Você está na página 1de 21

TÉCNICA VOCAL

AULA 5

Prof.ª Luciana Mendes da Silva


CONVERSA INICIAL

Até aqui, temos aprendido como a nossa voz é produzida na laringe, mais
especificamente nas pregas vocais, e a partir daí os ressonadores entram em
ação reverberando os sons criados e dando-lhes timbre, intensidade e outras
qualidades. Por último, vamos nos aprofundar nos órgãos responsáveis pela
articulação dos sons produzidos, o que forma palavras, sílabas e efeitos sonos
específicos (como imitações de animais ou outras expressões não verbais).

TEMA 1 – ARTICULADORES E A DICÇÃO

A compreensão dos articuladores e seu papel na dicção (maneira de


articular ou pronunciar palavras; pronúncia, prolação) da voz cantada é
extremamente importante para que o cantor obtenha clareza na mensagem
comunicada e aprenda a navegar por sons e posições mais complicados em sua
tessitura vocal. Também é importante que se aprenda a utilizar tais articuladores
de maneira natural e relaxada, o que infelizmente não ocorre na maioria dos
casos.

Figura 1 – Articuladores

Crédito: Smile Ilustras.

Cada um dos articuladores da figura acima está ativamente ligado à


qualidade dos tons e à clareza das palavras faladas ou cantadas.
A melhor maneira para compreender as articulações de vogais e
consoantes é na experiência própria. Fale ou cante as vogais.

2
Observe o posicionamento de seus articuladores e formantes, como se
movem, as diferenças entre cada vogal. Acostume-se com essas sensações.

TEMA 2 – VOGAIS ANTERIORES E POSTERIORES

2.1 Vogais anteriores: I – IH – Ê – É – Á

Essas vogais são formadas pelo posicionamento da língua no espaço


criado pelos ressonadores na cavidade oral.

• i = seu foco natural é frontal, com a parte de trás da língua (em arco) bem
mais perto do palato; por isso é chamada de vogal fechada.
• ê, é = à medida que a língua se move para baixo, mais longe do palato, o
espaço ressonador se torna maior, e as vogais se tornam mais abertas.
Há dois tipos de vogais E: Ê = fechado; É = aberto.
• á = finalmente, com a língua o mais longe do palato possível, o espaço
ressonador se torna completamente aberto, o foco se move para trás. Á
é a vogal mais aberta.

Crédito: Smile Ilustras.

2.2 Vogais posteriores: U – UH – Ô – Ó – AH – Á

Essas vogais são formadas pelo posicionamento dos lábios e da


mandíbula, mudando seu formato e utilizando o espaço dos ressonadores. A
língua deve estar neutra e em repouso, com a ponta encostada nos dentes
frontais de baixo.

3
• u = a vogal posterior mais fechada: lábios fechados e puxados para a
frente em forma de bico; mandíbula também mais fechada
• ô = à medida que os lábios se abrem e a mandíbula se move para baixo,
a próxima vogal formada é o Ô fechado.
• ó = lábios mais relaxados em relação às posições anteriores; mandíbula
também relaxada, abrindo e criando mais espaço: Ó aberto.
• ah = vogal entre ó e á – não tão usada no português falado, mas sim
usada no canto, em notas agudas que necessitam de mais espaço, mas
mantendo um formato mais vertical. Não deixe que os cantos da boca se
espalhem muito para os lados.
• á = finalmente, a mesma vogal aberta mencionada no quadro acima.

Crédito: Smile Ilustras

TEMA 3 – MODIFICAÇÃO DE VOGAIS: FOCO FRONTAL/FOCO FARÍNGEO

Neste tema, vamos explicar como formar certas vogais no canto seguindo
os princípios do canto não clássico, entendendo que, neste caso, o objetivo do

4
canto é manter os padrões da fala, o mais próximo possível, com clareza de
articulação, especialmente no que se diz respeito às vogais.
Esta abordagem apresenta certos obstáculos para o cantor
contemporâneo, devido a estes fatores: Certas vogais se tornam difíceis de lidar
em certos pontos da extensão e tessitura vocal; Transições (passaggios)
também se tornam difíceis em certas vogais, por serem muito abertas e difíceis
de controlar a projeção e ressonância.
Por esses motivos, é necessário utilizar migração ou a modificação de
vogais. Quatro observações para se conscientizar neste aprendizado:

1. Mudança na pressão do ar entre cada formato de vogal:


• i–ê–é–a
• u–ô–ó–a
2. Sempre busque o foco frontal para ambas as vogais:
• i = naturalmente frontal – foco como laser;
• a = naturalmente mais aberta, foco naturalmente na parte de trás da boca.

IMPORTANTE:

• Mantenha a ponta da língua encostada atrás dos dentes da frente/de


baixo em ambas as vogais (a tendência da língua é ir para trás na vogal
a);
• Não deixe que se mova para trás em direção à faringe, pois isso faz com
que a língua se assente pesadamente no topo da laringe, “esmagando”
seu desempenho e o som produzido;
• A língua vai se curvar e levantar na vogal i; e vai descer e estreitar-se na
vogal a.

3. Permita que sua voz faça a transição entre os registros enquanto mantém
o foco (colocação do som) consistente:

• Posicionamento da língua – frontal (ponta atrás dos dentes frontais


inferiores);
• Foco (colocação) – frontal (som atrás dos dentes frontais superiores).

4. Tenha certeza de que a transição muscular ocorre no mesmo lugar


(mesma nota), subindo ou descendo. Quanto mais conhecimento você
tiver de suas zonas de transição, mais poderá controlá-las e mantê-las
consistentes.

5
3.1 Modificação de Vogais Abertas

Além do foco frontal e do posicionamento da língua, vogais abertas nas


zonas de transição e acima delas também requerem a modificação para o foco
faríngeo, em que direcionamos o foco da ressonância em direção à nasofaringe,
enquanto mantemos a língua em sua posição frontal (atrás dos dentes).
O resultado dessas modificações resulta nos sons internos (sensações
simpatéticas) abaixo:
AH → ÃH // Ó → Õ // É → Ê (nasal)
Os exercícios CAVEMAN e ESCALA DE 5 NOTAS ao final desta aula lhe
darão a oportunidade de praticar este método. Quando realizados corretamente,
as vogais ainda serão ouvidas externamente como elas são: puras e abertas;
mesmo que o cantor esteja modificando-as internamente.

3.2 Exemplos em letras de canções

Cante os trechos das canções abaixo, utilizando as modificações de


vogais abertas e semiabertas: Ã, Õ e Ê nasal.
Lembre-se de manter a língua e o foco frontal e faríngeo.
ALL BY MYSELF (versão Celine Dion)
All by my-self / Don’t wanna be / All by my-self…
[õll bãe mãe-self] [õll bãe mãe-self]

TEMPO PERDIDO (Legião Urbana)


Somos tão jó----vens / Tão jó----vens / Tão jó---ve-e-ens
[jõ----]l [jõ----]l [jõ----vê-e-eins]

NEVER ENOUGH (The Greatest Showman)


Never e – nough / Never, never // Never e – nough / Never, never
[nê – vãrrê – nõõõf] [nê-vuhrr nê-vuhrrr] [nê – vãrrê – nõõõf] [nê-vuhrr nê-
vuhrrr]

TEMA 4 – CONSOANTES: ALVEOLARES, PALATAIS, DENTAIS E LABIAIS

Consoantes produzem sons muito breves em relação às vogais – que


carregam o som. Pense nisto: quando cantamos, os tons (notas) são levados por

6
meio das vogais primariamente, da maneira que as consoantes funcionam como
ferramentas de articulação, que interrompem rapidamente o processo de
ressonância e entonação da voz. Sem as consoantes, cantaríamos uma linha
completamente ligada, parando apenas para respirar.
Apesar de a interrupção causada pelas consonantes ser tão breve, sua
articulação torna-se de suma importância, e se realizada incorretamente e sem
uma técnica adequada, influencia negativamente todo o desempenho do trato
vocal. Fatores como a pressão do ar, o posicionamento dos articuladores e a
facilidade em seu mecanismo devem ser o foco de nosso estudo.
Observe a figura a seguir, em que se demonstra a posição de órgãos
articuladores – particularmente a língua, os lábios e o palato – e como formam
os tipos diferenciados de consoantes. Suas categorias têm tudo a ver com o
órgão articulador e formante envolvido em sua produção.
A segunda fileira demonstra as áreas de ressonância ativadas de acordo
com cada posição dos articuladores.

Crédito: Smile Ilustras.

Ao ler e estudar as próximas seções sobre as consoantes, fale-as em voz


alta, prestando atenção em sua pronúncia: onde a pressão do ar é liberada
criando o seu som; qual área de ressonância você percebe cada consoante etc.
As vogais ê colocadas em cada consoante somente são um mecanismo
para pronúncia de cada uma como uma sílaba completa. Tente pronunciar cada
consoante com o ê adicionado, mas também as pronuncie sem a vogal, para
focar puramente na consoante e no seu som e pressão do ar.

7
4.1 Consoantes e sua formação na caixa de ressonância: cinco categorias

8
4.2 Consoantes e seus modos de articulação: duas categorias

9
4.3 Modos constritos/contínuos: quatro subclassificações

4.4 Consoantes surdas e sonoras

10
Lembre-se:

• Aprenda a aplicar apenas a pressão do ar necessária para produzir as


consoantes;
• Relaxe língua, mandíbula, lábios, pescoço e laringe. Este relaxamento
não ocorre naturalmente, devemos aprender e praticar constantemente;
• Conecte o seu tom entre as vogais o máximo possível. Use boa técnica
respiratória em todos os exercícios e frases musicais.

TEMA 5 – EXERCÍCIOS DE ARTICULAÇÃO

5.1 Articulações de vogais – anteriores e posteriores

11
• Í – Ê – É – Á: Essas vogais são formadas pela posição do arco da língua
em relação ao palato, diminuindo e aumentando o espaço de ressonância.
Você não precisa mover sua mandíbula ao formá-las.
• Ó – Ô – Ú: Continue com a mandíbula no lugar; apenas mova os lábios
para uma posição mais fechada para formar as vogais posteriores.

Colocar os dedos entre os dentes (como demonstrado nas figuras a


seguir) ajuda a desativar o movimento da mandíbula, e faz com que a língua
trabalhe nas vogais anteriores e posteriores.

Figura 21 – Colocar o(s) dedo(s) entre os dentes (sem morder) mantém a


mandíbula imóvel para que somente a língua forme as vogais

Crédito: Luciana Mendes da Silva.

5.2 Articulações de consoantes

Pratique este próximo exercício com a mandíbula e a língua relaxados,


especialmente passando pelas transições (passaggios) e subindo até as notas
mais agudas da tessitura.

12
5.3 Foco nasal e faríngeo

Este próximo exercício deve ser executado com o foco exageradamente


nasal e estridente.
Imagine uma bruxinha chata como aquelas de desenhos animados, com
a voz irritante e nasal, provocando os outros personagens com sua voz aguda e
anasalada: nha, nha, nhaaaaa!!!!
Este é o segredo deste exercício. O tom deve ser realmente feio e irritante,
com o foco nasal a ponto de você enrugar o nariz e torcer as maçãs do rosto e
os músculos da testa para apoiar toda a colocação do som.
Utilize o foco faríngeo e nasal para navegar as notas de passagem e as
notas do topo de sua extensão. Quando feito corretamente, você poderá
estender esse som até as notas mais agudas de sua extensão vocal, pois este
foco proporciona mais facilidade ao cantar notas mais difíceis, e contribui para
fortalecer a musculatura usada em belting, ou modalidades 2 e 3.

13
5.4 MÍ – Ú – Í – Ú – Í: Completo – 3 Partes

Neste exercício de vogais fechadas, o movimento deve estar


primariamente na sua língua em vez de nos lábios ou mandíbula. Comece e
termine cada som com o vocal fry, e faça aquele som de “criança birrenta”, que
auxilia a voz mover pelos breaks (passaggios).

5.4.1 Descendo – Belting (MOD. 3)

5.4.2 Subindo – Belting (MOD. 3 e 2)

Agora, vamos subir na tessitura e puxar a musculatura do registro mais


denso – modalidade 3 – para alcançar notas mais agudas. Continue usando o
som bem irritante, como uma criança fazendo um escândalo, e o vocal fry pra
começar e terminar.

14
5.4.3 Subindo – Voz de Cabeça (MOD. 1)

Vozes femininas: mudando de modalidade 3 para modalidade 1.


Para começar e terminar cada intervalo, utilize o portamento: pequeno
deslize abaixo da nota, até a nota – em vez do vocal fry.
Mantenha a voz pura, delicada, não muito alta – para somente utilizar o
ligamento vocal – não os outros músculos.

15
5.5 Caveman

Neste exercício, você terá a oportunidade de explorar o poder da sua


ressonância vocal em vogal aberta (AH). Ao chegar a este ponto, depois de ter
realizado os exercícios anteriores com sucesso, você aprenderá a projetar a sua
voz com o poder do belting, em que se consegue cantar com volume e energia,
mas sem o esforço na garganta.
É importante que você continue usando o vocal fry para iniciar e terminar
cada intervalo. Ao passar pelo seu break, modifique a vogal de ÁH para ÃH.

5.5.1 Caveman Belting (MOD. 3)

16
5.5.2 Caveman Voz de Cabeça/Whistle (MOD. 1) – vozes femininas

Repetindo o exercício, mas desta vez empregando a musculatura da


modalidade 1 – voz de cabeça, falsete – em vez de utilizar o vocal fry, utilizamos
o portamento –, um suave deslize de baixo para cima até alcançar a primeira
nota, e ao fim da frase um suave deslize para deixar a última nota.
A modificação de voga também muda: em vez de Ah – Ãh, use Ah – Ôh.
Veja a figura abaixo:

17
5.6 Escala 5 Notas – Belting

O último exercício da série Schexnayder (de canto popular e belting,


desenvolvida por Brian Schexnayder) consiste em uma escala simples de 5
notas, utilizando a vogal mais aberta – AH. Neste ponto, depois de realizar os
exercícios anteriores, você deverá observar que a sua musculatura está
propriamente aquecida e funcionando de maneira mais uniforme, mais
conectada em cada nota.
Ao cantar usando a vogal A, mova a sua voz para cima e para baixo nas
cinco notas da escala. Modifique a sua vogal para o som Ã, ao cruzar pelo seu
break. Continue usando o vocal fry.

18
NA PRÁTICA

Cantar bem – cantar uma peça musical contendo palavras, frases,


significado literário – significa obter uma técnica na qual vogais e consoantes
trabalham harmoniosamente com a voz e sua projeção em ressonância, sem
pontos fracos em toda a sua tessitura e dinâmica. Este domínio leva muitos anos
para se aprimorar. Cada peça musical deve ser dissecada, cada frase, palavra,
sílaba – para se identificar a melhor colocação de cada parte da voz – respiração,
foco de ressonância, articulação, volume, intensidade, registro etc., pois cada
frase requer uma abordagem diferente. Cada nota, cada tonalidade, cada estilo
musical.
Recapitulando, estes são os objetivos a respeito de articulação de vogais
e consoantes:

19
FINALIZANDO

Continue exercitando a sua voz diariamente. Alguns destes exercícios são


mais aleatórios – como as articulações consonantais, por exemplo. Mas outros,
como Exercícios respiratórios, vibração de língua (sirenes e escalas), técnica de
canudo, Humming (bocca chiusa), Mí-ú-í-ú-í (com todas as variações, Elvis (com
todas as variações), Caveman (com todas as variações), e a Escala de 5 notas,
devem ser realizados diariamente, em sequência.
De agora em diante, você deve exercitar a sua voz no mínimo 10 minutos
diários; idealmente entre 10 e 20 minutos diários. Ao seguir estas
recomendações, você verá uma diferença na sua voz, que se tornará mais
brilhante, mais versátil, mais clara, limpa, pura. Quanto mais disciplina vocal se
aplica, mais liberdade vocal se desfruta.

20
REFERÊNCIAS

PHILLIPS, P. S. Canto Para Leigos. 2. ed. Rio de Janeiro: Alta Books, 2013.

ROBINSON, D. K. Dj. Arts, [s.d.]. Disponível em: <https://www.djarts.com.au/>.


Acesso em: 23 jun. 2020.

VILLELA, E. C. Fisiologia da Voz. 2. ed. São Paulo: Currículo da Universidade


Católica de Campinas, 1961.

21

Você também pode gostar