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Vida e obra de Fernando Pessoa

Vida
Fernando António Nogueira Pessoa nasceu em 1888, em
Lisboa, aí morreu em 1935, e poucas vezes deixou a cidade
e os seus arredores em adulto, mas passou nove anos da
sua infância em Durban, na colónia britânica da África do
Sul, onde o seu padrasto era o cônsul Português.
Curiosidade

Fernando Pessoa faleceu em sua cidade natal, dia 30 de Novembro de


1935, vítima de cirrose hepática, com 47 anos.

No leito de morte sua última frase foi escrita, em inglês ,a lápis, com a
data de 29 de Novembro de 1935:

“I know not what tomorrow will bring” (Não sei o que o amanhã trará).
Com apenas 5 anos, Fernando Pessoa ficou órfão
de pai, que acometido pela tuberculose, deixou a
família em estado de pobreza. Pessoa tornou-se
um rapaz tímido e cheio de imaginação, e um
estudante brilhante.
Pouco depois de completar 17 anos, voltou a Lisboa
para entrar no Curso Superior de Letras, que
abandonou depois de dois anos, sem ter feito um
único exame. Preferiu estudar por sua própria conta
na Biblioteca Nacional, onde leu livros de filosofia, de
religião, de sociologia e de literatura (portuguesa em
particular) a fim de completar e expandir a educação
tradicional inglesa que recebera na África do Sul. A
sua produção de poesia e de prosa em inglês foi
intensa durante este período, e por volta de 1910, já
escrevia também muito em português
Publicou o seu primeiro ensaio de crítica literária
em 1912, o primeiro texto de prosa criativa (um
trecho do Livro do Desassossego) em 1913, e os
primeiros poemas de adulto em 1914.

Vivendo por vezes com parentes, outras vezes em


quartos alugados, Pessoa ganhava a vida fazendo
traduções ocasionais e redação de cartas em inglês
e francês para firmas portuguesas com negócios
no estrangeiro. Embora solitário por natureza, com
uma vida social limitada e quase sem vida
amorosa, foi um líder ativo da corrente
modernista em Portugal, na década de 1910, e ele
próprio inventou alguns movimentos, entre os
quais um «Interseccionismo» de inspiração cubista
e um estridente e semi-futurista «Sensacionismo»
Publicou regularmente o seu trabalho em revistas,
mas o seu génio literário só foi plenamente
reconhecido após a sua morte.

No entanto, Pessoa estava convicto do próprio génio,


e vivia em função da sua escrita. Embora não tivesse
pressa em publicar, tinha planos grandiosos para
edições da sua obra completa em português e inglês
e, ao que parece, guardou a quase totalidade
daquilo que escreveu.
Obra
“Esta tendência para criar em torno de mim um outro mundo, igual a este mas com outra gente, nunca me saiu da
imaginação.”
Fernando Pessoa viu publicada uma parte muito pequena da sua extensa obra, que tem vindo a ser
editada em vários livros desde 1942.
Deixou mais de 25 mil folhas com texto que são espólio à guarda da Biblioteca Nacional de
Portugal. A demorada compreensão e organização destes papéis explica o longo intervalo com que
a obra de Fernando Pessoa tem vindo a ser publicada.
Fernando Pessoa começou a escrever poemas em criança – o seu primeiro poema data de 1895, quando tinha
sete anos. Fê-lo desde logo em português, mas depressa passou a usar também outras línguas (o primeiro em
inglês é de 1901). Começou pela poesia e alargou-se cedo a outros géneros como as notícias, charadas e anedotas
que couberam no jornal O Palrador.
Até à sua morte, não abandonou nenhuma destas facetas. A
par da poesia, escreveu ensaio, teatro, correspondência vária,
novelas policiárias e dedicou-se também à astrologia, além
de ser inventor, crítico literário e publicitário. Apesar da sua
ocupação profissional ser a de «correspondente estrangeiro
em casas comerciais» (ocupava-se da redação de cartas em
língua estrangeira) manteve-se sempre ligado a projetos
editoriais e revistas, como a Orpheu, a Athena e a editora Íbis.
A arca onde ele ia guardando os seus escritos ( hoje constitui
o Espólio de Pessoa na Biblioteca Nacional de Lisboa )
compreende mais de 25 mil folhas com poesia, peças de
teatro, contos, filosofia, crítica literária, traduções, teoria
linguística, textos políticos, cartas astrológicas e outros textos
sortidos.
Pessoa escrevia em cadernos de notas, em folhas
soltas, no verso de cartas, em anúncios e panfletos,
no papel timbrado das firmas para as quais
trabalhava e dos cafés que frequentava, em
sobrescritos, em sobras de papel e nas margens dos
seus textos antigos.
Obras publicadas em vida

• 35 Sonnets (1918)

• Antinous (1918)

• English Poems, I, II e III (1921)

• Mensagem (1934)
Algumas obras póstumas
• Poesias de Fernando Pessoa (1942)
• A Nova Poesia Portuguesa (1944)
• Poemas Dramáticos (1952)
• Novas Poesias Inéditas (1973)
• Poemas Ingleses Publicados por Fernando Pessoa
(1974)
• Cartas de Amor de Fernando Pessoa (1978)
• Sobre Portugal (1979)
• Textos de Crítica e de Intervenção (1980)
• Obra Poética de Fernando Pessoa (1986)
• Primeiro Fausto (1986)
Relação com a arte
Fernando Pessoa colaborou em diversas revistas de arte e literatura : A Águia,
Orpheu, Contemporânea, Athena, Portugal Futurista, Folhas de Arte, Presença,
entre outras, e foi diretor e subdiretor de algumas delas (Orpheu, Athena).

Escreveu também textos de História de Arte, de que um dos melhores exemplos é


o seu livro, publicado postumamente : Lisboa, o que o turista deve ver. As
artes mais recentes também foram alvo do seu interesse, tendo escrito a
história de vários filmes, também publicados postumamente, num livro com
esse mesmo título. Além de tudo isso, escreveu crítica literária, onde abordou
também questões sobre arte. Concorreu para o cargo de conservador do
Museu Conde de Castro Guimarães, em Cascais, um museu ligado às artes,
não tendo no entanto sido selecionado, o que muito lamentou.
Fernando Pessoa é conhecido e designado geralmente como poeta. Nos seus
textos de ensaio há muitas reflexões sobre literatura e arte, por vezes
separadas, falando ora de uma ora de outra, ora das duas juntas,
indistintamente, pois para ele “toda a arte é uma forma de literatura, porque
toda a arte é dizer qualquer coisa (…). Há que procurar em toda a arte que
não é literatura, a frase silenciosa que ela contém, ou o poema, ou o romance,
ou o drama”.
Isto significa que Fernando Pessoa dava prioridade à literatura, pois para ele a
literatura era definida como arte, e era para ele a mais suprema das artes.
Fernando Pessoa muitas vezes chama artistas aos escritores, como por
exemplo nos seus textos sobre o seu poema Antínoo
O interesse de Fernando Pessoa pela arte propriamente dita é muito vasto, tanto
na sua escrita ensaística, como poética, pois o poeta também escreveu alguns
poemas sobre música, canto, estátuas, quadros, teatro, etc. , ou poemas em
que algumas destas artes são referidas.
O problema da definição de arte

A arte conduz a muitos problemas filosóficos : o que é a arte


? para que serve a arte ? uma obra de arte tem de ser bela ?
a obra de arte ensina alguma coisa ? há progresso na arte ?
como é que uma obra de arte pode ser julgada ? em que
sentido o artista pode ser considerado testemunha do seu
tempo ? é o olhar do espetador que faz a obra de arte ? é
possível, na arte, estarmos certos ou errados, quando
dizemos que determinada obra é bela ? tem de se ser um
conhecedor para apreciar uma obra de arte ?
Existem 5 TEORIAS FILOSÓFICAS DA arte para responder a
estas perguntas sendo dessas 5 três teorias essencialistas(
que defendem a existência de propriedades essenciais
ou intrínsecas comuns a todas as obras de arte). E 2 teorias
não essencialistas(Defendem a existência de
propriedades extrínsecas aos objetos, ou seja, o contexto
relacional e a intenção do artistas.
Teorias essencialistas
• 1.Teoria da arte como imitação ou representação. TESE - Uma obra é arte
se, e só se, é produzida pelo homem e imita algo ou representa algo.
• 2.Teoria expressivista da arte ou arte como expressão. A obra é arte se, e só
se, produz no público os sentimentos e emoções vividas pelo artista.
• 3.Teoria formalista ou teoria da forma significante. O objeto é arte se, e só
se, possui uma forma significante que produz no espetador a emoção e o
prazer estético.

Teorias não essencialistas


4. Teoria institucional «Uma obra de arte é um artefacto criado para ser apresentado a um público do mundo da
arte». Quem define o que é a obra de arte são as pessoas que fazem parte do mundo da arte e o público que aprecia
a obra. Não é o artista que decide
5. Teoria histórica . define a arte pela intenção do artista em produzir um objeto que seja percecionado como obra
de arte, tal como os outros artistas o fizeram no passado histórico.
Fernando Pessoa interessou-se por alguns destes problemas filosóficos, escrevendo muitos
textos(quase todos pequenos, como acontece com a generalidade dos textos ensaísticos de
Fernando Pessoa) nomeadamente de ensaio, ou de caráter ensaístico, onde respondeu ou
procurou responder a alguns destes problemas sobre arte, textos esses que são pouco
conhecidos do grande público.
Fernando Pessoa abordou várias perspetivas acerca deste tema por diversas unidades
temáticas : a divisão e a classificação das artes, a definição e a caracterização da arte, a
finalidade e o valor da arte, a psicologia da arte, a sociologia da arte, a crítica de arte, o artista,
a genialidade, a celebridade, a arte e a moral, as escolas e as correntes artísticas.
• Fernando Pessoa não é redutível a uma teoria estética, não foi adepto de
nenhuma escola, a sua aspiração não foi exclusivista, preferindo antes uma
visão mais eclética e abrangente. A dificuldade de integrar Fernando Pessoa
numa conceção de arte, numa teoria estética, ou numa corrente artística, é
sublinhada pelo próprio Fernando Pessoa quando por exemplo ele afirma
sobre a revista Orpheu, e implicitamente sobre próprio : “Os artistas de
Orpheu pertencem cada um à escola da sua individualidade própria, não
lhes cabendo portanto, em resumo do que acima se disse, designação
alguma coletiva. As designações coletivas só pertencem aos sindicatos, aos
agrupamentos com uma ideia só (que é sempre nenhuma) e a outras
modalidades do instinto gregário, vulgar e natural nos cavalos e nos
carneiros.”
• Noutro texto, Fernando Pessoa reivindicava como objetivo do Orpheu, e
indiretamente como o seu objetivo : “toda a verdadeira arte moderna tem de
ser maximamente desnacionalizada, acumular dentro de si todas as partes
do mundo. Só assim será tipicamente moderna. Que a nossa arte seja uma
onde a dolência e o misticismo asiático, o primitivismo africano, o
cosmopolitismo das Américas, o exotismo ultra da Oceânia e o maquinismo
decadente da Europa se fundam, se cruzem, se intersecionem. E, feita esta
fusão espontaneamente, resultará uma arte-todas-as-arte, uma inspiração
espontaneamente complexa”
Fernando Pessoa quis viver dentro de si todos os movimentos artísticos, ser
tudo de toda as maneiras também na arte, não se enquadrou em nenhum
ismo (classicismo, futurismo, cubismo, sensacionismo, abstracionismo,
decadentismo, etc.). No entanto, apesar de ser difícil enquadrar Fernando
Pessoa numa teoria estética ou numa corrente artística única, Fernando
Pessoa assumiu o modernismo como a área onde se situava, contestando
o saudosismo, desnacionalizando a arte, e defendendo a
contemporaneidade artística como a mais próxima, embora não
necessariamente coincidente, com as suas ideias estéticas.

Gravura, “Masck Horse!?”, 1990. Litografia impressa a preto, s/papel de algodão. Mancha irregular. Papel 70x50cm
Por outro lado, existem algumas ideias centrais que se podem
retirar dos textos de Fernando Pessoa, sobre o que ele
pensava sobre a arte. Para Fernando Pessoa a arte não tem
um fim social, e se o tem, “o artista não tem que se importar
com o fim social da arte ou com o papel da arte adentro da
vida social, o artista tem só que fazer arte”, pois “a arte é a
expressão da individualidade”. No Livro do Desassossego
Fernando Pessoa defende também essas ideias : “o que é a
arte senão a negação da Vida ?” ; “a arte é um esquivar-se a
agir, ou a viver”” ; “a arte tem valia porque nos tira de aqui”.
Esta conceção é a da chamada “arte pela arte”, que defende a
autonomia da arte, desligando-a de objetivos funcionais,
pedagógicas ou morais, e privilegiando apenas a Estética.
Fernando Pessoa tinha “um conceito puramente estético da
arte”, para ele a arte é valiosa por si mesma, e o seu valor não
depende daquilo que ela traz ao público. Segundo Fernando
Pessoa o artista cria outros mundos, evade-nos do quotidiano,
“a arte é um afastamento da realidade. Fazer quadros,
estátuas, sinfonias ou poemas, é, humanamente, uma
anormalidade”. O artista cria mundos fictícios, assim como o
poeta, que segundo Fernando Pessoa é um fingidor, logo “tão
pouco se deve o artista preocupar com a verdade do que
escreve”
O verdadeiro artista
Daqui decorre também a separação entre o grande artista e
o seu tempo, pois segundo Fernando Pessoa muitas obras
de arte “coexistem com toda uma época do país em cuja
língua foram escritas, e quando essa época termina também
elas cessam.

O grande e verdadeiro artista, o génio, segundo Pessoa,


nunca é reconhecido no seu tempo, devido à falta de
fama em vida, e a oposição ao público do seu tempo.
O que é a arte ?

Atualmente, devido ao facto de muitos artistas criarem obras polémicas, que


propõem como sendo uma obra de arte, e perante a hesitação de muitas
pessoas em as considerarem como sendo uma obra de arte, mais do que nunca
coloca-se a seguinte questão : o que é a arte ? Esta questão coloca-se
sobretudo no nosso tempo, dado que a criação e a exposição de determinas
coisas como sendo obras de arte não parecem envolver as capacidades que
tradicionalmente se associam à arte, tais como por exemplo o talento para
desenhar e pintar. No entanto, embora esse problema se coloque mais nos
tempos de hoje, já em Fernando Pessoa existe a preocupação em pensar esse
problema, por um lado porque determinadas obras polémicas e suscetíveis de
dúvidas sobre o seu estatuto artístico, como por exemplo a , surgiram no
tempo de Fernando Pessoa, e por outro lado por terem surgido em Portugal
movimentos literários e artísticos que causaram também polémica, devido ao
seu carater vanguardista, como por exemplo a revista Orpheu, dirigida por
Fernando Pessoa. Pode mesmo dizer-se que a questão sobre o que é a arte, foi
a principal questão em torno da qual gravitou a reflexão de Fernando Pessoa
sobre a arte,
O que é arte para Pessoa?
Fernando Pessoa ortónimo afirma que “a arte é a expressão de um
equilíbrio entre a subjetividade da emoção e a objetividade do
entendimento, que, como emoção e entendimento, e como subjetiva e
objetiva, se entrepõem, e por isso, conjugando-se, se equilibram”.
Para Fernando Pessoa a arte não consiste no conteúdo da sensibilidade, mas
no que o artista faz desse conteúdo. A sensibilidade constitui o ponto de
partida da arte, mas é a inteligência que, trabalhando a sensibilidade, lhe
dá forma. Para isso, Fernando Pessoa lembra a Grécia antiga, ao afirmar
: “o grego reparava essencialmente na forma. É na forma que repara
primeiro o homem atento ao mundo exterior. O Cristianismo caiu no erro
regressivo de buscar na arte uma expressão de emoções, de sensações, de
aspirações. A arte é isto, porém, apenas num seu estádio inferior”.
A partir da sensibilidade que pretende trabalhar, o artista escolherá os elementos que
dão corpo à obra de arte. Na literatura, as palavras, e dentro destas a combinação de
determinados adjetivos, verbos, substantivos, etc. ; na pintura, a combinação de
linhas, cores e formas; na escultura, por entre os materiais como o mármores, o
calcário, o a madeira, a volumetria, a unidade, etc.; na música, uma certa relação entre
sons, timbres e ritmos; na dança, uma certa organização dos movimentos, etc.

“A arte consiste em fazer os outros sentir o que nós sentimos, em os libertar deles
mesmos, propondo-lhes a nossa personalidade para especial libertação.”
Crítica à teoria expressivista

Em certos capítulos é possível verificar críticas à teoria


expressivista da arte, segundo a qual a arte é essencialmente
expressão de sentimentos ou emoções, e critica por isso o
sentimentalismo do Romantismo como definidor do artista.

“quando a arte passou de ser tida como criação para passar a ser tida como expressão de sentimentos, cada qual podia ser artista, porque todos têm sentimentos”
Rejeita as teorias da arte como
imitação e representação

Uma outra ideia expressa por Fernando Pessoa, através do


seu heterónimo Álvaro de Campos, é a da não sujeição da
arte à imitação do real, nem a ligação da arte à beleza, mas
àquilo a que ele chama “força” : “A arte, para mim, é, como
toda a atividade, um indício de força, ou energia; mas, como
a arte é produzida por entes vivos, sendo pois um produto
da vida, as formas da força que se manifestam na arte são
as formas da força que se manifestam na vida".
Fotogaleria
Michael Barrett
De forma peculiar e dinâmica, Michael Barrett criou retratos de Fernando Pessoa com influências
impressionistas e expressionistas. Nesta obra o poeta é representado com os elementos que o
caracterizam, sendo ao mesmo tempo, envolvido numa paisagem quente com diversos pigmentos que
dão vivacidade à pintura. De modo a criar formas mais assentes, o pintor traçou nas manchas de
acrílico os atributos do rosto e da paisagem. Assim, a cor e a linha são os protagonistas desta graciosa
pintura que expressa a admiração de Michael Barrett pelo poeta português Fernando Pessoa.
Curiosidade

Em carta, Henriqueta Madalena Nogueira dos Santos Rosa, a Teca, conta a


Hubert Jennings a infância do poeta logo depois de a família voltar da África
do Sul para Lisboa. Fica-se sabendo que Fernando Pessoa morria de medo de
trovões e costumava se esconder em lugares escuros durante tempestades.
Também era amado pelas crianças, por deixar a sobrinha encher a sua cara de
espuma para barbeá-lo. Teca relata ainda que amigos reclamavam do
isolamento do autor. "Era ele que escolhia a reclusão, mesmo vivendo com
outros", escreve.

Carta de Teca, meia-irmã de Pessoa


Em carta, Henriqueta Madalena Nogueira dos Santos Rosa, a Teca, conta a
Hubert Jennings a infância do poeta logo depois de a família voltar da África
do Sul para Lisboa. Fica-se sabendo que Fernando Pessoa morria de medo de
trovões e costumava se esconder em lugares escuros durante tempestades.
Também era amado pelas crianças, por deixar a sobrinha encher a sua cara de
espuma para barbeá-lo. Teca relata ainda que amigos reclamavam do
isolamento do autor. "Era ele que escolhia a reclusão, mesmo vivendo com
outros", escreve.

• Em carta enviada a Hubert Jennings, Luiz Miguel Nogueira Rosa, o


Michael, irmão do poeta, comenta poemas ingleses inéditos de Pess
oa que tinha enviado ao intelectual -e discute um possível livro de
Jennings. O documento permitiu traçar a autoria de
um texto anônimo no acervo de Manuela Nogueira, sobrinha de
Pessoa, como sendo do próprio Jennings. Na carta, Michael
reclama de "Obra e Vida de Fernando Pessoa", de José Gaspar
Simões, por este dizer que o poeta era um bêbado.
"É verdade que ele bebia muito, mas nunca foi visto bêbado", escrev
e Michael. Carta de Michael, meio-irmão de Pessoa, a Hubbert Jennings
No quadro “O Poeta”, de Marc Chagall, observa-se, em primeiro plano, uma figura humana, sentada a um bar e acompanhada
por um gato. O plano de fundo apresenta-se difuso e acinzentado, enquanto que a cor vermelha, do lado direito da tela, e a
azul, do lado esquerdo, destacam a ação principal: um homem que escreve num pequeno caderno, enquanto desfruta de uma
bebida.
Este quadro está intimamente relacionado com os poemas de Fernando Pessoa que definem a teoria do fingimento artístico. O
contraste entre as cores frias que preenchem o corpo do poeta e as cores quentes do ambiente que o envolve realçam o
processo de intelectualização das emoções presente no processo criativo pessoano. A intensidade e espontaneidade das
sensações que o atingem são esfriadas pelo filtro da imaginação, uma vez que o poeta se expressa racionalmente (daí o facto
de a cabeça estar do avesso, posicionando o cérebro ao nível da boca), afastando o coração e a sua sensibilidade, como que a
guardando no seu bolso.
Absorvido pelo processo de escrita e pela sua bebida (como seria, aliás, comum em Pessoa), o poeta encontra-se indiferente à
vida exterior: à flor que desabrocha, ao gato que se aproxima e à fruta cortada abandonada no balcão. Para tal contribui,
também, o facto de a perspetiva do poeta em relação ao que o rodeia diferir da das pessoas comuns, pois é como se
observasse o mundo do avesso.
Esta obra de arte é, de facto, muito expressiva e rica em símbolos, cujos significados diferem de interpretação para
interpretação. Conjugando dois campos da arte (a literatura e a pintura), Chagall aproxima-nos do processo de escrita e
transmite ao observador a sensação de distanciamento do poeta em relação ao que o rodeia.
Face ao alcance indefinido da mente do poeta e à excentricidade do seu ponto de vista, talvez estejamos tão longe de o
compreender realmente como o gato inocente e de índole quente que o observa com curiosidade.
• o observar ambos os cartoons partilham uma conexão com a ideia
do “fingimento poético”, a reprodução literária de sentimentos do
poeta, típico de Fernando Pessoa.
O primeiro cartoon mostra a união da mente com o coração,
através de cordas de uma guitarra. A imagem sugere que o
cérebro “afina” os nossos sentimentos, fazendo uma alusão direta
à forma como Fernando Pessoa filtrava as emoções que sentia
pela razão: “Eu simplesmente sinto/ Com a imaginação” (“Isto”,
vv. 4-5).
O segundo cartoon mostra uma figura a ser impulsionada para o
ar, por um balão com a forma de cérebro. Neste cartoon, não está
explícita a relação razão/sentimento, no entanto é possível
interpretar a elevação da personagem (parecida com Fernando
Pessoa) através da razão, como uma referência a Pessoa. Como a
poesia de Pessoa é carregada de sentimentos, entre os quais a
dor, mas estes são “adulterados” pela razão, podemos concluir
que é de facto a mente que eleva o poeta: “Gira, a entreter a
razão,/ Esse comboio de corda/ Que se chama de coração.”
(“Autopsicografia”, vv. 10-12).
Deste modo, é possível relacionar os dois cartoons com a tese do
“fingimento poético” de Fernando Pessoa.
• Pessoa resume um pouco sobre qual o significado da
arte para si, e qual o propósito de seu trabalho. Neste
ponto de vista, a arte pode servir como uma “fuga”,
onde podemos esquecer dos nossos problemas e
condições para viver aventuras e sentimentos que
estão para além deste mundo.
• A ciência descreve as coisas como são; a arte, como
são sentidas, como se sente que são.
• Quando tentamos materializar sentimentos em arte
não devemos esperar por uma ideia externa, mas
apenas deixar que estas emoções nos guiem ao longo
do processo.
Durban High School

Universidade do Cabo

Universidade de Lisboa
• “toda a arte é uma forma de literatura, porque toda a arte é dizer qualquer coisa (…). Há que procurar em toda a arte que
não é literatura, a frase silenciosa que ela contém, ou o poema, ou o romance, ou o drama”.
• Isto significa que Fernando Pessoa dava prioridade à literatura, pois para ele a literatura era definida como arte, e era para
ele a mais suprema das artes. Fernando Pessoa muitas vezes chama artistas aos escritores, como por exemplo nos seus
textos sobre o seu poema Antínoo
• Reforçar a tal ideia de ele andar na rua e frequentar cafés
• A arte consiste em fazer os outros sentir o que nós sentimos, em os libertar deles mesmos, propondo-lhes a nossa
personalidade para especial libertação.
“O Poeta”, de Marc Chagall,

Fotogaleria: fingimento poético

André Letria, in Revista Pessoa, Ano 1, nº zero, agosto-setembro-outubro de 2010

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