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doxa

R e vis t a Brasileira d e P s i c o l o gi a e E d uc a ç ã o

Departamento de Psicologia da Educação


F.C.L. – Araraquara
UNE S P
ISSN 1413-2060

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP


FACULDADE DE CIÊNCIAS E LETRAS – F.C.L. – Araraquara

Diretor: Prof. Dr. Arnaldo Cortina


Vice-diretor: Prof. Dr. Cláudio César de Paiva
doxa
R e vi s t a Brasileira d e Ps ic o lo gi a e E duc a ç ã o
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Prof. Dr. Valério José Arantes (UNICAMP)

Doxa Araraquara v.17 n.1 e 2 p.1-330 2013


NOTAS PRELIMINARES SOBRE HISTORIOGRAFIA
DA EDUCAÇÃO SEXUAL BRASILEIRA:
APONTAMENTOS DE UMA CRONOLOGIA
DESCRITIVA. 1) ATITUDES E COMPORTAMENTOS
SEXUAIS NO BRASIL NOS DOCUMENTOS DA
INQUISIÇÃO DOS SÉCULOS XVI E XVII1
PRELIMINARY NOTES ON BRAZILIAN HISTORIOGRAPHY OF
SEX EDUCATION: NOTES FROM A DESCRIPTIVE CHRONOLOGY.
1) ATTITUDES AND SEXUAL BEHAVIOUR IN BRAZIL IN THE
DOCUMENTS OF THE INQUISITION ON 16TH AND 17TH CENTURIES

Paulo Rennes Marçal Ribeiro2


Regina Celia Bedin3

RESUMO ABSTRACT
Os autores pretendem apresentar a historio- The authors intend to present the history of
grafia da educação brasileira como campo Brazilian education as an important field of
importante de pesquisa a partir da descrição research from the chronological description of
cronológica de sua constituição, destacando os its constitution, highlighting authors and their
autores e suas respectivas obras que atuaram no works in Sexuality and Sex Education field. In
campo da Sexualidade e da Educação Sexual. this first paper, the period of study is the 16th
Neste primeiro artigo o período estudado é o and 17th centuries and the doccuments of the
Brasil Colônia dos séculos XVI e XVII e o mate- Inquisition.
rial de análise são os documentos da Inquisição.

PALAVRAS-CHAVE KEYWORDS
História da Educação, Historiografia da Edu- Education History, Historiography ofEduca-
cação, Brasil. tion, Brazil.
1
Trabalho parcialmente apresentado e publicado nos Anais da 28ª Reunião Anual da ANPED com o
título Por minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa... a educação sexual no Brasil nos documentos da
inquisição dos séculos XVI e XVII.
2
Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação Sexual. UNESP – Universidade Estadual Paulista.
Faculdade de Ciências e Letras – Araraquara – SP – Brasil. CEP: 14800-901. E-mail: paulorennes@fclar.
unesp.br
3
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar. UNESP – Universidade Estadual
Paulista. Faculdade de Ciências e Letras – Araraquara – SP – Brasil. CEP: 14800-901. E-mail: redacelita@
hotmail.com

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Paulo Rennes Marçal Ribeiro e Regina Celia Bedin Notas preliminares sobre historiografia da educação sexual brasileira: apontamentos de uma cronologia descritiva.
1) Atitudes e comportamentos sexuais no Brasil nos documentos da inquisição dos séculos XVI e XVII

1. Introdução Como vários médicos de seu tempo, Afrânio Peixoto transitava com desenvol-
tura no campo da Educação, e da mesma forma que se destacou na Medicina Legal e
A configuração do campo da História da Educação no Brasil começa nas úl- na Saúde Pública, inclusive com a publicação de obras relevantes como Elementos de
timas décadas do século XIX, período em que são publicadas obras voltadas para a Higiene, de 1913, e Psicopatologia Forense, de 1916 (Maio, 1994), obteve reconheci-
descrição de escolas, compilação de leis e relatórios, elogios à política educacional do mento como um pioneiro da História da Educação tendo publicado o já mencionado
Império, obras estas publicadas sob os auspícios do Instituto Histórico e Geográfico Noções de história da educação (PEIXOTO, 1933). Afrânio Peixoto já havia publicado
Brasileiro (IHGB), fundado em 1838, e que constituía o espaço mais importante anteriormente um livro sobre Educação (PEIXOTO, 1923), e Reis e Ribeiro (2004),
para a consolidação de uma identidade nacional a partir da escrita da nossa história. por outro lado, o citam em um texto sobre a institucionalização do conhecimento
Proclamada a República, destacam-se as Escolas Normais, e com o Estado Novo de sexual no Brasil, assim como Abrantes (2010), que descreve o pensamento pedagógico
Getúlio Vargas surge mais um espaço importante para a História da Educação, que de Afrânio Peixoto no tocante à educação feminina a partir de sua obra Eunice ou a
é o INEP – Instituto Nacional de Pedagogia, denominado posteriormente Instituto educação da mulher, cuja 1ª edição data de 1936 (PEIXOTO, 1944).
Nacional de Estudos Pedagógicos. Comentando esta obra, Reis e Ribeiro (2004, p. 52) explicam que
Vidal e Faria Filho (2003) mencionam como marco da História da Educação
no Brasil o artigo em francês L’instruction publique au Brésil, de Frederico José de Afrânio Peixoto trata da educação sexual, que deve ser iniciada pelos pais, na família,
e continuada pelos mestres e mestras, nas escolas [...] e é uma forma de preparar a
Santa-Anna Nery, publicado na Revue Pédagogique, em 1884, e o “primeiro livro
mulher para o casamento, destacando a importância da relação sexual como respon-
voltado exclusivamente a narrar a história da educação brasileira, L’instruction sável pela harmonia conjugal e criticando a atitude brutalizada que muitos homens
publique au Brésil: histoire et legislation (1500 – 1889), de José Ricardo Pires de tinham no relacionamento sexual com suas esposas.
Almeida” (op.cit., p. 40), obra de vital importância que foi citada por vários autores
posteriores, como Julio Afrânio Peixoto, Primitivo Moacyr, Fernando de Azevedo Abrantes complementa esta idéia, dizendo que para Afrânio Peixoto
e Theobaldo Miranda Santos. Estes historiadores deram valiosa contribuição para
a educação, portanto, era o fator primordial da emancipação feminina, pois, se-
a constituição da História da Educação enquanto campo de ensino e pesquisa
gundo [ele], os homens sabiam que a subalternidade de educação e de instrução
com a publicação de livros que se tornaram referência para a Historiografia da da mulher era o meio mais eficaz de mantê-la na submissão civil e doméstica. Essa
Educação no Brasil, como os três volumes de A instrução e o Império: subsídios para situação levava a ocorrência de algumas tragédias familiares, pois algumas mulheres
a História da Educação no Brasil (MOACYR, 1936/1938), Noções de história da preferiam a má fama a continuarem sofrendo nas mãos de cônjuges que dilapidavam
educação (PEIXOTO, 1933) e o também intitulado Noções de história da educação seus bens, mocidade e beleza. Dessa forma, Peixoto defendia que, se a educação era
(SANTOS, 1945). fundamental para a mulher viver bem no casamento, mais ainda era para viver sem
ele. (ABRANTES, 1994, p. 151)
Depois do IHGB, um segundo pólo aglutinador de obras de história da educa-
ção foi constituído pelas Escolas Normais, que podemos considerar serem das mais Outros educadores vinculados às Escolas Normais são apontados por Vidal e
importantes instituições responsáveis pelo avanço da ciência no Brasil. Estiveram Faria Filho (2003) como autores de obras de valor para a constituição da História
à frente da consolidação da Psicologia no país e possuíam em seus quadros os mais da Educação enquanto área específica de estudo. José Veríssimo era professor de
qualificados e conhecidos docentes de sua época (RIBEIRO, 1997; 1999). No to- escola normal. Ruy de Ayres Bello, que publicou Esboço de história da educação, em
cante à História da Educação, Vidal e Faria Filho (2003, p. 45-46) mencionam que 1945, foi diretor da Escola Normal de Pernambuco, e Tito Lívio Ferreira, autor
de História da Educação Luso-brasileira, de 1966, era diretor de escola normal no
em 1928 era introduzida a disciplina História da Educação no currículo da Escola
Normal do Rio de Janeiro [...]. Dentre os primeiros professores chamados a minis-
Estado de São Paulo.
trar a nova disciplina... estava Júlio Afrânio Peixoto. Médico, membro da Academia Um terceiro pólo aglutinador de estudos sobre a história da educação no Brasil
Brasileira de Letras desde 1911, antigo diretor da Escola Normal do Distrito Federal foi o INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, criado em
em 1915 e reformador da instrução pública da capital brasileira em 1916... 1937, que tinha como uma de suas metas “organizar documentação relativa à história

150 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.149-168, 2013 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.149-168, 2013 151
Paulo Rennes Marçal Ribeiro e Regina Celia Bedin Notas preliminares sobre historiografia da educação sexual brasileira: apontamentos de uma cronologia descritiva.
1) Atitudes e comportamentos sexuais no Brasil nos documentos da inquisição dos séculos XVI e XVII

e ao estudo atual das doutrinas e das técnicas pedagógicas, bem como das diferentes Preto e Franca, constituindo-se, assim, centros de ensino e pesquisa na área de Edu-
espécies de instituições educativas” (BRASIL, 1938). cação, os quais, apesar das condições incipientes da época, puderam contribuir para
a formação do grupo de pesquisadores que começava a se constituir a partir da
De 1938 a 1945 o INEP foi dirigido por Lourenço Filho, tendo subsidiado
a produção de importantes obras, inclusive A instrução e a república, de Primitivo antiga secção de Pedagogia da FFCL da USP e para dar maior densidade aos tra-
balhos que começavam a ser produzidos. No âmbito da História da Educação, dois
Moacyr, em sete volumes, que na fala de Carvalho (2000, p. 919-920) foi, junta- nomes pioneiros merecem especial destaque: o de Laerte Ramos de Carvalho e o de
mente com A cultura brasileira, de Fernando Azevedo, “as principais ferramentas, Roque Spencer Maciel de Barros (TANURI, 1998, p. 144).
senão as únicas, para todo o estudante ou pesquisador que trabalhasse com história
da educação brasileira”. Das várias obras de História e Historiografia da Educação Vidal e Faria Filho (2003, p. 55-56) citam nominalmente o núcleo inicial de
produzidas pelo INEP, podemos mencionar Subsídios para a história da educação pesquisadores com relevantes trabalhos em História da Educação: o já citado Ro-
brasileira, coleção em 11 volumes publicados entre 1942 e 1951 (VIDAL; FARIA que Spencer Maciel de Barros e sua A ilustração brasileira, de 1959; Casemiro dos
FILHO, 2003, p. 45). Em 1944 é criada a Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Reis Filho e o Índice básico da legislação do ensino paulista, de 1963; Jorge Nagle
e em 1952 a direção do Instituto é assumida por Anísio Teixeira. e Educação e sociedade no Brasil, de 1966; Heládio César Gonçalves Antunha e sua
A consolidação das universidades no Brasil possibilitou o direcionamento dos obra A reforma de 1920 da instrução pública no Estado de São Paulo, de 1967; Maria
estudos de História da Educação para centros de ensino superior que possuíam em de Lourdes Mariotto Haidar e O ensino secundário no Império, de 1971; e Leonor
seus quadros docentes que se voltavam para esta área, notadamente a Universidade de Tanuri e sua Escola Normal no Estado de São Paulo, de Leonor Tanuri.
São Paulo – USP, que já tinha Fernando de Azevedo como seu grande interlocutor: No final da década de 1960 são criados os primeiros programas de pós-graduação
em educação, o da PUC-Rio em 1965 e da PUC-São Paulo em 1969, seguidos pelo
A cultura brasileira teve sua escrita marcada pela dupla inserção de Fernando Aze- da USP, em 1971 e da UFRJ em 1972, que criaram novos espaços para o ensino e
vedo. Professor universitário, lente de sociologia educacional, em 1942, e de so-
ciologia, em 1943, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (USP), da qual foi a pesquisa em História e Historiografia da Educação.
também diretor, entre 1941 e 1943 (período de redação da obra), Azevedo fora Os programas de pós-graduação, segundo Warde (1984, p. 2), não nasceram
reformador da instrução pública do Distrito Federal (1927-1930) e de São Paulo
(1933), redator do Manifesto dos pioneiros da educação nova, carta monumento com uma tradição de estudos historiográficos já constituída. Muito ao contrário,
publicada em 1932 defendendo um modelo de educação nacional (a escola noiva), esses programas nasceram ou dentro da tradição de estudos filosóficos que marcavam
e presidente da Associação Brasileira de Educação, eleito em 1938 (VIDAL; FARIA uma linha de investigação das idéias filosóficas no âmbito da educação e de propo-
FILHO, 2003, p. 52). sição de modelos pedagógicos, ou nasceram com a marca da tendência tecnicista e
economicista que vinha influindo o pensamento pedagógico brasileiro. O Programa
De fato, A cultura brasileira é referência ímpar para os estudos de história da de Pós-Graduação da Universidade de São Paulo (USP) e o da Pontifícia Universida-
educação, tendo subsidiado imensa produção na área. de Católica (PUC), até mais ou menos 1978, são exemplos da primeira vertente; o
da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), exemplo da segunda.
Antes mesmo da constituição de cursos de pós-graduação, entre 1938 e 1969,
surgiram vários trabalhos importantes na USP, mas também no interior do Estado de Dentre as características que podemos levantar atualmente para os programas
São Paulo, nos então Institutos Isolados de Ensino Superior, que em 1976 formaram de pós-graduação em educação existentes no Brasil, Warde (1984, p. 5) afirma que
a UNESP – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”:
ainda predomina, nos trabalhos examinados, certa tendência de se caminhar pelas
Um outro fator que me parece relevante no Estado de São Paulo para o aumento da fendas já abertas pela historiografia da educação, quando muito acrescentando novos
produção bibliográfica na área da educação, inclusive da produção historiográfica, dados, mais do que vasculhando as muitas zonas de sombra nas quais se encontra
foi a interiorização do ensino superior, ou seja a criação dos Institutos Isolados do a história da educação brasileira. [...] boa parte dos trabalhos não são de efetivo
Ensino Superior do Estado de São Paulo, a partir do final dos anos 50, no governo interesse na investigação histórica, na efetiva preocupação de historicizar a educação
de Jânio Quadros. Além dos tradicionais cursos de Pedagogia da USP e da PUC, como objeto de análise.
instalaram-se outros nas FFCL de Araraquara, Marília, Rio Claro, São José do Rio

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Paulo Rennes Marçal Ribeiro e Regina Celia Bedin Notas preliminares sobre historiografia da educação sexual brasileira: apontamentos de uma cronologia descritiva.
1) Atitudes e comportamentos sexuais no Brasil nos documentos da inquisição dos séculos XVI e XVII

Ou seja, mesmo considerando a longa trajetória desde os trabalhos do Insti- cultura sexual brasileira, que é nossa proposta para este artigo e para os demais a
tuto Histórico e Geográfico do Brasileiro, no século XIX, não conseguimos ainda serem publicados em sequência.
a constituição de uma Historiografia da Educação Brasileira relevante, contínua e
sistematizada.
Continuando, Warde (op. cit., p. 6) diz que 2. Sobre a constituição do saber sexual

na maioria dos estudos historiográficos, ainda é o Estado a grande personagem do Questões ligadas à sexualidade e que contribuíram para a constituição de um
palco educacional. O que ele fez ou o que deixou de fazer, o que cumpriu ou deixou conhecimento sexual no Brasil têm sido objeto de estudo e pesquisa das ciências
de cumprir, o que absorveu das demandas de setores sociais e o que deixou de absor- humanas em geral, particularmente da educação, da antropologia, da psicologia e
ver são ainda as grandes questões vistas nesses estudos. seus afins, da sociologia, da história e das ciências médicas.
E Nagle (1984), ao descrever os problemas atuais dos estudos historiográficos A institucionalização do conhecimento sexual no Brasil ocorreu a partir do
em educação, conclui que há, no Brasil, uma falta de tradição destes estudos entre final do século XIX e principalmente nas primeiras décadas do século XX, quando
nós e dificuldade em selecionar material de pesquisa. médicos e, posteriormente educadores, elaboraram, desenvolveram ou se apropriaram
de teorias e idéias que foram consideradas científicas e capazes de dar sustentação
Ele explica que os estudos sobre história da educação brasileira inicialmente
àquelas instituições que necessitavam de um discurso oficial para atingir seus obje-
foram de natureza basicamente descritiva. Com essa orientação encontram-se os tivos de fazer ciência, propor ações educacionais ou práticas pedagógicas e resolver
relatos sobre a situação então presente, ou os relatórios dos ministérios, das câmaras, problemas de saúde pública, em alguns casos para justificar ideologias e exercer o
além daqueles poucos estudos realizados por intelectuais não diretamente ligados poder. É a partir deste período que questões ligadas à sexualidade começaram a ter
ao setor público. No momento seguinte, a ênfase foi dada à análise da história das lugar importante no discurso médico-educacional.
idéias educacionais, especialmente a partir da discussão do republicanismo no Brasil
(NAGLE, 1984, p. 28). Alguns estudos sobre este momento histórico foram realizados, como o artigo
de Vidal (1998), a tese de doutorado de Besse (1983), e mais recentemente os traba-
Estas observações são importantes porque nos levam a tentar compreender lhos de Reis e Ribeiro (2001, 2002, 2004, 2005) e Ribeiro e Reis (2003), mas não
porque a historiografia da educação brasileira ainda é um tanto restrita e refratária a temos uma historiografia da educação sexual no Brasil abrangente e aprofundada,
inovações. Aliás, talvez até possamos estender esta característica à área da Educação como explicam Nunes e Silva (1998, p. 172):
como um todo, que não tem facilitado a inserção de novos campos nos Programas
de Pós-Graduação em Educação. (há) necessidade de estudos que resgatem algumas perspectivas sobre a história da
educação sexual e sobre as tentativas históricas de institucionalizá-la. (...) A educação
Neste contexto, inserimos a Educação Sexual enquanto campo específico do sexual no Brasil não conta com uma historiografia bem explicitada.
saber educacional que, contraditoriamente, tanto tem se fortalecido e consolidado
como campo de investigação nas universidades brasileiras (Bedin, 2010) quanto tem Se considerarmos que a educação sexual abrange toda educação recebida pelo
sido discriminado e até evitado em várias tentativas de implementação nas escolas e indivíduo desde o nascimento referente à aquisição de concepções, valores e normas
como disciplina curricular nos cursos de graduação de Pedagogia e nas Licenciaturas sexuais, inicialmente na família, posteriormente na comunidade, com seu grupo
(Leão, 2009). social e religioso; e que esta educação sexual é contínua, indiscriminada e decorrente
Mas a Educação Sexual tem uma história que, no Brasil, reconhece sua insti- dos processos culturais, influenciando a manifestação de comportamentos e atitudes
tucionalização a partir das primeiras décadas do século XX (Ribeiro, 2009) e tem sexuais, podemos dizer que desde a Colônia havia uma educação sexual no Brasil.
em José de Albuquerque o seu pioneiro mais expoente que, em 1934, já publicava De lá até nossos dias temos quinhentos anos de história, mas a história da
seu livro Educação Sexual. Para compreendermos este processo de institucionaliza- educação sexual carece de estudos que resgatem sua especificidade, abrangência e
ção é importante fazermos um passeio até a Colônia e estudarmos a constituição da importância.

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Paulo Rennes Marçal Ribeiro e Regina Celia Bedin Notas preliminares sobre historiografia da educação sexual brasileira: apontamentos de uma cronologia descritiva.
1) Atitudes e comportamentos sexuais no Brasil nos documentos da inquisição dos séculos XVI e XVII

Estudar as formas com que se lidava e como se concebia atitudes e comporta- De fato, para um bando de brancos católicos educados sob a égide da ocultação
mentos sexuais é essencial, portanto, para se entender a constituição do conhecimento da nudez, em que o pecado e a culpa faziam parte de seu imaginário e que ouvia dos
sexual no Brasil, a institucionalização do saber médico e educacional para questões padres que o corpo era o templo do demônio, índias nuas com certeza constituíram
sexuais e a difusão de idéias que influenciaram conceitos, comportamentos e atitudes objeto de extrema surpresa. Este fascínio inicial precisava ser justificado e nada melhor
por gerações. Em seu cotidiano o indivíduo vai alicerçando o seu modis vivendi (que do que a comparação com o Éden e a nudez de Adão e Eva. Como eles, também os
inclui concepções, atitudes e práticas sexuais) a partir da educação recebida desde índios eram inocentes em sua nudez.
o nascimento. Parker (1991) fala em uma cultura sexual brasileira cheia de contra- Mas Caminha e Cabral foram embora, e com eles a inocência das índias.
dições, fundamentada historicamente em uma ordem social patriarcal e dominada Na medida em que chegavam os primeiros portugueses, as relações se estrei-
pela Igreja Católica, em que permissividade e proibição, práticas sexuais e culpa tavam com algumas tribos, com outras hostilidades resultavam em guerra. Mas o
fazem parte do contexto sexual brasileiro desde a Colônia. português ia se instalando do litoral para o interior, fundando vilas, indo atrás do
Há, portanto, já na Colônia, um conhecimento sexual popular, aquele conheci- ouro e do apresamento de índios. Alianças são feitas e a falta de brancas européias
mento que homens, mulheres, jovens, famílias tinham acerca de questões envolvendo levou os primeiros colonizadores a tomarem índias por mulheres.
atitudes e comportamentos sexuais em sua vida cotidiana, derivado de sua própria A nudez dos índios e índias e a relação sexual livre de interditos e impedimentos
observação e experiência e da interpretação que faziam do saber religioso. As práticas assustavam os padres. Os jesuítas tinham verdadeira aversão à nudez, a mesma nudez
e atitudes sexuais de então atendiam mais as necessidades dos habitantes do que a que era corrente e natural na Idade Média a ponto de até os santos serem retratados
ordem pregada pela Igreja. nus (USSEL, 1981). A índia não via o ato sexual com o pudor da mulher européia
Vamos, então, refletir sobre as concepções e práticas sexuais da Colônia, parti- e isto era estímulo para os portugueses. De inocente ela não tinha nada, prevalecia
cularmente nos séculos XVI e XVII, período em que as visitações do Santo Ofício à visão de propensa aos deleites sexuais, já que indistintamente se entregava com a
da Inquisição, indo além do combate e perseguição ao judaísmo,visaram descobrir e maior naturalidade. Os jesuítas não aprovavam essa união indiscriminada e levan-
punir delitos e crimes sexuais. A documentação produzida pelos padres inquisidores tavam a voz contra práticas sexuais tão contrárias aos princípios da Igreja Católica,
pode ser considerada como os primeiros documentos oficialmente registrados sobre entre eles o Padre Manoel de Nóbrega.
educação sexual no Brasil. Vainfas (1997a, p. 232-233) descreve que

aos olhos dos jesuítas, sempre queixosos das dificuldades da catequese, do clima, e da
3. A Colônia dos jesuítas falta de recursos, o frenesi sexual campeava, antes de tudo, entre os índios: sempre
nus, poligâmicos, incestuosos. (...) em relação aos primeiros colonos... quase todos...
Quando os portugueses aqui aportaram em 1500 e se depararam com o nativo não satisfeitos em fazer suas escravas de mancebas, lançavam-se às livres, pedindo-as
habitante da terra recém descoberta, chamou-lhes atenção à nudez das índias, que aos índios por mulheres. E se os padres ousassem admoestá-los para que se casassem
com uma só índia, como Deus mandava, eram ofendidos, ameaçados e até persegui-
raspavam os pelos púbicos deixando a mostra os detalhes vaginais, detalhes estes que
dos pelos escandalosos colonos.
foram parar na carta de Pero Vaz de Caminha ao rei Dom Manuel e que constituí-
ram a primeira impressão sexual que um europeu teve de nossos liberais costumes: Da mesma forma, Freyre (1978, p.93) assinala os “riscos” sexuais que corriam
os europeus que no Brasil aportassem:
(...) Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem moças e bem gentis, com
cabelos muito pretos, compridos pelas espáduas, e suas vergonhas tão altas, tão cer-
O europeu saltava em terra escorregando em índia nua; os próprios padres da Com-
radinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as muito bem olharmos, não tínhamos
panhia precisavam descer com cuidado, se não atolavam o pé em carne... As mulhe-
nenhuma vergonha... e certo era tão bem feita, e tão redonda, e sua vergonha (que
res eram as primeiras a se entregarem aos brancos, as mais ardentes indo esfregar-se
ela não tinha) tão graciosa, que a muitas mulheres da nossa terra, vendo-lhe tais
nas pernas desses que supunham deuses. Davam-se ao europeu por um pente ou um
feições, fizera vergonha, por não terem a sua como ela. (CAMINHA, 1939, p. 6).
caco de espelho.

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1) Atitudes e comportamentos sexuais no Brasil nos documentos da inquisição dos séculos XVI e XVII

Temos, então, na Colônia, duas posições antagônicas em relação às práticas prietários de homens imoderado desejo de possuir o maior número possível de crias.
sexuais, uma relacionada à posição dos primeiros povoadores e outra a que os jesuítas (...) Dentro de semelhante atmosfera moral, criada pelo interesse econômico dos
senhores, como esperar que a escravidão ...atuasse senão no sentido da dissolução, da
queriam impor. O português recém-chegado seguia a natureza para a liberação do
libidinagem, da luxúria? O que se queria era que os ventres das mulheres gerassem.
desejo: se havia mulheres disponíveis, porque não fazer sexo? O colono encontrava-se Que as negras produzissem muleques (FREYRE, 1978.p. 316-317).
no Paraíso, no meio de índias que se apresentavam tais como Eva em sua inocência
e deixava que aflorasse o desejo para que fosse saciado com tantos corpos quanto É preciso atentar, porém, para as diferentes formas de liberdade sexual existentes.
se apresentassem. Para a elite dominante da sociedade colonial agro-açucareira, a tendência pró-sexual
A cultura sexual indígena, livre da culpa cristã e permitindo a liberação da era unilateral. O senhor de engenho, dono da terra, dos escravos, da mulher, das
energia sexual do branco, pode ser considerada a primeira condição para o favore- filhas, dos filhos, dos empregados, ocupava o topo de uma hierarquia em que somente
cimento das práticas sexuais na Colônia. os homens tinham voz e razão. As mulheres, brancas ou negras, eram submissas e a
Terminado o período pré-colonizador, a agro-manufatura do açúcar e os en- elas era negado qualquer direito. As primeiras seriam mães de seus herdeiros, estas
genhos deram um novo contorno à sociedade brasileira em formação, exigindo a últimas objeto de desejo.
vinda de mais colonos portugueses e de numerosos escravos africanos, ao mesmo A autoridade sem limite do senhor do engenho servia de modelo para seus
tempo em que escasseavam os nativos do litoral. A população do Brasil aumentava subordinados e até para as próprias crianças que lentamente formavam seu próprio
e o objeto sexual do branco foi ampliado, sendo que negros e negras seriam subme- caráter:
tidos aos desejos de seu senhor.
Uma espécie de sadismo do branco e masoquismo da índia ou da negra terá predo-
E a educação sexual,passada informal e naturalmente, sem ninguém pensar que minado nas relações sexuais como nas sociais do europeu com as mulheres das raças
fosse de fato uma educação sexual, de livre que era, ia muito lentamente absorvendo submetidas ao seu domínio. O Furor femeeiro do português se terá exercido sobre
o sentido de pecado que lhe atribui a Igreja Católica. vítimas nem sempre confraternizantes no gozo... Isto quanto ao sadismo de homem
para mulher  – não raro precedido pelo de senhor para muleque. Através da sub-
A pregação dos padres não conseguia atingir o povo, que continuou licenciosa- missão domuleque, seu companheiro de brinquedos e expressivamente chamado de
mente ativo por todo o período colonial, não obstante muitos delitos sexuais terem leva-pancadas, iniciou-se muitas vezes o menino branco no amor físico (FREYRE,
sido julgadospelos tribunais do Santo Ofício durante a Inquisição, que, em Portugal 1978, p. 50).
começou em 1536 e se estendeu até à Colônia, porém aqui chegando após 1590.
Cercado de escravos, vítima do autoritarismo do pai, o menino branco transferia
Portugal já era escravocrata quando aqui aportou. Os índios foram seus pri-
a opressão a que era submetido para o escravo companheiro, que sofria todo tipo
meiros apresamentos. Índios com costumes sexuais livres do pecado cristão que
de maus tratos. Adulto, tinha gosto em mandar bater, em torturar, em violentar.
estimulavam, por esta condição, o apetite sexual dos primeiros colonos. O africano
que aqui aportava igualmente não considerava o sexo como pecado ou transgressão Freyre (1978, p. 51) fala de como este sadismo se manifestou tantas vezes nesse
moral. Soma-se a isto o desejo sexual sem contenção do português e temos o espaço menino ou adolescente quando homem feito,
propício para a erotização do período colonial. no gosto de mando violento ou perverso que explodia nele ou no filho bacharel
Gilberto Freyre, embora opine a partir de seus valores e pareça sugerir que o quando no exercício de posição elevada, política ou de administração pública; ou no
comportamento sexual vigente na Colônia fosse corrompido e beirasse a perversão, simples e puro gosto de mando, característico de todo brasileiro nascido ou criado
em casa-grande de engenho.
chamando de depravação o que considera excesso de sensualidade, faz uma análise
que pode ser a segunda das condições que tornaram favoráveis as práticas sexuais Voltando às mulheres, elas se casavam cedo, em torno de 12 anos, eram eco-
de então: nomicamente dependentes mas administravam a casa e eram responsáveis pelo
Não há escravidão sem depravação sexual. É da essência mesma do regime. Em pri- que as escravas produziam, como roupas, geléias, licores, sabão e outros produtos
meiro lugar o próprio interesse econômico favorece a depravação, criando nos pro- domésticos.

158 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.149-168, 2013 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.149-168, 2013 159
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1) Atitudes e comportamentos sexuais no Brasil nos documentos da inquisição dos séculos XVI e XVII

A quase reclusão a que eram submetidas, porém, não impediu que várias as crioulas, especialmente as da casa-grande, amantes dos sinhôs e sinhozinhos ...
mulheres fossem julgadas pelo Santo Ofício, acusadas de delitos sexuais da mes- eram também as vítimas prediletas de sinhás tirânicas que não hesitavam em suplicá-
-las por ciúme ou simples inveja de “seus belos dentes ou rijos peitos”. E a predomi-
ma forma que muitos homens, como mencionado anteriormente. Temos muitos
nar sobre todas em matéria de paixão e ardor, lá estava a mulata, exemplo recorrente
exemplos de comportamento feminino que contrariavam o papel submisso atribu- de beleza e sedução no imaginário masculino relacionado à terra brasílica.
ído à mulher branca da elite. A mulher do povo – branca em minoria, mameluca
e negra – tinha maior independência e não limitava sua via à casa-grande e ao A conclusão que se tira, então, é que durante os séculos XVI e XVII, a se-
abrigo do marido. xualidade no Brasil manifestava-se de forma ambivalente. De um lado, a ótica
Como era, então, a vida sexual destes homens e mulheres da América portuguesa masculina de liberdade para si e contenção para a mulher – a sua mulher, já que
no final do século XVI e começo do século XVII? a mulher dos outros poderia ser sempre objeto de sua conquista. De outro, sob
Sobre a mulher branca, Araújo (1997, p. 58-62) fala o seguinte: a ótica da mulher, três situações distintas: a branca, ainda em pequeno número,
pronta para correr riscos para não deixar murchar seu desejo sexual pulsante e
Bem que os homens do reino lusitano desconfiavam que suas mulheres não se con- transgressor; a índia, sexualmente livre e pronta para amar inconteste o admira-
formavam, como eles tanto queriam, em aprisionar a sexualidade a ponto de só do branco; e a negra, oprimida e escrava, porém igualmente erótica e sensual. A
manifestá-la, com o recato possível, no leito conjugal. Os homens tinham vida mais
Colônia dos séculos XVI e XVII era altamente erótica e nela as práticas sexuais
solta, o que era admitido pela Igreja e pelo Estado, mas o paradoxo é evidente... Ora,
se “corrompiam” as mulheres dos outros, como não desconfiar da própria mulher? se manifestavam das mais variadas formas, não obstante as diferenças de etnia e
cultura que aqui encontramos.
Com desconfiança e artifícios para impedira vida sexual das suas mulheres, o É o que mostra a farta documentação do Santo Ofício da Inquisição (Vainfas,
macho branco, porém, tomava para si a mulher do outro que quisesse. As mulheres, 1997c; Mott, 1988), tanto nos autos dos inquéritos quanto em seus manuais de
por sua vez, corriam risco, mas o adultério feminino não era raro na Colônia. Também normas e regras. Neles se encontra rico material sobre a vida sexual e de relação na
as freiras davam vazão ao desejo sexual, e também os padres que, com trânsito livre Colônia a partir das descrições dos delitos da carne e das normas que pretendiam
nos conventos, secretamente chegavam às clausuras para encontros com as freiras. controlar e conter os comportamentos e atitudes sexuais.
Araújo (1997, p. 68-73) bem explica estes fatos:

Desenvoltas e muito bem informadas sobre o que se passava fora do convento, as 4. O sexo nos manuais da Inquisição
freiras mantinham contato permanente e íntimo com o mundo externo. Demasiado
íntimo, aliás, pois uma legião de homens, apropriadamente chamados de “freiráti-
cos”, cultivava naquela época a vaidade de seduzir freiras. O costume vinha de Portu-
A Inquisição, que inicialmente pretendia investigar os cristãos-novos da Penín-
gal, e a acreditar no português frei Lucas de Santa Catarina... elas é que seduziam os sula Ibérica, após o Concílio de Trento – convocado para fazer frente à expansão do
homens. Era um jogo com regras bem definidas e rebuscada etiqueta, além de caro... protestantismo Pós-Reforma – amplia seu leque de ações com poderes para investigar
Isso porque, além de cumular a amada com presentes, havia que contribuir para a qualquer denúncia que implicasse no não cumprimento das leis e normas da Igreja
montagem de peças representadas no convento e para a realização das sucessivas Católica relacionadas à vida cotidiana da população. Ocultação da nudez e contenção
festas religiosas no correr do ano.
da vida sexual faziam parte da moralidade pregada pelos jesuítas, que não admitiam
os vícios disseminados no Brasil, como explica VAINFAS (1997b, p. 48):
Sobre a mulher índia, vale citar Vainfas (1997d, p. 116), que diz que
Ameríndios luxuriosos, colonos insaciáveis, negros lascivos, mulatas desinquietas,
as índias eram as “negras da terra”, nuas e lânguidas, futuras mães de Ramalhos e
senhores desregrados, sinhás enciumadas, o pecado estava emtodas as gentes e lu-
Caramurus, todas a desafiar, com seus parceiros lascivos, a paciência e o rigorismo
gares. A todos, sem exceção, cabia portanto, intimidar, ameaçar, castigar  – foi o
dos jesuítas.
que pensaram os seguidores de Trento no ultramar português. Atendendo a tan-
tas lamúrias e apelos, já no primeiro século nossos bispos enviariam visitadores a
Sobre as negras, o mesmo Vainfas (1997d, p. 116) escreve que

160 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.149-168, 2013 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.149-168, 2013 161
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1) Atitudes e comportamentos sexuais no Brasil nos documentos da inquisição dos séculos XVI e XVII

rastrear os pecados de todos e a puni-los com o rigor da lei eclesiástica. Não tardaria, Discutia-se e se codificava se o ato denunciado era erro, pecado ou crime; o
ainda, paraque o já célebre Santo Ofício lisboeta, enviasse também ele o seu próprio grau da punição – por exemplo, morte na fogueira, castração, confisco de bens,
visitador, acrescentando à intimidação jesuítica o pânico da fogueira inquisitorial.
degredo; e a extensão do ato – se havia derramamento de sêmen, se havia apenas
carícias nos genitais, se apenas eram homens com jeito e trajes femininos, se era
Palco de extrema liberdade erótica e libidinosa, o Brasil precisava se submeter à
relação entre mulheres. Verificava-se se o crime ou pecado não consistia sodomia,
orientação sexual e moral eclesiástica. A punição para os pecadores, ainda que nem
mas molície (menos grave) – nome que se davaa enorme lista de atos sexuais que
sempre rigorosa, implicava em ter sua vida exposta ao domínio público. Os trans-
excluíam penetração anal ou vaginal, como masturbação, sexo oral e desvios sexuais.
gressores, acusados de crimes ou delitos sexuais, se tornariam personagens reais de
uma história de horror e intolerância em que sua intimidade era devassada enquanto Os termos utilizados e a descrição dos atos instruíam o inquisidor. Se a pene-
corria o processo, o julgamento e a condenação. tração anal resultava em ejaculação, entre homens era denominada sodomia perfeita,
entre um homem e uma mulher, sodomia imperfeita. O ânus era chamado de vaso
A lista dos delitos sexuais pode ser vista nas célebres Confissões da Bahia, estu-
posterior ou vaso preposterum, a vagina era o vaso natural ou vaso dianteiro. Sodomia
dadas por Vainfas (1977b, 1977c), e em documentos variados sobre a Inquisição
foeminarum era a relação entre mulheres.
no Brasil, mencionados por Mott (1988): sodomia (pecado nefando da sodomia),
bigamia, crime de solicitação (o padre utilizar-se da confissão para obter favores O detalhamento era necessário para a distinção entre as práticas sexuais que a
sexuais), masturbação (chamada de punheta), fornicação, sexo oral. Inquisição considerava fora de sua alçada ou de menos gravidade.
Tão numerosos casos julgados pelo Santo Ofício, nem todos condenados, Vainfas (1997b, p. 199) explica que
porém,nos dão a idéia de quão erótica era à sociedade brasileira na Colônia, aliás,
os pecados mortais da carne, os sonhos eróticos, o mero pensar em qualquer inde-
erótica, autoritariamente hierarquizada, escravocrata e machista. cência, nada disso interessava aos inquisidores enquanto simples manifestações da
Das visitações do Santo Ofício, a partir de 1591, resultaram documentos vários fragilidade do corpo, da tentação fugaz do demônio e da corrupção geral da cria-
denominados denunciações e confissões, todos com descrições minuciosas dos crimes tura humana resultante da primeira e irreversível queda. (...) não eram os pecados
da carne ou os crimes morais que despertavam a atenção inquisitorial. Ao Santo
cometidos, que nos dão a idéia real das práticas, atitudes e comportamentos sexuais
Ofício interessavam ... os erros de doutrina passíveis de serem captados não apenas
no cotidiano da Colônia. As Confissões (1935) e As Denunciações da Bahia (1925), em afirmações ou idéias contestatórias à verdade oficial e divina, mas em atitudes
As Confissões (Mello, 1970) e As Denunciações de Pernambuco (1929), assim como ou comportamentos que, por sua obstinação desafiadora àquela verdade, implica-
regimentos, autos, livros de visitação e documentos dispersos do Pará, Maranhão e vam suspeita de heresia, presunção de que o indivíduo pecava e insistia em fazê-lo,
Sergipe, além de registros sobre atitudes e comportamentos sexuais, constituem os recusando-se a qualquer emenda e urdindo maneiras de burlar a disciplina norma-
primeiros documentos de educação sexual do Brasil. tizadora da Igreja. Interessavam-lhe, enfim, ainda que no campo das moralidades e
do erotismo, os indivíduos que, por livre arbítrio – e não por eventual tentação de-
Neles percebe-se que as relações extraconjugais eram largamente praticadas. moníaca – escolhiam doutrinas ou modos de viver francamente hostis aos preceitos
Separações e casamentos ocorriam sucessivamente sem a existência do estado de do catolicismo.
viuvez exigido pela Igreja. Relações anais, tanto entre dois homens como entre um
homem e uma mulher, eram comuns na Colônia. Até o homoerotismo feminino Esta distinção é importante para que não fique a idéia de que a Inquisição
fazia parte do comportamento sexual da mulher. buscava punir os crimes sexuais apenas por serem sexuais. Era preciso que o crime
Destas práticas, havia desde as que não eram consideradas como heresia, sendo sexual estivesse na esfera da heresia! Pouquíssimas mulheres praticantes da sodomia
toleradas e não sofrendo penas, até as mais perseguidas pela Igreja, como a sodomia. foeminarum foram condenadas na Colônia. O adultério e o concubinato não eram
Considerada heresia e também denominada pecado nefando, englobava não só a julgados pelo Santo Ofício, mas a bigamia, sim.
relação sexual anal, mas também o sexo oral, a masturbação e até relações entre Porém, independentemente de qual categoria pertencia o crime e de qual
mulheres, embora a gravidade maior recaísse nos homens homófilos que praticavam poder o julgaria – fosse o Santo Ofício, fosse a justiça eclesiástica, fosse a justiça
o intercurso sexual contrário à “ordem natural”. civil – é essencial destacar que as práticas sexuais tinham especial atenção por parte

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1) Atitudes e comportamentos sexuais no Brasil nos documentos da inquisição dos séculos XVI e XVII

das autoridades. Se havia essa atenção, além do controle e do regramento da vida ignorar seu discurso sexual – ainda que anti-sexual – e a exacerbada importância
sexual, tudo mostrado na minuciosa descrição dos processados, nos remetemos a que dava ao sexo – ainda que no sentido de negá-lo.
uma simples e única conclusão: havia muito sexo na Colônia em confronto com os Ao habitante da Colônia cabia duas posições: acatar a normatização ou trans-
ditames da Igreja Católica. gredi-la. Foi exatamente essa transgressão, fruto da rebeldia e da não aceitação do
controle sexual, que possibilitou que chegasse até nossos dias o conhecimento da
vida sexual e de relação vigente nos primeiros tempos de Brasil.
5. Considerações finais
Este trabalho procurou demonstrar que podemos considerar que o primeiro Referências
momento histórico da educação sexual no Brasil ocorreu no período colonial (Ri-
beiro, 2004). As práticas sexuais eram variadas e livres. Não obstante autores como ABRANTES, E. S. A educação da mulher na visão do médico e educador Afrânio
Gilberto Freyre (1978) e Capistrano de Abreu (1976) terem destacado a sensua- Peixoto. In: Outros Tempos, v. 7, n. 10, 2010, p. 143-157.
lidade das índias e negras como provocadoras da libido portuguesa, a leitura dos ARAÚJO, E. A arte da sedução: sexualidade feminina na Colônia. In: DEL
documentos da Inquisição nos remete a uma vida sexual livre também da mulher PRIORE, Mary. (org.) História das mulheres no Brasil.São Paulo: Contexto/
branca que não pertencia à elite econômica e ocupava um espaço intermediário Editora UNESP, 1997d, p .45 – 77.
entre as camadas mais altas e os escravos – filhas e esposas de artesãos, pequenos
comerciantes elavradores, e também brancas sem ocupação recém chegadas de BEDIN, R. C. A institucionalização do conhecimento sexual enquanto tema
Portugal e mestiças. de investigação e ensino em universidades brasileiras a partir das ações de
grupos de pesquisa. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar) – Faculdade de
Contrapondo-se a esta liberdade, primeiramente pregaram os jesuítas, e em
Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2010.
seguida, o Santo Ofício. Eram pregações que objetivavam condenar, ordenar e
controlar as práticas sexuais e fundamentavam-se na doutrina da Igreja por meio de BESSE, S. K. Freedom and bondage: the impact of capitalism in women in São
bulas papais e regimentos do Santo Ofício, que por sua vez, influenciavam o con- Paulo, Brazil, 1917 – 1937. Tese de doutorado-Yale University, New Haven, 1983.
teúdo das provisões, determinações régias, as famosas ordenações reais – Afonsinas,
BRASIL. Diário Oficial da União. Decreto-Lei nº 580 de 30 de Julho de 1938. In:
de 1446, Manuelinas, de 1512 e Filipinas, de 1603, com explicitação dos crimes
http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/5_Gov_Vargas/
sexuais – e outros documentos. Havia também os chamados Penitenciais, manuais de
decreto-lei%200580-1938%20inep.htm.Acesso em 19 de janeiro de 2013.
confessores em que se relacionava os pecados e as penitências aplicadas à transgressão
de cada um deles. Finalmente, com riqueza nos detalhes, temos osautos do Santo CAMINHA, P. V. Carta a El-Rei Dom Manoel. Lisboa: J. Borsoi, 1939.
Ofício, retratando todo o processo do acusado, constituindo descrição minuciosa
dos costumes sexuais da Colônia. CAPISTRANO DE ABREU, J. Capítulos da história colonial (1500 – 1800).
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1976.
Considerando a utilização destes documentos por parte da Igreja para nortear
as atitudes e comportamentos que desejava para os habitantes da terra brasileira e CARVALHO, M. M. C. L’histoire de l’éducation au Brésil: traditions
sendo estes, em grande número e com explícito conteúdo normatizador de práticas historiographiques et processus de rénovation de la discipline”. In: Paedagogica
sexuais, podemos aceitá-los como a primeira tentativa de educação sexual que se Historica, Gent (Bélgica), v. 36, n. 3, 2000, p. 909-934.
tem registro na História do Brasil.
FREYRE, G. Casa grande & senzala. Rio de Janeiro: José Olympio, 1978.
Podemos não concordar com a posição da Igreja dos séculos XVI e XVII e
até achar que seu objetivo era impor a moral católica vigente. Porém não podemos

164 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.149-168, 2013 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.149-168, 2013 165
Paulo Rennes Marçal Ribeiro e Regina Celia Bedin Notas preliminares sobre historiografia da educação sexual brasileira: apontamentos de uma cronologia descritiva.
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O objetivo deste trabalho é analisar o “Código The objective of this paper is to analyze the
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viver no século XIX”, de J. I. Roquette, publi- de bem viver no século XIX” (Code of good
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História e historiografia da Sexualidade, Impé- History and Historiography of Sexuality, Bra-
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constituição histórica do campo (1880-1970), Revista Brasileira de História, São
Paulo, v. 23, n. 45, 2003, p. 37-70. Foi se o tempo em que a história era escrita a partir de documentos oficiais
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Em 1929, a publicação da Revista Annales d’histoire économique et sociale inicia
uma transformação completa dos estudos históricos. Uma revolução, no entender
de Burke (2003).

1
Universidade Federal do Espírito Santo-UFES-Vitória- ES- Brasil- 29075-910.
2
Universidade Federal do Espírito Santo-UFES- Vitória- ES- Brasil- 29075-910.

168 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.149-168, 2013 Doxa, v.17, n.1 e 2, p.169-181, 2013 169

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