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PRIMEIROS PASSOS NA MÚSICA CLÁSSICA
Por João Mauricio Galindo

SUMÁRIO

1) Quando ouvir música era difícil pg. 04


2) Quando ouvir música é fácil pg. 05
3) Abrindo a mente pg. 07
4) Erudita ou popular? pg. 07
5) Música da fala pg. 10
6) Música dos rituais pg. 12
7) Música de fundo pg. 13
8) Música artística pg. 14
9) Música para ser ouvida pg. 15
10) Origem das notas musicais pg. 17
11) O Compositor surdo pg. 20
12) O mistério da partitura pg. 21
13) Símbolos musicais pg. 23
14) A partitura moderna pg. 25
15) Cifras pg. 27
16) O Concerto pg. 28
17) E os aplausos? pg. 29
18) A orquestra sinfônica pg. 31
19) Sinfônica ou Filarmônica? pg. 43

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20) Música e Futebol: as regras do jogo pg. 45
21) Um novo idioma pg. 46
22) Um novo modo de ouvir pg. 47
23) Treinando o ouvido pg. 49
24) As faixas sonoras e o espaço musical pg. 50
25) Treinando o ouvido em concertos pg. 54
26) Música para o povo pg. 55
27) Canto orfeônico pg. 57
28) Aprendendo música pg. 58

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Quando ouvir música era difícil.

Imagine que você vive em alguma cidade do centro da Europa no início do


século XVIII. No interior da França ou da Alemanha, por exemplo. Você
está com muita, mas muita vontade mesmo de ouvir música.

O que você faz? Coloca um CD no aparelho de som? Consulta uma de suas


playlists no seu celular? Acessa o o Spotfy? Apple Music?

Impossível! … Nada disso existia naquela época.

O que lhe resta? Ir a um concerto?


Também não! Ao contrário do que você possa pensar, naquele tempo as
apresentações musicais públicas, com ingressos pagos, praticamente não
existiam. Estavam apenas nascendo.

Pode-se portanto perguntar: o é que as pessoas daquela época faziam


quando queriam ouvir música? A resposta é simples: elas faziam a sua
própria música. Em casa!

Quem não pertencia à enorme massa de miseráveis que habitava a Europa


de então e tinha o privilégio de uma boa educação, aprendia música.
Aprendia a ler partituras e a tocar um instrumento.

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Foto: Pavel Danilyuk - Pexels

As partituras eram pretextos para as pessoas se reunirem e apreciar o


trabalho de um bom compositor. Elas dedicavam horas e horas a esta
gostosa atividade: colocavam as partituras nas estantes, pegavam seus
instrumentos, liam as notas e se surpreendiam com a música que surgia.
E quando ela surgia, invadindo o ambiente, eu imagino que aquelas pessoas
tinhm uma sensação quase mágica, de prazer e encantamento.

Quando ouvir música é fácil.

Hoje, trezentos anos depois, tudo está muito diferente.


Ouvir música se tornou fácil e corriqueiro. Na internet encontramos de
tudo!

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Existem gravações de música popular do Afeganistão, de sinfonias escritas
há 200 anos na Alemanha, dos primeiros sambas feitos no Rio de Janeiro
no começo do século passado, de bandas de rock acompanhadas por
orquestras sinfônicas, de uma moderna Big Band pernambucana de frevo, e
até de corais com vozes exóticas da Bulgária …

Coro Vocal Feminino da Televisão Estatal Búlgara. Creative commons.

Apesar de toda essa variedade e maravilhosa riqueza de estilos musicais,


muitas pessoas ouvem apenas um tipo de música!
Há pessoas que só ouvem pagode. Outras só ouvem rock, outras só funk, e
assim por diante. Será mesmo gosto ou será falta de conhecimento?

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Se você gosta de música de verdade, proponho-lhe abrir a mente e
conhecer mais sobre o imenso mundo musical à nossa disposição.

Abrindo a mente

Não é exagero dizer que, para se usufruir desse mundo de música de que
dispomos, é preciso “abrir a mente”.

Quando tinha 14 anos, eu passei por uma experiência que ilustra isso
muito bem: eu só queria saber de rock… até que um dia, de férias numa
praia, me vi no meio de uma roda de samba! Era uma música deliciosa,
mas quando percebi que gostava dela, me senti mal!
Afinal, como é que eu, roqueiro, poderia gostar de samba?

Aos poucos fui vencendo meus próprios preconceitos e aprendi que


qualquer gênero musical podia ser bom. E que não temos obrigação de
gostar de apenas um deles!

Erudita ou popular?

Ouvimos com frequência que existem dois tipos de música: a erudita e a


popular. Mas isso não corresponde à verdade. Existem muitos tipos, desde
a mais simples, como uma melodia folclórica, até uma sofisticada sinfonia.

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O Japão, por exemplo tem uma magnífica tradição de música para tambores
dos mais variados tipos e tamanhos, que diferente completamente da
música feita pelas baterias de escola de samba aqui no Brasil.

Grupo de tambores japoneses. Creative Commons.

A cultura europeia desenvolveu muito a linguagem musical, que chegou a


um alto grau de sofisticação e passou a ser classificada como “erudita”, o
que não é errado. Contrapor, porém, à música erudita todo o resto da
música de nosso planeta e chamar esse resto de “popular” é simplificar
demais.
Outro dia, me perguntaram se um analfabeto pode ser músico. Claro que
pode!

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Eu conheci músicos formidáveis, que tocavam instrumentos com técnica e
emoção, sendo, contudo, analfabetos ou semianalfabetos.

Tenho um exemplo em minha família. Uma parte dela é formada por


imigrantes do norte da Itália que chegaram ao Brasil no início do século
XX. Eram camponeses, alguns analfabetos. Minha mãe conta que nossos
parentes, após voltar da roça, tomar banho e jantar, se reuniam para cantar,
acompanhados de violão e acordeão. Ela garante que as canções eram
lindas e emocionantes.

Isso é um exemplo de autêntica música popular.

Foto: Marko Milivojevic – Pixnio

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E a música “erudita”? O que é, afinal?

Há séculos atrás, homens das classes sociais mais altas, como aristocratas e
religiosos, se reuniam para cantar e tocar, assim como faziam os pobres e
os sem instrução. Alguns, além de fazerem música, também tinham gosto
pela pesquisa e, ao estudarem sons, instrumentos e técnicas de escrita,
criavam músicas nunca antes ouvidas. Assim surgiu a expressão música
erudita, que é fruto da erudição, ou seja, dos conhecimentos e da pesquisa
de pessoas que tinham condições para fazê-lo.

O fundamental é saber que música popular e música erudita sempre se


alimentaram mutuamente. Quando um cantor popular toca violão, ele toca
acordes criados por pesquisadores eruditos há muitos séculos. O contrário
também acontece: muitos compositores eruditos incluem em suas obras
elementos rítmicos e melódicos de estilos musicais tipicamente populares.

Música da fala

A música sempre fez parte da vida do ser humano.


Até nas mais simples atitudes percebemos a sua presença!
Por exemplo, como você, ao falar, diferencia as seguintes frases:

“Você vai comer aquele biscoito!” e “Você vai comer aquele biscoito?”

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Resposta: pela música!

Explico: no primeiro caso, você termina a frase com um som grave, e no


segundo, com um som mais agudo. A subida para o agudo é que faz dela
uma interrogação, e é a caída para o grave que faz dela uma exclamação. As
palavras são absolutamente as mesmas, mas é a “melodia da fala” que lhes
dá o sentido definitivo.

Outra experiência: experimente falar uma frase qualquer sem a melodia.


Parece difícil, mas eu explico.
Primeiro escolhemos uma frase, por exemplo:

“eu tenho muita vontade de conhecer Milão”.

Agora repita-a em voz alta, falando as sílabas com uma velocidade


absolutamente uniforme, e com o mesmo tom, sem ir para o agudo nem
para o grave. É como falam os robôs em filmes de ficção científica.
Pronto. Você tirou a música da fala. E sem música, você há de convir
comigo, ela fica mesmo muito estranha. Isso vale para todas as frases!

Esses exemplos mostram o quanto a música está arraigada na nossa fala, na


nossa comunicação e, portanto, na nossa vida!
Por isso, muitos estudiosos dizem que música e fala nasceram juntas.

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Música dos rituais

A música está presente em outras situações; por exemplo, nos rituais.

Você já deve ter visto, em filmes, povos “considerados primitivos”, que


fazem música para seus deuses, pedindo chuva ou boa colheita.

Pessoas consideradas nada primitivas, ligadas a religiões modernas, também


fazem música para Deus, agradecendo por alguma graça obtida, ou apenas
pelo dom da vida.

Nas igrejas do sul dos Estados Unidos, os afrodescendentes criaram para


seus cultos um belíssimo estilo musical, o gospel.

Grandes torcidas de times de futebol empurram seus times com cânticos


ou batuques.

E até mesmo quem vai a alguma “balada”, está participando de um


frenético ritual de socialização, no qual a música é essencial.

Nesses casos, podemos dizer que a música não está sendo apresentada
como uma arte independente, pois está associada a uma outra atividade
humana. Ela é fundamental para esses “rituais”!

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Música de cerimônia ritual realizada no Santuário Jongmyo em Seul.
Licença creative commons.

Música de fundo

Há ocasiões em que a música é simplesmente um “pano de fundo”.

Isso acontece, por exemplo, quando você chega em casa cansado e com
fome, vai para a cozinha preparar um lanche e liga a playlist do seu celular.
Enquanto prepara sua comida, você certamente não está prestando muita
atenção na música, mas ela está lá, em segundo plano, fazendo-lhe
companhia.

O mesmo acontece quando algumas pessoas estão no carro, conversando,


com o rádio ligado, ou então em um restaurante com música ao vivo.

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Em todas essas situações, a música está presente; embora não prestemos
muita atenção nela. Apenas sentimos sua falta, se ela pára.

Música artística

E o músico? Você já parou pra pensar no que ele sente?

Na maioria das situações, os músicos estão trabalhando enquanto as


pessoas estão se divertindo: dançando, comendo, conversando. Essa é a
função deles: alegrar, preencher o ambiente com sons.

É um trabalho digno e bonito.

Mas, se você perguntar a um músico, ele certamente irá dizer que, na


verdade, preferiria que as pessoas parassem para ouvir, prestar atenção e
apreciar sua música.
A essa música não chamamos mais de “música de fundo”, mas de “música
artística”, ou “arte musical”.

Ambas são expressões corretas, mas eu gosto muito de outra: “música


para ser ouvida”.

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Música para ser ouvida

Além de servir de companhia, no papel de música de fundo, de ser peça


fundamental em rituais de toda ordem e de fazer parte da fala, a música,
quando ouvida com atenção, pode dar muito prazer ao ser humano.

Com isso, descobriu-se uma outra coisa: ela poderia ser ouvida,
simplesmente. Você pode até achar estranho, mas acredite: é relativamente
recente na nossa história o fato de um grupo de pessoas se reunir
especificamente para ouvir música. É o que chamamos atualmente de
concerto.

Cartaz da primeira série de concertos em que se podia entrar comprando ingressos, em 1754.
Chamava-se “Concert Spirituel”, e acontecia no Palácio das Tulheiras, em Paris. Creative commons.

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Os concertos públicos só começaram a acontecer na Europa no começo do
século XVIII.

Muito antes já aconteciam apresentações musicais em majestosos palácios,


pertencentes a ricos aristocratas – condes, duques, príncipes. Mas essas
apresentações eram reservadas a poucos.

As orquestras naquele tempo atuavam basicamente em duas situações bem


específicas: na ópera e nas cerimônias religiosas.

Na primeira, não era a música que estava em primeiro plano, mas a ação
teatral e as habilidades técnicas dos cantores.
Na segunda, a música preenchia, por exemplo, uma missa solene.

Em ambos os casos, a música ficava mesmo em segundo plano. Somente


aos poucos é que vingou a ideia de se colocar uma orquestra ou um
conjunto musical num palco e fazer com que, finalmente, a própria música
e os músicos ocupassem o centro das atenções.

Dois fatores contribuíram para isso: a existência de um público disposto a


pagar para ver esse tipo de espetáculo e o grau de evolução que a música
europeia havia atingido.

É dessa evolução que falaremos agora.

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Origem das notas musicais

Como foi o desenvolvimento da linguagem musical na Europa?


Até o século XI, a música era formada por melodias simples, sem qualquer
acompanhamento.
Um exemplo que é cultivado até hoje é o “Canto Gregoriano”.
Clique aqui para ouvir um exemplo de canto gregoriano

Como já disse, eram melodias muito simples, sem qualquer tipo de


acompanhamento, muito diferentes do que acontece hoje quando ouvimos
uma orquestra sinfônica.

A linguagem musical de hoje só foi alcançada após séculos de pesquisa dos


sons e suas combinações.
Esse trabalho foi feito, inicialmente, por monges europeus, que ficavam
trancados em seus mosteiros, estudando e experimentando.

Monges meidevaislendo uma partitura


e cantando.
Creative commons.

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Você já deve ter ouvido, ao menos uma vez, os nomes das notas musicais:
dó, ré, mi, fá, sol, lá, si.

Além dessas sete notas, existem outras cinco:


- o dó sustenido ou ré bemol, que fica entre o dó e o ré
- o ré sustenido ou mi bemol, que fica entre o ré e o mi
- o fá sustenido ou sol bemol, entre o fá e o sol
- o sol sustenido ou lá bemol, que fica entre o sol e o lá
- e finalmente o lá sustenido ou si bemol, entre o lá e o si.

São, portanto, 12 notas no total.


Veja-as na ilustração abaixo, um pedaço de um teclado de piano.

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Olhando para este teclado, imagine tocar três notas simultaneamente, por
exemplo, dó, mi bemol, sol sustenido. Você consegue saber, antes de tocar,
se o som produzido será agradável ou desagradável? Para quem nunca
estudou música, certamente a resposta é não.

Foi essa questão que começou a ser resolvida a partir do século XI.
Monges começaram a pesquisar as combinações de sons, e muitos músicos
participaram desse longo estudo. Essa pesquisa levou séculos.
Graças a isso, hoje é possível escrever as notas musicais em um papel e
imaginar como será o som resultante, sem precisar tocá-las em um
instrumento. Isso nos leva a Beethoven!

Partitura do compositor Nicolas Gombert, que viveu no século XVI.


Clique aqui para ouvi-la.

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O Compositor surdo

Muita gente se espanta, outros não conseguem entender: como é que


Beethoven podia compor, se ele era surdo?

Ludwig van Beethoven, na idade em que começou a ficar surdo.

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A resposta é simples: Beethoven começou a ficar surdo por volta dos 30
anos de idade. Mas, como ele começou a estudar música quando ainda era
criança, teve muitos anos para desenvolver sua audição musical interna.

Durante sua infância, ele foi guardando em sua memória várias


combinações sonoras, acordes e melodias. Por isso ele podia olhar para
uma partitura e "ouvir” mentalmente a música escrita, assim como podia
imaginar uma música em sua mente e em seguida escrevê-la.

Isso não foi um privilégio de Beethoven. Qualquer músico, estudando e


praticando, é capaz de fazê-lo.

Beethoven compôs sua célebre 9a. Sinfonia totalmente surdo!

Clique aqui para ouvir um trecho da 9 a. Sinfonia, com legendas em português.

O mistério da partitura

Você já deve ter ouvido falar em alguém que “toca de ouvido”, certo?
Essa expressão é muito comum.

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Tocar de ouvido é tocar sem precisar ler uma partitura. Uma pessoa
imagina uma música qualquer em sua mente e simplesmente sai tocando
num instrumento.

A habilidade de traduzir em sons a música que está na memória, utilizando


um instrumento musical, é muito importante para quem quer ser um bom
músico.

Mas, se uma pessoa decide se tornar um músico profissional, dependendo


da atividade que ela for exercer, tocar apenas de ouvido não será suficiente.
Na maioria dos casos, será necessário aprender a ler uma partitura.

Há, porém, muitos músicos profissionais que não sabem ler partituras e
vivem muito bem assim. Eles tocam músicas curtas e simples, que podem
ser memorizadas com facilidade.

Contudo, quando se trata de tocar uma obra musical longa e complicada,


como uma sinfonia de Beethoven, é preciso recorrer a uma partitura, pois
somente a memória não é suficiente.

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Símbolos musicais

Há pouco vimos que os monges europeus fizeram, durante a Idade Média,


muitas pesquisas envolvendo a combinação de sons. Para registrar o que
iam descobrindo e para poder utilizar essas descobertas sonoras nas
músicas que cantavam em seus cultos, eles também tiveram de desenvolver
uma escrita musical eficiente. Afinal, a música que faziam tornava-se mais
elaborada, e a memória, somente, já não bastava.

Os símbolos musicais empregados por eles não se pareciam em nada com


os que encontramos nas partituras modernas, que se desenvolveram
lentamente durante o século XVI, até chegar ao que conhecemos hoje.
Primeiro usaram símbolos chamados neumas, que pareciam pequenos
pontos e rabiscos.

Os neumas são os pontos e demais sinais colocados acima da letra da música.

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Os neumas não indicavam com exatidão qual nota devia ser cantada e nem
quanto tempo ela deveria durar, como acontece com as partituras atuais.
Eles apenas ajudavam os cantores a se recordar das melodias que já tinham
aprendido previamente. Depois de alguns séculos, as linhas e notas já
estavam mais parecidas com as das partituras modernas.

Nesta foto, os neumas estão colocados sobre quatro linhas paralelas, à semelhança das partituras modernas.

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A partitura moderna

A partitura moderna é escrita sobre uma base que chamamos de


pentagrama, constituído por cinco linhas paralelas.

O músico não observa apenas as linhas, mas também os espaços entre elas.
“Bolinhas” representam as notas musicais, que podem ser escritas sobre os
espaços ou sobre as linhas.

Quanto mais aguda a nota, mais para cima ela deve ser escrita; quanto mais
grave, mais para baixo. Assim, uma nota na 5ª linha será mais aguda que
uma nota escrita no 2º espaço.

Outras coisas devem estar escritas na partitura, como o tempo que cada
nota deve durar ou se ela deve ser tocada com som forte ou fraco.

O compositor pode querer que o som vá crescendo ou diminuindo pouco a


pouco em determinado trecho da música, e isso também deve estar
claramente grafado.

Há, numa partitura como essa, muitas informações para os músicos, por
isso é que leva algum tempo para que se aprenda a decifrá-la!

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Na partitura a seguir, além das linhas e das notas, vemos expressões como:
cresc ……… aumentar gradativamente o volume.
f: forte.
p: piano, sonoridade suave.
pp: pianissimo, sonoridade muito suave.
sf: sforzando, nota particularmente acentuada.

Uma página da partitura de uma sonata para piano de Beethoven.

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Cifras

Existem também sinais gráficos simplificados que são chamados de cifras.


Por exemplo, o sinal C6 – muito utilizado na música popular – é uma cifra
que indica que as notas dó, mi, sol e lá devem ser tocadas.
Na internet podemos encontrar letras de músicas e cifras, o que possibilita
as pessoas cantarem e se acompanharem com um instrumento.

As cifras existem há muito tempo, desde o século XVIII.


Veja o exemplo, em uma canção de Noel Rosa (1910-1937).
As cifras estão em vermelho.

G D7 G D7
Agora vou mudar minha conduta

G E7/G# Am7
Eu vou pra luta, pois eu quero me aprumar

E7 Am7
Vou tratar você com força bruta

D D7 G
Prá poder me reabilitar

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O Concerto

Nem todo mundo se sente à vontade para ir a um concerto. Muitas pessoas


pensam que os preços não são acessíveis, ou que serão barradas na porta
do teatro se não estiverem bem vestidas, ou, ainda, que não saberão se
comportar; enfim, criam uma porção de empecilhos para si mesmas.

Felizmente, as coisas não são tão complicadas quanto parecem e ninguém


deveria ter receio de ir a um concerto. Nas grandes cidades de todo o
mundo são promovidos concertos de diversos tipos, para diferentes
públicos: desde os mais formais, voltados para os conhecedores de música
clássica, até os mais descontraídos, em que os maestros contam para o
público curiosidades sobre o repertório. Os preços também variam. Há
ingressos muito caros, mas há os mais baratos e até mesmo os gratuitos.
Existem também concertos voltados para o público infantil, e concertos
realizados ao ar livre.

Concerto ao ar livre na Alemanha.


Foto Pixabay - Funki50

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E os aplausos?

Na música clássica instrumental existem obras curtas, como muitas peças


para piano de Chopin, e obras mais longas, como as sinfonias e concertos
de Tchaikovisky.

A maioria das obras longas é dividida em partes, do mesmo modo que um


livro é dividido em capítulos e uma peça de teatro é dividida em atos.

As partes de uma sinfonia são denominadas movimentos.


A intenção do compositor ao dividir uma sinfonia em movimentos é deixá-
la mais variada, pois cada movimento tem um “espírito” diferente.

Numa sinfonia em três movimentos, por exemplo, podemos ter a seguinte


divisão: o primeiro movimento rápido e de caráter mais sério; o segundo
lento e mais emotivo; e o terceiro bem rápido e alegre.

Clicando aqui você ouve uma peça curta, em apenas 1 movimento.


Clicando aqui você ouve uma mais longa, em 3 movimentos.

A questão dos aplausos intriga o público que não está acostumado com
concertos. Mas é simples: no caso de uma obra dividida em movimentos,
como acontece com a maioria das sinfonias, costuma-se aplaudir somente
ao final.

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Basta ter à mão o programa e acompanhar, por meio dele, o desenrolar das
músicas que estão sendo apresentadas.
Contudo, antigamente não era assim No século XVIII, por exemplo, era
comum se aplaudir entre os movimentos.

Vejam esta historinha verídica a respeito, vinda do compositor Wolfgang


Amadeus Mozart (1756-1791)

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Quando esteve em Paris, em 1778, regendo uma de suas sinfonias, o jovem
Wolfgang Amadeus Mozart escreveu uma carta para seu pai onde dizia que
a sinfonia tinha sido um sucesso para todos, mas lamentava uma coisa: “…
no segundo movimento, o público se esqueceu de aplaudir por tanto tempo
e tão calorosamente quanto fizera no primeiro e no último movimento…”

Ou seja: isso prova que o público aplaudia entre os movimentos das


sinfonias, diferente do que se faz hoje.

Clicando aqui você ouve a sinfonia que Mozart regeu em Paris.

A orquestra sinfônica

Existe música clássica feita para todos os instrumentos, isoladamente –


piano, violino, flauta etc. –, e para muitas combinações de instrumentos –
piano com violino, flauta com violoncelo etc. Mas a combinação que mais
encanta as pessoas, por sua grandeza e variedade, é a da orquestra
sinfônica.

Uma orquestra sinfônica tem três grandes grupos de instrumentos: cordas,


sopros e percussão. Na ilustração seguinte, você pode ver a estruturação de
uma orquestra sinfônica, com a disposição dos grupos de instrumentos.

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Essa disposição pode variar um pouco de uma orquestra para outra, mas
obedece sempre ao seguinte critério: quanto mais potente o instrumento,
mais para o fundo do palco ele fica, e vice-versa.

Diagrama de uma orquestra sinfônica:


Vermelho: Cordas com arco
Azul claro: Sopros de madeira
Azul escuro: Sopros de metal
Verde: Percussão

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Os instrumentos de cordas mais usados são aqueles tocados com arco:
violinos, violas, violoncelos e contrabaixos.
São todos semelhantes, seja em sua construção e no número de cordas.
O violino é o mais agudo, e o contrabaixo o mais grave. Violas e
violoncelos são intermediários, sendo a viola mais aguda que o violoncelo.
Violino.

Viola

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Violoncelo
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Contrabaixo

Os instrumentos de sopro são divididos em dois grupos: os feitos de metal


e os feitos de madeira.
Trompetes, trompas, trombones e tuba são sopros de metal

Trompete

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Trompa Tuba

Flauta, flautim, oboé, corne-inglês, clarineta, clarone, fagote e contrafagote


são sopros de madeira.

Flauta

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A flauta é uma exceção: durante séculos ela foi feita de madeira, mas no
século XIX, com o desenvolvimento da tecnologia da manipulação dos
metais, elas passaram a ser feitas de metal, sem perder a sua sonoridade
característica. Portanto, muitas passaram a ser feitas de metal, sendo que as
de madeira ainda são muito apreciadas pelos flautistas.

Flautim, flauta pequena e aguda.


Este exemplar é feito de madeira.

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Oboé.

Corne-inglês

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Fagote, fotografado em dois ângulos diferentes.

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Contrafagote

Os instrumentos de percussão também são divididos em grupos:


tambores, teclados, pratos e acessórios.

Por serem numerosos, é praticamente impossível citar o nome de todos


aqui.

Vamos, então, ver os mais usados.

Entre os tambores estão os tímpanos, a caixa, os ton-tons, as congas, o


bongô e o bombo sinfônico.

Entre os pratos temos o prato suspenso, os pratos de choque, o gongo


chinês e o tantã.

Os teclados são xilofone, marimba, vibrafone, glockenspiel.

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E os acessórios são os instrumentos pequenos como triângulo, pandeiro,
reco-reco, chocalho, ganzás, blocos de madeira (woodblocks), agogô, afoxé,
xequerê, guiro, maraca, entre tantos outros.

Tímpanos

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Caixas

Xilofone

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Sinfônica ou Filarmônica?

Uma das perguntas mais frequentes entre as que recebo é: qual a diferença
entre “Orquestra Sinfônica” e “Orquestra Filarmônica?”.
A reposta é: nenhuma!

A palavra filo, de origem grega, significa “amigo”; filarmônica, portanto,


quer dizer “amigo da música”.
Então, teoricamente, quando uma orquestra sinfônica era mantida com
dinheiro particular, era chamada de filarmônica. E se era mantida com
dinheiro do governo, era chamada de sinfônica.

Orquestra
Sinfônica da Cidade de Birmingham. Foto wikimedia commons.

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A Orquestra Filarmônica de Berlim e a Orquestra Sinfônica de Londres
estão entre as melhores do mundo. Embora haja diferença na
nomenclatura, não há qualquer diferença em termos musicais. Ambas são
compostas pelos mesmos instrumentos e, se quiserem, podem tocar o
mesmo repertório.

Para ser chamada de sinfônica ou filarmônica, uma orquestra deve ter os


três grupos de instrumentos: cordas, sopros e percussão.

Quanto ao número de músicos, não há uma regra fixa, mas se for composta
por menos de 50 músicos, a orquestra é considerada uma pequena
sinfônica, uma “sinfonieta”.
Com menos de 30 músicos temos uma orquestra de câmara.

São comuns também as Orquestras de Cordas e as Orquestras de Sopros,


também chamadas de Bandas Sinfônicas.

Existe também a "Big Band", um tipo de orquestra inventado nos Estados


Unidos na 1ª metade do século XX. É a orquestra típica do jazz, composta
por 5 saxofones, 4 trombones, 5 trompetes, bateria, baixo, guitarra, piano.
Pode haver algumas pequenas variações, mas a disposição básica é essa!

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Muitas big bands ganharam enorme prestígio, deixando as salas de baile e
apresentando-se em salas de concerto por todo o mundo a partir dos anos
50 do século passado.

Big Band de Duke Ellington. Foto wikimedia commons.

Clique aqui para ouvir a Big Band de Duke Ellington

Música e Futebol: as regras do jogo

O Brasil é conhecido como o país do futebol. Aqui, este esporte mobiliza


grande platéia, principalmente na época da Copa do Mundo.

Quando eu era criança, durante esse evento, muitas famílias – incluindo a


minha – se reuniam em frente a TV sempre com muito entusiasmo; todos
davam palpites, torciam, faziam apostas.

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Uma vez minha avó tentou acompanhar um dos jogos com a gente, mas
não conseguiu. Sempre que acontecia algo no jogo que nos mobilizava ela
perguntava o que tinha acontecido.
Ninguém tinha a menor paciência de lhe explicar o que era uma falta, um
impedimento ou um escanteio. Isso fez com que ela desistisse de assistir ao
jogo e fosse para a cozinha. Fez um bolo!

Minha avó não se envolveu com o jogo porque ela não o compreendia.
Não entendia suas regras.

Contudo quem jogou bola na infância e entende minimamente de futebol,


ao assistir uma partida, se entusiasma bastante.

Coisa muito parecida acontece com a música. Quem participou de algum


grupo musical, tocando um instrumento ou cantando, e aprendeu as
“regras” do “jogo musical”, consegue ouvir uma longa sinfonia sem se
cansar, pois está sensibilizado para isso.

Um novo idioma

Quando me referi à música, eu usei a palavra “regras” assim, entre aspas,


porque ela é apropriada para o futebol, mas não para a música.

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Na música é melhor falarmos em linguagem, pois aprender música é como
aprender um novo idioma.

Imagine que estamos ouvindo alguém falando em uma língua que não
conhecemos. Por exemplo, paquistanês. Se prestarmos atenção, podemos
perceber muita coisa do que está sendo dito. No mínimo, percebemos o
estado de espírito – calmo, nervoso, aflito, entusiasmado, chateado, triste –
do emissor. Mas só poderemos entender o conteúdo exato se aprendermos
o vocabulário e a gramática da língua paquistanesa.

Do mesmo modo, se ouvirmos uma sinfonia de Beethoven, podemos


perceber sem dificuldade os momentos em que a música transmite calma,
aflição, entusiasmo. Para penetrar mais fundo nessa música, porém, e
perceber muito mais do que as emoções que ela transmite, é preciso
conhecer mais sobre os sons e como eles se conectam.

Um novo modo de ouvir

Você então pode me perguntar se o único jeito de aprender a linguagem


musical é tocando ou cantando em um grupo, conjunto, orquestra ou coral.
Não, esse não é o único jeito. Mas, é o melhor, o mais prazeroso e
divertido, pois fazer música é algo muito bom.

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É possível aprender muito dessa nova língua desenvolvendo um novo modo
de ouvir, em que a música deixa de servir apenas como fundo para outras
coisas que fazemos.

O primeiro passo é criarmos o hábito de ouvir música com atenção, sem


fazer qualquer outra coisa. Lembre-se do que foi dito no início deste texto:
há música para servir como “fundo musical”. E há a “música artística”,
aquela que a gente pára para ouvir.

É como ler um livro ou assistir a um filme no cinema. Quando vamos ler,


procuramos um ambiente silencioso, que favoreça a concentração. No
cinema o ambiente é perfeito para nos envolvermos com a trama: a sala é
escura, e as pessoas só conversam sussurrando. Por que com a música
haveria de ser diferente?

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Foto: TravelCoffeBox - Pixabay

Uma bela sala de concertos como a da foto acima favorece enormemente


nossa atenção e encantamento quando assistimos a um concerto.
Educando a concentração para ouvir música, está dado o primeiro passo
para desfrutarmos as obras-primas criadas por grandes compositores.

Treinando o ouvido

Quando era adolescente, eu jogava futebol no time da escola. Sempre que a


bola estava comigo, o técnico do time me orientava a não olhar para meus
pés. Ele insistia que eu mantivesse meu olhar a minha volta, tanto para ver
o adversário se aproximando, quanto para analisar para quem eu poderia
passar a bola.
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Ele me dava essas orientações porque tinha conhecimento de que o ser
humano tende a focalizar um ponto no campo visual e abandonar o resto;
sabia também que, se prestarmos atenção, podemos ampliar nosso campo
visual.

Pois o mesmo acontece com nosso ouvido. Nós tendemos a nos concentrar
nos sons agudos e desprezar os demais. No entanto, para nos tornarmos
bons apreciadores de música, precisamos “abrir” nosso campo auditivo e
tentar ouvir todos os sons simultaneamente.

As faixas sonoras e o espaço musical

De maneira geral, podemos dividir os sons em três faixas sonoras: a faixa


dos sons agudos, dos graves e dos médios.

- Uma melodia que alguém assobia em meio ao silêncio usa apenas a faixa
dos sons agudos.

- O apito de um grande navio está situado na faixa dos sons graves.

Pois bem, quando um compositor escreve uma música, ele usa cada uma
dessas faixas para colocar uma informação diferente.

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Imagine um instrumento bem agudo, como o violino, tocando uma
melodia, e um contrabaixo acompanhando esse violino. Eles estão
ocupando essas duas faixas sonoras.

Há, ainda, a terceira faixa, destinada aos sons médios. Se, para acompanhar
o violino e o contrabaixo, tivermos um violão, o espaço musical estará todo
preenchido, pois os acordes desse instrumento ocuparão a terceira faixa.

Imagine a fachada de um prédio de três andares, com grandes janelas, de


modo que a gente vê o que tem dentro.

No 3o. andar, um flautista tocando. No andar abaixo alguém tocando um


violão. E mais abaixo ainda, um contrabaixista.

“A Primavera”, de Antonio Vivaldi, compositor italiano que viveu no século


XVIII, é uma das músicas mais conhecidas do repertório clássico.

Ela ilustra bem o que são as faixas sonoras e o espaço musical.

Trata-se de um concerto para violino e orquestra de cordas, dividido em


três movimentos.

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Eles apresentam temas e melodias que simbolizam ou imitam eventos
típicos da primavera, como o cantar dos pássaros, os trovões de uma
tempestade e assim por diante.

No segundo movimento desse concerto, Vivaldi tenta representar, por meio


dos sons, uma tarde quente e ensolarada, durante a qual um rebanho pasta
enquanto um jovem pastor dorme. Faz calor, e ele está encostado em uma
árvore. Ao lado do pastor, seu cão, fiel amigo, late insistentemente.

Para ilustrar isso musicalmente, Vivaldi fez o seguinte:

- Na faixa dos sons agudos, colocou o violino principal, que chamamos de


solista, tocando uma melodia bonita, porém bastante lenta, para simbolizar
a preguiça e o sono do pastor.

- Na faixa dos sons mais graves está a viola, tocando notas que simbolizam
os latidos do cão.

- Na faixa dos sons médios, os demais violinos fazem uma melodia


muitíssimo discreta que sugere o murmurar dos arbustos e galhos das
árvores sob o efeito da brisa.

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Ao ouvir essa música pela primeira vez, é comum as pessoas não
perceberem as faixas sonoras. Elas ouvem tudo misturado, como se fosse
uma coisa só, com o cérebro dando um enorme destaque para a melodia
principal.

Depois de explicada a divisão das faixas e a ideia de Vivaldi, quando ouvem


pela segunda vez, todos identificam, surpresos, as três faixas e seus
elementos.

Mais abaixo há um link para o youtube, e clicando nele. você verá uma
execução em vídeo deste trecho.

Será bem fácil perceber as faixas sonoras olhando para os músicos:

- A violinista solista, que está mais à frente e no centro, toca a melodia da


faixa sonora aguda (a melodia do sono do pastor).

- As violistas, que estão ao fundo e à direita, tocam na faixa sonora mais


grave (os latidos do cão).

- As violinistas à esquerda tocam na faixa dos sons médios – a mais difícil


de ouvir. (o murmurar das folhas sob a brisa.)

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É um trecho curto. Procure ouvir 3 ou 4 vezes, tentando identificar as
faixas sonoras. Você ficará surpreso em perceber como sua percepção pode
aumentar, treinando a audição deste modo!

Clicando aqui você ouve o trecho musical citado acima

Treinando o ouvido em concertos

Outro bom modo de treinar nosso ouvido é assistir a concertos ao vivo.


Nessas situações, a visão pode nos ajudar bastante.

Faça a seguinte experiência: enquanto estiver assistindo à orquestra,


procure olhar para o movimento dos arcos dos contrabaixos por alguns
minutos. Você certamente começará a ouvir com mais clareza os sons
graves emitidos por eles.

Do mesmo modo, fique olhando para determinado instrumento que não


esteja tocando, por exemplo, a clarineta.
Quando o clarinetista aproximar o instrumento dos lábios, fique atento! No
momento em que ele soprar, procure identificar o som produzido.

Você verá que pouco a pouco passará a ouvir com muita facilidade os sons
graves e médios, que nosso cérebro tem mais dificuldade para discernir.

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Música para o povo

No capítulo anterior, vimos algumas dicas de como treinar o ouvido.


No entanto, a melhor forma de aprender a linguagem musical, é “pondo a
mão na massa”: estudar música e fazer música, cantando ou tocando algum
instrumento. Estudar por prazer, sem a intenção de se profissionalizar.

Se esse estudo musical for constante e durar alguns anos, ele exercitará o
ouvido e aumentará a sensibilidade de quem o faz. Isso aplicado a uma
comunidade gera uma população que sabe apreciar música e frequenta os
concertos, ou seja, gera um público grande e entusiasmado.

Com um público assim, os compositores se empolgam e criam obras


musicais sofisticadas, orquestras são fundadas, salas para concertos são
construídas, ou seja, a vida musical adquire força e se expande.

Mas tudo depende de o ensino musical ser acessível à população.

Os países que geraram os maiores compositores de música clássica são


justamente aqueles em que produzir música fazia parte do dia a dia das
pessoas.

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É o caso, por exemplo, da Alemanha e da Áustria. Nesses dois países
nasceram e viveram grandes compositores: Bach, Haydn, Mozart,
Beethoven, Schubert, Schumann, Brahms, Wagner.

Havia, tanto na Alemanha quanto na Áustria, o costume de a população


cantar no coro da igreja.

Coral de uma Igreja Luterana Alemã. Wikimedia Commons.

E, com tanta gente fazendo música assim, era natural que surgissem alguns
talentos acima da média. Os jovens talentosos eram reconhecidos
rapidamente e enviados para estudar música em boas escolas. Estava aberto
o caminho para se tornarem grandes artistas.

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Essa situação acontece no Brasil com o futebol: são tantas crianças jogando
bola desde pequeninos, que muitos talentos excepcionais surgem e são
incentivados.
Canto orfeônico

A expressão “canto orfeônico” vem da língua francesa. Foi um movimento


realizado em Paris a partir do final do século XIX, objetivando a formação
de corais de amadores.
No Brasil o grande incentivador dessa prática foi o compositor Heitor
Villa-Lobos.

Villa-Lobos regendo um gigantesco coral orfeônico de crianças.

Graças a ele, em 1932, o presidente da república assinou um decreto que


instituía o canto orfeônico nas escolas e, também, cursos para professores
de canto. Villa-Lobos fez pesquisas e preparou partituras baseadas em
canções folclóricas. Milhares de crianças e jovens tiveram uma importante
iniciação musical.

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O canto orfeônico existiu durante quarenta anos, ou seja, até 1971, quando
o governo federal extinguiu o ensino musical obrigatório nas escolas.

Aprendendo música

Como e onde os jovens estão aprendendo música? Muitos participam das


bandas de colégio, uma turma entusiasmada, que fazem apresentações e
disputam concursos estaduais e até nacionais.

Outro importante centro de iniciação musical são as igrejas, principalmente


as evangélicas. Muitas herdaram a tradição européia de cantar em conjunto
durante os cultos, várias mantêm cursos de instrumentos e têm orquestras
organizadas.

Há também escolas e programas de iniciação musical mantidos por


governos municipais, estaduais, e por organizações não-governamentais.

Outra maneira – mais corriqueira – de se começar a estudar música hoje


no Brasil é comprar um violão ou uma guitarra e procurar aprender
sozinho.

Pesquisando na internet, consultando amigos, com força de vontade, em


pouco tempo é possível cantarolar algumas canções acompanhando-se ao
instrumento.

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De qualquer forma, a mensagem é a seguinte: se você gosta de música,
procure ouvir com atenção. Neste texto eu sugeri alguns exercícios. Faça-
os!

Mas se puder, procure fazer música de alguma maneira: cantando em um


coral, tocando algum instrumento com os amigos. Sem se preocupar se o
resultado está perfeito – o que, aliás, pode ser estressante.
Essa preocupação é obrigatória para um profissional, mas não para quem
quer desenvolver a sensibilidade musical e assim usufruir mais dessa bela
arte.

Ponha a mão na massa, faça música de algum jeito, e sobretudo….


Ouça de tudo, e seja curioso!

Saudações Musicais, sempre!

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Sobre o autor

João Mauricio Galindo é Bacharel em Composição e Regência pela Unesp e


Mestre em Musicologia pela USP.

Foi violista da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo entre 1985 e


1992, sob direção do maestro Eleazar de Carvalho.

Também atuou como violista da Orquestra de Câmara de Heidelberg,


Alemanha, entre 1989 e 1991.

Em 1990 foi o único brasileiro participante do 1o. Curso Latino Americano


para Jovens Regentes, realizado em Caracas, Venezuela, patrocinado pela
OEA – Organização dos Estados Americanos.

Foi regente das orquestras Sinfônica Jovem do Estado de São Paulo,


Orquestra Sinfônica do Conservatório de Tatuí, Amazonas Filarmônica e
Sinfônica de São Bernardo do Campo.

Desde 2000 é regente da Brasil Jazz Sinfônica, tendo sido seu Diretor
Artístico de 2005 a 2017.

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No exterior realizou concertos como convidado em diversos países, como
Perú, Venezuela, Cuba, Portugal, Itália, Turquia, Servia, Letônia e Lituânia.

Há mais de 20 anos direge a série de concertos beneficentes-educativos “O


Aprendiz de Maestro”, uma experiência única que une música sinfônica,
teatro, ópera e balé, e que tem por objetivo criar no público infantil e
adolescente o gosto pelos espetáculos musicais.

O maestro João Mauricio Galindo é também um dos comunicadores da


Rádio Cultura FM de São Paulo, onde produz e apresenta dois programas:
“Encontro com o Maestro” e “Pergunte ao Maestro”.

Tem dois livros públicados: “Música, Pare para Ouvir”, Melhoramentos,


2009), e “Beethoven, as Muitas Faces de um Gênio”, (Editora Contexto,
2019).

No ano de 2010 foi condecorado pelo governo francês como “Chevalier de


l’Ordre des Arts et des Lettres”.

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