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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES


FACULDADE DE EDUCAÇÃO
FUNDAÇÃO CECIERJ /Consórcio CEDERJ / UAB
Curso de Licenciatura em Pedagogia – modalidade EAD
Polo: Três Rios
5º Seminário

Quando criança eu era muito tímida e isso foi mudando com o passar do tempo, falante eu sempre fui. Nascida e
criada em uma cidade do interior do Rio de Janeiro onde nada tinha e nada tem ainda, com pais sempre muito rígidos
o estudo foi meu único lazer até os meus 17 anos.

Esse seminário me fez viajar em minhas lembranças, percorri toda a minha trajetória escolar e profissional e junto
delas momentos bons e ruins da minha vida. É engraçado como que a partir de lembranças de outras pessoas acabei
me recordando inicialmente de fragmentos e depois construindo cenas do passado, minhas histórias de vida que por
vezes eram próximas de pessoas que eu nem sonhava em conhecer naquela época.

No momento em que passamos por determinada situação nem imaginamos a proporção de significado que aquele
momento pode ter em nossa vida anos depois. Fiquei imaginando como eu era quando criança, meus anseios, minhas
expectativas de vida. Por exemplo, há 10 anos eu nunca imaginaria estar fazendo faculdade de Pedagogia, pois
almejava Letras com licenciatura em Português e Inglês ou Ed. Física. Estar trabalhando onde estou hoje também não
era meu intuito, sou cuidadora escolar no munícipio de Petrópolis e na verdade nunca quis sair da minha cidade,
almejava ser professora em Paraíba do Sul, ter um casal de filhos, ser casada, bem resolvida financeiramente e viajar
muito pelo Brasil. Porém já tive dois casamentos fracassados, não tenho filhos e o concurso pra qual passei foi de
cuidadora escolar (que nem queria fazer, diga-se de passagem!), não sei falar a língua inglesa fluentemente ainda
porque devido ao fato de não ter me organizado financeiramente ainda não obtive dinheiro para pagar um curso.

Eu iniciei minha vida escolar com 4 anos de idade, e queria muito aprender a ler. Eu amava gibis da turma da Mônica
e queria ler sozinha, sendo assim minha mãe mesmo não sabendo ler e escrever muito bem começou do jeitinho dela a
me ensinar em casa e minha irmã (sendo obrigada) me ajudava também. Eu sempre fui muito dedicada (até porque eu
queria muito aprender!) e no fim do ano já sabia escrever meu nome, dos meus pais, minha irmã, minhas madrinhas,
amiguinhos mais próximos, reconhecia números e lia alguma coisinha. Na minha época a escola era divida em 1º, 2º e
3º período, C.A. (Classe de Alfabetização, atual 1º ano hoje), 1ª a 4ª série, 5ª a 8ª série e 1º a 3º ano (que fiz 2 vezes,
contarei mais à frente), sendo assim já entrei no 2º período com 4 anos, devido ao fato da minha mãe não trabalhar
fora então ficava comigo, mas eu queria muito ir para a escola e consegui. No ano seguinte comecei a estudar com
uma “tia” que não me deixava escrever nem o meu nome nos meus trabalhinhos... Fiquei arrasada! Chegava todos os
dias tristinha em casa e reclamava com minha mãe (sempre fui de falar demais), minha mãe foi até a escola e a “tia”
falou que como os outros amiguinhos não sabiam ainda eu não podia escrever também. Minha mãe, mesmo não tendo

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estudo sempre lutou muito junto do meu pai para dar uma boa educação para eu e minha irmã e na mesma hora
solicitou que então me transferissem para uma série à frente, porém a escola se recusou devido a minha idade (faço
aniversário em 06 de abril e acredito que só poderia se eu fizesse até 31 de março). Claro que minha mãe não cruzou
os braços e aceitou numa boa, fomos a outras três escolas da cidade (que eu me lembro) e fiz provas de proficiência
em cada uma. Uma dessas provas me marcou, sou muito medrosa, sempre fui, e a aplicadora da prova solicitou que eu
escrevesse meu nome, o alfabeto, algumas palavras e depois os numerais até 20 ou 30 (não me recordo bem) e quando
eu estava já na parte dos numerais ela saiu da sala e me deixou sozinha (fiquei morrendo de medo!) e dai pra m
distrair e não sair correndo chorando resolvi me concentrar na atividade e fiz os numerais até mais de 100. Ao chegar
a “tia” ficou impressionada, me perguntou se eu reconhecia os números e eu falei que sim e contei pra ela, quiseram
fazer a minha matricula na mesma hora. Quando minha mãe voltou até a escola onde eu estudava solicitando minha
transferência à secretaria não quis dar, minha mãe disse que eu não ficaria naquela turma que estava me atrasando e
que todos nas outras escolas tinham ficado impressionados comigo e ela não me deixaria perder oportunidades dessa
forma, sendo assim a diretora resolveu me matricular no C.A. e junto comigo foram mais 2 amiguinhos, a Talita e o
Jonathan, a Talita chorava tanto que acabaram voltando ela para o 3º período e, eu e Jonathan permanecemos seguindo
juntos até a 8ª série quando eu sai daquela escola para fazer o Médio Normal na cidade de Três Rios.

Darcy Ribeiro diz que “A nova LDB muda muita coisa, porém o faz mais incentivando transformações nos vários
níveis de ensino do que ordenando rigidamente normas estatutárias. Os sistemas estaduais de educação são
fortalecidos e incentivados a ir adaptando a educação em seus Estados às prescrições da lei, mas fazendo com
respeito às próprias tradições e singularidades.” Somente esse ano me dei conta de que a minha situação descrita
acima ocorreu no ano em que a LDB 9394/96 foi sancionada. E penso se naquela época as pessoas responsáveis pelo
colégio em que eu estudava imaginavam a diferença que iria fazer um ano em minha vida.

Já dizia Paulo Freire da importância de valorizar o conhecimento do aluno, e eu fui brutalmente bloqueada pela minha
professora. Sempre que vejo uma criança empolgada a escrever ou ler algo mesmo que esteja errado eu super apoio,
pois a lembrança que tenho do meu pré-escolar é péssima devido a essa negatividade que a professora me passou. Eu
nem me recordo do ano anterior direito, lembro-me dela tirar trabalhinhos da minha mão grosseiramente para que eu
não escrevesse meu nome. Eu ficava arrasada, muito triste mesmo e reclamava muito (eu não tinha culpa se meus
amiguinhos não sabiam!).

Agora, nesse exato momento me dei conta de que a Constituição Federal é muito recente... 1988! Já a estudei, li,
comentei, mas sabe quando não atentamos para certos detalhes? Fiquei assustada comigo mesma agora!!!

Mas, voltando a minha história...

O decorrer do meu primário correu calmamente e com muitos elogios (o que, diga-se de passagem, sempre gostei!),
sempre tirei notas boas e era uma das melhores alunas. Cheguei a ganhar uma viagem para o Museu no Rio de Janeiro
devido as minhas boas notas. Fiquei super feliz!

Durante o meu ginásio (5ª a 8ª série) eu estudei muito também, porém comecei a dar uma vacalhada. Não me dedicava
tanto como antes aos estudos, estava pensando em namoradinhos, porém ainda assim tirava boas notas, não eram mais

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10 como antigamente, mas também não eram vermelhas. Minha primeira nota vermelha foi na 8ª série em artes, pois
me recusei a comprar uma tela para fazer um desenho que a professora queria. Não sabia, não sei e não gostava de
desenhar, e não ia gastar um dinheiro que não tinha pra fazer um trabalho que a meu ver não era útil. Sendo assim, me
recusei a fazer, fui com nota vermelha, reclamei com a diretora e a professora teve que me dar um trabalho extra, fiz o
trabalho e recuperei a minha nota. Claro que a professora não gosta de mim, mas eu tentei conversar com ela primeiro,
porém não me ouviu.

Desde que me entendo por gente eu dizia que iria ser professora e quando eu estava na 8ª série quase vi meu sonho
terminar antes mesmo de começar. Não tinham escolas que ofereciam o curso de formação de professores em minha
cidade, ai descobri que tinha o Instituto de Educação em Três Rios (cidade vizinha de onde moro, atualmente onde
faço minha faculdade), na época a dificuldade era maior, eu não conhecia a cidade e tinha apenas 14 anos (faria 15 em
abril do 1º ano do Curso Normal). Fui com minha mãe fazer uma pré-inscrição no Instituto (que nem sabíamos onde
era), ao fazer a inscrição não tive certeza que eu conseguiria a tão esperada vaga e com isso foram meses de
sofrimento e indecisão. Apenas em dezembro de 2004 que chegou uma carta solicitando que eu e um responsável por
mim fossemos fazer a minha matrícula, sendo que na época não tínhamos o dinheiro da passagem e foi a maior
correria pra conseguir e “chororo” de emoção de poder realizar meu sonho de estudar para ser professora. Após a
matricula eu fiquei muito feliz, porém muito triste também, eu queria ser professora, mas não queria abandonar a
minha turma, estávamos juntos desde o C.A. foram 9 anos juntos entre trancos e barrancos e eu fiquei arrasada.

Ao chegar à escola nova me juntei com umas meninas meio revoltadas da vida, algumas fumavam (Mas eu nunca
fumei não. Tenho a maior alergia, quase morro com fumaça de cigarro, imagina se eu fumasse?! Morria!) e todas nós
éramos muito doidas (arrumávamos algumas brigas de vez enquanto, e gostávamos muito de dar uns beijos nos
meninos, resumindo éramos namoradeiras e dai criávamos algumas inimizades.), porém como eu disse acima sempre
falei demais e essas meninas falavam muito também, sendo assim nosso maior defeito era não calar a boca nem um
segundo na escola, nem sala de aula nem em lugar nenhum. Um professor muito sério sempre anotava um sinalzinho
de menos em frente ao nosso nome, na semana da primeira prova dele recebemos a noticia que havia falecido
(achamos que era brincadeira de inicio e comemoramos, depois soubemos que era sério e a consciência pesou muito.).
Eu, em 10 anos na mesma escola, nunca havia perdido um professor, no primeiro bimestre em uma nova escola um
professor que aparentava detestar a gente se mata, simplesmente quis desistir do curso. Fiquei em prantos, só queira
voltar pra minha escola. Mas claro que minha mãe não deixou, disse que era frescura, hoje sei que não foi, mas na
época até acreditei que era mesmo. Cheguei a desmaiar algumas vezes, hoje sei que foi tudo emocional, mas na época
achei que estava morrendo.

Durante o Magistério eu aprontei muito e não dei o devido valor aos estudos, aprendi muita coisa, mas hoje vejo que
poderia ter aprendido muito mais. Atualmente na faculdade também não tenho me dedicado como deveria o fato de
assimilar com facilidade os conteúdos eu acabo não dando a ênfase necessária ao que realmente importa. E dizendo
isso me recordo de um texto muito interessante que minha professora Marlene apresentou para a turma provavelmente
no ano de 2007 ou 2008 intitulado Sobre homens e moluscos, onde Rubens Alves diz o seguinte:

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Piaget, antes de se dedicar aos estudos da psicologia da aprendizagem, fazia pesquisas sobre os moluscos dos lagos da
Suíça.[...] Ignoro detalhes da biografia de Piaget e não sei o que o levou a abandonar seu interesse pelos moluscos e a
se voltar para a psicologia da aprendizagem dos humanos. Não sabendo, tive de imaginar. E foi imaginando que
pensei que Piaget não mudou o seu foco de interesse. Continuou interessado nos moluscos. Só que passou a concentrar
sua atenção num tipo específico de molusco, chamado "homem".[...]

Esse texto marcou minha vida e até hoje nos lembramos dele, digo eu e minha turma daquele ano, por isso termino
esse breve memorial com duas citações desse texto. Porém antes gostaria de dizer que não esperava que escreveria tão
rápido 4 laudas, e nem precisei “encher linguiça”, como eu acreditei que iria precisar. Foi realmente gratificante
relembrar de tantas coisas, não deu pra descrever tudo, estresses quando aluna, experiência em sala de aula como
professora (achei por vezes que iria surtar, mas foi extremamente gratificante, e atualmente o eu mais quero é voltar
para sala de aula como professora), tudo o que aprontei na escola, apertos sinistros que passamos durante os estágios,
nossas apresentações de dança, a Trupe da Alegria, tantos acontecimentos que ficou difícil colocar em apenas quatro
folhas e sei que pequei em não relacionar minhas experiências a pensamentos de Piaget, Vigotsky e outros pensadores,
porém garanto que sei que na prática o mais importante é conhecer cada criança e valorizar sua cultura, anseios e reais
necessidades a fim de proporcionar as mesmas oportunidades de acesso ao conhecimento a todos. Cada um irá
internalizar o que lhe for útil.

“O corpo aprende para viver. É isso que dá sentido ao conhecimento. O que se aprende são ferramentas, possibilidades
de poder. O corpo não aprende por aprender. Aprender por aprender é estupidez. Somente os idiotas aprendem
coisas para as quais eles não têm uso. É o desafio vital que excita o pensamento.” – Rubens Alves

“A memória não carrega conhecimentos que não fazem sentido e não podem ser usados. Ela funciona como um
escorredor de macarrão. Um escorredor de macarrão tem a função de deixar passar o inútil e guardar o útil e
prazeroso. Se foi esquecido, não fazia sentido. [...] O aprendido é aquilo que fica depois que tudo foi esquecido...”
– Rubens Alves

Fontes de pesquisa:

LDB 9394/96

Sobre moluscos e homens

https://pt.wikipedia.org/wiki/Mem%C3%B3ria

https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/direito/neuropsicologia-como-funciona-a-nossa-memoria/52408

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