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1. TÍTULO DO TRABALHO

O preço da sequidão: gênese de uma indústria da Seca no Aracati durante a grande


seca do Séc. XIX (1877-1880)

2. DELIMITAÇÃO TEMÁTICA

Parece não merecer duvida que Deus tem resolvido fazer-nos passar por
privações vigorosas e só nos resta pois impregar os meios ao nosso alcance
para mitigar ou menorar o rigor dos soffrimentos(...) Lembra porem que aqui
já tem completa falta de gêneros alimentícios e que o Aracaty celeiro desta
villa, está olhado como lugar de refugio do sertão e já não tem abundancia de
generos.1

Seca, palavra cara à região Nordeste do Brasil. Cara pelo peso simbólico que
carrega, dada a multiplicidade de conceitos que consegue acumular. Para além do
fenômeno climático, as secas alçaram a posição de problema social, cultural, político
e econômico e a sua importância de certa forma define toda uma parte da história da
referida região do Brasil.
Abordado como nota marginal com uma certa frequência na literatura
historiográfica até a primeira metade do século XIX, a “seca” ganhou status de tema
relevante na segunda metade desse mesmo século, mais precisamente durante a
grande seca dos anos de 1877 a 1880. ALBUQUERQUE JR chama-nos a atenção de
que a seca enquanto fenômeno natural possui, na história brasileira desde a época
colonial, 31 registros anteriores a esta grande seca do século XIX2. Juntamente com o
advento desta, a historiografia contemporânea que se debruça sobre o tema concorda
de forma geral que movimentos inéditos foram percebidos durante os anos setenta e
oitenta daquele século que permitiram novas perspectivas sociais, políticos, culturais
e econômicas sobre o tema e sobre a região do semi-árido conhecido à época como
norte brasileiro.
1 Ofício do Paço da Câmara Municipal de Villa da União, em 21 de Abril de 1877. In F. NETO. A
tragédia dos mil dias: a seca de 1877-79 no Ceará. Fortaleza: Premius, 2006. p. 42-43
2 ALBUQUERQUE JR. Durval M. “Palavras que calcinam, palavras que dominam: a invenção da

seca no Nordeste.” Revista Brasileira de História. São Paulo: ANPUH/Marco Zero, vol. 15, nº 28, 1995.
p. 111.
2

NEVES afirma que “O ano de 1877 inaugura não só um período de


transformações históricas importantes para o Ceará, mas igualmente uma nova forma
de percepção generalizada sobre o fenômeno da seca (...)”3. Isso é possível porque a
temática da seca, enquanto objeto de estudo para as ciências sociais, ganha em
significado quando o tema passa a ser reconhecido enquanto problema social, político
e econômico. Para a historiografia, esse reconhecimento se dá através da análise das
representações produzidas documentalmente por uma elite letrada do período,
atingida pelos efeitos de tal fenômeno. Tratando da “Grande Seca” do século XIX, o
autor acrescenta:

(...) a seca adentrou ao mundo do poder constituído, avançou sobre o centro


imaginário deste poder, sem respeitar-lhe os ‘canais competentes’, e atingiu o
cerne da aventura civilizatória que a elite local imaginava experimentar neste
momento.4.

A seca de 1877 a 1880, enquanto marco historiográfico, constitui-se, no dizer


de ALBUQUERQUE JR, em uma invenção: a seca é “inventada como objeto de
discursos e práticas, como uma estratégia política diferenciada (...)”5. A “invenção” da
seca se explica em um contexto onde as elites do Norte sofriam os revezes das
transformações no âmbito político e econômico que se desenrolava desde fins do
período colonial, intensificados durante o Segundo Reinado. A perca do predomínio
econômico e político das elites “nortistas” em função do declínio açucareiro e do
menor fluxo do mercado escravista em relação às províncias do sul, reservou às
classes dominantes da região o segundo plano no cenário político e econômico
nacional. O impacto da grande seca do século XIX sobre estas elites deu-lhes uma
oportunidade de barganhar solicitudes frente ao governo imperial, pois caía-lhes nas
mãos um forte discurso favorável às usas reivindicações:

(...) Politizar, pois a seca, colocando-a no centro das atenções, sobrepô-la a


qualquer outro problema da área, tornando-a a temática através da qual se
solicita qualquer recurso ou investimento neste espaço, recursos baratos, que
viessem como doações, e permitissem a recuperação da economia dessas
províncias, passa a ser a estratégia.6.

3 NEVES, Frederico de Castro. Estranhos na Belle Époque: a multidão como sujeito político
(Fortaleza,1877-1915) IN: Trajetos: Revista de História da UFC, vol. 3 Nº 6. 2005.
4 NEVES, Frederico de Castro. A multidão e a história: Saques e outras ações de massa no Ceará.

Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2000. p. 25.


5 ALBUQUERQUE JR. Durval M. Op. cit. p. 112.
6 ALBUQUERQUE JR. Durval M. Op. cit. p. 118.
3

É neste contexto que o presente trabalho tem por objetivo situar sua análise,
uma vez que tais estratégias e novas posturas frente às mudanças à nível macro
conferiram às relações de poder locais suas características que se tornariam
constantes ainda no século seguinte. Segundo Neves (2000: p. 83-84), o sistema de
controle de donativos e de assistência à classe trabalhadora retirante, constante das
épocas de estiagem, contudo não restrito a elas, que no século XX ganhou a
denominação de “indústria das secas”, teve como embrião as práticas empreendidas
durante a grande seca iniciada em 1877, principalmente na adoção dos “chamados
socorros públicos indiretos” (SOUSA, 2009, p. 151-190). O termo “indústria”, atribuído
a um sistema de concentração de poder político e econômico nos sertões nordestinos
diretamente vinculado às relações estabelecidas entre as elites nacionais, locais e a
população campesina, é de certa forma recente. Atribuído ao jornalista e escritor
Antonio Callado, em final da década de cinquenta no século XX7, quando da
publicação de uma série de reportagens suas a respeito do problema das Ligas
Camponesas8. Reportagens que permitiram que a questão fosse elevada ao debate
da opinião pública a nível nacional, contribuindo para o despertar de interesse da elite
política nacional sobre o tema urgente.
Apesar da distância temporal entre a grande seca de 1877 a 1880 e a
cunhagem do termo "indústria” para definir o que se tornaria o nada imperceptível
problema em meados dos anos cinquenta, tanto Neves (2000: p. 84) quanto Cunniff
(1975: p. 65-82) entendem ser a grande seca do séc. XIX o ponto onde as origens
deste sistema apresentam seus vestígios mais evidentes. Sobre isto, Cunniff resume:

These drought windfalls convinced many that only with large injections of
outside money could they continue to develop the interior and conquer their
old problems. After 1880 the drought area had a sense of region it had never
possessed before. The drought bloc created during the crisis had been fragile
and dependent upon outside help for success, but in teaching Northeasterners
how to make an industry of the droughts it created a legacy which was to
dominate the regional politics for the next century. 9

7 QUELER, J. J.; ZANGELMI, A. J. “Por uma revolução branda no campo. Significados do


vocabulário político das reportagens de Antonio Callado sobre o Nordeste (1959-1960).” Revista
de História, [S. l.], n. 179, p. 01-29, 2020. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/revhistoria/article/
view/154247. Acesso em: 02 out. 2022.
8 Sobre as Ligas Camponesas cf. AZEVEDO, Fernando Antônio. As ligas camponesas. Rio de

Janeiro: Paz e Terra, 1982 e BASTOS, Élide Rugai. As ligas camponesas. Petrópolis: Vozes, 1984.
9 Trad.: “Estes ganhos inesperados da seca convenceram muitos de que somente com grandes

injeções de dinheiro externo poderiam continuar a desenvolver o interior e superar seus antigos
problemas. Depois de 1880, a área da seca teve um sentido de região que nunca havia possuído
antes. O bloco da seca criado durante a crise era frágil e dependia de ajuda externa para ter sucesso,
4

Sobre este “nascimento” da “indústria da seca”, suas implicações práticas ou


talvez inexistentes em âmbito local é que objetivamos tratar no presente trabalho.
Contudo, o faremos conduzindo o olhar para objeto mais próximo de nos ajudará em
nossa análise. Especificamente falando da então Província do Siará, esta ganhou,
nos discursos da seca, o status de “modelo”, chegando a confundir-se a seca do
Norte com “seca do Ceará”10. Isto se deu, principalmente em função da ação da
imprensa nacional e cearense, contribuindo de forma preponderante para a
construção desse imaginário11.
Muito embora a historiografia seja abundante sobre o tema, acreditamos que a
natureza das origens desta indústria ainda sejam algo que possui uma riqueza
inexplorada, principalmente no que diz respeito à natureza das relações de poder
formadas a partir das novas percepções da seca que citamos há pouco. Diversos
estudos se debruçam ou simplesmente mencionam a “grande seca do século XIX”, se
utilizando de diversas abordagens. Além dos já citados, mencionamos também
CHAVES12, que se debruça sobre o imaginário da seca, tendo foco na cidade de
Fortaleza. Citamos também a pesquisa de PONTE13, que, ao falar de estruturação
urbana e disciplina social, trabalha as condutas urbanas na cidade de Fortaleza em
relação aos retirantes emigrados. A abordagem de DOS ANJOS14, que foca sobre a
formação do espaço urbano e a formação da periferia de Fortaleza. Há ainda o de
COSTA15, onde analisa as teorias médicas e sua influência sobre o espaço urbano e a
higiene em Fortaleza, durante a grande seca do século XIX, além dos escritos de

mas ao ensinar os nordestinos a fazer das secas uma indústria, criou um legado que dominaria a
política regional no século seguinte.” In: CUNNIFF, Roger L. “The Birth of the Drought Industry:
Imperial and Provincial Response to the Great Drought in Northeast Brazil (1877-1880).” Revista
de Ciências Sociais, Fortaleza, vol. VI, nº ½, 1975. p. 76.
10 ALBUQUERQUE JR. Durval M. Op. cit. p. 117.
11 ALBUQUERQUE JR. Durval M. Op. cit. p. 119. Ainda sobre a importância da imprensa na difusão do

imaginário da seca difundido por todo o país, ver: BARBALHO, Alexandre. “Corpos e mentes
dilacerados: o grotesco nas imagens da seca de 1877.” Trajetos: Revista de História da UFC.
Fortaleza: Departamento de História da UFC, vol. 03, nº 06, 2005.
12 CHAVES, José O. de Souza. Fortaleza e os retirantes da Seca de 1877-1879: o real de um

imaginário dominante. Dissertação de Mestrado em História apresentada a UFPE. Recife: 1995.


13 PONTE, Sebastião Rogério. Fortaleza Belle Époque: reformas urbanas e controle social (1860-

1930). Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 1993.


14 DOS ANJOS. Karla Torquato. “Limpar a cidade”: a (in)salubridade e a formação dos subúrbios em

Fortaleza durante a seca de 1877 a 1879. Monografia apresentada à Universidade Estadual do Ceará –
UECE. Fortaleza, 2008.
15 COSTA, M.C.L. Teorias médicas e gestão urbana: a seca de 1877-1879 em Fortaleza. História,

Ciência, Saúde – Manguinhos, vol. 11, n. 1. Rio de Janeiro, jan./abr. 2004.


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GIRÃO16 e de THEÓPHILO17, dos quais podemos extrair detalhes e representações


dos acontecimentos da seca de 1877 a 1879. Existem diversas outras obras e artigos
que tratam do assunto, contudo, destaco estes por já me ter sido dada a oportunidade
de um contanto mais próximo e abrangente.
Como se percebe, a historiografia cearense sobre o século XIX, de forma geral,
tem se centrado do caso específico de Fortaleza, alcançando o restante da província
de forma complementar ou acessória. O que buscamos no presente é, sem
menosprezar a importância da capital no contexto explorado, encontrar o peculiar e
específico evento nas circunstâncias locais e encontrar os fios que o amarram ao
geral, visando entender as escalas que em que essa conexão se fortalece. Seria esta
o recorte “espacial” escolhido, o micro, o pequeno ou até mesmo escondido.
O segundo ponto motivador do recorte, parte de uma inquietação no que diz
respeito à distribuição dos socorros durante a seca, procedimento que no meu
entender é de suma importância para um entendimento mais amplo da “grande seca
do século XIX” e dos vestígios do que Cunniff sugeriu como o “nascimento da
indústria da seca". Na obra de THEÓPHILO18, é-nos relatado sobre a formação das
comissões de socorros públicos, em diversas localidades da província. Ao tratar da
política de distribuição de gêneros promovida pelo governo provincial por meio destas
comissões, o autor salienta que tal se deu em meio à corrupção e falta de
fiscalização. O já citado NEVES fala de “Um amplo sistema de controle dos donativos,
por parte de comissários e funcionários”, como estrutura antecipadora da “indústria”
subsequente19. O termo “amplo sistema” denota abrangência que vai além do território
da capital, Fortaleza, adentrando às localidades onde também se formavam
comissões. Perceber tal a existência ou não de tal “sistema” requer, portanto, focar
uma outra localidade que não a capital, onde também se tenha formado uma
comissão de socorros públicos. Tem-se em vista verificar e analisar a coesão de tal
assertiva do autor, a pertinência na referência a um provável traço marcante na
condução dos negócios em período de seca, uma “indústria”, que segundo ele
persistiu no século seguinte.

16 GIRÃO, Raimundo. Pequena História do Ceará. 2ª ed. Fortaleza: Editora Instituto do Ceará, 1962.
17 THEÓPHILO, Rodolpho. História da secca do Ceará (1877-1880). Rio de Janeiro: Imprensa
Inglesa. 1922.
18 THEÓPHILO, Rodolpho. Op. Cit.
19 NEVES, Frederico de Castro. A seca na história do Ceará. Em Uma nova história do Ceará. Org.

Simone de Souza. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2000. p. 83-84


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A historiografia, predominantemente da capital, cita outros nomes de


localidades da província. Um dos que mais aparecem é o da cidade do Aracati. Pelas
obras que tratam do século XVIII e primeira metade do século XIX, das quais notamos
a de CANEIRO GIRÃO20 e a de LEMENHE21, percebemos que a cidade do Aracati era
o principal entreposto comercial da província, antes da ascensão de Fortaleza como
cidade hegemônica na segunda metade do século. Tendo perdido tal posição, o
Aracati ainda se favorecia por sua localização como entreposto comercial do vale
jaguaribano, escoando, dentre outros itens, o algodão. Por sua importância enquanto
escoadouro e receptor de gêneros, os quais eram distribuídos por várias localidades
ao decorrer do rio Jaguaribe, a comissão de socorros formada no Aracati tinha, a
princípio, função dupla, que seria tanto de distribuir socorros para os da cidade como
para os das localidades do vale jaguaribano. GIRÃO, ao falar da cidade de Fortaleza
como a “metrópole da fome, capital dum pavoroso reino”22, destaca em segundo plano
ao Aracati, lembrando que segundo o censo do início da década de 1870, a cidade
possuía um número em torno de 5.000 habitantes, e que em 1878, subia a 60.00023.
Se tomarmos este dado a princípio, percebemos que a comissão de socorros do
Aracati, dadas as devidas proporções, mergulhou em um trabalho tão árduo quanto o
da capital. Ao falar disso, lembro que estrutura urbana e econômica aracatiense, em
muito não se equiparava à da capital, e que, portanto, um número de 100.000
retirantes na capital, poderia suscitar tantos problemas à elite de Fortaleza, como um
número de 60.000 à elite do Aracati.
Quando falo de elite, vale lembrar que os membros das comissões de socorros
na província, em 1877, foram nomeados pelo então presidente Caetano Estellita,
dentre os membros das elites locais, que segundo THEÓPHILO, as comissões
“Ordinariamente (...) se compunham das principaes autoridades da localidade e do
vigário da freguezia” 24. Entendo que o quadro da seca que tanto NEVES, quando fala
de um sistema que torna-se uma “indústria”, como ALBUQUERQUE JR, quando

20 CARNEIRO GIRÃO, Valdelice. As oficinas ou charqueadas no Ceará. Fortaleza: Secretaria de


Cultura e Desporto, 1984.
21LEMENHE, Maria Auxiliadora. As razões de uma cidade: conflitos de hegemonias. Fortaleza: Stylus
Comunicações, 1991. Sobre a situação urbana do Aracati, enquanto cidade hegemônica, ver: JUCÁ
NETO, Clóvis Ramiro. A urbanização no Ceará Setecentista: as vilas de Nossa Senhora da
expectação do Icó e de Santa Cruz do Aracati. Salvador, 2007. Tese de Doutorado em Arquitetura e
Urbanismo – UFBA
22 GIRÃO, Op. cit. p. 320-321.
23 GIRÃO, Op. cit. p. 320-321.
24 THEÓPHILO, Rodolpho. Op. Cit. p. 85.
7

remete-se à “politização” da seca, torna-se de possível entendimento, quando


focamos sobre um caso específico como este de Aracati.
Portanto, diante deste lugar vazio na historiografia, pretendo tomar como
recorte espacial a cidade de Aracati, onde formulo a partir de então o objeto do
presente trabalho.
Dentro do recorte espacial, encontramos nosso objeto, dada à riqueza
documento com a qual pudemos contar. Trata-se da Comissão de Socorros Públicos
no Aracati durante o período da grande seca do séc. XIX. A predominância de
documentos, sejam ofícios, relatórios, mapas de compras ou cartas, produzidos pela
comissão de socorros ou remetidos à ela, orientou de forma contundente a proposta
de objeto do presente trabalho. A ele remetemos a partir de então.
Conforme circular emitida pelo então presidente da Província, Desembargador
Caetano Estellita Cavalcante Pessôa, datada de 17 de abril de 1877, ficava nomeada
a comissão de socorros da cidade do Aracati25. Esta primeira comissão de socorros foi
composta por quatro indivíduos constantes da elite da cidade, identificados como
sendo um Coronel, dois comerciantes e o vigário da cidade. Os mesmos se
responsabilizariam por arregimentar funcionários para proceder à distribuição de
gêneros para a população retirante.
O que se segue nas fontes nos mostra a ação constante da comissão na
distribuição de gêneros, que incluía roupas, utensílios domésticos e de trabalho, e,
principalmente, alimentos. No primeiro ano, 1877, a distribuição de gêneros delimitou
de forma geral a ação da comissão, e nesta labuta, pudemos notar peculiaridades no
que diz respeito à denunciada corrupção trazida à tona por THEOPHILO e os demais
da historiografia. A lide da comissão de socorros do Aracati expressa na
documentação, nos leva a ponderar sobre a natureza da própria comissão. A forma
como ela exerce sua incumbência expõem questões que envolvem o uso do alimento
como instrumento de poder que, por diversas vezes, não reflete simplesmente o
poder central provincial, ou mesmo a uma corrupção pura e simples, denunciada
pelos autores e periódicos da época26. Expressa micro-histórias e micro-poderes, que
conectam a comissão a vários aspectos da seca, sendo este de implicância social,
política e econômica. Mostram que a comissão não apenas representava uma

25 Ofício da Comissão de Socorros Públicos do Aracaty, em 19 de setembro de 1877, In: APEC -


Fundo: Governo da Província. Série: Correspondências recebidas. (1877-1889). Caixa 02
26 Um dos grandes denunciadores da corrupção nas comissões de socorros em toda província foi o
Jornal O Retirante, o qual trabalhamos nesta pesquisa.
8

extensão do poder central provincial, mas em alguns momentos, chega a lhe ser
antagônica.
Nas fontes relativas aos anos de 1878 e 1880, vemos que a natureza da
comissão modificou-se e foi modificada, chegando, principalmente no ano de 1878, a
tomar proporção de órgão com poderes de controle e disciplinamento social, com
influência sobre a estrutura urbana, higiênica e de segurança na cidade do Aracati.
Construção de hospitais e cuidado médico dos doentes, construção de cadeia pública,
cemitério, ponte, abarracamentos, reemigração, organização de mão-de-obra
retirante, limpeza da cidade, vacinação, sem falar da habitual distribuição de gêneros,
foram responsabilidades acumuladas pela comissão de socorros do Aracati. Em
certos momentos, o comissário de socorros era criticado, como quem querendo ser
“absoluto, ter poderes de sultão (...)”27. A comissão auferia subsídios para um maior
poder de barganha nos conflitos intra-citadinos, mas também era posta em posição de
alvo de críticas e ataques, tanto por parte do governo provincial como da elite local e
retirantes.
Ao perceber a comissão de socorros do Aracati, nos questionamos sobre como
sua natureza nas relações de poder, como ela pode nos esclarecer sobre a questão
da seca. Por meio da ação da comissão, da sua formação e de seu relacionamento
com o contexto da seca no Aracati, de 1877 a 1880, nota-se uma possibilidade de
análise que contribua com do tema aqui proposto num âmbito não mais restrito à
análise da capital ou de uma panorâmica generalizante da calamidade que ela
proporcionou em toda província.

2.1. Problematização e Justificativa

Ao analisarmos as correspondências e ofícios produzidos pela comissão de


socorros do Aracati e os documentos remetidos a ela, de uma forma geral,
perfazendo os três anos de seca, percebemos três momentos de certa forma distintos
na condução de suas práticas.
No primeiro ano, 1877, a comissão tem uma função predominante, que é a de
recebimento e distribuição de gêneros, sejam víveres, roupas ou objetos para o
auxílio da distribuição e no emprego da mão-de-obra retirante (ferramentas e outros).

27 O Retirante. 23.02.1878. p.4


9

A comissão era responsável por receber os gêneros remetidos pelo governo


provincial, enviados nas embarcações que interligavam os portos de Fortaleza e
Aracati. Entretanto, o número de retirantes aumentava assustadoramente a cada dia
na cidade aracatiense. Os imigrantes alojavam-se nas ruas, construindo palhoças no
interior do perímetro urbano da cidade. Segundo estimativa da comissão, o número
de retirantes, ao final de 1877, chegava a 40.00028.
A distribuição de socorros era realizada em armazéns selecionados pela
comissão, os quais eram cedidos por comerciantes da cidade. Os gêneros enviados
geralmente não satisfaziam a demanda dos retirantes. A medida tomada pela
comissão, seguindo consentimento do próprio presidente provincial, era de comprar a
quantidade de gêneros necessários, de forma a suprir a demanda insuficiente. Tal
medida, antes tomada de forma emergencial, torna-se uma constante, ao ponto de
próximo ao final do ano de 1877, a compra de gêneros aos comerciantes da cidade
superar o número de remessas do governo provincial. A conta dessas compras era
paga pela Mesa de Rendas, órgão local vinculado à Tesouraria da Fazenda
Provincial.
Face à falta de fiscalização das contas referentes às compras feitas, o balanço
de tais movimentos não chegavam a contento em mãos da presidência da província.
Em outubro de 1877 dá-se a primeira demissão de um comissário por motivo de não
prestação de contas29. As denúncias de corrupção começam a se tornar comuns.
Uma delas pode-se ver em O Retirante, periódico de Fortaleza:

Uma parte considerável dos gêneros alimentícios que para aqui têm sido
remettidos, destinados ao sustento dos emigrados indigentes, distribue os
empregados com suas famílias, parentes e amigos; outra parte é vendida,
sendo o seu producto de panno fino, chapéus de sol de sêda, finos
esquesitos perfumes, vestidos com que presenteam as incautas que atiram a
mais vil e abjecta prostituição com os gêneros do próprio governo ao – trinta e
um – de 2$000 a boca etc, etc!! (...)30.

Em janeiro de 1878, o então presidente da Província, João José Ferreira


d’Aguiar, tomou uma drástica medida: demitiu todos os membros da comissão. Na
função de Presidente da comissão, foi nomeado Quintino Augusto Pamplona, que

28 Ofício da Comissão de Socorros Públicos do Aracaty, em 12 de dezembro de 1877, In: APEC -


Fundo: Governo da Província. Série: Correspondências recebidas. (1877-1889). Caixa 02
29 Carta do Juiz de Direito do Aracaty, Sr. Antonio Joaquim J. da Silva ao Exmo. Sr. Presidente da
Província, Desembargador Caetano Estellita Pessoa, em 21 de outubro de 1877, In: APEC - Fundo:
Governo da Província. Série: Correspondências recebidas. (1877-1889). Caixa 02
30 O Retirante. 12/12/1877, p. 04.
10

vindo da capital, assumia a missão de moralizar a comissão de socorros do Aracati.31


O que se observa a partir de então é um processo racionalizador das práticas da
comissão. Segundo direcionamento do governo provincial, a comissão assume
também responsabilidades com relação às obras públicas, reemigração, limpeza
urbana e, com o apoio de uma comissão médica dirigida pelo Dr. Meton de França
Alencar, a situação higiênica da cidade. O que se percebe, em relação à compra de
alimentos, é que há um drástico declínio no número de requisições feitas aos
comerciantes locais.
O comissário Pamplona dirige a comissão até o mês de março. Sua gestão não
foi menos conflituosa do que a de seus antecessores, onde recebeu ataques por sua
política de economização na distribuição de gêneros, sendo responsabilizado pela
morte de imigrantes famintos no início do ano 187832. Seu substituto, Luiz Carlos da
Silva Peixoto, lança clamores ao presidente da Província por culpa da pressão de ser
o Encarregado da Comissão: “(...) e necessitando até do apoio das authoridades do
logar, que devião coadjurar-me nos intuitos de minha missão, vejo-me no entretanto
só, e como que abandonado”33. Dentre os desafetos da comissão no ano de 1878,
encontramos o médico da cidade, Dr. Francisco de Paula Cavalcante de Albuquerque,
descontente com as medidas de economia na distribuição de dietas alimentícias aos
doentes da cidade34.
Em 1879, com a chegada da comissão médico-higiênica, formada por médicos
da capital e chefiada por um médico do Império35, as responsabilidades dantes
pertencentes à comissão de socorros são entregues a esta outra comissão. A
comissão de socorros retorna à sua função de recebedora e distribuidora de gêneros,
agora sob a tutela da comissão médico higiênica. A partir de então, como no caso da
“carne podre”36, vemos emergir conflitos entre a comissão médico-higiênica e a

31 Ofício da Comissão de Socorros Públicos do Aracaty, em 21 de Janeiro de 1878, In: APEC - Fundo:
Governo da Província. Série: Correspondências recebidas. (1877-1889). Caixa 02
32 O Retirante. 23.02.1878. p.4.
33 Ofício do Comissário de Socorros Públicos do Aracaty, em 12 de Abril de 1878, In: APEC - Fundo:
Governo da Província. Série: Correspondências recebidas. (1877-1889). Caixa 02
34 Ofício do Comissário de Socorros Públicos do Aracaty, em 2 de Outubro de 1878, In: APEC - Fundo:
Governo da Província. Série: Correspondências recebidas. (1877-1889). Caixa 02
35 Relatório apresentado à Assembléia Geral Legislativa na segunda Sessão da Décima Sétima
Legislatura pelo Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Império, Conselheiro Carlos Leoncio
de Carvalho. Rio de Janeiro: Typografia Nacional, 1879. p. 40
36 Carta do Dr. Hippolyto Cassiano Pamplona ao Dr. José Maria Teixeira, em 26 de julho de 1879. In:
APEC. Fundo: Governo da Província. Série: Correspondências recebidas. (1877-1889). Caixa 02
11

comissão de socorros, na discordância dos procedimentos de distribuição de gêneros


alimentícios. O ordem de poder é mudada, e o discurso médico prevalece em 1879.
Expondo alguns aspectos das práticas da comissão de socorros, passamos a
nos questionar sobre a natureza do poder que a permeava e sobre as práticas dos
seus membros que refletiam o modo de ser e estar naquela situação calamitosa, em
conflito direto com uma ordem transformadora e em transformação que se impunha.
Mais do que algo que lhe fora concedido, o poder é expresso no ambiente da
comissão de forma dissolvida nos relacionamentos desta com os elementos
constantes da seca no Aracati, sejam autoridades políticas, policiais, comerciantes,
moradores e retirantes. Nota-se, nos momentos que se decorreram no período de
seca, uma construção de relações, e o poder ali se estrutura por meio de práticas e
representações. Como os membros da comissão levariam a termo a proposta da
comissão é algo que parece óbvio nas fontes consultadas. Contudo, percebe-se algo
mais, trajetos e práticas não oficiais, contra as quais a oficialidade luta. Percebe-se
também práticas não-oficiais lutando contra as oficiais. Ainda, um conjunto de
perspectivas simbólicas, em meio a conflitos e acordos, negociando com outro
conjunto de perspectivas simbólicas. Do quadro surgido desta primeira consideração
dos vestígios levantados, constrói-se a pergunta: Qual a natureza, ou naturezas, este
poder concedido (ou conquistado) pela comissão apresentava?
A partir desta pergunta, ainda podemos questionar: Por quais representações
este poder se expressava? Quais relações de poder se construíram em torno
comissão, seja a lhe favorecer ou a lhe opor? Que papéis representariam nestas
relações a elite local aracatiense inserida no quadro funcional da comissão e os
indivíduos “importados” do governo provincial e imperial?
Perceber o que era Comissão de Socorros do Aracati, ou como ela se
apresentou nos anos de seca (1877 a 1879), é remeter diretamente à sua natureza
política, econômica e social. Nestes três planos, nota-se que a comissão toca o
mundo externo a ela, ou seja, a realidade da seca na cidade aracatiense.
12

3. OBJETIVOS

3.1. Objetivo Geral:

• Compreender a “indústria da seca”, em seus aspectos primordiais por meio da


análise das relações de poder na Comissão de Socorros Públicos do Aracati
nos anos da grande seca do século XIX (1877-1880).

3.2. Objetivos Específicos:

• Analisar a formação social da comissão de socorros do Aracati no ano de 1877


e as práticas de obtenção e distribuição de gêneros, incluindo as compras de
alimentos a comerciantes locais e as relação dos membros da comissão com
tal parcela da elite aracatiense, percebendo também as forças opostas à
comissão no desenrolar destas práticas.

• Compreender a práxis cultural e social na mudança de rumo das práticas da


comissão no ano de 1878, o que inclui o aumento de suas responsabilidades
com relação à cidade do Aracati, e o ganho de influência em relação à Câmara
Municipal e demais órgãos do Aracati; Analisar as relações de poder no
empreendimento de obras públicas e limpeza urbana e as representações
construídas pela comissão em relação às autoridades da cidade e aos
retirantes emigrados.

• Entender a as forças implicantes na mudança nos anos de 1880, onde a


comissão é rebaixada a segundo plano na política de controle social e urbano
na cidade do Aracati, restando-lhe a inicial função de distribuição de gêneros,
agora sob a tutela da comissão médico-sanitária.

4. QUADRO TEÓRICO

A formação das Comissões de Socorros tinha caráter oficial, pois eram


constituídas a partir da nomeação da presidência provincial. A Comissão de Socorros
do Aracati, assim como as demais, tinha a responsabilidade inicial de prover as
necessidades dos retirantes, do ponto de vista alimentar, de moradia, de vestimenta e
13

também com relação à ocupação por meio do trabalho, sendo atribuída à comissão a
responsabilidade de empregar a mão-de-obra emigrante em obras públicas.
Oficialmente, estas eram as funções da comissão. Contudo, pelo exposto em
nossa problematização, notamos que mais do que na oficialidade, a comissão
conduziu-se por meio de práticas não oficiais, que não expressavam simplesmente o
mando governamental provincial, mas também interesses outros de elementos locais,
interesses tidos como menores, que também careciam de mecanismo para serem
satisfeitos. Para tanto, a posição oficial da comissão era um caminho, uma ferramenta
para outros interesses. Entende-se que há mais de uma natureza de poder envolvida
neste processo. Portanto, precisamos de uma compreensão do poder imerso nas
relações sociais, aquelas não-oficiais da política oficial, mas da política do cotidiano.
O poder é algo também do âmbito menor, apresenta-se dissolvido e ramificado. Seja
no âmbito oficial, nas práticas não repressivas da comissão e do governo provincial,
seja no âmbito não-oficial, nas artimanhas e conflitos que se engendraram entre os
membros da comissão, e destes com o governo provincial e com as forças políticas e
econômicas aracatienses, entendo que em FOUCAULT37 temos um conceito aplicável
de poder positivo, que tem múltiplas funções. Também ainda de que o poder se
manifesta em micro-poderes que se constroem e se entrelaçam na vida social,
adestrando ações e visões do real.
A fala dos membros da comissão, aqueles que eram naturais do Aracati,
expressa a visão de realidade da parcela social aracatiense mais privilegiada política
e economicamente. Nos registros produzidos por ela, vemos sua intenção de expor
sua visão do real, da condição da cidade e dos retirantes. Entretanto, há algo além
disso: a visão de si mesmos e de seus interesses em relação ao contexto da seca.
Existem aí elementos que nos levam a questionar sobre a visão de mundo que
possuíam, diretamente vinculada à sua cultura e condição social. No caminho
proposto pela documentação, os discursos mudam, a partir do momento em que
também mudam os atores que produzem os discursos, os quais manifestam visões do
universo da seca no Aracati de formas distintas, explicitando assim, seus lugares
sociais ou políticos. Segundo o antropólogo Marshall Sahlins, uma estrutura social
não se forma apenas segundo um ditame prescrito, ou “prescritivo”, mas também

37FOUCAULT, Michel. A microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979; e


FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. 17ª ed. Petrópolis: Ed. Vozes, 1998.
14

como síntese e resultado das negociações dos indivíduos envolvidos, que agem
(práxis) segundo suas formas de ser e estar no mundo (cultura), ou seja, edificam
suas estruturas sociais de forma performativa38. A este conceito antropológico
chamado pelo autor de "mito-práxis” também buscamos o diálogo para o melhor
entendimento do objeto analisado.
Por fim, verifica-se que as práticas procuram legitimarem-se por meio das
representações produzidas pelos atores sociais e as mudanças na Comissão de
Socorros, igualmente, no decurso dos anos de seca, são também passíveis de
análise a partir destas representações. Em função disso, buscamos em CHARTIER o
conceito de práticas e representações com vistas a entender o quadro aqui exposto:

As estruturas do mundo social não são um dado objectivo, tal como o


não são as categorias intelectuais e psicológicas: todas elas são
historicamente produzidas pelas práticas articuladas (políticas, sociais,
discursivas) que constroem as suas figuras. (...) Daí a caracterização das
práticas discursivas como produtoras de ordenamento, de afirmação de
distâncias, de divisões; daí o reconhecimento das práticas de apropriação
cultural como formas diferenciadas de interpretação39.

Entendemos que tais matrizes teóricas são profícuas na análise do objeto


proposto, assim como da compreensão do problema levantado.

38 SAHLINS, Marshall. Cultura e razão prática. Trad. Sergio Tadeu de Niemayer Lamarao 1ª Ed. Rio
de Janeiro. Jorge Zahar, 2003; SAHLINS, Marshall. Ilhas de história. Trad. Bárbara Sette. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003. p. 9.
39 CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas em representações. Trad. Maria Manuela

Galhardo. Lisboa: Difel, 1990, p. 27-28.


15

5. FONTES E METODOLOGIA

A questão central levantada no presente trabalho pretende a compreensão da


natureza ou de supostas naturezas de poder que formaram o caráter da Comissão de
Socorros Públicos do Aracati. Tal questão, aparentemente, encontra-se atrelada à
busca da compreensão de um elemento específico, a comissão de socorros do
Aracati, e mais pretensamente possível, entender o panorama da seca na cidade do
Aracati. Lembramos aqui o ponto de partida de nossa delimitação temática e do
objeto proposto: a compreensão por parte da historiografia da seca enquanto
“estratégia política diferenciada” 40 e das comissões de socorros como “amplo sistema
de controle dos donativos”41. Há um quadro posto diante de nós pela historiografia
que, como já se referir, foca-se na análise da seca a partir da capital, Fortaleza, e a
toma como um quadro geral, munindo-se de apreciações ligeiras sobre a realidade de
outras localidades cearenses. Por outro lado, o presente trabalho não objetiva
substituir a análise sobre o caso fortalezense, nem mesmo generalizar ou “concluir”
sobre a seca em toda província, partindo do caso aracatiense. O que pretendemos é
compreender a Comissão de Socorros, mas sob num olhar “morelliano” sobre um
quadro, “examinando os pormenores mais negligenciáveis” 42.
A redução da escala ao objeto “Comissão de Socorros do Aracati” tem sua
razão: a contribuição para o entendimento dos efeitos dos discursos e práticas nas
relações sociais inseridos no contexto da grande seca do século XIX. Contribuir para
a compreensão da seca de 1877-1880 e contribuir para o entendimento do que se
propôs na historiografia como “sistema” na seca. Analisar a comissão seria uma
espécie de análise da “orelha própria de Botticelli” 43
no método morelliano, cujo
quadro é o universo da seca.

(...) a escolha de uma escala particular produz efeitos de conhecimento, e


pode ser posta a serviço de estratégias de conhecimentos. Varia a objetiva

40 ALBUQUERQUE JR. Durval M. Op. cit. p. 112.


41 NEVES, Frederico de Castro. Op. cit. p. 83-84
42 GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas e sinais: morfologia e história. São Paulo, Cia. das Letras,

1990. p. 144.
43 Idem
16

não significa apenas aumentar (ou diminuir) o tamanho do objeto no visor,


significa modificar sua forma e sua trama.44.

Já foi citado aqui que as fontes levantadas possuem um número predominante


de registros produzidos pela Comissão de Socorros do Aracati. É sobre a própria fala
dos membros da comissão que será trabalhada a análise proposta aqui. Desta
documentação, encontrada nos arquivos do APEC (Arquivo Público Estadual do
Ceará), é que se tomará a espinha dorsal da pesquisa.
Nestes registros, procuramos primeiramente fazer um levantamento geral,
organizando o acervo de forma cronológica. Feita a sequência cronológica da
documentação produzida pela comissão, proceder-se-á à organização por tópicos e
sub-tópicos, localizando e agrupando os documentos que possuem similaridades em
relação a tópicos que consideramos de importância para a compreensão da
problemática central, e os sub-tópicos às hipóteses levantadas em função da
compreensão da problemática central. Aqueles que falam diretamente das práticas da
comissão, que exprimem as relações de poder a ela inerentes, serão colocados como
centrais em grupo de tópicos. Depois, proceder-se-á igualmente com a documentação
que trata de sub-tópicos ligados aos tópicos da problemática central, a fim de darmos
coerência aos problemas decorrentes da problemática central.
Afora esta documentação produzida pela comissão, entendemos que existem
outras fontes que contribuem para a análise da problemática central. São ofícios e
correspondências da Câmara Municipal do Aracati, encontrados no APEC, assim
como registros relacionados ao Aracati nos periódicos de Fortaleza, encontrados do
Setor de Microfilmagem da Biblioteca Pública Menezes Pimentel. A opção pela
pesquisa em periódicos de Fortaleza se deu pela falta de periódicos remanescentes
da cidade do Aracati. Com tal documentação, procederemos similarmente ao exposto
no parágrafo anterior, em tópicos e sub-tópicos.
Na elaboração de hipóteses, que pretendem dar respaldo à análise e
explicação da problemática central, entendemos que outras fontes são necessárias.
Entre elas estão os artigos e códigos de posturas do Aracati, das décadas de 1860 e
1870, encontrados no APEC e na Biblioteca Pública Menezes Pimentel. Assim como
nos relatórios e falas dos Presidentes de Província, encontrados na digitalizados na

44REVEL, Jacques Revel. Microanálise e construção do social. In: REVEL, Jacques.Jogos de


Escalas: a experiência da microanálise. Trad. Dora Rocha. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio
Vargas, 1998, p. 20.
17

Rede Mundial de Computadores (INTERNET). Outra documentação que


exploraremos, no sentido proposto neste parágrafo, são os registros de óbitos da
paróquia do Aracati, encontrados no Palácio Diocesano da cidade de Limoeiro do
Norte.

5.1. Listagem das Fontes

Ofícios:

APEC - Fundo: Câmaras Municipais. Série: Correspondências expedidas. Local:


Aracati (1853-1912). Caixa 14
APEC - Fundo: Câmaras Municipais. Série: Correspondências expedidas. Local:
Aracati (1838-1894). Caixa 93
APEC - Fundo: Comissões de Socorros. Série: Correspondências expedidas. Caixa
16
APEC - Fundo: Governo da Província. Série: Correspondências recebidas. (1877-
1889). Caixa 02
APEC - Fundo: Saúde Pública. Série: Correspondências expedidas. Local: várias
localidades. (1846-1888). Caixa 10

Relatórios:

Falla com o que Ex.mo Sr. Desembargador Caetano Estellita Cavalcanti Pessoa,
Presidente da Província do Ceará, abriu a 2ª Sessão da 23ª Legislatura da
Assembléia Provincial em 02.07.1877. Fortaleza: Typ. Dom Pedro II, 1877.

Relatório com que o Ex.mo Sr. Desembargador Caetano Estellita Cavalcanti Pessoa,
passou a administração da Província do Ceará ao Ex. mo Sr. Conselheiro João José
Ferreira D’Aguiar Presidente da mesma Província em o dia 23.11.1877. Fortaleza:
Typ. Dom Pedro II, 1877.

Relatório com que o Ex.mo Sr. Conselheiro João José Ferreira D’Aguiar passou a
administração da Província do Ceará ao Ex.mo Sr. Dr. Paulino Nogueira Borges da
18

Fonseca, 3º vice-presidente da mesma província em o dia 22.02.1877. Fortaleza:


Typografia Brasileira, 1878.

Falla com o que Ex.mo Sr. Dr; José Júlio de Albuquerque Barros, Presidente da
Província do Ceará, abriu a 1ª Legislatura da Assembléia Provincial no dia
01.11.1878. Fortaleza: Typographia, 1879.

Relatório apresentado à Assembléia Geral Legislativa na segunda Sessão da Décima


Sétima Legislatura pelo Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Império,
Conselheiro Carlos Leoncio de Carvalho. Rio de Janeiro: Typografia Nacional, 1879.

Falla com o que Ex.mo Sr. Dr; Júlio de Albuquerque Barros, Presidente da Província do
Ceará, abriu a 1ª Sessão da 25ª Legislatura da Assembléia Provincial no dia
01.07.1880.. Fortaleza: Typographia Brasileira, 1880.

2.3. Legislação

LEIS PROVINCIAIS. (1862-1875). Compilação das leis provinciais do Ceará.


Artigos de posturas da Câmara Municipal do Aracaty. Resolução nº 1.229 de 12
de novembro de 1867. Publicados pelo presidente Pedro Leão Velloso.

LEIS PROVINCIAIS. (1862-1875). Compilação das leis provinciais do Ceará.


Artigos de posturas da Câmara Municipal do Aracaty. Lei nº 1.488 de 16 de
dezembro de 1872. Publicados pelo presidente Francisco de Assis Oliveira Maciel.

LEIS PROVINCIAIS. (1862-1875). Compilação das leis provinciais do Ceará.


Artigos de posturas da Câmara Municipal do Aracaty. Lei nº 1.560 de 09 de
setembro de 1873. Publicados pelo presidente Francisco de Assis Oliveira Maciel.

LEIS PROVINCIAIS. (1862-1875). Compilação das leis provinciais do Ceará.


Artigos de posturas da Câmara Municipal do Aracaty. Resolução nº 1.706 de 12
de julho de 1876. Publicados pelo presidente Francisco de Faria Lemos.
19

Obituário

Livro de Óbitos nº 10, da Paróquia de Aracaty, criada em 20/06/1780. Assentos:


01/04/1877 a 07/04/1878.

6. SUMÁRIO JUSTIFICADO

7. CRONOGRAMA
ATIVIDADES
Elaboração e
qualificação
do projeto
Consulta à
documentaçã
o oficial

Pesquisa aos
periódicos

Pesquisa em
obras da
época

Leitura e
Fichamento
bibliográfico

Elaboração
da
monografia

Revisão

Defesa
20

8. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
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