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EDUCAÇÃO PARA SAÚDE EM UNIDADE HOSPITALAR: UM ESPAÇO

1
PROFISSIONAL DO ENFERMEIRO

Magali Olivi*
Magda Lúcia Félix Oliveira**

RESUMO
O estudo teve por objetivos avaliar a dimensão educadora do enfermeiro que atua em unidade hospitalar e
analisar sua capacitação para o exercício de educar. Foi realizado em um hospital público, através da aplicação
de um roteiro de entrevista respondido por dezoito enfermeiros, no horário e local de trabalho. Percebeu-se que
os enfermeiros não têm uma visão integral do paciente como agentes de sua recuperação e encontrou-se,
ainda, confusão entre as expressões educação para a saúde e educação continuada; porém os entrevistados
demonstraram interesse em exercer a atividade de educação para a saúde e reconheceram sua importância.
Este estudo discute com os profissionais de enfermagem o compromisso com a educação dos pacientes, suas
famílias e a comunidade, conforme previsto no Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem e a Lei do
Exercício Profissional de Enfermagem.
Palavras-chave: Educação para a saúde. Assistência em enfermagem. Unidade hospitalar.

INTRODUÇÃO situações e de organizar e realizar as ações e de


avaliá-las com espírito crítico.
O interesse pelo tema surgiu porque sei da A ação educativa é um processo de
importância da educação para a saúde na capacitação de indivíduos e de grupos
prevenção de doenças e para evitar problemas para assumir a solução dos problemas
repetitivos resultantes da falta de conhecimento de saúde, processo este que inclui o
da população, e porque, na minha experiência de crescimento dos profissionais de saúde,
trabalho, percebi que não estava preparada para através de reflexão conjunta sobre o
trabalho que desenvolvem e suas
executar tal atividade. Compreendendo, então,
relações com a melhoria das condições
as dificuldades do enfermeiro que atua em de saúde da população. Esta deve
unidade hospitalar para desenvolver a função de ocorrer em todo e qualquer contato
educador, pois normalmente o que se faz são entre o profissional de saúde e a
orientações sobre procedimentos, optei por população (BRASIL, 1997, p. 13).
estudar a dimensão educadora na prática de
enfermeiros que atuam em uma unidade
Neste conceito de ação educativa para a
hospitalar pública.
saúde, reconhece-se que muitas experiências,
Segundo o Ministério da Saúde (Brasil, tanto positivas quanto negativas, causam
1997), a ação educativa tem por fim desenvolver impacto naquilo que o indivíduo, o grupo ou a
no indivíduo a capacidade de analisar comunidade pensam ou fazem em relação a
criticamente a sua realidade, de decidir ações saúde. O conceito não restringe a educação para
conjuntas para resolver problemas e modificar a saúde à atividades de saúde planejadas ou

1
Extraído da monografia apresentada ao Curso de Especialização em Administração da Assistência de Enfermagem –
Universidade Estadual de Maringá.
*
Enfermeira, Especialista em Admistração do Serviço de Enfermagem, do Ambulatório Médico e de Enfermagem da
UEM. Av.Colombo,5790, Maringá. laluna@irapida.com.br
**
Enfermeira, Mestre em Saúde Coletiva, do Departamento de Enfermagem.

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formais. Em seu sentido mais limitado, a lucrativa do que social (DELTA LAROUSSE,
educação para a saúde geralmente define um 1971).
trabalho planejado ou formal que visa incentivar Historicamente, o cuidado ao doente era
e fornecer informação no momento oportuno, prestado no lar, por mulheres e escravos. Na
através de técnicas e situações que desenvolvem Idade Média, as práticas de saúde e a sua
os conhecimentos, atitudes e comportamentos organização social estavam influenciadas pelas
mais adequados para a saúde do indivíduo, do práticas religiosas cristãs, sendo estimulada a
grupo ou da comunidade (BRASIL, 1997). participação de ordens religiosas na assistência a
Tradicionalmente, a educação para a saúde pessoas doentes. Com a Reforma Protestante e
tem se caracterizado pelos modelos industriais a saída das ordens religiosas, a prática de
de desenvolvimento, empregando mão-de-obra enfermagem sofreu um colapso que durou
especializada para educar a população mal- séculos. Durante esse período, as atividades de
orientada, dando à educação um cunho enfermagem passaram a ser executadas por
paternalista e autoritário, que se traduz pelo pessoas analfabetas e de baixo padrão moral
assistencialismo. No entanto, o conceito de (ALMEIDA, 1982).
educação em saúde sofreu significativa alteração Sob a liderança de Florence Nightingale, na
em 1977, durante a IV Reunião dos Ministros Inglaterra, surge a enfermagem moderna, que se
das Américas. Considerou-se então que a preocupa em sistematizar e normatizar o seu
participação comunitária poderia levar ao trabalho. A prática passa a ser exercida por
desenvolvimento de habilidades e à pessoas com preparo formal. O ensino de
transformação de pessoas em função de suas enfermagem passa a preparar pessoal para a
próprias necessidades, esperando-se que assistência ao doente hospitalizado ou no
pudessem assim ter mais responsabilidade e zelo domicilio, e ainda para administrar,
em relação à própria saúde. Implícita neste supervisionar e ensinar.
conceito encontra-se a proposta de um diálogo
A hegemonia da assistência curativa sobre a
permanente e contínuo entre o pessoal da saúde
prática sanitária exerceu influência no avanço da
e a comunidade (BRASIL, 1997).
clínica, intensificando a indústria hospitalar.
A Organização Pan-Americana de Saúde
Essa situação resultou em maior envolvimento
(OPAS) e a Organização Mundial da Saúde
dos enfermeiros em tarefas administrativas, para
(OMS) reconhecem que a educação em saúde e
manter a produção industrial em funcionamento,
a participação comunitária, - como uma de suas
passando o cuidado direto ao paciente para os
formas de intervenção - precisam se transformar
ocupacionais de enfermagem (ALMEIDA,
em fato regular do sistema de atendimento da
1982). Desde então, está havendo um resgate da
saúde, ou seja , precisam tornar-se permanentes.
profissão de enfermagem, para uma redefinição
Sabe-se que há uma imensa necessidade de
do papel da enfermeira na assistência de
treinamento dos profissionais envolvidos na
enfermagem ao cliente com vista à qualidade de
prática da educação, quanto a metodologias de
vida deste através do cuidado direto prestado
planejamento, educação e comunicação,
pela enfermeira (MARTINS, 1983).
implementação, supervisão, administração,
acompanhamento e avaliação, etapas necessárias Imogine King (apud POTTER; PERRY,
ao processo educativo. Torna-se necessário 1997), diz que o objetivo da enfermagem é usar
perceber a necessidade de aplicar essas técnicas a comunicação para ajudar o paciente a
e metodologias de acordo com as peculiaridades restabelecer uma adaptação positiva ao seu meio
do ambiente e da população-alvo (BRASIL, ambiente.
1981). Neste sentido, a educação para a saúde em
Com relação aos serviços de saúde unidade hospitalar ganha um papel importante
hospitalar, observamos que os primeiros para a enfermagem atingir seus objetivos, e o
hospitais surgiram sob influência do hospital deixa de ser uma instituição onde se
cristianismo, no século VI, e serviam de refúgio restabelece a saúde de seus usuários para ter
para os viajantes, os estrangeiros e os doentes. uma função mais abrangente na recuperação,
Com o tempo, eles passaram a ter função mais manutenção e prevenção de doenças.

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Diante deste processo, entende-se que trabalho e pertencentes aos turnos da manhã,
educação em saúde é uma tarefa particular a ser tarde e noite. Estes profissionais foram
realizada pelo enfermeiro de maneira articulada selecionados através de um sorteio, a partir de
aos objetivos educativos propostos. Isto reflete listagem fornecida pelo setor de recursos
um momento histórico da profissão, que busca, humanos do hospital.
entre outras questões, compreender melhor os Foi utilizado como instrumento de coleta de
potenciais do ato educativo (SILVA et al., dados um roteiro de entrevista, aplicado aos
1992). enfermeiros individualmente, constituído de
Por outro lado, a função educadora, em duas partes: a primeira, com campo limitado de
nível de preparo pedagógico, é sempre respostas, constava de questões para
negligenciada em relação ao preparo técnico- identificação e caracterização dos entrevistados,
científico da área específica. Como reflexo, os e na segunda, as perguntas foram trabalhadas em
enfermeiros evitam desempenhar tal função e, na formato aberto.
contingência de assumi-la, fazem-no com O roteiro de entrevista passou por quatro
insegurança (BOERY; DOSATTI; LASELVA, fases: elaboração preliminar do instrumento,
1994). avaliação preliminar pela orientadora deste
Baseado nesse referencial teórico, o trabalho de pesquisa, validação de conteúdo por
presente trabalho teve como objetivos: especialistas e reformulação posterior.
caracterizar os enfermeiros entrevistados; O processo de investigação compreendeu as
verificar o entendimento dos enfermeiros sobre seguintes etapas: elaboração do roteiro de
educação para a saúde; verificar o interesse dos entrevista; solicitação de autorização à Diretoria
enfermeiros em exercer a educação para a saúde; de Enfermagem para entrevistar os enfermeiros
identificar os obstáculos à implantação da no seu local de trabalho; solicitação de parecer
educação para a saúde em uma unidade da Comissão de Ética de Enfermagem do
hospitalar. hospital; e realização das entrevistas, após
cumprimento aos preceitos éticos da Resolução
MATERIAL E MÉTODO 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, tendo
sido solicitada autorização formal dos
O estudo foi realizado na cidade de entrevistados.
Maringá, situada no Noroeste do Estado do
Paraná, que possui 267.878 habitantes, com RESULTADOS E DISCUSSÃO
97,48% da população residindo em área urbana
(MARINGÁ, 1997). É sede da 15ª Regional de Inicialmente, os resultados do presente
Saúde, com abrangência de trinta municípios, estudo serão apresentados de forma a
sendo a população dessa regional de, caracterizar o grupo de enfermeiros
aproximadamente, 500.000 habitantes. entrevistados nos seguintes itens: setor de
O hospital estudado é um órgão de ensino atuação, turno de trabalho, faixa etária, tempo de
vinculado a uma universidade pública, conclusão do curso de graduação, tempo de
atendendo a população de Maringá e dos outros atuação profissional e pós-graduação.
29 municípios pertencentes à 15ª Regional da Posteriormente, pretende-se analisar as
Saúde, prioritariamente. questões do roteiro de entrevista aplicado a esse
O estudo foi realizado junto aos enfermeiros grupo de enfermeiros.
que atuam no referido hospital, Do total dos enfermeiros entrevistados, 10
independentemente de este servidor estar sob atuavam em unidades de internamento (55,5%) e
contrato de trabalho efetivo ou temporário e do seis em unidades ambulatoriais ou de pronto-
turno de trabalho, correspondendo a 52 atendimento (33,3%). Entrevistou-se, ainda, um
profissionais. Esses trabalham nos turnos da enfermeiro atuante em unidade hemoterápica e
manhã, tarde e noite, com carga horária semanal um enfermeiro do Serviço de Controle de
de 36 horas. Infecção Hospitalar (SCIH).
A amostra do presente estudo constou de 18 Dos enfermeiros entrevistados, seis
enfermeiros, entrevistados no seu local de pertenciam ao turno noturno (33,4%) e seis ao
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turno vespertino (33,4%). Os demais pertenciam [...] compreende todas as orientações que
ao turno matutino ou trabalhavam em período a gente faz para as mães na pediatria ou a
integral – 8 horas/dia. todos os pacientes do hospital. (Enf. 13)
A maioria dos enfermeiros entrevistados Um entrevistado refere a educação para a
estava na faixa etária dos 25 a 30 anos (28,0%) e saúde como uma estratégia do enfermeiro para
de 30 a 35 anos (44,0%), sendo que nove deles se diferenciar enquanto profissional dentro da
tinham de um a cinco anos de graduação e equipe de saúde e como um fator importante
somente um contava mais de quinze anos de para a interação entre enfermeiro e paciente.
graduação. Dos dez enfermeiros, quatro estavam
cursando especialização e oito eram É uma situação importante...
direcionada ao paciente, gera um
especialistas (44,5%).
vínculo da relação entre paciente/
Dos entrevistados, oito tinham dupla enfermeiro... onde o profissional pode
jornada de trabalho (44,4%), ou seja, estar se diferenciando enquanto
trabalhavam em outras instituições, que profissional e pode estar esclarecendo
variavam entre hospitais, clínicas especializadas as dúvidas do paciente na medida do
e empresas/indústrias. Esta prática potencializa a possível. (Enf. 9)
ação de fatores de desgaste físico e psíquico,
Embora, neste caso, seja referida como um
comprometendo a assistência prestada e a saúde
fator de vínculo entre enfermeiro e paciente,
dos profissionais de saúde (PITTA, 1990).
mantém-se o eixo da educação para a saúde
Para avaliar o conhecimento dos
como “fornecedora de informações” –
enfermeiros em educação para a saúde, foram
esclarecendo as dúvidas [...].
agrupadas as questões do roteiro de entrevista.
Ressalte-se ainda que, apesar de este
Tais questões visavam obter respostas dos
enfermeiro reconhecer a importância da
enfermeiros sobre a definição de educação para
educação para a saúde, ele deixa claro que só
a saúde, qual a contribuição da sistematização
executa esse tipo de trabalho “na medida do
da assistência de enfermagem para a realização
possível”, ou seja, quando dá tempo. Este é um
destas atividades, se o enfermeiro as prescrevia
aspecto que vai aparecer em diversas respostas
aos pacientes no seu dia-a-dia e de que forma era
na seqüência do trabalho, onde os enfermeiros
executada essa prescrição.
reconhecem a importância dessa atividade, mas
Foram também analisadas as sugestões
não a executam como rotina.
apontadas pelos enfermeiros para a implantação
Um enfermeiro referiu que a educação é
de atividades de educação para a saúde em
ambiente hospitalar, pois era esperado que, [...] o que você faz, atitudes diárias,
através das atividades sugeridas, eles atos, orientações ao paciente e família,
apresentassem sua visão e conhecimento sobre a visando à melhora dele e à recuperação
mais rápida possível, para futuramente
temática.
não ter complicações que a trouxeram
Quando os enfermeiros foram questionados aqui. (Enf. 18)
quanto ao que eles entendiam por educação para
a saúde, eles responderam de uma forma Este profissional define e aponta aspectos
particular, conforme conceitos individuais. positivos da educação para a saúde, como as
atividades do cotidiano – atitudes diárias – e a
Em algumas definições relatadas, a
importância do envolvimento da família na
educação para a saúde é vista como a
recuperação da saúde do familiar.
informação fornecida aos pacientes e suas
De maneira geral, na forma como os
famílias pelos profissionais de saúde,
enfermeiros definiram educação para a saúde,
contribuindo para a prevenção, recuperação e
percebe-se que eles se limitaram a referi-la como
manutenção da saúde, conforme verbalizações:
“informação”, “educação dada”, sempre numa
Educação para a saúde é quando a direção única, onde o saber é propriedade dos
enfermeira faz um trabalho de orientação profissionais e cabe aos pacientes receber
e continuação de um determinado grupo passivamente as informações. Não foi citado em
de pacientes. (Enf. 5)
momento algum que o paciente deva, junto com

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o profissional, achar a solução dos problemas Sim, contribui [...] só que a família
levantados por eles e a valorização do indivíduo precisa ser envolvida, pois os pacientes
como parte do processo educativo. vão ter alta, e a sua família é que vai ter
que cuidar dessa paciente. Na
A experiência da sistematização da sistematização, ou plano de alta,
assistência de enfermagem (SAE) no hospital foi fazendo a orientação sobre a
iniciada em 1990, no sentido de facilitar a hospitalização deste familiar e do
organização e o planejamento das atividades de próprio paciente no autocuidado, isso
enfermagem desenvolvidas pelos enfermeiros da vai melhorar para que ele volte no
instituição e contribuir para a melhoria da ambulatório, ou no serviço de saúde
qualidade do atendimento prestado, além de que não seja um hospital para um
fornecer condições para que o discente do Curso acompanhamento, para evitar uma nova
internação. (Enf. 7)
de Enfermagem vivencie a prática de
enfermagem sistematizada. Quando se perguntou aos enfermeiros se
A SAE é executada a partir das seguintes incluíam atividades de educação para a saúde
fases: o histórico de enfermagem, feito no ato da em suas prescrições de enfermagem, cinco
internação do paciente pelo enfermeiro responderam afirmativamente, onze
responsável pelo setor, sendo nesse momento responderam negativamente e dois responderam
listados os problemas de enfermagem e realizada que “quando possível” eles prescreviam
a primeira prescrição de enfermagem. Essa atividades de educação para a saúde aos
prescrição é reformulada diariamente, após pacientes sob seus cuidados.
visita do enfermeiro ao paciente, verificando-se É importante ressaltar que dos cinco
a ocorrência de novos problemas e a solução dos enfermeiros que responderam afirmativamente
anteriores (evolução e avaliação de quanto à prescrição de atividades de educação
enfermagem). para a saúde em ambiente hospitalar, a forma
Destarte, a sistematização da assistência como eles desenvolvem essa atividade é verbal,
traz para o enfermeiro uma diretriz a seguir para ou na alta hospitalar do paciente.
a definição de seu papel e do seu espaço de
Sim, pois (no hospital) existe um plano
atuação. Entretanto, para o agir organizado e
de cuidados ao paciente, a
sistemático se exige competência técnico- sistematização da assistência de
científica e responsabilidade legal e ética pela enfermagem, e essa é feita sob os
assistência e o assistido. cuidados de cada enfermeira do setor.
No que se refere à contribuição da No caso, quando o paciente é
sistematização da assistência de enfermagem ambulatorial, essa atividade de
desenvolvida no hospital para a determinação educação também é feita no prontuário
global da assistência de enfermagem e da ou numa forma informal quanto aos
educação para a saúde em particular, todos os cuidados que podem ser feitos em casa.
enfermeiros responderam afirmativamente. (Enf. 7)

Sim, a sistematização do Hospital Os que responderam negativamente se


permite um contato direto com o justificaram pelo setor em que trabalham (UTI
paciente através do histórico de Neonatal, UTI Adulto), plantões noturnos,
enfermagem, onde você tem os dados dificuldade dos pacientes entender as
da pessoa e o nível de orientação que orientações e acúmulo das funções assistencial e
ele tem. A partir daí você já faz a administrativa, conforme relato:
orientação ao paciente e à família no
momento da alta. (Enf. 4) Não tem como, é difícil, pois a gente
fica na parte assistencial e
Os enfermeiros, além de afirmarem a administrativa que ocupa 70% do dia e
contribuição da SAE, reconhecem a importância 30% para a assistencial, e para a
desta para a educação para a saúde. orientação eu acredito que fica bem
Um enfermeiro relacionou a assistência de pouco. (Enf. 5)
enfermagem e a família: Observou-se que os enfermeiros das UTIs
não referiram a oportunidade de orientar a
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família dos pacientes sob seus cuidados, não interesse dos enfermeiros em exercer atividades
percebendo que estes é que provavelmente darão de educação para a saúde, foram questionados
continuidade aos cuidados ao paciente no quanto à importância dessas atividades em
domicílio. ambiente hospitalar e o porquê delas, e ainda
[...] quando possível. Na UTI é difícil, quanto ao interesse desses profissionais em
mas no corredor é mais fácil de executá-las.
prescrever. (Enf. 3) Todos os enfermeiros entrevistados
responderam que era importante a educação para
Porém é importante ressaltar que eles não a saúde em ambiente hospitalar e fizeram
realizam estas atividades como rotina. referências às vantagens desse procedimento
Foi solicitado, então, que os enfermeiros para os pacientes e suas famílias.
apresentassem sugestões para implantação de
atividades de educação para a saúde no hospital. Sim, porque pode prevenir futuras
Percebeu-se uma dificuldade em responder: internações, ou reinternações no
hospital. (Enf. 2)
Não sei te dizer [...] Criar, implantar
uma rotina para isso. (Enf. 13), Vídeo Sim, o contato que nós temos com o
na sala de espera. Uma sala só para paciente e a família é importante a
recreação dos pacientes. (Enf. 17), partir do momento que o profissional
Formação de uma comissão com as tenha consciência dessa orientação
principais situações de orientações ao relacionada à saúde. (Enf. 4)
paciente nas diversas especificidades.
(Enf. 4) Sim, porque com a educação para a
A maioria dos enfermeiros pensa no seu saúde você consegue muitas vezes com
setor de trabalho, e não no hospital como um que o paciente não volte para o hospital
com o mesmo problema, e se o que ele
todo.
tem é para o resto da vida ele vai agir
Elaborar [...] um grupo para montar um
melhor diante do problema. (Enf. 15)
projeto, miniprojeto, e iniciar na
Pediatria com as mães e bebês. E fazer Todos os enfermeiros responderam que têm
das mães multiplicadoras de saúde na interesse em exercer a educação para a saúde em
comunidade delas. (Enf. 2) ambiente hospitalar, quando isto lhes foi
Percebeu-se que a atividade de educação perguntado, e notou-se que sabem da
para a saúde não é vista como atividade de importância e dos resultados positivos dessa
rotina do enfermeiro e sim, como uma atividade atividade.
paralela, um “momento determinado” no Para a identificação dos obstáculos, foram
processo de assistência. feitas questões que verificavam a dificuldade do
enfermeiro em exercer atividades de educação
Acredito que a educação para a saúde para a saúde no seu setor de trabalho e em
pode começar através de formação de enumerar alguns itens que dificultavam a
grupos ou até pelas consultas de realização dessa atividade.
enfermagem no ambulatório. (Enf. 6)
Quando os enfermeiros foram questionados
A adoção de conceitos extraídos da teoria sobre dificuldades para exercer atividades de
clássica da administração favoreceu o educação, 12 responderam que as tinham e 01
ajustamento da enfermagem a um contexto respondeu “às vezes”.
hospitalar burocrático. Estes conceitos fizeram Sinto bastante. Apesar de que aqui no
com que a enfermeira se distanciasse da HU, tem uma atividade de orientação
assistência direta ao paciente, ficando limitada a ao paciente vítimas de animal, mas é
delegar funções e assegurar o cumprimento das difícil a gente estar orientando, pela
ordens médicas, e ao paciente a enfermeira falta de tempo. (Enf. 5)
transmite regulamentos e instruções do hospital,
Sim, pois trabalho no período noturno.
assim como instruções relativas às ordens (Enf. 8)
médicas (TREVISAN, 1988). Para verificar o
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Não tenho dificuldade, mas poderia ser CONSIDERAÇÕES FINAIS


facilitado se o enfermeiro da manhã
ficasse só na atividade assistencial e Após análise dos dados, podemos verificar
não em outras atividades. (Enf. 15) que, quanto à expressão educação para a saúde,
Foram citados os seguintes obstáculos: chama a atenção que os enfermeiros parecem
não ter uma visão integral do paciente, como
número de pacientes; complexidade das
patologias; muita atividade administrativa; agente de sua recuperação. Isso sugere que
atividades de educação para a saúde são
limitações do paciente; exercício de atividades
no período noturno; falta de trabalho em informações e orientações prestadas ao paciente
equipe; falta de tempo; a filosofia do serviço. e família, quanto aos cuidados que devem ter
continuidade em casa, ou só sobre a patologia
A primeira delas é um enfermeiro em que ocasionou sua internação.
cada unidade para atender todos os Não obstante, os enfermeiros entrevistados
pacientes, para orientar, prescrever, demonstraram interesse em exercer a atividade
explicar alguma técnica que ele vai
de educação para a saúde e reconhecem sua
utilizar em casa, e isso demora. A outra
é que os clientes, a família, têm um importância. Porém, percebemos que estes
nível de compreensão abaixo daquilo profissionais não reconhecem esta atividade
que seria necessário para compreender como parte de seu cotidiano e necessária para
aquilo que você está orientando. (Enf. uma assistência integral ao paciente.
12) Acreditamos que a escola formadora pode
não estar preparando profissionais para exercer a
É difícil, porque o serviço não está atividade de educação. Foi ressaltada a
voltado para isso. Muito serviço
importância e os objetivos da educação para a
burocrático, pessoal. A filosofia não é
voltada para a prevenção. (Enf. 17) saúde na assistência ao indivíduo e comunidade;
no entanto, na maioria dos estágios curriculares
Falta de tempo. Por ser uma supervisão em hospitais não há tempo para os acadêmicos
única no período noturno, quando você exercerem a atividade de educação, pois há uma
vai ver o paciente ele já está dormindo, preocupação em treiná-los nas técnicas, em
ai tem que pensar no conforto do aprimorar sua destreza manual; a assistência
paciente. (Enf. 9) prestada ao paciente fica centrada na patologia e
Os obstáculos relacionados demonstram o em garantir o seu bem-estar físico.
dilema que a enfermagem vem vivenciando As sugestões apresentadas pelos
nestes últimos anos entre prestar cuidados enfermeiros para a realização de atividades
diretos ao paciente e funções de chefia e educativas mostram que eles não reconhecem
supervisão. Nakamae et al. (1987 apud esse momento como uma oportunidade de
CAMPEDELLI, 1989), enfatizam que o orientar os pacientes. Ficam presos a mais um
momento não é de renunciar ao cuidado direto, papel, a mais uma rotina a ser implantada
mas de resgatá-lo ou conquistá-lo, tornando-se quando sugerem formação de comissões para
tal recuperação ou conquista um projeto a ser criar impressos ou formulários.
concretizado. Com o acúmulo de atividades
O acúmulo de funções administrativas foi o administrativas, nos parece necessária a
item mais citado como obstáculo a que os implantação de um manual de rotina ou de
enfermeiros exerçam a atividade de educação padrões mínimos de assistência, pois não seria
para a saúde aos pacientes sob seus cuidados, preciso prescrever os cuidados básicos e a
porém percebemos que há o desejo dos prescrição de enfermagem seria direcionada aos
enfermeiros em assumir o papel de prestar o reais problemas do paciente. Com essa rotina
cuidado junto com a equipe de enfermagem, ou implantada, sobraria mais tempo para o
seja, administrar a assistência e supervisioná-la. enfermeiro prescrever e executar atividades de
educação ao paciente.

HEALTH EDUCATION IN A HOSPITAL UNIT: A PROFESSIONAL SPACE FOR THE NURSE

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ABSTRACT
The study had for objectives to evaluate the educating dimension of the nurse that acts in a hospital unit, and to
analyze his/her training for the exercise of educating. It was accomplished at a public hospital, through the
application of an interview answered by 18 nurses, in their schedule and work place. It was noticed that the
nurses do not have a whole perception of the patients as agents of their recovery, and they were still confused
about the expressions education for the health and continuous education. However, the interviewees
demonstrated interest in practicing health education and they recognized its importance. This study discusses
with the nursing professionals the commitment with the patients' education, their families and the community, as
foreseen in the Code of Ethics and the Law for the Nursing Professionals.
Key words: Education for health. Nurse assistance. Hospital unit.

EDUCACIÓN PARA LA SALUD EN UNA UNIDAD HOSPITALARIA: UN ESPACIO PROFESIONAL


DEL ENFERMERO
RESUMEN
Este estudio tuvo por objetivos evaluar la dimensión educadora del enfermero que actúa en una unidad
hospitalaria y analizar su capacitación para el ejercicio de educar. Fue realizado en un hospital público, a través
de la aplicación de entrevistas respondidas por dieciocho enfermeros, en el horario y local de trabajo. Se
percibió que los enfermeros no tienen una visión integral del paciente como agentes de su recuperación y se
encontró, además, confusión entre las expresiones educación para la salud y educación continuada, sin
embargo, los entrevistados demostraron interés en ejercer la actividad de educación para la salud y
recononocieron su importancia. Este estudio discute con los profesionales de enfermería el compromiso con la
educación de los pacientes, sus familias y la comunidad, conforme lo previsto en el Código de Ética de los
Profesionales de la Enfermería y la Ley del Ejercicio Profesional de la Enfermería.
Palabras Clave: Educación para la salud. Asistencia en enfermería. Unidad hospitalaria.

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Janeiro: Delta, 1971. v. 8, p. 3416.

Endereço para correspondência: Magali Olivi. Universidade Estadual de Maringá - Ambulatório Médico de
Enfermagem, Av. Colombo, 5790. Maringá – PR. CEP: 87.020-900. E-mail: laluna@irapida.com.br
Recebido em: 03/09/2003
Aprovado em: 20/02/2004

Ciência, Cuidado e Saúde Maringá, v. 2, n. 2, p. 131-138, jul./dez. 2003

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