legislação também parece ter sido
instituída para excluir de tributação os ganhos auferidos “por conta” da
avaliação a valor justo, e não do recebimento de um ativo avaliado a valor
justo. Por tal razão, parece lógico estender a essas contribuições a mesma
conclusão obtida em relação ao PIS/COFINS.

d) Arbitragem de Moedas Virtuais (Cryptocurrency Arbritation)

Outro fenômeno econômico nascido no universo virtual é a chamada


arbitragem de moedas virtuais (cryptocurrency arbritation). Novamente
numa linguagem pouco técnica, a arbitragem de moedas virtuais nada mais
é do que o processo de compra e venda dessas moedas de forma
simultânea, em diferentes mercados, de sorte a auferir lucro com a
combinação de operações. Ou seja, aproveita-se da volatilidade das
cotações em diferentes mercados, com o objetivo de auferir um saldo
lucrativo ao final.

915
De toda forma, as operações de compra e venda de moedas virtuais por
meio da arbitragem em nada diferem da disciplina anteriormente delineada
aplicável à compra e venda. Como tal, os ganhos e perdas anteriormente
mencionados, comporão o saldo positivo ou negativo decorrente da
arbitragem das moedas virtuais e terão os mesmos efeitos fiscais antes
verificados.

Em termos práticos, a maior dificuldade associada à prática de


arbitragem de moedas virtuais reside no cálculo do PIS e COFINS devidos
pelos contribuintes sujeitos ao regime não cumulativo, que tenham no
comércio desses ativos financeiros o seu objeto social precípuo. Isso
porque, em muitos casos, é quase impossível assegurar a verificação de
todos os requisitos necessários ao creditamento do ativo adquirido como
“insumo”, em especial a garantia de que o alienante dos ativos é
contribuinte das referidas contribuições.

Adicionalmente, é importante registrar que a arbitragem de moedas


virtuais é usualmente realizada em ambientes intitulados de “corretoras”,
embora tais empreendimentos não se encontrem reguladas pelo SFN. Ditas
corretoras tendem a cobrar uma “taxa”, em percentual fixo, em cada
operação realizada.

Fiscalmente, as atividades desenvolvidas pelas referidas corretoras


devem ser tratadas como uma prestação de serviço, estando sujeitas, além
dos tributos incidentes sobre a renda e o faturamento bruto153, ao Imposto
Sobre Serviços (ISS)154.

e) Tributação Indireta e Moedas Virtuais

916
A tributação das moedas virtuais ainda se mostra longe de pacificação,
seja no Brasil seja alhures. Algumas jurisdições, tais como os já
mencionados Reino Unido155 e Austrália, se posicionaram no sentido de
que as moedas virtuais seriam ativos, podendo assim estar sujeitas à
tributação indireta.

Em território nacional, claramente os conceitos de mercadorias e


produtos industrializados, previstos respectivamente na legislação dos
Impostos sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)156 e sobre
Produtos Industrializados (IPI)157, não englobam as moedas virtuais, não
havendo nenhuma possibilidade de tributação desses ativos por tais
exações sem uma profunda reforma constitucional.

Mais interessante, contudo, é a análise de eventual incidência do


Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre as operações
envolvendo esses ativos. Atualmente, dita legislação somente disciplina a
tributação sobre o comércio de títulos e valores mobiliários e de um único
ativo financeiro: o ouro158.

Com efeito, os já citados estudos promovidos pelo FMI159 e pela


Autoridade Bancária Europeia160 traçam claro paralelo entre a estruturação
das criptomoedas e a utilização do ouro como lastro monetário. Assim, é
de se presumir que operações envolvendo esse tipo de ativo financeiro
sejam mais facilmente assemelhadas ao ouro do que a simples
mercadorias.

No caso brasileiro, é importante verificar que não existe uma expressa


limitação constitucional vedando a consideração das moedas virtuais no
campo de incidência do IOF, não obstante o fato de a leitura da legislação
infralegal claramente afastar essa tributação. Embora isso aparentemente

917
signifique que uma reforma constitucional não se faz necessária, qualquer
alteração visando à tributação das moedas virtuais por esse imposto
prescindiria de uma sensível alteração da legislação infraconstitucional
vigente, incluindo a necessidade de regulação da atividade e a eventual
inclusão dos seus operadores no âmbito do SFN (o que parece ser o exato
oposto do objetivo proposto pelas moedas virtuais).

IV. CONCLUSÃO

A análise detida das moedas virtuais, em especial das criptomoedas,


leva à inegável conclusão de ser esse um tema embrionário e em constante
mutação. Embora os Estados estejam reconhecendo o seu impacto (e como
tal, sua importância), a sua fluidez ainda impede uma precisa rotulação.

Por tal razão, não é de se estranhar que as principais manifestações


oficiais encontradas sejam de natureza tributária e orçamentária,
reconhecendo o impacto econômico desse novo fenômeno. Por outro lado,
as particularidades de cada sistema impossibilitam a verificação de uma
padronização quanto à forma de tributação e controle contábil desse novo
mundo.

No caso brasileiro, as operações envolvendo o comércio de moedas


virtuais parecem não se amoldar às estruturas rígidas do sistema tributário
nacional, de forma que essas negociações podem – teoricamente – acabar
sendo hipo ou hipertributadas. É de se presumir que o aumento no volume
de operações, noticiado a cada dia pela imprensa, chamará a atenção das
autoridades fazendárias brasileiras, sendo presumível a edição de
normativos (vinculantes ou não) para tratar o tema.

Nesse contexto, o presente artigo, mais do que uma tentativa de


exteriorizar a opinião dos autores sobre o assunto, busca trazer uma singela

918
reflexão e um convite a um debate mais aprofundado. Naturalmente, tantos
outros enfoques podem e devem ser dados, sendo o presente uma mera
tentativa de listar alguns dos principais pontos de atenção na esfera
tributária.

919
IRF e IOF sobre remessas realizadas por
empresas de intermediação de pagamento e
regulação do BACEN
161 162
Renato Souza Coelho e Gabriel Oura Chiang

1. INTRODUÇÃO

O desenvolvimento do processo de globalização e da evolução


tecnológica vem tornando as relações comerciais cada vez mais dinâmicas,
complexas e menos óbvias. Consequentemente, as interações entre os
agentes acabam por se afastar, gradativamente, das operações comerciais
tradicionais sobre as quais os institutos jurídicos foram originalmente
moldados para fins de normatização.

Tal distanciamento entre a nova realidade digital das operações


comerciais e o conjunto normativo, mais pautado nas relações físicas e
tangíveis, comumente provoca incertezas a respeito do tratamento legal,
inclusive tributário, que seria aplicável à situação existente, seja por conta
de um potencial conflito de normas seja, até mesmo, por um vácuo
legislativo.

Diante desse cenário, aliado ao total descompasso existente entre a


evolução legislativa – notadamente a de natureza tributária – e a evolução
tecnológica, as mudanças das práticas comerciais ressaltam o importante
papel dos aplicadores do Direito em adequar os conceitos jurídicos
abrangentes e estanques à realidade dinâmica e peculiar das operações
comerciais em um ambiente tecnológico.

920
Esse descompasso é, ainda, agravado quando considerado o fato de o
Direito Tributário adotar frequentemente conceitos próprios e específicos,
inclusive, por vezes, conflitantes e/ou incongruentes com os conceitos
típicos de outras áreas do Direito. O recente julgamento pelo Supremo
Tribunal Federal (STF) referente à discussão sobre a extensão da
imunidade tributária a livros eletrônicos163, por exemplo, evidencia a ainda
recente dificuldade de harmonização de conceitos consolidados em outra
época à atual realidade.

Dentre as várias situações atuais que podem provocar incertezas a


respeito do devido tratamento tributário, destacam-se as operações de
intermediação de pagamentos oriundos do Brasil a beneficiários residentes
no exterior, por meio de plataformas digitais. Essas operações têm se
tornado cada vez mais comuns no País, haja vista, principalmente, a
necessidade de mecanismos práticos e simples para empresas
internacionais em atingir consumidores pulverizados pelo mundo,
sobretudo no atual contexto de um mercado cada vez mais globalizado e
concorrido.

Apenas para delimitar os elementos da situação fática que nos


propomos a analisar, trata-se de operação por meio da qual uma empresa
brasileira titular de uma plataforma tecnológica é contratada para
intermediar um pagamento por consumidor brasileiro a um fornecedor
estrangeiro em contraprestação por um produto (e.g., direito ou serviço)
fornecido. Para fins meramente ilustrativos, o fluxo financeiro da operação
tal como descrita poderia ser representado das seguintes formas:

Diante dos cenários descritos, o presente trabalho tem como objetivo


abordar o tratamento tributário aplicável às remessas efetuadas pela
empresa intermediadora ao fornecedor estrangeiro, notadamente no que

921
diz respeito ao Imposto de Renda retido na Fonte (IRF) e ao Imposto sobre
Operações Financeiras na modalidade Câmbio (IOF-Câmbio).

2. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE

Para que se possa analisar a possibilidade de atribuição da


responsabilidade pela retenção e recolhimento do IRF ao intermediador do
pagamento na operação tal como descrita acima, faz-se necessário analisar
os conceitos atinentes ao próprio fato gerador do imposto.

O Imposto de Renda é um tributo cujo fato gerador está disciplinado no


artigo 43 do Código Tributário Nacional (CTN), sendo definido como a
aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica da renda ou dos
proventos de qualquer natureza que representem acréscimo ao patrimônio
do contribuinte.

Ademais, em relação aos rendimentos auferidos por um não residente, e


que estejam sujeitos à tributação no Brasil, o caput do artigo 100 do
Decreto n. 5.844/43 (reproduzido pelo artigo 685 do Decreto n. 3.000/99 –
Regulamento do Imposto de Renda) determinou que compete à fonte do
rendimento a retenção e o recolhimento do imposto de renda
correspondente164. A atribuição de tal responsabilidade possui respaldo no
parágrafo único do artigo 45 do CTN165.

Desse modo, outorgou-se à fonte do pagamento o dever de retenção do


valor correspondente ao IRF e do recolhimento aos cofres públicos. Muito
embora a figura do contribuinte do imposto de renda mantenha-se intacta,
permanecendo na pessoa que percebeu o acréscimo patrimonial, a lei
atribui, de forma expressa, a responsabilidade pelo recolhimento à terceira
pessoa que efetuou o pagamento.

922
A partir da redação dos referidos dispositivos, merecem destaque os
conceitos de fonte e rendimento para fins de atribuição da
responsabilidade do recolhimento e satisfação da obrigação de pagamento
do imposto de renda. Como regra, a execução de quaisquer das ações
descritas no artigo 100 do Decreto n, 5.844/43 (isto é, pagar, creditar,
empregar, remeter ou entregar) que represente a transferência de
rendimentos ao beneficiário estrangeiro por uma fonte brasileira ensejaria
a realização do fato gerador do IRF.

Tendo isso em vista, a controvérsia existente reside na (in)existência de


fato gerador do IRF e/ou da responsabilidade pela sua retenção no caso de
intermediação de pagamentos efetuados ao exterior por pessoa titular da
plataforma digital, por meio de quaisquer das estruturas delineadas, mas
que não tomou o serviço prestado pelo estrangeiro.

Preliminarmente, vale ressaltar que a sistemática da retenção na fonte


do imposto de renda tem como fundamento a autorização legal de
atribuição da sujeição passiva do imposto a uma figura distinta do
contribuinte. O artigo 121 do CTN expressamente dispõe que a obrigação
de pagamento de um tributo pode recair sobre a figura do contribuinte ou
do responsável quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua
obrigação decorra de disposição expressa de lei. Tal dispositivo deve ser
interpretado em consonância com o artigo 128 do CTN que, por sua vez,
apresenta critérios gerais aplicáveis à responsabilidade tributária166.

É de suma importância notar que o referido artigo condiciona a


possibilidade de atribuição de responsabilidade tributária a terceira pessoa,
desde que esta esteja vinculada ao fato gerador da obrigação do
pagamento do tributo. O mero intermediador de pagamento ao exterior,

923
segundo pensamos, não representa a figura de fonte nem tampouco
transfere rendimento ao não residente.

A intermediação de pagamentos nada mais é do que uma operação de


prestação de serviços em que o intermediador é contratado por um
estrangeiro para viabilizar o recebimento de recursos vinculados a outra
operação comercial. Deste modo, a intermediação de pagamentos, embora
represente uma operação comercial acessória a uma operação comercial
subjacente principal, com ela não se confunde.

Em outras palavras, a contratação de um intermediador de pagamentos


por um não residente representa uma relação jurídica completamente
distinta da relação entre um fornecedor estrangeiro e o tomador brasileiro.

Retomando os conceitos de fonte e rendimento para fins de incidência


do IRF, deve-se notar que, na operação de intermediação de pagamentos, o
contratado assume o papel de mero intermediário de um repasse de
recursos financeiros. Muito embora esses recursos representem, de fato,
rendimentos de um não residente, somente o são no contexto da operação
comercial subjacente. Já no âmbito da intermediação de pagamentos,
ocorre mero repasse de recursos e essa ação representa o objeto de uma
relação jurídica própria (isto é, prestação de serviços de intermediação).

Apesar de o intermediador dos pagamentos, de fato, representar uma


fonte imediata dos recursos, ele não deve ser confundido com o conceito
de fonte previsto nas regras aplicáveis ao IRF. O conceito de fonte
somente pode ser aquele vinculado ao rendimento que configure a
hipótese de incidência do IRF e que recai sobre a figura do tomador
brasileiro que adquiriu o serviço ou direito. É esta, e somente esta, a

924
relação jurídica que ensejaria o surgimento de um rendimento sujeito ao
IRF no Brasil.

O fato gerador do IRF está vinculado à relação jurídica que gerou a


riqueza tributável e consiste no próprio adimplemento da obrigação de
pagamento, no âmbito do direito privado, pela outra parte. Nas palavras de
Ricardo Mariz de Oliveira167:

A própria terminologia “retenção na fonte” ou “desconto na fonte” é expressiva


da realidade de que o imposto se torna devido quando a fonte se desincumbe da sua
obrigação de direito privado, mediante pagamento da renda ou do provento, de
maneira a disponibilizar a renda ou o provento ao respectivo titular, quando então
ela retém ou desconta, do montante assim disponibilizado, o valor do imposto
devido.
Isto acarreta uma consequência interessante: o imposto devido na fonte somente
se torna devido – o fato gerador somente ocorre – se a pessoa encarregada da
retenção e do recolhimento cumprir a sua obrigação de direito privado, consistente
no pagamento de alguma obrigação prevista em lei ou em contrato, de tal arte que,
se houver inadimplemento no âmbito privado, não nasce a obrigação tributária, e, se
houver mora no cumprimento da obrigação privada, o fato gerador somente ocorre
quando houver o cumprimento dessa obrigação, caso em que, embora haja atraso no
direito privado, não há atraso no direito tributário.

Ao analisarmos o fluxo financeiro de uma operação de pagamento ao


exterior por um intermediário, em quaisquer das estruturas apresentadas
(pagamento pelo intermediador no Brasil diretamente ao beneficiário ou
por meio de outra entidade também localizada no exterior), é possível
identificar que a transferência de recursos do tomador brasileiro ao
intermediário representa, por si só, adimplemento e desobrigação daquele
em relação ao fornecedor estrangeiro. Embora o pagamento seja realizado
a um terceiro, este o recebe e dá quitação em nome do não residente, em
linha com os artigos 308, 319 e 320 do Código Civil168.

Mais especificamente, e conforme observa Ricardo Mariz de Oliveira,


tal transferência pode ser enquadrada como “entrega” para fins de

925
aplicação das regras do IRF, na medida em que representa “ato físico de
passar o dinheiro do pagamento para as mãos do beneficiário ou de alguém
por ele autorizado a receber”169.

Em razão disso, considerando que o intermediário recebe a importância


em dinheiro por conta e ordem do efetivo beneficiário no exterior, essa
transferência, segundo pensamos, já representaria o pagamento ou
entrega dos recursos vinculados à operação que deu origem ao rendimento
tributável e, portanto, fato gerador do IRF.

A relação do conceito de fonte pagadora ao cumprimento da obrigação


no âmago da relação de Direito Privado é bem descrita por Alberto
Xavier170:

A “fonte pagadora”, à qual o art. 45, parágrafo único, do Código Tributário


Nacional, permite a atribuição do papel de responsável tributário é a entidade à qual
é imputável, juridicamente, como devedor, o pagamento e que, portanto, suporta o
respectivo ônus, sendo irrelevantes o local e a moeda em que este se realiza.

Cumpre relembrar que o intermediador dos pagamentos apenas


participa da relação comercial em nome e no interesse do fornecedor
estrangeiro. A transferência dos recursos pelo tomador brasileiro ao
intermediador do pagamento já representaria disponibilidade jurídica por
parte do beneficiário no exterior, pois, ao contrário, o intermediador não
teria legitimidade para receber os valores em seu nome. No momento em
que o intermediador obtém posse sobre os recursos financeiros, o fato
gerador do IRF correspondente já teria ocorrido.

Se a fonte pagadora da operação é o tomador brasileiro, porquanto seja


este quem realiza o fato gerador do IRF mediante pagamento ou entrega do
rendimento ao beneficiário estrangeiro por intermédio de terceiro, não

926
pode este figurar, ao mesmo tempo, como fonte pagadora da mesma
riqueza.

A relação jurídica da qual emanam os elementos constitutivos da


obrigação tributária do IRF é uma só, em contraposição a uma possível
pluralidade conceitual de tais elementos atinentes à regra-matriz do
imposto. No mesmo sentido, a análise a respeito da sujeição passiva do
imposto, na figura do responsável, igualmente deve estar vinculada à
situação que constitui o fato gerador, devendo ser desconsiderados os atos
jurídicos subsequentes que não guardam vínculo direto ao fato gerador.

É de se reconhecer que o instituto da retenção na fonte tem supedâneo


no vínculo da fonte pagadora com o fato gerador do IRF, sobretudo pela
possibilidade de se apossar do valor do imposto e adimplir a obrigação
tributária sem assumir o ônus econômico do tributo. Este sistema de
arrecadação está em linha, inclusive, com os próprios preceitos
constitucionais, notadamente o princípio da eficiência, conforme disposto
no artigo 37 da Constituição Federal171.

A importância da possibilidade de a fonte reter e recolher o valor do


imposto sem que seu próprio patrimônio seja afetado é destacada por
Luciano Amaro, segundo o qual, para que possa haver a atribuição de
responsabilidade de terceiro, “é necessário que esse vínculo seja de tal
sorte que permita a esse terceiro, elegível como responsável, fazer com
que o tributo seja recolhido sem onerar seu próprio bolso”172.

De fato, o intermediador dos pagamentos dispõe, teoricamente, dessa


possibilidade, mas não se pode adotar esse critério de conveniência de
forma desvinculada do fato gerador e da própria regra-matriz do IRF. Os
critérios de oportunidade e conveniência na atribuição da responsabilidade

927
tributária em decorrência da posse que um terceiro possui sobre os
recursos do contribuinte devem estar intrinsicamente ligados e limitados à
materialidade do imposto, que consiste no próprio acréscimo patrimonial.

A esse respeito, Renato Nunes indica que “não se pode perder de vista
que a relação de poder deve guardar referência com a materialidade de
hipótese da regra-matriz de incidência”173. No mesmo sentido, vale
relembrar os ensinamentos de Ricardo Mariz de Oliveira no sentido de
que, para a ocorrência do fato gerador do IRF, deve tratar-se de pagamento
de renda ou provento, e não de simples tradição de moeda174.

Em outras palavras, a posse e a disponibilidade financeira por parte do


intermediador não deve ser interpretada como ato suficiente para, por si só,
representar a ocorrência do fato gerador do IRF quando do pagamento ao
fornecedor estrangeiro. A retenção na fonte representa tão somente uma
técnica de arrecadação do imposto, não tendo o condão de alterar a
natureza jurídica deste ou seus elementos essenciais, tais como o próprio
enquadramento dos recursos ao conceito de pagamento de rendimento.

Conforme também bem apontado por Hugo Funaro175, faz-se necessário


que haja um vínculo entre o terceiro a ser responsabilizado e o fato gerador
do tributo, e não somente um vínculo qualquer com a situação a que se
pretende tributar:

Não basta, assim, a existência de algum vínculo com o sujeito passivo direto
para que alguém seja colocado na condição de responsável por substituição. O
substituto tributário deve ter participação no fato, ato ou negócio sujeito à
tributação. Mas não uma participação qualquer. A testemunha de um contrato, por
exemplo, não pode ser responsabilizada pelo tributo eventualmente devido em razão
do negócio celebrado. O substituto deve ter participação relevante na situação que
configura o fato gerador, assumindo uma posição que lhe permita exigir do
contribuinte o valor correspondente ao tributo a ser recolhido aos cofres públicos,
evitando, dessa forma, o desfalque de seu próprio patrimônio. A possibilidade de

928
ressarcimento do responsável é indispensável para que se caracterize a vinculação
do fato gerador que legitima a substituição tributária.

Em que pese a argumentação acima, verificamos a existência de


precedente contrário no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos
Fiscais (CARF) no sentido de que a responsabilidade pelo recolhimento do
IRF recairia sobre a pessoa que realiza a remessa ao exterior, independente
de sua relação jurídica com o beneficiário. Tal entendimento foi
consignado no julgamento que culminou no Acórdão n. 106-14.997 de
2006, cuja ementa segue transcrita abaixo:

IR FONTE — PAGAMENTO A BENEFICIÁRIO NO EXTERIOR PELA


PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – Quando o pagamento pela prestação de serviços é
realizado a beneficiário no exterior, a retenção na fonte é definitiva, e tem como
suporte a regra do art. 685 do RIR199, sendo responsável pela retenção aquele que
ultima a transferência do valor à empresa com sede no exterior. Recurso provido –
6ª Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes, Acórdão n. 106-14.997, Relator
Wilfrido Augusto Marques, julgado em 19/10/2005, publicado em 11/05/2006.

No caso analisado pelo CARF, uma pessoa jurídica firmou um contrato


de prestação de serviços com outras duas empresas, uma nacional e outra
estrangeira. Pelos termos do contrato, ambos os serviços seriam faturados
pela contratada nacional, a qual, por sua vez, realizaria a remessa dos
valores ao prestador estrangeiro.

Como se pode notar, há semelhanças entre a situação analisada pelo


CARF e a operação de intermediação de pagamentos ao exterior, na
medida em que ambos os casos envolvem uma parte que intermedia e
operacionaliza a remessa de rendimentos a beneficiário estrangeiro
oriundos de uma relação jurídica da qual não participou.

Nesse sentido, entende-se que a posição adotada pelo CARF não parece
totalmente acertada, dado que, assim como sustentado no presente
trabalho, o fato gerador do IRF já teria ocorrido na transferência de

929
recursos do devedor brasileiro ao intermediário brasileiro que
operacionaliza a remessa ao exterior.

Por outro lado, há de se notar que o caso analisado pelo CARF


apresenta certas diferenças fáticas que podem ser consideradas como
relevantes para a resolução da demanda. A parte que intermediou os
pagamentos ao exterior também figurou como contratada da prestação de
serviço, ou seja, ela também foi formalmente parte do negócio jurídico que
deu origem aos rendimentos sujeitos ao IRF. Desse modo, poderia ser
eventualmente argumentado que, por participar do negócio jurídico, a
empresa brasileira não teria participado como mera intermediária do
pagamento, mas sim como parte vinculada ao próprio fato sujeito à
incidência do IRF.

Muito embora ainda não haja uma jurisprudência suficientemente


madura a respeito da situação específica que se analisa no presente
trabalho, a discussão a respeito do momento de ocorrência do fato gerador
do IRF já foi amplamente debatida. Essa discussão é importante na medida
em que, conforme já sustentado, a determinação da fonte pagadora para
fins de atribuição de responsabilidade pelo recolhimento do imposto está
vinculada ao momento de ocorrência do fato gerador do tributo.

Nos casos analisados pela jurisprudência, pondera-se, de modo geral, se


o fato gerador do IRF se daria (i) no crédito contábil da obrigação de
pagamento pelo devedor; (ii) no vencimento contratual da obrigação; ou
(iii) na efetiva liquidação financeira da obrigação com o beneficiário.

De forma resumida, nota-se uma tendência nas decisões em acatar o


vencimento contratual da obrigação como momento a partir do qual o

930
beneficiário do rendimento passa a deter disponibilidade econômica ou
jurídica, muito embora esse entendimento sofra diversas críticas176.

Nos julgamentos que resultaram nos acórdãos ns. 9202-003.120177,


9202-003.097178 e 9304-00.114179 pela Câmara Superior de Recursos
Fiscais (CSRF), por exemplo, fixou-se o entendimento de que o fato
gerador do IRF não ocorreria no mero crédito contábil da obrigação de
pagar, mas tão somente no seu vencimento contratual ou no adimplemento
da obrigação material do negócio jurídico que consubstancia o ganho
tributável (e.g., execução proporcional de um serviço).

Diversas outras decisões proferidas pelas câmaras baixas do CARF


estão no mesmo sentido das da Câmara Superior descritas acima, tais
como os Acórdãos ns. 1402-002.342180, 2202-003.029181 e 2202-002.535182.

Ademais, há decisões que adotam um raciocínio semelhante ao do


vencimento contratual, segundo o qual a materialidade do IRF estaria
desvinculada da efetiva liquidação financeira dos rendimentos, seja por
meio de pagamento seja por remessa ao exterior. Nesse sentido, vale
mencionar o Acórdão n. 2201-001.836183, em que o CARF entendeu que o
perdão de dívida por empresa brasileira em favor de empresa estrangeira
representaria fato gerador do IRF, independentemente de um efetivo
desembolso.

De fato, há decisões do CARF no sentido de que o fato gerador do IRF


ocorreria somente na remessa dos recursos ao exterior. Contudo, nesses
casos, nota-se que tal decisão se pauta em uma contraposição ao
argumento de que o fato gerador do imposto poderia se dar no mero
crédito contábil da obrigação de pagamento, não tendo, portanto, analisado
especificamente a hipótese de vencimento contratual. Este é o caso, por

931
exemplo, dos Acórdãos ns. 2102-01.845 e 106-14.497, cujas ementas
seguem transcritas abaixo:

IRRF. REMESSA DE JUROS AO EXTERIOR. DATA DO FATO GERADOR.


INOBSERVÂNCIA.
O fato gerador do IRRF aplicado a remessa de juros ao exterior é o momento em
que o rendimento foi pago ou remetido ao beneficiário. É improcedente o
lançamento formalizado sem observância das normas processuais e materiais
aplicáveis ao fato em exame pela afronta ao Princípio da Estrita Legalidade.
RECURSO DE OFÍCIO. IMPROCEDÊNCIA.
Nega-se provimento ao recurso de ofício quando a autoridade julgadora singular
aprecia o feito nos termos da legislação de regência e das provas constantes dos
autos. Recurso de Ofício Negado – 1ª Câmara da 2ª Turma Ordinária da 2ª Seção de
Julgamento do CARF, Acórdão n. 2102-01.845, Relator Rubens Mauricio Carvalho,
julgado em 08/02/2012, publicado em 08/02/2012.
IMPOSTO DE RENDA NA FONTE. CRÉDITO CONTÁBIL. RESIDENTES
OU DOMICILIADOS NO EXTERIOR. FATO GERADOR – Estão sujeitas à
incidência do imposto na fonte as importâncias pagas, creditadas, entregues,
empregadas ou remetidas a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior, por
fonte situada no país, a título de juros, comissões, descontos, despesas financeiras e
assemelhados. Fica prejudicada a hipótese de incidência não se verificando a efetiva
disponibilidade econômica ou jurídica dos rendimentos.
Recurso provido – 6ª Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes, Acórdão
n. 106-14.497, Relator José Ribamar Barros Penha, julgado em 16/03/2005,
publicado em 24/09/2005.

Novamente, embora não se esteja concordando com o eventual


resultado das decisões mencionadas acima, elas reforçam o entendimento
de que o fato gerador do IRF não está vinculado ao pagamento e/ou à
remessa ao exterior, mas sim ao momento em que há efetiva
disponibilidade econômica ou jurídica sobre a renda.

No caso da intermediação de pagamento ao exterior, a transferência


pelo tomador brasileiro ao intermediador do pagamento, que recebe os
recursos por conta e ordem do beneficiário estrangeiro, já constitui, a
nosso ver, fato gerador do IRF. Tal pagamento representa uma ação
positiva executada pela efetiva fonte do rendimento tributável, bem como

932
o momento a partir de quando o fornecedor estrangeiro possui
disponibilidade econômica e jurídica sobre o rendimento.

Portanto, apesar de o agente que intermedia pagamentos para fora do


País realizar a liquidação financeira da operação, ele não deve ser
enquadrado como fonte pagadora dos rendimentos, eis que: (i) não possui
vínculo direto na relação jurídica que deu origem ao rendimento tributável;
e (ii) quando do recebimento dos recursos financeiros, o fato gerador já
teria ocorrido e a fonte pagadora já teria sido determinada.

Por outro lado, não se pode deixar de levar em consideração o fato de


que, embora haja fundamento jurídico para embasar a conclusão acima
delineada, ela pode levar a uma situação fática de difícil recolhimento
espontâneo aos cofres públicos e quase impraticável fiscalização por parte
das autoridades fiscais.

No âmbito da econômica global e digitalizada, os intermediadores de


pagamento atuam como plataformas para a realização de relações
comerciais de baixo valor e pulverizadas em um vasto número de
tomadores.

Tal dificuldade prática representa, inclusive, um dos fundamentos da


própria instituição do sistema de arrecadação concentrada na figura da
fonte pagadora. Não há como negar que a situação fática do intermediador
dos pagamentos apresenta determinados elementos que instigariam a
atribuição de responsabilidade pelo recolhimento do IRF, tais como a
concentração em uma única pessoa, a posse sobre os rendimentos e a
possibilidade de realizar o recolhimento aos cofres públicos sem suportar o
ônus econômico de tal obrigação.

933
Todavia, esses elementos não são, por si só, suficientes para legitimar
tal atribuição de responsabilidade. Conforme o artigo 97, inciso III, do
CTN184, a determinação da sujeição passiva é matéria submetida à reserva
legal e, conforme já explicado, os dispositivos que fundamentam a
atribuição de responsabilidade nas remessas ao exterior não deveriam ser
aplicáveis à operação de intermediação de pagamentos porquanto a
operação não se subsume ao fato gerador do IRF.

Como consequência, a imputação de responsabilidade pelo


recolhimento do IRF ao intermediador do pagamento precederia,
necessariamente, de disposição legal específica, a qual inexiste atualmente.
O próprio surgimento de uma norma nesse sentido seria palco de um
amplo debate sobre a sua legalidade vis-à-vis os conceitos jurídicos de
fonte e rendimento abordados acima.

Desse modo, considerando o cenário legislativo atual, a remessa ao


exterior efetuada por intermediador de pagamentos – titular de uma
plataforma digital que capta os recursos devidos por terceiros e os
transfere para o beneficiário – não deveria estar sujeita à incidência do
IRF. A incidência do IRF ocorre no momento em que o tomador efetua o
pagamento ao intermediador, ainda que, no Brasil, seja aquele o único
responsável tributário pela retenção do imposto.

3. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS NA MODALIDADE


CÂMBIO

Outro assunto que pode representar controvérsias quando há um agente


intermediador de pagamento nas remessas ao exterior (não considerando a
instituição financeira responsável pela operação de câmbio) é a própria
natureza do câmbio e a responsabilidade pelo pagamento do IOF-Câmbio.

934
Essa discussão é ainda mais presente nas situações nas quais o
intermediador transfere os recursos arrecadados para uma outra entidade
estrangeira do seu grupo, a qual também atua como intermediadora e faz o
pagamento ao beneficiário final.

A análise a respeito do cumprimento da obrigação tributária vinculada


ao IOF-Câmbio requer, igualmente, um aprofundamento nas regras de
sujeição passiva do referido imposto.

Conforme o artigo 6º da Lei n. 8.894/94, os contribuintes do IOF-


Câmbio são “os compradores ou vendedores da moeda estrangeira na
operação referente a transferência financeira para ou do exterior,
respectivamente”. Assim, os agentes privados que pretendem realizar a
conversão de valores de ou para moeda estrangeira no âmbito de
transferências internacionais são as pessoas que realizam o fato gerador do
referido imposto.

O parágrafo único do dispositivo citado acima, por sua vez, atribui a


responsabilidade pela retenção e recolhimento do IOF-Câmbio às
instituições financeiras autorizadas à realização das operações de câmbio.
Os dispositivos que versam sobre a sujeição passiva do IOF-Câmbio são
reproduzidos nos artigos 12 e 13 do Decreto n. 6.306/2007 – Regulamento
do IOF.

Para melhor compreender o papel das intermediadoras de pagamento na


materialidade da incidência do IOF-Câmbio, é necessário analisar sua
participação na própria intermediação de pagamentos para o exterior.

Com a edição da Lei n. 12.865/2013, foram normatizadas as regras


referentes aos fluxos financeiros no âmbito de arranjos de pagamentos. O

935
Banco Central (BACEN), por sua vez, emitiu resoluções a fim de
regulamentar as referidas operações.

Como regra, as intermediadoras de pagamento não figuram como


instituições financeiras autorizadas para operar com o câmbio de moedas.
Conforme o artigo 6º, inciso III, da referida lei, define-se como instituição
de pagamento a “pessoa jurídica que, aderindo a um ou mais arranjos de
pagamento, tenha como atividade principal ou acessória, alternativa ou
cumulativamente” determinadas atividades de auxiliar e/ou intermediar
operações de pagamento.

Contudo, o parágrafo 2º do mesmo dispositivo expressamente dispõe


que “é vedada às instituições de pagamento a realização de atividades
privativas de instituições financeiras, sem prejuízo do desempenho das
atividades previstas no inciso III do caput”. Desse modo, a legislação em
comento deixou claro que, embora seja reconhecido o importante papel
dessas entidades nos arranjos de pagamentos, elas não podem desenvolver
atividades privativas das instituições financeiras.

Como consequência, em não sendo o intermediador do pagamento


instituição financeira responsável pela operação de fechamento de câmbio,
ele não figuraria como responsável pelo recolhimento do IOF-Câmbio.

Embora o intermediador não seja responsável pelo recolhimento do


IOF-Câmbio, é ele quem realiza a contratação da operação de câmbio,
sendo, por força dos artigos 6º, caput, e 12, caput, da Lei n. 8.894/94 e
Decreto n. 6.306/2007, respectivamente, configurado como contribuinte do
imposto.

936
Mesmo considerando que a operação de fechamento de câmbio é
realizada no interesse do beneficiário estrangeiro, há de se notar que é o
intermediador do câmbio quem, efetivamente, compra moeda estrangeira
para fins de remessa ao exterior.

Assim, assumindo a figura do contribuinte, entendemos que o


intermediador do pagamento poderia ser chamado ao cumprimento da
obrigação tributária referente ao IOF-Câmbio. O STJ já se posicionou
nesse sentido no julgamento dos REsp n. 642.375/RJ e 674.828/RJ, cujas
ementas seguem transcritas abaixo:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. ART. 97, I, DO CTN. REPETIÇÃO


DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. RECURSO ESPECIAL.
IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IOF. ARTS. 121 E
66 DO CTN. ARTS. 2º E 3º DO DECRETO-LEI N. 1.783/80. DISTINÇÃO
ENTRE O CONTRIBUINTE E O RESPONSÁVEL PELA COBRANÇA E
RECOLHIMENTO DO IMPOSTO.
1. O dispositivo contido no art. 97 do CTN reproduz o princípio da legalidade
previsto constitucionalmente, razão pela qual a matéria não pode ser invocada em
recurso especial. Precedentes: REsp 691433/RS, 2ª T., Min. Castro Meira DJ de
07.05.2007; REsp 595383/RS, 1ª T., Min. Teori Albino Zavascki, DJ de
24/10/2006.
2. Nos termos do art. 2º do Decreto-lei n. 1.783/80, são contribuintes do IOF “os
tomadores do crédito, os segurados, os compradores de moeda estrangeira e os
adquirentes de títulos e valores mobiliários”. E, segundo o art. 3º, III, do mesmo
Decreto-lei, a instituição autorizada a operar em câmbio é responsável pela sua
cobrança e pelo seu recolhimento ao Banco Central do Brasil, ou a quem este
determinar, nos prazos fixados pelo Conselho Monetário Nacional. Precedente:
REsp. 674828/RJ, 1ª T., Min. Denise Arruda, DJ de 02.08.2007.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido – STJ,
REsp n. 642.375/RJ, Primeira Turma, Relator Ministro Teoria Albino Zavazcki, j.
04/09/2007, DJ 27/09/2007.
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUPOSTA OFENSA AOS
ARTS. 97, 121 E 128 DO CTN. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IOF. OPERAÇÃO DE
CÂMBIO. CONTRIBUINTE DO IMPOSTO.
1. A matéria suscitada nas razões de recurso especial e não abordada no acórdão
recorrido, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não merece ser
conhecida por esta Corte, ante a ausência do indispensável prequestionamento
(Súmula 211/STJ).

937
2. Nas operações de câmbio, as instituições que são autorizadas a vender moeda
estrangeira figuram como “responsáveis pela cobrança do imposto e pelo seu
recolhimento ao Banco Central do Brasil”, e não como contribuintes do IOF (art. 3º,
caput e III, do Decreto-Lei 1.783/80). Em tais operações, são contribuintes do
imposto “os compradores de moeda estrangeira” (art. 2º).
3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido – STJ,
REsp n. 675.828/RJ, Primeira Turma, Relatora Ministra Denise Arruda, j.
26/06/2007, DJ 26/06/2007.

De forma resumida, no voto do Ministro Teori Albino Zavascki nos


autos do REsp n. 642.375/RJ, adotou-se o entendimento de que a
legislação do IOF-Câmbio, ao atribuir a responsabilidade pelo
recolhimento do imposto à instituição financeira que opera o câmbio, não
afastou a responsabilidade do contribuinte. O trecho transcrito abaixo
sumariza o entendimento exposto:

Como se vê, o Decreto-lei 1.783/80 não eximiu de responsabilidade o


contribuinte comprador da moeda estrangeira, que tem relação direta e pessoal com
a situação que configura o fato gerador do tributo e, portanto, guarda relação natural
com o fato da tributação. O que fez foi distinguir o contribuinte do responsável pelo
recolhimento e pelo repasse: o primeiro tem responsabilidade tributária, o segundo,
responsabilidade administrativa.

Seguindo o entendimento do STJ nas decisões transcritas acima, o


CARF igualmente já se pronunciou a respeito da matéria no julgamento
que resultou no Acórdão n. 3402-002.467, de 2014, cuja ementa segue
transcrita abaixo:

IOF. CÂMBIO. AÇÃO JUDICIAL COM MESMO OBJETO DE PROCESSO


ADMINISTRATIVO. CONCOMITÂNCIA. RENÚNCIA À ESFERA
ADMINISTRATIVA.
(...)
IOF. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PELA
RETENÇÃO E RECOLHIMENTO. LANÇAMENTO FISCAL NA
CONTRATANTE DO EMPRÉSTIMO E CÂMBIO. ILEGITIMIDADE PASSIVA.
INOCORRÊNCIA.
Não só a Instituição Financeira, como responsável, mas também o contribuinte,
enquanto tomador do empréstimo no exterior são partes legítimas na relação
jurídico-tributária em face do que dispõe a lei reguladora do IOF (art. 66 da CTN),
inexistindo impedimento para que seja efetivado o lançamento fiscal sobre o

938
contribuinte, enquanto tomador do empréstimo no exterior e beneficiário da
conversão da moeda estrangeira através de correspondente operação de câmbio.
Recurso Voluntário Conhecido em Parte.
Recurso Voluntário Negado.
Crédito Tributário Mantido – 4ª Câmara da 2ª Turma Ordinária da 3ª Seção de
Julgamento do CARF, Acórdão n. 3402-002.467, Relator João Carlos Cassuli
Junior, julgado em 20/08/2014, publicado em 17/09/2014.

Conforme a posição adotada pelos órgãos judiciais e administrativos


nas decisões transcritas acima, o contribuinte do IOF-Câmbio não estaria
eximido da obrigação de recolhimento do imposto, embora a
responsabilidade pelo seu recolhimento também tenha sido atribuída ao
agente de câmbio.

Uma outra possível controvérsia envolvendo uma das situações


abordadas no presente estudo diz respeito à natureza do câmbio – e,
portanto, à alíquota aplicável – quando os valores são primeiramente
remetidos para uma entidade ou conta do intermediador brasileiro para,
então, ser repassado ao beneficiário estrangeiro.

Conforme já explicado, a operação de intermediação poderia ser


executada mediante entrega direta dos recursos pelo agente intermediador
no Brasil ao não residente; ou mediante entrega indireta por meio da
utilização de conta de disponibilidades no exterior de titularidade do
intermediador brasileiro.

No primeiro caso, embora a remessa ao exterior represente somente a


liquidação financeira acessória a uma operação comercial principal de
importação de determinado direito ou serviço, ela deveria ser considerada
como vinculada a esta para fins de determinação da alíquota aplicável.
Nesse sentido, considerando atualmente não haver alíquota específica
aplicável a tais operações de importação, a incidência do IOF-Câmbio

939
ocorreria à alíquota geral de 0,38%, tal como dispõe o artigo 15-B do
Regulamento do IOF, conforme atualmente aplicável.

No segundo caso, no entanto, há determinadas particularidades que


deveriam ser levadas em consideração. O pagamento poderia ser realizado
de forma indireta pelo intermediador mediante a utilização de conta de
disponibilidades em moeda estrangeira no exterior. A manutenção de
recursos tal como descrita é atualmente disciplinada pelo BACEN por
meio da Circular n. 3.689/2013. Embora a referida circular não tenha o
condão de – e nem poderia – versar sobre os aspectos fiscais relacionados,
ela autoriza as instituições financeiras brasileiras a realizar tais operações,
conforme seus artigos 7º e 8º185.

De todo modo, assim como as operações de câmbio vinculadas à


importação de direitos e serviços, as operações de câmbio vinculadas à
transferência de recursos para a constituição de conta de disponibilidade
no exterior atualmente também não estão sujeitas à aplicação de
determinada alíquota específica. Como consequência, essas operações de
câmbio igualmente estariam sujeitas à alíquota geral do IOF-Câmbio de
0,38%.

Embora, atualmente, não haja diferença em termos da alíquota aplicável


a ambas as operações, uma eventual alteração da alíquota incidente sobre
quaisquer das operações poderia ensejar discussões acerca da alíquota
aplicável. A operação tal como descrita poderia representar tanto um
câmbio para a constituição de disponibilidade no exterior (critério direto)
como uma importação de direitos ou serviços (critério indireto). Em
estando cada uma das operações sujeitas a alíquotas diferentes, poderia
haver discussões sobre qual delas prevaleceria no caso concreto.

940
Em suma, muito embora o agente intermediador de pagamentos a
beneficiário no exterior não seja enquadrado como responsável pela
retenção e recolhimento do IOF-Câmbio, permanece-lhe a sujeição passiva
por figurar como contribuinte do imposto. Assim, não tendo sido o IOF-
Câmbio devidamente recolhido pela instituição financeira apta à operação
no mercado de câmbio como responsável pelo imposto, este ainda poderia
ser cobrado do intermediador do pagamento. Ademais, a despeito de
ambas as estruturas existentes para a realização do pagamento estarem
atualmente sujeitas à alíquota geral do IOF-Câmbio de 0,38%, caso haja
alteração de alíquota, pode haver uma controvérsia, no futuro, acerca da
natureza do câmbio – e, portanto, da alíquota aplicável – quando o
intermediário utilizar recursos externos para pagamento ao beneficiário
final.

4. CONCLUSÕES

A evolução das interações comerciais e digitais tem exigido um grande


esforço por parte dos aplicadores do Direito em adaptar os conceitos
estanques, embora abrangentes, do mundo jurídico à realidade fática. A
intermediação de pagamentos a fornecedores e prestadores no exterior por
meio de plataformas digitais encaixa-se nesse contexto e torna evidente as
diversas questões jurídicas controversas que podem surgir, notadamente de
natureza tributária.

No que se refere ao IRF, muito embora o intermediador dos pagamentos


seja quem, na prática, operacionaliza a remessa de recursos ao exterior, ele
não deve ser tido como responsável pela retenção e recolhimento do
imposto, na medida em que não representa efetiva fonte pagadora dos
rendimentos.

941
Deve ser analisada a figura da fonte pagadora no âmbito da relação
jurídica que deu origem aos rendimentos sujeitos à materialidade do
imposto de renda. A participação do intermediador representa mera
liquidação financeira, e só ocorre por solicitação e no interesse do
beneficiário estrangeiro que, por sua vez, já demonstraria haver anterior
disponibilidade econômica e jurídica da renda.

Acreditamos que o fato gerador do IRF ocorre na transferência dos


recursos pelo tomador brasileiro ao intermediador do pagamento, sendo
aquele a única fonte pagadora responsável pelo recolhimento do imposto.

Já no que se refere ao IOF-Câmbio, tendo em vista o papel limitado do


intermediador na contratação de operação de câmbio para remessa dos
recursos, torna-se evidente que ele não assume o papel de instituição
financeira autorizada a atuar no mercado de câmbio.

Como consequência, o intermediador dos pagamentos não se


enquadraria como responsável pela retenção e recolhimento do imposto.
Não obstante, isso não impede o seu enquadramento como contribuinte em
razão de ser o agente que contrata a operação de câmbio, ainda que em
benefício de um terceiro. Na condição de contribuinte do IOF-Câmbio, o
intermediador poderia ser chamado ao cumprimento da obrigação de
pagamento do imposto sob o fundamento de que a atribuição da
responsabilidade pelo recolhimento à instituição financeira que realiza a
operação de câmbio não lhe afastaria a sujeição passiva.

Por fim, atualmente, tanto a constituição de disponibilidade no exterior


quanto a remessa para pagamento por serviços ou direitos adquiridos estão
sujeitas à alíquota geral do IOF-Câmbio de 0,38%. Não obstante, caso haja
a instituição de uma alíquota própria para uma das transações, haverá

942
controvérsias acerca da natureza da remessa feita pelo intermediador,
notadamente quando o pagamento ao beneficiário final é feito por meio de
recursos do intermediador mantidos no exterior.

De todo modo, o presente artigo não se propõe a encerrar ou esgotar a


discussão referente aos impactos tributários sobre as operações de
intermediação de pagamentos por meio de plataformas digitais, mas, pelo
contrário, estimular o debate sobre as consequências jurídicas,
notadamente tributárias, a que essas operações poderiam estar sujeitas.

943
A Tributação de SaaS e SaaP no Brasil por
ISS ou ICMS: Estudo de Casos de Massively
Multiplayer Online Games (MMOGs)
186 187
Lucas de Lima Carvalho e Rogério Baptista Fedele

INTRODUÇÃO

Basta uma breve pesquisa no sítio eletrônico da Receita Federal do


Brasil (RFB), e logo nos deparamos com diversas Soluções de Consulta
recentes sobre a tributação de software como serviço (no inglês, Software
as a Service, ou SaaS) e de software como produto ou mercadoria (no
inglês, Software as a Product, ou SaaP).

Entre essas Soluções de Consulta, destaca-se a Solução de Consulta


COSIT RFB n. 191, de 23 de março de 2017, que reconheceu a incidência
do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre o pagamento, o
crédito, a entrega, o emprego ou a remessa para o exterior da remuneração
de SaaS, e da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE)
sobre a mesma manifestação econômica, porém em decorrência da
contratação desses serviços (dado que o contribuinte da CIDE é o
importador)188-189.

Outra Solução de Consulta relevante é a Solução de Consulta COSIT


RFB n. 235, de 15 de maio de 2017, que determinou a aplicação do
percentual de presunção da renda para fins de tributação pelo Lucro
Presumido de 8% (oito por cento) sobre a receita bruta da venda de
software adaptado, desde que a adaptação seja mero ajuste de programa,
“permitindo que o software (que já existia antes da relação jurídica) possa
atender às necessidades [do] cliente”, e de 32% (trinta e dois por cento)

944
nos casos em que a adaptação seja efetiva customização do software para o
cliente, criando um programa feito sob medida, ou em casos nos quais o
desenvolvedor do software crie um “banco de dados relacional” para o
cliente190.

No âmbito estadual, graças à hipótese tributável do Imposto sobre a


Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), a tributação de SaaS e
SaaP também é um assunto recorrente em pronunciamentos do Fisco e em
decisões administrativas. Evolução recente dessas discussões pôde ser
vista na Decisão Normativa n. 4, de 20 de setembro de 2017, da
Coordenadoria da Administração Tributária (CAT) da Secretaria da
Fazenda do Estado de São Paulo (SEFAZ-SP), que afirmou ser tributável
por ICMS a comercialização de software padronizado, ainda que este
tenha sido disponibilizado ao cliente por meio digital, via download ou
streaming191. Dias após publicada essa Decisão, o Conselho Nacional de
Política Fazendária (CONFAZ) publicou o Convênio ICMS n. 106, que
trouxe regras sobre as obrigações acessórias à tributação de SaaP, além de
alternativas de responsabilidade de recolhimento192.

No âmbito municipal, a edição da nova Lei Complementar n. 157, de 29


de dezembro de 2016, que modificou a Lei Complementar n. 116, de 31 de
julho de 2013, abriu aos Municípios a possibilidade de tributar atividades
da economia digital com o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza
(ISS). Nesse sentido, foi adicionado à lista anexa o item 1.09, que
estabelece como critério material do ISS o seguinte193:

Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e


texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos
(exceto a distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de Acesso
Condicionado, de que trata a Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011, sujeita ao
ICMS).

945
A abordagem direta ou indireta dos conceitos de SaaS e de SaaP em
manifestações do Fisco e das cortes administrativas se estende para os
conceitos de infraestrutura como serviço (no inglês, Infrastructure as a
Service, ou IaaS) e de plataforma como serviço (no inglês, Platform as a
Service, ou PaaS), ainda que de forma tímida.

No âmbito federal, por exemplo, a Solução de Divergência COSIT RFB


n. 6, de 3 de junho de 2014, determinou que devem incidir IRRF, CIDE e
as Contribuições sobre as Receitas de Importação (PIS/COFINS) sobre as
remessas para pagamento de serviços prestados por data center,
considerando que a natureza do contrato de relevo não poderia ser
reduzida a apenas uma locação, e sim a um conjunto de serviços de gestão
e armazenamento de dados194. Essa discussão diz respeito a um exemplo de
IaaS, mas questões tributárias podem igualmente surgir quando da análise
de exemplos de PaaS, como o local em que os serviços da plataforma
estão sendo prestados, seus beneficiários, e em que medida uma
plataforma não “situada” ou “localizada” no Brasil poderia gerar um
estabelecimento permanente no Brasil.

Este artigo traz uma contribuição às discussões sobre como tributar


manifestações econômicas associadas a SaaS e SaaP no Brasil,
particularmente sob o prisma de ISS ou ICMS, na forma de um estudo de
casos envolvendo hipóteses tributárias advindas de jogos virtuais
conhecidos como Massively Multiplayer Online Games (MMOGs). Esses
são jogos populares em diversos países, com milhões de jogadores
amadores e profissionais195, e que geram receitas que devem chegar à
marca de 31 bilhões de dólares em 2017196.

Na qualidade de plataformas virtuais, os MMOGs permitem a seus


usuários a transação de diversos bens de natureza virtual, como itens e

946
equipamentos, personagens, territórios, entre outros. Por outro lado,
também permitem a aquisição de “novas funcionalidades”, como o acesso
a desafios específicos, a entrada em clãs ou guildas, o uso temporário de
poderes especiais, entre outros benefícios que poderiam, a princípio, ser
qualificados como bens ou serviços, ou, ainda, como direitos adquiridos
pelos jogadores.

Todos os eventos citados são manifestações econômicas e, a depender


de sua conexão com a jurisdição brasileira, poderiam ser tributadas
segundo a legislação tributária local. A dúvida seria, no entanto, como
tributar cada uma dessas manifestações sem desvirtuar sua natureza, e de
forma consentânea com a estrita disposição de lei brasileira (noutras
palavras, sem desbordar das hipóteses textualmente previstas na lei
brasileira para tributar situação análoga, o que seria expressamente vedado
pelo art. 108, § 1º, do Código Tributário Nacional).

O primeiro capítulo enfoca as peculiaridades de cada uma das siglas


relevantes para a nossa análise, a saber, IaaS, PaaS (como conceitos
correlatos), SaaS e SaaP (como conceitos submetidos à análise), bem
como a sigla MMOGs, e os diferentes tipos de jogos virtuais sob seu
manto. No segundo capítulo, apresentaremos os três casos a serem
estudados no universo de MMOGs. No terceiro capítulo, exploraremos a
tributação adequada para cada um dos três casos estudados, sob ISS ou
ICMS. Por último, a título de considerações finais, refletiremos sobre as
lições de nosso estudo de casos para a tributação de SaaS e SaaP no Brasil,
e analisaremos brevemente os desafios a serem enfrentados pelo Direito
Tributário no Brasil para tributar manifestações econômicas digitais ou
virtuais no presente e no futuro.

1. DEFINIÇÕES RELEVANTES

947
Em essência, o Direito Tributário é o conjunto de normas destinadas a
reger as relações de instituição, imposição, arrecadação e fiscalização
tributárias entre Fisco e contribuintes197. No Estado Democrático de
Direito, o intuito primário desse arcabouço normativo é proteger os
últimos das investidas do primeiro, com o interesse de garantir que, no afã
de angariar recursos para o custeio de suas atividades, as autoridades
fiscais não vulnerem os direitos individuais de seus jurisdicionados198.

A aplicação dos tributos, portanto, deve ser ordinariamente guiada por


esse intuito delimitador, fronteiriço, cerceador de linguagem e de poder. É
assim que deve operar o sistema tributário brasileiro, na esteira de
dispositivos como o artigo 150, inciso I, da Constituição Federal (que, em
decorrência do art. 5º, II, institui o princípio da legalidade tributária), do
artigo 3º do Código Tributário Nacional (que estabelece o tributo como
prestação compulsória cobrada mediante atividade administrativa
plenamente vinculada à lei), e, ainda, do artigo 110, também do Código
Tributário Nacional. Esse dispositivo diz o seguinte:

A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos,


conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela
Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do
Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.

A rigor, o artigo 110 do Código Tributário Nacional é apenas excesso


de zelo do legislador, uma vez que o respeito deste às disposições do texto
maior é pedra angular do adequado funcionamento do nosso sistema
tributário199. O “lembrete”, no entanto, é útil para esclarecer que, quando a
Constituição Federal estabelece, em seu artigo 156, inciso III, a
competência municipal para a exigência de um imposto sobre “serviços de
qualquer natureza”, não pode o legislador infraconstitucional, a pretexto de

948
querer regular ou regulamentar a dita norma, incluir no rol de serviços a
locação de bens móveis200.

De igual modo, quando a Constituição Federal atribui aos Estados e ao


Distrito Federal a competência para instituir um imposto sobre “operações
relativas à circulação de mercadorias”, proíbe em caráter terminativo que o
legislador infraconstitucional insira no rol de “mercadorias” tributáveis
aquilo que se reveste de íntima natureza de serviço, como por exemplo o
software feito sob medida para o contribuinte, um clássico exemplo de
SaaS201. Em última análise, a preocupação externada pelo artigo 110 do
Código Tributário Nacional é uma preocupação com a garantia de alguma
medida de certeza do Direito, pilar da segurança jurídica202 no
Ordenamento Jurídico brasileiro.

Definir, portanto, cada uma das siglas relevantes para o nosso artigo, a
saber, IaaS, PaaS, SaaS e SaaP e MMOGs, é um esforço para apreender o
seu sentido prático e, com a mesma ênfase, também o seu sentido jurídico-
tributário. Com esse exercício, pretendemos aproximar cada manifestação
econômica subjacente às hipóteses de imposição dos tributos relevantes no
Brasil.

1.1. IaaS e PaaS

Multiplicam-se os sítios eletrônicos e os periódicos científicos que


oferecem conceitos e exemplos de IaaS e PaaS. Segundo Aleksandra
Bal203:

The IaaS model provides the client with fundamental computing resources
(processing, storage, networks) where he is able to deploy and run his software.
The consumer does not manage or control the underlying cloud infrastructure but
has control over the operating systems and deployed applications. […] The PaaS
model offers a platform, typically including operating system, programming
language execution environment, database, and web server, for customers to use.

949
Application developers can develop and run their software solutions on a cloud
platform without the cost and complexity of buying and managing the underlying
hardware and software layers.

Timothy Grance e Peter Mell complementam essas definições ao


esclarecer que, no ambiente de IaaS, o consumidor pode ter controle
limitado sobre “componentes de rede específicos”, tais como a
hospedagem de firewalls. Já no ambiente de PaaS, o consumidor teria
controle apenas sobre aplicativos desenvolvidos e, possivelmente, sobre
“padrões de configuração para o ambiente de hospedagem [desses]
aplicativos”204. Um exemplo de IaaS seria o Rackspace205, enquanto um
exemplo de PaaS seria o Microsoft Azure206-207.

Ao analisarmos as definições acima sob o prisma jurídico-tributário,


podemos concluir que ambos os ambientes de IaaS e PaaS comportam o
fornecimento de serviços, em maior ou menor escala, e para clientes com
interesses distintos.

No modelo de IaaS, o cliente busca uma “residência” de capacidade,


processamento e conectividade para sua propriedade intelectual, ou para as
funcionalidades da propriedade intelectual a que o cliente tem acesso.
Ainda assim, embora a princípio o conceito de IaaS não recuse abrigo ao
simples aluguel de um data center (manifestação econômica que não
constitui serviço tributável pelo ISS, por exemplo), sua aplicação mais
comum traria consigo a execução de diversos serviços de contenção,
manutenção, gerenciamento e segurança propriamente qualificáveis como
tais sob a ótica do Direito Tributário no Brasil. Esse raciocínio se aplica
com muito mais razão ao modelo de PaaS, dada a expansão dos serviços
fornecidos e o maior nível de dependência do cliente em relação ao
prestador.

950
Ainda a título de comentários sobre a natureza jurídico-tributária dos
modelos de IaaS e PaaS, nenhum deles contempla, segundo os conceitos e
exemplos oferecidos, qualquer fornecimento de bens ou mesmo de direitos
ao cliente (tomador de serviços). Isso não impede que, em contratos
híbridos, um cliente seja ao mesmo tempo comprador de um bem digital
ou de um direito permanente, e que essa transação seja vinculada ao uso,
por parte do cliente, de uma infraestrutura ou de uma plataforma criada e
mantida pelo vendedor.

O desafio para o intérprete será identificar, recortar, segregar a parcela


do acordo entre as partes que confere ao cliente todas as faculdades típicas
da propriedade no Direito Civil (uso, gozo e disposição, bem como o
direito de reaver a coisa “do poder de quem quer que injustamente a
possua ou detenha”)208, para apenas então, e somente com relação àquela
parcela segregada, admitir que sua natureza é de compra e venda de um
bem, quer tangível, quer intangível, ou de um direito permanente.

1.2. SaaS e SaaP

A distinção entre SaaS e SaaP guarda alguma familiaridade com a


distinção entre o “software por encomenda” e o antigo “software de
prateleira”, relevante para fins de ISS e ICMS, mas é incorreto afirmar que
a distinção é a mesma. Vejamos.

Tanto no caso do fornecimento de um “software por encomenda”


quanto no caso da venda de um “software de prateleira”, é normal que o
cliente receba um bem, quer customizado, quer padronizado, quer gravado
em suporte físico (como um CD-ROM), quer recebido via download.
Trazendo a discussão para a esfera tributária, concordamos com Salvador
Cândido Brandão Junior quando aponta o paradoxo do legislador, bem

951
como das autoridades fiscais, de querer tributar a transferência de um
“software por encomenda” através do valor de uma suposta “licença de
software”209: ora, se pertence ao encomendante a propriedade dos direitos
relativos a programas de computador por ele encomendados210, como
admitir que o encomendante receba algo que não o próprio software
customizado, encerrado em sua inteireza como novo bem a integrar seu
domínio econômico? A distinção é relevante apenas para determinar qual a
natureza preponderante do liame estabelecido entre cliente e fornecedor:
em um modelo de fornecimento de “software por encomenda”, a busca do
cliente é por uma solução digital tailor-made, a justificar a tributação dessa
manifestação econômica como serviço, ordinariamente submetido ao ISS
no Brasil.

Por outro lado, em um modelo de fornecimento de “software de


prateleira”, embora seja indubitável que houve esforço intelectual
necessário para a criação do software relevante, a busca do cliente não é
por esse esforço, nem exerce ele qualquer influência sobre como será
direcionado; normalmente, quando da formação do vínculo de compra e
venda, o esforço já foi empreendido, e o cliente adquire um software
comum, igual e indistintamente oferecido para outros clientes nos mesmos
termos.

A caracterização de um software como serviço, portanto no modelo de


SaaS, parte da premissa de que as funcionalidades de um software criado,
desenvolvido, gerenciado e mantido por uma fonte são utilizadas por um
determinado cliente. É serviço porque se constitui como obrigação de fazer
e não de dar; no modelo de SaaS, o software não é transferido em caráter
definitivo para o usuário, antes, é mantido por um prestador e atualizado
periodicamente.

952
Para nos mantermos no ambiente de jogos virtuais, citemos o exemplo
do jogo World of Warcraft211, pertencente à categoria de Massive
Multiplayer Online Role-Playing Games (MMORPGs), integrante do
universo de MMOGs. O que o usuário do jogo World of Warcraft adquire
junto ao sítio eletrônico mantido pela Blizzard Entertainment é um
software oferecido como serviço, ou SaaS, em conformidade com os
seguintes trechos dos termos de uso do jogo212:

2. Concessão de uma Licença Limitada para Usar o Serviço


Sujeito à sua concordância e a contínua conformidade com os Contratos da
Blizzard, você poderá usar o Serviço somente para seus próprios propósitos não
comerciais ao acessá-lo com um Jogo Cliente autorizado e não modificado. Você
não pode usar o Serviço para qualquer outro propósito ou em conexão com qualquer
outro software. [...]
6. Nenhum Direito de Propriedade na Conta
Você reconhece e concorda que não terá nenhuma propriedade ou outro
interesse de propriedade sobre qualquer conta armazenada ou hospedada em um
sistema da Blizzard, incluindo sem limitação qualquer conta BNET ou conta do
World of Warcraft, e reconhece ainda e concorda que todos os direitos em e para
tais contas são e deverão ser para sempre de propriedade e para o benefício da
Blizzard.

Se SaaS é o fornecimento de um software como serviço, ou seja, como


uma obrigação de fazer para o recebedor ou tomador, SaaP é o
fornecimento de software como um produto. Como esclarece Maria
Ângela Lopes Paulino Padilha, nas transações no modelo de SaaP, “o
programa é instalado e rodado no próprio computador do usuário mediante
o pagamento de uma taxa única”213.

Não se ignora que, também no modelo de SaaP, o desenvolvedor


prestou serviços que culminaram na formatação de um produto digital e
também não se ignora que o produto adquirido possa estar submetido a
atualizações pontuais a serem oferecidas gratuitamente pelo
desenvolvedor. No entanto, o objeto do negócio acertado em um modelo
de SaaP é um programa de computador completo ab initio, programa esse

953
que é transferido ao comprador com todas as faculdades inerentes à
propriedade civil.

Para fins de comparação, e ainda no ambiente dos jogos virtuais,


diferencie-se o jogo World of Warcraft, MMORPG, de uma edição
anterior da mesma série produzida pela empresa Blizzard Entertainment, a
saber, Warcraft III: Reign of Chaos (seguido pela sua expansão, The
Frozen Throne)214. Embora o Warcraft III contivesse o modo de jogo
multijogador (no inglês, multiplayer)215, o software adquirido era
essencialmente um produto acabado, comercializado inclusive em
prateleiras de lojas, ao modo dos antigos “software de prateleira”.
Enquanto o World of Warcraft se firmou no mercado de jogos virtuais
como um portal de acesso a uma realidade virtual detida pela Blizzard
Entertainment, o Warcraft III oferecia histórias e modos de jogo
predeterminados (expansíveis mediante aquisição de um novo software)
aos jogadores, com a prioritária intenção de criar entretenimento offline,
individual para cada jogador.

Quando trazemos os conceitos técnicos de SaaS e SaaP para o ambiente


jurídico-tributário, a impressão inicial é a de que o software como serviço
deveria ser tributado pelo ISS e, por outro lado, o software como produto
deveria ser tributado pelo ICMS. A outra impressão inicial, embora lateral
a este trabalho, é a de que ambos os tipos de software deveriam ser
tributados por PIS/COFINS, bem como por PIS/COFINS-Importação, pois
seriam, respectivamente, qualificáveis como serviços ou produtos. As duas
impressões iniciais merecem ponderações e cautela.

Quanto à primeira impressão, uma transação ocorrida no ambiente de


SaaS deve ser tributada pelo ISS apenas e tão somente dentro das estritas
hipóteses tributáveis do ISS (como, por exemplo, o licenciamento de

954
software, constante do item 1.05 da lista anexa à Lei Complementar n.
116/2003) e, ainda assim, apenas dentro da estrita competência oferecida
pela Constituição Federal aos Municípios (de tributar serviços de qualquer
natureza, hipótese tributária em que, a princípio, não se incluiria a mera
disponibilização de conteúdo de áudio pela internet, inaugurada pela Lei
Complementar n. 157/2016 como o item 1.09 da lista anexa à Lei
Complementar n. 116/2003)216.

De forma semelhante, uma operação “de compra e venda de


mercadoria” só poderia ser submetida ao ICMS se efetivamente
transferisse a propriedade de bem destinado ao comércio entre comprador
e vendedor e apenas se tal transferência configurasse a hipótese tributária
preponderante no caso concreto – aqui, cabe o regresso à antiga distinção
entre “software de prateleira” e “software por encomenda”. Ambas as
operações são em princípio integrantes do ambiente de SaaP, e ambas
transferem um bem definido ao comprador, mas apenas a transferência do
“software de prateleira” seria tributável pelo ICMS, dado que o “software
de prateleira” seria entendido como um bem destinado ao comércio e,
portanto, uma mercadoria, daí apta a atrair a incidência do referido tributo.

Quanto à segunda impressão, é correto afirmar que receitas auferidas


por pessoas jurídicas engajadas em transações nos modelos SaaS e SaaP
devem ser submetidas aos regimes cumulativo e não cumulativo de
PIS/COFINS, conforme seja o caso217. No entanto, a mesma assertiva não
é necessariamente verídica para PIS/COFINS-Importação, dado que o
artigo 3º, incisos I e II, da Lei n. 10.865, de 30 de abril de 2004, estabelece
que essas contribuições incidirão apenas sobre “a entrada de bens
estrangeiros no território nacional” e sobre “o pagamento, o crédito, a

955
entrega, o emprego ou a remessa de valores a residentes ou domiciliados
no exterior como contraprestação por serviço prestado”.

Diversas Soluções de Consulta da Receita Federal do Brasil já


definiram que o simples pagamento por uma licença de uso de software a
pessoa residente no exterior não é capaz de fazer nascer a exigibilidade de
PIS/COFINS-Importação, uma vez que o que se remunera com a licença é
a exploração de um direito, e não propriamente a prestação de um
serviço218. Por outro lado, a importação de um “software de prateleira”, por
exemplo, seria hipótese típica de tributação via PIS/COFINS-Importação,
e, destaque-se, mesmo o fornecimento de uma tecnologia por pessoa
residente no exterior, em situação que poderia estar no âmbito de um
modelo SaaP, também estaria sujeita às mesmas contribuições, à luz de
posição recente externada pela Receita Federal do Brasil na Solução de
Consulta COSIT RFB n. 340, de 26 de junho de 2017219.

1.3. MMOGs

MMOGs são definidos pelo Dicionário Oxford como “jogos online que
podem ser jogados por um número bastante grande de pessoas
simultaneamente”220. Essa definição é complementada por Tania E. Bilir221,
que traça um histórico da criação e do desenvolvimento de MMOGs desde
a década de 1970, quando Role-Playing Games (RPGs) como Dungeons
and Dragons, populares em meio físico, foram transportados para o meio
digital222. A autora aponta elementos comuns a diversos desses jogos nos
dias de hoje, como a criação e a evolução de perfis de jogadores por meio
das funcionalidades de seus personagens (avatares)223, o compartilhamento
de ambientes virtuais pertencentes a um enredo, ou a enredos específicos,
e a realização de tarefas ou desafios individuais ou em conjunto (no inglês,
quests)224.

956
A literatura especializada aponta uma arquitetura específica para o
funcionamento de MMOGs, a qual será relevante na análise dos casos
estudados em nosso trabalho. Segundo Devan Tanvir Ahmed e Shervin
Shirmohammadi225:

To accommodate a large number of players, [a MMOG’s] map is logically


divided into multiple zones where each zone encompasses the players that are in the
same vicinity. Each zone has a master (e.g., server) that coordinates the
interactions of the zone members in a multicast fashion. A set of master nodes
regulates the operation of the MMOG and provides overlay services in client-server
model. On the other hand, [a] hybrid model incorporates the participation of the
players. The system is hybrid as it combines the benefits of both centralized and
distributed systems. To overcome the functionality limitations of the IP multicast,
application layer multicasting (ALM) can be chosen for intra zonal communication.

Na estrutura de jogo comum aos MMOGs mais populares do mundo, as


zonas de jogo funcionam como cenários facilitadores da experiência
convivial de milhares ou milhões de usuários simultâneos. Um exemplo é
o MMORPG Dofus, lançado em 2004 pela desenvolvedora francesa
Ankama Games226, em que diversas zonas de jogo são partilhadas por
usuários em diferentes servidores, com o intuito de não apenas congregar
jogadores do mundo inteiro para aquele universo, mas também de criar
oportunidades de interação entre jogadores.

Para citar uma dessas formas de interação, jogadores de Dofus podem


ativar aquilo que o MMORPG denomina modo Mercador (no inglês,
Merchant mode), onde o usuário “organiza sua loja” e escolhe itens que
deseja vender, bem como o preço de venda para cada item. Após a
organização da loja, o usuário pode escolher “mudar para o modo
Mercador” e, assim, se desconectar do jogo227. Seu avatar ficará disponível
na zona escolhida para que seja acessado como uma loja própria no
ambiente de Dofus, e, o que é interessante para os fins da nossa discussão

957
neste trabalho, as vendas são tributadas pelo jogo, na moeda oficial do
jogo, kamas228.

Há diferentes tipos de jogos classificados como MMOGs na Internet,


cada qual com suas peculiaridades. Em um estudo publicado no ano de
2012, Davinder Ghuman e Mark D. Griffiths identificaram três tipos
predominantes de MMOGs: o MMORPG, o Massively Mulitplayer Online
First-Person Shooter (MMOFPS) e o Massively Multiplayer Online Real-
Time Strategy (MMORTS)229.

Na linha de exemplos já citados, os MMORPGs permitem ao usuário a


escolha de avatares de uma variedade de raças, profissões, aspirações
morais ou gêneros, com o objetivo primário de explorar vastos ambientes
virtuais. A jogabilidade envolve a obtenção de talentos e habilidades por
meio da conclusão de quests e da vitória sobre oponentes. Nos
MMORPGs, como nos RPGs de maneira geral, o jogador é estimulado a
“aumentar seu nível” (no inglês, level up), de modo a ampliar os seus
poderes dentro do jogo. Interações sociais entre os jogadores são parte
fundamental de MMORPGs, e podem ser consideradas obrigatórias para a
conclusão de quests.

Por outro lado, MMOFPSs são jogados com visibilidade em primeira


pessoa e dependem das capacidades de reação e velocidade dos usuários,
por envolverem situações de caça, batalha, disputas e tiroteio. Em
contraste com os MMORPGs, os MMOFPSs oferecem mais oportunidades
de competição entre jogadores, quer individualmente, quer em times ou
equipes. Já nos MMORTSs, jogadores coordenam tropas ou times,
desenvolvem especialidades ou se aliam a outros jogadores para obter
maior status no jogo, em nome de algum ideal ou alguma figura relevante
no universo do jogo230.

958
Diante dos nossos comentários nos Subcapítulos 1.1 e 1.2, resta
evidente que os MMOGs se qualificam como SaaS ou SaaP, com todas as
implicações jurídicas e tributárias a eles pertencentes, a depender da
relação que é criada entre a empresa responsável pelo jogo e o jogador.

Os MMOGs não são, a princípio, exemplos de IaaS ou de PaaS,


embora se admita qualquer dessas duas classificações para o serviço de
uma empresa que ofereça a desenvolvedores hospedagem, gestão de dados
e promoção de jogos criados de forma independente. Uma dessas
plataformas é a Utomik, um serviço de oferta de jogos na nuvem231 que
promete a desenvolvedores a integração de seus jogos, o teste de
funcionalidades e o lançamento para uma comunidade cativa de usuários,
com o material publicitário de sua escolha (trailers, imagens e texto)232. No
entanto, a Utomik, embora seja instrumental (ou essencial) para a
divulgação dos MMOGs, não se confunde com os próprios jogos virtuais.

Esses jogos, e a relação criada entre a empresa que os gerencia e


mantém e os seus usuários, pertencem a um plano jurídico distinto daquele
que envolve a plataforma e os desenvolvedores de jogos. Para citarmos
uma situação análoga, imagine-se uma empresa de turismo que oferece a
seus clientes quartos em hotéis de diversas cidades no Brasil. É possível
cogitar de uma relação jurídica (1), a saber, aquela estabelecida entre o
cliente e o hotel, intermediada pela empresa de turismo, e outra relação
jurídica (2), que seria aquela entre o hotel e a própria empresa de turismo,
na condição de promotora de seus serviços hoteleiros e, portanto, credora
de uma comissão pelo seu trabalho. Tanto não se confundem as relações
jurídicas (1) e (2), quanto não se confundem as relações jurídicas entre
jogadores, plataforma de lançamento e promoção de MMOGs, e os seus
desenvolvedores.

959
2. APRESENTAÇÃO DOS TRÊS CASOS DE ESTUDO

Os três casos de estudo escolhidos para o presente trabalho tratam de


relações jurídicas entre partes diferentes engajadas no universo de
MMOGs. Para os fins dessa apresentação, utilizaremos o termo MMOG
não apenas para definir o software utilizado pelo jogador, como também
para definir a empresa prestadora do serviço pertinente ao jogo (se a
conclusão apontar para o tratamento jurídico e tributário dessa
manifestação econômica como SaaS) ou para definir a empresa vendedora
de um bem digital ou mesmo um direito permanente (se a conclusão
apontar para SaaP). No mesmo intuito, o tomador do serviço ou o
adquirente do bem digital será referido em nossos casos como jogador ou
usuário.

No primeiro caso, analisaremos a qualificação jurídico-tributária da


relação estabelecida entre um MMOG e seu jogador (com vínculo
preexistente) quando da aquisição de um acesso especial a áreas
específicas do jogo. Aqui, cuida-se de um pagamento em moeda real, feito
pelo jogador ao MMOG, para que seu avatar possa circular por áreas antes
não permitidas a ele, com o intuito de explorar mais tesouros, enfrentar
oponentes de níveis superiores e participar de quests especiais. Esse caso é
adaptado a partir da oferta de assinaturas pagas pela empresa Ankama
Games, desenvolvedora e mantenedora do MMORPG Dofus233, e nos
comentários do Capítulo seguinte, será intitulado “Caso 1 – MMOG,
Jogador e Acesso a Área de Jogo”.

No segundo caso, analisaremos a qualificação jurídico-tributária da


relação estabelecida entre um MMOG e seu jogador (com vínculo
preexistente) quando da aquisição de um conjunto de benefícios no jogo,
incluindo o acesso especial a áreas específicas, descontos na compra de

960
itens regulares em lojas virtuais, bem como itens exclusivos. Esse caso é
adaptado a partir da oferta de assinaturas pagas pela empresa Jagex,
desenvolvedora e mantenedora do MMORPG RuneScape234, e nos
comentários do Capítulo seguinte, será intitulado “Caso 2 – MMOG,
Jogador e Pacote de Benefícios”.

No terceiro caso, analisaremos a qualificação jurídico-tributária da


relação entre jogadores que transacionam bens digitais entre si (por
exemplo, uma arma disponível no MMOG relevante), a princípio,
utilizando a moeda do próprio jogo. Esse caso é adaptado a partir do
sistema de compras e vendas do jogo Wakfu, desenvolvido e mantido pela
empresa Ankama Games235. Nos comentários do Capítulo seguinte, será
intitulado “Caso 3 – Jogador, Jogador e Item de Jogo”.

3. ASPECTOS TRIBUTÁRIOS DOS TRÊS CASOS DE ESTUDO

Vejamos, a seguir, os aspectos tributários relevantes para cada um dos


três casos de estudo apresentados no Capítulo 2, bem como os comentários
pertinentes que lançamos em complemento à nossa análise.

3.1. Caso 1: MMOG, Jogador e Acesso a Área de Jogo

Premissa relevante do Caso 1 é a preexistência de uma relação jurídica


entre o MMOG e o Jogador. Noutras palavras, não se cuida aqui de um
licenciamento de software entre MMOG e Jogador, uma vez que o
licenciamento ocorreu no momento da aquisição do produto ou do serviço
subjacente. Como é sabido, o licenciamento de software por parte de um
prestador a um tomador é submetido à incidência do ISS, a alíquotas entre
2% e 5%, de acordo com a Lei Complementar n. 116/2003236.

961
O que temos no Caso 1 é a oferta de novas funcionalidades para o
mesmo software já licenciado, em particular, o acesso a áreas específicas
do jogo. A nosso ver, a discussão sobre se o Caso 1 está no âmbito de
incidência do ISS ou do ICMS passa por dois questionamentos específicos.
Em primeiro lugar, (1) indagamos se a oferta de novas funcionalidades de
um software configuraria uma “nova licença de um mesmo software”, ou a
“licença de um novo software”, ambas aptas a trazer a incidência de ISS.
Em segundo lugar, (2) indagamos a natureza das funcionalidades
ofertadas: o “acesso a áreas específicas do jogo” é qualificável como um
serviço, como um bem ou como um direito? Enfocaremos os dois
questionamentos nos parágrafos seguintes.

Quanto ao primeiro questionamento, entendemos que a aquisição do


acesso a novas áreas do mesmo jogo é uma licença adicional do mesmo
software, portanto submetida ao ISS, conforme comentado anteriormente.
Aqui, cabe o recurso à definição de “programa de computador” trazida
pela Lei do Software, a Lei n. 9.609, de 19 de fevereiro de 1998. Diz o seu
artigo 1º:

Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções


em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer
natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da
informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em
técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins
determinados.

Ora, não se ignora que os novos territórios de um MMOG, ou as novas


zonas de jogo, compõem um “conjunto organizado de instruções em
linguagem natural ou codificada”, e o fato de esse conjunto organizado de
instruções não ser comercializado em suporte físico não o desnatura como
software, uma vez que o conjunto deve estar contido, veiculado em um
suporte físico “de qualquer natureza”, o que incluiria qualquer suporte

962
físico utilizado pela empresa desenvolvedora e mantenedora para oferecer
o jogo (como um servidor, por exemplo).

Todas as demais características do artigo 1º estão presentes no MMOG.


Também não se ignora que, do ponto de vista contratual, o valor pago em
moeda real pela assinatura “estendida” de um jogo (por exemplo, para
acessar áreas específicas) é entendido como contraprestação pela licença
de um software. Veja-se como exemplo um trecho da página de Termos e
Condições de Uso do MMORPG Dofus237:

9.1 Right of use: Ankama allows you to acquire rights of use over Credits. The
rights of use over Credits allow you to access content made available to you by
Ankama on the Websites and/or Games. The content to which Ankama allows you
access in exchange for Ogrines, including subscriptions, booster packs, services
that can be used within certain Games and rights of use over virtual objects, over
Krosmaster virtual figurines or over Kamas that can be used in the DOFUS game,
in exchange for Goultines, including rights of use over virtual objects or services
that can be used within the DOFUS TOUCH game, or in exchange for Krosmaga
Kamas, including virtual cards (in the form of boosters or decks) or services that
can be used within the KROSMAGA game, is called the “Exchange Content”.
Whatever the terminology used, Ankama only supplies a right of use over
Credits and not a right of ownership, which you expressly acknowledge. […].

Perceba-se que mesmo o conteúdo que é franqueado aos usuários no


âmbito do MMORPG Dofus é entendido como conteúdo submetido à
licença de uso de software, e há ressalva expressa de que o conteúdo não
constitui propriedade para o jogador que o adquire, mesmo na modalidade
de assinatura (no inglês, subscription). Ou seja, embora pudéssemos
discutir a natureza efetiva do que está sendo cedido para o jogador por
meio da assinatura, fato é que as áreas novas do mesmo MMORPG
constituem um “conjunto organizado de instruções em linguagem natural
ou codificada”, e que o MMORPG que utilizamos como base para o
estudo do Caso 1 trata esse acesso ampliado como parte do direito de uso
cedido aos jogadores.

963
Quanto ao segundo questionamento, voltamos a uma discussão
apresentada ainda na Introdução deste trabalho, e consolidada na Solução
de Divergência COSIT RFB n. 6, de 3 de junho de 2014. Nas linhas
daquela Solução de Divergência, e aqui adotamos o mesmo raciocínio,
ainda que se pudesse caracterizar o acesso a áreas novas do MMOG como
um acesso físico a um território (ou seja, um direito de passagem, ou
mesmo o uso de um espaço físico por tempo determinado, o que se
assemelharia a uma “locação” virtual), o acesso físico a esse território é
suportado por uma gama de serviços, desde a hospedagem de dados, a
garantia de segurança da conta de cada usuário e as próprias
funcionalidades do jogo. A natureza dessa oferta aos usuários, portanto,
revela inegável caráter de serviço, e não de bem ou mesmo de direito.

Poder-se-ia questionar aqui se o serviço a que faz referência a assinatura


do MMOG relevante seria ele todo um serviço de licenciamento de
software, ou se a natureza específica do benefício auferido pelo tomador
daria ensejo a uma tributação ainda pelo ISS, mas sob item distinto da
Lista Anexa.

Suponha-se que, na área acessada após a assinatura, o jogador tenha


acesso ao conteúdo de um manuscrito que permite a seu avatar a
investigação de novos tesouros, bem como a futura aquisição de novas
habilidades. Poderia, aqui, o intérprete querer tributar a operação via ISS,
mas sob o item 1.09 (disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdo
de texto por meio da Internet) da Lista Anexa à Lei Complementar n.
116/2003?

Ainda nessa situação, entendemos que, seguindo um critério de


preponderância (não de mercadoria sobre serviço ou vice-versa, nos
termos já rejeitados pelo Superior Tribunal de Justiça em jurisprudência

964
consolidada238, mas entre serviços, com o intuito de identificar a atividade-
fim do contrato celebrado entre MMOG e jogador), o serviço mais
relevante seria o licenciamento de software, referido no item 1.05 da Lista
Anexa à Lei Complementar n. 116/2003. No Caso 1, não há nenhum
elemento individualizável obtido pelo jogador com a assinatura junto ao
MMOG que justifique tratamento tributário diverso, o que separa essa
hipótese daquela explorada no Caso 2, a seguir.

3.2. Caso 2: MMOG, Jogador e Pacote de Benefícios

Há diversas similaridades entre o Caso 1 e o Caso 2, entre elas a


preexistência do vínculo entre o MMOG e o jogador, a assinatura adicional
celebrada entre as partes e o comentário nos Termos e Condições de que a
assinatura também faz parte da licença de uso. A diferença relevante aqui é
a oferta de bens digitais determinados, ou vantagens determinadas, em
conjunto com o acesso a áreas específicas do jogo. Os bens e as vantagens
que listamos e que serão objeto de nossa análise nos parágrafos abaixo são
(1) descontos na compra de itens regulares em lojas virtuais, e (2) itens
exclusivos.

Antes mesmo de procedermos à nossa análise, ressaltamos que a


compra de um “pacote de benefícios” por parte de um jogador junto a um
MMOG levanta questões sobre a natureza específica de cada benefício
adquirido, em contraposição à compra de um benefício único, ou de uma
assinatura que confira um benefício único. Aqui, podemos fazer referência
à legislação de ISS, que em certos serviços (vale notar, apenas um deles
sob o código de “serviços de informática e congêneres”, a saber, a
distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de Acesso
Condicionado, no item 1.09 da Lista Anexa) segrega aquilo que deve estar
sob a incidência de ISS daquilo que deveria ser tributado via ICMS.

965
No tocante à aquisição de uma licença de software que reverta para o
tomador o benefício na compra de itens regulares em lojas virtuais do
MMOG relevante, ainda nesse caso a licença de software é preponderante
em relação ao desconto obtido, que seria em essência um direito conferido
pelo MMOG ao jogador. Ainda, como o desconto conferido ao jogador
não é transacionável, ou seja, não pode ser cedido onerosamente a outros
jogadores, não há que se falar em bem digital tributável pelo ICMS,
partindo da premissa, inaugurada pela Decisão Normativa CAT n. 4, de 20
de setembro de 2017, no Estado de São Paulo, de que o software sem
suporte físico poderia ser submetido a esse tributo.

Por outro lado, no tocante a itens exclusivos, a princípio, se for possível


ao aplicador da lei tributária brasileira segregar a parcela do preço
correspondente ao item exclusivo e a parcela do preço correspondente ao
“acesso a novas áreas do jogo”, resta caracterizada a operação tributável
pelo ICMS, porquanto configurada a operação de compra e venda de
mercadoria (a saber, bem oferecido ao comércio). Veja-se a disposição dos
itens 3 e 4 da Decisão Normativa CAT referida acima239:

3. No que se refere à forma de comercialização, os softwares não personalizados


podem ter suas cópias distribuídas em larga escala por meio físico ou serem
negociados em meio digital, tanto por download como por streaming (utilização do
software “na nuvem”). Essa alteração, no entanto, não tem o condão de
descaracterizar a natureza de produto desse tipo de software (mercadoria). A
circunstância de o adquirente instalar o software (de loja física ou virtual) em sua
máquina (download) ou utilizá-lo “na nuvem” por meio de internet (streaming) não
descaracteriza a natureza jurídica da operação como comercialização de software
pronto.
4. Portanto, há incidência do ICMS nas operações com softwares, programas,
aplicativos, arquivos eletrônicos, e jogos eletrônicos, padronizados, ainda que sejam
ou possam ser adaptados, independentemente da forma como são comercializados.

É importante ressaltar que o nosso comentário sobre a tributação


apartada do item exclusivo na assinatura do MMOG não depende de sua

966
comercialização entre usuários do jogo. Por exemplo, é possível cogitar de
um item exclusivo que seja pessoal e intransferível, e que represente para o
jogador de um MMOG, ou de um MMORPG como RuneScape, uma
armadura, uma arma, ou mesmo uma habilidade qualquer.

É relevante aqui que a comercialização tenha ocorrido entre MMOG e


jogador, por meio da compra de um “pacote de benefícios”, celebrada
mediante o pagamento de determinada soma em dinheiro. O fato de esse
bem digital não poder ser transferido a posteriori entre um jogador
assinante e um jogador não assinante não desnatura a operação inicial
como uma operação intrinsecamente conceituável como de compra e
venda de mercadoria, portanto sujeita ao ICMS, na modalidade de SaaP, e
não ao ISS, na modalidade de SaaS.

3.3. Caso 3: Jogador, Jogador e Item de Jogo

No universo de Wakfu, jogadores podem selecionar itens de sua


propriedade para transferir a outros jogadores em troca da moeda oficial
do jogo, kamas240. Essa faculdade é possível a partir do uso de um
inventário chamado haven bag, com um item específico chamado Display
Window (na tradução para o português, uma “vitrine”). Segundo o sítio
eletrônico Wakfu Wikia241:

Selling Items
You can click “manage display” to put items on the window once you have it
placed to put things out for sale. You may also use this as extra storage for your
inventory. Some items will cost a storage tax to sell. The bigger the stack of items
put of for sale the more the storage tax is. If it is a stack of one item it is possible to
put it on sale for one or two kamas without being charged the storage tax, though
the prices can vary depending on the taxes set by the governor in each territory.
Items put on display for extra inventory storage and at 0 kama will have no storage
tax, but can be bought by other players.

967
Que a operação seja tributada pelo próprio jogo, por meio de uma
espécie de “tributo sobre armazenagem” (no inglês, storage tax), é um
dado relevante para a consideração de se há ou não operação tributável
ocorrendo entre jogadores. Para os fins do Caso 3, suponhamos que
comprador e vendedor sejam pessoas físicas residentes no Brasil, e que o
MMOG relevante esteja hospedado em um servidor localizado nos Estados
Unidos. Indaga-se: a operação em comento seria tributável pelo ICMS no
Brasil?

Em primeiro lugar, o item transacionado no jogo poderia (embora os


Termos e Condições de Wakfu vedem esse tipo de operação) ser
transacionado fora do jogo entre os mesmos jogadores242. Em segundo,
apesar de a operação ter sido concluída dentro de um servidor localizado
nos Estados Unidos, o bem digital foi retirado da conta local do usuário
brasileiro vendedor e passou para a conta local do usuário brasileiro
comprador. Nesse sentido, a operação poderia ser entendida como
download de um bem digital e, com essa qualificação, poderia ser
tributada pelo ICMS.

Uma preocupação distinta, mas também relevante para fins da


tributação do ICMS, seria o valor do item transacionado, uma vez que esse
valor, na situação fática exposta no Caso 3, seria expresso apenas na
moeda do jogo (se estivermos nos referindo especificamente ao MMORPG
Wakfu, a moeda do jogo seria kamas). A questão pode ser resolvida por
alguma forma de câmbio, prevista pelo próprio jogo, entre a moeda virtual
e alguma moeda real (por exemplo, dólares), ou pode ser resolvida pelo
arbitramento do valor de cada item transacionado, tomando por base as
características do item em relação a outros itens disponíveis no jogo.

968
Para ilustrar este último cenário, suponhamos que determinada espada
seja comercializada entre Jogador 1 e Jogador 2, no MMORPG Wakfu ou
em qualquer MMOG relevante, pelo valor de 1.000.000,00 kamas (um
milhão de kamas). Suponhamos, ainda, que não exista um câmbio oficial
entre kamas e qualquer moeda real específica243. Uma forma de estabelecer
o valor da espada que foi transacionada, de modo a submeter essa
operação ao ICMS, seria, por exemplo, comparar os atributos dessa espada
aos atributos de outra espada vendida pelo jogo por moeda real (mediante
uma assinatura específica e premium, por exemplo), com o intuito de
arbitrar um valor aproximado para o valor em kamas da espada relevante.
Outra possibilidade seria utilizar o valor de cotação “não oficial” dos
kamas em moeda real, com o intuito de aferir o valor em reais da transação
entre o Jogador 1 e o Jogador 2, valor esse tributável por ICMS.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os comentários deste artigo sobre a tributação de SaaS e SaaP, partindo


do estudo de casos de MMOGs, ilustram a difícil tarefa de aplicar o
Direito com amparo em analogias. Sim, o artigo 108, § 1º, do Código
Tributário Nacional veda o uso de analogia para exigir tributo não previsto
em lei, mas, como observamos, a vedação pode ser inócua na eventual
apreciação de hipóteses tributáveis no universo desses jogos virtuais.
Afinal de contas, resgatando a discussão do Capítulo 3, releva para a
subsunção ao fato gerador do ICMS e, portanto, para a caracterização de
determinada manifestação econômica como uma “circulação de
mercadoria”, por exemplo, o fato de o bem digital ser comercializável por
moeda sonante?

Se essa comercialização for proibida pela plataforma que o criou, essa


proibição deve ser considerada pelo aplicador da legislação tributária

969
correspondente? São dúvidas resolvidas apenas de forma precária, e
apenas com o emprego de analogias, e não com o emprego de uma
legislação tributária que entenda o fenômeno digital sob análise e o tribute
de acordo com as suas qualidades intrínsecas. Outras questões enfrentadas
em nosso trabalho tiveram o mesmo destino.

O desconforto, o incômodo na aplicação de qualquer analogia para


justificar não a exigência de tributo não previsto em lei, mas sim a
subsunção de manifestação econômica inovadora a uma hipótese tributável
incapaz de a abrigar por completo, não é privilégio de situações próprias
da economia digital. No entanto, com essas situações, temos visto a
celeuma criada pelo legislador complementar (no âmbito de ISS) e pelos
Estados (no âmbito de ICMS) com o adequado tratamento fiscal de cada
hipótese de SaaS ou SaaP.

Os desafios que temos diante de nós poderiam ser mais bem


contornados com a edição de uma Lei Complementar sobre essa matéria,
disciplinando as hipóteses de tributação de SaaS ou SaaP, com o objetivo
de resolver conflito de competência, à luz da ordem deixada pelo artigo
146, inciso I, da Constituição Federal.

Enquanto as hipóteses tributárias de ISS e ICMS, em situações


pertencentes à economia digital, forem disciplinadas por diferentes
legisladores, ou mesmo por integrantes do Poder Executivo (a Decisão
Normativa CAT n. 4, de 20 de setembro de 2017, é um sintoma desse
problema), continuaremos a debater sem fim a aplicação de conceitos
vagos, arcaicos, ou mesmo conflitantes, a situações novas
(indubitavelmente relevantes do ponto de vista econômico, de capacidade
contributiva e isonomia fiscal) que merecem a atenção do Direito
Tributário no Brasil.

970
Desafios na tributação dos programas de
fidelização
244 245
Jorge N. F. Lopes Jr. e Mariana Monte Alegre de Paiva

Este artigo pretende examinar algumas das principais controvérsias


tributárias envolvendo as empresas administradoras dos chamados planos
de “fidelização”. Uma análise meramente descritiva, porém, não seria
suficiente, sendo imprescindível uma breve reflexão quanto à origem de
tais controvérsias, as lacunas legislativas atualmente existentes e as
possíveis alternativas para dirimir os conflitos a elas associados.

Para tanto, o presente artigo foi dividido nos seguintes capítulos: (1)
Introdução, onde indicaremos a relevância da análise; (2) Principais
controvérsias tributárias envolvendo os programas de fidelização, em que
discutiremos a atividade desenvolvida pela empresa que administra os
programas de fidelização e abordaremos os temas mais polêmicos da
tributação federal, estadual e municipal, em especial as questões sobre a
eventual incidência do ICMS e do ISS, além do momento de
reconhecimento da receita da empresa gestora, especialmente para efeitos
da incidência de PIS/COFINS; e, por fim, (3) Conclusões e possíveis
alternativas para os desafios legislativos.

1. INTRODUÇÃO

Programas de fidelização estão em franca expansão no Brasil. Segundo


dados da Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização
(ABEMF)246, a quantidade de cadastros aumentou 24% no segundo
trimestre de 2017 em relação ao mesmo período de 2016, passando de 81
para mais de 100 milhões de usuários cadastrados no Brasil. A ABEMF

971
estima terem sido emitidos 60 bilhões de novos pontos no segundo
trimestre de 2017, sendo que 49 bilhões foram resgatados pelos
consumidores no mesmo período.

De acordo com a pesquisa divulgada, os pontos e milhas foram


originados aproximadamente na seguinte proporção: 13% pela aquisição
de serviços aéreos e 87% pela utilização de cartões de crédito e aquisições
de produtos no varejo. Os pontos e milhas resgatados, por outro lado,
foram utilizados na proporção de 24% em novos produtos e serviços e
76% em passagens aéreas.

Mas os programas de fidelização não são exatamente uma novidade.


Surgiram há muitos anos como estratégia de marketing para estimular
consumidores a continuar adquirindo produtos ou consumindo serviços das
empresas, ou seja, como forma de retenção dos clientes. Afinal, atrair
novos clientes se mostra, geralmente, mais difícil e custoso do que premiar
e reter clientes já existentes. Além dessa nítida vantagem, os programas de
fidelização ainda oferecem a possibilidade de as empresas conhecerem
melhor seus clientes, por meio da obtenção de dados que fornecem
valiosos elementos para identificar com maior exatidão seu perfil de
consumo.

Em sua origem247, os programas de fidelização, também conhecidos


como programas de benefícios ou recompensas, começaram de forma mais
simples: os próprios fornecedores de produtos e serviços concediam tickets
de desconto, cupons de troca e cartões de prêmios a seus clientes,
garantindo assim descontos ou benefícios nas próximas aquisições a serem
realizadas.

972
Os principais programas de fidelização foram desenvolvidos nas
décadas de 1980 e 1990: em 1980, a companhia aérea American Airlines
ofereceu seu primeiro programa de milhagem AAdvantage; em 1994, a
Varig lançou o programa SMILES no Brasil, hoje associado à GOL; em
1995, a empresa Subway lançou um programa de selos de descontos,
estreando assim uma série de novos programas. Com o sucesso desse
método de fidelização, o mercado foi crescendo para englobar grandes
varejistas, como redes de supermercado, lojas de departamento, farmácias,
postos de gasolina, hotéis, restaurantes, entre outros.

Inicialmente, as próprias empresas gerenciavam seus planos de


fidelização. Esses programas são conhecidos como os programas de
fidelização individuais, em que os consumidores só trocam os pontos ou
milhas por produtos ou serviços oferecidos pela própria empresa. Com a
evolução do mercado, surgiram os programas de “fidelização de
coalização”, em que várias empresas parceiras, inclusive de segmentos
distintos, se unem para permitir que a aquisição de bens e serviços
ofertados por uma gerem pontos ou milhas que possam ser resgatados em
novos bens e serviços providos por outra. Os programas de coalização logo
se mostraram muito atrativos, já que proporcionam mais possibilidades de
troca para os consumidores.

Diante disso, surgiram também as empresas gestoras ou


administradoras dos programas de fidelização, que emitem e concedem os
pontos ou milhas e organizam todo o fluxo de troca por produtos e
serviços junto aos fornecedores e aos consumidores. Hoje, no Brasil,
existem grandes empresas como DOTZ, LIVELO, MULTIPLUS,
NETPOINTS, SMILES, dentre várias outras, responsáveis pelos principais

973
programas de fidelização, contando com centenas de outras empresas
participantes e milhares de consumidores.

Em resumo, os programas de fidelização envolvem diferentes partes,


em relações jurídicas diversas: empresas fornecedoras de produtos e
serviços, empresa gestora do programa e consumidores. Em suas diversas
interações, muitas dúvidas surgem a respeito da natureza das relações
jurídicas e suas consequências no campo tributário.

Assim como ocorre com outros modelos de negócios mais


inovadores248, a regulamentação legal quanto aos programas de fidelização
ainda é incipiente e, no campo tributário, não há atualmente normas claras
e precisas que determinem com exatidão os tributos que devem incidir nas
operações praticadas no contexto dos programas de fidelização. E, na
ausência de regulamentação adequada, as empresas têm de lidar com
grande insegurança jurídica e o risco de se envolverem em conflitos com o
Fisco.

O papel de definir os impactos tributários e de, em tese, mitigar de


alguma maneira essa insegurança, tem sido relegado à jurisprudência, que,
aos poucos, vem estudando o tema e se posicionando, embora nem sempre
de forma tão apropriada, do ponto de vista técnico-jurídico, como veremos
a seguir.

2. PRINCIPAIS CONTROVÉRSIAS TRIBUTÁRIAS

Dentre as inúmeras controvérsias de ordem tributária relativas ao


mercado de fidelização, concentraremos nosso estudo naquelas
envolvendo as empresas gestoras dos programas de fidelização de
coalização tradicionais249, analisando, a partir do seu ponto de vista, as
potenciais consequências fiscais de tais atividades. Antes, porém, vale

974
descrever brevemente como, em regra, se estrutura o modelo básico de
geração, acúmulo e resgate de pontos e milhas nesses programas.

Etapa 1 – Acúmulo de pontos e milhas

i) o consumidor adquire bens e serviços de uma empresa fornecedora


participante do programa; esses bens e serviços geram determinados números
de pontos e milhas, conforme acordado nas regras do programa;
ii) a empresa fornecedora informa a gestora sobre a aquisição e realiza o
pagamento do valor correspondente aos pontos/milhas à gestora;
iii) a empresa gestora, então, disponibiliza os números de pontos/milhas
correspondentes ao consumidor (credita em sua conta do programa), o qual
passa a ser titular de um direito de resgatar os pontos/milhas, de acordo com
as regras do programa, convertendo-os em benefícios futuros (novos produtos
ou serviços), enquanto a empresa gestora assume, em contrapartida, a
obrigação de entregar/fornecer os benefícios (novos produtos e serviços)
quando do resgate;

Etapa 2 – Resgate de pontos e milhas

iv) o consumidor opta por resgatar, integral ou parcialmente, os pontos/milhas


acumulados em sua conta, emitidos pela empresa gestora, para adquirir novos
produtos e serviços; e
v) assim, a empresa gestora paga os fornecedores pelos valores correspondentes
aos novos produtos e serviços adquiridos pelo consumidor mediante o resgate
daqueles pontos ou milhas.

Em geral, as empresas gestoras auferem receita a partir de duas fontes


principais, quais sejam: (i) pela diferença positiva entre (a) os valores
recebidos dos fornecedores quando da “geração” de pontos/milhas e (b) os
valores remetidos aos fornecedores quando do resgate de tais
pontos/milhas pelos consumidores (“spread”); e (ii) quando os
consumidores deixam de resgatar os pontos e milhas, que acabam por
expirar (receita conhecida como “breakage”).

O modelo descrito enseja alguns questionamentos legais, os quais terão


potenciais consequências tributárias. Por exemplo, indaga-se a natureza

975
jurídica da atividade das gestoras, se seriam meras revendedoras de
produtos e serviços que teriam sido por ela adquiridos e revendidos em
nome próprio aos consumidores. Em caso positivo, haveria então a
incidência do ICMS e/ou PIS/COFINS nessa suposta “revenda”, ou seriam
essas empresas meras intermediadoras, caso em que haveria a incidência
do ISS sobre um serviço de intermediação? E o momento de
reconhecimento de sua receita ocorreria quando do recebimento dos
valores dos fornecedores para o “creditamento” dos pontos/milhas na
conta do participante, ou apenas quando do resgate desses pontos/milhas?
Vejamos esses pontos em maiores detalhes nos próximos itens.

2.1. A atipicidade da atividade desenvolvida pelas empresas gestoras do


programa de fidelização

As controvérsias tributárias existentes no negócio de programas de


fidelização parecem derivar da própria complexidade de se compreender e
identificar a real natureza jurídica das atividades desenvolvidas e dos
negócios jurídicos atrelados a seu modelo de negócios. É preciso, portanto,
refletir se há instituto jurídico que possa suportar, de maneira adequada,
uma definição sobre a natureza de sua atividade. E, para tanto, é necessário
examinar algumas peculiaridades da atividade das gestoras dos programas
de fidelização.

i) As peculiaridades da atividade desenvolvida pelas empresas gestoras

Como mencionado acima, as empresas gestoras surgiram quando se


percebeu que, quanto mais fornecedores envolvidos, mais atrativos se
tornariam os programas de fidelização. Dada a complexidade operacional
de se organizar e gerenciar uma grande quantidade de fornecedores,
provendo bens e serviços para uma ampla gama de consumidores, veio à

976
tona um nicho de mercado que passou a ser explorado por tais empresas
gestoras.

A breve análise da origem dos programas de fidelização e o exame das


etapas envolvidas nesse modelo de negócios já evidenciam que o propósito
das gestoras do programa não é a comercialização de produtos e serviços.
Quem comercializa produtos e serviços e lucra com essa comercialização
são os fornecedores. Apenas os fornecedores têm como propósito a
fidelização dos clientes e o incremento do volume de suas operações
comerciais.

Com efeito, a atividade das empresas gestoras não se confunde com


aquela de natureza comercial característica da transação buscada por seus
consumidores quando do resgate último de seus pontos/milhas. Na etapa
do resgate, as gestoras não adquirem para si os produtos e serviços; não há
efetiva transferência de titularidade/propriedade sobre esses produtos e
serviços, que, contratualmente, devem ser fornecidos diretamente aos seus
consumidores e usuários. Apesar de as gestoras realizarem o pagamento e,
de certa maneira, remunerarem os fornecedores, não parece que possam se
qualificar como as adquirentes dos produtos e nem tomadoras dos
serviços, conforme o caso.

Afastada, assim, sua caracterização como revendedoras de bens e


serviços, é preciso ponderar se as gestoras, então, poderiam ser vistas
como tendo atividade de comercialização de seus próprios pontos/milhas e
se, em caso positivo, haveria um caráter comercial em tal venda.

As gestoras dos programas de fidelização, como visto, têm por


finalidade principal a gestão eficiente dos programas de fidelização, muitas
vezes por meio de plataformas de acúmulo e resgate de pontos e milhas. A

977
administração dessas plataformas e do negócio de fidelização como um
todo exige que tenham relações diretas, de um lado, com os fornecedores
participantes e, de outro, com os consumidores daqueles bens e serviços.
Cabe assim analisar em maiores detalhes essas relações.

Em um primeiro momento, existe uma relação entre as gestoras e os


fornecedores: recebem valores em contrapartida de pontos/milhas que
devem disponibilizar aos consumidores. Esse pagamento que é feito pelos
fornecedores, porém, não remunera qualquer atividade comercial das
gestoras.

Em um ciclo regular de obtenção de pontos/milhas pelo participante e


seu posterior resgate para a aquisição de bens ou serviços, não parece fácil
qualificar a atividade principal de gestoras como “vendas” propriamente
ditas de tais pontos/milhas aos fornecedores, caso em que estariam
auferindo receita nessa suposta “comercialização de pontos/milhas”. Ao
contrário, com base no artigo 481 do Código Civil, parece-nos que o
negócio jurídico de compra e venda envolve a efetiva transferência de
titularidade/propriedade sobre um bem ou direito. Assim, ainda que se
considerem pontos/milhas como bens intangíveis ou direitos imateriais – já
que claramente não se caracterizam como mercadorias –, os fornecedores
não estariam adquirindo os pontos/milhas para si, já que estes se traduzem
em direitos outorgados aos próprios consumidores.

Além disso, não parece adequado afirmar que os fornecedores estariam


remunerando as próprias gestoras pela “venda” de pontos/milhas, já que os
valores pagos às gestoras correspondem ao número de pontos/milhas
atribuídos às aquisições de produtos e serviços pelos consumidores.
Ademais, de forma imediata, as gestoras assumem com os consumidores a
obrigação de pagar os fornecedores quando do resgate, não havendo que se

978
falar em receita de comercialização de pontos/milhas da gestora nesse
momento.

Nesse sentido, é preciso recordar que a receita da gestora deriva da


diferença entre os valores recebidos dos fornecedores e pagos
posteriormente quando do resgate aos demais fornecedores, e, ainda, do
breakage. Dessa forma, a nosso ver, não é possível tratar as gestoras como
revendedoras de produtos e serviços e nem como comerciantes de
pontos/milhas. Resta avaliar se poderiam eventualmente ser vistas como se
estivessem prestando algum serviço nessa cadeia.

Em princípio, parece-nos que a mera disponibilização de pontos/milhas


na conta dos consumidores não corresponde a qualquer tipo de serviço
prestado pelas gestoras; ao contrário, estas apenas assumem a obrigação de
gerenciar seu acúmulo e eventual resgate, tendo o dever de garantir que os
consumidores sejam providos com os novos produtos e serviços
resgatados. Assim, ainda que haja uma relação entre gestoras e
fornecedores, envolvendo, simultaneamente, os consumidores, é possível
argumentar que não há propriamente um serviço prestado em tal situação.

A etapa do resgate de pontos/milhas, por sua vez, também não se


caracteriza necessariamente como um serviço prestado. Embora as
gestoras assumam o dever de proporcionar a troca dos pontos/milhas por
novos produtos e serviços, quem fornece os produtos e presta os serviços
são os fornecedores, de modo que a obrigação das gestoras seria a de
simplesmente possibilitar o resgate.

Ao desenvolver sua atividade, é bem verdade que as empresas gestoras


beneficiam ambas as partes – fornecedor e consumidor –, ao proporcionar,
mediante a gestão do programa, a fidelização dos consumidores almejada

979
pelos fornecedores e os benefícios decorrentes da possibilidade de
acúmulo e resgate de pontos e milhas aos clientes, facilitando assim o
acesso a toda a gama de produtos e serviços oferecidos pelos fornecedores.

A atividade de gestão do programa de fidelização, portanto, parece


poder ser definida como atípica, e, como o setor de fidelização não é
regulamentado no Brasil, na realidade não parece existir uma definição
própria a respeito da natureza jurídica da atividade desenvolvida pelas
empresas gestoras. A ausência dessa definição, porém, não autoriza que a
sua atividade seja automaticamente equiparada à compra e venda ou à
prestação de serviços.

ii) O ICMS e o ISS

Existe hoje grande polêmica envolvendo a tributação no caso das


empresas gestoras, em especial, envolvendo o conflito entre o ICMS e o
ISS.

É relevante destacar que esse conflito, na realidade, decorre da própria


atribuição de competências outorgadas aos entes federados: a competência
dos Municípios para cobrar ISS é restrita à taxatividade fechada da lista de
serviços, de modo que os Municípios só podem cobrar o imposto sobre os
serviços que estão ali expressamente previstos e não podem exigir ISS
sobre atividades sujeitas ao âmbito do ICMS. Essa repartição gera uma
constante disputa entre Estados e Municípios. Os programas de fidelização
acabam sendo objeto de uma dessas disputas.

De um lado, os Municípios têm, em regra, interesse em sustentar a


posição de que empresas gestoras prestam serviços e devem recolher ISS
sobre suas receitas, enquanto os Estados, privados mais que nunca de
recursos, tendem a argumentar que as gestoras seriam meras revendedoras

980
de produtos, devendo recolher o ICMS em suas operações. Dada a
atipicidade da atividade desempenhada pelas empresas gestoras, porém,
parece-nos a princípio que nem os Estados nem os Municípios teriam
competência para tributar a sua receita. Vejamos.

Em relação ao ICMS, cumpre observar que esse imposto pressupõe a


existência de operação de circulação de mercadorias, com transferência de
titularidade e com nítido intuito mercantil, nos termos do artigo 155, II, da
Constituição Federal. No caso, porém, é certo que as gestoras não têm
como propósito realizar operações de circulação de mercadorias.
Primeiramente porque, como visto, não comercializam elas mesmas aos
consumidores os produtos e serviços, os quais são providos diretamente
pelos fornecedores participantes do programa.

Dessa forma, as gestoras não estariam sujeitas ao ICMS, não tendo a


obrigação de emitir nota fiscal de venda de produtos ou serviços aos
consumidores ou aos fornecedores. Na primeira etapa – quando da
primeira compra de bens ou serviços que gera o acúmulo de milhas ao
consumidor – os fornecedores deveriam emitir notas fiscais de venda ou
prestação de serviço contra esses consumidores. Na segunda etapa –
relativa ao resgate dos pontos/milhas –, mesmo que os fornecedores na
prática eventualmente emitam notas fiscais contra as gestoras dos
programas – o que não deveria ser o caso –, tais documentos não teriam o
condão de caracterizá-las como revendedoras dos produtos e serviços
resgatados pelos consumidores. Idealmente, na segunda etapa, os
fornecedores deveriam emitir notas fiscais diretamente contra os
consumidores, ainda que, em termos de fluxo financeiro, estes recebam os
valores das gestoras, e não dos consumidores.

981
Ademais, como discutido acima, as gestoras não comercializam os
pontos/milhas. Na realidade, para fins de incidência do ICMS, é certo que
os pontos e milhas não seriam “mercadorias” propriamente ditas (mas sim
direitos imateriais). Mas, ainda que o fossem, não haveria circulação
econômica com intuito comercial e lucrativo, já que as gestoras assumem
apenas o dever de disponibilizar os pontos/milhas na conta dos
consumidores. Além disso, mesmo que os pontos e milhas sejam
entendidos como mercadorias, sua “venda” não implicaria qualquer
utilidade aos compradores, no caso, os fornecedores, já que os pontos e
milhas somente se tornam “consumíveis” para fins do resgate pelos
consumidores. Portanto também não seria factível, em nosso
entendimento, que as gestoras emitissem nota fiscal de venda de
pontos/milhas, sujeitando o valor recebido dos fornecedores como se fosse
preço de venda.

Em relação ao ISS, é preciso pontuar que esse tributo incide, nos termos
do artigo 156, III, da Constituição Federal, sobre serviços de qualquer
natureza, desde que definidos em lei complementar e que não estejam
compreendidos no campo de incidência do ICMS.

Na linha do acima comentado, a princípio parece que as gestoras


poderiam ser vistas como não realizando propriamente um serviço no
contexto de sua atividade de gestão dos programas de fidelização. Assim,
parece-nos que os Municípios também não estariam aptos a cobrar tal
imposto municipal, por inexistir serviço especificamente prestado pela
empresa gestora. Contudo, na prática, pode-se verificar que os Municípios
têm alegado que as gestoras realizariam uma espécie de serviço de
intermediação, ao administrar os programas de fidelização.

982
A esse respeito, vale mencionar que, durante muitos anos, a prestação
de serviço esteve associada a uma obrigação de fazer, ou seja, à
disponibilização de um bem imaterial produzido mediante o esforço
humano, físico ou intelectual250. Essa contraposição entre obrigação de
fazer e obrigação de dar era utilizada com frequência para identificar se
haveria prestação de serviço ou não e para dirimir conflitos de
competência entre ICMS e ISS.

Ao longo do tempo, é verdade que, em especial com o surgimento de


novas tecnologias, a premissa de que só haveria prestação de serviço se
houvesse obrigação de fazer foi sendo superada, em especial no âmbito da
jurisprudência251 e inclusive pelo fato de que vários itens classificados
como serviços na lista anexa da Lei Complementar n. 116/2003 claramente
não correspondem a obrigações de fazer – como é o caso do item 1.05, que
envolve o licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de
computação, e do item 17.08, que trata do serviço de franquia.

O atual conceito de serviço está mais relacionado à identificação do seu


conteúdo econômico do que com eventual obrigação de fazer, isto é, se
determinada atividade implicar utilidade econômica a outro, a princípio,
seria passível de tributação – desde que esteja prevista da lista de serviços.

Assim, muito embora as gestoras não realizem propriamente uma


obrigação de fazer, já que não há qualquer bem imaterial produzido
mediante esforço, isso não afasta, necessariamente, a caracterização da sua
atividade como serviço.

Nesse sentido, seria até possível superar o fato de que não seria
obrigatória a existência de uma obrigação de fazer para que seja
caracterizada a prestação de serviço, mas continua sendo indispensável que

983
o serviço esteja previsto, de forma específica, na lista anexa da Lei
Complementar n. 116/2003, conforme determinado na própria
Constituição Federal.

Frise-se que, a despeito da evolução da jurisprudência quanto ao


conceito – agora mais elástico – de obrigação de fazer, o entendimento
pacificado do Supremo Tribunal Federal252 é no sentido de que apenas os
serviços expressamente indicados na lista anexa podem ser tributados pelo
ISS, em razão da mencionada taxatividade fechada da lista. Muito embora
a taxatividade tenha sido, em determinados casos, objeto de
questionamento e alguns precedentes tenham adotado na prática uma
interpretação mais extensiva, a fim de equiparar a serviços tributáveis pelo
ISS certas atividades que não estejam expressamente previstas na lista, a
orientação firmada pelo Supremo deve prevalecer.

Diante disso, no atual cenário, temos que toda atividade passível de


tributação pelo imposto deve constar, de forma específica, como “serviço”
na lista da Lei Complementar n. 116/2003, ainda que não implique,
necessariamente, uma obrigação de fazer.

Tanto é assim que, recentemente, várias atividades que não envolvem


obrigações de fazer foram incluídas como serviços pela Lei Complementar
n. 157/2017 na lista anexa justamente para legitimar a cobrança do ISS: é o
caso do item 1.03, que trata de processamento, armazenamento ou
hospedagem de dados, textos, imagens, vídeos, páginas eletrônicas,
aplicativos e sistemas de informação; do item 1.04, que diz respeito à
elaboração de programas de computadores, inclusive de jogos eletrônicos,
independentemente da arquitetura construtiva da máquina em que o
programa será executado, incluindo tablets, smartphones e congêneres; do
item 1.09, que cuida da disponibilização, sem cessão definitiva, de

984
conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet; e, ainda,
do item 17.25, que se refere à inserção de textos, desenhos e outros
materiais de propaganda e publicidade, em qualquer meio.

Em razão disso, é preciso ponderar se, mesmo não havendo obrigação


de fazer, a atividade desenvolvida pelas gestoras dos programas de
fidelização poderia ser enquadrada em um dos itens da lista anexa de
serviços. Note-se que existe um código CNAE bastante específico e
adequado à atividade das gestoras – qual seja, “serviços de intermediação
na compra e venda de pontos ou milhas ou similares adquiridos em
programas de fidelização, relacionamentos” (item 8299-7/99). Contudo,
atualmente, na lista anexa de serviços da Lei Complementar n. 116/2003,
não há correspondência com esse código CNAE e inexiste um item
específico de intermediação que cuide dessa atividade em particular.

No entanto, como visto, os Municípios têm tentado equiparar a


atividade desenvolvida pelas gestoras ao serviço mais genérico de
intermediação, previsto no item 10.05: “agenciamento, corretagem ou
intermediação de bens móveis ou imóveis, não abrangidos em outros itens
ou subitens, inclusive aqueles realizados no âmbito de Bolsas de
Mercadorias e Futuros, por quaisquer meios”.

Cumpre observar que a intermediação nada mais é do que a


“aproximação entre duas ou mais pessoas que desejem negociar”253. Nesse
sentido, pode-se questionar se as gestoras de um programa de fidelização
de coalizão, ao administrarem os programas, intermediariam os
fornecedores e os consumidores. Ou seja, haveria realmente um serviço de
intermediação envolvido? Quem seriam os tomadores desse serviço? Ou,
ainda, quem remuneraria as gestoras?

985
Primeiramente, em nosso entendimento, as gestoras não intermedeiam
relações entre fornecedores e consumidores: elas não unem as partes e as
colocam em contato direto, permitindo uma interação imediata.
Diferentemente de agências de viagens, agências de publicidade,
corretoras de imóveis, entre outras empresas que se dedicam a atividades
de intermediação, em nossa visão, as gestoras dos programas de
fidelização não atuam com o propósito de aproximar as partes envolvidas,
sendo remuneradas por uma das partes em razão justamente dessa
aproximação. No caso, elas têm como finalidade estruturar uma ampla
rede em que está inserido o maior número possível de fornecedores e
consumidores e fazer que a gestão do programa seja o mais eficiente para
que a diferença entre os valores pagos pelos fornecedores pelos pontos e
milhas e os valores de troca desses pontos e milhas seja interessante.

Segundo, é preciso reconhecer que as gestoras não são comissionadas:


não auferem remuneração por serviços prestados em sua operação. Sua
receita principal não provém exclusivamente dos fornecedores e nem dos
consumidores, mas sim da troca de pontos e milhas, ou seja, do spread e
também do breakage. Assim, questiona-se a ideia de que gestoras
deveriam emitir nota fiscal de serviço de intermediação, se não são
remuneradas por nenhuma das partes, mas auferem receita no âmbito da
sua operação em si.

Dessa maneira, a nosso ver, a tentativa de equiparação da atividade das


gestoras de programas de fidelização ao serviço de intermediação não
deveria ser admitida, em especial porque a legislação não autoriza
qualquer equiparação: a sujeição de determinada atividade ao ISS
demanda previsão legal expressa na lista de serviços.

986
A despeito disso, vale mencionar que, em 2012, o Município de São
Paulo, por meio da Solução de Consulta SF/DEJUG n. 8 (Solução de
Consulta n. 8/12), analisou a atividade desenvolvida por empresa
responsável pela gestão de programa de fidelização e, na ocasião,
manifestou-se no sentido de que a gestora deveria reconhecer sua receita
no item 17.06 da lista de serviços como “propaganda e publicidade,
inclusive promoção de vendas, planejamento de campanhas ou sistemas de
publicidade, elaboração de desenhos, textos e demais materiais
publicitários”.

Note-se que o programa de fidelização em questão era classificado


como “cashback”, em que o consumidor recebia de volta, em dinheiro,
parte do montante gasto na aquisição de produtos e serviços.
Diferentemente de outros programas de fidelização, a gestora é
remunerada mediante comissões de venda pelos fornecedores
participantes, auferindo ainda uma receita decorrente das mensalidades
pagas pelos consumidores para fazer parte do programa.

O caso da empresa envolvida na Solução de Consulta n. 8/12 é bastante


específico, e, dadas as suas peculiaridades, o Fisco Municipal acabou
entendendo que a empresa seria remunerada pela propaganda realizada ao
divulgar as marcas dos fornecedores em seu website.

Em 2016, o Fisco de São Paulo editou a Solução de Consulta


SF/DEJUG n. 22 (Solução de Consulta n. 22/16). A empresa foi indicada
como “prestadora de serviços de intermediação comercial na venda de
produtos de terceiros, promovendo a intermediação entre
anunciantes/vendedores e consumidores/compradores mediante a
divulgação do produto a ser vendido em seu sítio virtual na rede mundial
de computadores”. O Fisco entendeu de fato se tratar de atividade

987
caracterizada como intermediação no item 10.05 da lista de serviços,
como, aliás, havia sido indicado pela própria consulente.

Mais recentemente, em 2017, na Solução de Consulta SF/DEJUG n. 1,


o Fisco de São Paulo examinou caso envolvendo empresa que realiza a
venda de cartões-presente para empresas presentearem funcionários ou
terceiros. O Fisco também entendeu se tratar de atividade de
intermediação, destacando que a empresa deveria submeter à tributação
pelo ISS as comissões recebidas dos fornecedores participantes, bem como
as eventuais diferenças positivas entre os valores pagos pelos clientes pela
aquisição dos cartões e os valores pagos aos fornecedores pelos resgates e
também as eventuais receitas quando não há quaisquer resgates pelos
presentados.

Muito embora essas manifestações não tratem, de forma profunda, das


atividades desenvolvidas por empresas gestores em programas de
fidelização de coalização, e não as examinem, na prática, parece-nos que
existe risco efetivo de os Municípios tentarem cobrar o ISS sobre a receita
auferida, muito embora, como visto, tal cobrança só possa ser legitimada
mediante a inserção de um item específico na lista anexa de serviços.

Dessa forma, para fins tributários, parece-nos possível construir um


cenário em que, do modo como atualmente articulada a legislação
aplicável, as gestoras dos programas de fidelização deveriam atualmente
tributar suas receitas – spread e eventual breakage – apenas considerando
os tributos federais, quais sejam, PIS/COFINS (alíquota conjunta de 9,25%
na sistemática não cumulativa), e IRPJ/CSL (alíquota conjunta de 34%),
não se sujeitando ao ICMS, por não haver efetiva comercialização de bens,
nem ao ISS, dada a ausência de item específico na lista anexa de serviços
que cuide da atividade desenvolvida.

988
2.2. O momento do reconhecimento da receita auferida pela empresa gestora
do programa de fidelização para fins de tributação do PIS/COFINS

Outro aspecto polêmico envolvendo a tributação das gestoras de


programas de fidelização diz respeito ao momento da tributação sobre a
receita auferida, especificamente, para fins de incidência do PIS/COFINS.

De acordo com o regime de competência, as receitas devem ser


reconhecidas, para efeitos de tributação, a partir do momento em que nasce
o direito ao seu recebimento, independentemente de sua efetiva quitação.

Vale repisar, como discutido acima, que a receita auferida pelas


gestoras provém do spread e do breakage. Assim, conclui-se que, quando
recebem os valores dos fornecedores para disponibilizar os pontos/milhas
nas contas dos consumidores, as gestoras não contabilizam ainda uma
receita correspondente à totalidade dos recursos recebidos dos
fornecedores, já que assumem, também e imediatamente, o dever de
honrar os valores devidos aos fornecedores quando do resgate pelos
consumidores, obrigando-se perante os consumidores a garantir que os
fornecedores entreguem/forneçam os novos produtos e serviços
resgatados.

Assim, nessa primeira etapa, as gestoras ainda não têm certeza se os


consumidores vão ou não resgatar seus pontos/milhas e por quais
benefícios vão optar quando do resgate. Nesse momento, portanto, parece-
nos que não caberia qualquer reconhecimento de receita pelas gestoras,
porque elas simplesmente não têm ainda o direito de incorporar tais
valores ao seu próprio patrimônio. Somente terão certeza de sua receita na
etapa seguinte, quando do resgate ou da expiração dos pontos/milhas.

989
Nesse contexto, é importante esclarecer que a natureza dos pagamentos
efetuados aos fornecedores quando do resgate não consiste em custo das
gestoras, uma vez que estas últimas não realizam a aquisição e revenda de
produtos e serviços em nome próprio, nem prestam quaisquer serviços,
como discutido acima.

Note-se que conceito de custo abarca as despesas básicas da empresa,


necessárias à manutenção da atividade e comercialização. Tecnicamente, o
conceito de custo não se confunde com o conceito de despesa: despesa
implica o emprego de recursos para a obtenção de algo que não deve
permanecer no ativo da empresa, recursos que são subtraídos do seu
patrimônio. Diferentemente, o conceito de custo refere-se à utilização de
recursos para aquisição ou obtenção de determinado bem ou direito. Custo
não implica redução do patrimônio, pois os recursos gastos são
substituídos com o bem ou direito adquirido.

Não podem ser caracterizados como custos nem como despesas os


valores referentes aos pagamentos efetuados aos fornecedores em relação
aos produtos e serviços que serão providos aos consumidores, uma vez que
tais montantes não correspondem a insumos, ativos, bens ou direitos
adquiridos pelas empresas gestoras, necessários ao desenvolvimento de
suas atividades operacionais.

Parece, portanto, que as gestoras não podem tratar como custos ou


despesas os valores remetidos aos fornecedores porque, na realidade, no
contexto dos programas de fidelização, estão apenas coordenando o fluxo
financeiro entre os fornecedores e os consumidores participantes, sendo
responsáveis por repassar os valores entre as partes. Como as gestoras
receberam os valores dos participantes, mas assumiram a obrigação de
disponibilizar os respectivos pontos/milhas e a obrigação de garantir a

990
entrega/fornecimento dos benefícios (novos produtos e serviços) quando
do resgate, estão apenas repassando os valores que foram pagos pelos
próprios fornecedores para garantir que os seus consumidores possam
escolher quais produtos e serviços querem resgatar.

Na prática, verifica-se que as gestoras reconhecem os valores recebidos


dos fornecedores na primeira etapa como “receita diferida” no passivo
circulante (em contrapartida de “contas a receber”) e, à medida que os
pontos/milhas sejam resgatados ou expirem, os respectivos montantes são
registrados como receita própria e, nesse momento, oferecidos à tributação
(os valores são baixados da conta “receita diferida” contra o resultado254).

O Fisco, porém, já discordou desse tratamento. A polêmica envolvendo


a tributação pode ser sintetizada no caso da MULTIPLUS. No passado, a
empresa foi autuada pelo Fisco por ter recolhido PIS/COFINS
supostamente a menor no ano de 2012. O Fisco entendeu que a empresa
deveria reconhecer a receita com a “venda de pontos e milhas” quando os
fornecedores realizam o pagamento, e não quando os clientes resgatam os
pontos/milhas. Diferentemente, e como mencionado, no momento inicial a
empresa reconhece tais valores como receita diferida e somente oferece à
tributação o saldo quando os pontos e milhas são resgatados ou expiram.

O principal argumento do Fisco foi no sentido de que a MULTIPLUS


realizaria a “venda” de pontos/milhas aos fornecedores, devendo
reconhecer a receita correspondente nesse momento, e, posteriormente,
realizaria a aquisição e a revenda de produtos e serviços aos consumidores.
O Fisco entendeu que seriam duas operações jurídicas distintas que
deveriam sofrer os respectivos reflexos tributários de forma independente.

991
Por sua vez, a empresa defendeu que, quando recebe os valores
correspondentes aos pontos/milhas dos fornecedores, assume o dever
contratual de liquidar obrigações futuras perante os consumidores em
nome dos fornecedores participantes do programa, o que se caracterizaria,
a princípio, como assunção de dívida. A sua receita própria somente se
concretiza quando o consumidor de fato resgatar seus pontos/milhas, o que
é incerto; inclusive, essa incerteza se reflete no fato de que muitas vezes os
pontos/milhas expiram e também no fato de que ocasionalmente seu
spread pode até ser negativo (no caso de passagens internacionais
resgatadas pelos consumidores, por exemplo, que custam mais do que os
montantes originalmente recebidos dos fornecedores).

É importante mencionar que, no caso comentado, a MULTIPLUS fez


questão de esclarecer que não consistia em empresa comercial e que não
havia propriamente “venda de pontos e milhas” e nem “compra e revenda
aos consumidores”, porque essas eram meramente atividades-meio para
que ela pudesse atingir a atividade-fim, que era a administração e o
gerenciamento do programa de fidelização.

Em 2017, por maioria de votos, o CARF cancelou a autuação255. De


acordo com o voto do Relator, o entendimento que prevaleceu foi no
sentido de que os valores recebidos dos fornecedores para disponibilização
dos pontos na conta dos consumidores não seriam receita efetiva da
empresa, pois nesse momento já surge a obrigação da gestora de assumir
as despesas financeiras do resgate de pontos pelos consumidores. Como
não há como antecipar o montante das despesas financeiras futuras dos
demais fornecedores, a receita somente deverá ser auferida e tributada
quando houver certeza quanto ao resgate e seu valor ou quanto à
expiração.

992
3. CONCLUSÕES E ALTERNATIVAS QUANTO AOS DESAFIOS
LEGISLATIVOS

Como visto, há uma série de controvérsias tributárias envolvendo os


programas de fidelização. A presente análise foi voltada às empresas que
administram esses programas, mas existem outras várias polêmicas para as
demais empresas que participam dos programas. Por exemplo: Os
pontos/milhas representariam moedas eletrônicas? Ou moedas virtuais?
Deveriam ser tratados como arranjos de pagamento? Nesse caso, haveria
necessidade de os consumidores reconhecerem os pontos e milhas como
bens e direitos para fins de IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física)?
Como os fornecedores que prestam serviços e entregam produtos por
ocasião do resgate deveriam tratar tais operações? Haveria incidência de
ICMS? Seriam brindes?

Todas essas controvérsias decorrem da falta de regulamentação legal


dos programas de fidelização. Como o nosso sistema tributário está
baseado no princípio de legalidade tributária, fundado na segurança
jurídica, e tendo em vista o nosso modelo federalista de repartição de
competências tributárias, hoje temos um cenário no qual as empresas
envolvidas nos programas de fidelização inevitavelmente lidam com
instabilidade no que tange à tributação e, pior, acabam sendo arrastadas
para disputas de competência entre entes, como ocorre com o ISS e ICMS.

Atualmente, tramita no Congresso Nacional uma série de Projetos de


Lei que pretendem regulamentar os programas de fidelização256. A maioria
dos Projetos, porém, está mais direcionada aos consumidores, sob o ponto
de vista do Direito do Consumidor, do que à criação de um marco de
regulamentação legal que defina a natureza jurídica das operações
envolvidas e possa, então, subsidiar uma discussão tributária a respeito.

993
Enquanto não tivermos uma regulamentação mais precisa, as empresas
que atuam nesse segmento de programas de fidelização vão continuar a
operar em um ambiente de insegurança jurídica, sujeitas a potenciais
questionamentos por parte dos Fiscos federal, estadual e municipal.

Ao mesmo tempo, é preciso ponderar que novas tecnologias e


diferentes formas de negócios surgem a cada momento, de forma que, no
fundo, é inevitável que haja lacunas na regulamentação e que várias
situações fiquem sem resposta, mesmo com uma legislação mais completa
do que a que temos hoje.

Isso não significa, porém, que seria dispensável qualquer


regulamentação mais precisa: pelo contrário, se ao menos existisse uma
base legal, outras hipóteses mais complexas seriam certamente objeto de
discussão, mas os critérios e parâmetros fixados serviriam para guiar as
futuras discussões.

Assim, idealmente, seria importante uma regulamentação em nível


federal que reconheça, em especial para as empresas gestoras dos
programas, que a sua atividade não deveria ser equiparada à compra e
revenda de bens ou à prestação de serviços.

Enquanto essa regulamentação não vem, cabe ao Fisco uma atuação


consciente e responsável: se os contribuintes têm o dever de pagar tributos,
as Autoridades também têm o dever de explicar as regras do jogo e
garantir um mínimo de estabilidade aos contribuintes. A jurisprudência,
como o CARF vem fazendo, no âmbito de sua competência, também tem o
dever de analisar com atenção o contexto dos programas de fidelização e
suas características em cada caso específico e fixar premissas que possam
servir como paradigmas para outros casos.

994
Tributação das Aplicações Over-The-Top no
Brasil: visão geral e análise das atividades de
transmissão de conteúdo audiovisual, envio
de mensagens e realização de chamadas de
voz por meio da internet
257
Ricardo Augusto Alves dos Santos

1. INTRODUÇÃO

Em seu livro A Galáxia da Internet, publicado no já distante ano de


2001, o sociólogo espanhol Manuel Castells afirma que a internet é a base
tecnológica para a formação da Era da Informação, por meio da qual nos
tornamos habitantes de uma rede global. Segundo o autor, no final do
século XX, três processos se uniram, inaugurando essa nova estrutura
social: as exigências da economia por flexibilidade administrativa e
globalização de capital, da produção e do comércio; as demandas da
sociedade por liberdade e comunicação aberta; e os avanços
extraordinários da computação e das telecomunicações. Sob essas
condições, a internet tornou-se a alavanca na transição para essa nova
forma de sociedade, o que permitiria o surgimento de uma nova economia.

Essa nova economia, dizia Castells àquela época, seria fundada em um


potencial sem precedentes de crescimento de produtividade em
decorrência das mais variadas formas de uso da internet por todo tipo de
empresa em todo tipo de operação, o que culminaria em um novo mundo
dos negócios258.

Hoje, essa nova economia tornou-se uma realidade: a Economia Digital.


Nesse novo mundo dos negócios, diversas transações econômicas são

995
desenvolvidas inteiramente pela internet e o fornecimento de bens e
serviços ocorre exclusivamente em ambiente virtual.

No contexto da Economia Digital, exercem papel central os formatos de


negócios baseados na oferta de bens, serviços e conteúdo, os quais são
disponibilizados por provedores especializados integralmente por meio da
internet aos seus usuários finais. Costuma-se denominar essas
funcionalidades ofertadas por meio da internet como Aplicações Over-
The-Top (Aplicações OTT259).

No presente trabalho, apresentaremos uma visão geral sobre a


tributação das Aplicações OTT no Brasil e, além disso, analisaremos os
impostos incidentes sobre as atividades de transmissão de conteúdo
audiovisual e de envio de mensagens e realização de chamadas de voz por
meio da internet.

É importante ressaltar que, em nosso país, o avanço da computação


sempre esteve intimamente ligado ao Direito Tributário. Com efeito, a
entrada do Brasil na era do processamento eletrônico de dados foi iniciada
nos anos 196٠, com a importação dos primeiros computadores pelo
Ministério da Fazenda, destinados a melhorar a eficiência na arrecadação
de tributos, especificamente do imposto de renda.

Esses computadores eram utilizados pelos técnicos lotados no Serviço


Federal de Processamento de Dados, criado pela Lei n. 4.516, de 1964,
cujo objetivo era executar, por meio de processos eletromecânicos ou
eletrônicos, todos os serviços de processamento de dados e tratamento de
informações necessários aos órgãos do Ministério da Fazenda260.

996
Nessa perspectiva, é possível afirmar que a expansão da internet no país
contribuiu, de um lado, para o aprimoramento da administração tributária
e, de outro, para a formatação de novos modelos de negócios executados
integralmente em ambiente digital.

Com base nessa premissa, passamos a analisar a tributação das


Aplicações OTT no Brasil, firmes no entendimento de que o Direito
Tributário é indissociável dos avanços sociais e econômicos
proporcionados pela internet.

2. DELIMITAÇÃO DO CONCEITO DE APLICAÇÕES OTT

Usualmente, são denominadas como “Aplicações OTT” as


funcionalidades fornecidas aos usuários finais por meio da internet por
provedores especializados. Sendo assim, o uso corrente da expressão
Aplicações OTT está relacionado a uma ampla gama de bens, serviços e
conteúdo ofertada exclusivamente em ambiente digital.

As Aplicações OTT, vale destacar ainda, são funcionalidades


autônomas e que não se confundem com os serviços de conexão à internet
e tampouco com os serviços de telecomunicações que dão suporte para
essa conexão à internet.

De acordo com o Órgão de Reguladores Europeus para as


Comunicações Eletrônicas (BEREC), entidade ligada à União Europeia e
que busca a disseminação de boas práticas regulatórias no setor de
telecomunicações e de radiodifusão, as Aplicações OTT englobam
qualquer conteúdo ou serviço (ou seja, qualquer coisa) fornecido ao
usuário final por meio da internet, geralmente sem o envolvimento do
provedor de acesso à internet no controle e distribuição dessas
funcionalidades261. Para essa entidade, as Aplicações OTT devem ser

997
qualificadas de acordo com a atividade desempenhada por seus
provedores, enquadrando-se como serviços de comunicação apenas
aquelas funcionalidades em que os provedores especializados se
responsabilizem pela transmissão do conteúdo aos usuários (como é o caso
dos serviços de VoIP262 que permitem a realização de chamadas, a partir de
um computador, destinadas a terminais ligados à rede pública de
telefonia).

Já para a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento


Econômico (OCDE), as Aplicações OTT consistem em serviços
especializados por meio dos quais podem ser entregues aos usuários finais
serviços e conteúdo por meio da internet, por meio de redes ultrarrápidas
de acesso e de forma segregada ao tráfego de internet propriamente dito.
De acordo com os critérios adotados pela OCDE, as Aplicações OTT
devem ser categorizadas em conformidade com o conteúdo ofertado aos
usuários, qualificando-se como serviços de comunicação os aplicativos de
comunicação em tempo real entre usuários e os serviços de streaming de
música e vídeo, por possibilitarem aos usuários as mesmas funcionalidades
que os serviços de telecomunicação tradicionais263.

No Brasil, a Lei n. 12.965, de 2014, que instituiu o Marco Civil da


Internet no país, define as aplicações de internet como “o conjunto de
funcionalidades que podem ser acessadas por meio de um terminal
conectado à internet”. Em uma primeira aproximação, a abrangência dessa
definição parece indicar que as Aplicações OTT devam ser classificadas
como uma espécie das aplicações de internet prevista na referida lei. O
fato, porém, é que não temos, até o momento, qualquer ato normativo em
nosso ordenamento jurídico, seja para fins tributários seja para

998
regulatórios, que trate especificamente sobre a definição e o
enquadramento legal das Aplicações OTT.

Diante desse contexto, verifica-se que, apesar de haver algum consenso


em torno do conceito ordinário das Aplicações OTT, diferentes critérios
têm sido adotados por organismos internacionais para a classificação
dessas funcionalidades, sob o ponto de vista das práticas regulatórias da
atividade desempenhada pelos provedores especializados na oferta de
Aplicações OTT, o que reflete diretamente em seu enquadramento como
uma espécie de serviço de comunicação ou, em vez disso, como um
serviço de natureza diversa.

No presente artigo, buscamos construir um significado para o termo


“Aplicações OTT” que esteja em conformidade com o nosso sistema
positivo tributário.

3. INTERPRETAÇÃO DINÂMICA DA LEI TRIBUTÁRIA

À época da promulgação da Constituição Federal, em 1988, o


constituinte não poderia vislumbrar a oferta de bens, serviços e conteúdo
variados por fornecedores especializados por meio da internet, vez que
esse fenômeno econômico sequer existia naquele momento histórico. Em
razão disso, a discussão acerca da incidência, ou não, dos impostos sobre o
consumo elencados na Constituição sobre o provimento das Aplicações
OTT depende, fundamentalmente, da opção pelo intérprete em adotar a
corrente doutrinária que prega a interpretação estática das normas
constitucionais ou, em vez disso, da corrente que defende a interpretação
dinâmica das normas constitucionais.

Ao se filiar à interpretação estática, adota-se a premissa de que a


Constituição fixa conceitos originais e imutáveis ao longo do tempo e daí

999
se conclui pela impossibilidade de tributação das Aplicações OTT, visto
que tais funcionalidades não se caracterizam como mercadoria e tampouco
como serviços, segundo os sentidos originais dessas expressões previstos
na Constituição à época de sua promulgação.

Por outro lado, ao se adotar a interpretação dinâmica, parte-se da


premissa de que as normas constitucionais devem se adaptar à realidade
social e à evolução dos fenômenos econômicos, pelo que se chega à
conclusão de que as Aplicações OTT podem, em princípio, enquadrar-se
nas categorias de mercadorias ou de serviços sujeitas à incidência dos
impostos elencados na Constituição.

Para justificar a não tributação das Aplicações OTT, os adeptos da


intepretação estática valem-se de argumentos eminentemente históricos,
segundo os quais os conceitos utilizados pelo constituinte são inalteráveis.
De modo diverso, os seguidores da intepretação dinâmica justificam a
possiblidade de tributação das Aplicações OTT com o emprego de
argumentos de ordem linguística (ou sistêmica), segundo os quais os
significados dos dispositivos constitucionais devem ser qualificados de
acordo com a linguagem ordinária e técnica em vigor no momento da
aplicação da lei, devendo o ordenamento jurídico evoluir juntamente com
a realidade social por ele regulada.

Essa disparidade de conclusões se deve ao fato de que, a partir de um


mesmo texto normativo, é possível construir normas jurídicas diferentes e
muitas vezes antagônicas, todas baseadas em um raciocínio logicamente
estruturado e justificadas por argumentos que fundamentam as premissas
utilizadas para a interpretação.

1000
Diante disso, como é possível identificar a interpretação jurídica mais
adequada para determinado texto normativo? A resposta é a valoração dos
argumentos em face dos princípios constitucionais, tendo em vista que, ao
se valorar e sopesar argumentos que apontam em direções opostas, é
preciso que se dê prevalência àqueles que estejam em maior consonância
com os princípios constitucionais axiologicamente subjacentes ao
dispositivo interpretado264.

No que tange à discussão sobre a tributação das Aplicações OTT no


Brasil, pode-se afirmar que os argumentos que fundamentam a
interpretação dinâmica devem prevalecer, pois são eles os que melhor se
coadunam ao princípio da igualdade tributária. Com efeito, essa
interpretação se baseia em uma perspectiva evolutiva dos enunciados
normativos, segundo a qual a construção da norma jurídica deve ser
pautada pela linguagem em vigor no momento da interpretação ou da
aplicação da lei.

A questão central, aqui, é que o tratamento diferenciado entre os


contribuintes somente pode ser considerado válido, em face do princípio
da igualdade tributária, se fundamentado em critérios objetivos e aferíveis
no plano concreto. É essencial, dessa forma, que a medida de comparação
entre os contribuintes esteja vinculada sempre à realidade, ou seja, decorra
de uma diferença existente no plano concreto, e não em função de
situações hipotéticas previstas na lei tributária265.

A título ilustrativo, consideremos o exemplo das Aplicações OTT de


transferência eletrônica de bens em formato digital via download (como é
o caso dos jogos eletrônicos266). Uma eventual distinção de tratamento
tributário entre os bens em formato físico e os digitais somente poderia ser
considerada legítima com base nos argumentos históricos, que

1001
fundamentam a interpretação estática. Essa forma de interpretação,
contudo, não deve prosperar, pois viola o princípio da igualdade tributária,
na medida em que não se pode alegar que as atividades de comercialização
de mercadorias em formato físico ou digital sejam fenômenos econômicos
tão distintos a ponto de justificar o tratamento tributário diferenciado entre
os contribuintes que se dedicam a esses negócios.

Isto posto, esclarecemos que, no presente trabalho, adota-se a corrente


da interpretação dinâmica das normas tributárias, tendo em vista que, a
nosso ver, os argumentos que privilegiam a construção do significado dos
textos normativos de acordo com a linguagem em vigor no momento da
aplicação da lei, e não à época de sua promulgação, estão em maior
consonância com o princípio da igualdade tributária.

4. VISÃO GERAL SOBRE A TRIBUTAÇÃO DAS APLICAÇÕES OTT NO


BRASIL

Como já mencionado, as Aplicações OTT consistem na oferta por


provedores especializados de um amplo leque de funcionalidades por meio
da internet. Pode-se afirmar, dessa forma, que os provedores de Aplicações
OTT promovem, sob o ponto de vista jurídico, atividade econômica de
produção e circulação de bens e serviços267. Em vista disso, a oferta de
Aplicações de OTT está sujeita, em princípio, ao campo de incidência dos
tributos sobre o consumo elencados na Constituição, ou seja, àqueles
tributos incidentes sobre a circulação de bens e serviços e que admitem o
repasse da carga fiscal ao consumidor final (i.e., o “contribuinte de fato”).

Vale observar, nesse contexto, que a Constituição Federal elenca os


seguintes impostos sobre o consumo: (a) ICMS-Mercadoria, que incide
sobre a circulação de mercadorias; (b) ICMS-Comunicação, que repercute
sobre a prestação de serviços de comunicação; (c) IPI, incidente sobre a

1002
circulação de produtos industrializados; (d) IOF, que se aplica aos serviços
financeiros e securitários; e, por fim, (e) ISS, que incide sobre os serviços
de qualquer natureza268.

Ao discriminar as competências tributárias para instituição e cobrança


dos impostos, que se caracterizam como tributos não vinculados a uma
atuação estatal e que se voltam à satisfação das necessidades gerais da
sociedade, a Constituição Federal adota uma sistemática rígida de
repartição do poder de tributar entre as pessoas jurídicas de direito público,
atribuindo a cada um dos entes tributantes, de forma mutuamente
excludente, as situações hipotéticas passíveis de incidência fiscal, sendo
vedada a cobrança de diferentes impostos por entes tributantes diversos
sobre um mesmo fenômeno econômico269.

Dessa premissa não se pode concluir, todavia, que a Constituição


descreva de modo preciso e acabado a hipótese tributária dos impostos por
ela contemplados. De fato, o texto constitucional faz apenas referências, de
modo fluido e elástico, às principais características das condutas (i.e.,
núcleo material da hipótese tributária) que, se concretizadas no plano
social, podem dar ensejo à incidência dos impostos.

Em razão disso, podemos entender que a Constituição não se vale de


conceitos fechados, precisos e inflexíveis para a descrição exata dos
fenômenos passíveis de incidência dos impostos. Pelo contrário, ao repartir
a competência para instituir os impostos entre as pessoas políticas, o
constituinte faz uso de tipos abertos, vagos e flexíveis, referindo-se a
características típicas das situações que podem ser objeto dos impostos270.

Como consequência, a Constituição admite a possibilidade de


interpenetração das materialidades dos impostos por ela elencados, o que

1003
gera conflitos de competência verticais entre os entes da Federação. Esses
conflitos, importante frisar, não se verificam no plano da aplicação do
texto constitucional, como se costuma supor. Em verdade, esses conflitos
decorrem da própria técnica de que se vale o constituinte ao se referir aos
núcleos materiais das hipóteses de incidência dos impostos previstos na
Constituição, por meio de tipos abertos, e não de conceitos cerrados.

Para dirimir esses conflitos de competência e delimitar o campo de


incidência dos impostos atribuídos à União, aos Estados e aos Municípios,
a Constituição reserva à lei complementar o papel de definir os conceitos
exatos e precisos daquelas situações hipotéticas às quais se refere o texto
constitucional por meio de tipos. Cabe, assim, ao legislador complementar
a tarefa de fixar, por meio de normas gerais em matéria de Direito
Tributário, as definições exatas das hipóteses tributárias, os contribuintes e
as bases de cálculo dos impostos elencados pelo constituinte.

Para os fins a que se dispõe o presente estudo, é fundamental que se


reconheça que a Constituição descreve a materialidade dos impostos por
meio de tipos abertos e mutáveis, cuja conceituação precisa somente é
dada por meio de lei complementar. Com isso, admite-se uma
interpretação dinâmica da legislação tributária, o que, para além de
privilegiar o princípio da igualdade tributária previsto na Constituição,
permite a evolução constante do Direito Tributário à vida social e a sua
adaptação aos novos modelos de negócios criados a partir de inovações
disruptivas, como é o caso das Aplicações OTT271.

No julgamento do Recurso Extraordinário n. 651.703, submetido ao rito


de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a
fluidez das expressões utilizadas pela Constituição e a mutação de sua
natureza jurídica ao longo do tempo, admitindo que os tributos sobre o

1004
consumo, de que são exemplos o ISS e o ICMS, assimilam considerações
econômicas, pois são baseados em conceitos elaborados pelo próprio
Direito Tributário ou em conceitos tecnológicos272.

No que diz respeito especificamente às Aplicações OTT, vale notar que,


embora essas aplicações tenham como traço comum o fato de serem
disponibilizadas por meio da internet, os bens e os serviços entregues aos
usuários finais pelos provedores de Aplicações OTT são bastante distintos
entre si, tais como: (i) arquivos digitais comercializados por meio de
download; (ii) músicas e vídeos transmitidos por streaming; (iii)
mensagens de texto e chamadas de voz realizadas por aplicativos de
internet; (iv) pagamentos intermediados por meio de marketplaces; (v)
softwares acessados e utilizados por meio de recursos de computação em
nuvem; entre outros.

Em razão disso, não se pode determinar, aprioristicamente e com base


apenas no texto constitucional, se as Aplicações OTT se caracterizam
como mercadorias tributáveis pelo ICMS-Mercadoria, serviços de
comunicação sobre os quais incide o ICMS-Comunicação, operações de
crédito sujeitas ao IOF ou serviços de outra natureza tributáveis pelo
ISS273.

Por tal razão, a discussão acerca dos tributos incidentes sobre a oferta
das Aplicações OTT deve ser realizada a cada caso concreto, com base na
natureza jurídica do bem ou do serviço fornecido ao usuário final pelos
provedores dessas funcionalidades. Deve-se verificar, inicialmente, em
qual das materialidades dos impostos descritos pela Constituição se
enquadram o bem e o serviço ofertados pelo provedor das Aplicações OTT
ao usuário final. Por vezes, esse expediente já será suficiente para
determinar o tributo incidente sobre o bem ou serviço em questão, como é

1005
o caso, por exemplo, das operações de crédito concedidas por meio de
Aplicações OTT, que se sujeitam à tributação do IOF.

Todavia, dessa primeira aproximação, dificilmente se extrairá um juízo


definitivo quanto ao tributo aplicável à maioria das espécies de Aplicações
OTT, tendo em vista que as situações previstas na Constituição são
interpenetráveis. Por esse motivo, o intérprete deve partir para a análise
das hipóteses tributárias e das normas gerais sobre solução de conflitos de
competência previstas nas leis complementares, verificando, no caso
concreto, a qual hipótese tributária dos impostos sobre o consumo se
subsume a oferta do bem ou do serviço pelo provedor das Aplicações
OTT.

Confiram-se, a título exemplificativo, as Aplicações OTT que se


traduzem na venda de um bem em formato digital: com base na
interpretação dinâmica das normas constitucionais, pode-se afirmar que o
significado atualmente em vigor da expressão “circulação de mercadorias”
prevista na Constituição compreende também a transferência via download
da propriedade de bens em formato digital, do que se pode sustentar, em
princípio, a viabilidade de que tais bens sejam tributados pelo ICMS-
Mercadoria274.

Cumpre-nos enfatizar, nesse aspecto, a nossa discordância em relação à


posição adotada por alguns doutrinadores ligados à interpretação estática,
segundo a qual o ICMS-Mercadoria não poderia incidir sobre os bens
digitais porque o significado de mercadoria empregado pela Constituição
se limitaria aos bens corpóreos, pois a norma constitucional estaria
vinculada ao conceito de mercadoria previsto no Código Comercial de
1850. Esse posicionamento, além de desprezar por completo a necessidade
de adaptação do Direito à realidade social e aos avanços tecnológicos,

1006
acaba por dispensar tratamento diverso a situações semelhantes, na medida
em que o formato físico ou digital da mercadoria comercializada não é
critério válido, em face do princípio da igualdade tributária, para
diferenciar esses fenômenos econômicos.

Feitas essas considerações gerais, passamos à análise dos tributos


incidentes sobre as Aplicações OTT nas modalidades de transmissão de
conteúdo audiovisual, bem como de envio de mensagens e realização de
chamadas voz por meio da internet.

5. TRANSMISSÃO DE CONTEÚDO AUDIOVISUAL POR MEIO DA


INTERNET

A transmissão de obras televisivas, musicais e programas de rádio pela


internet representa uma clara ruptura em relação ao modelo tradicional de
distribuição e consumo de músicas e vídeos praticados pela indústria
fonográfica e pelas empresas de radiodifusão.

No que diz respeito à natureza jurídica dessas atividades, é preciso levar


em consideração que músicas e vídeos consistem em obras intelectuais
reguladas pela Lei n. 9.610, de 1998, que dispõe sobre a proteção dos
direitos autorais no país. De acordo com a referida lei, os direitos autorais
são considerados bens móveis, de natureza tangível ou intangível. Em
razão disso, o conteúdo audiovisual transmitido pela internet pelos
prestadores de Aplicações OTT pode ser caracterizado, sob o ponto de
vista do sistema positivo legal, como um bem móvel e intangível.

Quanto à forma de comercialização do conteúdo audiovisual pela


internet, há dois modelos de negócios usualmente utilizados pelos
provedores que se dedicam a essa atividade, a saber: (a) a oferta de
músicas e vídeos com emprego da tecnologia streaming, que possibilita a

1007
disponibilização eletrônica por fluxo contínuo de dados ao usuário, sem
que o conteúdo seja gravado em seu computador, mediante a cobrança de
assinatura mensal (a Netflix e o Spotify são exemplos de empresas que
utilizam esse formato); (b) a venda de faixa musical, filmes e seriados com
a entrega do conteúdo ao usuário por meio de transferência eletrônica de
dados (download), mediante pagamento de valor fixo por música ou vídeo
(o ITunes e o Google Play são os provedores mais conhecidos desse
formato de negócios).

Ainda que possam ser disponibilizadas por meio da internet, vale


observar que as obras audiovisuais entregues aos usuários são obras de
criação do espírito humano que não se confundem com os programas de
computador que dão suporte à realização das atividades desempenhadas
pelos provedores das Aplicações OTT dessa modalidade.

Com efeito, a definição legal de software decorre da Lei n. 9.610, de


1998, que o conceitua como a “expressão de um conjunto organizado de
instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico
de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de
tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos
periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar
de modo e para fins determinados”. Pode-se afirmar, deste modo, que o
software se caracteriza como o conjunto de programas e procedimentos
que efetuam o processamento de dados do computador, de acordo com os
comandos do usuário275.

Nas Aplicações OTT de conteúdo audiovisual, a distinção entre as


obras audiovisuais e o software é bastante evidente, na medida em que a
atividade-fim do provedor dessas funcionalidades é a entrega de músicas e
vídeos aos usuários, ou seja, o objeto da relação jurídica entre os

1008
provedores e os usuários é a transmissão das obras televisivas e musicais.
O software, por sua vez, é apenas instrumento que possibilita a entrega
dessas obras via internet aos usuários finais, constituindo apenas uma
atividade-meio necessária à oferta dessas Aplicações OTT.

Em vista do exposto, é possível concluir que a transmissão de conteúdo


audiovisual por meio da internet se caracteriza como a comercialização de
bem móvel e intangível, entregue ao usuário final por meio streaming ou
download e que não se confunde com software. Isto posto, resta investigar
qual o imposto incidente sobre tal atividade.

5.1. ICMS-Mercadoria

Nos termos do art. 2º, inciso I, da Lei Complementar n. 87, de 1996, o


ICMS-Mercadoria incide sobre as operações relativas à circulação de
mercadorias. Vale observar que o termo “mercadoria” tem sido
interpretado pela doutrina que tradicionalmente se dedica a esse tema
como coisa móvel e corpórea objeto de operações comerciais276.
Historicamente, esse entendimento tem sido acolhido pela jurisprudência
do STF, que em diversas decisões já reconheceu que a tributação do
ICMS-Mercadoria fica limitada apenas a bens corpóreos277.

Sendo assim, com base nesse posicionamento seria possível afastar, já


em uma primeira aproximação, a incidência do ICMS-Mercadoria sobre as
Aplicações OTT na modalidade de transmissão de conteúdo audiovisual
pela internet, já que as obras audiovisuais transmitidas via download ou
streaming não podem ser consideradas bens corpóreos.

Todavia, conforme mencionamos acima, esse entendimento decorre de


uma interpretação estática do conceito de mercadoria, com a qual não
concordamos. A nosso ver, repise-se, o significado da expressão

1009
“mercadoria” deve ser interpretado de maneira dinâmica, razão pela qual
não pode ser limitado apenas aos bens corpóreos278. Resta investigar,
então, se a adoção dessa interpretação evolutiva do conceito de mercadoria
permite a tributação do ICMS-Mercadoria sobre o conteúdo audiovisual
ofertado por meio da internet.

É preciso que se leve em conta, incialmente, que a expressão


“circulação”, para fins de incidência do ICMS-Mercadoria, caracteriza-se
como transmissão jurídica da propriedade do bem, conforme
jurisprudência dominante do STF sobre esse assunto279. Desse modo, no
que diz respeito à tributação do provimento das Aplicações OTT de vídeo
e música pela internet, a questão que se coloca é se a transferência
eletrônica de arquivos de conteúdo audiovisual via streaming ou download
pode ser considerada operação de transmissão da propriedade desses bens.

A resposta, de certo, é negativa, tendo em vista que os provedores das


Aplicações OTT nessa modalidade não transferem a propriedade das obras
audiovisuais aos seus clientes. No caso da transferência eletrônica de
faixas musicais filmes e seriados por meio de download, não há que se
falar em venda da propriedade dessas obras, mas sim de cessão do direito
de uso do referido conteúdo audiovisual aos usuários finais. Já na
disponibilização eletrônica do conteúdo via streaming, não há sequer a
transferência dos arquivos de som e vídeo aos usuários, que não podem
copiá-los em seu computador.

Pelo exposto acima, podemos concluir que as Aplicações OTT de


conteúdo audiovisual não estão sujeitas à tributação do ICMS-Mercadoria,
na medida em que a propriedade sobre os direitos autorais das obras
televisivas e musicais não são transferidos pelos provedores aos usuários
finais, havendo tão somente a cessão do direito de uso desses bens.

1010
5.2. ICMS-Comunicação

De acordo com o artigo 2º, inciso III, da Lei Complementar n. 87, de


1996, o ICMS-Comunicação incide sobre as prestações onerosas de
serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a
emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a
ampliação de comunicação de qualquer natureza.

A incidência desse imposto pressupõe a realização de um negócio


jurídico que tenha por objeto a prestação, a título oneroso, de um serviço
de comunicação. Sendo assim, a hipótese tributária do ICMS-
Comunicação prevê a conjugação dos seguintes elementos: (i) a relação
comunicativa entre, no mínimo, duas pessoas, em que haja a transmissão e
a recepção da mensagem; e (ii) a prestação de serviços, a título oneroso,
por terceiro, que disponibiliza os meios físicos, eletrônicos, digitais etc.
(ou seja, o canal de comunicação) necessários ao envio e à entrega da
mensagem, possibilitando o contato entre o emissor e o receptor do
conteúdo transmitido.

Em vista disso, podemos entender que somente presta serviços de


comunicação tributável pelo imposto estadual em questão quem fornece a
terceiros, mediante pagamento, os meios e canais indispensáveis à
transmissão de mensagens.

Nesse sentido, Marco Aurélio Greco afirma que os serviços de


comunicação se referem “ao fornecimento dos meios para a transmissão ou
recebimento de mensagens e não ao seu próprio conteúdo”, de tal forma
que somente “presta serviço de comunicação quem fornece o ambiente de
comunicação”280. De igual modo, há jurisprudência assentada no âmbito do
STF no sentido de que os serviços de comunicação sujeitos à incidência do

1011
ICMS-Comunicação se caracterizam pelo “fornecimento, em caráter
continuado, das condições materiais para que ocorra a comunicação entre
o usuário e terceiro”281.

Isto posto, vale observar que, no caso das Aplicações OTT de conteúdo
audiovisual, os provedores especializados na oferta dessas funcionalidades
não podem ser enquadrados como prestadores de serviços de comunicação,
tendo em vista que esses provedores não fornecem o “ambiente de
comunicação”, ou seja, as “condições materiais” necessários à transmissão
do conteúdo audiovisual. Convém observar, nesse sentido, que o conteúdo
audiovisual ofertado aos usuários finais pelos provedores das Aplicações
OTT não se confunde, em absoluto, com os serviços de conexão à internet
e tampouco com os serviços de telecomunicações que dão suporte para
essa conexão282.

Além de não disponibilizarem os canais necessários à comunicação, os


provedores dessas Aplicações OTT ocupam a posição de emissor da
mensagem na relação comunicativa estabelecida junto aos usuários finais
(i.e., os assinantes dos serviços de transmissão de música e vídeo), e não a
condição de terceiro, alheio à relação comunicativa e que presta os
serviços de comunicação mediante a oferta dos meios necessários à sua
efetivação.

É importante ressaltar, ainda, que o provimento de Aplicações OTT de


vídeos e músicas não se confunde, sob o ponto de vista regulatório e
tributário, com os serviços de transmissão de conteúdo audiovisual
ofertados pelas prestadoras de Serviço de Acesso Condicionado (SeAC),
disciplinados pela Lei n. 12.485, de 2011. O SeAC consiste em um serviço
de telecomunicações de interesse coletivo, prestado no regime privado,
cuja recepção é condicionada à contratação remunerada por assinantes e

1012
destinado à distribuição de conteúdos audiovisuais na forma de pacotes e
canais de programação, por meio de tecnologias, processos, meios
eletrônicos e protocolos de comunicação quaisquer, incluindo a internet.

De acordo com a referida lei, além dos serviços de televisão por


assinatura, as prestadoras de SeAC podem também prestar aos seus
assinantes serviços de telefonia ou de acesso à internet. Verifica-se, desse
modo, que as prestadoras de SeAC, diferentemente dos provedores de
Aplicações OTT, disponibilizam o ambiente de comunicação, ou seja,
todos os meios físicos, eletrônicos e digitais necessários à transmissão do
conteúdo audiovisual aos seus assinantes.

Em razão disso, ainda que as prestadoras de SeAC possam em alguns


casos fazer uso da internet para viabilizar a transmissão de conteúdo
audiovisual (como, por exemplo, os serviços de video on demand ofertados
por empresas de TV por assinatura), as atividades desempenhadas por
essas empresas se caracterizam como serviços de comunicação tributados
pelo ICMS-Comunicação, o que não ocorre com as Aplicações OTT
ofertadas por provedores especializados.

Nesse sentido, a Lei Complementar n. 116, de 2003, com as recentes


alterações promovidas pela Lei Complementar n. 157, de 2016, determina
que a distribuição de conteúdo de áudio, vídeo, imagem e texto por meio
da internet pelas prestadoras de SeAC sujeita-se à tributação do ICMS-
Comunicação. Por outro lado, conforme será analisado mais
detalhadamente no próximo item, a disponibilização desse tipo de
conteúdo por provedores não caracterizados como SeAC (como é o caso
dos provedores das Aplicações OTT) está sujeita à tributação do ISS.

1013
Embora as prestadoras de SeAC e as provedoras de Aplicações OTT
sejam iguais sob um ponto de vista objetivo das operações que praticam
(isto é, transmissão das obras audiovisuais), o tratamento diferenciado
dispensado a essas empresas pela referida lei complementar justifica-se, a
nosso ver, em razão do princípio da igualdade tributária. Em atenção a esse
princípio, cada contribuinte deve ser tratado de modo diferente na medida
em que ele se diferencia dos demais, mediante as considerações de suas
particularidades, ou seja, de acordo com a capacidade tributária
subjetiva283.

Em vista do exposto, a transmissão de conteúdo audiovisual pelos


provedores de Aplicações OTT não se sujeita à tributação do ICMS-
Comunicação, uma vez que tais empresas não disponibilizam os meios,
redes e aparatos físicos, eletrônicos ou digitais necessários à efetivação da
relação comunicativa junto aos usuários finais.

5.3. ISS

A Lei Complementar n. 116, de 2003, alterada pela Lei Complementar


n. 157, de 2016, conceitua a atividade de disponibilização, sem cessão
definitiva, de conteúdo de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da
internet como prestação de serviço tributada pelo ISS.

Alguns doutrinadores consideram que tal dispositivo deveria ser


reputado como inconstitucional, na medida em que a transmissão de
conteúdo audiovisual pela internet seria equiparada à locação de bens
móveis, caracterizando-se como obrigação de dar (e não de fazer), razão
pela qual não deveria haver a incidência no ISS sobre tal atividade, nos
termos da Súmula Vinculante 31, do STF284.

1014
Por outro lado, há doutrinadores que defendem que esse dispositivo
apenas aprimorou as normas gerais aplicáveis à tributação dos serviços de
streaming de música e vídeo pelos Municípios, na medida em que tais
atividades se equiparariam à licença de uso de programas de computador e
já poderiam ser tributadas pelo ISS antes mesmo da edição da referida lei
complementar promulgada em 2016285.

Divergimos de ambos os posicionamentos e consideramos a tributação


do ISS sobre a atividade de Aplicações de OTT na modalidade de
transmissão de conteúdo audiovisual, a partir da edição da Lei
Complementar n. 157, compatível com a Constituição.

Em relação ao segundo entendimento acima destacado, reiteramos que


as músicas e os vídeos transmitidos pela internet não se confundem com
programas de computador, razão pela qual não se poderia cogitar da
tributação válida do provimento dessas Aplicações OTT anteriormente à
edição da referida lei complementar. Vale salientar, ainda, que a lista de
serviços tributáveis pelo ISS é taxativa, sendo admitida a interpretação
extensiva apenas para os serviços congêneres previstos na lei
complementar286. Em razão disso, o serviço listado no item 1.05 da Lei
Complementar n. 116 (i.e., “licenciamento ou cessão de direito de uso de
programas de computação”) não pode ser interpretado de maneira
extensiva, pois não prevê nenhum serviço congênere.

Já no que se refere ao primeiro entendimento acima relacionado, que


defende que a incidência do ISS deve se restringir apenas às obrigações de
fazer, é preciso levar em consideração que esse entendimento vem sendo
relativizado ao longo dos últimos anos pelo STF. Esse posicionamento,
vale lembrar, foi firmado pelo próprio STF no ano de 2000, por ocasião do
julgamento do Recurso Extraordinário n. 116.121, sob a relatoria do

1015
Ministro Marco Aurélio, em que restou afastada a incidência do ISS sobre
a locação de bem móvel, ficando consignado que somente constituiriam
serviços sujeitos ao ISS as atividades desenvolvidas pela via direta do
esforço humano, que perfaçam uma obrigação de fazer.

Todavia, em 2009, no julgamento do Recurso Extraordinário n.


592.905, relatado pelo Ministro Eros Grau, o STF admitiu uma acepção
mais ampla para o conceito de prestação de serviços, desvinculando-o
apenas das obrigações de fazer para permitir a incidência do ISS sobre as
operações de leasing financeiro e leaseback. Em seguida, no ano de 2011,
ao julgar o Agravo Regimental na Reclamação n. 8.623, o Supremo
admitiu a incidência do ISS sobre a atividade de cessão de direito de uso
de marca.

Finalmente, em 2016, no julgamento do Recurso Extraordinário n.


651.703, relatado pelo Ministro Luiz Fux e submetido ao rito dos recursos
repetitivos, o STF entendeu que o núcleo material da hipótese de
incidência do ISS previsto na Constituição não se confunde com o
conceito de serviço de Direito Privado, razão pela qual a tributação do ISS
não deve se limitar apenas às obrigações de fazer. Além disso, o Tribunal
considerou que o ISS pode incidir sobre qualquer serviço, desde que não
esteja sujeito ao campo de competência tributária do IOF e ICMS,
executado a partir de um conjunto de atividades materiais ou imateriais,
que gere utilidade para terceiros, prestado com habitualidade e intuito de
lucro, podendo estar conjugado ou não com a entrega de bens ao tomador.

Em vista disso, entendemos que a defesa por parte da doutrina quanto à


inconstitucionalidade da incidência do ISS sobre o provimento das
Aplicações OTT de conteúdo audiovisual, fundada na dicotomia entre
obrigação de dar e obrigação de fazer do Direito Privado, não merece

1016
prosperar. Além disso, ainda que não se possa alegar que o entendimento
refletido na Súmula Vinculante 31 tenha sido abandonado em definitivo
pelo STF, fato é que as atividades de oferta das Aplicações OTT de música
e vídeo pela internet não envolvem apenas uma obrigação de dar, como é o
caso da locação de bens móveis corpóreos.

Com efeito, o provimento dessas Aplicações OTT reveste-se de uma


série de obrigações de fazer indispensáveis à transmissão dos arquivos de
som e imagem aos usuários finais, tais como a manutenção dos servidores
remotos pelos provedores, a garantia de largura adequada de banda de
internet para permitir a transferência de dados, a indicação pelos
provedores de filmes e músicas aos usuários baseados em suas
preferências, a manutenção de sistema de avaliação das obras para
montagem de lista de preferências de cada usuário, entre outros.

Todos esses “fazeres” não consistem em meros expedientes de meio, na


medida em que são indispensáveis e indissociáveis à prestação da utilidade
ao usuário final (ou seja, assistir, ler e ouvir o conteúdo audiovisual que
lhe é disponibilizado). Não se pode alegar, assim, que a oferta dessas
funcionalidades se caracterize como uma simples obrigação de dar
equiparável à locação de um bem móvel.

Vale observar, ainda, que o verbo “disponibilizar” foi incorporado ao


nosso idioma oficial recentemente, tendo sido incluído pela primeira vez
no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia
Brasileira de Letras, apenas em 2009. De acordo com o Dicionário
Aurélio, disponibilizar significa “tornar acessível, disponível”287, o que
denota uma obrigação de dar algo a terceiro envolta por “fazeres” que
permitam tornar essa coisa acessível ao beneficiário.

1017
Em nosso sistema legal positivo, o Marco Civil da Internet, promulgado
em 2014, utiliza largamente a palavra “disponibilizar” ao se referir às
atividades desempenhadas pelos provedores de conexão à internet e pelos
provedores de aplicações de internet. Além disso, com a edição da Lei
Complementar n. 157, de 2016, o verbo “disponibilizar” passou a
constituir o núcleo material da hipótese de incidência do ISS incidente
sobre as atividades de provimento de conteúdo audiovisual pela internet,
como é o caso das Aplicações OTT de transmissão de áudio e vídeo.

Ainda em relação ao vocábulo “disponibilizar”, nota-se que o fato de o


critério material do ISS sobre essas Aplicações OTT ser formado por um
verbo novo e apenas recentemente incorporado à língua portuguesa
evidencia, por si só, que estamos diante de um fenômeno econômico
inteiramente inovador, o qual não deve ser interpretado como uma simples
locação de bem móvel.

Com base no exposto, o nosso entendimento é de que a atividade de


transmissão de conteúdo audiovisual pela internet por provedores de
Aplicações OTT deve ser tributada pelo ISS, nos termos da Lei
Complementar n. 116, de 2003, alterada pela Lei Complementar n. 157, de
2016.

6. ENVIO DE MENSAGENS MULTIMÍDIA E REALIZAÇÃO DE


CHAMADAS DE VOZ PELA INTERNET

As Aplicações OTT que permitem o envio de mensagens instantâneas e


a realização de chamadas de voz pela internet caracterizam-se como uma
inovação disruptiva em relação aos serviços convencionais de
comunicação oferecidos pelas operadoras de telecomunicações,
especialmente a telefonia móvel.

1018
Essas funcionalidades permitem tanto o envio de mensagens
instantâneas de arquivos multimídia (texto, imagens, vídeos, documentos
em PDF e outros formatos) quanto a realização de chamadas de voz entre
usuários conectados à internet com emprego da tecnologia VoIP (e outras
similares).

No Brasil, os principais provedores desses serviços são WhatsApp,


Telegram, Viber, Skype, entre outros. Usualmente, essas modalidades de
Aplicações OTT são ofertadas de modo gratuito ao usuário ou por meio do
modelo freemium288, em que os serviços são gratuitos para o usuário, mas
há veiculação de propagandas nos aplicativos.

No que tange às chamadas de voz com emprego de VoIP e mecanismos


correlatos, é importante ressaltar que essas tecnologias permitem também a
realização de chamadas originadas de terminais conectados à internet e
destinadas a telefones fixos e móveis da rede de telefonia convencional
(esse é o caso, por exemplo dos serviços fornecidos pelo Skype por meio
de assinatura mensal)289. Essa modalidade de chamadas, no entanto, não
pode ser enquadrada como Aplicações OTT, visto que essas
funcionalidades permitem, por definição, o envio de mensagens destinadas
apenas a usuários conectados à internet.

Em relação à natureza jurídica dessas Aplicações OTT, importante


notar que a Lei n. 9.472, de 1997, estabelece o conceito de
telecomunicação como “a transmissão, emissão ou recepção, por fio,
radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo
eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons
ou informações de qualquer natureza” (art. 60, § 1º). Por outro lado, a
referida lei conceitua o serviço de valor adicionado (SVA) como “a
atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá

1019
suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao
acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de
informações” (art. 61, § 1º).

Nesses moldes, as Aplicações OTT que permitem o envio de


mensagens e a realização de chamadas de voz por meio da internet devem
ser caracterizadas como espécie de SVA, na medida em que tais serviços
adicionam novas funcionalidades/utilidades aos serviços de telefonia
móvel que lhes dão suporte, sem confundir-se com serviços de
telecomunicações. É importante ressaltar, nesse aspecto, que tanto os
serviços de telefonia móvel quanto as Aplicações OTT em questão
destinam-se à oferta das mesmas utilidades aos usuários, quais sejam o
envio de mensagens multimídia e a realização de chamadas de voz.

Todavia, os serviços de telefonia móvel são caracterizados como


serviços de telecomunicações, na medida em que as operadoras de
telefonia disponibilizam aos usuários as condições materiais (fibras óticas,
antenas etc.) necessárias à transmissão das mensagens. Já os provedores
das Aplicações OTT caracterizam-se como prestadores de serviços do tipo
SVA, já que ofertam aos seus clientes novas funcionalidades para
aprimorar/otimizar, por meio do uso da internet, o envio de mensagens
instantâneas e a realização de chamadas de voz, não se confundindo com
os serviços de telecomunicações que dão suporte a tais funcionalidades.

Em vista disso, podemos entender que as Aplicações OTT dessa


modalidade devem ser caracterizadas, sob o ponto de vista de sua natureza
legal, como serviços de valor adicionado (SVA), sujeitando-se ao
tratamento tributário comentado a seguir.

6.1. ICMS-Mercadoria

1020
Vale destacar, inicialmente, que não há que se cogitar na incidência do
ICMS-Mercadoria sobre as funcionalidades que possibilitam o envio de
mensagens e a realização de chamadas de voz. Conforme detalhado nos
tópicos acima, esse imposto incide sobre as operações consistentes na
transferência de propriedade de bem móvel, que nada tem que ver com
serviços de transmissão de mensagens multimídia e realização de
chamadas por meio da internet. Sendo assim, descarta-se a tributação do
ICMS-Mercadoria sobre as Aplicações OTT em questão.

6.2. ICMS-Comunicação

Não se pode falar também em tributação do ICMS-Comunicação sobre


tais funcionalidades, na medida em que os provedores dos aplicativos que
possibilitam o estabelecimento da relação comunicativa não ofertam ao
emissor e ao receptor das mensagens o ambiente de comunicação, ou seja,
as redes, sistemas e aparatos físicos e digitais indispensáveis à transmissão
das mensagens.

Vale notar, nesse sentido, que o funcionamento desses aplicativos de


mensagens e chamadas de voz está condicionado à contratação pelos
usuários finais junto a outros prestadores de serviços de conexão à internet
e de telefonia móvel que dão suporte a essa conexão. Esses serviços,
reitere-se, não são fornecidos pelos provedores das Aplicações OTT, mas
sim por provedores de acesso à internet e por operadoras de
telecomunicações.

Em vista disso, deve-se concluir que os provedores dessas Aplicações


OTT prestam serviços do tipo SVA aos usuários, que não se confundem
com os serviços de telecomunicações que lhes dão suporte. Importante
ressaltar, nesse contexto, que a jurisprudência do Superior Tribunal de

1021
Justiça (STJ) é pacífica quanto à não incidência do ICMS-Comunicação
sobre a prestação de SVA290. Senso assim, o provimento das Aplicações
OTT de mensagens e chamadas de voz não devem ser tributadas pelo
referido imposto.

6.3. ISS

As Aplicações OTT de envio de mensagens e realização de chamadas


são potencialmente tributáveis pelo ISS, na medida em que tais
funcionalidades caracterizam-se como SVA. Conforme já mencionado, a
oferta dessas Aplicações OTT não se confunde com a locação de bem
móvel, uma vez que a atividade-fim objeto do provimento dessas
funcionalidades não se enquadra como mera obrigação de dar, sendo
indissociável de diversos “fazeres” prestados aos usuários finais.

Ocorre que a lista de serviços tributáveis pelo ISS prevista na lei


complementar que rege tal matéria é taxativa, admitindo a interpretação
extensiva apenas para serviços congêneres por ela listados. Esse não é o
caso dos serviços de valor adicionado (SVA), que não são relacionados
expressamente pela Lei Complementar n. 116, de 2003. Tampouco esses
serviços se enquadram como congêneres ou similares dos serviços
previstos na referida lei complementar.

Em razão disso, por falta de previsão legal para tributação de serviços


do tipo SVA, as Aplicações OTT de envio de mensagens e realização de
chamadas de voz não se sujeitam à tributação do ISS.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por todo o exposto acima, apresentamos as seguintes conclusões:

1022
a) sob uma perspectiva geral, a análise acerca da tributação da oferta das
Aplicações OTT deve ser fundamentada em uma interpretação dinâmica da
legislação tributária, a qual se conforma ao princípio da igualdade tributária
previsto na Constituição e possibilita a evolução constante do Direito
Tributário, com sua adaptação à vida social e aos novos modelos de negócios
criados a partir de inovações disruptivas;
b) com base nessa interpretação evolutiva do Direito Tributário, é possível
afirmar que, em princípio, as Aplicações OTT podem se sujeitar aos
seguintes impostos sobre o consumo elencados na Constituição: (b.1) ICMS-
Mercadoria, sobre as operações em que haja a transferência da propriedade
de bens em formato digital; (b.2) IOF, sobre operações financeiras e
securitárias realizadas pela internet; e (b.3) ISS, nas prestações de serviços de
natureza diversa não sujeitos aos demais impostos previstos na Constituição,
na medida em que as funcionalidades disponibilizadas pela internet
caracterizam-se, usualmente, como uma obrigação de dar revestida por
diversos “fazeres” indispensáveis ao fornecimento da utilidade ao usuário
final;
c) no que diz respeito às Aplicações OTT na modalidade de disponibilização de
conteúdo audiovisual por meio da internet, entregues aos usuários finais via
download ou streaming, nosso entendimento é que tais funcionalidades
devem ser tributadas pelo ISS, nos termos da Lei Complementar n. 116, de
2003, alterada pela Lei Complementar n. 157, de 2016. Vale observar que a
oferta dessas funcionalidades caracteriza-se como uma obrigação de dar
suportada por diversos “fazeres” indispensáveis à entrega da utilidade
contratada pelo usuário final, razão pela qual essas Aplicações OTT devem se
sujeitar à incidência do ISS; e
d) por fim, entendemos que as Aplicações OTT na modalidade de envio de
mensagens multimídia e de realização de chamadas de voz entre usuários
conectados à internet constituem um tipo de serviço de valor adicionado
(SVA), pois acrescentam uma nova funcionalidade aos serviços de
telecomunicações e de conexão à internet contratados pelos usuários finais
junto a outros prestadores. Esse serviço é potencialmente tributável pelo ISS,
mas a incidência desse imposto sobre tal atividade deve ser descartada, em
razão da falta de previsão para tributação de SVA na Lei Complementar n.
116, de 2003.

1023
O Software as a Service (SaaS) e a tributação
pelo ISS
291
Maria Ângela Lopes Paulino Padilha

1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS: A INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E SEUS


REFLEXOS NO UNIVERSO JURÍDICO-TRIBUTÁRIO

Na dinâmica da sociedade informatizada, que revolucionou as bases das


relações econômicas, destacam-se os negócios com programas de
computador, instrumentalizados por meio das licenças eletrônicas de uso.
O software, ou programa de computador, tem ampla presença nas
diferentes esferas sociais, pois, integrado ao sistema informático, confere
às pessoas físicas e jurídicas profusas informações e utilidades na
execução das mais variadas tarefas. Trata-se de uma tecnologia que está
em contínuo processo de inovação, seja aperfeiçoando suas próprias
funcionalidades, seja contribuindo para a criação de novas experiências,
utilidades, produtos e serviços ou potencializando o desempenho dos já
criados, acrescentando-lhes aplicabilidades.

Esse atual panorama tecnológico pertinente à disponibilização onerosa


de software, porém, tem acarretado problemas tributários de intrincada
solução, relacionados sobretudo à definição da natureza jurídica do
software, das relações econômico-contratuais estabelecidas com esse “bem
digital” e do seu enquadramento às materialidades tributárias
contempladas no sistema constitucional em vigor.

Dada a abrangência do tema relativo à tributação dos programas de


computador, este artigo tem como escopo abordar a incidência do ISS

1024
sobre o modelo de negócio do Software as a Service (SaaS), contrastante
às tradicionais licenças de uso do Software as a Product (SaaP).

2. A NATUREZA JURÍDICA DO SOFTWARE, A SUA PROTEÇÃO E O


TRATAMENTO CONFERIDO PELA LEI N. 9.609/98

A edição da Lei n. 9.609/1998, ainda válida no ordenamento pátrio,


teve como propósito amoldar a disciplina jurídica da proteção do software
à conjuntura econômica à época em formação, conferindo-lhe maior
eficiência e aplicabilidade com a supressão do regime protecionista de
reserva de mercado até então vigorante e adequando-a aos tratados
internacionais ratificados pelo Brasil. De acordo com o artigo 1º da Lei n.
9.608/98, o software é definido como um conjunto de instruções em
linguagem natural (código-fonte) ou codificada (código-objeto), que não
se confunde com o suporte físico que o contempla e de emprego necessário
no uso de computadores, pois habilita o hardware a processar
informações, executar funções e tarefas, com vistas a produzir
determinado resultado. Enquanto sequência lógica de comandos
codificados para o manuseio de computadores, o artigo 2º, por sua vez,
qualifica-o como bem incorpóreo equiparado à obra intelectual protegida
pelos direitos do autor. Isso porque, em cada software produzido,
manifesta-se a criatividade pessoal e individual do programador,
decorrente das escolhas e soluções por ele empregadas durante o
desenvolvimento do código, inexistindo programas coincidentes se
trabalhados separadamente por diferentes técnicos em computação.

O corpo material que dá suporte aos programas de computador consiste


num instrumento necessário para a apreensão e a divulgação do programa,
propiciando sua disponibilização a terceiros, sem o condão de afastar a sua
natureza de bem incorpóreo protegido pelo direito autoral. Essa relação

1025
acessória entre o software e o seu suporte físico resta mais inconteste no
atual estágio da era da informação, em que a grande maioria dos
programas são disponibilizados exclusivamente pela internet.

Objeta-se, desde logo, a considerações no sentido de desqualificar


juridicamente o software como obra intelectual em virtude da importância
econômica das funcionalidades providas aos seus usuários. A despeito do
forte caráter utilitário e funcional do software, possibilitando a utilização
do equipamento de acordo com as necessidades do usuário, as soluções
práticas buscadas pelo programa, além de resultarem do trabalho
intelectual de seu criador, dependem também da aplicação dos outros
componentes do sistema informático, tocantes aos dispositivos eletrônicos,
denominados hardware. A automatização das atividades humanas, cada
vez mais entranhada nos domínios do conhecimento, não é executada
isoladamente pelo software, na medida em que suas instruções se voltam a
capacitar o hardware na obtenção dos resultados desejados.

3. CONTRATOS DE LICENÇA DE USO DO SOFTWARE: A FORMA


JURÍDICA DE EXPLORAÇÃO ECONÔMICA MAIS COMUM NA
DISPONIBILIZAÇÃO DE PROGRAMAS DE COMPUTADOR PELA
INTERNET

A discussão na doutrina e na jurisprudência em torno da competência


para tributar transações com programas de computador deriva, como
prenunciado, da complexidade em definir a natureza jurídica da exploração
econômica do software, mais especificamente de delimitar os contornos do
contrato de licença de uso de software.

Tomando como ponto de partida o arquétipo legal enunciado na Lei de


Software (Lei n. 9.609/98) e na Lei de Direito Autoral (Lei n. 9.610/98),
importa já advertir que, no exercício das faculdades patrimoniais do titular

1026
para explorar economicamente o programa de computador, a cessão de
software292 e a licença de software293 não se confundem: enquanto, na
primeira, tem-se a transferência, sempre em caráter exclusivo e não
temporário, de parcela ou de todos os direitos patrimoniais do autor em
favor do cessionário, na segunda, é conferida uma autorização para que o
licenciado utilize ou explore o bem imaterial sob determinadas condições,
permanecendo com o licenciante a propriedade intelectual de todos os
direitos patrimoniais do software. Somente nos contratos de cessão total
aperfeiçoa-se a transferência plena da propriedade do programa de
computador.

Especificamente no que toca à licença de uso de software, enunciada no


artigo 9º da Lei n. 9.609/98, o detentor dos direitos patrimoniais do bem
imaterial concede a autorização para terceiro utilizar o programa,
normalmente numa cópia em código-objeto, estipulando os termos de
utilização, tais como prazo, número de cópias e restrições a modificações.
Trata-se da modalidade contratual disseminada amplamente a partir do
advento dos microcomputadores, da difusão das redes e da consequente
massificação dos programas. A licença pode levar em conta o número de
instalações por terminal de hardware, o número de usuários com acesso
simultâneo independentemente do dispositivo em que o programa é
acessado ou o número de cópias, observado o direito ao back up
assegurado pelo artigo 6º, I, da Lei n. 6.609/98. Pode igualmente alternar-
se em função dos conteúdos disponibilizados e versões contratadas. O
conjunto dessas variáveis, aliás, corroboram que, na mera licença de uso, o
objeto da relação é a autorização, é a outorga do direito para utilizar o
software, tudo em concordância com as permissões acordadas perante o
titular dos direitos.

1027
Junto com a formalização da licença de uso, em função do disposto no
artigo 8º da Lei n. 9.609/98, nada impede que as partes contratem
prestação de serviços técnicos, serviços de suporte, reparo, manutenção,
treinamento e consultoria para o uso correto do programa.

4. O SOFTWARE AS A SERVICE (SAAS) COMO MODELO DE BUSINESS


NO LICENCIAMENTO DE USO DO SOFTWARE

A evolução mercadológica do software, representada pela sofisticação


crescente dos negócios jurídicos referentes a ele, é o retrato certeiro da
evolução técnica da informática e dos meios de comunicação. Somente
com os avanços tecnológicos dessas áreas, marcadas pelo aprimoramento
da infraestrutura em torno da internet, pela elevada capacidade
computacional e pela tecnologia da cloud computing, foi possível a plena
migração da exploração econômica do software do mundo físico para o
universo virtual, inovando-se na maneira como se licencia o uso dos
programas de computador padronizados: a forma tradicional de
licenciamento de uso de software, abrangendo os clássicos Software as a
Product (SaaP) perdeu espaço para um modelo de business de
licenciamento suportado na arquitetura da nuvem, irrompendo os
denominados Software as a Service (SaaS).

Relativamente à oferta do tipo SaaP, os programas eram, inicialmente,


apenas licenciados em suportes físicos como CD e DVD, postos à
disposição em lojas físicas e, a partir do desenvolvimento do comércio
eletrônico indireto, em estabelecimentos virtuais. Usualmente
denominados tais programas veiculados em mídia de “software de
prateleira”, a sua licença instrumentaliza-se mediante contrato de adesão
conhecido como shrink-wrap agreement, constando no termo o aviso de
que o rompimento da embalagem implica automaticamente o

1028
consentimento com as disposições de uso do programa. Nessas espécies de
licenças, contrata-se uma versão do programa e passa-se a utilizá-la até o
lançamento de uma nova versão, a ser comercializada nas lojas físicas ou
estabelecimentos virtuais.

Com os avanços tecnológicos e o desenvolvimento do comércio


eletrônico direto, o SaaP passou a ser, cada vez mais, licenciado
exclusivamente através da internet e, hoje, a vasta maioria dos softwares
padronizados tem seu uso autorizado em ambiente virtual. Nessas
hipóteses, os termos do contrato de adesão à licença, designado por click-
wrap agreement, são gerados e visualizados quando o usuário opta por
fazer a instalação do software no hardware e, durante o processo de
instalação, o usuário clica no botão “ok” ou “eu concordo/aceito” numa
caixa de diálogo ou janela pop-up, concordando assim com as condições
estipuladas. Formalizada a licença, exige-se a criação de uma conta de
usuário ou a digitação de uma chave de acesso, com o escopo de
identificar o licenciado e, com isso, liberar o uso do software.

Todas essas tradicionais licenças de Software as a Product, seja em


estabelecimentos físicos, seja via comércio eletrônico direto ou indireto,
processam-se, em sua vasta maioria, por meio de licenças perpétuas
mediante o pagamento de uma taxa, instalando-se uma cópia no
computador do usuário, onde os dados são processados e armazenados. Por
isso, as aplicações somente podem ser acessadas no dispositivo local,
incumbindo ao usuário a responsabilidade pela segurança do banco de
dados e pelos demais recursos informáticos necessários para o uso e a
manutenção do programa. Com certa frequência, a versão do programa
SaaP instalada no computador do usuário sofre updates (atualizações
menores e gratuitas). Nesses casos, o fornecedor notifica o usuário, a

1029
atualização é baixada e instalada no programa licenciado. Já as grandes
atualizações ensejam a realização de upgrades (novas versões), ou seja, a
contratação de novas licenças.

No tocante às licenças de uso da nova geração de softwares, designados


por Software as a Service e viáveis economicamente por meio da
tecnologia em nuvem, o usuário adere a uma espécie de “assinatura”,
mediante o pagamento de uma taxa mensal ou anual, e o programa de
computador é disponibilizado pela internet, com o fornecimento de login e
senha, podendo ou não ser instalado em máquinas locais. Eis aqui as
primeiras notas distintivas entre os licenciamentos de programas de
computador tradicionais e o SaaS: além de se basear sempre numa licença
temporária, o acesso ao SaaS pelo usuário pode suceder exclusivamente
pelo navegador da internet, em razão do processo de virtualização dos
meios e recursos informáticos através da cloud, sem a necessidade de uma
cópia do software ser instalada e processada localmente.

Porém a grande inovação no modo de explorar economicamente a


licença de softwares, refletindo no conteúdo do negócio jurídico, é que o
objeto convencionado no modelo SaaS consiste em usufruir o software
licenciado, combinando-lhe a oferta de recursos informáticos, assegurados
pela infraestrutura de nuvem, a qual é contratada pelo próprio fornecedor
do programa de computador. Assim, cabe ao fornecedor do SaaS,
independentemente da vontade e de ações do usuário, controlar e
implementar, serviços de atualizações (updates), inserção de novas
funcionalidades e melhorias (upgrades), serviços de backup (cópias de
segurança), serviços de infraestrutura, processamento, hospedagem e
armazenamento de dados etc., dentre outros recursos computacionais para

1030
a contínua utilização dos aplicativos licenciados a qualquer momento, de
qualquer local, pelo consumidor.

O próprio titular do programa de computador licenciado é quem


consome os recursos e as funcionalidades da cloud computing fornecidas
por desenvolvedores de infraestrutura (IaaS) e de plataforma (PaaS), a fim
de projetar o software e licenciá-lo ao usuário final na modalidade SaaS. É
o desenvolvedor do SaaS quem contrata essas ferramentas informáticas da
nuvem, ou seja, fora dos computadores locais e pessoais, para assim
desenvolver e gerenciar o software que irá disponibilizar no mercado por
meio de licenças de uso.

Percebe-se assim que, com a chegada dos softwares baseados na cloud,


a distinção entre update e upgrade está ficando cada vez menos relevante,
na medida em que o processo de atualização e aprimoramento do software
e de suas utilidades passa a ser contínuo, compondo parte indissociável do
licenciamento de uso do SaaS.

Por ser um programa de computador com amplo alcance na sociedade,


o pacote Office da Microsoft, que inclui os softwares Word, Excel, Power
Point e One Note, é um ótimo exemplo para retratar a transição do modelo
de licença do Software as a Product para o do Software as a Service, já
que a empresa oferece ao interessado em utilizar suas aplicações as duas
modalidades: o clássico Office Desktop e o Office 365.

O primeiro, cuja última versão é o Office 2016, é a suíte tradicional que


os usuários licenciam uma única vez, em caráter perpétuo, instalando-se o
pacote de aplicativos contratado na área de trabalho do computador
pessoal. O segundo é a suíte de multiusuários de aplicativos e recursos
informáticos via computação em nuvem, baseada num modelo de

1031
assinatura mensal ou anual que, acaso suspensa, torna o conteúdo digital
indisponível. Essas formas distintas de disponibilização do software
refletem no ciclo de upgrades: os usuários do pacote Office 365 têm suas
aplicações atualizadas automaticamente pelo provedor, assim que uma
nova “versão” sair, ao passo que os usuários do pacote Office tradicional
devem adquirir uma nova licença para obterem as mais recentes
atualizações294.

O Office 365 assemelha-se à versão tradicional na medida em que seus


clientes podem instalá-lo em suas máquinas, a fim de habilitar o
funcionamento dos aplicativos off-line, porém, com o adicional elementar
de prover, continuamente, o uso do pacote de aplicativos agregado a
funcionalidades e acessibilidade através da internet, bastando que o
dispositivo manuseado tenha conexão à rede. O modelo SaaS da Microsoft
abrange “a versão completa do Outlook, armazenamento online adicional
por meio do OneDrive, versões online da suíte acessíveis por meio do
Office On Demand”295, que proporcionam aos licenciados usufruir do
programa e respectivas ferramentas e recursos informáticos, a qualquer
hora, de qualquer lugar, em qualquer dispositivo conectado à internet.

Observa-se que, no modelo tradicional de licença de software, os dados


são processados e armazenados em ambiente local, as aplicações somente
podem ser acessadas nos dispositivos do usuário e a ele incumbe a
responsabilidade pela segurança do banco de dados e pelos demais
recursos informáticos necessários para o uso e a manutenção do programa,
muitas vezes contratando funcionários de TI ou terceiros para a prestação
do serviço. Diversamente, o SaaS traz uma nova concepção de exploração
econômica de softwares. Em vez de tão somente licenciar o uso do
programa e instalar uma cópia no computador pessoal sob o manto de uma

1032
licença perpétua, o usuário contrata a autorização para usufruir o software
associada a outros elementos negociais, com base num modelo de
assinatura: o provedor do SaaS fornece recursos informáticos, tanto em
ordem de software quanto em ordem de hardware, necessários e
indispensáveis para o uso, a manutenção e o funcionamento adequados do
programa, acessível por qualquer dispositivo conectado à internet, já que,
muitas vezes, sua instalação sequer é executada no computador do usuário.
Enquanto vigente o contrato de SaaS, o processo de atualização e
aprimoramento do software, efetivado pelo provedor externo, é contínuo,
acrescentando-lhe melhorias e novas funcionalidades, sem qualquer
interferência do usuário.

4.1. Da unicidade do negócio jurídico SaaP para a complexidade do negócio


jurídico SaaS

Uma vez delineado acima o cenário evolutivo da exploração econômica


do software, colhe-se o ensejo para tratar de forma breve sobre a unidade e
a pluralidade dos negócios jurídicos e distinguir, em relação à primeira, os
contratos unitários dos contratos complexos e, em relação à segunda, a
coligação contratual da união de contratos. Trata-se de reflexão jurídica
imprescindível para melhor compreender as formas negociais aplicadas em
matéria de licenciamento de uso de software disponibilizados
eletronicamente e poder avançar para a análise que consome nosso artigo –
a tributação pelo ISS.

Acerca da unidade e pluralidade dos negócios jurídicos, valemo-nos da


explicação de Marcos Bernardes de Mello, inspirado no magistério de
Pontes de Miranda:

A unidade do negócio jurídico se refere à especificidade de que se atribui ao ato


jurídico. Diz-se uno, ou único, o negócio jurídico quando as suas disposições
constituem um todo indissociável, não se podendo separá-las em partes distintas

1033
sem descaracterizá-lo. Há um só negócio jurídico porque se lhe atribui
especificidade única, o que se identifica pela existência de um só fim (= objeto)
específico. Os negócios jurídicos típicos, considerados em seus suportes fáticos
específicos, são atos jurídicos unos (ex.: compra e venda, doação, locação). No
entanto, se no mesmo negócio jurídico há elementos de negócios jurídicos vários,
inclusive atípicos, o negócio jurídico se torna complexo, ou misto, mas essa
complexidade não exclui a unidade sempre que existir subordinação do todo à
especificidade deles, que é preponderante (= especificidade preponderante), e ao
fim comum do negócio jurídico complexo ou misto (ex.: contrato de leasing,
296
contrato de franquia, […]) .

Assim, a unidade do negócio jurídico nada tem que ver com o seu ato
de conclusão, com a sua forma de instrumentalização, tampouco com o seu
conteúdo, mas está sim relacionada à especificidade única ou
preponderante e ao fim comum da estrutura negocial.

A propósito, cotejando a unidade e a pluralidade contratual, convém


transcrever os esclarecimentos de Marcos Bernardes de Mello:

À unidade se opõe a pluralidade, que ocorre quando existem dois ou mais


negócios jurídicos, cada um com sua especificidade própria, mesmo que tenham os
mesmos figurantes, as prestações (diferentes) recaiam sobre um mesmo bem e
constem em um mesmo instrumento negocial (A compra de B o apartamento X e na
297
mesma escritura o dá em locação ao próprio vendedor […]) .

No que toca à unidade do negócio jurídico, acaso verificada, o contrato


pode ser unitário ou complexo, a depender do conteúdo do contrato.
Segundo os ensinamentos “ponteanos”, a discussão sobre ser o negócio
jurídico unitário ou complexo já assenta na convicção de que é único o
negócio jurídico: será unitário qualquer negócio jurídico em que houver
identidade dos elementos fáticos relativos ao sujeito, ao objeto ou à
manifestação da vontade e será complexo quando algum desses elementos
não é unitário, mas pelo menos um o é.

Nos contratos complexos, quando qualificados pela pluralidade de


manifestações de vontade e, por conseguinte, de elementos negociais,

1034
justifica o jurista sua característica de negócio jurídico único, pois, ainda
que haja a combinação de “elementos de diferentes tipos de negócios
jurídicos, inclusive de negócios jurídicos atípicos, suscetíveis de serem
suporte fáctico de regras jurídicas especiais”, esses elementos estão
“subordinados à especificidade preponderante e ao fim comum do negócio
jurídico complexo (= misto)”298.

Não há uma “mistura” de negócios jurídicos, pois esta ocorre no suporte


fático, é pré-jurídica (antes de o negócio se juridicizar). Dessa mistura pré-
jurídica resulta um negócio jurídico de espécie própria, em que as diversas
manifestações de vontade se coagulam e nenhuma declaração existe por si
só. Essa coagulação leva à unidade e complexidade volitiva do negócio
jurídico.

Se o suporte fático contém elementos que seriam de dois ou mais negócios


jurídicos, e só um entra, é que a unidade se fez pela composição complexa do
suporte fático. […]. Quando o negócio jurídico é único, mas complexo, não se pode
dizer que é, em parte, contrato de compra e venda, e em parte contrato de sociedade
(por exemplo); é envoltório, cápsula, parte de elementos de compra e venda e parte
de elementos da sociedade. Por isso mesmo, as regras jurídicas essenciais que
incidem sobre esses elementos não levam consigo a sua especificidade, se esses
299
elementos não são os de caráter específico preponderante, do negócio jurídico .

Desse modo, os contratos complexos caracterizam-se como um negócio


jurídico unitário de múltiplo conteúdo, combinando partes de espécies
negociais diferentes, porém essa combinação de elementos negociais
diversos leva a um liame impartível, na medida em que existe uma
subordinação do todo a um elemento específico, que é o preponderante.
Com efeito, se verificada a preponderância da especificidade própria de
um dos elementos, ao qual todos os demais aspectos negociais estão
submetidos, aperfeiçoa-se a unidade. Eis o critério – especificidade
preponderante – que permite discernir, perante o elemento volitivo plural,
o negócio jurídico único complexo da pluralidade de negócios jurídicos.

1035
Já na pluralidade de negócios jurídicos, em que cada elemento tem sua
especificidade própria individualizada, manifestam-se a coligação
contratual, se caracterizada a interdependência funcional, e a união de
contratos, se configurada a autonomia. Nos negócios coligados, apesar de
as avenças, tal como nos contratos complexos, serem interdependentes
umas das outras para a fiel execução de cada uma delas, os liames mantêm
sua individualidade. Os contratos coligados, preleciona Caio Mario da
Silva Pereira:

[…] são resultado de uma hipercomplexidade contratual que decorre da


necessidade de concretização de interesses cada vez mais intrincados e que devem
se conectar com outras situações jurídicas que a estes interesses estejam ligados.
Ocorre uma conexão funcional entre os contratos, fazendo com que um só tenha
executividade jurídica se o outro também tiver, formando assim, uma rede
contratual interdependente. Vale dizer, a classificação dos contratos coligados não
se refere especificamente a uma característica substancial do contrato, mas a um
grupo de contratos que se conectam entre si de tal maneira que a execução fiel de
um fica subordinada à execução de outro. Exemplo típico encontra-se no contrato
de planos de saúde, em que se coligam contratos de prestação de serviços médicos,
300
de hospitalização, de fornecimento de medicamentos e de seguro etc. .

A coligação não se confunde com a simples união contratual. Nesta,


conquanto os ajustes sejam instrumentalizados ao mesmo tempo ou num
mesmo documento, os negócios celebrados são distintos e completamente
autônomos entre si, sem qualquer vínculo funcional. Sobre a união de
contratos, destaca Pontes de Miranda, que “cada negócio jurídico tem o
seu suporte fático, os seus elementos, nucleares ou não; e a forma é
acidental, sem qualquer influência de um na sorte do outro negócio” (por
exemplo, compro o chapéu por x e, no mesmo momento, deixo outro para
conserto por y)301.

Faz-se oportuno realçar que a exploração econômica envolvendo


contratos coligados, onde há pluralidade, não se confunde com um
contrato complexo, marcado pela unidade. Enquanto a complexidade

1036
representa um só negócio jurídico, em que é inviável alcançar jurídica e
economicamente a finalidade específica preponderante pretendida pelas
partes “sem o liame incindível dos vários elementos considerados no
acordo e coordenados formalmente”302, na coligação há diferentes
contratos celebrados pelas partes que se apresentam interligados por um
nexo funcional, em que as vicissitudes de um interferem sobre o outro.

Em suma, a reunião contratual em ambos é feita com dependência,


porém os negócios coligados conservam sua individualidade, incidindo as
regras jurídicas próprias de cada um, e os negócios complexos
caracterizam-se por um específico elemento negocial preponderante, a que
todos os demais se submetem, em uma combinação indissociável, voltada
ao escopo comum do pactuado, que irá determinar a regra a incidir.

Transpondo-se os esclarecimentos acima às formas contratuais


aplicadas no licenciamento de uso de software, tem-se que o Software as a
Product pressupõe negócio jurídico único com unitariedade, e o Software
as a Service pressupõe negócio jurídico único com complexidade. Explico
melhor.

No modelo tradicional SaaP, tem-se um típico licenciamento de uso de


programas de computador, na forma prevista na própria Lei n. 9.609/98,
como espécie contratual para atender relações econômicas em matéria de
software. Aqui, a unidade do negócio jurídico configura-se na existência
de um só fim específico, consistente na outorga ao licenciado do direito de
usufruir o software, permanecendo os direitos patrimoniais do programa
sob a propriedade do licenciador, o qual, inclusive, pode licenciar para
outros interessados. Diversamente, o licenciamento do Software as a
Service compõe-se de diversos elementos negociais indissociáveis, cuja
combinação é operada em razão de os aplicativos apoiarem-se na

1037
infraestrutura da cloud. Não se trata de somatório de contratos
individualizados – interdependentes ou autônomos. Ao contrário, trata-se
do encadeamento de diversos deveres e correspondentes direitos na
formação de um contrato uno que tem como específica finalidade
preponderante o licenciamento de uso do programa. Todos os elementos
negociais reunidos no SaaS subordinam-se à especificidade preponderante,
que é outorga do direito de uso do software.

É dizer: a estrutura negocial complexa do SaaS é adequada à categoria


jurídica de licenciamento de uso, pois a reunião e conjugação de diferentes
avenças, interdependentes umas das outras, visa a um fim comum: a
utilização do programa de forma contínua de qualquer lugar e a qualquer
hora pelo licenciado.

Por fim, convém relembrar que, a depender dos interesses envolvidos,


da aplicabilidade/destinação do software e da complexidade em manuseá-
lo, é possível que haja uma pluralidade de negócios coligados no
licenciamento de uso, contratando-se, à parte, serviços técnicos
complementares e/ou customizações do programa, adaptando-o para
atender às necessidades específicas do licenciado. Nessas hipóteses de
contratos coligados, os serviços de manutenção e customização têm
importância econômico-jurídica individualizada, são dissociáveis do
licenciamento de uso sem descaracterizá-lo, assumindo, portanto, tais
atividades efeitos fiscais próprios.

5. O LICENCIAMENTO ELETRÔNICO DE USO DE SOFTWARE E O ISS

No arranjo constitucional do critério material do ISS, consistente em


“prestar serviços de qualquer natureza” na forma prevista no artigo 156, II,
da Carta Maior, são fatos tributáveis por esse imposto municipal as

1038
atividades (i) com conteúdo econômico que representam (ii) um esforço
humano, físico ou intelectual, desenvolvido (iii) sem subordinação e (iv)
sob o regime de Direito Privado, conferindo (v) uma utilidade material ou
imaterial em favor de terceiro, desde que tais atividades estejam (vi)
definidas em lei complementar, (vii) excetuadas da competência dos
Estados e do Distrito Federal e (viii) representem a prestação-fim
objetivada no contrato celebrado entre tomador e prestador.

Deveras, o constituinte de 1988, a fim de circunscrever os fatos


abrangidos pela competência dos Municípios, reportou-se de forma
expressa ao termo “serviço”, tipicamente alusivo ao Direito Privado. E
sem fazer menção distinta ao vocábulo para disciplinar a faixa municipal,
aceitou o uso linguístico do termo encontrado originariamente naquela
seara jurídica. Mediante a incursão no plano jurídico-privado, em especial
nos dispositivos do Código Civil de 2002303, referida figura tributária
municipal pressupõe uma obrigação de fazer: o prestador, por meio de um
fazer físico ou intelectual, compromete-se a executar algo antes
inexistente, segundo especificações convencionadas com o tomador do
serviço304. Em tom preciso, na relação contratual firmada entre tomador e
prestador, o fazer algo há de ser o objeto precípuo acordado pelas partes.
Eventual dar é simples consequência de um fazer personalizado,
contratado previamente.

No universo da jurisprudência, vale mencionar o emblemático


julgamento do Supremo Tribunal Federal no RE n. 116.121305 que cuidou
de afastar a pretensão fiscal de exigir o ISS na locação de bens. Alicerçada
na supremacia constitucional e na tipicidade, posicionou-se a Corte pela
preservação dos institutos de Direito Privado utilizados pelo constituinte
na repartição das competências tributárias, concluindo que somente as

1039
obrigações de fazer, caracterizadas juridicamente como o esforço humano
de elaborar uma utilidade em favor de terceiro, qualificam-se como
prestação de serviços passíveis de serem tributadas pelo ISS e que não se
confundem com a definição civil de locação de bens móveis.

No intento de sintetizar com fidelidade o entendimento do STF,


destacamos os seguintes excertos dos votos dos Ministros Marco Aurélio e
Celso de Mello, na sequência em que foram proferidos no julgamento:

Na espécie, o imposto, conforme a própria nomenclatura revela e, portanto,


considerado o figurino constitucional, pressupõe a prestação de serviços e não o
contrato de locação. [...]. Em síntese, há de prevalecer a definição de cada instituto,
e somente a prestação de serviços, envolvido na via direta o esforço humano, é fato
gerador do tributo em comento. Prevalece a ordem natural das coisas cuja força
surge insuplantável; prevalecem as balizas constitucionais e legais, a conferirem
segurança às relações Estado-contribuinte; prevalece, alfim, a organicidade do
próprio Direito, sem a qual tudo será possível no agasalho dos interesses do Estado,
embora não enquadráveis como primários (Voto Min. Marco Aurélio).
Cabe advertir, neste ponto, que a locação de bens móveis não se identifica e nem
se qualifica, para efeitos constitucionais, como serviço, pois esse negócio jurídico
[...] não envolve a prática de atos que consubstanciam um “prestare” ou um
“facere”. Na realidade, a locação de bens configura verdadeira obrigada de dar. [...]
Veja-se, pois, que para efeito de definição e de identificação e do alcance dos
institutos, dos conceitos e formas de direito privado, o Código Tributário Nacional,
em seu art. 110, “faz prevalecer o império do Direito Privado – Civil ou Comercial”
[...], razão pela qual esta Suprema Corte, para fins jurídico-tributários, não se pode
recusar, ao instituto da locação de bens móveis, a definição que lhe é dada pelo
Código Civil (art. 1.188), sob pena de prestigiar, no tema, a interpretação
econômica do direito tributário, em detrimento do postulado da tipicidade (Voto
Min. Celso de Mello).

A Constituição de 1988 exigiu também que os serviços englobados na


competência dos entes municipais sejam definidos em lei complementar,
sendo, porém, vedado ao legislador incluir atividades estranhas ao
conceito constitucional de serviço, sob pena de modificar as faixas para
instituir impostos, subvertendo a estrutura hierárquica do ordenamento
jurídico. Nessa tarefa de contribuir com as feições do critério material do
ISS, o legislador complementar definiu como atividade tributável pelo

1040
imposto o “licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de
computação”, incluindo-o no item 1.05 do rol de serviços constante da
Lista Anexa à Lei Complementar n. 116/2003.

Perdoando as atecnias contidas na nomenclatura utilizada pelo


legislador, visto que licença e cessão de software revelam-se institutos
jurídicos distintos como já explicitado, e cientes também de que a própria
doutrina e jurisprudência têm empregado as expressões “licença de uso” e
“cessão de uso” como equivalentes, podemos constatar que, nos moldes
dessa norma nacional, estariam os Municípios autorizados a instituir o ISS
sobre a outorga, pelo titular da propriedade intelectual, do direito de
utilizar o programa de computador em favor de terceiros. A nosso ver,
contudo, não caminhou bem o legislador ao qualificar como serviço a
concessão do direito autoral de uso do software, justamente porque se trata
de negócio jurídico caracterizado como obrigação de dar.

Passa-se, então, nos itens subsequentes a justificar tal posicionamento,


tecendo primeiro o estudo a respeito da incidência do ISS no
licenciamento eletrônico de uso de software, pressupondo o modo
tradicional desse tipo de exploração econômica, concernente ao Software
as a Product, cujo negócio jurídico tem como fim único e específico a
utilização do software em ambientes locais.

A despeito do objetivo primordial deste escrito circunscrever-se à


tributação do SaaS pelo ISS, trata-se de digressão preambular necessária
não só porque partiu do SaaP a evolução da forma de licenciar o uso de
programas de computador, mas também porque a complexidade negocial
do modelo contratual SaaS, por agregar ao licenciamento soluções
tecnológicas, pode levar ao equívoco do exegeta de que essa hipótese

1041
assumiria categoria jurídica diversa, ajustando-se à classe de serviços
inserida na competência dos Municípios.

5.1. A licença de uso de software no formato tradicional (Software as a


Product) e o ISS

Quando o usuário do computador realiza o download de um software


padronizado do tipo SaaP, aceitando os termos de adesão à licença de uso,
sem prévia estipulação de cláusulas entre as partes, o licenciante obriga-se
a disponibilizar um software já existente em favor do licenciado que irá
utilizá-lo dentro dos limites autorizados. Nesses casos, o contratante busca
por um programa já pronto, sem ter em mente a qualificação pessoal e
formação técnica do contratado.

A licença de uso de software assemelha-se à locação de bens móveis,


definida no Código Civil como um contrato em que “uma das partes se
obriga a ceder à outra, por tempo determinado, ou não, o uso e gozo de
coisa fungível, mediante certa retribuição”306. Tal como a relação locatícia,
o licenciamento de uso de software consiste na utilização da propriedade
alheia, porém de um bem intelectual, tutelável pelos direitos do autor. E,
especificamente quanto à incidência do ISS sobre a locação de bens
móveis, o STF manifestou-se pela sua inconstitucionalidade no RE n.
116.121. Ordenou que “somente a prestação de serviços, envolvendo na
via direta o esforço humano, é fato gerador” do ISS. Essa orientação,
inclusive, encontra-se consolidada pela Súmula Vinculante 31/2010307, a
cujos efeitos subordinam-se órgãos judiciais e administrativos na forma
prevista no art. 103-A da CR/88. Sob idênticos alicerces, preleciona Aires.
F. Barreto:

Sendo a cessão de uso de software (cessão de direitos) negócio jurídico que,


diante da nossa ordem jurídica, configura obrigação de dar, segue-se,
necessariamente, que jamais pode refletir “prestação de serviço” (que só pode

1042
alcançar obrigação de fazer). Não há, pois, como subsumir a cessão de direito de
308
uso de software no conceito de serviço tributável, por via do ISS .

A fim de corroborar a ausência de um facere contratado entre o


licenciante e o licenciado do software, colaciona-se precedente bastante
ilustrativo pela inconstitucionalidade da cobrança do ISS sobre as licenças
de uso de programas de computador:

Como bem ressaltou a douta Procuradoria de Justiça, é inconstitucional a


previsão de incidência de ISS sobre a locação de bens móveis, ou sobre qualquer
obrigação de dar, que, de acordo com a jurisprudência do STJ, não pode ser
considerada como serviço, posto que este se restringe à obrigação de fazer. No
contrato em tela, no que se refere, estritamente, ao valor pago pela impetrante
quanto ao licenciamento ou cessão de direito de uso de programa de computação,
licença de software desenvolvido por empresas estrangeiras, não pode haver
incidência do ISSQN, uma vez que não está compreendido dentro do conceito de
serviços, na expressão constitucional, tratando-se, apenas, de disponibilização de
309
programa já elaborada pela cedente. [...] .

Ainda que os programas de computador exprimam um esforço


intelectual, no licenciamento de uso de software esse fazer humano não é o
objetivado no contrato. O licenciante não se obriga, segundo
especificações e necessidades do licenciado, a elaborar um software, que
vá resultar num dar. Trata-se, porém, de circunstâncias fático-jurídicas
presentes na celebração de contratos de desenvolvimento de programas de
computador. Aliás, a dicotomia “software padronizado” e “software por
encomenda” cumpre, neste momento, o seu propósito apenas para
demonstrar que os contratos de licenciamento de uso assumem natureza
jurídica distinta dos contratos de desenvolvimento. Enquanto naqueles
almeja-se a utilização de um programa de computador, pronto e acabado,
predominando um dar, nestes contrata-se a confecção de um software para
satisfazer exigências e necessidades particulares do contratante,
sobressaindo aqui uma obrigação de fazer e, por conseguinte, uma

1043
atividade consentânea com o conceito constitucional de serviço tributável
pelo ISS310.

Distintamente das licenças de uso, nos contratos de desenvolvimento, o


bem imaterial advindo é personalizado, decorrente de um esforço humano
objetivado no contrato e não uma simples autorização de uso de um
software. O próprio legislador complementar definiu o desenvolvimento
de software como categoria distinta do licenciamento de uso, prevendo no
item 1.04 da listagem anexa à LC n. 116/2003 a “elaboração de programas
de computadores”.

Em suma, a atividade de criação de software sob encomenda é o suporte


fático que se ajusta ao critério material do ISS, ao passo que a licença de
uso figura como relação contratual cujos deveres estipulados não implicam
uma prestação de fazer, trata-se de prestação de dar, consistente em
outorgar a terceiros o direito de usar o bem incorpóreo.

5.2. A licença de uso na modalidade Software as a Service (SaaS) e o ISS

Tal como na modalidade Software as a Product, também no formato


Software as a Service contrata-se a utilização de um programa de
computador. Conforme elucidado, a diferença entre essas variantes
contratuais consiste no fato de que o uso do SaaS é disponibilizado numa
infraestrutura de nuvem, possibilitando ao licenciado o acesso ao software
de qualquer lugar, a qualquer momento, desde que manuseie um
computador conectado à internet.

Vimos também que é o próprio titular e desenvolvedor do programa de


computador licenciado quem consome diretamente os recursos e as
funcionalidades da cloud computing (ou seja, fora dos computadores locais
e pessoais), fornecidas por desenvolvedores de infraestrutura (IaaS) e de

1044
plataforma (PaaS), a fim de projetar o software e licenciar seu uso na
modalidade SaaS.

Por ser executado na nuvem, à utilização do software agregam-se


soluções tecnológicas que lhe são subjacentes, tais como manutenção
(correções, atualizações, melhorias etc.), processamento e armazenamento
de dados, cuja oferta irá variar em função do quanto o programa dependa
da infraestrutura da cloud. Esses recursos informáticos figuram como
elementos negociais intrínsecos ao escopo contratual do SaaS, que é a
licença de uso do software, porquanto as atividades de updates e entrega
de soluções de TI, providas pelo licenciante através da nuvem, asseguram
o acesso aos aplicativos de forma onipresente e escalonada, a partir de
diferentes dispositivos conectados à internet.

Diante dessas peculiaridades do software licenciado na nuvem,


assinalamos que, diferentemente da licença de uso do Software as a
Product, o qual pressupõe negócio jurídico único com unitariedade,
visando apenas ao fim específico de autorizar o direito de usufruir o
aplicativo em ambiente local, o Software as a Service pressupõe negócio
jurídico único com complexidade. Nesta modalidade, tem-se o
encadeamento de diferentes deveres e correlatos direitos na formação de
um contrato uno que tem como específica finalidade preponderante a
utilização do programa na hora e lugar convenientes ao licenciado.

Com efeito, misturando vários elementos negociais, em que prepondera


como elemento específico o licenciamento, a execução do contrato SaaS
realiza-se de forma una e global e qualquer investida com o fim de
dissociar esses elementos negociais acabaria por desnaturar o negócio
jurídico. É a preponderância de um ou outro, reveladora da atividade-fim
convencionada pelas partes, que servirá como substrato fático para a

1045
exigência fiscal. E somente quando imperar e ultimar-se o fazer incidirá o
ISS. Em outras palavras, a incidência tributária é definida com base na
ação-fim, de caráter preponderante, pois a realidade econômica que
interessa ao Direito Tributário consiste no desígnio final manifestado pelo
contratante quando da contratação da atividade. A propósito, não é
diferente o entendimento dos nossos Tribunais:

[...]. É certo, portanto, que o alvo da tributação do ISS “é o esforço humano


prestado a terceiros como fim ou objeto. Não as suas etapas, passos ou tarefas
intermediárias, necessárias à obtenção do fim. [...] somente podem ser tomadas,
para compreensão do ISS, as atividades entendidas como fim, correspondentes à
311
prestação de um serviço integralmente considerado em cada item. [...] .

Com o intuito de melhor demonstrar a incompetência dos Municípios


para exigir o ISS sobre a complexidade negocial do licenciamento de uso
do SaaS, faz-se oportuno mencionar manifestações jurisprudenciais a
respeito da cobrança do ISS nas atividades de franquia. Do mesmo modo
que sucede nas licenças de uso do SaaS, os contratos de franquia assumem
natureza complexa, formados por diferentes elementos negociais.

De acordo com o artigo 2º da Lei n. 9.955/95, franquia é definida como:

[…] um sistema pelo qual um franqueador cede ao franqueado o direito de uso


de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou
semiexclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de uso
de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional
desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta ou
indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício.

Devido à complexidade contratual da franquia, o Tribunal de Justiça do


Estado de São Paulo tem entendido que a atividade compreende, em
caráter principal, cessão de marcas e de know-how, que pode envolver
serviços, porém coadjuvantes na relação negocial, afastando-se a atividade
do conceito constitucional de serviço:

1046
[...] a franquia é um contrato de natureza híbrida e complexa, fundamentalmente
uma cessão de direito de uso de marca ou patente e, portanto, não se caracteriza
exatamente como efetiva prestação de serviços, descabendo alterar a definição e o
312
alcance de seu conceito, à luz do artigo 110 do Código Tributário Nacional .

O Superior Tribunal de Justiça também já se manifestou pela


intributabilidade das atividades de franquia. Decidiu que o fato de os
negócios de franquia estarem previstos “no rol de serviços constantes da
lista anexa à Lei Complementar 116/2003 não possui o condão de
transmudar a natureza jurídica complexa do instituto, composto por um
plexo indissociável de obrigações de dar, de fazer e de não fazer” e, por
isso, “revela-se inarredável que a operação de franquia não constitui
prestação de serviço (obrigação de fazer), escapando, portanto, da esfera
da tributação do ISS pelos municípios”313.

Pois bem, se (i) na estrutura negocial complexa do SaaS, a reunião e a


conjugação de diferentes soluções tecnológicas (atividades-meio) visam à
utilização do software de qualquer lugar e a qualquer hora (atividade-fim),
dentro das limitações impostas pela licença de uso e (ii) a atividade de
licença de uso de software não se subsume ao conceito constitucional de
serviços tributáveis pelo ISS, então forçoso concluir que também o
licenciamento na modalidade Software as a Service não está submetido à
tributação do ISS.

No mais, mesmo que fosse admitido o desdobramento dessa estrutura


negocial para fazer valer as atividades-meio na qualificação jurídica do
fato, as soluções tecnológicas oferecidas no licenciamento de uso de SaaS
afastam-se da configuração constitucional de serviço, uma vez que não
traduzem um fazer pela via direta humana segundo especificações
avençadas entre licenciante e licenciado. Além de a licença
instrumentalizar-se via contrato de adesão pela internet, as soluções

1047
práticas e utilidades conferidas ao licenciado decorrem diretamente do
funcionamento do computador, por meio da atuação conjunta do hardware
e do software. É o sistema informático como um todo que proporciona as
utilidades ao usuário do computador: o conjunto de comandos do software
habilita o hardware a processar informações e a executar funções com
vistas a produzir um resultado.

Em suma: em matéria de software para efeito de tributação do ISS,


impõe-se verificar, na formação da vontade das partes, a presença de
cláusulas que atestem o interesse do contratante em ter um programa de
computador personalizado ou customizado, isto é, que demonstram a
existência de um prévio ajuste entre as partes de que o programa de
computador comportará traços específicos e distintivos para atender
anseios e necessidades particulares. Somente haverá serviço quando a
relação jurídica comportar um fazer acertado e delimitado entre o tomador
e o prestador, circunstâncias apenas presentes nos contratos de
desenvolvimento e customização de software, porém ausentes no
licenciamento de uso do programa de computador.

1048
Tributação de software “embarcado” e os
conflitos ICMS vs. ISS
314 315
Fernanda Sá Freire Figlioulo e Maria Virgínia Fantucci Pillekamp

1. INTRODUÇÃO

Os temas tributários envolvendo software são não só desafiadores,


como também imprevisíveis. A cada dia surge uma tese nova, uma
interpretação diferente das autoridades fiscais e um posicionamento
divergente entre as mesmas. Os conflitos de competência são claros, e é
difícil prever qual ente tributante vai sagrar-se vencedor – se é que é
possível utilizar a palavra “vencedor” quando estamos diante de conflito
de competência em matéria tributária.

Discussões tributárias envolvendo software sempre partem, como regra,


da definição da natureza jurídica desse. Todavia, o presente trabalho não
busca, como ponto de partida, essa análise, mas, sim, examinar as
transações em que há uma venda conjunta do software com o hardware,
aqui qualificado como (“software embarcado”). Ou seja, o que se pretende
é estudar qual o tratamento tributário que deve ser conferido ao software
embarcado, se autônomo ou como parte inerente do equipamento.

Pois bem. Temos que a essência do software, como programa de


computador nos termos da Lei n. 9.609/98 (Lei do Software), é permitir a
transmissão de informações para que o hardware exerça determinadas
funções. Deveras, essa lei define programa de computador como um
“conjunto organizado de instruções [...] contida em suporte físico de
qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de

1049
tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos
periféricos [...] para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados”.

Ainda que a Lei do Software estabeleça que esse deve estar “contid[o]
em suporte físico de qualquer natureza”, é inquestionável que esse é o fim
do software em si mesmo, já que não há que se imaginar um software que
não seja utilizado em suporte físico. Até mesmo o software em nuvem316,
essencialmente, tem por pressuposto o download para que seja, em algum
momento, executado em um equipamento. Caso contrário, de nada valeria.

Portanto, estarem ou não contidos em hardware não é fato que


desnatura a natureza do software, já que a instalação é apenas uma questão
temporal.

A despeito de a legislação não prever distinção entre tipos de software,


o que nos parece certo, é sabido que a doutrina e a jurisprudência tributária
vêm distinguindo o software de prateleira, do software customizado e do
software por encomenda317. Todavia, a diferenciação entre software
autônomo e software embarcado, a priori, não possui influência nas três
feições que o software pode apresentar. Não obstante, ainda que não seja
uma regra, é comum que o software embarcado se caracterize como
software standard.

Sabidamente, há situações em que o equipamento apenas se presta à sua


função com o software nele instalado – não fosse esse software, o
equipamento (hardware) seria mera junção de plástico e metal. Esse
software instalado é denominado “software residente”.

Já em outros casos, o software, também instalado, não é essencial ao


funcionamento do equipamento, mas apenas o aperfeiçoa ou permite

1050
funcionalidades extras a esses equipamentos. Nada impede que, nessas
situações, o software seja fornecido de forma autônoma do equipamento, o
que confirmaria o seu caráter de independência. Basta verificar que, em
muitos casos, as empresas podem licenciar o mesmo software para
diferentes clientes, com níveis de adaptação distintos, sem que
necessariamente haja o fornecimento de equipamento (hardware).

No âmbito do direito tributário, essas distinções são importantes, se não


essenciais, já que a depender do caso a operação com o software pode se
aproximar de uma transação envolvendo mercadoria, usualmente
submetida ao ICMS, em contraposição ao licenciamento de software,
atualmente sujeito ao ISS, já que inserido no item 1.05 da lista anexa à Lei
Complementar n. 116/2003.

Assim, o presente estudo, de forma pragmática, propõe-se a analisar a


dicotomia havida entre a incidência do ICMS ou do ISS nas situações
envolvendo software embarcado, considerando as normas atualmente
vigentes.

2. ANÁLISE JURÍDICA DOS CONFLITOS ICMS VS. ISS: PERSPECTIVA


BRASILEIRA E A DISCUSSÃO SOBRE A FRAGMENTAÇÃO DE
CONTRATOS

Os efeitos tributários aplicáveis ao software são tema de grande debate,


sendo, de pronto, necessário adiantar que não há pacificação de
entendimento.

Há, por parte de todos os entes tributantes, decisões antagônicas, de


análise incompletas ou confusas, o que acaba por gerar grande dúvida nos
contribuintes, que se veem envolvidos em questões de conflito de

1051
competência entre Estado e Município, sem a resolução definitiva do
impasse.

As controvérsias são potencializadas pelo fato de que há interpretações


de que operações com software possuem natureza de serviços, “locação” e
até mesmo de venda de mercadorias.

De qualquer sorte, lembramos que, para fins tributários, os conceitos


definidos pelo Direito Privado são fundamentais, pois devem ser
absorvidos pelo Direito Tributário, observando integralmente os efeitos
originais dos institutos, conceitos e formas definidos por esse ramo do
Direito. Esse raciocínio está em linha com o artigo 110 do Código
Tributário Nacional (CTN), pelo qual “[a] lei tributária não pode alterar a
definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de
direito privado [...] para definir ou limitar competências tributárias” (grifos
nossos).

Por isso, ao aplicador318 do Direito Tributário não caberia ampliar ou


alterar a definição, o alcance, o conteúdo e o conceito jurídico de software,
sob pena de se evadir do referido conceito e descumprir a limitação
imposta pelo artigo 110 do CTN.

Nesse contexto, ainda que não seja escopo da presente análise,


lembramos que a Lei do Software define que este goza do regime de
proteção aplicável à propriedade intelectual, de sorte que o seu uso
somente poderá ser realizado por quem tenha expressa licença concedida
pelo respectivo desenvolvedor. Percebe-se que, de acordo com a
legislação, a natureza jurídica do software é de direito autoral, valendo
dizer que o seu desenvolvedor é o titular do direto de autor, e sua

1052
propriedade não necessariamente transfere-se integralmente, visto que
existe uma vinculação permanente do produto com o seu criador.

Ademais, nos termos da Lei de Software, sua disponibilização sempre


ocorre via licenciamento, independentemente de quem esteja realizando a
operação com o software e o tipo e forma de disponibilização.

Ocorre, todavia, que esses conceitos são ignorados ou até mesmo


distorcidos pelo Poder Judiciário e pelos precedentes administrativos dos
Municípios, Estados e União.

A bem da verdade, a discussão jurídica envolvendo a adequada


tributação de softwares embarcados, especialmente quando não essenciais
ao funcionamento do equipamento em que são instalados, é bastante
incipiente, havendo somente decisões administrativas sobre a matéria. É
verdade, portanto, que essa discussão específica ainda não chegou ao
Poder Judiciário de forma contundente, a despeito de conhecermos
algumas ações, sem decisão de mérito, no Superior Tribunal de Justiça
(STJ) ou no STF.

Não obstante isso, fato é que a Constituição Federal de 1988, ao definir


as competências tributárias, atribuiu aos Estados a competência para a
cobrança do imposto sobre operações de circulação de mercadorias e sobre
os serviços de transporte interestadual e intermunicipal e os de
comunicação (ICMS); ao passo que os Municípios foram autorizados a
instituir imposto sobre operações de prestação de serviços, mediante a
cobrança do ISS.

Especificamente com relação ao ICMS, ressaltamos tratar-se de um


imposto incidente sobre operações mercantis que tem como hipótese de

1053
incidência a realização de operações de circulação de mercadorias,
conforme sua matriz insculpida no inciso II do artigo 155 da Constituição
Federal. Assim, para a incidência desse imposto, é necessária a observação
concomitante de três elementos: (i) operações, (ii) circulação, e (iii)
mercadoria.

Entendam-se por operações os atos jurídicos regulados pelo Direito


como produtores de determinada eficácia jurídica, ou seja, são os atos
juridicamente relevantes. São, portanto, atos ou negócios hábeis para
provocar a circulação de mercadorias, adquirindo, neste momento, a
acepção de toda e qualquer atividade regulada pelo Direito e que tenha a
virtude de realizar aquele evento.

A circulação, por sua vez, deve ser jurídica, isto é, deve ensejar a
transferência de titularidade da mercadoria, não bastando para fins de
incidência do ICMS a mera circulação física. Dessa forma, para que haja a
circulação de mercadoria é pressuposto que haja a mudança de propriedade
desta.

Por fim, para que determinado bem possa ser considerado como
mercadoria, faz-se necessário que ele seja móvel, corpóreo e objeto de
operações comerciais. Não há que se falar em “mercadoria” caso o bem
seja intangível (exceto a energia elétrica, em razão de expressa disposição
legal) ou que não esteja sujeito à distribuição para consumo.

Em suma, para que haja a incidência do ICMS, é necessário haver a


cumulação dos três elementos acima, sendo certo que a inexistência de
qualquer um deles impossibilitará o estabelecimento da relação jurídica
tributária.

1054
Assim, em uma primeira análise, pode-se afirmar que qualquer tentativa
dos Estados no sentido de cobrar o ICMS nas operações com software
embarcado, ao argumento de que o valor de tal transação compõe a base de
cálculo do ICMS incidente sobre os equipamentos (hardware),
representaria uma frontal violação à competência tributária prevista na
Constituição Federal. Tal raciocínio decorreria do fato de que, nas
operações com software, não há transferência de titularidade, bem como
não estamos tratando de bens corpóreos, já que o que se negocia é um
direito.

No que diz respeito ao ISS, a despeito de as atividades de elaboração de


software e licenciamento ou cessão de direito de uso destes
(independentemente de ser software de prateleira, por encomenda ou
customizado) estarem previstas na Lista de Serviços Anexa à Lei
Complementar n. 116/2003, especificamente nos itens 1.04 e 1.05319,
entendemos ser incabível a cobrança do ISS sobre essas operações, uma
vez que a disponibilização de software não pode ser entendida como uma
prestação de serviços, já que não se qualifica como uma “obrigação de
fazer”, que é a hipótese de incidência do ISS320.

Todavia, a nós, quer parecer que a não incidência do software, quer


pelo ICMS, quer pelo ISS, não é a tendência jurisprudencial. Portanto,
ainda que, a rigor, essa seja uma interpretação jurídico-tributária que se
fundamenta de forma aderente, para os fins do presente estudo, parte-se da
premissa de que haverá a incidência tributária do imposto estadual ou do
imposto municipal sobre as operações com softwares embarcados.

Em vista disso, a análise que aqui se propõe passa, primeiro, pelas


formas jurídicas de disponibilização de software embarcado em termos

1055
contratuais, para depois adentrar na seara do suposto conflito de
competências de ISS e ICMS nessas hipóteses.

2.1. Comentários sobre as formas contratuais de disponibilização de software


embarcado

Antes de qualquer consideração, é importante lembrar que, do ponto de


vista prático, o desenvolvimento de software e a fabricação de hardware
possuem dinâmicas muito distintas entre si. Essas diferentes dinâmicas,
quer nos parecer, devem nortear a estruturação contratual das formas de
disponibilização de software para fins de seus reflexos tributários, em uma
abordagem que leve em conta a “essência sobre a forma”.

Assim, é dizer que o desenvolvimento de software exige, em si, um


trabalho quase que integralmente intelectual, com dispêndio de várias
horas-homem para tornar a “linguagem natural ou codificada” em
“instrução” baseada em “técnica digital ou análoga”321. Tanto é assim que a
Lei do Software os equipara às obras literárias, cujas grandeza e riqueza
são abstratas e imateriais.

Por outro lado, a confecção de hardware consiste em um processo


industrial, essencialmente muito diferente dos volumosos investimentos
em mão de obra especializada, em treinamento de pessoal altamente
qualificado e em tecnologia de armazenamento e de processamento de
dados que o desenvolvimento de software exige. Ainda que a elaboração
de hardware exija, também, investimentos em tecnologia, sua essência
requer muito mais uma mera produção em larga escala de bem
materializado322 que a abstração inerente ao software.

Dessa forma, especialmente nos casos em que o processo de


desenvolvimento do software embarcado requer a parametrização e a

1056
adaptação às especificidades do cliente, por ter sido encomendado
especialmente para atender determinadas funcionalidades exigidas por
esse, é possível dizer que se está diante de duas relações negociais
diferentes, e que não se confundem, ainda que, por razões de conveniência,
esse software esteja “embarcado” no hardware em questão.

Tanto não deveria haver confusão de relações negociais e jurídicas, que


há muitas situações em que o fornecedor é capaz de entregar ao cliente
hardware com software, mas por razões comerciais o cliente prefere
adquirir o hardware de terceiro, sendo a operação limitada ao
licenciamento do software, dissociado do equipamento.

Nesses casos, ainda que se esteja diante de software potencialmente


“embarcável”, não se está diante de software “residente”, cuja
essencialidade determina a razão de ser do equipamento. Essa situação
corrobora a independência do software em relação ao hardware – e vice-
versa –, justificando a necessidade de se analisar os dois fornecimentos de
forma segregada.

Por outro lado, em sendo o software “residente”, há, a nosso ver, meios
de equipará-lo a um produto fabricado em larga escala, com natureza de
“mercadoria”, ou parte inerente do equipamento no qual está
eventualmente instalado.

Diante dessas considerações factuais, entendemos, de forma objetiva,


que nas operações com software embarcado, há, ao menos, dois possíveis
modelos de negócio jurídico:

•operações com software embarcado que sejam essenciais ao funcionamento do


hardware – software residente; e
•operações com software embarcado que não sejam essenciais ao
funcionamento do hardware e cuja contratação seja optativa.

1057
Acreditamos que esses dois modelos de negócio jurídico abarcariam a
quase totalidade de operações envolvendo o software dito “embarcado”,
“residente” ou não.

É importante observar que os modelos de negócio em questão não


levam em consideração a valoração das operações, bem como a forma de
pagamento e/ou as partes contratantes. Isso porque, conforme será
apresentado, tais fatos são irrelevantes para a conclusão a que se chegará
acerca da tributação das operações com software embarcado, já que, no
fim e conforme anteriormente mencionado, o que se deve buscar é uma
análise visando à “essência sobre a forma”.

O primeiro negócio jurídico a ser analisado – hipótese 1 – é aquele em


que há o fornecimento de um equipamento (hardware) que requer um
software “residente” para que sua funcionalidade seja alcançada. Melhor
explicando, nessa hipótese, o software representa a funcionalidade básica
do equipamento e, segundo a posição sustentada pelo INPI323, esse
software está inerentemente “associado a um produto (aparelho,
equipamento etc.), gerando efeitos técnicos”. É o caso, por exemplo, de
“um programa de computador presente nos automóveis para controle da
transmissão automática ou então um programa de computador presente
num microcontrolador de um robô o qual é responsável pelo seu
deslocamento”.

De forma intuitiva, pode-se dizer que, na hipótese 1, se está diante de


um único negócio jurídico, que não comporta fragmentação. Isso porque,
nesse cenário, o funcionamento do equipamento depende do software,
sendo o software essencial para que o equipamento em questão se
caracterize como equipamento eletrônico X ou Y. Ou seja, nesse caso, não

1058
é possível que seja feita uma segregação entre hardware e software, dado
que, nessa hipótese, o equipamento não seria funcional.

Já no que se refere à hipótese 2, estamos diante de software que foi


desenvolvido para aperfeiçoar ou tornar mais eficiente o uso de
determinados equipamentos, agregar funcionalidades ou até mesmo
atender demandas específicas de cada cliente.

Nesses casos, dado o processo de desenvolvimento, adaptação e


parametrização a que o software está submetido, não se pode afirmar, de
partida, que o software é parte integrante do equipamento, ainda que por
razões de conveniência esteja previamente instalado no hardware.

De fato, nessa situação, há uma manifestação de vontade autônoma e


um negócio jurídico segregado no que tange à disponibilização do
software, que é independente do negócio jurídico de venda de hardware.
Há, portanto, duas manifestações de vontade visando à obtenção de dois
itens ofertados de forma segregada, sendo, portanto, estabelecidos dois
vínculos obrigacionais autônomos entre fornecedor e cliente. Em geral,
são, também, estabelecidos dois preços apartados, devendo, por
consequência, cada operação ser analisada, do ponto de vista jurídico-
tributário, de forma autônoma de acordo com a sua natureza e suas
características individuais.

2.2. Comentários pertinentes ao conflito de competência de ISS e ICMS em


casos de software embarcado: nossa visão sobre a matéria

Feitas as delimitações quanto à possibilidade de fragmentação


contratual nas hipóteses de software “embarcado”, é importante, antes de
se adentrar nos reflexos tributários decorrentes, notar que, sob o ponto de

1059
vista legal, o software está submetido à regra de proteção da propriedade
intelectual distinta daquela aplicável ao hardware.

É notório que no caso de fornecimento de hardware, há a transferência


de titularidade ao cliente, enquanto a entrega de software se caracteriza
como mera permissão de uso. Assim, ainda que o software seja instalado e
constitua um sistema operacional indispensável ao equipamento, a Lei do
Software não diferencia essa situação como aquela em que não se estaria
diante de necessidade de observância de proteção intelectual e
fornecimento via licenciamento.

Como resultado lógico-jurídico dessa proposição, existindo uma


materialidade sujeita à proteção de direito autoral que segregue o software
daquilo que constitua o seu suporte físico, não há justificativa para conferir
um tratamento jurídico conjunto a tais elementos pelo simples fato de o
software ser previamente instalado no hardware, ou ser comercializado
como parte de um conjunto de soluções (hardware, software e serviços),
para atender a demanda de determinado cliente.

Nessa linha, há de se destacar que o simples fato de a entrega dos dois


itens (hardware + software instalado) se realizar ao mesmo tempo não
desnatura a existência de duas operações diferentes, seja do ponto de vista
contratual, seja do ponto de vista tributário.

Na essência, o fato de o software assumir características distintas que o


aproximem de uma “mercadoria”, tal como ocorre no caso do “software de
prateleira”, não deveria alterar a possibilidade de individualizá-lo em
relação ao equipamento no qual está instalado, já que o software está
sujeito a um regime jurídico (e tributário) distinto daquele aplicável ao
hardware.

1060
Considerada essa individualidade, é controverso se no caso de
possibilidade de fragmentação de contrato de disponibilização de software
embarcado em hardware, por mera conveniência, se estaria diante da
tributação pelo ICMS ou pelo ISS.

A nosso ver, seria possível, para fins tributários, fazer uma alusão à
discussão jurisprudencial atualmente existente nas situações envolvendo
fornecimento de mercadorias associadas com prestações de serviço para o
deslinde da controvérsia.

Nesses casos, não raro, em que pese a Constituição Federal ter atribuído
ao Estado a autorização para a instituição de imposto sobre circulação de
mercadorias, a própria Carta Magna também concedeu competência aos
Municípios para a instituição de imposto sobre serviço de qualquer
natureza definidos em lei complementar, desde que não compreendidos na
competência tributária estadual (que é o caso do serviço de comunicação e
do serviço de transporte intermunicipal).

Ocorre que essa dualidade de competências gera, por vezes, uma


aparente incidência simultânea (ISS e ICMS) sobre o mesmo fato. Nesses
casos, o que parece ocorrer é uma dupla subsunção do fato a duas normas
diferentes.

Dizemos aparente incidência simultânea posto que não é admissível,


diante das diretrizes traçadas na Constituição Federal, que um fato reste
incluído em mais de um âmbito de competência constitucional e assim
acabe por haver a cobrança de dois impostos sobre o mesmo evento,
gerando um ônus excessivo em relação à carga tributária suportada pelo
contribuinte.

1061
Ora, da interpretação dos princípios constitucionais tributários, quer nos
parecer que o deslinde da questão reside na definição do que prevalece na
relação de fornecimento de mercadorias associadas com prestações de
serviço.

A respeito da prevalência da incidência do ISS ou do ICMS nas


hipóteses de atividades mistas, a jurisprudência vem adotando, também, o
critério da predominância da atividade para definir o imposto exigível. De
acordo com esse critério, ainda que em determinada operação haja
fornecimento de mercadorias, se o objeto da contratação for
preponderantemente a prestação de serviços, o imposto incidente será o
ISS. De outro lado, se o objeto da contratação for a aquisição, para o
consumidor final, de um bem, incidirá o ICMS.

O STF, nessa linha, já arguiu que “cabe ao intérprete perquirir se o


sujeito passivo presta um serviço marcado por um talento humano
específico e voltado ao destinatário final, ou desempenha atividade
essencialmente industrial” (ARE-AgR 839976, 10 de fevereiro de 2015).

Sob esse mesmo raciocínio, entendeu que hão de se observar dois


critérios básicos para o deslinde do conflito de competências entre ICMS e
ISS: “(i) verificar se a venda opera-se a quem promoverá nova circulação
do bem e (ii) caso o adquirente seja consumidor final, avaliar a
preponderância entre o dar e o fazer mediante a averiguação de elementos
de industrialização”. À luz desses critérios, “só haverá incidência do ISS
nas situações em que a resposta ao primeiro item for negativa e se no
segundo item o fazer preponderar sobre o dar” (AI-AgR 803296 e ADI n.
4.389/DF-MC).

1062
Bem assim, considerando os critérios essenciais para incidência do
ICMS, acima descritos, bem como nossas considerações iniciais acerca do
tema, entendemos que há fortes argumentos para sustentar a não incidência
do ICMS nos licenciamentos de direito de uso do software, mesmo nos
casos em que o software é entregue já instalado no hardware, desde que (i)
o software em questão não seja essencial ao funcionamento do hardware
em que está instalado, por não integrarem o equipamento de forma
indissociável; e (ii) a venda do software caracterize negócio jurídico
distinto da operação de venda do hardware.

Nosso entendimento tem por fundamento o fato de que o que se


licenciará será somente o direito de uso do software, sendo certo que a
propriedade intelectual deste permanecerá sob a titularidade dos seus
desenvolvedores. Não há, portanto, obrigação de dar324.

Segundo porque o fato de o software já vir gravado/instalado em um


hardware não significa que este passa a fazer parte indissociável do
aparelho, tanto que, na maioria dos casos, é, inclusive, possível realizar a
remoção do software, sem que o hardware perca sua funcionalidade ou
sofra qualquer tipo de dano.

Portanto, entendemos haver bons argumentos para sustentar que o


software instalado que não seja essencial ao funcionamento do
equipamento não deveria ser incluído no valor do equipamento, por se
tratar de produtos autônomos, não havendo relação principal versus
acessório entre esses dois produtos. Afastar-se-ia, com isso, a incidência
do ICMS.

Pela negativa, portanto, seria possível dizer que deve haver a incidência
do ISS no licenciamento do software325, enquanto o hardware deveria ser

1063
tributado pelo ICMS, sem a inclusão do software em sua base de cálculo.

Diferente é, porém, a situação de software “residente”. Nesses casos,


ainda que também haja o licenciamento do software “embarcado”,
prevalece a vontade de se adquirir um equipamento, ao que incidente o
ICMS.

Isso porque, à luz da relação jurídica contratual, não há dúvidas de que


as situações envolvendo o “software residente”, por sua indissociabilidade
com o hardware em que está acoplado, deve sofrer, por via transversa e
como componente da base de cálculo do ICMS do hardware, a incidência
desse imposto.

Com isso, não estamos querendo dizer que o negócio jurídico de


licenciamento resta desnaturado na hipótese de “software residente”. Pelo
contrário. Ainda se está diante de licenciamento, mas porque se está diante
da venda de um equipamento, consubstancialmente, o valor desse
licenciamento deve ser incorporado ao valor do bem, sendo, por
consequência, tributado pelo ICMS.

De toda forma, a despeito dos argumentos acima apresentados e de sua


robustez, não nos parece ser essa a linha de entendimento que vem se
firmando no âmbito do contencioso administrativo, conforme veremos na
sequência pela análise de precedentes que trataram da questão.

2.3. Comentários pertinentes ao conflito de competência de ISS e ICMS em


casos de software embarcado: evolução dos precedentes administrativos
sobre a matéria

Como explicado, é controverso se no caso de possibilidade de


fragmentação de contrato de disponibilização de software embarcado em

1064
hardware, por mera conveniência, se estaria diante da tributação pelo
ICMS ou pelo ISS.

Especificamente no que concerne ao entendimento jurisprudencial da


matéria, importante mencionar, uma vez mais, que essa discussão foi mais
profundamente explorada pela esfera administrativa.

Dessa forma, pautaremos nossa análise quanto a esse ponto pela análise
do entendimento exarado pelas Autoridades Tributárias administrativas,
mais especificamente, pelas decisões do Tribunal de Impostos e Taxas de
São Paulo (TIT) do Estado de São Paulo, pelas manifestações da
Consultoria Tributária da Secretaria de Fazenda do Estado de São Paulo
(SEFAZ/SP) e pelas manifestações da Secretaria de Finanças do
Município de São Paulo.

Nesse sentido, iniciamos nossos comentários com a menção ao


julgamento do AIIM n. 3.006.779-0 pelo TIT, no qual o contribuinte foi
autuado por não ter incluído na base de cálculo do ICMS o valor
correspondente ao software comercializado juntamente com equipamentos
de informática. Tal software era gravado em suporte físico (mídia) e
possuía valor individualizado em relação ao preço dos equipamentos,
tendo sido tributado, na ocasião, pelo dobro do valor de mercado do
suporte físico, conforme determinava o já revogado Decreto n.
51.619/2007326.

Para sustentar a tese de que o software comercializado não deveria


compor o valor dos equipamentos, o contribuinte juntou laudo técnico que
comprovou que o software comercializado não se confundia com o
equipamento, pois eram intercambiáveis e opcionais, não sendo essenciais
ao funcionamento do hardware.

1065
No caso, o Relator, prolator do voto vencedor, entendeu que o simples
fato de software e hardware serem comercializados ao mesmo tempo não
descaracterizaria “a natureza jurídica dos entes a serem tributados, sendo a
questão temporal mero indício e não prova conclusiva a demonstrar a
necessidade de inclusão do preço da licença de uso do software na base de
cálculo do hardware”.

Importante destacar que, no processo em referência, embora o software


não estivesse gravado no hardware, mas em mídia física comercializada
juntamente com os equipamentos, não parece ter sido esse o fator
determinante para que restasse firmado o entendimento de que o software
deveria ser dissociado do preço dos equipamentos, e receber tratamento
tributário autônomo. Em princípio, o alicerce do entendimento firmado se
deu a partir do fato de que o software comercializado não era essencial ao
funcionamento da máquina que o acompanhava, devendo, portanto, ser
tratados como produtos distintos que foram objetos de uma mesma
contratação.

Diferentemente do observado no julgamento acima, é de se citar a


decisão no julgamento do AIIM 3.041.929-3327 pelo TIT, no qual a questão
da essencialidade do software para o funcionamento normal do aparelho
não foi ressaltada pelo julgador, tendo sido dada maior relevância ao fato
de que o software instalado comporia o produto como uma solução
contratada pelo adquirente, de forma que o fornecimento do equipamento
com o software foi reputado como essencial, tendo em vista, não o
funcionamento básico do aparelho, mas o que seriam os interesses e
necessidades do contratante.

No caso em questão, em sede de Recurso Especial, o contribuinte


autuado frisou que não apenas o software em questão era customizado,

1066
mas que as centrais telefônicas já eram comercializadas com uma versão
básica de software, este sim tributado pelo ICMS, tendo sido apresentada a
decisão proferida no AIIM 3.006.779-0 como paradigma para a
interposição do Recurso Especial.

No entanto, a decisão do Recurso Especial foi no sentido de alargar o


conceito de software residente, distanciando-se do conceito de algo que
seria essencial ao funcionamento do aparelho.

A Consultoria Tributária da SEFAZ/SP também já se manifestou acerca


da questão na Resposta à Consulta Tributária n. 2.437, de 12 de fevereiro
de 2014, em que foi analisada operação de venda de hardware (no caso,
um pendrive) com software gravado.

Nesse caso, a Consultoria Tributária entendeu que ocorreria a


comercialização de um produto único (hardware com software instalado),
o que diferenciaria a situação de uma operação com software disciplinada
pelo Decreto n. 51.619/2007, vigente à época. Diante dessa situação, o
ICMS deveria incidir sobre o valor total da operação, compreendendo o
valor do hardware e do software conjuntamente328.

De fato, o que se observa nos casos analisados é que os julgadores em


âmbito administrativo estadual têm entendido que a aquisição do hardware
inclui o software, no sentido de que o que o cliente busca com a aquisição
do hardware não é simplesmente um equipamento apto a desenvolver sua
funcionalidade mínima, mas uma solução integrada.

Tanto que, em mais de um julgado, é traçado o paralelo entre a


aquisição de hardware com o software, com a hipótese de aquisição de
veículo com computador de bordo instalado que possui um software que

1067
permite o funcionamento do computador da forma almejada pelo cliente.
Ressaltamos que esse não é um bom paralelo, pois os computadores de
bordo adquiridos de fábrica, juntamente com os veículos, de fato integram
o veículo, não sendo possível fazer a sua remoção, já que o painel é
adaptado para o recebimento desse acessório.

De toda forma, por todo o acima exposto, a tendência atual na esfera


administrativa, embora ainda não completamente consolidada no TIT, é no
sentido de entender que, em se tratando de software instalado em
equipamento, ainda que esse não seja essencial ao funcionamento do
equipamento, seu valor comporia o preço do hardware em que se encontra
instalado e, por consequência, integraria a base de cálculo do ICMS.

Por outro lado, recentemente, o Município de São Paulo, por meio de


seu Secretário Municipal de Fazenda, publicou o Parecer Normativo SF n.
1, de 18 de julho de 2017, por meio do qual se assentou o entendimento,
aplicável a todos aqueles estabelecimentos situados nessa Municipalidade,
de que

[o] Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação, por


meio de suporte físico ou por transferência eletrônica de dados (“download de
software”), ou quando instalados em servidor externo (“Software as a Service –
329
SaaS”), enquadra-se no subitem 1.05 da lista de serviços do caput do artigo 1º da
Lei n. 13.701, de 24 de dezembro de 2003.

Ou seja, por meio desse Parecer Normativo, fica evidente a intenção do


Município em tributar pelo ISS qualquer situação envolvendo software,
incluindo software embarcado em “suporte físico”, ou seja, hardware.

Mais que isso, pela amplitude da linguagem utilizada em referido


Parecer, operações com software, até mesmo o “software residente”,
poderiam ser albergados pela incidência do ISS.

1068
Nota-se, portanto, que a questão, na esfera administrativa, está longe de
ser pacificada. O que se denota, especialmente, é que os entes tributantes
pretendem cobrar tributos em operações de software “embarcado”, haja ou
não a prevalência da natureza do objeto contratual como “serviço” ou
como “fornecimento de mercadoria”, haja ou não a individualização de
negócios jurídicos.

3. CONCLUSÃO

Não há dúvida de que o tema em questão ainda vai demandar uma


análise mais aprofundada do Poder Judiciário, e com certeza não irá se
resolver quando for definitivamente analisado e definido pelo STF a
natureza jurídica do software e sua incidência tributária (ICMS, ISS ou
nenhum dos dois).

Isso porque, não obstante a potencial definição a curto prazo do STF


acerca da tributação do software, fato é que nos casos em que a
disponibilização do software ocorra juntamente com o hardware, há uma
clara tendência dos Estados no sentido de qualificar toda a operação como
“fornecimento de mercadoria”, operação essa sujeita ao ICMS, já que se
está “entregando” um equipamento – mercadoria – com um software
instalado.

Assim, conforme apontamos acima, acreditamos que a análise do tema


em questão passa, necessariamente, por identificar a natureza da
contratação realizada, bem como a funcionalidade do software.

Ou seja, os programas de computador que são parte inerente do


equipamento, cuja instalação ocorre no próprio processo de fabricação e
cuja utilização é fundamental para o próprio funcionamento do
equipamento, não se confundem com aqueles que são desenvolvidos para

1069
aperfeiçoar ou tornar mais eficiente o uso dos equipamentos, agregar
funcionalidades e também atender demandas específicas de cada cliente.

No primeiro caso, ainda que também haja o licenciamento do software


– denominado “residente” –, prevalece a vontade de se adquirir um
equipamento, suscitando a incidência do ICMS.

Por outro lado, já no segundo caso, entendemos haver bons argumentos


para sustentar que o software instalado que não seja essencial ao
funcionamento do equipamento não deveria ser tratado como parte do
equipamento, por se tratar de produto autônomo, não havendo relação
principal versus acessório entre esses dois produtos. Estar-se-ia, nesse
caso, diante de negócios jurídicos independentes.

1070
Tributação de negócios desenvolvidos por
meio de aplicativos associados aos serviços
de hospedagem no Brasil
330
Leonardo Aguirra de Andrade

1. INTRODUÇÃO

A economia de compartilhamento (“sharing economy”) tem como ideia


central um modelo de produção, consumo e distribuição de bens e serviços
por meio do qual as pessoas compartilham – ou, melhor, comercializam –
seus ativos ou recursos excedentes por meio de acordos individuais (peer-
to-peer arrangements)331.

Trata-se da popularização do acesso aos meios de produção de riqueza


que, tradicionalmente, (i) estavam restritos a poucos agentes de mercado,
(ii) cujo acesso (pelas vias tradicionais) encontra barreiras regulatórias
importantes (tais como as licenças ou autorizações do Estado) ou (iii)
cujos recursos não estavam disponíveis para comercialização em um
ambiente institucionalizado. Esse fenômeno tem afetado
significativamente o consumo e, em alguma medida, prejudicado os
tradicionais agentes de mercado332 e favorecido o consumidor.

O compartilhamento pode se consubstanciar de diferentes formas, entre


elas: (i) na cessão de uso de um automóvel no período em que o seu
proprietário não está fazendo uso dele333; (ii) na prestação de serviços de
passeio com cães, enquanto os donos estão no trabalho334; (iii) na prestação
privada de serviços de transporte de pessoas, como ocorre, a título de
exemplo, por meio da famosa plataforma Uber335; ou, ainda, o que é objeto

1071
do presente artigo, (iv) na cessão de uso de imóvel por determinado
período de tempo, a qual é comercializada336-337.

O ponto em comum entre tais negócios de compartilhamento é o uso de


plataformas digitais, para fins da celebração de negócios jurídicos e da
realização dos respectivos pagamentos. As atividades das plataformas,
portanto, são realizadas apenas online, ou seja, em lugar (físico) nenhum.
Justamente em razão dessa característica, a questão ganha relevo no
Direito Tributário Internacional. Isso porque a “presença digital” afasta a
aplicabilidade dos tradicionais elementos de conexão tanto com os países
de fonte como com os países de residência, majorando o risco de ausência
de tributação da renda gerada nessas atividades (doble non-taxation)338.

Diante disso, é atualíssima a preocupação com a revisão dos standards


jurídicos aplicáveis para fins de definir qual jurisdição tem competência
para tributar a renda decorrente das atividades realizadas online339. Para
endereçar o assunto, a Ação 1 do BEPS340 apresentou três possíveis
alternativas para efetivar essa tributação:

(i) avaliar viabilidade da caracterização de um estabelecimento permanente


341
digital, com base em novos parâmetros de elementos de conexão ;
(ii) refletir sobre a tributação dos pagamentos realizados pelos consumidores
dessas empresas digitais por meio de retenção na fonte (“withholding income tax on
342
digital transactions”), em casos específicos ;
(iii) buscar equalizar a tributação das atividades tangíveis e digitais,
considerando-se inclusive a criação de um novo tributo sobre atividades online.

No Brasil, além das questões relativas à tributação da renda, também se


mostra oportuno examinar a aplicabilidade dos atuais critérios aplicáveis à
incidência do Imposto Sobre Serviços (ISS) relativamente às atividades
desprovidas de um estabelecimento prestador tangível.

1072
Do ponto de vista tributário, verifica-se uma dificuldade (i) na
qualificação da natureza dessas novas atividades digitais, (ii) na obtenção
de informações sobre os fluxos financeiros correlatos aos respectivos
negócios e (iii) na identificação e tributação da renda tributária auferida
pelas empresas titulares dos referidos sites pelas autoridades fiscais, dada a
ausência de domicílio fiscal físico dessas empresas. Tais dificuldades são,
exatamente, aquelas identificadas pela OCDE/G-20 na Ação 1 do BEPS,
em seu Relatório Final, como (i) “nexus”, (ii) “data” e (iii)
“characterisation”343.

Especificamente em relação aos serviços de hospedagem, a internet


viabilizou modificações relevantes, (i) no modus operandi do anúncio do
imóvel a ser utilizado/compartilhado, (ii) no contato entre as partes
contratantes e (iii) no fluxo de pagamento da remuneração pelo uso do
imóvel.

Para enfrentar essas questões em relação ao objeto central do presente


artigo, é oportuno, primeiramente, examinar os detalhes dos negócios
desenvolvidos por meio de aplicativos associados aos serviços de
hospedagem, conforme abaixo exposto.

2. O MODELO DE NEGÓCIO E SUAS ATIVIDADES

De maneira geral, as empresas detentoras de plataforma virtual


associada ao serviço de hospedagem disponibilizam uma plataforma344
online para que proprietários de imóveis anunciem sua locação e, por outro
lado, os indivíduos interessados (turistas-locatários) possam obter
informações sobre tais imóveis, seus respectivos bairros, relatos pessoais
(“reviews” ou depoimentos) de turistas-locatários que anteriormente
tenham realizado a sua locação.

1073
Da perspectiva econômica, essa atividade pode ser entendida como um
fator de correção de falha de mercado, na medida em que atua como
redutor do desequilíbrio entre a oferta e a demanda no mercado de
hospedagem, tendo por base (i) a conexão (digital) entre pessoas e
informações, (ii) a oferta de preços mais baixos em comparação com a
tradicional rede hoteleira, e (iii) o aumento da confiança por meio do
sistema de feedbacks dos viajantes345. Tais plataformas compreendem,
portanto, um ambiente digital criado para facilitar a comunicação entre
locadores e locatários de imóveis346.

A própria plataforma também disponibiliza um sistema de pagamento


correspondente à operação, por meio de cartão de crédito ou empresa
(terceirizada) de meios de pagamento online (tais como PayPal, Sepa,
Moip, Ebanx etc.). Concluído o contrato, a empresa cobra – em geral, das
duas partes – uma taxa de serviço calculada sobre o valor do aluguel, em
contrapartida pelo uso da plataforma.

Portanto, como apenas provedoras do ambiente de troca de informações


e de comercialização do direito de uso de imóveis, as empresas detentoras
de plataforma online associadas ao serviço de hospedagem não são
proprietárias de qualquer acomodação. Nesse sentido, tais empresas não
são partes dos contratos celebrados relativamente à locação ou à
hospedagem347.

O acordo entre o proprietário da acomodação e o usuário é estabelecido


exclusivamente entre eles e se caracteriza como sendo de licença de
ocupação de espaço por período de tempo estabelecido. Essa ocupação
pode ser relativa ao imóvel por completo (uso exclusivo) ou a apenas uma
parte dele, por exemplo, quando há a locação de apenas um quarto de um
apartamento, que, por sua vez, continua sendo utilizado pelo proprietário

1074
durante o período de hospedagem. Os valores (preço do aluguel), termos e
condições deste acordo são estabelecidos entre as partes do contrato de
locação (locador e locatário), portanto, sem a interferência significativa da
empresa detentora da plataforma, diferentemente do que ocorre em outros
segmentos da economia digital. Por exemplo, o preço (“retribuição”) do
contrato – elemento essencial do contrato de aluguel, conforme o art. 565
do Código Civil348 – não é definido pelo site de hospedagem.

Portanto, a partir do exame das principais características desse modelo


de negócio, é possível afirmar que existe uma relação triangular, na qual
são formalizados três contratos principais349: (i) o contrato entre a empresa
(site) e o proprietário (ou administrador) do imóvel a ser locado; (ii) o
contrato entre a empresa (site) e o turista (ou hóspede) que é o locatário do
imóvel ou de parte dele; e, por fim (iii), o contrato entre o proprietário (ou
administrador) do imóvel e o referido turista (ou hóspede). Essa relação
triangular pode ser ilustrada da seguinte maneira:

1075
Neste momento, é possível concluir que a empresa detentora da
plataforma exerce duas atividades principais: (i) o fornecimento de um
marketplace350-351 para a divulgação e consulta de imóveis para locação e
(ii) a intermediação352 dos contratos concluídos entre locadores e
locatários, usuários da plataforma. Apesar de haver alguma proximidade,
essas duas atividades merecem um tratamento diferenciado em razão de
suas particularidades e objetivos, pois:

i) de um lado, no marketplace, verificam-se atividades voltadas à redução de


custos de transação e ao aumento da segurança para os usuários (locatários e
locadores) da plataforma, tais como:
a) a divulgação de anúncios/publicidade no website por parte dos proprietários
ou administradores dos imóveis a serem locados;
b) a obtenção de informações, por parte dos locatários, sobre o imóvel e suas
características (retratadas por meio de fotos e vídeos), sobre o país, a cidade,
o bairro onde ele está localizado;
c) a obtenção de informações sobre as experiências anteriores dos locatários que
já locaram o mesmo imóvel;
d) a avaliação dos locadores e locatários pelos próprios usuários da plataforma,
conforme a suas experiências anteriores.
ii) de outro lado, os serviços de intermediação de contrato não dependem das
atividades acima e, como tal, poderiam ser realizados independentemente das
aludidas atividades. Trata-se da disponibilização de um ambiente
institucionalizado de comercialização de direitos de uso de imóvel. Para
ilustrar, seria oportuno fazer uma comparação, por analogia, com a atividade
de mercado de bolsa de valores, em cujo ambiente compradores e vendedores
de determinados direitos se encontram (digitalmente) para celebração de
negócios jurídicos, tomando os riscos da assimetria de informação (que é
objeto da atividade (i) acima) quanto aos detalhes do objeto comercializado
(no caso, o imóvel). Nesse caso, tal como uma bolsa de valores mobiliários, a
plataforma assume o risco do não pagamento por parte do usuário-locatário,
na medida em que, mesmo que o locatário não venha a realizar o pagamento
do aluguel, o locador/administrador do imóvel receberá o aluguel acordado.

Superada a análise acerca da caracterização das atividades intrínsecas


ao modelo de negócio adotado pelas empresas detentoras de plataforma
virtual associada ao serviço de hospedagem, passa-se a analisar seus
reflexos tributários.

1076
3. A TRIBUTAÇÃO DA ATIVIDADE

Para fins didáticos, a tributação será segmentada neste artigo entre (i)
tributação do consumo; e (ii) tributação da renda. É o que passa ser
examinado a seguir.

3.1. A tributação do consumo

Atualmente, no Brasil, os impostos que regem a tributação sobre o


consumo de bens e serviços, relevantes para os fins do presente artigo, são,
principalmente, o ICMS e o ISS.

As questões relativas à tributação da economia digital deixam clara a


pertinência da crítica ao modelo brasileiro de segregação da tributação do
consumo entre serviços e mercadorias, pois se trata de materialidades
imbricadas e, muitas vezes, de qualificação indissociável353-354, o que gera
certa dificuldade na avaliação da tributação sobre o consumo.

Em razão da limitação de espaço, este artigo examinará apenas as


questões relativas à incidência de ISS sobre a atividade em questão.

3.1.1. A ausência de tributação sobre atividade marketplace e a tributação da


intermediação de contratos pelo ISS

Como visto acima, os websites de hospedagem em questão realizam


duas atividades distintas: (i) a disponibilização de um marketplace para
troca de informações sobre imóveis; e (ii) o serviço de intermediação de
contratos.

Não há, na lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003, nenhuma


hipótese de serviço que contemple a atividade de divulgação ou consulta
de anúncios de imóveis para locação, motivo pelo qual não pode ser

1077
cobrado o ISS sobre essa atividade, sob pena de violação aos princípios da
tipicidade e legalidade.

Nesse particular, destaca-se o ensinamento de Eduardo Botallho no


sentido de que o armazenamento de dados objeto das comunicações
realizadas online pelos websites não se qualifica como serviço passível de
tributação pelo ISS355. Portanto pode-se dizer que a atividade de
disponibilização de um ambiente digital de interação entre pessoas não foi
capturada pelo legislador complementar como hipótese de incidência do
ISS.

Diante desse cenário, parece oportuna a realização de ajustes na


legislação em vigor, para a adequação das normas tributárias à nova
realidade, vale dizer, para viabilizar a tributação das atividades de
marketplace. Por se tratar de matéria inerente ao escopo de incidência do
ISS, tal alteração somente poderia ser efetivada em sede de lei
complementar, em observância ao art. 146 da CF/88.

Por outro lado, o item 10.02 da lista anexa à Lei Complementar n.


116/2003 prevê os serviços relativos a “agenciamento, corretagem ou
intermediação de títulos em geral, valores mobiliários e contratos
quaisquer”. Sendo assim, é possível a incidência do ISS sobre o serviço de
intermediação de contratos prestado por empresa detentora de plataforma
online associada ao serviço de hospedagem, desde que legislação
municipal assim estabeleça.

A segregação clara do quantum relativo a cada parte (marketplace


versus intermediação de contratos) que compõe o preço cobrado dos
usuários, nesse contexto, parece ser recomendável, a fim de que seja
oferecida à tributação, pelo ISS, tão somente a materialidade que se refere

1078
ao serviço de intermediação de contratos. Eis aqui uma oportunidade de
redução de carga tributária para as empresas do setor que não fazem tal
segregação entre marketplace e intermediação de contratos.

Em resumo, para fins do ISS, a atividade dos websites de hospedagem


somente deve ser tributada na parte que se refere à intermediação de
contratos, o que não se confunde com a outra atividade por eles realizada,
qual seja, a disponibilização de marketplace para anúncio e consultas de
imóveis a serem locados, sobre a qual não há incidência de ISS.

3.1.2. Onde é devido o ISS sobre intermediação online de contratos?

Uma vez enfrentada a questão da materialidade tributável e suas


espécies tributárias, cabe analisar – agora, sim, dentro do escopo das
preocupações atinentes à tributação da economia digital – qual município
seria competente para exigir o ISS na hipótese acima mencionada. Em
outras palavras, onde ocorreu a intermediação de contratos, considerando
que a atividade do website de hospedagem se dá de maneira online?

Refletindo sobre situação análoga, Renato Nunes Confolonieri afirma


que, tratando-se da atividade de intermediação de negócio envolvendo
agentes situados em municípios diferentes, “o ISS deve ser recolhido para
a Municipalidade onde foram efetivamente prestados os serviços de
intermediação de negócios” e que essa prestação ocorreria onde estariam
os funcionários e a estrutura administrativa da empresa que realizou a
intermediação356. Faz-se referência a esse estudo com vistas a ilustrar como
os parâmetros aplicáveis no exame de materialidades tangíveis são
impertinentes ao estudo da tributação da economia digital, simplesmente
porque tais critérios não respondem às atuais demandas.

1079
A questão torna-se ainda mais complexa, porque, de acordo com o art.
3º da Lei Complementar n. 116/2003, os serviços do item 10.02 da sua
lista anexa (no qual estão inseridos os serviços de intermediação de
contratos em questão) devem ser oferecidos à tributação no local do
estabelecimento do prestador do serviço.

Deixando de lado as peculiaridades de cada empresa do segmento de


websites de hospedagem, considera-se, neste artigo, a hipótese em que
determinada empresa desse segmento não tenha estabelecimento no Brasil,
nem “filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de
representação ou contato”, como prevê o art. 4º da Lei Complementar n.
116/2003, uma vez que todas as suas atividades podem ser realizadas
online. Nesse caso, onde seria devido o ISS sobre a atividade em questão?
É o que se passa a examinar abaixo.

A meu ver, o “local” previsto no art. 4º da Lei Complementar n.


116/2003357 se refere a um local físico ou tangível. Não parece que o
legislador contempla a hipótese de um “local” virtual, e esse entendimento
está alinhado também com o princípio da territorialidade, adotado pela
CF/88, para fins da tributação dos serviços358.

Nesse sentido, a CF/88, em seu artigo 156, § 3º, II, delegou à lei
complementar a atribuição de isentar a exportação de serviços à tributação
pelo ISS (“excluir da sua incidência exportações de serviços para o
exterior”), considerando os limites (físicos) territoriais do Brasil.

Assumindo tal atribuição, a Lei Complementar n. 116/2003 isentou, em


seu art. 2º, a exportação de serviços, estabelecendo que os serviços cujos
resultados se verifiquem no Brasil não estão isentos à tributação pelo ISS.
Aplicando uma interpretação, a contrario senso, conclui-se que estão

1080
isentos os serviços (i) desenvolvidos no exterior (que já estariam
desonerados de tributação por força do princípio da territorialidade em sua
acepção de local físico) e (ii) desenvolvidos no Brasil, porém cujos
resultados são caracterizados no exterior359.

Como se vê, os parâmetros mencionados acima estão baseados em uma


noção de território ou de estabelecimento (art. 4º da Lei Complementar n.
116/2003) físico ou tangível360, que, como tal, são insuficientes para lidar
para com as questões da tributação da economia digital.

Relativamente às atividades desenvolvidas exclusivamente na internet,


é impertinente, inclusive, falar-se em importação ou exportação de serviço,
pois inexistem limites territoriais bem definidos no ambiente digital361, os
quais são os pressupostos ontológicos do conceito de importação ou
exportação.

Seria cabível especular que o ISS seria devido onde (local físico) o
website foi desenvolvido, o que, todavia, não resolveria o problema por
completo, pois o local da idealização tecnológica do site não se confunde
com o local onde está situado o estabelecimento que presta os respectivos
serviços. Também não parece tecnicamente adequado considerar que o
local onde está localizado o servidor (hardware) contratado pelo website
seria o local onde os programas informáticos (software) realizam as suas
atividades. A meu ver, faz-se necessário reconhecer que a internet é uma
dimensão estanque do mundo físico e, como tal, deve ser tratada, vale
dizer, como um local desprovido de identificação no meio físico.

Por outro lado, seria factível admitir – mesmo não tendo segurança a
respeito da definição do local onde os serviços foram desenvolvidos e do
local em que os serviços são prestados – que tal desenvolvimento ocorreu

1081
fora do Brasil, sobretudo porque se trata de empresas estrangeiras que, por
hipótese, não têm estabelecimento no Brasil. Mesmo que determinado
website de hospedagem tenha, por exemplo, uma filial no Brasil, seria
necessário avaliar se se trata de um estabelecimento prestador do serviço
de intermediação de contratos, pois, caso contrário, ainda assim, tratar-se-
ia de um serviço realizado no exterior. Até porque essa filial poderia ter
outras funções (comerciais, por exemplo) que não se confundem com a
efetiva prestação de serviço de intermediação.

Para viabilizar o aprofundamento do exame da questão, adota-se, neste


artigo, a hipótese na qual o website de hospedagem não tem
estabelecimento no Brasil (seja considerando a internet como meio sem
espaço físico – como é o entendimento ora defendido –, seja considerando
que o website teria sido desenvolvido fora do Brasil), e os seus clientes
situados no Brasil realizam negócios online em sua plataforma. Nesse
caso, haveria incidência de ISS no Brasil? A resposta a essa questão toca
em uma divergência doutrinária interessante.

Por um lado, o Professor Luís Eduardo Schoueri sustenta, com base no


princípio do destino, que, tendo o Brasil exonerado as exportações à
tributação pelo ISS, por coerência, seria necessário tributar as importações,
ainda que o desenvolvimento tenha ocorrido no exterior362. Com uma linha
de raciocínio semelhante (embora relativamente a um objeto de estudo
diferente), Gustavo Vetori defende que “[f]az sentido que os tributos sobre
o consumo sejam cobrados no país em que ocorre o consumo”, com base
na lógica do princípio do destino363.

Com entendimento diverso, Sergio André Rocha aponta que é


inconstitucional a exigência de ISS sobre serviços realizados no exterior e,
como tal, que tem como única conexão com o Brasil o fato de o tomador

1082
do serviço situar-se no Brasil364. Igualmente crítica à ideia de tributação de
ISS sobre serviços desenvolvidos no exterior, Simone Rodrigues Duarte
Costa afirma que a desoneração das exportações e as razões meramente
econômicas não podem autorizar a incidência do ISS em descompasso
com as normas constitucionais365.

O problema central é que a Lei Complementar n. 116/2003 não define,


expressamente, qual deve ser o tratamento a ser dado às importações de
serviços, razão pela qual a sua interpretação deve ser construída a partir do
regramento aplicável à exportação de serviço, dado tratar-se de uma única
operação vista de dois ângulos366. Nesse ponto, apesar de empregar
comando normativo não claro, o legislador complementar sinalizou dois
parâmetros pertinentes ao exame da presente questão, quais sejam:

a) no art. 1º, § 1º da Lei Complementar n. 116/2003, o legislador aponta, a


contrario senso, que os serviços cuja prestação tenha se encerrado no exterior
não estariam submetidos à tributação pelo ISS no Brasil;
b) no art. 2º, parágrafo único, da Lei Complementar n. 116/2003, o legislador
adotou o critério do local do resultado como parâmetro para isentar a
exportação dos “serviços desenvolvidos no Brasil”;
c) invertendo-se os critérios utilizados no parágrafo único do art. 2º da Lei
Complementar n. 2003 (local do desenvolvimento e local do resultado), seria
possível afirmar que não devem ser tributados no Brasil os serviços (i)
desenvolvidos no exterior e (ii) cujos resultados também foram percebidos no
exterior.

Da leitura dos dispositivos legais acima, nota-se que existem dois


elementos que poderiam atrair para o Brasil a tributação pelo ISS: o local
do desenvolvimento (ou efetiva prestação dos serviços) e o local onde se
dá o seu resultado. Se esses dois elementos se referirem a um local fora do
Brasil, não se trata de importação de serviços, e não haverá aqui
tributação. No entanto, caso o serviço seja desenvolvido fora do Brasil e os

1083
seus resultados se verifiquem aqui no Brasil, não haverá obstáculo à
tributação pelo ISS.

Cabe reconhecer que há um certo desconforto com essa conclusão, por


força do princípio da legalidade, uma vez que o regramento legal do tema
não é claro, e por força do princípio da territorialidade, uma vez que o
serviço foi realizado no exterior. Por um lado, a falta de clareza não
impede a interpretação sistemática dos dispositivos legais acima
mencionados. Por outro lado, o princípio da territorialidade não se limita
ao local da prestação do serviço, devendo também considerar o local onde
são percebidos os resultados desse serviço.

Essa interpretação é muito pertinente à avaliação em perspectiva da


problemática da tributação da economia digital. Isso porque, de fato, tais
serviços não foram prestados em nenhum lugar, uma vez que a atividade
se dá de maneira online, sendo o local do consumidor o único passível de
percepção física. Essa interpretação também está em conformidade com a
observância do princípio do destino. A adoção deste princípio é
recomendada pela Organização Mundial do Comércio (OMC) – da qual o
Brasil é integrante – em relação à tributação sobre o consumo367, em seu
Working Party on Border Tax Adjustments, de 1970368.

A tributação sobre consumo no ambiente internacional deve ocorrer


onde se dá o consumo, e não onde ocorre a criação do produto/serviço
consumido. Nesse particular, destaca-se o entendimento de Misabel
Derzi369, segundo a qual a Lei Complementar n. 116/2003 optou por
aplicar o princípio do destino, que submete as importações à incidência do
ISS “onde se localizar o estabelecimento do tomador”.

1084
Por outro lado, em homenagem à clareza e à segurança jurídica, seria
oportuno alterar a Lei Complementar n. 116/2003 para que ela passasse a
conter, expressamente, um comando normativo no sentido da tributação
especificamente dessas atividades online de intermediação de contratos na
pessoa do tomador dos serviços (consumidor).

Ou seja, o problema não está no plano constitucional, sendo possível a


lei complementar definir o aspecto territorial do fato gerador do ISS,
sobretudo se tratando de atividade que, a bem da verdade, não ocorre em
lugar (físico) algum.

Seguindo essa lógica, a Lei Complementar n. 116/2003 estaria deixando


expressa a opção do legislador complementar – já constante na atual
redação dessa lei, segundo meu entendimento – no sentido de não abrir
mão do emprego do elemento “resultado” para fins do exercício da
competência tributária sobre a importação de serviço. A meu ver, o
resultado para tais fins deve ser entendido como utilidade final ou
benefício que o serviço proporciona para o respectivo tomador
(consumidor)370.

Uma vez identificado o local da percepção do resultado, é cabível a


exigência de ISS pelo Munícipio competente, que, no caso de
intermediação online de contratos que tenham como objeto a locação de
imóvel, será o Município do local do imóvel, pois é ali onde se dá o
consumo. Não havendo estabelecimento prestador no Brasil, a exigência
recairia sobre a pessoa (turista-hóspede) “vinculada ao fato gerador” do
ISS, nos termos do art. 6º da Lei Complementar n. 116/2003.

Por fim, cabe registrar que, nesse ajuste na Lei Complementar n.


116/2003, também seria recomendável alterar a terminologia adotada no

1085
seu aludido art. 6º, especificamente para a hipótese em que os serviços não
são prestados no Brasil, mas seu resultado é aqui percebido. Nesse sentido,
seria adequado tratar o tomador do serviço como contribuinte, e não como
responsável pelo recolhimento do ISS. Isso porque, neste caso, o fato
gerador do ISS se consubstancia na utilização do serviço no Brasil, e não
na sua prestação; até porque o consumidor-importador é a única pessoa
(residente no País) que tem relação pessoal e direta com o fato gerador,
nos termos do art. 121 do CTN.

3.2. Tributação sobre a renda

Como as atividades das plataformas de hospedagem podem ser


realizadas integralmente online, vale dizer, de maneira desvinculada de um
domicílio físico, vem à tona a questão relativa ao nexus ou elemento de
conexão dessa atividade com o país que teria competência para tributar a
renda por ela gerada.

Nesse sentido, não sendo possível coletar informações (data)


suficientes para a identificação do local onde tais atividades são realizadas,
é factível que a renda respectiva não seja tributada por nenhuma jurisdição
(dupla não tributação).

Em relação a muitos países onde as plataformas de hospedagem atuam,


é provável que o único elemento de conexão – entre a empresa proprietária
do website e a jurisdição – se refira ao fluxo financeiro correlato aos
pagamentos realizados pelos usuários da plataforma. Hoje, tal
identificação ainda é possível porque as moedas eletrônicas (bitcoins)
ainda podem ser consideradas uma exceção em comparação com as
moedas convencionais, razão pela qual as instituições financeiras são,
hoje, uma fonte de informação importante na guerra contra o sigilo

1086
financeiro. No entanto, é cabível cogitar que, no futuro, nem sequer os
fluxos financeiros seriam passíveis de identificação pelas autoridades
fiscais.

Nesse cenário, torna-se pujante a preocupação das autoridades fiscais


com a eventual perda de arrecadação fiscal nesse mercado e em outros da
economia digital. É nesse contexto que a Ação 1 do BEPS cogita o estudo
de viabilidade de três caminhos para endereçar a tributação da renda
gerada na economia digital: (i) a alteração do conceito de nexus
(estabelecimento permanente), no sentido de construir uma noção de
estabelecimento permanente digital; (ii) a tributação dessa renda por meio
da exigência de retenção na fonte, por ocasião dos pagamentos por parte
dos usuários das plataformas online; e (iii) a equalização da carga
tributária entre empresas com atividades tangíveis e as empresas com
atividades digitais.

A adoção de um conceito de estabelecimento permanente digital,


apenas com base na “presença econômica significativa”371, mesmo sem a
existência de um local físico, seria um divisor de água na história no
Direito Tributário Internacional372. Nesse particular, a Ação 1 do BEPS
cogita alterar as regras atuais relativas à caracterização de um
estabelecimento permanente, previstas, por exemplo, no parágrafo 1º do
artigo 5º da Convenção-Modelo da OCDE, que faz referência a um local
fixo (físico) no qual os negócios de uma empresa são executados no todo
ou em parte.

Como tal parâmetro (existência física) não atende às demandas da


economia digital e não haveria nenhum obstáculo ontológico para sua
reformulação373, é oportuna a sua revisão, a fim de atender à atuais
necessidades da tributação da economia digital.

1087
Os novos parâmetros, cogitados pela OCDE/G20, estariam voltados a
estabelecer o direito de tributação da renda gerada nas atividades da
economia digital no Estado de fonte, de maneira desvinculada do conceito
de presença física como pré-requisito para atração da tributação dos lucros
empresariais374.

A conceituação de estabelecimento permanente, nesse contexto, daria


menor importância para a identificação de elementos tangíveis para, de
modo inovador, se ater à “existência digital substancial” (substantial
digital presence) do negócio realizado online pelos agentes da economia
digital375.

Nesse particular, na Ação 1 do BEPS, são apresentadas algumas


sugestões de critérios para tal identificação da presença digital, tais como
(i) o local onde está localizado um elevado número de contratos celebrados
pelos consumidores com as plataformas digitais, (ii) a localização da
infraestrutura de pagamento ou de entrega de produtos atrelada à atividade
digital, (iii) a localização da origem das informações coletadas quanto aos
pagamentos realizados, tais como faturas de cartão de crédito376.

No âmbito doutrinário, há outras sugestões para tanto, dentre as quais se


destaca aquela elaborada por Pasquale Pistone e Peter Hongler, que
sugerem critérios bastante próximos – porém mais assertivos – em relação
aos parâmetros comentados pela OCDE/G20, na Ação 1 do BEPS, tais
como (i) volume de negócios, (ii) definição de algum gatilho (acima de mil
negócios), (iii) avaliação em determinado período (um mês, um ano), e (iv)
um valor mínimo de receita contemplada pelo escopo de análise377.

A viabilidade desses novos parâmetros tem dois obstáculos claros: (i) a


dificuldade política correlata à redução do poder dos Estados de

1088
residência, na medida em que a ampliação do conceito de estabelecimento
permanente institucionalizaria a perda de arrecadação por tais Estados de
residência (hoje tratado como mero problema de evasão fiscal), o que
coloca dúvida a respeito de quão sérias são as cogitações apresentadas pela
OCDE/G20378; e (ii) a falta de eficácia jurídica (enforcement) em relação
às atividades que, atualmente, são realizadas exclusivamente no meio
online379.

A segunda sugestão para o endereçamento da questão, como dito,


refere-se à exigência de imposto de renda na fonte em determinados tipos
de negócios digitais380. Em um cenário da dificuldade na identificação do
estabelecimento que está realizando a atividade online, a saída para
permitir – ainda que parcialmente – a tributação da receita gerada nessa
atividade seria atribuir a uma pessoa (física ou jurídica) – chamada de
“collecting agent” – a responsabilidade de pagar o tributo.

Sobre o tema, cabe registrar o trabalho de Yariv Brauner e Andres


Baez, que sugerem a instituição de um novo tributo de abrangência global,
com alíquota de 10%, que estaria submetido à sistemática de retenção na
fonte e recairia sobre os pagamentos realizados por residentes no interesse
de não residentes em contrapartida à realização de serviços específicos
(excluídos os salários, os dividendos e os bens e serviços realizados por
humanos). Segundo os autores, a instituição desse novo tributo dependeria
da cooperação internacional para a criação de um sistema único de
retenção na fonte381.

Existem dois problemas relacionados com essa sugestão: (i) a sua


incompatibilidade com o atual modelo adotado em mais de três acordos
bilaterais para evitar a bitributação (a consequente necessidade de reformar
tais documentos); e (ii) a possível popularização das moedas eletrônicas

1089
(bitcoins), que impossibilitaria a identificação dos fluxos financeiros e dos
agentes envolvidos, de modo a tornar sem eficácia a política de retenção
do imposto de renda na fonte382.

Uma terceira sugestão apresentada na Ação 1 do BEPS diz respeito à


equalização da carga tributária que recai sobre as empresas com presença
física e as empresas com presença econômica significativa apenas online
em determinado país. Em linhas gerais, a ideia examinada tem com base
(i) a criação de uma plataforma digital de controle de operações, as quais
deveriam ser obrigatoriamente registradas pelos consumidores locais; ou
(ii) a instituição de um tributo com base no número de usuários dos
websites ou de acordo com o volume de dados coletados no país.

Essa sugestão tem como premissa a ideia de que os usuários dos


websites e as empresas com atividade online irão se submeter às regras
impostas para obtenção de informações relativas às atividades online. No
entanto, tal premissa não parece ser factível, por ausência de eficácia
jurídica (enforcement) em relação às empresas que não têm domicílio na
jurisdição a qual seria responsável por impor essa exigência.

A meu ver, as sugestões acima mencionadas não têm chance alguma de


se concretizar de maneira eficiente, enquanto estiverem desassociadas de
uma preocupação com o incentivo ao cumprimento voluntário (voluntary
compliance) por parte dos agentes de mercado do segmento digital. A
OCDE/G20 deve abandonar o military approach383 nas questões relativas à
tributação da economia digital, para passar a se preocupar com a
construção de modelos de incentivos para disponibilização de informações
(fair play approach384).

1090
A avaliação (i) do número de contratos/clientes, (ii) em determinado
período de tempo e (iii) considerando-se os valores de receitas geradas
parece ser razoável para fins da construção de um conceito de
estabelecimento permanente digital, mas, ainda assim, seria insuficiente,
pois ainda faltaria a eficácia jurídica (enforcement) em relação a operações
realizadas no anonimato e sem incentivo algum para deixar tal anonimato.

Um critério adicional me parece pertinente nessa avaliação, vale dizer:


o grau de aproveitamento das benesses da jurisdição local. Nesse sentido,
caberia investigar, adicionalmente, em que medida um estabelecimento
digital estaria onerando a jurisdição local a ponto de estabelecer um
elemento de conexão com ela. A instabilidade jurídica, o nível de
previsibilidade, o registro do domínio eletrônico do website, o poder de
consumo dos clientes/usuários das plataformas online seriam parâmetros
oportunos nesse exame.

O Brasil ainda não endereçou esse assunto internamente. Nossa


legislação tributária nesse particular, aliás, é silente sobre o tema como um
todo. A ausência de um conceito de estabelecimento permanente no País é
um bom exemplo disso385. A regulamentação mais próxima do conceito de
estabelecimento permanente consta do art. 147 do Regulamento do
Imposto de Renda (RIR – Decreto n. 3.000, de 26-3-1999), que determina
que podem ser considerados pessoas jurídicas situadas no Brasil, por
exemplo, “os comitentes domiciliados no exterior, quanto aos resultados
das operações realizadas por seus mandatários ou comissários no País”.

Como não é possível considerar que os usuários da plataforma online


seriam mandatários ou comissários da empresa estrangeira proprietária do
website, dada a ausência de qualquer poder de representação, o art. 147 do
RIR é inaplicável na hipótese em que a referida plataforma online não

1091
constitui uma pessoa jurídica (filial, sucursal, agência ou representação) no
Brasil. Com efeito, no atual cenário, não há fundamento jurídico válido
para que o governo brasileiro possa tributar a renda de empresa estrangeira
que detenha plataforma virtual associada ao serviço de hospedagem com
atuação no Brasil desprovida de presença física/jurídica no País.

4. CONCLUSÕES

As plataformas online associadas ao serviço de hospedagem exercem


duas atividades diferentes – uma atividade de marketplace e uma atividade
de intermediação de contratos, as quais devem receber tratamentos
tributários distintos.

Na atividade de marketplace, há um serviço passível de tributação por


ISS. Na atividade de intermediação de contratos, aplica-se o item 10.02 da
lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003, para fins da incidência de
ISS. Relativamente à atividade tributada pelo ISS, é tormentosa a questão
correlata ao local onde esse imposto é devido. Isso porque o legislador
complementar elegeu o local do estabelecimento prestador como aquele
onde o ISS é devido, o qual pode não existir fisicamente. Para tal hipótese,
a meu ver, aplica-se a interpretação conjunta do art. 1º, § 1º e do art. 2º,
parágrafo único, da Lei Complementar n. 116/2003, à luz do princípio do
destino, para se concluir que é devido o ISS no local onde está o tomador
do serviço, que, por sua vez, deve ser considerado contribuinte do imposto,
e não mero responsável tributário.

Quanto à tributação da renda, o desafio é ainda maior. As sugestões


apresentadas pela OCDE para lidar com os problemas da tributação da
economia digital – (i) estabelecimento permanente digital, (ii) retenção da
fonte de pagamentos e (iii) equalização da carga tributária – mostram-se

1092
pouco eficientes em um cenário em que não há “enforcement”, nem há
uma predisposição para a criação de mecanismos de incentivo ao
“voluntary compliance”. No Brasil, o tratamento da questão é inexistente,
em razão da ausência de legislação própria sobre o tema, o que deixa
evidente que há muito trabalho pela frente no sentido de viabilizar a
tributação das riquezas geradas em atividades realizadas exclusivamente
na internet. A revisão da legislação brasileira sobre o assunto é medida
urgente.

1093
Aspectos fiscais aplicáveis à cessão e
disponibilização de dados
386 387
Diego Alves Amaral Batista e Luís Felipe Vieira Rangel

1. INTRODUÇÃO

Apesar de os verdadeiros desafios e impactos da era da economia


digital ainda não serem totalmente conhecidos, já é possível perceber um
novo paradigma gerado pelo desenvolvimento das novas tecnologias.
Nesse aspecto, fica cada vez mais evidente o intercâmbio entre o que se dá
online e aquilo que ocorre offline, especialmente no que se relaciona aos
hábitos e comportamentos das pessoas nesse ambiente cada vez mais
integrado.

Esse contexto caracteriza a geração de um gigantesco volume de dados,


que possui um valor potencial de semelhante proporção, conforme é
realizada a sua organização em informações que possuem verdadeira
utilidade econômica. Assim, com os insights propiciados pela obtenção,
pelo processamento e pela disponibilização desses dados, é possível
construir um conhecimento útil para diversos fins. Essas informações
podem inspirar a otimização de processos, a redução de custos, as novas
fontes de receita, as mudanças de comportamento, entre outras tantas
utilidades, que vêm sendo objeto, cada vez mais, de estudo e
considerações.

Nesse sentido, vale destacar artigo recente da publicação inglesa The


Economist, “Fuel of the Future: Data is giving rise to a new economy”388,
no qual são abordados justamente os enormes potenciais econômicos
surgidos em razão da forma como novas tecnologias vêm gerando e

1094
valendo-se de dados e informações digitais. Prevê-se tamanho significado
para o papel dos dados na economia do século XXI, que o artigo, sem
receios de cometer exageros, alça a relevância dessas informações àquela
verificada em relação ao petróleo no século XX.

As formas pelas quais esses dados vêm sendo obtidos, armazenados,


utilizados e disponibilizados na era da economia digital são diversas. Além
disso, esses dados podem variar de meros dados cadastrais, fornecidos e
obtidos para inscrição em websites, até dados mais complexos, vinculados
aos hábitos de consumo de usuários. A combinação dessas diferentes
formatações permite inúmeros modelos e possibilidades, como se pode
imaginar.

Em síntese, o papel e a importância dos dados na era da economia


digital são evidentes, uma vez que se trata de matéria prima capaz de gerar
e potencializar, ao mesmo tempo, inovação e desenvolvimento não apenas
para aqueles envolvidos no processo de produção, obtenção e
disponibilização dos dados, mas também para aqueles que se beneficiam
dos dados gerados em relação a suas operações, de concorrentes e de
clientes. Trata-se de segmento que não encontra paralelo idêntico em
nenhuma outra atividade já existente e que, evidentemente, gera desafios
em áreas diversas389.

No âmbito do Direito, especificamente, são diversas as preocupações


que surgem em relação a esse ambiente. As relações de consumo, a
proteção à privacidade, a segurança, as relações antitruste, entre tantos
outros modelos de regulação, são alguns exemplos dos desafios gerados
em razão desse novo segmento.

1095
No que se refere ao fenômeno da tributação, uma das maiores
dificuldades é a compreensão dos conceitos envolvidos nesse novo
paradigma econômico, uma vez que, sem esse trabalho, não seria possível
identificar o verdadeiro objeto e conteúdo dessas atividades de forma a
verificar se estão contempladas pelas competências tributárias e hipóteses
de incidência previstas no arcabouço jurídico tributário existente390.

Note-se, dessa forma, que o objetivo do presente artigo é valer-se da


análise dos diversos modelos de geração de valor por meio desses dados
para concluir sobre a forma como essas novas tecnologias amoldam-se às
categorias já estabelecidas no ordenamento jurídico-tributário brasileiro,
em especial o possível enquadramento dessas atividades no âmbito de
incidência do Imposto sobre Serviços (ISS).

Não obstante, serão também endereçadas as incidências do Imposto


sobre a Renda Retido na Fonte (IRF), da Contribuição de Intervenção no
Domínio Econômico (CIDE), das Contribuições para o Financiamento da
Seguridade Social (COFINS) e para o Programa de Integração Social
(PIS), nas situações específicas passíveis de serem oneradas por essas
exações. Por fim, ainda, serão analisadas operações entre participantes de
diferentes jurisdições e o possível enquadramento dos respectivos
rendimentos nas previsões de tratados firmados para evitar a dupla
tributação.

2. OS DIFERENTES MODELOS ADOTADOS NAS OPERAÇÕES DE


DISPONIBILIZAÇÃO DE DADOS

Como introduzido acima, a geração de dados atingiu patamares


incomparáveis a qualquer outro tipo de negócio, e essa realidade revela
infinitas oportunidades de negócio. Ao mesmo tempo, surge nesse
contexto uma grande dificuldade em sistematizar a forma como essa

1096
atividade vem sendo explorada e desenvolvida por tradicionais e novos
participantes. Dessa forma, faz-se necessário um recorte metodológico que
torne possível identificar as diferentes funções e os diferentes modelos
adotados na coleta, no processamento e na disponibilização de dados, para
que deles se extraia o maior valor e utilidade possíveis.

Assim, faz-se oportuno mencionar o estudo de setor realizado pelo


Boston Consulting Group391, que realizou uma classificação didática dos
(até então) possíveis modelos geralmente adotados para o desenvolvimento
de negócios envolvendo a disponibilização e a utilização econômica de
dados, assim como as oportunidades e formas de monetização dessas
atividades.

Em linhas gerais, é possível identificar que diversos negócios possuem


em suas operações a oportunidade de obter dados e, consequentemente,
recursos valiosos a partir desse ativo. Entretanto, até o momento, a
exploração dessa capacidade não ocorre tão facilmente por meio de
negócios independentes, exclusivamente voltados para o fim de
desenvolver a atividade de exploração de dados. Assim, esse
desenvolvimento depende muitas vezes de uma associação com outros
empreendimentos, o que pode ocorrer pela efetiva combinação de negócios
ou apenas pelo estabelecimento de relações contratuais de parceria
comercial.

Antes de adentrar em cada caso específico, é importante esclarecer que


os modelos de negócio podem variar tanto em relação ao modo como são
fornecidos os produtos/serviços, como na duração na relação comercial
entre fornecedores e seus clientes. A esse respeito, inclusive, tais clientes
podem ser outras empresas (business-to-business) ou mesmo
consumidores finais (business-to-customer). Assim, a combinação dessa

1097
multiplicidade de possíveis estruturas de negócio gera diversas
possibilidades de objeto de estudo.

Ainda, sobre o modo como são disponibilizadas essas informações, é


possível identificar uma gradação de personalização, que parte de dados
genericamente obtidos, processados e fornecidos até altos graus de
depuração dessas informações. Nesses últimos, busca-se desenvolver ao
máximo a adequação dessas informações às necessidades daqueles que
têm interesse em usufruir desse conhecimento para seus respectivos
negócios e/ou hábitos. Por outro lado, quanto à fonte de receitas geradas,
há uma variação que vai desde o pagamento conforme o uso (pay per use),
passando por comissões, troca de valor, até assinaturas periódicas.

2.1. Disponibilização personalizada de dados (build to order)

Em diversas situações, empresas dotadas de capacidade analítica são


contratadas para depurarem dados que são gerados no âmbito das
operações de seus clientes. O objetivo maior nessas situações é a extração
de conteúdo útil ao direcionamento de campanhas e à otimização de
processos, os quais podem reduzir custos e aumentar a produtividade das
operações do interessado.

Fica, de certo modo, evidente nesses casos o componente de esforço de


personalização, sendo possível concluir preliminarmente estar-se diante de
uma prestação predominantemente de serviços. Contudo, ao contrário do
que se possa concluir inicialmente, isso não significa, necessariamente,
que os resultados advindos dessas atividades estejam sujeitos à tributação
pelo ISS, tendo em vista os muitos outros elementos que devem ser
considerados para se firmar essa conclusão.

1098
Com efeito, além da forma por meio da qual os dados e as informações
são obtidos, é necessário verificar como esse conteúdo é disponibilizado
aos clientes, isto é, se há obrigação de customização dos dados e das
informações. Isto será determinante para concluir em favor ou não da
sujeição de determinada situação específica ao ISS. Esse parâmetro de
análise é identificado na jurisprudência construída pelos tribunais em casos
envolvendo operações similares àquelas que são objeto de nosso estudo
(disponibilização de dados em atividades de tecnologia).

A título exemplificativo, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP),


sustentando-se em precedentes do Superior Tribunal de Justiça392 (STJ),
valeu-se desses elementos para concluir em favor da incidência do ISS em
operação que envolveria “uma plataforma de inteligência geográfica que
une informações sociodemográfica e permanentemente atualizadas pela
Geofusion e aliadas às bases de dados do próprio cliente para ajudar as
empresas em seu planejamento estratégico, expansão, marketing,
inteligência de mercado, vendas e gestão de negócios” (Caso Geofusion).

Como se nota, há uma característica clara de customização de dados, na


medida em que as bases de informação da própria Geofusion são aliadas às
bases de dados dos próprios clientes para gerar uma informação mais
completa e eficiente. Portanto essa característica de personalização dos
dados e informações dá contornos de uma “obrigação de fazer” da
sociedade contratada àquele cliente específico, o que poderia permitir a
incidência do ISS.

Além disso, o acórdão proferido pelo TJ/SP, ao tratar das obrigações


estabelecidas contratualmente, faz referência à disponibilização de
conteúdo em “site na internet que dê acesso aos usuários da
CONTRATANTE a mapas e relatórios, com dados de mercado, para todos

1099
os municípios brasileiros no nível municipal, e para os municípios
mencionados no Anexo A para o nível intraurbano; verificação e
atualização periódica das INFORMAÇÕES e atualização e manutenção do
SITE”.

A mera verificação e atualização periódica de informações e dados não


deveria, isoladamente, caracterizar uma obrigação de fazer, especialmente
se a sociedade contratada atualiza seu banco de dados para fornecê-lo
indiscriminadamente a todos os seus clientes, sem qualquer esforço de
personalização. No entanto, no Caso Geofusion, a verificação e atualização
de dados e informações que foram originalmente gerados pela sociedade
contratada de forma customizada também seria uma obrigação de fazer
autônoma, na medida em que a atualização desses dados só teria utilidade
àquele cliente específico.

Por outro lado, a mera liberação de acesso às informações por meio do


site na internet seria apenas um meio utilizado para viabilizar o acesso e a
transferência dos dados e informações obtidos/gerados pela contratada aos
seus clientes, portanto configurando uma atividade acessória que estaria
fora do perímetro de incidência do ISS.

Mesmo estando fora do campo de incidência do ISS, não seria legítimo


ao contribuinte simplesmente “fatiar” essa atividade-meio para faturá-la
em separado e alocar parte do valor global cobrado do cliente a uma
atividade supostamente não tributável pelo ISS, pois a simples liberação de
acesso ao site, no presente caso, não gera utilidade ou valor econômico ao
cliente que, em última análise, remunera a contratada pelo alto valor que
os dados customizados podem gerar.

1100
Estando essa atividade potencialmente sujeita à incidência do ISS,
cumpre analisar sua adequação (ou não) à lista de serviços previstos na Lei
Complementar n. 116/2003 (LC n. 116/2003).

Ao analisar o caso, o TJ/SP classificou esta atividade no item 1.05393 da


Lista de Serviços da LC n. 116/2003, o que parece não se sustentar. Isso
porque as operações objeto daquele caso concreto possuem características
muito similares, senão idênticas, àquelas verificadas na atividade de
disponibilização de dados, que não se confunde com operações de
software para nenhum fim.

O enquadramento dessa atividade no item 1.05 da Lista de Serviços da


LC n. 116/2003 merece ressalvas, uma vez que não se trata, tecnicamente,
de um programa de computação, mas sim da mera disponibilização de
dados trabalhados e customizados conforme as demandas do cliente, por
mais que isso ocorra em ambiente virtual via acesso à plataforma
direcionada por site da internet.

Por outro lado, a Lista de Serviços contém hipóteses que poderiam ser
entendidas como previsões voltadas às atividades de processamento de
dados do cliente e à customização de dados e informações, tais como os
itens 1.03394 e 17.01395.

Por outro lado, para além das discussões de ordem constitucional e legal
travadas nas Cortes Superiores, merece destaque o posicionamento que
vem sendo adotado pelas autoridades fiscais. Nesse sentido, vale
considerar o entendimento do Fisco paulistano, que assim respondeu a
consulta formulada por determinado contribuinte:

9. O contrato de prestação de serviços de desenvolvimento de sistemas


específicos tem por objeto as atividades de levantamento de dados, elaboração de
anteprojeto, elaboração de análise funcional, elaboração dos programas em

1101
conformidade com a análise funcional, elaboração do plano de testes, execução dos
testes, evidência de conformidade, homologação do sistema, elaboração do
cronograma de implementação, treinamento dos usuários, conversão da base de
dados, execução de simulados e paralelo, homologação para entrada do sistema em
produção.
9.1 Os serviços objeto deste contrato enquadram-se no item 1.01 – Análise e
desenvolvimento de sistemas, relativo ao código de serviços 0258, exceto a parte
relativa à elaboração dos programas em conformidade com a análise funcional, que
se enquadra no item 1.04 – elaboração de programas de computador, inclusive de
jogos eletrônicos, relativos ao código de serviço 02690 (Solução de Consulta
SF/DJUD n. 30, de 26 de março de 2007).

Essa solução de consulta revela uma distinção contida no entendimento


das autoridades fiscais, que se dá entre as atividades envolvendo a
obtenção, análise e disponibilização de dados e a elaboração de programas
de computador. Apesar dessa distinção, que a nosso ver está correta, uma
vez que são atividades que não se confundem, as autoridades fiscais
concluem em favor da incidência do ISS nos casos envolvendo a atividade
de obtenção, análise e disponibilização de dados. Segundo as autoridades
fiscais municipais, essa atividade específica pertenceria ao gênero “análise
e desenvolvimento de sistemas”, prevista na legislação como hipótese de
incidência do tributo ora analisado.

Portanto, não obstante as inúmeras incertezas advindas do cenário


descrito acima, é possível concluir pela existência de parâmetros capazes
de nortear a adequação da tributação incidente sobre essas atividades
inovadoras, sendo que, sob a perspectiva da efetiva customização e
personalização dos dados e informações, as atividades classificadas como
“build to order” caracterizariam uma obrigação autônoma de fazer,
configurando uma prestação de serviços passível de tributação pelo ISS.

2.2. Disponibilização de dados gerais para todos os clientes (Plug and Play)

1102
No outro extremo do grau de personalização na obtenção e
disponibilização de dados estão aquelas atividades que refletem a mera
entrega de informações gerais para todos os tipos de cliente. Nesses casos,
muitas vezes, há tão somente a geração de dados e informações como um
subproduto das operações centrais de determinado negócio, sem que isso
signifique, contudo, ausência de valor desse conteúdo para outros
parceiros comerciais.

A título de exemplo, instituições financeiras emissoras de cartões de


crédito possuem, em suas operações, um enorme potencial de exploração
dos dados relacionados às transações diárias de seus clientes. Respeitadas
as regras de sigilo e segurança de dados, esse conteúdo é valioso para
melhorar o direcionamento de campanhas de marketing, promoções,
fornecimento de crédito. Um outro exemplo a ser cogitado nesse contexto
refere-se aos aplicativos de georreferenciamento (GPS), que geram
significativas quantidades de dados relacionados aos padrões do tráfego
em vias urbanas e/ou estradas, que podem interessar, entre outros atores,
ao poder público na organização de suas políticas de planejamento urbano.

Assim, desde os setores financeiro e de telecomunicação, clássicos


exemplos de indústrias com grandes quantidades de dados gerados em suas
operações, até indústria e varejo, não tão habituados com a geração e uso
de dados digitais, a verdade é que em tempos de economia digital não é
possível mais ignorar o valor dos insights analíticos que podem ser
extraídos de dados e informações gerados em quantidades gigantescas em
questão de segundos. Ao contrário do item anterior, contudo, as transações
com esses tipos de dados, como regra geral, alinham-se mais a uma
obrigação “de dar”, que a uma obrigação “de fazer”, o que os afasta, ao
menos conceitualmente, do âmbito de incidência do ISS.

1103
Mesmo nos casos em que os dados e as informações não são gerados
como subproduto de uma atividade operacional principal, a mera cessão
desses dados e informações, sem qualquer customização, não poderia ser
objeto de incidência do ISS.

Nesse sentido, diversas situações são passíveis de serem excluídas do


campo de incidência do ISS, sob o raciocínio de que, em sua essência, não
constituiriam a realidade econômica prevista constitucionalmente como
passível de tributação, ou seja, uma prestação de serviços.

Ilustrativamente, a incidência do tributo sobre a cessão do direito de uso


de banco de dados sísmicos (Caso de Dados Sísmicos) já foi enfrentada
judicialmente e propicia significativas reflexões acerca do tema.

Naquela oportunidade, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de


Janeiro (TJ/RJ) concluiu396 que a “elaboração de um banco de dados do
solo e do subsolo oceânico destina-se a integrar o ativo da empresa de
pesquisa e não constitui atividade sujeita ao recolhimento de ISS por se
tratar de serviço prestado àquela e não a terceiros”. Não bastasse isso, o
TJ/RJ enfrentou também a questão envolvendo o modelo de
disponibilização ao decidir que “não se considera serviço para fins de
recolhimento de ISS a simples outorga de licença de acesso ao banco de
dados criado pela empresa de pesquisa a outras do ramo de prospecção de
petróleo e de gás natural”. Ou seja, o precedente apresenta relevantes
parâmetros de análise da atividade de disponibilização de dados e o seu
(não) enquadramento como um serviço sujeito ao ISS.

Ao mesmo tempo que a decisão judicial conclui que a obrigação de


fazer (que seria potencialmente passível de tributação) é realizada em
favor da própria sociedade contratada (pois o banco de dados passaria a

1104
integrar o seu ativo permanente), conclui também que a disponibilização
desse conteúdo, por meio da outorga da licença de acesso ao banco de
dados, não poderia ser vista como um serviço previsto na legislação em
vigor, passível de tributação.

Portanto, os esforços de obtenção, coleta e organização de dados não


são realizados de forma customizada a um cliente específico. Ao contrário
dos dados fornecidos de forma personalizada no Caso Geofusion, os dados
obtidos pela empresa de mapeamento sísmico são disponibilizados a todos
os clientes sem qualquer adaptação ou personalização para adaptar tais
dados às necessidades específicas deste ou daquele cliente.

Por isso nos parece acertada a decisão do TJ/RJ ao mencionar que os


esforços de obtenção e atualização dos dados sísmicos realizados pela
sociedade contratada são parte do ativo permanente desta sociedade, pois o
resultado dessa pesquisa pode ser “cedido” a diversos clientes sem
nenhuma necessidade de customização ou personalização. Do ponto de
vista econômico, essas diferenças podem também ser percebidas no
Pronunciamento do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) n. 4,
que trata de ativos intangíveis, e define que “ativo é um recurso (a)
controlado pela entidade como resultado de eventos passados; e (b) do
qual se espera que resultem benefícios econômicos futuros para a
entidade”.

Aqui recai uma importante diferenciação. Dados não customizados


podem, via de regra, gerar benefícios econômicos futuros, pois podem
igualmente ter utilidade a uma multiplicidade de outros clientes ou
negócios. Já os dados customizados tendem a ser produzidos com tamanha
especificidade que não geram benefícios econômicos a outros clientes ou

1105
negócios, possuindo utilidade apenas àquele cliente específico para quem
foram gerados e/ou preparados.

Isto demonstra que, no Caso de Dados Sísmicos, as atividades


realizadas pela sociedade contratada, de realizar a verificação e a
atualização periódica das informações de seu banco de dados, são de
interesse da própria contratada para possibilitar que seu banco de dados
(ou, seu ativo) tenha a qualidade necessária para atrair interesse dos
clientes que buscam informações precisas e que possam gerar efetivo valor
na tomada de decisões de investimento.

Portanto a cessão de dados não customizados a clientes, ainda que


atualizados em bases regulares, não deveria configurar uma obrigação de
fazer para fins de incidência do ISS. Tampouco deveria gerar a incidência
desse tributo a mera liberação do acesso ao site ao cliente, tendo em vista
se tratar de uma mera atividade-meio para que o cliente acesse aquele
banco de dados.

Acrescenta-se, ainda, que os já mencionados itens 1.03 e 17.01 da Lista


de Serviços poderiam, com certo esforço de interpretação extensiva, ser
entendidas como previsões voltadas à atividade de disponibilização de
dados e que poderiam, portanto, suportar a incidência do tributo nessas
condições.

Ocorre que, como se antecipou acima, a obtenção, a organização e o


processamento dos dados pelas sociedades contratantes é realizada sem
qualquer esforço de customização ou personificação, o que afasta esta
atividade dos itens da lista mencionados acima397.

1106
Portanto, ainda que houvesse previsão legal em sentido favorável à
referida tributação, é evidente que prevalece uma “obrigação de dar” no
caso específico, ou seja, uma obrigação de ceder dados atualizados a toda a
base de clientes sem qualquer customização ou personalização dessas
informações.

Esse raciocínio possui lastro na consolidada jurisprudência do Supremo


Tribunal Federal (STF), objeto do Recurso Extraordinário n. 116.121, de
11 de outubro de 2000, no qual foi decidido que a obrigação de dar não se
sujeita à incidência do ISS. Sendo assim, em que pese a especificidade da
elaboração de um trabalho para a coleta, a organização e a atualização de
dados e informações, esses dados e informações passam a ser um “ativo”
da sociedade contratada, que permite acesso a seus clientes por um tempo
determinado (assinaturas mensais, anuais etc.).

Não obstante, vale destacar que essa segregação em obrigações de fazer


e obrigações de dar vem sendo, de certa forma, flexibilizada pela
jurisprudência do próprio STF398. No julgamento do Recurso
Extraordinário n. 592.905/SC399, que tinha por objeto operações de leasing
e a possibilidade de incidir o ISS sobre essas operações, o relator Ministro
Eros Grau entendeu que a expressão “de qualquer natureza” prevista na
Constituição Federal resultaria em hipóteses mais abrangentes que meras
obrigações de fazer no sentido dado pelo julgado de 2000.

Essa relativização inaugurou um exame, para fins da incidência ou não


do ISS, referente à predominância, isto é, ao prevalecer uma obrigação de
fazer, a subsequente obrigação de dar não impediria, em tese, a tributação
dos resultados auferidos na transação pelo ISS. Essa flexibilização assumiu
contornos ainda mais marcantes em recente decisão proferida em sede de
repercussão geral pelo Tribunal Pleno do STF, no julgamento do Recurso

1107
Extraordinário n. 651.703, de 29 de setembro de 2016 e relatoria do
Ministro Luiz Fux. Essa decisão, publicada em 26 de abril de 2017, trouxe
uma nova perspectiva para a questão envolvendo o conceito constitucional
de serviços para fins de incidência do ISS, adotando uma visão do ISS que
o caracteriza como um tributo residual400.

Esse desenvolvimento da jurisprudência do STF evidencia ainda mais a


dificuldade existente na tentativa de adequar previsões constitucionais
tributárias a situações concretas que estão em constante evolução. Uma
solução possível, certamente não a mais técnica, mas, possivelmente, mais
adequada sob a perspectiva de justiça fiscal, é justamente essa abordagem
relativista que vem sendo adotada pelo STF, o que não parece ser tão
adequado quanto seria uma ampla reforma tributária, tão cara e esperada
pelos contribuintes e pelo Fisco.

De toda forma, é interessante notar que o STF deverá enfrentar


novamente a questão acima quando do julgamento da repercussão geral
reconhecida no Recurso Extraordinário n. 688.223/PR, que deverá analisar
a incidência do ISS sobre operações e contratos de cessão ou
licenciamento de programas de computador, em serviço personalizado.

Nessa oportunidade, a Suprema Corte terá novamente a oportunidade de


endereçar uma análise que pode impactar a disponibilização onerosa de
dados e a sua respectiva tributação pelo ISS, fazendo-se aqui
diferenciações entre a disponibilização customizada e não customizada de
dados.

A despeito dos sólidos argumentos para sustentar a não incidência do


ISS na cessão de dados e informações não customizados, não se pode
ignorar a constante tentativa dos Fiscos Estaduais em abocanhar resultados

1108
auferidos no âmbito de operações envolvendo diversas atividades da
economia digital, especialmente quando se trata de operações que revelam
um nítido caráter de cessão/transferência de bens digitais.

Nesse sentido, há diversas situações pendentes de análise pelo Poder


Judiciário que envolvem a transferência de bens digitais. A título de
exemplo do que se busca demonstrar, merece destaque a discussão
envolvendo a possível incidência de Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) sobre a disponibilização de
programas de computador.

Ocorre que, juridicamente, a incidência do ICMS exige a “circulação”


de uma mercadoria, o que significa, ao menos, a transferência de
titularidade do bem. Nesse sentido, o Plenário do STF definiu, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário n. 158.834401, que o ICMS somente
pode incidir quando há efetiva transferência de titularidade da mercadoria.

Ora, a disponibilização de acesso ou a entrega de dados cadastrais ou


mesmo vinculados a hábitos de consumo, conforme mencionado acima,
não significam a transferência de titularidade, quanto menos uma
mercadoria no sentido clássico do conceito, já que se trata, quando muito,
de um bem intangível.

Note-se que, até não muito tempo atrás, as discussões travadas no


Judiciário em relação à tributação de novas tecnologias pautaram-se pelo
clássico precedente do STF, proferido nos autos do Recurso Extraordinário
n. 176.626/SP402. Naquela oportunidade, foi definido que a circulação de
exemplares de programas de computador, acompanhados de suporte físico,
produzidos em série e comercializados no varejo, estaria sujeita ao ICMS.

1109
Ora, com relação à incidência do ICMS nos casos em que tais
programas não estão acompanhados do suporte físico, há questionamento
da constitucionalidade da legislação do Estado do Mato Grosso do Sul que
previu a incidência do ICMS sobre o download de programas de
computador. O caso é tratado na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.
1.945 (ADI n. 1.945), que aguarda julgamento há quase 20 anos.

Ocorre que a solução a ser dada nesse caso é relevante não só para os
casos específicos envolvendo software, interessando também diversas
outras atividades vinculadas a novas tecnologias, tais como a cessão de
dados e informações não customizados. Isso porque é discutida a
possibilidade de o ICMS poder incidir apenas sobre bens materiais, bem
como a questão específica relacionada à ocorrência (ou não) de efetiva
transferência de titularidade em casos envolvendo contratos de licença e
não de contratos de compra e venda.

Paralelamente a isso, os Estados vêm se organizando para regulamentar


a tributação das operações envolvendo software sem suporte físico. Essa
organização resultou no Convênio n. 181, de 29 de dezembro de 2015, do
CONFAZ, que autorizou os Estados a concederem redução na base de
cálculo do ICMS incidente sobre operações com programas de
computador. Ato contínuo, o Estado de São Paulo internalizou em 12 de
janeiro de 2016 a previsão do Convênio por meio do Decreto n. 61.791,
reduzindo a base de cálculo nas operações com software.

O mais interessante do referido Decreto Estadual, porém, refere-se ao


esclarecimento realizado no sentido de que não seria cobrado o ICMS nos
casos de transferência eletrônica de dados “até que fique definido o local
de ocorrência do fato gerador para determinação do estabelecimento
responsável pelo pagamento do imposto”.

1110
Ora, fica evidente a intenção dos Estados em, ao menos no futuro,
cobrar o tributo sobre as operações que são ora analisadas. Vê-se, dessa
forma, que esses atos recentes disciplinam não apenas operações
envolvendo programas de computadores, mas também aplicativos e
arquivos eletrônicos de um modo geral, disponibilizados por qualquer
meio, inclusive por transferência eletrônica de dados.

Embora este não seja o objeto central de análise do presente artigo, é


importante destacar a regulamentação da questão mencionada acima,
realizadas pelo Convênio CONFAZ n. 106, de 5 de outubro de 2017.
Referido convênio prevê que apenas operações envolvendo software sem
suporte físico e destinadas ao consumidor final serão tributadas, sendo que
o ICMS será devido nas saídas internas e importações realizadas por meio
da internet no Estado onde estiver domiciliado o adquirente do bem digital
(mesmo nos casos de assinatura mensal).

Segundo a nova regulamentação, a pessoa jurídica detentora do site ou


plataforma é o contribuinte e deve ter inscrição estadual em todos os
Estados onde realizar operações. O Convênio passará a produzir efeitos
após seis meses da data de sua publicação, momento em que a intenção
dos Estados destacada acima poderá tomar forma, resultando em
questionamentos do ICMS relacionados à disponibilização onerosa de
dados.

3. QUESTÕES ESPECÍFICAS VERIFICADAS NO ÂMBITO DA


ECONOMIA DIGITAL

Além das questões acima, aplicáveis a modelos de negócio de cessão


e/ou uso de dados que não ocorrem necessariamente no contexto da
economia digital, algumas transações merecem destaque, uma vez que

1111
possuem grande relevância no âmbito das novas tecnologias e estão
relacionadas aos hábitos de consumo em ambiente virtual.

Um exemplo ímpar do que se busca destacar neste capítulo está


relacionado às formas de monetização desenvolvidas pelo Facebook,
empresa extremamente capaz de gerar receitas derivadas de sua gigantesca
base de usuários e, consequentemente, dados403. A rede social mais
conhecida no mundo é também uma das mais lucrativas em seu ramo,
muito por conta dos dados gerados pelos usuários da plataforma e pela
capacidade da plataforma de valer-se desses dados para gerar resultados
financeiros relevantes.

Reportagem trazida pela BBC indica que entre os meses de julho e


setembro de 2016, o faturamento do Facebook atingiu 7 bilhões de
dólares404. Desse valor, cerca de 97,42% do faturamento decorre de
anúncios de publicidade contratados por empresas interessadas na
identificação precisa dos perfis de usuários e dos hábitos de consumo
desses. Nesse sentido, além dos dados cadastrais fornecidos à rede social
para possibilitar o acesso do usuário, a frequente utilização da plataforma e
as constantes interações no ambiente virtual permitem o direcionamento
específico de produtos e serviços para os usuários da rede mais suscetíveis
de tornarem-se consumidores.

Assim, se na ponta do usuário com o Facebook, existe uma troca de


dados pessoais (cadastrais e hábitos de uso) pela possibilidade de
utilização da plataforma para interação e consumo de conteúdos
compartilhados, na outra ponta, veem-se vultosos recursos sendo pagos à
rede social para que esta forneça não apenas os dados mencionados acima
propriamente ditos, mas um serviço de publicidade direcionado em função
de tais dados.

1112
É possível perceber, portanto, que nesse modelo específico (existem
outros), o negócio desenvolvido pelo Facebook não está diretamente
relacionado à cessão onerosa de dados a terceiros, mas à utilização de seu
próprio banco de dados para refinar a prestação de serviço de veiculação
qualificada de publicidade. Portanto, nesse modelo, os dados do Facebook
não são economicamente explorados de forma autônoma como uma
efetiva cessão dos dados aos potenciais clientes, mas são ferramentas
importantíssimas para veicular publicidade de maneira bastante
direcionada e, portanto, muito mais eficiente em atingir o público
pretendido.

Ainda assim, há controvérsias relacionadas à tributação dessa atividade


de publicidade na internet, especialmente com relação à possível
incidência do ISS sobre essa atividade; ou sua tributação pelo ICMS. De
um lado, Municípios buscam estender as regras existentes para tributar a
veiculação de publicidade na internet, mesmo sem previsão específica na
LC n. 116/2003 para tanto405. Por outro lado, Estados entendem incidir o
ICMS sobre essa atividade, sustentando tratar-se de um serviço de
comunicação. Apesar das modificações recentes na LC n. 116/2003406, que
indicam que deveria haver a tributação dessa atividade pelo ISS, os
Estados não parecem ter desistido da tributação pelo ICMS407, o que
implicará discussões adicionais no âmbito do Poder Judiciário.

Situação semelhante àquela descrita acima, para atividade do Facebook,


é verificada em diversas operações do Google, conhecido por sua tão
difundida ferramenta de pesquisa. Assim como o Facebook, a larga
utilização por usuários da internet da ferramenta de pesquisa do Google
gera um relevante banco de dados, que possibilita a sobreposição dos

1113
hábitos de pesquisa e consumo, bem como a identificação de plataformas
que atingem determinados perfis.

A título de exemplo, é possível identificar que usuários que buscam


comprar um imóvel residencial, também costumam acessar sites de
comércio eletrônico de móveis e eletrodomésticos. Assim, o cruzamento
dessas e outras informações sugere um perfil de usuário e um hábito de
consumo específico. Com esse tipo de informação, o Google, assim como
o Facebook, veicula publicidade dirigida a públicos específicos em sites
próprios e de terceiros de grande circulação.

Portanto, também nesse caso, em que pese essas atividades da economia


digital estarem intimamente vinculadas à geração e utilização de dados,
esses exemplos permitem-nos identificar que os dados, muitas vezes, são
meios para o desenvolvimento de uma determinada atividade-
fim/principal, não devendo a sua utilização ou sua captura serem objeto de
tributação como regra geral.

Não obstante, há circunstâncias em que o próprio Google não se vale


apenas dos dados gerados pelos acessos à sua própria ferramenta de
pesquisa, mas adquire informações e dados adicionais de empresas
especializadas, que são contratadas para obter informações específicas e
detalhadas sobre determinados hábitos de consumo, de identidade e de uso
dos meios de comunicação conforme uma “moldura” particular de
informações determinada pelo próprio Google. Nessas hipóteses, há um
predomínio da obrigação de fazer, ficando evidenciado o contorno de um
serviço de levantamento, organização e processamento de dados
potencialmente passível de tributação pelo ISS conforme descrito nos itens
acima.

1114
Outra situação interessante refere-se a sites desenvolvidos para
pesquisas online, que remuneram seus usuários (fornecedores de dados,
informações e/ou opiniões) com pontos/milhas de programas de
fidelização.

De um lado, eventuais rendimentos auferidos pelos usuários ao ceder


onerosamente seus dados em troca de direitos ou utilidades relacionados a
programas de pontos/milhas estariam potencialmente sujeitos à incidência
do Imposto de Renda das Pessoas Físicas como rendimento ordinário.

Por outro lado, as empresas que obtêm esses dados e informações


incorrem em um custo específico e determinável para adquirir informações
preciosas para o desenvolvimento de suas atividades. Nesse aspecto, os
dados e informações passariam a ser, via de regra, um ativo intangível
amortizável pelo prazo de sua vida útil. Eventualmente, caso a obtenção
desses dados ocorra no contexto de levantamento e processamento de
dados específicos para um cliente (como no caso das “molduras” de
pesquisas formatadas pelo Google e Facebook), os dispêndios para
obtenção dos dados seriam computados como custo do serviço prestado (e
não como um ativo amortizável), na medida em que dificilmente essa
mesma base de dados (preparada com tamanha especificidade a um
determinado cliente) poderia ser reutilizada e gerar benefícios econômicos
futuros.

Nesse contexto, a licença de uso de informações e base de dados, em


princípio, poderia resultar em discussões relacionadas à incidência do ISS
e ICMS conforme já endereçado acima.

Por outro lado, a receita dessa cessão onerosa deveria se sujeitar à


incidência do imposto sobre a renda, decorrente das atividades ordinárias

1115
da sociedade, hipótese em que tais receitas seriam contrapostas às
eventuais despesas de amortização do custo de desenvolvimento do banco
de dados (notadamente quando esse banco de dados pode ser reutilizado
pelo cedente e gerar receitas futuras adicionais) ou ao custo geral de
desenvolvimento e prestação do serviço (quando o banco de dados não
possuir utilidade econômica futura).

Esse último cenário pode ser especialmente interessante no Brasil,


tendo em vista disposições contidas na legislação brasileira que buscam
tributar ganhos de capital auferidos por investidor não residente na
alienação de ativos localizados no Brasil (art. 26 da Lei n. 10.833, de 29-
12-2003 – Lei n. 10.833/2003).

A título de exemplo, a política de privacidade do Facebook permite


concluir que a titularidade dos direitos sobre os dados de usuários
brasileiros é do Facebook Ireland Inc. (entidade irlandesa do grupo) e que
essa entidade pode compartilhar esses dados e informações com outras
entidades do grupo ou empresas parceiras.

Nesse contexto, é possível identificar potenciais discussões relacionadas


à “localização” desse ativo, tendo em vista que a detentora dos direitos
sobre a base de dados é uma sociedade irlandesa, mas trata-se de um ativo
intangível que, via de regra, não pode ser objeto de registro como
propriedade intelectual naquele país. Ademais, há de se considerar que
essa base de dados gerada pela atuação do Facebook no Brasil refere-se
especificamente ao mercado de consumo brasileiro. Assim, caso reste
caracterizado como um ativo localizado no Brasil, um eventual ganho de
capital auferido pelo Facebook Ireland Inc. na cessão desses dados estaria
potencialmente sujeito à tributação no Brasil conforme disposto no artigo
26 da Lei n. 10.833/2003.

1116
Como se pode notar, a cessão onerosa de dados é tema relevante e pode
gerar uma infindável gama de discussões no âmbito fiscal. Entretanto, o
surgimento e desenvolvimento da economia digital permitem identificar
diversos elementos de análise e discussão que se mostram inéditos, seja em
relação à sua natureza, seja em razão de sua inimaginável dimensão.

4. CONSIDERAÇÕES ADICIONAIS RELACIONADAS A OPERAÇÕES


CROSS-BORDER

Operações nas quais o prestador/fornecedor está localizado e realiza a


sua atividade, integral ou parcialmente, no exterior e o beneficiário da
prestação está localizado no Brasil poderão sujeitar-se aos efeitos fiscais
aplicáveis às importações de serviço.

De forma semelhante, prestações de serviço realizadas por entidade


localizada no Brasil em favor de beneficiário situado no exterior ou que
gerem seus resultados fora do Brasil poderão ser submetidas aos efeitos
fiscais geralmente aplicáveis a uma exportação de serviço. Entretanto,
como o Brasil adotou um sistema que privilegia e exonera, como regra
geral, as exportações, não serão abordadas no presente artigo as nuances
dessas transações, as quais, ressalvadas algumas discussões específicas
vinculadas, não sofrem tributação.

Dada a posição dos Fiscos estaduais descrita acima com relação aos
bens digitais e a respectiva incidência do ICMS, é possível que, no futuro,
as operações relacionadas aos modelos que envolvam disponibilização de
dados com eminente caráter de obrigação de dar também venham a ser
consideradas hipóteses de incidência do ICMS geralmente incidente na
importação de mercadorias. Por hora, entretanto, uma vez que não há lei
complementar voltada à instituição do ICMS em operações desse tipo, o

1117
presente artigo limitar-se-á às considerações aplicáveis às importações de
serviço.

Assim, o parágrafo 1º do artigo 1º, da LC n. 116/2003, prevê que os


serviços contratados por entidade sediada no Brasil que provêm do exterior
ou cuja prestação tem início fora do país estão, como regra geral, sujeitos
ao ISS. A partir da redação contida em referida legislação, é possível
concluir que os serviços provenientes do exterior são aqueles
integralmente prestados fora do Brasil ou mesmo serviços cuja prestação
tenha início no exterior, mas que se referem a prestações passíveis de
serem segregadas em mais de uma fase, havendo uma parcela da atividade
realizada no exterior.

Apesar dessas previsões, os contribuintes vêm questionando essa


tributação, sustentando que o ISS deveria ser norteado pelo princípio da
territorialidade e que, por esse motivo, a cobrança do tributo sobre serviços
realizados exclusivamente fora do Brasil seria inconstitucional. É
importante destacar que ainda não houve enfrentamento definitivo desse
tema por parte dos Tribunais Superiores, havendo decisões favoráveis e
desfavoráveis proferidas por Tribunais de Justiça de diversos Estados.

Ademais, a importação de serviços está sujeita ao IRF como regra geral,


exceção às situações sujeitas às limitações previstas em disposição de
Tratado celebrado para Evitar a Dupla Tributação entre o Brasil e a
respectiva jurisdição de residência do prestador de serviço, em respeito ao
que prevê o artigo 98 do Código Tributário Nacional (CTN) e conforme
será analisado em maiores detalhes a seguir.

Segundo o artigo 7º, da Lei n. 9.779, de 19 de janeiro de 1999 (Lei n.


9.779/99), os rendimentos de prestação de serviços, pagos, creditados,

1118
entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no
exterior sujeitam-se à incidência do IRF à alíquota de 25%, salvo nos
casos envolvendo serviços técnicos ou de assistência técnica, os quais
estão sujeitos à alíquota de 15%.

Assim, faz-se necessário concluir se a atividade que envolve a


disponibilização personalizada de dados configura, ou não, uma hipótese
de serviços técnicos ou de assistência técnica. Nesse aspecto, a Instrução
Normativa n. 1.455, de 6 de março de 2014 (IN n. 1.455/2014), editada
pela Receita Federal do Brasil (RFB), previu no artigo 17, parágrafo 1º,
inciso II, alínea “a”, que serviços técnicos são aqueles que dependam de
conhecimentos técnicos especializados ou que envolvam assistência
técnica administrativa ou prestação de consultoria, realizado por
profissionais independentes ou com vínculo empregatício ou, ainda,
decorrentes de estruturas automatizadas com claro conteúdo tecnológico.

Como se pode notar, a previsão contida na legislação fiscal em vigor é


bastante abrangente. Assim, nos casos envolvendo a transferência onerosa
de dados personalizados e que envolvam algum conteúdo tecnológico, as
autoridades fiscais federais provavelmente apresentariam o entendimento
no sentido de que se trata de serviços técnicos/assistência técnica.
Confirmada essa posição, além do IRF à alíquota de 15% nos termos
acima, haveria também a incidência da CIDE à alíquota de 10%.

Especificamente com relação a essa contribuição, vale lembrar que a


redação original da Lei n. 10.168, de 29 de dezembro de 2000 (Lei n.
10.168/2000), previa que a CIDE seria devida por entidades detentoras de
licença de uso ou adquirentes de conhecimentos tecnológicos, bem como
contratantes em acordos envolvendo a transferência de tecnologia.
Entretanto, a partir da publicação da Lei n. 10.332, de 19 de dezembro de

1119
2001 (Lei n. 10.332/2001), a CIDE passou a onerar igualmente os
pagamentos efetuados por ocasião de contratos de serviços técnicos e
aqueles previstos nos contratos de assistência administrativa e
semelhantes.

Esse alargamento do campo de incidência da CIDE vem sendo


amplamente discutido no Poder Judiciário pelos contribuintes interessados,
os quais sustentam que, em contratos que não envolvem a efetiva
transferência de tecnologia, não seria devido o tributo. A questão ainda
não foi pacificada definitivamente pelos Tribunais Superiores, porém a 2ª
Turma do STJ decidiu recentemente em favor da cobrança da CIDE
quando há fornecimento de tecnologia, mesmo sem haver o acesso ao
código-fonte (transferência). No entendimento da Corte Superior, a lei não
teria exigido a “entrega dos dados técnicos necessários à ‘absorção da
tecnologia’ para caracterizar o fato gerador da exação, contentando-se com
a existência do mero ‘fornecimento de tecnologia’ em suas mais variadas
formas”408.

Tal discussão, ainda não dirimida definitivamente no âmbito dos


tribunais, como se pode notar acima, interessa ao objeto do presente
estudo, tendo em vista que a mera disponibilização de dados,
personalizados ou não, não deveria ser vista como uma hipótese de
transferência de tecnologia passível de tributação pela CIDE como regra
geral. Trata-se, portanto, de mais um elemento de incerteza vinculado à
tributação da atividade de cessão onerosa de dados.

Ademais, importações de serviços estão, via de regra, sujeitas também à


incidência das Contribuições para o Programa de Integração Social e para
o Financiamento da Seguridade Social na importação (PIS/COFINS-

1120
Importação), que incidem à alíquota conjunta de 9,25% sobre os valores
remetidos em função dos serviços importados.

Nesse aspecto específico, é razoável considerar que a tributação pelo


PIS/COFINS-Importação seria, em regra, aplicável, caso o resultado das
discussões mencionadas acima fosse em favor de que há uma efetiva
prestação de serviço, com elevado grau de customização, organização e
processamento dos dados, por exemplo. Por outro lado, quando se tratar de
uma mera cessão de intangível sem esforços relevantes que possam
representar uma obrigação de fazer, não ficaria caracterizada a hipótese de
incidência das Contribuições, como já manifestado pela própria
Coordenação-Geral de Tributação da Receita Federal do Brasil (COSIT)
em casos análogos de remessas de pagamento ao exterior pelo
licenciamento e uso de software sem customização (isto é, sem combinar a
prestação de serviço).

Feitas essas considerações gerais sobre os impactos de importações e


exportações de serviço no contexto da disponibilização de dados
personalizados, vale retomar brevemente a questão envolvendo o
enquadramento dos rendimentos percebidos nesse tipo de operação em
alguma das previsões estabelecidas por meio de Tratados celebrados para
Evitar a Dupla Tributação.

5. APLICAÇÃO DE TRATADOS FIRMADOS PARA EVITAR A DUPLA


TRIBUTAÇÃO

Os Tratados firmados pelo Brasil com outras jurisdições seguem, como


regra geral, os parâmetros estabelecidos na Convenção Modelo da
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

1121
Segundo o artigo VII dessas convenções, os lucros das empresas seriam
tributáveis apenas no Estado de residência do beneficiário desses
rendimentos, exceto se o beneficiário possuir estabelecimento permanente
no Estado da fonte pagadora. Sobre esse assunto, merece destaque inicial a
decisão proferida pelo STJ no julgamento do Recurso Especial n.
1.161.467/RS409, que definiu que o termo “lucro da empresa estrangeira”
abarca os resultados decorrentes de importação de serviços sem
transferência de tecnologia, impedindo consequentemente a tributação
desses resultados pelo IRF no Brasil. Tal decisão sanou uma controvérsia
antiga relacionada justamente ao alcance da expressão frente às
disposições internas da legislação brasileira.

Após esse julgamento, no entanto, as autoridades fiscais federais


publicaram o Ato Declaratório Interpretativo n. 5, de 16 de junho de 2014
(ADI n. 5/2014), manifestando-se no sentido de que os rendimentos pagos
em função da prestação de serviços técnicos e de assistência técnica, com
ou sem transferência de tecnologia, terão o tratamento dispensado em
Acordo ou Convenção firmados para Evitar a Dupla Tributação conforme
(i) o artigo que trata de royalties, quando o respectivo protocolo do
Acordo/Convenção fizer a equiparação entre royalties e serviços técnicos e
de assistência técnica; (ii) o artigo que trata de profissões independentes ou
serviços profissionais nos casos envolvendo qualificação técnica da pessoa
ou grupo prestador; e (iii) o artigo que trata de lucro das empresas de
forma residual.

Ainda assim, é importante destacar que, mesmo nos casos em que há a


previsão em protocolo de qualificação de serviços técnicos sem
transferência de tecnologia como outros itens que não os lucros das
empresas, há discussões que visam afastar a cobrança do IRF no Brasil.

1122
Com efeito, a título exemplificativo, a equiparação desses rendimentos a
royalties contidas em protocolos dos Tratados vem sendo discutida
judicialmente. Recentemente, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região
firmou o entendimento410 de que a equiparação a royalties prevista em
protocolo seria aplicável apenas aos serviços com transferência de
tecnologia.

Como se pode imaginar, as discussões envolvendo a aplicação dos


Tratados é complexa, variando muito a depender da redação adotada
especificamente por cada Acordo ou Convenção, assim como em razão da
situação fática. Assim, além das significativas dificuldades verificadas na
qualificação jurídica das operações envolvendo a disponibilização onerosa
de dados personalizados para fins fiscais, a constante integração dos
mercados e as cada vez mais comuns operações cross-border envolvendo
atividades inseridas no contexto da economia digital revelam elementos
adicionais de complexidade e discussão.

Em linhas gerais, contudo, é possível concluir que a mera


disponibilização de dados, mesmo que coletados em caráter específico, é
atividade que não envolveria a transferência de tecnologia necessária ao
enquadramento dos rendimentos advindos dessa atividade como royalties,
sendo mais adequada sua qualificação como “lucro das empresas” ou, em
casos excepcionais, como ganhos de capital, conforme o caso.

6. CONCLUSÕES

A economia da era digital vem gerando inúmeras oportunidades no que


se refere às possibilidades de criação de valor a partir de dados capazes de
otimizar hábitos e processos de produção. Ao mesmo tempo, vem impondo
também grandes desafios à sociedade em termos de regulação, dentre os

1123
quais a dificuldade de aplicar regras tributárias pensadas sobre uma
realidade econômica muito menos dinâmica. Assim, ficam claros os
benefícios que surgiriam de reformas da tributação aplicável sobre
atividades produtivas.

Apesar disso, dado o ordenamento jurídico em vigor, buscou-se situar a


discussão sobre os critérios e os parâmetros necessários à adequada
definição dos tributos incidentes em diferentes modelos de negócio
envolvendo a disponibilização onerosa de dados e informações. Com
efeito, situações envolvendo a obtenção, organização e atualização de
dados conforme critérios e necessidades específicas de determinados
players apresentam claros contornos de uma prestação de serviço sujeita
ao ISS, dados os componentes relacionados a uma obrigação de fazer. Por
outro lado, a mera entrega generalizada de dados, sem uma relação
continuada e obrigação de detalhamento e renovação, apresenta um caráter
nítido de obrigação de dar que pode fazer surgir a incidência do ICMS,
dadas as pretensões fiscais mais recentes.

Ademais, ao sair das operações circunscritas ao território nacional,


considerando a integração dos mercados e, em especial, operações
envolvendo novas tecnologias, é possível identificar elementos adicionais
de dificuldade para fins fiscais, tais como a incidência dos diversos
tributos geralmente aplicáveis às importações de serviço, bem como as
discussões envolvendo a aplicação de Tratados firmados para Evitar a
Dupla Tributação e o enquadramento de rendimentos no conceito de “lucro
das empresas”.

1124
Parte II
NOVAS PERSPECTIVAS: POLÍTICAS
FISCAIS PARA A TRIBUTAÇÃO DOS
NEGÓCIOS NA ECONOMIA DIGITAL E DAS
NOVAS TECNOLOGIAS

1125
Seção A
Economia Digital e Formas Alternativas de Tributação

Tributação e Novas Tecnologias: Reformular


as Incidências ou o Modo de Arrecadar? Um
“SIMPLES” Informático
411
Marco Aurélio Greco

1. INTRODUÇÃO

Dizer que o sistema tributário brasileiro é complicado e que as novas


tecnologias trouxeram grandes desafios nesse campo é repetir o que tem
sido constatado um sem-número de vezes.

Creio que é o momento de caminhar numa nova direção.

No presente estudo, vou procurar situar as dificuldades que o convívio


do sistema tributário com as novas tecnologias tem gerado para, então,
tentar indicar caminhos possíveis a trilhar na busca de um ponto de
equilíbrio que atenda às expectativas tanto dos Fiscos como dos
contribuintes.

Os Fiscos têm a expectativa de arrecadar os tributos legalmente criados


na dimensão que resulte do perfil das respectivas incidências, e os
contribuintes buscam honrar seus compromissos com simplicidade, clareza
e sem surpresas futuras.

1126
Hoje em dia, por diversas razões, este ideal tem sofrido múltiplos
reveses.

2. RAZÕES TÊM ORIGEM EM AMBOS OS CAMPOS

As dificuldades presentes têm origem tanto no campo do Direito


Tributário como das novas tecnologias, especialmente as ligadas à
informática.

O ordenamento jurídico corresponde a uma construção abstrata que


procura retratar determinada realidade à qual vincula certa consequência
voltada à conduta humana, ao patrimônio, ao estado civil da pessoa etc.

Para o ordenamento funcionar plenamente, o grande desafio é


identificar a correlação entre o modelo abstrato previsto na norma e a
realidade à qual se pretende aplicá-lo. Ou, ao revés, identificar na realidade
as qualidades que o ordenamento contempla em abstrato para fins de
deflagração das respectivas consequências.

Em breves palavras, é essencial encontrar a sintonia entre os conceitos


(integrantes do modelo abstrato construído pelo ordenamento) nos quais
estão definidas as qualidades a serem buscadas na realidade e essa própria
realidade com as qualidades que possui concretamente.

Isto gera uma permanente busca de respostas que permeia o


ordenamento jurídico como um todo, na medida em que sua aplicação se
desdobra no tempo, e o mundo existente na data em que o conceito foi
construído nem sempre coincide com o mundo do momento em que a
regra precisa ser aplicada412.

Daí a importância dos mecanismos utilizados pelo ordenamento para


enfrentar situações de descompasso, seja mediante alterações legislativas,

1127
construção jurisprudencial ou elaboração doutrinária; cada qual no seu
momento e na dimensão que lhe couber.

Especificamente no que diz respeito à tributação brasileira, nunca é


demais lembrar que o Texto Constitucional é analítico, com a
discriminação de competências tributárias apoiada em conceitos que, pela
sua própria condição, estão em permanente confronto com a realidade.

Acentue-se que a atual discriminação de competências tem sua origem


– no que toca à qualificação de “mercadorias” e “serviços” – na década de
1960, quando aprovada a Emenda Constitucional n. 18/65 à CF/46.

Naquela época, o mundo digital praticamente não existia; ainda que


existisse pontualmente em alguns ambientes específicos, não existia na
dimensão que hoje apresenta na sociedade.

A questão crucial consiste em saber se o significado do conceito


utilizado pela Constituição deve ser determinado à luz da realidade
existente à data da promulgação da Constituição (1988) ou à data da
aplicação da lei tributária de incidência (p. ex., 2017).

Esta é uma discussão que se estende há décadas sempre que se procura


identificar a linha divisória das competências constitucionais dos Estados
(para instituírem o ICMS) e dos Municípios (para o ISS), posto haver uma
faixa limítrofe de difícil equacionamento.

Por outro lado, quando se foca a análise nas mudanças trazidas pelos
avanços da tecnologia no âmbito da informática, três constatações são
nítidas.

Primeira: a informatização levou à desmaterialização dos bens.

1128
Os bens sempre foram vistos como instrumentos para a fruição de
determinadas utilidades. Alguém compra um alimento para com ele
garantir sua sobrevivência, um veículo, para poder se locomover, uma
roupa, para se proteger do frio etc.

Porém esta utilidade era obtida pela fruição de determinado objeto


físico no sentido de constituído ou atrelado a um conjunto de átomos.

Nesse sentido, a própria informação dependia de um suporte físico para


ser guardada ou transmitida e, com isso, ser fruída. As antigas tábuas
hititas são demonstração disso.

A evolução da tecnologia, especificamente no âmbito da informática, o


uso da linguagem binária e outros avanços fizeram com que a mensagem
adquirisse condições de circulação independente de um suporte físico à
qual estivesse agregada413.

Passamos de uma civilização apoiada em átomos para uma apoiada em


bits. Apesar de não ter um suporte físico ao qual esteja indissociavelmente
agregada, essa informação em bits tornou-se muito valiosa e, a rigor, até
mesmo a moeda reduziu-se – em grande parte – a um registro na memória
de um computador.

A isso se acrescente o surgimento de equipamentos portáteis que hoje –


graças à tecnologia neles embarcada – realizam proezas.

As antigas tábuas hititas com singelas informações, transformaram-se


em tablets multifuncionais...

Tão profunda modificação trouxe, imediatamente, problemas a serem


enfrentados pela tributação, a começar pela dificuldade de enquadrar

1129
determinadas figuras (p. ex., software, banco de dados) nos conceitos de
mercadoria ou de serviço. A pergunta subjacente ao debate consiste em
saber se o software corresponde a uma “mercadoria virtual” ou se o seu
licenciamento de uso corresponde a uma prestação de serviço.

Também não se pode excluir a posição daqueles que afirmam tratar-se


de situação não alcançada pelos dois impostos (ICMS e ISS), sendo
hipótese a carecer de uma previsão constitucional específica ou apenas
captável por um imposto do campo residual de competência.

Esse debate dura há décadas e tudo indica que ainda continuará.

Em suma, os avanços da informática levaram a grandes dificuldades no


enquadramento da realidade dela decorrente nos conceitos
tradicionalmente utilizados no Brasil, para discriminar competências
tributárias. Dúvidas relevantes quanto à ocorrência ou não do fato gerador
deste ou daquele imposto.

Segunda: a informatização levou à desterritorialização das atividades.

Na medida em que a mensagem não necessita mais de um suporte físico


para circular, o efeito imediato é o território perder sua função de apoio e
critério definidor do local em que as atividades se desenvolvem.

Além das consequências ligadas à figura da fronteira414, essa perda do


território como referencial de definição gera efeitos não só no plano da
identificação do local em que se considera ocorrido certo evento, como de
seu consequente que é a determinação da entidade cuja legislação será
aplicada àquela atividade.

1130
Isto implica comprometimento de conceitos de apoio utilizados pela
legislação tributária que foram construídos paulatinamente. Tal é o caso,
no âmbito da tributação internacional, do conceito de estabelecimento
permanente que, nas Convenções para evitar a dupla tributação da renda,
tem como elemento inicial o seu caráter “fixo”.

Ora, que fixidez é imaginável no mundo informático? Hoje em dia um


notebook para um prestador de serviços ou para um agente financeiro pode
ser seu “estabelecimento”.

A desterritorialização das atividades gera, além de outros, dois efeitos


tributários relevantes: coloca em dúvida a entidade política a quem será
devido o tributo (p. ex., Estado ou Município) e, por consequência, deixa
em aberto quanto será devido.

Dessas duas constatações iniciais resulta um quadro de perplexidades,


pois o contribuinte pode encontrar-se na situação de não saber que tributo
deve pagar, a quem deve fazê-lo e de quanto é sua obrigação!!!

Terceira: a informatização provocou a desintermediação das


transações.

No mundo que existia antes das alterações recentes trazidas pelo avanço
da informática, as transações comerciais, financeiras, patrimoniais etc.
dependiam, em sua grande maioria, de intermediários. Ou seja, de pessoas
que tinham por função servir de canal de trânsito das operações entre dois
interessados.

O comerciante tradicional é, por definição, um intermediário, assim


como o é, no seu campo específico, a instituição financeira.

1131
Ora, a informática serviu para aproximar produtores e consumidores de
modo que, num sem-número de situações é possível uma negociação
direta, sem a necessidade de um intermediário. Compra-se remotamente;
entrega-se física ou remotamente.

Essa consequência tem relevância tributária porque um dos


instrumentos de controle da ocorrência dos fatos geradores e do
cumprimento das obrigações daí decorrentes é investir os intermediários
na condição de responsáveis tributários, seja como agentes de retenção (p.
ex., as fontes de pagamento de renda), seja como agentes de arrecadação
(p. ex., o substituto tributário no âmbito do ICMS).

Essa mudança de perfil do fluxo das transações415 ensejou o surgimento


de outros mecanismos de controle (igualmente informáticos e que podem
atingir outros valores, como a privacidade), mas estes não são objeto do
presente estudo.

O exemplo mais atual e que melhor mostra essas três mudanças é a


figura do bitcoin, pois seu valor prescinde da vinculação a um suporte
físico (como a moeda ao ouro ou à prata); é aterritorial, pois se encontra
“na nuvem” e afeta a intermediação financeira, pois prescinde de
instituições. E, apesar disso, tem valor econômico no âmbito da sociedade.

O quadro aqui desenhado mostra que a situação atual não é confortável


para ninguém. Não o é para o contribuinte, pois pode estar na situação de
não saber o que pagar, a quem pagar e quanto pagar; nem o é para os
Fiscos, pois não têm uma garantia de ingresso de recursos financeiros,
posto não saberem realmente qual a base econômica sobre a qual seus
impostos devem incidir.

1132
Qual caminho trilhar?

Um caminho possível é proceder a uma reformulação das incidências


tributárias. Cerne do que nos últimos vinte anos tem sido objeto das
inúmeras propostas de reforma tributária já apresentadas.

Os estudos e propostas feitos nesse sentido possuem valor e merecem a


devida ponderação e avaliação.

Penso, porém, que – independentemente do que ocorrer no âmbito da


denominada reforma tributária e da amplitude que ela venha a ter – há um
outro caminho possível de trilhar em que o foco não é a incidência
tributária em si, mas o modo de cumprimento das obrigações geradas. Esse
caminho pode assegurar ao contribuinte a tranquilidade de ter cumprido as
obrigações a seu cargo e aos Fiscos, a segurança de um fluxo de ingressos
tributários.

Para tanto, é necessário ter em conta a postura e o modelo de


compreensão da realidade, como pressuposto para a fundamentação da
alternativa proposta.

3. A TRIBUTAÇÃO ADEQUADA

Historicamente, a tributação é vista como função do Poder Público que


basta a si mesma; como algo que existe por emanação direta do poder
estatal. Por muito tempo, seu fundamento foi visto como o poder de
império de que investido o Estado perante os indivíduos a ele submetidos.

Essa concepção está na base do desenho adotado pela Constituição


Federal de 1967 em relação ao capítulo “Sistema Tributário” nela
contemplado, no qual se encontravam apenas competências legislativas, ou

1133
seja, modos pelos quais poderia ser atingido o patrimônio dos
indivíduos416.

A partir disso, o Direito Tributário – como conjunto organizado de


regras dispondo sobre o exercício do poder de tributar e respectivos limites
– estruturou-se juridicamente focado quase que exclusivamente na
captação de manifestações de capacidade contributiva, posto que o
personagem central era o Estado-aparato.

Para tanto, o Direito Tributário utiliza-se de conceitos abstratos


aplicáveis a quaisquer situações e contextos, sem maiores perquirições.

Não há dúvida de que os conceitos são essenciais para o Direito


funcionar.

Mas uma visão que esteja focada apenas neles assume o perfil de uma
visão “idealista”, quase platônica, do mundo das ideias, a qual se afasta do
mundo real.

Isso fez que, com o tempo, houvesse um hiato entre dois mundos: o
abstrato dos conceitos tributários e o real das atividades econômicas de
cada setor empresarial.

Mais do que isso. Definiu-se, em tese, um nível ou padrão de tributação


(alíquotas, sistemáticas cumulativa e não cumulativa, conjunto de
obrigações acessórias etc.) e tudo que disso divergisse seria visto como
benefício/privilégio ou, então, como agravamento/punição.

O distanciamento entre o modelo abstrato e o mundo real, aliado às


justas demandas de controle e de compreensão das peculiaridades, fez
proliferar as regras, sub-regras, subconceitos, sub-regras de sub-regras etc.

1134
Um bom exemplo disso é o debate sobre o conceito de insumos no
âmbito de PIS/COFINS não cumulativo e todas aquelas regras específicas
sobre inúmeros produtos e regimes que a legislação dessas contribuições
apresenta.

Diante da complexidade assim gerada, busca-se cada vez mais dar


“racionalidade” ao Sistema Tributário.

A questão é saber qual racionalidade deve ser adotada, pois podem


existir vários tipos de racionalidade.

Pode existir uma racionalidade arrecadatória, assim como uma de


simplificação operacional, ao lado de uma busca de uniformidade de
tratamento, ou de neutralidade econômica, sem esquecer a racionalidade
de necessidades e a que vê o tributo como instrumento de políticas
públicas, e tantas outras.

Por serem distintas, a cada específica racionalidade adotada como


parâmetro, corresponde uma concepção diferente de Sistema Tributário
que aponta para diferentes modificações e ajustes a serem considerados
necessários.

Entendo que a racionalidade a ser adotada como parâmetro deve se


apoiar em diretrizes que emanem da Constituição, pois, assim, os preceitos
técnicos terão um norte a ser perseguido.

A racionalidade que encontro na Constituição passa quase


desapercebida, posto que ainda não se reconheceu a devida dimensão e a
profunda modificação trazida pela CF/88 quando comparada com a CF/67.

1135
Na CF/67, o personagem principal era o Estado-aparato; na de 1988 é
o Estado-sociedade417.

Em matéria tributária, essa mudança de personagem principal dá realce


ao que se pode chamar de racionalidade da adequação.

Dessa perspectiva, inverte-se o ponto de partida do desenho da


tributação.

Em vez de o foco estar na competência constitucional, na lei


instituidora ou no conceito abstrato (mercadoria, serviço, renda etc.),
parte-se da realidade dos fatos, daquilo que concretamente existe para, a
partir disso, definir a tributação nas quatro dimensões ligadas à sua
instituição: incidência, controles, cobrança e sanções418.

Essa racionalidade está na base de dois preceitos da CF/88 que devem


ser interpretados com a postura de entender a razão pela qual eles estão
incorporados ao Texto Federal. Qual motivo os tornaria tão relevantes a
ponto de merecerem uma previsão expressa na Constituição? E entendê-
los de modo a extrair-lhes a amplitude possível diante da realidade à qual
se dirigem.

São eles as alíneas “c” e “d” do inciso III do artigo 146 da Constituição
Federal de 1988 (CF/88), posto que ambos incorporam a ideia de
adequação como base para determinada disciplina jurídica no campo
tributário.

Na alínea “c” encontra-se expressa referência a um “adequado


tratamento tributário” a ser dispensado aos atos de cooperação. Ou seja,
atos de cooperação devem ser vistos, da perspectiva tributária, como
eventos diferentes dos meros atos empresariais cujo intuito é a obtenção de

1136
lucro. Por isso, não se trata de “isentar” tais atos, mas de delinear a regra
adequada para identificar se, onde e em que dimensão há efetiva
capacidade contributiva neles manifestada.

Na alínea “d”, a previsão é de um “tratamento diferenciado” em função


da dimensão econômica das empresas. Ou seja, o fato de uma empresa ser
de pequeno porte foi suficiente para o Constituinte entender que merecia
um “tratamento diferenciado”. Ou seja, um tratamento não idêntico ao da
generalidade dos contribuintes. Um tratamento que atenda às
peculiaridades inerentes ao fato de ser de pequeno porte.

Sublinhe-se que tratamento diferenciado não significa tratamento


favorecido. Tanto é assim que a alínea “d” contempla os dois tipos
(“diferenciado” e “favorecido”) a significar que tratamento diferenciado
não é necessariamente favorecido. Vale dizer, não é um tratamento que
desonere, isente etc. É um tratamento diferente dos demais, que atenda às
peculiaridades resultantes do tamanho das empresas.

Detectado o critério subjacente a ambos os dispositivos, então se pode


reconhecer que a CF/88 consagra como parâmetro da tributação sua
adequação à realidade, no sentido de estar a ela amoldada.

Isso significa que o caminho a seguir deve ser o de construir uma regra
e um modelo de tributação a partir da realidade concreta e não dos
conceitos abstratos.

Inverte-se a lógica de raciocínio, que deixa de ser a lógica da


uniformidade (a mesma regra aplicável a todos os contribuintes) para ser a
lógica de diversidade (regras distintas conforme as diferenças que forem
detectadas; daí o “diferenciado”).

1137
Aliás, isonomia é exatamente tratar os desiguais na medida de sua
desigualdade.

4. A RELEVÂNCIA DOS SETORES

A aplicação de um tratamento diferenciado supõe identificar uma razão


concreta que o justifique à luz de algum critério que transcenda o próprio
ambiente tributário, pois a tributação, além de mera geradora de recursos
financeiros para o Estado, assume, dentro da CF/88, o papel de
instrumento de viabilização de valores constitucionais e políticas públicas.

Por um lado, o artigo 146, III, “c”, ao prever o adequado tratamento


tributário dos atos de cooperação, vincula-se ao artigo 174, § 2º ao
estabelecer que a lei estimulará o cooperativismo e outras formas de
associativismo.

Por outro lado, com relação ao tratamento diferenciado, o artigo 146,


III, “d” da CF/88 explicitou o critério da dimensão econômica da empresa
que encontra apoio no princípio da ordem econômica previsto no artigo
170, IX, que aponta na direção de um “tratamento favorecido para as
empresas de pequeno porte”.

Ou seja, no corpo da Constituição encontram-se dois dispositivos da


ordem econômica aos quais a tributação deve se adequar. É a composição
entre valores e objetivos constitucionais de um lado e instrumentos
tributários dando-lhes aplicabilidade neste campo específico.

Como a tributação no Brasil envolve todos os âmbitos de governo, é


assegurada a cada entidade tributante a possibilidade de adotar os seus
mecanismos de implementação de tais valores e objetivos; mas seus efeitos
ficam restritos à respectiva área.

1138
Para que um mecanismo abranja toda a gama de tributos incidentes – no
caso sobre as empresas de pequeno porte – é preciso existir um
instrumento nacional ao qual todas as entidades se submetam. Daí a
previsão do artigo 146 no sentido de a lei complementar ser o veículo de
tais previsões.

Ocorre que a CF/88 utiliza diversos critérios para definir os parâmetros


da legislação e da ação administrativa. Há dispositivos que adotam o
critério político, quando a referência é a temas “federais, estaduais ou
municipais”; o viés territorial, quando se refere a providências de caráter
“regional”; e a visão abrangente quando trata de questões “nacionais”.

Ao lado de todas essas perspectivas de compreensão e tratamento da


realidade, uma dimensão identificável no âmbito da sociedade e
reconhecida pela CF/88 é a existência de setores (não só econômicos, mas
também estes) cuja relevância é nela reiteradamente mencionada para
inúmeros fins.

Assim, por exemplo, o artigo 48, IV, da CF/88, atribui ao Congresso


Nacional a competência para dispor sobre planos e programas setoriais de
desenvolvimento, de cuja elaboração orçamentária dispõem os artigos 165,
§ 4º e 166, § 1º, II.

De outra parte, o artigo 187, ao tratar da política agrária, refere-se aos


setores de comercialização, armazenamento e transporte.

Por sua vez, o artigo 195, § 12, também da CF/88, menciona os setores
de atividade econômica para os quais as contribuições previstas nos seus
incisos I, “b”, e IV serão não cumulativas.

1139
O artigo 216-A, § 3º volta a mencionar as “políticas setoriais do
governo”.

E o artigo 41 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias


(ADCT) assegura a permanência dos incentivos fiscais setoriais anteriores
à Constituição que tenham sido reavaliados e confirmados nos termos ali
previstos.

Outras menções poderiam ser feitas.

O importante é constatar que a CF/88 reconhece o critério setorial como


válido para fins de definição de políticas públicas e modos de ação
administrativa, sendo mais que uma simples possibilidade, pois assume a
condição de um dos critérios a serem necessariamente levados em
consideração na ação estatal. Só isto dá sentido, por exemplo, à existência
de uma competência específica para aprovar planos e programas setoriais
de desenvolvimento (art. 48, IV, da CF/88).

Ora, o setor de informática é identificável como tal no âmbito da


atividade econômica em geral.

Claro que qualquer segmentação por meio de conceitos que se faça no


bojo da sociedade civil apresentará um núcleo nítido e uma borda
nebulosa. É inerente a qualquer conceito – cujo objeto seja as condutas
humanas – essa dualidade formada por um núcleo preciso e uma borda
imprecisa o que leva à constante reavaliação de sua amplitude e à eventual
criação de novos conceitos mais precisos. Não há nada de novo nessa
constatação. É uma das características da produção jurídica, fruto do
convívio com uma realidade em permanente mutação.

1140
Mas isso não afasta a utilidade de uma segmentação por setores, na
medida em que características neles existentes podem merecer um
tratamento específico (diferenciado).

Como exposto, o setor de informática – em razão dos avanços


tecnológicos que incorpora – apresenta peculiaridades que afetam
diretamente a tributação interna no Brasil.

A desmaterialização, a desterritorialização e desintermediação levaram


à situação paradoxal de, em inúmeras hipóteses, não se saber qual imposto
pagar (ICMS ou ISS), a quem pagar (a qual Estado ou Município desde
que superada a questão anterior) e, por decorrência, quanto pagar (em
função da lei tributária da entidade que vier a ser reconhecida como
competente).

Outros setores também apresentam peculiaridades que os distinguem,


como o agronegócio (por sua relação com o tempo, os riscos naturais e a
interação com o meio ambiente), ou o de petróleo e derivados (pela sua
concentração na produção e pulverização no seu consumo) etc.

5. ARRECADAÇÃO UNIFICADA

Diante do quadro traçado, da complexidade detectada e


independentemente de uma reforma que atinja a discriminação de
competências tributárias incrustada na Constituição, uma alternativa
possível de ser adotada com o objetivo de simplificar as obrigações a cargo
dos contribuintes e assegurar um fluxo de recursos às entidades tributantes
é instituir um tratamento diferenciado consistente num regime único de
arrecadação, à semelhança do previsto no parágrafo único do artigo 146 da
CF/88.

1141
Esse regime único poderia abranger não apenas ICMS e ISS, mas
também os tributos e contribuições federais com o perfil delineado nesse
dispositivo constitucional.

Neste ponto, o Brasil tem mais de 10 anos de vivência do regime único


de arrecadação criado sob a denominação de “Simples Nacional”419 que,
como toda obra humana, tem qualidades, defeitos e desafios a enfrentar,
mas cujo saldo é manifestamente positivo por dar a tranquilidade ao
contribuinte de que cumpriu suas obrigações, e aos Fiscos, a
previsibilidade da arrecadação.

Claro que não se trata de transplantar acriticamente esta ou aquela


legislação, mas de raciocinar a partir deste outro ponto de vista e construir
um modelo unificado de arrecadação que atenda às peculiaridades do
setor.

Para tanto, por envolver tributos de competência das três esferas de


governo, sua implementação depende de inclusão, no inciso III, do artigo
146 da CF/88, de uma alínea específica autorizando a lei complementar a
dispor sobre esse regime aplicado em função de setores econômicos e não
apenas em função da dimensão econômica da empresa, como resulta da
alínea “d” atual.

Não se exclui que, em função da experiência vivida com esse modelo,


ele possa vir a ser estendido a todo o universo de contribuintes. É o futuro
que dirá.

6. DESAFIOS SUPERVENIENTES

A adoção de um regime único de arrecadação aplicado ao setor de


informática envolve desafios. Destaco dois, embora outros certamente

1142
existam.

Um desafio é a definição da amplitude do que seria considerado setor


de informática. Seriam apenas as empresas ligadas a softwares básicos,
sistemas operacionais ou também as que disponibilizam aplicativos,
inclusive para equipamentos portáteis? Abrangeria hipóteses do que é
alcançado pelo ICMS-Comunicações e, neste caso, em que dimensão? A
disponibilização de utilidades no âmbito da internet estaria abrangida? Etc.

Delimitar um campo é uma dificuldade a ser enfrentada com o debate a


respeito e a adoção de um critério tão objetivo quanto possível, como
ocorreu na experiência do Simples.

Outro desafio é compatibilizar um regime único de arrecadação com os


regimes não cumulativos de tributação que existem no ICMS e em
PIS/COFINS. Este desafio é maior do que o enfrentado pelo Simples,
porque a informática está disseminada por todo o universo de agentes
econômicos, independentemente da sua dimensão ou local.

Aqui também cabe o debate e, eventualmente, a extensão do regime a


outros setores até chegar à totalidade dos contribuintes.

7. CONCLUSÃO

A proposta aqui exposta busca implantar um regime de tributação que


seja adequado ao setor de informática.

Sublinho que, por buscar a adequação à realidade do setor, não se trata


de benefício nem de redução de tributos. Trata-se, apenas, de viabilizar um
modo concentrado de cumprimento das obrigações tributárias legalmente
previstas.

1143
Não se trata de criação de uma nova incidência, nem de afastamento de
alguma existente. Trata-se, apenas de reunir num único recolhimento os
valores pertinentes aos impostos e contribuições incidentes sobre as
atividades ligadas à informática.

A dimensão pertinente a cada imposto ou contribuição é matéria a ser


debatida no curso do processo legislativo da lei complementar aqui
referida.

Para a distribuição dos respectivos valores entre as entidades


tributantes, a própria informática fornece atualmente instrumentos
eficientes.

Em suma, independentemente de haver ou não reforma das


competências tributárias em si com reflexo nas respectivas incidências, um
passo significativo que pode ser dado é caminhar na direção da unificação
do recolhimento de impostos e contribuições, criando o que poderia ser
denominado de um “Simples informático”.

1144
Economia digital e a criação de um IVA para
o Brasil
1
Paulo Caliendo

1. INTRODUÇÃO

O presente texto objetiva analisar o impacto da economia digital no


atual modelo da tributação sobre o consumo. Os negócios surgidos com as
novas tecnologias não somente alteraram os meios técnicos existentes, mas
revolucionaram a base econômica tradicional, por meio de uma
“disrupção” com as estruturas presentes.

De outro lado, verificaremos as consequências da incompatibilidade


entre essa mudança estrutural e o sistema tributário nacional,
especialmente na tributação particionada sobre o consumo, em particular
quanto ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias – ICMS (Estados e
DF), ao Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, às contribuições
sociais para o PIS e para a COFINS (União) e ao Imposto sobre Serviços –
ISS (Municípios).

Por fim, irá se demonstrar a necessidade da adoção inafastável do


modelo IVA (imposto sobre valor agregado), como exigência de
eficiência, de praticidade e de equidade. O presente “estado de coisas” irá
exigir uma nova normatividade jurídica, adaptada aos novos desafios,
particularmente como uma exigência constitucional.

A Constituição Federal de 1998 (CF/88) estabeleceu um marco


normativo abrangente sobre as mudanças tecnológicas. A proteção da
tecnologia nacional está presente no texto constitucional em diversos

1145
dispositivos (art. 5º, XXIX e art. 216, III). A CF/88 ainda determina a
promoção da tecnologia, por meio do acesso, da difusão e da criação,
como política pública constitucionalizada (art. 23, V; art. 24, IX e art. 200,
V). Para tanto, o texto determina o incentivo à pesquisa e tecnologia,
como uma das prioridades de Estado (art. 179, III; art. 213, § 2º, arts. 217,
218 e 219).

Os novos desafios tecnológicos irão demandar a proteção e incentivo da


tecnologia, mas também a necessária adaptação do sistema tributário às
novas formas negociais e econômicas.

2. OS NOVOS MODELOS DE NEGÓCIOS NA ECONOMIA DIGITAL E


SEUS IMPACTOS SOCIOECONÔMICOS

O impressionante desenvolvimento tecnológico, nesse início do século


XXI, excedeu em muito as melhores previsões. Há vinte anos, as grandes
perspectivas estavam com o mundo novo das “tecnologias da informação“
(technology of information – IT). Nem os cenários mais futuristas, daquela
época, projetariam o desenvolvimento exponencial dos últimos ou dos
vindouros anos. Diversas tecnologias, convergentes ou não, surgem
surprendendo todos os roteiros sistemáticos e “abrangentes”. A lista de
inovações, a cada momento tida como definitiva e fielmente organizada,
exige nova atualização, com novos e impactantes modelos, técnicas e
desafios.

Uma nova tecnologia pode imediatamente tornar-se disruptiva e alterar


todas as formas de realização de negócios anteriores. Tamanha alteração
de contexto histórico produzirá alterações sobre os conceitos e regras
utilizados em Direito Tributário? Essa é uma pergunta fundamental.
Haveria permanência dos conceitos em um contexto de mudança
tecnológica?

1146
A essência transformadora, revolucionária e, por que não dizer,
disruptiva do capitalismo foi acuradamente percebida por Joseph
Schumpeter, em sua obra Capitalismo, Socialismo e Democracia,
originalmente publicada em 1943. Para o autor, o processo de destruição
criativa é próprio do âmago desse sistema econômico. Ele consiste e vive
nesse processo contínuo de destruição do modo anterior de produção e de
criação de modelos mais inovadores (“this process of Creative Destruction
is the essential fact about capitalism. It is what capitalism consists in and
what every capitalist concern has got to live in”2).

Schumpeter não fazia uso das expressões atualmente em voga –


“disruptivo” ou “exponencial” –, mas afirmava que existiam momentos de
mudanças tecnológicas “revolucionárias” e não meramente lineares.
“Qualitativas” e não meramente quantitativas. O fenômeno pressentido por
Schumpeter tornou-se cristalino na atualidade. Essa havia sido sua intuição
genial.

Três movimentos tiveram profunda influência no Ambiente de Inovação


e, consequentemente, no Direito. Primeiro, a mudança no foco no inventor
individual para as redes de pesquisas (networked learning); segundo, da
inovação direcionada ao mercado à interação entre práticas de mercado e
sociais (nonmarket practices) e, por último, dos direitos proprietários para
a interação entre direitos proprietários e comuns3.

A literatura sobre o assunto tem demonstrado a tendência da inovação


em direção às práticas coletivas e compartilhadas. O padrão do inventor
solitário cede espaço aos ambientes coletivos de inovação4. O papel
heróico do indivíduo precursor é contrabalançado pelas contribuições da
comunidade onde ele está inserido5.

1147
Outra conclusão relevante é de que a existência de conexões entre a
indústria e a Universidade importam e muito6. Aqui, diversos fatores
devem ser levados em consideração: proteção da propriedade intelectual,
relações laborais, regulação, dentre outras. A tributação se destaca como
um possível obstáculo relevante a um ambiente de inovação sadio.

A tributação poderá prejudicar enormemente o desenvolvimento da


economia digital, especialmente na ausência de clareza e previsibilidade na
utilização dos conceitos jurídicos, em face dos novos fatos econômicos.

Os conceitos de Direito Tributário apresentaram um extraordinário


desenvolvimento no século XX, motivado por um cuidadoso e sério
trabalho de professores e doutrinadores. A questão que se coloca é
justamente sobre a atualidade desse conjunto de elaborações. Como
paradigma dessas preocupações está o debate sobre o Plano BEPS (Base
Erosion and Profit Shifting) da OCDE, referência para os debates
internacionais. Dentre os principais questionamentos está a dúvida sobre a
natureza dessas alterações. Representarão as novas tecnologias apenas
mais um conjunto de técnicas a somarem-se a tantas outras, como o
telefone, a televisão, ou produzirão uma radical alteração dos fatores
produtivos e, consequentemente, dos conceitos tributários?

A OCDE percebeu uma mudança estrutural no modo de se fazer


negócios, especialmente no Relatório denominado de Action 1 do BEPS,
com o surgimento de um novo fenômeno: a decomoditização
(decommoditise). A redução contínua dos custos de produção, por meio
das novas tecnologias de informação e comunicação (TIC), impôs aos
agentes econômicos a busca de novas formas de vantagem competitiva
pela agregação de valor, em aspectos específicos ou partes do processo
produtivo. Aqui surgiriam novas e excepcionais oportunidades produtivas7.

1148
Diversos estudos foram elaborados, no início do século XX, com o
intuito de responder a esse questionamento, tomando por base a novidade e
particularidade dessa nova forma de comércio. Veja-se, nesse sentido, o
quadro elaborado por Charles McLure Jr., comparando as principais
formas de comércio, suas peculiaridades e diferenças8:

Forma de
Atividade Era Bens Publicidade Aquisição
Pagamento

Comércio

Pré- Relação Relação


Comércio Material Local
imprensa direta direta

Pré- Relação Relação


Serviços Serviços Local
imprensa direta direta

Produtos materiais

Pagamento
Pedido contra
por Telefone/ entrega/
Imprensa Material Correio
correio Correio Cheque e
tradicional cartão de
crédito

Cheque/
TV/Tele- TV/ Telefone/
Analógica Material Cartão de
marketing Telefone Correio
crédito

Telefone/
Comunicação Comunicação
Comércio Comunicação
Digital Material Instantânea Instantânea
eletrônico Instantânea
(on line) (on line)
(on line)

Comércio sem intermediação de conteúdo digital

Comunicação Comunicação Comunicação Comunicação


Imateriais Digital Instantânea Instantânea Instantânea Instantânea
(on line) (on line) (on line) (on line)

Comunicação
Comunicação Comunicação Comunicação
Serviços Digital
Instantânea Instantânea Instantânea

1149
Serviços Digital Instantânea Comunicação Comunicação Comunicação
(on line) Instantânea Instantânea Instantânea
(on line) (on line) (on line)

O Plano de Ação do BEPS, sobre Economia Digital, aprofundou em


muito os desafios já previstos no início dos anos 2000, para muito além do
comércio de bens intangíveis, sem a intermediação de entrega ou
pagamentos por meios materiais. A OCDE listou as seguintes
possibilidades tecnológicas: (i) o uso de smartphones e tablets; (ii)
internet; (iii) software; (iv) produção de conteúdo; (v) uso de dados e (vi)
icloud. Dentre as tecnologias promissoras cita: a internet das coisas;
moedas virtuais; robótica e impressão 3D.

Cada uma dessas tecnologias individualmente, e em conjunto, irá operar


uma mudança no modo de se fazer negócios, com a destruição das antigas
formas tecnológicas, incapazes de continuar o fluxo de produção de
riqueza e os novos modelos, que irão gerar novas oportunidades. Cada
uma dessas novas tecnologias merece um estudo detalhado e
individualizado, o que foge ao objeto do presente texto9. Nosso objetivo é
verificar o impacto geral dessas novas tecnologias no sistema tributário
como um todo.

3. ECONOMIA DIGITAL E SEUS IMPACTOS TRIBUTÁRIOS

A economia digital tende a modificar as bases da tributação do


consumo, de forma radical. Vejamos rapidamente os princípios e
postulados que regem a tributação de bens e serviços. A tributação sobre o
consumo se divide historicamente nas seguintes etapas: (i) tributação
seletiva sobre alguns produtos; (ii) tributação sobre o consumo geral, tão
somente na fase das vendas (monofásica) e (iii) tributação sobre o
consumo em geral, em todo o ciclo do consumo (plurifásica).

1150
Coube aos franceses a origem do que realmente entendemos por um
tributo sobre o valor agregado, conforme as propostas seminais do diretor
adjunto da Direção Geral de Impostos (Direction générale des Impôts
Français) Maurice Lauré10. O autor defendeu esta ideia em sua tese
perante a Faculdade de Direito de Paris, em 1952, com a dissertação sob o
título “Aspectos econômicos e técnicos da taxa sobre a produção” (Aspects
Économiques et Techniques de la taxe à la Production). Posteriormente o
governo francês decidiu implantar, em 10 de abril de 1954, o Imposto
sobre Valor Agregado (Taxe sur la Valeur Ajoutteé – TVA), em
substituição ao Imposto sobre Vendas (Taxe sur le Chiffre D’Affaires).

A Itália, por sua vez, adotou em 1919 o Imposto sobre as Vendas (tassa
sugli scambi), inicialmente incidente apenas nas vendas realizadas no
atacado, sendo depois alterada para alcançar igualmente o varejo, por meio
do Imposto Geral sobre Entradas (Imposta generale sull’entrata) em 1940.
Outros também adotaram essa iniciativa: a Checoslováquia (1919); Canadá
(1920); Bélgica, Hungria, Romênia e Iugoslávia (1921); Cuba e
Luxemburgo (1922); Áustria e Polônia (1923); Equador e Turquia (1925);
Uruguai (1928); Rússia (1930); Argentina (1931); Holanda (1933);
Noruega (1935) e Japão (1948)11.

Diversos economistas defenderam a natureza eficiente da tributação do


consumo, visto que esses autores entendiam que os indivíduos devem ser
tributados nos seus gastos, e não pela sua renda12, dado que a tributação
sobre os acréscimos patrimoniais induz ao desincentivo à acumulação.

No Direito Comunitário Europeu a harmonização do IVA ocorreu sob


os auspícios do Tratado de Roma (1957), por força da adoção do Relatório
“Neumark”, de autoria do Professor Fritz Neumark, em que sugeria a
adoção da não cumulatividade para reger os impostos sobre o consumo13.

1151
Essa orientação se consolidou com a adoção das Diretrizes n. 2, de 11 de
abril de 1967 e n. 6, de 17 de maio de 1977, estabelecendo os princípios de
harmonização comuns a todos os países-membros da União Europeia
(UE). O objetivo principal dessa iniciativa era proteger o mercado único da
adoção de barreiras fiscais ao comércio comunitário, de tal forma a evitar
que a tributação se constituísse em uma nova forma de obstáculo ao livre
comércio europeu.

O IVA foi progressivamente sendo adotado pelos países europeus,


especialmente quando da sua ampliação e entrada de novos países no
mercado comum. Assim, a França foi o primeiro país a adotar o sistema
em 1954, depois a Alemanha em 1968, a Itália em 1972, substituindo o
Imposto Geral sobre Entrada, e a Espanha em 1984.

A história do Imposto sobre Valor Agregado foi fundamentalmente


vinculada à noção de uma tributação neutra, uniforme e eficiente sobre o
ciclo econômico do consumo, e ainda hoje os desafios permanecem
gigantescos para a doutrina, especialmente sobre uma forma de alcançar o
respeito ao princípio da capacidade contributiva nos tributos sobre o
consumo.

O IVA possui como característica ser cobrado em todas as fases de


produção, ou seja, sua característica plurifásica lhe garante isonomia
econômica no tratamento de todas as fases do ciclo econômico, não
incentivando ou desincentivando a união ou a separação das operações das
unidades produtivas. Esta incidência plurifásica tem por efeito diluir o
peso da carga fiscal sobre todas as fases econômicas de modo mais
uniforme, visto que impede o impacto sobre uma única classe de agentes
econômicos.

1152
O método de determinação da base de cálculo é variado, sendo que
alguns países adotam o “método do crédito de imposto”, de tal modo que é
aplicada alíquota ao montante global das transações da empresa,
deduzindo-se do montante assim obtido o imposto por ela incorrido nas
compras desse mesmo período (crédito), conforme as suas faturas de
aquisição. O valor resultante será considerado como valor de imposto a
pagar. Em Portugal, por exemplo, a liquidação e o pagamento do imposto
concede o direito à dedução para fins de apuração do imposto devido, em
que os sujeitos passivos deduzem o imposto incidente sobre as operações
tributáveis que efetuaram.

No método do crédito de imposto existe o direito ao aproveitamento de


créditos, de tal modo que esteja assegurado o direito de compensação do
imposto pago (dedução imediata) no período de pagamento.

O IVA tem se caracterizado por defender um alargamento da base


tributável e uma redução da lista de produtos com proteção fiscal,
mantendo apenas e especialmente os bens essenciais e os alimentares
ligados à subsistência da classe mais desfavorecida, bem como os bens
agrícolas e os produzidos para autoconsumo de produtos alimentares.

A nova economia digital irá questionar os mais profundos princípios do


IVA. Será cada vez mais difícil determinar onde as operações foram
realizadas, em operações cross-borders. Onde se devem coletar os
tributos? Onde o produto ou serviço foi consumido? O que ocorre quando
não houver materialidade, presença física e mesmo territorialidade da
prestação claramente definida?

Todos esses questionamentos imporão novos desafios, muito distintos


daqueles surgidos durante a história do tributo. Duas soluções têm sido

1153
apontadas: a tributação no local onde o consumidor é residente ou no local
onde o prestador é residente14. O primeiro modelo tem sido utilizado
especialmente quando o fornecedor é cadastrado no local de presença do
consumidor e lá deve recolher os tributos. No segundo modelo, o
fornecedor será tributado no local de sua residência, mesmo que a
operação seja realizada em outra jurisdição.

A atribuição de competência à jurisdição de residência do consumidor é


a regra indicada pela OCDE no fornecimento de serviços, no modelo B2B,
no OECD International Guidelines VAT/GST (2014). É o modelo para as
“cross-border supplies of services and intangibles that are capable of
delivery from a remote location”, sob as recomendações da OECD 2003 E-
commerce Guidelines. A OCDE informa que o modelo de tributação na
residência do prestador tem sido o método escolhido por preferência,
especialmente porque reduz o risco de fraudes na exportação de serviços15.

Os desafios da nova economia digital ao IVA não se limitarão ao


problema do local de cobrança. Problemas relativos ao sujeito passivo, que
se “despersonifica”; aos meios de pagamento, que se “virtualizam”; à base
de cálculo, que se torna ambígua e tantos outros irão criar diversos
desafios aos países que adotam algum dos regimes de tributação do
consumo, sob a modalidade VAT/GST (value added tax/gross sale tax).

O caso brasileiro será ainda mais complicado, em razão de o país não


adotar um modelo de IVA na tributação sobre o consumo. Torna-se
urgente a resolução dos graves entraves fiscais em que o país se assenta.
Se os problemas já eram profundos, a nova economia digital será
implacável com a arcaica estrutura tributária nacional.

4. O ATUAL MODELO DE TRIBUTAÇÃO DO CONSUMO NO BRASIL E


A SUA INCOMPATIBILIDADE COM A NOVA ECONOMIA DIGITAL

1154
O Brasil possui a sua tributação sobre o consumo baseada em quatro
tributos distintos: ICMS, ISS, IPI e PIS/COFINS. Cada uma dessas
espécies impositivas incide sobre determinada hipótese de incidência e
possuía a sua correspondente base de cálculo. O ICMS possui duas
hipóteses de incidências: (i) as operações de circulação de mercadorias e
(ii) a prestação de serviços de comunicação e transporte interestadual e
intermunicipal. As mercadorias são caracterizadas por sua natureza
tangível, por sua “corporeidade”.

O Supremo Tribunal Federal (STF), com voto do Ministro Sepúlveda


Pertence, sustentou que “(...) o conceito de mercadoria efetivamente não
inclui os bens incorpóreos, como os direitos em geral: mercadoria é bem
corpóreo objeto de atos de comércio ou destinado a sê-lo”16. A matéria
dirigia-se à controvérsia da incidência do ICMS sobre o software. A Corte
afastou a incidência do imposto aos casos onde não houvesse presença de
substrato material.

O ISS incidirá somente sobre a prestação de serviços. Contudo, o


conceito de “fazer” estará alargado, ampliado, abarcando contratos e
situações distintas, que fogem ao conceito tradicional de prestar. Esse será
o caso da incidência sobre o licenciamento ou cessão de direito de uso de
programas de computação (item 1.05 da Lista de Serviços da Lei
Complementar n. 116, de 31-7-2013). Questiona-se se há um “fazer” no
licenciamento de software, sendo que a matéria se encontra pendente de
julgamento pelo STF, sob o regime de repercussão geral17. O STF já
decidiu anteriormente a matéria afirmando que o software customizado é
objeto de incidência do ISS18.

O IPI irá incidir sobre os produtos industrializados, considerando-se


igualmente a presença de uma base corpórea.

1155
Iremos analisar a necessidade de adoção de um IVA para o Brasil, bem
como os efeitos dessas mudanças nos países que já possuem esse modelo
de tributação do consumo.

5. A ECONOMIA DIGITAL E A EXIGÊNCIA DE UM IVA PARA O


BRASIL

Considerando todos os elementos anteriormente expostos, torna-se claro


que a nova economia digital irá impactar as estruturas sociais, bem como
exigir mudanças nos modelos tributários nacionais. Todos os países serão
afetados pelas mudanças, mas o Brasil sofrerá mais, pelo sistema
complexo, ineficiente e sem harmonia com os padrões internacionais.
Contudo, quando se fala em reforma tributária, muitos imediatamente
disparam o gatilho emocional de desânimo ou desconfiança. Parece que
novamente estamos a tratar de um assunto nacional insolúvel.

O desejo de reforma tributária é antigo e remonta aos primeiros anos de


vigência da Constituição promulgada em 1988. Nem o novo sistema
tributário era posto à prova e já existiam propostas para a sua completa
reforma. Havia um sentimento precoce de caducidade. Teriam os
constituintes errado na formatação do Estado Fiscal? De todos os lados
proliferavam vozes pelo descompasso entre os legítimos desejos de um
sólido Estado Social e um desengonçado Estado Fiscal, raquítico no
financiamento de políticas fiscais e pesado na incidência sobre os negócios
privados. A equação fiscal do novel Estado Democrático de Direito não
fechava.

Outro questionamento ensurdecedor indagava o porquê de a


Constituinte de 1988 não ter adotado o IVA, como modelo para tributação
sobre o consumo, tal como a amplíssima maioria dos Estados
desenvolvidos e da região. Todos os vizinhos regionais haviam migrado

1156
para o novo modelo entre os anos 1970 e 1980, bem como todos os
principais parceiros comerciais do país. Havia uma sucessão irrefreável de
adoções, atingindo mais de 160 jurisdições no mundo19.

Não se podia debitar a um senso de conservadorismo na doutrina. Pelo


contrário, a fiscalidade brasileira se demonstrava aberta a novas teorias e
tendências. Diferentemente do que ocorria em outras searas doutrinárias. O
Código Comercial de 1850 ainda era vigente, no momento da promulgação
da CF/88; o Código Civil era de 1916, que por sua vez havia revogado as
disposições das Ordenações Portuguesas. Neste último caso, o país havia
pulado as novidades francesas do Code Civil de Napoleão.

No campo tributário não havia essas resistências. O Imposto de Renda


foi criado em 1922 muito antes que os vizinhos regionais o fizessem. O
Brasil criaria o Imposto sobre Vendas e Consignações em 1922, um pouco
após a criação do similar francês. O Imposto de Consumo adotava
princípios modernos da fiscalidade francesa, da taxe sur la valeur ajoutée,
concebido por Maurice Lauré, Diretor Geral de Impostos. A França adotou
o novo tributo em 1954, e o Brasil adotaria o seu em 30 de dezembro de
1958, com a edição da Lei n. 3.520, posteriormente transformado em IPI,
em 1964.

O ICM havia sido criado pela Emenda Constitucional n. 18, de 1965,


adotando receptivamente as novas ideias de combate à cumulatividade nos
tributos sobre o consumo. Enquanto o modelo francês era limitado a
alguns produtores, o ICM se estendia para todos; pequenos, médios e
grandes contribuintes eram abrangidos. Surgia o primeiro tributo sobre
consumo não cumulativo estadual. Todas as demais legislações criaram
tributos centralizados no ente federal, com as exceções tardias do Canadá e
da Índia. Esses dois grandes países também se caracterizavam por suas

1157
gigantescas dimensões territoriais, necessidade de descentralização
administrativa e de financiamento estadual.

Cabe ressaltar que a recepção foi incompleta e podemos dizer que, em


alguns casos, foi falha, mas é indubitável que houve a recepção precoce de
ideias inovadoras.

Chama atenção o fato de que não houve a adoção completa do modelo


IVA. O que haveria de distinto? Alguns podem alegar que temos um IVA
nacional, “tropicalizado”. Outros dirão que se trata de um IVA remediado,
desnutrido, esquálido em seus fundamentos. Outras vozes mais críticas
diriam que nosso ICMS é um falso IVA, um bastardo, manco e coxo,
desmerecedor de sua nobre genealogia francesa distante.

A formatação inicial do ICM era bastante inovadora, tinha base ampla,


permitia o crédito e seu caráter estadual era uma novidade. No início, a sua
adoção foi um tremendo sucesso financeiro, abastecendo os cofres
estaduais, racionalizando os negócios e permitindo o surgimento de uma
ampla base industrial no país, ampliando a capacidade de financiamento
do governo. As reformas tributárias da década de 1960 ampliaram
profundamente a capacidade de financiamento não inflacionário
(endividamento e emissão de moeda). A carga tributária nacional saiu de
um percentual de 16,5% do PIB, no biênio 1963/64, para 25-26% no final
da década20. O salto de 10 pontos percentuais, em tão curto espaço
temporal, não objetivava sufocar a iniciativa empresarial, mas, ao
contrário, estava vocacionado para o crescimento econômico.

Havia um grande obstáculo; a equação fiscal errônea tornou nosso


modelo obsoleto e deficiente. O Brasil, incialmente inovador, perdeu as
grandes alterações produzidas logo após. A França modificaria

1158
radicalmente o seu sistema em 1968 e adotaria o modelo de base ampla. As
demais legislações europeias seguiriam a tendência francesa, tais como a
Alemanha (1968), Países Baixos (1969), Luxemburgo (1970), Bélgica
(1971) e Itália (1973)21. Três pontos nos diferenciariam: a nossa restrição
ao aproveitamento somente do crédito físico, a não desoneração das
exportações e a exclusão dos serviços da base. A nossa inovação surgia
envelhecida por um “originalismo prejudicial”.

As justificativas para o originalismo pareciam destacar nossas virtudes;


afinal nenhum país-continente havia adotado o IVA, nem os Estados
Unidos, nem Canadá (1991), nem a Rússia (1992), China (1994) ou Índia
(2000). Contudo perdemos a grande oportunidade histórica em
atualizarmos a nossa legislação, na Constituinte de 1988. Aquele era o
momento certo de corrigirmos a equação fiscal, equilibrar demandas
sociais e econômicas; a distribuição de renda e a produção de riqueza; as
tarefas de um governo central, das tarefas estaduais e locais; enfim,
permitir um equilíbrio entre tarefas constitucionais e receitas públicas. A
Carta do Cidadão falhou gravemente em produzir um sistema eficiente de
finanças públicas.

A Constituinte de 1988 foi movida por dois objetivos democráticos:


descentralização política e desconcentração econômica. Para concretizar
esses fins, foram erguidos dois pilares financeiros no texto constitucional:
o fortalecimento da seguridade social e o aprofundamento do federalismo
fiscal. Houve uma forte mudança na repartição de receitas e nas
competências federais. O Estados e os Municípios aumentaram a sua
participação em detrimento da União. Os impostos seletivos da União
seriam extintos (sobre a energia elétrica, os combustíveis, minerais,
transportes rodoviários e serviços de comunicação), e suas bases seriam

1159
integradas ao ICMS. Os Fundos Estaduais e Municipais ampliariam a
transferência do produto da arrecadação do IR e do IPI para os Estados e
Municípios (de 33% para 47% no caso do IR e de 33% para 57% no do
IPI)22. Como consequência, a União perdeu, nos primeiros anos,
significativa parcela de participação no bolo nacional, de 60,1% recuou
para 54,3% em 1991, enquanto os Estados ampliavam a sua participação
de 26,6% para 29,8%, e os Municípios, de 13,3% para 15,9%. Talvez isso
explique o ambiente de ouvidos moucos aos apelos de reforma tributária
no período.

A principal proposta de Reforma Tributária, do Deputado Federal


Germano Rigotto, criava um IVA atualizado. Contudo, este passava o
tempo a explicar para ouvidos gentis, mas pouco receptivos. A União
precisava cada vez mais de recursos e não queria nem um pouco saber de
mais perdas. Os Estados estavam satisfeitos com seu sistema, embevecidos
pelas novas receitas, bastava apenas ampliar ainda mais a transferência via
fundos. O resultado foram duas décadas perdidas.

Os sinais da crise não tardaram a aparecer e novamente os desejos de


reformas tributárias tímidas, quase remendos, foram surgindo. Nada de
uma revisão radical do sistema, mas tão somente ajustes fiscais. A inércia
foi fatal, e os golpes vieram de todos os lados, criação incessante de novas
contribuições não partilháveis, a reforma dos regimes do PIS/COFINS
(2002/2003), aumento brutal da base de substituição tributária,
desonerações fiscais do IPI e IR, criação e ampliação do Simples Nacional,
cobrança do Diferencial de Alíquotas, entre outros. Somente para ilustrar,
o aumento de casos de substituição tributária cresceu de uma listagem de
66 casos em 2004, em São Paulo, para 281 em 200923; o mesmo aumento
ocorreria em Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

1160
A cada medida da União, havia uma reação dos Estados tentando
preservar o pouco que conquistaram na Carta de 1988. O resultado não
poderia ser mais desastroso: Estados falidos, União esgotada e Municípios
em regime de quase insolvência.

O resultado é que não há um IVA no País, nem os constituintes o


desejaram, tampouco as administrações estaduais o defenderam. Houve a
aceitação de princípios gerais tidos como válidos e referenciais,
especialmente o princípio da não cumulatividade. Houve a aceitação da
base ampla de incidência. Mas o IVA é bem mais do que esse princípio,
ele exige um sistema completo de tratamento da tributação sobre o
consumo24. No caso brasileiro, o constituinte optou por manter a repartição
de competências tributárias entre os três níveis da federação: União (IPI,
CIDEs e PIS/COFINS); Estados e Distrito Federal (ICMS) e Municípios
(ISS). É como se existisse um IVA fatiado, dividido e, em alguns casos,
compartilhado.

O resultado foi desastroso. Os conflitos de competência se


multiplicaram, e os tribunais se tornaram abarrotados de casos complexos.
Talvez não exista democracia ocidental com tamanha quantidade de casos
judicializados, referentes a dúvidas de interpretação da legislação e da
Constituição Tributária.

Dentre as razões para a adoção do IVA destacam-se as exigências de


uma federação funcional. O atual sistema de repartição de competências
tributárias entre União, Estados e Municípios não funciona. O STF e o
Superior Tribunal de Justiça (STJ) estão sobrecarregados, com conflitos
envolvendo os diversos entes federados, especialmente entre o ICMS e o
ISS.

1161
Vejamos alguns números. Somente sobre o ICMS existem 22 Súmulas
do STJ25. Existem três Súmulas sobre o IPI26. Sobre o ISS existem seis
Súmulas editadas27. Os números representam um gigantesco estoque de
casos judiciais.

O STJ ainda julgou sob o novo regime de julgamentos de demandas sob


o rito repetitivo seis casos28. O STF, por sua vez, editou três Súmulas29,
além de duas Súmulas Vinculantes30 somente sobre o ICMS. Existem, ao
total, 31 casos desse imposto submetidos ao regime de repercussão geral,
dentre os julgados ou pendentes de julgamento31.

Os casos de conflitos de competência entre o ICMS, o IPI e o ISS são


os mais diversos, dentre os quais podemos destacar aqueles relativos ao
questionamento sobre a exação devida em operações mistas, tais como as
realizadas por farmácias de manipulação, gráficas e produção de
embalagens, industrialização por encomenda, entre tantas outras.

Os efeitos sobre as finanças públicas de um sistema tributário


disfuncional são graves. Há um estoque de mais de um trilhão e
quinhentos bilhões de reais em dívida ativa, mais de 600 bilhões em
tribunais administrativos e bilhões em programas de parcelamentos32. O
sistema cobra, mas não arrecada. O sistema legisla, mas não consegue
implementar. Por mais que investiguemos meios alternativos de cobrança,
o que por sinal é necessário, não se resolvem as causas do caos tributário.

É o momento de esta geração dotar o país de um sistema tributário


moderno, superando as antigas amarras retóricas da dificuldade (“é difícil
mudar”), da complexidade (“é muito complexo”), da conspiração
(“grandes interesses se opõem”) e outras tantas, e deter-se na solução do
problema, impondo princípios, fundamentos, prazos e metas.

1162
De todas as propostas apresentadas, parece que há, finalmente e de
modo inédito, um grau de relativo acordo sobre as bases da reforma.
Talvez o momento nacional tenha facilitado a busca de soluções urgentes.
Talvez a situação mundial tenha convencido que precisamos mudar nosso
regime tributário para competir com eficiência no disputado cenário
global. Ou talvez seja simplesmente mais um afago do sentimento de
otimismo, na espera de resolução desse grave problema nacional. O certo é
que existem diversas razões para demonstrar a atualidade e a importância
na adoção de um IVA moderno no Brasil33.

O primeiro projeto de reforma do ICMS é de autoria do Deputado


Federal Germano Rigotto, de 1992, por meio da Proposta de Emenda
Constitucional (PEC) n. 110, que reduzia o número de impostos de 15 para
8. Os Estados e Distrito Federal ficariam com um ICM, formado pela
fusão do ICMS e do IPI. Os municípios ficariam com o IPTU, ITBI,
ITCMD, IPVA e com um ISS alargado, com a incidência sobre
comunicações e transportes. Haveria uma transferência adicional de
receitas da União para Estados e Municípios, o que provavelmente
decretou a morte da proposta.

A proposta do Deputado Federal Mussa Demes, a PEC 175/1995, criava


o IVA sob a forma de um ICMS compartilhado, extinguia o ICMS, o IPI, o
ISS, Cofins, Pis/Pasep, CPMF e Salário Educação e criava um único
imposto partilhado pela União, Estados e Municípios34. O modelo não
esclarecia satisfatoriamente a repartição de receitas, entre entes
notoriamente desconfiados entre si.

Na ausência de uma reforma profunda, em 1996 é promulgada a Lei


Kandir (Lei Complementar n. 87, de 13-9-1997), substituindo o regime do
Decreto-lei n. 406, de 31 de dezembro de 1968. A norma resolveu parcial e

1163
insatisfatoriamente os principais dilemas do ICMS, deixando para trás a
ideia de uma revisão completa, e resolvia apenas alguns pontos mais
urgentes dos problemas existentes. Dois pontos se destacaram: a
desoneração das exportações e o novo regime de aproveitamento dos
créditos fiscais, que seriam continuamente adiados.

Em 2003, o Deputado Federal Virgílio Guimarães apresenta um novo


projeto de Reforma Tributária, mediante a PEC n. 41/2003. Nessa proposta
o ICMS seria legislado exclusivamente por leis complementares e
regulamentado por um colegiado composto por representantes dos Estados
e do Distrito Federal, sendo vedada a adoção de norma estadual autônoma.
As alíquotas seriam reduzidas ao número máximo de 5 e mantinha-se o
sistema de alíquotas interestaduais, com um sistema misto de partilha do
imposto. A proposta criava um IVA federal, com um sistema integrado de
liquidação de tributos, incluindo o IPI, o ICMS e o ISS.

O Deputado Sandro Mabel veio a apresentar um novo projeto em 2007.


A principal característica do projeto está em criar um sistema de IVA-dual,
com a criação de um IVA-Federal, unificando o Cofins/Pis e a Cide-
combustível; incorporava a CSLL ao IRPJ e criava um novo ICMS, com
legislação única, alíquotas uniformes e cobrado no Estado de destino da
mercadoria. Novamente a solução dual é apresentada de modo
insatisfatório.

A proposta submetida sob a denominação de PEC n. 45/2007, pelo


Deputado Federal Luiz Carlos Hauly, em 2007, possui sugestões
importantes, tais como criar impostos seletivos na competência federal e
estadual, pagos ao Estado consumidor, por meio da substituição tributária;
recria a CPMF, com alíquota máxima de 0,76%, extingue a CSLL;
municipaliza o IPVA, o ITR e o ITCMD.

1164
Dentre as principais virtudes dessa proposta está o aparente equilíbrio
de repartição de receitas entre os entres federados. Este era item pouco
tratado pelas propostas anteriores. Aparentemente a composição de
receitas dá-se de modo satisfatório para a União (IR/CSSL, CPMF e o
novo Imposto Seletivo Monofásico), os Estados (IPI, ISS, IPI,
PIS/COFINS e Salário-educação) e os Municípios (IPTU, ITR, ITBI,
ITCD e IPVA).

Trata-se de uma proposta radical e inovadora que redistribui


corretamente as bases de incidência: renda (União), consumo (Estados) e
propriedade (Municípios).

Talvez não seja a proposta perfeita, como nenhuma o será. O


importante é notar que há o desejo de simplificação da carga tributária,
equilibrando o financiamento federativo, retirando todos os custos de
informação e transação que impedem as decisões dos agentes econômicos
e garantindo a competitividade nacional perante os demais países
desenvolvidos.

A distinção entre “mercadoria” e “serviço”, em tributos, competências e


legislações distintas, definitivamente não combina com a economia digital,
e se mantida irá deixar o país com grandes dificuldades para construir uma
ponte para o século XXI.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A economia digital terá um impacto revolucionário na economia e na


tributação, especialmente sobre o consumo. A magnitude dessa
“disrupção” ainda é difícil de ser parametrizada, mas alterará
definitivamente as estruturas existentes.

1165
O sistema tributário nacional apresenta uma forte incompatibilidade
com as mudanças estruturais, decorrentes das inovações tecnológicas,
especialmente em razão da tributação distribuída sobre o consumo, em
ICMS (Estados e DF); IPI e PIS/COFINS (União) e ISS (Municípios).
Desse modo, faz-se urgente a adoção pelo país de um modelo IVA, nos
termos mencionados pela OCDE em seus estudos sobre a economia
digital.

1166
Os desafios da tributação indireta do
comércio eletrônico: estratégias para a
simplificação da arrecadação tributária em
operações B2C
35 36
Misabel Abreu Machado Derzi e César Vale Estanislau

1. INTRODUÇÃO

O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação


conduziu ao surgimento e crescimento da economia digital, a qual se
tornou, com vertiginosa velocidade, elemento central nas relações
comerciais. Diante desse quadro, “é difícil, se não impossível, isolar a
economia digital do restante da economia, para fins de imposição de
tributos”37, o que não significa que o regime tributário aplicável ao e-
commerce deva ser o mesmo que o regente das trocas tradicionais no
mercado. É preciso identificar as peculiaridades do comércio eletrônico, de
modo a formular soluções específicas para os problemas nele recorrentes.

Dentre as características marcantes da economia digital38, destacam-se:


(i) a elevada mobilidade com respeito a intangíveis e usuários; (ii) a
necessidade de expressivo acervo de informações, no que se inclui o
fenômeno da big data; (iii) a geração de efeitos em rede, dada a sinergia, o
dinamismo e a integração da economia digital (v.g., o sucesso de uma rede
social tem por requisito o registro de um grande número de usuários, de
forma que as demais pessoas tenham incentivos para também se filiar à
plataforma); (iv) a reduzida relevância das fronteiras geográficas para a
celebração de negócios; (v) a tendência à formação de oligopólios e
monopólios, sobretudo em razão do domínio de alguma inovação em um

1167
mercado pouco explorado; e (vi) volatilidade, uma vez que novas
tecnologias mudam, rapidamente, a estrutura da economia digital.

Evidentemente, essas características não são encontradas em todas as


transações realizadas no meio virtual, possuindo maior relevância para as
baseadas na prestação de serviços e no fornecimento de bens intangíveis.
A economia digital é variada e em constate metamorfose, sendo possível
distinguir diferentes categorias de e-commerce.

Nessa linha, é possível diferenciar as operações que são realizadas


integralmente no ambiente digital daquelas que são somente contratadas
por meios telemáticos. O primeiro grupo é identificado como o comércio
eletrônico direto, no qual a integralidade de negócios envolvendo serviços
e intangíveis transcorre virtualmente. É o caso da venda de um software,
transferido diretamente ao comprador. Por outro lado, o comércio
eletrônico indireto serve, somente, para facilitar o contato entre o vendedor
e o adquirente de bens tangíveis, reduzindo os custos de transação e
permitindo que os agentes tenham acesso a mercados distantes.

Consideravelmente menores são os desafios enfrentados pelas


administrações tributárias no que se refere ao comércio eletrônico indireto,
porquanto as transações nele iniciadas serão ultimadas do mesmo modo
que as tradicionais, isto é, mediante a entrega da mercadoria física39.

No caso de operações entre sujeitos localizados em diferentes países ou


municípios, ainda será possível exigir o pagamento dos tributos pertinentes
no momento do ingresso do bem no território onde domiciliado o
consumidor. Isso não significa que não existam problemas a serem
solucionados nessa modalidade de transações, especialmente quando a
tributação se baseia no princípio do destino. No entanto, a arrecadação é

1168
certamente menos complexa do que nas operações virtuais envolvendo
serviços e intangíveis, por não estarem os instrumentos de fiscalização
tributária suficientemente adaptados a essa realidade.

As dificuldades na tributação do comércio eletrônico direto são ainda


mais acentuadas nas operações B2C (business-to-consumer, isto é, entre
empresas sujeitas ao imposto sobre o consumo e pessoas físicas não
contribuintes) que envolvem agentes em jurisdições distintas. Nesses
casos, diferentemente do que ocorre com transações B2B, o recurso à
substituição tributária encontra escassas chances de sucesso, como se pode
constatar com a experiência americana com o use tax estadual. Excetuada
a hipótese de tributação na origem, francamente desacreditada em razão de
seu impacto na neutralidade do sistema tributário, as transações eletrônicas
B2C constituem o maior desafio para os Fiscos ao redor do mundo. Diante
desse quadro, é relevante compreender as respostas formuladas nos
diferentes sistemas jurídicos para tal problema, o que será feito ao longo
do presente trabalho.

2. OS PRINCÍPIOS DA CONVENÇÃO DE OTTAWA E A ESTRUTURA


FUNDAMENTAL DA TRIBUTAÇÃO NO COMÉRCIO ELETRÔNICO

Como visto, o desenvolvimento do comércio eletrônico acarretou uma


série de implicações multifacetadas, econômicas, ambientais, sociais e
políticas, verdadeiro desafio para os governos, em especial para o controle,
a fiscalização e a arrecadação dos tributos40.

Além da rapidez das transformações e do encurtamento das distâncias, a


redução dos custos do comércio eletrônico, que pode suprimir os tributos e
os ônus da distribuição e da postagem, em relação ao comércio de revistas,
jornais, livros, cursos, projetos e planejamentos em geral, consultoria e
assistência técnica, programas de informática e música cedidos à distância,

1169
estabelece uma desigualdade afrontosa, que pode inviabilizar o mercado
tradicional41.

A Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômicos


(OCDE), desde o final de década de 1990, vem promovendo trabalhos e
pesquisas sobre a tributação do e-commerce, com vistas ao
estabelecimento de pontos mínimos de consenso de caráter político,
econômico e jurídico42. A Conferência Ministerial realizada em Ottawa,
Canadá, e promovida pela OCDE em 1998, intitulada “A Borderless
World – Realising the Potential of Electronic Commerce” definiu
princípios e recomendações, agrupados nas conhecidas “Ottawa Taxation
Framework Conditions”. Confira-se:

a) Neutralidade – a tributação deve ser neutra e equitativa entre as formas do e-


commerce e entre o comércio convencional e eletrônico, evitando-se a dupla
tributação e a não tributação não intencional. Um imposto neutro contribuirá
com a eficiência, mediante a garantia de que seja alcançada a alocação ótima
dos meios de produção. Uma distorção (e o correspondente peso-morto)
ocorrerá quando mudanças nos preços acarretarem alterações distintas na
oferta e na demanda do que as que ocorreriam na ausência do tributo. Nesse
sentido, a neutralidade também implica que o sistema tributário aumente a
sua receita ao mesmo tempo que minimiza a discriminação a favor ou contra
alguma escolha econômica específica. Isso significa que os mesmos
princípios de tributação devem ser aplicados a todas as formas de negócios,
ao passo que também devem tratar das peculiaridades que possam prejudicar
uma aplicação igual e neutra dessas normas.
b) Eficiência – os custos para implementação das obrigações e para a
administração fiscal pelos governos devem ser minimizados tanto quanto
possível.
c) Certeza e simplicidade – as regras tributárias devem ser claras e simples à
compreensão, de modo que o contribuinte possa saber onde, como e onde o
tributo será recolhido. Um sistema tributário simples contribui para que
indivíduos e empresas entendam as suas obrigações e direitos. Desse modo,
os contribuintes estarão mais inclinados a realizar decisões mais eficientes e a
responder adequadamente a políticas econômicas. A complexidade também
favorece planejamentos tributários agressivos.
d) Efetividade e equidade – a tributação deve determinar o montante certo de
imposto no momento adequado, devendo ser minimizado o potencial de

1170
evasão por meio de contramedidas proporcionais.
e) Flexibilidade – os sistemas de tributação devem ser flexíveis e dinâmicos
para se adaptarem ao desenvolvimento tecnológico e comercial, bem como às
43
mudanças nas necessidades orçamentárias dos entes tributantes .

Muito embora o desenho dessas diretrizes tenha se dado no bojo das


discussões sobre o comércio eletrônico, é amplamente reconhecido que são
princípios adequados a toda forma de tributação sobre o consumo,
independentemente do meio (virtual ou presencial) ou da
extraterritorialidade (relações econômicas nacionais ou transnacionais) da
transação44.

Por certo, a neutralidade se entronca com a correta e abrangente


aplicação da não cumulatividade do ICMS, IPI e PIS/COFINS, bem como
com a vedação a tratamentos tributários discriminatórios, conforme
tutelado nos artigos 150, II, 151, I, e 152, todos da Constituição da
República. Impõe-se, essencialmente, que o ônus dos impostos indiretos
não recaia, em regra, sobre o contribuinte, impedindo, igualmente, que as
decisões empresariais sejam guiadas pelas deficiências do sistema
tributário.

Ainda sobre o relatório de 1998, é importante realçar as três


recomendações relativas aos impostos sobre o consumo:

a) as regras para a tributação do consumo nas transações eletrônicas


internacionais deverão adotar o critério do destino, de modo que a tributação
ocorra onde se deu o consumo;
b) para propósitos fiscais e tributação do consumo, o fornecimento de produtos
digitais não deverá ser tratado como fornecimento de bens tangíveis;
c) nas situações em que empresas e outras organizações de um país comprem
serviços e bens intangíveis de fornecedores estrangeiros, os países deverão
considerar o uso da responsabilidade tributária reversa, autolançamento ou
outros mecanismos equivalentes que garantam proteção imediata às receitas
45
tributárias e à competitividade com fornecedores locais .

1171
A tributação no destino foi consagrada pela legislação brasileira no que
se refere às exportações, como se vê nos regimes do IPI (art. 150, § 3º, III,
CRFB), do ICMS (art. 155, § 2º, X, a, CRFB) e do ISSQN (art. 156, § 3º,
III, CRFB c/c art. 2º, II, da Lei Complementar n. 116/2003).

Trata-se, evidentemente, de um esforço amplo para o fomento do


export-drive, em consonância com o costume internacional de exonerar as
mercadorias e os serviços exportados, os quais serão onerados somente no
país de destino. Como referido anteriormente, o modelo foi pensado com
vistas à existência de barreiras físicas para a entrada de mercadorias, isto é,
que a imposição tributária pudesse ocorrer na aduana.

Ocorre, todavia, que essa realidade não se repete no comércio eletrônico


direto, que transcorre integralmente no ambiente virtual. Por isso, é de
suma relevância que as legislações estejam adaptadas ao estágio atual do
desenvolvimento tecnológico, distinguindo, para fins tributários, o
comércio de produtos virtuais. Nesse ponto, contudo, o sistema brasileiro
ainda não apresenta respostas satisfatórias.

Para que as transações virtuais envolvendo intangíveis e serviços sejam


tratadas de modo específico, é preciso, de antemão, que se determine a
natureza de tais operações, ou seja, que sejam identificadas as
características relevantes que as apartam das realizadas no mercado
tradicional.

A discussão relativa à natureza das transações aperfeiçoadas e


executadas por meio da internet é tormentosa e tem ensejado as mais
diversas posições conflitantes. Para que sejam feitas as devidas
diferenciações, cumpre identificar o critério a partir do qual se pode
enfocar o tema. Em regra, as transações eletrônicas podem ser abordadas

1172
do ponto de vista dos tributos diretos (renda, lucros), assim como do ponto
de vista dos impostos incidentes sobre o consumo.

Do ponto de vista dos tributos diretos, procura-se buscar um consenso,


a partir dos tratados e convenções internacionais para se evitar a
bitributação ou a ausência involuntária de tributação, em torno da natureza
da renda, por suas fontes de produção. É que a grande massa dos países,
inclusive o Brasil, costuma dar tratamento tributário diferente à renda e aos
lucros, em razão de sua fonte ou origem (se fruto de ganhos de capital; se
fruto de atividade empresarial, como lucros; se decorrente do trabalho,
como salários e remunerações, ou ainda se proveniente de aplicações
financeiras ou de royalties, juros e cessão de uso, marcas e patentes)46.

A OCDE, relativamente às atividades desenvolvidas por via telemática,


estabeleceu diferenciações quanto aos conceitos de (a) aquisição de
propriedade; (b) prestação de serviços; (c) pagamento de royalties pelo uso
e cópia de bem protegido por direito autoral; (d) pagamento de royalties
pela transferência de tecnologia47. Mas tais diferenciações não são
adequadas aos impostos sobre o consumo e destinam-se, antes, a definir a
natureza específica da renda, em razão de suas fontes de produção ou em
razão dos atos e negócios jurídicos de que provêm.

Sob esse ângulo, Reuven S. Avi-Yonah trata com acuidade ímpar a


matéria, analisando o profundo estudo, desenvolvido pelo Tesouro norte-
americano sobre o comércio eletrônico global48, talvez pioneiro, que se
baseia no critério da residência para tributar a renda proveniente da
internet, a fim de sugerir uma simplificação mais adequada49.

Do ponto de vista dos impostos sobre o consumo, as recomendações da


OCDE consistem, como acima reproduzido, na tributação no destino e no

1173
tratamento diferenciado para intangíveis.

A legislação brasileira não confere às transações eletrônicas nenhuma


especificidade, nem mesmo por razões de praticidade, tratando de forma
sistematicamente idêntica o comércio de bens e serviços, que se concretiza
em bens materiais, e o comércio que se concretiza no espaço cibernético.
O tratamento legal da matéria abre um vácuo jurídico de não tributação
involuntária, que contribui para a insegurança jurídica e provoca a quebra
da neutralidade.

A perplexidade com que o sistema jurídico nacional reage diante da


tributação do comércio eletrônico fica evidente quando consideramos a
manutenção de controvérsias históricas na jurisprudência e na doutrina.
Um dos exemplos desse panorama é o conflito de competências sobre a
tributação de softwares, no qual ainda é comum colocar o tema sob a
antiquada dicotomia software de prateleira vs. software por encomenda50.

É evidente que existem transações de natureza diferente, todas de


alguma forma e, em algum momento, utilizando-se da internet. Em
primeiro lugar, (a) há comércio eletrônico de bens e mercadorias (e mesmo
de serviços), contratado por via telemática, que deve seguir as regras
gerais do comércio tradicional, pois a execução envolve saída física de
bens ou prestação de serviços, que também se materializam em bens
corpóreos. Em decorrência, as dificuldades de tributação, de controle ou de
fiscalização não diferem daquelas inerentes ao comércio padrão. Trata-se
do já comentado comércio eletrônico indireto. Ademais, (b) existem
também prestações de serviços, executados por via eletrônica (como
atividades pedagógicas, agências de viagem, intermediação financeira),
mas contratados segundo as regras da territorialidade, aplicáveis às
prestações de serviços. Segundo o XIX Relatório do Conselho de

1174
Impostos, a “Corte de Justiça da Comunidade Europeia já se pronunciou,
em 1997, no sentido de considerar da mesma maneira as prestações de
serviços (financeiros no caso em tela) tomados sob uma forma tradicional
ou sob uma forma eletrônica”51. Por fim, (c) há de se referir às vendas de
bens intangíveis, contratados e liberados por meio da rede eletrônica, de
forma imaterial e em tempo real. Esse é o caso da venda de música, de
livros, revistas e jornais, de programas de informática etc., totalmente
digitalizados.

Como se observa, as situações registradas nas letras (a) e (b) não devem
merecer tratamento diferenciado daquele que lhes é conferido no comércio
tradicional. O ambiente virtual serve, somente, para tornar mais simples e
rápida a contratação da operação. Mas a situação (c), em que a
imaterialidade é total, sendo a transação contratada e executada,
inteiramente, por meio da via eletrônica, sem liberação física de
mercadorias, não encontra uma resposta adequada no regime tradicional
para a tributação do consumo.

A situação do software é, como antecipado, esclarecedora dessas


dificuldades: convivem, no sistema jurídico nacional, normas que
qualificam a transferência virtual de programas de computador como uma
operação de venda de mercadorias e como prestação de serviço,
sujeitando-a à incidência do ICMS e do ISS. Essa incerteza não é uma
constante em outras paragens, tendo outros países adotado definições
claras a respeito da natureza jurídica do comércio eletrônico direto.

A visão de que o comércio de intangíveis deve seguir o mesmo regime


tributário de serviços prestados no ambiente virtual foi fomentada na
Conferência de Ottawa. A França, seguida por outros Estados da União
Europeia, implementou esse entendimento por meio de uma instrução de

1175
fevereiro de 1996, “prevendo que a cessão à distância, sem suporte, de
programas standards, constituía uma prestação de serviços imaterial”,
entendimento que foi estendido pela resposta ministerial, de 5 de junho de
2000, ao conjunto do comércio eletrônico online52.

Assim sendo, em alguns países europeus, o conceito de comércio


eletrônico direto foi integralmente equiparado a prestações de serviços. Em
consequência, aplicam-se a tais transações, as mesmas regras relativas às
prestações de serviço, em especial, as alíquotas normais.

Como se sabe, a comercialização do livro e dos jornais impressos está


sujeita a alíquotas reduzidas na Europa, que são inaplicáveis às prestações
de serviços. Portanto, no momento em que o Fisco francês descaracterizou
tais vendas para prestações de serviços, na prática determinou a majoração
das alíquotas aplicáveis aos livros e aos jornais online.

Cedo levantaram-se algumas críticas contra o entendimento do Fisco


francês, segundo o qual o comércio digital foi equiparado a prestação de
serviço, invocando-se a sua incompatibilidade com as orientações da
OCDE, estabelecidas em Ottawa, que consagram o princípio da
neutralidade, proibindo discriminações para transações e contribuintes que
se encontram em situações similares.

Contudo, em resposta a M. François Goulard, de 16 de fevereiro de


1998, confirmada pela resposta a M. Olivier de Chazeaux, de 21 de
outubro de 2000, pelo menos em se tratando da imprensa escrita,

a Administração fiscal francesa justifica essa escolha pelo fato de que a extensão
da alíquota reduzida aos editores de imprensa via Internet não corresponderia aos
objetivos originais desse regime favorável, pois essas empresas não suportam os
custos do preço do papel, da distribuição e da postagem suportados pela imprensa
53
impressa .

1176
Portanto, na França e em outros países europeus, todo o comércio
eletrônico imaterial foi identificado com a prestação de serviços, o que é
possível pela forma ampla e residual com que os europeus disciplinaram o
IVA. Aquilo que não configura operação de circulação de mercadorias,
será identificado com uma prestação de serviço (basta que se crie uma
utilidade).

A atribuição da natureza de serviço ao comércio online acarretou,


inicialmente, a imposição do mesmo regime jurídico inerente aos serviços,
ou seja, a regra aplicável seria a do regime geral de tributação de acordo
com o local em que se encontrasse estabelecido o prestador de serviços
(regra geral similar àquela do art. 3º da Lei Complementar n. 116/2003), se
não fosse o advento da Diretiva n. 38/2002 do Conselho da União
Europeia.

Portanto, nesses países, algo que poderia ser considerado uma operação
de circulação de mercadorias (se estivesse na forma de aquisição
convencional de programas padronizados de informática), tornou-se uma
prestação de serviço caso fosse concretizado inteiramente por via
eletrônica, sem suporte material. Nesse ponto seguiu-se a orientação da
própria OCDE.

Ocorre que esse não foi o caminho adotado no Brasil, especialmente


porque a competência para a tributação do consumo foi segregada entre os
três entes da federação. A Lei Complementar n. 116/2003 não regulou
separadamente a incidência do ISSQN sobre o comércio eletrônico, ou
seja, os serviços prestados por meio da via cibernética estão disciplinados
de forma idêntica àqueles contratados e prestados pela forma
convencional.

1177
Também aquilo que for definido como operação de circulação de
mercadorias não se converte em prestação de serviços pelo fato de sua
execução ter sido online, sem suporte material. Pode-se mesmo discutir se
o ICMS poderia incidir sobre bens imateriais, não corpóreos,
classicamente estranhos ao conceito de mercadorias54. Mas a resposta
negativa a essa pergunta, projetando as operações com bens intangíveis
para fora do campo de incidência do ICMS, não acarretaria
automaticamente a identificação da venda a uma prestação de serviços.

3. O PRINCÍPIO DO DESTINO E A COMPLEXIDADE DA


ARRECADAÇÃO DE TRIBUTOS NAS OPERAÇÕES ENVOLVENDO
SERVIÇOS E INTANGÍVEIS VIRTUAIS

O sistema tributário brasileiro reveza a tributação indireta entre os


critérios de origem e destino. Como se sabe, o Brasil adotou, como critério
espacial, para definir a competência de cada Município, o local onde se
situa o estabelecimento prestador, ou seja, o local do fornecimento do
serviço. Mas a regra comporta várias exceções, uma delas referindo-se às
importações. Em todas as hipóteses de importações, seja por forma
convencional, seja por via eletrônica, tributam-se os serviços importados
no local onde se situa o estabelecimento ou residência do tomador do
serviço (critério do destino-consumo) ou do intermediário, configurando-
se a exoneração das exportações.

Embora, nas operações domésticas, o Brasil tenha se aproximado da


Sexta Diretiva da União Europeia, segundo a qual o serviço se considera
prestado onde se situar a sede ou estabelecimento do prestador, nas
importações o Brasil adotou o princípio do destino, muito mais adequado
às operações internacionais. A Lei Complementar n. 116/2003 aplica,
nesse último aspecto, as recomendações da OCDE (a“reverse-charge”
rule), deslocando a responsabilidade tributária para o importador ou

1178
tomador do serviço, e a tributação, para o local onde se situar o
estabelecimento-tomador.

Na verdade, dá-se fenômeno similar tanto no ICMS, quanto no ISSQN:


a competência para a oneração da importação de mercadorias é definida
pelo lugar onde se situar o importador (“reverse-charge” rule).

Por outro lado, levando em consideração as recentes alterações


realizadas pela EC n. 87/2015, as operações interestaduais comportam três
regimes tributários distintos: (i) caso as mercadorias sejam alienadas com
vistas a posterior revenda ou a sua utilização como insumo por
contribuinte do imposto, o ICMS será cobrado na origem, na proporção da
alíquota interestadual aplicável; (ii) caso a mercadoria seja remetida para
consumidor final que também seja contribuinte do imposto, o ICMS será
dividido entre os estados de origem e de destino: o vendedor recolherá o
tributo ao ente em que estiver localizado, na proporção da alíquota
interestadual, ao passo que o adquirente recolherá ao estado de destino na
proporção do diferencial de alíquota; (iii) e, por fim, na hipótese de o
consumidor final não ser contribuinte, mantém-se a divisão do ICMS
anteriormente descrita, com a peculiaridade de o remetente ser
constrangido a realizar o recolhimento também à unidade federada de
destino55.

Em nosso país, temos, assim, diferentes regimes, tanto no ICMS,


quanto no ISSQN, a depender de a operação se inserir no conceito de
comércio doméstico ou internacional. Entretanto, como antecipado, a
nossa ordem jurídica não faz ressalvas especiais em relação ao comércio
eletrônico.

1179
Na Europa, as transações, que envolvem serviços, são tratadas de forma
diferente. Em relação ao IVA, incidente sobre as prestações de serviço,
vigora o princípio da origem, ou seja, a competência se define em razão do
local onde se situa o fornecedor do serviço, embora convivendo a regra
com várias exceções, que se cumulam em proporções cada vez maiores.
Para resumir a complexidade da tributação das transações eletrônicas
internacionais, vamos reproduzir a síntese de Avi-Yonah:

O caso dos serviços é mais complexo. Os serviços estão incluídos na base


imponível do IVA, que nesse ponto é maior que a do imposto estadual sobre vendas
no varejo dos EUA. A responsabilidade é determinada com base no lugar do
fornecimento, que foi definido tradicionalmente (na Sexta Diretiva da União
Europeia, por exemplo) como sendo o lugar de residência do fornecedor. Esta regra
causa problemas para o comércio eletrônico, pois o fornecedor pode residir em um
paraíso fiscal no que toca ao IVA (os Estados Unidos, por exemplo). Recentemente,
contudo, tem havido uma crescente tendência a usar a chamada regra da “cobrança
reversa” (“reverse-charge” rule), pela qual o lugar da prestação é onde está o
consumidor, pelo menos para vendas B2B (entre empresas). Esta regra foi adotada
recentemente pela União Europeia para os serviços de telecomunicações, aplicando-
se também a diversões. Destarte, parece provável que o comércio eletrônico possa
ser objeto de um IVA aplicado pelo regime de cobrança reversa, que é semelhante
56
ao princípio do destino no que tange a bens .

Pois bem, esse modo de considerar a tributação dos serviços eletrônicos


trouxe problemas aos Fiscos da Europa. Eis o trecho do XIX Relatório do
Conselho de Impostos da França que enfoca a questão:

A ausência de regra específica e a qualificação como prestações de serviço


fazem as vendas imateriais pela Internet entrarem no regime geral de tributação no
lugar da prestação, o que acarreta dois tipos de problemas:
– em primeiro lugar, no quadro de uma compra on line, a empresa vendedora
fica submetida ao TVA se ela está estabelecida em um Estado-Membro. Em
compensação, se se trata de uma empresa de um terceiro país, suas vendas na União
Europeia não estão submetidas ao TVA comunitário, mas unicamente à fiscalidade
indireta do Estado onde se situa seu estabelecimento. No interior mesmo do Estado
francês, um operador, desejando vender produtos imateriais a particulares, poderia
ser tentado a se deslocar para um DOM unicamente para lá se beneficiar das
alíquotas (particularmente na Guiana onde o TVA não é aplicável).
– em segundo lugar, uma empresa comunitária, vendendo via Internet a um
cliente de um terceiro país, submete-se à tributação, enquanto a mesma venda, no

1180
interior de um terceiro Estado, está frequentemente exonerada para ela (em
particular nos EEUU).
Em consequência, existe um risco de perda de base fiscal e de deslocamentos
para fora da União Europeia de certas atividades ligadas à Internet. Esse risco
continua pequeno, se considerado o volume ainda modesto das trocas imateriais via
57
Internet. Seu desenvolvimento impõe, todavia, tratar rapidamente essa questão .

A preocupação, acima registrada, era inteiramente procedente. Um


fornecedor de serviços eletrônicos europeu, que sofria a incidência do IVA
na origem, poderia pretender estabelecer-se em um paraíso fiscal (e os
EUA são, para isso, a melhor opção), local “virtual” de difícil
identificação, a partir do qual prestariam seus serviços a consumidores da
União Europeia. Em decorrência dessas e de outras formas de evasão,
muito mais infensas ao controle fiscal, aprovou-se a Diretiva n. 38/2002 do
Conselho, que introduziu novas exceções à Sexta Diretiva.

Como se sabe, desde 1977, a Sexta Diretiva, em seu art. 9º, item 1, já
estabelecia que o “lugar da prestação de serviços” seria definido segundo o
local onde sediado o fornecedor, ou seja, o lugar onde o prestador tenha a
sede de sua atividade econômica ou um estabelecimento estável, ou ainda
o lugar do seu domicílio ou residência habitual. No item 2, são abertas
várias exceções relativas às prestações de serviços de transporte, às
atividades culturais, artísticas, desportivas, científicas, docentes,
recreativas, de peritagens e outras, em relação às quais o lugar das
prestações será o lugar onde são materialmente executadas.

Naquilo que concerne às importações, a Sexta Diretiva também abriu


uma série de exceções, alterando o princípio de origem para o do território
onde se situa o destinatário do serviço (em regra o tomador), ou seja, onde
o destinatário tenha a sede de sua atividade econômica ou um
estabelecimento estável.

1181
Enfim, como proclama o XIX Relatório do Conselho de Impostos, “na
hora atual, a regra do Estado do prestador é apenas uma regra de aplicação
residual para as prestações efetivamente ocorridas no plano
internacional”58.

Entretanto a lista das exceções tornou-se ainda mais ampla com o


tempo. Em 7 de maio de 2002, considerando a insuficiência e inadequação
das normas até então existentes, em especial do ponto de vista da
bitributação, da não tributação e da prevenção de distorções da
concorrência no domínio dos serviços de radiodifusão, televisão e serviços
prestados por via eletrônica, a Diretiva n. 38 alterou a Sexta Diretiva para
introduzir, na letra (e) do n. 2 do art. 9º, os seguintes itens: serviços de
radiodifusão e televisão; serviços prestados por via eletrônica,
nomeadamente os descritos no anexo L. Consequentemente, tais serviços,
prestados por via eletrônica, consideram-se ocorridos no lugar onde o
destinatário tenha a sede de sua atividade econômica ou um
estabelecimento estável para o qual tenham sido prestados.

Os serviços, descritos no anexo L, da Diretiva n. 38, de forma


expressamente exemplificativa, são:

a) fornecimento de sítios informáticos, domicílio de páginas web, manutenção à


distância de programas e equipamentos;
b) fornecimento de programas e respectiva atualização;
c) fornecimento de imagens, textos e informações, e disponibilização de bancos
de dados;
d) fornecimento de música, filmes e jogos de azar e de dinheiro, e de emissões
ou manifestações políticas, culturais, artísticas, científicas ou de lazer; e
e) prestação de serviços de ensino a distância.

Percebe-se que a competitividade e a concorrência determinaram


alterações substanciais em relação ao comércio eletrônico internacional, na
União Europeia. Dessa forma, em relação às importações, a União

1182
Europeia adota um sistema misto, ora elegendo o local da sede do
prestador de serviços, ora o local do estabelecimento do destinatário.

Em relação ao comércio eletrônico, impõe-se a tributação no destino,


sendo definida a competência segundo o lugar em que o destinatário do
serviço tem a sede de suas atividades ou um estabelecimento estável, ponto
em que, novamente, dá-se uma aproximação entre as normas brasileiras e
as europeias.

Não obstante, a disciplina da importação de serviços eletrônicos não


recebe nenhum tratamento especial na legislação tributária brasileira,
quando se sabe que as evasões e as distorções da concorrência são de
difícil identificação e combate.

Aliás essa dificuldade se espraia em relação à importação de serviços


imateriais de modo geral, quer adentrem o território nacional por meio da
via eletrônica ou não. Problemas de solução mais fácil ocorrem com a
importação de mercadorias e produtos que sejam bens tangíveis, pois tais
bens, sendo corpóreos, devem ingressar no território nacional com maior
visibilidade. No entanto, o comércio de serviços intangíveis, em especial
pela internet, é um desafio aos Fiscos em toda a parte.

Em decorrência, as soluções apontadas prendem-se especialmente a


dois pontos: (i) de um lado, busca-se a responsabilização tanto do
importador, tomador ou destinatário do serviço, como ainda do respectivo
prestador, ainda que ele não tenha estabelecimento no país da importação,
estando sediado apenas no exterior; (ii) há um esforço no sentido de serem
tomadas medidas de administração tributária, para identificação dos
operadores e destinatários dos serviços59.

1183
No âmbito da União Europeia, o que nos parece mais notável, digno de
menção, uma vez que tem se apresentado como uma experiência vitoriosa
no combate às distorções da concorrência, reside em questões de
Administração tributária. Referimo-nos ao regime especial, adotado na
Diretiva n. 38/2002, e expandido pela Diretiva n. 8/2008, para os
fornecedores que prestem serviços de telecomunicações, radiodifusão ou
envolvidos com o comércio eletrônico direto B2C.

Essas questões serão examinadas a seguir, pois as soluções


experimentadas pela União Europeia, desde 2003, podem ser utilizadas no
sistema brasileiro, não apenas no âmbito do comércio internacional, como
ainda no âmbito doméstico.

4. REGISTRO ÚNICO DE FORNECEDORES E PRESTADORES NÃO


RESIDENTES NO TERRITÓRIO DO ENTE TRIBUTANTE: A
EXPERIÊNCIA EUROPEIA

De longa data, os países desenvolvidos ensaiam projetos e propostas


para a tributação dos serviços imateriais. Ressaltam, como desafio, os
serviços eletrônicos, prestados por operadores estrangeiros a particulares,
que não são sujeitos passivos do imposto (B2C).

No comércio internacional, como já vimos, a OCDE recomendou a


adoção do princípio do destino, segundo o qual o lugar da prestação será
onde o destinatário ou tomador tiver a sede de suas atividades ou um
estabelecimento estável, ou ainda, o seu domicílio ou residência habitual.

Segundo o XIX Relatório do Conselho de Impostos, foram apresentadas


diversas propostas, com o intuito de evitar que a cobrança do imposto
recaísse sobre o destinatário, atribuindo-se a responsabilidade tributária ao
prestador de serviço, estabelecido no estrangeiro:

1184
a) na visão inicial da Comissão, os operadores de um terceiro país deveriam se
identificar e se registrar em um só Estado-membro, onde pagariam o IVA
devido, incidente sobre as transações efetuadas com consumidores passivos
comunitários. A primeira proposta da Comissão encontrou opositores, pois
ela não impede a elisão, com a escolha do Estado-membro de tributação mais
baixa, assim como acarretaria perdas de receitas para os Estados
consumidores;
b) outra solução, preconizada em certo momento pela França, determinava que
cada um dos operadores de um terceiro país se identificasse em cada Estado-
membro, em que residissem seus clientes, recolhendo o IVA devido a cada
um deles e aplicando as alíquotas nacionais de cada Estado. Seria esse um
mecanismo análogo ao utilizado nas prestações de telecomunicações (art. 9º,
4, da Sexta Diretiva). Mas a solução é por demais complexa para os
fornecedores de serviço, embora respeitante do princípio do consumo, para
distribuição da receita;
c) como terceira solução, sugeriu-se alinhar essas transações ao regime das
vendas a distância, o que acarreta igualmente os mesmos problemas inerentes
àquelas vendas;
d) criação de uma alíquota média do IVA, para as prestações de serviços
imateriais, de tal modo que o operador de um terceiro país tivesse suas
dificuldades reduzidas e se evitassem as distorções da concorrência. Mas essa
sugestão esbarrou no receio de perdas de receita para aqueles países que
trabalham com as mais elevadas do setor;
e) finalmente, a sugestão mais prestigiada, que viria a ser adotada pela Diretiva
n. 38, preconizou a instalação de um portal eletrônico (servidor ou passarela
informática) comum à União Europeia, “que permitisse tratar
automaticamente a identificação no IVA dos operadores de um terceiro país e
a indicação do IVA devido pelo vendedor aos Estados beneficiários
(calculado a partir das alíquotas nacionais) [...] Em tais condições, a proposta
de identificação em um portal eletrônico único parece sedutora:
culturalmente e tecnicamente adequada aos operadores ativos via Internet, ela
lhes permitiria declarar em um ponto único, dividindo suas vendas por
Estado, e efetuando um pagamento online a cada Estado, com a própria
60
alíquota do Estado do consumo” .

A última solução – do portal eletrônico – parece ser a mais adequada


para a tributação do comércio eletrônico, podendo ser utilizada para
solucionar os problemas internos, que, no Brasil, se levantam nas
transações interestaduais e intermunicipais.

1185
Trata-se, relativamente ao ICMS, de uma iniciativa mais abrangente e
simplificadora do que a Guia Nacional de Recolhimento de Tributos
Estaduais, que permite só a emissão das guias para as unidades federadas
em que não estiver localizado o contribuinte61.

Já no caso do ISS, não há registro da implantação de iniciativas


semelhantes, muito embora tal medida tenha sido sugerida no 2º Relatório
da Comissão Permanente de Simplificação e Revisão da Legislação
Tributária ao Prefeito do Município de Belo Horizonte62. Vale notar, ainda,
que idêntica solução foi preconizada nos Estados Unidos, para pôr fim às
dificuldades de se tributarem as vendas a distância, que envolvem Estados-
membros diferentes.

Na verdade, os Estados Unidos configuram um paraíso fiscal, do ponto


de vista da tributação do comércio eletrônico. Contudo as dificuldades que
lhes são inerentes têm raízes mais profundas. Como se sabe, os Sales
Taxes são tributos estaduais importantes, que incidem sobre as vendas no
varejo de bens tangíveis, assim distribuídos: cinco Estados não aplicam os
Sales Taxes, mas trinta e quatro Estados autorizaram os seus Municípios a
cobrar também Sales Taxes, o que ocorre em 7.600 jurisdições locais.

O tributo em referência representa 33% da arrecadação dos Estados e


11% da receita das Municipalidades. Os problemas se adensam nas
operações interestaduais, que assim são consideradas se, e somente se, o
vendedor de um certo Estado tem um estabelecimento físico em outro
(nexus), hipótese na qual ele recolherá o Sale Tax ao Estado de residência
do comprador. Caso contrário, nas vendas a distância, feitas por um
comprador de outro Estado, onde o vendedor não tem presença física,
caberá ao adquirente, consumidor, recolher o imposto, agora denominado
de Use Tax.

1186
Dá-se que somente 5% dos particulares fazem o recolhimento, de tal
modo que as vendas a distância, feitas por um consumidor de outro Estado,
quase não são tributadas. Tais dados foram projetados e são os mesmos em
relação às transações eletrônicas. Por isso mesmo, a Internet Tax Freedom
Act, de 1998, previu a isenção temporária do acesso à internet, o que se
perenizou com a edição do Trade Facilitation and Trade Enforcement Act,
de 2015.

A Associação Nacional dos Governadores (National Governors


Association), desejosa de reformar os Sales Taxes, recomendou
exatamente a instalação de portais eletrônicos para a simplificação do
recolhimento tributário no comércio eletrônico e nas vendas a distância.
Eis o resumo feito pelo XIX Relatório do Conselho de Impostos:

Em março de 2001, 32 Estados participaram dessa reflexão com o objetivo em


particular de pôr fim à quase ausência de tributação das vendas a distância e do
comércio eletrônico nos EUA. A ideia é harmonizar as legislações dos Estados
(campo de aplicação dos Sales Taxes, exonerações) com exceção das alíquotas. Um
modelo de legislação foi preparado pela Associação dos Governadores. Em março
de 2001, já tinha sido adotado (ao menos parcialmente) por 19 Estados.
Portais eletrônicos (gerados pelas empresas privadas que desempenhariam o
papel de “representantes dos fiscos”) permitiriam aos devedores calcular e pagar o
imposto devido aos Estados nos quais estão estabelecidos os clientes de suas vendas
a distância. Uma primeira experiência acontecerá ao final do ano 2000.
Entretanto, esse projeto supõe, para ser bem conduzido, a aprovação de uma lei
federal permitindo obrigar os operadores de vendas a distância a arrecadar os Sales
Taxes sobre suas vendas a outros Estados, o que não é possível atualmente
considerando a jurisprudência da Corte Suprema. No início de 2001, propostas
63
foram depositadas nesse sentido no Congresso .

A solução da União Europeia vem exatamente na mesma direção


daquela proposta pelos Governadores dos Estados norte-americanos. Em
caráter opcional e experimental, a Diretiva n. 38/2002 determinou que os
Estados comunitários autorizassem os prestadores de serviços,
estabelecidos no estrangeiro, que prestassem serviços a consumidores

1187
domiciliados ou residentes em território da UE, a aderir a um regime
especial, aplicável a todas essas prestações (de radiodifusão, televisão e
comércio eletrônico) dentro da Comunidade. Tal regime especial envolve e
pressupõe:

a) identificação dos responsáveis, prestadores estabelecidos no estrangeiro, por


via eletrônica, a um Estado-membro comunitário, no início de suas atividades
tributáveis, incluindo: nome, endereço postal, endereços eletrônicos, sítios
web, número de contribuinte nacional, se o tiver, declaração de que não está
identificado para efeitos de IVA na Comunidade;
b) notificação ao responsável, prestador não estabelecido, feita por via
eletrônica pelo Estado-membro de identificação escolhido, do número de
identificação que lhe foi atribuído;
c) declaração de imposto, por via eletrônica, feita pelo responsável, prestador
não estabelecido, a cada trimestre civil, até vinte dias depois do encerramento
do período, quer tenha havido ou não prestação de serviço;
d) a referida declaração do IVA deve mencionar o número de identificação e,
para cada Estado-membro de consumo em que é devido o imposto, o valor
total das prestações de serviços eletrônicos, relativo ao período, além das
alíquotas e o montante do imposto total do imposto;
e) pagamento do imposto, feito pelo responsável, prestador de serviço não
estabelecido, no momento da apresentação da declaração em conta bancária
indicada pelo Estado-membro da identificação; e
f) reembolso do IVA, de acordo com a Diretiva n. 86/560/CEE, inerente ao
64
sistema dos sujeitos passivos não estabelecidos .

Em que pese a adesão inicial à medida não ter sido significativa, a


experiência colheu bons frutos, motivo pelo qual foi expandida no
chamado Mini One-Stop-Shop – MOSS (ou minibalcão único).

Criada pela Diretiva CE n. 8 de 2008, e produzindo efeitos desde o


início de 2015, a iniciativa consiste em um regime unificado de registro e
pagamento do IVA para as empresas prestadoras de serviços de
telecomunicações, radiodifusão ou que atuem no comércio eletrônico de
serviços e intangíveis em operações B2C. No entanto, diferentemente da

1188
medida prevista na Diretiva n. 38/2002, o MOSS abrange, também,
pessoas jurídicas situadas em países componentes da União Europeia65.

Em síntese, o regime permite que as prestadoras de serviços TBE (em


inglês, telecommuncations, broadcasting and electronically supplied
services) recolham, por meio do registro em somente um país membro da
União Europeia, o imposto devido aos demais Estados, em conformidade
com as operações B2C com consumidores localizados em tais jurisdições.

E não somente isso: esses contribuintes poderão, por meio da


plataforma virtual do MOSS, apresentar a declaração do IVA devido a
todos os países-membros nos quais estejam localizados os consumidores
de seus serviços. Importante destacar que se trata de regime opcional,
podendo o contribuinte decidir por se registrar em cada um dos países nos
quais estejam localizados os usuários de suas prestações.

Ademais, o MOSS se aplica, somente, às operações B2C, fincando as


transações B2B submetidas à substituição tributária (reverse-charge rule),
por se cuidar de ferramenta ainda mais simples de arrecadação tributária.

A experiência se mostrou bem-sucedida já no primeiro ano de


funcionamento do MOSS, como se pode constatar dos dados levantados
pela Deloitte em relatório elaborado a pedido da Comissão Europeia:

A implementação do MOSS é vista como um importante marco pela Comissão


Europeia e por muitos Estados-Membros da UE. O sistema MOSS já levou ao
recolhimento de cerca de 3 bilhões de euros a título de receitas de IVA em 2015,
tanto pelo regime da União como pelo sistema extra-União. Em 2016, já foi
auferido aproximadamente 1,58 bilhão de euros de IVA. Uma projeção cautelosa
para todo o ano de 2016 calcula a arrecadação do IVA em 3,2 bilhões de euros.
Diante do apoio expressado ao sistema, inclusive pelas empresas afetadas, a
Comissão Europeia está considerando opções para ampliar a implementação da
medida, com o objetivo de reduzir os ônus administrativos associados com o
66
tratamento do VAT no comércio transfronteiriço .

1189
Os bons números da iniciativa europeia comprovam que a redução dos
custos de compliance tributário constitui incentivo poderoso para
solucionar os desafios da tributação do comércio eletrônico B2C. Estimou-
se que, antes da implementação do MOSS, os custos administrativo-
tributários arcados pelas empresas em operações B2C de e-commerce
totalizavam 6 bilhões de euros por ano, ou aproximadamente 24 mil euros
por contribuinte67. Segundo os levantamentos iniciais, houve uma redução
substancial dessa espécie de dispêndio entre as empresas que aderiram ao
novo regime, pelo que se formou opinião amplamente favorável pela
expansão do MOSS em direção ao comércio de bens tangíveis68.

5. CONCLUSÕES: RECOMENDAÇÕES PARA O SISTEMA TRIBUTÁRIO


NACIONAL

Os desafios da tributação do comércio eletrônico indireto não


encontram respostas claras na legislação brasileira.

A omissão legislativa desperta elevada preocupação, especialmente com


a intensificação das investidas estaduais e municipais sobre essa
materialidade. Vale destacar que, recentemente, os municípios tiveram
reconhecida pela Lei Complementar n. 157/201669 a competência para a
cobrança do ISS sobre a “disponibilização, sem cessão definitiva, de
conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet, respeitada
a imunidade de livros, jornais e periódicos” (item 1.09 da lista anexa à Lei
Complementar n. 116/2003).

Nesse contexto, e ciente do exemplo da União Europeia, é


recomendável a criação de um portal eletrônico, de âmbito nacional, para
identificação obrigatória e declaração dos prestadores de serviço e dos
fornecedores de intangíveis que, não estando estabelecidos no território do

1190
ente tributante, prestem serviços a sujeitos passivos ou a consumidores,
destinatários não contribuintes, domiciliados ou residentes em outro.

Tal identificação pode ser feita apenas no local onde estiver


estabelecido o prestador de serviços ou fornecedor de produtos digitais.
Mas as declarações periódicas deverão estar acompanhadas da
especificação das operações realizadas a destinatários, situados em cada
um dos demais Municípios ou Estados, em que o contribuinte tiver seus
clientes, ainda que o ISSQN ou o ICMS, pela natureza da transação, tiver
que ser recolhido a outro ente tributante, acompanhado de cada um dos
valores totais e do imposto devido.

Futuramente, o portal eletrônico poderá abranger os agentes


econômicos estabelecidos no estrangeiro. No entanto, para esse desiderato,
é necessário um esforço concertado da comunidade internacional70, a qual,
a julgar das recomendações presentes nos estudos da OCDE, inclina-se, ao
menos nesse momento, em direção à simplificação dos registros das
empresas em cada um dos países em que realizam negócios.

De qualquer modo, diante das características do e-commerce B2C, a


redução dos custos empresariais com o cumprimento da legislação fiscal se
apresenta como a melhor medida para assegurar a arrecadação tributária.

1191
Reforma tributária: desafios da evolução da
economia digital versus complexidades da
Federação brasileira
71
José Luis Ribeiro Brazuna

1. INTRODUÇÃO

O presente texto pretende tratar das possíveis políticas fiscais para a


tributação dos negócios na economia digital. Por tal razão,
independentemente de reflexões gerais e teóricas que poderiam ser feitas a
respeito do tema “reforma tributária”, a nossa atenção estará aqui centrada
nos desafios que a evolução econômica apresenta frente ao anseio geral de
reestruturação do Sistema Tributário Nacional.

Como todo fato que dispensa comprovação, a necessidade de uma


reforma tributária em nosso País é notória, afirmada e confessada por todas
as partes envolvidas – Fisco e contribuintes – e admitida aqui como
incontroversa. Falta-lhe apenas a presunção legal de veracidade, uma vez
que o sistema que aí está deriva da própria vontade do legislador.

Ainda assim, mesmo se tratando de um sistema estruturado


preponderantemente no texto constitucional, a sua configuração hoje
revela feições distorcidas72. É desconexo e disfuncional, resulta de
acomodações, remendos e improvisos que poucas vezes guardam
racionalidade entre si, que não a lógica de atender a demandas e interesses
de momento, seja do Poder Público, seja dos setores econômicos capazes
de capturar o legislador tributário.

1192
Construímos, pouco a pouco, um dos piores73 sistemas tributários do
mundo!

A sua alta complexidade74 é uma barreira severa à livre concorrência e à


alocação eficiente de recursos75, sendo por isso um sistema favorável à
concentração econômica, como se já não bastasse para tanto a sua
conhecida configuração regressiva76.

Diante de tamanhas vicissitudes e dos desafios que a evolução


tecnológica nos apresenta, cabe-nos decidir se seguiremos a marcha do
improviso, com novos remendos e rearranjos “possíveis”, ou se, do
contrário, mudaremos o rumo do nosso futuro, com alterações reais na
estrutura de arrecadação de tributos, na repartição de recursos para o
financiamento dos gastos estatais e, por tudo isso, com uma necessária
revisão do nosso atual Pacto Federativo77.

2. COMO CHEGAMOS AQUI?

O caos tributário brasileiro não é fruto do acaso. Parece resultar do


histórico não enfrentamento e da persistente não solução dos problemas
reais que se apresentam, buscando-se sempre a acomodação possível, traço
marcante do “homem cordial” de Sergio Buarque de Holanda, de maneira
que as mudanças que se queira promover ao final não criem mudança
nenhuma. Todos querem uma reforma tributária, mas ninguém quer
perder.

Iniciamos78 esta nossa caminhada no período das Capitanias


Hereditárias, quando já era possível encontrar a cobrança concomitante79
de tributos tanto por parte da Coroa de Portugal, quanto pelos donatários
das Capitanias. Além disso, logo aí se inaugurava o hábito de exigir tributo

1193
sobre tributo, na medida em que os donatários cobravam a redízima de
todas as rendas arrecadadas para a Coroa!

No período do Governo-Geral, testemunhou-se a criação desordenada


de impostos, taxas e contribuições, onerando destacadamente as fontes de
riqueza que então se apresentavam disponíveis, tais como a criação de
gado, a venda de escravos, o ouro e o tabaco.

Inaugurou-se a “extrafiscalidade”, com a introdução de tributos para


financiar gastos excepcionais da Coroa de Portugal; descobriu-se a
“parafiscalidade”, com o Marquês de Pombal, autorizando a cobrança de
tributos pelos chamados “contratadores”; introduziram-se novos tributos
de maneira assistemática, inclusive por parte dos municípios, que, mesmo
sem competência para tanto, taxavam açougues e o uso das praças de
comércio.

“A história tributária do Brasil ao tempo da colônia é muito fácil de


traçar, porque a tributação era extremamente confusa”, dizia Alcides Jorge
Costa80.

Com a vinda da Família Real para o Brasil, acomodou-se aqui o sistema


tributário lusitano de então, com os seus impostos de importação, sobre
imóveis urbanos, sisa sobre bens de raiz, sobre heranças e legados,
imposto do selo, imposto sore a renda de funcionários da Fazenda e da
Justiça, pensão para a capela imperial, contribuição de política, subsídio
real sobre carne, couros, aguardentes e lã. Criaram-se também tributos
sobre negociantes, livreiros, boticários, lojas de ouro e prata, carruagens de
quatro e duas rodas, estes últimos com a sua arrecadação vinculada à
criação do Banco do Brasil. Enfim, uma baderna!

1194
Somente após a Constituição Imperial, na primeira metade do século
XIX, diante de multiplicidades de tributos, vários deles cobrados sobre os
mesmos fatos e gêneros, tenta-se sistematizar o orçamento público de
então. Destaque aqui para a Lei n. 317/1843, que contabilizava setenta e
cinco fontes de receita pública, dentre as quais diferentes impostos, ditos,
taxas, sisas, direitos e dízimas sobre as mais variadas manifestações de
riqueza.

Com a Constituição de 1891, pela primeira vez se procurou sistematizar


a cobrança de tributos em um regime federativo e republicano, declarando-
se a autonomia política, administrativa e financeira dos Estados-Membros.
À União cabia tributar as importações, o direito de entrada, de saída e de
estadia de navios, cobrar taxa de selo e taxas de correios e telégrafos
federais. Aos Estados cabiam os impostos de exportação e sobre imóveis
rurais e urbanos, bem como as taxas de selo e as contribuições sobre
telégrafos e correios locais. Nenhum poder de tributar era atribuído aos
Municípios.

União e Estados podiam criar outras fontes de arrecadação tributária, de


maneira cumulativa ou não. Ou seja, admitia-se que um novo imposto
fosse criado por ambos os entes federados, ainda que sobre o mesmo fato
imponível.

Nas Constituições de 1934 e 1937, o sistema tributário começava a


ganhar feições mais parecidas com as do atual, havendo aí uma primeira
reordenação dos tributos existentes, para se atribuir: à União, os impostos
sobre importação, consumo de mercadorias, sobre a renda e proventos de
qualquer natureza, sobre transferência de fundos para o exterior; aos
Estados, os impostos sobre a propriedade territorial rural, sobre
transmissões causa mortis e inter vivos, sobre o consumo de combustíveis,

1195
sobre vendas e consignações, sobre exportação e sobre indústrias e
profissões; e, aos Municípios, os impostos sobre licenças, sobre
propriedade predial e territorial urbana, sobre diversões públicas e sobre
renda de imóveis rurais.

No regime de 1934, União e Estados detinham o poder de criar outros


impostos além daqueles constitucionalmente autorizados, sendo que,
havendo tributação concorrente, prevaleceria sempre o imposto federal.
Sob a Constituição de 1937, o poder tributário residual era detido apenas
pelos Estados-Membros, valendo aquela mesma regra de prevalência do
imposto da União, no caso de eventual sobreposição.

Em 1946, enfraquece-se a competência tributária estadual,


redistribuindo-se para a União os impostos sobre combustíveis e sobre
propriedade territorial rural, e, para os Municípios, os impostos sobre
transmissão inter vivos e sobre profissões e indústrias. Retorna a
competência tributária residual concorrente para União e Estados-
Membros, novamente com a prevalência do tributo federal, no caso de
criação de tributo estadual idêntico.

Identificam-se, no entanto, algumas deficiências estruturais do sistema


tributário assim constituído, dentre as quais a cumulatividade do imposto
sobre vendas e consignações, além da incompatibilidade da competência
estadual para tributar exportações versus a competência federal para tratar
de comércio exterior além de política monetária e cambial.

Entra em curso, por esses motivos, a reforma tributária de 1965, em que


o Brasil decide, então, estruturar um sistema de tributação sobre o valor
agregado81, repartindo-a, entretanto, em três tributos atribuídos a três entes
tributantes distintos (IPI, ICM e ISS), além da segregação de certas

1196
operações e bens no poder de tributar seletivo da União, a quem cabia
inclusive tributar operações de crédito, câmbio, seguro e relativas a títulos
e valores mobiliários.

São definidas as espécies tributárias, consolidadas as limitações ao


poder de tributar, inserido o conceito de não cumulatividade e
redistribuídas as competências tributárias em quatro grandes grupos:
impostos sobre o comércio exterior (impostos de importação e exportação,
ambos de competência da União), impostos sobre o patrimônio e a renda
(impostos de renda e sobre propriedade rural, para a União; imposto sobre
transmissão de imóveis, de competência dos Estados; e imposto sobre
propriedade predial e territorial urbana, pertencente aos Municípios),
impostos sobre a produção e a circulação (IPI, IOF e imposto sobre
serviços de transporte e comunicações, para a União; ICM estadual; e o
ISS, distribuído aos Municípios), além dos chamados impostos especiais
(impostos únicos sobre combustíveis, energia elétrica e minerais, todos
pertencentes à União). Nada se dizia aí a respeito de competência tributária
residual, prevendo-se apenas a necessária possibilidade de criação de
impostos extraordinários para o caso de guerra.

Promulga-se o Código Tributário Nacional, mantendo a mesma


classificação das incidências tributárias em impostos sobre o comércio
exterior, impostos sobre patrimônio e renda, impostos sobre a produção e
circulação, impostos especiais, impostos extraordinários, taxas e
contribuições de melhoria.

Na Constituição de 1967 e na Emenda Constitucional n. 1, de 1969, não


obstante mantidas as competências tributárias de 1965, abandona-se a
separação econômica dos tributos, voltando-se a agrupá-los por ente
tributante competente para a sua cobrança.

1197
Permite-se à União instituir contribuições, tendo em vista a intervenção
no domínio econômico e o interesse da previdência social ou de categorias
profissionais, assim como os empréstimos compulsórios. Reserva-se à
mesma União a competência tributária residual para instituir novos
impostos, desde que não tivessem eles base de cálculo e fato gerador
idênticos a outros impostos já discriminados constitucionalmente.

Na Constituinte de 1988, verifica-se certa descentralização do poder de


tributar, com o aumento dos impostos atribuídos aos Estados, Distrito
Federal e Municípios: (i) aglutinando-se sob a competência dos Estados e
do Distrito Federal, para a tributação de circulação de mercadorias, os
antigos impostos federais únicos sobre combustíveis, energia elétrica,
minerais, transporte e comunicação, dando origem ao ICMS; (ii)
atribuindo-se aos Estados e ao Distrito Federal a competência para a
instituição e cobrança do IPVA, em substituição implícita à antiga taxa
rodoviária única federal; (iii) substituindo-se o imposto estadual sobre
transmissões de bens imóveis, pelo imposto de transmissão causa mortis e
de doação de quaisquer bens ou direitos, de competência dos Estados e
Distrito Federal, e pelo imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis
e direitos reais sobre imóveis, de competência dos Municípios; e (iv)
outorgando-se aos Municípios o poder de tributar as vendas a varejo de
combustíveis líquidos e gasosos, exceto óleo diesel, competência essa que
lhes foi posteriormente retirada pela Emenda Constitucional n. 3/1993.

Ademais: (v) cria-se a possibilidade de tributação das grandes fortunas,


competência essa até hoje não exercida; e (vi) mantém-se exclusivamente
nas mãos da União a competência para criar novos impostos, exigindo-se
para tanto a aprovação de lei complementar, a observância de um regime

1198
não cumulativo para o novo tributo e que não tenha ele fato gerador ou
base de cálculo de imposto já previsto na Constituição.

Não se conseguiu, naquele momento, promover uma mudança mais


radical do sistema tributário nacional, baseada na tributação ampla e
progressiva da renda, na criação de um imposto geral sobre o patrimônio,
na tributação sobre sucessões e doações, e, finalmente, na unificação dos
chamados impostos indiretos em um único imposto sobre o valor agregado
cobrado no destino, o qual absorveria também os impostos únicos sobre
minérios, combustíveis, energia elétrica e serviços de telecomunicação e
transporte. Discutia-se inclusive a substituição transitória da contribuição
ao Finsocial e do salário-educação por um IVA (imposto sobre valor
agregado) suplementar federal, o que acabou por não vingar na
Assembleia Nacional Constituinte.

Essa era a linha principal do projeto de sistema tributário advogado pelo


IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que propunha também
instrumentos de compartilhamento de receitas fiscais, incluindo a
constituição de um “fundo de descentralização”, com o propósito de
compensar igualmente a descentralização de funções públicas que ali se
idealizava.

Em vez disso, sagrou-se vitoriosa a descentralização mais tímida que


inspirava os projetos Afonso Arinos e IASP/ABDF, com modificações
pontuais em relação ao sistema tributário anterior e sem a criação de um
imposto sobre valor agregado:

apesar das alterações feitas no Imposto sobre Circulação de Mercadorias (tal


como o aumento da base tributável), a reforma não adotou a adoção de um imposto
sobre o valor agregado e não estabeleceu o princípio da destinação para a
arrecadação deste imposto. Isto pode ser explicado pelos conflitos de interesses e o
efeito de um consenso ambíguo que se estabeleceu entre os atos para possibilitar a

1199
aprovação das alterações. Assim, a ausência de uma reforma mais profunda no
momento da Constituição devido à necessidade de satisfazer os interesses das
82
coalizões em conflito teve um impacto significativo na sequência .

Posteriormente, outras oportunidades preciosas foram desperdiçadas


para que se pudesse aprimorar o sistema tributário nacional, quando o
Constituinte Derivado aprovou emendas: permitindo que se criasse o
regime único de arrecadação de impostos e contribuições da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, o que veio a ser feito pela
Lei Complementar n. 123/2006; prevendo a possibilidade de lei
complementar estabelecer critérios especiais de tributação, para prevenir
desequilíbrios da concorrência, competência essa até hoje não exercida;
criando competência tributária para a instituição e cobrança de
contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico sobre
importação de produtos estrangeiros ou serviços; autorizando Municípios e
Distrito Federal a cobrarem contribuição para o custeio do serviço de
iluminação pública; instituindo o princípio da anterioridade nonagesimal
para tributos; permitindo a fiscalização e cobrança do ITR pelos
Municípios, repartindo nesse caso a arrecadação do imposto entre
Municípios e União; ampliando a imunidade das exportações ao ICMS83,
bem como imunizando do mesmo imposto as prestações de serviços de
comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens
de recepção livre e gratuita; criando regras próprias de uniformização de
alíquotas e repartição do ICMS entre origem e destino, no que se refere a
operações com combustíveis derivados de petróleo e lubrificantes, gás
natural e seus derivados; inserindo regras de tributação mínima e máxima
do ISS, determinando também à lei complementar que regulamentasse a
forma como benefícios fiscais relativos a esse imposto poderiam ser
criados pelos Municípios; e estabelecendo a possibilidade de substituição
da contribuição previdenciária patronal sobre folha de salários, por uma

1200
contribuição sobre a receita ou faturamento. Agora mais recentemente, nos
deparamos com a Emenda Constitucional n. 87/2015, revendo a repartição
do ICMS sobre operações e prestações de serviços interestaduais com
consumidores finais entre Unidades Federadas de origem e de destino.

Como resultado, temos um sistema tributário assim distribuído84, o qual


sem sombra de dúvidas pode ser aprimorado, como forma de tornar o
Brasil um país mais competitivo no mercado global:

2015
Tributo/Competência
R$ milhões % PIB %

Total da Receita Tributária 1.928.182,85 32,66% 100,00%

Tributos do Governo Federal 1.316.190,50 22,29% 68,26%

Orçamento Fiscal 475.674,76 8,06% 24,67%


Imposto de Renda 341.901,46 5,79% 17,73%
Pessoas Físicas 27.198,66 0,46% 1,41%
Pessoas Jurídicas 104.910,17 1,78% 5,44%
Retido na Fonte 209.792,63 3,55% 10,88%
Imposto sobre Produtos Industrializados 48.048,71 0,81% 2,49%
Orçamento Seguridade Social 673.918,57 11,41% 34,95%
Contribuição para a Previdência Social (1) 320.447,09 5,43% 16,62%
Cofins 199.876,00 3,39% 10,37%
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido 59.146,89 1,00% 3,07%
Contribuição para o PIS/Pasep 52.589,86 0,89% 2,73%
Contrib. Seg. Soc. Servidor Público – CPSS 29.339,60 0,50% 1,52%
Demais 166.597,17 2,82% 8,64%
Contribuição para o FGTS (2) 118.322,54 2,00% 6,14%
Salário Educação 19.038,91 0,32% 0,99%
Contribuições para o Sistema S 18.153,27 0,31% 0,94%
Cide Combustíveis 3.271,18 0,06% 0,17%
Cide Remessas 2.983,43 0,05% 0,15%

Tributos do Governo Estadual 489.103,22 8,28% 25,37%

ICMS 396.513,09 6,72% 20,56%


IPVA 36.257,11 0,61% 1,88%

ITCD 6.468,65 0,11% 0,34%

1201
Contrib. Regime Próprio Previd. Est. 20.796,90 0,35% 1,08%
Outros Tributos Estaduais 29.067,47 0,49% 1,51%

Tributos do Governo Municipal 122.889,13 2,08% 6,37%

ISS 58.083,52 0,98% 3,01%


IPTU 30.759,50 0,52% 1,60%
ITBI 11.106,63 0,19% 0,58%
Contrib. Regime Próprio Previd. Mun. 8.885,35 0,15% 0,46%
Outros Tributos Municipais 14.054,13 0,24% 0,73%

Participação das Bases de Incidência na Arrecadação Total 2015

% da Arrecadação Total

Cód. Tipo de Base 2015

1000 Renda 18,27%


2000 Folha de Salários 25,83%
3000 Propriedade 4,44%
4000 Bens e Serviços 49,68%
5000 Trans. Financeiras 1,80%
9000 Outros Tributos –0,02%

0000 Receita Tributária Total 100,00%

Participação dos Entes Federativos na Arrecadação Total 2015

Ente Federativo 2015

Governo Federal 68,26%


Governo Estadual 25,37%
Governo Municipal 6,37%

Receita Tributária Total 100,00%

3. A ACOMODAÇÃO PELA REPARTIÇÃO DE RECEITAS

O desenho constitucional do sistema tributário é marcado


obrigatoriamente pelo debate em torno da distribuição e do repasse das

1202
receitas arrecadadas.

Comparativamente ao que se via desde a Constituição de 194685, a


Constituinte de 1988 trouxe um quadro de redistribuição de receitas muito
mais complexo e “amarrado”86, de tal sorte que, também por isso, o
sistema tributário foi ganhando feições distorcidas, na medida em que,
independentemente da racionalidade dos tributos existentes, os entes da
federação buscavam assegurar a sua arrecadação e o seu sustento por meio
de repasses e redistribuições de receitas.

A lógica e a racionalidade do sistema imponível deixam de ser o mais


relevante, desde que se consiga assegurar, na ponta da repartição
financeira da arrecadação, um certo grau de conforto que permita manter o
acordo federativo e custear os gastos públicos.

Ao mesmo tempo que a Constituição vincula a arrecadação a


determinados gastos87, ela também desvincula em parte esses dispêndios
obrigatórios, por meio da chamada “desvinculação de receitas”88, o que
vem interferindo diretamente na forma como, por exemplo, as
contribuições sociais são utilizadas pela União como fonte de arrecadação,
cujo produto não necessita ser repartido com nenhum outro ente da
Federação89:

1203
Ao final do dia, vemos um sistema tributário bastante carregado na
arrecadação dos tributos de competência da União90, com destaque para a
alta dependência de transferências de arrecadação para a manutenção das
despesas correntes dos deficitários municípios brasileiros91, o que afeta
também, ainda que em menor grau, os Estados-Membros da Federação22.
92
4. PERSPECTIVAS INTERNACIONAIS

No âmbito internacional, tomando-se por referência os dados dos países


membros da OCDE, verificamos um aumento cada vez maior de
importância da tributação de operações com bens e serviços na
composição da arrecadação dos Estados, desde que teve início a adoção de
impostos sobre valor agregado93:

Atualmente, porém, a distribuição da carga tributária dos países da


OCDE segue bem menos regressiva do que a brasileira, com um equilíbrio
muito maior do ônus tributário sobre as bases consumo versus renda e
lucro94:

1204
Registra-se que, nesse universo de países, vem-se procurando aumentar
a arrecadação dos impostos sobre valor agregado mediante o aumento da
sua base, o que traz à baila justamente a questão da tributação do comércio
de serviços e intangíveis no contexto da atual economia digital.

Os esforços enveredados na consolidação de uma política comum para a


cobrança do IVA, iniciados em 2006 e concluídos nos International
VAT/GST Guidelines de 2015, somam-se ao plano de ação n. 1 do BEPS,
no intuito de ajustar a tributação do valor agregado aos desafios que a
inovação tecnológica traz ao exercício do poder de tributar de cada Estado.

Do lado das guidelines, busca-se manter a tributação sobre valor


agregado dentro dos parâmetros da neutralidade, eficiência, certeza e
simplicidade, efetividade e justiça e, finalmente, flexibilidade95, por meio
de quatorze diretrizes96 a orientar a cobrança de impostos sobre bens e
serviços.

No âmbito do programa BEPS, procura-se combater o fenômeno da


stateless income97, mediante o combate à fragmentação de serviços e
negócios com intangíveis, o aprimoramento de regras para controle de
preços de transferência em operações dessa natureza e o aperfeiçoamento

1205
de regras CFC. Tudo isso em linha também com os trabalhos do Task
Force on the Digital Economy (TFDE), que mira o aperfeiçoamento das
definições de estabelecimento permanente e outras medidas necessárias
para assegurar a cobrança efetiva de VAT em transações internacionais98.

Dentre os desafios criados pela economia digital e identificados pela


OCDE, podemos mencionar: a evolução dos dispositivos computacionais
pessoais; a convergência dos serviços de telecomunicação; a
transformação do software em verdadeiras commodities; a venda de
conteúdos digitais; as operações com informações/dados; a computação
em nuvem; a internet das coisas; a difusão do uso da moeda digital; a
automação robótica; a popularização das impressoras 3D; a difusão da
economia e da produção colaborativa; o comércio eletrônico; a criação dos
serviços de meio de pagamento; as lojas de aplicativos; a publicidade on-
line; o comércio de banda/frequência de acesso à internet; e a exploração
de plataformas de produção de conteúdo99.

Tudo isso atrelado a características especiais, que tornam a economia


digital ainda mais particular: a sua enorme mobilidade (mobilidade dos
intangíveis, mobilidade dos usuários e consumidores, mobilidade dos
fatores de produção); a geração e o uso de informações (big data); os
efeitos em rede da tomada de decisões dos consumidores no uso de
tecnologias; os modelos multilaterais de negócios; a tendência à formação
de monopólios ou oligopólios; e a volatilidade da tecnologia100.

5. PERSPECTIVA INTERNA

Diferentemente do que ocorre nos países que seguem as diretivas da


OCDE, o Brasil vem optando, conforme retrospectiva acima, por uma
partição múltipla da realidade econômica, para fins de tributação,

1206
dividindo e distribuindo entre os entes estatais os diferentes negócios
jurídicos que podem ser praticados com bens ou mercadorias, para
servirem de fonte de arrecadação de recursos.

Tudo isso dentro da lógica já plantada na reforma de 1965, no sentido


de repartir a tributação sobre o consumo em um imposto sobre a indústria
(IPI), um imposto sobre o comércio de mercadorias e sobre determinados
serviços de comunicação e transporte intermunicipal e interestadual
(ICMS), um imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS) e um
imposto sobre operações financeiras (IOF).

Ao lado dessa divisão, segregou-se também a competência residual da


União, de maneira a lhe permitir que, quando necessário, instituísse algum
eventual novo imposto sobre alguma outra base ou fato gerador,
observando obrigatoriamente uma sistemática não cumulativa de
tributação.

Os conflitos a partir daí gerados, ao longo dos mais de cinquenta anos


desse sistema, são incontáveis. Vale lembrar, por exemplo:

•conflitos ICMS versus ISS: não incidência do ICMS sobre o fornecimento de


101
pré-moldados em contratos de empreitada global ; incidência exclusiva do
ISS no fornecimento de concreto produzido em caminhões betoneiras a
102
caminho da obra ; incidência do ICMS sobre operações de industrialização
103
por encomenda de embalagens ; incidência do ICMS na confecção de
104
material de propaganda ; prevalência do ISS na substituição ou troca de
105
pneus ; não incidência de ISS na realização de atividades-meio para a
106
consecução de serviços de telecomunicação ; a incidência do ICMS sobre o
chamado software de prateleira e do ISS sobre o software produzido por
107 108
encomenda ; incidência de ICMS sobre serviço de TV por assinatura ;
•conflitos ISS versus IPI: não tributação, pelo IPI, do serviço de composição
109
gráfica personalizada e sob encomenda ; não incidência de IPI, mas de ISS,
110
sobre a produção e o fornecimento de elevadores ; a divergência de

1207
entendimentos com relação à incidência desses impostos em operações de
111
industrialização por encomenda ;
•conflitos ICMS/IPI versus IOF: inclusão ou não de juros na base de cálculo
112
do ICMS e do IPI nas vendas a prazo e na venda financiada ; e
•conflitos entre impostos existentes e não tributação: a incidência do ISS
113
sobre operações de leasing , ao mesmo tempo que se consolidava a não
114
incidência sobre locação de bens móveis ; não incidência do ICMS em
115
importação de bens objeto de arrendamento mercantil ; não incidência de
116
ICMS, nem de ISS, sobre provedores de acesso à internet ; não incidência do
117
ICMS sobre assinatura pela contratação de serviço de telecomunicação ;
dentre outros tantos.

Isto sem se falar nas divergências de definições existentes nas


legislações dos impostos acima, com os conceitos utilizados nas normas de
incidência da contribuição ao PIS e da Cofins.

Diferentemente dessas complexidades assim geradas no Brasil, os


países que se guiam pelas orientações da OCDE abrangem pelo VAT
(value added tax) todas as operações com “goods and services”, definindo
“services” inclusive de maneira negativa, seja como “tudo aquilo não
definido de outra forma”, seja como tudo aquilo que não forem “goods”118.

A abrangência desse mecanismo de delimitação do campo de


incidência, como se pode perceber, elimina grande parte dos conflitos que,
no nosso sistema, presenciamos em razão da nossa peculiar repartição da
tributação sobre o valor agregado.

E que assim se faça por vontade do legislador, e não pelo Poder


Judiciário, como temos assistido recentemente, em alguns julgados nos
quais os conceitos utilizados para a distribuição de competências
tributárias pela Constituição vêm sendo alargados119, ora a favor de um
tributo, ora a favor de outro, ignorando-se completamente a competência
tributária residual da União.

1208
6. PROPOSTAS DE REFORMA TRIBUTÁRIA

Neste momento há três projetos que se apresentam como alternativas


para reforma do confuso sistema tributário nacional: a PEC de autoria do
Deputado Federal Luiz Carlos Hauly120, o projeto do Centro de Cidadania
Fiscal121 (CCiF) e a proposta do Movimento Brasil Eficiente122 (MBE);
cada qual baseada, resumidamente, nas seguintes premissas:

PEC Luiz Carlos Hauly Projeto CCiF PEC MBE

• Propõe a criação de
um Imposto sobre
Bens e Serviços (IBS) • Propõe a eliminação de
• Inspirado no sistema europeu, federal, compartilhado qualquer tipo de
propõe a concentração da com Estados e sobreposição de tributos,
tributação federal em imposto municípios. mediante proibição de
sobre a renda, imposto sobre • Prevê a criação do inclusão de tributo na
valor agregado e imposto seletivo IBS por uma alíquota base de cálculo de tributo.
sobre determinados bens. inicial de 1%, por • Federaliza o ICMS e
• O Imposto sobre Bens e cinco anos, em mantém o ISS.
Serviços (IBS) estadual, com substituição a uma • Prevê a revogação de
legislação federal, teria alcance redução de 1% da benefícios fiscais
amplo, abrangendo importações a Cofins. irregulares de ICMS.
qualquer título, locações • Aumento progressivo • CSLL absorvida pelo
por oito anos e IRPJ.
eliminação de guerra
fiscal.

• Passada essa • Fundo de Compensação:


transição, seriam repasses pelas instituições
eliminados o IPI, o financeiras e
• e cessões de bens e direitos e PIS, a Cofins, o ICMS proporcionalmente à
demais operações com bens e o ISS. arrecadação dos últimos
intangíveis e direitos. • O IBS teria alíquota dois anos.
• Prevê a extinção de IPI, IOF, única para todos os • Elimina IPI e exclui a
CSLL, PIS, Pasep, Cofins, bens, “cálculo por competência para
Salário-Educação, CIDE- fora”, e não instituição do imposto
Combustíveis, ICMS e ISS. cumulatividade pelo sobre grandes fortunas.
• ITCMD federal e IPVA critério do crédito • 100% do IR iria para
estadual, ambos com repasse financeiro. custeio da seguridade
integral para municípios. • Transição de 50 anos social.
• Regras de partilha da para redistribuição de • Substitui PIS/Cofins por
arrecadação para manter status arrecadação do IBS contribuição sobre lucro
atual, pelos próximos cinco anos. operacional, para

1209
entre os Estados, DF e financiar a previdência do
Municípios. setor privado.

• Propõe a eliminação das


contribuições de
• Passado esse período, haverá intervenção no domínio
transição de 10 anos para novo econômico.
modelo de repartição. • Vigoraria após a criação
do ICMS-federal, por lei
complementar.

Ao menos em relação ao texto já apresentado, o projeto Hauly é o que


aparenta maior abrangência quanto à incidência do Imposto sobre Bens e
Serviços (IBS), eliminando grande parte das zonas cinzentas acima
referidas123. Sem prejuízo, não elimina a competência residual da União,
cujo exercício, no entanto, acaba ficando bastante limitado.

Os projetos têm recebido algumas críticas – em especial os dois


primeiros referidos acima – por pretenderem copiar o modelo europeu do
IVA, sem atentarem para as dificuldades que esse sistema já apresenta
naquela região e para a insegurança que mudanças estruturais no sistema
tributário poderiam gerar124. Menciona-se, ainda, que na economia norte-
americana esse tipo de imposto jamais existiu, o que seria um sinal de que
o Brasil deveria refletir sobre a efetiva conveniência da sua
implementação125.

Não obstante algumas dessas críticas pareçam incompatíveis com


propostas de reforma já apresentadas no passado126, o fato é que o Brasil já
enfrenta há muito tempo questões relativas à determinação do local de
pagamento do ICMS e do ISS, por exemplo, tendo avançado enormemente
no desenvolvimento de mecanismos de controle de operações sujeitas a
esses impostos, em especial ao ICMS127.

1210
De outro lado, se compararmos o nosso contexto com os conflitos
territoriais que também existem nos Estados Unidos da América, o Brasil
já conta com mais de quarenta anos de experiência e exercício de
negociação no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária, o qual
bem ou mal vem exercendo um papel para o qual, naquele país, os Estados
Federados ainda tentam buscar a constituição de uma instância de
discussão e de harmonização das suas legislações tributárias estaduais128.

Além disso, tomando em conta as complexidades e os mecanismos de


fiscalização já existentes no Brasil, vemos que muitos deles já solucionam
ou enfrentam uma série de situações de risco identificadas no modelo
europeu129, não obstante o que tenhamos aqui ainda possa e deva ser
aprimorado.

Uma reforma no sentido da unificação dos diferentes tributos em torno


de um só imposto sobre bens e serviço traria, sem dúvida, maior
familiaridade dos investidores, inclusive os estrangeiros, com o nosso
sistema tributário, com isso aumentando a atratividade do Brasil. É essa,
inclusive, a linha que se buscou adotar na recente reforma do sistema de
tributação indireta na Índia130, o que representava naquele país igualmente
um sério entrave ao avanço econômico.

Em relação às propostas de reforma acima, no entanto, o risco que se


vislumbra ao seu avanço é o fato de diluírem o poder de tributar hoje
existente nas mãos dos Estados-Membros e do Distrito Federal, podendo
levar essas Unidades Federadas a ficarem à mercê das transferências de
receitas do governo central131. Como bem alerta Zilvetti:

No Brasil, como relatou Sousa, há muito tempo se discute sobre a federalização


do ICMS no Brasil como meio de diminuir as tensões entre Estados e propiciar
melhor controle da arrecadação. De fato, a federalização do ICMS poderia fazer
com que o fruto do imposto permanecesse nos Estados, porém o Governo Federal

1211
centralizaria a regulamentação. A centralização da regulamentação resultaria,
contudo, na temida perda de autonomia estadual. Inevitavelmente, perderiam os
Estados sua força política, relegados a meros agentes de política fiscal unitária,
determinada pela União, tal como ocorre nos sistemas federativos europeus,
132
exceção feita à Suíça .

Sob esse ponto de vista, o Brasil poderia se inspirar no modelo


canadense133 de conjugação de um imposto geral sobre bens e serviços de
competência federal, cobrado conjuntamente com um imposto estadual
sobre o mesmo fato gerador e a mesma base, o que abriria inclusive espaço
para que as próprias Unidades Federadas utilizassem essa sua fatia da
tributação como fator de atração de investimentos e de atividade
econômica, com ou sem a manutenção do regime já regulado pela Lei
Complementar n. 24/75.

Interessante observar, em paralelo a tudo isso, que grandes mudanças


vêm sendo propostas e aprovadas, inclusive rompendo a barreira da
estrutura “tradicional” de um IVA, sem prejuízo dos esforços em se
aprovar uma reforma tributária mais profunda no Congresso Nacional.
Estamos aqui nos referindo a três eventos recentes, nomeadamente, a
Emenda Constitucional n. 87/2015, a Lei Complementar n. 160/2017 e o
Convênio ICMS n. 106/2017.

O primeiro deles, como se sabe, mudou a competência para a


arrecadação do ICMS em operações de venda a consumidores finais não
contribuintes do imposto, repartindo-a entre as Unidades Federadas de
origem e de destino da mercadoria. Trata-se, inquestionavelmente, de uma
alteração relevante, provocada pela necessidade de ajustamento da
cobrança do ICMS à realidade do crescente comércio eletrônico/não
presencial de bens de consumo134.

1212
Outra mudança radical – e também forçada pela realidade econômica –
é o recente Convênio ICMS n. 106/2017, que, não obstante aparente
extravasar a competência constitucional atribuída aos Estados e ao Distrito
Federal135, ambiciona transformar o ICMS em um verdadeiro retail sales
tax. E isto porque, na prática: isenta todas as operações internas com bens
e mercadorias digitais comercializadas por meio de transferência eletrônica
de dados; prevê o pagamento do imposto apenas na operação interna ou
importação com o consumidor final; e para tanto obriga o fornecedor a
estar sempre inscrito como contribuinte na mesma Unidade Federada do
seu cliente final (de certa forma, utiliza-se conceito similar ao “one stop
shop” europeu136 ou de local domain name / local digital plataform do
projeto BEPS137). Prevê-se também a responsabilização tributária dos
intermediadores financeiros (administradora de cartão de crédito ou de
outro meio de pagamento), em voluntária ou involuntária inspiração no
conceito de local payment options138.

Por fim, temos a Lei Complementar n. 160/2017, que ambiciona


permitir que Estados e Distrito Federal celebrem um convênio para dar um
fim à malfadada “guerra fiscal”, no qual deliberariam sobre a remissão dos
créditos tributários, constituídos ou não, decorrentes de isenções,
incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais instituídos em
desacordo com o disposto no artigo 155, parágrafo 2º, inciso XII, alínea
“g”, da Constituição Federal, bem como sobre a reinstituição das
respectivas isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais
por prazos determinados139, de acordo com o segmento econômico
interessado.

7. CONCLUSÕES

1213
O que se nota, do exposto acima, é que o Brasil necessita de uma
reforma tributária abrangente, no que diz respeito ao seu sistema de
tributação de operações com bens e serviços, a fim de trazê-lo próximo aos
parâmetros e às diretrizes dos países mais competitivos. E o momento de
crise econômica é propício para tanto140.

As demandas da economia digital também convergem para a revisão


mais profunda do nosso sistema de repartição de competências entre
setores industrial, comercial, de prestação de serviços e financeiro, na
medida em que as novas tecnologias vêm rompendo as barreiras entre
esses segmentos, exigindo uma base de tributação única e ampla, capaz de
eliminar os incessantes conflitos de competência que desde a reforma de
1965 se apresentam na vida dos contribuintes brasileiros e nos nossos
Tribunais.

Há que se avançar, portanto, em uma reforma tributária que elimine


tributos e unifique cobranças em torno de um único imposto sobre valor
agregado de aplicação mais simples e alinhada com as práticas de outros
mercados.

Finalmente, que se pondere sobre a unificação dessa tributação apenas


nas mãos do governo federal, o que a nosso ver seria um golpe bastante
duro contra o modelo federativo brasileiro, ainda que os anseios e as
necessidades das Unidades Federadas possam ser assegurados por
mecanismos de transferência de receitas por parte da União.

1214
Jogos de realidade virtual e robótica: desafios
para a tributação de humanos no mundo
virtual e robôs no mundo real
141
Victor Polizelli

O presente artigo versa sobre dois temas futurísticos distintos que


apresentam enormes desafios aos sistemas tributários em sua formatação
atual, e que foram negligenciados no relatório da ação 1 do projeto BEPS.
Trata-se da tributação de atividades exercidas por seres humanos em jogos
de realidade virtual e por robôs no mundo real. Em ambos os casos,
abordam-se questões relativas às fronteiras dos sistemas tributários atuais e
as correspondentes sugestões de reforma tributária que estão em discussão.

A tributação em mundos virtuais é um tema que já foi cogitado e


aprofundado em estudos acadêmicos nos Estados Unidos (EUA) na última
década, tendo resultado em manifestações das autoridades fiscais e
congressuais, mas sem nenhum impacto legislativo concreto até o
momento. No caso dos robôs, por sua vez, avaliam-se aqui propostas
bastante recentes que receberam ainda pouca atenção em debates atinentes
à tributação da economia digital. O objetivo deste estudo é confrontar tais
propostas com o sistema tributário brasileiro e apresentar, quando
pertinente, as modificações recentes da legislação brasileira condizentes
com os temas selecionados.

1. TRIBUTAÇÃO SOBRE JOGOS DE REALIDADE VIRTUAL

Aquilo que Bryan Camp dizia nos Estados Unidos dez anos atrás a
respeito da tributação de jogos de realidade virtual pode ser considerado
ainda válido no Brasil de hoje142. A abordagem deste tema é, de certa

1215
forma, prematura, pois não há nenhuma indicação de que a Receita Federal
do Brasil esteja interessada em tributar ganhos obtidos em mundos
virtuais, o que torna este um tema puramente acadêmico. Também se pode
afirmar que tal questão poderia ser levantada em meio a uma fiscalização
de imposto de renda de pessoa física – na qual o auditor pode querer
examinar as atividades e os ganhos realizados de determinado contribuinte
em mundos virtuais –, mas a chance de isso acontecer é remota, pois as
fiscalizações são poucas e normalmente dirigidas a determinados temas
pré-identificados.

A despeito disso, observa-se que a indústria de jogos on-line tornou-se


multibilionária na última década, e isso se deve principalmente aos jogos
de interpretação de personagens on-line e em massa para multijogadores143.
Milhões de pessoas do mundo real gastam quantidades exuberantes de
tempo e dinheiro nas suas vidas virtuais em “reinos virtuais”144. Há
exemplos famosos de pessoas que enriqueceram com suas atividades em
mundos virtuais, como o da avatar Anshe Chung, que figurou na capa da
Newsweek como sendo a primeira pessoa a ganhar um milhão de dólares
no universo do Second Life145, e também de uma transação realizada por
um jogador bem ranqueado no World of Warcraft, que vendeu um par de
armas lendárias por 9.500 dólares.

Os jogadores imersos em tais jogos podem ganhar ou produzir itens


virtuais (bens virtuais e moedas virtuais) e vendê-los ou trocá-los dentro
ou fora do universo dos jogos, recebendo normalmente moedas virtuais,
mas também possivelmente moedas reais, do mundo real. Controlar e,
sobretudo, tributar adequadamente tais transações é um desafio que vem
suscitando debates intensos, especialmente nos Estados Unidos, que

1216
competem com a China na liderança do número de usuário no mercado de
jogos on-line.

Conforme aponta Leandra Lederman, a intuição de muitas pessoas é


que a acumulação de itens virtuais num mundo virtual apenas para fins de
diversão não deveria ser tributada desde que tais bens não sejam trocados
por moeda real146. Encontrar ouro, ganhar poderes ou obter novas armas
não são atividades que intuitivamente deveriam ser tributadas. Mas uma
análise preliminar da legislação sugere o contrário, pois – assim segue a
autora – os prêmios obtidos em competições esportivas no mundo real e os
ganhos extraordinários, como os de loteria, estão sujeitos à imposição de
imposto de renda147. O mesmo vale para lucros obtidos em determinadas
operações de permuta148. Para conhecer a fundo os detalhes deste debate,
faz-se mister compreender como os jogadores humanos obtêm recursos
nos mundos virtuais, como tais itens são transacionados e, em última
análise, como eles se traduzem em dinheiro e benefícios reais no mundo
real.

1.1. Transações no mundo virtual

As transações que ocorrem no mundo virtual podem apresentar


variações em função de seu relacionamento com o mundo exterior. Fala-
se, assim, de uma economia virtual para se referir às atividades
econômicas realizadas entre uma comunidade de entidades num ambiente
virtual. Essas economias virtuais podem ser fechadas, o que significa que
as atividades econômicas e unidades de troca usadas pela comunidade não
interagem com a economia real existente fora do mundo virtual, ou podem
ser abertas, notadamente quando se verificam atividades que ocorrem tanto
no ambiente virtual quanto na economia real. Fala-se, ainda, de economias

1217
virtuais híbridas, nas quais alguns dos fluxos entre a economia virtual e a
economia real estejam proibidos/bloqueados149.

Os dois autores, Leandra Lederman e Bryan Camp, que produziram


artigos seminais acerca deste assunto, designavam o World of Warcraft e
jogos similares como uma aventura estruturada, na qual o jogador segue
por roteiros e etapas específicas. Já os jogos similares ao Second Life
seriam enquadrados na modalidade não estruturada, pois as interações no
mundo virtual ocorrem livremente, sem um script a ser seguido.

No primeiro caso, a intenção dos programadores do jogo é fazer com


que os usuários gastem o máximo de tempo possível on-line
desenvolvendo seus avatares e progredindo lentamente. As vendas de itens
virtuais entre os participantes de tal jogo são, em princípio, proibidas e
desincentivadas pelos programadores. Se um jogador compra poderes,
armas etc. de alguém, ou adquire avatares com habilidades mais
desenvolvidas, isso faria com que ele avançasse rápido demais pelas etapas
do jogo. E se o jogador progredisse rápido pelo jogo, ele logo se sentiria
chateado e mudaria de jogo150.

Já no caso do Second Life, os programadores do jogo não impõem


restrições ao comércio entre os participantes. Como não há um roteiro ou
uma jornada a ser seguida, tem-se que o comércio dentro do mundo virtual
até mesmo enriquece a experiência do jogo. Como se verá em maior
detalhe adiante, o Second Life desenvolveu uma moeda virtual própria, os
Lindens, para incentivar transações no mundo virtual151.

No relatório preparado pelo Escritório de Responsabilidade do


Governo152 dos Estados Unidos sobre o tema, a nomenclatura utilizada
para sistemas de moeda virtual associados a jogos on-line divide-os em

1218
sistemas de fluxo fechado, sistemas híbridos e de fluxo aberto. O World of
Warcraft é considerado um sistema híbrido, ao passo que o Second Life se
classifica como um sistema aberto.

Vale explorar alguns detalhes dessas transações tomando como


exemplos esses dois jogos, que são os mais emblemáticos em suas
categorias.

1.1.1. World of Warcraft (jogos estruturados, de economia híbrida)

O World of Warcraft (WoW) é um mundo de magia no qual os


jogadores assumem o papel de heróis, conforme vão explorando e se
aventurando através de um vasto mundo virtual. Os avatares, sozinhos ou
em grupo, lutam entre si em batalhas épicas e competem com inimigos em
busca de poder e glória. O principal objetivo no jogo é ganhar experiência
e habilidades, avançando e completando várias missões que fazem parte da
jornada de cada herói. Nessa jornada o personagem/avatar deve angariar
certos itens, como armas e armaduras, a fim de obter sucesso e ter acesso a
níveis mais elevados do jogo. Alguns itens de menor valor podem ser
encontrados pelo caminho, mas as maiores recompensas são normalmente
obtidas quando se mata um personagem fictício do jogo, por exemplo um
monstro, que então derruba a sua carga de itens para o ganhador153. A
moeda utilizada no WoW é o ouro (virtual). Não há um mercado oficial
para compra desse ouro, mas o mercado paralelo é bastante ativo, e sua
cotação já atingiu o pico de 0,13 centavos de dólar154.

Se a jornada consiste no grande atrativo do jogo, não faz sentido que


alguém queira comprar um avatar ou algum item útil ou raro. Lederman
então questiona: por que comprar itens se a diversão consiste exatamente
em obtê-los sozinho? Pois bem, os jogadores adquirem itens

1219
principalmente em razão do longo tempo necessário para ganhá-los.
Muitos dispõem de tempo para completar todas as etapas, ao passo que
outros, que têm dinheiro para gastar e pouco tempo para usufruir
momentos de diversão ou que simplesmente querem acelerar seu progresso
para participar de batalhas em conjunto com seus amigos que já estejam
em estágio mais avançado, podem preferir adquirir um item importante,
um avatar em estágio mais avançado ou uma conta inteira de um jogador,
contendo avatares e itens. Em razão desse mercado real de itens virtuais,
alguns participantes podem chegar a comprar tais coisas como uma forma
de investimento155.

Em teoria, o WoW pretende operar como uma economia de fluxo


fechado, pois seus programadores não permitem que os participantes
efetuem transações com dinheiro real. Todavia, alguns participantes
conseguem burlar tais proibições por meio de uma prática secreta
conhecida como “troca por dinheiro real”156. As duas pessoas humanas
interessadas na transação entram em acordo sobre a troca, o comprador
paga ao vendedor com dinheiro real no mundo real e, depois, o avatar do
vendedor transfere o item virtual para o avatar do comprador no mundo
virtual157. Um exemplo de como esse mercado está operando neste
momento pode ser visto no link abaixo158. Há ofertas de ouro, contas de
usuário, pacotes de poderes e diversos itens separados. Em termos
práticos, é por causa desta fissura que o WoW é classificado como um
sistema híbrido (e não um sistema de fluxo fechado)159.

1.1.2. Second Life (jogos desestruturados, de economia aberta)

O jogo Second Life (SL) é um mundo virtual que pretende ser em tudo
similar ao mundo real. Os jogadores também acessam o jogo por meio de
um avatar que, embora seja limitado (os jogadores podem escolher

1220
humanos ou uma variedade de formas não humanas), pode ter sua
aparência modificada pelo dono. Os avatares do SL não possuem muitas
características ou habilidades predefinidas e estas não melhoram
automaticamente com base em atividades repetitivas. Eles também não
têm papéis estruturados. Não há tarefas, nem missões, tampouco há
personagens fictícios no jogo (todos são avatares de seres humanos reais).
Cada jogador tem a possibilidade de criar qualquer item virtual
imaginável. Os jogadores podem construir qualquer coisa, desde imóveis
(casas, lojas, discotecas, filmes teatros, jardins, arenas), itens pessoais
(vestuário, partes do corpo, móveis, fotos, veículos, aviões, fogos de
artifício, arte), itens recreativos (tempestades, animais de estimação, fontes
mágicas, brinquedos), a rotinas de animação que permitam aos avatares
fazer coisas como dançar, pular, fazer caras ou simular sexo. Nesse
sentido, destaca Camp, é como jogar com LEGOs on-line160.

O comércio faz parte da essência do SL e este jogo ganhou notoriedade


ao tempo de seu lançamento, sendo de se destacar que os seus termos
gerais de contratação expressamente dizem que os participantes vão reter
todos os direitos de propriedade intelectual sobre as criações que fizerem
no mundo virtual161. Itens criados no mundo do SL podem ser vendidos em
troca da moeda virtual própria (Linden) ou também ser objeto de troca por
dinheiro real, do mesmo modo que acontece no WoW. O SL ainda permite
e facilita a compra e venda de Lindens em troca de dólares estadunidenses,
por meio do sistema Lindex.

Conforme pontua Huang, o SL caracteriza-se como economia virtual de


fluxo aberto e apresenta, portanto, a melhor probabilidade de gerar
transações tributáveis. Se a filosofia subjacente a esses mundos virtuais
dita que todos os ativos virtuais e as moedas são facilmente

1221
intercambiáveis por ativos e moedas reais e tangíveis, então as
consequências fiscais das transações envolvendo esses itens deveriam ser
indistinguíveis daquelas que ocorrem no mundo real162.

1.2. Propostas para tributação de jogos de realidade virtual

O grande desafio trazido pelos jogos de realidade virtual consiste em


saber se há justificativas suficientes para tributar as atividades e o
comércio realizado entre seres humanos por meio de seus avatares no
mundo virtual, envolvendo bens virtuais por eles criados, encontrados ou
ganhados em batalhas. Caso tal tributação seja plausível, vale ainda
questionar qual é o momento adequado para que tal tributação ocorra em
vista dos princípios que informam os tributos do mundo real.

Uma profícua discussão foi inaugurada pelos Professores Leandra


Lederman e Bryan Camp, cujos argumentos continuam a reverberar em
estudos mais aprofundados nessa matéria. Essas visões serão exploradas
nos tópicos seguintes, com detalhamento das razões pelas quais
determinadas atividades no mundo virtual deveriam ser submetidas à
tributação no mundo virtual ou isentas de tributação até que gerem
resultados concretos no mundo real.

1.2.1. Tributação dentro do mundo virtual

Uma questão central a ser enfrentada na tributação de atividades do


mundo virtual se relaciona com a aquisição de itens virtuais por avatares,
sejam eles bens ou moedas virtuais. Pode-se afirmar que os poderes e o
ouro, por exemplo, ganhos em batalhas no WoW, assim como os bens
produzidos no SL e o dinheiro virtual recebido em razão de suas vendas
(e.g. Lindens) são acréscimo patrimonial sujeito à apuração de imposto de
renda? Esses itens podem ter seu valor identificável no mundo real – em

1222
páginas eletrônicas que promovem o seu comércio no mundo –, o que
afastaria precariamente um potencial problema de mensurabilidade.

A resposta a essa questão conduz a outros fatores importantes para a


configuração jurídica do fenômeno. Leandra Lederman, por exemplo, se
questiona se tais itens virtuais constituem mesmo “bens” transacionáveis.
Após realizar uma análise dos termos de contratação de jogos estruturados
como o WoW – originalmente desenhado como uma economia de fluxo
fechado, mas que, na realidade, transformou-se num sistema híbrido –,
Lederman conclui que os itens virtuais não constituem “bens” no sentido
jurídico e, portanto, não podem ser considerados propriedade dos avatares
que os detêm. Todos os itens virtuais do WoW constituem propriedade
intelectual exclusiva dos criadores do jogo e não pertencem aos jogadores.
Os jogadores teriam uma licença de uso de tais itens. Sendo assim, não
caberia falar, no contexto da legislação estadunidense, em ganhos
tributáveis na venda de bens163.

O caso do SL é notadamente diferente. Seus termos de contratação


reconhecem direitos de propriedade intelectual às criações próprias dos
avatares, e o comércio de tais itens é estimulado pelo jogo. Nesse caso –
sustenta Lederman, mais enfaticamente, em um segundo artigo sobre o
tema –, os lucros recebidos na forma de Lindens devem ser tributados
dentro do mundo virtual e antes mesmo que o contribuinte faça a
conversão de tais Lindens em moedas do mundo real. O recebimento de
Lindens no mundo virtual deve ser tributado da mesma forma que os
valores recebidos via PayPal. Não haveria razões para a formulação de
regras tributárias que permitissem diferir tal tributação para o momento da
passagem para o mundo real, porque isso geraria uma vantagem indevida
que não existe atualmente, por exemplo, no caso de vendas de bens reais

1223
realizadas em plataformas como o eBay, cujo recebimento se dá por meio
do Paypal164.

No Brasil, o tema não foi suficientemente abordado ainda em atos


normativos ou casos práticos, sendo interessante apontar a recente
introdução de dois esclarecimentos no “Perguntas e Respostas” do IRPF
que, desde 2016, comentam as transações com moedas virtuais165. É
possível inferir que, no entendimento da Receita Federal do Brasil, moedas
virtuais qualificam-se, sim, como bens – ao menos no sentido econômico,
e não propriamente civilista do termo – e não configuram nem moeda nem
ativo financeiro no sentido puro (seriam ativos financeiros por
equiparação, mas tal condição não parece modificar seu regime de
tributação). A alienação de moedas virtuais, de acordo com a Receita
Federal do Brasil, é atividade submetida, portanto, ao regime de apuração
de ganho de capital. Disso é possível concluir que os bens virtuais também
tendem a ser tratados como bens para fins da legislação tributária
brasileira, de modo que a sua alienação seria submetida também a este
regime (e não ao regime geral da tabela progressiva e tampouco ao regime
de ganhos líquidos em renda variável).

Ainda no contexto legislativo brasileiro atual, não é possível afirmar


com segurança que a aquisição de itens virtuais no mundo virtual possa ser
submetida a tributação dentro do mundo virtual e antes, portanto, de uma
conversão de tais itens em moeda ou bens do mundo real. Há problemas
sérios de mensurabilidade, liquidez e certeza que apontam ser mais
apropriado postergar a tributação para um momento posterior166.

Mesmo no caso das vendas realizadas no SL em troca de Lindens, tais


problemas persistem. Embora os Lindens sejam um fenômeno similar a
uma moeda, e seu recebimento pudesse ser tratado como um evento de

1224
“caixa” para fins da aplicação do regime de caixa, seria necessária a
presença de um mercado mais amplo e organizado de conversão de
Lindens em dinheiro ou em bens, a fim de garantir uma mensurabilidade
mais precisa, maior liquidez e segurança no recebimento. No contexto
brasileiro tal mercado inexiste, sendo inapropriado pensar em tributação no
mundo virtual, ao menos por enquanto.

1.2.2. Tributação na passagem do mundo virtual para o mundo real

Bryan Camp também entende que as atividades realizadas no mundo


virtual devem ter sua tributação postergada para o momento em que itens
virtuais são convertidos em moeda ou bens do mundo real. Todavia, tal
autor segue um caminho distinto daquele percorrido por Lederman. Camp
não entende que a tributação deva depender do intrincado debate acerca da
qualificação jurídica de itens virtuais como “bens” em razão dos termos de
contratação deste ou daquele site. Em sua visão, os termos de contratação
têm uma relevância questionável no encaminhamento da questão
tributária. Eles podem muitas vezes ser considerados similares a contratos
de adesão, nos quais os usuários não têm escolha sobre o que assinam e,
mesmo que tais termos de contratação possam ser vistos como contratos
acordados conscientemente, alguns de seus termos podem ser questionados
em vista da ausência de liberdade dos usuários na sua configuração167.

O acirrado debate sobre a qualificação jurídica dos itens virtuais não


importaria ao Direito tributário. Um jogador do WoW ou SL que receba
dinheiro real pela venda de uma conta de usuário em tais jogos, ou pela
venda de itens virtuais em troca de ativos (dinheiro ou bens) do mundo
real, terá auferido renda tributável não importando se tais itens são
configurados como bens ou não. Se é verdade que tais itens não são bens,
então o jogador terá recebido renda pela prestação de serviços168.

1225
O argumento da tributação sob a forma de prestação de serviços faz
sentido, até porque o desenvolvimento de tais itens no mundo virtual
normalmente demanda tempo e esforços do “jogador-vendedor-
contribuinte”. No Brasil, porém, é mais provável que prevaleça a noção de
imposição tributária sob a forma de ganho de capital em vez de prestação
de serviços. A uma porque nossa regra de ganho de capital é mais ampla,
alcançando não só a venda de bens, mas também de direitos de qualquer
natureza169. Se os itens virtuais de jogos como o WoW não são bens detidos
pelos jogadores, mas sim direitos de uso de bens pertencentes aos
programadores/donos do jogo, a venda de tais direitos também estará
alcançada pela mecânica de ganhos de capital.

No que respeita a vendas realizadas dentro do mundo virtual, em troca


de bens virtuais ou moedas virtuais, o argumento de Camp é que tais
atividades são serviços prestados pelos jogadores a si próprios,
normalmente por prazer ou diversão. Ainda que determinados atos de
venda de bens virtuais no mundo virtual sejam identificáveis e ainda que
tais bens sejam mesmo considerados “bens” no sentido jurídico do termo,
não faz sentido tributar o ato lúdico do jogo, pois estes seriam, quando
muito, renda imputada. Tais atividades ocorrem num ambiente separado
do mundo real e a elas poderia se aplicar – diz o autor – a mesma máxima
de Las Vegas, de que “o que acontece em Vegas, permanece em Vegas”170.

Ele formula então uma regra da retirada (cash out rule), segundo a qual
transações do mundo virtual somente podem ser tributadas quando os itens
virtuais se converterem em retiradas, de dinheiro ou bens, no mundo real.

O tema é polêmico e, como pontua Seto, o que acontece em Vegas é tão


tributável quanto as coisas que acontecem em outros lugares171. A regra da
retirada, porém, tem a vantagem de eliminar a possibilidade de impor

1226
tributação sem afetar os jogadores que não têm finalidade lucrativa, mas
sim lúdica.

Segundo ressalta Chung, a regra da retirada é benéfica porque permite


tributar as pessoas que usam os mundos virtuais com finalidade lucrativa,
deixando isentas de tributação as pessoas que jogam apenas para fins de
entretenimento. É correto afirmar também que o uso dessa regra pode
estimular o diferimento de tributos e a evasão fiscal. Chung aponta que o
contribuinte pode se sentir interessado em reduzir suas retiradas para
minimizar a tributação da sua renda virtual. Pode-se chegar ao ponto de o
contribuinte depositar a moeda virtual em um banco que opera no mundo
virtual e auferir juros não tributáveis172. Mas de todo modo, no cenário
atual, os benefícios da regra da retirada parecem ainda superar suas
desvantagens.

2. TRIBUTAÇÃO SOBRE ROBÔS

Ganhou força no ano de 2017 a ideia de se instituir uma tributação


específica sobre robôs num futuro não muito distante. O tema teve
destaque num encontro anual mundial de tributaristas, no evento da
International Fiscal Association (IFA), no Rio de Janeiro, em palestras
proferidas pelo Professor Xavier Oberson, que retratou ideias de um
recente artigo seu publicado no World Tax Journal173. Mas o tema também
já havia “viralizado” na mídia geral desde fevereiro de 2017, depois de
uma entrevista concedida para o Quartz, em que Bill Gates respaldou a
ideia de um imposto sobre robôs, reforçando a noção de que os robôs
causam desemprego e não pagam os mesmos tributos a que um empregado
está sujeito174. A questão é polêmica, pois vai na contramão da tendência
de muitos países de incentivar investimentos em tecnologia e automação
por meio da concessão de incentivos fiscais a tais atividades.

1227
Um marco importante dessa discussão – que revela não ser ela uma
polêmica exótica, supérflua e tampouco precoce – consiste no relatório
apresentado no início de 2017 pela Comissão de Assuntos Jurídicos ao
Parlamento Europeu para sugerir mudanças na legislação civil em matéria
de robótica175. Na sessão plenária de 16 de fevereiro de 2017, o Parlamento
Europeu votou favoravelmente ao relatório.

Tal relatório reconhece a possibilidade de que, no futuro, a inteligência


artificial chegue a ultrapassar a capacidade intelectual humana176. Tal fator
traz à tona uma preocupação que antes só frequentava as telas dos cinemas
em filmes de ficção científica, pois os impressionantes avanços
tecnológicos da última década permitem a atribuição de certas
características cognitivas (de autoaprendizado) e de autonomia aos robôs e,
com isso, podem realmente chegar ao ponto de colocar a humanidade em
risco. Embora as famosas três diretivas de Asimov, também conhecidas
como as Três Leis da Robótica177, devam ser sempre consideradas pelos
engenheiros, programadores e operadores de robôs a fim de proteger a
humanidade contra o avanço da tecnologia, a União Europeia – e também
outros países – começam a se questionar se deveriam ser efetuadas
modificações nos sistemas jurídicos nacionais para aprimorar as soluções
jurídicas disponíveis, especialmente em matéria de responsabilidade civil
em casos de danos a terceiros178.

Uma sugestão – talvez a mais controversa – levantada nesse relatório


consiste em reconhecer-se personalidade jurídica a determinados robôs,
particularmente aqueles capazes de tomar decisões autônomas ou que
interajam por qualquer outro modo com terceiros de forma
independente179. Essa ideia de se atribuir direitos e deveres a robôs por
meio de uma “personalidade eletrônica” abre espaço para que se discuta,

1228
doravante, se os robôs não deveriam sujeitar-se autonomamente à
tributação.

Segundo ressaltado por Oberson, a ideia de tributar os robôs decorre de


duas circunstâncias principais. A primeira está associada com a diminuição
dos postos de trabalho humanos, pois os robôs revelam o potencial de,
num longo prazo, substituir muitas – senão a maior parte –, das atividades
humanas e afetar sensivelmente os níveis de emprego. Esse fenômeno
pode resultar numa perda considerável de receitas orçamentárias advindas
de impostos e contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de
salários. A segunda circunstância refere-se ao necessário aumento de
gastos sociais que será necessário manter para dar suporte a um número
crescente de pessoas desempregadas. Em suma, a crescente presença de
robôs causa o que Oberson denomina de uma “dupla perda”, retratada na
diminuição de receitas e aumento de gastos orçamentários180.

Seria interessante imaginar que os humanos, quando substituídos por


robôs, serão liberados de muitas rotinas aborrecíveis e passarão a se
dedicar a atividades de cunho mais criativo e intelectual mais elevado. Em
vez de desemprego, a utilização de robôs poderia levar a uma realocação
de atividades, mais eficiência e desenvolvimento. A demanda por
profissionais da área de tecnologia de informação (TI), por exemplo, deve
continuar crescendo exponencialmente nas próximas décadas181. De todo
modo, mesmo se considerando as fragilidades que previsões futurísticas
envolvem, não há indicações seguras de que essa visão romântica da
realocação dos empregos vá prevalecer.

Um famoso estudo recente sugere que 47% dos empregos dos Estados
Unidos estão numa categoria de alto risco, o que significa que haverá um
potencial para que tais empregos sejam substituídos por sistemas

1229
automatizados no período de uma ou duas décadas. Aqui se incluem os
empregos nas áreas de transportes e logística, em conjunto com a maior
parte dos postos de trabalho em linhas de produção e escritórios de apoio
administrativo. No caso das atividades produtivas, essa tendência de
substituição de pessoas por máquinas automatizadas já vem se
concretizando há tempos com o uso de robôs industriais. Para as outras
áreas indicadas no estudo, basta citar o desenvolvimento de tecnologia
para veículos com sensores avançados, que já dispensam o uso de um
motorista. Outras profissões que estão a risco são aquelas que envolvem
habilidades e destreza manual, como as ocupações de serviços pessoais e
domésticos. Até mesmo empregos na área de vendas tendem a ser
substituídos, pois alguns postos, como os de caixa, balconista e operadores
de telemarketing, embora envolvam tarefas interativas, não demandam um
alto nível de inteligência emocional182.

A área tributária não passa ilesa a essa tendência e deve ser ocupada
massivamente por robôs. Apenas 1% da atividade de preenchimento de
declarações fiscais, por exemplo, é considerada livre de risco de
substituição por sistemas computadorizados. Os profissionais dedicados a
planejamento tributário (advogados, contadores) poderiam entender que
estão a salvo dessa onda robótica, em comparação com seus colegas da
prática de compliance fiscal. Mas não é assim que pensam, por exemplo,
Richard e Daniel Susskind, segundo os quais uma boa parte do trabalho de
planejamento tributário deverá também ser tomada por máquinas no
futuro, pois – conforme argumentam tais autores – o planejamento
tributário e o cumprimento de obrigações fiscais são, do ponto de vista
técnico, duas faces da mesma moeda, uma vez que ambos operam sobre o
mesmo sistema complexo de normas e práticas183.

1230
Tomando como válida, portanto, a suposição de que os robôs vão
progressivamente causar mais desemprego, a equação de “dupla perda”
nos orçamentos dos países certamente se traduz numa pressão por mais
receitas e revela uma necessidade premente de se reformularem os
sistemas tributários para, de alguma maneira, encontrar novas fontes de
tributação.

O enfrentamento dessa questão suscita debates sobre dois principais


tópicos: (i) a definição do que seja um robô, e (ii) quais seriam as formas
de tributação adequadas sobre os robôs. Esses são temas atuais da
tributação da economia digital que serão pontuados adiante, repassando os
desafios que tais propostas representam a partir da perspectiva brasileira.

2.1. Definição de robôs

A existência de novos seres similares aos seres humanos, ou seja, com


capacidade elevada de raciocínio e aprendizado, bem como autonomia
decisória, ainda faz parte de obras de ficção científica. Mas muitas
tecnologias hoje existentes nos permitem imaginar que, dentro de algumas
décadas, haverá robôs que reúnam tais características, o que conduz à
indagação sobre a regulação que o Direito deve dar a tal fenômeno.

Se os robôs do futuro tiverem tanta autonomia a ponto de interagirem


com seres humanos “de igual para igual” (vale dizer, em condições de
igualdade), se eles substituírem os seres humanos em funções
inerentemente humanas e, mais ainda, se tais robôs também tiverem
autonomia financeira, não seria difícil conceber que eles também
pudessem ser tributados como qualquer ser humano. Esta seria uma das
razões que demandariam uma definição precisa de robôs.

1231
Numa visão mais condescendente do direito tributário, pode-se cogitar
que o primeiro passo virá do Direito Civil, quando eventualmente este
chegar ao ponto de atribuir uma personalidade jurídica aos robôs em razão
das questões de responsabilidade. Nesse momento, não só haverá espaço
para se cogitar de tributação, como também será exigido um
posicionamento da legislação tributária para tal fenômeno. Se os robôs têm
personalidade jurídica (uma “personalidade eletrônica”) e, eventualmente
também, uma capacidade financeira, por que não pensar em uma
capacidade contributiva? Isso é bem diferente e talvez até mais plausível
do que proativamente justificar uma iniciativa isolada da legislação
tributária, que atribuísse capacidade contributiva autônoma aos robôs, a
fim de lhes impor tributação em razão do desemprego e desequilíbrio
orçamentário que eles potencialmente causam184.

Pensando-se, então, numa definição de robôs que sirva para um cenário


de tributação mais distante no futuro, toma-se aqui como referência a
sugestão feita pela Comissão de Assuntos Jurídicos ao Parlamento
Europeu, a respeito das principais características de um robô inteligente.
Seriam elas:

•aquisição de autonomia por meio de sensores e/ou de troca de dados com o seu
ambiente (interconectividade) e troca e análise desses dados;
•autoaprendizagem com a experiência e com a interação (critério opcional);
•um suporte físico mínimo;
•adaptação do seu comportamento e das suas ações ao ambiente; e
185
•ausência de vida no sentido biológico do termo .

Muitos desses elementos são polêmicos e deverão gerar discussões


calorosas nos anos por vir. A questão da autonomia é interessante, porque
pode envolver manifestações de vontade – que configuram um tema caro
para a configuração da personalidade e para o Direito. A autonomia
decisória envolve manifestação de vontade, mas não é apenas esse aspecto

1232
o que deveria demandar um tratamento diferenciado aos robôs, porquanto
os animais também têm autonomia decisória e nem por isso ganham
personalidade jurídica e tampouco se submetem autonomamente à
tributação. O que diferencia os robôs e faz a questão da personalidade ser
colocada seriamente é sua capacidade de substituir o homem em tarefas
inerentemente humanas.

A autonomia e o processo de tomada de decisões dos robôs são os


elementos que ganham maior enfoque. Segundo aponta Oberson,
diferentemente das máquinas, tais como dispensadores, trens e carros, o
fator decisivo parece estar na presença de inteligência artificial, o que
engloba uma dose suficiente de autonomia e a capacidade de aprender,
progredir e tomar decisões186.

Na análise de legislação comparada (não tributária), três características


parecem se destacar na definição do que seja um robô, quais sejam: a
presença de sensores, a existência de inteligência e controle e a capacidade
de ação. Esses fatores guiaram a definição de robôs na legislação
japonesa187. Na Coreia do Sul, a legislação também criou um conceito de
robô fundado nesses três aspectos, segundo o qual um robô inteligente é
um dispositivo mecânico que percebe o ambiente externo por si próprio,
discerne as circunstâncias e se move voluntariamente188.

O tema não parece ter ainda sequer sido cogitado pelos órgãos
legislativos brasileiros. Segundo reporta Silvia Melchior, que enfrentou
tais questões em um estudo comparativo internacional, não há atualmente
no Brasil nenhuma regulamentação sobre os robôs e nenhuma categoria
específica a eles aplicável. Com a exceção dos drones, que são
considerados aeronaves, as demais máquinas inteligentes – como os

1233
veículos autônomos – não foram especificamente consideradas pelo
legislador brasileiro189.

2.2. Propostas para a tributação de robôs

As ideias em torno de uma tributação sobre robôs orbitam em torno de


duas principais modalidades de propostas: (i) uma tributação sobre os
robôs enquanto seres com reconhecida personalidade jurídica, e (ii) um
tributo novo e específico sobre o uso de robôs.

Um contraponto importante nessa discussão, ressaltado por Ryan e


Bret, consiste em questionar os incentivos fiscais que muitos países
conferem às atividades de automação. Embora os avanços tecnológicos
sejam bastante promissores e desejados, o discurso atual não analisou
adequadamente a importância de políticas fiscais relativas à automação. Os
sistemas tributários não deveriam encorajar a automação – e a substituição
de trabalhadores por robôs – a não ser que isso fosse resultado de uma
política pública convincente190.

Inovar o sistema tributário provavelmente continuará sendo a palavra de


ordem, mas há um desafio importante pela frente, na busca de um
equilíbrio que permita estabilizar os orçamentos nacionais e as bases de
tributação sem afugentar iniciativas de desenvolvimento tecnológico.

O relatório europeu retrata esse dilema, pois, ao identificar claramente o


problema dos impactos na arrecadação causados pelo aumento no uso de
robôs, sua sugestão original consiste na criação de um tributo sobre o
trabalho dos robôs ou uma taxa sobre o uso de robôs191. Mas, segundo
protesta Luciano Floridi, um tal tributo específico sobre o uso de robôs
seria contraprodutivo e um desincentivo à inovação192.

1234
2.2.1. A capacidade contributiva dos robôs (ou decorrente de seu uso)

Uma alternativa ainda improvável nos tempos atuais consiste em


reconhecer uma personalidade jurídica aos robôs e impor a tributação
normal sobre eles, tal como se fossem pessoas detentoras de uma
capacidade contributiva própria. Embora esse cenário possa se afigurar
distante, uma força motriz inicial pode ser visualizada nas iniciativas
associadas à regulamentação de responsabilidade civil. Como já se
apontou antes neste estudo, a concepção de uma “personalidade
eletrônica” para os robôs poderia ser formulada no Direito Civil e incitar
respostas do Direito Tributário.

Conforme argumenta Oberson, os fatos que reclamam o


reconhecimento da personalidade eletrônica aos robôs nos tempos atuais
não seriam muito diferentes dos acontecimentos que um dia levaram à
formulação da personalidade jurídica para empresas, as quais, naquela
época, não tardaram a ser contempladas com um tributo específico: o
imposto de renda de pessoas jurídicas193. Com efeito, na virada do século
XIX para o século XX, ocorriam em diversos países movimentos
desordenados de imposição tributária sobre as empresas, que passaram a se
submeter a impostos sobre seus ativos, seu capital, sobre a distribuição de
dividendos, até que se formulou uma forma de tributação unificada e
abrangente sobre a renda194.

A ausência de capacidade financeira é um óbice que logo pode ser


levantado contra a tributação dos robôs como pessoas distintas dos seus
donos. Situação similar foi enfrentada na formulação de um imposto
específico sobre as pessoas jurídicas, haja vista o problema de dupla
tributação econômica que se verifica quando se cobra imposto sobre os
lucros das pessoas jurídicas e depois, novamente, sobre a distribuição de

1235
dividendos aos sócios. No caso das pessoas jurídicas, essa questão não
impediu o reconhecimento de capacidade contributiva às empresas. O que
tal empecilho causa é a necessidade de se implementar algum método de
integração da pessoa jurídica com seus sócios a fim de eliminar ou, o que é
mais comum, amenizar essa imposição em dobro sobre a mesma matéria
imponível195.

Talvez, num primeiro estágio, a tributação de robôs empregados em


atividades econômicas venha a recair sobre a capacidade contributiva de
seus empregadores, os quais, por utilizá-los, economizariam custos por
meio da redução de sua folha de salários. Num segundo estágio, quando a
tecnologia permitir que os robôs tenham uma capacidade financeira
permanente, poder-se-á, então, pensar na atribuição de capacidade
contributiva exclusiva a eles196.

Nesse primeiro estágio, a tributação recairia sobre o uso de robôs, em


razão da economia que eles proporcionam aos seus donos. Se um carro
automatizado conduz seu dono ao trabalho, uma imposição tributária não
seria despropositada, pois tal robô permite a liberação de novo espaço de
tempo livre na vida do seu dono, que pode utilizá-lo para o trabalho, lazer
e outras tarefas. Esse raciocínio caminha em paralelo com o tema da
imposição de imposto de renda sobre a renda imputada197. Como ressalta
Oberson, assumindo-se que os robôs substituem os humanos nas suas
tarefas, uma tributação de robôs consistiria na imposição do imposto de
renda sobre o salário hipotético imputado que eles supostamente
receberiam198.

Na instituição de uma tal tributação, é de se reconhecer que dificuldades


existirão tanto no que respeita à definição do que sejam robôs quanto na
estipulação do valor de salário imputado correspondente. Tomando-se

1236
como referência a definição de robôs proposta pelo relatório europeu199,
nota-se prontamente que, ao tornar opcional o requisito de
autoaprendizagem, a definição ficou muito restrita para uma tributação que
seja orientada pelo conceito de economia proporcionada por robôs. Um
aspirador de pó inteligente, por exemplo, seria qualificado como robô por
ser um objeto físico, inanimado no sentido biológico, que possui
autonomia em decorrência de seus sensores e é capaz de reagir em razão
do ambiente. Ao adquirir tal aspirador, um sujeito terá economias por não
ter mais que pagar a diária de uma faxineira. A presença desse ganho é o
que justificaria a imposição de imposto de renda sobre tal renda imputada.
Todavia, no caso de robôs da atividade industrial, a definição do relatório
abrangeria apenas os robôs que possuem sensores e são capazes de
reconhecer minimamente os objetos com os quais são programados para
lidar, deixando de lado um grande grupo de robôs menos complexos. Se
uma tributação do uso de robôs busca compensar a perda tributária
decorrente do desemprego que eles causam, então a definição de robôs
deveria ser ainda mais abrangente.

A imposição de uma tal tributação pelo salário imputado passa, ainda,


pelo desafio de definir qual base de cálculo seria adequado estipular.
Oberson dá notícia de uma proposta recente, defendida pela Unión
General de Trabajadores (UGT) da Espanha, que protestava pela
instituição de contribuição previdenciária sobre as empresas que usam
robôs que substituem seres humanos. O parâmetro de referência seria o
número de horas trabalhadas200. É curioso pensar assim, porque um robô
pode substituir mais de um empregado humano e também ser mais
eficiente com o mesmo número de horas trabalhadas. Não se trata de
equação fácil de atender com precisão, pois um só tributo provavelmente
não será capaz de compensar adequadamente a dupla perda orçamentária

1237
causada pelos robôs. É possível que um conjunto variado e coordenado de
medidas seja necessário201.

Outros efeitos fiscais ainda devem ser considerados no cenário de


tributação do salário imputado. O empregador que paga um salário tem
direito a uma dedução desse valor como despesa operacional em seu
imposto de renda, logo, no caso do salário imputado (cujo imposto devido
pelo robô terá sido pago pelo empregador na condição de responsável
tributário), o empregador também faria jus a uma redução proporcional do
seu imposto de renda de pessoa jurídica. Ademais, deve-se evitar uma
dupla dedução que seria decorrente da dedução do salário imputado em
conjunto com o valor de depreciação dos robôs202.

Por fim, um segundo estágio de tributação dos robôs seria aquele no


qual se reconhece que os próprios robôs possuem capacidade contributiva
e financeira e devem se submeter à tributação como se fossem seres
humanos. Não seria um devaneio pensar que o dia ainda virá em que os
robôs terão sua própria conta bancária. Um exemplo interessante dos
tempos atuais pode ser visto nos “plantoides da Okhaos”, que são uma
espécie de planta equivalente a um androide. O plantoide consiste num
objeto com vida autônoma criada sob a forma de uma organização
autônoma descentralizada cujo espírito é um software desenvolvido com a
tecnologia de blockchain da plataforma Ethereum e cujo corpo consiste
numa escultura mecânica disposta em exibição pública. Pois bem, os
plantoides não pertencem a ninguém e não podem ser adquiridos por
ninguém, pois são autônomos, isto é, eles possuem-se a si próprios e, além
disso, têm carteiras próprias de bitcoins destinadas a receber doações de
apreciadores. Quando os plantoides tiverem fundos suficientes, eles
decidirão contratar artistas para criar novas formas de plantoides. Nesse

1238
ponto, será possível presenciar relações contratuais propostas por um robô
e cujos serviços correspondentes serão remunerados por moeda virtual de
titularidade dos robôs203.

2.2.2. Tributos específicos sobre o uso ou propriedade de robôs

Um outro conjunto de alternativas possíveis congrega as propostas de


criação de tributos novos e específicos sobre o uso de robôs ou sua
propriedade. Na perspectiva dos tributos sobre a propriedade, essa
alternativa opera de maneira similar a um IPVA ou tributos análogos,
existentes em outros países, que oneram a propriedade de animais. Esse
novo tributo poderia ser baseado num valor fixo ou ser variável de acordo
com as distintas modalidades de robôs, a exemplo do que se observa nos
IPVAs de outros países, que variam conforme a potência, o nível de
poluição e o ruído204.

Tal como se comentou no tópico antecedente, a definição de robô é um


ponto crítico para qualquer medida de tributação que lhe seja dirigida.
Tomando-se a definição do relatório europeu como referência para
discussão dos tributos ora enfocados205, nota-se que, além de a definição
ser insuficiente (subinclusiva) para abarcar boa parte dos robôs
industriais206, ela também pode ser excessiva (sobreinclusiva) em razão de
ter amenizado sobremaneira o aspecto físico. Embora os programas de
software denominados de “robôs” representem um ganho estrondoso de
eficiência, é de se duvidar se a tributação ora discutida deveria aplicar-se a
eles. Para tomar exemplos brasileiros notórios e recentes, basta mencionar
o caso do programa “robô” dos pregões eletrônicos ou dos programas
“robôs” utilizados para operar em bolsas de valores. Esses “robôs”
consistem essencialmente de softwares que não possuem expressão física,
mas dependem de um computador ou qualquer outro dispositivo para

1239
interagirem com o usuário. Se essa interface com o usuário qualifica o
“suporte físico mínimo” da definição europeia de robôs, então
praticamente toda sorte de aplicativos e softwares estariam englobados
pela definição. Não parece ser essa uma definição adequada para robôs.
Ou bem se escolheu a palavra errada e a intenção verdadeira é de tributar
qualquer tecnologia que seja eficiente e cause desemprego, ou acerta-se o
foco para discutir formas apropriadas de tributação do fenômeno da
automação.

A criação de tributos novos sobre o uso de robôs pode assumir


variações. Ryan Abbott e Bret Bogenschneider apresentam cinco
alternativas que têm em comum a intenção de eliminar distinções entre a
tributação do trabalho (isto é, da contratação de empregados) e do capital
(isto é, dos investimentos em ativos fixos associados à automação). Os
professores californianos apontam que o problema da dupla perda
orçamentária é resultado de sistemas tributários que foram desenhados
para tributar o trabalho em vez de o capital. Sua proposta, portanto, busca
eliminar os incentivos que hoje favorecem demitir um empregado e
investir num robô.

Além de propor a eliminação de deduções fiscais relativas aos


investimentos em ativos fixos de automação (robôs), os autores também
enumeram as alternativas de se abolir completamente a tributação
incidente sobre o empregador com relação à folha de salários – que faria
com que tanto os robôs quanto os humanos ficassem isentos de
contribuições previdenciárias –, bem como a criação um tributo específico
em razão de demissões e o aumento da alíquota do IRPJ atual207. Além
disso, os autores explicitam uma proposta para criar um tributo novo sobre
as empresas que atuam com poucos ou nenhum empregado. Seria algo

1240
como um tributo sobre os lucros, mas cujas alíquotas tomariam como
indicador uma relação entre o lucro e a despesa com folha de salários.
Conforme tal indicador aumentasse, as alíquotas seriam maiores. A
intenção é criar um atrativo para a criação de empregos, em vez de sua
substituição por robôs. Uma variação seria instituir tal tributo sobre as
receitas208.

A implementação prática de qualquer dessas medidas deve levar em


conta o dilema aqui já comentado, de equilibrar o estímulo à inovação com
a estabilização orçamentária. Segundo notícias, a Coreia do Sul teria sido o
primeiro país a adotar o imposto sobre robôs. Na verdade, trata-se de
alarde enganoso, pois o que há de concreto, ao tempo da escrita deste
artigo, é simplesmente uma (anunciada e ainda não implementada) redução
de incentivos sobre a tecnologia209. No Brasil, houve em 2017 uma medida
concreta de redução de benefícios ao setor de tecnologia da informação,
que logo foi revertida. Não se pode, porém, associar tal medida à questão
do desemprego causado pela tecnologia, pois esse tema não frequentou as
discussões congressuais brasileiras210. A questão aqui era simplesmente
equilíbrio orçamentário. A Contribuição Previdenciária sobre a Receita
Bruta (CPRB), aliás, muito se assemelha a uma das propostas discutidas
acima. Talvez a sua alíquota devesse ser ajustada para compensar
adequadamente as perdas orçamentárias.

Outra preocupação importante consiste em impor tributos indiretos


sobre as atividades executadas por robôs não como empregados, mas sim
como fornecedores de bens e prestadores de serviços a terceiros211. Essa
observação traz à tona um ponto controverso, porém interessante, da
legislação brasileira, que foi a criação do conceito de serviços técnicos
automatizados. Por meio do polêmico exercício de poder regulamentar, a

1241
Instrução Normativa RFB n. 1.455/2014, expandiu o conceito de serviços
técnicos sujeitos a imposto de renda na fonte em remessas ao exterior para
abranger também a “execução de serviço (...) decorrente de estruturas
automatizadas com claro conteúdo tecnológico”. Trata-se visivelmente de
uma iniciativa que pretende impor tributação sobre robôs (e talvez também
outros fenômenos não corporificados fisicamente), que poderia muito bem
decorrer de uma política fiscal formulada no foro congressual adequado e
com maior harmonia entre os demais tributos, em vez de ser introduzida de
surpresa pelo veículo normativo inadequado.

1242
Tributação direta vs. tributação indireta na
economia digital: reflexões sobre os impactos
da concentração de tributos sobre o consumo
em detrimento da tributação sobre a renda
para a praticabilidade e justiça fiscal
212 213
Rafael Malheiro e Laura Salviano Almeida da Costa

1. TRIBUTAÇÃO DO CONSUMO: TENDÊNCIAS E DESAFIOS DA ERA


DIGITAL NOS MERCADOS INTERNACIONAIS E NO BRASIL

O avanço das telecomunicações, do gerenciamento de informações, do


desenvolvimento de software e do personal computing possibilitou uma
significativa redução dos custos de organização e de coordenação de
atividades econômicas complexas a longas distâncias. Basta dizer que,
atualmente, as empresas são capazes de tomar decisões e de administrar
suas operações globais por meio de centrais remotas, cuja sede não
necessariamente coincide, geograficamente, com a região ou jurisdição
onde suas atividades são realizadas ou onde seus consumidores ou
fornecedores estão localizados.

Como consequência da expansão do acesso a mercados remotos, houve,


de um lado, um aumento considerável da capacidade de fornecimento de
bens e serviços para além das fronteiras e, de outro, uma redução da
presença física e do emprego de esforço humano para operar essas
atividades, principalmente no setor de novas tecnologias da informação e
comunicação.

Não por outro motivo, a Organização para a Cooperação e


Desenvolvimento Econômico (OCDE) elencou, dentre as principais

1243
características da economia digital, a mobilidade, tanto das funções e
modelos de negócios das companhias insertas nesse contexto, quanto dos
usuários e consumidores de seus produtos e serviços214.

A premissa da OCDE é de que a era pós-globalização iniciou um


processo de maior flexibilidade dos modelos de negócios, a partir do qual,
além do surgimento de novos ramos de exploração econômica, os ativos
das companhias e as suas atividades, mesmo as mais tradicionais, podem
ser deslocados do seu mercado consumidor em nome da redução de custos,
do aumento da produtividade e da maximização de resultados.

Simultaneamente, graças aos avanços da conectividade, tornou-se


possível o acesso remoto a atividades comerciais, o que desafia a
identificação de onde se realizou a venda ou a prestação de serviços. Para
que se tenha uma dimensão real do desafio, imagine-se que essa
mobilidade de usuários e consumidores permite, por exemplo, a um
indivíduo residente em uma determinada jurisdição realizar o download de
um aplicativo enquanto está em outra (jurisdição) e somente utilizar o
serviço disponibilizado pelo aplicativo em trânsito por uma terceira.
Ademais, a possibilidade de interação anônima na internet torna ainda
mais precária a localização desses usuários215.

Adicionalmente, a economia digital gerou um ambiente propício à


inovação e à evolução dos modelos de negócios, tal como o advento do
mercado das app stores, da publicidade online, do armazenamento de
dados em nuvem, da disponibilização de conteúdos via streaming, serviços
de pagamento online e plataformas da chamada “economia
compartilhada”, que engloba serviços como os de transporte e
hospedagem. Ainda que seja possível estabelecer um paralelo entre esses
modelos e categorias preexistentes na economia tradicional, as novas

1244
modalidades guardam suas especificidades e vêm chamando a atenção
quanto à sua rápida difusão e adesão de consumidores em todo o mundo.

O surgimento de novos modelos de negócio, da mobilidade dos


negócios e dos usuários, da integração de mercados e, consequentemente,
de novas manifestações de riqueza são alguns dos aspectos mais
proeminentes da economia digital, que se tornou a ordem do dia em
matéria de tributação.

Esse foi um dos gatilhos para que a OCDE, em conjunto com o G20,
desenvolvesse o Projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting), cujo
objetivo é o combate à erosão das bases tributárias e o desvio de lucros das
empresas para jurisdições de baixa ou nenhuma tributação sobre a renda,
mediante planejamentos tributários agressivos baseados em lacunas da
legislação e assimetrias encontradas nos sistemas tributários internos. No
contexto deste projeto, foram elaborados 15 planos de ação pontuais,
sendo um deles inteiramente destinado à identificação dos principais
desafios à aplicação das atuais regras de tributação internacional impostos
pela economia digital e o desenvolvimento de soluções para remover esses
obstáculos216.

A atribuição de uma maior relevância da tributação sobre o consumo


ocorre na medida em que se tenta “capturar” a capacidade contributiva
refletida pelas novas formas de manifestação de riqueza, sobretudo dessas
empresas do setor digital, e alcançar as receitas provenientes dos novos
modelos de negócio, que muitas vezes escapam da tributação da renda.

Será essa transição – ainda em andamento – da matriz tributária um


caminho a ser perseguido pelo Brasil? Quais os princípios orientadores e
os limites para tanto?

1245
No campo do plano de ação do BEPS dedicado à economia digital, a
OCDE e o G20 identificam desafios que abrangem tanto a tributação direta
quanto indireta, sobre o consumo, e, no que tange a esta última, destaca,
entre outros aspectos, a dificuldade do seu recolhimento em operações
envolvendo o comércio internacional de bens, serviços e intangíveis,
principalmente quando estes são providos por fornecedores no exterior.

Com o propósito de vencer esse desafio, corrigindo as possíveis


distorções, diversas jurisdições reformularam ou encontram-se em
processo de reformulação e inovação de seus sistemas tributários por meio
da orientação de suas políticas fiscais a privilegiar a tributação do
consumo de bens e serviços, ou mesmo valendo-se da medida do consumo
como métrica para alocação da renda “consumida” em suas jurisdições,
com base na premissa de que dessa forma passariam a tributar de forma
mais justa e eficiente os agentes inseridos nesse mercado.

Na Comissão Europeia vem sendo reforçada a proposta de atualização


das regras de tributação que não estejam adaptadas à realidade da atuação
das empresas líderes no segmento da economia digital, sobretudo norte-
americanas, no mercado europeu. Na visão da Comissão, o modelo de
negócios dessas empresas e suas práticas agressivas de planejamento
tributário inibem a tributação de seus lucros e obstaculizam o crescimento
dos negócios europeus, prejudicando as finanças dos Estados-membros217.

A iniciativa tem como um dos seus pilares estabelecer e proteger o


direito dos Estados-membros de tributar essas companhias de destaque na
economia digital em jurisdições nas quais elas possuem mercado
consumidor relevante, mesmo com pouca ou nenhuma presença física, mas
com uma “presença digital significativa”.

1246
Nesse contexto, destaca-se na União Europeia a proposta de uma base
tributária comum consolidada (“Common Consolidated Corporate Tax
Base”), um conjunto de regras para determinação dos lucros tributáveis
auferidos por grupos multinacionais. O montante calculado seria então
dividido entre os Estados-membros nos quais as multinacionais atuam,
permitindo que cada um deles tributasse os lucros alocados à sua
jurisdição de acordo com a sua alíquota interna. Não se trata, naturalmente,
de uma tributação sobre o consumo, mas um dos critérios para a alocação
desses lucros remete ao volume de vendas realizadas por essas empresas
em cada Estado-membro, o que refletiria com mais eficiência onde os
valores recebidos são de fato originados, recorrendo claramente à
distribuição da renda com base no mercado consumidor de destino. Essa
medida, além de maior simplicidade para o contribuinte pela redução de
seus custos de conformidade, inibiria a elisão tributária por meio de
planejamentos pelas grandes corporações218.

Alinhados com o trabalho desenvolvido pela OCDE no projeto BEPS


no âmbito dos desafios da economia digital, em 2016 a Índia introduziu
uma nova espécie tributária (“equalization levy”) que passaria a onerar
receitas da prestação de serviços de publicidade online, disponibilização de
espaços publicitários na internet e outras facilidades que sirvam a esse
propósito, auferidas por companhias de e-commerce não residentes e que
não possuam um estabelecimento permanente em território indiano219. O
propósito seria “equalizar” o montante de impostos que as companhias de
economia digital deveriam pagar caso operassem de forma convencional e,
portanto, estivessem formalmente sujeitas à tributação local. De acordo
com as novas disposições, essas receitas passaram ser tributadas pela fonte
residente indiana – ou que possua um estabelecimento permanente na Índia
– a uma alíquota de 6%. A fonte pagadora tem ainda a obrigação de

1247
consignar em declaração ao governo indiano os detalhes do pagamento e
da retenção do imposto.

Também nessa esteira, em 2015, no âmbito da reforma de seu sistema


tributário, o Japão propôs a imposição de um tributo sobre o consumo em
operações internacionais de fornecimento de serviços digitais. As
alterações promovidas pelo Japão envolvem a definição do conceito de
“serviços digitais” e o critério para a sua tributação, a imposição da
responsabilidade de recolhimento do tributo ao destinatário dos serviços
(“reverse charge mechanism”) nas transações de cunho comercial
(“Business to Business – B2B transactions”), a limitação da tomada de
créditos do tributo em transações comerciais entre empresa e consumidor
final (“Business to Commerce – B2C transactions”) e a introdução de um
sistema de registro de fornecedores de serviços estrangeiros220.

Mesmo nos Estados Unidos, um país conhecido por adotar um sistema


tributário historicamente mais dependente dos impostos sobre a renda e a
propriedade, iniciativas no sentido de cortes em tributos sobre a renda de
pessoas físicas e jurídicas e aumento de tributos sobre o consumo vêm se
mostrando uma tendência. Muitos de seus estados, incluindo Georgia,
Kansas, Oklahoma, Ohio e Carolina do Norte, já aprovaram legislações
com esse objetivo, sob a justificativa de que os tributos sobre o consumo
viabilizariam maior crescimento econômico, já que, de acordo com esse
raciocínio, seriam menos voláteis em comparação aos tributos sobre a
renda e são menos sensíveis à sonegação221.

É sintomático ainda que, de acordo com o que vem sendo amplamente


divulgado, propostas de reforma tributária envolvendo a redução dos
tributos sobre a renda nos Estados Unidos na esfera federal também
tenham ganhado recentemente mais força, numa tentativa de incentivar a

1248
permanência de multinacionais em “fuga” para outras jurisdições222,
tornando mais atrativa a manutenção dos lucros das empresas no país por
meio de cortes nas alíquotas do imposto de renda.

A última redução de alíquota do imposto de renda das empresas nos


Estados Unidos ocorreu em 1986223, e, desde então, diversas nações ao
redor do mundo vêm reduzindo significativamente suas alíquotas do
tributo. No ano-calendário 2017, os Estados Unidos ainda possuíam uma
das maiores alíquotas nominais de imposto de renda das pessoas jurídicas
do mundo (35% no nível federal), a mais elevada dentre os países da
OCDE e ultrapassando em 10 pontos percentuais a alíquota média de
24,8% da organização224.

Com base nessas constatações, o plano de reforma elaborado pelo


Governo dos Estados Unidos propõe uma redução da alíquota federal do
imposto sobre a renda das empresas de 35% para 20%225, o que
representaria o maior corte nas alíquotas do imposto já efetuado na história
do país.

Em recente estudo divulgado pela organização Washington Center for


Equitable Growth, estimou-se que a transferência dos lucros de
multinacionais para outras jurisdições representa uma perda de
arrecadação de aproximadamente US$ 100 bilhões ao ano para os Estados
Unidos. Dessa perda, cerca de 98% resultaria da transferência para países
que tributam a renda das empresas a alíquotas inferiores a 15%226.

Voltando agora ao objeto central deste estudo, isto é, se seria


conveniente ao Brasil – que naturalmente também é sensível aos
movimentos da economia digital – acompanhar a tendência internacional –
ou mesmo, em sendo essa a solução, como essa solução se comportaria –,

1249
é preciso ter em referência que, a despeito da tendência à convergência de
uma maior incidência tributária sobre a matriz do consumo de bens e
serviços em diversos países, essa prevalência já se manifesta
historicamente na cesta de arrecadação brasileira, a qual é mais onerada
por tributos indiretos, de competência de todos os níveis da federação
(ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS).

O papel de destaque da tributação sobre o consumo na arrecadação


pode ser mais bem visualizado nos gráficos abaixo, elaborados a partir de
dados divulgados pela Receita Federal do Brasil em 2016, e que
evidenciam que os tributos sobre bens e serviços representaram cerca de
49,7% da arrecadação em 2015227:

1250
Ainda que represente uma tendência global adotada em vários países e
possua extrema relevância para a arrecadação, a tributação sobre o
consumo no Brasil é incomparável com a de outras jurisdições e com a
proporção da tributação sobre a renda e o consumo nestas, notadamente
em razão do sistema constitucional de repartição de competências
tributárias entre os entes federativos. A existência de um sistema que
distribui a competência tributária sobre o consumo entre todos esses
níveis, aliada ao constante surgimento de novas atividades econômicas e
modelos de negócio com pouca ou nenhuma regulamentação, termina em
um certo casuísmo e dá vazão a conflitos de competência, muitas vezes de
difícil solução.

O produto da arrecadação tributária sobre o consumo no Brasil é, ainda,


o resultado de um amplo leque de benefícios fiscais destinados a pessoas
jurídicas, concedidos pelos entes federados em forma de renúncia com o
objetivo extrafiscal de atração de empreendimentos e promoção de
desenvolvimento em seus territórios. Esses benefícios, principalmente no

1251
caso do ICMS, materializam-se em forma de isenções, reduções de
alíquota e de base de cálculo, diferimentos e suspensões de tributação e
não raras vezes são concedidos em desrespeito à regra constitucional que
requer consenso entre os estados para a sua instituição. É também
recorrente o enfrentamento dos requisitos para a renúncia de receitas
públicas estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), tais
como a ausência de estimativas de impacto orçamentário e de medidas de
compensação.

Além dos conflitos entre os entes federados e do esperado contencioso e


ineficiência a eles associados, a concessão intensa e desordenada de
incentivos fiscais associados à tributação sobre o consumo também
contribui enormemente para distorcer comparativamente a sua relevância
com o peso da incidência do imposto sobre a renda e proventos de
qualquer natureza.

Junte-se a esse cenário o fato de que o Brasil já convive com outros


conflitos diretamente relacionados a uma imersão progressiva na
digitalização da economia e a tributação sobre o consumo, dentre os quais
a disposição dos estados e municípios que reivindicam a competência para
a tributação de espaços publicitários na internet. Ao menos até a sua
inclusão na lista anexa à Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003
(LC n. 116/2003)228, o conflito desencadeou inúmeras autuações contra
grandes multinacionais atuantes no setor, que não submetiam essas receitas
à incidência do ISS, até mesmo porque os tribunais administrativos já
haviam se pronunciado no sentido de que a veiculação de publicidade na
internet caracterizar-se-ia como um serviço de comunicação, sujeito à
incidência do ICMS-Comunicação229.

1252
Outro exemplo nos chega da cessão de uso de software, sobre a qual
não há até aqui um consenso quanto à sua qualificação como prestação de
serviços, sujeita à incidência do ISS, como circulação de mercadoria,
sujeita à incidência do ICMS, ou ainda se não haveria nem serviço nem
mercadoria, afastando a incidência de ambos.

Questões similares preocupam também empresas dedicadas à atividade


de streaming, incluída recentemente na lista anexa à LC n. 116/2003230, em
uma tentativa de qualificação da atividade de cessão de conteúdos de
áudio, vídeo, imagens, dentre outros, em caráter não definitivo, como uma
espécie de serviço, teoricamente autorizando a sua cobrança pelos
municípios. Ainda que alguns municípios já tenham incorporado a
alteração à respectiva legislação interna231, a sua constitucionalidade ainda
é ou será virtualmente questionada pelos contribuintes que entendem que a
atividade não se enquadra como uma obrigação de “fazer” ou “dar”, mas
em uma terceira categoria que, quando muito, estaria sujeita à incidência
de um imposto de competência residual da União, nos termos do artigo
154, inciso I, da Constituição, o qual, contudo, ainda não foi instituído.

Os dois últimos casos confirmam que também no Brasil a economia se


aproxima cada vez mais de um momento em que não haverá necessidade
de suporte físico para a realização de operações, que se darão cada vez
mais via download, assinaturas, plataformas virtuais mantidas pelas
empresas e demais formas de acesso a conteúdos e aplicações, tornando
obsoleto o critério tradicional de diferenciação entre obrigações de “dar” e
de “fazer” para distinguir mercadorias e serviços com o propósito de
dirimir conflitos de competência tributária, bem como dificultando a
atribuição a um estabelecimento físico dos lucros oriundos dessas
transações.

1253
A chamada “economia colaborativa”, pautada no compartilhamento do
uso de bens e serviços, na maioria das vezes facilitada por sites e
aplicativos, com previsão de movimentação de bilhões nos próximos
anos232 e que chama a atenção de grandes investidores, também representa
um grande desafio à tributação indireta. No Brasil, essa tendência de
consumo vem ganhando cada vez mais força com a utilização de
aplicativos como os de mobilidade urbana, que conectam motoristas
proprietários de carros a passageiros e de hospedagem, que ligam pessoas
dispostas a receber hóspedes em suas casas em troca de variadas formas de
pagamento, bem como aplicativos de delivery e plataformas de vendas e
trocas de produtos online. Uma das consequências óbvias dessa nova
modalidade de consumo é a dificuldade de definição da competência
municipal para tributar esses serviços pelo ISS. A legislação e a
jurisprudência não oferecem parâmetros seguros para se afirmar
satisfatoriamente que o ente competente é o daquele lugar onde
efetivamente o serviço foi prestado ou onde a empresa prestadora atua.

A constatação é que, ainda que a Constituição (art. 146, I) tenha


conferido à lei complementar o papel de dispor sobre conflitos de
competência, no universo da tributação sobre o consumo não há uma lei
complementar específica, com critérios precisos para dirimir conflitos
de competência entre tributos como o ISS e ICMS, mas apenas uma lei
complementar para cada tributo. Dessa forma, ainda que as atuais leis
complementares permitam a sistematização das espécies tributárias, resta
enfraquecido o potencial conferido pelo constituinte à legislação
complementar233.

A indústria do consumo cresce em um ritmo cada vez mais acelerado e


ganha novas facetas, que, naturalmente, não estão previstas em abstrato

1254
pela legislação e, em muitos casos, nem deveriam sob o ponto de vista da
técnica legislativa. Nesse aspecto não convém deixar despercebido o fato
de que no Brasil, em certa medida, a própria sobreposição da tributação
sobre o consumo acentua desequilíbrios da tributação da economia dita
tradicional.

A questão a ser debatida aqui, todavia, não está direcionada ao conflito


em si ou às distorções do sistema, que estimulam a concorrência entre os
entes federativos e a guerra fiscal, mas em avaliar a conveniência da
concentração da tributação sobre o consumo, em detrimento da tributação
sobre a renda, num modelo que tende a agravar distorções e acentuar os
conflitos de competência já existentes e os que inevitavelmente surgirão
dos novos modelos de negócio na economia digital.

Por outro lado, como procuramos antecipar, a tendência de evolução


para um modelo de tributação concentrado sobre o consumo apresenta
certa vantagem quando comparado a uma política fiscal centrada na
tributação sobre a renda, principalmente porque oferece uma ferramenta
complementar à coerção do desvio de resultados a outras jurisdições com
tributação sobre a renda mais amigável ao contribuinte. Há quem enxergue
na praticabilidade, cujo pressuposto é a massificação, eficiência e
exequibilidade da tributação, um princípio de direito tributário que
justificaria essa política, cabendo investigar como e em que medida esse
propósito poderia se sobrepor à acentuação da assimetria da tributação
sobre o consumo no Brasil e quais os limites dessa política fiscal.

2. TRIBUTAÇÃO INDIRETA. PRATICABILIDADE VS. CAPACIDADE


CONTRIBUTIVA E JUSTIÇA FISCAL

A simplicidade é uma característica desejável em qualquer sistema


tributário234, uma vez que serve ao objetivo de tornar mais eficaz a

1255
execução das leis, promovendo a capacidade contributiva e a eficiência
fiscal. Essa característica, também denominada praticabilidade, como
elemento essencial à simplificação do sistema tributário, deve levar em
consideração a necessidade de massificar a tributação, tornando-a
aplicável ao maior número possível de contribuintes e suas manifestações
de riqueza235.

De acordo com esse raciocínio, a ausência de praticabilidade e,


portanto, de exequibilidade da legislação atentaria contra o princípio da
igualdade da tributação, contrariando a própria noção de justiça fiscal, que
decorre de normas práticas, efetivas e equânimes236.

Transportando essa necessidade à realidade do sistema tributário


brasileiro e tendo em vista que a simplificação se volta à facilitação da
arrecadação fiscal, cumpre analisar se a busca obsessiva por esse objetivo
é compatível ou não com os direitos do contribuinte e com os princípios
constitucionais do nosso ordenamento.

A noção de justiça tributária inserta no artigo 3º, inciso I, da


Constituição é alcançada com a observância do princípio da capacidade
contributiva, derivado do princípio da isonomia, segundo o qual,
genericamente falando, a carga tributária deve ser igualmente distribuída
entre os cidadãos. Em termos ainda mais genéricos, a justiça tributária
implica uma tributação de boa qualidade, instrumentalizada por leis claras
e um sistema tributário prático e eficiente que seja capaz de prevenir a
sonegação, mas que respeite a qualidade de vida e os direitos do
contribuinte237.

No entanto, ainda que a noção de justiça tributária seja indissociável da


praticabilidade tributária, deve-se encontrar um ponto de equilíbrio entre

1256
esses dois fatores. Na hipótese de confronto entre eles, prevalece o respeito
à isonomia e à capacidade contributiva, pois a adoção da praticabilidade
não pode ter como objetivo outro que não a efetivação desses princípios e,
como consequência, o alcance da justiça fiscal. Em outras palavras, a
praticabilidade não se justifica, isoladamente, quando não promove a
justiça fiscal ou, ainda pior, quando é adotada como instrumento contrário
a esse interesse.

Sob a perspectiva da praticabilidade da arrecadação, a tributação sobre


o consumo é tida pela Administração Tributária como mais eficiente em
relação à tributação sobre a renda. Isto se deve à maior facilidade de
cobrança dos tributos sobre o consumo, cujo valor da exação já está
embutido no preço da mercadoria ou serviço. A predileção por essa forma
de cobrança tem a vantagem de evitar a evasão tributária, uma vez que
coíbe em parte que os contribuintes se furtem à realização do fato gerador.
A ideia é que a tributação indireta teria o mérito de captar rendas auferidas
por meio de fontes alternativas, porém mantidas na informalidade, situação
bastante comum em famílias que declaram baixa ou nenhuma renda e,
portanto, não submetem esses valores à tributação238. A captação dessa
renda se dará não no momento da percepção dos rendimentos, mas quando
esta se manifestar pelo consumo de bens e serviços, ocasião na qual é
consideravelmente mais difícil furtar-se à arrecadação.

Ademais, a eficiência desses tributos é medida pela inelasticidade na


demanda por bens de amplo consumo, adquiridos por uma parcela
considerável da população, para a qual não há uma diminuição de
consumo frente a uma maior imposição tributária239.

Por fim, há quem enxergue ainda uma vantagem arrecadatória no fato


de a própria sistemática de cálculo e cobrança dos tributos incidentes sobre

1257
o consumo muitas vezes inibir a percepção do pagamento do tributo.

Voltando ao contexto da economia digital, mais flexível à necessidade


da presença física em um determinado mercado, o produto da tributação
indireta assume um papel relevante no orçamento dos países inseridos
nesse cenário. Com efeito, em decorrência da internacionalização dos
mercados, aos grandes atores do setor digital é facultado transferir suas
sedes e demais estabelecimentos físicos para outras jurisdições, alocando
seus lucros em jurisdições de menor carga tributária, o que impacta a
arrecadação dos países nos quais possuem atuação comercial significativa.

A constatação das diversas jurisdições que se voltaram ao incremento


da tributação sobre o consumo em detrimento da renda é que seus
ordenamentos tributários internos são falhos em captar a verdadeira
capacidade contributiva de empresas que atuam nesse mercado e que se
valem de mecanismos existentes na legislação de imposto sobre a renda
para diminuir sua carga tributária, erodindo as bases da arrecadação do
país.

Contudo, afirmar que a “praticabilidade”, para usar o termo que no


Brasil passou a exprimir um princípio, é um instrumento de justiça fiscal
depende da dose em que esta é aplicada ao caso concreto. Existe, com
efeito, um limite para que a praticabilidade possa ser considerada como
justa e generalize a tributação de forma racional, aliando a eficácia à
capacidade contributiva240.

Deve-se atentar ao fato de que o incremento da praticabilidade tributária


é acompanhado pelo efeito perverso do avanço da regressividade em
matéria tributária, que se verifica quando as alíquotas efetivas do tributo se
reduzem conforme o aumento da capacidade contributiva.

1258
Este efeito regressivo indesejável é imediato no caso dos tributos sobre
o consumo. Nessa modalidade de tributação, o tributo não incide sobre o
produto ou serviço consumido em si, mas sobre a renda manifestada no ato
do consumo, e o percentual dessa renda que é destinado ao consumo é
decrescente conforme aumenta a riqueza do contribuinte241.

A afirmação acima é facilmente visualizada quando se imagina que um


indivíduo com poucos recursos empregará toda a sua renda em consumo,
e, portanto, ela será alcançada pela tributação em maior grau, enquanto um
indivíduo com uma renda maior destinará uma parte maior dela à
poupança.

Pode parecer contraditório, mas, por um ângulo, a tributação indireta


sobre o consumo sempre será uma forma de tributação da renda das
famílias, na medida em que a renda seja “consumida” na aquisição de bens
e serviços. Ao contrário da mecânica de tributação clássica de renda,
todavia, a tributação da renda no consumo tende a nivelar a carga tributária
entre contribuintes de baixa e alta renda. Daí dizer-se que um sistema
tributário pode ser mais ou menos perverso de acordo com a sua tendência
à regressividade quando privilegia a tributação sobre o consumo.

Um certo grau de regressividade da tributação indireta é inevitável e se


manifesta em todo o mundo, pois aqueles com maior capacidade
contributiva sempre terão menor perda financeira ao consumirem
mercadorias e serviços em relação àqueles que têm menor capacidade.
Todavia, o fato de o Brasil já concentrar a tributação sobre o consumo em
detrimento da renda, tributada progressivamente, torna a tributação
nacional, no cômputo da sua totalidade, regressiva242.

1259
O resultado é que, mesmo a carga tributária no Brasil sendo
nominalmente mais baixa do que a de alguns países da OCDE243, a má
distribuição entre o produto da tributação indireta e o restante das fontes de
arrecadação do Brasil, além de inviabilizarem a realização do princípio da
capacidade contributiva e justiça fiscal em sua plenitude, contribuem para
a concentração da renda e aprofundam a desigualdade social244.

Os gráficos abaixo, elaborados a partir de dados de arrecadação do


Brasil e da OCDE analisados pela Receita Federal, demonstram a
comparação entre a carga tributária nacional e a de alguns dos membros da
organização com a maior carga tributária em 2014. Ainda que algumas das
espécies tributárias existentes em cada país possam diferir, como, por
exemplo, aquelas relacionadas ao financiamento da previdência, que não
existem em algumas jurisdições, bem como a metodologia de compilação
desses tributos em cada país possa variar, a carga tributária total do Brasil
está a uma considerável distância de países como Suécia, Áustria, Itália,
Finlândia, Bélgica, França e Dinamarca:

Fonte: Elaboração própria. Dados da Receita Federal do Brasil (2014).

Entretanto, quando a comparação entre o Brasil e esses mesmos países


se dá tendo por base a incidência, observa-se que, para a base de bens e

1260
serviços, a tributação brasileira supera com facilidade a carga tributária
dos demais países analisados:

Fonte: Elaboração própria. Dados da Receita Federal do Brasil (2014).

Sem receio de relatar o óbvio, o quadro é de um país cuja matriz de


incidência tributária já é fortemente concentrada sobre o consumo,
excessivamente regressiva, o que é em parte resultado da sobreposição de
tributos sobre o consumo em diversos níveis federativos e em parte acirra
conflitos de competência, muitos ainda sem solução. Este ponto é
especialmente preocupante quando analisado à luz do fortalecimento da
economia digital, cujos novos modelos de negócios são tão inovadores
quanto são inovadores os seus conteúdos tecnológicos.

3. CONCLUSÕES

A relevância do consumo na economia digital vem chamando a atenção


dos formuladores de políticas fiscais para a necessidade de iniciativas,
tanto internacionais quanto internas em matéria de tributação dirigidas a
esse setor. Com a progressiva dispensa da presença física e a crescente
valorização da presença digital na economia, essas iniciativas em geral

1261
estão voltadas a um maior protagonismo dos tributos sobre o consumo nas
receitas tributárias dos países, ao passo que a importância da tributação
sobre a renda é gradativamente reduzida.

Por diversas questões relacionadas principalmente ao controle da


arrecadação, à inevitabilidade e elasticidade da sua mecânica de apuração,
um sistema de tributação que privilegia os tributos sobre o consumo em
detrimento dos tributos sobre a renda tende a ser mais eficiente em termos
de arrecadação quando comparado a sistemas que privilegiam impostos
sobre a renda, e pode ter um importante papel no combate a práticas
tributárias abusivas e tentativas de evasão fiscal. Por outro lado, sempre
que o peso da tributação sobre o consumo tem maior relevância no
cômputo geral da arrecadação, a tendência é encontrar um sistema mais
regressivo, cujo efeito é especialmente perverso para os contribuintes de
baixa renda.

Sob essa perspectiva, há pouco ou nenhum espaço para a acentuação da


tributação indireta no Brasil, que historicamente privilegia tributos sobre
bens e serviços, com acentuada regressividade e em prejuízo da
capacidade contributiva, da isonomia e da justiça fiscal.

Diversas questões relacionadas ao atual sistema tributário agravam esse


quadro, tais como os citados conflitos de competência tributária e as
distorções causadas pela enorme e desordenada quantidade de benefícios
fiscais que carregam de insegurança e inconsistências o sistema.

Não fosse já pelos inúmeros outros motivos conhecidos de todos, uma


harmonização interna da legislação entre os entes federativos, a reforma
tributária, é fundamental e urgente para que o sistema tributário brasileiro
alcance de forma mais justa e eficiente as novas manifestações de riqueza

1262
que se diversificam com o desenvolvimento de novas tecnologias e suas
formas de exploração.

Objetivamente falando, ao avaliarmos a conveniência da concentração


da tributação sobre o consumo, em detrimento da tributação sobre a renda,
nos deparamos com um sistema já perversamente regressivo, em que as
distorções e os conflitos de competência já existentes e os que
inevitavelmente surgirão dos novos modelos de negócio na economia
digital poderiam ser irreversivelmente acentuados e agravados sem
justificativa aparente.

1263
A Competitividade no Mercado Global e a
Tendência à Migração para um Sistema de
Tributação Territorial
245
Ramon Tomazela Santos

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo propõe-se a analisar a atual tendência de migração


para um sistema de tributação territorial da renda que vem sendo seguida
por países europeus e que está em debate nos Estados Unidos em razão do
projeto de reforma tributária aprovado pelo Congresso norte-americano no
último dia 20 de dezembro de 2017 e que aguarda sanção pelo Presidente
Donald Trump246-247. Essa inclinação de certos países para um regime de
territorialidade parcial na tributação da renda pode ser atribuída não apenas
à crescente integração do mercado global na era da “economia digital”,
mas também à acirrada competição fiscal entre os Estados em busca de
arrecadação, sobretudo em um contexto de crise econômico-financeira
mundial.

Para tanto, este estudo abordará as principais razões que podem ser
apontadas para a tendência de migração para um regime de tributação
territorial da renda, para então examinar os desafios que precisam ser
enfrentados pelos Estados para a adaptação de seus sistemas tributários a
essa nova experiência internacional, especialmente em relação à
necessidade de introdução de conjunto sistemático e orgânico de regras
para a determinação da fonte dos rendimentos, de aprimoramento da
definição de estabelecimento permanente, bem como de fortalecimento das
regras de preços de transferência.

1264
2. A TENDÊNCIA DE MIGRAÇÃO PARA UM MODELO DE
TERRITORIALIDADE

Segundo relato de Reuven Avi-Yonah, ao longo da história dos


sistemas tributários, os Estados Unidos tradicionalmente guiaram os
demais países desenvolvidos na adoção de um regime de tributação
universal da renda dos contribuintes, sejam pessoas físicas, sejam pessoas
jurídicas. Foi assim que, em 1962, durante o governo do presidente John F.
Kennedy, os Estados Unidos editaram as primeiras regras de “Controlled
Foreign Corporation” (CFC), conhecidas como “Subpart F” e inseridas
na Seção 956 (c)(1)(C) do “Internal Revenue Code” norte-americano, que
depois se propagaram para diversos países do mundo, como Alemanha
(1972), Canadá (1975), Japão (1978), França (1980) e Reino Unido
(1984)248.

Entretanto o cenário acima começou a ser alterado entre 1994 e 2006,


quando o governo norte-americano adotou medidas para suavizar a rigidez
de suas regras de CFC.

Na mesma época, a Corte Europeia de Justiça, no julgamento do caso


“Cadbury Schweppes” (C-196/04), decidiu que as regras de tributação
automática dos lucros do exterior apenas podem alcançar operações
artificiais, sob pena de violação das liberdades fundamentais, em especial
o princípio da liberdade de estabelecimento249. Com isso, a Corte Europeia
de Justiça passou a impor severas limitações à aplicação de regras de CFC,
que deveriam alcançar apenas estruturas artificiais utilizadas pelos
contribuintes, que não reflitam a realidade econômica e que tenham como
único objetivo a obtenção de economia fiscal.

Mais recentemente, a proposta de reforma tributária aprovada pelo


Congresso norte-americano preconiza o retorno a um sistema de

1265
territorialidade mitigada, com isenção para os dividendos distribuídos por
entidades residentes no exterior250-251.

Em linhas gerais, o plano de reforma tributária aprovado nos Estados


Unidos propõe a redução da alíquota de imposto de renda das pessoas
jurídicas de 35% para 21%, juntamente com a mudança para um sistema
de tributação territorial e a introdução de um regime especial de tributação
para estimular a repatriação de lucros represados no exterior por
multinacionais norte-americanas.

Os méritos das medidas aprovadas pelo Congresso norte-americano


podem ser facilmente identificados. A alta alíquota de imposto de renda
das pessoas jurídica cobrada pelos Estados Unidos estimula estratégias de
planejamento tributário internacional, de inversão da estrutura societária,
de manipulação de preços de transferência e de esquemas para o
aproveitamento de crédito de imposto de renda pago no exterior, o que
resulta em custos de conformidade extremamente elevados em relação à
arrecadação fiscal efetivamente obtida pelo governo norte-americano com
os lucros do exterior. Atualmente, os Estados Unidos têm a maior alíquota
de imposto de renda corporativo entre os países da OCDE, cujas taxas
médias de imposto de renda corporativo variam entre 20% e 30%. Assim,
a concorrência fiscal pressiona o governo norte-americano a reduzir a sua
alíquota atual de 35%252.

À primeira vista, pode parecer que a alíquota de imposto de renda das


pessoas jurídicas cobrada pelos Estados Unidos não é um problema real,
pois as multinacionais norte-americanas são capazes de reduzir as suas
alíquotas efetivas a níveis muito baixos. Tanto é assim que o próprio
gatilho do Projeto BEPS foi a indignação da opinião pública acerca das
baixas alíquotas de imposto de renda suportadas pelas multinacionais

1266
norte-americanas em pleno cenário de crise econômica, como Apple,
Google, GE, Starbucks, entre outros.

Além disso, sabe-se que várias multinacionais de países europeus


suportam uma alíquota de imposto de renda efetiva mais elevada que as
multinacionais norte-americanas similares, independentemente do sistema
de territorialidade parcial em vigor em países da União Europeia, por meio
dos regimes de isenção para os dividendos provenientes do exterior.

No entanto, apesar dos aspectos acima mencionados, é inegável que a


alíquota de imposto de renda das pessoas jurídicas cobrada pelos Estados
Unidos afeta o comportamento econômico das multinacionais norte-
americanas de forma prejudicial para o crescimento econômico e para o
sistema tributário como um todo. Assim, a redução da alíquota de imposto
de renda das pessoas jurídicas, combinada com esforços para suprimir
lacunas exploradas por contribuintes, parece ser um passo razoável na
tentativa de recuperar o sistema tributário dos Estados Unidos, que está no
pior dos dois mundos: não arrecada efetivamente com a tributação dos
lucros do exterior e, ao mesmo tempo, não se beneficia com os lucros que
ficam represados no exterior, que deixam de ser investidos em seu
mercado interno.

Neste contexto, percebe-se que o governo norte-americano acredita que


uma mudança para um regime de territorialidade parcial pode reduzir
significativamente os problemas causados por estratégias de elisão fiscal
internacional, planejamento tributário agressivo, transferência artificial de
lucros e inversões de estruturas societárias, além de eliminar os supostos
impactos negativos do sistema de tributação em bases universais para a
competitividade internacional das multinacionais norte-americanas e para

1267
os Estados Unidos, em razão do claro desestímulo à repatriação dos lucros
auferidos no exterior.

As principais razões que podem ser apontadas para a tendência de


migração para um regime de tributação territorial da renda são as
seguintes:

i) a competição fiscal internacional;


ii) as operações de inversão da estrutura societária;
iii) o impacto negativo para competitividade das empresas no cenário global;
iv) os benefícios socioeconômicos colaterais da repatriação de lucros.

A seguir, passa-se a examinar cada razão indicada acima.

2.1. A competição fiscal internacional

A concorrência fiscal internacional é um fenômeno inerente à


coexistência de Estados com sistemas tributários autônomos e distintos no
cenário internacional. A globalização e a mobilidade da renda expandiram
as oportunidades para a migração dos fatores de produção e o
deslocamento do capital, por meio da alocação de empreendimentos em
outros Estados253. Os Estados experimentam os efeitos econômicos nocivos
da competição fiscal, sobretudo em razão da adoção de práticas para a
atração de capitais por Estados estrangeiros.

Nesse contexto, para conter o avanço da perda de arrecadação


provocada pela competição fiscal, vários Estados passaram a formular
políticas tributárias unilaterais para mitigar os efeitos econômicos nocivos
decorrentes do deslocamento volátil de investimentos e capitais, dentre as
quais se destaca, para os fins do presente estudo, a isenção de imposto de
renda sobre lucros e dividendos provenientes de investimentos no exterior.

1268
Além disso, o fato de grupos econômicos multinacionais exercerem as
suas atividades em diferentes jurisdições, como uma unidade econômica
integrada, facilitou a transferência de suas sedes para outros Estados
soberanos, com sistemas tributários mais atrativos254.

Assim, no atual estágio do desenvolvimento econômico, em que


empresas multinacionais apresentam cada vez maior mobilidade e a
migração da sede da pessoa jurídica pode proporcionar externalidades
positivas, é natural a tendência de retorno à territorialidade mitigada, por
meio do relaxamento das regras de CFC e da concessão de isenção de
imposto de renda para os lucros e dividendos provenientes de
investimentos no exterior255.

2.2. As operações de inversão da estrutura societária

Sabe-se que a elevada alíquota de imposto de renda da pessoa jurídica,


combinada com o regime de tributação dos lucros em bases universais,
estimula a adoção de estratégias de planejamento tributário, como a
inversão da estrutura societária do grupo econômico, na qual a sociedade
matriz (“parent company”) de um grupo econômico com sociedades
controladas e subsidiárias no exterior é substituída no topo da cadeia de
participações societárias por uma sociedade constituída no exterior, em um
país sem regras de CFC.

Essas operações de inversão da estrutura societária tornaram-se um


problema político delicado nos Estados Unidos a partir de 2002, quando a
empresa Stanley Works, uma fabricante líder de ferramentas industriais,
anunciou seu plano de expatriação para as Bermudas256. Como reação, o
Congresso norte-americano promulgou uma regra antielisiva específica257,

1269
para coibir as operações de inversão realizadas por motivações de cunho
fiscal258.

Entretanto é preciso reconhecer que a maior parte dos países do mundo


ainda não adota regras para prevenir a inversão de estruturas societárias.
Assim, a falta de regras contra as operações de inversão, combinada com a
ausência de coordenação entre os países para a adoção de um padrão
comum para a estruturação das regras de CFC, acaba atraindo as empresas
multinacionais para os Estados que não possuem regras de CFC ou aqueles
que seguem regras de CFC mais brandas, que alcançam apenas situações
abusivas.

Diante disso, percebe-se que a migração para um regime de tributação


parcialmente territorial, com isenção de imposto de renda para os lucros e
dividendos provenientes do exterior, pode reduzir significativamente os
riscos de operações de inversão.

2.3. O impacto negativo para competitividade das empresas no cenário global

A adoção de um sistema de territorialidade parcial permite que o Estado


da residência estimule as incursões de suas pessoas jurídicas no exterior,
reduzindo a sua carga tributária total em caso de repatriação de lucros para
as sociedades controladoras259. Ao consagrar a neutralidade de importação
de capitais, o método da isenção reconhece que os seus contribuintes
podem estar atuando no exterior em países com diferentes graus de
desenvolvimento e evita que a tributação residual no Estado da residência
nivele a carga tributária de contribuintes que não estão em situações
similares260. Assim, o sistema de territorialidade parcial pode ser visto
como uma forma de apoio às pessoas jurídicas que operam no exterior,
contribuindo para a sua competividade no plano internacional261.

1270
Por outro lado, a tributação imediata dos lucros auferidos no exterior,
por meio de regras de tributação em bases universais excessivamente
rígidas e abrangentes, coloca as multinacionais de determinado país em
uma situação de desvantagem competitiva em comparação com seus
concorrentes que adotam um regime de territorialidade parcial262.

O problema da competitividade surge porque a pessoa jurídica que


decide efetuar um investimento produtivo em outro país deverá pagar, às
autoridades fiscais locais, o imposto de renda devido com base na alíquota
doméstica. Ocorre que, por estar situada em um Estado que adota um
regime de tributação automática dos lucros auferidos no exterior, como é o
caso do Brasil, essa pessoa jurídica deverá recolher o imposto de renda
corporativo devido no seu Estado de residência sobre os lucros do exterior,
independentemente de qualquer distribuição, com direito ao desconto de
crédito em relação ao imposto de renda pago no exterior, desde que
atendidos os requisitos legais263.

De todo modo, cabe pontuar que a principal objeção contra as regras de


CFC, que repousa nos seus efeitos econômicos nocivos para a
competitividade das empresas nacionais que atuam no exterior, apenas se
verifica nos casos de adoção unilateral. Como exemplo, o problema da
rigidez do regime brasileiro de tributação em bases universais, previsto na
Lei n. 12.973/2014, reside justamente em sua adoção isolada pelo Brasil,
que acaba por prejudicar a expansão das empresas brasileiras que atuam no
exterior. Porém, se todos os concorrentes das empresas brasileiras também
estivessem sujeitos à tributação residual de seus lucros no Estado de
residência da sociedade matriz, o impacto na competitividade voltaria a
ficar restrito às diferenças de alíquotas entre os países, que é um problema
inerente à soberania dos Estados264.

1271
2.4. Os benefícios socioeconômicos colaterais da repatriação de lucros

A isenção concedida para os lucros e dividendos provenientes do


exterior tem o condão de fomentar o desenvolvimento do mercado interno
e o crescimento econômico. Assim, há benefícios socioeconômicos
colaterais decorrentes da adoção de um regime de territorialidade parcial,
uma vez que o fortalecimento da atividade econômica pode contribuir para
a elevação dos níveis de empregos, bem como para o aumento dos salários
pagos aos funcionários das multinacionais que atuam no mercado
internacional. Aliás, é justamente isso o que espera o Presidente Donald
Trump com a sua proposta de reforma tributária recentemente aprovada
pelo Congresso norte-americano.

Assim, a potencial perda de arrecadação provocada pelo regime de


territorialidade parcial pode ser compensada com os resultados positivos
obtidos em longo prazo, assim como ocorre na maior parte dos casos de
renúncia fiscal por meio de isenções.

Nessa linha, a cobrança de imposto de renda da pessoa jurídica sobre os


lucros auferidos no exterior, por meio de um regime de tributação em
bases universais, pode resultar em efeitos adversos para economia, como a
retenção dos lucros no Estado estrangeiro, sem distribuição aos sócios ou
acionistas da entidade estrangeira. Logo, a adoção de um regime de
territorialidade parcial pode evitar que a lei tributária crie distorções na
gestão financeira da sociedade, estimulando a retenção de lucros acima do
ponto de equilíbrio para o reinvestimento dos resultados na atividade
empresarial.

Daí se dizer que a retenção de lucros no exterior, apenas para evitar a


cobrança de imposto de renda sobre os valores repatriados, pode afetar a

1272
chamada alocação ótima de recursos financeiros, pois, como os lucros
permanecem no âmbito da sociedade no exterior, os sócios ou acionistas
não podem utilizar os dividendos recebidos para outras finalidades
econômicas. Segundo Joseph E. Stiglitz, a retenção de lucros no âmbito da
pessoa jurídica pode diminuir a eficiência econômica das empresas, tendo
em vista que os seus administradores terão uma grande quantidade de
recursos financeiros retidos, o que exigirá menos eficiência na
administração e nas decisões empresariais265.

3. OS PROBLEMAS DA MIGRAÇÃO PARA UM REGIME DE


TERRITORIALIDADE PARCIAL

De acordo com Reuven Avi-Yonah, a migração para um regime de


territorialidade parcial pode estimular ainda mais o uso de estratégias para
a transferência artificial de lucros para o exterior, que poderão ser
posteriormente repatriados sem incidência de imposto de renda. Para o
autor, o maior desestímulo à adoção de expedientes para a alocação
artificial de lucros no exterior advém da dificuldade de repatriar os
recursos para o investidor, justamente em razão da incidência de imposto
de renda sobre os dividendos distribuídos. Dessa forma, caso a lei
tributária passe a conceder isenção para os lucros e dividendos
provenientes do exterior, as empresas multinacionais terão um incentivo
econômico ainda maior para transferir lucros ou atividades para outros
Estados, pois será possível repatriar os resultados auferidos no exterior
sem tributação no país de origem do investimento266.

Logo, a migração para um sistema de tributação territorial requer o


fortalecimento das regras de determinação da fonte para certos tipos de
rendimento, o aperfeiçoamento da definição de estabelecimento

1273
permanente, bem como o endurecimento das regras sobre preços de
transferência267, como será demonstrado a seguir.

3.1. Ausência de conjunto sistemático e orgânico de regras para a


determinação da fonte dos rendimentos

Em linhas gerais, a fonte do rendimento corresponde a um critério


adotado pelo país para determinar o alcance da lei tributária a partir de um
elemento de conexão objetivo. Enquanto o critério da residência está
fundado em elemento de conexão subjetivo, o critério da fonte baseia-se
em aspecto objetivo, atrelado à própria situação tributável.

No âmbito da doutrina, a fonte do rendimento pode ser analisada a


partir de dois aspectos distintos: fonte de produção e fonte de
pagamento268.

A fonte de produção da renda tem índole econômica, sendo identificada


a partir do nexo causal entre o substrato econômico e o fato que o
determina. Assim, o conceito de fonte de produção refere-se ao local
(limite territorial) em que o rendimento foi efetivamente gerado,
alcançando os resultados produzidos ou derivados de atividade exercida no
território de determinado Estado. Logo, a fonte de produção demarca o
local de ocorrência do fato jurídico que produziu o rendimento a ser
tributado269.

Por outro lado, a fonte de pagamento estabelece conexão com o Estado


de onde provêm os recursos financeiros utilizados para o pagamento do
rendimento. Como os recursos necessários para o pagamento do
rendimento devido ao não residente devem ser extraídos do patrimônio de
um titular, esse critério estabelece a conexão entre o rendimento e o Estado

1274
competente para a sua tributação a partir da localização da fonte de
pagamento270.

Embora os dois elementos, por vezes, possam estabelecer conexão


objetiva com o mesmo Estado, não é raro que a fonte de produção e a fonte
de pagamento estejam localizadas em jurisdições distintas. Além disso,
nada impede que um mesmo ordenamento jurídico adote diferentes
elementos de conexão, de acordo com as circunstâncias. Assim, o Estado
poderá adotar, simultaneamente, o critério da residência, com o objetivo
de tributar todos os residentes, independentemente da localização, da
condição jurídica ou da nacionalidade da fonte do rendimento, bem como
o critério da fonte, para alcançar os rendimentos produzidos (fonte de
produção) ou pagos (fonte de pagamento) por fonte local,
independentemente da residência do seu beneficiário.

Vale registrar, ainda, que a definição da fonte do rendimento deve ser


objeto de análise casuística por parte do intérprete, a partir do exame de
cada situação concreta à luz da legislação interna do país. Isso porque o
Estado pode deixar de adotar um critério único e uniforme para todas as
classes de rendimentos passíveis de imposição fiscal.

No Direito interno brasileiro, o artigo 43, parágrafo 1º, do Código


Tributário Nacional (CTN) outorga ampla margem de liberdade ao
legislador ordinário, ao estabelecer que a incidência do imposto de renda
“independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização,
condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de
percepção”. Assim, o legislador ordinário tem liberdade para eleger os
elementos de conexão que servirão para vincular determinados
rendimentos ao território nacional.

1275
Entretanto, salvo em situações específicas, o Brasil não adota regras
claras para a determinação da fonte dos rendimentos, o que pode suscitar
dúvidas em casos concretos. Como exemplo, imagine-se que uma pessoa
jurídica domiciliada no Brasil receba rendimentos oriundos de licença de
uso de marca para residentes no exterior. Caso a fonte do rendimento
esteja no Brasil, o valor recebido por essa pessoa jurídica deve ser
oferecido à incidência do IRPJ e da CSLL regularmente, segundo o regime
de competência. Por outro lado, caso a fonte do rendimento esteja no
exterior, o valor recebido por essa pessoa jurídica deve ser oferecido à
incidência do IRPJ e da CSLL apenas em 31 de dezembro de cada ano-
calendário.

Nesse sentido, o artigo 25 da Lei n. 9.249/95 determina que os lucros,


rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior devem ser
computados na determinação do lucro real por ocasião do levantamento do
balanço de 31 de dezembro de cada ano. Veja-se:

Art. 25. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serão


computados na determinação do lucro real das pessoas jurídicas correspondente ao
balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano. (Destaques do autor.)

Como se pode antever, a dificuldade que surge, no exemplo apresentado


acima, consiste em saber se o valor recebido pela pessoa jurídica no Brasil,
em razão do pagamento de royalty por um residente em outro Estado
soberano, em decorrência de contrato de licença de uso de marca, pode ser
considerado um rendimento auferido no exterior. Essa dificuldade surge
justamente em razão da ausência de regra clara determinando a fonte do
rendimento.

A expressão “rendimento auferido no exterior” parece indicar que a


fonte de produção da renda deve estar localizada em outro Estado. Assim,

1276
para fins de aplicação do artigo 25 da Lei n. 9.249/95, é insuficiente que a
mera fonte de pagamento esteja no exterior.

Apenas para que fique claro o raciocínio, imagine-se que uma pessoa
jurídica no Brasil possua um data center no País e decida disponibilizá-lo
para uma pessoa não residente para o armazenamento e processamento de
dados, por acesso remoto. O valor da remuneração recebida por essa
pessoa jurídica no Brasil será desembolsado por uma fonte de pagamento
localizada no exterior, mas a fonte econômica de produção da renda, que
corresponde à infraestrutura para armazenamento e processamento de
dados, está localizada no Brasil. Assim, esse rendimento deverá ser
tributado pelo regime de competência, pois não se enquadra na hipótese
normativa do artigo 25 da Lei n. 9.249/95. Por outro lado, no mesmo
exemplo acima, caso a pessoa jurídica no Brasil disponibilize para um não
residente um data center localizado no exterior, o valor da remuneração
poderá ser considerado um rendimento auferido no exterior271.

Note-se que essa interpretação foi adotada pela Coordenação do


Sistema de Tributação (COSIT) nas razões de decidir da Solução de
Consulta COSIT n. 94, de 3 de abril de 2014, da qual se transcreve a
seguinte passagem:

Isso posto, torna-se claro que a legislação pertinente à matéria analisada não
elegeu o local da fonte pagadora como critério para a caracterização da origem
do lucro. Tanto é verdade que nos casos de exportação de mercadoria e de
prestação direta de serviço no exterior, o pagamento efetuado como contrapartida,
mesmo sendo proveniente do exterior, não enseja hipótese de obrigatoriedade de
apuração do lucro real. (Destaques do autor.)

A bem da verdade, a localização da exata fonte de produção da renda é


um tema extremamente controvertido, tanto entre economistas, quanto
entre juristas.

1277
Em caráter geral, é possível dizer que a fonte de produção dos royalties
devidos pela licença de uso de marca está localizada no Estado de
desenvolvimento e registro da propriedade intelectual, por se tratar de
remuneração do ativo intangível desenvolvido. Afinal, é o criador da
marca que suporta os riscos da sua desvalorização, os custos de sua
manutenção, os investimentos para sua divulgação, bem como os gastos
para a sua proteção, contribuindo, assim, para a geração da renda. Assim, a
origem da renda relativa ao uso da marca está localizada no Estado em que
a marca foi desenvolvida e registrada, especialmente porque, sem o
desenvolvimento da marca, sequer existiria a possibilidade de
licenciamento272.

Nessa linha, nos países estrangeiros que licenciam a marca, o


rendimento que surge está relacionado à exploração de atividade
econômica mediante o uso da marca (i.e., venda de bens ou prestação de
serviços com a marca licenciada). Esse rendimento tem natureza de lucro
ou resultado de atividade econômica, que não se confunde propriamente
com o royalty que remunera o uso da marca. Sem dúvida, o royalty a ser
pago para a pessoa jurídica no Brasil será retirado dos valores recebidos
com essa atividade econômica desenvolvida pelas empresas sediadas no
exterior, mas a sua fonte de produção econômica está relacionada ao
Brasil.

Note-se que o fato de a marca licenciada também estar registrada no


Estado onde está sendo explorada comercialmente por terceiros não altera
o raciocínio acima, pois o critério decisivo, sob o ponto de vista da fonte
de produção, é onde a marca foi desenvolvida. Do contrário, bastaria
alterar o país de registro da marca para alterar a sua fonte de produção, o

1278
que não condiz com a ideia de identificar a origem da renda e a sua
pertinência econômica.

Dessa forma, como os valores recebidos pela pessoa jurídica no Brasil


remuneram o direito de utilizar uma marca que foi desenvolvida e
registrada no País, é possível dizer que a sua fonte de produção está
situada no território nacional, independentemente da sua utilização e do
registro adicional realizado nos outros Estados estrangeiros.

Portanto a produção do elemento intelectual é o aspecto predominante


na origem do royalty. Isso não impede, porém, o reconhecimento de que a
utilização da marca contribui para a produção da renda, por se tratar de um
fenômeno econômico que não pode ser isolado e destacado. A fonte de
produção predominante está no Estado onde a marca foi desenvolvida e o
seu titular suporta os riscos da sua desvalorização, os custos de sua
manutenção, os investimentos para sua divulgação, bem como os gastos
para a sua proteção, como mencionado acima.

Seja como for, é possível reconhecer que, economicamente, o mercado


também contribui para a obtenção da renda, o que causa controvérsias
doutrinárias em relação ao tema. Segundo Reuven Avi-Yonah, é
comumente aceita a ideia de que parte dos rendimentos relativos aos
royalties deve ser alocada ao Estado onde a marca ou a patente foi
desenvolvida, em adição ao mercado onde o produto final foi vendido273.

O próprio autor menciona que os Estados Unidos atribuem, em suas leis


domésticas, a fonte de produção do royalty ao país onde o intangível foi
utilizado, mas pondera que isso decorre de um pleito das empresas
farmacêuticas norte-americanas, que desenvolviam as pesquisas de
medicamentos nos Estados Unidos e depois vendiam seus produtos ao

1279
redor do mundo. Caso a fonte de produção do royalty fosse alocada aos
Estados Unidos (onde o remédio foi desenvolvido), as empresas
farmacêuticas norte-americanas não poderiam aproveitar o crédito do
imposto de renda pago no exterior sobre esse rendimento274.

Ao contrário dos Estados Unidos, o direito positivo brasileiro não


consagrou um conjunto sistemático e orgânico de regras para a
determinação da fonte dos rendimentos, o que exige uma análise de cada
caso concreto, à luz de suas características econômicas e das regras
brasileiras que tratam da tributação de tais rendimentos275. Em vista disso,
inúmeras dificuldades podem surgir na determinação da fonte de um
rendimento, de modo que a adoção de um regime territorial (amplo ou
mitigado) de tributação depende da concepção, pelo legislador, de um
conjunto sistemático e orgânico de regras para a determinação da fonte dos
rendimentos.

3.2. Aprimoramento do conceito de estabelecimento permanente ou a adoção


de medidas substitutivas

Outra providência importante, para os países que migram para regimes


territoriais, envolve o fortalecimento das regras de estabelecimento
permanente, para evitar que o seu mercado interno seja explorado por
empresas multinacionais na condição de Estado da fonte, sem o pagamento
de imposto de renda, em razão da ausência de nexo sob a perspectiva das
regras atuais. Essa medida é necessária para a proteção da arrecadação
fiscal, bem como para evitar que as próprias subsidiárias ou controladas no
exterior exerçam atividades ou desenvolvam negócios no Estado da
sociedade matriz sem a superação do parâmetro necessário para a
caracterização de um estabelecimento permanente.

1280
Neste ponto, as medidas previstas na Convenção Multilateral do Projeto
BEPS parecem insuficientes para a efetiva proteção das bases tributáveis
de um Estado que migrou para um regime de territorialidade parcial. Isso
porque as alterações propostas na definição de estabelecimento
permanente limitam-se a combater as estratégias de planejamento
tributário comumente utilizadas pelos contribuintes para impedir a sua
caracterização em casos concretos, por meio de: (i) contratos de comissão
ou estratégias similares; (ii) utilização das isenções (i.e. lista negativa)
previstas para atividades específicas; e (iii) a divisão de contratos entre
diferentes contribuintes para evitar o período de tempo exigido para a
caracterização do estabelecimento permanente no Estado da fonte276.

Em razão do escopo limitado da Convenção Multilateral e do insucesso


da Ação 1 do Projeto BEPS, os países vêm adotando medidas unilaterais
descoordenadas para evitar a manipulação do conceito de estabelecimento
permanente, tais como o “Diverted Profits Tax”, no Reino Unido e na
Austrália, bem como o “Equalization Levy”, na Índia, que pretendem
tributar a renda gerada mediante a exploração dos seus mercados locais,
sem a necessidade de um teste de “presença econômica significativa”, tal
como ocorre com o conceito de estabelecimento permanente.

No Brasil, a noção de estabelecimento permanente é utilizada de forma


limitada, alcançando, basicamente, as vendas diretas realizadas no Brasil
por empresas estrangeiras, por meio de agente, representante ou
comissário residente no País277. As medidas defensivas para a tributação da
renda gerada pela exploração do mercado brasileiro envolvem,
fundamentalmente, a exigência de IRRF sobre os rendimentos de prestação
de serviços, bem como a previsão de que filiais, sucursais, agências ou
representações de pessoas jurídicas domiciliadas no exterior serão

1281
equiparadas às pessoas jurídicas sediadas no País para fins de tributação.
Assim, a migração para um regime de tributação territorial dependeria do
fortalecimento do sistema tributário brasileiro e de sua política de
tributação de não residentes.

3.3. O fortalecimento das regras de preços de transferência

O terceiro problema que surge na migração para um regime de


territorialidade (total ou parcial) reside na necessidade de fortalecimento
das regras de preços de transferência.

Como se sabe, a sistemática que rege o controle de preços de


transferência tem o propósito de evitar a erosão das bases tributáveis e a
transferência artificial de lucros por meio de operações internacionais entre
empresas associadas.

No cenário internacional, o controle de preços de transferência com


base no “padrão arm’s length”278 está consagrado nos mais de 3.000
acordos de bitributação atualmente existentes, baseados na Convenção
Modelo da OCDE. O artigo 9º da Convenção Modelo da OCDE permite a
realização de ajustes no lucro tributável da pessoa jurídica em razão de
transações realizadas entre empresas associadas, para a sua adequação ao
lucro que teria sido apurado caso a transação tivesse ocorrido entre partes
independentes.

Ocorre que as regras de preços de transferência baseadas nas diretrizes


da OCDE apresentam diversas falhas estruturais que dificultam a migração
para um regime territorial. Em apertada síntese, é possível elencar os
seguintes problemas:

i) falta de operações comparáveis para a identificação do preço parâmetro;

1282
ii) inexistência de um único resultado correto, tendo em vista que o resultado
“arm’s length” compreende uma faixa, que admite oscilações;
iii) elevados custos de conformidade e de fiscalização (v.g., o custo para
encontrar operações comparáveis é mais caro do que o ganho da transação);
iv) aumento da complexidade e sofisticação das operações internacionais (v.g.,
dificuldade de aplicação da análise funcional para operações na economia
digital);
v) vulnerabilidade das regras atuais em face das estratégias de transferência de
lucros envolvendo ativos intangíveis e a assunção contratual de riscos;
vi) ausência de precisão e segurança jurídica para os investidores, tendo em
vista que os resultados das aplicações das regras de preços de transferência
são imprevisíveis e os valores das autuações fiscais apenas aumentam;
vii) ineficiência dos métodos para capturar sinergias e outros resultados
decorrentes da integração de entidades em um grupo econômico
internacional;
viii) multinacionais atuam de forma integrada, desenvolvendo uma única
atividade econômica, o que afasta a lógica de tentar estabelecer um critério
de comparação com partes independentes;
ix) inexistência de coordenação efetiva entre os países para alinhar os resultados
de preços de transferência (v.g., procedimento amigável, acordos prévios de
preços de transferência e “tax rulings”);
x) altos custos envolvidos nos acordos prévios de preços de transferência
bilaterais ou multilaterais;
xi) falta de alinhamento entre as regras atuais de preços de transferência e o
rápido desenvolvimento do ambiente de negócios (a realidade econômica
mudou desde 1917, quando o “padrão arm’s lenght” foi concebido);
xii) inexistência de uma abordagem sólida para a identificação da criação de
valor, tal como proposto pela OCDE no âmbito do Projeto BEPS;
xiii) o grau de complexidade do “arm’s length” e das análises funcionais
exigidas chegou a um patamar que beira a irracionalidade.

Diante de todos os problemas apontados acima, percebe-se que há um


severo obstáculo à migração para um regime territorial, pois seria possível
manipular as regras de preços de transferência para permitir que
determinada renda seja gerada no exterior e, posteriormente, repatriar esse
lucro para o país de residência do investidor sem tributação, em virtude da
isenção de imposto de renda para os lucros e dividendos auferidos no
exterior.

1283
Neste cenário, as regras de tributação automática dos lucros do exterior
servem justamente para escorar as regras de preços de transferência,
capturando os lucros deslocados artificialmente para outros países, por
meio de operações que não foram adequadamente valoradas segundo os
métodos previstos nas regras domésticas de preços de transferência279.

No Brasil, as regras de preços de transferência introduzidas pela Lei n.


9.430/96 não apresentam as mesmas falhas estruturais das regras de preços
de transferência baseadas nas Diretrizes da OCDE, em virtude da adoção
de um regime distinto de controle.

De fato, as regras de preços de transferência foram introduzidas no


sistema tributário brasileiro com o objetivo de controlar a manipulação de
preços em transações realizadas com pessoas físicas ou pessoas jurídicas
vinculadas ou residentes em jurisdição com tributação favorecida ou em
regime fiscal privilegiado, evitando-se, com isso, o superfaturamento nas
operações de importação, bem como o subfaturamento nas operações de
exportação.

A grande diferença da lei brasileira, em comparação com a prática


internacional, reside no fato de que os métodos objetivos previstos na Lei
n. 9.430/96 estão baseados na fixação de margens predeterminadas de
lucro, na estipulação de zonas de segurança (“safe harbours”) e no
estabelecimento de restrições à comparabilidade livre, como forma de
reduzir a subjetividade e a incerteza na aplicação do Direito. Até mesmo
nos métodos comparativos, como o PIC e o PCI nas operações de
importação, bem como o PVEx e o PECEX nas operações de exportação, o
legislador tributário estabeleceu diversas restrições para diminuir a
amostra de preços comparáveis e o grau de subjetividade do aplicador do
Direito280.

1284
Ocorre que, apesar de a Lei n. 9.430/96 não apresentar as mesmas
vulnerabilidades das regras de preços de transferência da OCDE, devido
ao uso de margens de lucro predeterminadas, as regras de preços de
transferência brasileiras podem facilmente resultar em dupla tributação,
uma vez que o outro país pode deixar de fazer o ajuste correlativo quando
o ajuste fiscal determinado pela lei brasileira não corresponder ao “padrão
arm’s length”.

Isso ocorre porque o ajuste correlativo apenas é realizado na hipótese


em que o Estado comprova o desvio ao “padrão arm’s length”. Tanto é
assim que o Brasil não reproduz em seus acordos de bitributação o
parágrafo 2º do artigo 9º da Convenção Modelo da OCDE, que prevê a
realização do ajuste correlativo de preços de transferência para eliminar a
dupla tributação econômica da renda281. Como se sabe, o artigo 9º prevê
dois níveis distintos de ajustes: (i) o primeiro ajuste no lucro é realizado
para que a transação entre as empresas associadas reflita o valor de
mercado (“primary adjustment”); (ii) o segundo ajuste no lucro é realizado
pelo Estado de residência do beneficiário, para eliminar a dupla tributação
econômica do lucro ajustado no primeiro Estado (“correlative
adjustment”).

Essa omissão do parágrafo 2º do artigo 9º da Convenção Modelo da


OCDE, nos acordos de bitributação celebrados pelo Brasil, decorre das
particularidades das regras brasileiras de preços de transferência, que, na
maior parte dos métodos, utilizam margens predeterminadas de lucro e não
preveem a possibilidade de realização do ajuste correlativo.

Além disso, as regras de preços de transferência previstas na Lei n.


9.430/96 podem tributar excessivamente determinadas transações e tributar
insuficientemente outras, tendo em vista que as margens de lucro

1285
predeterminadas exigidas pelo método aplicável podem ser maiores ou
menores do que os lucros obtidos pelos contribuintes.

Diante disso, contata-se que o problema das regras brasileiras não está
na utilização das margens predeterminadas de lucros, que eliminam
diversos problemas encontrados nas diretrizes da OCDE de preços de
transferência, mas, sim, na impossibilidade de produção de prova em
contrário pelo contribuinte, o que dificulta a sua compatibilização com o
artigo 9º dos acordos de bitributação baseados na Convenção Modelo da
OCDE.

Dessa forma, para que a Lei n. 9.430/96 fosse plenamente compatível


com os acordos de bitributação celebrados pelo Brasil, o legislador
tributário deveria ter permitido que o contribuinte comprovasse que o
ajuste previsto nas margens predeterminadas não deve ser aplicado ao caso
concreto, tendo em vista que as operações contratadas observaram as
condições normais de mercado para aquele ramo de atividade. É dizer, o
contribuinte deveria ter a faculdade de comprovar que a operação
comercial ou financeira foi firmada em condições idênticas àquelas
praticadas por partes não relacionadas em condições análogas, de acordo
com o tipo de atividade exercida pela pessoa jurídica.

Neste contexto, é possível listar as deficiências da Lei n. 9.430/96:

i) impossibilidade de produção de prova em contrário pelo contribuinte, que não


consegue comprovar que a operação comercial ou financeira praticada
observa o padrão de mercado;
ii) escassez na variedade de margens de lucro, que deveriam captar as
especificidades de cada segmento econômico;
iii) elevado risco de dupla tributação econômica nas operações internacionais;
iv) não aplicação das regras de preços de transferência para os pagamentos de
royalties e de remuneração pela prestação de assistência técnica, científica ou

1286
administrativa, que estão sujeitos a restrições quantitativas para a dedução
das respectivas despesas;
v) ausência de ajuste correlativo de preços de transferência para evitar a dupla
tributação econômica da renda nas operações internacionais;
vi) não utilização do procedimento amigável para a realização de ajustes
correlativos ou para resolver conflitos na área de preços de transferência;
vii) falta de celebração de acordos prévios de preços de transferência com os
contribuintes e com outros Estados contratantes;
viii) limitações estruturais dos métodos brasileiros de preços de transferência,
que não se amoldam ou não capturam determinados tipos de operações
específicas, como aplicações financeiras, vendas de participações societárias,
contratos de garantia, transferências de intangíveis, entre outras operações.

Com tais anotações, conclui-se que tanto as regras de preços de


transferência baseadas nas diretrizes da OCDE, quanto as regras brasileiras
de preços de transferência previstas na Lei n. 9.430/96 apresentam diversas
falhas estruturais, o que dificulta significativamente o processo de
migração para um regime de tributação territorial da renda.

4. CONCLUSÕES

Como visto no presente estudo, as principais razões apontadas para a


tendência de migração para um regime de tributação territorial da renda
envolvem: a competição fiscal internacional e os seus impactos na
tributação da renda; as operações de planejamento tributário agressivo e,
em especial, as operações de inversão da estrutura societária; o impacto
negativo das regras de tributação automática dos lucros do exterior para a
competitividade das empresas no cenário global; os benefícios
socioeconômicos colaterais da repatriação de lucros.

Ocorre que a migração para um regime de territorialidade parcial pode


estimular ainda mais o uso de estratégias para a transferência artificial de
lucros para o exterior, que poderão ser posteriormente repatriados sem a
incidência de imposto de renda.

1287
O maior desestímulo à adoção de estratégias de alocação artificial de
lucros no exterior deriva da dificuldade de repatriar os recursos para o
investidor, justamente em razão da incidência de imposto de renda sobre
os dividendos distribuídos. Dessa forma, caso a lei tributária passe a
conceder isenção para os lucros e dividendos provenientes do exterior, as
empresas multinacionais terão um incentivo econômico ainda maior para
transferir lucros ou atividades para outros Estados, pois será possível
repatriar os resultados auferidos em outros países sem tributação residual
no país de origem do investimento.

Por essa razão, a migração para um sistema de tributação territorial


requer o fortalecimento das regras de determinação da fonte dos
rendimentos, o aprimoramento do conceito de estabelecimento permanente
ou de regras congêneres, bem como o endurecimento das regras de preços
de transferência.

O problema é que, tanto no Brasil, quanto na maior parte dos países do


mundo, não há conjunto sistemático e orgânico de regras para a
determinação da fonte dos rendimentos. A localização da exata fonte de
produção da renda é um tema extremamente controvertido, tanto entre
economistas, quanto entre juristas, de modo que cabe ao legislador de cada
Estado estabelecer um conjunto coerente de regras para disciplinar o tema.
Antes disso, a migração para um regime de tributação territorial pode ser
extremamente arriscada, ainda que apenas os lucros e dividendos
provenientes do exterior sejam alcançados pela isenção.

Da mesma forma, o conceito de estabelecimento permanente tem se


mostrado insuficiente para a proteção do mercado doméstico, sobretudo
em razão dos inúmeros avanços nos modelos de negócio adotados na
economia digital.

1288
Com relação aos preços de transferência, o fortalecimento de tais regras
é essencial para a migração para um regime de tributação territorial da
renda. Do contrário, será possível manipular as regras de preços de
transferência para permitir que determinada renda seja gerada no exterior
e, posteriormente, repatriar esse lucro para o país de residência do
investidor sem tributação, em virtude da isenção para os lucros
provenientes do exterior.

Neste ponto, o problema é que as regras internacionais de preços de


transferência, baseadas nas diretrizes da OCDE, apresentam diversas
falhas estruturais, que não foram resolvidas pelas Ações 8, 9 e 10 do
Projeto BEPS, que pretenderam alinhar os resultados das regras de preços
de transferência com a criação de valor. Esse aspecto corrobora o perigo
envolvido na migração para um sistema de tributação territorial.

De modo semelhante, no caso das regras brasileiras de preços de


transferência, apesar do uso de margens predeterminadas de lucros, as
regras de tributação em bases universais previstas na Lei n. 12.973/2014
servem justamente para escorar as regras de preços de transferência,
capturando os lucros deslocados para o exterior, principalmente quando o
lucro total obtido na operação ultrapassa a margem de lucro exigida pela
lei brasileira.

Por fim, as regras da Lei n. 12.973/2014 também suprem as limitações


estruturais dos métodos brasileiros de preços de transferência, que não se
amoldam ou não capturam determinados tipos de operações específicas.
Daí a dificuldade de migração do Brasil para um regime de tributação
territorial da renda, com isenção de imposto de renda para os lucros e
dividendos provenientes de participações societárias no exterior.

1289
Impressão 3D e sistema tributário
disfuncional
282
Flávio Veitzman

Há muito se discute sobre a complexidade e inoperância do sistema


tributário brasileiro. A morosidade legislativa para levar a cabo uma ampla
e efetiva reforma tributária não aparenta estar ligada somente à força
política do governo ao tempo da sua propositura: desde 1995, nada menos
que cinco projetos que propunham alterar em profundidade o Sistema
Tributário Nacional foram engavetados pelo Congresso, a despeito do
patrocínio político que receberam do Executivo283. Atualmente, uma
comissão especial da Câmara dos Deputados está encarregada de analisar
propostas legislativas de reforma do Sistema Tributário Nacional.

Não causa surpresa que o cidadão brasileiro mantenha as expectativas


baixas para mais esta rodada de debates. Pode parecer, à primeira vista,
que a demora (ou falta de interesse) em produzir mudanças favorece a
administração, que supostamente se beneficia da existência de um regime
fiscal disfuncional, notório pela incidência de diversos tributos sobre a
atividade produtiva, muitos deles exigidos em cascata, bem como pela
imposição de gravosas multas por descumprimento de obrigações
acessórias. O resultado também não surpreende: muitos tributos somente
são exigidos por meio de autuações, gerando insegurança e alimentando o
contencioso fiscal brasileiro, que só faz crescer.

Entretanto o mundo que conhecíamos mudou. O mesmo se pode dizer


do mundo que, agora, pensamos conhecer. Praticamente, muitos
pensamentos estão voltados para o que será do mundo nos próximos cinco,

1290
dez, quinze anos. Em grande medida, isso se deve à introdução, em larga
escala, de novas tecnologias que alteram, de maneira substancial e
disruptiva, a forma como os agentes sociais, econômicos e políticos se
relacionam.

Não é por acaso que cientistas e futuristas ganham cada vez mais
projeção. Dentre estes, destaca-se Ray Kurzweil, inventor, futurista e
empreendedor norte-americano, notoriamente conhecido por disseminar os
conceitos e as implicações relacionadas ao crescimento exponencial da
tecnologia284. Muito é noticiado a respeito de uma nova revolução
industrial, fruto da utilização de tecnologias como a inteligência artificial,
forjando a “indústria 4.0”.

Como regra geral, uma tecnologia é considerada disruptiva quando ela


rompe o status quo, altera a forma como as pessoas vivem e trabalham,
rearranjam cadeias de valor, resultando em produtos e serviços
inteiramente novos, tal como exposto em relatório elaborado pela
consultoria Mcksiney & Company285.

Nesse contexto, pretendemos jogar luz, por meio deste artigo, à


provocação de que a reforma tributária brasileira será cunhada, a fórceps,
em razão do surgimento de tecnologias disruptivas, como, por exemplo, o
emprego de impressoras 3D em escala comercial.

Tal como noticiado pelo Valor Econômico286 em reportagem de 24 de


abril de 2017, as impressoras 3D “são máquinas capazes de fazer
praticamente qualquer objeto – do componente do motor de um avião a
próteses humanas, passando por peças de carros, brinquedos e roupas”. A
grosso modo, basta que um indivíduo ou empresa detenha a impressora,

1291
adicione a inteligência (isto é, software ou modelo) e a matéria prima
(plástico, metal, tecido etc.), para que o produto desejado seja produzido.

Imaginemos, agora, os impactos que a adoção de impressoras 3D em


escala comercial poderão causar aos sistemas tributários, em especial ao
caso brasileiro. Em estudo elaborado pela McKinsey & Company em
relatório de 2013, os impactos econômicos futuros decorrentes da
utilização de impressões 3D são estimados em 600 bilhões de dólares ao
ano durante os próximos oito anos.

A adoção de novas tecnologias afetará as formas como os bens são


produzidos, alterando as cadeias industriais e de comercialização até então
conhecidas. Esse é justamente o caso da utilização de impressoras 3D em
escala comercial: dentistas passarão a produzir diretamente, por meio de
impressoras 3D, próteses a serem utilizadas por seus pacientes; hospitais
também fabricarão as próteses, ou até mesmo órgãos, a serem utilizados
por seus pacientes em cirurgias; indústrias imprimirão as próprias
máquinas que irão compor o seu ativo permanente, as quais serão
utilizadas para a fabricação dos bens a serem comercializados junto aos
seus consumidores; distribuidores/lojistas poderão imprimir (“fabricar”) os
bens a serem comercializados junto aos seus consumidores; e os
indivíduos – por que não? –, poderão imprimir, no conforto de suas
residências, os próprios bens que serão objeto de seu consumo.

Torna-se claro, assim, que os fundamentos da tributação das atividades


econômicas que, até recentemente, vinham sendo utilizados pelos
governos de forma relativamente eficiente podem estar com os seus dias
contados. Isso porque, em um novo mundo em que os bens físicos (“brick
and mortar”), a propriedade e a atividade econômica desenvolvida
substancialmente por pessoas jurídicas dão espaço aos bens imateriais, ao

1292
compartilhamento e à participação direta de indivíduos no
desenvolvimento de atividades econômicas, as bases de tributação
anteriormente conhecidas não mais permanecerão válidas, devendo ser
repensadas.

A corroborar o acima exposto, vale mencionar recente manifestação de


Everardo Maciel, ex-Secretário da Receita Federal do Brasil durante o
período de 1995 a 2002, sobre o tema:

Há uma mudança global nas bases de arrecadação. No mundo inteiro a forma de


comunicação mudou e há a quarta revolução industrial, com a inteligência artificial
tomando lugar da inteligência humana. O problema, diz Everardo, que também foi
Secretário de Fazenda nos Estados de Pernambuco e no Distrito Federal, é que as
287
bases de tributação estão ultrapassadas .

Não obstante, tem-se que o sistema tributário brasileiro é baseado na


imposição de tributos específicos sobre atividades industriais, comerciais e
de prestação de serviços. Ademais, há imposição de tributos na importação
de bens, verificada quando da entrada das mercadorias em território
nacional.

Se um fabricante produzir um determinado produto e comercializá-lo,


estará sujeito, no que interessa à presente discussão, à incidência do IPI e
do ICMS. Dependendo do produto, mais complexidade pode ser
adicionada, com a imposição de regimes de substituição tributária. Por
exemplo, em uma operação típica de um fabricante de vestuário, o Fisco
pode seguramente esperar o recolhimento do IPI e do ICMS devidos nas
operações de fabricação e comercialização da roupa ao consumidor.

A necessidade de uma qualificação precisa da natureza das operações


para os fins de incidência tributária, em que está baseado o atual modelo
de tributação brasileiro, torna-se dramática quando confrontada com o

1293
surgimento de tecnologias que desafiam os paradigmas jurídicos
existentes. Assim, quando se insere a tecnologia de impressoras 3D nessa
equação, o resultado é explosivo.

Ora, espera-se que, em um futuro próximo, sejamos capazes de produzir


nossos próprios produtos no conforto de nossas residências. Nesse “novo
mundo”, o consumidor poderá, com um clique, fazer o download de um
modelo digital da roupa de sua marca preferida e produzir a peça na
impressora 3D de sua preferência.

De forma simplificada, teremos consumidores finais pagando à empresa


que fabricava roupas pela aquisição do aplicativo/software. Em paralelo,
tais consumidores adquirirão matérias-primas para a produção do
vestuário. Já que se espera que grande parte do valor dessas transações seja
atribuído ao aplicativo/software, o governo brasileiro sofrerá, de imediato,
duros golpes na sua capacidade de arrecadar tributos.

O primeiro golpe evidencia-se pela impossibilidade de arrecadação do


IPI sobre os pagamentos feitos pelos usuários para a aquisição da “roupa
virtual” contida no aplicativo/software. Se a roupa é produzida pelo
próprio consumidor, não há que se falar em incidência do IPI nessa etapa
da operação. Deve-se reconhecer que o IPI continuará a incidir na
aquisição das matérias-primas que alimentarão as impressoras 3D, mas os
valores tendem a ser pouco expressivos, na medida em que grande parte do
valor da transação deve ser atribuído ao aplicativo/software que contenha o
plano para a impressão da roupa.

Espera-se, assim, uma inversão do modelo de custos de produção


atualmente existentes para a manufatura de produtos. Partindo do
pressuposto de que o local da produção tornar-se-á irrelevante com a

1294
adoção de tecnologias como a impressora 3D, custos de natureza
intelectual ou intangível (design, conceito etc.) serão mais relevantes que
os custos físicos para a produção do produto.

A segunda ameaça ao governo brasileiro está relacionada à definição do


tributo que incidirá na aquisição do aplicativo/software pelo consumidor.
Acreditem: estamos em 2017 e ainda não sabemos se operações que
envolvam o download de software estão sujeitas à incidência do ICMS, do
ISS ou de nenhum desses tributos.

Estados (ICMS) e Municípios (ISS) disputam a competência para


tributar essas operações, enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF)
coloca lenha na fogueira da insegurança jurídica ao não julgar uma ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI n. 1.945) ajuizada há quase 20 anos
(!), que tem como alvo determinar se é constitucional a cobrança, pelo
Estado do Mato Grosso, do ICMS em operações envolvendo o download
de software.

Em 1998, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 199.464/SP, o


STF firmou o entendimento de que o ICMS deveria incidir sempre que o
programa de computador comercializado fosse reproduzido em larga
escala, não houvesse customização (hipótese em que incidiria o ISS), e
houvesse suporte físico para a sua comercialização, de forma que a
tangibilidade da operação permitisse a caracterização da operação como
uma circulação de mercadorias, passível de incidência pelo ICMS.

Nesse contexto, chama a atenção que a manifestação do STF nos autos


do Recurso Extraordinário n. 176.626-6, determinando que a incidência do
ICMS em operações envolvendo software está condicionada à existência
de suporte físico, ocorreu no mesmo momento em que o download de

1295
software passou a despontar como uma nova tecnologia. A história parece
ser repetir neste momento, uma vez que o STF tende a se manifestar sobre
a tributação de operações envolvendo download de software quando novas
tecnologias alteraram significativamente esse modelo de negócio, que
perde relevância nas novas economias.

Vale notar que, no que interessa à presente discussão envolvendo a


aquisição do modelo (aplicativo/software) pelo consumidor para os fins de
sua utilização na impressora 3D, a essência da operação consistiria na
aquisição de um bem intangível e, portanto, deveria resultar na tributação
aplicável a operações envolvendo bens. Assim, poder-se-ia argumentar que
a Lei n. 9.610/98 (Lei dos Direitos Autoriais) suportaria a incidência do
ICMS na operação, já que os programas de computador são caracterizados
como obras intelectuais sujeitas à Lei dos Direitos Autorias e, portanto,
bens móveis nos termos dessa lei.

Referido entendimento tende a ser corroborado pelo Ministro Gilmar


Mendes, que, no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de
Inconstitucionalidade n. 1.945/MT, afirmou que

O Tribunal não pode se furtar a abarcar situações novas, consequências


concretas do mundo real, com base em premissas jurídicas que não são mais
totalmente corretas. O apego a tais diretrizes jurídicas acaba por enfraquecer o texto
constitucional, pois não permite que a abertura dos dispositivos da Constituição
possa se adaptar aos novos tempos, antes imprevisíveis.

Por outro lado, questiona-se a incidência do ICMS na operação


envolvendo download de software com base no disposto na Lei n.
9.609/98 (Lei do Software), segundo a qual as operações envolvendo
software no Brasil serão objeto de contratos de licença. Assim, na medida
em que a licença de uso refletiria a ausência de transferência de
propriedade do bem, não haveria que se falar na incidência do ICMS na

1296
operação. Nesse sentido, animam-se os Fiscos municipais, que sustentam,
de forma questionável, que a licença de uso de software é um serviço,
passível de incidência do ISS.

Adicionam combustível a essa situação as recentes movimentações


feitas pelos Estados e Municípios para tributar operações envolvendo a
economia digital, destacando-se as previsões no Convênio CONFAZ n.
106/2017, em relação ao ICMS, e à Lei Complementar n. 157/2016, em
relação ao ISS. Infelizmente, não há qualquer perspectiva de resolução
desse impasse no curto prazo.

Esse tipo de desgaste teria fim se o sistema tributário brasileiro


eliminasse a cobrança do ICMS e do ISS, substituindo-os por um tributo
único, de competência da União, que incidiria de forma geral e não
cumulativa sobre atividades empresariais (setor de serviços, comércio,
indústria e similares, para que ninguém alegue que sua atividade não possa
ser tributada).

A possibilidade de adoção de um imposto não cumulativo único, em


substituição ao ICMS e ISS, foi, inclusive, objeto de discussão na
comissão especial da Câmara dos Deputados para a reforma tributária,
instituída no ano de 2017. Pela proposta em pauta, conforme consta de
material elaborado pelo Deputado Luiz Carlos Hauly, relator da reforma,
um Imposto sobre Bens e Serviços estadual e um Imposto Seletivo federal
substituiriam não só o ICMS e o ISS, como também IPI, IOF, CSL, PIS,
Cofins, Salário-Educação e CIDE-Combustíveis288.

Entretanto, há quem duvide (com toda razão) da viabilidade de uma


ampla reforma tributária e proponha, especificamente em relação ao setor
de tecnologia, a adoção de caminhos alternativos, como a implementação

1297
de um regime de tributação simplificado para companhias desse setor
(“Simples-Tecnologia”). Nesse cenário, contribuintes pagariam os tributos
de forma consolidada em um único boleto, ficando a cargo da legislação
específica (fruto de acordo entre União, Estados e Municípios) estabelecer
a divisão das receitas entre as partes.

Para uma empresa cujo negócio principal envolva a disponibilização de


intangíveis (software) e a prestação de serviços a eles relacionados, essa
proposta pode ser vista com bons olhos, apesar de também possuir
algumas dificuldades de implementação. Entretanto, como enquadrar no
Simples-Tecnologia empresas que tenham os seus negócios transformados
pelas impressoras 3D? Estamos falando, por exemplo, de uma montadora
de veículos que produzirá carros e peças, bem como disponibilizará a suas
concessionárias ou prestadores de serviços um aplicativo/software, que
permitirá que estes produzam em tempo real peças de reposição aos seus
clientes. Não parece ser razoável e tampouco simples sugerir que o
“Simples-Tecnologia” seja eficaz nessa nova realidade.

Se não bastassem os desafios acima, o que dizer do regime de


tributação de importações, que privilegia a incidência de tributos (IPI, II,
ICMS etc.) no desembaraço aduaneiro de mercadorias físicas? Em um
mundo em que a impressão 3D tenha se tornado realidade, muitas aduanas
tendem a ficar a ver navios, já que os consumidores adquirirão os
planos/software dos produtos detidos por companhias estabelecidas em
qualquer parte do globo, para então produzi-los por meio de suas
impressoras 3D.

Imagine-se a perda de arrecadação que pode advir do setor industrial se


uma indústria, em vez de importar maquinários e peças, passar a produzi-
los por meio de impressoras 3D próprias. Nesse caso, não haveria que se

1298
falar em incidência do IPI, II, PIS/COFINS-Importação e, até o presente
momento, do ICMS na operação. Quando muito, haveria a incidência do
imposto de renda, a ser retido na fonte, sobre tais pagamentos, sendo
discutível a referida tributação caso a operação venha a ser caracterizada
como importação de um bem.

A complexidade das questões envolvendo a implementação de novas


tecnologias, especialmente no âmbito tributário, só tende a crescer. A
demora na resolução de questões jurídicas postas há quase duas décadas,
como é o caso da possibilidade de incidir ICMS sobre transações
envolvendo software sem o respectivo suporte físico, somente alimenta as
ineficiências de um sistema tributário já disfuncional. A própria eficácia
das soluções eventualmente conferidas a esses impasses poderá ser posta
em xeque, na medida em, muito provavelmente, já nascerão ultrapassadas.

A estratégia de empurrar com a barriga a realização de uma reforma


tributária já está cobrando o seu preço, sendo que a conta crescerá cada vez
mais. A realização de “puxadinhos” aqui e ali em um sistema disfuncional
não mais terá vez em uma nova realidade em que tecnologias disruptivas
sejam adotadas em escala comercial.

Bom senso, unificação de tributos e imposição tributária de forma geral


e não cumulativa sobre atividades empresariais (setor de serviços,
comércio, indústria e similares, para que ninguém alegue que sua atividade
não possa ser tributada) são ingredientes básicos a serem considerados na
formatação de um sistema tributário que tenha a pretensão de ser funcional
e adaptável a um mundo em constante transformação.

1299
Deveres instrumentais na economia digital: o
Siscoserv e os limites ao controle do
comércio internacional de serviços
289
Caio Augusto Takano

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A dualidade entre a promoção da eficiência da Administração Tributária


e a proteção de direitos e garantias dos contribuintes é evidenciada muito
fortemente nas discussões envolvendo deveres instrumentais tributários
(ou obrigações acessórias290). Não raro, novos deveres são instituídos
buscando otimizar os procedimentos fiscalizatórios, sempre no interesse
dos entes tributantes, impondo, de outro lado, relevantes custos de
conformidade à atividade empresarial.

Não é novidade afirmar, no Brasil, que os custos de conformidade


suportados pelos contribuintes são demasiadamente significativos. Como
decorrência da própria complexidade do sistema tributário brasileiro, uma
importante parcela do faturamento das empresas do setor produtivo é
consumida para que elas sejam adequadas às diversas exigências da
legislação tributária. Apenas para ilustrar, segundo um estudo realizado em
2012 pela FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), os
“custos indiretos” da tributação equivaleriam a 1,16% (R$ 24,6 bilhões) do
faturamento da Indústria de Transformação, sendo 0,31% (R$ 6,5 bilhões)
apenas para o cumprimento de deveres instrumentais tributários e a
instalação de programas de computador (software) dedicados ao
compliance291.

1300
Assim, se, de um lado, a economia digital demanda a evolução dos
deveres instrumentais até então existentes, como consectário da
complexidade dos novos modelos de negócios desenvolvidos, de outro,
mais do que nunca se torna importante o debate para se poder avaliar até
que ponto a instituição ou a exigência de deveres instrumentais é uma
medida fomentadora de concorrência no setor produtivo ou, reversamente,
atua como um significativo óbice econômico para a competitividade em
um determinado setor, em face de seus elevados custos.

Neste intento, o presente trabalho busca analisar os deveres


instrumentais instituídos no Sistema Integrado de Comércio Exterior de
Serviços, Intangíveis e Outras Operações que Produzam Variações no
Patrimônio (Siscoserv) que, de um lado, proporcionaram melhores
condições ao governo federal para se controlar e monitorar o “comércio
internacional de serviços”, mas, de outro, impuseram relevantes custos de
conformidade aos contribuintes, exigindo-se informações que, por vezes,
já foram declaradas em outros deveres instrumentais, bem como
expressivas multas pelo seu não cumprimento.

Eis o desafio que se apresenta.

2. OS DEVERES INSTRUMENTAIS NO SISTEMA TRIBUTÁRIO


BRASILEIRO E SEUS LIMITES NORMATIVOS

É nítido o relevante papel desempenhado pelos deveres instrumentais


em nosso ordenamento jurídico, como eficazes instrumentos de
fiscalização e controle da arrecadação tributária. Não basta apenas que seja
instituída a norma jurídica tributária, dispondo sobre os critérios relevantes
para a conformação da regra matriz de incidência do tributo; é igualmente
necessário que sejam produzidas normas jurídicas que disponham sobre
outras condutas, positivas ou negativas, que atribuam ao Poder Público os

1301
meios de racionalizar o procedimento arrecadatório e de conferir o regular
cumprimento da norma tributária. Essas últimas normas configuram o que
denominaremos de “deveres instrumentais tributários”, que têm como
principais objetivos: (i) a otimização da arrecadação estatal e (ii) o
combate à evasão fiscal por meio de efetivo controle e fiscalização pelos
órgãos fazendários, mediante o cotejo entre as informações fornecidas pelo
contribuinte e os dados de que dispõem em seus sistemas292.

De fato, somente por meio do cumprimento de tais deveres é que o fato


jurídico tributário é vertido na linguagem própria do Direito, permitindo
que o Poder Público tenha conhecimento das informações necessárias para
a realização de fins arrecadatórios ou extrafiscais. Nas palavras de Eurico
de Santi, os deveres instrumentais “prescrevem a criação de sistemas
linguísticos que permitam o acesso denotativo ao fato jurídico
tributário”293. Acrescente-se, ainda, que a própria extinção das obrigações
tributárias igualmente exige um procedimento próprio, demandando
inúmeros deveres instrumentais específicos.

Daí Hector Villegas sustentar que “o fisco só pode desenvolver sua


atuação de forma devida, se os particulares vierem a cumprir diversos
deveres formais”, de forma a transformar o tributo “legislativamente
criado” em tributo “fisicamente percebido”294.

Se tais deveres – que guardam relativa independência com a obrigação


tributária principal (mas há de existir uma relação de pertinencialidade
entre o dever instrumental instituído e a obrigação tributária que visa
viabilizar sua arrecadação ou fiscalização para justificar a sua
exigibilidade, como já reconheceu o STJ295) – são inequivocamente
relevantes para a operacionalidade do sistema tributário, é imperioso
reconhecer que há limites para a sua instituição.

1302
Evidentemente, há em relação a este tema uma série de princípios
jurídicos aplicáveis, que atuam como verdadeiros vetores na limitação do
âmbito de atuação estatal, mas cuja análise foge dos lindes desse estudo296.

É forçoso reconhecer, contudo, que especificamente em relação aos


limites à instituição e exigência dos deveres instrumentais tributários, não
foi o legislador nacional silente, instituindo verdadeira regra limitadora no
bojo do Código Tributário Nacional (CTN), precisamente em seu artigo
113, parágrafo 2º, pela qual os deveres instrumentais deverão ser
instituídos “no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos”297.
A nosso ver, trata-se do núcleo semântico fundamental para a verdadeira
compreensão das limitações a que se submetem os deveres instrumentais.
Define o referido dispositivo a justificativa pelo qual se permite a
intervenção do Estado sobre o âmbito de proteção da liberdade e da livre
iniciativa: o interesse da arrecadação e da fiscalização de tributo. Eis a sua
causa, isto é, a sua legitimação, pela qual tal exigência comportamental
pelo Estado se mostra em conformidade com os ditames da Justiça298.

Estamos convencidos de que o “interesse da arrecadação e fiscalização


do tributo” é um conceito delimitador do regime jurídico dos deveres
instrumentais tributários da mais elevada importância, ao lado de alguns
relevantes princípios constitucionais, informadores de tal regime (como,
e.g., legalidade, praticabilidade, isonomia, livre iniciativa e livre
concorrência). Com efeito, é a explicitação do próprio sopesamento feito
pelo legislador complementar entre os vários princípios constitucionais
que agem sobre a matéria, explicitando os exatos limites pelos quais é
permitido ao legislador ordinário ou à administração pública instituir
deveres instrumentais.

1303
Dentro dessa perspectiva, há de se reconhecer que o citado parágrafo 2º
do artigo 113 do CTN confere, de um lado, maior flexibilidade à
Administração Pública, permitindo que normas infralegais veiculem
deveres instrumentais na forma em que mais conveniente for para
racionalizar a fiscalização tributária, evitando uma delimitação e maior
enrijecimento, já em sede de norma geral, sobre quais deveres podem ser
exigidos, sob quais condições e a partir de quais instrumentos normativos
podem ser introduzidos no ordenamento. Diferentemente de outros
sistemas (como o alemão), há uma margem relativamente ampla em
relação aos sujeitos que poderão ser compelidos a realizar as condutas
exigidas pelo Poder Público no Direito brasileiro. Toda essa margem de
discricionariedade conferida pelo legislador nacional possui, como
contrapeso, uma única, mas rigorosa, limitação de natureza material: os
deveres instrumentais devem ser instituídos de tal modo que sejam aptos a
atender a finalidade normativa de sua imposição, ou seja, o “interesse da
arrecadação e da fiscalização dos tributos”299.

Dois caminhos são passíveis de serem trilhados pelo intérprete: neste


tema (i) ou se interpreta o signo “interesse” em seu significado comum,
coloquial, permitindo que todo dever instrumental que seja “importante,
útil ou vantajoso”300 à arrecadação ou à fiscalização tributária se justifique
perante o ordenamento jurídico; (ii) ou se constrói o seu significado
técnico-jurídico, sistemática e restritivamente, em plena consonância com
o texto normativo e seu contexto limitador. Nesse sentido, Paulo Ayres
Barreto, referindo-se às lições de Riccardo Guastini, ensina que
“significações específicas no discurso jurídico devem ser obtidas a partir
dos textos normativos ou do uso dos juristas, e não dos dicionários”301.

1304
O primeiro caminho implicaria retirar qualquer peso à tomada do
legislador nacional e conferir amplos poderes à Administração Tributária.
Teria o legislador complementar não prescrito limite algum à imposição de
deveres instrumentais, diferentemente do que fez em relação a todos os
demais temas em matéria tributária? A utilização do termo “interesse” teria
sido acidental? Parece-nos que as respostas a essas indagações haverão de
ser negativas.

Estamos convencidos, pois, de que sua interpretação deve ser feita de


forma restrita, sob pena de aviltar o limite buscado pelo legislador
nacional. Assiste razão a Luís Eduardo Schoueri, ao aduzir que somente se
verifica o “interesse da arrecadação ou da fiscalização” na medida em que
os deveres instrumentais se revelem necessários (imprescindíveis) para
assegurar o cumprimento da obrigação tributária principal302 ou,
complementamos, atestar a inexistência do tributo nos casos de imunidade,
isenção e não incidência.

Em outras palavras, trata o referido dispositivo de uma verdadeira


garantia do contribuinte, e não de um “cheque em branco” concedido ao
fisco, que poderá utilizá-lo sempre que desejar impor deveres aos
administrados que, de alguma forma, ainda que por via oblíqua, possa
interessar a arrecadação ou a fiscalização303. Eis porque o Poder Público
não pode solicitar informações que já detenha ou que poderiam ser obtidas
de outras formas menos onerosas ao administrado, apenas por
“comodidade”, tendo em vista que não são imprescindíveis, mas, no
máximo, estariam dentro do interesse subjetivo da própria Administração,
figura completamente distinta do “interesse da arrecadação e da
fiscalização dos tributos”, que envolve também o interesse da coletividade
e do próprio administrado na arrecadação e na fiscalização tributária.

1305
Há autores, ainda, que se posicionam no sentido de traduzir o “interesse
da arrecadação ou da fiscalização dos tributos” numa “utilidade em prol da
arrecadação ou da fiscalização de tributos”, justificando a imposição de
deveres instrumentais sempre que eles sejam motivados por um benefício
efetivo para a atividade de fiscalização tributária304. Nesse sentido, sustenta
Paulo de Barros Carvalho que “[s]e o dever instrumental não produz
qualquer benefício para a Administração Tributária, inexiste motivo que
autorize a sua exigência”305.

Entretanto tal posição parece confundir o interesse da Administração


Tributária com o “interesse da arrecadação ou da fiscalização de tributos”
que, como se sustentou acima, não são idênticos. Aquele até pode compor
o último em muitos casos, todavia nem sempre ambos convergirão. A
mera constatação de um benefício (facilitação do conhecimento ou
controle do cumprimento de uma obrigação tributária) não justifica a
imposição de deveres instrumentais. Entendimento contrário significaria
consentir que quem dirá, ao final, se a exigência de um dever instrumental
é legítima é a própria Administração Tributária, e não a lei, bastando que
ela simplesmente identifique naquela imposição um benefício para si.
Dentro dessa linha de pensamento, constatando-se tal benefício, nem
mesmo o próprio Poder Judiciário poderia afastar aquela exigência, pois
estaria em conformidade com o conteúdo normativo (atribuído por essa
corrente, diga-se) do artigo113, parágrafo 2º, do CTN.

Se assim é, não é a mera presença de qualquer benefício que justifica a


instituição de deveres instrumentais. O “interesse da arrecadação ou da
fiscalização dos tributos” não se confunde com o interesse subjetivo do
Poder Público, mas pressupõe a convergência do interesse do Estado em
assegurar o cumprimento das obrigações tributárias, garantindo-lhe meios

1306
financeiros para custear as suas finalidades; o interesse da coletividade no
bom funcionamento de um sistema tributário justo e eficiente, que
distribua equitativamente a carga tributária entre todos, sob o menor custo
possível; e o interesse do próprio contribuinte de ser tributado em
consideração à sua capacidade contributiva ou segundo outros critérios de
igualdade relevantes, aplicáveis para o tributo cobrado.

Portanto, para que a instituição de um dever instrumental guarde plena


aderência com nosso sistema tributário, é necessário (i) que ele possa
realizar sua finalidade precípua de auxiliar o cumprimento da obrigação
principal; (ii) que haja um tributo existente, no mínimo, no plano abstrato,
com o qual se articule; (iii) que esteja dentro da competência da
Administração Pública instituidora desse tributo; (iv) que exista
razoabilidade entre o dever instituído e seu critério dimensionador; e (v)
que, em cada caso concreto, haja proporcionalidade entre o dever
instrumental instituído (meio) e o interesse da arrecadação ou da
fiscalização dos tributos (fim)306.

3. A INFORMATIZAÇÃO FISCAL E O PIONEIRISMO DO BRASIL NA


EXIGÊNCIA DE DEVERES INSTRUMENTAIS

A informatização das Administrações Tributárias vem se tornando uma


realidade irrefreável, fenômeno que acompanha o momento histórico de
elevada transformação tecnológica da sociedade. Como observa Paulo de
Barros Carvalho, diversas nações vêm buscando a melhor forma de utilizar
a tecnologia para imprimir maior eficácia à dinâmica dos respectivos
sistemas307. De fato, como assevera Richard Bird, a “chave para uma boa
administração tributária” reside em coletar a informação necessária para
assegurar que as pessoas cumpram suas obrigações legais de acordo com a
legislação tributária, tarefa que não é possível realizar eficientemente sem

1307
fazer uso extensivo da moderna tecnologia da informação, inclusive para
facilitar o cumprimento das obrigações tributárias pelo contribuinte308.

Nesse contexto, as autoridades fazendárias viram na informática um


poderoso elemento de otimização e racionalização da Administração
Tributária, oferecendo como algumas de suas principais vantagens: (i) o
aumento da arrecadação, pela otimização da identificação de riscos e
seleções para fiscalização; (ii) uma elevação no nível de cumprimento
voluntário da legislação tributária, pela melhoria no acesso a informações
e pela redução dos custos de conformidade; (iii) melhores comunicações
entre autoridades fiscais e outros órgãos governamentais; e (iv) maiores
níveis de transparência da administração e a consequente redução de
oportunidades de fraude ou corrupção309.

A evolução tecnológica da máquina estatal passa a ser relevante em


matéria tributária, causando profundas transformações na relação entre o
fisco e o contribuinte310, não apenas na gestão pública dos tributos e em
temas relacionados à obrigação tributária principal (constituição e extinção
do liame obrigacional, exigibilidade do crédito tributário etc.311), como
também na dinâmica dos deveres instrumentais e suas limitações.

Diante da mudança no suporte físico em que os deveres instrumentais


serão cumpridos, confere-se, a um só tempo, maior agilidade e
racionalidade à fiscalização tributária, bem como uma perspectiva de
diminuição de deveres instrumentais a serem exigidos e dos custos de
conformidade suportados pelos contribuintes312.

Tal esforço é necessário. Como apontou José Eduardo Soares de Melo,


calcula-se que, no ano de 2006, somente para cumprir os deveres
instrumentais referentes ao ICMS do Estado de São Paulo, os contribuintes

1308
emitiram cerca de 60 milhões de notas fiscais por mês, o que gerou um
custo que variou de 2% a 5% da receita da empresa para a impressão,
emissão e guarda desses papéis pelo prazo de cinco anos313-314. Embora os
dados não sejam recentes, o exemplo é bastante ilustrativo para demonstrar
o esforço hercúleo do contribuinte para o cumprimento da legislação
tributária, antes de serem praticadas a escrituração fiscal digital e a
escrituração contábil digital, a partir de 2007315.

Se, de um lado, a informatização da administração pública oferece


inúmeras vantagens no que se refere à gestão tributária, de outro, parece-
nos razoável que, com a informatização, os contribuintes possam esperar
que a diminuição dos custos operacionais do sistema tributário dela
decorrente não seja refletida apenas nos custos administrativos, como
também nos custos de conformidade. Isso causaria significativa redução,
em virtude da maior eficiência no trabalho do fisco e da desnecessidade de
se permanecer exigindo diversos deveres instrumentais, para obter
informações que, ainda que necessárias para a fiscalização, já estando em
mãos de órgãos da Administração Pública, possam ser obtidas pelo ente
tributante sem a interferência do contribuinte. Exemplificativamente, por
intermédio de uma permuta/solicitação de informações, por meio digital
inclusive, prevista em lei ou convênio celebrado pelos diversos entes
públicos, como prevê o artigo 199 do CTN.

Não se pode, entretanto, deixar de perceber o paradoxo que


circunscreve o tema, como apontado por Luís Eduardo Schoueri: se, por
um lado, espera-se da informatização da Administração Tributária uma
racionalização e uma simplificação do processo de arrecadação, por outro,
não há como ignorar que ela resultou num aumento de deveres
instrumentais – e, portanto, maior complexidade –, exigindo-se novos

1309
deveres sempre que um novo passo era dado em direção à
informatização316.

Nesse sentido observa Roque Carrazza que, com a informatização,


surgiu a necessidade de as empresas contratarem funcionários
qualificados, adquirirem programas de computador caros, manterem
sistemas de computação que são na maioria das vezes bastante complexos,
gerando gastos que, em muitos casos, podem superar o valor do próprio
tributo devido317.

Eis porque qualquer medida de modernização que busque a redução da


carga tributária total (direta e indireta) deverá ser realizada de forma
consciente e coerente pelo Poder Público, sendo imprescindível que haja
sensibilidade pela Administração Tributária também sobre os custos de
conformidade, em especial os custos iniciais (commencement costs),
necessários para a observância da legislação tributária, não apenas em
relação ao custo efetivo para a implementação dos sistemas informatizados
como também no que se refere ao tempo necessário, para que o
contribuinte possa se adequar à legislação tributária, de modo a sentir com
menor intensidade os seus efeitos.

Embora tal conclusão possa ser considerada “óbvia”, não é incomum


que a Administração Tributária opte pelo caminho mais “cômodo”, mas
igualmente mais oneroso ao contribuinte. Em vez de se caminhar a uma
racionalização do sistema tributário brasileiro, a informatização fiscal
trilha caminho radicalmente inverso, priorizando a multiplicidade de
exigências de uma mesma informação, cuja consistência será analisada a
partir de um complexo sistema eletrônico de cruzamento de informações.

1310
Em estudo inédito realizado em 2012 pela Associação Comercial de
São Paulo – ACSP, em parceria com a empresa PricewaterhouseCoopers
– PWC, apontou-se, por exemplo, a duplicidade de informações em mais
de quarenta deveres instrumentais exigidos para o recolhimento de apenas
cinco tributos (CSL, IPI, ICMS, PIS e COFINS), sendo emblemática a
constatação da multiplicidade de exigências no âmbito dos deveres
instrumentais referentes ao IPI, em que se identificou que o contribuinte
deve informar o valor de seus débitos mensais em seis oportunidades,
quando do cumprimento da legislação tributária (no preenchimento da
EFD-ICMS/IPI, do DIPJ, do Livro de Entradas/Saídas, do Livro de
Apuração, da DCTF e do PER/DCOMP)318.

Não obstante o estudo tenha sido realizado em 2012, suas conclusões


permanecem preocupantes. Mesmo com o posterior desenvolvimento e a
implementação das chamadas “obrigações acessórias digitais” – expressão
comumente utilizada para se referir aos deveres instrumentais instituídos
nos diversos módulos do Projeto SPED –, a multiplicidade de informações
continua configurando um fator presente.

Tal fato muitas vezes é justificado a partir da necessidade das


Administrações Tributárias de obterem fontes alternativas para a obtenção
de informações fiscais sensíveis e relevantes ao contribuinte. Eis
precisamente o caso da Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior,
instituída pela Resolução CMN (BACEN) n. 2.911/2001 – e com
fundamento legal na Medida Provisória n. 2.224/2001 –, pela qual os
residentes no Brasil devem informar ao Banco Central do Brasil os ativos
em moeda e os bens e direitos possuídos fora do território nacional. Tais
informações são todas exigidas na declaração do imposto de renda (ou
passíveis de serem informadas em campos que lá poderiam ser inseridos).

1311
A inserção de um novo dever instrumental justificou-se como um
instrumento de se obter informações que, por vezes, eram omitidas nas
declarações de imposto de renda, e assim diminuindo o espaço para que
houvesse evasão fiscal.

Em que pese ser louvável o objetivo da instituição da Declaração de


Capitais Brasileiros no Exterior, na medida em que reduzir a evasão fiscal
significa promover com maior força a livre concorrência319, a crescente
introdução de tais deveres instrumentais – que visam apenas promover a
declaração consistente de informações dos contribuintes, por vezes já
fornecidas – implica desnecessário aumento dos custos de conformidade e,
em que pese gerar um benefício à Administração Tributária, não parece
guardar aderência com a noção de “interesse da arrecadação ou da
fiscalização dos tributos”.

A informatização fiscal deve gerar benefícios a toda a sociedade,


promovendo um sistema tributário mais racional e eficiente, e não apenas
benefícios às Administrações Tributárias.

4. O SISCOSERV E O CONTROLE DO COMÉRCIO INTERNACIONAL


DE SERVIÇOS

4.1. Considerações sobre a exigência das informações relacionadas ao


Siscoserv

A inerente dificuldade de se exercer o controle sobre a prestação de


serviços, em razão, muitas vezes, de sua própria intangibilidade, é
intensificada nas operações internacionais, em virtude das limitações ao
exercício de fiscalização impostos pela territorialidade, não obstante a
necessidade de as informações referentes a importações e exportações de
serviços constarem em diversos deveres instrumentais, tais como as notas

1312
fiscais de serviço, os livros fiscais das empresas, a declaração o imposto de
renda etc.

Diante desse cenário, a Lei n. 12.546/2011 instituiu a “obrigação de


prestar informações para fins econômico-comerciais ao Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior relativas às transações
entre residentes ou domiciliados no País e residentes ou domiciliados no
exterior que compreendam serviços, intangíveis e outras operações que
produzam variações no patrimônio das pessoas físicas, das pessoas
jurídicas ou dos entes despersonalizados”, por meio do Siscoserv. Trata-se
de ação pioneira do Brasil no controle do comércio internacional de
serviços que, inclusive, tornou-se referência pelas Nações Unidas320.

Em síntese, exige-se o registro no Siscoserv de transações entre


residentes ou domiciliados no Brasil e residentes ou domiciliados no
exterior que compreendam serviços, intangíveis e outras operações que
produzam variações patrimoniais feitas por (i) prestador ou tomador do
serviço residente ou domiciliado no Brasil; (ii) pessoa física ou jurídica,
residente ou domiciliada no Brasil, que transfira ou adquira o intangível,
inclusive os direitos de propriedade intelectual, por meio de cessão,
concessão, licenciamento ou por quaisquer outros meios admitidos em
direito; e (iii) pessoa física ou jurídica residente ou domiciliado no Brasil,
que realize outras operações que produzam variações no patrimônio321.

Tais informações seriam utilizadas pelo Ministério do


Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) para fins
estatísticos, visando ao gerenciamento de informações sobre o setor de
serviços, especialmente o “comércio de serviços” com o exterior, atuando,
ainda, como ferramenta para o aprimoramento das ações de estímulo,
formulação, acompanhamento e aferição das políticas públicas

1313
relacionadas a serviços e intangíveis, bem como para a orientação de
estratégias empresariais de comércio exterior daquele setor (artigo 26).
Entretanto, nos próprios enunciados da lei, consta que as “informações (...)
poderão subsidiar outros sistemas eletrônicos da administração pública”
(art. 25, § 6º), inequivocamente abrindo-se espaço para que as informações
sejam utilizadas para fins fiscais.

A natureza da obrigação de prestar informações no âmbito do Siscoserv


como dever instrumental tributário evidencia-se a partir da sua instituição,
especificamente para fins de fiscalização tributária, pela Receita Federal
do Brasil, por meio da Instrução Normativa RFB n. 1.277/2012, com
fundamento, inclusive, no artigo 16 da Lei n. 9.779/99. Assim, dúvidas
não há de que, como tal, submete-se aos controles normativos existentes
para os deveres instrumentais, inclusive a regra do artigo 113, parágrafo
2º, do CTN.

Assim, sob uma perspectiva estritamente jurídica, apesar de louvável a


iniciativa, não se pode deixar de notar que as informações que devem ser
prestadas por meio do Siscoserv podem ser obtidas por outros meios,
menos onerosos ao contribuinte, como contratos de câmbio devidamente
classificados e codificados por natureza de operação ou mediante a adição
de campos de preenchimento específicos para informações
complementares nas declarações já prestadas pelos contribuintes. Dessa
forma, passa a ser questionável se a exigência de implementação de um
novo sistema informatizado e de inúmeras novas obrigações tributárias
dele decorrentes, com todos os custos de conformidade que tal opção
implica, justificar-se-ia perante o sistema jurídico. E, tratando-se de
informações que a União Federal poderia obter de outras formas –

1314
principalmente por intermédio de deveres instrumentais que já exige do
contribuinte –, a resposta nos parece negativa.

Isso porque, sob a ótica da necessidade da informação, não se justifica


um dever instrumental que busca apenas confirmar a informação que é
trazida em outros deveres instrumentais ou que poderia ser obtida com a
simples atualização nos sistemas digitais disponibilizados pelos órgãos
públicos. De outro lado, sob a ótica de um aprimoramento do enforcement
do dever instrumental, conquanto seja inegável existir um ganho da
administração tributária na possibilidade de se identificar inconsistências a
partir do cruzamento de informações fiscais, entendemos que a medida
seria desproporcional, pois haveria outras formas menos onerosas para se
obter tais informações ou de garantir a boa execução das normas
tributárias sem que, com isso, seja necessário aumentar os custos de
conformidade e aumentar o caráter regressivo do sistema tributário322.

4.2. Considerações sobre as penalidades impostas pelo descumprimento dos


deveres instrumentais relacionados ao Siscoserv

Na sistemática introduzida pela Instrução Normativa RFB n.


1.277/2012, merecem atenção, ainda, as penalidades impostas pelo
descumprimento dos deveres instrumentais nela inseridos, que encontram
fundamento no artigo 57 da Medida Provisória n. 2.158/2001. Embora as
penalidades por apresentação extemporânea não sejam em montante
significativo, as multas previstas em razão de omissão ou fornecimento
inexato das informações poderão ser bastante expressivas, pois são
calculadas no percentual de 3% do “valor omitido, inexato ou incompleto”.

A primeira crítica que se faz é a ausência de adequada dosimetria na


sanção imposta que visa punir um dever instrumental claramente instituído
no interesse da fiscalização tributária, porquanto referido dever possui fins

1315
meramente estatísticos ou para ser utilizado no confronto de outras
informações que já detém o ente tributante323. Nesses casos, a penalidade
imposta (multa com base no valor da operação) não guarda aderência com
o bem jurídico que foi efetivamente lesionado (interesse da fiscalização).

Com efeito, caso se trate de dever instrumental instituído no interesse


da arrecadação, sendo necessário para a formalização do fato jurídico
tributário e para a própria constituição do crédito tributário, a
proporcionalização da sanção com base no valor do tributo que deixou de
ser recolhido é válida, na medida em que o bem jurídico lesado é
justamente o valor do tributo que, por força do descumprimento do dever
instrumental, ficou impossibilitado de se formalizar na linguagem jurídica
competente, prejudicando o erário.

De outro lado, o mesmo nexo não existirá nos casos em que o dever
instrumental é instituído no interesse da fiscalização, pois seu
descumprimento prejudicará o regular exercício da fiscalização, que será
igualmente lesionado por cada conduta do infrator independentemente do
valor a que se refere a obrigação tributária que seria fiscalizada. É dizer,
inconsistências no valor declarado ou omissões no valor declarado
atingirão o exercício da fiscalização com igual força, independentemente
do tributo exigido em cada situação.

De lege ferenda, parece-nos premente a fixação em lei de um valor


máximo (teto) para a multa pecuniária pelo descumprimento do dever
instrumental, que reflita efetivamente o dano ao interesse da fiscalização.

Isso não significa que as sanções tributárias, nesses casos, nunca


poderão levar em consideração o valor do tributo devido em sua
mensuração. O que se sustenta, aqui, é que a proporcionalização da sanção

1316
em função do valor do tributo que teria sido devido, na ausência de
descumprimento do dever instrumental, posto que aceitável, como
parâmetro de igualdade horizontal, deverá respeitar como limite máximo a
expressão econômica do “interesse da fiscalização” promovido pelo dever
instrumental descumprido, que inexoravelmente será um valor fixo, a
depender da conduta ilícita e da efetiva lesão àquele bem jurídico.

Ademais, as multas pelo descumprimento de deveres instrumentais


instituídos no interesse da fiscalização e que se pautem unicamente pelo
valor do tributo não resistem, a nosso ver, a um exame de
proporcionalidade da sanção cominada. Aqui, surge a voz de Ricardo
Mariz de Oliveira, sustentando que, em qualquer campo ou caso, as
sanções tributárias deverão ser justas, adequadas, proporcionais e
razoáveis324. Razoáveis serão aquelas em que a penalidade imposta guarde
relação de equivalência com a gravidade da infração e da lesão ao bem
jurídico tutelado; adequadas e proporcionais serão aquelas que passem
no exame da proporcionalidade, isto é, em que haja adequação entre meios
(sanção cominada) e fins (tríplice função das sanções tributárias),
vedando-se a imposição de medidas superiores àquelas estritamente
necessárias ao atendimento do interesse público; e justas serão aquelas
que não causem restrição excessiva a um direito fundamental.

Não é razoável ou proporcional que se estabeleça uma sanção que não


guarde relação com o bem jurídico protegido pelo ordenamento. Daí a
importância de se investigar o regime sancionador em conjunto com
conteúdo semântico da regra do artigo 113, parágrafo 2º, do CTN,
porquanto ele auxilia sobremaneira na identificação do bem jurídico
lesado, agindo, portanto, como um parâmetro relevante na imposição da
penalidade.

1317
Outro ponto que merece discussão é a previsão, no artigo 4º, parágrafo
3º, da Instrução Normativa RFB n. 1.277/2012, segundo a qual “a multa
prevista (...) será reduzida à metade, quando a obrigação acessória for
cumprida antes de qualquer procedimento de ofício”. Referido dispositivo
confere um benefício ao contribuinte que, espontaneamente, se propõe a
reparar o ilícito fiscal cometido pelo contribuinte.

Entretanto não se pode deixar de notar que, sob a aparência de um


benefício, referido dispositivo consolida o entendimento do fisco de que o
instituto da denúncia espontânea em matéria tributária, previsto no artigo
138 do CTN, não tem aplicabilidade para infrações relativas ao não
cumprimento de deveres instrumentais.

Com efeito, tem sido reiterado, em diversos julgados do Superior


Tribunal de Justiça (STJ), que “as responsabilidades acessórias autônomas,
sem qualquer vínculo direto com a existência do fato gerador do tributo,
não estão alcançadas pelo art. 138, do CTN”. Sustenta-se, em síntese, que
a responsabilidade de que trata a denúncia espontânea seria de “pura
natureza tributária”, razão pela qual não se aplicaria ao descumprimento de
normas de caráter administrativo, necessárias para a fiscalização tributária,
“sem qualquer laço com os efeitos de qualquer fato gerador [do
tributo]”325.

O raciocínio empregado pelos Ministros do STJ merece ser


questionado, pois, ainda que a natureza jurídica dos deveres instrumentais
seja de fato a de deveres administrativos, o seu descumprimento gera
responsabilidade de “natureza tributária”, como dispõe o artigo 113,
parágrafo 3º, do CTN. Eis o significado da “conversão” em obrigação
principal relativamente à penalidade pecuniária a que alude o citado
dispositivo: trata-se da equiparação do regime jurídico das sanções

1318
tributárias por descumprimento de dever instrumental ao da própria
obrigação principal326, conferindo-lhe, por ficção327, a natureza
“tributária” àquelas sanções pecuniárias.

Ademais, o próprio enunciado do artigo 138 do CTN não exige, como


pressuposto inafastável para a aplicação da denúncia espontânea, a
existência ou recolhimento de um tributo. O legislador utilizou a expressão
“se for o caso”, pela qual se evidencia que a exigência de pagamento de
tributo se aplica somente nos casos em que houver uma infração a uma
prestação cujo objeto seja o pagamento de tributo, e não a todas,
indiscriminadamente.

Nesse sentido, sustenta Luís Eduardo Schoueri que a expressão


“acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo e dos juros”
evidencia que haverá situações abrangidas pela norma em que não haverá
pagamento de tributo ou de juros328. Posição que também é defendida por
Misabel Derzi, para quem equivaleria a modificar indevidamente o teor do
artigo 138 do CTN a interpretação de que as multas pelo inadimplemento
de deveres instrumentais tributários não estariam abrangidas pela denúncia
espontânea, já que o referido dispositivo não abre nenhuma exceção ou
mitigações329, referindo-se, de forma ampla, à responsabilidade por
infrações em geral330.

Nessa linha de raciocínio, não seria lícito ao intérprete distinguir aquilo


que o legislador não distinguiu331, enquanto não houver a instituição de
restrição legislativa332 que vede tal possibilidade333. E não há, no
dispositivo em questão, qualquer condicionante da aplicação da denúncia
espontânea a um “vínculo direto com a existência do fato gerador do
tributo”, como frequentemente se sustenta no STJ. Pelo contrário, o
próprio enunciado normativo sugere que o vínculo é prescindível.

1319
Assim, verifica-se que o artigo 4º, parágrafo 3º, da IN RFB n.
1.277/2012, não institui um benefício de redução de 50% da sanção
pecuniária aplicada, mas verdadeiramente busca manter 50% da multa
aplicada, ainda que o infrator tenha reparado seu ilícito fiscal de forma
espontânea, em total descompasso com o comando positivado no artigo
138 do CTN.

5. CONCLUSÃO

A informatização fiscal, como importante ferramenta de racionalização


do sistema tributário e otimização da gestão pública dos tributos, tem
transformado de forma substancial a relação existente entre o fisco e o
contribuinte. Entretanto, a adequação da Administração Tributária à
economia digital, por mais salutar e relevante que seja, não pode servir de
subterfúgio para que se ignorem limites positivados para a instituição de
deveres instrumentais em nosso ordenamento jurídico.

O mesmo raciocínio aplica-se, pois, aos deveres instrumentais “digitais”


instituídos com a finalidade de otimizar o controle do comércio
internacional de serviços. Constatando-se que as informações que devem
ser prestadas por meio do Siscoserv podem ser obtidas por outros meios,
menos onerosos ao contribuinte, como contratos de câmbio devidamente
classificados e codificados por natureza de operação ou mediante a adição
de campos de preenchimento específicos para informações
complementares nas declarações já prestadas pelos contribuintes, torna-se
questionável a sua aderência ao artigo 113, parágrafo 2º, do CTN.

Igualmente as sanções impostas ao descumprimento dos deveres


instrumentais relacionados ao Siscoserv merecem críticas, na medida em
que não guardam relação com o bem jurídico lesionado pela conduta

1320
infratora (“interesse da fiscalização”). É dizer, inconsistências no valor
declarado ou omissões no valor declarado atingirão o exercício da
fiscalização com igual força, independentemente do tributo exigido em
cada situação. Seja como for, há de se reconhecer que a denúncia
espontânea efetuada pelo contribuinte implica a plena relevação da
penalidade cabível, nos termos do artigo 138 do CTN, e não apenas sua
redução pela metade, como previu o artigo 4º, parágrafo 3º, da Instrução
Normativa RFB n. 1.277/2012.

Por fim, dentro do tema “deveres instrumentais tributários”, é


fundamental que não se olvide a precisa advertência de Luís Eduardo
Schoueri, no sentido de que “se é certo que a arrecadação e o combate à
evasão fiscal são objetivos legítimos a serem perseguidos pelo Estado,
também está claro que a arrecadação não pode ser obtida a qualquer custo,
em detrimento de princípios e garantias constitucionais dos
contribuintes”334.

1321
Seção B
Economia digital, a Ação 1 do BEPS e a visão da ONU:
proposições e críticas

As estruturas de planejamento tributário


adotadas pelas empresas de tecnologia, as
proposições da Ação 1 do BEPS e as
iniciativas legislativas dos países ao redor do
mundo
335
Ricardo Maitto da Silveira

1. INTRODUÇÃO

Em janeiro de 2013, o então Primeiro-Ministro britânico, David


Cameron, afirmou que grandes empresas multinacionais atuavam de forma
“inescrupulosa” no Reino Unido336. Tais declarações foram dadas em
reação a um relatório encomendado pelo parlamento britânico, de
novembro de 2012, que acusou empresas como Amazon, Google e
Starbucks de produzirem lucros significativos no país sem o
correspondente recolhimento de tributos337.

O fogo cruzado contra as grandes multinacionais intensificou-se anos


antes de um vazamento de informações, conhecido como Panama Papers
(2016), revelar que a família do próprio David Cameron havia constituído
um fundo nas Bahamas, o qual possibilitou o não recolhimento de tributos
no Reino Unido. Desgastes políticos à parte, a enorme contradição a que

1322
ficou exposto o político britânico é fruto de uma antiga discussão: a
legitimidade das estruturas de planejamento tributário.

Embora o debate não seja recente, a questão tomou corpo em razão de


um contexto político-econômico específico: com a crise financeira de
2008, o mundo enfrentou um período de austeridade fiscal e corte de
despesas públicas. Em paralelo, a era da informação levou ao
conhecimento do público a enorme incompatibilidade entre os lucros
produzidos pelas grandes multinacionais e o montante de tributos
recolhidos nos países ondem atuavam.

No período pós-crise financeira, intensificaram-se os protestos públicos


contra as multinacionais, particularmente na Europa, e a polarização foi
inevitável. De um lado, as empresas sustentavam que suas práticas
estavam em conformidade com as regras tributárias vigentes e que têm o
dever fiduciário, perante os acionistas, de buscar a maximização de lucros.

No extremo oposto figuram aqueles que defendem a necessidade de se


estabelecerem regras mais rígidas para que as empresas recolham a sua
“parcela justa” de imposto. Essas vozes sustentam um sistema tributário
mais “igualitário”, condenando a prática de planejamento tributário como
algo que, mesmo sendo legal, é moralmente condenável338. Ao se
pronunciar sobre o tema em 2016, o então presidente dos Estados Unidos,
Barack Obama, reconheceu: “muito do que é feito [pelas empresas] é
legal, mas é exatamente esse o problema”339.

Na era da economia digital, essa questão tornou-se ainda mais


proeminente. Estudos recentes indicaram a enorme disparidade entre o
volume de operação das empresas de tecnologia em determinados países,
em termos de faturamento, número de funcionários etc., e o montante de

1323
tributos recolhidos340. Segundo a Comissão Europeia, os modelos de
negócio “digitalizados”, que são fortemente amparados pelo uso de ativos
intangíveis e se beneficiam de diversos incentivos fiscais, estão sujeitos a
uma carga tributária média de 8,5%, ao passo que os modelos de negócio
“tradicionais” submetem-se a uma carga tributária média de 23,2%341.

Uma das principais causas desse problema é o descompasso entre as


tradicionais regras tributárias, concebidas no início do século XX, e a
economia digital. As regras atuais foram concebidas para lidar
principalmente com a “velha economia”, que se baseia nos tradicionais
negócios de venda de mercadorias e serviços, vinculados fisicamente ao
território de um país (brick and mortar). Atualmente, grande parte da
economia é digital, e uma parte significativa dos negócios pode ser
realizada sem a presença física da empresa no local onde estão os
consumidores. Até mesmo os meios de pagamento estão sendo alterados,
com a crescente obsolescência das moedas físicas.

Não é por acaso que grande parte das atuais discussões em torno da
revisão das regras tributárias no mundo são voltadas para as estruturas
tributárias adotadas pelas grandes empresas de tecnologia. Cientes de que
o argumento da “moralidade” não é suficiente para lidar com o problema,
muitos países estão adotando medidas para adequar seus sistemas
tributários à nova realidade.

Nesse contexto, o Projeto BEPS representa uma iniciativa conjunta dos


países desenvolvidos para lidar com essa questão. Por meio da Ação 1, o
Projeto pretende discutir os principais desafios para a adequada tributação
das atividades desenvolvidas na economia digital. Além disso, muitos
países começaram a introduzir, de forma unilateral, regras tributárias
especificamente voltadas para as empresas de tecnologia.

1324
Para analisar a questão de forma mais aprofundada, é fundamental
compreender a essência das estruturas tributárias adotadas pelas empresas
multinacionais, de forma a pontuar as principais fragilidades das regras
tributárias vigentes, e também as possíveis soluções para o problema.
Nesse sentido, o presente artigo pretende apresentar ao leitor uma visão
geral dessas estruturas, tendo por base os exemplos descritos no Relatório
Final da Ação 1 do Projeto BEPS342 (BEPS 1).

Como escopo secundário, serão apresentadas algumas iniciativas


legislativas que pretendem “preencher as lacunas” que permitem tais
planejamentos tributários. Nesse sentido, serão abordadas, além das
proposições contidas no próprio BEPS 1, o diverted profit tax introduzido
no Reino Unido e na Austrália em 2015, o equalization tax instituído na
Índia em 2016 e as iniciativas de países como França e Itália.

Para limitar o escopo de análise, as discussões serão restritas à


tributação direta. Ao final, serão apresentadas as nossas conclusões, com
uma breve referência aos impactos da recente reforma tributária norte-
americana, além de algumas considerações sobre a legislação brasileira.

2. AS PRINCIPAIS ESTRUTURAS DE PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO


ADOTADAS PELAS EMPRESAS DE TECNOLOGIA

2.1. Apresentação do tópico

O Anexo B do BEPS 1 contém alguns exemplos daquilo que o relatório


denomina “típicas estruturas de planejamento tributário” desenvolvidas
por meio de modelos de negócio integrados. Inicialmente o relatório
apresenta uma descrição detalhada da estrutura legal criada pelo hipotético
grupo econômico RCo, em diversos países, sem identificá-los
nominalmente. Posteriormente, o relatório destaca os efeitos tributários

1325
que a estrutura gera em cada um dos países, particularmente quanto à
redução de base tributável efetiva do Grupo RCo.

Os exemplos levam em considerações algumas das principais atividades


desenvolvidas por empresas multinacionais na era da economia digital.
Assim, ilustram as estruturas de venda de produtos por meio de
plataformas online (item 2.2), a venda de publicidade pela internet (2.3) e
a venda de aplicativos por meio de lojas virtuais (2.4).

Embora hipotéticos, os casos descritos têm evidente similaridade com


as estruturas tradicionalmente utilizadas por empresas como Apple,
Amazon e Google. Assim, à medida que os casos forem apresentados,
serão estabelecidas algumas correlações com as estruturas adotadas por
tais empresas, com particular atenção às jurisdições envolvidas, a exemplo
da Irlanda, de Luxemburgo e da Holanda.

2.2. Venda de produtos online para consumidores finais (online retailer)

2.2.1. Descrição da estrutura

O primeiro exemplo trata de um grupo multinacional que atua na venda


online de produtos físicos e digitais, o Grupo RCo, cujo website oferece os
produtos nos mercados onde atua, no idioma local, com a possibilidade de
pagamento por meio de cartão de crédito. Os produtos físicos são
entregues por meio de serviços terceirizados, ao passo que os produtos
digitais são transferidos via download.

Na estrutura adotada pelo Grupo RCo, o processo de compra permite a


obtenção de dados pessoais dos clientes, os quais são processados e
analisados por meio de um sofisticado software, sendo os resultados

1326
utilizados para fazer novas recomendações de compra e propaganda
direcionada aos potenciais clientes.

Os intangíveis inerentes ao negócio são desenvolvidos por funcionários


de uma empresa denominada RCo, residente no Estado R. Essa empresa é
responsável por coordenar as atividades de venda, o controle de estoque e
as demais tarefas administrativas. Tais serviços são executados com base
em contratos firmados entre a RCo e as subsidiárias locais.

Ocorre que a RCo transferiu os direitos sobre os intangíveis utilizados


no processo de venda (website) para uma empresa com atuação regional, a
RCo Regional Holding, residente do Estado T, que os adquiriu por meio de
um arranjo contratual de compartilhamento de custos. Tal contrato prevê o
pagamento de um montante inicial (buy in) equivalente ao valor dos
intangíveis e, ainda, a obrigação de compartilhar os custos de
desenvolvimento futuro de tais intangíveis. Cabe notar que a titularidade
legal dos intangíveis é mantida pela RCo, já que o contrato em questão
prevê apenas a transferência dos direitos de exploração comercial.

As ordens de compra dos produtos na região de atuação da RCo


Regional Holding são gerenciadas por uma subsidiária, a RCo Regional
OpCo, também residente no Estado T, que cuida dos processos relativos à
venda, ao pagamento e à liquidação das transações, e que detém a
propriedade legal dos produtos comercializados. O processo de compra é
formalizado eletronicamente por meio de contratos padronizados, sem que
exista um contato direto entre os funcionários da RCo Regional OpCo e os
clientes. Além disso, a RCo Regional OpCo é uma “empresa híbrida”, já
que é qualificada como “empresa” para fins fiscais no Estado T, mas é
tratada como fiscalmente transparente no Estado R.

1327
As diversas subsidiárias locais, a exemplo da SCo, residente no Estado
S, prestam serviços para a RCo Regional OpCo quanto à logística e ao
suporte pós-venda dos produtos comercializados em seus respectivos
territórios. No caso da SCo, as ordens de compra são atendidas por meio
de um centro de distribuição localizado no Estado S, que é detido e
operado pela própria SCo. Pelos serviços prestados, a SCo é remunerada
pela RCo Regional OpCo com base no custo incorrido, mais uma margem
de lucro.

A estrutura pode ser visualizada no diagrama a seguir, extraído do


BEPS 1.

Diagrama 1 – Vendas online para consumidor final (online retailer)

Fonte: BEPS 1, p. 169.

O exemplo acima é claramente inspirado na estrutura adotada pela


Amazon na Europa. Informações públicas dão conta de que a
Amazon.com, Inc. (“Amazon US”), a matriz norte-americana do grupo
(leia-se RCo), transferiu os direitos sobre a propriedade intelectual
associada ao website da empresa para duas empresas residentes em

1328
Luxemburgo: a Amazon Europe Holding Technologies SCS ou “Amazon
Holding” (leia-se RCo Regional Holding) e Amazon EU Sàrl ou “Amazon
EU” (leia-se RCo Regional OpCo)343.

A Amazon Holding era uma empresa sem efetiva substância


econômica, isto é, não tinha funcionários, sede própria ou qualquer
atividade econômica concreta. Como a empresa fora constituída sob a
forma de “limited partnership”, fazia jus a um regime de transparência
fiscal em Luxemburgo, segundo o qual seus lucros eram tributos
unicamente no nível dos sócios. A sua função, portanto, era intermediar a
transferência dos direitos de propriedade intelectual entre a matriz e a
Amazon EU, já que sublicenciava os referidos direitos para a Amazon EU
e, ao mesmo tempo, fazia pagamentos anuais para a Amazon US afim de
custear as despesas de pesquisa e desenvolvimento incorridas nos Estados
Unidos.

A Amazon EU é que conduzia a atividade operacional do grupo na


Europa, com mais de 500 empregados responsáveis por selecionar os
produtos a serem comercializados no website da empresa, adquirir
produtos junto a fornecedores e gerenciar o processo de venda como um
todo. De acordo com a estrutura adotada pelo grupo, a Amazon EU
figurava como contraparte em todas as vendas realizadas na Europa,
registrando a totalidade das receitas de vendas, ainda que tais transações
fossem realizadas com o suporte de subsidiárias locais.

Na prática, as receitas de vendas registradas pela Amazon EU eram


abatidas por royalties pagos à Amazon Holding, que atingiam, em média,
o equivalente a 90% dos lucros auferidos pela primeira empresa. Ademais,
os royalties recebidos pela Amazon Holding eram materialmente inferiores

1329
àquelas contribuições anuais feitas por esta empresa em favor da matriz
norte-americana.

A estrutura adotada pelo grupo Amazon foi formalmente respaldada por


rulings emitidos pelo governo luxemburguês, que atestavam a sua
conformidade às regras tributárias locais. Porém, após a divulgação do teor
desses rulings, em novembro de 2014, por meio do chamado LuxLeaks344,
iniciou-se um processo de investigação por parte da Comissão Europeia, o
órgão executivo da União Europeia. Em paralelo, o fisco norte-americano
também passou a questionar o critério de valoração adotado pela Amazon
US na transferência dos direitos de propriedade intelectual para as
empresas luxemburguesas.

Em outubro de 2017, a Comissão Europeia concluiu que os benefícios


fiscais concedidos por Luxemburgo à Amazon não estavam em
conformidade com as regras do EU State Aid, já que possibilitavam à
empresa recolher tributos com base em alíquotas substancialmente
inferiores àquelas aplicáveis em condições normais, não refletindo assim a
realidade econômica das transações firmadas entre as empresas do
grupo345. Nos Estados Unidos, embora a empresa tenha obtido decisão
favorável na esfera administrava, a questão ainda permanece sob litígio346.

2.2.2. Principais efeitos tributários da estrutura para os países envolvidos

A forma de estruturação dos negócios no exemplo hipotético descrito


acima traz significativas consequências quanto à tributação efetiva do
Grupo RCo. De forma geral, a transferência dos direitos sobre os
intangíveis para uma subsidiária regional (RCo Regional Holding), aliado
à ausência de sujeição tributária dessa mesma empresa no Estado S, onde
as vendas são realizadas, faz com que a maior parte da renda tributável

1330
gerada pelo grupo fique concentrada no Estado T, onde a empresa faz jus a
um regime fiscal preferencial.

Inicialmente, cabe notar que há uma alocação mínima de renda


tributável para o Estado S, onde está localizado o mercado consumidor. Na
prática, essa empresa recebe apenas uma remuneração pelos serviços de
gerenciamento logístico e de pós-venda. Isso significa que, embora a fonte
originária dos rendimentos esteja localizada no Estado S, a parcela de
tributos recolhida naquele país é bastante reduzida.

As receitas de venda dos produtos no Estado S são tratadas como


rendimentos da RCo Regional OpCo, a empresa operacional do grupo, já
que esta figura legalmente como contraparte nos contratos de venda. Como
essa empresa não tem presença física nos países onde estão localizados os
mercados consumidores, o fisco desses países não pode tributar os lucros
da transação.

Essa restrição à tributação no país da fonte da renda, se não decorrer


diretamente da ausência de uma regra doméstica (tributação na fonte), será
aplicada em razão de um acordo de bitributação, o qual usualmente
consagra o princípio da tributação dos lucros das atividades empresarias
exclusivamente no país de residência da empresa. Não é por acaso,
portanto, que a jurisdição escolhida pela Amazon (Luxemburgo) é
particularmente conhecida pela vasta rede de acordos de bitributação
firmados junto aos países da Europa.

Ainda no exemplo sob discussão, embora o Estado T possa tributar os


lucros da RCo Regional Holding, a aplicação de um regime fiscal
preferencial reduz a alíquota efetiva do imposto da empresa. No caso da
Amazon, esse “regime fiscal preferencial” equivale ao mecanismo de

1331
transparência fiscal a que estava sujeita a Amazon Holding, que permitia
que seus lucros fossem tributados apenas no nível dos sócios.

Por outro lado, embora o Estado T também possa tributar os lucros da


RCo Regional OpCo, decorrentes das vendas online, parte significativa
desses lucros é abatida pelos royalties pagos em favor da RCo Regional
Holding. De fato, conforme visto no caso da Amazon, a Amazon EU
pagava um percentual médio de 90% dos seus lucros à Amazon Holding,
na forma de royalties, reduzindo consideravelmente a sua base tributável.

O Estado R, por sua vez, pode cobrar um imposto sobre os lucros da


RCo, incluindo aqueles decorrentes da transferência de direitos sobre os
intangíveis para a RCo Regional Holding. Porém, como não há um
parâmetro razoável para valorar esses intangíveis, a RCo pode sustentar
que o valor de tais ativos é muito baixo. Foi exatamente essa a situação
verificada no caso da Amazon, já que o valor atribuído aos direitos de
propriedade intelectual transferidos pela Amazon US era relativamente
baixo. Isso levou, inclusive, a questionamentos nos Estados Unidos quanto
ao critério de valoração dos intangíveis.

Ainda no Estado R, as regras domésticas de tributação de lucros no


exterior (CFC) poderiam forçar a RCo a tributar a renda passiva (royalty)
auferida pela subsidiária RCo Regional Holding. No entanto, como a RCo
Regional OpCo, que paga os royalties, é considerada fiscalmente
transparente no Estado R, a existência desse pagamento é desconsiderada
para fins fiscais, e não mais se qualifica como renda passiva, podendo ser
tributada apenas no momento da efetiva distribuição. Trata-se de situação
semelhante àquela ocorrida no caso da Amazon: nos Estados Unidos, as
regras locais permitiam o diferimento da tributação dos lucros da Amazon
US para o momento da efetiva distribuição, de tal forma que grande parte

1332
dos lucros produzidos pela empresa na Europa pudesse ser “represada” na
Amazon Holding.

2.3. Venda de publicidade pela internet (internet advertising)

2.3.1. Descrição da estrutura

O segundo exemplo do BEPS 1 ilustra um cenário em que o grupo


multinacional RCo atua na prestação de múltiplos serviços de internet
(e.g., sites de busca) para clientes ao redor do mundo. Muitos desses
serviços não são cobrados, mas propiciam ao grupo obter dados pessoais
dos usuários, que são analisados por meio de um sofisticado algoritmo e
posteriormente utilizados em publicidade direcionada. Com isso, a maior
parte das receitas auferidas pelo Grupo RCo advém da venda de
publicidade por meio de sua plataforma online, tendo como
contraprestação um valor referenciado no número de usuários que acessa
os banners de publicidade.

A tecnologia utilizada nas atividades do Grupo RCo foi desenvolvida


por funcionários da empresa RCo, a matriz do Grupo situada no Estado R.
Os direitos de explorar essa tecnologia, em determinada região, são detidos
por uma subsidiária com dupla residência fiscal denominada XCo,
constituída no Estado T, mas cuja administração efetiva ocorre no Estado
X. A XCo adquiriu os direitos de propriedade intelectual com base em um
contrato de compartilhamento de custos similar àquele descrito no
exemplo anterior.

A XCo licencia os direitos de uso da tecnologia para uma subsidiária


estrangeira residente no Estado Y, a YCo, a qual sublicencia esses mesmos
direitos para uma empresa residente no Estado T, a TCo, mantendo uma
pequena margem sobre o valor dos royalties pagos e recebidos. Tanto a

1333
YCo quanto a TCo são “empresas híbridas”, ou seja, são tratadas como
“empresas” para fins fiscais no Estado em que estão localizadas, mas
qualificadas como fiscalmente transparentes no Estado R. Por outro lado,
as empresas YCo e XCo apresentam uma estrutura corporativa bastante
reduzida (estrutura física mínima, nenhum funcionário etc.).

A TCo atua como matriz regional do Grupo RCo e emprega uma


quantidade substancial de funcionários para o gerenciamento das
atividades do grupo na região, operando os websites e figurando como
parte das transações de venda de publicidade. Os contratos de publicidade
da TCo são concluídos eletronicamente.

A fim de lidar com grandes mercados e com clientes mais importantes,


o Grupo RCo constituiu diversas subsidiárias locais que atuam na
promoção dos serviços de publicidade, a exemplo da SCo. Tal empresa,
que é residente no Estado S, tem a função de promover os produtos do
grupo e prestar serviços de suporte de marketing.

A estrutura pode ser visualizada no diagrama a seguir, extraído do


BEPS 1.

Diagrama 2 – Venda de publicidade pela internet (internet


advertising)

1334
Fonte: BEPS 1, p. 175.

A semelhança entre o exemplo acima e a estrutura adotada pelo Google


não é mera coincidência. Informações públicas revelaram que a matriz do
grupo nos Estados Unidos, Alphabet Inc. (leia-se RCo), transferiu parte da
propriedade intelectual associada às atividades da empresa para uma
subsidiária na Irlanda denominada Google Ireland Holdings Unlimited ou
“Google Holdings” (leia-se XCo). Essa empresa foi constituída sob as leis
da Irlanda, mas tem administração formal nas Ilhas Bermudas. Como a
sujeição tributária das empresas na Irlanda é definida pelo critério da
“administração efetiva”, a Google Ireland não é qualificada como residente
fiscal na Irlanda. Por outro lado, sendo as Ilhas Bermudas um paraíso
fiscal, não há cobrança efetiva de imposto corporativo sobre os lucros
registrados pela empresa.

Essa estrutura contempla a constituição de uma segunda empresa na


Irlanda, a Google Ireland Limited ou “Google Ireland” (leia-se TCo), que

1335
desempenha a atividade operacional do grupo na Europa, gerenciando os
websites e figurando como contraparte nas relações com os clientes. A
parcela significativa dos lucros da operação é registrada pela Google
Ireland, mas esses lucros são reduzidos em função de royalties pagos em
favor de uma terceira empresa com sede na Holanda, a Google
Netherlands Holdings BV ou “Google BV” (leia-se YCo). A Google BV
atua como intermediária no licenciamento dos direitos de propriedade
intelectual, retendo uma pequena margem no processo de intermediação.
Ao final, os lucros da atividade são em sua maioria direcionados para a
Google Holding (Bermudas).

A criação de duas empresas na Irlanda conferiu a essa estrutura, que foi


e vem sendo largamente utilizada por empresas de tecnologia, o apelido de
“double Irish sandwich” ou, quando envolve também a constituição de
empresa na Holanda, como no caso do Google, “double Irish and Dutch
sandwich”. Na maior parte dos casos, as estruturas são respaldadas por
rulings emitidos pelas administrações tributárias locais.

O Google tem enfrentado inúmeros questionamentos quanto à estrutura


adotada tanto nos Estados Unidos quanto em países da Europa, a exemplo
do Reino Unido, Itália e França. Afinal, embora os clientes da empresa
estejam localizados nesses países, os lucros são registrados na Irlanda, e
ficam sujeitos a uma tributação reduzida naquele país, já que há uma
“realocação” de parcela significativa para as Ilhas Bermudas.

A empresa firmou um acordo com o Reino Unido no início de 2016


para recolher tributos sobre operações passadas no país e alterar a sua
estrutura, de forma a direcionar parte da base tributável para o Reino
Unido347. É interessante notar que, mesmo tendo concordado em firmar o
acordo, houve o reconhecimento por parte do fisco britânico de que a

1336
estrutura adotada pela empresa não era ilegal. Um acordo semelhante foi
firmado na Itália em maio de 2017348.

Na França, a empresa obteve um resultado favorável até o momento.


Em julho de 2017, um tribunal administrativo francês decidiu em favor do
Google, reconhecendo que os lucros registrados em vendas realizadas na
França não estavam sujeitos à tributação naquele país, já que as atividades
desenvolvidas pela subsidiária francesa eram meramente instrumentais.
Como os lucros eram atribuídos à Google Ireland, e restou decidido que a
empresa não tinha um estabelecimento permanente na França, tais lucros
não poderiam ser tributados no país349.

2.3.2. Principais efeitos tributários da estrutura para os países envolvidos

O exemplo descrito no item anterior, devidamente ilustrado pelo caso


Google, revela as lacunas contidas nas regras tributárias vigentes, e que
possibilitam a adoção de meios legais de planejamento tributário. Na
prática, a estrutura em questão permite direcionar uma parcela substancial
das receitas tributáveis para o Estado X (leia-se Bermudas), sendo uma
parte mínima alocada para os demais países (Estados S, R e T).

De fato, há uma alocação mínima de renda tributável para o Estado S,


onde está o mercado consumidor. As receitas de venda de publicidade no
Estado S são tratadas como rendimentos da TCo, que figura legalmente
como parte nos contratos. O fato de os funcionários da SCo não terem
poderes para obrigar contratualmente a TCo impede que seja configurada a
existência de um estabelecimento permanente da TCo no Estado S. Assim,
a administração tributária do Estado S não pode tributar os lucros da
transação.

1337
No Estado T, embora seja possível a cobrança de imposto sobre os
lucros de TCo, a base tributável da empresa é substancialmente reduzida
em função dos royalties pagos para YCo pela tecnologia licenciada.
Ademais, tal pagamento não está sujeito ao imposto de renda na fonte em
face do acordo de bitributação entre os Estados T e Y. O mesmo se dá no
caso Google, em que os fluxos de pagamentos entre Irlanda e Holanda,
aliado à aplicação do acordo de bitributação firmado entre esses países,
permite uma dedução fiscal de royalties no nível da Google Ireland e, ao
mesmo tempo, a não incidência do imposto de renda na fonte sobre os
pagamentos realizados entre as empresas localizadas nestes países.

Embora o Estado Y possa tributar os lucros da YCo (leia-se Google


BV), a base tributável da empresa é limitada à diferença entre o valor dos
royalties pagos e recebidos. O Estado X, por sua vez, não cobra o imposto
de renda corporativo. Trata-se de um típico paraíso fiscal que, no caso
Google, equivale às Ilhas Bermudas.

Também neste exemplo há uma peculiaridade no país onde está


localizada a matriz do grupo. O Estado R pode cobrar imposto sobre os
lucros da RCo, incluindo aqueles decorrentes da transferência de direitos
sobre intangíveis, mas não há um parâmetro razoável para valorar tais
ativos, o mesmo problema se estendendo às contribuições anuais feitas
pela subsidiária XCo. Além disso, as regras tributárias do Estado R
qualificam a YCo e a TCo como fiscalmente transparentes, de forma a
desconsiderar as transações concluídas entre XCo, YCo e TCo. Assim, os
rendimentos auferidos por YCo e TCo são atribuídos, para fins fiscais,
diretamente à XCo, podendo ser tributados apenas no momento da efetiva
distribuição para a matriz RCo.

1338
Os mesmos problemas são identificados no caso Google, em que os
Estados Unidos, país onde está localizada a matriz do grupo, permitem a
transferência dos intangíveis com base em critérios de valoração que
podem se distanciar da realidade econômica (embora essa questão tenha
gerado litígios entre o fisco norte-americano e as empresas). Ademais,
pelas regras CFC norte-americanas então vigentes, era possível diferir a
tributação dos lucros auferidos por subsidiárias estrangeiras.

2.4. Venda de aplicativos online (internet app store)

2.4.1. Descrição da estrutura

O último exemplo trata da hipótese em que o grupo RCo desenvolveu


um sistema operacional para telefones celulares e outros dispositivos
portáteis, por meio do qual mantém uma loja virtual de aplicativos. Os
usuários dos dispositivos fabricados pelo Grupo RCo pagam pelo
download de aplicativos, incluindo também aqueles desenvolvidos por
terceiros.

Os desenvolvedores independentes de aplicativos que pretendam


comercializar seus produtos pela loja virtual da RCo devem utilizar o
software fornecido pela empresa. Os preços dos produtos são definidos
pelos desenvolvedores a partir de diretrizes estabelecidas pelo Grupo RCo,
sendo a eles atribuída uma parcela de 75% das receitas de venda dos
produtos pela loja virtual, e os demais 25% atribuídos ao Grupo RCo.

Na fase inicial das atividades do Grupo RCo, a RCo alienou os direitos


sobre a tecnologia associada à loja virtual, além dos demais intangíveis
inerentes ao negócio, para uma subsidiária, a TCo, residente no Estado T.
Em paralelo, a RCo firmou um contrato de prestação de serviços por meio
do qual continua fornecendo atualizações e melhorias, recebendo uma

1339
contraprestação referenciada no custo dos serviços, mais uma margem de
lucro.

A TCo gerencia o processo de cobrança junto aos clientes e também aos


desenvolvedores independentes. Os contratos relativos à compra dos
produtos são concluídos eletronicamente por meio de processos
automatizados. Em mercados mais relevantes, a TCo constituiu afiliadas
locais para assessorá-la com a promoção de seus produtos. Tais afiliadas, a
exemplo da SCo, residente no Estado S, não estão formalmente envolvidas
no processo de venda de produtos ou nos contratos de comissão celebrados
com os desenvolvedores independentes.

A estrutura pode ser visualizada no diagrama a seguir, extraído do


BEPS 1.

Diagrama 3 – Venda de aplicativos online (internet app store)

1340
Fonte: BEPS 1, p. 179.

Não há como negar a fonte de inspiração do exemplo descrito: trata-se


da estrutura adotada pela Apple por meio de subsidiárias irlandesas. A
Apple Inc. é a matriz do grupo sediada nos Estados Unidos, que transferiu
os direitos de propriedade intelectual para afiliadas do grupo, a exemplo da
Apple Sales International e da Apple Operations Europe, ambas com sede
na Irlanda350. Os contratos em questão preveem que as subsidiárias
irlandesas devem efetuar contribuições anuais para custear as atividades de
pesquisa e desenvolvimento da Apple Inc.

As subsidiárias irlandesas têm atividade operacional efetiva, com sede


própria e centenas de funcionários, e se responsabilizam pelas vendas de
produtos e serviços da Apple no mundo. Na Europa, por exemplo, as
operações foram estruturadas de tal forma que os produtos são adquiridos

1341
formalmente junto às subsidiárias irlandesas, e não junto às subsidiárias
localizadas em cada um dos países onde estão os mercados consumidores.

Com base em acordos firmados entre a Apple e o fisco irlandês


(rulings), admitia-se legalmente uma “realocação” dos lucros registrados
pelas subsidiárias irlandesas, apenas para fins fiscais, sob o pressuposto de
que as empresas não tinham residência fiscal na Irlanda, já que eram
administradas por uma “sede” (head office) localizada fora do território
irlandês.

Na prática, essa “sede” não estava localizada em nenhuma jurisdição,


isto é, não se sujeitava às regras tributárias de nenhum país (“stateless
companies”), de tal forma que apenas uma fração dos lucros originalmente
atribuídos às empresas irlandesas era registrada e tributada na Irlanda.
Criou-se, assim, um descasamento considerável entre o montante de lucros
registrados nos balanços das empresas irlandesas e o valor dos tributos
recolhidos. Segundo notícias divulgadas pela imprensa, o imposto
corporativo pago por tais empresas entre 2003 e 2014 não superava o
percentual de 1% do lucro351.

A Comissão Europeia, por meio de uma investigação iniciada em 2014,


entendeu que a Irlanda concedeu benefícios fiscais indevidos para a Apple,
no montante de até 13 bilhões de euros, em violação às regras do EU State
Aid. Na decisão, proferida em agosto de 2016352, concluiu-se que os rulings
emitidos em favor da Apple, embora estivessem em conformidade com a
legislação então vigente, reduziram substancialmente, e de forma artificial,
os lucros auferidos pela empresa na Europa. A decisão impõe à Irlanda a
obrigação de restituir o valor equivalente ao benefício fiscal indevido.

2.4.2. Principais efeitos tributários da estrutura para os países envolvidos

1342
A essa altura pode-se perceber com clareza a forma como a estruturação
descrita no exemplo acima permite a redução ou o diferimento dos lucros
auferidos pelo Grupo RCo. Em face de tal estrutura, uma parcela relevante
dos lucros gerados pela TCo no Estado T (leia-se Irlanda) permanece fora
do escopo de aplicação das regras tributárias do Estado T ou de qualquer
outro país (“stateless income”).

Com efeito, nos países onde estão localizados os mercados


consumidores, a exemplo do Estado S, a alocação de renda tributável é
mínima. No caso da Apple, a SCo equivale às subsidiárias locais do grupo
que oferecem suporte operacional para as vendas de produtos e serviços.

As receitas de venda dos aplicativos são tratadas como rendimentos da


TCo, que figura legalmente como parte nos contratos com os clientes. O
Estado T cobra o imposto corporativo sobre os significativos lucros
auferidos pela TCo, mas a alíquota do imposto é equivalente a 50%
daquela aplicável nos Estados R e S. No caso da Apple, verificou-se que a
aplicação de regras domésticas da Irlanda, devidamente respaldadas por
acordos firmados com o fisco local (rulings), afastava a caracterização das
empresas irlandesas como residentes fiscais naquele país, de tal forma que
seus lucros não estavam sujeitos ao imposto corporativo irlandês.

Ainda no exemplo citado, o Estado R pode cobrar imposto sobre os


lucros da RCo, incluindo o ganho de capital decorrente da transferência de
direitos sobre os intangíveis para a TCo. Porém, como não há um
parâmetro razoável para valorar tais intangíveis, a empresa pode sustentar
que o seu valor é muito baixo, de forma a reduzir a sua base tributável.
Some-se a isso o fato de a legislação tributária do Estado R não
contemplar regras que obriguem a RCo a tributar os lucros não
distribuídos da TCo. É o que ocorria nos Estados Unidos previamente à

1343
aprovação da reforma tributária, o que permitia à Apple Inc. diferir a
tributação dos lucros auferidos fora daquele país.

3. INICIATIVAS LEGISLATIVAS PARA COMBATER OS


PLANEJAMENTOS TRIBUTÁRIOS AGRESSIVOS

3.1. O Plano BEPS 1 e a visão da União Europeia

Conforme comentado anteriormente, a publicidade atribuída às


estruturas de planejamento tributário adotadas pelas empresas de
tecnologia gerou fortes reações públicas, especialmente na Europa. Nesse
contexto, o Projeto BEPS representou uma das principais iniciativas dos
países desenvolvidos para criar mecanismos conjuntos de combate a tais
estruturas.

O Projeto BEPS, desenvolvido por um grupo de trabalho que engloba a


OCDE e os países do G20, tem como principal objetivo sugerir políticas
de combate a essas estratégias de planejamento tributário. Em outubro de
2015, o grupo de trabalho apresentou os relatórios finais relativos aos 15
planos de ação do Projeto, dentre os quais se destaca o já mencionado
Plano de Ação 1, cujo Anexo B serviu como base para os exemplos citados
no item anterior.

A doutrina tem criticado o BEPS 1, já que o relatório não sugeriu


políticas concretas e uniformes para enfrentar os desafios da tributação da
economia digital353. De fato, a conclusão final do relatório reflete a falta de
consenso entre os países quanto às medidas a serem adotadas, e posterga
para 2020 a publicação de um relatório final sobre o tema. Isso acabou por
forçar alguns países a adotar iniciativas unilaterais, conforme será
apontado posteriormente.

1344
É certo, porém, que o BEPS 1 sugere alguns possíveis mecanismos para
lidar com o problema, embora não os recomende formalmente. São eles:
(i) a introdução de um “teste de presença econômica significativa”; (ii) a
criação de um imposto de renda na fonte sobre transações digitais; e (iii) a
criação de um tributo de equalização (equalization levy).

O teste de “presença econômica significativa” tem o propósito de


atribuir a uma empresa estrangeira uma sujeição tributária (taxable
presence) no país de localização do mercado consumidor, a partir de
fatores que denotem a vinculação entre a atividade exercida e a economia
do país (new nexus approach). Esses fatores podem incluir a existência de
um website local ou uma plataforma digital local, a existência de usuários
registrados no país, a conclusão regular de contratos eletrônicos com tais
usuários, o volume de dados coletados junto aos usuários, entre outros354.

O BEPS 1 considera, ainda, a criação de um imposto de renda na fonte


sobre pagamentos feitos por fontes locais, em contraprestações pela
aquisição de mercadorias e serviços online junto a não residentes. Esse
imposto poderia incidir, por exemplo, sobre o montante bruto dos valores
atribuídos a empresas não residentes.

O próprio relatório reconhece, porém, que esse tipo de cobrança suscita


alguns conflitos de ordem legislativa, em particular quanto à possível
incompatibilidade com as regras internacionais (GATT, GATS e
especialmente os acordos de bitributação vigentes), além das dificuldades
de implementação quanto à cobrança do imposto no caso de transações
envolvendo consumidores finais (B2C – business to consumer
transactions)355.

1345
Outra alternativa sugerida pelo BEPS 1 é a criação de um tributo de
equalização, ou equalization levy, em linha com o mecanismo introduzido
por alguns países para assegurar a igualdade de tratamento tributário entre
transações envolvendo partes estrangeiras e partes locais. Tal tributo pode
ser estruturado sob variadas formas, a exemplo de um imposto sobre o
consumo ou industrialização (excise tax) ou mesmo como uma forma
alternativa de tributar as atividades empresariais de um não residente que
tenha presença econômica significativa no território do país356.

Enquanto os países do G20 e a OCDE continuam o trabalho de


discussão e acompanhamento dos temas ligados à tributação de economia
digital, com a previsão de publicação de um relatório intermediário em
meados de 2018 (além do relatório final em 2020), a União Europeia
também tem atuado ativamente na discussão do tema.

Para além dos processos de investigação que vêm sendo conduzidos em


relação aos incentivos fiscais concedidos por Estados Membros (State Aid
control), a exemplo dos casos Apple e Amazon, a Comissão Europeia
criou grupos de trabalho para consolidar informações sobre o nível de
tributação das empresas de tecnologia na Europa e pressionar os Estados-
Membros a adotar um consenso sobre a revisão das atuais normas
tributárias.

Por meio da chamada estratégia de mercado único digital (DSM


Strategy), o bloco pretende eliminar obstáculos que impeçam o
desenvolvimento da economia digital na Europa, destacando-se as medidas
de revisão dos sistemas tributários, de forma a assegurar a justa e efetiva
tributação dos negócios da economia digital357.

1346
Em relatório publicado em setembro de 2017, a Comissão Europeia
sustentou que as regras tributárias internacionais “precisam ser reformadas
de forma a capturar o valor criado pelos novos modelos de negócio”,
enfatizando que “tem se provado difícil chegar a um consenso em nível
global, conforme evidenciado pelo relatório da OCDE de outubro de 2015
[BEPS 1]”. A Comissão Europeia demonstrou a preocupação dos Estados-
Membros no sentido de desenvolver regras de forma coordenada,
enfatizando que o novo relatório da OCDE deve apresentar “conclusões
apropriadas e realistas” e identificar “opções de política [fiscal] genuínas
para enfrentar esse desafio”358.

Há, porém, uma clara falta de consenso entre os países da União


Europeia. Enquanto a Comissão defende a discussão em torno de um
conjunto de regras comuns para calcular a base tributável das empresas no
bloco, denominada Base Tributável Consolidada Comum (Common
Consolidated Corporate Tax Base – CCCTB)359, que nunca chegou a ser
implementado, um grupo de países liderados por França, Alemanha,
Espanha e Itália sustenta a adoção de medidas unilaterais imediatas, a
exemplo de um tributo sobre a receita, que seria aplicado exclusivamente
às empresas de tecnologia360.

3.2. O diverted tax profit do Reino Unido

Antes mesmo da apresentação da versão final do BEPS 1, coube ao


Reino Unido a iniciativa de introduzir uns dos primeiros conjuntos de
regras destinadas a coibir as práticas de planejamento tributário das
empresas de tecnologia: o diverted tax profits (DPT). Como o Reino Unido
foi um dos países a encabeçar o Projeto BEPS, o anúncio da criação do
DPT foi uma surpresa para a comunidade internacional, já que

1347
representava uma iniciativa unilateral dissonante das medidas coordenadas
previstas no Projeto BEPS.

Não é por acaso que o DPT foi apelidado de “Google tax”, embora o
escopo de aplicação do imposto não seja restrito às empresas de
tecnologia. De acordo com o UK 2015 Finance Bill, o propósito do DPT é
“conter o uso de técnicas agressivas de planejamento tributário utilizadas
por empresas multinacionais para desviar lucros do Reino Unido para
jurisdições com baixa tributação”361. Com efeitos a partir de abril de 2015,
o DPT impõe uma taxa de 25% sobre os lucros artificialmente “desviados”
do Reino Unido.

Uma primeira situação que enseja a aplicação do DPT envolve


empresas britânicas que adotem estruturas ou que realizem transações,
ambas sem substância econômica, e que resultem no chamado
“descasamento tributário” (tax mismatch). Um exemplo é a situação em
que uma empresa no Reino Unido transfere direitos de propriedade
intelectual para uma afiliada no exterior, situada em um país de baixa
tributação, e paga royalties dedutíveis para tal empresa.

No exemplo citado, se, em razão das circunstâncias, ficar comprovado


que a beneficiária dos pagamentos não tem capacidade operacional para
explorar a propriedade intelectual (ausência de substância), e que a
dedução fiscal no Reino Unido não foi acompanhada de um
correspondente acréscimo na base tributável da beneficiária (tax
mismatch), fica caracterizada uma situação sujeita ao DPT.

Outra circunstância que enseja a aplicação do DPT é aquela envolvendo


empresas estrangeiras que comercializem produtos no mercado britânico,
mas estruturem suas atividades de forma a impedir a sua qualificação

1348
como residente fiscal no Reino Unido, ou a sujeição dos lucros ao imposto
corporativo local (taxable presence).

Um exemplo simples da situação descrita acima é o das empresas que


comercializam mercadorias e serviços no Reino Unido com o suporte de
subsidiárias locais, criadas para atuar em funções instrumentais (marketing
e pós-venda), em que os contratos são formalmente concluídos entre os
clientes e as empresas estrangeiras.

As regras do DPT foram desenhadas a partir de “testes” que devem ser


aplicados para determinar a ausência de “substância econômica” e/ou o
“descasamento tributário”, e preveem algumas exceções ou isenções362.
Ressalte-se, ainda, que a aplicação do DPT requer a “requalificação” ou
“normalização” da transação ou das transações para se determinar qual a
parcela do lucro presumidamente “desviada”, sobre a qual recai o imposto
de 25%.

É interessante notar que, como a alíquota corporativa no Reino Unido é


de 19٪, o DPT tem uma função indutora: estimular as empresas a tributar
seus resultados localmente. Além disso, segundo a visão sustentada pela
administração tributária do Reino Unido, a aplicação do DPT não é afetada
pelos vigentes acordos de bitributação celebrados pelo país.

Seguindo o caminho do Reino Unido, a Austrália introduziu seu próprio


modelo de DPT em 2015. Há também discussões em andamento para a
criação de regras similares na Nova Zelândia.

3.3. O equalization tax da Índia

A Índia foi um dos primeiros países a introduzir uma exação voltada


especificamente para as empresas de tecnologia. Em linha com as

1349
sugestões descritas no BEPS 1, o país conduziu, a partir de 2016, uma
análise dos impactos da economia digital na esfera tributária.

Um comitê formado por membros da administração tributária e


profissionais independentes recomendou a introdução de um “equalization
tax”, cujo propósito é neutralizar a injusta vantagem tributária de certas
empresas estrangeiras que atuam em território indiano sem o devido
recolhimento de tributos363.

O tributo em questão, com efeitos a partir de junho de 2016, é


representado pela cobrança de um percentual de 6% sobre valores brutos
pagos a não residentes – excetuados aqueles que detenham um
estabelecimento permanente na Índia – em contraprestação por serviços
previamente especificados, incluindo publicidade online, locação de
espaço de publicidade online e serviços correlatos.

O equalization tax é cobrado por meio de retenção na fonte, sendo


atribuída à fonte pagadora a obrigação de recolhimento, bem como o dever
de prestar informações ao fisco indiano sobre as transações realizadas ao
longo do ano. Cabe notar, ainda, que o imposto é devido apenas nas
transações de caráter empresarial (B2B – business-to-business
transactions), além de contemplar uma isenção para transações de pequeno
valor.

Como já era previsto no próprio BEPS 1, algumas críticas têm sido


suscitadas pela doutrina acerca da adequação do equalization tax às
normas tributárias vigentes. Dentre os aspectos suscitados, discute-se o
fato de tal exação representar uma forma de violação indireta às
obrigações assumidas em acordos de bitributação firmados pela Índia, os
quais impediriam a cobrança de um imposto no país da fonte do

1350
rendimento quando a empresa estrangeira não detiver um estabelecimento
permanente no país364.

3.4. Iniciativas legislativas na França e na Itália

A França e outros países adotaram uma linha dura na disputa com


empresas estrangeiras que atuam em seus territórios, por meio de
estruturas de planejamento tributário similares àquelas descritas no item 2.
O governo francês adotou uma posição refratária quanto à celebração de
acordos com as empresas. Em 2016, o Ministro da Fazenda, Michel Sapin,
chegou a afirmar: “nós não fazemos acordos como o Reino Unido, nós
aplicamos a lei”365.

O governo francês tentou introduzir uma norma equivalente ao DPT do


Reino Unido em 2016, a qual foi inclusive aprovada pelo parlamento
francês. Porém, o Conselho Constitucional do país acabou por considerar
que a regra violava os princípios constitucionais, tornando-a sem efeitos366.

O governo sofreu um novo revés em julho de 2017, a partir de uma


decisão proferida por um tribunal administrativo em favor do Google. Tal
como mencionado anteriormente, o tribunal amparou-se nos princípios
tributários vigentes – e nos acordos de bitributação celebrados pela França
–, tendo reconhecido que os lucros registrados por uma empresa do grupo
Google, em vendas realizadas na França, não estavam sujeitos à tributação
naquele país, já que a empresa não era residente fiscal na França, e as
atividades desenvolvidas pela subsidiária francesa eram meramente
instrumentais. Notícias divulgadas pela imprensa sugerem que, em face da
decisão, o governo francês está agora disposto a firmar acordos com as
empresas de tecnologia367.

1351
A Itália, assim como a França, também adota uma posição bastante
rígida em relação ao tema. O país firmou um acordo com o Google para o
recebimento de tributos passados em decorrência de transações realizadas
pelo grupo no país. Além disso, o parlamento italiano aprovou uma
proposta para a criação de um imposto de 6% sobre as transações
realizadas por empresas de tecnologia junto a consumidores locais, a
exemplo da venda de publicidade online. Ao longo de 2018 deverão ser
definidas as condições de implementação do novo imposto, bem como o
início da vigência.

Em paralelo ao novo imposto, em junho de 2017 a Itália aprovou um


conjunto de regras que prevê a possibilidade de denúncia espontânea, por
parte das empresas, quanto à existência de estabelecimentos permanentes
não declarados no país, bem como quanto à resolução de disputas
tributárias em andamento. Essas regras permitem, por exemplo, que
empresas estrangeiras submetam ao fisco italiano uma avaliação quanto à
existência de um estabelecimento permanente na Itália em operações
passadas ou correntes, com o benefício de redução de penalidades sobre a
tributação de lucros supostamente apurados na Itália. Além disso, as novas
regras possibilitam a exclusão de eventuais repercussões na esfera
criminal.

4. CONCLUSÕES

Embora a era pós-BEPS revele um novo estágio de maturação quanto à


necessidade de revisão das tradicionais normas tributárias, ainda existe
dissenso entre os países sobre como a economia digital deve ser tributada.
Ao mesmo tempo que os países concordam que seus sistemas tributários
não são adequados para lidar com os novos modelos de negócio, as
discussões variam desde a adoção de soluções coordenadas, que favoreçam

1352
um sistema tributário mais harmônico, até o emprego de medidas de
caráter unilateral. Nessa disputa, os países com mercado consumidor mais
relevante parecem ter o receio de que as “soluções coordenadas” possam
representar uma perda de base tributável.

O BEPS 1 expôs de maneira didática as fragilidades das atuais regras


tributárias, mas não foi contundente na proposição de alternativas,
limitando-se a sugerir possíveis mecanismos de combate à erosão de base
tributável, sem recomendá-los formalmente. Porém, tais mecanismos
podem conflitar com a legislação doméstica dos países e também com os
acordos de bitributação, como reconheceu a própria OCDE, e como já tem
sido observado a partir das experiências de alguns países.

Enquanto se aguardam as conclusões finais da OCDE sobre o tema, as


iniciativas legislativas de caráter unilateral, voltadas prioritariamente para
a tributação de empresas de tecnologias, têm sido recorrentes. Tais
iniciativas podem representar um entrave para a criação de um “sistema
tributário harmônico, justo e eficiente”, como reivindica o órgão executivo
da União Europeia.

De forma concomitante, para mitigar a possível perda de receitas


tributárias associada às atividades empresarias, verifica-se um claro
movimento dos países desenvolvidos no sentido de reduzir a alíquota do
imposto de renda corporativo368. Na Europa, a alíquota média adotada
pelos países já é inferior a 30%.

Seguindo essa tendência, os Estados Unidos aprovaram recentemente


uma significativa reforma tributária que reduz a alíquota corporativa de
35% (máximo) para 21% já a partir de 2018. Além disso, uma das
principais metas da reforma tributária é incentivar a repatriação – e coibir

1353
o diferimento tributário – de recursos que vinham sendo mantidos no
exterior por empresas norte-americanas, cujos valores estimados variam
entre US$ 2 e US$ 3 trilhões369.

Em face das novas regras, ao mesmo tempo em que os Estados Unidos


voltam a adotar parcialmente o princípio da territorialidade, tributando
apenas os rendimentos auferidos localmente, cria-se um mecanismo que
permite a repatriação de recursos mantidos no exterior mediante a
imposição de uma alíquota que varia de 15,5% (caixa ou equivalente) a
8% (valores reinvestidos). Ademais, foram introduzidas regras de
tributação antiabuso (base erosion anti-abuse tax – BEAT) para coibir
estratégias de planejamento tributário internacional que permitam a
alocação artificial de lucros para países de baixa tributação370.

De forma geral, a reforma tributária norte-americana pretende tornar


mais atrativo o ambiente tributário nos Estados Unidos, estimulando as
multinacionais a manterem suas operações localmente, de forma a coibir,
por exemplo, as estruturas que contemplem a transferência de intangíveis
para o exterior, tal como visto anteriormente371.

No Brasil, excetuadas as iniciativas legislativas para a tributação


indireta das atividades da economia digital (e.g., operações envolvendo
software, veiculação de publicidade online, serviços de streaming etc.)372,
acirrando a antiga disputa entre Estados e Municípios (ICMS vs. ISS), não
foram adotadas medidas concretas em reação aos problemas apontados no
BEPS 1. Por enquanto, as medidas tomadas pelo Brasil em face do Projeto
BEPS limitam-se à introdução de regras sobre transparência fiscal
(divulgação e troca de informações)373.

1354
A posição aparentemente passiva do Brasil em relação à tributação
direta tem uma explicação evidente. É que a legislação brasileira já prevê
regras de tributação na fonte sobre rendimentos auferidos por não
residentes de fontes brasileiras – o imposto de renda na fonte (IRRF) com
alíquotas de 15% a 25% –, além de ter introduzido uma série de tributos
sobre a importação de serviços (e.g., CIDE 10%, PIS/COFINS-Importação
9,25%, IOF 0,38%, além do ISS-Importação com alíquota máxima de 5%),
os quais acabam por atingir uma parcela considerável das operações
transnacionais de venda de “mercadorias digitais” e serviços vinculados à
economia digital (e.g., SaaS, serviços de veiculação de publicidade e
outros serviços online)374.

Com efeito, as discussões sobre a existência de elementos de conexão


que resultem em sujeição tributária de empresas estrangeiras no Brasil
(taxable presence), sejam ou não relacionadas às empresas de tecnologia,
não têm sido suscitadas no Brasil simplesmente porque o nosso sistema
tributário não contém regras abrangentes sobre a definição de
“estabelecimento permanente”375. Em vez disso, o Brasil introduziu
progressivamente os referidos tributos, de forma indiscriminada, muitas
vezes sujeitando as importações a uma tributação superior àquela aplicável
às transações locais.

Embora essas regras possam sugerir um caráter “pioneiro” do Brasil


para lidar com as questões ligadas à tributação da economia digital, na
realidade, essas exações não apenas se afastam dos propósitos dos BEPS 1,
uma vez que suscitam problemas similares àqueles verificados em outros
países (e.g., tributação sobre a renda bruta, incompatibilidade com os
acordos de bitributação, desigualdade de tratamento em relação a
operações locais etc.), mas também criam um ambiente de desestímulo aos

1355
investimentos estrangeiros. Afinal, para uma empresa que pretenda
comercializar seus serviços no mercado brasileiro, uma tributação que
pode ser superior a 50% não se mostra adequada do ponto de vista
negocial.

Além disso, os mecanismos de inversão da responsabilidade tributária


para a fonte pagadora (reverse charge), previstos nas regras brasileiras,
suscitam os mesmos problemas que já são apontados pela OCDE quanto à
dificuldade de cobrança e controle sobre transações de caráter não
empresarial. De fato, como no Brasil as pessoas físicas podem realizar
compras no mercado internacional por meio de cartão de crédito, na
prática a nossa legislação acaba por ter um escopo de aplicação limitado às
transações entre empresas (B2B).

Nota-se, portanto, que as discussões e ideias que já foram suscitadas


pelo BEPS 1, e ainda serão amadurecidas ao longo dos próximos anos,
representam uma ótima oportunidade para que o Brasil possa repensar a
sua política fiscal, de forma a desenvolver regras tributárias mais justas e
competitivas, especialmente em face da nova realidade decorrente da
economia digital.

1356
Uma proposta para a modificação da
Convenção Modelo da OCDE em face da
digitalização da economia
376
Tatiana Falcão

INTRODUÇÃO

A economia digital, ou a digitalização da economia, tem sido tema


reincidente nos fóruns de direito tributário desde o lançamento do projeto
BEPS (base erosion profit shifting) da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) em 2013. O tema “economia
digital” foi tratado dentro do plano de ação número um, e visava analisar
como a digitalização da economia possibilitava às empresas novos e
melhores mecanismos para efetuar planejamento tributário e, assim, evitar
o pagamento de impostos em uma ou múltiplas jurisdições, levando à
erosão da base tributária de múltiplos países e, por vezes, à dupla não
tributação.

O Relatório final do Plano de Ação n. 1, publicado em 2015377,


concluiu, dentre outras coisas, que a economia digital não pode ser vista
isoladamente, desconexa das demais atividades desenvolvidas por uma
empresa. Ela deve ser considerada um novo fator que veio para modificar
a forma como as empresas passaram a estruturar suas operações nacionais
e transnacionais.

A digitalização da economia é caracterizada pela:

•maior proximidade entre produtores e consumidores, sendo este tanto um fator


necessário para a digitalização das relações negociais, quanto uma
característica decorrente da digitalização;

1357
•promoção de serviços gratuitos para os usuários, e geração de receitas por meio
(a) da venda de espaço virtual para propaganda por terceiros ou (b) da
compilação de dados dos usuários à medida que estes aceitam fazer uso dos
serviços que lhes são proporcionados gratuitamente; e
•capacidade de maior fragmentação e transformação das empresas,
possibilitando que estas se coloquem como meras intermediárias entre
produtor e consumidor.

A digitalização das relações comerciais é, acima de tudo, caracterizada


pela maior habilidade de as empresas adentrarem múltiplos mercados
consumidores, em diversas jurisdições, sem a necessidade de estar
fisicamente presente no país de atuação, seja por meio de uma subsidiária,
um estabelecimento permanente, ou mesmo um representante comercial
(agente). Por esse motivo, a análise do impacto da economia digital nas
relações negociais requer uma completa revisão das regras de tributação
internacional hoje existentes.

As regras de Direito Tributário internacional atuais foram cunhadas sob


a premissa de que as entidades integrantes de um mesmo grupo econômico
devem ser tratadas como entes independentes, e que estas devem
transacionar entre si utilizando como base preços de mercado, equivalentes
àqueles que seriam empregados caso a transação ocorresse com terceiros
(princípio do arm’s length price, no original).

O princípio das entidades independentes, ou independent entity


approach, é em verdade uma ficção jurídica que opera em contradição à
realidade econômica atual na qual as entidades pertencentes a um mesmo
grupo econômico atuam sob o comando central e direção da matriz, e que
seus entes constitutivos, conquanto fragmentados, obedecem às regras
criadas pela empresa matriz. O princípio das entidades independentes
possibilita que empresas multinacionais fragmentem as diferentes áreas de
negócio (recursos humanos, pesquisa e desenvolvimento, administração de

1358
intangíveis etc.) colocando cada qual em uma empresa e jurisdição
distinta. As atividades mais rentáveis são então alocadas a jurisdições de
baixa tributação, enquanto as atividades pouco lucrativas ou geradoras de
prejuízo são atribuídas a países de alta incidência tributária.

Resta claro, portanto, que a modificação do status quo requer uma


absoluta mudança de paradigma na forma como as regras de Direito
Tributário internacional operam. No lançamento do projeto BEPS, o grupo
dos 20 países mais desenvolvidos (G20) solicitou essa mudança de
paradigma, declarando que as atividades devem passar a ser tributadas
“onde as atividades econômicas ocorrerem ou a mais valia for criada”378.

O relatório da OCDE de 2015 foi bastante criticado por não ter


objetivado a completa revisão das regras de Direito Tributário
internacional. Em vez disso, o relatório optou por prover soluções de curto
prazo para lidar com a questão da digitalização das relações mercantis e
econômicas. O relatório relegou a completa análise do assunto para 2020,
com uma análise preliminar em 2018.

O objetivo deste artigo é analisar as opções hoje disponíveis para os


órgãos regulamentadores de política fiscal. Embora “digitalização” e
“BEPS” tenham sido assuntos cunhados em primeira mão pela OCDE,
uma mudança nas diretrizes de política fiscal traz reflexos tanto para os
países desenvolvidos quanto para aqueles em desenvolvimento. Por esse
motivo, outras organizações, como as Nações Unidas (ONU)379, o Fundo
Monetário Internacional (FMI)380 e o Banco Mundial (WB), também estão
tratando do assunto381. O tema da digitalização talvez seja único por não
deter particularidades atreladas somente aos países desenvolvidos ou em
desenvolvimento.

1359
A discussão não é de fonte ou residência. Ela revolve em torno da
capacidade de os países arrecadarem os tributos decorrentes das atividades
exercidas em suas jurisdições. Neste sentido, esta é uma discussão ímpar,
na qual todos os países detentores de um mercado consumidor são “países
fonte”. O que se vê, na prática, é uma proliferação de países desenvolvidos
cunhando medidas unilaterais ditas temporárias, para tributar na fonte as
transações decorrentes das atividades digitais. Esta é, portanto, a primeira
vez que a revisão das regras de “fonte versus residência” pode vir a ser de
interesse tanto dos países desenvolvidos quanto dos países em
desenvolvimento.

A seção que se segue tratará brevemente das soluções aventadas pela


OCDE no Relatório de 2015, e discutirá por que essas soluções não são
apropriadas para discutir a digitalização das formas negociais a longo
prazo. O artigo, então, passará a discutir diferentes opções do ponto de
vista político-fiscal e tendo em vista a unidade da entidade corporativa e
proporá a solução mais adequada do ponto de vista dos países
desenvolvidos e em desenvolvimento. Este artigo, em seguida, sugerirá a
modificação do tratado modelo para evitar a dupla tributação e a evasão de
recursos em face dos problemas aventados e das soluções identificadas.

1. O RELATÓRIO DE 2015 DA OCDE

O Relatório interino da Ação 1 do BEPS identificou cinco possíveis


respostas para o desafio imposto pela economia digital no sistema de
tributação direta, quais sejam:

1) modificar o rol de isenções admissíveis, no artigo 5º, parágrafo 4º, da


Convenção Modelo da OCDE, quando do reconhecimento do status de
estabelecimento permanente;
2) estabelecer um novo “nexo” (ou elemento de conexão) para determinar a
existência de um estabelecimento permanente, baseado na existência de

1360
presença digital significativa;
3) substituir os critérios para a caracterização de um estabelecimento
permanente por um teste de “presença significativa”;
4) criar impostos de incidência na fonte para transações digitais; e
5) introduzir um imposto sobre o fluxo de dados pela internet (bandwidth ou bit
tax).

Este artigo tecerá breves considerações acerca de cada uma das opções
arroladas, notando-se, entretanto, que apenas as opções 2, 3 e 4 são
consideradas viáveis do ponto de vista político-fiscal.

1.1. Opção 1: Modificar o rol de isenções admissíveis, no artigo 5º, parágrafo


4º, da Convenção Modelo da OCDE, quando do reconhecimento do status
de estabelecimento permanente

A opção 1 visaria apenas à revisão do parágrafo 4º do artigo 5º, que


lista uma série de atividades auxiliares, e de cunho preparatório, que não
pressupõem a configuração de um estabelecimento permanente. O
raciocínio da OCDE é que muitas dessas atividades hoje poderiam vir a
constituir estabelecimentos permanentes em vista da digitalização das
relações negociais. Embora essa premissa seja verdadeira, a mera reforma
do parágrafo, e reformulação dos comentários ao artigo 5º, parágrafo 4º,
não seriam suficientes para alcançar toda a complexidade gerada por essa
nova forma de relação comercial. Além disso, a necessidade de reformar,
reformular ou eliminar o artigo 5º, parágrafo 4º, já está sendo avaliada sob
a ótica da Ação 7 do BEPS, já que este dispositivo também poderia levar à
descaracterização de um estabelecimento permanente por meio de
estruturas artificiais evasivas (artificial avoidance of PE status)382. A
possibilidade de reformular o artigo 5º, parágrafo 4º ou eliminá-lo foi
discutida no Relatório final da Ação 7383 e deve ser incorporada na nova
versão da Convenção Modelo da OCDE.

1.2. Opção 2: Estabelecer um novo “nexo” (ou elemento de conexão) para


determinar a existência de um estabelecimento permanente, baseado na

1361
existência de presença digital significativa

De acordo com o relatório da OCDE, os seguintes critérios poderiam


ser considerados para a caracterização de “presença digital significativa”
em um país: (i) um número significativo de contratos assinados
remotamente, entre uma empresa e um consumidor localizado no país de
execução dos contratos, pretendendo estes o fornecimento de produtos ou
serviços digitais e imateriais; (ii) o consumo, ou utilização em larga escala
em um país, dos produtos ou serviços digitais de uma companhia ou
multinacional; (iii) pagamentos significativos feitos pelos clientes
localizados no país de consumo, para a empresa, em decorrência de
obrigações contratuais para o fornecimento de produtos ou serviços, sendo
estes produtos ou serviços parte da atividade principal da empresa; (iv)
uma filial da empresa oferece funções secundárias à principal atividade da
empresa, tais como marketing ou consultorias, que sejam intimamente
relacionadas com a atividade principal da empresa.

1.3. Opção 3: Substituir os critérios para caracterização de um


estabelecimento permanente por um teste de “presença significativa”

A opção 3 trata do elemento de conexão entre a empresa e o país da


fonte, onde a atividade é exercida. Esta opção visa substituir o atual teste
para a configuração de um estabelecimento permanente por um teste de
presença significativa, que visa abordar a mudança nas relações de
consumo no âmbito da economia digital, enquanto ao mesmo tempo obtém
respaldo em alguns critérios que têm base na presença física. Uma empresa
passaria no teste da presença significativa por meio:

•de uma relação entre consumidores e usuários que perdure por mais de seis
meses, em combinação com alguma presença física no país, diretamente ou
por intermédio de um agente dependente;
•da venda de produtos ou serviços por meios que necessitem de uma relação
próxima com os consumidores no país, incluindo (a) um site na língua local;

1362
(b) disponibilidade de serviço de entrega a partir de fornecedores localizados
no país; (c) utilização de bancos e outras estruturas oferecidas por
fornecedores localizados no país; ou (d) oferta de produtos ou serviços obtidos
de fornecedores localizados no país; e
•oferecendo produtos ou serviços para consumidores no país resultando ou
envolvendo arrecadação sistemática de dados desses consumidores ou fazendo
uso da contribuição de conteúdo por pessoas localizadas no país.

O raciocínio para incidência de tributo com base em tal opção é que a


empresa não teria gerado a renda decorrente de sua atividade principal, não
fosse o seu respaldo na infraestrutura do país da fonte, ou no seu mercado
consumidor. Sendo assim, caberia ao estado do mercado consumidor
requerer o direito de tributar ao menos parte da receita, ainda que não haja,
de fato, presença física no país. O relatório da OCDE sustenta que deve
haver ao menos alguma presença física para que o país da fonte, do
mercado consumidor, tenha o direito de tributar, posição da qual
discordamos, por ir de encontro à teoria do benefício (benefit theory)384.

1.4. Opção 4: Criar impostos de incidência na fonte para transações digitais

Esta opção considera soluções de curto prazo para lidar com a


complexidade gerada pela digitalização da economia. O Relatório 2015 da
OCDE reconheceu que alguns países, interessados em adotar medidas
imediatas para remediar a perda de recursos provenientes da digitalização
das formas tradicionais de transacionar e da erosão da base tributária,
poderiam introduzir impostos unilaterais, tais como impostos incidentes na
fonte, e impostos de equiparação (equalization levy, no original).

Um imposto de incidência na fonte é o de mais fácil aplicação e tem por


finalidade tanto controlar o número de operações ocorridas no país da
fonte quanto tributar a renda gerada no país a partir de uma atividade
comercial, e assim atribuir para o país da fonte parte do lucro líquido da
empresa. O imposto de equiparação, como o nome já diz, visa dar paridade

1363
de tratamento entre uma entidade corporativa residente no país, e sujeita a
tributação dos lucros auferidos no país, e uma entidade não residente
detentora de negócios envolvendo o país, mas não sujeita ao pagamento de
impostos em função da inexistência de previsão legal para tanto. Este
imposto objetiva a tributação dos lucros relacionados ao país, desde que
exista atividade econômica de substância, conferindo à entidade não
residente o mesmo ônus conferido à entidade residente ou domiciliada
(para fins fiscais) no país.

Na sequência da edição do Relatório 2015 da OCDE, alguns países


passaram a introduzir uma nova modalidade de imposto unilateral: o
diverted profits tax (imposto sobre lucro desviado). Introduzido
originalmente pelo Reino Unido, o imposto sobre lucro desviado é uma
ficção jurídica criada por um país, neste caso o Reino Unido, para conferir
ao país de fonte o direito de tributar o lucro proveniente de uma operação
caso esta não tenha sido tributada anteriormente por nenhum outro país.
Em termos gerais, no caso do Reino Unido, o imposto sobre lucro
desviado visa afetar as multinacionais que se estruturem de forma a
desviar a aferição de lucros do Reino Unido, seja pela adoção de uma
estrutura que inviabilize a configuração de um estabelecimento
permanente no país, seja efetuando pagamentos sem substância econômica
(ou que sejam destinados a uma companhia localizada em um país de
baixa tributação destituída de substância econômica)385.

Além de já ter sido introduzido no Reino Unido (entrada em vigor em


abril de 2015), outros países, tais como a Nova Zelândia e a Austrália,
estão atualmente analisando a introdução de impostos similares. O imposto
de equiparação, o mais popular dentre os três, já foi introduzido pela Índia,
e está sendo cogitado por um número significativo de países386. Já a França

1364
vem analisando a introdução de um google tax, que nada mais é que um
imposto incidente sobre o lucro líquido das operações ocorridas por vias
digitais no país. Muitos outros países introduziram ou estão em vias de
introduzir impostos incidentes na fonte. Outros exigem que, para que
empresas digitais possam continuar a atuar em território nacional, estas
obtenham um registro para fins de aplicação do imposto sobre valor
agregado (IVA). Desta forma, alguns países têm tributado as operações
provenientes da economia digital por meio do IVA387.

A tributação com base na renda bruta de uma empresa tem defeitos


intrínsecos, já que não há nenhuma relação com a lucratividade da
empresa. O custo desses impostos, considerados individualmente, tendem
a ser repassados para o consumidor final por meio de um acréscimo no
preço final do produto comercializado, motivo pelo qual as multinacionais
não se opõem à imposição dos mesmos. O maior mérito dessa modalidade
de tributo está na simplicidade na imposição e administração, motivo pelo
qual ele vem ganhando popularidade dentre as administrações tributárias
de diferentes países.

A maior crítica relacionada à administração desse tipo de tributo é que,


por não se tratar de um imposto sobre a renda ou sobre os lucros, não há
margem para se cogitar um crédito tributário decorrente do imposto pago
no país de fonte ou uma isenção no país de residência, e por isso há alto
risco de dupla tributação. Além disso, há de se aventar como esses
impostos se relacionariam com a incidência do imposto de renda já
existente. O ideal, caso venham a ser introduzidos por múltiplos países, é
que a incidência fosse limitada aos casos em que (i) a tributação no país de
residência se desse a uma alíquota baixa ou inexistente, ou (ii) um crédito
(ou isenção) fosse conferido no país de residência, pelo imposto já pago no

1365
país de fonte. Ambas as opções requereriam um projeto de coordenação no
tratamento tributário entre um ou mais países388.

A União Europeia iniciou um processo de consulta entre os países


membros para obter um projeto de coordenação em resposta aos desafios
impostos pela digitalização da economia. Seguindo a linha proposta pelo
Relatório 2015 da OCDE, a primeira Comunicação emitida pela Comissão
Europeia sobre o tema propõe três medidas alternativas de curto prazo: (i)
um imposto de equiparação sobre o volume de negócios realizados pelas
empresas digitais; (ii) um imposto na fonte sobre todas as transações
digitais; ou (iii) um imposto sobre a renda gerada em decorrência do
fornecimento de serviços digitais e de atividade de propaganda, sempre
que a empresa não residente, concluindo transações com consumidores
locais remotamente, tenha presença econômica substantiva389.

Resta claro que as opções propostas acima não visam lidar com os
impactos de longo prazo, provenientes da digitalização da economia. O
mero risco de incidir em dupla tributação em bases recorrentes é suficiente
para excluir tais opções, que poderiam levar a um decréscimo nas
atividades comerciais e, de fato, vir a impor uma barreira ao livre
comércio, podendo mesmo vir a ser configurada como medida contrária
aos princípios de livre comércio estabelecidos pela Organização Mundial
do Comércio (OMC) sob a égide do Acordo Geral sobre Tarifas e
Comércio de 1994390.

1.5. Opção 5: Introduzir um imposto sobre o fluxo de dados pela internet


(bandwidth ou bit tax)

A opção 5 propõe a imposição de um tributo unilateral sob a utilização


da rede de dados de internet. Tratar-se-ia da tributação de bits, ou dados de
internet. Tal proposta denota um tributo de difícil administração e

1366
coordenação entre os países. Além disso, a imposição deste tributo
requereria maior reflexão sobre a forma de operacionalização. Esta opção
não ganhou tração entre países desenvolvidos ou em desenvolvimento, e
não deve ser seriamente considerada como opção por se tratar meramente
de uma opção de curto prazo. A maior parte das ações de curto prazo são
caracterizadas pela adoção de medidas unilaterais que visam remediar as
falhas do sistema atual pela criação de novos tipos tributários, a fim de
evitar uma consequente perda na arrecadação. A adoção de ações
unilaterais foi discutida de forma aprofundada quando da análise da opção
4.

2. CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DAS OPÇÕES PROPOSTAS

Fica comprovado, a partir das considerações propostas acima, que


nenhuma das opções, consideradas individualmente, seria suficiente para
lidar com o problema imposto pela digitalização da economia. Para que
haja uma completa revisão do modelo de tributação internacional hoje
empregado, seria necessário que as opções 2 e 3 fossem aplicadas
concomitantemente. Dessa forma, estabelecer-se-ia um nexo causal entre a
empresa exercendo o comércio digital, ou utilizando-se de uma plataforma
digital para gerar renda, e a atividade ocorrida no território nacional, na
medida em que apenas as atividades de comprovada substância econômica
passariam a ser tributadas.

Nexo e substância econômica são, pois, dois critérios que devem ser
aplicados em combinação, para alcançar todas as transações ocorridas
utilizando meios digitais e tendo por finalidade auferir lucros por meio da
utilização desses meios digitais.

2.1. Considerações político-fiscais acerca do nexo negocial e da substância


econômica das atividades exercidas pela via digital

1367
O desafio ora imposto é como alinhar o lucro tributável com a real
atividade econômica e a agregação de valor em um ambiente corporativo
digitalizado. Isto requereria definir um novo nexo (de causa e efeito) para
a constituição de um estabelecimento permanente, baseado na existência
de presença digital significativa, ao mesmo passo que se substituiriam os
critérios atuais para caracterização de um estabelecimento permanente por
um teste de “presença digital significativa”. O nexo fiscal entre a atividade
econômica e o direito à imposição tributária (aqui simplesmente
denominado nexo fiscal) e presença local (ainda que por via digital) devem
ser discutidos simultaneamente para que o arcabouço do Direito Tributário
internacional possa ser remodelado na sua integralidade.

O nexo fiscal se traduz nos critérios identificados para ligar a renda


gerada por uma multinacional a um país, uma jurisdição ou uma
localização geográfica específica. A doutrina acerca do assunto defende a
adoção de dois critérios para tributar uma multinacional com relação às
suas transações digitais: tributá-la no nível de seu controle acionário ou no
nível de seu mercado consumidor391. A definição desses critérios decorre
da premissa de que indivíduos (ainda que detentores de capital) são muito
menos móveis do que os principais elementos constitutivos de uma
entidade corporativa e, consequentemente, são menos suscetíveis a mudar
de localização geográfica ou jurisdição, tendo como única intenção a
obtenção de uma vantagem econômica ou uma redução de alíquota para a
empresa na qual estes detêm participação. Esta autora defende a tributação
na jurisdição onde o mercado consumidor estiver localizado porque este é
o único critério verdadeiramente imóvel na atividade corporativa de uma
multinacional, isto é, no local onde esta comercializa seus produtos,
efetuando venda para terceiros não vinculados.

1368
O objetivo não é tributar empresas que estejam efetuando transações em
um país estrangeiro (fora da jurisdição de residência) incidentalmente, mas
sim tributar aquelas que estejam efetuando atividade econômica
substancial no país, interagindo com o mercado consumidor local,
utilizando a infraestrutura local do país, ou compilando informações
(dados pessoais) que venham a agregar valor ao seu negócio. Estes seriam
os principais critérios, não cumulativos, para identificar a existência de
uma presença significativa no país de fonte.

Em recente consulta pública acerca da digitalização da economia,


realizada pela OCDE392, identificaram-se quatro modelos de negócio
dentro da categoria digital393: (i) comércio eletrônico (e-commerce) ou
varejista/revendedor digital (também conhecido como bricks and mortars
business); (ii) plataforma digital; (iii) assinatura digital (on demand
subscription); e (iv) mídia social ou propaganda digital (online)394.

Em cada uma dessas modalidades de negócio, o valor é agregado


levando em consideração diferentes fatores. No caso do e-commerce,
deve-se levar em consideração a maturidade do modelo empregado e o
montante de investimento empregado para que haja substância na
atividade econômica. No caso da plataforma digital, deve-se atentar para a
conectividade da plataforma e sua habilidade de escalonar custos. Em
todos os modelos, deve-se levar em consideração a habilidade da
multinacional de analisar dados adquiridos por meio da sua interação com
o consumidor, a natureza dos produtos e serviços vendidos, a existência de
serviço específico prestado ao consumidor, a presença de uma operação
logística local ou de empregados locais ou terceirizados. A estrutura na sua
integralidade deve também ser analisada, notando se há propriedade sobre

1369
os bens locais ou se a estrutura é pública. O emprego de intangíveis é
também uma consideração de suma importância.

O BEPS Monitoring Group395, uma sociedade civil que conta com uma
rede de peritos em diversas matérias de Direito Tributário internacional, e
integrante de uma rede de sociedades civis engajadas na promoção de
justiça social, participou desta consulta pública e contribuiu também com
uma série de critérios para a definição de “substância econômica” ante a
economia digital396. Seguem abaixo os critérios sugeridos para a
caracterização de substância econômica, e defendidos por esta autora
durante o processo de consulta pública da OCDE:

•relação com os consumidores ou usuários que perdure por mais de seis meses,
combinada a algum tipo de presença física no país, diretamente ou por
intermédio de um agente dependente ou de uma parte relacionada que seja
prestadora de serviços;
•venda de produtos ou serviços por meios que envolvam o desenvolvimento de
uma relação próxima com os consumidores localizados no país, incluindo (i)
uma página digital (website) veiculado na língua local; (ii) oferta de serviço de
entrega a partir de fornecedores localizados no país; (iii) utilização de serviços
bancários (financeiros) ou outras amenidades pertencentes a fornecedores
localizados no país, ou de um armazém ou depósito local; ou (iv) oferta de
bens ou serviços provenientes de fornecedores localizados no país; ou
•fornecimento de produtos ou serviços para consumidores localizados no país,
desde que o produto ou serviço seja resultado da (ou envolva a) compilação
sistemática de dados de pessoas localizadas no país ou conte com
contribuições de conteúdo a partir de pessoas localizadas no país.

O objetivo da definição sugerida acima é captar as situações onde reste


claro que a multinacional em questão detém presença significativa no país
de destino, mesmo que essa presença seja apenas digital, e incluir, dentro
dos critérios para caracterização de um estabelecimento permanente, a
questão do valor agregado decorrente da coleta sistemática de dados, ou
contribuição de conteúdo pelo país de destino (país de fonte e de atuação
da empresa).

1370
Uma questão que decorre da definição acima é como valorar as
diferentes transações a partir dos diferentes modelos negociais
identificados para a economia digital. Isto porque o princípio das entidades
independentes (independent entity principle, no original)397, que é o atual
arcabouço principiológico para a aplicação das regras de preço de
transferência constantes da Diretriz de Preços de Transferência da OCDE
(Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax
Administrations), restaria defasado ante a reforma da Convenção Modelo
da OCDE para incluir uma definição, tal qual a proposta acima, com base
no “whole of entity approach”. Esta última passaria a tratar multinacionais
com base na realidade econômica de suas atividades, vendo o grupo como
uma unidade econômica, e não como uma multiplicidade de partes
independentes, embora relacionadas.

2.2. Valoração das transações a partir dos diferentes modelos negociais

A valoração das transações ocorridas dentro de um mesmo grupo


econômico traz uma série de complexidades, tanto do ponto de vista da
aplicação das regras de preço de transferência, quanto da perspectiva da
possível erosão da base tributária por meio da realização de planejamento
tributário estratégico.

A análise deve partir das quatro categorias modelo de atividade digital,


quais sejam: (i) comércio eletrônico (e-commerce) ou varejista/revendedor
digital (também conhecido como bricks and mortars business); (ii)
plataforma digital; (iii) assinatura digital (on demand subscription); e (iv)
mídia social ou propaganda digital (online).

De um lado temos o espectro de atividades onde o conteúdo veiculado


pelo comerciante digital é grátis, sendo a receita gerada pelo provedor

1371
proveniente de atividades secundárias, tais como propaganda paga, clicks
remunerados, e da coleta de dados dos usuários para melhor adequar a
propaganda virtual (ou outros portais de comércio eletrônico) ao mercado
almejado. Para esta modalidade de negócio, uma metodologia global teria
que ser empregada para atribuir a renda para um país específico ou para
efetuar o rateio entre diferentes países.

Duas metodologias seriam aptas, pelo menos em tese, para repartir o


lucro de uma empresa tendo como premissa a unidade econômica: o
método da partilha de lucros segundo fórmulas predeterminadas, ou
formulary apportionment, no original, ou o método da divisão do lucro
(profit split method).

O modelo mais sofisticado, e mais justo do ponto de vista de política


fiscal, seria a aplicação do método da partilha de lucros segundo fórmulas
predeterminadas, ou formulary apportionment, no original. Sob o sistema
de formulary apportionment, os lucros de uma multinacional devem ser
consolidados e atribuídos para as diferentes jurisdições onde esta atua com
base em certos fatores (tais como número de empregados, montante de
vendas, presença de ativos físicos, dentre outros) que reflitam a real
atividade da empresa multinacional em cada país. Este método asseguraria
uma conexão direta entre a atividade econômica da empresa em um país e
sua contribuição pessoal (por meio do pagamento de impostos) para a
manutenção dos serviços coletivos públicos e de infraestrutura que
permitem a ela atuar naquela jurisdição.

Este modelo não é isento de controvérsias. Primeiramente, porque o


rateio de lucros entre países desenvolvidos e em desenvolvimento por
meio de uma fórmula de partilha é um tema que por si só traz dificuldades
políticas imensuráveis398. Ademais, este método nunca foi testado na

1372
prática. O país que mais se aproxima da aplicação de um sistema de
formulário (método de repartição de lucros com base em uma fórmula
matemática) é o Brasil, e mesmo assim este só o faz unilateralmente, em
nível doméstico, sem levar em consideração as consequências econômicas
no âmbito internacional ou a conciliação entre os métodos de aplicação do
preço de transferência brasileiro e o método comumente aplicado
internacionalmente, com base no modelo da OCDE399.

A União Europeia tem analisado o cabimento da aplicação de um


sistema unitário dentro do Mercado Comum Europeu por intermédio de
um método denominado “base comum consolidada do imposto
corporativo” (ou common consolidated corporate tax base – CCCTB, no
original), mas este método até agora só foi cogitado teoricamente. Uma
versão atualizada da proposta publicada pela Comissão da União Europeia
em 2016 está atualmente sendo avaliada pelo Parlamento Europeu400.

A tributação unitária com base no formulary apportionment requereria


um override dos tratados bilaterais existentes e, portanto, uma
renegociação de tais acordos. Esta não seria uma opção viável sem que
houvesse uma liderança política proeminente de um país interessado na
adoção do mecanismo.

Outros métodos tais como o Residence Based World Wide Taxation401 e


o Destination Based Cash-Flow Tax402 também veiculam um sistema
unitário de alocação de lucros, mas são ainda mais complexos e suscitam
os mesmos problemas identificados para o formulary apportionment,
motivo pelo qual não serão considerados detalhadamente neste artigo.

Em se tratando da necessidade de simplicidade e atribuição igualitária


de lucros para jurisdições diversas, talvez a adoção de uma versão mais

1373
robusta do método profit split, já adotado pela diretriz de preço de
transferência da OCDE, pudesse vir a ser a solução mais adequada, com a
formulação de regras de alocação concreta e pesos diferenciados entre os
modelos de negócio tradicional e o digital.

Do outro lado do espectro dos modelos de negócio, estão aquelas


empresas que apenas se utilizam de uma plataforma digital para concluir
vendas. Este seria o caso de um varejista digital, ou um serviço digital por
assinatura. Para esse tipo de forma negocial, talvez a melhor técnica para a
atribuição de lucros fosse o estabelecimento de um patamar quantitativo
mínimo para tributar a operação, tal como nível mínimo de vendas, ativos
ou empregados em um mesmo país. Uma metodologia mais simplificada,
com base em critérios objetivos, teria o mérito de ser de mais fácil
aplicação. No entanto esta poderia também vir a ser uma metodologia mais
fácil de evitar, e, assim, incidir na erosão da base tributária dos países da
fonte. À medida que a empresa puramente varejista se envolvesse em
outras atividades geradoras de valor, ou de maior complexidade, ela
poderia ser requerida a adotar técnicas ou metodologias mais complexas
para repartição de lucros.

2.3. Mudanças à Convenção Modelo da OCDE

O “teste da presença econômica substantiva” só poderia ser incorporado


ao sistema de tratados internacionais pelo remodelamento das regras de
Direito Tributário internacional atualmente em vigor. Para que essas regras
sejam implementadas de forma eficaz e para que elas operem com relação
a todos os dispositivos incluídos no âmbito dos tratados internacionais,
propor-se-ia a inclusão de um novo artigo na Convenção Modelo da
OCDE, estabelecendo os critérios para a configuração de um
estabelecimento permanente digital.

1374
Os comentários relacionados a esse novo artigo, que por hora
denominamos de “artigo 5-A”, explicariam quais circunstâncias dariam
margem à configuração de um estabelecimento permanente digital,
proporia exemplos e remeteria o leitor para o artigo 7º, que esclareceria as
regras para o rateio e a atribuição de lucros.

O artigo 7º e seus comentários teriam o condão de definir uma


metodologia única para a atribuição de lucros entre o estabelecimento
permanente digital e o escritório matriz, além de prover tratamento
paritário e equânime na forma como a renda derivada da consecução de
atividades digitais é tributada nos casos onde não há nenhuma ou pouca
presença física no país de fonte.

Dessa modificação decorreriam mudanças consequenciais aos demais


artigos da Convenção Modelo impactados por essa nova noção de
estabelecimento permanente. Ademais, os países que concordassem com a
adoção dessas novas regras também teriam que efetuar mudanças na
legislação local para aderir ao novo conceito de “estabelecimento
permanente digital”.

3. CONCLUSÕES

A digitalização da economia é um tema que deve impactar todos os


demais fluxos de trabalho organizados sob a égide do Projeto BEPS. Uma
reforma sistemática da Convenção Modelo da OCDE em face da
digitalização das formas tradicionais de negócio deve provocar reflexos (i)
no sistema atual de aplicação de regras de preço de transferência
(impactando os planos de ação 8, 9 e 10 do Projeto BEPS), (ii) na forma
como os países passarão a trocar informações (impactando o plano de ação
13 do Projeto BEPS); (iii) pode vir a prover uma solução adequada para a

1375
questão da dupla não tributação (discutida sob a égide do plano de ação 3
do projeto BEPS); (iv) pode vir a solucionar o impasse entre fonte e
residência, resolvendo a questão da aplicação de impostos na fonte quando
da constituição de subsidiária local (impactando assim o plano de ação 7
do projeto BEPS).

Em última análise, uma reforma integral na forma de aplicação dos


tratados bilaterais para evitar a dupla tributação e impedir a erosão da base
tributária pode requerer a reformulação do Instrumento multilateral
(Multilateral Instrument), discutido sob a égide do plano de ação 15 do
Projeto BEPS.

Antes mesmo de realizar qualquer modificação ao sistema tributário


internacional, a OCDE já veiculou um relatório403 que visa garantir a
manutenção do princípio da destinação econômica (destination based
principle, no original) quando da aplicação do IVA por uma ou mais
jurisdições. O relatório tem por finalidade garantir maior coordenação na
aplicação do IVA quando do comércio internacional de bens e serviços,
principalmente em face da digitalização da economia.

No curto prazo, deve-se esperar maior regulamentação no sentido de


coordenar as medidas unilaterais adotadas pelos países-membros, e
proporcionar maior cooperação entre estes. No entanto, uma reforma no
atual sistema de tributação internacional se faz imperativa no longo prazo,
observando a soberania dos países em matéria de tributação, mas trazendo
para a modernidade um sistema defasado, arquitetado em 1928 pela Liga
das Nações, que claramente não reflete a nova ordem político-econômica
mundial.

1376
Operações de Inversão (Inversions) ou
Redomiciliação Fiscal (Reparanting) na
Economia Digital
404
Alexandre Luiz Moraes do Rêgo Monteiro e Leonardo Freitas de Moraes e
405
Castro

1. INTRODUÇÃO E ESCOPO DO ARTIGO

Na época de constituição da Microsoft, segundo recorda Shaviro406, Bill


Gates havia se mudado para o Estado do Novo México (EUA) e fundado,
em 1975, a companhia. Conquanto Gates seja, indiscutivelmente, uma das
pessoas mais ricas do planeta, fato é que poderia, já àquela época, ter
optado pela incorporação da sociedade em um paraíso fiscal como as
Bermudas (local onde constituiu sua nova companhia), por exemplo, e, se
assim o tivesse feito, certamente teria ficado muito mais rico407.

A provocação feita pelo Professor Shaviro, muito embora possa parecer


de certo modo exagerada, representa hoje elemento central para a
constituição de novas sociedades em algumas jurisdições.

De fato, em especial nos casos de companhias com grande potencial


global, o local de sua constituição configura ponto central de seu
planejamento fiscal, notadamente nos países adeptos do regime de
tributação com bases universais (worldwide income taxation)408, alinhados
ao conceito de capital export neutrality (CEN)409, como é o caso do Brasil,
e também, até pouco tempo atrás, dos Estados Unidos410.

Especificamente no âmbito da Economia Digital, a escolha do local de


constituição, ou mesmo alteração da residência, encontra-se na ordem do

1377
dia dos contribuintes, na medida em que o conceito de local de residência
vem se tornando cada dia mais abstrato411.

Feito este breve introito, o presente artigo busca abordar o tema das
chamadas operações de inversão fiscal (tax inversions), em que grupos
econômicos, notadamente multinacionais com operações globais,
procuram alterar o local de residência da sociedade controladora, seja (i)
por intermédio da inversão da cadeia vertical do grupo, seja (ii) mediante
operações societárias (fusões ou incorporações societárias), ou mesmo
(iii) com a constituição de nova controladora em uma nova jurisdição.

Para atingir o referido escopo, busca-se, primeiramente, tratar das


características centrais da chamada Economia Digital, que facilitam a
ocorrência das inversões ou redomiciliações neste âmbito, para, em
seguida, estudar a origem e evolução das operações de inversão nos
Estados Unidos.

A partir do estudo de alguns casos que demonstram a mobilidade dos


fatores na Economia Digital, tornando mais simples a alteração da
residência do controlador, vamos para a análise dos possíveis reflexos do
ingresso nesta nova Era para o regime de tributação brasileiro. Neste
ponto, trataremos, também, de alguns casos práticos em que operações de
inversão fiscal foram feitas ou buscadas no Brasil.

Com base no que for refletido ao longo deste trabalho, será traçada uma
síntese conclusiva, com o apontamento de algumas perspectivas para o
futuro, não apenas em relação ao Brasil, mas também no que tange a
discussões entabuladas internacionalmente.

2. RESIDÊNCIA FISCAL E A MOBILIDADE DOS FATORES


PRODUTIVOS NA ECONOMIA DIGITAL

1378
Como é cediço, a residência (ou domicílio) é elemento de conexão de
grande importância no âmbito do Direito Tributário Internacional412.
Diversos acordos e convenções internacionais, assim como a própria
legislação interna de inúmeros países, reconhecem a possibilidade de
tributação pelo país da residência da renda auferida pelo seu residente. Em
alguns casos, como visto, entre eles o Brasil, a legislação estabelece que o
residente deve ter toda a sua renda oferecida à tributação no seu país,
independentemente do local em que tenha sido auferida (worldwide
income taxation).

Sendo assim, em especial nos países em que se tributa a renda com


bases universais, a definição do local da residência do contribuinte é
essencial, dela decorrendo, diretamente, a sistemática de tributação a ser
aplicada e, destarte, a própria carga tributária do grupo econômico
(effective tax rate).

Em que pese a importância dos referidos conceitos, a Economia Digital


trouxe, com ela, diversos desafios às noções e princípios tributários
adotados internacionalmente.

Com efeito, notadamente no que atine às noções geográficas


tradicionalmente utilizadas, o Professor Arthur Cockfield lembra que as
dificuldades em determinar a jurisdição apropriada para tributar renda e
consumo vêm se tornando mais severas no âmbito da Economia Digital.
Seriam elas resultado do avanço da internet (world wide web), bem como
decorrentes do fato de que os custos de reprodução e distribuição têm
chegado, em alguns casos, próximos a zero, tornando a ideia de espaço
geográfico cada vez mais etérea quando se pensa no espaço virtual
(cyberspace)413.

1379
Em linha com o aduzido pelo Professor Cockfield, há 15 (quinze) anos,
praticamente todos os setores da economia já adotam o que se entende por
tecnologia de informação e comunicação (ICT), de modo a aumentarem
produtividade, reduzirem custos e maximizarem os mercados atingidos.
Dessa forma, mesmo nos setores produtivos já existentes, a noção de
fragmentação e dispersão das atividades produtivas, agora possibilitadas
pelos menores custos de deslocamento e facilidade na comunicação, e a
utilização de novas tecnologias permitem a alteração da noção idealizada
de residência, que gradativamente vem perdendo espaço.

Não só isso. O avanço tecnológico permitiu, ainda, a criação de novos


segmentos e produtos, inclusive inteiramente digitais, produzindo novos
mercados virtuais (marketplaces), moedas eletrônicas e virtuais414,
anúncios no ambiente virtual e, mesmo, acesso a tecnologias de
infraestrutura em nuvem (cloud computing). Todas as referidas alterações,
portanto, em linha com o quanto apontado no Relatório Final do Plano de
Ação 1 do BEPS (Base Erosion and Profit Shifting Project) possuem uma
característica, que será explorada a seguir, em comum: demonstram uma
mobilidade sem precedentes quanto (i) aos intangíveis relacionados à
atividade digital, (ii) aos próprios usuários, como, também, (iii) às próprias
funções econômicas ou fatores de produção, os quais podem ser facilmente
alterados para outras localidades415.

No que tange ao escopo deste trabalho, tem-se particular interesse na


noção de mobilidade dos fatores produtivos, proporcionada pela Era
Digital. De fato, nesse ambiente, o avanço da tecnologia de comunicação e
informação permitiu que operações globais passassem a poder ser geridas
e coordenadas de maneira integrada, de uma única localidade, sendo
possível o seu deslocamento para outro lugar que não aquele em que

1380
fornecedores e consumidores estejam presentes, com relativa flexibilidade.
E isso não apenas para multinacionais, como historicamente já ocorria,
mas também para atividades empresárias de médio e pequeno porte,
incluindo-se start-ups416.

Conforme apontado no Relatório Final do Plano de Ação 1 do BEPS, as


alterações proporcionadas pelo aprofundamento da Economia Digital
geraram quatro espécies de estratégias para mitigação de tributos sobre a
renda dos contribuintes, a saber:

i) minimização da tributação no país da fonte (ou do mercado alcançado)


mediante eliminação de presença tributariamente relevante, em especial
evitando a configuração de estabelecimento permanente, ou, no caso de
presença tributariamente relevante, redução da tributação mediante
realocação da renda a partir de estratégias utilizando estruturas de trading, ou
mediante redução do lucro líquido em virtude da maximização de deduções
no nível da fonte pagadora;
ii) baixa ou nenhuma tributação na fonte;
iii) baixa ou nenhuma tributação no nível intermediário, do recebedor dos
recursos, por meio de alteração de sua residência para países com tributação
favorecida ou regimes privilegiados, ou mesmo mediante instrumentos
híbridos, permitindo que esses intermediários sejam titulares de parte
417
substancial dos rendimentos percebidos em virtude de arranjos intragrupo ;
bem como
iv) baixa tributação no país da controladora do grupo econômico (ultimate
parent), o que pode ser alcançado, também, com a migração para países que
adotem regime territorial e que tenham ou um regime de tributação de lucros
no exterior (regras CFC ou Controlled Foreign Corporation Rules) não
abrangente, ou simplesmente não adotem regras CFC.

Especificamente no que toca ao item “iv”, acima, objeto do presente


estudo, a mobilidade dos fatores de produção, proporcionada pelo avanço
na digitalização da economia, permite que estratégias como as de inversão
fiscal ou redomiciliação da controladora sejam postas em prática, com
significativa redução da carga tributária dos grupos econômicos.

1381
Nesse diapasão, países com regime de tributação universal da renda e
que adotem regras amplas de tributação dos lucros no exterior, como vem
a ser o caso do Brasil, passam a sofrer o risco de perderem seus principais
players, seja porque já serão constituídos diretamente no exterior, seja
porque começarão a vislumbrar formas de alteração de seu domicílio.

É justamente nesse aspecto, voltado à análise específica das chamadas


operações de inversão fiscal, que se pretende evoluir a seguir, apontando-
se as especificidades e casos atinentes, especificamente, à Economia
Digital.

3. OPERAÇÕES DE INVERSÃO (TAX INVERSIONS) NOS ESTADOS


UNIDOS

Antes de ingressar, propriamente, no tema central do presente artigo,


cumpre definir o que seja uma operação de inversão fiscal (tax inversion).
Nesse sentido, adotando a conceituação de Joseph, trata-se de processo por
meio do qual determinada estrutura societária que contenha como último
sócio pessoa jurídica sediada nos Estados Unidos (ou em outro local que
esteja sob análise) é alterada, de modo que o beneficiário final seja uma
sociedade sediada em outro país418. Chama-se inversão, na medida em que
a sociedade controladora (na hipótese, americana) passa a ser subsidiária
integral da nova sociedade, domiciliada no exterior.

Em geral, referidas estruturações societárias resultam, invariavelmente,


na alocação dessa nova controladora seja para um paraíso fiscal, seja para
locais que adotem regime territorial, isentando as rendas auferidas no
exterior de tributação. Dessa maneira, não apenas jurisdições como as
Ilhas Cayman e Bermudas, mas também o Reino Unido, Canadá, Irlanda e
Suíça são alguns dos exemplos de jurisdições procuradas para esse tipo de
operação419.

1382
Esse tipo de reestruturação, como já adiantado anteriormente, foi e
continua a ser, apesar das inúmeras tentativas da Receita Federal Norte-
Americana (IRS) de combatê-la, um importante veículo para expatriação
de grandes grupos multinacionais daquele país por meio de operações de
inversão fiscal.

3.1. Origem e evolução no Sistema Tributário Americano

Conforme explorado pela doutrina, as operações de inversão fiscal, via


de regra, visam atender dois interesses dos sócios ou acionistas, a saber: (i)
distribuir rendimentos de controladas no exterior (CFC) sem a
correspondente tributação da renda, bem como (ii) impedir a sujeição de
rendas no exterior à alta carga tributação norte-americana420 (35% de
income tax, na esfera federal, em vigor até a recente reforma aprovada pelo
Congresso).

Como será visto nos casos discutidos a seguir, as operações de inversão


iniciaram-se há mais de 3٠ (trinta) anos nos Estados Unidos e a partir de
estruturas bastante simples. Referidas estruturas, com o passar do tempo, e
com as iniciativas do IRS em coibir a prática naquele país, foram
ganhando tons de sofisticação.

3.1.1. Caso McDermott

O primeiro caso de inversão de que se tem notícia remonta ao ano de


1982, quando a sociedade McDermott, Inc., atuante no segmento de
construção civil, buscou solucionar a questão da tributação dos
rendimentos auferidos em obras no Panamá. Para tanto, criou-se, no
Panamá, uma nova CFC designada McDermott International, que
posteriormente emitiria novas ações para subscrição pelos então acionistas
da McDermott Inc. com as próprias ações nesta última, invertendo a

1383
estrutura societária. Posteriormente, a mesma McDermott International
viria a adquirir as ações na antiga CFC panamenha, consolidando-se como
a controladora final do grupo. Confira-se breve reprodução da operação, na
parte que interessa ao escopo deste trabalho:

A subsidiária panamenha, portanto, ao passar a ser subsidiária da nova


controladora panamenha, poderia distribuir dividendos livremente, sem
que eles fossem sujeitos à tributação nos Estados Unidos, ainda que a
sociedade americana não tivesse alterado, de nenhuma forma, a sua sede.
Referida operação, conhecida como o primeiro caso emblemático de
inversion, representa importante precedente para a legislação norte-
americana.

Como se pode imaginar, a transação entabulada foi objeto de autuação


pelo IRS no caso Bhada v. Commissioner, 89 T.C. 959 (1987), buscando
reaver os tributos que entendiam que deveriam ter sido recolhidos sobre a
parcela da renda auferida no exterior submetida ao tratamento das regras
internas CFC (Subpart F income), mas sem sucesso. Os tribunais

1384
americanos entenderam, à época, que a transferência de ações pelos sócios
da controladora para a controlada não constituiria uma operação de
transferência ou venda entre controladora e controlada sujeita ao
tratamento da Section 304(a)(2) do Internal Revenue Code (IRC) como
distribuição de dividendos fictos.

Muito embora o IRS tenha saído derrotado da disputa judicial, o


Congresso norte-americano instituiu, em 1984, a Section 1248(i) no IRC,
que passava a considerar operações de transferência como a do caso
McDermott em duas etapas sucessivas. A primeira consistia em tratar a
operação como uma distribuição das ações da controlada no exterior para a
norte-americana para, em seguida, considerar uma segunda etapa de
distribuição das ações para os acionistas na forma de dividendos pela
sociedade norte-americana, sujeitando à tributação a parcela de lucros
acumulados no exterior421.

3.1.2. Caso Helen of Troy

Em caso bastante semelhante à operação vislumbrada no McDermott


case, também nesta hipótese os acionistas da companhia Helen of Troy,
sociedade no ramo de cosméticos, buscavam diferir a tributação das suas
controladas no exterior422. Nesse sentido, constitui-se uma nova sociedade
nas Bermudas, na qual os acionistas vieram a aportar as ações detidas na
sociedade americana Helen of Troy, Inc. e as demais CFCs do grupo, da
seguinte maneira:

1385
Em seguida, para evitar uma futura possibilidade de incidência
tributária, a nova holding em Bermudas transferiu a sua participação
mediante aumento de capital em uma nova sociedade em Barbados, para
que o grupo pudesse se beneficiar da aplicação do acordo para evitar a
bitributação celebrado entre os Estados Unidos e aquela jurisdição.

Apesar de a estrutura ser bastante similar àquela representada no Caso


McDermott, desta vez a questão foi tratada de forma mais séria, na medida
em que Bermudas é considerada como paraíso fiscal para os Estados
Unidos. Além disso, diferentemente do caso McDermott, a nova estrutura
partiu da criação de uma nova sociedade em paraíso fiscal, de modo que a
transação não era afetada pela criação da Section 1248(i), eis que
inexistentes quaisquer lucros acumulados no exterior.

Posteriormente ao referido caso, o IRS editou a Notice 94-96, vindo a


instituir a Section 367(a), a partir da qual operações que, como as
indicadas, não geravam ganho de capital para os acionistas, de acordo com
a Section 351(a) do IRC, passariam a ser consideradas para fins de
reconhecimento de ganhos tributáveis (não perdas).

3.1.3. Casos Pós-Helen of Troy

Apesar da inserção da Section 367(a) no IRC, após a conclusão do caso


Helen of Troy, diversas operações de inversão se avolumaram. Uma

1386
aparente explicação para o fenômeno decorreu do declínio do valor das
ações de companhias norte-americanas no final da década de 1990, com a
crise enfrentada na economia neste período423, ocasionando menor ganho
tributável em operações sujeitas à Section 367(a) do IRC.

Dessa forma, diferentemente do impacto ocorrido após o caso


McDermott, em que houve mais de 10 (dez) anos de diferença entre as
operações, a partir de 1996 inúmeras inversões ocorreram, podendo-se
citar os casos de Triton Energy, Tyco International, Gold Reserve (1996-
1998), Transocean, Fruit of the Loom, FXRE Corp., Xoma Ltd., White
Mountain Insurance (1999), Seaget Technology, Everest Reinsurance
(2000), Foster Wheeler, Accenture, Ingersoll-Rand, Global Santa Fe
(2001), e Noble Corp., Cooper Industries, Weatherford (2002)424.

Assim, em especial diante dos clamores populares ocasionados a partir


do trágico evento de 11 de setembro de 2001, com os ataques terroristas às
torres gêmeas, em que as ideias de patriotismo ficaram exacerbadas, o
Congresso norte-americano dedicou-se à consolidação das propostas de lei
em tramitação, editando a Section 7874, em 2004.

De acordo com estudos desenvolvidos por Webber, a introdução da


Section 7874, visando à desconsideração (i) das operações para fins de
alteração da residência tributária, bem como (ii) da utilização de atributos
da tributação norte-americana para reduzir ou eliminar os ganhos, surtiu
boa parte dos efeitos desejados, na medida em que, entre a data de entrada
em vigor do dispositivo e o final de 2010, nenhuma sociedade sediada nos
Estados Unidos e listada no ranking da S&P500 alterou seu domicílio para
o exterior425. Apenas as controladoras já residentes no exterior tiveram
qualquer espécie de restruturação, com alteração de sua sede426:

1387
O tema das inversões fiscais voltaria à tona após 2009, e com maior
força a partir do final de 2010, em especial diante (i) das inconsistências de
tratamento por parte da legislação e das normas editadas pelo IRS, bem
como (ii) da crise vivenciada pelas companhias americanas após a crise de
2008. Retomaremos o assunto adiante, após a análise das modificações
ocorridas a partir da edição da Section 7874 do IRC.

3.1.4. Section 7874 do IRC e seus desdobramentos

Em linhas gerais, a Section 7874 do IRC aplica-se aos casos de


aquisição por uma sociedade no exterior (considerada pela legislação
como substituta) de substancialmente todos os ativos detidos direta ou
indiretamente por uma sociedade domiciliada nos Estados Unidos.

Nessas hipóteses, a sociedade estrangeira será considerada substituta


pela legislação, para fins de aplicação da Section 7874 do IRC, se,
cumulativamente:

i) adquire substancialmente todos os ativos (substantially all test),


ii) ao menos 60% (sessenta por cento) em valor ou direitos políticos das ações
da sociedade no exterior continuará detido pelos antigos acionistas da
sociedade norte-americana (ownership test), e
iii) a sociedade no exterior não detém, por si ou por intermédio de seu grupo
427
econômico (expanded affiliated group) atividades econômicas substantivas
no país onde a sociedade estrangeira for criada, em comparação com o total
das atividades do grupo econômico (lack of substantial business activities
test).

No que toca ao teste de controle, a legislação dispôs que, se após a


restruturação entabulada os antigos acionistas da sociedade norte-
americana continuassem a deter428 80% (oitenta por cento) ou mais da
participação, em valor ou economicamente, na sociedade estrangeira, esta
continuaria a ser tratada, para fins fiscais, como norte-americana, para

1388
todos os fins da legislação. Dito de outra forma, a operação seria
desconsiderada para fins fiscais.

Por outro lado, caso, ao final da operação, os antigos acionistas


restassem controladores de percentual entre 60% (sessenta por cento) e
80% (oitenta por cento), a transação teria efeitos fiscais, muito embora
determinados atributos fiscais que pudessem permitir a redução da
tributação sobre o ganho de capital referido pela Section 367 do IRC
fossem desconsiderados, obrigando a sociedade americana a reconhecer a
tributação incidente sobre este429.

No que toca ao teste de existência de atividades econômicas


substantivas ou operacionais no local de constituição da sociedade
estrangeira, a legislação também evoluiu. Em um primeiro momento, em
2006430, a regulação temporária do dispositivo determinou que a avaliação
deste critério dependeria de fatos e circunstâncias do caso concreto, mas
criou uma espécie de safe harbor para os casos em que ao menos 10% (dez
por cento) dos empregados, ativos e vendas do grupo econômico fossem
efetivados no país estrangeiro alvo.

Posteriormente, em 2009431, o safe harbor foi excluído, retomando-se


apenas a análise a partir de fatos e circunstâncias do caso concreto. A
indecisão quanto a esse aspecto, aliás, levou a um êxodo relevante de
companhias, aproveitando-se da indefinição quanto aos critérios, o que só
foi obstado, ao menos parcialmente, a partir de 2012432, quando o
percentual do safe harbor foi alterado para 25%.

Em linha com a ideia de reforçar os óbices às operações de inversão


fiscal, o IRS editou, em setembro de 2014, a Notice 2014-52, por meio da
qual se buscou não apenas (i) expandir o âmbito de aplicação da Section

1389
7874 do IRC, como também limitar algumas estratégias levadas a cabo
pelo grupo econômico após a efetivação da inversão fiscal.

Nada obstante as tentativas de reforçar as regras anti-inversão norte-


americanas, a questão continuou em aberto, resultando na contínua
estruturação de operações que tenham, como um dos seus elementos, o
interesse em alterar o domicílio da sociedade controladora para o exterior.
Alguns casos, citados na literatura estrangeira, ocorridos a partir de 2014
são as operações envolvendo o Burger King433, ocorridas no mês anterior à
edição da Notice 2014-52, assim como os casos Horizon434 e Coca-Cola435.

O acúmulo de operações desse tipo demonstra que o tema segue


bastante atual. A sua atualidade decorre, principalmente, do aumento da
mobilidade dos fatores de produção no cenário da Economia Digital,
inclusive para mercados anteriormente já explorados como o da Coca-Cola
ou do Burger King.

3.1.5. Estruturações e Inversão fiscal na Economia Digital

Conforme sustenta Avi-Yonah, com a rápida evolução da tecnologia e o


desenvolvimento de sociedades voltadas a mercados fundamentalmente
atrelados à criação de valor por meio de intangíveis, a residência fiscal do
contribuinte passa a ser um conceito dotado de pouca ou nenhuma
relevância436.

Nessa linha de ideias, considerando-se a mobilidade dos fatores,


diversas sociedades desenvolvidas nesse cenário econômico já nascem em
jurisdições com tributação mais vantajosa, a exemplo de Bermudas, ou
mesmo em países que adotam total ou parcialmente um regime com
tributação em bases territoriais (v.g., Irlanda, Reino Unido, entre outras).

1390
Além dessas, diversas multinacionais com estruturas já sedimentadas
realizaram operações de inversão (ou reestruturação) intermediária, com a
criação de holdings localizadas em jurisdições com tributação favorecida
para as quais se transferiu a propriedade intelectual (IP), aproveitando-se
de transações intragrupo e das deficiências da legislação de CFC
(notadamente norte-americana) para a redução da tributação na residência
da controladora final.

Com efeito, talvez o caso mais emblemático desse tipo de inversion


intermediária seja aquele envolvendo a Google, Inc. No referido caso, a
controladora final americana constituiu uma subsidiária na Irlanda, gerida
e controlada diretamente de Bermudas, e para a qual transferiu a
propriedade intelectual. Referida holding, por sua vez, detinha
participações em uma sociedade operacional também irlandesa e uma
conduit company na Holanda, cujo único propósito seria evitar pagamentos
diretos de royalties para a holding, considerada pela Irlanda como
domiciliada em jurisdição com tributação favorecida.

A estrutura, tal como modelada, se justificava, na medida em que se


beneficiava do fato de que a sociedade holding era enxergada pela
legislação dos demais países como residente na Irlanda, muito embora para
este país, por ser gerida e controlada de Bermudas, não era considerada
como residente. A existência dessa divergência de qualificação fazia com
que fosse possível basicamente anular a tributação do grupo, evitando-se
também a aplicação das regras de CFC americanas, por conta da aplicação
de exceção para o reconhecimento do chamado Subpart F income pelo
reconhecimento de receitas operacionais na holding a partir da utilização
da ferramenta conhecida como check the box, que permitiu à sociedade

1391
operacional optar por ser considerada transparente para fins fiscais nos
Estados Unidos.

Em linha com esta modelagem, e entre outros exemplos verificados437, a


Apple Inc. optou por manter a sua controladora final nos Estados Unidos,
inserindo uma holding intermediária na cadeia societária na Irlanda e para
a qual se transferiu o intangível, também se beneficiando das relações
intragrupo e das regras de check the box para evitar a tributação das rendas
no exterior438.

Em adição às reestruturações e planejamentos realizados no contexto da


Economia Digital e apesar das dificuldades proporcionadas pela rigidez
crescente das regras de inversions nos Estados Unidos, algumas operações
foram bem-sucedidas, culminando também na troca do controle final da
estrutura para outras jurisdições. Entre as referidas operações, destaca-se,
pela proximidade com o tema desta obra, aquela envolvendo as empresas
Johnson Controls e Tyco.

A operação em referência representa um dos casos mais recentes de


inversion, resultante de uma incorporação internacional entre as citadas
companhias, com a transferência da sede da nova controladora, Johnson
Controls PLC, para a Irlanda, local de domicílio da Tyco. Como
decorrência da referida transação, os antigos controladores da sociedade
americana remanesceram com 56% das ações da nova companhia439,
respeitando os limites criados pela Section 7874 do IRC.

Entende-se que o caso Johson Controls é emblemático na seara da


Economia Digital, na medida em que esta companhia, especializada no
segmento de smart cities, foi uma das primeiras a ingressar no universo da

1392
internet das coisas (internet of things), caracterizada pelo desenvolvimento
dos novos tipos de comunicação M2M440, isto é, entre robôs ou máquinas.

4. REGRA BRASILEIRA DE TRIBUTAÇÃO DE CONTROLADAS E


COLIGADAS NO EXTERIOR (CFC) E OPERAÇÕES DE INVERSÃO
FISCAL

Assim como o quanto aduzido em relação aos Estados Unidos, cuja


legislação foi, inclusive, recentemente alterada quanto à tributação em
bases universais, o sistema brasileiro também é bastante hostil à formação
de grupos controladores sediados no País. De fato, desde a inserção do art.
74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001, mais recentemente substituído
pelas regras constantes da Lei n. 12.973/2014441, a tributação dos lucros
das controladas e coligadas442 no exterior (regra brasileira CFC) possui
abrangência desproporcional, alcançando lucros produzidos por
subsidiárias no exterior tanto no tocante às rendas passivas, como também
às ativas.

Sem a pretensão de esgotar o tema da regra brasileira, que não constitui


escopo específico deste trabalho, a legislação pátria considera todo e
qualquer lucro, ainda que não distribuído, disponibilizado por controladas
diretas ou indiretas443 (ou a elas equiparadas444), e mesmo algumas
coligadas445, de sociedades brasileiras no exterior, sujeitando-o a uma
elevada alíquota combinada de IRPJ e CSLL446. Referida tributação,
bastante elevada se comparada à de outros países do G20, reduz a
competitividade dos grupos brasileiros, fazendo com que se reflita a
respeito (i) da constituição do controle diretamente no exterior, bem como
(ii) da inversão de estruturas em que o controlador final esteja neste país.

A temática ganhou especial relevância mais recentemente, por ocasião


da aprovação de extensa reforma tributária nos Estados Unidos, com a

1393
redução da alíquota de income tax sobre as pessoas jurídicas (passando de
35% para 21%447), assim como modificando, substancialmente, o regime
de tributação sobre rendimentos offshore, tornando o Brasil virtualmente o
único país a manter o regime de tributação com bases universais. Referidas
alterações, principalmente considerando a representatividade dos
investimentos norte-americanos no Brasil, certamente trará grandes
impactos para multinacionais que tenham optado por manter no País seu
hub de investimentos na América Latina.

Em linha com este entendimento, e em relação, especificamente, ao


tema da inversão fiscal, a atratividade na constituição de holding
controladora no exterior também acaba se justificando para grupos
brasileiros, em especial nos casos de internacionalização de suas
atividades, na medida em que não há, no País, a extensão das rígidas regras
CFC para pessoas físicas448. Assim, seja a partir da constituição de
sociedades diretamente no exterior, seja mediante interposição de
holdings, a legislação não obsta a ocorrência de inversões fiscais,
alterando-se o controle do grupo econômico.

Deste modo, seja em relação a multinacionais, cujo controle final é


exercido por não residentes e que possam deixar de ter interesse em manter
subsidiárias no Brasil como hubs para investimento, em especial em outros
países da América Latina, seja em relação aos próprios grupos brasileiros,
fato é que os avanços em direção à chamada Economia Digital
aprofundam a natureza internacional ou “aterritorial” das receitas, fazendo
aumentar o interesse ou os incentivos por operações de inversão fiscal
quanto a controladoras no Brasil.

No que tange a esse aspecto, dois casos449, no passado recente, foram


emblemáticos, no tocante a multinacionais que buscaram implementar

1394
operações de inversão fiscal. No primeiro deles, envolvendo a JBS S.A.,
buscando-se reduzir a tributação efetiva de suas atividades, há muito
globalizadas, com o consequente aumento de sua competitividade e
redução de seus custos, a companhia procurou implementar reestruturação
que resultasse na troca do controle, retirando-o do País. O projeto, como
noticiado, acabou não sendo bem sucedido, porém em virtude de aspectos
políticos e do veto à sua implementação pelo BNDES450.

Além deste caso, talvez a mais emblemática reestruturação tenha


ocorrido com a Magnesita Refratários S.A. (Caso Magnesita), que acabou
por alterar o seu controle para o exterior, consistindo em importante
precedente e um autêntico marco para futuras reestruturações no bojo da
chamada Economia Digital. Em virtude de sua relevância para o estudo,
trataremos dos aspectos mais relevantes do Caso Magnesita a seguir.

451
4.1. Caso Magnesita

A reestruturação envolvendo o grupo econômico Magnesita assemelha-


se, em parte, aos casos McDermott e Helen of Troy, nos Estados Unidos.
A exemplo dos casos americanos, a sociedade brasileira (Magnesita S.A.)
detinha o controle do grupo, consolidando toda a tributação das receitas
auferidas no exterior no País. O organograma societário, antes do início da
reestruturação, apresentava algo próximo de 55% das ações com direito a
voto (ONs) pulverizadas no mercado de bolsa de valores (BM&FBovespa,
ora B3 S.A. – Brasil, Bolsa, Balcão), sendo o restante detido pelo grupo de
controle, da seguinte maneira:

1395
A partir da fotografia inicial, Magnesita Internacional (Mag
International) aumentou seu capital, sendo este integralmente subscrito
com o aporte, pela Magnesita S.A. (“Companhia” ou “Magnesita”), de sua
participação na Magnesita Mineração S.A. (Magnesita Mineração) e
Magnesita Finance S.A. (Magnesita Lux), transformando-se a Mag
International em uma companhia aberta em Londres (public limited
company). Ato contínuo, a Companhia deliberou pela redução de seu
capital, mediante entrega aos acionistas da integralidade de sua
participação na Mag International pelo respectivo valor contábil, na forma
admitida pelo art. 22 da Lei n. 9.249/95, com a superveniente admissão a
negociação das suas ações na bolsa de Londres (London Stock Exchange).

Por fim, realizou-se aumento de capital na Mag International,


integralmente subscrito com ações da Magnesita, invertendo-se o controle

1396
societário. Com o novo formato societário, requereu-se o registro da Mag
International como emissora de valores mobiliários “Categoria A” e
“BDRs” junto à Bolsa (i.e., B3), concluindo-se a operação de inversão
corporativa do grupo econômico, que pode ser sintetizada pela ilustração
abaixo, contendo a etapa inicial e final da estrutura:

A partir da reestruturação, portanto, verifica-se uma alteração


substancial do controle, passando a Magnesita a deter, como controladora,
apenas participação em outras sociedades na América do Sul, reduzindo a
exposição de seus rendimentos offshore à elevada alíquota de tributação
sobre a renda no Brasil (IRPJ e CSLL).

4.2. Principais questões tributárias e perspectivas do cenário digital

Conforme antecipado linhas atrás, a economia vem, em larga escala, se


tornando digital, reduzindo-se as fronteiras físicas e ampliando-se os bens
e serviços fornecidos em um ambiente integralmente virtual. Além do
surgimento de novos bens, serviços e funcionalidades, os segmentos
tradicionais vêm sofrendo significativas modificações, delas resultando
uma constante internacionalização dos grupos econômicos, também
possibilitada pela mitigação da importância das fronteiras no espaço
virtual.

1397
É justamente nesse cenário, de internacionalização da economia na Era
Digital, que passa a se justificar uma análise mais detida de estratégias de
inversão. Não apenas em relação às start-ups, que inclusive já poderiam
ser concebidas com controle estrangeiro, mas também no tocante aos
grupos econômicos que vêm ampliando sua natureza internacional452.

Com efeito, considerando-se as regras tributárias brasileiras,


absolutamente ultrapassadas quanto à estratégia de conferir
competitividade às multinacionais brasileiras, e a postura conservadora da
Receita Federal do Brasil, ao insistir em adotar interpretações legais de
cunho nitidamente arrecadatório em relação à tributação de rendas no
exterior453, abre-se a porta para reestruturações que retirem do País o centro
da tomada de decisão do grupo econômico.

Contudo, muito embora haja o cenário econômico propício para


mudanças estruturais desta natureza (considerando-se que aspectos como
valuation e risk assessment sejam enfrentados ex ante), alguns aspectos
tributários são imprescindíveis nesta avaliação, na medida em que podem
impactar, profundamente, as vantagens tributárias decorrentes da alteração
do controle.

Nesse sentido, a maior discussão refere-se à tributação da variação


cambial acumulada dos investimentos no exterior, na medida em que,
como se viu, a parcela do ajuste do valor do investimento (variação
positiva) pelo método de equivalência patrimonial (MEP) não inclui esse
montante454. Dessa forma, discute-se, desde antes da edição da Lei n.
12.973/2014, se haveria a incidência de IRPJ e CSLL sobre essa rubrica no
momento da alienação do investimento, entendendo a Câmara Superior de
Recursos Fiscais, em seu caso mais recente, pela tributação (Caso Aché455),
muito embora haja acórdãos em sentido contrário no CARF456. Por outro

1398
lado, a matéria já foi levada à apreciação pelo Poder Judiciário, havendo,
no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (Caso Yolanda457), decisão em
sentido contrário à imposição da exação.

No caso específico das estruturações de inversão fiscal, e tomando-se


como exemplo o Caso Magnesita, verifica-se a existência de duas etapas
da operação possivelmente sujeitas à incidência de IRPJ/CSLL sobre
variação cambial, mais especificamente no momento de integralização da
participação detida em controladas no exterior em uma nova holding
internacional, bem como a posterior redução de capital com a devolução
aos acionistas da participação detida na holding.

Com efeito, o posicionamento atual, principalmente das instâncias


administrativas, é no sentido de entender que ambas as hipóteses (i.e.,
integralização e redução de capital) são formas de alienação do
investimento, razão pela qual, neste momento, haveria a incidência de
tributos sobre a parcela da variação cambial, com a realização da renda.
Esse tema, portanto, muito embora enseje discussões ainda não
pacificadas, deve ser aferido na implementação da reestruturação, em
especial nos casos em que haja um impacto considerável de variação
cambial não submetido à tributação.

Ainda em relação à qualificação das operações como alienação do


investimento, deve-se notar que os lucros ainda não tributados
(especialmente aqueles do próprio exercício) estarão sujeitos à tributação
no balanço da controladora ao final do ano-calendário458, como efeito do
que se logrou denominar fato gerador complessivo (ou periódico) nos
tributos incidentes sobre a renda459.

1399
Outro aspecto curial, notadamente nas hipóteses de integralização de
investimentos (i.e., pela Controladora na holding estrangeira – Etapa 1 –, e
pelos acionistas das respectivas participações na Controladora brasileira no
capital da holding – Etapa 3), refere-se à discussão sobre a possibilidade
de aporte das participações pelo respectivo valor contábil. Como se sabe, a
legislação tributária (i.e., Lei n. 9.249/95) é expressa, apenas, em relação à
possibilidade de integralização pelo valor histórico pelas pessoas físicas460,
nada dispondo a respeito dos casos em que a alienação é realizada por
pessoas jurídicas.

Neste caso, poder-se-ia entender, com o que não concordamos, que a


transação deveria observar o valor justo dos ativos, tributando-se, destarte,
o ganho de capital correspondente à diferença, ou diferindo-se a sua
tributação na hipótese do art. 17 da Lei n. 12.973/2014. Quanto a esse
aspecto, seja por entendermos inaplicáveis os dispositivos atinentes à
distribuição disfarçada de lucros (DDL)461, seja por não haver, em nossa
opinião, subsunção a nenhum dos itens da legislação de preços de
transferência (no caso de integralização em partes relacionadas no
exterior)462, não haveria que se falar na necessidade de realização da
transação por valor justo, para fins tributários.

No que atine à redução de capital, e conforme já tangenciado


anteriormente, o art. 22 da Lei n. 9.249/95 possibilita a entrega de bens, no
caso a participação societária na holding, pelo respectivo valor contábil,
sem a realização, via de regra463, de ganho de capital na sociedade cujo
patrimônio tiver sido reduzido. Para sócios ou acionistas pessoas físicas
que venham a receber os bens, poderão optar pelo registro na respectiva
declaração de imposto de renda pelo valor da participação extinta, sem
auferir ganhos tributáveis. Por outro lado, no caso de pessoas jurídicas, há

1400
o risco de se considerar como tributável a eventual diferença entre o valor
contábil do bem recebido e o atribuído à participação da pessoa jurídica
extinta, o que ensejaria tributação no acionista do correspondente ganho de
capital464.

Além dos referidos aspectos, analisados de forma geral, certamente


outras questões específicas de cada caso concreto deverão ser aferidas465,
em especial no tocante aos limites da reestruturação para sua oponibilidade
em relação à administração pública, notadamente no que atine à
jurisprudência atual do CARF para análise de operações entendidas como
planejamentos tributários, ou com a finalidade precípua de redução de
tributos466. Obviamente, operações deste jaez, que envolvam outras
jurisdições (e mesmo a relação destas com o País, no caso de jurisdições
com tributação favorecida, regimes fiscais privilegiados, entre outros)
deverão ser aferidas em cada caso concreto.

De todo modo, buscou-se demonstrar, brevemente, os aspectos


tributários de maior relevo na análise de operações de inversão fiscal.
Referidos pontos, sinteticamente reproduzidos, deverão ser objeto, cada
vez mais, de análise específica, na medida em que a nova Era Digital
imponha a internacionalização e automatização da economia, notadamente
se o Brasil persistir na adoção do regime tributário com bases universais.

5. SÍNTESE CONCLUSIVA

Como se verificou, uma das mais significativas características da nova


Era Digital, muito bem sintetizadas no Plano de Ação 1 do BEPS, é a
grande mobilidade dos fatores de produção, além dos elementos próprios
da desvinculação entre players, consumidores e da própria atividade aos
conceitos clássicos de território geográfico.

1401
A desmobilização dos elementos centrais das atividades, sejam elas
novas, criadas no bojo da nova Economia Digital, ou mesmo adaptação
dos setores já existentes, induz à perda de relevância do país de residência
da controladora do grupo (ultimate parent), tornando custosa e
dificultando a competição dos players no cenário global que porventura
estejam domiciliados em países que, como o Brasil, adotem regimes de
tributação com bases universais.

Os elementos trazidos com a Era Digital, aliados às deficiências do


regime de tributação brasileiro, funcionam como elemento indutor à
reestruturação dos grupos econômicos, em muitos dos casos apontando
para a inversão do grupo, com a alocação da sociedade brasileira como
subsidiária de holdings no exterior, no que se logrou denominar, nos
Estados Unidos, de inversions (i.e., inversão fiscal).

Referidas operações, de cunho substancialmente tributário, representam


a alteração da controladora, no caso brasileiro, fazendo com que esta se
torne subsidiária do grupo econômico, seja (i) por intermédio da inversão
da cadeia vertical do grupo, seja (ii) mediante operações societárias (fusões
ou incorporações societárias), ou mesmo (iii) com a constituição de nova
controladora em uma nova jurisdição. Surgiram, nos Estados Unidos, a
partir de operações como no Caso McDermott e Helen of Troy, sucedidas
por diversas outras reestruturações a partir dos anos 1990, e que resultaram
na introdução de inúmeras alterações na legislação tributária daquele país,
mais especificamente nas Sections 367 e 7874 do IRC, acompanhadas de
vasta regulação e análise de casos ao longo dos anos.

No bojo da Economia Digital, a perda de competitividade decorrente de


regras tributárias desse tipo, associadas às características das atividades,
aponta para um movimento mais significativo de expatriações do controle,

1402
consistindo em ambiente propício para modificações estruturais com custo
relativamente reduzido e sem maiores impactos no desenvolvimento das
atividades.

Nesse cenário, o Brasil, a partir das regras tributárias hoje existentes,


notadamente as regras de tributação de controladas e coligadas no exterior,
encontra-se em total descompasso com outros países, que apresentam
regime territorial e oferecem maior competividade para seus residentes.
Assim, constitui terreno fértil para operações de inversão fiscal que
venham a mitigar os impactos negativos do regime tributário existente,
limitando-o às operações necessariamente realizadas no País, a exemplo do
que ocorreu no Caso Magnesita, analisado neste trabalho.

Como conclusão, e considerando-se (i) os custos tributários envolvidos,


em muitas das hipóteses, relativamente baixos (notadamente em relação à
tributação da variação cambial na alienação dos investimentos), bem como
(ii) a internacionalização das atividades na Era Digital, é curial a alteração
da política fiscal brasileira no cenário econômico atual e, em especial, após
a extensa reforma tributária ocorrida nos Estados Unidos, sob pena de
haver um fluxo gradativamente maior e mais significativo de expatriações,
a exemplo do Caso Magnesita e do que ocorreu naquele país.

1403
A aplicação dos acordos de bitributação aos
negócios da economia digital: as visões do
Brasil, da OCDE e da ONU sobre software e
serviços técnicos
467
Paulo Victor Vieira da Rocha

INTRODUÇÃO

Embora o Brasil baseie os seus acordos de bitributação na Convenção


Modelo da OCDE468, ele é daqueles países que historicamente resistem à
política fiscal internacional preconizada por aquela entidade, o que, em si,
como país em desenvolvimento que é, tem aspectos muito positivos. Por
outro lado, a tributação dos royalties em operações transnacionais está
entre aqueles temas sobre os quais a política fiscal da ONU mais se
contrapõe à da OCDE. Isso explica que, muito embora o Brasil baseie sua
rede de acordos de bitributação majoritariamente na Convenção Modelo da
OCDE, no que toca a tributação dos royalties, os acordos brasileiros
rejeitem sistematicamente o modelo proposto por essa Organização e se
pautem predominantemente na Convenção Modelo da ONU469.

Enquanto o modelo proposto pela OCDE privilegia a tributação dos


royalties pelo Estado da residência470, o modelo forjado no âmbito da ONU
propõe a competência cumulativa dos Estados da fonte e da residência; daí
porque países em desenvolvimento, normalmente, baseiam os artigos
referentes a royalties dos seus acordos na Convenção Modelo da ONU471.
Por sua vez, os serviços técnicos, segundo a Convenção Modelo da OCDE,
têm sua tributação fixada em favor do Estado da Residência – já que
considerados “lucros de empresa” – e uma forma comum de contornar isso

1404
(por parte de países em desenvolvimento) é associá-los ao conceito de
royalties472. Este o contexto em que alguns negócios da economia digital
normalmente precisam ser qualificados no âmbito dos acordos de
bitributação.

No âmbito da OCDE o Projeto BEPS, especificamente em sua Ação


1473, propõe uma modesta revisão da tributação dos royalties e dos serviços
que impliquem transferência de tecnologia. Contudo, o Comitê de Experts
em Cooperação Internacional em Matéria Fiscal da ONU também
promove um debate intenso sobre diferentes possibilidades de se alterar
radicalmente a estrutura dos acordos de bitributação entre países
desenvolvidos e em desenvolvimento474, mas ali dá-se bastante atenção à
tributação dos royalties e, mais ainda, dos serviços técnicos.

Por sua vez, na busca pela tributação de royalties e de rendimentos


decorrentes da prestação de serviços técnicos (ambos intimamente ligados
com a economia digital), as autoridades fiscais brasileiras adotam práticas
que parecem em sintonia com algumas das propostas mais arrojadas em
debate no âmbito da ONU sobre a tributação desses rendimentos pelo
Estado da fonte.

O que causa espanto é que tais propostas, como o próprio termo que as
designa denuncia, são ainda “propostas” e, portanto, não estão
incorporadas ao texto da Convenção Modelo da ONU nem aos
comentários a ela, muitos menos aos textos da rede de acordos de
bitributação dos quais o Brasil é parte. Ao contrário, de acordo com os
textos dos acordos de bitributação celebrados pelo Brasil, uma enorme
parcela dos rendimentos hoje classificados pela sua administração
tributária como royalties deveria, indiscutivelmente, ser qualificada como
lucros de empresa.

1405
1. A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS TÉCNICOS E DO SOFTWARE E SUA
QUALIFICAÇÃO NOS ACORDOS DE BITRIBUTAÇÃO BRASILEIROS

Inicialmente, é preciso fixar algumas premissas sobre o conceito de


royalties no Direito Tributário internacional475. Isso porque não é intuitiva
a classificação da remuneração de quaisquer licenciamentos de software
nem de quaisquer serviços como royalties, que, a rigor, representam a
contraprestação pela cessão de direitos, sejam aqueles de propriedade
intelectual (como marcas e patentes) sejam direitos autorais (caso do
software), ou mesmo direitos de exploração de recursos naturais (minas,
florestas, óleo e gás, por exemplo); daí, por exemplo, falar-se que os
royalties remuneram “a circulação de bens imateriais e a transferência de
tecnologia”476.

Nos tratados de bitributação, contudo, não é nova a “extensão” do


conceito de royalties para abarcar a remuneração decorrente de negócios
diversos da mera “cessão ou licenciamento” de direitos sobre intangíveis.
Com efeito, a Convenção Modelo da ONU, no artigo 12, ao distribuir entre
os Estados a competência para a tributação dos royalties, amplia seu
âmbito de aplicação não só a serviços técnicos como até mesmo ao aluguel
de equipamentos.

Historicamente, essa extensão pressupõe alguma vinculação entre tais


negócios e a exploração de direitos remunerados por royalties, o que leva à
afirmação de que todas essas atividades cujos rendimentos se submetem ao
artigo 12 da Convenção Modelo da ONU devem estar relacionadas de
maneira acessória ou ancilar à “transferência de tecnologia”477. O mesmo
se pode afirmar em relação ao software. Com efeito, a compreensão da
amplitude semântica do termo royalties nos acordos exige algumas

1406
considerações sobre a própria regulação civil e comercial da propriedade
imaterial no direito doméstico.

No Direito brasileiro, a expressão royalty, em geral, designa a


remuneração decorrente da exploração de direitos de propriedade
intelectual, bem como direitos de exploração de recursos naturais. Já a
contraprestação pela cessão ou licenciamento de direitos autorais, em
geral, é referida pelo próprio termo “direito autoral”. Em outras palavras, o
autor das assim chamadas “obras do espírito”478, quando cede seus direitos
autorais, recebe segundo o direito brasileiro “direitos autorais” e não
royalties. Como se vê, o termo é plurissignificativo, denota o próprio
direito objeto de cessão, bem como a remuneração por tais cessões (ou
licenciamento).

Embora o Direito privado, no Brasil, considere os royalties e os direitos


autorais categorias distintas, o Direito Tributário doméstico, em relação a
alguns aspectos, equipara, por meio de ficções jurídicas479, ambas as
categorias. É o que se vê no artigo 22 da Lei n. 4.560/64, que equipara,
para determinados fins fiscais, ambas as formas de remuneração de
intangíveis.

Contudo, nos acordos de bitributação em geral, o termo “royalty” faz


referência a ambas as contraprestações, referentes a direitos de autor e à
propriedade intelectual, o que é bastante natural, já que em inglês o termo
royalty, de fato, representa a remuneração tanto por copy rights (direito de
autor) como por intellectual property (propriedade intelectual).

Contudo, tanto a Convenção Modelo da OCDE quanto a da ONU


excluem das suas definições de royalties aqueles direitos de exploração de
recursos naturais, reduzindo significativamente no Direito Tributário

1407
internacional a amplitude que normalmente tem esse termo na linguagem
comum (em inglês mesmo). Esta “redução semântica” é contraposta por
uma ampliação, de outro lado. É que esses mesmos modelos incluem (ou
já incluíram, no passado, no caso da OCDE) no regime convencional dos
royalties algumas remunerações pelo uso de equipamentos, típicos
aluguéis, ou seja, incluem rendimentos que, a rigor, não são, de modo
algum, royalties.

Mas há um traço comum a todos os negócios abrangidos pelo artigo 12


das Convenções Modelo: eles estão relacionados a intangíveis e à
transferência de tecnologia. Isso explica a exclusão do âmbito de aplicação
deste artigo dos royalties decorrentes da cessão de direitos de exploração
de recursos naturais. Por outro lado, torna compreensível a inclusão de
verdadeiros “aluguéis” de equipamentos que sejam necessários à
performance das obrigações previstas nos demais negócios abarcados pelo
referido artigo.

O mesmo se dá com a prestação de determinados serviços, referidos


genericamente como “serviços técnicos”, que, em geral, são incluídos no
escopo do artigo 12 dos acordos de bitributação, especialmente aqueles
celebrados entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. O Brasil
costumeiramente inclui, por meio de protocolos, os serviços técnicos no
âmbito do artigo referente a royalties dos seus acordos. Contudo, a força
com que as autoridades fiscais brasileiras vêm enquadrando os mais
diversos negócios no escopo desse dispositivo cresceu sobremaneira nos
últimos anos.

Se antes a aplicação dos acordos de bitributação pelas autoridades


fiscais brasileiras era fortemente marcada pela descontrolada e quase
ilimitada qualificação de rendimentos como “residuais”, nos termos do

1408
artigo 21 da Convenção Modelo da OCDE, hoje a prática interpretativa da
Receita Federal do Brasil (RFB) segue linha diversa, no sentido de uma
também descontrolada e quase ilimitada tendência de qualificação de
rendimentos de serviços e (demais bens da economia digital) como
royalties.

Isso se explica pela decisão do caso Copesul pelo Superior Tribunal de


Justiça480. Pois com a decisão do caso Copesul, o STJ rechaçou a “corrida
ao artigo 21” praticada pela RFB, de modo que se precisou “encontrar um
novo caminho” (tão errado quanto o primeiro, diga-se de passagem), que
acabou sendo o “caminho do artigo 12”.

O caso tinha por objeto a prestação de determinados serviços abarcados


pelos tratados Brasil-Alemanha e Brasil-Canadá. Empresas sediadas
naqueles países prestavam serviços técnicos (e de assistência técnica) a
uma sediada no Brasil, e as autoridades fiscais entenderam que esta última
estava obrigada a efetuar retenção do imposto de renda, sob o argumento
de que a correta qualificação desses rendimentos era aquela prevista nos
artigos 21 de ambos os acordos considerados no caso concreto, que
asseguravam a tributação pelo Estado da fonte.

A empresa brasileira, por sua vez, sustentava não se sujeitar a tal dever
de retenção, sob o argumento de que os rendimentos por ela pagos às
empresas estrangeiras deveriam ser qualificadas nos termos dos artigos 7º
de ambos os acordos. Em outros termos, os referidos pagamentos
constituiriam “lucros de empresa” (art. 7º), cujos contornos são bastante
conhecidos nas literaturas internacional481 e doméstica482.

A pretensão da RFB pode ser explicada por duas perspectivas


(explicado não quer dizer correto). Primeiramente, como dito, a tradição

1409
interpretativa da rede de acordos brasileiros pela sua Administração
tributária sempre se pautou pelo maior alargamento possível do artigo 21
em detrimento do artigo 7º.

Isso porque, ao contrário da Convenção Modelo da OCDE, os


dispositivos de grande parte dos acordos brasileiros correspondentes ao
artigo 21 do modelo dele se distanciam, ao atribuírem competência
cumulativa ao Estado da fonte para tributar rendimentos residuais (outros
rendimentos). Já os dispositivos desses mesmos acordos correspondentes
ao artigo 7º do mesmo modelo estabelecem, como regra geral, seguindo o
Modelo OCDE, competência exclusiva do Estado da residência para
tributar os lucros de empresas, salvo se obtidos por meio de um
estabelecimento permanente localizado no Estado da fonte.

Outra perspectiva pela qual se poderia entender o argumento sustentado


pela Fazenda Nacional (o que não significa concordar com ele) é a do
próprio confronto entre os artigos 7º e 12 dos acordos brasileiros em geral.
No âmbito da OCDE – e na própria literatura sobre o tema483 – há certo
consenso de que os “serviços técnicos” (e os de assistência técnica)
possivelmente sujeitos ao mesmo tratamento dos royalties, nos termos do
artigo 12, são aqueles que implicam transferência de tecnologia ou aqueles
que representam atividades-meio para tanto.

Os serviços prestados pelas empresas alemã e canadense no caso


Copesul parecem ser daqueles que indiscutivelmente não poderiam ser
enquadrados nesta categoria. Daí porque, àquela época, provavelmente se
optou por sustentar a tributação brasileira (IRRF) com base no artigo 21 e
não no artigo 12. Esta é a segunda perspectiva pela qual se pode explicar a
anterior postura interpretativa adotada pelo fisco, que, como dito, pautava-
se sistematicamente pela maior ampliação possível do escopo do artigo 21.

1410
Acontece que, ao decidir o caso Copesul, o STJ rejeitou
contundentemente a intepretação de que os pagamentos por aqueles
serviços técnicos seriam “outros rendimentos”. Ao contrário, os ministros
afirmaram de forma categórica que a qualificação correta daqueles
pagamentos era a de “lucros empresa”, nos termos do artigo 7º, já que as
empresas não tinham estabelecimento permanente no Brasil.

Aliás, a corte confirmou o argumento sustentado pelo contribuinte de


que a interpretação pretendida pela administração tributária brasileira tinha
a consequência absurda de esvaziar completamente o escopo do artigo 7º
do Modelo OCDE (no qual se basearam os acordos Brasil-Alemanha e
Brasil-Canadá), tornando-o “letra morta”. Afinal, a se seguir a lógica
interpretativa proposta pelas autoridades fiscais, mais nada, praticamente,
se enquadraria naquele que é considerado por alguns o principal
dispositivo dos tratados contra a bitributação484.

Com a derrota do fisco no caso Copesul, revogou-se o Ato Declaratório


Normativo n. 01/2000. Em outros termos, a RFB deixou de qualificar
como “outros rendimentos” os pagamentos ao exterior referentes a
serviços técnicos prestados por residentes de países com os quais o Brasil
tenha acordo de bitributação. Mas seguiu-se a publicação do Ato
Declaratório Normativo n. 5/2014 (ADN n. 5/2014), segundo o qual as
contraprestações por serviços técnicos prestados por não residentes,
independentemente de tais serviços implicarem ou não transferência de
tecnologia, devem ser qualificadas como royalties, nos termos do artigo 12
(quando este dispositivo incluir essas atividades em seu escopo) e não
como lucros de empresas, nos termos do artigo 7º dos acordos de
bitributação brasileiros.

1411
De maneira quase irônica, como o STJ teria afastado “apenas” a
interpretação dos tratados que qualificava esses rendimentos no escopo do
artigo 21, nada tendo dito sobre o artigo 12, passaram as autoridades
fiscais a sustentar a aplicação deste último a casos como aquele discutido
no Copesul, como se a Corte não tivesse decidido que: não somente o
artigo 21 não era aplicável, como o artigo a ser aplicado ao caso era o 7º,
referente a lucros de empresas485. Assim, serviços técnicos e de assistência
técnica passaram a ter seus rendimentos qualificados pela RFB como
royalties ao se aplicarem os acordos de bitributação em que constem este
“conceito ampliado” de royalties, independentemente de implicarem ou
não transferência de tecnologia.

De fato, o Brasil, por meio de protocolos, incluiu na maioria de seus


acordos de bitributação a remuneração dos serviços técnicos e de
assistência técnica no escopo dos royalties. Em alguns chegou, inclusive, a
incluir, juntamente com a assistência técnica, a assistência científica e
administrativa (seja lá o que isto possa ser). Então, o ADN n. 5/2014 fixou
a interpretação de todos esses tratados nos quais o Brasil adotou conceito
de royalties como compreensivo também da remuneração de serviços
técnicos.

O problema central, contudo, é que esses acordos não estendem o


escopo dos royalties a todo e qualquer “serviço técnico”,
independentemente de haver transferência de tecnologia. Claro que se
poderia afirmar que, assim como os acordos (na maioria dos casos, seus
protocolos) não ampliaram expressamente o escopo dos royalties para
incluir serviços técnicos prestados sem transferência de tecnologia, eles
também não restringiram esse escopo aos serviços prestados com
transferência de tecnologia.

1412
Esta, contudo, é uma interpretação equivocada, primeiramente, em
termos lógicos. Pois o artigo 12 já não trata, em sua essência, de serviços.
A ampliação de seu escopo no sentido de abranger rendimentos que, a
rigor, não são royalties já tem caráter excepcional e, só por isso, já deveria
ser interpretada restritivamente: a exceção confirma a regra. A boa-fé que
deve pautar a relação entre os Estados determina que, se é convencionado
ampliar um conceito, as partes esperam que essa ampliação seja praticada
nos próprios limites em que acordada, porque, como dito, ela já é uma
“ampliação” em relação ao padrão normalmente adotado486.

Além disso, a interpretação adotada no ADN n. 5/2014 é equivocada


em termos semânticos. Pois o artigo 12 trata de rendimentos decorrentes
de intangíveis e de atividades relacionadas diretamente a eles, como
acessórias. Os serviços, em geral, que sejam objeto principal dos negócios,
enquadram-se no conceito mais genérico e amplo do artigo 7º, que,
exatamente por ser a regra geral, só não prevalece diante de regra especial,
como é o caso do artigo 12, que, como regra especial, “abre uma exceção”
à regra geral.

Afinal, excluir todo e qualquer serviço técnico do âmbito do artigo 7º


implicaria, por dever de coerência, excluir também a aquisição de todo e
qualquer “bem” de caráter técnico, já que não há qualquer razão nos
tratados para se distinguirem os negócios que tenham por objeto o
comércio de bens e a prestação de serviços, de resto, distinção que já não
faz sentido mesmo em outros contextos em que historicamente ela é
adotada (como em relação à dicotomia entre ISS e ICMS)487.

A interpretação que inclui a contraprestação por qualquer serviço


técnico no escopo dos royalties levada a cabo coerentemente, portanto,
levaria ao mesmo entendimento em relação à contraprestação (preço pago)

1413
por qualquer “mercadoria técnica”, implicando, mais uma vez, o
esvaziamento do artigo 7º, consequência interpretativa já afastada
veementemente pelo STJ no caso Copesul.

Vale ressaltar que, tendo em mente a tributação da economia digital, a


amplitude desta “corrida ao artigo 12” praticada pela RFB já chegou a
outros polos, tendo alcance mais amplo que os próprios serviços técnicos.
Com efeito, não são mais “só” os rendimentos decorrentes de serviços
técnicos que tendem a ser indiscriminadamente qualificados como
royalties, mas também aqueles decorrentes de negócios que tenham por
objeto software, independentemente de o objeto específico do contrato ser
o licenciamento do direito de uso ou do direito de comercializar, tampouco
importando se há ou não alienação dos direitos de autor sobre o software,
ou seja, alienação do intangível.

De sua parte, serviços técnicos e de assistência técnica, ainda que sem


qualquer transferência de tecnologia, são e serão cada vez mais prestados
sem a presença física e, portanto, em ambiente digital. Já os programas de
computador, se não são o “coração” da economia digital, representam, no
mínimo, um típico objeto de negócios celebrados neste ambiente
econômico. Eles são “bens”, “produtos” ou “mercadorias” digitais por
excelência488. É por isso que não se pode deixar de apontar que a aplicação
desenfreada do alargamento do conceito de royalties em detrimento do de
“lucros de empresa” já chegou ao mercado de software.

Inicialmente, vale lembrar que, no Direito doméstico, o software é


protegido pelo regime dos direitos autorais489 e não por aquele da
propriedade industrial. Contudo, no Direito Tributário internacional ambos
os direitos de propriedade intelectual têm o mesmo tratamento, qual seja,
aquele conferido aos royalties490. Por outro lado, no Brasil, tanto os

1414
negócios envolvendo o licenciamento de uso de software como aqueles
envolvendo o licenciamento de direitos de distribuição ou comercialização
são regidos pela Lei de Direitos Autorais491.

Mais uma vez, contudo, o cenário no Direito Tributário internacional é


um pouco diverso, pois, em geral, os acordos de bitributação são
interpretados a partir de uma distinção entre a verdadeira “cessão” dos
direitos de autor ou de propriedade intelectual em sentido amplo e a
comercialização (revenda) desses programas de computador492.

Com efeito, segundo a OCDE, os royalties sujeitos ao artigo 12 são


aqueles correspondentes à cessão de direitos de autor ou de propriedade
intelectual, para que um terceiro os explore economicamente ou integre ao
seu produto, como no caso dos direitos sobre um livro que seu autor cede a
uma editora para que o publique, reproduza cópias em série e venda essas
cópias. Nesses casos, o preço recebido pela editora como contraprestação
pela venda de cópias do livro não seriam royalties, para efeito de sua
qualificação em acordos de bitributação493. O exemplo é analogamente
aplicado ao software pela própria organização494.

Distinção semelhante, a propósito, era feita pela própria RFB na seara


da tributação internacional. A Solução de Divergência n. 27/2008 (SD n.
27/2008) partiu exatamente desta distinção para afirmar que as remessas
feitas ao exterior como contraprestação pelo licenciamento do direito de
“revender” no Brasil softwares reproduzíveis em larga escala (de
prateleira) não deveriam ser classificadas como royalties nem mesmo no
próprio Direito doméstico sobre o imposto de renda, ou seja, nem na
ausência de acordos de bitributação, esses pagamentos estariam sujeitos ao
imposto de renda retido na fonte.

1415
Essa solução de divergência, inclusive, fez referência expressa à
analogia entre a revenda desse tipo de software e outros bens como livros e
discos, por sua vez feita pelo STF no julgamento do RE n. 176.626-3495.
Aliás, a própria administração tributária, em diversas outras oportunidades
anteriores e posteriores à SD n. 27/2008, afirmou como um dos
fundamentos da não qualificação desses pagamentos como royalties o fato
de o “software de prateleira” consistir verdadeira “mercadoria”496.

O que fica disso é que: se no Direito Privado doméstico o licenciamento


do uso de software e o direito à sua reprodução em cópias e revenda têm
tratamento extremamente próximo, dado pela Lei de Direitos Autorais, no
Direito Tributário doméstico e, especialmente, no Direito Tributário
internacional, a diferenciação dessas modalidades é marcante. E faz todo
sentido que o seja, afinal, adquirir uma cópia de um programa de
computador tem substância econômica muito mais próxima da aquisição
de um bem (ou mesmo uma mercadoria) do que da aquisição de um direito
sobre um intangível objeto de propriedade intelectual.

Contudo, recentemente, o fisco reviu a posição adotada desde 2008 (SD


n. 27/2008) e, por meio da Solução de Divergência Cosit n. 18/2017497,
passou a tratar igualmente os pagamentos feitos como contraprestação ao
licenciamento do direito de uso e o ao licenciamento do direito de
distribuir ou comercializar programa de computador, por meio de cópias
que permitem (essas sim) apenas seu uso pelo “consumidor final”.
Entendeu o órgão da Receita Federal (Cosit) que mesmo a contraprestação
pelo direito de comercializar ou distribuir cópias do software deveria ser
considerada como “direito autoral” e, portanto, qualificada como royalty.
Este entendimento recentemente se consolidou com a publicação do Ato
Declaratório Interpretativo RFB n. 7/2017.

1416
Em síntese, dois dos principais objetos da economia digital (serviços
técnicos e software) servem de exemplo da prática interpretativa das
autoridades fiscais brasileiras tendente a alargar de maneira extrema o
conceito de royalties em detrimento daquele de lucros de empresa, visando
a garantir para si parte da tributação desses rendimentos.

Seguindo um histórico já bastante conhecido, não surpreende que a


postura brasileira contrarie a política fiscal internacional preconizada pela
OCDE, que sempre tende a privilegiar a tributação da renda internacional
pelo Estado da residência, perfil típico dos países desenvolvidos e
exportadores de capital.

O que causa certa surpresa é que, não obstante a política fiscal


preconizada pela ONU represente historicamente uma oposição dos países
em desenvolvimento e importadores de capital à perspectiva da OCDE – e,
por isso, o Brasil, em relação à tributação dos royalties, sempre se baseou
nos modelos provenientes daquela organização –, a posição atual da RFB
não encontra apoio nem mesmo nesse modelo no qual o Brasil se baseou
para negociar e celebrar seus tratados (ONU, no caso dos royalties). É o
que se poderá demonstra brevemente no último tópico.

2. A PERSPECTIVA DA OCDE

Como dito, a Convenção Modelo da OCDE privilegia a tributação dos


royalties pelo Estado da residência, daí porque, muito embora ela sirva de
base para a rede de tratados de bitributação do Brasil, em relação a este
tipo de rendimento, o País dela se afastou e baseou-se no artigo 12 do
Modelo da ONU, que, ao contrário, garante competência cumulativa a
ambos os Estados. Já se indica, assim, um grande distanciamento entre a

1417
perspectiva do Brasil e a da OCDE no que se refere à qualificação de
negócios à luz do conceito de royalties.

Além disso, as diferenças entre a perspectiva brasileira e a da OCDE


mantiveram sua atualidade com a publicação do relatório final do Plano de
Ação 1 do Projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting), dirigido
exatamente aos desafios da economia digital. Com efeito, no Anexo A do
referido Relatório consta uma série de sugestões de inclusões e alterações
aos Comentários à Convenção Modelo OCDE, dentre as quais a expressa
não qualificação como royalties do preço pago pelo direito de reproduzir e
comercializar programas de computador, exatamente o oposto da prática
do fisco brasileiro.

Inicialmente, em relação ao software, os comentários da OCDE já


afirmavam que a licença de uso adquirida pelo consumidor final daria
margem a “lucros de empresa”, nos termos do artigo 7º (parágrafo 14.2
dos Comentários), do mesmo modo como a licença adquirida para
distribuir cópias de software, independentemente do meio pelo qual o
produto é distribuído – se por meio eletrônico ou por mídia física tangível
(parágrafo 14.4 dos Comentários) –, devendo ser qualificados como
royalties pela cessão de know-how apenas aqueles pagamentos
correspondentes à disponibilização dos princípios e ideias subjacentes ao
programa, como algoritmos, lógica e linguagem de programação
(parágrafo 14.3 dos Comentários).

Os comentários da OCDE parecem muito consistentes ao não


diferenciar pagamento da licença de uso pelo consumidor final e
pagamento da licença do direito de comercializar ou distribuir cópias do
software pelo distribuidor. Isso porque os royalties remuneram o acesso
aos direitos de propriedade intelectual, que, por sua vez, vão representar

1418
essencialmente “insumos” para aquele que os paga, sem que adquira o
próprio intangível, como um bem a ser negociado.

Ninguém compra e vende (ou revende) direitos de propriedade


intelectual. A editora que adquire direitos de autor o faz para produzir
exemplares de um livro e vendê-los, como bens acabados em termos de
cadeia de produção e não para “revender” os direitos autorais; ela,
portanto, paga royalties. Mas o distribuidor que dela adquire exemplares
desses livros apenas os revende. Ele vende o que já foi vendido a ele
pronto e acabado, por isso ele revende.

Algo muito similar ocorre com o software reproduzido em larga escala.


O distribuidor ou revendedor revende cópias do software que ele adquiriu
pronto e acabado, como uma mercadoria. Fazer uma comparação entre o
distribuidor e um agente ou comissário (ou comissionário, para usar a
linguagem rigorosa de Pontes de Miranda498) talvez ajude a esclarecer o
ponto. O agente e o comissário, embora celebrem negócios que tenham por
objeto mercadorias, não as detêm. Eles não as revendem, simplesmente
porque o agenciado e o comitente não as venderam a eles. Só se pode
revender aquilo que antes se comprou de alguém.

Perceba-se que, no caso do agente, ele celebra contratos em nome do


agenciado (como representante dele)499, enquanto o comissário celebra
contratos em seu próprio nome, mas ambos à conta do comitente500.
Embora um celebre em nome próprio e outro não, o traço comum entre
eles é que nenhum vende por sua própria conta, pois eles não detêm o
domínio daquilo que vendem. Daí sua remuneração ser uma “margem”
proporcional ao preço pelo qual negociarem os bens à conta de outrem.
Em geral, a comissão é um percentual do preço.

1419
Algo diferente ocorre, em geral, com os contratos de distribuição e de
revenda. O distribuidor, como alguém que comercializa à sua própria
conta, adquire o objeto da revenda e o valor que venha a agregar ao objeto
(que inclui seu próprio lucro) é a si atribuível. Também é dele o risco de
não celebrar nenhum negócio jurídico e, portanto, não revender aquilo
que outrem lhe vendeu. Diversamente, o risco do agente e do comissário é
muito baixo. Se eles não obtiverem êxito em vender os bens de outrem
(ainda que em nome próprio), eles não suportarão, em geral, o custo de
aquisição desses bens.

Essa lógica, embora baseada em noções bastante tradicionais do Direito


Privado, focado na noção de mercadoria como “coisa” móvel, parece
plenamente aplicável aos bens “digitais”. Caso o distribuidor ou
revendedor de software não seja um agente, remunerado por meio de
comissões calculadas sobre o preço das vendas que ele efetuar e devidas
somente no caso de tais vendas ocorrerem, sua atividade negocial será
econômica e legalmente muito semelhante à do revendedor de bens
corpóreos.

Assim, se ele paga uma espécie de contraprestação pela “aquisição” dos


bens digitais para os revender à sua própria conta, faz muito sentido
aplicar o raciocínio exposto no exemplo acima e concluir que este
distribuidor “revende” os dados que adquiriu do detentor dos direitos de
propriedade intelectual sobre o software. Isso torna frágil a distinção entre
o pagamento pelo direito de uso e o pagamento pelo direito de distribuir ou
revender praticado pelas autoridades brasileiras.

Por fim, é interessante perceber que a mesma OCDE, no parágrafo 10


dos seus comentários, dá outro exemplo que parece seguir uma lógica
muito semelhante a esta proposta aqui, de se levarem em conta os

1420
pagamentos feitos pelo distribuidor como contraprestação por uma
“aquisição”, e não pelo direito de usufruir da propriedade intelectual de
outrem. Embora o exemplo trate efetivamente de bens corpóreos, ele
parece seguir exatamente essa lógica.

O referido parágrafo dos comentários ilustra a ideia com a situação de


um distribuidor de roupas que efetua um pagamento a um fabricante
residente de outro Estado como contraprestação pelo direito que adquire
não de usar sua marca, mas de comercializar em dado território os
produtos fabricados por este último. Esses pagamentos, segundo os
referidos comentários, seriam “lucros de empresa”, e não royalties.

O exemplo é bom exatamente porque não trata exatamente da


“aquisição” de mercadorias para revenda, mas sim de situação muito
semelhante ao caso do software, quando um distribuidor paga uma alta
quantia ao detentor dos direitos autorais não para adquirir unidades
tangíveis determinadas e revendê-las, mas para ter o direito de
comercializar cópias daqueles dados (o software) que ele detém, mas cuja
propriedade intelectual pertence a outrem.

O exemplo, portanto, vai além. Pois, de fato, uma quantia paga pelo
distribuidor ao fabricante que não represente preço pela aquisição daquilo
que revenderá, a rigor, não é exatamente compra de um bem (tangível ou
não), mas aquisição de um direito ou licença (o de revender com
exclusividade em dado território). Ainda assim, como o fabricante não
cede ou licencia ao distribuidor o direito de usar um ativo intangível em si,
ele é tratado pela OCDE como uma “aquisição” de algo para “revenda”.

Portanto, o trato do software é suficiente para demonstrar a amplitude


da distância entre a perspectiva da OCDE e aquela adotada pela

1421
administração tributária brasileira ao definir a qualificação de negócios
entre os conceitos de royalties e lucros de empresa. Mas a mesma distância
pode ser percebida também em relação à tributação dos serviços técnicos,
pois, como dito, a remuneração de tais atividades não só está fora da
definição de royalties da OCDE, como a qualificação desses rendimentos
nos termos do artigo 12 é expressamente negada pelos respectivos
comentários, que receberam acréscimos incisivos por parte do referido
Anexo A do relatório final do Plano de Ação 1 do Projeto BEPS
reforçando tal entendimento.

Com efeito, no que se refere aos “serviços técnicos”, tais comentários já


tinham como traço delimitador da incidência do artigo 12 a “transferência
de tecnologia” (parágrafo 11.1) e explicitavam que esses contratos se
distinguiam da prestação de serviços, porque nesses casos uma das partes,
o prestador, se vale de técnicas e conhecimentos próprios para executar ela
mesma o trabalho em favor da outra parte, o tomador (parágrafo 11.2).

Já se afirmava, portanto, que esses serviços não se enquadravam no


conceito de know-how e, portanto, não seriam subsumíveis ao artigo 12,
cujo escopo são os royalties. Mas a Ação 1 do BEPS fez constar, ao final
desse parágrafo, a afirmação clara sobre a descrição de serviços no sentido
de que “pagamentos feitos no bojo desses últimos contratos geralmente se
enquadram no artigo 7º”.

Adicionalmente, a mesma Ação 1 alterou o parágrafo 11.3 dos


comentários, que, após reconhecer as dificuldades em se distinguirem
algumas vezes pagamentos por know-how e pagamentos pela prestação de
serviços, elenca alguns critérios, como a execução da atividade contratada
pelo próprio beneficiário dos pagamentos e detentor das técnicas
caracterizadoras dos serviços, sem transferência de tecnologia. Em

1422
contraponto, afirma-se nos comentários que no contrato de cessão de
know-how, em geral, muito pouco precisa ser feito pelo cedente, além da
própria cessão das informações e técnicas, esclarecendo, ainda, que, nesses
contratos, em geral, muito pouca despesa é exigida dela para adimplir sua
obrigação contratual.

Não bastasse, acrescentaram-se inserções aos parágrafos 11.4 e 11.5


desses comentários, dando exemplos do que não consiste prestação de
serviços assimilável ao artigo 12, mas sim prestação de serviços em geral
(sujeitas ao artigo 7º), dentre eles, assistência técnica e pareceres exarados
por profissionais liberais, como contadores, advogados e engenheiros.
Chegou-se, ainda, em seguida, ao ponto de afirmar que, nos casos em que
o fornecedor precise disponibilizar informações sobre programas de
computador, para que o respectivo pagamento seja considerado
contraprestação por know-how (portanto royalties), é necessário que o
referido pagamento se dê “em função dessa disponibilidade de
informação” e que ela seja provida “para adquirir informações que
constituam ideias e princípios subjacentes ao programa, como lógica,
algoritmos, linguagem ou técnicas de programação, de modo que essa
informação seja provida sob a condição de o consumidor não a divulgar
sem autorização e ela esteja sujeita a qualquer proteção ao segredo
negocial disponível”501.

Repita-se: tais comentários afirmam não apenas que royalties


representam a contraprestação pela disponibilização de know-how
(parágrafo 11) e que este é objeto de contratos em que as informações
técnicas são disponibilizadas pelo cedente para que o cessionário as utilize
por sua própria conta, sem que o cedente exerça qualquer atividade no
emprego em si dessas informações ou conhecimentos cedidos (parágrafo

1423
11.1), como também acrescenta que “este tipo de contrato, portanto, difere
do contrato de prestação de serviços no qual uma das partes exerce o uso
das técnicas costumeiras da sua designação para executar ele mesmo para
a outra parte” (parágrafo 11.2). Além disso, essa redação foi
complementada pelo seguinte acréscimo constante da Ação 1:
“Pagamentos feitos sob esses últimos contratos geralmente recaem sob o
artigo 7º”.

Como se vê, enquanto, de um lado, a OCDE desenvolve todo o conceito


de royalties como contraprestação pela cessão da exploração econômica de
direitos de propriedade intelectual e, consequentemente, só admite como
tais os rendimentos decorrentes de atividades acessórias a uma forma
específica dessa cessão, que é o contrato de know-how, no qual a
transferência de tecnologia é inerente, a RFB, de outro lado, firma sua
posição partindo exatamente da premissa de que a remuneração por
serviços técnicos (e assistência técnica) deve ser considerada como
royalties, independentemente de haver qualquer transferência de
tecnologia.502

O distanciamento entre as perspectivas da RFB e da OCDE sobre o


assunto, como dito, não é de causar qualquer surpresa. Causa alguma
espécie, contudo, perceber que a aplicação dos tratados de bitributação
pelo Brasil, em certo ponto, não coincide sequer com a interpretação que a
ONU dá ao seu modelo, no qual se baseiam os acordos de bitributação
celebrados pelo Brasil relativamente aos royalties. A prática brasileira até
coincide com as propostas da ONU para o futuro, mas não com a
interpretação que ela dá ao texto atual.

3. A PERSPECTIVA DA ONU

1424
Como dito, a oposição entre as perspectivas dos países em
desenvolvimento e desenvolvidos em matéria de política fiscal é bastante
conhecida503, assim como o são as posições da OCDE – como foro onde se
privilegia a posição dos exportadores de capital (desenvolvidos) – e da
ONU – como ambiente em que os interesses de importadores de capital
(países em desenvolvimento) são mais levados em conta504.

Daí não causar surpresa o fato de que, em matéria de royalties, a ONU


assegure a competência ao Estado da fonte, sendo exatamente os royalties
apontados por Schoueri505 como exemplo da divergência entre este modelo
e o da OCDE: o nível de tributação reservado ao Estado da fonte, maior no
modelo da ONU que no modelo da OCDE.

Em relação ao conceito de royalties definido no texto do artigo 12, não


se registram tantas diferenças por parte da ONU em relação à política
preconizada pela OCDE. Em matéria de software, inclusive, os
comentários são extremamente próximos. A diferença, contudo, começa a
ficar bastante evidente quando se ingressa no tema dos serviços técnicos,
primeiramente porque os comentários da ONU alargam a incidência do
artigo 12 a uma parte significativa desses serviços.

Além disso, no âmbito do artigo 5º, a Convenção Modelo da ONU


contém um dispositivo que cria o “Estabelecimento Permanente de
Serviço” (Service PE) e que tem o condão de alargar as bases tributáveis
do Estado da fonte no que diz respeito aos rendimentos decorrentes da
prestação de serviços em geral, e não apenas os serviços técnicos. Essa
abordagem – pelo viés dos países em desenvolvimento – dos serviços,
muito focada nos de caráter técnico, mas não restrita a eles, é que distancia
a perspectiva da ONU em relação à da OCDE506.

1425
Enquanto a Ação 1 do BEPS propõe mudanças aos comentários à
Convenção Modelo da OCDE que não trazem significativas modificações
na alocação de bases tributáveis entre fonte e residência (ao contrário, eles
parecem visar exatamente à manutenção das bases em favor do Estado da
Residência), o referido comitê da ONU nos últimos anos discutiu uma
série de propostas para um novo formato de tributação da prestação de
serviços com essas características, que, na busca por uma radical
realocação do poder de tributar ao Estado da fonte, vão desde a criação de
um novo conceito de Estabelecimento Permanente (Service PE) até um
artigo inteiramente novo na Convenção Modelo ONU, para tratar
especificamente dos serviços técnicos prestados por residentes de um
Estado em favor de tomadores residentes em outro Estado.

As propostas da ONU, portanto, são radicais em relação à redistribuição


das bases tributáveis no que diz respeito à remuneração por serviços,
especialmente, os técnicos. Com efeito, se demonstrará que a prática do
fisco brasileiro coaduna-se bastante com aquela que talvez seja, em termos
de tributação pelo Estado da fonte, a mais arrojada das propostas das ONU
ou, ainda, que tais práticas, possivelmente, configuram-se como uma
mistura das mais arrojadas propostas em cena naquele foro.

Contudo, até agora, naquela organização supranacional não se chegou a


nenhuma conclusão definitiva sobre qual das alternativas deve ser adotada
como a “política da ONU”. Afinal, como afirma Baez507, ao comentar a 10ª
Reunião do Comitê da ONU, ali “parecia não haver nenhum traço de um
‘acordo básico’ geralmente considerado”; aliás, ele em seguida chega a
mencionar um “dissenso notável” nas discussões.

Inicialmente, é preciso apontar que, embora o chamado Base Erosion


Approach (oriundo das ideias do Projeto BEPS) dê um suporte teórico

1426
praticável para a tributação de serviços técnicos internacionais,
especialmente aqueles praticados na economia digital, ele visa
fundamentalmente reestabelecer os níveis pré-estabelecidos de tributação
pelo Estado da residência (aqueles níveis tradicionais da OCDE).508

O projeto da ONU, ao contrário, visa essencialmente a uma “atribuição


adicional” de competência ao Estados da fonte, tanto que, enquanto
referências à “dupla não tributação” ou a “planejamento tributário
internacional” são expressões recorrentes no discurso da OCDE – às quais
a ONU não faz referência –, a “erosão de bases tributárias nacionais” por
meio da prestação de serviços não é um problema ao qual o Projeto BEPS
faz qualquer alusão direta, embora a ONU o considere dos mais relevantes,
como aponta Baez509.

Fixado que os objetivos nucleares dessas políticas fiscais são diferentes,


algumas das principais propostas da ONU evidenciam, uma vez mais,
maior proximidade da prática brasileira em relação a elas que em relação à
OCDE. Merecem destaque como propostas – além da já antiga revisão dos
comentários da ONU à sua Convenção Modelo sobre a tributação dos
serviços técnicos – especialmente aquelas dirigidas ao artigo sobre
royalties: (1) a ampliação do conceito de “estabelecimento permanente”
para instituir o conceito de “estabelecimento permanente de serviço”
(Service PE) e (2) a inserção de um artigo completamente novo na
Convenção Modelo da ONU sobre a tributação de serviços.

A dita ampliação do conceito de estabelecimento permanente encontra-


se hoje no artigo 5 (3) b do modelo ONU. Já no modelo OCDE não há
dispositivo equivalente, embora nos comentários haja uma menção à
possibilidade de os estados inserirem nos tratados um dispositivo tratando
da questão (parágrafo 42.3 dos comentários). Como se sabe, a existência

1427
de estabelecimento permanente é uma condição excepcional por força da
qual o Estado da fonte pode tributar os lucros de empresa residente em
outro Estado510. Sua ampliação permitiria maior alcance desse conceito aos
prestadores de serviço, em função da presença física de profissionais.

A proposta do estabelecimento permanente de serviços constante do


Modelo da ONU não é tão diferente daquilo posto nos comentários da
OCDE. Aquela da ONU não faz menção expressa ao termo “Service PE”.
Por parte da OCDE, o conceito de “Service PE” apresenta uma série de
requisitos para a sua caracterização que podem incomodar países em
desenvolvimento, pois, por exemplo, a presença física de pessoas é difícil
de ser controlada e fiscalizada e, além disso, é um requisito bastante
formal e objetivo, pelo que sua elisão pelos prestadores de serviços
estrangeiros pode se mostrar relativamente fácil511. Ademais, a proposta
deixa completamente descoberta a prestação de serviços executada sem
qualquer presença física – de maneira completamente remota –, o que
hoje, talvez, seja um dos elementos centrais da economia digital512.

Por fim, o estabelecimento permanente de serviços deve ser tratado pelo


Estado da fonte de forma similar a um residente, no sentido de que ele
deve ser tributado sobre bases líquidas, o que gera polêmica. Pois em
comparação com uma simples retenção na fonte sobre o valor das
remessas ao exterior, fiscalizar a apuração contábil de receitas e despesas
do estabelecimento permanente pode ser uma realidade bastante difícil por
parte de muitos Estados em desenvolvimento que figurem como Estado da
fonte513.

É inevitável, aqui, perceber que a criticada tributação sobre bases


líquidas inerente ao Servive PE atende aos reclamos do princípio da
igualdade segundo a capacidade contributiva e torna a tributação de

1428
serviços técnicos no âmbito internacional514 muito mais adequada aos
padrões de Direito doméstico (constitucional) da maioria dos países, que
prescrevem que a tributação por meio de impostos deve pressupor
capacidade contributiva, do mesmo modo como a graduação desses
tributos deve, primordialmente, se basear em tal parâmetro515.

Obviamente, pode-se alegar que a igualdade segundo a capacidade


contributiva é matéria estranha ao Direito dos acordos de bitributação516.
Mas o que se pretende salientar aqui é que, caso se opte por defender a tese
em favor da tributação em bases líquidas baseada na igualdade segundo a
capacidade contributiva, tal empreitada implica ingressar em complexa
ponderação entre tal princípio de Direito fundamental e um bem coletivo
muito caro a qualquer sistema tributário: a praticabilidade517.

Por isso, uma das principais alternativas para adaptar melhor o modelo
de Service PE à tributação em bases líquidas poderia ser fixar margens de
lucro presumidas aos estabelecimentos, como aponta Baez, tal qual hoje se
faz no Brasil para a tributação sobre o lucro presumido (e até na fixação de
margens predeterminadas nos preços de transferência), o que, por sua vez,
também implica levar em conta que os efeitos práticos de uma tal
sistemática pode ser muito parecido a simplesmente se aplicar uma
alíquota significativamente reduzida sobre os rendimentos brutos.

Portanto, inserir um modelo de Estabelecimento Permanente de


Serviços nos tratados está longe de ser livre de polêmicas, como também
não o é a alternativa hoje cada vez mais enfatizada e discutida no seio da
ONU, qual seja: inserir-se um novo e específico artigo na Convenção
Modelo, dispositivo este que atribuiria competência cumulativa ao Estado
da fonte para tributar em bases brutas os rendimentos de serviços técnicos
internacionais.

1429
Referida proposta independeria de qualquer presença física do prestador
de serviços estrangeiros, o que a torna, sob este aspecto, mais ampla que a
inserção do conceito de Service PE nos tratados, conforme esse conceito
consta hoje da modelo ONU (artigo 5 (3) b) e dos comentários da OCDE.
No entanto, sob um outro aspecto, o novo artigo que se propõe inserir na
Convenção Modelo da ONU acaba sendo mais restrito que a adoção do
conceito de Service PE.

Pois, enquanto o artigo 5 (3) b do atual modelo ONU faz referência


genérica a “serviços, inclusive serviços de consultoria”, o proposto novo
artigo sobre serviços restringe-se à tipologia dos chamados “serviços
técnicos”, cujos problemas relacionados à delimitação semântica já são
conhecidos518. Com efeito, o proposto novo dispositivo, além de delimitar
seu âmbito de incidência aos “serviços técnicos”, define-os como sendo
aqueles “gerenciais, técnicos ou de consultoria”519.

Embora mais restrito, o escopo limitado a “serviços técnicos” pode ser


significativamente amplo e, em princípio, com base nele se pudesse chegar
ao limite de afirmar que ele inclui até mesmo aqueles serviços cuja
prestação ocorre sem qualquer “transferência de tecnologia”. Mas intenção
do Comitê da ONU não parece ser tão ampla a ponto de incluir todo e
qualquer serviço sob a incidência deste novo artigo, por exemplo, já se
excluindo, nos próprios comentários, serviços prestados “em massa”,
como, por exemplo, aqueles de acesso a bases de dados. A prática
brasileira, portanto, parece ir além até da própria perspectiva da ONU, já
bastante alargada.

É possível fazer uma análise extremamente crítica dessa proposta da


ONU, a começar pelas dificuldades em se definirem “serviços técnicos”
(em sentido amplo) e, mais ainda, “serviços gerenciais, técnicos (em

1430
sentido estrito) e de consultoria”. De outro giro, se o traço característico da
prestação de serviços técnicos é o emprego inerente a eles de técnicas e
conhecimentos específicos, então a racionalidade da proposta fica bastante
ameaçada quando se percebe que determinados serviços, ainda que
prestados em massa, podem depender de mais conhecimento específico e
sofisticado que muitos serviços prestados de forma “customizada”, como
aponta Baez520.

Portanto, a proposta de inserir no modelo ONU um artigo


completamente novo para tratar a questão da tributação dos serviços
técnicos também é sujeita a uma série de dificuldades e debates de difícil
solução. Ademais, o referido artigo, mantendo em cena o problema já
antigo de se definirem serviços técnicos, talvez também não possa ser
chamado exatamente de um dispositivo “inteiramente novo”.

Mas um resumido confronto entre a inserção desse dispositivo e a


adoção do já existente modelo de Service PE demonstra que, de um lado,
esta última proposta é mais ampla no que toca aos serviços abrangidos
(não somente os técnicos) e mais restrita no que se refere às bases de
incidência (líquidas), além disso, ela exige presença física. Ao contrário,
aquela proposta de inserção do assim chamado “novo artigo” é mais
restrita em relação aos serviços abrangidos (pelo menos teoricamente, já
que, como dito, serviços técnicos, de acordo com alguns pressupostos,
podem acabar sendo quaisquer serviços) e mais ampla no que diz respeito
às bases de incidência (brutas), além disso, não exige presença física.

Esse balanço entre as duas que parecem ser as principais tendências de


política fiscal internacional da ONU, no que se refere aos serviços
técnicos, permite chegar-se, dentre outras, a uma conclusão parcial: o
modelo mais tradicional de se ampliar o escopo do artigo 12, equiparando

1431
a royalties a remuneração por serviços técnicos, parece o menos indicado,
pois apresenta os principais problemas de ambas as alternativas aqui
apresentadas, sem contudo, possuir suas principais vantagens.

De um lado, a assimilação de serviços técnicos ao artigo sobre royalties


mantém as dificuldades inerentes à definição de serviços técnicos (e sua
respectiva insegurança jurídica), assim como a incidência de altas
alíquotas sobre bases brutas. De outro, mantém-se a necessidade de
presença física como requisito para tributação pelo Estado da fonte, pelo
menos na forma como geralmente se interpreta o conceito de fonte. O
curioso é que, voltando-se à perspectiva prática das autoridades fiscais
brasileiras, percebe-se que boa parte dessas dificuldades vivenciadas na
definição de um modelo de política fiscal internacional da ONU para
“serviços” (especialmente os “digitais”, que mais interessam aqui) são,
bem ou mal, “superadas”.

Na prática brasileira, a questão da presença física há muito é contornada


pela adoção do conceito de “fonte de pagamento”521 como elemento de
conexão. Já as dificuldades relacionadas à definição de serviços técnicos
são superadas pela simples definição de serviços técnicos como,
praticamente, quaisquer serviços, implicando ou não transferência de
tecnologia, de modo que, para as autoridades fiscais brasileiras,
praticamente todo serviço é técnico. Por fim, as dificuldades quanto à
tributação de serviços como lucros de empresa, atribuíveis a um Service
PE, são contornadas com a simples aplicação da alíquota comum sobre o
rendimento bruto.

Repita-se: as dificuldades postas em debate no cenário internacional,


especialmente na ONU, são contornadas com enorme facilidade pela
prática interpretativa brasileira. Contudo isso talvez não seja razão para

1432
comemorações. Embora o cenário dos serviços seja um pouco diverso
daquele exposto em relação ao software, o problema deles decorrente é
muito semelhante.

4. CONCLUSÕES

Em relação ao software, OCDE e ONU não têm políticas muito


diversas. De modo geral, tanto o pagamento pelo licenciamento do direito
de uso como pelo licenciamento do direito de comercializar ou distribuir
software, em princípio, devem ser qualificados como lucros de empresa,
independentemente de se tratar de software de prateleira ou de software
customizado, sendo, portanto, tributáveis somente no Estado da residência
dos beneficiários desses rendimentos.

Isso permite afirmar que, segundo esse modelo, a elaboração de um


software customizado assemelha-se muito à prestação de um serviço –
ainda que, juridicamente, o objeto do contrato seja o licenciamento de seu
uso – e, por outro lado, pode-se dizer que o licenciamento do direito de uso
ao consumidor final ou de comercialização de software “de prateleira”
assemelha-se à venda de uma mercadoria (digital).

Portanto a primeira grande divergência entre a interpretação de acordos


defendida pelo fisco brasileiro em relação tanto à OCDE quanto à ONU:
para a RFB, o licenciamento de software, seja relacionado ao direito de
uso ou ao direito de comercializar ou distribuir cópias, tem como
contraprestação o pagamento de royalties, submetidos ao imposto de renda
retido na fonte.

Embora no que se refere aos royalties o Brasil baseie seus acordos de


bitributação no Modelo da ONU, ele nega a interpretação desse modelo
dada pela própria ONU, qualificando, de forma ampla e irrestrita, os

1433
rendimentos correspondentes ao software como royalties, e não como
lucros de empresa. A interpretação ampliativa da tributação pelo Estado da
fonte, pela perspectiva brasileira, é muito distante daquela propugnada
pela ONU.

Em relação aos serviços técnicos, a comparação entre as perspectivas é


um pouco mais complexa, pois, diferentemente do que ocorre em relação
ao software, a ONU não decidiu ainda qual das alternativas expostas acima
vai adotar como seu modelo de política fiscal. E a escolha não é fácil, uma
vez que, como dito, todas as alternativas têm “prós” e “contras”. A política
da OCDE é mais definida, mas não é nela que o Brasil baseia seus acordos
em matéria de royalties e, indiretamente, nem de serviços técnicos; o
parâmetro brasileiro neste ponto é a ONU.

O curioso é que a Administração tributária, guiada por certo


pragmatismo, adota uma prática de qualificar rendimentos de serviços
técnicos que parece superar boa parte dos problemas inerentes às
alternativas cogitadas pela ONU, qual seja: (1) royalties são um conceito
amplo o suficiente para abarcar toda e qualquer forma de remuneração por
serviços técnicos; (2) serviços técnicos formam um conceito amplo o
suficiente para abranger quase todo e qualquer serviço, independentemente
de implicar transferência de tecnologia; (3) por conta da irrelevância de
estabelecimento permanente, a incidência se dá sobre rendimentos brutos,
ou seja, sobre o preço inteiro dos serviços.

A única questão que, aparentemente, fica de fora da solução brasileira


é a necessidade ou não de presença física do prestador de serviços no
Brasil, como requisito para a tributação na fonte. Embora esta seja uma
questão não abordada no trato do tema pelo Brasil, ela se resolve por uma
outra prática geralmente adotada pelas autoridades fiscais brasileiras e

1434
adotada pela legislação doméstica, que é considerar como Estado da fonte
não aquele de onde provém efetivamente o rendimento transnacional
(fonte de produção do rendimento), mas sim aquele onde se localiza o
responsável pelo pagamento (fonte de pagamento).

Muito provavelmente esta será a solução adotada pelo Brasil diante da


economia digital, em que os serviços serão cada vez mais prestados de
forma remota, sem que o prestador tenha qualquer presença física no
Estado onde se localiza o tomador e, assim, execute toda sua atividade fora
dos limites territoriais desse último Estado.

A questão que se põe ao final diz respeito a saber se a rede de acordos


de bitributação do Brasil permite essas soluções. Como dito, em geral,
trata-se de soluções discutidas com foco prospectivo, como futuros
padrões de política fiscal a serem adotados pela ONU. Mas, se são
discutidas como soluções prospectivas, significa que é preciso, em relação
a cada uma delas, analisar a respectiva inserção em tratados concretamente
considerados.

Em relação ao cogitado “artigo novo”, ele ainda nem consta da


Convenção Modelo, logo, não é preciso muito esforço para se concluir que
tal dispositivo não consta de nenhum tratado assinado pelo Brasil. Assim,
os efeitos práticos de sua adoção, como ignorar presença física do
prestador de serviços e ampliar o escopo do que sejam serviços técnicos –
tornando-se irrelevante implicarem ou não transferência de tecnologia –,
dependem de previsão expressa em cada tratado, o que, por sua vez, é
ignorado palas autoridades brasileiras, que adotam essas soluções
independentemente de previsão convencional para tanto. Desse modo,
ainda que a ONU cogite mudar tratados, as autoridades brasileiras atingem

1435
o mesmo efeito prático sem qualquer dessas alterações. Isso parece
violação aos acordos presentes.

Já em relação ao conceito de “Service PE”, o Brasil adota o conceito


mais amplo possível de “serviços” para a qualificação de seus rendimentos
como royalties. A adoção de um conceito de royalties que, embora
baseado na ideia de “serviços técnicos”, abrange serviços com ou sem
transferência de tecnologia, prestados de forma massificada ou não, atinge
os mesmos resultados que a adoção de um dispositivo nos moldes do
artigo 5 (3) b, que define o Estabelecimento Permanente de Serviços.

Por fim, a questão mais antiga: a solução comumente adotada pelos


países em desenvolvimento, qual seja a ampliação do conceito de royalties
do próprio artigo 12, é adotada pelo Brasil, contudo, de maneira também
mais ampla. Isso porque, embora as autoridades fiscais só apliquem o
artigo 12 a serviços técnicos nos casos em que haja previsão convencional
para tanto (pelo menos em protocolo), elas o fazem a “quaisquer serviços
técnicos”, independentemente de haver ou não transferência de tecnologia,
transformando “qualquer serviço” em “serviço técnico”, como consta no
ADI n. 5/2014, o que, por sua vez, parece extrapolar os acordos, já que o
conceito internacionalmente adotado de serviços técnicos assimiláveis ao
artigo 12 limita-se àqueles serviços em que haja transferência de
tecnologia.

Para teminar, de todo modo, o que há de comum em todas essas


soluções pela perspectiva da ONU é que todas elas são propostas de novas
políticas de tratados e, portanto, dirigem-se à alteração do próprio corpo
desses instrumentos, seja inserindo-se um artigo prevendo a caracterização
do Estabelecimento Permanente de Serviços abrangendo quaisquer
serviços, seja inserindo-se um artigo completamente novo e que diga

1436
respeito a serviços técnicos. Nenhuma dessas medidas é política
“meramente interpretativa”, se é que se podem considerar interpretações
(minimamente possíveis) algumas daquelas adotadas pela RFB. Elas, na
ONU, são propostas de alteração dos tratados de bitributação.

O que o Brasil faz muitas vezes, portanto, é aplicar a sua legislação


tributária à margem de seus acordos de bitributação, adotando práticas que
até são bastante atuais nos debates da ONU, mas que lá são, como devem
ser, propostas de alterações à sua Convenção Modelo (ou de seus
comentários); lá são propostas, aqui são práticas, à margem dos tratados.

1437
Alocação da propriedade intelectual e a
tributação dos royalties no Projeto BEPS: o
combate aos planejamentos tributários
“abusivos” e o “nexus approach”
522 523
Reinaldo Ravelli Neto e Daniel Leib Zugman

1. INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento


Econômico (OCDE) e o G-20 – do qual o Brasil faz parte – vêm liderando
discussões para inibir as práticas realizadas por grupos multinacionais com
finalidade meramente fiscal de erosão de base tributável e de transferência
de lucros (Base erosion and profit shifting – BEPS) para países com baixa
tributação. Como resultado, em outubro de 2015, a OCDE publicou o
relatório final do BEPS (o “Plano de Ação”), no qual 15 ações foram
recomendadas.

Se pudermos sintetizar em uma única ideia o complexo conjunto de


recomendações do Plano de Ação, seria a de possibilitar que a renda
auferida por grupos multinacionais seja tributada na jurisdição em que ela
é efetivamente gerada, isto é, onde há substância econômica524.

A OCDE ilustra o Projeto BEPS por meio de três pilares (coerência,


substância e transparência) assentados sobre duas bases (Economia Digital
e Instrumento Multilateral):

1438
De acordo com o Plano de Ação525, as Ações 2 (Neutralising the Effects
of Hybrid Mismatch Arrangements), 3 (CFC Rules), 4 (Interest
Deductions) e 5 (Countering Harmful Tax Practices More Effectively
taking into account Transparency and Substance) têm por escopo
coordenar e harmonizar a legislação tributária doméstica das diversas
jurisdições envolvidas no Projeto. Quando desenvolvem suas regras fiscais
domésticas, os Estados soberanos podem não levar suficientemente em
conta o efeito das regras de outros países. A interação de conjuntos
independentes de regras aplicadas por países soberanos pode causar efeitos
indesejáveis, incluindo a dupla tributação da renda de empresas ou grupos
multinacionais que operam em vários países. Tal interação também acaba
por criar lacunas nos casos em que a renda corporativa não é tributada em
lugar algum, seja pelo país de origem (fonte) ou pelo país de residência
(dupla não tributação da renda).

Na arquitetura das legislações tributárias domésticas, a coerência é


geralmente alcançada por meio de um princípio de correspondência: um
pagamento que é fiscalmente dedutível pela fonte geralmente é tributável
nas mãos do destinatário, a não ser que seja explicitamente isento.

1439
Entretanto, não existe um princípio similar de coerência no nível
internacional, o que deixa margem para planejamentos realizados pelos
contribuintes, muito embora os Estados soberanos venham cooperando
para garantir a coerência em um campo estreito, que é evitar a dupla
tributação da renda.

As Ações 6 (Preventing Tax Treaty Abuse), 7 (Avoidance of PE Status),


8 (TP Aspects of Intangibles), 9 (TP/Risk and Capital) e 10 (TP/High Risk
and Transactions) concentram-se na análise da substância econômica de
cadeias produtoras de valor de grupos econômicos e buscam revisar
conceitos de nexo de produção e de alocação de renda:

essa revisão conceitual orienta-se por uma maior ênfase no reconhecimento da


geração de valor e da produção de renda através do desempenho de atividades
humanas, de funções na cadeia produtiva, e por uma menor ênfase no
reconhecimento da geração de valor através da disponibilidade ou estrutura de
capital financeiro intragrupo, da estrutura jurídica de capital intragrupo, e da
526
assunção contratual de riscos intragrupo .

O último pilar é composto pelas Ações 11 (Methodologies and Data


Analysis), 12 (Disclosure Rules), 13 (TP Documentation) e 14 (Dispute
Resolution). As ações implementadas para combater o BEPS não poderiam
ter sucesso sem um incremento da transparência de informações para os
fiscos, bem como da segurança jurídica e da previsibilidade para as
empresas. A disponibilidade de informações oportunas, específicas e
abrangentes é essencial para permitir aos governos identificar rapidamente
áreas de risco. Embora as fiscalizações continuem sendo uma fonte-chave
de obtenção de informações, elas sofrem com uma série de restrições e
com a falta de ferramentas para a detecção precoce de planejamentos
fiscais agressivos. Como resultado, informações oportunas, abrangentes e
relevantes sobre as estratégias de planejamento tributário geralmente não
estão disponíveis para as administrações tributárias. Assim, as Ações

1440
acima mencionadas buscam incentivar a criação de novos mecanismos
para obter essas informações. Ao mesmo tempo, buscam assegurar
mecanismos para fornecer às empresas a certeza e a previsibilidade
necessárias à tomada de decisões de investimento.

Permeando todos os pilares e Ações acima sumarizados está a temática


da economia digital. A propagação da economia digital também traz
desafios para a cooperação internacional, sendo caracterizada por uma
dependência sem paralelo de ativos intangíveis, pelo uso maciço de dados
(principalmente dados pessoais), pela adoção generalizada de modelos
empresariais transnacionais que capturam valor de externalidades geradas
por produtos gratuitos, bem como pela dificuldade de determinar a
jurisdição em que a criação de valor ocorre. Isso enseja a questão
fundamental sobre como as empresas da economia digital geram valor
agregado e auferem seus lucros e como a economia digital se relaciona
com os conceitos de fonte e residência ou a caracterização de lucro para
fins fiscais.

Como se pode notar do panorama acima, a preocupação em relação à


alocação de ativos intangíveis e propriedade intelectual (PI) e dos lucros
decorrentes de sua exploração é central no Projeto BEPS e permeia todas
as Ações e recomendações de modo geral. No entanto, para o propósito do
presente artigo, será dada especial atenção à Ação 5 e, subsidiariamente, às
Ações 8, 9 e 10.

2. O QUE EXATAMENTE O PROJETO BEPS BUSCA COIBIR EM


RELAÇÃO À ALOCAÇÃO DE ATIVOS INTANGÍVEIS?

Como explicam Sarah Churton, Ellis Lambert e Ian Dennis, embora não
exista um modelo de planejamento fiscal que se aplique a todas as
empresas em relação à alocação de PI, pode-se notar uma constante527.

1441
Geralmente, os grupos multinacionais procuram segregar a propriedade
jurídica dos ativos intangíveis da sua fonte original de
financiamento/tomada de decisão, bem como do local em que são
realizadas as atividades de pesquisa e desenvolvimento responsáveis pela
criação desses intangíveis. O quadro esquemático abaixo ilustra essa
situação528:

529

Nesse cenário, o titular jurídico detém exclusivo direito sobre os ativos


intangíveis em territórios situados fora da jurisdição do controlador. Os
lucros decorrentes da exploração desses intangíveis acabam sendo
alocados ao titular jurídico, que geralmente está situado em uma jurisdição
de baixa tributação e/ou que possui algum regime especial para a
tributação de rendimentos decorrentes da exploração da PI.

Embora exista alguma substância no titular jurídico, as decisões


estratégicas relacionadas à exploração dos intangíveis permanecem no
nível do controlador. Um aspecto relevante para que essa estrutura
funcione é que as regras CFC da jurisdição do controlador não podem
inibir entidades de renda passiva ou possuir outros mecanismos que
possibilitem que os lucros alocados para o titular jurídico sejam tributados
na jurisdição do controlador. Geralmente um tratado para evitar a dupla
tributação entre a jurisdição do controlador e a do titular jurídico também

1442
pode ser útil para afastar ou diferir a tributação aplicável na jurisdição do
controlador.

O titular jurídico licencia a utilização dos ativos intangíveis à empresa


operacional, que explora economicamente o ativo e efetua vendas ao
mercado consumidor de sua jurisdição. Geralmente, trata-se de uma
jurisdição com tributação elevada. A estrutura torna-se ainda mais
vantajosa se essa jurisdição possuir um tratado para evitar dupla tributação
com a jurisdição do titular jurídico limitando ou afastando a tributação na
fonte sobre os royalties remetidos. Outra vantagem é o fato de que
geralmente os royalties remetidos ao exterior são considerados despesas
dedutíveis para fins de apuração do imposto de renda corporativo na
jurisdição da empresa operacional.

Com os lucros acumulados em virtude do recebimento de royalties, o


titular jurídico firma contratos de prestação de serviços com outras
controladas do grupo situadas em países que possuem força produtiva
especializada e/ou que tenham regimes fiscais atrativos para empresas que
instalem ali centros de pesquisa e de desenvolvimento.

Em suma, como se pode notar do cenário ilustrado acima, na era pré-


BEPS, os grupos multinacionais buscavam alocar seus ativos intangíveis
(decorrentes de PI) em jurisdições que oferecessem baixas alíquotas de
imposto de renda corporativo ou um regime fiscal atrativo para royalties
ligados a propriedade intelectual, além de dedutibilidade de despesas com
amortização de PI adquirida, e/ou baixa ou nenhuma tributação na fonte
sobre royalties remetidos ao exterior530.

Diversas jurisdições passaram a competir para atrair essas empresas,


oferecendo regimes fiscais atrativos e, em contrapartida, exigindo pouca

1443
ou nenhuma atividade substantiva ligada à propriedade intelectual alocada.
Romero Tavares traz maiores esclarecimentos sobre essa situação
indesejada:

Proliferaram-se regimes “nocivos” de Cash Boxes e Patent Boxes, empresas “de


papel” interpostas em operações internacionais sem atividades econômicas ou
funções relevantes, dentre outros regimes opacos existentes principalmente na
Europa, e multiplicaram-se os países que se prestaram a ser paraísos fiscais para
atrair divisas e gerar empregos apenas para contadores, bancários e advogados. A
resposta do Projeto BEPS é vincular o reconhecimento da “fonte produtora de
renda” ou base tributável à substância econômica das atividades de geração de
valor, das funções desempenhadas e do controle e gerenciamento do risco
empresarial, e não da simples disponibilidade de capital financeiro e mera assunção
531
contratual de riscos entre partes relacionadas .

É nesse contexto que as Ações 5, 8, 9 e 10 do Projeto BEPS foram


editadas.

3. RELATÓRIO BEPS E PROPRIEDADE INTELECTUAL: COERÊNCIA,


“NEXUS APPROACH” E SUBSTÂNCIA

3.1. Ação 5

O trabalho da OCDE sobre práticas fiscais nocivas originalmente foi


documentado no relatório da OCDE de 1998 sobre Harmful Tax
Competition: An Emerging Global Issue. O relatório de 1998 apontou um
conjunto de fatores para determinar se um regime é preferencial e, em caso
afirmativo, se o regime preferencial é realmente nocivo. Como ensina
Jeffrey Owens, os principais critérios seriam os seguintes532:

•ausência de ou baixas alíquotas efetivas sobre rendimentos decorrentes de


exploração de propriedade intelectual. Um regime preferencial prejudicial
geralmente combinará uma baixa alíquota efetiva com outros benefícios;
•“ring-fencing”: alguns regimes são parcial ou inteiramente insulados em
relação ao mercado doméstico da jurisdição que concede o regime. É o caso
das chamadas zonas francas, por exemplo, ou de regimes fiscais aplicáveis
apenas a não residentes. O fato de os próprios países sentirem a necessidade de

1444
separar seus mercados domésticos desses regimes é um indicativo de que
podem ser prejudiciais;
•falta de transparência do funcionamento do regime: é um conceito amplo, mas
geralmente decorre da forma com que o regime é arquitetado ou administrado;
e
•falta de troca de informação sobre quem são os contribuintes que se beneficiam
do regime preferencial.

De acordo com o Relatório BEPS, a Ação 5 visa reforçar o trabalho


sobre práticas fiscais nocivas com prioridade na melhoria da transparência,
incluindo o intercâmbio espontâneo compulsório sobre decisões
relacionadas a regimes preferenciais e no requisito de atividade substancial
para usufruir os benefícios de qualquer regime preferencial.

Várias abordagens foram consideradas para determinar a falta ou não de


atividade substancial. A OCDE alcançou consenso sobre o “nexus
approach”, que utiliza as despesas como evidência para a existência de
atividade substantiva, podendo este princípio ser aplicado a todos os tipos
de regimes preferenciais. Desse modo, tais regimes podem conceder
benefícios a um contribuinte apenas na medida em que o contribuinte
tenha realizado as principais atividades necessárias para produzir o tipo de
renda beneficiada pelo regime preferencial.

O relatório preliminar desenvolveu o “nexus approach” no contexto de


regimes voltados para a renda decorrente da exploração de PI e
estabeleceu que a principal atividade geradora desse tipo de rendimento é a
de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Nessa linha, um contribuinte só
poderá se beneficiar de um regime preferencial de propriedade intelectual
na medida em que o próprio contribuinte tenha incorrido em despesas de
P&D que originaram a renda da PI.

1445
Na sequência da publicação do relatório preliminar da Ação 5, a
Alemanha e o Reino Unido propuseram uma abordagem modificada, que
ficou conhecida como “modified nexus approach”. Essa metodologia foi
aprovada pela OCDE e pelos participantes do Projeto BEPS. O relatório
final inclui detalhes adicionais sobre a aplicação dessa abordagem.

De acordo com o “modified nexus approach”, apenas os rendimentos


resultantes do seguinte cálculo podem ser beneficiados por um regime
preferencial:

Despesas qualificadas incorridas


para desenvolver ativos de PI

Receita
Rendimento
Recebendo
× global do ativo =
benefícios
de PI
fiscais

Despesas gerais incorridas para


desenvolver ativos de PI

Portanto, o “nexus approach” exige uma conexão entre as despesas, os


ativos de PI e o rendimento da PI, e os contribuintes devem demonstrar
essa conexão sempre que possível. No entanto, quando esse rastreamento
não puder ser realisticamente evidenciado, as jurisdições podem optar por
permitir que o rastreamento ocorra no nível do produto.

A Ação 5 também recomenda limitar os tipos de ativos que podem


usufruir os benefícios fiscais sob um regime de PI. Segundo o relatório,
apenas patentes (e outros ativos de PI que sejam funcionalmente
equivalentes a patentes, isto é, desde que estejam legalmente protegidos e
sujeitos a processos similares de aprovação e registro533) poderiam se
beneficiar.

1446
Há várias categorias de despesas que podem ser consideradas despesas
elegíveis (qualifying expenditures) e despesas em geral (overall expenses).
Entre as despesas elegíveis, temos principalmente despesas de P&D
incorridas pelo próprio contribuinte, bem como despesas de outsourcing
(terceirização) para a contratação de partes não relacionadas para a
prestação de serviços de P&D. Entre as despesas em geral, que não são
elegíveis, citam-se o custo de aquisição de intangíveis não desenvolvidos
internamente e as despesas com contratação de partes relacionadas.

Por fim, na área da transparência, foi acordado um quadro abrangendo


todos os rulings que pudessem originar preocupações de BEPS na ausência
de troca espontânea compulsória de informações. Esses rulings deverão
passar a ser compartilhados espontaneamente entre as administrações
tributárias das jurisdições envolvidas no Projeto. Rulings são definidos de
forma abrangente como qualquer orientação, informação ou compromisso
que uma autoridade fiscal atribui ou assume com uma empresa ou grupo
empresarial específico.

O quadro abrange seis categorias de decisões (rulings) que devem ser


intercambiadas entre as administrações tributárias, relativas a: (i) regimes
preferenciais; (ii) acordos unilaterais de preços antecipados em operações
envolvendo empresas de dois países diferentes (advanced pricing
arrangements – APAs) ou outras decisões unilaterais relativas a preços de
transferência; (iii) possibilidade, concedida unilateralmente, de efetuar
ajustes de redução de lucros tributáveis; (iv) estabelecimento permanente
(permanent establishment – PE); (v) decisões envolvendo conduit
companies (trata-se principalmente de empresas que são consideradas
como “transparentes” para fins de tributação sobre a renda, ou seja, elas
recebem rendimentos e os repassam para uma outra empresa); e (vi)

1447
qualquer outro tipo de decisão em que o Forum on Harmful Tax Practices
– FHTP concorda que a ausência de troca poderia originar preocupações
com BEPS. Isso não significa que as decisões sobre esses temas sejam a
priori prejudiciais ou que elas próprias deem origem a BEPS, mas
reconhece-se que a falta de transparência no funcionamento desses
regimes pode dar origem a desajustes no tratamento tributário da renda,
notadamente uma possível dupla não tributação.

3.2. Ações 8, 9 e 10

Como explicam Clarissa Machado e Thiago Del Bel534, as Ações 8, 9 e


10 do Plano de Ação visam alinhar os efeitos da aplicação das regras de
preços de transferência com as atividades que, efetivamente, criaram valor,
no que diz respeito a intangíveis, a riscos e capital e a outras transações de
alto risco. Referida ferramenta fundamenta-se no valor criado pelas partes
envolvidas nas transações sujeitas a controle de preços de transferência,
buscando mitigar possíveis vulnerabilidades e manipulações com relação
às regras de preços de transferência até então vigentes no modelo OCDE.

Em apertada síntese, a Ação 8 recomenda a criação de regras que


evitem a erosão de base tributável e a transferência de lucros por meio da
alocação de intangíveis entre entidades integrantes do grupo multinacional.
A Ação 9 destaca a necessidade de criação de regras que previnam a
transferência de riscos e a alocação excessiva de capital entre as entidades
integrantes, com o objetivo de erosão de base tributável e de transferência
de lucros. A Ação 10 também recomenda a criação de regras para
combater a erosão de base tributável e a transferência de lucros, realizadas
por meio de transações que muito dificilmente existiriam em um contexto
de mercado, isto é, em uma relação entre partes independentes.

1448
Em suma, as Ações fazem alusão ao combate de estruturas que
distorcem a aferição dos riscos ou que transferem, artificialmente, a
titularidade de intangíveis para manipular o “arm’s length principle” e,
consequentemente, a distribuição dos lucros entre as diferentes partes e
jurisdições envolvidas na transação sujeita a controle de preços de
transferência. Ao buscar uma aferição mais precisa dos riscos, atribuindo-
os à parte que possua efetiva capacidade de suportá-los, a iniciativa do
BEPS demonstra, mais uma vez, a busca pela primazia da essência sobre a
forma para fins tributários, já há algum tempo incluída nos objetivos da
OCDE.

4. IMPACTOS DAS RECOMENDAÇÕES DO PROJETO BEPS PARA


ESTRUTURAS QUE SEGREGAM ATIVIDADE ECONÔMICA
SUBSTANTIVA, TOMADA DE DECISÃO E PROPRIEDADE
INTELECTUAL

Como regra geral, nos casos em que as atividades realizadas pelas


empresas de um grupo econômico não respaldarem os arranjos contratuais
entre elas, deverá prevalecer a atividade real, e os lucros decorrentes dos
arranjos contratuais serão alocados para a entidade que realizou as
contribuições-chave para a geração desses lucros.

De acordo com Churton, Lambert e Dennis535, para determinar o preço


“arm’s length”, a análise funcional é utilizada para entender as atividades
econômicas significativas e as responsabilidades assumidas, os ativos
empregados ou contribuídos, bem como os riscos assumidos pelas partes
na transação. Em relação a intangíveis, especial atenção deve ser dada à
tomada de decisão e às funções de controle associadas ao
desenvolvimento, incremento, manutenção, proteção e exploração dos
intangíveis que geram valor para o negócio.

1449
Nesse sentido, as empresas que possuem apenas a titularidade jurídica
de ativos, ou para as quais são alocados os riscos apenas contratualmente,
serão consideradas como não sujeitas a riscos sob o princípio do “arm’s
length”. Assim, os lucros decorrentes das transações que envolvem a
exploração da PI devem ser alocados para as entidades que realizam
atividades econômicas significativas.

Outro foco do Projeto BEPS diz respeito aos “hard to value


intangibles”, ou seja, ativos intangíveis de difícil valoração. É o caso, por
exemplo, de ativos apenas parcialmente desenvolvidos, ou cujas projeções
financeiras ainda são consideravelmente incertas.

Especificamente em relação a esses ativos, o Projeto pretende


possibilitar que as administrações fiscais utilizem “evidências pós-fato”,
como resultados financeiros de anos posteriores para avaliar a
adequadação de arranjos de preço intragrupo de anos anteriores. Embora o
uso dessas evidências esteja restrito a certas situações, provavelmente esse
elemento adicionará incerteza aos controles de preços de transferência.

Portanto é evidente que, com a implementação das recomendações


propostas nas Ações relativas a preços de transferência, estarão em xeque
políticas e controles de preços de transferência sobre estruturas nas quais
sejam atribuídos lucros significativos a um detentor de PI que realize
pouca ou nenhuma função relevante.

Relativamente às recomendações da Ação 5, deve-se notar que as


despesas com a contratação de partes relacionadas para prestação de
serviços de P&D não se qualificarão para o cálculo dos rendimentos que
poderão usufruir de regimes preferenciais. Pelo contrário, elas reduzirão o

1450
montante de despesas elegíveis. Assim, esse tipo de outsourcing ficará
prejudicado.

Da mesma sorte, os custos em que uma empresa incorre para adquirir


um ativo intangível de outra empresa (inclusive royalties e similares) não
serão considerados despesas elegíveis. Assim, operações de aquisição de
ativos intangíveis que já tenham sido significativamente desenvolvidos
anteriormente à transação restarão desestimuladas.

Também é muito comum que grupos multinacionais estabeleçam


contratos de compartilhamento de custos (cost sharing) para que diversas
empresas do grupo contribuam economicamente para o desenvolvimento
de um ativo intangível. Nos casos em que as empresas que efetuam
contribuições não desenvolvam atividades de P&D, também haverá
restrição no montante de despesas elegíveis.

Portanto, como se depreende do exposto acima, os contribuintes que


desejarem se beneficiar de um regime preferencial de PI terão de
evidenciar que as despesas incorridas estão relacionadas aos rendimentos
decorrentes da exploração de propriedade intelectual.

Em suma, uma vez implementadas as recomendações das Ações 5, 8, 9


e 10 pelos países participantes do Projeto BEPS, os grupos multinacionais
serão fortemente compelidos a alocar ativos intangíveis às empresas que
efetivamente realizam as contribuições-chave para o desenvolvimento
desses ativos. Ou seja, haverá uma tendência de as empresas que
efetivamente realizam atividades de P&D permanecerem com a
propriedade dos ativos por elas desenvolvidos.

5. CONSEQUÊNCIAS PARA O BRASIL

1451
O que as recomendações do Projeto BEPS em relação a ativos
intangíveis significam para o Brasil, multinacionais brasileiras e
multinacionais estrangeiras com atividades no Brasil?

Do ponto de vista da legislação doméstica brasileira, até o momento


pouco mudou. Por enquanto, talvez a única novidade na legislação pátria
relacionada diretamente às Ações que tratam de ativos intangíveis seja a
Instrução Normativa (IN) RFB n. 1.689, de 20 de fevereiro de 2017. Tal
IN acrescentou o artigo 3º-A ao texto da IN RFB n. 1.396, de 16 de
setembro de 2013, que dispõe sobre processos de solução de consulta.

Em linha com as recomendações da Ação 5 relativas à transparência de


informações, a Receita Federal do Brasil (RFB) publicou esta IN tratando
do intercâmbio de rulings. Como dito acima, rulings podem ser definidos
como orientações dadas pelas autoridades fiscais a um contribuinte
específico. No Brasil, enquadram-se nesse conceito as soluções de
consulta, de divergência e os atos declaratórios interpretativos.

Basicamente, o artigo 3º-A exige informações adicionais dos


contribuintes que apresentarem consultas a respeito de: (i) preços de
transferência; (ii) o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico
da Indústria de Semicondutores (Padis); ou (iii) estabelecimento
permanente. Nessas hipóteses, a consulta deverá apresentar: (i)
identificação do controlador direto e do controlador final da pessoa
jurídica que formulou a consulta, bem como seus países de domicílio, na
hipótese de serem no exterior; (ii) identificação dos países de residência de
todas as partes relacionadas com as quais o contribuinte efetua transações
objeto da consulta; e (iii) identificação do país de residência da matriz e do
estabelecimento permanente, na hipótese de a consulta versar sobre essa
temática.

1452
O sumário das respostas a essas consultas será encaminhado às
administrações tributárias dos países de domicílio das pessoas acima
referidas.

A par da implementação de mecanismos de transparência e troca de


informações, parece-nos que as recomendações do BEPS relativas a ativos
intangíveis trarão implicações pouco severas para o Brasil.

Isso porque o Brasil tem uma longa tradição em traçar seus próprios
caminhos no que diz respeito a parâmetros de tributação internacional.

Do ponto de vista de jurisdição que remete pagamento de royalties ao


exterior (isto é, da empresa operacional no esquema ilustrativo apresentado
no item 2 acima), o Brasil nunca foi uma jurisdição que proporcionasse
grandes oportunidades para a erosão da base de cálculo e para a
transferência de lucros para o exterior.

Como regra geral, o Brasil sempre se preocupou em exigir o


recolhimento de pesados tributos na fonte sobre pagamentos ao exterior,
como o imposto de renda retido na fonte (IRRF), a CIDE, o IOF-Câmbio,
e, por vezes, o PIS/COFINS-importação e imposto sobre serviços (ISS).
Na prática, qualquer benefício decorrente da potencial dedutibilidade das
despesas de royalties tende a ser sensivelmente mitigado ou até
neutralizado em razão dos tributos com os quais a empresa operacional
brasileira tem que arcar ao remeter royalties para o exterior.

Ademais, a dedutibilidade de despesas, no Brasil, com royalties pagos


por utilização de patentes ou tecnologia em geral está limitada a margens
fixas de 1% a 5% sobre as vendas líquidas no País. Nesse sentido, os

1453
royalties, como regra geral, não estão sujeitos às regras de preços de
transferência.

Ainda que o pagamento por certos intangíveis possa não se enquadrar


nas regras de dedutibilidade específicas para royalties, nossa legislação de
preços de transferência também deixa pouca margem para planejamentos
tributários envolvendo ativos intangíveis. Diferentemente dos países que
seguem os padrões da OCDE, em que os preços de transferência estão
baseados em ativos, riscos e funções, as regras brasileiras sempre foram
pautadas notadamente por margens fixas. Essas margens são aplicadas
para calcular o teto de despesas dedutíveis em caso de pagamentos ao
exterior (importação) bem como o mínimo de receitas tributáveis em caso
de exportações. Assim, arranjos contratuais que atribuam juridicamente
riscos ou funções entre empresas de um mesmo grupo econômico são,
como regra geral, pouco relevantes para a aplicação da nossa legislação de
preços de transferência.

Além disso, embora o Brasil já possua uma rede de aproximadamente


trinta tratados para evitar a dupla tributação, são poucos aqueles que têm o
condão de reduzir ou limitar a alíquota de IRRF aplicável sobre royalties
remetidos ao exterior. Ou seja, o titular jurídico do intangível sofre
também uma pesada tributação na fonte no Brasil.

Sob a perspectiva de multinacionais brasileiras que exportam tecnologia


ao exterior, as regras brasileiras também dão pouca margem para
planejamentos com a alocação de PI em jurisdições de baixa tributação ou
que ofereçam regimes preferenciais. Nossas regras de tributação de lucros
no exterior são, historicamente, bastante restritivas. Há anos discute-se a
possibilidade de os lucros auferidos por controladas e coligadas no exterior
serem tributados automaticamente no Brasil ao final de cada ano ou se os

1454
tratados teriam o condão de diferir a tributação até o momento da
distribuição desses lucros para a controladora brasileira536. Nesse contexto,
alocar PI em jurisdições que ofereçam regimes preferenciais para diferir a
tributação no Brasil é, no mínimo, assunto que tem grandes chances de ser
objeto de contencioso fiscal.

Ademais, mais recentemente, com o advento da Lei n. 12.973, de 13 de


maio de 2014, esse tipo de planejamento restou ainda mais desestimulado.
Isso porque a nova legislação adotou o conceito de renda passiva e de
regime de subtributação para afastar o direito do contribuinte ao
diferimento do pagamento dos tributos (uma espécie de parcelamento, na
verdade) e/ou à consolidação de resultados. E entre as espécies de renda
passiva estão, exatamente, os royalties.

Sob a perspectiva da jurisdição que recebe ativos intangíveis a título de


integralização de capital com o objetivo de explorar economicamente o
ativo e aproveitar a sua amortização fiscal, o Brasil também impõe
empecilhos. A RFB tem adotado o entendimento de que incidem o IRRF e
a CIDE sobre o valor de quotas emitidas por empresa brasileira em virtude
de recebimento de ativo intangível como integralização de capital537.

Por fim, um dos aspectos que talvez possa ser afetado de forma mais
direta no Brasil diz respeito à aplicação de certos incentivos fiscais hoje
disponíveis. É o caso dos benefícios previstos na chamada “Lei do Bem”
(Lei n. 11.196, de 21 de novembro de 2005).

Em princípio, não há um enquadramento perfeito da Lei do Bem no


conceito de regime preferencial definido pela OCDE. Isso porque, embora
a Lei do Bem reduza a alíquota efetiva de Imposto de Renda da Pessoa
Jurídica e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (IRPJ e CSLL), a

1455
alíquota é reduzida de forma abrangente, e não apenas para os rendimentos
decorrentes de exploração de PI. Na verdade, a referida Lei busca
incentivar investimentos em pesquisa e desenvolvimento e, com isso,
permite a tomada de dedutibilidade de certas despesas ligadas a P&D de
forma multiplicada ou acelerada ou, ainda, reduz a zero a alíquota do IRRF
incidente sobre remessas ao exterior para registro ou manutenção de
marcas e patentes538.

Ainda que se conclua que a Lei do Bem estabelece um regime


preferencial, o que nos parece discutível, a legislação visa incentivar
gastos que em sua maioria provavelmente seriam considerados despesas
elegíveis sob o “modified nexus approach”. É o caso de dispêndios de
P&D contratados no País com universidade, instituição de pesquisa ou
inventor independente, desde que a pessoa jurídica que efetuou o
dispêndio fique com a responsabilidade, o risco empresarial, a gestão e o
controle da utilização dos resultados dos dispêndios. Também é o caso de
importâncias transferidas a microempresas e empresas de pequeno porte
destinadas à execução de pesquisa tecnológica e de desenvolvimento de
inovação tecnológica de interesse e por conta e ordem da pessoa jurídica
que promoveu a transferência, ainda que a pessoa jurídica recebedora
dessas importâncias venha a ter participação no resultado econômico do
produto resultante.

Para o gozo dos benefícios fiscais, além da regularidade fiscal da pessoa


jurídica, os dispêndios e os pagamentos devem ser controlados
contabilmente em contas específicas, e somente serão dedutíveis se pagos
a pessoas físicas ou jurídicas residentes e domiciliadas no País, ressalvados
os royalties pagos a pessoa não residente, desde que observados os limites

1456
específicos de dedutibilidade aplicáveis a royalties, tal como comentado
acima.

Para se harmonizar com as recomendações do Projeto BEPS, talvez


uma restrição adicional na legislação faça sentido: só se qualificarão para
os benefícios da Lei do Bem despesas não relacionadas a pagamentos
efetuados a empresas do mesmo grupo econômico.

Diante disso, embora os obstáculos descritos acima não nos pareçam ter
sido coordenados pelo legislador e pelas autoridades fiscais brasileiras
para coibir intencionalmente planejamentos tributários envolvendo ativos
intangíveis, as recomendações do Projeto BEPS sobre essa temática
parecem ter pouca efetividade e aderência ao atual sistema tributário
brasileiro, a não ser que uma profunda reforma tributária seja
implementada para trazê-lo mais próximo ao marco jurídico observado nos
países membros da OCDE.

6. CONCLUSÕES

A Ação 5 do Projeto BEPS visa reforçar o trabalho sobre práticas


fiscais nocivas com prioridade na melhoria da transparência, incluindo o
intercâmbio espontâneo compulsório sobre decisões relacionadas a
regimes preferenciais e no requisito de atividade substancial para usufruir
os benefícios de qualquer regime preferencial.

A OCDE adotou o “nexus approach” como critério para determinar os


rendimentos que podem usufruir regimes preferenciais. Essa abordagem
exige uma conexão entre as despesas, os ativos de PI e o rendimento da PI.
Em suma, apenas rendimentos produzidos por empresas que incorram em
despesas de P&D realizados internamente ou por partes não relacionadas
serão elegíveis para se beneficiar de regimes preferenciais.

1457
A Ação 5 também recomenda o compartilhamento de informações
sobre decisões (rulings) relacionadas a temáticas que podem gerar
competição prejudicial entre jurisdições no que diz respeito a tratamentos
fiscais preferenciais.

As Ações 8, 9 e 10 fazem alusão ao combate de estruturas que


distorcem a aferição dos riscos ou que transferem, artificialmente, a
titularidade de intangíveis para manipular o “arm’s length principle” e,
consequentemente, a distribuição dos lucros entre as diferentes partes e
jurisdições envolvidas na transação sujeita a controle de preços de
transferência. Ao buscar uma aferição mais precisa dos riscos, atribuindo-
os à parte que possua efetiva capacidade de suportá-los, a iniciativa do
BEPS demonstra, mais uma vez, a busca pela primazia da essência sobre a
forma para fins tributários.

No cenário internacional, a implementação das recomendações do


Projeto BEPS compelirá grupos multinacionais a alocarem ativos
intangíveis às empresas que efetivamente realizam as contribuições-chave
para o desenvolvimento desses ativos. Ou seja, haverá uma tendência de as
empresas que efetivamente realizam atividades de P&D permanecerem
com a propriedade dos ativos por elas desenvolvidos.

No Brasil, as recomendações da Ação 5 relativas ao compartilhamento


de informações já foram implementadas por meio da IN n. 1.689, de 20 de
fevereiro de 2017. No entanto, com respeito às demais recomendações,
parece-nos que terão pouca efetividade e aderência ao atual sistema
tributário brasileiro.

O Brasil tem uma longa tradição em traçar seus próprios caminhos no


que diz respeito a parâmetros de tributação internacional. O País nunca foi

1458
uma jurisdição atrativa para efetuar pagamentos de royalties ao exterior do
ponto de vista tributário, tendo em vista a pesada carga tributária imposta
na fonte para a parte estrangeira, os tributos adicionais devidos pela pessoa
jurídica brasileira e as regras bastante restritivas de dedutibilidade de
royalties.

Do ponto de vista de preços de transferência, nossa legislação sempre


esteve pautada por margens fixas, deixando pouco espaço para
planejamentos baseados na alocação contratual de riscos e de funções.

Em relação a multinacionais brasileiras, nossa legislação de tributação


de lucros auferidos no exterior é uma das mais restritivas do mundo. Hoje,
como regra, exige-se a tributação automática anual de lucros auferidos no
exterior e impõem-se restrições em caso de empresas que aufiram
eminentemente rendas passivas. Assim, resta pouca margem para
planejamentos que pretendam alocar intangíveis em jurisdições que
concedam regimes preferenciais no exterior.

Por fim, talvez um dos elementos da legislação pátria que possa ser
afetado pelas recomendações do Projeto BEPS consiste nos incentivos
fiscais da Lei do Bem. Embora a qualificação dos incentivos como regime
preferencial possa ser controversa, a legislação dá margem para que
pagamentos a partes relacionadas sejam considerados no cálculo dos
incentivos fiscais ligados a inovação tecnológica. Com base nas
recomendações do Plano de Ação, é possível que o legislador brasileiro
considere impor uma restrição ao cômputo das despesas com partes
relacionadas entre os gastos passíveis de usufruírem os incentivos fiscais
dessa legislação.

1459
Parte III
DIREITO COMPARADO: A TRIBUTAÇÃO
DA ECONOMIA DIGITAL SOB A
PERSPECTIVA DE OUTROS PAÍSES

1460
Evolução da Tributação da Economia Digital
na Alemanha
539
Gerd Willi Rothmann

INTRODUÇÃO

No Direito Tributário alemão, já foram disciplinados vários aspectos da


economia digital, especialmente no que se refere à tributação dos
rendimentos auferidos, sujeitos ao imposto de renda da pessoa física
(Einkommensteuer – ESt) e do imposto de renda da pessoa jurídica
(Körperschaftsteuer – KSt) e à incidência do imposto sobre vendas
(Umsatzsteuer – USt). Com base na legislação doméstica, nos acordos
internacionais, na jurisprudência e na doutrina, estão sendo resolvidos
muitos dos problemas concretos, levantados por este setor em constante
evolução tecnológica, eliminadas dúvidas e preenchidas lacunas.

O presente trabalho visa fornecer alguns exemplos da evolução da


legislação tributária sobre o comércio digital (e-commerce) na Alemanha,
depois de apresentar as peculiaridades do sistema tributário alemão mais
relevantes para a melhor compreensão da matéria540. Pela sua importância
jurídica e estratégica, será exposto, detalhadamente, o Ofício de 27 de
outubro de 2017, emitido pela Repartição Federal Central de Tributação
(Bundeszentralamt für Steuer – BZSt), do Ministério Federal das Finanças
(Bundesministerium der Finanzen – BMF) da Alemanha.

1. A ECONOMIA DIGITAL, O E-COMMERCE E SEUS DESAFIOS


TRIBUTÁRIOS

O desenvolvimento das relações econômicas domésticas e


internacionais está cada vez mais influenciado pelos avanços da tecnologia

1461
digital, a ponto de já ter sido sugerido substituir o conceito de “economia
digital” por “digitalização da economia”.

A tratar da visão global (holistic approach) da tributação da economia


digital como objeto da Ação 1 do Projeto BEPS, que abrange tanto os
tributos diretos como os indiretos, Fehling constata que não há uma
“economia digital” distinta de outros setores da economia, visto que a
tecnologia da informação e comunicação já alcança toda a economia e
influencia quase todos os atuais modelos negociais541. Assim, seria
terminologicamente mais adequado não falar em “economia digital”, mas
em “digitalização da economia”, para refletir a onipresença da tecnologia
digital na economia globalizada.

Também o Comunicado da Comissão Europeia, de 21 de setembro de


2017, relativo a um sistema tributário fair e eficiente para o mercado
digital na União Europeia (UE), destaca a crescente “digitalização da
economia” no mundo globalizado, que afeta todos os negócios, ainda que
em diversos graus. Isto exige a reforma do sistema tributário internacional,
que não mais atende às suas finalidades542.

Para tanto, o Comunicado da Comissão Europeia cita uma série de


objetivos a serem observados na elaboração do sistema tributário da
economia digitalizada. Entre eles, destaca-se o aumento de
competitividade, que exige remover obstáculos existentes e evitar a criação
de novas barreiras tributárias ao surgimento de novos negócios, que
aumentem a inovação e criação de empregos543. É exatamente a mesma
preocupação da Alemanha, que depende, em grande parte, da exportação
de seus produtos.

1462
Enquanto não houver um sistema tributário internacional geral da
tributação da economia digital, referido comunicado da Comissão
Europeia propõe, entre as alternativas de solução a curto prazo, a
tributação na fonte das transações digitais. Esta tributação na fonte
alcançaria determinados pagamentos feitos a provedores (providers) não
residentes de bens e serviços encomendados online, calculada numa base
bruta, exclusiva (standalone) e definitiva544. É exatamente esta a
modalidade de tributação vigente no sistema tributário alemão para as
hipóteses de obrigação tributária limitada (beschränkte Steuerpflicht).

A impossibilidade de delimitar e definir a economia digital como ramo


separado da economia, também é referida por Pinkernell, na sua análise da
Minuta da OCDE, relativa aos desafios tributários à “economia digital”, de
24 de março de 2014545. A rede da internet pode conectar praticamente
todos os aparelhos técnicos, máquinas e robôs, de tal maneira que não há
base para a implantação de um único regime especial de tributação, como,
por exemplo, aquele previsto no art. 8º do Acordo Modelo de Bitributação
da OCDE (AM-OCDE) para rendimentos relativos à navegação aérea e
marítima546.

Também não há nenhuma definição unitária de e-commerce. Baseado


na definição elaborada pelo Departamento do Tesouro dos Estados Unidos
e vários autores, Utescher propõe a seguinte definição:

Electronic commerce é a execução de atividades de compra e venda de bens


corpóreos e de serviços com a utilização da Internet para apoio de todas ou algumas
547
fases e funções da coordenação de prestações organizadas para o mercado .

Conforme a autora, sua característica mais destacada consiste em


permitir aos “players” do mercado a participação em mercados,
independentemente da sua sede ou localização. Uma definição mais

1463
detalhada é referida por Spatschek, com fundamentos da definição do
relatório do Senado norte-americano n. 105.276, de 30 de julho de 1998:

Electronic commerce consiste em cada transação executada mediante a internet,


inclusive do acesso a internet, e que abrange a venda, leasing, financiamento, oferta
e fornecimento de propriedades, mercadorias, serviços ou informações, sem que, em
548
virtude da simples oferta, seja paga uma contraprestação .

Enquanto não existir um conceito unitário de economia digital, devem


ser apurados e regulados suas principais características, para efeitos
tributários, tanto no ordenamento jurídico doméstico como internacional,
para garantir a necessária segurança jurídica aos contribuintes.

2. PECULIARIDADES DOS PRINCIPAIS IMPOSTOS ALEMÃES


ENVOLVIDOS NO COMÉRCIO DIGITAL

Para melhor compreensão do presente estudo, cabe destacar algumas


peculiaridades dos seguintes impostos envolvidos no comércio digital.

2.1. Imposto sobre vendas (Umsatzsteuer, doravante designado USt)

Trata-se de um imposto geral sobre o consumo de bens e de serviços,


atribuído, em parte iguais, à União e aos Estados Federados e arrecadado
pelos Estados.

Sua estrutura é harmonizada pela legislação comunitária da União


Europeia, que, no entanto, não atinge as alíquotas, que variam muito entre
seus membros. Na Alemanha, há, basicamente, duas alíquotas: a normal,
de 19% e a reduzida, de 7%.

Objeto tributável é a circulação das mercadorias e dos serviços nas suas


diversas fases, até o consumidor final. Como imposto plurifásico, adota o
sistema do valor acrescido com crédito do imposto incidente na fase
anterior (Mehrwertsteuer – IVA).

1464
Sua cobrança segue o princípio do país de destino.

2.2. Imposto de Renda da Pessoa Física (Einkommensteuer, doravante


designado ESt) e o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica
(Körperschaftsteuer, doravante designado KSt)

O sistema tributário alemão distingue as empresas pela sua forma


jurídica, nos termos do Direito Privado. Todas as pessoas jurídicas de
Direito Privado são sujeitos passivos do Imposto Sobre Entidades
Jurídicas (Körperschaftsteuer), ou seja, “Imposto de Renda da Pessoa
Jurídica”. Pelo catálogo dos sujeitos passivos do Imposto Sobre Entidades
Jurídicas, contido no § 1º, inciso I da Lei do Imposto das Entidades
Jurídicas (Körperschaftsteuergesetz, doravante referida como KStG), trata-
se, especialmente, de sociedades de capital, como a Sociedade Europeia
(SE), a Sociedade por Ações (AG), a Sociedade Comandita por Ações
(KGaA) e a Sociedade com Responsabilidade Ltda. (GmbH).

Por outro lado, sociedades como, por exemplo, a Sociedade em


Comandita (Kommanditgesellschaft – KG) são consideradas, pelo Direito
Civil, como sociedades de pessoas, cujos rendimentos são atribuídos
diretamente aos respectivos sócios, e, em princípio, sujeitos aos Imposto
de Renda da Pessoa Física (Einkommensteuer, doravante referida como
ESt). Nesta forma societária, não ocorre, pois, a indesejável dupla
tributação econômica, da pessoa jurídica e dos respectivos sócios, a que
estão sujeitas as chamadas sociedades de capital.

No entanto, a forma societária da KG, que pode ser vantajosa sob o


aspecto da carga fiscal, apresenta um grave inconveniente: como no
Direito Civil brasileiro, os sócios comanditados, pessoas físicas, são
responsáveis, solidária e ilimitadamente, pelas obrigações sociais,
inclusive as tributárias. Para eliminar este inconveniente sem prejudicar a

1465
eliminação da dupla oneração econômica do lucro, foram criadas as
formas societárias mistas (Mischformen), como, por exemplo, a GmbH &
Co. KG, sociedade em comandita, cujo sócio comanditado não é uma
pessoa física, mas uma sociedade de responsabilidade limitada (GmbH).

Devido ao duplo benefício (redução de carga fiscal e limitação da


responsabilidade), a maioria das empresas alemãs adota uma das formas
societárias mistas. É de se observar, porém, que, desde a criação de formas
mistas, a tributação das pessoas jurídicas pela KSt foi reduzida,
drasticamente, de uma alíquota de 56% para 15% e introduzidas isenções
substanciais.

Outra peculiaridade do sistema tributário alemão consiste na distinção


da competência tributária, conforme se tratar de uma empresa sediada na
Alemanha, com atividades fora da Alemanha, ou de uma empresa com
sede no exterior, com atividade na Alemanha. Na primeira hipótese, o § 1º,
inciso 1º da Lei do Imposto de Renda (EStG) e o § 1º, inciso 1º da Lei do
Imposto das Entidades Jurídicas (KStG), estabelecem a obrigação
tributária ilimitada (unbeschränkte Steuerpflicht), que se baseia em
características pessoais do contribuinte (domicílio ou residência) e alcança
todos os rendimentos tributáveis (princípio da renda mundial).

Por sua vez, as empresas estrangeiras residentes no exterior com


atividades na Alemanha estão sujeitas a uma obrigação tributária limitada
(beschränkte Steuerpflicht) na Alemanha, quando lá obtiverem os
rendimentos constantes do catálogo do § 49 EStG, ou seja, rendimentos
provenientes de fontes situadas na Alemanha (princípio da fonte ou
territorial).

1466
Esse dualismo de princípio da residência e da fonte pode levar a uma
indesejável bitributação dos rendimentos, a ser eliminada ou mitigada
pelas normas do Direito doméstico alemão ou pelos acordos de
bitributação, concluídos pela Alemanha com outros Estados.
Consequentemente, a tributação da economia digital no sistema tributário
alemão deverá ser examinada tanto com base na sua legislação doméstica
como nos acordos de bitributação. Como, lamentavelmente, o acordo de
bitributação entre o Brasil e a Alemanha, de 1975, foi denunciado pela
Alemanha em 2005, a tributação das relações econômicas entre os dois
países está sujeita somente às respectivas leis domésticas549.

Em virtude dessa diferença na extensão da competência tributária, o


direito tributário alemão distingue dois casos básicos de tributação das
transações via internet: o caso outbound e o caso inbound.

No caso outbound, quando o residente na Alemanha fornece bens ou


serviços a destinatários no exterior, os rendimentos daí resultantes são
tributados, integralmente, conforme o princípio da renda mundial,
independentemente da sua fonte. Impostos, eventualmente pagos no
exterior, são creditados com base na lei doméstica alemã (§ 34 do EStG).

Diferentemente, no caso inbound, em que o fornecedor é residente no


exterior e o destinatário, na Alemanha, somente os rendimentos auferidos
na Alemanha estão sujeitos à obrigação tributária limitada (§ 49, inciso 1º
EStG).

Na hipótese de transações via internet com Estados com os quais a


Alemanha celebrou acordo de bitributação, sua tributação rege-se pelo
respectivo acordo. Via de regra, nesses acordos, que se utilizam do Acordo

1467
Modelo da OCDE, o Estado ao qual não cabe a competência tributária
isenta esses rendimentos.

3. IMPOSTO SOBRE VENDAS (UMSATZSTEUER – UST), O IMPOSTO DE


RENDA (EST) E O IMPOSTO SOBRE ENTIDADES (KST) NO E-
COMMERCE

3.1. Vendas offline e vendas online

As empresas oferecem mercadorias e serviços na internet, sujeitos à


incidência do imposto sobre vendas (Umsatzsteuer – USt). No e-
commerce, as transações recebem tratamento tributário distinto, conforme
se trate de vendas offline ou de vendas online.

Nas vendas offline, o interessado comprador visita a homepage do


ofertante e poderá efetuar seu pedido diretamente online ou por outros
meios (telefone). O fornecimento é efetuado pela remessa do bem. Os
negócios offline são tributados conforme as regras clássicas do comércio à
distância (Versandhandel), previstos na legislação doméstica alemã e no
Direito comunitário da União Europeia550.

As vendas online, em que não há fornecimento de bens corpóreos,


constituem serviços, tais como definidos pela UStG. Portanto, aplica-se o
princípio do país do destino, onde se localiza o consumidor. Assim, por
exemplo, o serviço de assessoria jurídica, prestado via internet por um
advogado residente na União Europeia, a um empresário alemão, é
tributável na Alemanha (§ 3º, inciso 3º UStG c/c o § 3º, inciso 4º, da
UStG)551.

3.2. A tributação de pagamentos pela utilização de software e de bancos de


552
dados, conforme § 13b da UStG e do § 50 da EStG

1468
Diferentemente da regra geral da UStG, pela qual o imposto sobre
vendas é devido pelo fornecedor de bens ou prestador dos serviços (§ 13
UStG), a remuneração pela utilização de bancos de dados, localizados no
exterior, deve ser paga pelo destinatário da prestação, ou seja, na
Alemanha (§ 13b UStG). Essa transferência da obrigação tributária ao
destinatário é conhecida como “reverse-charge”553.

Assim, o sujeito passivo da obrigação tributária é distinto daquele


previsto para efeitos do imposta de renda. Pelo § 50 a, inciso 1 Nr.3 da
EStG, a remuneração pela disponibilização do uso ou direito à utilização
de direito, em especial de direitos autorais e de know-how, pagos a pessoas
residentes no exterior, estão sujeitos à retenção do imposto de renda na
Alemanha, com base na obrigação tributária limitada. Portanto, para
efeitos do USt, contribuinte do imposto é o destinatário residente na
Alemanha, ao passo que o imposto sobre o rendimento do fornecimento
deverá ser suportado pelo prestador residente no exterior. No USt, o
destinatário é contribuinte do imposto, enquanto para o ESt, o destinatário
é mero responsável pela retenção na fonte do imposto devido pelo
fornecedor residente no exterior, que é o seu contribuinte.

Uma sinopse das respectivas regras da UStG e EStG consta da seguinte


tabela comparativa, apresentada por Holthaus554:

Sinopse § 13b UStG / § 50a EStG

§ 13b UStG § 50a EStG

Destinatário da Prestador do serviço com residência ou estabelecimento


remuneração permanente no exterior

Responsável pela
Destinatário do serviço com residência ou estabelecimento
retenção/recolhimento
permanente na Alemanha
do imposto

1469
Destinatário do serviço Destinatário do serviço é mero
Sujeito passivo
é contribuinte responsável

Finalidade de A intenção de obtenção de lucro é


A intenção de obtenção
obtenção de necessária, mas pode ser dispensada
de receita é suficiente (§
receita/lucro por parte se o prestador do serviço for uma
2º, inciso 2º, 3ª frase
do prestador do instituição de Direito público ou de
UStG). (...)
serviço finalidade não lucrativa

Elemento material do Disponibilização de direitos por prestadores residentes no


fato gerador exterior mediante remuneração

Sujeita ao imposto (se


de forma digital é
Não tributada, porque a legislação
Disponibilização de tratada como
alemã não permite a transferência de
software standard fornecimento, sujeito às
direito autoral para utilização
regras sobre
aquisição/importação)

§ 13b UStG § 50a EStG

Em princípio, não há
isenções, mas a
obrigação de pagamento Possível não incidência, conforme
pode desaparecer na acordo de bitributação, desde que
Isenções / não
hipótese da plena seja apresentado, previamente, o
incidências
dedutibilidade dos respectivo comprovante à repartição
créditos do imposto, federal competente (BZSt)
existentes no devedor
da remuneração

A dedução do imposto
Efeitos recíprocos § de renda nos termos do O débito do USt, conforme § 13b
13b UStG / § 50 a § 50 EStG não reduz a UStG, não reduz a base do cálculo
EStG base de cálculo da USt, do ESt, prevista no § 50 a da EStG
conforme § 13 b UStG

Irrelevante, por se tratar


Efeito de um acordo O acordo de pagamento líquido tem
de obrigação tributária
sobre pagamento por efeito o gross up, ou seja,
própria do destinatário
líquido ou bruto aumento da alíquota do imposto
da prestação

Somente quando se tratar de


prestadores residentes na União
Não tem efeito sobre a Europeia e despesas comprovadas,
Efeito de despesas do obrigação tributária do concretas, relacionadas, direta e
prestador do serviço destinatário da exclusivamente, à obtenção dos
prestação rendimentos sujeitos à tributação

1470
(BMF de 17-6-2014, BStBl. 12014,
887)

Atualmente 15%, possível não


Atualmente 19%, incidência ou redução, conforme
possível redução a 7%, acordo de bitributação, desde que
Alíquota
conforme § 12, inciso 2, apresentado, previamente, o
n. 7c UStG respectivo comprovante da
repartição federal competente (BZSt)

Com o decurso do
Nascimento da período em que a Com a entrada da remuneração junto
obrigação tributária respectiva prestação ao prestador residente no exterior
tenha sido executada

Depende do volume do
USt pago no ano
Recolhimentos devem ser realizados
anterior: entre 1.000,01€
Recolhimento do até o dia 10 do mês seguinte ao
e 7.500,00€ trimestral,
imposto trimestre vencido (10-4./10-7./
valores superiores
10-11./10-1.)
devem ser pagos
mensalmente (...)

Eventualmente, renúncia à dedução


do imposto ou responsabilidade pelo
Não há, por tratar-se de seu recolhimento, desde que, para o
Existência de regras
obrigação tributária do mesmo credor e a mesma situação de
de equidade relativas
destinatário da fato, seja concedido ou possa ser
ao passado
prestação concedido um certificado de não
incidência no âmbito do acordo de
bitributação

No artigo de Holthaus consta, ainda, a tabela das isenções/reduções na


tributação da disponibilização de direito, concedidas nos 91 acordos de
bitributação celebrados pela Alemanha, vigentes em 12 de janeiro de 2015.
Em relação aos países referidos como BRICS, observa-se o seguinte:
China e Índia: redução da alíquota para 10%; Rússia e África do Sul:
isenção; Brasil: não há acordo555.

3.3. Tributação dos negócios B2B e B2C no cloud computing

1471
Na sua análise deste setor do comércio digital, Pinkernell chega às
seguintes conclusões sobre a tributação das operações típicas de cloud
computing, os negócios Business-to-Business (B2B) e Business to
Commerce (B2C), tanto na área do imposto de renda (ESt) como do
imposto sobre vendas (USt).

3.3.1. Imposto de renda (ESt) e da pessoa jurídica (KSt)


a) Negócios inbound, ou seja, prestações de cloud computing fornecidas a
clientes alemães por provedores estrangeiros, via de regra, não estão sujeitos
à obrigação tributária limitada na Alemanha, pela inexistência de
rendimentos lá auferidos.
b) Negócios outbound, nos quais o residente na Alemanha oferece prestações
baseadas na cloud a um cliente residente no exterior, tem seus rendimentos
tributados na Alemanha, em virtude da obrigação tributária ilimitada do
ofertante da prestação (§ 49, inciso 1º, Nr. 2, alínea f., EStG).

3.3.2. Imposto sobre vendas (USt)


a) Negócios inbound, que abrangem fornecimentos e outras prestações que um
empresário na Alemanha realizar, onerosamente, são sujeitos à incidência do
imposto sobre vendas (§ 1º, inciso 1º, nº 1 da UStG). Trata-se de negócios
online, realizados somente pela internet, tendo por objeto, exclusivamente,
prestações que não consistem no fornecimento de mercadorias (as assim
chamadas “outras prestações” do § 3º, inciso 9º, frase 1ª UStG).

Nos negócios B2C, o lugar da prestação é aquele a partir do qual o


empresário realiza seus negócios (§ 3º, inciso 1º, 1ª frase UStG). Se,
porém, a prestação for executada por um estabelecimento permanente do
empresário, este é considerado lugar da prestação.

Quando o destinatário da prestação também for empresário (negócio


B2B), o lugar da prestação desloca-se, em princípio, para a sede da
empresa do destinatário. No entanto, se a prestação for dirigida ao
estabelecimento de um empresário, o lugar deste define a localização da
prestação.

1472
Prestações a consumidores com domicílio no exterior, fora da União
Europeia, não são tributáveis na Alemanha.

b) Negócios outbound, com prestações a destinatários residentes na Alemanha,


são tributáveis na sede da empresa prestadora, se o ofertante tiver sua sede na
União Europeia. Nos serviços eletrônicos prestados por empresa fora da
União Europeia, o lugar da prestação desloca-se para a Alemanha, para
garantir a tributação no lugar do consumo.

4. TRIBUTAÇÃO LIMITADA E DESCONTO NA FONTE NA


DISPONIBILIZAÇÃO DE SOFTWARE E BANCOS DE DADOS NA
ALEMANHA

Com Ofício de 27 de outubro de 2017, a Repartição Federal Central de


Tributação (Bundeszentralamt für Steuern – BZSt) do Ministério de
Finanças (Bundesministerium der Finanzen) publicou as diretrizes para a
tributação na fonte dos rendimentos provenientes da disponibilização de
software e de bancos de dado por servers residentes no exterior a clientes
na Alemanha556. Esta ordem de aplicação da legislação federal do ESt e do
KSt, de competência comum de União e Estados Federados, disciplinará os
casos futuros e pendentes na sua publicação.

Os tributaristas alemães destacam, unanimemente, a importância deste


Ofício BZSt. Assim, Pinkernell opina que a matéria é da maior importância
para a nova economia digital, com sua elevada carga fiscal,
proporcionando maior segurança jurídica557. Para os auditores da Ernst &
Young de Munique, as diretrizes constituem um desenvolvimento positivo
para fornecedores e usuários de software e bancos de dados, sendo bem-
vindas pelos contribuintes, pois eliminam as incertezas técnicas de forma
pragmática558.

No entanto, algumas críticas são apresentadas. De maneira geral, é


referido que o Ofício BZSt limita-se a tratar somente da disponibilização

1473
de software de bancos de dados e deixa de eliminar as incertezas existentes
em relação a outras transações digitais, como, por exemplo, venda de
direitos à imagem, online streaming, online gaming, ou venda de espaço
de publicidade online559. Também é criticada a permanência de
dificuldades procedimentais, que, no entanto, requerem alterações da
legislação560.

Outras observações críticas relativas a aspectos específicos da Minuta e


do Ofício BZSt, publicado sem alterações substanciais, serão apontadas
durante o resumo que segue.

Na sua Primeira Parte, relativa à disponibilização cross border de


software a usuários na Alemanha, o Ofício BZSt trata dos seguintes
tópicos.

1. Obrigação tributária limitada (Beschränkte Steuerpflicht)

Pela Lei do Imposto de Renda alemã (Einkommensteuergesetz,


doravante referido como EStG), o ofertante residente no exterior, que
disponibiliza software para utilização na Alemanha pode estar sujeito, com
os rendimentos auferidos na Alemanha, à obrigação tributária limitada,
conforme o § 49, inciso 1, n, 2, alínea f ou n. 6 da EStG, se já não estiver
sujeito à obrigação tributária limitada por enquadrar-se no § 49, inciso 1,
n. 2, alínea a da EStG, pelo fato de ter um estabelecimento permanente ou
representante na Alemanha, aos quais é atribuída a concessão dos direitos.

Os rendimentos auferidos e as regras para sua tributação, objeto do


Ofício BZSt, dizem respeito, exclusivamente, à análise da disponibilização
de software e de bancos de dados por ofertantes residentes no exterior a
usuários residentes na Alemanha. Nisto, devem ser observadas as
seguintes regras:

1474
a) Rendimentos derivados da disponibilização de direitos

Na disponibilização de direitos, o Ofício BZSt distingue entre a


concessão da funcionalidade do software, em que o objeto do contrato é
somente a utilização em conformidade com sua destinação. Neste caso, os
respectivos rendimentos auferidos, na Alemanha, pelo residente no
exterior, não são tributáveis na Alemanha, não estão sujeitos ao imposto de
renda na fonte.

Diferentemente, estará sujeito ao imposto de renda na fonte quando a


disponibilização de software cross-border ao usuário implicar direitos
abrangentes de uso do software para seu aproveitamento econômico
ulterior.

Esclarece o Ofício BZSt que, via de regra, os direitos de uso contratuais


não são abrangentes, respectivamente, não visam o ulterior aproveitamento
econômico, se pela legislação dos direitos autorais (em especial pelos §§
69 e s. da Lei de Direitos Autorais – Urheberrechtsgesetz, doravante
designada UrhG) não for necessária a autorização do titular do direito para
sua utilização específica561.

b) Aproveitamento econômico ulterior dos direitos concedidos na


Alemanha

Os rendimentos oriundos da disponibilização de software cross-border


somente são, pois, tributáveis na Alemanha, se os direitos forem
“aproveitados” num estabelecimento na Alemanha ou em outra instituição
(ex., universidade pública). Aproveitamento (Verwertung) significa uma
ação, que tem por finalidade tirar proveito econômico próprio dos direitos
concedidos (aproveitamento econômico ulterior – wirtschaftliche
Weiterverwertung).

1475
Exemplo 1

A B-GmbH com sede e gerência na Alemanha recebe da Software Pte.


Ltd., domiciliada em Singapura, direitos de divulgação, multiplicação,
publicação e modificação relativos a um especial software de imagem
fotográfica, que ela, em vista das necessidades do mercado alemão,
adapta (entre outros, traduz) e distribui como parte de um pacote de
software composto de diversos elementos de programa. A própria
Software Pte. Ltd. não mantém, na Alemanha, nenhum estabelecimento,
nem contratou um representante permanente.

Os royalties pagos pela Ltda.-B constituem rendimentos da Software


Pte. Ltd. no país, nos termos do § 49, inciso 1, n. 2, alínea f, letras aa da
Lei do Imposto de Renda (EStG). A Software Pte. Ltd. concedeu à Ltda.-B
amplos direitos de aproveitamento. O software fotográfico é aproveitado
no país como parte de um pacote de software.

Holthaus562 não concorda com esta distinção básica feita pelo Ofício,
que, na sua opinião, não encontra fundamento no texto legal. Para ele, a
simples utilização de um direito num estabelecimento comercial ou em
outra instituição na Alemanha representa um aproveitamento. Se não fosse
assim, qualquer utilização de know-how na Alemanha também não ficaria
sujeito à tributação dos seus rendimentos na fonte. O que corrobora sua
crítica é o fato de que tanto em relação aos conhecimentos obtidos num
banco de dados no exterior, como no know-how, via de regra, não é
permitido o aproveitamento ulterior. Por isso, Holthaus chama a atenção à
possibilidade de que, pelo princípio da igualdade do art. 3º da Constituição
Alemã, surjam reivindicações no intuito de obter desoneração comparável
nos casos de utilização de know-how.

1476
Para Holthaus, o objetivo dessa distinção consiste, claramente, na não
tributação na fonte dos casos típicos de disponibilização de software e
utilização de bancos de dados na Alemanha. Na sua opinião, porém, essa
finalidade seria mais bem atingida por uma medida baseada na equidade.

Por sua vez, Schnitger e Oskamp criticam que o Ofício BZSt fornece
uma enumeração exemplificativa dos chamados direitos abrangentes de
uso, não permitindo vislumbrar que outros direitos de utilização pudessem
ser adequados para constituir rendimentos ou a obrigação ao desconto do
imposto de renda na fonte. Na opinião desses autores, o Ofício deveria ter
uma enumeração taxativa e não exemplificativa563.

2. Desconto do imposto na fonte conforme § 50a inciso 1, n. 3 EStG

Se o ofertante residente no exterior estiver sujeito à obrigação tributária


limitada na Alemanha, relativa aos rendimentos auferidos pela
disponibilização de software cross-border, o imposto será cobrado pela
modalidade do desconto do imposto na fonte (Abzugssteuer). Esse
esclarecimento é importante, pois a obrigação tributária limitada também
pode ser cumprida pela modalidade do imposto lançado
(Veranlagungssteuer).

O desconto do imposto de renda na fonte, nos termos do dispositivo


legal acima referido, somente se aplica ao caso da disponibilização
temporária de um direito à utilização do software. Isso se deve ao fato de
que, em se tratando de software protegido por direitos autorais, sua
transferência definitiva é proibida pela legislação alemã de direito autorais.

3. Casos específicos
a) Disponibilização de software em conformidade com sua destinação

1477
Os rendimentos auferidos na Alemanha não são tributáveis nos termos
do § 49, inciso 1, n. 2, alínea f e n. 6 da EStG, quando os direitos
disponibilizados somente possibilitam a utilização de um software em
conformidade com sua destinação (bestimmungsgemässer Gebrauch),
independentemente de tratar-se de software standard (que no Brasil se
conhece como software de prateleira) ou de software individual,
desenvolvido especialmente (ou seja, por encomenda do usuário).

Da mesma forma como a distinção entre uso abrangente e não


abrangente, o conceito de uso em conformidade com sua destinação é da
maior importância na determinação do alcance do § 49, inciso 1, n. 2,
alínea f, letras aa e n. 6 da EStG. Como destacam Schnitger e Oskamp, o
Ofício BZSt elimina a insegurança jurídica até então existente e limita o
conceito dos rendimentos, no sentido de que somente a disponibilização de
direitos abrangentes de uso do software, que propiciam o aproveitamento
econômico ulterior, pode dar margem a rendimentos tributáveis, como foi
visto acima564.

Além disso, fica esclarecido que não se trata de rendimentos na


Alemanha, tributáveis na fonte, se o objeto da disponibilização for
somente a utilização do software em conformidade com sua destinação
(bestimmungsgemässer Gebrauch), pois não há, neste caso, concessão de
direitos abrangentes para aproveitamento econômico ulterior. Desta
maneira, o Ofício BZSt limita, de maneira razoável, a obrigação da
dedução na fonte, prevista no § 50a da EStG565.

Em dois exemplos, o Ofício mostra que os meros atos de cópia e de


adaptação do software são considerados utilização do software conforme
sua destinação, não sujeita à tributação na fonte, quando não estiverem
vinculados a nenhum aproveitamento econômico ulterior:

1478
Exemplo 2

A X-Software Inc. é uma sociedade de capital estrangeira com sede e


gerência nos Estados Unidos (USA), que, no país, não possui
estabelecimento comercial nem contratou um representante permanente. A
Bau GmbH é uma empresa com sede e gerência na Alemanha. A Bau
GmbH recebe da X-Software Inc., mediante remuneração, software
standard de processamento de textos para uso no seu próprio
estabelecimento. Conforme o acordo de uso de software elaborado, a Bau
GmbH tem o direito de produzir e utilizar 5.000 cópias do programa para
empregados (licença operacional). O contrato concede direito de rescisão
a ambas as partes contratantes.

Os pagamentos da Bau GmbH pelo software não constituem para a X-


Software Inc. rendimentos no país, nos termos do § 49, inciso 1, n. 2,
alínea f, letras aa da EStG, relativos à disponibilização de direitos. Os
direitos de uso, contratualmente concedidos, não são abrangentes. Eles
possibilitam somente o uso do software pela Bau GmbH e seus
empregados, conforme sua destinação e função. Meros atos de
multiplicação não dependem do consentimento do titular do direito (aqui:
X-Software Inc.) pela legislação dos direitos autorais, na medida em que
são necessários à utilização do software conforme sua destinação (cf. § 69
d, inciso I, c/c. § 69 c, n. 1 da Lei dos Direitos Autorais – UrhG).

Exemplo 3 (variação do Exemplo 2)

A X-Software Inc. concede à Bau GmbH um software standard, pronto


para uso, para utilização na sua própria empresa. Além da extensão
funcional do software colocado à disposição, a Bau GmbH deseja adaptá-
lo para integrá-lo nos seus processos empresariais. Para tanto, a X-

1479
Software Inc. criou, de antemão, possibilidades de ampliação do software,
para que o próprio cliente possa executar essas adaptações, sem, porém,
alterar as funções do software, colocado à disposição. O acordo de
utilização do software permite à Bau GmbH utilizar 5.000 cópias do
programa na sua própria empresa bem como, adicionalmente, realizar
trabalhos no software para adaptação aos seus processos empresariais.

Os pagamentos da Bau GmbH pelo software não constituem, para a X-


Software Inc., rendimentos no país, nos termos do § 49, inciso 1, n. 2,
alínea f, letras aa da EStG. O acordo de utilização de software não
contém direitos de uso abrangentes para o aproveitamento econômico
ulterior do software. Para a utilização do software pelo usuário, conforme
sua destinação e função, está prevista a possibilidade de realizar uma
ampliação/adaptação do software concedido.

Como aponta Pinkernell, também é louvável o esclarecimento do Ofício


BZSt no sentido de que não haverá desconto do imposto de renda na fonte,
quando a empresa de um grupo de sociedades, com sede na Alemanha,
adquire licenças de software do produtor residente no exterior e, com seu
consentimento, as repassa a outras empresas do grupo566. Nesse caso,
continua a tratar-se de disponibilização de software a usuários coligados,
que não recebem direitos de aproveitamento econômico ulterior, mas o
utilizam em conformidade com sua destinação.

Em relação ao respetivo exemplo do Ofício BZSt, cabe destacar que a


não incidência do imposto, no uso dentro do grupo societário, independe
do fato de que a transferência dos direitos de uso ser realizada com base no
custo (despesa de aquisição da licença) ou de ser paga uma
contraprestação, que o ultrapasse, como mostra o exemplo seguinte.

1480
Exemplo 4

A Q-GmbH é uma empresa com sede e gerência na Alemanha; como


parte de um grupo de empresas, é encarregada do suprimento de software
dentro do grupo. A X-Software Inc. americana concede à Q-GmbH uma
licença para seu grupo, relativa a um software para elaboração de textos,
que permite à Q-GmbH, transferir licenças a empresas do grupo, nos
termos do § 18 da Lei das Sociedades por Ações. As empresas do grupo
utilizam o software de elaboração de textos, conforme sua destinação e
para finalidades da sua própria empresa, confeccionando somente cópias
de segurança. Não são transferidos direitos mais amplos. O custo do
software é repassado às empresas do grupo.

A X-Software Inc. não aufere rendimentos tributáveis no país, nos


termos do § 49, inciso 1, n. 2, alínea f, letras aa da EStG, porque ela não
concede à Q-GmbH direitos abrangentes de uso para aproveitamento
econômico ulterior. Os direitos de uso disponibilizados limitam-se à
utilização, no grupo, conforme sua destinação.

b) Disponibilização de direitos abrangentes de uso do software para seu


aproveitamento econômico ulterior

Como já referido, incide o imposto de renda na fonte quando são


concedidos direitos abrangentes de uso do software, que permitem seu
aproveitamento econômico ulterior. O Ofício BZSt refere-se a uma série de
atos que ultrapassam a utilização do software conforme sua destinação e
caracterizam seu aproveitamento econômico ulterior, pelo
desenvolvimento do software recebido e pela sua distribuição de forma
aperfeiçoada.

Exemplo 5

1481
O X-Software Group é um dos líderes de mercado no setor de produção
e distribuição de software empresarial. Responsável pelo desenvolvimento
é a Y-Software Inc. com sede nos Estados Unidos. A Y-Software Inc.
permite à sua subsidiária X-Software GmbH, sediada em Frankfurt,
desenvolver mais e distribuir comercialmente na Alemanha os produtos de
software desenvolvidos pela Y-Software Inc.. A base jurídica para a
distribuição é um Software Distribution Agreement. À Y-Software GmbH
são concedidos direitos de cópia, adaptação e distribuição, relativos aos
produtos de software, contra o pagamento de royalties. A própria Y-
Software Inc. não possui, no país, estabelecimento empresarial, nem
contratou um representante permanente.

Os royalties pagos pela Y-Software GmbH constituem rendimentos da


Y-Software Inc. no país, nos termos do § 49, inciso 1, n. 2, alínea f, letras
aa da EStG. A Y-Software Inc. concedeu à Y-Software GmbH direitos
abrangentes de uso (multiplicação, adaptação e distribuição). Com isso, a
Y-Software GmbH, como autorizada ao uso, não só tem direito à
utilização do software conforme sua destinação, mas ao aproveitamento
pelo desenvolvimento ulterior do software e sua distribuição sob a forma
adaptada: adaptações, que ultrapassam a utilização conforme a
destinação, dependem de autorização prévia, conforme a legislação
autoral (§ 69 d, inciso 1, c/c. § 69 c, n. 2 UrhG). Neste caso, a regra
relativa ao grupo societário (referida no Exemplo 3) não se aplica, devido
à falta de limitação à utilização conforme sua destinação. A Y-Software
GmbH deve descontar na fonte o imposto sobre o pagamento de royalties,
conforme § 50 a, inciso 1, n. 3 da EStG.

c) Disponibilização de cópias de software a revendedores para sua


distribuição

1482
Não se trata, porém, de concessão de direitos que impliquem o
pagamento de rendimentos tributáveis, quando o direito limitar-se à
distribuição de determinado número de cópias por ele adquiridas e não
permitir ao revendedor fazer mais cópias do software.

Na prática, o controle dessa limitação é difícil, pois a disponibilização


pode ser realizada por meio de downloads ou de forma física (por exemplo
um DVD). Por isso, Schnittger e Oskamp pensam que seria razoável,
dentro de uma interpretação sistemática, também não considerar
tributáveis os rendimentos quando ao revendedor for concedido o direito
de fazer cópias do programa, desde que numericamente limitado (por
exemplo, a 1.000 exemplares)567.

d) Contratos mistos

São considerados mistos os contratos nos quais, de um lado, são


concedidos direitos abrangentes de uso, sujeitos à tributação na fonte e,
por outro lado, outras prestações, de importância secundária, que,
isoladamente, não geram a obrigação à retenção do imposto (como, por
exemplo, serviços de treinamento para aplicação do software).

Nos contratos mistos, porém, o rendimento está, integralmente, sujeito


ao imposto retido na fonte, quando a disponibilização abrangente de
direito for, visivelmente, preponderante e a outra parte da prestação tiver
somente importância secundária. Isto é o caso quando não representar mais
que 10% da prestação global (conforme decisão da Corte Fiscal Federal-
BFH, de 28-1-2004). O Ofício BZSt esclarece, ainda, que, em princípio, a
concessão de direitos é preponderante nas adaptações do software ou nos
serviços de desenvolvimento que um ofertante de software, não residente
na Alemanha, prestar em virtude dessa concessão de direitos.

1483
Quando as respectivas prestações não podem ser devidamente
classificadas, ou a sua classificação for inadequada, a remuneração deverá
ser repartida com base num critério adequado. Assim, a remuneração
somente será tributada na medida em que for paga pela disponibilização de
direitos. Conforme o caso, a participação dos diversos componentes da
prestação deve ser estimada (conf. § 162, inciso 1 do Código Tributário
Alemão – AO), como se vê no seguinte exemplo.

Exemplo 6

A Infrastructure Inc., sediada nos Estados Unidos, disponibiliza à


Infrastructure-Service-GmbH alemã amplo espaço de arquivo num de seus
servers norte-americanos, para utilização a título de locação. Além disso,
a Infrastructure Inc. obriga-se, especialmente, a uma determinada
capacidade de transmissão. A Infrastructure-Service-GmbH possui,
contratualmente, o direito de alugar o espaço de arquivo a clientes
comerciais e particulares. Além disso, a Infrasctructure-Service-GmbH
recebe da Infrastructure Inc. software de arquivo, que a Infrastructure-
Service-GmbH pode desenvolver mais e colocar, desta forma, à disposição
de seus clientes. A Infrastructure Inc. recebe da Infrastructure-Service-
GmbH uma remuneração global por mês.

A remuneração está sujeita apenas parcialmente à obrigação tributária


limitada conforme § 49, inciso 1, n. 2, alínea f, letras aa da EStG e à
dedução na fonte conforme o § 50 a, inciso 1, n. 3 da EStG. A
disponibilização do espaço de arquivo constitui uma prestação de serviço
e não uma cessão de direitos, no sentido dos fatos geradores acima
mencionados: o cerne do acordo consiste na disponibilização de um
arquivo virtual e não na concessão de direitos abrangentes de uso. Por
outro lado, há uma concessão abrangente de direitos pela

1484
disponibilização do software, porque a Infrastructure-Service-GmbH tem
o direito ao seu ulterior aproveitamento econômico. A remuneração
global da Infrastructure Inc. deve ser repartida. Se não resultar do
contrato uma atribuição demonstrável das respectivas remunerações, a
remuneração global deve ser repartida por estimativa.

e) Disponibilização de software com base na internet

A disponibilização do software também pode ser realizada via internet.


Para tanto, o Ofício BZSt distingue, acertadamente, entre prestações do
ofertante (provider) ao usuário final, em especial SaaS (software as a
service) ou ASP (application service providing), que não visam o
aproveitamento econômico ulterior, e eventuais relações contratuais de
provider a produtores de software. Como acentua Pinkernell, deve ser
examinado, em cada caso concreto, quais os direitos concedidos pelo
produtor ao ofertante (provider), como, por exemplo, direitos de cópia e
desenvolvimento, bem como o direito à reprodução pública, conforme o §
69 c, n. 1, 2 e 4 da Lei dos Direitos Autorais UrhG, cuja concessão pode
implicar a obrigação de pagamento do imposto de renda na fonte568.

Também no caso da disponibilização do software via internet, haverá


rendimentos tributáveis na fonte, desde que sejam concedidos direitos
abrangentes de uso para ulterior aproveitamento econômico, e outros não
tributáveis, onde falta este pressuposto, como mostram os exemplos
seguintes do Ofício BZSt.

Exemplo 7

Um ofertante de software sediado na Índia põe à disposição de uma


empresa com sede na Alemanha, via internet, um software para
contabilidade e suprimento/armazenagem de mercadorias, instalado num

1485
servidor da Índia, desenvolvido por ele mesmo (ASP-application service
providing). O software é utilizado pelos empregados da empresa alemã,
sem que haja um download – o software permanece o tempo todo no
computador do ofertante. Conforme o respectivo contrato, o ofertante
obriga-se, contra uma remuneração mensal pelo seu uso, à
disponibilização do software para prestações regulares de serviço
(manutenção e up dates gratuitos do software, utilização até um certo
volume de dados, data storage e hotline service). O contrato celebrado por
tempo indeterminado pode ser rescindido com aviso prévio de 14 dias
para o final do mês. O ofertante do software não possui estabelecimento
nem constituiu representante permanente no país.

Com a disponibilização onerosa do software para contabilidade e


suprimento de mercadorias, o ofertante do software não aufere
rendimentos tributáveis no país, nos termos do § 49, inciso 1, n. 2, alínea
f, da EStG. Em todo caso, os direitos de uso cedidos não são abrangentes,
porque somente põem a empresa alemã em condições de utilizar o
software dentro de sua esfera operacional, em conformidade com sua
destinação.

Exemplo 8 (variação do Exemplo 7)

A empresa de software sediada na Índia não disponibiliza seu software


a empresas clientes finais, ela própria, mas deixa a comercialização,
distribuição e assistência permanente (manutenção e up date do
programa, data storage e hotline service) a uma outra empresa, sediado na
Alemanha (distribuidor de ASP). Esta põe à disposição dos clientes finais
empresariais o software para contabilidade e suprimento/armazenagem de
mercadoria a título de locação, sendo que o software permanece no server
da empresa de software, sediada na Índia. Contratualmente, esta empresa

1486
de software cede ao distribuidor alemão de ASP, para esta finalidade, o
direito à multiplicação e o direito de tornar o software acessível a
terceiros, entre outros direitos.

A empresa de software da Índia aufere rendimentos tributáveis no país,


conforme § 49, inciso 1, n. 2, alínea f, letras aa da EStG, pois cede
direitos abrangentes de uso ao distribuidor alemão de ASP (cf. § 69 c n. 1
e 4 UrhG), que possibilitam o aproveitamento econômico ulterior num
estabelecimento sediado no país.

Exemplo 9

A SaaS Inc., com sede nos Estados Unidos, oferece e desenvolve


aplicações empresariais para a distribuição, assistência técnica e
marketing, baseados em nuvem (cloud based). A distribuição para a
Alemanha é realizada por intermédio da SaaS-GmbH, sediada em
Munique. Num contrato de licença, a SaaS Inc. cede à SaaS-GmbH,
mediante pagamento, direitos de uso do software, limitados no tempo e no
território (direitos de multiplicação, alteração, distribuição e locação bem
como o direito à publicação. A SaaS-GmbH concede aos seus próprios
clientes na Alemanha, onerosamente, acesso às aplicações. A SaaS Inc.
não mantém estabelecimento no país, nem constituiu representante
permanente.

Os royalties pagos pela SaaS-GmbH constituem rendimentos


tributáveis da SaaS Inc., nos termos do § 49, inciso 1, n. 2, alínea f, letras
aa da EStG, porque à SaaS-GmbH foram concedidos direitos abrangentes
de uso, para aproveitamento econômico ulterior.

Exemplo 10

1487
A ZAP-AG, com sede e gerência na Suíça, onerosamente, põe à
disposição da Auto-GmbH, sediada em Colônia, aplicações de software
para uma multiplicidade de pontos individuais de trabalho. As aplicações
de software são disponibilizadas e administradas mediante ligação à
internet e um webbrowser. O acesso é feito pelo computador dos usuários.
Conforme o acordo relativo ao software as a service (acordo SaaS), o
server assume a manutenção e periódicas atualizações e aperfeiçoamentos
do software. O acordo dá às partes contratantes o direito de rescisão. A
ZAP-AG não possui estabelecimento, nem contratou representante
permanente na Alemanha.

Com a contraprestação que recebe pelo seu serviço, a ZAP-AG não


aufere rendimentos tributáveis no país, nos termos do § 49, inciso 1, n. 2,
alínea f, letras aa da EStG. À Auto-GmbH não são concedidos direitos de
uso abrangentes para o aproveitamento econômico ulterior. A ela é
permitida somente a utilização do software conforme sua destinação e
dentro do próprio estabelecimento. Se a remuneração referir-se, também,
a serviços (manutenção, atualização), igualmente não há rendimentos
tributáveis no país, nos termos do § 49 da EStG.

Na sua Segunda Parte, o Ofício BZSt trata da disponibilização cross-border de


bancos de dados/conteúdos de bancos de dados a usuários na Alemanha.

1. Aspectos gerais

O Ofício BZSt estabelece, em analogia à disponibilização cross-border


de software, objeto de primeira parte do Ofício BZSt, que, na
disponibilização cross-border de bancos de dados ou de seus conteúdos,
também não há obrigação de reter na fonte o imposto de renda, a não ser
que sejam disponibilizados ao usuário, residente na Alemanha, direitos
abrangentes de uso para o aproveitamento econômico ulterior do software

1488
(em especial, direitos de cópia, desenvolvimento, divulgação ou
publicação). Isso pode dizer respeito tanto ao uso do banco de dados como
um todo, como a determinados conteúdos.

Critérios para a apreciação da extensão do direito de uso podem resultar


da legislação dos direitos autorais, pela qual, via de regra, não se trata da
disponibilização de direitos abrangentes de uso quando não for necessária
a autorização do uso pelo titular do direito autoral.

2. Casos específicos
a) Utilização das funções de acesso, leitura e impressão de um banco de
dados

Neste caso, não se trata de rendimentos tributáveis na fonte, como


mostram os exemplos seguintes.

Exemplo 11

A editora americana REALIMP Medical Magazine, ao lado de seus


veículos tradicionais, oferece aos seus clientes também jornais eletrônicos
(e-journals). Os e-journals são versões online das edições impressas, à
disposição dos usuários de forma digital. O grupo farmacêutico Medical
AG, sediado na Alemanha, usa este serviço online para jornais científicos
especializados, mediante pagamento de uma remuneração mensal. De
acordo com o contrato de licença celebrado, os empregados da Medical
AG têm o direito de ler e imprimir os jornais eletrônicos. Ambas as partes
têm o direito de rescindir o contrato com aviso prévio de um mês, sem
justa causa. A editora REALIMP Medical Magazine não tem nem
estabelecimento nem representante permanente na Alemanha.

Com a contraprestação, a REALIMP Medical Magazine não aufere


rendimentos tributáveis na Alemanha, nos termos do § 49, inciso 1, n. 2,

1489
alínea f, letras aa da EStG. Para o acesso à leitura e à autorização de
multiplicar e divulgar para o uso interno da empresa, a Medical AG não
precisa de direitos abrangentes de uso (cf. também § 87c, inciso 1, frase 1,
n. 2 UrhG). À Medical AG somente é possibilitada a utilização do banco
de dados/software/jornais conforme sua destinação e no seu próprio
estabelecimento, mas não a exploração econômica do próprio banco de
dados. É irrelevante a utilização de conhecimentos adquiridos do
conteúdo do banco de dados no âmbito de sua atividade empresarial.

Exemplo 12

A agência de rating X Ltd., sediada nos Estados Unidos, disponibiliza,


onerosamente, diversos dados do mercado (entre outros, cotações de
ações e de câmbio bem como ratings) a um banco com sede na Alemanha.
Mediante licença de usuário final, ao banco é concedido,
temporariamente, o direito de ter acesso online às fontes de dados, bem
como consultar dados históricos nos bancos de dados. O acesso aos dados
é realizado pela internet mediante um aplicativo online de software. A
agência de rating X Ltd. não tem estabelecimento nem representante
permanente na Alemanha.

Com os rendimentos por ela auferidos da disponibilização de dados


sobre o mercado financeiro, a X Ltd. não está sujeita à obrigação
tributária limitada, conforme § 49, inciso 1, n. 2, alínea f, letras aa, da
EStG, porque não são concedidos direitos abrangentes de uso para
aproveitamento econômico ulterior. Ao banco alemão somente são
concedidos aqueles direitos que são necessários ao acesso dos elementos
do banco de dados e sua utilização usual (funções de acesso, leitura e
impressão).

1490
Além disso, também não há disponibilização de know-how nos termos
do § 49, inciso 1, n. 9 da EStG, porque não é disponibilizado nenhum
conhecimento especializado, mas somente determinados conteúdos de
dados, bem como os resultados (ratings) da aplicação de conhecimentos
especializados.

b) Concessão de direitos abrangentes de uso de bancos de dados/conteúdos


de bancos de dados

Diferentemente, nesta hipótese, os rendimentos estão sujeitos à


tributação na fonte, quando for possível o aproveitamento econômico
ulterior dos direitos concedidos, como ilustram os exemplos seguintes.

Exemplo 13 (continuação do Exemplo 12)

Pelo contrato, o banco alemão é autorizado pela agência de rating X


Ltd. a conceder aos seus clientes amplo acesso ao banco de dados
(sublicença).

Os rendimentos auferidos pela agência de rating X Ltd. estão sujeitos à


obrigação tributária limitada na Alemanha, conforme § 49, inciso 1, n. 2,
alínea f, letras aa da EStG, pois ela concedeu ao banco alemão direitos
amplos de uso do banco de dados, que os aproveita economicamente no
contrato com seus clientes.

Exemplo 14 (continuação do Exemplo 13)

Ao lado da licença de usuário final, o banco alemão também obtém


uma licença que o autoriza a disponibilizar os resultados da pesquisa aos
seus clientes, que, com eles, geram dados próprios. No entanto, ao banco
não é permitido conceder acesso a terceiros (p. ex., clientes) ou
disponibilizar informações essenciais do banco de dados.

1491
Com os rendimentos por ela auferidos pela disponibilização dos dados
do mercado financeiro, a agência de rating X Ltd. não está sujeito à
obrigação tributária limitada, conforme o § 49, inciso 1, n. 2, alínea f,
letras aa da EStG, porque não são concedidos direitos abrangentes de uso
para aproveitamento econômico ulterior. O banco não tem o direito de
multiplicar, divulgar ou publicar o banco de dados inteiro ou uma parte
essencial dele, pela sua natureza ou extensão.

c) Utilização de banco de dados em universidades e bibliotecas públicas

Este item não constava da Minuta do Ofício. Nele, o Ofício BZSt


definitivo esclarece uma série de aspectos controvertidos, que dizem
respeito a peculiaridades das universidades e bibliotecas.

Assim, confirma que, quando o § 49, inciso 1, n. 2, alínea f e n. 6 da


EStG refere-se a estabelecimento permanente ou outra instituição na
Alemanha, para efeitos da incidência ou não incidência do imposto de
renda na fonte, o conceito de “outra instituição” também abrange
universidades e repartições públicas.

Via de regra, nas universidades e bibliotecas, não há uma atividade


econômica do aproveitamento dos direitos disponibilizados.

Finalmente, não há disponibilização econômica ulterior quando bancos


de dados científicos são disponibilizados a universidades e a bibliotecas
públicas, e sua utilização comercial é excluída pelo contrato entre o
provider e a universidade/biblioteca. A não incidência do imposto na fonte
não é prejudicada, se a universidade cobrar taxas de uso com base no
custo.

Exemplo 15

1492
Uma universidade alemã utiliza os bancos de dados de um server
sediado nos Estados Unidos. Pelo contrato de licença, a universidade é
autorizada, por tempo limitado, mediante pagamento de uma
contraprestação e no local, a conceder aos membros da universidade e a
terceiros, acesso aos bancos de dados. Pelos estatutos da biblioteca da
universidade, seus membros podem utilizá-los gratuitamente. Pessoas de
fora devem pagar taxas baseadas no custo. O server dos bancos de dados
não tem estabelecimento nem representante permanente na Alemanha.

O server dos bancos de dados, sediado nos Estados Unidos, não aufere
rendimentos tributáveis na Alemanha, nos termos do § 49, inciso 1, n. 2,
alínea f, letras aa ou n. 6 da EStG. Independentemente da questão do
acesso público ou não do banco de dados (cf. § 87b inciso 1, frase 1 da
UrhG) não há, de qualquer caso, nenhum aproveitamento de direitos pela
universidade, porque ela possibilita a utilização dos bancos de dados
gratuitamente ou à base do custo.

CONCLUSÃO

A legislação da Alemanha está enfrentando as questões tributárias da


economia digital e os desafios da constante evolução do e-commerce de
forma bastante pragmática. Procura adaptar os novos modelos de negócios
eletrônicos ao sistema tributário existente, de modo a não surpreender e
onerar, excessivamente, os contribuintes alemães que, nas palavras de
Rödder e Pinkernell, caracterizam-se, via de regra, como “good corporate
citizens”.

O recente Ofício da competente Repartição Central Federal de Impostos


(BZSt) do Ministério das Finanças da Alemanha mostra, claramente, a
tendência de não aumentar a carga tributária, que onera o e-commerce,

1493
levando em consideração que a Alemanha é tanto Estado de fonte como de
residência. Por isso, tem especial interesse em evitar que sua legislação
sobre o comércio digital possa levar a desvantagens concorrenciais das
empresas alemãs, frente aos seus competidores, residentes no exterior,
sujeitos a carga fiscal menor.

1494
As disputas de Cost Sharing Agreements
envolvendo empresas de tecnologia nos
Estados Unidos
569
Rubens Barrionuevo Biselli

I. INTRODUÇÃO

As transações internacionais envolvendo ativos intangíveis detidos por


empresas multinacionais (MNEs), principalmente do setor de tecnologia,
têm suscitado frequente atenção das autoridaides fiscais ao redor do
mundo, em especial da Receita Federal dos Estados Unidos da América
(IRS). O IRS sustenta que tais operações geralmente resultam na
transferência de lucros ao exterior, pois os rendimentos decorrentes da
exploração do intangível passam a ser reconhecidos por sociedades
residentes em jurisdições com baixa ou nenhuma tributação, enquanto a
legislação tributária dos Estados Unidos permitia, até muito recentemente,
o diferimento da tributação até o momento em que os lucros fossem
repatriados570.

As regras de transfer pricing exigem a alocação de uma base tributável


apropriada para as jurisdições envolvidas em transações internacionais e,
em geral, estabelecem que partes relacionadas transacionando entre si
devem praticar preços que teriam cobrado em transações entre partes não
relacionadas, tendo em vista transações e circunstâncias comparáveis. É a
aplicação do chamado “arm’s length standard”, expressamente
reconhecido na legislação dos Estados Unidos e dos países que integram a
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)

1495
como a base sobre a qual todas as regras de preços de transferência são
desenvolvidas e aplicadas pelas autoridades fiscais.

No que diz respeito às operações entre partes relacionadas envolvendo


intangíveis nos Estados Unidos, a última sentença do artigo 482 do
Internal Revenue Code571 (IRC) determina que, no caso de qualquer
transferência (ou licença) de ativo intangível, na acepção do artigo 936(h)
(3)(B), o rendimento em relação a essa transferência ou licença deve ser
proporcional ao rendimento atribuível ao intangível. A última sentença do
artigo 482 do IRC foi incluída pelo Tax Reform Act of 1986 e refere-se ao
“commensurate with income standard”572, o qual exige que preços de
transferência utilizados demostrem que o retorno obtido pela sociedade
responsável pelo desenvolvimento do intangível seja proporcional aos
rendimentos atribuídos a este mesmo ativo573.

Historicamente, a posição do IRS e do Departamento do Tesouro norte-


americano sempre foi que o arm’s length standard representa a espinha
dorsal do arcabouço legal que embasa as regras norte-americanas de
preços de transferência, tendo rejeitado qualquer interpretação do IRC que
fosse além do arm’s length standard574.

Neste contexto, os Cost Sharing Agreements (CSAs) têm sido objeto de


intensa discussão política e jurídica575, não apenas nos Estados Unidos mas
também no contexto do Projeto Base Erosion and Profit Shifting (BEPS)
da OCDE. O CSA é um acordo formal e escrito pelo qual os participantes
compartilham custos de pesquisa e desenvolvimento de intangíveis na
proporção de sua participação nos benefícios razoavelmente esperados
(reasonably anticipated benefits – RABs) resultantes da exploração de
seus interesses nos intangíveis. Os participantes também ganham o direito

1496
de compartilhar intangíveis pré-existentes, i.e., desenvolvidos antes da
execução do CSA e que podem ser contribuídos por um dos participantes.

O benefício fiscal de um CSA é que todos os participantes são


considerados proprietários de seus respectivos interesses nos intangíveis
criados (e contribuídos), sem a aplicação das regras gerais de transfer
pricing relativas a intangíveis576. O participante do CSA não é obrigado a
pagar arm’s length royalties durante o período de utilização do intangível,
devendo apenas arcar com parte do custo incorrido para o
desenvolvimento e pesquisa do ativo577. O CSA permite, então, que os
participantes possam financiar em conjunto novos projetos de pesquisa e
desenvolvimento, e a propriedade de novos intangíveis criados é dividida
previamente.

Os pagamentos de compartilhamento de custos não são considerados


rendimentos auferidos pelos beneficiários, mas apenas reduzem os custos
que seriam dedutíveis da parte em que originalmente incorreram578.

Mais relevante para fins do presente artigo, os participantes de um CSA


também devem fazer um buy-in payment579. O buy-in serve para remunerar
um dos participantes do CSA pela contribuição do direito de uso relativo a
intangíveis pré-existentes utilizados (a) na fabricação e venda de produtos
atuais e (b) no desenvolvimento e pesquisa de novos intangíveis e
produtos. O buy-in é tratado como renda tributável para o beneficiário e,
em geral, configura despesa dedutível para o pagador.

Atualmente, a principal disputa entre IRS e contribuintes é exatamente


o montante de buy-in a ser reconhecido para fins fiscais. O IRS tem
expressado preocupação nas abordagens utilizadas pelos contribuintes para
avaliar os ativos pré-existentes, alegando que as empresas, principalmente

1497
do setor de tecnologia, têm adotado técnicas para subestimar o valor dos
intangíveis pré-existentes, resultando em prejuízo aos cofres do governo580.

Para exemplificar, considere que uma sociedade norte-americana (US


Corp.) possui um intangível, e a pesquisa e desenvolvimento dos
intangíveis é realizada nos Estados Unidos. A US Corp. decide expandir
suas atividades no exterior e inicia suas vendas por distribuidores
independentes. A US Corp. decide, então, constituir uma subsidiária,
residente em jurisdição de baixa tributação (Offshore), atribui à Offshore
os contratos estrangeiros e assina um CSA para desenvolver a próxima
linha de produtos a serem vendidos no exterior. O CSA estabelece que a
Offshore passará a possuir todos os direitos para licenciar a nova linha de
produtos a serem vendidos fora dos Estados Unidos.

Embora um centro menor de pesquisa e desenvolvimento seja


organizado pela Offshore, o trabalho de pesquisa e desenvolvimento
relevante continua a ser realizado nos Estados Unidos. Considerando a
contribuição da versão antiga dos produtos para o CSA pela US Corp., a
Offshore é obrigada a pagar um buy-in em favor da US Corp.
Posteriormente, todas as receitas geradas pela Offshore pela venda de
novos produtos no exterior estarão sujeitas à tributação no país de
residência da Offshore, a não ser que os lucros sejam repatriados, tendo em
vista que as regras de Controlled Foreign Corporation (CFC) norte-
americanas, ao menos até a aprovação da reforma tributária em dezembro
de 2017, não tratavam a receita ativa reconhecida pela Offshore como
sujeita ao regime de tributação automática581.

O IRS argumenta que muitas empresas estão usando a estrutura de CSA


como uma maneira eficiente para fornecer acesso à propriedade intelectual
e outros intangíveis detidos pela controladora, transferindo também as

1498
receitas futuras para sociedades offshore residentes em outros países,
resultando em redução considerável da alíquota global efetiva das
MNEs582. A OCDE, no âmbito do Projeto BEPS, levantou esse mesmo
argumento para justificar a alteração das suas diretrizes para regras de
preços de transferência.

As empresas de tecnologia norte-americanas argumentam que outros


países desenvolvidos têm migrado para um sistema de tributação
territorial, ou adotam regimes de “patent box” para atrair empresas
detentoras de intangíveis, o que, aliado a alta tributação sobre a renda nos
Estados Unidos sobre rendimentos do exterior, as coloca em desvantagem
competitiva.

Além da postura mais agressiva adotada pelo IRS, o governo Obama


tentou alterar o artigo 482 do IRC por meio de propostas para refletir
abordagens econômicas e jurídicas desenvolvidas pelo IRS583. Nenhuma
dessas propostas foi aprovada pelo Congresso, e a única solução
encontrada pelo Poder Executivo foi a publicação de várias Treasury
Regulations584 (Regulations).

A dificuldade é que a determinação do montante a ser pago como buy-


in envolve complexa análise de valuation, influenciada por argumentos
muitas vezes subjetivos e pesquisas empíricas em economia, estatística,
psicologia comportamental, finanças etc.585.

A posição adotada pelo IRS foi discutida em detalhes em casos julgados


pelo United States Tax Court586 (Tax Court), tanto no caso Veritas, como
no recente caso da Amazon. Ambos os casos abordaram a questão do buy-
in payment e, como veremos, representaram grande revés para o IRS.
Juntamente com a decisão do Tax Court proferida no caso Altera, esses

1499
casos revelam que a adoção do arm’s length standard geralmente impede a
aplicação da teoria econômica defendida pelo IRS em casos de CSA, um
ponto que também foi reconhecido pela própria OCDE quando do
lançamento do Projeto BEPS.

Em 16 de dezembro de 2011, o IRS e o Departamento do Tesouro


emitiram as chamadas Final Regulations relativas aos CSAs, a fim de
reforçar as posições do IRS para combater o planejamento tributário
implementado pelas empresas de tecnologia. A eficácia dessas novas
regras para resolver a disputa, no entanto, é altamente questionável.

A questão dos CSAs também esteve no centro do debate de reforma


tributária dos Estados Unidos. No relatório emitido pelo Joint Committee
on Taxation (JCT), no início do processo da reforma, foi divulgado que
lucros decorrentes da exploração de intangíveis representam grande parte
dos lucros transferidos por empresas norte-americanas para jurisdições de
baixa tributação. Além disso, a questão envolvendo intangíveis e CSAs
também foi objeto da Ação n. 8 do Projeto BEPS, a qual alterou o Capítulo
8 das diretrizes de preços de transferência (Transfer Pricing Guidelines).

Neste artigo, pretendemos explorar em maiores detalhes a discussão do


buy-in, o impacto das Final Regulations e dos casos Veritas e Amazon, e
como o debate se relaciona com os relatórios finais do Projeto BEPS e o
projeto de reforma tributária dos Estados Unidos aprovado pelo Congresso
norte-americano em dezembro de 2017.

II. O CASO VERITAS

No caso Veritas, a Veritas US (matriz) atuava no desenvolvimento,


fabricação e comercialização de software avançado para gerenciamento e
armazenamento. Para expandir seus negócios no exterior, a Veritas US

1500
constituiu uma subsidiária na Irlanda, a Veritas Irlanda, e celebrou um
CSA que consistia em um acordo de compartilhamento de custos de
pesquisa e desenvolvimento e uma licença para tecnologia pré-existente. A
subsidiária estrangeira efetuou pagamentos de buy-in a favor da Veritas
US, calculados de acordo com o método de transações não controladas
(comparable uncontrolled transactions – CUT).

O IRS lavrou auto de infração suportado pela análise de um economista


independente que justificou seus cálculos com base no método de renda
(income method) para mensurar o valor do buy-in. O IRS concluiu que o
pagamento do buy-in deveria ter sido de US$ 2,5 bilhões, um montante
que antes do julgamento foi reduzido para US$ 1,6 bilhão.

O cálculo do IRS supôs que a transferência dos intangíveis pré-


existentes seria comparável a uma “venda do negócio” (“akin to a sale”
theory) explorado pela Veritas US e deveria ser analisada como tal para
fins fiscais. O IRS agregou os intangíveis e defendeu que os ativos
possuíam sinergias consideráveis, de forma que o “pacote” como um todo
deveria ser mais valioso do que cada ativo intangível considerado
individualmente. Esse argumento do IRS está relacionado ao entendimento
de que os pagamentos de buy-in devem compensar o contribuinte residente
nos Estados Unidos pela rentabilidade futura do negócio transferido, ou
seja, deve-se considerar que a empresa norte-americana transferiu um
fluxo de rentabilidade em perpetuidade e, por isso, deveria reconhecer e
tributar a receita “perdida” nos Estados Unidos em conformidade com a
essência da transação.

A abordagem adotada pelo IRS originou vários outros argumentos: (a)


os intangíveis abrangidos pelo pagamento do buy-in não seriam apenas os
intangíveis pré-existentes, mas também os intangíveis e os direitos

1501
subsequentemente desenvolvidos durante a vida do CSA; (b) a vida útil
dos intangíveis pré-existentes era perpétua, uma vez que tais intangíveis
representavam a base de conhecimento necessária para desenvolver
intangíveis futuros gerados por meio do CSA; e (c) o método da renda
(income method), baseado primordialmente em uma análise de fluxo de
caixa descontado (DCF) seria o método mais confiável para determinar o
buy-in.

O Tax Court rejeitou a abordagem do IRS e decidiu a favor da Veritas.


A decisão aceitou o método CUT adotado pela Veritas com alguns ajustes.
O tribunal também determinou que os intangíveis, tal como definidos pela
legislação norte-americana, não abrangem itens como acesso a uma equipe
de pesquisa e desenvolvimento ou marketing.

O tribunal ainda rejeitou a inclusão de intangíveis desenvolvidos após o


início do CSA para fins da mensuração do buy-in, afirmando que o
pagamento de buy-in deve basear-se unicamente nos intangíveis pré-
existentes. Em linha com esse entendimento, o Tax Court também rejeitou
o entendimento de que os intangíveis pré-existentes transferidos teriam
vida útil indefinida. O tribunal mensurou o pagamento de buy-in usando os
contratos com terceiros da Veritas, que transferiam apenas direitos de
fabricação ou venda (make-or-sell rights).

III. O CASO AMAZON

No caso Amazon, o auto de infração lavrado pelo IRS contra a


Amazon.com, Inc. surgiu de uma série de transações pelas quais a Amazon
US transferiu para a Amazon Europe Holding Technologies SCS (Amazon
Europa), sociedade residente em Luxemburgo, os ativos intangíveis
necessários para operar o negócio do site europeu da Amazon.

1502
A Amazon US e a Amazon Europa firmaram um CSA, o qual exigiu
que a Amazon Europa fizesse um pagamento de buy-in para compensar a
Amazon US pelos seguintes intangíveis transferidos: (a) software e outras
tecnologias necessárias para operar os sites europeus, centros de
atendimento e atividades comerciais relacionadas; (b) intangíveis de
marketing, incluindo marcas registradas, nomes comerciais e nomes de
domínio; e (c) listas de clientes e outras informações relativas a clientes
europeus.

Os argumentos utilizados pelo IRS como fundamento do auto de


infração são, em geral, muito semelhantes aos abordados acima em relação
ao caso Veritas. Novamente, a decisão do Tax Court declarou que o
pagamento do buy-in tem a função de compensar unicamente pelo uso de
intangíveis pré-existentes; consequentemente, a compensação por
intangíveis desenvolvidos após o CSA não deve ser objeto do pagamento
de buy-in.

O tribunal aplicou o mesmo entendimento defendido no caso Veritas:


ao avaliar os intangíveis de curta duração como se tivessem uma vida
perpétua, o IRS indevidamente incluiu na avaliação dos ativos o valor dos
intangíveis posteriormente desenvolvidos sob o CSA, o que não seria
permitido pela legislação tributária em vigor à época dos fatos.

O IRS também tentou apoiar sua posição com base no princípio da


alternativa realista (realistic alternative principle), argumentando que, se
estivesse lidando com partes não relacionadas, a Amazon US preferiria
manter todos os seus intangíveis nos Estados Unidos, pois firmar o CSA
daria ao seu concorrente acesso às suas “joias da coroa”. Com base neste
raciocínio, o IRS argumentou que o método DCF seria o único razoável
para capturar o valor dessa alternativa realista. O tribunal também rejeitou

1503
esse argumento. O juiz Lauber afirmou que esse raciocínio tornaria o
próprio conceito de CSA inútil, porque as partes sempre teriam a
alternativa realista de não firnar um CSA, e defendeu que o artigo 1.482-
1(f)(2)(ii)(A) das Regulations impõe ao IRS analisar os resultados de uma
transação tal como estruturada pelo contribuintes, a menos que a estrutura
adotada não apresente substância econômica587.

IV. AS FINAL REGULATIONS EMITIDAS EM 2011

Em 16 de dezembro de 2011, o IRS e o Departamento do Tesouro


norte-americano emitiram as Final Regulations, que não foram analisadas
nos casos Veritas e Amazon. O preâmbulo das novas regras configura um
endosso ao método de renda e às abordagens de agregação em muitos
casos. Elas também estabeleceram o “modelo de investidor”588 e o
princípio da alternativa realista.

De acordo com o novo regime, a análise do buy-in deverá ser feita com
base no retorno esperado do participante, ajustado pelos riscos assumidos,
em seu investimento total no CSA. Quando um participante não faz uma
contribuição inicial ao CSA, ele tem direito a um retorno limitado de
investimento589. Essa abordagem também exige que os pagamentos de buy-
in sejam avaliados com base nas abordagens de avaliação de agregação
que considerem todo o período durante o qual os intangíveis desenvolvidos
pelo CSA devem gerar renda.

As Final Regulations trouxeram pontos relevantes para reforçar a


posição do IRS, tal como (a) ampliação da definição de buy-in, a fim de
incluir como objeto do pagamento todo e qualquer insumo que leve ao
desenvolvimento de intangíveis em um CSA; (b) adoção da abordagem de
agregação dos ativos para fornecer o resultado mais confiável; (c) adoção

1504
do “modelo de investidor”, no qual a vida útil dos intangíveis seria
equivalente ao período durante o qual os participantes razoavelmente
antecipam que se beneficiarão de retornos financeiros; e (d) adoção do
método de renda como método mais confiável para atingir o arm´s length
standard.

Com a promulgação das Final Regulations, reconhece-se que o IRS


possui ferramentas efetivas para questionar contribuintes que transfiram
intangíveis de grande valor para fora dos Estados Unidos em função de um
CSA590. No entanto, é razoável argumentar que as decisões proferidas pelo
Tax Court nos casos Veritas e Amazon enfatizam princípios legais sobre
como aplicar o arm’s length standard nos termos do artigo 482 do IRC, de
forma que o IRS pode continuar com dificuldades para fazer prevalecer
sua posição na discussão de buy-in.

Muitos especialistas argumentam, por exemplo, que os tribunais podem


não aceitar que algum valor adicional deva ser reconhecido para fins do
buy-in apenas sob o pressuposto teórico de que os intangíveis contribuem
para o desenvolvimento de novos intangíveis. O desenvolvimento de
intangíveis futuros é exatamente o propósito dos CSAs, razão pela qual o
valor a ser potencialmente desenvolvido por meio do CSA não deve ser
considerado na mensuração do buy-in591.

O Tax Court, nos casos Veritas e Amazon, afastou a posição defendida


pelo IRS também sob o argumento de que as empresas em questão
atuavam em mercados de tecnologia que exigem inovação constante,
contrariando a premissa do IRS de que os intangíveis utilizados pelas
empresas durariam indefinidamente e apresentariam valor relevante para
novas pesquisas e desenvolvimento de futuros intangíveis.

1505
O juiz Foley mencionou expressamente que

na indústria dinâmica de software de armazenamento, produtos com função de


última geração perdem valor rapidamente conforme a funcionalidade em questão é
duplicada por concorrentes ou substituída por novas tecnologias. Mesmo com
substancial e constante pesquisa e desenvolvimento (P&D), os produtos da
VERITAS US tiveram ciclos de vida definidos. A concorrência intensa (ou seja, de
OEMs que oferecem produtos comparáveis) e o rápido ritmo de avanços
tecnológicos forçaram a VERITAS US a inovar constantemente. No momento em
que um novo modelo de produto ficou disponível para compra, a próxima geração
já estava em desenvolvimento.

O entendimento do tribunal é importante, porque demonstra que as


novas regras relativas a CSAs não podem ignorar que o processo de
pesquisa e desenvolvimento utilizado pelas empresas que atuam no setor
de tecnologia e internet muda drasticamente. Por isso, o conceito de
contribuição compensável pelo buy-in defendido pelo IRS sob as novas
regras pode ser irrelevante.

A potencial fragilidade do conceito de contribuição compensável pelo


buy-in também pode prejudicar a posição do IRS na discussão relativa à
vida útil dos intangíveis pré-existentes, na medida em que essa abordagem
está intimamente relacionada ao valor concedido aos intangíveis pré-
existentes como relevantes para pesquisas e desenvolvimento de
intangíveis futuros. O Tax Court declarou no caso Veritas que a vida útil
relevante dos intangíveis pré-existentes era sua vida útil sem incluir
pesquisa e desenvolvimento futuros, e citou a opinião de peritos do próprio
IRS no sentido de que os intangíveis pré-existentes perderiam o seu valor
dentro de dois a quatro anos sem pesquisas adicionais.

Não bastasse isso, o Tax Court considerou ainda que, sob uma
alternativa de licença dos direitos, as partes geralmente concordam em

1506
reduzir as taxas de royalties para considerar a obsolescência gradual da
tecnologia objeto do contrato de licença.

Adicionalmente, a decisão proferida nos casos Veritas e Amazon


examinou cada ativo individualmente e descartou a posição do IRS porque
alguns dos ativos incluídos nos autos de infração não estavam sendo
transferidos ou não tinham valor significativo comprovado. No caso
Veritas, o Tax Court destacou que as Regulations em vigor, no artigo
1.482-1(f)(2)(i)(A), autorizavam a abordagem de agregação se essa
produzisse os meios mais confiáveis para determinar a contrapartida
devida em linha com o arm’s length standard, mas também declarou que
tratar a transferência no CSA como semelhante a uma “venda do negócio”
não produz o resultado mais confiável, descartando a agregação feita pelo
IRS.

As decisões do Tax Court observaram que, mesmo que o IRS estivesse


autorizado a usar a abordagem de agregação, a teoria da “venda do
negócio” violava o artigo 1.482-1(f)(2)(ii)(A) das Regulations, pois as
autoridades fiscais devem respeitar os resultados de uma transação tal
como estruturada pelos contribuintes, a menos que a estrutura utilizada não
tenha substância econômica.

Quando o tribunal rejeitou a teoria de “venda do negócio” defendida


pelo IRS nos casos Veritas e Amazon, é razoável argumentar que essa
decisão representa um forte golpe contra a estratégia do IRS. Os
argumentos relacionados à vida útil dos intangíveis transferidos, o uso da
abordagem agregada e até mesmo a confiabilidade do método de renda
estão intimamente conectados à teoria da “venda do negócio”. Se o IRS
não convencer o tribunal de que a teoria deve ser aceita, muitos dos outros
argumentos sustentados pelo IRS podem ser prejudicados.

1507
Outro ponto importante feito especialmente no caso Veritas relaciona-se
ao uso do método CUT pelos contribuintes. Embora o Tax Court tenha
indicado que deveria limitar a análise aos métodos previstos nas
Regulations em vigor ao tempo dos fatos, a decisão explicou o motivo pelo
qual os acordos com terceiros eram comparáveis e deveriam fornecer o
resultado mais confiável, o que ainda poderia ser aplicável em casos
futuros diante da subjetividade inerente ao método da renda.

Para finalizar, e esse talvez seja o ponto mais relevante, tem-se que a
invalidação de Regulations que não atendem ao princípio arm’s length não
é novidade nas discussões de preços de transferência nos Estados Unidos.
Em 27 de julho de 2015, ao analisar o caso Altera, o Tax Court invalidou
parte das Regulations que exigiam que os participantes de um CSA
compartilhassem custos relacionados a pagamentos baseados em ações
(SBC). A decisão unânime (15-0) proferida pelo tribunal estabeleceu o
princípio de que a abordagem do IRS, ao lidar com preços de
transferência, deve ser vinculada à forma como as transações são
efetivamente realizadas entre partes não relacionadas.

No caso Altera, a Altera Corporation (Altera) firmou um CSA com sua


subsidiária localizada nas Ilhas Cayman (Altera CI). Entre 2004 e 2007, a
Altera concedeu opções de compra de ações e outros SBC para alguns
funcionários, e o SBC relacionado ao programa de pesquisa e
desenvolvimento não foi incluído no pool de custos objeto do CSA.

O principal ponto de discussão para o Tax Court era se acordos


firmados por partes não relacionadas estabeleciam ou não o rateio de
custos com SBC. Como as autoridades fiscais não demonstraram, com
base em uma análise empírica, que partes não relacionadas

1508
compartilhavam custos com SBC, o tribunal considerou que as
Regulations eram inconsistentes com o princípio arm’s length.

A decisão proferida no caso Altera reforça assim a posição que pode ser
adotada pelos contribuintes ao questionar autos de infração envolvendo
pagamentos de buy-in, ainda que os questionamentos estejam embasados
nas Final Regulations. Com base no caso Altera, os contribuintes
poderiam alegar que qualquer regra que esteja supostamente em acordo
com o arm’s length standard deve basear-se em evidências empíricas que
refletem a maneira como partes não relacionadas se comportam em
circunstâncias semelhantes, independentemente de construções teóricas
sobre como partes não relacionadas devem transacionar em um cenário
racional do ponto de vista econômico.

O professor Reuven S. Avi-Yonah observou que a perda do IRS no caso


Veritas resultou do fato de que o governo não está disposto a defender a
teoria de que o princípio arm’s length não se aplicaria aos CSAs. Na
opinião do referido autor, o IRS teria melhores chances se defendesse que
o padrão correto para decidir os casos de CSA é o commensurate with
income, de tal forma que as regras de CSA deveriam ser interpretadas
como uma implementação da regra do super-royalty adicionada pelo
Congresso norte-americano ao artigo 482 do IRC em 1986592.

Michael Schler também chama atenção aos problemas fundamentais


gerados pela aplicação do arm’s length standard aos CSAs, tendo em vista
que “uma transação entre partes relacionadas é inerentemente diferente e
não comparável a uma transação com partes não relacionadas”593.

O primeiro problema fundamental é que a transferência de risco dentro


do mesmo grupo econômico muitas vezes não apresenta motivos

1509
econômicos, mas apenas fiscais. Consequentemente, as transações entre
partes relacionadas são inerentemente não comparáveis às transações entre
partes não relacionadas. O segundo problema fundamental é que as partes
relacionadas geralmente realizarão transações que partes não relacionadas
nem sequer cogitariam colocar em prática.

No contexto de um CSA, não há dúvida de que partes relacionadas


concordariam em compartilhar intangíveis essenciais em troca de um
preço baixo ou alto. A única diferença em relação ao montante da
contraprestação é o efeito tributário dos preços praticados entre as partes
relacionadas. Pelo contrário, partes não relacionadas provavelmente nunca
concordariam em compartilhar seus principais intangíveis a depender do
preço negociado. Portanto, a transação simplesmente não seria
implementada com uma parte não relacionada, e é conceitualmente
incoerente tentar determinar o preço de mercado com base em uma
transação hipotética com uma parte não relacionada.

Por último, o terceiro problema fundamental é que o objetivo de um


grupo econômico é gerar maiores eficiências pela estruturação de cadeias
de fornecimento globais e atividades integradas de pesquisa, vendas,
administração e marketing. E porque esses tipos de eficiência não ocorrem
nas transações entre partes não relacionadas, é quase impossível valorizar
cada transação com base no preço das transações entre partes não
relacionadas.

Ao que parece, portanto, contribuintes, principalmente empresas que


atuam no setor de tecnologia e têm como base de sua produção a pesquisa
e o desenvolvimento de intangíveis, e o Governo norte-americano
continuarão a gastar relevantes recursos financeiros e tempo para discutir a
questão.

1510
A menos que haja uma alteração de paradigma para estabelecer que o
arm’s length standard não deve ser aplicável quando o commensurate with
income produz o resultado mais apropriado nos CSAs, as Final
Regulations ainda poderiam ser inúteis para suportar o esforço do IRS na
disputa de buy-in, de forma semelhante ao ocorrido no caso Altera quanto
à inclusão dos custos de SBC em um CSA. Simultaneamente, o cenário
traz grande insegurança jurídica para empresas de tecnologia estruturarem
suas operações no exterior, pois ainda que os preços praticados estejam
alinhados com a legislação em vigor e o arm´s length standard, há grandes
chances de questionamento por parte das autoridades fiscais.

V. O PROJETO BEPS E A REFORMA TRIBUTÁRIA DOS ESTADOS


UNIDOS

O Projeto BEPS, desenvolvido pela OCDE com participação dos países


do G20, tem como objetivo combater a erosão da base tributária e
transferência de lucros ao exterior por meio de planejamentos tributários
implementados por MNEs, sob o pressuposto de que tais planejamentos
representam grave risco à receita, soberania e equidade fiscal dos países.
Em termos gerais, o projeto consiste em um plano de ação global com base
em análise dos principais pontos de preocupação identificados pelo plano
com o intuito de encontrar soluções concretas de realinhamento das
normas tributárias internacionais dos países.

Uma das áreas de foco do Projeto BEPS está justamente relacionada às


regras de transfer pricing, mais especificamente no que diz respeito à
transferência de riscos e intangíveis, divisão artificial da propriedade de
intangíveis entre empresas de um mesmo grupo, bem como às transações
entre empresas do mesmo grupo que normalmente não ocorreriam entre
partes não relacionadas. Inclusive, o relatório inicial divulgado pela OCDE

1511
listou a estrutura de CSA como exemplo de estrutura de planejamento
tributário das MNEs que resulta em BEPS.

As ações 8 a 10 do Projeto BEPS têm como intuito assegurar que a


distribuição de resultados de preços de transferência esteja em linha com
as condutas efetivamente realizadas pelas empresas de um mesmo grupo,
além do controle dos riscos assumidos e a geração de valor na cadeia de
negócios, tendo em vista, principalmente, análises sobre intangíveis, riscos
e capital. A OCDE determinou que, se as contribuições e benefícios
decorrentes de um CSA não são devidamente avaliadas, o CSA resulta em
transferência de lucros ao exterior da jurisdição em que há criação de valor
para a jurisdição em que as atividades econômicas são desempenhadas.

A nova versão do Capítulo VI das Transfer Pricing Guidelines procura


assegurar que os lucros decorrentes da transferência e exploração de
intangíveis sejam apropriadamente alocados de acordo com a criação de
valor, tal como um novo método para endereçar a transferência de
intangíveis de difícil mensuração (hard-to-value intangibles – HTVI).

No que diz respeito à identificação dos intangíveis sob o Projeto BEPS,


o relatório final determina que dificuldades podem resultar de definições
de intangíveis que sejam muito restritas ou amplas. Uma definição restrita
pode resultar em Governos ou contribuintes argumentando que algo cai
fora da definição, e o resultado seria permitir o uso ou transferência de
intangível sem compensação onde essa transferência teria sido
compensada em condições arm’s length. Uma ampla definição pode ter o
resultado oposto, ou seja, qualquer valor deveria representar um ativo
intangível594.

1512
A orientação final do Projeto BEPS define um ativo intangível para fins
de preços de transferência como algo que não é físico ou ativo financeiro,
que é capaz de ser de propriedade ou controlado para uso em atividades
comerciais, e cujo uso ou transferência seriam compensados se ocorresse
em transação entre partes independentes em circunstâncias comparáveis595.
Essa definição não se encontrava nas diretrizes emitidas pela OCDE em
2010.

O relatório final fornece alguns exemplos de intangíveis que se


encaixariam nessa definição, incluindo tanto propriedade intelectual,
patentes e marcas, passíveis de registro, quanto outros ativos como know-
how, segredos comerciais e direitos contratuais. O relatório indica certos
fatores que, embora possam contribuir para o rendimento obtido por uma
empresa, tais como sinergias e características específicas de mercados
locais, não são eles próprios intangíveis. Esses fatores devem ser tratados
como fatores de comparabilidade em uma análise de preços de
transferência.

O relatório final é claro ao dispor que o propósito de fornecer uma


definição de intangíveis é exclusivamente para fornecer clareza às
autoridades fiscais e contribuintes na identificação de intangíveis para fins
de preços de transferência. Não se destina a ter qualquer impacto em
outras questões tributárias, tais como a definição de royalties nos termos
do artigo 12 do Modelo de Imposto Convenção, ou no reconhecimento de
renda, capitalização de custos de desenvolvimento, amortização, ou outras
questões fiscais relacionadas a intangível596.

O relatório final apresenta ainda orientação sobre a questão fundamental


de qual entidade ou entidades dentro de um grupo multinacional devem
compartilhar os retornos econômicos decorrentes da exploração de

1513
intangíveis. As novas diretrizes esclarecem que a mera propriedade legal
de um intangível não confere por si só direito ao retorno da sua
exploração. Em vez disso, o retorno econômico de intangíveis e os custos e
os encargos econômicos associados com intangíveis serão alocados para as
entidades que executam e controlem funções de criação de valor que
consistem em desenvolver, aprimorar, manter, proteger e explorar os
intangíveis (developing, enhancing, maintaining, protecting and exploiting
– DEMPE)597.

Em essência, a aplicação desse conceito indica que: (a) uma empresa


que não detém a propriedade legal de um intangível, mas executa funções
DEMPE, tem direito a uma compensação arm´s length, e a natureza dessa
remuneração considerará quais entidades assumem e controlam os riscos
associados às funções DEMPE; (b) uma empresa que assume
contratualmente o risco associado às funções DEMPE (por exemplo,
assume o risco financeiro associado com o desenvolvimento do intangível)
deve reconhecer as consequências financeiras associadas ao risco, desde
que essa mesma empresa exerça controle funcional sobre o risco.

Para uma empresa exercer controle sobre o risco ela deve ter a
capacidade de tomar a decisão de assumir, renunciar ou recusar a
oportunidade de tomada de risco, e a capacidade de tomada de decisão
sobre se e como responder ao risco associado à oportunidade. O relatório
reconhece que o gerenciamento rotineiro do risco pode ser terceirizado
para outras empresas, desde que a empresa que controle o risco detenha a
capacidade de tomar a decisão de terceirizar o risco e supervisionar o
trabalho de gerenciamento do risco.

Uma empresa que financia o desenvolvimento de um intangível, mas


não executa ou controla qualquer função DEMPE relativa ao intangível

1514
geralmente espera um retorno ajustado sobre o seu investimento em
financiar o projeto (ou seja, retorno esperado semelhante ao retorno que
poderia ser alcançado ao financiar um projeto comparável de risco
semelhante). Se a empresa não exerce controle sobre os riscos financeiros
associados ao financiamento, então não tem direito a mais do que um
retorno sem risco.

Ao abordar métodos de transfer pricing baseados em projeções de fluxo


de caixa descontado598, tal como o método de renda discutido nos casos
Veritas e Amazon, o relatório final da OCDE estabelece que tais técnicas
podem ser ferramentas úteis para avaliar transações envolvendo
intangíveis, na ausência de comparáveis não controlados confiáveis, e
pode fornecer resultados mais confiáveis que qualquer outro método de
precificação.

Quando tal técnica for utilizada, o relatório reconhece que é necessário


aplicá-la de maneira consistente com o arm´s length standard e outros
princípios das diretrizes da OCDE. Especial cuidado deve ser aplicado na
utilização de projeções financeiras e avaliações preparadas para outros
propósitos, e cuidados especiais devem ser considerados para entender e
validar os pressupostos subjacentes a qualquer modelo de avaliação, já que
pequenas mudanças nos parâmetros de avaliação podem ter um impacto
significativo na estimativa de valor do intangível.

Uma novidade do Projeto BEPS foi abordar como mensurar e avaliar os


HTVI599, os quais são definidos como “intangíveis” ou direitos em
intangíveis para os quais, ao tempo de transferência entre empresas
associadas, (a) não existem comparáveis confiáveis; e (b) no momento de
execução da transação, as projeções de fluxos de caixa ou renda futura, ou
mesmo os pressupostos utilizados na avaliação do intangível são altamente

1515
incertos, tornando difícil prever o nível de sucesso final do intangível no
momento da transferência. O relatório identifica que transações com HTVI
podem envolver, justamente, intangíveis utilizados em conexão ou
desenvolvidos sob um CSA.

No que diz respeito aos CSAs, as novas diretrizes procuraram alinhar a


orientação sobre CSAs com as novas orientações encontradas nos outros
capítulos das diretrizes em relação, principalmente, aos conceitos de
controle de risco e transações envolvendo intangíveis. Em particular, as
novas diretrizes procuram garantir que os resultados de um CSA e os
retornos aos participantes devem ser semelhantes a qualquer outro contrato
ou operação que tenha características econômicas semelhantes600.

Uma grande novidade é que o conceito de controle abordado acima


também se tornou um pré-requisito para uma empresa ser considerada
participante do CSA. Todo participante em um CSA deve ter capacidade
funcional para exercer controle sobre os riscos assumidos em um CSA, e a
capacidade financeira para assumir tais riscos.

Sobre o buy-in payment, as novas diretrizes não sofreram alterações


substanciais, e continuam a reconhecer que contribuições feitas no início
do CSA, ou mesmo quando houver alguma entrada de novo participante,
devem ser compensadas de acordo com o arm´s length standard601.
Portanto, embora o tema do buy-in tenha gerado intensa discussão nos
Estados Unidos e tenha sido reconhecido como uma preocupação no
relatório inicial do Projeto BEPS, a OCDE não forneceu expressamente
novos métodos computacionais para determinar buy-ins.

De qualquer forma, mesmo no âmbito do BEPS, a OCDE ratifica seu


entendimento de que o princípio arm’s length é reconhecido como o

1516
parâmetro internacional a ser utilizado pelos membros da OCDE,
concluindo que o princípio está fundamentado em teoria sólida, produz os
resultados mais razoáveis em termos de rendimentos a serem reconhecidos
em transações intragrupo e defendendo que um abandono do princípio
poderia ameaçar o consenso internacional em torno das discussões de
transfer pricing e, assim, gerar dupla tributação em diversas situações.

Vale lembrar que, ao menos no início, o Projeto BEPS havia elevado a


possibilidade de que a OCDE pudesse expressamente afastar-se da estrita
adesão ao padrão arm´s length. Por exemplo, quando do lançamento do
Projeto BEPS, a OCDE divulgou o seu entendimento de que o padrão arm
´s length permitiu às MNEs transferir os lucros decorrentes da exploração
de ativos intangíveis para jurisdições de baixa tributação e que medidas
especiais, dentro ou fora do parâmetro arm´s length, poderiam ser
necessárias para abordar as falhas do padrão anteriormente adotado pela
OCDE.

Em última análise, no entanto, o Projeto BEPS resultou em um endosso


mais claro ao padrão arm´s length, mesmo que algumas de suas
recomendações específicas pareçam ser inconsistentes com esse princípio.
No seu formato final, ainda que os novos conceitos trazidos pelo Projeto
BEPS possam favorecer, de alguma forma, a posição das autoridades
fiscais para impedir planejamentos tributários por meio de um CSA, tal
como o IRS vem tentando há anos, especialistas norte-americanos criticam
a posição do Projeto BEPS ao não ter levado adiante a possibilidade de as
regras de transfer pricing colocarem menos ênfase no arm´s length
standard e basearem-se mais no padrão commensurate with income, o que
seria mais eficiente para mitigar as estruturas utilizadas pelas empresas de
tecnologia norte-americanas602.

1517
Em outras palavras, argumenta-se que, embora o Projeto BEPS tenha
tentado endereçar a questão, as soluções propostas no formato final do
projeto teriam pouco efeito prático, considerando-se a dependência das
regras ao arm´s length standard. A experiência norte-americana, abordada
acima quando da análise dos casos julgados pelo Tax Court, seria uma
demonstração de que, para combater estruturas de CSA, confiar no arm´s
length standard talvez não seja o melhor caminho.

Por outro lado, também deve ser reconhecido que a relutância em


abandonar o arm´s length standard está relacionada ao fato de que o
princípio commensurate with income também pode gerar outras discussões
dada a sua insegurança, subjetividade e risco de dupla tributação.

Ao que tudo indica, o que resta às autoridades fiscais que procuram


combater o tipo de planejamento abordado acima no curto e médio prazo,
tal como o IRS, seria modificar sua legislação interna e criar regras
específicas contra a erosão da base tributária e transferência de lucros ao
exterior, ainda que essas regras específicas não estejam diretamente
relacionadas às regras de transfer pricing e, ao mesmo tempo, tornar o seu
sistema tributário mais atrativo para seus próprios contribuintes. Grande
exemplo disso é a reforma tributária recentemente aprovada nos Estados
Unidos, que traz disposições específicas para endereçar o problema.

Em primeiro lugar, a legislação aprovada pelo Congresso norte-


americano estabeleceu redução substancial na alíquota de imposto de
renda federal das empresas, de 35% para 21%. A alíquota de 21% fará
com que a alíquota conjunta de imposto sobre a renda das empresas nos
Estados Unidos, que também compreende o imposto de renda estadual e
local, seja reduzida para 25,75%, contra a alíquota conjunta anterior de
38,9%. Essa nova alíquota ainda será dois pontos percentuais maior do que

1518
a alíquota média de 23,75% para os demais países da OCDE, mas será a
menor alíquota média dos países do G7, com exceção do Reino Unido.

Adicionalmente, no âmbito internacional, a reforma tributária trouxe


um regime de isenção de investimentos no exterior (participation
exemption), em que dividendos distribuídos por subsidiárias no exterior
não serão tributáveis nos Estados Unidos. O participation exemption, no
entanto, é acompanhado de um imposto mandatório de repatriação sobre
lucros apurados a partir de 1986 e alocados no exterior que ainda não
foram submetidos à tributação, com alíquotas de 15,5% sobre ativos
líquidos e 8% sobre ativos ilíquidos.

Em relação às regras específicas contra erosão da base e transferência


de lucros ao exterior em transações envolvendo intangíveis, a reforma
impõe um imposto sobre a renda mínimo incidente sobre o que se
identificou como rendimentos globais decorrentes de intangível sujeito à
baixa tributação (global intangible low-taxed income – GILTI). As novas
regras aperfeiçoaram o regime de CFC dos Estados Unidos e impõem que
uma controladora norte-americana inclua os rendimentos GILTI na sua
base tributável, ainda que tais rendimentos sejam auferidos por uma
subsidiária no exterior e não sejam distribuídos à controladora residente
nos Estados Unidos.

O GILTI603 é definido como o excesso de renda estrangeira ativa sobre


um retorno de 10% sobre a base tributável ajustada de ativos tangíveis
detidos pela subsidiária. Embora o rendimento GILTI esteja sujeito a
100% da nova alíquota de 21% de imposto de renda, uma empresa norte-
americana tem direito a deduzir determinados items, o que resultaria em
uma alíquota efetiva de imposto de renda de aproximadamente 10,5%.
Eventuais créditos tributários do exterior associados com os rendimentos

1519
GILTI não podem ser integralmente utilizados para compensar o imposto
mínimo, tendo em vista que a nova lei estabelece um limite de 80% para
utilização desses créditos604. Além do mais, tais créditos não podem ser
utilizados para o passado ou o futuro, e nem seriam passíveis de
compensação com outros tipos de rendimentos do exterior.

A reforma ainda foi além na questão da alocação de lucros ao exterior


por meio de transferência de intangíveis, já que também alterou o artigo
que define intangíveis, inclusive para fins de transfer pricing, com o
propósito de incluir explicitamente valores como goodwill e going
concern, além de expandir a autoridade do IRS para utilizar os métodos de
avaliação utilizados no caso Veritas e Amazon.

O texto aprovado também permite uma dedução de 37,5% para


rendimentos auferidos diretamente por empresas norte-americanas no
exterior com transações envolvendo intangíveis. Com essa dedução, tais
rendimentos diretos com intangíveis detidos por empresas norte-
americanas ficariam sujeitos a uma tributação efetiva de aproximadamente
13,12%. O projeto aprovado no Senado continha, ainda, proposta para
eliminar a potencial tributação pelos Estados Unidos no caso de
distribuição de intangível do exterior para os Estados Unidos, a fim de
encorajar a realocação de ativos intangíveis para o país. No entanto, essa
proposta foi abandonada e não consta no texto final aprovado pelo
Congresso norte-americano.

Nota-se, portanto, que o projeto de reforma dos Estados Unidos procura


aumentar as desvantagens de empresas norte-americanas deterem ativos
intangíveis no exterior por meio de regras específicas contra erosão da
base tributária e transferência de lucros ao exterior. Em conjunto, o projeto
claramente tenta tornar mais atrativo o ambiente tributário para que

1520
empresas norte-americanas tragam seus intangíveis de volta aos Estados
Unidos. A nova alíquota de 21%, aliada à possibilidade de depreciação e
amortização acelerada sobre investimentos em ativos, já é vista como uma
grande redução na carga tributária das empresas.

Ainda não se sabe ao certo como tais regras afetariam os CSAs, mas é
razoável admitir que as novas regras devem ao menos mitigar os efeitos de
eventuais planejamentos efetuados por meio de CSAs.

Mesmo antes da reforma tributária, alguns argumentavam que o IRS


deveria revogar as regras relativas ao CSA, uma alternativa que vinha
sendo debatida não só em resposta às recentes derrotas do Governo
envolvendo o assunto, mas também por conta dos custos relevantes
decorrentes dos trabalhos de fiscalização e contencioso em que o IRS tem
incorrido605.

A favor da revogação do CSA, o professor Avi-Yonah argumenta que o


próprio motivo que justificou a criação do regime de CSA mostrou-se
falso com o passar dos anos. Ele argumenta que a ideia por trás de um
CSA era que uma MNE não conseguiria antecipar se o desenvolvimento
do intangível seria bem-sucedido ou não, de forma que os riscos
suportados pela empresa norte-americana em “renunciar” à parcela
dedutível de custos que seria alocada para a subsidiária no exterior inibiria
empresas norte-americanas em adotar posições muito agressivas nos seus
CSAs. No entanto, em sua visão, esse raciocínio possui duas falhas: (a) os
intangíveis bem-sucedidos resultam em lucros absurdamente
desproporcionais aos custos para seu desenvolvimento, isto é, um
intangível que custa US$ 100 milhões para ser desenvolvido tem um
potencial de lucro de US$ 1 bilhão; e (b) os contribuintes estarão sempre
na melhor posição para projetar, precisamente, se o intangível será bem-

1521
sucedido ou não, e as estruturas de CSA são implementadas apenas quando
as empresas têm segurança de que o intangível será lucrativo606.

A eventual revogação das regras de CSA, aliada à implementação da


reforma tributária nos Estados Unidos, deve reduzir drasticamente o
incentivo para que as empresas norte-americanas aloquem lucros no
exterior. É notório que o elevado imposto de renda nos Estados Unidos
aplicável até a reforma tributária, em conjunto com a possibilidade de
diferimento indefinido de renda ativa gerada no exterior, produzia um
“lock-out effect” que, para muitos, prejudica a economia norte-americana e
incentiva empresas a implementarem técnicas de planejamento tributário
que corroem a base do imposto a ser recolhido aos cofres públicos607.

Portanto, apesar de uma suposta falha dos esforços do IRS em


prevalecer nas discussões de transfer pricing e do Projeto BEPS em se
afastar do princípio arm´s length a fim de impedir transferência de lucros
ao exterior em transações envolvendo intangíveis, a reforma tributária dos
Estados Unidos pode ser vista como um primeiro teste para demonstrar
que um sistema tributário com regras específicas de antierosão da base
tributária, mas com um regime tributário atrativo para seus próprios
contribuintes, talvez seja a solução ideal de curto e médio prazo.

Assumindo que a reforma tributária dos Estados Unidos realmente


tenha algum sucesso na disputa contra planejamentos tributários
envolvendo intangíveis, a grande desvantagem é que essa é uma solução
unilateral, que pode resultar não só em dupla tributação, mas também em
um acirramento da “guerra fiscal” entre países desenvolvidos para atrair
empresas de tecnologia.

VI. CONCLUSÃO

1522
Os casos Veritas e Amazon demonstram claramente a preocupação das
autoridades fiscais em combater planejamentos tributários que resultam na
transferência de lucros ao exterior por meio de CSAs. As Final
Regulations emitidas pelo IRS e pelo Departamento do Tesouro norte-
americano refletem não só as teorias defendidas pelo IRS, mas também os
argumentos que haviam sido levantadas pela OCDE em seus relatórios
inicias no âmbito do Projeto BEPS.

No entanto as decisões do Tax Court nos casos Veritas e Amazon


poderiam ser usadas pelos contribuintes para reforçar que o padrão arm’s
length é um princípio fundamental que deve ser respeitado sempre em
discussões envolvendo CSAs, mesmo quando as regras emitidas pelo
Governo estão supostamente embasadas no princípio commensurate with
income, tal como foi decidido no caso Altera.

No âmbito do BEPS, há críticas ao trabalho final da OCDE em relação


aos efeitos do projeto sobre as regras de preços de transferência, na medida
em que é possível sustentar que as novas ações apenas reforçaram o arm´s
length standard, sem elevar a aplicabilidade do princípio commensurate
with income. Nesse sentido, a experiência norte-americana sobre o assunto
demonstra que o arm´s length standard talvez não seja o melhor
instrumento à disposição das autoridades fiscais.

Nesse meio tempo, as empresas de tecnologia se encontram em uma


situação de pouca segurança jurídica, pois continuam a sofrer com
autuações subjetivas e baseadas em métodos questionáveis no que diz
respeito à sua confiabilidade para atingir parâmetros arm´s length. Por
outro lado, as autoridades fiscais continuam a sustentar que MNEs estão se
valendo de estruturas de CSA para transferir lucros ao exterior e, assim,
reduzir a sua alíquota global efetiva de imposto de renda.

1523
A solução de curto e médio prazo talvez seja a adoção de reformas
tributárias que permitam às autoridades enfrentar a disputa com outros
instrumentos, tais como as normas específicas de antierosão da base
tributária e transferência de lucros ao exterior aprovadas pelo Congresso
norte-americano no âmbito da reforma tributária dos Estados Unidos.
Resta acompanhar de perto os próximos anos do cenário tributário e
econômico desse país, a fim de analisar os efeitos de um sistema tributário
mais atrativo para as empresas, mas com regras específicas de antierosão.

1524
European VAT and the Digital Economy
1
Aleksandra Bal

1. INTRODUCTION

The digital economy has placed strains on consumption taxes


throughout the world. The evolution of technology has dramatically
increased the ability of private consumers to shop online and the ability of
businesses to sell to consumers around the world without the need to be
present physically in the consumer’s country. As consumption taxes were
conceived at the time when commerce meant local traders selling products
to consumers in their brick-and-mortar shops, technological advances and
the proliferation of digital goods have made it necessary to revisit the
existing rules.

The digital economy has been the subject of many initiatives


undertaken at both international and national levels in the last few years.
The international debate in respect of taxation issues arising from the
digital economy was largely driven by the OECD (Organisation for
Economic Co-operation and Development). The BEPS Action Plan2
designated tax challenges of the digital economy as Action Item 1. On 24
March 2014, the OECD published a discussion draft on Action Item 13,
and on 16 September 2014 another report was released4.

In the context of consumption taxation, this report identified as the main


policy concerns the ability of private consumers to acquire goods, services
and intangibles from remote suppliers, and the use of exemptions for
imports of low-value goods. The report recommended that countries apply
the principles of the International VAT/GST Guidelines5 and consider

1525
introducing the collection mechanisms included in those guidelines. The
OECD work on the taxation of the digital economy is ongoing. An interim
report is expected to be released in April 2018, whereas the final report is
scheduled for 2020.

Electronic commerce, i.e. trade in goods and services conducted over


the Internet, has been the backbone of the digital economy since the very
beginning. The aim of this chapter is to examine the VAT (value added
tax) treatment of electronic commerce in the European Union (EU). The
chapter will proceed as follows. Section 2 will provide a brief overview of
the main characteristics of the EU VAT system. Sections 3 and 4 will
focus on two types of e-commerce transactions: supplies of digital
(intangible) products and supplies of tangible goods ordered online (mail-
order delivery system). Section 5 will provide a summary of the initiatives
undertaken by the European Union in the field of e-commerce taxation.

2. OVERVIEW OF EU VAT SYSTEM

VAT is an important pillar in the tax and economic system of the


European Union. Apart from being a significant revenue source, it
contributes to a non-distortive trade policy and respects the fundamental
freedoms. VAT legislation in the European Union has been harmonized to
a large extent to ensure the proper functioning of the internal market. This
process started in 1967, when the First and the Second VAT Directive
were enacted6. Currently, the VAT Directive7 lays down the fundamental
concepts of the VAT system. The majority of its provisions is
straightforward and leaves no discretion with regard to their
implementation; however, some allow certain leeway in adopting national
rules8. To ensure uniform application of the VAT Directive, the VAT
Implementing Regulation9 was enacted10. However, the large number of

1526
VAT cases referred to the Court of Justice of the European Union (CJEU)
indicates that the EU VAT system is far from being clear and uniform.

Decisions of the CJEU play a fundamental role in the application of the


EU VAT rules. The CJEU is “the supreme court” in EU VAT matters,
since it has the main responsibility for ensuring that VAT law is
interpreted and applied in the same way in all EU countries. The CJEU
makes sure that national courts do not give different rulings on the same
issue and that Member States and EU institutions do what the law requires.
Most matters brought before the Court are either references for preliminary
rulings or direct actions. Preliminary rulings result from requests by
Member States’ national courts for the CJEU to give guidance on the
interpretation of EU law. Direct actions are usually brought by the
European Commission against Member States that have failed to fulfill
their obligations under EU law. The CJEU is acknowledged to have been
the driving force in the emergence of a distinctive “European Union law”,
separate from both national and traditional international law. The CJEU
proclaimed this law to be “a new legal order” in NV Algemene Transporten
Expeditie Onderneming van Gend en Loos v. Nederlandse Administratie
der Belastingen (26/62)11. Moreover, this new legal order was accorded
supremacy over the national laws of the Member States in Flaminio Costa
v. ENEL (6/64)12.

In simple terms, the functioning of the VAT system can be described as


follows. All supplies of goods and services carried out for consideration by
a taxable person in the EU territory are subject to VAT, unless a specific
exemption applies. VAT charged by the supplier to his customers is known
as “output VAT”. The supplier is generally responsible for the remittance
of output VAT to the tax authorities. VAT paid by the supplier to other

1527
businesses on goods and services that he receives is known as “input
VAT”. A taxable person is generally able to recover input VAT
attributable to his taxable transactions by setting it off against the output
VAT in his VAT return, provided that all the requirements for an input
VAT deduction are met.

3. SUPPLIES OF DIGITAL PRODUCTS

3.1. Concept of electronically supplied services

EU VAT is levied on supplies of goods and services by a taxable person


acting as such. A supply of goods is defined as the transfer of the right to
dispose of tangible property as owner13. A supply of services is defined
residually as any transaction which is not a supply of goods14.

An important category of services is electronically supplied services


(commonly referred to as “digital supplies” or “online services”). They are
defined as services delivered over the Internet or an electronic network, the
nature of which renders their supply essentially automated, involving
minimum human intervention and impossible in the absence of
information technology15. A non-exhaustive list of those services provided
in the VAT Implementing Regulation includes: website hosting, distance
maintenance of programmes as well as supplies of software and other
digitalized products (text, images, music, information and games)16.

3.2. Place of supply

The place-of-supply rules determine where a supply takes place, i.e.


which country has the jurisdiction to tax the supply. Under the place-of-
supply rules applicable as from 1 January 2015, all supplies of electronic
services are subject to the VAT rules of the country of the customer17. In
order to establish who has to account for the VAT due, in EU scenarios, it

1528
is necessary to distinguish between business-to-business (B2B) and
business-to-consumer (B2C) transactions. In the EU, the supplier may
regard his customer as a business (taxable person) if the customer has
communicated his VAT identification number to him and the supplier has
verified its validity or if the customer has demonstrated that he is in the
process of registering for VAT18. If the customer is located outside the EU,
his status is not relevant since the supply is outside the scope of EU VAT.

The reverse charge mechanism19 applies to cross-border supplies to


businesses (i.e. the VAT liability is shifted to the customer who accounts
for VAT on the supply in his VAT return), whereas a simplified
registration mechanism (One Stop Shop/Mini One Stop Shop scheme)20
may be used in respect of cross-border supplies of electronic services to
EU final consumers. In the latter case, since the reverse charge cannot be
applied, the supplier must determine where his customers are established,
have a permanent address or usually reside in order to apply the correct
VAT rate21. To assist suppliers with the identification of the location of
their non-taxable customer, the Commission has issued a detailed
regulatory framework consisting of the VAT Implementing Regulation,
which establishes a number of rebuttable presumptions and an evidence
rule, supplemented by more detailed explanations in the non-binding
Explanatory Notes22. Under the presumptions laid down in the VAT
Implementing Regulation, electronic services that are provided at, for
example, a Wi-Fi hot spot, an Internet café, a restaurant or a hotel lobby,
are presumed to be supplied at those places23. Also, non-taxable persons
are presumed to be established or resident at the place of installation of the
fixed landline through which they receive the services or in the country
whose code is mentioned on the SIM card when they receive the services
through a mobile network24. According to the evidence rule, it is assumed

1529
that the customer is established at the place identified on the basis of two
items of non-contradictory evidence (for example, billing address, bank
details, IP address or other commercially relevant information)25.

3.3. One Stop Shop

The One Stop Shop (OSS) scheme was introduced on 1 July 2003 to
avoid a situation in which, for the purpose of having to account for VAT
on B2C electronic services in a maximum of 28 Member States, non-EU
suppliers must be registered in all of those Member States. Under this
scheme, the non-EU supplier can register and account for VAT in a single
Member State, but applies the VAT rate of the customer’s Member State26.
As from 1 January 2015, EU suppliers of electronic services to EU final
consumers have the option to use a similar arrangement (the Mini One
Stop Shop scheme, MOSS), i.e. to register and remit VAT only in the
Member State of their establishment. The Mini One Stop Shop regime is
optional; however, a taxable person that chooses to use the scheme must
apply it in all relevant Member States. The scheme cannot be applied to
supplies of electronic services in the Member State where the taxable
person is established; such supplies must be declared in the domestic VAT
return.

3.4. Intermediaries

A common feature of transactions in the digital economy is the


presence of intermediaries. For example, a consumer of cloud services
may request them directly from a cloud service provider or a cloud
broker27. The cloud broker acts as an intermediate party between the
consumer and the provider. It may create a new service by combining
multiple service offerings or by enhancing an existing one.

1530
In intermediary structures, it is essential to identify who the supplier of
services to the final consumer is since the supplier is responsible for the
correct determination of the place of supply and thus the application of the
correct VAT rate. In cloud structures, the supplier of services to the final
consumer could be the cloud broker, the cloud service provider or even the
content developer.

Article 9a(1) of the VAT Implementing Regulation introduces a


rebuttable presumption that a taxable person who takes part in the supply
of electronic services is acting in his own name but on behalf of the
provider of those services. This means that the intermediary party is
deemed to act as a “commissionaire”, i.e. to have received and supplied
the services itself28. The presumption does not apply to taxable persons
who solely provide payment processing services (for example, a credit
card company)29.

In order to assess whether a taxable person is taking part in the supply


of services, the facts and the nature of the contractual relations have to be
examined. If there is a contradiction between contractual arrangements and
economic reality, the latter should prevail30. The following indicators
suggest that a taxable person is taking part in the supply31:

i) owning or managing the technical platform over which the services are
delivered;
ii) being responsible for the actual delivery;
iii) being responsible for collecting payment unless the only involvement of the
taxable person is the processing of payment;
iv) controlling or exerting influence over the pricing;
v) being the one legally required to issue a VAT invoice, receipt or bill to the
end user in respect of the supply; and
vi) providing customer support in relation to queries about or problems with the
service itself.

1531
The presumption about the application of the commissionaire
arrangement can be rebutted if the taxable person taking part in the supply
explicitly indicates another person as the supplier of the service (in an
invoice or bill of receipt) and this is reflected in the contractual
arrangements. If the presumption is rebutted, the intermediary party
provides intermediation services and invoices them to the service provider.
The latter must ensure the correct VAT treatment of the supply to the final
customer.

The application of the commissionaire arrangement is mandatory if a


taxable person is authorizing the charge to the customer32, authorizing the
delivery of the service33 or setting the general terms and conditions34. In
practice, the person who authorizes payment or delivery is likely to be the
person who controls the technical platform over which the services are
offered or provided.

4. SUPPLIES OF GOODS ORDERED ONLINE

The second type of transactions typical for the digital economy is


distance sales, i.e. supplies of goods ordered via the Internet. The VAT
treatment of distance sales is complex and depends on the status and
location of the customer as well as the seller’s turnover from distance sales
in a particular Member State.

Distance sales to business customers follow the general VAT rules. If


goods are transported to a customer in another Member State or a third
country, an intra-Community supply35 or exportation takes place,
respectively. If a taxable person established in a Member State acquires
goods from abroad, it is deemed to perform an intra-Community
acquisition36 or importation.

1532
In the EU, there is a special regime for distance sales of goods that are
dispatched or transported for or on behalf of a supplier in one Member
State to a person in another Member State who is not registered for VAT
(and who does not apply VAT to his intra-Community acquisitions of
goods)37. The place of taxation of those supplies depends on the supplier’s
turnover from distance sales in the customer’s country. VAT of the
Member State of destination is applied if sales in that Member State
exceed a certain threshold (EUR 100,000, EUR 35,000 or the equivalent in
national currency)38. Distance sales below the threshold are taxed in the
Member State of origin. However, even if the threshold is not exceeded,
suppliers have an option to select the country of destination as the place of
taxation. The consequence of the fact that distance sales are taxed at
destination is that the supplier must register in the country of the customer.
There is no simplification option similar to the OSS to prevent multiple
registrations; registration is required in each country where the sales
volume has exceeded the applicable threshold.

Goods delivered from a third country to the EU are generally subject to


the rules on importation, irrespective of the status of the recipient. Import
VAT must be remitted to the customs office at the rate of the Member
State of importation when goods enter the territory of the EU. However, to
reduce the administrative burden of customs authorities, the following
simplification measures are adopted:

•the importation of goods of a total value not exceeding EUR 10 (or EUR 22, if
a Member State decides so) is exempt from VAT. Member States may exclude
goods which have been imported on mail order from this exemption (small
39
consignment exemption) ; and
•consignments of goods of negligible value dispatched direct from a third
country to a consignee in the EU are exempt from customs duties if the value
40
of the consignment does not exceed EUR 150 .

1533
The VAT exemption for the importation of low-value consignments
enables EU customers to purchase third-country goods VAT free, whereas
the same goods supplied within the EU would be subject to tax. It creates
distortions of competition since it gives preferential treatment to supplies
of low-value goods from third countries. Moreover, the existing rules do
not offer significant simplification in situations in which a commercial
consignment has a value of between EUR 22 and EUR 150; such
consignments are exempt from customs duties but still subject to VAT.

5. EU INITIATIVES REGARDING TAXATION OF THE DIGITAL


ECONOMY

5.1. Expert Group of the Taxation of the Digital Economy

Tax challenges raised by the digital economy have been the subject of
many initiatives undertaken by the EU. On 22 October 2013, the European
Commission adopted a decision establishing an Expert Group on the
Taxation of the Digital Economy41. The aim of this Expert Group was to
examine the best ways of taxing the digital economy in the EU, to identify
the key problems with digital taxation from an EU perspective and to
present a range of possible solutions. On 28 May 2014, the EU Expert
Group presented its final report, in which it recommended the introduction
of a broader One Stop Shop scheme that would cover all supplies of goods
and services to private individuals (i.e. removing the existing thresholds
for distance sales and taxing remote supplies of goods at the location of the
final consumer), the termination of the low-value consignments exemption
and the elimination of tax barriers for small and medium enterprises
(SMEs) operating in the EU Single Market.

5.2. Strategy for the EU Digital Single Market

1534
On 6 May 2015, the European Commission announced its Strategy for
the EU Digital Single Market42. In this context, the Commission committed
to make legislative proposals to modernize the VAT rules for cross-border
e-commerce and to reduce the administrative burden arising from different
VAT regimes by the end of 2016. In particular, the Strategy
recommended: (1) extending the current single electronic registration and
payment mechanism to intra-EU and third country online sales of tangible
goods; (2) introducing a common EU-wide simplification measure (VAT
threshold) to help small e-commerce businesses; (3) allowing for home
country controls, including a single audit of cross-border businesses for
VAT purposes; and (4) removing the VAT exemption for the importation
of low-value consignments. The Commission’s commitment to remove
VAT obstacles to electronic commerce in the EU Single Market was
repeated in the VAT Action Plan, published on 7 April 201643.

5.3. Modernising VAT for E-commerce

On 1 December 2016, the European Commission unveiled plans to


simplify the VAT rules for cross-border electronic commerce44. The
Commission’s proposals will make it easier for businesses to carry out
online sales in other Member States and reduce compliance costs. The
proposed package consists of the following measures:

•expansion of the One-Stop Shop scheme (see section 5.3.1);


•simplification of the VAT rules for small businesses (see section 5.3.2); and
•abolition of the exemption for the importation of low-value consignments (see
section 5.3.3).

5.3.1. Expansion of the One Stop Shop

In the EU, there is a special VAT regime for distance sales of goods
(see section 4). The place of taxation of those supplies depends on the

1535
supplier’s turnover from distance sales in the customer’s country. VAT of
the Member State of destination is applied if sales in that Member State
exceed a certain threshold (EUR 100,000, EUR 35,000 or the equivalent in
national currency). Distance sales below the threshold are taxed in the
Member State of origin. However, even if the threshold is not exceeded,
suppliers have an option to select the country of destination as the place of
taxation. The consequence of the fact that distance sales are taxed at
destination is that the supplier must register in the country of the customer.
There is no simplification option similar to the MOSS scheme to prevent
multiple registrations. Registration is required in each country where the
sales volume has exceeded the applicable threshold. This significantly
increases the operating costs of businesses engaged in intra-EU sales of
goods. According to the European Commission, companies that sell goods
online pay around EUR 8,000 in VAT compliance costs for every EU
country into which they sell. This is a significant cost which can prohibit
growth for online traders, in particular small enterprises. It is also
estimated that EUR 5 billion of VAT is lost each year in the EU due to
non-compliance on cross-border online sales. This figure is projected to
rise to EUR 7 billion by 202045.

Therefore, on 1 December 2016, the European Commission proposed to


extend the application of the MOSS to include cross-border online supplies
of physical goods and all supplies of services to end customers. Under this
extended MOSS, businesses will have to charge VAT of the country of
their customer. They will report VAT on those supplies via a quarterly
return to their home tax administration. Local VAT registrations will no
longer be required. The intra-EU distance sales regime will be abolished.

1536
One of the reasons for extending the MOSS is that both businesses and
tax administrations are very satisfied with its current operation. According
to the European Commission, VAT compliance costs for businesses have
decreased by EUR 500 million, or about EUR 41,000 per company,
compared to the alternative of having to register and account for VAT in
each and every Member State where customers are based. In 2015,
approximately EUR 3 billion of VAT was paid via the MOSS,
representing about 70% of the total sales of electronic telecommunication
and broadcasting services. This shows that direct registration in each
Member State was chosen only by a small minority of generally large
businesses who are already registered for other reasons46.

5.3.2. Simplified VAT rules for small businesses

The current regime for taxing cross-border electronic services imposes a


significant compliance burden on small businesses established in the EU.
As from 1 January 2015, suppliers who provide electronic services to final
consumers established or resident elsewhere in the EU are required to
register irrespective of the turnover generated from such supplies. They
cannot rely on any registration threshold.

Some Member States implemented measures to relieve the compliance


burden placed upon small businesses engaged in electronic commerce. On
8 January 2016, the UK HMRC released Revenue and Customs Brief 4
(2016), which outlines the simplifications available to UK businesses
trading below the UK’s VAT registration threshold (currently set at GBP
83,000) that make cross-border supplies of digital services. HMRC allows
UK businesses that are below the UK VAT registration threshold and
registered under the MOSS to make their customer location decisions
based solely on the information provided to them by their payment service

1537
providers. Small businesses are also allowed to make a judgement on
customer location based on a single piece of information.

According to the Commission’s proposals presented on 1 December


2016, online companies with annual cross-border sales up to EUR 10,000
will be able to account for VAT on these sales under their home country
rules. Thus, they will benefit from the familiar VAT rules of their home
country, such as invoicing requirements and record-keeping. The
Commission has sought to strike the right balance between reducing
burdens for small businesses while ensuring that the threshold will not
create distortions to the Single Market arising from differences in the VAT
rates47. According to the Commission, setting the threshold at EUR 10,000
will give a boost to 430,000 businesses across the EU, representing 97% of
all micro-businesses trading cross-border. The thresholds could be applied
as early as 2018 to electronic services and by 2021 to online supplies of
goods. Additionally, for companies providing cross-border electronic
services with less than EUR 100,000 in cross-border sales per year, one
piece of evidence should suffice to identify the location of their customers.
Currently, two pieces of evidence are necessary.

5.3.3. Importation of low-value consignments

As explained in section 4, the VAT exemption for the importation of


low-value consignments enables EU customers to purchase third-country
goods VAT free, whereas the same goods supplied within the EU would
be subject to tax. It creates distortions of competition and puts EU
businesses at a clear disadvantage since it gives preferential treatment to
supplies of low-value goods from third countries. Companies based
outside the EU can fraudulently undervalue expensive goods, such as
mobile phones and tablets (i.e. mark them as costing less than EUR 22), to

1538
benefit from this VAT exemption. A recent study based on real purchases
found that 65% of consignments from third countries were non-compliant
with the EU VAT rules. Moreover, the existing rules do not offer
significant simplification in situations in which a commercial consignment
has a value of between EUR 22 and EUR 150; such consignments are
exempt from customs duties but still subject to VAT.

On 1 December 2016, the European Commission announced its


intention to abolish the VAT exemption for low-value consignments
imported into the EU that are worth less than EUR 22. Removing this
VAT exemption has been strongly requested by European e-commerce
organizations and is in line with the general global trends: other OECD
members have taken or are about to take similar measures.

To remove the compliance burden for non-EU suppliers, registration


under the One Stop Shop scheme will be available to trustworthy sellers
from outside the EU. All such traders will be able to designate an EU
intermediary (such as a marketplace, courier, postal operator or customs
agent) to deal with VAT-related compliance. This system will be efficient
because most intermediaries are already familiar with the EU VAT rules
and procedures. The clearance of small consignments from trusted non-EU
traders who register with the VAT One Stop Shop will be simplified in
terms of customs procedures. Consignments valued up to EUR 150 will no
longer be stopped at customs for VAT clearance, and VAT collection for
these goods will be managed separately on a self-assessment basis48.

6. CONCLUSIONS

The EU VAT system has embraced the destination principle and seeks
to levy tax in the country of consumption. Digital products are already

1539
taxed in the country of the customer, whereas for a similar tax treatment of
tangible goods ordered online the legislative proposals are pending.
Whereas the destination principle is the theoretically correct way to tax
consumption, its practical application is difficult. Enacting legislation that
will subject supplies of digital goods by nonresidents to local consumers to
VAT/GST seems to be a relatively easy task compared to the challenge of
how to collect the tax due. The biggest disadvantage of OSS/MOSS is that
it relies on the voluntary compliance of the supplier. If the supplier does
not register and remit VAT/GST, the tax administration will hardly ever
know that a taxable supply took place. It is questionable whether the fact
that tax collection in cross-border scenarios is reliant on voluntary
compliance by non-resident suppliers is acceptable from a neutrality and
competition perspective in the long term. Without effective supervision
and enforcement, there is a risk of non-taxation that threatens to distort
competition. If tax rules are not linked to a real possibility of enforcement,
taxpayers are unlikely to comply.

1540
Canada: Taxing Global Digital Income in a
Post-BEPS World
49
Arthur J. Cockfield

1. INTRODUCTION

Tax rules, primarily put in place to deal with cross-border transactions


involving physical goods in the post-World War I environment, have a
more difficult time in guarding against aggressive planning techniques.
Since that time, the world has changed. In particular, global investments
and transactions increasingly rely on value-creation associated with highly
mobile intangible assets such as brands, goodwill, copyright, and patents.

The digital world also exacerbates a number of the already-existing soft


spots in the international tax regime. Global digital transactions involving
digital goods and services as well as intangible assets are characterized in
part by their intangible nature and ease of crossing national borders.
Moreover, the digital world facilitates cross-border collaboration,
production and sales of these intangible goods and services. Other tax
challenges arising from the digital world include the usage of new
payment systems such as bitcoin and the enhanced trading of personal
information for “free” services in the cross-border business-to-consumer
social media context.

This chapter discusses some of these tax challenges, and evaluates


recent efforts by the OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting (BEPS)
reform efforts to tackle aggressive international tax planning for firms
engaged in the cross-border sale or transfer of digital goods and services50.
Action 1 that required the OECD to identify the main challenges that the

1541
digital economy poses for the application of current international tax rules
and to develop recommendations to address these challenges. According to
the OECD, “[t]he BEPS package of measures represents the first
substantial renovation of the international tax rules in almost a century…
BEPS planning strategies that rely on outdated rules or on poorly co-
ordinated domestic measures will be rendered ineffective”51.

The main conclusion of this article, however, is that the BEPS efforts
do not change the planning environment in any significant way although
incremental reforms to the permanent establishment principle and
elsewhere will need to be taken into account by planners. In other words,
the reform does not significantly alter the status quo and will not affect
many traditional cross-border structures, including those deployed by
firms within the global digital economy.

The article is organized as follows. Part 2 overviews the roots of


international tax reform efforts directed at cross-border e-commerce as
well as the OECD’s more recent BEPS efforts. Part 3 examines the main
Action 1 Final Report recommendations surrounding global digital
taxation as well as some of the reforms the OECD chose not to pursue.
Part 4 discusses how the recommended reforms will not significantly
curtail tax planning for most firms with global digital sales although
prospective reforms surrounding hybrid entities, treaty shopping, transfer
pricing and controlled foreign corporations could inhibit certain practices.
A final Part concludes.

2. OVERVIEW OF BEPS AND GLOBAL DIGITAL TAXATION

This Part overviews earlier global e-commerce tax reforms before


discussing the more recent BEPS reforms by the OECD and G20.

1542
2.1. Background on Related OECD Reform Efforts

Governments, businesses, and academics have paid significant attention


to e-commerce tax developments since the Internet became a viable
commercial medium in the mid-1990s. Beginning with the first OECD
global e-commerce meeting in Turku, Finland in 1997 and followed-up
with another Ministerial meeting in Ottawa, Canada in 1998, tax
authorities generally did not advocate departures from traditional laws and
policies unless there was evidence that technological change was
significantly undermining important interests52.

Our review of national responses to e-commerce tax challenges reveals


that insofar as national governments have reacted at all to these challenges
they have done so with caution, as long as there was little evidence that
traditional values (e.g., the collection of revenues from cross-border
transactions) were at serious risk53. A possible explanation for this cautious
approach lay in the increasing view that the taxation of cross-border e-
commerce was not leading to undue revenue losses for high tax countries.

One of the most interesting consequences of the intense debate over the
implications of cross-border e-commerce for tax regimes was the
emergence of enhanced cooperation via non-binding mechanisms at the
international level. Because tax policy remains such a politically sensitive
issue governments continue to take great care not to sign onto agreements
that would bind their fiscal hands. Nevertheless, the perceived threat to
their tax revenues combined with the spectre of rising cross-border tax
disputes brought governments together and may well have reduced
conflicts between taxpayers and foreign tax authorities. As part of this
enhanced international tax cooperation, the OECD initiated a series of
“firsts” to confront global e-commerce tax challenges. Under the auspices

1543
of, or in collaboration with, the OECD, the following developments
occurred for the first time:54

a) countries engaged in multilateral discussions that led to agreement on tax


principles – the Ottawa Taxation Framework – that would guide the
subsequent formulation of international tax rules;
b) the OECD joined with members of industry to agree to a framework – the
Joint Declaration of Business and Government Representatives – to guide the
development of new tax rules;
c) the OECD analysed policy options in an extensive way through the
publication of multiple discussion drafts of reports (that sometimes included
both majority and minority viewpoints) from Technical Advisory Groups and
Working Parties consisting of tax experts drawn from national tax authorities,
industry, and academia;
d) non-OECD countries were permitted to be part of on-going deliberations
along with the development of tax policy options through the appointment of
representatives from non-OECD governments to Technical Advisory Groups;
and
e) OECD member states engaged in extensive discussions with respect to cross-
border Value-Added Tax/Goods and Services Tax issues and attempted to
promote consensus-driven reform efforts in this area.

The policy responses demonstrate the importance of effective


institutions and institutional reform processes to confront cross-border tax
challenges promoted by technology change. These new cooperative
institutions and processes – such as the OECD VAT/GST Guidelines –
now address issues apart from, or in integration with, the taxation of global
digital commerce. This approach, which wisely chose not to “ring fence”
the digital economy from conventional economic activities, was also
adopted by the OECD with respect to its BEPS reforms directed at global
digital taxation, a topic to which we now turn.

2.2. BEPS and Digital Taxation

In the aftermath of the 2008 global financial crisis, a number of


countries faced serious budgetary problems as their tax revenues

1544
diminished. Governments and their tax authorities began to discuss the
need to address international tax avoidance, offshore tax evasion and
concomitant revenue losses.

In 2013, the OECD launched its Base Erosion and Profit Shifting or
BEPS project to develop cooperative efforts among governments in this
area, which was subsequently endorsed by the G2055. “Base erosion and
profit shifting” refers to the many tax plans used by multinational firms to
reduce their global tax liabilities. The OECD approach includes fifteen
studies called “Actions”. Several Actions target specific problem areas
such as interest deductions, hybrid mismatch arrangements, and various
aspects of transfer pricing, including intangibles and the allocation of risk
within multinational groups. The challenge, as set out by the G-20 in the
Tax Annex to the St. Petersburg Declaration of 2013, is to design and
implement tax rules to ensure that “profits are taxed where economic
activities occur and where value is created”56.

The scrutiny of global e-commerce transactions continues within the


OECD Action Plan on Base Erosion and Profit Shifting (BEPS) that was
launched in 201357. According to the Action Plan58:

The spread of the digital economy also poses challenges for international
taxation. The digital economy is characterised by an unparalleled reliance on
intangible assets, the massive use of data (notably personal data), the widespread
adoption of multi-sided business models capturing value from externalities
generated by free products, and the difficulty of determining the jurisdiction in
which value creation occurs. This raises fundamental questions as to how
enterprises in the digital economy add value and make their profits.

Accordingly, Action 1 required the OECD to identify the main


challenges that the digital economy poses for the application of current
international tax rules and develop detailed alternatives to address these
challenges59. The OECD also formed a Task Force on the Digital Economy

1545
that released a report in September 2014. Finally, the OECD released its
Final Report for Action 1 in 2015. Thirteen Action final reports, including
Action 1, were presented to the G20 leaders at their summit in Antalya,
Turkey on November 15, 2015.

The OECD countries also agreed to adopt four “minimum standards”


areas of preventing treaty shopping, Country-by-Country Reporting
(whereby tax authorities deploy a common template for multinational
firms to disclose their tax payments in foreign countries for transfer
pricing purposes), fighting harmful tax practices and improving dispute
resolution. In some cases, countries have not, however, fully agreed to
implement all of these minimum standards.

For instance, Canada has agreed to adopt harmful tax practices (Action
5) by committing to the spontaneous exchange of tax rulings that is limited
to certain areas such as cross-border rulings relating to preferential
regimes, transfer pricing, downward adjustment not directly reflected in
the taxpayer’s accounts, permanent establishment issues, and related-party
conduits60. Canada did commit to the three other minimum standards:
adoption of Country-by-Country Reporting, prevention of treaty abuse
(Action 6) and binding arbitration for dispute resolution (action 14).

Canada also signed the Multilateral Instrument but has registered


provisional reservations with respect to most BEPS measures. Finally,
Canada has implemented the Common Reporting Standard via a global
administrative tax agreement to automatically exchange cross-border tax
information with other participating countries.

3. BEPS DIGITAL TAX REFORMS

1546
This Part explores the main BEPS tax treaty changes to the permanent
establishment principle, which may affect global digital transactions, then
touches on reforms rejected by the OECD.

3.1. Tax Treaty Changes

Under the traditional tax treaty definition, a permanent establishment is


a fixed base through which business is conducted. A firm that conducts
mere preparatory or auxiliary activities, however, is excepted from this
main definition and hence does not constitute a permanent establishment.

The most important development to arise from Action 1 is a planned


modification of the permanent establishment definition in Article 5(4) of
the OECD Model Tax Treaty. The reform arose from the view that
multinational firms were entering into artificial arrangements to divert
profits away from high tax countries. The Task Force on the Digital
Economy noted that some activities that were previously preparatory or
auxiliary in the context of conventional business models may have become
core functions for some businesses engaged in global digital commerce61.

As a result of this view as well as the work of Action 7 (Preventing the


Artificial Avoidance of PE Status)62, it was agreed to create a new test to
ensure that the firms which conduct these core functions do not fall within
the preparatory or auxiliary activities exception to the definition of
permanent establishment. The purpose of the new approach is to enable
countries to tax foreign companies that do not maintain a physical
presence within the countries but derive significant sales income or
maintains a physical presence that was traditionally exempted from
permanent establishment status under the preparatory or auxiliary activity
exception.

1547
For example, consider a large online seller of tangible goods. If this
seller sets up a warehouse staffed by a significant number of employees in
country X to expedite deliveries to country X consumers then, under
prospective reforms, this warehouse will no longer be considered to be a
preparatory or auxiliary activity63. One option explored by the OECD was
to simply delete the word “delivery” from the categories of preparatory or
auxiliary activities although this was not implemented in the draft
proposed changes noted below.

Moreover, a new “anti-fragmentation” rule was recommended to inhibit


to benefit from this exception through the fragmentation of business
activities among related businesses. The Commentary to Article 5 the
OECD model tax treaty at paragraph 27.1 currently indicates that
subparagraph (f) of Article 5(4) deals with situations where a single firm
“fragment[s] a cohesive operating business into several small operations in
order to argue that each is merely engaged in a preparatory or auxiliary
activity”. The OECD noted that subparagraph (f) does not deal with
situations where these operations are carried on by related parties, hence
there is a risk that this will encourage unacceptable cross-border tax
planning.

Accordingly, further amendments were thought to be needed to inhibit


the ability of firms to fragment its business among related parties so that it
appears like mere preparatory or auxiliary activities are taking place. In
other words, the reform again tries to provide countries where customers
are located with enhanced rights to levy a cross-border income tax on
significant business operations taking place within their borders.

In July 2017, the OECD released draft proposed changes to Article 5(4)
as follows64:

1548
4. Notwithstanding the preceding provisions of this Article, the term “permanent
establishment” shall be deemed not to include:
a) the use of facilities solely for the purpose of storage, display or delivery of
goods or merchandise belonging to the enterprise;
b) the maintenance of a stock of goods or merchandise belonging to the
enterprise solely for the purpose of storage, display or delivery;
c) the maintenance of a stock of goods or merchandise belonging to the
enterprise solely for the purpose of processing by another enterprise;
d) the maintenance of a fixed place of business solely for the purpose of
purchasing goods or merchandise or of collecting information, for the enterprise;
e) the maintenance of a fixed place of business solely for the purpose of carrying
on, for the enterprise, any other activity of a preparatory or auxiliary character;
f) the maintenance of a fixed place of business solely for any combination of
activities mentioned in subparagraphs a) to e), provided that the overall activity of
the fixed place of business resulting from this combination is of a preparatory or
auxiliary character, provided that such activity or, in the case of subparagraph f),
the overall activity of the fixed place of business, is of a preparatory or auxiliary
character.
4.1 Paragraph 4 shall not apply to a fixed place of business that is used or
maintained by an enterprise if the same enterprise or a closely related enterprise
carries on business activities at the same place or at another place in the same
Contracting State and
a) that place or other place constitutes a permanent establishment for the
enterprise or the closely related enterprise under the provisions of this Article, or
b) the overall activity resulting from the combination of the activities carried
on by the two enterprises at the same place, or by the same enterprise or closely
related enterprises at the two places, is not of a preparatory or auxiliary
character, provided that the business activities carried on by the two enterprises at
the same place, or by the same enterprise or closely related enterprises at the two
places, constitute complementary functions that are part of a cohesive business
operation.

In addition, the definition of a permanent establishment in Article 5(5)


and 5(6) is to be modified to address artificial arrangements that seek to
shift profits to a jurisdiction where a contract has been concluded (e.g., by
simply providing for a clause of the contract that stipulates that the
contract has been concluded in this jurisdiction). It was thought that global
digital activities, which often deploy website contracting for both business-
to-consumer and business-to-business transactions, have greater latitude to

1549
engage in this sort of aggressive international tax planning. According the
Final Report of Action 765:

As a matter of policy, where the activities that an intermediary exercises in a


country are intended to result in the regular conclusion of contracts to be performed
by a foreign enterprise, that enterprise should be considered to have a sufficient
taxable nexus in that country unless the intermediary is performing these activities
in the course of an independent business. The changes to Article 5(5) and 5(6) and
the detailed Commentary that appear [in this report] will address commissionnaire
arrangements and similar strategies [to] better reflect this policy.

In another example, multinational firms sometimes structure their cross-


border sales to ensure that contracts are concluded in low or nil tax
jurisdictions even though a final sale has been made to a consumer in a
high tax country66. Assuming a sales force of a local subsidiary of an
online seller of tangible goods or an online provider of advertising services
habitually plays the principal role in the conclusion of contracts with
prospective large clients for these goods and services without material
revisions by the parent company then, under the proposed approach, this
activity would result in a permanent establishment of the parent company.

The Final Report on Action 7 recommends that Article 5(5) be amended


to provide that, subject to Article 5(6), an enterprise has a permanent
establishment in a Contracting State where a person acts in that State on
behalf of the enterprise “and, in doing so, habitually concludes contracts,
or habitually plays the principal role leading to the conclusion of contracts
that are routinely concluded without material modification by the
enterprise”, and the contracts are either in the name of the enterprise, or for
the transfer of goods or services by the enterprise.

This same Final Report recommends that Article 5(6) be amended to


provide that, although a permanent establishment will not be deemed to
exist under Article 5(5) if the person acting in a Contracting State for the

1550
enterprise is doing so in the ordinary course of its business as an
independent agent, a person will not be considered to be an independent
agent if it acts “exclusively or almost exclusively on behalf of one or more
enterprises to which it is closely related”. The meaning of “closely related”
is addressed in a separate subparagraph of Article 5(6). More recently, the
OECD explored the impact of these changes on profit attribution to
permanent establishments67.

The draft proposed changes to Article 5(5) and (6) are as follows:

5. Notwithstanding the provisions of paragraphs 1 and 2 but subject to the


provisions of paragraph 6, where a person − other than an agent of an independent
status to whom paragraph 6 applies − is acting in a Contracting State on behalf of
an enterprise and has, and habitually exercises, in a Contracting State, an authority
to conclude contracts, in doing so, habitually concludes contracts, or habitually
plays the principal role leading to the conclusion of contracts that are routinely
concluded without material modification by the enterprise, and these contracts
are
a) in the name of the enterprise, or
b) for the transfer of the ownership of, or for the granting of the right to use,
property owned by that enterprise or that the enterprise has the right to use, or
c) for the provision of services by that enterprise,
that enterprise shall be deemed to have a permanent establishment in that State
in respect of any activities which that person undertakes for the enterprise, unless
the activities of such person are limited to those mentioned in paragraph 4 which, if
exercised through a fixed place of business (other than a fixed place of business to
which paragraph 4.1 would apply), would not make this fixed place of business a
permanent establishment under the provisions of that paragraph.
6. An enterprise shall not be deemed to have a permanent establishment in a
Contracting State merely because it carries on business in that State through a
broker, general commission agent or any other agent of an independent status,
provided that such persons are acting in the ordinary course of their business.
Paragraph 5 shall not apply where the person acting in a Contracting State on
behalf of an enterprise of the other Contracting State carries on business in the
first-mentioned State as an independent agent and acts for the enterprise in the
ordinary course of that business. Where, however, a person acts exclusively or
almost exclusively on behalf of one or more enterprises to which it is closely
related, that person shall not be considered to be an independent agent within the
meaning of this paragraph with respect to any such enterprise.
7. The fact that a company which is a resident of a Contracting State controls or
is controlled by a company which is a resident of the other Contracting State, or

1551
which carries on business in that other State (whether through a permanent
establishment or otherwise), shall not of itself constitute either company a
permanent establishment of the other.
8. For the purposes of this Article, a person or enterprise is closely related to
an enterprise if, based on all the relevant facts and circumstances, one has
control of the other or both are under the control of the same persons or
enterprises. In any case, a person or enterprise shall be considered to be closely
related to an enterprise if one possesses directly or indirectly more than 50 per
cent of the beneficial interest in the other (or, in the case of a company, more
than 50 per cent of the aggregate vote and value of the company’s shares or of the
beneficial equity interest in the company) or if another person or enterprise
possesses directly or indirectly more than 50 per cent of the beneficial interest (or,
in the case of a company, more than 50 per cent of the aggregate vote and value
of the company’s shares or of the beneficial equity interest in the company) in the
person and the enterprise or in the two enterprises.

Some governments have indicated they will not follow the proposed
permanent establishment changes. For instance, the Canadian government
has reserved the right for the changes not to be included in its tax treaties.

3.2. Rejected BEPS Reforms

As discussed within Action 1’s Final Report, the OECD ultimately


decided not to pursue other options analysed by the Task Force on the
Digital Economy, which concluded the options “would require substantial
changes to key international tax standards”68. Importantly, however, the
OECD indicates that countries could introduce any of these options in their
domestic laws (assuming there is no conflict with any existing bilateral tax
treaties) or in their bilateral tax treaties.

This section briefly addresses these additional options, which have been
previously explored in the global e-commerce tax literature69.

The first option is to develop a “significant economic presence test” to


enable source countries to tax profits generated by their markets. This test
could rely on an above threshold revenue quantum such as a $ 1 million in

1552
sales70. Alternatively, it could rely on a mix of quantitative and qualitative
factors such as marketing efforts using a local domain name within the
source country and whether significant amounts of employees travel to, or
are based within, the source country71.

The second option is to develop a withholding tax on certain types of


digital transactions. The approach resembles one first proposed by Richard
Doernberg and later developed by other observers such as Reuven Avi-
Yonah72. The OECD notes that the unilateral adoption of such a
withholding tax may conflict with World Trade Organization agreements73.

The third option is to develop an equalization levy that essentially tries


to tax profits of a non-resident firm if it, again, has a “significant economic
presence” within the country. For instance, countries could apply a levy on
all transactions concluded remotely with source country consumers
(assuming the firm maintains a significant economic presence). Another
option would be to charge the levy based on the volume of data collected
from source country consumers and users.

The espoused approaches seem less clearly delineated compared to the


other options. In many respects, the levy appears to resemble transaction
taxes or “bit taxes” that had been previously rejected by the OECD74. The
more recent proposal emphasizes taxing the annual band width of digital
information used by a firm (at least above a sales threshold).
Problematically, the levy may conflict with existing international trade
obligations and generate international double taxation to the extent a firm
is subject to the levy and another tax such as the corporate income tax.
Moreover, the approach seems inconsistent with other OECD reforms that
seek to extend VAT (value added tax) jurisdiction over source country

1553
sales of digital goods and services75. Here too a country could potentially
assess both a levy and a VAT on the same transaction.

In any event, this option along with the others was rightly rejected by
the OECD as representing a significant departure from traditional
international tax principles.

4. IMPACT OF BEPS ON GLOBAL DIGITAL TAXATION

This Part reviews a cross-border structure for a firm engaged in


transactions with digital goods and services. It then assesses the impact of
BEPS reforms on this structure, and concludes that the structure continues
to be viable although prospective reforms on hybrid entities, transfer
pricing, and controlled foreign corporations need to be taken into account.

4.1. Cross-border Structures with Digital Taxation

In its initial report on BEPS, the OECD reviewed a “two-tiered” cross-


border e-commerce structure using a cost contribution arrangement (CCA)
to transfer intangibles among related foreign members of a corporate
group76. A CCA is an agreement whereby members of a multinational
group agree to share costs and risks of developing, producing or selling
goods and services where each participant’s proportional share of the
overall contributions to the arrangement will be consistent with the
resulting income each party enjoys77. For complex global digital
commercial operations, a properly-structured CCA may be able to reduce
global tax liabilities while complying with all relevant national transfer
pricing laws.

The structure, which involved a group of related companies developing


search and advertising technology, included the following elements. Soon

1554
after it begins operation, Company A, a corporation, transfers rights to
technology (that it developed in Country A) to Company C. Company C is
an unlimited liability company registered under the laws of Country B, but
managed in Country C (and is thus a tax resident of Country C). Under the
CCA, Company A receives a “buy in” payment for the technology and
agrees to share the cost of future technology development. The buy-in
payment is fully taxable in Country A. Company C then licenses the
technology to Company D based in Country D. Company D then sub-
licenses the technology to Company B.

Company B is where most of the thousands of the group’s employees


work and is based in Country B that maintains a high corporate income tax
rate. However, in calculating its income in Country B, Company B deducts
the amount of the royalty it pays to Company D, thereby reducing its
taxable profits to less than 1% of its gross revenues. Country B has a tax
treaty with Country D that eliminates withholding for cross-border
royalties.

As detailed in the OECD report, the structure can be designed: (a) to


ensure royalty income is not taxed by any high tax country; (b) to
eliminate withholding taxes on cross-border royalties and; (c) to avoid the
application of controlled foreign corporation rules.

The cross-border e-commerce structure discussed by the OECD


incorporates two traditional international tax planning efforts. First, related
business entities are placed in foreign tax havens to ensure that as many
cross-border royalties as possible are taxed in these zero tax rate countries.
Moreover, the offshore jurisdictions are “shopped” to ensure they have
bilateral tax treaties with the economies where the technology is either
designed or purchased to reduce withholding taxes on these royalties and

1555
to generate other tax benefits such as the tax-free repatriation of after-tax
profits “generated” within the tax havens. The structure is also designed to
comply with the controlled foreign corporation rules of Country B so that
foreign source income is not deemed to be passive income subject to these
rules.

Second, the business entities used are so-called hybrid entities such as
an unlimited liability company that, under the laws of one country, are
treated as a taxable person and, under the laws of the other country, are
treated as a flow-through entity where only the owners of the entity are
subject to tax. This international tax arbitrage strategy is also designed to
promote global tax savings by ensuring that cross-border royalties remain
largely untaxed in high tax countries.

4.2. Impact of BEPS Reforms on Cross-border Structures

As mentioned, the most important recommendations coming out of


Action 1 surround proposed changes to the definition of permanent
establishments. These reforms do not come into play with respect to the
above-noted structure as it does not rely on any permanent establishments.
The OECD concluded that more aggressive reforms (e.g., a new
withholding tax on e-commerce transactions discussed previously) were
not warranted because other BEPS measures “will have a substantial
impact” on aggressive tax planning related to the global digital economy78.
As set out in the Introduction, the OECD maintains that these measures
represent a substantial renovation of traditional tax rules and principles.

In fact, the BEPS project can be portrayed as largely an assemblage of


past efforts to inhibit aggressive planning, in particular previous efforts in
the 1960s such as efforts to tax cross-border passive business income on an

1556
accrual basis via controlled foreign corporation rules as well as (at the time
secret) deliberations concerning the abusive use of tax treaties79. The BEPS
Actions led to innovations in the area of global administrative tax
agreements (that is, the Common Reporting Standard, Country by Country
Reporting80 and the Multilateral Instrument). In terms of possible
substantive tax law changes, the reform efforts generally focus on
bolstering the current environment through specific anti-avoidance rules
(SAARs), general anti-avoidance rules (GAARs), and other traditional
mechanisms.

In an earlier assessment, I noted the main difficulty with the BEPS


project is that it does not address a fundamental incentive within the
international tax regime: multinational corporations should rationally
engage in tax plans as long as the transaction costs they face are lower than
global tax savings they derive via tax planning81. The BEPS project does
nothing to alter this environment. While the project may result in new anti-
avoidance rules, multinational firms should rationally embrace this added
technical complexity even though complex rules raise the risk of, among
other things, international double taxation; these firms take advantage of
the system’s complexity to generate new tax avoidance strategies that
offset the raised transaction costs. Allison Christians and Stephen Shay are
also correct when they point out it is too soon to render any final
judgments about the BEPS project82.

The hypothetical cross-border structure deployed a hybrid entity via


Company C. These hybrid entities, which take advantage of different
national laws that promote dissimilar and often-conflicting tax outcomes,
may be deployed to a greater extent in the digital world. Similarly,
enhanced global activity in the digital world leads to more treaty shopping

1557
to take advantage of treaties with countries that have low or no income
taxes. The OECD BEPS project targets hybrid entities and treaty shopping
through two separate Actions83. To the extent governments modify their
domestic tax rules or tax treaties to inhibit planning through these devices,
it may restrict certain cross-border structures for firms engaged in global
digital sales and services.

As illustrated by the hypothetical, the value firms engaged in global


digital transactions is significantly invested in intangible assets such as
brand, goodwill, copyright, trademark or patents – that may give rise to
cross-border royalty payments. An important concern is to tamp down on
the ability of firms to shift intangible rights to low tax jurisdictions such as
the cross-border payment from Company B to Company D that reduces
taxable income in high tax Country B. Multinational firms sometimes
claim that because of contractual allocations and legal ownership of
intangibles significant profits should be shifted to these jurisdictions even
if the related company performs very few to no business activities. The
BEPS work surrounding transfer pricing revised the guidelines for
intangibles to clarify that legal ownership alone does not necessarily
generate a right to tax all (or even any) of the cross-border royalties
generated by the intangible84. Rather, countries where the companies that
perform important functions, contribute assets and sustain economically
significant risks will be entitled to tax returns from intangibles.

Under this approach, related parties within a multinational firm should


be compensated based on the value they create through functions
performed, assets used and risks assumed in the development,
maintenance, protection and exploitation of intangibles. For instance, the
structure envisions related party payments by Companies A, B, C and D,

1558
despite the fact that the bulk of the economic activities occur in Country B.
Tax authorities could challenge the transfer prices paid to jurisdictions
where less activities are taking place.

Specific rules have been additionally developed to inhibit the use of


cost contribution arrangements that seek to divert profits to low tax
jurisdictions on the basis that the intangible was co-developed (or paid for)
by a related company based in these jurisdictions. For instance, the
reforms try to ensure that contributions, including intangibles, to a cost
contribution arrangement should not be measured at cost where this does
not provide a reliable basis to determine the value contributed by
participants. This reform, if implemented by governments, could affect the
buy-in payment to Company A within the hypothetical.

Efforts have also been directed at inhibiting perceived abuses associated


with the application of the transactional profit split methods. At times,
firms deploy a version of this profit split method to allocate residual profits
from intangibles to companies based in low tax jurisdictions. This tax
planning strategy is at-times conducted by firms with global value chains.
For hard-to-value intangibles, the OECD reforms in this area suggest that
the post-transfer profitability of an intangible can be taken into account to
determine the appropriate transfer prices. Again, this reform could affect
the value of the compensation paid to Company A.

In addition to transfer pricing rules, controlled foreign corporation


(CFC) are expected to be modified as a result of the work of Action 3. This
is important because income generated from intangibles or the sale of
digital goods and services is considered highly mobile. I have explored
how tax planning regarding ‘‘virtual income’’ (defined as income largely
derived from the workings of mobile and intangible computer code) could

1559
subvert traditional international tax rules85. CFC rules generally try to tax
foreign source passive income, including returns on intangibles, on a
current or accrual basis even if this income has not been repatriated from a
foreign country.

The main way that the suggested CFC reforms will address digital
economy matters is via new definitions to capture income so that it is
included as foreign source passive income (called “foreign accrual
property income” or FAPI under Canadian tax law or “Subpart F” income
under U.S. tax law). For instance, the OECD notes that new definitions
may be needed to include profits generated by license fees as well as
certain types of income from sales of digital good and services86. The main
gist of the proposed reforms is to identify whether the CFC is engaged in
substantial economic activities or whether it is really supporting profit
shifting of passive income that ought to be subjected to current taxation by
a residence country.

Finally, reforms efforts have been directed to intellectual property


regimes, including patent boxes, under Action 5. This work follows up on
the OECD’s earlier efforts to inhibit the use of “harmful preferential tax
regimes”87. For transactions that seek to shift intellectual property rights,
the OECD has proposed a new “nexus approach” which looks to firm
expenditures as a proxy for substantial activity. The effort tries to ensure
that countries where significant monies are spent on actual research and
development activities get to tax related returns generated by intangibles.
This effort may inhibit the ability of some multinational firms engaged in
global digital economic activities to deploy “patent boxes” or otherwise
shift income associated with the development of intangibles for tax
planning purposes.

1560
5. CONCLUSION

When the BEPS project was launched in 2013, the OECD touted the
beginning of a new era in international tax reform. Indeed, the OECD and
G20 reform effort represents the most extensive global political tax
cooperation thus far. Four years later, the reforms have led to important
global administrative tax agreements via Country-by-Country Reporting,
the Multilateral Instrument and the Common Reporting Standard.

However, the BEPS project was less successful at promoting


substantive tax law reforms at the domestic level. For the most part, all the
sound and fury coming from the OECD led to few changes that actually
inhibit aggressive international tax planning – although it may be too soon
to pass final judgment.

In particular, Action 1 on global digital taxation witnessed few


developments or recommended changes. To a certain extent, this approach
follows the OECD’s sensible strategy to apply the same tax rules to digital
and conventional economic activities. Most importantly, the permanent
establishment principle was modified to encourage more source state
taxation under certain circumstances where a non-resident company
manages to generate significant profits from source state consumers. Here
we see the ongoing evolution – and dilution – of the traditional permanent
establishment principle, which keeps moving away from its original roots
that mainly fixated on the need for a “fixed place through which business
is conducted”.

More radical reforms such as a withholding tax on cross-border


payments for digital goods and services were properly rejected on the basis

1561
they would represent a significant departure from traditional international
tax principles.

While the global digital taxation reforms will have little bite, other
BEPS reforms may come into play, including the possible domestic
implementation of efforts to inhibit planning involving hybrid entities,
treaty shopping, transfer pricing, and ways around controlled foreign
corporation rules. Overall, the reforms represent ongoing and incremental
change within the international tax regime, and need to be taken into
account by both planners and academics.

1562
Taxation of the Digital Economy: A U.S.
Subnational Perspective
88
Walter Hellerstein

1. INTRODUCTION

The digital economy presents daunting challenges to cross-border


taxation, a proposition so universally recognized that no citation of
authority is necessary. Indeed, if it were, one could simply cite this book!
Although references to cross-border tax challenges typically focus on
international tax issues, cross-border tax issues arise in a variety of
contexts, including among subnational jurisdictions (as in the United
States, Canada, and Brazil) and among “a group of countries bound by a
common legal framework”89 (as in the European Union). Context matters,
of course, and one must be careful about drawing false analogies between
cross-border tax issues from one context to another lest something be “lost
in translation.”90 Nevertheless, cross-border tax issues often raise common
problems in different contexts, and the experience of one set of
jurisdictions in addressing those problems may well be instructive for
other cross-border contexts. With these caveats in mind, this article
considers the tax challenges of the digital economy from the perspective of
the U.S. subnational states (hereafter simply “the U.S. states”) in the hope
that it may shed some light on these issues in other contexts as well.

2. DIRECT TAX ISSUES

Perhaps the two most fundamental issues raised by the digital economy
in the direct tax context are whether the traditional nexus standard of a
physical permanent establishment (reflected in the international bilateral

1563
treaty structure)91 should be modified to reflect a “significant economic
presence”92 and whether income may be attributed to a jurisdiction based
solely on the existence of a market for the taxpayer’s goods or services in
the state along with the extraction and exploitation of data from the state’s
market93. Without entering into the debate over the merits of these
questions – which are explored elsewhere in this book –, the ensuing
discussion describes how the U.S. states (and pertinent U.S. law) have
resolved them.

2.1. Nexus

Although the U.S. Congress possesses broad powers to prescribe the


rules governing state taxation of interstate commercial activity94, including
the nexus standards applicable to state income taxation, Congress has
established nexus standards in only one, narrowly defined context – and
one that long antedates the digital economy. In 1959, in response to a U.S.
Supreme Court decision that broadened states’ authority to tax income
from interstate commerce95, Congress prohibited the states from imposing
a net income tax on income from interstate commerce as applied to any
person whose activities in the state were limited to “the solicitation of
orders… for sales of tangible personal property” when the orders are “sent
outside the State for approval or rejection, and, if approved, are filled by
shipment or delivery from a point outside the State”96. The statute is
carefully circumscribed, applying only to sales of tangible personal
property and only those vendors who limit their in-state activity to
“solicitation of orders”. Accordingly, in the absence of controlling
congressional legislation, the nexus rules applicable to taxation of income
from subnational cross-border activity have largely been articulated by the
courts under broad constitutional principles generally prohibiting the states
from “burdening” interstate commerce97.

1564
To understand the development of the judicial doctrine establishing the
nexus rules applicable to state income taxation of subnational cross-border
activity, one must keep in mind that, in the indirect tax context98, the U.S.
Supreme Court has explicitly embraced a nexus standard of physical
presence. In the celebrated case of Quill Corp. v. North Dakota99, the Court
reaffirmed the rule of its earlier decision in National Bellas Hess, Inc. v.
Department of Revenue100 that out-of-state suppliers cannot be required to
collect sales or use taxes101 unless the vendor is physically present in the
state. However, the Court has deliberately declined to address the question
of whether this rule applies to other taxes (including income taxes). Thus,
the Court explicitly noted on two separate occasions in Quill that “we have
not, in our review of other types of taxes, articulated the same physical-
presence requirement that Bellas Hess established for sales and use
taxes”102 and that “in our cases … concerning other types of taxes, we have
not adopted a similar bright-line physical-presence requirement”103.

In the decades following Quill, there has been an intense debate over
the question of whether a physically remote corporation’s exploitation of
the state’s market – commonly referred to as “economic nexus”104 –
satisfies the judicially articulated Commerce Clause standard105 of required
“substantial nexus”106 for purposes of income, franchise, and other taxes on
business activity. In the overwhelming majority of states where the issue
has been addressed, courts, administrative tribunals, and tax administrators
have embraced the theory that an economic rather than a physical presence
can satisfy the Commerce Clause’s “substantial nexus” requirement107.
Indeed, a number of states (including Alabama, California, Colorado,
Connecticut, Michigan, New York, Ohio and Tennessee) now assert
“economic” nexus for income and other business activity taxes over out-
of-state taxpayers whose in-state sales or receipts exceed a defined

1565
threshold108. The Multistate Tax Commission has adopted a model statute
that asserts nexus based on, among other things, a threshold of sales109. In
addition, a number of states have adopted economic nexus provisions for
financial institutions110. In short, one may reasonably characterize the U.S.
state approach to direct taxation of out-of-state corporations as embracing
a concept of “significant economic presence” and, along with it, an
assertion of nexus over those engaged in the digital economy in the state.

2.2. Income Attribution

The second fundamental direct tax challenge raised by the digital


economy is whether income may be attributed to a jurisdiction based
solely on the existence of a market for the taxpayer’s goods or services in
the state along with the extraction and exploitation of data from the state’s
market111. As the OECD has observed, “while having a market in a country
is clearly valuable to a seller, this condition by itself has not created a
taxing right in the area of direct taxation to this point”112. The question of
whether and, if so, how direct taxing rights should be attributed to the
market jurisdiction lies at the center of the debate over the direct tax
challenges of the digital economy. In the U.S. state tax context, that issue
was addressed and resolved many years ago, but it remains an issue of
continuing controversy, as the ensuing discussion reveals.

When the U.S. states began taxing corporate income in the early part of
the twentieth century113, they generally relied on separate accounting to
determine the geographic source of a taxpayer’s income through
segregation of the profits attributable to a state through identification of
state-specific receipts, costs, and expenses from the taxpayer’s books and
records114. Over the years, however, separate accounting was subjected to
growing criticism. As multistate businesses expanded, particularly during

1566
the second half of the twentieth century, and increasingly dominated the
economies of all states in which they produced, processed, warehoused,
and marketed a great number and variety of products and services, separate
accounting for integrated businesses became even less viable in practice
and more dubious in principle. As a consequence, states generally
embraced formulary apportionment as a method of attributing income to
the state.

In the earliest U.S. Supreme Court decision addressing the propriety of


the formulary apportionment method of income attribution, the Court
approved the method in broad terms115:

The legislature, in attempting to put upon this business its fair share of the
burden of taxation, was faced with the impossibility of allocating specifically the
profits earned by the processes conducted within its borders. It, therefore, adopted a
method of apportionment which, for all that appears in this record, reached, and was
meant to reach, only the profits earned within the state.

The formula employed in the case was a single-factor property formula,


whose numerator consisted of the real and tangible personal property
located in the state and whose denominator consisted of all the taxpayer’s
real and tangible personal property wherever located.

Although many of the early state income tax statutes employed single-
factor property formulas, the states gradually abandoned the traditional
single-factor property formula and other single-factor formulas for more
sophisticated and refined methods of dividing the corporate net income tax
base. During the twentieth century, a broad consensus developed over the
country that, for most manufacturing and mercantile businesses, a three-
factor formula that averaged the ratios of property, payroll, and sales
within the state to the totals throughout the business, ordinarily produced
an equitable and workable division of the corporate net income among the

1567
states. Indeed, by 1978 forty-three of the forty-five states (as well as the
District of Columbia) that imposed corporate income taxes used an equally
weighted three-factor formula of property, payroll, and sales116.

Moreover, the U.S. Supreme Court recognized both the widespread


acceptance of and the underlying justifications for the three-factor formula
for apportioning income. “[N]ot only has the three-factor formula met our
approval, but it has become … something of a benchmark against which
other apportionment formulas are judged”117. The Court further observed
that “[t]he three-factor formula … has gained wide approval precisely
because payroll, property, and sales appear in combination to reflect a very
large share of the activities by which value is generated”118. The Court also
noted that “[t]he standard three-factor formula can be justified as a rough,
practical approximation of the distribution of either a corporation’s sources
of income or the social costs which it generates”119.

Despite the legislative and judicial consensus that had emerged over the
appropriateness of the equally weighted three-factor formula for
apportioning net income, we now know, with the benefit of hindsight, that
1978 was the high water mark for state income tax apportionment
uniformity based on that formula. In that year, U.S. Supreme sustained the
constitutionality of Iowa’s single-factor sales formula in Moorman
Manufacturing Co. v. Bair120. The Court made it clear that federal
constitutional protections for interstate commerce did not require judicial
articulation and enforcement of uniform division-of-income rules, because
it was to Congress – not the Court – “that the Constitution has committed
such policy decisions”121. Furthermore, since 1978 the states have
increasingly abandoned the equally weighted three-factor formula for
formulas that give greater – if not exclusive – weight to the sales factor for

1568
reasons that have little to do with sound state tax policy and everything to
do with state “economic development” policy122. Indeed, fewer than one
third of the states with corporate income taxes currently employ the
equally weighted three-factor formula, and only eight rely on it
exclusively, as the following table reveals.

TABLE 1 – STATE APPORTIONMENT OF CORPORATE


INCOME123

(Formulas for tax year 2017)

ALABAMA Double wtd Sales NEBRASKA Sales

ALASKA 3 Factor NEVADA No State Income Tax

Sales/Double wtd NEW


ARIZONA Double wtd Sales
Sales HAMPSHIRE

ARKANSAS Double wtd Sales NEW JERSEY Sales

80% Sales, 10%


CALIFORNIA Sales NEW MEXICO
Prop/Payroll

COLORADO Sales NEW YORK Sales

NORTH
CONNECTICUT Sales Quadruple wtd Sales
CAROLINA

NORTH
DELAWARE (4) Double wtd Sales 3 Factor
DAKOTA

FLORIDA Double wtd Sales OHIO No State Income Tax

GEORGIA Sales OKLAHOMA 3 Factor

HAWAII 3 Factor OREGON Sales

IDAHO Double wtd Sales PENNSYLVANIA Sales

ILLINOIS Sales RHODE ISLAND Sales

1569
INDIANA Sales SOUTH Sales
CAROLINA

SOUTH
IOWA Sales No State Income Tax
DAKOTA

KANSAS 3 Factor TENNESSEE Triple wtd Sales

KENTUCKY Double wtd Sales TEXAS Sales

LOUISIANA 3 Factor UTAH Sales

MAINE Sales VERMONT Double wtd Sales

Sales/Double wtd Double wtd


MARYLAND VIRGINIA
Sales Sales/Sales

Sales/Double wtd
MASSACHUSETTS WASHINGTON No State Income Tax
Sales

MICHIGAN Sales WEST VIRGINIA Double wtd Sales

MINNESOTA Sales WISCONSIN Sales

MISSISSIPPI Sales/Other WYOMING No State Income Tax

DIST. OF
MISSOURI 3 Factor Sales
COLUMBIA

MONTANA 3 Factor

Notes to Chart

The formulas listed are for general manufacturing businesses. Some


industries have a special formula different from the one shown.

Slash (/) separating two formulas indicates taxpayer option or specified


by state rules.

3 Factor = sales, property, and payroll equally weighted.

Double wtd Sales = 3 factors with sales double weighted

1570
Sales = single sales factor

So what implications do the U.S. state approach to and experience with


income attribution have for the digital economy? First, and most
important, they demonstrate that “the market,” as reflected in the sales
factor embodied in income apportionment formulas, has a long and storied
history as a legitimate basis for income attribution. Although “having a
market in a country … by itself” may have “not created a taxing right in
the area of direct taxation to this point”124 under international income
attribution rules embodied in the OECD’s Model Tax Convention and
transfer pricing guidelines, the U.S. subnational experience suggests that
the market, by itself, does have a legitimate role to play in income
attribution. Indeed, the European Union’s proposed Common Consolidated
Corporate Tax Base (CCCTB), which included a three-factor income
apportionment formula analogous to the formula historically employed by
the U.S. states, lends further support to that suggestion125. In short, the U.S.
states’ experience demonstrates that the market has been viewed as a
legitimate basis for income attribution and, insofar as corporations taxable
in the United States are currently deriving income from the digital
economy, their income is being assigned in whole or in part on a market
basis.

Second, the U.S. experience may also be read as a cautionary tale about
excessive reliance on the market as a factor in assigning direct taxing
rights, even in a digital economy. As legitimate as it may be to rely on the
market as one of several indicators of income attribution, to rely largely or
exclusively on the market as many U.S. states now do through their
apportionment formulas126 is difficult if not impossible to defend as a
matter of tax policy. Although it may no longer be true as the U.S.

1571
Supreme Court suggested a century ago that the definition of income may
be limited to “the gain derived from capital, from labor, or from both
combined”127, to ignore capital and labor entirely in the attribution of
income blinks reality even in a digital economy.

3. INDIRECT TAX ISSUES

In contrast to the debate in the direct tax context over the proper
assignment of taxing rights, when it comes to indirect taxes – most
importantly broad-based consumption taxes such as value added taxes
(VATs), goods and services taxes (GSTs), and retail sales (RSTs) – there
is (or at least there should be) no debate about where taxing rights should
be assigned, even in a digital economy. As the OECD’s recently adopted
International VAT/GST Guidelines128 make clear, consumption should
be taxed where consumption occurs under the destination principle129:

[T]here is widespread consensus that the destination principle, with revenue


accruing to the country of import where final consumption occur is preferable to the
origin principle from both a theoretical and practical standpoint. In fact, the
destination principle is the international norm and is sanctioned by World Trade
Organization (WTO) rules.

The destination principle is also largely embraced by the U.S. state


RSTs130. Accordingly, the key challenge that the digital economy poses to
indirect tax regimes is how to assure effective collection of the tax at
destination when the supplier is not located in the jurisdiction of
taxation131.

3.1. Nexus

As noted above, despite the existence of ample power in the U.S.


Congress to prescribe the rules governing state taxation of interstate
commercial activity, including rules providing for collection of RST on

1572
cross-border sales when the seller is not located in the jurisdiction of
taxation132, and despite the introduction of proposed legislation to address
these issues133, Congress thus far has not acted. Consequently, for the
moment at least the basic rules governing taxation of cross-border sales are
those reflected in U.S. constitutional doctrine limiting the states’ power to
tax interstate commerce, and, specifically, the rule of Quill134 that prohibits
the states from imposing an RST collection obligation on a supplier
without physical presence in the state. In this respect, then, the challenges
that the digital economy poses to the US subnational cross-border
consumption taxes resemble the challenges it poses to international cross-
border consumption taxes insofar as the jurisdiction of taxation (the
destination jurisdiction) may have limited or no authority effectively to
enforce a collection or other compliance obligation upon the supplier who
is not located in the jurisdiction of taxation135.

3.2. US State Strategies for Addressing the Distance Selling Problem under
the RST

In addition to their efforts to persuade Congress to enact legislation


authorizing the states to require collection of tax on remote sales136, and
direct legislative and judicial challenges seeking U.S. Supreme Court
reconsideration and reversal of the rule of Quill137, states have adopted a
variety of strategies for addressing the distance selling problem when the
vendor is not located in the jurisdiction with the RST taxing rights, a
problem that virtually defines the digital economy. All of these strategies
are designed to deal with the problem created by Quill, namely, that no
obligation to collect the RST can constitutionally be imposed on a vendor
(or other potential tax collector) without physical presence in the state. The
strategies are therefore designed either to identify a potential tax collector
that does have physical presence in the state or to make tax collection

1573
sufficiently easy or attractive so that potential tax collectors voluntarily
agree to collect the tax. The ensuing discussion briefly describes the most
important strategies that the states have adopted.

3.2.1. Business-to-Business (B2B) Sales: Reverse Charge (Direct Pay)

In the context of business-to-business (B2B) sales, there is a readily


available strategy for effective tax collection on cross-border sales when
that remote vendor cannot be required to comply with the collection
obligation, namely, shifting the tax collection or remittance obligation to
the business purchaser. Indeed, in the so-called “reverse charge” is well
recognized in the global VAT/GST context and the OECD recommends
the approach in the International VAT/GST Guidelines for enforcement
of the destination principle with respect to cross-border B2B supplies of
services and intangibles138. For most of the reasons advanced in the global
context, the guidance generally applies as well to the taxation of remote
B2B sales under the U.S. RST. First, the tax authority in the business
purchaser’s jurisdiction “can verify and ensure compliance since that
authority has personal jurisdiction over the customer”139. Second, the
compliance burden is largely shifted from the vendor to the customer and
is minimized since the customer has full access to the details of the sale140.
Third, the administrative costs for the tax authority are also lower because
the vendor “is not required to comply with tax obligations in the
customer’s jurisdiction”141. Fourth, it reduces the revenue risks associated
with the collection of tax by non-resident vendors142.

In fact, the reverse charge is no stranger to the U.S. RST. The reverse
charge mechanism is analogous to the use of a “direct pay” permit under
which some business taxpayers, especially larger purchasers, may register
with states and agree to “self-assess” a use tax on all taxable goods and

1574
services they purchase143. The Federation of Tax Administrators describes
the direct payment process as follows144:

Direct pay is authority granted by a tax jurisdiction that generally allows the
holder of a direct payment permit to purchase otherwise taxable goods and services
without payment of tax to the supplier at the time of purchase. (Also in the case of
exempt transactions, it allows a holder to purchase without issuing exemption
certificates.) Suppliers are to be furnished a written notification of the purchaser’s
direct pay authority (often a numeric designation). The holder of the direct payment
permit is to timely review its purchases and make a determination of taxability and
then reports and pays the applicable tax due to the tax jurisdiction. The permit
holder’s tax determination and adequacy of payment are subject to audit by the tax
jurisdiction.

In light of the existence of “direct pay” authority under U.S. RSTs, and
its advantages from a tax enforcement standpoint (particularly with regard
to remote sales), one may wonder why states have not generally adopted
the direct pay mechanism as a mandatory requirement for all remote B2B
sales, thereby addressing (if not substantially resolving) the enforcement
issues with regard to such sales, rather than relegating it to a voluntary
system that tends to be confined to larger purchasers. The answer probably
lies in the fact that, in contrast to VAT regimes under which most
businesses are already registered as part of the staged-collection process,
many businesses are not registered under the single-stage U.S. RST.
Accordingly, imposition of a universal “direct pay” requirement for
business purchasers under the U.S. RST would impose a substantial new
tax compliance obligation on previously unregistered vendors. Moreover,
because there is generally a legal obligation imposed on purchasers,
whether or not registered for sales or use tax purposes, to remit use tax on
taxable items with respect to which sales tax has not been collected, many
businesses already comply with their use tax remittance obligations, which
states routinely monitor through audits145. That said, in light of the
increasing enforcement challenges of remote sales in the B2B context

1575
under the U.S. RST, states might well consider expanding the scope of
direct pay authority and, perhaps with appropriate thresholds for small
purchasers, making direct payment mandatory rather than voluntary.

3.2.2. Business-to-Consumer (B2C) Sales

Because customer collection is generally not regarded as a viable option


for the collection of a VAT or RST on cross-border sales from vendors to
final consumers (B2C sales)146, jurisdictions have essentially two other
options for the effective collection of tax on B2C sales when the vendor is
not located in the jurisdiction of taxation: (1) enlist some other participant
involved in the transaction and with respect to whom it does have
enforcement jurisdiction, e.g., an intermediary, to collect the tax; (2) adopt
a simplified registration and collection regime under which compliance is
sufficiently easy or attractive that vendors are induced to comply with their
tax obligations notwithstanding the jurisdiction’s absence of power to
compel compliance. The states have pursued both options in their efforts to
collect tax on the remote sales that characterize the digital economy, and
we examine each of these initiatives in turn.

3.2.2.1. Intermediaries

In 2017, four states (Minnesota, Pennsylvania, Rhode Island, and


Washington) enacted legislation that for the first time explicitly targeted
marketplace platforms147 in connection with state sales and use tax
administration. Because marketplace platforms lie at the heart of the
digital economy, and other states are likely to enact marketplace platform
legislation in the future, we briefly describe the key features of the
legislation148.

1576
Minnesota. In what is generally heralded as “the nation’s first
marketplace nexus provision”149, Minnesota enacted legislation on May 30,
2017 (effective July 1, 2019) that imposes tax collection obligations on or
attributable to “marketplace providers”. The legislation accomplishes this
objective by amending the definition of a “retailer maintaining a place of
business in this state”, on which the statute imposes tax collection
obligations, to include a “retailer having a representative, including … a
marketplace provider … operating in this state”150. A retailer is represented
by a marketplace provider “if the retailer makes sales in this state
facilitated by a marketplace provider that maintains a place of business in
this state”151. A “marketplace provider” is “any person who facilitates a
retail sale by a retailer by”:

1) listing or advertising for sale by the retailer in any forum, tangible personal
property, services, or digital goods that are subject to tax under this chapter;
and
2) either directly or indirectly through agreements or arrangements with third
parties collecting payment from the customer and transmitting that payment
to the retailer regardless of whether the marketplace provider receives
152
compensation or other consideration in exchange for its services .

A marketplace provider must collect sales and use tax on all “facilitated
sales” for a retailer unless the retailer has registered to collect sales and use
tax153. This collection obligation applies not only to sales of tangible
personal property, but also to sales of digital products and taxable
services154. Minnesota provides a threshold applicable to retailers selling
through marketplace providers. The law provides that a retailer with less
than $10,000 of annual sales has no tax collection obligation if it is a
“retailer maintaining a place of business in the state solely because it made
sales through a marketplace provider”155. If the retailer is not “maintaining
a place of business” in Minnesota, it does not have an obligation to collect

1577
tax on its sales into Minnesota156. In turn, the marketplace provider does
not acquire an obligation to collect with respect to that retailer’s sales.

Washington. On July 7, 2017, Washington adopted legislation


effective January 1st, 2018 “to address the significant harm and unfairness
brought about by the physical presence nexus rule”157. Among other things,
the legislation requires “marketplace facilitators” to elect either to (1)
collect and remit sales and use tax on all taxable sales into the state or (2)
comply with specified tax notice and reporting provisions158. A
“marketplace facilitator” is a “person that contracts with sellers to facilitate
… the sale of the seller’s products through a physical or electronic
marketplace operated by the person”, whose own or facilitated sales in the
state equal or exceed $10,000, and who engages in any of the following
activities:

•transmitting or communicating the offer or acceptance between buyer and


seller;
•owning or operating the infrastructure that brings buyers and sellers together;
•providing a virtual currency that buyers are allowed or required to use to
purchase products from the seller;
•software development or research related to the electronic marketplace;
•with respect to the seller’s products, payment processing, fulfillment, or
storage services; listing products for sale; setting prices; order taking;
159
advertising; customer service; assisting with returns or exchanges .

A marketplace facilitator “is deemed to be an agent” of any marketplace


seller that makes retail sales through the marketplace160.

The provision of an election for marketplace facilitators to collect or


report is confined to situations in which the marketplace seller lacks a
physical presence with respect to facilitated sales and in which the
marketplace facilitator lacks a physical presence with respect to its own
sales. Thus the statute provides that the election applies only with respect

1578
to sales through the marketplace facilitator’s marketplace “by or on behalf
of marketplace sellers who do not have a physical presence in this
state”161 and only with respect to the marketplace facilitator’s own sales
“if the marketplace facilitator does not have a physical presence in the
state”162. Accordingly, when such a physical presence does exist, tax
collection is required, and there is no option to report or collect.

The foregoing limitation of the reporting/collection option to


circumstances in which the marketplace facilitator, on the one hand, or the
marketplace seller, on the other hand, lacks physical presence constitutes a
bow to the reality of the current state of the law under which the state
cannot require a non-physically present person to comply with sales and
use tax collection obligations under Quill but nevertheless may impose
sales and use tax reporting obligations on such non-physically present
persons under Direct Marketing Association v. Brohl163. By offering a
collect-or-report option to market facilitators and referrers when the
marketplace seller or the marketplace facilitator lacks physical presence in
the state, the legislature is presumably hoping to induce such market
facilitators and referrers to collect the tax, because the collection burden
may well be less onerous than the reporting burden.

Rhode Island. On August 3, 2017, Rhode Island enacted its version of


marketplace platform legislation. Although Rhode Island law does not
impose tax collection obligations on online marketplace platforms,
effective January 15, 2018, Rhode Island requires “retail sale facilitators”
to provide state tax authorities with:

•a list of names and addresses of the retailers for whom during the prior
calendar year the retail sale facilitator collected Rhode Island sales and use
tax; and

1579
•a list of names and addresses of the retailers who during the prior calendar year
used the retail sale facilitator to serve in-state customers but for whom the
164
retail sale facilitator did not collect Rhode Island sales and use tax .

The obligation applies only to retail sale facilitators that either have
gross revenue of at least $100,000 from the sale of property or services
delivered into the state or that have sold such property or services in at
least 200 separate transactions165. In addition, there is no obligation with
respect to facilitated sales with respect to retailers that are registered with
the state or that have a Streamlined Sales and Use Tax exemption
certificate166.

A “retail sale facilitator” is any person that facilitates a sale by a retailer


by engaging in the following types of activities:

•using in-state software to make sales at retail of tangible personal property,


prewritten computer software delivered electronically or by load and leave,
and/or taxable services; or
•contracting or otherwise agreeing with a retailer to list and/or advertise for sale
tangible personal property, prewritten computer software delivered
electronically or by load and leave, and/or taxable services in any forum,
including, but not limited to, an Internet website; and
•either directly or indirectly through agreements or arrangements with third
parties, collecting payments from the in-state customer and transmitting those
167
payments to a retailer .

Pennsylvania. On October 30, 2017, Pennsylvania enacted its version


of platform legislation effective March 1, 2018168. Pennsylvania’s platform
legislation bears striking resemblance to Washington’s legislation, with
several notable differences, including Pennsylvania’s limitation of its
legislation to sales of tangible personal property169. The legislation requires
“marketplace facilitators” with $10,000 in aggregate sales of tangible
personal property delivered to locations in Pennsylvania to file an election
with the department of revenue either to (1) collect and remit sales tax on

1580
sales of tangible personal property within Pennsylvania or (2) comply with
tax notice and reporting requirements (generally of the same variety as
those upheld in Direct Marketing and imposed by other platform
legislation)170. Like Washington’s legislation, Pennsylvania’s legislation
limits the availability of the “election” for marketplace facilitators to (1)
facilitated sales “made by or on behalf of” marketplace sellers not
maintaining a place of business in the state and (2) the marketplace
facilitators’ own sales if the marketplace facilitator does not maintain a
place of business in the state171.

A “marketplace facilitator” is defined as a “person that facilitates the


sale at retail of tangible personal property”172. A person “facilitates” a sale
at retail if the person or an affiliated person:
173
1) lists or advertises tangible personal property for sale at retail in any forum ;
and
2) either directly or indirectly through agreements or arrangements with third
parties, collects the payment from the purchaser and transmits the payment to
174
the person selling the property .

The definition of “marketplace facilitator” does not specify for whom


the marketplace facilitator facilitates sales of tangible personal property.
However, the legislation answers this question by including a definition of
“marketplace seller”175. A “marketplace seller” is defined as “a person that
has an agreement with a marketplace facilitator pursuant to which the
marketplace facilitator facilitates sales for the person”176.

3.2.2.2. Simplified Collection Regimes

The principal guidance from a global perspective bearing on the indirect


challenges of the digital economy with respect to collection of VAT/GST
when the supplier is not located in the jurisdiction of taxation is the

1581
recommendation that jurisdictions consider adopting simplified
registration and collection regimes177. The Guidelines (and related OECD
guidance) elaborate upon this recommendation in some detail178, and a
number of regimes have already taken it to heart, including the Member
States of the European Union179, New Zealand180 and Australia181.

The global guidance for taxing remote B2C supplies would appear
generally to apply as well to the taxation of remote B2C sales under the
US RST.

In the US subnational context, many states have adopted a simplified


RST registration and collection regime as an alternative to their traditional
compliance regimes in conjunction with their membership in the
Streamlined Sales and Use Tax Agreement (SSUTA), which became
effective in 2005182. The fundamental purpose of SSUTA is “to simplify
and modernize sales and use tax administration in the member states in
order to substantially reduce the burden of tax compliance”183. Registration
under SSUTA is voluntary, but SSUTA provides a number of inducements
to voluntary registration, including one-stop multistate electronic
registration; waiver of registration fees; streamlined return and remittance
procedures; relief from certain liabilities; enhanced compensation for tax
collection obligations; and amnesty for certain uncollected or unpaid
taxes184. A primary target of SSUTA are remote sellers who do not have
nexus in most of the states in which they have customers, i.e. taxpayers
that are not located in the jurisdiction of taxation.

The US state of Alabama, which is not a member of SSUTA, has


adopted its own simplified tax compliance regime, “The Simplified Seller
Use Tax Remittance Act”185, directed specifically at taxpayers that are not
located in the state. The legislation allows remote sellers to register

1582
voluntarily to collect Alabama tax on sales into the state, report
electronically, and avoid the complexity of calculating combined state and
local tax rates. In addition, sellers generally may retain 2 percent of the tax
they collect.

4. CONCLUSION

If the foregoing overview of the tax challenges of the digital economy


from a US subnational perspective has accomplished nothing else, it has
presumably provided evidence for the proposition advanced at the outset
of this discussion that “cross-border tax issues often raise common
problems in different contexts”. Although it remains an open question
whether, and the extent to which, U.S. subnational experience may be
“translated” into instructive guidance for other cross-border contexts186,
one may suggest that, like the digital economy itself, the tax problems and
solutions associated with the digital economy are not effectively confined
by borders.

1583
Australia’s Multinational Anti-Avoidance
Law (2016): Treating the symptom rather
than the disease
187
Michael Kobetsky

1. INTRODUCTION

In July 2017, it was reported that funds held by US non-financial


multinational enterprises (MNEs), from non-US income, was US$1.84
trillion at the end of 2016188. Provided the income is not remitted to the US,
under the US Tax Code prior to the December 2017 amendments, these
non-US earnings of US multinationals are shielded from US taxation. The
top five cash-rich US companies according to the report are the bedrock of
the world’s digital economy: Apple, Microsoft, Google, Cisco and
Oracle189. In this group, Google is the biggest media entity in the world and
reported in 2016 that its revenue from advertising was US$79.4 billion190.
Google advertising can reach an audience of millions of individuals and its
consumer data can be used to target advertising191.

Prior to the sweeping changes to the US Tax Code enacted by


legislation informally called the Tax Cuts and Jobs Act being signed into
law by President Trump on 22 December 2017192, the US used a
worldwide taxation system in which US MNEs were taxed on foreign
earnings and given a credit for any foreign tax paid. By enacting the Tax
Cuts and Jobs Act the US has moved to a territorial system193. Under the
previous worldwide tax system, US MNEs were able to avoid US taxation
on foreign earnings by deferral; this involved not remitting foreign
earnings to the US parent company through a range of techniques.

1584
Avoidance of US taxation through deferral provides MNEs with an
additional incentive to minimise the tax they pay on their foreign earnings.
As tax on the non-US income is being deferred, any foreign tax paid is a
cost of business that is not recouped until the foreign earnings are remitted
to the US, at which time a foreign tax credit is claimed.

One of the techniques used by Google to avoid taxation in host


countries was to ensure that it avoided permanent establishment status in
those countries. Under tax treaties, if an enterprise which derives business
profits in a host country has no permanent establishment, the host country
loses its taxing rights over the business profits. Google has used entities
that are resident in Ireland and Singapore to avoid taxation in host
countries using Ireland’s and Singapore’s tax treaties, respectively. Google
used this scheme to avoid taxation in Australia by avoiding permanent
establishment status prior to Australia enacting the “Multinational Anti-
Avoidance Law”194 (MAAL) in 2015. The MAAL reflects the first limb of
the UK’s Diverted Profits Tax195.

The OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting (BEPS) project was
initiated to counter aggressive tax avoidance by MNEs. The objective
underlying the BEPS actions was a consensus response by member
countries to minimise the risk of individual countries engaging in
unilateral action to protect their tax base which may result in “avoidable
uncertainty and unrelieved double taxation”196. The strategy is that
governments need to achieve consensus to counter the gaps in domestic
law and tax treaties197. BEPS Action 7 prevents enterprises avoiding
dependent agent permanent establishment status by ensuring that the
dependent agent does not have the formal authority to enter into contracts.
BEPS Action 7 is an optional measure and is not a “minimum standard”

1585
under the OECD/G20 Inclusive Framework198. It is expected that Action 7
“Additional Guidance on the Attribution of Profits to a Dependent Agent
Permanent Establishment” will be finalised in 2018199. The BEPS Action 7
reform, which may be implemented through Article 12 of the Multilateral
Convention to Implement Tax Treaty Related Measures to Prevent Base
Erosion and Profit Shifting200 (MLI), treats an enterprise as having a
permanent establishment if the dependent agent does most of the work
leading to a contract. In addition, BEPS Action 6, a “minimum standard”
under the Inclusive Framework, includes measures to prevent treaty abuse,
with the principal purpose test being the most popular option. This
measure denies tax treaty benefits if the taxpayer’s principal purpose is to
obtain treaty benefits.

Although Australia is a member country of both the OECD and G20,


and despite the underlying objective of the BEPS project for consensus
responses, Australia has adopted, inter alia, the MAAL, a unilateral
response outside the BEPS Actions. The MAAL may treat an MNE as
having a permanent establishment in Australia or, if the MNE has a
permanent establishment in Australia, it may attribute additional profits to
a permanent establishment. This article, with Google as a case study,
argues that while the MAAL has proven to be effective in countering the
avoidance of permanent establishment status in Australia by large MNEs,
but implementing Article 12 of the MLI would have been equally effective
if it had been widely adopted. The advantages of implementing Article 12
of the MLI would be simplicity and consensus, and if double taxation
disputes arise, they can be dealt with under the mutual agreement
procedure in tax treaties. By comparison, the MAAL involves a complex
unilateral approach to countering MNE tax avoidance.

2. BACKGROUND

1586
Under the business profits article of the OECD Model Tax Convention
on Income and on Capital201 (OECD Model (2017)) (Article 7(1)), a host
country cannot tax the business profits derived by an enterprise resident in
the other country unless the enterprise has a permanent establishment in
the host country. The term “permanent establishment” is defined in Article
5 of the OECD Model but there are gaps in the definition. This part will
focus on two aspects of the definition, the fixed geographic place of
business permanent establishment and the dependent agent permanent
establishment.

Article 5(1) provides that an enterprise will satisfy the permanent


establishment threshold requirements if it has a fixed place of business in
the source country through which the business of the enterprise is partly or
wholly carried on. An enterprise that has an office in the host country that
sells internet advertising to business customers in the host country would
have a permanent establishment; the office would be treated as a fixed
geographic place through which advertising services are rendered by the
enterprise to the business customers. This aspect of the definition is easily
avoided by not operating through a fixed place of business in the host
country.

To deal with the travelling salesperson, former Article 5(5) of the


OECD Model provided that an enterprise will be deemed to have a
permanent establishment in the host state if the enterprise has a person
(dependent agent), who is not an independent agent, in the host country
with the authority to enter into contracts on behalf of the enterprise and the
person habitually exercises that power202. A dependent agent is an
employee or an agent that is economically dependent on the principal.
Under former Article 6(6) an agent that is carrying on an independent

1587
business that is not economically dependent on the enterprise is not treated
as being a permanent establishment. The dependent agent permanent
establishment test does not require the enterprise to have a fixed
geographic location in the host state.

Article 5(5) of the OECD Model (2017) expands former Article 5(5) by
treating an enterprise as having a deemed permanent establishment if a
person in the host country “habitually plays the principal role leading to
the conclusion of contracts that are routinely concluded without material
modification by the enterprise, and these contracts are a) in the name of the
enterprise, or b) for the transfer of the ownership of, or for the granting of
the right to use, property owned by that enterprise or that the enterprise has
the right to use, or c) for the provision of services by that enterprise”203.

The permanent establishment test is viewed as reflecting the notion that


once a permanent establishment is created, the enterprise is participating in
the economic life of the host country. The OECD Commentary on former
Article 7(1) noted that (emphasis added)204:

First, it [Article 7(1)] restates the generally accepted principle of double taxation
conventions that an enterprise of one State shall not be taxed in the other State
unless it carries on business in that other State through a permanent establishment
situated therein. It is hardly necessary to argue here the merits of this principle. It is
perhaps sufficient to say that it has come to be accepted in international fiscal
matters that until an enterprise of one State sets up a permanent establishment in
another State it should not properly be regarded as participating in the economic
life of that other State to such an extent that it comes within the jurisdiction of that
other State’s taxing rights.

The internet has enabled digital MNEs to substantially participate in the


economic life of a host country without meeting the permanent
establishment requirements in former Article 5 of the OECD Model205.
Some MNEs avoid dependent agent permanent establishment status in the

1588
host country by having representatives in the country that, in substance,
negotiate the terms of a contract but they do not have the formal authority
to enter into contracts. The contracts are concluded by an entity that is
resident in a country that has a treaty with the host country. The MNE then
claims that as it does not have a permanent establishment in the host
country the income from the contract activity is only taxable in the
residence country. These schemes are artificial and contrived tax
avoidance. This gap in the permanent establishment definition has been
addressed by a BEPS Action 7 measure that treats an enterprise as having
a dependent agent permanent establishment if the dependent agent plays a
principal role in the process leading to a contract for the enterprise206. US
MNEs were avoiding permanent establishment status in host countries by
implementing deferral schemes to enable these MNEs to permanently
avoid US taxation on their non-US income. The advantage of such deferral
is that the deferred US tax liability is in effect a government subsidy to US
MNEs providing them with a competitive advantage globally over non-US
MNEs207. A web of differential tax laws enables this result.

3. GOOGLE’S “DOUBLE IRISH” AND “DUTCH SANDWICH” TAX


AVOIDANCE STRUCTURE

Google and other US MNEs have used Ireland, Singapore, the


Netherlands and Bermuda to defer tax on a long-term basis on non-US
earnings. Alphabet Inc, a public company incorporated in the US in 2015,
is the holding company of the Google group. Alphabet Inc’s subsidiaries
include Google Inc, a company incorporated in the US in 2015208. The
Google group has two entities incorporated in Ireland, Google Ireland
Limited (Google Ireland Limited (Ireland)) and Google Ireland Holdings
(Google Ireland Holdings (Bermuda)) which are the “Double Irish”
component of Google’s US taxation planning structure209. While both

1589
companies are incorporated in Ireland, Google Ireland Holdings
(Bermuda) is resident in Bermuda and not Ireland210. Google Ireland
Limited (Ireland) is resident in Ireland and is therefore able to use
Ireland’s tax treaties including its tax treaty with Australia. Google Ireland
Holdings (Bermuda) is a subsidiary of Alphabet Inc211. Google Ireland
Limited (Ireland) is a subsidiary of Google Inc212. The “Dutch Sandwich”
component is that the payments to Google Ireland Holdings (Bermuda) are
made through an interposed Google entity in the Netherlands to avoid Irish
royalty withholding tax.

Most countries treat a company incorporated in the jurisdiction as being


resident in the jurisdiction. The other commonly used residency test is the
central management and control test in which a company is treated as a
resident if it is incorporated abroad but it has central management and
control in the jurisdiction. Prior to 1 January 2015 Ireland used a central
management and control test and consequently only Google Ireland
Limited (Ireland) is resident in Ireland under this test. Ireland has amended
its residency tests to treat companies incorporated in Ireland as resident in
Ireland but it grandfathered until 31 December 2020 the new residency
rules for companies that were incorporated in Ireland before 2015.

3.1. Subpart F of the US Tax Code

A US company that is conducting its business operations abroad


through a foreign corporation has the advantage of income deferral of the
foreign company’s income213. The US shareholders of a foreign
corporation are usually only taxed in the US on dividends received from
the foreign company. The US has anti-deferral measures in Subpart F of
the US Tax Code to counter deferral of passive income such as dividends,
interest, rent and royalties derived by foreign companies controlled by US

1590
shareholders. Passive income derived by a controlled foreign company
(CFC) in a tax haven is considered to be tax avoidance. Under Subpart F
certain income, such as passive income, is treated as personal foreign
holding company income and is attributed to the US shareholders.

Subpart F provides an exemption for certain income received by a CFC


from a related CFC incorporated in the same jurisdiction (same country
exception) that uses a substantial part of its assets in trade or commerce in
that country (s 953(c)(3) of the US Tax Code)214. The income is not treated
as foreign personal holding company income and is therefore exempt from
attribution under Subpart F. The basis for the same country exception is
that two CFC incorporated in the same jurisdiction cannot engage in tax
arbitrage as they are subject to the same tax laws. Ireland provided an
opportunity for US MNEs to exploit Subpart F. Subpart F only requires
that the CFCs are incorporated in the same country to qualify for the same
country exception but does not require them to be resident in the country
of incorporation.

The US treats Google’s two Irish companies, which are CFCs, as being
eligible for the same country exception because they were both
incorporated in Ireland. As discussed below, Google Ireland Limited
(Ireland) is required to pay royalties to Google Ireland Holdings
(Bermuda). These royalties are exempt from attribution under the same
country exception in Subpart F. As Google Ireland Holdings (Bermuda) is
resident in Bermuda and not Ireland, it is able to derive the royalties tax-
free in Bermuda.

Despite Ireland amending its residency rules, US MNEs will be able to


continue avoiding tax under Subpart F. The check-the-box provisions in
the US now allows US MNE groups to elect to treat a foreign affiliate as

1591
being fiscally transparent215 and exempt from the operation of Subpart F216.
In addition, Subpart F includes a temporary “look-through” rule217 which
provides for look-through treatment for certain payments between related
CFC218. Under the look-through rule passive income derived by a CFC
from a related CFC is not treated as personal foreign holding company
income. While the look-through rule is temporary, an extension is usually
provided; the current extension ends in 2019219.

After the income is derived by Google Ireland Holdings (Bermuda) free


of income tax, the funds are used to fund Google’s active business
operations outside the US. The deferred US tax liability on the deferred
income is in effect a loan from the US Treasury to Google. The only
restriction is that the funds cannot be remitted to the US as then they
would be subject to US taxation.

As revealed in evidence to an Australian Senate Committee, Google Inc


is the owner of Google’s intellectual property220. Google Inc has licenced
its intellectual property for the non-Americas to Google Ireland Holdings
(Bermuda). Google Ireland Holdings (Bermuda) sub-licences the
intellectual property to two of Google’s regional headquarters, Google
Asia-Pacific (Singapore) and Google Ireland Limited (Ireland)221. Google
Ireland Holdings (Bermuda) has the licencing rights for Europe, the
Middle East and Africa. Google Asia-Pacific (Singapore) has the licencing
rights for the Asia-Pacific region.

According to Google’s filings with the Netherlands Chamber of


Commerce on 22 December 2017, Google Ireland Holdings (Bermuda)
was paid US$19.2 billion in 2016222. The funds were paid to Google
Ireland Holdings (Bermuda) by a Google Netherlands entity that has no
employees223. As stated above, the Netherlands entity is the “Dutch

1592
Sandwich” component of the avoidance scheme. Google has reported to
the US Securities and Exchange Commission that it had deferred foreign
income of US$60 billion at the end of 2016224. Bloomberg reported in 2010
that Google group had avoided US$3 billion in taxation in the preceding
three years through deferral planning using entities in Ireland, the
Netherlands and Bermuda. At the time, Google’s tax rate on its non-US
earnings was 2.4 per cent and the lowest of the top six technology
companies225. The article notes that Google’s tax rate on its non-US
income was remarkable as it operates in countries where the tax rate is
around 20 per cent226.

3.2. Google’s tax history in Australia

In 2011, Google Australia was reported to have a tax liability of


A$74,176 according to its filings with the Australian Securities
Investments Commission227. The filings claimed that Google Australia’s
2011 income was A$201 million. Google’s reported income was more
than A$1 billion from Australian customers for Google search engine and
advertising services. It was claimed that Australian business customers had
concluded contracts with Google Asia-Pacific (Singapore) which is
resident in a country with which Australia has a tax treaty. This resulted in
Google avoiding dependent agent permanent establishment status in
Australia.

To further illustrate the extent of Google’s tax avoidance in Australia,


the Australian Tax Commissioner (Commissioner) claimed in November
2017 that Google had been previously treated as a “small and medium
enterprise” by the Australian Taxation Office (ATO) because Google’s
turnover was less than A$250 million228. The situation has changed
significantly following the commencement of the MAAL.

1593
The ATO has obtained additional information about the operation of
foreign MNEs, which would be expected to include Google in Australia by
directly interviewing their customers and employees, despite the MNEs
objecting to this practice229. The ATO has evidence of salespersons of
MNEs working in Australia that received a base salary and “a bonus for
origination of sales”230. This evidence indicates that certain MNEs were
avoiding dependent agent permanent establishment status in Australia by
claiming that their agents in Australia did not have the formal capacity to
enter into contracts. This evidence is consistent with the information
obtained by the UK House of Commons Committee of Public Accounts
(see below) in relation to Google operations in the UK.

3.3. UK House of Commons Committee of Public Accounts: Google, MNEs


and tax morality

The aggressive tax avoidance engaged in by MNEs such as Google was


identified by the UK House of Commons Committee of Public Accounts
(UK Committee) in its report “Tax Avoidance – Google” (Google
Report)231. The evidence of blatant and contrived tax avoidance obtained
by the UK Committee was instrumental in the OECD/G20 BEPS project.
The UK Committee’s evidence was reported worldwide and gained the
attention of tax policy makers in many countries. In particular, Ms
Margaret Hodges MP, the former Chair of the UK Committee, made the
following statement about the tax avoidance practices of Google, Amazon
and Starbucks: “We are not accusing you of being illegal; we are accusing
you of being immoral”232.

Google provided evidence to the UK Committee in 2012, through Mr


Brittin, Google’s Vice-President for Sales and Operations in Northern
Ireland and Central Europe, who was based in the UK233. He stated that

1594
Google located some of its MNE group members in low tax countries or
tax havens234. Most of Google’s non-US income was derived by Google
Ireland Limited (Ireland). According to the UK Committee, Google
Limited (UK) reported revenue of £396 million but paid only £6 million in
corporation tax in the UK235. Google Limited (UK) had 1,300 employees.
Mr Brittin told the UK Committee that customers buying advertising
services from Google in Europe were buying the services from Google
Ireland Limited (Ireland). He also claimed that the 1,300 employees of
Google Limited (UK) were not selling Google services. Mr Brittin stated
700 staff members were marketing and digital consultancy staff who
worked with customers but were not selling Google services236.

The UK Committee pointed out that, under the UK-Ireland tax treaty,
an Irish company would only be subject to UK tax if it had a permanent
establishment in the UK237. If the employees of Google Limited (UK) had
the authority to conclude contracts on behalf of Google Ireland Limited
(Ireland) and that authority was exercised habitually, Google Limited (UK)
would be a permanent establishment of Google Ireland Limited (Ireland).
Mr Brittin insisted that the staff of Google Limited (UK) were not engaged
in negotiating contracts on behalf of Google Ireland Limited (Ireland). On
this basis, Google Ireland Limited (Ireland) claimed that it did not have a
dependent agent permanent establishment in the UK and that it was
therefore exempt from UK tax on its revenue from selling advertising to
UK customers238.

Following Mr Brittin’s appearance before the UK Committee, it


received evidence contradicting Mr Brittin’s evidence239. The UK
Committee noted further that a 2013 Reuters report, “How Google clouds
its tax liabilities”, also conflicted with Mr Brittin’s evidence240. The UK

1595
Committee claimed that it had evidence from former staff of Google UK
that the “staff carried out the substance of work leading to contracts with
major UK clients”241. The UK Committee received evidence such as pay
slips with sales related bonuses and Google documentation on the trading
and sales process in the UK242. The former staff stated that they had been
set sales targets and received remuneration in the form of sales
commissions. As cited above, the ATO subsequently sought similar
information and it would be expected that it sought this information on
Google’s operations in Australia.

The UK Committee concluded that243:

The UK is a key market for Google but the enormous profit derived is out
of reach of the UK’s tax system. Google generated US $18 billion revenue from
the UK between 2006 and 2011. Information on the UK profits derived from this
revenue is not available but the company paid the equivalent of just US $16 million
of UK corporation taxes in the same period. Google defends its tax position by
claiming that its sales of advertising space to UK clients take place in Ireland – an
argument which we find deeply unconvincing on the basis of evidence that, despite
sales being billed from Ireland, most sales revenue is generated by staff in the UK.
It is quite clear to us that sales to UK clients are the primary purpose, responsibility
and result of its UK operation, and that the processing of sales through Google
Ireland has no purpose other than to avoid UK corporation tax. This elaborate
corporate construct has damaged Google’s reputation in the UK and undermined
confidence in the effectiveness of HMRC. In contrast to evidence given to us
previously, Google has also conceded that its engineers in the UK are contributing
to product development and creating economic value in the UK.

4. AUSTRALIAN SENATE ECONOMIC REFERENCES COMMITTEE


INQUIRIES

4.1. Google’s operations in Australia prior to MAAL

Prior to Google’s restructuring of its operations in Australia, advertising


was sold to Australian customers by Google Asia-Pacific (Singapore).
Google Asia-Pacific (Singapore) avoided permanent establishment status
in Australia although substantial activities leading to the conclusion of

1596
contracts were undertaken in Australia. As Google Asia-Pacific
(Singapore) is a resident of Singapore it is entitled to treaty benefits under
the Australia-Singapore tax treaty244; Google Asia-Pacific (Singapore)
claimed it had no permanent establishment in Australia and Australia was
obliged to not tax the income Google Asia-Pacific (Singapore) derived
from its Australian customers under the business profits article of the tax
treaty. The income derived by Google Asia-Pacific (Singapore) was
subject to tax in Singapore and deductions would have been claimed for
the licence fees paid to Google Ireland Holdings (Bermuda). The tax rate
in Singapore is substantially lower than in Australia; the Australian
company rate is 30 per cent compared to 17 per cent in Singapore.
Nevertheless, the ATO asserted in evidence to the Senate Committee in
2015 that it was of the view that only minimal amounts of Google’s
revenue from Australian customers was subject to tax in Singapore and
that most of that revenue was derived by Google Ireland Holdings
(Bermuda) tax-free245.

4.2. 2015 parliamentary inquiry

The Australian Senate, Economic References Committee (Senate


Committee) published a report, Corporate tax avoidance: Part I You
cannot tax what you cannot see (2015)246, which examined the operations
of certain MNEs including Google and Microsoft. Microsoft’s profit from
Australia was allocated for accounting purposes to Singapore247. In 2015
Microsoft claimed that it derived income of A$2 billion from its Australian
customers and of that amount A$100 million of income was assessable in
Australia248.

The Senate Committee received evidence that Google has a regional


head office in Singapore (Google Asia-Pacific (Singapore)) and an

1597
Australian subsidiary, Google Australia. It was claimed that Google
Australia provides sales and marketing support services to its Australian
business customers and users, and it also renders research and
development services to Google globally249. Google reported to the Senate
Committee that Google Australia had a profit of A$46 million with gross
revenue of A$358 million for the 2012-13 income year250. Google paid tax
of A$7.1 million after claiming a research and development tax credit of
A$4.5 million251. A Google representative provided the following response
when questioned by the Senate Committee on the reason why Google
Australia does not pay more tax252:

[L]ike many other multinational corporations, whether they are digital or


otherwise, we pay the lion’s share of our taxes to the country where our
headquarters is based…So at Google, our success and our profits stem from our
intellectual capital, and that is the technology that helps to drive things like the
algorithm which provides what we think is the most relevant answer to whatever
search you put into Google Search…This intellectual capital was developed outside
of Australia, and this intellectual capital is owned outside of Australia.

4.3. 2017 parliamentary inquiry

In 2017, Mr Richardson, Director of International Tax, Google,


provided evidence to the Senate Committee. He claimed that Google
Australia had derived income in the 2015-16 income year of A$1 billion,
had a taxable income of A$121 million and paid tax of A$33 million253. Mr
Richardson stated that Google Australia’s tax rate was 27 per cent254 and
remarked255:

As those of you who were on this committee the last time we appeared will
recall the amount of tax we paid in Australia has increased substantially. There has
also been substantial change in Australia’s tax law since the last time. Of particular
relevance to Google are the government legislated multinational anti-avoidance law
and changed GST legislation, meaning that it now applies to digital goods sold to
Australians from overseas. The question posed by this committee is whether these
laws have changed how companies are operating. This is an important question.

1598
Mr Richardson acknowledged that prior to the introduction of the
MAAL, an Australian customer “bought advertising from Google our
Google Asia-Pacific headquarters in Singapore which entered into a
contract with that customer” and booked the revenue from that contract in
Singapore256. He stated that “Google Australia’s contribution to Google as
a whole was recognised in the form of a payment for sales and marketing
services”257.

Mr Richardson informed the Senate Committee that Google had


changed its business operations in Australia because of the MAAL. In
2016 Google Asia-Pacific restructured its operations in Australia by
devolving to Google Australia the responsibility for entering into contracts
with Australian customers258. When Google receives income from an
Australian customer for advertising with Google, Google Australia derives
that income259.

Mr Richardson claimed that Google Australia is now paid in accordance


with the transfer pricing principles for the functions it performs, the risks it
assumes and the assets it uses. Google Australia is required to pay fees to
Google Asia-Pacific (Singapore) for providing Google Australia with the
right to use intellectual property260. In turn, Google Asia-Pacific
(Singapore) is required to pay a royalty to Google Ireland Holdings
(Bermuda) for the use of Google’s intellectual property. It was boldly
asserted that Google Ireland Holdings (Bermuda) is rewarded in part for its
substantial research and development expenditure. Mr Richardson claimed
that Google Ireland Holdings (Bermuda) makes annual payments of
around $7 billion to Google Inc261. This is a clear example of Google
Ireland Holdings (Bermuda) facilitating long-term tax deferral for the
Google group’s non-US income.

1599
5. AUSTRALIA’S MULTINATIONAL ANTI-AVOIDANCE LAW 2016

The Multinational Anti-Avoidance Law was announced by the


Australian Treasurer in the 2015 federal Budget as a specific anti-
avoidance measure targeted at 30 identified MNEs engaged in profit-
shifting to no or low tax jurisdictions262. The Australian Taxation Office
(ATO) concluded that these MNEs were engaged in substantial tax
avoidance following a detailed ATO review of their operations. The 30
MNEs identified by the ATO were engaged in commercial activities but
were using “contrived structures to book billions of dollars of revenue
overseas and avoid Australian tax”263. On the introduction of the MAAL in
2016, the ATO had identified 80 MNEs as being within the scope of the
measures and at the time a further 300 MNEs were being profiled264.

The preferable response to problems of this nature would be for


Australia and other countries to implement BEPS Action 7 in tax treaties
through Article 12 of the MLI and to directly negotiate with treaty
countries. This approach would directly tackle the flaw in the permanent
establishment definition, rather than treating the symptoms of the flaw
indirectly through the MAAL.

The MAAL is targeted at large MNEs. The measures apply to entities


that are part of an MNE group earning more than A$1 billion annually265.
The Explanatory Memorandum to the MAAL asserted that large MNEs
“have the greatest opportunities to avoid tax through offshore activities
and represent the highest risk to Australia’s tax base”266. The aim of the
MAAL is267:

[To] ensure that multinational entities cannot use complex, contrived and
artificial schemes to escape paying Australian tax. It targets those multinational
entities that:

1600
• avoid a taxable presence by undertaking significant work in Australia in direct
connection to Australian sales but booking their revenue offshore; and
• have a principal purpose of avoiding tax in Australia or reducing their foreign
tax liability.

The “taxable presence” refers to certain MNEs avoiding Australian


taxation by avoiding the “permanent establishment” threshold tests in
Australia’s tax treaties. The targeted taxpayers are foreign entities that
meet the definition of “significant global entity”268.

5.1. The scope of the MAAL

The MAAL seeks to counter tax avoidance schemes used by an MNE to


avoid the attribution of profits to a permanent establishment of the MNE in
Australia. The MAAL is a specific anti-avoidance measure and does not
limit the application of Australia’s general anti-avoidance measures in Part
IVA.

The MAAL is not restricted by Australia’s tax treaties. Australia is a


dualist country where tax treaties are enacted by the Australian Parliament
and they are treated as part of the Australian tax law269. Where conflict
arises tax treaties prevail over Australian domestic law except for
Australia’s general anti-avoidance rule (Part IVA)270. The MAAL was
intentionally enacted as part of Part IVA to ensure the MAAL prevails
over Australia’s tax treaties. The MAAL may result in double taxation if a
tax authority of a tax treaty country does not allow a compensating
adjustment for the profits attributed to an enterprise’s Australian
permanent establishment under the MAAL271.

The threshold tests for the application of the MAAL are:


272
i) a foreign entity has made certain supplies to an Australian customer ;
273
ii) activities take place in Australia directly connected to the supply ;

1601
iii) some of the activities are undertaken by an Australian entity that is an
274
associate or commercially dependent on the foreign entity ;
iv) the foreign entity derives either ordinary or statutory income from the
275
supply ; and
v) some of that income is not attributable to an Australian permanent
276
establishment of the entity .

If the threshold tests are satisfied the MAAL seeks to attribute profits to
the Australian permanent establishment of an MNE to counter the
avoidance of Australian taxation. Alternatively, if the MNE does not have
a permanent establishment in Australia, the MAAL treats the MNE as
having an Australian permanent establishment and attributes profits to the
notional permanent establishment.

5.2. Definitions

The first threshold requirement is that a supply has been made by a


“foreign entity” to an “Australian customer”. The term “Australian
customer” of a foreign entity is defined to mean an “Australian entity” or
an entity that is in Australia277. An exclusion is provided for an entity that
is part of the foreign entity’s global group. The term “Australian entity” is
defined to have the same meaning as the definition of that term in
Australia’s controlled foreign company rules278. The controlled foreign
company rule definition includes as Australian entities, an Australian
partnership, an Australian trust or an entity other than a partnership or trust
that is a “Part X Australian resident”279. The term “Part X Australian
resident” is defined to mean a resident under the domestic tax law280. The
definition excludes an entity that is an Australian resident and a resident of
a country with which Australia has a tax treaty (dual resident entity) but
under the tie-breaker provision of the tax treaty, the entity’s residency is
allocated to the other jurisdiction. In this situation, the entity is treated as a
foreign entity.

1602
The definition of “Australian customer” is intended to target schemes
involving supplies by a foreign entity to Australian customers who are
independent of the foreign entity. This part of the definition provides the
first element of the connection between the foreign entity and Australia on
which jurisdiction to tax is being asserted. The second element is that
some of the activities take place in Australia in connection with the supply
(see below). The Australian customers of foreign entities purchase
services, such as advertising, for which, they are eligible for deductions,
but tax asymmetry is created when the foreign entity is not assessable in
Australia on that income.

The term “foreign entity” is defined as having the same meaning as the
definition of that term in the dictionary provision of the income tax law (s
995-1(1) of the Income Tax Assessment Act 1997 (the 1997 Act))281.
Section 995-1(1) defines a foreign entity as an entity that is not an
Australian entity. The term “entity” is defined in 960-100 of the 1997 Act
as including, inter alia, a body corporate and a partnership.

The term “supply” is defined by reference to s 9-10 of the goods and


services tax law, a value added tax282. This definition includes, inter alia,
the supply of goods, services, and the provision of advice or information283.
The Explanatory Memorandum for the MAAL claims that the definition of
the term supply would include “the supply of electronic material,
advertising services, downloads, the provision of data, intellectual property
rights, and the right to priority in research functions”284. As the definition
of supply in s 177A(1) of the 1936 Act is very broad, this definition has
the following express exclusions for the purposes of the MAAL:

•the supply of an equity interest in an entity;


•the supply of a debt interest in an entity;

1603
•the supply of an option to supply an equity interest or debt interest in an entity;
or
•the supply of an option to supply any combination of the above supplies.

These exclusions were intended to prevent the unintended application


of the MAAL to the foreign investors investing in Australian shares and
providing finance285.

5.3. Activities are undertaken in Australia and are directly connected with the
supply

The foreign entities targeted by the MAAL are involved in schemes to


exploit perceived shortcomings in the treaty definitions of permanent
establishment. As stated above, the second element of the necessary
connection with Australia is that some of “the activities are undertaken in
Australia directly in connection with the supply” to Australian
customers286. The Explanatory Memorandum states that the direct
connection between the activities undertaken in Australia and the supply to
Australian customers necessary to satisfy this requirement of the MAAL
depends on the facts and circumstances of the particular avoidance
scheme. The definition is intended to be broad287. As the UK Parliamentary
Committee of Public Accounts found, digital service providers, such as
Google, engaged in substantial activities in the UK with British customers,
including through individuals arranging for the terms of the proposed
contracts but falling short of formally concluding contracts with the
customers. Similarly, the ATO has sought information from customers and
employees to determine if activities are performed in Australia in
connection with supply. The Explanatory Memorandum states that
“[a]ctivities that contribute to bringing about the contract for supply, such
as building of client relationships, are captured”288.

1604
If a foreign entity does not perform any activities in Australia through
an associate or entity that is commercially dependent on it, the foreign
entity is excluded from the scope of the MAAL. In this situation, the
foreign entity would fail the MAAL test that activities are undertaken
directly in Australia in connection with the supply.

5.3.1. Activities are undertaken in Australia

If a foreign entity engages in a supply to an Australian customer and


some of the activities are undertaken in Australia the next requirement is if
“some or all of those activities are undertaken by an Australian entity who,
or are undertaken at or through an Australian permanent establishment of
an entity who, is an associate of or is commercially dependent on the
foreign entity”289. The term “commercially dependent” is not defined in the
income tax law. Whether an entity is commercially dependent on a foreign
entity depends on the facts and circumstances of the relationship between
the parties. The guidance provided in the Explanatory Memorandum
indicates that an entity will be treated as being commercially dependent if
the entity’s business is reliant on the foreign entity290. It would be expected
that most of the dependent entity’s business is performing activities for the
foreign entity.

The example provided in the Explanatory Memorandum to illustrate the


definition is a foreign entity that sells goods to Australian customers
through a legally independent agent291. If most of the agent’s business is
performing activities for a foreign entity and more than 90 per cent of its
assessable income is derived from commissions paid by the foreign entity,
the agent will be treated as being commercially dependent on the foreign
entity. On the other hand, if a foreign entity supplies services to Australian
customers through a legally independent agent and the agent has an

1605
extensive business and provides services to a range of other businesses, the
agent will not be treated as being commercially dependent on the foreign
entity292. In this situation, the foreign entity will not be subject to the
MAAL.

5.3.2. The foreign entity derives ordinary income or statutory income from the
supply

Another threshold element for the MAAL is that the scheme involves a
foreign entity that derives ordinary income or statutory income (assessable
income) from making the supply to Australian customers293. If the foreign
entity derives ordinary or statutory income, the MAAL will apply if some
or all of the income is not attributable to an Australian permanent
establishment of the foreign entity. The term “Australian permanent
establishment” is defined to include the definition of “permanent
establishment” in the domestic law and the tax treaty definitions294. If a
foreign entity is resident in a country with which Australia has a tax treaty,
the tax treaty definition of permanent establishment applies. In non-treaty
situations, the definition of permanent establishment in the domestic law
applies. The MAAL is targeted at MNEs using tax treaties to avoid
Australian taxation. Consequently, the MAAL is unlikely to apply to
foreign entities resident in non-treaty countries.

The Explanatory Memorandum notes that if some of the foreign entity’s


income is attributable to an Australian permanent establishment, the
MAAL may nevertheless apply295. This requirement ensures that a foreign
entity is unable to engage in planning to avoid the MAAL by making a
nominal sum of income attributable to a permanent establishment. If the
foreign entity would, but for the scheme, have attributed a larger amount
of income to the Australian permanent establishment, the MAAL is

1606
applicable296. The profits attributed to a permanent establishment may be
contentious and there is significant potential for disputes297. Moreover, the
OECD has delayed finalising its additional guidance on the attribution of
profits to a dependent agent permanent establishment and it may be
inferred that the OECD was unable to attain consensus on the 2016
Discussion Draft.

5.4. The principal purpose test

The core of the MAAL is the principal purpose test298. The principal
purpose test is satisfied if, based on certain issues, the conclusion is that
the scheme was entered into for a principal purpose of enabling the
taxpayer to obtain a “tax benefit”299. The MAAL principal purpose test
reflects the principal purpose test in the OECD/G20 BEPS Action 6. The
Explanatory Memorandum acknowledges that the MAAL principal
purpose test reflects BEPS Action 6300:

These new thresholds capture the language used in the 2014 OECD report titled
“Preventing the Granting of Treaty Benefits in Inappropriate Circumstances”. The
report (as discussed at pages 1112 of the Executive Summary and pages 6674 of the
main report) aims to reduce or address treaty abuse through an anti-abuse rule based
on “one of the principal purposes of any arrangements or transactions”. That is,
obtaining a treaty benefit need only be one of the principal purposes of an
arrangement or transaction under the new threshold (footnote excluded).

The test is that the sole principal purpose or one of the principal
purposes must be to obtain the specified benefit301. The principal purpose
of a scheme must be determined on the basis of a comprehensive and
objective analysis of the scheme. The analysis involves a determination of:
what the scheme achieved as a matter of substance; the legal effect of the
scheme; and the connections between the taxpayer and the other parties302.
The subjective motives of the scheme participants are irrelevant303. The
principal purpose test in s 177DA(1)(b) is a lower threshold than the

1607
purpose test used in the general anti-avoidance rule in Part IVA, which
requires a sole or dominant purpose of a person who entered into the
scheme or carried out the scheme304.

5.4.1. Obtaining a tax benefit

Under the MAAL, if the taxpayer had a purpose of obtaining a tax


benefit and this purpose combined with the purpose of reducing liability to
tax under a foreign law as the principal purpose or one of the principal
purposes, the tax benefit requirement is satisfied305. The Explanatory
Memorandum claims that a principal purpose of reducing a foreign tax
liability that included a purpose of obtaining a tax benefit satisfies the
principal purpose test306. This requirement was included to ensure that the
principal purpose test may be satisfied in situations where the Australian
tax benefit is minor by comparison to reducing tax under a foreign law307.
The Explanatory Memorandum claims that308:

Such an approach is necessary as a common (but not essential) feature of the


arrangements to which the multinational antiavoidance law is intended to apply
involves a purpose of reducing liabilities to tax under foreign laws, in addition to
obtaining an Australian tax benefit.

The deferral of a foreign tax liability is treated in the same manner as a


reduction of foreign tax liability309. This requirement was essential as US
MNEs have been engaging in deferring their foreign income indefinitely.

5.4.1.1. Having regard to certain factors

In reaching a determination about the principal purpose test the


legislation requires that regard be had to a number of matters310. The
MAAL requires that the general anti-avoidance factors be considered and
that specific MAAL factors also be considered.

5.4.1.2. Non MAAL Part IVA factors

1608
The general anti-avoidance factors in s 177D(2) require that
consideration be given to the following matters relating to schemes:

•the manner in which the scheme was entered into or carried out;
•the form and substance of the scheme;
•the time at which the scheme was entered into and the length of the period
during which the scheme was carried out;
•the result in relation to the operation of the Act that, but for Part IVA, would be
achieved by the scheme;
•any change in the financial position of the relevant taxpayer that has resulted,
will result, or may reasonably be expected to result, from the scheme;
•any change in the financial position of any person who has, or has had, any
connection (whether of a business, family or other nature) with the relevant
taxpayer, being a change that has resulted, will result or may reasonably be
expected to result, from the scheme;
•any other consequence for the relevant taxpayer, or for any person referred to
in the dot point above, of the scheme having been entered into or carried out;
and
•the nature of any connection (whether of a business, family or other nature)
between the relevant taxpayer and any person referred to in the dot points
311
above .

The Commissioner is required to consider these factors in determining


if the taxpayer has a principal purpose of obtaining a tax benefit, or of both
obtaining a tax benefit and reducing a tax liability under a foreign law312.

5.5. Additional matters for the MAAL

The MAAL requires that, if applicable, consideration must be given to


additional matters. These factors are specific to avoidance schemes that the
MAAL is seeking to counter. The first additional matter requires
consideration of the extent to which the activities that contribute to the
conclusion of a contract for the supply to Australian customers are able to
be performed by: the foreign entity; an Australian based entity; or, any
other entity313. The inclusion of “any other entity” allows the

1609
Commissioner to consider the activities of any entities that are linked to
the scheme314.

This part of the MAAL is focused on the schemes used by MNEs to


ensure that the activities that take place in Australia do not result in the
creation of a dependent agent permanent establishment. These additional
MAAL factors require a comprehensive analysis of the entities in Australia
that perform vital steps that result in a foreign entity obtaining a supply
contract with an Australian customer where the place of contracting is
formally outside Australia. The additional factors require the
Commissioner to examine the nature of activities that led to the conclusion
of a contract. In particular, the Commissioner must determine which entity
performs these activities315. The Explanatory Memorandum notes that316:

This additional matter draws the Commissioner’s attention to contrivance with


respect to the way in which the activities are divided between the relevant entities.
In particular, the extent to which the entity with which the contract is concluded
carries out the activities required to obtain the contract will be considered.
It will also draw the Commissioner’s attention to contrivance where it is clear
that an entity would not have the capacity to perform certain activities themselves
as part of the supply. For example, a foreign entity that has no senior staff would
find it difficult to establish that it has the capacity to negotiate and conclude
contracts even if it purports to do so.
This additional matter has the effect that schemes are more likely to be caught
where it appears that activities have been split in such a way so as to deliberately
fall short of constituting an Australian permanent establishment.

6. MULTILATERAL INSTRUMENT

On 7 June 2017 Australia became a signatory to the MLI317. Article 12


of the MLI provides that if an intermediary plays the principal role in
concluding substantively finalised contracts in a country on behalf of a
foreign enterprise, that arrangement is sufficient to characterise the
intermediary as a “permanent establishment” of the foreign enterprise in
that country. Article 12 does not affect independent agents. This provision

1610
implements a BEPS Action 7 measure to counter schemes for the artificial
avoidance of permanent establishment status though a dependent agent.
Article 12 is an optional article under the “inclusive framework”, and
Australia initially published an intention to adopt Article 12 in its draft
position but has since reserved its position on Article 12318. The Treasury
stated that319:

Australia will not adopt Article 12 at this time. Australia will consider adopting
these rules bilaterally, however, in future treaty negotiations to enable bilateral
clarification of their application in practice. Pending this, the Multinational Anti-
avoidance Law will continue to safeguard Australian revenue from egregious tax
avoidance arrangements that rely on a “book offshore” model.

Australia’s decision to make a reservation on Article 12 of the MLI is


curious given that Australia’s most recently revised tax treaty, the
Australia-Germany tax treaty, contains a provision that deals with the
avoidance of dependent agent permanent establishment status320. If
Australia chooses to implement Article 12 of the MLI it will provide the
advantage of dealing with the avoidance of permanent establishment status
through its tax treaties rather than under the MAAL. Apart from avoiding
the complexity of the MAAL321, countering this form of avoidance through
tax treaties minimises the risk of double taxation as the mutual agreement
procedure is available to a taxpayer that claims it has been subject to
double tax. This decision may reflect a general reluctance of signatories to
the MLI to adopt Article 12.

The main low-tax jurisdictions used by MNEs to avoid permanent


establishment status included Ireland and Singapore. Ireland has chosen to
reserve its position on Article 12 as the OECD has not finalised its position
on the profits that are attributable to a dependent agent permanent
establishment. The Irish Department of Finance has asserted that “Ireland
intends to reserve on Article 12 due to the continuing significant

1611
uncertainty as to how the test would be applied in practice”322. Singapore
has also chosen to not implement Article 12.

7. CONCLUSION

The MAAL has proven so far to be effective in preventing MNEs from


avoiding permanent establishment status in Australia but it is not an
optimal measure to counter this form of avoidance. The MAAL is a
unilateral specific anti-avoidance measure that is extraordinarily complex.
Adopting Article 12 of the MLI offers a simpler method of preventing this
avoidance by changing the dependent agent permanent establishment
definition to include dependent agents who are principally involved in the
conclusion of contracts with customers, that are routinely concluded
without modification, and who habitually exercise that power. Avoidance
of dependent agent permanent establishment status had been achieved
simply by claiming the dependent agent did not have the formal power to
conclude contracts with customers. The best method of remedying this
threshold shortcoming is by amending the permanent establishment
definition through the MLI. The advantage of refocussing on Article 12 of
the MLI is that this measure is of universal application and the risk of
double taxation is minimised. Under this approach, if a dispute arises it can
be resolved through the mutual agreement procedure in the individual tax
treaty. In addition, Article 12 is a BEPS measure which reflects the
consensus of the OECD and G20 member countries.

It is problematic that most countries have sought to reserve their


positions on Article 12 of the MLI. This reluctance to act in concert has
provided the incentive for some countries to implement unilateral anti-
avoidance measures, such as the MAAL. The particular problem with
disparate responses is that they may not be complementary, could result in

1612
double taxation and the mutual agreement procedures in tax treaties may
be unavailable.

1613
Taxation of the Digital Economy: Argentina
Perspective
323 324
Guillermo O. Teijeiro e Juan Manuel Vázquez

1. IMPORTANCE OF THE DIGITAL ECONOMY

The digital revolution is one of today’s most hotly debated topics in the
world. Politicians, economists, businessmen, journalists and, of course,
international tax experts worldwide are in the middle of a complex
discussion on how to approach this matter which is currently creating
large-scale disruptions in countries’ economies and tax systems. Argentina
is clearly not exempted from this discussion and, in the last few years, the
rapid growth of the Digital Economy (DE) has put “tech giants” businesses
on the spot of the local media325 and tax authorities326.

According to a recent report, today more than a fifth (22%) of global


GDP can be attributed to some form of digital skills, capital, goods or
services. Unsurprisingly, this report shows that the United States is the
dominant digital economic powerbase today, with digital revenue making
up a third (33%) of output. The United Kingdom and Australia follow
close behind on 31% and 29%, while China brings up the rear on 13%327.

In the case of Argentina, it is estimated that the digital sector currently


represents 2% of the country’s GDP, which is comparable to the figures of
countries like Colombia, Peru or Portugal328. Even when this percentage is
considerably lower than those of more developed countries (in which case
the aforementioned percentage is around 6%), the importance of the digital
sector in Argentina has shown a significant growth in the last few years.
For instance, in 2015 the gross sales of this sector accounted ARS 187,620

1614
million (USD 10,510 million) and in 2016 that sum raised up to ARS
232,211 million (USD 13,009 million), which represents a 23.7% increase
in only one year329. Moreover, in specific sub-sectors within the DE such
as the e-commerce, the growth has been even greater achieving a 51%
increase in 2016330. Moreover, as in other Latin American countries, the
growing importance of the DE in Argentina has been nurtured by a
particular “digital entrepreneurial culture” that made the software industry
grow more than 300% in the last decade331.

As a consequence of the growing importance of the DE and the lack of


adaptation of the Argentine old-fashioned legal system to the challenges
imposed by digital businesses, the Argentine Federal Tax Authority
[Administración Federal de Ingresos Públicos] (AFIP) and several local
tax authorities (influenced largely by the OECD BEPS project and the
individual initiatives of certain countries) started targeting tech companies
and strengthening their conviction that a fairer legal frame was necessary
for their operation in Argentina, which meant, inter alia, ensuring that they
effectively pay taxes in the country332.

Since the existing Argentine legal framework did not provided enough
legal grounds to do so, an extensive bill with amendments to the Argentine
Tax System (Tax Reform Bill or Bill) was recently submitted to the
Argentine Congress which included, inter alia, specific provisions
targeting DE businesses.

2. CURRENT TAXATION OF THE DE IN ARGENTINA

As in many other countries worldwide, the Argentine tax system was


originally conceived for brick and mortar businesses and did not even
consider the possibility that a company set-up in the a garage in Palo Alto,

1615
California, or the Netherlands could provide its digitized services to
millions of users around Argentina without having an office or a single
sales representative setting foot in the country333.

Therefore, when trying to apply the current Argentine taxes to the DE,
the different statutes show cracks on their logic and create many grey areas
that leave the tax authorities with only two alternatives: (i) stretching the
existing rules to cover circumstances not expressly (nor implicitly)
conceived by the law for creating a taxable event, which implies violating
the legality principle or (ii) complying with the rule of law and leaving
digital services provided in B2C transactions by non-resident aliens with
no physical presence in Argentina untaxed.

We consider this second alternative to be the correct one, since under


the current Argentine tax system digital services provided under those
conditions are not subject to tax (with the exception of B2B digital
services which are subject to VAT as described in Section II.2).
Notwithstanding, the non-taxation of digital services under the rules
currently in force in Argentina has been a quite disputed matter generating
many administrative, judicial and doctrinal discussions. The provisions
that have created uncertainty in this regard (which, in some cases, were
even applied by AFIP to tax these “dematerialized businesses”) are the
following.

2.1. Income Tax (IT)

2.1.1. General Sourcing Rules

The Income Tax Law No. 20,628, as amended (ITL), establishes that
non-resident individuals or legal entities without a permanent
establishment (PE) in Argentina are taxed only on income arising from

1616
Argentine sources334. Pursuant to the general ITL sourcing rules, income
from Argentine sources arise, inter alia, from: (i) assets located, placed or
used in Argentine territory; and (ii) the performance of any act or activity
in Argentina that produces an economic benefit335. Therefore, services
provided entirely abroad by non-resident aliens do not create Argentine
source income and consequently are not subject to IT in Argentina.

In order to specify in more detail the ITL provisions, its Regulatory


Decree (RDITL) provides a non-exhaustive list of Argentine source
income which includes: (i) royalties produced by assets located or rights
economically used in Argentina336; and (ii) any other gain generated by
tangible or intangible assets and rights located, collocated or economically
used in Argentina337.

Under the aforementioned rules, and considering that one of the major
challenges created by the DE is the correct characterization of the
transaction (i.e., is it a sale of an intangible asset or a digital service
provided abroad?) and the type of payments related to them (i.e., royalties,
service fees etc.)338, it could be argued that an intangible asset (e.g., digital
book) economically used in Argentina creates Argentine source income for
a non-resident alien supplier with no physical presence in the country.
However, as we conclude below, we consider that most of the DE
expressions imply a supply of services which, if not provided within
Argentina, are out of the scope of the IT339.

2.1.2. Special Sourcing Rules

In addition to the general rules aforementioned, the ITL provides


special sourcing rules applicable to income arising from certain specific
activities such as telecommunications and foreign technical assistance340,

1617
which have had a considerable impact on the taxation of the DE in
Argentina.

These special rules establish a non-rebuttable presumption which deems


of Argentine source the: (i) 50% of the price paid to producers, distributors
or intermediaries for the exploitation in Argentina of foreign
cinematographic films, magnetic videos and audio tapes recorded abroad,
radio and television broadcasts from abroad, telex, tele-facsimile or similar
services, transmitted from abroad; and any other foreign projection,
reproduction, transmission or dissemination of images or sounds341; and (ii)
100% of the fees or other remuneration originated by technical, financial
or other kind of assistance provided from abroad342.

The link between the presumption for telecommunications and some of


the most famous business of the DE which involve the reproduction,
transmission or diffusion of images, sounds, movies etc. (e.g., Netflix,
Amazon Prime Video, Spotify etc.) is clear. However, it should be noted
that this provision was introduced at a time in which the only way that a
foreign entity could transmit that type of contents to foreign Argentine
users was through either importing a tangible good that contained the
intangible343, creating a physical presence in Argentina or contracting with
a local company so that it assumed the exploitation of the content in the
country344. Call-back345 and satellite services346 were taxed under this
provision. However, in the case of the businesses mentioned above, the
exploitation is not carried out by a resident company, but directly by the
non-resident alien in Argentina (i.e., B2C service). This situation was not
foreseen by the ITL and, therefore, we understand this provision does not
apply to this type of DE businesses.

1618
On the other hand, the foreign technical assistance presumption has
caused a strong debate in the last years in relation to the tax treatment of
the use in Argentina of computers systems located abroad. An example of
this is the Aerolíneas Argentinas347 and Austral Líneas Aéreas348 cases
related to the taxation of gains arising from the use of the Amadeus
System (i.e., a booking system for airlines) by Argentine companies. In
those cases, this provision was used by AFIP for the purposes of taxing
services provided by a non-resident company entirely from abroad.

Even when some services provided through digital means can easily fall
under the “technical assistance” provision (e.g., the provision of plans for
buildings and new facilities via web)349, most of the DE businesses do not
imply a transfer of “a technical knowledge applied to a productive
activity” either because there is no “technical knowledge” or because the
digital service is not applied to a productive activity (it is provided to a
final consumer).

It cannot be denied that most of the DE businesses have, in a greater or


lesser extent, characteristics of several legal transactions (i.e., sale of
intangible goods, supply of services, IP license property, technical
assistance etc.). However, if the essential elements of these businesses are
taken into account350, in the vast majority of the cases, we would be framed
as a “provision of services”. In fact, regarding online advertising, it has
been sustained that the characterization of the activity is undoubtedly the
provision of a service; an online advertiser hires and pays for advertising
services (display of its advertisements among a particular audience of the
Website) and not for the use of intangible assets developed by the site
operator (e.g., database of users of the site)351. In similar terms, AFIP held
that the nature of the activity may not be embrangled with the

1619
technological means through which the service is provided. Furthermore,
the OECD has undoubtedly characterized income from digital services as
business income under article 7, OECD Model Convention (OECD
MC)352.

Therefore, we conclude that most of the DE businesses can be


characterized as a “provision of services” which are not subject to tax in
Argentina when provided entirely abroad without a physical presence in
the country.

Finally, we must make a specific reference to the potential taxation of


the DE trough the creation of PE by the foreign supplier under domestic
Argentine law. In this sense, due to the lack of a PE definition under the
Argentine ITL, administrative precedents and case law uses a PE
definition based on a construction derived from the ITL provisions353, the
definition stated under the Argentine minimum presumed income tax or
the definition stated under tax treaties. In this scenario, the challenges
described by the OECD in relation to the taxation of the DE trough a PE
are also present when dealing with both the Argentine domestic PE
concept and that included in the tax treaties entered into by Argentina354.

2.2. Value Added Tax (VAT)

Currently, the Argentine VAT law does not regulate expressly the
taxation of transactions performed remotely through the Internet (using
apps or web pages) like those included in the concept of DE. Under the
VAT general rules, the tax – which has a 21% standard rate355 – applies to
the sale of goods located in Argentina, the provision of services in the
country and the final import of goods356. Services provided abroad which
are effectively used or exploited in Argentina (usually known as “import

1620
of services”)357 trigger a VAT liability for the Argentine customer (not the
foreign supplier) only when the former is: (i) subject to VAT because of
other taxable transactions; and (ii) registered for VAT purposes with
AFIP358.

Therefore, services rendered abroad and effectively used or exploited in


Argentina are subject to VAT when performed in B2B transactions, and
they are out of the scope of this tax when the customer “on the other side
of the counter” is a final consumer (B2C).

In the former case, the VAT liability will be triggered on the Argentine
recipient or customers, who will be responsible for assessing and paying
the tax to AFIP on the value of the imported services under the mechanism
of substitute liability (responsabilidad sustituta), which is more or less
comparable to the reverse charge mechanism in other jurisdictions (albeit
the recipients of imported services do not account for VAT through their
periodic VAT return, but trough a separate declaration form)359 and would
further be entitled to credit such VAT as a credit against other own VAT
debits on the month following that in which the VAT taxable event
occurred360.

It should be noted that Argentina has a specific regime for paying VAT
in transactions involving the sale of tangible goods and the provision of
services through electronic marketplaces. Such regime obliges two specific
Argentine electronic marketplaces to charge VAT to resident aliens that
comply with certain requirements (e.g., being registered for VAT purposes
with AFIP, being included in the Simplified Regime for Small Taxpayers
etc.)361.

2.3. Gross Turnover Tax (GTT)

1621
The gross turnover tax is a local tax levied on gross revenues resulting
from the regular and onerous exercise of commerce, industry, profession,
business, services or any other onerous activity conducted on a regular
basis within the respective jurisdiction. Each of the Argentine Provinces
and the City of Buenos Aires apply different rules depending on the type
of activity362.

Recently two of the most important Argentine local jurisdictions in


terms of economic relevance and concentration of population moved
forward to tax the DE through a GTT. The first one to do so was the
Autonomous City of Buenos Aires that in 2014 established a withholding
tax of 3% on gross payments for online digital services363. The credit cards
companies intervening in those transactions were designated as
withholding agents and they had to perform such withholding at the time
of the transfer of the funds abroad364. For non-resident digital service
providers, these withholding had the character of a unique and definitive
payment of the GTT. The so called “Netflix” tax even generated a judicial
precedent in which the court dismissed the action without addressing the
substantive matter (i.e., the legality of imposing GTT on digital
services)365. It should be noted that before the tax actually entered in force
it was indefinitely suspended366 and, as of the present date, it is not in
force.

The second local jurisdiction that, inspired by the failed attempt of the
City of Buenos Aires, moved forward to impose GTT on the supply of
digital services is the Province of Santa Fe367. In this case, a new provision
was incorporated to its Fiscal Code368, extending the application of the
GTT to “the commercialization of online subscription services which
provide access to all kinds of audio-visual entertainment (movies, shows,

1622
music, games and videos) that are transmitted from the Internet to
televisions, computers, mobile devices and connected consoles”. The
applicable rate is 4.5% on the gross turnover of the non-resident company
accrued on each fiscal period369. It should be noted that, in this case, the
law that introduced the tax is currently in force but, due to practical
difficulties, the tax is not being levied yet370.

We consider that the imposition of GTT on digital services provided


through the Internet from abroad by non-resident aliens who do not have
any type of physical presence in Argentina are not subject to GTT under
the existing legal framework. Pursuant to the Argentine Constitutional
provisions and the laws that define the scope of the GTT, the common
elements that must concur in order to trigger a GTT liability are: (i) the
exercise of an activity; (ii) with regularity; (iii) for profit; and (iv) with
certain physical presence in the respective jurisdiction (Territorial
Requirement). The importance of the Territorial Requirement for the GTT
has been highlighted both by the Argentine Supreme Court of Justice371
and the doctrine372.

Therefore, considering that most of the DE businesses do not have any


type of physical presence in the local jurisdictions, no GTT liability should
be triggered on the supply of digital services to consumers located therein.
In other words, as long as it is not demonstrated that the digital services
are provided by the non-resident alien in a physical, material and tangible
way within the territorial scope of the jurisdictions where the consumption
operates, the Territorial Requirement would not be complied with and the
taxable event will not occur373. In this sense, we consider that the initiatives
of the two local jurisdictions mentioned above are not in line with the
existing Argentine legal framework.

1623
3. INTERNATIONAL CONTEXT: BEPS AND COUNTRY’S
EXPERIMENTS

The path chosen by Argentina to tax the DE cannot be fully understood


if considered isolated from the existing international tax context, in which
the OECD/G20 BEPS Project and some individual country’s initiatives
have had a preponderant role.

3.1. Direct Taxation

In relation to Direct Taxation, the OECD/G20 Final Report on BEPS


Action 1 (Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy)
illustrated the direct tax challenges posed by the DE to market jurisdictions
as well as the limited scope of the traditional PE concept as a tool to
allocate income obtained therefrom to destination countries374.

Approaches for a comprehensive response were indeed highlighted in


Chapter 7 of the Final Report on Action 1 (i.e., significant economic
presence test375, withholding tax on digital transactions376 and equalization
levy377) but none was adopted nor uniformly recommended. Moreover, the
main features of the three options were foremost barely described, so it
was reasonable to foreseen that application at the national level could
show great variances, as the subsequent domestication process in selected
jurisdictions later confirmed378. In this sense, we consider that the OECD
G20 BEPS Report’s response to DE issues fell short to provide a
comprehensive approach and lacked a uniform recommendation to be
implemented by market economies, somehow allowing inter-nation
imbalances to rise379.

As expected, many countries decided to move forward individually,


either by introducing (i) a significant economic presence test, (ii) a

1624
withholding tax or (iii) an equalization levy on digital economy’s yield.
Examples of the first option are Malaysia (2013), Turkey (2016) and Israel
(2016)380.

Regarding the second alternative, the first practical experience was the
UK Diverted Profit Tax (DPT) which imposes a 25% tax on diverted
profits arising on or after 1 April 2015 from the UK, by companies that
either (i) seek to avoid creating a UK PE that would bring a foreign
company within the UK’s Corporation Tax, or (ii) use arrangements or
entities which lack economic substance to exploit tax mismatches either
through expenditure or the diversion of income within the group381. The
DPT has been designed as a levy which is applied separately from the
income tax, and, hence, aimed at bypassing challenges coming from the
fact that income tax conventional rules would still treat income from
inbound sales and services as foreign source (as well as EU law –
applicable at the time – and trade obligations). Australia382 and France383
are other examples of jurisdictions that have implemented a DPT. New
Zealand was also considering following the same path384.

It should be noted that on 23 November 2017, the UK released a Budget


announcement of plans to introduce a withholding tax on royalties paid by
a non-UK resident company to another non-resident company in a no or
low-tax jurisdiction if the royalty is “in connection with” sales of products
and services to UK customers. The proposal is advanced as a short term
response to multinational groups selling to UK customers, where the
group’s intangible assets are in such a jurisdiction. In the longer term,
international consensus though the OECD BEPS project is seen as the
solution385.

1625
Regarding the equalization levy, the first country to use that tool was
India by implementing a 6% equalization tax that came into effect on June
1st, 2016, which, as in the case of DPT, was conceived as a levy separate
from the income tax applicable on every consideration received by
nonresidents from Indian tax residents for the provision of online
advertisement, digital advertising space, or other similar online
advertisement services. The levy is to be withheld by the Indian residents
from the consideration paid to non-resident service providers386. Following
the Indian example, other jurisdictions have considered incorporating
similar taxes on their domestic or supranational legislation. For instance, a
recent pronouncement signed by 10 Finance ministers within the EU
insists on an equalization tax on the turnover generated in Europe by the
digital companies387.

Finally, we highlight that at the recent annual conference of the


Canadian Tax Foundation in Toronto on 21 November 2017, several
speakers noted that no generally accepted solution had been found to the
tax challenges of the DE, and that while the OECD is looking for long
term solution to them, the unilateral measures mentioned above would be
acceptable short term solutions, pending the development of a
consensus388. We do not share the same view. Actually, if these initiatives
(or other available alternatives such as formulary apportionment or
destination-based corporate tax) were to become widespread on a
unilateral basis, it is not difficult to foresee a DE tax world where
countries’ in-coordination, jurisdictional overlaps, and, possibly, cascade
taxation, might become rampant.

3.2. Indirect Taxation

1626
In the last few years, the VAT revenue forgone by not taxing cross-
border sales of digital goods and services has been generating serious
concerns for many tax authorities worldwide389. For example, in 2015 New
Zealand estimated that it suffered an annual VAT leakage of NZD 180
million ($114 million) because of cross-border services, intangibles and
goods390. As a consequence of this VAT leakage, some countries391 started
implementing new VAT rules that largely conform to the OECD BEPS
project and the updated International VAT/GST Guidelines (2015)
(Guidelines)392.

Action 1 of BEPS refers to the results achieved in the context of


Guidelines, which endorse the destination principle as an international
norm and recommend that B2B and B2C transactions be taxed in the
country where the customer is established, except on-the-spot B2C
services such as personal services, accommodations, and restaurants,
which should be taxed where the service is rendered. The Guidelines also
recommend that services involving immovable property should be taxed
where the property is located. For B2C services, the guidelines recommend
that the non-resident vendor should register for and charge a VAT in the
country where the consumer is located. For B2B services, the guidelines
suggest that the business recipient should self-assess VAT using a reverse
charge or similar mechanism393.

After almost two years since BEPS’ final report was published in 2015,
we understand that there are still two recurring problems that remain
unsolved in this area. The first problem is that the new VAT rules recently
implemented to tax the DE differ significantly among jurisdictions. This
lack of harmonization produces a great deal of complexity, uncertainty and
heavy compliance burdens to businesses involved in cross-border

1627
transactions. Moreover, none of the set of rules adopted by the different
jurisdictions can serve as the “perfect model” to follow, and every single
one of them has both positive and negative features394. The second
recurring problem we identify in this field is that countries have not found
yet a practical mechanism to ensure an effective enforcement of these new
VAT rules. This is extremely relevant since, without such mechanism, it is
unlikely that VAT would be paid and, thus, these new rules will become
futile395.

Experts expect that the number of countries adapting their VAT/GST


laws to address the challenges of the digital economy will only grow396.
With the publication of the Tax Reform Bill397, there is now more certainty
that Argentina has actually decided to follow the same path.

4. THE ARGENTINE EXPERIMENT

4.1. The DE on the Spot

On July, 2017. AFIP’s highest official announced on the media that


digital platforms such as Netflix, Uber, Spotify, Airbnb and similar were
going to start paying taxes at the national level in Argentina. In that
occasion, it was specified that a withholding tax was going to apply and
that financial entities would act as withholding agents in the payments
made through the credit cards of the Argentine users of digital goods and
services398. This statement put the complex discussion on the taxation of
the DE back on the spot of both the Argentine media and tax
professionals399. In the latter case, there was certain skepticism on whether
the Argentine government were finally going to move forward with one of
the many alternatives available to tax this type of business, primarily
because – as explained in section II – there are currently no legal grounds
to support that imposition. However, the inclusion of provision amending

1628
the existing legal framework to allow the taxation of the DE in the Bill
submitted to the Argentine Congress dissipated all existing doubts on this
regard400.

In any case, the political decision to tax the DE should be understood in


the context of the domestic and international policies promoted by the
current Argentine government. In the domestic field, the government
intends to reduce the Argentine fiscal pressure (i.e., 32% without
considering inflation) by expanding the existing tax base. In other words,
the intention of the government is to increase the current number of
taxpayers in order to distribute the tax burden more equally among the
Argentine population. Concerning the international field, the clear goal is
to align Argentina to the OECD’s recommendation in order to gain the full
admission to that forum in the next years401.

4.2. The Argentine Tax Reform Bill

As mentioned above, the inclusion of specific provisions targeting DE


business in the extensive Tax Reform Bill submitted to the Argentine
Congress dissipated all existing doubts on whether this type of business
were going to remain untaxed or not in Argentina.

4.2.1. Direct Taxation

The following rule was included in previous versions of the Tax


Reform Bill, but finally the Argentine Ministry of finance decided to abort
it before sending the bill to Congress (Aborted Proposal):

(First article added after article 13, ITL)


Article … (I). It is presumed, without admitting proof to the contrary, that
FIFTY PER CENT (50%) of the price paid for digital services provided through the
Internet or any adaptation or modification of the protocols platforms or technology
used by the Internet or another network through which equivalent services are
provided, constitutes net gain of Argentine source, when the service is economically

1629
used in the country. The regulations will establish the scope of the referred
supplies.

We consider that the Aborted Proposal was highly inconvenient for the
following policy, legal and technical reasons402:

i) Contravention of ITL sourcing rules and OECD Guidance: by taxing


foreign digital services, the Aborted Proposal would have contravened ITL
sourcing rules on services rendered from abroad by nonresidents having no
PE presence in Argentina, and solid OECD guidance disallowing to peg
source to the residence country of consumers, users or service recipients
without any additional economic link between the foreign services provider
and said jurisdiction.
ii) Unequal Treatment of Digital and Non-digital Services: the Aborted
Proposal would have also created unfounded inequalities on the provision of
services from abroad, artificially grounded on the way such services are put
at the disposal of users or consumers (e.g., advertising in the foreign press
such as the New York Times would have remained untaxed while advertising
403
in a foreign platform would have been taxed) .
iii) Generation of double taxation: in effect, an isolated – not shared by most
trading partner countries – taxation on digital economy’s yields at source
would have not allowed crediting the tax so imposed in the home country;
this is so because according to international recognized rules, service income
is sourced where the activity takes place, and the foreign tax credit is limited
to taxes paid on foreign source income under the residence country’s
legislation. Similarly, taxable income under the Aborted Proposal would not
have been considered foreign source in exemption countries.
iv) Violation of Argentine Treaty Obligations: the Aborted Proposal would
have also contravened Argentine treaty obligations under current tax treaties
and the MLI (Multilateral Instrument) signed by Argentina on June 7, 2017.
Under all these agreements business income is exclusively allocated to the
residence country unless the foreign enterprise has a PE in the source country
and the income is attributable to the latter.
v) Differential treatment to Treaty and Non-treaty Countries: as a
consequence of the previous point, the Aborted Proposal would have also
created significant differences between treaty and non-treaty countries, thus
inadvertently promoting a possible migration of foreign digital players
towards treaty-partner countries, a move which could have made the new
piece of legislation useless in terms of positive revenue effect.
vi) Contradiction with OECD/G20 Policies: pending the revised outcome of
Action 1, BEPS, by April 2018, adopting a premature decision on a unilateral
basis following a more than a decade old and highly controversial legislation

1630
404
in Latin America , as intended, might have implied taking serious risks of
going in the opposite direction of most OECD/G20 countries. This would
have undoubtedly undermined Argentina’s efforts to gain admission to that
global forum in the future.
vii) No taxation of Digital Goods: from a different perspective, it is not clear
why digital services would have been taxable while digital goods would have
not.
viii) No definition of Digital Services: it is worth noting that a central
definition would have been left empty and conditioned upon the regulations’
final elaboration, in what appeared to be an undesirable sort of blank taxable
405
event .
ix) Overlapping with VAT provisions: the Aborted Proposal would have also
overlapped with the VAT provision incorporated in the Tax Reform Bill to
tax the DE.

4.2.2. Indirect Taxation

The Tax Reform Bill also includes an amendment to the VAT Law. In
this regard, the Bill establishes that, as of the second month following the
entry into force of the bill406, VAT will also apply as follows:

ARTICLE 1. e) The digital services (included in Article 3, section e, subsection


21, section m), provided by a person resident or domiciled abroad which effective
use or exploitation is carried out in the country, as long as the borrower is not
included in the provisions provided in the previous paragraph (i.e., import of
services applicable to B2B transactions). The digital services included in subsection
m) of section 21 of subsection e) of article 3, provided by a resident subject or
407
domiciled abroad shall be understood, in all cases, made abroad .

This new provision implies the extension of the current scope of the
Argentine VAT to B2C services defined by the Tax Reform Bill as
“digital”. In this sense, the bill specifies:

Digital services are deemed, regardless of the device used for downloading,
viewing or using them, as those carried out through the Internet or any adaptation or
application of the protocols, the platforms or the technology used by the Internet or
another network through which equivalent services are provided, which by their
nature, are basically automated and require minimal human intervention.

1631
In addition to the general definition aforementioned, the proposed
provision provides a non-exhaustive list of the most common digital
services408 and an exemption for the access and download of digital
books409.

The bill further dispose that the VAT liability relies on the Argentine
recipient or customers, who will be responsible for assessing and paying
the tax on the net price of the transaction arising from the foreign
provider’s invoice410, under the terms and conditions to be established by
AFIP. In B2C transactions involving intermediaries who intervene in the
payment of the service (e.g., banks, e-marketplaces etc.), the bill specifies
that they will be obliged to act as withholding agents411. The Bill further
specifies that the VAT liability is triggered as soon as the supply of the
service is completed, or there is a total or partial payment by the customer,
whichever happens first412.

Regarding the determination of the jurisdiction of “effective use or


exploitation” of the service, the bill provides that the jurisdiction in which
that occurs is “that in which the immediate use or the first act of
disposition of the service by the customer occurs, even if the latter uses it
for its consumption”. It further establishes as a non-rebuttable presumption
that there is an “effective use or exploitation” of the digital service in
Argentina when either: (i) the IP address413 (for services received through
computers, tablets etc.) or the SIM card country code (services received
through mobile phones) is located in Argentina; (ii) the billing address of
the client is in Argentina; (iii) the bank account used for the payment or
the issuing bank of the credit or debit card used to make the payment are
located in Argentina414.

1632
The aforementioned expansion of the current Argentine VAT rules to
cover digital services provided in B2C transactions raise the following
preliminary comments:

i) Definition of Digital Services: In this area, the Bill has followed the example
of the European Union (EU) legislation, which establishes a broader
415
definition of digital services and provides a long, non-exhaustive list of
items that are considered digital services. However, differently from
Argentina, the EU legislation also provides negative examples of services
that are not “digital”, which include professional services provided over
email; advertising services in newspapers, posters, and television; distance
learning in which content is delivered electronically (akin to correspondence
courses); and so forth. This brings more certainty and clarity at the time of
416
determining the type of services covered by this provisions .
Other jurisdictions take a less specific approach and more closely follow the
417
OECD guidelines (e.g., Australia and New Zealand). In fact, in a proposal
published in December 2016, the European Commission recommended
adopting a similar approach, namely taxing all B2C services where the
418
consumer is located, unless a specific exception applies . In this sense, the
Argentine Bill seems to be in line with the international legislation that
defines digital services in a broadly way.
ii) Determining the VAT liability: by imposing the VAT liability on the
Argentine customer, the rules adopted by Argentina differ significantly from
those recommended by the OECD updated International VAT/GST
419
Guidelines , which state that for B2C services, the non-resident vendor
should register for and charge a VAT in the country where the consumer is
located.
The Argentine rules also differ from those adopted by most jurisdictions which,
in general, have followed the OECD recommendations on this regard.
However, even when other countries generally require the foreign vendor to
register in the jurisdiction of consumption, as would be expected, they vary in
their approach to registration, and some even require a vendor to appoint a
420
fiscal representative . New Zealand and Russia, for example, have
introduced a simplified registration process for non-resident vendors of
digital services. The EU have also introduced the VAT Mini One Stop Shop
421
to alleviate the registration burden on companies . Since the Argentine Bill
does not require registration of the foreign supplier, the compliance and
enforcement issues that most jurisdictions face when applying VAT on
digital services will be avoided. In this sense, the Argentine mechanism was
422
probably inspired in a recent Colombian initiative .

1633
iii) The Role of Banks and E-marketplaces: in this regard, the Argentine Bill
is not entirely in line with the international initiatives.
Most of the countries which have enacted VAT rules for the DE deem that sales
via an e-marketplace are carried out by the e-marketplace, not by each
individual vendor, thereby shifting the VAT liability (and compliance
obligations) from the vendor to the e-marketplace. In this sense, the
approaches to the taxation of the intermediaries also varies among
jurisdictions and are based on precise contractual terms. For instance, both
the EU and Australia have rules that deem an intermediary involved in “key
aspects of the sale” to be the vendor, but they apply their rules differently.
Under the EU approach, each transaction in the supply chain is examined
and, for each transaction, each entity is deemed to have received and resold
423
the digital service itself (reseller assumption) . Thus, an operator involved in
key aspects of the sale to the final consumer is required to account for a
VAT. Conversely, a payment service provider that merely processes the
payment for the provision of e-services (for example, a bank or credit card
company) is not subject to the assumption in the EU. Finally, it should be
noted that some jurisdictions implement joint and several liability for vendors
424
and e-marketplaces, which may drag them both into the VAT net .
However, the Argentine Bill differs from the aforementioned rules since
(despite the major difference described in item (ii) above) they never shift the
VAT liability to the intermediary involved in the transaction. However, it
should be noted that if the intermediary (bank, e-marketplace or similar)
intervenes in the payment in a B2C digital service transaction, it will be
obliged to act as withholding agent and pay the VAT withheld to AFIP. This
should not be understood as an elimination of the VAT liability of the
Argentine consumer, who will still be the person subject to the tax.
iv) Identifying the Customer’s Location: in this regard, the Argentine Bill
seems to have also followed the EU example with the main difference that
the former has foreseen the application of “non-rebuttable” presumptions as a
general rule, instead of the rebuttable presumptions established by the EU for
specific transactions. In this sense, the EU legislation establishes a set of
rebuttable presumptions which apply only to specified transactions, and in all
other digital transactions, a business must determine the customer location
based on two non-contradictory pieces of evidence, such as customer billing
address, IP address, bank details, country code of the SIM card used, and
425 426 427
location of a residential fixed landline . Countries like India and Belarus
have implemented similar rules, but with some differences in the evidence
that sellers may use to determine the customer location. The problem of these
presumptions (which also apply to those included in the Argentine Bill) is
that the information in which they are based is not always readily available,
further increasing the compliance burden of taxpayers. For that reason, the
EU VAT modernization proposal suggested a gross receipts threshold under

1634
which businesses can presume the customer’s location based on only one
428
piece of evidence . Finally, different pieces of evidence may result in a
customer being deemed to be in two taxing jurisdictions and a business
429
would have to justify why one jurisdiction should be preferred to the other .
This can be an issue when a transaction involves two jurisdictions with very
different approaches (e.g., Argentina and the EU for services that require two
pieces of evidence which differ from those elements used by the Argentine
430
non-rebuttable presumptions) .
v) Differentiation between B2B and B2C services: determining the status of
the customer “in the other side of the counter” is a recurring problem under
the VAT legislation of most foreign countries. This is relevant because,
generally speaking, there are different rules and implications for B2B and
B2C transactions, and properly categorizing the customer is, unfortunately,
not necessarily simple. However, we understand that this problem is more
serious in those countries that have follow OECD recommendations and
require the registration of the foreign vendor in the consumer’s jurisdiction.
In those cases, the determination of the B2C or B2B character of the
transactions is relevant because it determines the registration obligation.
However, under the Argentine Bill, the VAT liability relies on the Argentine
customer (company or consumer), therefore the aforementioned challenge
will only be faced by payment of intermediaries, who will need to determine
the character of the customer in order to act as withholding agents. In that
case, we understand that – at least for Argentine intermediaries – it will not
be complicated for them to determine the status of the customer.
vi) Overlapping between B2B and B2C Payment Mechanisms: the Bill may
allow the existence of cases in which, if the type of transaction is not clearly
identified (B2B or B2C), there will be an overlapping of the existing payment
431
mechanisms for these transactions . For instance, if a bank cannot identify if
the payments to be processed come from a business or from a consumer, it
will probably choose to avoid tax contingencies and apply the VAT
withholding anyway. In that case, if that payments actually came from a
business there would be double taxation since the tax would have already
been accounted and paid to AFIP by the local company under the substitute
liability mechanism.
vii) Bank’s identification of digital transactions: another additional issue
raised by the Bill is how financial institutions will know if the credit/debit
card payments they process arise from a provision of “digital services” and,
consequently, if they should act as withholding agents or not. Is there going
to be an official list or registry of non-resident companies providing digital
services?
viii) Payments made through foreign intermediaries: finally, the Bill also
leaves a gab in relation to payments made by Argentine consumers for the
provision of digital services consumed in Argentina through foreign bank

1635
accounts or other payment intermediaries. This is just an example of the
many uncertainties that the Argentine VAT reform may generate.

5. WHAT’S NEXT?

Controversial domestic experiments and proposals worldwide like those


mentioned herein have pushed the OECD to attempt to regain control on
the digital taxation area by speeding up a revision process originally
expected by 2020. To that end, the Task Force on the Digital Economy
(TFDE) sought public comments on key issues identified in a request for
inputs related to the tax challenges raised by digitization and the potential
options to address these challenges, and held a public consultation meeting
at the University of California, Berkeley on November 1st, 2017. These
new efforts are aimed at issuing a revised (interim) report considering
inputs from stakeholders by April 2018.

Although OECD/G20’s objectives at this stage may be much modest


than arriving to a definitive solution on the taxation of the DE, in the
Direct Taxation area one would ideally expect that the optional policies
underlying the 2015 Report on Action 1 be replaced by the adoption of a
uniform criterion on the attribution of income tax jurisdiction432.

Although it is premature to ascertain what would be the path chosen


(i.e., whether to boost residence or source taxation on digital economy
income, or even resorting to new paradigms such as destination based
corporate income taxation), it is quite clear that the traditional inter-nation
equilibrium between residence and source countries on business income
will be shaken. Meanwhile, it is highly advisable not to adopt interim
domestic solutions which, at last, might place a country in a competitive
disadvantage vis-à-vis other G20 countries aligned with the revised
outcome on Action 1433.

1636
Regarding the Indirect Tax area, we understand that until the two
recurring problems mentioned above (i.e., lack of harmonization and
enforcement mechanisms) remain unsolved, most of the VAT rules
designed to tax DE will be futile causing more chaos to the already
unstable tax scenario434.

1637
Taxation of the digital economy in France
435
Polina Kouraleva Cazals

INTRODUCTION

Digital economy covers an extremely wide range of activities, each very


different from the other. Furthermore, digital aspects can be found in any
economic activity via online shops, specific software etc. Digital economy
develops at a fascinating rate and is much discussed about. However, the
interest for this topic is mainly a political one, probably due to the
importance of financial implications. Thus many public reports have been
written by various parliamentary and independent task forces436. While the
academic interest for this topic in France is increasing, only a few
significant conferences seem to have been organised so far437 and only few
local papers have been published on this topic438. In the current state of
law, very few legal provisions deal with issues of digital economy, even
more so in the French General Tax Code (GTC)439.

While dealing with these new ways of doing business, the first step is to
determine and classify issues raised. Indeed, digitalization of economy
offers different opportunities to individuals and to companies. For the
former, Internet has multiplied possibilities for commercial exchanges,
which does not raise new issues, but requires clarification of some old
fundamental concepts (item 1). For the latter, digitalization multiplies
opportunities to overcome borders and material connections with specific
States. This new way of doing business raises some issues that are not
specific to the digital economy, but they are intensified by it. It does also
create opportunities for taxation that are yet unexplored (item 2).

1638
The purpose of this article is to address certain issues related to the
taxation of the digital economy from a French perspective. This work will
not deal with VAT issues, as the legislation in this area is harmonized on
the European Union (EU) level. Nor will this work deal with the issue of
the use of software and artificial intelligence in tax procedures (with
specific rules regarding the tax control of accounting software, but also the
use of artificial intelligence to search for tax fraud), as these issues are not
directly related to the taxation of the digital economy.

1. QUESTIONS RAISED BY TAXATION OF INDIVIDUALS

Digital economy offers exceptional opportunities to non-professional


individuals who can thus sell goods and services online through gateways
that offer them access to millions of possible clients at once. New forms of
exchange (referred to as “collaborative economics”) have also developed
in the past years. Refusing to clarify some fundamental concepts (e.g.,
what should the object of taxation be: income or enrichment?), the
legislator searches for quick and specific solutions to deal with the cost-
sharing (item 1.1) or compliance issue raised by the digitalization (item
1.2). Other issues are still to be addressed, like the confused distinction
between professional and non-professional income (item 1.3).

1.1. Cost-sharing issue

The development of online platforms raised the issue of taxation of


“cost-sharing”. Reducing costs leads to enrichment, even if a very limited
one440. French tax authorities441 however decided not to levy taxes on
money received from “co-consumption” activities (sharing cars, boats,
cooking together etc.), even if it is not clear whether such cost-sharing
practices are considered outside the scope of the natural persons income

1639
tax (NPIT) as defined by the legislator or if it is a mere administrative
tolerance.

Two conditions should however be satisfied. The first condition relates


to the co-consumption and implies that the taxpayer should also consume
services. Thus, the taxpayer is considered as “co-consuming” if he/she
shares his/her car with other persons, going together with them to the same
destination. However, the exemption does not apply with respect to a lease
of movable or immovable property. Therefore, if the taxpayer rents his/her
car, associated rental income will be subject to tax. The second condition
is that the amount of money paid should not exceed the amount of costs
incurred for the purposes of the “service” concerned. Thus, in the example
of sharing a car ride with other persons, the cost in oil necessary for the
journey can be shared among all the passengers (including the taxpayer)
without taxation. However, if the amount paid to the taxpayer by the
passengers exceeds the price of the oil, the legal nature of the amounts
received by the taxpayer changes accordingly: it is no longer considered to
be a “cost-sharing”, but rather a taxable income; in this case the full
amount paid is subject to tax442.

1.2. Compliance issues for income generated via online platforms

Income generated by sales or services provided via online platforms


raises important compliance issues for two main reasons. First, tax
authorities have difficulties to control all transactions taking place via
online platforms. To address this issue, the legislator laid down new legal
duties for all online platforms443, requiring them to report to French tax
authorities annual income gained by each of their users. These new
obligations will be effective as of 2019444.

1640
Second, old tax legislation still in force does not match the
opportunities offered by digital economy. Thus, in the current state of the
French law the principle of taxation of all type of income (whether from a
regular activity or on a one-off basis)445 is considered as being too harsh
for often low and occasional income. Existing exemptions are too specific
and not sufficiently well known by non-professional individuals (e.g., an
exemption of capital gains not exceeding 5,000 euros from occasional
sales of movable property446). The Senat’s task force report on the taxation
of collaborative economy suggests a general exemption for any income
perceived through online platforms within the limit of 3,000 euros per
year447. This exemption could also be used to stimulate the online
platforms’ compliance with their new reporting obligations.

1.3. The distinction between professional and non-professional income

For natural persons’ income tax purposes, taxable base is the sum of
outcomes of different categories of income, each being assessed according
to its own specific rules. Some categories are clearly intended to cover
income generated by professional activities (e.g., commercial profits
category, also covering income from industrial and craft activities).
However, in practice all income generated by a specific type of activity
(e.g., commercial activity) will fall within these categories, whether it has
been exercised on a professional basis or not. Thus rental of furnished
dwellings (such as airbnb) is qualified as a commercial activity under
French tax law. Associated income will fall within the category of
commercial income, even if this activity is clearly exercised on a non-
professional basis.

The distinction concerned may however influence the tax treatment of


losses. The latter are better treated448 if generated by an activity exercised

1641
on a professional basis. There is however no single criterion of distinction.
For commercial activities to be considered as exercised on a professional
basis, the taxpayer need to be personally involved449, whereas for the rental
of furnished dwellings it is a matter of the amounts earned450. However,
considering the limited impact of this distinction451, the issue of its removal
should be considered.

2. COMPANIES’ TAXATION IN A GLOBAL ECONOMY

Digital economy generates employment, but also a dynamic and


stimulating economic environment. The French government is thus
determined to stimulate the development of the digital economy in
France452. One of the main characteristics of this economy is its extremely
rapid innovation. France has some attractive tax incentive measures, which
were not created for the digital economy, but which are used to a major
extent by digital companies. The main example is the “research tax credit”.
The amount of the tax credit is equal to 30% of the amount of research and
development (R&D) expenses (also deductible from the taxable base) not
exceeding 100 million Euros and 5% of the amount of R&D expenses
exceeding this threshold453. The tax credit so determined can be used to
reduce the amount of the corporate income tax (CIT) normally due. If the
amount of the tax credit exceeds that of the CIT, the balance can be used to
reduce the amount of CIT due for the next three fiscal years. Some
companies can even ask for an immediate reimbursement454.

Created in 1983455, this tax credit constitutes one of the main tax
expenditures, with a total amount of 5.5 billion Euros in 2016456. About
25% of this amount corresponds to research expenses in the area of digital
economy457. French legislator has not distinguished between different
possible areas in which R&D expenses can be made. According to the

1642
French tax authorities’ guidelines, expenses incurred for software
development can be considered as qualified research expenses, as long as
the company concerned deals with unsolved technical issues and the
outcome remains uncertain458. However, tax authorities’ guidelines on this
matter have recently changed. In its updated version, only a few specific
details on software development are provided, although software is
mentioned in the list of qualified research activities459.

The problem of this type of incentive is that it is used by research units


working on the development of new projects that will probably be used to
make profits elsewhere, which profits France will not be able to tax460.
Thus, France is determined to tax at least part of the profits made by the
main digital companies in France. On August, 7th 2017 the French
Minister of Finance reaffirmed his purpose to guarantee a “fair taxation”
of the main digital companies in the State where their profits are made. In
particular, on a national level, the Minister underlined the importance of
provisions intended to improve tax audits efficiency. All other measures
should normally be taken either on the EU level (e.g., tax harmonisation
projects that should be achieved by 2018) or on a global level (e.g.,
changes introduced by OECD to the concept of permanent establishment,
taking into account companies’ “digital presence”). The French Minister
did not hesitate to specify that if European and global projects were too
slow to come, France will act in a unilateral way461 (not specifying
however what kind of unilateral measures would be taken). French law is
however already dealing with issues of taxation on income generated by
the digital economy (item 2.1) and various alternative proposals are made
to take into account specific features of the digital economy (item 2.2).

2.1. Difficulties raised by the taxation of income

1643
According to traditional economic theories, taxation of an enterprise in
a State other than its State of residence can only be justified by the
contribution of this State’s infrastructures to the origin of the enterprise’s
wealth462. It explains the reason why most permanent establishment criteria
aim to prove a material presence in a State and an activity exercised
through this material presence. Digital economy however can make profits
in a State without any material presence (item 2.1.1) or can easily
dissociate the material presence and its main activity (item 2.1.2). French
judges search for solutions that sometimes can be found in old case law.

2.1.1. Issues raised by an activity exercised without material presence in a State

Under French domestic law, according to article 209 of the GTC, a


company should be subject to tax in France if it has a business carried on
in France. Law does not define this concept of “business”. Authors and
judges agreed on the following interpretation of this criterion: it means a
regular exercise of a commercial activity either through an establishment
or with the help of a non-independent representative or else if it forms a
full commercial cycle463. The first two criteria are close to those of the
permanent establishment, even though they apply only to corporate (not
natural) persons, and they can never apply to a separate legal person (a
subsidiary as such can never be a “business carried on by the holding
company”).

The third criterion (full commercial cycle) is a specific one. It is


however one of the most interesting criterion for the digital economy.
Indeed, it does not require any material presence in France, not even that
of a representative. It requires only commercial transactions, all of which
taking place in France and directed at French clients and consumers.

1644
On this matter, there is an interesting old case concerning a company
established in Monaco, which was selling advertisement spot to French
clients. These advertisement spots were broadcasted on a French radio,
thus aiming at French clients. Judges considered that this activity
constituted a “full commercial cycle” and profits generated thereby should
be subject to tax in France within the limits provided by international tax
treaty provisions. In that specific case, judges considered that the relevant
activity has been exercised through a permanent establishment in France
(the Monaco company apparently had two offices in France464) and
therefore France had the right to tax profits from this activity, according to
the applicable tax treaty between France and Monaco465. The impact of this
case on income from online transactions is thus limited by applicable tax
treaties. To overcome this limit, the Collin and Colin Report466 suggests to
introduce a concept of “virtual permanent establishment”, which would
justify taxation in the State where an enterprise provides services using
personal data provided by internet users of this State467.

2.1.2. A subsidiary: material presence separated from the main activity?

Another issue concerns an activity exercised by the taxpayer in the


State of source where he/she also has a subsidiary (e.g., France). Two
types of situations should be distinguished. In the first type of situation, the
subsidiary itself does not qualify as a permanent establishment. However,
tax authorities prove the use of the subsidiary’s premises by the main
taxpayer for his/her own purposes. These premises can thus constitute a
fixed place of business in France of the foreign taxpayer.

On this matter, the Council of State has considered the situation of a


company established in Luxembourg and active in the wholesaling of
perfume and other cosmetic products, namely in France. For the purposes

1645
of this activity, the company used premises of its French subsidiary,
arguing they were acting under a contract for the provision of services.
However, the existence of this contract has not been proved. In these
circumstances, in a decision held in 2010, judges considered that the
Luxembourg company had its fixed place of business in France468.

One year later, the administrative court of appeal in Paris had to deal
with a Lebanese company using its French subsidiary’s premises in similar
circumstances. There were no arguments about a possible contract for
provision of services. However, numerous legal and accounting documents
signed by the Lebanese company have been found in the French
subsidiary’s premises. It was considered to be a sufficient proof of an
activity exercised by the Lebanese company in the concerned premises.
This activity has been distinguished from the activity exercised by the
French subsidiary itself469. French judges decided that the Lebanese
company had a fixed place of business in France.

The solutions in both cases are in line with the OECD commentaries
under article 5 of the OECD Model Convention470. However, those cases
also show that if French subsidiaries had better contracts with foreign
mother or sister companies (for example, for the use of their premises or
for delivery services, as we can imagine for some online platforms), it
could be more complicated to qualify the existence of a permanent
establishment in France.

The second type of situations covers precisely subsidiaries providing


services to the main taxpayer under a valid contract. The issue then is to
know whether such subsidiaries can be considered as a non-independent
agent and thus qualify as a permanent establishment. This issue was raised
in the recent, publicly commented Google case. A French subsidiary

1646
(Google France – GF), owned by a US company (Google Inc.), had a
“marketing and services agreement” with an Irish subsidiary (Google
Ireland Limited – GIL), also owned by Google Inc. The purpose of the
contract was for GF to provide marketing and sales assistance services to
GIL, owner of the licence of the AdWords program. French clients signed
contracts directly with the GIL. However, they were approached by GF,
which could also lead the negotiations of specific terms and conditions,
subject to approval by GIL. GF also provided certain customer services.

In this specific case, judges have considered that the French subsidiary
fulfilled only one of the two necessary criteria to be qualified as a non-
independent agent.

The first criterion is “dependence”, which French judges consider to be


related to the legal and financial situation of the subsidiary. Legal
dependency is met when the main taxpayer owns the subsidiary directly or
indirectly. It can also be met if the French subsidiary is a sister company to
the main taxpayer, as it was the case for GF and GIL. As to the financial
dependence, judges consider the subsidiary’s financial situation, whether
the main taxpayer is its only client or not. In the case concerned, GIL was
the unique client of GF. The dependency criterion was therefore fulfilled.

The second criterion is the capacity to engage the main taxpayer in a


legal relationship, which should be part of the taxpayer’s main activity. In
the Google case judges reminded that all advertisement sales were signed
only by GIL and all changes in its terms and conditions had to be approved
by GIL471. The only contracts that were signed between French clients and
GF were confidentiality agreements or legal transactions in which French
clients waived their rights with respect to any legal pursuits against “any

1647
company of the Google group”. These contracts were considered separate
from the taxpayer’s main activity (advertisement sales).

This type of situation is however not new nor specific to the digital
economy. A similar issue was raised in the Interhome AG case. The
French judges considered in this case that in order to qualify as a
permanent establishment, a French subsidiary should “regularly exercise in
France, in law or in fact, power to engage the non-resident taxpayer in a
commercial relation connected with the taxpayer’s main activity”472. Even
though inspired by OECD commentaries473, this expression has been
strongly criticized474. The Council of State has thus abandoned this
reference to “in law or in fact”. However, it still considers that whether an
agent can bind the main taxpayer regarding third parties should be
appreciated taking into account all circumstances, and not only the legal
appearance. Thus considering the situation of a commission agent, judges
first reminded that under the commission contract, the commission agent
has no power to bind in law the principal regarding third parties. They also
examined whether the legal appearance of a commission contract did not
disguise a different type of legal relationship between the main taxpayer
and his/her alleged agent475. Legal analysis of relations between a non-
resident taxpayer and its French subsidiary should prevail, unless the
economic substance is different from the legal appearance476. Several
months later, the Council of State confirmed its approach considering that
a Swiss company’s French office, which negotiated, drafted and executed
contracts on behalf of the Swiss company, could not be qualified as a non-
independent agent, as long as all contracts were signed by the Swiss
company477. The decision taken by judges in the Google case is thus in line
with this previous case law.

1648
Some members of the government admitted that the contractual
structure of business set up by Google was legal although “morally
reprehensible”478. The issue is however not definitely solved. French
Minister of Finance appealed against the decision of the Administrative
tribunal479. Google is currently under criminal investigation for aggravated
tax fraud and money laundering by organized crime480. However,
according to the French constitutional council, a criminal conviction is
prohibited if an administrative or a civil judge concludes, on a substantive
ground, to the absence of tax liability481. Therefore, no criminal conviction
of Google is possible unless criminal investigations cover different
elements, taxes or years other than the one treated by Administrative
Tribunal of Paris, or unless a superior jurisdiction later cancels the
decision of the Administrative Tribunal of Paris.

2.2. Alternatives to the taxation of income

Many States, when facing difficulties to tax income generated by digital


economy, start to set up alternative measures of taxation, the most famous
one being the so-called UK diverted profits tax. This type of taxation has
no chance to succeed in France (item 2.2.1). However, various task forces
proposed some interesting and completely new approaches to the taxation
of digital economy (item 2.2.2).

2.2.1. Reasons of a failure to introduce a diverted profits tax in France

During the examination of the draft of the Finance Act for 2017,
members of Parliament proposed to introduce a French version of a
diverted profits tax. In its final version, this provision aimed to tax any
profits made by a non-resident company from sales, but also from an
activity consisting in providing goods or services, in France through an
enterprise or a legal entity in a situation of legal dependence with the non-

1649
resident company (either through a holding position of more than 50% or
if the main taxpayer plays – in any other way – a decisive role in the
management of this enterprise or legal entity482). Taxation would also
apply to profits from sales or provision of goods and services, if these
profits were made with the help of a legal or natural person whose activity
could be “reasonably” considered as aiming at avoiding taxation in France.
Legal provision did not define such an activity, but provided several
examples. The first example covered the use of any material place in
France to receive, stock and deliver in France products sold by the foreign
legal entity. The second one concerned a website, whether hosted in
France or not, which would target French clients, making sales or
providing them with goods or services on behalf of the foreign legal entity.
It established a presumption of diverted profits and the provision expressly
specified that the French tax authorities could decide to use it on the
occasion of a tax audit483.

The power conferred to French tax authorities to decide when to use the
presumption laid down in the provision on the diverted profits was
considered as violating the exclusive competence of the French Parliament
regarding all tax issues, as provided by article 34 of the French
Constitution. The Constitutional Council has censored the whole provision
on this ground484, considering that if it cancelled only the part of the
provision that has been criticized, the effects of the diverted profits as a
whole would be different from the effects expected by the legislator485.

This critic could be easily overcome, but this provision had another,
more significant weakness. In its initial version, profits that were deemed
to be diverted were supposed to be subject to a specific tax486. However,

1650
many deputies and Government representatives expressed their concern
regarding the compliance of this provision with tax treaties487.

Indeed, most of the French tax treaties apply not only to the existing
“corporate income tax”, but also to any “identical or substantially similar”
taxes (in line with the OECD model wording). The French Council of
State (the highest administrative court) has long considered that the taxes’
substantial features should prevail over procedural rules, for the purposes
of assessing the “substantial similarity” of taxes. Thus a specific tax
introduced on real property capital gains was considered to be
“substantially similar” to the natural persons income tax and to the
corporate income tax, as long as it could be deducted from these taxes488.
The position of the French Cour de cassation (the highest court in the
judiciary) is yet a more tempered one. Thus a specific levy on insurance
premiums and contributions were considered as not being similar to
income taxes, even though it was deductible from the CIT amount, but
according to parliamentary records this deduction was introduced only to
balance out the budget and to increase the collection efficiency489.
However, the possibility of deducing a specific tax from a more general
income tax is not the only similarity criterion. The Council of State has
thus considered that tax treaties should cover a tax if its territorial scope is
defined by reference to the territorial scope of the CIT490. The French tax
authorities have also admitted that tax treaties cover social taxes491, as long
as they are qualified as a “tax” (as opposed to social contributions) by the
French constitutional council492 and their taxable base consists of the
various types of personal income.

The diverted profits tax, as it has been initially stipulated, had chances
to be considered as being “substantially similar” to the CIT. Indeed, not

1651
only was it a tax on profits, but it was supposed to be paid on profits which
should have been subject to CIT (if the taxpayer did not intentionally avoid
the creation of a permanent establishment). Other arguments could also be
found. The rate of the diverted profits tax was fixed by reference to the
article of the French general tax code setting the rate of the CIT. Finally,
any taxes paid abroad on the same profits were deductible from the
diverted profits tax, as long as they were “comparable” to the French CIT.

To address these critics, Government representatives and members of


Parliament preferred to waive the idea of a specific tax and to subject
profits concerned to the corporate income tax, thus clearly restricting the
effects of this provision to situations where there is no applicable tax
treaty493. Therefore, should the Government or members of Parliament
introduce a similar provision – amended on the issue of the tax authorities’
powers – it would still have a very limited impact, applying only if there is
no tax treaty. It seems thus necessary to search for entirely new approaches
to taxation of the digital economy.

2.2.2. New approach to taxation of the digital economy

New approaches search for new sources of profits in the digital


economy. Thus, on the 19th July 2012, Mr. Philippe Marini, Senator and
president of the Sénat Finance commission of the Senat, introduced a
legislative proposal aiming at “a fair and neutral taxation of the digital
economy”. The two main measures of this proposal intended to introduce
specific taxes. The first was an on-line advertisement tax. A similar tax on
the advertisement broadcasted in/from France by radio and television has
already been introduced in 2003. It is a lump-sum tax, the amount of
which varies depending on the amount received by advertisement
departments494. The tax proposed for on-line advertisement was different,

1652
as it was supposed to have progressive rates going from 0.5% to 1% of
amounts perceived by advertisement departments. However, the idea to
apply the same tax to the on-line advertisement has generated strong
adverse reactions mainly for the reason that it would affect the competition
ability of French companies and restrain the development of digital
economy in France495. The proposal was eventually abandoned.

The second specific tax in Mr. Marini’s proposal was intended to be


levied on the remuneration of any services provided to French clients on-
line. The term “services” covered any sales or provision of goods and
services following a request sent via any electronic means, other than by
phone. It was however stipulated that the simple fact that the provider of
such “services” and his/her client were exchanging emails was not enough
to presume that the services themselves would be provided via electronic
means. Once the provision of such electronic services was proven, the
turnover from these services would be subject to tax at a 0.25% rate. The
tax did not apply if the turnover did not exceed 460,000 euros. This
specific tax was not entirely new either, as it was inspired by the tax on
supermarkets and shopping centres496. The idea of this tax was also
strongly criticised497 and eventually abandoned. The two weaknesses
common to these two taxes were, first, that they aimed at taxing only
specific areas of the digital economy498 and, second, that if they were to be
introduced unilaterally only in France, this could have a negative impact
on the competition ability of French companies499.

Mr. Collin and Colin’s report focused on a specific feature of digital


economy: the importance of the personal data transferred free of charge by
individuals to web companies, for whom it constitutes a good that can be
sold. The report argues for the introduction of a specific tax not on the

1653
collection of personal data itself, but on the way to stock and to use them.
The idea is to use this tax as a public policy tool to influence the behaviour
of digital economy actors. Thus, a lump sum will be due for any newly
created account or any new IP using a specific software. The sum could
vary depending on the quality of the consumers’ access to their personal
data, whether it is easy or not to recover or to change these data500. The
authors of the report call it a “predator pays” principle, making a parallel
with the “polluter pays” principle in eco-taxes. Although the National
Digital Board approves the idea of such taxation, it warns against the risk
to introduce such a tax in a unilateral way501. None of these ideas has yet
been implemented.

CONCLUSION

The taxation of the digital economy draws the attention of the French
Parliament and its experts. However, as of today, very few measures have
been implemented. Any new form of taxation or any unilateral change in
the approach of international issues of taxation can significantly affect the
competition ability of French companies. There are still however two ways
to improve the efficiency of the taxation of the digital economy in France
by acting on a national level. First, by clarifying the initial logic and basic
concept of taxation, thereby ensuring to taxpayers at least a good level of
legal security. Second, by reinforcing tax audit efficiency, thus ensuring to
French tax authorities at least a good level of collection for existing taxes.

1654
Taxation of Digital Economy: India
Perspective
502 503
T. P. Ostwal e Mohak Shingala

1. INTRODUCTION

According to Charles Darwin, the originator of the biological theory of


evolution, those who survive are the ones who most accurately perceive
their environment and successfully adapt to it. The world, as we know, is
encountering a digital evolution at lightning speed. Digital is not just part
of the economy – it is the economy504. The digital economy505 continues to
show an uptrend and has been influential on the social and economic
growth of nations.

While on one hand e-commerce technologies have helped nations to


accelerate their economic growth and to provide opportunities for
businesses to grow, it has also created many challenges and effects across
various domains of society, as well as for policymakers.

Taxation policy applied to digital service providers has been one of the
more far-reaching sets of policies that have concerned national and
international policy makers, in particular, taxation policy for enterprises
with no permanent establishment (PE) within the territory of a nation
applying the tax. This issue has occupied the minds of international experts
for several years at the Organization for Economic Cooperation and
Development (OECD) and the G20. A number of suggestions have
emerged as a result of this exercise.

1655
India has been a pioneer in addressing one aspect of this issue through
an equalization levy. This policy has raised both concerns as well as voices
of support. The importance of the policy and the growing scope of digital
services require a closer independent and objective examination of the
basic features and the concerns relating to this policy.

2. DIGITAL ECONOMY IN INDIA

The revolution of information technology has been a worldwide


sensation, strongly prevalent in India as well. India’s private sector has
provided a crucial impetus to digital-based activities, and the Government
of India (GoI), through various programmes such as “Digital India”, which
comprises of various initiatives each targeted to prepare India for
becoming a knowledge economy and for bringing good governance to
citizens through synchronized and coordinated engagement of the entire
Government, is rapidly expanding the scope and basis of digital
transactions in India.

The ability for enterprises to provide services from any location without
having a physical presence facilitates inclusiveness and generates
conditions for positive network effects for creating multiplier effects for
economic and social transactions. The potential in India is huge, due to the
growth in digital technologies as well as the significant segment of the
population that is yet to become an active part of this growth. The e-
Commerce and Internet sector is tipped to be the drivers of India’s
economy in times to come – sooner rather than later.

Goldman Sachs predicted that over the coming decade, India –


comprising 15% of the world population, with a growth rate of 7% to 9%,
could be the second largest economy by 2030506. India’s new leadership

1656
considers the digital economy as a major growth enabler. When Prime
Minister Narendra Modi strategically listed Digital India among the top
priorities for the new central government, he delivered a colossal nod to
the digital economy’s opportunities. The Department of Electronics &
Information Technology of India published Internet of Things (IoT), which
is defined as the interplay of software, telecom and electronic hardware
industry, policy estimating IoT industry in India grow up to INR 940
billion by 2020507. Cisco estimates that all Internet of Everything (IoE)
pillars – Internet of things, Internet of people, Internet of data, and the
Internet of Process – for India have a value at stake of INR 31.880 trillion
(about half a trillion U.S. dollars) for the next ten years. From that INR
7.263 trillion is in the public sector and INR 24.616 trillion is in the private
sector during the next decade508.

It is estimated that India’s e-commerce market was worth about US$3.9


billion in 2009, further going up to US$12.6 billion in 2013. In 2013, the
e-retail segment was worth US$2.3 billion. A large part of India’s e-
commerce market was travel related, but that may be changing now.
According to Google India, there were 35 million online shoppers in India
in the first quarter of 2014 and is expected to cross the 100 million mark
by end of the year 2016. Electronics and Apparel are the biggest categories
in terms of sales. Overall the e-commerce market is expected to reach INR
1,07,800 crores (US$24 billion) by the year 2015 with both online travel
and e-tailing contributing equally5.

With more and more consumers preferring the online marketplace to


traditional brick-and-mortar stores, the importance of the former has been
growing at a rapid pace. Consequently, this business model has been a
lucrative investment opportunity for foreign investors in India. However,

1657
due to its growing importance and exponential growth, the sector has been
seeing protracted litigation relating to tax-related issues.

3. HISTORICAL TAXATION OF DIGITAL ECONOMY

Traditionally, the taxation on intangible goods and services has been


marred by double taxation, litigations, and confusion in the industry. India
(as a developing nation and a predominantly capital importing country) has
been a strong advocate of source-based taxation as well as residence-based
taxation. The 1961 Indian Income Tax Act (IITA) envisages cross-border
taxation in India for the reason that the originator of the transactions
resides in the Home State and the website of the transactions is in the Host
State. Income arising out of such transaction is subject to tax in both
countries by virtue of Residence Rule to the transfer as well as by virtue of
the Source Rule to the income itself. This gives rise to double taxation of
the same income, which is generally solved by a Double Taxation
Avoidance Agreement (DTAA) between the two concerned countries. Due
to the absence of national boundaries, non-requirement of the physical
presence of goods and non-requirement of physical delivery (in certain
cases), taxation of e-commerce transactions raises several issues. India had
traditionally adopted a unique “source” based approach to the digital
economy. This includes:

3.1. Royalty

India has entered into a number of treaties wherein payment for use of
equipment has been classified as royalty, which is taxable on a gross basis.
An important point to note is that the Indian domestic laws were amended
in 2012 to include payments for “transmission by cable, optic fiber or
similar processes” within the purview of royalty.

1658
This amendment has caused a controversy in the Indian domestic laws,
with the argument that is the payment being made for transmission by
cable, optic fibre etc. (which is the underlying infrastructure for e-
commerce) or is the payment being made for the service/good from the
digital platform without concerning the underlying infrastructure.

3.2. Fees for Technical Service (FTS)

Another argument provided by the Indian Tax Authorities is that the


website provider renders technical service to the payer since technology is
involved in the e-commerce transactions.

3.3. Permanent Establishment (PE)

Due to absence of national boundaries, non-requirement of physical


presence of goods as well as non-requirement of physical delivery in
certain cases, the location where the e-commerce transaction gets
concluded gets blurred. The age old method of transacting with countries
by way of branches, subsidiaries which traditionally creates a PE, which in
turn is taxable in the countries where revenue arises, is not necessarily a
reality in e-commerce transactions.

The Indian Courts were dealing with several cases, mostly at the
Income Tax Apellate Tribunal (ITAT) level, which were expected to be
appealed at the High Courts and Supreme Courts. A classic example is the
case of ITO vs. Right Florists Pvt. Ltd. for tax assessment year 2005-06509,
wherein the ITAT held that payments made by Indian residents to Google
and Yahoo for advertisement services rendered through their search
engines were not taxable in India since such payments were not in the
nature of FTS in the absence of human intervention. Hence, a website was

1659
not a “tangible property” and therefore, it could not be regarded as a PE of
a foreign company unless the servers are located in India.

An important point to note is that Commentary to the OECD’s Model


Convention states that where an enterprise carries on business through a
website hosted on its server (leased or owned), the place where such server
is located could constitute a PE in certain circumstances. However, the
circumstances for considering a website a PE were not specified. Further,
the Government of India made a reservation on the above view which was
taken note of by the ITAT. The ITAT, however, viewed that the
reservation would not have an impact in interpreting the meaning of the
term PE under treaties that India has entered into prior to 2008 (which is
when such reservations were expressed).

Similar views were taken in the following decisions:


510
•Income Tax Officer (ITO) vs. Pubmatic India Pvt. Ltd. :

The Assessee and its Holding Company in the USA were engaged in
providing services of internet advertisement and marketing. During the
year under consideration, the Assessee made payments to the US
Company for purchase of online advertisement space, which he claimed
did not require withholding tax on account of absence of PE. Thus, the
issue for consideration before the ITAT was whether purchase of
advertisement space on foreign websites constitutes PE under the Tax
Treaty. Hence, it was held that although purchase of advertisement space
on foreign websites forms part of the business income of US Company,
however, in absence of PE such profits are not taxed in India.
511
•Yahoo India Pvt. Ltd. vs. Deputy Commissioner of Income Tax :

1660
The Assessee was engaged in providing consumer services such as
search engine, content and information on a wide range of topics, email,
chat etc. The Department of Tourism of India intended to display a banner
advertisement on a portal owned by Yahoo Holdings (Hong Kong) Ltd. for
which it hired the assessee to approach Yahoo Hong Kong to provide
uploading and display services for hosting banner advertisement to Yahoo
Hong Kong portal. The Indian Tax authorities were of the opinion that the
payment made to the assessee was in the nature of royalty. However, it
was held that since uploading and displaying the advertisement was the
responsibility of Yahoo Hong Kong, the said payment was not in nature of
royalty taxable in India.
512
•Pinstorm Technologies Pvt. Ltd. vs. ITO :

The Assessee was engaged in the business of digital advertising and


internet market and was utilising search engines such as Google and
Yahoo for buying advertising space on behalf of its clients. The assessee
had made payments to Google Ireland during the year, which was
allegedly classified as services by the tax authorities and, hence, to be in
the nature of fees for technical services. Therefore, the tax authorities
claimed that the assessee company was liable to deduct tax at source.
However, it was held that the payment to non-resident for uploading and
displaying banner advertisements was not chargeable to tax in the absence
of a PE.

In one of the recent decisions by the tribunal in the case of Google India
Pvt. Ltd.513 wherein the Assessee – Google India – was a wholly owned
subsidiary of Google LLC and appointed as a non-exclusive authorized
distributor of Adword program514 to advertisers in India by Google Ireland.
The controversy surrounding this case was regarding the classification of

1661
the “payouts” that Google India made to Google Ireland. In case such
payouts are classified as being made for availing services, it would be
characterised as in the nature of business income and in case Google
Ireland does not have PE in India, there would be no tax liability.
However, in case the payouts are characterised as “right to use an
intellectual property” (i.e., the Adword program), the same would be
subject to tax as royalty and therefore, withheld at the appropriate rates.

The argument put forth by Google India was that since independent
advertisers get the advertisement uploaded onto Adword through Google
India’s website, the advertisements are displayed in the manner determined
by the programs run by Google servers outside India. However, the
tribunal rejected such an argument and concluded that the payment made
by Google India is royalty and not business profit and, therefore,
chargeable to tax in India.

4. INDIA’S APPROACH

Following the Base Erosion and Profit Shifting (BEPS) Action Plan, the
Indian tax authorities have been vocal in expressing its commitment to tax
the digital economy, in spite of the “wait-and-watch” approach suggested
in the action plan. The genesis of this approach is not new, considering the
difference in ideology of source-based UN models – such as the one
followed by India – and residence-based OECD models. This apart, the
ever-growing digital economy and innovating valuation means adopted by
private equity players – for instance, based on the number of active users
in India – have surely added to India’s desire to demand a fair share of
revenue on source principles.

1662
In order to address the challenges in terms of taxation of such digital
transactions, the Central Board of Direct Taxes (CBDT) constituted a
committee (the Committee) to study and issue a report on taxation in e-
commerce. The Committee comprised of senior officials from the Finance
Ministry and the Income Tax Department, industry representatives,
Institute of Chartered Accountants of India (ICAI) representatives and
independent professionals. They examined the tax issues for new business
models in the digital economy, as well as took cognizance of detailed
discussion by the OECD in the Digital Economy action plan. It stated that
the main objective behind recommendation for introduction of the
equalization levy is to neutralize “unfair tax advantage” enjoyed by
certain foreign enterprises on account of absence of tax liability in India.

This Committee, in its report515 published on February 3, 2016, provided


the following recommendations, which are reproduced as under:

A. Equalization Levy may be imposed on payments to nonresidents for


specified services by a separate chapter in the Finance Act, 2016
190. In accordance with the conclusions of the BEPS Report on Action 1, which
have been endorsed by G-20 and OECD, it is recommended that an “Equalization
Levy” may be imposed on digital transactions, by introducing the necessary
statutory provisions by a separate chapter in the Finance Act, 2016. This will not be
a part of the Income-tax.
191. The Equalization Levy should be chargeable on any sum that is received by
a nonresident from a resident in India or a permanent establishment in India as a
consideration for the specified digital services.
192. The rate of Equalization Levy may be between 6 to 8 percent of the gross
sum received.
193. Specified services may be defined as following:
i) online advertising or any services, rights or use of software for online
advertising, including advertising on radio & television;
ii) digital advertising space;
iii) designing, creating, hosting or maintenance of website;
iv) digital space for website, advertising, e-mails, online computing, blogs,
online content, online data or any other online facility;
v) any provision, facility or service for uploading, storing or distribution of
digital content;

1663
vi) online collection or processing of data related to online users in India;
vii) any facility or service for online sale of goods or services or collecting
online payments;
viii) development or maintenance of participative online networks;
ix) use or right to use or download online music, online movies, online games,
online books or online software, without a right to make and distribute any copies
thereof;
x) online news, online search, online maps or global positioning system
applications;
xi) online software applications accessed or downloaded through internet or
telecommunication networks;
xii) online software computing facility of any kind for any purpose;
xiii) reimbursement of expenses of a nature that are included in any of the
above.
194. It may be clearly explained in the provision that for the purposes of the
above, “online” means a facility or service or right or benefit or access that is
obtained through the internet or any other form of digital or telecommunication
network including radio & television, whether analog or digital.
195. It may also be clearly explained that Equalization Levy would be payable if
the sum received is a consideration for any of the above, irrespective of how it may
be described in the books of the beneficial owner or the payer.
196. Equalization Levy should not be charged unless the consideration received
for specified services in a year from a person in India is more than one lakh
rupees.
197. Equalization Levy should also not be charged on payments received by a
permanent establishment of a nonresident in India, which are attributable to that
permanent establishment and taxable under Income-tax Act, 1961. A written
declaration by the beneficial owner in a prescribed form including Indian PAN and
a Tax Identity Number in country of residence for this purpose should be sufficient.
198. Every person that has received any sum chargeable to Equalization Levy,
would be required to pay the Equalization Levy chargeable on that sum to the
central government. The Equalization Levy payable by that person will be the
Equalization Levy payable on the sum chargeable to Equalization Levy as reduced
by the Equalization Levy deducted by the payers from such sum at the time of
payment or credit of such sum.
199. Every person that has received any sum chargeable to Equalization Levy,
would be required to file a return of Sum chargeable to Equalization Levy as
prescribed, if such total sum received by that person in a year exceeds ten crore
rupees. Necessary facility for filing of such return online in a simple form should be
made available. The details sought in the form should include the name and address
of the payer, amount and date of payment of each payment of sum that is received
by that person and the amount of Equalization Levy deducted by the payer on it.
200. The payer should be liable to deduct the Equalization Levy, if the payment
is incurred for the purpose of a business in India and likely to be claimed as an
expenditure (including capitalized expenses). This obligation should be similar to

1664
the obligation that exists in respect of Tax deducted at source under Income-tax Act,
1961.
201. The payer should also be required to get a certificate from an Auditor,
within 60 days after the end of the year, that Equalization Levy has been deducted
from all sums chargeable to it, and paid to the Central Government within 30 days
of such deduction. The payer should also be required to file an annual return of
deduction of Equalization Levy, in a simple form including the name and address of
the payer, amount and date of payment of each such payment, the amount of
Equalization Levy deducted on it and the details of payment of such deducted
amount to the Government.
B. Corresponding Changes in the Income-tax Act, 1961
202. Any income arising from a transaction on which Equalization Levy has
been paid should be exempted from income-tax, by necessary amendment in
Section 10 of the Income-tax Act, 1961.
203. The allowability of the payment as an expense for determining the taxable
profits under the Income-tax Act, 1961 may be linked with the payment of
Equalization Levy, similar to the allowability under Section 40 of that Act,
including the allowance of such deduction in the year in which it is paid.
204. Payments subjected to Equalization Levy may also be notified under
Section 195 (7) of the Income-tax Act, 1961, along with an exemption provided in
the notification itself to those cases where Equalization Levy is paid, so as to
strengthen the deterrent against noncompliance.
C. Other Recommendations
205. The definition of “business connection” in section 9 of the Income-tax Act,
1961 may be expanded to include the concept of significant economic presence.
206. Work on exploring the possibility of deduction of Equalization Levy by the
payment gateways should be initiated immediately, and should include a review of
rules and regulations as well as the systematic requirements for implementation of
such a mechanism, which may substitute or complement the deduction of
Equalization Levy by the payer.
207. The implementation and impact of Equalization Levy may be monitored on
a regular basis, particularly as the digital services that can be provided and availed
without physical presence, continue to evolve and expand in India. A Standing
Committee may be constituted for this purpose.

5. ACTION TAKEN BY INDIA

Following the committee recommendations, India’s Finance Minister


through the Finance Act, 2016516, in Chapter VIII, introduced the scheme
of equalization levy chargeable at the rate of 6% of the amount of
consideration, for “specified services”, received or receivable by a
nonresident from a resident in India who carries out business or profession

1665
in India, or from a nonresident having PE in India. The levy would be
under a separate self-contained code and is not a part of the income tax
law.

The said scheme adopted most of the recommendations of the


Committee, except the scope of “specified services”. The Committee had
recommended inclusion of 13 types of “specified services” as provided
above. However, as per the Finance Act “specified services” includes
online advertisement; and any provision for digital advertising space or
any other facility or service for the purpose of online advertisement. It also
provided that such specified service includes any other service as may be
notified by the Central Government at a later date. It may be reasonable to
anticipate that the scope of specified service would be expanded in due
course to include the remaining types of services.

The said Chapter has also provided the definition of “Online”, which
means a facility or service or right or benefit, or access that is obtained
through the Internet or any other form of digital telecommunication
network.

The Chapter also provided specific exclusions from the scope of


equalization levy, i.e., equalization levy shall not be charged in the
following cases:

i) a non-resident provider of specified services has a PE in India and that the


specified services are effectively connected with such a PE;
ii) the aggregate amount of consideration for specified services received or
receivable in a financial year by a non-resident, from a person resident in
India and carrying on business or profession, or from a non-resident having a
PE in India, does not exceed INR 100,000 (approximately US$1,500);
iii) the payment for specified services by a person resident in India or the PE in
India is not for the purpose of carrying out business or profession, i.e.,

1666
equalization levy shall apply only in case of a business-to-business (B2B)
transaction.

It has also been provided that equalization levy would be administered


by the Income-tax authorities. In case an assessee is aggrieved by the
order, he has an option to appeal against the penalty to the Commissioner
of Income-tax (Appeals) and next round of appeal before the ITAT.

6. CONCERNS ABOUT EQUALIZATION LEVY

There have been several concerns raised about the equalization levy. It
has been classified into different parts for ease of understanding:

6.1. What is the nature of Equalization Levy? Is it a direct or indirect tax?

Due to equalization levy being under a separate chapter under the


Finance Act, 2016, the exact nature of the tax is still ambiguous. Is it in the
nature of additional income tax, or is it an indirect tax as it is on
consideration for services?

Equalization levy is charged on consideration for any specified services


received or receivable by a person, being by a non-resident enterprise.

The Ministry of Finance in the Memorandum to Finance Bill, 2016517


has stated that the typical direct tax issues relating to e-commerce are the
difficulties of characterizing the nature of payment and establishing a
nexus or link between a taxable transaction, activity and a taxing
jurisdiction, the difficulty of locating the transaction, activity and
identifying the taxpayer for income tax purposes.

The digital business fundamentally challenges physical presence-based


permanent establishment rules. If PE principles are to remain effective in
the new economy, the fundamental PE components developed for the old

1667
economy, i.e., place of business, location and permanency, must be
reconciled with the new digital reality.

The Memorandum further goes on to state that equalization levy would


result in double taxation. Such double taxation arises due to the source
based taxation rule in India, wherein under section 9 of the IITA, any
income which accrues or arises or is deemed to accrue or arise in India to
nonresidents is taxed. On payment of such income, tax is withheld at the
rate ranging between 10% and 20% as per section 195 of the IITA.

However, under section 90 the taxpayer has the liberty of applying the
provisions of IITA or applicable DTAA, whichever is more beneficial for
determination of his tax liability in India. Hence, if the taxpayer is a
resident of another country under DTAA, he can avail benefit of DTAA in
India, provided the taxpayer furnishes Tax Residency Certificate (TRC) of
the resident country along with certain details in the prescribed format
(Form 10F). However, since equalization levy does not fall under the
purview of IITA, the above-mentioned exemption cannot be availed.
Hence, it had been proposed to provide exemption under section 10 of the
IITA for any income arising from providing specified services on which
equalization levy is chargeable in order to avoid double taxation.

Section 166(1) of the Finance Act, 2016 stipulates that: “Every person,
being a resident and carrying on business or profession or a non-resident
having a permanent establishment in India… shall deduct the equalization
levy from the amount paid or payable to a non-resident in respect of the
specified service…”.

It is also pertinent to keep in mind the following statement of the


Revenue Secretary of the Government of India, in respect of the confusion

1668
about equalization levy being a direct or indirect tax, in an interview with a
leading business magazine518:

Although people are viewing it as indirect tax, this is a direct tax. Our intention
is that the person, who is giving advertisements to a foreign portal, is supposed to
deduct 6 per cent out of the income that the other person is earning, and give it to
the government. So, it is really income tax, but it’s a different matter that the
Internet company may gross the charges up by 6 per cent and the burden may come
upon the Indian company. But to that extent, the Internet company’s
competitiveness may come down.

Therefore, it can be concluded that equalization levy is a direct tax.

6.2. Is Equalization Levy a tax on income?

The Committee in its report has taken the view that as the Equalization
Levy is imposed on the gross amount of transaction, and not on the income
arising from such transaction, it is applicable irrespective of whether any
income arising from the transaction is taxable in India or not. As the
Equalization Levy is not imposed on income, it does not fall within the
scope of “income-tax” or “tax on income” or “any identical or
substantially similar taxes”, which typically define the scope of taxes
covered within the tax treaties.

However, a logical conclusion follows that if there is a tax on gross


consideration, the income portion embedded in this gross consideration is
also taxed. For example, withholding tax on royalty or fees for technical
services, under the domestic laws or tax treaty, is a tax on foreign
enterprise’s income. Hence, the view of the Committee – that equalization
levy is not a tax on income – is incorrect.

6.3. Burden of Equalization Levy

1669
The Committee report states a possible ground of criticism of
equalization levy could be that since there will be no foreign tax credit
available to the taxpayer in lieu of equalization levy, it would amount to
double taxation of their income. If it is to be imposed, it should be under
the tax treaties so that there is no double taxation.

The reply to this criticism provided by the committee is that this is


acceptably an inherent limitation of Equalization Levy or any other option
that may be imposed under domestic laws, not covered by the tax treaties.
The reply further states that the onus is on taxpayer’s country of residence
from granting relief under their domestic laws to avoid such double
taxation. It also proposes that such country should also impose an
equalization levy for a bilateral agreement between India and such country
to be entered into for providing relief. Another alternative provided is for
the taxpayer to have a PE in India, and hence not fall under the purview of
equalization levy.

It is most likely that since no tax credit will be available for the levy,
the entire tax burden will be passed on to the Indian consumers since
Indian companies will have to gross up the fee so that the non-resident
enterprises can receive the original fee. This has created problems for start-
ups and small businesses in the form of stunted growth along with
affecting their customer acquisition.

6.4. Is Equalization Levy beyond the purview of tax treaties?

The Committee in paragraph 110 of its report states that the BEPS
Report conceptualizes Equalization Levy as a tax that is different from the
Corporate Income Tax, and thus may not necessarily be subjected to the
limitations of the tax treaties. The Report does not prescribe any particular

1670
design that must be adhered to, but suggests that it could be a tax on the
gross payment arising from digital economy. Such a tax on the gross
amount of payment would thus be very similar to the second option of
withholding tax, except that it, not being a tax on income, would not be
covered by the obligations of the tax treaties, and hence can be levied
under domestic laws, even without changes in the tax treaties.

However, the Committee has overlooked the important fact the Indian
version of the equalization levy is substantially dissimilar to the
equalization levy recommended in the BEPS Report on Action 1. The
OECD/BEPS version provides for equalization levy to be imposed on the
gross value of the goods or services provided to in-country customers and
users, paid by in-country customers and users, and collected by the foreign
enterprise via a simplified registration regime, or collected by a local
intermediary519.

This proves that the two versions are fundamentally different.


Therefore, the Committee’s view that equalization levy is different from
corporate income tax due to the fact that it is stated in BEPS Action 1 is
incorrect. This also proves that the Committee’s view of equalization levy
not being covered by obligations of tax treaties is imprecise.

Further, it can be stated that our version of equalization levy shows


similarities with the withholding tax on royalty and fees for technical
service as provided in Article 12 of the majority of the Indian DTAA’s.
Thus, it can be concluded that our equalization levy is not different from
corporate income tax and it is within the purview of the existing tax
treaties.

6.5. Even though Equalization Levy is not incorporated in the IITA, can
treaty provisions apply?

1671
It can be argued that since the nature of our equalization levy is similar
to withholding tax on gross income, tax treaties should apply irrespective
of the fact that equalization levy is not incorporated in the IITA. This is on
account of Article 2 (Taxes covered) of the DTAA’s.

Further, it can also be stated that equalization levy is a direct tax on the
income of a non-resident enterprise not having PE in India. Hence, it is a
tax on the income which would otherwise not be taxable under Article 7
(Business Profits) of a particular tax treaty.

Thus, it appears that exaction of equalization levy in a bilateral tax


treaty situation could be a case of treaty override or treaty dodging.

6.6. How consistent is Equalization Levy with the present bilateral tax treaties
entered into by India?

The BEPS Report on Action 1 has acknowledged the fact that


implementation of equalization levy may not be compatible with Source
State’s obligations under existing bilateral tax treaties and it may lead to
long-lasting litigation in tax treaty situations. Accordingly, the Report
points out that countries may introduce, inter alia, equalization levy in
their domestic laws “as additional safeguards against BEPS, provided they
respect existing treaty obligations, or in the bilateral tax treaties”.

Since equalization levy is a tax on income attributable to nonresidents


not having PE in India, Article 7 (Business Profits) of a bilateral tax treaty
would prevent imposition of equalization levy. Although prima facie the
main motive behind the introduction of equalization levy is to overcome
this hurdle, the only legitimate view forward is amendment of the existing
bilateral treaties through renegotiation. Else, with due respect, the proposal
to introduce equalization levy, in its current form, is an attempt to override

1672
tax treaties in a furtive or indirect way, through amendments made in the
domestic laws.

7. CONCLUSION

The Internet and digital economy is a disruptive medium; it has


completely changed the way the world works by changing how
information is exchanged and business is transacted. Online transactions
have put the viability of source based transactions under threat. Physical
limitations, which have long defined traditional taxation concepts, are no
longer applicable and the application of international tax concepts to the
internet and related e-commerce transactions is problematic and unclear.
Due to the features of e-commerce, there is an urgency to redefine the
locale of source. The enterprises have to keep in mind India’s source based
taxation rule while doing business in and with India.

Professor Richard Bird and Professor Scott Wilkie argued that “the old
rules of the international tax game... decreasingly serve to carve up the
international tax base in a reasonable and sustainable way”. It is widely
believed that electronic commerce does not create new problems in
international taxation; it is exposing all the old problems more quickly at a
global level.

Irrespective of the difference between traditional physical transaction


and e-commerce transactions, it is important that both be taxed
appropriately and rightly. Although, it is clearly evident that the age-old
rules of taxation are difficult to implement since e-commerce transactions
are completed in cyberspace, and hence national boundaries have been
rendered meaningless. In a nutshell: how does one mark territory in a
seamless, digital world? How does one map nations and taxing

1673
jurisdictions in a world that is not based on geography? This throws the
application of tax laws into disarray.

It would not be incorrect to compare the introduction of equalization


levy in India to some sort of presumptive tax which is imposed on certain
specified services provided by the digital sector. In spite the fact that the
unfair advantage that non-resident companies without PEs were enjoying
from double non-taxation has been corrected, however, there are glaring
weaknesses that equalization levy suffers from.

1674
Taxation of the Digital Economy: Japan
Perspective
520
Asatsuma Akiyuki

1. PERSONAL INCOME TAX AND CORPORATE INCOME TAX

1.1. 2014 amendment from entire income principle to attributed income


principle

Suppose that Japan, as a source country, tries to impose tax on business


income when a foreign enterprise has a PE (permanent establishment:
kôkyûteki shisetsu in Japanese) in Japan. Japanese source business income
taxation has been changed through 2014 amendment from the old
American style521 “entire income principle” with “force of attraction” rule
to the German style “attributed income principle”, which follows AOA
(Authorized OECD Approach).

Source country’s business income taxation has three hurdles: (1) source
rule, (2) PE concept as threshold, and (3) scope of taxable income. Japan
2014 amendment changed the third hurdle: scope of taxable income.

Under German style “attributed income principle”, (1) (2) and (3) are
closely related because business income in question is determined as
domestic source income when a foreign enterprise is recognized as having
a PE and business income in question is attributable to the PE522. OECD
Model Tax Convention does not expressly contemplate the business
income source rule, but AOA implicitly presupposes that only business
income attributable to a PE can be taxed in a country where the PE is
located.

1675
Before the 2014 amendment523, under the “entire income principle”, (1)
source rules of business income were provided in item-by-item basis524 and
were not closely related with the PE concept. Concerning (3) scope of
taxable income, Japanese taxable income was not limited to business
income attributable to a PE, but the entire domestic source income
including investment income, if Japan and a country in which the owner of
the PE was a resident did not conclude a tax convention.

For example, suppose that a foreign enterprise had a branch (PE) in


Japan. The domestic branch (PE) did business with Japanese customer 1,
and the foreign head office also did business with Japanese customer 2 not
through the branch (PE). If both income accrued from transactions with
customers 1 and 2 were determined as Japanese domestic source income
according to the item-by-item basis source rule, the entire Japanese
domestic source income was attracted to the PE and the PE had to file tax
return to Japanese tax authorities. This was called as “force of attraction”
rule525.

However, if Japan concluded a tax convention with a country in which


the foreign enterprise was a resident, the tax convention tended to preclude
the “force of attraction” rule and the AOA was applied.

After the 2014 amendment, the AOA is applied regardless of whether


Japan has concluded a tax convention with a country in which a foreign
enterprise is a resident. Although 2014 amendment did not expressly target
the aforementioned cross border direct transactions between a foreign head
office and Japanese customer 2 through Internet, but mainly target cross
border investments, digital economy or electronic commerce might also
become easier.

1676
1.2. To be a PE or not to be a PE

1.2.1. Co-Location service near Tokyo Stock Exchange

OECD Commentary to the OECD Model Convention says that a


computer server can be a PE if the server’s activities do not fall within
preparatory or auxiliary character, but an Internet website cannot be a
PE526. In late 1990s, not a small number of information and communication
technology specialists laughed tax lawyers who had looked at the location
of computer servers, because distance had little meaning with Internet and
with electronic commerce (nowadays called as digital economy).
However, distance is serious in some types of economic activities as seen
below.

Co-Location services527 are utilized by foreign investors who make


investment in Tokyo Stock Exchange and Osaka Stock Exchange. Not all
but many buying or selling orders of stocks or other securities are
nowadays determined and done by computers automatically. Buying or
selling determinations and orders need to be done very quickly. If a
computer server located in a foreign country makes buying or selling
determinations and orders, it is too late. Distance is serious. Therefore,
such computer servers need to be located near Tokyo Stock Exchange or
Osaka Stock Exchange.

Are such computer servers PEs? If a tax law student reads OECD
Commentary without prejudgment, he/she might say that buying or selling
determinations and orders done by computer servers for Co-Location
services do not fall within “preparatory or auxiliary” character and might
conclude that the servers constitute PEs.

1677
Tokyo Stock Exchange asked National Tax Agency (NTA)528 (Japanese
tax authority) concerning whether computer servers for Co-Location
service for foreign investors constitute PEs. NTA answered that those
servers do not constitute PEs529 in ordinary situations. It is because foreign
investors have no right to dispose of those servers530. So-called “at its
disposal” requirement531 is relevant, although I wonder whether such
reason is persuasive to a tax law student or not, and the conclusion of non-
recognition of PEs might be lead from policy consideration not to
intervene on inbound investments.

Before the 2014 amendment, under “entire income principle”, if those


servers constitute PEs of foreign investing vehicles who are residents of
Cayman Islands or other jurisdictions which have not concluded a tax
convention with Japan, the PEs attract the entire Japanese domestic source
income under the “force of attraction” rule. Recognition of PEs would
dramatically give disincentive for foreign investors to make investments in
Tokyo Stock Exchange or Osaka Stock Exchange. If foreign investors
elected residence in countries which had concluded tax conventions with
Japan, there would be no fear about “force of attraction” rule; however
non-negligible foreign investors had elected residence in countries which
had not concluded tax convention with Japan. Even after 2014 amendment,
under the “attributed income principle” without “force of attraction”
rule532, recognition of PEs would give disincentive for inbound investments
because PE taxation with filing tax returns might be procedurally
burdensome.

1.2.2. Amazon

Unfortunately, there is no judgment of a court or other official opened


materials concerning PE issues of Amazon. This section relies on

1678
secondary materials533.

In 2007, the National Tax Agency (NTA) tried to impose JPY 14


billion534 tax on Amazon. Japanese customers ordered books or other
merchandises through Internet to Amazon.Int’l, who was a US resident,
and books or other merchandises were delivered from warehouses in
Japan.

Amazon argued that the warehouses did “delivery”535 activities which


had “preparatory or auxiliary” character and that the warehouses did not
constitute PEs. NTA argued that the warehouses or other facilities in Japan
did not only delivery activities but also other activities, and the entire
activities were not judged as “preparatory or auxiliary” character.

This case was not discussed in a court, but in a mutual agreement


procedure536. Details of the discussion have not been opened because of
duty of secrecy. Also the conclusion was not officially announced, but it is
well-known that the outcome was that Amazon had no PE in Japan. And,
as it is widely known, BEPS Action 7537 is intended to create PEs for
Amazon cases, which are discussed in the next section; although there is
little possibility that US accept changes of “preparatory or auxiliary”
requirement.

1.2.3. Internet auction: Tokyo High Court (28 January 2016)

In this case, a taxpayer, named Mr. X, had been a resident in Japan and
had operated an individual enterprise named “Car Points”, reselling
imported car parts through Internet auction sites538 since 2002. The head
office of his business was a room in an apartment in Japan. On 12 April
2004, Mr. X married a US national woman. On 23 October 2004, Mr. X
exited from Japan to US and became a US resident. Mr. X continued his

1679
reselling business, which was located in the aforementioned apartment and
hired two staffs539. Mr. X also rented a warehouse since 1st December
2006.

This case was discussed in the National Tax Tribunal540-541, Tokyo


District Court542 and Tokyo High Court543, and the case has not been fixed.
This case might be discussed in the Supreme Court.

The main issues under discussions were the following: (1) the activities
through the apartment and the warehouse in question were limited within
“storage” and “delivery” in the meaning of Japan-US Tax Convention,
Article 5(4)(a); and (2) whether “storage” and “delivery” are examples of
“preparatory or auxiliary” character.

Courts judged that, concerning the first issue, the activities through the
apartment and the warehouse in question were not limited within “storage”
and “delivery”, and did not fell within “preparatory or auxiliary” character.
If fact findings concerning the first issue544 are enough to decide that Mr. X
had a PE in Japan and the reason for the first issue is ratio decidendi, then
the courts’ statement concerning the second issue is obiter dictum.
However, the second issue is interesting as seen below.

Mr. X argues that “storage” and “delivery” in Article 5(4)(a) of both


OECD Model Tax Convention and Japan-US Tax Convention are not
examples of “preparatory or auxiliary” character in Article 5(4)(e) and (f)
of both Tax Conventions, but a negative list because of OECD’s papers545
and because it might be reasonable to think that “delivery” is not
“preparatory or auxiliary” character, as UN Model Tax Convention also
presupposes546. Mr. X argues that “storage” and “delivery” always keep
facilities in question from being recognized as PEs if the activities of the

1680
facilities in question are limited within “delivery”, regardless of whether
the “storage” and “delivery” activities through the facilities in question fall
within “preparatory or auxiliary” character or not547.

The NTA argues that “storage” and “delivery” activities through the
facilities in question do not constitute PEs only when the entire activities
in question fall within “preparatory or auxiliary” character. According to
the NTA’s argument, “storage” and “delivery” are only examples of
“preparatory or auxiliary” character.

Courts adopted the NTA’s argument concerning the second issue.

As widely known, BEPS Action 7 contains an amending proposition


which makes all the subparagraphs of Article 5(4) subject to a
“preparatory or auxiliary” condition548, and this proposition is similar to
the NTA’s argument. However, of course, Japan-US Tax Convention,
which is applicable in this case, does not contain such amendment. After
the amendment, the NTA’s argument and courts’ statement concerning the
second issue are definitely reasonable. However, now, not small number of
tax law practitioners and professors549 wonder whether the courts’
statement concerning the second issue is suitable for Japan-US Tax
Convention. And, therefore, further discussions concerning the second
issue in Supreme Court is waited550.

1.3. Quasi general anti-avoidance rule for dealings of PEs

Japanese personal Income Tax Act and Corporate Tax Act do not have
the so-called GAAR (general anti-avoidance/abuse rule), like AO
(Abgabenordnung) (German General Tax Act), § 42 “Missbrauch von
rechtlichen Gestaltungsmöglichkeiten (abuse of capability of legal form
election). However, Japanese Income Tax Act, Article 157 and Corporate

1681
Income Tax Act, Article 132 provide quasi general anti-avoidance rule, in
which actions or figures of family owned corporations can be disregarded
by a chief of a tax office when the actions or figures “futôni (unjustly)”
lead to reduction of tax amounts. There have been many case laws
concerning this quasi GAAR for family owned corporations. Roughly
speaking, transactions departed from arm’s length principle tend to be
recognized as satisfying the “unjustly” requirement551.

In the 2014 amendment, Income Tax Act, Article 168-2 and Corporate
Tax Act, Article 147-2 introduced quasi GAAR in order to disregard
actions or figures of PEs, and these Articles also contain the “unjustly”
requirement. However, there is no definite opinion concerning what types
of dealings of PEs will be disregarded. It is because profits attributed to
PEs shall be calculated in line with arm’s length principle under domestic
law after 2014 amendment and under tax conventions concluded by Japan;
therefore, comparable normal situation can hardly be imagined, although
we need to compare a certain situation and normal situation in order to
recognize that the certain situation “unjustly”552 leads to reduction of tax
amounts. Can digital economy or electronic commerce “unjustly” lead to
reduction of profits attributable to PEs? It is mystery.

1.4. Virtual PE

In Japan, discussions concerning virtual PE (permanent


establishment)553 have not gained enthusiasm. English DPT (diverted profit
tax), Australian MAAL (multinational anti-avoidance law), or other
similar legislations in foreign countries have been studied and are well
known by Japanese tax law professors, but not treated by Japanese
legislators.

1682
I think that the most important hurdle for source country’s taxing right
on digital economy or electronic commerce is not the definition of PE
itself, but the arm’s length principle in OECD Model Tax Convention,
Article 7(2)554. If we introduce a virtual PE concept in a tax convention and
we make a tax policy decision that more taxing rights concerning digital
economy or electronic commerce should be allocated to source countries,
we also need to change the profit attribution rule for the virtual PEs, and
the attribution rule would be departed from the arm’s length principle. If
we make PE profits attribution rules which are and are not in line with
arm’s length principle, we will be confused for utilizing the two lines of
PE profits attribution rules.

2. VALUE ADDED TAX

2.1. Before the 2015 amendment

2.1.1. Destination principle for goods

The Japanese value added tax is provided in Consumption Tax Act555


and contemplates a tax policy of destination principle for international
trade, especially for tangible goods.

Before the 2015 amendment, Consumption Tax Act, Article 4(1)


provides that “transfer of goods, etc.”556 done by an “enterprise”557 in Japan
is subject to tax, and Article 4(2) provides that “taking foreign goods from
bonded area [of tax customs]” is subject to tax, according to Article 5(1).
Article 4(2) does not refer a subject of “taking”; therefore, value added tax
is imposed when not only enterprises but also consumers “tak[e] foreign
goods from bounded area”. Therefore, if I, as a Japan resident consumer,
order a good to a foreign supplier through Internet, then I must pay value

1683
added tax in Japan if the price of the imported good is over JPY 10,000558
(about US$100).

Consumption Tax Act, Article 7(1)(1) provides that the “transfer or


lease of goods as export from Japan” is tax exempt, which means 0%
VAT559.

2.1.2. Incomplete destination principle for services

Consumption Tax Act does not define export of services because


“export (yushutsu)” is used only when goods are transacted. Therefore, this
article uses “export of services” or “export” in non-strict-legal meaning.

Before the 2015 amendment, “export of services” is treated in


Consumption Tax Act, Article 4(3)(2), which delegates the determination
of “place of supply of services” to Order for Enforcement of the
Consumption Tax Act, Article 6(2). “Place of supply of services” is
mainly determined based on the place of a “office (jimusho)” for supply of
services (see sections 2.1.3 and 2.1.4).

Transfer or lease of patent right or copyright is categorized as “transfer


or lease of goods” in Consumption Tax Act, although patent or copyright
transactions seem to be services transactions. Place of a patent right560 is
determined based on whether the patent right is registered in Japan or in a
foreign country. However, place of copyright561 is determined looking at
the domicile of the transferor or lessor.

For example, a Japanese resident novel writer, named Mr. J, has written
an English novel. Mr. J transferred or leased the copyright of the novel to a
publishing corporation, named P-co., who is a resident of F country. As a
matter of intellectual property law, legal protections for copyright of the

1684
novel in Japan and in F country are conceptually different. However, the
place of the copyright of the novel is deemed to be in Japan. In this case,
the place of goods has little meaning because this transaction between Mr.
J and P-co. fall within the tax-exempt export transaction provided by
Consumption Tax Act, Article 7.

At a next stage, P-co. supplies e-books of the novel to Japanese


consumers through Internet. I understand that transactions between P-co.
and Japanese consumers do not fall within transfer or lease of copyright
because the copyright is retained by Mr. J or P-co. Before the 2015
amendment, the transactions between P-co. and Japanese consumers are
classified as supply of information562 or other services563. Concerning such
services, place of supply is determined based on the place of an office. The
word “office (jimusho)” is not defined by Consumption Tax Act. I
understand that “office (jimusho)” in this context is similar to the “fixed
establishment” concept564 as used in European Union VAT system. If P-co.
has no office for supplying services in Japan, then Japanese value added
tax is not imposed on transactions between Mr. J and P-co. and between P-
co. and Japanese consumers before the 2015 amendment. If P-co. is a
resident of Japan, Japanese value added tax is imposed. Japanese
enterprises had complaint concerning non-equal footing business
circumstances between domestic and foreign enterprises.

2.1.3. Place of supply of services: Tokyo District Court (13 October 2010)

There have been small numbers of cases concerning destination


principle of Japanese value added tax. This section introduces two cases.

A Japanese resident corporation, named J-co., participated in the Indy


Racing League, whose car races were held in US and Japan. J-co. received

1685
sponsorship money from other Japanese corporations. The National Tax
Authority (NTA) argued that J-co.’s “supply of services [were] done in
and out of Japan”565 and J-co.’s office was located in Japan; therefore J-
co.’s supply of services was subject to Japanese value added tax. J-co.
argued that 14 or 15 car races per one year were held in US and only one
car race was held in Japan and that place of supply of services of J-co. was
located in US. The Court566 judged in favor of the NTA.

J-co. did not appeal the court judgment. In sponsorship contracts, the
Japanese sponsoring corporations had made J-co. to supply services in
Japan in order to claim input value added tax credits.

2.1.4. Tourists: Tokyo High Court (9 February 2016)

Consumption Tax Act, Article 7 provides export exemption as


mentioned in section 2.1.1. Order for Enforcement of the Consumption
Tax Act, Article 17(2)(7)(2) provides that inland drinking and eating and
inland sleeping services for non-residents are tax exempt as export.

Korean tourists had made orders of a Japan tour to a Korean


corporation, named K-co. K-co. had delegated the detail arrangements of
such Japan tour (drinking, eating, sleeping, visiting places, traffic etc.) to a
subsidiary of K-co. in Japan, named J-co.

The courts567 judged that tour arrangements services from J-co. to K-co.
do not fall within the exempt export transactions under Order for
Enforcement of the Consumption Tax Act, Article 17(2)(7).

2.2. After the 2015 amendment: supply of service using electric


communication

1686
After the 2015 amendment, which is effective since 1 July 2016,
Japanese value added tax introduces destination principle for services
using electric communication (denki tsûshin). As already contemplated in
the EU-VAT system, a reverse charge system is applied for the so-called
B2B transactions and a registration system is applied for so-called B2C
transactions.

2.2.1. B2B: reverse charge

After the 2015 amendment, Consumption Tax Act, Article 4(1)


(compared with section 2.1.1) is changed from “transfer of goods, etc.
done by an enterprise in Japan” to “transfer of goods, etc. (excluding
specified transfer of goods, etc.) and specified inputs (which means
specified transfer of goods, etc. received in course of business from other
persons) done by an enterprise in Japan”, which is taxable by Article 5(1).

“Specified transfer of goods, etc.” means “supply of services using


electric communication to enterprises and supply of specified services”568.

“Supply of services using electric communication” means “supply of


copyrighted works through electric communication lines and other supply
of services through electric communication (excluding569 supply of
services of transmitting of other people using telephone, telegraph, or other
communication equipment), which do not include570 notification of results
of other transfer of goods etc. nor supply of services done incidentally in
the course of other transfer of goods etc.”571.

Consumption Tax Act, Article 4(3)(iii) is newly legislated. Article 4(3)


provides determination criterion of place of supply of goods and services.
Article 4(3)(iii) says “in case of supply of services using electric
communication: domicile or residence, or place of head office or main

1687
office of a person who receives the supply of services using electric
communication”.

When a receiver (both consumer and enterprise) of “supply of services


using electric communication” is a Japanese resident, then the place of
supply is deemed to be located in Japan. When the receiver of “supply of
services using electric communication” is a Japanese consumer, then the
registration system is applied (see section 2.2.2).

When the receiver of “supply of services using electric communication”


is a Japanese enterprise, this supply is not taxable for the foreign supplier
of such services because Article 4(1) defines taxable transactions as
“transfer of goods, etc. (excluding specified transfer of goods, etc.) …
done by an enterprise in Japan”; this supply is taxable for the Japanese
enterprise receiver because Article 4(1) provides “specified inputs (which
means specified transfer of goods, etc. received in course of business from
other persons) done by an enterprise in Japan”. Therefore, not the supplier
but the receiver of the services must pay Japanese value added tax, the
amount of which is, in the next stage, credited if the receiver does taxable
transactions and pays Japanese value added tax.

For example, suppose that the Japanese value added tax rate is 8%572
and the price without tax of “supply of services using electric
communication” (for example, supply of e-book) is 200 in the first stage
and the price without tax of “transfer of goods, etc.” (for example, supply
of accountant services) done by Japanese enterprise in the second stage is
500. The Japanese enterprise receiver of “supply of services using electric
communication” pays 200 to the foreign supplier and must also pay
Japanese value added tax of 16 (= 200 × 8%). In the next stage, the

1688
Japanese enterprise receiver must pay Japanese value added tax of 24,
which is calculated as 500 × 8% – 16 = 40 – 16.

If, in the second stage, the Japanese enterprise receiver does a non-
taxable transaction (for example, supply of education or medical services
because the receiver is a university or a hospital), then the receiver’s inputs
Japanese value added tax of 16 cannot be credited. Therefore, the tax
amount of 16 is a burden of the Japanese enterprise receiver.

2.2.2. B2C: registration

When the receiver of “supply of services using electric communication”


is a Japanese consumer, then the receiver’s inputs do not fall within
“specified inputs … done by an enterprise” in Article 4(1) and the
consumer is not taxable. The foreign supplier must pay Japanese value
added tax. The foreign supplier needs to be registered in Japan as
“registered foreign enterprise”573.

If a foreign enterprise does “supply of services using electric


communication” for both Japanese enterprises and Japanese consumers,
the reverse charge system is applied or registration system is applied? The
main question is whether the “supply of services using electric
communication” is targeted only to Japanese enterprises or not.

Consumption Tax Act, Article 4(1) provides “transfer of goods, etc.


(excluding specified transfer of goods, etc.)” as a taxable transaction.
“Specified transfer of goods, etc.” is not taxable for the foreign supplier
(but taxable for the Japanese enterprise receiver as “specified inputs”
discussed in section 2.2.1). “Specified transfer of goods, etc.” means
“supply of services using electric communication to enterprises”574, which
means “foreign enterprise’s supply of service using electric

1689
communication, a receiver of which is ordinarily limited to an
enterprise because of the nature of the supply of services using electric
communication or because of transactional conditions etc. of the supply of
services”575. Therefore, a question of whether a foreign supplier needs to
be registered in Japan or not is relied on whether a receiver of the services
in question is “ordinarily limited to an enterprise” or not.

For example, a foreign supplier provides e-books through Internet only


to Japanese enterprises, and supply of the e-books to Japanese consumers
is prohibited in the terms of transactions, then the foreign supplier needs
not to be registered in Japan and the reverse charge system is applied, even
if one day a Japanese consumer, with cheat technique, makes use of the e-
books.

2.2.3. Incomplete destination principle after the 2015 amendment

Consumption Tax Act uses the “supply of services using electric


communication” concept. There are many types of international supply of
services which do not fall within “supply of services using electric
communication”.

For example, a lawyer whose office is located in F country gives legal


advice to a Japanese corporation, named J-co., and J-co. pays money on
account of fee. This kind of international supply of services does not fall
within “supply of services using electric communication” and is not
taxable under Japanese value added tax. Even if the foreign lawyer gives
legal advice materials through Internet to J-co., it is not “supply of services
using electric communication”576 because “notification of results of other
transfer of goods. etc. nor supply of services done incidentally in the
course of other transfer of goods. etc.”577 is excluded. Therefore, neither

1690
the reverse charge system in section 2.2.1 nor the registration system in
section 2.2.2 are applied.

2.2.4. 2017 amendment concerning bitcoins and other virtual currencies

Before the 2017 amendment, bitcoins and other virtual currencies are
taxable goods, like gold, under Japanese value added tax. If you buy a
book and transfer your gold as payment to the book owner, then the
transfer of the book and the transfer of the gold are both subject to value
added tax if both you and the book seller are enterprises. Bitcoins and
other virtual currencies had also been treated as gold.

Since 1 July 2017, bitcoins and other virtual currencies are categorized
as non-taxable goods as “means for payments”578. Consumption Tax Act,
Article 6 provides various types of non-taxable transactions, and Appendix
Table First, number 2, has qualified securities or other “means for
payments” as non-taxable goods. After the 2017 amendment, Order for
Enforcement of the Consumption Tax Act, Article 9(4) added virtual
currencies579 as means for payments.

1691
Challenges of the tax systems in the digital
economy era: Mexico perspective
580 581
Elias Adam Bitar e Victor Diaz Infante Martinez

Think about gambling without a casino, think about stock trading without an
exchange, think about real estate transactions without deeds, and think about
transactions without clearing houses – that is the world we are heading into. We
have just barely scratched the surface today.
Fred Wilson, from a talk at the Collaborative-Peer-Sharing Economy
Summit, New York University, May 30, 2014.

1. INTRODUCTION

1.1. What’s the so called digital economy?

The world as we know is in constant change, and one of the


fundamental drivers is digital transformation. At its core, digital
transformation permeates all aspects of society, including the way people
interact, the economic landscape, the skills needed to get a good job, and
even political decision-making.

The “digital economy”582 is the economic activity that results from


billions of everyday online connections among people, businesses,
devices, data, and processes. The backbone of the digital economy is
hyperconnectivity which means growing interconnectedness of people,
organizations, and machines that results from the Internet, mobile
technology and the internet of things.

The digital economy extends beyond businesses and markets – it


includes individuals, communities and societies – and it has the potential
to generate new scientific research and breakthroughs, fueling job
opportunities, economic growth, and improving how people live their

1692
lives. This broader conception encompasses new themes such as the rapid
growth of social networks and free and rapid access to social media and
other user-created content. Measuring the digital economy and
understanding the various dimensions of its impact often means improving
measurement of the “traditional” economy583.

Mobility, cloud computing, social networking, sensor-nets and big data


analytics are some of the most important trends in the digital economy
today. Collectively these trends are making possible the future of “smart
everything”, as well as empowering businesses, consumers and society at
large.

The digital economy is taking shape and undermining conventional


notions about how businesses are structured and how consumers obtain
services, information, and goods. To understand the structural impact of
the information and communication technologies and the changing nature
of competition in the digital economy, it is important to consider price
differentials between goods and services sold online versus offline, as well
as measures of price dispersion across producers using the same
distribution method.

Digital economy as the global activity that it is has of course impacted


Latin America and even when not only the region but the world has moved
faster, overall Mexico has made relevant progress in terms of digitisation584
and the percentage of active population within the digital world and access
to digitisation continues growing year by year.

1.2. Which market offerings are included within such concept?

As aforementioned, the digital economy is a worldwide network of


economic activities that comprises billions of daily connections among

1693
many agents (people, businesses, devices, processes etc.) transforming
several business models, commercial transactions and professional
interactions that are enabled by information and communications
technologies.

Nicholas Negroponte, founder of the Massachusetts Institute of


Technology’s Media Lab and author of the 1995 book “Being Digital”,
has described the digital economy as using “bits instead of atoms” and
among such bits the most common market offerings currently found within
the trends in the digital economy are the activities listed in the following
sections.

1.2.1. Sharing culture – P2P

According to NYU Professor Arun Sundararajan585, “sharing economy”


or “crowd-based capitalism” is an economic system with the following
five characteristics:

i) largely market-based: creates markets that enable the exchange of goods


and the emergence of new services, resulting in potentially higher levels of
economic activity;
ii) high-impact capital: opens new opportunities for everything, from assets
and skills to time and money, to be used at levels closer to their full capacity;
iii) crowd-based “networks” rather than centralized institutions or
“hierarchies”: the supply of capital and labor comes from decentralized
crowds of individuals rather than corporate or state aggregates;
iv) blurring lines between the personal and the professional: the supply of
labor and services often commercializes and scales peer-to-peer activities like
giving someone a ride or lending someone money, activities which used to be
considered “personal”; and
v) blurring lines between fully employed and casual labor, between
independent and dependent employment, between work and leisure:
many traditionally full-time jobs are supplanted by contract work that
features a continuum of levels of time commitment, granularity, economic
dependence, and entrepreneurship.

1694
With digital economy a new human dynamic is emerging: peer-to-peer
(P2P). As P2P gives rise to the emergence of a third mode of production, a
third mode of governance, and a third mode of property, it is poised to
overhaul our political economy in unprecedented ways. P2P is based on
distributed power and distributed access to resources: sharing economies
build value, ignoring money.

Any kind of sharing economy will likely yield a greater range of


available options for its participants (access) and possibly a greater
attention to long term goals like sustainability, as well as an increased
reliance on social rather than economic cues to facilitate the organizing of
economic activity.

1.2.2. Fintech

“Fintech” or Financial Technology describes an emerging financial


services sector in the 21st century. Originally, the term was employed to
technology applied to the back-end of established consumer and trade
financial institutions. Since the end of the first decade of the 21st century,
the term has expanded to include any technological innovation in the
financial sector, including innovations in financial literacy and education,
retail banking, investment and even crypto-currencies like bitcoin586.

Fintech is becoming nowadays a new generation of P2P systems that


promise to expand the potential of crowd-based capitalism or sharing
economy significantly over the coming years, transitioning the role of the
crowd from being the source of capital and labor to actually owning and
running the marketplace in a decentralized fashion. Many of these
emergent systems are based on the ideas and “blockchain” technologies
that power the popular digital currency Bitcoin, Ethereum or ICOs.

1695
A lot of the attention paid to the Bitcoin platform or technology has
focused on its success in creating currency without a government backer,
about how bitcoin value measured in traditional money fluctuates a lot
over time, and perhaps also about the use of bitcoin for commerce that
many governments consider illegal.

But Fintech is currently not only about blockchain; in a system like


PayPal a trusted third-party (i.e. a centralized entity, or PayPal itself) keeps
track of who has how much, and updates a private digital “ledger” of some
sort every time someone sends money to someone else. Bitcoin, in
contrast, uses a public ledger, the blockchain.

But just talking about blockchain or Paypal to refer to Fintech is


completely limited; many other systems for trading currently exist and we
just need to take a look to see how many marketplaces have moved for
digital assets as well: marketplaces’ giftcards, Itunes, Amazon, Spotify,
eBay, Pandora, Venmo etc.

The above are just few examples of a new marketplace technology


paradigm that may power the next generation of sharing economy or
crowd-based capitalism within the Fintech. There are a number of new
forms of economic activity that new decentralized P2P marketplaces will
facilitate simply because they lower transaction costs.

In many ways, this new generation of decentralized P2P technologies


promises to create immense economic value over the coming decades
within the Fintech industry and evidences the relevance of digital
economy.

1.2.3. Crowdfunding

1696
Crowdfunding is another modality of this new generation of P2P
systems that allows raising finance by asking a large number of people
each for a small amount of money (donation-based, rewards-based, and
equity crowdfunding). Traditionally, financing a business, project or
venture involved asking a few people for large sums of money.

Crowdfunding switches this idea around, using the internet to talk to


thousands – if not millions – of potential funders and helping raising
capital through a funnel to start a business or launch a new product.

The crowdfunding platforms turns that funnel on-end. By giving the


entrepreneur a single platform to build, showcase, and share his pitch
resources, this approach dramatically streamlines the traditional model.

1.2.4. Software & Cloud as a service

Software-driven products and services like cloud computing and data


analytics are transforming the global economy.

The term “cloud computing” is one of the markets offered by digital


economy and describes a whole range of infrastructure, software, data or
applications residing in the “cloud” – that is to say, off your own premises
and accessed via the Internet.

The greatest commercial benefit of the cloud is that the services that use
it can hone economies of scale by cutting out hardware costs and reducing
their costs per unit as demand increases.

Cloud computing comes mainly in three guises:

•infrastructure (data centres);


•online platforms (operating systems); and
•applications (web-based email, online office applications, file-sharing).

1697
Cloud computing is the latest of the many waves of innovation that
have transformed the IT industry. The technology is expected to shake up
existing business models and reduce the need for on-site information
technology (IT) staff in companies and Cloud technology is quickly
becoming a core part of addressing the needs of a growing business.

From the above, it is more than evident that digital economy is


transforming business models and the way to interact within social,
economic and commercial spheres. This new generation of decentralized
technologies will create diverse and huge economic and social reactions in
ways we probably cannot imagine yet.

2. INCOME TAX CONSIDERATIONS

2.1. Technical analysis of source rules contained in the domestic law and their
inability to tax the earnings proceeding from the market to the hands of
the offshore offerors

Connectivity has increased significantly the possibility of businesses to


choose the jurisdiction in which their core business activities take place.
Consequently, many of the e-commerce activities currently carried out in
Mexico have its personnel, IT infrastructure (i.e., servers) and customers
spread among several jurisdictions.

Notwithstanding the above, Mexican tax legislation, rooted in the past


business models, does not allow the possibility to tax the income of those
services that used to be provided in person, but that now have been
migrated to other countries. In contrast, the amount generally taxable
within the jurisdiction is limited to the profits attributable to the few
services provided domestically. This is because, under the Mexican
Income Tax Law (MITL), non-resident entities587 without a PE in Mexico

1698
may only be taxed over the income obtained from a source of wealth
located within Mexico.

According to the domestic definition of PE, which follows the MTC


(Model Tax Convention on Income and on Capital) of the OECD
(Organization for Economic Co-operation and Development), a non-
resident will be deemed as having a PE in Mexico when having a place of
business and/or when acting through a dependent agent that has the
authority to sign contracts on behalf of the non-resident, or an independent
agent that does not act within the scope of his ordinary activities. As a
consequence, offshore offerors which presence in Mexico does not fall
within the purview of the abovementioned definition of PE will only be
taxed over its Mexican source of wealth.

In this regard, Article 153 of the MITL588 establishes that the income
obtained by non-residents may be taxable in Mexico when said income
arises from sources of wealth located in Mexican territory.

In that order of ideas, Title V of the MITL set forth different types of
income which are considered as Mexican source and, therefore, taxable in
Mexico. The types of income comprised in Title V of the MITL include,
among others, income derived from salaries, personal independent
services, leasing immovable property, leasing of movable property, sale of
fixed assets, sale of shares, dividends and other profit distributions,
interests, financial leasing, royalties and technical assistance, construction
and installation services, prizes, artistic and sport activities, and business
activities.

Derived from the above, a nonresident will be taxed under Title V of


the MITL when the following requirements are met: (i) the specific kind of

1699
income is expressly considered as taxable, and (ii) the hypotheses for
having a Mexican source of wealth are fulfilled.

The specific kind of income obtained depends of the revenue model


followed by the digital business. As described by the OECD through the
Final Report issued in 2015 regarding Action 1 (“Addressing the tax
challenges of the digital economy”), the variety of revenue models in the
digital economy include:

•the advertising revenue model, in which the advertising company offers


content, services and/or products and also provides a forum for advertisements
which are consequently paid by the advertised entity (for example, Youtube or
Yahoo);
•the subscription revenue model allows users to access the content or services of
a website by charging a subscription fee (for example, specialized reports
online);
•the sales revenue model, through which a company receives income by selling
goods, information or services to customers (for example, Amazon);
•the selling of users data and customized research models are used by Internet
Service Providers (ISP), data brokers, data analytics firms etc.; and
•intermediation between local users and local service providers through a
mobile app.

Despite the core services provided through the mentioned business


models are generally rendered in a digitalized format (that is, without
physical presence in the country of the consumer), a part of such services
may also be provided locally. For instance, the storage and logistic
coordination of the goods sold, the marketing and advertisement duties
performed locally, the local legal advice to solve domestic controversies
etc. Provided that such auxiliary services are not constitutive of being a
PE, the income obtained through those will be taxable in Mexico when the
service is provided locally.

1700
According to the MITL, the service is presumed to be completely
rendered in Mexico when a part of this is proven to be rendered in
Mexican territory, unless the taxpayer demonstrates the portion of the
service it rendered abroad, in which case, the tax shall be calculated only
over the portion of the consideration that corresponds to the portion of the
service rendered in Mexico.

Likewise, unless demonstrated otherwise, the service is presumed as


rendered within the Mexican territory when said service is paid by a
Mexican resident or a nonresident with a permanent establishment in
Mexico to a nonresident that is a related party in accordance with article
179 of the MITL589.

As a consequence, the domestic legislation does not currently allow the


core business services which are rendered digitally by offshore offerors to
be taxed locally. On the contrary, the only income obtained by
nonresidents which remains taxable under the Mexican jurisdiction is the
one derived by the services rendered within the Mexican territory.

2.2. Technical analysis of the general structure of double taxation treaties and
the classification of income

According to article 4 of the MITL590 a nonresident is allowed to benefit


from the tax treaties signed by Mexico when certain requirements are met.

Derived from the above, offshore offerors rendering digital services in


Mexico would be entitled to benefit from the Treaty provisions with regard
to the income obtained locally when fulfilling with the requirements set
forth in the MITL for such purposes, such as: evidencing that the offshore
entity resides in a country with which Mexico has executed a tax treaty591;
appoint a legal representative resident in Mexico for tax purposes or

1701
nonresident but with PE in Mexico, who keeps available to the Mexican
authorities the support documentation that proves that the offshore entity
has fulfilled with its tax obligations in Mexico; and to comply with the
conditions of the respective treaty.

Once confirmed that the non-resident entity is eligible for the benefits
of the Double Tax Treaty (DTT) with Mexico, as long as the requirements
set forth in the law and Treaty are fulfilled, it is necessary to determine
which article of the Treaty applies to the income obtained by the offshore
offeror for the rendering of its services in Mexico.

In this regard, online transactions which imply the transfer of IP rights


generally imply the provision of licenses which are treated for tax
purposes as “royalties”. Some other transactions may involve access to
contents, information, systems or clouds which are more typically
described as provision of services. There are also transactions which have
elements of both property and services. That way, the type of transaction
affects the characterization of the income, which in turn affects the way it
is taxed.

As anticipated, tax treaties signed by Mexico follow the MTC of the


OECD, through which priority was given to the origin of the wealth (i.e.,
source) when allocating jurisdictions to tax, being the resident state the one
providing double taxation relief. As a consequence, outbound payments
made with regard to royalties are generally taxable under the domestic law
on a gross basis by means of a withholding tax. Bilateral conventions
deviate from the mentioned MTC and usually fix a maximum withholding
rate to be taxed by the source state, being the residual right taxable by the
state of the residence.

1702
Regarding the services provided by the offshore offeror in Mexico,
those may be characterized as business profits, being taxable at the state of
residence of the digital service provider provided that the entity does not
comply with the needed requirements to constitute a PE within the
country.

In any case, revenue characterization is one of the topics to be


addressed in the 2020 report to be prepared by the Task Force on the
Digital Economy (TFDE) of the OECD, so there is a possibility that the
interpretation published in this regard will also affect the abovementioned
classification and characterization of the income.

2.3. Expected practical reactions from the Federal tax authorities

While no insights have been published yet by the Mexican tax


authorities regarding the international tax digitalization project, its
previous reaction to the other Actions of BEPS (Base Erosion and Profit
Shifting)592 may be extrapolated to this one to anticipate that the Mexican
legislation might be amended in line with the measures proposed by BEPS
for Action 1.

In this regard, some of BEPS recommendations are highlighted in the


following sections.

2.3.1. Permanent Establishment (PE)

According to Article 5(4) of the OECD Model, a PE is deemed not to


include the use of facilities solely for the purpose of storage, display or
delivery of goods or merchandise belonging to the enterprise; the
maintenance of a stock of goods or merchandise belonging to the
enterprise solely for the purpose of storage, display or delivery; the

1703
maintenance of a stock of goods or merchandise belonging to the
enterprise solely for the purpose of processing by another enterprise; the
maintenance of a fixed place of business solely for the purpose of
purchasing goods or merchandise or of collecting information.

Bearing the above in mind, the digitalization of the economy has


implied that many of the businesses activities can be performed digitally,
in a way that the physical presence of the business entity to perform within
a territory may be narrowed to activities which do qualify as a PE.

In reaction to that, BEPS recommendations focus on the widening of


the definition of PE to cover the digital economy beyond the concepts
currently in force. In particular, the following must be taken into account:

•Virtual or Tech/Digital PE

One of the potential options included in the OECD Discussion Draft for
alternative PE thresholds is the extension of the current forms of PE to a
virtual place of business, a virtual agency PE or an on-site business
presence PE.

Through this alternative, a website would be deemed to be a PE since it


is a technological way to conduct contracts that are habitually concluded
on behalf of an enterprise with persons located in the market country as a
virtual agency PE. As a consequence, a foreign entity that renders services
to domestic customers through a web interface with a significant digital
presence in the economy of another country would be deemed to be a
virtual or tech PE in such country.

Some of the factors proposed by the Discussion Draft to be considered


as a fully dematerialized digital activity eligible to become a virtual PE

1704
include the facts that online sale of digital goods or digital services is the
core part of the business of the enterprise, requiring no physical stores,
agencies or assets (except servers and IT tools). Another factor is that the
legal or tax residence and the physical location of the vendor are
disregarded by the customer and do not influence its choices.

In addition to the above, a digital business is deemed to have a


significant digital presence in a country when there is a significant number
of contracts concluded with customers in that country, or the enterprise’s
goods or services are widely used or consumed in that country, clients in
that country make substantial payments to the enterprise, or an existing
branch of the enterprise in that country offers secondary functions such as
marketing and consulting targeted at clients resident in the country that are
strongly related to the core digital business of the enterprise or even when
the entity does a significant business in the country using personal data
obtained by regular and systematic monitoring of Internet users in that
country through the use of multi-sided business models.

•Modulation of the preparatory and auxiliary activities as non PE

According to the new recommendations of BEPS, when the use of a


fixed place of business to purchase, warehouse, and deliver merchandise is
“core” for e-commerce and constitute a significant part of the principal’s
main business, it will not be considered as preparatory or auxiliary, and
will therefore not be exempt from PE status. For example, procurement
offices may now be considered as a PE itself if the purchasing activity is
deemed to be a core activity for the business.

In any case, even when the auxiliary or preparatory activity is not


considered to be a PE, the anti-fragmentation rule described in Action 7593

1705
remains applicable. This rule is aimed to avoid fragmentation of cohesive
operating business into several smaller operations in order to consider
those as preparatory or auxiliary activities. If this is the case, the anti-
fragmentation rule would apply so that the different activities, when
analyzed on a broad and combined basis, exceed what is considered as
preparatory or auxiliary.

2.3.2. Transfer pricing (TP)

More and more entities rely nowadays on branding and innovation


rather than on physical assets and labor force to generate revenue. Such
functions are, more than ever, performed from different jurisdictions and
group entities. Consequently, a big effort is to be made from a TP point of
view in order to assess correctly where and how the value is created and
where and how it must be then taxed.

•CbC (Country-by-Country) Reporting

BEPS Action 13 report594 aims at providing tax administrations with a


good level of transparency, with detailed information regarding the global
value chain of the companies and its TP policies.

In this regard, Mexico incorporated BEPS Action in Article 76-A of the


MITL as part of the 2016 reform. Through this provision, certain Mexican
taxpayers will be obliged to submit three new annual transfer pricing
information returns for fiscal year 2016 before December 31, 2017:

i) a master file (if reported accruable income is greater than MXN $664
million);
ii) a local file; and
iii) a CbC report (Mexican multinational controlling entities with consolidated
income greater than MXN $ 12,000 million).
•Development, enhancement, maintenance, protection and exploitation
(DEMPE) of Intellectual Property (IP)

1706
Several multinational groups have shown their prevalence to centralize
the global or regional ownership of intangibles due to commercial, legal
and tax reasons. Even when these structures are most common in the
technology, software and pharmaceutical sector, it can also take place
within other industries.

According to BEPS Actions 8595 and 10596, intra-group contractual


relationships must be carefully analyzed to conclude whether those are
correctly aligned with the functions performed. Special attention must be
paid to the decision-making and control functions associated with the
DEMPE of intangibles that drive value creation in a business.

Furthermore, according to the approach followed by BEPS, legal


ownership does not necessarily generates the right to all (or indeed any) of
the revenue derived from the exploitation of the intangible. Instead, the
group entities performing the core functions and bearing the significant
risks should be entitled to the allocation of the income to such entity.

2.3.3. United Nations Report

In addition to the BEPS Actions described, it must be pointed out that


the United Nations has also published its insights on digital economy
through the following reports: “Protecting the Tax Base in the Digital
Economy (June 2014)” and the “World investment report (2017)”.
Through these, the United Nations analyzes the importance of digital
economy and the mentioned proposed BEPS Actions.

Recently, the United Nations’ Committee of Experts on International


Cooperation in Tax Matters published a report597 summarizing some of the
unilateral measures taken by some countries around the world598 in relation
to taxing the digital economy, since the beginning of the BEPS era.

1707
The report establishes that:

Developing countries have the most to gain from the introduction of policies
aiming to address the digital economy. For one, unilateral actions driven by the
digital economy have greater emphasis on withholding-based structures, be they
based on VAT, goods and services tax, income or profit, allowing countries to
increase their revenue collection abilities through the mere “ownership” of a
consumer market or a digital infrastructure. That is particularly interesting for
countries with large consumer markets or countries facing a lag in development,
because it attributes to the source country the right to tax without the need for
physical presence.

The report also notes that:

A further argument is that this new way of doing business might lead countries
to want to reinterpret or add on to the existing concept of permanent establishment
(perhaps through the creation of a “digital permanent establishment”, following the
example of article 12A, referring to fees for technical services, in the new version of
the United Nations Model Double Taxation Convention between Developed and
Developing Countries).

The report divides the unilateral actions into:

i) VAT based measures, based on the geographical location of the consumer


market;
ii) presumed allocation of profits to a domestic jurisdiction (either by making
use of a presumed permanent establishment approach as in the United
Kingdom and Australian examples, or by requiring taxpayers to register in
the country as a result of their digital presence);
iii) taxes on the use of the country’s digital infrastructure (as in India’s
equalization levy); and
iv) transfer pricing-related measures (where transfer pricing rules are reformed
to take into account the location of the consumer market, as in the Italian
example).

3. VALUE ADDED TAX CONSIDERATIONS

3.1. Importation of Services

In accordance to article 1, paragraph IV, of the Value Added Tax Law


(VATL), individuals and entities (either residents of Mexico or not) will

1708
trigger VAT when importing services or goods within the Mexican
Territory.

In terms of the above, the offshore offeror importing services or goods


within the Mexican territory will be compelled to pay VAT.

In that order of ideas Article 24 of the VATL establishes that the


following are deemed as importation of goods or services: the purchase by
Mexican residents of intangible goods transferred by nonresidents, the
temporary use or enjoyment in Mexican territory of intangible goods
provided by nonresidents, the temporary use or enjoyment of tangible
assets in Mexico, the material delivery of which took place overseas, the
utilization in Mexican territory of services mentioned in Article 14599, if
rendered by nonresidents.

Additionally to the above, article 48 of the Regulations to the VATL


establishes when a service is deemed as utilized in Mexico for purposes of
article 24, paragraph V, of the VATL, as follows:

For purposes of article 24, paragraph V of the Law, the utilization in the
Mexican territory of services rendered in Mexico by nonresidents, includes services
rendered from abroad as well as services rendered within the country.

Consequently if the service or good provided by the offshore offeror is


utilized in Mexico and qualifies as an independent service under article 14
of the VATL, then, in accordance with article 24 of the VATL, this is
deemed as an importation of services, taxable at a 16% rate over the total
consideration convened.

•Credit mechanism

Taxpayers who import services for which the VAT is triggered may
credit such tax in accordance with the rules set forth in the VATL, in the

1709
monthly tax return to which the importation corresponds.

Derived from the above, importers may credit the payable tax for
taxable activities against the VAT triggered for the importation of services.
The above may not entail cash flow since the credit may be virtually done
in the monthly tax return to which the import corresponds. The above will
require reporting to the Mexican tax authorities the importation of services
and filing the corresponding tax return in which the importation will be
reported and the VAT credit done as well as to fulfill the requirements for
the VAT to be creditable.

3.2. Exportation of Services

In accordance with article 29 of the VATL, legal entities that are


resident in Mexico for tax purposes that export services to nonresidents
will calculate the corresponding value added tax over such service at the
rate of 0%.

For the 0% rate to apply to the exported service, the service must meet
the following conditions: (i) be rendered by a Mexican resident for tax
purposes; (ii) qualify as personal independent service; and, (iii) be wholly
utilized abroad by a nonresident without a permanent establishment in
Mexico.

As anticipated, Article 14 of the VATL establishes which services


qualify as personal independent services. Consequently, the exportation of
digital services should be analyzed on a case-by-base basis.

A personal independent service would be deemed as wholly utilized


abroad when such service is hired and paid by a nonresident without PE in
Mexico, as long as the payment is done with a check with a specified

1710
payee or through a wire transfer to the service provider’s account in a
baking institution or brokerage house, and the payment arises from an
account in a foreign financial institution600.

4. LOCAL (STATE) TAX CONSIDERATIONS

4.1. Diverse and non-organized types of reactions

From a Local (State) tax perspective reactions have occurred in some of


the Mexican States by establishing local contributions when rendering
certain type of services through technological or digital platforms; for
example: transportation or lodging services with contribution rates ranging
from 1.5% to 3% applicable to the value of the service rendered.

Local tax authorities have established the above contributions through


different approaches like implementing the payment of such obligations
through the signing and execution of private agreements with the digital
platforms, or by publishing Decrees, and in very few cases this has been
established through the applicable law, what make us question the
constitutionality of this local contribution.

Additionally, it is worth mentioning that the creation of these Local


(State) contributions might bring several legality questions since the nature
of such contributions seem to clearly go against the Federal Fiscal
Coordination System arrangement.

In other cases, Local Tax authorities have issued administrative rules to


impose withholding duties to non-resident operators of digital platforms
with the purpose of submitting to Local lodging taxes the activities of local
hosts renting out their space throughout digital platforms; each State and

1711
authorities have different approaches to this depending on the
characteristics of the taxes and some other considerations.

1712
1 Diretor do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Professor do IBDT. Doutor em
Direito Tributário pela Universidade de São Paulo (USP). Advogado em São Paulo.
2 Mestranda em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo (USP). Graduada em
Ciências Jurídicas e Sociais pela PUC/SP. Especialista em Direito Tributário pela GVLaw.
LLM em Direito Societário pelo Insper/IBMEC. Professora nos Cursos de Especialização
e Atualização do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT. Advogada em São
Paulo.
3 Por esse motivo, Sergio André Rocha afirmou que a Convenção Modelo da OCDE e
também a Convenção Modelo da ONU (Organização das Nações Unidas) são marcadas
por um “imperialismo fiscal”, na medida em que restringem a competência tributária dos
Estados de fonte, em proveito dos Estados de residência – geralmente desenvolvidos e
exportadores de capital (ROCHA, Sérgio André. The Other Side of BEPS: “Imperial
Taxation” and “International Tax Imperialism”. In: Tax Sovereignty in the BEPS Era.
ROCHA, Sergio André; CHRISTIANS, Allison (Editors). The Netherlands: Kluwer Law
International BV, Series on International Taxation, v. 60, 2017, p. 179-200). A
prevalência dos interesses dos países desenvolvidos na alocação de competência tributária
também foi denunciada por Yariv Brauner, para quem a OCDE, inclusive no projeto
BEPS (Base Erosion and Profit Shifting Project), privilegiou – e continua a privilegiar – o
Estado da residência, em prejuízo do Estado da fonte (BRAUNER, Yariv. What the
BEPS? In: Florida Tax Review, v. 16, n. 2, 2014, p. 63).
4 Sobre os debates teóricos e teorias que sustentam a tributação pelo Estado da fonte, vide:
SCHOUERI, Luís Eduardo. Princípios no Direito Tributário Internacional:
Territorialidade, Fonte e Universalidade. In: FERRAZ, Roberto (Coord.). Princípios e
Limites da Tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005; e KEMMEREN, Eric C. C. M.
Source of Income in Globalizing Economies: Overview of the Issues and a Plea for an
Origin-Based Approach. In: Bulletin for International Taxation. Amsterdam: IBFD, 2006,
p. 430-452.
5 Cf. ROTHMANN, Gerd Willi. Tributação internacional sem sujeito passivo: uma nova
modalidade do imposto de renda sobre ganho de capital. São Paulo: Dialética, 2006, v. 10,
p. 111-112.
6 Cf. KEMMEREN, Eric C. C. M. Source of Income in Globalizing Economies: Overview of
the Issues and a Plea for an Origin-Based Approach. In: Bulletin for International
Taxation. Amsterdam: IBFD, 2006, p. 431.
7 Cf. KEMMEREN, op. cit., p. 451.
8 BRAUNER, Yariv; BAEZ, Andrés. Withholding Taxes in the Service of BEPS Action 1:
Address the Tax Challenges of the Digital Economy. Disponível em:
<https://www.ibfd.org/sites/ibfd.org/files/content/WithholdingTaxesintheServiceofBEPSAction1-
whitepaper.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
9 Cf. XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. p. 629.
10 Nas linhas que se seguem, faremos referência a estudo de um dos autores do presente
artigo, João Francisco Bianco, em que ele aborda o conceito de estabelecimento
permanente na Convenção Modelo da OCDE e seu tratamento perante a legislação
tributária brasileira. A íntegra deste estudo pode ser conferida em: BIANCO, João

1713
Francisco Bianco. O estabelecimento permanente na legislação do imposto de renda. In:
ROCHA, Valdir de Oliveira. Grandes questões atuais do Direito Tributário. São Paulo:
Dialética. 2005, v. 9, p. 298-313.
11 Cf. ROTHMANN, Gerd Willi. Tributação internacional sem sujeito passivo: uma nova
modalidade do imposto de renda sobre ganho de capital. São Paulo: Dialética, 2006. v. 10,
p. 109-110.
12 XAVIER, op. cit., p. 631-632.
13 OECD. Articles of the OECD Model Tax Convention on Income and Capital [as they read
on 22 July 2010]. Disponível em: <http://www.oecd.org/ctp/treaties/47213736.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
14 Não constituem estabelecimento permanente, por exemplo, as instalações ou os depósitos
utilizados apenas (i) na armazenagem, (ii) na exposição, (iii) na expedição, (iv) na
transformação de mercadorias, (v) para fins de publicidade, (vi) investigação científica ou
atividade análogas de caráter auxiliar ou preparatório (§ 4º do art. 5º).
15 As referidas exceções, como explicou Alberto Xavier, estão baseadas na teoria da
realização, pois as instalações ou os depósitos mencionados no § 4º não têm caráter
produtivo direto, já que a geração de lucros e rendimentos não lhes é imputada
diretamente (XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2015, p. 634).
16 A lista do § 4º do art. 5º, de atividades auxiliares ou preparatórias que não caracterizam a
existência do estabelecimento permanente material, aplica-se igualmente ao
estabelecimento permanente pessoal, conforme esclarece o § 5º. Isso quer dizer que um
agente dependente, que tenha poderes de representação somente para a contratação das
atividades auxiliares listadas – como a locação de um depósito ou o despacho de
mercadorias em estoque nesse depósito para clientes –, não configura um estabelecimento
permanente pessoal.
17 Sobre o tema, especialmente a respeito das controvérsias inerentes à aplicação do referido
dispositivo, confira-se: SCHOUERI, Luís Eduardo; GÜNTHER, Cristoph Oliver. The
subsidiary as a permanent establishment. In: Bulletin for International Taxation, v. 65, n.
2. Amsterdam: IBFD, 2011, p. 69-74.
18 Aqui, novamente é feita referência a estudo de um dos autores do presente artigo, João
Francisco Bianco, em que ele aborda o conceito de estabelecimento permanente na
Convenção Modelo da OCDE e seu tratamento perante a legislação tributária brasileira. A
íntegra desse estudo pode ser conferida em: BIANCO, João Francisco. O estabelecimento
permanente na legislação do imposto de renda. In: ROCHA, Valdir de Oliveira. Grandes
questões atuais do Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 2005, v. 9, p. 298-313. Sobre
o assunto, vide também: ROCHA, Sergio André. Estabelecimento permanente pessoal “à
brasileira”: tributação de lucros auferidos através de comissários, mandatários e
representantes. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 213. São Paulo: Dialética, p.
153-162; CALIENDO, Paulo. Estabelecimento permanente em Direito Tributário
Internacional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005; LOBO, Diana Piatti de
Barros. Breves anotações sobre o conceito de estabelecimento permanente no Direito
Tributário brasileiro. Revista de Direito Tributário Internacional, n. 9. São Paulo: Quartier
Latin, 2008, p. 51-77.

1714
19 Não é de se estranhar que seja assim, já que o art. 126, III, do CTN estabelece que a
capacidade tributária passiva independe, até mesmo, de estar a pessoa jurídica
regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional.
Logo, ainda que a filial, a sucursal, a agência ou a representação não estejam formalmente
registradas, elas terão capacidade tributária, podendo ser alçadas à condição de sujeito
passivo tributário, se configurarem uma unidade econômica ou profissional.
20 Art. 397 do RIR/99.
21 Art. 398 do RIR/99.
22 Registre-se que a totalidade dos tratados internacionais para evitar a dupla tributação,
assinados pelo Brasil, adota, no artigo que trata do estabelecimento permanente, uma
definição muito próxima daquela sugerida pela Convenção Modelo da OCDE.
23 Contudo, há incompatibilidade entre os tratados firmados pelo Brasil para evitar a dupla
tributação e a legislação brasileira. É o caso, por exemplo, do art. 539 do RIR, que exige o
arbitramento do lucro. Em função disso, como apontado em outro estudo, esse regime
excepcional de tributação por arbitramento não pode ser exigido nas hipóteses em que a
empresa estrangeira que realizar vendas diretas no Brasil, por meio de agente com plenos
poderes de representação, estiver sediada em país que tenha firmado tratado com o Brasil
(BIANCO, João Francisco. O estabelecimento permanente na legislação do imposto de
renda. In: ROCHA, Valdir de Oliveira. Grandes questões atuais do Direito Tributário.
São Paulo: Dialética, 2005, v. 9, p. 312). Outras incompatibilidades foram apontadas nos
seguintes estudos: ROCHA, Sergio André. Estabelecimento permanente pessoal “à
brasileira”: tributação de lucros auferidos através de comissários, mandatários e
representantes. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 213. São Paulo: Dialética, p.
153-162; LOBO, Diana Piatti de Barros. Breves anotações sobre o conceito de
estabelecimento permanente no Direito Tributário brasileiro. Revista de Direito Tributário
Internacional, n. 9. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 51-77.
24 OECD (2014). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy. Paris: OECD
Publishing, 2014, p. 24. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264218789-en>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
25 Idem, ibidem.
26 Idem, ibidem.
27 OECD (2014). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy. Paris: OECD
Publishing, 2014, p. 129. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264218789-en>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
28 AVI-YONAH, Reuven S.; XU, Haiyan. Evaluating BEPS. In: Tax Sovereignty in the
BEPS Era. ROCHA, Sergio André; CHRISTIANS, Allison (Editors). The Netherlands:
Kluwer Law International BV, Series on International Taxation, v. 60, 2017, p. 97-124.
29 De acordo com o relatório final, as sugestões debatidas durante os trabalhos relacionados à
Ação n. 1 acabaram não recomendadas, dentre outras razões, porque algumas questões
suscitadas pela economia digital seriam resolvidas com a adoção de propostas debatidas
em outras ações do projeto BEPS, inclusive na Ação n. 7, que tratou das medidas
necessárias ao combate do abuso verificado em determinadas estruturas no sentido de
evitar a qualificação de um estabelecimento permanente (OECD/2015. Addressing the Tax
Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final Report. Paris: OECD

1715
Publishing, 2015, p. 148. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1787/9789264218789-en).
Contudo, conforme será referido adiante, tais medidas não foram suficientes para
equalizar os problemas da economia digital.
30 OECD (2014). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy. Paris: OECD
Publishing, 2014, p. 144. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264218789-en>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
31 Idem, ibidem.
32 Idem, p. 147. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264218789-en>. Acesso em:
15 dez. 2017.
33 OECD (2014) Addressing the Tax Challenges..., cit., p. 147..
34 Idem, ibidem.
35 É interessante notar que alguns países têm adotado medidas unilaterais, e não
coordenadas, para combater a erosão da base tributável e a realocação de lucros,
decorrentes da utilização de estruturas que evitam a caracterização de estabelecimento
permanente no Estado da fonte. Medidas dessa natureza foram adotadas, por exemplo,
pelo Reino Unido e pela Austrália. Sobre o tema, vide: BIANCO, João Francisco;
SANTOS, Ramon Tomazela. A Change of Paradigm in International Tax Law: Article 7
of Tax Treaties and the Need to Resolve the Source versus Residence Dichotomy. In:
Bulletin for International Taxation, 2016, v. 70, n. 3.
36 Nesse sentido: BLUM, Daniel W. Permanent Establishments and Action 1 on the Digital
Economy of the OECD Base Erosion and Profit Shifting Initiative – The Nexus Criterion
Redefined?. In: Bulletin for International Taxation, v. 69. Amsterdam: IBFD, 2015,
Journals IBFD, p. 323-324.
37 Cf. BRAUNER, Yariv. What the BEPS?, In: Florida Tax Review, v. 16, n. 2, 2014, p. 73.
38 ROCHA, Sergio André; SANTOS, Ramon Tomazela. A Convenção Multilateral da
OCDE e a Ação 15 do Projeto BEPS. Artigo inédito.
39 Nesse sentido, vide, por exemplo: AVI-YONAH, Reuven S.; BENSHALOM, Ilan.
Formulary Apportionment – Myths and Prospects. In: World Tax Journal, 2011, p. 371-
398.
40 Cf. BRAUNER, Yariv. What the BEPS?, In: Florida Tax Review, v. 16, n. 2, 2014, p. 74.
41 A dificuldade em se estabelecer, globalmente, a mesma base tributável e a mesma fórmula
de alocação da renda foi apontada no relatório geral do “International Fiscal Association”
(IFA), de 2017, como uma das razões para a não adoção do “formulary apportionment”
enquanto critério para controle de preços de transferência (ROCHA, Sergio André.
General Report. In: Cahiers the Droit Fiscal International. Seminar B: The future of
transfer pricing. V. 102. The Netherlands: IFA, 2017, p. 17-63).
42 AUERBACH, Alan et al. Destination-Based Cash Flow Taxation. Oxford: Working Paper
Series, n. 01, University of Oxford, 2017.
43 HONGLER, Peter; PISTONE, Pasquale. Blueprints for a new PE nexus to tax business
income in the era of the digital economy. Disponível em:
<https://www.ibfd.org/sites/ibfd.org/files/content/pdf/Redefining_the_PE_concept-
whitepaper.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.

1716
44 Essa releitura do princípio da fonte foi consentida por diversos autores, como se vê, por
exemplo, em: BLUM, Daniel W. Permanent Establishments and Action 1 on the Digital
Economy of the OECD Base Erosion and Profit Shifting Initiative – The Nexus Criterion
Redefined?. In: Bulletin for International Taxation, v. 69. Amsterdam: IBFD, 2015,
Journals IBFD, p. 325; SANTOS, Ramon Tomazela; ROCHA, Sergio André. Tax
Sovereignty and Digital Economy in Post-BEPS Times. In: Tax Sovereignty in the BEPS
Era. ROCHA, Sergio André; CHRISTIANS, Allison (Editors). The Netherlands: Kluwer
Law International BV, Series on International Taxation, v. 60, 2017, p. 29-46;
SCHOUERI, Luís Eduardo; GALENDI JÚNIOR, Ricardo André. Justification and
Interpretation of the International Allocation of Taxing Rights: Can We Take One Thing
ate a Time?. Tax Sovereignty and Digital Economy in Post-BEPS Times. In: Tax
Sovereignty in the BEPS Era. ROCHA, Sergio André; CHRISTIANS, Allison (Editors).
The Netherlands: Kluwer Law International BV, Series on International Taxation, v. 60,
2017, p. 47-72.
45 BRAUNER, Yariv; BAEZ, Andrés. Withholding Taxes in the Service of BEPS Action 1:
Address the Tax Challenges of the Digital Economy. Disponível em:
<https://www.ibfd.org/sites/ibfd.org/files/content/WithholdingTaxesintheServiceofBEPSAction1-
whitepaper.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
46 Aliás, a inexistência de lei interna dispondo sobre um conceito de estabelecimento
permanente compatível com a economia digital é também uma fonte de preocupação da
OCDE, conforme manifestado na Ação n. 1 do BEPS: “(...) mesmo na ausência das
limitações impostas pelos tratados fiscais [presença física], parece que muitas jurisdições
não teriam em suas leis internas o nexo necessário à configuração do estabelecimento
permanente. Por exemplo, muitas jurisdições não tributam os rendimentos obtidos por
uma empresa não residente oriundos de vendas pela internet para clientes localizados nas
referidas jurisdições, a menos que a empresa tenha mantido algum grau de presença física
nessa jurisdição. Como resultado, a questão do nexo também se relaciona com as regras
domésticas para a tributação de empresas não residentes” (OECD. Addressing the Tax
Challenges of the Digital Economy. Paris: OECD Publishing, 2014, p. 129. Disponível
em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264218789-en>. Acesso em: 15 dez. 2017).
47 Alberto Xavier, por exemplo, entende que, mesmo havendo no tratado o chamado
“conceito estendido de royalty”, os serviços técnicos sem transferência de tecnologia não
devem ficar sujeitos à aplicação do artigo 12. De fato, para o autor, a qualificação da
remuneração por “assistência técnica ou serviços técnicos” como “royalty” somente
abrange os contratos que – seja qual for a sua denominação – tenham caráter
complementar ou instrumental de contratos de transferência de tecnologia, pois a
remuneração, nestes casos, é, por natureza, “royalty”, e não rendimento do trabalho
autônomo (tratando-se de serviços pessoais) ou preço constitutivo de lucro de empresa
(tratando-se de serviços não pessoais), como ocorre nas hipóteses em que não se dá a
transferência de tecnologia (XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil.
8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 649). Neste sentido, citem-se, também, a título
exemplificativo, os acórdãos proferidos pela 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª
Região nos processos n. 2012.61.00.016356-1/SP e 2014.61.00.010028-6/SP, bem como
os acórdãos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial n.
1.161.467/RS (2ª Turma) e no Recurso Especial n. 1.272.897/PE (1ª Turma). O tema,

1717
contudo, é controvertido, como apontam, dentre outros: CASTRO, Leonardo Freitas de
Moraes e; MONTEIRO, Alexandre Luiz Moraes do Rêgo. Qualification of services under
double tax treaties in Brazil: Open issues after Iberdrola case. In: INTERTAX, v. 45, Issue
1. The Netherlands: Kluwer Law International BV, 2017, p. 54-66.
48 Cf. ARNOLD, Brian J. The Taxation of Income from Services under Tax Treaties:
Cleaning Up the Mess – Expanded Version. In: Bulletin for International Taxation, v. 65,
n. 2. Amsterdam: IBFD, 2011, p. 23.
49 PhD em Direito Tributário Internacional, Comércio Internacional e Direitos Humanos pela
Queen Mary University of London. LLM pela London School of Economics and Political
Science. Doutor em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da UFMG. Diretor da
Associação Ibero-americana de Arbitragem Tributária (AIBAT). Conselheiro fundador do
Instituto de Estudos Fiscais (IEFi). Diretor da Associação Brasileira de Direito Financeiro
(ABDF). Professor do curso de Mestrado do Instituto Brasileiro de Direito Tributário
(IBDT). Consultor da United Nations Economic Commission for Africa (UNECA).
50 Mestre em Direito Tributário pela FGV/SP. MBA em Finanças pelo IBMEC/MG.
Especialização em Direito Tributário pela PUC/MG. Graduada em Direito pela UFMG.
Coordenadora da Comissão de Tributação da Associação Brasileira de Direito da
Tecnologia da Informação e das Comunicações – ABDTIC.
51 KLEINBARD, Edward D. Stateless Income. Florida Tax Review, v. 11, n. 9. Gainesville:
Universidade da Florida, 2011.
52 OCDE (2014), Plano de ação para o combate à erosão da base tributária e à
transferência de lucros, OECD Publishing. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264207790-pt>, p. 7. Acesso em: 15 dez. 2017.
53 OCDE (2013), Addressing Base Erosion and Profit Shifting, OECD Publishing.
Disponível em: <http://www.oecd.org/tax/addressing-base-erosion-and-profit-shifting-
9789264192744-en.htm>. Acesso em: 15 dez. 2017. A OCDE lançou, em 2014, a
tradução desse documento em português, disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264207790-pt>. Acesso em: 15 dez. 2017.
54 De acordo com o relatório da OCDE, 2014, sobre o BEPS: “Especificamente, o objetivo
do Plano de ação seria dotar os países de instrumentos domésticos e internacionais para
uma melhor harmonização dos poderes de imposição tributária com as atividades
econômicas”. OCDE (2014), Plano de ação para o combate à erosão da base tributária e
à transferência de lucros. OCDE Publishing. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264207790-pt>, p. 11. Acesso em: 15 dez. 2017.
55 SCHOUERI, Luis Eduardo. O Projeto BEPS: Ainda uma Estratégia Militar. In: GOMES,
Marcus Lívio; SCHOEURI, Luis Eduardo (Orgs.). A Tributação Internacional na Era
Pós-BEPS: Soluções globais e peculiaridades de países em desenvolvimento, 1. ed. Rio de
Janeiro: Lumen Iuris, 2016, v. I, p. 36.
56 BRAUNER, Yariv; BAEZ, Andres. Withholding taxes in the service of BEPS Action 1:
address the tax challenges of the digital economy, WU International Taxation Research
Paper Series N. 2015 – 14, 2015. Disponível em SSRN:
<http://ssrn.com/abstract=2591830>, p. 4-5. Acesso em: 15 dez. 2017.
57 HONGLER, Peter; PISTONE, Pasquale. Blueprints for a new PE nexus to tax business
income in the era of the digital economy, 2015. Disponivel em SSRN:

1718
<http://ssrn.com/abstract=2586196>, p. 22-23. Acesso em: 15 dez. 2017.
58 Como os casos Bella Hess (1967) e Quill Corp (1992) analisados sobre o ponto de vista da
evolução da tributação do comércio eletrônico entre estados. In: ROLIM, João Dácio,
Proportionality and Fair Taxation. The Netherlands: Kluwer Law International BV, 2014,
p. 34-35.
59 BRAUNER, Yariv; BAEZ, Andres, op. cit., p. 6-7.
60 OCDE, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1, OECD/G20
Base Erosion and Profit Shifting Project, OECD Publishing, Paris, 2015. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264241046-en>, p. 148. Acesso em: 15 dez. 2017.
61 Conforme Convenção de Berna – Universal Copyright Convention (UCC).
62 STF, RE 176.626/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 10-11-1998, Primeira Turma, DJ
11-12-1998.
63 STF, Medida Cautelar na ADIN 1.945/MT, Rel. Min. Octavio Gallotti, j. 26-5-2010,
Pleno, DJ 14-3-2011.
64 RUPARELLA, Nayan. Cloud Computing. Cambridge, MA: The MIT Press, 2015, p. 4 e
17, tradução livre.
65 MILLARD, Christopher; HON, W. Kuan. Cloud Computing Law. New York: Oxford
University Press, 2013, p. 3-4.
66 MILLARD, Christopher; HON, W. Kuan. Cloud Computing Law. New York: Oxford
University Press, 2013, p. 4.
67 Como exemplo, vide termos de uso dos serviços de cloud da Amazon:
<https://aws.amazon.com/pt/agreement/> e do Dropbox:
<https://www.dropbox.com/privacy#terms>.
68 STF, RE: 651.703/PR, Rel. Min. Luiz Fux, j. 29-9-2016, Plenário, DJ 26-4-2017.
69 TS-5113-HC-2016 (DELHI)-O, (2016) 381 ITR 31 (DELHI), (2016) 132 DTR 57
(DELHI), (2016) 287 CTR 213 (DELHI), (2016) 238 TAXMAN 178 (DELHI) IN THE
HIGH COURT OF DELHI. S MURALIDHAR AND VIBHU BAKHRU, JJ. ITA NO
890/2015. PRINCIPAL COMMISSIONER OF INCOME TAX. VS M TECH INDIA P
LTD.
70 TRF 3ª Região AP 0008354-29.2013.4.03.6114/SP, Rel. Des. Federal Mônica Nobre, 7-6-
2017.
71 RESP 1.272.987/PE, DJ 9-12-2015.
72 GRECO, Marco A.; ROCHA, Sérgio André. Sistema Brasileiro. In: UCKMAR et al.
Manual de Direito Tributário Internacional. São Paulo: Dialética, 2012, p. 353-354.
73 FONSECA, Frederico; GARCIA, Ana Carolina. Não incidência de IRRF sobre Remessas
ao Exterior – Serviços Técnicos sem Transferência de Tecnologia – Análise da
Jurisprudência. São Paulo, Revista Dialética de Direito Tributário n. 172.
74 Vale lembrar que o Brasil possui Reciprocidade de Tratamento com os EUA, sendo que o
tributo federal pago em um dos países, incidente sobre as receitas e rendimentos, pode ser
compensado no outro país, dentro dos limites estipulados (Ato Declaratório SRF n.
28/2000).
75 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 6. ed. Rio de Janeiro:

1719
Forense, 2007. p. 604-606.
76 Professor dos cursos de Especialização do Insper – Instituto de Ensino e Pesquisa e do
IBDT – Instituto Brasileiro de Direito Tributário. Ex-integrante do CARF – Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais. Advogado em São Paulo.
77 Mestre em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo. Doutorando em Políticas Públicas, Estratégias e
Desenvolvimento pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Advogado em São Paulo.
78 Recurso Extraordinário 176.626-3, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 11-12-1998.
79 Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços, de competência estadual.
80 Artigo 1º do ADI 7/2017. Adicionalmente, conforme parágrafo único do mesmo artigo 1º,
no caso de o beneficiário dos pagamentos ser residente ou domiciliado em país ou
dependência com tributação favorecida (conforme art. 24 da Lei n. 9.430, de 27 de
dezembro de 1996), aplica-se a alíquota de 25%.
81 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax Treatment
of Software. p. 4, § 13. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-
en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
82 GATES, Bill; MYHRVOLD, Nathan; RINEARSON, Peter. The road ahead. Estados
Unidos: Penguin Group, 1995, p. 22.
83 MOTA, Maurício. Questões de Direito Civil Contemporâneo. Rio de janeiro: Elsevier,
2008, p. 397-436.
84 A memória somente de leitura ou ROM (acrônimo em inglês de read-only memory) é um
tipo de memória que permite apenas a leitura, ou seja, as suas informações são gravadas
pelo fabricante uma única vez e após isso não podem ser alteradas ou apagadas, somente
acessadas pela máquina.
85 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax Treatment
of Software. p. 2, § 3. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-
en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
86 Idem, ibidem.
87 SAAVEDRA, Rui. A Proteção Jurídica do Software e a Internet. Lisboa: Ed. Don
Quixote, 1998, p. 106-107.
88 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax Treatment
of Software. p. 3, § 5. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-
en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
89 Convenção assinada em Estocolmo, em 14 de julho de 1967. Emenda de 28 de outubro de
1979.
90 Understanding Industrial Property. WIPO, Geneva, 2016, p. 4-6. Disponível em:
<http://www.wipo.int/edocs/pubdocs/en/wipo_pub_895_2016.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
91 Idem, p. 8.
92 “Por princípio da Compatibilidade, entende-se que os direitos reais devem ser compatíveis
entre si e não sejam auto excludentes. Assim, não é possível a existência de dois direitos

1720
de propriedade sobre a mesma coisa. Contudo, é possível a coexistência de direitos reais
sobre uma mesma coisa desde que possuam conteúdos diferentes (ex.: direito de
propriedade e direito de usufruto). Por princípio da Transmissibilidade, entende-se a
capacidade de transferência de um direito real entre as pessoas, seja por ato inter vivos ou
causa mortis”. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. Direito das
Coisas. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, v. 5, p. 20.
93 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax Treatment
of Software. p. 4, § 13. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-
en>, in verbis: “11. Transfer of software can take a variety of commercial forms. (…). It
clearly contains elements of intellectual property, and the question this arises as to
whether in conveying software, the transferor is also conveying a license both to use and
to reproduce for sale the ideas contained in the software. Arm’s length commercial
contracts normally cover this point by spelling out the rights conveyed and the limitations
on such rights. Such limitations can have implications for income tax as well as for
customs duty and sales tax”. E continua “13. (...). The fundamental economic
characteristics of the arrangements may represent a transaction in goods, in services, in
intellectual property, or in a combination of all three”.
94 DORNELLES, Arnaldo Diefenthaeler. O imposto sobre Serviços e seu Alcance sobre os
Softwares. In: Revista de Estudos Tributários, Ano XVI, n. 99, set.-out. 2014, Porto
Alegre, Ed. Síntese, p. 44.
95 “Art. 4º Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador,
contratante de serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa de computador,
desenvolvido e elaborado durante a vigência de contrato ou de vínculo estatutário,
expressamente destinado à pesquisa e desenvolvimento, ou em que a atividade do
empregado, contratado de serviço ou servidor seja prevista, ou ainda, que decorra da
própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos”.
96 Recurso Extraordinário 116.121-3, Plenário, Rel. Min. Octavio Gallotti, Rel. para o
acórdão Min. Marco Aurélio, publicado em 25-5-2001 (visão mais restritiva de “prestação
de serviços”). Recurso Extraordinário 547.245-SC, Plenário, Rel. Min. Eros Grau, j. 2-12-
2009 (visão mais ampla de “prestação de serviços”).
97 Conforme art. 17, § 1º, II, itens “a” e “b”, da Instrução Normativa n. 1.455/2014,
consideram-se: (i) serviço técnico a execução de serviço que dependa de conhecimentos
técnicos especializados ou que envolva assistência administrativa ou prestação de
consultoria, realizado por profissionais independentes ou com vínculo empregatício ou,
ainda, decorrente de estruturas automatizadas com claro conteúdo tecnológico; e (ii)
assistência técnica a assessoria permanente prestada pela cedente de processo ou fórmula
secreta à concessionária, mediante técnicos, desenhos, estudos, instruções enviadas ao País
e outros serviços semelhantes, os quais possibilitem a efetiva utilização do processo ou
fórmula cedido.
98 Como já informado, exceto pelo IRRF, não é parte do escopo do presente analisar a
incidência dos demais tributos sobre as transações internacionais com software, incluído a
CIDE. Para uma análise sobre a incidência da CIDE nos contratos envolvendo software,
veja SCHOUERI, Luís Eduardo e CEZAROTI, Guilherme. A Cide Royalties e as
Remessas por Licença de Distribuição e Comercialização de Programas de Computador.
Revista Dialética de Direito Tributário, n. 130, p. 41-55.

1721
99 Artigo 1º, inciso III, alínea “b” da Portaria MF n. 1, de 4 de janeiro de 2006. Pela cláusula
de nação mais favorecida presente no tratado entre Brasil e Espanha, a redução da alíquota
de IRRF a 10% prevista no tratado com Israel resultou em igual alíquota aplicável a
serviços técnicos pagos a residentes da Espanha (Ato Declaratório Interpretativo SRF n. 4,
de 17 de março de 2006).
100 AISBL Global Tax and Fiscal Group. Cross-border Taxation of Software Contracts.
Disponível em: <https://www.bkd.com/docs/solution-sheets/Cross-
BorderTaxationofSoftwareContracts.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
101 ATHENIENSE, Alexandre. Análise Jurisprudencial sobre Contratação de Softwares. In:
BLUM, Renato M. S. Ópice et al. (Coords.). Manual de Direito Eletrônico e Internet. São
Paulo: Lex, 2006, p. 456-457.
102 CERQUEIRA, Tarcísio Queiroz. Software: Direito autoral e contratos. Rio de Janeiro:
Forense, 1993, p. 72.
103 MAEDA, Denise Ferrari. A CIDE-Tecnologia nos Contratos de Licença de Uso de
Software e a Lei n. 11.452/2007. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Sistema
Tributário, Legalidade e Direito Comparado. Entre forma e substância: proteção dos
direitos fundamentais, responsabilidade tributária, procedimentos fiscais, tributação das
operações internacionais. Belo Horizonte: Forum, 2010, p. 321.
104 Solução de Divergência n. 18, de 2017 e, mais recentemente, ADI RFB n. 7, de 21 de
dezembro de 2017.
105 CERQUEIRA, Tarcísio Queiroz. Software: Direito autoral e contratos. Rio de Janeiro:
Forense, 1993, p. 72-75. No mesmo sentido: ALBUQUERQUE, Adriana Haack Velho de.
A Comercialização de Software no Brasil: Aspectos Relevantes. In: Manual de Direito
Eletrônico e Internet, op cit., p. 473-487. CALIENDO, Paulo. Da Tributação do Software
nos Acordos Internacionais contra a Dupla Tributação da Renda. In TÔRRES, Heleno
Taveira. Direito Tributário Internacional Aplicado, São Paulo: Quartier Latin, 2004, v. II,
p. 387-421.
106 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax
Treatment of Software. p. 13, § 47. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-en>. Acesso em: 15 dez. 2017. No
mesmo sentido: MORAES e CASTRO, Leonardo Freitas de. Tributação da Transferência
Internacional de Tecnologia: Importantes Diferenças entre sua Qualificação como
Royalties ou Ganho de Capital. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 213, p. 80-109.
107 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax
Treatment of Software. p. 13, § 47. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
108 “Art. 26. O adquirente, pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no Brasil, ou o
procurador, quando o adquirente for residente ou domiciliado no exterior, fica responsável
pela retenção e recolhimento do imposto de renda incidente sobre o ganho de capital a que
se refere o art. 18 da Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de 1995, auferido por pessoa física
ou jurídica residente ou domiciliada no exterior que alienar bens localizados no Brasil”.
109 Conforme explica Luis Eduardo Schoueri: “no Direito Tributário Internacional, o
princípio da fonte caracteriza um critério adotado por diversos ordenamentos jurídicos
nacionais para a definição do alcance da lei tributária a partir do seu aspecto objetivo.

1722
Enquanto o princípio da residência firma-se no elemento de conexão subjetivo, o princípio
da fonte baseia-se no aspecto objetivo da situação tributável. Em linhas gerais, dir-se-á
que ao adotar o princípio da fonte, o Estado tributará todo rendimento cuja origem esteja
localizada em seu território”. SCHOEURI, Luís Eduardo. Princípios no Direito Tributário
Internacional: Territorialidade, Fonte e Universalidade. In: FERRAZ, Roberto C. B.
(Org.). Princípios e Limites da Tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 342.
110 “Art. 709. Estão sujeitas à incidência do imposto na fonte, à alíquota de quinze por cento,
as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas para o exterior pela
aquisição ou pela remuneração, a qualquer título, de qualquer forma de direito, inclusive a
transmissão, por meio de rádio ou televisão ou por qualquer outro meio, de quaisquer
filmes ou eventos, mesmo os de competições desportivas das quais faça parte
representação brasileira”.
111 ADI RFB n. 7, de 23 de agosto de 2016: “Art. 1º A integralização de capital de pessoa
jurídica no Brasil com cessão de direito por residente no exterior sujeita-se à incidência do
Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF) à alíquota de 15% (quinze por cento)
sobre o valor do direito, conforme previsto no art. 72 da Lei n. 9.430, de 27 de dezembro
de 1996”. O CARF também buscou amparo em tal dispositivo para considerar legítimo
auto de infração em face de fonte pagadora pelo pagamento de preço pago na aquisição de
direito de passe de jogador de futebol que não atuava no Brasil (cf. Acórdão 2201-
000.999, publicado em 16-3-2011).
112 Veja-se, por exemplo, o artigo 13 do Tratado celebrado entre o Brasil e os Países Baixos:
“ARTIGO 13 – Ganhos de Capital
1. Os ganhos obtidos por um residente em um Estado Contratante na alienação de bem
imobiliário, dos que trata o Artigo 6, situado no outro Estado Contratante, podem ser
tributados naquele outro Estado.
2. Os ganhos provenientes da alienação de bem mobiliário que faça parte do ativo de um
estabelecimento permanente que uma empresa de um Estado Contratante possuir no outro
Estado Contratante, inclusive os ganhos provenientes da alienação desse estabelecimento
permanente (isoladamente ou com o conjunto da empresa), podem ser tributados naquele
outro Estado. Todavia, os ganhos provenientes da alienação de navios ou aeronaves
operados no tráfego internacional, ou da propriedade móvel relacionada à operação de tais
navios ou aeronaves, só serão tributados no Estado Contratante em que estiver situada a
sede da direção efetiva da empresa.
3. Os ganhos provenientes da alienação de qualquer bem diverso daqueles a que se referem os
parágrafos 1 e 2 podem ser tributados em ambos os Estados Contratantes”.
113 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax
Treatment of Software. p. 7, § 24. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
114 Incorporado ao artigo 52 do RIR/99.
115 Art. 3º da Medida Provisória n. 2.159, de 2001. Salvo no caso de beneficiário residente
de jurisdição de tributação favorecida, caso em que aplicável a alíquota de 25% prevista
no artigo 8º da Lei n. 9.779, de 1999.
116 Restrição veiculada pelo art. 22, letra “d”, da Lei n. 4.506/64, incorporado ao art. 52, IV,

1723
do RIR/99.
117 Em decisão de setembro de 2017, a 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do
CARF decidiu pelo voto de qualidade que o autor da obra é necessariamente um
indivíduo, pessoa física, não cabendo falar em criador pessoa jurídica para fins de
aplicação da ressalva ao conceito de royalties. Tal ponto foi enfrentado para se decidir
pela não dedutibilidade das despesas de royalties na apuração do lucro real. Cf. Acórdãos
n. 9101-003.063 e n. 9101-003.062, de 13 de setembro de 2017, Rel. Rafael Vidal de
Araújo.
118 Solução de Consulta Cosit n. 154/2016.
119 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax
Treatment of Software. p 12, § 44. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
120 Portaria MF n. 45/76, art. 1º, I, letra “d”.
121 Solução de Consulta DISIT/6ª Região Fiscal n. 6026, de 17 de junho de 2016. Vinculada
à Solução de Divergência Cosit n. 4, de 13 de maio de 2016.
122 Solução de Divergência Cosit n. 4, de 13 de maio de 2016.
123 Portaria MF n. 1/06, art. 1º, III, letra “d”.
124 Portaria MF n. 92, art. 1º, letra “d”.
125 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax
Treatment of Software. p. 11/12, §§ 42-44. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-en>. Acesso em: 15 dez. 2017. No
mesmo sentido, CALIENDO, Paulo. Da Tributação do Software nos Acordos
Internacionais contra a Dupla Tributação da Renda. In: TÔRRES, Heleno Taveira. Direito
Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2004, v. II, p. 402-404.
126 Em sentido diverso, YAMASHITA, Douglas. Licenciamento de Software no Brasil:
Novas Tendências Tributárias. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 141, p. 62-68.
GONÇALVES, Renato Lacerda de Lima. A Tributação do Software no Brasil. São Paulo:
Quartier Latin, 2005, p. 174.
127 Solução de Divergência Cosit n. 18, de 27 de março de 2017.
128 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax
Treatment of Software. p. 12, § 43. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
129 Vide, por exemplo, YAMASHITA, Douglas. Licenciamento de Software no Brasil:
Novas Tendências Tributárias. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 141.
GONÇALVES, Renato Lacerda de Lima. A Tributação do Software no Brasil. São Paulo:
Quartier Latin, 2005.
130 Lessons from the software task force. OCDE. Preparado por Fraçois Lequiller. Paris,
2002, p. 3-4, §§ 10, 11 e 12.
131 Art. 565 do Código Civil Brasileiro (Lei n. 10.406/2002).
132 Incorporado ao art. 49 do RIR/99.
133 Art. 22 da Lei n. 4.506, de 1964, incorporado ao art. 52 do RIR/99.
134 Solução de Consulta DISIT/10ª RF n. 63, de 11 de julho de 2010.

1724
135 Solução de Consulta DISIT/10ª RF n. 41, de 4 de julho de 2011.
136 Veja, por exemplo, a redação do item 3 do art. 12 do Tratado Celebrado entre Brasil e os
Países Baixos:
“O termo ‘royalties’, empregado neste Artigo, designa pagamentos de qualquer natureza
efetuados em contrapartida pelo uso ou pelo direito ao uso de direitos autorais sobre obra
literária, artística ou científica (inclusive filmes cinematográficos, filmes ou fitas para
transmissão de rádio ou televisão); sobre qualquer patente, marca de indústria ou de
comércio, desenho ou modelo, plano, fórmula ou processo secretos; ou pelo uso ou pelo
direito ao uso de equipamento industrial, comercial ou científico; ou pela informação
relativa à experiência industrial, comercial ou científica”.
137 XAVIER, Alberto. O Imposto de Renda na Fonte e os Serviços Internacionais – Análise
de um Caso de Equivocada Interpretação dos arts. 7º e 21 dos Tratados. Revista Dialética
de Direito Tributário, n. 49, p. 10 e seguintes.
138 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital 2014. R(10) The Tax
Treatment of Software. p. 12, § 43. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264239081-103-en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
139 Neste sentido vide Solução de Consulta COSIT n. 235, de 15 de maio de 2017. Embora
tratasse de questão voltada ao percentual de cálculo de presunção no regime do lucro
presumido, a fundamentação adotada pode se aplicar ao caso de operações internacionais.
140 Mestre e Doutor em Direito Econômico e Financeiro pela Faculdade de Direito da USP.
Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo – TIT/SP (biênio 2018-
2019). Conselheiro do Conselho Municipal de Tributos de São Paulo – CMT/SP (biênios
2006/2008 e 2010/2012). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, da
Associação Brasileira de Direito Financeiro – ABDF, do Instituto de Pesquisas Tributárias
– IPT/SP e da International Fiscal Association – IFA. Professor dos cursos de
especialização e do Mestrado Profissional de Direito Tributário Internacional do IBDT.
Membro do Conselho Jurídico do SINDUSCON. Conselheiro Fiscal certificado pelo
Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC. Advogado em São Paulo.
141 LLM pela Cornell Law School. Mestre em Direito Econômico e Financeiro pela
Faculdade de Direito da USP. Conselheiro Julgador do Conselho Municipal de Tributos
do Município de São Paulo. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT,
da Associação Brasileira de Direito Financeiro – ABDF e da International Fiscal
Association – IFA. Conselheiro da Associação dos Advogados São Paulo – AASP.
142 Sobre o assunto, numa perspectiva mais abrangente do que as operações envolvendo
software, por englobar a tributação da chamada economia digital, vide: OECD (2015).
Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final Report,
OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project, OECD Publishing, Paris. Disponível
em: <http://www.oecd-ilibrary.org/docserver/download/2315281e.pdf?
expires=1513548319&id=id&accname=guest&checksum=CC8E2FEEEF38B89F5A5A38CD825946AA>
ROSEMBUJ, Tulio. Taxing Digital. Barcelona: El Fisco, 2015. 209 p. Disponível em:
<http://elfisco.com/app/uploads/2017/01/33.pdf>. Acessos em: 15 dez. 2017.
143 Esse critério é fundamental, inclusive, para fins aduaneiros, eis que compõe o valor
aduaneiro o software incorporado a um bem e indispensável a seu uso. Nesse caso, o
software está contido em circuitos integrados, semicondutores e dispositivos similares,

1725
conforme § 2º do art. 81 do Regulamento Aduaneiro. Vide os acórdãos n. 201-67.397 e n.
302-39.032 prolatados pelas Primeira e Segunda Câmaras do Segundo e Terceiro
Conselho de Contribuintes respectivamente, nas sessões de 18 de setembro de 1991 e de
16 de outubro de 2007. Vide também o recente acórdão n. 3302-003.224 prolatado pela
Segunda Turma Ordinária da Terceira Seção do CARF, na sessão de 21 de junho de 2016.
144 Publicado no Diário Oficial de 15-9-75, o Parecer Normativo n. 79 tratava de
integralização do capital social da importadora, com software fornecido por acionista
estrangeiro.
145 Essa parece ser a visão sustentada pelas autoridades fiscais brasileiras, em especial pela
Receita Federal do Brasil, como se observa na Solução de Divergência n. 11/2011 (DOU
de 17-5-2011), que trata de CIDE royalties, cujo raciocínio é aplicável para a tributação da
renda de não residente, bem como em outras mais recentes, como a Solução de Consulta n.
1.025/2017 (DOU de 27-7-2017), que trata de PIS/COFINS-importação.
146 Os royalties são uma categoria de rendimento que corresponde à remuneração decorrente
do uso, fruição, exploração de direitos, de tal forma que abrange tanto os pagamentos pela
exploração de direitos autorais, como aqueles efetuados em virtude da exploração de
direitos de propriedade industrial. Note-se que o pagamento de royalties está associado à
obtenção do direito de uso, fruição e exploração de determinados direitos de propriedade
intelectual, mediante licenciamento por parte dos efetivos titulares (proprietários) desses
direitos, por determinado período de tempo. Nesse caso, o direito de propriedade
intelectual não é cedido integralmente a terceiro, mas apenas o seu uso é franqueado, sob
certas condições. Apesar de os direitos de propriedade intelectual, nas suas vertentes de
propriedade industrial e direitos autorais, estarem sujeitos a regimes jurídicos diferentes, a
legislação tributária enquadrou indistintamente como royalties os valores pagos pelo uso,
fruição e exploração desses direitos no art. 22 da Lei n. 4.506/64. A única exceção são os
pagamentos pela exploração de direitos autorais, quando efetuados em favor do respectivo
autor ou criador do bem ou obra, que não se enquadram no conceito de royalties segundo
o referido dispositivo legal. Assim, somente estão sob o manto dos royalties os
pagamentos pelo direito de uso quando o titular for um terceiro e não for o próprio autor
(caso em que se trataria de remuneração de trabalho autônomo).
147 Partindo-se da premissa de que não se trata de transferência de tecnologia, o pagamento
de royalties relativos a direitos autorais para beneficiário residente no exterior fica sujeito
à incidência de IRRF, à alíquota de 15% (cf. art. 77, § 1º, da Lei n. 3.470/58, com redação
dada pelo art. 28 da Lei n. 9.249/95; art. 685, I, do Decreto n. 3.000/99 – RIR). Se
beneficiário for residente em paraíso fiscal, o IRRF incide à alíquota de 25%.
148 Conforme Solução de Divergência COSIT n. 27/2008.
149 Conforme Solução de Divergência COSIT n. 18/2017.
150 Cf. PASQUALIN, Roberto. The taxation of income derived from the supply of
technology. Brazil. National Reporter. In: Cahiers de Droit Fiscal International. Vol. 82a.
The Hague: International Fiscal Association, 1997. p. 258.
151 Conforme Solução de Divergência COSIT n. 18/2017.
152 Partilhando desse entendimento, vide: CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e.
Tributação da Transferência Internacional de Tecnologia: Importantes Diferenças entre
sua Qualificação como Royalties ou Ganho de Capital. In: Revista Dialética de Direito

1726
Tributário, n. 213. São Paulo: Dialética, 2013. p. 82.
153 O ganho de capital auferido por não residentes, em operações de alienação de bens ou
direitos (que comportem ou não transferência de tecnologia), está sujeito à incidência do
IRRF de forma progressiva, com alíquotas variando de 15% a 22,5% conforme o valor do
ganho (art. 18 da Lei n. 9.249/95; art. 21 da Lei n. 8.981/95, com redação dada pela Lei n.
13.259/2016; art. 685, I, “b”, do RIR). Todavia, se o beneficiário for residente de país com
tributação favorecida, a alíquota aplicável é de 25% (cf. art. 8º da Lei n. 9.779/99; art. 685,
II, “b”, do RIR).
154 Se o prestador de serviços for um não residente, haverá a incidência de IRRF à alíquota
de 15%, conforme art. 7º da Lei n. 9.779/99; art. 685, II, “a”, do RIR; art. 3º da Medida
Provisória n. 2.159-70/2001; e art. 2º-A da Lei n. 10.168/2000.
155 Conhecimentos, técnicas e informações que não se revestem da condição de bens ou
direitos de propriedade industrial, que sejam transferidos ao tomador de serviços cuja
execução tenha propiciado essa transferência, de forma dissociada de qualquer
licenciamento ou cessão de direitos de propriedade industrial, acabam por integrar o
resultado da prestação de serviços, sendo remunerados como tal, e não como royalties. Ao
contrário, ainda que a prestação de serviços não seja considerada, isoladamente, uma
transferência de tecnologia para fins da legislação de proteção dos direitos de propriedade
industrial, quando associada ao licenciamento ou cessão desses direitos (como no caso de
serviços de desenvolvimento de software combinado com o licenciamento de outro
software já existente), poderá ser entendida como suscetível de ensejar alguma
transferência de tecnologia associada a esses mesmos direitos de propriedade industrial,
ficando, por isso mesmo, subjugada a determinados controles regulatórios. Nessa hipótese,
a remuneração por tais serviços – posto que indissociáveis da transferência de direitos de
propriedade industrial – deve ser qualificada como royalties.
156 Em se tratando de prestação de serviços dissociada de qualquer transferência de
tecnologia (que seria o caso da prestação de “serviços puros”), não há, na nossa visão,
margem para se considerar que a respectiva remuneração seja reputada como royalty.
Somente quando a prestação de serviços estiver intrinsecamente ligada à transferência de
determinada tecnologia é que será possível qualificar a sua remuneração como royalties,
dado que, em contratos mistos, com objeto híbrido, ou mesmo em arranjos contratuais
simultâneos, a prestação de serviços deve ser entendida como atividade instrumental ou
secundária, ou seja, ela somente se justifica e existe em função da atividade principal, que
é a transferência da tecnologia. A rigor, a prestação de serviços, nesses casos, deve ser
entendida como “assistência técnica”, em vista do seu caráter de complementaridade a
contratos de transferência de tecnologia. Ademais, a Resolução INPI n. 54/2013 enumera,
expressamente, quais são os contratos que não comportam transferência de tecnologia,
dentre os quais: “10. Serviços de suporte, manutenção, instalação, implementação,
integração, implantação, customização, adaptação, certificação, migração, configuração,
parametrização, tradução ou localização de programas de computador (software); 11.
Serviços de treinamento para usuário final ou outro treinamento de programa de
computador (software); 12. Licença de uso de programa de computador (software); 13.
Distribuição de programa de computador (software); 14. Aquisição de cópia única de
programa de computador (software)”. Fora de tais casos, são os traços distintivos do
contrato que envolva prestação de serviços que permitirão concluir-se pela existência ou

1727
não de eventual transferência de tecnologia. É relevante a constatação de que a
remuneração por serviços, no bojo de contratos cujo objeto não comporte a transferência
de determinada tecnologia (propriedade industrial), como é o caso de serviços de
customização de software, acaba padecendo de conturbada qualificação, para fins de
aplicação dos tratados contra a bitributação, por parte das autoridades fiscais brasileiras.
157 Cf. ROSEMBUJ, Tulio. Taxing Digital. Barcelona: El Fisco, 2015. p. 131. Disponível
em: <http://elfisco.com/app/uploads/2017/01/33.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
158 O Parecer Normativo SF n. 1/2017 (DOM 19-7-2017) qualifica contratos SaaS como
serviços tributáveis pelo ISS. Do mesmo modo, a Solução de Consulta COSIT n. 191/2017
conclui que “incide imposto de renda na fonte, à alíquota de quinze por cento, sobre as
importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas ao exterior a título de
remuneração de Software as a Service (SaaS), considerados serviços técnicos, que
dependem de conhecimentos especializados em informática e decorrem de estruturas
automatizadas com claro conteúdo tecnológico”. No mesmo sentido, vide: Solução de
Consulta Disit/SRRF03 n. 3001/2016.
159 É controversa a afirmação de que a disponibilização de funcionalidades de software
constitua serviço para fins de tributação pelo Imposto sobre Serviços. No entanto, a
Receita Federal editou o Ato Declaratório Interpretativo RFB n. 7/2014, segundo o qual as
operações realizadas por empresas contratadas no exterior para disponibilizar
infraestrutura para armazenamento e processamento de dados em alta performance para
acesso remoto, identificada no jargão do mundo da informática como data center, são
tributadas como prestação de serviços (e não como locação), sujeitas a IRRF.
160 Aleksandra Bal também elenca uma terceira modalidade de contrato denominada
Infrastructure as a Service (IaaS), que compreenderia processamento, armazenamento e
rede, colocados à disposição do usuário (Cf. BAL, Aleksandra. The Sky’s the Limit –
Cloud-Based Services in an International Perspective. In: Bulletin for International
Taxation. Amsterdam: IBFD, September 2014. p. 515-521 (p. 515)).
161 Sobre o assunto, vide: <https://www.cpamagazine.com/feature-articles/125-technology-
advisor/rick-richardson-columns/1475-what-is-fog-computing>;
<https://wattio.com/en/blog/what-is-fog-computing-/29>. Acesso em: 15 dez. 2017.
162 Cf. BAL, Aleksandra. The Sky’s the Limit – Cloud-Based Services in an International
Perspective. In: Bulletin for International Taxation. Amsterdam: IBFD, September 2014.
p. 515-521 (p. 516).
163 STF, Recursos Extraordinários 176.626 (DJ 11-12-1998) e 199.464 (j. 2-3-1999).
164 STF, Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.945 Mato Grosso
(DJ 14-3-2011).
165 STF, Recurso Extraordinário 688.223-PR.
166 Cf. Convênio ICMS n. 106/2017, editado no âmbito do Conselho Nacional de Política
Fazendária – CONFAZ.
167 No caso de São Paulo, vide o recente Parecer Normativo SF n. 1 (DOM 19-7-2017).
168 Sobre o assunto, vide: FUSO, Rafael Correia. Tributação do software “virtual” no Brasil:
a guerra entre Estados e Municípios continua. In: Revista Digital, v. 18, n. 43, outubro de
2017 [on-line]. São Paulo: Tributário, outubro 2017. Disponível em:

1728
<https://tributario.com.br/rafael22/tributacao-do-software-virtual-no-brasil-guerra-entre-
estados-e-municipios-continua/>. MACEDO, Alberto. Licenciamento de software não
pode ser considerado mercadoria virtual. In: Revista Consultor Jurídico, dezembro de
2017 [on-line]. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-dez-13/alberto-macedo-
stf-desvirtuar-conceito-mercadoria>. Acessos em: 15 dez. 2017.
169 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 7. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2010. p. 628.
170 OECD – Income and Capital Model Convention and Commentary 2017. Commentary on
Article 7, paragraph 7: item 62.
171 Essa já era a conclusão manifestada há cerca de 30 anos pelos estudiosos da matéria (cf.
JONES JR., John B.; MATTSON, Robert N. Tax treatment of computer software. General
Report. In: Cahiers de Droit Fiscal International. Vol. 73b. The Hague: International
Fiscal Association, 1988. p. 35).
172 OECD – Income and Capital Model Convention and Commentary 2017. Commentary on
Article 12, paragraph 2: itens 8 through 18.
173 OECD – Income and Capital Model Convention and Commentary 2017. Commentary on
Article 12, paragraph 2: item 11.3.
174 OECD – Income and Capital Model Convention and Commentary 2017. Commentary on
Article 12, paragraph 2: item 14.2.
175 Em versões anteriores, os Comentários à CM-OCDE pareciam aceitar a ideia de que, em
contratos mistos, a atividade tida por preponderante deveria determinar o tratamento
tributário da remuneração prevista, quando aplicada indistintamente a todas as atividades,
devendo apenas haver uma segregação da remuneração e alocação específica por atividade
quando nenhuma delas fosse preponderante. Verifica-se que os Comentários evoluíram
para tornar como recomendação primeira a segregação da remuneração (e o respectivo
tratamento tributário) por obrigação ou atividade, abandonando a visão de que o
tratamento tributário (da remuneração) da atividade principal deveria ser estendido às
demais atividades tidas por secundárias (Cf. LAINOFF, Steven R.; VAISH, Ramesh C.
The taxation of income derived from the supply of technology. General Report. In:
Cahiers de Droit Fiscal International. Vol. 82a. The Hague: International Fiscal
Association, 1997. p. 35-36).
176 Cf. BAL, Aleksandra. The Sky’s the Limit – Cloud-Based Services in an International
Perspective. In: Bulletin for International Taxation. Amsterdam: IBFD, September 2014.
p. 515-521 (p. 516).
177 Embora os Comentários à CM-OCDE não façam referência ao acesso de software em
nuvem, parece-nos que a respectiva remuneração também seria qualificável como
royalties, sem prejuízo de, a depender das funcionalidades adicionais ofertadas (não
relacionadas ao licenciamento do programa em si), existir margem para se qualificar os
respectivos rendimentos como lucro de empresa (serviços).
178 OECD – Income and Capital Model Convention and Commentary 2017. Commentary on
Article 12, paragraph 2: item 13.1.
179 Tal circunstância não é um fato recente. LAINOFF e VAISH já apontavam, à margem
dos Comentários à CM-OCDE, a existência de divergências de entendimento, por força do

1729
tratamento dado pelas leis internas, sobre o tratamento tributário das operações com
software, seja como licenciamento em contrapartida de royalties, seja como venda, cuja
remuneração seria qualificada como ganho ou lucro (Cf. LAINOFF, Steven R.; VAISH,
Ramesh C. The taxation of income derived from the supply of technology. General
Report. In: Cahiers de Droit Fiscal International. Vol. 82a. The Hague: International
Fiscal Association, 1997. p. 33-34).
180 Não se descarta, porém, o risco de ocorrer conflito de qualificação, o que pode ensejar a
inaplicabilidade do tratado e, por fim, a bitributação do rendimento considerado. Sobre o
assunto, vide o nosso: SILVEIRA, Rodrigo Maitto da. Aplicação de Tratados
Internacionais contra a Bitributação: Qualificação de Partnership Joint Ventures. São
Paulo: Quartier Latin, 2006.
181 Doutor e Mestre em Direito Tributário pela USP. Especialista em Direito Tributário pelo
IBET. Visiting Research Scholar na Fredric G. Levin College of Law – University of
Florida (2017-18) e Visiting Researcher no Institute for Austrian and International Tax
Law – Wirtschaftsuniversität Wien (2014). Professor no Mestrado Profissional em
Tributação Internacional do IBDT. Professor nos Cursos de Graduação e Pós-graduação
da USJT. Conselheiro Julgador do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).
182 Mestre em Direito Tributário pela USP. Especialista em Direito Tributário pelo INSPER.
Professor visitante dos cursos de atualização e pós-graduação do IBDT. Advogado em São
Paulo.
183 Gupta, Piyush. “Cloud” – A Technological Odyssey. 20 Asia-Pac. Tax Bull. 5 (2014),
Journals IBFD.
184 Nesse sentido, William Jeremy Robinson: “The law cannot keep up with the pace of
change in computer networking. By the time legislatures or courts figure out how to deal
with a new product or service, the technology has already progressed” (ROBISON,
William Jeremy, Free at What Cost? Cloud Computing Privacy Under the Stored
Communications Act (April 1, 2010). Georgetown Law Journal, Vol. 98, No. 4, 2010.
Available at SSRN: https://ssrn.com/abstract=1596975.
185 “Illustratively expressed: the treaty acts like a stencil that is placed over the pattern of
domestic law and covers over certain parts”. VOGEL, Klaus. Klaus Vogel on Double
Taxation Conventions. London: Kluwer, 1999, p. 31-32.
186 Sobre o tema, vide: SHAKOW, David. The Taxation of Cloud Computing and Digital
Content. University of Pensilvania. Pen Law: Legal Scholarship Repository. Faculty
Scholarship. Paper 475, 2013.
187 Sobre tais conceitos, vide: OECD, The Discussion Draft on Tax Challenges of Digital
economy (OECD 2014); OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy –
Action 1: 2015 Final Report, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project (OECD
2015); GRANCE, Timothy; MELL, Peter. The NIST Definition of Cloud Computing:
Recommendations of the National Institute of Standards and Technology. NIST, U.S.
Department of Commerce, 2011. Disponível em:
<http://nvlpubs.nist.gov/nistpubs/Legacy/SP/nistspecial publication800-145.pdf>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
188 Sobre tais conceitos, vide: GRANCE, Timothy; MELL, Peter, op. cit.; MAIA,
Wellington Antunes da. Artigo publicado na Revista Direito Tributário Atual n. 37. São

1730
Paulo: Editora IBDT, p. 470 e s., 2017. PADILHA, Maria Ângela Lopes Paulino.
Tributação de software. Exame da constitucionalidade da incidência do ISS e do ICMS-
Mercadoria sobre a licença de uso de programa de computador disponibilizado
eletronicamente. Tese de doutorado apresentada à Faculdade de Direito PUC/SP, p. 124 e
s.; BARTHEM NETO, Hélio. Novos Desafios da Tributação do Software no Brasil sob as
Perspectivas do ICMS e do ISS – do Corpus Mechanicum ao Cloud Computing. 2016, fls.
79. Dissertação apresentada na Escola de Direito de São Paulo, da Fundação Getúlio
Vargas, no Programa de Pós-Graduação em Direito e Desenvolvimento como requisito
para a conclusão do curso de Mestrado Profissional; VIEIRA, Gustavo Siqueira. A
regulamentação tributária dos serviços over the top: uma análise do PLC 366/2013.
Revista Tributária e de Finanças Públicas, v. 134/2017, p. 225-241, maio-jun./2017;
SOUSA, Flavio R. C.; MOREIRA, Leonardo O.; MACHADO, Javam C. Computação em
Nuvem: Conceitos, Tecnologias, Aplicações e Desafios. Disponível em:
<https://www.academia.edu/783784/Computa%C3%A7%C3%A3o_em_Nuvem_Conceitos_Tecnologias_
Acesso em: 15 dez. 2017.
189 Vide: GRANCE, Timothy; MELL, Peter, op. cit.
190 Deve, ainda, ser considerada a alíquota de 25% de IRRF na hipótese de beneficiário
sediado em paraíso fiscal.
191 KOENIG, Harvey; HO, Kah Chuan. Taxing the Borderless Cloud within the Singapore
Border, 18 Asia-Pac. Tax Bull. 5, Journals IBFD. Amsterdam: IBFD, 2012.
192 BIANCO, João Francisco; SANTOS, Ramon Tomazela. A mudança de Paradigma: o
Artigo 7º dos Acordos de Bitributação e a Superação da Dicotomia Fonte Versus
Residência. Direito Tributário Internacional. Homenagem ao Prof. Alberto Xavier. Coord.
Sérgio André Rocha e Heleno Torres. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 319-346.
193 FERRAZ, Luiz Felipe Centeno; Paro, Giácomo. Tributação das Remessas para
Pagamentos de Serviços – Artigo 7º dos Acordos para Evitar a Dupla Tributação em
Matéria de Imposto de Renda. Sinopse tributária 2013-2014. São Paulo: Impressão Régia,
2014.
194 BIANCO, João Francisco. SANTOS, Ramon Tomazela, op. cit, p. 324-325.
195 STJ, REsp 1161467/RS.
196 Sobre o tema, vide: SCHOUERI, Luís Eduardo; SILVA, Natalie Matos. Brazil. In: The
Impact of the OECD and UN Model Conventions on Bilateral Tax Treaties (LANG,
Michael; PISTONE, Pasquale; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus, editores).
Cambridge: Cambridge University Press, 2012, p. 171 e s.
197 LANG, Michael. Introduction to the law of double taxation conventions. Viena: Linde,
2013, p. 42 e s.
198 SCHOUERI, Luís Eduardo. Preços de transferência no Direito Tributário brasileiro.
São Paulo: Dialética, 2013, p. 414 e s.
199 Decreto n. 4.012, de 13 de novembro de 2001.
200 Deve ser considerada, ainda, a incidência da CIDE à alíquota de 10%.
201 Nesse sentido: BAL, Aleksandra. The Sky’s the limit – Cloud-Based Services in an
International Perspective. Bulletin for International Taxation. Amsterdam: IBFD, 2014, p.
516-519.

1731
202 Vide, por exemplo, acordo Brasil-Portugal (Decreto n. 4.012, de 13 de novembro de
2001).
203 Sobre o tema, vide: SPIES, Karoline. Permanent Establishment versus Fixed
Establishment: The Same or Different?, 71 Bull. Intl. Taxn. 12, Journals IBFD.
Amsterdam: IBFD, 2017; AVERY JONES, John F.; LÜDICKE, Jürgen. The Origins of
Article 5(5) and 5(6) of the OECD Model, in World Tax Journal, v. 6, n. 3. Amsterdam:
IBFD, 2014; TEODOROVICZ, Jeferson. O Estabelecimento Permanente no Direito
Tributário Internacional: o art. 5º das Convenções Modelos da ONU, OCDE e EUA.
Revista Tributária e de Finanças Públicas. Vol. 114. Coord. Edvaldo Pereira Brito. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 79 e seg.
204 Para um interessante estudo quanto à relevância da CM-ONU nos tratados celebrados
pelo Brasil, vide: ROCHA, Sergio André. A política fiscal internacional brasileira. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2017.
205 Vide, por exemplo: BRASIL, Decreto n. 355, de 2 de dezembro de 1991. Acordo Brasil-
Países Baixos, art. 5 (3).
206 Vide: BRASIL, Decreto n. 762, de 19 de fevereiro de 1993. Acordo Brasil-China, art. 5
(3).
207 Vide, por exemplo: BRASIL, Decreto n. 75.106, de 20 de dezembro de 1974. Acordo
Brasil-Dinamarca, art. 5 (5).
208 Vide, por exemplo: BRASIL, Decreto n. 6.000, de 26 de dezembro de 2006. Acordo
Brasil-México, art. 5 (7).
209 BRAUNER, Yariv; PISTONE, Pasquale. Adapting Current International Taxation to
New Business Models: Two Proposals for the European Union, 71 Bull. Intl. Taxn. 12 3
(2017), Bulletin for International Taxation IBFD. Disponível em:
<https://online.ibfd.org/document/bit_2017_12_int_1>. Acesso em: 15 dez. 2017.
210 OECD. Implementation of the Ottawa Taxation Framework Conditions. Disponível em:
<http://www.oecd.org/tax/administration/20499630.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
211 Nesse sentido, vide: KOENIG, Harvey; HO, Kah Chuan. Taxing the Borderless Cloud
within the Singapore Border, 18 Asia-Pac. Tax Bull. 5 (2012), Journals IBFD.
212 Sobre o tema, vide: GUPTA, Piyush, op. cit.
213 OCDE. Are the Current Treaty Rules for Taxing Business Profits Appropriate for E-
Commerce? Disponível em: <http://www.oecd.org/tax/treaties/35869032.pdf>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
214 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p.
627 e s.
215 O ADI RFB n. 5, de 16-6-2014, tem sido utilizado como fundamento para outras
manifestações administrativas, a exemplo da Solução de Consulta COSIT n. 5, de 12-1-
2017.
216 BRAUNER, Yariv; PISTONE, Pasquale, op. cit.
217 Além da Ação 1, a Ação 7 do Projeto BEPS também apresenta contribuições, sugerindo,
por exemplo, a alteração dos critérios para definição das atividades consideradas auxiliares
ou preparatórias. Com isso, algumas dessas atividades passariam a ser consideradas

1732
centrais e, assim, serviriam à caracterização do estabelecimento permanente. Essas
mudanças, no entanto, tendem a impactar não os provedores de cloud computing, mas
especialmente atividades de e-commerce, em que produtos são vendidos e que, portanto,
se valem de estruturas de armazenagem.
218 HONGLER, Peter; PISTONE, Pasquale, Blueprints for a New PE Nexus to Tax Business
Income in the Era of the Digital Economy (January 20, 2015). WU International Taxation
Research Paper Series No. 2015 – 15. Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=2591829
ou http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2591829>. Acesso em: 10 out. 2017.
219 OECD (2015), Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project, OECD Publishing,
Paris, p. 107-109.
220 Nesse sentido, vide: BRAUNER, Yariv; PISTONE, Pasquale, op. cit.; KOFLER, G. W.;
MAYR, G.; SCHLAGER, C. Taxation of the Digital Economy: “Quick Fixes” or Long-
Term Solution?, 57 Eur. Taxn. 12, Journals IBFD. IBFD, Amsterdam, 2017.
221 OCDE, Comments on International Tax Rules for Digital Economy on the Request for
Input (October 2017). Disponível em: <http://www.oecd.org/tax/beps/tax-challenges-
digitalisation-part-1-comments-on-request-for-input-2017.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
222 Vide, por exemplo: HONGLER, Peter; PISTONE, Pasquale, Blueprints for a New PE
Nexus to Tax Business Income in the Era of the Digital Economy (January 1, 2015).
Diponível em: <https://ssrn.com/abstract=2586196>; BRAUNER, Yariv; BAEZ
MORENO, Andres, Withholding Taxes in the Service of BEPS Action 1: Address the Tax
Challenges of the Digital Economy (February 2, 2015). WU International Taxation
Research Paper Series No. 2015 – 14. Disponível em:
<https://ssrn.com/abstract=2591830>. Acessos em: 15 dez. 2017; OLBERT, Marcel;
SPENGEL, Christoph. International Taxation in the Digital Economy: Challenge
Accepted?, 9 World Tax J. (2017), Journals IBFD; KOFLER, G. W.; MAYR, G.;
SCHLAGER, C. Taxation of the Digital Economy: “Quick Fixes” or Long-Term
Solution?, 57 Eur. Taxn. 12, Journals IBFD. IBFD, Amsterdam, 2017.
223 BRAUNER, Yariv; PISTONE, Pasquale, op. cit.
224 Sobre a interpretação dos termos dos tratados a partir de seu contexto, vide: NETO, Luís
Flávio. Os “contextos” na interpretação e aplicação dos acordos de bitributação. Tese de
doutorado. USP (Faculdade de Direito Direito do Largo São Francisco), 2015.
225 LLM em International Taxation pela Levin College of Law. Advogado no Rio de Janeiro
e em São Paulo.
226 Facebook, Airbnb, Uber, and the unstoppable rise of the content non-generators. The
Independent. 5-5-2015. Disponível em:
<http://www.independent.co.uk/news/business/comment/hamish-mcrae/facebook-airbnb-
uber-and-the-unstoppable-rise-of-the-content-non-generators-10227207.html>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
227 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy – Action 1: 2015 Final
Report, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project (OECD 2015).
228 Cf. European commission – Directorate-General Taxation and Customs Union – Expert
Group on Taxation of the Digital Economy. Working Paper: Digital Economy – Facts &

1733
Figures, p. 3-4. Disponível em:
<https://ec.europa.eu/taxation_customs/sites/taxation/files/resources/documents/taxation/gen_info/good_g
03-13_fact_figures.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
229 COCKFIELD, Arthur J. and PRIDMORE, Jason. A Synthetic Theory of Law and
Technology. Minnesota Journal of Law, Science & Technology, v. 8, n. 2, 2007.
Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=1020993>. Acesso em: 15 dez. 2017.
230 Basu, Subhajit. Direct Taxation and E-Commerce: Possibility and Desirability in Digital
Economy Innovations and Impacts on Society 27, 26-48 (2012); e Basu, Subhajit,
International Direct Taxation and E-Commerce: A Catalyst for Reform, 10 NUJS L. Rev.
19, 48 (2017).
231 KPMG, Future Focus: Tax and Transformation in Asia Pacific’s New Business Reality,
November 2011. Disponível em: <https://www.kpmg.de/docs/future-focus-tax-asia-
pacific.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
232 AVI-YONAH, Reuven S., International Tax as International Law (March 2004). U of
Michigan Law, Public Law Research Paper No. 41; Michigan Law and Economics
Research Paper No. 04-007. Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=516382 ou
http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.516382>. Acesso em: 15 dez. 2017.
233 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. reformulada e
atualizada até setembro de 2015 com a colaboração de Roberto Duque Estrada e Renata
Emery. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 213.
234 AVI-YONAH, Reuven S., op. cit., p. 4.
235 A validade desse princípio foi analisada pela Suprema Corte dos EUA no caso Cook v.
Tait. Na decisão, entendeu-se que seria possível tributar cidadãos que não moram nos
EUA por contas dos benefícios usufruídos pela cidadania americana em qualquer lugar do
planeta.
236 XAVIER, Alberto, op. cit., p. 253.
237 AVI-YONAH, Reuven S., op. cit., p. 5.
238 VOGEL, Klaus. Worldwide vs. Source Taxation of Income – A Review and Re-
Evaluation of Arguments (Part II), 16 Intertax (1988), p. 311.
239 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy – Action 1: 2015 Final
Report, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project (OECD 2015), p. 24-25.
240 VOGEL, Klaus. Worldwide vs. Source Taxation of Income – A Review and Re-
Evaluation of Arguments (Part III), 16 Intertax 393, 402 (1988).
241 International Centre for Tax and Development, A world upside down? New approach to
international tax, February 21, 2013. Disponível em: <http://www.ictd.ac/blogs/entry/a-
world-upsidedown-new-approach-to-international-tax>. Sobre o assunto, confira Library
of the European Parliament, Corporate tax avoidance by multinational firms, September
23, 2013. Disponível em:
<http://www.europarl.europa.eu/RegData/bibliotheque/briefing/2013/130574/LDMBRI
(2013)130574_REVIEN.pdf>. Acessos em: 15 dez. 2017.
242 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy – Action 1: 2015 Final
Report, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project (OECD 2015), p 16.

1734
243 KLEINBARD, Edward D. Throw Territorial Taxation From the Train, 114 TAX NOTES
547, 559 (Feb. 5, 2007) e Kleinbard, Edward D., Stateless Income (November 15, 2011).
Florida Tax Review, Vol. 11, p. 699, 2011; USC CLEO Research Paper No. C11-1; USC
Law Legal Studies Paper No. 11-6. Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=1791769>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
244 Slemrod, Joel (2010), Location, (Real) Location, (Tax) Location: An Essay on Mobility’s
Place in Optimal Taxation, National Tax Journal, 63:4, p. 843-64. Disponível em:
<dx.doi.org/10.17310/ntj.2010.4S.02>. Acesso em: 15 dez. 2017.
245 Essa regra é utilizada num caso paradigmático de planejamento tributário internacional
largamente utilizado por empresas da economia digital dos EUA (Double Irish Dutch
Sandwich) que foi objeto de estudos e de muitas críticas. Sobre o assunto, Drucker, Jesse,
Google 2.4% Rate Shows How $60 Billion Lost to Tax Loopholes, BLOOMBERG, Oct.
21, 2010. Disponível em: <https://www.bloomberg.com/news/2010-10-21/google-2-4-
rate-shows-how-60-billion-u-s-revenue-lost-to-tax-loopholes.html>. Acesso em: 15 dez.
2017. Darby III, Joseph B. and Lemaster, Kelsey, Double Irish More than Doubles the Tax
Saving: Hybrid Structure Reduces Irish, US and Worldwide Taxation, 11 Practical
U.S./Int’l Tax Strategies 2 (2007).
246 Kleinbard, Edward D., Stateless Income (November 15, 2011). Florida Tax Review, v.
11, p. 706-7.
247 BASU, Subhajit, Direct Taxation and E-Commerce: Possibility and Desirability in
Digital Economy Innovations and Impacts on Society 27, p. 48 (2012).
248 AVI-YONAH, R., International Taxation of Electronic Commerce (1997) 52 Tax L Rev
507 e DOERNBERG, R., Electronic Commerce and International Tax Sharing (1998) 16
Tax Notes International 1013.
249 HINNEKENS, L., Looking for an Appropriate Jurisdictional Framework for Source-
State Taxation of International Electronic Commerce in the Twenty-first Century (1998)
26 Intertax 192.
250 DOERNBERG, R. and HINNEKENS, L., Electronic Commerce and International
Taxation. Kluwer Law International, International Fiscal Association 1999 e
COCKFIELD, A., Reforming the Permanent Establishment Principle through a
Quantitative Economic Presence Test (2003) 38 Canadian Business Law Journal 400-422.
251 Formulary apportionment é, em linhas bem gerais, a técnica de se alocar lucros e perdas
de determinado grupo multinacional para uma determinada jurisdição, que pode ser
baseada, por exemplo, em ativos, riscos, vendas, folha de salários etc. Sobre o assunto,
confira: FLEMING, J. Clifton and PERONI, Robert J. and SHAY, Stephen E., Formulary
Apportionment in the U.S. International Income Tax System: Putting Lipstick on a Pig?
(January 19, 2015). Michigan Journal of International Law, v. 36, n. 1, 2014. Disponível
em: <https://ssrn.com/abstract=2552271> e AVI-YONAH, Reuven S. and POUGA
TINHAGA, Zachee, Unitary Taxation and International Tax Rules (November 3, 2014). U
of Michigan Public Law Research Paper No. 369; U of Michigan Law & Econ Research
Paper No. 13-020; ICTD Working Paper No. 26. Disponível em:
<https://ssrn.com/abstract=2351920> ou <http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2351920>.
Acessos em: 15 dez. 2017.
252 LI, Jinyan. International Taxation in the Age of Electronic Commerce: A Comparative

1735
Study. Toronto, ON, Canadian Tax Foundation, 2003.
253 SOETE, L. and KAMP, K., The Bit Tax: Taxing Value in the Emerging Information
Society in Arthur J. Cordell and others, The New Wealth of Nations: Taxing Cyberspace
(Between the Lines 1997) e AZAM, R., The Political Feasibility of a Global E-commerce
Tax (2013) 43(3), University of Memphis Law Review 711.
254 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy – Action 1: 2015 Final
Report, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project (OECD 2015), p 99.
255 BRAUNER,Yariv. An International Tax Regime in Crystallization, 56 TAX L. R. 259
(2003).
256 OCDE, Request for Input on Work Regarding the Tax Challenges of the Digitalised
Economy. Disponível em: <http://www.oecd.org/tax/tax-policy/tax-challenges-digital-
economy-request-for-input.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
257 OECD, BEPS – Frequently Asked Questions, OECD.org – pergunta 54. Disponível em:
<http://www.oecd.org/ctp/beps-frequentlyaskedquestions.htm>. Acesso em: 15 dez. 2017.
258 Sobre o assunto, JOHNSTON, Stephanie Soong, SAINT-AMANS, Warns Against
Unilateral Moves to Tax Digital Economy, Tax Notes: Worldwide Tax Daily (18-9-2017).
259 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. reformulada e
atualizada até setembro de 2015 com a colaboração de Roberto Duque Estrada e Renata
Emery. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 517.
260 TÔRRES, Heleno. Pluritributação Internacional sobre as Rendas das Empresas. 2. ed.
revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 339.
261 Art. 15-B, VII e X do Decreto n. 6.306/2006, com alterações promovidas pelo Decreto n.
8.325/2014.
262 “Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e
existentes os seus efeitos: (...) Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá
desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a
ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da
obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.”
263 Bacharel pela Faculdade de Direito da USP. Mestra e Doutora em Direito Tributário pela
PUC/SP. Professora no Curso de Mestrado Profissional da Escola de Direito de São Paulo
– FGV e nos Cursos de Especialização da Faculdade de Direito da PUC/SP, do Instituto
Brasileiro de Estudos Tributários – IBET, do Instituto Brasileiro de Direito Tributário –
IBDT e da Escola de Direito do CEU – IICS. Advogada em São Paulo.
264 Bacharel pela Faculdade de Direito da PUC/SP. Mestre em Direito Econômico,
Financeiro e Tributário pela USP. Professor dos Cursos de Atualização e Especialização
em Direito Tributário do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT. Advogado em
São Paulo.
265 Na atualidade muitas vezes se afirma que a tecnologia se insere como fator de produção,
essencial em qualquer circunstância, a exemplo do capital e do trabalho.
266 Como funcionam os mercados: a nova economia das combinações e do desenho de
mercado, trad. Isa Mara Lando e Mauro Lando. 3. ed. São Paulo: Portgolio-Penguin, 2016,
p. 14.

1736
267 Fundamentos de Economia. São Paulo: Terra Editora, 1994, p. 3.
268 A expressão digital, associada à economia, decorre do fato de que a informação é
convertida na forma numérica binária para ser transmitida e capturada.
269 CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede (A era da informação: economia, sociedade e
cultura). 4. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999, v. I, p. 58.
270 Perspectivas de la OCDE sobre la economía digital. Disponível em:
<www.http://dx.doi.org>. Acesso em: 15 dez. 2017.
271 Cf. Glossário ANATEL Disponível em: <www.anatel. gov. br/institucional/busca>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
272 Idem.
273 Relação extraída da Convenção Coletiva de Trabalho, firmada entre SEINESP e
SINDIESP, para o período de 2013/2014. Disponível em: <www.seinesp.org.br>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
274 International Financial Reporting Standards.
275 A Contabilidade reconhece como sujeita às suas regras apenas a entidade que prepara
demonstrações financeiras, sendo por essa razão irrelevante que ela seja uma pessoa
jurídica ou não.
276 “Art. 11. As disposições normativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem
lógica, observadas, para esse propósito, as seguintes normas: (...) c) expressar por meio
dos parágrafos os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as
exceções à regra por este estabelecida; (...).”
277 “Art. 16. Compete à Secretaria da Receita Federal dispor sobre as obrigações acessórias
relativas aos impostos e contribuições por ela administrados, estabelecendo, inclusive,
forma, prazo e condições para o seu cumprimento e o respectivo responsável.”
278 Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 15 dez. 2017.
279 Idem.
280 Cf. Dicionário de Tecnologia, whati’s?com’s, editado por Lowell Thing, trad. Bazan
Tecnologia e Linguística e Texto Digital. São Paulo: Futura, p. 380.
281 Idem, p. 802.
282 No RE n. 176.626-3, São Paulo, em 10-11-1998, Supremo Tribunal Federal – STF, por
sua 1ª Turma, decidiu que incide ICMS na negociação de “software de prateleira” (off the
shelf) padrão, comercializado em larga escala para uma pluralidade de usuários
equiparando-se a uma mercadoria. O “software feito sob encomenda” ou “à medida do
cliente” não se equipara a mercadoria, por ser desenvolvido para atender necessidades
específicas de um determinado usuário/cliente.
283 O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento sobre a distinção, para fins tributários,
entre a obrigação de dar e de fazer, como se observa na Súmula 31: “É inconstitucional a
incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISS sobre operações de
locação de bens móveis”.
284 Streaming media corresponde a sons e imagens transmitidos pela internet em forma de
fluxo (streaming) ou contínua, por pacotes de dados.
285 ECAD: Escritório Central de Arrecadação, órgão privado que arrecada os direitos

1737
autorais de cada música tocada “em execução pública” no Brasil, seja ela nacional ou
estrangeira.
286 Mestranda em Contabilidade na Universidade de São Paulo (USP). Especialista em
Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET). Advogada e
Contadora em Minas Gerais.
287 Mestre e Doutor em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo (USP). Master of
Laws (LLM) em International Taxation pela New York University (NYU). Especialista
em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Advogado e Contador em
Minas Gerais e São Paulo.
288 Atualmente, contempla o objetivo da contabilidade propiciar informações tanto
econômico-financeiras quanto sociais e de sustentabilidade. Cf.: IUDÍCIBUS, Sérgio.
Teoria da Contabilidade. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 6.
289 PATON, William Andrew. Accounting Theory with special reference to the corporate
enterprise. The Roland Press Company New York, 1922.
290 MORGAN, Gareth. Accounting as a Reality in Construction: Towards a New
Epistemology for Accounting Practice. Accounting, Organizations and Society, v. 13. n. 5,
p. 477-485.
291 CHUA, Wai Fong. Radical Developments in Accounting Thought. The Accounting
Review, v. LXI. n. 4, p. 602.
292 PATON, W. A.; LITTLETON, A. C. An Introduction to Corporate Accounting
Standards. American Accounting Association, 1940. p. 19-21.
293 EDWARDS, Edgar O.; BELL, Philip W. The Theory and Measurement of Business
Income. University of California Press, 1961. p. 6-11.
294 COMPARATO, Fábio Konder. Natureza Jurídica do Balanço de Sociedade Anônima. In:
COMPARATO, Fabio Konder. Doutrinas Essenciais de Direito Empresarial. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2010. v. 3, p. 693.
295 “Os que imaginam que a ciência contábil seja quantitativa ou exata, apenas pelo fato do
ativo ser igual ao passivo mais ou menos patrimônio líquido, não conseguem vislumbrar
quão complexa é a Contabilidade. Uma coisa é a escrituração, outra, totalmente diferente,
a ciência contábil propriamente dita.” IUDÍCIBUS, Sérgio; MARTINS, Eliseu; LOPES,
Alexsandro Broedel. Os Vários Enfoques da Contabilidade. In: LOPES, Alexsandro
Broedel; MOSQUERA, Roberto Quiroga (Coords.). Controvérsias Jurídico-Contábeis
(Aproximações e Distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2012. v. 3, p. 348.
296 SANDERS, Thomas Henry; HATFIELD, Henry Rand; MOORE, Underhill. A Statement
of Accounting Principles. American Institute of Accountants, New York, 1938. p. 5-6.
297 BEAVER, W. Financial Reporting: An Accounting Revolution. Third Edition. London:
FT Prentice Hall, 1998. p. 3.
298 HENDRIKSEN, Eldon S.; VAN BREDA, Michel F. Teoria da Contabilidade. 5. ed.
Trad. Antônio Zoratto Sanvicente. São Paulo: Atlas, 1999.
299 EDWARDS, Edgar O.; BELL, Philip W. The Theory and Measurement of Business
Income. University of California Press, 1961.
300 “By bringing financial analysis into the computer age, the efficient markets hypothesis

1738
gained the status of an icon, and as a result it led people to infer much – in fact too much –
about the perfection of markets.” SHILLER, Robert J. Finance and the Good Society.
Princeton University Press, 2012. p. 367.
301 FAMA, Eugene F. The Behavior of Stock-Market Prices. Journal of Business, v. 38,
Issue 1. Jan., 1965. p. 34.
302 SHILLER, Robert J. Irrational Exuberance. Princeton University Press, 2000. p. 3.
303 THALER, Richard. Quasi Rational Economics. Russell Sage Foundation, 1991. p. XXI.
304 CARVALHO, Nelson. Essência × Forma na Contabilidade. In: LOPES, Alexsandro
Broedel; MOSQUERA, Roberto Quiroga (Coords.). Controvérsias Jurídico-Contábeis
(Aproximações e Distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2010. p. 376.
305 Assim consideradas as vendas de bens produzidos pela entidade com a finalidade de
venda e bens comprados para revenda, tais como mercadorias compradas para venda no
atacado e no varejo, terrenos e outras propriedades mantidas para revenda.
306 A prestação de serviços envolve tipicamente o desempenho da entidade em face da tarefa
estabelecida contratualmente a ser executada ao longo de um período estabelecido entre as
partes.
307 Assim consideradas as receitas de juros (encargos pela utilização de caixa e equivalentes
de caixa ou de quantias devidas à entidade), de royalties (encargos pela utilização de
ativos de longo prazo da entidade, como, por exemplo, patentes, marcas, direitos autorais e
software de computadores) e de dividendos (distribuição de lucros a detentores de
instrumentos patrimoniais na proporção das suas participações em uma classe particular
do capital).
308 GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. 5.
ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 37.
309 HOOGENDOORN, Martin N. Accounting and Taxation in Europe – A Comparative
Overview. The European Accounting Review, v. 5, 1996. Supplement 783.
310 IUDÍCIBUS, Sérgio de. Teoria da Contabilidade. São Paulo: Atlas, 1980. p. 16.
311 É importante ressaltar que a informação assimétrica pode causar problemas significativos
ao funcionamento eficiente do mercado. Sobre o assunto: ARKELOF, George. The
Market for Lemons: Quality Uncertainty and the Market Mechanism. The Quartely
Journal of Economics, v. 84, 1970, p. 488-500.
312 Doutor em Direito Econômico pela Wirtschaftsuniversität Wien – WU, Viena, Áustria.
LLM pela Ludwig-Maximilians-Universität München – LMU, Munique, Alemanha.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Advogado em
São Paulo.
313 Mestrando e Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo – USP. Pós-graduado pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT.
Advogado em São Paulo.
314 Art. 1º, parágrafo único, da Lei n. 7.646/87.
315 Recurso Extraordinário n. 176.626-3/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 10-
11-1998, unânime.
316 Recurso Extraordinário n. 199.464-9, 1ª Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 2-3-1999,

1739
unânime.
317 Decisão sobre pedido de liminar na Medida Cautelar na Ação Direta de
Inconstitucionalidade n. 1.945/Mato Grosso, Rel. Min. Octavio Gallotti, Redator do
Acórdão Min. Gilmar Mendes. Plenário, j. 26-5-2010, DJe 14-3-2011.
318 Cf. BRITO, Edvaldo. “Software”: ICMS, ISS ou Imunidade Tributária?, Revista
Dialética de Direito Tributário, n. 5, São Paulo: Dialética, fev./1996, p. 21.
319 Negando a possibilidade de se atribuir mais de uma natureza jurídica ao software, o qual
não poderia ser confundido nem com mercadoria, por um lado, nem com serviço, por
outro, v. GONÇALVES, Renato Lacerda de Lima. A Tributação do Software no Brasil.
São Paulo: Quartier Latin, 2005.
320 Cf. Lei n. 10.168/2000, art. 2º, § 1º-A.
321 Recurso Extraordinário n. 925.038/PE, 2ª Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 28-6-2016,
unânime.
322 Recurso Extraordinário n. 626.706/SP, Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 24-9-2010,
unânime.
323 Cf. BARRETO, Aires F. ISS na Constituição e na Lei. 2. ed. rev., ampliada e atualizada.
São Paulo: Dialética, 2005, p. 63.
324 Cf. CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 42-43.
325 Cf. BRIGAGÃO, Gustavo. ICMS não incide sobre o download de softwares. Disponível
em <https://www.conjur.com.br/2016-fev-24/consultor-tributario-icms-nao-incide-
download-softwares>. Acesso em: 15 dez. 2017.
326 BARRETO, Aires F. ISS na Constituição e na Lei. 2. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo:
Dialética, 2005. p. 42.
327 Em sentido contrário, defendendo a impossibilidade de cobrança do ICMS sobre
software em geral, vide JARDIM NETO, José Gomes. Os Produtos Digitais Vendidos na
Internet e o ICMS. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (Org.). Internet: o Direito na Era
Virtual. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 286.
328 Levantando críticas semelhantes sobre a tributação, pelo ICMS, do download de
software, v. BRIGAGÃO, Gustavo. ICMS não incide sobre o download de softwares.
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2016-fev-24/consultor-tributario-icms-nao-
incide-download-softwares>. Acesso em: 15 dez. 2017.
329 Embora o Convênio traga a possibilidade aos Estados de imputar responsabilidade pelo
recolhimento do imposto às administradoras de cartão de crédito, certo é que, na prática,
isso terá uma praticabilidade bastante questionável (Cláusula quinta, II e IV).
330 Elaboração de programas de computadores, inclusive de jogos eletrônicos,
independentemente da arquitetura construtiva da máquina em que o programa será
executado, incluindo tablets, smartphones e congêneres.
331 Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação.
332 Cf. MOREIRA JUNIOR, Gilberto de Castro; ALMEIDA, Flora Ferreira de. Cloud
computing e a Tributação do Software as a Service (SaaS). In: SCHOUERI, Luís Eduardo;
BIANCO, João Francisco (Coords.); e CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes; e
DUARTE FILHO, Paulo César Teixeira (Orgs.). Estudos de Direito Tributário em

1740
Homenagem ao Professor Gerd Willi Rothmann. São Paulo: Quartier Latin, 2016. p. 590-
591.
333 V. Solução de Consulta SF/DEJUG n. 40/2013.
334 PLP n. 171/2012, que inclui na lista de serviços o item “Computação em nuvem”.
335 “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de
institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente,
pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do
Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”
336 E destacado o componente da licença, em si, que não deve ser tida por serviço.
337 Sobre o tema, v. CEZAROTI, Guilherme. Inaplicabilidade da Interpretação Restritiva
(CTN, Art. 111) na Análise dos Créditos de PIS e Cofins não Cumulativos: um Caso de
Interpretação Equivocada. RDDT n. 239. São Paulo: Dialética, Agosto de 2015, p. 75 e s.
338 LLM em Tributação Internacional pela Universidade de Leiden. Especialista em
Finanças e Negócios Internacionais pela New York University. Especialista em
Administração de Empresas pela EAESP-FGV. Professor Convidado da Pós-Graduação
da GVLaw, FIPECAFI e IBDT. Advogado em São Paulo.
339 Pós-graduado em Direito Econômico pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).
Advogado em São Paulo.
340 No original: “Norma internacional que os países-membros da OCDE concordaram que
deveria ser usada para a determinação de preços de transferência para fins tributários. Está
prevista no Artigo 9 do Modelo de Convenção Fiscal da OCDE: quando ‘forem
estabelecidas ou impostas condições entre duas empresas, em suas relações comerciais ou
financeiras, que diferirem daquelas que teriam sido estabelecidas entre
Empreendimentos/Empresas independentes, os lucros que, devido a essas condições, não
foram assim auferidos, poderão ser incluídos nos lucros dessa empresa e tributados de
acordo’”. Cf. OCDE, Diretrizes da OCDE sobre Preços de Transferência para Empresas
Multinacionais e Administrações Fiscais, Paris: International Tax Institute, 2011, p. 31
(Glossário).
341 Diretrizes da OCDE sobre Preços de Transferência para Empresas Multinacionais e
Administrações Fiscais – julho de 2017.
342 Cf. OCDE, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project, Executive Summaries
(2015 Final Reports). Disponível em: <https://www.oecd.org/ctp/beps-reports-2015-
executive-summaries.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017. p. 27.
343 Diretrizes da OCDE sobre Preços de Transferência para Empresas Multinacionais e
Administrações Fiscais, p. 43.
344 Diretrizes da OCDE sobre Preços de Transferência para Empresas Multinacionais e
Administrações Fiscais, p. 44 e 45.
345 Diretrizes da OCDE sobre Preços..., cit., p. 44 e 45.
346 O art. 18, § 9º, da Lei n. 9.430/96, estabelece: “O disposto neste artigo não se aplica aos
casos de royalties e assistência técnica, científica, administrativa ou assemelhada, os quais
permanecem subordinados às condições de dedutibilidade constantes da legislação
vigente”.

1741
347 Diretrizes da OCDE sobre Preços de Transferência para Empresas Multinacionais e
Administrações Fiscais, p. 248.
348 Idem, p. 249.
349 Diretrizes da OCDE sobre Preços..., cit., p. 255.
350 Idem, p. 265.
351 Idem, p. 265.
352 Idem, p. 275.
353 Diretrizes da OCDE sobre Preços..., cit., p. 275.
354 A empresa brasileira não está sendo considerada como controlada direta da empresa
americana, e a empresa americana também não é acionista da brasileira. Ou seja, elas são
vinculadas, mas não há participação societária direta entre as empresas.
355 Conforme previsto no art. 88 da Instrução Normativa RFB n. 1.700/2017.
356 Art. 18 da Lei n. 9.430/96.
357 Foi considerado 1% também com base na regra brasileira de limitação da dedutibilidade
de royalties.
358 Advogado e consultor na área de preços de transferência em São Paulo/SP. LLM em
Tributação Internacional pela Universidade de Leiden (Holanda). Professor convidado do
Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
359 GREGORIO, Ricardo Marozzi. Restrições da Comparabilidade, Margens
Predeterminadas e Liberdade de Escolha de Métodos. In: SCHOUERI, Luís Eduardo
(Coord.). Tributos e Preços de Transferência. São Paulo: Dialética, 2013. v. 4, p. 358.
360 PIC: definido como a média aritmética ponderada dos preços de bens, serviços ou
direitos, idênticos ou similares, apurados no mercado brasileiro ou de outros países, em
operações de compra e venda empreendidas pela própria interessada ou por terceiros, em
condições de pagamento semelhantes.
361 PCI: definido como os valores médios diários da cotação de bens ou direitos sujeitos a
preços públicos em bolsas de mercadorias e futuros internacionalmente reconhecidas.
362 PVEX: definido como a média aritmética dos preços de venda nas exportações efetuadas
pela própria empresa, para outros clientes, ou por outra exportadora nacional de bens,
serviços ou direitos, idênticos ou similares, durante o mesmo período de apuração da base
de cálculo do imposto de renda e em condições de pagamento semelhantes.
363 PECEX: definido como os valores médios diários da cotação de bens ou direitos sujeitos
a preços públicos em bolsas de mercadorias e futuros internacionalmente reconhecidas.
364 CPL: definido como o custo médio ponderado de produção de bens, serviços ou direitos,
idênticos ou similares, acrescido dos impostos e taxas cobrados na exportação no país
onde tiverem sido originariamente produzidos, e de margem de lucro de 20% (vinte por
cento), calculada sobre o custo apurado.
365 CAP: definido como a média aritmética dos custos de aquisição ou de produção dos
bens, serviços ou direitos, exportados, acrescidos dos impostos e contribuições cobrados
no Brasil e de margem de lucro de quinze por cento sobre a soma dos custos mais
impostos e contribuições.

1742
366 PRL: definido como a média aritmética ponderada dos preços de venda, no País, dos
bens, direitos ou serviços importados, em condições de pagamento semelhantes menos
margem de lucro, calculada segundo sistemática própria – o chamado cálculo
proporcional.
367 PVA: definido como a média aritmética dos preços de venda de bens, idênticos ou
similares, praticados no mercado atacadista do país de destino, em condições de
pagamento semelhantes, diminuídos dos tributos incluídos no preço, cobrados no referido
país, e de margem de lucro de quinze por cento sobre o preço de venda no atacado.
368 PVV: definido como a média aritmética dos preços de venda de bens, idênticos ou
similares, praticados no mercado varejista do país de destino, em condições de pagamento
semelhantes, diminuídos dos tributos incluídos no preço, cobrados no referido país, e de
margem de lucro de trinta por cento sobre o preço de venda no varejo.
369 Aprovado pelo Decreto n. 3.000/99.
370 “Art. 2º O INPI averbará os contratos de licença, de sublicença e de cessão de direitos de
propriedade industrial e registrará os contratos de transferência de tecnologia e de franquia
a seguir:
I – Licença de direito de propriedade industrial:
a) o contrato de licença e de sublicença para exploração de patente concedida ou de pedido de
patente, conforme disposto nos artigos 61 a 63 da Lei n. 9.279, de 1996;
b) o contrato de licença e de sublicença para exploração de registro de desenho industrial ou
de pedido de desenho industrial, conforme disposto no artigo 121 da Lei n. 9.279, de
1996; e,
c) o contrato de licença e de sublicença para uso de registro de marca ou de pedido de marca,
conforme disposto nos artigos 139 a 141 da Lei n. 9.279, de 1996.
II – Cessão de direito de propriedade industrial:
a) o contrato de cessão de patente concedida ou de pedido de patente, conforme disposto nos
artigos 58 a 60 da Lei n. 9.279, de 1996;
b) o contrato de cessão de registro de desenho industrial ou de pedido de desenho industrial,
conforme disposto no artigo 121 da Lei n. 9.279, de 1996; e,
c) o contrato de cessão de registro de marca ou de pedido de marca, conforme disposto nos
artigos 134 a 138 da Lei n. 9.279, de 1996.
III – Transferência de tecnologia:
a) o contrato de fornecimento de tecnologia (“know how”) que compreende a aquisição de
conhecimentos e de técnicas não amparados por direitos de propriedade industrial ou o
fornecimento de informações tecnológicas, destinados à produção de bens e serviços; e,
b) o contrato ou fatura de prestação de serviços de assistência técnica e científica que estipula
as condições de obtenção de técnicas, métodos de planejamento e programação, pesquisas,
estudos e projetos destinados à execução ou prestação de serviços especializados.
IV – o contrato de Franquia empresarial regido pela Lei n. 8.955, de 15 de dezembro de
1994.”
371 Não é objeto do presente trabalho a análise de aspectos regulatórios e outros aspectos
tributários decorrentes de operações envolvendo moedas virtuais.

1743
372 Disponível em:
<http://static.cpc.mediagroup.com.br/Documentos/187_CPC_04_R1_rev%2008.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
373 O Guia de Perguntas e Respostas da DIPJ, Seção de Operações Internacionais foi editado
na última vez no ano de 2013. Citação obtida em dezembro de 2017 no sítio da Receita
Federal: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/orientacao/tributaria/declaracoes-e-
demonstrativos/dipj-declaracao-de-informacoes-economico-fiscais-da-pj/respostas-
2013/capitulo_xix_irpj_e_csll_operacoesinternacionais_2013.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
374 O BEPS – Base Erosion and Profit Shifting da OCDE é um grupo de trabalho
internacional formado por autoridades fiscais de diversos países, com o objetivo de
combater planejamentos tributários lesivos à arrecadação dos países em matéria de
tributação da renda.
375 Advogado em São Paulo. Ex-Conselheiro Suplente da Segunda Seção do CARF. LLM
em International Tax pela NYU. Pós-graduado em Contabilidade Financeira pela UFRJ.
376 Advogada em São Paulo. Bacharel em Contabilidade pela PUC-SP.
377 Disponível em: <http://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles/software>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
378 Disponível em: <https://www.techopedia.com/definition/4356/software>. Acesso em: 15
dez. 2017.
379 A rigor, a decisão do STF fez referência a três grupos de softwares: “de prateleira”, por
encomenda e customizados, sendo esses últimos um híbrido entre os dois primeiros:
segundo o STF, seriam eles softwares baseados em programas standard que seriam
modificados para se adaptarem às necessidades de clientes específicos. Todavia, em nossa
opinião, essa terceira categoria não merece existência autônoma – ao menos para os fins
desse artigo. Com efeito, se as modificações ao programa standard são suficientemente
significativas, ele passaria à categoria de software por encomenda; e, se tais modificações
forem pouco materiais, o software continuaria a classificado como “de prateleira”.
380 Na tentativa de responder essa indagação, nos baseamos em atos normativos e
precedentes proferidos até outubro de 2017, quando este artigo foi finalizado.
381 Nesse sentido, o acórdão proferido pelo STF no julgamento do RE n. 176.626/SP, já
mencionado, e os acórdãos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do
Recurso Especial n. 633405/RS; Recurso Especial n. 1.070.404/SP; e Recurso Especial n.
216.967/SP.
382 RE n. 176.626/SP.
383 “Art. 57. Poderá ser computada como custo ou encargo, em cada exercício, a importância
correspondente à diminuição do valor dos bens do ativo resultante do desgaste pelo uso,
ação da natureza e obsolescência normal. § 1º A quota de depreciação dedutível na
apuração do imposto será determinada mediante a aplicação da taxa anual de depreciação
sobre o custo de aquisição do ativo.”
384 “97. O valor amortizável de ativo intangível com vida útil definida deve ser apropriado
de forma sistemática ao longo da sua vida útil estimada. A amortização deve ser iniciada a
partir do momento em que o ativo estiver disponível para uso, ou seja, quando se

1744
encontrar no local e nas condições necessários para que possa funcionar da maneira
pretendida pela administração. A amortização deve cessar na data em que o ativo é
classificado como mantido para venda ou incluído em um grupo de ativos classificado
como mantido para venda, de acordo com o Pronunciamento Técnico CPC 31 – Ativo Não
Circulante Mantido para Venda e Operação Descontinuada, ou, ainda, na data em que ele
é baixado, o que ocorrer primeiro. O método de amortização utilizado reflete o padrão de
consumo pela entidade dos benefícios econômicos futuros. Se não for possível determinar
esse padrão com confiabilidade, deve ser utilizado o método linear. A despesa de
amortização para cada período deve ser reconhecida no resultado, a não ser que outra
norma ou pronunciamento contábil permita ou exija a sua inclusão no valor contábil de
outro ativo.”
385 Doutor e Mestre em Direito Econômico e Financeiro pela USP. Especialista em Direito
Tributário (USP e IBET). Procurador da Fazenda Nacional.
386 STF. ADI n. 1.945-MC, Rel. Min. Octavio Gallotti, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar
Mendes, Tribunal Pleno, j. 26-5-2010, DJe 11-3-2011.
387 “Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...) II –
operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as
prestações se iniciem no exterior; (...)
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) III – serviços de qualquer
natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.”
388 “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de
institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente,
pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do
Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”
389 Como observa Pedro Guilherme Lunardelli, “o que define precisamente o termo
mercadoria, a partir do contido no art. 191 do Diploma Comercial, é estar seu objeto
submetido a um contrato de compra e venda de natureza mercantil, celebrado por pessoa
considerada comerciante”. LUNARDELLI, Pedro Guilherme Accorsi. Tributação na
Internet. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, v. 59, p. 84, ago. 2000.
390 FERNANDES, Adaucto. Direito Comercial brasileiro: parte terrestre. Rio de Janeiro: A.
Coelho Branco Fº, 1956. p. 327.
391 MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p.
473.
392 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Campinas:
Bookseller, 1999. t. 15, p. 449.
393 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 49.
394 STJ, Primeira Turma, Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n. 19010/GO. Rel.
Min. Luiz Fux, DJ 23-11-2006, p. 213. No mesmo sentido: AgRg no REsp 601140/MG,
Rel. Min. Denise Arruda, DJ 10-4-2006; AgRg no Ag 642229/MG, Rel. Min. Luiz Fux,
DJ 26-9-2005; e REsp 659569/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJ 9-5-2005.
395 UCKMAR, Victor. Diritto Tributario e Tecnologia. In: MARINS, James (Coord.).
Tributação e tecnologia. Curitiba: Juruá, 2003. p. 45.

1745
396 “Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer
meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente
no futuro, tais como: (...) XII – os programas de computador; (...).”
397 CARBONI, Guilherme C. Direito de autor na multimídia. São Paulo: Quartier Latin,
2003. p. 142.
398 “Art. 49. Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a terceiros,
por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de
representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou
por outros meios admitidos em Direito, obedecidas as seguintes limitações: I – a
transmissão total compreende todos os direitos de autor, salvo os de natureza moral e os
expressamente excluídos por lei; II – somente se admitirá transmissão total e definitiva
dos direitos mediante estipulação contratual escrita; III – na hipótese de não haver
estipulação contratual escrita, o prazo máximo será de cinco anos; IV – a cessão será
válida unicamente para o país em que se firmou o contrato, salvo estipulação em contrário;
V – a cessão só se operará para modalidades de utilização já existentes à data do contrato;
VI – não havendo especificações quanto à modalidade de utilização, o contrato será
interpretado restritivamente, entendendo-se como limitada apenas a uma que seja aquela
indispensável ao cumprimento da finalidade do contrato.”
399 Cf. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 4. ed. São Paulo:
Atlas, 2004. p. 325.
400 STJ, REsp 123.022/RS, Rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, j. 14-8-1997, DJ 27-
10-1997.
401 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 8. ed. São Paulo: Dialética,
2005. p. 19.
402 BIFANO, Elidie Palma. O negócio eletrônico e o sistema tributário brasileiro. São
Paulo: Quartier Latin, 2004. p. 227.
403 CEZAROTI, Guilherme. ICMS no comércio eletrônico. São Paulo: MP, 2005, p. 118.
404 STF, ADI 1.945-MC, Rel. Min. Octavio Gallotti, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes,
Tribunal Pleno, j. 26-5-2010, DJe 11-3-2011.
405 STF, RE 651703, Repercussão Geral, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 29-9-2016,
DJe 25-4-2017.
406 TJSP, Apelação 1020788-97.2016.8.26.0053, Rel. Silvia Meirelles, 6ª Câmara de Direito
Público, j. 31-7-2017.
407 STF, ADI n. 5.576. Petição inicial disponível a partir de: <http://www.stf.jus.br>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
408 Solução de Consulta Cosit n. 130/2016.
409 Advogado. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET).
LLM com honras pela Northwestern University School of Law e Certificate in Business
Administration pela Kellogg School of Management.
410 Advogado. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Especialista em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas.

1746
411 Art. 1º, da Lei n. 9.609/98: “Programa de computador é a expressão de um conjunto
organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de
qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da
informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica
digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados”.
412 Ainda está em tramitação o Projeto de Lei n. 5.344/2013 que dispõe sobre este tema.
413 Tradução livre do original em inglês. Cf. MELL, Peter; GRANCE, Timothy. The NIST
Definition of Cloud Computing. NITS Special Publication 800-145. U.S. Department of
Commerce. September 2011. Disponível em:
<http://faculty.winthrop.edu/domanm/csci411/Handouts/NIST.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
414 OCDE. Addressing the tax challenges of the digital economy, Action 1. Paris: OECD
Publishing, 2015, p. 60.
415 OCDE. Addressing the tax challenges of the digital economy, Action 1. Paris: OECD
Publishing, 2015, p. 11.
416 Income and Indirect Tax Consequences of Inbound Cloud Computing Transactions – Tax
Management International Forum, Volume 35, Number 4, December 2014.
417 Tão somente na década de 1980 é que os computadores passaram a ser comercializados
em escala. Antes eram de difícil acesso e, após o surgimento da internet, apenas utilizados
por organizações militares/governamentais. Desta maneira, é natural que conceitos
tributários para a internet não fossem tratados na CF ou no CTN, pois a internet ainda
estava em implementação pelo mundo, e os referidos textos legais em pleno surgimento no
Brasil. Todavia, o grande problema atual não é a criação de instrumentos legais para tratar
destes novos elementos advindos com a internet, mas sim, a ausência de atualização destes
fatos/conceitos pela legislação brasileira. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u34809.shtml>. Acesso em: 15 dez.
2017.
418 Como ocorre também, exemplificativamente, para o mercado financeiro, no qual a
legislação não acompanha as novas modalidades de investimentos criados.
419 Art. 109, do CTN: “Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da
definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para
definição dos respectivos efeitos tributários”.
420 O STF, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 540.829/SP, Min. Rel. para acórdão
Luiz Fux, Pleno, STF, DJ 11-9-2014, adotou as definições de “operação”, “circulação” e
“mercadoria” como elementos definidores da hipótese de incidência do ICMS, no caso em
que tratou de importações realizadas mediante arrendamento mercantil (leasing).
421 STF, Recurso Extraordinário n. 116.121-3/SP, Min. Rel. Marco Aurélio, Pleno, DJ 11-
10-2000.
422 Art. 9º, da Lei n. 9.609/98: “O uso de programa de computador no País será objeto de
contrato de licença”.
423 A título de curiosidade, o Windows foi introduzido em larga escala na mesma época em
que teve início a vigência da CF, demonstrando a inexistência de conceitos, à época, para
incluir hipoteticamente a incidência de ICMS e ISS para estas novas tecnologia em

1747
surgimento, tal como acontece hoje para o cloud computing. Disponível em:
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Microsoft_Windows>. Acesso em: 15 dez. 2017.
424 Disponível em: <http://blog.innotechno.com.br/data-center-proprio-ou-servico-de-cloud-
computing-saiba-escolher/>. Acesso em: 15 dez. 2017.
425 Anteriormente, a Consulta DISIT n. 3.001/2016 previa que as remessas para pagamento
ao exterior, em modalidade parecida, estariam sujeitas ao IRRF e à CIDE. Entretanto, para
este caso houve enquadramento no serviço do item 1.05, da lista anexa à LC n. 116/2003,
que trata de licenciamento de programa de computador, diversamente da prestação de
serviço almejada na Solução de Consulta n. 191/2017.
426 “Art. 17. As importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas a
pessoa jurídica domiciliada no exterior a título de royalties de qualquer natureza e de
remuneração de serviços técnicos e de assistência técnica, administrativa e semelhantes
sujeitam-se à incidência do imposto sobre a renda na fonte à alíquota de 15% (quinze por
cento).
§ 1º Para fins do disposto no caput: (...)
II – considera-se:
a) serviço técnico a execução de serviço que dependa de conhecimentos técnicos
especializados ou que envolva assistência administrativa ou prestação de consultoria,
realizado por profissionais independentes ou com vínculo empregatício ou, ainda,
decorrente de estruturas automatizadas com claro conteúdo tecnológico; e (...).”
427 Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/anexoOutros.action?
idArquivo Binario=45847>. Acesso em: 15 dez. 2017.
428 Soluções de Consulta COSIT n. 316/2017 e n. 342/2017.
429 Assumindo que não é transferida tecnologia, como é padrão nesse tipo de contratação.

1748
1 Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Vice-Presidente
do Instituto Brasileiro de Direito Tributário.
2 Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Pós-
Graduando em Direito Tributário Internacional pelo Instituto Brasileiro de Direito
Tributário. Advogado em São Paulo.
3 Cf. PEYTON, Antigone. A Litigator’s Guide to the Internet of Things. Richmond Journal
of Law & Technology, v. 22, n. 9, 2016, p. 8.
4 Cf. CHENG, Jacqui. Withings WiFi body scale review: weight data and cool graphs. Ars
Technica, 28 January 2011. Disponível em:
<https://arstechnica.com/gadgets/2011/01/withings-wifi-body-scale-review-weight-data-
and-pretty-graphs>. Acesso em: 15 dez. 2017.
5 Cf. PEYTON, Antigone. A Litigator’s Guide to the Internet of Things. Richmond Journal
of Law & Technology, v. 22, n. 9, 2016, p. 15.
6 Cf. JONES, Mega Leta. Privacy without Screens & the Internet of Other People’s Things.
Idaho Law Review, v. 51, 2014-2015, p. 640.
7 Cf. KOMINERS, Paul. Interoperability Case Study: Internet of Things (IoT). Berkman
Center Research Publication, n. 2012-10, abril de 2012, p. 4.
8 Cf. PEYTON, Antigone. A Litigator’s Guide to the Internet of Things. Richmond Journal
of Law & Technology, v. 22, n. 9, 2016, p. 2.
9 Cf. PEYTON, Antigone. A Litigator’s Guide to the Internet of Things. Richmond Journal
of Law & Technology, v. 22, n. 9, 2016, p. 1; ASHTON, Kevin. That ‘Internet of Things’
Thing. RFiD Journal, 22 de junho de 2009. Disponível em:
<http://www.rfidjournal.com/articles/view?4986>. Acesso em: 15 dez. 2017. Sobre a
dificuldade de se definir Internet das Coisas, cf. KOMINERS, Paul. Interoperability Case
Study: Internet of Things (IoT). Berkman Center Research Publication, n. 2012-10, abril
de 2012, p. 7.
10 Cf. ASHTON, Kevin. That ‘Internet of Things’ Thing. RFiD Journal, 22 de junho de
2009. Disponível em: <http://www.rfidjournal.com/articles/view?4986>. Acesso em: 15
dez. 2017.
11 Cf. JONES, Mega Leta. Privacy without Screens & the Internet of Other People’s Things.
Idaho Law Review, v. 51, 2014-2015, p. 642.
12 Cf. BAILEY, Melissa W. Seduction by Techonology: Why Consumers Opt Out of Privacy
by Buying into the Internet of Things. Texas Law Review, v. 94, 2015-2016, p. 1025.
13 Cf. PEYTON, Antigone. A Litigator’s Guide to the Internet of Things. Richmond Journal
of Law & Technology, v. 22, n. 9, 2016, p. 3.
14 Cf. KOMINERS, Paul. Interoperability Case Study: Internet of Things (IoT). Berkman
Center Research Publication, n. 2012-10, abril de 2012, p. 3.
15 Cf. PEYTON, Antigone. A Litigator’s Guide to the Internet of Things. Richmond Journal
of Law & Technology, v. 22, n. 9, 2016, pp. 3-4.
16 Cf. KOMINERS, Paul. Interoperability Case Study: Internet of Things (IoT). Berkman
Center Research Publication, n. 2012-10, abril de 2012, p. 4.
17 Cf. JONES, Mega Leta. Privacy without Screens & the Internet of Other People’s Things.

1749
Idaho Law Review, v. 51, 2014-2015, p. 641.
18 Cf. PEYTON, Antigone. A Litigator’s Guide to the Internet of Things. Richmond Journal
of Law & Technology, v. 22, n. 9, 2016, p. 5.
19 Cf. HARTZOG, Woodrow; e SELINGER, Evan. The Internet of Heirlooms and
Disposable Things. North Carolina Journal of Law & Technology, v. 17, n. 4, maio de
2016, p. 583.
20 Cf., e.g., FEN, Hannah Lim Yee. The Data Protection Paradigm for the Tort of Privacy in
the Age of Big Data. Singapore Academy of Law Journal, v. 27, 2015, p. 789-821; e
BAILEY, Melissa W. Seduction by Techonology: Why Consumers Opt Out of Privacy by
Buying into the Internet of Things. Texas Law Review, v. 94, 2015-2016, p. 1023-1054.
21 Cf., e.g., ROBINSON, W. Keith. Patent Law Challenges for the Internet of Things. Wake
Forest Journal of Business and Intellectual Property Law, v. 15, n. 4, 2015, p. 655-670.
22 Cf., e.g., SOARES DE MELO, José Eduardo. ICMS: Teoria e Prática. 13. ed. rev. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2017. p. 13 e s.; e CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS.
15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 38 e s.
23 Cf. COSTA, Alcides Jorge. ICMS na Constituição, Revista de Direito Tributário, n. 46,
São Paulo, Revista dos Tribunais, 1988, p. 163.
24 No mesmo sentido, cf. SOARES DE MELO, José Eduardo. ICMS: Teoria e Prática. 13.
ed. rev. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. p. 16 e s.
25 Sobre o tema, cf. JARDIM NETO, José Gomes. “Os produtos digitais vendidos na
Internet e o ICMS”. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (Coord.). Internet: o direito na era
virtual. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 279 e s.
26 Nessa linha, cf. SOARES DE MELO, José Eduardo. ICMS: Teoria e Prática. 13. ed. rev.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. p. 16 e s.; COSTA, Alcides Jorge. ICM na
Constituição e na Lei Complementar. São Paulo: Resenha Tributária, 1978. p. 99; e
CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 44 e s.
27 Cf. STF, RE 176.626-3-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 10-11-1998, DJ
11-12-1998; STF, RE 199.464-9-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 2-3-1999, DJ
30-4-1999; e STF, AgRg no RE 285.870-6-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Eros Grau, j. 17-6-
2008, DJ 1º-8-2008.
28 Cf. STF, ADI-MC 1.945-MT, Plenário, j. 26-5-2010, DJ 14-3-2011.
29 Com a opinião de que em nenhuma hipótese pudesse incidir ICMS sobre softwares, cf.
JARDIM NETO, José Gomes. “Os produtos digitais vendidos na Internet e o ICMS”. In:
SCHOUERI, Luís Eduardo (Coord.). Internet: o direito na era virtual. Rio de Janeiro:
Forense, 2001, p. 287.
30 Cf. STF, RE 179.560-3-MT, 1ª Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 30-3-1999, DJ 28-5-
1999; e STF, RE 191.732-6-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 4-5-1999, DJ
18-6-1999.
31 STF, RE 179.560-3-MT, 1ª Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 30-3-1999, DJ 28-5-1999,
p. 739.
32 STF, RE 176.626-3-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 10-11-1998, DJ 11-
12-1998.

1750
33 Cf. ASHTON, Kevin. That “Internet of Things” Thing. RFiD Journal, 22 de junho de
2009. Disponível em: <http://www.rfidjournal.com/articles/view?4986>. Acesso em: 15
dez. 2017.
34 Cf. CORAZZA, Edison Aurélio. ICMS Sobre Prestações de Serviço de Comunicação. In
MARTINS, Eliseu; COSTA, Alcides Jorge et al. Teses Tributárias. São Paulo: Quartier
Latin, 2010. p. 118; SANTOS FILHO, Walter Gazzano dos. Tributação dos Serviços de
Comunicação. Curitiba: Cenofisco, 2004. p. 41; COSTA, Alcides Jorge. Algumas
Considerações a Respeito do Imposto sobre Prestação de Serviços de Comunicação. In
BORGES, Eduardo de Carvalho (Coord.). Tributação nas Telecomunicações. São Paulo:
Quartier Latin, 2005. p. 18; e CEZAROTI, Guilherme. A Não incidência dos ICMS sobre
o Serviço de Tv por Assinatura. In BORGES, Eduardo de Carvalho (Coord.). Tributação
nas Telecomunicações. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 223.
35 Sobre esse tema, cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. ISS sobre a Importação de Serviços do
Exterior. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 100. São Paulo: Dialética, 2004, p.
39-51; e explicando para o ISS, mas também extensível ao ICMS, cf. BAPTISTA,
Marcelo Caron. ISS: do texto à norma, São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 259.
36 Cf., e.g., art. 46 do Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo publicado pelo Decreto
n. 45.490, de 30 de novembro de 2000; e art. 17, § 1º, do Regulamento do ISS do
Município de São Paulo publicado pelo Decreto n. 53.151, de 17 de maio de 2012.
37 Cf. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, Pronunciamento Técnico CPC 45: Receita de
Contrato com Cliente, aprovado em 4 de novembro de 2016 e divulgado em 22 de
dezembro de 2016, itens 73 e s.
38 Cf. art. 14, II, da Emenda Constitucional n. 18, de 1º de dezembro de 1965; art. 22, VII, da
Constituição Federal de 1967; e art. 21, VII, da Emenda Constitucional n. 1, de 17 de
outubro de 1969. Sobre o tema, cf. COSTA, Alcides Jorge. ICMS – Comunicação –
Parecer. Revista Direito Tributário Atual, v. 16. São Paulo: Dialética, 2001, p. 6.
39 Cf. COSTA, Alcides Jorge. ICMS – Comunicação – Parecer. Revista Direito Tributário
Atual, v. 16. São Paulo: Dialética, p. 7.
40 Cf. COSTA, Alcides Jorge. “Algumas Considerações a Respeito do Imposto sobre
Prestação de Serviços de Comunicação”. In BORGES, Eduardo de Carvalho (Coord.).
Tributação nas Telecomunicações. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 19.
41 Cf. BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu
Machado Derzi. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 479. Exigindo prestação
onerosa, cf. STF, Recurso de Mandado de Segurança 18.856-SP, 2ª Turma, Rel. Min.
Aliomar Baleeiro, j. 5-11-1968, DJ 11-12-1968.
42 Em sentido parecido, cf. COSTA, Alcides Jorge. ICMS na Constituição. Revista de
Direito Tributário, n. 46. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 170.
43 Com a opinião correta de que o Convênio n. 66/88 era inconstitucional em razão de prever
a incidência sobre o serviço de comunicação e não sobre a prestação do serviço de
comunicação, cf. COSTA, Alcides Jorge. ICMS – Comunicação – Parecer. Revista Direito
Tributário Atual, v. 16. São Paulo: Dialética, 2001, p. 8-9.
44 Com o entendimento de que o Convênio 66/88 apenas poderia suprir lacunas, cf. STF, RE
149.922-2-SP, Plenário, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 23-2-1994, DJ 29-4-1994. Também

1751
sobre esse ponto, cf. LIMBORÇO, Lauro. O ICMS no convênio 66/88. Revista de Direito
Tributário, n. 46, ano 12. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 104.
45 Cf., e.g., ÁVILA, Humberto. Imposto sobre a prestação de serviços de comunicação.
Conceito de prestação de serviço de comunicação. Intributabilidade das atividades de
veiculação de publicidade em painéis e placas. Inexigibilidade de multa. Revista Dialética
de Direito Tributário, n. 143, São Paulo: Dialética, 2007, p. 126; e CARRAZZA, Roque
Antonio. ICMS. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 218.
46 Cf. Lei Complementar n. 87/96, art. 2º, III. Com a opinião de que o inadimplemento
absoluto do consumidor implica a não onerosidade da prestação de serviço de
comunicação e, portanto, não se pode cogitar a incidência do ICMS-C, cf. ÁVILA,
Humberto. ICMS como imposto sobre o consumo: inocorrência de prestação onerosa de
serviço de comunicação no caso de inadimplemento do consumidor. Revista Dialética de
Direito Tributário, n. 186. São Paulo: Dialética, 2011, p. 110-125.
47 Cf. MOREIRA, André Mendes. A Tributação dos Serviços de Comunicação. 2. ed. São
Paulo: Noeses, 2016, p. 78 e s.; CARVALHO, Paulo de Barros. Não incidência do ICMS
na Atividade dos Provedores de Acesso à Internet. In TORRES, Heleno Taveira (Coord.).
Direito Tributário das Telecomunicações. São Paulo: IOB Thomson: ABETEL, 2004, p.
491-492; CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p.
212; MELO, José Eduardo Soares de. Imposto sobre Serviço de Comunicação. 2. ed. São
Paulo: Malheiros, 2003, p. 68; ANGEIROS, Luciana. Tributação dos Provedores de
Acesso à Internet. In SCHOUERI, Luís Eduardo (Org.). Internet: O Direito na Era
Virtual. São Paulo: Lacaz Martins, Halembeck, Pereira Neto, Gurevich & Schoueri
Advogados, 2000, p. 236; COSTA, Alcides Jorge. ICMS – Comunicação – Parecer.
Revista Direito Tributário Atual, v. 16. São Paulo: Dialética, 2001, p. 5-10; CEZAROTI,
Guilherme. A Não incidência dos ICMS sobre o Serviço de TV por Assinatura. In
BORGES, Eduardo de Carvalho (Coord.). Tributação nas Telecomunicações. São Paulo:
Quartier Latin, 2005. p. 226-227; WALD, Arnoldo; e NISHIOKA, Alexandre Naoki. Da
Definição de Serviços de Comunicação para Efeitos de Incidência do ICMS: o Caso da
Habilitação de Telefone Móvel Celular. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 102.
São Paulo: Dialética, 2004, p. 29.
48 Cf. GRECO, Marco Aurelio; ZONARI, Anna Paola. ICMS – Materialidade e Princípios
Constitucionais. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de Direito
Tributário. 2. ed. São Paulo: Edições Cejup, 1993, p. 155; e MENDRONI, Fernando
Batlouni. A Prestação de Serviço de Comunicação como Hipótese de Incidência do ICMS.
Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 38. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001,
p. 59-78.
49 Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Não incidência do ICMS na Atividade dos Provedores
de Acesso à Internet. In TORRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário das
Telecomunicações. São Paulo: IOB Thomson: ABETEL, 2004. p. 492; CARRAZZA,
Roque Antonio. ICMS. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 212-228; MELO, José
Eduardo Soares de. Imposto sobre Serviço de Comunicação. 2. ed. São Paulo: Malheiros,
2003. p. 68; e MOREIRA, André Mendes. A Tributação dos Serviços de Comunicação. 2.
ed. São Paulo: Noeses, 2016. p. 91.
50 Em relação às taxas de adesão à televisão a cabo, cf. STJ, REsp 418.594-PR, 1ª Turma,
Rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 17-2-2015, DJ 21-3-2005. No tocante à habilitação de

1752
aparelhos celulares, cf. STF, RE 572.020-DF, Plenário, Rel. Min. Marco Aurélio, Red.
Min. Luiz Fux, j. 6-2-2014, DJ 10-10-2014; STJ, RMS 11.368-MT, 1ª Seção, Rel. Min.
Francisco Falcão, j. 13-12-2004, DJ 9-2-2005; STJ, REsp 617.107-SP, 2ª Turma, Rel.
Min. Eliana Calmon, j. 2-8-2005, DJ 29-8-2005; STJ, REsp 694.429-SP, 2ª Turma, Rel.
Min. Castro Meira, j. 15-8-2006, DJ 25-8-2006; e STJ, REsp 1.022.257-RS, 2ª Turma,
Rel. Min. Castro Meira, j. 4-3-2008, DJ 17-3-2008. No que diz respeito ao serviço de
instalação de linha telefônica, cf. STJ, REsp 601.056-BA, 1ª Turma, Rel. Min. Denise
Arruda, j. 9-3-2006, DJ 3-4-2006. Tratando de maneira ampla acerca das atividades
preparatórias e da manutenção, cf. STJ, REsp 402.047-MG, 1ª Turma, Rel. Min.
Humberto Gomes de Barros, j. 4-11-2003, DJ 9-12-2003; e STJ, REsp 760.230-MG, 1ª
Seção, Rel. Min. Luiz Fux, j. 27-5-2009, DJ 1º-7-2009.
51 Cf. ÁVILA, Humberto. Imposto sobre a prestação de serviços de comunicação. Conceito
de prestação de serviço de comunicação. Intributabilidade das atividades de veiculação de
publicidade em painéis e placas. Inexigibilidade de multa. Revista Dialética de Direito
Tributário, n. 143, São Paulo: Dialética, 2007, p. 123; LOPES XAVIER, Helena de
Araújo. O Conceito de Comunicação e Telecomunicação na Hipótese de Incidência do
ICMS. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 72. São Paulo: Dialética, 2001, p. 77;
CORAZZA, Edison Aurélio. ICMS Sobre Prestações de Serviço de Comunicação. In
MARTINS, Eliseu; COSTA, Alcides Jorge et al. Teses Tributárias. São Paulo: Quartier
Latin, 2010. p. 131; GRECO, Marco Aurelio; ZONARI, Anna Paola. ICMS –
Materialidade e Princípios Constitucionais. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.).
Curso de Direito Tributário. 2. ed. São Paulo: Edições Cejup, 1993. p. 155; e SANTOS
FILHO, Walter Gazzano dos. Tributação dos Serviços de Comunicação. Curitiba:
Cenofisco, 2004. p. 53 e s.
52 MOREIRA, André Mendes. A Tributação dos Serviços de Comunicação. 2. ed. São Paulo:
Noeses, 2016. p. 109-110.
53 Cf. ÁVILA, Humberto. Imposto sobre a prestação de serviços de comunicação. Conceito
de prestação de serviço de comunicação. Intributabilidade das atividades de veiculação de
publicidade em painéis e placas. Inexigibilidade de multa. Revista Dialética de Direito
Tributário, n. 143, São Paulo: Dialética, 2007, p. 117.
54 Cf. CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 213 e
216-217; GRECO, Marco Aurelio; ZONARI, Anna Paola. ICMS – Materialidade e
Princípios Constitucionais. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de
Direito Tributário. 2. ed. São Paulo: Edições Cejup, 1993. p. 155; GRECO, Marco
Aurelio; ZONARI, Anna Paola. ICMS – Materialidade e Princípios Constitucionais. In
MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de Direito Tributário. 2. ed. São Paulo:
Edições Cejup, 1993. p. 155-156; SANTOS FILHO, Walter Gazzano dos. Tributação dos
Serviços de Comunicação. Curitiba: Cenofisco, 2004. p. 53 e s.; SOARES DE MELO,
José Eduardo. ICMS: Teoria e Prática. 13. ed. rev. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2017. p. 118-119.
55 STF, ADI 1.089-1-DF, Plenário, Rel. Min. Francisco Rezek, j. 29-5-1996, DJ 27-6-1997,
p. 241-242.
56 Cf. WALD, Arnoldo; e NISHIOKA, Alexandre Naoki. Da Definição de Serviços de
Comunicação para Efeitos de Incidência do ICMS: o Caso da Habilitação de Telefone
Móvel Celular. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 102, São Paulo: Dialética, 2004,

1753
p. 24.
57 Cf., e.g., CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 213.
Para críticas acerca dessa correlação, cf. MOREIRA, André Mendes. A Tributação dos
Serviços de Comunicação. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2016. p. 190.
58 MOREIRA, André Mendes. A Tributação dos Serviços de Comunicação. 2. ed. São Paulo:
Noeses, 2016. p. 106-107.
59 Cf. CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 214 e s.;
e ÁVILA, Humberto. Imposto sobre a prestação de serviços de comunicação. Conceito de
prestação de serviço de comunicação. Intributabilidade das atividades de veiculação de
publicidade em painéis e placas. Inexigibilidade de multa. Revista Dialética de Direito
Tributário, n. 143, São Paulo: Dialética, 2007, p. 124.
60 Cf., e.g., STF, ADI 1.467-6-DF, Plenário, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 20-11-1996, DJ
14-3-1997.
61 Sobre o tema, cf. MOREIRA, André Mendes. A Tributação dos Serviços de
Comunicação. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2016. p. 124.
62 MOREIRA, André Mendes. A Tributação dos Serviços de Comunicação. 2. ed. São Paulo:
Noeses, 2016. p. 192. No mesmo sentido, cf. ALMEIDA, Fábio Andrade. Repensando a
Tributação Sobre os Serviços de Valor Adicionado. In RABELO FILHO, Antonio
Reinaldo; ALVES, Gustavo Baptista; SILVA FILHO, Paulo Cesar da; MENDONÇA,
Victor Furtado de (Coords.). Tributação & Telecomunicações. São Paulo: Quartier Latin,
2016. p. 187.
63 Para uma discussão sobre os exemplos descritos, cf. MOREIRA, André Mendes. A
Tributação dos Serviços de Comunicação. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2016. p. 200 e s.
Sobre a incidência de ISS-SVA sobre serviço de provimento de acesso à Internet, cf.
Súmula 334 do STJ; CARVALHO, Paulo de Barros. Não incidência do ICMS na
Atividade dos Provedores de Acesso à Internet. In TORRES, Heleno Taveira (Coord.).
Direito Tributário das Telecomunicações. São Paulo: IOB Thomson: ABETEL, 2004. p.
493 e s.
64 MOREIRA, André Mendes. A Tributação dos Serviços de Comunicação. 2. ed. São Paulo:
Noeses, 2016. p. 193.
65 CORAZZA, Edison Aurélio. ICMS Sobre Prestações de Serviço de Comunicação. In
MARTINS, Eliseu; COSTA, Alcides Jorge et al. Teses Tributárias. São Paulo: Quartier
Latin, 2010. p. 127-128.
66 Doutor e Livre Docente em Direito. Ex-Professor Titular da PUC-SP. Visiting Scholar da
U.C.Berkeley (Califórnia). Orientador da Bucerius Law School (Hamburgo). Professor
Emérito da Faculdade de Direito de Tributação. Advogado em São Paulo.
67 FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. 2. ed. São Paulo:
Atlas, 1994. p. 174.
68 CARVALHO, Paulo de Barros, Direito tributário: linguagem e método. 2. ed. São Paulo:
Noeses, 2008. p. 405.
69 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27. ed. 9. tir. São Paulo: Saraiva, 2010. p.
112.
70 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado, t. XLVII. Rio de Janeiro: Borsoi,

1754
1958. p. 3 e 4.
71 BARRETO, Aires. ISS na Constituição e na Lei. 1. ed. São Paulo: Dialética, 2003. p. 35.
72 SEGUNDO, Hugo de Brito Machado; MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos. O ISS e os
serviços de informática no âmbito da Lei Complementar n. 116/2003. In ROCHA, Valdir
de Oliveira (Coord.). O ISS e a LC 116. São Paulo: Dialética, 2003. p. 149.
73 GONÇALVES, Renato Lacerda Lima. ISS sobre licenciamento ou cessão de direito de
uso de programas de computação. In BRUNELLI, Rodrigo Machado (Coord.). ISS na Lei
Complementar n. 116/2003. São Paulo: Quartier Latin e IPT, 2004. p. 146-147.
74 REsp n. 1.559.264-RJ, 2ª Seção, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 8-2-2017, Dje
15-2-2017.
75 GOLDSCHMIDT, Fábio. A Lei Complementar n. 116 e a Tributação pelo ISSQN da
Cessão do uso de Marca. In ISS na Lei Complementar n. 116/2003. São Paulo: Quartier
Latin/IPT, 2004. p. 102.
76 SCHARKACK, José Rubens. ISS e Cessão de Direitos. In PEIXOTO, Marcelo Magalhães
e MARTINS, Ives Gandra da Silva (Orgs.). ISS – LC 116/2003. Curitiba/São Paulo: Juruá
e APET, 2004. p. 314.
77 SALOMÃO, Marcelo Viana. O ISS e a Locação, a Cessão de Direito de uso e
Congêneres. In PEIXOTO, Marcelo Magalhães e MARTINS, Ives Gandra da Silva. ISS –
LC 116/2003. Curitiba/São Paulo: Juruá e APET. 2004. p. 460.
78 MELO, José Eduardo Soares de. Contratos e Tributação – noções fundamentais. São
Paulo: Malheiros, 2015. p. 108.
79 LUMMERTZ, Henry Gonçalves, Lei Contraria Perfil Constitucional do ISS ao Tributar
Áudio e Vídeo na Internet, Revista Consultor Jurídico (Conjur), de 14-1-2017. Disponível
em: <www.conjur.com.br>. Acesso em: 15 dez. 2017.
80 Idem.
81 CARVALHO, Paulo de Barros. Não incidência do ICMS nas Atividades dos Provedores
de Acesso à Internet, Revista Dialética de Direito Tributário n. 73, p. 4.
82 SOBRINHO, José Wilson Ferreira. Perfil Tributário do Provedor da Internet. 6º Simpósio
Nacional IOB de Direito Tributário. São Paulo: IOB, 20 e 21-11-97, p. 21.
83 OLIVEIRA, Júlio Maria de. Internet e Competência. São Paulo: Dialética, 2001. p. 160.
84 Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 456.650-PR, Rel. p/acórdão Min.
Franciulli Neto, 1ª S., j. 11-5-2006, DJU 1 de 20-3-2006.
85 COSTA, Regina Helena. Imunidades Tributárias – Teoria e Análise da Jurisprudência do
STF. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 361.
86 MORAES, Bernardo Ribeiro de. A imunidade tributária e seus novos aspectos.
Imunidades tributárias. Pesquisas Tributárias, Nova Série 4, coedição da Ed. RT e do
Centro de Extensão Universitária, São Paulo, 1998, p. 115-118.
87 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Imunidade constitucional de publicações –
Interpretação teleológica da Norma Maior – Análise jurisprudencial. Revista de Direito
Tributário 41/225.
88 Consultor Tributário Chefe na Secretaria da Fazenda de São Paulo e Juiz na 4ª Câmara do
Tribunal de Impostos e Taxas – TIT/SP. Doutor e Mestre em Direito Econômico,

1755
Financeiro e Tributário pela USP. Mestre em Controladoria/Ciências Contábeis pela
Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Direito Tributário pelo IBET e
pela USP. Bacharel em Administração de Empresas pela FGV-SP e em Direito pela USP.
89 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 194 e 205.
90 BARRETO, Aires F. ICMS e ISS: serviços de comunicação e de “valor adicionado”. In
Revista de Direito Tributário, n. 81, São Paulo, Malheiros, 2001, p. 193.
91 MIGUEL, Luciano Garcia. Hipótese de Incidência do ICMS e a evolução dos conceitos
tradicionais de mercadoria e serviço de comunicação. 2015. Tese (Doutorado em Direito
Tributário) – Pontifícia Universidade Católica – PUC/SP, São Paulo, 2015, p. 132-134.
92 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Atualizado por Misabel Abreu
Machado Derzi. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 479.
93 MIGUEL, Luciano Garcia. Hipótese de Incidência do ICMS e a evolução dos conceitos
tradicionais de mercadoria e serviço de comunicação. 2015. Tese (Doutorado em Direito
Tributário) – Pontifícia Universidade Católica – PUC/SP, São Paulo, 2015, p. 128-129.
94 GRECO, Marco Aurélio. Internet e Direito. 1. ed. São Paulo: Dialética, 2000. p. 124.
95 COSTA, Alcides Jorge. ICMS: comunicação: parecer. In Direito Tributário Atual n. 1.
São Paulo: Dialética – Instituto Brasileiro de Direito Tributário, 2001. p. 6-7.
96 Resposta à Consulta n. 389/2004.
97 Como é o caso de voto-vista do Dr. Douglas Kakazu Kushiyama no julgamento do AIIM
3.161.750-5, julgado na 4ª Câmara do TIT-SP (2 votos × 1 voto), cujo tema será
reapreciado pela Câmara Superior do TIT-SP: “No caso em tela, não há que se falar em
incidência do ICMS-Comunicação, tendo em vista que esta só ocorre quando houver
prestação onerosa e com todos os elementos necessários para a ocorrência da
comunicação, ou seja, emissor, receptor e uma mensagem. Há que se ressaltar que o
receptor deve ser determinado ou determinável para que haja a incidência do ICMS. (...)
Não havendo a possiblidade de se determinar os destinatários, não há que se falar em
comunicação e por consequência, ICMS-comunicação” (Processo DRTC-III-1091754 /
Ano 2011 / AIIM 3.161.750-5 / 4ª Câmara Julgadora do Tribunal de Impostos e Taxas de
São Paulo).
98 Como é o caso de nosso voto como relator (onde expusemos nosso posicionamento) no
julgamento do AIIM 3.161.750-5, julgado na 4ª Câmara do TIT-SP (2 votos × 1 voto),
cujo tema será reapreciado pela Câmara Superior do TIT-SP:
“14.1 – Evidentemente que conforme narra a Recorrente, o ‘GOOGLE ADWORDS’ permite
a inserção dos links patrocinados nos resultados das buscas efetuadas pelos usuários. Mas
não podemos concordar com afirmação da Recorrente que esta solução não tem nenhuma
diferença com uma busca normal na Internet, exceto pelo fato do link patrocinado aparecer
em outro local para o usuário. É evidente que a onerosidade do contrato se justifica
justamente pela posição privilegiada (ao lado e acima das demais pesquisas feitas pelo
usuário da internet) com que os links patrocinados do contratante irão aparecer nas buscas
ao usuário final. Deste modo, nos é patente que o ‘GOOGLE ADWORDS’ não consiste
apenas em um sistema de gerenciamento de dados e manutenção de página eletrônica, mas
principalmente, é um sistema que garante que os links patrocinados pelos contratantes irão
ser comunicados onerosamente aos usuários e destinatários finais (ainda que

1756
indeterminados). Ou seja, os usuários que tiverem interesse em realizar busca pela Internet
por meio de palavras-chave predefinidas pelo contratante, receberão os anúncios
patrocinados na tela de busca do ‘Google’; (...)
16.2 – Assim, evidente que são preenchidos os requisitos para configuração do serviço de
comunicação: i) a natureza da prestação do serviço é onerosa (os clientes pagam para ter
seus links divulgados a destinatários indeterminados numa determinada área geográfica),
ii) há o uso de um canal de comunicação entre remetente e destinatário da mensagem, que
é a própria rede da internet e o site da própria Google, que permite que lá sejam
divulgados os links em posições privilegiadas; iii) e por fim há a transmissão de uma
mensagem, normalmente por sinais e signos direcionando os destinatários ao endereço
eletrônico dos ofertantes (clientes da Recorrente). Por fim, não se trata de uma relação
comunicacional apenas entre a Recorrente e o usuário-final por recepção livre e gratuita,
pois a Recorrente tem a obrigação jurídica de divulgar os links e conteúdos de seus
clientes a estes usuários finais não determinados, mas que estão delimitados em
determinadas área geográfica. (...)” (Processo DRTC-III-1091754 / Ano 2011 / AIIM
3.161.750-5 / 4ª Câmara Julgadora do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo).
99 Respostas às Consultas n. 226/2000; 389/2004; 186/2005; 630/2006; 51/2010: íntegras
disponíveis na opção de “busca” disponibilizada no site da Secretaria de Fazenda
(https://portal.fazenda.sp.gov.br) clicando na opção “Legislação tributária” (links:
“Legislação e Agenda Tributária”/”Tributária”/”Pesquisa”) e em seguida em “busca”
(digitar palavras com frase exata “Número Consulta/Ano AAAA”).
100 Autos de Infração julgados na Câmara Superior do Tribunal de Impostos e Taxas:
“Ementa: ICMS Falta de emissão de notas fiscais relativas à prestação de serviços de
comunicação, na modalidade de veiculação de publicidade na rede internet, para clientes
localizados no Estado de São Paulo, deixando, assim, de recolher o ICMS-Comunicação.
(...). A base legal para atribuição da prestação de serviços de comunicação tem suas raízes
na Carta Constitucional de 88 (art. 155, Inciso II). O artigo 11, inciso IV da Lei
Complementar n. 87/96, delimila o local da operação e o responsável para efeito da
cobrança do ICMS-Comunicação, no caso. A autuada participa efetivamente da
configuração do fato gerador do tributo imponível, na medida em que amealha os recursos
vindos dos anúncios feitos com os clientes situados em solo bandeirante e os contabiliza
em seu balanço, fato por ela mesma admitido, a despeito da prestação do serviço de
comunicação ter se iniciado no Exterior. Por isso, é considerada contribuinte do ICMS-
Comunicação como manda a lei complementar. Recurso especial é conhecido e
desprovido, ficando mantido o aresto recorrido por seus próprios fundamentos (...)”
(Processo DRTC-III-622158 / Ano 2011 / AIIM 3.154.111-2 / Câmara Superior do
Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo). “(...) No caso de veiculação de propaganda, o
contribuinte detentor dos meios de comunicação se compromete a dar publicidade ao
conteúdo da mensagem de propaganda de interesse do anunciante. Se, no caso de
veiculação de propaganda por meio da internet, para que se instaure o vínculo entre o
anunciante e seu público alvo, é imprescindível que o prestador de serviço de
comunicação albergue em seu espaço virtual o material propagandístico de seu cliente, de
outro lado, esse albergamento do material propagandístico não constitui um fim em si
mesmo, como é no caso do ‘dropbox’, é apenas meio para a realização do objetivo final,
que é tomar público o conteúdo da mensagem propagandística de seu cliente (...)”

1757
(Processo DRTC-III-428633 / AIIM 3.148.649-6 / Câmara Superior do Tribunal de
Impostos e Taxas de São Paulo).
101 “(...) 3. Registre-se que a atividade publicitária visa tornar públicas informações que
pretendem influenciar mercados consumidores, por meio dos diversos veículos de
comunicação, sendo, portanto, uma atividade comunicativa. E, quando a publicidade é
veiculada na forma de serviço com contraprestação de terceiros, ocorre prestação de
serviço de comunicação.
4. Dessa forma, as atividades de veiculação ou divulgação de publicidade de terceiros na
internet, quando realizadas onerosamente, são prestações de serviços de comunicação e se
sujeitam à incidência do ICMS (artigos 1º, III, e 2º, XII, ambos do RICMS/2000).
5. Portanto, ocorre o fato gerador do imposto na prestação onerosa de serviço de
comunicação ao anunciante, prestado por meio da disponibilização para o público da
propaganda desse anunciante no site do prestador na internet. (...)” (Resposta à Consulta n.
6097/2015).
102 Como consignamos em nosso voto de relatoria no julgamento do AIIM 3.161.750-5,
julgado na 4ª Câmara do TIT-SP (2 votos × 1 voto), cujo tema será reapreciado pela
Câmara Superior do TIT-SP (Processo DRTC-III-1091754 / Ano 2011 / AIIM 3.161.750-
5 / 4ª Câmara Julgadora do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo).
103 “Art. 2º O imposto incide sobre:
(...)
III – prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração,
a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de
comunicação de qualquer natureza;
(...)
Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
(...)
VII – das prestações onerosas de serviços de comunicação, feita por qualquer meio, inclusive
a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação
de comunicação de qualquer natureza.”
104 Súmula Vinculante 31 do STF: “É inconstitucional a incidência do imposto sobre
serviços de qualquer natureza – ISS sobre operações de locação de bens móveis”.
105 Por exemplo, no Processo DRTC-III-1091754 / Ano 2011 / AIIM 3.161.750-5 /
Recorrente: Google Brasil Internet Ltda. / Recurso Ordinário / Relator: Roberto Biava Jr. /
4ª Câmara Julgadora do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo.
106 Resposta à Consulta n. 186/2005.
107 Por exemplo, no Processo DRTC-III-1091754 / Ano 2011 / AIIM 3.161.750-5 /
Recorrente: Google Brasil Internet Ltda. / Recurso Ordinário / Relator: Roberto Biava Jr. /
4ª Câmara Julgadora do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo, no qual a empresa
autuada alega a referida imunidade constitucional para tentar afastar a incidência do
ICMS.
108 A íntegra ao boletim impresso pode ser obtida na biblioteca física da Secretaria da
Fazenda do Estado de São Paulo (Av. Rangel Pestana, 300, 17º andar – Centro – São

1758
Paulo/SP).
109 Pós-Graduada em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários –
IBET. Bacharel em Direito pela Universidade Mackenzie. Advogada em São Paulo.
110 Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de
Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação.
111 Doravante, quaisquer referências a “Estados” ou ao “Estado”, genericamente, abrange,
também, o Distrito Federal.
112 Neste estudo, as referências a “consumidor final” ou “consumidor” abrangem, apenas, os
consumidores não contribuintes do ICMS.
113 EREsp 174.241/MG, Rel. Min. Franciulli Netto, Primeira Seção, j. 26-2-2004, DJ 26-4-
2004. No mesmo sentido, REsp 732.991/MG, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 21-
9-2006, DJ 5-10-2006; REsp 174.241/MG, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, Primeira
Turma, j. 7-8-2001, DJ 6-5-2002.
114 AgRg no REsp 1.564.338/BA, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 23-2-
2016, DJ 20-5-2016.
115 “Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...) II –
operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as
prestações se iniciem no exterior. (...) § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao
seguinte: (...) XII – cabe à lei complementar: (...) g) regular a forma como, mediante
deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais
serão concedidos e revogados.”
116 ADI n. 4.635, Rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, j. 11-12-2014, DJ 12-2-2015.
117 De acordo com a LC n. 160/2017, ficam os Estados autorizados a celebrar convênio, sem
a necessidade de que sua aprovação seja unânime (tal como exigido pela LC n. 24/75),
deliberando sobre a remissão dos créditos tributários, constituídos ou não, decorrentes das
isenções, dos incentivos e dos benefícios fiscais ou financeiro-fiscais instituídos em
desacordo com o disposto na alínea “g” do inciso XII do § 2º do art. 155 da Constituição
Federal e a reinstituição das respectivas isenções, incentivos e benefícios fiscais ou
financeiro-fiscais.
118 ADI n. 4.628/DF, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 17-9-2014, DJ 24-11-2014.
119 “Art. 99. Para efeito do disposto no inciso VII do § 2º do art. 155, no caso de operações e
prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte localizado em
outro Estado, o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a
interestadual será partilhado entre os Estados de origem e de destino, na seguinte
proporção: I – para o ano de 2015: 20% (vinte por cento) para o Estado de destino e 80%
(oitenta por cento) para o Estado de origem; II – para o ano de 2016: 40% (quarenta por
cento) para o Estado de destino e 60% (sessenta por cento) para o Estado de origem; III –
para o ano de 2017: 60% (sessenta por cento) para o Estado de destino e 40% (quarenta
por cento) para o Estado de origem; IV – para o ano de 2018: 80% (oitenta por cento) para
o Estado de destino e 20% (vinte por cento) para o Estado de origem; V – a partir do ano
de 2019: 100% (cem por cento) para o Estado de destino.”
120 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS – Teoria e Prática. 13. ed. revista. Porto Alegre:

1759
Livraria do Advogado, 2016. p. 310-311.
121 “Art. 3º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento: (...) XV – da
saída de bens e mercadorias nas operações iniciadas em outra Unidade da Federação com
destino a consumidor final não contribuinte do imposto, localizado neste Estado (...).”
122 Como se observa, o § 2º da Cláusula Segunda, limitou-se a definir o que deve ser
considerado por “destino” apenas em relação aos serviços de transporte.
123 “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente
sobre: I – direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico; (...) § 1º No
âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer
normas gerais. § 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a
competência suplementar dos Estados. § 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os
Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. § 4º
A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no
que lhe for contrário.”
124 “Art. 102. A legislação tributária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
vigora, no País, fora dos respectivos territórios, nos limites em que lhe reconheçam
extraterritorialidade os convênios de que participem, ou do que disponham esta ou outras
leis de normas gerais expedidas pela União.”
“Art. 199. A Fazenda Pública da União e as dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios prestar-se-ão mutuamente assistência para a fiscalização dos tributos
respectivos e permuta de informações, na forma estabelecida, em caráter geral ou
específico, por lei ou convênio. Parágrafo único. A Fazenda Pública da União, na forma
estabelecida em tratados, acordos ou convênios, poderá permutar informações com
Estados estrangeiros no interesse da arrecadação e da fiscalização de tributos.”
125 STF, ADI n. 4.628/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, j. 17-9-2014, DJ 24-11-
2014.
126 RE 136.215/RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, j. 18-2-1993, DJ 16-4-1993.
127 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 93.
128 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 31. ed. rev.,
ampl. e atual. até a EC n. 95/2016. São Paulo: Malheiros, 2017. p. 1211-1212.
129 Ag. Reg. no RE n. 580.903/PR, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, 1ª Turma, j. 28-4-2015,
DJe 22-5-2015.
130 Outras entidades, como o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
(CFOAB) e a Associação Brasileira dos Distribuidores de Medicamentos Especiais e
excepcionais (Abradimex) também ingressaram com ADIs contra o referido Convênio.
Trata-se das ADIs ns. 5.464 e 5.439.
131 Conselheiro Titular da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais
(CARF). Doutorando em Direito Tributário (USP). Mestre em Direito Tributário (PUC-
SP). Professor das Faculdades Integradas Campos Salles e do Instituto Brasileiro de
Direito Tributário (IBDT). Advogado licenciado.
132 Conselheiro Titular da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais
(CARF). Doutorando em Direito Tributário (USP). Mestre em Direito Tributário (USP).
Professor da Escola Paulista de Direito (EPD) e do Instituto Brasileiro de Direito

1760
Tributário (IBDT). Advogado licenciado.
133 “Art. 146. Cabe à lei complementar: I – dispor sobre conflitos de competência, em
matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios: (...).”
134 Passaram a constar como serviços na lista anexa à LC n. 116/2003 os seguintes itens:
“1.03 – Processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos, imagens, vídeos,
páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre outros formatos, e
congêneres.
1.04 – Elaboração de programas de computadores, inclusive de jogos eletrônicos,
independentemente da arquitetura construtiva da máquina em que o programa será
executado, incluindo tablets, smartphones e congêneres.
1.09 – Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto
por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos (exceto a
distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de Acesso Condicionado, de que
trata a Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011, sujeita ao ICMS)”.
135 ÁVILA, Humberto. Teoria da Segurança Jurídica. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2016, p.
136-137.
136 GRAU, Eros Roberto. O Direito Posto e o Direito Pressuposto. 9. ed. São Paulo:
Malheiros, 2014. p. 103.
137 Há que se pontuar que o conceito de Federação não é um conceito formal, independente
do Direito Positivo do Estado que adotou tal forma, mas sim um conceito material,
positivado no corpo de uma Constituição e que assume nuanças particulares em cada
Ordenamento distinto. Sobre a distinção entre categorias formais e materiais, Cf.
BORGES, José Souto Maior. Obrigação Tributária – uma introdução metodológica. 3.
ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 27-32.
138 ATALIBA, Geraldo. Sistema Constitucional Tributário Brasileiro. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1968. p. XIII.
139 CARRAZZA, Roque A. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29. ed. São Paulo:
Malheiros, 2013. p. 161.
140 Isso já era ressaltado há muito pelo saudoso Ministro Victor Nunes Leal, ao apontar
como três características típicas da Federação i) a rigidez na Constituição (podendo ser
tanto absoluta como relativa), ii) a partilha constitucional das competências, e iii) a
existência de um poder supremo para resolução de conflitos sobre a aplicação das
disposições constitucionais (LEAL, Victor Nunes. Leis federais e leis estaduais. In
Problemas de Direito Público. Rio de Janeiro: Forense, 1960. p. 110-111).
141 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 9. ed. São Paulo:
Malheiros, 1992. p. 86.
142 ATALIBA, op. cit., p. 24-25.
143 Sobre o tema, veja-se DÓRIA, Antônio R. S. Discriminação das Rendas Tributárias. São
Paulo: José Bushatsky, 1972.
144 DANIEL NETO, Carlos Augusto. Imunidades Tributárias Isencionais. In CARRAZZA,
Elizabeth N. (Coord.). Atualidades do Sistema Tributário Nacional. São Paulo: Quartier
Latin, 2015. p. 126-127. No mesmo sentido, explica Heleno Taveira Torres: “Deter

1761
competência legislativa em matéria tributária equivale ao mesmo que ter poderes para
instituir tributos, com todos os seus elementos, criar os mecanismos para sua cobrança,
obrigações acessórias, regras isentivas e, para os casos de seu descumprimento, a
imputação de sanções ou controles” (TORRES, Heleno Taveira. Direito Constitucional
Tributário e Segurança Jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 324).
145 FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: Técnica, Decisão e
Dominação. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 154.
146 Cf. GRECO, Marco Aurélio. Contribuições (uma figura “sui generis”). São Paulo:
Dialética, 2000. p. 121-122.
147 Cf. ÁVILA, Humberto. Eficácia do Novo Código Civil na Legislação Tributária. In:
GRUPPENMACHER, Betina (Org.). Direito Tributário e o Novo Código Civil. São
Paulo: Quartier Latin, 2004. v. 1, p. 65-66.
148 TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário. Rio
de Janeiro: Renovar, 2009. V. I, p. 315.
149 CHIARELLI, Giuseppe. Elasticità della Costituzione. In Studi di Diritto Costituzionale
in memoria de Luigi Rossi. Milano: Giuffré, 1952. p. 45.
150 No dizer de Bandeira de Mello, “o fundamento das constituições rígidas é serem ‘leis de
proteção, leis de garantia’” (MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Teoria das
Constituições Rígidas. 2. ed. São Paulo: José Bushatsky, 1980. p. 147).
151 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988 – Sistema
Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 3-4.
152 LINARES QUINTANA, Segundo V. El Poder Impositivo y la Liberdade Individual.
Buenos Aires: Editora Alfa, 1958. p. 120.
153 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Editora Almedina, 2013. p. 1.107.
154 VELLOSO, Andrei Pitten. Conceitos e Competências Tributárias. São Paulo: Dialética,
2005. p. 147.
155 Idem, p. 148.
156 ÁVILA, Humberto. Eficácia do Novo Código Civil na Legislação Tributária, cit., p. 69-
71.
157 “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de
institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente,
pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do
Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”
158 Também o Ministro Marco Aurélio, no julgamento do RE n. 116.121-3, que discutia a
incidência de ISS sobre locações, aduziu com precisão: “Em síntese, há de prevalecer a
definição de cada instituto, e somente a prestação de serviços, envolvido na via direta o
esforço humano, é fato gerador do tributo em comento. Prevalece a ordem natural das
coisas cuja força surge insuplantável; prevalecem as balizas constitucionais e legais, a
conferirem segurança às relações Estado-contribuinte; prevalece, alfim, a organicidade do
próprio Direito, sem a qual tudo será possível no agasalho dos interesses do Estado,
embora não enquadráveis como primários”.

1762
159 ANDRADE, José Maria Arruda de. Conceitos de Direito Privado e Normas de
Competência Tributária. In: HORVATH, Estevão; CONTI, José Maurício; SCAFF,
Fernando Facury (Orgs.). Direito Financeiro, Econômico e Tributário. São Paulo:
Quartier Latin, 2014. p. 463 a 476.
160 “1.03 – Processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos, imagens,
vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre outros formatos, e
congêneres.”
161 A distinção recebeu guarida do STF no julgamento do RE n. 176.626/SP.
162 Nesse ponto, o STF aderia às conclusões XLII Congresso Internacional de Direito e
Fiscal, promovido pela International Fiscal Association (JONES, John B.; MATTRON,
Robert N. General Report: Tax treatment of computer software. Cahiers de Droit Fiscal
Internacional. V. 73, 1988, p. 32).
163 “Art. 7º O contrato de licença de uso de programa de computador, o documento fiscal
correspondente, os suportes físicos do programa ou as respectivas embalagens deverão
consignar, de forma facilmente legível pelo usuário, o prazo de validade técnica da versão
comercializada.”
164 Consignou-se que “O Tribunal não pode se furtar a abarcar situações novas,
consequências concretas do mundo real, com base em premissas jurídicas que não são
mais totalmente corretas. O apego a tais diretrizes jurídicas acaba por enfraquecer o texto
constitucional, pois não permite que a abertura dos dispositivos da Constituição possa se
adaptar aos novos tempos, antes imprevisíveis”.
165 CARRAZZA, Roque A. Serviços de Fornecimento de Conteúdo – Sua intributabilidade
por meio de ICMS-comunicação. In PIRES, Adilson R.; TORRES, Heleno T. (Orgs.).
Princípios de direito financeiro e tributário – Estudos em homenagem a Ricardo Lobo
Torres. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 810; Na mesma linha, CHIESA, Clelio. ICMS-
comunicação – Delimitação do campo impositivo. In BARRETO, Aires F. (Coord.).
Direito Tributário Contemporâneo. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 160.
166 CARRAZZA, Roque A. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 50.
167 PINHEIRO, Hendrick. Download de Software e Tributação: entre ICMS e ISSQN. In
PINTO, Sérgio L. M.; MACEDO, Alberto; ARAUJO, Wilson J. (Coords.). Gestão
Tributária Municipal e Tributos Municipais. São Paulo: Quartier Latin, 2015. v. V, p. 121.
168 GRECO, Marco Aurélio. Internet e Direito. São Paulo: Dialética, 2000. p. 53.
169 “Concede-se medida cautelar para interpretar o art. 1º, caput e § 2º, da Lei
Complementar 116/2003 e o subitem 13.05 da lista de serviços anexa, para reconhecer que
o ISS não incide sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens,
destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização
ou de circulação de mercadoria. Presentes os requisitos constitucionais e legais, incidirá o
ICMS (ADI 4389 MC, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado
em 13/04/2011)”.
170 COSTA, Alcides Jorge. O ICM na Constituição e na Lei. São Paulo: Resenha Tributária,
1978. p. 30-31.
171 A relevância da inserção em uma cadeia de circulação sobre a materialidade da
mercadoria tem sido sistematicamente reafirmada pelo STF, a exemplo do julgamento do

1763
ARE 839.976 AgR/RS, relatado pelo Min. Roberto Barroso e julgado em 10-2-2015, no
qual aduziu expressamente: “Nas hipóteses de conflito entre os fatos imponíveis do ICMS
e do ISS, não se pode desconsiderar o papel da atividade exercida no contexto de todo o
ciclo produtivo. Sob tal perspectiva, cabe ao intérprete perquirir se o sujeito passivo presta
um serviço marcado por um talento humano específico e voltado ao destinatário final, ou
desempenha atividade essencialmente industrial, que constitui apenas mais uma etapa
dentro da cadeia de circulação. Perfilhando esta diretriz, não é possível fazer incidir o ISS
nas hipóteses em que a atividade exercida sobre o bem constitui mera etapa intermediária
do processo produtivo”.
172 No mesmo sentido, Cf. PINHEIRO, Hendrick. Download de Software e Tributação:
entre ICMS e ISSQN, cit., p. 123.
173 “Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) III – serviços de
qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.”
174 BARRETO, Aires F. ISS na Constituição e na Lei. 3. ed. São Paulo: Dialética, 2009. p.
35. Em sentido próximo é a lição de Marçal Justen Filho: “serviço designa a atividade
humana de prestar utilidade a outrem, tenha esta atividade por conteúdo esforço físico ou
intelectual, tenha por finalidade o resultado, ou seja, um fim em si mesma. Essa acepção
larga ou ampla, abrangente, é aquela indicada na Constituição, como indica a alusão final
da norma (serviço de qualquer natureza)” (JUSTEN FILHO, Marçal. O imposto sobre
serviços na Constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985, p. 77).
175 “É inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS
sobre operações de locação de bens móveis.”
176 “Essa adjetivação ‘de qualquer natureza’, aliás, faz muito mais sentido quando se entende
que o constituinte incorporou o conceito econômico de serviços. Isso porque,
diferentemente do conceito de serviços no Direito Civil (e não no Direito Privado como
um todo) – que não demanda maiores exercícios interpretativos, por ser facilmente
apreensível (embora dificilmente aplicável numa série de atividades econômicas) –, o
conceito de serviços na Economia, de maneira distinta, já apresenta, de pronto, uma
vagueza semântica caracterizada pelo conjunto de atividades econômicas que não
consubstanciam, como produtos, bens materiais. Tal vagueza, ao ser acompanhada da
expressão ‘de qualquer natureza’, denota que é tributável pelo ISS toda a residualidade
desse conceito no universo da atividade econômica, depois de afastados os serviços de
comunicação e de transporte interestadual ou intermunicipal, tributáveis pelo ICMS; os
serviços financeiros, tributáveis pelo IOF.” (MACEDO, Alberto. ISS – O conceito
econômico de serviços já foi juridicizado há tempos também pelo Direito Privado. In: XII
Congresso Nacional de Estudos Tributários – Direito Tributário e os Novos Horizontes do
Processo. MACEDO, Alberto et al. São Paulo: Noeses, 2015. p. 71-79). No mesmo
sentido, MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e Prática do Imposto sobre Serviços.
1. ed. 3. tir.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984. p. 42-43.
177 CARRAZZA, Elizabeth Nazar. Natureza “Não Cumulativa” do ISS. Revista de Direito
Tributário n. 19-20, jan./jun. de 1982, p. 256. A tese da autora, aprovada por unanimidade
no congresso em que foi apresentada, sendo proclamada nos seguintes termos: “1ª
Conclusão: ‘O serviço tributável pode ser definido como a prestação ou a fruição de uma
utilidade material ou imaterial, por uma pessoa física ou jurídica, sob regime de direito
privado.’ (...) Aprovada, por unanimidade”.

1764
178 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Serviço Público: Conceito e Características.
Biblioteca Juridica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM. Sítio
virtual: <https://archivos.juridicas.unam.mx/www/bjv/libros/6/2544/5.pdf>. Acesso em:
15 nov. 2017.
179 CARRAZZA, Elizabeth Nazar. Natureza “Não Cumulativa” do ISS, op. cit., p. 255.
180 LÉVI, Pierre apud PINHEIRO, Hendrick. Download de Software e Tributação: entre
ICMS e ISSQN, op. cit., p. 125.
181 “Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante
decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria
constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá
efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração
pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à
sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas
determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre
esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante
multiplicação de processos sobre questão idêntica.”
182 Isso poderia mudar, diante de uma revogação da Súmula Vinculante 31, ou mesmo com
uma alteração constitucional da regra de competência.
183 “Art. 154. A União poderá instituir: I – mediante lei complementar, impostos não
previstos no artigo anterior, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador
ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição (...).”
184 JENSEN, Jennifer. US – The disparate state and local tax treatment of digital streaming
services. In: PwC, ebusiness and ecommerce, In Year 2015 and beyond. EUA, 9-9-2015.
Disponível em: <http://ebiz.pwc.com/2015/09/us-the-disparate-state-and-local-tax-
treatment-of-digital-streaming-services-2/>. Acesso em: 15 nov. 2017.
185 Professor do Mestrado do IBDT. Coordenador da Pós-Graduação em Direito Tributário
da PUC-Campinas. Pesquisador Visitante na Vienna University of Economics and
Business (Áustria). Doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP.
Mestre em Direito Público pela UERJ. Mestre em Direito Tributário pela University of
Florida (EUA).
186 Doutorando e Mestre em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP com
formação complementar em Comércio Internacional pela Mission of Brazil to the World
Trade Organization (WTO). Procurador do Estado de Goiás à disposição da Representação
da Governadoria em Brasília. Conselheiro Titular do Conselho Administrativo de
Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda (CARF/MF).
187 A globalização impõe mudanças na formulação da política fiscal dos Estados,
especialmente porque a busca por maior competitividade pode ter impacto sobre a
distributividade e a eficiência, já que o Estado passa a fornecer maiores incentivos a
reduzidos grupos de sua escolha, tornando-se mais dependente da mobilidade dos
contribuintes que escolhem suas conexões com as jurisdições. Cf. DAGAN, Tsilly. The
tragic choices of tax policy in a globalized economy. In: BRAUNER, Y.; STEWART, M.
(Eds.). Tax, Law and Development. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing Limited,
2013. p. 57-76.

1765
188 AMAZON.COM Annual Report 2016. Disponível em:
<http://www.annualreports.com/HostedData/AnnualReports/PDF/NASDAQ_AMZN_2016.pdf
Acesso em: 15 nov. 2017.
189 Neste sentido, Rifat Azam sustenta a criação de um Imposto sobre a renda do comércio
eletrônico global a ser gerido por um órgão internacional (Global Tax Fund). Sobre este
assunto, v. AZAM, Rifat. Global Taxation of Cross Border E-Commerce Income (July 25,
2012). In: Virginia Tax Review, v. 31, p. 639, 2011-2012.
190 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report, p. 11.
191 NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos: contributo para a
compreensão constitucional do estado fiscal contemporâneo. Coimbra: Almedina, 2015. p.
185.
192 Apesar de diferenças importantes, no Brasil, o ICMS poderia ser comparado ao IVA.
193 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report, p. 13.
194 Doravante Convênio n. 106.
195 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. São Paulo:
Noeses, 2008. p. 646-648.
196 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 44.
197 CARRAZZA, op. cit., p. 294.
198 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva. 2017. p. 278-
282.
199 Não por razão diversa, a estruturação do ICMS foi destinada à lei complementar pela
Carta Política, a seguir sintetizada: “Art. 155. (...) § 2º (...) XII – cabe à lei complementar:
a) definir seus contribuintes (...); d) fixar, para efeito de sua cobrança e definição do
estabelecimento responsável, o local das operações relativas à circulação de mercadorias e
das prestações de serviços (...); i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do
imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço.”
200 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva. 2017. p. 89.
201 SCHOUERI, op. cit., p. 487-491.
202 VANONI, Ezio. Natureza e interpretação das leis tributárias. Trad. Rubens Gomes de
Souza. Rio de Janeiro: Edições Financeiras S.A., 1932. p. 181.
203 VANONI, op. cit., p. 209.
204 Idem.
205 WALD, Arnold. Da Natureza Jurídica do Software. In: GOMES, Orlando e outros. A
Proteção Jurídica do Software. Rio de Janeiro: Forense, 1985.
206 ESTADO DE SÃO PAULO. Secretaria do Estado da Fazenda. Consulta n. 691/1986, de
1º de junho de 1987, Boletim Tributário, v. 458, p. 192/6.
207 STF, RE n. 176.626, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, j. 10-11-1998, DJ
11-12-1998, PP-00010 EMENT VOL-01935-02 PP-00305 RTJ VOL-00168-01 PP-00305.
208 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS teoria e prática. 11. ed. São Paulo: Dialética,

1766
2009. p. 116.
209 STF, RE n. 199464, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, j. 2-3-1999, DJ 30-4-1999,
PP-00023 EMENT VOL-01948- 02 PP-00307.
210 STF, ADI n. 1.945-MC, Rel. Min. Octavio Galloti, Rel. p/ Acórdão: Min. Gilmar
Mendes, Tribunal Pleno, j. 26-5-2010, DJe-047, DIVULG 11-03- 2011 PUBLIC 14-03-
2011 EMENT VOL-02480- 01 PP-00008 RTJ VOL-00220- 01 PP-00050.
211 GRECO, Marco Aurélio. Internet e direito. São Paulo: Dialética, 2000. p. 94-5.
212 BARRETO, Simone Rodrigues Costa. Mutação do conceito constitucional de
mercadoria. São Paulo: Noeses, 2016. p. 164.
213 CARRAZZA, op. cit., p. 39.
214 Ficam os Estados do Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão,
Mato Grosso do Sul, Paraná, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do
Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Tocantins autorizados a conceder
redução de base de cálculo do ICMS, de forma que a carga tributária corresponda ao
percentual de, no mínimo, 5% (cinco por cento) do valor da operação que envolva
softwares, programas, jogos eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres,
padronizados, ainda que sejam ou possam ser adaptados, disponibilizados por qualquer
meio, inclusive nas operações efetuadas por meio de transferência eletrônica de dados
(download ou streaming). A cobrança de débitos de ICMS relacionadas a tais operações
passou a produzir efeitos aos fatos geradores ocorridos a partir de 1º-1-2016.
215 STF, ADIs ns. 5.569 e 5.576, Rel. Min. Dias Toffoli.
216 “Art.156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (…) III. Serviços de
qualquer natureza, não compreendidos no art.155, II, definidos em lei complementar.”
217 Serviços de informática e congêneres. 1.01 Análise e desenvolvimento de sistemas. 1.02
Programação. 1.03 Processamento de dados e congêneres. 1.04 Elaboração de programas
de computadores, inclusive de jogos eletrônicos. 1.05 Licenciamento ou cessão de direito
de uso de programas de computação. 1.06 Assessoria e consultoria em informática. 1.07
Suporte Técnico em informática, inclusive instalação, configuração e manutenção de
programas de computação e banco de dados. 1.08 Planejamento, confecção, manutenção e
atualização de páginas eletrônicas.
218 “Art. 2º O imposto incide sobre: (…) V – fornecimento de mercadorias com prestação de
serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei
complementar aplicável expressamente o sujeitar a incidência do imposto estadual.”
219 PISCITELLI, Thatiane dos Santos; IZELLI, Anna Flávia. Os serviços de provedores de
acesso a internet e a LC n. 116/2003. In: TORRES, Heleno Taveira. Imposto sobre
serviços-ISS na Lei Complementar n. 116/2003 e na Constituição. São Paulo: Manole,
2004. p. 474-487.
220 CARVALHO, Paulo de Barros. Hipótese de incidência e base de cálculo do ICM.
Cadernos de Pesquisas Tributárias 3/331, São Paulo: Resenha Tributária, 1978.
221 STF, RE n. 330.817/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 31-8-2017.
222 Doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP. Mestre em Direito
Tributário pela PUC/SP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de
Estudos Tributários (IBET). Bacharel em Direito pela PUC/SP. Juiz Contribuinte do

1767
Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo. Professor Convidado dos cursos de
pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas. Membro da Comissão do Contencioso
Administrativo Tributário da OAB/SP. Membro do grupo de pesquisa “Tributação e
Novas Tecnologias” da Direito FGV. Membro da IFA e da ABDF. Advogado em São
Paulo.
223 TAPSCOTT, Dan. The digital economy: promise and peril in the age of networked
intelligence. New York: McGraw-Hill, 1997.
224 Para alguns dados interessantes quanto ao crescimento exponencial da economia digital:
OECD Digital Economy Outlook 2015. Paris: OECD Publishing, 2015. In
<http://dx.doi.org/10.1787/9789264232440-em>. Acesso em: 15 nov. 2017; OECD
Digital Economy Outlook 2017. Paris: OECD Publishing, 2015. In
<http://www.keepeek.com/Digital-Asset-Management/oecd/science-and-technology/oecd-
digital-economy-outlook-2017_9789264276284-en#.WepPzWhSzIU#page1>. Acesso em:
15 nov. 2017.
225 BORGES, José Souto Maior. O fato gerador do ICM e os estabelecimentos autônomos.
In: Revista de Direito Administrativo 103. Rio de Janeiro: FGV, 1971, p. 34.
226 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 39.
227 Texto de conclusão de Congresso. In: Revista de Direito Tributário v. 19/20, p. 61.
228 DERZI, Misabel. Direito tributário brasileiro. 11. ed., 4ª tir. Rio de Janeiro: Forense,
1999. p. 495-496.
229 ATALIBA, Geraldo. Estudos e pareceres de direito tributário – Volume I. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1978. p. 99.
230 MELO, José Eduardo Soares de. ISS – Aspectos teóricos e práticos. 5. ed. São Paulo:
Dialética, 2008. p. 37.
231 FILHO, Marçal Justen. O imposto sobre serviços na Constituição. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1985, p. 90.
232 BARRETO, Aires Fernandino. ISS na Constituição e na lei. São Paulo: Dialética, 2003.
p. 423.
233 GRECO, Marco Aurélio. Internet e direito. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2000. p. 93-94.
No mesmo sentido: BEIJA, Osvaldo Bispo de. ICMS e comércio de “mercadorias”
intangíveis, via internet. In: Revista Dialética de Direito Tributário 88, p. 66 e s.;
CEZAROTI, Guilherme. ICMS no comércio eletrônico. São Paulo: MP, 2005. p. 152-153.
234 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. 1. ed., 2ª
tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978. p. 81-85.
235 Nesse ponto, o texto da CF/88 é similar ao da CF/67, ao atribuir a competência aos
Municípios para instituir imposto sobre “serviços de qualquer natureza”, não sobre a
prestação de serviços.
236 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. 1. ed., 2ª
tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978. p. 98-99.
237 MACEDO, Alberto. ISS – O conceito econômico de serviços já foi juridicizado há
tempos também pelo Direito Privado. In: CARVALHO, Paulo de Barros (Org.). XII
Congresso Nacional de Estudos Tributários – Direito Tributário e os Novos Horizontes do

1768
Processo. São Paulo: Noeses, 2015. p. 71-79.
238 Essa jurisprudência será analisada no tópico seguinte.
239 Embora não seja uma categoria definida pelo direito, a expressão “bens digitais” é
coloquialmente utilizada como referência aos bens intangíveis que existem em forma
digital, tais como e-books, músicas, software, vídeos, ringtones etc. Na maior parte das
vezes, tais bens têm valor comercial.
240 MELIS, Giuseppe. Economia digitale e imposizione prospettive. In: Diritto e pratica
tributaria Internazionale 3/2016. Padova: CEDAM, 2016, p. 977-1020; LAMENSCH,
Marie. The Treatment of “Digital Products” and Other “E-Services” under VAT. In:
LANG, Michael; LEJEUNE, Ine (Orgs.). VAT/GST in a Global Digital Economy.
Amsterdam: Wolters Kluwer, p. 15-39; CANNAS, Francesco. The VAT Treatment of
Cloud Computing: Legal Issues and Practical Difficulties. World Journal of VAT/GST
Law, 2016 e The New Models of the Digital Economy and New Challenges for VAT, p. 1-
13; SAINT-AMANS, Pascal. Tax challenges, disruption and the digital economy, OECD
Observer 307, Q3, 2016. In:
<http://oecdobserver.org/news/fullstory.php/aid/5600/Tax_challenges,_disruption_and_the_digital_econom
Acesso em: 15 dez. 2017; OECD (2015), Addressing the Tax Challenges of the Digital
Economy, Action 1 – 2015 Final Report, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting
Project, OECD Publishing. In: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264241046-en>. Acesso
em: 15 dez. 2017; OECD (2013), Action Plan on Base Erosion and Profit Shifting, OECD
Publishing. In: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264202719-en>. Acesso em: 15 dez. 2017;
LEOW, Edmund; SEOW, Jia Xian. Taxing the Digital Economy: Impending changes to
GST in Singapore. March 31, 2017. In:
<https://dentons.rodyk.com/en/insights/alerts/2017/march/31/taxing-the-digital-economy-
impending-changes-to-gst-in-singapore>. Acesso em: 15 dez. 2017; SMITH, Paul. Action
1: The Digital Economy and VAT/GST. New business models worsen BEPS risk. Tax
Watch Edition 7, October 2014. In: <http://www.ey.com/nz/en/services/tax/ey-tax-watch-
edition-7-2014-2-action-1-the-digital-economy-and-vat-gst>. Acesso em: 15 dez. 2017.
241 TÔRRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 332.
242 Até porque o texto deve ser, ao mesmo tempo, o início e o limite do processo de
concretização normativa. Nesse sentido: CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito
constitucional e teoria da constituição. 7. ed., 6ª reimpr.. Coimbra: Almedina, 2003. p.
1220; ANDRADE, José Maria Arruda de. Interpretação da norma tributária. São Paulo:
MP, 2006. p. 62.
243 Cf. MÜLLER, Friedrich. Métodos de trabalho do direito constitucional. 3. ed. Trad.
Peter Naumann. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 44; NEVES, Marcelo. A interpretação
jurídica no Estado Democrático de Direito. In GRAU, Eros Roberto; GUERRA FILHO,
Willis Santiago (Orgs.). Direito constitucional – estudos em homenagem a Paulo
Bonavides. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 360.
244 Ainda que o STJ (REsp 39.457/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Primeira
Turma, j. 13-8-1994, DJ 5-9-1994, p. 23040; RMS 5.934/RJ, Rel. Min. Hélio Mosimann,
Segunda Turma, j. 4-3-1996, DJ 1º-4-1996, p. 9892) tenha manifestado o entendimento de
que a exploração econômica de programas de computador se amoldava ao item 24 da lista

1769
anexa ao Decreto-lei n. 406/68 (com a redação da Lei Complementar n. 56/87 – Análises,
inclusive de sistemas, exames, pesquisas e informações, coleta e processamento de dados
de qualquer natureza), fato é que esse item era bastante genérico.
245 RE 176626, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, j. 10-11-1998, DJ 11-12-
1998, PP-00010 Ement Vol-01935-02 PP-00305 RTJ Vol-00168-01 PP-00305. Em
semelhante sentido: RE 199464, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, j. 2-3-1999, DJ
30-4-1999, PP-00023 Ement Vol-01948-02 PP-00307.
246 RE 191732, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, j. 4-5-1999, DJ 18-6-1999,
PP-00024 Ement Vol-01955-03 PP-00433.
247 RE 285870 AgR, Rel. Min. Eros Grau, Segunda Turma, j. 17-6-2008, DJe-142 Divulg
31-07-2008 Public 1º-8-2008, Ement Vol-02326-06 PP-01078.
248 A bem da verdade, esse Convênio criou nova hipótese de incidência do ICMS ao arrepio
de lei complementar, o que é claramente inconstitucional.
249 Resposta à Consulta Tributária n. 10382/2016, de 28 de junho de 2016. Esse
entendimento foi recentemente corroborado pela Decisão Normativa CAT 4/2017.
250 O SaaS tem por objeto a utilização de software disponibilizado pelo contratado por meio
da internet, em operação na qual o programa e as informações a ele associadas estão
hospedados na nuvem. Nesse caso, não há o download. Para uma análise dessa e de outras
modalidades de contratação de serviços em nuvem: TAURION, Cezar. Cloud computing:
Computação em nuvem: transformando o mundo da Tecnologia da Informação. Rio de
Janeiro: Brasport, 2009; VELTE, Anthony T.; VELTE, Toby J.; ELSENPETER, Robert.
Cloud computing: Computação em nuvem – uma abordagem prática. Trad. Gabriela Mei.
Rio de Janeiro: Alta Books, 2010.
251 Solução de Consulta SF/DEJUG n. 40, de 1º de agosto de 2013.
252 Essa jurisprudência será retomada mais à frente.
253 RE 547245, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, j. 2-12-2009, DJe 4-3-2010.
254 Essa foi a conclusão do julgamento da Reclamação 8623.
255 RE 651703, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 29-9-2016, Processo Eletrônico
Repercussão Geral – Mérito DJe-086 Divulg 25-4-2017 Public 26-4-2017.
256 Tribunal Pleno, Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.945-MT,
Rel. Min. Octavio Gallotti, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 26-5-2010, DJe 11-3-
2011.
257 Essa também é a opinião de Marco Aurélio Greco sobre o tema. In: Internet e direito. 2.
ed. São Paulo: Dialética, 2000. p. 93-94.
258 Sobre a violação da LC n. 116/2003, vide GAIA, Fernando Antonio Cavanha; BARROS,
Maurício. ICMS na aquisição de softwares: a ilegalidade do Decreto 61.522/2015. Jota de
26/10/2015. Disponível em: <https://jota.info/artigos/icms-na-aquisicao-de-softwares-a-
ilegalidade-do-decreto-61-5222015-26102015>. Acesso em: 15 dez. 2017.
259 RE 176626, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, j. 10-11-1998, DJ 11-12-
1998, PP-00010 Ement Vol-01935-02 PP-00305 RTJ Vol-00168-01 PP-00305.
260 RE 199464, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, j. 2-3-1999, DJ 30-4-1999, PP-
00023 Ement Vol-01948-02 PP-00307.

1770
261 BARROS, Maurício. Função da lista de serviços da LC n. 116/03 e a competência
tributária municipal. In: BERGAMINI, Adolpho; BOMFIM, Diego Marcel (Orgs.).
Comentários à Lei Complementar 116/03 – de advogados para advogados. São Paulo:
MP, 2009. p. 393-412.
262 À época, tanto a Primeira quanto a Segunda Turma do STF adotavam o mesmo
entendimento, a saber: RE 115103, Rel. Min. Oscar Correa, Primeira Turma, j. 22-3-1988,
DJ 29-4-1988, PP-09851 Ement Vol-01499-04 PP-00678; RE 112947, Rel. Min. Carlos
Madeira, Segunda Turma, j. 19-6-1987, DJ 7-8-1987, PP-15439 Ement Vol-01468-04 PP-
00784.
263 Conforme art. 2º, da Lei Complementar n. 87/96.
264 Conforme o art. 1º, caput e § 2º, da Lei Complementar n. 116/2003.
265 Cf. Lei Complementar n. 87/96: “Art. 2º O imposto incide sobre:
I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação
e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares; (...).”
266 RE 129877, Rel. Min. Marco Aurélio, Segunda Turma, j. 3-11-1992, DJ 27-11-1992, PP-
22303 Ement Vol-01686-02 PP-00263 RTJ Vol-00144-02 PP-00630.
267 Mestre em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP. Especialista em Direito
da Economia e da Empresa pela FGV/GVlaw. Advogado em São Paulo.
268 Bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo (USP). Bacharel em Administração
de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
269 PINHEIRO, Patrícia Peck. Aspectos Legais do Cloud Computing. In: Direito Digital
Aplicado. São Paulo: Intelligence, 2012. p. 131.
270 The NIST Definition of Cloud Computing – Recommendations of the National Institute
of Standards and Technology. Disponível em
http://nvlpubs.nist.gov/nistpubs/Legacy/SP/nistspecial publication800-145.pdf. Acesso
em: 15 dez. 2017.
271 A Computação em Nuvem na Universidade de São Paulo. Disponível em
http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/61687. Acesso em: 15 dez. 2017.
272 O software é definido do direito brasileiro pelo art. 1 º da Lei n. 9.609/98.
273 Disponível em <https://gsuite.google.com/intl/pt-BR/solutions>. Acesso em: 15 dez.
2017.
274 HOMSY, Leonardo e BRASIL, Isaque. ICMS e ISS na Economia Digital. In Tributação
& Telecomunicações. São Paulo: Editoria Quartier Latin, 2016.
275 Disponível em <https://azure.microsoft.com/pt-br/solutions>. Acesso em: 15 dez. 2017.
276 BARRETO, Aires F. O ISS na Constituição e na Lei. 3. ed. São Paulo: Dialética, 2009. p.
35.
277 ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
p. 262.
278 Neste sentido, mencionem-se as seguintes decisões: AG. REG. no RE n. 446.003-Paraná,
Rel. Min. Celso de Mello, j. 30-5-2006 e RE n. 116.121-São Paulo, Rel. Min. Octavio
Gallotti, j. 11-10-2000.

1771
279 RE n. 651.703-Paraná, Rel. Min. Luiz Fux, j. 29-9-2016.
280 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: Teoria e Prática. 12. ed. São Paulo: Dialética,
2012. p. 13, 15 e 16.
281 Permite-se a tributação da energia elétrica pelo ICMS, bem incorpóreo, por conta da
competência estabelecida no § 3º do art. 155 da CF/88.
282 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 48.
283 “Os conceitos de operação, circulação e mercadoria permanecem intimamente
vinculados, devendo os intérpretes e os destinatários do imposto tomá-los na sua
concepção jurídica para efeito de caracterização de sua incidência. A operação mercantil
centra-se na obrigação de ‘dar’ (atividade fim), devidamente materializada, não tendo
relevância jurídica a atividade meio, que pode consistir num fazer.” In: PAULSEN,
Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 10.
ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016. p. 277.
284 CF/88: “Art. 146. Cabe à lei complementar:
I – dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios;”
285 “Art. 1º (...) § 2º Ressalvadas as exceções expressas na lista anexa, os serviços nela
mencionados não ficam sujeitos ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de
Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação – ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.”
286 Vale mencionar que, no tocante ao item 1.03, a legislação paulistana ainda não foi
reformada para contemplar a redação dada pela Lei Complementar n. 157/2016 ao item
1.03 da Lei Complementar n. 116/2003, que passou a ser a seguinte: “1.03 –
Processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos, imagens, vídeos,
páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre outros formatos, e
congêneres”.
287 Cumpre destacar que a orientação interpretativa mencionada, ao contrário do que afirma
em suas justificativas, acaba trazendo ainda mais insegurança jurídica aos contribuintes.
Isso porque, ao afirmar que as operações de SaaS podem ser qualificadas nos subitens
1.03, 1.05 ou 1.07, acaba por gerar a dúvida sobre qual a correta classificação a ser
adotada no entendimento das Autoridades Fiscais, com reflexos práticos concretos, já que
tais subitens estão sujeitos a alíquotas distintas.
288 Neste sentido, vide RE n. 361.829-6-Rio de Janeiro, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 13-12-
2005.
289 “8. Os softwares disponibilizados em ambiente de nuvem, objetos de contratos
independentes firmados em apartado, enquadram-se no subitem 1.05 da Lista de Serviços
do art. 1º da Lei 13.701, de 24 de dezembro de 2003, código de serviço 02798 do Anexo I
da Instrução Normativa SF/SUREM n. 8, de 18 de julho de 2011, relativo a licenciamento
ou cessão de direito de uso de programas de computação, inclusive distribuição, sujeitos à
alíquota de 2%, conforme o disposto no art. 16, I, ‘a’, da Lei n. 13.701, de 24 de dezembro
de 2003, com a redação da Lei n. 15.406, de 8 de julho de 2011.”
290 “Art. 1º O Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação, por
meio de suporte físico ou por transferência eletrônica de dados (‘download de software’),

1772
ou quando instalados em servidor externo (‘Software as a Service – SaaS’), enquadra-se
no subitem 1.05 da lista de serviços do ‘caput’ do artigo 1º da Lei n. 13.701, de 24 de
dezembro de 2003.”
291 BUENO, Neide. Licença de Software Livre: Questões Relativas ao Regime Contratual e
o Direito de Autor. Boletim ASPI n. 43. São Paulo: ASPI, 2014, p. 32.
292 Como já exposto, no tocante ao item 1.03, a legislação paulistana ainda não foi
reformada para contemplar a redação dada pela Lei Complementar n. 157/2016 ao item
1.03 da Lei Complementar n. 116/2003.
293 Neste sentido, mencione-se que o STJ já decidiu pela impossibilidade de se exigir o ISS
sobre atividades meio. Vide REsp n. 883.254-Minas Gerais, Rel. Min. José Delgado, j. 18-
12-2007 e REsp n. 69.986-São Paulo, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, j. 2-10-1995.
294 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 177.
295 Conforme mencionado, de acordo com o artigo 9º Lei n. 9.609/98, o uso de programa de
computador no País será objeto de licença.
296 Neste ponto, mencione-se o posicionamento externado de Gilberto de Castro Moreira
Junior e Flora Ferreira de Almeida que, ao analisarem as operações de SaaS, concluíram,
por esta mesma razão, pela impossibilidade de exigência do ICMS nesta operação: “O
elemento ‘circulação’ não é verificado no caso do Software as a Service (SaaS), uma vez
que não há troca de titularidade do bem. O contrato firmado entre as partes não obriga a
empresa detentora do programa a fornecê-lo, mas sim a disponibilizar seu uso, tendo em
vista que o software será acessado em ambiente externo ao computador do usuário”. Cloud
Computing e a Tributação do Software as a Service (SaaS). In: Estudos de Direito
Tributário em Homenagem ao Professor Gerd Willi Rothmann. São Paulo: Quartier Latin,
2016. p. 596.
297 CARPINETTI, Ana Carolina e SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Estados disciplinam a
cobrança do ICMS nas operações com bens digitais. Publicado no Consultor Jurídico em
11-10-2017. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-out-11/opiniao-estados-
disciplinam-icms-operacoes-bens-digitais>. Acesso em: 15 dez. 2017.
298 BRIGAGÃO, Gustavo. A incidência do ICMS sobre o download de softwares. In
Estudos de Direito Tributário em Homenagem ao Professor Gerd Willi Rothmann. São
Paulo: Quartier Latin, 2016. p. 614.
299 SCHOUERI, Luís Eduardo. Planejamento Tributário e o “Propósito Negocial” –
Mapeamento de Decisões do Conselho de Contribuintes de 2002 a 2008. São Paulo:
Quartier Latin, 2010. p. 14.
300 LLM em International Taxation pela University of Florida (UF). Mestre em Direito
Tributário pela Universidade de São Paulo (USP). Bacharel em Administração Pública
pela Fundação Getúlio Vargas (EAESP/FGV). Advogado em São Paulo.
301 Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT).
Advogada em São Paulo.
302 “[...] 8. ICMS. Incidência sobre softwares adquiridos por meio de transferência eletrônica
de dados (art. 2º, § 1º, item 6, e art. 6º, § 6º, ambos da Lei impugnada). Possibilidade.
Inexistência de bem corpóreo ou mercadoria em sentido estrito. Irrelevância. O Tribunal
não pode se furtar a abarcar situações novas, consequências concretas do mundo real, com

1773
base em premissas jurídicas que não são mais totalmente corretas. O apego a tais diretrizes
jurídicas acaba por enfraquecer o texto constitucional, pois não permite que a abertura dos
dispositivos da Constituição possa se adaptar aos novos tempos, antes imprevisíveis [...]”.
303 “TRIBUTÁRIO. FORNECIMENTO DE PROGRAMAS DE COMPUTADOR
(SOFTWARE). CONTRATO DE CESSÃO DE USO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
PERSONALIZADOS. ISS. INCIDÊNCIA. PRECEDENTES. [...] 1. O entendimento de
que a jurisprudência desta Corte de Justiça firmou-se no sentido de que os programas de
computador desenvolvidos para clientes, de forma personalizada, geram incidência de
tributo do ISS não conflita com o conteúdo da Súmula Vinculante 31 do STF, segundo a
qual é inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza –
ISS sobre operações de locação de bens móveis. [...]” (EDcl no AgRg no AREsp
32.547/PR, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j. 13-12-2011).
304 ADI n. 1.945/MT, Rel. Min. Octavio Gallotti, Rel. para Acórdão Min. Gilmar Mendes,
Tribunal Pleno, j. 26-5-2010.
305 No julgamento do RE n. 176.626/SP, o STF entendeu que, não tendo por objeto uma
mercadoria, mas um bem incorpóreo, sobre as operações de licenciamento ou cessão do
direito de uso de programas de computador não poderiam os Estados cobrar o ICMS.
306 “Art. 11. Nos casos de transferência de tecnologia de programa de computador, o
Instituto Nacional da Propriedade Industrial fará o registro dos respectivos contratos, para
que produzam efeitos em relação a terceiros.”
307 Antes da alteração do Regulamento do ICMS paulista, o tratamento tributário no Estado
de São Paulo foi por muito tempo disciplinado pelo Decreto paulista n. 51.619/2007, que
determinava que nas operações com softwares, personalizados ou não, o ICMS seria
calculado sobre uma base de cálculo correspondente ao dobro do valor de mercado do seu
suporte informático.
308 “Art. 37 (DDTT). Não será exigido o imposto em relação às operações com software,
programas, aplicativos, arquivos eletrônicos, e jogos eletrônicos, padronizados, ainda que
sejam ou possam ser adaptados, quando disponibilizados por meio de transferência
eletrônica de dados (download ou streaming), até que fique definido o local de ocorrência
do fato gerador para determinação do estabelecimento responsável pelo pagamento do
imposto.”
309 “7 – Cláusula sétima. Este convênio entra em vigor na data da publicação de sua
ratificação nacional no Diário Oficial da União, produzindo efeitos a partir do primeiro
dia do sexto mês subsequente ao da sua publicação.”
310 “3. No que se refere à forma de comercialização, os softwares não personalizados podem
ter suas cópias distribuídas em larga escala por meio físico ou serem negociados em meio
digital, tanto por download como por streaming (utilização do software ‘na nuvem’). Essa
alteração, no entanto, não tem o condão de descaracterizar a natureza de produto desse
tipo de software (mercadoria). A circunstância de o adquirente instalar o software (de loja
física ou virtual) em sua máquina (download) ou utilizá-lo ‘na nuvem’ por meio de
internet (streaming) não descaracteriza a natureza jurídica da operação como
comercialização de software pronto.”
311 Bacharel e Mestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo. Advogada em São Paulo.

1774
312 PAZELLO, Fernanda Ramos. Desonerações tributárias das operações de exportação: a
imunidade das contribuições sociais e a isenção do ISS. 2008. 141 f. Dissertação
(Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2008.
313 O BEPS consiste em um conjunto de 15 ações para evitar a chamada erosão da base
tributária e o deslocamento de lucros. Seu objetivo é evitar, no plano internacional, o
fenômeno conhecido como dupla não tributação ou a tributação reduzida.
314 Serviços de streaming de vídeos e aplicativos de conversas de voz e troca de mensagens
como imagens, conversas em grupo e outras funcionalidades.
315 MELO, José Eduardo Soares de. Aspectos teóricos e práticos do ISS. 4. ed. São Paulo:
Dialética, 2005.
316 “Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
[...] § 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei
complementar: [...]
II – excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior;[...].”
317 O Pleno do STF, de forma indireta, no julgamento do Agravo Regimental no Mandado
de Injunção n. 590-2, decidiu que, nesse caso, atribui-se à lei complementar o poder de
escolher os serviços que ficarão isentos, conforme razões de política tributária.
318 COSTA, Regina Helena. Imunidades tributárias: teoria e análise da jurisprudência do
STF. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 107-108.
319 Confira-se: “[...] EMENTA: NÃO INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA – IMUNIDADE –
COISA JULGADA. A lei municipal não pode alcançar fatos geradores ocorridos no
exterior e o ISS só incide sobre serviços descritos na lista anexa ao Decreto-lei 834/69,
prestados nos limites do município, excepcionalmente, em outros municípios brasileiros.
[...] VOTO [...] Ora, o município só pode tributar os serviços prestados em seu território e,
excepcionalmente, em outras comunas, mas sempre dentro do Brasil. Estamos diante de
não incidência tributária. [...]” (Recurso Especial 26.827-1/SP, Rel. Min. Garcia Vieira, 1.ª
Turma do STJ, de 16-9-1992).
320 “[...] Art. 1º [...] § 1º O imposto incide também sobre o serviço proveniente do exterior
do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País. [...].”
321 Art. 153, § 3º, III.
322 Art. 155, § 2º, X, “a”, introduzido pela Emenda Constitucional n. 42/2003.
323 Art. 155, § 2º, XII, “e” e 156, § 3º, II.
324 Art. 149, § 2º, I, introduzido pela Emenda Constitucional n. 33/2001.
325 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. Atualizado por
Misabel Abreu Machado Derzi. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 467.
326 CRUZ, Duarto Ivo. Enquadramento jurídico e econômico da exportação, Revista de
Direito Mercantil, São Paulo, n. 17, p. 45.
327 TÔRRES, Heleno Taveira. O IVA na experiência estrangeira e a tributação das
exportações no direito brasileiro, Revista Fórum de Direito Tributário, Belo Horizonte,
ano 3, n. 16, jul.-ago. 2005, p. 49.
328 Marcelo Marques Roncaglia assevera que o Imposto sobre Valor Agregado (IVA)

1775
europeu se sujeita, em regra, ao princípio do destino. Neste aspecto, o autor ressalta que (i)
o IVA europeu, embora devesse observar o princípio da origem para acabar com os
controles aduaneiros, entendeu por bem aplicar o princípio do destino em razão de
eventuais desequilíbrios arrecadatórios; (ii) o IVA substitui o nosso ICMS, IPI e ISS; (iii)
a legislação do IVA prevê o que é entrega de bens e que todo o resto é prestação de
serviços, exemplificando; e (iv), por fim, os serviços tributados pelo IVA obedecem ao
princípio da origem, paradoxalmente (RONCAGLIA, Marcelo Marques. O ISS e a
importação e exportação de serviços, Revista Dialética de Direito Tributário, v. 129. São
Paulo, Dialética, 2006, p. 98-111).
329 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 586
330 Entendemos que os bens virtuais não podem ser definidos como produtos, na medida em
que são bens incorpóreos, ou seja, não são coisas materiais e com existência física.
331 TROIANELLI, Gabriel Lacerda; GUEIROS, Juliana. O ISS e exportação e importação
de serviços, In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães; MARTINS, Ives Gandra da Silva (Orgs.).
ISS e a LC 116/2003. Curitiba: Juruá, 2004. p. 199-208.
332 RONCAGLIA, Marcelo Marques. O ISS e a importação e exportação de serviços,
Revista Dialética de Direito Tributário, v. 129, São Paulo, Dialética, 2006, p. 98-111.
333 ÁVILA, Humberto. Imposto sobre a Prestação de Serviços de Qualquer Natureza.
Exportação de serviços. Lei Complementar n. 116/2003. Isenção: requisitos e alcance.
Conceitos de “desenvolvimento” de serviço e “verificação” do seu resultado, Revista
Dialética de Direito Tributário, n. 134, São Paulo, Dialética, 2006, p. 101-109.
334 SCHOUERI, Luís Eduardo. ISS sobre a importação de serviços do exterior, Revista
Dialética de Direito Tributário, n. 100, São Paulo, Dialética, 2004, p. 45.
335 Idem, p. 48.
336 FERNÁNDEZ, German Alejandro San Martín. O ISSQN (imposto sobre serviços de
qualquer natureza) incidente sobre importação de serviços e o alcance da expressão “cujo
resultado se verifique no País” e a isenção (heterônoma) na exportação prevista na LC n.
116/2003, Revista de Direito Tributário Internacional ano 2, n. 6, São Paulo, Quartier
Latin, 2007, p. 25.
337 Confira-se trecho: “[...]O objetivo de se isentar as exportações de serviços do pagamento
do imposto é justamente estimular a entrada de divisas no País. Ocorre que, para
caracterizar a exportação, segundo a Lei Complementar, não basta a entrada de divisas.
É preciso que o resultado se verifique no exterior. Entretanto, há controvérsias sobre o que
vem a ser ‘resultado’ do serviço, pois a norma legal não delineou o tema. Embora decisão
recente do Superior Tribunal de Justiça (ARESP 587.403/RS, em 18/10/2016) tenha sido
no sentido mais amplo da exportação de serviços, entendo ser preciso aprimorar a norma
legal para dirimir as referidas dúvidas. [...]”
338 Ministro José Delgado (Relator), acompanhado dos Ministros Francisco Falcão, Luiz Fux
e Denise Arruda. Vencido o Ministro Teori Albino Zavascki.
339 O Relator foi o Ministro Gurgel de Faria e participaram do julgamento os Ministros
Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Regina Helena Costa.
340 OLIVEIRA, Maurine Morgan Pimentel de. O Conflito de Competência entre o ISS e o
ICMS à Luz do RE 688223/PR. In: GOMES, Marcus Lívio e SCHOUERI, Luís Eduardo

1776
(Coords). A Tributação Internacional na Era Pós-BEPS: soluções globais e peculiaridades
de países em desenvolvimento. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016. v. III, p. 243-284.
341 Professor da Pós-Graduação de Direito Tributário (GV-Law) e MBA em Gestão de
Tributos e Planejamento Tributário da Escola de Administração de São Paulo (FGV
management), ambos ligados à Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) –
São Paulo. Graduado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (FDSBC).
Mestre e Pós-Graduado em Direito Tributário pela Escola de Direito da Fundação Getúlio
Vargas (FGV) – São Paulo. Advogado em São Paulo.
342 Graduado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Pós-Graduado em Direito
Tributário pela GV-Law, Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) – São
Paulo. Mestrando pelo Departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da
Universidade de São Paulo (USP). Advogado em São Paulo.
343 Decreto n. 6.759, de 5 de fevereiro de 2009. Regulamenta a administração das atividades
aduaneiras, e a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior.
Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
2010/2009/decreto/d6759.htm>. Acesso em: 15 dez. 2017.
344 Vale destacar que a inclusão de serviços e outros intangíveis no valor aduaneiro não é
exatamente uma novidade, conforme artigos 77 e 80 do Regulamento Aduaneiro.
345 Organização Mundial do Comércio – OMC. Acordo sobre a Implementação do Artigo
VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio 1994. Disponível em:
<http://www.mdic.gov.br/index.php/comercio-exterior/negociacoes-internacionais/1885-
omc-acordos-da-omc>. Acesso em: 15 dez. 2017.
346 Comitê de Valoração Aduaneira. Decisão 4.1. Décima Reunião, celebrada em 26 de abril
de 1984. Disponível em:
<https://www.receita.fazenda.gov.br/publico/Legislacao/Ins/2003/AnexoUnicoIN318.doc>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
347 SHERMAN, Saul L. e GLASHOFF, Hinrich. Customs Valuation: Commentary on the
GATT Customs Valuations Code. London: ICC Publishing S.A., 1987. p. 86.
348 Essa discussão se assenta em assertiva do Presidente do Comitê de Valoração Aduaneira.
Segundo ele: “Indeed, if the technical facilities are available to the parties to the
transaction, the software can be transmitted by wire or satellite, in wich case the question
of Customs duties does not arise. In addition, the carrier medium is usually a temporary
means of storing the instructions or data; in order to use it, the buyer has to transfer or
reproduce the data or instructions into the memory or data-base of his own system”
(SHERMAN e GLASHOFF, 1987, p. 86).
349 Decreto n. 2.498, de 13 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre a aplicação do Acordo sobre
a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT 1994.
Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d2498.htm>. Acesso em: 15
dez. 2017.
350 Receita Federal do Brasil. Solução de Consulta DISIT/SRRF10 n. 95, de 9 de maio de
2012. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?
idAto=59593&visao=anotado>. Acesso em: 15 dez. 2017.
351 Disponível em: <http://idg.carf.fazenda.gov.br>. Acesso em: 15 dez. 2017.

1777
352 CARF, Processo n. 10880-727704/2011-80, Acórdão n. 3292-000.546, Rel. Gilberto de
Castro Moreira Junior, j. 25-9-2012, p. 8.
353 Idem, p. 9.
354 Idem, p. 12.
355 Idem, p. 12-13.
356 Idem, p. 13.
357 “Medida Provisória n. 2.219, de 4 de setembro de 2001. Estabelece princípios gerais da
Política Nacional do Cinema, cria o Conselho Superior do Cinema e a Agência Nacional
do Cinema – ANCINE, institui o Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Cinema
Nacional – PRODECINE, autoriza a criação de Fundos de Financiamento da Indústria
Cinematográfica Nacional – FUNCINES, altera a legislação sobre a Contribuição para o
Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional e dá outras providências.”
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2219.htm>. Acesso em: 15
dez. 2017.
358 “Art 1º Para fins desta Medida Provisória entende-se como:
I – obra audiovisual: produto da fixação ou transmissão de imagens, com ou sem som, que
tenha a finalidade de criar a impressão de movimento, independentemente dos processos
de captação, do suporte utilizado inicial ou posteriormente para fixá-las ou transmiti-las,
ou dos meios utilizados para sua veiculação, reprodução, transmissão ou difusão (...).”
359 CARF, Processo n. 10880-727704/2011-80, Acórdão n. 3292-000.546, Rel. Gilberto de
Castro Moreira Junior, j. 25-9-2012, p. 14.
360 JFSP, Ação n. 5007448-54.2017.4.03.6100, Juíza Federal Cristiane Farias Rodrigues dos
Santos, 9ª Vara Cível Federal de São Paulo, j. 30-5-2017, p. 4.
361 JFSP, Ação n. 5007448-54.2017.4.03.6100, cit., p. 5-6.
362 TRF3, Apelação/Reexame Necessário n. 0006315-49. 2010.4.03.6119/SP
2010.61.19.006315-0/SP, 4ª T., DJ 18-5-2012.
363 JFSP, Ação n. 5007448-54.2017.4.03.6100, cit., p. 6.
364 TRF3, Apelação/Reexame Necessário n. 0006315-49. 2010.4.03.6119/SP
2010.61.19.006315-0/SP, 4ª T., DJ 18-5-2017.
365 Idem.
366 Idem.
367 “Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011. Dispõe sobre a comunicação audiovisual de
acesso condicionado; altera a Medida Provisória n. 2.228-1, de 6 de setembro de 2001, e
as Leis ns. 11.437, de 28 de dezembro de 2006, 5.070, de 7 de julho de 1966, 8.977, de 6
de janeiro de 1995, e 9.472, de 16 de julho de 1997; e dá outras providências.” Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/L12485.htm>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
368 Conforme o art. 7º da MP n. 2.228-1/2001, que instituiu a ANCINE, em seu art. 5º, são
diversas as competências das Agência Nacional, dentre as quais se destacam: (i) executar a
política nacional de fomento ao cinema, regular as atividades de fomento; (ii) regular as
atividades de fomento e proteção à industria cinematográfica e videofonográfica; e (iii)
coordenar as ações e atividades governamentais relativas às indústria cinematográfica e

1778
videofonográfica. (Medida Provisória n. 2.228-1, de 6 setembro de 2001. Esabelece
princípios gerais da Política Nacional do Cinema, cria o Conselho Superior do Cinema e a
Agência Nacional do Cinema – ANCINE, institui o Programa de Apoio ao
Desenvolvimento do Cinema Nacional – PRODECINE, autoriza a criação de Fundos de
Financiamento da Indústria Cinematográfica Nacional – FUNCINES, altera a legislação
sobre a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional e dá
outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/mpv/2228-
1.htm>). Acesso em: 15 dez. 2017.
369 ANCINE. Análise de Impacto Regulatório n. 1/2016/SEC, de 10 de novembro de 2016.
Disponível em: <https://www.ancine.gov.br/sites/default/files/consultas-publicas/AIR-
JogosEletronicos_0.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
370 ANCINE. Chamada Pública BRDE/FSA PRODAV 14/2017 – Produção de Jogos
Eletrônicos – Retificação n. 02. Disponível em: <http://www.brde.com.br/wp-
content/uploads/2017/08/Edital_PRODAV-14-
2017_Retifica%C3%A7%C3%A3o02.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
371 Idem.
372 O estudo, nesse tocante, é impreciso, pois, em vez de se referir aos tributos como
PIS/COFINS-Importação, IPI-Importação e iCMS-Importação, simplesmente os
denominou como PIS/COFINS, IPI e ICMS, o que contraria as regras de incidência sobre
produtos e mercadorias importadas.
373 Vale destacar também que a ANCINE, ao sustentar a análise de impacto fiscal, cometeu
equívoco ao citar a Solução de Consulta DISIT/SRRF10 n. 95, de 9 de maio de 2012. Isso
porque a Receita Federal, quando exarou a aludida Solução de Consulta, apesar de ter
classificado os obras de computador como obras intelectuais, a partir da interpretação dada
ao artigo 7º, XII, da Lei n. 9.610/98, expressamente afirmou que o valor aduaneiro do
software seria exclusivamente o custo ou valor do suporte físico.
374 ANCINE. Análise de Impacto Regulatório n. 1/2016/SEC, de 10 de novembro de 2016.
Disponível em: <https://www.ancine.gov.br/sites/default/files/consultas-publicas/AIR-
JogosEletronicos_0.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
375 CONFAZ. Convênio ICMS n. 181, de 28 de dezembro de 2015. Autoriza as unidades
federadas que especifica a conceder redução de base de cálculo nas operações com
softwares, programas, jogos eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres na
forma que especifica. Disponível em:
<https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/convenios/2015/cv181_15>. Acesso em:
15 dez. 2017.
376 Portaria n. 116, de 29 de novembro de 2011. Regulamenta os segmentos culturais
previstos no § 3º do artigo 18 e no artigo 25 da Lei n. 8.313, de 23 de dezembro de 1991.
Disponível em:
<http://www.cultura.gov.br/documents/10895/939065/Portaria+n%C2%BA%20116.pdf/de16dd3e-
113f-461d-b0b5-56598889a562>. Acesso em: 15 dez. 2017.
377 Lei n. 9.609, de 19 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre a proteção da propriedade
intelectual de programa de computador, sua comercialização no País, e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9609.htm>.
Acesso em: 15 dez. 2017.

1779
378 ASSIS, Jesus de Paula. Artes do Videogame. Conceitos e Técnicas. Disponível em:
<http://www2.eca.usp.br/cap/poeticasdigitais/artigos/artesdovideogame_1ponto1.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
379 RAMOS, Andy; LÓPEZ, Laura; RODRÍGUES, Anxo; MENG, Tim; e ABRAMS, Stan.
The Legal Status of Video Games, p. 20-21. Disponível em:
<http://www.wipo.int/export/sites/www/copyright/en/creative_industries/pdf/video_games.pdf
Acesso em: 15 dez. 2017.
380 Idem.
381 TJSP – Apl. Crim. N. 9110445-88.2007. 8.26.0000, 11ª Câm. Crim., Rel. Daniela de
Carvalho Duarte, j. 27-8-2010.
382 WACHOWICZ, Marcos. Jogos Digitais Educacionais como Bens Informáticos:
Elementos que integram sua tutela jurídica enquanto bem intelectual. In GAMA, Lynn
Rosalina; CARDOSO, Hugo S. P.; DE SOUZA, Claudio R. Barbosa. Interfaces entre
Games, Pesquisa & Mercado. Salvador: EDIBA, 2016, p. 1.
383 WACHOWICZ, op. cit., p. 2.
384 Idem, p. 5.
385 Idem, p. 6.
386 MENEGHETTI, Tarcísio Vilton. Autoria e Titularidade em Jogos Eletrônicos.
Dissertação (Mestrado) UFSC. Florianópolis: 2013, p. 52-53.
387 WACHOWICZ, op. cit., p. 8.
388 Idem, p. 9.
389 DE LA HAZA, Andy Ramos. Video Games: Computer Programs or Creative Works?,
Disponível em: <http://www.wipo.int/wipo_magazine/en/2014/04/article_0006.html>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
390 MENEGHETTI, op. cit., p. 52.
391 MENEGHETTI, op. cit., p. 155.
392 Idem, p. 159.
393 Idem, p. 204.
394 Idem, p. 206.
395 WACHOWICZ, op. cit., p. 12.
396 Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da PUC-SP. Pós-Graduado em Direito
Tributário pela Fundação Getúlio Vargas. Bacharelando em Ciências Contábeis pela
Faculdade de Economia, Administração, Contábeis e Atuariais da PUC-SP. Advogado em
São Paulo.
397 Bacharel pela Faculdade de Direito da PUC-RJ. Pós-Graduado em Direito Empresarial
pela Fundação Getúlio Vargas. Mestre em Direito e Contabilidade pela London School of
Economics and Political Sciences. Membro da Associação Brasileira de Direito
Financeiro, do Instituto Brasileiro de Direito Tributário e da International Fiscal
Association. Advogado em São Paulo.
398 Vale destacarmos que a Lei do Software veio a substituir a Lei n. 7.646, de 18 de
dezembro de 1987, à qual até então cabia assegurar a proteção da propriedade intelectual

1780
sobre programas de computador.
399 CARVALHO, Paulo de Barros, apud CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16. ed. São
Paulo: Malheiros, 2012. p. 48-49.
400 “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de
institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente,
pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do
Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”
401 Neste sentido, vide a energia elétrica que, embora não seja bem móvel corpóreo, foi
considerada mercadoria para fins de incidência do ICMS.
402 “Art. 9º O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licença.”
403 “Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer
meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente
no futuro, tais como: [...] XII – os programas de computador.”
404 ASSUNÇÃO, Matheus Carneiro, O ICMS nas transferências eletrônicas de software,
Revista Jurídica da Presidência da República, Brasília, v. 11, n. 93, p. 1-35, fev./maio
2009.
405 “Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) III – serviços de
qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.”
406 Em posição contrária, Fernando Dias Fleury Curado e Robinson Sakiyama Barreirinhas
entendem que “se o constituinte tivesse a intenção de restringir a competência municipal
às obrigações de fazer, não teria se referido a serviços de qualquer natureza, Ademais, o
próprio Código Civil brasileiro dispõe que o empresário dedica-se à produção ou
circulação de bens e de serviços (art. 966), reconhecendo a característica de circulação
econômica em relação aos serviços. (...) Portanto, por estas razões e, principalmente, à luz
do mais recente pronunciamento do STF, adotamos o entendimento de que o critério
material do ISS é a circulação econômica de bens imateriais, que não se restringe à
obrigação de fazer, mas abrange a cessão de direitos, locação de bens móveis,
arrendamento etc.” (BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama; CURADO, Fernando Dias
Fleury. Manual do ISS. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 41-42).
407 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 182.
408 “Note-se, por outro lado, que a remuneração que o licenciador recebe do licenciado não é
o preço de serviço algum (base de cálculo do ISS); pelo contrário, é relativa à cessão do
direito de uso do software. Poderia – voltamos a escrever – integrar a base de cálculo de
um ainda inexistente imposto residual sobre cessão de direitos; jamais a base de cálculo do
ISS. Em suma, o valor recebido (pelo licenciador, do licenciado) pela cessão do direito de
uso do software não pode compor a base de cálculo do ISS, que, por injunção
constitucional, somente pode ser o preço do serviço» (CARRAZZA, Roque Antonio.
ICMS. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 182-183).
409 “Art. 4º Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador,
contratante de serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa de computador,
desenvolvido e elaborado durante a vigência de contrato ou de vínculo estatutário,
expressamente destinado à pesquisa e desenvolvimento, ou em que a atividade do
empregado, contratado de serviço ou servidor seja prevista, ou ainda, que decorra da

1781
própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos.”
410 Em opinião diversa, Yamashita afirma que “[...] como o encomendante torna-se, via de
regra, o proprietário do programa de computador (art. 4º supracitado) e como nenhum
proprietário em sã consciência licenciaria o uso do próprio software a si mesmo, nos
‘softwares por encomenda’ é juridicamente impossível o licenciamento do uso do
software, mas tão somente o desenvolvimento por encomenda. E mesmo que o
encomendante não se torne proprietário do software, é evidente que o desenvolvimento do
software não se confunde com o licenciamento de seu uso, da mesma forma que a
empreitada de construção de um edifício não se confunde nem com sua propriedade e nem
com sua locação” (YAMASHITA, Douglas. Licenciamento de Software no Brasil: Novas
Tendências Tributárias, Revista Dialética de Direito Tributário, v. 141, São Paulo,
Dialética, 2007, p. 64).
411 Greco, em sua obra Internet e Direito, discorre sobre o tema para concluir que em uma
interpretação literal, partindo de uma concepção estrita de tipicidade tributária, o software
não seria alcançado pela tributação por não constituir uma mercadoria (GRECO, Marco
Aurélio. Internet e Direito. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2000. p. 93-95). No entanto, ainda
segundo o brilhante autor, uma interpretação que prestigie os fins sociais da lei, os
princípios constitucionais e a evolução histórica do fenômeno jurídico leva a uma
conclusão diametralmente oposta no sentido de que as operações com software,
contenham ou não suportes físicos, estão abrangidas pela materialidade da competência
tributária do ICMS.
412 No mesmo sentido, Gonçalves: “O download de software é, provavelmente, a maneira de
distribuição de software que apresenta a maior quantidade de diferentes suportes físicos de
uma só vez. [...] Se fosse possível olharmos o fluxo de informações de um grande
backbone da Internet, não conseguiríamos compreender cognoscitivamente a enorme
quantidade de informação que por ele trafega num determinado período de tempo. Isto
porque um software, uma imagem digital ou um som digital são rigorosamente idênticos
em sua essência, sendo todos eles compostos por pequenos pacotes de dados, e em última
análise, por uma sequência lógica e determinada – mas incompreensível aos seres
humanos – de zeros e uns” (GONÇALVES, Renato Lacerda de Lima. A Tributação do
Software no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 63-64).
413 No mesmo sentido, vide os seguintes julgados no STJ: RESP 216.967-SP, RESP
633.405/RS, RESP 222.001/SP e RMS 5.934/RJ.
414 Com relação à suspensão da expressão “ainda que realizadas por transferência eletrônica
de dados”, conforme redação original do art. 2º, § 1º, VI, da Lei Estadual n. 7.098/98.
415 “Artigo 73 (SOFTWARES (sic.)) – Fica reduzida a base de cálculo do imposto incidente
nas operações com softwares, programas, aplicativos e arquivos eletrônicos, padronizados,
ainda que sejam ou possam ser adaptados, disponibilizados por qualquer meio, de forma
que a carga tributária resulte no percentual de 5% (cinco por cento).”
416 Publicado em 5 de outubro de 2017, com efeitos a partir de 1º de abril de 2018.
417 Curiosamente, o Município de São Paulo editou, em julho de 2017, o Parecer Normativo
n. 1 para fixar a sua interpretação acerca das operações com software realizadas por
transferência eletrônica de dados (download) ou streaming que estariam todas, sem
distinção, sujeitas ao imposto municipal. Confira-se: “Art. 1º O Licenciamento ou cessão

1782
de direito de uso de programas de computação, por meio de suporte físico ou por
transferência eletrônica de dados (‘download de software’), ou quando instalados em
servidor externo (‘Software as a Service – SaaS’), enquadra-se no subitem 1.05 da lista de
serviços do ‘caput’ do artigo 1º da Lei n. 13.701, de 24 de dezembro de 2003. Parágrafo
único: O enquadramento a que se refere o ‘caput’, no tocante ao SaaS, não prejudica o
enquadramento de parte da sua contratação nos subitens 1.03 e 1.07 da lista de serviços do
‘caput’ do artigo 1º da Lei n. 13.701, de 2003. Art. 2º O enquadramento tratado no artigo
1º deste parecer normativo independe de o software ter sido programado ou adaptado para
atender à necessidade específica do tomador (‘software por encomenda’) ou ser
padronizado (software de prateleira ou ‘off the shelf’)”.
418 “Art. 23. A base de cálculo do imposto nas operações com mercadorias, apurada
conforme previsto no Capítulo anterior, terá seu valor reduzido para: (...) LXXXI – valor
que resulte em carga tributária equivalente a 5% (cinco por cento), a partir de 1º de
outubro de 2016, nas operações com softwares, programas, jogos eletrônicos, aplicativos,
arquivos eletrônicos e congêneres, padronizados, ainda que sejam ou possam ser
adaptados, disponibilizados por qualquer meio, inclusive nas operações efetuadas por
meio de transferência eletrônica de dados.”
419 Mestre em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo
(USP). Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários
(IBET). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e em
Ciências Contábeis pela Pontifícia Universidade de São Paulo (PUC-SP). Membro do
Conselho da Associação dos Tributaristas de Alagoas (ATRIAL), da Associação Paulista
de Estudos Tributários (APET), do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT) e do
Tax Executives Institute (TEI). Professor convidado de Direito Tributário em Escolas de
Pós-Graduação e Especialização em Alagoas e São Paulo.
420 Mestranda em Direito pela Universidade Federal de Alagoas. MBA em Direito Tributário
pela Fundação Getúlio Vargas – FGV. Graduada em Direito pelo Centro de Estudos
Superiores de Maceió – CESMAC. Professora Universitária em Alagoas. Secretária-Geral
da Associação dos Tributaristas de Alagoas (ATRIAL).
421 MELL, Peter; GRANCE, Tim. The NIST Definition of Cloud Computing (Sep., 2011), p.
2. Disponível em: <http://nvlpubs.nist.gov/nistpubs/Legacy/SP/nistspecialpublication800-
145.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
422 DOLAN, Fiona; CHAIRMAN. Cloud Computing and Revenue Recognition. PwC
Telecom Industry Accounting Group. (May, 2015), p. 2. Disponível em:
<http://www.pwc.com/gx/en/communications/publications/assets/pwc-cloud-computing-
and-revenue-recognition-whitepaper.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
423 OCDE. Cloud Computing: The Concept, Impacts and the Role of Government Policy.
OECD Digital Economy Papers, No. 240. Paris: OECD Publishing, 2014. Grupo de
Pesquisa Tributação na Era Digital do NEF/FGV Direito SP Tributação na era digital:
Renda × Consumo. Disponível em: <https://www.jota.info/artigos/tributacao-na-era-
digital-renda-x-consumo-20102017>. Acesso em: 15 dez. 2017. Para uma visão mais
profunda sobre o cloud computing, vide: 7 RAVAZI, Amir R.; STROMMEN-
BAKHTIAR, Abbas. In: HILL, Richard; MAHMOOD, Zaigham. Cloud computing for
enterprise architectures. London: Springer, 2011. p. 53; FINGAR, Peter;
MULHOLLAND, Andy; PYKE. Enterprise Cloud Computing: A Strategy Guide for

1783
Business and technology leaders – and the rest of us. Tampa, Fla: Meghan-Kiffer Press,
c2010.
424 CANNAS, Francesco. The VAT Treatment of Cloud Computing: Legal Issues and
Practical Difficulties. World Journal of VAT/GST Law, 2016. Grupo de Pesquisa
Tributação na Era Digital do NEF/FGV Direito SP Tributação na era digital: Renda ×
Consumo. Disponível em: <https://www.jota.info/artigos/tributacao-na-era-digital-renda-
x-consumo-20102017>. Acesso em: 15 dez. 2017.
425 MELL, Peter; GRANCE, Tim. The NIST Definition of Cloud Computing (Sep., 2011), p.
2. Disponível em: <http://nvlpubs.nist.gov/nistpubs/Legacy/SP/nistspecialpublication800-
145.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
426 Idem.
427 Idem.
428 Idem.
429 DOLAN, Fiona; CHAIRMAN. Cloud Computing and Revenue Recognition. PwC
Telecom Industry Accounting Group. (May, 2015), p. 3. Disponível em:
<http://www.pwc.com/gx/en/communications/publications/assets/pwc-cloud-computing-
and-revenue-recognition-whitepaper.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
430 BORGES, Hélder Pereira; DE SOUZA, José Neuman; MURY, Antonio Roberto; e
SCHULZE, Bruno; Computação em Nuvem, p. 33-37. Disponível em:
<http://livroaberto.ibict.br/bitstream/1/861/1/COMPUTAÇÃO%20EM%20NUVEM.pdf>.
MACEDO, Alberto. Tributação dos bens digitais, p. 17. Disponível em:
<https://direitosp.fgv.br/sites/direitosp.fgv.br/files/arquivos/tributacao_de_software_pelo_iss_e_os_potenc
Acesso em: 15 dez. 2017.
431 MACEDO, Alberto. Tributação dos bens digitais, p. 16. Disponível em:
<https://direitosp.fgv.br/sites/direitosp.fgv.br/files/arquivos/tributacao_de_software_pelo_iss_e_os_potenc
Acesso em: 15 dez. 2017.
432 LEWIS, Alesia. A closer look at sales and use taxation of the cloud. Mar., 2016.
Disponível em: <https://www.journalofaccountancy.com/newsletters/2016/mar/sales-and-
use-taxation-of-cloud.html>. Acesso em: 15 dez. 2017.
433 Ernst & Young LLP. Worldwide Cloud Computing Tax Guide (2015). Disponível em:
<http://www.ey.com/gl/en/services/tax/worldwide-cloud-computing-tax-guide---
introduction>. Acesso em: 15 dez. 2017.
434 SAAKE, Ron; MALINE, Mandana. International tax issues and cloud computing.
Revisão da tributação internacional | Intangíveis. Deloitte. 2013, p. 47-50. Disponível em:
<https://www2.deloitte.com/content/dam/Deloitte/us/Documents/Tax/us-tax-itr-
intangibles-guide.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
435 DOLAN, Fiona; CHAIRMAN. Cloud Computing and Revenue Recognition. PwC
Telecom Industry Accounting Group. (May, 2015), p. 1. Disponível em:
<http://www.pwc.com/gx/en/communications/publications/assets/pwc-cloud-computing-
and-revenue-recognition-whitepaper.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
436 Ernst & Young LLP. Worldwide Cloud Computing Tax Guide (2015). Disponível em:
<http://www.ey.com/gl/en/services/tax/worldwide-cloud-computing-tax-guide---
introduction>. Acesso em: 15 dez. 2017.

1784
437 WASSER, Michael; HELMES, Rebecca. Sales Tax on Cloud Computing: The Need for
Clarity and Predictability. Weekly State Tax Report, Ernst. (Jan., 2017). Disponível em:
<https://www.bna.com/sales-tax-cloud-n73014450102>. Acesso em: 15 dez. 2017.
438 LIVNI, Ben. The Storm of Cloud Computing Taxation. (July, 2017). Disponível em:
<http://www.taxanalysts.org/node/196876>. Acesso em: 15 dez. 2017.
439 FRANTS, Vlad. The Evolution of Cloud Computing Taxation: Characterizing and
Sourcing Cloud Computing Payments in an Uncertain World (2013). Disponível em:
<https://www.americanbar.org/groups/young_lawyers/publications/the_101_201_practice_series/the_evol
Acesso em: 15 dez. 2017.
440 Ernst & Young LLP. Worldwide Cloud Computing Tax Guide (2015). Disponível em:
<http://www.ey.com/gl/en/services/tax/worldwide-cloud-computing-tax-guide---
introduction>. Acesso em: 15 dez. 2017.
441 Ibidem.
442 A despeito do aumento de receita previsto com os serviços, há fontes que indicam que a
perda de arrecadação tributária com serviços de computação em nuvem está estimada
entre 27 e 33 bilhões de dólares até 2022. LIVNI, Ben. The Storm of Cloud Computing
Taxation. (July, 2017). Disponível em: <http://www.taxanalysts.org/node/196876>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
443 WASSER, Michael; HELMES, Rebecca. Sales Tax on Cloud Computing: The Need for
Clarity and Predictability. Weekly State Tax Report, Ernst. (Jan., 2017). Disponível em:
<https://www.bna.com/sales-tax-cloud-n73014450102>. Acesso em: 15 dez. 2017.
444 Tax Bulletin Sales and Use Tax TB-ST-740, October 21, 2016, New York State
Department of Taxation and Finance, p. 1. Disponível em:
<https://www.tax.ny.gov/pdf/tg_bulletins/sales/b16_740s.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
445 Decision DTA n. 824336, Tax Appeals Tribunal, State Of New York, March 16, 2015, p.
16-19. Disponível em: <https://www.dta.ny.gov/pdf/decisions/824336.dec.pdf?
_ga=1.208844626.1355548187.1421825327>. Acesso em: 15 dez. 2017.
446 Advisory Opinion, Petition n. S120425A, Commissioner Of Taxation And Finance,
Office of Counsel Advisory Opinion Unit, New York State Department of Taxation and
Finance, April 14, 2015, p. 5. Disponível em:
<https://www.tax.ny.gov/pdf/advisory_opinions/sales/a15_2s.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
447 Advisory Opinion, Petition n. S130314A, Commissioner Of Taxation And Finance,
Office of Counsel Advisory Opinion Unit, New York State Department of Taxation and
Finance, July 6, 2017, p. 4. Disponível em:
<https://www.tax.ny.gov/pdf/advisory_opinions/sales/a17_9s.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
448 Advisory Opinion, Petition n. S130314A, op. cit., p. 1.
449 2016 Act 84, Pennsylvania General Assembly, TAX REFORM CODE OF 1971 –
OMNIBUS AMENDMENTS, Act of Jul. 13, 2016, P.L. 526, n. 84. Disponível em:
<http://www.legis.state.pa.us/cfdocs/legis/li/uconsCheck.cfm?
yr=2016&sessInd=0&act=84>. Acesso em: 15 dez. 2017.
450 Vide Pennsylvania Statutes Title 72 P.S. Taxation and Fiscal Affairs § 7201. Definitions.

1785
Disponível em: <http://codes.findlaw.com/pa/title-72-ps-taxation-and-fiscal-affairs/pa-st-
sect-72-7201.html>. Acesso em: 15 dez. 2017.
451 Letter Ruling SUT-17-002 (“SUT-17-002”), Pennsylvania Department of Revenue (the
“Department”), p. 1. Disponível em:
<http://www.revenue.pa.gov/GeneralTaxInformation/TaxLawPolicies
BulletinsNotices/Documents/Letter%20Rulings/SUT/SUT-17-002.pdf>. Acesso em: 15
dez. 2017.
452 Letter Ruling 12-8: Cloud Computing, Department of Revenue of Massachusetts, 8 de
novembro de 2013. Disponível em: <http://www.mass.gov/dor/businesses/help-and-
resources/legal-library/letter-rulings/letter-rulings-by-years/2012-rulings/lr-12-8.html>.
Com base no Regulamento 830 CMR 64H.1.3 830 de Massachusetts (14) (a). 830 CMR
64H.1.3 Computer Industry Services and Products, Department of Revenue, 20 de outubro
de 2006, atualizado até 22 de setembro de 2017, p. 15. Disponível em:
<http://www.mass.gov/courts/docs/lawlib/800-899cmr/830cmr64h.pdf>. Acessos em: 15
dez. 2017.
453 É o que acontece no Estado da Pensilvânia. Para mais detalhes sobre a tributação dos
Estados norte-americanos, vide DUNN, Jennifer. Sales Tax by State: Is SaaS Taxable?,
TaxJar, Aug. 9, 2016 (listing the state sales tax treatment of cloud computing transactions
in each state) ou DONNINI, Gerald; EISENSTEIN, Martin; MILLER, Keller; YOPP,
Mark. SaaS Sales and Use Tax: Reconciling Varying State Rules to Avoid Unforeseen
Tax Traps. Disponível em: <http://media.straffordpub.com/products/saas-sales-and-use-
tax-reconciling-varying-state-rules-to-avoid-unforeseen-tax-traps-2015-06-
09/presentation.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
454 LIVNI, Ben. The Storm of Cloud Computing Taxation. (July, 2017). Disponível em:
<http://www.taxanalysts.org/node/196876>. Acesso em: 15 dez. 2017.
455 Idem.
456 LIVNI, op. cit.
457 Idem.
458 Ernst & Young LLP. Worldwide Cloud Computing Tax Guide (2015). Disponível em:
http://www.ey.com/gl/en/services/tax/worldwide-cloud-computing-tax-guide---
introduction>. Acesso em: 15 dez. 2017.
459 CANNAS, Francesco. The VAT Treatment of Cloud Computing: Legal Issues and
Practical Difficulties. World Journal of VAT/GST Law, 2016.
460 Cf. art. 44 da Diretiva 2008/8/EC.
461 Vide art. 7º do Regulamento de Execução (UE) n. 282/2011 do Conselho, de 15 de março
de 2011.
462 Vide art. 58 da Diretiva 2008/8/EC.
463 Ernst & Young LLP. Worldwide Cloud Computing Tax Guide. (2015). Disponível em:
<http://www.ey.com/gl/en/services/tax/worldwide-cloud-computing-tax-guide---
introduction>, p. 6. PwC Taxing the cloud: a foggy endeavour, p. 4. Disponível em:
<https://www.pwc.com/gx/en/communications/publications/assets/pwc-taxing-the-cloud-
a-foggy-endeavour.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
464 Idem.

1786
465 ALMEIDA, Flora Ferreira de; MOREIRA JUNIOR, Gilberto de Castro. Cloud
computing e a tributação do software as a service (SaaS). In: Estudos de Direito
Tributário em Homenagem ao Prof. Gerd Willi Rothmann. São Paulo: Quartier Latin,
2016. p. 589-604.
466 Antes do referido parecer, o Fisco Paulistano havia dado respostas divergentes às
consultas que lhe foram formuladas (apontado para a não incidência e incidência de ISS,
respectivamente), a primeira realizada pelo iTunes (SF/DEJUG n. 17, de 2 de abril de
2013), e a outra realizada pelo Netflix (SF/DJUG n. 65, de 6 de dezembro de 2012).
467 Vale mencionar que, na nossa visão, seguindo as orientações de Breyner, o Parecer
Normativo agride a irretroatividade tributária, uma vez que se proclama “interpretativo” e
revoga “Soluções de Consulta emitidas antes da publicação deste ato e com ele em
desacordo, independentemente de comunicação aos consulentes”, indo de encontro,
também à jurisprudência sedimentada no STF RE 176.626 SP (BREYNER, Frederico
Menezes. O parecer do fisco paulistano sobre ISS de software. Disponível em:
<https://jota.info/artigos/o-parecer-do-fisco-paulistano-sobre-iss-de-software-06092017>).
Acesso em: 15 dez. 2017.
468 O Convênio ICMS n. 181/2015 prevê, entre outros, a competência dos Estados para
tributar, pelo ICMS, as transferências via download, de aplicativos, programas de
computador, jogos e outros.
469 O Convênio ICMS n. 106/2017 prevê a possibilidade de cobrança do ICMS nas
“operações com bens e mercadorias digitais, tais como software, programas, jogos
eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres, que sejam padronizados, ainda
que tenham sido ou possam ser adaptados, comercializadas por meio de transferência
eletrônica de dados”.
470 Estão para ser julgadas no Supremo Tribunal Federal duas ADIs (n. 5.576/SP e n.
5.659/MG), em que se questiona a incidência do ICMS sobre o download de software .
471 Note-se que, antes mesmo da aprovação da norma pelo CONFAZ, ao menos o Estado de
São Paulo já sinalizava no sentido da tributação das operações com bens eletrônicos.
472 O caput do artigo 1º estabelece que o licenciamento de software, por meio físico ou
download ou quando instalado em servidor externo (Software as a Service – SaaS) deverá
ser enquadrado no subitem 1.05 (licenciamento ou cessão de direito de uso de programas
de computação) da Lei Municipal n. 13.701/2003, sujeito à alíquota de 2%.
473 Breyner tece críticas a respeito do tema, apresentando exemplos que comprovariam que
(i) o suporte técnico, em algumas oportunidades, sequer seria fato gerador de ISS, como
no caso de suporte para acesso ao software, bem como (ii) o processamento de dados, no
mais das vezes, seria mera atividade-meio desempenhada pelo contratado para viabilizar
ao contratante os benefícios e a utilidade do objeto contratado, qual seja, o acesso e uso do
software, além de serem realizadas no próprio interesse do contratado (BREYNER,
Frederico Menezes. O parecer do fisco paulistano sobre ISS de software. Disponível em:
<https://jota.info/artigos/o-parecer-do-fisco-paulistano-sobre-iss-de-software-06092017>.
Acesso em: 15 dez. 2017).
474 MACEDO, Alberto. ISS versus ICMS-Mercadoria: Licenciamento de Software e a
Impossibilidade do Avanço do Conceito Constitucional de Mercadoria como Bem
Imaterial. In: MACEDO, Alberto; AGUIRREZÁBAL, Rafael; PINTO, Sérgio Luiz de

1787
Moraes; ARAÚJO, Wilson José de (Coords.). Gestão Tributária Municipal e Tributos
Municipais. São Paulo: Quartier Latin, 2017. v. 6, p. 57-99.
475 Idem, ibidem.
476 Vimos, anteriormente, que o SaaS, por exemplo, é mais que uma disponibilização pura e
simples de software.
477 Na jurisprudência do STF, o conceito constitucional de prestação de serviços, no
contexto da tributação do ISS, parece ter mudado no sentido de não estar mais restrito às
típicas obrigações de fazer, abrangendo o oferecimento de utilidade de qualquer natureza
para outrem (RE 547.245/SC) “a partir de um conjunto de atividades imateriais, prestado
com habitualidade e intuito de lucro, podendo estar conjugado ou não à entrega de bens ao
tomador” (RE 651.703/PR), não obstante o teor da Súmula Vinculante 31.
478 Nesse sentido, também parecer ter sido a linha adotada, no âmbito federal, na Solução de
Consulta COSIT n. 191/2017.
479 Súmula Vinculante 31: “É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de
qualquer natureza – ISS sobre operações de locação de bens móveis”.
480 O próprio STF, ao analisar a situação de cessão de uso de marca, em sede de reclamação,
ressaltou a inaplicabilidade da Súmula (distinguish) ao caso (Rcl 8623, AgR, Rel. Min.
Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. 22-2-2011, DJe 10-3-2011).
481 Sobre o tema do estabelecimento permanente nas plataformas de tecnologia, vide:
GARCIA, Regina Vitoria Soares. A tributação do ISS na sociedade de informação.
Dissertação apresentada à Faculdade de Direito da USP, 2013, p. vi.
482 Para mais detalhes sobre a oscilação jurisprudencial no âmbito do ISS, vide as seguintes
colunas de Gustavo Brigagão em jornal eletrônico: BRIGADÃO, Gustavo. Oscilação
jurisprudencial do ISS se alia à ineficiência legislativa. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2017-mar-15/consultor-tributario-oscilacao-jurisprudencial-
iss-alia-ineficiencia-legislativa>. Acesso em: 15 dez. 2017. Competência tributária
relativa à incidência do ISS volta a ficar incerta. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2015-abr-22/competencia-tributaria-incidencia-iss-volta-
ficar-incerta>. Acesso em: 15 dez. 2017.
483 O art. 4º da LC n. 116/2003 define o conceito de “estabelecimento prestador”.
484 No mesmo sentido, vide as conclusões de Gabriel Batti: BATTI, Gabriel Bez. ISS sobre
os serviços de computação em nuvem: um passo adiante. Disponível em:
<http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI263824,11049-
ISS+sobre+os+servicos+de+computacao+em+nuvem+um+passo+adiante>. Acesso em:
15 dez. 2017.
485 Professor Titular de Direito Financeiro da Faculdade de Direito da USP. Foi Vice-
Presidente da International Fiscal Association – IFA. Advogado.
486 Superior Tribunal de Justiça, Súmula 334: “O ICMS não incide no serviço dos
provedores de acesso à Internet”.
487 “Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de
telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades
relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de
informações.

1788
§ 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se
seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os
direitos e deveres inerentes a essa condição. (...).”
488 “Art. 21. Compete à União: (...)
XI – explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de
telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a
criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais.”
489 Nas palavras do Prof. Newton de Lucca, o provedor presta “um serviço de natureza vária,
seja franqueando o endereço na Internet, seja armazenando e disponibilizando o site para a
rede, seja prestando e coletando informações etc. É designado, tecnicamente, de Provedor
de Serviços de Conexão à Internet (PSC), sendo a entidade que presta o serviço de
conexão à Internet (SCI).” (DE LUCCA, Newton. Títulos e Contratos Eletrônicos: o
advento da informática e suas consequências para a pesquisa jurídica. In: DE LUCCA,
Newton et al. (Orgs.). Direito & Internet. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 60).
490 Cf. Norma n. 4/1995, aprovada pela Portaria n. 148, de 31 de maio de 1995.
491 STJ, EREsp 456.650/PR. Rel. Min. José Delgado, Primeira Seção, j. 11-5-2005.
492 “Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de
telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades
relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de
informações.
§ 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se
seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os
direitos e deveres inerentes a essa condição. (...)”
493 Nos termos do voto do Min. Franciulli Netto, relator para acórdão.
494 “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de
institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente,
pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do
Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”
495 Também para afastar a incidência do ICMS sobre os valores cobrados a título de acesso,
adesão, ativação, habilitação, disponibilidade, assinatura e outros serviços suplementares e
facilidades adicionais que aperfeiçoem ou apliquem o processo de comunicação; a locação
de aparelhos e outros serviços similares; as atividades das programadoras de TV a cabo;
serviços acessórios ou suplementares aos serviços de comunicação.
496 Exemplo disso é o contrato utilizado pela Universo On Line, disponível em:
<http://download.uol.com.br/publicidade/termos_e_condicoes.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
497 MACHADO, Hugo de Brito. Tributação na Internet. In: MARTINS, I. G. S. (Org.).
Pesquisas Tributárias. n. 7, São Paulo: RT, 2001. p. 87.
498 CARRAZZA, Roque Antonio. O ICMS. 11. ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2006.
p. 174.
499 MACHADO, Hugo de Brito. O ICMS e a radiodifusão, Revista Dialética de Direito
Tributário, n. 23. São Paulo, Dialética, 1997.

1789
500 CORAZZA, Edison Aurélio. ICMS sobre Prestações de Serviços de Comunicação. São
Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 122. Cf., no mesmo sentido, ÁVILA, Humberto. Imposto
sobre a Prestação de Serviços de Comunicação. Conceitos de Prestação de Serviço de
Comunicação. Intributabilidade das atividades de veiculação de publicidade em painéis e
placas. Inexigibilidade de Multa, Revista Dialética de Direito Tributário, n. 143, São
Paulo, Dialética, 2007. p. 123.
501 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Tributação na internet. In: MARTINS, Ives Gandra da
Silva (Coord.); SCARTEZZINI, Ana Maria Goffi Flaquer et al. Pesquisas tributárias:
Tributação na internet. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 44.
502 MACHADO, Hugo de Brito. Aspectos fundamentais do ICMS. 2. ed. São Paulo:
Dialética, 1999. p. 63.
503 Cf. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Tributação na Internet. In: MARTINS, Ives
Gandra da Silva (Org.); SCARTEZZINI, Ana Maria Goffi Flaquer et al. Pesquisas
Tributárias: Tributação na internet. n. 7. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 108.
Falando sobre radiodifusão:
“Por outro lado, entendida a radiodifusão como comunicação, vale dizer, se considerada a
relação entre quem emite as informações, e quem as recebe, tem-se que concluir que essa
prestação de serviço não é onerosa, mas gratuita, porque o destinatário da ‘comunicação’,
além de não identificado, nada paga por ela. Entendida a radiodifusão como serviço de
comunicação, ter-se-á de entender que se trata de uma prestação não onerosa, que nos
termos da lei complementar não configura hipótese de incidência do imposto”.
504 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS – comunicação: sua Não Incidência sobre a
Denominada Tarifa de Assinatura Básica Mensal – Questões Conexas, Revista Dialética
de Direito Tributário, n. 155, São Paulo, Dialética, 2008, p. 88.
505 “Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação
dada pela Emenda Constitucional n 3, de 1993) (...)
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda
Constitucional n. 3, de 1993) (...)
X – não incidirá: (...)
d) nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de
sons e imagens de recepção livre e gratuita; (Incluído pela Emenda Constitucional n. 42,
de 19-12-2003).”
506 Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, AC com Revisão n. 636.044-5/1-00, Rel.
Antonio Carlos Villen, Décima Câmara de Direito Público, j. 16-6-2008.
507 No mesmo sentido: CORAZZA, Édison Aurélio. ICMS sobre Prestações de Serviços de
Comunicação. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 24.
508 MACHADO, Hugo de Brito. Aspectos Fundamentais do ICMS. São Paulo: Dialética,
1997. p. 37.
509 A Cláusula Primeira do Convênio ICMS n. 69/98, sob referência, diz que “os signatários
firmam entendimento no sentido de que se incluem na base de cálculo do ICMS incidente
sobre prestações de serviços de comunicação os valores cobrados a título de acesso,
adesão, ativação, habilitação, disponibilidade, assinatura e utilização dos serviços, bem
assim aqueles relativos a serviços suplementares e facilidades adicionais que otimizem ou

1790
apliquem o processo de comunicação, independentemente da denominação que lhes seja
dada”.
510 STJ, REsp 402047/MG, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 1ª Turma, j. 4-11-2003,
DJ 4-12-2003, p. 214.
511 REsp 1176753/RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Min. Mauro
Campbell Marques, Primeira Seção, j. 28-11-2012, DJe 19-12-2012.
512 STF, ARE 782749 RG/RS, Rel. Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, j. 25-6-2015.
513 Código Civil: “Art. 594. Toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou
imaterial, pode ser contratada mediante retribuição”.
514 Código Civil: “Art. 593. A prestação de serviço, que não estiver sujeita às leis
trabalhistas ou a lei especial, reger-se-á pelas disposições deste Capítulo”.
515 AZEVEDO, Álvaro Vilaça. Curso de Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações. 7. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 69.
516 STF, Re 446.003 AgR/PR, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, j. 30-5-2006.
517 STF, RE n. 116.121-3/SP, Rel. Min. Octavio Gallotti, Tribunal Pleno, j. 17-10-2000.
518 BRANDÃO, Eduardo Rangel; MORAES, Anamaria de. Formatos de anúncios
veiculados na internet. In: 6º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em
Design, 2004, São Paulo. Anais do 6º Congresso Brasileiro de Pesquisa e
Desenvolvimento em Design. São Paulo: AEnD BR – Associação de Ensino de Design do
Brasil, 2004, p. 8.
519 STJ, Resp n. 888.852/ES, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 4-11-2008.
520 CARRAZZA, Roque Antonio. O ICMS. 11.ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2006.
p. 174.
521 Mestre e Doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP. MBA em
Gestão Pública Tributária pela Fundação Dom Cabral – FDC. Professor de Direito
Tributário no Insper, FGV, IBDT e IBET. Auditor Fiscal, Representante de São Paulo na
Câmara Técnica Permanente da ABRASF. Assessor Especial da Secretaria Municipal da
Fazenda de São Paulo. Ex-Subsecretário da Receita Municipal de São Paulo. Ex-
Presidente do Conselho Municipal de Tributos de São Paulo.
522 Aqui, definiremos tributação sobre o consumo aquela limitada aos impostos ISS, ICMS,
IPI e IOF. Não entram nessa classe as contribuições sociais PIS/PASEP (Contribuição
para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor
Público) e COFINS (Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social).
Isso porque, em que pese as referidas contribuições possuírem efeitos econômicos
similares aos impostos sobre consumo, a materialidade dessas contribuições se distancia
juridicamente das materialidades daqueles impostos, na medida em que, em termos
jurídicos, essas contribuições não incidem sobre a circulação de bens e serviços, mas sim
sobre a receita bruta decorrente da circulação de bens e serviços. Para maiores detalhes, cf.
MACEDO, Alberto. ISS, ICMS-Mercadoria e o Caso “Embalagens” (ADI-MC 4.389 DF)
– A Constitucionalização, pelo STF, de Critérios que não são Constitucionais. In:
MACEDO, Alberto; CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e (Coords.). Tributação
Indireta Empresarial: Indústria, Comércio e Serviços. São Paulo: Quartier Latin, 2016. p.
809-846.

1791
523 Nesse sentido, cf.: MACEDO, Alberto. ISS versus ICMS-Mercadoria: Licenciamento de
Software e a Impossibilidade do Avanço do Conceito Constitucional de Mercadoria Como
Bem Imaterial. In: MACEDO, Alberto; AGUIRREZÁBAL, Rafael; PINTO, Sérgio Luiz
de Moraes; ARAÚJO, Wilson José de (Coords.). Gestão Tributária Municipal e Tributos
Municipais. São Paulo: Quartier Latin, 201,7. v. 6 p. 57-99; MACEDO, Alberto.
Licenciamento de Software e Software as a Service (SaaS). A Impossibilidade do Avanço
do Conceito Constitucional de Mercadoria como Bem Imaterial e suas Implicações na
Incidência do ISS, do ICMS e dos Tributos Federais. In: PISCITELLI, Tathiane;
VASCONCELOS, Roberto (Coords.). Tributação de Bens Digitais. São Paulo, FGV-SP,
2017, no prelo; MACEDO, Alberto. Licenciamento de software não pode ser considerado
mercadoria virtual. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-dez-13/alberto-
macedo-stf-desvirtuar-conceito-mercadoria>. Acesso em: 15 dez. 2017.
524 Não há uma residualidade de serviços não tributáveis no universo das atividades de
produção e circulação de bens e serviços. Nesse sentido, cf. MACEDO, Alberto. ISS – O
conceito econômico de serviços já foi juridicizado há tempos também pelo direito privado.
In: MACEDO, Alberto et al. XII CNET – Direito Tributário e os Novos Horizontes do
Processo. São Paulo: Noeses, 2015. p. 1-79.
525 MOREIRA, André Mendes. A Tributação dos Serviços de Comunicação. 2. ed. São
Paulo: Noeses, 2016. p. 177-178.
526 Idem.
527 Esse critério lógico é hoje o protocolo TCP/IP (Transmission Control Protocol/Internet
Protocol). Cf. BOTELHO, Fernando Neto. Tributação do serviço de provimento da
internet. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário das
Telecomunicações. São Paulo: IOB Thompson – ABETEL, 2004. p. 561-589.
528 BOTELHO, Fernando Neto. Tributação do serviço de provimento da internet. In:
TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário das Telecomunicações. São Paulo:
IOB Thompson – ABETEL, 2004. p. 561-589.
529 Previamente, o conceito de SVA havia sido trazido pela Lei n. 9.295, de 19-7-1996,
definido da seguinte forma: “Art.10. (...). Parágrafo único. Serviço de Valor Adicionado é
a atividade caracterizada pelo acréscimo de recursos a um serviço de telecomunicações
que lhe dá suporte, criando novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento,
apresentação, movimentação e recuperação de informações, não caracterizando exploração
de serviço de telecomunicações”.
530 MOREIRA, André Mendes; ESTANISLAU, César Vale. ISSQN × ICMS: a tributação
do serviço de comunicação multimídia (SCM). In: PINTO, Sergio Luiz de Moraes;
MACEDO, Alberto; ARAÚJO, Wilson José de (Orgs.). Gestão tributária municipal e
tributos municipais. 1. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2014. v. 4, p. 67-81.
531 MOREIRA, André Mendes; ESTANISLAU, César Vale. ISSQN × ICMS: a tributação
do serviço de comunicação multimídia (SCM). In: PINTO, Sergio Luiz de Moraes;
MACEDO, Alberto; ARAÚJO, Wilson José de (Orgs.). Gestão tributária municipal e
tributos municipais. 1. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2014. v. 4, p. 67-81.
532 Idem.
533 Disponível em:
<http://www.mundodigital.net.br/index.php/noticias/telecomunicacoes/5628-o-que-e-ott>.

1792
Acesso em: 15 dez. 2017.
534 Disponível em:
<http://berec.europa.eu/eng/document_register/subject_matter/berec/download/0 /5751-
berec-report-on-ott-services_0.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
535 Idem.
536 Idem.
537 Disponível em: <http://www.telesintese.com.br/brasil-quer-regular-relacao-ott-e-
telecom-caso-caso>.
538 Disponível em:
<http://berec.europa.eu/eng/document_register/subject_matter/berec/download /0/5751-
berec-report-on-ott-services_0.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
539 Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?
uri=CELEX:32002L0021&from=en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
540 Disponível em: <http://www.sitehosting.com.br/streaming>.
541 Buffering: Funcionalidade usada por players de áudio e vídeo para armazenar
temporariamente porções do conteúdo que está sendo acessado via streaming, com
objetivo de antecipar seu download e fazendo com que a experiência do usuário seja fluida
e sem interrupções/pausas. Glossário de Marketing Digital IAB Brasil. Disponível em:
<http://iabbrasil.com.br/>. Acesso em: 15 dez. 2017.
542 Disponível em: <https://www.crackle.com.br>. Acesso em: 15 dez. 2017.
543 Disponível em: <https://www.viki.com>. Acesso em: 15 dez. 2017.
544 Disponível em: <https://www.ted.com/talks>. Acesso em: 15 dez. 2017.
545 Disponível em: <https://br.canalsony.com/especiais/episodios-completos-canal-sony>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
546 Disponível em: <http://www.tntgo.tv.br>. Acesso em: 15 dez. 2017.
547 Disponível em: <https://foxplay.com>. Acesso em: 15 dez. 2017.
548 Disponível em: <https://br.hbomax.tv/hbogo>. Acesso em: 15 dez. 2017.
549 Disponível em: <https://www.hulu.com/press/spotify-and-hulu-unveil-first-of-its-kind-
premium-entertainment-streaming-bundle-spotify-premium-for-students-now-with-hulu-
launches-today-nationwide-bundled-offerings-targeted-at-broader-market>. Acesso em: 15
dez. 2017.
550 Disponível em: <https://www.netflix.com/br>. Acesso em: 15 dez. 2017.
551 Disponível em: <https://www.looke.com.br>. Acesso em: 15 dez. 2017.
552 Disponível em: <https://www.amazon.com.br/b?node=16067150011>. Acesso em: 15
dez. 2017.
553 Disponível em: <https://www.oldflix.com.br>. Acesso em: 15 dez. 2017.
554 Disponível em: <https://www.spotify.com/br>. Acesso em: 15 dez. 2017.
555 Disponível em: <https://www.apple.com/br/itunes>. Acesso em: 15 dez. 2017.
556 Disponível em: <https://www.deezer.com/br>. Acesso em: 15 dez. 2017.
557 Disponível em: <https://www.techtudo.com.br/noticias/2017/11/o-que-e-iptv.ghtml>.

1793
Acesso em: 15 dez. 2017.
558 Disponível em: <http://www.convergenciadigital.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?
UserActiveTemplate=site&infoid=34458&sid=4>. Acesso em: 15 dez. 2017.
559 Disponível em: <https://en.wikipedia.org/wiki/Electronic_sell-through>. Acesso em: 15
dez. 2017.
560 Conforme argumentado em MACEDO, Alberto. ISS, ICMS-Mercadoria e o Caso
“Embalagens” (ADI-MC 4.389 DF) – A Constitucionalização, pelo STF, de Critérios que
não são Constitucionais. In: MACEDO, Alberto; CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e
(Coords.). Tributação Indireta Empresarial: Indústria, Comércio e Serviços. São Paulo:
Quartier Latin, 2016. p. 809-846.
561 FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Normas gerais e competência concorrente – uma
exegese do art.24 da Constituição Federal. Revista Trimestral de Direito Público, São
Paulo, Malheiros, n.7, p.16-20, 1994.
562 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva,
2009, p.217.
563 A única exceção é justamente o ISS, pois a sua instituição por lei ordinária demanda
previsão expressa de lista de serviços por lei complementar. Essa taxatividade da lista é
uma contraposição à elasticidade e variabilidade do conceito econômico de serviço,
juridicizado pela Emenda Constitucional n. 18, de 1º-12-1965, e pelas Constituições
Federais posteriores. A respeito, cf. MACEDO, Alberto. ISS – O conceito econômico de
serviços já foi juridicizado há tempos também pelo direito privado. In: XII CNET –
Direito Tributário e os Novos Horizontes do Processo. MACEDO, Alberto et al. São
Paulo: Editora Noeses, 2015, p. 1-79.
564 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Atualizado por DERZI,
Misabel Abreu Machado. São Paulo: Forense, 2008, p. 43.
565 A jurisprudência entende que a ausência de norma geral editada pela União não impede
os Estados e Municípios de exercer sua competência plena, com fulcro no artigo 24, § 3º,
da Constituição de 1988 (AI-AgR 167.777/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 4-3-1997).
566 Salvo o ISS, cuja definição de conceito constitucional por lei complementar é
mandatória. Nesse sentido, conferir nossos MACEDO, Alberto. ISS, ICMS-Mercadoria e
o Caso “Embalagens” (ADI-MC 4.389 DF) – A Constitucionalização, pelo STF, de
Critérios que não são Constitucionais. In: MACEDO, Alberto; CASTRO, Leonardo
Freitas de Moraes e (Coords.). Tributação Indireta Empresarial: Indústria, Comércio e
Serviços. São Paulo: Quartier Latin, 2016. p. 809-846; e MACEDO, Alberto. ISS – O
conceito econômico de serviços já foi juridicizado há tempos também pelo direito privado.
In: MACEDO, Alberto et al. XII CNET – Direito Tributário e os Novos Horizontes do
Processo. São Paulo: Noeses, 2015. p. 1-79.
567 Entre outros, JUSTEN FILHO, Marçal. O Imposto Sobre Serviços na Constituição.
Coleção Textos de Direito Tributário. v. 10. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985;
OLIVEIRA, Fernando A. Albino e. Conflitos de Competência entre ICM e ISS. Revista de
Direito Tributário, São Paulo, n.19-20, jan./jun. 1982, p. 161; BAPTISTA, Marcelo
Caron. ISS: Do Texto à Norma. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 196.
568 Curso de Direito Constitucional Tributário. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 633.

1794
569 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, linguagem e método. São Paulo:
Noeses, 2008. p. 181-186.
570 Interpretando o comando, o “dispor”, na verdade, dá lugar ao “prevenir”.
571 Sobre norma geral abstrata, sua aplicação e processo de positivação do direito, cf. nosso
MACEDO, Alberto. ITBI – Aspectos Constitucionais e Infraconstitucionais. São Paulo:
Quartier Latin, 2010.
572 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva,
2009.
573 Doutor em Direito pela PUC/SP. Professor dos cursos de pós-graduação da FGV e
INSPER. Ex-Subsecretário da Receita Federal.
574 Mestranda em Direito pela PUC/SP. Mestre em Economia pela UNB. Auditora de
Finanças e Controle da Secretaria do Tesouro Nacional.
575 ROSS, Alf. Direito e Justiça. 1. ed. Bauru, SP: Edipro, 2003. p. 139.
576 MACHADO, Hugo de Brito; MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Imunidade
tributária do livro eletrônico, Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n.
38, 1º jan. 2000. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/1809>. Acesso em: 15 dez.
2017.
577 Rel. Min. Dias Toffoli, j. 8-3-2017.
578 Rel. Min. Marco Aurélio, j. 8-3-2017.
579 FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato Gerador da Obrigação Tributária. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais. p. 117.
580 BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3. ed. São Paulo:
Malheiros, 2001. p. 219.
581 O conceito nos parece inadequado pois tais normas são regras de estrutura dirigidas às
pessoas jurídicas de direito público e não tratam de incidência que é inerente às normas
que criam, propriamente, o tributo.
582 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 145.
583 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1970. p. 87.
584 Tal expressão também não nos parece apropriada pois dá a entender que há dois
momentos distintos, um da incidência das regras de competência e outro, posteriormente,
quando são introduzidos os preceitos supressivos.
585 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 26. ed. São Paulo: Saraiva,
2015. p. 183.
586 CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 19. ed. São
Paulo: Malheiros, 2003. p. 635.
587 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Imunidade do Patrimônio, Rendas e Serviços relacionados às
Atividades Essenciais dos Templos de Qualquer Culto. In: MARTINS, Ives Gandra da
Silva e CARVALHO, Paulo de Barros (Coords.). Imunidades das Instituições Religiosas.
São Paulo: Noeses, 2015. p. 124.
588 CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 19. ed. São

1795
Paulo: Malheiros, 2003. p. 641.
589 TRF, 3ª Região, 6ª Turma, Rel. Desembargador Federal Johonsom di Salvo, j. 25-7-
2013.
590 STF, 1ª Turma, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 6-8-2013.
591 STF, 2ª Turma, Rel. Min Ellen Gracie, no RE 221239.
592 “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMUNIDADE
TRIBUTÁRIA. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS
– ICMS. CREDITAMENTO. INSUMOS UTILIZADOS NA CONFECÇÃO DE
JORNAIS, LIVROS E PERIÓDICOS. AGRAVO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
1. Em se tratando de insumos destinados à impressão de livros jornais e periódicos, a
imunidade tributária abrange, exclusivamente, materiais assimiláveis ao papel. 2.
Impossibilidade do reexame de provas: incidência da Súmula 279 do Supremo Tribunal
Federal” (STF, Ag. Reg. no Recurso Extraordinário n. 372.645/SP, Rel. Min. Cármen
Lúcia, j. 20-10-2009).
593 Recurso Extraordinário n. 203.859/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa.
594 J. 23-5-2006, DJ 8-6-2006.
595 RE 202149, Rel. Min. Menezes Direito, Rel. p/ o Acórdão Min. Marco Aurélio, 1ª
Turma, j. 26-4-2011.
596 RE 327414 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, j. 7-3-2006.
597 Rel. Min. Dias Toffoli, j. 8-3-2017.
598 Rel. Min. Marco Aurélio, j. 8-3-2017.
599 Esta posição ainda encontra amparo no artigo 215 da Constituição Federal: “Art. 215. O
Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da
cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações
culturais”.
600 RE 330817/RJ, Rel. Min Dias Toffoli, j. 8-3-2017, DJe-195, 31-8-2017.
601 Disponível em: <https://dicionariodoaurelio.com/acessorio>. Acesso em: 15 dez. 2017.
602 TRF-2ª Região, Apelação em Mandado de Segurança AMS 200251010075489/RJ
2002.51.01.007548-9, j. 8-11-2011.
603 STF, RExt 621407 AgR/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 1º-8-2017.
604 TIT-SP, Recurso Ordinário, DRT 14, Processo 456243, Ano 2003, AIIM 3006405-3,
Data da Publicação 15-10-2013.
605 O Acórdão ainda não foi publicado, apesar de já sabermos o conteúdo da decisão: o
Tribunal, por unanimidade, e nos termos do voto do Relator, apreciando o tema 259 da
repercussão geral, conheceu do recurso extraordinário, negou-lhe provimento e fixou a
seguinte tese: “A imunidade da alínea ‘d’ do inciso VI do artigo 150 da Constituição
Federal alcança componentes eletrônicos destinados, exclusivamente, a integrar unidade
didática com fascículos”. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia, em sessão
plenária de 8-3-2017. Não obstante, o Ministro Marco Aurélio citou seu voto no recém-
publicado RExt n. 330817, motivo pelo qual lhe citamos agora.
606 Mestre em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito
Tributário pela PUC/SP. Advogada em São Paulo.

1796
607 Mestre em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito
Tributário e Direito Tributário Internacional pelo IBDT. Advogado em São Paulo.
608 Decisão essa que adotava a mesma lógica empregada um ano antes pelo Superior
Tribunal de Justiça (STJ), nos autos do Recurso Especial n. 123.022/RS, de 14-8-1997,
para determinar que programas de computador colocados no mercado para que pudessem
ser adquiridos por qualquer pessoa deveriam ser considerados mercadorias sujeitas à
incidência do ICMS.
609 BOWER, Joseph L.; CHRISTENSEN, Clayton M. Disruptive Technologies: Catching
the Wave, Harvard Business Review, Jan.-Fev./1995.
610 THE ECONOMIST. The Rise of the Superstars. Disponível em:
<https://www.economist.com/news/special-report/21707048-small-group-giant-
companiessome-old-some-neware-once-again-dominating-global>. Acesso em: 15 dez.
2017. Matéria publicada em 17-9-2016.
611 MELL, Peter; GRANCE, Timothy. The NIST Definition of Cloud Computing:
Recommendations of the National Institute of Standards and Technology. National
Institute of Standards and Technology. NIST Special Publication 800-145. 2011.
Disponível em: <http://nvlpubs.nist.gov/nistpubs/Legacy/SP/nistspecialpublication800-
145.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
612 “Ficam os Estados do Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás,
Maranhão, Mato Grosso do Sul, Paraná, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio
Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Tocantins autorizados a
conceder redução na base de cálculo do ICMS, de forma que a carga tributária
corresponda ao percentual de, no mínimo, 5% (cinco por cento) do valor da operação,
relativo às operações com softwares, programas, jogos eletrônicos, aplicativos, arquivos
eletrônicos e congêneres, padronizados, ainda que sejam ou possam ser adaptados,
disponibilizados por qualquer meio, inclusive nas operações efetuadas por meio da
transferência eletrônica de dados.”
613 “Art. 1º Os valores pagos, creditados, entregues ou remetidos por residente ou
domiciliado no Brasil para empresa domiciliada no exterior, em decorrência de
disponibilização de infraestrutura para armazenamento e processamento de dados para
acesso remoto, identificada como data center, são considerados para fins tributários
remuneração pela prestação de serviços, e não remuneração decorrente de contrato de
aluguel de bem móvel.
Parágrafo único. Sobre os valores de que trata o caput devem incidir o Imposto sobre a Renda
Retido na Fonte (IRRF), a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico destinada
a financiar o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à
Inovação (Cide-Royalties), a Contribuição para o PIS/Pasep-Importação e a Cofins-
Importação.”
614 “NATUREZA DAS ATIVIDADES EXECUTADAS POR DATA CENTER.
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO E NÃO LOCAÇÃO DE BEM MÓVEL.
IMPOSSIBILIDADE DE SEGREGAÇÃO DAS DESPESAS COM EQUIPAMENTOS E
SUA GESTÃO DAS DESPESAS COM SERVIÇOS DE APOIO. Divergência entre a SC
n. 99 – SRRF/09 e a SC n. 86 – SRRF/08: A contratação de um data center não se
caracteriza como uma locação de bem móvel, mas sim como uma típica prestação de

1797
serviços. Nesse sentido, sobre as remessas para pagamento dos serviços prestados por data
center devem incidir o Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF), a CIDE/Royalties
e as Contribuições PIS-importação e Cofins-importação, nos termos da legislação
aplicável. Entende-se que a atividade de prestação de serviço por um data center, tendo
em vista sua própria natureza, não é passível de segregação para efeitos tributários entre os
equipamentos e a gestão dos serviços de apoio que a compõe, pois estes se subsumem
naqueles. (...).”
615 ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
616 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.
491. BARRETO, Aires F. ISS – Atividade-Meio e Serviço-Fim, São Paulo, Revista
Dialética de Direito Tributário n. 5, p. 72-97.
617 Podendo ser mencionada, por exemplo, a decisão proferida pelo STF nos autos do
Recurso Extraordinário n. 116.121/SP, no qual a Corte concluiu que o ISS somente pode
incidir sobre “obrigações de fazer” ou sobre “obrigações de prestar”:
“Tenho para mim, na mesma linha de entendimento exposta por Aires Fernandino Barreto
(‘Revista de Direito Tributário’, vol. 38/192) e por Cléber Giardino (‘Revista de Direito
Tributário’, vol. 38/196), que a qualificação da ‘locação de bens móveis’, como serviço,
para efeito de tributação municipal mediante incidência do ISS, nada mais significa do que
a inadmissível e arbitrária manipulação, por lei complementar, da repartição constitucional
de competências impositivas, eis que o ISS somente pode incidir sobre obrigações de
fazer, a cuja matriz conceitual não se ajusta a figura contratual da locação de bens móveis.
Cabe advertir, neste ponto, que a locação de bens móveis não se identifica e nem se qualifica,
para efeitos constitucionais, como serviço, pois esse negócio jurídico – considerados os
elementos essenciais que lhe compõem a estrutura material – não envolve a prática de atos
que consubstanciam um prestare ou um facere”.
618 Graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Pós-graduado
em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT. LLM em
Direito Tributário Internacional pela Universidade de Leiden, Holanda. Professor de
Direito Tributário no Insper e de Direito Tributário Internacional do International Tax
Center da Universidade de Leiden. Advogado em São Paulo.
619 Graduada pela Universidade de Salvador em Direito e na Northeastern University
(Boston, EUA) em Contabilidade. LLM em Direito Tributário Internacional pela New
York University (Nova York, EUA).
620 99 Taxis. Termos de Uso. Disponível em: <http://www.99taxis.com/termos>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
621 UBER. Termos de Uso. Disponível em: <https://www.uber.com/pt-BR/legal/terms/br>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
622 Cabify. Termos de Uso. Disponível em: <https://cabify.com/brazil/terms>. Acesso em:
15 dez. 2017.
623 “Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer
meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente
no futuro, tais como:
(...) XII – os programas de computador (...).”

1798
624 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se
aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXVII –
aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas
obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar (...).”
625 BARRETO, Aires Fernandino. ISS na Constituição e na Lei. 2. ed. São Paulo: Dialética,
2005. p. 140.
626 ANAN JR., Pedro e JACOBSON NETO, Eduardo. ISS e o Licenciamento do Direito de
Uso de Software. In: MACEDO, Alberto et al. (Coords.). ISS Pelos Conselheiros
Julgadores. São Paulo: Quartier Latin, 2012. p. 355.
627 “Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) III – serviços de
qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.”
628 Anexo 1 da Instrução Normativa SF/Surem n. 08/2011 do Município de São Paulo.
629 STJ, 3ª Turma, REsp n. 443.119/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Sessão de 8-5-2003, DJ
30-6-2003.
630 BRIGAGÃO, Gustavo. ICMS não incide sobre download de softwares, Consultor
Jurídico, 24-2-2016. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-fev-24/consultor-
tributario-icms-nao-incide-download-softwares#_ftn3>. Acesso em: 15 dez. 2017.
631 Mestre e Doutor em Direito. Advogado em Fortaleza. Membro do ICET – Instituto
Cearense de Estudos Tributários. Professor da Faculdade de Direito da Universidade
Federal do Ceará, de cujo Programa de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) foi
Coordenador. Professor do Centro Universitário Christus (Graduação e Mestrado).
Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversität, Viena, Áustria.
632 Mestra em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Doutora em Direito Tributário
pela Universidade de São Paulo. Membro do ICET – Instituto Cearense de Estudos
Tributários. Professora da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará.
Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversität, Viena, Áustria.
633 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1999. p. 407.
634 Já em 1971, Hugo de Brito Machado escrevia que, para se definir mercadoria, “um jogo
de palavras dizendo apenas da natureza do bem e de seu estado de conservação é
insuficiente. O elemento ‘destinação’ há de ser considerado. Carvalho de Mendonça, com
sua indiscutível autoridade, mostra que a destinação é elemento essencial no conceito de
mercadoria. ‘Todas as mercadorias’, ensina aquele mestre, ‘são necessariamente coisas;
nem todas as coisas, porém, são mercadorias. Não há, como se vê, diferença de substância
entre coisa e mercadoria: a diferença é a destinação.’ (Tratado de Direito Comercial
Brasileiro, Liv. Freitas Bastos S.A., 7. ed., Rio, 1963, v. 5, p. 28). ‘São mercadorias’,
doutrina Waldemar Ferreira, ‘as coisas móveis que se compram e se vendem, por atacado
ou a varejo nas lojas, armazéns, mercados ou feiras, sejam produtos da natureza, sejam da
indústria, na sua variedade imensa.’ (Tratado de Direito Comercial, Ed. Saraiva, 6º vol.,
São Paulo, 1961, pág. 230). Além de ser bem móvel, novo ou usado, a mercadoria
somente se caracteriza como tal pela sua destinação ao comércio. O que é mercadoria para
uma empresa não o será necessariamente para outra. Sua destinação dentro do patrimônio
de cada empresa é decisiva. [...] Fran Martins também encontra na destinação um

1799
elemento integrante do conceito em espécie. Na lição do ilustre comercialista, ‘chamam-se
mercadorias as coisas móveis que os comerciantes adquirem com a finalidade específica
de revender’ (Curso de Direito Comercial, Forense, Rio, 1970, p. 129)” (MACHADO,
Hugo de Brito. O ICM, São Paulo: Sugestões Literárias, 1971, p. 29). De uma forma ou de
outra, verifica-se, em todas as definições, a noção de coisa ou de bem corpóreo e,
portanto, tangível, como elemento central, o qual desaparece no caso do download.
635 Nos Estados Unidos, essa divisão é seguida por muitos Estados, que inclusive não
tributam por meio do sales tax o software elaborado por encomenda, por considerar tratar-
se de serviço profissional não sujeito ao imposto. Cf. NGO, Tuan Q. Cloud Computing
and State Sales Tax, Hastings Business Law Journal. v. 9.2, 327, 350 (2013), p. 331.
636 STF, 1ª T., RE 176.626/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 10-11-1998, v. u., DJ 11-
12-1998, p. 10.
637 ATALIBA, Geraldo; GIARDINO, Cléber. Imposto sobre circulação de mercadorias e
imposto sobre serviços. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; BRITO, Edvaldo (Coords.).
Doutrinas essenciais do direito tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. v. 4, p.
517.
638 A internet, na verdade, apenas deu dimensão considerável a uma realidade que, a rigor, a
precedia. Nos Estados Unidos, existia uma modalidade de “venda” de software chamada
load and leave, na qual o usuário comprava um software e o fornecedor ia até a sua
residência com os disquetes ou CDs correspondentes, fazia a instalação, cobrava pela
software instalado, mas levava os CDs ou disquetes de volta consigo. Diante dessa
realidade, a Missouri Administrative Hearing Comission (Filenet Corp. vs Director of
Revenue), por exemplo, considerou inválida a exigência do sales tax, à míngua de
qualquer venda de algo físico ou tangível que permanecesse em poder do comprador. Cf.
NGO, Tuan Q. Cloud Computing and State Sales Tax, Hastings Business Law Journal. v.
9.2, 327, 350 (2013), p. 332.
639 MELSANSON, Raffi. Sales Taxes and the Shadow of Cloud Computing: Searching the
Horizon for a Workable, National Solution, 65 Tax Law. 871, 896 (2012), p. 874.
640 STF, Pleno, ADI-MC n. 1.945, inteiro teor em SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.945 Mato Grosso. Disponível
em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=620411>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
641 “1.09 – Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e
texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos (exceto a
distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de Acesso Condicionado, de que
trata a Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011, sujeita ao ICMS).”
642 Não muito distante porque, como dito, neste terreno em algumas décadas se assiste a
mudanças radicais que tornam anacrônico muito do que se diz ou pensa sobre a economia
digital.
643 ANTONOPOULOS, Nick; GILLAM, Lee (Eds.). Cloud computing: principles, systems
and applications. London: Springer, 2010. p. 4.
644 NGO, Tuan Q. Cloud Computing and State Sales Tax, Hastings Business Law Journal. v.
9.2, 327, 350 (2013), p. 329.

1800
645 Vale lembrar que situações assim turvas, nos termos da Constituição, devem ter os
conflitos de competência delas decorrentes resolvidos pela Lei Complementar (art. 146, I),
a quem cabe, em princípio, definir em quais dos âmbitos de competência se situam.
646 Veja-se, a propósito, MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos. Competência tributária:
entre a rigidez constitucional e a atualização interpretativa. São Paulo: Malheiros, 2014,
passim.
647 É o que defende, por exemplo, GARCIA, Regina Vitória Soares. Tributação do ISS na
sociedade da informação. Dissertação de mestrado. São Paulo: USP, 2013.
648 Decidiu a Corte que “as administradoras de cartões de crédito não são responsáveis pelo
pagamento do ISS decorrente do serviço prestado pelos estabelecimentos a elas filiados
aos seus usuários já que não estão vinculadas ao fato gerador da respectiva obrigação [...]”
(STJ, 1ª T., REsp 55.346/RJ, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, rel. p. o ac. Min. Cesar Asfor
Rocha, j. 25-10-1995, DJ 12-2-1996, p. 2412).
649 GRECO, Marco Aurélio. Internet e Direito. São Paulo: Dialética, 2000, passim. Na
verdade, o mundo de bits, ou o mundo criado pela informação, existe há muito tempo,
sendo talvez contemporâneo ao ser humano. É o “mundo 3” a que alude Karl Popper
(POPPER, Karl. Em busca de um mundo melhor. Trad. Milton Camargo Mota. São Paulo:
Martins Fontes, 2006. p. 41), ou o mundo de “realidades institucionais” a que se refere
John Searle (SEARLE, John R. Libertad y neurobiologia. Trad. Miguel Candel.
Barcelona: Paidós, 2005, p. 92-93). A questão é que a informática e principalmente a
internet permitiram um descolamento das realidades institucionais, ou das realidades do
mundo 3, dos suportes físicos que por milênios eram necessariamente seus veículos. Daí
as dificuldades criadas para o Direito por esse “mundo de bits” advindo da informática.

1801
1 Mestre em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Bacharel em Ciências
Econômicas e Ciências Contábeis. Professora Conferencista no Instituto Brasileiro de
Estudos Tributários (IBET). Professora nos cursos de pós-graduação da FGV. Advogada
em São Paulo.
2 Pioneiro e líder deste segmento, conforme a American Marketing Association. Disponível
em: <https://www.ama.org/publications/MarketingNews/Pages/Google-AdWords-
Success.aspx>. Acesso em: 15 dez. 2017.
3 Para fins deste artigo, virtual e digital são termos utilizados como sinônimos.
4 Nesse sentido, vide: BIFANO, Elidie P. O negócio Eletrônico e o Sistema Tributário
Brasileiro. São Paulo: Quartier Latin, 2004. p. 299 e 300 (itens 12 a15).
5 Conforme a publicação “Marketing Digital”, os Social Ads são anúncios dentro das redes
sociais em seus mais diversos formatos. As mais conhecidas redes sociais como Facebook,
Twitter, LinkedIn, YouTube e Instagram disponibilizam ads.
6 Nesse sentido, vide: <https://www.ama.org/publications/MarketingNews/Pages/Google-
AdWords-Success.aspx>. Acesso em: 15 dez. 2017.
7 Muitos dos conceitos contidos neste tópico foram extraídos da obra: SHARMA, Vakul.
Unit-3 Advertising and Taxation vis-à-vis E-Commerce, 2017. Disponível em:
<http://www.egyankosh.ac.in/bitstream/123456789/7649/1/Unit-3.pdf>. Acesso em: 15
dez. 2017.
8 COBRA, Marcos. Administração de Marketing no Brasil. São Paulo: Cobra ed., 2005. p. 31
9 De acordo com texto disponível em: <https://rockcontent.com/marketing-de-conteudo>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
10 Conforme artigo do Impacta Blog, o Brasil é o 5º país mais conectado no mundo (105
milhões de brasileiros), 92% dos usuários utilizam a internet para pesquisar sobre
empresas, produtos e serviços antes de realizarem uma compra. A internet se tornou o
terceiro veículo de maior alcance no Brasil, atrás somente do rádio e da TV. Um estudo
recente feito pela Accenture revelou que, em 5 anos, o Marketing Digital será responsável
por mais de 75% dos investimentos do setor. Disponível em:
<http://www.impacta.com.br/blog/2017/04/17/a-importancia-do-marketing-digital-para-
as-empresas-entenda>. Acesso em: 15 dez. 2017.
11 Servidor é um programa em um computador servidor, que fornece páginas da web para o
navegador da web. Disponível em: <http://www.accelerated-ideas.com/perguntas-e-
respostas/computadores/qual-diferenca-entre-servidor-navegador-1003751-spage.aspx>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
12 Navegador da web é uma aplicação de software para recuperar dados de navegação na
web, apresentando e atravessando os recursos de informação na World Wide Web. Ex.:
Internet Explorer, Mozilla Firefox, Google Chrome. Disponível em:
<http://www.accelerated-ideas.com/perguntas-e-respostas/computadores/qual-diferenca-
entre-servidor-navegador-1003751-spage.aspx>. Acesso em: 15 dez. 2017.
13 Disponível em: <https://www.microsoft.com/pt-br/security/resources/cookie-
whatis.aspx>. Acesso em: 15 dez. 2017.
14 Informação disponível em: <https://www.microsoft.com/pt-br/security/resources/cookie-
whatis.aspx>. Acesso em: 15 dez. 2017.

1802
15 Informação disponível em:
<http://www.egyankosh.ac.in/bitstream/123456789/7649/1/Unit-3.pdf>. Acesso em: 15
dez. 2017.
16 Disponível em: <http://www.emarket.ppg.br/entrevista-respondida-por-ricardo-prates-
morais-sobre-cookies-e-publicidade-online>. Acesso em: 15 dez. 2017.
17 Idem.
18 O próprio Google explica o AdWords como programa Google AdWords pelo qual qualquer
usuário pode criar publicidades que aparecerão em páginas relevantes dos resultados da
pesquisa Google e na rede de sites de parceiros. Disponível em:
<https://support.google.com/adsense/answer/76231?hl=pt-BR>. Acesso em: 15 dez. 2017.
19 Disponível em: <https://www.google.com.br/adwords/benefits/?channel=ha&subid=br-pt-
ha-aw-brhsln~215747447955>. Acesso em: 15 dez. 2017.
20 Disponível em: <http://www.egyankosh.ac.in/bitstream/123456789/7649/1/Unit-3.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
21 Disponível em: <https://support.google.com/adsense/answer/76231?hl=pt-BR>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
22 O conjunto de sites parceiros costuma ser chamado de Rede de Displays do Google.
23 Disponível em: <http://www.agenciaeplus.com.br/links-patrocinados-ecommerce>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
24 Disponível em: <https://support.google.com/adwords/answer/142918?hl=pt-BR>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
25 Disponível em: <https://support.google.com/adwords/answer/142918?hl=pt-BR>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
26 Glossário de termos do AdWords pode ser encontrado em:
<https://support.google.com/adwords/topic/3121777?hl=pt-BR&ref_topic=3119071>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
27 Termos do Programa de Publicidade Google, atualizado em 1º de outubro de 2017.
Disponível em: <https://payments.google.com/payments/apis-
secure/u/0/get_legal_document?ldi=27184>. Acesso em: 15 dez. 2017.
28 Idem.
29 Termos do Programa de Publicidade Google, cit.
30 PEREIRA, Elisabeth D. Kanthack. Proteção jurídica do software no Brasil. 1. ed.
Curitiba: Juruá, 2004. p. 34.
31 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 1447 e s.
Disponível em: <https://www.scribd.com/document/334822506/Contratos-RIZZARDO-
Arnaldo>. Acesso em: 15 dez. 2017.
32 Google AdWords e AdSense são patenteados pelo Google.
33 A este respeito, cite-se o RE 176.626/SP e o ADI-MC n. 1.945.
34 SAAVEDRA, Rui. A proteção jurídica do software e a Internet. Lisboa: Don Quixote,
1998. p. 29 e s.
35 Processar dados, segundo o entendimento de Arnaldo Rizzardo ora adotado, significa

1803
transformar informações disponíveis em um banco em informações úteis, trabalhas,
conclusivas ou especificadas. Cf. RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 15. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. p. 1447 e s. Disponível em:
<https://www.scribd.com/document/334822506/Contratos-RIZZARDO-Arnaldo>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
36 Adota-se, para esta finalidade, o conceito de serviço que se entende ainda vigente no
âmbito do STF (Súmula Vinculante 31), muito embora se reconheça que haja discussão
doutrinaria e jurisprudencial em relação à questão.
37 Código Civil, art. 593 e seguintes.
38 Apesar de haver controvérsia doutrinária quanto à utilização da distinção entre tributos
diretos e indiretos, utiliza-se o termo “tributação direta”, neste artigo, em contraposição
aos tributos incidentes sobre o consumo.
39 A exploração de direitos autorais é classificada como royalties pela Lei n. 4.506/64, que a
inclui dentre os rendimentos de qualquer espécie decorrentes do uso, fruição, exploração
de direitos, salvo quando percebidos pelo autor ou criador do bem ou obra. Nos termos do
art. 22 desta lei serão classificados como royalties os rendimentos de qualquer espécie
decorrentes do uso, fruição, exploração de direitos, tais como: “a) direito de colher ou
extrair recursos vegetais, inclusive florestais; b) direito de pesquisar e extrair recursos
minerais; c) uso ou exploraçâo de invenções, processos e fórmulas de fabricação e de
marcas de indústria e comércio; d) exploração de direitos autorais, salvo quando
percebidos pelo autor ou criador do bem ou obra” (destacou-se).
40 Regulamento do Imposto sobre a Renda: “Art. 710. Remessas a beneficiários residentes
em Paraísos Fiscais estão sujeitas à alíquota de 25%”.
41 Incluído pela Lei n. 11.452, de 2007.
42 Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?
visao=anotado&idAto=81825>. Acesso em: 15 dez. 2017.
43 Solução de Divergência n. 11, de 2011, da Coordenação-Geral de Tributação. Cabe
lembrar que deve haver recolhimento sobre as remessas para pagamentos pela prestação
de serviços de manutenção e suporte técnico, de acordo com sua natureza e a
contraprestação avençada.
44 Art. 155, da CF/1988.
45 Pelo menos desde a década de 1930, ainda que sob outras denominações.
46 A respeito, cumpre referência à celebre doutrina de Paulo de Barros Carvalho, na obra:
CARVALHO, Paulo de Barros. Regra matriz de incidência do ICM. Tese apresentada
para a obtenção de Título de Livre Docente da Faculdade de Direito da PUC/SP, 1981.
47 STF, 1ª Turma, RE 176626, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 10-11-1998.
48 Nesse sentido, vide: MACEDO, Alberto. ISS: O conceito econômico de serviços já foi
juridicizado há tempos também pelo direito privado. In: MACEDO, Alberto et al. Direito
Tributário e os Novos Horizontes do Processo. São Paulo: Noeses, 2015. p. 1-79.
49 A identidade havia sido consagrada no RE 116.121.
50 STF, Tribunal Pleno, RE 547245, Rel. Min. Eros Grau, j. 2-12-2009.
51 STF, Tribunal Pleno, RE 592905, Rel. Min. Eros Grau, j. 2-12-2009.

1804
52 STF, Tribunal Pleno, RE 651703, Rel. Min. Luiz Fux, j. 29-9-2016.
53 STF, Tribunal Pleno, ADI n. 1.945 MC, Rel. Min. Octavio Gallotti, Rel. p/ Acórdão Min.
Gilmar Mendes, j. 26-5-2010.
54 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 20. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2011.
55 STF, 2ª Turma, AI 246239 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, j. 26-10-1999.
56 MAIA, Wellington Antunes. Tributação em Software e necessidade de lei complementar
que institua tributo por competência residual, Revista Direito Tributário Atual, n. 37. São
Paulo, IBDT, 2017, p. 479.
57 “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de
institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente,
pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do
Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”
58 Disponível em: <http://www.taylorcocks.co.uk/services/tax/vat/adwords-vat-reverse-
charge>. Acesso em: 15 dez. 2017.
59 Disponível em: <https://support.google.com/adwords/answer/2375370?hl=en>. Acesso
em: 15 dez. 2017. Não há informações sobre o Brasil na lista disponibilizada pelo Google
que contém mais de 160 países.
60 Mestre em Direito Tributário, Econômico e Financeiro pela USP. Pós-graduado em
Direito Tributário pelo IBET. Membro do IBDT. Professor em Cursos de Pós-Graduação
em Direito Tributário (FAAP; MBA da Poli/USP; IBDT). Associado Fundador do
Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial (IBDEE) e Coordenador do Comitê de
Direito Tributário e Contabilidade desse mesmo Instituto. Advogado em São Paulo.
61 Segundo a Anatel, Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC é o serviço de
telecomunicações que, por meio de transmissão de voz e outros sinais, destina-se à
comunicação entre pontos fixos determinados, utilizando processos de telefonia.
62 Serviço de Comunicação Multimídia – SCM consiste em espécie de serviço fixo de
telecomunicação de interesse coletivo, prestado em âmbito nacional e internacional, no
regime privado, que possibilita a oferta de capacidade de transmissão, emissão e recepção,
por qualquer meio, de informações multimídia, a assinantes dentro de uma área de
prestação de serviço.
63 Neste estudo, também será ilustrada e detalhada a parcela dos serviços geralmente
prestados pelos provedores de serviços VoIP que pode se caracterizar como serviços de
telecomunicações propriamente ditos e, nesse caso, sujeitos à tributação do ICMS-
Comunicação, que são aqueles realizados fora de sua rede IP ou que não estejam
abrangidos no contexto do provimento VoIP.
64 Salvo em casos onde o serviço é executado 100% em rede IP, entre clientes do próprio
provedor, sem qualquer necessidade de serviços de interconexão.
65 Nestes casos, esse computador pode corresponder até mesmo a um aparelho telefônico,
não comum, sendo certo que tal aparelho estará parametrizado (software embarcado) de
tal forma que será identificado como se um terminal IP fosse, assemelhando-se, nesse
caso, de forma perfeita, a um computador.
66 Constituição Federal: “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...) IV –

1805
águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão”.
67 A LGT prevê que “serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita
a oferta de telecomunicação”, bem como que “telecomunicação é a transmissão, emissão
ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo
eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de
qualquer natureza” (Art. 60, caput e § 1º, da Lei n. 9.472/97).
68 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 132.
69 CARVALHO, Paulo de Barros. Não Incidência do ICMS na Atividade dos Provedores de
Acesso à Internet, Revista Dialética de Direito Tributário, n. 73, São Paulo, Dialética,
2001. p. 98-101.
70 Artigo 61, caput, da Lei n. 9.472/97.
71 Artigo 61, § 1º, da Lei n. 9.472/97.
72 MOREIRA, André Mendes. A tributação dos serviços de comunicação. São Paulo:
Dialética, 2006. p. 204.
73 REsp 1206428/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 4-2-2011; REsp 778333/RS, Min.
Castro Meira, DJ 8-3-2007.
74 REsp n. 1176753/RJ, 1ª Turma do STJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28-11-
2012. Repetitivo n. 472 – Tese firmada: incidência do ICMS, no que se refere à prestação
dos serviços de comunicação, deve ser extraída da Constituição Federal e da LC 87/96,
incidindo o tributo sobre os serviços de comunicação prestados de forma onerosa, através
de qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a
retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza (art. 2º, III,
da LC n. 87/96). A prestação de serviços conexos ao de comunicação por meio da
telefonia móvel (que são preparatórios, acessórios ou intermediários da comunicação) não
se confunde com a prestação da atividade-fim processo de transmissão (emissão ou
recepção) de informações de qualquer natureza, esta sim, passível de incidência pelo
ICMS. Desse modo, a despeito de alguns deles serem essenciais à efetiva prestação do
serviço de comunicação e admitirem a cobrança de tarifa pela prestadora do serviço
(concessionária de serviço público), por assumirem o caráter de atividade-meio, não
constituem, efetivamente, serviços de comunicação, razão pela qual não é possível a
incidência do ICMS.
75 Emitido pela ANATEL em 31 de julho de 2009. Disponível em:
<http://www.anatel.gov.br/Portal/exibirPortalPaginaEspecial.do?
acao&codItemCanal=1216>. Acesso em: 15 dez. 2017.
76 Trata-se de uma especificação tecnológica que define os padrões e os procedimentos para
a entrega de voz e dados por meio de redes com a tecnologia 4G LTE (Long-Term
Evolution). Trata-se de um método para criar, prover e gerenciar serviços de alta
velocidade de voz, vídeo e mensagens em uma rede 4G sem fios para celulares e outros
aparelhos portáteis, tais como tablets e relógios-pulseira. Os serviços que podem ser
providos usando a tecnologia VoLTE incluem as chamadas de vídeo, chamadas de voz e
serviços de compartilhamento e streaming. O VoLTE usa a tecnolgia IMS e quando
recebe dados de redes GSM e CDMA converte esses dados em pacotes para só depois
transmiti-los.

1806
77 É possível o tráfego de uma chamada exclusivamente em rede IP, de forma que o software
ou a tecnologia embarcada permitirá que receptor receba voz na ponta final.
78 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 132.
79 TJ/SP, Apelação n. 0031647-97.2013.8.26.0053, Rel. Des. José Maria Câmara Junior.
80 REsp n. 1.036.589/MG; REsp n. 1.176.753/RJ; EDcl no Recurso Especial n.
1.022.527/RS.
81 MS n. 0031647-97.2013.8.26.0053. 3ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central de São
Paulo. Decisão em 16-1-2014. Vale destacar que, à época, o mesmo contribuinte impetrou
o Mandado de Segurança n. 1013166-69.2013.8.26.0053, no qual obteve decisão favorável
no sentido de restar declarada a inexigibilidade do ISS sobre a prestação de serviços VoIP.
Em que pese em segunda instância o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP – Apelação
n. 101316669.2013.8.26.0053-SP. Decisão em 14-8-2014) ter extinguido esse segundo
MS sob o argumento de que a via eleita pelo contribuinte não seria o meio processual
correto, a análise de mérito dada em decisão de primeira instância é bastante reveladora.
82 Disponível em <http://www.anatel.gov.br/Portal/exibirPortalInternet.do>. Acesso em: 15
dez. 2017.
83 Doutoranda em Direito Tributário pela USP. LLM – Harvard Law School. Mestre em
Direito do Estado – PUC/SP. Advogada em São Paulo.
84 Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pós-Graduada em
Direito Tributário pela PUC-SP. Advogada em São Paulo.
85 Por meio da “nuvem”, é possível utilizar a memória e capacidade de armazenamento de
computadores e servidores compartilhados e interligados por meio da rede mundial de
computadores (web).
86 Atualmente, além do IaaS, que é o modelo que oferece a infraestrutura para
armazenamento de dados (data center), há pelo menos mais dois tipos de “produtos” na
nuvem oferecidos no mercado de tecnologia: SaaS (Software as a Service), relacionado
com soluções em software, em que é oferecido um produto completo hospedado e
gerenciado pelo fornecedor e PaaS (Plataform as a Service), modelo entre o SaaS e o
IaaS, em que o fornecedor disponibiliza a plataforma para desenvolvimento e
gerenciamento de aplicativos na nuvem, com a configuração de infraestrutura necessária
para que esta plataforma esteja em funcionamento. Um exemplo de PaaS é um servidor
que hospeda um site. Por vezes, as sociedades de tecnologia oferecem o conjunto desses
produtos para seus clientes. Sobre o tema, vide Aleksandra Bal (trecho mantido no original
em inglês): “Three cloudservice models can be distinguished. First, software as a service
(SaaS) provides applications that run on the cloud eliminating the need to install them on
the costumer computer. Second, platform as a service (PaaS) is a service targeting
developers and facilitates the development of applications by providing operating system
support and software development frameworks. Third, infrastructure as a service (IaaS)
comprises resources, such as processing, storage and network, which can be virtualized
and delivered as a service” (The Sky’s the Limit – Cloud-Based Services in an
International Perspective, Bulletin for International Taxation, September 2014, p. 515).
87 Nos termos do art. 647 do Decreto n. 3.000, de 26 de março de 1999 (RIR/99) e art. 30 da
Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003.

1807
88 Vide trecho da ementa da Solução de Consulta n. 122/2011: “(...) os pagamentos referentes
à locação de ambientes para contingência, constituídos de estações de trabalho e
tecnologias em geral, como equipamentos (hardware), programas de computador
(software) e componentes agregados e à locação de espaço para armazenamento de dados
e equipamentos (data center) não estão sujeitos à retenção do IR, por não tratarem de
prestação de serviços na forma prevista no § 1º do art. 647 do RIR/99”.
89 A Solução COSIT n. 6/2014 reformou a Solução de Consulta n. 86/2012 e considerou que
não haveria divergência entre as conclusões da Solução de Consulta n. 99/2013 e a
Solução de Consulta n. 122/2011, pois essa última solução de consulta tratava de
pagamentos locais, e sua análise teria sido restrita à necessidade de retenção de tributos
por “serviços profissionais”, e o objeto da Solução de Consulta n. 99/2013 seria
pagamentos remetidos ao exterior.
90 Vide Solução de Consulta COSIT n. 6/2014.
91 Foram citados (i) arts. 682 e 708 do RIR/99, que trazem, respectivamente, as regras gerais
de retenção quando há pagamentos ao exterior e de incidência de IRRF nas remessas de
rendimentos referentes a serviços técnicos e assistência técnica administrativa (à alíquota
de 25%, mas que é reduzida quando há incidência de CIDE); (ii) o art. 2º-A da Lei n.
10.168/2000, que estabelece a alíquota de 15% de IRRF quando há incidência de CIDE
nas remessas ao exterior a título de serviços de assistência técnica administrativa e
semelhante; e (iii) art. 1º, da Lei n. 10.865/2004, que instituiu o PIS/COFINS-Importação
incidente sobre a importação de produtos e serviços.
92 O pagamento poderia estar sujeito a retenções de IRPJ/CSLL e PIS/COFINS, se
considerado serviço técnico.
93 O que estaria mais próximo do PaaS do que o IaaS.
94 Parecer disponível em <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-
/materia/108390>. Acesso em: 15 dez. 2017. Tramitação – Anexo do dia 5-11-2013
(Relatório Legislativo).
95 Conforme art. 30, III, da Lei n. 16.757/2017.
96 Quando o STF decidiu, por exemplo, que faltavam à locação os elementos que a
caracterizassem como prestação de serviço (RE n. 116.121-3, de 11-10-2002 e Súmula
Vinculante 31 do STF).
97 Pontes de Miranda explica que serviço, em sentido amplo, consiste em “qualquer
prestação de fazer, ao menos largamente, de atividade. Tratado de Direito Privado, Parte
Especial, Tomo XLVII. 1. ed. São Paulo: Bookseller, 2006. p. 27.
98 MELLO, José Eduardo Soares de. ISS, Aspectos Teóricos e Práticos. 5. ed. Dialética: São
Paulo, 2008. p. 37.
99 Nesse sentido, vide Washington de Barros Monteiro. Curso de Direito Civil, Direito das
Obrigações, 1ª parte. Saraiva: São Paulo, 2007. p. 91-92.
100 Cf. Silvio Rodrigues: “o acordo de duas ou mais vontades, em vista de produzir efeitos
jurídicos”. Direito Civil: dos Contratos e das declarações unilaterais da vontade, v. 3.
São Paulo: Saraiva, 1997. p. 9-10.
101 Isso porque, ao contrário do contrato de trabalho, na prestação de serviços não há relação
de subordinação entre as partes, o prestador executa o serviço contratado utilizando os

1808
métodos e processos que julgar convenientes, sob sua própria orientação técnica.
102 Nesse caso, foi analisada a constitucionalidade da incidência do ISS sobre a atividade de
administração de planos de saúde (itens 4.22 e 4.23 da LC n. 116/2003).
103 O julgamento desse recurso se deu em sede de repercussão geral, podendo refletir em
julgamentos futuros do STF que analisam, por exemplo, se a licença de software e a
atividade de franquia podem ser consideradas serviço, que tambem estão sob repercussão
geral (RE n. 688.223 e RE n. 603.136).
104 Paulo Ayres Barreto frisa que o legislador constitucional discriminou a competência
impositiva mediante a utilização de conceitos. Caso se admitisse que o legislador
infraconstitucional é quem definiria as referências sígnicas constitucionais, seria esvaziada
a repartição de competências impositivas delineada pelo legislador constitucional (cf.
Planejamento tributário: limites normativos. São Paulo: Noeses, 2016. p. 56).
105 XAVIER, Alberto. Da Tributação dos Rendimentos Pagos a Titulares de Data Center
Residentes no Exterior, Revista Dialética de Direito Tributário, n. 234, 1º-3-2015, p. 7-14.
106 Alberto Xavier classifica a natureza do contrato de data center como “contrato
inominado tendo por objeto a disponibilização de infraestrutura para armazenamento e
processamento de dados” (Op. cit., p. 13).
107 “A fim de identificar cada um dos serviços que compõem essa hospedagem e a parcela
do preço que corresponde a cada um deles, e assim reduzir os problemas com a
indefinição de qual o imposto incidente, a empresa que oferece hospedagem poderia
celebrar contratos distintos para cada um dos serviços” (MACHADO, Rodrigo Brunelli.
Tributação das Atividades Realizadas por “Data Centers”. In: MOREIRA, André Mendes;
RABELO FILHO, Antônio Reinaldo; CORREIA, Armênio Lopes. Direito das
Telecomunicações e Tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 343).
108 Cf. Aires Barreto em ISS na Constituição e na Lei. 3. ed. São Paulo: Dialética, 2009. p.
212.
109 Como no caso da decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que concluiu
pela “natureza jurídica híbrida e complexa do contrato de franquia, que não envolve, na
essência, pura obrigação de fazer, mas variadas relações jurídicas entre franqueador e
franqueado, afastando-se do conceito constitucional de serviços” (Apelação n. 0039300-
24.2011.8.26.0053, de 25-8-2015).
110 Como no Acórdão n. 1201-000.941, de 27-8-2014: “A natureza jurídica do contrato de
franquia, por ser complexa e híbrida, implica relações jurídicas diferentes entre si,
passíveis de segregação e individualização. Dentre as atividades que encontramos nesse
complexo relacional está a atividade de cessão de direitos, a cessão de know how, a
distribuição, a prestação de serviços e a venda de mercadorias. No caso em apreço a
fiscalização não individualizou as operações, preferindo imputar toda a receita da venda
de mercadorias como royalties, utilizando uma base de cálculo presumida de 32%. Diante
disso, o artigo 519 do RIR é muito claro em contemplar possibilidades de que uma mesma
pessoa jurídica tenha objetivos sociais diversos, hipótese em que cada uma dessas
atividades deverá se submeter ao percentual específico para apuração da base de cálculo
do lucro presumido”. Esse acórdão foi parcialmente reformado pela Câmara Superior de
Recursos Fiscais em decisão recente (Acórdão n. 9101-003.098, de 5-10-2017).
111 O art. 15, § 1º, III, prevê o percentual de presunção de 32%, entre outros itens, para: (a)

1809
as atividades de prestação de serviços em geral, exceto a de serviços hospitalares (...); (c)
administração, locação ou cessão de bens imóveis, móveis e direitos de qualquer natureza.
Como sustentado neste artigo, além de a disponibilização de acesso ao data center não
representar prestação de serviço, ele também não poderia ser segregado em locação, por
exemplo. Por isso, a alíquota de 32% seria inaplicável.
112 Caso a sociedade de data center pague pelo licenciamento de software, que é utilizado no
data center, pode haver discussão se esse pagamento se equipara a royalty e, por
consequência, se poderia ter sua dedutibilidade (para fins de IRPJ) limitada a 5% do valor
da “receita líquida de vendas”, conforme art. 355, do RIR/99. Embora não concordemos
que o pagamento pelo licenciamento de software tenha natureza de royalty, temos
conhecimento de autos de infração que glosaram as despesas com licenciamento de
software justamente com base nesse argumento. A Câmara Superior de Recursos Fiscais
também já se posicionou de forma desfavorável ao contribuinte (Acórdãos n. 9101-
001.908, de 13 de maio 2014, e n. 9101-003.063, de 13 de setembro de 2017).
113 Tais como despesas com locação do espaço, manutenção dos equipamentos, entre outros.
Não vamos abordar aqui quais tipos de despesa seriam passíveis de creditamento de
PIS/COFINS, mas pode haver discussões sobre determinadas despesas serem consideradas
insumos da atividade, principalmente por se tratar de atividade de cunho comercial e não
industrial.
114 Essa regra também é aplicável ao PIS, conforme art. 15, inciso V, da Lei n. 10.833/2003.
115 As exceções ao regime da não cumulatividade foram introduzidas em um contexto de
privilegiar alguns setores que não foram beneficiados pela mudança para o regime não
cumulativo. Isso porque alguns setores (incluindo o de informática) não seriam capazes de
reconhecer créditos de PIS/COFINS, uma vez que nem todos os seus custos e despesas
dariam direito a crédito. Assim, como o propósito principal da mudança do regime
cumulativo para o não cumulativo era de reduzir a carga fiscal da cadeia de produção
como um todo, não haveria razão para que as receitas de alguns setores, como o de
informática, fossem tributadas pelo regime não cumulativo. Em outras palavras, a
aplicação do regime cumulativo pode ser vista como uma espécie de benefício para os
setores listados nas exceções (além do setor de informática, as receitas decorrentes de
atividade de call center e telemarketing também estão incluídas nas exceções).
116 Conforme art. 3º, § 7º, da Lei n. 10.833/2003 (“Na hipótese de a pessoa jurídica sujeitar-
se à incidência não cumulativa da COFINS, em relação apenas à parte de suas receitas, o
crédito será apurado, exclusivamente, em relação aos custos, despesas e encargos
vinculados a essas receitas”). A mesma disposição consta da Lei n. 10.637/2002, aplicável
ao PIS (art. 3º, § 7º).
117 A alíquota de 25% de IRRF é aplicável no caso de remessas de serviços técnicos e de
assistência (art. 708 do RIR/99, que é reduzida a 15% quando há incidência de CIDE – art.
2º-A da Lei n. 10.168/2000) e de prestação de serviços em geral (art. 685, II, “a”, do
RIR/99). Como entendemos que esse não é o caso da atividade de data center, essa
alíquota não seria aplicável.
118 Esse conceito foi originalmente introduzido pela Lei n. 9.430/96. Na prática, a RFB lista
as jurisdições qualificadas como de tributação favorecida na Instrução Normativa n. 1.037,
de 7-6-2010.

1810
119 A equiparação em questão está prevista no inciso I do artigo 1º do referido ADI
(transcrição abaixo). Trata-se, porém, de questão polêmica, havendo fundamento para se
sustentar que a qualificação de determinada contraprestação como royalty, à luz do art. 12
da Convenção Modelo, somente se aplica no caso de serviços que impliquem efetiva
transferência de tecnologia.
“Art. 1º O tratamento tributário a ser dispensado aos rendimentos pagos, creditados,
entregues, empregados ou remetidos por fonte situada no Brasil a pessoa física ou jurídica
residente no exterior pela prestação de serviços técnicos e de assistência técnica, com ou
sem transferência de tecnologia, com base em acordo ou convenção para evitar a dupla
tributação da renda celebrado pelo Brasil será aquele previsto no respectivo Acordo ou
Convenção:
I – no artigo que trata de royalties, quando o respectivo protocolo contiver previsão de que os
serviços técnicos e de assistência técnica recebam igual tratamento, na hipótese em que o
Acordo ou a Convenção autorize a tributação no Brasil (...).”
120 Cf. item 11.6 dos Comentários da OCDE ao Artigo 12 (trecho original mantido em
inglês): “mixed contract (...) If, however, one part of what is being provided constitutes by
far the principal purpose of the contract and the other parts stipulated therein are only of
and largely unimportant character, then the treatment applicable to the principal part
should generally be applied to the whole amount of consideration”.
121 Cf. SILVEIRA, Ricardo Maitto da. O Escopo Pessoal dos Acordos Internacionais contra
a Bitributação: Regimes fiscais especiais, conflitos de qualificação e casos triangulares –
Série Doutrina Tributária v. XIX. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 266 e nota de rodapé
n. 640.
122 Cf. Recursos Especiais n. 1.272.897, de 19-11-2015, e n. 1.161.467, de 17-5-2012.
123 A importação de serviços também é sujeita ao ISS (art. 1º, § 1º, da LC n. 116/2003).
124 No Município de São Paulo, o tomador de serviços provenientes do exterior do País é
responsável pelo pagamento do ISS, devendo reter na fonte o seu valor (art. 6º, I, do
Decreto n. 53.151/2012).
125 Nos termos da legislação, a alíquota de 2,9% passaria a ser vigente após 90 dias da data
da publicação da Lei n. 16.757/2017, que foi em 15-11-2017.
126 Usualmente, em contratos de prestação de serviço, é negociado que a eventual incidência
de tributos não afeta o montante a ser recebido pelo prestador. Assim, há a transferência
do ônus do imposto para o tomador do serviço que remunera o prestador em montante
superior ao valor do serviço para que a incidência dos tributos não diminua o pactuado em
contrato.
127 Cf. art. 1º, do Decreto n. 5.712, de 2-3-2005.
128 Parecer disponível em:
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=F82349A45D24F73F256A4
codteor=1565058&filename=Parecer-CCTCI-31-05-2017>. Acesso em: 15 dez. 2017.
129 Pós-graduado em Direito Tributário pela PUC-SP. Mestre em Direito Tributário (LL.M.
in Taxation) pela Georgetown University Law Center, instituição pela qual foi designado
Graduate Tax Scholar e agraciado com bolsa de estudos. Especialista em Negociações
Avançadas: Estruturação e Implementação de Negócios pela Harvard Law School.

1811
Advogado em São Paulo.
130 Pós-graduado em Direito Tributário (LL.M) pelo INSPER. Contador e advogado pela
PUC-SP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Advogado em São
Paulo.
131 “Virtual Currencies and Beyond: Initial Considerations”, encontrado no endereço
eletrônico do FMI: <https://www.imf.org/external/pubs/ft/sdn/2016/sdn1603.pdf>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
132 O presente artigo fará uso da expressão “moedas virtuais” por ser essa a mais largamente
utilizada nas manifestações legais encontradas local e internacionalmente. Nada obstante,
cumpre registrar que essa expressão será aqui utilizada com dois grandes sentidos: (i)
como gênero, situação na qual dita expressão contempla diversos tipos diferentes de
representação digital de valor; e (ii) como uma das espécies desse gênero, em que tal
representação faz uso de tecnologia criptográfica para validação (situação na qual é
sinônimo de criptomoeda). Embora muitos dos comentários feitos aqui possam ser
estendidos a outras espécies, essas não perfazem propriamente o escopo do presente
artigo.
133 A esse respeito, cumpre menção ao FATF (Financial Action Task Force), órgão
internacional criado em 1989, que busca mecanismos para combater a lavagem de
dinheiro e financiamento ao terrorismo, tendo recentemente se empenhado em evitar a
utilização desses “instrumentos” para finalidades ilícitas (http://www.fatf-
gafi.org/media/fatf/documents/reports/Guidance-RBA-Virtual-Currencies.pdf. Acesso em:
15 dez. 2017).
134 Informação obtida no seguinte endereço eletrônico: <http://historyofbitcoin.org>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
135 Cotações obtidas no endereço eletrônico da Infomoney
(http://www.infomoney.com.br/mercados/bitcoin). Acesso em: 15 dez. 2017.
136 Naturalmente, o exercício matemático acima tem caráter eminentemente exemplificativo
e busca ilustrar a impressionante valorização dos Bitcoins. É de se presumir que operações
com um volume tão grande de Bitcoins teriam impacto direto na sua quantificação. Além
disso, existe um limite teórico ao número de Bitcoins que serão criadas de 21 milhões de
unidades (vide https://bitcoin.org/en/faq#what-about-bitcoin-and-taxes. Acesso em: 15
dez. 2017).
137 A esse respeito, vide interessante sumário feito por Roberto Quiroga Mosqueira, in
Direito Monetário e Tributação da Moeda, São Paulo: Dialética, 2006, p. 50 e s.
138 Definição proposta pelo já aludido grupo de estudos do FMI. No original: “VCs are
digital representations of value, issued by private developers and denominated in their
own unit of account. VCs can be obtained, stored, accessed, and transacted electronically,
and can be used for a variety of purposes, as long as the transacting parties agree to use
them”. Ob. citada, p. 7.
139 Cf. EBA Opinion on “Virtual Currencies”
(http://www.eba.europa.eu/documents/10180/657547/EBA-Op-2014-
08+Opinion+on+Virtual+Currencies.pdf. Acesso em: 15 dez. 2017), p. 11.
140 Conforme Title 31 do CFR § 1010.100(m): “(m) Currency. The coin and paper money of

1812
the United States or of any other country that is designated as legal tender and that
circulates and is customarily used and accepted as a medium of exchange in the country of
issuance. Currency includes U.S. silver certificates, U.S. notes and Federal Reserve notes.
Currency also includes official foreign bank notes that are customarily used and accepted
as a medium of exchange in a foreign country”.
141 Disponível em: <https://www.irs.gov/pub/irs-drop/n-14-21.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
142 Para aprofundamento, sugere-se leitura da compilação da legislação internacional sobre
moedas virtuais feita pela Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos da América,
intitulada Regulation of Bitcoin in Selected Jurisdictions, que pode ser encontrada no
seguinte endereço eletrônico: <http://www.loc.gov/law/help/bitcoin-survey>. Acesso em:
15 dez. 2017.
143 Tópico 3.2.2, itens 87 a 89. Confira-se: “87. Os anos recentes têm sido marcados pelo
aparecimento e desenvolvimento das ‘moedas virtuais’, que significam unidades de troca
digital que não são suportadas por curso legal e emissão governamental. Essas moedas
adotaram diversas formas. Algumas moedas virtuais são específicas a uma única economia
virtual, como os jogos online, onde elas são usadas para comprar ativos e serviços dentro
do jogo. Em alguns casos, essas específicas moedas virtuais podem ser trocadas por
moedas reais ou utilizadas para comprar mercadorias e serviços reais, por meio de trocas
que podem ser operadas pelos criadores dos jogos ou terceiros. 88. Outras moedas virtuais
foram desenvolvidas primeiramente para permitir a compra de mercadorias e serviços
reais. O mais proeminente exemplo desse tipo são as várias ‘criptomoedas’,
particularmente os bitcoins, que dependem de criptografia e verificação de segurança para
confirmar transações. Muitos operadores privados têm optado por aceitar pagamentos em
bitcoins. 89. Como as moedas virtuais consideravelmente ganham efetivo valor
econômico, elas levantam questões políticas relevantes. Algumas dessas provêm da
natureza anônima das transações. No caso das bitcoins, por exemplo, transações podem
ser inteiramente anônimas, uma vez que nenhuma informação de identificação pessoal é
requerida para adquirir ou transacionar bitcoins” (tradução livre).
144 Apenas a título ilustrativo, os ganhos decorrentes da alienação de moedas virtuais por
pessoas físicas estarão sujeitos à tributação, nos termos do artigo 21 da Lei n. 8.981/95,
cujas alíquotas variam de 15% a 22,5% a depender do montante do ganho apurado.
Ganhos decorrentes de operações com preço unitário inferior a R$ 35.000,00 (trinta e
cinco mil reais) são isentos de tributação, nos termos do artigo 22 da Lei n. 9.250/95. Tal
entendimento já foi exteriorizado pela RFB por meio do diretório “Perguntas e
Respostas”, no item 607, nos seguintes termos: “ALIENAÇÃO DE MOEDAS VIRTUAIS
607 – Os ganhos obtidos com a alienação de moedas ‘virtuais’ são tributados? Os ganhos
obtidos com a alienação de moedas virtuais (bitcoins, por exemplo) cujo total alienado no
mês seja superior a R$ 35.000,00 são tributados, a título de ganho de capital, à alíquota de
15%, e o recolhimento do imposto sobre a renda deve ser feito até o último dia útil do mês
seguinte ao da transação. As operações deverão estar comprovadas com documentação
hábil e idônea”.
145 Conforme art. 1º, § 3º, IX, da Lei n. 10.637/2002.
146 Conforme art. 1º, § 3º, VIII, da Lei n. 10.833/2003.

1813
147 Em ambos os casos, afasta-se do conceito de receita financeira previsto no art. 373 do
Decreto n. 3.000/99.
148 Dita vedação somente será aplicável às empresas que se enquadrarem nas hipóteses
listadas pelo art. 14 da Lei n. 9.718/98.
149 Conforme art. 3º, § 2º, IV da Lei n. 9.718/98; art. 1º, § 3º, VI da Lei n. 10.637/2002; e
art. 1º, § 3º, II da Lei n. 10.833/2003.
150 “Q-8: Does a taxpayer who ‘mines’ virtual currency (for example, uses computer
resources to validate Bitcoin transactions and maintain the public Bitcoin transaction
ledger) realize gross income upon receipt of the virtual currency resulting from those
activities? A-8: Yes, when a taxpayer successfully ‘mines’ virtual currency, the fair
market value of the virtual currency as of the date of receipt is includible in gross income.
See Publication 525, Taxable and Nontaxable Income, for more information on taxable
income.”
151 Conforme o Internal Revenue Code – Sections 1.402(b) e 1.402(c)(2)(C).
152 Conforme Pronunciamento CPC n. 48, itens 4.1.3. e 5.1.1.
153 Novamente, por não se tratar de atividade necessariamente regulada, aqueles que não se
encontrarem sob o crivo do SFN poderão adotar qualquer regime fiscal desejado, desde
que atendidos os demais requisitos previstos na legislação.
154 Tal atividade enquadra-se no item 10.02 da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar
n. 123/2003. De toda forma, cumpre menção à Solução de Consulta SF/DEJUG n.
08/2013, proferida pela Secretaria de Finanças e Desenvolvimento Econômico da Cidade
de São Paulo, que se dirige às atividades conduzidas por empresa dedicada à gestão de
programas de recompensa (na maioria, virtuais), e conclui que essa atividade também
estaria sujeita ao ISS, mas teria natureza de “promoção de vendas” prevista no item 17.06
da Lista de Serviços.
155 O Brief 9 (2014) do HMRC expressamente lista os casos em que o tributo sobre vendas
deverá incidir sobre as operações envolvendo criptomoedas.
156 Conforme art. 155, II, da Constituição Federal c/c o art. 2º, I, da Lei Complementar n.
87/1996.
157 Conforme art. 155, IV, da Constituição Federal c/c o art. 46 do CTN.
158 Conforme art. 4º da Lei n. 7.766/89 c/c o art. 36 e seguintes do Decreto n. 6.306/2007.
159 “Virtual Currencies and Beyond: Initial Considerations”, encontrado no endereço
eletrônico do FMI: <https://www.imf.org/external/pubs/ft/sdn/2016/sdn1603.pdf>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
160 EBA Opinion on “Vitual Currencies”, encontrado no seguinte endereço eletrônico:
<http://www.eba.europa.eu/documents/10180/657547/EBA-Op-2014-
08+Opinion+on+Virtual+Currencies.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
161 Bacharel em direito pela Faculdade de Direito da PUC-SP. Bacharel em Economia pela
Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo
(FEA-USP). Pós-graduado em direito tributário pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (PUC-SP). Mestre em Direito Tributário Internacional (LLM) pela Leiden
University, Holanda. Advogado em São Paulo.

1814
162 Bacharel em direito pela Faculdade de Direito da FGV. MBA em IFRS pela FIPECAFI.
Advogado em São Paulo.
163 STF, RE n. 330.817/RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 8-3-2017, DJ 31-8-
2017.
164 “Art. 100. A retenção do imposto, de que tratam os arts. 97 e 98, compete à fonte,
quando pagar, creditar; empregar, remeter ou entregar o rendimento.”
165 “Art. 45. (...) Parágrafo único. A lei pode atribuir à fonte pagadora da renda ou dos
proventos tributáveis a condição de responsável pelo imposto cuja retenção e recolhimento
lhe caibam.”
166 “Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso
a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da
respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este
em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.”
167 MARIZ DE OLIVEIRA, Ricardo. Fundamentos do imposto de renda. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2008. p. 501-502.
168 “Art. 308. O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob
pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito.”
“Art. 319. O devedor que paga tem direito a quitação regular, e pode reter o pagamento,
enquanto não lhe seja dada.
Art. 320. A quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular, designará o
valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo
e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor, ou do seu representante.
Parágrafo único. Ainda sem os requisitos estabelecidos neste artigo valerá a quitação, se de
seus termos ou das circunstâncias resultar haver sido paga a dívida.”
169 MARIZ DE OLIVEIRA, op. cit., p. 513.
170 XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. Rio de Janeiro: Forense,
2015. p. 518.
171 “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)”
(Redação dada pela Emenda Constitucional n. 19, de 1998).
172 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 200.
173 NUNES, Renato. Imposto sobre a renda devido por não residentes no Brasil: regime
analítico e critérios de conexão. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 211.
174 MARIZ DE OLIVEIRA, op. cit., p. 505.
175 FUNARO, Hugo. Sujeição passiva indireta no direito tributário brasileiro – as hipóteses
de responsabilidade pelo crédito tributário previstas no Código Tributário Nacional. São
Paulo: Quartier Latin, 2013. p. 83-84.
176 Como a proferida por Alberto Xavier: “(...) Ora, para fins de retenção do imposto, quis a
lei que a obrigação respectiva só surgisse em razão de atividade específica da fonte
pagadora, de ato positivo seu, qual seja: o creditar, o pagar, o empregar, o remeter ou o
entregar o rendimento. Quisesse a lei que o fato gerador da obrigação tributária em causa

1815
surgisse com o só vencimento do prazo contratual, tê-lo-ia dito, sem dúvida, de forma
clara, sem condicionar a ocorrência do fato gerador a um ato positivo, um facere da fonte
pagadora do rendimento, como a forma verbal utilizada demonstra” (XAVIER, op. cit., p.
521-522).
177 2ª Turma da CSRF, Acórdão n. 9202-003.120, Rel. Elias Sampaio Freire, j. 26-3-2014,
publ. 20-5-2014.
178 2ª Turma da CSRF, Acórdão n. 9202-003.097, Rel. Marcelo Oliveira, j. 25-3-2014, publ.
8-5-2014.
179 4ª Turma da CSRF, Acórdão n. 9304-00.114, Rel. Ivete Malaquias Pessoa Monteiro, j. 4-
5-2009, publ. 4-5-2009.
180 4ª Câmara da 2ª Turma Ordinária da 1ª Seção de Julgamento do CARF, Acórdão n.
1402-002.342.
181 2ª Câmara da 2ª Turma Ordinária da 2ª Seção de Julgamento do CARF, Acórdão n.
2202-003.029.
182 2ª Câmara da 2ª Turma Ordinária da 2ª Seção de Julgamento do CARF, Acórdão n.
2202-002.535.
183 2ª Câmara da 1ª Turma Ordinária da 2ª Seção de Julgamento do CARF, Acórdão n.
2201-001.836.
184 “Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:
(...)
III – a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no
inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo.”
185 “Art. 7º As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo
Banco Central do Brasil, autorizadas a operar no mercado de câmbio, podem dar curso,
por meio de banco autorizado a operar no mercado de câmbio, a transferências ao exterior
por pessoa física ou jurídica, residente, domiciliada ou com sede no País, para constituição
de disponibilidade no Exterior.
Art. 8º Para os fins das disposições deste capítulo, ‘disponibilidades no exterior’, é a
manutenção por pessoa física ou jurídica, residente, domiciliada ou com sede no País, de
recursos em conta mantida em seu próprio nome em instituição financeira no exterior.
Parágrafo único. Quando da realização de transferências destinadas à constituição de
disponibilidades no exterior, deve ser informado no campo ‘Outras especificações’ do
contrato de câmbio o número de conta e o nome da instituição depositária no exterior.”
186 LLM em Tributação Internacional pela New York University School of Law. LLM em
Direito Corporativo pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais. MBA Executivo
Internacional pela Chinese University of Hong Kong. MBA em Direito Tributário pela
Fundação Getúlio Vargas. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará.
Advogado em São Paulo.
187 Pós-graduando em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas. Bacharel em
Ciências Contábeis pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Bacharel em Direito pela
Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado em São Paulo.
188 Publicado no DOU de 29 de março de 2017. Disponível em:

1816
<http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?
visao=anotado&idAto=81598>. Acesso em: 15 dez. 2017.
189 Vide art. 2º da Lei n. 10.168/2000.
190 Publicado no DOU de 23 de maio de 2017. Disponível em <http://normas.receita.
fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=83001>. Acesso em: 15
dez. 2017.
191 Publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo (DOE-SP) de 21 de setembro de
2017. Disponível em:
<https://portal.fazenda.sp.gov.br/DiarioOficial/Paginas/Decis%C3%A3o-Normativa-CAT-
04,-de-20-de-setembro-de-2017.aspx>. Acesso em: 15 dez. 2017.
192 Publicado no DOU de 5 de outubro de 2017. Disponível em:
<https://www.confaz.fazenda. gov.br/legislacao/convenios/2017/CV106_17>. Acesso em:
15 dez. 2017.
193 Publicado no DOU de 1º de junho de 2017. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/LCP/Lcp157.htm>. Acesso em: 15 dez. 2017.
194 Publicado no DOU de 22 de julho de 2017. Disponível em
<http://normas.receita.fazenda.gov.br/ sijut2consulta/link.action?
visao=anotado&idAto=54319>. Acesso em: 15 dez. 2017.
195 Vide ALTAY, Omer. Most Popular MMORPGs in the World. 18 de abril de 2015.
Disponível em: <https://mmos.com/editorials/most-popular-mmorpgs-world>. Acesso em:
15 dez. 2017.
196 Vide STATISTA. Statistics & Facts on MMO/MMORPG gaming. Fevereiro de 2017.
Disponível em: <https://www.statista.com/topics/2290/mmo-gaming/>. Acesso em: 15
dez. 2017.
197 Vide MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 37. ed. São Paulo:
Malheiros, 2016. p. 59. Outros autores, a exemplo de Paulo de Barros Carvalho,
conceituam o Direito Tributário como o “ramo didaticamente autônomo do Direito,
integrado pelo conjunto das proposições jurídico-normativas que correspondam, direta ou
indiretamente, à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos”. Vide: CARVALHO,
Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 15.
198 Vide MACHADO, op. cit., p. 60.
199 Relevante, aqui, é a observação de que a legislação tributária poderia, a princípio, alterar
a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de Direito Privado
que não fossem utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal. Essa
faculdade se justifica, inclusive, à luz de uma interpretação histórica desse dispositivo,
que, no seio do Anteprojeto que serviu de base para os trabalhos da Comissão Especial do
Código Tributário Nacional, submetido pelo Professor Rubens Gomes de Sousa, a impedia
de modo expresso. Vide Anteprojeto. Trabalhos da Comissão Especial do Código
Tributário Nacional. Rio de Janeiro, 1954, p. 298.
200 De acordo com a Súmula Vinculante 31, do Supremo Tribunal Federal (STF), “É
inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISS sobre
operações de locação de bens móveis.” Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumario.asp?sumula=1286>. Acesso

1817
em: 15 dez. 2017.
201 Segundo a Receita Federal do Brasil, na Solução de Consulta COSIT RFB n. 130, de 31
de agosto de 2016, “O software customizável não se confunde com programa de
computador sob encomenda. O primeiro, ainda que comporte certo grau de
personalização, é produto padronizado, pronto para uso, concebido e desenvolvido para
suprir as necessidades de potenciais clientes, ao passo que o segundo visa atender a um
prévio e determinado encomendante”. Disponível em:
<http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?
visao=anotado&idAto=78043>. Acesso em: 15 dez. 2017.
202 Vide TORRES, Heleno Taveira. Temporalidade e Segurança Jurídica – Irretroatividade e
Anterioridade Tributárias. Revista da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).
PGFN: Brasília, 2011, p. 50.
203 Vide BAL, Aleksandra. Tax Implications of Cloud Computing – How Real Taxes Fit Into
Virtual Clouds. Bulletin for International Taxation. Amsterdã: IBFD, 2012, pp. 335/336.
204 Vide GRANCE, Timothy; e MELL, Peter. The NIST Definition of Cloud Computing –
Recommendations of the National Institute of Standards and Technology. Gaithersburg:
Departamento de Comércio dos Estados Unidos, p. 02/03. Disponível em:
<http://nvlpubs.nist.gov/nistpubs/ Legacy/SP/nistspecialpublication800-145.pdf>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
205 Vide informações disponíveis em: <https://www.rackspace.com/pt-br/dedicated-servers>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
206 O Microsoft Azure se apresenta como uma plataforma em nuvem, utilizável para a
criação de “aplicativos inteligentes.” A plataforma possui inteligência artificial interna, e
fornece diversas ferramentas para desenvolvedores e clientes, entre elas marketing digital
e o ambiente para a criação de jogos. Disponível em: <https://azure.microsoft.com/pt-
br/solutions/>. Acesso em: 15 dez. 2017.
207 Vide YOO, Christopher S. Cloud Computing: Architectural and Policy Implications.
University of Pennsylvania, p. 06. Última revisão em 31 de janeiro de 2014. Disponível
em: <https://papers.ssrn. com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1824580>. Acesso em: 15 dez.
2017.
208 Vide BRASIL. Código Civil. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, art. 1.228.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
209 Vide BRANDÃO JUNIOR, Salvador Cândido. A Tributação de Software sob
Encomenda: A Inadequação do Parecer Normativo SF 1/2017. JOTA, 26 de agosto de
2017. Disponível em: <https://jota.info/artigos/a-tributacao-de-software-sob-encomenda-
26082017>. Acesso em: 15 dez. 2017.
210 Vide art. 4º da Lei n. 9.609/97 (Lei do Software).
211 O MMORPG World of Warcraft foi criado pela empresa norte-americana Blizzard
Entertainment em 2004, e é reconhecido como o jogo virtual com o maior número de
inscritos em todo o mundo: mais de 10 milhões de jogadores registrados. Vide ROUNER,
Jef. 10 Games with Guinness World Records. 15 de maio de 2014. Disponível em:
<http://www.houstonpress.com/arts/10-games-with-guinness-world-records-6392480>.

1818
Acesso em: 15 dez. 2017.
212 Última atualização em 22 de agosto de 2012. Disponível em: <http://us.blizzard.com/pt-
br/company/legal/wow_tou.html>. Acesso em: 15 dez. 2017.
213 Vide PADILHA, Maria Ângela Lopes Paulino. Tributação de Software: Exame da
Constitucionalidade da Incidência do ISS e do ICMS-Mercadoria sobre a Licença de Uso
de Programa de Computador Disponibilizado Eletronicamente. Tese de Doutorado,
orientada por Paulo de Barros Carvalho. São Paulo: PUC-SP, 2016, p. 124. Disponível
em:
<https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/19637/2/Maria%20%C3%82ngela%20Lopes%20Paulino%20
Acesso em: 15 dez. 2017.
214 O jogo Warcraft III: Reign of Chaos foi lançado pela empresa norte-americana Blizzard
Entertainment em julho de 2002, enquanto a sua expansão, intitulada The Frozen Throne,
foi lançada em julho do ano seguinte. Vide KASAVIN, Greg. Warcraft III: Reign of
Chaos Review. GameSpot, 3 de julho de 2002. Disponível em:
<https://www.gamespot.com/reviews/warcraft-iii-reign-of-chaos-review/1900-2873347/>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
215 Vide BLIZZARD. Warcraft III: Reign of Chaos – Real-time Strategy. Disponível em:
<https://us. shop.battle.net/en-us/product/warcraft-iii-reign-of-chaos>. Acesso em: 15 dez.
2017.
216 Vide críticas à inclusão do item 1.09 à lista anexa em GRILLO, Brenno. Lei que tributa
streaming iguala cessão de uso a serviço, alertam advogados. Revista Consultor Jurídico,
14 de janeiro de 2017. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-jan-14/imposto-
streaming-iguala-cessao-uso-servico-dizem-advogados>. Acesso em: 15 dez. 2017.
217 O art. 10, XXV, da Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003, afirma que estão
submetidas ao regime cumulativo de COFINS “as receitas auferidas por empresas de
serviços de informática, decorrentes das atividades de desenvolvimento de software e o
seu licenciamento ou cessão de direito de uso, bem como de análise, programação,
instalação, configuração, assessoria, consultoria, suporte técnico e manutenção ou
atualização de software, compreendidas ainda como softwares as páginas eletrônicas”. A
disposição se aplica também ao PIS, por força do art. 15, V, da mesma Lei.
218 Vide, por exemplo, a Solução de Consulta DISIT 09 RFB n. 13, de 19 de janeiro de 2009.
Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?
visao=anotado&idAto=69464>. Acesso em: 15 dez. 2017. Vide também a Solução de
Consulta COSIT RFB n. 448, de 18 de setembro de 2017. Disponível em:
<http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?
visao=anotado&idAto=87096>. Acesso em: 15 dez. 2017.
219 Publicada no DOU de 28 de julho de 2017. Disponível em:
<http://normas.receita.fazenda.gov.br/ sijut2consulta/link.action?
visao=anotado&idAto=84809>. Acesso em: 15 dez. 2017. Vide ainda CASTRO, Leonardo
Freitas de Moraes e. Novo Entendimento da Receita Aumenta Economia Digital. JOTA,
25 de outubro de 2017. Disponível em: <https://jota.info/artigos/novo-entendimento-da-
receita-aumenta-economia-digital-25102017>. Acesso em: 15 dez. 2017.
220 Disponível em: <https://en.oxforddictionaries.com/definition/mmog>. Acesso em: 15
dez. 2017. (Tradução livre.)

1819
221 Vide BILIR, Tania E. Real Economics in Virtual Worlds: A Massively Multiplayer
Online Game Case Study, Runescape. Publicado em 25 de dezembro de 2009, p. 14-19.
Disponível em: <https://papers. ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1655084>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
222 Dungeons and Dragons é um jogo de tabuleiro no estilo RPG, originalmente
desenvolvido por Gary Gygax e Dave Arneson, e lançado pela primeira vez no ano de
1974, pela empresa Tactical Studies Rules, Inc. Vide PETERSON, Jon. History: Forty
Years of Adventure. Dungeons & Dragons. Disponível em:
<http://dnd.wizards.com/dungeons-and-dragons/what-dd/history/history-forty-years-
adventure>. Acesso em: 15 dez. 2017. O sucesso de Dungeons and Dragons inspirou toda
uma geração de jogos RPG e MMORPG até os dias de hoje, com destaque para o
MMORPG Neverwinter, desenvolvido pela empresa BioWare e cuja primeira versão foi
lançada em 2002. A mecânica de jogo de Neverwinter é baseada na terceira edição de
regras do jogo Dungeons & Dragons. Vide ARC GAMES. Neverwinter: Tomb of
Annihilation. Data de lançamento: 20 de junho de 2013. Disponível em:
<http://www.arcgames. com/en/games/neverwinter>. Acesso em: 15 dez. 2017.
223 De acordo com o Dicionário Oxford, a palavra “avatar” significa a manifestação de uma
deidade ou de uma alma em forma humana na Terra. Um significado mais recente para
essa palavra, sem dúvida decorrente da influência de MMOGs e que tais na sociedade
moderna, é “um ícone ou uma figura representando uma pessoa determinada em um video
game, fórum da Internet, etc.”. Disponível em:
<https://en.oxforddictionaries.com/definition/avatar>. Acesso em: 15 dez. 2017.
224 Vide BILIR, Tania E., op. cit., p. 36.
225 Vide AHMED, Devan Tanvir; SHIRMOHAMMADI, Shervin. Zoning Issues and Area
Interest Management in Massively Multiplayer Online Games. Handbook of Multimedia
for Digital Entertainment and Arts. Editado por Borko Furht. New York: Springer, 2009,
p. 177.
226 Vide ANKAMA. Discover: Dofus. 2017. Disponível em:
<https://www.dofus.com/en/mmorpg/ discover>. Acesso em: 15 dez. 2017.
227 Vide ANKAMA. Dofus Touch: Purchase and Sell – Première Pas. 2017. Disponível em:
<http://www.dofus-touch.com/en/mmorpg/tutorials/532316-purchase-sell>. Acesso em:
15 dez. 2017.
228 A tributação é exigida sobre o valor do item colocado à venda.
229 Vide GHUMAN, Davinder; e GRIFFITHS, Mark D. A cross-genre study of online
gaming: Player demographics, motivation for play, and social interactions among
players. International Gaming Research Unit, Divisão de Psicologia. Nottingham:
Nottingham Trent University, 2012, p. 5. Disponível em:
<http://irep.ntu.ac.uk/id/eprint/8347/1/PubSub3174_Griffiths.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
230 Vide RICE JR, Robert A. MMO Evolution – The Online Games Industry Must Adapt and
Evolve. Lulu Press: 2006, p. 5-6.
231 A expressão “computação na nuvem” (no inglês, cloud computing) significa a prestação
de serviços de informática pela internet, com o apoio de servidores, bases de dados, redes,
software, entre outros. “Computação em nuvem representa uma convergência de duas

1820
grandes tendências em tecnologia da informação: (a) eficiência, através da qual o poder de
computadores modernos é utilizado de forma mais eficiente com recursos de hardware e
software com alta escala, e (b) agilidade de negócios, através da qual a tecnologia da
informação pode ser utilizada como uma ferramenta competitiva pelo desenvolvimento
rápido, processamento de batches paralelos, uso de ferramentas analíticas de intensa carga
computacional e aplicações interativas e móveis que respondem em tempo real a
requerimentos de usuários”. Vide BANDYOPADHYAY, Subhajyoti; GHALSASI,
Anand; LI, Zhi; MARSTON, Sean; e ZHANG, Juheng. Cloud Computing: The Business
Perspective. Universidade da Flórida: 2009, p. 3. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.1413545>. Acesso em: 15 dez. 2017.
232 Disponível em: <https://www.utomik.com/developers/>. Acesso em: 15 dez. 2017.
233 Disponível em: <https://www.dofus.com/pt/loja/19-servicos>. Acesso em: 15 dez. 2017.
234 Originalmente lançado em 2001, o jogo RuneScape é um MMORPG que já teve mais de
200 milhões de contas criadas em sua plataforma. O jogo é ambientado em Gielinor, um
cenário medieval fictício dividido em diferentes reinos, regiões e cidades. Vide
SALTZMAN, Marc. Five Things You Didn’t Know About RuneScape. USA Today, 27 de
julho de 2012. Disponível em:
<https://usatoday30.usatoday.com/tech/columnist/marcsaltzman/story/2012-07-
29/runescape-fun-facts/56542606/1>. Acesso em: 15 dez. 2017.
235 Disponível em: <http://wakfu.wikia.com/wiki/Haven_Bag>. Acesso em: 26 out. 2017.
236 Vide arts. 8º, 8º-A e item 1.05 da Lista Anexa à Lei Complementar n. 116/2003.
237 Disponível em: <https://www.dofus.com/en/tou>. (Tradução livre, grifo inexistente no
original.)
238 Vide, com comentários sobre a evolução do entendimento sobre a matéria no Tribunal,
STJ, REsp 975.105/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 9-3-2009.
239 Publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo (DOE-SP) de 21 de setembro de
2017. Disponível em:
<https://portal.fazenda.sp.gov.br/DiarioOficial/Paginas/Decis%C3%A3o-Normativa-CAT-
04,-de-20-de-setembro-de-2017.aspx>. Acesso em: 15 dez. 2017.
240 Disponível em: <http://wakfu.wikia.com/wiki/Kama>. Acesso em: 15 dez. 2017.
241 Disponível em: <http://wakfu.wikia.com/wiki/Display_Window>. Acesso em: 15 dez.
2017.
242 Disponível em: <https://www.wakfu.com/en/tou>. Acesso em: 15 dez. 2017.
243 Há “casas de câmbio” virtuais que transacionam kamas por moedas reais, como euros.
Por exemplo, no sítio eletrônico GameTradeEasy, vendedores de kamas são solicitados a
criar uma nova conta no jogo relevante (por exemplo, Wakfu) e a colocar kamas nessa
conta. Após a escolha do servidor, os jogadores devem digitar o montante solicitado, a
conta do jogo que foi criada, a senha para essa conta, e a conta no próprio sítio eletrônico
GameTradeEasy, e clicar no botão “Vender Agora” (no inglês, sell now). Disponível em:
<http://www.gametradeeasy.com/index.php?r=game/server&id=10007>. Acesso em: 15
dez. 2017.
244 Graduado em Direito pela USP. Pós-graduado em Direito Tributário pela PUC. LLM em
International Taxation pela New York University. Advogado em São Paulo.

1821
245 Graduada em Direito pela FGV DIREITO-SP. Pós-graduada em Economia pela FGV-
EESP. Mestranda em Direito Tributário pela FGV DIREITO-SP. Advogada em São Paulo.
246 Disponível em: <http://www.abemf.com.br/indicadores-mercado>. Acesso em: 15 dez.
2017.
247 Um dos primeiros programas de fidelização foi o S&H Green Stamp Program de 1896,
oferecido pela empresa Sperry & Hutchinson Company. Os consumidores colecionavam
pequenos selos quando compravam produtos em diversas lojas e depois trocavam por
outros produtos. A empresa se dedica até hoje a oferecer soluções tecnológicas e serviços
relacionados à fidelização de clientes.
248 Diversos negócios e novas tecnologias como plataformas de reserva de hospedagem,
plataformas de venda de veículos, armazenamento de dados em nuvens, locação de espaço
físico e infraestrutura para hospedagem de equipamentos, hospedagem de sites etc.
249 Não analisamos modelos como cashback, no qual o consumidor recebe da gestora de
volta, em dinheiro, parte do montante originalmente gasto na aquisição de produtos e
serviços. O modelo aqui analisado é aquele que envolve mais de um fornecedor de
produtos e serviços e que permite aos consumidores trocarem seus pontos e milhas por
novos produtos e serviços.
250 Vide MELO, José Eduardo Soares de. Aspectos Teóricos e Práticos do ISS. São Paulo:
Dialética, 2000; e BARRETO, Aires F. Parecer: ISS – por não constituir Serviço, a
Garantia de Crédito ou Prestação de Garantia não pode ser incluída na Base de Cálculo,
Revista Dialética de Direito Tributário n. 162, São Paulo, Dialética, 2009.
251 “(...) 7. A exegese da Constituição configura a limitação hermenêutica dos arts. 109 e
110 do Código Tributário Nacional, por isso que, ainda que a contraposição entre
obrigações de dar e de fazer, para fins de dirimir o conflito de competência entre o ISS e o
ICMS, seja utilizada no âmbito do Direito Tributário, à luz do que dispõem os artigos 109
e 110, do CTN, novos critérios de interpretação têm progressivamente ampliado o seu
espaço, permitindo uma releitura do papel conferido aos supracitados dispositivos. (...) 21.
Sob este ângulo, o conceito de prestação de serviços não tem por premissa a configuração
dada pelo Direito Civil, mas relacionado ao oferecimento de uma utilidade para outrem, a
partir de um conjunto de atividades materiais ou imateriais, prestadas com habitualidade e
intuito de lucro, podendo estar conjugada ou não com a entrega de bens ao tomador”
(STF, RE n. 651.703/PR, Rel. Min. Luiz Fux, j. 29-9-2016, DJE 27-6-2017).
252 Vide decisões nesse sentido: Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo
n. 687.577/PR, de 28-5-2015, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n.
823.414/RS, de 28-5-2013, Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 450.342/RJ,
de 2-8-2007 etc.
253 GOMES, Orlando. Contratos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971. p. 386.
254 Vide Informações Trimestrais da SMILES, disponível em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?
q=cache:zcSF6uPJYnUJ:ri.smiles.com.br/download_arquivos.asp%3Fid_arquivo%3D4217A2E3-
91D1-49BD-A768-6577FB0A6713+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br&client=firefox-
b>. Acesso em: 15 dez. 2017.
Ainda, vide Informações Trimestrais da MULTIPLUS, disponível em:
<http://ri.pontosmultiplus.com.br/conteudo_pt.asp?

1822
idioma=0&conta=28&tipo=62725&secao=1>. Acesso em: 15 dez. 2017.
255 Acórdão n. 3402-004.146, da 4ª Câmara da 2ª Turma da 3ª Seção de Julgamento do
CARF, de 24-5-2017.
256 O Projeto de Lei n. 2.303/2015, de atoria do deputado Aureo Ribeiro, propõe a inclusão
de moedas virtuais e programas de milhagens aéreas no conceito de “arranjos de
pagamentos”, nos termos da Lei n. 12.865/2013. O Projeto de Lei n. 642/2015, de autoria
do Senador Magno Malta, visa definir e regulamentar os programas de fidelização sob o
ponto de vista do Direito do Consumidor. Já o Projeto de Lei n. 4.015/2012, de autoria do
Deputado Carlos Bezerra, apenas proíbe a prescrição das milhas nos programas de
fidelização.
257 Graduado em Direito pela PUC-SP. Pós-graduado/Especialista em Direito Tributário pela
PUC-SP/COGEAE. Advogado em São Paulo.
258 CASTELLS, Manuel. A Galáxia da Internet: Reflexões sobre a Internet, os Negócios e a
Sociedade. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. p. 7-10.
259 A utilização do termo Serviços OTT, em vez de Aplicações OTT, é também bastante
frequente na literatura especializada. Todavia, preferimos o termo Aplicações OTT, tendo
em vista que essas funcionalidades envolvem a oferta de bens, serviços e conteúdo
diversos pela internet, e não só de serviços.
260 Ministério da Fazenda (2014). A História do Imposto de Renda: um enfoque da pessoa
física (1922-2013). Disponível em:
<http://www.ibet.com.br/download/Imp.%20Renda.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
261 BEREC (2016). Report on OTT Services. Disponível em: <http://berec.europa.eu>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
262 Tecnologia Voice over Internet Protocol, empregada em serviços de chamadas de voz.
263 OCDE (2014). The Development of Fixed Broadband Networks. Disponível em:
<http://www.oecd.org>. Acesso em: 15 dez. 2017.
264 Nesse sentido: ÁVILA, Humberto Bergmann. Argumentação Jurídica e a Imunidade do
Livro Eletrônico, Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, Porto Alegre, v. 19, p.157-
180, mar. 2001; e LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. Trad. José
Lamego. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997. p. 480.
265 ÁVILA, Humberto Bergmann. Teoria da Igualdade Tributária. 2. ed. São Paulo:
Malheiros, 2008. p. 40.
266 O objetivo do presente artigo não é analisar a natureza jurídica e a tributação dos jogos
eletrônicos. A referência a jogos eletrônicos no contexto acima tem como finalidade
apenas ilustrar a possibilidade de que esses itens sejam enquadrados como bens digitais.
267 De acordo com o art. 966 do Código Civil, considera-se empresário quem exerce
profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de
bens ou de serviços.
268 Embora o PIS e a COFINS tenham os mesmos efeitos econômicos dos tributos sobre o
consumo, o regime jurídico dessas contribuições é diverso, tendo em vista que não
incidem sobre a circulação de bens ou serviços, mas sim sobre o faturamento ou receita
bruta obtida pela pessoa jurídica.

1823
269 Como exceções à regra, temos os impostos extraordinários, previstos no art. 154, II, da
CF, que podem ser instituídos pela União em situação de iminência ou no caso de guerra
externa.
270 Sobre a distinção entre os tipos e os conceitos: SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito
Tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 275; e DERZI, Misabel de Abreu Machado.
Direito Tributário, Direito Penal e Tipo, Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, Belo
Horizonte, v. 31, p. 213-260, 1988.
271 No julgamento do Recurso Extraordinário n. 330.817, sob a relatoria do Ministro Dias
Toffoli e publicado em 1º-10-2012, que tratou sobre a aplicação da imunidade tributária
aos livros eletrônicos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu a necessidade
de interpretação evolutiva das normas constitucionais.
272 Supremo Tribunal Federal, RE n. 651.703/PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, DJe
26-4-2017.
273 Dentre os impostos sobre o consumo, pode-se descartar a apenas a incidência do IPI
sobre as Aplicações OTT, já que esse imposto recai sobre produtos industrializados, o que
nada tem a ver com funcionalidades ofertadas por meio da internet.
274 Embora não seja o escopo do presente trabalho, temos a comentar que a exigência do
ICMS sobre os bens em formato digital somente poderá ser viabilizada mediante a edição
de lei complementar estabelecendo normas gerais indispensáveis quanto ao local de
ocorrência do fato gerador, o contribuinte do imposto, a base de cálculo, dentre outros
aspectos fundamentais para a instituição da regra-matriz de incidência desse imposto pelos
Estados. Não é preciso grande esforço interpretativo para rechaçar a possibilidade de que
essas normas sejam veiculadas por meio de mero ato normativo expedido pelo Confaz,
como é o caso do Convênio n. 106/17, que padece de flagrante inconstitucionalidade.
275 PEREIRA, Elisabeth Dias Kanthack. Proteção jurídica do software no Brasil. 1. ed.
Curitiba: Juruá, 2001. p. 34.
276 Confira-se, nesse sentido: CARRAZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo:
Saraiva, 2015. p. 40; e CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e
Método. 5. ed. São Paulo: Noeses, 2013. p. 736.
277 São exemplos de julgados do STF nesse sentido: RE n. 31.737, 2ª Turma, Rel. Min.
Aliomar Baleeiro, DOU 12-10-1966 (que afastou a incidência do ICMS-Mercadoria sobre
energia elétrica); e RE n. 176.626, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DOU 11-12-
2008 (que tratou da não incidência do ICMS-Mercadoria sobre contratos de licença de uso
de softwares).
278 Em sentido diverso ao adotado pela doutrina e jurisprudência tradicionais, vale destacar o
entendimento de Marco Aurélio Greco, para quem as mercadorias são bens corpóreos,
incorpóreos ou não corporificados. (In: GRECO, Marco Aurélio. Internet e direito. 1. ed.
São Paulo: Dialética, 2000. p. 82-84). Além disso, no julgamento da ADIN n. 1.945, sob a
relatoria do Min. Gilmar Mendes e cujo acórdão foi publicado em 14-3-2011, o Plenário
do STF admitiu que o conceito de mercadoria não deve ser definido como bem corpóreo
em sentido estrito, sob o argumento de que o “Tribunal não pode se furtar a abarcar
situações novas, consequências concretas do mundo real, com base em premissas jurídicas
que não são mais totalmente corretas. O apego a tais diretrizes jurídicas acaba por
enfraquecer o texto constitucional, pois não permite que a abertura dos dispositivos da

1824
Constituição possa se adaptar aos novos tempos, antes imprevisíveis”.
279 Nesse sentido, os seguintes julgados: RE n. 540.829, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 18-11-
2014; e RE n. 461.968, Rel. Min. Eros Grau, DJe 23-8-2007. Em ambas as decisões, o
Plenário do STF afastou a incidência do ICMS-Mercadoria sobre operações de
arrendamento mercantil (leasing), sob o fundamento de que tais operações não importam a
transferência de titularidade do bem arrendado.
280 GRECO, Marco Aurélio. Internet e Direito, op. cit., p. 122.
281 STF, RE n. 912.888, Plenário, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe 10-5-2017.
282 A nosso ver, as Aplicações OTT de conteúdo audiovisual não se caracterizam como
serviços de valor adicionado (ou SVA). De fato, essas Aplicações OTT destinam-se à
oferta ao usuário final de conteúdo audiovisual, que constitui uma utilidade autônoma e
diversa dos serviços de telecomunicações que dão suporte para a conexão à internet. Desse
modo, por não agregar uma nova funcionalidade a esses serviços de telecomunicações,
mas por permitir a oferta de uma utilidade completamente distinta (vídeos e músicas), as
Aplicações OTT de conteúdo audiovisual não devem ser consideradas SVA.
283 ÁVILA, Humberto Bergmann. Teoria da Igualdade Tributária, op. cit., p. 88.
284 Nesse sentido: GRUPENMACHER, Betina Treiger. Incidência do ICMS sobre
Streaming é Inconstitucional. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2016-dez-
20/betina-grupenmacher-iss-streaming-inconstitucional>. Acesso em: 15 dez. 2017.
285 MACEDO, Alberto. LC 157/2016 Efetiva Aprimoramentos nas Normas Gerais do ISS.
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-jan-18/alberto-macedo-lc-1572016-
efetiva-aprimoramentos-normas-iss>. Acesso em: 15 dez. 2017.
286 STJ, REsp n. 1.111.234, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 8-10-2009.
287 Disponível em: <https://dicionariodoaurelio.com/disponibilizar>. Acesso em: 15 dez.
2017.
288 Não é objeto do presente trabalho a análise da tributação incidente sobre as atividades de
veiculação de propaganda e publicidade nos aplicativos de comunicação. Frise-se, nesse
sentido, que o foco do presente estudo é a tributação aplicável às atividades de envio de
mensagens instantâneas e de realização de chamadas pela internet, admitindo-se, por
hipótese, a possibilidade de prestação onerosa desses serviços.
289 Embora não seja objeto do presente artigo, a nosso ver, os serviços de VoIP que
permitem a realização de chamadas a telefone fixos e móveis convencionais devem ser
enquadrados como espécie de serviço de comunicação, sujeitando-se à tributação do
ICMS-Comunicação, na medida em que provedor oferta todo o ambiente de comunicação
aos usuários.
290 STJ, REsp 658.626/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Denise Arruda, DJe 22-9-2008.
291 Mestre e Doutora em Direito Tributário pela PUC-SP. Professora nos cursos em Direito
Tributário da PUC-SP, do IBET e do IBDT. Advogada em São Paulo.
292 Arts. 49 e s. da Lei Brasileira dos Direitos do Autor.
293 Arts. 9º, 10 e 11 da Lei de Software.
294 Cf. Tradução livre (IDEALWARE. Comparing Microsoft Office 2013 with Office 365.
Minneapolis, MN, US: Idealware, Nov. 2013. Disponível em:

1825
http://www.idealware.org/articles/comparing-microsoft-office-office-365. Acesso em: 15
dez. 2017).
295 Cf. Tradução livre (IDEALWARE. Comparing Microsoft Office 2013 with Office 365.
Minneapolis, MN, US: Idealware, Nov. 2013. Disponível em:
http://www.idealware.org/articles/comparing-microsoft-office-office-365. Acesso em: 15
dez. 2017).
296 MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico: plano da existência. São Paulo:
Saraiva, 1999. p. 190-191.
297 Idem.
298 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado: Parte Geral.
Tomo III. São Paulo: Bookseller, 2001. p. 173-174.
299 MIRANDA, op. cit., p. 176-177.
300 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Atualizado por Caitlin
Mulholland. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 68.
301 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado: Parte Geral.
Tomo III. São Paulo: Bookseller, 2001. p. 181.
302 TRABUCCHI, Alberto apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro:
contratos e atos unilaterais. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 3, p. 116.
303 Cf. dispositivos que regulam o contrato de prestação de serviços de forma genérica e
também figuras contratuais típicas e nominadas de prestação de serviço, a saber arts. 593 e
s., 623, 703, 717, 722, 738.
304 Trata-se de inferência jurídica que se aplica integralmente às prescrições do antigo
Código Civil de 1916, em vigor quando da promulgação da Constituição de 1988,
identificando-se também nos seus dispositivos a compreensão de serviços como o
fazimento por alguém de uma obra intelectual ou material em benefício de outra pessoa. É
o que se verifica, por exemplo, nos seguintes enunciados do Código revogado: art. 178, §
6º, X (serviços médicos e farmacêuticos); art. 390 (serviços de magistério); art. 414, VII
(serviços militares); arts. 1.216 e s. (locação de serviços em geral); art. 1.330 (serviços
advocatícios); art. 1.566, IV e V (serviços de edificação e serviços agrícolas de cultura e
colheita); e art. 1.569 (serviços domésticos).
305 STF, Recurso Extraordinário n. 116.121, Rel. Min. Octavio Gallotti, Rel. p/ o Acórdão
Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j. 11-10-2000, DJ 25-5-2001.
306 Art. 565, CC/2002.
307 Súmula Vinculante 31/2010: “É inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços
de Qualquer Natureza – ISS sobre operações de locação de bens móveis”.
308 BARRETO, Aires Fernandino. ISS na Constituição e na Lei. 3. ed. São Paulo: Dialética:
2009, p. 142.
309 TJ-RJ, Apelação n. 0039698-98.2006.8.19.0001, 11ª Câmara Cível, Rel. Claudio de
Mello Tavares, j. 17-3-2008, DJ 27-3-2008.
310 Vide REsp n. 814.075 que determina a incidência do ISS sobre a atividade de
desenvolvimento de software (STJ, 1ª Turma, REsp n. 814.075, Rel. Min. Luiz Fux, 12-2-
2008, DJe 2-3-2008). Importa também anotar que a incidência do ISS sobre licenciamento

1826
de uso de programas de computador personalizados é matéria submetida à repercussão
geral no RE n. 688.223 (STF, RE n. 688.223, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, j. 20-9-
2012, DJe 4-10-2008).
311 STJ, 1ª Turma, REsp n. 888.852/ES, Rel. Min. Luiz Fux, j. 4-11-2008, DJe 1º-12-2008.
312 TJ-SP, 15ª Câmara de Direito Público, Apelação n. 90213481420068260000/SP, Rel.
Silva Russo, 22-10-2009.
313 STJ, 1ª Turma, Recurso Especial n. 1.044.239/MG, Rel. Min. Luiz Fux, j. 6-11-2008,
DJe 1º-10-2008.
314 Pós-graduada em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Graduada em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Advogada em São
Paulo.
315 Mestre em Direito Tributário Internacional pela University of Florida. Pós-graduada em
Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas. Graduada em Direito pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. Advogada em São Paulo.
316 Em linhas gerais, as nuvens podem ser entendidas como ambientes que possuem recursos
acessados virtualmente por meio de hardware conectado à rede mundial de computadores
– a internet. A nuvem permite o acesso dos usuários a arquivos e software que são
utilizados nesse ambiente virtual sem necessidade de que seja feito necessariamente o
download dos arquivos no hardware do usuário.
317 De acordo com balizamento já realizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por
ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n. 176.626-3/SP em 10 de novembro de
1998, o software também pode assumir três feições: programas standard, programas “por
encomenda” ou programas “customizados”.
Sucintamente, podemos conceituar os programas standard, também conhecidos como
software de prateleira, como aqueles passíveis de distribuição em massa, que consistem
em “pacotes de programas bem definidos, estáveis, concebidos para serem dirigidos a uma
pluralidade de utilizadores – e não a um utilizador em particular –, com vista a uma
mesma aplicação ou função”.
Diferentemente, os programas “por encomenda” compreendem aqueles desenvolvidos “a
partir do zero para atender às necessidades específicas de determinado usuário”.
Já os programas adaptados ao cliente constituem uma forma híbrida entre os programas
standard e os programas “por encomenda”, pois se baseiam em programas standard que
são modificados para se adequarem às necessidades de um cliente particular.
318 Acerca da matéria, é importante apontar que o STF, quando do julgamento do RE
651.703, afetado pelo rito da repercussão geral, veio imprimir uma releitura do artigo 110
do CTN frente à Constituição Federal.
319 “Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos
Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços
constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante
do prestador. (...) Lista de serviços anexa à Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de
2003.
1 – Serviços de informática e congêneres. (...)
1.04 – Elaboração de programas de computadores, inclusive de jogos eletrônicos.

1827
1.05 – Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação.”
320 A despeito da rigidez de nossos argumentos aqui esposados, no sentido de que o
licenciamento de software não se confunde com prestação de serviços, pela ausência de
“obrigação de fazer”, não podemos deixar de apontar que esse argumento foi superado
pelo STF em recente decisão de 26-9-2016.
Nessa oportunidade, o STF alargou o conceito de serviços (RE 651.703/PR), em decisão que
entendeu pela incidência do ISS sobre atividades exercidas por operadoras de planos
privados de assistência à saúde (plano de saúde e seguro-saúde), sob o rito da repercussão
geral. Por esse novo entendimento, a interpretação da expressão “serviços de qualquer
natureza” no texto constitucional tem um sentido mais amplo do que tão somente
vinculado ao conceito de “obrigação de fazer”. Por essa decisão, “[o] conceito de
prestação de serviços não tem por premissa a configuração dada pelo Direito Civil, mas
relacionado ao oferecimento de uma utilidade para outrem, a partir de um conjunto de
atividades imateriais, prestados com habitualidade e intuito de lucro, podendo estar
conjugada ou não com a entrega de bens ao tomador”.
Por essa nova acepção, seria possível sustentar que o licenciamento de software, conquanto
representante de “utilidade para outrem, a partir de um conjunto de atividades imateriais,
prestados com habitualidade e intuito de lucro”, deve ser qualificado como serviço.
De toda forma, isso não necessariamente significa que essa seja a conclusão final. Isso
porque, o STF reconheceu a repercussão geral da matéria aqui tratada e, portanto,
analisará, definitivamente, a incidência do ISS sobre os contratos de licenciamento ou
cessão de direito de uso de software desenvolvido de forma personalizada. Trata-se do
Recurso Extraordinário n. 688.223, interposto em face de decisão desfavorável do
Tribunal de Justiça do Paraná.
Nesse caso, os argumentos utilizados pela empresa licenciadora de software foram no sentido
de que suas operações não estariam sujeitas à tributação pelo ISS porque o contrato
envolvendo software não teria natureza de prestação de um serviço – o mesmo argumento
acima exposto.
321 Expressões trazidas da Lei do Software.
322 Ainda que não objeto da presente análise, é importante lembrar que a Receita Federal do
Brasil (RFB) já se pronunciou algumas vezes no sentido de que a gravação de software em
disco rígido é operação de industrialização na modalidade beneficiamento, mas que o
software, em si, não é resultado de uma produção industrial, como na Solução de Consulta
Diana SRRF09 n. 78/2013: “GRAVAÇÃO DE SOFTWARE EM MÍDIA. INCIDÊNCIA
DE IPI. CONFECÇÃO DE SOFTWARE E TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. NÃO
INCIDÊNCIA DO IPI. NÃO CABIMENTO DE CÓDIGO NCM PARA SOFTWARE. A
gravação de software em mídia é operação de industrialização, sujeita à incidência do IPI.
A confecção de software bem como sua transferência por meio eletrônico não são
operações de industrialização, o que implica a não incidência do IPI. O software não é
mercadoria, não sendo cabível sua classificação em código NCM nem a exigência desse
código para fim de emissão de nota fiscal eletrônica. Dispositivos Legais: Lei n. 5.172, de
1966 (CTN), art. 46, parágrafo único; Lei n. 4.502, de 1964, arts. 1º a 4º; Decreto-lei n. 34,
de 1966, art. 1º; Lei n. 10.451, de 2002, art. 6º; Decreto n. 7.212, de 2010 (Ripi/2010),
arts. 2º a 4º, 8º a 10 e 35”.

1828
323 O próprio órgão de propriedade intelectual brasileiro (INPI), ao estabelecer os
procedimentos para o exame de pedidos de patentes envolvendo invenções implementadas
por programas de computador, reconhece a figura do “software embarcado” como “aquele
executado em um microprocessador, microcontrolador ou ASIC (processador dedicado,
tais como co-processadores aritméticos e os chipsets de vídeo), o qual é completamente
dedicado ao dispositivo ou sistema que ele controla”.
324 Novamente, lembramos que a concepção de obrigação de dar e de fazer para fins de
delimitação de competência tributária sofreu expressivas alterações em função do RE
651703 do STF, que apregoou que “(...) ainda que a contraposição entre obrigações de dar
e de fazer, para fins de dirimir o conflito de competência entre o ISS e o ICMS, seja
utilizada no âmbito do Direito Tributário (...) novos critérios de interpretação têm
progressivamente ampliado o seu espaço, permitindo uma releitura do papel conferido aos
supracitados dispositivos”.
325 Lembramos, aqui, que ainda que não concordemos com a incidência do ISS no
licenciamento, já que essa hipótese não se reveste das condições para qualificação de um
serviço (obrigação de fazer), fato é que a completa não incidência da operação não pode
ser entendida como tendência jurisprudencial. Mais que isso, tendo em vista o RE 651703
do STF, aqui comentado em várias passagens, quer nos parecer que há grandes chances de
que o ISS prevaleça, conforme racional abaixo:
“20. A classificação (obrigação de dar e obrigação de fazer) escapa à ratio que o legislador
constitucional pretendeu alcançar, ao elencar os serviços no texto constitucional
tributáveis pelos impostos (v.g., serviços de comunicação – tributáveis pelo ICMS, art.
155, II, CRFB/88; serviços financeiros e securitários – tributáveis pelo IOF, art. 153, V,
CRFB/88; e, residualmente, os demais serviços de qualquer natureza – tributáveis pelo
ISSQN, art. 156, III, CRFB/88), qual seja, a de captar todas as atividades empresariais
cujos produtos fossem serviços sujeitos a remuneração no mercado. 21. Sob este ângulo, o
conceito de prestação de serviços não tem por premissa a configuração dada pelo Direito
Civil, mas relacionado ao oferecimento de uma utilidade para outrem, a partir de um
conjunto de atividades materiais ou imateriais, prestadas com habitualidade e intuito de
lucro, podendo estar conjugada ou não com a entrega de bens ao tomador”.
326 “Art. 1º Na operação realizada com programa para computador (‘software’),
personalizado ou não, o ICMS será calculado sobre uma base de cálculo que
corresponderá ao dobro do valor de mercado do seu suporte informático.
Parágrafo único. O disposto no ‘caput’ não se aplica aos jogos eletrônicos de vídeo
(‘videogames’), ainda que educativos, independentemente da natureza do seu suporte
físico e do equipamento no qual sejam empregados.
Art. 2º Este decreto entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos para fatos
geradores que ocorrerem a partir de 1º de fevereiro de 2007.”
327 Em primeira instância, o AIIM foi mantido pela Quarta Câmara do TIT, que acompanhou
o voto do juiz relator Gianpaulo Camilo Dringoli, que entendeu que o software analisado
comporia o preço do equipamento.
328 Nesse sentido, destacamos alguns trechos da referida Resposta à Consulta: “(...) 5.1
Frise-se, preliminarmente, que a mercadoria ora comercializada, trata-se de um produto
único (hardware, ou ‘pen-drive’, com software instalado), motivo pelo qual não é

1829
aplicável a esta operação a base de cálculo diferenciada prevista para ‘programa para
computador – software’, nos termos do artigo 1º do Decreto Estadual n. 51.619/2017, visto
que não se trata, no caso, de comercialização de ‘software’”.
329 “1.05 – Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação.”
330 Doutorando e Mestre em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo, onde também fez Graduação em Direito. Advogado em São Paulo. Advogado
em São Paulo.
331 OEI, Shu-Yi; RING, Diane M. Can Sharing Be Taxed?, Washington University Law
Review, v. 93, issue 4, p. 989-1069, 2016 (997).
332 ZERVAS, Georgios; PROSERPIO, Davide; BYERS, John. The Rise of the Sharing
Economy: Estimating the Impact of Airbnb on the Hotel Industry (Nov 18, 2016). Boston
U. School of Management Research Paper No. 2013-16. Disponível em SSRN:
<https://ssrn.com/abstract=2366898.5>. Acesso em: 15 dez. 2017.
333 Veja, por exemplo, Getaround, <https://www.getaround.com>. Acesso em: 15 dez. 2017.
334 Veja, por exemplo, DogVacay, <https://dogvacay.com>. Acesso em: 15 dez. 2017.
335 Veja Uber, <https://uber.com>. Acesso em: 15 dez. 2017.
336 O presente artigo tem como objeto questões tributárias, deixando de lado outras áreas do
Direito. No entanto, para registro, um trabalho interessante sobre o tema do ponto de
outros ramos do Direito pode ser encontrado em: TAVOLARI, Bianca. Airbnb e os
impasses regulatórios para o compartilhamento de moradia: notas para uma agenda de
pesquisa em Direito. In: ZANATTA, Rafael A.; DE PAULA, Pedro C. B.; KIRA, Beatriz
(Coords.). Economia de Compartilhamento e Direito. Curitiba: Juruá, 2017. p. 259-278.
337 GUTTENTAG, Daniel. “Airbnb: disruptive innovation and the rise of an informal
tourism accommodation sector”. Current Issues in Tourism. Volume 18, No 12, 1192-
1271. Dezembro de 2017. Disponível em:
<http://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/13683500.2013.827159>. Acesso em: 15
dez. 2017.
338 GRUPO DE PESQUISA. Tributação na era digital: Renda × Consumo. São Paulo:
NEF/FGV, outubro de 2017. Disponível em: <https://www.jota.info/artigos/tributacao-na-
era-digital-renda-x-consumo-20102017>. Acesso em: 15 dez. 2017.
339 RANCHORDAS, Sofia. Does Sharing Mean Caring Regulating Innovation in the
Sharing Economy?, 16 Minn. J.L. Sci. & Tech. 414 (2015). Disponível em:
<http://scholarship.law.umn.edu/mjlst/vol16/iss1/9>. Acesso em: 15 dez. 2017.
340 OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. Addressing the Tax Challenges of
the Digital Economy, Action 1. OECD Publishing, p. 12.
341 SANTOS, Ramon Tomazela; ROCHA, Sergio André. Tax Sovereignty and Digital
Economy in Pos-BESP Times. In: ROCHA, Sergio André; CHRISTIANS, Allison. Tax
Sovereignty in the BEPS Era. Series on International Taxation, Volume 60. Amsterdam:
Kluwer Law International, 2017. p. 38.
342 BRAUNER, Yariv; BAEZ, Andrés. Withholding taxes in the service of BEPS action 1:
address the tax challenges of the digital economy. WU International Taxation Research
Papers Series, No. 2015-14. Vienne: Wirtchafts Universitat, 2015. p. 4.

1830
343 OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. Addressing the Tax Challenges of
the Digital Economy, Action 1. OECD Publishing, p. 99.
344 Airbnb: “(...) é um mercado on-line que permite aos usuários cadastrados (“Membros”), e
terceiros determinados, que oferecem serviços (Membros e terceiros que oferecem
serviços são chamados de “Anfitriões” e os serviços que eles prestam são “Serviços de
Anfitrião”) anunciar esses Serviços de Anfitrião na Plataforma Airbnb (“Acomodações”) e
comunicar-se e fazer transações diretas com membros que estejam buscando reservas
como Serviços de Anfitrião (os Membros que utilizam os Serviços de Anfitrião são
chamados de “Hóspedes”)”. Disponível em: <https://www.airbnb.com.br/terms>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
Housetrip: “(...) é um local que permite aos Proprietários anunciar um ou mais
estabelecimentos disponíveis para locação (separadamente, “Estabelecimento” e “Perfil de
estabelecimento”) para potenciais viajantes (separadamente, “Viajante”)”. Disponível em:
<https://rentals.tripadvisor.com/pt/termsandconditions/owner>. Acesso em: 15 dez. 2017.
Homeaway: [é] “uma página de anúncios classificados na Internet”, que “funciona como um
local que permite que os proprietários e administradores de imóveis que anunciam em
nosso site (denominados como «membro») ofereçam o aluguel de um imóvel específico,
com variantes de preços para potenciais hóspedes ou locatários (denominados como
«viajante»)”. Disponível em: <https://www.aluguetemporada.com.br/info/quem-
somos/informacao-legal/termos-condicoes>. Acesso em: 15 dez. 2017.
Wimdu: é um mercado online onde usuários podem oferecer e alugar apartamentos, casas,
quartos e outros tipos de acomodações (“acomodações”). Disponível em:
<https://www.wimdu.com.br/terms>. Acesso em: 15 dez. 2017.
345 TAVOLARI, Bianca. Airbnb e os impasses regulatórios para o compartilhamento de
moradia: notas para uma agenda de pesquisa em Direito. In: ZANATTA, Rafael A.; DE
PAULA, Pedro C. B.; KIRA, Beatriz (Coords.). Economia de Compartilhamento e
Direito. Curitiba: Juruá, 2017. p. 260.
346 Confira-se a descrição da atividade dada por Diane Ring e Shu-Yi Oei, em estudo
específico sobre o tema. OEI, Shu-Yi; RING, Diane M. Can Sharing Be Taxed?,
Washington University Law Review, Volume 93, issue 4, p. 989-1069, 2016 (1005-1006).
347 Nesse ponto, para ilustrar, destacam-se os termos utilizados no site Airbnb: “[c]omo o
fornecedor da Plataforma Airbnb, a Airbnb não é proprietária, não cria, vende, revende,
fornece, controla, gerencia, oferece, entrega ou abastece qualquer Acomodação ou
Serviços de Anfitrião. Os Anfitriões são os únicos responsáveis por suas Acomodações e
Serviços de Anfitrião. Quando os membros fazem ou aceitam uma reserva, eles celebram
um contrato diretamente um com o outro. A Airbnb não é e não se torna parte ou outro
participante de qualquer relacionamento contratual entre os Membros, tampouco a Airbnb
é uma corretora de imóveis ou seguradora. A Airbnb não atua como um agente em
qualquer capacidade para um Membro, exceto conforme especificado nos Termos de
Pagamento”. Disponível em: <https://www.airbnb.com.br/terms>. Acesso em: 15 dez.
2017.
348 Código Civil: “Art. 565. Na locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à outra,
por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa
retribuição”.

1831
349 Faz-se referência a contratos principais, pois existem outros contratos acessórios, tais
como (i) o contrato entre a plataforma e a empresa de cartão de crédito; (ii) o contrato
entre a plataforma e a empresa de meio de pagamento online; (iii) o eventual contrato
entre o proprietário do imóvel e o agente administrador do imóvel; (iv) o contrato entre a
plataforma e os seus fornecedores de serviços de marketing etc.
350 Veja: <https://aws.amazon.com/pt/solutions/case-studies/airbnb/>. Acesso em: 15 dez.
2017. Destaca-se o seguinte trecho: “Airbnb is a community marketplace that allows
property owners and travelers to connect with each other for the purpose of renting unique
vacation spaces around the world”.
351 A definição precisa dos elementos que compõe o marketplace online demanda uma
avaliação técnica que transcende o escopo do presente artigo. A título meramente
ilustrativo, destaca-se que a OCDE discrimina em três partes que integram o cloud
computing (que é o ambiente digital no qual tal marketplace é desenvolvido), vale dizer,
Infrastructure as a Service (IaaS), Platform as a Service (PaaS) e Software as a Service
(SaaS). OECD (2014), “Cloud Computing: The Concept, Impacts and the Role of
Government Policy”, OECD Digital Economy Papers, No. 240, OECD Publishing, Paris.
Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/5jxzf4lcc7f5-en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
352 A respeito do conceito de intermediação para fins da tributação pelo ISS, cabe recordar
as lições de Bernardo Ribeiro de Moraes: “Intermediação é palavra indicativa do modo de
operar da pessoa. Intermediário é quem exerce a aproximação entre duas ou mais pessoas
que desejam negociar. É também conhecida como corretagem, contrato pelo qual uma
pessoa se obriga, mediante remuneração, a aproximar as partes para a conclusão de um
negócio”. MORAES. Bernardo Ribeiro de. Doutrina e Prática do Imposto sobre Serviços.
1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1975. p. 306-307.
353 DE SANTI, Eurico Marcos Diniz; PEROBA, Luiz Roberto; NETO, João Alho.
Tributação na era digital:Autorregulação: uma possibilidade?. Disponível em:
<https://jota.info/artigos/tributacao-na-era-digital-25082017>. Acesso em: 15 dez. 2017.
354 VATARI, Luis Claudio Yukio. Conflito de Competência ICMS e ISSQN: novos serviços
da era digital. Dissertação de Mestrado. Fundação Getúlio Vargas – FGV. São Paulo,
2016.
355 BOTTALLO, Eduardo D.; TURCZYN, Sidnei. O regime jurídico dos serviços de
hospedagem de sites (hosting) na Internet, Revista Dialética de Direito Tributário, São
Paulo, Dialética, n. 98, p. 35-43, 2003.
356 CONFOLONIERI, Renato Nunes. Incidência do ISS sobre serviços de intermediação de
negócios, quando o fornecedor estiver localizado no exterior, e o local de recolhimento do
tributo, Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, Dialética, n. 87, 2002, p. 104-
109.
357 “Art. 4º Considera-se estabelecimento prestador o local onde o contribuinte desenvolva a
atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade
econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de
sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato
ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas.”
358 COSTA, Simone Rodrigues Duarte. A não tributação dos serviços prestados no exterior –
a inconstitucionalidade da Lei Complementar n. 116/06. In: TÔRRES, Heleno Taveira

1832
(Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2004. v.
II, p. 606.
359 BRIGAGÃO, Gustavo. ISS não incide sobre exportação de serviços. Portal Consultor
Jurídico, 31 de julho de 2013. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2013-jul-
31/consultor-tributario-iss-nao-incide-exportacao-servicos>. Acesso em: 15 dez. 2017.
360 TÔRRES, Heleno Taveira. Princípio da Territorialidade e Tributação de Não Residente
no Brasil. Prestações de Serviços no Exterior. Fonte de Produção e Fonte de Pagamento.
In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São
Paulo: Quartier Latin, 2003. v. I, p. 77.
361 Cabe ressalvar que os registros regulatórios e legais do domínio dos websites podem
estar vinculados a determinado país ou submetido, juridicamente, a determinada
jurisdição. No entanto, a atividade em si desenvolvida na internet não guarda relação com
um local físico.
362 SCHOUERI, Luís Eduardo. ISS sobre a Importação de Serviços do Exterior, Revista
Dialética de Direito Tributário n. 100, São Paulo, Dialética, janeiro de 2004, p. 44-47.
363 VETORI, Gustavo. Contribuição ao estudo sobre as influências recíprocas entre a
tributação da renda e o comércio internacional. Tese de doutorado sob a orientação do
Professor Luís Eduardo Schoueri. São Paulo: Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo, 2011. p. 144.
364 ROCHA, Sergio André. Considerações acerca da Incidência do ISS sobre Serviços
Prestados no Exterior, Revista Dialética de Direito Tributário n. 104, São Paulo,
Dialética, maio de 2004, p. 95.
365 COSTA, Simone Rodrigues Duarte. A não tributação dos serviços prestados no exterior –
a inconstitucionalidade da Lei Complementar n. 116/06. In: TÔRRES, Heleno Taveira
(Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2004. v.
II, p. 623.
366 SCHOUERI, Luis Eduardo. ISS sobre a Importação de Serviços do Exterior, Revista
Dialética de Direito Tributário n. 100, São Paulo, Dialética, janeiro de 2004, p. 45.
367 VETORI, Gustavo Gonçalves. Contribuição ao estudo sobre as influências recíprocas
entre a tributação da renda e o comércio internacional. Tese de Doutorado sob a
orientação do Prof. Luís Eduardo Schoueri. Universidade de São Paulo, 2011, p. 139-145.
368 VETORI, Gustavo Gonçalves, op. cit., p. 139.
369 DERZI, Misabel. O aspecto espacial do imposto municipal sobre serviços de qualquer
natureza, ISS na Lei Complementar n. 116/03 e na Constituição. Barueri: Manole, 2004.
p. 67-68.
370 Para Roque Antonio Carrazza, o “resultado” do serviço se confunde com a utilidade que
ele proporciona para o respectivo tomador (CARRAZZA, Roque Antonio. ISS – Serviços
de Reparação de Turbinas de Aeronaves, para Destinatários no Exterior – não incidência –
exegese do art. 2º, I e seu parágrafo único, da Lei Complementar n. 116/03. In: TÔRRES,
Heleno Taveira. Direito Tributário Internacional. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 529-
530). No mesmo sentido, o saudoso Alberto Xavier afirmava que o local do “resultado” se
refere àquele “onde se verifica o respectivo consumo ou a utilização do bem imaterial em
que o serviço se traduz” e que “tal local é precisamente o local onde é satisfeita a

1833
necessidade que levou o tomador do serviço a proceder à respectiva contratação”
(XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. p. 235-236).
371 OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. Addressing the Tax Challenges of
the Digital Economy, Action 1. OECD Publishing, p. 13.
372 SANTOS, Ramon Tomazela; ROCHA, Sergio André.Tax Sovereignty and Digital
Economy in Pos-BESP Times. In: ROCHA, Sergio André; CHRISTIANS, Allison. Tax
Sovereignty in the BEPS Era. Series on International Taxation, Volume 60. Amsterdam:
Kluwer Law International, 2017. p. 39.
373 GOEL, Shilpa, Should we supplement physical PE with a virtual PE to tax digital
services?, Kluwer International Tax Blog, October 24 2017. Disponível em:
<http://kluwertaxblog.com/2017/10/24/15735>. Acesso em: 15 dez. 2017).
374 BLUM, Daniel W. Permanent Establishment and Action 1 on the Digital Economy of
OECD Base Erosion and Profit Iniciatiave – The Nexus Criterion Redefined?, Bulletin for
International Taxation, Volume 69, No 6/7, sec. 3. Amsterdam: IBFD, 2015.
375 BAL, Aleksandra; GUTIÉRREZ, Carlos. Taxation of the Digital Economy. International
Tax Structures in the BEPS Era: an Analysis of Anti-Abuse Measures. Amsterdam: IBFD,
p. 249-280, 2015.
376 OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. Addressing the Tax Challenges of
the Digital Economy, Action 1. OECD Publishing, p. 105 e 245.
377 PISTONE, Pasquale; HONGLER, Peter. Blueprints for a New PE Nexus to Tax Business
Income in the Era of the Digital Economy.Working Paper, n. 20, IBFD, 2015. p. 3.
Disponível em:
<https://www.ibfd.org/sites/ibfd.org/files/content/pdf/Redefining_the_PE_concept-
whitepaper.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017: “If an enterprise resident in one Contracting
State provides access to (or offers) an electronic application, database, online market
place or storage room or offers advertising services on a website or in an electronic
application used by more than 1,000 individual users per month domiciled in the other
Contracting State, such enterprise shall be deemed to have a permanent establishment in
the other Contracting State if the total amount of revenue of the enterprise due to the
aforementioned services in the other Contracting State exceeds XXX (EUR, USD, GBP,
CNY, CHF, etc.) per annum”.
378 YARIV, Brauner. BEPS: An Interim Evalution. World Tax Journal.Volume 6, Nº 1.
Amsterdam: IBFD, 2014, p. 16-17.
379 SANTOS, Ramon Tomazela; ROCHA, Sergio André. Tax Sovereignty and Digital
Economy in Pos-BESP Times. In: ROCHA, Sergio André; CHRISTIANS, Allison. Tax
Sovereignty in the BEPS Era. Series on International Taxation, Volume 60. Amsterdam:
Kluwer Law International, 2017. p. 40.
380 OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. Addressing the Tax Challenges of
the Digital Economy, Action 1. OECD Publishing, p. 13.
381 BRAUNER, Yariv; BAEZ, Andrés. Withholding taxes in the service of BEPS action 1:
address the tax challenges of the digital economy. WU International Taxation Research
Papers Series, No. 2015-14. Vienne: Wirtchafts Universitat, 2015. p. 2. Disponível em:

1834
<https://www.ibfd.org/sites/ibfd.org/files/content/
WithholdingTaxesintheServiceofBEPSAction1-whitepaper.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
382 SANTOS, Ramon Tomazela; ROCHA, Sergio André. Tax Sovereignty and Digital
Economy in Pos-BESP Times. In: ROCHA, Sergio André; CHRISTIANS, Allison. Tax
Sovereignty in the BEPS Era. Series on International Taxation, Volume 60. Amsterdam:
Kluwer Law International, 2017. p. 40-42.
383 OWENS, Jeffrey, The Role of Tax Administrations in the Current Political Climate,
Bulletin for International Taxation, v. 67, n. 3. IBFD, Amsterdam, 2013, p. 158.
384 ROCH, Maria Teresa Soler. Tax administration versus taxpayer – a new deal?, World
Tax Journal, Amsterdã, IBFD, setembro de 2002, p. 24.
385 Cabe ressaltar que, recentemente, o Brasil se utilizou do conceito de estabelecimento
permanente para fins da regulação da Declaração País a País, por meio da Instrução
Normativa RFB n. 1.681, de 28 de dezembro de 2016 (ver art. 2º, IV), que consubstancia a
adoção das recomendações da Ação 13 do BEPS no Brasil.
386 LLM em International Tax Law pela Universidade de Leiden – Holanda. Advogado em
São Paulo.
387 Advogado em São Paulo.
388 THE ECONOMIST. Fuel of the future: Data is giving rise to a new economy. Disponível
em: <https://www.economist.com/news/briefing/21721634-how-it-shaping-up-data-
giving-rise-new-economy>. Acesso em: 15 dez. 2017.
389 The Economist. The World’s most valuable resource is no longer oil, but data. Disponível
em: <https://www.economist.com/news/leaders/21721656-data-economy-demands-new-
approach-antitrust-rules-worlds-most-valuable-resource>. Acesso em: 15 dez. 2017.
390 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva. 5. ed. p. 740-742.
391 The Boston Consulting Group. Outlook: Seven Ways to Profit from Big Data as a
Business. Disponível em: <https://www.bcg.com/publications/2014/technology-digital-
seven-ways-profit-big-data-business.aspx>. Acesso em: 15 dez. 2017.
392 AgRg no AREsp 32.547/PR, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. 20-10-2011.
393 “1.05 – Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação.”
394 “1.03 – Processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos, imagens,
vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre outros formatos, e
congêneres.”
395 “17.01 – Assessoria ou consultoria de qualquer natureza, não contida em outros itens
desta lista; análise, exame, pesquisa, coleta, compilação e fornecimento de dados e
informações de qualquer natureza, inclusive cadastro e similares.”
396 Apelação n. 0068922-52.2004.8.19.0001, Rel. Des. Maria Henriqueta do Amaral
Fonseca Lobo, 7ª Câmara Cível, j. 3-8-2011.
397 Em relação ao Item 1.03 da lista, a sociedade contratada não processa, não armazena e
não hospeda dados de seus clientes, mas sim dados obtidos pela própria contratada e
utilizados em suas atividades regulares. Em relação ao Item 17.01, a sociedade contratada
não analisa, examina, pesquisa, coleta, compila ou fornece dados e informações

1835
especificamente solicitadas por um ou outro cliente específico.
398 CARPINETTI, Ana Carolina; CAUMO, Renato. O ISS e as obrigações de dar e de fazer
– Uma análise à luz dos precedentes do STF. JOTA <https://jota.info/artigos/o-iss-e-as-
obrigacoes-de-dar-e-de-fazer-13062017>. Acesso em: 15 dez. 2017.
399 RE 592.905-SC, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, j. 2-12-2009 sob repercussão
geral.
400 “A lei complementar a que se refere o artigo 156, III, da CRFB/88, ao definir os serviços
de qualquer natureza a serem tributados pelo ISS a) arrola serviços por natureza; b) inclui
serviços que, não exprimindo a natureza de outro tipo de atividade, passam à categoria de
serviços, para fim de incidência do tributo, por força de lei, visto que, se assim não
considerados, restariam incólumes a qualquer tributo; e c) em caso de operações mistas,
afirma a prevalência do serviço, para fim de tributação pelo ISS. (...) A classificação
(obrigação de dar e obrigação de fazer) escapa à ratio que o legislador constitucional
pretendeu alcançar, ao elencar os serviços no texto constitucional tributáveis pelos
impostos (v.g., serviços de comunicação – tributáveis pelo ICMS, artigo 155, II, CRFB/88;
serviços financeiros e securitários – tributáveis pelo IOF, artigo 153, V, CRFB/88; e,
residualmente, os demais serviços de qualquer natureza – tributáveis pelo ISSQN, artigo
156. III, CRFB/88), qual seja, a de captar todas as atividades empresariais cujos produtos
fossem serviços sujeitos a remuneração no mercado. Sob este ângulo, o conceito de
prestação de serviços não tem por premissa a configuração dada pelo Direito Civil, mas
relacionado ao oferecimento de uma utilidade para outrem, a partir de um conjunto de
atividades materiais ou imateriais, prestadas com habitualidade e intuito de lucro, podendo
estar conjugada ou não com a entrega de bens ao tomador.”
401 Recurso Extraordinário n. 158.834, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, j. 23-
10-2002.
402 Recurso Extraordinário n. 176.626, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, j. 10-11-
1998.
403 O Facebook atingiu a marca de dois bilhões de usuários em 2017.
404 Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/internacional-37898626>. Acesso em:
15 dez. 2017.
405 A título de exemplo, merece destaque o Parecer Normativo n. 1, de 9-3-2016, por meio
do qual o Município de São Paulo manifestou o entendimento de que o serviço de
divulgação de propaganda e publicidade, ainda que por meio da internet, estaria
compreendido no item 17.06 da lista anexa à LC n. 116/2003 e, portanto, seria passível de
tributação.
406 Lei Complementar n. 157, de 29-12-2016 (LC n. 157/2016), item 17.25.
407 Resposta à Consulta Tributária n. 16.508, de 9-10-2017.
408 STJ, Recurso Especial n. 1.642.249, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, j.
23-10-2017.
409 STJ, Recurso Especial n. 161467/RS, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma, j. 17-5-2012.
410 TRF-3, Apelação n. 0016356-64.2012.4.03.6100, Rel. Des. Federal Mônica Nobre, 4ª
Turma, j. 19-4-2017.

1836
411 Doutor em Direito e Mestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo (PUC/SP). Advogado em São Paulo.
412 Tive oportunidade de examinar este tema na Primeira Parte do meu Dinâmica da
tributação: uma visão funcional, 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 1 a 60 e no artigo
Conceitos de direito privado e competência tributária: o significado de “empresa” no § 5º
do artigo 212 da CF/88, in: Temas relevantes do Direito Civil Contemporâneo. São Paulo:
Atlas, 2008, p. 91-110.
413 GRECO, Marco Aurélio. Internet e Direito. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2000. p. 16 e s.
414 GRECO, Marco Aurélio. Internet e Direito. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2000. p. 62 e s.
415 Idem, p. 58.
416 Para o exame do perfil da CF/67 e da modificação trazida pela CF/88, no que diz respeito
à posição do indivíduo perante o Estado e nas funções de que este está investido, confira-
se em GRECO, Marco Aurélio. Solidariedade social e tributação, no volume de mesmo
nome, coordenado juntamente com Marciano Seabra de Godoi. São Paulo: Dialética,
2005. p. 168 e s.
417 GRECO, Marco Aurélio. In: GRECO, Marco Aurélio e GODOI, Marciano Seabra de
(Coords). Solidariedade social e tributação. São Paulo: Dialética, 2005. p. 176 e s.
418 A racionalidade da adequação afeta também a dimensão do destino do produto da
arrecadação, mas este tema não é foco do presente estudo.
419 Lei Complementar n. 123/2006.
Exterior
Brasil
Tomador
Fornecedor
Intermediadora
Exterior
Brasil
Fornecedor
Tomador
Intermediadora
Intermediadora

1837
1 Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002), Estágio de
Doutoramento na Ludwig-Maximilians Universität em Munique (Alemanha) (2001).
Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1996). Graduado em
Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1992). Participou do Program of
Instruction for Lawyers da Harward Law School (2001). Árbitro da lista brasileira do
Sistema de Controvérsias do Mercosul. Atualmente, é professor permanente da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Autor da obra finalista do Prêmio Jabuti
“Direito Tributário e Análise Econômica do Direito” e da obra “Direito Tributário: três
modos de pensar a tributação”.
2 SCHUMPETER, Joseph. Capitalism, Socialism and Democracy. London/New York:
George Allen & Unwin, 1976. p. 83.
3 BENKLER, Yochai. Law, Innovation, and Collaboration in Networked Economy and
Society, Annual Review of Law and Social Science, v. 13, p. 231-250, 2017.
4 ALLEN RC. 1983. Collective invention. J. Econ. Behav. Organ. 4 (1), p. 1–24 e ALLEN
RC. 2009. The Industrial Revolution in miniature: the spinning jenny in Britain, France
and India. J. Econ. Hist. 69 (4): p. 901-27.
5 NUVOLARI A. 2004. Collective invention during the British Industrial Revolution: the
case of the Cornish pumping engine. Cambridge J. Econ. 28(3):347-63.
6 SAMILA S., Sorenson O. 2011. Noncompete covenants: incentives to innovate or
impediments to growth. Management Science, v. 57, n. 3, p. 425-38.
7 Cf. OECD. Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264241046-en>. Acesso em: 15
dez. 2017.
8 Cf. JR. MCLURE, Charles; CORABI, Giampaolo. La tributación sobre el comercio
electrónico: objectivos económicos, restricciones tecnológicas y legislación tributario.
Buenos Ayres: Depalma, 2000. MCLURE, p. 113.
9 Sobre o tema, cf. MANYIKA, James; CHUI, Michael; BUGHIN, Jacques; DOBBS,
Richard; BISSON, Peter e MARRS, Alex. Disruptive technologies: Advances that will
transform life, business, and the global economy. Report McKinsey Global Institute, 2013.
10 Cf. LAURE, Maurice. La Taxe sur la Valeur Ajoutée. Paris: Sirey, 1. ed. 1953.
11 Disponível em: <http://www.ey.com/gl/en/services/tax/worldwide-vat-gst-sales-tax-guide-
--country-list>. Acesso em: 15 dez. 2017.
12 MCNULTY, John K. Flat Tax, Consumption Tax, Consumption-Type Income Tax
Proposals in the United States: A Tax Policy Discussion of Fundamental Tax Reform.
December, Volume 88, Issue 6, 2000, p. 2150-2151.
13 EEC. The EEC reports on tax harmonization; the report of the Fiscal and Financial
Committee and the reports of the sub-groups A, B and C. Amsterdam: International
Bureau of Fiscal Documentation, 1963.
14 OECD. Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report, p. 31. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264241046-en>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
15 OECD. Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1, cit., p. 32.

1838
16 RE 176.626-3, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 11-12-1998.
17 RE 688223, Rel. Min. Luiz Fux.
18 RE 199.464-SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 2-3-1999.
19 França (1954), Costa do Marfim (1990), Senegal (1991), Brasil (1967), Dinamarca (1967),
Alemanha (1968), Suécia (1968), Uruguai (1968), Países Baixos (1969), Equador (1970),
Itália (1973), Peru (1973), Reino Unido (1973), Argentina (1975), Chile, (1975),
Colômbia (1975), Coreia do Sul (1977), México (1980), Portugal (1986), Japão (1989),
Espanha (1991), Canadá (1991), Rússia (1992) e China (1994).
20 OLIVEIRA, Fabrício Augusto de. A Evolução da estrutura tributária e do fisco brasileiro:
1889-2009. Texto para Discussão n. 1.469, Brasília: Ipea, 2010, p. 35.
21 VARSANO, Ricardo. A tributação do valor adicionado, o ICMS e as reformas necessárias
para conformá-lo às melhores práticas internacionais. Banco Interamericano de
Desenvolvimento, 2014, p. 14.
22 OLIVEIRA, Fabrício Augusto de. A Evolução da estrutura tributária e do fisco brasileiro:
1889-2009. Texto para Discussão n. 1.469, Brasília: Ipea, 2010, p. 39.
23 VARSANO, Ricardo. A tributação do valor adicionado, o ICMS e as reformas necessárias
para conformá-lo às melhores práticas internacionais. Banco Interamericano de
Desenvolvimento, 2014, p. 28.
24 REZENDE, F. (1993), A Moderna Tributação do Consumo, Reforma Fiscal – Coletânea de
Estudos Técnicos, Relatório da CERF, v. II, p. 355-402; SERRA, J. e AFONSO, José R.
(1999), Federalismo Fiscal à Brasileira: Algumas Reflexões, Revista do BNDES, v. 6, n.
12, p 3-30; VARSANO, R. (1995), A tributação do Comércio Interestadual: ICMS atual
versus ICMS partilhado, Texto para Discussão n. 382, IPEA e VARSANO R. (2000),
“Subnational Taxation and the Treatment of Interstate Trade in Brazil: Problems and a
Proposed Solution”. Em S. J. Burki e outros (eds.) “Decentralization and Accountability of
the Public Sector”. Procedimentos da Conferência Anual de Bancos sobre
Desenvolvimento na América Latina e no Caribe. Washington, D. C.: Banco Mundial, p.
339-356.
25 Súmulas 20, 49, 68, 71, 80, 87, 94, 95, 129,135, 152, 155, 198, 237, 334, 350, 391, 395,
431, 432, 433 e 457.
26 Súmulas 411, 494 e 495.
27 Súmulas 138, 156, 167, 274, 424 e 524.
28 REsp 1092206/SP, REsp 1110550/SP, REsp 871760/BA, REsp 960476/SC, REsp
886462/RS e REsp 871760/BA.
29 Súmulas 660, 661 e 662.
30 Súmulas Vinculantes 32 e 48.
31 RE 572762, RE 574706, RE 584100, RE 585535, RE 439796, RE 593824, RE 593849,
RE 582461, RE 559937, RE 588149, RE 588954, RE 583327, RE 606107, RE 540829,
RE 635688, RE 592887, RE 607056, RE 608872, RE 601967, RE 603917, RE 627051,
RE 598677, RE 754917, RE 628075, RE 660970, RE 970821, RE 912888, ARE 665134,
RE 680089, RE 835818 e RE 632265.
32 BRASIL. PGFN em números. Dados de 2016. Disponível em:

1839
<http://www.fazenda.gov.br/noticias /2017/fevereiro/pgfn-disponibiliza-edicao-2017-do-
201cpgfn-em-numeros201d/201cpgfn-em-numeros201d-2017.pdf>. Acesso em: 15 dez.
2017.
33 Bem relata VARSANO que o termo IVA moderno se refere ao termo utilizado no livro
publicado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), representando um sistema de
tributação simples, de base ampla e alto poder de arrecadar. Cf. EBRILL L. et al. The
Modern VAT, International Monetary Fund, Washington, D.C., 2001. Ver in VARSANO,
Ricardo. Os IVAs dos BRICs. Disponível em: <http://www.joserobertoafonso.com.br/ivas-
dos-brics-varsano>. Acesso em: 15 dez. 2017.
34 Para uma análise completa da proposta, veja-se LIMA, Edilberto Carlos Pontes. Reforma
Tributária no Brasil: entre o ideal e o possível. Texto para Discussão n. 666, Brasília: Ipea,
1999.
35 Professora Titular de Direito Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da
Universidade Federal de Minas Gerais. Consultora e advogada.
36 Mestre em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas
Gerais. Consultor e advogado.
37 OCDE. Addressing the tax challenges of the digital economy, Action 1. Paris: OECD
Publishing, 2015, p. 11.
38 OCDE. Addressing the tax challenges…, cit., p. 64-73.
39 OCDE. International VAT/GST Guidelines. Paris: OECD Publishing, 2017, p. 17.
40 Na década de 1990, as profundas mudanças acarretadas pela internet já eram anunciadas:
“Modos aceitos de fazer negócios são profundamente alterados. A distância econômica
entre produtores e consumidores encolherá, intermediários tradicionais serão substituídos,
novos produtos e mercados serão criados, e novos e distantes e próximos relacionamentos
serão forjados entre negócios e consumidores e entre diferentes partes de empresas
globais. Novos desafios crescerão em áreas como a tributação, em que os governos
continuarão a buscar elevar a receita sem distorcer as escolhas econômicas ou
tecnológicas. Tais mudanças requerem um redirecionamento tanto da efetividade das
políticas governamentais em relação ao comércio como das práticas e procedimentos
comerciais tradicionais, a maioria das quais formadas com base em uma imagem muito
diferente” (OECD. Taxation and Electronic Commerce: Implementing the Ottawa
Taxation Framework Conditions. Committee on Fiscal Affairs. Paris: OECD Publishing,
2000, p. 9).
41 Cf. UCKMAR, Victor. Direito Tributário e Tecnologia. In: MARINS, James (Org.).
Tributação e Tecnologia. Curitiba: Juruá, 2002, p. 11-32; GRECO, Marco Aurélio.
Internet e Direito. São Paulo: Dialética, 2000, p. 77-120.
42 Cf. TEIXEIRA, Alessandra M. Brandão. As recomendações da OCDE e a tributação do
comércio eletrônico. In: DERZI, Misabel Abreu Machado (Org.). Separação de Poderes e
Efetividade do Sistema Tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 2010, p. 387-408;
COCKFIELD, Arthur J. The Rise of the OECD as Informal World Tax Organization
through National Responses to E-Commerce Tax Challenges. Yale J.L. & Tech, n. 8,
2005-2006, p. 136 e s.
43 Cf. OECD. Taxation and Electronic Commerce: Implementing the Ottawa Taxation

1840
Framework Conditions. Committee on Fiscal Affairs. Paris: OECD Publishing, 2000, p. 1.
Cf., também, OCDE. Addressing the tax challenges of the digital economy. Paris: OECD
Publishing, 2015, p. 20-21; ASOREY, Ruben O. El impacto del cibercomercio en los
principios fiscales y en libertad de comercio. UCKMAR, Victor. Corso di diritto
tributario Internazionale. Padova: Cedam, 2002, p. 1125-1156.
44 OCDE. International VAT/GST Guidelines. Paris: OECD Publishing, 2017, p. 18.
45 Cf. OCDE. Electronic Commerce: Taxation Framework Conditions. A Report by the
Committee on Fiscal Affairs, as presented to Ministers at the OECD Ministerial
Conference, “A Borderless World: Realising the Potential of Electronic Commerce” on 8
October 1998. S. l, outubro de 1998, p. 5. Disponível em:
<https://www.oecd.org/ctp/consumption/1923256.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
46 Cf. CALIENDO, Paulo. Da tributação do software nos acordos internacionais contra a
dupla tributação da renda. In: TORRES, Heleno Taveira (Org.). Direito Tributário
Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2004. v. 2, p. 387-422.
47 Cf. OCDE. Tax Treaty Characterization Issues Arising From E-Commerce. S. l, fevereiro
de 2001, p. 5-9. Disponível em: <http://www.oecd.org/tax/consumption/1923396.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
48 Cf. Office of Tax Policy, Treasury Department, Selected Tax Policy Implications of
Global Eletronic Commerce, 1996, reimpresso no Daily Tax Report (BNA) de 22-11-
1996.
49 Cf. AVI-YONAH, Reuven S. A Tributação Internacional do Comércio Eletrônico. Trad.
Fernando Gomes. Revista Internacional de Direito Tributário da ABRADT, Belo
Horizonte, v. 6, jul./dez. 2006, p. 417-474.
50 Cf. STF, 1ª Turma, Recurso Extraordinário n. 176.626/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence,
j. 10-11-1998, DJ 11-12-1998.
51 Cf. FRANÇA. Conseil des Impôts. “XIX Relatório ao Presidente da República do
Conselho de Impostos da França. Imposto sobre o Valor Acrescido”, Revista
Internacional da ABRADT, Belo Horizonte, Del Rey, v. 2, p. 515.
52 Cf. FRANÇA. Conseil des Impôts. “XIX Relatório ao Presidente da República do
Conselho de Impostos da França. Imposto sobre o Valor Acrescido”, Revista
Internacional da ABRADT, Belo Horizonte, Del Rey, v. 2, p. 516.
53 Cf. FRANÇA. Conseil des Impôts, cit., p. 517.
54 É imprescindível notar que o conceito clássico de mercadoria tem sido progressivamente
abandonado, tanto pelas administrações tributárias quanto pela jurisprudência. Como
destacado anteriormente, o STF entendera, no Recurso Extraordinário n. 176.626/SP, que
o tributo cabível em operações envolvendo programas de computador dependeria das
características do software: se estandardizado e veiculado por mídia física, a competência
tributária seria dos estados; se, ao revés, fosse personalizado e feito por encomenda, aos
municípios cumpriria a cobrança de tributos. Ocorre que essa decisão é um reflexo de uma
época em que ainda era inexpressiva a transferência direta de programas por meio da rede
de computadores (download), o que, com o passar dos anos, tornou-se a regra do comércio
de softwares, substituindo o uso de mídias físicas. Esse novo contexto foi reconhecido na
Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.945/MT, na qual a

1841
existência de mídia física foi considerada irrelevante para a incidência do ICMS. Nesse
espírito, foram editados os Convênios ICMS 181/2015 e 107/2017, os quais regulam a
tributação sobre operações com softwares, confirmando a movimentação dos estados no
sentido de gravar essa materialidade. Em paralelo, os municípios se mantêm resolutos em
garantir a receita tributária relativa a essas transações, a exemplo do Município de São
Paulo, que, por meio do Parecer Normativo SF n. 1/2017, declarou a intenção de exigir o
ISS sobre o “licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação, por
meio de suporte físico ou por transferência eletrônica de dados (‘download de software’),
ou quando instalados em servidor externo (‘Software as a Service – SaaS’)”, por
supostamente se enquadrar no item 1.05 da lista de serviços tributáveis pelo imposto.
55 Há de se registrar que, até o exercício de 2019, vigorará um regime especial de
distribuição da competência para a exigência do diferencial de alíquota nessas operações,
como se extrai do art. 99 do ADCT: “Art. 99. Para efeito do disposto no inciso VII do § 2º
do art. 155, no caso de operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor
final não contribuinte localizado em outro Estado, o imposto correspondente à diferença
entre a alíquota interna e a interestadual será partilhado entre os Estados de origem e de
destino, na seguinte proporção:
I – para o ano de 2015: 20% (vinte por cento) para o Estado de destino e 80% (oitenta por
cento) para o Estado de origem;
II – para o ano de 2016: 40% (quarenta por cento) para o Estado de destino e 60% (sessenta
por cento) para o Estado de origem;
III – para o ano de 2017: 60% (sessenta por cento) para o Estado de destino e 40% (quarenta
por cento) para o Estado de origem;
IV – para o ano de 2018: 80% (oitenta por cento) para o Estado de destino e 20% (vinte por
cento) para o Estado de origem;
V – a partir do ano de 2019: 100% (cem por cento) para o Estado de destino”.
56 Cf. AVI-YONAH, Reuven S. A Tributação Internacional do Comércio Eletrônico. Trad.
Fernando Gomes. Revista Internacional de Direito Tributário da ABRADT, Belo
Horizonte, jul./dez. 2006, v. 6, p. 471.
57 Cf. FRANÇA. Conseil des Impôts. XIX Relatório ao Presidente da República do Conselho
de Impostos da França. Imposto sobre o Valor Acrescido, Revista Internacional da
ABRADT, Belo Horizonte, Del Rey, v. 2, p. 517.
58 Cf. FRANÇA. Conseil des Impôts. XIX Relatório ao Presidente da República do Conselho
de Impostos da França. Imposto sobre o Valor Acrescido, Revista Internacional da
ABRADT, Belo Horizonte, Del Rey, v. 2, p. 530.
59 OCDE. International VAT/GST Guidelines. Paris: OECD Publishing, 2017, p. 72-76.
60 Cf. FRANÇA. Conseil des Impôts. XIX Relatório ao Presidente da República do Conselho
de Impostos da França. Imposto sobre o Valor Acrescido, Revista Internacional da
ABRADT, Belo Horizonte, Del Rey, v. 2, p. 521 e 522.
61 No Brasil, há também bons exemplos de sistemas informatizados de declaração e
arrecadação de tributos. Pode-se citar o Sistema de Captação e Auditoria dos Anexos de
Combustíveis – SCANC, criado em conformidade com os Convênios ICMS 03/99 (com as
alterações do Convênio ICMS 107/2003), 54/2002 e 110/2007 e com o Ato Cotepe n.

1842
47/2003, por meio do qual são gerados e transmitidos os relatórios sobre a
comercialização de combustíveis.
62 BELO HORIZONTE. Comissão Permanente de Simplificação e Revisão da Legislação
Tributária ao Prefeito do Município de Belo Horizonte. 2º Relatório da Comissão
Permanente de Simplificação e Revisão da Legislação Tributária ao Prefeito do Município
de Belo Horizonte, Revista Internacional de Direito Tributário, Belo Horizonte, Del Rey,
v. 7, p. 445.
63 Cf. FRANÇA. Conseil des Impôts. XIX Relatório ao Presidente da República do Conselho
de Impostos da França. Imposto sobre o Valor Acrescido, Revista Internacional da
ABRADT, Belo Horizonte, Del Rey, v. 2, p. 522-523.
64 Cf. Directiva 2002/38/CE do Conselho, Jornal Oficial das Comunidades Europeias, p.
1128/41, de 15-5-2002.
65 Desse modo, o MOSS se divide em dois sistemas: o sistema União, para empresas
estabelecidas em países da União Europeia; e o sistema extra-União, para empresas
estabelecidas em países que não compõem o bloco. Em que pesem algumas diferenças nos
procedimentos exigidos, as características fundamentais desses regimes são as mesmas.
66 DELOITTE. VAT Aspects of cross-border ecommerce – Options for modernisation Final
report – Lot 3. Assessment of the implementation of the 2015 place of supply rules and the
Mini-One Stop Shop. Luxembourg: Publications Office of the European Union, 2016, p. 8-
9.
67 Idem, p. 33-34.
68 Idem, p. 96-97.
69 As modificações perpetradas pela Lei Complementar n. 157/2016 vão além da inclusão da
referida hipótese de cobrança. Há de se destacar a adesão ao critério de destino para a
cobrança do ISS sobre variados serviços, tais como planos de saúde, administração de
cartões de crédito, entre outros. Diante dos dilemas que acompanham essa opção do
legislador, são necessárias técnicas adequadas de arrecadação e fiscalização, no sentido de
uniformizar e centralizar as obrigações acessórias do imposto. Nessa linha, a Associação
Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais emitiu interessante estudo (Nota
Técnica n. 01/2017), no qual são expostas estratégias para fomentar a praticabilidade
tributária e evitar eventuais conflitos de competência: (i) a criação de portal único, por
meio do qual os prestadores de serviços poderiam declarar o imposto devido e emitir as
guias correspondentes; e (ii) formação de um banco de dados unificado sobre os
contribuintes.
70 DENGO, Atílio. Realidade virtual, direito e tributação do comércio eletrônico – Estudo de
Direito Comparado, Revista Tributária e de Finanças Públicas, n. 36, São Paulo, p. 197.
71 Advogado em São Paulo. Mestre em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da USP.
Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo (2008/2015) e Conselheiro
do Conselho Municipal de Tributos da Prefeitura de São Paulo (2016/2018). Professor do
Instituto Brasileiro de Direito Tributário.
72 A exemplificar essa constatação, vale transcrever a seguinte conclusão de Fernando
Zilvetti: “Assim, o Sistema Tributário nacional é juridicamente federal, porém
economicamente unitário” (A evolução histórica da teoria da tributação: análise das

1843
estruturas socioeconômicas na formação do sistema tributário. São Paulo: Saraiva, 2017,
p. 429).
73 Segundo levantamento do Fórum Econômico Mundial (The Global Competitiveness
Report 2017-2018), o Brasil encontra-se na penúltima posição, dentre 137 economias
consideradas, na avaliação dos efeitos do seu sistema tributário como incentivo ao
investimento. Na pesquisa do ano anterior (http://www3.weforum.org/docs/GCR2016-
2017/05FullReport/TheGlobalCompetitivenessReport2016-2017_FINAL.pdf. Acesso em:
15 dez. 2017), ocupávamos a última posição nesse mesmo ranking. Já no quesito relativo à
carga tributária total, estamos na 134ª posição, qualificados à frente somente de Colômbia,
Mauritânia e Argentina. No ranking Doing Business, de autoria do Banco Mundial
(http://www.doingbusiness.org/data/exploretopics/paying-taxes), ocupamos a 181ª
posição, dentre 190 economias analisadas.
74 Vale aqui a referência aos conhecidos milhares de horas de trabalho demandadas das
empresas estabelecidas no Brasil, para conseguirem cumprir as suas obrigações acessórias
necessárias à apuração e ao pagamento dos seus tributos, o que vem sofrendo gradual
redução nos últimos anos, desde o recorde de 2.600 até as atuais 2.038 medidas em 2017
(https://www.pwc.com/gx/en/paying-taxes/pdf/pwc-paying-taxes-2017.pdf). Acesso em:
15 dez. 2017.
75 Conforme aquele mesmo levantamento do Fórum Econômico Mundial (vide nota de
rodapé n. 2 acima), pesquisa de opinião realizada com executivos indicam a carga
tributária como primeiro obstáculo para se realizar negócios no Brasil. Em quarto lugar,
temos a burocracia estatal e, em sétimo lugar, a complexidade da regulamentação
tributária.
76 Marcada pela baixa progressividade da tributação da renda, concentração de carga
tributária no consumo de bens e serviços, assim como reduzida tributação sobre o
patrimônio (sobre o tema, vide relatório “A distância que nos une. Um retrato das
desigualdades brasileiras”, disponível em:
<https://www.oxfam.org.br/sites/default/files/arquivos/Relatorio_A_distancia_que_nos_une.pdf
Acesso em: 15 dez. 2017). Vale também a lembrança ao relatório “Carga Tributária no
Brasil 2015 – Análise por Tributo e Bases de Incidência”
(http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-
aduaneiros/estudos-e-estatisticas/carga-tributaria-no-brasil/ctb-2015.pdf. Acesso em: 15
dez. 2017), a revelar que, no ano de 2015, 49,68% da carga tributária brasileira recaía
sobre bens e serviços, enquanto somente 18,27%, sobre a renda e 4,44%, sobre a
propriedade.
77 Rompendo-se, a nosso ver, com a tradição da nossa “federação centrípeda”, na qual, nas
palavras de José Alfredo de Oliveira Baracho, “o Estado federal não vence a vocação
centralista do poder político” (Teoria geral do federalismo. Rio de Janeiro: Forense, 1986,
p. 186-204).
78 Sobre o histórico a seguir, vide: BALTAZAR, Ulbaldo Cesar. História do Tributo no
Brasil. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2005; AMED, Fernando José e CAMPOS, Plínio
José Labriola de. História dos Tributos no Brasil. São Paulo: SINAFRESP, 2012; e
COSTA, Alcides Jorge. História da Tributação no Brasil. Princípios e Limites da
Tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005.

1844
79 Ambos podiam arrecadar recursos da extração e do comércio do pau-brasil, pescado,
metais e pedras preciosas, especiarias e drogas. A Coroa de Portugal era titular do direito
régio das alfândegas, sobre mercadorias importadas e exportadas ou naufragadas,
enquanto os donatários das Capitanias podiam, isoladamente, exigir o foro para construção
de marinhas de sal, moendas de água e engenhos.
80 História da Tributação no Brasil. Princípios e Limites da Tributação. São Paulo: Quartier
Latin, 2005. p. 48-49.
81 Conforme estudo da OCDE sobre a tributação do consumo, o Brasil foi um dos primeiros
países a introduzir a tributação sobre o valor agregado (OECD – 2016). Consumption Tax
Trends 2016: VAT/GST and excise rates, trends and policy issues. OECD Publishing,
Paris, p. 181).
82 É o que conclui Melina de Souza Rocha Lukic, na sequência dos capítulos 1 e 2, da sua
excelente obra Reforma tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba:
Juruá, 2014, p. 207.
83 O que originalmente se restringia aos produtos industrializados, excepcionados os
chamados semielaborados.
84 Dados de 2015, extraídos do relatório “Carga Tributária no Brasil 2015 – Análise por
Tributo e Bases de Incidência”
(http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-
aduaneiros/estudos-e-estatisticas/carga-tributaria-no-brasil/ctb-2015.pdf. Acesso em: 15
dez. 2017). Gráficos a seguir foram retirados desta mesma fonte.
85 Na Constituição de 1946, previam os seguintes repasses obrigatórios de arrecadação: 75%
do imposto único sobre combustíveis e lubrificantes redistribuídos para Estados, Distrito
Federal e Municípios; 15% do imposto de renda redistribuído para Municípios; 10% do
imposto sobre consumo de mercadorias redistribuído para Municípios; e 100% do imposto
sobre propriedade territorial rural redistribuído para Municípios. Já em 1967 e 1969, o
quadro de redistribuição era o seguinte: 100% do imposto de renda sobre rendimentos do
trabalho e da dívida pública pagos pelos Estados e Distrito Federal era a eles distribuído;
de um total de 12% do imposto de renda e do IPI, 5% eram destinados para o Fundo de
Participação dos Estados e Distrito Federal, 5% para o Fundo de Participação dos
Municípios e 2% para o Fundo Especial; 40% do imposto único sobre combustíveis e
lubrificantes, para Estados, Distrito Federal e Municípios; 60% do imposto único sobre
energia elétrica distribuídos para Estados, Distrito Federal e Municípios; 90% do imposto
único sobre minerais distribuídos para Estados, Distrito Federal e Municípios; e 20% do
ICM distribuído aos Municípios.
86 O quadro atual, grosso modo, é o seguinte: 100% do imposto de renda sobre rendimentos
pagos pelos Estados, Distrito Federal e Municípios é a eles distribuído; 20% de qualquer
imposto instituído com a competência residual da União deve ser distribuído aos Estados e
ao Distrito Federal; o IOF sobre ouro é distribuído na proporção de 30% para Estados e
Distrito Federal e 70% para Municípios de origem; 50% do ITR deve ir para os
Municípios (100% para o Município que cobrar e arrecadar o ISS, desde a Emenda
Constitucional n. 42/2003); 50% do IPVA é distribuído para os Municípios; 25% do ICMS
é distribuído para os Municípios; 49% do imposto de renda e do IPI são repartidos em
21,5% para o Fundo de Participação dos Estados e Distrito Federal, 24,5% para o Fundo

1845
de Participação dos Municípios, e 3% para programas de financiamento nas regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste; 10% do IPI destinam-se a Estados e Distrito Federal conforme
as suas exportações, devendo eles redistribuírem 25% para Municípios; e 29% da CIDE-
combustíveis vão para Estados e Distrito Federal, devendo eles redistribuírem 25% para
Municípios.
87 Além da vinculação genérica das contribuições sociais ao financiamento da seguridade
social, conforme artigo 195, da Constituição Federal, temos também a contribuição ao
PIS, conforme artigo 239, com a sua arrecadação destinada ao programa do seguro-
desemprego, sendo pelo menos 40% para financiar programas de desenvolvimento
econômico através do BNDES. O salário-educação deve ser empregado na educação
básica pública (art. 212, §§ 5º e 6º). E a arrecadação de impostos, incluindo as
transferências, tem destinação parcialmente vinculada à manutenção e ao desenvolvimento
do ensino, conforme o mesmo artigo 212, e artigo 60, do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias (ADCT).
88 Desvinculação das Receitas da União, originalmente criada no período do Plano Real, para
viabilizar o financiamento do Fundo Social de Emergência (art. 71, do ADCT).
Atualmente, o tema é regulado pelos artigos 76, 76-A e 76-B, do ADCT, que permitem a
desvinculação, até 31 de dezembro de 2023: (i) no caso da União, de 30% da arrecadação
relativa às contribuições sociais, das contribuições de intervenção no domínio econômico
e das taxas, excluída daí a contribuição social do salário-educação; (ii) no caso de Estados
e Distrito Federal, de 30% da sua receita de impostos, taxas e multas, exceção feita aos
recursos destinados ao financiamento das ações e serviços públicos de saúde e à
manutenção e desenvolvimento do ensino, às receitas que pertencem aos Municípios
decorrentes de transferências previstas na Constituição Federal, às receitas de demais
transferências obrigatórias e voluntárias entre entes da Federação com destinação
especificada em lei e, finalmente, aos fundos instituídos pelo Poder Judiciário, pelos
Tribunais de Contas, pelo Ministério Público, pelas Defensorias Públicas e pelas
Procuradorias-Gerais dos Estados e do Distrito Federal; e (iii) no caso de Municípios, de
30% das suas receitas de impostos, taxas e multas, excluídos também os recursos
destinados ao financiamento das ações e serviços públicos de saúde e à manutenção e
desenvolvimento do ensino, as receitas de contribuições previdenciárias e de assistência à
saúde dos servidores, as transferências obrigatórias e voluntárias entre entes da Federação
com destinação especificada em lei e os fundos instituídos pelo Tribunal de Contas do
Município.
89 Gráficos a seguir extraídos da obra de Melina de Souza Rocha Lukic. Reforma tributária
no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014, p. 213-214. Sobre o tema,
confira também as palavras de Luis Eduardo Schoueri: “As contribuições sociais têm
crescido muito em importância nas contas do Governo Federal. Há uma explicação
imediata para tanto: enquanto as contribuições sociais destinam-se integralmente às
atividades da União, a receita dos impostos arrecadados pela União é repartida com
Estados, Distrito Federal e Municípios (v. artigo 159 da Constituição Federal)”
(SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 225).
90 Em 2015, 68,26% da arrecadação total de tributos no Brasil dizia respeito a tributos de
competência do Governo Federal; 25,37% referem-se a tributos estaduais; e apenas 6,37%
da arrecadação é originariamente dos municípios (Secretaria da Receita Federal do Brasil.

1846
Carga Tributária no Brasil 2015, citada na nota de rodapé n. 7). Em termos de
percentagem sobre o Produto Interno Bruto Brasileiro, os tributos federais representam um
peso de 22,29%, que se somam aos 8,28% dos tributos estaduais e aos 2,08% dos tributos
municipais (idem).
91 “A Constituição de 1988 concedeu aos governos subnacionais competências tributárias
exclusivas e autonomia para legislar, coletar e fixar alíquotas. A proposta era que a
descentralização da arrecadação reforçasse o vínculo entre o cidadão-contribuinte e o
poder público local, de forma a aumentar a qualidade dos bens e serviços públicos
oferecidos à população. Posteriormente, a LRF (2001) reiterou que instituição, previsão e
arrecadação de tributos de competência municipal são requisitos essenciais da
responsabilidade da gestão fiscal. Não obstante, o IFGF Receita Própria mostra um
quadro de significativo desequilíbrio entre o volume de receitas e a arrecadação própria na
grande maioria das prefeituras brasileiras.
Em 2016, 81,7% das cidades brasileiras ficaram com Conceito D no IFGF Receita Própria,
ou seja, 3.714 não geraram nem 20% de suas receitas em 2016. Apenas 136 municípios
em todo o país obtiveram Conceito A no IFGF Receita Própria por terem arrecadado com
recursos próprios mais de 40% de suas receitas. Neste grupo, a população média é de 130
mil habitantes, contra uma média de 9 mil habitantes nos municípios com Conceito D no
indicador” (IFGF 2017 – Índice FIRJAN de Gestão Fiscal. Ano-base 2016. Agosto, 2017.
Acesso em: <http://publicacoes.firjan.org.br/ifgf/2017/#18/z>. Acesso em: 15 dez. 2017).
92 A título de referência, vide Raio-X da Crise dos Estados. Economia. Portal G1
(http://especiais.g1.globo.com/economia/2016/raio-x-da-crise-nos-estados), que dá conta
de que “Diversos estados relataram que sua situação fiscal foi prejudicada pelas reduções
do repasses do Fundo de Participação de Estados e Municípios (FPE)”. Como referência
sobre a crise fiscal dos Estados, vide também o relatório “A Situação Fiscal dos Estados
Brasileiros. Publicações Sistema Firjan. Pesquisas e estudos socioeconômicos.
Abril/2017” (disponível em:
<http://www.firjan.com.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?
fileId=2C908A8F5B87A9E3015BA6AEE3DD5828>. Acesso em: 15 dez. 2017).
93 Gráfico a seguir extraído de OECD (2016). Consumption Tax Trends 2016: VAT/GST and
excise rates, trends and policy issues. OECD Publishing, Paris.
94 Gráfico a a seguir extraído de OECD (2016). Consumption Tax Trends 2016: VAT/GST
and excise rates, trends and policy issues. OECD Publishing, Paris.
95 OECD (2017). International VAT/GST Guidelines. OECD Publishing: Paris, p. 18.
96 Resumidamente, tais diretrizes são as seguintes: 2.1 o ônus do VAT não deve recair sobre
o negócio, a não ser que explicitamente determinado pela legislação (princípio flows
through the business); 2.2 negócios em situação similar, realizando transações similares,
devem estar sujeitos a níveis similares de tributação; 2.3 a legislação do VAT deve ser
elaborada de maneira a não influenciar primariamente as decisões de negócios dos
contribuintes; 2.4 em relação ao nível de tributação, o agente econômico estrangeiro não
deve ter vantagem nem desvantagem em relação ao agente econômico da jurisdição onde
o imposto for devido ou pago; 2.5 para assegurar que o agente econômico estrangeiro não
incorra no pagamento de VAT que não possa recuperar, as jurisdições podem criar um
sistema de restituição do VAT pago, desonerar o fornecimento de VAT, permitir a

1847
restituição mediante um registro local do contribuinte, alterar a responsabilidade pelo
pagamento do VAT para um fornecedor ou para o cliente local, ou, ainda, fornecer-lhe
certificado de isenção fiscal; 2.6 onde houver obrigações acessórias para agentes
econômicos estrangeiros, elas não podem onerar o negócio de maneira desproporcional ou
inapropriada; 3.1 para fins de tributação internacional do consumo de serviços e
intangíveis, esses serviços e intangíveis devem ser tributados de acordo com as normas da
jurisdição em que ocorre o seu consumo; 3.2 no caso de fornecimentos B2B, a jurisdição
em que estiver localizado o cliente tem o poder de tributar o comércio internacional com
serviços e intangíveis; 3.3 a identificação da localização do cliente é normalmente
determinada pelo contrato comercial entre as partes; 3.4 quando o cliente estiver
estabelecido em mais de uma jurisdição, o direito de tributar caberá à(s) jurisdição(ões)
onde estiver(em) localizado(s) o(s) estabelecimento(s) que utilize(m) o serviço ou
intangível; 3.5 a jurisdição em que o fornecimento for realizado fisicamente tem o direito
de tributar a operação B2C, com relação a serviços e intangíveis que forem materializados
fisicamente em um local identificável, aos serviços e intangíveis normalmente consumidos
no mesmo local em que são realizados ou, ainda, aos serviços ou intangíveis que
normalmente requeiram a presença física do fornecedor e do consumidor do serviço ou
intangível no mesmo local e momento em que o serviço é realizado; 3.6 a jurisdição em
que o consumidor tiver a sua residência usual tem o direito de tributar o fornecimento de
serviços ou intangíveis em uma operação B2C, quando não alcançada pelas regras
anteriores; 3.7 o direito de tributar uma operação internacional com serviços ou
intangíveis B2B deve ser alocado através de um critério distinto da localização do cliente,
quando a alocação do direito de tributar de acordo com a localização do cliente não levar a
um resultado apropriado de acordo com os critérios de neutralidade, eficiência, certeza e
simplicidade, efetividade e justiça, e quando a adoção de outro referencial levar a um
resultado melhor de acordo com esses critérios; e 3.8 para o fornecimento internacional de
serviços e intangíveis diretamente relacionados com propriedade imobiliária, o direito de
tributar deve ser alocado na jurisdição de localização do imóvel (OECD (2017).
International VAT/GST Guidelines. OECD Publishing: Paris).
97 OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report. OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. OECD Publishing:
Paris, 2015, p. 14.
98 Incluindo a tributação onde houver presença econômica significativa, a retenção de VAT
na fonte ou a criação de tributos de equalização, assegurando-se que tais medidas não
infrinjam acordos para evitar a dupla tributação da renda ou acordos comerciais firmados
pelo país (OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1
– 2015 Final Report. OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. OECD
Publishing: Paris, 2015, p. 15).
99 OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report. OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. OECD Publishing:
Paris, 2015, p. 36-49, 52-67.
100 OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report. OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. OECD Publishing:
Paris, 2015, p. 64-75.
101 Dentre outros, vide: STJ, Recurso Especial n. 40356/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Peçanha

1848
Martins, j. 29-11-1995; STJ, Recurso Especial n. 247595/MG, 1ª Turma, Rel. Min. José
Delgado, j. 11-4-2000; STJ, Recurso Especial n. 720717/MG, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. 20-2-2006; STJ, AgRg no Recurso Especial n. 1189255/RS, 1ª Turma, Rel. Min.
Luiz Fux, j. 5-8-2010.
102 Súmula 167/STJ.
103 Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4389/DF, Pleno, Rel. Min.
Joaquim Barbosa, j. 13-4-2011. Decisão essa que se contrapôs ao entendimento do STJ,
materializado na Súmula 156 e no Recurso Especial Repetitivo n. 1.092.206/SP, 1ª Seção,
Rel. Min. Teori Zavascki, j. 11-3-2009.
104 STJ, Recurso Especial n. 114171/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j.
17-6-1997; STJ, Ação Rescisória n. 1084/SP, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell
Marques, j. 10-2-2010; e STJ, EDcl no AgRg no Recurso Especial n. 791067/DF, 2ª
Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 2-8-2016.
105 STJ, Recurso Especial n. 1680712/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 21-9-
2017; STJ, Recurso Especial n. 1307824/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell
Marques, j. 27-10-2015.
106 Recurso Especial n. 883254/MG, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, j. 18-12-2007.
107 Recurso Extraordinário n. 176626/SP, Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 10-11-
1998; e Recurso Extraordinário n. 199464-9/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 2-3-
1999. Com destaque, ainda, para a decisão do Supremo Tribunal Federal na Medida
Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.945/MT, em que concedeu liminar
para permitir a cobrança do ICMS sobre programas de computador comercializados sem
suporte físico.
108 Recurso Especial n. 418594/PR, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 17-2-2005;
Recurso Especial n. 1497364/GO, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, j. 3-9-2015.
109 STJ, AgRg no Agravo em Recurso Especial n. 816632/SP, 2ª Turma, Rel. Min.
Humberto Martins, j. 2-2-2016.
110 STJ, Recurso Especial n. 1231669/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 7-11-
2013.
111 STJ, AgRg nos EDcl no Recurso Especial n. 1190282/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Hamilton
Carvalhido, j. 26-10-2010; STJ, AgRg no Recurso Especial n. 1280329/MG, 2ª Turma,
Rel. Min. Herman Benjamin, j. 27-3-2012.
112 STJ, Recurso Especial Repetitivo n. 1106462/SP, 1ª Seção, Rel. Min. Luiz Fux, j. 23-9-
2009; STJ, Recurso Especial n. 1586158/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 3-
5-2016.
113 Recursos Extraordinários ns. 547245/SC e 592205/SC, Pleno, Rel. Min. Eros Grau, j. 2-
12-2009.
114 Súmula Vinculante 31/STJ.
115 STF, Recurso Extraordinário com repercussão geral n. 540829/SP, Pleno, Rel. Min. Luiz
Fux, j. 11-9-2014.
116 Súmula 334/STJ e STJ, Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 456650/PR, 1ª
Seção, Rel. Min. Franciulli Neto, j. 11-5-2005.

1849
117 Recurso Extraordinário n. 912888/RS (tema 827 de repercussão geral) e Recurso
Especial n. 1176753/RJ (repetitivo – tema n. 427).
118 OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report. OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. OECD Publishing:
Paris, 2015, p. 31.
119 Exemplo disso é o julgado pelo STF no Recurso Extraordinário n. 651703/PR, Pleno,
Rel. Min. Luiz Fux, j. 29-9-2016.
120 Conforme minutas apresentadas pelo próprio Deputado Luiz Carlos Hauly em 22-8-
2017, disponíveis em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/comissoes/comissoes-temporarias/especiais/55a-legislatura/reforma-
tributaria/documentos/outros-documentos/propostas-apresentadas-pelo-relator-em-22-
08.17>. Acesso em: 15 dez. 2017.
121 Disponível em: <http://www.ccif.com.br/wp-content/uploads/2017/08/NT-IBS-
v1.1.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
122 Disponível em: <https://www.brasileficiente.org.br/images/61/original/4b_-
_Projeto_LeiPEC.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
123 Na linha da orientação da OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital
Economy, Action 1 – 2015 Final Report. OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting
Project. OECD Publishing: Paris, 2015, o projeto prevê como abrangidos pelo IBS as
importações a qualquer título, as locações e cessões de bens e direitos e demais operações
com bens intangíveis e direitos.
124 “Há muitas razões contrárias a pretensões megalomaníacas de reforma tributária.
Mudanças têm custos e riscos. Estabilidade normativa, no âmbito tributário, é um ativo
relevante para a decisão sobre investimentos privados... buscamos copiar modelos em
franca obsolescência, como o Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Enquanto isso, pouca
ou nenhuma atenção se dá às nossas mais severas enfermidades tributárias: o
burocratismo, a indeterminação conceitual e o processo tributário. A burocracia reina
triunfante no sistema tributário” (MACIEL, Everardo, O Equívoco da Reforma Tributária,
O Estado de S. Paulo, 5-10-2017).
125 “A ideia de que países ‘relevantes’ adotam o IVA, e o Brasil tem que fazer o mesmo não
pode deixar de ser confrontada com fatos observados nas duas principais economias do
planeta. Nos EUA, esse imposto não existe. Eles jamais se aventuraram nessa forma de
tributação. O outro caso se refere à Europa, onde esse tributo se tornou um problema por
conta de sua característica marcante, que é a burocracia, abrindo brechas para fraudes de
toda ordem. No fim de setembro deste ano, a Comissão Europeia divulgou um
comunicado à imprensa dizendo que o IVA gerou perdas de 152 bilhões de euros para os
países-membros daquela comunidade em 2015.” (CINTRA, Marcos. Reforma tributária à
brasileira, O Globo, 15-10-2017).
126 Conforme afirma Fernando Dall’Acqua, o próprio Everardo Maciel propusera em outra
oportunidade a criação de um IVA federal, com extinção de inúmeros outros tributos e
criação de impostos seletivos sobre determinados produtos (Uma Análise das Propostas de
Reforma Tributária Recentes. EAESP/FGV/NPP – Núcleo de Pesquisas e Publicações,
2002).
127 Não podemos nos esquecer de que, se não houver clareza quanto à competência

1850
territorial para a cobrança do imposto, a sua própria exigência estará prejudicada, como já
declarou o Supremo Tribunal Federal em relação ao transporte aéreo de passageiros, na
Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.600-8/UF. Se o conflito for apenas aparente, o
Código Tributário Nacional prevê o uso da ação consignatória em pagamento como
recurso de que pode lançar mão o contribuinte para discutir esse tipo de assunto perante o
Poder Judiciário.
128 Vide Streamlined Sales and Use Tax Agreement, disponível em:
<http://www.streamlinedsalestax.org4>.
129 Nesse sentido, vide OECD (2016). Consumption Tax Trends 2016: VAT/GST and excise
rates, trends and policy issues. OECD Publishing, Paris, p. 33-35; e NELLEN, Frank J. G.
Information Asymmetries in EU VAT. The Netherlands: Wolters Kluwer, 2017.
130 Vide Emenda Constitucional n. 101/2016 (http://www.cbec.gov.in/resources//htdocs-
cbec/gst/consti-amend-act.pdf) e breve relato sobre a reforma havida naquele país
(http://www.cbec.gov.in/resources//htdocs-cbec/gst/01092017-GST-Concept-and-
Status.pdf. Acesso em: 15 dez. 2017).
131 “Para concluir, podemos dizer que, de acordo com o que analisamos, os núcleos de
disputas em matéria de tributação são a estrutura federativa e a distribuição de
competências para a instituição e arrecadação de tributos de acordo com essa estrutura.
Uma vez que os atores que têm um poder econômico forte, representados pelos Estados
mais ricos (especialmente São Paulo), conquistaram um nível significativo de poder
tributário, o estudo mostrou que é difícil modificar esse status quo, sem que compensações
sejam previstas. A análise também mostra que, mesmo com a previsão de compensações, a
questão ainda origina oposições. A razão é que a competência para arrecadar alguns
tributos, especialmente o ICMS, não diz respeito apenas aos recursos em si, mas sim ao
poder político associado a essa competência” (LUKIC, Melina de Souza Rocha. Reforma
tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014. p. 375).
132 Reforma tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014. p.
428.
133 Canada Revenue Agency. General Information for GST/HST Registrants, disponível em:
<https://www.canada.ca/content/dam/cra-arc/migration/cra-arc/E/pub/gp/rc4022/rc4022-
17e.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
134 O que teve como pontapé inicial o Protocolo ICMS n. 21/2011, declarado
inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, nas Ações Diretas de
Inconstitucionalidade ns. 4.628/DF e 4.713/DF.
135 Na medida em que ambiciona tributar mais do que as operações relativas à circulação de
mercadorias, estendendo em muito a interpretação ainda não definitiva do Supremo
Tribunal Federal, na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.
1.945/MT, sobre a possibilidade de incidência do ICMS sobre mercadorias incorpóreas.
136 OECD (2015). Addressing the Tax Challenges, obra citada na nota de rodapé n. 30, p.
109. Vide também: <http://europa.eu/youreurope/business/vat-customs/moss-
scheme/index_en.htm>. Acesso em: 15 dez. 2017.
137 OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report. OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. OECD Publishing:
Paris, 2015, p. 52-67.

1851
138 Idem.
139 Quinze anos, quando se tratar de benefício destinado ao fomento das atividades
agropecuária e industrial, inclusive agroindustrial, e ao investimento em infraestrutura
rodoviária, aquaviária, ferroviária, portuária, aeroportuária e de transporte urbano; oito
anos, no caso de benefícios relativos à manutenção ou ao incremento das atividades
portuária e aeroportuária vinculadas ao comércio internacional, incluída a operação
subsequente à da importação, praticada pelo contribuinte importador; cinco anos, quando
se tratar de benefício pertinente à manutenção ou ao incremento das atividades comerciais,
desde que o beneficiário seja o real remetente da mercadoria; três anos, na hipótese de
benefício para operações e prestações interestaduais com produtos agropecuários e
extrativos vegetais in natura; e, finalmente, um ano, para os demais casos.
140 “Pode-se dizer, ao menos em boa parte das Federações, que as crises econômicas e
políticas serviram de mola propulsora para a implantação e modificação de Sistemas
Tributários federais” (ZILVETTI, Fernando, op. cit., p. 420). Na mesma linha, mencione-
se a fala do Deputado Luiz Carlos Hauly sobre o assunto no programa Roda-Viva, da TV
Cultura, do dia 30-10-2017 (disponível em: <https://www.youtube.com/watch?
v=OC_2s3WgwiY>. Acesso em: 15 dez. 2017, 00:46:55 em diante).
141 Doutor e Mestre em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da USP. Graduado em
Ciência Contábeis pela FEA-USP. Graduado em Direito pela Faculdade de Direito da
USP. Coordenador do Curso de Especialização em Direito Tributário Internacional do
IBDT. Professor do Mestrado Profissional do IBDT, nas matérias de Desafios da
Tributação do Comércio Eletrônico Internacional e Preços de Transferência. Advogado
em São Paulo.
142 CAMP, Bryan, The play’s the thing: A theory of taxing virtual worlds, Hastings Law
Journal, v. 59, n. 1, 2007, p. 70. Disponível em SSRN:
<https://ssrn.com/abstract=980693>. Acesso em: 15 dez. 2017.
143 Massively Multiplayer On-line Roleplaying Game (MMORPG).
144 HUANG, Byron M., Walking the thirteenth floor: the taxation of virtual economies, 17
Yale J.L. & Tech. 224 (2015), p. 225-226. Disponível em SSRN:
<https://ssrn.com/abstract=2584489>. Acesso em: 15 dez. 2017.
145 Vide <https://en.wikipedia.org/wiki/Anshe_Chung>. Acesso em: 15 dez. 2017.
146 LEDERMAN, Leandra, Stranger than fiction: taxing virtual worlds, New York University
Law Review, v. 82, 2007; Indiana Legal Studies Research Paper n. 76, p. 1624. Disponível
em SSRN: <https://ssrn.com/abstract=969984>. Acesso em: 15 dez. 2017.
147 Para referência ao Direito brasileiro, cf. arts. 676 e 677 do RIR. O fato de ser uma
tributação exclusiva na fonte, porém, oferece dificuldades maiores à implementação
prática desta imposição tributária em casos de fonte pagadora estrangeira.
148 Cf. art. 117, § 4º, do RIR.
149 U.S. Government Accountability Office, Rep. no. GAO-13-516, Virtual economies and
currencies: additional IRS guidance could reduce tax compliance risks (2013). Disponível
em: <http://www.gao.gov/assets/660/654620.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
150 LEDERMAN, Leandra, Stranger than fiction: taxing virtual worlds, New York University
Law Review, v. 82, 2007; Indiana Legal Studies Research Paper n. 76, p. 1637-1638.

1852
Disponível em SSRN: <https://ssrn.com/abstract=969984>. Acesso em: 15 dez. 2017.
151 LEDERMAN, Leandra, op. cit., p. 1639-1640.
152 U.S. Government Accountability Office, Rep. no. GAO-13-516, Virtual economies and
currencies: additional IRS guidance could reduce tax compliance risks (2013), p. 3-4.
Disponível em: <http://www.gao.gov/assets/660/654620.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
153 LEDERMAN, Leandra, op. cit., p. 1626-1628.
154 HUANG, Byron M., op. cit., p. 227.
155 LEDERMAN, Leandra, op. cit. p. 1628-1629.
156 Real money trading (RMT).
157 CHUNG, Steven S., Real taxation of virtual commerce, Virginia Tax Review, v. 28, n. 3,
2008, p. 108. Disponível em SSRN: <https://ssrn.com/abstract=1097793>. Acesso em: 15
dez. 2017.
158 Disponível em: <https://www.playerauctions.com/wow-account/>. Acesso em: 15 dez.
2017.
159 Cf. Relatório do GAO, op. cit. (nota 8), p. 4-5.
160 CAMP, Bryan, The play’s the thing: A theory of taxing virtual worlds, Hastings Law
Journal, v. 59, n. 1, 2007, p. 7. Disponível em SSRN:
<https://ssrn.com/abstract=980693>. Acesso em: 15 dez. 2017.
161 LEDERMAN, Leandra, op. cit., p. 1630. Os termos de serviço continuam com este
mesmo formato. Disponível em: <https://www.lindenlab.com/tos>. Acesso em: 15 dez.
2017.
162 HUANG, Byron M., op. cit., p. 236-237.
163 LEDERMAN, Leandra, op. cit., p. 1633-1649.
164 Cf. LEDERMAN, Leandra, EBay’s Second Life: when should virtual earnings bear real
taxes?, 118 Yale L.J. Pocket Part 136 (2009), p. 136. Disponível em:
<http://thepocketpart.org/2008/01/26/lederman.html>. Acesso em: 15 dez. 2017.
165 Em sua versão mais atual, vide perguntas 447 e 607 do “Perguntão 2017”. Disponível
em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/interface/cidadao/irpf/2017/perguntao/pir-pf-2017-
perguntas-e-respostas-versao-1-1-03032017.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
166 Cf. POLIZELLI, Victor B. O princípio da realização da renda: reconhecimento de
receitas e despesas para fins do IRPJ. São Paulo: IBDT/Quartier Latin, 2012. p. 266-270.
167 CAMP, Bryan, The play’s the thing: A theory of taxing virtual worlds, Hastings Law
Journal, v. 59, n. 1, 2007, p. 50-54. Disponível em SSRN:
<https://ssrn.com/abstract=980693>. Acesso em: 15 dez. 2017.
168 CAMP, Bryan, op. cit., p. 45.
169 Vide art. 117 do RIR.
170 CAMP, Bryan, The play’s the thing: A theory of taxing virtual worlds, Hastings Law
Journal, v. 59, n. 1, 2007, p. 60-61. Disponível em SSRN:
<https://ssrn.com/abstract=980693>. Acesso em: 15 dez. 2017.
171 Seto é um dos que defendem a tributação dentro do mundo virtual, sem dependência da
regra de retirada. Cf. SETO, Theodore P.,When is a game only a game?: The taxation of

1853
virtual worlds (2008), Loyola-LA Legal Studies Paper n. 2008-24, p. 13. Disponível em
SSRN: <https://ssrn.com/abstract=1220923>. Acesso em: 15 dez. 2017.
172 CHUNG, Steven S., Real taxation of virtual commerce, Virginia Tax Review, v. 28, n. 3,
2008, p. 116. Disponível em SSRN: <https://ssrn.com/abstract=1097793>. Acesso em: 15
dez. 2017.
173 OBERSON, Xavier, Taxing Robots? From the Emergence of an Electronic Ability to Pay
to a Tax on Robots or the Use of Robots, 9 World Tax J. (2017), Journals IBFD, p. 247-
261. Acesso em: 15 dez. 2017.
174 The robot that takes your job should pay taxes, says Bill Gates. Vide
<https://qz.com/911968>. Acesso em: 15 dez. 2017.
175 Relatório que contém recomendações à Comissão sobre disposições de Direito Civil
sobre Robótica (2015/2103(INL)), A8-0005/2017.
176 Relatório que contém recomendações à Comissão sobre disposições de Direito Civil
sobre Robótica (2015/2103(INL)), A8-0005/2017, p. 5.
177 Segundo o Wikipedia, as três diretivas que Asimov fez implantarem-se nos “cérebros
positrônicos” dos robôs em seus livros são: (i) 1ª Lei: Um robô não pode ferir um ser
humano ou, por inação, permitir que um ser humano sofra algum mal; (ii) 2ª Lei: Um robô
deve obedecer às ordens que lhe sejam dadas por seres humanos exceto nos casos em que
tais ordens entrem em conflito com a Primeira Lei; e (iii) 3ª Lei: Um robô deve proteger
sua própria existência desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira ou
Segunda Leis. Mais tarde Asimov acrescentou a “Lei Zero”, acima de todas as outras: um
robô não pode causar mal à humanidade ou, por omissão, permitir que a humanidade sofra
algum mal.
178 Segundo o Relatório, dois pontos importantes justificam esta abordagem. Primeiro, os
robôs dotados de maior autonomia podem deixar de ser encarados como sendo simples
instrumentos nas mãos de outros intervenientes (como o fabricante, o operador, o
proprietário, o utilizador etc.), dificultando a atribuição de responsabilidade. Segundo,
embora haja normas de responsabilização do fabricante em casos de defeitos de fábrica,
um robô com autonomia cognitiva pode tornar bastante difícil identificar a parte
responsável para prestar a indenização e reparar os danos causados. Relatório que contém
recomendações à Comissão sobre disposições de Direito Civil sobre Robótica
(2015/2103(INL)), A8-0005/2017, itens AB-AF Q dos Considerandos, p. 7-8.
179 Relatório que contém recomendações à Comissão sobre disposições de Direito Civil
sobre Robótica (2015/2103(INL)), A8-0005/2017, item “f” das sugestões, p. 20.
180 OBERSON, Xavier, op. cit., p. 249.
181 Para ficar apenas nos dados levantadas pelo relatório europeu aqui comentado, a
Comissão estima que a Europa pode enfrentar uma falta de até 825.000 profissionais das
áreas de tecnologia da informação e comunicação e também aponta que 90% dos
empregos exigirão, no mínimo, competências digitais mínimas. Cf. Relatório..., op. cit.
(nota 23), item 41, p. 16.
182 FREY, Carl Benedikt; OSBORNE, Michael A., The future of employment: how
susceptible are jobs to computerisation?, Research Paper, 2013, Disponível em:
<http://www.oxfordmartin.ox.ac.uk/downloads/academic/

1854
The_Future_of_Employment.pdf>, Acesso em: 15 dez. 2017, p. 38-39. Para quem tiver
interesse mais específico nas previsões, informamos que o Apêndice desse trabalho
apresenta uma lista de todas as profissões com a indicação da probabilidade de sua
substituição por robôs e congêneres.
183 A única diferença é que, em termos de processamento de informações, a atividade de
compliance fiscal envolve uma visão linear da legislação guiada pelos fatos, ao passo que
a atividade de planejamento tributário envolve um raciocínio de trás para a frente que
parte da legislação em busca de premissas legais e de fato que possam justificar uma certa
carga tributária almejada. Cf. SUSSKIND, Richard; SUSSKIND, Daniel. The future of
professions: how technology will transform the work of human experts. Oxford: Oxford
University Press, 2015. p. 88-89.
184 É importante salientar que a sugestão de atribuição de personalidade jurídica aos robôs,
feita no relatório europeu aqui citado, op. cit. (nota 23), também enfrenta críticas de
autores que, assim como Luciano Floridi, sustentam que os problemas de responsabilidade
civil devem continuar a ser atribuídos às pessoas que detenham ou controlem os robôs. A
discussão fantasiosa sobre um mundo no qual robôs são qualificados como uma forma de
“pessoa” consiste, na visão do autor, em uma distração irresponsável, porquanto se
constrói diante de um contexto conceitual equivocado. Soluções inovadoras devem ser
buscadas, mas o autor não diz quais são. Cf. FLORIDI, Luciano, Robots, jobs, taxes and
responsibility, Philosophy & Technology, 30, 2017, p. 4.
185 Relatório que contém recomendações à Comissão sobre disposições de Direito Civil
sobre Robótica (2015/2103(INL)), A8-0005/2017, item 1, p. 8.
186 OBERSON, Xavier, op. cit., p. 250.
187 TADA, Koki, Japan chapter. In BENSOUSSAN, Alain; BENSOUSSAN, Jeremy
(Coords.). Comparative handbook: robotic technologies law. Bruxelas: Larcier, 2016. p.
193.
188 Lei coreana n. 9.014/2008, art. 2º, (1): “1. The term ‘intelligent robot’ means a
mechanical device that perceives the external environment for itself, discerns
circumstances, and moves voluntarily”. Disponível em:
<http://elaw.klri.re.kr/eng_mobile/ viewer.do?hseq=17399&type=part&key=18>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
189 MELCHIOR, Silvia Regina Barbuy. Brazil chapter. In BENSOUSSAN, Alain;
BENSOUSSAN, Jeremy (Coords.). Comparative handbook: robotic technologies law.
Bruxelas: Larcier, 2016. p. 14.
190 ABBOTT, Ryan, BOGENSCHNEIDER, Bret N. Should Robots Pay Taxes? Tax Policy
in the Age of Automation, Harvard Law & Policy Review, 2017, p. 5. Disponível em
SSRN: <https://ssrn.com/abstract=2932483>. Acesso em: 15 dez. 2017.
191 Relatório que contém recomendações à Comissão sobre disposições de Direito Civil
sobre Robótica (2015/2103(INL)), A8-0005/2017, item “k”, p. 4.
192 FLORIDI, Luciano. Robots, jobs, taxes and responsibility, Philosophy & Technology, 30,
2017, p. 3.
193 OBERSON, Xavier, op. cit., p. 250-251.
194 Cf. SELIGMAN, Edwin R. Essays in taxation. 10. ed., reimpr. de 1969. New York:

1855
Augustus M. Kelley, p. 145-220.
195 Cf. TILBERY, Henry, Imposto de renda pessoas jurídicas: integração entre sociedade e
sócios. São Paulo: IBDT/Atlas, 1985.
196 OBERSON, Xavier, op. cit., p. 254.
197 De acordo com a legislação brasileira atual, o único caso de renda imputada é aquele do
art. 49, § 1º do RIR/99, que diz respeito à cessão gratuita de uso de imóvel para pessoas
que não sejam o cônjuge ou parentes de primeiro grau do proprietário.
198 Ao menos por enquanto, caberia ao dono do robô pagar o imposto de renda devido pelo
robô, é claro. OBERSON, Xavier, Taxing Robots? From the Emergence of an Electronic
Ability to Pay to a Tax on Robots or the Use of Robots, 9 World Tax J. (2017), Journals
IBFD, p. 254.
199 Relatório que contém recomendações à Comissão sobre disposições de Direito Civil
sobre Robótica (2015/2103(INL)), A8-0005/2017, item 1, p. 8. Vide, também, a nota de
rodapé 33 supra neste artigo e o texto que a introduz.
200 OBERSON, Xavier, op. cit., p. 255.
201 Abbott e Bogenschneider apresentam cinco propostas distintas (eliminar deduções fiscais
pelos investimentos em robôs, eliminar a tributação sobre a folha de salários, criar um
tributo específico em razão de demissões, criar um novo imposto sobre os lucros com
alíquotas progressivas em razão do lucro por empregado e aumentar a alíquota do imposto
de renda de pessoas jurídicas). ABBOTT, Ryan, BOGENSCHNEIDER, Bret N., Should
Robots Pay Taxes? Tax Policy in the Age of Automation, Harvard Law & Policy Review,
2017, p. 27-33. Disponível em SSRN: <https://ssrn.com/abstract=2932483>. Acesso em:
15 dez. 2017.
202 As duas questões são mencionadas rapidamente por Oberson. OBERSON, Xavier,
Taxing Robots? From the Emergence of an Electronic Ability to Pay to a Tax on Robots or
the Use of Robots, 9 World Tax J. (2017), Journals IBFD, p. 255.
203 Vide mais detalhes em <okhaos.com/plantoids>. Acesso em: 15 dez. 2017.
204 OBERSON, Xavier, op. cit., p. 257.
205 Relatório que contém recomendações à Comissão sobre disposições de Direito Civil
sobre Robótica (2015/2103(INL)), A8-0005/2017, item 1, p. 8. Vide, também, a nota de
rodapé 33 supra neste artigo e o texto que a introduz.
206 Essa insuficiência já foi discutida no tópico anterior (2.2.1).
207 ABBOTT, Ryan, BOGENSCHNEIDER, Bret N., Should Robots Pay Taxes? Tax Policy
in the Age of Automation, Harvard Law & Policy Review, 2017, p. 27-33. Disponível em
SSRN: <https://ssrn.com/abstract=2932483>. Acesso em: 15 dez. 2017.
208 Idem, p. 30-32.
209 Vide <http://www.koreatimes.co.kr/www/news/tech/2017/08/133_234312.html>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
210 A Medida Provisória n. 774/2017 pretendeu retirar este setor do regime alternativo de
contribuição previdenciária sobre a receita bruta (CPRB), mas foi posteriormente
revogada. Atualmente este incentivo à tecnologia continua intacto.
211 Oberson dedica um tópico específico a este assunto, no qual seu ponto de partida é o

1856
robô como entidade detentora de personalidade jurídica e que, ao fornecer bens e serviços
a terceiros, deveria ser contribuinte de IVA. Cf. OBERSON, Xavier, op. cit., p. 256-257.
212 Advogado em São Paulo.
213 Advogada em São Paulo e pós-graduanda em direito tributário pelo Instituto Brasileiro
de Direito Tributário (IBDT).
214 OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report, OECD/620 Base Erosion and Profit Shifting Project, OECD Publishing,
Paris.
215 OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report, OECD/620 Base Erosion and Profit Shifting Project, OECD Publishing,
Paris.
216 OECD (2015). Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1.
217 Comissão Europeia. Communication from the Commission to the European Parliament
and the Council. A Fair and Efficient Tax System in the European Union for the Digital
Single Market. Bruxelas, 2017.
218 Comissão Europeia. Questions and Answers on the package of corporate tax reforms.
Disponível em: <http://europa.eu/rapid/press-release_MEMO-16-3488_en.htm;
https://ec.europa.eu/taxation_customs/business/company-tax/common-consolidated-
corporate-tax-base-ccctb_en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
219 Income Tax Department, Government of India. The Finance Bill, 2016. Disponível em:
<http://www.incometaxindia.gov.in/Budgets%20and%20Bills/2016/Finance_Bill_2016.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
220 Ministry of Finance of Japan. Japan Tax Reform. FY 2015. Disponível em:
<http://www.mof.go.jp/english/tax_policy/publication/tax006/E27_all.pdf>. Acesso em:
24 nov. 2017. Acesso em: 15 dez. 2017.
221 ELENIEWSKI, Joe; NAGODE, Doug; TREBBY, James. Trends in State Taxation:
Consumption Tax versus Income Tax, Journal of State Taxation, Deloitte, 2014, p. 31.
Disponível em: <https://www2.deloitte.com/content/dam/Deloitte/us/Documents/Tax/us-
tax-current-trends-in-state-taxation-consumption-tax-versus-income-tax-010915.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
222 PORTER, Eduardo. The tax reform America needs (and probably won’t get), The New
York Times, 1º-8-2017. Disponível em:
<https://www.nytimes.com/2017/08/01/business/trump-tax-reform.html>. Acesso em: 15
dez. 2017.
223 U.S. Congress. Tax Reform Act of 1986.
224 POMERLEAU, Kylie; JAHNSEN, Kari. Corporate Income Tax Rates around the World,
2017. Tax Foundation. 2017. Disponível em: <https://taxfoundation.org/corporate-
income-tax-rates-around-the-world-2017/>. Acesso em: 14 dez. 2017.
225 A better way. Our vision for a confident America, 2016. Disponível em:
<https://abetterway.speaker.gov/_assets/pdf/ABetterWay-Tax-PolicyPaper.pdf>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
226 CLAUSE, Kimberly. The Washington Center for Equitable Growth. Profit shifting and

1857
US. Corporate tax policy reform. 2016. Disponível em:
<http://equitablegrowth.org/report/profit-shifting-and-u-s-corporate-tax-policy-reform>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
227 Receita Federal do Brasil. Carga tributária 2015. Disponível em:
<http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-
aduaneiros/estudos-e-estatisticas/carga-tributaria-no-brasil/ctb-2015.pdf/view>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
228 O item 17.25 – Inserção de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e
publicidade, em qualquer meio (exceto em livros, jornais, periódicos e nas modalidades de
serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita) foi
incluído na lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003 pela Lei n. 157/2016.
229 O Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo manifestou-se recentemente sobre o
assunto no julgamento do Auto de Infração n. 4078422-8, realizado em 17 de maio de
2017, cujo acórdão foi assim ementado: “ICMS. FALTA DE PAGAMENTO.
VEICULAÇÃO DE PUBLICIDADE. INTERNET. Demonstrado que a atividade
realizada pela Recorrente é de veiculação de propaganda e publicidade na Internet, a qual
se caracteriza como prestação de serviço de comunicação, havendo, portanto, incidência
do ICMS. Veiculação de propaganda e publicidade na Internet é sujeita ao ISS somente
após a eficácia da Lei Complementar Federal n. 157/2016. Inaplicabilidade da imunidade
da EC n. 42/2003, por falta de expressa menção. Não configurada mera intermediação,
mas, sim, efetivo domínio direto sobre o espaço publicitário, havendo prestação de serviço
de comunicação, constituindo obrigação de fazer. Não caracterização de SVA, visto não se
tratar de complementação de serviço de telecomunicação. Impossibilidade de lançamento
contra a Filial, em respeito à autonomia de estabelecimentos. Impossibilidade de
lançamento relativo ao serviço ‘DoubleClick’, por falta de instrução probatória. Recurso
Ordinário conhecido e parcialmente provido, excluindo do AIIM as operações realizadas
pela Filial da Recorrente e as operações relativas ao serviço ‘DoubleClick’”. O tribunal
também se manifestou sobre o assunto no julgamento do Auto de Infração n. 4037765-9,
em 19 de abril de 2017, cujo acórdão foi ementado da seguinte forma: “ICMS. NÃO
EMISSÃO DE DOCUMENTOS FISCAIS EM SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO
(VEICULAÇÃO DE PUBLICIDADE NA INTERNET). FALTA DE INSCRIÇÃO NO
CADASTRO DE CONTRIBUINTES DO ICMS. NÃO
FORNECIMENTO/TRANSMISSÃO DE ARQUIVO ELETRÔNICO À SEFAZ. – A
questão controvertida nos autos é se a veiculação de publicidade na internet configura ou
não serviço de comunicação, sujeito à incidência de ICMS. – Essa questão é objeto de
conflito de competência entre Estados e Municípios, pois o fisco paulista entende pela
incidência de ICMS sobre a veiculação de publicidade na internet e o fisco paulistano
entende pela incidência de ISS. – Nos termos do artigo 146, I, da Constituição Federal, os
conflitos de competência entre os entes federados devem ser dirimidos por lei
complementar. – A novel Lei Complementar n. 157/2016, ao modificar a lista de serviços
anexa à Lei Complementar n. 116/2003, solucionou o conflito de competência em favor
do fisco municipal, na medida em que prevê que a inserção de propaganda e publicidade
em qualquer meio é fato gerador do ISS. – RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO. AIIM
IMPROCEDENTE”.
230 A Lei n. 157/2016 incluiu na lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003 o item: 1.09 –

1858
Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por
meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos (exceto a
distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de Acesso Condicionado, de que
trata a Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011, sujeita ao ICMS).
231 Os municípios de São Paulo e do Rio de Janeiro recentemente regulamentaram a
cobrança de ISS sobre a atividade de streaming com a Lei n. 16.757, de 14 de novembro
de 2017 (SP) e a Lei n. 6.263, de 11 de outubro de 2017 (RJ). Na mesma linha, está em
tramitação na Câmara Municipal de Belo Horizonte o Projeto de Lei n. 387/2017, que
prevê a tributação desta atividade.
232 Em estudo publicado em 2015, a PricewaterhouseCoopers fez uma projeção de que, até
2025, os setores-chave da economia compartilhada (viagens, mobilidade urbana, finanças,
recrutamento de pessoal e streaming de música e vídeo) irão movimentar
aproximadamente U$ 335 bilhões no mundo. Disponível em:
<https://www.pwc.com/us/en/technology/publications/assets/pwc-consumer-intelligence-
series-the-sharing-economy.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
233 OLIVEIRA, Maurine Morgan Pimentel de. O conflito de competência entre o ISS e o
ICMS à luz do RE 688223/PR. In GOMES, Marcos Lívio; SCHOUERI, Luís Eduardo
(Coords.). A tributação internacional na era pós-BEPS. Soluções globais e peculiaridades
de países em desenvolvimento. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016. v. III, p. 243-244
234 COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária. Exiquibilidade da lei
tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 19.
235 ZILVETI, Fernando Aurelio. Simplicius Simplicissimus – os limites da praticabilidade
diante do princípio da capacidade contributiva. In. COSTA, Alcides Jorge; SCHOUERI,
Luís Eduardo; BONILHA, Paulo Celso Bergfstrom (Coords.). Revista Direito Tributário
Atual, n. 22, Dialética, São Paulo, 2008, p. 184-185.
236 Idem, p. 188.
237 COSTA, Regina Helena, op. cit., p. 379.
238 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 411.
239 GASSEN, Valcir; SILVA, Rafael Santos de Barros e. Quem pode menos paga mais:
tributação sobre o consumo no Brasil e democracia, Revista Brasileira de Direito, IMED,
v. 7, n. 2, 2011, p. 190-191.
240 ZILVETI, Fernando Aurelio. Simplicius Simplicissimus – os limites da praticabilidade
diante do princípio da capacidade contributiva. In COSTA, Alcides Jorge; SCHOUERI,
Luís Eduardo; BONILHA, Paulo Celso Bergfstrom (Coords.), Revista Direito Tributário
Atual n. 22, Dialética, São Paulo, 2008, p. 180.
241 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 407.
242 GASSEN, Valcir; SILVA, Rafael Santos de Barros e. Quem pode menos paga mais:
tributação sobre o consumo no Brasil e democracia, Revista Brasileira de Direito, IMED,
v. 7, n. 2, 2011, p. 193.
243 Receita Federal do Brasil. Carga tributária 2015. Disponível em:
<http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-
aduaneiros/estudos-e-estatisticas/carga-tributaria-no-brasil/ctb-2015.pdf/view>. Acesso
em: 15 dez. 2017.

1859
244 GASSEN, Valcir; SILVA, Rafael Santos de Barros e, op. cit., p. 194.
245 Doutorando e Mestre em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo. Master of
Laws (LLM) em tributação internacional na Universidade de Viena. Membro do Comitê
Acadêmico do Curso de Especialização em Direito Tributário Internacional do IBDT.
Coordenador do Curso de Extensão em Direito Tributário Internacional do IBDT.
Professor Assistente do Mestrado em Direito Tributário Internacional do IBDT. Professor
convidado em cursos de pós-graduação. Advogado em São Paulo.
246 Tax Cuts and Jobs Act – Conference Agreement.
247 Essa tendência de migração para regimes territoriais de tributação da renda pode ser
confirmada pelo fato de que, atualmente, 29 dos 35 países membros da OCDE concedem
isenção total ou parcial de imposto de renda para os dividendos provenientes do exterior
(Cf. PHUA, Stephen. Putting Territoriality in Its Place: Singapore’s Perspective on Tax
Competitiveness, Bulletin for International Taxation, v. 71. n. 6a, Amsterdam, IBFD,
2017, p. 53; PWC. Evolution of Territorial Tax Systems in the OECD, 2003, p. 1-15).
248 AVI-YONAH, Reuven. International Tax as International Law – An Analysis of the
International Tax Regime. New York: Cambridge. University Press, 2007, p. 25.
249 Confira-se: “It follows that, in order to a restriction on the freedom of establishment to
be justified on the ground of prevention of abusive practices, the specific objective of such
a restriction must be to prevent conduct involving the creation of wholly artificial
arrangements which do not reflect economic reality (...)”. (Cadbury Schweppes, C-196/04,
EU:C:2006:544, para. 51).
250 US Trump Presidency, 2017 Tax Reform for Economic Growth and American Jobs: The
Biggest Individual And Business Tax Cut In American History (26 April 2017).
Disponível em: <https://americansfortaxfairness.org/wp-content/uploads/White-House-
One-Pager-on-Trump-Plan.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
251 Budget of the US Government for Fiscal Year 2018 (A New Foundation For American
Greatness). Disponível em:
<https://www.whitehouse.gov/sites/whitehouse.gov/files/omb/budget/fy2018/budget.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
252 SANTOS, Ramon Tomazela. US Tax Reform: The Potential Tax Implications for
Brazilian Taxpayers, Bulletin for International Taxation, v. 71, n. 6a, Amsterdam, IBFD,
2017, p. 82.
253 GRECO, Marco Aurélio. Crise do imposto sobre a renda na sua feição tradicional. In:
REZENDE, Condorcet (Coord.). Estudos Tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p.
417-431.
254 PHUA, Stephen. Putting Territoriality in Its Place: Singapore’s Perspective on Tax
Competitiveness, Bulletin for International Taxation, v. 71. n. 6a, Amsterdam, IBFD,
2017, p. 54.
255 AVI-YONAH, Reuven S. Back to the future? The potential revival of territoriality,
Bulletin for International Taxation, v. 62, n. 10, Amsterdam, IBFD, 2008, p. 472.
256 SHAVIRO, Daniel N. Fixing U.S. International Taxation. New York: Oxford University
Press, 2014. p. 35.
257 A “regra anti-elisiva específica”, também chamada de “regra de prevenção”, tipifica

1860
atos e negócios jurídicos comumente praticados pelos contribuintes para reduzir a carga
tributária (Cf. TÔRRES, Heleno Taveira. Medidas contra a evasão e elusão fiscal
internacional no direito brasileiro. In: ALTAMIRANO, Alejandro C. Tôrres e UCKMAR,
Victor (Coords.). Impuestos sobre el comercio internacional. Buenos Aires: Ábaco, 2003.
p. 924).
258 Na dicção de Reuven Avi-Yonah: “In the US, this can be shown by the trend of inversion
transactions, in which US MNEs reincorporated in Bermuda in part to avoid Subpart F.
The trend was stopped by legislation in 2004, but the competitiveness issue continues”
(AVI-YONAH, Reuven S. Back to the future? The potential revival of territoriality,
Bulletin for International Taxation, v. 62, n. 10, Amsterdam, IBFD, 2008, p. 472).
259 LÜDICKE, Jürgen. Exemption and Tax Credit in German Tax Treaties – Policy and
Reality. In: BAKER, Philip e BOBBETT, Catherine (Coords.). Tax Polymath: A Life in
International Taxation. Amsterdam: IBFD, 2011. p. 281.
260 PIRES, Manuel. International Juridical Double Taxation of Income. Deventer: Kluwer
Law, 1989. p. 176.
261 LÜDICKE, Jürgen, op. cit., p. 281.
262 Reuven Avi-Yonah sintetiza o argumento: “The usual arguments against abolishing
deferral are that it will put US multinationals at a competitive disadvantage, that it will
lead to inefficient outcomes because less efficient foreign MNEs will obtain projects that
should have been owned by more efficient US MNEs, and that it will lead to migration of
US MNEs to other countries and to the establishment of new MNEs in other jurisdictions
with more favorable tax rules” (AVI-YONAH, Reuven S. Back From de Dead: How to
Prevent Transfer Pricing Enforcement, Law & Economics Working Papers n. 85.
Michigan: University of Michigan Law School, 2013, p. 3).
263 SCHOUERI, Luís Eduardo. Tributação Internacional das Empresas Nacionais e
Desenvolvimento: Novos Rumos?. In: SANTI, Eurico Marcos Diniz de (Coord.).
Tributação e Desenvolvimentos – Homenagem ao Professor Aires Barreto. São Paulo:
Quartier Latin, 2011. p. 483-484.
264 Sobre o tema, vide: AVI-YONAH, Reuven S. Advanced Introduction to International
Tax Law. Cheltenham: Edward Elgar Publishing, 2015. p. 94.
265 STIGLITZ, Joseph E. Economics of the Public Sector. 3th edition. New York/London:
WW. Norton, 2000. p. 663.
266 AVI-YONAH, Reuven S. Back to the future? The potential revival of territoriality,
Bulletin for International Taxation, v. 62, n. 10, Amsterdam, IBFD, 2008, p. 473. Na
mesma linha: AVI-YONAH, Reuven S.; MAZZONI, Gianluca. The Trump Tax Reform
Plan: Implications for Europe, Bulletin for International Taxation, v. 71, n. 6a,
Amsterdam, IBFD, 2017, p. 11.
267 Segundo Reuven Avi-Yonah: “This trend has its attendant problems as well. The main
argument against the US dividend exemption proposal is that, like any move in the
direction of territoriality, it puts more pressure on the source rules and on transfer
pricing” (AVI-YONAH, Reuven S., op. cit., p. 473).
268 TAVOLARO, Agostinho Toffoli. Tributação Internacional: Elementos de Conexão. In:
SOUZA, Arivaldo Santos de et al. (Coords.). Direito Tributário: Estudos Avançados em

1861
Homenagem a Edvaldo Brito. São Paulo: Atlas, 2014. p. 186-188.
269 ROTHMANN, Gerd Willi. Tributação Internacional sem Sujeito Passivo: uma Nova
Modalidade do Imposto de Renda sobre Ganhos de Capital?. Grandes Questões Atuais do
Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 2006. v. 13, p. 108-109.
270 SCHOUERI, Luís Eduardo. Princípios no Direito Tributário Internacional:
Territorialidade, Fonte e Universalidade. In: FERRAZ, Roberto (Coord.). Princípios e
Limites da Tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 336-337.
271 O exemplo acima pretende apenas distinguir os conceitos de fonte de produção e fonte de
pagamento, motivo pelo qual a sua estrutura foi simplificada. Porém, em casos concretos,
pode existir ampla divergência a respeito da natureza jurídica da atividade de
disponibilização de data center desenvolvida pela pessoa jurídica no Brasil (Cf. XAVIER,
Alberto. Da Tributação dos Rendimentos Pagos a Titulares de Data Center Residentes no
Exterior, Revista Dialética de Direito Tributário n. 234, São Paulo, Saraiva, 2015, p. 7-
14).
272 Confira-se o entendimento de Eric Kemmeren: “The cause of the royalty income
received is the creation of the intellectual property. Especially with respect to royalty
income, the overwhelming relevance of the intellectual element in the production of
income is obvious. The state where the intellectual element is found is the state of origin of
the royalty income. Through exploitation of the intangible, the producer of the intangible
creates income. The user of the intangible does not produce the royalty income, at least
not predominantly. He only uses the intellectual element of someone else producing
another item of income, for example, business income if he uses the intangible in his own
enterprise” (KEMMEREN, Eric C. C. M. Principle of Origin in Tax Conventions – A
Rethinking of Models. Dongen: Pijnenburg Vormgevers/Kemmeren, 2001. p. 452).
273 AVI-YONAH, Reuven. International Tax as International Law – An Analysis of the
International Tax Regime. New York: Cambridge University Press. 2007, p. 44-45.
274 AVI-YONAH, op. cit.
275 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. p. 269.
276 STORCK, Alfred; ZEILER, Alexander. Beyond the OECD Update 2014: Changes to the
Concepts of Permanent Establishments in the Light of the BEPS Discussion. In: LAND,
Michael et al. (Coords.). The OECD Model Convention and its Update 2014. Vienna:
Linde, 2015. p. 242-268.
277 BIANCO, João Francisco. O estabelecimento permanente na legislação do imposto de
renda. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do Direito
Tributário. São Paulo: Dialética, 2005. v. 9, p. 298-313.
278 Optou-se pela expressão “padrão arm’s length”, no lugar de “princípio arm’s length”, em
razão da ausência de natureza principiológica direta no “arm’s length”, que deflui do
princípio da igualdade. (Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. O Arm’s Length como Princípio
ou como Standard Jurídico. In: SCHOUERI, Luís Eduardo e BIANCO, João Francisco
(Coords.). Estudos de Direito Tributário em Homenagem ao Professor Gerd Willi
Rothmann. São Paulo: Quartier Latin, 2016. p. 216; ROTHMANN, Gerd Willi. Standard
Jurídico. LIMONGI FRANÇA, Rubens (Coord.). Enciclopédia Saraiva do Direito. São
Paulo: Saraiva, 1977. v. 7, p. 500-501).

1862
279 AVI-YONAH, Reuven S. Advanced Introduction to International Tax Law. Cheltenham:
Edward Elgar Publishing, 2015. p. 33.
280 GREGORIO, Ricardo Marozzi. Restrições da Comparabilidade, Margens
Predeterminadas e Liberdade da Escolha de Métodos. In: SCHOUERI, Luís Eduardo
(Coord.). Tributos e Preços de Transferência. São Paulo: Dialética, 2013. v. 4, p. 354-355.
281 OKUMA, Alessandra. As Convenções para Evitar Dupla Tributação e Elisão Fiscal e os
Meios de Solução de Controvérsia. TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário
Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2007. v. IV, p. 421.
282 Graduado em Administração de Empresas pela EAESP-FGV e em Direito pela PUC-SP.
Possui pós-graduação em Direito Tributário PUC-SP e LLM em Tributação Internacional
pela Universidade da Florida (EUA – John John W. Thatcher Graduate Tax Scholarship).
Foi associado estrangeiro do escritório Davis Polk & Wardwell (Nova York). Advogado
em São Paulo.
283 ALMEIDA, R. De FHC a Lula, cinco propostas de reforma tributária fracassaram, IG –
Último Segundo, 2-12-2010. Disponível em:
<http://ultimosegundo.ig.com.br/governolula/de-fhc-a-lula-cinco-propostas-de-reforma-
tributaria-fracassaram/n1237837177192.html>. Acesso em: 15 dez. 2017.
284 KURZWEIL, Ray. The Law of Accelerating Returns, 2001. Disponível em
<http://www.kurzweilai.net/the-law-of-accelerating-returns>. Acesso em: 15 dez. 2017.
285 MCKINSEY & COMPANY. Disruptive technologies: Advances that will transform life,
business, and the global economy. Disponível em
<https://www.mckinsey.com/~/media/McKinsey/Business%20Functions/McKinsey%20Digital/Our%20In
Acesso em: 15 dez. 2017.
286 VALOR ECONÔMICO. Nova dimensão. Valor Econômico, 19.9.2017. Disponível em
<http://www.valor.com.br/empresas/4946284/nova-dimensao>. Acesso em: 15 dez. 2017.
287 WATANABE, Marta. Mudanças estruturais devem afetar arrecadação. Valor Econômico,
São Paulo, 19-9-2017.
288 CÂMARA DOS DEPUTADOS; HAULY, L. C. Principais linhas da proposta de reforma
tributária. Brasília: 2017. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/comissoes/comissoes-temporarias/especiais/55a-legislatura/reforma-
tributaria/documentos/outros-documentos/resumo-hauly>. Acesso em: 15 dez. 2017.
289 Doutorando e Mestre em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade
de São Paulo – USP. Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo. Conselheiro do
Conselho Municipal de Tributos de São Paulo. Professor Convidado de cursos da Pós-
Graduação do IBDT, EPD, FBT, GVlaw e FGV Management. Advogado em São Paulo.
290 Em que pese o intenso debate doutrinário acerca da melhor terminologia para se referir
aos “deveres instrumentais tributários”, a nosso ver, não há óbices para que se utilize a
expressão “obrigações acessórias”, desde que cientes de que: não se trata de uma
“obrigação” na acepção do Direito Privado, em razão de inexistir qualquer caráter
patrimonial e não estar presente o predicado da transitoriedade, bem como o predicativo
“acessória” igualmente não guarda referência com seu homônimo em Direito Privado,
uma vez que os deveres instrumentais guardam relativa independência. De nossa parte,
adotaremos o termo “deveres instrumentais tributários” ao longo deste estudo, certos de

1863
que a terminologia empregada condiz precisa e adequadamente com o instituto a que se
refere, pois a adoção da expressão “dever instrumental tributário” apresenta, como
virtudes, as seguintes características: (i) pela utilização do signo “dever”, explicita sua
natureza de dever administrativo, sugerindo que sua exigência pela Administração Pública
deva obedecer, em sua estrutura, aos pressupostos de validade para a instituição dos atos
administrativos; (ii) pelo uso do predicativo “instrumental”, afasta a ideia de dependência
em relação à obrigação principal e, ao mesmo tempo, enfatiza sua função precípua de
instrumentalizar a arrecadação e fiscalização dos tributos; e (iii) pelo uso do complemento
“tributário”, evidencia sua sujeição, por força da matéria que regula, ao regime jurídico
tributário, evidentemente naquilo que lhe for cabível. Cf. TAKANO, Caio Augusto.
Deveres instrumentais dos contribuintes: fundamentos e limites. São Paulo: Quartier
Latin, 2017. p. 102-115.
291 Cf. FIESP. O peso da burocracia tributária na indústria de transformação.
Departamento de Competitividade e Tecnologia, 2012. Disponível em:
<http://www.fiesp.com.br/indices-pesquisas-e-publicacoes/o-peso-da-burocracia-
tributaria-na-industria-de-transformacao-2012/>. Acesso em: 15 dez. 2017.
292 Cf. TAKANO, Caio Augusto. Deveres instrumentais dos contribuintes: fundamentos e
limites. São Paulo: Quartier Latin, 2017. p. 27.
293 Cf. SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Lançamento tributário. 3. ed. São Paulo: Saraiva,
2010. p. 100.
294 Cf. VILLEGAS, Hector B. Curso de direito tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1980. p. 145-146.
295 Eis o teor da Ementa no que parece paradigmático: “1. A despeito do reconhecimento da
independência da nominada obrigação tributária acessória, essa obrigação só pode ser
exigida pelo Fisco para instrumentalizar ou viabilizar a cobrança de um tributo, ou seja,
deve existir um mínimo de correlação entre as duas espécies de obrigações que justifique a
exigibilidade da obrigação acessória” (STJ, Recurso Especial 1.096.712/MG, 1ª Turma,
Rel. Min. Denise Arruda, j. 2-4-2009). Neste excerto, nada mais fez a Ministra do que
reconhecer o “interesse na arrecadação ou na fiscalização de tributos” como limite
balizador da instituição dos deveres instrumentais, não se reconhecendo tal interesse à
míngua da correlação entre dever instrumental e tributo exigido.
296 Sobre o tema, cf. TAKANO, Caio Augusto. Deveres instrumentais dos contribuintes:
fundamentos e limites. São Paulo: Quartier Latin, 2017. p. 116-145.
297 “Art. 113. (...) § 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por
objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou
da fiscalização dos tributos.”
298 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica.
Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 131. Neste sentido, vale recordar o escólio de Vanoni
pelo qual “Toda relação de direito tem uma função prática que o direito coloca em
evidência particular, porquanto é exatamente para assegurar a obtenção de determinadas
finalidades, consideradas lícitas e dignas de proteção, que o ordenamento jurídico
empresta reconhecimento a relações da vida social e, tutelando-as, lhes atribui a categoria
de relações jurídicas”. Cf. VANONI, Ezio. Natureza e interpretação das Leis Tributárias.
Trad. Rubens Gomes de Souza. Rio de Janeiro: Edições Financeiras. p. 128.

1864
299 Cf. TAKANO, Caio Augusto, op. cit., p. 170-173.
300 Cf. HOUAISS, Antonio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua
portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p. 1633.
301 Cf. BARRETO, Paulo Ayres. Elisão tributária: limites normativos. Tese apresentada ao
concurso à livre-docência do Departamento de Direito Econômico e Financeiro – área de
Direito Tributário – da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo:
USP, 2008, p. 76.
302 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p.
498.
303 Cf. TAKANO, Caio Augusto. Os limites impositivos aos deveres instrumentais
tributários, Revista Direito Tributário Atual, n. 27, São Paulo: Dialética, 2012, p. 293-303.
304 Cf. MIGUEL, Luciano Garcia. O ICMS e os deveres instrumentais. In: PARISI,
Fernanda Drummond et al. (Coords.). Estudos de direito tributário em homenagem ao
professor Roque Antonio Carrazza. São Paulo: Malheiros, 2014. v. 2, p. 397-400.
305 Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Parecer inédito. São Paulo, 26-8-2010, p. 59. Apud
MIGUEL, Luciano Garcia. O ICMS e os deveres instrumentais. In: PARISI, Fernanda
Drummond et al. (Coords.). Estudos de direito tributário em homenagem ao professor
Roque Antonio Carrazza. São Paulo: Malheiros, 2014. v. 2, p. 399.
306 Cf. TAKANO, Caio Augusto, op. cit., p. 207-212.
307 Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Prefácio. In SANTELLO, Fabiana Lopes Pinto.
Direito tributário digital. Informatização digital. O uso da tecnologia no Sistema
Tributário Nacional. São Paulo: Quartier Latin, 2014. p. 13.
308 Cf. BIRD, Richard. Transparency and taxation: some preliminary reflections. In SANTI,
Eurico Marcos Diniz de (Coord.). Transparência fiscal e desenvolvimento: homenagem ao
professor Isaias Coelho. São Paulo: Quartier Latin, 2014. p. 179.
309 Cf. The Commonwealth Association of Tax Administrators. Implementing
computerisation and information technology for tax administration. London:
Commonwealth Secretariat, 2005. p. 1.
310 Tal importância é conhecida pelo Banco Mundial que, já em 2000, alertava que a
informatização fiscal, se bem planejada e implementada, poderia servir de base para
mudanças na visão, estrutura e imagem pública da Administração Tributária. Disponível
em: <http://www1.worldbank.org/prem/PREMNotes/premnote44.pdf>. Acesso em: 15
dez. 2017.
311 Sobre o assunto, cf. SANTELLO, Fabiana Lopes Pinto. Direito tributário digital.
Informatização digital. O uso da tecnologia no Sistema Tributário Nacional. São Paulo:
Quartier Latin, 2014. p. 207-269.
312 Nesse sentido, vale citar a implementação do “eSocial”, que busca unificar o envio de
informações pelo empregador em relação aos seus empregados para fins de pagamento de
diversos tributos, reduzindo, assim, os seus custos de conformidade (Disponível em:
<http://www.esocial.gov.br/Conheca.aspx>. Acesso em: 15 dez. 2017).
313 Cf. MELO, José Eduardo Soares de. Princípio da eficiência em matéria tributária. In
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Princípio da eficiência em matéria tributária
(Cadernos de Pesquisas Tributárias n. 12). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p.

1865
145-146.
314 Em rigor, os custos poderão ser ainda mais expressivos, levando em consideração que a
ausência de um prazo administrativo pode implicar um prazo muito superior de guarda de
documentos fiscais. Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 5. ed. São Paulo:
Saraiva, 2015. p. 668.
315 Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Prefácio. In SANTELLO, Fabiana Lopes Pinto.
Direito tributário digital. Informatização digital. O uso da tecnologia no Sistema
Tributário Nacional. São Paulo: Quartier Latin, 2014. p. 14.
316 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p.
500.
317 Cf. CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo:
Noeses, 2010. p. 216, Nota de rodapé n. 281.
318 Cf. BIFANO, Elidie Palma. Análise das obrigações acessórias. Estudo inédito realizado
pela Associação Comercial de São Paulo em parceria com a PricewaterhouseCoopers –
PWC. São Paulo, janeiro 2012, p. 38.
319 Cf. ROTHMANN, Gerd Willi. Tributação, sonegação e livre concorrência. In. FERRAZ,
Roberto (Coord.). Princípios e limites da tributação 2: os princípios da ordem econômica
e a tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 361-362.
320 “O Siscoserv, base de dados das importações e exportações de serviços brasileiros, foi
apontado como uma referência internacional pelas Nações Unidas. O sistema,
administrado pela Secretaria de Comércio e Serviços (SCS) do MDIC, em conjunto com a
Receita Federal do Brasil (RFB) do Ministério da Fazenda, foi apresentado aos
participantes da 5ª Reunião Multianual de Especialistas sobre Comércio, Serviços e
Desenvolvimento, realizada em Genebra, na Suíça.” Ver:
<http://www.mdic.gov.br/index.php/noticias/2624-base-de-dados-de-comercio-de-
servicos-e-apontado-como-referencia-pelas-nacoes-unidas>. Acesso em: 15 dez. 2017.
321 A exceção são as pessoas físicas residentes no País que, em nome individual, não
explorem, habitual e profissionalmente, qualquer atividade econômica de natureza civil ou
comercial, com o fim especulativo de lucro, desde que não realizem operações em valor
superior a US$ 30.000,00 (trinta mil dólares dos Estados Unidos da América), ou o
equivalente em outra moeda, no mês, conforme redação conferida ao art. 2º, inc. II, pela
Instrução Normativa RFB n. 1.391/2013.
322 Inúmeros estudos têm apontado que os custos de conformidade geram uma desigualdade
horizontal e possuem uma forte tendência à regressividade, isto é: empresas de maior porte
econômico, ainda que de uma mesma atividade, arcam, proporcionalmente, com menores
custos de conformidade, em comparação com empresas de porte menor. Esta tem sido a
conclusão tanto de estudos realizados na década de 1970 quanto no início dos anos 2000,
sejam eles realizados mundo afora ou levando em consideração a realidade brasileira, de
modo ser possível inferir que o fenômeno da regressividade está intimamente relacionado
à própria existência dos custos de conformidade, e não a aspectos extrínsecos a eles,
ligados a circunstâncias de tempo ou peculiaridades dos sistemas tributários em que os
deveres instrumentais tributários são instituídos. Sobre o tema, cf. TAKANO, Caio
Augusto. Deveres instrumentais dos contribuintes: fundamentos e limites. São Paulo:
Quartier Latin, 2017. p. 256-261.

1866
323 A nosso ver, um dever instrumental atenderá imediatamente o interesse da arrecadação,
se ligado à formalização do fato jurídico tributário, isto é, na medida em que ele for
imprescindível para a construção da norma individual e concreta referente ao tributo
devido; de outro lado, atenderão imediatamente o interesse da fiscalização aqueles deveres
que se voltam a propiciar meios ou benefícios à atividade da autoridade fiscal, quando da
fiscalização dos atos praticados pelo contribuinte, e cuja supressão não impede o
conhecimento do fato jurídico tributário pelas autoridades fiscais. Cf. TAKANO, Caio
Augusto. Deveres instrumentais dos contribuintes: fundamentos e limites. São Paulo:
Quartier Latin, 2017. p. 221-229.
324 Cf. OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Sanções tributárias e denúncia espontânea. In
MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Sanções administrativas tributárias. Fortaleza:
Dialética, 2004. p. 401, nota de rodapé n. 1.
325 Por todos, cf. STJ, Recurso Especial n. 572.424/PR, 1ª Turma. Rel. Min. José Delgado, j.
9-12-2003, DJe 15-3-2004.
326 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p.
501.
327 O termo “ficção”, a nosso ver, se refere à técnica legislativa pela qual se equiparam dois
institutos jurídicos apenas para determinados fins ou de modo amplo e irrestrito. Sobre o
tema, dentro dessa perspectiva, cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Distribuição disfarçada de
lucros. São Paulo: Dialética, 1996. p. 97-107.
328 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p.
834.
329 Cf. DERZI, Misabel Abreu Machado. Notas. In: BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário
brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 769.
330 Cf. ATALIBA, Geraldo. Espontaneidade como excludente de punibilidade no
procedimento tributário, Revista dos Tribunais, n. 464, São Paulo, Revista dos Tribunais,
1974, p. 67.
331 Cf. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 10. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2009. p. 688-689.
332 Como recorda Ricardo Mariz de Oliveira, a matéria do art. 138 do CTN é própria de lei
complementar, em virtude do art. 146, inc. III da Constituição Federal, pois as penalidades
tributárias têm natureza de obrigações tributárias principais, por força do art. 113 do CTN.
Assim, caso se deseje limitar a aplicação da denúncia espontânea, esta somente poderá ser
introduzida em nosso ordenamento jurídico por meio de lei complementar. Cf.
OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Sanções tributárias e denúncia espontânea. In:
MACHADO, Hugo de Brito. Sanções administrativas tributárias. Dialética: Fortaleza,
2004. p. 414.
333 Cf. OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Sanções tributárias e denúncia espontânea. In
MACHADO, Hugo de Brito. Sanções administrativas tributárias. Dialética: Fortaleza,
2004. p. 411.
334 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Restrições à atividade econômica do contribuinte na
substituição tributária e livre concorrência. In: FERREIRA NETO, Arthur M.; MICHELE,
Rafael (Coords.). Curso avançado de substituição tributária. São Paulo: IOB, 2010. p.

1867
525.
335 Mestre pela Faculdade de Direito da USP. Professor do Instituto Brasileiro de Direito
Tributário (IBDT). Advogado em São Paulo.
336 Cf. David Cameron: Tax avoiding foreign firms like Starbucks and Amazon lack “moral
scruples”, The Telegraph, janeiro de 2013. Disponível em:
<http://www.telegraph.co.uk/news/politics/david-cameron/9779983/David-Cameron-Tax-
avoiding-foreign-firms-like-Starbucks-and-Amazon-lack-moral-scruples.html>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
337 Para verificar o caráter contundente do relatório, basta mencionar os tópicos que
acompanharam as conclusões e recomendações finais. Cf. Public Accounts Committee –
Nineteenth Report. HM Revenue and Customs: Annual Report and Accounts. Disponível
em:
<https://publications.parliament.uk/pa/cm201213/cmselect/cmpubacc/716/71602.htm>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
338 Cf. o artigo publicado pela BBC News Magazine, em maio de 2013, intitulado Google,
Amazon, Starbucks: The rise of “tax shaming”. Disponível em:
<http://www.bbc.com/news/magazine-20560359>. Acesso em: 15 dez. 2017.
339 Cf. Barack Obama: Tax avoidance is a big global problem, BBC News. Disponível em:
<http://www.bbc.com/news/business-35971835>. Acesso em: 15 dez. 2017.
340 Cf. relatório preparado pela Comissão Europeia intitulado Communication from the
Commission to the European Parliament and the Council. A Fair and Efficient Tax System
in the European Union for the Digital Single Market. Disponível em:
<https://ec.europa.eu/taxation_customs/sites/taxation/files/1_en_act_part1_v10_en.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
341 Idem, p. 6.
342 OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. Addressing the Tax Challenges of
the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final Report. Os exemplos terão como base os
casos descritos no Anexo B do relatório, constantes das p. 167 et seq.
343 Uma descrição detalhada da estrutura pode ser encontrada no website da Comissão
Europeia. Cf. <http://europa.eu/rapid/press-release_IP-17-3701_en.htm>. Acesso em: 15
dez. 2017.
344 Disponível em: <https://www.icij.org/investigations/luxembourg-leaks>. Acesso em: 15
dez. 2017.
345 Na decisão da Comissão Europeia, Luxemburgo foi condenado a restituir o valor do
incentivo fiscal considerado ilegal, inexistindo punição direta para o Grupo Amazon. A
Comissão definiu a metodologia de cálculo do valor da vantagem fiscal indevida, isto é, a
diferença entre os tributos que a empresa recolheu e aqueles a que estaria sujeita sem os
incentivos fiscais. Cf.: <http://ec.europa.eu/competition/elojade/isef/case_details.cfm?
proc_code=3_SA_38944>. Acesso em: 15 dez. 2017.
346 Para maiores detalhes, cf. o artigo de Rubens Barrionuevo Biselli, “As disputas de Cost
Sharing Agreements envolvendo empresas de tecnologia nos EUA”, neste volume.
347 Cf. Google tax row: What’s behind the deal?, BBC News, janeiro de 2016. Disponível
em: <http://www.bbc.com/news/business-35428966>. Acesso em: 15 dez. 2017.

1868
348 Cf. Google settles huge £259m tax bill to end criminal investigation into alleged
avoidance, The Telegraph, maio de 2017. Disponível em:
<http://www.telegraph.co.uk/technology/2017/05/04/google-pay-306m-italy-tax-deal>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
349 Cf.: <https://www.nytimes.com/2017/07/12/business/13google.html>. Acesso em: 15
dez. 2017.
350 Para detalhes sobre a estrutura, cf. Commission Decision of 30.8.2016 on State Aid
SA.38373 (2014/C) (ex 2014/NN) implemented by Ireland to Apple. Disponível em:
<http://ec.europa.eu/competition/state_aid/cases/253200/253200_1851004_674_2.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
351 Cf. o press release divulgado no website da Comissão Europeia:
<http://europa.eu/rapid/press-release_IP-16-2923_en.htm>. Acesso em: 15 dez. 2017.
352 Cf. Commission Decision of 30.8.2016 on State Aid SA.38373 (2014/C) (ex 2014/NN) (ex
2014/CP) implemented by Ireland to Apple. Disponível em:
<http://ec.europa.eu/competition/state_aid/cases/253200/253200_1851004_674_2.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
353 Cf. TEIJEIRO, Guillermo O. A call for a Sustainable Response to the taxation of Digital
Economy within the International Income Tax System, October 5, 2017. Disponível em:
<http://kluwertaxblog.com/2017/10/05/callsustainable-response-taxation-digitaleconomy-
within-international-income-taxsystem>. Acesso em: 15 dez. 2017.
354 Cf. OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project. Addressing the Tax Challenges
of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final Report, item 7.6.1 (p. 107 et seq).
355 Ibidem, item 7.6.3 (p. 113 et seq).
356 Ibidem, item 7.6.4 (p. 115 et seq).
357 O relatório publicado pela Comissão Europeia em setembro de 2017 ilustra a posição do
bloco. Cf. Communication from the Commission to the European Parliament and the
Council. A Fair and Efficient Tax System in the European Union for the Digital Single
Market. Disponível em:
<https://ec.europa.eu/taxation_customs/sites/taxation/files/1_en_act_part1_v10_en.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
358 Cf.:
<https://ec.europa.eu/taxation_customs/sites/taxation/files/1_en_act_part1_v10_en.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
359 A CCCTB pretende estabelecer regras comuns para o cálculo dos tributos corporativos
na UE. Tais regras permitiriam às empresas adotar um único conjunto de regras para
apurar seus tributos, em detrimento das regras locais. Para maiores detalhes, cf.
<https://ec.europa.eu/taxation_customs/business/company-tax/common-consolidated-
corporate-tax-base-ccctb_en>. Acesso em: 15 dez. 2017.
360 Cf. EU Seeks Compromise on Tech Taxes as Macron Rails Against Google, Bloomberg
Technology, setembro de 2017. Disponível em:
<https://www.bloomberg.com/news/articles/2017-09-29/eu-needs-fair-google-tax-amid-
fierce-competition-romania-says>. Acesso em: 15 dez. 2017.
361 Cf. Finance Bill 2015: legislation and explanatory notes. Disponível em:

1869
<https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/416164/Finance_Bill_201
Acesso em: 15 dez. 2017.
362 Para uma análise mais aprofundada do DPT, cf. WASIMI, Shinasa, NARIO, Jai, e
BERTRAM, Kathryn, Diverted Profits Tax: U.K., Australian, and New Zealand
Approaches, Tax Notes International, July 24, 2017, p. 349 et set.
363 Cf. Proposal for Equalization Levy on Specified Transactions. Report of the Committee
on Taxation of E-Commerce. Versão integral do relatório disponível em:
<http://incometaxindia.gov.in/news/report-of-committee-on-taxation-of-e-commerce-feb-
2016.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
364 Para maiores detalhes, cf. o artigo de T. P. Ostwal e Mohak Shingala, “Taxation of
Digital Economy: India Perspective”, neste volume.
365 Cf. French finance minister rules out Google tax deal, more firms could be targeted,
Reuters, maio de 2016. Disponível em: <https://www.reuters.com/article/us-google-
france/french-finance-minister-rules-out-google-tax-deal-more-firms-could-be-targeted-
idUSKCN0YK03O>. Acesso em: 15 dez. 2017.
366 Cf. Constitutional council, 29 December 2016, n. 2016-744 DC.
367 Cf.: <https://www.reuters.com/article/us-france-alphabet-tax/france-ready-to-negotiate-
with-google-on-back-taxes-minister-idUSKBN1A92CO>. Acesso em: 15 dez. 2017.
368 Cf. o relatório da OCDE intitulado “Tax Policy Reforms in the OECD 2016” (OECD
Publishing, Paris), no qual o órgão aponta a tendência na redução da alíquota corporativa
nas principais economias do mundo.
369 Cf.: <https://www.lw.com/thoughtLeadership/US-tax-reform-key-business-impacts-
charts-transactional-diagrams>. Acesso em: 15 dez. 2017, p. 20.
370 Cf. um abrangente relatório sobre os principais efeitos da reforma tributária em:
<https://www.lw.com/thoughtLeadership/US-tax-reform-key-business-impacts-charts-
transactional-diagrams>. Acesso em: 15 dez. 2017. Outros dados de interesse podem ser
visualizados em Trump’s Tax Reform Plan, Investopedia, dezembro de 2017. Disponível
em: <https://www.investopedia.com/news/trumps-tax-reform-what-can-be-
done/#ixzz53cYYLbWs>. Acesso em: 15 dez. 2017.
371 Para uma análise mais aprofundada dos efeitos da reforma tributária em relação às
estruturas de transferência de intangíveis para o exterior, amplamente adotadas por
empresas de tecnologia norte-americanas, cf. o artigo de Rubens Barrionuevo Biselli, “As
disputas de Cost Sharing Agreements envolvendo empresas de tecnologia nos EUA”, neste
volume.
372 A LC n. 157/2016, por exemplo, previu a possiblidade de cobrança do ISS sobre as
atividades de “inserção de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e
publicidade, em qualquer meio” e “disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos
de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet”, abrindo caminho para a cobrança
do ISS, na esfera municipal, sobre as atividades desenvolvidas por empresas de streaming
e sobre a veiculação de publicidade online. Além disso, há uma relevante disputa entre
Estados e Municípios para a tributação das operações vinculadas ao licenciamento de
software. Enquanto o Convênio CONFAZ n. 106/2017 estabeleceu diretrizes sobre a
cobrança do ICMS sobre as “operações com bens e mercadorias digitais comercializadas

1870
por meio de transferência eletrônica de dados”, autorizando os Estados a cobrar o ICMS
sobre operações com software, as legislações municipais – com respaldo na Lei
Complementar n. 116/2003 – também preveem a cobrança do ISS sobre tais operações.
Recentemente o Município de São Paulo enfatizou sua posição sobre o tema, por meio do
Parecer Normativo n. 1/2017, em que trata da incidência do ISS sobre os “serviços de
licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação, por meio de
suporte físico ou por transferência eletrônica de dados”.
373 Destaquem-se, nesse sentido, as seguintes medidas: introdução de regras sobre a
Declaração País a País (IN RFB n. 1.681/2016); criação de normas sobre a troca de
informações relativas a rulings (IN RFB n. 1.689/2017); e a obrigatoriedade de declaração
do beneficiário efetivo das pessoas jurídicas brasileiras (IN RFB n. 1.634/2016). Além
disso, o Brasil assinou acordos sobre a troca automática de informações financeiras
(FATCA e CRS).
374 A tributação efetiva dessas operações exige uma análise caso a caso, considerando,
inclusive, o impacto da aplicação dos acordos de bitributação e a natureza jurídica
atribuída aos pagamentos feitos em favor das empresas estrangeiras. Esclareça-se, por
exemplo, que a própria Receita Federal do Brasil (RFB) já reconheceu a não aplicação do
IRRF sobre remessas ao exterior pela importação de serviços, nas transações sujeitas à
aplicação do artigo 7º dos acordos de bitributação celebrados pelo Brasil (ADI n.
05/2014). Além disso, também de acordo com a RFB, os pagamentos remetidos ao
exterior com a natureza de royalty não estão sujeitos ao PIS/COFINS-Importação, por não
caracterizarem a importação de mercadoria ou de serviços (SD COSIT 11/2011). Por outro
lado, a RFB também tem sustentado que operações de caráter misto, a exemplo de SaaS
(software as a service), devem ser equiparadas a “serviços técnicos” para fins de
tributação (SC n. 191, de 23-3-2017). Note-se, portanto, que há uma série de discussões e
controvérsias acerca do regime tributário aplicado a cada transação no âmbito da
economia digital, muitos dos quais são analisados com profundidade em artigos deste
livro, aos quais fazemos referência.
375 No Brasil, as regras acerca da caracterização de um “estabelecimento permanente”
limitam-se às hipóteses de venda direta de mercadorias por empresas estrangeiras, por
meio de um agente no Brasil.
376 Advogada com mais de dez anos de experiência no desenvolvimento de políticas fiscais
guiadas, principalmente, às necessidades de países em desenvolvimento e menos
desenvolvidos. Trabalhou no secretariado das Nações Unidas, atuando junto ao Comitê de
Peritos na revisão do Tratado Modelo da ONU e em diversos outros assuntos de tributação
internacional. Doutora pela Vienna University of Economics and Business (WU, Áustria)
em tributação ambiental internacional, mestra pela Universidade de Cambridge (Cantab,
UK) em Direito Corporativo e mestre pela New York University (NYU, USA) em Direito
Tributário Internacional. Especialista em Direito Tributário brasileiro pelo Instituto
Brasileiro de Estudos Tributários.
377 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report (OECD, 2015).
378 G20 – St Petersburg Action Plan, G20 Leader’s Declaration, p. 12 (Setembro, 2013).
Disponível em: <http://www.mofa.go.jp/files/000013493.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
Ver também Nações Unidas (2015), Addis Ababa Action Agenda of the Third

1871
International Conference on Financing for Development (UN, 2015), General Assembly
Resolution n. 69/313 de 27-7-2015. Disponível em: <http://www.un.org/esa/ffd/wp-
content/uploads/2015/08/AAAA_Outcome.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
379 Nações Unidas, Note by the Secretariat on “The digitalized economy: selected issues of
potential relevance to developing countries” (E/C.18/2017/6), julho 2017.
380 FMI, Digital Revolutions in Public Finance, IMF Publications, GUPTA, S., KEEN, M.,
SHAH, A. and VERDIER, G. (Eds.), 2017.
381 LENNARD, M., BEPS and Tax Administrations, in SIM, S. & SOO, M-J (Eds.), Asian
Voices: BEPS and Beyond, IBFD 2017, capítulo 3, Online Books IBFD.
382 PINTO, D., Options To Address the Direct Tax Challenges Raised by the Digital
Economy – A Critical Analysis, Canadian tax journal / revue fiscale canadienne (2017)
65:2, 291-331.
383 Organisation for Economic Co-operation and Development, Preventing the Artificial
Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7– 2015 Final Report, Paris:
OECD, 2015.
384 Klaus Vogel, “Worldwide vs. Source Taxation of Income – A Review and Re-evaluation
of Arguments (Part III)” (1988) 16:11 Intertax 393-402.
385 Dados oficiais recentes estimam que o Imposto sobre Lucro Desviado (DPT) arrecadou
£31m no ano fiscal de 2015/16 e £281m em 2016/17. Estas estimativas oficiais tiveram
como base poucas companhias. O fisco Inglês (HMRC) disse que o imposto focava atingir
apenas 100 grandes multinacionais, e foi informado em maio de 2017 que uma
multinacional em particular (Diageo) pagaria sozinha £107m, sob protestos. Dados
veiculados pelo BEPS Monitoring Group, Submission on the Tax challenges of the Digital
Economy. Disponível em:
<https://bepsmonitoringgroup.files.wordpress.com/2017/10/digital-economy.pdf>. Acesso
em: 15 dez. 2017.
386 Conforme OECD, Open Consultation meeting on the Digitalization of the Economy, 1º
nov. 2017 (notas do autor).
387 EY, Global Digital Tax Developments Review, abril 2016.
388 European Commission, A Fair and Efficient Tax System in the European Union for the
Digital Single Market, COM(2017) 547 final, Brussels, 21-9-2017.
389 Idem.
390 WTO, General Agreement on Tariffs and Trade, 1994. Veja, especificamente, a
discussão acerca da imposição de impostos fronteiriços (border tax adjustment) e a
aplicação das exceções do artigo XX, através do “princípio de políticas públicas” que
permite a um ente governamental fugir das regras estabelecidas pelo GATT.
391 De acordo com M. Devereux e J. Vella, o problema do sistema tributário atualmente em
vigor é que o direito de tributar é atribuído aos fatores móveis das funções empresariais,
tais como intangíveis, direitos sobre a propriedade intelectual, dentre outros fatores. Isso
leva à administração de estruturas agressivas de planejamento fiscal, permite que as
empresas aloquem a renda a países de baixa tributação e gera um ambiente de competição
destrutiva entre os países, na medida em que eles competem entre si para reduzir a
alíquota e atrair investimento externo. Os autores, portanto, argumentam que a solução

1872
seria migrar para um sistema onde o direito de tributar é atribuído a fatores relativamente
imóveis, tais como os acionistas ou os consumidores. Isso levaria a um sistema tributário
mais focado no destino da atividade econômica (destination based system).
Ver, neste sentido: M. P. Devereux e J. Vella, Implications of Digitalization for International
Corporate Tax Reform, WP 17/7, Oxford University Centre of Business Taxation, julho
2017, disponível em:
<https://www.sbs.ox.ac.uk/sites/default/files/Business_Taxation/Docs/Publications/Working_Papers/Serie
Acesso em: 15 dez. 2017.
392 OECD, Open Consultation meeting on the Digitalization of the Economy, 1º nov. 2017
(notas do autor).
393 Ver apresentação administrada pela Ernst & Young durante o OECD, Open Consultation
meeting on the Digitalization of the Economy, 1º nov. 2017 (notas do autor).
394 Para maiores informações sobre os diferentes modelos de negócio: S. Towers, Analysing
the Likely impact of the BEPS Project on Common Business Models, in SIM, S. & SOO,
M-J (Eds.), Asian Voices: BEPS and Beyond, Capítulo 26, seção 26.7, IBFD Online
Books, IBFD 2017. Ver também CHIEN, L., Life after BEPS in Asia: Challenges and
Opportunities, in SIM, S. & SOO, M-J (Eds.), Asian Voices: BEPS and Beyond, Capítulo
28, seções 28.1 e 28.2, IBFD Online Books, IBFD 2017.
395 Disponível em: <https://bepsmonitoringgroup.wordpress.com>. Acesso em: 15 dez.
2017.
396 BEPS Monitoring Group, “Submission on Tax Challenges of the Digital Economy,”
(Authors: J. Kadett and S. Picciotto with contributions from T. Falcão, T. Faccio, and A.
Waris), disponível em: <https://bepsmonitoringgroup.files.wordpress.com/2017/10/digital-
economy.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
397 O princípio das entidades independentes permite que as empresas explorem os erros
intrínsecos do sistema de tributação internacional. O princípio das entidades
independentes requer que as autoridades fazendárias analisem as contas de cada uma das
filiais localizadas em cada país, e promovam o ajuste de contas em cada país sem
reconciliar as atividades, partindo do pressuposto de que estas são entidades
independentes, interagindo entre si a arms length, sem um controle acionário único ou
uma diretriz única para tomada de decisão. O princípio ignora a realidade econômica sob a
qual as empresas operam – à medida que estas estão, de fato, sob controle e direção
centralizados.
398 Tanto os países desenvolvidos quanto os países em desenvolvimento veem este método
com suspeita, mas principalmente os países em desenvolvimento temem que uma fórmula
acordada no âmbito de um fórum regulamentado por países desenvolvidos não seja
favorável aos seus interesses econômicos e arrecadatórios.
399 FALCÃO, Tatiana (2012), Brazil’s approach to Transfer Pricing: A Viable Alternative to
the Status quo?, Bloomberg, BNA, Tax Management Transfer Pricing Report, v. 20, n. 20,
23-2-2012.
400 Parlamento Europeu, Common Consolidates Corporate Tax Base, 2016, disponível em:
<http://www.europarl.europa.eu/thinktank/en/document.html?
reference=EPRS_BRI%282017%29599395>. Acesso em: 15 dez. 2017.

1873
401 Kadet J. (2013) U.S. Tax Reform: Full-Inclusion Over Territorial System Compelling.
Tax Notes 139: 295-301.
402 Veja, neste sentido, legislação recente introduzida pelos EUA veiculando um destination
based cash flow tax: USA, The Tax Reform Task Force Blueprint, junho de 2016. Veja
também: AUERBACH, A, DEVEREUX, M. P., KEEN, M. et al. (2017), Destination-
Based Cash Flow Taxation, Working Paper 17/01, Oxford University Centre for Business
Taxation. AVI-YONAH, R. S. and CLAUSING, K. (2017), Problems with Destination-
Based Corporate Taxes and the Ryan Blueprint, Columbia Journal of Tax Law 8: 229-255.
Institute for Fiscal Studies, The Structure and Reform of Direct Taxation, Report of a
Committee chaired by Professor J. E. Meade (London: Allen and Unwin, 1978) e Alan J.
Auerbach, A Modern Corporate Tax, (Washington, DC: Center for American Progress,
2010).
403 OECD, “Mechanisms for the Effective Collection of VAT/GST” (OECD, 2017),
disponível em: <http://www.oecd.org/tax/consumption/mechanisms-for-the-effective-
collection-of-vat-gst.htm>. Acesso em: 15 dez. 2017.
404 Doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP. LLM em International
Taxation com bolsa integral por mérito (Arthur T. Vanderbilt Scholarship) pela New York
University School of Law. Pós-graduado em Direito Tributário pelo IBET. Conselheiro
Titular da 4ª Câmara Julgadora do Conselho Municipal de Tributos de São Paulo
(CMT/SP). Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo (TITSP).
Professor e Advogado em São Paulo e no Rio de Janeiro.
405 Doutorando em Direito Tributário Internacional pela Universiteit Leiden, Holanda.
Mestre (summa cum laude) em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela
Universidade de São Paulo (USP). Master of Laws (LLM) in Taxation pela Georgetown
University Law Center, EUA (Graduate Tax Scholarship e Dean’s Certificate Award).
Pós-Graduado em Direito Tributário Internacional pelo Instituto Brasileiro de Direito
Tributário (IBDT). Pós-Graduado em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de
Estudos Tributários (IBET). Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo
(TIT-SP). Coordenador da Comissão de Direito Tributário do IBRADEMP. Professor e
Advogado em São Paulo.
406 SHAVIRO, Daniel. The rising tax-electivity of U.S. Corporate Residence, in NYU,
International Tax Program @20. New York: NYU, 2016, p. 71.
407 Atribui-se a William Woods, enquanto chefe da Bolsa de Valores de Bermudas a célebre
frase de que Gates “teria sido fabulosamente mais rico se ele tivesse incorporado a
Microsoft em Bermudas (...). Sua ignorância em relação à tributação lhe custou uma
fortuna (...)” (tradução livre, in Matthew Bishop, Gimme Shelter, The Economist, jan. 29,
2000, at S15, apud SHAVIRO, Daniel. The rising tax-electivity of U.S. Corporate
Residence, in NYU, International Tax Program @20. New York: NYU, 2016, p. 71.
408 Nas palavras de Alberto Xavier, “do ponto de vista econômico, o princípio da fonte
(exonerando os lucros estrangeiros da tributação) favorece a neutralidade na importação
de capitais (NIC), enquanto o princípio da residência, conduzindo a tributação idêntica,
seja qual for o lugar de obtenção do lucro, favorece a neutralidade na exportação de
capitais (NEC)” (XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. Rio
de Janeiro: Forense. p. 217).

1874
409 Para muitos autores, a melhor política fiscal envolveria a neutralidade dos investimentos
em relação à exportação, tributando-se da mesma maneira as rendas auferidas
internamente e externamente. A referida diretriz conferiu a base teórica para as regras
CFC (controlled foreign company), tendo ampla influência na discussão levada a cabo no
congresso norte-americano, à época de sua edição. A respeito, vide: AVI-YONAH,
Reuven. The U.S. Treasury’s Subpart F Report: Plus Ça Change, Plus C’est la Même
Chose?, in Bulletin, IBFD, p. 185 e s., maio/2001.
410 Como se sabe, em 22-12-2017, foi assinada lei conhecida como Tax Cuts and Jobs Act,
alterando, profundamente, as regras de tributação norte-americanas, notadamente no que
toca à política de tributação internacional (entre outras alterações). A respeito, vide:
<https://www.lw.com/thoughtLeadership/US-tax-reform-key-business-impacts-charts-
transactional-diagrams>. Acesso em: 15 dez. 2017.
411 McLURE, Charles. Tax Competition in a Digital World, in Bulletin, IBFD, p. 154,
abril/2003.
412 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense. p. 251.
413 COCKFIELD, Arthur. The law and economics of Digital Taxation: challenges to
traditional Tax Laws and principles, in Bulletin, IBFD, p. 608, dezembro/2002.
414 A respeito da distinção, vide, entre outros, o Comunicado n. 31.379/17, do Banco Central
do Brasil.
415 Cf. OECD/G20. Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, in Base Erosion
and Profit Shifting Project. Disponível em: <http://www.oecd.org/tax/addressing-the-tax-
challenges-of-the-digital-economy-action-1-2015-final-report-9789264241046-en.htm>, p.
66.
416 Vide: OECD/G20. Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, in Base
Erosion and Profit Shifting Project, p. 67.
417 Em muitos dos casos mediante transferência de intangíveis, inclusive por meio dos
chamados cost-sharing agreements.
418 JOSEPH, Anton. Corporate Inversions and Earnings Stripping, in Derivatives and
Financial Instruments, IBFD, p. 92, maio-jun./2008. A mesma definição pode ser
encontrada em outros textos, além do trabalho recentemente publicado pelo Congressional
Research Service: MARPLES, Donald J.; GRAVELLE, Jane G. Corporate Expatriation,
Inversions and Mergers: tax issues, ago./2017. Disponível em:
<https://fas.org/sgp/crs/misc/R43568.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
419 Vide: MARPLES, Donald J.; GRAVELLE, Jane G. Corporate Expatriation, Inversions
and Mergers: tax issues, ago./2017. Disponível em:
<https://fas.org/sgp/crs/misc/R43568.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017, p. 2.
420 YANG, James G. S. The adverse effects of corporate inversions in the United States, in
Bulletin for International Taxation, IBFD, p. 679, nov./2015.
421 Cf. BEHAGG, Charles. Tax inversions: time do take a look in the mirror reflections on
the inversion phenomenon, in Intertax, vol. 44, issue 2, Kluwer Law International, p. 132,
2016.
422 Cf. YANG, James G. S. The adverse effects of corporate inversions in the United States,

1875
in Bulletin for International Taxation, IBFD, p. 679, nov./2015.
423 Cf. BEHAGG, Charles. Tax inversions: time do take a look in the mirror reflections on
the inversion phenomenon, in Intertax, vol. 44, issue 2, Kluwer Law International, p. 133,
2016.
424 Cf. relatório produzido pelo escritório Skadden, Arps, Slate, Meagher & Flom LLP.
Disponível em: <https://www.brookings.edu/wp-
content/uploads/2015/01/OOSTERHUIS_slides.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017. Bittker &
Lokken apresentam diversas outras razões para o fenômeno (BITTKER, Boris I.;
LOKKEN, Lawrence. Fundamentals of International Taxation. 2013/2014 edition. New
York: Thomson Reuters, 2013, p. 66-41).
425 WEBBER, Stuart. Escaping the US Tax System: from corporate inversions to re-
domiciling, in Tax Notes International, vol. 63, jul./2015, 2011, p. 276.
426 Idem.
427 O termo expanded affiliated group é definido pela Section 7874(c)(1).
428 Para fins de determinação do percentual deste dispositivo, (i) ações anteriormente detidas
por membros do grupo econômico que inclui a sociedade estrangeira deverão ser
desconsideradas do cálculo, assim como (ii) ações da sociedade estrangeira alienadas em
uma emissão pública de ações relacionada à operação também seriam desconsideradas do
cálculo (cf. Section 7874(c)(2)). A interpretação do dispositivo foi questionada, logo após
a sua edição, em virtude da falta de clareza a respeito da exclusão apenas no numerador ou
neste último e no denominador (vide: VANDERWOLK, Jefferson. The US anti-inversion
legislation and regulations, in Bulletin, IBFD, p. 379, set./2006). Posteriormente, outras
modificações foram feitas (v.g., Notice 2009-78).
429 Cf. Section 7874(a)(2)(B)(ii).
430 Internal Revenue Bulletin 2006-27.
431 Internal Revenue Bulletin 2009-28.
432 BEHAGG, Charles. Tax inversions: time do take a look in the mirror reflections on the
inversion phenomenon, in Intertax, vol. 44, issue 2, Kluwer Law International, p. 135,
2016. Vide, também: Internal Revenue Bulletin 2012-28.
433 YANG, James G. S. The adverse effects of corporate inversions in the United States, in
Bulletin for International Taxation, IBFD, p. 680, nov./2015.
434 YANG, James G. S., op. cit, p. 681.
435 Idem.
436 AVI-YONAH, Reuven S. For Haven’s Sake: reflections on inversion transactions, in Tax
Notes, vol. 95, n. 12, p. 1799, jun./2002.
437 Como no caso da Apple, Inc., por exemplo. Vide: Factbox: Apple, Amazon, Google and
tax avoidance schemes. Disponível em: <https://www.reuters.com/article/us-eu-tax-
avoidance/factbox-apple-amazon-google-and-tax-avoidance-schemes-
idUSBRE94L0GW20130522>. Acesso em: 15 dez. 2017.
438 Para informações mais detalhadas sobre o caso, confira-se: TING, Anthony. The politics
of BEPS – Apple’s International Tax Structure and the US attitude towards BEPS, in
Bulletin for International Taxation, IBFD, p. 410-415, jun.-jul./2015. Acesso em: 15 dez.

1876
2017.
439 Cf.: <https://www.usatoday.com/story/money/2016/01/25/johnson-controls-tyco-
international-merger/79289344>. Acesso em: 15 dez. 2017.
440 Em língua inglesa, machine to machine.
441 Cf. Capítulo IX, “Da Tributação em Bases Universais das Pessoas Jurídicas”.
442 O termo “coligada” encontra-se delimitado pelo art. 243, § 4º, da Lei n. 6.404/76.
443 A definição do termo “controle” pode ser extraída do art. 243, §§ 1º e 2º, da Lei n.
6.404/76, bem como do art. 1.098 do CC/2002.
444 As hipóteses de equiparação encontram-se discriminadas no art. 83 da Lei n.
12.973/2014.
445 Em linha com a diretriz seguida pelo STF no julgamento da ADI n. 2.588, a Lei n.
12.973/2014 (art. 81) determina a sujeição de coligadas às regras CFC brasileiras, desde
que situadas em (i) jurisdição com tributação favorecida, (ii) regime fiscal privilegiado, ou
(iii) jurisdição submetida a regime de subtributação (i.e., que tribute a renda em percentual
nominal inferior a 20%), ou por ela controlada, direta ou indiretamente. A legislação
também oferece à controladora a opção pelo regime de competência, isto é, pela tributação
da parcela da variação positiva do método de equivalência patrimonial das coligadas no
exterior (art. 82-A, da Lei n. 12.973/2014).
446 Aproximadamente 34%.
447 Com esta modificação, tributos sobre a renda (IRPJ e CSLL) pagos no País e que outrora
seriam compensáveis nos Estados Unidos, já que a alíquota deste país era superior (35%),
não mais produzirão o chamado foreign tax credit.
448 Com o advento da MP n. 627/2013, tentou-se instituir a tributação dos lucros no exterior
também para controladores pessoas físicas (art. 89 da MP). O texto da MP, no entanto, não
foi mantido na conversão na Lei n. 12.973/2014.
449 Digna de nota, também, a estruturação levada a cabo pela AMBEV, muito embora, neste
caso, a operação tenha sido mais complexa, por uma combinação de negócios com outro
grupo econômico belga. A respeito, vide: CARVALHO, Felipe Reis de. As razões
tributárias e econômicas das inversões corporativas. São Paulo, 2017, p. 86. Disponível
em:
<http://tede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/3114/5/Filipe%20Reis%20de%20Carvalho.pdf>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
450 Cf.: <http://www.valor.com.br/agro/4756539/jbs-cancela-reorganizacao-societaria-apos-
recusa-do-bndes>. Acesso em: 15 dez. 2017.
451 As etapas da operação e as ilustrações incluídas neste tópico foram extraídas de “Fato
Relevante” publicado pela Companhia, disponível em:
<https://ri.magnesita.com/Download.aspx?Arquivo=eo8U+73ZeRZXzbaAR4BebA>.
Acesso em: 15 dez. 2017.
452 Foi apresentado estudo pela Fundação Dom Cabral, em que se elencaram 48 (quarenta e
oito) grupos com alto grau de internacionalização. Entre eles, Gerdau, Fitesa, Marfrig,
Embraer, Alpargatas, entre inúmeras outras. Vide: DRUMMOND JUNIOR, Aldemir et. al.
Ranking FDC das Multinacionais Brasileiras 2015: a capacidade de adaptação cultural
das empresas brasileiras no mundo. Nova Lima/MG: Fundação Dom Cabral, 2015.

1877
453 Entre inúmeras outras, cite-se, como exemplo, a Solução de Consulta Cosit n. 400/2017,
em que se entendeu que a regra de isenção da tributação de dividendos no tratado para
evitar a dupla tributação celebrado com a Argentina não obstaria a tributação pelas regras
brasileiras CFC.
454 Cf. art. 77 da Lei n. 12.973/2014: “Art. 77. A parcela do ajuste do valor do investimento
em controlada, direta ou indireta, domiciliada no exterior equivalente aos lucros por ela
auferidos antes do imposto sobre a renda, excetuando a variação cambial, deverá ser
computada na determinação do lucro real e na base de cálculo da Contribuição Social
sobre o Lucro Líquido – CSLL da pessoa jurídica controladora domiciliada no Brasil,
observado o disposto no art. 76”.
455 CSRF, 1ª Turma, Acórdão n. 9101001.847, Rel. Marcos Aurélio Pereira Valadão, j. 10-
12-2013.
456 A título ilustrativo, vide: CARF, 1ª Seção, 1ª Turma Ordinária da 1ª Câmara, Acórdão n.
1101-000.869, Rel. Edeli Pereira Bessa, j. 9-4-2013.
457 STJ, RESP n. 1.211.882/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, j. 5-4-2011.
458 Cf. Art. 8º, § 6º, da IN n. 1.520/2015.
459 Os Tribunais Superiores, por diversas oportunidades, manifestaram-se acerca do caráter
periódico do imposto de renda, como se pode depreender dos seguintes julgados, entre
outros: STJ, AgRg no AgRg no Ag 1395402/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, j.
15-10-2013; STJ, REsp 671.278/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, j. 6-10-2005; STJ,
AgRg no AREsp 637.679/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, j. 10-3-
2015.
460 Art. 23 da Lei n. 9.249/95.
461 Cf. hipóteses previstas no art. 60 do Decreto-lei n. 1.598/77.
462 Cf. art. 19 da Lei n. 9.430/96.
463 A RFB, mais recentemente, e a nosso ver de forma equivocada, entendeu que a redução
de capital pelo valor contábil poderia gerar ganho tributável quando a devolução for de
bens avaliados a valor justo (Solução de Consulta Cosit n. 415/2017, de 8-9-2017).
464 Art. 61, II, da IN n. 11/96.
465 Discussões quanto à manutenção de saldos de prejuízo fiscal no exterior, entre outras.
466 Este ponto, apesar de relevante, não constitui escopo do presente artigo. A aferição dos
limites dos chamados planejamentos tributários, também no que toca à aplicação do
disposto no art. 149, VII, do CTN, assim como do art. 116, parágrafo único, envolve a
análise de requisitos, pela jurisprudência do CARF, como causa do negócio jurídico,
propósito negocial (business purpose), substância das operações (substance over form) –
oriundas do caso norte-americano Gregory v. Helvering –, bem como outras análise de
cunho subjetivo, aferidos em cada caso concreto. Em relação à análise do substance over
form e business purpose, confiram-se, entre outros: CASTRO, Leonardo Freitas de
Moraes e. Análise da aplicação da teoria do substance over form aos planejamentos
tributários no Brasil, in Revista de Direito Tributário da Apet, n. 22. São Paulo, MP
Editora, p. 55 e s.; MONTEIRO, Alexandre Luiz Moraes do Rêgo. Caso Felipão e Caso
Ratinho: o mito da impossibilidade de pessoas jurídicas prestarem serviços artísticos ou
intelectuais e seus reflexos tributários. In: CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e.

1878
Planejamento tributário: estudo de casos. São Paulo: MP Editora, 2010. p. 245 e s.
467 Pesquisador em programa de pós-doutorado da Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo. Advogado. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Direito Tributário
do IBDT, em São Paulo. Professor Adjunto da Universidade do Estado do Amazonas, em
Manaus. Doutor e Mestre em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo. Este
trabalho foi produzido no Grupo de Pesquisa Direito do Estado e Desenvolvimento, da
Universidade do Estado do Amazonas.
468 SILVEIRA, Ricardo Maitto. O escopo pessoal dos acordos internacionais contra a
bitributação: regimes fiscais especiais, conflitos de qualificação e casos triangulares. São
Paulo: IBDT/Quartier Latin, 2016. p. 40.
469 SCHOUERI, Luís Eduardo. Brazil. In: LANG, Michael, PISTONE, Pasquale, SCHUCH,
Josef e STARINGER, Claus (Eds.). The Impact of the OECD and UM Model Conventions
on Bilateral Tax treaties. Cambridge: Cambridge University Press, 2012 p. 171-202 (172).
470 HOLMES, Kevin. International Tax Policy and Double Tax Treaties. An Introduction to
Principles and Application. Amsterdam: IBFD, 2011. p. 260-261.
471 HOLMES, Kevin, op. cit., p. 278-279.
472 HOLMES, Kevin, op. cit., p. 271-274.
473 OECD (2015), Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report, OECD/G20. Base Erosion and Profit Shifting Project, OECD Publishing,
Paris. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1787/9789264241046-en>. Acesso em: 15 dez.
2017.
474 BAEZ MORENO, Andrés. The Taxation of Technical Services under the United Nations
Model Double Taxation Conventions: a Rushed – Yet Appropriate – Proposal for
(Developing) Countries?, World Tax Journal, 2015 (Volume 7), N. 3, JOURNALS IBFD.
475 Para uma análise detalhada e profunda do assunto, ver: DUARTE FILHO, Paulo Cesar
Teixeira. Os royalties nos acordos para evitar a dupla tributação. In: SCHOUERI, Luís
Eduardo, BIANCO, João Francisco (Coords.), MORAIS e CASTRO, Leonardo Freitas de,
DUARTE FILHO, Paulo César Teixeira (Orgs.). Estudos de direito tributário em
homenagem ao Professor Gerd Willi Rothmann. São Paulo: Quartier Latin, 2016. p. 321-
365.
476 GARBARINO, Carlo. Capitolo VII. Tassazoine dei redditi di impresa multinazionale. In:
UCKMAR, Victor (Coord.). Corso di Diritto Tributario Internazionale. Padova: CEDAM,
1999. p. 196.
477 XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. p. 583, 658-670.
478 ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito autoral. 2. ed. Rio de Janeiro/São Paulo/Recife:
Forense, 2007. p. 27.
479 SCHOUERI, Luís Eduardo. Distribuição disfarçada de lucros. São Paulo: Dialética,
1996. p. 97-129.
480 REsp. 1.161.467/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJe 1º-6-2012.
481 LANG, Micahel. Introduction to the Law of Double Taxation Conventions. 2nd ed.
Amsterdam/Vienna: IBFD/Linde, 2013. p. 91-97.

1879
482 XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. p. 625-669.
483 VOGEL, Klaus, PÖLLATH, Reinhard. Klaus Vogel DBA –
Doppelbesteuerungsabkommen der Bundesrepublik Deutschland auf dem Gebiet der
Steuern vom Einkommen und Vermögen Kommentar. 3 Auf. München: 1996, p. 1013-
1014, número de margem 33.
484 ROTHMANN, Gerd Willi. Tributação dos serviços importados na legislação doméstica e
internacional do Brasil. In: PARISI, Fernanda Drummond, TÔRRES, Heleno Taveira,
MELO, José Eduardo Soares de (Coords.). Estudos de direito tributário em homenagem
ao professor Roque Antônio Carrazza. São Paulo: Malheiros, 2014. v. 2, p. 79-104 (84-90,
especialmente 86).
485 SCHOUERI, Luís Eduardo. Chapter 4. Brazil. IN: BRAUNER, Yariv, PISTONE,
Pasquale (Eds.), Brics and the Emergence of International Tax Coordination. Amsterdam:
IBFD, 2015. p. 41-80 (58-59).
486 Em sentido semelhante: XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. 8.
ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 668.
487 XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. p. 576-577.
488 A própria Receita Federal já tinha reconhecido a assimilação do software (pelo menos o
de prateleira) ao conceito de mercadoria. Cf. Solução de Divergência Disit 27/2008,
Solução de Consulta Disit/SRRF10 120/2002, Solução de Consulta Disit/SRRF08
133/2003, Solução de Consulta Disit/SRRF10 83/2005, Solução de Consulta
Disit/SRRF08 513/2007, Solução de Consulta Disit/SRRF/06 78/2013.
489 Lei n. 9.610/98, art. 7º, XII. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito autoral. 2. ed. Rio de
Janeiro/São Paulo/Recife: Forense, 2007. p. 7-8.
490 Royalties. International Tax Glossary. 7th ed. Amsterdam: IBFD, 2015. p. 412-413.
491 Lei n. 9.610/98, arts. 8º e 9º.
492 VOGEL, Klaus, PÖLLATH, Reinhard. Klaus Vogel DBA –
Doppelbesteuerungsabkommen der Bundesrepublik Deutschland auf dem Gebiet der
Steuern vom Einkommen und Vermögen Kommentar. 3 Auf. München: 1996. p. 1014,
número de margem 33a.
493 OCDE. Comentários à Convenção Modelo (2010), parágrafo 17.4.
494 OCDE. Comentários à Convenção Modelo (2010), parágrafo 10.1.
495 RE n. 176.626-3/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 11-12-1998.
496 Cf. Solução de Divergência Disit 27/2008, Solução de Consulta Disit/SRRF10 120/2002,
Solução de Consulta Disit/SRRF08 133/2003, Solução de Consulta Disit/SRRF10
83/2005, Solução de Consulta Disit/SRRF08 513/2007, Solução de Consulta
Disit/SRRF/06 78/2013.
497 Solução de Divergência n. 18 Cosit, de 27-3-2017.
498 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcante. Tratado de direito privado. 2. ed. Rio
de Janeiro: Borsoi, 1963. v. XLIII, p. 284 e 324
499 PONTES DE MIRANDA, op. cit., p. 32.

1880
500 PONTES DE MIRANDA, op. cit., p. 284 e 324.
501 Tradução livre.
502 Ato Declaratório Normativo Cosit n. 5/2014.
503 GARBARINO, Carlo. Capitolo VII. Tassazoine dei redditi di impresa multinazionale. In:
UCKMAR, Victor (Coord.). Corso di Diritto Tributario Internazionale. Padova: CEDAM,
1999. p. 196.
504 SCHOUERI, Luís Eduardo. 5. Tax Sparring: a reconsideration of the reconsideration. In:
BRAUNER, Yariv, STUART, Miranda (Eds.). Tax, Law and Development. Cheltenham
(UK)/Northampton, MA (USA): Edward Elgar, 2013. p. 115-116.
505 Idem.
506 Como dito, em matéria de software, as posições da OCDE e da ONU são bastante
próximas.
507 BAEZ MORENO, Andrés. The Taxation of Technical Services under the United Nations
Model Double Taxation Conventions: a Rushed – Yet Appropriate – Proposal for
(Developing) Countries?, World Tax Journal, 2015 (Volume 7), N. 3, JOURNALS IBFD.
508 Idem.
509 BAEZ MORENO, op. cit.
510 LANG, Michael. Introduction to the Law of Double Taxation conventions. 2nd ed.
Amsterdam/Vienna: IBFD/Linde, 2013. p. 92-93.
511 BAEZ MORENO, Andrés. The Taxation of Technical Services under the United Nations
Model Double Taxation Conventions: a Rushed – Yet Appropriate – Proposal for
(Developing) Countries?, World Tax Journal, 2015 (Volume 7), N. 3, JOURNALS IBFD
(tópico 3.2.1.1.2 do artigo, especificamente).
512 Idem.
513 Idem.
514 Em defesa da incidência do princípio da capacidade contributiva no Direito Tributário
internacional: SCHAUMBURG, Harald. Internationales Steuerrecht. Außensteuerrecht.
Doppelbesteuerungsrecht. 3 auf. Köln: Dr. Otto Schmidt, 2011. p. 66-69, números de
márgem 4.7 e 4.10. SEER, Roman. Tipke/Lang Steuerrecht. 21 auf. Köln: Dr. Otto
Schmidt, 2013. p. 25, número de margem 83 e 29, número de margem 95.
515 VIEIRA DA ROCHA, Paulo Victor. A capacidade contributiva na teoria dos direitos
fundamentais, Revista Tributária das Américas (4/19), 2011. Idem. Teoria dos direitos
fundamentais em matéria tributária: restrições a direitos do contribuinte e
proporcionalidade. São Paulo: Quartier Latin, 2017. p. 157, 175-176.
516 Afinal, até os comentários de Vogel evitam a discussão, alegando que ela raramentre leva
a um significado claro (führt selten zu einem eindeutigen Ergebnis). VOGEL, Klaus.
Klaus Vogel DBA – Doppelbesteuerungsabkommen der Bundesrepublik Deutschland auf
dem Gebiet der Steuern vom Einkommen und Vermögen Kommentar. 3 Auf. München:
1996. p. 99-100, número de margem 14.
517 VIEIRA DA ROCHA, Paulo Victor. Substituição tributária e proporcionalidade: entre
capacidade contributiva e praticabilidade. São Paulo: Quartier Latin, 2012. p. 94-110.
Idem. Teoria dos direitos fundamentais em matéria tributária: restrições a direitos do

1881
contribuinte e proporcionalidade. São Paulo: Quartier Latin, 2017. p. 173-186.
518 XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. 8. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2015. p. 576 e s. DUARTE FILHO, Paulo Cesar Teixeira. Os royalties nos
acordos para evitar a dupla tributação. In: SCHOUERI, Luís Eduardo, BIANCO, João
Francisco (Coords.), CASTRO, Leonardo Freitas de Morais e, DUARTE FILHO, Paulo
César Teixeira (Orgs.). Estudos de direito tributário em homenagem ao Professor Gerd
Willi Rothmann. São Paulo: Quartier Latin. 2016, p. 321-365. BAEZ MORENO, Andrés.
The Taxation of Technical Services under the United Nations Model Double Taxation
Conventions: a Rushed – Yet Appropriate – Proposal for (Developing) Countries?, World
Tax Journal, 2015 (Volume 7), N. 3, JOURNALS IBFD (tópico 3.2.1.2.2,
especificamente).
519 E/C. 18/2014/CRP.8 parágrafos 59-60.
520 BAEZ MORENO, Andrés. The Taxation of Technical Services under the United Nations
Model Double Taxation Conventions: a Rushed – Yet Appropriate – Proposal for
(Developing) Countries?, World Tax Journal, 2015 (Volume 7), N. 3, JOURNALS IBFD
(tópico 3.2.1.2.2, especificamente)
521 SCHOUERI, Luís Eduardo. Chapter 4. Brazil. IN: BRAUNER, Yariv, PISTONE,
Pasquale (Eds.). Brics and the Emergence of International Tax Coordination. Amsterdam:
IBFD, 2015. p. 41-80 (51-52, 54-55). Para serviços, a definição consta do art. 6º do
Decreto-lei n. 1.418/75.
522 Mestre em Direito (LLM) pela Northwestern University School of Law. Pós-graduado
em Administração de Empresas pela Kellogg School of Management. Especialista em
Direito Tributário pela FGV-SP. Bacharel em Administração Pública pela FGV-SP e em
Direito pela USP. Advogado em São Paulo.
523 Mestre em Direito dos Negócios pela FGV-SP. Bacharel em Direito pela UPFR.
Advogado em São Paulo.
524 Conforme ZUGMAN, Daniel Leib. Implicações Recentes do BEPS no Brasil. Disponível
em: <https://jota.info/artigos/implicacoes-recentes-beps-no-brasil-10022017>. Acesso em:
15 dez. 2017.
525 OECD. Action Plan on Base Erosion and Profit Shifting, OECD Publishing, 2013.
526 TAVARES, Romero. Política tributária internacional: OCDE, BEPS e Brasil: como
deve se posicionar o setor industrial brasileiro? Disponível em:
<http://www.funcex.org.br/publicacoes/rbce/material/rbce/121_RJST.pdf>. Acesso em: 15
dez. 2017.
527 CHURTON, Sarah; LAMBERT, Ellis; DENNIS, Ian. The impact of BEPS on intangible
assets, International Tax Review, 2016. Disponível em:
<http://www.internationaltaxreview.com/Article/3535797/The-impact-of-BEPS-on-
intangible-assets.html>. Acesso em: 15 dez. 2017.
528 Idem.
529 Idem.
530 CHURTON, LAMBERT, DENNIS, op. cit.
531 TAVARES, Romero. Política tributária internacional: OCDE, BEPS e Brasil: como
deve se posicionar o setor industrial brasileiro? Disponível em:

1882
<http://www.funcex.org.br/publicacoes/rbce/material/rbce/121_RJST.pdf>. Acesso em: 15
dez. 2017.
532 OWENS, Jeffrey. How the BEPS Project should tackle harmful tax competition,
International Tax Review, 2013. Disponível em:
<http://www.internationaltaxreview.com/Article/3275221/How-the-BEPS-project-should-
tackle-harmful-tax-competition.html>. Acesso em: 15 dez. 2017.
533 Os ativos de IP que são funcionalmente equivalentes a patentes incluem, por exemplo,
direitos autorais pela criação de software.
534 MACHADO, Clarissa; DEL BEL, Thiago. Preços de Transferência e BEPS – Ações 8-
10, 13 e 14 e os potenciais impactos no Brasil. No prelo.
535 CHURTON, Sarah; LAMBERT, Ellis; DENNIS, Ian, op. cit.
536 Para mais detalhes, ver: ROCHA, Sérgio André. Tributação Internacional. São Paulo:
Quartier Latin, 2013.
537 Solução de Divergência Cosit n. 6, de 20 de agosto de 2015 e Solução de Consulta Cosit
n. 325, de 20 de junho de 2017.
538 A lei prevê outros tipos de incentivos, mas os citados no texto podem ser considerados os
mais relevantes.

1883
539 Professor Sênior de Direito Tributário da Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo. Mestre, Doutor e Livre-Docente pela Faculdade de Direito da USP. Co-fundador e
diretor do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Membro da International
Fiscal Association (IFA) e da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF).
Advogado em São Paulo.
540 Algumas das fontes bibliográficas consultadas para a elaboração deste artigo são listadas
a seguir: UTESCHER, Tanja, Internet und Steuern: electronic commerce und Telearbeit,
Düsseldorf, IDW-Verl., 1999; SPATSCHECK, Rainer, Steuern im Internet:
Steuerprobleme des E-Commerce, Colônia, O. Schmidt, 2000; DE HESSELLE, Vera, Das
deutsche Steuerrecht, Kompaktwissen für die Praxis, 2. ed. Atual., Troisdorf, Verlag
Personal, Recht, Management Limited, Birmingham, 2011; FEHLING, Daniel, Die
steuerlichen Herausforderungen der digitalen Wirtschaft, in IStR 2014, 638-beck-online;
PINKERNELL, Reimar, Der OECD-Diskussionsentwurf zu den steuerlichen
Herausforderungen der “Digital Economy”, de 24-3-2014, IStR 2014, 273 – beck-online;
RÖDDER, Thomas e PINKERNELL, Reimar, Zum Seminar F: 20 Thesen zur BEPS-
Diskussion, IStR 2013, 619 – beck-online; PINKERNELL, Reimar, Beschränkte
Steuerpflicht ein Vergnügen für Software und Datenbanken (Entwurf eines BMF-
Schreibens vom 17-5-2017), in Ubg, Caderno 9/2017, IStN 1865-7222; ERNST &
YOUNG, Germany issues final guidance on classification of cross-border software and
database use payments for withholding tax purposes, in Global Tax Alert, 2 de novembro
de 2017 – www.ey.com/taxalerts; SCHNITGER, Arne e OSKAMP, Michael, Der Entwurf
des BMF-Schreibens zur beschränkten Steuerpflicht und Abzugssteuer nach § 50 a EstG
bei grenzüberschreitender Überlassung von Software und Datenbanken, IStR 2017, 616-
beck-online; HOLTHAUS, Jörg, Besteuerung von Rechtsüberlassungen im Inland und
Steuerabzug gemäss § 50 c Abs. 1. Nr. 3 EstG vor dem Hintergrund des geplanten BMF-
Schreibens, IStR 2017, 729-beck-online; BMF-SCHREIBEN, Beschränkte Steuerpflicht
und Steuerabzug bei grenzüberschreitender Überlassung vom Software und Datenbanken,
de 27-10-2017, publicado no Bundessteuerblatt Teil I, em 2 de novembro de 2017;
ROTHMANN, Gerd Willi, A Denúncia do Acordo de Bitributação Brasil-Alemanha e
suas Consequências, in ROCHA, Valdir de Oliveira (Hrsg), Tributos e Preços de
Transferência, 2. Band, São Paulo, Dialética, 1999.
541 FEHLING, Daniel, Die steuerlichen Herausforderungen der digitalen Wirtschaft, in IStR
2014, 638-beck-online, p. 3.
542 EUROPEAN COMMISSION, Communication from the Commission to the European
Parliament and the Council, A Fair and Efficient Tax System in the European Union for
the Digital Single Market, COM, 2017 547 final, p. 3 ss.
543 COM, 2017, 547 final, op.cit., p. 8.
544 COM 2017, 547 final, op. cit., p. 10.
545 PINKERNELL, Reimar, Der OECD-Diskussionsentwurf zu den steuerlichen
Herausforderungen der “Digital Economy”, de 24-3-2014, IStR 2014, 273 – beck-online,
p. 3.
546 PINKERNELL, Reimar, op. cit., p. 5.
547 UTESCHER, Tanja. Internet und Steuern: electronic commerce und Tekarbeit,
Düsseldorf: IDW-Verl., 1999. p. 49.

1884
548 SPATSCHEK, Rainer. Steuern im Internet: Steuerprobleme des E-Commerce. Colônia:
O. Schmidt, 2000.
549 ROTHMANN, Gerd Willi. A Denúncia do Acordo de Bitributação Brasil-Alemanha e
suas Consequências. In ROCHA, Valdir de Oliveira (Org.), Tributos e Preços de
Transferência, 2. ed., São Paulo: Dialética, 1999.
550 SPATSCHEK, Rainer. Steuern im Internet: Steuerprobleme des E-Commerce. Colônia:
O. Schmidt, 2000. p. 58.
551 SPATSCHEK, Rainer, op. cit., p. 60.
552 HOLTHAUS, Jörg, Besteuerung von Rechtsüberlassungen im Inland und Steuerabzug
gemäss § 50 c Abs. 1. Nr. 3 EstG vor dem Hintergrund des geplanten BMF-Schreibens,
IStR 2017, 729-beck-online. p. 550 e s.
553 HOLTHAUS, op. cit., p. 551.
554 HOLTHAUS, op. cit., p. 558/559.
555 HOLTHAUS, Jörg, Besteuerung von Rechtsüberlassungen im Inland und Steuerabzug
gemäss § 50 c Abs. 1. Nr. 3 EstG vor dem Hintergrund des geplanten BMF-Schreibens,
IStR 2017, 729-beck-online, p. 3.
556 BMF-SCHREIBEN. Beschränkte Steuerpflicht und Steuerabzug bei
grenzüberschreitender Überlassung vom Software und Datenbanken, de 27-10-2017,
publicado no Bundessteuerblatt Teil I, em 2 de novembro de 2017.
557 PINKERNELL, Reimar. Beschränkte Steuerpflicht ein Vergnügen für Software und
Datenbanken (Entwurf eines BMF-Schreibens vom 17.5.2017), in Ubg, Caderno 9/2017,
IStN 1865-7222, p. 497.
558 EY, Germany issues final guidance on classification of cross-border software and
database use payments for withholding tax purposes, in Global Tax Alert, 2 de novembro
de 2017, disponível em: <www.ey.com/taxalerts>. Acesso em: 15 dez. 2017.
559 EY, op. cit.
560 EY, op. cit.
561 Sobre a diferença entre “utilização” (Nutzung) e aproveitamento (Verwertung), cf.
PINKERNELL, Reimar, op. cit., p. 503.
562 HOLTHAUS, Jörg, op. cit., p. 3.
563 SCHNITGER, Arne e OSKAMP, Michael, Der Entwurf des BMF-Schreibens zur
beschränkten Steuerpflicht und Abzugssteuer nach § 50 a EstG bei grenzüberschreitender
Überlassung von Software und Datenbanken, IStR 2017, 616-beck-online, p. 3.
564 SCHNITGER, Arne e OSKAMP, Michael, op. cit., p. 2.
565 SCHNITGER, Arne e OSKAMP, Michael, op. cit., p. 3.
566 PINKERNELL, Reimar. Beschränkte Steuerpflicht ein Vergnügen für Software und
Datenbanken (Entwurf eines BMF-Schreibens vom 17.5.2017), in Ubg, Caderno 9/2017,
IStN 1865-7222, p. 505.
567 SCHNITGER, Arne e OSKAMP, Michael, op. cit., p. 6.
568 PINKERNELL, Reimar, Beschränkte Steuerpflicht ein Vergnügen für Software und
Datenbanken (Entwurf eines BMF-Schreibens vom 17.5.2017), in Ubg, Caderno 9/2017,

1885
IStN 1865-7222, p. 508.
569 Advogado em São Paulo. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. Mestre (LLM) em Direito Tributário Internacional
pela Georgetown University Law Center (Graduate Tax Scholar).
570 BRAUNER, Yariv, Cost Sharing and the Acrobatics of Arm’s Length Taxation, 38
INTERTAX 554, (2010).
571 O Internal Revenue Code é a principal base legal do sistema tributário dos EUA,
compondo o Título 26 do Código Federal dos EUA (United States Code), promulgado
pelo Congresso norte-americano.
572 No passado, o princípio commensurate with income já recebeu muitas críticas
doutrinárias por não estar alinhado com os Guidelines da OCDE, na medida em que gera
incerteza sobre a aceitabilidade de transações que, embora consideradas at arm’s lenght,
não seriam comensuráveis com a renda. Sobre o assunto, veja SCHOUERI, Luis Eduardo.
Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro. 2. ed. São Paulo: Dialética,
2006. p. 224.
573 HERIFORD, Brandon, KEATES, Harry A., LAMOUREUX, Heather e WRIGHT,
Deloris R., US Cost Sharing: Current Issues and Court Cases, International Transfer
Pricing Journal, p. 204, jul./ago. (2013).
574 SCHLER, Michael L., The Arm’s-Length Standard After Altera and BEPS, Tax Notes, p.
1152-1155, 30 de novembro (2015).
575 BURNS, Debra Brubaker, Golden Apple of Discord: International Cost-Sharing
Arrangements, Houston Business and Tax Law Journal, Vol. XV, p. 65-66 (2015).
576 LEVEY, Marc M. e WRAPPE, Steven C., Transfer Pricing: Rules, Compliance and
Controversy, Wolters Kluwer CCH, 4th Edition, p. 161.
577 COLE, Robert T., Practical Guide to U.S. Transfer Pricing, 3rd Edition, § 13.02.
578 A alternativa viável para obter um resultado semelhante ao CSA, ao menos do ponto de
vista empresarial, seria a licença dos direitos relacionados aos ativos intangíveis aos outros
participantes, situação na qual o uso do intangível pelo licenciado estaria obviamente
condicionado ao pagamento de royalties sujeitos à tributação pelo licenciador.
579 O buy-in payment é referido atualmente na legislação dos EUA como platform
contribution transaction payment (PCT payment).
580 Em 27 de setembro de 2007, o IRS já havia publicado o “Coordinated Issue Paper
Addresses Cost-Sharing Arrangements Buy-in Adjustments” (CIP), um relatório para
formalizar sua preocupação e desenvolver teorias alternativas para a aplicação do arm’s
length standard. Vide IRS, Coordinated Issue Paper Addresses Cost-Sharing
Arrangements Buy-In Adjustments, LMSB-04-0907-62 (Sept. 27, 2007), withdrawn in
2012 (see LB&I-04-0812-010 (Aug. 17, 2012).
581 No âmbito da legislação tributária norte-americana, os rendimentos sujeitos ao regime de
tributação automática são aqueles definidos pela Subpart F do IRC § 951, comumente
conhecidos como Subpart F income.
582 A esse respeito, confiram relatório do inquérito emitido pelo U.S. Senate Permanent
Subcommittee on Investigations, que teve como um dos seus objetos a análise de dados de
operações de CSA da Microsoft: <https://www.gpo.gov/fdsys/pkg/CHRG-

1886
112shrg76071/pdf/CHRG-112shrg76071.pdf>. Acesso em: 15 dez. 2017.
583 Joint Committee on Taxation, Description of Revenue Provisions Contained in the
President’s Fiscal Year 2013 Budget Proposal, JCS-2-12, at 366-370 (1º-6-2012).
584 As Treasury Regulations são as regras tributárias emitidas pelo IRS, e representam a
interpretação oficial do Internal Revenue Code pelas autoridades fiscais norte-americanas.
Portanto, elas possuem força secundária em relação ao Internal Revenue Code.
585 LEVEY, Marc M. e WRAPPE, Steven C., Transfer Pricing: Rules, Compliance and
Controversy, Wolters Kluwer CCH, 4th Edition, p. 166.
586 O U.S. Tax Court é um tribunal criado pelo Congresso norte-americano, com
competência limitada a julgamento de casos envolvendo autos de infração relacionados a
tributos federais, exceto employment taxes. O tribunal possui regras específicas de
procedimentos (e.g., não permite julgamentos por júri) e é composto por 19 juízes,
apontados pelo Presidente dos EUA para um mandato de 15 anos.
587 No caso, o juiz entendeu que o IRS não questionou a suposta falta de substância
econômica da estrutura adotada pela Amazon.
588 O modelo de investidor foi incluído na legislação tributária norte-americana nas
Proposed Regulations de 2005.
589 MOREALES, Ivan A., BENDEMIRE, Kevin T. e MAUNEY, Mathew S., Cost Sharing
Final Regs. Clarify and Refine 2008 Temporary Regs., Journal of International Taxation,
maio (2012).
590 A posição do IRS em futuros casos seria apoiada pela decisão da Suprema Corte dos
EUA no caso Mayo Foundation v. United States, 562 US 44 (2011), a qual determinou que
as regras interpretativas (Regulations emitidas pelas autoridades fiscais com base em
expressa autorização legal) possuem um alto grau de deferência e geralmente serão
ignoradas somente se forem consideradas arbitrárias ou manifestamente contrárias ao IRC.
591 LEVEY, Marc M. e ARTHUR, Brian P., Cost Sharing Developments in the U.S.: The
Arm’s Length Standard After Xilinx and Veritas, 21 J. Int’l Tax n. 20, setembro (2010).
592 AVI-YONAH, Reuven, Xilinx Revisited, Tax Notes, p. 1621, 29 de março (2010); e The
Rise and Fall of Arm’s Length, Virginia Tax Review (1995).
593 SCHLER, Michael L., The Arm’s-Length Standard After Altera and BEPS, Tax Notes, p.
1167, 30 de novembro (2015).
594 OECD (2015), Aligning Transfer Pricing Outcomes with Value Creation, Actions 8-10
2015 Final Reports, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project, OECD
Publishing, Paris.
595 Idem, p. 67.
596 Idem, p. 68.
597 Idem, p. 74.
598 Idem, p. 103.
599 Idem, p. 109.
600 Idem, p. 163.
601 Idem, p. 174.

1887
602 SCHLER, Michael L., The Arm’s Length Standard After Altera and BEPS, Tax Notes, p.
1169, 30 de novembro (2015).
603 A sistemática do GILTI é relativamente parecida com a sistemática da “excess profit
analysis” contida no relatório final da OCDE no âmbito do Projeto BEPS, Ação 3, ao
abordar os métodos para mensurar lucros de uma CFC. Vide OECD (2015), Designing
Effective Controlled Foreign Company Rules, Action 3 – 2015 Final Report, OECD/G20
Base Erosion and Profit Shifting Project, OECD Publishing, Paris, p. 49.
604 Por conta disso, estima-se que, se os rendimentos GILTI forem submetidos a uma
tributação efetiva de 13,12% no exterior, não haveria qualquer tributação sobre tais
rendimentos nos EUA.
605 BURNS, Debra Brubaker, Golden Apple of Discord: International Cost-Sharing
Arrangements, Houston Business and Tax Law Journal, Vol. XV, p. 86 (2015).
606 O professor Avi-Yonah também destaca que, embora as regras de transfer pricing
aplicáveis a um CSA estabeleçam o pagamento de um buy-in para atingir resultado similar
ao do super-royalty rule, a discussão prática se resumiu a uma discussão de valuation,
com consequências desfavoráveis ao IRS (vide Veritas e Amazon). Vide AVI-YONAH,
Reuven S., Amazon vs. Commissioner: Has Cost Sharing Outlived Its Usefulness?, Law &
Economics Research Paper Series, Paper No. 17-003, maio de 2017.
607 HODGE, Scott A., Ten Reasons the U.S. Should Move to a Territorial System of Taxing
Foreign Earnings, Tax Foundation Special Report, No. 191, maio (2011).

1888
1 PhD (International Taxation, Leiden University), MBA (Rotterdam School of Management,
Erasmus University Rotterdam), LL.M. (International and European Tax Law, Maastricht
University), MSc (Fiscal Economics, Maastricht University), Manager of the Current
Awareness and Tables (CAT) Knowledge Group, International Bureau for Fiscal
Documentation (IBFD), and Managing Editor of the Bulletin for International Taxation.
The author can be contacted at a.bal@ibfd.org. The chapter covers developments until 1
October 2017.
2 OECD, Action Plan on Base Erosion and Profit Shifting (2013).
3 OECD, BEPS Action 1: Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy (Public
Discussion Draft) (2014).
4 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy. Action 1: 2014 Deliverable
(2014).
5 OECD, International VAT/GST Guidelines (OECD 2015).
6 First Council Directive 67/227/EEC of 11 April 1967 on the Harmonization of Legislation
of Member States Concerning Turnover Taxes and Second Council Directive 67/228/EEC
of 11 April 1967 on the Harmonisation of Legislation of Member States Concerning
Turnover Taxes - Structure and Procedures for Application of the Common System of
Value Added Tax, OJ 71 of 14 Apr. 1967.
7 Council Directive 2006/112/EC of 28 November 2006 on the Common System of Value
Added Tax, OJ L 347 of 11 Dec. 2006 (hereinafter: the “VAT Directive”).
8 For example, Member States may decide about the applicable VAT rates. The VAT
Directive only lays down the minimum standard rate (15%) and the minimum reduced rate
(5%).
9 Council Implementing Regulation (EU) No 282/2011 of 15 March 2011 Laying Down
Implementing Measures for Directive 2006/112/EC on the Common System of Value
Added Tax, OJ L77 of 23 Mar. 2011 (hereinafter: the “VAT Implementing Regulation”).
10 Regulations are binding in their entirety and are directly applicable in all Member States.
In contrast, a directive is binding as to the result to be achieved, allowing each Member
State to choose the method and form of implementing it.
11 CJEU, 5 Feb. 1963, 26/62, NV Algemene Transport- en Expeditie Onderneming van Gend
& Loos v Netherlands Inland Revenue Administration.
12 CJEU, 15 July 1964, 6/64, Flaminio Costa v. ENEL.
13 Art. 14(1) VAT Directive.
14 Art. 24 VAT Directive.
15 Art. 7(1) VAT Implementing Regulation.
16 Art. 7(2) and Annex 1 VAT Implementing Regulation.
17 Art. 44 VAT Directive (the default place-of-supply rule for B2B services), art. 58 and 59
VAT Directive (for B2C transactions). However, under article 59a of the VAT Directive,
Member States may exercise the option of levying VAT where consumption actually
occurs. A “use and enjoyment” clause may be applied by Member States to electronic
services supplied by EU suppliers to both private and business customers. It allows
Member States to consider that services supplied within their territory or in third countries

1889
are supplied, respectively, outside the European Union or within their territory if this is
where those services are effectively used and enjoyed.
18 According to article 18(2) of the VAT Implementing Regulation, if no VAT identification
number has been communicated, the supplier may regard his customer as a non-taxable
person, irrespective of any information to the contrary. The purpose of this provision is to
provide certainty for the supplier as to the status of the customer by disregarding
information other than the VAT identification number. The use of “may” makes it optional
for the supplier to use this provision. If the supplier does not know the VAT identification
number of the customer but has other evidence to substantiate his status as a taxable
person, the supplier may issue an invoice without VAT and apply the reverse charge
mechanism. In such a scenario, he assumes the risk for the incorrect status determination
and will be held liable for VAT payment if his determination turns out to be wrong.
19 Art. 196 VAT Directive.
20 See section 3.3.
21 The term “established” refers to non-registered legal persons and the terms “permanent
address” and “usual residence” refer to non-taxable natural persons. A permanent address
of a natural person is the address entered in the population or similar register, or the
address indicated by that person to the relevant tax authorities, unless there is evidence
that this address does not reflect reality. The place where a natural person usually resides
is the place where that natural person usually lives as a result of personal and occupational
ties. Where the occupational ties are in a country different from that of the personal ties, or
where no occupational ties exist, the place of usual residence shall be determined by
personal ties that show close links between the natural person and a place where he is
living (art. 12 and 13 VAT Implementing Regulation).
22 See European Commission, Explanatory Notes on the EU VAT Changes to the Place of
Supply of Telecommunications, Broadcasting and Electronic Services That Enter into
Force in 2015 (3 April 2014).
23 Art. 24a VAT Implementing Regulation.
24 Art. 24b VAT Implementing Regulation.
25 Art. 24d and 24f VAT Implementing Regulation.
26 The One Stop Shop Scheme cannot be used by non-EU suppliers that are already
registered in the European Union (for example, because they receive services that are
effectively used and enjoyed in a Member State or perform intra-Community supplies of
goods). See art. 358a VAT Directive.
27 For the concept of cloud broker, see National Institute of Standards and Technology
(NIST), NIST Cloud Computing Reference Architecture (2011), available at:
http://collaborate.nist.gov/twiki-cloud-
computing/pub/CloudComputing/ReferenceArchitectureTaxonomy/NIST_SP_500-292_-
_090611.pdf.
28 For commissionaire arrangements, see art. 28 VAT Directive.
29 Art. 9a(3) VAT Implementing Regulation.
30 Explanatory Notes, supra n. 21, at sec. 3.4.3.
31 Explanatory Notes, supra n. 21, at sec. 3.4.3.

1890
32 A taxable person authorizes the charge to the customer if it can influence whether, at what
time or under which preconditions the customer pays. See Explanatory Notes, supra n. 21,
at sec. 3.4.6.
33 The phrase “authorises … the delivery of the services” refers to the situation in which the
taxable person can influence whether, at what time or under which preconditions the
delivery is made. See Explanatory Notes, supra n. 21, at sec. 3.4.6.
34 Art. 9a(1) VAT Implementing Regulation.
35 The concept of intra-Community supply is similar to that of export of goods. Whereas the
exportation of goods refers to the removal of goods from EU territory, the intra-
Community supply refers to the removal of goods from the territory of one Member State
to a destination in another Member State. Just like the exportation of goods, intra-
Community supplies of goods are zero rated.
36 The concept of the intra-Community acquisition is similar to that of the importation of
goods. Whereas the importation of goods refers to the entry of goods into the territory of
the European Union from a non-EU country, the intra-Community acquisition refers to the
entry of goods into the territory of a Member State of the European Union from another
Member State. Just like the importation of goods, the intra-Community acquisition of
goods is subject to VAT where the customer is registered for VAT.
37 Art. 34 VAT Directive.
38 The value of distance sales of excisable goods should not be taken into account for the
purposes of determining whether or not the threshold has been exceeded. There is no
threshold for excisable products. Any supplier who makes distance sales of excisable
goods to another Member State must register and account for VAT in that Member State.
The supply of excisable goods is always subject to VAT in the Member State of arrival.
39 Art. 23 Council Directive 2009/132/EC of 19 October 2009 determining the scope of
Article 143(b) and (c) of Directive 2006/112/EC as regards exemption from value added
tax on the final importation of certain goods. Goods in small consignments of a non-
commercial character sent by private individuals from a third country to private
individuals in a Member State are exempt from import VAT if their value does not exceed
EUR 45. See Art. 2 Council Directive 2006/79/EC of 5 October 2006 on the exemption
from taxes of imports of small consignments of goods of a non-commercial character from
third countries.
40 Art. 23 Council Regulation (EC) No 1186/2009 of 16 November 2009 setting up a
Community system of reliefs from customs duty.
41 Commission Expert Group on the Taxation of the Digital Economy, Report (28 May
2014),
http://ec.europa.eu/taxation_customs/taxation/gen_info/good_governance_matters/digital_economy/index_
42 http://ec.europa.eu/priorities/digital-single-market_en; European Commission,
Communication from the Commission to the European Parliament, the Council, the
European Economic and Social Committee and the Committee of the Regions: A Digital
Single Market Strategy for Europe, COM(2015) 192 final (6 May 2015), http://eur-
lex.europa.eu/legal-content/EN/TXT/PDF/?uri=CELEX:52015DC0192&from=EN.
43 European Commission, Communication from the Commission to the European

1891
Parliament, the Council, the European Economic and Social Committee on an action plan
on VAT: Towards a single EU VAT area – Time to decide, COM(2016) 148 final (7 Apr.
2016).
44 European Commission, Fact Sheet, Modernising VAT for e-commerce: Questions and
Answers (1 Dec. 2016), http://europa.eu/rapid/press-release_MEMO-16-3746_en.htm.
45 European Commission, Fact Sheet, Modernising VAT for e-commerce: Questions and
Answers (1 Dec. 2016), http://europa.eu/rapid/press-release_MEMO-16-3746_en.htm.
46 European Commission, Fact Sheet, Modernising VAT for e-commerce: Questions and
Answers (1 Dec. 2016), http://europa.eu/rapid/press-release_MEMO-16-3746_en.htm.
47 European Commission, Fact Sheet, Modernising VAT for e-commerce: Questions and
Answers (1 Dec. 2016), http://europa.eu/rapid/press-release_MEMO-16-3746_en.htm.
48 European Commission, Fact Sheet, Modernising VAT for e-commerce: Questions and
Answers (1 Dec. 2016), http://europa.eu/rapid/press-release_MEMO-16-3746_en.htm.
49 Arthur Cockfield is a Professor at Queen’s University Faculty of Law, Canada.
50 This article draws from and updates an earlier work. See Arthur J. Cockfield, “BEPS and
Global Digital Taxation” 75 Tax Notes International 11 (2014).
51 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1: Final Report
(2015), at 3 [Action 1 Final Report].
52 See OECD Committee on Fiscal Affairs, Electronic Commerce: Taxation Framework
Conditions (1998) (advocating the usage of traditional international tax rules and policies
for global e-commerce).
53 See Chapters 4 and 6 of Arthur Cockfield, Walter Hellerstein, Rebecca Millar, and
Christophe Waerzeggers, Taxing Global Digital Commerce (Kluwer Law International
2013)[Taxing Global Digital Commerce].
54 See also Arthur J. Cockfield, “The Rise of the OECD as Informal World Tax Organization
through the Shaping of National Responses to E-commerce Taxation,” 8 Yale Journal of
Law and Technology 136 (2006).
55 The 2013 report on aggressive international tax planning included discussions on how
cross-border e-commerce structures could be contributing to these losses. See OECD,
Addressing Base Erosion and Profit Shifting 74-76 (2013) [Addressing BEPS]. Later in
that same year, the OECD launched an action plan to implement the BEPS project. See
OECD, Action Plan on Base Erosion and Profit Shifting (2013) [OECD BEPS Action
Plan].
56 Group of Twenty (G20), Tax Annex to the St. Petersburg G20 Leaders’ Declaration
(2013).
57 See OECD, Request for Input Regarding Work on Tax Challenges of the Digital Economy
(2013). See also European Commission, Commission Expert Group on Taxation of the
Digital Economy: Report (May 28, 2014).
58 See Action Plan on Base Erosion and Profit Shifting (2013) at 10.
59 See Action Plan on Base Erosion and Profit Shifting (2013) at 14-15.
60 See Canada Revenue Agency, Income Tax Information Circular IC70-6R7 (2016) at paras.
54 and 55.

1892
61 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1: Final Report
(2015), at 132.
62 OECD, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7 –
2015 Final Report (2015).
63 OECD, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status, Action 7 –
2015 Final Report (2015).
64 See OECD, Draft Contents to the 2017 Update to the OECD Model Convention (2017), at
12-13.
65 Action 7, Final Report 13, at 17.
66 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1: Final Report
(2015), at 145.
67 See OECD, Discussion Draft on Additional Guidance on the Attribution of Profits to
Permanent Establishments (2017).
68 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1: Final Report
(2015), at 136-138.
69 For a detailed discussion, see Arthur Cockfield, Walter Hellerstein, Rebecca Millar, and
Christophe Waerzeggers, Taxing Global Digital Commerce (Kluwer Law International
2013), at 334-403.
70 See, e.g., Arthur J. Cockfield, “Reforming the Permanent Establishment Principle Through
a Quantitative Economic Presence Test,” Tax Notes International (Feb. 17, 2004).
71 See also Luc Hinnekens, ‘‘Looking for an Appropriate Jurisdictional Framework for
Source-State Taxation of International Electronic Commerce in the Twenty-First
Century,’’ 26 Intertax 192 (1998). The OECD noted, however, it is not recommending a
virtual permanent establishment as per Hinnekens although its notion of a “significant
digital presence” is similar in nature.
72 Richard Doernberg, ‘‘Electronic Commerce and International Tax Sharing,’’ Tax Notes
Int’l, March 30, 1998, p.1013; Reuven S. Avi-Yonah, ‘‘International Taxation of
Electronic Commerce,’’ 52 Tax L. Rev. 507 (1997); Arthur J. Cockfield, ‘‘Balancing
National Interests in the Taxation of Electronic Commerce Business Profits,’’ 74 Tul. L.
Rev. 133 (1999)(discussing options to expand source state taxation).
73 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1: Final Report
(2015), at 115.
74 Luc Soete and Karin Kamp, ‘‘The Bit Tax: Taxing Value in the Emerging Information
Society,’’ in Arthur Cordell and Thomas Ide, eds., The New Wealth of Nations: Taxing
Cyberspace (Between the Lines, 1997).
75 Luc Soete and Karin Kamp, ‘‘The Bit Tax: Taxing Value in the Emerging Information
Society,’’ in Arthur Cordell and Thomas Ide, eds., The New Wealth of Nations: Taxing
Cyberspace (Between the Lines, 1997), at 119-129.
76 See OECD, Addressing Base Erosion and Profit Shifting 74-76 (2013).
77 See Chapter VI of the OECD Transfer Pricing Guidelines (2010).
78 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1: Final Report
(2015), at 148.

1893
79 Secret OECD meetings were held in Denmark on the issue of treaty abuse and revenue
losses, beginning with a confidential note from US representatives. See Note by the United
States Delegation on Tax Avoidance through the Improper use or Abuse of Tax
Conventions (TFD/FC/135) (Nov. 14, 1961), available at
http://www.taxtreatieshistory.org/.
80 See Arthur J. Cockfield and Carl MacArthur, “Country-by-Country Reporting and
Commercial Confidentiality,” 63 Canadian Tax Journal 627-660 (2015).
81 Arthur J. Cockfield, “The Limits of the International Tax Regime as a Commitment
Projector,” 33 Virginia Tax Review 59, 88-93 (2013).
82 See Allison Christians and Stephen Shay, General Report, Cahier de Droit Fiscal
International (IFA, 2017), at 13, 52.
83 See also OECD, Hybrid Mismatch Arrangements: Tax Policy and Compliance Issues
(2012); OECD, Neutralising the Effects of Hybrid Mismatch Arrangements (2015).
84 See OECD, Aligning Transfer Pricing Outcomes with Value Creation (2015).
85 See Arthur J. Cockfield, ‘‘Transforming the Internet Into a Taxable Forum: A Case Study
in E-Commerce Taxation,’’ 85 Minn. L. Rev. 1171, 1176, 1197-1200, and 1230-1235
(2001).
86 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1: Final Report
(2015), at 146.
87 See OECD, Harmful Tax Competition: An Emerging Global Issue (1998).
88 Distinguished Research Professor Emeritus. Francis Shackelford Distinguished Professor
in Taxation Law Emeritus.
89 This is how the OECD has described the European Union in making it clear that its
guidance on cross-border transactions do not necessarily apply to intra-EU transactions.
See OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), paragraph 2.31 (“a group of
countries bound by a common legal framework for their VAT system may apply specific
measures to transactions between those countries” (quoting OECD, Taxation and
Electronic Commerce – Implementing the Ottawa Taxation Framework Conditions
(2001), page 45, note 6).
90 Walter Hellerstein and Charles E. McLure, Jr., “Lost in Translation: Contextual
Considerations in Evaluating the Relevance of US Experience for the European
Commission’s Company Tax Proposals,” 58 Bull. for International Fiscal Documentation
86 (2004); Charles E. McLure, Jr. and Walter Hellerstein, “The European Commission’s
Report on Company Income Taxation: What the EU Can Learn from the Experience of the
US States,” 11 Int’l Tax and Public Finance 1 (2004).
91 See OECD, Model Tax Convention on Income and Capital (2017), article 5.
92 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report (2015), section 7.6.1
93 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report (2015), section 7.6.2.
94 See generally Jerome R. Hellerstein, Walter Hellerstein, and John A. Swain, State
Taxation (2017 rev.), Par. 4.25 (hereafter Hellerstein, State Taxation).

1894
95 Northwestern States Portland Cement Co. v. Minnesota, 358 U.S. 450 (1959).
96 Pub. L. No. 86-272, 73 Stat. 555 (1959), codified at 15 U.S.C. §§ 381-385 (Westlaw
2017).
97 Although the Commerce Clause by its terms is simply an affirmative grant of power to
Congress to regulate commerce, for most of U.S constitutional history, the U.S. Supreme
Court has construed this affirmative grant as embodying implied restraints on permissible
state action even in the absence of congressional legislation limiting state power. These
implied restraints on state action are often referred to as the “dormant” or “negative”
Commerce Clause: “dormant” because they remain inactive until the Court invokes them
to invalidate state legislation; “negative” because they reflect the “negative implications”
of the Commerce Clause. See Jerome R. Hellerstein, Walter Hellerstein, and John A.
Swain, State Taxation (2017 rev.), Par. 4.01[1][b].
98 The nexus rules in the indirect context are considered in item 3 below.
99 504 U.S. 298 (1992).
100 386 U.S. 753 (1986).
101 When states first adopted sales taxes during the 1930s, they encountered a troublesome
gap in the tax structure attributable to the constitutional strictures prohibiting them from
taxing sales consummated outside their borders or in interstate commerce. The gap created
two concerns. States feared (1) the loss of business that local merchants would suffer
when prospective customers made out-of-state or interstate purchases to avoid in-state
sales tax liability, and (2) the loss of revenue they would incur as a result of the diversion
of sales tax to non-tax states. To deal with this potential loss of business and revenue,
states enacted “complementary” or “compensating” use taxes on goods purchased outside
the state and brought into the state for use, storage, or consumption in the state. John Due
and John Mikesell, Sales Taxation: State and Local Structure and Administration (2d ed.
1994), page 245. Compensating use taxes are functionally equivalent to sales taxes. They
are typically levied upon the use, storage, or consumption in the state of tangible personal
property that has not been subjected to a sales tax. The use tax imposes an exaction equal
in amount to the sales tax that would have been imposed on the sale of the property in
question if the sale had occurred within the state’s taxing jurisdiction. The state overcomes
the constitutional hurdle of taxing an out-of-state or interstate sale by imposing the tax on
a subject within its taxing power – the use, storage, or consumption of property within the
state. See Henneford v. Silas Mason Co., 300 U.S. 577 (1937) (sustaining constitutionality
of state use tax scheme). In principle, then, the in-state purchaser stands to gain nothing by
making an out-of-state or interstate purchase free of sales tax because it will ultimately be
saddled with an identical use tax when it brings the property into the taxing state.
102 Quill, 504 U.S. at 314.
103 Quill, 504 U.S. at 317.
104 As distinguished from nexus based on physical presence.
105 See footnote 10 above.
106 See Complete Auto Transit, Inc. v. Brady, 430 U.S. 274 (1977).
107 These cases are discussed in detail in Jerome R. Hellerstein, Walter Hellerstein, and John
A. Swain, State Taxation (2017 rev.), par. 6.11.

1895
108 Ala. Code § 40-18-31.2 (Westlaw 2017) ($500,000 of sales or 25 percent of total sales);
Cal. Rev. & Tax. Code § 23101(b) (Westlaw 2017) (lesser of $500,000 or 25 percent of
total sales); 1 Colo. Code Regs. 201-2:39-22-301.1(2)(b)(iii) (Westlaw 2017) ($500,000 of
sales establishes “substantial nexus”); Conn. Gen. Stat. § 12-216a (Westlaw 2017)
(adopting “economic nexus” standard); Conn. Informational Pub. No. 2010 (29.1), Dec.
28, 2010, available at www.checkpoint.thomsonreuters.com ($500.000 of receipts gives
rise to economic nexus); Mich. Comp. Laws Ann. § 206.621(1) (Westlaw 2017)
($350,000 of gross receipts); N.Y. Tax Law § 209.1(b) (Westlaw 2017) ($1,000,000 of
receipts); Ohio Rev. Code Ann. §§ 5751.01(H), 5751.01(l) (Westlaw 2017) ($500,000 of
gross receipts); Tenn. Code Ann. § 67-4-2004(49)(A)(v)(a) (Westlaw 2017) (taxpayer’s
total receipts in the state exceed the lesser of $500,000) or 25 percent of the taxpayer’s
total receipts).
109 See Factor Presence Nexus Standard for Business Activity Taxes, available at
www.mtc.gov ($500,000 of sales).
110 See Jerome R. Hellerstein, Walter Hellerstein, and John A. Swain, State Taxation (2017
rev.), par. 6.31 (describing statutes).
111 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report (2015), section 7.6.2.
112 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report (2015), paragraph 359.
113 The following discussion is based on Jerome R. Hellerstein, Walter Hellerstein, and John
A. Swain, State Taxation (2017 rev.), paragraphs 8.03 – 8.06, which describes the
historical development of the states’ taxation of corporate income in detail.
114 George Altman and Frank Keesling, Allocation of Income in State Taxation (2nd ed.
1950), page. 38.
115 Underwood Typewriter Co. v. Chamberlain, 254 U.S. 113, 120-121 (1920).
116 Moorman Mfg. Co. v. Bair, 437 U.S. 267, 280 (1978) (Powell, J., dissenting).
117 Container Corp. of Am. v. Franchise Tax Bd., 463 U.S. 159, 170 (1983).
118 Container Corp. of Am. v. Franchise Tax Bd., 463 U.S. 159, 170 (1983), at 183.
119 General Motors Corp. v. District of Columbia, 380 U.S. 553, 561 (1965).
120 437 U.S. 267 (1978).
121 437 U.S. 267 (1978) at 280.
122 According greater (or exclusive) weight to the sales factor is designed to encourage
taxpayers to locate in the state because their in-state capital and labor will count relatively
less (or not at all) in determining their in-state income and their sales will count only
insofar as they have a market within the state. The extent to which these changes actually
influence economic development in a state, especially in light of other states’ adopting
similar formulas, remains an open and controversial question. See, e.g., Kelly Edmiston,
“Strategic Apportionment of the State Corporate Income Tax: An Applied General
Equilibrium Analysis,” 55 Nat’l Tax J. 239 (2002); Laura Wheeler, “Apportionment
Formula Change’s Effect on Georgia Corporate Tax Liability,” State Tax Notes, Sept. 27,
2010, page 829.

1896
123 Source: Federation of Tax Administrators, available at www.taxadmin.org.
124 OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015 Final
Report (2015), paragraph 359.
125 See Walter Hellerstein, “Formulary Apportionment in the EU and the US: A
Comparative Perspective on the Sharing Mechanism of the Proposed CCCTB,” in Ana
Dourado, ed., Movement of Persons and Tax Mobility in the EU: Changing Winds (2013),
page 413 (IBFD 2013); Walter Hellerstein, “Tax Planning Under the CCCTB’s Formulary
Apportionment Provisions: The Good, the Bad, and the Ugly,” in Denis Weber, ed.,
CCCTB: Some Selected Issues (2012), page 221.
126 See Table 1 above.
127 Eisner v. Macomber, 252 U.S. 189, 207 (1920) (quoting Stratton’s Independence, Ltd. v.
Howbert, 231 U.S. 399, 415 (1913) and Doyle v. Mitchell Bros., 247 U.S. 179 (1918)).
128 OECD, International VAT/GST Guidelines (2017).
129 OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), paragraph 1.11.
130 See Jerome R. Hellerstein, Walter Hellerstein, and John A. Swain, State Taxation (2017
rev.), par. 18.02[1].
131 See OECD, Tax Challenges of the Digital Economy, supra note 4, chapter 8; OECD,
Mechanisms for the Effective Collection of VAT/GST Where the Supplier is Not Located in
the Jurisdiction of Taxation, available at http://www.oecd.org/tax/consumption/oecd-
delivers-implementation-guidance-for-collection-of-value-added-taxes-on-cross-border-
sales.htm.
132 Walter Hellerstein, “Federal Constitutional Limitations on Congressional Power to
Legislate Regarding State Taxation of Electronic Commerce,” 53 Nat’l Tax J. 1307
(2000). The U.S. states stand in no better position vis-à-vis international commercial
activity (and, specifically, remote supplies into the United States from foreign suppliers)
than does the United States itself. Accordingly, with respect to international cross-border
activity, global perspectives on taxation of remote sales that are influenced by concerns
over enforcement jurisdiction would appear to be equally applicable to the U.S.
subnational states. See generally Walter Hellerstein, “Jurisdiction to Tax Income and
Consumption in the New Economy: A Theoretical and Comparative Perspective,” 38
Georgia Law Review 1 (2003) (elaborating on concepts of “substantive jurisdiction” and
“enforcement jurisdiction”).
133 See, e.g., Marketplace Fairness Act of 2017, S. 976, 115th Cong., 1st Sess.(2017)
(authorizing mandatory vendor collection of sales and use taxes on remote sales,
conditioned on states’ simplification and harmonization of their tax regimes and subject to
various thresholds); Remote Transactions Parity Act of 2017, H.R. 2193, 115th Cong., 1st
Sess. (2017) (same).
134 See item 2.1 above.
135 See OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), chapter 3, section C.3.2; OECD,
Mechanisms for the Effective Collection of VAT/GST Where the Supplier is Not Located in
the Jurisdiction of Taxation.
136 See, e.g., Marketplace Fairness Act of 2017, S. 976, 115th Cong., 1st Sess.(2017);

1897
Remote Transactions Parity Act of 2017, H.R. 2193, 115th Cong., 1st Sess. (2017).
137 See South Dakota v. Wayfair, Inc., 901 N.W.2d 754 (S.D. 2017), petition for cert. filed
(No. 17-494) (Oct. 3, 2017).
138 See OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), paragraph 3.64. Such services
obviously include (and, indeed, may largely comprise) remote digital supplies.
139 See OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), paragraph 3.64.
140 See OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), paragraph 3.64.
141 See OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), paragraph 3.64.
142 See OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), paragraph 3.64.
143 See Jerome R. Hellerstein, Walter Hellerstein, and John A. Swain, State Taxation (2017
rev.), par. 18.02[1].
144 Federation of Tax Administrators, Task Force on EDI Audit and Legal Issues for Tax
Administration, Report of the Steering Committee, Model Direct Payment Permit
Regulation 2 (2000), available at www.taxadmin.org.; see also Multistate Tax
Commission, Model Direct Payment Permit Regulation (2000), available at
www.mtc.gov. It may be worth noting that the Streamlined Sales and Use Tax Agreement
(SSUTA), which has been adopted by 24 states, provides, in pertinent part: “Each member
state shall provide for a direct pay authority that allows the holder of a direct pay permit to
purchase otherwise taxable goods and services without payment of tax to the supplier at
the time of purchase. The holder of the direct pay permit will make a determination of the
taxability and then report and pay the applicable tax due directly to the tax jurisdiction.
Each state can set its own limits and requirements for the direct pay permit”. SSUTA §
326 (as amended through September 17, 2015), available at
http://www.streamlinedsalestax.org. See generally Jerome R. Hellerstein, Walter
Hellerstein, and John A. Swain, State Taxation (2017 rev.), chapter 19A (“Streamlined
Sales and Use Tax”).
145 The same thing cannot be said about private consumers, who generally do not comply
with their use tax remittance obligations. A recent U.S. Government report observes that
“states generally require taxpayers who were not charged a tax on their purchases from
out-of-state vendors to pay a use tax on those purchases.” U.S. Government
Accountability Office, Sales Taxes: States Could Gain Revenue from Expanded Authority,
but Businesses Are Likely to Experience Compliance Costs, GAO-18-114 (November
2017), page 14. Some states permit taxpayers to pay use taxes when filing income tax
returns, whereas other states require taxpayers to file a separate use tax form. A few states
also have de minimis exemptions for low dollar amount out-of-state purchases, and some
states allow taxpayers who have not kept complete records of out-of-state purchases to
estimate the use tax owed. (Container Corp. of Am. v. Franchise Tax Bd., 463 U.S. 159,
170 (1983)). However, with the exception of purchases that are required to be registered
with the state, such as vehicles, voluntary compliance is generally thought to be extremely
low. For those states that permit taxpayers to report use taxes on their income tax returns,
it is estimated that only about 1 to 2 percent of returns include use tax payments. Id., page
14 (citing Minnesota House of Representatives, “Use Tax Collection on Income Tax
Returns in Other States,” updated 2015, www.house.leg.state.mn.us/hrd/pubs/usetax.pdf )
(emphasis supplied).

1898
146 See Sales Taxes: States Could Gain Revenue from Expanded Authority, but Businesses
Are Likely to Experience Compliance Costs, GAO-18-114 (November 2017), page 14;
OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), paragraph 3.130. The Guidelines
declare: “The level of compliance with a reverse charge mechanism for business-to-
consumer supplies is likely to be low, since private consumers have little incentive to
declare and pay the tax due, at least in the absence of meaningful sanctions for failing to
comply with such an obligation. Moreover, enforcing the collection of small amounts of
VAT from large numbers of private consumers is likely to involve considerable costs that
would outweigh the revenue involved”.
147 The term “platform” is used broadly to describe entities that facilitate the sale of tangible
personal property or services. Minnesota uses the term “marketplace provider”;
Pennsylvania and Washington use the term “marketplace facilitator”; and Rhode Island
uses the term “retail sale facilitators.” We elaborate upon the definition and application of
these terms in the ensuing discussion.
148 The ensuing discussion draws freely from Walter Hellerstein, John Swain, and Jonathan
Maddison, “Platforms,” 86 State Tax Notes 1165 (2017).
149 Maria Koklanaris, “Minnesota Enacts Nation’s First Marketplace Nexus Provision,”
State Tax Today, June 5, 2017, Doc. 2017-56759, 2017 STT 106-1, available at
www.taxanalysts.org.
150 H.F. 1, section 9, codified at Minn. Stat. Ann. § 297A.66(subd. 1(a)) (Westlaw 2017).
151 H.F. 1, section 9, codified at Minn. Stat. Ann. § 297A.66(subd. 1(a)) (Westlaw 2017).
152 H.F. 1, section 9, codified at Minn. Stat. Ann. § 297A.66(subd. 1(c)).
153 H.F. 1, section 9, codified at Minn. Stat. Ann. § 297A.66(subd. 4(b)).
154 H.F. 1, section 9, codified at Minn. Stat. Ann. § 297A.66(subd. 2).
155 H.F. 1, section 9, codified at Minn. Stat. Ann. § 297A.66(subd. 2).
156 H.F. 1, section 9, codified at Minn. Stat. Ann. § 297A.66(subd. 2)(a)).
157 Engrossed House Bill 2163, Section 201(3), chapter 28, Laws of 2017, 65th Legislature,
2017 3rd Special Session, approved July 7, 2017.
158 Engrossed House Bill 2163, Section 201(3), chapter 28, Laws of 2017, 65th Legislature,
2017 3rd Special Session, approved July 7, 2017, section 202(1)(a).
159 Engrossed House Bill 2163, Section 201(3), chapter 28, Laws of 2017, 65th Legislature,
2017 3rd Special Session, approved July 7, 2017, sections 202(2)(b), 204(3).
160 Engrossed House Bill 2163, Section 201(3), chapter 28, Laws of 2017, 65th Legislature,
2017 3rd Special Session, approved July 7, 2017, section 203(1)(a).
161 Engrossed House Bill 2163, Section 201(3), chapter 28, Laws of 2017, 65th Legislature,
2017 3rd Special Session, approved July 7, 2017, sections 202(1)(b)(i) (emphasis
supplied).
162 Engrossed House Bill 2163, Section 201(3), chapter 28, Laws of 2017, 65th Legislature,
2017 3rd Special Session, approved July 7, 2017, sections 202(1)(b)(ii) (emphasis
supplied).

1899
163 814 F.3d 1129 (10th Cir. 2016), cert. denied, 137 S. Ct. 591 (2016). The Brohl case is
discussed in detail in Jerome R. Hellerstein, Walter Hellerstein, and John A. Swain, State
Taxation (2017 rev.), par. 19.02[7][b].
164 R.I. Gen. Laws § 44-18.2-3(G) (Westlaw 2017).
165 R.I. Gen. Laws § 44-18.2-3(G) (Westlaw 2017), § 44-18.2-3(A).
166 R.I. Gen. Laws § 44-18.2-3(G) (Westlaw 2017), § 44-18.2-3(A), § 44-18.2-4. See Jerome
R. Hellerstein, Walter Hellerstein, and John A. Swain, State Taxation (2017 rev.), par.
19A.07[6], for a discussion of Streamlined Sales and Use Tax exemption certificates.
167 R.I. Gen. Laws § 44-18.2-3(G) (Westlaw 2017), § 44-18.2-4 (emphasis supplied). The
emphasis is supplied to underscore the point that collection and transmission of payments
are a prerequisite to being a “retail sale facilitator”.
168 H.B. 542, enacted as Act 43, Part V-A (Oct. 30, 2017).
169 H.B. 542, enacted as Act 43, Part V-A (Oct. 30, 2017), section 213(C) (defining
“marketplace facilitator” to include a person that facilitates “the sale of tangible personal
property” without any reference to other sales.).
170 H.B. 542, enacted as Act 43, Part V-A (Oct. 30, 2017), section 213.1(A).
171 H.B. 542, enacted as Act 43, Part V-A (Oct. 30, 2017), section 213.1(C).
172 H.B. 542, enacted as Act 43, Part V-A (Oct. 30, 2017), section 213(C).
173 A “forum” is defined as “a place where sales at retail occur, whether physical or
electronic. The term includes a store, a booth, a publicly accessible internet website, a
catalog, or similar place.” H.B. 542, enacted as Act 43, Part V-A (Oct. 30, 2017), section
213(B).
174 H.B. 542, enacted as Act 43, Part V-A (Oct. 30, 2017), section 213(C) (emphasis
supplied). The emphasis is supplied to underscore the point that collection and
transmission of payments are a prerequisite to being a “marketplace facilitator,” which is
similar to the Rhode Island definition of a “retail sale facilitator”, as mentioned in the
previous item. The Washington legislation does not appear to require that a “marketplace
facilitator” participate in the collection and/or transmission of the payments for the sale
(see item 3.2.2.1 above).
175 H.B. 542, enacted as Act 43, Part V-A (Oct. 30, 2017), section 213(D).
176 H.B. 542, enacted as Act 43, Part V-A (Oct. 30, 2017), section 213(D).
177 See OECD, Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 – 2015
Final Report (2015), chapter 8; OECD, VAT/GST Guidelines, supra note 38, chapter 3,
sections C.3.2, C.3.3; OECD, Mechanisms for the Effective Collection of VAT/GST, supra
note 41.
178 See OECD, International VAT/GST Guidelines (2017), chapter 3, sections C.3.2, C.3.3;
OECD, Mechanisms for the Effective Collection of VAT/GST Where the Supplier is Not
Located in the Jurisdiction of Taxation.
179 Council Directive 06/112, arts. 358a-369, 2006 O.J. (L 347) 1 (EC).
180 See Policy and Strategy, Inland Revenue, New Zealand, Special Report, “GST on cross-
border supplies of remote services” (May 2016), available at
http://taxpolicy.ird.govt.nz/publications/2016-sr-gst-cross-border-supplies/overview.

1900
181 See “GST registration system for non-resident businesses,” (describing and providing
portal for simplified GST registration), available at
https://www.ato.gov.au/Business/International-tax-for-business/In-detail/Doing-business-
in-Australia/Australian-GST-registration-for-non-
residents/#FullGSTregistrationwithABN.
182 Streamlined Sales and Use Tax Agreement, available at www.streamlinedsalestax.org
(SSUTA). For a detailed description and analysis of SSUTA, see Jerome R. Hellerstein,
Walter Hellerstein, and John A. Swain, State Taxation (2017 rev.), chapter 19A.
183 Streamlined Sales and Use Tax Agreement (SSUTA), section 102.
184 These provisions are all set forth in SSUTA and discussed in detail in Jerome R.
Hellerstein, Walter Hellerstein, and John A. Swain, State Taxation (2017 rev.), par.
19A.07[6].
185 Ala. Code §§ 40-23-191 et seq. (Westlaw 2017).
186 Walter Hellerstein and Charles E. McLure, Jr., “Lost in Translation: Contextual
Considerations in Evaluating the Relevance of US Experience for the European
Commission’s Company Tax Proposals,” 58 Bull. for International Fiscal Documentation
86 (2004); Charles E. McLure, Jr. and Walter Hellerstein, “The European Commission’s
Report on Company Income Taxation: What the EU Can Learn from the Experience of the
US States,” 11 Int’l Tax and Public Finance 1 (2004).
187 Associate Professor, University of Melbourne and Adjunct Professor, Australian
National University.
188 “US corporate cash pile grows to $1.84 trillion, led by the tech sector”, Moody’s Investor
Service, 19 July 2017.
189 Ibid.
190 “Google and Facebook bring in one-fifth of global ad revenue”, The Guardian, 2 May
2017.
191 “Why Google and Facebook proved the Digital Ad Market is a Duopoly”, Reuters 28
July 2017.
192 See M. Herzfeld, M. Honda, “Moving to Territorial: Lessons from Japan (2018)”, 89 Tax
Notes International 119.
193 Ibid.
194 Tax Law Amendment (Combating Multinational Tax Avoidance) Act 2015.
195 This article does not consider Australia’s diverted profits tax which commenced on 1
July 2017.
196 OECD, Action Plan on Base Erosion and Profit Shifting (2013), p. 11.
197 Ibid.
198 The Inclusive Framework is a framework to allow for the involvement of non-G20
countries in the implementation of the BEPS measures: OECD/G20, Background Brief,
Inclusive Framework on BEPS, para. 2.1. By June 2017, 100 countries and jurisdictions
had joined the Inclusive Framework: OECD/G20, Inclusive Framework on BEPS,
Progress Report July 2016June 2017. <http://www.oecd.org/tax/beps/inclusive-
framework-on-BEPS-progress-report-july-2016-june-2017.pdf>.

1901
199 In 2017, the OECD/G20 issued “Public Discussion Draft, Additional Guidance on the
Attribution of Profits to a Dependent Agent Permanent Establishment”. The Discussion
Draft replaced the Discussion Draft issued in July 2016.
200 OECD/G20, Multilateral Convention to Implement Tax Treaty Related Measures to
Prevent Base Erosion and Profit Shifting. <http://www.oecd.org/tax/treaties/multilateral-
convention-to-implement-tax-treaty-related-measures-to-prevent-BEPS.pdf>.
201 Model Tax Convention on Income and on Capital (Condensed) (Paris: OECD, 2017).
202 OECD Model Tax Convention on Income and on Capital, (Condensed), (Paris: OECD,
2014).
203 Article 5(5) of the OECD Model 2017.
204 OECD Model (2014), OECD Model Tax Convention on Income and on Capital,
(Condensed), (Paris: OECD, 2014), p. 202, para. 9.
205 OECD/G20, Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status,
Action 7, Final Report (2015), p. 13, para. 1.
206 Ibid., p. 15–27.
207 JC Fleming, RJ Peroni, SE Shay, “Worse Than Exemption”, (2009) 59 Emory Law
Journal 79, p. 934.
208 Bloomberg, S&P Global Market Intelligence.
209 Hansard, Senate Economic References Committee, 22 August 2017, p. 32.
210 Ibid.
211 Bloomberg, S&P Global Market Intelligence.
212 Ibid.
213 See JC Fleming, RJ Peroni, SE Shay, “Worse Than Exemption”, (2009) 59 Emory Law
Journal 79; ED Kleinbard, “Stateless Income and its Remedies” in T Pogge, K Mehta
(eds.) Global Tax Fairness (Oxford: OUP, 2016), p. 129-52; ED Kleinbard, “Stateless
Income” (2011), 11 Florida Tax Review 699; ED Kleinbard, “The Lessons of Stateless
Income” (2011), 65 Tax Law Review 99.
214 See US Senate, Permanent Subcommittee on Investigations, “Offshore Profit Shifting
and the U.S. Tax Code – Part 2 (Apple Inc.)” (2013), p. 15-16.
215 US Treasury Regulation § 301.7701-3(b)(2).
216 See US Senate, Permanent Subcommittee on Investigations, “Offshore Profit Shifting
and the U.S. Tax Code – Part 2 (Apple Inc.)” (2013), p. 13-15; JG Gravelle, Tax Havens:
International Tax Avoidance and Evasion, US Congressional Research Service (2015), p.
14; ED Kleinbard, “Stateless Income” (2011), 11 Florida Tax Review 699, p. 710.
217 Section 953(c)(6) of the US Tax Code.
218 See US Joint Committee on Taxation, General Explanation of Tax Legislation Enacted in
2015 (2016) p. 171-2; US Senate, Permanent Subcommittee on Investigations, “Offshore
Profit Shifting and the U.S. Tax Code – Part 2 (Apple Inc.)” (2013), p. 14-15.
219 US Joint Committee on Taxation, General Explanation of Tax Legislation Enacted in
2015 (2016) p.171-2. The look-through rule was extended to income years commencing
before 1 January 2020: US Consolidated Appropriations Act 2016.

1902
220 Hansard, Senate Economic References Committee, 22 August 2017, p. 32.
221 Ibid.
222 “Google’s ‘Dutch Sandwich’ Shielded 16 Billion Euros”, Bloomberg Technology, 3
January 2018.
223 Ibid.
224 See “US corporate cash pile grows to $1.84 trillion, led by the tech sector”, Moody’s
Investor Service, 19 July 2017.
225 Bloomberg, “Google’s 2.4% Rate Shows How $60 Billion Is Lost to Tax Loopholes”, 21
October 2010.
226 Ibid.
227 “Google Australia Tax Bill Slashed 90pc”, The Australian Financial Review, 2 May
2012.
228 “The $5bn tax crackdown targets multinational technology giants”, The Australian, 30
November 2017.
229 Ibid.
230 Ibid.
231 House of Commons Committee of Public Accounts, “Tax Avoidance – Google”, Ninth
Report of Session 2013-4.
232 UK Public Accounts Committee, Minutes of Evidence, HC716, 12 November 2012.
233 Ibid., p. 7, para. 1.
234 Ibid., p. 7, para. 3.
235 Ibid.
236 Ibid., p. 7, para. 45.
237 Ibid., p. 7, para. 5.
238 Ibid.
239 Ibid. p. 7-8, para. 6.
240 Ibid.
241 Ibid. p. 8, para. 8.
242 Ibid.
243 Ibid., p. 5, para. 1.
244 Agreement Between the Government of the Commonwealth of Australia and the
Government of the Republic of Singapore for the Avoidance of Double Taxation and the
Prevention of Fiscal Evasion with respect to Taxes on Income.
245 Senate, Economic References Committee, Hansard, 22 April 2015, p. 2.
246 Commonwealth of Australia, The Senate, Economic References Committee, Corporate
tax avoidance (2015).
247 Ibid., p. 27, para. 3.54.
248 Ibid., p. 28, para. 3.56.
249 Ibid., para. 3.58.

1903
250 Ibid., para. 3.60.
251 Ibid.
252 Ibid., para. 3.61.
253 Senate, Economic References Committee, Hansard, 22 August 2017, p. 31.
254 Ibid.
255 Ibid.
256 Ibid.
257 Ibid.
258 Ibid.
259 Ibid.
260 Ibid., p. 32; On the techniques used by US MNE to transfer intellectual property to low
or no-tax jurisdictions see MJ Graetz, R. Dowd, “Technological Innovation, International
Competition, and the Challenges of International Income Taxation” (2013), 113 Columbia
Law Review 347, p. 394-404.
261 Senate, Economic References Committee, Hansard, 22 August 2017, p. 32.
262 Treasurer, “Strengthening our taxation system”, Media Release 11 May 2015.
<http://jbh.ministers.treasury.gov.au/media-release/040-2015/>.
263 Second Reading Speech, Commonwealth of Australia, House of Representatives, Official
Hansard (No. 14, 2015), 16 September 2015, p. 10324.
264 K. O’Dwyer (Minister for Revenue and Financial Services), “The importance of free
enterprise, fairness and planning for the future”, Address to the National Press Club, 3
February 2016. <http://kmo.ministers.treasury.gov.au/speech/001-2016/>.
265 Explanatory Memorandum, Tax Laws Amendment (Combating Multinational Tax
Avoidance) Bill 2015 (MAAL Explanatory Memorandum), para. 2.4.
266 Ibid., para. 2.5.
267 Ibid., para. 3.4.
268 Subdivision 960-U of the Income Tax Assessment Act 1997 contains the following
definitions: “significant global” (s 960-555); “global parent entity” (s 960-560); “annual
global income” (s 960-565); and, “global financial statements” (s 960-570).
269 Section 4(1) of the International Tax Agreements Act 1953.
270 Section 4(2) of the International Tax Agreements Act 1953.
271 N. Tadmore, P. Klank, E. Davenport, “Managing Actual and Deemed Pes”, 2016
National Convention, The Tax Institute (Australia), p. 16.
272 Section 177DA(1)(a)(i) of the Income Tax Assessment Act 1936 (1936 Act).
273 Section 177DA(1)(a)(ii) of the 1936 Act.
274 Section 177DA(1)(a)(iii) of the 1936 Act. The activities may be performed by the
Australia permanent establishment of an entity.
275 Section 177DA(1)(a)(iv) of the 1936 Act.
276 Section 177DA(1)(a)(v) of the 1936 Act.
277 Section 177DA(1) of the 1936 Act.

1904
278 Section 177A(1) of the 1936 Act.
279 Section 317 of the 1936 Act.
280 Ibid.
281 Section 177A(1) of the 1936 Act.
282 A New Tax System (Goods and Services) Tax Act 1999.
283 Ibid.
284 MAAL Explanatory Memorandum, para. 3.34.
285 Ibid., para. 3.36.
286 Section 177DA(1)(a)(ii) of the 1936 Act.
287 Ibid.
288 MAAL Explanatory Memorandum, para. 3.40.
289 Section 177DA(1)(a)(iii) of the 1936 Act.
290 MAAL Explanatory Memorandum, para. 3.45.
291 Ibid., Example 3.5.
292 Ibid., Example 3.6.
293 Section 177DA(1)(a)(iv) of the 1936 Act.
294 Section 177A(1) of the 1936 Act.
295 MAAL Explanatory Memorandum, para. 3.40.
296 Ibid.
297 N. Tadmore, P. Klank, E. Davenport, “Managing Actual and Deemed Pes”, 2016
National Convention, The Tax Institute (Australia), p. 31.
298 Ibid., p. 34.
299 Section 177DA(1)(b) of the 1936 Act.
300 MAAL Explanatory Memorandum, para. 3.59.
301 Section 177DA(1)(b) of the 1936 Act.
302 MAAL Explanatory Memorandum, para. 3.52.
303 Ibid.
304 Section 177D(1) of the 1936 Act.
305 Section 177D(1)(b) of the 1936 Act.
306 MAAL Explanatory Memorandum, para. 3.61.
307 Ibid., para. 3.62.
308 Ibid., para. 3.63.
309 Section 177DA(3) of the 1936 Act.
310 Section 177DA(2) of the 1936 Act.
311 MAAL Explanatory Memorandum, para. 3.70.
312 Ibid., para. 3.71.
313 Section 177DA(2)(b) of the 1936 Act.

1905
314 MAAL Explanatory Memorandum, para. 3.73.
315 Ibid., para. 3.76.
316 Ibid., paras 3.77–79.
317 “Multilateral Instrument: Multilateral Convention to Implement Tax Treaty Related
Measures to Prevent Base Erosion and Profit Shifting”, Australian Treasury.
<https://treasury.gov.au/tax-treaties/multilateral-instrument/>.
318 PWC, “Draft MLI positions of different territories reflect a range of view on BEPS
implementation”, Tax Policy Bulletin, 12 June 2017.
<https://www.pwc.com/gx/en/tax/newsletters/tax-policy-bulletin/assets/pwc-draft-mli-
positions-of-territories-reflect-a-range-of-beps-views.pdf>.
319 “Multilateral Instrument: Multilateral Convention to Implement Tax Treaty Related
Measures to Prevent Base Erosion and Profit Shifting”, Australian Treasury.
<https://treasury.gov.au/tax-treaties/multilateral-instrument/>.
320 Agreement between Australia and the Federal Republic of Germany for the Elimination
of Double Taxation with respect to Taxes on Income and on Capital and the Prevention of
Fiscal Evasion and Avoidance (2015), Article 12(8).
321 N. Tadmore, P. Klank, E. Davenport, “Managing Actual and Deemed Pes”, 2016
National Convention, The Tax Institute (Australia), p. 50.
322 Deloitte, “Multilateral Instrument, Depart of Finance announces Irish Positions”.
<https://www2.deloitte.com/ie/en/pages/tax/articles/multilateral-instrument-department-
of-finance-announces-irish-positions.html>.
323 Mr. Teijeiro, LL.B, La Plata University, LL.M Harvard Law School, Visiting Scholar
HLS-ITP. Professor International Tax Law, Master Program in Taxation UCA, Austral
University, UTDT Master Program in Taxation, Academic Council. IFA Permanent
Scientific Committee (2006-2014) IFA General Council. President AAEF-IFA Argentina.
Vice-President IFA LatAm.
324 Mr. Vazquez received a bachelor’s degree in Law, Summa cum laude, from Universidad
Nacional de Tucuman (Argentina), a master’s degree in Tax Law from Universidad
Austral (Argentina) and an LL.M in Taxation, with a certificate in International Taxation,
from Georgetown University Law Center. Mr. Vazquez has written and lectured on many
legal topics related to the taxation of digital economy.
325 For example, see a recent article at one of Argentina’s most important newspaper titled
“The Corporate Power: when companies are more powerful than countries” in which the
five “tech giants” – Apple, Google, Microsoft, Facebook y Amazon – are expressly
mentioned (“Poder corporativo: cuando las empresas son más poderosas que los países”,
November 15th, 2017, http://www.lanacion.com.ar/2082253-poder-corporativo-cuando-
las-empresas-son-mas-poderosas-que-los-paises).
326 The Argentine Tax Authority stated that Netflix and similar digital platforms will start to
pay taxes at the national level, La Nacion Newspaper, July 5th, 2017,
http://www.lanacion.com.ar/2039731-netflix-comenzara-a-pagar-impuestos-a-nivel-
nacional.
327 Accenture’s Digital Disruption: the Growth Multiplier Report,
https://www.accenture.com/us-en/insight-digital-disruption-growth-multiplier.

1906
328 Telam, “El sector de las tecnologías de la información representa el 2% del PBI
argentino”, March, 25th 2017. http://www.telam.com.ar/notas/201703/183650-argentina-
tecnologias-informacion-pbi.html.
329 Telam, “El sector de las tecnologías de la información representa el 2% del PBI
argentino”, March, 25th 2017. http://www.telam.com.ar/notas/201703/183650-argentina-
tecnologias-informacion-pbi.html.
330 Argentine Chamber of E-commerce, E-commerce Annual Studies 2016,
http://www.cace.org.ar/estadisticas.
331 The latest report “A New Latin Rhythm: The Transformation of the Global Outsourcing
Business” made by KPMG, notes that after the global financial crisis of 2008, Latin
America has emerged as an attractive alternative to outsourcing software (nearshore),
gaining notoriety and competing with countries like India, China or Malaysia, traditionally
recognized as a destination for outsourcing software development (offshore). See Hexacta,
Software Industry in Argentina, http://www.hexacta.com/2016/08/24/software-industry-
in-argentina.
332 The Argentine Tax Authority stated that Netflix and similar digital platforms will start to
pay taxes at the national level, La Nacion Newspaper, July 5th, 2017,
http://www.lanacion.com.ar/2039731-netflix-comenzara-a-pagar-impuestos-a-nivel-
nacional; The Argentine Provinces will also tax the digital platforms, La Nacion
Newspaper, November 14th, 2017, http://www.lanacion.com.ar/2082212-las-provincias-
tambien-gravaran-a-las-plataformas-digitales.
333 See VAT and the Digital Economy: The Untold Story of Global Challenges, Philippe
Stephanny and Juan Vazquez, What’s News in Tax, Analysis that matters from
Washington National Tax, June 12, 2017, and Tax Notes International, Special Reports,
July 24, 2015.
334 ITL, article 1.
335 ITL, article 5. Income from Argentine sources also come from (iii) events occurring in
Argentina; and (iv) the sale or disposition of equity participations in Argentine companies.
Foreign source income is described in article 127 of the ITL as a “mirror” provision.
336 RGITL, article 9, section b.
337 RGITL, article 9, section d.
338 The OECD identifies broader tax challenges that can be categorized into (1) nexus for
taxation, (2) the use of data and the respective attribution of value, and (3) the
characterization of payments made for digital products or related services.32 (See OECD,
Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1: 2015 Final Report, 5
Oct. 2015, p. 99, available at http://dx.doi.org/10.1787/9789264241046-en).
339 It should be noted that we base our conclusion in the understanding that the concept of
“economic use”contemplated by the ITL only apply to tangible and intangible assets and
does not apply to services. The confusion on this regard arose from some judicial
precedents (TFN, Sala D, Aerolineas Argentinas S.A May 12, 2004, and CSJN,
Hidroeléctrica el Chocón S.A., September 17th, 2013) which applied the concept of
“economic use” to services for the purposes of the IT. This cases have been hardly
questioned by the argentine doctrine (Enrique Reig, Impuesto a las Ganancias, 12th

1907
edition, p. 120 and Keineger Walter, Beneficiarios del exterior y Fuente argentina,
Errepar, DTE, XXIX, 802). Pursuant to the majoritarian opinion the correct interpretation
of the Argentine sourcing rules for this type of transaction – which we share – was made
by the Argentine Tax Court in the following case: TFN, Sala A, Austral Líneas Aéreas
Cielos del Sur, 6/2/2007 (Enrique Reig, Impuesto a las Ganancias, 12th edition, p. 121).
340 Article 5 of INPI Resolution Num. 328/2005 states that “for the purposes foreseen in the
tax legislation, it will be understood as technical assistance, engineering and/or consulting
those transactions fulfilled under the form of a provision of services, insofar as they imply
a technical knowledge applied to the productive activity of the local contractor and the
transmission to itself or its employees of this knowledge, either in whole or in part,
through training, recommendations, guidelines, indications of mechanisms or technical
procedures, supply of plans, studies, reports or similar, provided that that their
consideration is paid proportionally to the work, which must be previously determined in a
concrete and precise manner in the contractual instrument”
341 ITL, article 13.
342 ITL, article 12.
343 For example, importing a music album recorded in a CD-Room. Under the general
sourcing rules this transaction would create foreign source income.
344 See Carlos Raimoindi and Adolfo Atchabahian, El Impuesto a las Ganancias, Tercera
Edición, Ed. Depalma, at p. 149-150.
345 AFIP’s Opinion 55/1996 (Dictámen). In this case, AFIP analysed the tax treatment
applicable to a system originated in the United States of America to which users based in
Argentina accessed through a subscription. The service allowed subscribers, through a key
they received, to obtain a satellite line to communicate with any destination in the world.
The system was being promoted in Argentina in order to attract the largest number of
subscribers, through campaigns supported by the company from abroad with promoters
who provided their services in an autonomous way, thereby receiving a commission. AFIP
concluded that for income tax purposes, the benefit was included in paragraph e) of article
13 of the ITL.
346 AFIP’s Opinion 42/2004 (Dictámen) and TFN, Sala A, Torneos Network S.A. – now Red
Imagen S.A. – 19/12/07.
347 TFN, Sala D, Aerolíneas Argentinas SA, 12/5/2004. In the same sense: CNACAF, Sala I,
5/5/2008.
348 CNACAF, Sala V, Austral Líneas Aéreas Cielos del Sur, 2/2/2009.
349 Mirna Screpante, La importación de software frente al impuesto a las ganancias,
Errepar, October 2011, p. 43.
350 For example: (i) the necessary availability of the sites or applications (i.e. if the
application or web page goes down or stops working, the user cannot access the content)
and (ii) the need for a constant update of the content (i.e. the constant updating of songs,
films and other content).
351 Kim A., L. Neumann, Netser I. and Fuller J., Character and Source of Income from
Internet Business Activities.
352 Guillermo O. Teijeiro, Is income taxation of foreign digital goods and services in the

1908
market state compatible with current international principles on the attribution of tax
jurisdiction?, November 22, 2017, http://kluwertaxblog.com/2017/11/22/income-taxation-
foreign-digital-goods-servicesmarket-state-compatible-current-international-principles-
attribution-taxjurisdiction/.
353 The ITL briefly defines a PE as a commercial, industrial, agricultural, mining or any
other type of establishment organized as a stable entity and belonging to foreign entities or
to individuals residing abroad. However, this definition does not offer further details to
determine the existence of a PE.
354 According to the OECD, “It had already been recognized in the past that the concept of
PE referred not only to a substantial physical presence in the country concerned, but also
to situations where the nonresident carried on business in the country concerned via a
dependent agent (hence the rules contained in paragraphs 5 and 6 of Article 5 of the
OECD Model Tax Convention). As nowadays it is possible to be heavily involved in the
economic life of another country without having a fixed place of business or a dependent
agent therein, concerns are raised regarding whether the existing definition of PE remains
consistent with the underlying principles on which it was based. For example, the ability
to conclude contracts remotely through technological means, with no involvement of
individual employees or dependent agents, raises questions about whether the focus of the
existing rules on conclusion of contracts by persons other than agents of an independent
status remains appropriate in all cases (See OECD, Addressing the Tax Challenges of the
Digital Economy, Action 1: 2015 Final Report, 5 Oct. 2015, p. 101, available at
http://dx.doi.org/10.1787/9789264241046-en).
355 An increased rate of 27% applies to specific services.
356 VAT Law No. 23,349, article 1, sections a, b and c.
357 The concept of “services effectively used or exploited in Argentina” has caused great
controversy in Argentina. AFIP’s has Circular 1288/1993 clarifies something on this
regard (despite the fact that it makes the focus on exports of services, the conclusions are
perfectly applicable to imports of services). For a deeper analysis of this matte please see
Mirna S. Screpante, Effective Economic Use of Services under Argentine IVA, Argentina,
IBFD, International VAT Monitor, January/February 2014.
358 VAT Law No. 23,349, article 1, section d.
359 Mirna S. Screpante, Effective Economic Use of Services under Argentine IVA, Argentina,
IBFD, International VAT Monitor, January/February 2014, p. 24.
360 AFIP’s General Resolution Num. 549/1999, articles 1 and 7. The recipient or customer
must declare and remit the VAT within 10 days of the date of the taxable event (i.e. the
date of the completion of the service, whichever occurs first). Unlike the reverse charge
mechanism, the substitute liability actually imposes a cash flow burden on businesses.
Businesses bear the burden of VAT from the time they declare and remit the import VAT
until the time they deduct the tax trough their periodic VAT return. (See Mirna S.
Screpante, Effective Economic Use of Services under Argentine IVA, Argentina, IBFD,
International VAT Monitor, January/February 2014, p. 24).
361 AFIP’s General Resolution No. 2955/2010.
362 The Provinces and the City of Buenos Aires have signed an agreement (“Multilateral
Agreement”) to avoid the double taxation of activities performed in more than one

1909
jurisdiction. Under this agreement, gross turnover is allocated between the different
jurisdictions applying a formula based on income obtained and expenses incurred in each
jurisdiction.
363 AGIP General Resolution Num. 593/2014. The withholding apply on payments for
subscription services to access movies, TV shows and other types of audiovisual
entertainment which are transmitted over the Internet to televisions, computers and other
devices connected to the internet as well as by subscription to buy and/or rent digital
content related to music, games, videos, or similar.
364 AGIP GR Num. 593/2014, article 1-3.
365 In a unanimous decision the Superior Court of Justice of the Autonomous City of Buenos
Aires dismissed the “amparo” action filed against the aforementioned resolution without
addressing the substantive issue under discussion. However, we highlight the vote of
Judge Casas who states obiter dictum that “to provide support to their claim, the plaintiffs
could have well argued – which, of course, they did not – that the contested withholding
regime implies a departure of the nature of the GTT as defined in art. 9th, section b,
subsection 1, of Law No. 23,548 of Co-participation of National Taxes, especially when it
provides specific guidelines related to the territorial requirement of the taxable event of
this tax (…)” (See TSJ CABA, Oliveto Lago, Paula Mariana y otro c/GCBA s/acción
declarativa de inconstitucionalidad, November 26, 2014).
366 AGIP General Resolution Num. 724/2014 (suspension until February 1st, 2015) and
26/2015 (Indefinite Suspension). The suspension was decided because the representatives
of the withholding agents originally nominated, expressed their immediate impossibility to
act as such. They argued that the payment mechanisms to companies and businesses
located abroad did not allow them to determine which goods and services acquired with
local credit cards were consumed locally, and which did not (see AGIP GR 26/2015).
367 Law Num. 13,167, published in Santa Fe’s Official Gazette on January, 4th, 2017.
368 Santa Fe’s Fiscal Code, Article 177, section i.
369 Article 6, section b (rate for activities performed by taxpayers located outside the
jurisdiction of the Province of Santa Fe). It should be noted that the Argentine Supreme
Court has recently declared unconstitutional the establishment of differential GTT rates
for taxpayers located outside the local jurisdiction (CSJN, Bayer S.A. c/ Santa Fe,
Provincia de s/ acción declarativa de certeza, October 31, 2017).
370 Pursuant to a press statement of the head of the Public Revenue Agency of Santa Fe, the
tax is not yet being levied because Netflix, Spotify and similar platforms have the same
operational problem since they do not have tax domicile assigned in Argentina and,
therefore they are waiting AFIP to issue the required resolutions and start levying a tax at
the National level to go along with them and apply the withholding tax on credit card
payments (Press Statement, Uno Santa Fe Newspaper, July 5, 2017, see
https://www.unosantafe.com.ar/santa-fe/santa-fe-aun-no-cobra-el-llamado-impuesto-
netflix- n1428453.html).
371 Specifically, the CSJN held that it results unquestionable the faculty of the provinces to
legislate their local taxes being the creation of the same, the choice of the taxable matter,
forms of perception, etc. issues of each jurisdiction and that make their autonomy without
that they must tolerate the intervention of a strange authority in it. (7:373; 105:273;

1910
114:282; 150:419; 235:571, among many others) However, it also clarifies “... with the
exception that those tax laws do not tax existing assets outside its political limits, or acts
with effects in strange jurisdiction; or that they are for other reasons contrary to the
Constitution” (235:571 and CSJN in re “Asociación de Bancos de la Argentina c/ Buenos
Aires, Provincia de s/ acción declarative de inconstitucionalidad”, Expte.: A.2107.XLII,
July, 15th 2014, published at www.csjn.gov.ar).
372 Pursuant to Bulit Goñi, the Territorial Requirement is contained in the definition of the
taxable event which, to be configured (so that the respective tax authority can claim the
tax), the activity must have been exercised effectively, physically, tangibly, in the territory
in question (Enrique G. Bulit Goñi, Impuesto sobre los Ingresos Brutos, 2ª Ed., Depalma,
Buenos Aires, 1997, T.II, p. 84.). Additionally, Teijeiro holds that “... the provinces cannot
tax activities that are performed in other jurisdictions because such an attitude would
imply an illegitimate overreach of their tax authority; there would be no jurisdictional or
territorial link in such case between the taxable event that is intended to tax (exercise of an
activity) and the province” (Guillermo O. Teijeiro, Estudios sobre la aplicación espacial
de la Ley Tributaria. La jurisdicción tributaria en el contexto internacional y las
potestades tributarias en el orden Provincial y Municipal, La Ley, Buenos Aires, 2002, p.
140).
373 Federico Parada Larrosa, El impuesto sobre los ingresos brutos frente a los servicios
intangibles prestados por residentes del exterior vía internet, Tesis de Maestría en
Derecho Tributario, Universidad Austral, 2015, 4.
374 Guillermo O. Teijeiro, Once more on a short-of-expectation BEPS outcome and the
erratic domestication of a weak guidance: The case of the digital economy, August 29,
2016, see http://kluwertaxblog.com/2016/08/29/once-more-on-a-short-of-expectation-
bepsoutcome-and-the-erratic-domestication-of-a-weak-guidance-the-case-of-the-
digitaleconomy/. See also Guillermo O. Teijeiro, Jurisdictional Excesses in BEPS’ Times:
National Appropriation of an enhanced Global Tax Basis, # 6.04, in Tax Sovereignty in
the BEPS Era, Rocha-Christians, Eds., Wolters Kluwer, Series in International Taxation, #
60, 2017.
375 The significant economic presence test would create a taxable presence at the market
jurisdiction on the basis of factors that evidence a purposeful and sustained interaction
with the economy of that country via technology and other automated tools, such as a local
domain name and a local Website or digital platform, availability of a local payment
option; or even user-based factors, including monthly active users (MAU) in the country,
the regular conclusion of on-line contracts with resident users, and the volume of digital
content collected from resident users and customers (Guillermo O. Teijeiro, Once more...,
id note 45).
376 This alternative raises a number of questions, including that (i) direct taxation of foreign
automated internet sales and services might be deemed to lack sufficient nexus with the
taxing jurisdiction, unless a significant economic presence is detected, (ii) the market
jurisdiction may consider income from foreign sales of tangible goods and/or foreign
services into the country to be foreign source income, in which case taxation of remote
online similar sales and services would be incoherent with the treatment afforded to
traditional inbound sale and service income; and (iii) a withholding tax on digital
transactions from abroad might conflict with treaty law commitments (particularly the

1911
treatment of business income) (Guillermo O. Teijeiro, Once more..., id note 45).
377 Either under the form of an excise tax applied if and when it is determined the existence
of a significant economic presence, or on all remote sales transactions entered into with
customers in a market jurisdiction (Guillermo O. Teijeiro, Once more..., id note 45).
378 Guillermo O. Teijeiro, Once more on a short-of-expectation BEPS outcome and the
erratic domestication of a weak guidance: The case of the digital economy, August 29,
2016, see http://kluwertaxblog.com/2016/08/29/once-more-on-a-short-of-expectation-
bepsoutcome-and-the-erratic-domestication-of-a-weak-guidance-the-case-of-the-
digitaleconomy/.
379 Guillermo O. Teijeiro, A call for a Sustainable Response to the taxation of Digital
Economy within the International Income Tax System, October 5, 2017, see
http://kluwertaxblog.com/2017/10/05/callsustainable-response-taxation-digitaleconomy-
within-international-income-taxsystem/.
380 José Ángel Gómez Requena, Saturnina Moreno González, Adapting the Concept of
Permanent Establishment to the Context of Digital Commerce: From Fixity to Significant
Digital Economic Presence (2017) 45 Intertax, Issue 11, p. 732-741.
381 Plus any “true-up interest”. Where taxable diverted profits are ring-fence profits or
notional ring-fence profits in the oil sector, DPT is charged at a rate of 55% plus true-up
interest. Finance (No. 2) Act 2015 introduced a surcharge of 8% on the taxable profits of
banking companies arising on or after 1 January 2016. There are consequential
amendments to the DPT legislation to apply DPT at a rate of 33% in cases where taxable
diverted profits would have been subject to the surcharge. (HM Revenue & Customs,
Diverted Profit Tax, Guidance, 30 November 2015, see
https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/480318/Diverted_Profits_T
382 In the 2016-17 Budget, the Australian Government announced that it would introduce a
DPT which finally came into effect on 1 July 2017 and imposes a 40% tax (Australian
Taxation Office, see https://www.ato.gov.au/General/New-legislation/In-detail/Direct-
taxes/Income-tax-for-businesses/Diverted-Profits-Tax/).
383 France’s Constitutional Council ruled that the DPT law included in Finance Bill 2017,
passed by Parliament in late December 2016, was unconstitutional (Decision 2016-744
DC, 29 December, 2016).
384 Multinationals must pay fair share of tax, Labour Party webpage, July 18, 2017, see
http://www.labour.org.nz/multinationals_must_pay_fair_share_of_tax.
385 The government is of the view that, pending such international reform, interim action is
needed. This they say is in recognition of public dissatisfaction digital businesses tax
contributions are not commensurate with the value that they derive from the UK market
(United Kingdom: Next steps in taxing digital business – will the sleeping giant be
awoken?, Jonathan Schwarz (Temple Tax Chambers; King’s College London), November
24, 2017, see http://kluwertaxblog.com/2017/11/24/united-kingdom-next-steps-taxing-
digital-business-will-sleeping-giant-awoken/).
386 Karan Kakkar Summet Hemkary, Equalization Levy – India’s first move to tax ‘digital
trans-actions’, Taxand India, www.taxand.com).
387 Supporters include France, Spain, Italy, Germany, Austria, Bulgaria, Greece, Portugal,

1912
Romania, and Slovenia. However, the proposal did not reached consensus at the digital
summit in Tallinn, last September 29, 2017 (Sara White, CCH Daily, September 18, 2017.
See the declaration at https://pbs.twimg.com/media/DJ1-xTsXUAA4QSR.jpg.; and
https://www.euractiv.com/section/economy-jobs/news/tax-fight-draws-divisions-ateu-
digital-summit/.
388 United Kingdom: Next steps in taxing digital business – will the sleeping giant be
awoken?, Jonathan Schwarz (Temple Tax Chambers; King’s College London), November
24, 2017, see http://kluwertaxblog.com/2017/11/24/united-kingdom-next-steps-taxing-
digital-business-will-sleeping-giant-awoken/.
389 Philippe Stephanny and Juan Vazquez, VAT and the Digital Economy: The Untold Story
of Global Challenges, Tax Notes International, Special Reports, July 24th, 2017, p. 337.
390 New Zealand Inland Revenue, “GST: Cross-Border Services, Intangibles and Goods”
(Aug. 2015).
391 For example: Albania, Australia, the Bahamas, Belarus, Colombia, the 28 member states
of the EU, the six member states of the Gulf Cooperation Council, Ghana, Iceland, India,
Japan, Kenya, New Zealand, Norway, Serbia, South Africa, South Korea, Switzerland,
Taiwan, and Tanzania.
392 OECD, “International VAT/GST Guidelines” (Nov. 2015) (“Guidelines”).
393 Philippe Stephanny and Juan Vazquez, VAT and the Digital Economy: The Untold Story
of Global Challenges, Tax Notes International, Special Reports, July 24th, 2017, p. 338.
394 Juan Manuel Vazquez, Indirect Taxation of Digital Services After BEPS: A Multilateral
Instrument to Achieve Harmonization and Effective Enforcement, Wolter Kluwers,
International Tax Journal, Aug. 23, 2017.
395 Juan Manuel Vazquez, Indirect Taxation of Digital Services After BEPS: A Multilateral
Instrument to Achieve Harmonization and Effective Enforcement, Wolter Kluwers,
International Tax Journal, Aug. 23, 2017.
396 Philippe Stephanny and Juan Manuel Vazquez, VAT and the Digital Economy: The
Untold Story of Global Challenges, Tax Notes International, Special Reports, July 24th,
2017, p. 338.
397 The bill was submitted to the National Congress on November 15, 2017.
398 AFIP Announcement, La Nacion Newspaper, July 5, 2017, see
http://www.lanacion.com.ar/2039731-netflix-comenzara-a-pagar-impuestos-a-nivel-
nacional.
399 Two years before AFIP official’s statement, the initiative of the Autonomous City of
Buenos Aires and the Province of Santa Fe in regard to the “Netflix” tax generated great
controversies. See http://www.lanacion.com.ar/1724049-aplica-la-ciudad-un-impuesto-a-
los-abonos-de-netflix-spotify-y-los-contenidos-pagos-de-internet.
400 Argentine Tax Reform Bill (MEN 2017-126-APN-PTE) submitted to the Argentine
National Congress on 15th November, 2017.
401 Argentine Tax Reform Bill (MEN 2017-126-APN-PTE) submitted to the Argentine
National Congress on 15th November, 2017, at p. 1-2.
402 Guillermo O. Teijeiro, Is income taxation of foreign digital goods and services in the

1913
market state compatible with current international principles on the attribution of tax
jurisdiction?, November 22, 2017, http://kluwertaxblog.com/2017/11/22/income-taxation-
foreign-digital-goods-servicesmarket-state-compatible-current-international-principles-
attribution-taxjurisdiction/.
403 Even though the proposal was aimed at reaching B2B services only, Argentine tax
jurisdiction on services digitally provided from abroad remained unwarranted despite the
fact that the Argentine recipient would have been allowed to deduct the correlative
expense as connected with taxable income; in other words, and going back to the
advertising example, if deduction by the Argentine counterparty were enough to justify
taxation of the foreign provider as if it were obtaining Argentine source income,
advertising in the traditional foreign press should have been similarly reached by the
proposal and it was not.
404 This provision was actually copied from a legislation approved in Peru in 2003 which
application was very conflictive and followed an old criteria which will surely be different
from those to follow by the OECD’s countries.
405 Queries also aroused in connection with the intended scope of digital services: were
digital services just those of an automated nature that require no substantial labor force to
be rendered? Was the rule aimed at reaching services that by its own nature might have
been rendered inside Argentina but for the service provider’s decision to migrate servers
outside Argentina? In other words, would foreign labor-based digital services have
remained untaxed in line with domestic and treaty general source provisions? On the
contrary, were digital services of all type rendered by a foreign provider through the
internet taxable? If that were the case, where was the dividing line: could even a foreign
accounting or legal advice rendered by mail to an Argentine client have felt within the
scope of taxable digital services? Just an extreme example of the many uncertainties the
Aborted Proposal would have created if maintained in the text of the bill sent for
Congressional consideration.
406 Tax Reform Bill, Article 95.
407 Tax Reform Bill, Article 86, section “e”.
408 Pursuant to Article 87 of the Tax Reform Bill (new article 3, section 2, subsection 21,
section m) Digital Services include, inter alia: 1. The supply and hosting of computer sites
and web pages, as well as any other service consisting of offering or facilitating the
presence of companies or individuals in a network electronics. 2. The supply of digitized
products in general, including, among others, computer programs, their modifications and
updates, as well as the access and/or download of digital books, designs, components,
patterns and similar, reports, financial analysis or data and market guides. 3. Remote
maintenance, in an automated way, of programs and equipment. 4. Management of remote
systems and online technical support. 5. Web services, including, among others, the
storage of data with access to remotely or online, memory services and online advertising.
6. Software services, including, among others, the software services provided in the
Internet (“software as a service” or “SaaS”) through cloud-based downloads. 7. Access
and/or download to images, text, information, video, music, games – including gambling.
This section includes, among other services, the downloading of films and other
audiovisual content to devices connected to the Internet, the online download of games –
including those with multiple players connected remotely –, the diffusion of music,

1914
movies, bets or any digital content – even if it is done through streaming technology, no
need to download to a storage device –, the obtaining jingles, mobile ringtones and music,
viewing online news, information on traffic and weather forecasts – including through
benefits satellites –, weblogs and website statistics. 8. The availability of databases and
any automatically generated service from a computer, through the Internet or from an
electronic network, in response to a introduction of specific data made by the client. 9.
Online club services or dating websites. 10. The service provided by blogs, magazines or
newspapers online. 11. The provision of Internet services. 12. Distance Teaching or test or
exercises, made or corrected in an automated way. 13. The concession, for consideration,
of the right to trade a good or service in a site of Internet that works as an online market,
including online auction services. 14. The manipulation and calculation of data through
the Internet or other electronic networks”.
409 Tax Reform Bill, Article 90.
410 Tax Reform Bill, Article 93.
411 Tax Reform Bill, Article 94.
412 Tax Reform Bill, Article 89.
413 IP of the device used by the customer or of its Internet service provider.
414 Tax Reform Bill, Article 86, second and third paragraphs.
415 Services delivered over the internet or via an electronic network that: are essentially
automated; involve minimal human intervention; and cannot be delivered without IT.
416 The taxation of bundled sales (for example, tangible property in combination with digital
services) may create additional challenges for determining the applicable VAT treatment
(See Philippe Stephanny and Juan Vazquez, VAT and the Digital Economy…).
417 Australia does not try to define a specific subcategory of digital services, but rather states
that all sales of services and intangibles made to Australian consumers are prima facie
subject to GST.15 Therefore, although primarily aimed at digital services, the rules
capture more traditional services such as consulting and advertising (A New Tax System
(Goods and Services Tax) Act 1999 (Australia) at section 38-190(3); See Philippe
Stephanny and Juan Vazquez, VAT and the Digital Economy…).
418 European Commission, Modernizing VAT for Cross-Border B2C E-Commerce,
COM(2016) 757 final 2016/0370 (CNS) (Dec. 12, 2016).
419 OECD, “International VAT/GST Guidelines” (Nov. 2015).
420 In Japan and Switzerland, a noresident entity may not register directly with the tax
authority and must appoint a local person to act as fiscal representative, who will generally
be held jointly and severally liable for tax obligations (See Federal Tax Administration
(Switzerland), 641.20 Federal Act of June 12, 2009, on Value Added Tax; and 641.201
Ordinance of November 27, 2009, on Value Added Tax. 28 Id. See also National Tax
Agency Japan, Information About Consumption Tax).
421 This simplified registration scheme allows EU vendors providing B2C sales of
telecommunications, broadcasting, and electronically supplied services to register in a
single member state (referred to as the member state of identification) and report all the
sales made to the other member states (referred to as the member states of consumption).
The state of identification is responsible for distributing remitted taxes to the member

1915
states of consumption.
422 Colombia, is considering a VAT withholding scheme for B2C transactions in which
financial institutions through which purchases are made would be required to withhold the
applicable VAT (Law 1819 of 2016 (Colombia) (Dec. 29, 2016) (providing for structural
reform of the Colombian tax system). The law was passed with an implementation date of
July 1, 2018. However, detailed regulations on the implementation have yet to be
published.
423 In assessing whether a taxable person is involved in key aspects of the sale, facts and
legal relationships must be considered. The EU explanatory notes provide guidance and
examples of factors that suggest involvement, such as owning the online platform,
controlling or influencing pricing policy, and owning customer data.9 The reseller
assumption can be rebutted if both the facts and the contractual arrangements between the
relevant parties demonstrate that the individual vendor and not the e-marketplace is
rendering the service (Council Implementing Regulation (EU) No. 1042/2013 of Oct. 7,
2013, amending Implementing Regulation (EU) 282/2011 regarding the place of supply of
services, at article 9a. See also Teck Chin Lim, Introducing the “Netflix Tax” in
Singapore: The Antipodean and European Approaches, 101 Taxation Today 19-20 (Dec.
2016).
424 See Philippe Stephanny and Juan Vazquez, VAT and the Digital Economy (…).
425 Council Implementing Regulation (EU) No. 1042/2013 of Oct. 7, 2013, amending
Implementing Regulation (EU) 282/2011 regarding the place of supply of services.
426 In India, for example, a consumer will be deemed established in that country if two of
seven listed conditions are satisfied (such as address in India, credit card issued in India,
or IP address in India (KPMG LLP, India: Non-resident E-Services Providers Required to
Register for Service Tax Effective December 1, 2016, Inside Indirect Tax, Dec. 2016; also
see Philippe Stephanny and Juan Vazquez, VAT and the Digital Economy…).
427 In Belarus, an individual purchasing digital services is deemed to be in Belarus if at least
one of the following conditions is met: • the individual is resident in Belarus; • payment is
made through a bank or e-payment operator in Belarus; • the individual used a Belarusian
IP address to purchase digital services; or • the individual used a Belarusian telephone
number to purchase digital services (KPMG LLP, “Belarus: VAT on Remote Electronic
Services Effective January 1, 2017, Inside Indirect Tax (Nov. 2016); also see Philippe
Stephanny and Juan Vazquez, VAT and the Digital Economy…).
428 EU VAT Modernization Proposal, see
https://ec.europa.eu/taxation_customs/business/vat/action-plan-vat_en.
429 See Philippe Stephanny and Juan Vazquez, VAT and the Digital Economy: The Untold
Story of Global Challenges, Tax Notes International, Special Reports, July 24th, 2017.
430 For instance, a sale will be considered taxable in Argentina if one of the non-rebuttable
presumption applies, and that same transaction may be subject to an EU VAT if, based on
the evidence collected, the consumer is deemed to be in an EU member state.
431 Payment by the recipient in B2B transactions and withholding by intermediary in B2C.
432 Guillermo O. Teijeiro, Is income taxation… of foreign digital goods and services in the
market state compatible with current international principles on the attribution of tax

1916
jurisdiction?
433 Idem.
434 Juan Manuel Vazquez, Indirect Taxation of Digital Services After BEPS: A Multilateral
Instrument to Achieve Harmonization and Effective Enforcement, Wolter Kluwers,
International Tax Journal, Aug. 23, 2017.
435 Tax law Professor at the University Savoie Mont Blanc, member of the CDPPOC
research center and an active member of the European Association of Tax Law Professors
(EATLP).
436 Senat’s (upper chamber of the French Parliament) commission on finance’s report,
Taxation of the collaborative economy: a need for simplicity, unity and equity, 29 March
2017, Report n. 481, Senat editions; Assemblée Nationale (lower chamber of the French
Parliament) Report on the implementation of recommendations of the Experts work on the
business’ international tax optimization, 11 June 2014 ; National Digital Board,
Consultation on the digital economy taxation, Opinion n. 2013-3 and Report, September
2013; P. Collin and N. Colin, Report to the Minister of Finance, Expert Work on the
taxation of the digital economy, January 2013; Ph. Marini, Report to the Finance
commission of the Senate on the taxation of the digital economy, 27 June 2012.
437 To the best of my knowledge no purely domestic event has been organised on this topic
and only one international academic event organised by University Paris Descartes and the
University of Geneva, on the topic “How to tax Internet? Issues for States and for
economic actors” in 2013. To this can be added events organised in France by
international organizations (e.g. discussions that have been conducted by OECD under
BEPS Action 1).
438 For example: V. Renoux and S. Bernard, Fiscalité international – Quelle imposition des
revenus de l’économie numérique?, Revue de droit fiscal, 2017, n. 39, ét. 477; L.
Stankiewicz, Numérique – Fiscalité et mobilité numérique, Juris Art etc. 2015, n. 21, p.
24; F. Teper, How to tax Internet?, article based on the 2013 conference with the same
title, Revue Droit Fiscal, 2013, n. 39, ét. 439. One should notice however serveral PhD are
currently prepared on topics related to the taxation of the digital money, tax regime for
data centers, as well as the blockchain and taxation.
439 Research results on the legislative database shows 6 provisions mentioning something
“digital”, most of them being about the application of specific tax regimes to material
goods (books, CD) and to their digital match.
440 For natural persons’ income tax purposes, the French legislator refers to economic
theories, justifying taxation of any enrichment (e.g. capital gains), as well as to civil law
theories, giving a much more restrictive definition of income, as being regularly produced
by an asset or an activity (article 584 and 584 of the French Civil Code). On this issue see,
for example, D. Gutmann, Droit fiscal des affaires, n. 130, p. 109.
441 Tax authorities guidelines have binding effect only on tax authorities agents. They are
not considered as a source of law. However, articles L80 A and L80 B of the Tax
Proceedings Code prevent tax authorities from changing its position, once a taxpayer
could reasonably rely on it at the moment of an operative event or the moment when the
taxpayer fills in his/her tax forms.
442 BOI-IR-BASE-10-10-10-10, 28th November 2016, n. 40 and the following. These

1917
guidelines are published online: http://bofip.impots.gouv.fr/bofip/1322-PGP.html.
443 Within the meaning of the article L111-7, I of the Consumption Code (personal
translation): “Should be considered as an online Platform operator any natural or legal
person proposing online professional communication services, whether remunerated or
not, relying on:
1. ranking or referencing of third persons’ content, goods or services by means of
computerised algorithms;
2. linking up parties for the purposes of a sale or a provision of services or an exchange or a
sharing of content, goods or services”.
444 Art. 1649 quater A bis.-I of the GTC, introduced by the Amending Finance Act for 2016.
445 According to article 12 of the GTC “Tax should be paid each year on any profit or
income made by the taxpayer or available to him during the year concerned” (free
translation of “L’impôt est dû chaque année à raison des bénéfices ou revenus que le
contribuable réalise ou dont il dispose au cours de la même année”).
446 Article 150 U A of the French GTC.
447 Senat’s commission on finance’s report, Taxation of the collaborative economy: a need
for simplicity, unity and equity, 29 March 2017, Report n. 481, Senat editions, p. 65-77.
448 According to article 156, I of the GTC, professional losses can be deducted from the
taxable base with few or no limits, whereas non-professional losses cannot be taken into
account immediately. They can only be used during six next fiscal years to reduce the
amount of taxable income of the same category (e.g., commercial income).
449 Article 156, I of the GTC.
450 Generated income should exceed an annual threshold of 23,000 euros, as well as a total
amount of other types of income (e.g., salary, agricultural income) earned by the taxpayer
and his/her family. See article 155, IV of the GTC.
451 This distinction remains of primary importance for the social security purposes,
professionals being subject to numerous legal duties and controls. The criteria of
distinction in this area have not been clearly specified. The Social security finance act for
2017 partly remedied this problem, introducing thresholds partly inspired by those that
exist in tax legislation (e.g., 23,000 euros for the rental of furnished dwellings). The
Senate’s task force report suggests to line up the distinction in the area of social security
with the income tax exemption threshold (also proposed in the same report) of 3,000
euros.
452 French Minister of Finance and Economy, press release, 7th August 2017. Public reports
also highlight France’s strong commitment to the development of digital economy in
general and artificial intelligence in particular: C. de Ganay and D. Gillot report for the
French Parliamentary office for the assessment of science and technology options, For a
mastered, useful and demystified artificial intelligence,15 March 2017, p. 107.
453 Article 244 quater B of the GTC.
454 Article 199 ter B of the GTC.
455 Finance Act for 1983, 29 December 1982, n. 82-1126.
456 According to figures published in schedules of the Finance Act for 2017, Report on

1918
“Evaluation des voies et moyens”, tome II, Tax expenditures, p. 19.
457 Base GECIR May 2012, MESR-DGRI-C1.
458 BOFIP 4 A-1-00, N. 27 du 8 février 2000.
459 BOI-BIC-RICI-10-10-10-20, 2 November 2016, n. 170 and n. 180.
460 Indeed, Most French successful start-ups are bought by foreign companies: See C. de
Ganay and D. Gillot report, prec. Foreign companies can also place in France, from the
beginning, their research units, using its innovations to make profits in other countries.
461 French Minister of Finance and Economy, press release, 7 August 2017.
462 Grounds for this taxation and new theories are now considered by French authors. See
for example N. Vergnet, Les fondements théoriques de l’établissement stable à l’épreuve
de la modernisation de l’économie, Revue de Droit Fiscal, 2017, n. 39, ét. 476.
463 It has first been formulated this way in an answer given by the Minister of Finance to a
question of a deputy, Mr. Valleix, JOAN Q, 22 September 1980, p. 4019. The Minister
referred to “authors and judges”, even though it seems difficult to find a specific case
mentioning all of the three situations. Judges refer to a “regular exercise of commercial
activity” (for example : Council of State, 19 May 1965, n. 58784; 7 April 1967, n. 58147
and 25 octobre 1972, n. 81999). Thus, it seems that the three situations have been
deducted out of different specific cases. See on this issue: B. Gouthière, Les impôts dans
les affaires internationales, 11e éd. Francis Lefebvre, n. 4605, p. 164, n. 4605.
464 Judges said Monaco company exercised its activity in France “through two permanent
establishments, located one in … and another in …”.
465 Council of State, 13 July 1968, n. 66503. Tax authorities have integrated this case in their
guidelines: BOI-IS-CHAMP-60-10-30, 1 July 2015, n. 160, published on:
http://bofip.impots.gouv.fr/bofip/4264-PGP.html#4264-
PGP_La_Haute_Assemblee_a_egalem_076.
466 P. Collin and N. Colin, Report to the Minister of Finance, Expert Work on the taxation of
the digital economy, January 2013.
467 P. Collin and N. Colin, Report to the Minister of Finance, Expert Work on the taxation of
the digital economy, January 2013, p. 123.
468 Council of State, 12 March 2010, n. 307235.
469 Administrative court of appeal of Paris, 12 July 2011, n. 09PA06458.
470 Model Tax Convention on Income and on Capital, condensed version as it read on 15
July 2014, OECD, article 5, § 41, p. 111.
471 Even though this approval could be quite formal and even though GF employees were
mentioned as “sale representatives” in the contracts signed between French clients and
GIL.
472 Council of State, 20 June 2003, n. 224407.
473 Government commissionner, Mr. Austry, referred under this case to the OECD
comments under article 5 of the 1963 OECD model convention, § 32.1.
474 The main critic was that one can only bind someone in law, and not in fact. See
rapporteur public Mrs Burguburu under Zimmer decision. She also referred to G. Blanluet,
Le commissionaire, un établissement stable du commettant? Réflexions autour de l’affaire

1919
Zimmer, Revue Droit fiscal, 2010, n. 3, at. 79.
475 Council fo State, 31 March 2010, n. 304715 and 308525, Sté Zimmer.
476 G. Blanluet, L’arrêt Zimmer: une victoire du droit au service d’une plus grande sécurité
juridique, Revue droit fiscal, 2010, n. 16, act. 127.
477 Council of State, 6 October 2010, n. 307680, Sté Iota.
478 Mounir Mahjoubi, secretary of State for digitalization, quoted in S. Levy, L’impôt
rdidicule que Facebook a payé en 2016 en France, Capital, 31 July 2017, published online:
https://www.capital.fr/entreprises-marches/les-impots-que-facebook-aurait-reellement-du-
payer-en-france-selon-nos-estimations-1238630.
479 Minister of Public Accounts also declared that the Government considered a possibility
of a transaction with Google. Cf. les Echos, 24 July 2017.
480 On the tax fraude: Th. Chenel, Google échappe à un redressement fiscal en France, Les
échos, 13 July 2017, published online:
https://www.lesechos.fr/13/07/2017/LesEchos/22486-085-ECH_google-echappe-a-un-
redressement-fiscal-en-france.htm.
481 Constitutional Council, 24 June 2016, n. 2016-546 QPC, § 13.
482 Concept of legal dependency is defined in the article L. 233-3 du code de commerce.
483 Article 46 quinquies in the last version of the draft of the Finance Act for 2017, which
was intended to be codified in the article 209 C of the French general tax code.
484 Constitutional council, 29 December 2016, n. 2016-744 DC, § 82 and the following.
485 Constitutional council, 29 December 2016, n. 2016-744 DC, § 84.
486 Article 46 quinquies of the 2017 Finance Act draft such as discussed by the Assemblée
Nationale (lower chamber of the French Parliament) in the first reading.
487 Report of the Assemblée Nationale’s second reading of the 2017 Finance Act draft,
second session of December 16, 2016.
488 Council of State, 26 November 1975, n. 93187.
489 Cour de cassation, chambre commerciale, 3 April 2012, n. 11-11161.
490 Council of State, 22 May 2009, n. 300478.
491 BOI-INT-DG-20-20-100, 3th June 2016, § 110. First “social taxes” were introduced by
the Finance Act for 1991.
492 Constitutional Council, 28 December 1990, n. 90-285 DC.
493 Report of the Assemblée Nationale’s second reading of the 2017 Finance Act draft,
second session of December 16, 2016.
494 Article 302 bis KD of the French general tax code. It is considered as a specific tax on
sales revenues.
495 See arguments developed by the French association of online services and Web labour
unions: Guillaume de Calignon et L. R., Les fronts se multiplient pour taxer les géants
d’Internet, les Echos, 19 July 2012, published on line :
https://www.lesechos.fr/19/07/2012/LesEchos/21230-023-ECH_les-fronts-se-multiplient-
pour-taxer-les-geants-d-internet.htm.
496 Article 3 of the 13 July 1972 Act introducing actions tu support certain types of old

1920
merchants and artisans, consolidated version. It is considered as a specific tax on the
inpuct factors.
497 Thus the President of a Federation for the cyber-commerce and distant selling, François
Momboisse, considered that the attempt to tax 4 Web giants did not justify to tax 100.000
other French commerial web sites: https://www.nextinpact.com/archive/72541-
proposition-loi-sur-fiscalite-numerique-regies-publicitaires-taxees.htm.
498 P. Collin and N. Colin abovementioned report, p. 73.
499 The National Digital Board abovementioned report, p. 50.
500 P. Collin and N. Colin abovementioned report, p. 131 et seq.
501 The National Digital Board abovementioned report, p. 8.
502 TP Ostwal is a Senior Partner in TP Ostwal & Associates LL.P and DTS & Associates,
chartered accounts and is based in Mumbai, having four decades in practice. He is a Final
Rank holder. He is a member of the Sub Committee on Transfer Pricing for Developing
Countries by UN. He has been a member of several committees set up by Government,
Ministry of Finance, CBDT, OECD and other associations. He is a visiting professor at
Vienna University Austria for teaching international tax for LL.M studies. He has been the
first vice-President of the executive committee IFA – Netherlands and a Chairman of IFA
India. He has been adjudged as 11th in the top 50 Tax professionals in the world for the
year 2006-07 by Tax-Business magazine of UK. He is an author of Black Money Act 2015
publication by the Bombay Chartered Accounts Society apart from other books. He is a
regular speaker in most Indian and International conferences on cross-border taxation
issues.
503 Mohak Shingala is currently working with T.P. Ostwal & Associates LL.P, Chartered
Accountants.
504 Comment by the Task Force on Digital Economy (TFDE) of the Committee of Fiscal
Affairs of the OECD in its report published on October 5, 2015 which can be read here:
http://www.oecd.org/ctp/addressing-the-tax-challenges-of-the-digital-economy-action-1-
2015-final-report-9789264241046-en.htm.
505 Section 4.3 of the BEPS Report on Action 1 describes the characteristics of digital
economy as under:
“4.3 Key features of the digital economy
151. There are a number of features that are increasingly prominent in the digital economy
and which are potentially relevant from a tax perspective. While these features may not all
be present at the same time in any particular business, they increasingly characterise the
modern economy. They include:
• Mobility, with respect to (i) the intangibles on which the digital economy relies heavily, (ii)
users, and (iii) business functions as a consequence of the decreased need for local
personnel to perform certain functions as well as the flexibility in many cases to choose
the location of servers and other resources.
• Reliance on data, including in particular the use of so-called ‘big data’.
• Network effects, understood with reference to user participation, integration and synergies.
• Use of multi-sided business models in which the two sides of the market may be in different

1921
jurisdictions.
• Tendency toward monopoly or oligopoly in certain business models relying heavily on
network effects.
• Volatility due to low barriers to entry and rapidly evolving technology.”
506
http://www.goldmansachs.com/gsam/docs/instgeneral/general_materials/whitepaper/india_revisited.pdf
507 The website of the Department of Electronics and Information Technology. Government
of India.
508 Committee on Taxation of E-Commerce, “Proposal for Equalization Levy on Specified
Transactions”, 2016, p. 14, 15.
509 ITA No. 1336/ Kol/2011, dated April 12, 2013.
510 ITA No. 7044/Mum/2011, dated July 26, 2013.
511 ITA No. 506/Mum/2008, dated June 24, 2011.
512 ITA No. 4332/Mum/2009, dated June 18, 2012.
513 IT(TP)A.1511 to 1518/Bang/2013, dated October 23, 2017.
514 Adword program is a continuous targeted advertisement campaign making available
technology permitted to Google-India and permitting same to be used by advertiser.
515 The entire report is available at http://incometaxindia.gov.in/news/report-of-committee-
on-taxation-of-e-commerce-feb-2016.pdf.
516 The Gazette of India Extraordinary, Part II dated May 14, 2016.
http://www.cbec.gov.in/resources/htdocs-cbec/fin-
act2016.pdf;jsessionid=86D93EE8B8EE9D549BFE78A773DF79D9.
517 The entire text of the memorandum to Finance Bill, 2016 can be found here:
http://www.incometaxindia.gov.in/budgets%20and%20bills/2016/memo_2016.pdf.
518 Business Today dated June 5, 2016. The entire interview can be found here:
http://www.businesstoday.in/magazine/features/revenue-secy-hasmukh-adhia-on-
countrys-tax-issues/story/232552.html.
519 Para 304 of the Final Report on BEPS Action Plan 1.
520 Professor of Tax Law, in College of Law and Politics, Rikkyo University, Japan. Master
of Law (University of Tokyo, 2001), Doctor of Law (University of Tokyo, 2004).
Opinions in this article is only my own, not of Japan nor of Rikkyo University.
521 “Old” means US source business income taxation before 1966 amendment. See, Harvey
P. Dale, Effectively Connected Income, 42 Tax Law Review 689 (1987); Ralph Winger,
US income taxation of non-resident alien individuals: A search for principles, in Essays on
International Taxation in honour of Sidney I. Roberts 423 (Herbert H. Alpert & Kees van
Raad, ed., Kluwer, 1993).
US source business income taxation after 1966 amendment is called as “effective connected
income principle”, which does not use PE concept but uses “trade or business in the US”
as threshold, and which treats income in question as taxable income when the income is
effectively connected with the “trade or business in the US” even though the income is
judged as foreign source income under item-by-item basis source rules. AOA makes focus

1922
on attribution between income and a PE. US rules after 1966 makes focus on effective
connection between income and “trade or business in the US”. AOA and US rules after
1966 are not strictly same but similar, although US rules after 1966 do not abandon “force
of attraction” rule.
522 German Income Tax Act (EStG: Einkommensteuergesetz), § 49(2)(a) provides
“Domestic income in the meaning of limited income tax liability is income from business
enterprises, for which a permanent establishment in domestic land is carried or a
continuous agent is assigned (Inländische Einkünfte im Sinne der beschränkten
Einkommensteuerpflicht sind Einkünfte aus Gewerbebetrieb, für den im Inland eine
Betriebsstätte unterhalten wird oder ein ständiger Vertreter bestellt ist)”.
523 Before 2014 amendment of Income Tax Act (Act No. 33 of 1965), Article 164 and
Corporate Tax Act (Act No. 34 of 1965), Article 141 are unofficially translated into
English in Japanese Law Translation (http://www.japaneselawtranslation.go.jp/).
Unfortunately, these Articles after 2014 amendment have not been translated yet.
524 Income Tax Act, Article 161 and Corporate Tax Act, Article 138. Source rules of a tax
convention take precedence to Japanese domestic source rules, according to Income Tax
Act, Article 162 and Corporate Tax Act, Article 139. See, Porus F. Kaka, Source
Taxation: Do We Really Know What We Mean?, 86 Tax Notes International 1221 (26
June 2017), at section IV “Principles of International Tax Treaties”.
525 “Force of attraction” rule was relevant only for branch PEs in OECD Model Tax
Convention, Article 5(1) and (2), according to Income Tax Act, Article 164 (1)(i) and
Corporate Tax Act, Article 141(1)(i) before 2014 amendment. Construction PEs in OECD
Model Tax Convention, Article 5(3) and agent PEs in OECD Model Tax Convention,
Article 5(5) did not attract entire Japanese domestic source income; only income
attributable to the PEs was subject to PE taxation filing tax returns, according to Income
Tax Act, Article 164 (1)(ii) and (iii) and Corporate Tax Act, Article 141(1)(ii) and (iii)
before 2014 amendment.
526 OECD Commentary on Article 5, paragraphs 42.2 and 42.7 (added in 2003 amendment).
See, also OECD Committee on Fiscal Affairs: Ottawa Meeting discussion paper
“Electronic Commerce: A Discussion Paper on Taxation Issues” (10 October 1998).
527 See “Introduction of JPX Co-Location Service”
(http://www.jpx.co.jp/english/systems/connectivity/); “Tokyo Stock Exchange Will
Launch Co-Location Service” (26 August 2008 http://www.mondovisione.com/media-
and-resources/news/tokyo-stock-exchange-will-launch-colocation-service/).
528 Cf. http://www.nta.go.jp/.
529 Tokyo Stock Exchange, Inc., “Tax Treatment Related to Use of the TSE Co-Location
Service by Foreign Investors” (11 June 2010
http://www.jpx.co.jp/english/systems/connectivity/tvdivq000 000099j-
att/b7gje6000000gmkz.pdf English version;
http://www.jpx.co.jp/systems/connectivity/tvdivq000000099j-att/b7gje6000001f73x.pdf
Japanese version) and “Tax Treatment of Foreign Investors Who Use Servers Located in
Japan” (16 June 2011
http://www.jpx.co.jp/english/systems/connectivity/tvdivq000000099j-
att/b7gje6000000jzns.pdf English version;

1923
http://www.jpx.co.jp/systems/connectivity/tvdivq000000099j-att/b7gje6000001mm7l.pdf
Japanese version).
530 Unfortunately, there is no official opened materials concerning the reason of no-
recognition of PEs. The reason is discussed in Nishimura & Asahi “Does a high-frequency
trading server constitute a permanent establishment?” (16 September 2011
https://www.jurists.co.jp/sites/default/files/tractate _pdf/ja/ILO_newsletter2011.pdf);
KITAMURA, Michito “Kôkyûteki shisetsu kazei wo meguru gendaiteki shomondai
(Present issues concerning permanent establishment taxation)” in KANEKO, Hiroshi ed.,
Gendai Sozeihô Kôza 4: Kokusai Kazei (Present Lectures on Tax Law 4: International
Taxation), p. 123 ff., at 136 (Nihon Hyôronsha, 2017) (written in Japanese).
531 OECD Commentary on Article 5, paragraphs 4 and 42.3.
532 Even if the computer servers constitute PEs, profits attributable to the PEs would be
small under arm’s length principle under OECD Model Tax Convention, Article 7(2). The
profits might only be time value of money of the cost of the computer servers or be with
slight plus amount.
533 See, Kitamura, supra note 11, p. 144; FUJITA, Kouji, “Shiten nashino gaikoku hôjin
heno kazei: denshi shoten heno kazei jirei ni chinande (Taxation on foreign corporations
without branches: tax cases concerning electric book shops)”, Jurist, no. 1447, p. 21
(November 2012); INAMI, Kuniyasu, “Zeigen shinshoku to rieki iten (BEPS) ni kakaru
wagakuni no taiô ni kansuru kôsatsu (II) (Consideration on Japan’s reaction on base
erosion and profit shifting (BEPS) (II))”, Zeidai Ronsô, no. 83, p. 159 ff., at 199-204
(September 2015).
534 Around US$ 140 million.
535 OECD Model Tax Convention, Article 5(4)(a) and Japan-US Tax Convention, Article
5(4)(a).
536 OECD Model Tax Convention, Article 25 and Japan-US Tax Convention, Article 25.
537 OECD (2015), Preventing the Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status,
Action 7 – 2015 Final Report, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project,
OECD Publishing, Paris. DOI: http://dx.doi.org/10.1787/9789264241220-en.
538 Rakuten and Yahoo.
539 One staff was shifted on one day.
540 When a taxpayer has complaint against action by tax authorities, the taxpayer makes an
argument to National Tax Tribunal before judicial judgments. See http://www.kfs.go.jp/.
541 National Tax Tribunal, adjudication on 25 November 2011, reported in
http://www.kfs.go.jp/service/JP/85/09/index.html. See NODA, Masaki and
KUROMATSU, Kouzou “Junbiteki hojoteki katsudô to kôkyûtekishisetsu (Preparatory or
auxiliary activities and permanent establishment)” in NAKAZATO, Minoru & et al., ed.,
Cross Boder Torihiki Kazei no Frontier (Frontier of Taxation on Cross Border
Transactions) at 157 (Yûhikaku, 2014); ASATSUMA, Akiyuki, case review, in Jurist, no.
1447, p. 8 (November 2012).
542 Tokyo District Court, decision on 28 May 2015, reported in
http://www.courts.go.jp/app/hanrei_jp/detail5?id=85442. See FUJITANI, Takeshi, case
review, in Jurist, no. 1494, p. 119 (June 2016).

1924
543 Tokyo High Court, decision on 28 January 2016, reported in
http://www.courts.go.jp/app/hanrei_jp/detail5?id=86117. See Kitamura, supra note 11, p.
139 ff.
544 Some readers might wonder whether there is difference concerning the first issue
between Amazon case in section 1.2.2. and this case in section 1.2.3. or not. Such question
is interesting. However, it is difficult to examine the existence of such difference because
details of Amazon case are not officially opened.
545 OECD Model Tax Convention: Revised proposals concerning the interpretation and
application of Article 5 (Permanent Establishment) (19 October 2012 to 31 January 2013
http://www.oecd.org/ctp/taxtreaties/PermanentEstablishment.pdf) p. 26-27, “13.
Relationship between delivery and the sale of goods in subparagraph 4 a) (paragraphs 22
and 27.1 of the Commentary)”
546 Both OECD Model Tax Convention, Article 5(4)(a) and Japan-US Tax Convention,
Article 5(4)(a) include “delivery”. UN Model Tax Convention, Article 5 (4)(a) does not
include “delivery”.
547 Before 1963 when OECD Model Tax Convention was made, productive clause was used
instead of Article 5(4) “preparatory or auxiliary”. Productive clause was not adopted by
OECD Model Tax Convention because all parts of an enterprise contributed productivity
of the enterprise. However, “The OECD ‘negative list’ and the commentaries have
crystallized as a compromise among a number of countries with different legal traditions,
without a distinct underlying principle”, said in Arvid Aage Skaar, Permanent
Establishment: Erosion of a Tax Treaty Principle at 325 (Kluwer Law and Taxation
Publishers, 1991). Therefore, historically, it is difficult (or might be impossible) to define
“preparatory or auxiliary” character.
548 BEPS Action 7, supra note 18, p. 29 proposes that “provided that such activity or, in the
case of subparagraph f), the overall activity of the fixed place of business, is of a
preparatory or auxiliary character” is added in Article 5(4).
Also see, OECD BEPS Action 15, “Multilateral Convention to Implement Tax Treaty
Related Measures to Prevent BEPS” (24 November 2016
http://www.oecd.org/tax/treaties/multilateral-convention-to-implement-tax-treaty-related-
measures-to-prevent-BEPS.pdf), p. 19 ff.; Part IV. Avoidance of Permanent Establishment
Status; Article 13 – Artificial Avoidance of Permanent Establishment Status through the
Specific Activity Exemptions.
549 See Kitamura, supra note 11, p. 143; Asatsuma, supra note 22, p. 9; Fujitani, supra note
23, p. 122.
550 Fact findings are basically not the task of Supreme Court. Therefore, it is hard to expect
that Supreme Court reverse the fact findings in lower courts in supra notes 23 and 24.
551 KANEKO, Hiroshi, Sozeihô (Tax Law), 22nd ed., p. 498 (Kôbundô, 2017). Meiji Bussan
case, Supreme Court decision on 29 May 1958, reported in Minshû, vol. 12, no. 8, p. 1254
http://www.courts.go.jp/app/hanrei_jp/detail2?id=54801 and the original decision, Tokyo
High Court 20 December 1951, reported in in Minshû, vol. 12, no. 8, p. 1271 stated that
“unreasonable form of actions elected by notable pure economic person (jun keizai jin)
who has no purpose of avoiding taxes” (underlined by Asatsuma) can be disregarded by
former provision of Corporate Tax Act, Article 132. The courts did not use the word

1925
“arm’s length principle” but use the word “pure economic person”, but Kaneko or other
tax law professors have understood that “unreasonable … actions [of] pure economic
person” roughly means departures from arm’s length principle; therefore, “unjustly”
roughly means departures from arm’s length principle.
552 In Japanese tax law, does the word “unjustly” only mean departure from arm’s length
principle? It is not clear. Corporate Tax Act, Article 132-2 provides quasi GAAR in order
to disregard actions or figures of corporations who do reorganization (mergers, division,
and etc.) and this Article also use “unjustly”. When corporations do reorganization, arm’s
length principle is hard to apply from the nature. Therefore, Supreme Court stated that
“unjustly” in Article 132-2 is not the same as “unjustly” in Article 132 and that “unjustly”
means “reduction of corporate tax amount with abuse of reorganization provisions for
resorts of tax avoidance”. Yahoo case, Supreme Court decision on 29 February 2016,
reported in Minshû, vol. 70, no. 2, p. 242 http://www.courts.go.jp/app/hanrei_jp/detail2?
id=85710 and ICDF case, Supreme Court decision on 29 February 2016, reported in
Minshû, vol. 70, no. 2, p. 470 http://www.courts.go.jp/app/hanrei_jp/detail2?id=85709.
“Unjustly” in Article 132 roughly means departures from arm’s length principle and
“unjustly” in Article 132-2 means “abuse of reorganization provisions”.
It is difficult to say that “unjustly” in quasi GAAR for PEs in Corporate Tax Act, Article 147-
2 means departures from arm’s length principle and “abuse” of PE provisions. Therefore,
tax law practitioners and professors have no consensus concerning the meaning of
“unjustly” in Corporate Tax Act, Article 147-2.
553 See OECD (2015), Addressing the Tax Challenges of the Digital Economy, Action 1 –
2015 Final Report, OECD/G20 Base Erosion and Profit Shifting Project, OECD
Publishing, Paris. DOI: http://dx.doi.org/10.1787/9789264241046-en; p. 156.
554 If we had adopted formulary apportionment with heavy reliance on sales factor rather
than arm’s length principle through historical developments of international tax law
discussions through League of Nations and OECD, then PE concept would have not
attracted attention as much as now.
555 Unfortunately, Consumption Tax Act (Act No. 108 of 1988) has not yet been translated
into English. See Japanese Law Translation in supra note 4. Translation of Consumption
Tax Act in this article is my own and might be unfortunately non-accurate.
556 Consumption Tax Act, Article 2 (1)(8) provides that “transfer of goods, etc.” means (1)
“transfer of goods”, (2) “lease of goods”, and (3) “supply of services”. “Goods” is not
limited within tangible goods. For example, copyright is also “goods” and it is discussed
in next section.
557 Consumption Tax Act, Article 2 (1)(4) provides that “jigyôsha (enterprise)” means
individual businesspersons and corporations.
558 Customs Tariff Act (Act No. 54 of 1910), Article 14(18).
559 Consumption Tax Act, Article 7(1)(5) delegate more detail provisions for tax-exempt
“transfer of goods, etc. as export” to Order for Enforcement of the Consumption Tax Act
(Order No. 360 of 1988), Article 17.
560 Order for Enforcement of the Consumption Tax Act, Article 6(1)(5).
561 Order for Enforcement of the Consumption Tax Act, Article 6(1)(7).

1926
562 Order for Enforcement of the Consumption Tax Act, Article 6(2)(6), which is abolished
after 2015 amendment.
563 Order for Enforcement of the Consumption Tax Act, Article 6(2)(7), which is re-
numbered as 6(2)(6) after 2015 amendment.
564 For example, Günter Berkholz v Finanzamt Hamburg-Mitte-Altstadt, CJEU, case C-
168/84; Commissioners of Customs and Excise v DFDS A/S, CJEU, case C-260/95; Aro
Lease BV v Inspecteur van de Belastingdienst Grote Ondernemingen, Amsterdam, CJEU,
case C-190/95.
It seems to be roughly agreed that “fixed establishment” needs personal and technical
resources for supplying services and that concept of “fixed establishment” in VAT
contexts is narrower than concept of “permanent establishment” in income tax contexts.
565 Order for Enforcement of the Consumption Tax Act, Article 6(2)(7) at that time.
566 Indy Car Racing case, Tokyo District Court decision on 13 October 2010, case number
Heisei 20 (2008) Gyô-u 730, reported in Shômu Geppô, vol. 57, no. 2, p. 549
http://www.courts.go.jp/app/hanrei_jp/detail5?id=81274.
567 Hanatour Japan case, Tokyo District Court decision on 26 March 2015, case number
Heisei23 (2011) Gyô-u 718, reported in Shômu Geppô, vol. 62, no. 3, p. 441
http://www.courts.go.jp/app/hanrei_jp/detail5?id=85246; Tokyo High Court decision on 9
February 2016, case number Heisei 27 (2015) Gyô-ko 156
http://www.courts.go.jp/app/hanrei_jp/detail5?id=86389.
568 Consumption Tax Act, Article 2(1)(viii-2).
“Supply of services using electric communication to enterprises” is defined in detail as
“foreign enterprise’s supply of service using electric communication, a receiver of which
is ordinarily limited to an enterprise because of nature of the supply of services using
electric communication or because of transactional conditions, etc. of the supply of
services” in Consumption Tax Act, Article 2(1)(viii-4), which is discussed in section
2.2.2.
“Supply of specified services” is defined in detail as “transfer of goods, etc. which is drama
done by foreign enterprises and other supply of services defined in Order (excluding
supply of services using electric communication)” in Consumption Tax Act, Article 2(1)
(viii-5), which is not discussed in this article.
569 Therefore, services of ISP (Internet Service Provider) for transmitting other people’s
communication are excluded.
570 This non-inclusion is discussed later in section 2.2.3., incomplete destination principle
after the 2015 amendment.
571 Consumption Tax Act, Article 2(1)(viii-3).
572 More accurately, national VAT rate is 6.3% and local VAT rate is 1.7%. This article uses
8% rate. Total VAT rate will be increased from 8% (= 6.3 + 1.7) to 10% (= 7.8 + 2.2)
since 1 October 2019.
573 Consumption Tax Act, Article 39.
574 Consumption Tax Act, Article 2(1)(viii-2).
575 Consumption Tax Act, Article 2(1)(viii-4) (underline is added by the author).

1927
576 Consumption Tax Act, Article 2(1)(viii-2).
577 Consumption Tax Act, Article 2(1)(viii-3).
578 See Skatteverket v. David Hedqvist, CJEU, case C-264/14.
579 Virtual currencies are defined in Payment Services Act (Act No. 59 of 2009), Article
2(5), which is unofficially translated into English in
http://www.japaneselawtranslation.go.jp/ as follows: “Article 2(5) The term “Virtual
Currency” as used in this Act means any of the following: (i) property value (limited to
one that is recorded on an electronic device or any other object by an electronic means,
and excluding the Japanese currency, foreign currencies, and Currency-Denominated
Assets; the same applies in the following item) which can be used in relation to
unspecified persons for the purpose of paying consideration for the purchase or leasing of
goods or the receipt of provision of services and can also be purchased from and sold to
unspecified persons acting as counterparties, and which can be transferred by means of an
electronic data processing system; and (ii) property value which can be mutually
exchanged with what is set forth in the preceding item with unspecified persons acting as
counterparties, and which can be transferred by means of an electronic data processing
system”.
580 Mr. Adam Bitar is a Cum Laude Lawyer admitted to practice from Universidad
Panamericana (Mexico), where he pursued a Masters in Tax Law also. He has studies in
International Finance (Euromoney Program) in Oxford England and coordinates the
International Taxation Studies division at Universidad Panamericana (Mexico).
581 Mr. Diaz-Infante received a bachelor’s degree in Law from Instituto Tecnologico
Autonomo de Mexico (ITAM), a Specialization in Mexican Tax Law from Universidad
Panamericana (UP), a Certificate in Income Tax Planning and Reporting from New York
University (NYU) and a Blue Course in International Taxation Principles & Planning from
Sheltons International Tax Training Institute.
582 The term “Digital Economy” was coined in Don Tapscott’s 1995 best-seller The Digital
Economy: Promise and Peril in the Age of Networked Intelligence.
583 OECD, “Measuring the Digital Economy. A new Perspective”, OECD Publishing, 2014.
584 See, for example, the World Bank Digital Adoption Index, the Network Readiness Index
of the World Economic Forum, the ITU’s Digital Opportunity Index, indices constructed
by various consultancy firms such as the Boston Consultancy Group’s e-Intensity Index,
and the “digitisation index” developed by Katz et al.
585 SUNDARARAJAN, Arun, “The sharing economy: the end of employment and the rise of
crowd-based capitalism / Arun Sundararajan”, Cambridge, MA: The MIT Press, 2016.
586 Source: Investopedia.
587 In terms of Article 9 of the Federal Fiscal Code, legal entities are considered to be
resident in Mexico for tax purposes if they have established their main place of business or
place of effective management in Mexico, whether they are incorporated under Mexican
or under foreign laws; otherwise, the concerning entity would be deemed as non-resident
for tax purposes. For such purposes, a legal entity is deemed to have established in Mexico
its main place of business or its effective management, when the place where the person or
persons who have the authority to decide on the control, direction, operation or

1928
management of the legal entity and over its activities are located within Mexican territory.
588 Article 153 of the MITL: “Nonresidents who earn income in cash, in kind, in services or
in credit, including income determined through presumptions by the tax authorities in
accordance with articles 58-A of the Federal Fiscal Code and 11, 179 and 180 of this Law,
are required to pay income tax in accordance with this Title when said income arises from
sources of wealth located in Mexican territory and they do not have a permanent
establishment in Mexico or when they have such an establishment and income is not
attributable thereto. Payments made as a result of the acts or activities referred to in this
Title that benefit the nonresident, including payments that resulted in decreased
expenditures for him, are considered to be part of the income mentioned in this paragraph
and therefore, the provisions governing the items of income that originated such payments
shall be applied thereto.
[…]
When a person who makes any of the payments referred to in this Title covers, for the
account of the taxpayer, the tax corresponding to the latter, the amount of said tax shall be
considered income of the types covered in this Title and the provisions applicable to the
relevant type of income for which the tax is paid shall apply thereto.
When in accordance with this Title, the tax is required to be paid through a withholding, the
withholding party shall be required to pay an amount equivalent to that which such
withholding party should have withheld on the date on which the obligation becomes due
or at the time the payment is made, whichever occurs first. In the case of considerations
denominated in a foreign currency, the tax shall be paid by converting the consideration
amount to Mexican currency at the moment when the consideration is due or is paid. For
the purposes of this Title, any other act by which the debtor discharges the obligation in
question shall have the same effect as a payment.
The tax due under this Title shall be considered definitive and shall be paid by filing a tax
return at the authorized offices. […]”.
589 Under article 179 of the MITL two or more persons are considered to be related parties
when one of them participates, directly or indirectly, in the administration, control or
equity of the other, or when a person or group of persons participates, directly or
indirectly, in the administration, control, or equity of said persons.
590 “Article 4. The benefits of treaties to avoid double taxation shall only apply to taxpayers
who demonstrate that they are residents of the country in question and comply with the
provisions of the treaty and the procedural provisions set forth in this Law, including the
obligation to submit an informative return on their tax situation pursuant to article 32-H of
the Federal Fiscal Code, or the obligation to submit audited financial statements, when the
election described in article 32-A of such Code has been exercised, as well as the
obligation to appoint a legal representative.
[…]
In cases where treaties to avoid double taxation establish withholding rates lower than those
provided for in this Law, the rates established in said treaties may be applied directly by
the withholding party. If the withholding party applies rates higher than those indicated in
the treaties, the nonresident shall be entitled to request a refund for the difference thereof.
Certificates of residence issued by foreign authorities shall be valid without legalization, and

1929
it shall only be necessary to produce an authorized translation when the tax authorities so
require.”
591 Such evidence of residence in a country with which Mexico has executed a tax treaty
shall be fulfilled through the provision of a certificate of residence issued by foreign
authorities or a document issued by the authority of that country which evidences that the
non-resident entity is a taxpayer of that country and that it has filed the tax return of the
last fiscal year.
592 The Mexican tax reforms implemented in 2014 and 2016 included a number of BEPS-
related issues (for example, regarding Action 2 – hybrids –, Action 3 – CFCs –, Action 6 –
Prevent treaty abuse –, and Action 13 – Transfer pricing documentation and CbC
reporting).
593 Additional Guidance on the Attribution of Profits to Permanent Establishments.
594 Transfer Pricing Documentation and Country-by-Country Reporting.
595 Implementing Guidance on Hard-to-value intangibles.
596 Revised guidance on profit splits.
597 Report released as part of their Fifteenth Session in Geneva on October 17th to 20th:
http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=E/C.18/2017/6.
598 Unilateral actions described are those executed by: Australia, China, France, India, Israel,
Italy and the UK.
599 Article 14 of the Value Added Tax Law: “For purposes of this Law, the following are
defined as rendering independent services:
I. An affirmative covenant by one person to perform in favor of another person, regardless of
the act from which such covenants arises and the name or classification given to said act
by other laws.
II. Transportation of persons or goods.
III. Insurance, bonding and re-bonding.
IV. Agency, commission, intermediation, representation, brokerage, consignment and
distribution.
V. Technical assistance and technology transfer.
VI. All affirmative covenants to give, or negative covenants to not do or allow undertaken by
one person in favor of another, provided that such obligations or covenants are not defined
hereunder as a transfer or temporary use or enjoyment of goods.
The rendering of independent services does not include the rendering of dependent services
for remuneration or the rendering of services for income which the Income Tax Law
defines as similar to said remuneration.
The rendering of independent services is deemed personal if the services are activities
described under this article which do not have the characteristics of business activities”.
600 Articles 58 and 61 of the Regulations to the VATL.

1930
Índice
Apresentação 38
Parte I - TRIBUTAÇÃO E OS DESAFIOS DA
42
ECONOMIA DIGITAL NO BRASIL
SEÇÃO A - ASPECTOS RELACIONADOS À TRIBUTAÇÃO
43
DIRETA LOCAL E INTERNACIONAL
Estabelecimento permanente: legislação tributária brasileira
43
e desafios na economia digital
1. Introdução 43
2. O Conceito de Estabelecimento Permanente no Modelo
45
de Convenção da OCDE
3. A Tributação do Estabelecimento Permanente na
53
Legislação Tributária Brasileira
4. Os desafios da economia digital: a Ação n. 1 do BEPS 58
5. Estabelecimento Permanente no Brasil: Novos Rumos
65
na Economia Digital?
6. Conclusão 68
A tributação de IRRF na importação de cloud computing no
70
Brasil e as soluções analisadas na Ação 1 do BEPS
1. Introdução 70
2. Panorama Geral do BEPS em relação aos desafios da
71
Economia Digital
3. A contratação do Cloud Computing de fornecedores
78
estabelecidos em outros países
4. A tributação do IRRF nas remessas ao exterior na
84
importação do Cloud Computing – O exemplo do SaaS
5. Conclusões 97
As operações internacionais envolvendo software e o
102
imposto de renda
1. Introdução 102
2. Definição de software. Tipos de software. Propósitos
105
com a sua criação
2.1. Definição de software 105
2.2. Tipos de software 106

1931
2.3. Finalidade da sua criação 107
2.4. Software como direito real do autor 110
3. Os diferentes negócios envolvendo software em
113
transações internacionais e o IRRF
4. Transações com software sob encomenda 115
5. Transações com software-produto 116
5.1. Cessão integral dos direitos de propriedade
119
sobre o software
5.2. Cessão parcial de direitos de exploração
123
econômica sobre o software
5.3. Licença de uso do software (copyrighted article) 127
5.3.1. Licenças perpétuas 127
5.3.2. Licenças temporárias 128
5.4. Compra e venda de licenças de direito de uso
(copyrighted articles) para a distribuição no mercado 134
interno
6. Transações com software adaptável (“customizável”) 139
Qualificação de operações envolvendo software no Brasil à
luz dos tratados contra a bitributação: visão da OCDE e a 141
prática brasileira
1. Introdução 141
2. Software: conceito, tipos e características relevantes
142
em função das diferentes formas de comercialização
2.1. Objeto do estudo: software de aplicação 142
2.2. Variações conforme o contrato e a natureza
144
jurídica do rendimento
2.3. Observação sobre licenças de uso 148
3. Qualificação dos rendimentos relacionados a operações
149
com software à luz dos tratados contra a bitributação
3.1. Possíveis qualificações de rendimento com base
149
na CM-OCDE
3.2. Comentários Oficiais da OCDE à CM-OCDE 150
3.3. Posicionamento do Brasil 155
4. Considerações Finais 156
Com a cabeça nas nuvens e os pés no chão? A tributação
158
internacional da renda no ambiente de cloud computing

1932
Introdução 158
1. Definição e modelos de “cloud computing”: novos
160
tempos, novos paradigmas
2. A tributação brasileira das remessas ao exterior para
162
remuneração do cloud computing
3. A qualificação dos rendimentos no contexto do cloud
computing para a aplicação dos acordos de bitributação e 165
a questão dos estabelecimentos permanentes
3.1. A qualificação dos rendimentos no contexto do
166
cloud computing
3.2. A questão do estabelecimento permanente 170
4. A solução acenada pelas autoridades fiscais brasileiras
174
para os rendimentos decorrentes de cloud computing
5. Considerações finais: apenas o início pela busca de
178
soluções
Os princípios da tributação no Estado da fonte e no Estado
da residência e os impactos da economia digital no Brasil e 183
no mundo
1. Introdução: economia digital e seus impactos no direito 183
2. Economia digital e seus impactos no Direito Tributário 186
2.1. Os princípios da tributação no estado da fonte e
187
no estado da residência
2.2. Desafios da economia digital para o princípio de
192
fonte e residência
3. Análise sob a perspectiva brasileira 202
4. Conclusões 206
Potenciais impactos tributários do CPC 47 nos negócios
210
voltados à economia digital
1. Introdução 210
2. Afinal, o que é a economia digital? Que atividades
212
estão por ela abrangidas?
2.1. Generalidades 212
2.2. As atividades na economia digital 215
3. Análise do CPC 47 218
3.1. Generalidades 218
3.2. Exame dos passos para reconhecimento da 219

1933
receita do CPC 47 219

3.2.1. Identificar as características do contrato 219


3.2.2. Identificar obrigações de desempenho 220
3.2.3. Determinar o preço da transação 221
3.2.4. Alocar o preço da transação 221
3.2.5. Reconhecer a receita 222
3.3. Contabilidade, Direito e o reconhecimento de
222
receitas
3.3.1. Contabilidade e tributação 223
3.3.2. Conceito de receita para fins tributários 225
3.3.3. Conteúdos do CPC 47 frente ao Direito 227
4. Reflexos tributários das metodologias contábeis 229
4.1. Royalties 230
4.1.1. Tratamento jurídico-tributário 230
4.1.2. Tratamento contábil 232
4.2. Licenciamento 234
4.2.1. Tratamento jurídico-tributário 234
4.2.2. Tratamento contábil 234
5. Os negócios digitais e seus reflexos tributários 236
6. Outras questões controversas relacionadas à
contabilização e tributação de negócios na economia 240
digital
7. Conclusões 245
Questões controversas relacionadas à contabilização de
negócios na economia atual e os seus possíveis reflexos 247
tributários
1. Aspectos introdutórios 247
2. Breves considerações acerca dos objetivos da
249
contabilidade
3. A estrutura conceitual básica da contabilidade adotada
254
no Brasil
4. Os critérios para o reconhecimento de receitas
258
contábeis
5. Os efeitos tributários do reconhecimento de receita
262
contábil

1934
6. Conclusões 268
Desafios da tributação doméstica de operações com
270
software na era da economia digital
1. Introdução 270
2. Qualificação das transações com software 273
2.1. Direito 275
2.2. Mercadoria 279
2.2.1. Aspectos gerais do software como
279
mercadoria
2.2.2. Transferência via download do software
283
como mercadoria
2.3. Serviço 288
2.3.1. Obrigações de dar e de fazer 288
2.3.2. Software como serviço e a “computação em
289
nuvem”
2.3.3. Novas tentativas de tributação do software
292
pelo fisco paulistano
3. Outros Aspectos Tributários: Regime do Lucro
293
Presumido; PIS e COFINS
3.1. Regime do lucro presumido 293
3.2. PIS e COFINS: regimes de apuração 295
3.2.1. Regime cumulativo 295
3.2.2. Regime não cumulativo 296
4. Conclusão 298
Preços de transferência e a criação de valor: distribuição de
301
software no Brasil
1. Introdução 301
2. Preços de transferência e a criação de valor 302
2.1. Análise funcional de preços de transferência na
303
era pós-BEPS
3. Economia Digital: Modelos de negócios e a criação de
305
valor
3.1. Distribuição de software: intangíveis na
308
realidade brasileira
3.2. Caso prático 311
3.2.1. Centralização no exterior 312

1935
3.2.1. Centralização no exterior 312
3.2.2. Reestruturação: vendas diretas no Brasil
313
(Buy/Sell)
3.2.3. Conclusão do caso prático 317
4. Conclusão 318
A economia digital e as regras brasileiras de preços de
transferência: os problemas na aplicação dos métodos aos 320
serviços, intangíveis e direitos
Introdução 320
1. As regras brasileiras de preços de transferência 320
2. Da exclusão da aplicação das regras de preços de
323
transferência sobre royalties
3. A adequação das regras brasileiras de preços de
transferência para serviços e intangíveis no âmbito da 325
economia digital
4. Conclusões 330
Transferências cross-border de direitos de uso sobre
software de prateleira: aquisição de mercadoria ou
331
licenciamento? Tributação na fonte e dedutibilidade de
despesas
1. Introdução e definições 331
2. Natureza da contraprestação pelo uso do software 333
3. Dedutibilidade 341
3.1. Tratamento contábil de ativos intangíveis 341
3.2. Tratamento fiscal de ativos intangíveis 344
4. Conclusão 348
Tratamento jurídico-tributário do download de software no
351
Brasil
1. Introdução 351
2. Os conceitos de “mercadoria” e “serviços” na
351
economia digital
3. O download de software: aspectos jurídico-tributários 353
4. Reflexos na tributação sobre a renda 359
5. Conclusões 361
Aspectos da tributação decorrente da importação do cloud
362
computing no Brasil

1936
2. Conceito de Cloud computing e suas modalidades 363
3. Tributação da Economia Digital 364
3.1. A legislação tributária: definindo-se o cloud
computing por intermédio do conflito entre o ICMS 365
e o ISS
4. Cloud computing e a tributação federal 368
4.1. As interpretações da RFB 369
4.2. As interpretações dos autores 370
5. Conclusão 372
Seção B - Aspectos relacionados à tributação sobre o consumo 374
Internet das Coisas à luz do ICMS e do ISS: entre
mercadoria, prestação de serviço de comunicação e serviço 374
de valor adicionado
Introdução 374
1. O que é Internet das Coisas? 376
2. A Internet das Coisas e os Conflitos de Competência:
378
perspectivas à luz do ICMS versus ISS
3. A venda de mercadoria deixa de ser uma operação
relativa à circulação de mercadoria pelo fato de ter valor 380
agregado (ser inteligente)?
3.1. ICMS sobre Operações de Circulação de
Mercadorias: considerações acerca do seu critério 380
material
3.2. Operações de circulação de mercadorias: bens
382
corpóreos e incorpóreos
4. É possível que em transações envolvendo objetos
385
inteligentes também haja uma prestação de serviço?
4.1. A atuação do legislador complementar:
385
imposição da regra tudo ou nada
4.2. A Internet das Coisas e o acirramento da
387
alocação entre ICMS e ISS
4.2.1. Roupas Inteligentes como exemplo de fácil
388
solução
4.2.2. Chamada de Emergência Inteligente como
389
exemplo de difícil solução
4.3. Breves considerações sobre o problema da
391

1937
4.3. Breves considerações sobre o problema da 391
alocação das obrigações na Contabilidade
5. Há prestação de serviço de comunicação ou serviço de
392
valor adicionado no âmbito da Internet das Coisas?
5.1. ICMS sobre a Prestação do Serviço de
Comunicação: considerações acerca do seu critério 393
material
5.1.1. Do Imposto sobre Serviços de
393
Comunicações antes de sua aglutinação ao ICM
5.1.2. Da aglutinação do Imposto sobre Serviços
394
de Comunicações no ICM
5.1.3 Da busca por uma noção de cadeia de
396
prestação comunicativa
5.1.4. Do núcleo comum do critério material do
397
ICMS-C às controvérsias
5.2. ISS sobre Serviços de Valor Adicionado: breves
401
considerações acerca de sua definição
5.3. Internet das Coisas: ICMS-C ou ISS-SVA? 402
Conclusão 405
A Lei Complementar n. 157/2016 à luz da Constituição
Federal: aspectos relacionados à retroatividade e aos
406
campos de incidência do ICMS e do ISS na atividade de
difusão de vídeos, áudio e textos pela internet
1. Lei Complementar n. 157/2016 – Pontos Básicos 406
2. Planos Jurídicos: Validade, Vigência, Eficácia,
407
Irretroatividade
3. Streaming (Difusão de vídeos, imagens, textos e sons
410
pela internet)
3.1 Considerações Jurídicas 410
3.2. Significado 412
3.3. Natureza Jurídica 413
3.4. ISS 414
3.5. ICMS 416
3.6. Imunidade 420
4. Conclusões 423
Determinação dos limites de incidência do ICMS na

1938
modalidade “comunicação” e do ISS nas atividades de 425
veiculação de textos/imagens e divulgação de publicidade
na internet
1. Introdução 425
2. O fato gerador do ICMS na modalidade de
Comunicação (posições doutrinárias, posição fazendária e 426
nosso posicionamento)
3. Da incidência do ICMS nas atividades de veiculação
de textos/imagens e divulgação de publicidade na internet
431
por contrato oneroso prestado por meio das empresas do
setor de internet
4. O Panorama da tributação pelo ISS antes e após a
edição da Lei Complementar n. 157/2016. A veiculação
de textos/imagens e divulgação de publicidade na internet
435
por contrato oneroso estava e continua inserida no campo
de incidência do ICMS, conforme preconiza o artigo 155,
inciso II, da Constituição Federal/1988
5. Da não configuração da imunidade constitucional
prevista na alínea “d”, do inciso X, do artigo 155 da 441
CF/88
6. Nossas Conclusões 445
E-Commerce: aspectos tributários sob a perspectiva
448
brasileira
1. Introdução 448
2. O Comércio Eletrônico e o ICMS Devido na Origem 449
3. A Emenda Constitucional n. 87/2015 e a Tributação do
457
ICMS no Destino
4. O Convênio ICMS n. 93 e as Controvérsias da
463
Tributação pelo Estado de Destino
5. Conclusão 471
O Paradigma da Economia Digital e os Novos Conceitos de
473
Serviço e Mercadoria — Reflexos na Tributação
Introdução 473
1. Federação e Competências Tributárias na Constituição
475
Federal de 1988
2. Conceitos de Direito Privado e as Competências
478
Constitucionais

1939
3. Os conceitos de mercadoria e serviço no contexto da 483
Economia Digital e seu impacto tributário
Conclusão 492
ICMS sobre software: evolução do conceito constitucional
495
de mercadorias em face da inovação tecnológica
1. A Tributação na Economia Digital 495
2. Circulação de Mercadorias na Constituição Federal:
498
tipos ou conceitos?
3. Circulação de Mercadorias na Legislação
Infraconstitucional: Lei Complementar em matéria de 502
ICMS
4. Da Interpretação da Legislação Tributária 506
5. A tributação de bens digitais no âmbito do Convênio
510
CONFAZ n. 106/2017: (in)constitucionalidade?
5.1. Evolução semântica de “mercadorias” no
511
contexto da economia digital
5.2. A circulação ou disponibilização de bens
514
digitais
5.3. Adoção do critério de destino nas operações
515
com bens digitais
5.4. Atribuição de responsabilidade tributária por
515
convênio
5.5. Analogia ou mera interpretação: nova incidência
516
sobre bens digitais?
6. Conflito Federativo Vertical: ICMS ou ISS sobre Bens
517
Digitais
7. Considerações Finais 521
Tributação da economia digital e os conflitos de
523
competência entre ICMS e ISS
1. Introdução 523
2. Primeira aproximação do problema: dificuldade de
enquadramento dos negócios da economia digital no 525
modelo adotado pelo sistema constitucional tributário
3. A instauração do conflito de competências 532
4. Algumas reações do judiciário 538
5. Proposta conclusiva 542

1940
Operações de Cloud Computing (SaaS, IaaS, PaaS etc.): 549
ICMS vs. ISS
1. Guerra Fiscal na Tributação de Software – ISS vs.
549
ICMS
1.1. Conflito de competência para tributação entre os
554
Municípios e os Estados (serviço vs. mercadoria)
2. Materialidade da Tributação do Software pelo
560
Município (Cloud Computing como Serviço)
3. Materialidade da Tributação do Software pelo Estado
568
(Cloud Computing como Mercadoria)
4. Conclusão 574
A Tributação pelo ISS e pelo ICMS das Operações com
577
Software
1. Introdução 577
2. Definição de Software 578
3. A Incidência do ISS e do ICMS nas Operações com
583
Software
3.1. Considerações preliminares 583
3.2. ISS 584
3.3. ICMS 585
4. Controvérsias da Tributação de Software pelo ISS e
590
pelo ICMS
5. Conclusões 596
O ISS e a exportação de serviços: conceito de resultado e o
princípio do destino nas atividades voltadas à economia 599
digital
1. O ISS e as operações de exportação 601
1.1. Seu critério espacial e o princípio da
603
territorialidade
2. O tratamento tributário dado às operações de
exportação: finalidade constitucional e o princípio do 605
destino
3. Proposta conceitual: operação de exportação de
608
serviços
4. O sentido e o alcance do artigo 2º da LC n. 116/2003:
610
compreensão do termo resultado

1941
5. Análise crítica 615
5.1. Decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) 615
5.2. Parecer Normativo n. 4, de 2016 e precedentes
618
administrativos do Município de São Paulo
6. Aplicação aos serviços relacionados à economia digital 621
7. Nossa conclusão 624
Jogando com o conceito de valor aduaneiro: um estudo
sobre a valoração aduaneira na importação de jogos 627
eletrônicos
1. Introdução 627
2. O valor aduaneiro na importação de jogos eletrônicos:
627
as normas internacionais e a posição brasileira
2.1. Valoração aduaneira de bem incorpóreo no
Direito Internacional e no ordenamento jurídico 629
brasileiro
2.2. O entendimento do Conselho Administrativo de
632
Recursos Fiscais (CARF)
2.3. O entendimento do Poder Judiciário no âmbito
635
do Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3. Natureza jurídica dos jogos eletrônicos 636
3.1. A Lei Federal n. 12.485/2011 – Obras
637
Audiovisuais
3.2. A Lei Federal n. 9.609/98 – Software 639
3.3. Opiniões de especialistas 641
3.4. Nossa opinião quanto à natureza jurídica 644
3.5. A cortina de fumaça em torno da Decisão 4.1 645
4. Considerações Finais 647
Aspectos tributários do download de software: equívocos
comuns e implicações decorrentes da edição do Convênio 649
CONFAZ n. 181/2015
O conceito de software no ordenamento jurídico
650
brasileiro
O software como mercadoria 651
As espécies de software 653
A tributação do software adquirido por meio digital
656
(download)

1942
A posição dos tribunais superiores 658
O Convênio ICMS n. 181/2015 663
Considerações Finais 667
Aspectos da tributação sobre o consumo no cloud
669
computing
Introdução 669
1. Cloud computing 669
1.1. Delimitação do conceito de cloud computing,
669
natureza jurídica e principais espécies
2. Questões tributárias relativas ao cloud computing 673
2.1. Panorama global 673
2.1.1. Desafios gerais e tendências 674
2.2. Principais questões no ambiente norte-
675
americano
2.3. A tributação sobre o consumo na Europa quanto
678
às transações realizadas na nuvem
3. O problema da tributação do cloud computing no
680
Brasil
3.1. Controvérsias identificadas no cenário brasileiro 680
Conclusões 690
Seção C - Tributação de produtos ou negócios selecionados 693
ICMS sobre a divulgação de material publicitário na
693
internet por provedor
1. Considerações Iniciais 693
2. A atividade do provedor. A distinção necessária entre
os contratos: provedor e usuários e os contratos de 696
divulgação de publicidade
3. Regra Matriz do ICMS-Comunicação e a
711
jurisprudência do STJ
3.1. A Ausência de Obrigação de Fazer no Contrato
721
de Cessão de Espaço Virtual
4. Síntese conclusiva 726
Tributação de atividades de streaming de áudio e vídeo:
730
guerra fiscal entre ISS e ICMS
1. Introdução 730
2. O Conceito Constitucional de Serviço de Comunicação 731

1943
2.1. Serviço de comunicação não se confunde com
734
serviços de informática prestados pela internet
3. Alguns Serviços de Comunicação 736
3.1. Serviço de Acesso Condicionado (SeAC) – TV
736
por Assinatura
3.2. Serviço de Comunicação Multimídia (SCM) 738
4. Serviços Over The Top (OTT) 740
4.1. O que é o Serviço de Streaming? 743
4.1.1. Tipos e Exemplos de Serviços de Streaming 744
4.1.2. Televisão por Protocolo de Internet (IPTV –
744
Internet Protocol TV)
4.1.3. As Receitas das Empresas de Streaming 746
5. Papel da Lei Complementar Tributária (art. 146 da
Constituição Federal) a fim de prevenir o conflito entre
747
Serviço de Qualquer Natureza e o Serviço de
Comunicação560
6. Conclusões 752
O alcance da imunidade tributária sobre os livros digitais e
754
seus acessórios
1. Introdução 754
2. Sobre a interpretação das imunidades tributárias 756
3. O alcance da imunidade de livros eletrônicos (e-books) 759
4. Sobre o alcance da imunidade aos acessórios
762
(softwares educativos)
5. Conclusões 766
IaaS, PaaS, SaaS e os reflexos tributários da Cloud
768
Computing desenvolvida no exterior
I. Introdução 768
II. As diferentes modalidades do Cloud Computing 770
III. As principais questões fiscais relacionadas ao Cloud
772
Computing no Brasil
III.1 Aspectos Gerais 772
III.2 A posição da jurisprudência a respeito da
775
questão
III.3 Nosso entendimento quanto à tributação do
779
Cloud Computing (IaaS, PaaS, SaaS)

1944
IV. Conclusões 781
Tributação de negócios desenvolvidos por meio de
783
aplicativos associados aos serviços de transporte
1. Introdução 783
2. A natureza jurídica da atividade econômica 784
3. Análise de aspectos relativos à tributação sobre o
788
consumo no Brasil
4. Conclusão 797
Tributação da atividade de armazenamento digital de dados 799
Introdução 799
1. Um pouco do histórico sobre a tributação das
800
operações realizadas pela internet
2. Algumas notas sobre a computação em nuvem (cloud
806
computing)
3. Trata-se, efetivamente, de um serviço? 809
4. Conceito de “local da prestação” e de “estabelecimento
812
prestador”
5. Dificuldades de ordem técnica 814
Considerações finais 817
Tributação de marketing digital por meio de websites: Caso
Google Adworks e o contraponto entre as perspectivas 820
brasileira e internacional
Introdução 820
1. Contexto geral: o mundo virtual ou digital3 820
2. Formas usuais de marketing digital7 822
2.1. Banners 823
2.2. Cookies 824
2.3. “Links Patrocinados”: Pay Per Click 826
3. Impulsionamento de campanhas na internet:
829
AdWords26 e sua natureza jurídica
3.1. Programa de Computador: o software 831
3.2. Licença de uso de software 832
4. Aspectos Tributários: impulsionamento de marketing
834
digital
4.1. Tributação Direta38 nas operações cross-border 834

1945
4.1.1. Royalties 835
4.2. Tributação indireta 836
4.3. AdWords: tributação indireta no mundo 840
5. Considerações finais 842
Regime Jurídico Tributário do VoIP 844
1. Introdução 844
2. Serviços VoIP: características técnicas 845
3. Modus Operandi dos Provedores de Serviços VoIP e
848
Sistemática de Medição desses Serviços
4. Hipótese Tributária do ICMS-Comunicação 851
5. Definição de “Serviço de Telecomunicação” e
854
Hipótese de Incidência Tributária
6. Não incidência do ICMS-Comunicação sobre os SVAs 856
7. Serviços de Voz sobre IP (VoIP) 859
8. Jurisprudência 865
Conclusões 867
Tributação de Data Center no Brasil 869
1. Introdução e Noções sobre Data Center 869
2. A Posição da RFB e do Fisco Municipal de São Paulo
871
acerca do Tema
3. Natureza Jurídica da Atividade de Acesso ao Data
875
Center e sua Distinção da Prestação de Serviços
3.1. Discussão sobre o Conceito de Prestação de
875
Serviços para Fins Fiscais
3.2. Natureza Jurídica do Data Center 878
4. Tributação do Data Center nas Relações Locais e
883
Internacionais
4.1. Relações locais 883
4.1.1. IRPJ/CSLL 883
4.1.2. PIS/COFINS 883
4.1.3. ISS 885
4.2. Relações internacionais 886
4.2.1. IRRF 886
4.2.2. CIDE 888
4.2.3. PIS/COFINS-Importação 888

1946
4.2.4. ISS 889
4.2.5. IOF 889
4.3 Outros comentários – Discussões recentes sobre
890
o regime tributário do data center
5. Conclusões 891
Breves Considerações sobre o Tratamento Legal, Contábil e
894
Fiscal das Moedas Virtuais
I. Introdução 894
II. Das Moedas Virtuais – Elementos Definidores,
896
Experiência Internacional e Disciplina Brasileira
II.1 Elementos Definidores 896
II.2 Breves Apontamentos sobre a Experiência
898
Internacional
II.3 O tratamento na Legislação Brasileira 900
III. Do Tratamento Contábil e Fiscal Aplicável às Moedas
903
Virtuais
III.1 Do Tratamento Contábil Atribuído às Moedas
904
Virtuais
III.2 Do Tratamento Fiscal Atribuído às Moedas
905
Virtuais
IV. Conclusão 918
IRF e IOF sobre remessas realizadas por empresas de
920
intermediação de pagamento e regulação do BACEN
1. Introdução 920
2. Imposto de Renda retido na Fonte 922
3. Imposto sobre Operações Financeiras na modalidade
934
Câmbio
4. Conclusões 941
A Tributação de SaaS e SaaP no Brasil por ISS ou ICMS:
Estudo de Casos de Massively Multiplayer Online Games 944
(MMOGs)
Introdução 944
1. Definições relevantes 947
1.1. IaaS e PaaS 949
1.2. SaaS e SaaP 951
1.3. MMOGs 956

1947
2. Apresentação dos Três Casos de Estudo 960
3. Aspectos Tributários dos Três Casos de Estudo 961
3.1. Caso 1: MMOG, Jogador e Acesso a Área de
961
Jogo
3.2. Caso 2: MMOG, Jogador e Pacote de Benefícios 965
3.3. Caso 3: Jogador, Jogador e Item de Jogo 967
Considerações Finais 969
Desafios na tributação dos programas de fidelização 971
1. Introdução 971
2. Principais controvérsias tributárias 974
2.1. A atipicidade da atividade desenvolvida pelas
976
empresas gestoras do programa de fidelização
2.2. O momento do reconhecimento da receita
auferida pela empresa gestora do programa de 989
fidelização para fins de tributação do PIS/COFINS
3. Conclusões e alternativas quanto aos desafios
993
legislativos
Tributação das Aplicações Over-The-Top no Brasil: visão
geral e análise das atividades de transmissão de conteúdo
995
audiovisual, envio de mensagens e realização de chamadas
de voz por meio da internet
1. Introdução 995
2. Delimitação do Conceito de Aplicações OTT 997
3. Interpretação Dinâmica da Lei Tributária 999
4. Visão Geral sobre a Tributação das Aplicações OTT no
1002
Brasil
5. Transmissão de conteúdo audiovisual por meio da
1007
internet
5.1. ICMS-Mercadoria 1009
5.2. ICMS-Comunicação 1011
5.3. ISS 1014
6. Envio de mensagens multimídia e realização de
1018
chamadas de voz pela internet
6.1. ICMS-Mercadoria 1020
6.2. ICMS-Comunicação 1021
6.3. ISS 1022

1948
7. Considerações finais 1022
O Software as a Service (SaaS) e a tributação pelo ISS 1024
1. Noções introdutórias: a inovação tecnológica e seus
1024
reflexos no universo jurídico-tributário
2. A natureza jurídica do software, a sua proteção e o
1025
tratamento conferido pela Lei n. 9.609/98
3. Contratos de licença de uso do software: a forma
jurídica de exploração econômica mais comum na
1026
disponibilização de programas de computador pela
internet
4. O Software as a Service (SaaS) como modelo de
1028
business no licenciamento de uso do software
4.1. Da unicidade do negócio jurídico SaaP para a
1033
complexidade do negócio jurídico SaaS
5. O licenciamento eletrônico de uso de software e o ISS 1038
5.1. A licença de uso de software no formato
1042
tradicional (Software as a Product) e o ISS
5.2. A licença de uso na modalidade Software as a
1044
Service (SaaS) e o ISS
Tributação de software “embarcado” e os conflitos ICMS
1049
vs. ISS
1. Introdução 1049
2. Análise jurídica dos conflitos ICMS vs. ISS:
perspectiva brasileira e a discussão sobre a fragmentação 1051
de contratos
2.1. Comentários sobre as formas contratuais de
1056
disponibilização de software embarcado
2.2. Comentários pertinentes ao conflito de
competência de ISS e ICMS em casos de software 1059
embarcado: nossa visão sobre a matéria
2.3. Comentários pertinentes ao conflito de
competência de ISS e ICMS em casos de software
1064
embarcado: evolução dos precedentes
administrativos sobre a matéria
3. Conclusão 1069
Tributação de negócios desenvolvidos por meio de
aplicativos associados aos serviços de hospedagem no 1071

1949
Brasil
1. Introdução 1071
2. O modelo de negócio e suas atividades 1073
3. A tributação da atividade 1077
3.1. A tributação do consumo 1077
3.1.1. A ausência de tributação sobre atividade
marketplace e a tributação da intermediação de 1077
contratos pelo ISS
3.1.2. Onde é devido o ISS sobre intermediação
1079
online de contratos?
3.2. Tributação sobre a renda 1086
4. Conclusões 1092
Aspectos fiscais aplicáveis à cessão e disponibilização de
1094
dados
1. Introdução 1094
2. Os diferentes modelos adotados nas operações de
1096
disponibilização de dados
2.1. Disponibilização personalizada de dados (build
1098
to order)
2.2. Disponibilização de dados gerais para todos os
1102
clientes (Plug and Play)
3. Questões específicas verificadas no âmbito da
1111
economia digital
4. Considerações adicionais relacionadas a operações
1117
cross-border
5. Aplicação de Tratados firmados para Evitar a Dupla
1121
Tributação
6. Conclusões 1123
Parte II - Novas perspectivas: políticas fiscais para a
tributação dos negócios na Economia Digital e das 1125
novas tecnologias
Seção A - Economia Digital e Formas Alternativas de Tributação 1126
Tributação e Novas Tecnologias: Reformular as Incidências
1126
ou o Modo de Arrecadar? Um “SIMPLES” Informático
1. Introdução 1126

1950
3. A tributação adequada 1133
4. A relevância dos setores 1138
5. Arrecadação unificada 1141
6. Desafios supervenientes 1142
7. Conclusão 1143
Economia digital e a criação de um IVA para o Brasil 1145
1. Introdução 1145
2. Os novos modelos de negócios na economia digital e
1146
seus impactos socioeconômicos
3. Economia digital e seus impactos tributários 1150
4. O atual modelo de tributação do consumo no Brasil e a
1154
sua incompatibilidade com a nova economia digital
5. A economia digital e a exigência de um IVA para o
1156
Brasil
6. Considerações Finais 1165
Os desafios da tributação indireta do comércio eletrônico:
estratégias para a simplificação da arrecadação tributária em 1167
operações B2C
1. Introdução 1167
2. Os princípios da Convenção de Ottawa e a estrutura
1169
fundamental da tributação no comércio eletrônico
3. O princípio do destino e a complexidade da
arrecadação de tributos nas operações envolvendo 1178
serviços e intangíveis virtuais
4. Registro único de fornecedores e prestadores não
residentes no território do ente tributante: a experiência 1184
europeia
5. Conclusões: recomendações para o sistema tributário
1190
nacional
Reforma tributária: desafios da evolução da economia
1192
digital versus complexidades da Federação brasileira
1. Introdução 1192
2. Como chegamos aqui? 1193
3. A acomodação pela repartição de receitas 1202
4. Perspectivas internacionais92 1204

1951
5. Perspectiva interna 1206
6. Propostas de reforma tributária 1209
7. Conclusões 1213
Jogos de realidade virtual e robótica: desafios para a
tributação de humanos no mundo virtual e robôs no mundo 1215
real
1. Tributação sobre jogos de realidade virtual 1215
1.1. Transações no mundo virtual 1217
1.1.1. World of Warcraft (jogos estruturados, de
1219
economia híbrida)
1.1.2. Second Life (jogos desestruturados, de
1220
economia aberta)
1.2. Propostas para tributação de jogos de realidade
1222
virtual
1.2.1. Tributação dentro do mundo virtual 1222
1.2.2. Tributação na passagem do mundo virtual
1225
para o mundo real
2. Tributação sobre robôs 1227
2.1. Definição de robôs 1231
2.2. Propostas para a tributação de robôs 1234
2.2.1. A capacidade contributiva dos robôs (ou
1235
decorrente de seu uso)
2.2.2. Tributos específicos sobre o uso ou
1239
propriedade de robôs
Tributação direta vs. tributação indireta na economia digital:
reflexões sobre os impactos da concentração de tributos
1243
sobre o consumo em detrimento da tributação sobre a renda
para a praticabilidade e justiça fiscal
1. Tributação do consumo: tendências e desafios da era
1243
digital nos mercados internacionais e no Brasil
2. Tributação indireta. Praticabilidade vs. Capacidade
1255
Contributiva e Justiça Fiscal
3. Conclusões 1261
A Competitividade no Mercado Global e a Tendência à
1264
Migração para um Sistema de Tributação Territorial
1. Introdução 1264

1952
2. A tendência de migração para um modelo de 1265
territorialidade
2.1. A competição fiscal internacional 1268
2.2. As operações de inversão da estrutura societária 1269
2.3. O impacto negativo para competitividade das
1270
empresas no cenário global
2.4. Os benefícios socioeconômicos colaterais da
1272
repatriação de lucros
3. Os problemas da migração para um regime de
1273
territorialidade parcial
3.1. Ausência de conjunto sistemático e orgânico de
1274
regras para a determinação da fonte dos rendimentos
3.2. Aprimoramento do conceito de estabelecimento
1280
permanente ou a adoção de medidas substitutivas
3.3. O fortalecimento das regras de preços de
1282
transferência
4. Conclusões 1287
Impressão 3D e sistema tributário disfuncional 1290
Deveres instrumentais na economia digital: o Siscoserv e os
1300
limites ao controle do comércio internacional de serviços
1. Considerações iniciais 1300
2. Os deveres instrumentais no sistema tributário
1301
brasileiro e seus limites normativos
3. A informatização fiscal e o pioneirismo do Brasil na
1307
exigência de deveres instrumentais
4. O Siscoserv e o controle do comércio internacional de
1312
serviços
4.1. Considerações sobre a exigência das
1312
informações relacionadas ao Siscoserv
4.2. Considerações sobre as penalidades impostas
pelo descumprimento dos deveres instrumentais 1315
relacionados ao Siscoserv
5. Conclusão 1320
Seção B - Economia digital, a Ação 1 do BEPS e a visão da
1322
ONU: proposições e críticas
As estruturas de planejamento tributário adotadas pelas
empresas de tecnologia, as proposições da Ação 1 do BEPS 1322

1953
empresas de tecnologia, as proposições da Ação 1 do BEPS 1322
e as iniciativas legislativas dos países ao redor do mundo
1. Introdução 1322
2. As principais estruturas de planejamento tributário
1325
adotadas pelas empresas de tecnologia
2.1. Apresentação do tópico 1325
2.2. Venda de produtos online para consumidores
1326
finais (online retailer)
2.2.1. Descrição da estrutura 1326
2.2.2. Principais efeitos tributários da estrutura
1330
para os países envolvidos
2.3. Venda de publicidade pela internet (internet
1333
advertising)
2.3.1. Descrição da estrutura 1333
2.3.2. Principais efeitos tributários da estrutura
1337
para os países envolvidos
2.4. Venda de aplicativos online (internet app store) 1339
2.4.1. Descrição da estrutura 1339
2.4.2. Principais efeitos tributários da estrutura
1342
para os países envolvidos
3. Iniciativas legislativas para combater os planejamentos
1344
tributários agressivos
3.1. O Plano BEPS 1 e a visão da União Europeia 1344
3.2. O diverted tax profit do Reino Unido 1347
3.3. O equalization tax da Índia 1349
3.4. Iniciativas legislativas na França e na Itália 1351
4. Conclusões 1352
Uma proposta para a modificação da Convenção Modelo da
1357
OCDE em face da digitalização da economia
Introdução 1357
1. O Relatório de 2015 da OCDE 1360
1.1. Opção 1: Modificar o rol de isenções
admissíveis, no artigo 5º, parágrafo 4º, da
Convenção Modelo da OCDE, quando do 1361
reconhecimento do status de estabelecimento
permanente

1954
1.2. Opção 2: Estabelecer um novo “nexo” (ou
elemento de conexão) para determinar a existência 1361
de um estabelecimento permanente, baseado na
existência de presença digital significativa
1.3. Opção 3: Substituir os critérios para
caracterização de um estabelecimento permanente 1362
por um teste de “presença significativa”
1.4. Opção 4: Criar impostos de incidência na fonte
1363
para transações digitais
1.5. Opção 5: Introduzir um imposto sobre o fluxo
1366
de dados pela internet (bandwidth ou bit tax)
2. Considerações gerais acerca das opções propostas 1367
2.1. Considerações político-fiscais acerca do nexo
negocial e da substância econômica das atividades 1367
exercidas pela via digital
2.2. Valoração das transações a partir dos diferentes
1371
modelos negociais
2.3. Mudanças à Convenção Modelo da OCDE 1374
3. Conclusões 1375
Operações de Inversão (Inversions) ou Redomiciliação
1377
Fiscal (Reparanting) na Economia Digital
1. Introdução e escopo do artigo 1377
2. Residência Fiscal e a Mobilidade dos Fatores
1378
Produtivos na Economia Digital
3. Operações de Inversão (tax inversions) nos Estados
1382
Unidos
3.1. Origem e evolução no Sistema Tributário
1383
Americano
3.1.1. Caso McDermott 1383
3.1.2. Caso Helen of Troy 1385
3.1.3. Casos Pós-Helen of Troy 1386
3.1.4. Section 7874 do IRC e seus
1388
desdobramentos
3.1.5. Estruturações e Inversão fiscal na Economia
1390
Digital
4. Regra brasileira de tributação de controladas e
coligadas no exterior (CFC) e Operações de Inversão 1393

1955
Fiscal
4.1. Caso Magnesita451 1395
4.2. Principais questões tributárias e perspectivas do
1397
cenário digital
5. Síntese conclusiva 1401
A aplicação dos acordos de bitributação aos negócios da
economia digital: as visões do Brasil, da OCDE e da ONU 1404
sobre software e serviços técnicos
Introdução 1404
1. A prestação de serviços técnicos e do software e sua
1406
qualificação nos acordos de bitributação brasileiros
2. A perspectiva da OCDE 1417
3. A perspectiva da ONU 1424
4. Conclusões 1433
Alocação da propriedade intelectual e a tributação dos
royalties no Projeto BEPS: o combate aos planejamentos 1438
tributários “abusivos” e o “nexus approach”
1. Introdução 1438
2. O que exatamente o Projeto BEPS busca coibir em
1441
relação à alocação de ativos intangíveis?
3. Relatório BEPS e propriedade intelectual: coerência,
1444
“nexus approach” e substância
3.1. Ação 5 1444
3.2. Ações 8, 9 e 10 1448
4. Impactos das recomendações do Projeto BEPS para
estruturas que segregam atividade econômica substantiva, 1449
tomada de decisão e propriedade intelectual
5. Consequências para o Brasil 1451
6. Conclusões 1457
Parte III - Direito comparado: a tributação da economia
1460
digital sob a perspectiva de outros países
Evolução da Tributação da Economia Digital na Alemanha 1461
Introdução 1461
1. A economia digital, o e-commerce e seus desafios
1461
tributários

1956
envolvidos no comércio digital 1464

2.1. Imposto sobre vendas (Umsatzsteuer, doravante


1464
designado USt)
2.2. Imposto de Renda da Pessoa Física
(Einkommensteuer, doravante designado ESt) e o
1465
Imposto de Renda da Pessoa Jurídica
(Körperschaftsteuer, doravante designado KSt)
3. Imposto sobre vendas (Umsatzsteuer – USt), o Imposto
de Renda (ESt) e o Imposto sobre Entidades (KSt) no e- 1468
commerce
3.1. Vendas offline e vendas online 1468
3.2. A tributação de pagamentos pela utilização de
software e de bancos de dados, conforme § 13b da UStG 1468
e do § 50 da EStG552
3.3. Tributação dos negócios B2B e B2C no cloud
1471
computing
3.3.1. Imposto de renda (ESt) e da pessoa jurídica
1472
(KSt)
3.3.2. Imposto sobre vendas (USt) 1472
4. Tributação limitada e desconto na fonte na
disponibilização de software e bancos de dados na 1473
Alemanha
Conclusão 1493
As disputas de Cost Sharing Agreements envolvendo empresas
1495
de tecnologia nos Estados Unidos
I. Introdução 1495
II. O caso Veritas 1500
III. O caso Amazon 1502
IV. As Final Regulations emitidas em 2011 1504
V. O Projeto BEPS e a reforma tributária dos Estados
1511
Unidos
VI. Conclusão 1522
European VAT and the Digital Economy 1525
1. Introduction 1525
2. Overview of EU VAT System 1526

1957
3. Supplies of Digital Products 1528
3.1. Concept of electronically supplied services 1528
3.2. Place of supply 1528
3.3. One Stop Shop 1530
3.4. Intermediaries 1530
4. Supplies of Goods Ordered Online 1532
5. EU Initiatives Regarding Taxation of the Digital
1534
Economy
5.1. Expert Group of the Taxation of the Digital Economy 1534
5.2. Strategy for the EU Digital Single Market 1534
5.3. Modernising VAT for E-commerce 1535
5.3.1. Expansion of the One Stop Shop 1535
5.3.2. Simplified VAT rules for small businesses 1537
5.3.3. Importation of low-value consignments 1538
6. Conclusions 1539
Canada: Taxing Global Digital Income in a Post-BEPS World 1541
1. Introduction 1541
2. Overview of BEPS and Global Digital Taxation 1542
2.1. Background on Related OECD Reform Efforts 1543
2.2. BEPS and Digital Taxation 1544
3. BEPS Digital Tax Reforms 1546
3.1. Tax Treaty Changes 1547
3.2. Rejected BEPS Reforms 1552
4. Impact of BEPS on Global Digital Taxation 1554
4.1. Cross-border Structures with Digital Taxation 1554
4.2. Impact of BEPS Reforms on Cross-border Structures 1556
5. Conclusion 1561
Taxation of the Digital Economy: A U.S. Subnational
1563
Perspective
1. Introduction 1563
2. Direct Tax Issues 1563
2.1. Nexus 1564
2.2. Income Attribution 1566
3. Indirect Tax Issues 1572

1958
3.1. Nexus 1572
3.2. US State Strategies for Addressing the Distance
1573
Selling Problem under the RST
3.2.1. Business-to-Business (B2B) Sales: Reverse
1574
Charge (Direct Pay)
3.2.2. Business-to-Consumer (B2C) Sales 1576
4. Conclusion 1583
Australia’s Multinational Anti-Avoidance Law (2016): Treating
1584
the symptom rather than the disease
1. Introduction 1584
2. Background 1586
3. Google’s “Double Irish” and “Dutch Sandwich” tax
1589
avoidance structure
3.1. Subpart F of the US Tax Code 1590
3.2. Google’s tax history in Australia 1593
3.3. UK House of Commons Committee of Public
1594
Accounts: Google, MNEs and tax morality
4. Australian Senate Economic References Committee
1596
inquiries
4.1. Google’s operations in Australia prior to MAAL 1596
4.2. 2015 parliamentary inquiry 1597
4.3. 2017 parliamentary inquiry 1598
5. Australia’s Multinational Anti-Avoidance Law 2016 1600
5.1. The scope of the MAAL 1601
5.2. Definitions 1602
5.3. Activities are undertaken in Australia and are directly
1604
connected with the supply
5.3.1. Activities are undertaken in Australia 1605
5.3.2. The foreign entity derives ordinary income or
1606
statutory income from the supply
5.4. The principal purpose test 1607
5.4.1. Obtaining a tax benefit 1608
5.4.1.1. Having regard to certain factors 1608
5.5. Additional matters for the MAAL 1609
6. Multilateral instrument 1610

1959
7. Conclusion 1612
Taxation of the Digital Economy: Argentina Perspective 1614
1. Importance of the Digital Economy 1614
2. Current Taxation of the DE in Argentina 1615
2.1. Income Tax (IT) 1616
2.1.1. General Sourcing Rules 1616
2.1.2. Special Sourcing Rules 1617
2.2. Value Added Tax (VAT) 1620
2.3. Gross Turnover Tax (GTT) 1621
3. International Context: BEPS and Country’s Experiments 1624
3.1. Direct Taxation 1624
3.2. Indirect Taxation 1626
4. The Argentine Experiment 1628
4.1. The DE on the Spot 1628
4.2. The Argentine Tax Reform Bill 1629
4.2.1. Direct Taxation 1629
4.2.2. Indirect Taxation 1631
5. What’s Next? 1636
Taxation of the digital economy in France 1638
Introduction 1638
1. Questions raised by taxation of individuals 1639
1.1. Cost-sharing issue 1639
1.2. Compliance issues for income generated via online
1640
platforms
1.3. The distinction between professional and non-
1641
professional income
2. Companies’ taxation in a global economy 1642
2.1. Difficulties raised by the taxation of income 1643
2.1.1. Issues raised by an activity exercised without
1644
material presence in a State
2.1.2. A subsidiary: material presence separated
1645
from the main activity?
2.2. Alternatives to the taxation of income 1649
2.2.1. Reasons of a failure to introduce a diverted
1649
profits tax in France

1960
2.2.2. New approach to taxation of the digital 1652
economy
Conclusion 1654
Taxation of Digital Economy: India Perspective 1655
1. Introduction 1655
2. Digital Economy in India 1656
3. Historical Taxation of Digital Economy 1658
3.1. Royalty 1658
3.2. Fees for Technical Service (FTS) 1659
3.3. Permanent Establishment (PE) 1659
4. India’s approach 1662
5. Action Taken by India 1665
6. Concerns about Equalization Levy 1667
6.1. What is the nature of Equalization Levy? Is it a direct
1667
or indirect tax?
6.2. Is Equalization Levy a tax on income? 1669
6.3. Burden of Equalization Levy 1669
6.4. Is Equalization Levy beyond the purview of tax
1670
treaties?
6.5. Even though Equalization Levy is not incorporated in
1671
the IITA, can treaty provisions apply?
6.6. How consistent is Equalization Levy with the present
1672
bilateral tax treaties entered into by India?
7. Conclusion 1673
Taxation of the Digital Economy: Japan Perspective 1675
1. Personal income tax and corporate income tax 1675
1.1. 2014 amendment from entire income principle to
1675
attributed income principle
1.2. To be a PE or not to be a PE 1677
1.2.1. Co-Location service near Tokyo Stock
1677
Exchange
1.2.2. Amazon 1678
1.2.3. Internet auction: Tokyo High Court (28
1679
January 2016)
1.3. Quasi general anti-avoidance rule for dealings of PEs 1681

1961
1.4. Virtual PE 1682
2. Value added tax 1683
2.1. Before the 2015 amendment 1683
2.1.1. Destination principle for goods 1683
2.1.2. Incomplete destination principle for services 1684
2.1.3. Place of supply of services: Tokyo District
1685
Court (13 October 2010)
2.1.4. Tourists: Tokyo High Court (9 February 2016) 1686
2.2. After the 2015 amendment: supply of service using
1686
electric communication
2.2.1. B2B: reverse charge 1687
2.2.2. B2C: registration 1689
2.2.3. Incomplete destination principle after the 2015
1690
amendment
2.2.4. 2017 amendment concerning bitcoins and
1691
other virtual currencies
Challenges of the tax systems in the digital economy era: Mexico
1692
perspective
1. Introduction 1692
1.1. What’s the so called digital economy? 1692
1.2. Which market offerings are included within such
1693
concept?
1.2.1. Sharing culture – P2P 1694
1.2.2. Fintech 1695
1.2.3. Crowdfunding 1696
1.2.4. Software & Cloud as a service 1697
2. Income Tax Considerations 1698
2.1. Technical analysis of source rules contained in the
domestic law and their inability to tax the earnings
1698
proceeding from the market to the hands of the offshore
offerors
2.2. Technical analysis of the general structure of double
1701
taxation treaties and the classification of income
2.3. Expected practical reactions from the Federal tax
1703
authorities
2.3.1. Permanent Establishment (PE) 1703

1962
2.3.2. Transfer pricing (TP) 1706
2.3.3. United Nations Report 1707
3. Value Added Tax Considerations 1708
3.1. Importation of Services 1708
3.2. Exportation of Services 1710
4. Local (State) Tax Considerations 1711
4.1. Diverse and non-organized types of reactions 1711

1963

Você também pode gostar