Você está na página 1de 5

Narrador: Entra o Guarda e passa a arrumar a posição das cadeiras e mesas, fica

ajeitando uma coisa e outra. Assoviando ou cantando. Em seguida entra o Escrivão,


com sua papelada embaixo do braço.
Narrador: Entra a Juiz.
Narrador: Todos se cumprimentam e senta-se em seus lugares.
Juiz: Guarda pode pedir para que a promotoria entre no recinto.

Guarda: Que entre no recinto a nobre promotoria!

Juiz: Guarda pode pedir que a ré e a defensoria entrem no recinto.

Guarda: Que entre no recinto a ré, acompanhado de sua defesa!

Entra o ré, acompanhado do defensor. Sentam-se em seus lugares.

Juiz: Escrivão, por favor, faça a abertura.

Escrivão levanta-se.

Escrivão: (lendo) Estamos aqui reunidos neste dia, nesta sala de solene, para proceder
o julgamento da ré “Carmosa Verdes”, solteira, profissional liberal, residente e
domiciliada nesta cidade, a qual será julgada pelo seguinte:
“Aos dois dias do mês de fevereiro do ano passado, a ré acima qualificada, agiu com
destempero em suas atitudes cotidianas no seio da sociedade em que vive. Quando
saiu de sua residência, por volta das 07 horas e 30 minutos, a pé, em direção ao seu
trabalho, veio a cometer as seguintes infrações, ao longo de seu trajeto: Danos na
lataria de um veículo automotor; além de espelho retrovisor quebrado; uma cadeira
de bar quebrada e um ventilador destruído; Lesões leves nos membros posteriores em
dois cães de estimação; e arranhões em um latão de lixo. As partes ofendidas, ora
representadas pela figura da nobre promotora, terão a oportunidade de expor seus
argumentos, bem como a parte defensora da ré, para que, após todas as oitivas, nosso
júri, decida a respeito da sua condenação ou não.”

Juiz: Obrigado Escrivã. Por favor, Guarda, Testemunha, de acusação.


Guarda: Sim senhor, que entre a testemunha.

Entra a testemunha de acusação, uma senhora já de idade avançada.

Juiz: A senhora jura dizer a verdade, somente a verdade e nada mais que a verdade?

Testemunha: Juro.

Juiz: (para a promotora) Acusação, a testemunha é sua.

Promotor: (levantando-se e dirigindo-se até a testemunha) Obrigado meritíssimo. Com licença.


(para a testemunha) Qual seu vínculo com a ré em questão?

Testemunha: Sou vizinho dele.

Promotor: Por favor, para auxiliar na decisão dos jurados, conte-nos o que a senhor presenciou
no dia dos fatos aqui apurados.

Testemunha: Bem, eu estava a sentado na frente da minha casa, quando ele passou,
aparentando estar nervoso, resmungando e bufando. Nem me cumprimentou. Daí ele chutou
o latão de lixo do meu vizinho, e passou por cima do carro dele. Até quebrou o espelho
retrovisor do carro. Fiquei abismado e vi que ele seguiu fazendo isso pela frente.

Promotor: Existe alguma loja de eletrodomésticos próxima da sua casa?

Testemunha: Sim, tem sim.

Promotora: E o senhor observou alguma coisa de anormal quando o ré passou por esta loja?

Testemunha: Sim. Ah sim! Ele pegou as cadeiras que estavam pela frente, jogou no chão,
quebrou um ventilador, fez o maior regaço.
Promotor: (para a testemunha) Obrigado! (para a juiz) Sem mais perguntas. (senta-se)

Juiz: Defesa, a testemunha é sua.

Defensor: (para a juíza) Obrigado meritíssimo. (dirige-se até a testemunha) O senhor disse
estava sentado em frente a sua casa, quando ré passou?

Testemunha: Sim, confirmo.

Defensora: Sobre o carro do seu vizinho? Onde ele estava quando a ré passou por cima dele?

Testemunha: Na calçada da casa dele ora. Não dá pra deixar nada na rua, a molecada fica
mexendo, além do mais a calçada é dele, foi ele que fez, ele que pagou, ele que limpa, que
cuida.

Defensora: (enfatizando) Então quer dizer que a calçada é dele?

Testemunha: Sim, sim.

Defensora: E sobre essa loja, próxima da sua casa. A senhora viu a ré entrar na loja e jogar os
objetos no chão? Onde estavam esses objetos?

Testemunha: Não, não! As coisas estavam na frente da loja, onde seu Nico, que é o dono,
sempre coloca, pra gente ver as promoções, as novidades.

Defensora: Só mais uma pergunta. O que a senhora realmente viu sobre o fato da ré com os
cachorros da sua rua?

Testemunha: Bom, eu vi os cachorrinhos gritando.

Defensora: (interrompendo) Não senhora, eu quis dizer o que a senhora viu? E não o que a
senhora ouviu?
Testemunha: Bom ver mesmo eu só os vi correndo pra dentro da casa da comadre Rosa,
assustados os coitadinhos. E gritando muito... (imitando) caimmm, caimmmm, caimmm!!!!

Defensora: Obrigado! Sem mais perguntas! (senta-se)

Juiz: A testemunha está liberada!

Juiz: Vamos ouvir agora a ré.

O guarda conduz a ré até o púlpito para prestar seu depoimento.

Juíza: A senhora jura dizer a verdade, somente a verdade e nada mais que a verdade?

Ré: Juro.

Juíza: Muito bem. Primeiro eu quero que conte a sua versão dos fatos.

Ré: Sim senhora. Sabe doutora, sempre fui uma cidadã cumpridora das minhas obrigações.
Sempre recolhi todos os meus tributos. Respeitei as autoridades. Nunca ultrapassei meus
limites em nada. Todo santo dia, quando saia de casa para meu trabalho, me deparava com
aquele carro estacionado na calçada, daí eu tinha de ir para a rua, dividir o espaço com os
carros e motos que andavam por lá. Quando conseguia voltar para a calçada, encontrava
mesas e cadeiras dos bares, lá tinha eu de ir para a rua de novo. Mais pra frente eram os
produtos das lojas. De tudo um pouco. Lá ia eu para a rua de novo. Mais pra frente vinham
cachorros soltos pra me morder. Tinha de fugir de novo. Isso tudo sem falar das árvores de
copas baixas, bem no meio das calçadas, onde temos praticamente que andar de quatro pra
conseguir passar. Confesso que nesse dia eu acordei com o pé esquerdo. Fiz isso que me
acusaram mesmo. Passei por cima do carro sim. Derrubei as cadeiras e outros objetos do
comércio também. E chutei os cachorros, com dó, porque gosto de cachorros, mas chutei
porque eles vieram me morder.

Juíza: Encaminhando a finalização do nosso trabalho, passo a palavra a nobre Promotora, para
suas considerações finais.
Promotora: Obrigado. Meritíssima Juíza, nobre colega Defensora, caríssimos jurados e demais
pessoas presentes. Estamos diante de um impasse. Ou condenamos esta ré, em função dos
danos por ela causados, ou a absolvemos, por considerar que as circunstâncias a levaram a
fazer isso. Caberá a vocês, cidadãos de bem, decidir. Se vocês consideram que ela errou, que
não devia levar ao extremo a sua conduta, então condenem. Mas se vocês acreditam que é
normal sua atitude, que é aceitável, tolerável, desculpável, então liberem ela desta
responsabilidade. E assim, abram um precedente para que outras pessoas ajam da mesma
forma. Se vocês absolverem essa pessoa não poderão mais questionar quando situações
semelhantes acontecerem, inclusive com vocês. Recomendo, então, que sigam suas
convicções de ordem, organização e convívio social tolerável, ou seja, condenem essa cidadã,
para que isso sirva de exemplo, para que fatos desta natureza não mais ocorram. Do contrário,
podem rasgar e queimar nossas leis, as quais levamos tanto tempo para criar. Obrigado.

Juíza: Com a palavra a defesa.

Defensora: Depois das tão belas palavras de nossa Promotora, me resta então apelar para a
sensibilidade e consciência de cada um dos senhores e senhoras jurados. A promotoria
enfatizou tanto ao longo desse julgamento sobre os erros cometidos pela ré. A qual inclusive
os reconheceu. Porém a acusação não mencionou as situações que a levaram a isso. Onde
está, aqui, o proprietário do carro que estava sobre a calçada? Estacionado em lugar proibido!
E o dono dos cães que perseguiram a ré, onde estão? Cães estes soltos na rua, contrariando
nossas leis. E os comerciantes? Aqueles que estenderam seus estabelecimentos até o meio fio
da rua! A promotoria não falou do risco que esta jovem passava todos os dias, deixando a
calçada e se obrigando a usar a rua, aliás, ela e todos os outros pedestres que utilizam essa via
de acesso, inclusive crianças, idosos e deficientes. Sabemos que um erro não justifica o outro.
Mas, coloquem-se no lugar dela, e, oportunizem outra chance. Para que o exemplo a ser dado
seja estendido também aos infratores que não se fazem presentes aqui neste recinto.
Obrigado.

Juíza: Feitas as considerações da defesa e da acusação. Passaremos agora, aos jurados, a


responsabilidade de decidir sobre esse caso. Escrivã, por favor, oriente os jurados.

Escrivã: Lembro a todos sobre as normas de convivência em sociedade, assim como


recomendo que considerem as leis, direitos e obrigações de cada indivíduo. Os jurados devem
observar as seguintes instruções: Se querem condenar o réu.

Você também pode gostar