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Nos primórdios do samba, nos anos 20 e 30, compositores como Sinhô, Donga, Assis
Valente e Noel Rosa, entre outros, compunham canções que, se não falavam de política
diretamente, continham forte comentário social. Muitas das letras eram verdadeiras crônicas
sobre a vida no Rio de Janeiro da época.
Marchas de Carnaval
Na época de ouro das rádios, nos anos 30, 40 e até a década de 50, as marchinhas
carnavalescas muitas vezes serviam de instrumento para crítica social e sátira política. Em
1950, Haroldo Lobo compôs “Retrato do Velho”, que acabou embalando a eleição que
levou Getúlio Vargas de volta ao Palácio do Catete. Em 1956, o compositor de marchas
Alberto Ribeiro lançou o LP Aviso aos Navegantes, só com canções de cunho social.
Anos de Chumbo
Após o Golpe de 1964, nomes como os de Chico Buarque, Geraldo Vandré, Sérgio Ricardo,
Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Ivan Lins, Luiz Gonzaga Jr. e outros de
sua geração dedicam parte significativa de suas obras à produção de canções que, de forma
explícita ou indireta, falam do estado de coisas no país.
Nos anos 80, Brasília se torna um polo de bandas de rock, caso de Capital Inicial e Legião
Urbana, que usam a política como inspiração extra para suas composições. Renato Russo se
torna ícone e arrasta multidões, que cantam “No Senado/ sujeira pra todo lado”. Cazuza
começa a personificar o tema ao compor “Ideologia”, que prega: “Meu partido/ É um
coração partido”.
Extremamente fácil
Ô Anna Julia
Enquanto a banda mais influente no Brasil nos últimos 15 anos compõe quatro cultuados
discos, a política se dilui. Novos compositores, como Rodrigo Campos, falam da sua
situação no país com um olhar mais cronista do que crítico. Não é mais uma política
“social”, mas sim autorreferente.
Geraldo Vandré
Uma noite para não esquecer. Em 29 de setembro de 1968, “Sabiá”,
composição de Antonio Carlos Jobim e Chico Buarque, foi apresentada no
Maracanãzinho, no Rio de Janeiro, durante o 3.º Festival Internacional da
Canção, e recebeu vaias quase unânimes, que se tornaram ainda mais
veementes quando a música foi anunciada como a melhor do certame,
segundo o júri.
O público que lotava o estádio preferia, e cantava em uníssono, “Pra Não Dizer
Que Não Falei das Flores” (também conhecida como “Caminhando e
Cantando”), de Geraldo Vandré, uma canção de protesto que criticava de forma
explícita o estado de coisas no país e conclamava o povo a reagir aos
desmandos do regime militar: “Vem, vamos embora/ Que esperar não é saber/
Quem sabe faz a hora/ Não espera acontecer”.
O historiador Gustavo Alonso, autor de Quem Não Tem Swing Morre com a
Boca Cheia de Formiga, sobre o cantor Wilson Simonal, acrescenta que não
era apenas a chamada MPB que se ocupava de discutir a sociedade, o
panorama político. Ele diz que gêneros musicais populares, como o sertanejo e
o brega, também fizeram isso, lembrando de Odair José e de sua ousadia em
músicas como “Pare de Tomar a Pílula” e “Vou Tirar Você Desse Lugar”.
Autor de inúmeras obras sobre música brasileira, entre elas o livro Driblando a
Censura (Editora Gryphus), o pesquisador lembra Aviso aos Nevegantes, LP
em dez polegadas lançado em 1956 pelo compositor Alberto Ribeiro (1902-
1971), parceiro constante de João de Barro (o Braguinha), em que interpretou
16 músicas de sua autoria, todas de cunho social.
“Poética do eu”
“Era uma canção pesada, difícil de digerir. O Gonzaguinha só foi fazer sucesso
de verdade, em 1979, quando suas canções de amor [como “Explode Coração”
e “Grito de Alerta”, gravadas por Maria Bethânia] aconteceram. Foi justamente
o ano da Abertura, em que os exilados políticos foram anistiados e começaram
a retornar ao país.”
Gustavo Alonso faz uma ressalva: do álbum de Chico, ele cita a canção
“Sinhã”, que, segundo ele, tem um sutil viés de crítica social, ao falar das
relações entre um escravo e sua senhora: “Se a dona se banhou/ Eu não
estava lá/ Por Deus Nosso Senhor/ Eu não olhei Sinhá/ Estava lá na roça/ Sou
de olhar ninguém/ Não tenho mais cobiça/ Nem enxergo bem”.