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ANO XVIII Nº 229 setembro de 2008

Adeus a Lourenço Diaféria Instituto Histórico e Geográfico


Presta Homenagem a jornalistas
Rosani Abou Adal
Nelly Martins Ferreira Candeias

O escritor, cro
nista, contis-
No dia 27 de agosto,

J. Reis
ta, novelista, autor de
ao comemorar os 200 Anos
estórias infantis e jor-
da Imprensa Régia e os 100
nalista Lourenço da Associação Brasileira de
Diaféria faleceu no dia Imprensa, vários jornalistas
16 de setembro, em foram homenageados em
São Paulo, vítima de cerimônia realizada no au-
um infarto. O autor de ditório do Instituto Histórico
Mesmo a Noite Sem e Geográfico de São Pau-
Luar Tem Lua deixou lo: Maurício Azêdo, presi-
a viúva, Geiza dente da ABI, Paulo
Diaféria, cinco filhos e Markun, diretor-presidente
três netos. da Fundação Padre Paulo Markun, Nelly Candeias, Maurício
Diaféria nasceu e Anchieta e Audálio Dantas, Azêdo, Audálio Dantas e Hernâni Donato
foi criado no bairro do vice-presidente da ABI e
Brás, em 28 de agos- presidente em São Paulo, recebe- Raro exemplo de talento e te-
to de 1933. Filho do ram o Colar do Bicentenário da Vin- nacidade. Nelly Novais Coelho, no
italiano Felipe Diaféria da da Família Real para o Brasil. Dicionário Crítico de Escritoras Bra-
e da portuguesa Ma- Ao deputado João Mellão Neto ou- sileiras, cita os seguintes versos de
ria de Jesus Cabral foi torgou-se o Colar do Centenário por Rosani : “há momentos em que me
Batizado na igreja de ter criado o projeto de lei 313/2008, sinto/ tão forte quanto as monta-
Santo Antônio do Pari. que visa a nhas do Tibet (...)”. Assim conside-
atribuir auxí- ro nossa homenage-
J. Reis
Fez o curso pri-
lio financeiro ada. Faz-me lembrar
mário na Escola Regi-
Lourenço Diaféria aos IHGs de a mulher tibeteana,
na Margarita. Estudou que recentemente le-
no Grupo Escolar Romão Puigari, Co- São Paulo,
com especial vou a tocha olímpica
légio Estadual Presidente Roosevelt Na obra Brás – sotaques ao topo do monte
atenção ao
e Escola Maria José. e desmemórias, Boitempo Edi- IHGSP, cria- Everest, para alegria
O autor de Brás – sotaques e torial, série Trilhas da coleção do em 1894, do povo chinês.
Desmemórias foi cronista do jornal Paulicéia, Diaféria retratou o no Salão No-
Folha de S. Paulo, Jornal da Tarde e bairro do Brás em forma de tes- Carlos Haddad representou o

J. Reis
bre da Facul- diretor-presidente da Imprensa
Diário Popular. Colaborou no Diário temunho, sem falsos saudosis- dade de Di- Oficial, prof. Hubert Alquéres.
do Grande ABC, nas rádios Excelsior, mos e sentimentalismos. Desta- reito.
Gazeta, Record, Bandeirantes e para cou os sotaques dos moradores Dez jornalistas receberam o di-
a Rede Globo. Aposentou-se como fis- do bairro do Brás desde os por- ploma do IHGSP por sua meritória
cal de rendas do Estado de São Pau- tugueses, espanhóis e italianos contribuição: Caio Porfírio Carnei-
lo. do início do século XX até os ro, Geraldo Nunes, Gioconda
Em 1964 escreveu a primeira crô- nordestinos. O livro foi ilustra- Bordon, João Gualberto de Carva-
nica assinada, Recado Urgente, na do com fotos antigas e moder- lho Meneses, José Marques de Nelly Martins Ferreira Candeias
Folha da Manhã. Em 1977 foi preso e nas do bairro e de sua gente. Melo, Luthero Maynard, Mário e Rosani Abou Adal
processado, com base na Lei de Se- Diaféria descreveu os mila- Porfírio Rodrigues, Reginaldo
gurança Nacional, pela publicação da gres do Padre Eustáquio, o as- Dutra, Rosani Abou Adal e Sergio Na vida muitos tentam e pou-
crônica Herói. Morto. Nós, no cader- sassinato do sapateiro Martinez Gomes da Silva. cos alcançam. E os que atingem os
no Ilustrada, da Folha de S. Paulo, durante a greve de 1917, as per- Ao organizar a cerimônia, con- mais elevados picos das monta-
considerada ofensiva às Forças Arma- nas de Isaurinha Garcia, as juntamente com Rodolfo Konder, nhas sagradas - o teto do mundo,
das. Em 1980 ele foi absolvido pelo pizzas do restaurante Castelões Carlos Taufic Haddad e Hernâni são pessoas abençoadas, porque
Supremo Tribunal Federal. e as lojas do Brás. Diaféria pre- Donato, tive a oportunidade de ler concretizam os sonhos de muitas
Lourenço Diaféria achava impor- feriu chamar suas lembranças a biografia de cada um dos home- outras e com elas compartilham
tante ter nascido no bairro do Brás . de desmemórias. nageados. Surpreendi-me com a suas excepcionais qualidades.
Em nota no seu livro Invisível Cava- trajetória de vida de Rosani Abou
Rosani Abou Adal é escritora, Adal - editora do jornal literário Lin- Nelly Martins Ferreira Candeias é
lo Voador, infanto-juvenil, Editora
jornalista, publicitária e guagem Viva , fundado por ela e presidente do Instituto Histórico
FTD, ele afirmou que “somente no vice-presidente do Sindicato Adriano Nogueira, em 1989, o qual e Geográfico de São Paulo,
Brás a gente da minha idade tinha la- dos Escritores no Estado circula mensalmente sem interrom- Professora Titular da
ranjais em flor o ano inteiro”. de São Paulo. per a periodicidade. Universidade de São Paulo.
Página 2 - setembro de 2008 LINGUAGEM VIVA

Editorial O AI-5 faz 40 anos


Linguagem Viva está completando 19 anos de Rodolfo Konder
circulação ininterrupta em setembro. Estamos come-
morando com uma edição especial em cores.

O
regime militar im Os de-
Começamos com a linotipia, impressão a quen- posto por um gol fensores da de-
te e com os tipos de Didot para composição dos títulos, pois não tínha- Rodolfo Ko
pe, em 1964, mos- mocracia, na nder
mos tituleira. Depois veio a composição eletrônica e a prova em papel trava sinais de cansaço. Grandes sua maioria, opta-
vegetal, entretanto o processo de impressão era o mesmo. Mais tarde passeatas, nas ruas, exigiam a ram por enfrentar a ditadura sem-
mudamos para a impressão em off-set, então surgiu o fotolito e a volta da democracia. Então, os pre pelo caminho da articulação
informatização. Em seguida passamos para a impressão em rotativa. militares mais radicais, da chama- política, sem armas na mão. Fo-
Aos 19 anos demos um novo passo: a impressão em cores. Alme- da “linha dura”, impuseram o AI-5 ram perseguidos, presos, alguns
jamos buscar patrocínios para dar continuidade a esse novo trabalho. - o Ato Institucional nº5. Era um se exilaram, outros “desaparece-
Linguagem Viva tem como meta o crescente trabalho em prol da golpe dentro do golpe. Intensifi- ram”. Muitos foram mortos, como
democratização da leitura, objetivando levar a informação a um núme- caram a repressão, as persegui- o jornalista Vladimir Herzog e o
ro cada vez maior de leitores. ções políticas, a censura. Restrin- operário Manoel Fiel Filho. Ou-
Conseguimos sobreviver todos esses anos, porque temos uma giram com violência o pouco es- tros ainda ficaram desfigurados
equipe de colaboradores altamente qualificados e contamos com o paço de liberdade que ainda res- pela humilhação e pela tortura.
apoio de nossos anunciantes e da Tribuna Piracicabana – parceira tava no país. Vivemos horas cin- Nada, absolutamente
desde o primeiro número -, que imprime e encarte o jornal. zentas, um tempo de farsa e tra- nada justifica uma ditadura. Os
A principal razão para circularmos durante esses 19 anos é o lei- gédia, de insegurança e medo, no fins não justificam os meios,
tor, porque nenhum veículo sobrevive sem ele. Os leitores também Brasil daqueles anos de chumbo. como dizem alguns estúpidos de-
são a alma do negócio dos nossos clientes. Alguém ainda se lembra? fensores do autoritarismo. Ao
Nesses 19 anos de vida damos os parabéns, a você, leitor, que Alguém se lembra da ação per- contrário, meios imorais poluem
mantém acessa a chama nos nossos corações – do Linguagem Viva, manente e estúpida da censura, e conspurcam os fins, destruin-
clientes, amigos e colaboradores. que golpeava jornais, revistas, es- do-os.
Viva! tações de rádio e de televisão? Com o tempo e a resistên-
Dos censores que confundiam li- cia dos democratas, o regime
vros sobre cubismo com propa- perdeu força, dividido e
ganda de Fidel Castro? Alguém fragilizado. Perdeu o fôlego, iso-
se lembra das prisões sem pro- lado. A economia enfraqueceu-
cesso, das ameaças permanen- se, o setor militar mais modera-
tes que pendiam sobre nossas do, liderado pelo Presidente
cabeças, como espadas de fogo? Ernesto Geisel, adotou uma po-
Das incertezas provocadas pela lítica de abertura, “lenta, gradual
falta de um Estado de Direito cla- e segura”. No governo do seu su-
ro e inquestionável? De um país cessor, o general Figueiredo, os
amordaçado, de uma sociedade brasileiros finalmente reconquis-
amedrontada? De um mundo do- taram a democracia e a liberda-
minado pelo ódio? de. Foram vinte anos de ditadu-
A partir de dezembro de ra, num mundo dominado pela
1968, o país mergulhou na mais Guerra Fria e numa América La-
completa escuridão, com o AI-5. tina onde o medo moldou diver-
Saiu da penumbra para entrar na sos regimes de exceção.
escuridão. Alguns grupos isolados Não podemos esquecer.
pegaram em armas para comba- Ditadura, nunca mais.
ter o regime militar. Um grave Rodolfo Konder é escritor,
equívoco. Contribuíram assim professor, jornalista, tradutor,
para fortalecer a repressão – e diretor do MASP e diretor
logo foram eliminados. cultural da UNIFMU.
Página 3 - setembro de 2008 LINGUAGEM VIVA

UM POEMA ÉPICO-LÍRICO Trajetória Literária do Grupo Livrespaço


Fernando Py Antonio Possidonio Sampaio
panhar o ca-
minho fluvial
O rio Loire é o mais extenso passo a pas- Não foram somente as lutas
da França [1.012km]. Nasce no so, Alice
operárias e sindicais que no final
maciço central, corre basicamente Spíndola sabe
de Sul para Norte, descreve uma da década de 70 e começo da se-
extrair o que
grande curva, onde alcança guinte tornaram o ABC paulista co-
houver de poesia da narrativa em
Orléans, e se inclina para o oeste, versos, coisa não muito fácil de ob- nhecido em todo o Brasil, com re-
descendo para o Oceano Atlântico, ter e que ela consegue mediante a percussão no exterior. Um grupo li-
onde desemboca. De grande im- contenção verbal e o manejo extra- terário, o Livrespaço, que atuou na
portância econômica, política e in- ordinário dos versos irregularmente região entre 1983 a 1994, também
telectual, já foi chamado “rio de dispostos nas páginas [com ondas a ganhou notoriedade, graças à for-
poetas e de príncipes”. Não é de se deslocarem no leito de um rio], ma de atuação de seus membros
admirar que uma escritora brasilei- quase sempre se dirigindo ao próprio que agora começa a vir a público
ra se encantasse com sua história Loire. Um menino e um avô assu- com maior visibilidade, além do que
e seu viés artístico, sobre ele es- mem, por vezes, essas falas ao rio, dele se conhecia .
crevendo um longo poema. Temos e o poema se faz mais vibrátil e ple- Para comemorar o 25° aniver-
a satisfação de apresentar aos lei- no de emoção, sobretudo quando a sário de sua fundação, seis poetas
tores O Loire – poema fluvial da autora se refere às guerras que o vale remanescentes do Grupo, inicial-
França, de Alice Spíndola [Goiânia: do Loire já assistiu. No interlúdio, Ali- mente composto de dez membros,
Kelps, 2005/2006]. Trata-se de um ce Spíndola canta “a saga / de um acabam de lançar o livro Seduzir Essas iniciativas podem ser
texto basicamente lírico, mostran- menino / que ouve o canto / de um para a Poesia – trajetória do Gru- conferidas em Seduzir para a Po-
do todos os arroubos de entusias- pássaro” e, assim, associa a infân- po Livrespaço- 1983-1994 (Ed. esia e nos oitos números da Revis-
mo despertados pela natureza e cia à celebração do rio. E nessa oca- Livrespaço, Santo André, 2008), de ta Livrespaço, que circulou trimes-
pela tradição que o Loire carrega, sião que volta a intervir o avô, numa Dalila Teles Veras (org.), Cláudio tralmente entre janeiro de 1992 e
fascínio a que não está ausente um ligação que vai construindo a juven- Feldman, José Marinho do Nasci- dezembro de 1994, quando rece-
legítimo tom de epopéia, que tan- tude, que aspira a conquistar outros mento, Jurema Barreto de Souza, beu da APCA (Associação Paulista
tas vezes acompanha, nos dias de horizontes [Mediterrâneo, África]. O Rosana Chrispim e Tônia Ferr. de Críticos de Arte) o prêmio de
hoje, um longo poema, num cantar poema também adquire recortes de O lançamento do livro é parte “Melhor Realização Cultural de
que a própria autora denomina escrita visual [texto em forma de da comemoração do 25º aniversá- 1993).”
“saga”, ou seja, o motivo histórico bomba, p. 190]. Finalmente, o rio do Grupo Livrespaço, objeto de Escritores como Lygia
se entremeia no canto. Pela estru- poslúdio trata das relações da Fran- uma exposição no Museu de San- Fagundes Telles, José Paulo Paes,
tura, o poema divide-se em um pre- ça e do Brasil, no caso da autora. Ali- to André, iniciada em 9 de setem- Ferreira Gullar, Hilda Hilst, Thiago
lúdio, um interlúdio e um poslúdio. ce Spíndola acentua, através de re- bro com duração até 11 de outu- de Mello, Olga Savary, José Mindlin,
No prelúdio, que dá título ao volu- ferências a poetas, sua admiração bro, aberta à visitação pública e Luís Alberto de Abreu, Claudio
me, a autora se dirige ao próprio pelo poeta, ensaísta e tradutor Jean- eventos referentes à trajetória do Willer e Uilcon Pereira contribuíram
rio [“tu nasces e renasces a cada Paul Mestas, a quem dedica o livro. Grupo (www.alpharrabio.com.br). para o prestígio alcançando pela
segundo”, “carregas o mistério de Embora parisiense de nascimento, O fazer poético, formação de Revista Livrespaço, que ao lado de
muito nós / que o deus-oceano en- Mestas pertence a uma família natu- leitores junto à rede escolar, divul- Seduzir para a Poesia e a Histó-
laçou em teu leito [...] até a frontei- ral da região central da França, ber- gação de trabalhos de seus mem- ria da Literatura em Santo André,
ra última do trajeto fluvial”]. A se- ço do Loire: Auvergne, Limousin, bros através de obras coletivas e registra a boa produção literária em
guir, vai enumerando paisagens e Périgord. Desse modo, o cântico ao individuais, palestras, participação Santo André. O Grupo Livrespaço
tipos de pessoas que o rio vai en- Loire é também uma homenagem ao em mostra de livros e a atuação jun- representa uma presença funda-
contrando pelo caminho, e sua tra- poeta, que já traduziu diversos poe-
to à União Brasileira de Escritores, mental para a constituição dessa
jetória cria uma atmosfera de ma- tas brasileiros para o francês.
gia e cumplicidade que a autora que na década de 80 manteve um história em curso.
sabe muito bem aproveitar para núcleo ativo no ABC, singularizaram Antonio Possidonio Sampaio,
maior lucro poético. Além de acom- Fernando Py é escritor e a presença do Grupo Livrespaço no escritor e advogado, é autor de
crítico literário. cenário da literatura brasileira na- Em Busca dos Companheiros,
queles anos de lutas. entre outros livros.
Página 4 - setembro de 2008 LINGUAGEM VIIVA

Espiralações Novas em Depois do Tempo


Um Homem Obstinado
Caio Porfírio Carneiro Como citar exemplos dentre tan-
Angelo Caio Mendes Corrêa Junior Às vésperas da revolução de 30, es- tos poemas e contos aqui reunidos?
teve com João Alberto e Siqueira Pode-se dizer que Ludimar de Apenas para confirmação do que ficou
Pouco antes de sua morte, em Campos em Buenos Aires, para con- Miranda inova e se renova de livro para exposto, citamos “O Perdulário e o Ava-
11 de novembro de 1998, exatamen- vidar Luís Carlos Prestes, lá exilado, livro. É de se dizer, igualmente, que isto rento”, poema em prosa ou prosa poé-
te um mês antes de completar um a integrar o estado-maior das forças é natural em qualquer poeta. Nem sem- tica, onde o autor expõe a precarieda-
século de existência, ouvi de meu revolucionárias. Prestes, no entanto, pre. Há os que se repetem. E com a de humana nas veredas da vida, pleno
avô paterno, Angelo Mendes Corrêa, recusou o convite, por entender tra- repetição, a criação poética perde o de emoções vividas e doídas. Citemos
uma frase muito marcante que meu tar-se de uma revolução burguesa, andamento da pujança criadora. “Estou triste porque envelheço e a Pri-
deu a dimensão de seu amor à vida: frisando que já aderira ao marxismo. Este poeta, por ser de vertente mavera ainda não chegou”, porque o
“nasci no século XIX, estou vendo o Em 1930 fundou o jornal Acção voltada às suas raízes e ao Amor no título, em si, já é um poema acabado.
século XX terminar e atravessando Liberal, ligado ao Partido Democráti- seu sentido totalizante, retorna sempre O elíptico ”Sem se ser”, belíssima vi-
o milênio, serei um homem de três co de São Paulo, importante órgão com espiralações novas, o visor de são filosófica da vida.
séculos.” de propagação das idéias revolucio- ambas muito abrangentes. Externa, Cada criação, inserida neste livro,
Nascido a 11 de novembro de nárias daquele período. por isto mesmo, uma certa palpitação é uma surpresa poética, particularmen-
1898, numa São Paulo ainda bastan- Vitoriosa a revolução, foi nomea- solidária, aquela solidão indefinível e te pelos “achados”, que dão a nota uni-
te provinciana, na casa de seu pri- do por João Alberto, que assumiu o fugidia, diversa da outra, que se perde versal a todas elas, pelo apanhado do
mo João Mendes de Almeida, juris- Governo de São Paulo, Secretário de em si mesma. cotidiano, pela unção às vezes qua-
ta, político e líder abolicionista, ao Segurança Pública. A seguir, assumiu É uma poesia ricamente se de prece, sem aproxi-
lado da Igreja de São Gonçalo, atual o cargo de prefeito de Taquaritinga, impressionista, eis que a mação religiosa ou
Praça João Mendes, foram seus pais no interior de São Paulo. amostragem panorâmica, apologética, pela
Manuel Pio Corrêa e Maria do Céu Advogado militante por mais de seja interior ou exterior, é ime- benquerença até nas pas-
Mendes de Almeida Telles Corrêa. O seis, ocupou também a direção geral diata, vem ao vivo em pou- sagens mais sofridas.
da Secretaria da Fazenda de São cos versos simples, a simpli- O autor caminhou mui-
pai, um dos mais renomados botâni-
cidade dos meio-tons, liber- to na vida vivida, sentida,
cos de nosso país, autor, dentre mais Paulo, onde criou, nos anos 60, o Ta-
tos de cadências formais. sem se despegar das suas
de uma centena de trabalhos cientí- lão da Fortuna, campanha de vulto
Por isto, muitas vezes se origens e juventude. Mas isto
ficos, do Dicionário das Plantas Úteis que visava combater a sonegação
nota a inversão no corpo do não o jogou na redoma do
do Brasil e das Exóticas Cultivadas. de impostos no estado.
poema: o descritivo apa- saudosismo inconseqüente.
Ainda jovem, transferiu-se para Leitor contumaz, foi um apaixo-
rentemente sobrepujando Ao revés, tonificou-o de pujan-
o Rio de Janeiro, onde cursou Direi- nado pelo universo dos livros, seguin- ça e fluidez no sentir e plasmar
a emanação poética, que flui em
to e atuou como jornalista e produtor do a tradição do avô paterno, Ignacio as suas criações, dando-lhes belas
subjacência ao longo da criação. É a
teatral, convivendo com figuras que Corrêa, editor e livreiro espanhol que cosmovisões.
sua palpitante maneira de versejar. É o
se transformaram em legendas de ainda jovem se estabeleceu no Por- seu “como dizer” poético. Tal como ele diz no segundo ver-
nossa história, tais como o jurista Rui to, Portugal, onde foi um dos edito- Motivo porque alguns dos traba- so do poema “Com licença”: “Como pin-
Barbosa, o escritor Lima Barreto, os res de Camilo Castello Branco. lhos em prosa – os contos – navegam go de chuva que faz um rio...”, Ludimar
atores Leopoldo Fróes e Procópio Conhecia como poucos a histó- em lirismo tênue, a poesia também vin- de Miranda fez desta obra um relicato
Ferreira e a maestrina Chiquinha ria das duas grandes guerras do sé- do ao vivo em todos eles. da alma, das lembranças do passado e
Gonzaga, ao lado de quem, aliás, foi culo XX, a cultura greco-latina e a Até nos poemas mais prosaicos, do cotidiano que o cerca, inovando sua
um dos fundadores da SBAT (Socie- obra de Eça de Queirós, escritor de herança dos poetas do modernismo de estética artística.
dade Brasileira de Autores Teatrais). sua máxima devoção. 1922, há um toque especial e ricamen- Este livro é emanação de vida,
Em 1924, de volta a São Paulo, te humano. Nos poemas longos o poe- com suas virtudes e tropeços, caminho
participou ativamente do Movimen- Angelo Caio Mendes Corrêa
Junior é professor e mestre em ta não se afasta muito do ritmo pulsante da arte escrita para a posteridade. Li-
to Tenentista, sendo nomeado ma- dos menores. É, assim, uma unidade vro que caminha nos patamares da
Literatura Brasileira pela Uni-
jor pelo general Isidoro Dias Lopes. criadora diversificada, uma prova a latejante poesia moderna, sem perder
versidade de São Paulo(USP).
mais da sua personalíssima sensibili- de vista a herança que a Arte de Deus,
dade. das escolas passados, nos deixou.
SOBRE O OFÍCIO Ludimar de Miranda mantém uma
aparente despretensiosidade, que já ferir.
Para melhor prova é lê-lo e con-

Eunice Arruda morre e ressuscita em cada poema. vem dos livros anteriores; mantém, Caio Porfírio Carneiro é escritor,
igualmente, o sopro amorável, o sorti- crítico literário, historiador e autor
Por uma questão de fidelidade Em cada poema escrito esgotamos
légio romântico, a amenidade lírica. de Trapiá, entre outros livros.
continuo o árduo, gratificante ofício o sentimento e ficamos depois, no
de escrever poesia. Iniciado por aca- escuro, as mãos vazias até o mo-
so ou mesmo por uma profunda e mento de outra criação. Assim, abra-
desconhecida intenção. É um cami- çados por múltiplas existências, se-
nho quase invisível, fino como um guimos perseguindo, buscando as
risco de lápis sobre o papel, talvez palavras como uma felicidade atin-
para os outros. Para mim, uma cer- gível.
teza. Uma necessidade de captar as E o poema, que nasce desta ex-
emoções, os pensamentos e periência singular vai adquirindo no-
devolvê-los depois ao mundo, trans- vas dimensões na medida em que
formados em outra linguagem: a da entra em contato com o público. É
poesia. Poesia gerada pelo senti- um segundo momento, quando a for-
mento que vai sendo objetivado por ça – também criativa – do leitor faz
procedimentos artísticos que im- com que ao poema se incorpore uma
põem uma organização, de acordo nova vida. Realizando sua trajetória
com as normas e valores do presen- no mundo, modifica algum caminho.
te e do passado. Acrescenta. Por esta profunda, co-
Ao lado do previsível cotidiano, nhecida intenção, exerço o gratifi-
corre um outro aspecto, um outro rio: cante ofício de escrever poesia.
o poeta e seu nervo exposto que Eunice Arruda é escritora e poeta.
Página 5 - setembro de 2008 LINGUAGEM VIIVA

Haicais Crianças vivendo RÉQUIEM PARA UM SEMEADOR


de Débora Novaes de Castro
na rua Paulo Bomfim Ainda hoje, antigos morado-
Marigê Quirino Marchini res da região evocam a lenda do
Há 110 anos, trágico 2 de ju- “velho Bomfim” ante o neto que já
o tempo é de mangas nho de 1898, no pátio da fazenda
Alguma coisa há de errado tem idade para ser pai daquele
as abelhas banqueteiras de café, num trole que chegava
Em um país que deixa “velho” que morreu com menos de
polpas amarelas com seus cavalos assustados, cinqüenta anos!
Crianças morando na rua.
dois homens agonizavam. O fa- No cemitério de Cravinhos, ao
* zendeiro e o troleiro que tentara pé da cruz do túmulo de Francis-
Alguma coisa errada
Na lei que prevê liberdade defendê-lo, haviam sido vítimas de co Bomfim, jaz o troleiro velando
Cruzeiro do Sul Mas não segurança mais uma tocaia que ensangüen- pelo sono do fundador de cidades.
verde ouro luz fruta água Às crianças dormindo ao relento. tava a terra roxa da Mogiana. Às vezes, quando cai geada
sedução latina Na varanda da casa-grande, no coração do poeta, um trole sur-
Que lua bela, lindas estrelas uma criança contemplava a cena ge com cavalos assustados e um
* Cobrindo petrificada de horror. sonho agonizando na boléia.
Menores dormindo A morte do meu avô marcaria Sobre as mãos que teclam
concha perolada Ao relento. para sempre a vida de meu pai, esta crônica, pousam as mãos de
descoberta pelos ventos mesmo nos momentos de alegria, meu pai e de meu avô. As de meu
Que feias faces, que más pessoas aquela brisa de tristeza traria das pai empunhando a pena ou o bis-
soprar das areias arcas do tempo o menino interno
Ignorando, ou até fingindo, turi, salvando vidas e apontando
- Na terra do sabiá, no colégio de Itu, esperando al- rumos, as de meu avô, mãos de
* Na terra da infância querida guém que não voltaria nunca. semeador de civilização, do se-
Na terra de Casimiro* – Com o assassinato de meu nhor de terras a perder de vista,
sol no nascente Que não existem avô Francisco Rodrigues dos San- transformadas em rosas que o
licores de pitangas Não existiram tos Bomfim, ruía o império de suas sangue foi tornando rubras.
manhanzinha Existirão? fazendas espalhadas por São Si- Há 110 anos o avô espera por
mão, Cravinhos e Vila Bomfim. um réquiem de seu neto!
Débora Novaes de Castro é Crianças vivendo na rua.
escritora, poeta, artista plástica e Paulo Bomfim é poeta, escritor e membro
Mestre em Comunicação e Semiótica *Casimiro de Abreu: Meus 8 anos. da Academia Paulista de Letras.
- Intersemiose na Literatura e nas
Artes. Tese: O HAICAI NO BRASIL: Marigê Quirino Marchini é
Comunicação & Cultura, Puc-SP,
2004. www..haicai.com.br .
escritora, poeta, crítica
literária e tradutora.
Vestibular & Concursos

www.xavi.com.br
Sonia Adal da Costa 2- Elas
UMA BIOGRAFIA CONTEXTUALIZAÇÃO estão meio
1- Assinale a alternativa cor-
ou meias bra-
Fábio Lucas reconta à luz de novas considera- reta quanto a grafia:
vas?
ções, ato pelo qual devolve ao lei- a) Irei a um chá beneficiente.
Respos-
tor substancial inquietação acerca b) Eles tem previlégios aqui.
ta: Meios, pois é advérbio e é in-

A
pós a leitura da obra c) O acessor do prefeito che-
dos eventos festivos que coroaram variável.
de Luís Giffoni, Dom gou.
a pujante recepção do primeiro bis- 3- Tenho um dó ou uma dó de
Frei Manoel da Cruz d) Ela tem a sombrancelha
po da diocese mineira. você?
(Belo Horizonte, Pulsar, 2008), veri-
Dadas as circunstâncias pintada.
fica-se que o autor é capaz de criar, Resposta: Um dó – dó, signifi-
investigativas e literárias do texto do e) Eles põem empecilho em
a cada publicação, um ambiente cando pena é palavra masculina.
autor de Dom Frei Manoel da Cruz, tudo.
facilitador do aplauso e admiração.
o que se tem é uma enérgica Resposta: E
De um tema já trilhado na Sonia Adal da Costa, professora
releitura do obscuro passado do Correção: de cursos preparatórios para concur-
historiografia mineira, a vida e a épo-
ouro e dos diamantes da circuns- a) Beneficente. sos públicos e vestibular, formada
ca de Dom Frei Manoel da Cruz, pri-
crição territorial de Minas Gerais. A b) Têm privilégios. pela Universidade de São Paulo, é
meiro bispo de Minas Gerais a inau-
contribuição de Luís Giffoni é ines- c) Assessor. pós-graduada em Teatro Infanto-
gurar a diocese de Mariana, Juvenil pela Universidade de São
timável. A beleza do texto, crítico e d) Sobrancelha.
estabelecida em 1745 (de sua en- Paulo. portsonia@ig.com.br
aliciador, reverencia os leitores mais
trada triunfal na Capital da Provín-
exigentes e habilitados da penosa
cia cogita o Áureo Throno Episco-
formação da subcultura mineira no
pal) temos uma das mais vigorosas
controvertido quadro da configura-
dissertações acerca do episódio. O
ção da sociedade brasileira. Todas
ficcionista e, agora, historiador, con-
as honrarias e aplausos devem co-
segue iluminar o caminho percorri-
roar o bem logrado estudo de Luís
do pelo Frei Manoel da Cruz, agen-
Giffoni. Digamos, em perfeita afina-
te, então, do clero e da nobreza, num
ção com a obra: Novum sydus
cenário de saques, de exploração
emicat. Ou seja: Brilha um novo as-
predatória, de arbítrio e de violên-
tro.
cia.
Realizada minuciosa pesquisa,
sem demissão do poder de análise Fábio Lucas é escritor, crítico
e de crítica, Luis Giffoni retoma o literário e membro da Academia
episódio de exibição ostentativa e o Paulista de Letras.
Página 6 - setembro de 2008 LINGUAGEM VIVA

50 POEMAS DE ARICY CURVELLO QUERO A PAZ


Berredo de Menezes como o ritmo musical de Carlos Frydman
“CAMINHOS’ Quero a paz

O
poeta Aricy Curvello re
e havia um outro ar dos campos prenhes,
solveu premiar os admi
sobre o ar, um outro fim de tarde
radores da poesia com o dos corações dadivosos e des-
sobre a tarde que findava, e
seu novo livro, “50 POEMAS ESCO- lumbrados.
havia
LHIDOS PELO AUTOR” (Rio de Ja-
a música que não se ouvia,
neiro: Edições Galo Branco, dez. Quero a paz
vinda de outras casas.
2007) .
um morrer e renascer de destino, das sólidas rochas
Trata-se, sem dúvida alguma, de Aricy Curve
sobre caminhos findos havia ou- llo onde os tufões se rechaçam.
livro que traz uma grande beleza que
tros
o poeta decidiu dividir com seus leito-
sem fim , por onde eu vinha,
res, pela seleção feita em suas qua- TEZA”, da página 68, que é mais um Quero a paz das colheitas
mas a brisa dispersou
tro obras anteriores e inéditos da pró- diamante de sua poesia: com destinos certos
no sul
xima, com versos que nos deixam “muito que temos por conheci- onde braços e bocas aguardam
ao frio
muitas vezes em estado de estesia. mento
teus olhos azuis tão longínquos.” porque plantaram.
Apesar de nunca me haver de- é só linguagem, porém
(p.36)
dicado à crítica literária, não posso
Destaco, porque me tocaram
conter o desejo de escrever a respei- nada é só palavra: Não quero a paz
flauta no coração, estes versos que
to dele cujo poema de abertura, . dos cabisbaixos
escolhi no poema “INSCIÊNCIA”
“TUDO” (p. 9), uma parelha, um ver- o jamais cessado, como cães amedrontados.
(p.42):
dadeiro dístico, já é um início o eterno fugaz,
“qual um dia sem lembrança é
extasiante:
tão distante. Porque a paz dos medos
“viver o instante é tudo o que posso o princípio é o movimento,
será, tudo será outro para sem- É a paz dos afogados.
viver o instante é tudo o que passa” a correnteza do efêmero.”
pre
Duas páginas seguintes (11), Na certeza de que os leitores
perante a extrema solidão do po-
vale a pena meditar, por inteiro, este de Aricy Curvello vão descobrir muito Quero a paz do canto solto
ema.”
outro fulgor : mais encantamentos neste seu novo porque a paz dos temerosos
Para impedir que o leitor des-
livro, concluo este modesto trabalho é loucura do silêncio
ta resenha deixe de procurar o seu
“AQUI NÃO MAIS AQUI” com a grande alegria de concordar
próprio violino nos “50 POEMAS ES- de vidas amortalhada.
nem tudo o que sabemos com a apreciação valiosa de Fábio
COLHIDOS DE ARICY CURVELLO”,
linguagem Lucas sobre o poeta:
é impossível esquecer o da página
nem tudo o que resta “Assistido por uma afinada A paz só tem grandeza
56, que vivo a repetir como se ouvis-
consciência verbal, proclama o otimis- quando o amor é imenso.
se um bandolim na alma:
: o pousar que recolhe mo dentro do pessimismo. Conhece
o que existe (a obscura mistura) a redenção pela palavra. Assume, por Carlos Frydman é escritor, poeta
“EU” e autor de Trilogia das Buscas,
viver significa vezes, um tom maior de cantor de
canção de uma só palavra entre outros livros.
- e é tudo grandes espaços, universaliza a pró-
pássaro de uma só asa
sobretudo” pria perda de rumos, a instauração do
cidades de uma só casa
O poeta trabalha muito bem com caos e a busca pertinaz de novos ca-
uma só mão batendo palmas”
assonâncias, evitando rimas, conse- minhos.”
Finalmente, decidi extrair ape-
guindo alcançar efeitos notáveis, Acrescento , para concluir, que,
nas este trecho do poema “CORREN-
ao concordar com Aricy Curvello, de
que “tudo será outro para sempre, pe-
Indicador Profissional rante a extrema solidão do poema,”
acabei também me convencendo des-
ta grande verdade que o poeta nos
transmite com emoção controlada
mas inexcedível:
“o verso existe para impedir o po-
eta de falar.”

Berredo de Menezes é poeta e


contista. Ex-prefeito de Vitória
(ES). Professor universitário
aposentado (UFES). Membro da
Academia Espírito-santense de
Letras e do Instituto Histórico e
Geográfico do Espírito Santo.
Página 7 - setembro de 2008 LINGUAGEM VIVA

Livros e Lançamentos O Intelectual do Ano. N ã o

Luzia Elaine de Souza Roman


E um episódio em 68 lembrava
mais os ros-
Janela da Liberdade e Outras Históri-
as, de Hildebrando Pafundi, Espaço Idea Edi- tos dos estu-
tora, Guarulhos, SP, 48 páginas. O autor é
Nildo Carlos Oliveira dantes do
jornalista, escritor, membro da Academia de Centro Aca-
O cenário recompôs, aos pou- dêmico XI de
Letras da Grande São Paulo e da Academia
cos, a memória. Foi naquele salão Agosto que se
Popular de Letras. A obra, ilustrada pelo revezaram
nobre. O mesmo onde o crítico Antô-
desenhista e artista plástico Alex Alves, reú- nos discur-
nio Cândido recebia, no dia 20 do mês
ne três contos que levam o leitor a uma fan- passado, o Prêmio Juca Pato de In- sos, naquele
tástica viagem ao universo maravilhoso da telectual do Ano. O mobiliário auste- salão nobre e
criança. Editora Espaço Idea: ro, produzido pelo Liceu de Artes e nos demais
wwww.editoraespacoidea.com.Br . Onde Ofícios, o pé direito elevado e, na pa- espaços por Antonio Candido
Comprar: Livraria Nobel, Shopping ABC - rede, atrás da mesa onde o crítico onde passaram os poetas Álvares de
Tel.: (111) 4979-5670. Hildebrando Pafundi: pronunciava o seu discurso de agra- Azevedo e Fagundes Varela e tribunos
hpafundi@ig.com.br decimento, reafirmando a sua convic- que continuavam a fazer escola, como
ção socialista, o mesmo quadro: D. o ícone maior: o professor Goffredo
Pedro 2º, de corpo inteiro. Pelas es- da Silva Telles.
A JANELA, de Tarcisio Lage,
cadarias, a visão dos vitrais de Mas o medo se insinuava. A po-
Scortecci Editora, São Paulo, SP. A obra é lícia fora mobilizada para desalojar os
Conrado Sorgenicht.
o segundo romance de uma trilogia, que estudantes e a qualquer momento en-
O repórter, que ouvia Antonio
tem como pano de fundo o mesmo ambi- Candido afirmar – “... não posso ir adi- traria ali com cachorros, bombas de
ente, a vida em Santo Antonio das Tabocas, ante sem mencionar que na redação efeito moral e cassetetes. No tumul-
uma cidade fictícia de Minas Gerais. Os li- da Folha da Manhã conheci ninguém to, os jovens procuravam uma solu-
vros que também fazem parte da trilogia são menos que o inventor do popular Juca ção. Como bloquear as forças polici-
Os Muros de Jerusalém e Eu, Cidade. O Pato” – lembrou-se também do jor- ais? De repente, uma idéia. Ela cres-
autor, natural de Minas Gerais, mora na nal que, um dia, talvez em junho de ceu entre eles e chegou à mesa. En-
Holanda onde se aposentou na função de 1968, reproduzira o pensamento tão um estudante pediu a palavra e
coordenador da Seção Brasileira da Rádio expresso na matéria que ele deixa- anunciou: “Há uma sugestão aqui.
ra, na madrugada anterior, na mesa Que peguemos o quadro de D. Pedro
Nederland, emissora internacional da
do secretário da redação, e que se 2º e o coloquemos na barricada, na
Holanda, em Hilversum. entrada da faculdade. Imagina-se que
relacionava com o quadro onde apa-
Onde Comprar: Scortecci Editora - diante da figura do Imperador e da
recia a figura soberana de D. Pedro
http://www.asabeca.com.br/home.php 2º. beleza do quadro, a polícia pensará
A memória se ajustava, duas vezes, antes de fazer a besteira
reconduzindo-o ao tempo de repór- de invadir o prédio”. De imediato, a
Anima Aninalis voz de bichos ter. Sim, ele estivera na Faculdade idéia ganhou adesão. E, num piscar
brasileiros, poemas de Olga Savary, do Largo de São Francisco, naquele de olho, o quadro foi removido da pa-
Editora LestraSelvagem, mesmo salão nobre onde agora as- rede, com todo o cuidado possível e
Caraguatatuba, SP, 152 páginas. A sistia à solenidade de entrega do prê- carregado para a entrada do prédio.
mio ao crítico notável, um dos fun- O repórter levou para a redação
obra, ilustrada com gravuras de Mar-
dadores do Partido Libertador, surgi- notícia insólita. Narrou as deliberações
celo Frazão, apresenta poemas e hai- da assembléia decidido a retornar à
do ali em 1939.
kais da autora. Olga Savary, escrito- Há exatamente 40 anos os es- faculdade para cobrir o desfecho. Con-
ra, poeta, ficcionaista, ensaísta, tra- tudantes tinham ocupado a secular fa- tudo, depois de aprontar a matéria,
dutora e jornalista, foi laureada com culdade reivindicando mudanças no não suportou o sono e dormiu sobre a
o Prêmio Jabuti e com o de tradução ensino de ciências jurídicas e soci- máquina, uma Remington antiga. Não
da Academia Brasileira de Letras. O ais, colocando-se na linha de frente acompanhou o desenvolvimento da
livro faz parte da Coleção Sentimen- dos que lutavam contra a ditadura. fase final de seu trabalho. Apenas
Manifestaram-se contra Gama e Sil- ouviu de um colega, ao estremunhar
to do Mundo, que é organizada por pela manhã, que já ia alta: “Poxa, a
va, reitor, que meses depois se reve-
Nicodemos Sena. LetraSelvagem: laria autor do texto do AI-5, e contra sua matéria rendeu, hein? Vai dar
Rua Manoel Borba Gato, 115 - cj. 602 Alfredo Buzaid, diretor da faculdade manchete”.
- Martim de Sá - Caraguatatuba - SP - e, mais tarde, ministro da Justiça. Na pressa em retornar ao Largo
11.662-050. Tel.: (12) 3883-5059. Site: Os discursos ganhavam emo- de São Francisco, nem se preocupou
www.letraselvagem.com.br ção com a notícia de arbitrariedades com os textos da edição vespertina,
desencadeadas em outras capitais, que estavam na oficina. Somente
sobretudo no Rio de Janeiro. Em todo mais tarde, quando pôs os pés na fa-
o País se montava o cenário com o culdade – e com o jornal, edição da
qual o regime justificaria a promul- tarde, já em circulação - é que se deu
gação do AI-5. A partir dali, se inten- conta de que os estudantes liam e riam
sificaria, em especial contra operári- diante da manchete do jornal, encai-
os e estudantes. xada sobre a foto do quadro de D.
Naquela noite a discussão en- Pedro 2 º. Era a seguinte: “D. Pedro
trou madrugada adentro. O repórter 2º na defesa das Arcadas”.
anotava os fatos. Às vezes não re- Os estudantes só saíram dali 26
sistia: queria participar dos debates. dias mais tarde, depois que a direto-
Interferir, para mostrar também a sua ria ganhou na Justiça a reintegração
inconformidade com a quebra da le- de posse. O fato foi mais um dos epi-
galidade. De qualquer modo, os jo- sódios daquele inconcluso 1968.
vens pareciam falar por todos, em um
momento em que o medo pesava nas Nildo Carlos Oliveria é
casas e nas ruas. escritor e jornalista.
Página 8 - setembro de 2008 LINGUAGEM VIVA

Ruth G
uima rães A Livraria Cultura inaugurou no
dia 10 de setembro uma loja no Con-
Notícias
junto Nacional, em São Paulo, que
A Câmara Brasileira do Livro Henriette Effenberger lançou
venderá apenas títulos da Compa-
e a Secretaria Municipal de Linhas Tortas , livro de contos que
nhia das Letras. A editora tem 2.500
Educação de São Paulo foram premiados em concursos
livros no seu catálogo, que ficarão
assinaram convênio, no dia 9 de literários, com o patrocínio da Lei
expostos para venda na nova loja.
setembro, para ampliar o Programa Municipal de Incentivo à Cultura. A
Délcio Teobaldo, escritor e
Minha Biblioteca a estudantes de quarta capa foi escrita por Ignácio Loyola
jornalista, foi laureado com a obra
5ª a 8ª séries e atender 484 escolas Brandão.
Pivetim – Um romance
da cidade de São Paulo. Será A Revista A Cigarra, editada por
proibidão na quarta edição do

ação
distribuído 1 milhão de livros para Jurema Barreto, está com um novo
Prêmio Barco a Vapor, que é
520 mil estudantes das escolas formato na edição nº 42 para celebrar

Divulg
destinado a originais de literatu-
públicas da capital. A Secretaria os 25 anos de existência e resistência
ra Infantil e Juvenil.
Municipal de Educação investiu R$ na sua trajetória poética. Informações
Charles Kiefer será o
10 milhões para a aquisição de 202 através do e-mail: acigarra@ig.com.br.
patrono da 54ª edição da Feira do
títulos de 63 editoras. Caixa Postal 214 - Santo André – SP –
Livro de Porto Alegre, que acontecerá
Brasil – 09015- 970.
Ruth Guimarães tomou posse de 31 de outubro a 16 de novembro Walcyr Carrasco, escritor,
A Medalha Jorge Amado, institu-
no dia 18 de setembro na Academia na capital gaúcha. cronista, teatrólogo, novelista e jor-
ída pela União Brasileira de Escritores
Paulista de Letras. A acadêmica foi Benedicto Ferri de Barros, nalista, tomou posse na Academia
do Rio de Janeiro em comemoração Ju-
eleita no dia 5 de junho, com 30 dos professor, poeta, jornalista, Paulista de Letras, no dia 4 de se-
bileu de Ouro da entidade, foi outorga-
34 votos válidos, para ocupar a ocu- empresário, ensaísta, polímata e tembro, para ocupar a cadeira nº 14,
da àqueles que se destacaram na lite-
par a cadeira nº 22, que pertenceu a membro da Academia Paulista de antecedida pelo poeta Cyro
ratura brasileira . Foram distinguidos An-
Odilon Nogueira de Matos. A autora Letras, faleceu aos 88 anos, no dia Pimentel.
tônio Olinto, Stella Leonardos, Eduardo
de Água Funda é tradutora, roman- 12 de setembro, em São Paulo. O A Livraria da Vila foi laureada
Portela, Helena Ferreira, Cláudio Murilo
cista, revisora, crítica literária, cronis- autor de Que Brasil é este? - Um com o Prêmio ABRESCE 2008
Leal, Antonio Carlos Secchin, Anna
ta, repórter, folclorista, dramaturga e depoimento foi membro da Acade- como a melhor livraria de São
Gasque, Sérgio Jerônimo, Luiz Gondim
poeta. mia Internacional de Direito e Eco- Paulo. O prêmio foi outorgado pela
de Araújo Lins, Amélia Esparano, Astrid
Luiz Paulo Horta, jornalista e nomia. Associação Brasileira de Shoppings
Cabral, Levi Bucalem Ferrari, Sônia
crítico musical, foi eleito membro da Aricy Curvello foi um dos poe- Centers.
Sales, Caio Pofírio Carneiro, Alice
Academia Brasileira de Letras com 23 tas escolhidos para participar Anto- Jorge Tufic lançou
Spíndola, entre outros. Stella Leonardos
votos no terceiro e último escrutínio,. logia Oficial da I Bienal Internacio- Guardanapos Pintados com
e Antonio Olinto, fundadores da UBE/RJ,
O novo acadêmico sucederá a escri- nal de Poesia de Brasília, lançada Vinho no dia 28 de agosto, no Ideal
foram eleitos ícones do Jubleu de Ouro.
tora Zélia Gattai e ocupará a cadeira pela Secretaria da Cultura/Governo Clube de Fortaleza.
que pertenceu a Machado de Assis. do Distrito Federal e Biblioteca Naci-
Projeto Leitura para Todos, onal de Brasília.
instituído pelo Instituto Oldemburg de O Ponto de Leitura Olido,
Desenvolvimento com apoio do inaugurado no mês passado, abriga
Ministério da Cultura, por meio da Lei uma minibiblioteca com um acervo
Federal de Incentivo à Cultura, de aproximadamente 3 mil títulos de
implantará 122 salas de leitura em livros e periódicos. O novo ponto de
cidades do interior dos estados de leitura funciona de segunda a sexta,
Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito das 10 h. às 18 h., à Avenida São
Santo, Paraná, São Paulo, Goiás, João, 473 – Térreo. Informações pelo
Pernambuco e do Distrito Federal. telefone (11) 3397-0158.

Linguagem Viva

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