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IMAGEM 1
(Um garçom com fisionomia morta adentra a cena ao som de música clássica, preparando uma mesa e cadeiras.
Olha atentamente o público, vai até as pessoas e passa a distribuir um cardápio. É o cardápio da fome, onde são
oferecidos apenas ossos, restos ou nada. Onde são oferecidos a preços exorbitantes os itens básicos para a
sobrevivência de um ser humano. O garçom pode atrair duas pessoas para sentarem-se à mesa. Ele então trará,
sem nada dizer, uma bandeja coberta. Quando ele a descobre, revela sobre a mesma apenas um grande osso de
animal. Ao fazê-lo, a música clássica é interrompida e um coro de personagens trabalhadores irrompe à cena,
cantando lentamente o trecho da canção “A FOME” enquanto carregam cartazes com escritos como “Tenho fome.
Me ajuda. Obrigado. Fé”. “Estou desempregado e passo dificuldades. Tenho 3 filhos e moro de aluguel. Se Deus
tocar no seu coração, me ajuda.” “Estou procurando emprego. Você pode me ajudar?”).
A FOME
E quando a boca
Se cala
Enquanto a fome
Não cala
Quando há boca?
E quando a fome
Não cala
Enquanto a boca
Se cala
Quando há fome?
Canta a boca:
Não cala
Enquanto há fome!
Conta a fome!
Não cala
Enquanto há boca!
Quanta fome!
IMAGEM 2
(Foco no Intérprete 1. É um homem com roupa de proteção contra agrotóxico, que lhe dá uma aparência distópica.
Durante sua fala podem ser projetadas imagens de ossos humanos e de outros animais, como numa aula de
osteologia, imagens do nosso organismo, principalmente do sistema digestivo e imagens e notícias de jornal com
dados sobre a fome no país e no mundo).
O osso é um órgão constituído principalmente por tecido conjuntivo mineralizado, vivo, portanto altamente
vascularizado e inervado. A Etimologia da palavra vem do Latin –ossu, os, ossis e do Grego –osteum: órgão
duro e sólido. Os ossos são formados por vários tipos celulares que pertencem ao tecido ósseo. As células
encontradas no tecido ósseo são osteócitos, osteoblastos e osteoclastos. A matriz óssea possui uma parte
orgânica e uma parte inorgânica. A parte orgânica apresenta, principalmente, fibras colágenas. Já a parte
inorgânica é rica em fosfato e cálcio. Já os alimentos são utilizados pelo nosso organismo para realizar o
metabolismo, ajudar na manutenção e crescimento dos tecidos, além de fornecer energia. Para aproveitar os
alimentos, nosso corpo conta com o sistema digestório, que é responsável por quebrá-los em porções menores
para serem aproveitadas pelo organismo. A porção do alimento que é aproveitada pelo corpo é denominada de
nutriente. Estes favorecem o funcionamento correto do organismo. Diante da falta de alguns nutrientes, o corpo
pode sofrer graves consequências em virtude da interrupção de alguma atividade básica. A desnutrição ocorre
quando uma pessoa apresenta a deficiência de algum nutriente. Quando não comemos, os estoques de glicogênio
passam a ser queimados com o intuito de gerar energia para o corpo. É possível que quem fique muito tempo sem
comer, também sinta tremores, irritação e confusão mental. E também uma sensação de cansaço causada pela
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hipoglicemia. Ao ficar sem comer até 24 horas, o corpo começa a fazer cetose. Ou seja, ele passa a queimar
gordura para conseguir funcionar normalmente. Depois desse período, é provável que desmaios passem a
acontecer. Após ficar sem comer por 72 horas, o cérebro reduz todo o seu trabalho em até 75% e também passa a
sentir falta de glicose. O metabolismo fica mais lento e reservas do fígado precisam ser acionadas. Por fim,
irritabilidade e sonolência tornam-se moderadas e começam a aparecer algumas alterações nos hormônios. Após
4 dias sem comer o corpo começa a fazer um grande esforço para que o cérebro se mantenha ativo. Dores de
cabeça e vertigens passam a ser mais comuns. Nesse ponto a glicose e quase toda a gordura do fígado já foi
consumida. De uma a duas semanas, o organismo faz de tudo para encontrar energia, consumindo e queimando a
proteína e qualquer resto que estiver sobrando nos músculos e nos tecidos. Na tentativa de poupar o máximo de
energia possível, o corpo passa a diminuir sua própria temperatura e até mesmo pára a cicatrização de
machucados. Algumas pessoas podem vir a óbito nesse ponto, por causa da baixa imunidade que deixa o corpo
exposto às doenças e também por desnutrição aguda, uma chance de infarto ou por insuficiência cardíaca. Isso
tudo por falta de vitaminas e sais minerais e também porque o coração perde a força para bombear o sangue. A
partir de três semanas, pessoas que não têm acesso à água e também não possuem gordura acumulada no corpo
não conseguem ficar vivas durante todo esse tempo sem comer.
(Ao final do último texto entra voz em off de dona Nazaré: “O que mais dói meu filho é a fome. A fome dói.” A
canção “A FOME” é retomada, com mais força, pelo coro).
IMAGEM 3
(Uma intérprete assume o lugar à mesa representando depoimento com base em relatos reais de Carolina Maria
de Jesus sobre a fome e a carestia, enquanto conta seus poucos feijões).
Quando começaram a demolir as casas térreas para construir os edifícios, nós, os pobres que residíamos nas
habitações coletivas, fomos despejados e ficamos residindo debaixo das pontes. É por isso que eu digo que a
favela é o quarto de despejo de uma cidade. Nós, os pobres, somos os trastes velhos. Lá no interior eu era mais
feliz, tinha paz mental. Gozava a vida e não tinha nenhuma enfermidade. Aqui as crianças ricas brincam nos
jardins com seus brinquedos prediletos. E as crianças pobres acompanham as mães a pedirem esmolas pelas
ruas... Eu classifico São Paulo assim: o Palácio é a sala de visita. A Prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o
jardim. E a favela é o quintal onde jogam os lixos. Semana passada, por exemplo, chegou um caminhão aqui na
favela. O motorista e seu ajudante jogaram umas latas. Linguiça enlatada. Pensei: É assim que fazem esses
comerciantes insaciáveis. Ficam esperando os preços subir na ganancia de ganhar mais. E quando apodrecem
jogam fora para os corvos e os infelizes favelados. Não houve briga. Eu até achei isto monótono. Vi as crianças
abrirem as latas de linguiça e exclamarem satisfeitas: - Hum! Tá gostosa! A Dona Alice deu-me uma para
experimentar. Mas a lata estava estufada. Já estava podre. Às vezes, pra gente se distrair, eu ligo o rádio e danço
com as crianças... Outro dia comprei marmelada para elas. Assim que dei um pedaço para cada um percebi que
eles me dirigiam um olhar terno. E o meu João José disse: - Que mamãe boa! Tem mais? Como é horrível ver um
filho comer e perguntar: 'Tem mais? Essa palavra tem mais fica oscilando dentro do cérebro de uma mãe que olha
as panelas e não tem mais. Anteontem quando cheguei do palácio que é a cidade os meus filhos vieram me dizer
que haviam encontrado macarrão no lixo. E a comida era pouca, eu fiz um pouco do macarrão com feijão. Achei
bonito a gordura frigindo na panela. Que espetáculo deslumbrante! As crianças sorrindo vendo a comida ferver nas
panelas. Ainda mais quando tem feijão, é um dia de festa para eles. O meu filho João José disse-me: 'Pois é. A
senhora disse que não ia mais comer as coisas do lixo'. Foi a primeira vez que vi a minha palavra falhar... Mas é
assim mesmo... Quando a gente tem pão, a gente come. Quando não tem, a gente chora. Hoje o maior espetáculo
do pobre é comer. A fome é igual um soco no estômago. É amarela... A cor amarela. Antes de comer eu via o céu,
as árvores, as aves, tudo amarelo, depois que comi, tudo normalizou-se aos meus olhos. A tontura da fome é pior
do que a do álcool. A tontura do álcool nos impele a cantar. Mas a da fome nos faz tremer. Percebi que é horrível
ter só ar dentro do estômago. Sou eu quem sustento a casa e muitas vezes deixo de comer para alimentar meus
filhos. Acordo todo dia antes das cinco... Então quando o açougue começou a distribuir os restos da desossa do
boi eu comecei a levantar ainda mais cedo pra garantir meu lugar na fila do osso. No começo tinha menos gente.
Mas hoje a fila dá volta no quarteirão... Tem que chegar bem cedinho. Três vezes na semana vou lá. Não tem para
onde a gente recorrer. Faz tempo que eu não como carne, se não fosse o ossinho... E agora parece que eles vão
começar a cobrar pelo osso... Dona Maria disse que colocaram uma placa nova lá: osso é vendido, não dado.
Parece que vai ser 4 reais o quilo. Tomara que não seja verdade. Ia ser triste e não quero ficar triste... Amanhã é
aniversário de minha filha Vera Eunice. Eu pretendia comprar um par de sapatos para ela. Mas o custo dos
gêneros alimentícios nos impede a realização dos nossos desejos. Atualmente somos escravos do custo de vida.
Então eu achei um par de sapatos no lixo, lavei e remendei para ela calçar. Talvez fiquem um pouco grandes...
Mas ela tá crescendo... Assim ela pode usar por mais tempo.
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IMAGEM 4
(Após o final da fala anterior, os demais intérpretes entram em cena com cestas e carrinhos de supermercado
vazios. Começam a andar pelo espaço como se dentro de um supermercado, com prateleiras e produtos
invisíveis. Em off ouvimos propagandas governamentais do período da ditadura militar que colocam a culpa da
inflação nos próprios alimentos e no povo. Podem ser projeções de vídeos também. Ouvimos ainda dicas
televisivas que gourmetizam a escassez de alimentos. As personagens em cena exclamam em cena como se
estivessem dentro de uma igreja: “Meu Deus!” “Minha Nossa Senhora!” “Jesus amado!” “Virgem Maria!”, etc. A
mesa em cena agora é transformada num balcão, em que as pessoas passam produtos inexistentes e comentam
com a caixa: “Tá caro!” “Muito caro!” “Tudo caro!”. A cena aos poucos vira um musical satírico em que as pessoas
cantam a canção “TÁ OSSO!”).
TÁ OSSO!
Eu entro no supermercado
O dinheiro não dá pra nada
Meu choro não é controlado
Nossa vida tá sendo dizimada!
O culpado é o Bolsonaro
O banqueiro e os ricos empresários
O capitalismo e o livre mercado
Os burgueses e os latifundiários!
Blackout.
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(Ao término da canção, entra a voz de um narrador de futebol. Pode ser feito em cena pelo mesmo intérprete do
garçom. A cena a seguir é uma reescritura de um momento da peça de Plínio Marcos “Quando as Máquinas
Param”. Zé está escutando um jogo do Corinthians pelo rádio. Seu time está perdendo. Anda nervoso de um lado
para outro. Entra Nina. Traz uma sacola na mão. Zé desliga o radio).
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Nina - Mas você não pode achar ruim.
Zé - Eu, me bronquear por futebol? Só quero trabalhar.
(Pausa. Zé entristece)
Zé - Não vai dar pé, Nina.
Nina - O quê?
Zé Essa jogada de eu ser motorista.
Nina - Não sei por quê.
Zé - Falta a grana.
Nina Ora, que grana? O Zelito vai te ensinar.
Zé - Mas pra tirar a carta?
Nina - Minha mãe falou que empresta.
Zé - Não quero esmola. Ainda mais da sua velha.
Nina - Esmola, não. Dinheiro emprestado. Não sei por que você implica tanto com a minha mãe!
Zé - Porque ela sempre me agourou. Acho até que fiquei assim de tanto ela me secar.
Nina - Você acha que minha mãe ia querer a nossa desgraça? A gente não está assim por culpa dela.
Zé - Estamos assim por minha culpa, então?
Nina - Minha é que não é.
Zé - Então é minha?
Nina - Não sei. Da minha mãe não é.
(Pausa)
Zé A culpa é dessa situação do país...
Nina - E minha mãe não tem nada com a ver com isso, ora! Ninguém de nós tem! (Começa a chorar) Por ela a
gente ia sempre bem. Você acha, Zé, que ela quer ver a nossa desgraça? Ela é minha mãe. Você casou comigo,
é que nem filho dela. Ela gosta muito de você. Ela sempre reclama que você não visita ela, nem nada.
Zé - Não chora! Pombas! Eu estava brincando, não precisa se queimar. Vai, Nininha, para de chorar. Por favor!
Nina - Você falou sério.
Zé - Falei brincando
Nina - Jura?
Zé - Juro.
Nina - Então não brinca mais assim, Zé. Você sabe que eu não gosto.
Zé - Não... não brinco. (Pausa) Só que é fogo ter que pedir grana emprestada pra aprender a dirigir, pra depois ir
trabalhar, pra depois ir pagar.
Nina - Que é que tem? Mãe é mãe.
Zé - Eu nem sei se levo jeito pra coisa.
Nina - Qualquer um aprende a dirigir.
Zé - Só que eu não sou qualquer um.
Nina - Você é igual aos outros. Igual aos outros, vírgula. Você é melhor.
Zé - Um cara que precisa da grana da sogra pra aprender uma profissão é o fim da picada.
Nina - Não põe minhoca na cabeça, Zé.
Zé - Mas é isso mesmo. Já pensou minha cara se eu não aprendo a guiar? Se não consigo tirar acarta?
Nina - Mas por que você não há de aprender?
Zé - Por quê? Porque, sei lá. Tá tudo tão difícil...
Nina - Bobagem, Zé. Tudo vai sair certo. (pausa) Você vai aprender?
Zé - Que remédio, né? Vou!
Nina - Posso falar pro Zelito que você topa?
Zé - Pode.
Nina - Sabe de outra coisa legal? Minha mãe falou que, se o Seu Raul quiser a casa mesmo, ela faz um quarto
nos fundos da casa dela pra nós.
(Zé está abatido. Nina nem percebe. Vai tirando mantimentos da sacola e pondo em cima da mesa)
Nina - Olha quanta coisa mamãe deu pra gente.
Zé - Comida?
Nina - Poxa, Zé, ela parece que adivinhou. Nós estávamos bem ruins. Amanhã nem sabia o que ia fazer pro
almoço. Não tínhamos nada. Eu ia sair cedo pra fila do açougue ver se tinha osso, pra pelo menos ter um pouco
de carne, que faz tempo que a gente não come...
Zé - Nina, o que você pensa de mim?
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Nina - O quê?
Zé Você acha que eu vou comer esmola? Morar de esmola? Você acha que eu vou viver de esmola? Eu não sou
aleijado, nem nada. Sou forte. Quero trabalhar. Eu não vou viver de esmola.
Nina - Eu sei! Mas isso não é esmola. Foi minha mãe que deu. É só até a gente dar um jeito na vida.
Zé - Você deve ter chorado as pitangas lá na casa da sua velha. Ela deve ter ficado com uma puta pena da
filhinha dela. Coitada, casada com um vagabundo. A velha ficou com tanta pena que até deu esmola.
Nina - Mamãe só quer ajudar a gente. Ainda mais agora, do jeito que eu tô...
(Pausa longa. Zé parece ter um grande conflito interior. Depois de um tempo longo, vira-se de costas para Nina)
Zé - Nina... Você vai tirar esse filho.
IMAGEM 6
(Ao final da cena podemos ter projeção de vídeo de bois e boiadas indo para o matadouro intercalando-se com
filas de desempregados, fila do osso, imagens que expressam o crescimento da miséria. O som do silêncio é
intercalado por sopros em um berrante. Enquanto isso, um intérprete entra representando um pequeno camponês
que recita o poema a seguir).
BOI DE PIRANHA
(Na sequência entra um intérprete que representa um ricaço/político do agronegócio, interagindo com o público
cantarolando no ritmo de La Habanera, da ópera Carmen, a canção “AGRO É MORTE”).
AGRO É MORTE
O agronegócio
Não é nada tech
Nem mesmo pop
Muito menos tudo
É agro é morte!
Fome e veneno
Desmatamento
Muitas queimadas
No país inteiro
É agro é morte!
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É agromorte!
O agro é morte!
É agro é morte!
É agro é morte!
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(A seguir o intérprete acima fala texto relacionando os cortes da carne e o desossar de um animal aos cortes na
economia que são verdadeiros cortes na carne do trabalhador. Podem ser projetadas imagens de banqueiros e
ministros da economia, chefes de estado em jantares/banquetes de ricos, a burguesia rindo etc. Enquanto isso, o
intérprete desse “açougueiro” vai cortando carne e ossos diante do público. Entre suas falas, o garçom que lê o
jornal A VERDADE interfere. Sua voz diz ao público manchetes que revelam os cortes provocados pelo governo).
Açougueiro - Com as ferramentas corretas não tem segredo nenhum. O animal já vem dividido ao meio. Então pra
desmontar a dianteira ou a traseira é fácil. Vem até com o carimbo do serviço de inspeção federal! Porque aí quer
dizer que o animal foi abatido com toda a segurança.
Voz - Governo corta verbas para ações de saúde e combate à pandemia em 2022, depois de já ter cortado verba
de 72% dos leitos de UTI para covid-19 no pior momento da pandemia.
Açougueiro - Pra começar você precisa da faca bem amolada. Passa a faca perto da fibra da carne e vai puxando.
Toda a carne tem sua divisão. Depois cada divisão tem também sua própria divisão. Primeiro vem a parte mais
bruta: ponta de peito, paleta, costela, miolo, carne de pescoço... Osso do quadril, coluna... Tem que cortar no
nervo e entender a diferença entre tendão e cartilagem.
Voz - Ao sancionar o Orçamento de 2022, presidente promoveu um corte de 3,2 bilhões de reais nas contas do
ano. Entre as áreas afetadas, foram barradas verbas para meio ambiente, assistência social, saúde, direitos
humanos, previdência, educação, desenvolvimento regional e obras públicas.
Açougueiro - Vai levantando e vai puxando com o gancho enquanto passa a faca. Você vai sentindo a mudança de
som da faca durante o corte. Quando você vê, ele tá praticamente solto, dividindo a carne do osso. Quando se
tem experiência, dá pra sentir na faca, não precisa nem fazer muita força.
Voz - Governo corta 87% da verba para Ciência e Tecnologia e Ministério da Saúde corta 290 milhões de reais do
valor destinado a procedimentos do SUS.
Açougueiro - Você precisa contornar o osso, separando da carne. Tem que ter o aproveitamento da carne, então
precisa raspar o máximo possível, pra não ficar nenhum retalho. O osso sai limpinho quando você tem prática!
Também precisa cuidar pra separar a gordura de cada lugar, pra não misturar as partes do animal e não danificar
a peça. Alguns são mais firmes que outros, então se precisar tem que afiar mais a faca.
Voz - Mais da metade do orçamento será para amortizar dívida pública, enquanto teto dos gastos afeta políticas
públicas, prejudicando diretamente classes sociais mais baixas, piorando a qualidade de vida dos trabalhadores e
retrocedendo o quadro de desigualdade social no país.
Açougueiro – Pronto! Carne desossada e destacada é só colocar na vitrine. Tudo uma questão de técnica. Tem um
padrão rigoroso que nós seguimos.
IMAGEM 8
(Entra o som da voz de uma mulher trabalhadora indignada com a situação em que vive o povo. Podem ser
projetadas revoltas populares, grandes manifestações, atos de rua, greves, lutas que são a reação do povo. O
texto a seguir é falado pela intérprete de uma trabalhadora de fábrica a partir do poema de Golondrina Ferreira
“INFORME” como se ela estivesse em uma assembleia de greve).
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Mas é preciso aguentar
Pois uma luva mais forte
Sai muito cara pra empresa?
Precisaremos falar, ainda que incomode
Que os salários aqui são de mil reais por mês
Os aluguéis de quinhentos
E as pessoas têm de um a três filhos?
Terá que ser dito, ainda que não se entenda
Que operamos nove máquinas
Ao mesmo tempo
E uma tela de 32 polegadas pisca em vermelho
À vista de todo o prédio
Quando alguma delas não produziu o suficiente?
Teremos que repetir, ainda que dê raiva
Que nossos bebês com três meses tenham que comer comida
Porque com quatro meses
Voltaremos a trabalhar e precisamos parar de amamentar?
Haveremos de relatar, ainda que canse
Que as luzes são muito fortes para não dormirmos
Que é proibido conversar
Assim como comer, olhar o celular
Ou sair do seu posto de trabalho?
Ainda faltará dizer
Que passamos oito horas olhando pecinhas minúsculas fazendo
O mesmo movimento com as mãos
Dentro de um cubículo de lata de um metro quadrado
Para evitar distrações?
Vai ter que ser dito, ainda que nojento
Que o banheiro também é usado
Para dormir e comer
Porque não há lugar próprio para isso
E dentro da fábrica é proibido mesmo no horário de pausa?
Teremos que dizer, ainda que agonie
Que cheiramos álcool acetona
Respiramos pó de alumínio zinco estanho
Às vezes ficamos tontas mas saímos dar uma volta
E retornamos ao trabalho?
Será preciso mesmo escrever, ainda que atordoe
Que o barulho é de cem decibéis
Quando o permitido é oitenta
Mas não se paga insalubridade
Pois o protetor de ouvido abafa um pouco o som
Será preciso dizer, ainda que assuste
Que quem se acidenta é culpado e demitido
E a ameaça de encarar a fila de 14 milhões de desempregados
E a fome que atinge mais da metade dos lares brasileiros
Nos obriga a esconder os cortes
Então fazemos os próprios curativos
E não contamos pra ninguém?
Mas se faz falta dizer, será dito, mesmo com fome
Que as pausas são de uma hora
A comida é ruim e cara
Não há lugar para descanso
E muitos não param nem esse tempo para conseguir bater a meta
Teremos enfim que gritar, ainda que nos dê vergonha
Que a cada falta nos descontam 20% do salário
Mesmo que seja por doença
E por isso não faltamos
Nem mesmo quando adoecemos?
Diremos, se é necessário, mesmo sendo alarmante
Que depois do trabalho, transporte e do sono recomendado
Sobram três horas de vida útil
De modo que às vezes não vemos os filhos
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E às vezes não dormirmos.
Agora que já não se pode mais
Voltar atrás nas palavras ditas neste poema
É você quem nos diz
A essa altura do relato
E de posse de todas essas informações
O que é mesmo que vamos fazer?
IMAGEM 9
Todos os intérpretes entram em cena representando seus personagens trabalhadores para cantar a canção
“OSSO DURO DE ROER”).
REFRÃO
Se a gente organizar
Nossa classe vai vencer
O futuro nos pertence
Nóis é osso duro de roer!
VOZ 1
Trabalhador, operário
Que tudo faz, tudo produz
Na Babilônia sanguinária
O fim do túnel não tem luz
VOZ 2
Se é tudo nosso
Então por que tanta dor?
Quanto tempo mais
Viver na onda do terror?
VOZ 3
O cidadão é maltratado
Condição: subumano
Desemprego que só cresce
Tamo indo pelo cano
VOZ 4
9
TODOS
VOZ 4
Ideologia coletiva
Não tô sozinho, vou à luta!
Revolucionário
É poder pro povo a toda à custa!
REFRÃO
Se a gente organizar
Nossa classe vai vencer
O futuro nos pertence
Nóis é osso duro de roer!
VOZ 5 falando
E vocês fiquem certos de que não fugimos da luta. É mais fácil saber que tombamos do que dizer que nós
corremos! Nossa luta é por tudo aquilo que pertence à classe trabalhadora! Afinal, pode o povo fugir à miséria
quando no Brasil a maioria das terras está nas mãos de uma minoria de latifundiários e de grandes empresas
agrícolas? Pode o povo ter uma vida digna quando um punhado de bilionários concentra em suas mãos todas as
terras, todas as máquinas, todas as fábricas, todo o dinheiro? Pode o povo ter liberdade enquanto o desemprego
só cresce e precisamos nos submeter a qualquer tipo de trabalho por um salário miserável? Camaradas, é melhor
morrer na luta do que morrer de fome!
REFRÃO
Se a gente organizar
Nossa classe vai vencer
O futuro nos pertence
Nóis é osso duro de roer!
VOZ 1
Trabalhador, operário
Que tudo faz, tudo produz
Na Babilônia sanguinária
O fim do túnel não tem luz
VOZ 2
Se é tudo nosso
Então por que tanta dor?
Quanto tempo mais
Viver na onda do terror?
VOZ 3
O cidadão é maltratado
Condição: subumano
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Desemprego que só cresce
Tamo indo pelo cano
VOZ 4
TODOS
VOZ 4
Ideologia coletiva
Não tô sozinho, vou à luta!
Revolucionário
É poder pro povo a toda à custa!
REFRÃO
Se a gente organizar
Nossa classe vai vencer
O futuro nos pertence
Nóis é osso duro de roer!
FIM
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