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Catete - 1825
A Grande Internação no século XVII e
seus Reflexos no Brasil em Formação
A Grande Internação no século XVII e
seus Reflexos no Brasil em Formação
A Grande Internação no século XVII e
seus Reflexos no Brasil em Formação
Os mecanismos de apartação
social tinham como finalidade de
prestar “assistência” aos
necessitados e de sanear a
cidade, poupando os mais
abastados do convívio social
com os considerados marginais e
desajustados.
A Grande Internação no século XVII e seus
Reflexos no Brasil em Formação
Hospital D. Pedro II
Detalhes arquitetônicos do
Salão Dourado, localizado Salão Dourado com estátua de D.
no Palácio Universitário da Pedro II, ao fundo, ao lado do piano.
Praia Vermelha, antigo Localizado no Palácio Universitário,
Hospício Pedro II. Ao fundo antigo Hospício Pedro II, na Praia
a estátua de Pedro II. Vermelha.
Hospital D. Pedro II 🡪 UFRJ
Em 1852, no ano da fundação do Hospício Provisório de Alienados de São Paulo, assim se referia
o presidente da província de São Paulo à presença de alienados nas cadeias:
“(...) estabeleci nesta capital uma casa provisória para os alienados (...); (...) esta despesa, Srs., e
aquela que d´ora em diante se fará com a sustentação desse estabelecimento é muito insignificante
se vos penetrardes do horror que a todos inspirava a barbaridade com que eram tratados esses
infelizes até agora lançados nas cadeias até morrerem, e metidos sem culpa no lugar de criminosos
e, entre eles, sofrendo violências que revoltam à humanidade." (Presidente José Tomás Nabuco de
Araújo, 1852).
Cerca de 30 anos depois, a situação parecia não ter mudado muito: "(...) É de urgente
necessidade a conclusão destas obras, a fim não só de modificar a aglomeração dos doentes,
como também, de atender-se a muitos pedidos de admissão de infelizes alienados, que existem
pelas cadeias da Província, por não haver mais acomodações no Hospício." (presidente
Francisco de Carvalho Soares Brandão, 1883).
A Grande Internação no século XVII e seus
Reflexos no Brasil em Formação
As autoridades policiais eram as principais fontes de encaminhamento de
alienados do interior paulista para o Hospício da capital:
"(...) a polícia remete para o Hospício os alienados que lhe são enviados pelas autoridades do
interior, as quais, muitas vezes, nem o próprio nome do enfermo sabem, visto aparecerem eles
vagando pelas ruas ou estradas e são completamente desconhecidos no lugar." (Presidente
Barão do Parnaíba, 1887).
Por esta via, ele integra-se ao esforço disciplinador da medicina, do direito, da engenharia
sanitária, da arquitetura, da pedagogia, das instituições penais e correcionais, da polícia e
assim por diante, no sentido de forjar uma sociedade organizada, asséptica, livre da ameaça.
Francisco Franco da Rocha
“Um bom asilo deve ter seções diversas nas quais a liberdade se gradue pelo estado
mental dos pensionistas. O excesso de zelo pela liberdade dos loucos pode
facilmente degenerar em futilidade”.
ROCHA, Franco. Hospício e Colônias de Juqueri: vinte anos de assistência aos alienados em São Paulo, 1912.
“Dentro em pouco tempo alguns enfermos, dos que entraram a gozar das regalias
relativas ao seu trabalho, perderam de todo a ideia de prisão ou hospício, que
muito constantemente vexa os insanos crônicos e raciocinantes. A prova mais
evidente do que acabamos de dizer é o seguinte episódio:
Assistia eu, há tempos, a uma remoção de terra em que trabalhavam diversos
insanos e um empregado. O empregado atirou por brincadeira uma pá de terra nas
pernas de um dos doentes; este, sem zangar-se, retrucou-lhe, com estas palavras:
Não comece a me provocar, que perco a cabeça e vou para outra vez no hospício.
(...) tais palavras valem, mais que um livro para demonstrar as vantagens do open-
door. Aquele doente não se julgava mais recluso; supunha-se em plena liberdade.
O hospício a que ele se referia era o antigo casarão da cidade.”
Colônia Agrícola: Asilo de Alienados do Juqueri
“Não se deve, entretanto, olhar somente o valor a produção (que é grande), mas o lado
moral da questão. O insano que trabalha e vê o resultado de seu suor, sente – se mais digno;
sai da condição ínfima de criatura inútil e eleva-se a seus próprios olhos; adapta-se a um
modus vivendi que lhe suaviza grandemente a desgraça. A consciência do próprio valor
pessoal revive no indivíduo, que, de outro modo, seria uma carga pesada e inútil para a parte
sã da sociedade”.
“Nas proximidades do Juqueri, num raio de 15 km em redor do Hospício, encontram-se
habitações esparsas, cujos donos vivem modestamente de sua pequena lavoura; há entre
eles, pessoas educadas, de boa índole, capazes de preencher as funções de nutrício tão bem
como os melhores da Escócia.
Ora, como os nossos insanos pobres em geral são de origem rústica e por isso mais ou menos
afeitos a lavoura, a tal ponto que até nem lhes convém outro gênero de trabalho, é de crer
que as condições existentes ofereçam franca possibilidade de resultado.”
Colônia Agrícola: Asilo de Alienados do Juqueri
O tratamento da loucura nessas instituições, uma vez que as sangrias e vomitórios da
medicina da época não se adaptavam bem a esse novo domínio, ficava circunscrito às
práticas de coerção, contenção e punição. Tais métodos, coadjuvados à imposição do
trabalho forçado nas colônias agrícolas, iriam constituir a base do tratamento moral nas
instalações brasileiras, fazendo um eco um tanto agrário a sua matriz europeia. Repetiam-se,
contudo as bizarrices consideradas terapêuticas à época:
• Banhos quentes e frios;
• Banhos quentes com aplicação de capacetes de gelo;
• Malarioterapia: que consistia na inoculação da malária no organismo de pacientes para que suas crises
afastassem a loucura,
• Trepanação: consiste na abertura de um ou mais buracos no crânio, através de uma broca neurocirúrgica.
• Insulinoterapia: aplicação de injeções de morfina e de outras substâncias sedativas para provocar o estado de
coma;
• Traumaterapia: macabra conquista da psiquiatria brasileira – “orgulhosamente” descoberta pelo médico
Franco da Rocha –: consistia em uma violenta pancada na boca do estômago do paciente, imobilizando-o.
O Espelho do Mundo:
Juqueri
O Espelho do Mundo: Juqueri
O Hospício do Juqueri vem para equacionar, pela via cientifica e sob o signo
reconciliado da “cura” e da “assistência”, uma questão política fundamental:
conferir legitimidade à exclusão de indivíduos ou setores sociais não totalmente
enquadráveis nos dispositivos penais.
Em seu prontuário não consta nenhuma observação além daquelas referentes à sua condição
sexual: “(...) desenvolvimento excessivo do membro viril. Desde os dezesseis anos é pederasta
passivo. Nunca praticou o coito normal com mulher”, assinala o alienista.
Segundo suas indicações, o jovem ainda “masturbava-se em excesso” e estava acometido de
doença venérea. Tinha, é verdade “orelhas mal conformadas” e uma certa “assimetria na
cabeça”, que reforçam a visão de que sua homossexualidade estava associada à degeneração.
Conclusão
Conclusão
O Juqueri constitui a instauração de um espaço médico para quem já não dispõe
de espaço social, ou para indivíduos por razões diversas incapazes de adaptação
às disciplinas exigidas pela vida e pelo trabalho urbano.
Neste sentido, seus maiores contingentes populacionais são fornecidos pelos
resíduos da força de trabalho da cidade de São Paulo. Eles: “(...) ocupam os
pavilhões e enfermarias [...] muitos vadios e prostitutas ou mulheres “promiscuas”
das ruas, trazidas pela polícia; mas também operários, caixeiros, copeiros,
cozinheiras e criadas, barbeiros, alfaiates, soldados, guarda-livros, etc”.
Nos alojamentos dos pensionistas, onde predominam os “loucos morais”,
degenerados “superiores” e histéricas, estão outros personagens: professores e
professoras, negociantes, advogados, militares, mulheres solteiras “de família”,
donas-de –casa e outras que merecem, no interior da vida asilar, um tratamento
diferenciado.
Conclusão
Desde os anos 30 o Juqueri tem sua história marcada por crises sucessivas, onde
despontam denúncias sobre as condições degradantes em que vive a população
internada.
Pensado no final do século XIX, ele já se debatia, em suas origens, no interior de
uma contradição que atravessa todo o pensamento médico sobre a loucura:
“curar” ou “assistir”, sequestrar ou tratar, fundar um hospital ou um asilo.
A partir dos anos trinta a psiquiatria buscará estender seu campo: a intervenção
deverá ser a da profilaxia social através das Ligas de Higiene Mental.
Ao Juqueri restará o papel de instituição para seres sem saída. Pacientes
terminais.
Juqueri (1900)
Juqueri (2005)
Em 2005 um incêndio atingiu o
setor administrativo do prédio do
Hospital. As seis horas de fogo
destruíram o prédio de dois
andares tombado pelo
Condephaat, sua biblioteca (a
mais completa em livros e
periódicos de psiquiatria da
metade do século XIX até metade
do século XX) e 100 anos da
memória do Hospital. Do edifício
sobraram apenas as paredes
estruturais e uma parte da
cobertura do piso inferior em uma
de suas laterais. O prédio havia
acabado ser restaurado, com
reforma do telhado, do piso,
vitrais e da estrutura elétrica.
Fórum Mineiro de Saúde Mental - Franco Basaglia e
a Reforma Psiquiátrica