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HISTORIOGRAFIA

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Historiografia SOMESB
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Faculdade de Tecnologia e Ciências - Ensino a Distância
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EQUIPE DE ELABORAÇÃO/PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO:

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Sumário

POSITIVISMO, MARXISMO E A REVOLUÇÃO


DOS ANNALES ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 07

POSITIVISMO E MARXISMO E SEUS DESDOBRAMENTOS NA


ESCRITA DA HISTÓRIA

A Historiografia no Século XIX ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 08

O Historiador e a Chamada Objetividade: Uma


História sem paixões ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 10

Positivismo: um Modelo filosófico e suas Influências


na Escrita da História e na Educação ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 12

Considerações Acerca do Marxismo na Historiografia ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 15

A REVOLUÇÃO PROPOSTA PELOS ANNALES

A Historiografia no Século XX: a Revolução dos Annales ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 21

Novos Pressupostos para a Escrita da História ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 29

A Influência dos Annales para o Historiador Atual ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 33

A NOVA HISTÓRIA CULTURAL E A HISTORIOGRAFIA


BRASILEIRA ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 38

HISTÓRIA NOVA E HISTÓRIA CULTURAL

Abertura de Novas Possibilidades de Fontes, Novos Objetos,


Novos Problemas, Novas Abordagens ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 39

O Caráter Interdisciplinar da História: a “Descrição Densa” da


Antropologia: por uma Interpretação da Cultura ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 41

Nova Historia Cultural e a Narrativa Histórica ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 44

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Os Modos de Escrever História: alguns Debates Existentes ao
Redor da História e Narrativa e as Principais Tendências 46 ○ ○

Historiografia

OS PRINCIPAIS MARCOS E ATUALIDADE DA


HISTORIOGRAFIA BRASILEIRA

A Historiografia Brasileira no Século XIX ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 62

A Geração de 30 e a Reinterpretação do Brasil ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○


64

Historiadores Brasileiros da Nova História Cultural ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 67

Historiografia e Livro Didático: Principais Tendências


e Críticas ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 68

Atividade Orientada ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 72

Glossário ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 74

Referências Bibliográficas ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 76

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Apresentação da Disciplina
Amigo (a) aluno (a),

É com prazer que iniciamos nossos trabalhos na disciplina


Historiografia, cujo objetivo principal é expressar a inteligibilidade da história
em sua inserção nos contextos nacional e internacional. Consideramos a
questão da historiografia e a educação como eixo norteador da disciplina.

É notória a ampliação da área de estudos e de trabalho do professor/


historiador no mundo contemporâneo, a partir de elementos como novas
fontes de pesquisa (eletrônicos e digitais, iconográficos), novos objetos de
estudo (cotidiano, cultura, comportamento), novos campos de atuação
(inserção em projetos culturais e de preservação do patrimônio artístico).
Para tanto, faz-se necessário formar um docente capaz de levar para a sala
de aula tanto as discussões sobre esses novos aspectos que estão sendo
estudados pelo historiador atual, como questões ligadas à cidadania e ética.

Diante dos fatos expostos, faz-se mister a reconstrução do estímulo


à interdisciplinaridade dos conteúdos, à integração e interação com outras
disciplinas, incentivando, sobretudo, o diálogo construtivo com as demais
ciências, como os historiadores do Annales realizaram.

Deste período, trabalharemos com os modelos de escrita da história


a partir história tradicional, passando pelo movimento dos Annales durante
as décadas de 30 a 60, até a transição para a Nova História nos anos 70 e
seus desdobramentos na Nova História Cultural – tendência atual.

Tomando como ponto de partida o impacto da “virada lingüística”


sobre a historiografia e as discussões acerca do “retorno da narrativa”, esta
disciplina propõe, a partir dos textos que se seguem, introduzir os debates
em torno das relações entre História e narrativa.

Esperamos que o estudo desta disciplina resulte numa renovação


do conceito de pesquisa em história, considerando-a como uma atitude
investigativa a ser formada e na perspectiva de um ensino articulado à
pesquisa, possibilitando novas formas aos elementos curriculares, como a
não memorização dos conteúdos, e sim a apreensão compreensiva,
permitindo ao aluno uma caminhada como sujeito de sua própria história.

Sucesso nessa nova caminhada!

Profª. Sandra Regina Barbosa da Silva

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Historiografia

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POSITIVISMO, MARXISMO E A
REVOLUÇÃO DOS ANNALES

POSITIVISMO E MARXISMO E SEUS


DESDOBRAMENTOS NA ESCRITA DA HISTÓRIA

O que é a historiografia? Podemos defini-la rapidamente como “a história da história”,


como a história vem sendo escrita ao longo dos séculos. Ou seja, nada mais que a história
do discurso – um discurso escrito e que se afirma como verdadeiro. O discurso historiográfico
diz respeito às opções tradições interpretativas, opções de correntes teóricas, opções de
recortes, ângulos, escalas de observação por parte do historiador.
Na segunda metade do século V a.C. na Grécia Antiga o historiador Heródoto
(aproximadamente 485-425 a.C.), também conhecido como o “pai da História” fez relatos
de uma História parecida com o conceito atual. Heródoto fez longas explanações e descreveu
rios, povos exóticos e costumes estranhos. Foi expulso, por motivos políticos, de
Halicarnasso e viveu por um tempo no Egito e na Mesopotâmia. Dizia que a “opes”
(observação) e o “aço” (o ouvir dizer) são as fontes essenciais, mas não únicas das
inquirições historiográficas.
Na Grécia Antiga, os poetas e
escultores humanizaram os deuses e
levaram para a mitologia um repensar de
histórias. Formou-se uma fronteira entre a
lenda e o real, o religioso e o profano e,
nesse cenário, observam-se as histórias
convertendo-se em História. A Grécia foi
dominada pelos romanos e é com Políbio
(208 a.C.?-122 a.C.?) que se estuda a
expansão romana de 221 a 146 a.C. num quadro alargado às dimensões mundiais da
conquista. A sua história é a última obra da historiografia grega e a primeira da historiografia
romana que se compraz em narrar tanto as conquistas como as virtudes.
As invasões germânicas e a cristianização conjugaram
os seus efeitos para encerrar o capítulo romano da
historiografia.
O homem medieval, a partir do século XII,
mostra as características de uma historiografia
ocidental. É aos monges de Saint Dinis que os reis
da França confiam o encargo de escrever histórias,
como as Cruzadas. Durante as Cruzadas,
(momento militar), nasce à crônica, e nasce da guerra
santa. A Igreja confia aos novos clérigos, à
historiografia do medievo.

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Em pleno século XV nasce uma
nova historiografia. Os homens da
Historiografia Renascença, os humanistas, lançam
olhares sobre os historiadores gregos
e romanos. A consciência histórica se
afirma. Os filósofos iluministas
lançaram as bases da historiografia e
o momento da filosofia sobre a História. Nesse
momento há uma reflexão sobre o objeto da
historiografia. A ela cabe descrever de maneira global
o percurso da natureza e das sociedades humanas.
Podemos analisar o pensamento de David Hume
(1711-1776), filósofo e historiador escocês, responsável pelo fenomenismo, o qual afirma:
“História é o lugar onde a imutável natureza dos homens se cruza com a poeira dos
acontecimentos”. Vemos aí a historiografia das luzes abrindo atalhos para o século XIX.

A HISTORIOGRAFIA NO SÉCULO XIX

O pensamento do século XIX não foi apenas influenciado por mudanças econômicas
e sociais, também deve ser compreendido de acordo com o momento em que se
encontravam a filosofia e a ciência. No século XVIII, Kant havia desenvolvido importantes
reflexões sobre as possibilidades e limites da razão. Neste mesmo século, diferentes linhas
filosóficas interpretaram o pensamento kantiano, entre elas encontra-se o Positivismo.
No século XIX, Comte formaliza as idéias positivistas. Quando Comte falou da
importância do conhecimento científico não estava apenas defendendo uma orientação
epistemológica, estava apresentando uma maneira de pensar e de realizar as
transformações sociais. “O pensamento positivista poderia garantir a organização racional
da sociedade”, dizia ele. O pensamento de Comte apresenta as seguintes preocupações
fundamentais: uma filosofia da história na qual encontram-se as bases de sua filosofia
positivista e as três fases da evolução do pensamento humano: o teológico, o metafísico e
o positivo. Após passar pelos três estágios históricos, no estágio científico abandona-se a
referência às causas últimas, ou seja, às não-observáveis.
O século XIX foi influenciado pela Revolução Francesa, pelo triunfo da burguesia,
pela consolidação dos Estados Nacionais e pela Revolução Industrial. O liberalismo e a
ideologia liberal tentaram justificar a revolução antimonárquica e pró-burguesia. Como
historiadores desta corrente, temos François Guizot (1787-1874) e Augusto Thierry
(1795-1856), que explicaram os fatos históricos em função da visão burguesa. Eram
formadores de ideais historiográficos liberais.
O filósofo e matemático francês, Auguste Comte, (1798-1857) criador do
Positivismo, vê na historiografia a necessidade de dotar a História de método científico,
técnico e objetivo. Sabemos que a História se faz a partir de documentos, e o historiador
não deve somente interpretá-los, mas analisá-los, colocá-los em ordem para melhor
compreensão, já que a História, em sentido geral, pode ser considerada “Ciência em
Construção”, uma vez que a conquista de seu método científico ainda não é completa.
Na concepção positivista, a história é submetida à metodologia das ciências exatas
e biológicas. Das atitudes intelectuais derivadas ou próximas do ideal positivista das ciências
sociais, nascem as teorias científicas do racismo e do preconceito social, como as que
conseguem encontrar relações entre a medida do crânio e a delinqüência de negros e
mulatos, ou mesmo de algumas etnias caucasianas. É também o caso do darwinismo social.

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Ou então a obra de Alfredo Ellis Jr., em que a superioridade racial do paulista é dada pela
ausência do elemento negro nos séculos iniciais e a influência das variações climáticas do
planalto sobre a “Raça de Gigantes”. Ou ainda, como já foi colocado acima, os determinismos
geográficos que explicam formações econômicas e sociais inteiras e, principalmente, o
“caráter nacional” – pelas determinações do clima e/ ou do relevo.

O historiador alemão Leopold Van Ranke (1795-1886) é


considerado o fundador da historiografia contemporânea e do moderno
método historiográfico crítico de pesquisa em História. A concepção
positivista da história se assenta em uma teoria que concebe o
conhecimento histórico como o reflexo da objetividade dos fatos
históricos. Segundo Adam Schaff, 1987 cabe a Leopold Von Ranke
– e não a Auguste Comte – o lugar de figura mais expressiva do
Positivismo.
Como se sabe, Ranke dizia caber ao historiador não a apreciação
do passado, ou a instrução de seus contemporâneos, mas apenas, e tão somente, dar
contas do que realmente se passou (Wie es eigentlich gewesen). A função do historiador
seria a de recuperar os eventos e suas interconexões através da documentação e fazer-
lhes a narrativa. A história se limitaria a documentos escritos e oficias de eventos políticos.
O historiador, para eles, narra fatos realmente acontecidos, tal como eles se passaram.

E quais eram estes fatos “narráveis”?

a) os eventos políticos;
b) administrativos;
c) diplomáticos;
d) religiosos;

Estes eventos, considerados o centro do processo histórico, dos quais todas as


outras atividades eram derivadas, em seu caráter factual.
O modelo dominante da disciplina história no século XIX, construído pelo
historiador alemão Leopold Von Ranke (1795-1886), privilegiava essencialmente a política
relacionada ao Estado, enfatizando uma história narrativa com ênfase nos
acontecimentos. Von Ranke baseava-se, principalmente, nos documentos diplomáticos
para fazer a história do Estado e de suas relações exteriores. Esta história científica alemã,
ou seja, o método histórico “positivista” contava com dois principais seguidores e
formuladores-divulgadores, na França: Charles Langlois e Charles Seignobos, com seu
manual de metodologia da história, Introduction aux études historiques, (Introdução aos
Estudos Históricos) datado de 1898. (REIS, 2004).
Podemos qualificar como principais traços do positivismo nesse manual: o apego
ao documento, o esforço obsessivo em separar o falso do verdadeiro; o medo de se enganar
sobre as fontes; o culto do fato histórico (que é dado nos documentos) e a falta de
interpretação dos fatos históricos.
O método de investigação e análise de fontes, dos historiadores da escola rankeana,
(referente a Leopoldo Von Ranke) limitava-se apenas a considerar os documentos como
expressão irrefutável do “fato”, da realidade. Eles diziam “os documentos falam por
si mesmos”. Os fatos falam por si e o que pensa o historiador a seu respeito é irrelevante.
Resumidamente, podemos afirmar que o trabalho do historiador seria reconstruir o
passado descritivamente, através dos documentos, “Tal como se passou”, o fato passado,

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que uma vez reconstituído, “fala por si”, a não se que aparecessem novos
documentos que alterassem a sua descrição. A esse historiador não competiria
o trabalho de problematizar, de construir hipóteses, de reler os fatos, ou seja,
Historiografia a interpretação.
O materialismo histórico é outra
corrente da historiografia que surge com
o socialismo e se desenvolve com a
filosofia de Karl Marx (1818-1883) e
Friedrich Engels (1820-1895).
No século XIX, o proletariado toma consciência
como classe social e os historiadores a interpretaram,
colocando-a no centro de seu modelo. A História
econômica nasce com a economia política burguesa,
junto ao capitalismo e à Revolução Industrial.
Para Karl Marx, a finalidade da História não é
apenas interpretar os fatos, mas transformar a sociedade, já que para ele a História é a
transformação da natureza humana. É na sociedade que se faz a história, com a finalidade
de dar respostas a problemas concretos. A História deve centrar-se nas análises dos modos
de produção existentes em cada etapa do desenvolvimento. Marx introduz conceitos básicos,
entre eles, o conflito humano ou lutas de classes, que é resultante das desigualdades
econômicas. O ponto chave das desigualdades é a sociedade industrial moderna, juntamente
com o modo, a forma ideológica de manipular as idéias para que o povo não perceba o
vínculo entre poder econômico e poder político e sua influência na qualidade de vida de
todos (alienação política e cultural). Não há dúvida que a ideologia marxista influenciou
sobremaneira a historiografia. (REIS, 2004).
Sobre o marxismo falaremos mais adiante.

O HISTORIADOR E A CHAMADA OBJETIVIDADE: UMA


HISTÓRIA SEM PAIXÕES

Abordando o tema da objetividade, parcialidade ou não do historiador, ao longo do


texto faremos alguns contrapontos com o marxismo.
O papel daquele que produz o conhecimento histórico, ou seja, o lugar ocupado pelo
historiador na sociedade, torna-se fundamental no momento de sua produção historiográfica.
Com isso, podemos aceitar que o conhecimento histórico apresenta-se de acordo com a
perspectiva do historiador, que também é “homem de seu tempo”.
Recapitulando, os principais traços do Positivismo são:

a) apego ao documento
b) esforço obsessivo em separar o falso do
verdadeiro
c) medo de se enganar sobre as fontes
d) a falta de interpretação
e) o culto do fato histórico que é dado “bruto” nos
documentos

Segundo Schaff, o pensamento historiográfico de Leopold Von Ranke é mais


apropriado para se pensar o Positivismo no âmbito específico da História. Como sabemos,
os fatos eram apresentados por esse historiador tradicional, “como eles realmente
aconteceram”, já que este entendia que a História é objetiva. Os fatos existem objetivamente,

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em si, brutos, e não poderiam ser recortados e construídos, mas, sim, apanhados em sua
integridade, para se atingir a sua verdade objetiva, ou seja, eles deverão aparecer “tais
como são”. Significa dizer que o historiador deve manter-se isento, imparcial,
emocionalmente frio e não se deixar condicionar pelo seu ambiente sócio-político-cultural
(contexto). Já adiantando o próximo assunto (marxismo), na historiografia marxista, a
produção do conhecimento é fruto de um contexto social do qual carrega seus pressupostos.
Dessa forma, para o materialismo histórico-dialético (marxismo) não existe verdade
única em História, porque a mesma é resultante da postura do sujeito. O historiador deveria
refletir/interpretar sobre e os fatos, tomando, assim, uma posição, e produzindo um
conhecimento, embora parcial. Essa postura do historiador, para alguns, teria criado
problemas ao caráter “científico” da história marxista.
No Positivismo, portanto, o conhecimento é visto como reflexo do objeto. Aquele que
conhece – o sujeito – se apresenta imune a paixões ou outro qualquer sentimento e convive
com uma separação em relação àquele que é conhecido – o objeto. Nesta concepção a
história, enquanto objeto de estudo, é considerada como uma estrutura já dada, de fatores
cujo conhecimento dependa apenas de descobrir e colecionar um grande número de
acontecimentos com base em documentos confiáveis.
Nesse modelo, baseado no Positivismo, o sujeito (historiador) reduz-se a captar o
que ele, passiva, objetiva e acriticamente observa, sem emoção, sem interferência, e,
conforme dito, sem paixão. Dessa forma, uma história científica, produzida por um sujeito
que se neutraliza enquanto sujeito para fazer aparecer o seu objeto. Os historiadores
seguidores da filosofia Positivista acreditavam que, se adotassem uma atitude de
distanciamento de seu objeto, sem manter relações de interdependência, obteriam um
conhecimento histórico objetivo, um reflexo fiel dos fatos do passado, puro de toda distorção
e subjetividade.
Dito de outra maneira, o sujeito, no processo de conhecimento, na perspectiva
positivista, busca uma postura de neutralidade e os documentos históricos são julgados
como objetos neutros pelo pesquisador. Imagina-se que o sujeito/historiador não interfere
com sua postura teórica na pesquisa por ele desenvolvida. Considera-se, assim que os
resultados obtidos com ela sejam neutros e imparciais.
O resultado disso é que a sociedade, ao ser analisada do ponto de vista positivista,
é perfeitamente enquadrada num princípio lógico de identidade que busca a ordem, o
consenso, a estabilidade e a funcionalidade social: a proclamada “Ordem e Progresso”. Na
concepção positivista, os historiadores e pesquisadores produzem a História como
conhecimento, e o professor a repassa para o aluno. O sujeito da História é sempre o ‘herói”,
o governante, aquele que se destaca na sociedade de classes. O homem comum não
participa da construção do processo histórico, apenas os grandes heróis produziram os
grandes feitos. (REIS, 2004).
O positivismo busca justificar e consolidar a ordem social liberal-burguesa, uma ordem
fortemente marcada pela luta de classes e pelas contradições sociais criadas pelo
capitalismo. É principalmente nos setores econômico, político ou nos científicos, que a
concepção positivista sustenta essa idéia de ordem e progresso.
Nesse modelo de história, o historiador quer ver os “fatos” e não a sua própria idéia
deles; melhor dizendo, somente escreve e pensa segundo os documentos, negando assim
a especulação e a interpretação. O conhecimento “verdadeiro”, o da objetividade “absoluta”,
conquistada pela imparcialidade, pela ausência de paixões ou de quaisquer a priori e pela
extração do fato “em si”, contido nos documentos conceitue os principais elementos da
historiografia positivista. O historiador reconstituiria o fato descritivamente, “tal como se
passou”, e não caberia ao historiador, a problematização, a construção de hipóteses, a
releitura dos fatos.

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Para Thompson, um dos mais significativos representantes de um
marxismo não-ortodoxo – e que nisso expressa também o pensamento de
outras linhas não comprometidas com o positivismo ou com o tradicionalismo
Historiografia – as evidências só podem informar (e significar) a partir de nossas perguntas,
apesar de terem o poder de limitar todas as teorias, anulando a validade das
que forem de encontro às mencionadas evidências. Os significados não são
revelados pela evidência, portanto, mas pela interrogação de mentes atentas
e desconfiadas, treinadas na articulação da “lógica histórica”, ou seja, no
manejo adequado das evidências e as teorias na composição de um discurso explicativo
coerente em que não haja predominância de nenhuma das duas.

POSITIVISMO: UM MODELO FILOSÓFICO E SUAS INFLUÊNCIAS


NA ESCRITA DA HISTÓRIA E NA EDUCAÇÃO

Um dos principais referenciais teóricos do professor de história, especialmente no


âmbito do ensino público, é o Positivismo, como foi dito, corrente de pensamento que se
originou na França, no século passado, a partir das reflexões teóricas de Auguste Comte
(1798-1857), pensador cujas idéias influenciaram fortemente a inúmeros cientistas na grande
área das ciências humanas e sociais aplicadas.
Segundo Comte, a sociedade possui um ritmo evolutivo incompatível com a revolução
violenta. Deste modo, ele concebe a sociedade sempre em termos harmônicos. Para este
filósofo, a sociedade reflete os diversos estados da vida de um homem; dessa forma, uma
vez que os organismos não podem mudar bruscamente, senão através de uma evolução
paulatina.
Como já foi afirmado aqui, tradicional é a característica de uma história de classe
dominante (ou que em algum momento esteve no poder do Estado). No caso específico do
Brasil do final do século XIX, o positivismo também é uma filosofia de elite política e social
em ascensão na virada do século, daí o seu parentesco em termos de compromisso político
muito próximo com os compromissos políticos da história factual, daí também decorrendo
uma das raízes da confusão má interpretação da diferença entre história positivista e a
história tradicional nas análises historiográficas e sobre o ensino da disciplina.
Onde estão presentes as influências do Positivismo?
Tanto na sua versão autoritária (Comte) quanto na versão liberal (Spencer), o
positivismo está a serviço do conservadorismo e da reação. As apropriações da teoria
para fins políticos, via de regra, conduzem a atitudes excludentes e concentradoras de poder,
renda e saber. O positivismo terá seu período áureo na proclamação da República brasileira,
inspirando o seu elitismo e autoritarismo, marcando a bandeira do país até os dias de hoje
nos dizeres comtianos “Ordem e Progresso”.
Comte defendia a idéia de ordem industrial e o progresso nela embutido. Seu lema
é “a ordem por base, o amor por princípio, o progresso por fim. O positivismo tende
poderosamente, por sua natureza, a consolidar a ordem pública, através do desenvolvimento
de uma sábia resignação”. (MORAIS, 1983, p.31). Os ideais de ordem e progresso na
educação aparecem sob forma de disciplina e educação, respectivamente, como processo
evolutivo. Por progresso, entende-se que o aluno, como membro da sociedade, deve passar
por fases evolutivas: o pensamento teológico, o metafísico e, por fim, o positivo. A superação
da metafísica levaria o homem a fugir de especulações. A presença de planejamento visando
ao alcance de objetivos também ilustra os ideais de ordem e progresso.
O eurocentrismo é um dos pontos de contanto mais importantes desse parentesco.
A história tradicional, bélica, aristocrática e eminentemente política é uma história em que
os europeus falam de si mesmos ou dos outros povos sob o seu ponto de vista, que os olha

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de cima, ou é a história de seus descendentes nos países conquistados. É uma história de
conquistadores, para os quais a própria ciência da história é uma arma de dominação.
Romântica, a história tradicional procura a sua lógica na ação dos indivíduos: os grandes
homens são, a exemplo de Jesus Cristo (o grande divisor de águas da história), redentores
de seus grupos. Não é tão diferente na doutrina positivista (excetuando-se a sua reserva
quanto à importância dos grandes homens), para a qual a transformação da sociedade, da
desordem para a ordem, parte da conversão pessoal e do convencimento cognitivo de
cada um, desprezando-se as diferenciações de classe.

Positivismo e educação

O Positivismo influenciou de maneira considerável a sociedade nos séculos XIX e


XX. Tendo em vista que a Educação é uma atividade social, também foi marcada por esta
influência. Nas escolas, a influencia do positivismo se fez sentir com força devido à influência
da Psicologia e da Sociologia, ciências auxiliares da Educação.
A classificação das ciências proposta por Comte tem reflexos na educação em função
da fragmentação do conhecimento e da especialização. O conhecimento fragmentado levou
à elaboração de currículos multidisciplinares, restringindo qualquer tipo de relação entre
diferentes disciplinas. Por meio da fundamentação e classificação das Ciências (Matemática,
Astronomia, Física, Fisiologia e Sociologia), Comte acabou por exaltar e defender a
superioridade das Ciências Exatas sobre as Ciências Humanas. De acordo com
BOTTOMORE, 1988, “uma vez submetido o domínio das ciências humanas às disciplinas
da ciência empírica, cessará a anarquia intelectual e uma nova ordem institucional adquirirá
estabilidade graças ao consenso” (1988, p.291). Mesmo a Sociologia desenvolvida por
Comte recebeu dele um caráter científico para o estudo dos fatos sociais.
O positivismo admite apenas o que é real, verdadeiro, inquestionável, aquilo que se
fundamenta na experiência. Deste modo, a escola deve privilegiar a busca do que é prático,
útil, objetivo, direto e claro. Os positivistas se empenharam em combater a escola humanista,
religiosa, para favorecer a ascensão das ciências exatas. As idéias positivistas influenciaram
a prática pedagógica na área das ciências exatas, influenciaram a prática pedagógica na
área de ensino de ciências sustentadas pela aplicação do método científico: seleção,
hierarquização, observação, controle, eficácia e previsão.
De forma marcante, o positivismo esteve presente no ideário das escolas e na luta a
favor do ensino leigo das ciências e contra a escola tradicional humanista religiosa. O currículo
multidisciplinar – fragmentado – é fruto da influência positivista.

Positivismo na educação brasileira

No Brasil esta influência aparece no início da República e na década de 70, com a


escola tecnicista. Foi muito divulgado por intermédio do Apostolado Positivista que se
incorporou ao movimento pela proclamação da república e da elaboração da constituição
de 1891. O movimento republicano apoiou-se em idéias positivistas para formular sua
ideologia da ordem e do progresso, graças particularmente à atuação de Benjamim Constant
(1836-1891).
O positivismo de Comte chegou ao Brasil em meados do século XIX. As idéias
positivistas encontraram boa receptividade entre muitos oficiais do exército. Com um currículo
voltado para as ciências exatas e para a engenha-ria, a educação se distancia da tradição
humanista e acadêmica, havendo uma certa aceitação das formas de disciplina típicas do
positivismo. As palavras “ordem e progresso” que fazem parte da bandeira brasileira indicam
clara-mente a influência positivista. Na década de 70 deste mesmo século, a escola tecnicista

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teve uma presença marcante. A valorização da ciência como forma de
conhecimento objetivo, passível de verificação rigorosa por meio da
observação e da experimentação, foi importante para a fundamentação da
Historiografia escola tecnicista no Brasil. Para esta escola o elemento primordial é a
tecnologia.
Na escola tecnicista, professores e alunos ocupam papel secundário
dando lugar à organização racional dos meios. Professores e alunos relegados
à condição de executores de um processo cuja concepção, planejamento,
coordenação e controle, ficam a cargo de especialistas supostamente habilitados, neutros,
objetivos, imparciais (SAVIANI, 1993, p.24). Portanto, pode-se perceber pelas palavras de
Saviani que neutralidade e objetividade são típicas do positivismo.
O Positivismo como doutrina sobre a sociedade e sobre as normas necessárias
para reformar a sociedade foi um movimento que dominou uma parte significativa da cultura
européia tanto no âmbito filosófico, historiográfico como político e pedagógico. A
necessidade expressa por Comte de se estabelecer uma relação fundamental entre a ciência
e a técnica concretizou-se de maneira significativa por gerações.
Na educação houve contribuições significativas no campo do planejamento escolar,
uso da tecnologia, ensino profissionalizante e aplicação do conhecimento científico. Por
outro lado, uma concepção puramente profissionalizante pode afetar o talento intelectual do
aluno. Segundo PAVIANNI, 1991, “a concepção profissionalista dos cursos universitários é
o principal entrave à existência de uma verdadeira formação universitária que tem a função
de desenvolver a versatilidade intelectual da pessoa, de criar homens de mentalidade e
sensíveis às necessidades dos outros homens de seu tempo” (PAVIANNI, 1991, p.53).
A educação, influenciada pelos ideais positivistas, carece de incentivo ao
desenvolvimento do pensamento crítico. A educação tecnicista apoiada nos ideais positivistas
não deve reduzir-se apenas ao ensino técnico, mas deve preocupar-se também em buscar
a razão do próprio procedimento técnico. Aceitar a ciência como o único conhecimento,
como queria o positivismo, é algo reducionista que perde uma considerável parcela de
conhecimento que não estão no dado; fica prejudicada tanto a criação como a dedução. A
história positivista, influenciada por Ranke, tende a projetar no Ensino de História o papel
de formador de um cidadão cívico, enquanto os segmentos afinados com a idéia de conflito
social, desigualdade social, etc., presentes em um amplo espectro marxista, desde Althusser
até Thompson, vêem no ensino de história uma possibilidade de gestação de um senso
crítico, isto é, de um cidadão revolucionário. Na educação cívica, os fatos históricos e os
grandes homens são cuidadosamente reconstituídos para a instrução da juventude. Faz-se
uma “história comemorativa”, que legitima os rituais cívicos, realizados nas datas (dia e
mês) que coincidem com as do evento passado, quando os grandes heróis produziram os
seus grandes feitos. (REIS, 2004)
O positivismo, ao buscar as regularidades da vida social, encarando-as como se
fossem naturais, universais e, portanto, não históricas (a-históricas), sob a ótica da
neutralidade, supõe uma ciência, uma concepção e um conhecimento descomprometidos.
A abordagem positivista implica uma metodologia fundamentada na aula expositiva onde
os alunos são ouvintes passivos e contemplativos. O sujeito da aprendizagem é um
receptáculo que deve registrar os conteúdos transmitidos pelo professor e reproduzi-los
posteriormente de modo o mais fiel possível.
Os conteúdos são apresentados como fatos prontos e acabados não passíveis de
uma reflexão e interpretação por parte dos alunos. O conteúdo escolhido se refere à história
factual e seqüencial. Subjacente a essa escolha seqüencial está o pressuposto de que só
se entende o presente a partir dos fatos passados. Os trabalhados escolares na perspectiva
positivista se referem, principalmente, a temas de conciliação, integração, consenso,

14
cordialidade e não violência, ou seja, os temas relacionam-se com a “Ordem”, pregada
pelo Positivismo. Os temas que deixam aflorar a contradição, o conflito, as tensões e
violências tendem a ser minimizados ou eliminados dos conteúdos apresentados em classe.
Várias análises dos livros didáticos atestam que o conteúdo se refere a uma história abstrata,
alienante e ideológica que expressa o interesse de classe dos grupos dominantes.

Nossas últimas considerações

Assim, os alunos e o professor, ideologicamente colocados como homens comuns,


não se sentem sujeitos do processo histórico. Tampouco percebem que podem interferir na
sociedade, no processo educacional e provocar mudanças que sejam frutos da vontade
coletiva da sociedade da qual fazem parte.
Os reflexos desta concepção de história nas escolas, como foi dito, são aulas
expositivas nas quais a participação dos alunos se limita à contemplação passiva. Eles
recebem, registram e reproduzem fielmente o conteúdo recebido, pois de outro modo terão
seu desempenho escolar julgado insuficiente. Não interrogam, não dialogam, não interpretam.
A compreensão do presente só é possível com o olhar voltado para o passado, e, além
disso, este conhecimento só é possível a partir das vozes oficiais, isto é, dos documentos
que emanem principalmente do poder público. Não é por outro motivo que a História do
Brasil, por exemplo, é pensada sempre em termos de uma personificação que destaca
heróis, como D. Pedro I, Tiradentes, Marechais, como Deodoro, etc. É como se o povo
tivesse que assistir á história como a uma partida de futebol: torcendo mas sem poder
interferir, uma vez que a história seria privativa de heróis, marechais, príncipes, etc.
Dessa forma, essa história tradicional, influenciada pelo Positivismo, proporcionava
apenas uma visão de cima, ou seja, concentrava sua atenção nos feitos dos grandes
homens, estadistas, generais e também em personalidades eclesiásticas.
Opondo-se ao modelo de história positivista, e questionando o paradigma tradicional
dominante, e aproximando-se das ciências sociais, os historiadores da Escola dos
Annales apresentaram um novo segmento para o conhecimento histórico. Os Annales,
derrubando a arcaica tendência positivista do séc. XIX, fortemente ligada ao movimento
das elites, substituída pela observação detalhada e metódica do cotidiano de uma época,
de uma localidade, do sistema de valores, crença, atividades humanas. A riqueza do novo
enfoque está cada vez mais presente no fazer histórico atual. É o que veremos no próximo
Tema 2.

CONSIDERAÇÕES ACERCA DO MARXISMO NA


HISTORIOGRAFIA

Sabemos que, também no século XIX, a humanidade, na sua constante busca de


elaboração e reelaboração do conhecimento histórico, para além do Positivismo, viu surgir
uma nova concepção de história – o Materialismo Dialético. O impulso original marxista
será a busca do fio condutor que explique a dinâmica das sociedades modernas, entendidas
como sociedades industriais.
Sob a liderança intelectual dos alemães Karl Marx e Friedrich Engels, na segunda
metade do século XIX assistiu à emergência de uma nova compreensão do homem, da
história e dos procedimentos metodológicos para a apreensão do conhecimento histórico.
Os homens interagem nas condições exteriores a que estão submetidos, lutam pela
transformação dessas condições que são construídas pelos sujeitos da História. Os homens
fazem a História e determinam seu rumo.
A nova receita, dada pelos fundadores do Materialismo Dialético, é a seguinte:

15
a) as classes sociais, cuja luta constitui a própria trama da história, não se
define pela capacidade de consumo e pela renda e sim pela sua situação no
processo produtivo (uma concepção de história que tem como base o
desenvolvimento do processo real da produção, concretamente a produção
Historiografia da vida material imediata);
b) a correspondência entre forças produtivas e relações de produção,
constituindo o principal objeto da história-ciência, ligada ao conceito de “modo
de produção” e “formação social” (concebe a forma das relações humanas
ligadas a este modo de produção e por ele engendrada, isto é, a sociedade civil
nos seus diferentes estágios, como sendo o fundamento de toda sua história);
c) a produtividade é a condição necessária da transformação histórica (se as
forças produtivas não se modificam, a capacidade de criação da vida humana
se imobiliza, e se elas se modificam tudo se move); (REIS, 2004)

Para Marx e Engels, portanto, as relações sociais são essencialmente moldadas


pelas condições materiais da existência humana. Uma história que trata da luta de classes
no quadro do desenvolvimento das forças produtivas, portanto, a realidade histórica é
estruturada em grupos de homens que ocupam lugares contraditórios no processo produtivo.
Na literatura marxista é a chamada luta de classes. No caso do positivismo vocês viram
anteriormente que o sujeito da História é sempre o “herói”, o governante, ou seja, o sujeito
que destaca na sociedade de classes. Diferente do marxismo, o homem comum não
participa da construção da história.
Para a concepção marxista, os homens “fazem a história”, intervindo, condicionando
na estrutura e pela estrutura econômico-social, melhor dizendo os homens transformam o
mundo e a si próprios. A questão econômica tem grande importância, é a base da estrutura
e a dinâmica da sociedade, e a chamada luta de classes é o “motor da História” na expressão
de Marx, que pode ser vista no Manifesto Comunista.
Como contraponto a isso, lembremos que o positivismo afirmava que numa sociedade
dividida em classes, os indivíduos “superiores” formariam a classe dominante e as
desigualdades sociais ganhavam, assim, justificativas em sintonia com o os interesses do
capitalismo e da burguesia liberal do século XIX.
Lembrem-se também que o pensamento positivista tinha como pressupostos básicos
os conceitos de ordem propriedade, moral, família, religião, progresso, pátria e trabalho.
Esses conceitos buscavam justificar a sociedade capitalista dividida em classes, a
propriedade privada dos bens de produção, a hierarquia social, o individualismo e outros
princípios que lhes são característicos.
Em razão disso, é conveniente dar voz ao próprio Marx, a fim de que ele exponha as
linhas gerais de seu pensamento. Em “Uma Contribuição Crítica da Economia Política” –
Marx diz: “O modo de produção material da vida material condiciona o processo em geral
de vida social, política e espiritual. Não é a consciência do homem que determina o seu ser,
mas, ao contrário, é o seu ser social que determina sua consciência. (...). Com a
transformação da base econômica, toda a superestrutura se transforma, com maior ou menor
rigidez” (MARX, 1978, p. 30).
Entretanto, embora colocasse as condições materiais – a infraestrutura – como
pressuposto quase absoluto para as condições jurídico-políticas – a superestrutura –, Marx
não se furtou de relativizar esta regra. Em Miséria da Filosofia, Marx tratou esta questão
nos seguintes termos:

“O modo de produção, as relações nas quais as forças produtivas são


desenvolvidas, não são de modo algum leis eternas, mas (antes) (...)
correspondem a um desenvolvimento determinado dos homens e de suas
forças produtivas e (...) uma mudança nas forças produtivas dos homens
necessariamente enseja uma mudança em suas relações de produção”.
(MARX, 2001)

16
O marxismo, enquanto concepção de história esteve, especialmente a partir da
hegemonização política da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas no Leste Europeu,
submetido a uma leitura reducionista que impunha, à referida concepção, a responsabilidade
pela versão dos debatidos “estágios do desenvolvimento histórico”. No Manifesto Comunista
pode ser visto uma concepção evolutiva e continuísta da história, na qual o modo de produção
capitalista é o resultado da sucessão dos modos de produção anteriores, por exemplo, o
escravista. O próximo modo de produção, para Marx, traria a superação, exclusão da luta
entre os homens, ou seja, não teria como motor a luta de classes: seria o modo de produção
socialista e este evoluiria para o comunismo, o qual na visão marxista seria o modelo de
sociedade justa, livre e comunitária.
Segundo esta versão o pensamento marxista se assentaria exclusivamente no
conceito de “Modo de Produção”. Um dos responsáveis por esta versão seria o ditador
Stálin, que com a publicação, em 1938, do texto Sobre o Materialismo Histórico e o
Materialismo Dialético, teria aberto caminho para uma versão sobre a concepção marxista
da história que transformou-se – pelo emprego do esquema unilinear das cinco etapas –
em uma vulgar filosofia da história, uma entidade metafísica que determinava, do exterior ,
o curso do devir histórico, não restando outro remédio aos dados concretos, salvo entrarem,
bem ou mal, no dito esquema. A pesquisa histórica passava a ser ‘ilustração’ das ‘verdades’
consagradas. (CARDOSO, 1979, p.71).
No sentido de contribuir para esta discussão epistemológica cuja importância
acadêmica é indiscutível, é conveniente, mais uma vez, dar voz a Marx, a fim de que ele,
pessoalmente, defina “modo de produção”:

“(...) em todas as formas de sociedade, é um modo de produção


determinado e as relações por ele engendradas que determinam todos os outros
modos de produção e as relações engendradas por estes últimos, como também
seu nível e sua importância. É como uma luz geral onde estão mergulhadas
todas as cores e que lhes modifica as tonalidades particulares. É como um éter
particular que determina o peso específico de todas as formas de existência que
dali emergem”. (MARX, 1991, p.11)

Com o início das críticas ao Stalinismo, a partir dos anos 50, conceitos como o de
Modo de Produção, começaram a ser rediscutidos. Houve também, a partir daí, uma
significativa troca de influências do marxismo com historiadores ocidentais em congressos
internacionais de história. Destacaram-se, nesta fase, nomes como os de Witold Kula, na
Polônia; Pierre Vilar, Charles Parain, J. Bouvier e Albert Soboul, na França; Eric Hobsbawm,
Maurice Dobb, Cristopher Hill e R. Hilton, na Inglaterra; E.Sereni, na Itália, K. Takahashi, no
Japão, etc.
Do mesmo modo, nomes como os de Louis Althusser, Antonio Gramsci, George
Lukács, Walter Benjamim, Agnes Heller, dentre outros, representaram etapas importantes
da trajetória do pensamento marxista. Louis Althusser, de acordo com Flamarion,
concretamente não contribuiu para a História, enquanto ciência, pois desconhecia a natureza
do trabalho do historiador. Apesar disto tem seu mérito no fato de concentrar-se em temas
fundamentais na epistemologia marxista, antes postos de lado. (CARDOSO, 1979, p.80)
O conjunto das obras de Antonio Gramsci, por sua vez, representam um momento de
revisão e questionamentos em relação ao marxismo. Gramsci reestuda e introduz conceitos
como os de Estado, hegemonia, teoria política nas sociedades industrializadas do ocidente
moderno, cultura, acumulação política em processos de longo curso, todos fundamentais
para uma teoria de história, do ponto de vista marxista. O objetivo de Gramsci apontava

17
para uma crítica ao economicismo, reduzindo o papel não apenas da
‘consciência de classe’, como da própria luta de classes.
A concepção materialista da história, portanto, pressupõe em primeiro
Historiografia lugar que a experiência é o eixo central da história, enquanto, ao mesmo tempo,
concebe uma identidade fechada e coletiva: os humanos experimentariam o
mundo através da classe social a que pertencem.
Enquanto “ciência” da história o marxismo, dá ênfase nas “contradições”
e prioriza o estudo dos “conflitos sociais”. De acordo com Hobsbawm, 1982,
esta seria a contribuição mais original de Marx para a historiografia, uma vez que as teorias
anteriores (principalmente o positivismo) davam prioridade a harmonia, unidade, entre as
diversas esferas sociais, ou melhor, entre as classes sociais.

O marxismo no ensino da História

Resumidamente, do ponto de vista do ensino de história referido a concepção


marxista, pode-se dizer que os professores marxistas tendem a projetar no ensino de história
um instrumento revolucionário capaz, justamente, de “arrancar a tradição ao conformismo”.
Itacy Salgado Basso, sintetiza, no trecho seguinte, a metodologia didática articulada à
concepção materialista da história:

“A metodologia de ensino e a seleção de conteúdos mediadas e


articuladas à concepção materialista da história proporcionam ao aluno
possibilidade de entender a sociedade em que vive e de ter consciência da
sua posição nestasociedade, isto é, possibilidade de recuperar a sua
memóriahistórica. Para que o aluno examine criticamente o papel da
sociedade na sua própria formação, é preciso que se inicie esse aluno nos
procedimentos da produção do conhecimento histórico (...). Partindo da
análise da situação presente, professores e alunos procuram entender o
passado... sob a luz da crítica da nossa sociedade. Só quando entendemos
criticamente a sociedade burguesa, isto é, quando a entendemos como
histórica, é que podemos compreender as sociedadesanteriores, o passado”.
(BASSO, 1989, p.7)

Questão 1 [ ] 
Agora é hora de
TRABALHAR

Existiria a possibilidade de se conhecer o passado, tal como ele se apresentava?


Ou o passado seria uma invenção, repleto de discursos e práticas?
Para o historiador Durval Muniz Albuquerque o passado adquire sentido quando se
relaciona com o presente.
E para você, caro aluno?
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Questão 2
Após a leitura do trecho abaixo de Durval Muniz Albuquerque acerca da “imaginação
histórica”, redija algumas considerações sobre a problemática apresentada.

O conhecimento histórico torna-se, assim, a invenção de uma cultura particular, num


determinado momento, que, embora se mantenha colado aos monumentos deixados pelo passado, á
sua textualidade e á sua visibilidade, tem que lançar mão da imaginação para imprimir um novo
significado a estes fragmentos. A interpretação em história é a imaginação de uma intriga, de um
enredo para os fragmentos de passado que se tem na mão. Esta intriga para ser narrada requer o uso
de recursos literários como as metáforas, as alegorias, os diálogos, etc. Embora a narrativa histórica
não possa ter jamais a liberdade de criação de uma narrativa ficcional, ela nunca poderá se distanciar
do fato de que é narrativa e, portanto, guarda uma relação de proximidade com o fazer histórico,
quando recorta seus objetos e constrói, em torno deles, uma intriga. (ALBUQUERQUE, 1995, p. 11).

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19
A REVOLUÇÃO PROPOSTA PELOS
Historiografia ANNALES

Para entendermos o momento atual da escrita da história


precisamos acompanhar a história da história. As mudanças que
ocorreram na escrita da história iniciaram-se com o aparecimento
da expressão francesa “La nouvelle histoire” (a nova história), na
passagem dos séculos XIX e XX. Essa Nouvelle histoire, praticada
pela Escola dos Annales, a partir de Febvre, Bloch e Braudel,
rompeu com a influência filosófica, amparando-se nas teorias das
novas Ciências Sociais (Sociologia, Economia, Psicologia, etc).
Em 1929, Marc Bloch e Lucien Febvre fundam a revista
dos Annales e inauguram uma fase nova e decisiva no campo da
história e historiografia. História escrita como reação ao modelo
tradicional ou “história rankeana”, alusão ao historiador alemão
Leopold von Ranke (1795-1886). Essa revista seria o porta-voz
dos apelos dos editores em favor de uma abordagem nova e interdisciplinar da história.
(BURKE, 1997).

Qual foi o seu principal alvo de combate?

A história política que se fazia na época, de influência


positivista, caráter “diplomático”, narrativo e factual.

O rigor da narrativa rankeana não considerava a imaginação do historiador, presente


em todos os atos de estruturação da narrativa histórica. Consideramos que a narrativa
histórica tem início e fim determinados pelo historiador, imprimindo sentido ao tempo e
possibilitando uma unidade através da narrativa.
Os Annales questionavam entre a virada do século XIX para o século XX a forma
como se fazia a história que era até então historizante, a qual preocupava-se tão somente
com os fatos singulares, sobretudo fatos políticos, militares e diplomáticos. Uma história
que tomava como um dos critérios, a análise de documentos verdadeiros, e assim poder-
se-ia chegar a cientificidade e a verdade dos fatos. Opunham-se ferrenhamente a uma
história contaminada de empirismo. Este novo paradigma de escrita da história foi proposto
pela chamada Escola dos Annales, tornando-se talvez o principal modelo para o fazer da
história. Burke, 1997 acredita que seja preferível falar num movimento do Annales, não numa
“escola”.
O núcleo central do grupo é formado por Lucien Febvre, Marc Bloch, Fernand Braudel,
Georges Duby, Jacques Le Goff e Emmanuel Le Roy Ladurie. E próximos a eles estão
Ernest Labrousse, Pierre Vilar, Maurice Agulhon e Michel Vovelle.
Para acompanhar o desenrolar do movimento dos Annales, observe um breve histórico
que se segue.

20
A HISTORIOGRAFIA NO SÉCULO XX: A REVOLUÇÃO DOS
ANNALES

Nas primeiras décadas do século XX surgiu na França um novo paradigma no campo


do conhecimento histórico, o qual apontava para novos direcionamentos para a comunidade
dos historiadores no que diz respeito à produção historiográfica.
A escola dos “Annales”: cujos membros deram um giro coperniano (refere-se a
Copérnico) na historiografia, atacaram o positivismo. Seus defensores são Marc Bloch (1886-
1944) e Lucién Febvre (1878-1956).
A partir de Bloch e Febvre começam a serem utilizados os métodos estatísticos,
econômicos e de qualquer outra ciência que servisse de subsídio. A economia e a sociedade
passaram a ser objetos de estudo da História, porém, mais importante que o Estado, as
instituições e as guerras, é o ser humano, o ser que vive em sociedade.
A nova história social é marxista, ainda que tenha passado por grandes
transformações, dependendo da experiência do socialismo real e da evolução ideológica,
derivada do contato com a realidade social. Se vocês recordarem do texto anterior, para
Marx, o materialismo dialético encara o ser humano como um ser histórico, isto é, diretamente
influenciado por sua época (contexto), pelo seu meio geográfico e social, mas um ser
igualmente capaz de reagir, pelo trabalho consciente, ao mundo em que vive. Essa realização
se dá através da práxis.
Sem dúvida, interessa ao historiador a História em sua totalidade com super estrutura
e infra-estrutura e, ao que parece, a única maneira de compreender o passado para analisar
o presente é entender as estruturas sociais, políticas e econômicas.

Novos Objetos

Como foi dito anteriormente, os Annales recusaram os objetos da história tradicional.


Estes objetos são: a política, as relações exteriores dos Estados nacionais. As guerras e a
biografia de seus grandes líderes e criaram outros. Os Annales recusaram fundamentalmente,
sobretudo a história política por considerarem, que esta era a história a serviço dos estados
nacionais, com seus heróis, batalhas e pretensões imperialistas.
Em outras palavras, a história política era vista pelos historiadores dos Annales como
elitista, biográfica, qualitativa, visando ao particular, individual; também era narrativa,
ideológica, partidária. Os seja, a história das “ações conscientes” dos “grandes indivíduos”
que realizavam “grandes feitos”.
Os principais objetos que aparecem na primeira fase da revista dos Annales
relacionam-se com: economia, sociologia, geografia e demografia. (REIS, 2004).

Bloch e Febvre: historiadores revolucionários

· compreensão, pela história –problema;


· historia global;
· renovação de fontes e técnicas.

21
Os fundadores criadores da chamada Escola dos Annales, Lucien
Febvre e Marc Bloch, lideraram, na França, o movimento da La nouvelle
Historiografia histoire ou “Nova História”, possuíam uma nova visão da disciplina história, os
quais consideravam que a “história-ciência” ainda em construção tinha como
características:
E mais, a narrativa foi minimizada em função do rigor científico.
Uma característica marcante do estudo de Lucien Febvre era a
introdução geográfica, um perfil da região estudada. Posteriormente, Braudel retomará a
ênfase no geográfico no seu famoso livro sobre o Mediterrâneo.

O importante papel do problema

Essa abertura e ampliação do campo dos objetos, das fontes e técnicas históricas,
estão associadas à inovadora proposta teórica da história-problema. Se para Langlois e
Seignobos “sem documentos não há história”, para os Annales, “sem problema não há
história”.
Dito de outra maneira é o problema e não a documentação que está na origem da
pesquisa, isto é, sem um sujeito que pesquisa, sem o historiador que procura respostas
para questões bem formuladas, não há documentação e não há história.
É o problema posto que dará a direção para o acesso e construção do corpus
necessário à verificação das hispóteses que ele terá suscitado. Melhor dizendo, a história-
problema devolve ao historiador a liberdade na exploração do material empírico. O fato
histórico não está presente “bruto” na documentação. O historiador não é um colecionador
e empilhador de fatos. Ele é um construtor, recortador, leitor e intérprete de processos
históricos Portanto, a grande renovação teórica propiciada pela reconstrução do tempo
histórico pelos Annales foi a história-problema. Ela veio se opor ao caráter narrativo da
história tradicional. Veio reconhecer a impossibilidade de se “narrar os fatos tal como se
passaram”. Que não há história sem teoria. A pesquisa histórica é a verificação de respostas-
hipóteses possíveis a problemas postos no início.

Na perspectiva dos Annales, ao historiador cabe:

· escolher seus objetos no passado e os interrogar a partir do


presente.
· explicitar a sua elaboração conceitual, pois não pretende
se apagar na pesquisa, em nome da objetividade. Ao contrário, para
ser mais objetivo, o historiador “aparece e confessa” seus pressupostos
e conceitos, seus problemas e hipóteses, seus documentos e suas
técnicas e os modos como as utilizou e, sobretudo, a partir de que
lugar social e institucional ele fala.
· escolher, selecionar, interrogar, conceituar, analisar,sintetizar
e concluir.

A partir da posição do problema, o historiador distribui suas fontes, atribui-lhes sentido


e organiza as séries de dados que ele terá construído. O texto histórico é o resultado de
uma narração objetivista de um processo exterior organizado em si pelo final.
A pesquisa é feita pelo problema que a suscitou, o problema vai guiar na seleção
dos:

1. documentos
2. construção das séries de eventos relevantes para a construção das hipóteses

22
Rompendo com a narração, a história tornou-se uma empresa teórica, seguindo o
caminho de toda a ciência põe problemas e levanta hipóteses e demonstra-as com uma
documentação bem criticada e com uma argumentação conceitual rigorosa.
Essa nova história reabre o passado, em vez de reconstituí-lo definitivamente. Ela
retoma-o, remaneja-o, rediscute-o, estimulada pelas experiências do presente, que é sempre
novo e exige a reabertura constante do passado.
A história conduzida por problemas e hipóteses fez o historiador mudar de posição e
de disposição: se antes ele era proibido, em tese, de aparecer na pesquisa, o que é
impossível de ser cumprido, agora, ele é obrigado a “aparecer” e a explicitar a sua estrutura
teórica, documental e técnica e o seu lugar social e institucional. Atingindo algum grau de
“intersubjetividade”.
A comunidade de historiadores é capaz de acompanhar e controlar as pesquisas
históricas, pois foi posta a par dos pressupostos, dos documentos e seus meios de
processamento, sabe o que o pesquisador quis demonstrar e onde ele pode chegar.

A possibilidade da história-problema liga-se estreitamente à


reconstrução do tempo histórico produzida pelos Annales.

Essa inovação teórica depende de uma anterior reconstrução da representação do


tempo histórico. A representação teleológica do tempo histórico é compatível coma história-
narrativa e incompatível com a história-problema.

1. Não sendo mais movida pelo fim, mas articulação de permanências e mudança, a história é
mais representada como um progresso. A pesquisa histórica conduzida por problemas
é uma “reconstrução temporal”, que polemiza com o passado-presente, mas não chega a
“reconstruí-los”, tal como se passaram. O conhecimento histórico constrói e tematiza o seu
objeto, formula problemas e hipóteses, sob a influência do presente, se referir a valores
teleológicos.
2. Há uma outra periodização – ela é agora temática e definida pelo problema a ser tratado.
As periodizações demográfica, econômica, social, lingüística e antropológica não são grandes
cortes na história da humanidade, mas uma flutuação cíclica no interior de uma estrutura.
3. Há uma outra relação passado-presente – são diferentes que dialogam reciprocamente.
O presente não continua e nem é superior ao passado, é “outro”. O método retrospectivo não
leva o historiador à busca das “origens”. Este vai do presente ao passado e retorna do
passado ao presente.

Esse método regressivo


sustenta a história-problema: temática,
Atenção! essa história elege, a partir das
tensões vividas no presente, os temas
O historiador não pode ignorar o presente que interessam a esse presente,
ao qual pertence – deve ter a sensibilidade histórica problematizando-os e tratando-os no
do seu presente e interrogar o passado a partir passado, trazendo informações para o
dele. Ou seja, faz o caminho do presente para o presente, que o esclareçam sobre a sua
passado. experiência vivida (BLOCH, 1997).
O título do ensaio do historiador
Peter Burke, 1997, A Revolução da
Historiografia: a Escola dos Annales (1929-1989) evidencia que este autor apresenta o
movimento com a criação da revista Annales como um verdadeiro movimento revolucionário,
configurando-se em um novo paradigma (modelo) historiográfico, ou seja, uma revolução
ocorrida na forma de produzir o conhecimento histórico. Segundo Burke, 1992, “é a História

23
escrita como uma reação deliberada contra o ‘paradigma’ tradicional, [...] que
será conveniente descrever como ‘História rankeana’ [...]”.
Fazendo aqui uma breve recapitulação, a historiografia tradicional ou
Historiografia positivista refere-se essencialmente à política, adota a narrativa como forma
de transmissão de conhecimento, e interessa-se principalmente pelos feitos
dos “grandes homens”, utiliza como fontes os documentos emanados do
governo e preservados em arquivos, condicionando as explicações a uma
relação mecânica de causa e efeito, conforme Ranke, “como eles realmente
aconteceram”. Em oposição, a Nova História interessa-se praticamente por toda atividade
humana, preocupando-se com as pessoas comuns e com as mentalidades coletivas,
substituindo ou complementando a narrativa com a análise das estruturas. Sobre as fontes,
a Nova História, considera todo tipo de vestígio deixado pelo homem, além de criticar as
fontes oficiais, as quais expressam o ponto de vista oficial.

As três fases dos Annales

Comumente a chamada escola dos Annales é dividida em três


gerações, a primeira representada por Lucien Febvre e Marc Bloch – seus
fundadores – , a segunda notadamente representada pela liderança de
Fernand Braudel e por fim a terceira, integrada entre outros, por Georges
Duby, Jacques Le Goff e Emmanuel Le Roy Ladurie.

1. A geração dos fundadores, entre 1929 e 1946, com L. Febvre


e M. Bloch caracterizou-se pelo espirito de síntese, por uma história
problematizada, é a geração da história total, a qual veio a se constituir
um dos principais traços do movimento. A heterogeneidade, mobilidade
e a abertura aos temas e metodologias também marcaram essa primeira
fase.
Reis (2004) apresenta uma relação de temas de artigos dessa fase,
entre eles podemos citar: a atividade industrial na Alemanha; o problema
da população na URSS; as finanças da guerra de Alexandre Magno, o
Grande; os bancos da época moderna; as fortunas da Roma Republicana;
o comércio do século XVI; os operários na índia; as artes e as ciências;
a exploração das florestas e os conflitos sociais; o ouro na Idade Média;
crise bancária nos EUA; história social romana; o calvinismo e o capitalismo em Genebra,
as cidades francesas, o trabalho servil no Brasil, etc. Notamos que são temas variados e
com perspectivas, as mais diversas.

2. A segunda geração, entre 1946 e 1968, conhecida como


era de Braudel, o principal expoente do paradigma dos Annales,
autor de várias obras que se tornaram clássicos como “O
Mediterrâneo e o mundo mediterrânico na época de Felipe II”.
Note-se que é nesta monumental obra o autor situa a história
em três tempos: nos acontecimentos, que se inscreve no tempo
curto; nas conjunturas, que segue um ritmo mais lento; em
profundidade, uma história estrutural, de longa duração, “que põe
em causa séculos”. Esta segunda geração foi marcada por
regularidades, quantificação, séries, técnicas, numa abordagem
estrutural, e com penetração do marxismo. Com isso, temos nesta
fase a produção de grandes obras de história total, histórias

24
sintéticas, com grande ênfase nos aspectos sócio-econômico, relacionadas ao meio
geográfico.
Nessa fase também abre um campo de objetos, fortemente ligados a demografias e
“civilizações”, porém com a permanência dos temas econômicos-socais. Temos como
exemplo o livro de Braudel, Gramática das Civilizações.
Ainda Reis, 2004, nos apresenta alguns temas desta fase: as moedas e a civilização;
a miséria e o banditismo; as reflexões sobre o equilíbrio demográfico; a educação nazista;
as migrações; a Idade Média e a história estatística; a França rural; os movimentos de
preços e salários; os milagres no Brasil (notem que este tema muito vinculado à terceira
geração); o Islã e a África do Norte; a América pré-colombiana, etc.

3. A terceira geração, a partir de 1969, teve preocupações


transferidas “do porão ao sótão”, ou seja, mudança de bases sociais
e econômicas para as mentalidades e a vida cotidiana, na vida
privada, a “superestrutura cultural”. É a fase do abandono da história
global e a incorporação da fragmentação. Nessa fase encontram-se
André Burguiére e Jacques Revel, na administração da revista
Annales e Jacques Le Goff, ocupando a presidência da École des
Hautes Études en Sciences Sociales. É nessa geração que as
mulheres são incluídas, tais como: Mona Azouf, autora de estudos
sobre os festivais durante a Revolução Francesa; e Michele Perrot,
que escreveu sobre a história do trabalho e a história da mulher.
Os temas/objetos relacionados a economia, sociologia, demografia, continuam
presentes, contudo, vemos uma história marcadamente inter-relacionada com a antropologia,
ampliando muito mais os objetos históricos. Torna-se, assim, mais difícil de traçar o perfil
dessa terceira geração, como foi possível das duas anteriores dominadas por Febvre e
Braudel. François Dosse, do qual falaremos mais adiante chega a falar em fragmentação
da história nessa fase.
Temos como exemplo estes estudos: história da alimentação; história do meio
ambiente; história do clima; história da arquitetura; espaço feminino e espaço masculino;
linguagem popular; mitos arianos; história psicanalítica; revoltas populares; discurso
iluminista; pensamento selvagem a aculturação; feiticeiros, usos sociais do corpo; literatura
popular; modas e costumes; história das idéias; vida e morte através da arte; abandono de
crianças; vida sexual e casamento tardio; imagens e sons; linguagem e representação,
carnaval, catolicismo e engajamento social, opinião pública, dentre outros (REIS, 2004).
O que percebe com estes exemplos de objetos pesquisados nas três fases é:

a) a interdisciplinaridade, melhor dizendo, as diversas junções


que a história fez com as ciências sociais;
b) a ampliação dos objetos, do campo de pesquisa dos
historiadores;
c) a nova forma do tempo, ou seja, o presente tematizando o
passado (não se estuda apenas o passado);
d) o “desengajamento político-partidário”, a recusa da
dimensão política; (REIS, 2004, p. 90).

O tema político voltou, devido ao seu crescimento e papel nas sociedades modernas;
porém, modificado em “política econômica”, “política demográfica”, ou “política cultural”. Esta
história política, não está ligada aos grandes indivíduos e ao Estado, agora, representada
em setores da sociedade, sindicatos, são as “micropolíticas”. Temos como exemplo os
estudos de Michel Foucault sobre os “micro-poderes”, o poder da história política não se

25
encontra em único espaço: o Estado. E sim distribuído em uma rede de micro-
poderes, ou seja, a luta pelo poder no interior da família, da escola, das fábricas.
Juntamente com Georgs Duby, Le Goff foi um dos mais destacados
Historiografia historiadores das mentalidades. Sua contribuição veio com a história do
“imaginário medieval” com a obra La naissance du Purgatoire (O nascimento
do Purgatório), refere-se às mudanças das representações da vida depois
da morte. Em relação a Duby, renomado historiador social e econômico da
França Medieval, era inspirado na teoria social neomarxista, ligou-se a história
das ideologias, da representação cultural e também do imaginário social. Seu importante
livro foi Les trois ordres (As três ordens), no qual investigou “as relações entre o mental e o
material no decorrer da mudança social”, Duby abordou a sociedade medieval dividida em
três grupos: padres, cavaleiros e camponeses, ou seja, os que rezam os que guerreiam e
os que trabalham.
Também vinculado a esta terceira geração, Michel Vovelle, um historiador estudioso
do século XVIII, especificamente da Revolução Francesa, como fez Duby, buscou fundir a
história das mentalidades coletivas com ideologia do tipo marxista. Vovelle teve interesse
pela “descristianização”, as atitudes diante da morte e do além, que estavam reveladas nos
testamentos. Por exemplo, em sua tese sobre a Provença, pesquisou cerca de 30.000
testamentos a procura de evidências sobre a proteção dos padroeiros, número de missas
encomendadas para salvação da alma, arranjos para os funerais, assim como o peso das
velas acendidas durante o funeral. (BURKE, 1997).

VEJAM ESTE QUADRO:

I FASE - História Total, Estruturas Em Longa Duração

II FASE - Quantificação, Demografia, Geografia

III FASE - Antropologia, Mentalidades, Cultura

Os três tempos de Braudel

Fernand Braudel foi um nome extremamente importante neste


processo de renovação historiográfica e que exerceu forte influência
durante muito tempo nos ciclos de historiadores. Entre os conceitos
introduzidos por Braudel, encontram-se o de longa e o de curta duração,
o que significa dizer que na história há fenômenos que se transformam
rapidamente, enquanto outros levam milênios para sofrerem
alterações, por exemplo, as mentalidades.
São exatamente estes os fenômenos da vida cotidiana,
das mentalidades. Estes fenômenos são mais fossilizados, e
mesmo as revoluções muitas vezes não os modificam. Em seu
estudo sobre o Mediterrâneo Braudel considerava importante a
história “do homem em relação ao seu meio”, ou seja, uma geografia histórica, ou “geo-
história”. O principal objeto da primeira parte do livro sobre o Mediterrâneo e a geo-história,
no qual descreve montanhas e planícies, litorais e ilhas, climas, rotas terretres e marítimas.
Por fim, Braudel também demonstra que todas as características geográficas têm a
sua história, por exemplo, no capítulo sobre as montanhas, ele discute, dentre outras questões,
a cultura e a sociedade das regiões montanhosas, o conservadorismo dos montanheses, e

26
as barreiras socioculturais que separavam os homens da montanha dos da planície. (BURKE,
1997).
O historiador francês Fernand Braudel dividiu em três momentos diversos o tempo
histórico:

1 - O tempo da “geo-história” ou da história estrutural: relação seres


humanos e meio ambiente, uma história de passagem imperceptível e repetições
e ciclos recorrentes. O maior exemplo está em sua obra “O Mediterrâneo e o
mundo mediterrânico na época de Felipe II”, na qual Braudel reitera que “a
conhecida e sempre condenada lentidão de Felipe II em reagir aos eventos
não deve ser explicada apenas em termos de seu temperamento, mas deve ser
associada à exaustão financeira da Espanha e aos problemas de comunicação
em um império tão vasto”. (BURKE, 1997, p.47)
2 - O tempo dos “sistemas econômicos, Estados, sociedades e
civilizações” de ritmos lentos, porém perceptíveis é a chamada história
conjuntural.
3 - O tempo acelerado de eventos e indivíduos, o sujeito da narrativa
tradicional, centrada nos fatos, nos eventos, considerada por Braudel superficial.

Para Braudel, todas as “estruturas” estão sujeitas a mudanças, mesmo que lentas.
Seus temas ultrapassam a história tradicional econômica (agricultura, comércio, indústria)
e enfatiza “a vida diária”, o povo a as “coisas que a humanidade produz ou consome”,
alimentos, vestuários, habitação, ferramentas, moedas. Assim, aparecem os conceitos de
“vida diária” e “civilização material”, este último conceito ligado ao seu outro livro Civilização
material e capitalismo.
A partir destes pressupostos, do novo olhar, do desprezo nos fatos e ênfase nos
problemas, houve a possibilidade da ampliação da noção de fonte, trazendo informações
acerca do cotidiano, da civilização material, das crenças, de tudo aquilo que compõe a
cultura, a política, a economia, de uma determinada sociedade num dado tempo.

E as produções historiográficas de Braudel?

Ambos os historiadores tornaram-se especialistas em história medieval, publicando


obras de renome como Les Rois Thamaturges (Os Reis Taumaturgos) e La societé
féodale (A Sociedade Feudal), a primeira um estudo sobre o caráter sobrenatural atribuído
aos reis da França e Inglaterra e a segunda uma síntese dos conhecimentos do momento
sobre a organização social da Idade Média, ambos lançados entre 1923 e 1936.
Segundo Burke, 1997, Os Reis Taumaturgos de Bloch merece ser considerada umas
das grandes obras históricas do nosso século, culo tema é a crença, difundida na Inglaterra
e na França da Idade Média até o século XVIII, de que os reis tinham o poder de curar os
doentes de escrófula, uma doença de pele conhecida como “mal dos reis” transmitida através
do toque real e acompanhado de um ritual. Esse livro foi pioneiro para o que atualmente é
entendido por história “das mentalidades”. É também descrito como um estudo de sociologia
histórica, ou antropologia histórica, por focalizar as crenças.
Mas, é a partir do livro A Sociedade Feudal, que Bloch é mais conhecido. Esse estudo
abrange quatro séculos de história européia, do ano 900 a 1300, uma variedade de temas
como: servidão e liberdade, monarquia sagrada e a importância do dinheiro. É considerado
um livro muito influenciado pelo sociólogo Durkheim, onde é utilizada a linguagem da
consciência coletiva, da memória, das representações coletivas. (BURKE, 1997).
Para Lucien Febvre a História era a “ciência dos homens, a ciência da mudança
perpétua das sociedades humanas”, já Marc Bloch a definia como “a ciência dos homens
no tempo”.

27
Para refletir...
· O que vocês acham
Historiografia dessas definições da história?
· Vocês definem história
para seus alunos? Como?
· Em busca de uma
interdisciplinaridade para a
história.

Qual seria a característica principal das três gerações?

A I-N-T-E-R-D-I-S-C-I-P-L-I-N-A-R-I-D-A-D-E

Os fundadores do movimento, Bloch e Febre, questionavam o porquê da história


fechar-se em si mesmo, abdicando de um diálogo com as ciências vizinhas. No programa
proposto por eles preponderava fundamentalmente: a interdisciplinaridade (história com
Antropologia, Psicologia, Geografia, Economia, Sociologia, entre outras), a mudança dos
objetos da pesquisa (estruturas econômico-social-mental), mudança na explicação/
compreensão em história, no conceito de fonte histórica e, sobretudo a mudança do conceito
de tempo histórico. (REIS, 2004).
Enquanto Febvre proclamava “historiadores, sejam geógrafos. Sejam juristas,
também, e sociólogos, e psicólogos” (BURKE, 1997, p. 12), Bloch, na mesma linha, era um
medievalista que pensava sob a perspectiva da história problema. Segundo Burke : O
compromisso de Bloch com a geografia era menor do que o de Febvre, embora seu
compromisso com a sociologia fosse maior. Contudo, ambos estavam pensando de uma
maneira interdisciplinar. Bloch, por exemplo, insistia na necessidade de o historiador regional
combinar as habilidades de um arqueólogo, de um paleógrafo, de um historiador das leis, e
assim por diante. Esses dois homens tinham necessariamente de encontrar-se. Bloch e
Febvre passam a reclamar uma história problema, oposta à narrativa de fatos e de feitos
heróicos. A história agora passava a ser total provida de emoções, medos, taxas
demográficas, relações familiares, etc. Ao invés do grande nome, do imperador, do general,
do rei, do papa, agora contava o homem comum, o ser construtor da nova história.
É dessa forma que vai-se abrindo caminho para o cotidiano e as mentalidades,
considerados então, objetos dignos de interesse pelo historiador. Como foi dito
anteriormente, Bloch estudou a crença milenar que franceses e ingleses tiveram no poder
curativo de seus reis e sobre doença escrófula em “Les Rois Thaumaturges”, (Os reis
Taumaturgos) enquanto Febvre discutiu a possibilidade de haver ou não descrença, ou seja,
irreligiosidade, na França no século XVI, em “O problema da descrença - a religião de
Rebelais”. A pergunta desse livro era: Era ou não Rabelais um ateu?
Mas o que significa “teoricamente” a interdisciplinaridade na História, proposta pelo
Annales?
Segundo o filósofo francês Michel Foucault, em sua obra, As palavras e as coisas,
significa adotar o ponto de vista das ciências sociais, emprestar-lhes objetos, instrumentos,
métodos e a dimensão do tempo. Para Bloch e Febvre a interdisciplinaridade poderia se
dar pelo “objeto comum” à história e às ciências sociais: o homem social. (REIS, 2004).
E o resultado para a história, desta interdisciplinaridade?

28
a) multiplicação de pesquisa particulares e
localizadas
b) a história fragmentou-se em infinitas
histórias, bem distante da tão anunciada pelo Annales,
visão global do homem social.

Sobre esta excessiva fragmentação da história, é interessante ler o livro de François


Dosse, A História em Migalhas.
Atualmente, a interdisciplinaridade, tornou-se uma ameaça para história, para sua
identidade enquanto história.

NOVOS PRESSUPOSTOS PARA A ESCRITA DA HISTÓRIA

Do que foi exposto até aqui, vocês poderão se questionar, qual era o modelo proposto por
esses historiadores “revolucionários”? Vamos em frente...

Atentem para os novos princípios da escrita dessa história:

1 - história global ou total numa tentativa de


apreender a totalidade e a coesão de qualquer período
histórico ou sociedade;
2 - uma convicção de que a história é
determinadas por forças externas ao homem mas não
são inteiramente neutras;
3 - a determinação, sem prescindir da totalidade
da ação humana, na análise estatística rigorosa.

Questões como interdisciplinaridade, novos objetos, tudo passaria a ser objeto de


pesquisa histórica, as estruturas, econômico-social-mental, assim como a explicação e
a evolução no conceito de fontes históricas e sobretudo a modificação no conceito de tempo
histórico foram o marco das produções historiográficas influenciadas pelo movimento dos
Annales.

29
Atenção!
Historiografia
Não deixem de ler o texto “A trajetória da
Escola dos Annales” no link www.2.uol.com.br/
cultvox/novos/novos_artigos/
trajetória_annales.pdf

Os Annales e as fontes históricas

A documentação será agora relativa ao campo econômico-social-mental: é massiva,


serial revelando a longa duração. Os documentos referem-se à vida cotidiana das massas
anônimas, á sua vida produtiva, às suas crenças coletivas. Os documentos não são mais
ofícios, cartas, editais, textos explícitos sobre a intenção do sujeito, mas listas de preços, de
salários, séries de certidões de batismo, óbito, casamento, nascimento, fontes notariais,
contratos, testamentos, inventários.
Ou seja, a documentação massiva e involuntária é prioritária e em relação aos
documentos voluntários e oficiais. Todos os meios são tentados para se vencer as lacunas
e silêncios das fontes.

Os Annles foram engenhosos para inventar, reinventar ou reciclar fontes históricas.


Eles usavam escritos:

1. psicológicos
2. orais
3. estatísticos
4. musicais
5. literários
6. poéticos
7. religiosos

Utilizaram de maneira ousada e inovadora a documentação e as técnicas das diversas


ciências sociais:

· Da economia = arquivos bancários, empresas, balanços comerciais, documentos portuários,


documentos fiscais e alfandegários.
· Da demografia = registros paróquias, civis, recenseamentos.
· Da antropologia = os cultos, os monumentos, narrativas orais, hábitos de linguagem, livros
sagrados, iconografia, lugares sagrados, relíquias, gestos, medicina popular, processos da
inquisição, testamentos, vocabulários, folclores, rituais.
· Do direito = arquivos judiciários, processos criminais, arquivos eleitorais, correspondências
oficiais, a legislação.
· Da arquelogia = cerâmicas, tumbas, fósseis, paisagens, conjuntos arquiteturais, inscrições,
moedas.

Sobre as técnicas para o tratamento dessas fontes: teorias econômico-sociais, a


informática, reconstituição de famílias, análise estatística, modelos, inventários, lexicografia,
fotografia aérea, fenologia, dendrocronologia, carbono 14, genealogia, microfilme, gravador,
filmagem, etc. (DOSSE, A história em migalhas, 1887; BURKE, A Escola dos Annales, 1990).

Os historiadores e a utilização das fontes

30
Como se deve manusear adequadamente as fontes históricas?
Vejam alguns exemplos de fontes:

a) documentais de arquivos (cartoriais, eclesiásticos, judiciários, etc);


b) impressas (jornais, revistas);
c) orais (entrevistas);
d) audiovisuais e musicais (rádio, cinema, televisão).

Para se utilizar da melhor forma possível os documentos de arquivos, recomenda-se


o seguinte:

a) conhecer a origem dos documentos (estudar o funcionamento da máquina administrativa


para entender o contexto de produção dos documentos);
b) preparar-se para enfrentar as condições de trabalho do arquivo escolhido (alguns
encontram-se em difíceis condições de trabalho);
c) usar luvas, máscaras e avental e lupas de aumento no contato direto com os documentos;
d) manusear os papeis com cuidado, respeitando seus limites;
e) buscar familiarizar-se da caligrafia, se for possível aprender paleografia;
f) Cruzar fontes, cotejar informações, justapor documentos, relacionar texto e contexto;
g) Observar as regras existentes de transcrição e edição, anotar a refrencia do documento
indicar todos os dados que permitam identifica-lo.

Para os impressos, orientamos assim:

a) constituir uma longa e representativa série de jornais ou revistas


b) atentar para periodicidade, uso ou ausência de iconografia e de publicidade
c)caracterizar o grupo responsável pela publicação
d) identificar os colaboradores
e) informar a que público se destinava

Sobre as fontes orais, recomendamos:

a) familiarizar-se com as discussões acadêmicas sobre o tema e da metodologia de História


oral, levando em consideração as reflexões dos estudiosos a respeito de: polarização simplificada
entre “memória oficial” e “memória dominada”; considerar as condições de produção da fonte
oral (aliás o que deve se fazer com qualquer fonte);
b) definir que tipo de pessoa será entrevistada, quantos e qual o tipo de entrevista será
realizada;
c) elaborar uma listagem extensa e flexível das pessoas que serão entrevistadas (é bom
que as pessoas sejam de diferentes origens, classes sociais);
d) Reservar um tempo relativamente longo para a realização das entrevistas, assim como a
elaboração de roteiros com perguntas também flexíveis, abertas, diretas;
e) Não esquecer o documento de cessão de direitos (autorização do entrevistado para
publicar as informações contidas na entrevista);
f) Duplicar a gravação e transcrever a fita e editar o texto se for para publicação;

A respeito das fontes audiovisuais e musicais deve-se:

a) compreender a linguagem técnico-estética dessas fontes e as representações da realidade


histórica ou social nela contidas;
b) organizar a ficha técnica e explorar gênero, suporte, origem, data, autoria, conteúdo,
acervo;
c) analisar letra, estrutura musical, sonoridade vocais e instrumentais, visuais. (PINSKY,
2005).

31
Historiografia

Principais contribuições dos annales

Para Burke, 1997, a principal proposta dos Annales foi a interdisciplinaridade e as


suas três gerações – apesar das divergências e descontinuidades – fizeram uma história
sob a influência das ciências sociais. Vejam com suas próprias palavras:

“Da minha perspectiva, a mais importante contribuição do


grupo dos Annales, incluindo-se as três gerações, foi expandir o campo
da história por diversas áreas. O grupo ampliou o território da história,
abrangendo áreas inesperadas do comportamento humano e a grupos
sociais negligenciados pelos historiadores tradicionais. Essas
extensões do território histórico estão vinculadas à descoberta de
novas fontes e ao desenvolvimento de novos métodos para explorá-
las. Estão também associadas à colaboração com outras ciências,
ligadas ao estudo da humanidade, da geografia à lingüística, da
economia à psicologia. Essa colaboração interdisciplinar manteve-
se por mais de sessenta anos, um fenômeno sem precedentes na
história das ciências sociais.” (BURKE, 1997, p.126).

Burke ainda acrescenta que depois do movimento dos Annales, a historiografia nunca
mais foi a mesma.
Entretanto, Reis (2000) considera que a grande mudança produzida pelos Annales
foi a nova representação do tempo, exigida pela prática da interdisciplinaridade. (Braudel,
Escritos sobre a História, 1978).
As ciências sociais opõem-se à visão da história como a construção linear e acelerada
do futuro. Contra a abordagem teleológica, as ciências sociais preferirão uma “abordagem
estrutural” do tempo histórico.

Relação entre tempo histórico e conhecimento histórico

1. A percepção das experiências humanas cria a representação do tempo histórico.

32
2. A representação do tempo histórico é condição subjetiva do historiador e da sua sociedade,
sobre a qual todas as experiências se tornam inteligíveis.
3. O tempo histórico enquanto tal é uma abstração. Ele só existe em relação a uma época
histórica determinada e a uma construção simbólica determinada.
4. Não se tem o “tempo histórico enquanto tal”, mas um “tempo histórico do qual se fala”.
5. O tempo histórico se dá a uma representação histórica.

Donde se conclui que:

Toda renovação em história, toda “escola histórica”


realiza uma mudança profunda na representação do tempo
histórico, apoiadas em mudanças ocorridas na história efetiva. É
esta reconstrução que permite a renovação teórico-
metodológica da história, pois é a partir dela que se
distinguem novos objetos, que se formulam novos problemas e
reformulam-se os antigos, que se constroem novas abordagens.
Enfim a hipótese, em sua terceira formulação: relação
tempo histórico e conhecimento histórico.

O conhecimento histórico só se renova, uma “nova história” só aparece quando se


realiza uma mudança significativa na representação do tempo histórico.
O tempo histórico, portanto, parece-nos o centro e a base de toda reflexão sobre a
pesquisa histórica. Muda-se a perspectiva sobre esse centro e base, uma outra história
emerge, com novos historiadores, novos objetos, novas fontes, novas técnicas e uma nova
utopia.
Quando aos annales, em decorrência dessa hipótese geral, eles só representaram
uma renovação teórico-metodológica e “utópica” em relação à história tradicional porque
teriam produzido, sob a influência das ciências sociais, uma nova representação do tempo
histórico. (Reis, 1994, Tempo, História e Evasão).

A INFLUÊNCIA DOS ANNALES PARA O HISTORIADOR ATUAL


· história total e a ampliação e diversificação do
conceito de fontes;
· abertura de fronteiras temáticas;
· construção da “história problema”;
· interpretação, a busca dos “porquês” , indo além
do “o quê” e do “como” da história tradicional do século
XIX.

Recapitulando, foi Em 1929, que a revista Anais da História Econômica e Social,


dirigidas por Marc Bloch e Lucien Febvre, provocou um turbilhão no domínio da historiografia,
transformando-se no principal acontecimento do século nesse âmbito.
O “movimento dos Annales”, surgido como desdobramento da revista fundada ao
final dos anos vinte por Bloch e Febvre, só passou a ser reconhecido como um movimento
a partir da “segunda geração” e como desdobramento da liderança acadêmica de Fernand
Braudel.
Peter Burke, 1997, autor de várias obras sobre o que chama de “revolução francesa
da historiografia”, descreve as linhas diretrizes do movimento nos seguintes termos:

“Em primeiro lugar, a substituição da tradicional narrativa de acontecimentos por uma


história-problema. Em segundo lugar, a história de todas as atividades humanas e não apenas

33
história política. Em terceiro lugar, visando completar os dois primeiros objetivos, a
colaboração com outras disciplinas, tais como a Geografia, a sociologia, a psicologia,
a economia, a linguística, a antropologia social, e tantas outras.”. (BURKE, 1997.
p.11-12)
Historiografia
Vimos que sob a proclamação de que “a história é filha de seu tempo”
e defendendoa necessidade de “uma história mais abrangente e totalizante”,
os franceses Marc Bloch e Lucien Febvre lideraram a fundação da revista
Annales, a qual terminou por promover uma verdadeira revolução no fazer
historiográfico, resultando no aparecimento de uma outra concepção de história: a História
Nova. É certo que o termo História Nova é problemático, na medida em que ignora as
contribuições dos antecessores de Bloch e Febvre e, principalmente, porque propõe uma
unidade que não existe. Como já foi apontado, sob o guarda-chuva da Nova História são
enquadradas e igualadas propostas historiográficas não apenas diferentes como conflitantes,
do que são exemplos os postulados de Le Goff e Vovelle sobre mentalidades ou, mesmo,
os modelos de História Cultural de Thompson e Foucault. Os conflitos e as desavenças
entre historiadores da escola marxista ortodoxa e os herdeiros da Escola dos Annales –
ainda que entre estes estejam marxistas da estirpe de Michel Vovelle – têm obscurecido e
prejudicado o debate historiográfico.
É comum associar-se a herança historiográfica de Bloch e Febvre à História das
Mentalidades e/ou à História do Cotidiano, entretanto é mais correto considerar que é
bastante vasto o campo abarcado hoje pela renovação historiográfica que se iniciou nos
anos trinta. Normalmente estas novas correntes são, todas, enquadradas no grande ícone
“História Cultural” ou, quando muito, “História Sócio-Cultural”.
Observamos anteriormente que a terceira geração dos Annales – década de 60 a 80
– se consentram os estudos nos hábitos, costumes, crenças, rituais, bem como do amor, do
sexo, do casamento, da magia, da religião, da morte. Esse é um momento de preocupação
com a história que mudava lentamente, e é a essa geração que ficou denominado Nouvelle
Histoire, (Nova História) apesar de a idéia de uma história renovada já estar presente nos
textos-manifestos dos primeiros momentos da revista, ainda no tempo de Bloch e Febvre.
Franceses como Jacques Le Goff, George Duby, Jean-Louis Fladrim, Philippe Ariés
traduzem nas suas obras a preocupação latente com uma historiografia do cotidiano, com
uma história das mentalidades. Esse quadro de renovação não se limita à França. Na
Inglaterra outros autores como E. P. Thompson, Christopher Hill, Eric Hobsbawm procuraram
pontos de ligação entre a antropologia e categorias marxistas, assim como na tradição
socialista de uma história dos movimentos sociais. (SOUZA, 1986).
É dessa forma que o estudo do cotidiano e das mentalidades vai ganhando o estatuto
da análise das ações humanas enquanto repetição, manutenção e entraves, muitas vezes
de transformações mais radicais das sociedades, o cidadão comum, independentemente
de raça, credo ou condição econômica, passa a ser visto como um agente histórico.
Contemporaneamente o ensino da História, articulado a estas inovações teóricas,
convive com a possibilidade de trazer para o ambiente da sala de aula novas temáticas,
como a história da infância, a família, as “minorias”, a festa, a moda, a culinária, o cotidiano
e as “mentalidades coletivas”. O mercado editorial, também acompanhando estas mudanças,
tem oferecido livros didáticos que já contemplam estas novas temáticas. Para esta pesquisa,
o desafio de articular práticas pedagógicas a estas novas referências esteve vinculado ao
papel que as referências pós-estruturalistas reservam para o ensino de história:
Estes assuntos poderão ser estudados de maneira mais aprofundada, no Tema 4.
Resumidamente, Marc Bloch clamava por uma história-problema, profunda e total.
Esta história seria alcançada pela formulação de perguntas pertinentes por parte do

34
pesquisador, a partir das quais ele questionaria o passado, através da aliança com as
ciências sociais.
Considere-se que a intenção de abordar aspectos relativos à vida dos homens em
sociedade, que transcendem a esfera política e exige métodos e técnicas de investigação
e análise dos quais a história absolutamente não dispunha, tornando portanto fundamental
essa “aliança a serviço da história”, com o intuito de incorporar metodologias compatíveis
para investigar novos temas e objetos.
Lembramos que uma das principais contribuições dos Annales assim como da Nova
História foi a INTERDISCIPLINARIDADE
A primeira fase dos Annales que se inicia em 1929 mostrou um certo domínio de
diálogo com a Sociologia. No segundo momento, período Braudel, a aproximação maior foi
com a Economia. E no terceiro momento os diálogos foram com a Antropologia.
A Antropologia e a Histórica, uma das principais junções interdisciplinares da nova
escrita da história.

É a antropologia histórica, pois os historiadores aprenderam muito com


os antropólogos...

Por exemplo, Cliford Geertz com a sua “descrição densa” no livro “A Interpretação
das Culturas”. Analisa-se um microfenômeno, um ritual, uma obra, um evento buscando
características que definem a sociedade da qual estão inseridos via mediação dos
significados da cultura. Um método parecido com o da etnografia.

Um exemplo deste tipo de estudo,


ainda que pese a dimensão mais ampla e
menos antropológica, é livro de Georges
Duby sobre a batalha de Bouvines em 1214
“O Domingo de Bouvines”.

Esta história está inserida na “Nova História Cultural”, sucesso nos EUA e destaque
para os historiadores Natalie Zenon Davies e Robert Darnton. Metodologicamente estes
historiadores fazem uma aproximação entre a história e a antropologia, mas também refletem
uma reação contra a velha histórica política que não dava espaço ao povo, assim como a
história de alguns historiadores dos Annales que privilegiava as dimensões econômicas,
demográficas e sociais em detrimento da cultura.
Altera-se também a noção de temporalidade, com ênfase na longa duração, ou no
tempo longo, na sucessão sem mudança.
José Carlos Reis, 2000, considera que Bloch foi o primeiro dos “novos historiadores”
a ter inserido a dimensão da permanência na história e a romper com a noção de tempo
histórico tradicional, na qual o fato, o acontecimento imediato ocupa lugar central.

Novos objetos, fontes e problemas.

Fernand Braudel da chamada segunda geração dos Annales, ocupou a direção da


Revista dos Annales dos anos 50 e 60. Este é o período de apogeu dos estruturalismos, de
viés Antropológico (Lévi Straus) ou Marxista.
O método quantitativo é a tônica, para análise de fontes históricas. A informática é
grande colaborador dessa história.

35
O tempo “quase imóvel” das estruturas, que ocupa posição de destaque
em suas obras. Ainda que não exclua o evento situando-o em um nível de
menor importância.
Historiografia A década de 1960 foi marcada por vários conflitos sociais, e segmentos
como

mulheres, homossexuais, indígenas e os jovens,

Ou seja, a diversidade comportamental combinava com modelos preestabelecidos.


Essa nova realidade social não passaria em branco pelos intelectuais da época e no final
dessa década e com as transformações futuras a história com ênfase na estrutura de longa
duração, assim como a história com tendência marxista. Nesse momento surgem teóricos
como Foucault que defende o relativismo na histórica, questionando a eficácia dos métodos
quantitativos para a análise de fontes históricas. Tal metodologia que permite o estudo dos
homens comuns, também, encobrem as particularidades individuais, ou seja, o viés cultural.
A abordagem cultural é a marca da terceira geração dos Annales ou Nouvelle
Nouvelle Histoire ou Nova História. Durante a década de 70 e 80 a Revista dos Annale vai
receber a contribuição dos historiadores, Jacques Le Goff, Le Roy Ladurie, Robert Mandrou,
Jacques Revel dentre outros. Nesta fase a produção histórica foi avaliada e reelaborada
teórico e metodologicamente.

O conhecimento histórico
produzido nesse período enfatiza a
interdisciplinariedade, porém não propicia
uma história total e globalizante,
defendida pelas gerações anteriores, e
sim uma história fragmentada, cuja crítica
está no livro de François Dosse “História
em Migalhas”.

Peter Burke (1997) e em artigo intitulado “Gilberto Freyre a Nova História” afirma que
Freyre antecipa a “Nova História”, ao passo que já nos anos 30 ele “trabalha com tópicos
como a família, sexualidade, infância e cultura material (alimentação, vestimenta e
habitação)”. (Revista Tempo Social, 1997). Esta antropologia histórica de Gilberto Freyre e
seu interesse pelas mentalidades foram reconhecidas por Braudel quando descobriram a
obra e Freyre “Casa Grande e Senzala”, no fim dos anos 30.
O interesse por acontecimentos imediatos, assim como por personagens individuais,
reaparece, além da preocupação com o aspecto literário da escrita da história. Dessa forma
questões como totalidade social, globalidade, recorte territorial, longa duração, ênfase na
perspectiva social, são progressivamente abandonadas dando espaço para novas
concepções.
É o retorno da narrativa história...

Sites
Vejam o artigo sobre interdisciplinaridade nos links:
www.netflash.com.br/pessoais/cleal/complexidade.html.
www.crmariocovas.sp.gov.br/itd_l.php?t+001

36
Questão 1
[ ] 
Agora é hora de
TRABALHAR

O que você acha da questão interdisciplinar? Reflita sobre a interdisciplinaridade na


história e a importância desta no mundo atual.
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Questão 2
A busca do historiador em atravessar as fronteiras das Ciências Sociais, porém
correndo o risco de se perder enquanto disciplina específica. Reflita.
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Questão 3
Caro aluno, com base nos textos mencionados acima, responda com base nas suas
práticas atuais na disciplina de história. Veja se você está enquadrado no perfil
TRADICIONAL ou da NOVA HISTÓRIA?
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37
A NOVA HISTÓRIA CULTURAL
Historiografia
E A HISTORIOGRAFIA
BRASILEIRA

HISTÓRIA NOVA E HISTÓRIA CULTURAL

Uma breve recapitulação acerca das mudanças empreendidas no


paradigma da produção historiográfica no século XX

Neste tema, partiremos dos desdobramentos da História Nova como a


interdisciplinaridade e a aproximação da História com a antropologia. Por fim discutiremos
o despertar, os problemas e os desafios da narrativa histórica na produção historiográfica
contemporânea.
Vimos que em 1929, a revista Anais da História Econômica e Social, dirigidas por
Marc Bloch e Lucien Febvre, provocou um turbilhão no domínio da historiografia,
transformando-se no principal acontecimento do século nesse âmbito.

Lembram dos Annales?

A Escola dos Annales quebrou de uma vez por todas a visão tradicional ao chamar
para si outros eixos históricos: dados econômicos, estatísticas, modelos sociológicos, como
nunca havia sido feito anteriormente. Na verdade, os Annales se reivindicaram e se
posicionaram como a verdadeira Ciência Humana, na medida em que congregaram métodos
e experiências de todas as disciplinas da área:

Sociologia, Psicologia, Geografia,


Antropologia, as Artes.

A influência dos geógrafos é notória, por exemplo, no trabalho de Fernand Braudel,


sobre o Mediterrâneo. Pensemos na importância da cartografia para a História Nova, grande
produtora de mapas de pesquisa e de explicação em detrimento dos antigos mapas
ilustrativos e de orientação.
Tudo é válido para se entender o universo humano em sua plenitude e
complexidade!!!!!!!
Vale ressaltar, que mesmo sendo conhecida como uma Escola, os Annales nunca se
constituíram como um corpo fechado de doutrinas restritas. Cada membro, cada ensaísta
da revista, possuía suas próprias opiniões, fazia suas próprias pesquisas, abria seus próprios
caminhos.

Atenção!
Para Peter Burke, é possível que fosse mais
correto falar de “movimento” dos Annales em vez
de “escola”.
38
ABERTURA DE NOVAS POSSIBILIDADES DE FONTES, NOVOS
OBJETOS, NOVOS PROBLEMAS, NOVAS ABORDAGENS

Veremos a seguir com a História Nova a utilização, por parte dos historiadores, além
dos documentos escritos fartamente utilizados, o uso de produtos de escavações
arqueológicas, documentos orais (depoimentos).

“Uma estatística, uma curva de preços, uma fotografia,


um filme, ou um pólen fóssil” (para um passado mais distante).
Le Goff

Vocês estudaram também que Braudel, a frente da “segunda geração dos Annales”,
rejeitou e desprezou o conceito de uma história regionalista e minúscula. Amplia essa visão
ao considerar a História como o conhecimento dos grandes movimentos humanos ao longo
de enormes períodos de tempo e, dessa forma, fazendo com que as mudanças abruptas e
repentinas, as revoluções que constantemente criariam novos mundos, praticamente
desapareçam. Um movimento, lento, largo, abrangente. É a História de Longa Duração.
Entendendo assim, tudo é possível nessa História, com:
a) todos os dados disponíveis (FONTES/EVIDÊNCIAS).
b) todas as ciências conhecidas (INTERDISPLINARIDADE).
c) todos os países do mundo. (HISTÓRIA TOTAL)

Os tempos mudam; os desafios teóricos, metodológicos, sociais e humanos também.


As necessidades enfrentadas pela Nova História não são as mesmas de um Bloch, um
Fèbvre, um Braudel. Estamos em um mundo que vive a queda de antigos paradigmas, um
pessimismo generalizado, um subjetivismo e um RELATIVISMO absoluto.

A História Nova

“A nova história dos homens e das mentalidades,


idéias e eventos pode ser vista mais como complementar
que como substituta da análise das estruturas e
tendências socioeconômicas”.
(Eric Hobsbawm)

Não há espaço para teorizações totalizantes e abrangentes. A História Nova diferencia-


se da tradicional em seis pontos:

I. o paradigma tradicional diz respeito somente à história política, a


História Nova, preocupa-se com uma história total, onde tudo é histórico;
II. a história tradicional pensa na história como narração dos grandes
fatos, a nova preocupa-se em analisar as estruturas; a tradicional olha de
cima, a nova, de cima, de baixo e de outros ângulos possíveis;
III. documentos oficiais são os que interessam ao paradigma
tradicional, o paradigma da História Nova aceita qualquer espécie de
documento;
IV. o historiador tradicional explica por meio da vontade do indivíduo
histórico, História Nova preocupa-se com os movimentos sociais;
V. finalmente, o paradigma tradicional considera a História uma ciência
objetiva, com três pressupostos básicos: conhecimento histórico é verdadeiro;
passado é fixo o qual é adquirido através de um método. O paradigma novo
não crê na possibilidade de uma objetividade total.

39
Alguns problemas da História Nova

Historiografia A Nova História apresenta problemas relativos à definição. Porquê


isto?

Posto que os historiadores estão avançando em um território não


familiar, estão pouquíssimo habituados a relacionar acontecimentos e
estruturas, quotidiano e mudança, visão de cima e visão de baixo.
Problemas relativos ao uso fontes também são apontados, essas novas fontes
precisariam de uma nova crítica, de um novo método de trabalho.
Percebemos também problemas de explicação e de síntese, donde a explicação
estrutural, apesar de aumentar a interdisciplinaridade, muitas vezes não toma conta do fluxo
do tempo, o qual é uma das preocupações do historiador, além disso, está cada vez mais
difícil conseguir uma síntese, em decorrência da profusão de diferentes objetos.
A História fragmenta-se, despedaça-se, esmigalha-se, move-se por temas.
Separada, destruída, desumanizada, feita em pedaços: História em Migalhas, portanto, é a
história do Medo, Jovens, Poder, Sexualidade, Religiosidade, Estruturas, Mulheres,
Alimentação, Livro, Mito, entre outras. É a vez da “Micro-História” tão desprezada por Braudel.
O que se convencionou chamar “História Nova” teve um atrativo a mais, além da
inteligente e aguçada aproximação com outras ciências humanas, com a antropologia, a
sociologia, a geografia e a economia, para não alongarmos, a História Nova adotou a
narrativa como forma de expressão e, com isso, aproximou-se de um grande público.
Como resultado dessa “nova forma de fazer história” conquistou-se mais e mais
leitores, para temas históricos. Destaque para os festejados livros organizados por Jacques
Le Goff e Pierre Nora: “História: novos problemas”, “História: novos objetos” e
“História: novas abordagens”, todos de meados dos anos 701.
Entretanto foi em 1978 sob a coordenação de Jacques Le Goff, 2001 que apareceu
“A História Nova” fascinante coletânea com nomes como: Michel Vovelle, explicando o
que é a longa duração, os tempos da história e sua dialética; Philippe Arriès e a história
das mentalidades; André Burguière, trabalhando sobre as relações de história e
antropologia; Evelyne Patlagean e as entradas pelo campo pantanoso do imaginário;
Guy Bois e as relações entre o marxismo e a nova história.
Segue ainda com as abordagens de Jean Claude Schmitt, falando sobre a
necessidade premente de estudar os chamados “marginalizados” na história, entre outros.

A influência da Nova História

Os livros influenciados pela Nova História são saborosos e interessantes de ler, o


que justifica o sucesso alcançado, sobretudo através de duas linhas de pesquisa:

1. as obras que recuperam a narrativa (abandonada pelas


pretensões supracientíficas daqueles que tratavam desta disciplina
que possui um objeto tão complexo, o homem).
2. por tratar-se de obras que se debruçam por temas,
relativamente, estudados (o campo das mentalidades), outros
diriam das culturas.

Para ler mais a esse respeito, ver o livro


de Peter Burke,
A Escola dos Annales: a revolução
francesa da historiografia.
40
E as críticas?

É inútil tentar transmitir, a importância desse livro, faz-


se obrigatório a sua leitura e crítica, e conseqüentemente o
descobrimento das suas lacunas. François Dosse, um dos mais
ferrenhos críticos da Nova História, a qual denominou de “história
da perfumaria” e “história em migalhas”.

François Dosse bateu de frente e com muita força na Nova


História, a corrente historiográfica francesa conhecida como a
Terceira Geração da Escola dos Annales. Como vocês puderam
acompanhar no tema anterior.
Na “A História em Migalhas”, título do seu livro, Dosse,
protestou, apaixonado e veemente, contra o que ele considerou
uma deturpação e destruição dos avanços e princípios teóricos
realizados pela geração anterior dos Annales.
O livro, no entanto, como qualquer clássico literário não
pode ser mexido e tornou-se um patrimônio da historiografia.

De “História em Migalhas” para hoje (2006) muita água


já rolou, muita coisa mudou, foi revista e passado a limpo.

E a nossa dívida para com a Nova História?

Pensemos nas barreiras rompidas permitindo que nos impregnássemos com a


antropologia, linguística, psicologia, sociologia, demografia, geografia e ecologia.
Essa interdisciplinaridade que se traduziu no surgimento de ciências compostas,
por exemplo: História Sociológica, Demografia Histórica, Antropologia Histórica, e ainda
psicolinguística, etno-história, entre outras.

O CARÁTER INTERDISCIPLINAR DA HISTÓRIA: A “DESCRIÇÃO


DENSA” DA ANTROPOLOGIA: POR UMA INTERPRETAÇÃO DA
CULTURA

O caráter interdisciplinar imprimido na escrita da história desde o “movimento dos


annales”, sem dúvida qualificou grandemente a produção historiográfica contemporânea. A
grande virada antropológica da historiografia ainda vista nos dias atuais dá-se a partir da
terceira geração dos Annales. A “antropologia histórica” de Andrè Burguière representa
esse novo campo.
Surgida em fins da década de 70 como uma reação à história quantitativa, caminhou
para a Antropologia cultural ou ‘simbólica’. Antropólogos como Pierre Bourdieu, Michel de
Certeau, Erving Goffman, Glifford Geertz vão influenciar os trabalhos dos historiadores
contemporâneos.
Uma parceria, uma troca interdisciplinar que só aumentou a qualidade das pesquisas
historiográficas. Temas como o medo, o corpo, a morte, a loucura, o clima, a feminilidade
etc., objetos de estudo desse novo historiador, o que na perspectiva da história tradicional
era algo praticamente impensável. Todos estes aspectos da vida humana dentro da
perspectiva cultural.
Nesse sentido, assinala Burke (1997, p.11):

41
O que era previamente considerado imutável é agora
encarado como uma ‘construção cultural’, sujeita a
Historiografia variações, tanto no tempo como no espaço [...]. A base
filosófica da nova história é a idéia de que a realidade é
social ou culturalmente constituída.

Um outro ponto que os novos historiadores e antropólogos


culturais parecem convergir é com relação à questão do simbólico.
Historiadores como Carlo Ginzburg e Robert Darnton em seus trabalhos, buscam
uma aproximação vantajosa com a Antropologia, sobretudo com uma “antropologia estrutural
simbólica”. Só para citar alguns: História Noturna: decifrando o sabá, de Ginzburg. O
grande massacre dos gatos e Outros Episódios da História Cultural Francesa, de
Darnton.
É importante ressaltar que esse diálogo com a Antropologia não quer dizer que o
historiador perca sua identidade, mas tão-somente utilize a disciplina vizinha para resolver
questões que os métodos da História não possuem, como, por exemplo, valorizar o que os
antropólogos chamam de “a visão do nativo”, para a partir daí entender os significados
implícitos na sua visão de mundo, assim como, a busca por formas simbólicas análogas em
sociedades diferente no tempo e no espaço etc.
Portanto, ao historiador cabe agir de forma interdisciplinar, sem, contudo, perder de
vista sua perspectiva histórica, processual e resolver os problemas historicamente.
A aproximação da história com a antropologia foi sem dúvida de extremo valor, na
medida em que alertou os historiadores para a importância em registrar cuidadosamente
os acontecimentos. O antropólogo Clifford Geertz cunhou a expressão “descrição densa”
para uma técnica de descrever concreta e precisamente práticas ou acontecimentos
particulares. No seu caso a descrição das brigas de galo em Bali.
Geertz se debruçou em seu livro “A interpretação da Cultura” argumentando acerca
da dificuldade em se conceituar cultura. Tratando-se de um conceito ambíguo, conflituoso e
polêmico como é o caso dos conceitos de democracia, religião, entre outros. O autor, em
estudos anteriores em Harvard, encontra 171 definições de cultura, classificáveis em 13
categorias. Dessa forma, Geertz vai defender um conceito de cultura essencialmente
interpretativa, a procura de significados.
Na antropologia questionada por Geertz, executa-se um trabalho etnográfico de
“estabelecer relações, selecionar informações, transcrever textos, mapear campos, levantar
genealogias, manter diário, e assim por diante”. O esforço intelectual dele consiste na
elaboração de uma “descrição densa”. (GEERTZ, 1978, p.10).
Os textos antropológicos que acompanham a lógica de Geertz são interpretações
de segunda e terceira mão. Dito de outra maneira, os textos
apresentam-se como construções, e na análise cultura, a linha
entre a representação e o conteúdo palpável é extremamente
tênue. Chega-se a partir de uma densidade textual a partir
da anotação do discurso social, que consiste em observar,
registrar e analisar. Para o historiador, o interessante seria
a realização de uma narrativa bastante densa, na qual
abarcaria para além da seqüência dos acontecimentos e
das ações dos atores (nesses acontecimentos) também as
estruturas – instituições, modos de pensar, etc. – e qual a
relação entre ambas (acontecimentos e estruturas). Os romances

42
históricos ilustram muito essa questão. Pensem em: “Guerra e Paz” de Tolstoi. 2

Cabe alguns lembretes rápidos:

As chamadas “micro-narrativa” ou “micro-história” que são narrações de uma história


sobre as pessoas comuns no local em que estão instaladas são métodos comumente
explorados pelos romancistas históricos. Os historiadores não são livres para inventar seus
personagens, ou mesmo as palavras e os pensamentos de seus personagens como
freqüentemente os romancistas o fizeram. Diferente do antropólogo, o historiador tem a
experiência na crítica dos documentos e na percepção do tempo e da mudança.
A História das Mentalidades tem sua trajetória marcada por três momentos, faremos
a seguir um breve resumo:

1) o primeiro abarca os anos trinta e quarenta, estando ligada ao seu surgimento e afirmação
enquanto disciplina voltada para o estudo da “psicologia histórica”. Neste momento a disciplina
vincula-se aos nomes de Bloch e Febvre, responsáveis pela aproximação da história com a
antropologia de Levy-Brhul, a qual dotará a história do conceito de “outilage mental” ou “mentalidade
pré-lógica”;

2) a segunda, abarcou as décadas de cinqüenta e sessenta, refere-se ao declínio do prestígio da


disciplina. Naquele momento dois fatos explicam o tal declínio: a ascensão acadêmica de Fernand
Braudel, momento em que os Annales serão mais acentuadamente invadidos pela influência marxista,
e a própria necessidade que os adeptos da história das mentalidades sentem de refugiar-se das
críticas, que então se acentuam. Essa tendência marxista, cujo principal representante é Michel
Vovelle, propõe a substituição do conceito de “inconsciente coletivo” trabalhado por Le Roy Ladurie
pelo de “imaginário coletivo”;

3) finalmente, num momento que se inicia nos anos setenta e que ainda não se concluiu, a História
das Mentalidades se transmuta em “História Cultural”, quando então vai conhecer três tendências:
a micro-história de Ginzburg, a história cultural de Chartier e a nova história do trabalho de Thompson.

Enquanto disciplina que relacionada ao método historiográfico, a História das


mentalidades apresenta os seguintes pressupostos teóricos:

a) vocação à interdisciplinaridade, aproximando-se


principalmente da psicologia, da Lingüística, da demografia e
da estatística;
b) ampliação do campo documental, que se alarga a
ponto de enquadrar, como objeto da História, até mesmo o
subconsciente;
c) quantitativismo, baseado em fontes singulares (como
o Rabelais, em Febvre) e em série.

São creditados a Le Goff os conceitos subjacentes à História das Mentalidades:

I) a mentalidade é igual em todos, não se


diferenciando em razão da posição social;
II) o objeto das mentalidades é o inconsciente
coletivo;
III) o método das mentalidades é a pesquisa
arqueopsicológica;
IV) o tempo das mentalidades é a longa duração.

Não deixem de ler o artigo “História e romance


histórico: fronteiras”
www.bibvirt.futuro.usp.br/textos/hemeroteca/ 43
nor/nor0236/nor0236_07.pdf
Os dilemas com os quais a História das Mentalidades vai conviver, as
Historiografia
principais críticas que as farão perder prestígio são as seguintes:

a) Como articular longa duração e mudança?


b) Como articular o individual com o coletivo?

Estes questões serão respondidas, por Ginzburg e Thompson.


A História Cultural, atualmente trabalhada pelos historiadores tem como pressupostos
teóricos:
(1) a rejeição ao conceito de mentalidades sem
abrir mão do mental como objeto de estudo;
(2) a preocupação teórica com o popular e com a
informaidade, assim como com o resgate das classes
sociais.

As tendências atuais da História cultural estão representadas nos trabalhos de


Ginzburg (micro história), Thompson (nova história social inglesa) e Chartier (história das
representações).

NOVA HISTORIA CULTURAL E A NARRATIVA HISTÓRICA

Na História Nova, métodos como o do emprego de fontes orais sem dúvida ampliaram
o nosso escopo documental e conseqüentemente a expansão de novas temáticas.
Abre-se dessa forma um campo novo.
E vocês podem me questionar. Essa perspectiva cultural é realmente tão nova assim?
Será que essa abordagem é conseqüência do movimento dos Annales?
Peço-lhes que retornem aos historiadores dos séculos XVIII e XIX, por exemplo:
Legrand d’Aussy e Jules Michelet
Ambos, já desprezavam a história factual, dos acontecimentos, e se preocupam em
estudar uma história social dos costumes dos franceses, das
mentalidades; uma história com uma abordagem cultural, mais
estrutural que factual. A busca pela precisão factual com
embasamento em sólido aparato documental não excluía o
estilo, a narrativa, criando assim a ilusão de uma reatualização
do passado e dando a idéia dos “fatos falarem por si mesmos”.
Em 1782, Legrand d’Aussy, por exemplo, já demonstra
a sua insatisfação com o tipo de história que se vinha fazendo
até então, essencialmente política, voltada para os grandes
acontecimentos, para os feitos dos reis e generais.
Observem este trecho de Legrand d’Aussy em sua
História da vida privada dos franceses (3 vol.):

“Obrigado, pelos grandes acontecimentos que deve contar, a estudar o que não se oferece
a ele com certa importância, ele só admite na cena os reis, os ministros, os generais de exército e
toda aquela classe de homens famosos cujos talentos ou erros, esforços ou intrigas produziram a
infelicidade ou a prosperidade do Estado. No entanto, o burguês em sua cidade, o camponês em
sua choupana, o gentil-homem em seu castelo, o francês, enfim, no meio de seus trabalhos, de
seus prazeres, no seio de sua família e de seus filhos, eis o que não nos pode representar.”

44
Vemos nesse trecho a preocupação do autor em inserir nos estudos os chamados
grupos subalternos. Para o historiador cultural contemporâneo dos séculos XX e XXI, parece
algo muito pertinente e até certo ponto natural.
Dessa forma, de acordo com André Burguière (LE GOFF, 2001) essa citação acima
até poderia ser a expressão de Lucien Febvre ou até mesmo de Jacques Le Goff ou
ainda de um George Duby. Entretanto, vemos que se trata de um olhar etnológico no séc.
XVIII, que torna Legrand um historiador além do seu tempo.
Um outro precursor do que hoje conhecemos como nova história cultural é Michelet.
No séc. XIX, em meio a uma história positivista norteada por uma metodologia inspirada
nos moldes das ciências experimentais, onde o elemento básico era o fato histórico, ou
seja, o acontecimento; Michelet surge como um historiador que busca outros modelos de
explicação da sociedade, uma história da moda alimentar, da sensibilidade, do
comportamento das elites francesas no século XVIII, das mentalidades, enfim, uma história
etnológica, sem prescindir de estudar as camadas populares. Michelet defendia uma “história
da perspectiva das classes subalternas”, uma “história daqueles que sofreram, trabalharam,
definharam e morreram sem ter a possibilidade de descrever seus sofrimentos”. (BURKE,
2004, p. 19). O Povo, A Feiticeira, são títulos de dois importantes livros de sua vasta obra.
Representação como objeto histórico tornou-se uma das pedras angulares do
discurso histórico contemporâneo. Na noção de representação trabalhada por Chartier
ele lança mão para designar o modo pelo qual em “diferentes lugares e momentos uma
determinada realidade é construída, pensada, dada a ler” por diferentes grupos sociais
(CHARTIER, 1990, p.16). A construção das identidades sociais seria o resultado de uma
“(...) relação de força entre as representações impostas por aqueles que têm poder de
classificar e de nomear e a definição, submetida ou resistente, que cada comunidade produz
de si mesma”. (CHARTIER, 2002, p. 73).
Chartier (1990), em sua noção de representação, problematizada em suas diferentes
acepções atribui grande importância ao conceito durkheimiano-maussiano de
representações coletivas e à ênfase dada por Bourdieu às lutas por formas de
classificações sociais. Além das representações coletivas, Chartier destaca também a
acepção de representação política. Outras noções importantes são a de apropriação,
em particular cultural, no sentido antropológico. Esse autor está atento às mediações que
diferenciam os grupos sociais através da produção, da apropriação, dos usos e das práticas
culturais. Ele salienta como as estruturas objetivas são culturalmente constituídas ou
construídas, a sociedade sendo ela própria uma representação coletiva.
Essas reflexões consolidaram um campo de possibilidades que podemos chamar
de “História Cultural” e que colocam um problema importante: o modo como as
representações sobre o social são operadas de forma ativa na construção do mundo
objetivo.
Assim sendo, as representações do social - profundamente históricas e políticas –
variam conforme o contexto em que são produzidas e os interesses partilhados pelo grupo
que as forjou. As percepções do social, segundo Chartier (1990), não seriam discursos
neutros, elas produzem estratégias e práticas (sociais, escolares, políticas) que tenderiam
a construir uma autoridade à custa de outros, legitimando um projeto reformador ou
justificando, para os próprios indivíduos, as suas escolhas e condutas.

45
Historiografia

OS MODOS DE ESCREVER HISTÓRIA: ALGUNS DEBATES


EXISTENTES AO REDOR DA HISTÓRIA E NARRATIVA E AS
PRINCIPAIS TENDÊNCIAS
“Uma das marcas do bom historiador profissional é a
firmeza com que ele lembra a seus leitores a natureza puramente
provisória das suas caracterizações dos acontecimentos, dos
agentes e das atividades encontrados no registro histórico sempre
incompleto.” (Hayden White)

A NARRATIVA HISTÓRICA - O retorno de formas de explicação histórica


proposta pelo paradigma da Nova História

Faz-se necessário uma leitura apurada dos textos que seguem, contextualizando-o
dentro do tema proposto, para auxiliá-lo nesta compreensão.

Qual seria a definição de narrativa histórica?

46
A narração clássica, tradicional apresentava os trabalhos historiográficos
centralmente como uma sucessão temporal de acontecimentos descritíveis. Era uma
narrativa de cronistas de viajantes de coisas passadas. A Narrativa histórica trata-se da
junção de uma narrativa em que se privilegia a seleção, descrição e explicação de objetos
e causas históricas, com um trabalho teórico mais complexo de utilização de conceitos e
generalizações histórico-causais. A narrativa história, então, é o resultado do trabalho
historiográfico.
Então, de acordo com a definição de narrativa histórica, podemos perceber que
todo trabalho historiográfico pode ser definido como uma narrativa. Portando, todo historiador
realiza uma narrativa, e o comprometimento desta com o conjunto do seu trabalho poderá
ser essencial ou secundário em relação aos seus objetivos teóricos.
Os precursores dos Annales, (Febvre e Bloch) rejeitavam a “história narrativa”. Na
visão de Febvre o fato histórico identificado como acontecimento encontrado na fonte levaria
o historiador a conceber a realidade histórica como narrativa de ficção, na medida em que
as fontes seriam tomadas acriticamente. Para Bloch a “história narrativa” ou narrativa
histórica seria apenas os fatos fornecidos pelos documentos expressando assim o ponto
de vista dos próprios atores do acontecimento narrado.
Isso significa que a história narrativa opta por uma crítica a uma ciência histórica
excessivamente concentrada em estruturas e processos, com forte embasamento teórico e
com procedimentos analíticos. Ou seja, uma estrutura temporal de textos e argumentações
históricas.
Dessa forma, narrar pode ser entendido como uma forma de exposição, na qual a
sucessão temporal de acontecimentos descritíveis e de ações compreensíveis ocupem um
lugar central, e não a análise de estrutura e processos, mesmo que se possa tentar lançar
luz sobre estas estruturas e processos através da narração e acontecimentos e ações.

Apresentamos, também, outros sentidos do conceito de “narração”:

Como se distingue a história narrativa da estrutural?


1. maior disposição descritiva do que analítica.
2. enfoque central no homem e não em circunstâncias.
3. preferência pelo tratamento do particular e específico
em detrimento do total, coletivo e estatístico.

Da Nova História para o retorno da modalidade narrativa

O historiador inglês Lawrence Stone, com o seu artigo intitulado “O Ressurgimento


da narrativa, reflexões sobre uma nova velha história”, 1979, em muito têm contribuído para
transformar a narrativa histórica em um tema de debate. O autor apresentou as afinidades
entre o discurso histórico a o discurso ficcional.
O século XX, aquele da exaltação à verdade científica nas ciências humanas colocou
em descrédito a narrativa. Mas as crises existenciais dos historiadores saturados de
hierarquias, estruturas, modos-de-produção, etc, suscitaram a volta da narrativa.

Um retorno à narração?

O filósofo francês Paul Ricoeur, certamente, têm razão quando declara que toda a
história escrita, incluindo a chamada história “estrutural” associada a Braudel,
necessariamente possui algum tipo de forma narrativa.

47
Já nos anos 70 volta uma tendência à história narrativa, porém com
Historiografia nova roupagem, com um viés antropológico, da qual mencionamos em textos
anteriores. Um dos melhores exemplos desta nova forma de escrita da história
– a narrativa - concentra-se no livro do historiador medievalista francês,
Georges Duby, “Guilherme Marechal, ou o Melhor cavaleiro do Mundo”, já
editado no Brasil.

De que trata este livro?

É a vida de um cavaleiro de pequena nobreza,


ambientado no século XIII. O texto de forte oralidade deixa
o leitor ansioso pelo desenrolar da trama. Duby, nesse
livro, majestosamente, utiliza-se a arte de narrar e o rigor
historiográfico, vinculando a história das mentalidades à
antropologia.

Quais as razões principais do retorno da narrativa?

1. Acessibilidade ao público não especialista (sem preparo


para tabelas não digeríveis e argumentos analíticos áridos).
2. Um público culto, porém não especializado, já que entre
os próprios historiadores não se chegaria a um mercado
significativo, não estouraria o mercado editorial como algumas
obras fizeram. Um público leigo na história e profissional em outra
área, causando uma interação com as demais ciências humanas.

Resumindo:
Constata-se atualmente uma impressionante reativação do
interesse pela história narrativa por parte de um público mais
amplo e ao qual a história profissional, altamente especializada e
com tendência para a história estrutural, analítica, não responderia.
Um outro ponto importante apontado pelos que exigem
mais narração, refere-se às deficiências nas obras historiográficas
mais analítica dos últimos anos, a qual sua ênfase na orientação
teórica, pareciam áridas e desinteressantes para o público não-
profissional. Estas produções são comumente chamadas de “obras
de divulgação”.
Recentemente no Brasil, os livros de Eduardo Bueno “A
Viagem do Descobrimento: A Verdadeira História da Expedição de Cabral”
e “Náufragos, Traficantes e Degredados - As Primeiras Expedições ao
Brasil”.

48
VEJAMOS, DE MANEIRA BREVE, DO QUE
ESSES LIVROS TRATAM:

A primeira narrativa, A Viagem do


Descobrimento - A Verdadeira História da
Expedição de Cabral, trata em forma de aventura, da
busca de um novo mundo pelos portugueses. Nesse
livro pode se vislumbrar detalhes sobre a viagem; o
cotidiano dos homens que chegaram no Brasil com
Cabral (tais como aventureiros, soldados, sacerdotes
e degredados). Aparecem também curiosidades sobre quanto recebiam,
como se alimentavam e os propósitos que os moviam, assim como
os dos homens que, longe de estarem sofrendo as vicissitudes da
viagem eram os responsáveis pelos planos que acarretaram na
expansão marítima portuguesa.
A segunda, Náufragos, Traficantes e Degredados – As
Primeiras Expedições ao Brasil, aborda detalhadamente o período de
nossa história compreendido entre 1500 e 1531. Um período escasso de
registros e estudos, no qual é retratada a saga vivida pelos primeiros
europeus que aqui chegaram; de que maneira eles terminaram por
constituir-se nos primeiros brasileiros, já que segundo Eduardo Bueno,
sua atuação direta nos acontecimentos, como por exemplo, no comércio
indiscriminado de pau-brasil ou na exploração do Prata (dentre tantos
outros) vai contribuiu para definir os caminhos do iminente país.

No que se depara o leitor nessas obras?


1. Uma narrativa povoada dos mais variados detalhes acerca de nossa
história colonial.
2. Linguagem utilizada suscita imagens e o leitor consegue assim,
sentir e vivenciar os acontecimentos narrados.
3. Linguagem atrativa, bem-humorada, detalhada, prendendo o leitor
e o instigando a conhecer e entender o contexto que movia os homens da
época, seus desejos, suas relações, as forças políticas e econômicas que
atuaram na expansão marítima e conseqüentemente em nossa história.

É importante ressaltar que Eduardo Bueno aparece assumindo o papel de contador


de histórias, afasta-se do tom costumeiro utilizado nos livros didáticos destinados aos
estudantes de ensino fundamental e médio e do tom acadêmico.
O escritor é um jornalista sem preocupações maiores, além de informar, de maneira
interessante, as curiosidades e peculiaridades de nossa história.

Destaque para algumas estratégias observadas:

· a de popularização da história, por ter imprimido à narrativa o


tom libertário e criativo a que me referi, libertando a história dos bancos
de escola, como ele mesmo diz.
· através dessa estratégia e mais dos recursos lingüísticos,
estilísticos e narrativos Bueno, constitui-se numa forma prazerosa de
mergulhar no passado do país e atinge um público amplo.

49
Ressalte-se também que esses livros alcançaram a marca de 300 000
exemplares vendidos.
Historiografia
(...) a linguagem, a costura, é o delineamento dessa história
e o jeito como ela foi apresentada. Eu libertei a história colonial do
banco de escola... para que ela retornasse para lá mais livre e com
mais frescor, fragrância e dinamismo.
Eduardo Bueno

Lembramos ainda que acompanhando a volta da narrativa histórica são os periódicos


históricos populares (vendidos em qualquer banca de Revista). No Brasil recentemente
(novembro de 2003) inicio-se a publicação mensal, editada pela Biblioteca Nacional de
uma revista intitulada “Nossa História”, cujos artigos fazem uma revisão necessária de
imagens que se cristalizaram em nossa memória.

Sites
Consultem o site:
www.nossahistoria.net

Apresentamos também alguns problemas que remontam o “retorno da narrativa”:

· A baixa qualidade de trabalhos, devido ao anseio de se


escrever textos que causem impacto.
· A limitação por temas curiosos, diferentes, sem a busca
de uma análise criteriosa.

Em relação à narrativa histórica, Hayden White, um dos defensores da imaginação


na história, em seu livro “Meta-História: imaginação histórica do século XIX” defende a
elaboração de um enredo com definição de personagens, implicando na construção de um
argumento, não esquecendo das implicações políticas, além dos pressupostos filosóficos.
Hayden White sugeriu uma divisão para as narrativas históricas em quatro planos
básicos: Comédia, Tragédia, Sátira, Romance.

Características da narrativa histórica

1 - Forma fundamental e necessária de explicação da


realidade, que tem raízes nas condições básicas da existência humana;
2 - Uma realização cultural imprescindível e um exercício
lingüístico elementar e geral, através do qual as experiências
temporais são interpretadas;
3 - Organização de materiais numa seqüência cronológica e a
concentração do conteúdo numa única história coerente embora
possuindo sub-tramas.

50
E as características da forma narrativa de escrever história?

Vejam as principais:

1. relato de um acontecimento de forma simples possibilitando a


um público mais amplo o acesso a alguns aspectos da história estrutural.
2. interesse pela história do cotidiano, sobretudo pelas
experiências cotidianas, pelo comportamento e pelo modo de vida do
dia-a-dia, pela cultura das pessoas simples, estudando o homem dentro
de suas circunstâncias.
3. concentra-se na reconstrução de pequenos mundos em
transformação, em biografias, na história de uma família ou de uma
greve.
4. orientada em problemas típicos da antropologia cultural.
5. argumentação discursiva com reduzida tensão entre teoria e
narração, entre ciência histórica analítica e narrativa, configurando-se
num princípio constitutivo da própria ciência histórica, sem conotação
antiteórica, antiestrutural.

Se vocês estiverem atentos ao que foi apresentado até aqui, poderão me


questionar. O que se entende por história analítica?

Então, vejamos:

- Seria uma história altamente técnica no seu conteúdo e apresentada através


de expressões quantitativas e matemáticas.
- Ênfase nas estruturas e nos processos mais gerais como industrialização,
formação de Estados e revoluções.

Devemos considerar que uma forma adequada à ciência histórica com orientação
teórica não seria nem tabela nem narração, mas a argumentação histórica.

Que significa isto?

A narrativa com argumentos históricos, evidencia-se pela leveza de uma bela narração
alicerçada num criterioso trabalho com fontes, com documentos históricos.

Aliado a quê?

Uma freqüente reflexão sobre as condições e conseqüências da abordagem teórico-


metodológica escolhida, a qual pode ser questionada em relação à sua validade e limites,
à luz de outras abordagens não alternativas não escolhidas.

Diga uma outra característica...

Deve-se à clarividência da sua definição conceitual e às interrupções na narrativa


para abordagem e considerações teórico-conceituais favorecendo uma exposição mais
reflexiva do texto. Entretanto, também a história com ênfase nas estruturas, as ações e as
experiências, os acontecimentos e os indivíduos foram contemplados na historiografia mais
recente.

51
CONCLUSÃO:
Os novos caminhos da história e da
produção histórica
Historiografia

O saber histórico na pós-modernidade

A pós-modernidade abriu uma nova condição histórica, na qual o


conhecimento apresenta-se relativo ao contexto histórico. Este conhecimento não segue
antigos paradigmas, teorias e metodologias.
Na sociedade pós-moderna inexiste a realidade objetiva e o historiador Durval Muniz
de Albuquerque argumentou em 1995 em artigo “História: a arte de inventar o passado”,
que na pós-modernidade qualquer acontecimento histórico tem um caráter relacional,
contextual e plural, e dessa forma possibilitando a “relatividade da realidade”.
White, 1994, em Trópicos do discurso: ensaios sobre a crítica da cultura, afirma
que todas as descrições humanas do mundo são passíveis de contestação. Admite-se,
dessa forma que as descrições são parciais e que fatalmente excluem outros tipos de
informações. Ele também questionou os tabus da imaginação histórica e dando um novo
fôlego à disciplina histórica cujos pressupostos teóricos permaneciam centrados em:

1. Verdade
2. Objetividade
3. Cientificidade

Sites
Acessar o site:
www.cetico.hpgvip.ig.com.br/ciencia.html

Hayden White também, critica as restrições da historiografia profissional à


imaginação. Tabus que impedem o uso de imaginação artístico-literário, forçando os
historiadores a darem ênfase á distinção entre fato e ficção.
As novas tendências discutidas por especialistas, trazem uma teoria da apresentação
do trabalho histórico, uma teoria que não exclui as teorias de longo alcance, mas que pensa
a História de modo literário, sem esquecer das estruturas.

Sites
Leia o artigo de Hayden White “Teoria
literária e escrita da história” no link
www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/132.pdf
As variadas representações e concepções não excluem a exigência do trabalho a
partir da evidência histórica. White, no entanto, não escapa à crítica dos historiadores
profissionais que o acusam de enfatizar o relativismo histórico.
A história, certamente demarca a ficção, pois os historiadores trabalham fatos
acontecidos no passado. Entretanto, segundo White a representação contemporânea desse
passado pode e deve transpor as limitações metodológicas dos legados dos positivistas.

52
Sites
Para aprofundar os conhecimentos sobre a
relação Ciência e História, acesse o texto “Ciência em
uma encruzilhada histórica” no link, www.cb.ufrn.br/
~araujo/Cronica1.html

O fazer histórico está também relacionado à criação, à imaginação. O historiador


narra, a partir dos dados, dos documentos referentes aos seus objetos de estudo. Pesquisa
em arquivos uma série de informações, de fatos deixados por gerações passadas. Ele
recorta, revê e problematiza a partir do olhar do presente, ou seja, recria os dados
apresentados nos documentos, à luz de suas próprias questões e pressupostos teórico-
metodológicos. Isso ode ser considerado uma criação, ainda que munido de fontes,
evidências, do rigor metodológico, o historiador não se exime da sua criação, ou da sua
imaginação histórica.
[...] não há nada que se possa considerar como uma única concepção correta de qualquer objeto de
estudo, [...] mas, muitas concepções corretas, cada uma das quais exigindo seu próprio estilo de representação
[...] (WHITE, 1994)

Cientificismo e narração representam dois extremos de um amplo espectro de


maneiras de exposição histórica. A propósito poder-se-ia buscar uma mescla entre a
exposição das estruturas e dos processos através dos acontecimentos e das pessoas
narrando-os.

Para isso, o historiador precisa...

· utilizar os acontecimentos e analisa-los da posição de um observador


posterior munido de fontes documentais.

É o historiador na busca pela interpretação dos fatos de maneira criativa com base
em evidências.

Na historiografia existem alguns exemplos magníficos de como fazer esta junção:


ANÁLISE ESTRUTURAL COM NARRATIVA
Na história operária de E. P. Thompson – “A Formação da classe operária
inglesa” – história da luta na Inglaterra no começo do século XVIII entre caçadores
clandestinos e autoridades na floresta de Windsor, argumentando sobre o conflito entre
plebeus e nobres naquela época.

VAMOS CONHECER UM POUCO


DESSA DELICIOSA E ATRAENTE
BI B LIO G R A F I A ?

53
Ou a agradável narrativa de Carlo Ginzburg em “O queijo
e os vermes”, criticada por aqueles que não compreendem o
alcance da sua micro-história. Este livro relata minuciosamente
a cosmologia de um humilde moleiro do norte da Itália do
Historiografia início do século XVI, através do qual procurou mostrar a
perturbação intelectual e psicológica a nível popular.
Ótimo exemplo também são as pesquisas de Jean
Delumeau – “História do Medo no Ocidente”.
Eric Hobsbawm – “Rebeldes e Primitivos” – descrição
da vida curta, desagradável e brutal dos rebeldes e bandidos
pelo mundo.

Caros alunos querem outros exemplos de análise e narrativa?


Norbert Elias – “O Processo Civilizador” – livro sobre a
sociedade de corte e surgimento da etiqueta na Europa moderna.
Examina os significados e entendimentos atribuídos aos
conceitos de “civilização” e “cultura” na Alemanha, França e
Inglaterra. Melhor dizendo, a maneira como ao longo da história
os alemães interpretam o comportamento de ingleses e
franceses. Um dos exemplos citados no livro é a língua e escrita
alemã que eram desvalorizadas e tidas como “semi-bárbara”,
“rústica” e “plebéia” em comparação com o latim e o francês,
sinônimo de refinamento e cultura.

Georges Duby – “O Domingo de Bouvines: 27 de julho de 1214” –


Escrito num estilo fluente e acessível, trata-se de uma narração de
um único acontecimento, ou relato de uma única batalha Bouvines
e por meio desta esclareceu as principais características da sociedade
feudal francesa na primeira metade do século XIII. Este livro é uma
análise minuciosa de um único dia na história da França. Ou melhor,
de um período de cerca de cinco horas, o tempo que teria durado a
batalha de Bouvines. Duby esboça uma etnografia da prática militar
no começo do século XIII, as concepções de guerra e de paz que
lhes serviram de fundo em mais a forma como um acontecimento é
transmitido e deformado por pontos de vista conflitantes. O autor
observa como um acontecimento se faz e se desfaz, já que ele só
existe pelo que dele se diz. Para isto se serve de diversos relatos da
batalha que são reproduzidos, montando com isso a “história da
lembrança de Bouvines, de sua deformação progressiva pelo jogo,
raramente inocente, da memória e do esquecimento”.

Atenção!
Você saberá muito mais acerca deste livro de
Duby na disciplina História Medieval.

Explicações tradicionais do tipo “as ordens chegaram de Madri, porque Felipe II não
conseguia decidir o que fazer”. Diferem daquelas utilizadas pelos historiadores estruturais
como (citando o famoso exemplo de Braudel) “as ordens chegaram tarde de Madri porque
os navios do século dezesseis demoravam várias semanas para cruzar o Mediterrâneo”.
Diferentemente dos historiadores narrativos tradicionais, esses mencionados acima,
dentre outros, estão interessados nas:

54
1. vidas, sentimentos e comportamentos dos pobres e
obscuros em detrimento dos grandes e poderosos.
2. a análise continua sendo a tônica em seus métodos
assim como a descrição.
3. eles abriram novas fontes (registros de tribunais
penais, visto que trazem transcrições por escrito de
depoimentos das testemunhas, interrogados e examinados).
4. contam suas histórias de maneira diferente, por
exemplo, de um Homero. Sofreram influências do romance
moderno e das idéias freudianas, exploraram com maestria o
subconsciente ao invés de se apegarem aos fatos em si.
5. ao contar a história de uma pessoa, um julgamento
ou um episódio dramático para ampliar o funcionamento de
uma cultura ou de uma sociedade do passado.

Quais são esses romancistas modernos, os quais utilizam a descontinuidade


temporal como marca principal?

James Joyce,
Virgínia Woolf,
Franz Kafka

Sites
Leia mais sobre eles acessando:
www.prossiga.bvgf.fgf.org.br/portugues/
obras/artigos/imprensa/james_joyce.htm
www.suigeneris.pro.br/joyce.htm

Atenção!
O final de uma narrativa ajuda a determinar a
interpretação do leitor. Dessa forma alguns romancistas
apresentam finais alternativos. Fechos alternativos
encorajam os leitores a chegarem às suas próprias
conclusões.

Para o historiador, o interessante seria a realização de uma narrativa bastante densa,


na qual abarcaria para além da seqüência dos acontecimentos e das ações dos atores
(nesses acontecimentos) também as estruturas – instituições, modos de pensar, etc. – e
qual a relação entre ambas (acontecimentos e estruturas).
Os romances históricos ilustram muito essa questão. Leiam: “Guerra e Paz” de
Tolstoi.
As chamadas “micro-narrativa” ou “micro-história” que são narrações de uma história
sobre as pessoas comuns no local em que estão instaladas são métodos comumente
explorados pelos romancistas históricos.

55
Saiba mais...
Os historiadores não são livres para inventar
seus personagens, ou mesmo as palavras e os
Historiografia
pensamentos de seus personagens como
freqüentemente os romancistas o fizeram.

A integração entre a Narrativa Histórica e as estruturas

Não se pode dizer que se tenha efetivamente compreendido um fenômeno histórico


optando de maneira independente por apenas uma das dimensões: estruturas/processos
ou experiências/ações, na medida em que ambas estão intimamente relacionadas.
Para além de um “retorno á narração” pura e simples será mais importante uma
integração da história das estruturas e das ações com processo e experiências.
Apresentamos quatro soluções encontradas nas obras de alguns historiadores
contemporâneos que atendem às prerrogativas apresentadas para narrativa histórica.

1. a micro-narrativa;
2. narração da história de populares no tempo e no espaço,
observando a presença das estruturas;
3. utilizar várias vozes a fim de captar os conflitos e as
permanências;
4. redigir de trás para frente, mostrando o peso do passado;
5. encontrar o relacionamento dialético entre acontecimento e
estrutura.

VEJAM ESSES EXEMPLOS:

Uma análise da relação entre estrutura e


acontecimento pode ser encontrada na obra do antropólogo
social norte-americano Marshall Sahlins, intitulado “Ilhas de
História”, o qual considera que os acontecimentos “portam
traços culturais distintos” que são “regulados pela cultura”.
Entretanto, Sahlins também declara que acontecimentos e
as estruturas estão dialeticamente relacionados.
Dito de outra maneira, a estrutura cultural dá
significado aos acontecimentos. Porém, os acontecimentos
também mudam a estrutura cultural.

A micro-narrativa também foi


adotada por Natalie Davis – “O
retorno de Martin Guerre”

O recurso à narrativa muitas vezes é essencial para a apreensão do fluir temporal...


Entretanto, a narrativa tem de ser outra, não a narrativa tradicional, mas sim uma
forma de narrativa que consiga escapar...

· da superficialidade do
acontecimento

· da rigidez temporal de um
discurso analítico.

56
Entendendo ser necessário densificar a narrativa.

Peter Burke analisando a “rebelião” contra a narrativa tradicional acrescenta que as


novas formas de narrativa histórica devem incluir:
1. a micronarrativa
2. a narrativa de frente para trás
3. e as histórias que se movimentam para frente e para
trás, entre os mundos público e privado
4. apresentar os mesmos acontecimentos a partir de
pontos de vista múltiplos

Delacroix em seu diário anotado no dia 5 de abril de 1850 afirmou:

“A tarefa do historiador parece-me a mais difícil; ele precisa de uma


atenção constantemente voltada para mil objetos ao mesmo tempo, devendo
através das citações, das enumerações precisas, dos fatos que ocupam uma
posição apenas relativa conservar este calor capaz de animar a narrativa.”

Duby também pensava como ele, os fatos são relativos e o essencial é a “animação”.
Ele que buscava compreender o que era para os combatentes que delas participaram os
significados de uma batalha, paz, guerra e honra e para isto apenas a exposição dos “fatos”
não eram suficientes. Este historiador, esforçava-se por encarar os fatos com os olhos desses
guerreiros, buscava se identificar com eles e nessa incorporação imaginativa Duby dava
sua contribuição.

Acompanhe esta citação:

[...] o historiador é obrigado a usar sua própria liberdade, que isto não
deixa de implicar em riscos, mas que ele é forçado a tomar partido, e em
conseqüência seu discurso nunca passa de uma aproximação, na qual se exprime
a reação livre de uma pessoa diante dos vestígios esparsos do passado. (DUBY,
1993, p. 61)

Mais adiante, nessa mesma obra, Duby reitera que na fase de composição o que
prevalece é a razão, os mecanismos da lógica, o senso de equilíbrio. Com essa atitude, na
fase de redação não seria perigoso afastar-se da verdade, já que na escrita a sensibilidade
se apresenta mais.

Resumindo:
Vamos então concluir este curso, de Historiografia
compreendendo que

Visões retrospectivas, cortes e a alternância entre cena e


história podem ajudar os historiadores em sua difícil tarefa de
revelar o relacionamento entre os acontecimentos e as estruturas
e apresentar pontos de vista múltiplos maneiras.

57
Para refletir...
Caro aluno, você, que também é professor, faz
Historiografia
suas reflexões sobre a História baseadas em quê?

· Antigas retóricas?
· Na crítica dos textos?
· Nas técnicas de análise das estruturas sociais e
econômicas?
· Ou na junção da análise com a arte de contar história?

Resumidamente, para concluir este terceiro tema podemos dizer que nos decênios
de 1970/80 os historiadores entenderam que tudo era possível transformar-se em temas
históricos. Entretanto, o horizonte continua sendo o da globalidade, mas não na síntese, e
sim na busca pela diversidade de objetos, ou temas de investigação.
As características da escrita da história e as novas alianças interdisciplinares foram
fundamentais nesse período. Porém, ressaltamos que, o historiador deve demarcar fronteira
na sua disciplina. A postura interdisciplinar não deve impedir a perda da identidade do
historiado, dito de outra maneira, o historiador não deve se abster da “crítica” ou do seu
“ponto de vista” em relação às demais disciplinas.
Podemos pensar ser perigoso comungar com as correntes culturalistas e pós-
modernas que apagam as fronteiras entre a ficção e a história. Como por exemplo, Hyden
White, 1995 no seu livro “Meta-história” que afirma não haver diferença essencial entre o
discurso literário e o discurso historiográfico.

Você concorda? Literatura e história se aproximariam não pela forma ou pela


fantasia, mas pela natureza do próprio conhecimento que é carregado de
imaginação?

Levantamos um questionamento no que se refere à validade de uso da escrita literária


como fonte de pesquisas. Haverá idoneidade nas narrativas de estrutura literária para
cumprirem uma função histórica? E os relatos históricos? Estes trazem em sua estrutura um
viés literário?
Na década de 1980, a narrativa, a biografia e o evento, que foram violentamente
reprimidas ao longo de sessenta anos volta com mais força embora sob novas formas.
Por exemplo, no caso da narrativa, o artigo de Lawrence Stone, 1991, o Retorno da
Narrativa ou Reflexões sobre uma Nova Velha História é o ponto de partida para novos
debates acerca do “ressurgimento” da história narrativa.
E como fica essa nova forma de escrita da história com valorização da narrativa?

Ênfase na análise, problemas e argumentos, dando


relevância ao aspecto formal, ou literário do texto histórico.

Peter Burke, em seu texto “A história dos acontecimentos e renascimento da


narrativa” afirma que é preciso escapar do confronto entre narradores e analistas, procurando
questionar o relacionamento entre estruturas e acontecimentos, e com isto estabelecer uma
nova forma narrativa que considera olhares diversos. Ainda segundo Burke, cabe ao narrador
moderno encontrar um modo de se tornar visível em sua narrativa, deixando claro ao leitor
que a sua interpretação não é a única possível.

58
A História narrativa também vê de forma positiva a abordagem
de temas que comportem “pessoas comuns”, ou os “marginalizados”.
A biografia histórica também passa a ser um gênero
valorizado, porém sem exagerar na figura dos feitos de grandes
homens.
Vemos aí um retorno de narrativas voltadas para o sujeito, o
evento, a narração, das nações, da história política, da biografia.
Atualmente a história, sobretudo, com a influência das demais
Ciências Sociais especialmente a antropologia tem-se apresentado
de forma leve, com um toque pessoal e estilístico de cada historiador,
porém sem perder o rigor da pesquisa histórica. Ao historiador não é
permitida a criação livre, abstendo-se da coerência, a este cabe a permanência da realização
responsável entre a imaginação pessoal e as informações contidas nos vestígios do passado.
Em suma, a escrita da história atualmente está empenhada na árdua tarefa de revelar
o relacionamento entre acontecimentos e estruturas, mostrando variados pontos de vista.
Neste intuito alguns historiadores incorporaram novas formas narrativas como a
micronarrativa e a narrativa de frente para trás. Existe também aqueles que se utilizam
técnicas de um romance.
Retorno ao exemplo do livro de Natalie Davies “O retorno de
Martin Guerre”, no qual ela realiza a difícil tarefa de narrar um
evento singular e descrever toda uma época. Seu trabalho
é um grande exemplo da atualidade histórica quando
relaciona a micro-história e narrativa.
Carlo Ginzburg também é um exemplo de autor
que trabalha num nível micro, mas não nega a validade
ou a importância das estruturas. Ou seja, não prescinde
da idéia de que os seres humanos tenham também uma
dimensão para além do individual, coletivista e comunitária.
Diante de tudo que foi apresentado rapidamente até
aqui, vamos concluir este módulo apresentando algumas
questões mais globais em torno das diversas dimensões da História, decisivas para que a
História narrativa tivesse esse “retorno”, ainda que com nova roupagem:

1 - Crise do conhecimento (queda das anteriores certezas


científicas);
2 - Dúvida quanto às realidades concretas e as verdades
do conhecimento científico.

Para refletir...
O que você acha dessas questões?

Comecem pensando em relativismo e verdade.


Na literatura podem coexistir vários mundos imaginários, mas há apenas
um mundo histórico, onde o historiador retira suas conclusões com o auxílio
das evidências oferecidas pelas fontes. O romancista vive o fato de modo
intimista, tanto faz se ele parte de eventos concretos ou não, o que importa é
a sua interpretação, a leitura que faz do mundo. Por outro lado o historiador
não deve prescindir durante as suas interpretações, da narrativa dos

59
acontecimentos pesquisados e analisados, do apoio de suas fontes,
de seus documentos.
Dessa maneira a função da narrativa, seja ela histórica ou
Historiografia literária está ligada ao narrador e ao método aplicado. A intenção
do literato será, sempre, o de expor um universo de ficção, ao
historiador ficará a tarefa de mostrar o como e o porquê dos
acontecimentos.

Sites
Relatividade da realidade, acesse o texto “Relativismo ou
Objetivismo?” no link www.cfh.ufsc.br/~wfil/relativismo2.htm

Atenção!
Para enriquecer seus argumentos, não deixe de
assistir ao filme: “Uma cidade sem passado”.

Sites
Para saber mais sobre EMPIRISMO vá ao link citado anteriormente e
também www.artnet.com.br/~pmotta/metod_rac_emp_compl.rtf

Questão 1 [ ] 
Agora é hora de
TRABALHAR

Diante de tudo que foi estudado, qual a postura que o historiador deve apresentar
durante uma produção historiográfica, considerando a posição do mesmo na sociedade a
qual ele pertence?

Questão 2
A narrativa histórica seria uma ficção no mesmo sentido que a ficção literária?

Questão 3
O que você acha? Na medida em que a história é uma ciência, que preza pelo
argumento, pela interpretação pautada em documentos, ela dispensa o auxílio da arte, da
beleza estilística, da narrativa de um texto?

60
Questão 4
Considerando a flexibilidade dos critérios de cientificidade da produção do
conhecimento da pós-modernidade, não necessariamente compostas por leis e certezas,
o historiador do século XXI pode voltar a enfatizar a sua dimensão literária e artística com
mais liberdade. Leia o trecho abaixo de Georges Duby escreva suas contribuições.
“Há algum tempo que emprego cada vez mais a palavra ‘eu’ em meus
livros. É a maneira que tenho para advertir o leitor. Não tenho a pretensão de
comunicar-lhe a verdade, mas de sugerir-lhe o provável, colocando-o diante
da imagem que eu mesmo tenho, honestamente, do real. Dessa imagem
participa em boa dose aquilo que eu imagino. Cuidei, entretanto, para que as
elasticidades do imaginário permanecessem solidamente presas a esses ganchos
que em caso algum, em nome de uma moral, a do cientista, ousei manipular
ou negligenciar, e que testei em todos os casos minuciosamente, para confirmar-
lhes a solidez. Estou falando dos documentos, minhas ‘provas’”. (DUBY, 1993, p.
62)

Questão 5
Faça uma análise da seguinte passagem do historiador Robert Darnton em seu livro
“O beijo de Lamouret”:
“Como historiador, estou com aqueles que vêem a história como
uma construção imaginativa, acho que precisa ser retrabalhado
interminavelmente. Mas não acho que ela possa ser convertida em qualquer
coisa que impressione a fantasia. Não podemos ignorar os fatos nem nos
poupar ao trabalho de desenterra-los, só porque ouvimos falar que tudo é
discurso”.

61
OS PRINCIPAIS MARCOS E
Historiografia ATUALIDADE DA HISTORIOGRAFIA
BRASILEIRA

Uma Breve Contextualização

O desenvolvimento da historiografia brasileira está intimamente relacionado à


evolução das universidades do país, melhor dizendo, aos cursos de pós-graduação em
História. A quase totalidade da produção historiográfica é o resultado da produção de teses
de doutoramento e dissertações de mestrado. (POLITO, 1996). Certamente, não excluímos
as importantes produções historiográficas de determinados núcleos não universitários de
pesquisa. É o caso do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP) e o Centro
de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea (CPDOC).
A universidade brasileira surgiu somente em 1920, com a fundação da primeira
universidade oficial do Brasil – a Universidade do Rio de Janeiro. Os cursos privilegiados
nesta instituição de ensino superior eram: medicina, farmácia, engenharia e direito. Os
cursos de história, geralmente vinculadas às faculdades de filosofia apareceriam em 1934
na Universidade de São Paulo (USP).
Segundo Polito, 1996, os primeiros cursos de pós-graduação em história no Brasil
estavam fortemente influenciados pelos referenciais estrangeiros, notadamente da França.
Contudo, necessário uma ressalva, havia um certo atraso em relação às tendências
historiográficas francesas. Enquanto neste país nos anos 70 já havia um amadurecimento
das concepções teórico-metodológicas do que seria a Nova História, no Brasil ainda
estávamos sob a influência da primeira geração da “Escola” ou movimento dos Annales.
Somente nos anos 80 é que surgiriam os primeiros estudos sob influência da chamada
Nova História, mais especificamente trabalhos na linha de história das mentalidades.
O marxismo, também foi uma forte corrente teórica que orientou inúmeros trabalhos
historiográficos no anos 70, sobretudo porque o contexto era de confronto entre a esquerda
marxista em oposição ao autoritarismo dos generais da ditadura militar, iniciada em 1964.
Todavia a maioria das produções acadêmicas dos anos 70 eram marcadas pelas reflexões
positivistas. (POLITO, 1997).

A HISTORIOGRAFIA BRASILEIRA NO SÉCULO XIX

No dia dois de outubro de 1838 foi criado, no Rio de


Janeiro, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB).
Um período de extrema importância para a compreensão da
formação do Império e do Brasil como Estado Nacional, fato
que coadunava com os objetivos do IGHB, que apesar de
carregada de idéias nativistas e ufanistas “os traços mais
notáveis do órgão, no entanto, são o pragmatismo da história
e o gosto pela pesquisa”, o que não desconsidera o estudo
da história como ferramenta pedagógica “orientadora dos
novos para o patriotismo, com base no modelo dos
antepassados.” (IGLÉSIAS, 2000, p. 61).

62
O objetivo do modelo historiográfico do IGHB era:

a) identificar as origens do Brasil


b) contribuir para delimitar uma identidade
nacional homogênea
c) inserir o Brasil numa tradição de progresso

Nessa época o IGHB lançou um concurso que contemplaria com 200 mil réis aquele
que apresentasse “um plano para se escrever a história antiga e moderna do Brasil,
organizado de tal modo que nele se compreendessem as partes política, civil, eclesiástica
e literária” (RODRIGUES: 1957, 160). Apresentaram trabalhos apenas dois estudiosos - o
naturalista alemão Karl Friedrich Philipp von Martius e Júlio de Wallenstein.
Já Von Martius apresentou seu “Como se deve escrever a História do Brasil”, escrito
em 1843, e foi publicado na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro em 1845.
Martius foi dado como vencedor em 20 de maio de 1847, com seu trabalho que se situa
entre a inovação e o característico de uma época, “Como se deve escrever...” é fruto de
atenta observação do naturalista enquanto esteve expedicionando pelo interior do Brasil
sob patrocínio do rei da Baviera.
O estudioso alemão apresentou um tratado contendo todos os pontos e problemas
que deveriam conter, segundo seu entendimento, para uma melhor compreensão geral e
ampla do Brasil. Von Martius, nesse tratado, foi o primeiro a salientar a importância do índio
e do negro, e consequentemente a necessidade de se conhecer mais profundamente os
costumes, a língua e a mitologia indígena. O Legado de Martius foram às influências e a
introdução de alguns debates a respeito da forma como se escrevia a história do Brasil até
então.
O que vai caracterizar o Instituto e o tornará um divisor de águas na historiografia
brasileira é a pesquisa. O trabalho anteriormente realizado, desde o século XVII, tinha como
característica principal o autodidatismo e o individualismo, factual e descontínuo. Eram
estudos realizados em sua grande maioria por religiosos, militares, juristas e até médicos.
O IHGB foi responsável por reunir os que pensavam a história e estavam interessados em
discuti-la, mas não em formá-los, uma vez que esta entidade não possuía – e não possui até
hoje – as características de uma universidade. Sua função primordial era direcionar as
discussões por meio da sua Revista e publicar documentos pertinentes aos estudos
históricos.
João Capistrano de Abreu deve ser mencionado devido à sua importância no quadro
mais geral da historiografia brasileira, da qual ele é um marco, definidor de mudanças que
vão ocorrer no início do século XX em relação à historiografia ligada e identificada com o
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Capistrano de Abreu é considerado como o
primeiro historiador a dar importância a elementos populares e a escrever uma história
sócio-econômica do Brasil. Este historiador cearense em seu conhecido livro “Capítulos
de História Colonial”, tratou de assuntos tais como o indígena, os franceses e ingleses no
Brasil, a guerra flamenga, a expansão para o sertão e a formação dos limites territoriais,
entre outros. No entanto, sua produção intelectual foi muito mais extensa, produziu
incansavelmente de 1878 a 1927.
O que torna Capistrano até hoje lido e citado? Não restam muitas dúvidas, Capistrano
insere novas problemáticas na História do Brasil e as responde, antecipando o que os
historiadores brasileiros somente discutiriam em suas obras nos anos 30, iniciando-se com
Gilberto Freyre: a diversidade cultural. Capistrano abordou em suas obras sobre o período
colonial, vários Brasis, com suas diferenças muitas vezes inconciliáveis, onde havia pessoas

63
e grupos vivendo de variadas formas. Ou seja, Capistrano enxergava o Brasil
por uma perspectiva que poderíamos atualmente de pluralista.
João Capistrano de Abreu, além de ser o intermediário entre a
Historiografia historiografia tradicional nos moldes do IHGB e a chamada “geração de 1930”,
inaugurou na historiografia brasileira um olhar problematizador baseado no
reconhecimento das diferenças, como elemento formador da realidade social
colonial.

A GERAÇÃO DE 30 E A REINTERPRETAÇÃO DO BRASIL

A década de 1930, no Brasil, foi um


período fecundo de reinterpretação do
processo histórico, uma fase que ficou
marcada pela produção de correntes
explicativas que buscavam compreender a
sociedade brasileira à luz de certas teorias e
métodos que eram vistos por seus defensores
como instrumentos válidos para decifrar o
enigma da constituição de sua nação. Os
nomes de Gilberto Freyre, Caio Prado Jr. e
Sérgio Buarque de Holanda sobressaem-se
neste grupo de estudiosos da história brasileira, tanto pelos novos paradigmas de pesquisa
que eles aplicaram, quanto pelo impacto que suas interpretações.
Indiscutivelmente 1930 é o marco principal da virada do pensamento histórico
brasileiro, Antônio Cândido, definiu Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio
Prado Jr. como os pensadores que constituíram a moderna interpretação do Brasil. Os três
são considerados precursores da moderna ciência social brasileira. Estes trabalhos foram
publicados num momento da historiografia brasileira em que se buscava o “caráter nacional
brasileiro”. É desta forma que, nos anos 30, surgiram três trabalhos que buscavam explicar
o significado de ser brasileiro. Foram eles: Casa Grande e Senzala (1933), de Gilberto
Freyre; Evolução Política do Brasil (1933), de Caio Prado Júnior; e Raízes do Brasil (1936),
de Sérgio Buarque de Holanda. A seguir falaremos um pouco de cada historiador
separadamente.

Gilberto Freyre

Primeiramente, apresentaremos Gilberto Freyre, um dos


membros desta “tríade fundadora” da historiografia profissional
brasileira moderna. Freyre era Antropólogo por formação, e
desenvolveu seus estudos ainda na década de 1920, época
em que o ambiente intelectual brasileiro estava sob o impacto
do modernismo em prol de um nacionalismo. É neste
ambiente que Gilberto Freyre está inserido, passando
posteriormente a completar seus estudos nos Estados Unidos,
onde teve contato com os estudos do professor Franz Boas,
antropólogo que o influenciaria em seu grande e melhor trabalho
sobre o período colonial brasileiro, Casa Grande e Senzala.
(FREYRE, 1976).
Neste trabalho, Freyre contribui e enriquece sobremaneira com a historiografia
brasileira, na medida em que incorpora a matriz culturalista da Antropologia à abordagem

64
histórica, o que já foi dito anteriormente no texto sobre a Nova História. Para Freyre as
diferenças entre os grupos sociais eram principalmente de natureza cultural e destacava de
maneira original as práticas, crenças e costumes cotidianos, resultados do entrecruzamento
dos três grupos que constituíram o povo brasileiro: o indígena, os portugueses e os africanos.
(SOUZA, IN: FREITAS, 1998).

Quais eram as fontes de Freyre?

Gilberto Freyre foi buscar nos diários dos senhores de engenho e na vida
pessoal de seus próprios antepassados a história do homem brasileiro. As
plantações de cana em Pernambuco eram o cenário das relações íntimas e do
cruzamento das três raças: índios, africanos e portugueses. Anteriormente a toda
produção historiográfica da Nova História, Freyre já utilizava como fontes em
Casa Grande e Senzala, anúncios de jornais, diários e a correspndência familiar,
escritos de viajantes estrangeiros, livros de recitas, fotografias, cantigas de rodas
e toda a tradição oral.

No que concerne estritamente à historiografia, Casa Grande e Senzala tem grande


relevância no que diz respeito à incorporação de alguns objetivos manifestados por Marc
Bloch e Lucien Febvre pouco antes de sua publicação, como a interdisciplinaridade e a
ampliação documental. Seu trabalho dá grande importância às relações estabelecidas entre
senhores e escravos, assumindo pela primeira vez a importância do negro na formação do
nosso “modo de ser”. Freyre explorou diversos tipos de relação: as sexuais, de produção,
sob o viés da dominação senhorial, criando assim uma interpretação que foi acusada
posteriormente de justificar e “amenizar” os horrores da escravidão.
Peter Burke, 1997 pontuou a importância de Freyre e a sua similaridade com a
chamada “nova história” pregada e praticada na França a partir da década de 60 e a história
que Gilberto Freyre escreveu a partir da década de 30: “Os fundadores da escola dos
Annales, Marc Bloch e Lucien Febvre estavam interessados no que eles chamavam
“psicologia histórica” e estudaram a psicologia de Henri Wallon, embora negligenciassem
Freud. Freyre, por outro lado, referiu-se em Casa-Grande & Senzala e em outras obras não
apenas a Freud (que o atraía porque “explica mistérios de minha meninice”), mas também
a monografias sobre a psicologia da infância e da família de discípulos de Freud tais como
Flügel, Moll e Pfister. As referências não são casuais, pois a idéia de uma relação sado-
masoquista entre senhor e escravo tem um papel central no estudo de Freyre”.
Freyre é apontado pelos críticos como um justificador do imperialismo português,
devido a sua percepção da mestiçagem como um valor positivo o que o levaria a exaltação
da superioridade dos portugueses como colonizadores mais flexíveis que os demais povos.
Ele lançaria as bases de uma análise de mestiçagem vista numa perspectiva harmônica,
sem antagonismos entre as culturas européia, indígena e africana. (SOUZA, IN: FREITAS,
1998).

Sérgio Buarque de Holanda

Dando continuidade à apresentação da “geração de 1930”, não


podemos deixar de mencionar a importância dos trabalhos de Sérgio
Buarque de Holanda para a interpretação da sociedade colonial
“brasileira”. Raízes do Brasil é publicado em 1936, é obra inaugural do
historiador sob influencia, pensamento europeu, para o acervo cultural
das ciências humanas (história, antropologia e sociologia). Sua maior
referência em Raízes do Brasil é Max Weber, quase inacessível ao
pensamento brasileiro naquela época.

65
Em sua análise, Holanda transmite visões muito amplas como:

Historiografia a) História da Cultura;


b) Mentalidades;
c) Cotidiano;
d) Marginalidade.

Com um estilo econômico, de leitura fácil e agradável, este trabalho preocupa-se em


verificar elementos psicológicos e sociológicos formação histórica do Brasil colonial, na
qual Sérgio Buarque de Holanda encontra as raízes explicativas para o estágio de
desenvolvimento brasileiro na década de 1930. Ele encontra as
explicações na “irracionalidade” do “homem cordial”, movido pela
emoção e não pela razão de viés iluminista.
Se observarmos os temas acima mencionados veremos
que Holanda revelou, através das páginas de Raízes do Brasil,
a metodologia francesa na historiografia da conhecida École
des Annalles (Escola dos Annales), e posteriormente a
Nouvelle Histoire (Nova História), o modernismo, entre outras.
Em Raízes do Brasil combinam-se características da
história social, da antropologia histórica, da sociologia, da
etnologia e da psicologia, produzindo uma corrente analítica
difícil de classificar, mas dotada de uma singular riqueza.
Enquanto Caio Prado Jr. buscou delinear o caminho dos
processos econômicos que formaram a estrutura da sociedade
brasileira, Buarque de Holanda preocupou-se com os aspectos culturais desta mesma
sociedade.
É um trabalho que, de certa maneira, rompeu não só com visões teológicas da história,
como também com racionalismos e determinismos científicos tão presentes na historiografia
positivista daquele momento.

Caio Prado Jr.

Completando a tríade, consideremos agora Caio Prado


Júnior. Formação do Brasil Contemporâneo, 1942 pode ser
considerado a primeira grande síntese histórica de matriz marxista
do “Brasil” colonial. É importante que se identifique, inicialmente,
um princípio de natureza metodológica que permeou o trabalho
de Caio Prado Júnior e que pode ser notado no início de sua
elaboração acerca da sociedade colonial: a abordagem teleológica.
Caio Prado enxerga uma rígida continuidade entre o passado
colonial.
Adotando o modelo teórico do materialismo histórico
formulado no século XIX por Karl Marx e Friedrich Engels, Prado
Jr. buscou delinear nesta obra o que ele denominou o “sentido
da colonização do Brasil”. Para o autor, a circunstância constitutiva
da realidade brasileira, presente mesmo no início do século XX, seria
a construção, no período colonial, de uma sociedade e uma economia
voltadas acima de tudo para a satisfação do mercado externo.

66
As estruturas da história brasileira teriam sido erguidas sobre os alicerces da
dependência em relação aos ditames da economia internacional, e não sobre as bases de
um projeto para a formação de uma nação autônoma diante de seus colonizadores. Esta
interpretação marxista da história, em Caio Prado provocou uma reconstrução das
referências intelectuais ocorridas na universidade e fora dela.
Formação do Brasil Contemporâneo criou uma tradição historiográfica no Brasil,
identificada, sobretudo com o marxismo, buscando dar uma explicação estrutural e da
sociedade colonial. Um dos trabalhos mais filiados à concepção de Caio Prado de “sentido
da colonização” é Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777 – 1808),
de Fernando Antônio Novais, publicado em 1979, texto que impressiona pelo volume de
informações e pelo conceito de Antigo Sistema Colonial, com acumulação externa de capital.
Este sistema este teria o seu fim, segundo a formulação de Novais, com a ascensão das
nações industrializadas.
Na década seguinte, os trabalhos acadêmicos baseados em pesquisa serial como
Homens de Grossa Aventura: Acumulação e Hierarquia na Praça Mercantil do Rio de Janeiro
de João Fragoso abalariam gravemente as teorias defendidas no trabalho de Novais,
sobretudo aquela que defende a exclusividade da acumulação exógena.
Portanto, a tradição historiográfica iniciada por Caio Prado Júnior só começaria a
ser seriamente revista nos anos 80, na medida em que convergiram vários fatores para
uma mudança no ambiente acadêmico brasileiro.

HISTORIADORES BRASILEIROS DA NOVA HISTÓRIA CULTURAL

A partir dos anos 1980, acontece uma grande mudança na historiografia brasileira.
Notamos neste período que há um grande impacto no ambiente historiográfico brasileiro
daquilo que Roger Chartier, 1988 chamou de “A Nova História Cultural”, que retoma aspectos
que estavam presentes nos trabalhos de Bloch e Febvre, como a preocupação com as
mentalidades, tendo no Brasil correspondência nos trabalhos de Gilberto Freyre.
Esta “nova” história cultural teria uma de suas primeiras representantes no Brasil em
Laura de Mello e Souza, com seu livro O Diabo e a Terra de Santa Cruz, livro cuja marca
principal é influência da microhistória de Carlo Ginzburg. A autora utiliza-se de fontes
inquisitoriais, tratados teológicos, fontes literárias e muitas outras, analisando assim a
demonização da América Portuguesa. Seguido a mesma tendência acima mencionada,
Ronaldo Vainfas, insere a América portuguesa no mundo cristão ocidental moderno através
da Companhia de Jesus e do Santo Ofício, com seu Tropico dos Pecados.
Em busca do mesmo sucesso que teve a História da Vida Privada dirigida por
Georges Duby e Philippe Áries, no interior da Nova História Cultural, surge em 1997 na
historiografia brasileira a coleção dirigida por Fernando Novaes, 1997, História da Vida
Privada no Brasil, cujo volume 1 aborda o cotidiano e vida privada na América portuguesa.
Nesta coleção é forte a presença da relação do micro com o macro, os temas
recortados são levados ao conjunto, e articulados numa análise mais fidedigna da História.
Incitando, evidentemente, uma crítica a “generalização estrutural”, da historiografia brasileira.
Seu objeto de estudo no volume citado, é como ele mesmo diz: “esse viver em colônias”.
Novais vai tentar articular manifestações da intimidade cotidiana com as estruturas
básicas da formação colonial. Utilizando-se de diversos elementos, como a miscigenação,
acumulação primitiva de capital autônomo na colônia, diversidade entre colônia e metrópole,
análise das peculiaridades coloniais com relação a esquemas do velho mundo, análise do
privado ao invés do público.

67
HISTORIOGRAFIA E LIVRO DIDÁTICO: PRINCIPAIS
TENDÊNCIAS E CRÍTICAS

Historiografia Dos marcos pertencentes ao campo da historiografia e livros didáticos


destaca-se Eni Orlandi (1987) com formação em lingüística, substitui o exame
do conteúdo pelo da forma, realiza uma análise do discurso dos livros didáticos
de história. Orlandi, apesar de não ser historiadora, possui uma abordagem
próxima da Nova História Cultura, por exemplo, de autores como Foucault.
Orlandi apresenta as formas de exclusão, através da linguagem, das camadas menos
favorecidas, nos livros didáticos.
Nessa tendência de análise de conteúdo o foco é a crítica historiográfica e ideológica.
No caso da ideologia a crítica é referente à falsa consciência, difundida pelos livros didáticos
de história. Esses trabalhos, em sua maioria assumem a perspectiva materialista-dialética,
e propõem apreender o livro como “elemento instituído, como produto, e, ao mesmo tempo,
como elemento que institui que cria a vida social” (GALZERANI, 2000, p. 106).
Segundo Maria Carolina Galzerani (1988), esses trabalhos, (de tendência marxista/
materialista-dialética), entendidos por muitos críticos como maniqueístas, simplistas e até
autoritários, negligenciam o contraditório da linguagem, impossibilitando, assim leituras
distintas dos livros, assim como a capacidade analítica e crítica dos alunos. Uma capacidade
que se valorizada pelo professor com variadas formas de utilização do livro didático, levaria
a um questionamento dos conteúdos destes.
Nas análises de conteúdos dos livros didáticos, diversos temas são abordados. A
seguir alguns dos mais relevantes temas e autores que se destacam na abordagem de
cada um deles:

a) Periodização e recorte espaço-temporal – Inspirados nos estudos de Marc


Ferro (1983), criticam a periodização da história em Idades (Antiga, Medieval,
Moderna e Contemporânea) ou em Modos de Produção (Comunista Primitivo,
Escravista, Feudal e Capitalista.

Nas críticas destaca-se também a visão totalizante, a identidade


estabelecida nos livros entre “história do Brasil” e biografia da nação brasileira.
Uma outra crítica é o privilégio do continente europeu em detrimento dos
demais povos que somente passam a existir a partir do contato com o homem
europeu. (VESENTINI, 1984, p. 75-6).
A inclusão dos “três tempos de Braudel” nos livros didáticos de história
tem sido incoerente, misturam-se conceitos como “longa duração” com “curta
duração”.
São apresentados assuntos como:

“conjuntura econômica em determinados capítulos e prevalecendo em


outros, na mesma obra, o arcabouço da curta duração, onde predomina
exclusivamente o político. Esta situação pode ser exemplificada com o estudo do
Império brasileiro, geralmente dividido em Primeiro Reinado, Regência, Segundo
Império e Proclamação da República, mesmo para autores que se propõem a
trabalhar, por exemplo, com conjuntura econômica ou com modos de produção”.
(BITTENCOURT, 2000, p. 76).

68
b) Os conceitos empregados – Procura-se ver como alguns conceitos (trabalho, espaço,
tempo e cotidiano) são explicitados nos livros didáticos, chamando atenção para a
inconsistência e o caráter ideológicos destes conceitos quando formulados nos livros.

A respeito do tempo, nesses livros didáticos, nota-se o privilégio do “tempo


curto” do fato político juntamente com o “tempo longo”. Entretanto o processo histórico
é constitui-se de maneira unilinear a um futuro pré-definido, ou seja, chegará ao
progresso. Por isso, confere aos livros didáticos um caráter teleológico (tal qual
abordado pelo marxismo).
Na questão do espaço, estão presentes, o etnocentrismo, no caso do Brasil,
presente na noção de “descoberta” (que indica a existência de um espaço vazio e
sem dono) e a noção de “povoamento” (trata-se de terra sem habitantes e possível de
apropriação).
Com a noção de cotidiano na abordagem dos livros didáticos, os problemas
são referentes a aspectos da vida cotidiano dos povos habitantes.
Seguindo a história tradicional de tendência positivista, há aqueles livros
didáticos que valorizam o cotidiano dos grandes personagens de acontecimentos
marcantes e consagrados pela historiografia, inversamente desconsideram o cotidiano
de homens comuns. E os livros cuja influência está na Nova História, conseguem ao
mesmo abordar o cotidiano relacionando o sistema social, econômico e político (história
macro) com a particularidade e experiências dos grupos em questão (objetos,
brincadeiras, vestimentas, moradia, alimentação). (VILLALTA, 1996, 1997).

c) Os sujeitos excluídos – a historiografia ressalta que os europeus (portugueses,


espanhóis, ingleses, franceses) são os principais sujeitos presentes nos livros didáticos.
Muito pouco se diz sobre os indígenas e africanos. Geralmente os livros priorizam
muito mais o conceito de nação em detrimento das camadas populares, conflitos de
classes e resistências dos dominados (escravos). (VESENTINI, 1984 e DAVIES, 2000).

A história indígena antes do “descobrimento” do Brasil, não existe, na


maioria dos livros didáticos. Os índios são representados de uma maneira
folclórica. Segundo Davies, 2000, há uma tendência em crescimento na
historiografia brasileira, em valorizar a participação das camadas populares na
história, em se estudar as resistências, assim como suas condições de vida e
trabalho. Por exemplo, os estudos sobre os quilombos, do historiador baiano
João José Reis, 1996.
Entretanto, esta tendência em nada mudou os conteúdos dos livros
didáticos, onde predominam a história com ênfase nos “grandes homens” e
“heróis”. Para Davies, “nas pouquíssimas páginas que os livros didáticos
dedicam a esta questão na história [da participação das camadas subalternas],
as camadas populares aparecem como passivas e obedientes ou então como
supersticiosas, irracionais (A Revolta de canudos)” (DAVIES, 2000, p. 95).
Pensando nos autores que poderiam influenciar a escrita dos livros
didáticos, não podemos deixar de mencionar Caio Prado Jr., com seus clássicos
Formação do Brasil Contemporâneo, História Econômica do Brasil e
Evolução Política do Brasil. Fernando Novais também é um historiador muito
citados nos livros didáticos.

69
Historiografia

Questão 1
[ ] 
Agora é hora de
TRABALHAR

Leia o trecho a seguir e analise fazendo uma relação com o livro didático que você
trabalha ou conhece.

“A concepção de História e a seleção do que deve ser ensinado foi mantida nos livros
didáticos, passando a idéia de que existe uma História ´correta´, que deve ser mantida na formação
do estudante. Falta, então, a incorporação das idéias transmitidas pelas novas propostas
historiográficas, vistas também não como verdades imutáveis, mas como afirmações possíveis de
revisão na medida em que se repensa e se reescreve constantemente a História.” (ABUD, 1984, p.
87).
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Questão 2
De acordo com o texto do conteúdo 2 – A Geração de 30 e a reinterpretação do
Brasil, apresente, mencione as principais características do pensamento e as obras dos
três autores citados.
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70
Questão 3
Você já leu Casa-Grande e Senzala? Leia atentamente o texto abaixo de Gilberto
Freyre:

“Todo brasileiro, mesmo o alvo, de cabelo louro, traz na alma, quando não na alma e no
corpo – há muita gente de jenipapo1 ou mancha mongólica pelo Brasil – a sombra, ou pelo menos
a pinta, do indígena ou do negro. [...]
Na ternura, na mímica excessiva, no catolicismo em que se deliciam nossos sentidos, na
música, no andar, na fala, no canto de ninar menino pequeno, em tudo que é expressão sincera de
vida, trazemos quase todos a marca da influência negra. Da escrava ou sinhama que nos embalou.
Que nos deu de mamar. Que nos deu de comer, ela própria amolengando na mão o bolão de
comida. Da negra velha que nos contou as primeiras histórias de bicho e de mal-assombrado. Da
mulata que nos tirou o primeiro bicho-de-pé de uma coceira tão boa. Da que nos iniciou no amor
físico e nos transmitiu, ao ranger da cama-de-vento, a primeira sensação completa de homem. Do
moleque que foi o nosso primeiro companheiro de brinquedo.”
(Casa-Grande & Senzala, p. 283).

Pelo texto percebe-se um ambiente de propriedade rural. A partir do texto, responda:

a) O autor defende ou condena a mestiçagem? Justifique sua resposta.


Em quais passagens do texto podem ser identificadas as fontes e/ou abordagens
da Nova História Cultural?

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Jenipapo
: mancha escura no dorso das crianças
que é sinal de mestiçagem.
71
Atividade
Historiografia
Orientada

A avaliação aqui não tem o


cunho de exame. É, na verdade,
um detector da construção do
conhecimento e aprendizagem
do aluno. Bom trabalho!

Etapa 1
Com base no que foi estudado nos temas 1 e 2 na disciplina Historiografia, responda
a seguinte questão:

a) Pense em um tema/objeto de estudo que você gostaria de pesquisar;


b) Relacione, a partir deste tema/objeto escolhido, as seguintes categorias:

· Justificativa;
· Objetivo geral;
· Objetivos específicos;
· Fontes.

Etapa 2
Escreva um de, no mínimo, 10 linhas correlacionando o seu objeto/tema de pesquisa
escolhido (Como você o desenvolveria? Quais fontes utilizaria, relacionando a sua pesquisa
com o trabalho do historiador segundo as perspectivas: Positivista, Marxista, da Escola
dos Annales e da Nova História Cultural.
Sugerimos que o aluno leia atentamente o texto abaixo enquanto inspiração para a
metodologia da sua pesquisa:

“Munido das armas e precauções dispostas anteriormente, de conhecimento prévio sobre o


assunto (fruto de muita pesquisa bibliográfica a respeito do período estudado e do que concluíram
historiadores que trabalharam antes dele), o pesquisador está pronto para prosseguir na análise e
na interpretação de suas fontes. Já pode cotejar informações, justapor documentos, relacionar texto e
contexto, estabelecer constantes, identificar mudanças e permanências e produzir um trabalho de História.”
(PINSKY, 2005, p. 71)

72
Etapa 3
Tendo como referencial o que foi estudado na disciplina Historiografia, escolha três
livros didáticos de história (do Ensino Fundamental II ou Ensino Médio) e comente
criticamente (mínimo de 10 linhas) como são apresentadas as classes populares (servos,
camponeses livres, degredados), relacionando-o com as correntes historiográficas estudadas
neste módulo.

CARO ALUNO,
MUITA ATENÇÃO PARA AS
PERGUNTAS.
REFLITA BASTANTE ANTES DE
RESPONDÊ-LAS.

73
Glossário
Historiografia

CONJUNTURA – na linguagem dos economistas franceses significa


“tendência”. Na concepção de Braudel a palavra implica um sentido de conexão
entre fenômenos diversos, mas simultâneos. Genericamente adotado pelos
historiadores de Annales no sentido de oposição à estrutura, significando a
curta ou média duração.

ESTRUTURA – tudo o que numa sociedade, ou numa economia, tem


uma duração suficientemente longa em sua modificação para escapar ao
observador comum.

HISTÓRIA CULTURAL – campo historiográfico que abriu-se a estudos


os mais variados, como a “cultura popular”, a “cultura letrada”, as
“representações”, as práticas discursivas partilhadas por diversos grupos
sociais, sistemas educativos, mediação cultural através de intelectuais, ou
quaisquer outros campos temáticos atravessados pela polissêmica noção de
“cultura”. (BARROS, 2004, p. 55).

HISTÓRIA DA CULTURA MATERIAL – estuda os objetos materiais em


sua interação com os aspectos mais concretos da vida humana, desdobrando-
se por Domínios históricos que vão dos estudos dos utensílios ao estudo da
alimentação, do vestuário, da moradia e das condições materiais do trabalho
humano. (BARROS, 2004, p. 30).

HISTÓRIA DEMOGRÁFICA – noções que se referem as “dimensões”


ou a fatores que ajudam definir a realidade social (a população). É tudo que se
refere mais ou menos diretamente á “População”: suas variações quantitativas
e qualitativas, crescimento e declínio populacional, os movimentos migratórios,
e assim por diante. (BARROS, 2004, p. 23)

HISTÓRIA EPISÓDICA (événementielle) – termo que se refere a história


dos acontecimentos, lançado por Braudel no prefácio do seu livro Mediterrâneo.

HISTÓRIA DO IMAGINÁRIO – termo que se refere à velha história das


representações coletivas. O Vocábulo antigo tinha referências a Durkheim,
enquanto este tem vinculações neomarxistas. A História do Imaginário é
atravessada pelo conceito de “imagem”, que não se prende apenas ao de
imagem visual, mas também abarca o âmbito das imagens verbais e das
imagens mentais. (BARROS, 2004, p. 22).

HISTÓRIA IMEDIATA – modalidade historiográfica em que o autor, é ao


mesmo tempo historiador, e personagem dos acontecimentos que descreve ou
analisa.

74
HISTÓRIA DAS MENTALIDADES – enfoca a dimensão da sociedade
relacionada ao mundo mental a aos “modos de pensar” e os “modos de sentir”.

HISTÓRIA SERIAL – termo empregado por Chaunu em 1960, depois


apropriada por Braudel, que se refere às tendências de longa duração, estudo
das continuidades e descontinuidades, no interior de séries relativamente
homogêneas de dados (preços, nascimentos, etc.). São classificações da
História que remete ao tipo de fontes com as quais elas lidam ou às abordagens
que os historiadores utilizam para tratar estas fontes, (a serialização de dados).
(BARROS, 2004, p. 18).

75
Referências
Historiografia
Bibliográficas

ALBUQUERQUE, Durval Muniz. História: a arte de inventar o passado. In: Cadernos de


História, UFRN, v. 2, n. 1, jan. 1995.

BASSO, Itacy Salgado. As Concepções de história como mediadoras da prática pedagógica


do professor de história. Didática. São Paulo, 25: 1-10, 1989.

BOTTOMORE, Tom. (ed.). Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Jorge


Zahar, 1988.

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Anotações

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Historiografia

FTC - EaD
Faculdade de Tecnologia e Ciências - Educação a Distância
Democratizando a Educação.
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