Você está na página 1de 286

Qualidade

dos Sedimentos
2a edição
Cristiano Poleto
Gustavo H. Merten

Qualidade
dos Sedimentos
2a edição

2013
© dos autores
2a edição: 2013

Direitos reservados desta edição:


Associação Brasileira de Recursos Hídricos

Capa: Juliane Manz Fagotti


Tradução e Revisão Gramatical: Clarissa Apellaniz Dias
Professora de Idiomas e Comunicação
Editoração Eletrônica: Carlos André O. Campos

Qualidade dos Sedimentos: Revisado e Ampliado / Organizado por Cristiano Poleto


e Gustavo Henrique Merten. Porto Alegre: ABRH, 2013. 397 p.

ISBN 978-85-60308-39-2

I Sedimentologia II Cristiano Poleto


III Gustavo H. Merten

CDU.551.3
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RECURSOS HÍDRICOS

DIRETORIA
Biênio 2012/2013

Presidente
Luiz Gabriel Todt de Azevedo

Vice-Presidente
Jussara Cabral Cruz

Diretoria de Representações Regionais


Dirceu Reis

Diretoria de Publicações
Arisvaldo Mello Júnior

Diretoria de Eventos
Vladimir Caramori de Souza

Diretoria de Comissões Técnicas


Rafael Kelman

ABRH – Associação Brasileira de Recursos Hídricos


Av. Bento Gonçalves, 9500 – Caixa Postal 15029
CEP 91501-970 - Porto Alegre - RS
Fona: (51) 3316-6652 – Fax (51) 3493-2233
Site: www.abrh.org.br - Email: abrh@abrh.org.br
Autores (em ordem alfabética):

Carlos Alberto Ceretta


Engenheiro Agrônomo
Doutor em Ciência do Solo pela UFRGS, Porto Alegre
Universidade Federal de Santa Maria, UFSM
carlosceretta@ufsm.br

Cristiano Poleto
Engenheiro Civil
Doutor em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental pelo
IPH/UFRGS, Porto Alegre
Pós-doutor pela Coventry University, Inglaterra
Universidade Tecnológica Federal do Paraná, UTFPR
poleto@utfpr.edu.br

Danilo Rheinheimer dos Santos


Engenheiro Agrônomo
Doutor em Ciência do Solo pela UFRGS, Porto Alegre
Pós-doutor pelo INRA, França
Universidade Federal de Santa Maria, UFSM
danilo@ccrl.ufsm.br

Deborah Pinheiro Dick


Química
Doutora em Agronomia, Univ. Técnica de Munique (TUM), Alemanha
Pós-doutora pelo Instituto de Espectroquímica e Espectroscopia Aplicada
(ISAS) em Dortmund, Alemanha
Professora Associada do Departamento de Físico-Química, UFRGS
Instituto de Química, UFRGS
deborah.dick@ufrgs.br

Edson Campanhola Bortoluzzi


Engenheiro Agrônomo
Doutor em Ciência do Solo pelo INAPG/INRA, França
Pós-doutor pela Universidade de Poitiers, França
Professor Titular da UPF-FAMV, Universidade de Passo Fundo - Faculdade de Agronomia e
Medicina Veterinária
edsonb@upf.br

Elba Calesso Teixeira


Química
Doutora em Geoquímica pelo Institut National Polytechnique de Lorraine - França
Pós-doutora pela UFRGS, Porto Alegre
Pesquisadora da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luís
Roessler, FEPAM, RS
gerpro.pesquisa@fepam.rs.gov.br

Gilberto Rodrigues Gonçalves


Biólogo
Doutor em Ciências Naturais pela Univ. Técnica de Brauschweig e
Centro de Estudos de Ambientais (UFZ), Alemanha
Universidade Federal de Pernambuco, Centro de Ciências Biológicas
gilberto_rodrigues@ecologia.ufrgs.br
Gustavo Henrique Merten
Engenheiro Agrônomo
Doutor em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental pelo IPH/UFRGS, Porto Alegre
Professor do Programa de Pós-Graduação em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental,
IPH/UFRGS
Visiting Research Professor Depto. of Civil Engineering University of Minnesota, MN, USA
merten@iph.ufrgs.br

Jean Paolo Gomes Minella


Engenheiro Agrônomo
Doutor em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental pelo
IPH/UFRGS, Porto Alegre
Universidade Federal de Santa Maria, UFSM
jminella@gmail.com

João Kaminski
Engenheiro Agrônomo
Doutor em Ciência do Solo pela UFRGS, Porto Alegre
Pós-doutor pela Michigan State University, USA
Universidade Federal de Santa Maria, UFSM
joao.kaminski@gmail.com

Leandro Souza da Silva


Engenheiro Agrônomo
Doutor em Ciência do Solo pela UFRGS, Porto Alegre
Universidade Federal de Santa Maria, UFSM
leandro@smail.ufsm.br

Maria Alice Santanna dos Santos


Bacharel em Química
Doutora em Ciências (Físico-química) pela UFSCar, São Carlos
Pós-doutora pela Universidade de Bath, Inglaterra
Universidade Federal de Santa Maria, UFSM
alice@smail.ufsm.br

Nilvania Aparecida de Mello


Engenheira Agrônoma
Doutora em Ciência do Solo pela UFRGS, Porto Alegre
Pós-doutora pela Université Joseph Fourrier, França
Universidade Tecnológica Federal do Paraná, UTFPR
nilvania@utfpr.edu.br

Rosane Martinazzo
Engenheira Agrônoma
Doutora em Ciência do Solo pela UFRGS, Porto Alegre
Pesquisadora da Embrapa Clima Temperado
rosane.martinazzo@embrapa.br
Apresentação

Os estudos de sedimentos ainda apresentam uma limitada disseminação de


conhecimentos dentro do meio acadêmico brasileiro e, ainda assim, com sua atenção
quase que exclusivamente voltada para os problemas físicos, como o assoreamento
de lagos e rios.
Muitos países apresentam um conhecimento bem consolidado sobre a
relação entre os sedimentos e a qualidade do meio aquático. Muitos estudos têm
apresentado bons resultados sobre a interação entre sedimentos, contaminantes e o
ambiente aquático.
Com o intuito de apresentar e facilitar a compreensão da importância dos
estudos de sedimentos para o gerenciamento ambiental, bem como favorecer
a formação básica de estudantes e profissionais que estejam interessados em
compreender melhor o complexo conjunto que é formado por um sedimento,
apresentamos este livro.
Assim, os capítulos procuram abordar desde como se formam as diferentes
matrizes de sedimentos, e como isso se refletirá em sua capacidade de armazenar e
liberar poluentes, até apresentar abordagens sobre como analisar e compreender os
dados resultantes desses estudos.
Mas, para se chegar aos resultados finais de estudos sobre a qualidade dos
sedimentos, muitos procedimentos devem ser adotados para se evitar que sejam
gerados dados falsos ou não-confiáveis. Esses procedimentos têm seu início na
delineação do novo projeto, passam pela escolha dos métodos de amostragem dos
sedimentos em suspensão e têm um enfoque especial sobre os cuidados necessários
para que as amostras não sejam contaminadas.
Esperamos que, ao final desse livro, possamos ter atingido nosso objetivo,
que é despertar o interesse sobre os estudos voltados para a sedimentologia.
Desejamos a todos uma boa leitura.

Prof. Dr. Cristiano Poleto


Sumário

Capítulo 1 17
Rede de monitoramento e coleta de amostras.................................................. 19
1.1 | Introdução.................................................................................................. 19
1.2 | Objetivos do monitoramento...................................................................... 21
1.3 | Escolha e instalações de uma rede de monitoramento............................. 21
1.4 | Amostragem de sedimentos em suspensão.............................................. 26
1.4.1 Método igual incremento de largura (iil)................................................ 29
1.4.2 Método igual incremento de descarga (iid)........................................... 32
1.5 | Cálculo do fluxo de elementos químicos associados aos sedimentos ..... 35
1.6 | Frequência de amostragem....................................................................... 36
1.7 | Escolha dos equipamentos........................................................................ 39
1.8 | Cuidados com a preservação de amostras................................................ 42
1.9 | Aspectos de segurança.............................................................................. 44
1.10 | Referências bibliográficas ....................................................................... 45

Capítulo 2 47
Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo
como fonte de sedimentos.................................................................................. 49
2.1 | Função ecológica do solo.......................................................................... 49
2.2 | Gênese, processos e classes de solos...................................................... 50
2.2.1 Fatores de formação ........................................................................... 50
2.2.2 Processos de formação ....................................................................... 58
2.2.3 Principais classes de solo .................................................................... 60
2.3 | Atributos da fração mineral do solo e qualidade de sedimentos................ 63
2.3.1 Textura e estrutura................................................................................ 63
2.3.2 Mineralogia ......................................................................................... 65
2.3.2.1 Minerais não silicatados................................................................ 65
2.3.2.2 Minerais silicatados....................................................................... 67
2.3.3 Origem das cargas dos argilominerais................................................. 69
2.3.4 Principais argilominerais....................................................................... 70
2.3.5 Reações químicas no solo.................................................................... 71
2.3.6 Modelos de distribuição de cargas....................................................... 73
2.3.7 Ponto de carga zero (pcz)..................................................................... 74
2.3.8 Processos de oxi-redução ................................................................... 74
2.4 | Considerações finais ................................................................................. 76
2.5 | Bibliografia citada e consultada................................................................. 76
Capítulo 3 79
Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza
mineralógica das partículas................................................................................ 81
3.1 | Introdução ................................................................................................. 81
3.2 | Principais métodos de estudo de partículas ............................................. 82
3.2.1 Pré-tratamento de amostras................................................................. 82
3.2.1.1 Eliminação da matéria orgânica.................................................... 83
3.2.1.2 Eliminação de fe e al livres............................................................ 83
3.2.1.3 Dispersão das amostras ............................................................... 84
3.2.2 Métodos para determinar a distribuição do tamanho de partículas ..... 85
3.2.2.1 Métodos clássicos......................................................................... 85
3.2.2.2 Métodos instrumentais................................................................... 93
3.2.3 Principais métodos para determinar a natureza das partículas ......... 102
3.2.3.1 Área superficial específica – ase................................................. 102
3.2.3.2 Difração de raios-x....................................................................... 108
3.3 | Considerações finais.................................................................................114
3.4 | Referências bibliográficas.........................................................................116

Capítulo 4 121
Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos,
composição e reações....................................................................................... 123
4.1 | Introdução: definição, formação e composição da matéria orgânica....... 123
4.1.1 Definição............................................................................................. 123
4.1.2 Formação............................................................................................ 125
4.1.3 Composição química ......................................................................... 126
4.2 | Fracionamento da matéria orgânica: métodos, distribuição e composição das
frações............................................................................................................. 130
4.2.1 Fracionamento e isolamento de moa ................................................. 130
4.2.2 Fracionamento químico da mo .......................................................... 133
4.2.3 Fracionamento físico da mo ............................................................... 136
4.3 | Reações da matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos....... 137
4.3.1 Reações com íons e minerais ............................................................ 138
4.3.2 Reações com moléculas orgânicas ................................................... 141
4.4 Referências bibliográficas.......................................................................... 142

Capítulo 5 147
Poluentes orgânicos e inorgânicos.................................................................. 149
5.1 | Introdução................................................................................................ 149
5.2 | Poluentes inorgânicos.............................................................................. 149
5.3 | Poluentes orgânicos................................................................................. 156
5.3.1 Substâncias orgânicas naturais: origem e constituição...................... 156
5.3.2 Substâncias orgânicas sintéticas: principais compostos e características .159
5.4 | Interação dos poluentes com os sedimentos........................................... 162
5.4.1 Reatividade dos sedimentos............................................................... 162
5.4.2 Interação entre elementos químicos ou moléculas em solução com os
grupos funcionais de superfície dos sedimentos......................................... 166
5.4.3 Modelos químicos para a distribuição dos poluentes na água e nos
sedimentos................................................................................................... 172
5.4.3.1 Modelos matemáticos empíricos ao equilíbrio químico instantâneo.173
5.4.3.2 Modelos matemáticos mecanísticos ao equilíbrio químico instantâneo..175
5.4.3.3 Modelos matemáticos cinéticos................................................... 177
5.4 | Referências bibliográficas........................................................................ 179

Capítulo 6 183
Qualidade das amostras e valores de referência............................................ 185
6.1 | Introdução................................................................................................ 185
6.2 | Protocolo de controle para estudos de qualidade.................................... 185
6.3 | Cuidados nos procedimentos e conservação das amostras.................... 186
6.4 | Amostras em “branco” para controle........................................................ 188
6.5 | Amostras de background ou de base....................................................... 188
6.6 | Material de referência padrão ou certificado............................................ 189
6.7 | Guidelines ou valores de referência......................................................... 191
6.8 | Análises ecotoxicológicas........................................................................ 196
6.8.1 Tipos de testes de toxicidade.................................................................. 197
6.8.2 Testes de toxicidade aguda................................................................ 198
6.8.3 Testes de toxicidade crônica............................................................... 200
6.8.4 Testes de toxicidade para multiespécies............................................ 201
6.8.5 Perspectivas gerais............................................................................. 202
6.9 | Exposição humana a sedimentos contaminados..................................... 203
6.10 Riscos à saúde humana........................................................................... 204
6.11 Referências bibliográficas........................................................................ 206

Capítulo 7 211
Processamento de amostras e extrações sequenciais.................................. 213
7.1 | Introdução................................................................................................ 213
7.2 | Processamento de amostras de sedimentos após a coleta..................... 213
7.3 Métodos de extração sequencial............................................................... 219
7.3.1 Protocolo desenvolvido por tessier..................................................... 220
7.3.2 Protocolo desenvolvido pela união européia...................................... 224
7.3.3 Vantagens e limitações das extrações sequenciais............................ 227
7.2 | Aplicabilidade ao gerenciamento ambiental............................................. 228
7.3 | Estudo de caso........................................................................................ 230
7.4 | Referências bibliográficas........................................................................ 232
Capítulo 8 235
Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos.................................... 237
8.1 | Introdução................................................................................................ 237
8.2 | Influência do sedimento em diferentes níveis de organização ecológica:
organismo, população, comunidade e ecossistema........................................ 241
8.3 | Qualidade do sedimento e os indicadores biológicos.............................. 244
8.4 | Leitura de eventos pretéritos e atuais em ecossistemas aquáticos......... 247
8.4 | Sedimento e a restauração ecológica...................................................... 247
8.6 | Referências bibliográficas........................................................................ 251

Capítulo 9 257
Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem
dos processos de emissão de sedimentos em bacias hidrográficas........... 259
9.1 | Introdução................................................................................................ 259
9.2 | Processos de ligação entre os ecossitemas terrestres e aquáticos........ 260
9.3 | Interações entre sedimentos, contaminantes e elementos traçadores.... 262
9.3.1 Composição dos sedimentos em ambientes tropicais e propriedades
conservativas dos elementos traçadores..................................................... 263
9.3.2 Mecanismos de sorção entre sedimentos e contaminantes ou elementos
traçadores.................................................................................................... 264
9.3.3 Características do meio aquoso que afetam a relação sedimentos e
poluentes ou elementos traçadores............................................................. 265
9.4 | Identificação de fontes de sedimentos..................................................... 270
9.4.1 Histórico.............................................................................................. 270
9.4.2 Exemplo de aplicação da técnica de identificação de fontes de
sedimentos................................................................................................... 274
9.4.2.1 Características da bacia.............................................................. 274
9.4.2.2 Coleta das amostras das fontes de sedimentos e dos sedimentos em
suspensão............................................................................................... 276
9.4.2.3 Caracterização física e química das amostras............................ 277
9.4.2.4 Discriminação das fontes de sedimentos.................................... 277
9.4.2.5 Classificação das amostras de sedimentos em suspensão........ 280
9.5 | Consideração final................................................................................... 282
9.6 | Referências bibliográficas........................................................................ 282
Rede de Monitoramento
e Coleta de Amostras
Capítulo 1

REDE DE MONITORAMENTO E COLETA DE AMOSTRAS


Gustavo H. Merten & Cristiano Poleto

1.1 | INTRODUÇÃO
Tradicionalmente, a preocupação com sedimentos fluviais nos ecossistemas
aquáticos tem sido abordada mais como um problema físico relacionado com os
processos deposicionais, como por exemplo, o assoreamento de reservatórios, e com
as questões de estabilidade da calha fluvial (Vanoni, 1975). Mais recentemente, tem
sido reconhecido que os sedimentos atuam também como vetores que transferem
nutrientes e poluentes dos ecossistemas terrestres para os ecossistemas aquáticos
(Horowitz, 1991). Uma vez presentes no ecossistema aquático, os sedimentos
passam a ter um papel importante para a biota através do fornecimento de nutrientes
e energia sendo que esse assunto será tratado no Capítulo 8. Além disso, os
sedimentos também cumprem uma função na regulação da qualidade da água por
sua capacidade de reter e liberar poluentes como fósforo e metais (Golterman et
al., 1983; Forstner, 2004). Neste contexto, a quantificação do fluxo de nutrientes e
poluentes transportados pelos sedimentos em suspensão nos rios passa a ter um
papel importante nas questões relacionadas com a gestão dos recursos hídricos.
Nutrientes e alguns poluentes como metais pesados presentes na água, por
exemplo, encontram-se presentes tanto na fase sólida como na fase dissolvida. Por
definição a fase dissolvida é considerada aquela obtida a partir da filtração da água
através de filtros com porosidade de 0.45 μm. No caso de metais e alguns nutrientes,
por exemplo, a fase sólida normalmente apresenta uma contribuição maior em termos
percentuais desses elementos químicos conforme pode ser verificado através da
Figura 1.1. Estudos realizados para a bacia do rio Mississippi nos Estados Unidos
mostraram que 75% do fósforo, 50% do carbono e 30% do nitrogênio se encontram
ligados aos sedimentos (Horowitz, 2013).
Tradicionalmente a determinação na água da fase dissolvida e particulada de
um elemento químico é realizada a partir da coleta de uma amostra que é sub-dividida
em duas onde em uma sub-amostra a análise química é realizada sobre o material
filtrado (filtro 0.45 μm de porosidade) – fase dissolvida enquanto que na segunda
sub-amostra a análise química é realizada em toda a amostra – fase dissolvida +
particulada. Nessa condição, a fase particulada (ligada aos sedimentos) é obtida
através da diferença entre a concentração total do elemento químico (dissolvido +
particulado) menos a concentração do elemento químico na fase dissolvida (de Vries
& Klaver, 1994). Pelo fato do volume de água amostrada ser muito pequeno (< 1

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 19


L) as amostras coletadas contém uma concentração muito pequena de sedimentos
(ordem de mg). Essa condição pode influir negativamente na determinação analítica
onde muitas vezes a concentração de um elemento químico determinado na fase
filtrada é maior que aquela determinada na amostra não filtrada. Segundo Horowitz
(2013), essa condição pode ocorrer por erros na determinação analítica ou pela falta
de homogeneidade da amostra especialmente quando essa contém sedimentos
composto por uma mistura de grãos do tamanho variando entre silte e areia (63
a 2000 μm). Para solucionar esse problema uma alternativa seria a realização de
amostragens de um grande volume de água para que, posteriormente, os sedimentos
sejam separados da água através de processos de filtração ou centrifugação (Ongley
& Blachford, 1982) [ver Capítulo 7 item 7.2].

Cu [04]
[05]
Pb [04]
[05]
Zn [04]
[05]
Cd [04]
[05]
Elementos Químicos

Cr [04]
[05]
Ni [04]
[05]
Ba [04]
[05]
Fe [04]
[05]
Mn [04]
[05]
Al [04]
[05]
Tot. P [04]
[05]
Tot. N [04]
[05]
0 20 40 60 80 100
Contribuição (%)
Sedimentos Dissolvidos

Figura 1.1 – Contribuição de alguns elementos químicos na fase sólida e dissolvida da água
verificada em um rio urbano na cidade de Atlanta nos Estados Unidos para os
anos de 2004 (04) e 2005 (05).
Fonte: Horowitz (2008)

Independentemente do procedimento para processar a amostra de água para


analisar a presença de elemento químico nos sedimentos, é necessário considerar
que diferentemente da fase dissolvida (que se encontra uniformemente distribuída
em uma seção transversal de um rio), a fase sólida dos elementos químicos presente

20 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


nos sedimentos não se encontram uniformemente distribuídos na seção transversal
de um rio.
Os sedimentos quando transportado através da calha fluvial apresentam
uma distribuição não uniforme tanto em relação à seção transversal como em
profundidade.
De uma maneira geral, a concentração de sedimentos em suspensão (CSS)
é maior no centro da seção transversal e próximo ao leito. Fatores relacionados
com o tamanho dos sedimentos e da velocidade da água explicam essa condição
(Edwards & Glysson, 1999). Quando o fluxo de sedimentos é composto por partículas
de granulometria tamanho areia a CSS torna-se gradualmente distribuída na seção,
ou seja, maior no centro e próximo ao leito e menor na superfície e próximo as
margens. Por outro lado, quando no fluxo de sedimentos ocorre a predominância de
partículas equivalentes ao tamanho silte e argila (< 63 μm) a distribuição da CSS é
muito mais uniforme tanto ao longo da seção transversal como em profundidade. O
fato da CSS não se encontrar uniformemente distribuída na seção transversal de um
rio implica que a amostragem da mistura da água e sedimentos para fins de análise
química deve requerer cuidados especiais. Esses cuidados devem ser não apenas
para evitar a contaminação da amostra, mas para que a amostra da mistura de água
e sedimentos quando coletada seja representativa da seção de um rio.

1.2 | OBJETIVOS DO MONITORAMENTO


A elaboração de um projeto de monitoramento visando estudos de geoquímica
de sedimentos depende, fundamentalmente, dos objetivos propostos nesse projeto.
Assim, um projeto pode ter diferentes objetivos, tais como:
a) Identificação dos elementos poluentes que estão sendo transportados
pelos sedimentos;
b) Determinação do fluxo de poluentes;
c) Conhecimento do padrão de variação espaço temporal dos poluentes;
d) Avaliação das implicações da carga poluente na qualidade da água e
na biota aquática.
No caso dos propósitos a, b e c, é necessário o estabelecimento de uma
rede de monitoramento que permita avaliar tanto as variáveis hidrológicas (vazão)
relacionadas com o fluxo de sedimentos como também a caracterização geoquímica
dos sedimentos através da sua amostragem e posterior análise em laboratório.

1.3 | ESCOLHA E INSTALAÇÕES DE UMA REDE DE MONITORAMENTO


Uma vez definido o número e a distribuição espacial das estações de
monitoramento, o próximo passo consiste na instalação das seções de monitoramento.
Uma estação de monitoramento poderá ser implantada através da construção
de uma estrutura hidráulica destinada à medição das vazões como um vertedor ou

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 21


uma calha (Figura 1.2), ou poderá ser instalada diretamente na seção de um rio.
Normalmente, as estruturas hidráulicas são implantadas em cursos de água de pouca
largura e não necessitam elaboração de uma curva-chave [equação de regressão
entre os níveis do escoamento e as vazões medidas na seção de monitoramento
(Figura 1.7)]. Por outro lado, as estruturas hidráulicas são obras caras que nem
sempre estão ao alcance dos orçamentos dos projetos de monitoramento. Assim,
de uma maneira geral, normalmente as estações de monitoramento são implantadas
sobre uma seção natural de um arroio ou rio (Figura 1.3).

1 2

3 4

Figura 1.2 – Foto de estruturas hidráulicas para medição de vazão: (1) vertedor de grande
porte; (2) vertedor de médio porte; (3) calha Parshall; e, (4) calha e vertedor de
pequeno para avaliação de escoamento em bacias sem a presença de um canal
fluvial (bacias de ordem zero).
Foto: Merten (2010)

Na escolha dos locais de instalação de uma seção de monitoramento, devem


ser levados em consideração alguns requisitos básicos, como:
a) Escolher um trecho do rio que seja o mais retilíneo possível, onde as
margens sejam suficientemente altas para acomodar o escoamento,
estáveis, ou seja, não seja suscetível a erosão e tenha uma seção o mais
uniforme possível;
b) Haver uma seção controle de jusante (condição criada no escoamento
que condiciona um regime crítico, e com isso possibilita uma relação
estável de cota e vazão), como quedas, corredeiras e cachoeiras;
c) Facilitar o acesso a esta seção, especialmente durante os períodos

22 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


chuvosos;
d) Escolher uma seção próxima a uma residência para evitar depredação
de equipamentos;
e) Evitar locais com efeito de remanso, como proximidade da foz de rios e
oceanos;
f) Evitar seções logo à jusante de confluência de rios;
g) Em casos de bacias de ordem zero (muito utilizadas em estudos
agronômicos de erosão) a instalação de uma estrutura hidráulica de
medição de vazão (Figura 1.2, número 4) pode ser realizada no talvegue
da junção entre duas encostas.

Figura 1.3 – Foto de uma seção de monitoramento instalada sobre uma seção natural de um
rio.
Foto: Merten (2004)

Na realidade, é muito difícil encontrar um local que atenda todas as


características desejáveis; porém, sempre que possível, deve ser buscado uma
situação o mais próximo da ideal.
Um aspecto importante que deve ser considerado, quando da instalação
de uma seção de monitoramento, é que as medições de maior importância para
determinações, tanto de quantidade como de qualidade dos sedimentos nos rios, são
aquelas realizadas durante as cheias, uma vez que quase 90% do fluxo de sedimentos/
nutrientes e poluentes são transportados durante este período (Figura 1.4).
Condições de operação em uma seção durante uma cheia implicam que a
velocidade da água é bastante elevada, o que aumenta os riscos com a segurança
dos técnicos que estão medindo, seja de forma embarcada ou especialmente se as
medições estiverem sendo feitas a vau (aquelas em que o operador realiza medições

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 23


dentro do rio sem uso de embarcações). Nestas condições, as medições através
de pontes são uma boa alternativa, desde que as estruturas da ponte (pilares) não
alterem significativamente a hidrodinâmica do escoamento e, com isso, prejudiquem
as medições de vazão (Q) e CSS (Figura 1.5).

SSC [04]
[05]
Cu [04]
[05]
Pb [04]
[05]
Zn [04]
[05]
Cd [04]
Elementos Químicos

[05]
Cr [04]
[05]
Ni [04]
[05]
Ba [04]
[05]
Fe [04]
[05]
Mn [04]
[05]
Al [04]
[05]
Tot. P [04]
[05]
Tot. N [04]
[05]
0 20 40 60 80 100

Contribuição (%)
Cheia Fluxo de Base

Figura 1.4 – Gráfico ilustrativo da contribuição de elementos químicos adsorvidos aos


sedimentos quando amostrados durante cheias e na condição de águas baixas
(fluxo de base) para um rio urbano na cidade de Atlanta nos Estados Unidos.
Fonte: Horowitz (2008)

Escolhidas as seções de monitoramento, a próxima fase compreende a


instalação do posto sedimentométrico. No posto sedimentométrico devem ser
realizadas avaliações de Q, CSS e coleta de sedimentos em quantidade suficiente
para a realização das análises geoquímicas. Essas medições e coletas devem ser
realizadas sempre na mesma seção(s) previamente escolhida(s) durante a fase de
implantação do projeto.
Para o monitoramento das Q, utilizam-se as leituras diárias de um
conjunto de réguas linimétricas e/ou um linígrafo (equipamento que registra as

24 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


variações do nível de água no tempo) (Figura 1.6).

Figura 1.5 – Foto de uma seção de monitoramento instalada sobre uma ponte.
Foto: Merten (2007)

(1) (2)

Sensor de nível
ultrassom

Régua de
leitura de nível
Mangueira de amostragem
de sedimentos por uso de
equipamento tipo ISCO

Figura 1.6 – Foto ilustrando uma régua linimétrica e um cano onde se encontra um sensor de
nível para instalações em rios (1) e sensor de ultrassom e régua de nível instalada
em calha para avaliações em bacias de ordem zero sem cana fluvial (2).
Foto: Merten (2009)

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 25


Com base nas leituras dos níveis do escoamento e através de uma curva-
chave (Figura 1.7), é possível converter a cota medida na régua linimétrica ou no
linígrafo em Q.
O local de instalação, tanto das réguas linimétricas como do linígrafo, deve se
localizar à montante, porém próximo da seção de medição. É importante que junto à
seção de monitoramento seja instalado marcos com referência de nível, no caso de
ocorrer uma situação onde as réguas ou linígrafo sejam removidas por uma enchente.
Com a presença de um marco é possível recolocar o conjunto de réguas e linígrafo
na mesma posição onde estas se encontravam. Neste capítulo não serão discutidos
detalhes de instalação de réguas e linígrafos; essas informações devem ser buscadas
em manuais específicos para esse fim como DNAEE (1977) e OWDC (1982).

480
460
440
420
400
380
360
Cota (cm)

340
320
300
280
260
240
220
200
180
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32 34 36 38 40 42 44 46 48 50 52 54 56 58 60

Vazão (m³/s)
Figura 1.7 – Exemplo de uma curva-chave de vazão onde a partir da cota (altura do nível de
água) se estabelece uma relação com a vazão.

1.4 | AMOSTRAGEM DE SEDIMENTOS EM SUSPENSÃO


A técnica de amostragem dos sedimentos em suspensão a ser utilizada durante
os estudos de qualidade de sedimentos poderá variar de acordo com a disponibilidade
de equipamentos e/ou objetivos a serem atingidos. Quando o propósito da pesquisa
é o de apenas caracterizar a geoquímica dos sedimentos, como no caso do uso da
técnica de identificação de fontes de sedimentos como Fingerprinting [ver Capítulo
9 item 9.4; (Minella et al., 2008)], por exemplo, existem diferentes possibilidades

26 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


de amostragem de sedimentos em suspensão: como amostrador do tipo torpedo
(Figura 1.8); amostrador automático tipo ISCO (Figura 1.9). Importante observar que
esses equipamentos sejam construídos de materiais que não contaminem a amostra
coletada, conforme descrição que consta no item 1.6 e Tabela 1.5.
Por outro lado, quando o propósito da pesquisa é o de estimar o fluxo do
elemento químico particulado ou dissolvido (massa tempo-1) ou fluxo total (massa) é
necessária à utilização de amostradores do tipo isocinéticos combinados com uso de
técnicas especiais de amostragem (Figura 1.15).

Figura 1.8 – Foto de um amostrador do tipo torpedo para acumular sedimentos adaptado de
tubo de PVC. Fonte: Minella (2012)

A técnica utilizada para a amostragem da mistura de água e sedimentos


deve possibilitar que a amostra coletada seja capaz de representar a variabilidade
espacial do fluxo de sedimentos na seção transversal (considerando uma variação
natural da CSS em profundidade e ao longo da seção). De uma maneira geral,
conforme já comentado, o fluxo de sedimentos em suspensão é maior próximo do
centro de uma seção transversal e menor próximo às margens e na superfície. Para
que a amostragem leve em consideração essa variabilidade que ocorre naturalmente
na seção transversal de um rio, a coleta da mistura de água e sedimentos deve
ser realizada em várias verticais e de forma a integrar o perfil vertical da seção.

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 27


Além disso, é necessário que a amostragem seja realizada de forma isocinética, ou
seja, o equipamento utilizado deve ser capaz de coletar uma amostra da mistura
água e sedimentos sem alterar em módulo e direção a velocidade do escoamento no
momento da coleta (Edwards & Glysson, 1999). Essa condição é importante quando
na mistura de água e sedimentos contém partículas do tamanho areia misturada
com silte. Nessa condição, uma amostragem sem uso do equipamento isocinético
implicará em determinação errada da CSS o que, consequentemente, implicará em
erros na estimativa do fluxo de sedimentos/elementos químicos.

Figura 1.9 – Foto de um amostrador do tipo automático ISCO adaptado para amostragem de um
volume suficiente de água para possibilitar a análise geoquímica dos sedimentos.
Foto: Merten (2010)

No caso da utilização de equipamentos automáticos de coleta, como o


ISCO (Figura 1.9), também é necessário observar alguns aspectos de uso desse
equipamento que realiza amostragens pontuais e não isocinética. Trabalho realizado
por Gettel et al. (2011) mostra que o dispositivo de coleta de amostra da mistura de
água e sedimentos do ISCO (tubo coletor) pode gerar erros da CSS em até 7.000%.
Algumas adaptações possíveis de serem realizadas no sistema de coleta desses
amostradores podem atenuar esses erros, porém não resolve o problema da condição
de amostragem não isocinética e da amostragem pontual na seção transversal.
Para resolver o problema da amostragem pontual e não isocinética, é
necessário que seja realizado um procedimento para corrigir os valores de CSS
quando da utilização desse amostrador. Para isso, é necessário se estabelecer
uma correlação entre a CSS obtida com uso do ISCO vs CSS determinada por
procedimentos padrões com uso de amostradores isocinéticos (Figura 1.10).
Existem duas técnicas de amostragem que são utilizadas para determinar
a CCS em rios de maneira manual levando-se em consideração a variabilidade
espacial da CSS na seção transversal de um rio (Carvalho, 1994; Edwards &
Glysson, 1999; Carvalho et al., 2000; WMO, 2008). A primeira é denominada Igual
Incremento de Largura (IIL) onde uma seção transversal de um rio é dividida em

28 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


semi-seções espaçadas igualmente entre si. O segundo método é denominado de
Igual Incremento de Descarga (IID) onde a seção transversal de um rio é dividida
em semi-seções de igual vazão. Em ambos os casos a amostragem de sedimentos
deverá ocorrer no centro de cada semi-seção.

amostrador automático pontual

amostragem manual em toda seção

amostragem
manual

amostragem pontual

Figura 1.10 – Desenho ilustrativo da condição de amostragem pontual realizada com um


equipamento do tipo ISCO e a relação matemática de correção da CSS determinada
através de amostragens manuais com uso de equipamentos isocinéticos.
onte: Merten (2008)

1.4.1 Método Igual Incremento de Largura (IIL)

O princípio básico do método IIL baseia-se na divisão de uma seção


transversal de um rio em semi-seções igualmente espaçados, sendo a amostragem
realizada em uma vertical, localizada na posição central de cada segmento, conforme
mostra a Figura 1.11.
É recomendado, conforme o Guia de Práticas Sedimentométricas (Carvalho et
al., 2000), que as amostragens de sedimentos sejam realizadas em um mínimo de dez
e no máximo vinte verticais. No exemplo da Figura 1.11, uma seção transversal com
20 m de largura foi dividida em 10 semi-seções espaçadas a 2 m. Nessa condição,
as amostragens da mistura de água e sedimentos devem ser realizadas no centro de
cada meia-seção, conforme ilustrado na Figura 1.11. A determinação da velocidade do
escoamento (necessária para determinação da velocidade de trânsito) é realizada nas
verticais que delimitam as semi-seções (nove verticais espaçadas a 2 m uma da outra,
ou seja, nas verticais posicionadas a 2, 4, 6, 8, 10, 12, 14, 16, 18 m do PI).

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 29


Distância (m)

Profundidade (m)

Figura 1.11 – Desenho esquemático da aplicação do método IIL na seção transversal de um rio.
(PI refere-se ao ponto inicial de medição).
Fonte: Merten (2008)

A coleta da mistura de água e sedimentos deve ser realizada com amostradores


apropriados (Figura 1.15) que deverão percorrer um trajeto vertical da superfície da
água até bem próximo ao leito, no entanto, sem encostar-se nesse leito (5 a 10 cm
afastado do leito para evitar suspensão de sedimentos e com isso alterar a CSS do
escoamento) e novamente voltar à superfície. Esse trajeto deve ser percorrido em
velocidade constante (velocidade de trânsito) tanto na descida como na subida.
A razão ou velocidade de trânsito (velocidade com o qual o equipamento deve
percorrer a vertical de amostragem sem alterar as condições isocinéticas de coleta)
dependente de vários fatores, como tamanho do bocal utilizado no equipamento
de amostragem, volume da amostra a ser coletada, velocidade do escoamento e
profundidade amostrada (Wilde & Radke, 1998). Uma maneira simplificada para estimar
a razão, ou velocidade de trânsito, tem sido proposta por Carvalho (1994). Segundo
esse Autor, a razão ou velocidade de trânsito pode ser calculada pelo produto entre a
velocidade do escoamento na vertical amostrada (velocidade determinada pela média
entre as verticais adjacentes que formam uma semi-seção) vezes uma constante de
proporcionalidade “K” que varia conforme o tamanho do bocal utilizado no amostrador
isocinético (Equação 1.1). Três tipos de bocais (1/4”, 3/16” e 1/8”) são utilizados nos
amostradores isocinéticos. Os bocais 1/4” e 3/16” normalmente são utilizados quando
a velocidade do escoamento encontra-se baixa ou média (<1 m.s-1). Já o bocal 1/8” é
mais utilizado para maiores velocidades do escoamento (ou maiores profundidades).

Vt = Ve * K (Equação 1.1)

Onde: Vt é a razão ou velocidade de trânsito (m.s-1), Ve é a velocidade do escoamento


(m.s-1) e “K” a constante de proporcionalidade. Para bocais de 1/4” e 3/16” é
recomendado utilizar um coeficiente “K” com um valor de 0,4 enquanto que para o
bocal 1/8” o valor “K” é de 0,2.

30 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


Para uma amostragem de sedimentos, entretanto, a informação que é
utilizada pelo operador do equipamento não é a Vt mas sim o tempo de percurso
de ida e volta do amostrador da superfície até próximo ao leito. Assim, o cálculo
do tempo de amostragem para garantir que o equipamento esteja amostrando de
maneira isocinética deve ser calculado conforme a Equação 1.2.

2p
t = (Equação 1.2)
Vt

Onde: t representa o tempo de amostragem para realização dentro dos padrões


isocinéticos e p é a profundidade da vertical de amostragem (m).

No método IIL, a Vt deve ser uma só para todas verticais de amostragem


sendo essa calculada a partir da escolha da vertical de amostragem (verticais
localizadas no centro de cada meia-seção) cujo produto da profundidade pela
velocidade média da meia-seção (média entre as verticais que delimitam uma meia-
seção) seja a maior entre todas as verticais de amostragem. Para as demais verticais
de amostragem, utiliza-se sempre a mesma Vt, onde deve se calculado o tempo de
amostragem em função das diferentes profundidades de amostragem. As amostras
coletadas nas diferentes verticais (normalmente com um volume que varia entre 400
a 1000 mL) poderão ser analisadas separadamente, ou então colocadas todas em
um mesmo recipiente, como um balde fracionador, conforme mostra a Figura 1.12.
Um balde fracionador é um recipiente com uma torneira (construído com material
não contaminante) cujo interior contém um sistema de agitação da amostra para
possibilitar a homogeneização da amostra durante o fracionamento das sub-amostras.

Figura 1.12 – Fotografia de um balde fracionador utilizado para armazenar a mistura de água
e sedimentos coletada no rio e posterior fracionamento de sub-amostras para
análises de SSC e química.
Foto: Merten (2010)

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 31


Em se tratando de análise química, é preferido que as amostras coletadas em
cada vertical fossem agrupadas em uma só amostra, formando uma amostra composta
e, assim, fornecer material suficiente para análises químicas e/ou granulométricas.
Na Tabela 1.1, são apresentados alguns valores mínimos de amostras de sedimentos
em suspensão necessários para avaliações físico-químicas.

Tabela 1.1 – Quantidade requerida de sedimentos em suspensão para vários tipos de


análises
Tipo de análise Tamanho (mm) Quantidade mínima (g)
Difratometria Laser 0,00004 - 2,5 0,5
Peneiramento 0,062 - 0,5 0,07
Peneiramento 0,25 - 2,0 0,5
Peneiramento 1,0 - 16 20
Pipetagem 0,002 - 0,062 1,8
Química 0,002 1
Química 0,002 - 0,062 2
Química 0,062 - 2,0 10
Mineralógica 0,002 1
Mineralógica 0,002 - 0,062 2
Mineralógica 0,062 - 2,0 5

Adaptado de: Edwards & Glysson (1999)

1.4.2 Método Igual incremento de Descarga (IID)

Diferentemente do método IIL, o método IID condiciona as medições através


da divisão de uma seção transversal em semi-seções de igual incremento de vazão.
Em cada semi-seção é coletada uma amostra na vertical localizada no centro dessas
(Figura 1.13). Para esse método, recomenda-se a utilização de um mínimo de quatro
e um máximo de nove verticais (Edwards & Glysson, 1999). Assume-se, então, que
a média da CSS determinada a partir da CSS de cada semi-seção represente a CSS
da seção transversal medida.
Outro aspecto do método IID, que difere do método IIL, é que a Vt deve ser
diferente para cada vertical amostrada (contrário ao IIL onde a Vt é única para todas
as verticais, sendo que quem varia é a profundidade e o tempo de amostragem de
cada vertical).
A utilização do método IID necessita que inicialmente sejam conhecidas
as velocidades e as vazões das seções a serem amostradas. Com base nessas
informações, elabora-se um gráfico utilizando-se a porcentagem acumulada das
vazões parciais (eixo das ordenadas) vs as distâncias na seção transversal (eixo das
abscissas). Esse gráfico representa uma combinação de dois gráficos com mesma
escala de abscissas. O gráfico inferior representa o desenho da seção transversal,
enquanto que o superior representa a curva da distribuição acumulada das vazões

32 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


parciais dessa seção. A função dos gráficos é possibilitar a identificação das posições
e profundidade de amostragem e a obtenção das velocidades do escoamento
necessárias para o cálculo das Vt .
Para elaboração dos gráficos, inicia-se com o desenho da seção transversal,
indicando-se as verticais onde foram realizadas as medições de velocidade e, sobre
esse gráfico, elabora-se o gráfico das vazões acumuladas (Figura 1.13). A divisão
das vazões parciais é realizada subdividindo-se a curva de vazões acumulada em
segmentos de igual descarga, que pode ser em incrementos de 20%, por exemplo.
Então, neste caso, a curva acumulada em incrementos de 20% seria dividida em
semi-seções (20, 40, 60, 80 e 100%). As amostragens de sedimentos em suspensão
devem ser realizadas na posição central de cada semi-seção correspondente ao
incremento de vazão. No caso do exemplo, as posições de amostragens seriam a 10,
30, 50, 70 e 90% da curva de vazões acumuladas.

Figura 1.13 – Figura representativa de uma seção dividida em igual incremento de vazões
(20%) e posições de amostragens no centro do incremento das vazões.
Fonte: Merten (2008)

Para identificar a posição de amostragem, uma linha horizontal na posição


central de cada incremento do gráfico da curva de vazões acumulada deve ser

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 33


traçada. No ponto onde a linha horizontal corta a curva acumulada, traça-se uma
linha vertical até atingir o eixo das abscissas que define a posição de amostragem.
A determinação da profundidade de amostragem pode ser obtida pelo simples
prolongamento da linha vertical em direção do gráfico que representa a seção
transversal. Já a velocidade média para definir a Vt em cada vertical de amostragem
é obtida através da média das velocidades determinadas em posições adjacentes a
vertical de amostragem. No caso do uso do ADCP acoplado com GPS para medições
de vazões, a determinação das verticais de amostragem torna-se mais simples. Com
uso desse sistema, uma vez determinado a vazão de uma seção transversal de um
rio, é possível se obter, através do software utilizado com o ADCP, o posicionamento
das verticais de amostragem.
Definidas, então, as distâncias a serem amostradas, calcula-se para cada
vertical de amostragem a Vt e o tempo de amostragem através das Equações 1.1
e 1.2. Nesta situação, é possível a utilização de bicos diferentes para cada vertical
conforme a velocidade utilizada para determinar a razão de trânsito da vertical de
amostragem. Para esse método, o volume amostrado em cada vertical será o mesmo,
diferentemente do método IIL, em que o volume é proporcional à profundidade
amostrada.
Para ilustrar de forma mais clara o procedimento descrito, na Tabela 1.2,
é apresentado o procedimento utilizado para elaboração da curva acumulada das
vazões parciais da Figura 1.13, e na Tabela 1.3, são apresentadas as informações
necessárias para a amostragem.

Tabela 1.2 – Modelo de tabela utilizado no cálculo da vazão acumulada para aplicação
do método IID
Vertical Distância Profundidade Velocidade Vazão % vazão Vazão
PI do PI (m) (m) (m/s) (m³/s) total acumulada
1 2 1,5 0,15 0,1 0,1 0,1
2 5 3,5 0,34 1,9 1,3 1,4
3 8 4,6 0,47 4,9 3,6 5,0
4 11 5,1 0,67 8,2 5,9 10,9
5 14 5,1 0,82 11,2 8,1 19,0
6 17 5,1 0,83 12,5 9,0 27,9
7 20 5,1 0,87 13,0 9,3 37,3
8 23 5,1 0,98 14,2 10,2 47,5
9 26 5,1 0,79 13,6 9,8 57,3
10 29 5,0 0,80 12,1 8,7 66,0
11 32 5,2 0,74 11,7 8,4 75,7
12 35 4,5 0,53 9,2 6,6 81,0
13 38 3,3 2,42 17,2 12,4 93,4
14 40 3,2 0,29 8,7 6,3 99,7
PF 42 0,0 0,00 0,5 0,4 100,0
Total 139,1

*PI e PF correspondem aos pontos iniciais e finais, respectivamente.

34 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


Tabela 1.3 – Informações utilizadas para amostragem utilizando-se o método IID
Increm. % Abcis. Abcis. de Velocidade Bico Velocidade Profundidade Tempo
de das de igual amostragem média (pol.) Trânsito de mínimo
Q Q Q (m) (m) (m/s) (m/s) amostragem (s)
20 20 14,2 9,5 0,6 1/4 0,24 4,9 41
40 20 21 17 0,8 3/16 0,32 5 31
60 20 28 23 0,8 3/16 0,32 5,1 32
80 20 35 30,5 0,8 3/16 0,32 5,1 32
100 20 40,5 37 1,5 1/8 0,3 3,2 21

1.5| CÁLCULO DO FLUXO DE ELEMENTOS QUÍMICOS ASSOCIADOS AOS


SEDIMENTOS

Depois de coletada e analisada a CSS (massa por volume) e a concentração


do elemento químico nos sedimentos (massa por massa) pode então ser determinado
à concentração do elemento químico adsorvido aos sedimentos através da Equação
1.3 (Horowitz et al., 2001).

CPS ∗ CSS (Equação 1.3)


CTP =
1000

Onde: CTP é a concentração total do elemento químico particulado (mg.L-1 = g.m-3), CPS
é a concentração do elemento químico particulado (μg.g-1) e CSS é a concentração
de sedimentos em suspensão (mg.L-1).

Já a estimativa do fluxo do elemento químico particulado é obtida através da


multiplicação da CTP pela vazão (m³. s-1):

FEQ = CTP * Q (Equação 1.4)

Onde: Q é a vazão (m³.s-1).

No caso do cálculo do fluxo do elemento químico dissolvido (determinado no


material filtrado), o fluxo seria calculado apenas pela Equação 1.4.

O fluxo total do elemento químico particulado ou dissolvido em um intervalo


de tempo é estimado pela Equação 1.5.
n

∑ CTP * Q * t (Equação 1.5)


1

Onde: n representa o número de medições de Q; e, t representa o intervalo de tempo


das medições de Q.

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 35


Caso a Q seja determinada em uma escala diária, esse tempo seria de um
dia. Em intervalos sub-diários a Q poderia ser determinada em intervalos de horas
ou minutos. Importante considerar também que as medições do fluxo do elemento
químico particulado deveria também ser realizado no mesmo intervalo de tempo da
Q.
Na prática, as medições da CPS na água são realizados em uma frequência
muito inferior do que aquela utilizada nas medições da Q. Por outro lado, as variações
temporais da CPS são menores que aquelas verificadas na Q e na CSS (Horowitz,
2013). Nessa condição, pelo menos para grandes rios, a estimativa do CPS poderia
ser calculado a partir de uma série de amostragens mensais ou quinzenais onde pelo
menos 80% dessas amostragens fossem realizadas durante as cheias.

1.6 | FREQUÊNCIA DE AMOSTRAGEM


De uma maneira geral, considera-se que, em se tratando de sedimentos
em suspensão, 90% ou mais do transporte de sedimentos ocorre em menos de
10% do tempo (durante o período das cheias). Nessas condições, verifica-se que as
amostragens de sedimentos em suspensão para fins de análise química deveriam
se concentrar durante o período das cheias. No entanto, é importante considerar
que o fluxo de sedimentos em suspensão nos rios é uma condição dependente da
disponibilidade desse material na bacia, que, por sua vez, é consequência do processo
de desagregação do solo e de transferência de sedimentos da bacia vertente para a
calha fluvial.
O processo de desagregação do solo e de transferência de sedimentos na
bacia irá depender de fatores como distribuição anual de chuvas, uso e manejo do
solo, condições geomorfológicas do terreno e umidade antecedente, entre outros.
Assim, é importante considerar que um simples evento amostrado por ano não irá
caracterizar a concentração de sedimentos em suspensão (e, consequentemente, a
sua natureza geoquímica), que ocorre durante os demais períodos do ano. Em bacias
rurais, por exemplo, a CSS pode ser elevada para uma cheia que ocorre durante o
período do ano em que a cobertura vegetal da bacia é baixa (época em que os
agricultores revolvem o solo para o cultivo). Já em períodos cuja cobertura vegetal da
bacia é mais elevada, é bem provável que as CSSs sejam menores. Evidentemente,
essa análise é correta desde que a ocorrência dos eventos apresente magnitudes
semelhantes em termos de energia de chuva e volume escoado da bacia.
Na Tabela 1.4, são apresentados os resultados de um trabalho realizado em
uma pequena bacia rural onde os autores avaliaram a CSS e a presença do fósforo
total (Ptotal) nos sedimentos durante duas cheias (subida do arroio ou ascensão, no
pico e na descida ou recessão). De acordo a Tabela 1.4, verifica-se que nos dois
eventos medidos tanto a CSS como a CTP- Ptotal variaram ao longo de uma cheia
com valores máximos observados durante o pico das cheias.

36 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


Tabela 1.4 – Concentrações de sedimentos e Ptotal medida em duas cheias em uma
pequena bacia rural (1,68 km²) localizada no município de Agudo –RS
Evento Fase do hidrograma CSS (mg.L-1) CTP-Ptotal (mg.L-1)
Ascensão 4960 1,52
1 Pico 6560 5,0
Recessão 2610 1,01

Ascensão 5580 2,26


2 Pico 9410 3,76
Recessão 1530 0,65

Fonte: Gonçalves (2007)

Nas bacias urbanas, os períodos de maior disponibilidade de sedimentos


são aqueles em que ocorrem obras civis que envolvem mobilização do solo por
retificação de estradas ou alteração da cobertura vegetal para fins de edificações.
Em estudos voltados para qualidade de sedimentos em áreas urbanas, uma atenção
especial deve ser dada a contribuição fornecida por ruas e estradas (Poleto et al.,
2009). Essas áreas impermeáveis possuem ligações diretas com o sistema de
drenagem, o que em períodos chuvosos facilita o aporte de uma grande quantidade
de sedimentos e, consequentemente, uma grande carga de poluentes adsorvidos em
um curto espaço de tempo.
Já em relação à frequência de amostragem durante um evento, o princípio
básico que deve ser utilizado para definição do intervalo de coleta das amostras
irá depender principalmente do conhecimento que se tem da forma do hidrograma
(gráfico que representa a distribuição das vazões no tempo). Assim, para o caso
dos rios que atingem a vazão de pico em um período de um dia, por exemplo,
as amostragens realizadas pelo menos duas a três vezes por dia poderiam ser
suficientes para descrever o período de ascensão do hidrograma. Durante o pico,
a frequência de amostragem deve aumentar para um intervalo de horas, enquanto
que, na recessão, o intervalo de amostragem pode ser reduzido.
Para alguns rios, o intervalo de tempo do hidrograma na condição de ascensão
pode levar dias e, neste caso, as amostragens podem ser diárias. Nas Figuras 1.11 e
1.12 são apresentados gráficos com hidrogramas descrevendo um evento de cheia
em um rio de médio porte (bacia de 6000 km²) e em um arroio (bacia de 1 km²).
Pelo gráfico é possível verificar, para ambos, uma maior declividade da linha do
hidrograma durante o período de ascensão quando comparado com a recessão. Na
comparação dos gráficos das Figuras 1.11 e 1.12, verifica-se também diferenças
no intervalo de tempo da cheia, onde no rio de médio porte o intervalo é na razão
de dias enquanto que no arroio é na ordem de minutos. Nesse caso, a amostragem
necessária para descrever as variações da CSS e CPS durante a subida e descida
do arroio deveria ser na ordem de minutos ou pelo menos conforme apresentada na
Tabela 1.4.

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 37


1400
1200

Q (m3 s-1) 1000


800
600
400
200
0
7/15

7/20

7/24
7/14
7/14
7/15

7/16
7/16
7/17
7/17
7/18
7/18
7/19
7/19

7/20
7/21
7/21
7/22
7/22
7/23
7/23
7/24

7/25
7/25
7/26
7/26
7/27
7/27
7/28
Tempo (dias)

Figura 1.11 – Gráfico referente a um hidrograma de uma enchente de um rio de médio porte (rio
Pelotas).

600
500
Q (m3 s-1)

400
300
200
100
0
23:11

0:11

0:41

1:11

1:41

2:11

2:41

3:11

3:41

4:11

4:41
20:41

21:11

21:41

22:11

22:41

23:41

Tempo (minutos)

Figura 1.12 – Gráfico referente a um hidrograma de uma enchente de um rio de pequeno porte
(arroio Lajeado Ferreira).

Na Figura 1.13, pode-se observar um comparativo de três escalas de bacias,


segunda a ordem de seus tributários, e suas diferentes necessidades quanto aos
períodos de amostragem.

Figura 1.13 – Hidrogramas para tributários de primeira, segunda e terceira ordens.

38 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


Como regra geral, o número de amostras que devem ser tomadas durante
a subida de uma onda de cheias, deve ser quatro vezes maior que o número de
amostragens para descrever a descida da onda de cheia (Edwards & Glyson, 1999).
Outra questão que deve ser levada em consideração em um programa de
amostragem é a precisão das informações que se quer obter. A princípio, quanto
maior for à precisão que se deseja ter em uma avaliação, maior será a quantidade de
amostras a serem coletadas.
Outro ponto importante diz respeito à coleta de amostras durante o período
seco, ou de baixas vazões. Nesse período, as fontes pontuais de sedimentos podem,
também, apresentarem variações (caso da construção de uma estrada, por exemplo).
Medições durante as vazões baixas são importantes, também, para verificar o fluxo
de elementos químicos que se encontram na fase dissolvida.
Na Figura 1.14, é apresentado um exemplo de gráfico da evolução de uma
cheia onde o fósforo total (Ptotal) foi medido durante a subida, no pico e na descida da
onda de cheia (Tabela 1.4 referente ao Evento 1).

Estimativa da quantidade de Ptotal exportado durante o evento = 7 kg

0,6000 3,000

0,5000 2,500
Vazão (m3 s-1)

P total (g s-1)
0,4000 2,000

0,3000 1,500

0,2000 1,000

0,1000 0,500

0,0000 0,000
21:11
20:41

21:41

22:11

22:41

23:11

23:41

0:11

0:41

1:11

1:41

2:11

2:41

3:11

3:41

4:11

4:41

Tempo (min)

vazão Ptotal

Figura 1.14 – Gráfico ilustrativo da evolução de uma enchente em uma pequena bacia rural (1
km²) e o fluxo de fósforo (Ptotal = fósforo total).
Adapatado de: Gonçalves (2007)

1.7 | ESCOLHA DOS EQUIPAMENTOS


Os equipamentos utilizados na amostragem de sedimentos em suspensão
para estudos e avaliações de qualidade podem ser de dois tipos:
a) Equipamentos manuais;
b) Equipamentos automáticos.
Alguns equipamentos manuais, conforme já comentado, utilizam o princípio
da amostragem isocinética; outros permitem uma amostragem simples, porém sem
considerar as condições isocinéticas. Os equipamentos automáticos não possibilitam

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 39


uma amostragem isocinética nem a representação da variabilidade espacial da CSS
que ocorre em uma seção transversal de um rio, porém apresentam a vantagem de
poder programar uma amostragem conforme a variação de nível, ou por intervalos de
tempo pré-determinados desde que se tomem os cuidados já comentados no item 1.4.
Considerando-se as dificuldades operacionais das amostragens manuais,
especialmente durante os períodos das cheias, e visto a necessidade da realização das
amostragens durante esse período, uma solução seria uma combinação de métodos
(manuais com automáticos) (Horowitz, 1991). Nessa condição, procedimentos
manuais com equipamentos isocinéticos deveriam ser utilizados para medições de
algumas cheias. Já o equipamento automático tipo ISCO poderia ser utilizado para
medições contínuas, desde que devidamente calibrados conforme já comentado no
item 1.4. Outro aspecto importante em relação aos equipamentos diz respeito ao
material com que eles são construídos. Equipamentos para amostragem de qualidade
de sedimentos devem ser construídos de forma a evitar a contaminação química das
amostras. Na Tabela 1.5, são apresentados materiais de diferentes composições e
sua compatibilidade para a amostragem de contaminantes de diferentes naturezas.

Tabela 1.5 – Relação dos tipos de materiais possíveis de serem utilizados nos
equipamentos de amostragem de sedimentos para fins de avaliação de
qualidade
Condições para análise de
Tipo de material substâncias
Inorgânicas Orgânicas
Polímeros de Fluorocarbono (Teflon, Kynar e Tefzel) apropriado 1
apropriado2
Polypropyleno apropriado não apropriado
PVC apropriado não apropriado
Silicone apropriado 3
não apropriado
Nylon apropriado não apropriado4
Metais com Fe, Cu, Pb, Al e material galvanizado não apropriado apropriado5
Vidros, borasílica e cerâmica apropriado6 aproriado
1 Fonte potencial de ferro
2 Pode provocar adsorção de alguns materiais orgânicos
3 Material muito poroso e fonte de silício
4 Exceto para CFC
5 Não deve ser usado se o material apresentar sinais de corrosão
6 Fonte potencial de boro e sílica
Fonte: Wilde et al. (1998)

Para fins de orientar a aquisição de equipamentos manuais capazes de


realizar amostragens em condição isocinética, é apresentado um diagrama (Figura
1.15) que contém diferentes situações de utilização desses equipamentos. Detalhes
e especificações técnicas destes amostradores podem ser encontrados em FISP
(2006). Na Tabela 1.6, encontram-se as especificações técnicas e operacionais
dos equipamentos manuais destinados à coleta de amostras de sedimentos em
suspensão.

40 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


Seleção de equipamentos destinados à amostragem de
sedimentos em suspensão para análise de qualidade

Método da integração

Medições Prof. até 4,5 m Prof. até 11 m Prof. até 34 m Prof. até 67m
a vau

US DH-81 US DH-95 US DH 2 US DH 96 US DH 99

Figura 1.15 – Diagrama para seleção de equipamentos manuais destinados à amostragem de


sedimentos em suspensão.
Adaptado de: Davis (2005)

Tabela 1.6 – Especificações técnicas e operacionais dos equipamentos manuais


destinados à amostragem de sedimentos em suspensão
Diâmetro Máxima Mínima Máxima Zona não
Volume do Peso
Equipamento do bico profundidade velocidade1 velocidade amostrada
recipiente (kg)
(pol.) (m) (m/s) (m/s) (cm)
US-DH-81 3/16 Garrafa 1,0 L 2,7 0,6 1,9 10 0,5
US-DH-81 1/4 Garrafa 1,0 L 2,7 0,5 2,3 10 0,5
US-DH-81 5/16 Garrafa 1,0 L 2,7 0,6 2,1 10 0,5
US-DH-2 3/16 Saca 1 L 11 0,6 1,8 9 14
US-DH-2 1/4 Saca 1 L 6 0,6 1,8 9 14
US-DH-2 5/16 Saca 1 L 4 0,6 1,8 9 14
US-DH-95 3/16 Saca 1 L 4,5 0,5 1,9 12 29
US-DH-95 1/4 Saca 1 L 4,5 0,6 2,0 12 29
US-DH-95 5/16 Saca 1 L 4,5 0,6 2,0 12 29
US-DH-96 3/16 Saca 3 L 33,5 0,6 3,8 10 60
US-DH-96 1/4 Saca 3 L 18 0,6 3,8 10 60
US-DH-96 5/16 Saca 3 L 12 0,6 3,8 10 60
US-DH-96A1 3/16 Saca 3 L 33,5 0,6 1,8 10 36
US-DH-96A1 1/4 Saca 3 L 18 0,6 1,8 10 36
US-D-99 3/16 Saca 6 L 67 1,0 4,6 24 125
US-D-99 1/4 Saca 6 L 37 0,9 4,6 24 125
US-D-99 5/16 Saca 6 L 24 0,9 4,6 24 125
1
Velocidade mínima para possibilitar uma amostragem em condições isocinética
Fonte: Davis (2005)

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 41


1.8 | CUIDADOS COM A PRESERVAÇÃO DE AMOSTRAS
Pode-se realizar a coleta de amostras de sedimentos para diferentes tipos
de análises, entre elas a que determina as substâncias orgânicas e inorgânicas
presentes nessas amostras, além da distribuição granulométrica e os mais diversos
testes biológicos. Mas para que essas amostras possam refletir as condições das
áreas amostradas, tornando-as mais representativas, a maneira que as amostras
serão conservadas até a sua análise final desempenhará um papel fundamental na
obtenção de bons resultados.
Assim, não apenas os materiais utilizados durante as coletas se tornam
importantes, mas sim, todos que entrarão em contato com as amostras até a obtenção
dos resultados finais. Esse tipo de cuidado torna-se de suma importância quando um
dos objetivos almejados é o estudo da qualidade dos sedimentos.
Esse tipo de estudo exige um planejamento cuidadoso dos frascos e
utensílios envolvidos, desde o início do procedimento (coleta) até a sua preservação,
e todas as análises laboratoriais envolvidas. Deve-se ter atenção especial em todas
as fases desse planejamento, evitando-se eventuais contaminações das amostras, o
que levaria a obtenção de dados imprecisos, ou até mesmo falsas avaliações.
Segundo Diamond et al. (2002), estas interferências podem potencialmente
confundir a interpretação dos resultados analíticos de duas maneiras:
a) Introduzindo um contaminante na amostra, tanto através de equipamentos
inapropriados ou inadequadamente limpos quanto por armazenamento
ou manuseio equivocado;
b) Por mudanças nas condições de biodisponibilidade química ou física
da amostra, resultando em alterações no seu equilíbrio químico e de
toxidade.
Um bom exemplo é o estudo de metais contidos em sedimentos, onde a
ocorrência do contato das amostras com frascos ou colheres de metal, ou outro
equipamento qualquer, poderá contaminar o material coletado. Esse tipo de
interferência poderá ocorrer em diferentes estudos, por isso torna-se importante
conhecer o potencial contaminante dos materiais e utensílios que serão utilizados
durante todas as etapas da pesquisa a ser desenvolvida.
A Tabela 1.7 apresenta os tipos de frascos e preservação que são considerados
os mais adequados para cada tipo de estudo a ser realizado com amostras de
sedimentos.
No caso de análises para determinação de compostos orgânicos, mercúrio e
alguns elementos como chumbo, bismuto e selênio, a utilização de vidrarias de boro-
silicatos poderá ser uma boa alternativa para se evitar contaminações. Mas, deve-se
lembrar de que existe uma grande desvantagem na utilização de frascos e outros
utensílios de vidro, que é a possibilidade deles se quebrarem facilmente durante os
procedimentos de campo, ao longo do seu transporte, ou mesmo quando estiverem
repletos de amostra e forem ser congelados.
Outras formas de armazenamento também podem apresentar algum tipo de
problema, como é o caso dos estudos que priorizam a biodisponibilidade de alguns

42 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


contaminantes. A utilização de sacos plásticos e frascos, por exemplo, poderá permitir
a oxidação do sedimento e, assim, alterar as principais características em estudo.
Isto porque a oxidação altera a concentração de alguns metais (Ankley et al., 1996),
e principalmente a abundância de vários compostos voláteis.

Tabela 1.7 – Tipos de frascos utilizados para a conservação de amostras em estudos


com diferentes parâmetros, com modo e tempo de estocagem
Parâmetros Frascos Modo de preservação Tempo máximo de estocagem
Granulometria P, V, ou M Úmida, 4ºC, bem vedada 14 dias
Estratigrafia Core Úmida, 4ºC Vários meses

Testes de toxidade P ou V Peneirada, 4ºC, no escuro Processar dentro entre 2 e 7 dias

Testes bacteriológicos V esterelizado Úmida, 4ºC Processar dentro de 6 horas


Úmida, em repouso e sem
pH, Eh, CTC Balde e core Determinar “in loco”
tratamentos
Ptotal V Congelada, -20ºC 1 mês
Carbono orgânico total (COT) P ou V Congelada, -20ºC, escuro 6 meses
Óleo e graxa M ou V Úmida, 4ºC 1 dia
Seca (60ºC) ou congelada
Metais P ou T 6 meses
(-20ºC)
Mercúrio V ou T Congelada, -20ºC 1 mês
Orgânicos voláteis V vedável Congelada, -20ºC 1 mês
Cianetos P Congelada, -20ºC Até 1 mês
M ou V envolvidos em
Pesticidas e PCB Congelada, -20ºC, escuro 7 dias até a extração
papel alumínio

*P = Polietileno ou Polipropileno; V = Vidro; T = Teflon®; M = Metal.


Adaptado de: Mudroch & Azcue (1995)

Outro fator a ser considerado é o tempo em que a amostra permanecerá


armazenada até que ela seja processada. Estas informações também podem ser
observadas na Tabela 1.7 e, mesmo assim, segundo Percival & Lindsay (1996),
apesar de se adotar procedimentos adequados para a sua preservação, evitando-se,
dentre outras, as alterações físicas nas amostras, as mesmas deverão ser analisadas
o mais rápido possível.
Portanto, quando se pensa em análises qualitativas, deve-se ter um bom
planejamento de todos os materiais, utensílios e equipamentos que poderão ser
utilizados ao longo desses procedimentos. Por isso, Mudroch & Azcue (1995)
ressaltam que se deve levar em consideração a amostragem, o manuseio e a
estocagem das amostras como prováveis fontes de contaminação. Isso nos leva a
fazer algumas considerações para que estes problemas sejam minimizados, na qual
podemos citar os seguintes cuidados:
a) Minimizar as interações entre as amostras, frascos e utensílios utilizados
durante a sua coleta e manuseio;
b) Minimizar as interações entre as amostras e o ambiente externo;
c) Tratar os frascos com os mesmos cuidados despendidos com as amostras;
d) Lavar os frascos e utensílios utilizados para as amostragens e manuseios,
com soluções de limpeza apropriadas para cada tipo de análise a ser
realizada posteriormente.

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 43


Outro aspecto interessante a se ater é a importância que deve ser dada a
uma identificação apropriada das amostras durante as coletas. Um erro comum é a
utilização de marcadores que não sejam a prova d’água ou etiquetas que se soltem
facilmente dos frascos. Isso poderá levar à perda de várias amostras ou até mesmo
de todo o lote, caso ocorram dificuldades na sua identificação, sejam estas dúvidas
sobre a procedência e/ou distribuição temporal do material.
Entre as informações mais importantes, que devem estar à disposição dos
laboratoristas, estão:
a) Identificação da amostra;
b) Local de amostragem;
c) Data e horário da coleta da amostra em questão;
d) Para qual finalidade a amostra foi coletada;
e) Nome do técnico responsável pela amostragem.

1.9 | ASPECTOS DE SEGURANÇA


As coletas e as análises de sedimentos podem envolver riscos substanciais
para a segurança e saúde das pessoas envolvidas nessas atividades. Segundo
Diamond et al. (2002), a coleta de sedimentos “in natura” pode acarretar riscos
devido à presença de contaminantes carcinogênicos, mutagênicos e patogênicos e
compostos tóxicos.
Esses riscos podem ser tanto originários da água quanto de microorganismos
que se desenvolvem nos sedimentos. O risco aumenta muito por não se saber ao
certo quais são as fontes de poluentes e o seu grau de periculosidade.
Um exemplo disso pôde ser observado em estudos realizados por Poleto et al.
(2005) na periferia da região metropolitana de Porto Alegre, mostrando que 31% dos
esgotos são clandestinos, ou seja, o esgoto sanitário doméstico “in natura” lançado
para um corpo d’água que cruza o ambiente urbano; outros 43% dos moradores
fizeram ligação direta com a canalização de drenagem de águas pluviais e, assim,
os resíduos acabam chegando ao canal; 7% construíram fossas rudimentares; e, os
19% restantes construíram fossas rudimentares e as ligaram com a canalização de
drenagem de águas pluviais, evitando realizar a devida manutenção, ou seja, o esgoto
também vai para o rio. Essa condição constituiu-se em uma das maiores fontes de
contaminação do sistema fluvial dessa bacia; mas, em áreas industrializadas, os
riscos podem ser ainda maiores.
Portanto, recomendam-se alguns cuidados mínimos durante os procedimentos
de coleta e manuseio de amostras, entre eles:
a) Utilização de luvas;
b) Utilização de óculos ou mascaras de proteção facial;
c) Manipulação de amostras em local ventilado ou com ventilação forçada.

Esses e outros cuidados devem ser suficientes para resguardar os técnicos


ou funcionários que estejam coletando ou manipulando as amostras de sedimentos

44 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


de doenças que possam ser ocasionadas pela ingestão ou contato cutâneo
com agentes infecciosos, também pela inalação ou absorção através da pele de
substâncias corrosivas ou tóxicas, levando-se em consideração inclusive a asfixia
pela presença de gases nocivos.

1.10 | REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALLAN, N. D. J. 2006. Stream ecology – structure and function of running waters. The
Netherlands, Springer. pp.109-129.

ANKLEY, G. T.; DI TORO, D. M.; HANSEN, D. J.; BERRY, W. J. 1996. Technical Basis
and Proposal for Deriving Sediment Quality Criteria for Metals. Environmental
Toxicology and Chemistry. v.15, n.12, pp.2056-2066.

CARVALHO, N. O. 1994. Hidrossedimentologia prática, CPRM, Rio de Janeiro, 372p.

CARVALHO, N. O.; FILIZOLA, N., P. J.; SANTOS, P. M. C.; LIMA, J. E. F. W. 2000. Guia de
Práticas Sedimentométircas. ANEEL. 154p.

DAVIS, B. E. 2005. A Guide to the Proper Selection and Use of Federally Approved
Sediment and Water-Quality Samplers. U.S. Geological Survey, Vicksburg, Open
File Report 2005-1087, 20p.

DE VRIES A.; KLAVER H. C. 1994. Riverine fluxes of pollutants: monitoring strategy first,
calculation methods second. European Journal of Water Pollution Control 4,
pp.12-17.

DNAEE, Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica 1977. Manual para serviços de
hidrometria. Ministério das Minas e Energia. Brasil.

DIAMOND, J.; BURTON, A.; SCOTT, J. 2002. Methods for Collecting, Storing, and Manipulating
Sediments and Interstitial Water Samples for Chemical and Toxicological Analyses.
In: Whittemore, R. C. Handbook on Sediment Quality. Special Publication. Water
Environment Federation. 394p. ISBN: 1572782013

EDWARDS, T. K.; GLYSSON, G. D. 1999. Field Methods for Measurement of Fluvial Sediment.
U.S. Geological Survey, Reston. 89p.

FEDERAL INTERAGENCY COMMISSION (FISP). Disponível em http://fisp.wes.army.mil/.


Acesso em 3 outubro de 2006.

FORSTNER, U. 2004. Sediment dynamics and pollutant mobility in rivers: An interdisciplinary


approach. Lakes and Reservoirs: Research and Management, 9, pp.25-40.

GOLTERMAN, H. L.; SLY, P. G; THOMAS, R. L. 1983. Study of the Relationship Between


Water Quality and Sediment Transport. UNESCO, Technical Papers in Hydrology,
Paris. 231p.

GONÇALVES, C. S. Caracterização dos sedimentos e de contaminantes numa microbacia


hidrográfica antropizada. Santa Maria, Universidade Federal de Santa Maria, 2007.
89p. (Tese de Doutorado).

HOROWITZ, A. J. 1991. A primer on sediment-trace element chemistry. 2 ed. Chelsea,


EUA: Lewis Publishers. 136p.

HOROWITZ, A. J. 2001. Estimating suspended sediment and trace elemento fluxes in large
river basin: methodological considerations as applied to the NASQAN programme.
Hydrological Processes. 15, pp.1107-1132.

Rede de monitoramento e coleta de amostras | Capítulo 1L 45


HOROWITZ, A. J. 2013. A review of selected inorganic water quality-monitoring practices: Are
we really measuring what we think, and if so, are we doing it right? Environmental
Science and Technology. (em fase de publicação).

HOROWITZ, A. J.; ELRICK, K. A.; SMITH, J. J. 2008. Monitoring urban impacts on suspended
sediment, trace element, and nutrient fluxes within the City of Atlanta, Georgia,
U.S.A.: program design, methodological considerations, and initial results. Hydrol
Process,15, pp.1473–1496.

MINELLA, J. P. G., WALLING, D. E.; MERTEN, G. 2008. Combining sediment source


tracing techniques with traditional monitoring to assess the impact of improved land
management on catchment sediment yields. J. Hydrol. 348, pp.546–563.

MUDROCH, A.; AZCUE, J. 1995. Manual of Aquatic Sediment Sampling. Florida, EUA:
CRC Press. 219p.

OFFICE OF WATER DATA COORDENATION (OWDC). 1982. National Handbook of


Recommended Methods for Water-Data Acquisition. U.S. Geological Survey,
Reston, VA, Chapter 3 – Sediment, pp.3-100.

ONGLEY, E.; BLACHFORD, N. 1982. Application of continuous-flow centrifugation to


contaminant analysis of suspended sediment in fluvial systems: environmental
contamination analysis of suspended sediment in fluvial systems. Environmental
Technology Letters. v.3. pp.219-228.

PERCIVAL, J. B.; LINDSAY, P. J. 1996. Measurement of Physical Properties of Sediments. In:


Mudroch, A.; Azcue, J.; Mudroch, P. 1996. Manual of Physical-Chemical Analysis
of Aquatic Sediments. Florida, EUA: CRC Press. 287p.

POLETO, C.; MERTEN, G. H.; SILVEIRA, A. L. L. 2005. Socio-Economic Impacts on Fluvial


System an Urban Watershed in Southern Brazil. In: 10º International Conference
on Urban Drainage. Copenhagen.

POLETO, C.; MERTEN, G. H.; MINELLA, J. P. 2009. The identification of sediment sources in
a small urban watershed in southern Brazil: an application of sediment fingerprinting.
Environmental Technology, issue 30 (11), pp.1145-1153.

VANONI, V. A. (editor). 1975. Nature of sedimentation problems in Sedimentation Engineering,


ASCE, New York.

WORLD METEOROLOGICAL ORGANIZATION. 2008. Manual on Sediment Management


and Measurement – Operational Hydrology Report No 47. WMO-number 948.
ed. Geneva. 158p.

WILDE, F. D.; RADKE, D. B. 1998. Field Measurements In: National Field Manual for the
Collection of Water-Quality Data. U.S. Geological Survey Techniques of Water
Resource Investigations, Book 9, chap. A4, pp.7-99.

46 M Capítulo 1 | Rede de monitoramento e coleta de amostras


Relação Entre a Fração Mineral do
Solo e Qualidade de Sedimentos –
O Solo como Fonte de Sedimentos
Capítulo 2

RELAÇÃO ENTRE A FRAÇÃO MINERAL DO SOLO E QUALIDADE DE


SEDIMENTOS – O SOLO COMO FONTE DE SEDIMENTOS
Nilvania Aparecida de Mello

2.1 | FUNÇÃO ECOLÓGICA DO SOLO


O solo participa de praticamente todos os ciclos da natureza e desempenha
papel fundamental na regulação do ciclo hidrológico. Na natureza, a água proveniente
da precipitação segue dois caminhos: infiltra-se no solo ou escoa sobre ele. No processo
de infiltração, a água realiza um movimento predominantemente descendente no
perfil do solo atingindo o nível freático, de onde se move de forma mais lenta para
o nível de base. No processo de escoamento superficial a água se movimenta na
superfície do solo, chegando rapidamente aos corpos hídricos de superfície. Em
solos não perturbados, sob vegetação nativa, estes processos ocorrem de forma
equilibrada, ou seja, os dois processos ocorrem simultaneamente e o escoamento
não gera erosão, de forma que a qualidade da água de superfície é mantida. Em
solos alterados pelo homem o equilíbrio é rompido, há um predomínio do escoamento
sobre a infiltração e o escoamento superficial pode remover partículas sólidas do
solo e transportá-las para os cursos hídricos, comprometendo sua qualidade.
A necessidade de preservação da qualidade da água deu origem a novas
técnicas de manejo e conservação do solo e a pesquisa sobre qualidade dos
sedimentos. Muitas vezes, apenas a quantidade de sedimentos presente num corpo
hídrico não explica a redução de sua qualidade. Tornou-se necessário entender
também o grau de contaminação exercido pelos sedimentos que entram no padrão
de drenagem.
A pesquisa de sedimentos sempre interagiu com a ciência do solo, devido
a importância deste no ciclo hidrológico e seu papel como fonte de matéria. Apesar
disto a maioria dos estudos conferia mais atenção ao total de sedimentos produzidos
e transportados via erosão que às características dos sedimentos em si. Com as
novas técnicas de manejo e conservação do solo este cenário ficou mais complexo.
A ampla adoção de sistemas como o plantio direto, no qual o solo coberto altera
a dinâmica do escoamento superficial, mas que ao mesmo tempo exige o uso de
insumos como dessecantes e herbicidas que podem ser facilmente transportados
nas cargas da fração sólida do solo deu um novo sentido à qualidade dos sedimentos
Com a crescente utilização do solo como fator de produção e frente a
necessidade de preservar a qualidade da água, entender o solo como fonte de

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 49
sedimentos significa também entender seus atributos físicos e mineralógicos que
podem facilitar o transporte de elementos tóxicos para os cursos de água (Brady,
2007).
O solo é um sistema aberto, que troca energia e matéria com o ambiente.
Sua composição é trifásica, ou seja, apresenta uma fase líquida, uma fase gasosa e
uma fase sólida (Vezzani e Mielniczuk, 2009). A fase sólida é composta pela fração
mineral e pela fração orgânica. A composição ideal do solo (Figura 2.1) é aquela em
que a fase líquida ocupa de 30 a 35% do total, a fase gasosa ocupa 15 a 20% e a
fase sólida ocupa 50%, com 45% de fração mineral e 5% de fração orgânica.
O solo também pode ser entendido como um corpo tridimensional resultante
de processos químicos físicos e biológicos, que lhe conferem atributos característicos,
especialmente no que diz respeito a mineralogia, por isso é impossível entender
um dado solo e as características dos sedimentos dele derivados sem entender
inicialmente o processo de formação do mesmo.

Porção Sólida ou Estruturante

Fração Mineral 45%


Fração Orgânica 5%

Fração Gasosa 20% Fração Liquida 30%

Espaço Poroso
Figura 2.1– Composição ideal do solo.

2.2 | GÊNESE, PROCESSOS E CLASSES DE SOLOS

2.2.1 Fatores de formação

Solos diferenciam-se entre si conforme ocorrem mudanças nas condições


do ambiente em que estão inseridos. É comum verificar-se mudanças na cores,
espessuras e quantidades de camadas que surgem, por exemplo, nos cortes de
estrada ao longo de uma viagem. Estas mudanças dizem respeito às mudanças na
quantidade e arranjo de horizontes (camadas relativamente paralelas que observamos
nos perfis de solo) e nos atributos diagnósticos ou não que formam o solo daquela

50 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
região. Embora o solo seja um corpo tridimensional e que não se individua na
paisagem convencionou-se o seu estudo a partir de cortes bidimensionais chamados
de perfis de solo. A Figura 2.2 ilustra um perfil de Latossolo Vermelho localizado em
Goiânia e a unidade de paisagem que ele representa.

Figura 2.2 – Perfil de Latossolo Vermelho Escuro sob pastagem e a unidade de paisagem em
que está contido.

A formação do solo é um processo lento, resultante da combinação de


diferentes fatores. Das diferentes combinações resultarão condições específicas
que darão origem aos horizontes do solo, camadas que se distribuem de forma
predominantemente horizontal, com evidências de evolução pedogenética (Lepsch,
2011). Os horizontes apresentam atributos que os diferenciam entre sí e permitem a
diferenciação das classes de solo, seja pelos seus aspectos morfológicos seja pela
sua funcionalidade.
Os horizontes são nominados com letras (Figura 2.3) sendo adotada a letra A
(horizonte A) para o horizonte mineral superficial. O horizonte O designa camada de
acúmulo de resíduos orgânicos provenientes da vegetação, por isso este horizonte
também só pode ser encontrado na superfície do solo. O horizonte B é o que melhor
expressa os processos de formação do solo, e também o que sobre menor grau de
alteração antrópica, por isto este horizonte é que receberá a qualificação que indica a
qual ordem o solo pertence. O horizonte C representa o horizonte de transição entre
o solo e a rocha subjacente. Além destes horizontes também podem existir num perfil
de solo horizontes transicionais como AB (intermediário do horizonte A para o B) BA
(mais semelhante ao B, mas ainda com algumas propriedades do A) e o BC.

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 51
O

Figura 2.3 – Perfil hipotético de solo destacando-se alguns horizontes e o material de origem.
Adaptado de: USDA (2004)

A compreensão da gênese do solo favorece a compreensão de seus atributos,
uma vez que estes são resultantes dos fatores de formação, e, por conseguinte, facilita
a compreensão de importantes características que conferem diferentes propriedades
aos sedimentos que um dado solo origina. Jenny (1945) propôs que o solo era o
resultado da interação de diferentes fatores, como exemplificado na equação:
Solo = ƒ (clima, organismos, relevo, material de origem) tempo

Esta equação pode ser lida assim: O solo é função da interação entre os
fatores clima, organismos, material de origem ou rocha subjacente num determinado
intervalo de tempo. É a partir da interação entre clima, vegetação e relevo que se
formarão as principais características do solo, que por sua vez será determinante
para a formação do território enquanto espaço de produção humana.
Dentre os fatores de formação do solo, o clima é o mais ativo, pois influencia
na quantidade de água que estará presente num determinado sistema, na temperatura
que acelerará ou atenuará os processos e, ainda nos organismos que surgirão sobre
um determinado ambiente. Isto favorece a ocorrência de uma série de reações
químicas e físicas que caracterizam o intemperismo, processo de transformação
(físico-químico) das rochas em solo. O processo intempérico será mais acelerado em
regiões de clima quente e úmido, pois a presença de água combinada com elevadas

52 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
temperaturas favorece o intemperismo químico das rochas e a formação de solos. É
por isso que nas regiões tropicais os solos são geralmente profundos e pobres em
fertilidade natural. Nestas regiões geralmente os solos rasos ocorrem nos pontos em
que o relevo não é favorável a infiltração da água.
Em regiões de clima quente e seco predominará o intemperismo físico das
rochas, resultando na fragmentação das mesmas. Regiões de clima frio e úmido
terão o processo intempérico limitado pela ausência de calor para acelerar as reações
químicas. Por outro lado, são propícias ao acúmulo de matéria orgânica devido à
baixa taxa de decomposição da mesma. Em regiões de frio extremo, em que a água
permaneça a maior parte do tempo em estado sólido, predominarão os processos de
intemperismo físico.
Na condição bioclimática de frio seco, há predomínio dos processos de
intemperismo físico sobre os químicos, e não haverá lavagem do perfil, pois não
há água disponível. Esta situação resultará em solos rasos e com grande acúmulo
de bases no perfil, devido à ausência de lixiviação. Se o bioclima for frio e úmido,
ocorrerá translocação de materiais de um horizonte para outro (A para B). Em
bioclimas quentes e secos, ou seja, com temperaturas elevadas e pouca água
predominarão os processos de intemperismo físico, resultando em solos rasos e
pedregosos. Nestes casos também não haverá lavagem do perfil. O acúmulo de
matéria orgânica será muito pequeno, por isso os solos deste bioclima tendem a ser
salinos ou salinizados, pois a combinação da ausência de lixiviação do perfil com o
pequeno aporte de matéria orgânica resulta nesta condição.
Nos locais de clima quente e úmido predominarão os processos de latolização
e ferralitização. Ocorrerá intensa transformação de materiais seguida de remoção de
sílica e bases do perfil. Os solos resultantes deste processo serão muito profundos,
lixiviados e altamente intemperizados.
Ao avaliar a condição climática de uma região é importante lembrar-se que
o clima atmosférico não se reproduz fielmente no solo, e que alguns fatores podem
fazer com que ocorram diferenças relacionadas ao clima em solos muito próximos.
A fonte primária de água para o solo sempre será a precipitação, que é reflexo
direto do clima de uma determinada região. Porém, o comportamento da água no
solo está relacionado a algumas propriedades e características do solo, que podem
fazer com que o regime hídrico do solo seja diferente do regime hídrico atmosférico.
A Figura 2.4 apresenta dois perfis de Latossolo, um localizado em Pato
Branco, PR, e outro em Palmas, PR. A diferença entre os dois deve-se à diferença
no clima entre os dois municípios.
Enquanto o primeiro está a cerca de 600 metros de altitude, o segundo está
cerca de 1000 metros acima do nível do mar, apresentando, portanto, clima mais frio.
Todos os demais fatores entre os municípios são semelhantes são semelhantes, mas
a diferença na altitude faz com que o clima em Palmas seja mais ameno que em Pato
Branco. Ao longo dos anos esta diferença modificou os solos dos locais, enquanto o
solo de Pato Branco adquiriu matiz vermelha o de Palmas em função do acúmulo de
matéria orgânica tornou-se bruno.

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 53
Figura 2.4 – (a) Perfil de Latossolo Vermelho no município de Pato Branco – PR; (b) Perfil de
Latossolo Bruno, no município de Palmas – PR. A vegetação e material de origem
de ambos os solos é a mesma, a diferença é devida ao clima.

Os organismos podem ser compreendidos como reflexo do clima. Neles


estão incluídas a micro e macro flora e fauna. Tanto animais quanto vegetais atuam
na superfície e no interior dos solos, formando canais que facilitam a entrada da água,
acelerando os processos intempéricos e liberando ácidos orgânicos ou adicionando
matéria orgânica quando sua vida se extingue. A vegetação muitas vezes atua em dois
sentidos, pois ao mesmo tempo que a cobertura vegetal fornece proteção, impedindo
a variação brusca de temperatura e o impacto direto das gotas da chuva, suas raízes
são capazes de explorar o solo em profundidade, inclusive podem romper a camada
rochosa, facilitando a infiltração de água (Figura 2.5).
As raízes também realizam translocação de materiais, absorvendo elementos
químicos em profundidade e translocando-os para a parte aérea do vegetal. Quando
a planta morre, ou perde folhas, estes elementos, que anteriormente estavam em
profundidade, serão depositados na superfície do solo.
O relevo, relativo às formas do terreno que compõem a paisagem em que o
solo está inserido, atua diretamente na dinâmica da água e, portanto, é um importante
fator na formação do solo, acentuando ou atenuando a ação climática (Figura 2.6).

54 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
Raízes de Culturas
Horizonte A

Horizonte B
Raízes de Árvores

Horizonte C

Rocha

Figura 2.5 – Esquema demonstrando a exploração do perfil de solo pelo sistema radicular das
plantas. Plantas de lavoura exploram os horizontes superficiais, enquanto raízes
de árvores podem chegar até a rocha subjacente.

Figura 2.6 – Efeito do relevo sobre a formação dos solos em toposequência avaliada em
Chopinzinho – PR. O material de origem é basalto do derrame do Trapp e o clima da
região é Cfb (clima chuvoso, sem estação seca, verão brando e com temperaturas
para o mês mais quente e mais frio, respectivamente inferiores a 22°C e 18°C).

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 55
A água que chega à superfície através da precipitação pode infiltrar-se ou
escoar sobre esta, dependendo das condições oferecidas pelo relevo. Quando
a declividade é elevada, a oportunidade de infiltração da água é menor, e maior
quantidade de água escoará sobre a superfície. Este fenômeno faz com que o
intemperismo atue de forma diferenciada, dando origem a solos mais rasos nestes
locais. Além disto, a combinação de declividade elevada com facilidade de escoamento
superficial facilita a remoção de materiais, de forma que predominam processos de
remoção e transporte de materiais, o que impede a formação de solos mais profundos.
Se a declividade é baixa e predomina o processo de infiltração sobre escoamento
ocorre a formação de perfis de solos mais profundos e mais intemperizado, devido
a maior presença de água. Outro fator importante é que nestes locais predominam
os processos de deposição, ou seja, material removido das áreas mais declivosas
podem ser depositados nestes ambientes, favorecendo a formação de solos mais
profundos.
Para a produção de sedimentos, a lógica é a mesma, ou seja, solos situados
em áreas mais declivosas tendem a produzir mais sedimentos que aqueles situados
em áreas menos declivosas, especialmente quando o manejo não é adequado. Do
ponto de vista da qualidade dos sedimentos produzidos, no entanto, as áreas mais
intemperizadas tendem a apresentar solos mais evoluídos, com partículas de tamanho
muito pequeno e maior capacidade de adsorção (como será discutido mais a frente)
e, portanto, apresentam maior potencial de exportação de elementos adicionados as
cargas e consequentemente maior potencial de contaminação ambiental.
Material de origem é o termo utilizado para designar a rocha que deu origem
ao solo. O solo é dito autóctone quando é formado diretamente sobre a rocha que
lhe deu origem, e alóctone quando é formado sobre sedimentos não consolidados
oriundos de outros locais.
Todo solo guarda importantes resquícios do material que lhe deu origem,
tais como cor, textura, mineralogia, composição química etc. Materiais de origem
diferentes sob um mesmo clima condicionam, portanto, solos diferentes. Conhecer
o tipo de material de origem do solo pode facilitar o entendimento de seus atributos
e também do tipo e a qualidade dos sedimentos que este pode produzir. No entanto,
um mesmo material de origem, sob variação de outros fatores, pode gerar solos
distintos.
Em condições normais, os horizontes superiores são mais alterados em
relação ao material de origem, enquanto o horizonte C guarda ainda muitos resquícios
e semelhanças com a rocha que lhe deu origem. De maneira geral, vários atributos
do solo são condicionados pelo material de origem, mas o que apresenta maior
relação é a textura do solo. A Figura 2.7 mostra dois perfis de solo da região de Ponta
Grossa, PR. O primeiro é um Cambissolo Háplico, de textura arenosa, formado sobre
o arenito Furnas, uma rocha sedimentar psamítica, cuja granulometria principal é
composta por areia. O segundo é um Cambissolo Húmico, de textura argilosa e
com grande acúmulo de matéria orgânica cujo material de origem é um folhelho da
formação Ponta Grossa, com granulometria principal formada por argila e silte.

56 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
Figura 2.7 – Perfis de Cambissolo Háplico (a) e Cambissolo Húmico (b) localizados em Ponta
Grossa, PR. O primeiro tem como material de origem o arenito Furnas, e o
segundo, folhelhos da formação Ponta Grossa.

Fixadas as demais condições, os solos podem se diferenciar de acordo


com suas “idades” em solos jovens, maduros e velhos, conforme o estágio de
desenvolvimento em que se encontram. Esta classificação é controversa, uma vez
que nenhum solo do planeta está “pronto”, todos seguem evoluindo, pois se tratam
de sistemas abertos, mas é importante destacar que a passagem cronológica do
tempo é um fator de diferenciação dos solos. Este fator é considerado o mais passivo
de todos, uma vez que não acrescenta ou remove qualquer fenômeno, representa
apenas uma medida do tempo que o solo foi exposto aos demais fatores.
O conceito de solo jovem, maduro ou velho baseia-se na presença ou não
de determinados atributos. Solos jovens são pouco profundos, apresentam no perfil
grande quantidade de bases e outros materiais facilmente lixiviáveis, sendo muitas
vezes dominados por sais, o que indica pouca atuação da água sobre sua formação
e apresentam pequenas quantidades ou ausência de minerais secundários. Solos
maduros se caracterizam pelo equilíbrio com o ambiente. Apresentam quantidades
razoáveis de bases e outros nutrientes e possuem minerais primários e secundários.
Os solos considerados velhos são aqueles que já passaram por um longo processo de
intemperização, caracterizado pela ausência de bases, já removidas pela lixiviação e
pela abundância de minerais secundários.
Embora pareça fácil determinar a idade do solo, Lepsch (2011) salienta que
nem sempre a evolução significa diretamente idade cronológica, ou seja, um solo pode
ser considerado velho e ter idade cronológica menor que a de um solo considerado
jovem, se, por exemplo, o primeiro estiver sobre um material de origem mais difícil
de intemperizar, ou em clima que não favoreça o intemperismo, e o segundo estiver
sobre material de origem facilmente intemperizável ou em região de clima favorável
aos processos intempérico.

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 57
2.2.2 Processos de formação

Num ambiente qualquer, são inúmeras as combinações possíveis entre os


fatores de formação do solo (material de origem, clima, relevo, organismos) dentro
de um longo período de tempo. Estas interações geram os processos pedogenéticos,
que são os processos que de fato diferenciam os solos. Estes processos consistem
numa combinação de reações químicas, biológicas e físicas, cuja ação e intensidade
é condicionada pelos fatores ambientais, resultando em diferentes tipos de solos.
Os fatores fornecem as condições necessárias para que predominem
determinados processos, que, por sua vez, resultarão em solos com diferentes
propriedades e atributos. Idealmente são identificados cinco fatores distintos, já
descritos na sessão 2.2.1, mas cabe ressaltar que na natureza os fatores atuam
sempre de forma conjunta, o que dificulta a identificação dos limites de atuação de
cada um deles. De qualquer maneira, são os fatores presente e sua intensidade
que condicionam os processos de formação do solo e conferem propriedades e
características morfológicas e químicas distintas ao ponto de permitir a reconstrução
e entendimento da história do solo, desde o início da transformação do material de
origem até a atualidade.
Os principais processos pedogenéticos são a ferralitização e laterização,
lessivagem, gleização, carbonatação, salinização e sodificação, podzolização,
sulfurização, paludização. Destes, são mais importantes para a qualidade de
sedimentos os processos descritos abaixo.
O processo de Ferralitização predomina nas regiões tropicais e subtropicais
úmidas, nas quais a abundância de chuvas e altas temperaturas favorecem um
intemperismo químico intenso e rápido (Figura 2.8). Quando solo esta sob processo
de ferralitização ocorre intensa lixiviação dos cátions e básicos (Ca, Mg, K, Na) e do
silício liberados na alteração dos minerais.

Figura 2.8 – Solos formado com predomínio do processo de ferralitização. Trata-se de


Latossolo Vermellho em Mariópolis, PR. A cor intensa é devida a presença de
óxidos de ferro.
Foto: Bello (2004)

58 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
O ambiente oxidante favorece a formação de óxidos de ferro (goethita e
hematita) e de alumínio (gibbsita), que tendem a acumular. O silício remanescente no
sistema pode combinar-se com alumínio formando caulinita. Devido à acumulação
de Fe e Al no solo, esse processo é chamado de ferralitização. Os principais solos
formados nestas condições são os Latossolos e os Nitossolos. Estes solos em geral
são altamente lixiviados, ácidos e pobres em nutrientes. Do ponto de vista da produção
de sedimentos, os solos formados sob este processo são ideais, pois apresentam
boa estrutura física e portanto maior resistência aos processos erosivos e portanto
quando bem manejados ou sob vegetação nativa geram pouco sedimentos. Quanto
a qualidade dos sedimentos produzidos, nestes solos predominam argilas e óxidos,
que possuem cargas e podem transportar elementos tóxicos para os cursos hídricos.
A Lessivagem é basicamente um processo de translocação de minerais do
horizonte superficial para os horizontes subsuperficiais. O material transportado
geralmente é a fração argila fina (<0,2 μm). Este processo gera diferenciação entre
os horizontes, de forma que o superior por perder argila torna-se mais arenoso
e é chamado de horizonte eluvial, e o subsuperficial acumula argila, tornando-se
mais argiloso, sendo o horizonte iluvial. Existe nomenclatura específica para estes
horizontes, o que perde argila é representado pela letra E (somente quando o
processo é muito intenso) e o que ganha argila recebe a letra t, de textural, pois surge
uma diferença textural entre os horizontes. As classes de solo Argissolo, Planossolo
e Luvissolo são as principais classes de solo no Sistema Brasileiro de Classificação
que apresentam este processo.
Uma das características resultantes do acúmulo de argila no horizonte
B é a redução da capacidade de infiltração de água no solo, por isto estes solos
geralmente apresentam maior produção de sedimentos que aqueles formados por
Ferralitização. Como no horizonte superficial ocorre redução de argila, os riscos de
contaminação são menores, devido a menor quantidade de cargas presentes nos
sedimentos gerados.
Os processos Paludização e Podzolização são relacionados à presença de
materiais orgânicos. Do primeiro resultam as turfeiras e os Organossolos, e o segundo
caracteriza-se pela mobilização de materiais orgânicos dos horizontes superficiais
para subsuperficiais, gerando os Espodossolos. Sempre que há presença de matéria
orgânica, há presença de cargas elétricas, que podem acentuar processos de
contaminação ambiental quando os solos são utilizados sem critérios.
A Gleização dá origem aos Gleissolos, que se caracterizam pelas cores
acinzentadas, típicas de ambientes de redução. Este processo se caracteriza pela
ausência de oxigênio, ocorre em ambiente com excesso de água, nos quais ocorre a
redução do ferro, que resulta na mudança da coloração do solo, de tons avermelhados
e alaranjados para o cinza característico dos Gleissolos (Figura 2.9).
A presença de sais no perfil de solo pode elevar a produção de sedimentos,
devido a dispersão das argilas, e alterar a qualidade dos sedimentos produzidos
,especialmente quando há predomínio do Sódio. O processo de Salinização causa
o acúmulo de sais solúveis no perfil de solo, principalmente nos períodos de seca,
quando os sais do subsolo podem ser translocados para a superfície por capilaridade.
O processo de Sodificação ou Solonização causa o mesmo efeito, porém o sal

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 59
acumulado é o sódio, que passa a dominar a capacidade de troca catiônica (CTC)
do solo causando colapso da estrutura do solo, facilitando o processo erosivo e
potencializando a produção de sedimentos.

Figura 2.9 – (a) Paisagem com indícios de alagamento de água; (b) Perfil de solo nela formado
com predomínio do processo de gleização. A diferença de cor entre o horizonte
superficial e o subsuperficial deve-se à redução do ferro.
Fonte: www.landcareresearch.co.nz

2.2.3 Principais classes de solo

Antes de iniciar o tema classificação de solos é importante lembrar porque


se classifica qualquer objeto. Qualquer sistema de classificação, seja de elementos
pertencentes ao reino mineral, vegetal ou animal, serve em primeiro lugar para
estabelecer uma posição, por comparação, com outros indivíduos semelhantes e, a
partir daí, extrair informações básicas, mas de grande importância. Á classificação
de um objeto consiste em estabelecer relações entre o objeto em estudo e outros
objetos. Para isto é preciso algum conhecimento sobre o assunto em questão.
Propriedades diferentes geram indivíduos diferentes. O mesmo ocorre no
solo, como visto anteriormente, os fatores e processos de formação condicionam o
surgimento de solos distintos.
No Brasil, os solos são classificados de acordo como o Sistema proposto por
Embrapa (1999), conhecido como Sistema Brasileiro de Classificação de Solos.
O atual Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (SisBCS) é baseado
em níveis categóricos, que são conjuntos de classes definidas num mesmo nível de
generalização ou abstração e que devem incluir todos os solos que atendam esta
definição. Apresenta seis níveis categóricos: Ordens, Subordens, Grandes Grupos,
Subgrupos, Familias e Séries. Embora o Brasil tenha longa tradição na Classificação

60 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
de Solos, visto que os primeiros esforços neste sentido datam de meados dos anos
40, o SisBCS atualmente contempla do 1º ao 4º nível categórico, o 5º e 6º ainda não
estão sistematizados. O sistema possui ao todo 13 ordens distintas de solo, que
por sua vez apresentam sub-ordens de tal forma que no segundo nível categórico
existem 43 tipos distintos de solo, e assim sucessivamente, até o 4º nível categórico,
quando contam-se 447 tipos distintos de solos.
No 1º nível categórico, ou Ordem, as classes foram separadas de acordo
com características como presença ou ausência de um determinado atributo ou
horizonte diagnóstico, passíveis de serem vistas a campo. Este nível reflete, portanto,
os principais atributos deixados pelos processos de formação do solo. No 2º nível
categórico, ou Subordem, estão refletidos a atuação conjunta de processos ou fatores
que diferenciaram os processos dominantes e envolvem propriedades conferidas
pela gênese do solo que são muito importantes para o desenvolvimento das plantas
e uso do solo ou propriedades que reflitam variação dentro das classes do 1º nível.
No 3º nível categórico, ou Grandes Grupos, as classes são separadas por
uma ou mais das seguintes características: tipos e arranjamento de horizontes,
atividade de argila, condição de saturação, presença de horizontes ou propriedades
que restringem o uso do solo. O 4º nível categórico representa os Subgrupos, as
classes são separadas conforme representem o conceito central de solos daquela
classe (solos típicos), sejam intermediários para os demais níveis ou representem
solos com propriedades únicas.
A nomenclatura dos solos foi elaborada de forma a agregar importantes
informações técnicas. No primeiro nível categórico (ordem) os nomes são formados
pela associação entre um elemento formativo mnemônico e a terminação ssolos. As
principais características das classes estão listadas a seguir.

NEOSSOLOS: Grupamento de solos pouco evoluídos, com ausência de


horizonte B diagnóstico. São solo em via de formação, que tem
como característica a insuficiência de atributos diagnósticos,
pouca diferenciação de horizontes, com sequência A- C – R ou
A-R. Predominío de características do material de origem.

VERTISSOLOS: Solos cuja fração mineral é dominada por argilas com


propriedades vérticas. Desenvolvimento restrito em
função da expansão/contração do material constitutivo
(argilas),apresentam expressão e profundidade de ocorrência
dos atributos resultantes dos fenômenos de expansão e
contração.

CAMBISSOLOS: Grupamento de solos pouco desenvolvidos, com pedogênese


pouco avançada, porém com ausência ou quase da estrutura
da rocha, croma mais forte, matizes mais vermelhas, conteúdo
de argila mais elevado quando em comparação com a classe
dos Neossolos.

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 61
CHERNOSSOLOS: Solos com horizonte A rico em matéria orgânica e básico. A
evolução não muito expressiva, com manutenção de cátions
básicos e eventual acumulação de carbonatos.

LUVISSOLOS: Solos com horizonte B textural, argila de atividade alta e


saturação por bases alta. A evolução é marcada pela mobilização
de argila. Apresentam cores vivas.

ARGISSOLOS: Solos com B textural com argila de atividade baixa. Também


caracterizam-se pela mobilização de argila, mas são mais
intemperizados quando comparados aos Luvissolos.

NITOSSOLOS: Solos com B nítico, com argila de atividade baixa. Evolução


pedogenética, com estrutura em blocos ou prismática moderada
a forte. Apresenta cerosidade.

LATOSSOLOS: Solos com B latossólico, indicando evolução muito avançada


com expressivo processo de latolização.

ESPODOSSOLOS: Solos com B espódico, cuja a principal característica é a


eluviação de húmus ácido dos horizontes superficiais para os
horizontes subsuperficiais.

PLANOSSOLOS: Solos que apresentam desargilização intensa do horizonte


superficial e aumento no subsuperficial. Apresentam mudança
textural abrupta.

PLINTOSSOLOS: Apresentam processo de Plintitização expressiva, caracterizada


pela segregação de ferro que se acumula formando pequenos
nódulos concrecionários chamados de plintita.

GLEISSOLOS: Presença de gleização expressiva. São solos formados sob


hidromorfia, em ambiente que propicia a redução de ferro.
Podem apresentar presença e acúmulo de matéria orgânica.

ORGANOSSOLOS: Solos de natureza essencialmente orgânicos, sendo constituidos


preponderantemente por este tipo de material.

62 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
2.3 | ATRIBUTOS DA FRAÇÃO MINERAL DO SOLO E QUALIDADE DE
SEDIMENTOS

2.3.1 Textura e estrutura

A fase sólida do solo é composta por materiais minerais e orgânicos, que


no solo interagem continuamente conferindo importantes propriedades, tanto do
ponto de vista do solo em si, como do ponto de vista da produção e qualidade de
sedimentos.
O termo textura do solo é usado para significar as proporções relativas das
frações granulométricas observadas na fração mineral do solo. Para a classificação
das frações são utilizadas escalas como a de Atterberg, utilizada pela Sociedade
Internacional de Ciência do Solo e a escala de Wentworth. Para os solos brasileiros,
a EMBRAPA recomenda o uso da escala de Atterberg (Figura 2.10).

Areia Grossa Areia Fina Silte Argila

Esqueleto Areia Areia


do Muito Areia Areia Areia Muito
Silte Argila
Solo Grossa Grossa Média Fina Fina

Figura 2.10 – Escala de Atteberg (escala superior) e a adaptação feita pelo U.S.D.A. para
classificação de solos (escala inferior).

A textura do solo relaciona-se diretamente com atributos importantes para a


qualidade de sedimentos. Quanto maior a proporção das frações de tamanho menor,
maior a capacidade de troca de cátions, maior a capacidade do solo armazenar água,
se ligar a fração orgânica, aumentando sua estabilidade e também sua capacidade
de manter o solo estruturado.
A estrutura do solo (Figura 2.11) reflete a aglutinação das partículas primárias
em partículas compostas ou agregados, separadas umas das outras no solo por
planos de fraqueza ou por descontinuidade. Os agregados do solo apresentam
configurações peculiares que refletem o tipo de partícula mineral que compõem
o solo, o conteúdo de matéria orgânica e os processos físico-químicos ocorridos
durante a formação do solo e ainda a presença de elemento que causem distúrbios,
como elevada quantidade de sais, por exemplo. Por si só a estrutura não é um
parâmetro que determine maior ou menor potencial de uso agrícola de um solo ou
reflita na produção ou qualidade de sedimentos, mas controla uma série de fatores
que interferem, tais como a quantidade de água e ar do solo e a maior ou menor
suscetibilidade à erosão.
As partículas primárias do solo, areia, silte e argila, encontram-se agrupadas
formando partículas maiores, os agregados, que conferem a estrutura ao solo.
Esta constitui um dos atributos morfológicos mais importantes do ponto de vista de
identificação de horizontes dos perfis de solo (Resende et al., 1997; Oliveira, 1992;

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 63
Kiehl, 1979).
A formação da fase mineral do solo tem início com o intemperismo da rocha
que ocorre em longos espaços de tempo. Neste processo estão envolvidos clima,
relevo, fauna e flora, e características intrínsecas do material de origem. Estas
transformações, além de serem químicas e físicas, são sobretudo estruturais com
importante reorganização e transferência dos minerais formadores do solo entre os
níveis superiores do manto de alteração. A estrutura do solo é portanto o resultado da
busca de equilíbrio físico e químico entre os diversos novos compostos que surgem
no processo de formação do perfil de solo.

Blocos Angulares

Colunar Laminar

Blocos Subangulares

Prismática

Grãos Simples

Granular

Figura 2.11 –
Nomenclatura de estrutura do solo utilizados no Sistema Brasileiro de
Classificação do Solo. Além desta há também a estrutura massiva ou maciça.

Usualmente a estrutura é descrita quanto ao tipo de estrutura (Figura 2.11),


quanto ao grau de desenvolvimento e quanto ao tamanho, e avaliada quanto a
estabilidade dos agregados. Quanto ao tipo de estrutura, as classes são grânulos,
grumos, blocos, prismas, colunas e laminar. Os grânulos e grumos apresentam
formato arredondado, sem um eixo preferencial e diferem entre si pelo aspecto mais
poroso dos grumos, resultante normalmente de maior conteúdo de matéria orgânica
mineralizada. A estrutura em blocos caracteriza-se por apresentar faces planas sem
um eixo dominante e que no perfil de solo ficam justapostas. Este tipo de estrutura
está associada a processos de umedecimento e secamento, podendo estar portanto
também associada a outros fenômenos como a cerosidade, e pode ser subdividida
em blocos angulares e sub angulares. As estruturas prismática e colunar apresentam
eixo vertical de maior tamanho, e diferem entre si pelo aspecto arredondado na parte

64 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
superior da estrutura colunar e pelo aspecto compacto que esta apresenta. Por fim,
a estrutura laminar apresenta dominância do eixo horizontal. Maiores informações
sobre a estrutura dos solo podem ser encontradas na literatura específica.

2.3.2 Mineralogia

Os minerais do solo podem ser classificados quanto a sua composição ou


quanto ao processo de formação. No primeiro caso considera-se o elemento químico
ou grupo de elementos dominante em sua estrutura molecular. No segundo caso
se considera se o mineral é herdado do material de origem ou surge no solo como
resultado do intemperismo ou dos processos pedogenéticos. De acordo com esta
classificação os minerais são classificados como primários ou litogênicos, quando
provenientes da rocha que deu origem ao solo e secundários ou pedogêncios se
resultantes da pedogênese.
Por definição, minerais são elementos encontrados na natureza que
apresentam arranjo estrutural definido, de acordo com formas geométricas definidas.
O arranjo estrutural dos minerais obedece determinadas leis que caracterizam os
eixos e ângulos de uma figura geométrica, podendo ser cúbico, tetragonal, hexagonal,
ortorrômbico, monoclínio e triclínio. Quando o mineral atinge esta estrutura, é dito
cristalino; se não é dito não cristalino ou amorfo. Estas características, assim como
outras propriedades físicas e químicas que permitem identificação dos minerais na
rocha, permanecem no solo nos minerais primários, que geralmente compõem as
frações com tamanho superior a 50 mm. Apenas minerais de elevada resistência,
como o quartzo, permanecem no solo nas frações de tamanho inferior a este limite
em quantidades significativas. Outros minerais primários, como piroxênios, olivinas,
feldspatos anfibólios podem ser encontrados, mas em quantidades muito pequenas.
Em regiões de clima tropical ou sub tropical, como é o caso do Brasil, o intemperismo
ocorre de forma mais intensa, o que também contribui para a pouca expressividade dos
minerais primários na composição da fração mineral do solo. Por isso a participação
dos mesmos na composição dos sedimentos, e principalmente nos fatores que
influenciam a qualidade dos elementos, é pouco expressiva. No entanto, os minerais
primários representam uma reserva de nutrientes e outros elementos, que podem
ser liberados quando estes são destacados no solo no qual se encontram numa
condição estável, e transportados para outros meios em condições diferentes de pH,
temperatura e oxigenação.

2.3.2.1 Minerais não silicatados

Na classificação dos minerais presentes no solo baseada na composição


química usualmente adota-se a divisão de minerais silicatados e não silicatados. No
grupo dos minerais não silicatos estão os haletos, sulfetos e carbonatos e o grupo
dos óxidos hidróxidos e oxihidróxidos.
A principal característica do grupo dos haletos, sulfetos e carbonatos é a alta

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 65
solubilidade destes materiais e, portanto, a facilidade com que são intemperizados e
removidos do perfil. Sua acumulação só ocorre em situações bastante específicas,
por isso para o foco da qualidade de sedimentos apresentam pouca importância. No
grupo dos sulfitos, o principal mineral é a pirita, que aparece na natureza associada a
rochas formadas a partir de sedimentos orgânicos. No processo de oxidação da pirita
ocorre a formação de ácido sulfúrico, o que causa redução do pH do solo. Em áreas
de mineração de carvão os problemas decorrentes da acidificação do solo devido
à oxidação da pirita podem alterar os sedimentos, conferindo-lhes características
diferenciadas, mas este processo também é restrito a alguns locais e processos de
formação do solo.
Na classe dos minerais não silicatados, os mais expressivos para a
qualidade de sedimentos são os óxidos (termo geral utilizado para identificar óxidos,
oxihidroxidos e óxidos hidratados), presente na maioria dos solos brasileiros. Estes
são minerais secundários, formados no solo pelo intemperismo de outros minerais, e
podem possuir ferro, alumínio, manganês ou titânio em sua estrutura.
Os óxidos de ferro são os mais abundantes óxidos metálicos nos solos. Podem
ser utilizados como indicadores de ambientes pedogênicos e geoquímicos, pois além
de conferirem propriedades específicas, como a cor, por exemplo, podem persistir
no solo por longo tempo, mesmo após mudanças ambientais (Kampf & Curi, 2000).
Também são associados ao comportamento físico e químico do solo, em função
principalmente de sua elevada área superficial específica, e pelo caráter variável
de suas cargas, que podem assumir valores positivos (Inda, 2002). A presença de
cargas elétricas positivas, o que lhes permite ligarem-se a ânions é importantes no
contexto da limnologia, pois permite o transporte de elementos de baixa mobilidade
como por exemplo alguns compostos fosfatados, para os cursos hídricos.
Os óxidos mais comumente encontrados no solo são a goethita (α-FeOOH)
e a hematita (α-Fe2O3), além de outras formas menos frequentes como a maghemita
(γ-Fe2O3), magnetita (Fe3O4), ferrihidrita (Fe5O8x4H2O) e lepidocrocita (γ-FeOOH).
O elemento Fe ocorre em minerais primários na forma de Fe2+, o qual, após
a intemperização do mineral que o contém, é liberado, oxida a Fe3+ e precipita,
originando óxidos de ferro. No caso Fe3+, a precipitação do Fe origina ferrihidrita
ou goethita, dependendo da taxa de liberação do Fe durante o intemperismo. A
ferrihidrita é um óxido mal cristalizado que, por arranjo interno e desidratação, da
origem a hematita, sendo o precursor necessário para a formação desta. A goethita
forma-se de íons Fe3+ da solução ou dissolvidos da ferrihidrita.
Para o Fe2+, a partir da oxidação de sais do grupo hidroxi- Fe2+-Fe3+ (green rust)
poderão ser formadas a lepidocrocita ou goethita, ou ainda a ferrihidrita. Os fatores
que favorecem a formação de um ou outros destes óxidos são: concentração de Fe2+,
a velocidade de oxidação, a presença de carbonatos ou CO2 e a concentração de
Al (Kämpf, 1986). A formação dos óxidos é altamente influenciada pela quantidade
de água, de matéria orgânica, pH e tipo de clima. Maiores informações sobre estes
processos específicos podem ser obtidas em Kämpf & Curi (2000) e Inda (2002).
Todos os óxidos apresentam como característica comum a estrutura
superficial e a dependência de sua carga superficial ao pH do solo. Os cristais de
óxido de Fe no solo, frequentemente presentes em faixas de tamanho de 5 a 150nm,

66 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
exibem uma grande área superficial específica (70 a 170 m².g-1) e um alto ponto de
carga zero (PCZ pH 7 - 9) (Kämpf, 1997). A área superficial específica (ASE) varia de
acordo com a forma do cristal. Óxidos de baixa cristalinidade expõem maior ASE.
A ferrihidrita e a lepidocrocita são óxidos de baixa cristalinidade e de alta
reatividade, mas são metaestáveis, enquanto que a goethita e hematita são altamente
variáveis na sua formação, causando altas faixas de ASE e apresentando menor
reatividade e alta estabilidade em ambientes oxídicos.
Uma das principais características dos óxidos é a presença de cargas elétricas
que podem ser positivas ou negativas, dependendo o pH do solo. A superfície do
óxido pode ser hidroxilada ou hidratada (protonação e desprotonação do grupo OH)
gerando assim cargas positivas ou negativas, conforme ocorre adsorção ou desorção
de H+ ou OH-. Geralmente a carga líquida dos óxidos é positiva, pois em solos ácidos
o balanço entre cargas resulta em cargas positivas. No valor de pH 8 o balanço de
cargas é zero. Se o pH aumenta, superando este valor, o balanço de cargas passa a
ser negativo. A equação abaixo demonstra o processo de protonação/desprotonação
dos óxidos:

OH2 + OH2 0 OH -
+OH- +OH-
Fe A- Fe Fe C+
+ H+ + H+
-
OH2 OH OH
PCZ

Este é o modelo proposto por Schwertmann & Taylor, (1989) e a partir de seu
estudo percebe-se que os íons de Fe não participam diretamente no desenvolvimento
das cargas. O PCZ equivale ao ponto de carga zero, ou seja, o valor de pH em
que o balanço das cargas é zero. No solo quando ocorre aumento excessivo de
cargas superficiais positivas ou negativas estas são balanceadas por ânions (A-) ou
cátions (C+) em quantidade suficiente para preencher as cargas existentes, por isso
é possível inferir que a as cargas dos óxidos também dependem da concentração de
eletrólitos, valência e íons e da força iônica.
Os óxidos também conferem importantes propriedades físicas aos solos,
como cores típicas e capacidade de agregação elevada. Recentemente, também
têm sido associados aos processos de estabilização da matéria orgânica nos solos.

2.3.2.2 Minerais silicatados

Esta classe é de grande importância, cerca de 42% dos minerais que


compõem a fração sólida do solo são silicatados, e os argilominerais fazem parte
deste grupo. Junto com os óxidos e a matéria orgânica, as argilas compõem a dita
fração coloidal do solo, de grande importância devido à presença de cargas elétricas.
Por mineral silicatado entende-se aquele que possui silício em sua composição.
Na natureza, o silício (Si) não aparece puro, mas sim combinado com quatro átomos
de oxigênio, formando um tetraedro cuja fórmula pode ser escrita como (SiO4)4.

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 67
Como os íons de oxigênio são maiores que o silício, o arranjo tetraedral permite que
este último fique no centro da molécula, entre os oxigênios, como demonstrado na
Figura 2.12a. Outro fator importante do tipo de arranjo estrutural feito pelo silício é
a ausência de estabilidade eletrostática, ou seja, as cargas elétricas negativas do
oxigênio não são satisfeitas pelo silício, que possui apenas quatro cargas positivas,
de forma que restam cargas livres.
O silício pode também combinar-se com oxidrilas OH, formando ácido silícico
e assim tornar-se neutro, ou ainda ligar-se à moléculas de água, o que também
confere neutralidade elétrica à molécula.
Do ponto de vista de formação do solo e de sedimentos, o processo mais
importante é a capacidade de polimerização que o tetraedro de silício apresenta
(Figura 2.12b).

Figura 2.12 – Representação de um tetraedro de silício e da ligação entre tetraedros de silício.


Adaptado de: Meurer & Klamt (2000)

Os tetraedros são capazes de compartilhar os oxigênios das arestas, dando


origem a estruturas mais complexas. Outro arranjo possível é o octaedro de alumínio
ou de magnésio, no qual um destes elementos coordena seis oxidrilas OH. Nesta
estrutura, o alumínio ou o magnésio também ocupam a posição central, e as cargas
elétricas não são satisfeitas.
Os argilominerias do solo são todos formados por diferentes combinações
destas estruturas básicas, o que lhes confere diferentes propriedades das quais as
mais importantes são a elevada superfície específica, a capacidade de adsorção de
íons e a capacidade de expansão, presente em alguns argilominerais.
O agrupamento dos tetraedros de silício dá origem a uma lâmina, assim
com o agrupamento de octaedros de alumínio. A combinação destas lâminas permite
classificar os argilominerais em duas categorias: aqueles formados pela repetição do
arranjo de uma lâmina de tetraedros para uma lâmina de octaedros, ditos minerais
1:1 (representação gráfica na Figura 2.13) e aqueles formados por uma lâmina de
tetraedros, uma lâmina de octaedros e mais uma lâmina de octaedros, ditos minerais
2:1.

68 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
Oxigênio Silício

Tetraedro de Silício
Lâmina Tetraedral

Figura 2.13 – Representação de um tetraedro de um mineral 1:1.


Adaptado de: http://www.soils.wisc.edu

A ligação das camadas pode ser feita por ligação eletrostática entre os O e
OH, por pontes de cátions como o K, Ca, Mg entre outros ou ainda por forças de van
der Waals (Sparks, 1995).

2.3.3 Origem das cargas dos argilominerais

As cargas presentes nos argilominerais são oriundas do arranjo de suas


camadas. Dois processos são considerados como geradores de cargas nas superfícies
destes minerais (Ajayi et al., 2009). O primeiro é a substituição isomórfica, que
confere cargas permanentes ao argilomineral. Neste processo, durante a formação
do mineral, ocorre a substituição de um elemento por outro, de raio iônico semelhante,
mas de carga elétrica diferente. Se, por exemplo, o Si for substituído por Al, ao invés
das cargas tetravalentes do primeiro, estarão presentes as cargas trivalentes deste
último, o que causa um desbalanço do qual resulta uma carga elétrica disponível
para realizar ligações com outro elemento.
Outro processo é o que dá origem às cargas variáveis, que podem existir ou
não no solo, dependendo do pH do meio. Isto ocorre porque estas cargas são geradas
nos grupos superficiais terminais dos argilominerais, que são formados basicamente
por grupos OH. Estes grupos são coordenados pelo Al, formando aluminol, ou pelo
silício, formando o silanol, e sempre apresentam um desbalanço de cargas. Quando o
pH do meio aumenta, o hidrogênio do grupo OH se dissocia, e o oxigênio permanece
ligado ao Si ou Al da estrutura. Assim, o hidrogênio torna-se trocável, e, como a
lâmina do argilomineral é formada por milhares de grupos aluminol e silanol, este
processo ocorre ao longo de toda a estrutura, resultando que toda a superfície do
mineral adquire um caráter eletronegativo. Assim, cátions que estejam presentes na
solução do solo são atraídos para a superfície do argilomineral. Este processo é mais
importante nos argilominerais do grupo 1:1 que naqueles do grupo 2:1, nos quais
predomina a formação de carga por substituição isomórfica.

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 69
2.3.4 Principais argilominerais

Os principais minerais do grupo 1:1 que ocorrem em solos brasileiros são a


caulinita e a haloisita. A caulinita apresenta forte ligação entre a lâmina tetraedral e a
lâmina octaedral, por isso é inexpansível, ou seja, a distância entre suas camadas
não varia. A haloisita pode conter moléculas de água entre as camadas, por isso
pode expandir a distância entre elas. Ambas apresentam muito pouca substituição
isomórfica, de forma que a maioria de suas cargas encontram-se balanceadas, o
que condiciona pouca cargas disponíveis. A geração de cargas nestes minerais
geralmente ocorre por dissociação de prótons, sendo portanto pH dependentes.
A caulinita é um argilo mineral não expansivo, com distancia basal de 0,72 nm
e cuja fórmula estrutural pode ser escrita como Al2Si2O5(OH)4 resultando, portanto,
em carga elétrica neutra e é o argilomineral predominante nos solos brasileiros. Do
ponto de vista agronômico, a ausência de cargas elétricas pode ser negativa, pois
significa menor capacidade de reter cátions no solo. Em alguns solos a caulinita
pode apresentar uma capacidade de troca variando entre 1 a 5 cmolc kg-1 devido
principalmente a superfície basal do silício, o que dá origem a cargas negativas, ou
cargas positivas e negativas nas lâminas laterais pela presença dos grupos AlOH.
Para a qualidade de sedimentos, esta característica pode ser vista como inatividade
química, e portanto impossibilidade de ligar-se a outros elementos e transportá-los
para outros ambientes. No entanto, a capacidade de gerar cargas pH dependentes
pode fazer com que estes minerais adquiram a capacidade de carrear materiais
adsorvidos em sua superfície. Kämpf & Curi (2003) afirmam que devido a protonação
e dissociação a caulinita em solos ácidos apresenta balanço de cargas positiva,
atraindo anions para sua superfície. Esta cargas podem ser utilizadas para reter
nitratos em solos agrícolas e, portanto, é de se esperar que, se houver processo de
desagregação que de origem a sedimentos, estes podem transportar nitratos para
outros ambientes, dando origem a processos como o bloom de algas.
No grupo 2:1 os principais minerais são as micas (ilita, muscovita, flogopita,
biotita) a vermiculita e a esmectita. A mica apresenta alumínio, magnésio e ferro na
lâmina octaedral. A substituição isomórfica ocorre com frequência, parte das cargas
geradas é compensada com cátions K, resultando em ausência de expansão, devido
à força da ligação.
A vermiculita apresenta elevada capacidade de expansão em água e maior
substituição isomórfica na camada de tetraedros, que resulta em cargas negativas
entre camadas. A capacidade de expansão associada à presença de cargas faz com
que este mineral apresente a maior capacidade de troca de cátions.
As esmectitas, anteriormente chamadas de montmorilonitas, apresentam
substituição isomórfica predominantemente na lâmina octaedral, na qual o Mg2+ ocupa
o lugar do Al3+. Sua fórmula pode ser escrita como [M+0,5(Al1,5Mg0,5)(Si4)O10(OH)2]
Estes minerais são de tamanho pequeno, o que lhes confere elevada área superficial
específica, elevando a capacidade de reter íons e moléculas orgânicas e inorgânicas.
A capacidade de troca das argilas deste grupo é estimada em 50 a 160 cmolc kg-1.
As esmectitas são os argilominerais com maior capacidade de adsorver elementos
como herbicidas, fungicidas e inseticidas, o que pode fazer com que sedimentos de

70 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
áreas em que este mineral predomina sejam potenciais contaminantes ambientais.

2.3.5 Reações químicas no solo

Entre os componentes da fração mineral da fase sólida do solo, alguns têm


propriedades específicas, que lhes confere capacidade de reagir quimicamente.
Estes componentes são chamados de colóides do solo. São eles a matéria orgânica,
as argilas e os óxidos. As propriedades da matéria orgânica serão discutidas num
capitulo específico, por isso o foco deste item será nas reações químicas que a
fração mineral pode realizar no solo.
Um dos principais atributos dos colóides é a elevada área de superfície
específica (ASE). Este fenômeno ocorre porque quanto menor o diâmetro de uma
partícula, maior sua superfície específica, que é a relação entre a superfície de um
corpo e sua massa (Figura 2.14). No caso dos argilominerais, capazes de expor
também a superfície interna das camadas, a ASE aumenta no sentido das argilas 1:1
não expansivas para as 2:1 expansivas. Resende et al. (1997) afirmam que toda a
área de um campo de futebol pode estar contida em 500 a 1000 gramas de caulinita
(1:1) ou em cerca de 14 g de esmectita (2:1). O conjunto das cargas presentes nos
colóides e sua elevada ASE dão origem a uma série de fenômenos, entre os quais a
adsorção e troca iônica.

Arestas Arestas de
de 1m 0,001m

ASE = 6m²
ASE = 600m²

Figura 2.14 – Representação gráfica da formação da área de superfície específica. A massa é


conservada, mas a superfície aumenta.

Adsorção é a forma como os constituintes minerais presentes no solo ficam


retidos na superfície dos colóides. Este fenômeno impede que os elementos sejam
rapidamente lixiviados do perfil de solo e, ao mesmo tempo, não é tão forte a ponto
de impedir que os elementos sejam absorvidos pelas plantas.
Os elementos presentes no solo podem ficar adsorvidos na superfície dos
colóides através de uma série de mecanismos químicos, como forças de van der Waals,
pontes de hidrogênio, ligações covalentes e coordenação. No solo, a quantidade de
íons adsorvidos está em equilíbrio com a quantidade e íons em solução. Como as
ligações são em sua maioria de natureza eletrostática, estas podem ser facilmente

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 71
revertidas, como ilustrado na Figura 2.15. Neste exemplo, ocorre deslocamento dos
cátions trocáveis que estavam adsorvidos na superfície pelo efeito de massa da
adição de grande quantidade de cálcio no solo.

Figura 2.15 – Representação gráfica do efeito da lei das massas no solo. Os cátions NH4+, em
maior quantidade, deslocam os demais da superfície dos colóides até que se
atinja um novo equilíbrio com a solução do solo.

Esta reação é estequiométrica, reversível e ocorre de forma rápida, ou seja,


as trocas são numericamente acertadas em valência e quantidade de íons. As reações
ocorrem nos dois sentidos, se aumentar demais a concentração de um elemento
num dos lados da reação esta se deslocará para o outro lado até atingir o equilíbrio.
Como esta reação ocorre largamente na natureza, ela é de grande importância para
a qualidade de sedimentos, especialmente aqueles provenientes de áreas agrícolas
ou áreas que receberam algum tipo de tratamento químico ou lodos.
Os solos brasileiros são em sua maioria muito intemperizados, por isso
apresentam elevada quantidade de argilas, nas quais predominam as cargas
negativas, por isso fenômeno da troca de cátions (capacidade de troca catiônica,
CTC) adquire grande importância. CTC é, portanto, uma medida da capacidade
de cátions que o solo pode reter. Esta informação é muito importante no contexto
agronômico, e também pode ser valiosa para estimar o potencial de transporte de
elementos das encostas para os cursos de água via sedimentos. Usualmente, a CTC
de um solo pode ser determinada com uma solução salina neutra que não interfira
no pH do solo, para que não se manifestem as cargas pH dependentes, ou então
utilizando-se uma solução tamponada a um valor de pH (por exemplo, a pH 7). Neste
caso, a CTC determinada é dita potencial, pois ativou-se as cargas pH dependentes,
que nem sempre estão presentes no solo. No caso anterior tem-se a CTC efetiva.
Os principais cátions presentes nos solos são Ca, Mg, K, Na, Al e H, sendo
os quatro primeiros chamados de bases trocáveis. A soma das quantidades deles
presentes no solo é o valor S ou soma de bases.
A CTC do solo depende ainda do tipo de argilomineral presente, de sua
quantidade no solo e também do conteúdo de matéria orgânica. Solos argilosos
apresentam maior CTC que solos arenosos, e da mesma forma, solos dominados
por argilas 2:1 apresentam CTC maior que solos dominados por argilas 1:1. Estas

72 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
propriedades transmitem-se para os sedimentos gerados nestas áreas.
Os cátions não são retidos de maneira homogênea na superfície dos
argilominerais, a valência interfere na força com que ele será retido. A ordem de
retenção é:
Al3+ > Ca2+ > Mg2+ > K+ > Na+

2.3.6 Modelos de distribuição de cargas

A importância do fenômeno de retenção de elementos na superfície dos


colóides minerais e orgânicos do solo deu origem a teorias que explicam como os
íons ficam retidos. Um dos modelos mais adotados é o de Gouy-Chapman, ou da
dupla camada difusa. De acordo com esta proposição, os íons ordenam-se em torno
da superfície dos colóides, dando origem às camadas. A primeira camada, mais
próxima da superfície, é composta basicamente por cátions, devido a influência da
superfície do mineral que é negativa. Esta primeira camada é chamada de camada
de Stern. Como os ânions não se aproximam da superfície, ficam afastados e, assim,
acabam por atrair as cargas dos cátions, que passam então a contrabalançar a
eletronegatividade da superfície dos ânions repelidos, formando então uma espécie
de nuvem eletrônica que da origem a segunda camada, chamada de camada difusa.
Esta camada vai difundindo-se até atingir equilíbrio com a solução do solo. Quanto
maior a carga de um íon mais fortemente ele será atraído pela superfície. Este fator
interfere diretamente na espessura da dupla camada. Íons monovalentes fazem
dupla camada mais espessa que os divalentes. Uma aplicação prática deste principio
é o processo de dispersão de partículas para análise textural. Geralmente utiliza-
se como dispersante o NaOH, que quando dissocia-se origina íons monovalentes
aumentando a espessura da dupla camada e gerando a dispersão.
Os íons presentes na solução do solo podem formar os complexos de
superfície com a fase sólida do solo. Dependendo da energia de ligação do íon estes
complexos são chamados de complexos de esfera externa (quando a energia de
ligação é baixa e o íon pode ser facilmente removido da superfície) ou complexos de
esfera interna, quando o íon é fortemente retido. A Figura 2.16 demonstra a diferença
entre os dois processos. Na natureza, a maioria dos íons encontram-se solvatados,
ou seja, estão cercados de moléculas de água, e quando se ligam à superfícies não
perdem a água de solvatação.
Isto faz com que estes íons sejam fracamente adsorvidos, pois a molécula
de água se interpõe na ligação com a superfície, e o íon não coordena diretamente
com os elétrons da superfície. Nos processos de formação de complexo de esfera
interna não há moléculas de água entre o íon e a superfície, permitindo a ligação
direta com o grupo funcional do colóide, o que dá origem a ligações muito fortes. Este
processo é altamente dependente do pH do meio, a reação é seletiva, independe da
concentração do íon na solução do solo e tende para a irreversibilidade.
Este processo tem grande importância para a qualidade de sedimentos, pois
a maioria dos metais realiza este tipo de ligação.

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 73
Figura 2.16 – Representação gráfica do complexo de esfera externa (para o cátion Ca2+) e
complexo de esfera interna (para o íon H2PO4) Os cátions Ca2+ não perdem a água
de solvatação.

2.3.7 Ponto de carga zero (PCZ)

Algumas das cargas elétricas presentes no solo variam em função o pH do


meio. Estas cargas são diretamente relacionadas com a atividade dos íons H+ e OH-,
cuja atividade no solo se traduz em variações de pH.
O ponto de carga zero, ou PCZ, é o valor de pH em que o balanço de cargas
positivas e negativas presentes no solo é igual a zero. Este valor é uma característica
de cada solo, varia conforme a mineralogia e o conteúdo de matéria orgânica do solo.
Abaixo do PCZ ocorre predomínio de cargas positivas no solo, e acima dele
ocorre predomínio de cargas negativas. O valor de PCZ da fase sólida é variável,
alguns óxidos apresentam valores próximos a 8,0, enquanto a matéria orgânica
possui PCZ igual a 3,0. A maioria dos solos apresenta valores baixos de PCZ para
os horizontes superficiais devido a presença de matéria orgânica.
O PCZ tem importância na qualidade de sedimentos porque interfere no tipo
de material que poderá ser removido de uma área juntamente com os sedimentos.
Quando varia o PCZ varia a capacidade de transportar anions ou cátions e, portanto,
ocorrerá variação no potencial de contaminação do sedimento.

2.3.8 Processos de oxi-redução

Oxidação significa aumentar o número de oxidação positivo ou diminuir o


número de oxidação negativo de um elemento. O elemento oxidado recebe O, e
o elemento reduzido perde O. Percebe-se que uma reação redox sempre envolve
transferência de elétrons, em número inteiro, e necessita, portanto, de um doador de
elétrons e de um receptor.
Este fenômeno tem importância na qualidade de sedimentos porque muitos
metais tornam-se mais tóxicos ao alterar seu estado de oxidação. Em condições de

74 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
solo natural, os elementos que podem oxi-reduzir são carbono, nitrogênio, oxigênio,
enxofre, manganês e ferro. Outros metais como o cromo, chumbo, arsênio, etc,
também podem sofre oxi-redução, mas não são usualmente encontrados em solos.
O que determina a ocorrência de uma reação redox é a mudança de potencial,
que gera um campo de força, ou pela força eletromotriz.
O potencial de reação redox pode ser medido conforme expresso na equação
abaixo, adaptada de Camargo et al. (2001):

ox + n elétrons → reduzidos

Onde: ox é a forma oxidada da espécie química e bioquímica em questão, e n é um


número inteiro de elétrons transferidos pelo oxidante resultando na forma reduzida.

Em sistemas abertos, como o solo, os reagentes e produtos não possuem


atividades unitárias, por isso o potencial redox padrão Eo é corrigido utilizando-se a
equação de Nernst:

Eh = Eo ox, red - RT ln (red)


nF ox

ou para 25º C:

Eh = Eo ox, red - 0,059 ln (red)


n ox

Onde: R = constante dos gases (8,314 JK-1 mol-1), T = temperatura absoluta (K), F
= faraday (9,65x104 Cmol-1), (red) e (ox) são, respectivamente, as atividades das
espécies reduzidas e oxidadas, e Eº ox,red é o potencial padrão de meia célula. Eo
ox, red é definido como o potencial Eh no qual (red) = (ox) sendo a medida feita com
referência a um eletrodo de hidrogênio “normal” à cuja meia célula é arbitrariamente
estabelecido o potencial zero volt.

Os valores de Eh mudam conforme a condição de oxigenação do solo,


podendo atingir valores próximos a 800 em solos muito oxidados e valores próximos
a -500 em solos extremamente reduzidos (Jackson, 1973).
Outra forma de medir a atividade eletrônica é através do pE, logaritmo
negativo da atividade eletrônica da solução. O fator de conversão para a unidade é
Eh (mV) = 59,2 pE (Lindsay, 1979, citado por Camargo et al., 2001). Valores positivos
altos de pE propiciam a ocorrência de formas oxidadas, enquanto valores baixos ou
negativos propiciam a ocorrência de espécies reduzidas. Também é possível construir
diagramas Eh – pH, como sugerido por Sparks (1995). Esta proposição parte da
constatação de que independentemente do ambiente, que é extremamente variável,
especialmente quando trata-se de sedimentos que podem ser gerados em ambiente
com uma característica, transportados em outro e depositados num terceiro, em

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 75
última análise todas as reações tratam do comportamento de prótons e elétrons.
A importância das reações de redução vem da possibilidade destas em
aumentar ou diminuir a concentração dos elementos em solução. Em alguns casos
aumenta-se a solubilidade porque o elemento em sua forma reduzida é mais solúvel
que o elemento em sua forma oxidada e desta maneira aumenta a concentração do
elemento na solução do solo. O manganês sofre este efeito ao ser reduzido. Sua
forma Mn2+ é mais solúvel que as demais.
O inverso também pode ocorrer, ou seja, a redução pode reduzir a concentração
de um elemento porque sua forma reduzida é menos solúvel que a oxidada. Para a
qualidade de sedimentos talvez o elemento com mais importância seja o cromo, que
é oxidado de Cromo III para Cromo IV quando na presença de óxidos, comuns em
solos tropicais. A espécie Cromo IV é altamente tóxica e potencialmente cancerígena
para seres humanos.

2.4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS


O planeta Terra é um sistema no qual diversos reservatórios estão em
constantemente fluxo de energia e matéria. Embora usualmente o ambiente seja
dividido em diversos compartimentos para facilitar seu entendimento, os processos
ambientais que tem importância do ponto de vista da qualidade de sedimentos, tais
como erosão, transporte, contaminação, difusão entre outros não ocorrem de forma
isolada. Os ciclos bio-geoquímicos que ocorrem na superfície do planeta afetam e
são afetados nas fases em que passam pelo solo, água e ar, por isso a compreensão
destes ambientes é fundamental quando se busca a mitigação ou minimização dos
efeitos de contaminação das ações antrópicas. Embora o transporte e deposição
de sedimentos ocorram de forma natural na superfície do planeta, a ações mal
conduzidas são o principal fator de aceleração deste processo.
O entendimento do local em que foi gerado o sedimento, especialmente do
solo, permite avaliar de forma mais precisa quais são os riscos de contaminação
presentes, e quais as possíveis mudanças que podem ocorrer com o sedimento em
outros locais. Desta maneira é possível controlar e estabelecer formas de manejo
que favoreçam a manutenção da qualidade da água e do ambiente.
Os fatores e processos de formação do solo condicionam o produto final
de forma a acentuar ou atenuar a suscetibilidade ao processo erosivo e a produção
de sedimentos, interferindo assim na sustentabilidade e qualidade ambiental de
sistemas antropizados.

2.5 | BIBLIOGRAFIA CITADA E CONSULTADA

AJAYI, A. E. et al. 2009. Relation of strength and mineralogical attributes in Brazilian latosols.
Soil and Tillage Research, v.102, pp.14-18.

76 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
BELLO, I. R. 2004. Relatório técnico anual. Ano base 2004. Secretaria de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Econômico do Município de Mariópolis. Mariópolis, PR.

BOHN, H. L.; McNEAL, B. L.; O´CONNOR, G. A. 1979. Soil Chemistry. New York, John
Willey & Sons.

BOUL, S. W.; HOLE, F. D.; McCRACKEN, R. J. 1973. Soil Genesis and Classification.
Ames: The Iowa State University Press.

BOUMA, J.; DROOGERS, P.; PETERS, P. 1999. Defining the Ideal Soil structure in surface
soil of a typic Fluvaquent in the Netherlands. Soil Sci. Soc. Am. J., v.63, pp.343-
348.

BOURG, I.; SPOSITO, G. 2011. Molecular dynamics simulations of the electrical double
layer on smectite surfaces contacting concentrated mixed electrolyte (NaCl-CaCl2)
solutions. J. Colloid Interface Sci., v.360, pp.701-715.

BRADY, N. C.; WEIL, R. 2007. The Nature and Properties of Soils. 14a edição. Ed.
Pearson, New York.

BREWER, R.; SLEEMAN, J. R. 1988. Soil Structure and Fabric. Adelaide, Australia,
SCIRO – Division of Soil.

CAMARGO, O. A.; ALLEONI, L. A. F.; CASAGRANDE, J. C. 2001. Reações dos Micronutrientes


e Elementos Tóxicos no Solo. IN: FERREIRA, M. E. et al. (ed). Micronutrientes e
elementos tóxicos na agricultura. CNPq,FAPESP, POTAFOS.

EMBRAPA. 1999. Sistema Brasileiro de Classificação de Solos. Embrapa Solos, Rio de


Janeiro. Brasília.

INDA, A. V. 2002. Caracterização de goethita e hematita em solos poligenéticos. Porto


Alegre, UFRGS. 126p. Dissertação de doutorado.

JENNY, H. 1994. Factors of soil formation: A system of quantitative pedology, Dover


publicatins, New York (original published 1945).

KÄMPF, N. 1986. O ferro no solo. Porto Alegre, UFRGS, pp.35-71.

KÄMPF, N. 1997. Iron oxides in Tropical soils. In: TWAS, ABC. Workshop on Tropical soils.
Rio de Janeiro, pp.56 – 64.

KIEHL, E. J. 1979. Manual de Edafologia. São Paulo, Editora Ceres.

LEMOS, R. C.; SANTOS, R. D. 1996. Manual de descrição e coleta de solo no campo. 3a


edição, Campinas, SP, SBCS.

LEPSCH, I. 2011. 19 Lições de Pedologia. 1ª edição, Oficina de Textos, São Paulo.

MEURER, E. J. 2000. Fundamentos de química do solo. Genesis, Porto Alegre. 174p.

OLIVEIRA, J. B.; JACOMINE, P. K. T.; CAMARGO, M. N. 1992. Classes gerais de solo do


Brasil: guia auxiliar para seu reconhecimento. 2a ed. Jaboticabal, FUNEP.

RESENDE, M.; CURI, N.; REZENDE, S. B.; CORRÊA, G. F. 1997. Pedologia: Base para
distinção de ambientes. 2aed. Viçosa. NEPUT.

SCHWERTMANN, U.; TAYLOR, R. M. Iron oxides. In: DIXON, J. B.; WEED, S. B. 1989.
Minerals in soil environments. Soil Science Society of America, Madison,
Wisconsin, pp.379-438.

SPARKS, D. L. 1995. Enviromental soil chemistry. Academic Press, San Diego, California,
USA. 267p.

SPOSITO, G. 1989. The chemistry of soils. New York: Oxford University Press. 277p.

Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos | Capítulo 2L 77
STUCKI, J. W.; GOODMAN, B. A.; SCHWERTMANN, U. 1988. Iron in soils and clay
minerals. Reidel Publishing Company, Dordrecht, Holland. 893p.

VEZZANI, F.M.; MIELNICZUK, J. 2009. Uma visão sobre qualidade do solo. Rev. Bras.
Ciênc. Solo, v.33, n.4, Viçosa.

WAMBEKE, A. VAN. 1992. Soils of the tropics. McGraw-Hill, New York. 343p.

78 M Capítulo 2 | Relação entre a fração mineral do solo e qualidade de sedimentos – o solo como fonte de sedimentos
Metodologias para Estudos de
Sedimentos: Ênfase na Proporção e na
Natureza Mineralógica das Partículas
Capítulo 3

METODOLOGIAS PARA ESTUDOS DE SEDIMENTOS: ÊNFASE NA


PROPORÇÃO E NA NATUREZA MINERALÓGICA DAS PARTÍCULAS
Edson Campanhola Bortoluzzi & Cristiano Poleto

3.1 | INTRODUÇÃO
O presente capítulo se propõe a apresentar e discutir algumas metodologias
e seus instrumentos de relevante importância para o estudo de constituintes de solos
ou sedimentos. Uma atenção especial será dada às metodologias que permitem o
estudo do tamanho das partículas e da natureza mineralógica. Vale ressaltar que
os organismos vivos presentes em no solo e no sedimento são também relevantes,
porém não serão abordados aqui.
Nesse contexto, algumas considerações básicas acerca dos constituintes
minerais devem ser relembradas antes das metodologias serem apresentadas.
Primeiro, entende-se por partícula mineral uma partícula natural cuja estrutura sólida
pode ser amorfa ou apresentar diferentes graus de cristalinidade. As partículas
minerais apresentam uma composição química definida e propriedades físico-químicas
intrínsecas. Entretanto, elas podem variar em tamanho, forma e as propriedades em
concordância com sua natureza química e mineralógica. No geral, essas características
são dependentes do grau de evolução do material que deu origem as partículas. Por
exemplo, nos solos partículas mais finas e mal cristalizadas são geralmente mais
antigas e sofreram em consequência maior grau de alteração. Também, partículas
com estrutura cristalográfica similares, podem se apresentar adicionalmente com um
ou outro cátion na estrutura (Dixon & Weed, 1989). Isso é importante porque pode
determinar o tipo de mineral e as suas propriedades físico-químicas.
Outro ponto que merece atenção é a capacidade apresentada pelas partículas
de se associarem (forças de coesão), quer sejam partículas de mesma natureza ou de
natureza diferentes (associações entre argilominerais - óxidos - compostos orgânicos)
(Chenu, 2001). Tal capacidade confere aos constituintes propriedades interessantes.
Entretanto, causam problemas quando se deseja conhecer as características e
propriedades elementares dos constituintes de materiais heterogêneos. Por exemplo,
a distribuição de tamanho de partículas em classes de tamanho e sua função no
todo é afetada pela formação de agregados - assembléia de partículas elementares
devido à existência de ligantes orgânicos ou minerais.
Em particular os estudos sobre sedimentos devem considerar as associações
entre as partículas e sua natureza. Partículas em suspensão na água de rios,

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 81
lagos e mares são constituintes normalmente minerais e orgânicos, pertencentes
a diferentes frações (em tamanho), que se originaram de superfícies da crosta
terrestre sensíveis ao processo de erosão. Áreas agrícolas e de estradas de terra
são potencialmente produtoras de sedimento (Minella et al., 2007). Por este motivo,
as partículas presentes no sedimento se constituem de tamanho, forma e natureza
mineralógica variadas, mas concordante com o tipo de material que as originaram.
Nesse sentido, pode ser possível rastrear a região de origem do sedimento por meio
da análise de sua constituição mineralógica (Hsieh, 1984), como também, permite
melhor compreender processos acerca da transferência de poluentes dos sistemas
terrestres aos aquáticos (Pellegrini et al., 2010; Rheinheimer et al., 2010). Já, a
estimação da reatividade do sedimento como um todo passa pela identificação da
natureza e reatividade das partículas que compõem os sedimentos. Por essa razão,
determinar parâmetros, tais como a proporção do tamanho das partículas de um
sedimento e a natureza mineralógica destes, além das propriedades físico-químicas
intrínsecas a estas partículas, são fundamentais e devem integrar os estudos sobre
sedimentos (Filella et al., 1997; Ledin et al., 1995).
Estudos de materiais heterogêneos do ponto de vista granulométrico e
mineralógico como são os solos e sedimentos demandam a aplicação de forma
conjugada de várias técnicas e metodologias. A distribuição do tamanho de partículas
em uma amostra diz respeito a uma quantificação relativa de classes de tamanhos de
partículas elementares constituídas numa amostra. Em função disso, é fundamental
desagregar as partículas para que possamos de maneira matemática agrupá-las em
classes para aplicar outros métodos. A caracterização mineralógica de uma amostra,
por exemplo, é realizada sobre classes de tamanho de partículas específicas ao
objetivo do estudo, normalmente a classe argila (< 2 μm) considerada mais reativa.
Por fim, estudos que necessitem a caracterização de materiais heterogêneos, como
sedimentos e solos, devem conjugar técnicas de pré-tratamento de amostras, de
extração de frações granulométricas definidas e de caracterização mineralógica.
Nesse sentido, o presente capítulo preocupa-se em apresentar algumas
metodologias sobre granulometria e mineralogia, utilizadas em estudos de partículas
minerais, como sedimentos. Nosso objetivo é também tecer comentários acerca
destas técnicas. Métodos clássicos que usam a lei de Stokes e instrumentais
que usam a difração laser serão abordados para contemplar as metodologias de
determinação do tamanho de partículas, assim como a área superficial específica e
a difração de raios-X, métodos usados para caracterizar quali-quantitativamente os
materiais, inclusive sedimentos.

3.2 | PRINCIPAIS MÉTODOS DE ESTUDO DE PARTÍCULAS

3.2.1 Pré-tratamento de amostras

O pré-tratamento de amostras de sedimento e solos consiste basicamente


em operações que eliminam a ação de agentes ligantes que são responsáveis por

82 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
formar associações ou agregados de partículas de tamanhos elementares diferentes.
As técnicas normalmente utilizadas para esse fim apresentam algumas variações
quanto à quantidade inicial de material a ser utilizada, a natureza e a concentração dos
reagentes dispersantes e o grau de estresse mecânico que a amostra é submetida.
Nesse sentido, este capítulo se preocupará mais com o princípio da medida do que
com as possíveis variações dos métodos.
A premissa básica para qualquer determinação granulométrica é partir de uma
dispersão total e homogênea da amostra. Isso permitirá a separação e a estimação
de uma determinada classe de tamanho de partículas entre todas as partículas da
amostras. Para isso, a subtração de agentes de cimentação, como a matéria orgânica
óxidos de Fe e Al que fazem a ponte entre partículas pode ser necessária. Convém
notar que as técnicas aqui descritas são algumas entre tantas outras utilizadas,
como a eliminação de sais e de carbonatos descritas detalhadamente em EMBRAPA
(1997), AFNOR (1996) e Kunze & Dixon (1986).

3.2.1.1 Eliminação da matéria orgânica

A eliminação da matéria orgânica (MO) é realizada por oxidação, através


do contato com peróxido de hidrogênio (H2O2, 30% v/v). Para isso, coloca-se uma
massa de amostra em Becker e adicionando-se paulatinamente um volume de
H2O2. Uma efervescência devido a evaporação de CO2 é observada, o que indica a
oxidação da MO. Esse processo persistirá até a total destruição desse constituinte
(existirá sempre um traço de compostos orgânicos intimamente ligados às argilas).
Após esse processo, pode-se aquecer a amostra de solo até 60ºC sobre areia, a fim
de eliminar o peróxido de hidrogênio que não reagiu. Para amostras de sedimentos,
não ultrapassar 40ºC (Horowitz, 1991; Mudroch et al., 1996).
Nos casos onde se procura estudar o efeito da MO no material a eliminação da
MO pode ser em apenas metade da amostra. Também em alguns estudos suprime-se
o tratamento em casos de baixo teor de MO. O julgamento na escolha ou não desse
pré-tratamento deve levar em conta o objetivo do estudo, por consequência, o tipo
de resultado que se deseja. Em todo o caso é necessário mencionar na descrição da
metodologia.

3.2.1.2 Eliminação de Fe e Al livres

Sedimentos originários de solos com conteúdos elevados de Fe e Al, como


os solos do tipo Latossolos, podem apresentar problemas quanto à dispersão nas
análises granulométricas e quanto às propriedades ópticas e de fluorescência em
análises mineralógicas de raios-X e microscopia. A eliminação desses elementos
é indispensável por ocasião de análises granulométricas. O método de eliminação
do Fe livre, que oferece menor impacto sobre as características da amostra e sobre
silicatos de Fe, é o descrito por Mehra & Jackson (1960). Este método consiste no uso

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 83
de ditionito de sódio como redutor de íons de Fe livre, de citrato de sódio como agente
complexante e o bicarbonato como agente tampão da solução. O procedimento pode
ser sucintamente descrito como: uma massa de material é submetido a ação de citrato
e bicarbonato de sódio, para acelerar a reação a amostra é mantida em temperatura
elevada (80ºC em banho Maria). A adição de ditionito age como complexante de
íons Fe e Al que após flocular com ajuda de centrifugação o sobrenadante pode ser
utilizado para se dosar Fe e Al, e o depósito é usado para a análise de granulometria.

3.2.1.3 Dispersão das amostras

A dispersão propriamente dita consiste em destruir os agregados e forçar


a suspensão das partículas elementares no meio. A dispersão pode ser feita com
a ajuda de movimentos mecânicos em agitadores, o uso de ultra-sons, e também
o uso de agentes químicos dispersantes, como o NaOH na concentração 1 M e o
hexametafosfato de Na (HMP) 1 M.
A dispersão física consiste na agitação da amostra sólido/água por meio de
um agitador do tipo vaivém ou circular vertical por um tempo determinado. Pode-se
também adicionar esferas de vidro e dispersante químico para auxiliar na dispersão.
Normalmente, quando se usa um dispersante químico deve-se deixar a amostra em
repouso por uma noite e em seguida agitar por um tempo de 5 a 15 minutos, conforme
o material. O uso de ultra-sons pode ser entendido por níveis de energia de vibrações
que atuarão nas partículas a fim de mantê-las separadas. Schildberg (1993) mostra
que o uso de ultra-sons na potência de 210 W e na frequência de 20 kHz durante 10
min é um bom tratamento para dispersão das argilas.
Já, a técnica descrita em EMBRAPA (1997), prevê a adição de uma certa
massa de material (solo ou sedimento) em 100 mL de água com 10 mL de dispersante
químico. Após agitar com bastão de vidro, deixar em repouso por uma noite. No
dia seguinte proceder a agitação em agitador elétrico tipo stirrer. Este procedimento
além de demandar grande quantidade de material para solos, pode ser considerado
extremo, pois, inflige à amostra estresses químicos e físicos que podem alterar a
integridade das partículas. Nesse sentido, o procedimento deve ser adaptado ao tipo
de amostra e ao objetivo do estudo. Assim, alterações indesejadas na composição
mineralógica da amostra, como dissoluções de minerais ou a quebra de partículas,
são evitadas.
Em face do exposto, é aconselhável executar primeiramente procedimentos
que causam pouco estresse às amostras, como a agitação mecânica, passando para
métodos que aplicam maior energia, como os dispersantes químicos e ultra-sons,
quando não há uma dispersão satisfatória da amostra. Uma análise de partículas
grosseiras em microscopia óptica, após cada tratamento, a fim de verificar a presença
de argila aderida à frações maiores, como areia, indica se a dispersão foi insuficiente.
Quando as partículas de areia não apresentam partículas menores agregadas,
considera-se que a dispersão foi adequada.

84 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
3.2.2 Métodos para determinar a distribuição do tamanho de partículas

A distribuição do tamanho de partículas é um parâmetro fundamental para a


caracterização de materiais com composição heterogênea. Técnicas granulométricas
são empregadas para a caracterização de materiais com diversas origens, como
industriais, fármacos, químicos, alimentares, como também em solos e sedimentos.
Em sedimentos, a análise do tamanho das partículas permite auxiliar estudos sobre
a agregação de partículas, o transporte de sedimento em rios e a dissolução de
partículas finas (Stumm & Morgan, 1996).
Os métodos existentes podem ser agrupados em clássicos manuais e
instrumentais. Os métodos clássicos utilizam equipamentos tradicionais normalmente
encontrados em laboratórios de análise. Eles apresentam baixo custo e uma
importante dependência do operador, inclusive para a parte de cálculos. Esses
métodos culminam em pouca agilidade e detalhamento das amostras (Beuselinck et
al., 1998).
O desenvolvimento de equipamentos eletro-mecânicos com boa precisão e
exatidão, capazes de reduzir o tempo das análises, oferecendo maior detalhamento
do material, constitui-se a meta dos métodos instrumentais. O uso de tecnologia
laser em equipamentos portáteis ou fixos pode ser um exemplo desses métodos
(Kammer & Forstner, 1998).
Nesta seção, será mostrada sucintamente a base dos métodos clássicos,
como também métodos que usam a difração a laser.

3.2.2.1 Métodos clássicos

Os métodos clássicos são utilizados frequentemente em laboratórios de


análises de materiais, como solos e sedimentos. O princípio utilizado é baseado
em sedimentologia, e pode ser equacionado através da lei descrita por Stokes. O
emprego desse princípio permite, além da quantificação relativa das classes, a
extração de determinada classe de tamanho de partículas para que futuras análises
sejam realizadas.
A separação de um material heterogêneo em quatro classes é a mais
comum para fins de classificação da distribuição do tamanho de partículas.
Para solos, a relação dessas classes é denominada de textura e expressa, em
porcentagem, a massa relativa das classes. A divisão em um maior número de
classes pode ser utilizada de acordo com o grau de detalhamento e interesse do
estudo (Tabela 3.1). Em amostras de solo, normalmente a distribuição de tamanho
de partículas ou textura é expressa em três classes – areia, silte e argila. Essas
classes de tamanhos de partículas foram definidas em função do comportamento
específico que cada intervalo de tamanho de partículas apresenta. Assim, o
tamanho da classe da fração areia foi definida como sendo aquela que apresenta
uma determinada relação com a água. A classe argila foi definida pelo fato das
partículas apresentarem movimento Brawniano. O intervalo de tamanho da fração
silte foi definido como sendo uma areia fina que apresenta propriedades químicas

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 85
e físicas das argilas.

Tabela 3.1 – Classes de tamanho de partículas para a caracterização de amostras de


solos

Fração Classes
AREIA 0,05 – 2 mm
Areia muito grossa 2-1 mm
Areia grossa 1-0,5 mm
Areia mediana 0,5-0,25 mm
Areia fina 0,25-0,10 mm
Areia muito fina 0,10-0,05 mm
SILTE 0,05 – 0,002 mm
Silte grosso 0,05-0,005 mm
Silte fino 0,005-0,002 mm
ARGILA < 0,002 mm
Argila grossa 2-0,2 μm
Argila fina < 0,2 μm
Fonte: USDA (1996)

Para sedimentos, normalmente separam-se as seguintes frações: cascalho


(> 2 mm), areia (63 μm – 2 mm) silte (2 - 63 μm) e argila (< 2 μm) (Mudroch &
Azcue, 1995). Porém, as classes podem ser ainda subdivididas. Na Tabela 3.2, estão
apresentadas as subdivisões das classes de tamanho de partículas apenas das
partículas inferiores a 2 mm (Mudroch & Azcue, 1995).

Tabela 3.2 – Classes de tamanho de partículas para caracterização de amostras de


sedimento

Fração Classes
AREIA 0,05 – 2 mm
Areia muito grossa 2-1
Areia grossa 1-0,5
Areia mediana 0,5-0,25
Areia fina 0,25-0,125
Areia muito fina 0,125-0,063
SILTE 0,002 – 0,063 mm
Silte grosso 0,063-0,0156
Silte médio 0,0156-0,0078
Silte fino 0,0078-0,0039
Silte muito fino 0,0039-0,002
ARGILA < 0,002 mm
Fonte: Mudroch & Azcue (1995)

86 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
Classes sistemáticas de 2, 8, 12, 16, 20, 24, 28, 32, 34 μm de diâmetro
também podem ser encontradas para caracterizar sedimentos (Stumm & Morgan,
1996). As classes de sedimentos são expressas em porcentagens de volume, número
ou área superficial. É importante notar que, para certas análises, pode-se pré-definir
o tamanho de partículas, como é o caso da determinação do fósforo solúvel reativo,
proposto por Murphy & Riley (1962), onde se separa, por filtração, a fração inferior a
0,45 μm.
A divisão em classes de tamanho de partículas para amostras de solos
seguem a lógica da função de cada classe de tamanho de partícula tem dentro do
solo. A fração argila, por exemplo, é uma classe cujas partículas apresentam alta
reatividade no solo, já a fração areia apresenta uma presença física em função do
grande tamanho das partículas, porém sem nenhuma reatividade química. A fração
silte por sua vez apresenta ambas as características, logo está em uma classe
intermediária de tamanho. Para sedimentos, a separação granulométrica, parece ser
arbitrária comparada àquela para solos. Assim, a escolha das classes de tamanho
de partículas de sedimentos pode ser definida em função das necessidades exigidas
em cada estudo.
Princípio da medida granulométrica clássica: partindo-se de uma amostra
de material com massa conhecida, onde partículas heterogêneas estão suspensas
em um meio aquoso, têm-se as seguintes premissas: i) as partículas são sólidas e
de formato esférico e suspensas de forma homogênea em um determinado volume
de água; ii) a velocidade das partículas na queda em função da gravidade é afetada
unicamente pela viscosidade do meio; iii) a velocidade de queda das partículas é
uniforme, sem interferência de outras partículas. Assim, a velocidade de queda da
partícula em suspensão no fluido vai depender então de seu raio, da densidade da
partícula e da temperatura do líquido. As partículas de maior diâmetro migrarão mais
rapidamente que as de menor tamanho. Ao final de um tempo t, as partículas com
diâmetro inferior àquele pré-determinado são amostradas a uma altura previamente
estabelecida.
O tempo que certos tamanhos de partículas, suspensas em um meio aquoso
dentro de uma proveta, necessitam para migrar verticalmente depende, ainda,
das características do meio (viscosidade e densidade do líquido), do ambiente
(temperatura e aceleração da gravidade) e da própria partícula (sua densidade e seu
diâmetro), e é regida pela seguinte equação:

t = 18 η h / [ g (ρs – ρl) Φ² (Equação 3.1)

Onde:
t = tempo de queda, em s;
η = viscosidade da água, em g.cm-1.s-1;
h = altura de queda, em cm;
g = aceleração devido a gravidade, em cm.s-2;
ρs = densidade do sólido, em g.cm-³;
ρl = densidade do líquido, em g.cm-³;
Φ = diâmetro da classe de partículas, em cm.

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 87
Com esta equação, define-se o tempo, em segundos, no qual todas as
partículas com diâmetro superior ao definido, Φ, deslocar-se-ão até a profundidade
h. Um maior detalhamento desta equação poderá ser encontrado em USDA (1996).
A velocidade de queda das partículas pode ser acelerada com a modificação
do parâmetro g, através do uso de centrífugas. Utilizando-se a centrífuga, o princípio de
sedimentação é o mesmo, porém, através de uma velocidade de queda mais intensa,
pode-se separar frações mais finas de partículas, inviáveis com a sedimentação em
proveta. Tendo como referência uma temperatura de 20ºC, e densidade de partículas
de 2,6 g.cm-³, a velocidade de queda de um determinado tamanho de partículas
segue a seguinte equação:

t = 4,27 log nep (x/xo) / N² r² (Equação 3.2)

Onde:
t = tempo, em min;
r = raio da partícula, em μm;
N = rotações por minuto, em 1000 min-1;
Log nep = Logarítimo Neperiano;
Xo = distância entre o eixo da centrífuga e o nível da suspensão no tubo da
centrífuga devidamente instalada no rotor, em cm;
X = distância entre o eixo da centrífuga e a altura onde a suspensão será
coletada, em cm.

Os parâmetros x e xo podem ser visualizados na Figura 3.1.

Eixo do
rotor xo
x
Tubo da centrífuga

Figura 3.1 – Esquema demonstrativo do tubo da centrífuga em posição de operação com os


parâmetros x e xo da equação.

Para a fração grosseira, de tamanho superior a 50 μm, o processo de


separação é por peneiramento. Partículas de formato mais alongado podem não ser
consideradas nesta classe, visto que podem passar pela malha da peneira. Quando o
formato das partículas for diferente daquele de uma esfera, partículas com formato de
acículas, como as de aloisita e goetita, maior será a probabilidade de partículas com
comprimento maior que a malha passarem por ela. Para a fração silte, normalmente
determina-se pela diferença da massa da areia e da argila.

88 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
Para determinar quantitativamente a classe argila pode-se lançar mão da
extração e estimação de cada classe de tamanho de partículas (método direto,
pipeta), ou da hidrometria, método de Bouyoucus (Bouyoucus, 1962), que determina
indiretamente a concentração de partículas em suspensão.
O método da pipeta pode ser utilizado com grande segurança em provetas,
como demonstra a Figura 3.2.

Saída

Sifão

xo
Partículas com raio
inferior ao calculado
x

Partículas com raio


superior ao calculado

Figura 3.2 – Método da pipeta: à esquerda, foto demonstrativa do procedimento de sifonamento


em provetas com 1 L de capacidade. Nesse procedimento está sendo extraída a
fração inferior a 5 μm, no sobrenadante, e no fundo da proveta encontra-se a
fração entre 5 e 50 μm; À direita, está apresentado um esquema que demonstra
os parâmetros e o procedimento de sifonagem em um tubo de centrífuga.
Foto de: E. C. Bortoluzzi

Esse procedimento permite que uma quantidade certa de suspensão seja


extraída para posterior pesagem e determinação da sua proporção em relação ao
todo. O método também permite que a totalidade das partículas seja coletada em
uma determinada classe de tamanho, para fins de futuras análises em mineralogia.
Para se extrair as frações, conforme EMBRAPA (1997), deve-se proceder
da seguinte maneira. A partir de certa quantidade de material seco (20 g) disperso
em água, para a fração areia: pode-se usar a tamisagem com peneira malha 50
μm, onde esta ficará sobre a malha e as frações inferiores passarão para dentro de
uma proveta de 1 L; levar o material para estufa e após secagem peneirar o material
em peneira malha 0,2 mm para separar a fração areia fina da grossa; e, por fim,
determinar a massa das duas frações de areia.
Já para a fração argila: aferir a proveta para conter 1 L, agitar com bastão
por 20 segundos, começando a marcar o tempo; dê o tempo necessário para que
somente as partículas inferiores a 2 μm estejam acima da altura pré-definida; nesta
etapa, compensa-se o tempo através da diferença da temperatura do meio obtida

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 89
sobre uma amostra em branco. Em seguida, pipetar 50 mL da suspensão a 5 cm
de profundidade para uma cápsula de porcelana. Deixá-la evaporar e determinar a
massa da argila em balança analítica.
A quantidade relativa entre as classes é produto de relações matemáticas
que levam em conta a quantidade de material inicial e a massa destes materiais após
extração. A fração silte, neste caso, é determinada por diferença da quantidade das
outras frações.
O método do hidrômetro (Figura 3.3) segue de maneira similar o anterior,
para a fração areia e silte. Contudo, utiliza-se uma quantidade maior de material
inicial (50 g), e a fração argila é definida como sendo a diferença de leitura entre o
densímetro da amostra e de uma prova em branco. Para obter o teor de argila da
amostra, agite a suspensão na proveta; dê o tempo necessário para sedimentar as
frações superiores à da argila; transfira o volume correspondente à fração argila para
a proveta de 250 mL e introduza o densímetro para então fazer a leitura.
O uso desses métodos para estudos de sedimentos é possível. Em ambos
os métodos, a quantidade de material inicial é grande e muitas vezes incompatível
com a disponibilidade de material para estudos de sedimentos. Essa situação muitas
vezes inviabiliza a determinação de classes de tamanho de partículas.

Escala
Leitura

Suspensão de
partículas

Hidrômetro

Peso

Proveta

Figura 3.3 – Método do hidrômetro (Bouyoucus). Esse esquema mostra a condição de leitura
do teor de argila suspensa em um meio aquoso.

As premissas anteriormente estabelecidas para o processo de sedimentação

90 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
apresentam problemas, principalmente quando parte do princípio que não há interação
entre as partículas durante a queda na proveta. É notório que partículas maiores
podem arrastar partículas de menor tamanho durante a queda. Este fenômeno não
interfere na determinação relativa das frações, visto que as partículas maiores são
eliminadas anteriormente e, no caso do silte, determinadas por diferença do total.
Contudo, este fato deve ser levado em conta quando o objetivo é extrair determinada
fração de tamanho de partícula, exigência para as determinações mineralógicas. A
composição mineralógica é realizada sobre uma fração conhecida de tamanho de
partículas, logo, se deve evitar contaminação com outras frações.
Robert & Tessier (1964) aperfeiçoaram um sistema de separação e
extração de frações de tamanho de partículas para fins de estudos mineralógicos.
Este procedimento baseia-se no uso conjugado de tamisagem, sedimentação
e centrifugação, o que facilita a extração de inúmeras frações de uma amostra
heterogênea. Um fluxograma demonstrando este procedimento pode ser visualizado
na Figura 3.4.
Neste procedimento, introduz-se a noção de esgotamento da fração suspensa
na amostra. Esgotamento nada mais é do que a aplicação dos mesmos parâmetros de
operação em sucessivas extrações do sobrenadante, até que o mesmo não apresente
partículas em suspensão da fração requerida. Com isto, repete-se o procedimento
de pipetagem, coletando-se quatro vezes a mesma fração de partículas, o que, por
consequência, vai esgotá-la da suspensão total. Tal processo se faz necessário,
devido: i) a presença de partículas de tamanho inferior ao procurado abaixo do ponto
de sucção da pipeta, ii) ao fato de na queda das partículas haver o carreamento de
partículas com raio menor. A cada extração preenche-se novamente a proveta com
água até completar 1 L, agita-se o conteúdo e se espera o momento de extrair a
fração desejada. Assim, as partículas que estavam suspensas abaixo do ponto de
sucção retornam em suspensão, possibilitando sua extração (AFNOR, 1996).
As partículas da fração areia são separadas por tamisagem em malha 50
μm, enquanto a fração silte 5-50 μm por sedimentação em proveta, controlando-
se o tempo de sifonamento e a temperatura do meio. Para a separação da fração
2-5 μm daquela inferior a 2 μm, utiliza-se uma centrífuga. Para uma centrífuga com
parâmetros de X = 21 cm e X0 = 21 cm, operando a 800 rpm (rotação por minuto)
durante três minutos, pode-se separar a fração < 2 μm, que estará em suspensão
daquela superior que ficará depositada no fundo do tubo. A fração < 0,2 μm pode ser
também separada em centrifuga daquela entre 0,2 e 2 μm, porém, aplica-se uma
maior rotação (2900 rpm) e tempo (26,4 min), para uma condição de temperatura de
20 ºC.

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 91
Sedimento

1) Queima da matéria orgânica (Kunze & Dixon, 1986)


2) Eliminação do Ferro (Merha & Jacson, 1960)
Pré- Sim 3) Eliminação de Carbonatos (Grossman & Millet, 1961)
tratamento 4) Dispersão química com NaOH ou Hexametafosfato
5) Dispersão física com ultra-sons
Não

Separação granulométrica
Amostra total de sedimento Concentração de
alíquota sedimento, g L-1

Peneiramento extração Fração > 2 mm


malha 2000 μm g kg-1

Peneiramento extração Fração areia grossa


malha de1000 μm 1000 e 2000 μm, g kg-1

Peneiramento extração Fração areia fina entre


malha 53 μm 53 e 1000 μm, g kg-1

Sedimentação extração Fração silte grosso


extração da > 5 μm entre 5 e 50 μm, g kg-1

Centrifugação extração Fração silte fino entre


extração > 2 μm 2 e 5 μm, g kg-1

Sobrenadante
Centrifugação extração Fração argila fina
da fração < 2 μm < 0,2 μm, g kg-1

depósito Fração argila grossa


entre 0,2 e 2 μm, g kg-1

Figura 3.4 – Fluxograma demonstrativo da separação de classes de tamanho de partículas,


incluindo a etapa de pré-tratamento das amostras.
Adaptado de: Robert & Tessier (1974)

Comentário: Os métodos de granulometria clássica permitem a separação


física das partículas segundo o tamanho, baseando-se na lei de Stokes. A apresentação
dos resultados em classes de tamanho de partículas, embora em número pequeno,
possibilita a relação entre as classes, fornecendo informações importantes acerca
do sedimento. A determinação de classes de tamanho de partículas de forma
sistemática, isto é, em tamanhos de partículas pré-estabelecidos, não permite que
elas sejam vinculadas à natureza das partículas ou a sua função no meio. Este ponto
poderia ser melhorado para estudos sobre sedimentos. Esta preocupação é tão mais

92 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
importante quanto maior for a amplitude de tamanhos de partículas na composição
de um sedimento. Outro problema diz respeito à operacionalização dos métodos.
Em estudos de sedimentos, frequentemente depara-se com amostras pouco
concentradas em partículas suspensas, o que se torna um problema, principalmente
quando o objeto de estudo são as partículas finas, por consequência, determinações
da granulometria com métodos clássicos são prejudicadas. Por fim, o pré-tratamento
dado às amostras de sedimentos pode alterar a composição do sedimento. Processos
de dissolução de minerais finos podem ser acelerados com procedimentos agressivos
como o aquecimento e o uso de dispersantes.

3.2.2.2 Métodos instrumentais

Difratometria laser (DL) ou granulometria laser (LG): os métodos instrumentais


são, em geral, mais rápidos e exatos do que os clássicos (Mudroch & Azcue, 1995;
Mudroch et al., 1996; Bortoluzzi et al., 2010). Eles permitem maior detalhamento dos
tamanhos de partículas contidos nas amostras em estudo, porém ainda apresentam
um alto custo de análise, devido o custo do equipamento. A difração laser permite
detalhar a granulometria de uma amostra entre os tamanhos de partículas, de 0,01-
2500 μm ou mesmo superior a isso em amostras a seco.
A tecnologia é usualmente empregada na indústria desde a década de
60, a fim de controlar a qualidade de produtos como cimentos e aerossóis. Foi
também ser empregada em análises de pigmentos, alimentos, química de produtos
e medicamentos. Há relatos da aplicação em estudos sobre sedimentos marinhos
(Mccave et al., 2006), fluviais (Hsieh, 1984, Casamitjanan et al., 2002), mais
recentemente, sobre os solos (Muggler et al., 1997; Dur et al., 2004; Bortoluzzi et al.,
2010) e sedimentos urbanos (Poleto et al., 2009). Na área de farmacologia, o uso da
DL permite inferir, por exemplo, sobre o grau de dissolução de medicamentos e no
tempo de reação no organismo (Beekman et al., 2005). Processos fisiológicos em
plantas de Hevea também foram estudados com a técnica, cujas informações foram
importantes para a indústria da borracha (Kongsawadworakul & Chrestin, 2003).
Em ecossistemas marinhos, a técnica foi empregada para determinar a turbidez da
água e a concentração de sais e de sólidos, possibilitando estimar a quantidade de
alimento para peixes (Mccave et al., 2006).
Em sedimentos fluviais, os estudos tentam compreender a origem do
sedimento e a função exercida no processo de eutroficação das águas (Mudroch
et al., 1996; Pye & Blott, 2004). Em solos, além de estudos voltados a evolução do
solo (Dur et al., 2004), pode-se estudar a interação das partículas no processo de
floculação/dispersão.
A difração laser baseia-se no princípio de difração da luz laser, para construir
diagramas de difração de cada partícula e estimar o seu tamanho na amostra.
Pressupõe-se que as partículas, ao interagirem com o feixe de luz, promovam um
diagrama de luz intrínseco ao seu tamanho. Os equipamentos usam a luz laser com
comprimento de onda conhecido, (por exemplo, o galium emite um comprimento de
onda de 750 nm). Esta luz é emitida em direção às partículas suspensas em um meio

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 93
que pode ser aquoso ou gasoso. A luz ao interagir com a partícula sofre transformações,
podendo, a princípio, ser absorvida ou difundida no meio. A luz absorvida transforma-
se em calor, ou é capaz de provocar o processo de fosfo ou fluorescência, enquanto
que a luz difusa decompõe-se em três fenômenos - a reflexão, a difração e a refração.
A difusão luminosa pode ser enquadrada no domínio de Rayleigh quando o diâmetro
da partícula for menor que um décimo do comprimento de onda laser; o domínio
de Rayleigh-Gans-Debye aplica-se quando o diâmetro for menor que a metade do
comprimento de onda. A Figura 3.5 apresenta um demonstrativo da interação entre
luz e partícula.

Figura 3.5 – Esquema demonstrativo da interação luz/partícula. Pode-se observar que parte
da luz laser é absorvida e parte é difundida no meio. A luz difusa é oriunda de três
fenômenos - a refração, a reflexão e o principal, a difração. É importante notar
que a partícula é representada de forma esférica, premissa do método de difração
laser.
Adaptado de: Coulter (1997)

Brevemente, o princípio da determinação granulométrica pelo uso de luz


laser baseia-se na propriedade que a luz sofre em função do tamanho das partículas.
Assim, partículas grandes desviam o feixe de luz a ângulos menores que partículas
pequenas. Lentes de Fourier auxiliam no direcionamento da luz difusa difratada em
direção aos detectores, onde são interceptadas e encaminhadas na forma eletrônica
para um programa de computador. Desta forma, os detectores localizados em ângulos
diferentes são capazes de captar a luz difusa oriundos de tamanhos de classes
de partículas diferentes (Figura 3.6). Para maiores detalhes do funcionamento da
tecnologia, consultar Bortoluzzi et al. (2010).
A construção de um diagrama resultante da interação luz/partículas de uma
determinada amostra de material é fruto de um processo estatístico que leva em
conta não apenas as partículas individuais, mas o conjunto de partículas presentes
na amostra que interage com o laser. Na Figura 3.7, é mostrado o diagrama de luz

94 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
de duas partículas de tamanhos diferentes.
O tamanho das partículas, ou classes destas partículas, é estimado através
dos dados desses diagramas de luz. Assim, o diagrama de distribuição de tamanho
de partículas segue como a interação de todas as respostas de luz de cada partícula
que chegam ao detector.

Detectores para
grandes ângulos - PIDS

Detectores
Feixe de luz laser

Partícula
Detector
central
Medidor
eletrônico

Raio
Partícula

Lente de
Fourier

Computador

Figura 3.6 – Esquema demonstrativo da interação da luz sobre uma partícula grande e uma
pequena. Pode-se observar que a luz é difratada com ângulos diferentes, conforme
o tamanho da partícula, sendo captados em detectores diferentes, a partir do
detector central. Observa-se que os detectores estão conectados ao computador.
Adaptado de: Schildberg (1993)

partícula grande
Intensidade da luz

partícula pequena

-90 -60 -30 0 30 60 90


Ângulo de difusão
Figura 3.7 – Diagrama esquemático mostrando a luz difratada ao chegar ao detector. A partícula
grande corresponde a uma intensidade de luz elevada à pequenos ângulos, com
presença de pequenos picos a medida que o ângulo aumenta; já para a curva de
uma partícula pequena, esta mostra-se também nos pequenos ângulos, porém
representada por uma curva com largura maior, a meia altura.
Adaptado de: Coulter (1997)

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 95
O programa de computador tem a função de considerar n diagramas
experimentais de cada partícula, e integrar em n classes granulométricas do total de
partículas contidas na amostra. A aplicação dos cálculos matriciais permite obter a
fração volumétrica de cada classe de tamanho a partir de seu diâmetro e apresentá-
la na forma de histograma que relaciona a área superficial, o volume e o número de
partículas referente a cada classe de tamanho de partículas.
As premissas de detecção e estimação dos tamanhos de partículas são
regidas pelas teorias de Mie & Fraunhofer, o que permite que a medida abranja
uma variada gama de tamanhos de partículas. A teoria de Fraunhofer é adaptada
às partículas grandes com bordos irregulares e com grande capacidade de absorver
a luz. Isso porque as partículas grandes têm tamanho similar ao comprimento de
onda do feixe laser utilizado. Nesta teoria, é possível que as propriedades ópticas do
material e do meio de suspensão sejam ignoradas. Assim, parâmetros, como o índice
de refração, tornam-se desnecessários para partículas superiores a 7 μm, mesmo
que essas partículas apresentem-se com formato outros do que uma esfera e com
completa impermeabilidade à luz.
Para a aplicação da Lei de Mie, alguns pré-supostos são exigidos, como o de
que as partículas assumam um formato esférico, denotando um volume, mesmo que
o formato original da partícula seja outro. Nesse caso, o volume é construído a partir
da medida do maior diâmetro da partícula, como um diâmetro de revolução. Outro pré-
suposto refere-se ao fato da captação da luz difratada pelo detector de somente uma
partícula. A interação da luz difusa sobre outras partículas não é considerada. Além
destas premissas, a teoria de Mie focaliza-se na resposta das pequenas partículas
à luz laser. Isso porque o comprimento de onda do feixe laser é muito próximo do
tamanho das partículas finas. A quantidade de luz absorvida ou difundida depende,
então, das características ópticas do material. A refletividade, embora seja diferente
para partículas de diferentes tamanhos e naturezas, assume-se que é homogênea
para partículas finas, inferior a 7 μm.
A fim de contornar o problema de detecção de partículas pequenas, através do
uso da teoria de Lorentz-Mie, detectores colocados de forma perpendicular aos feixes
laser para os grandes ângulos, os quais se constituem na tecnologia PIDS (Polarized
Intensity Differential Scattering). Esse sistema pôde ser visualizado anteriormente na
Figura 3.6. O sistema visa captar a luz difratada de partículas finas de aproximadamente
40 nm, que mesmo com capacidade de difratar a luz em pequenos ângulos, a luz é de
pequena intensidade. Assim, esses detectores recebem luz polarizada sob diferentes
comprimentos de onda capazes de captar, ainda, a difusão lateral e a retro-difusão da
luz com intensidade superior aquelas para grandes ângulos.
Índice de refletância (i.r): esse índice é um parâmetro importante, pois pode
alterar o comportamento da luz difusa, e o diagrama de luz de partículas de mesmo
diâmetro. Este índice varia em função da temperatura do meio em que se mede a
amostra, da pressão e do comprimento de onda do laser. O uso de i.r. adequado, tanto
para as partículas quanto para o meio (água e gás), é fundamental para estudos de
partículas finas em sedimento e solos, por necessitarem da teoria de Mie. No entanto,
pode-se usar um mesmo i.r. em difração laser, para que abranja diferentes proporções

96 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
de tamanhos e de natureza de partículas. Nesse sentido, índices de refletâncias
foram estimados para grupos de partículas cuja natureza é similar. Por exemplo, para
a água, o i.r. é de 1,33. Para as argilas de solos e de sedimentos convenciona-se, um
i.r variando de 1,45 a 1,56, valores referente a caulinita. Para materiais como metais,
verifica-se que os valores de i.r. podem ser superiores, na ordem de 2 a 3,5. A cor
do material pode alterar o i.r. Contudo, para misturas de materiais, como o caso do
sedimento, usa-se o índice que mais se adapta às condições da composição. Já o
coeficiente de absorção pode varia de 0,01-10, onde os minerais se localizam entre
0,01 e 0,1. Dur et al. (2004) utilizaram em seus estudos com solos um i.r. de 1,55 e
um coeficiente de absorção de 0,1, valores coerentes com os minerais em geral.
Outro fator a ser levado em conta é a concentração de partículas em
suspensão na câmara de leitura. Essa informação é integrada no parâmetro grau de
obscuração, dado em porcentagem, que é o bloqueio da luz difratada que alcança os
detectores dos grandes ângulos (PIDS). O Grau de obscuração pode ser diferente,
o que produz variações no diagrama final do tamanho das partículas, como as
observadas por Muggler et al. (1997).
Instrumentação: Atualmente, existem vários modelos de equipamentos que
utilizam a luz laser como forma de estimar a granulometria de materiais. Guardando as
diferentes características próprias de cada equipamento, o modo de funcionamento
segue o demonstrado na Figura 3.6. A precisão e a exatidão deste método podem
ser testadas através da análise de materiais certificados de referência (Konert &
Vandenberghe, 1997). Contudo, Pye & Blott (2004) verificaram variações nestes
parâmetros devido a um viés instrumental. Entretanto, a reprodutibilidade dos dados
pode ser resultante muito mais do processo de pré-tratamento e das condições em
que a medida foi realizada, que propriamente das diferenças nos equipamentos.
Dentre as características interessantes presentes nos equipamentos de
difração laser citam-se algumas em especial:
1. Possibilidade de medida em meio gasoso, aquoso e sólido;
2. Receptáculo das amostras de pequeno volume e com condição de
recuperação das mesmas após a análise; Este ponto é importante,
principalmente quando se tem pouca amostra, situação típica de
estudos com sedimentos. A possibilidade de recuperação da amostra
também é interessante caso exista previsão de aplicação de tratamentos
posteriores. Por exemplo: pode-se passar uma amostra sem dispersão e
posteriormente aplicar dispersantes;
3. Trabalhar com concentrações variáveis de partículas em suspensão;
Os equipamentos podem trabalhar com graus de obscuração variados;
porém, existe uma faixa de obscuração que produzem diagramas mais
confiáveis, normalmente próximo a 50% de PIDS;
4. Possuir um programa de computador de fácil uso e que possa gerenciar
automaticamente o equipamento;
5. Ter a possibilidade de alteração dos parâmetros que interferem na medida,
como o i.r e a índice de absorção;
6. Oferecer rapidez nas medidas e na limpeza do compartimento da amostra.
Presença de agitador e ultrassons na câmara de leitura.

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 97
Na Figura 3.8 são apresentados exemplos de equipamentos estacionários
que usam o princípio laser para determinação da granulometria de partículas. Na
figura estão representados os modelos: BeckmanCoulter® LS230, CILAS® 1180 e
Malvern® Mastersizer, entre outros.

Figura 3.8 – Difratômetro laser: no alto, modelo BeckmanCoulter® LS13320, seguido do


modelo CILAS® 1180 e Malvern® Mastersizer.
Fotos respectivamente de: A. F. Giuliani, C. Poleto e E. C. Bortoluzzi.

Os equipamentos apresentam características intrínsecas a cada fabricante.


Contudo, o mais importante é explorar as potencialidades de cada equipamento. Por
exemplo, em função do tipo de análise e do material a ser analisado, pode-se escolher
as configurações dos instrumentos que sejam mais adaptadas às necessidades das
análises, inclusive com uso de ultra-sons no momento da medida. A possibilidade de
leituras in situ, através de equipamentos portáteis, ou, em instrumentos estacionários,

98 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
escolher o volume da câmara de leitura, são algumas das opções para a técnica
(Kammer & Forstner, 1998; Kammer & Kammer et al., 2005). Escolher a gama de
tamanho de partículas analisadas pelo instrumento de forma a ser compatível com o
nível de detalhamento que queremos dar para a amostra. Mais, escolher previamente
o estado das amostras, secas ou em suspensão, e a possibilidade de aplicação
de tratamentos (químicos ou mecânicos) dentro da câmara de leitura são também
opções importantes a serem consideradas.
Concernindo os resultados das análises granulométricas, estes são expressos
em porcentagem do volume, do número ou da área superficial específica das classes
de tamanho de partículas (Tabela 3.3).

Tabela 3.3 – Formato de arquivo produzido pelo difratômetro laser modelo Coulter®
LS 230
COULTER LS ########
File name: DomJesus.$01
Group ID: DomJesus
Sample ID: Dom Jesus (Ca, MO)
Operator: jcd
Comments:
Comments:
Bar Code:
Instrument: LS 230, Small Volume Module
Run number: 1
Start time: ########
Run length: 61
Optical model: Sol-502.rfd PIDS included
Obscuration: 4
PIDS Obscur: 19
Obscuration: LOW
Serial Number: 6984

From 0.04
To 2000
Volume 100
Mean: 0.868
Median: 1.006
D(4,3): 1.252
Mode: 0.91
S.D.: 2.644
Variance: 6.99
Skewness: -0.802
Kurtosis: 0.118
Specific Surf. Area:
1.22E+05

%< Size
1 0.0718
25 0.59
50 1.006
75 1.757
99 4.29

Channel Channel Cum. < Diff. Diff. Diff.


Number Diameter Volume Volume Surface Area
Number
(Lower) % % % %
um
1 0.04 0 0.023 0.27 2.47
2 0.044 0.023 0.032 0.34 2.62

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 99
Na Tabela 3.3 pode-se ter um exemplo de arquivo de dados de uma amostra
submetida à difração laser, onde são apresentados algumas análises estatísticas
descritivas e o início da apresentação dos resultados para as classes (0,04 e 0,044
μm). Com o total dos dados por classe é possível gerar curvas indicando a quantidade
relativa de cada categoria de tamanho de partícula, mas também os resultados
acumulados.
A preparação das amostras a serem submetidas a DL não apresenta
um protocolo único e infalível, depende da amostra e do objetivo que se deseja
alcançar. Trata-se da etapa mais importante e delicada do processo de estimação
da granulometria em tecnologia laser. Para isso, dispõe-se de uma vasta quantidade
de informações acerca dos procedimentos de preparação e as consequências
em termos de granulometria de material decorrentes das escolhas tomadas. Por
exemplo, Muggler et al. (1997), ao trabalharem com dois graus de obscuração e
três sistemas de dispersão (dispersos em água, tratados em H2O2 e tratados com
H2O2 e ditionito), verificaram que o nível de agregação das partículas dependem
do agente de cimentação. Poleto et al. (2007) testaram vários níveis de energia
na dispersão de amostras de sedimento com ultra-sons, obtendo diferenças na
agregação das partículas após dispersão total em função do tempo. Assim, percebe-
se que pode haver uma reorganização das partículas por afinidade dentro da câmara
de leitura o que pode apresentar um viés à medida de DL. Estes autores alertam
para a importância da padronização dos tratamentos referentes à preparação da
amostra para a leitura em DL. Apesar de estudos darem a impressão de baixa
eficácia da DL, o método se mostrou confiável em testes com materiais de referência
(Konert & Vandenberghem, 1997). Isso reforça a ideia de aplicar a DL em materiais
heterogêneos. Em amostras de solos (fração inferior a 2000 μm dispersa em água)
que são submetidas à DL podem apresentar uma subestimação dos teores de argila
em relação a outros métodos de estimação, como o da pipeta (Beuselinck et al., 1998;
Konert & Vandenberghem, 1997). Isso se deve as diferentes características ópticas
das frações em estudo como também devido aos diferentes formatos das partículas
(Blott & Pye, 2006). Para frações maiores (50-2000 μm), obtidas por peneiramento, a
correlação entre os métodos é considerada boa. Para Beuselinck et al. (1998), esses
resultados seguem a tendência para diferentes amostras, desde que a mineralogia
seja similar. Dur et al. (2004), compararam diagramas da fração argila, obtidos em DL
e por microscopia eletrônica à transmissão – MET, e encontraram boa confiabilidade
na predição de 116 classes dentro.
Nesse sentido, o uso de frações previamente separadas pode melhor
discriminar as classes de partículas em DL, oferecendo maior confiabilidade. Por
exemplo, Bortoluzzi et al. (2004) estudaram em DL a granulometria da fração fina de
sedimentos fluviais oriundos de áreas com diferentes usos do solo (Figura 3.9). Os
resultados puderam auxiliar no estudo tanto da mineralogia do sedimento quanto na
predição das suas funções no rio (Pellegrini et al., 2010). Duas informações principais
acerca do método de difração laser podem ser observadas: a primeira diz respeito
à precisão do método, visto que a variação entre as três observações é pequena; a
segunda, diz respeito a informação propriamente dita, com excelente discriminação
dos tratamentos, no caso, os locais que as amostras representam.

100 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
Em função do exposto, percebe-se uma grande potencialidade no uso da
difração laser em estudos de materiais heterogêneos, tais como solos e sedimentos.
Contudo, protocolos de tratamento e utilização da difração laser devem ser
implementados de forma clara e completa, para que os resultados obtidos de diversos
estudos possam ser confrontados.
Como considerações finais pode-se inferir que apesar dos inconvenientes
apresentados pela metodologia clássica para se determinar a distribuição do tamanho
de partículas seu uso é ainda necessário. Ao se dispor qualquer intervalo de tamanho
de partículas de um material heterogêneo pode-se aplicar na sequência metodologias
mais pontuais como as análises em difração laser. Os métodos clássicos apresentam
pouco detalhamento das classes de tamanho, sendo esse a sua maior limitação. Já
o método de difração laser produz um maior detalhamento das classes de tamanho
de partículas. Ainda esse método permite o maior detalhamento de uma fração
específica, como por exemplo a fração argila (< 2 μm), eliminando o viés óptico e
do formato das partículas que geram interferências na medida. Contudo, a aplicação
de pré-tratamentos nas amostras deve estar em concordância com os objetivos do
estudo, para que o uso da difração laser seja viável.

Coletor 1
5 Coletor 2
Coletor 3
Coletor 4
4
Volume %

0
0,01 0,1 1 10 100 1000

Diâmetro µm (log)
Figura 3.9 – Diagrama da distribuição de partículas obtidas em difração laser de um sedimento
sob dispersão total, oriundos dos coletores 1, 2, 3 e 4 da MBH do arroio Lino em
Agudo, em um evento pluviométrico.
Adaptado de: Bortoluzzi (2004)

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 101
3.2.3 Principais métodos para determinar a natureza das partículas

Nessa seção, optou-se por apresentar dois métodos que auxiliam na


determinação da natureza das partículas de materiais, tais como sedimentos. Um
deles é indireto, onde através da superfície específica das partículas pode-se inferir
sobre sua mineralogia. O outro é direto, visto que usa a difração de raios-X para
determinar qualitativamente e semi-quantitativamente a composição mineralógica de
uma amostra.

3.2.3.1 Área superficial específica – ASE

A área superficial específica (ASE) é um parâmetro indicador do potencial


de interação físico-químico entre a superfície de uma partícula e o meio em que ela
se encontra (Caillère et al., 1982). Ao se expressar a razão entre a área superficial
de uma partícula e a sua massa (m².g-1), tem-se a noção da ASE e, por conseguinte,
da reatividade da partícula e da sua natureza mineralógica. A ASE também pode ser
expressa pela razão entre a área e o volume da partícula (m².m-³).
As partículas sólidas de solos e sedimentos apresentam diferentes tamanhos
e formas. Estas partículas podem ser associadas a figuras geométricas simples,
assumindo, assim, formas teóricas equivalentes a: i) esfera, no caso do quartzo;
ii) placa, no caso de esmectitas; iii) cúbica, no caso dos feldspatos; ou, ainda, iv)
prisma, no caso das caulinitas. A área superficial dessas figuras geométricas pode
ser facilmente determinada por equações com poucas variáveis. Assim, por exemplo,
observa-se a área superficial de uma esfera como sendo o produto da seguinte
equação:
Au = π d2 (Equação 3.3)

Onde:
Au = área externa da esfera, expressa em m²;
π = constante pi, equivalente a 3,1416;
d = diâmetro da esfera, expresso em m.

Já o seu volume segue a seguinte equação:

Vu = 1/6 π d3 (Equação 3.4)

Onde:
Vu = volume da esfera, expresso em m³;

Ao associar as Equações 3.3 e 3.4, obtém-se a área superficial específica


da esfera pela razão entre as duas equações. Tem-se, assim, a seguinte equação
simplificada:

102 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
ASEe = 6/d (Equação 3.5)

Onde:
ASEe = área superficial da esfera, expressa em m².m-³;
d = diâmetro da esfera, em m.

Assumindo-se uma amostra homogênea de partículas esféricas, porém


de diferentes diâmetros a área superficial das partículas varia da seguinte forma,
conforme mostrado na Tabela 3.4.

Tabela 3.4 – Relação entre as grandezas de uma esfera, expressos em centímetros, e


a sua área superficial específica teórica de um volume constante de 1 cm³
de material
d, cm Au, cm² Vu, cm³ V, cm³ N ASEe, cm² cm-³
1 3,1416 0,523 1 1,9 6
0,1 3,1416x10-2 5,23x10-4 1 1,9x103 60
0,01 3,1416x10-4 5,23x10-7 1 1,9x106 600
0,001 3,1416x10-6 5,23x10-10 1 1,9x109 6.000
0,0001 3,1416x10-8 5,23x10-13 1 1,9x1012 60.000
D= diâmetro unitário; N = número de partículas em 1 cm³; Au=área unitária da partícula; Vu=
volume unitário da partícula.

As características de uma partícula elementar condicionam os parâmetros


físicos de uma amostra. Assim, uma amostra composta de partículas de 1 μm, ou
0,0001 cm, chegam a produzir uma área superficial específica de 6 m² ou 60.000 cm²,
conforme a Tabela 3.4. Apesar de ser um exemplo teórico, a noção da magnitude é
mantida, pois, ao se diminuir as dimensões individuais da partícula, aumenta-se a
ASE e o número delas por unidade de volume.
No entanto, esse raciocínio apresenta um problema. O fato de se estabelecer
igualdade entre os parâmetros dimensionais de partículas com formato teórico
aqueles de partículas presentes em amostras de solos e sedimentos apresenta um
viés importante. No exemplo supracitado, apenas a superfície externa da esfera
é considerada. Entende-se por superfície externa aquela formada pelos planos
superiores e inferiores de cada cristal. Assim como as superfícies laterais (bordos),
estas são geralmente pequenas.
Para argilominerais do tipo 1:1 (caulinita e haloisitas), a superfície externa
constitui-se na superfície total da partícula. Entretanto, é notório que argilominerais de
tipo 2:1, expansíveis (esmectitas), apresentem, além da superfície externa, também
uma área interna, devido aos espaços interfoliares, chamado entrecamadas.
Nesse sentido, as metodologias que consideram a característica destas
estruturas representam com maior exatidão a área superficial específica de uma
amostra. Somente desta forma a ASE permitirá, então, auxiliar na compreensão e
na interpretação da composição mineralógica de uma amostra heterogênea e, por
conseguinte, as suas propriedades físico-químicas, inclusive de reatividade.

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 103
Na Tabela 3.5 encontram-se a ASE de vários argilominerais, normalmente
encontrados em solos e sedimentos.

Tabela 3.5 – Área superficial específica de alguns constituintes presentes em solos e


sedimentos
Área superficial específica, m².g-1
Argilomineral
Total Externa Interna

Caulinita 10-30 10-30 0


Ilita 100-175 80-120 20-55
Montmorilonita 700-800 80 600-700
Vermiculita 700 40-70 700
Fonte: Dejou (1987)

Princípio de adsorção na determinação da ASE (métodos de BET e EGME):


A estratégia de determinação da ASE pelos métodos caracteriza-se pelo caminho
inverso da determinação da ASE, pelo cálculo das formas geométricas simples.
Assim, não há a necessidade de se conhecer a forma e o tamanho das partículas
de uma amostra para posterior cálculo da ASE. Este parâmetro pode ser estimado
indiretamente sobre a amostra. O princípio de isotermas de absorção de moléculas
sobre a superfície das partículas permite a estimação da área superficial específica. O
parâmetro permite inferir, entre outros, sobre a estrutura mineralógica das partículas
que compõem a amostra (Caillère et al., 1982).
Dois métodos destacam-se ao determinar a área superficial específica. O
primeiro baseia-se na isoterma de BET, iniciais dos nomes Brunauer, Edward e Teller
(Brunauer et al., 1938), e refere-se à adsorção em monocamada de uma molécula
gasosa, tal como o N2, sobre a superfície da partícula sólida (Figura 3.10). O princípio
é de fisissorção de moléculas gasosas, neutras, não polares às superfícies das
partículas, permitindo a estimação da área superficial específica externa. Para isso,
algumas premissas são consideradas: uso de um gás inerte que possa se depositar
em camadas uniformes sobre a superfície do sólido, e que não exista interação entre
camadas sucessivas de moléculas. Assim, quando determinado o volume de gás
adsorvido em monocamada à superfície, sob condições controladas de temperatura e
pressão, pode-se inferir a área superficial da partícula, conhecendo-se as dimensões
da molécula e seu comportamento. A área superficial específica será a razão dessa e
da massa da amostra inicial. No caso do BET, utiliza-se o Nitrogênio, que apresenta
uma fraca afinidade com ligações interfoliares, o que, por consequência, subtrai da
estimação a superfície interna dos argilominerais do tipo 2:1.

104 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
Figura 3.10 – Equipamento BET para determinação da área superficial específica externa por
adsorção de N2.
Foto de: E.C. Bortoluzzi

Ao contrário do BET, o método que usa uma substância orgânica, o EGME


(etileno-glicol monoetil éter-C4H10O2), interage com cátions trocáveis e coloca
em evidência, também, as superfícies internas (entrecamadas expansíveis) dos
argilominerais (Carter et al., 1965). O princípio do método é a diferença de massa de
uma amostra antes e depois da solvatação monocamada da superfície com moléculas
de EGME. Esse método prevê pesagens sucessivas de uma amostra, partindo da
solvatação completa com EGME até a massa da amostra se manter constante após
evaporação do excesso de EGME. Quando o processo de evaporação do excesso de
EGME for completo, restará apenas determinada quantidade de moléculas de EGME
em monocamadas, recobrindo as superfícies externas e internas. Ao se conhecer a
capacidade de recobrimento desta molécula sobre uma superfície, estima-se qual a
área foi coberta na amostra. Por exemplo, estima-se que 1 grama de EGME adsorvida
em partículas recobre 3.496 m² de área da amostra.
Na Figura 3.11 é apresentado um esquema simplificado do sistema. Para
uma descrição detalhada consultar Carter et al. (1965).

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 105
Figura 3.11 – Esquema do aparato usado para medir a área superficial específica por EGME.
Adaptado de: Carter et al. (1965)

Os passos para a determinação da ASE total por EGME podem ser


visualizados na Tabela 3.6.

Tabela 3.6 – Passos para determinação da área superficial específica total por
adsorção de EGME
Etapas Descrição
1 Saturação da amostra com cátion conhecido: saturações com CaCl2 e lavagens
sucessivas para eliminação do excesso de íons.
2 Padronização do teor de umidade: em dessecador em presença de sílica ou em
estufa;
3 Saturação das amostras com EGME: em atmosfera confinada (dentro de
dessecador) colocar placa de petri com EGME e proceder ao vácuo com auxílio
de bomba peristáltica;
4 Processo de eliminação do excesso de EGME: Nesta fase, todos os dias pela
manhã e a tarde, deve-se retirar o vácuo e trocar a cápsula de CaCl2 abaixo das
amostras. Proceder a determinação da massa das amostras
5 Manter o procedimento acima até a massa constante, ou seja, quando a
quantidade de EGME não é mais perdida, estado de monocamada sobre as
partículas.
6 Cálculo da área da amostra em m².g-1
Adaptado de: Carter et al. (1965)

É importante notar que quanto maior o dessecador, maior a capacidade de


receber amostras. Um dessecador de 30 cm de diâmetro pode receber até quatro
amostras, com uso de duas repetições, totalizando 8 placas de petri. Como medida
de segurança, o sistema dessecador/bomba a vácuo deve ser instalado no interior
de uma capela, sendo a exaustão acionada durante o procedimento de abertura do
sistema, a fim de eliminar resíduos de EGME na atmosfera.

106 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
Considerações finais: É compreensível que partículas pequenas apresentem
maior área superficial específica que as partículas maiores. Isto porque uma partícula
sólida e compacta, ao se dividir, tem sua área superficial aumentada a cada nova
fratura criada, sem que a massa do conjunto de partículas seja alterada. Contudo, duas
partículas com tamanho similar podem apresentar uma área superficial específica
diferente. Isso acontece porque a estrutura e a evolução mineralógica ocorrida
preteritamente pode não ter sido a mesma para as duas partículas. Neste sentido,
nos solos, a redução do tamanho das partículas minerais à medida da evolução do
solo, processo chamado de argilificação, ocorre concomitantemente com a evolução
mineralógica dessas partículas. Nos solos é possível relacionar um parâmetro físico,
como a área superficial específica, com a capacidade de troca catiônica, parâmetro
regido pela presença de sítios de carga negativa nas partículas. Bigorre (2000)
verificou a possibilidade de estimar a capacidade de troca de cátions (CTC) através
da área superficial específica de constituintes minerais de solos. Verifica-se nesta
figura que quanto menor a partícula, maior a área superficial específica e a CTC.
A determinação da ASE se constitui em um parâmetro de fácil estimação a
ser aplicado para inferir sobre a reatividade de materiais, como constituintes de solo
e sedimento. Pode-se estimar a ASE sobre materiais totais ou frações conhecidas
deste material, sendo necessária neste caso, a aplicação prévia de técnicas de
extração e separação de determinados tamanhos de partículas.
A técnica, por necessitar um recobrimento de monocamada de moléculas de
EGME sobre a superfície das partículas, apresenta problemas quando a amostra é
composta de materiais minerais e orgânicos. Os constituintes orgânicos apresentam
uma superfície diferente daquelas dos minerais, além de modificar a sua estrutura
(forma) quando submetidas a diferentes estados de umidade, ou solvatação com
moléculas de EGME, por exemplo. A presença de matéria orgânica pode apresentar-
se como um viés na determinação da ASE. Há uma subestimação da área superficial
externa, medida por BET, em presença de matéria orgânica (Kaiser & Guggenberger,
2003; Mayer & Xing, 2001). Os mesmos autores encontraram um aumento da ASE
com a destruição da matéria orgânica das amostras. Contudo, a área superficial total,
medida por adsorção de EGME, pode ser aumentada, visto que a matéria orgânica
constitui-se também em uma superfície afim para a molécula de EGME (Dejou, 1987).
É importante notar que a diferença das áreas superficiais determinadas
por BET (externa) e por EGME (interna e externa) pode ser atribuída unicamente à
superfície interna das partículas que, por conseguinte, são de estrutura do tipo 2:1
expansíveis.
Em ambos os métodos, há a necessidade de um pré-tratamento das amostras.
Isto porque as amostras apresentam quantidades significativas de gases não inertes
e diferentes cátions hidratados na entrecamadas. Essa condição engendra um viés,
influenciando o bom recobrimento da superfície pela molécula de N ou EGME. Nesse
sentido, realizam-se procedimentos prévios de degazagem e de desidratação, além
de uma saturação catiônica com CaCl2, por exemplo, que permitirá uma melhor
uniformização dos espaços interfoliares e posterior recobrimento.

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 107
3.2.3.2 Difração de raios-X

A identificação de minerais em amostras de sedimentos pode ser realizada


através de estudos em difração de raios-X do comportamento da rede cristalina
destes minerais. O uso de raios-X para estudos mineralógicos começou em meados
da década de 60. Por meio desta técnica, determinações semi-quantitativas de fases
minerais podem também ser possíveis de serem realizados (Caillère et al., 1982). A
Figura 3.12 mostra um exemplo de equipamento de raio-X para fins de mineralogia.

Figura 3.12 – Difratômetro de raios-X modelo Siemens® D5000.


Foto de: E. C. Bortoluzzi

Princípio: raios-X são produzidos quando partículas carregadas eletricamente


são freadas de maneira brusca. Assim, elétrons podem ser acelerados sobre uma
tensão V, e ao serem freados por colisão com outros elétrons (anti-cátodo), produzem
calor, mas também raios-X. Os elétrons, que por colisão ficaram em estado de
excitação, podem passar da camada K para a L ou K para a M, acompanhando
a emissão de um fóton nomeado Kα e Kβ, respectivamente. A radiação Kα pode
ser produzida por anti-cátodos de Cu, Fe, Co, Cr e Mo. Os anti-cátodos mais
frequentemente encontrados em equipamentos são os de Fe com Kα de 1,935 Ǻ de
comprimento de onda, Cu com Kα de 1,540 Ǻ e Co com Kα de 1,788 Ǻ. A emissão de
energia Kβ é filtrada por monocromadores de cristal curvo de quartzo, selênio, silício
ou grafite.
Os raios-X estão sujeitos a fenômenos de difração, e reflexão, refração, entre
outros. A interação entre os raios-X e as partículas de uma amostra pode respeitar
a lei de Bragg (equação 3.6), isto é, se a reflexão dos raios-X for coerente, como
também os planos atômicos de estruturas cristalinas.

108 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
Lei de Bragg:
nλ = 2d sen θ (Equação 3.6)

Onde:
λ = comprimento de onda Kα do anti-cátodo, em Ǻ;
θ = ângulo de incidência e reflexão dos raios-X, em graus;
dhkl = distância dos índices de Miller, em Ǻ;
n = 1.

Assim, a um determinado ângulo de inclinação, os raios-X incidentes em


planos atômicos coerentes que seguem a lei de Bragg farão vibrar conjuntamente
os íons deste plano, fazendo assim vibrações em fase, de modo a ser amplificada a
resultante dos planos, logo, o pico no DRX. Um exemplo disso está representado na
Figura 3.13.

θ θ
B

d hkl θ θ
A C
Planos iônicos
B´ coerentes
d hkl

Figura 3.13 – Representação esquemática das vibrações de planos coerentes e equidistantes.


Adaptado de : Bouchet et al. (2000)

Desta forma, pode-se conhecer a distância d, quando os parâmetros θ e


λ forem conhecidos, logo, a lei de Bragg é contemplada. Os argilominerais com
estrutura cristalina possuem planos atômicos coerentes e já foram estudados, logo, a
distância d já é bem conhecida. Assim, os índices de Miller, hkl, referem-se à distância
entre esses planos, característicos de cada mineral. O índice 00l corresponde à
distância basal dos argilominerais silicatos (filosilicatos). Em difratogramas, o pico
correspondente ao índice 00l (espaço que separa dois planos atômicos similares de
uma camada elementar) ainda pode ser de primeira ordem, 001, de segunda, 002,
ou terceira ordem, 003, e assim por diante, variando com o ângulo de inclinação do
conjunto emissão-amostra e receptor dado pelo goniômetro. Na Figura 3.14 estão
demonstradas as partes de um goniômetro 2º de θ, com emissão, porta amostra e o
receptor.
A amplitude dos ângulos a ser aplicada sobre uma amostra é definida em
função do objetivo de estudo, e em grande amplitude (amostras em pó desorientado
e em depósito orientado).

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 109
Obtenção de difratogramas de raios-X em amostras de pó de partículas
desorientadas: quando uma amostra de uma determinada fração é seca e submetida
a difração de raios-X, existe uma alta probabilidade de todas as faces dos minerais
serem representadas e expostas aos raios-X. Desta forma, os planos hk são
preferencialmente observados no domínio de Bragg. Assim, para representar um
conjunto de distâncias dos planos atômicos hk de partículas minerais, deve-se
programar para que o conjunto de graus do domínio de Bragg seja contemplado, isto
é, de 2 a 75 ou 80º 2θ.

Figura 3.14 – Foto à esquerda goniômetro radiação Co de um difratômetro de raios-X. À direita:


esquema de um goniômetro com suas respectivas partes.
Foto de: E. C. Bortoluzzi; Adaptado de: Bouchet et al. (2000)

Quando o objeto do estudo for identificar argilominerais (filosilicatos), as


amostras em pó não são eficientes para se obter diagramas com picos intensos (00l).
Nesse sentido, um tratamento realizado sobre as amostras, de modo a possibilitar
a orientação das partículas segundo o plano 00l, é necessário. Para isso, parte-se
de frações de materiais passíveis de conter esses minerais (por exemplo, frações
< 5 μm), e aplica-se uma suspensão de material cerca de 2 mL sobre lâminas de
vidro (Figura 3.15). A quantidade necessário é de cerca de 100 mg de material para
preparar uma lâmina.
Com este procedimento, as partículas, cuja forma são frequentemente
achatadas, se depositam umas sobre as outras durante o processo de evaporação
da água, expondo-se, assim, aos raios-X, os planos 00l (Robert & Tessier, 1974).
Difratogramas de raios-X podem ser obtidos apenas no intervalo de ângulos
entre 2 e 35º θ, visto que, os picos, referente ao plano 00l, são detectados nesta
gama de ângulos.

110 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
Figura 3.15 – Preparação de amostras de depósito orientado da fração argila proveniente de
um sedimento pluvial. Nos francos estão as suspensões de sedimento, fração <
2 μm. Abaixo, estão as lâminas de vidro já contendo uma cobertura de argila.
Foto de: E. C. Bortoluzzi

Testes de comportamento sobre as amostras:


Anterior aos testes de comportamento, um pré-tratamento deve ser realizado.
Nas argilas, existe a presença de cátions nos espaços das entrecamadas, sendo,
por essa razão, que a saturação das amostras com Ca, Mg, K ou mesmo Cs, se
constitui em tratamento fundamental. Desta forma, as distâncias basais encontradas
nos difratogramas de raios-X podem ser comparadas aquelas das tabelas, obtidas a
partir de argilominerais de referência (Brindley & Brown, 1980).
Tratamento normal: a passagem em difração de raios-X de amostras em
depósito orientado, secas ao ar, nas condições acima descritas, constitui-se no
tratamento normal a temperatura ambiente (25°C). Nessas condições, as argilas
possuem uma hidratação e, por consequência, uma expansão dos espaços das
entrecamadas compatível com a quantidade de água neste espaço.
Solvatação por moléculas orgânicas, como etileno-glicol (EG) ou glicol
(G): trata-se de um teste de comportamento e visa expandir as entrecamadas dos
argilominerais 2:1 expansíveis. Para isso, as lâminas de vidro com as amostras são
submetidas a atmosfera saturada por molécula orgânica. Esta molécula entra nas
entrecamadas, forçando a sua expansão.
Amostras submetidas à secagem: com o processo de secagem em mufla,
com temperatura controlada durante certo tempo, elimina-se gradativamente a
hidratação das partículas, forçando o fechamento das entrecamadas. Normalmente,
as temperaturas são de 200, 300 e 550°C. A cada nível de temperatura está associado
um comportamento específico de certos minerais, refletido nas distâncias basais dos
diagramas de raios-X.
Um esquema demonstrativo dos principais argilominerais pode ser
visualizado na Figura 3.16. As respostas dos picos em função do tratamento auxiliam
na identificação dos minerais na amostra. Normalmente, para se identificar uma fase
mineral com segurança, usa-se no mínimo a posição de três picos 00l (001, 002 e
003) em tratamento normal. Entretanto, a constatação definitiva da presença de uma
determinada espécie mineral deve ser confirmada após testes de comportamento
específicos.

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 111
Para os testes de solvatação (EG ou Glicol) e de aquecimento (200, 300 e
550°C), usa-se somente o domínio de Bragg, compreendido dos pequenos ângulos,
intervalo de 2 a 16º θ. Testes específicos também podem ser realizados para verificar
a presença de haloisita desidratada através do uso da formamida (Churchman et al.,
1984).

Após Após
aquecimento aquecimento
Condição Após EG 200 e 300 ºC 550 ºC
Normal Família das
Pico 7,15 Ǻ Pico 7,15 Ǻ Pico 7,15 Ǻ caulinitas
desaparece
Pico 7 Ǻ
Após formamida
Pico 7,2 Ǻ Pico 10 Ǻ Haloisita
Difratograma
de raios-X
00l
Família das
Pico 10 Ǻ Micas/ilitas
Amostras Após aquecimento
saturadas com 200 ºC
Ca ou Mg
Pico 17 Ǻ Pico 10 Ǻ Esmectitas
Após aquecimento
Pico 14-15 Ǻ
300 ºC saturação K

Pico 14-15 Ǻ Pico 10 Ǻ Vermiculitas


Após aquecimento Após aquecimento
300 ºC 550 ºC
Pico 14 Ǻ Pico 14 Ǻ Pico 14 Ǻ Cloritas

Figura 3.16 – Fluxograma dos picos de Raios-X 00l em função de tratamentos; da esquerda
para a direita: a) condição normal; b) após etileno-glicol (EG); c) aquecimentos a
200, 300 e 550°C; d) famílias de minerais correspondentes aos tratamentos.
Adaptado de: Brindley & Brown (1980)

Assim, os difratogramas de raios-X (DRX) podem subsidiar informações


quanto aos minerais presentes em uma amostra. Na Figura 3.17, são apresentados
DRX de amostras da fração argila, oriundas de sedimentos. Neles, pode-se notar a
presença de picos correspondentes a diferentes argilominerais, entre eles, minerais
de estrutura 2:1 a 14 Ǻ, que apresentaram expansividade a d = 17 Ǻ pelo teste de
solvatação ao EG, e fechamento da entrecamada a d = 10 Ǻ, após aquecimento a
550°C. Após aquecimento a 550°C, percebe-se também a supressão do pico a d = 7
Ǻ, característico do comportamento da caulinita.
Os diagramas apresentados na Figura 3.17 são próprios para a determinação
qualitativa dos minerais, porém não são adequados para análises quantitativas. Para
isto, a decomposição de difratogramas de raios-X se faz necessária. O procedimento
baseia-se: i) na escolha da área a ser modelada, que normalmente compreende a
área dos pequenos ângulos referentes aos picos 00l; ii) no traçado de uma linha de
base, abaixo do diagrama bruto; iii) na aplicação de curvas elementares Lorencianas
ou Gaussianas referentes às fases minerais presentes, com estrutura definida,
presentes na amostra; iv) na integração matemática da área destas curvas; v) na
proporcionalidade das áreas de cada fase.

112 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
CCc <2µm saturada Ca2+
17,12Å
'
-15,21Å (montmorilonita)
-10,00Å
- 3,03Å
Intensidade

CCb Aq 550o C Calcita

-7,2Å
CCb Aq 200o C

- 3,346Å
-4,05Å Feldaspato
- 3,85Å Calcita

-3,23Å Feldaspato
-4,25Å Qz
CCb EG

CCc N

5 10 15 20 25 30 35 40

o 2
Figura 3.17 – Diagrama de raios-X (DRX) da fração < 2 µm, saturada com Ca2+ do sedimento
coletado no exutório da Microbacia Hidrográfica de Agudo-RS, Brasil. Amostra
coletada durante um evento pluviométrico em outubro de 2003.
Adaptado de: Bortoluzzi et al. (2006)

O procedimento pode ser realizado com auxílio de programas de computador,


tais como o DecompRX (Lanson, 1997). O método é descrito em detalhes por Lanson
(1997). Nos últimos anos, muitos estudos mineralógicos são realizados com base
nessa técnica, e vêm contribuindo para o entendimento da evolução mineralógica
dos solos e grande expectativa é colocada em estudos de sedimentos (Lanson &
Besson, 1992; Lanson, 1997; Inoue et al., 1989; Bortoluzzi et al., 2005; Moore &
Reynolds, 1997; Bortoluzzi et al., 2012). Para estudos da estrutura, principalmente
dos argilominerais interestratificados, técnicas de modelagem matemáticas dos picos
das fases são requeridas (Reynolds & Reynolds, 1996).
Na Figura 3.18, é apresentado um difratograma de DRX decomposto de uma
amostra de sedimento coletada no exutório da MBH Arroio Lino - Agudo em 2003.
No difratograma de raios-X modelado, pode-se perceber a presença de
curvas referente às fases minerais da amostra e sua superfície relativa (proporção).
Observa-se que a presença de montmorillonita (Mt) argila do tipo 2:1 expansiva, é
majoritária na amostra, cerca de 93%, seguida da caolinita (caol), com 7%. A ilita não
alcançou 1%, quantidade que poderia ser discriminada pelo método.

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 113
2+
CCb N Ca

Diagrama Bruto
Curva Modelada
Fases
Intensidade

9,93Å 7,53Å
0% 7%
15,26Å Ilita Caol
93%
Mt

2 4 6 8 10 12 14 16 18
o
2
Figura 3.18 – Diagrama modelado de raios-X (radiação Co), em condição normal (temperatura
de 25°C) da fração < 2 µm, saturada com Ca2+ de um sedimento da máxima vazão
(CCb) de um evento pluviométrico, coletado no exutório da bacia hidrográfica do
Arroio Lino – Agudo.
Adaptado de: Bortoluzzi (2004)

3.2.4 Métodos para determinar a composição química total de amostras

Os métodos químicos são os mais utilizados para se conhecer o teor de


elementos químicos totais em uma amostra, porém são destrutivos e dispendiosos
de reagentes, equipamento e tempo. Normalmente, as amostras são solubilizadas
em meio ácidos (em presença de HF e/ou ácido sulfúrico) de modo que os elementos
possam ser dosados. Metodologias não destrutivas, como a fluorescência de raios-X,
ganham espaço. Trata-se de um método que possibilita a estimação (massa/massa)
de elementos químicos em amostras líquidas (água, leite, água+sedimentos), sólidas
orgânicas (madeira e vegetal) e inorgânicas (rocha, solo e sedimento) com estrutura
preservada ou não. Equipamentos de Fluorescência de raios-X possibilitam também
controlar a atmosfera na cápsula de medida (ar, vácuo ou algum gás como o N2), o
tempo de medida e o número de repetições, além de outros parâmetros.
O fenômeno que ocorre quando os raios-X (radiação Kα) interagem com
os elétrons dos elementos químicos que compõem a amostra emitindo luz consiste
no princípio básico da medida de fluorescência. Os elétrons se excitam e passam
a planos orbitais mais externos. Quando os elétrons retornam a órbita originária
emitem diferentes comprimentos de ondas, entre elas ondas de luz que podem
ser medidas. Assim, quanto maior a quantidade de um dado elemento químico na
amostra maior será a emissão de luz correspondente aquele elemento. Detectores

114 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
transmitem a programas de computador específicos que estimam a proporção de
todos os elementos detectados na amostra e permitem a quantificação de cada
espécie química na ordem de partes por milhão (mg.kg-1). Vale ressaltar que os
elementos químicos estimados por esse método não permitem a identificação da
espécie química do elemento muito menos se compõem a fase sólida de partículas
ou encontra-se nas posições de troca (grupos funcionais). Mas dão uma excelente
informação dos elementos que compõem a amostra.

3.3 | CONSIDERAÇÕES FINAIS


Nos últimos anos, novas metodologias e equipamentos vêm sendo
desenvolvidos a fim de tornar as análises de partículas mais fáceis e menos
dispendiosas de recursos financeiros, de trabalho e de tempo. Muitas das
metodologias foram adaptadas ao estudo de sedimentos a partir do seu uso em outras
áreas. Grande ênfase está sendo dada na rapidez da amostragem e na capacidade
de análise em larga escala como também na manutenção das características da
amostra durante a análise. Nesse sentido, medidas in situ têm estado em voga assim
como os equipamentos e as metodologias que delas dependem. Entretanto, o ponto
chave para estudos que empurram a fronteira do conhecimento ainda dependem
de um excelente controle na coleta das amostras e sua preparação. Conhecer o
que se busca ao coletar e analisar uma amostra, muitas vezes limitado em relação
a quantidade de material que se dispõem, parece uma tarefa simples, mas é de
fundamental importância em estudos que envolvem sedimentos.
Outro aspecto é equalizar o número de amostragem ao detalhamento dos
procedimentos para um dado objetivo. Em outras palavras, para conduzir estudos
detalhados, por exemplo, em mineralogia dos sedimentos, o número de amostras
e seu volume devem ser condizentes com os exigidos pelas metodologias. Em
campanhas de monitoramento, onde muitas vezes a quantidade de sedimento
coletado é pequena (pequenos córregos, baixa concentração de sedimentos) o uso
de metodologias de caracterização passa a ser uma questão de prioridade. Depara-
se em situações onde as escolhas devem ser tomadas a fim de viabilizar a aplicação
de certas metodologias pontuais em detrimento de outras de modo que, no todo, os
resultados sejam representativos da população que se deseja estudar. Nesse sentido,
por exemplo, a caracterização mineralógica de sedimentos não deve ser utilizada na
lógica qualitativa estatística, ou seja, alto número de repetições, o que demanda
tempo e recursos sem a proporcional melhoria na precisão dos resultados. Uma
boa estratégia para estudos mais pontuais passa indubitavelmente pelo processo
de escolha de amostras representativas do conjunto da população estudada. Assim
será possível caracterizar em detalhe o material com o uso de metodologias que se
complementam e discriminem os efeitos que se quer isolar.
Apesar disso, é impossível conceber instrumentos que captam todas as
facetas da natureza dos materiais estudados. A capacidade de associação entre
partículas na formação de agregados (flocos), e o que essas associações representam

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 115
quanto a sua origem e a transferência de poluentes dos sistemas terrestres aos
aquáticos ainda merecem estudos. Uma grande evolução nesse sentido, já foi dada
por meio de medidas in situ da granulometria de sedimentos (Kammer & Forstner,
1998; Kammer et al., 2005). Até lá, a estratégia de amostragem e preparação das
amostras de acordo com a finalidade do estudo deverão ser o foco principal para
estudos de sedimentos.
Neste contexto, a separação do tamanho de partículas dispersas, ainda é
condição fundamental para a caracterização de materiais, sejam eles de pedológicos
ou de sedimento. Dentre as técnicas de maior impacto, a DL tem seu lugar em
estudos de sedimentos, visto que, permite com pouca amostra detalhar sem destruir.
A partir daí, técnicas tradicionais poderão ser utilizadas para o estudo de uma ou
outra classe de tamanho de partícula, tais como a difração e a fluorescência de
raios-X, a espectrometria infravermelho, a análise térmica diferencial, a microscopia
óptica e a microscopia eletrônica a varredura e à transmissão (Elsass et al., 2008).
Em face do exposto neste capítulo, percebe-se que uma técnica não substitui
outra, elas são complementares. Por essa razão, espera-se que o capítulo tenha
suscitado o interesse dos colegas no uso de ferramentas de análises mineralógicas
a fim de implementar estudos que caracterizam os sedimentos.

3.4 | REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


AFNOR. 1996. Qualité des sols. Recueil de normes françaises. AFNOR, Paris France. 533p.

BEEKMAN, A.; SHAN, D.; ALI, A.; DAI, W.; WARD-SMITH, S.; GOLDENBERG, M. 2005.
Micrometer scale particle sizing by laser diffraction: critical impact of the imaginary
component of refractive index. Pharmaceutical Research. 22, 4, pp.518-522.

BEUSELINCK, L.; GOVERS, G.; POESEN, J.; DEGRAER, G.; FROYEN, L. 1998. Grain-size
analysis by laser diffractometry: comparison with the sieve-pipette method. Catena,
32, pp.193-208.

BIGORRE, F. 2000. Influence de la pédogenèse et de l’usage des sols sur leurs propriétés
physiques. Mécanismes d’évolution et éléments de prévision. Thèse Univ. Nancy I,
145p.

BLOTT, S.J.; PYE, K. 2006. Particle size distribution analysis of sand-sized particles by laser
diffraction: an experimental investigation of instrument sensitivity and the effects of
particle shape. Sedimentology, 53, pp.671-685.

BORTOLUZZI, E. C. 2004. Caracterização quali-quantitativa de sedimento fluvial oriundo da


microbacia hidrográfica fumageira de Agudo, Rio Grande do Sul, Brasil. Relatório
Técnico, Brasília: CNPq. 75p.

BORTOLUZZI, E. C.; MOTERLE, D. F.; RHEINHEIMER, D. S.; CASALI, C. A.; MELO, G.


W.; BRUNETTO, G. 2012. Mineralogical changes caused by grape production in
a regosol from subtropical Brazilian climate. Journal of Soils and Sediments, 12,
pp.854-862.

BORTOLUZZI, E. C.; POLETO, C.; BAGINSKI, A. J.; SILVA, V. R. 2010. Aggregation of


subtropical soil under liming: a study using laser diffraction. Revista Brasileira de
Ciência do Solo, 34, pp.725-734.

BORTOLUZZI, E. C.; RHEINHEIMER, D. S.; KAMINSKI, J.; GATIBONI, L. C.; TESSIER, D.


2005. Alterações na mineralogia de um Argissolo do Rio Grande do Sul submetido à

116 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
fertilização potássica. Revista Brasileira de Ciência do Solo, 29, pp.327-335.

BORTOLUZZI, E. C.; RHEINHEIMER, D. S.; PELLEGRINI, J. B. R.; PERNES, M.; DUR, J.


C. 2006. Qualidade de sedimento e processo de eutroficação de águas fluviais em
uma microbacia hidrográfica do Rio Grande do Sul. V simpósio internacional de
qualidade ambiental: gestão integrada do ambiente. PUCRS, In: CD-Rom.

BORTOLUZZI, E. C.; SANTOS, M. A. S.; VILLETTI, M. A. 2010. Sediment Characterization.


In: Cristiano Poleto; Susanne M. Charlesworth. (Org.). Sedimentology of Aqueous
Systems, 216p. Sedimentology of Aqueous Systems, 216p.. 1ed. London: John
Wiley & Sons/Blackwell, v.1, pp.80-107.

BOUCHET, A.; MEUNIER, A.; SARDINI, P. 2000. Minéraux argileux: structure cristalline,
identification par diffraction de rayons-X. Bulletin Centre Rech. Elf. Explor. Prod. ,
Mém. 23. 136p.

BOUYOUCUS, G. J. 1962. Hydrometer method improved for making particle size analyses of
soils. Agronomy Journal, 53, 5, pp.464-465.

BRINDLEY, G. W.; BROWN, G. 1980. Crystal structures of clays minerals and their X-ray
identification. Mineralogical society, monograph n° 5, London, 495p.

BRUNAUER, S.; EMMETT, P. H.; TELLER, E. 1938. Adsorption of gases in multi-molecular


layers. J. Am. Chem. Soc., 60(2) pp.309-319; DOI: 10.1021/ja01269a023

CAILLERE, S.; HENIN, S. ; RAUTUREAU, M. 1982. Minéralogie des argiles: structure et


propriétés physico-chimiques. 2nd. Actualités scientifiques et agronomiques/INRA,
v.8, 184p.

CARTER, D. L.; HEIMAN, R.; GONZALES, C. L. 1965. Ethylene glycol monoethyl ether for
determining surface area of silicate minerals. Soil Science, 100, pp.356-360.

CASAMITJANAN, X.; SERRA, T.; COLOMER, J. 2002. A study of the evolution of the particle
boundary layer in a reservoir, using laser particle sizing. Water Research, 36,
pp.4293-4300.

CHENU, C. 2001. Le complexe argilo-humique des sols: Etat des connaissances actuelles.
C. R. Acad. Agric. Fr. 87, 3, pp.3-12.

CHURCHMAN, G. J.; WHITTON, J. S.; CLARIDGE, G. G. C.; THENG, B. K. G. 1984.


Intercalation method using formamide for differentiating halloysite from kaolinite.
Clays and Clay Minerals, 32:4, pp.241-248.

COULTER, 1997. Product manual Coulter LS series. Coulter, Miami.

DEJOU, J. 1987. La surface spécifique des argiles, as mesure, relation avec la CEC et son
importance en agronomie. In: colloque AFES sur la CEC et fertilisation des sols
agricoles. Caen, França, pp.72-83.

DIXON, J. B.; WEED, S. B 1989. Minerals in soil environments. 2end. Soil Science Society of
America, Madison, USA. 1244p.

DUR, J. C.; ELSASS F.; CHAPLAIN V.; TESSIER D. 2004. The relationship between particle-
size distribution by laser granulometry and image analysis by transmission electron
microscopy in a soil clay fraction. European Journal of Soil Science, 55, pp.265-270.

ELSASS, F.; CHENU, C. ; TESSIER, D. 2008. Transmission electron microscopy for soil
samples: preparation methods and use. Chapter 9. In: Methods of Soil Analisys. Part
5. Mineralogical methods. Soil Science Society of America, Book Series, 5, pp.235-
268.

EMBRAPA, 1997. Manual de métodos de análise de solos. 2edn. Ver. Atual. Rio de Janeiro.
EMBRAPA/CNPS. 212p.

FILELLA, M.; ZHANG, J.; NEWMAN, M. E.; BUFFLE, J. 1997. Analytical applications of photon

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 117
correlation spectroscopy for size distribution measurements of natural colloidal
suspensions: capabilities and limitations. Colloids and Surfaces A: Physicochemical
and Engineering Aspects, v.120, pp.27-46.

GROSSMAN, R. B.; MILLET, J. C. 1961. Carbonate removal from soils by a modification of


acetate buffer method. Soil Sci. Soc. Am. Proc. 25, pp.325-326.

HSIEH, Y. P. 1984. Using clay mineralogy to infer sources of suspended clay and silt in a
watershed: quantitative approach. Soil Sci. Soc. Am. J. 48, pp.1446-1450.

HOROWITZ, A. J. 1991. A primer on sediment-trace element chemistry. 2 ed. Chelsea, EUA:


Lewis Publishers. 136p.

HUGHES, R. E.; MOORE D. M.; GLASS, H. D. 1994. Qualitative and quantitative analysis of
clay minerals in soils. pp.330-359. In: Quantitative Methods in soil Mineralogy (Jon
M. Baterls, editor), Soil Science Society of America, Madison, Wisconsin, USA.

INOUE, A.; BOUCHET, A.; VELDE, B.; MEUNIER, A. 1989. Convenient technique for
stimating smectite layer percentage in randomly intertratified illite/smectite minerals.
Clays and clay Minerals, 37, pp.227-234.

KAISER, K.; GUGGENBERGER, G. 2003. Mineral surfaces and soil organic matter. European
Journal of Soil Science, 54, pp.219-236.

KAMMER, F. V. D.; BABOROWSKI, M.; FRIESE, K. 2005. Field-flow fractionation coupled


to multi-angle laser light scattering detectors: applicability and analytical benefits
for the analysis of environmental colloids. Analytica Chimica Acta, 552, pp.166-174.

KAMMER, F.; FORSTNER, U. 1998. Natural colloid characterization using flow-field-flow-


fractionation followed by multi-detector analysis. Water Science and Techonology,
37, pp.173-180.

KONERT, M.; VANDENBERGHE, J. 1997. Comparison of laser grain size analysis with
pipette and sieve analysis: a solution for the underestimation of the clay fraction.
Sedimentology, 44, pp.523-535.

KONGSAWADWORAKUL, P.; CHRESTIN, H. 2003. laser diffraction: A new tool for


identification and studies physiological effectors involved in aggregation-coagulation
of the rubber particles from Hevea latex. Plant Cell. Physiol. 44, 7, pp.707-717.

KUNZE, G. W.; DIXON, J. B. 1986. Pretreatment for mineralogical analysis. In: Method of soil
analysis: part 1 physical and mineralogical methods. P91-100. 2nds. (Klute, A. ed.),
SSSA, Madison, 1986.

LANSON, B. 1997. Decomposition of experimental X-ray diffraction patterns (profile fitting):


a convenient way to study clay minerals. Clay and Clay Minerals, 45, pp.132-146.

LANSON, B.; BESSON, G. 1992. Characterization of the end of smectite-to-illite transformation:


decomposition of X-ray patterns. Clays and clay minerals, 40, pp.40-52.

LEDIN, A.; KARLSSON, S.; DUKER, A.; ALLARD, B. 1995. Characterization of the
submicrometer phase in surface waters. The Analyst., 120, pp.603-608.

MAYER, L. M.; XING, B. 2001. Organic matter-surface area relationships in acid soils. Soil
Sci. Soc. Am. J. 65, pp.250-258.

MCCAVE, I. N.; HALL, I. R.; BIANCHI, G. G. 2006. laser vs. settling velocity differences in silt
grainsize measurements: estimation of palaeocurrent vigour. Sedimentology, 1-10.
DOI: 101111/j.1365-3091.2006.00783.x.

MEHRA, O. P.; JACKSON, M. L. 1960. Iron removal from soils and clays by a dithionite citrate
system buffered with sodium bicarbonate. Clays and Clay Minerals, 7, pp.312-327.

MINELLA, J. P. G.; MERTEN, G. H.; REICHERT J. M.; RHEINHEIMER, D. S. 2007.


Identificação e implicações para a conservação do solo das fontes de sedimentos

118 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
em bacias hidrográficas. Rev Bras Cienc Solo, 31, pp.1637-1646.

MOORE, D. M.; REYNOLDS, R. C. 1997. X-ray diffraction and the identification and analysis
of clay minerals. pp.100-200. Oxford University Press Inc, USA.

MUDROCH, A.; AZCUE, J. M. 1995. Manual of aquatic sediment sampling. Florida, EUA:
CRC Press. 219p.

MUDROCH, A.; AZCUE, J.; MUDROCH, P. 1996. Manual of physico-chemical analysis of


aquatic sediments. Florida, EUA: CRC Press. 287p.

MUGGLER, C. C.; PAPE, T. H.; BUURMAN, P. 1997. laser grain-size determination in soil
genetic studies 2. Clay content, clay formation, and aggregation in some brazilian
oxisols. Soil Science, 162, n.3. pp.219-228.

MURPHY, J.; RILEY, J. P. 1962. A modified single solution method for the determination of
phosphate in natural waters. Analitica Chimica Acta, 27, pp.31-36.

PELLEGRINI, J. B. R.; RHEINHEIMER, D. S.; GONÇALVES, C. S.; COPETTI, A. C. C.;


BORTOLUZZI, E. C. ; TESSIER, D. 2010. Impacts of anthropic pressures on soil
phosphorus availability, concentration, and phosphorus forms in sediments in a
Southern Brazilian watershed. Journal of Soils and Sediments, 10, pp.451-460.

PERNES-DEBUYSER, A. 2003. Différenciation des propriétés du sol par apports d’engrais et


d’amendements. Cas de l’essai de longue durée des 42 parcelles. Thèse Université
de Bourgogne, spécialité environnement et agronomie.

POLETO, C.; BORTOLUZZI, E. C.; MERTEN, G. H. 2007. Uso de ultra-som como pré-
tratamento de amostras de sedimento fluvial em difratometria laser. In: MERTEN,
G.H.; POLETO, C. & OLIVEIRA, A.L.B. (org.). Sedimentos: o Desafio da
Multidisciplinaridade. 1ed. Porto Alegre: Associação Brasileira de Recursos Hídricos-
ABRH, pp.48-62.

POLETO, C.; BORTOLUZZI, E. C.; CHARLESWORTH, S. M.; MERTEN, G. H. 2009.


Urban sediment particle size and pollutants in Southern Brazil. Journal of Soils and
Sediments, 9, pp.317-327.

PYE, K.; BLOTT, S. 2004. Particle size analysis of sediments, soils and related particulate
materials for forensic purposes using laser granulometry. Forensic Science
international. 144, pp.19-27.

REYNOLDS, R. C. JR.; REYNOLDS, R. C. 1996. NEWMOD for windows©: The calculation of


on-dimensional X-ray diffraction patterns of mixed-layered clay minerals. In: 8 Brook
Road, Hanover, New Hampshire.

RHEINHEIMER, D. S.; GONÇALVES, C. S.; BORTOLUZZI, E. C.; PELLEGRINI, J. B. R.;


SILVA, J. L. S.; PETRY, C. 2010. Qualidade de águas subterrâneas captadas em
fontes em função da presença de proteção física e de sua posição na paisagem.
Engenharia Agrícola, 30, pp.948-957.

ROBERT, M.; TESSIER, D. 1974. Méthode de préparation des argiles de sols pour les études
minéralogiques. Annalles Agronomique, 25, pp.859-882.

SCHILDBERG, Y. 1993. Granulometrie laser: applications aux argiles. Ecole National de


Nancy. Stage de fin d´étude. 50p.

STUMM, W. ; MORGAN, J. J. 1996. Aquatic chemistry: chemical equilibria and rates in natural
waters. 3ed. New York:John Wiley & Son. 1022p.

USDA. 1996. Soil survey laboratory methods manual. United States Department of Agriculture.
Soil survey investigations report. n.42. version 3. 716p.

Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul | Capítulo 3L 119
120 M Capítulo 3 | Metodologias para estudos de sedimentos: ênfase na proporção e na natureza mineralógica das partícul
Matéria Orgânica em Ambientes
Terrestres e Aquáticos: Compartimentos,
Composição e Reações
Capítulo 4

MATÉRIA ORGÂNICA EM AMBIENTES TERRESTRES E AQUÁTICOS:


COMPARTIMENTOS, COMPOSIÇÃO E REAÇÕES
Deborah Pinheiro Dick & Rosane Martinazzo

4.1 | INTRODUÇÃO: Definição, Formação e Composição da Matéria Orgânica

4.1.1 Definição

A matéria orgânica (MO), nos ambientes aquáticos e terrestres, ocorre tanto


na fase sólida como na fase aquosa, apresentando diferentes tipos de estrutura,
composição, interações e formas de solubilidade. No ambiente terrestre, a MO ocorre
na fase sólida do solo e na água do solo, sendo que esta última pode ser subdividida
em água intersticial e água de drenagem. No ambiente aquático, a MO pode
ocorrer tanto na água superficial como nos sedimentos. No primeiro compartimento,
destacam-se os ambientes de água doce e água marinha, enquanto os sedimentos
podem ser subdivididos em fase sólida e água intersticial (Kördel et al., 1997).
A matéria orgânica do solo (MOS) pode ser considerada como todo o material
orgânico do solo de origem vegetal e animal, abrangendo a liteira, a fração leve dos
resíduos vegetais em decomposição, biomassa microbiana, compostos orgânicos
solúveis e matéria orgânica estabilizada (Stevenson, 1994). Numa abordagem
mais ampla, eventualmente, esse conceito pode abranger a biomassa total do solo,
incluindo a meso e macrofauna (Roscoe & Machado, 2002) e todas as substâncias
resultantes da decomposição de plantas terrestres e aquáticas, incluindo as turfas
(Macalady, 1998).
Na fase aquosa, seja de ambiente aquático ou de ambiente terrestre, a MO
pode ser dividida em duas categorias: matéria orgânica dissolvida (MOD) e matéria
orgânica particulada (MOP). A MOD inclui todo material orgânico que passa por uma
membrana de filtro de 0,45 μm, e a MOP abrange o material orgânico de diâmetro
maior do que 0,5 a 0,45 μm. O carbono contido em ambiente terrestre, ou seja, a
matéria orgânica do solo pode chegar a 2,5 x 1015 Kg de C, enquanto que o ambiente
marinho (substâncias húmicas marinhas) pode chegar a conter até 3 x 1015 Kg de C
(Kördel et al., 1997).
Ao material orgânico completamente decomposto, que não apresenta
vestígios morfológicos do material do qual se originou, é dado comumente o nome
de húmus (Tan, 2003). Este, por sua vez, pode ser subdividido em material orgânico

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 123
não-húmico e matéria orgânica humificada.
A matéria orgânica humificada é constituída por uma mistura de substâncias
polidispersas, sem fórmula molecular definida, contendo os principais grupos
funcionais do carbono, comportando-se como compostos macromoleculares de alto
peso molecular, em geral ≥ 2 kilodaltons (Hayes & Clapp, 2001). No ambiente terrestre
e em sedimentos, essa fração pode apresentar elevado tempo de permanência
no solo, de centenas a milhares de anos. Este comportamento é atribuído às
características químicas e estéreo-químicas da matéria humificada, como também à
formação de complexos organo-minerais (Stevenson, 1994; Christensen, 1996). Do
ponto de vista do comportamento em meio aquoso com diferentes níveis de pH, as
substâncias húmicas são divididas em três grupos principais: ácidos húmicos (AH)
- fração solúvel em meio básico e que precipita em meio ácido; ácidos fúlvicos (AF)
- fração solúvel tanto em meio ácido como em meio básico, e huminas (HU) - fração
não-ácida insolúvel em qualquer valor de pH.
A fração não-húmica é composta por substâncias orgânicas simples de
fórmula molecular e características conhecidas, tais como carboidratos, proteínas,
lipídios, ácidos orgânicos e outros, que são liberados durante a decomposição dos
organismos. Essas substâncias são facilmente decompostas no solo e seu tempo de
permanência no meio é da ordem de dias a alguns meses (Sparks, 1995).
O carbono orgânico dissolvido (COD) na solução do solo e meio aquático não
corresponde necessariamente à fração não-húmica, pois sua definição é vinculada
ao método empregado na sua obtenção. Essa fração é uma mistura complexa de
compostos variando de ácidos simples e polissacarídeos a substâncias húmicas
complexas. Metodologicamente, o COD é considerado como sendo aquela fração
orgânica solúvel que passa em membrana de 0,45 µm (Thurman, 1985).
Substâncias húmicas aquáticas (SHA) contribuem de 40 a 60% para o COD, e
representam a fração mais abundante da matéria orgânica natural em águas naturais
(Thurman, 1985). Grande parte das SHA é composta de AF (em geral em torno de
90%), enquanto os AH ocorrem em menor abundância (Rocha & Rosa, 2003).
Em ambientes marinhos, a quantidade da fração da MOD excede a da MOP
em 10 a 20 vezes. No mar, a MOP compreende em grande parte organismos vivos,
tais como o fitoplâncton e resíduos cuja proporção relativa depende da localização
e da profundidade (Riley, 1970). A MOP é extremamente importante para a cadeia
alimentar marinha, uma vez que fornece nutrientes para diversos organismos,
porém, também representa a primeira etapa na acumulação de poluentes (Kördel et
al., 1997).
Os compostos orgânicos solúveis desempenham papel importante na
nutrição de plantas, pois atuam como fonte imediata de nutrientes. Do ponto de
vista ambiental, a importância dessas substâncias está associada a sua elevada
reatividade. Essa fração pode atuar localmente como agente mitigador do efeito
tóxico de metais pesados, devido à acentuada capacidade complexante de metais
apresentada por alguns ácidos orgânicos, como também de compostos xenobióticos
orgânicos, devido à interação desses com as estruturas hidrofóbicas presentes nas
moléculas. Por outro lado, esses compostos podem atuar como carreadores desses
contaminantes para lençóis freáticos em processos de lixiviação, e para cursos de

124 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
água adjacentes, quando apresentam elevada mobilidade.

4.1.2 Formação

Nos processos de decomposição dos resíduos orgânicos no solo, o termo


humificação é empregado para designar a formação da matéria orgânica estabilizada.
Os processos químicos e bioquímicos envolvidos na humificação não são, todavia,
completamente conhecidos, e as teorias propostas têm sido motivo de controvérsia
entre os pesquisadores. Duas teorias, que se diferenciam quanto à abordagem, são
tradicionalmente citadas:
a. Numa delas, a rota de humificação se verifica pela despolimerização de
biopolímeros conduzindo diretamente à matéria orgânica humificada;
b. E, na outra, a formação das substâncias húmicas envolve a polimerização
de moléculas de pequeno tamanho molecular liberadas na decomposição total dos
resíduos orgânicos (Stevenson, 1994; Sparks, 1995; Tan, 2003).
A teoria clássica da decomposição da lignina, proposta inicialmente por
Waksman, em 1936, e suas modificações posteriores (Tan, 2003), é um exemplo da
primeira abordagem. Segundo essa proposta, ligninas modificadas, resultantes do
ataque microbiano, seriam as principais unidades estruturais da matéria humificada,
que seriam formadas pela perda gradativa dos grupos metoxila, formação de
hidroxifenóis e oxidação das cadeias alifáticas laterais formando grupos carboxilas.
Seguindo esta teoria, Hedges (1988) propôs que a degradação de biopolímeros leva
inicialmente à formação da fração humina, cuja degradação posterior leva à formação
de ácidos húmicos e fúlvicos.
Em contrapartida, a teoria dos polifenóis pressupõe que aldeídos e ácidos
fenólicos e quinonas interagem com amino-compostos, polimerizando e formando
estruturas húmicas macromoleculares.
No entanto, o caráter macromolecular das substâncias húmicas tem
sido questionado recentemente. Enquanto alguns pesquisadores caracterizam
as substâncias húmicas como macromoléculas clássicas, outros afirmam que
esses compostos são na realidade associações supramoleculares de moléculas
heterogêneas menores que se comportam como macromoléculas (Swift, 1999;
Piccolo et al., 2004). Esses arranjos supramoleculares seriam mantidos pela ação
de forças não-covalentes entre as moléculas, tais como forças dispersivas (Van der
Waals, r-r*, CH r*) em pH neutro e ligações de hidrogênio em meio ácido (Piccolo,
2002; Piccolo et al., 2002; Simpson et al., 2002). Essas duas teorias podem, no
entanto, ser simultaneamente compatíveis. Garcia-Mina et al. (2004) identificaram
macromoléculas pequenas e moléculas de pequena massa molecular em
associações supramoleculares co-existindo em sistemas húmicos obtidos de solo,
de compostagem e de turfas.
Em sistemas de água doce, a matéria orgânica aquática (MOA) é originada
tanto do ambiente aquático como do terrestre, uma vez que cursos de água doce
captam material de toda a bacia de drenagem. Nesses ambientes, três componentes
principais podem ser identificados: material refratário alóctone, material autóctone

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 125
relativamente lábil e a contribuição antropogênica (Ertel et al., 1986).
No ambiente marinho se destacam quatro fontes principais de carbono
orgânico (Stumm & Morgan, 1996):
a. Solo: material orgânico de solo é transportado para o mar principalmente
pelos rios e, em menor quantidade, por via eólica;
b. Decomposição de organismos mortos: este tipo de decomposição
ocorre simultaneamente por autólise e por ação bacteriana. A contribuição de cada
mecanismo para o produto final dependerá das condições em que se encontra o
material morto e da disponibilidade das bactérias;
c. Excreção de produtos extracelulares de algas: algas podem liberar
quantidades consideráveis de compostos orgânicos resultantes da sua fotossíntese;
d. Excreção de animais marinhos: excreções de animais marinhos e
zooplâncton podem constituir uma fonte importante de compostos orgânicos.
Analogamente às SHA de água doce, as SHA marinhas podem ser
classificadas segundo sua formação como alóctone (origem terrestre) e autóctone
(origem aquática) (Kordel et al., 1997).

4.1.3 Composição química

A matéria orgânica em ambientes naturais é composta principalmente


de carbono (52 a 58% m/m) e oxigênio (34 a 45% m/m), seguido de nitrogênio e
hidrogênio (3,3 a 8% m/m) (Tabelas 4.1 e 4.2). Enxofre e fósforo ocorrem geralmente
em proporções inferiores a 2% (Stevenson, 1994). Os grupos funcionais contendo
O e N, e o S em menor escala, contribuem para o caráter hidrofílico da matéria
orgânica, sendo que muitos destes grupos dissociam segundo o equilíbrio ácido-
base (Tabela 4.3).

Tabela 4.1 – Composição elementar, relação C/N, razões atômicas H/C e O/C, teor de
carboxilas, hidroxilas fenólicas e acidez total de substâncias húmicas de
solos de diferentes regiões do mundo
OH- Acidez
C H O N COOH* fenólica* total*
SH C/N H/C O/C
% cmol kg-1
ÁH 50 - 59 3,9 - 6,2 32 - 40 3,1 - 5,0 10 - 17 0,80 - 1,2 0,42 - 0,57 150 - 570 210 - 570 560 - 890
ÁF 41 - 51 4,3 - 7,0 40 - 53 0,9 - 3,3 18 - 38 0,93 - 1,4 0,65 - 1,0 520 - 1120 30 - 570 640 - 1420
HU 57 - 59 4,5 - 5,5 33 - 35 2,7 - 3,0 19 - 22 0,92 - 2,1 0,42 - 0,46 180 - 220 290 - 330 490 - 530
* determinado por métodos químicos (via úmida)
Dados de: Stevenson (1994), Sparks (1995), Kang et al. (2003), Tan (2003) e Song et al. (2005)

Tanto em ambiente aquático como em ambiente terrestre, os AH se diferenciam


dos respectivos AF pelo maior teor de C e menor teor de O (Tabelas 4.1. e 4.2), o
que se reflete na sua acidez (Tabela 4.3). A composição da humina pode variar em

126 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
função do material que a compõe. A sua insolubilidade em meio aquoso pode ser
simultaneamente devido tanto à sua elevada hidrofobicidade como também à forte
interação com os componentes inorgânicos. Essa fração pode conter componentes
lipídicos, estruturas de carboidratos e aromáticas em diferentes proporções (Rice,
2001).
Os AF aquáticos são mais ricos em oxigênio do que os AF terrestres. As
composições químicas de AF e de AH aquáticos possuem relativamente mais
semelhança entre si do que no caso de AF e AH terrestres (Visser, 1983).

Tabela 4.2 – Dados de composição elementar, relação C/N e razões atômicas H/C e
O/C para substâncias húmicas de matrizes de diversas regiões do Brasil

Fração, C H N O
procedência,
vegetação do C/N H/C O/C Referência
solo e número de
amostras %

AH - Latossolo,
Argissolo e Dick et al. (1998)
Chernossolo (RS), 52 - 54 4,4 - 5,1 4,6 - 7,2 35 - 39 7,3 - 15 1,03 - 1,16 0,49 - 0,58 Empinotti (1999)
vegetação nativa Dick et al. (2003)
e culturas, 8
amostras
HU - Latossolo e
Chernossolo (RS), 43 - 45 3,7 - 4,0 4,6 - 6,0 46 6,8 - 9,9 0,98 - 1,11 0,76 - 0,80 Dick et al. (2003)
vegetação nativa,
2 amostras
AF - Latossolo e
Chernossolo (RS), 42 - 49 2,3 - 4,8 1,0 - 3,5 48 - 49 12 - 49 0,57 - 1,36 0,74 - 0,87 Dick et al. (1999)
vegetação nativa,
2 amostras
AH - solos
hidromórficos 51 - 55 4,3 - 5,7 2,0 - 4,8 35 - 41 11 - 26 0,94 - 1,25 0,48 - 0,60 Nascimento
(2004)
(ES), 7 amostras
Araújo et al.
SH aquáticas (RS) 33 - 38 0,6 - 1,6 1,4 - 4,0 n.d. 25 - 72 0,4 - 1,3 n.d. (2002)
AH de carvão 58 - 64 4,2 - 4,4 1,2 - 1,8 29,6 - 36,2 36 - 53 0,83 - 0,88 0,35 - 0,47 Dick et al. (2002)
(RS), 4 amostras
n.d. não determinado

A composição da MOA marinha é suscetível às condições do meio, sendo


afetada por alterações da salinidade, do teor de oxigênio dissolvido, das variações
sazonais que, por sua vez, afetam a temperatura, das adições alóctones e
antropogênicas e da hidrologia do sistema (Leenheer, 1991).

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 127
Tabela 4.3 – Principais grupos funcionais da matéria orgânica do solo

Grupo Funcional Estrutura
Carboxila R-COOH
Enol R-CH=CH-OH
OH fenólica Ar-OH
Quinona Ar=O
OH-alcoólico R-CH2-OH
Éter R-CH2-O-CH2-R
Cetona R-C=O(-R)
Aldeído R-CH=O
Éster R-C=O(-OR)
Amina R-CH2-NH2
Amida R-C=O(-NH-R)
Adaptado de: Sparks (1995)

Em geral, para SH terrestres, o teor de nitrogênio tende a decrescer na ordem


AH > HU > AF para amostras da mesma origem, e a razão C/N tende a aumentar na
ordem inversa. Os compostos nitrogenados em AH e em MOS foram identificados
por espectroscopia de RMN de 15N como sendo principalmente grupos amida e,
portanto, de baixa recalcitrância (Knicker & Lüdeman, 1995; Knicker et al., 2000;
Abe et al., 2005; Dick et al., 2005; Diekow et al., 2005). O enriquecimento relativo de
N em AH e a ocorrência de estruturas nitrogenadas relativamente lábeis sugerem
um aprisionamento de compostos nitrogenados herdados do resíduo original ou
produzidos pela biomassa nessa fração húmica.
A partir da composição elementar são calculados índices que podem informar
sobre a estrutura das SH e, portanto, ser úteis na avaliação do seu comportamento
no ambiente.
A relação C/N é usualmente empregada para se avaliar o grau de humificação
da MO, sendo que valores inferiores a 20 são esperados para a MO humificada que
constitui fração da MOS mais decomposta. Durante a decomposição do resíduo, parte
do carbono e uma maior proporção de nitrogênio são incorporadas à MO humificada e
à biomassa microbiana, ocorrendo um decréscimo gradativo desse parâmetro. Valores
entre 15 e 8 têm sido observados para fração de MO < 53 μm e para MO do solo inteiro
tratada com HF (Roscoe & Burmann, 2003; Dick et al., 2005; Santos, 2005).
Em contrapartida, a composição da MOP é fortemente influenciada pelo
resíduo vegetal que a originou. Em geral, resíduos de leguminosas tendem a apresentar
relação C/N em torno de 20, enquanto o de gramíneas pode variar de 40 a 80.
A razão molar H/C é usualmente empregada como indicador da saturação
dos átomos de C e das estruturas que compõem a molécula húmica. Quanto menor
o valor dessa razão, maior o grau de insaturação da estrutura.
Para amostras de solos valores entre 0,6 e 1,4 têm sido observados (Tabelas
4.1 e 4.3). Entretanto, em materiais orgânicos com elevado teor de cinzas, o hidrogênio
determinado pode advir das fases inorgânicas presentes, seja por co-extração ou por

128 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
neo-formação das mesmas. Também, é preciso considerar que a substituição do anel
aromático por grupos funcionais contribui para a diminuição da razão H/C. Portanto,
recomenda-se a utilização deste índice para comparação de amostras de origem
semelhante e de baixo teor de cinzas, com confirmação das indicações obtidas por
outras técnicas.
Em SHA, valores baixos de H/C foram obtidos para AF e AH cuja absorção
específica no UV foi elevada, indicando maior insaturação do C (Abbt-Braun et al., 2004).
A razão molar O/C pode ser utilizada para inferir-se sobre o grau de oxidação
e o teor de carboidratos (Abbt-Braun et al., 2004). Entre as três frações húmicas,
separadas pelo fracionamento químico, AF tende a apresentar razão O/C mais
elevada devido ao seu maior teor de grupos carboxilas (Tabelas 4.1 e 4.2). Este
comportamento também é observado em SHA.
As huminas apresentam, em geral, razão H/C semelhante ou mais elevada
do que os respectivos AH, sugerindo um caráter alifático elevado. Dados de RMN
13C confirmam a elevada proporção de estruturas alifáticas (54 a 70%) (Hayes &
Malcolm, 2001; Kang et al., 2003; Song et al., 2005; Dick et al., 2006).
O ambiente de formação da SH afeta sua composição química. SHA podem
apresentar ampla variação de razão H/C, porém baixos teores de N são comumente
observados (Tabela 4.2). Em contrapartida, AH de carvão se destacam pelo baixo
teor de N e de O, que se reflete nos elevados valores de razão C/N e razão O/C (Dick
et al., 2002).
A MO em sistemas naturais apresenta uma variedade de grupos funcionais
de C e alguns de N (Tabela 4.3). Os grupos carboxílico, enol, OH fenólico e quinona
apresentam comportamento ácido, enquanto os grupos funcionais nitrogenados são
básicos. Os restantes são considerados neutros.
Nas SHA o oxigênio encontra-se principalmente na forma de carboxilas e
hidroxilas fenólicas, cuja concentração varia 500 a 1000 cmol.Kg-1 e 100 a 300 cmol.Kg-1,
respectivamente (Rocha e Rosa, 2003). O teor de carboxilas das SHA tende a ser
superior ao de SH terrestres (Tabela 4.3).
A proporção de carboxilas nos AF é geralmente superior à dos AH, levando
a uma maior acidez trocável naquela fração húmica. Já nos AH, carboxilas e
hidroxilas fenólicas contribuem na mesma proporção para a acidez total. As huminas
apresentam relativamente baixa acidez, o que contribui, ao lado da forte associação
com minerais, para sua insolubilidade em meio aquoso alcalino.
A identificação dos grupos funcionais de C e a determinação das respectivas
proporções são usualmente realizados por espectroscopia de ressonância magnética
nuclear do 13C no estado sólido, com polarização cruzada e rotação da amostra em
torno do ângulo mágico (RMN 13C CPMAS). O espectro de RMN 13C de MO, seja
essa particulada ou húmica, pode ser dividido nas seguintes bandas espectrais e
respectivos tipos de carbono: a) 0 a 45 ppm - C alquil, que engloba o C metila (-CH3)
e o C metileno (-CH2-); b) 45 a 60 ppm – N alquil + C metoxil; c) 60 a 110 ppm - C O
alquil; d) 110 a 160 ppm – C aromático; e) 160 a 190 ppm - C carboxílico; e, f) 190 a
220 ppm - C cetônico (Stevenson, 1994).
AH tendem a ser mais aromáticos e menos carboxilados do que os respectivos
AF (Tabela 4.4).

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 129
Tabela 4.4 – Proporção de grupos funcionais de carbono determinados por
Espectroscopia de 13C RMN em amostras de substâncias húmicas e
matéria orgânica
C N alquil + C-O C C C
Fração alquil C metoxil alquil aromático carboxílico cetônico
(número de 0 - 45 45 - 60 60 - 110 110 - 160 160 - 190 190 - 220
amostras) ppm ppm ppm ppm ppm ppm
Fração fúlvica 12,5 - 2,5 - 5 22,5 - 54 7,5 - 25 9 - 21 4 - 7,5
de solo (8) 22,5
17,3 - 12,2 -
AH de solo (8) 4,2 - 9,4 23,6 - 42,4 12,2 - 17,9 3,8 - 6,6
29,7 18,4
AF aquáticos 31 - 41 4-7 9,5 - 18 10,3 - 13,8 16,2 - 19 4,8 - 11,1
22,8 -
AH aquáticos 4,8 - 5,9 9,0 - 20,7 29 - 35,5 13,8 - 17,2 6,2 - 7,9
29,7
AH = ácido húmico; AF = ácido fúlvico
Adaptado de: Stevenson (1994)

AF de solos apresentam maior proporção de grupos C O alquil do


que os respectivos AH, possivelmente devido ao maior teor de estruturas tipo
polissacarídeos. AH e MO originadas de carvão destacam-se pelo seu elevado grau
de aromaticidade, o que é compatível com seu ambiente de formação. Dependendo
da origem, SHA tendem a apresentar maior proporção de grupos C alquil quando
comparadas às amostras de solos (Tabela 4.4). Por outro lado, Lankes & Ludeman
(2002) constataram em AF aquáticos do lago Hohloh (Alemanha) maior proporção
de grupamentos aromáticos (C aromático = 35%) em comparação a AF de efluente
urbano (C aromático = 27%). Em ambas as amostras a proporção de O alquil ficou
em torno de 20% e de C carboxílico 15%.

4.2| FRACIONAMENTO DA MATÉRIA ORGÂNICA: Métodos, Distribuição e


Composição das Frações

4.2.1 Fracionamento e isolamento de MOA

Em ambientes aquáticos, o teor de carbono orgânico pode variar de 1 ml.L-1 de


COD (em águas subterrâneas e marinhas) a 40 mg.L-1 (em águas de rios) (Thurman,
1985). Devido à baixa concentração de MO em ambientes aquáticos (Tabela 4.5),
tratamentos prévios que isolem e concentrem as diferentes frações de MOA tornam-
se imprescindíveis.

130 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
Tabela 4.5 – Concentrações de substâncias húmicas aquáticas extraídas de alguns
sistemas aquáticos
Concentração de SHA
Amostras Referências
estimada (mg.L-1)
Águas superficiais 7 Rocha et al. (2001)
8 Rocha et al. (1998)
16 Áster, Burba & Broekaert (1996)
30 Suffet & MacCarthy (1989)
Águas subterrâneas 20 Suffet & MacCarthy (1989)
Águas marinhas 0,0029* Malcolm (1990)
*Teor de ácidos húmicos aquáticos (fração das SHA) obtido
Adaptado de: Rocha & Rosa (2003)

Um esquema de fracionamento da MOA usualmente empregado encontra-se


esquematizado na Figura 4.1.

Amostra de água

Filtragem a 0,45 µm

Particulado Dissolvido

Substâncias Resina
húmicas (ácidos, Amberlite
bases e neutros XAD 8
hidrofóbicos)

Resina
MSC 1
Bases hidrofílicas (catiônica)

Duolite A7
Ácidos hidrofílicos (aniônica)

Hidrofílicos neutros

Figura 4.1 – Diagrama de fracionamento do carbono orgânico dissolvido.


Adaptado de: Rocha & Rosa (2003)

A separação entre MOA particulada (MOAP) e MOD é puramente operacional,


sendo considerada MOAP aquela fração que fica retida em membrana de 0,45 μm. A
fração que passa na membrana é posteriormente fracionada por cromatografia de sorção,

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 131
submetendo-se a suspensão à passagem em resinas XAD em pH ácido (pH ≤ 2) (Rocha
& Rosa, 2003). Estes sorventes são resinas macro-porosas não iônicas compostas por
estireno-divinilbenzeno (XAD-2 e XAD-4) ou por éster acrílico (XAD-7 e XAD-8). As SHA
(AF e AH) ficam sorvidas na resina XAD, sendo posteriormente dessorvidas por eluição
com solução aquosa alcalina (pH ≥ 12). Os AHA podem ser ainda isolados dos AFA por
acidificação da suspensão de SHA a pH 2, onde AHA precipitam.
O material orgânico que não é sorvido na resina XAD em pH ácido é
denominado de substância não-húmica aquática (SNHA), a qual pode ser, todavia,
fracionada em bases hidrofílicas e ácidos hidrofílicos e neutros (Figura 4.1). As frações
separadas são usualmente concentradas/secadas por liofilização ou por evaporação
sob pressão reduzida (rotavapor) para serem posteriormente analisadas. Deve-se
levar em conta, porém, que estes métodos de concentração podem também conduzir
a um enriquecimento em material inorgânico que pode eventualmente interferir nas
técnicas analíticas.
As SHA podem ainda ser fracionadas segundo seu tamanho molecular aparente
e sua carga, sendo que estes procedimentos são geralmente empregados para fins de
investigação do seu comportamento no ambiente (Rocha & Rosa, 2003). Entre estes
métodos destacam-se métodos cromatográficos (cromatografia de permeação em gel
(GPC), cromatografia líquida (HPLC, entre outros), osmometria, eletroforese (eletroforese
capilar (CE), “focusing” isoelétrico, eletroforese capilar de zoneamento (CEZ), etc), ultra-
filtração, ultra-centrifugação e espectrometria de massas (Kudryavtsev et al., 2000;
Schmitt-Koppling et al., 2002; Ubner et al., 2004; Leenheer & Croué, 2003; Abbt-Braun
et al., 2004). Estas técnicas são muito úteis na separação de misturas complexas de
SHA, podendo ser acoplados à técnicas de caracterização química e estrutural, tais com
fluorescência, ICP-MS e espectroscopia de UV (Specht & Frimmel, 2000).
Uma outra técnica, que se baseia nos diferentes tamanhos moleculares das
SHA, vem sendo frequentemente empregada. O sistema de ultra-filtração sequencial
desenvolvido por Burba, Shkinev & Spivakow (1995) foi posteriormente modificado
por Rocha et al. (2000) que utilizaram filtros disponíveis comercialmente constituídos
de membranas de poli-eter-sulfonas. Entre as principais vantagens deste sistema
de fracionamento sequencial por ultrafiltração (SFSU), destaca-se: a possibilidade
de fracionar e concentrar SH em seis frações de diferentes tamanhos moleculares
aparentes (>100, 50-100, 30-50, 10-30, 5-10 e <5 kDa) e a viabilidade de se trabalhar
com grandes volumes de amostra líquida, fracionando as SH e concentrando as
respectivas frações.
Em amostras de água coletadas do Rio Negro (AM), submetidas ao SFSU,
Rocha et al. (1999) observaram que o COD concentrou-se principalmente na fração <5
kDa (27%) seguido da fração 50-100 kDa (18%) e apenas 8,5% do COD foi observado
na fração >100 kDa. O grau de aromaticidade da SHA decresceu gradualmente de
35% na fração >100 kDa a 25% na fração <5 kDa. Após fracionamento de amostras
do Rio Negro (AM) com SFSU, Sargentini et al. (2001) constataram a complexação
preferencial de íons metálicos (Ni, Cu, Cd, Zn e Pb) com moléculas húmicas
aquáticas de massa molecular mais elevada. Resultados semelhantes foram obtidos
por Specht & Frimmel (2000), empregando cromatografia de exclusão por tamanho
(SEC) acoplada à técnica analítica de ICP-MS. Neste estudo foi constatado que

132 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
Fe, Pb e Al se associaram preferencialmente com SHA extraídas de lago (Hohloh,
Alemanha), que apresentaram maior tamanho molecular.

4.2.2 Fracionamento químico da MO

O fracionamento químico da matéria orgânica de solos e sedimentos baseia-


se nas diferentes propriedades físico-químicas da MO, tais como solubilidade em
um dado meio solvente e carga de superfície. A solubilidade de um componente
num dado meio é consequência de suas características químicas e moleculares
e, portanto, o seu comportamento num determinado solvente informa sobre sua
reatividade e composição.
O método de fracionamento químico mais comumente empregado é o que
utiliza como extrator a solução de NaOH (0,1 a 0,5 mol.L-1) (Swift, 1996). Três frações
principais, definidas operacionalmente, e que diferem quanto à solubilidade no meio
aquoso em diferentes valores de pH, são separadas: ácidos húmicos (AH), ácidos
fúlvicos (AF) e huminas (HU) (Figura 4.2).

Figura 4.2 – Diagrama de fracionamento químico da matéria orgânica do solo.

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 133
A distribuição do C orgânico nas três principais frações húmicas depende
do tipo de solo, do tipo de vegetação, do uso e manejo do solo. Em geral, em
horizontes superficiais do solo, a proporção do C contido na HU pode variar de 45
a 90% do C total, enquanto 25 a 40% do C total são verificados na forma de AH e
de 10 a 20% na forma de AF (Stevenson, 1994; Benites et al., 2001; Santos, 2003).
A solução diluída de Na4P2O7 (0,1 a 0,2 mol.L-1), um solvente mais
moderado do que a solução de NaOH, também é frequentemente empregado,
porém, apresenta rendimento inferior à solução de NaOH (Schnitzer & Schuppli,
1989; Senesi et al., 1994; Clapp & Hayes, 1996; Hayes et al., 1996). Solventes
orgânicos, tais como dimetilsulfóxido (DMSO), dimetilformamida (DMF), piridina e
solução ácida de acetona, que extraem SH de caráter mais hidrofóbico, conduzem
a um baixo rendimento (Hayes et al., 1975; Piccolo, 1988; Stevenson, 1994). A
contaminação da SH com o extrator orgânico pode também representar um
obstáculo na sua caracterização química e espectroscópica.
A alteração da composição química das SH devido a reações de oxidação
durante a extração alcalina, quando a mesma não se realiza sob atmosfera inerte,
tem sido questionada (Senesi et al., 1994). Porém, estudos sistemáticos realizados
com diferentes extratores e em diferentes valores de pH não constataram a formação
de produtos artefatos (Tan et al., 1991; Hayes et al., 1996; Dick et al., 1999; Hayes
& Malcolm, 2001).
Hayes & Clapp (2001) sugerem que “quando são usados procedimentos de
isolamento relativamente brandos, a composição dos componentes das SH será
muito similar àquela que se apresenta nos solos, apesar das associações poderem
ser bem distintas”.
O pré-tratamento com HCl 0,5 mol.L-1 (Figura 4.2) visa remover carbonatos
(caso ocorram) e cátions trocáveis que estejam realizando pontes catiônicas entre
moléculas orgânicas, e entres essas e a superfície dos minerais.
A solubilização de SH solúveis (AH e AF) com solução de NaOH se verifica
principalmente pelos seguintes mecanismos:
a) Rompimento de ligações de hidrogênio entre as moléculas orgânicas
entre si e com a superfície mineral;
b) Desprotonação dos grupos carboxílicos e fenólicos que realizam
interações eletrostáticas com os íons Na+ em abundância, o que, por
sua vez, aumenta a espessura da dupla camada elétrica, levando à
dipersão;
c) Reação de troca de ligantes entre as hidroxilas do meio e os grupos
carboxílicos e fenólicos da substância húmica, pelos quais a molécula
orgânica se encontra coordenada na superfície do mineral;
d) Aumento da repulsão eletrostática entre a MOS e a superfície dos
minerais pelo aumento da carga de ambos como consequência da
desprotonação de grupos hidroxilas (orgânicos e inorgânicos) e de
carboxilas.
A extração de SH solúveis com solução de pirofosfato de sódio consiste
principalmente no rompimento das pontes catiônicas que unem as moléculas
orgânicas entre si e com a superfície dos minerais. Devido à elevada afinidade do

134 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
pirofosfato pelos cátions di e trivalentes, tais como Ca+2 e Al+3, ocorre uma remoção
do cátion do complexo metal-húmico e consequente formação de complexo
pirofosfato-cátion (Stevenson, 1994; Cornejo & Hermosín, 1996). Além do efeito
complexante, o pH 10 da solução diluída de pirofosfato de sódio, exerce efeito
dispersante similar ao da solução de NaOH, porém menos intenso.
A acidificação do meio alcalino contendo as chamadas SH solúveis
provoca precipitação do AH enquanto o AF permanece em solução (Figura 4.2).
Provavelmente a protonação dos grupos funcionais oxigenados leva à precipitação
de estruturas macromoleculares e/ou micelares de comportamento macromolecular
de AH. Os AF são mais oxigenados e são constituídos por moléculas menores
do que os AH, ou ainda, formam micelas de menor tamanho, que permanecem
em solução mesmo quando protonadas. Adicionalmente, a elevada força iônica do
meio favorece a solubilização do AF.
A ocorrência de diferentes mecanismos extratores nos métodos químicos
permite a extração seletiva de SH que diferem quanto às características químicas
e estruturais.
A extração de SH de Gleissolo em diferentes valores de pH permitiu a Hayes
et al. (1996) distinguir AH e AF mais ricos em grupos ácidos e mais aromáticos
(extraídos em pH 7) de AH e AF com maior teor de carboidratos, extraídos em
pH alcalino (10,6 e 12,6). As SH extraídas em pH neutro apresentaram maior
grau de humificação do que as extraídas em meio alcalino. Dick & Burba (1999)
obtiveram valores superiores para a massa molecular aparente média nos extratos
húmicos de pirofosfato quando comparados às respectivas frações húmicas
extraídas com solução de NaOH, de Latossolo Vermelho e de Chernossolo. Esses
resultados podem ser considerados como uma indicação de que o rompimento
de ligações intermoleculares, tais como as ligações de H, pela solução alcalina
provocou a desagregação das micelas formadas por moléculas húmicas de menor
massa molecular. Esse fato corroboraria o modelo de estrutura supramolecular
de SH proposto por Piccolo (2001). Nessas mesmas amostras Dick et al. (1999)
constataram que AH e AF extraídos com solução alcalina de NaOH (AHN e AFN)
apresentaram menor teor de oxigênio do que as frações húmicas extraídas com
solução neutra de pirofosfato (AHP e AFP). A proporção de grupos carboxila
determinada por ressonância magnética nuclear (RMN) de 13C foi superior no AHP
(25%), enquanto que a proporção de grupos C O alquil, estruturas mais suscetíveis
à decomposição, foi superior no AHN . As características diferenciadas das frações
húmicas segundo o tipo de extrator podem também estar relacionadas com o tipo
de mecanismo de interação da MO com os outros componentes no solo.
A maior proporção de carboxilas, que é o principal grupo complexante das SH,
associada à maior massa molecular aparente de AHP, verificados por Dick & Burba
(1999), sugere que moléculas húmicas maiores se associam preferencialmente
com cátions através desse grupo funcional. Kipton et al. (1992) propuseram que
Al+3 e Fe+3 interagem preferencialmente com moléculas húmicas maiores, sendo
que a solução de pirofosfato apresenta elevada afinidade por esses cátions.

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 135
4.2.3 Fracionamento físico da MO

Fundamentalmente, o fracionamento físico separa a MO de solos e sedimentos


em frações associadas aos minerais e em frações não-associadas (Figura 4.3).
As frações não-associadas são também chamadas de particuladas e,
em geral, são compostas por resíduos de vegetais parcialmente decompostos
(Christensen, 1992; 2001; Golchin et al., 1994). A fração particulada (MOP), além de
ser constituída pela liteira propriamente dita, pode ser também considerada como um
compartimento transitório entre a liteira e a fração humificada (Gregorich et al., 1997),
e seu teor é afetado principalmente pelo uso e manejo do solo e pela vegetação
(Christensen, 2001).
Em solos de clima temperado, sob vegetação nativa, a fração particulada nos
horizontes superficiais pode corresponder de 15 a 40% da MO total do solo, baixando
para valores inferiores a 10% quando o solo é cultivado (Christensen, 2001).
Em clima subtropical, 33% do C orgânico total (COT) de Latossolo Bruno do
Paraná sob mata nativa esteve contido na MOP (Santos, 2005). Nesse mesmo solo,
sob plantio direto, essa proporção decresceu para 6% e, sob plantio convencional,
aproximadamente 3% do COT encontrava-se nessa fração. Já, em Argissolo do Rio
Grande do Sul, sob campo nativo, a proporção de C na fração particulada foi de 17%
do COT. O uso agrícola reduziu essa proporção de 8,5 a 4,8%, sendo essa fração
afetada principalmente pela rotação de cultura, seguida pelo tipo de manejo.
A fração particulada leve livre é obtida por flotação em líquidos de densidade
elevada (1,6 a 2,2 g.cm-3), tais como iodeto de sódio (NaI) e politungstato de sódio
([Na6(H2W12O40).H2O]) (Figura 4.3). A fração particulada leve oclusa, contida no interior
de macroagregados, é obtida por flotação em líquidos de elevada densidade, após
dispersão dos agregados por sonicação. Essa fração geralmente é mais decomposta
e apresenta tempo de permanência maior no solo quando comparada com a fração
leve livre.
A MO associada aos minerais e, portanto, mais pesada que a fração
particulada, é separada basicamente em três frações granulométricas: areia, silte e
argila. Na dispersão da amostra, o emprego de ultra-som é preferido em detrimento
às soluções alcalinas, para evitar a co-extração de MO via solubilização e sua
consequente remobilização. O nível de energia usualmente empregado é da ordem
de 450 a 600 J.mL-1. Porém, solos argilosos e ricos em óxidos de ferro (>60%
argila) necessitam de níveis mais elevados (de 1200 a 1600 J.mL-1) para que a
dispersão se complete (Lunardi, 2002). Por outro lado, níveis de energia da ordem
de 1800 a 2000 J.mL-1 podem romper complexos organo-minerais e destruir retículos
minerais, provocando redistribuição de material orgânico e inorgânico para frações
granulométricas menores (Christensen, 1992).
Após a dispersão, a fração areia (>53 μm) é separada por peneiramento e as
frações silte (53 a 2 μm) e argila (<2 μm) na suspensão resultante, por sedimentação,
baseando-se na Lei de Stokes. Dependendo do objetivo do estudo, as frações menores
que 53 μm são separadas em silte grosso (53 a 20 μm), silte fino (20 a 2 μm), argila grossa
(2 a 0,2 μm) e argila fina (<0,2 μm). A proporção de COT contido na fração areia é
usualmente baixa, não excedendo 5%. Valores elevados de 8 a 10%, observados

136 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
em Latossolo argiloso podem ser devido à presença de agregados organo-minerais
resistentes à sonicação (Santos, 2005). A MO associada às frações silte e argila
apresentam grau de decomposição mais avançado do que as frações particuladas,
correspondendo à MO humificada. A variação da composição química e grau de
humificação da MOS entre essas frações depende principalmente do tipo de solo e
do uso e manejo. Em geral, em horizontes superficiais, acima de 50% do COT pode
ser encontrado nas frações associadas aos minerais.

Sol. politungstato de sódio centrifugação sobrenadante MOP


(d= 1,8 a 2,2 g cm-3) Livre
sonicação
100 mL H2O centrifugação
fração areia

sobrenadante MOP
SOLO 63 µm Oclusa

areia

silte-argila AREIA ARGILA


sonicação
centrifugação
secagem
liofilização
centrifugação
floculação

suspensão argila

63 µm
SILTE

sedimentação

Figura 4.3 – Diagrama de fracionamento químico da matéria orgânica do solo.

4.3| REAÇÕES DA MATÉRIA ORGÂNICA EM AMBIENTES TERRESTRES E


AQUÁTICOS

A ocorrência de diversos grupos funcionais na estrutura da MO permite que


a mesma realize variadas reações com íons orgânicos e inorgânicos, com metais e
moléculas orgânicas neutras e superfícies de minerais.
A interação entre a MO e íons e moléculas afeta uma série de processos no
ambiente:
a. Formação de complexos solúveis com micronutrientes contribui
para o aumento da disponibilidade de nutrientes para as plantas e
microorganismos no solo. Estes elementos, tais como o Fe, se encontram
na forma insolúvel sob condições de aeração e de pH do solo;
b. Formação de complexos solúveis com metais pesados, tais como Pb

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 137
e Cd, e com moléculas de pesticidas, tais como atrazina, pode levar à
contaminação de lençóis freáticos e cursos de água. Estes complexos,
onde a MO atua como carreador, quando atingem o ambiente aquático,
podem ser sorvidos nos sedimentos, levando a uma acumulação do
material (Kördel et al., 2004);
c. Formação de complexos insolúveis com metais pesados e com
xenobióticos orgânicos, diminuindo sua toxidez no ambiente. Em longo
prazo, este processo conduz à acumulação destes materiais, os quais
podem ser posteriormente remobilizados pela alteração das condições
físico-químicas do ambiente.
Por sua vez, a interação da MO com a superfície de minerais afeta
principalmente os seguintes processos:
a. Intemperismo dos minerais, pois atua tanto na dissolução como na
formação de novos minerais (Stevenson, 1994);
b. Aumento da capacidade de troca catiônica do colóide inorgânico, pois, ao
sorver na superfície do mineral, a MO confere carga negativa à superfície.
As principais reações da MO no ambiente, os grupos funcionais envolvidos e
respectivos mecanismos encontram-se relacionados na Tabela 4.6.

4.3.1 Reações com íons e minerais

A contribuição da MO para a troca catiônica do solo reside, principalmente, na


carga negativa originada da desprotonação dos grupos COOH (Tabela 4.6 - reação 1).
Grupos funcionais vizinhos à carboxila podem afetar a acidez do próton, resultando
que o pKa de dissociação do grupo ácido difere dos valores observados para ácidos
orgânicos simples. Em geral, a maioria dos grupos funcionais carboxílicos encontra-
se dissociada entre pH 5 e 7. A hidroxila fenólica desprotona em pH mais básico (em
torno de pH 8), portanto, sua contribuição para a CTC da MO em níveis de pH de
solos agrícolas e de ambientes aquáticos é limitada.
Complexos metal-orgânicos (Tabela 4.6 - reação 2), onde ocorre a
sobreposição das esferas de coordenação do ligante (orgânico) e do átomo central
(cátion), se verifica, principalmente, com o alumínio, os metais da primeira série de
transição e alguns da segunda série, tal como molibdênio. Em geral, ácidos moles
e bases moles, por exemplo, enxofre como átomo ligante, tendem a formar ligação
de coordenação de caráter covalente mais elevado, enquanto que na ligação entre
metais de transição e bases duras, como oxigênio sendo átomo ligante, o caráter
iônico predomina.
A ocorrência de compostos organo-metálicos no solo têm sido detectada em
áreas contaminadas por lixo industrial e urbano e em áreas de mineração (Mello et
al., 2006). A formação destes compostos no solo, onde o átomo doador é o carbono,
ocorre geralmente via biótica, com participação de algas e bactérias. Complexos
organo-metálicos do tipo metal-alquila, envolvendo metais tipo Sn, As, Hg e Cd,
também têm sido identificados (Macalady, 1998).

138 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
Tabela 4.6 – Reações da matéria orgânica no ambiente
Principais grupos Reagente ou Grupo
Reação funcionais da MOS funcional com o qual Mecanismo de reação
envolvidos interage
1. Reações de troca
Troca catiônica/ complexo
R-COO- e -R fenol- O- Cátions em solução do solo Interação eletrostática
esfera externa
2. Formação de compostos
de coordenação com metais
R-C(H)=O, R-SH,
Complexação com cátions/ Metais de transição, Al e metais Coordenação com cátions
R-NH2 R-COOH e R-OH
complexo de esfera interna traços na solução do solo em solução
(fenólicas)
3. Interações de superfície
com minerais
Grupos protonados
R-NH2, NH em ciclo superfícies com cargas
a.Troca catiônica Interação eletrostática
alifático, N em anel negativas
aromático
superfícies de cargas positivas
b.Troca aniônica R-COO- e O--fenol-R Interação eletrostática
de minerais de carga variável
c. Sorção via ponte
catiônica
R-COOH, -R-NH2, Cátions trocáveis da superfície Interação eletrostática
c.1.esfera externa
R>C=O, R-OH do mineral (pontes de H2O)
R-COOH, -R-NH2, Cátions coordenados às Coordenação com cátions
c.2.esfera interna
R>C=O, R-OH superfícies coordenados à superfície
d. Coordenação na -FeOH e Al-OH de superfície de
R-COO- e O--fenol-R Troca de ligantes
superfície minerais de carga variável
H da hidroxila de superfície
Amino, carbonila,
e. Protonação O-H de supefície protona O ou N da MOS
carboxilato
sem se desligar do mineral
Molécula de H2O de hidratação
Amino, carbonila,
f. ligações de hidrogênio do cátion de superfície ou da Ligação de hidrogênio
carboxila, OH-fenólico
superfície hidratada
g. Forças de van der Estuturas apolares da
OH da superfície Íon-dipolo
Waals MOS
Mecanismo de “expulsão”
Frações alifáticas e Superfícies hidrofóbicas de
h. Interação hidrofóbica das frações hidrofóbicas do
aromáticas hidrofóbicas mineras
meio hidrofílico
4. Reações com moléculas
orgânicas
Grupos nitrogenados protonados
a.Troca catiônica R-COOH e OH-fenol-R ou cátions orgânicos em solução Interação eletrostática
do solo
-COOH, -OH, R-HC=O,
b. Pontes de H Grpos C=O e amino Ligação de hidrogênio
-NH2
c. Forças de van der Estruturas polares e Dipolo-diplo (induzido ou
Estruturas apolares
Waals apolares da MOS permanente)
Mecanismo de “expulsão”
Frações alifáticas e Superfícies hidrofóbicas de
d. Interação Hidrofóbica das frações hidrofóbicas do
aromáticas hidrofóbicas moléculas orgânicas
meio hidrofílico
e. Transferência de Estrutras quinonas Anéis aromáticos ou triazínicos
carga (elétron aceptor) (elétron doador) Ligação covalente tipo r*-r

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 139
Ao interagir com a superfície de minerais via atração eletrostática, a MO
pode atuar tanto como cátion (Tabela 4.6 - reação 3a) ou como ânion (Tabela 4.6 -
reação 3b). No primeiro caso, o N quaternário de estruturas alifáticas ou aromáticas,
com carga positiva, desloca um cátion (geralmente monovalente) do sítio de troca.
Considerando-se que o teor de N na MO do ambiente é relativamente baixo (≤ 5%
para MOS e ≤ 3% para MOA) e que o pH dos ambientes aquáticos e da solução
do solo encontra-se acima de 4,5, esta reação é pouco expressiva. No segundo
caso, grupos carboxilatos deslocam ânions monovalentes dos sítios de troca, que
consistem de hidroxilas de superfícies protonadas (-OH+2), sendo esse mecanismo
mais comum em solos de carga variável.
A sorção da MO via ligação catiônica pode ocorrer via reação de coordenação
do cátion à superfície do mineral (complexo de esfera interna, Tabela 4.6 - reação
3c1), como também por interação eletrostática entre carga negativa da MO e carga
positiva de cátion polivalente, sendo que o cátion mantém sua esfera de hidratação
(complexo de esfera externa, Tabela 4.6 - reação 3c2).
A coordenação de superfície (Tabela 4.6 - reação 3d) ocorre quando o grupo
carboxilato (ligante) se coordena diretamente com a superfície contendo Fe-OH ou
Al-OH, deslocando a hidroxila original. Em situações de elevada densidade de sorção
associada à elevada afinidade entre o ligante orgânico e o cátion da superfície ocorre
remoção deste do retículo mineral na forma de complexo. Esta reação representa uma
das etapas iniciais do intemperismo químico de minerais hidroxilados, como também
contribui para a disponibilização de Fe para as plantas pela ação de sideróforos
(Benite & Machado, 2002).
O mecanismo de protonação (Tabela 4.6 - reação 3e) se verifica quando o
próton do grupo funcional de superfície se associa ao N ou ao O (carbonila, carboxila)
do grupo funcional da MO. Também, o próton de molécula de água de solvatação de
cátion divalente, apresentando caráter ácido, pode interagir por este mecanismo com
a MO. A protonação pode se tornar relevante em condições de pH ácido do solo ou
de baixa umidade, quando a acidez de superfície é elevada. A ligação de hidrogênio
(Tabela 4.6 - reação 3f) é um mecanismo de interação fraca e pouco expressivo,
pois os grupos funcionais orgânicos, como aqueles das superfícies de argilominerais
e óxidos, não apresentam eletronegatividade suficiente para o estabelecimento de
ligações por hidrogênio.
As forças de Van der Waals (Tabela 4.6 - reação 3g), que são ligações fracas
quando consideradas separadamente, tornam-se um importante mecanismo de
interação entre estruturas poliméricas orgânicas e superfície dos minerais, onde se
verifica seu efeito aditivo. Em condições de pH em que a carga líquida da estrutura
orgânica é baixa ou nula, ou, também, para a MO contendo baixa proporção de
grupos hidrofílicos, as interações por forças de Van der Waals estabelecidas entre
os inúmeros sítios apolares da MO e a superfície dos minerais se somam resultando
numa relativamente forte associação organo-mineral.
A interação hidrofóbica (Tabela 4.6 - reação 3h) ocorre com estruturas da
MO de caráter hidrofóbico que, devido a sua baixa solubilidade em meio aquoso, se
concentram junto à superfície do mineral (veja abordagem da reação 4d).

140 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
4.3.2 Reações com moléculas orgânicas

A interação de compostos orgânicos de origem antropogênica com a MO,


tais como pesticidas, adubos e fertilizantes, pode ter dois efeitos opostos. Quando
a ligação ocorre com estruturas micelares ou poliméricas da MO, o composto
orgânico é imobilizado, seja por aprisionamento ou por uma ligação química forte.
Dependendo do produto, esta associação pode ter um efeito destoxificante, como
também, pode dificultar sua decomposição ou sua ação pela qual foi adicionado ao
solo. Se a interação ocorre com estruturas solúveis de baixo peso molecular, tais
como substâncias não-húmicas e ácidos fúlvicos, a MO pode atuar como carreador
destes compostos para outros compartimentos do ambiente.
Compostos orgânicos contendo grupos nitrogenados, N quartenário na forma
de grupos amino protonados, podem interagir com a carboxila por troca catiônica
(Tabela 4.6 - reação 4a). Nesta reação ocorre o deslocamento do próton da carboxila
ou de um cátion trocável que ocupa o sítio de troca do carboxilato (-COO-).
A interação por ligação de hidrogênio (Tabela 4.6 - reação 4b) ocorre,
em geral, entre grupos protonados amino e carboxílicos da MOS com o oxigênio,
nitrogênio e até mesmo flúor de compostos orgânicos antropogênicos. A MO possui
vários grupos funcionais contendo carbonila e amino em sua estrutura, resultando em
muitas possibilidades de interação com o composto orgânico. O efeito aditivo destas
inúmeras ligações torna este tipo de mecanismo relativamente forte e relevante.
A interação por ligação de Van der Waals (Tabela 4.6 - reação 4c) se verifica
entre as frações polares e apolares da MO e compostos apolares. Analogamente
ao ocorrido na associação organo-mineral, estas ligações que são fracas, quando
consideradas individualmente, levam a uma associação relativamente forte devido
ao efeito aditivo dos diversos pontos de ligação da MO.
Para compostos não-iônicos ou de baixa polaridade, a interação de Van der
Waals torna-se relevante devido à repulsão adicional do composto pelo meio aquoso
hidrofílico. Neste caso extremo, ocorre a chamada interação hidrofóbica (Tabela 4.6
- reação 4d), onde o composto orgânico interage com as estruturas hidrofóbicas da
MO. Neste processo, a molécula do composto orgânico pode ser encapsulada dentro
de nichos tridimensionais hidrofóbicos e o fenômeno não é mais de superfície, e
passa a ter a denominação de “sorção”.
O mecanismo de transferência de carga, também chamado de transferência
de elétron (Tabela 4.6 - reação 4e), foi inicialmente apontado como sendo responsável
pela sorção de atrazina em AH (Senesi, 1992), ocorrendo uma ligação do tipo r-r*.
Nesta reação, o anel triazínico, estrutura rica em elétrons, atuaria como elétron doador
(orbital r* preenchido) e estruturas tipo quinonas, que são deficientes em elétrons,
presentes nos AH, atuariam como elétron receptores (orbital r não preenchido).
Posteriormente, Martin-Neto et al. (2001) constataram que, neste processo, a atrazina
converte-se previamente em hidroxi-atrazina, cujo anel triazínico atuaria então como
elétron doador.

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 141
4.4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABBT-BRAUN, G.; LANKES, U.; FRIMMEL, F. H. 2004. Structural characterization of aquatic


humic substances - the need for a multiple method approach. Aquatic Science, 66,
pp.151-170.

ABE, T.; MAIE, N.; WATANABE, A. 2005. Investigation of humic acid N with X-ray
photoelectron spectroscopy: effect of acid hydrolysis and comparison with 15N
cross polarization/magic angle spinning nuclear magnetic resonance spectroscopy.
Organic Geochemistry, 36, pp.1490-1497.

ARAÚJO, A. B. et al. 2002. Distribuição de metais e determinação da constante de troca de


frações húmicas aquáticas de diferentes tamanhos moleculares. Química Nova, 25,
pp.1103-1107.

BENITE, A. M. C.; MACHADO, S. P. 2002. Sideróforos: uma resposta dos microorganismos.


Química Nova, 25, pp.1155-1164.

BENITES, V.M.; SCHAEFER, C. E. G. R.; MENDONÇA, E. S.; MARTIN NETO, L. 2001.


Caracterização da matéria orgânica e micromorfologia de solos sob campos de
altitude no Parque Estadual da Serra do Brigadeiro (MG). Revista Brasileira de
Ciência do Solo, 25, pp.661-674.

BURBA, P.; SHKINEV, V.; SPIVAKOW, B. Y. 1995. On-line fractionation and characterization
of aquatic humic substances by means of sequential-stage ultrafiltration. Fresenius
Journal of Analytical Chemistry, 351, pp.74-82.

CHEN, Y.; SENESI, N.; SCHNITZER, M. 1977. Information provided on humic substances by
E4/E6. Soil Science Society of America Journal, 41, pp.352-358.

CHRISTENSEN, B. T. 1996. Matching measurable soil organic matter fraction with conceptual
pools simulation models of cabn turnover: reision of model structure. In: Powlson,
D. S.; Smith, P.; Smith, J. U. (eds). Evaluation of soil organic matter models: using
long-term experiment datasets. Springer, New York, pp.143-159.

CHRISTENSEN, B. T. 2001. Physical fractionation of soil and structural and functional


complexity in organic matter turnover. European Journal of Soil Science, 52, pp.345-
353.

CHRISTENSEN, B. T. 1992. Physical fractionation of soils and organic matter in primary


particle size and density separates. Advances in Soil Science, 20, pp.2-90.

CLAPP, C. E.; HAYES, M. H. B. 1996. Isolation of humic substances from an agricultural soil
using a sequential and exhaustive extraction proccess. In: Clapp, C. E.; Hayes, M.
H. B; Senesi, N.; Griffith, S. M. (eds.). Humic substances and organic matter in soil
and water environments: Characterization, transformations and interactions. IHSS,
Birmingham.

CORNEJO, J.; HERMOSIN, M. C. 1996. Interactions of humic substances and soil clays.
In: Piccolo, A. (ed). Humic substances in terrestrial ecosystems. Elsevier, The
Netherlands. pp.595-623.

DICK, D. P.; BURBA, P. 1999. Extraction kinetics and molecular size fractionation of humic
substances from two brazilian soils. Journal of Brazilian Chemistry Society, 10,
pp.146-152.

DICK, D. P.; BURBA, P.; HERZOG, H. 1999. Influence of extractant and soil type on molecular
characteristics of humic substances from two brazilian soils. Journal of Brazilian
Chemistry Society, 10, pp.140-145.

DICK, D. P.; MANGRICH, A. S.; MENEZES, S. C.; PEREIRA, B. 2002. Chemical and
spectroscopical characterization of humic acids from two south Brazilian coals of
different ranks. Journal of the Brazilian Chemical Society, v.13, pp.177-184.

142 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
DICK, D. P.; GONÇALVES, C. N.; DALMOLIN, R. S. D., KNICKER, H.; KLAMT, E.; KÖGEL-
KNABNER, I.; SIMÕES, M. L.; MARTIN-NETO, L. 2005. Characteristics of soil
organic matter of different Brazilian Ferralsls under native vegetation as a function of
soil depth . Geoderma, v.124, pp.319-333.

DICK, D. P.; KNICKER, H.; AVILA, L. G. 2006. Composition and content of humins in
Brazilian Ferralsosl: effect of texture and iron oxides. In: Frimmel, F. H.; Abbt-Braun,
G. Proceedings of the Meeting of the International Humic Substances Society, 13.,
Humic Substances - Linking Structure it Functions. pp.553-556.

DIECKOW, J.; MIELNICZUK, J.; KNICKER, H.; BAYER, C.; DICK, D. P.; KÖGEL-KNABNER,
I. 2005a. Composition of organic matter in a subtropical Acrisol as influenced by
land use, cropping and N fertilization, assessed by CPMAS 13CNMR spectroscopy.
European Journal of Soil Science, v.56, pp.705-715.

ERTEL, J. R.; HEDGES, J. I.; DEVOL, A. H.; RICHEY, J. E.; RIBEIRO, M. 1986. Limnology
and Oceanography, 31, pp.739-754.

GARCIA-MINA, J. M.; FUENTES, M.; BAIGORRI, R.; GONZALEZ-GAITANO, G. 2004.


On the chemical nature of humic substances: a dynamic equilibrium of individual
macromolecules, small molecules and supramolecule governed by the environmental
conditions. In: Martin-Neto, L.; Milori, D. M. B. P.; Silva, W. T. L. da. (eds). Humic
substances and soil and water environment. Proceedings of the XII International
Meeting of the International Humic Substances Society, São Pedro, Brasil, pp.266-
268.

GREGORICH, E. G.; JANZEN, H. H. 1996. Storage of soil carbon in the light fraction and
macroorganic matter. In: CARTER, M.R., STEWART, B.A. (Eds.) Structure and
organic matter storage in agricultural soils. Boca Raton: CRC Press, pp.167-211.

GOLCHIN, A.; CLARKE, P.; OADES, J. M.; SKJEMSTAD, J. O. 1995. The effects of cultivation
on the composition of organic matter and structural stability of soils. Australian
Journal of Soil Research, v.33, pp.975-993.

HAYES, M. H. B.; CLAPP, C. E. 2001. Humic substances: considerations of compositions,


aspects of structures and environmental influences. Soil Science, 166, pp.723-737.

HAYES, M. H. B.; MALCOLM, R. L. 2001.Considerations of compositions and of aspects


of the structures of humic substances. In: HAYES, M. H.; MALCOLM, R. L. (eds).
Humic Substances and Chemical Contaminants. Madison, Soil Science Society of
America. 750p.

HAYES, M. H. B.; SWIFT, R. S.; WARDLE, R. E.; BROWN, J. K. 1975. Humic materials from
organic soil: a comparison of extractants and of properties of extractants. Geoderma,
13, pp.231-245.

HAYES, T. M.; HAYES, M. H. B.; SKJEMSTAD, J. O.; SWIFT, R. S.; MALCOLM, R. L. 1996.
Isolation of humic substances from soil using aqueous extractants of different pH
and XAD resins and their characterization by 13C NMR. In: CLAPP, C. E.; HAYES,
M. H. B; SENESI, N.; GRIFFITH, S. M. (eds.). Humic substances and organic matter
in soil and water environments: Characterization, transformations and interactions.
IHSS, Birmingham.

HEDGES, J. I. 1988. Polymerization of humic substances in natural environments. In: Frimmel,


F. H.; Christman, R. F. (eds.). Humic substances and their role in the environment.
Report Dahlem Workshop on Humic Substances and their Role in the Environment,
Berlin, March 29–April 3, 1987. Wiley Intersciences, New York, pp.45-57.

KANG, S.; AMARASIRIWARDENA, D.; VENEMAN, P.; XING, B. 2003. Characterization of ten
sequentially extracted humic acids and a humin from a soil in western Massachussets.
Soil Science, 168, pp.880-887.

KIPTON, H.; POWELL, J.; TOWN, R. M. 1992. Analytica Chimica Acta, 267, 47.

KNICKER, H.; LÜDEMANN, H. D. 1995. N-15 and C-13 CPMAS and solution NMR studies

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 143
of N-15 enriched plant material during 600 days of microbial degradation. Organic
Geochemistry, 23, pp.329-341.

KNICKER, H.; SCHMIDT, M. W. I.; KÖGEL-KNABNER, I. 2000. Nature of organic nitrogen in


fine particle size separates of sandy soils of highly industrialized areas as revealed
by NMR spectroscopy. Soil Biology and Biochemistry, 32, pp.241-252.

KÖRDEL, W.; DASSENAKIS, M.; LINTELMANN, J.; PADBERG, S. 1997. The importance of
natural organic material for environmental processes in waters and soils. Pure and
Applied Chemistry, 69, pp.1571-1600.

KUDRYAVTSEV, A. V.; PERMINOVA, I. V.; PETROSYAN, V. S. 2000. Size exclusion


chromatography descriptions of humic substances. Analytica Chimica Acta, 407,
pp.193-202.

LANKES, U.; LUDEMANN, H. D. 2002. Structural characterization of refractory organic


substances by solid state high-resolution 13C and 15N nuclear magnetic resonance.
In: Frimmel, F. H.; Abt-Braun, G.; Heumann, K. G.; Hock, B.; Ludemann, H. D.;
Spieteller, M. (eds). Refractory organic substances (ROS) in the environment.
Weinheim, Wiley-VCH. pp.96-114.

LEENHEER, J. A. 1991. Organic substance structure that facilitate contaminant transport and
transformations in aquatic sediments. In: Baker, R. A. (ed.), Organic substances in
sediments and water, v.1, Humics and soils, Lewis Publishers, Michigan. pp.54-89.

LEENHEER, J. A.; CROUÉ, J. P. 2003. Charactherising aquatic dissolved organic matter.


Environmental Science and Technology, 37, pp.18-26.

LUNARDI, M. H. 2002. Fracionamento físico da matéria orgânica do solo com diferentes


energias de sonicação em três latossolos brasileiros sob vegetação nativa. 49p.
Dissertação (Mestrado em Ciência do Solo) – Universidade Federal do Rio Grande
do Sul de mestrado, Faculdade de Agronomia, UFRGS, Porto Alegre.

MACALADY, D. L. (ed). Perspectives in environmental chemistry. Oxford University Press.


New York, 1998. 329pp.

MARTIN-NETO, L.; TRAGHETTA, D. G.; VAZ, C. M. P.; CRESTANA, S.; SPOSITO, G.


2001. On the interaction mechanisms of atrazine and hydroxiatrazine with humic
substances. Journal of Environmental Quality, 30, pp.520-525.

MELLO, J. W. V.; ROY, W. R.; TALBOTT, J. L.; STUCKY, J. W. 2006. Mineralogy and arsenic
mobility in arsenic-rich brazilian soils and sediments. Journal of Soils And Sediments,
6, pp.9-19.

NASCIMENTO, P. C. 2004. Gênese dos solos hidromórficos do estado do Espírito Santo,


com ênfase na matéria orgânica e no enxofre. 165p. Tese (Doutorado em Solos e
Nutrição de Plantas) - Universidade Federal de Viçosa, Viçosa.

PICCOLO, A. 1988. Characteristics of soil humic extracts obtained by some organic and
inorganic solvents and purified by HCl-HF treatment. Soil Science, 146, pp.418-426.

PICCOLO, A. 2001.The supramolecular structure of humic substances. Soil Science, 166,


pp.810-832.

PICCOLO, A. The supramolecular structure of humic substances: a novel understanding of


humus chemistry and implications in soil science. Advances in Agronomy, 75:57-
134, 2002.

PICCOLO, A.; CONTE, P.; TRIVELLONE, E.; VAN LAGEN, B.; BUURMAN, P. 2002.
Environmental Science and Technology, 36, pp.76-84.

PICCOLO, A.; CONTE, P.; SPACCINI, R.; FIORENTINO, G. Conformational and molecular
structure of humic substances based on mass spectrometric methods. In: Martin-
Neto, L.; Milori, D. M. B. P.; Silva, W. T. L. da. (eds). Humic substances and soil and
water environment. In: International Meeting of the International Humic Substances

144 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
Society, 12., 2004, São Pedro, Brasil, pp.274-276.

RICE, J. 2001. Humin. Soil Science, 166, pp.848-857.

RILEY, J. P. 1970. Adv. Mar. Biol. 8, pp.1-118.

ROCHA, J. C. et al. 1999. Multi-method study na aquatic humic substances from “Rio Negro”,
Amazonas State, Brazil. Emphasis on molecular-size classification of their metal
contents. Journal of Brazilian Chemistry Society, 10, pp.169-175.

ROCHA, J. C. et al. 2000.Substâncias húmicas: sistema de fracionamento seqüencial por


ultrafiltração com base no tamanho molecular. Química Nova, 23, pp.410-412.

ROCHA, J. C.; ROSA, A. H. 2003. Substâncias húmicas aquáticas: interações com espécies
metálicas. São Paulo: UNESP. 120p.

ROSCOE, R.; BUURMAN, P. 2003. Tillage efects on soil organic mater in density fractions of
a Cerrado Oxisol. Soil Tillge and Research, 70, pp.107-119.

ROSCOE, R.; MACHADO, P. L. O. 2002. Fracionamento físico do solo em estudos de matéria


orgânica. Dourados, EMBRAPA Agropecuária Oeste. 86p.

SANTOS, C. A. A. 2005. Matéria orgânica de Argissolo Vermelho e Latossolo Bruno sob


diferentes sistemas de manejo e sob vegetação nativa: distribuição em frações
físicas, qualidade e sorção do herbicida atrazina. 2005. 196p. Tese (Doutorado em
Ciência do Solo) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

SANTOS, V. B. 2003. Matéria orgânica e biomassa microbiana de um planossolo sob


diferentes sistemas de manejo. 2003. 79p. Dissertação (Mestrado em Ciência do
Solo) – Universidade Federal de Pelotas, Pelotas.

SARGENTINI, J. R. E.; ROCHA, J. C.; ROSA, A. H.; ZARA, L. F.; SANTOS, A.. 2001.
Substâncias húmicas aquáticas: fracionamento molecular e caracterização de
rearranjos internos após complexação com íons metálicos. Química Nova, 24,
pp.339-344.

SCHMIDT-KOPPLING, P.; NETKORN, N.; KETTRUP, A.; JUNKERS, J.; PING, G.; ZHANG, Y.;
PERDUE, M; CHEN, Y. 2002. Cappilary zone electrophoresis-elctrosprayionization/
mass spectrometry (CZER-ESI-MS) of natural organic matter (NOM). Proceedings
of the 20th Anniversary Conference of the International Humic Substances Society.
Boston, USA, pp.179-184.

SCHNITZER, M.; SCHUPPLI, P. 1989. The extraction of organic matter from selected soils
and particle size fractions with 0.5 M NaOH and 0.1 M Na4P2O7 solutions. Canadian
Journal of Soil Science, 69, pp.253-262.

SENESI, N. 1992. Binding mechanisms of pesticides to soil humic substances. Science of the
Total Environment, 123/124, pp.63-76.

SENESI, N., MIANO, T. M.; BRUNETTI, G. 1994. Methods and related problems for sampling
soil and sediment organic matter. Extraction, fractionation and purification of humic
substances. Quimica Analytical., 13, pp.26-33.

SIMPSON, A. J.; KINGERY, W. L.; HAYES, M. H. B.; SPARUL, M.; HUMPFER, E.;
DVORSTAK, P.; KESSEBAUM, R.; GODEJOHANN, M.; HOFMANN, M. 2002. The
structures and associations of organic molecules in the terrestrial environment.
Naturwissenschaften, 89, pp.84-88.

SONG, J.; PENG, P.; HUANG, W. 2005. Characterization of humic-like material isolated from
the humin fraction of a topsoil. Soil Science, 170, pp.599-611.

SPARKS, D. L. 1995. Environmental Soil Chemistry. Academic Press, San Diego. 267p.

SPECHT, C. H.; FRIMMEL, F. H. 2000. Specific interactions of organic substances by size


exclusion chromatography. Environmental Science and Technology, 34, pp.2361-

Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações | Capítulo 4L 145
2366.

STEVENSON, F. J. 1994. Humus Chemistry. Wiley, New York. 497p.

STUMM, W.; MORGAN, J. J.1996. Aquatic Chemistry. John Wiley and Sons, INC. New York,
3rd edition. 1022p.

SWIFT, R. S. Organic matter characterization. In: SPARKS, D. L. (ed.). Methods of soil


analysis. Part 3. Chemical Methods. Madison: SSSA, 1996. pp.1001-1069.

SWIFT, R. S. 1999. Macromolecular properties of humic substances: fact, fiction and opinion.
Soil Science, 164, pp.790-802.

TAN, K. H.; LOBARTINI, J. C.; HIMMELSBACH, D. S.; ASMUSSEN, L. E. 1991. Composition


of humic acids extracted under air and nitrogen atmosphere. Communications of
Soil Science and Plant Analisys, 22, pp.861-877.

TAN, K. H. 2003. Humic matter in soil and the environment. Principles and controversies.
New York, Marcel Dekker. 385p.

THURMAN, E. M. 1985. Humic substances in groundwater. In: AIKEN, G. R. et al. (ed.). Humic
substances in soil, sediment and water: geochemistry, isolation and characterization.
New York: John Wiley & Sons. pp.87-104.

THURMAN, E. M. 1985. Organic Geochemistry of natural waters. Martinus Nijhoff/Dr. W.


Junk, Dordrecht.

ÜBNER, M.; LEPANE, V.; LOPP, M.; KALJURAND, M. 2004. Electrophoretic aggregation of
humic acid. Journal of Chromatography A, 1045, pp.253-258.

VISSER, S. A. 1983. Application of Van Krevelen’s graphical-statistical method for the study
of aquatic humic material. Environmental Science and Technology, 17, pp.412:417.

146 M Capítulo 4 | Matéria orgânica em ambientes terrestres e aquáticos: compartimentos, composição e reações
Poluentes Orgânicos e Inorgânicos
Capítulo 5

POLUENTES ORGÂNICOS E INORGÂNICOS


Danilo Rheinheimer dos Santos, Leandro Souza da Silva, João Kaminski, Carlos
Alberto Ceretta & Maria Alice Santanna dos Santos

5.1 | INTRODUÇÃO

A relação do homem com o ambiente é cada vez mais complexa. Por um
lado, o ambiente está em constante mudança, como consequência de fenômenos
naturais e da própria ação antrópica; por outro lado, o homem está constantemente
produzindo novos compostos, cuja interação com o ambiente, pouco conhecida e
cercada de incertezas, é objeto de estudos.
A necessária busca da harmonia na relação do homem com o ambiente
aquático vem sendo investigada há vários anos. Para melhor inferir sobre as
consequências dos poluentes orgânicos e inorgânicos na qualidade do ambiente
e de vida do homem faz-se necessário identificar essas espécies, considerando
especialmente as substâncias orgânicas naturais ou sintéticas. Os sedimentos jogam
um papel importante nesse processo, já que sua grande área superficial os torna
potencialmente capazes de interagir de várias formas com os poluentes. Contudo,
a multiplicidade dessas interações faz com que modelos químicos e matemáticos
sejam cada vez mais empregados nesses estudos. Talvez um dos maiores desafios
da atualidade seja compreender de que forma os fenômenos naturais, aliados àqueles
causados pelo homem, se relacionam com a qualidade do ambiente e o que isso pode
significar para a qualidade de vida do homem e de todos os seres vivos que habitam
nosso planeta. O objetivo deste capítulo é apresentar informações sobre poluentes
e sua reatividade os sedimentos, particularmente aqueles de tamanho coloidal, para
subsidiar discussões mais qualificadas sobre a relação do homem com o ambiente.

5.2 | POLUENTES INORGÂNICOS


Conceitualmente, poluente é uma substância, ou elemento químico, que
está fora de seu local de origem e em concentrações capazes de promover efeitos
adversos aos seres vivos. No entanto, a maioria das substâncias inorgânicas e
elementos químicos classificados como poluentes já está naturalmente presente nos
solos e sedimentos, pois é derivada de minerais que compõe a rocha da qual o solo
se originou. Mas como a ocorrência natural se dá em muito baixas concentrações,

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 149


em geral essas substâncias não são sequer identificadas como problema. Elas se
tornam preocupantes enquanto poluentes e, causam prejuízos maiores, quando
entram na cadeia alimentar; isso ocorre, por exemplo, quando passam a integrar
partes comestíveis de plantas que são ingeridas por animais e seres humanos. Outro
aspecto importante a considerar é o fato de que, juntamente com os poluentes, nos
solos e sedimentos há também nutrientes que são essenciais a todos os seres vivos,
tais como nitrogênio, fósforo, zinco, ferro e cobre. O fósforo, por exemplo, não tem
um efeito direto de toxicidade, mas é importante porque controla as populações de
organismos vivos em todos os ecossistemas, já que é o macronutriente essencial
encontrado em menor concentração na natureza (“lei do mínimo”). Assim, o aumento
da concentração de fósforo no meio ambiente promove a proliferação de organismos,
o que contribui para o estabelecimento dos processos de eutroficação, responsável
pela acelerada degradação, principalmente em sistemas aquáticos (McBride, 1994;
Aciolly et al., 2000; Guilherme et al., 2005).
O nitrogênio e o fósforo, quimicamente, são não-metais, e seus hidroxi-
compostos são os ácidos nítrico e ortofosfórico (Russel, 1994). Ambos são nutrientes
essenciais a todos os organismos vivos, pois o nitrogênio faz parte de todos os
aminoácidos e, consequentemente, de proteínas e enzimas. Por sua vez, o fósforo
é componente do DNA e RNA, além de estar envolvido em todos os processos de
armazenamento, transferência e troca de energia do metabolismo de seres vivos.
Em vista disso, é difícil conceber que estes dois elementos químicos tenham papel
na degradação do ambiente (Azevedo et al., 2004).
Os compostos nitrogenados inorgânicos não são comumente encontrados
como minerais, porque a maioria deles é solúvel em água e se dispersa no ambiente.
Porém, em regiões de clima seco, ou cujo paleoclima é seco, existem jazidas de
nitratos, geralmente de sódio e/ou potássio, como é o caso do salitre do Chile, ocorrente
em desertos costeiros do Chile e Peru. A principal fonte natural de nitrogênio é a
atmosfera, onde ele ocorre na forma de gás N2 (~78% em volume), cuja molécula é
muito estável, com energia de ligação de 945 kJ.mol-1, o que faz com que o nitrogênio
reaja muito lentamente com a maioria das outras substâncias (Russell, 1994).
A amônia é o primeiro composto obtido a partir da quebra da molécula de N2
por organismos portadores do sistema enzimático nitrogenase, processo que ocorre
a pressão e temperatura normais. A amônia é incorporada aos compostos orgânicos,
que são então a fonte inicial de nitrogênio no solo. A outra forma de obtenção da
amônia é por via industrial, pelo processo Haber, o qual ocorre sob pressão de
500 a 1000 atmosferas, a temperaturas entre 400 e 500°C e com a presença de
um catalisador. A partir da amônia, são obtidos todos os compostos nitrogenados
inorgânicos, desde a matéria prima para obtenção de explosivos até os fertilizantes
nitrogenados usados na agricultura.
A amônia é extremamente solúvel em água. Esta solução era também
conhecida como hidróxido de amônio, embora a molécula NH4OH não exista, mesmo
em solução. O meio é complexo e envolve intercâmbio protônico entre as espécies
hidratadas de NH3, NH4+, H2O, OH- e H+. Os sais de amônio contêm o íon NH4+,
formando soluções ácidas com ácidos fortes (Russell, 1994). A presença da amônia
em águas doces é aceita pelo CONAMA em concentrações variáveis, de acordo com

150 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


o pH da água, sendo admitido 3,7 mg.L-1 a pH 7,5 e somente 0,5 mg.L-1 a pH 8,5.
Independente de sua forma amídica ou amoniacal, o nitrogênio aplicado ao
solo, ou mesmo presente em sedimentos não submersos, tenderá a se acumular na
forma oxidada de nitrato (N-NO3), quando o meio é aeróbico. Em meio em que oxigênio
está ausente, o nitrogênio se acumula na forma amoniacal. Por isso, os nitratos são
as formas mais comuns encontradas em solos e sedimentos. Embora seja absorvido
pelos organismos autotróficos na forma de íon amônio ou íon nitrato, o nitrogênio é
incorporado nos esqueletos carbônicos na sua forma reduzida. Entretanto, quando
é alta a oferta de nitrato às plantas ou a outros organismos autotróficos, como algas
clorofiladas, estas absorvem e acumulam o nitrato nos vacúolos. Se a planta ou
alga for assim consumida, como se faz com frutas e verduras, este nitrato será
reduzido a nitrito no trato intestinal, entrando na circulação sanguínea e podendo
provocar a metahemoglobinemia, também conhecida como “doença azul”, que afeta
principalmente crianças. Fenômeno semelhante ocorre quando se consome água
com nitratos acima de 10 mg.L-1, limite máximo admitido pela Organização Mundial
de Saúde. Este é o efeito direto da intoxicação por nitrato em animais (Alaburda &
Nishihara, 1998).
Com relação aos compostos fosfatados, estes são de origem mineral e não
ocorrem isoladamente na natureza, sendo a maior parte encontrada em depósitos
de rochas de fosfatos, na forma de mineral apatítico. O fósforo é bastante disperso
na natureza, aparecendo como adsorvido em sesquióxidos hidratados ou amorfos e
estrutural em compostos cristalinos de ferro e alumínio ou em compostos alcalinos
de cálcio em solos calcários ou não-ácidos. Também ocorrem compostos fosfatados
na forma orgânica, ligados a esqueletos carbônicos, principalmente na forma
de monoesteres, como inositol e fitinas, e de diesteres como ácidos nucléicos e
fosfolipídios. Geralmente suas concentrações são maiores nos horizontes superficiais
por causa da maior atividade biológica e da acumulação de material orgânico nestas
camadas. O conteúdo de fósforo no solo é variável conforme o seu material de origem,
a textura e as formas de minerais de argila ocorrentes. Contudo, independente de
sua forma, a sua biodisponibilidade natural é baixa. Por isso, embora o fósforo atue
sempre como nutriente para os seres vivos, ele também pode ser retido por grupos
funcionais de superfícies sólidas da matriz do solo quando é adicionado ao solo.
Devido à sua alta afinidade com as superfícies minerais, o fósforo forma complexo
de esfera interna, no qual não existe água entre os grupos funcionais da superfície
e o ânion. Se o ânion, como regra geral, mostrar tendência de ligar-se fortemente
a algum íon de metal em particular, ele também mostrará uma forte afinidade pelo
sítio de uma superfície mineral M-OH formada pelo mesmo metal, como é o caso do
fósforo com Fe3+ e Al3+ em meio ácido (Pellegrini, 2005; Berwanger, 2006).
Nos ecossistemas naturais, como as microbacias florestadas, as taxas de
erosão são similares àquelas fornecidas pelo intemperismo, que é determinado pela
ação dos fatores de formação do solo. Nesses casos, as transferências de sedimento
durante as enxurradas aos corpos d’água são mínimas e o aporte de fósforo ocorre de
maneira sincronizada às necessidades das populações de macro e microrganismos
aquáticos (Reynolds & Davies, 2000). Isso se deve ao ambiente natural, o qual
propicia maior infiltração da água, redução do impacto da gota da chuva, redução do

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 151


escoamento superficial e maior atividade de reciclagem da água e do fósforo. Para
esses autores, as quantidades de fósforo total transferidas das florestas são inferiores
a 9 kg.ha-1.ano-1. Porém, a derrubada da floresta e a implantação da agricultura
em sistemas de cultivos convencionais aumentam drasticamente as perdas desse
nutriente, que podem chegar a ultrapassar a magnitude de 100 kg.ha-1 ano-1 de
fósforo total. A disponibilidade do fósforo na água depende da interação qualitativa
e quantitativa entre os sedimentos e a água, no espaço e no tempo (Reynolds &
Davies, 2001; Tiessen, 1995). A sua dinâmica interfere na qualidade da água e é
por ela afetada. As formas e as quantidades de fósforo no escoamento e no deflúvio
superficial dos agroecossistemas são dependentes, entre outros fatores:
(a) das fontes de poluição;
(b) dos mecanismos de transferência de sedimento e fósforo; e,
(c) das transformações que ocorrem durante a trajetória.
Pelegrini (2005), trabalhando numa microbacia hidrográfica de cabeceira
cultivada com fumo na região central do Rio Grande do Sul, constatou que:
(a) as transferências de sedimentos e de fósforo dos sistemas terrestres
aos ambientes aquáticos são incrementadas pelo aumento das áreas de
lavoura e das fontes de poluição pontual, respectivamente. A distribuição
e a posição das lavouras e das estradas na paisagem são tão, ou mais
importantes, nas transferências de sedimentos e fósforo, do que a sua
contribuição relativa em termos de área. A inexistência da mata ciliar
contribui para o aumento nas concentrações de sedimento e fósforo na
água do escoamento superficial;
(b) as águas coletadas nas áreas com maior ação antrópica apresentaram
maiores concentrações de sedimento e de fósforo em todas as formas,
comparativamente àquelas coletadas em áreas com maior cobertura
florestal. As fontes de poluição pontual aumentaram os teores de
fósforo em todas as formas modificando a sua dinâmica na água e nos
sedimentos;
(c) as concentrações de sedimentos e de fósforo total na água são maiores
durante os eventos pluviométricos de alta intensidade. Já a concentração
de fósforo solúvel é maior na fase inicial do desenvolvimento da cultura
do fumo, estando mais relacionada à aplicação dos fertilizantes no solo;
(d) as concentrações de fósforo particulado biodisponível foram altas em
todas as condições de uso do solo e épocas do ano, variando de 3,5%
do fósforo total nas áreas de maior contribuição de lavouras e estradas a
13% nas áreas com influência de fontes de poluição pontual;
(e) os sedimentos oriundos das áreas com maior cobertura florestal
possuem maior concentração de fósforo particulado biodisponível e
taxa de dessorção constante, porém, com maior capacidade máxima
de dessorção de fósforo do que os sedimentos coletados nas áreas
com maior interferência de lavouras e de estradas. Estes parâmetros
estão relacionados com os teores de ferro extraído por ditionito-citrato-
bicarbonato de sódio e não com os teores de argila;
(f) os sedimentos oriundos das áreas com maior interferência de lavouras

152 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


e de estradas apresentam maior capacidade máxima de adsorção e
constante relacionada à energia de ligação de fósforo, mas com menor
concentração de equilíbrio de fósforo do que os sedimentos oriundos das
áreas com maior cobertura florestal.
Os elementos químicos que ocorrem em baixas concentrações no solo
são identificados como elementos traço. Como na sua grande maioria pertencem
ao grupo dos metais, eles são muitas vezes denominados metais pesados. Mas,
além desta terminologia ser de difícil conceituação, existe, entre eles, não-metais
como o flúor e o bromo; semi-metais como o boro, o arsênio e o selênio, e, por isso,
denominá-los elementos traço permite englobar todos estes elementos químicos.
Alguns metais de transição, como o manganês, o cobre, o zinco e o ferro, são
nutrientes essenciais, mas que também podem prejudicar os seres vivos quando
encontrados em concentrações maiores do que aquelas que os organismos podem
suportar (Guilherme et al., 2005; Alleoni et al., 2005).
Os elementos traço mais comuns ocorrentes em solos e sistemas aquáticos
superficiais e subsuperficiais são apresentados na Tabela 5.1.
Todos os elementos químicos listados, de ocorrência natural no solo e
sedimentos, estão envolvidos em reações químicas ou físico-químicas com os
minerais de argila ou com a matéria orgânica presentes no ambiente. Porém, todos
eles estão em equilíbrio com seus correspondentes iônicos dissolvidos na água
(Alleoni et al., 2005).
A importância com que os elementos traço são tratados, tanto metais quanto
não metais, reside em sua capacidade de promover alterações fisiológicas negativas
nos seres vivos, sendo que por isso eles também são denominados elementos
tóxicos. Mesmo que alguns dos elementos traço sejam essenciais, eles podem
promover alterações nas rotas metabólicas quando encontrados em concentrações
superiores àquelas necessárias aos organismos (Aciolly et al., 2000). Assim, o flúor,
que é o mais eletronegativo dos halogênios, é essencial para a formação de dentes
e ossos, mas pode provocar descalcificação de ossos em idosos se administrado em
doses superiores a 3 mg.dia-1.
O alumínio, elemento químico muito comum nos solos, tem efeito deletério em
plantas superiores quando na forma trocável em solo com pH inferior a 5,5. Também
está associado à ocorrência do mal de Alzheimer, pois sua presença foi constatada
no cérebro de pessoas com essa doença. São bem conhecidos os efeitos do selênio,
que tem alguma similaridade com o enxofre, no seu comportamento fisiológico, mas
causa distrofia muscular em animais quando encontrado em baixas concentrações, e
pode promover queda de pêlos e penas em animais e aves, como também provocar
má formação dos dentes e do casco, quando em excesso. O arsênio, o mercúrio, o
cádmio e o selênio são particularmente tóxicos em animais superiores, enquanto que
o selênio, o cobalto, o cobre o ferro, o manganês, o zinco e o níquel são considerados
fitotóxicos e são nocivos à saúde humana (Macedo, 2002).

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 153


Tabela 5.1 – Elementos traço de ocorrência comum em solos e aquíferos
Formas de
Elemento Função biológica Toxicidade Limites*
ocorrência
Encontrado em Haletos e sais de
Arsênio (As) fosfolipídios de algas e Alta 10
ácidos fracos
fungos
Boro (B) Essencial às plantas Média-Baixa Ácido bórico e boratos -
Com ligantes haletos e
Cádmio (Cd) Desconhecida Média-Alta 5
complexos tetraédricos
Metálico e galena
Chumbo (Pb) Desconhecida Alta 3
(PbS)
Não é bem conhecida,
mas o Cr3+ parece Cr3+ e Cr6+ são as mais
Cromo (Cr) Alta (Cr )
6+
comuns, sendo que a
estar envolvido no 50
Baixa (Cr3+) última é frequente em
metabolismo de ambientes aquáticos
açucares dos mamíferos
Cobre (Cu) Essencial ** Baixa Íon Cu2+ 200
Bromo (Br) Desconhecida Média-Alta Brometos -
Componentes dos
Flúor (F) Média Fluoretos -
dentes de mamíferos
Óxidos e hidróxidos
Ferro (Fe) Essencial Baixa 300
Fe2+ e Fe3+
Líquido prateado ou
Mercúrio (Hg) Desconhecida Alta 0,2
Hg2+ em meio aquoso
Óxido de manganês
Manganês (Mn) Essencial Baixa 100
(IV) e íon Mn2+
Metal ou complexos
Níquel (Ni) Enzima urease Média-Alta aniônicos, neutros e 130
catiônicos
Essencial aos
Selênio (Se) Média-Alta Metalóide e óxidos 1
mamíferos
Metálica e compostos
Zinco (Zn) Essencial Baixa-Média 100
de Zn2+
* Limites de aceitação para consumo humano, em µg.L-1.
** Essencial a todos organismos vivos.
Adaptado de: Russel (1994); Macedo (2002); Guilherme et al. (2005)

A água atua como veículo de transporte de qualquer substância, seja ela


dissolvida ou arrastada. Por isso, sempre que houver deslocamento de água, natural
ou forçada, haverá transferência de substâncias e sedimentos. O transporte de solutos
pode ocorrer durante o deflúvio ou por drenagem interna; afinal, a água é solvente
universal e dissolvem-se nela todas as substâncias eletrolíticas ou não-eletrolíticas.
Pelo arraste, são transportadas partículas de solo, fragmentos e partículas de rocha,
os quais, pela ação combinada da gravidade com a massa de água deslocada, são
depositados como sedimentos nos estratos inferiores das paisagens, o que explica
porque nestes locais são encontradas as maiores concentrações de poluentes. Estes
processos podem ser naturais, mas são muito mais intensos e acelerados pela ação
antrópica (Azevedo et al., 2004).
As fontes de poluentes podem ser pontuais, porque são pontos na paisagem
onde existe grande quantidade de material descartado com potencial poluente, como

154 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


resíduos industriais, pontos de descarregamento de redes cloacais, descarte de lodo
de esgoto ou pontos de acumulação do lixo urbano, entre outros. Estes materiais
são ricos em material orgânico, contêm quantidade considerável de nitrogênio e
fósforo, mas são também as principais fontes de introdução de elementos traço no
ambiente. Isso acontece porque, por um lado, os nutrientes exportados em grãos ou
demais partes das plantas são transferidos para os centros urbanos para consumo
in natura, industrializados ou semi-industrializados, dos quais parte é incorporada
aos humanos e grande parte é eliminada pelos organismos. Por outro lado, muito do
material industrializado de uso cotidiano, como sabões, detergentes, ceras e tintas
têm elementos traço e/ou fósforo e nitrogênio na sua composição. Assim, estima-se
que cada pessoa humana gera entre 15 e 35 mg.L-1 de nitrogênio total e 7-10 mg.L-1
de fósforo inorgânico total por dia. Este material é inteiramente descartado em forma
de suspensão ou solução para a rede de esgoto cloacal, que poderá ser tratado ou
não. Se tratado, grande parte dele fará parte do lodo do esgoto. Se eliminado na
forma sólida, ele fará parte da coleta de resíduos urbanos, que poderá ser disposto
em local apropriado ou descartado (Macedo, 2002; Abreu et al., 2002). Outra grande
fonte de produção de poluentes inorgânicos é a criação de animais confinados, como
aves, suínos e bovinos. Eles produzem uma grande carga de material orgânico, muito
rico em fósforo, nitrogênio e alguns elementos traço. Este material, tão logo seja
descartado, é mineralizado biologicamente, liberando os nutrientes e os elementos
traço, tornando-se uma fonte pontual de contaminação.
Poluentes inorgânicos são também originados de fontes não pontuais ou
difusas e são representadas, principalmente, pela atividade agropastoril. A origem é,
principalmente, o tipo de insumo usado. É uma forma de perturbação que resulta em
alterações em propriedades físico-químicas do solo. Ela é realizada com o intuito de
promover condições para facilitar o crescimento das espécies introduzidas, se não
exóticas, pelo menos diferentes das originais, com a finalidade de produzir grãos,
fibras, raízes e madeira, as commodities, em quantidades compatíveis com o ganho
financeiro. São alterados o pH e a capacidade de troca de cátions, neutralizado
o alumínio trocável, elevada a saturação com bases e aumentados os teores de
fósforo, de potássio, de nitrogênio e de outros nutrientes essenciais às plantas. Entre
os insumos usados estão incluídos os fertilizantes, que fornecem principalmente
fósforo e nitrogênio. Estes insumos promovem benefícios, pois levam a um aumento
na produtividade das culturas, mas também provocam impactos negativos que se
devem a seu escape para outros meios que não o alvo. Embora os solos possuam
mecanismos físico-químicos e biológicos para reter estes nutrientes, quando os
seus teores atingem limites próximos à saturação, eles deixam de ser retidos e são
perdidos para o ambiente. Neste caso, atuam mais como poluentes do que como
nutrientes e podem poluir fontes de água potável, inclusive os aquíferos, e promover
a eutroficação de lagos e rios. Além disso, muitos fertilizantes fosfatados, naturais
ou industrializados, carregam consigo impurezas trazidas das jazidas de onde foram
retirados. Essas impurezas contêm elementos traço, como o flúor, o cádmio, o cromo,
o bário, o cobre, o mercúrio, o níquel e o chumbo, porém em concentrações muito
baixas, da ordem de µg.kg-1, de modo que só viriam a ser perigosos à saúde do
ambiente após muitos anos de uso continuado (Abreu et al., 2002). Porém, como

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 155


esses elementos traço são cumulativos, eles devem ser monitorados com cuidado
em áreas agrícolas. A avaliação deve ser feita, principalmente, nos sedimentos de
fundo de rios e lagos, pois há riscos de os elementos traço se acumularem ao longo
da cadeia alimentar, ou na água de consumo armazenada em bacias hidrográficas
com intensa atividade agrícola (Basso, 2003; Pellegrini, 2005; Berwanger, 2006).
A deposição atmosférica e o descarte de rejeitos oriundos das indústrias
metal-mecânica, de vitrificação e de fertilizantes são fontes importantes de entrada
de elementos traços em solos e sedimentos, especialmente de cádmio, cromo, cobre,
flúor, mercúrio, chumbo e zinco (Macedo, 2002).

5.3 | POLUENTES ORGÂNICOS


As substâncias que podem ser consideradas poluentes de origem orgânica
em sedimentos são as naturais ou sintéticas, oriundas tanto de atividades rurais
como urbanas. Entre as substâncias orgânicas naturais, destacam-se os compostos
orgânicos liberados ou gerados pela atividade biológica durante a decomposição
de resíduos de origem animal e vegetal, tais como esterco, urina, penas e peles de
animais, partes de plantas, etc, ou pelo descarte de materiais oriundos de processos
industriais ou agroindustriais, tais como lodos de estações de tratamento de efluentes
e vinhaça. Entre as substâncias orgânicas sintéticas, destacam-se os componentes
ou compostos presentes em diversos produtos e equipamentos industrializados que
são utilizados na produção agropecuária ou descartados no ambiente, tais como
agrotóxicos, produtos de limpeza, aditivos em rações, etc. Cabe salientar que,
muitas vezes, a aplicação de um determinado material ao ambiente pode acarretar
a contaminação simultânea com compostos orgânicos e inorgânicos, mas a ênfase
neste item será dada aos poluentes orgânicos.
Os materiais naturais ou sintéticos e seus produtos de transformação podem
atingir diretamente os cursos de água ou podem ser carreados até as fontes de água
juntamente com os sedimentos erodidos. A maior parte dos resíduos produzidos pelas
indústrias, quando não sofrem tratamento adequado, é despejada em rios, os quais
acabam interagindo com os sedimentos presentes e, cedo ou tarde, desaguando nos
mares. É através do movimento contínuo das águas que os poluentes atingem até
mesmo pontos distantes de onde foram gerados ou distribuídos, contaminando, ao
longo do percurso, a flora e a fauna aquáticas e os demais seres da cadeia alimentar.
Dessa forma, é de fundamental importância o conhecimento dos
principais materiais existentes e suas características gerais, de modo a contribuir
para o entendimento da reatividade de seus compostos com os sedimentos e,
consequentemente, a sua biodisponibilidade nos ambientes aquáticos.

5.3.1 Substâncias orgânicas naturais: origem e constituição

Na natureza existem diversos compostos orgânicos que, em função de


sua concentração, podem provocar danos ao ambiente. Em condições normais, a

156 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


concentração desses compostos não é suficiente para causar impactos significativos
ao ambiente onde são gerados ou distribuídos. Entretanto, a atividade humana
localizada em centros urbanos ou em áreas rurais gera e concentra resíduos por
excelência, sejam eles oriundos de processos industriais ou agrícolas (Abreu Jr. et
al., 2005). Em sua maioria, tais resíduos são ricos em materiais orgânicos e também
em elementos inorgânicos. Isto faz com que sejam materiais adequados para
aplicação no solo, com vistas à ciclagem dos elementos considerados nutrientes às
plantas, resultando em redução no consumo de fertilizantes e, consequentemente,
em menor custo de produção. Entretanto, alguns desses materiais podem conter
em sua composição outros agentes potencialmente contaminantes ao ambiente, tais
como metais pesados e organismos patogênicos, bem como uma série de compostos
orgânicos e inorgânicos que podem causar prejuízos aos animais e ao homem,
quando aplicados no ambiente.
No aspecto ambiental, a aplicação desses materiais proporcionará uma
espécie de redistribuição de seus componentes ao ambiente em uma área maior
onde eles estão concentrados, o que pode reduzir seu potencial poluente, desde
que aplicados dentro de critérios seguros. Isso quer dizer que os resíduos orgânicos
podem ser considerados, além de fertilizantes de origem orgânica, fontes de
poluição, principalmente dos recursos hídricos, quando mal manejados em termos
de quantidade e modo de aplicação. Entre os principais materiais descartados no
ambiente que podem originar compostos orgânicos naturais capazes de interagir
com os sedimentos, destacam-se o lodo de esgoto ou biossólido, composto de
lixo urbano, vinhaça, resíduo de curtumes e os dejetos de animais, os quais serão
descritos a seguir.
a) Lodo de esgoto ou biossólido: É aquele resíduo obtido do tratamento
das águas servidas com a finalidade de torná-las menos poluídas antes
de retornarem ao ambiente. Quando o lodo de esgoto é estabilizado e
seco, recebe o nome de biossólido. Considerando que os materiais que
atingem as estações de tratamento de esgoto, bem como os processos
de tratamento para descontaminação das águas, são bastante variados,
a composição final desses materiais também será bastante variável. De
modo geral, o pH situa-se próximo da neutralidade (entre 6,0 e 7,0), e
o teor de carbono representa em torno de 30% do lodo (base seca).
Como tudo que vai para o esgoto pode fazer parte do lodo de esgoto, o
principal problema do descarte desse tipo de material no ambiente estaria
relacionado com a possível presença de metais pesados, organismos
patogênicos, ovos de parasitas e compostos orgânicos (Melo et al., 1999).
b) Composto de lixo urbano: Material resultante da decomposição
controlada de resíduos orgânicos coletados juntamente com todo
material descartado nas residências, formando um material estável
com composição e características diferentes do material de origem.
Sua composição final está muito associada com os hábitos alimentares
da região onde os materiais são coletados e o grau de seleção prévia,
considerando-se maior ou menor contato com materiais não orgânicos
presentes no lixo urbano, tais como pilhas, baterias, plásticos, materiais

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 157


hospitalares, etc. Dessa forma, sua aplicação em sistemas agrícolas
deve ser criteriosa, considerando-se principalmente a possibilidade de
presença de organismos patogênicos e de metais pesados.
c) Vinhaça: Também conhecida como vinhoto, restilo ou calda, é o resíduo
gerado pelas destilarias de aguardente e álcool, anexas ou não às usinas
de açúcar. De modo geral, possui pH abaixo de 4,0, com elevados
valores de demanda bioquímica e química de oxigênio (DBO e DQO,
respectivamente), com um relativo baixo teor de sólidos em suspensão.
O problema principal é que a adição de um resíduo com alta DBO e
nutrientes dissolvidos pode afetar a microbiota do solo, contaminar
as águas subterrâneas e causar eutroficação nas águas superficiais
(Selbach et al., 1999). Segundo esses autores, é necessário um
tratamento secundário para diminuir a DBO e neutralizar o pH, podendo
o material posteriormente ser aplicado puro ou ainda diluído com outras
águas servidas também utilizadas na indústria, especialmente a água
de lavagem das canas. Sua aplicação deve ser criteriosa, para evitar
a distribuição não uniforme e concentrada em determinados locais, a
erosão e a compactação do solo, tendo em vista o fato de ser necessário
aplicar grandes quantidades de material utilizando-se equipamentos
pesados.
d) Resíduos de curtume: É o material resultante do processamento do
couro, o qual inclui restos de peles e pêlos, substâncias utilizadas no
curtimento, tais como tanino e cromo, e no tingimento e acabamento do
couro. Seus problemas estão associados à alta DBO e DQO, presença de
sulfetos e grande quantidade de cromo (Selbach et al., 1999). Portanto,
sua aplicação está na dependência das exigências ambientais quanto a
esses parâmetros.
e) Dejetos de animais: Neste grupo estão incluídos todos os materiais (fezes
+ urina + sobra de ração + água residual, etc.) eliminados nas criações
de animais, especialmente a avicultura, a suinocultura e a bovinocultura.
O confinamento total ou parcial dos animais gera o acúmulo de grande
volume de dejetos em pequenas áreas que possuem esse tipo de
criação. Em função das características da avicultura (que gera um
material essencialmente sólido), os resíduos orgânicos são facilmente
empregados na agricultura e, portanto, representam um potencial
poluente inferior aos demais. Dejetos de bovinos e suínos, mesmo que
possam ser manejados na forma sólida, predomina sua utilização na
forma líquida. Nesses dejetos líquidos incluem-se as dejeções (fezes e
urina), a água descartada na limpeza, os resíduos de ração, os pêlos e a
poeira decorrentes da criação.
Esses materiais apresentam grande variabilidade em suas características,
o que é resultado, principalmente, da alimentação fornecida aos animais, da
quantidade de água utilizada nas instalações e das diferentes opções de manejo dos
dejetos. Independentemente da forma como são manejados, os dejetos de animais
apresentam uma elevada DQO (chega a ser acima de 30.000 mg.L-1), podendo

158 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


reduzir a quantidade de oxigênio dissolvido nos cursos de água a valores inferiores
às necessidades da fauna aquática, causando danos ao equilíbrio ecológico no
ambiente (Giacomini & Aita, 2006). Além disso, esses autores ressaltam que a
presença de bactérias coliformes e substâncias orgânicas putrescíveis, geradoras
de odores desagradáveis, pode tornar as águas de superfície impróprias tanto
para o consumo como para o lazer. A presença ou liberação de nitrato, fosfatos e
metais pesados também têm sido consideradas na utilização desses materiais como
fertilizantes orgânicos. De modo geral, o potencial poluidor dos dejetos depende
fundamentalmente das suas características, das quantidades e da forma que eles
são aplicados no solo e das condições edafoclimáticas predominantes após sua
aplicação.

5.3.2 Substâncias orgânicas sintéticas: principais compostos e


características

Até praticamente o século XIX era possível criar animais e cultivar plantas sem
a utilização de qualquer substância sintética (embora algumas substâncias naturais
anteriormente empregadas no manejo dos sistemas de produção, tais como extratos
de plantas e caldas, também apresentassem alguma toxicidade humana). Com a
era industrial, especialmente no início do século XX e, sobretudo, após a II Guerra
Mundial, através do desenvolvimento do conhecimento científico e dos processos
produtivos, houve uma grande generalização na produção e uso de substâncias
químicas sintéticas. Nesse contexto, a agricultura passou a se utilizar fortemente da
aplicação de agrotóxicos, além de outros produtos, levando à banalização da prática
e a sua utilização, por vezes sem qualquer tipo de restrições ou cuidados específicos.
De outro modo, os processos industriais em zonas urbanas também produziram uma
série de compostos orgânicos que podem atingir o ambiente, especialmente quando
não sofrem nenhum tipo de tratamento ou controle de suas emissões.
Nas últimas décadas, centenas de milhares de novas substâncias químicas
foram criadas com a finalidade de facilitar os processos produtivos, as quais atingem
o solo e os recursos hídricos, interagindo com os sedimentos ali presentes. Entre
as primeiras substâncias orgânicas sintéticas utilizadas, formou-se um grupo de
compostos que são altamente tóxicos e perigosos denominados genericamente
de Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs). Os POPs são substâncias químicas
produzidas em diversas atividades industriais, e podem ser considerados como os
principais representantes: bifenilos policlorados (PCBs); dioxinas e furanos; aldrin,
endrin e dieldrin; DDT; heptacloro e clordano; hexaclorobenzeno (HCB); mirex e
toxafeno. São chamados de persistentes porque não se degradam facilmente na
natureza e podem contaminar mesmo durante décadas após terem sido utilizados
uma única vez.
Os POPs estão em todo lugar e são repassados de geração a geração,
acumulando-se no ambiente e nos corpos de pessoas, animais e plantas. Estas
substâncias tóxicas são geradas em diversos processos industriais, dentre eles:
produção do PVC (plástico utilizado em brinquedos, utensílios domésticos, tubos e

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 159


conexões, embalagens de alimentos, etc), produção de papel (através do processo
de branqueamento com cloro), geração e composição de produtos agrícolas (um
grande número de herbicidas, inseticidas e fungicidas), incineração de lixo (doméstico,
industrial e hospitalar), e processos industriais (quando empregam cloro e derivados
do petróleo).
Ao contrário do que acontece com a maioria dos compostos orgânicos
existentes na natureza, aqueles caracterizados como aromáticos (isto é, que contêm
um ou mais anéis de benzeno), tendem a ser muito estáveis. Os hidrocarbonetos
aromáticos podem tornar-se ainda mais estáveis quando um ou mais átomos de
hidrogênio se encontram substituídos por elementos halogênios (flúor, cloro, bromo
ou iodo), processo denominado de halogenação. Dessa forma, o cloro tem sido
largamente usado na produção de diversos produtos para a agricultura (especialmente
em biocidas) e para a indústria (em solventes, agentes de limpeza, plásticos, etc.).
Tais produtos tornam-se resistentes à degradação química, biológica e fotolítica,
afetando a saúde humana e os ecossistemas, mesmo em pequenas concentrações.
Muitos destes efeitos ocorrem porque alguns poluentes orgânicos são
capazes de mimetizar ou bloquear determinados hormônios, afetar enzimas que
controlam as reações bioquímicas no organismo e atingir os neurotransmissores e
células do sistema imunológico. Os persistentes têm uma atração muito forte por
gorduras e, em contato com os tecidos gordurosos dos seres vivos, se acumulam,
podendo ser encontrados em grandes quantidades até em comunidades que nunca
estiveram perto de suas fontes produtoras. A sua capacidade de se acumular nos
tecidos biológicos, em particular nos adiposos, é proporcional à lipossolubilidade que
apresentam – fenômeno a que se dá o nome de bioacumulação. A halogenação de um
composto orgânico reduz a sua solubilidade em água e aumenta a lipoafinidade e, por
consequência, a tendência para se bioacumular, encontrando-se predominantemente
em seres vivos aquáticos ou em matéria orgânica, onde atingem concentrações muito
maiores do que no meio aquoso. Em animais de níveis alimentares superiores, como
lontras ou águias, os poluentes persistentes podem atingir concentrações milhares
de vezes superiores às que se verificam nos peixes de que se alimentam. A esta
propriedade dá-se o nome de biomagnificação.
Na água, a maior parte dos POPs se deposita à superfície de sedimentos
ou mesmo de seres vivos e a quantidade de poluentes armazenada desta forma é
muito superior à que se encontra dissolvida, enquanto que a quantidade existente
no ar pode ser considerada insignificante. A liberação de POPs diretamente para a
água constitui, normalmente, um problema de âmbito local ou regional, ainda que de
grande gravidade. No entanto, uma parte pode ser absorvida pela fauna ou dissolver-
se na água, entrando e subindo na cadeia alimentar. Portanto, os efeitos fazem sentir-
se durante muitos anos após a cessação das emissões.
A fauna aquática pode acumular grandes quantidades de POPs porque
filtra água e sedimentos continuamente. O nível de biomagnificação atingido pelos
organismos aquáticos, no entanto, é limitado porque existe uma tendência permanente
de se atingir um estado de equilíbrio entre os tecidos e o meio envolvente. Quando
um peixe se alimenta de zooplâncton, por exemplo, irá aumentar a sua concentração
de poluentes persistentes até que a concentração dos contaminantes na água

160 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


seja inferior. Logo, o efeito de acumulação é permanentemente contrabalançado
pela água. Peixes grandes, que se alimentam em larga escala, podem ingerir mais
poluentes do que a sua capacidade de expelir. A concentração ainda pode variar de
forma sazonal, tendo em vista que na época de desova de alguns peixes as reservas
lipídicas são mobilizadas e consumidas em grande escala. Os principais problemas
de contaminação, no entanto, ocorrem nos predadores dos peixes, no topo da cadeia
alimentar, como as focas, lontras, algumas aves de rapina e inúmeras aves aquáticas.
Ao contrário do que ocorre com os peixes, as aves e os mamíferos respiram por
pulmões, com limitado contato com a água e, assim, o efeito de equilíbrio descrito
anteriormente está totalmente ausente. A concentração de substâncias tóxicas nos
tecidos é determinada pela relação entre a ingestão de alimentos e a capacidade de
metabolizar e excretar os poluentes. No caso dos POPs, este processo é muito lento
o que, no decurso de uma vida, podem atingir níveis muito elevados no organismo.
Em caso de mobilização das reservas lipídicas para obtenção de energia, onde os
contaminantes estão armazenados, pode ocorrer liberação para a corrente sanguínea,
eventualmente atingindo órgãos vitais e, até mesmo, provocar a morte.
Atualmente, mesmo considerando que os compostos orgânicos sintéticos
altamente tóxicos já não são mais produzidos, ou deixaram de ser aplicados
no ambiente, a agricultura ainda pode ser uma importante fonte de poluição dos
recursos hídricos. A busca da simplificação da produção, com o uso indiscriminado
de agrotóxicos, mesmo daqueles denominados seletivos para os organismos não-
alvos, com menor persistência no ambiente por sua maior facilidade de degradação,
também pode causar algum efeito sobre o ecossistema. Quando o cultivo ainda for
associado com práticas de manejo inadequadas à conservação do solo e da água,
uma grande quantidade de sedimentos, tais como argila e matéria orgânica, pode ser
transportada juntamente com a água de deflúvio, carreando nutrientes e agrotóxicos
para as fontes de água. Em função da grande diversidade de princípios ativos
existentes para diversos tipos de cultivos, um grande número de moléculas orgânicas,
com diferentes graus de solubilidade na água e persistências no ambiente, é lançado
na natureza todos os anos. Tais moléculas terão comportamento na água e interação
com os sedimentos de acordo com as suas características químicas, podendo ser
considerados poluentes em diferentes graus de importância. Entretanto, a utilização
dessa água diretamente para consumo pode causar intoxicação dos animais e dos
agricultores, reduzindo a qualidade de vida e a sustentabilidade dos mesmos na
atividade rural.
Um exemplo de que o uso de princípios ativos dos agrotóxicos “modernos”
pode representar um risco ao ambiente e ao próprio homem é o trabalho feito por
Machado (2003). Esse autor monitorou a persistência de herbicidas na água da
lavoura de arroz irrigado por alagamento. Mesmo o herbicida propanil, que é dito
de baixa persistência e apresentou meia-vida de 0,6 dias, teve resíduos detectáveis
até o sétimo dia após a aplicação. Além disso, o autor destaca que existem relatos
na literatura de que um dos seus metabólitos, o 3,4-dicloroanilina (3,4-DCA), pode
persistir por mais tempo do que o propanil. Para o herbicida 2,4-D, a meia-vida na
água foi de 1,5 dias, a sua concentração variou de 2 a 50 μg.L-1 ao final da primeira
semana. A velocidade de degradação do 2,4-D na água é rápida, mas depende

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 161


da concentração de nutrientes, sedimentos, carbono orgânico dissolvido e da
oxigenação da água. Para o bentazon, na média de três anos de avaliação, houve
uma redução de 64% da concentração aplicada nos primeiros sete dias da aplicação
do herbicida, sendo que a meia-vida deste herbicida foi em média de 2,2 dias. O
herbicida quinclorac apresentou meia vida de 2,8 dias, e a concentração manteve-se
alta até o sétimo dia (232 μg.L-1, em média), representando 39% da concentração
média aplicada. Entretanto, foram observadas concentrações detectáveis do
herbicida até 21 dias após a aplicação. O herbicida clomazone foi o mais persistente,
com meia vida na água de 3,9 dias, sendo o único herbicida detectado até 28 dias,
inclusive sendo um dos herbicidas mais frequentemente encontrados em águas de
rios. Assim, a manutenção dos herbicidas na lavoura, através do manejo de irrigação
que reduzam o escape da água, é uma medida a ser adotada a fim de evitar ou
minimizar a entrada de resíduos de herbicidas nos mananciais hídricos. De qualquer
modo, devem-se buscar sistemas de produção de alimentos que mantenham e até
melhorem a qualidade da água, que sejam economicamente viáveis, que respeitem
as leis ambientais e que sejam ecologicamente aceitáveis e socialmente justos.

5.4 | INTERAÇÃO DOS POLUENTES COM OS SEDIMENTOS

5.4.1 Reatividade dos sedimentos

Os colóides inorgânicos presentes nos solos e, consequentemente, nos


sedimentos são formados pelos filossilicatos e pelos óxidos. As estruturas básicas
dos filossilicatos são os tetraedros e octaedros. A formação de uma unidade básica
deverá respeitar as seguintes regras:
(a) os átomos na forma de íons são esferas sólidas com raio constante;
(b) deve-se formar um arranjo que minimize a carga eletrostática;
(c) o raio do ânion é sempre muito maior do que o raio do cátion;
(d) o arranjo tem a tendência de ser o mais compacto possível;
(e) os ânions são coordenados por um cátion central, com um máximo de
ânions.
A relação entre o raio do cátion (rc) e o raio do oxigênio (ro) define o
número de coordenação do cátion. Quando a relação rc/ro for < 0,414, a estrutura
mais estável é o tetraedro e quando a rc/ro for entre 0,414 e 0,732, o octaedro é
o arranjo mais estável. A relação entre o raio do Si+4 e do O-2 é somente de 0,3,
o que indica que sempre esse cátion formará tetraedros, enquanto que a relação
de raios do Al+3 / O-2 é de 0,41, o que permite que esse cátion forme octaedros e
tetraedros estáveis. Outros cátions como o Fe+2,+3, Mn+4,+3,+2, Ca+2 e Mg+2, podem se
instalar somente dentro dos octaedros, uma vez que são íons grandes e necessitam
de maior espaço. Desse modo, os tetraedros são formados basicamente pelo Si+4,
embora o Al+3 possa substituí-lo. Os octaedros são formados por Al+3, mas esse pode
ser substituído por vários cátions de raio semelhante, como é o caso do Mg+2, Fe+2
e Mn+2. A substituição isomórfica, por consequência, produzirá uma distorção na

162 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


estrutura do mineral (diferentes raios e forças das ligações) e um excesso de cargas
negativas. As unidades básicas simples (tetraedros e octaedros) são organizadas
em estruturas mais complexas, que são as lâminas tetraedrais e octaedrais. A união
de lâminas tetraedrais e octaedrais pelo compartilhamento de oxigênio forma uma
camada. A associação das camadas e seu espaço entre-camadas define o grupo de
mineral de argila. Assim, os minerais de argila presentes nos sedimentos podem ser
classificados em função:
(a) da organização de suas camadas (estruturas 1:1, 2:1 e 2:1:1);
(b) da carga total da lâmina;
(c) do preenchimento da lâmina octaedral (di ou tri-octaedral);
(d) do caráter expansivo ou não do espaço entre-camadas, o qual depende
do local do déficit de carga resultante da substituição isomórfica e do
cátion neutralizador (Schulze, 1989).
Em sedimentos oriundos de solos mais velhos, predominam minerais de argila
que já perderam uma lâmina (caulinita e haloisita) ou as duas lâminas tetraedrais,
originando os óxidos, os quais são formados pelo arranjamento de octaedros. Os
principais óxidos presentes nos sedimentos de regiões tropicais e sub-tropicais são
os de ferro (hematita, goethita e ferrihidrita, principalmente), os de alumínio (gibbsita)
e os de manganês (birnesita, pirolusita e todorkita). Os tipos de óxidos formados
são dependentes das condições ambientais e condicionarão as suas reatividades.
Por exemplo, em solos localizados nas partes altas do terreno que apresentem
altos teores de matéria orgânica, há um predomínio de ferrihidrita/goethita sobre a
hematita. A ferrihidrita apresenta alta área superficial específica (2 à 5 x 105 m².kg-1)
e sua reorganização e desidratação dá origem a goethita, cuja forma é acicular e tem
menor área superficial específica em relação a ferrihidrita (6 à 20 x 104 m².kg-1), mas
é superior a da hematita. A goethita pode apresentar até 33% de substituição de ferro
por alumínio, enquanto que na hematita o percentual é de apenas 16% e apresenta
um empacotamento denso e, por isso, uma menor reatividade com os poluentes
presentes na água. Geralmente, os óxidos de manganês apresentam estruturas em
túneis, expondo uma grande área superficial que, aliado ao baixo ponto de carga
zero dos grupos funcionais, lhes garante alta reatividade com cátions, especialmente
com os metais de transição (Tabela 5.2).
A matéria orgânica, conforme comentado anteriormente, é formada por uma
mistura de substâncias orgânicas muito diversas e pelos organismos vivos. Tanto
a parte morta (substâncias húmicas e não húmicas) quanto a parte viva (biomassa
microbiana e de outros organismos) pode interagir com os poluentes orgânicos e
inorgânicos presentes nos sedimentos. Logicamente, as substâncias que apresentam
características coloidais expõem um grande número de grupos funcionais e, por isso,
elas são mais reativas com a maioria dos poluentes, especialmente com os metais
pesados. A polifuncionalidade das substâncias húmicas é oriunda da diversidade
de grupos funcionais e da reatividade diferenciada mesmo dentro do mesmo grupo
funcional devido à constituição das vizinhanças desses grupos funcionais. Também,
uma substância húmica tem a capacidade de fazer associações intra-moleculares,
alterando sua conformação (labilidade estrutural), a qual é dependente das
condições geoquímicas (Sposito, 1994; Schlten & Schnitzer, 1997). Nos ambientes

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 163


aquáticos, podem ser encontradas substâncias orgânicas mais simples, oriundas
da decomposição e síntese microbiana ou mesmo sintetizadas pelo homem, que
podem reagir com os poluentes, especialmente os inorgânicos como os metais
pesados (Zsolnay, 2003; Dudal & Gerard, 2004; Garnier, 2004). Entre outras, os di-
carboxílicos (oxalatos), os ceto-carboxílicos (oxalacetatos), os hidroxi-carboxílicos
alifáticos (citratos), os hidroxi-carboxílicos aromáticos (salicilatos), os aldeídicos,
os aminoácidos e EDTA são as principais substâncias encontradas nos ambientes
aquáticos.

Tabela 5.2 – Grupos funcionais, valência de Pauling, carga sobre o oxigênio e carga
residual

Valência Carga Carga residual


Metal Grupo funcional Pauling sobre o O
-O -OH -OH2
Si-O 1,0 -1 0 +1
Si 4/4 = 1,0
Si2-O 2,0 0 +1 +2

Mn-O et Ti-O 0,66 -1,33 - 0,33 + 0,66


Mn e Ti Mn2-O et Ti2-O 4/6 = 0,66 1,33 -0,66 + 0,33 + 1,33
Mn3-O et Ti3-O 2,00 0 +1 +2

Al-O et Fe-O 0,5 - 1,5 - 0,5 + 0,5


Al e Fe Al2-O et Fe2-O 3/6 = 0,5 1,0 -1 0 +1
Al3-O et Fe3-O 1,5 - 0,5 + 0,5 + 1,5

Metodologicamente, as substâncias húmicas são separadas da matriz mineral


dos sedimentos, geralmente pela elevação do pH, ou seja, pela extração em meio
alcalino. A quantidade extraída depende da constituição mineralógica do sedimento
e das características do extrator básico utilizado, pois as substâncias húmicas estão
ligadas aos colóides inorgânicos com diferentes energias ou podem estar fisicamente
protegidas dentro de microagregados, especialmente em sedimentos oriundos de
solos ricos em caulinita e óxidos de ferro (Coleman et al., 1989). Similarmente, a
separação entre ácidos húmicos e ácidos fúlvicos é normalmente feita baseada na
solubilidade em meio ácido. Na realidade, os colóides presentes nos sedimentos
formam naturalmente associações organominerais. Os diferentes constituintes se
mantêm unidos por interações de diferentes mecanismos, como as ligações de
hidrogênio, as forças de Van der Waals, as interações eletrostáticas, as pontes de
cátions e, principalmente, as ligações covalentes entre elementos químicos de dois
grupos funcionais de dois constituintes diferentes, como é o caso da interação entre
os grupos funcionais carboxílicos e fenólicos da matéria orgânica com os grupos
funcionais dos óxidos. É evidente que a determinação da reatividade individual de
cada constituinte não é a mais adequada para, através do somatório, estimar a
reatividade do sedimento ou do solo (Cruz-Guzmán et al., 2003). Esses autores, por

164 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


exemplo, demonstraram que, em pH 3,0, a associação entre um ácido húmico com a
ferrihidrita foi muito forte e bloqueou os grupos funcionais, diminuindo drasticamente
a adsorção de chumbo, enquanto que a adição de montmorilonita aumentou a
capacidade de adsorção desse mesmo metal pesado, pois não houve associação
entre esses dois colóides em pH baixo.
A reatividade dos colóides de origem orgânica, inorgânica ou sua associação
deve-se à presença de grupos funcionais. Grupos funcionais são estruturas químicas
que expõem átomos ou grupos de átomos instáveis quimicamente e, quando em
contato com a solução do solo, reagem com íons ou moléculas para diminuir suas
energias livres. Os grupos funcionais são formados durante a gênese dos argilominerais
(substituição isomórfica), pela exposição terminal dos tetraedros e octaedros e pelas
superfícies externas das substâncias húmicas. Os grupos funcionais permanentes
(cargas negativas permanentes) têm sua reatividade independente da condição
geoquímica. Os cátions presentes na água são adsorvidos com diferentes energias
de ligação. Habitualmente, os íons adsorvidos mantêm suas camadas de água de
hidratação e, por isso, formam complexos de esfera externa, mesmo com a maioria
dos metais pesados. Somente alguns cátions podem ser adsorvidos especificamente
na cavidade siloxana com alta energia (complexo de esfera interna), como é o caso
do potássio, amônio e césio (Sparks, 1995).
Os outros grupos funcionais são todos formados pela exposição superficial
dos colóides no meio aquoso. No caso dos argilominerais, os átomos das bordas
quebradas das lâminas apresentam um desequilíbrio no número de coordenação
do cátion (Si e Al) e no número de prótons ligados ao ânion coordenador (O),
gerando os dois principais tipos de grupos funcionais, o silanol e aluminol. O mesmo
princípio é aplicado aos óxidos, cujos oxigênios ligados aos cátions (Fe, Al, Mn e
Ti), expostos superficialmente, são considerados grupos funcionais. A reatividade
desses grupos funcionais depende da relação entre a valência do cátion e o número
de coordenação (Valência de Pauling), do número de metal que o oxigênio está
ligado (mono, di e tricoordenado), e do plano de exposição do grupo funcional no
mineral. Didaticamente, na Tabela 5.2 são apresentadas as valências de Pauling
e a carga residual do oxigênio dos principais grupos funcionais. Observa-se, por
exemplo, que a valência de Pauling é 1,0 para o Si, 0,66 para o Mn e Ti e 0,5 para o
Al e Fe, resultando que o oxigênio é ligado mais energeticamente ao Si do que ao Fe
e Al. Consequentemente, a energia de ligação do hidrogênio no grupo silanol é mais
fraca, facilitando a dissociação, gerando carga negativa. Contrariamente, nos outros
grupos funcionais o oxigênio é fracamente ligado ao metal, o que leva a um aumento
na energia da ligação com o hidrogênio e, por consequência, facilita o deslocamento
de todo o grupo funcional (OH ou OH2+) e sua substituição por um outro ânion, o qual
se liga diretamente ao metal da superfície do mineral. As constantes de dissociação
dos prótons são sempre inferiores para o grupo funcional silanol (Si-O) (pK1 < 2
et pK2 6-7), seguida do Mn-O (pK1 < 3-4 et pK2 7-9) e finalmente o Fe-O e Al-O
(pK1 5-7 et pK2 8-10), e isso justifica os valores do ponto de carga zero (pcz) dos
principais minerais portadores desses grupos funcionais. Assim, o pcz do quartzo
(Si-O) e da birnesita (Mn-O) é menor do que 2; o da caulinita (Si-O + Al-O) é de
aproximadamente 4,5; o da goethita (Fe-O) é mais ou menos 6,0 e o do corundum

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 165


(Al-O) é de 9,0. Além das diferentes constantes de dissociação, o oxigênio de todos
os grupos funcionais pode estar ligado a um [Fe-OH(H)]– monocoordenado, dois
[Fe2OH(H)]– bicoordenado ou três metais [Fe3O(H)]– tricoordenado. Geralmente no
pcz do mineral, os grupos funcionais monocoordenados estão protonados, e nos
tricoordenados estão deprotonados, pois os oxigênios estão mais estabilizados
quimicamente (Parfitt, 1978; Bolt et al., 1991).
Os principais grupos funcionais da matéria orgânica são os carboxílicos
(R-COOH) e fenólicos (Anel-OH), mas também existem os carbonílicos (R-C=O),
alcoólicos (R–CH2–OH), amínicos (R–NH2), amídicos (R–CO-NH2), aldeídicos (R–
COH), cetônicos (R–CO–R), ésteres (R–COO–R) e tiós (R–SH). A quantidade de
grupos funcionais carboxílicos é maior nos ácidos fúlvicos (5,2 a 11,2 mol.Kg-1) do
que nos ácidos húmicos (1,5 a 6,0 mol.Kg-1).
Nos modelos mecanísticos de adsorção de metais pelas substâncias
húmicas, a distribuição da afinidade dos grupos funcionais pelo próton e pelos
cátions pode ser assumida como sendo discreta (modelo VI e modelo CD-MUSIC)
ou contínua (modelo NICCA). No primeiro caso, os grupos funcionais carboxílicos
e fenólicos são separados em quatro tipos cada um. No segundo modelo, não há
separação dentro de cada grupo funcional, mas se faz a distribuição do logaritmo das
constantes de afinidades usando-se o valor da mediana da constante de afinidade e
a amplitude da distribuição. Mesmo modelos ditos empíricos, como os de Langmuir-
Freundlich, Freundlich generalizada e Toth, usam a distribuição contínua.

5.4.2 Interação entre elementos químicos ou moléculas em solução com


os grupos funcionais de superfície dos sedimentos

As interações que costumam ocorrer na interface partícula/solução (solução


do solo ou água) podem ser enquadradas dentro de um dos seguintes modelos:
ligações de natureza puramente eletrostática (caráter iônico) ou ligações com
compartilhamento de elétrons (caráter covalente); ou, ainda, mais frequentemente,
situarem-se em posição intermediária entre esses extremos. Embora não haja uma
fronteira clara entre a ligação iônica e a ligação covalente, é conveniente considerar
cada uma em separado antes de tentar discutir moléculas em que ambas são
importantes (Cotton et al., 1995; Atkins & De Paula, 2002; Huheey, 1978).
A ligação iônica baseia-se em um modelo eletrostático simples, o qual foi
desenvolvido para explicar o comportamento dos chamados sólidos iônicos, tais
como NaCl, MgO e Al2O3. O modelo eletrostático descreve esse tipo de sólido como
uma rede de íons positivos e negativos com a geometria necessária para maximizar
as forças atrativas (entre íons de carga oposta) e minimizar as forças repulsivas (entre
íons de mesma carga). As ligações iônicas são, em geral, fortes e unidirecionais e
os compostos iônicos tendem a ter altos pontos de fusão e de ebulição. Os sólidos
iônicos costumam ser solúveis em solventes polares com altas constantes dielétricas
(como a água) e, uma vez em solução, a energia de interação (E) entre os dois íons
com cargas q+ e q- é dada pela lei de Coulomb:

166 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos



q q (Equação 5.1)
E
4  r

Onde:
r é a distância de separação entre as partículas;
f é a constante dielétrica do solvente.

No entanto, o modelo de ligação iônica não foi capaz de explicar as ligações


existentes entre os não-metais (em moléculas como N2 ou CO2), pois os elementos
não metálicos, devido a suas elevadas energias de ionização, dificilmente perdem
seus elétrons de valência e, assim, não formam cátions monoatômicos. A natureza
das ligações entre átomos de não metais intrigou os cientistas até 1916, quando
Lewis apresentou outra abordagem, na qual o fator dominante na ligação química
era atribuído ao compartilhamento de elétrons entre dois átomos da ligação (ligação
covalente).
Os aspectos mais importantes das ligações químicas da molécula ou do íon
complexo, segundo o modelo de Lewis, são:
(a) os elétrons que participam da ligação (elétrons ligantes), permanecem
localizados entre o par de átomos (é um modelo de elétron localizado);
(b) a ligação na estrutura toda da molécula é vista como a soma das ligações
individuais entre os pares de átomos;
(c) os elétrons que não estão sendo compartilhados entre átomos estão
localizados como par de elétrons livres em um ou outro átomo dentro da
molécula.
Essa formulação da ligação covalente baseia-se em regras empíricas
simples, como os diagramas de Lewis, nos quais somente os elétrons de valência do
átomo são descritos e a regra do octeto, em que a molécula busca a configuração
eletrônica de um gás nobre, acomodando um máximo de oito elétrons na camada de
valência. Para elementos que dispõem de orbitais d, a camada de valência pode ser
expandida além do octeto. Esses elementos aparecem a partir do terceiro período da
tabela periódica e são geralmente não-metais em seus compostos de maior valência
ou metais de transição em complexos.
Posteriormente, para levar em conta aspectos da geometria das ligações, foi
incorporada ao modelo da ligação covalente localizada de Lewis a teoria da hibridização
e a teoria da repulsão dos pares de elétrons da camada de valência (VSEPR, em
inglês). A hibridização permite a “construção” de novos orbitais nos átomos, de modo
que a ligação na molécula fica consistente com o que se conhece de sua geometria.
A teoria VSEPR leva em conta o fato de que a geometria das ligações em um átomo
na molécula ou íon poliatômico é ditada pela necessidade de cada par de elétrons
situar-se à maior distância possível dos outros pares de elétrons do mesmo átomo,
devido às forças de repulsão. Regiões de alta concentração de elétrons tomam
posições que tendem a maximizar suas separações. Pares de elétrons livres causam
repulsão mais forte do que pares ligados e, assim, tendem a comprimir os ângulos de
ligação. Por exemplo, no íon sulfito (SO32-) há quatro regiões de alta concentração de
elétrons: uma correspondente ao par de elétrons livres do átomo central de enxofre,

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 167


e as outras três a cada um dos três átomos de oxigênio que também possuem pares
de elétrons livres. O maior afastamento possível entre essas quatro regiões ocorre
se elas estiverem dispostas nos vértices de um arranjo tetraédrico, com o átomo de
enxofre no centro. Assim, a estrutura do íon sulfito não é tetraédrica, mas sim trigonal
bipiramidal, pois três dos vértices do tetraedro são ocupados pelos átomos de oxigênio
e um deles é ocupado pelo par de elétrons livres (que não são considerados quando
se nomeia a estrutura do íon). Pelo arranjo tetraédrico, espera-se que os ângulos
de ligação O-S-O sejam de 109,5°. Experimentalmente, sabe-se que, embora o íon
sulfito seja de fato trigonal bipiramidal, o ângulo da ligação O-S-O é menor do que
o esperado (106°). Resultados semelhantes foram observados em outras moléculas
que envolvem um par de elétrons livres, o que levou a uma modificação do modelo
VSEPR: os pares de elétrons livres teriam maior poder de repulsão do que os pares
de elétrons ligados. Ainda assim, o modelo VSEPR não permite calcular o valor exato
do ângulo de ligação, embora possa prever que será menor do que 109,5°.
Essas três abordagens teóricas conjugadas (diagrama de Lewis, hibridização
e teoria VSEPR) são ferramentas poderosas na interpretação da estrutura e das
ligações químicas das moléculas.
O modelo da ligação covalente localizada é conveniente para descrever
íons como Cu2+ou Al3+ na solução do solo, que se apresentam como íons complexos
(aqua íons), frequentemente com geometria octaédrica (com seis moléculas de água
ligadas ao átomo central, simetricamente dispostas). Cada molécula de água (ligante
monodentado) atua como doadora de um par de elétrons para o átomo central do
metal, formando uma ligação covalente coordenada (em que ambos os elétrons
são oriundos de apenas um dos átomos, o qual atua como uma base de Lewis). O
átomo metálico central atua como um aceptor de elétrons, isto é, como um ácido de
Lewis. Os ligantes que contêm dois ou mais átomos, cada um dos quais podendo
simultaneamente formar uma ligação com o átomo central e doar-lhe dois elétrons,
são chamados bidentados ou tridentados e etc, ou ainda genericamente quelatos
(que significa garra, em grego).
No entanto, a idéia de que os elétrons sempre permanecem localizados
entre os pares de átomos tem importantes limitações. No caso do íon nitrato (NO3-),
por exemplo, seria possível arranjar os elétrons em torno do núcleo de três modos
diferentes: o átomo de nitrogênio está ligado a três átomos de oxigênio, sendo uma
dessas ligações dupla e duas simples. A ligação dupla pode estar em qualquer um
dos três oxigênios, e os três diagramas de Lewis são corretos e igualmente válidos.
Para resolver esse problema, introduziu-se a idéia da ressonância, que reconhece
que as três estruturas são igualmente prováveis, de modo o íon é representado
melhor quando considerarmos os elétrons deslocalizados em uma estrutura que é
intermediária entre essas três descritas (não havendo uma alternância entre elas).
É provável que cada ligação heteronuclear (entre átomos diferentes)
apresente uma mistura de caráter covalente e caráter iônico. Em geral, falamos
de compostos iônicos ou compostos covalentes quando o composto em questão
é predominantemente um ou outro. No entanto, em muitos casos, é conveniente
trabalhar com uma situação intermediária.
Existem ainda forças atrativas e repulsivas entre as moléculas que não são

168 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


nem iônicas nem covalentes. Coletivamente, essas forças atrativas e repulsivas
são conhecidas como forças de Van der Waals. A aproximação das moléculas
que se encontram no estado líquido ou sólido está limitada pelas forças repulsivas
eletrostáticas que surgem quando ocorre sobreposição da parte externa das nuvens
eletrônicas em torno dos átomos. As forças atrativas também são de natureza
eletrostática e podem ocorrer entre moléculas polares (atração dipolo-dipolo) ou
entre uma molécula polar e outra apolar, cuja nuvem eletrônica é distorcida pela
proximidade com a molécula polar (atração dipolo-dipolo induzido).
Mesmo as moléculas apolares se atraem umas às outras. A evidência disso
é que os gases nobres (que são monoatômicos e, portanto, apolares) podem ser
liquefeitos (o estado líquido implica uma interação atrativa entre as moléculas).
Duas moléculas apolares podem atrair-se como resultado do surgimento de cargas
parciais instantâneas e momentos de dipolo instantâneos, gerados por flutuações
nas suas respectivas distribuições eletrônicas. Essas interações são conhecidas
como forças de London e são sempre atrativas. Elas existem em todos os tipos de
moléculas, mas, para as moléculas apolares, esta é a única força existente. Quanto
mais facilmente a nuvem eletrônica da molécula puder ser distorcida, maior será a
sua polarizabilidade. As forças de London são mais fortes entre as moléculas mais
polarizáveis. Moléculas grandes (com muitos elétrons) são mais polarizáveis do que
moléculas pequenas (com poucos elétrons).
O aumento do conhecimento da estrutura das moléculas e dos íons complexos,
através da cristalografia de raios-X e da espectroscopia, permitiu a determinação
experimental da estrutura das moléculas, dos ângulos de ligação e das distâncias
de ligação. Esses avanços experimentais e teóricos culminaram no desenvolvimento
da mecânica quântica, em que o elétron é descrito como apresentando um
comportamento dualista onda-partícula. Consequentemente, a localização do elétron
no átomo não pode ser dada em termos de uma posição exata, mas sim em termos
da probabilidade dele ser encontrado em alguma região do espaço (definida por seu
orbital).
A teoria da ligação de valência (teoria LV) foi a primeira teoria mecânico-
quântica da ligação química, e partiu da idéia dos pares de elétrons para descrever a
ligação covalente em termos de orbitais moleculares. Conceitos como emparelhamento
de spins, ligações v e r e hibridização fazem parte da linguagem que ela introduziu e
que é hoje amplamente utilizada na química. A teoria LV permitiu calcular os valores
numéricos dos ângulos e das distâncias de ligação, representando um avanço em
relação ao modelo VSEPR e a teoria de Lewis, e é especialmente usada na descrição
das propriedades e das reações dos compostos orgânicos. No entanto, ela falhou em
explicar as propriedades de algumas moléculas, como a de oxigênio (O2). O oxigênio
apresenta propriedades paramagnéticas experimentalmente comprovadas: quando
oxigênio líquido é vertido entre dois pólos magnéticos, o líquido pára e adere aos pólos
do magneto, ao invés de seguir fluindo. Porém, pela teoria de ligação de valência
(e também pela teoria de Lewis), o oxigênio não deveria apresentar magnetismo
nenhum. A razão dessa falha, como se verificou depois, é que o paramagnetismo
é uma propriedade decorrente da existência de elétrons desemparelhados (não
previstos na molécula de O2 pela teoria LV).

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 169


Com um maior desenvolvimento computacional, surgiu a teoria do orbital
molecular (teoria OM), que tem por base o modelo de elétrons deslocalizados sobre
toda a molécula, e não mais confinados às ligações individuais, contrastando com a
teoria de ligação de valência (e a teoria de Lewis) de elétrons de ligação, localizados
entre os dois átomos ligantes. A teoria OM foi bem desenvolvida e proporciona os
conceitos amplamente usados nas discussões modernas sobre as ligações químicas.
Para se ter uma idéia de como são construídos os orbitais moleculares,
consideremos a molécula mais simples possível, o H2. Pela teoria OM, quando os
orbitais atômicos pertencentes à camada de valência dos dois átomos de hidrogênio
se aproximam e se sobrepõem parcialmente, formam-se orbitais moleculares. Os
orbitais atômicos podem ser interpretados como ondas, centradas em diferentes
núcleos, que podem interferir construtiva ou destrutivamente. A interferência
construtiva entre os dois orbitais atômicos }1 e }2 origina um orbital molecular para
a molécula de H2, que é dado por } = }1 + }2. O orbital molecular } é denominado
uma combinação linear de orbitais atômicos (em inglês, LCAO). O orbital molecular
LCAO obtido tem uma energia menor do que a de qualquer dos dois orbitais atômicos
usados em sua construção. O elétron que ocupa esse OM é atraído por ambos os
núcleos e terá, portanto, uma energia menor do que quando está confinado ao orbital
atômico de um dos átomos. Em outras palavras, há uma maior probabilidade de se
encontrar o elétron em locais em que ele pode interagir com ambos os núcleos (isto
é, na região de sobreposição construtiva dos dois orbitais atômicos). A combinação
de orbitais atômicos que resulta em um abaixamento da energia é chamada orbital
ligante.
O número de orbitais moleculares formados deve ser igual ao número de
orbitais atômicos que foram sobrepostos para formá-los. Assim, quando sobrepomos
dois orbitais atômicos no hidrogênio molecular, formam-se dois orbitais moleculares.
No caso de uma sobreposição destrutiva das ondas dos dois orbitais atômicos }1
e }2, origina-se um orbital molecular para a molécula de H2, dado por } = }1 - }2.
Nesse caso, a probabilidade de encontrar o elétron na região entre os dois núcleos
fica reduzida, provocando um aumento da repulsão entre os dois núcleos e um
consequente aumento da energia do orbital molecular formado. Na região em que
os orbitais atômicos se cancelam completamente, surge uma superfície nodal. Na
molécula de H2, a superfície nodal é um plano que se situa na metade da distância
entre os dois núcleos e representa uma região de onde o elétron está excluído. Como
o elétron está excluído justamente da região onde haveria possibilidade de uma maior
interação com os dois núcleos, a energia da combinação linear de orbitais atômicos
no caso da interferência destrutiva é maior do que a dos orbitais atômicos individuais.
A combinação linear de orbitais atômicos que resulta num aumento da energia é
chamada orbital antiligante.
Na teoria OM, define-se a ordem de ligação (OL) como sendo o número
líquido de ligações permitidas, dado por: OL = (N - N*) / 2, onde N é o número
de elétrons em orbitais moleculares ligantes e N* o número de elétrons em orbitais
moleculares antiligantes. A teoria OM explicou com sucesso o paramagnetismo da
molécula de oxigênio, as propriedades elétricas dos metais e dos semicondutores e
a razão para a inexistência da molécula de He2.

170 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


Depois das ligações iônicas e covalentes, as ligações de hidrogênio são as
mais comuns e mais fortes são as interações entre átomos. A ligação de hidrogênio
ocorre quando o átomo de H se liga a outro átomo X (principalmente F, O, N ou Cl),
de modo que a ligação X-H é muito polar e o átomo de H, por carregar uma carga
parcial positiva, interage com outro átomo rico em elétrons. A ligação de hidrogênio
pode ser definida como uma interação secundária entre um par de elétrons livres
de um átomo Y e um átomo de hidrogênio ligado a um resíduo X eletronegativo
(X__ H ....:Y). O átomo de hidrogênio nesse caso tem um caráter eletropositivo e
atua como um ácido de Lewis (aceptor de elétrons) enquanto que o átomo Y atua
como uma base de Lewis (doador de elétrons). Geralmente, considera-se que as
ligações de hidrogênio são devidas à atrações eletrostáticas entre os átomos de H e
Y. A ligação X__ H se torna um pouco mais longa, mas permanece essencialmente
como uma ligação normal de dois elétrons. A distância H ....:Y é geralmente muito
maior do que a distância normal covalente H__ Y. Porém, quando as ligações de
hidrogênio são muito fortes, a distância X ....:Y encurta e as distâncias X__ H e H
....Y se tornam quase iguais. Nesses casos, admite-se que existem componentes
tanto covalentes quanto eletrostáticos em ambas as ligações X__ H e H ....Y. A
ligação de H é direcional, o que significa que, na maioria dos sistemas, os ângulos
da ligação X__ H ....:Y situam-se entre 160 e 180°.
De um modo simplificado, os complexos de superfície (reação dos íons e
moléculas com os grupos funcionais) pelos colóides adsorvidos nos sedimentos
podem ser agrupados em complexos de esfera externa e complexos de esfera interna
(Bolt et al., 1991; Sposito, 1994; Sparks, 1995).
A reatividade da interface mineral-água é frequentemente interpretada com a
ajuda de modelos usados em eletroquímica, na química de coordenação em solução
e em cristalografia. A dissolução pode ser explicada em termos de um processo de
troca de ligantes. Estudos da estrutura molecular na interface mineral-água, através
de técnicas avançadas como a espectroscopia de absorção de raios-X, especialmente
EXAFS (Extended X-ray Absorption Fine Structure Spectroscopy), permitem fazer
a distinção entre complexos de esfera externa e complexos de esfera interna na
superfície das partículas. Essas informações, acopladas a estudos de química de
soluções sobre os processos de adsorção, podem trazer novas informações sobre os
mecanismos das reações de dissolução e os fatores que as aceleram ou as inibem.
Nos complexos de espera externa, há uma interposição de moléculas de
água entre o íon ou molécula e o grupo funcional do colóide. Neles não envolve o
compartilhamento de elétrons, o que diminui a energia de retenção. Ela pode ser
considerada uma simples interação eletrostática (dipolo-dipolo ou dipolo-íon) devido
à presença de um campo elétrico na superfície dos colóides e nos residuais de
cargas dos íons ou moléculas presentes na água, caracterizando um processo de
fisiossorção (adsorção física). Os cátions como o Na+, K+, NH4+, Ca+2 e Mg+2 e ânions,
como o NO3- e Cl-, são, geralmente, adsorvidos fisicamente pelas cargas negativas
e positivas, respectivamente. Também, metais pesados como o Zn+2 e Cd+2 são, na
maioria das vezes, adsorvidos mantendo suas camadas de água de hidratação e, por
isso, podem ser considerados como trocáveis. Desse modo, o processo é reversível,
e estes cátions podem ser facilmente trocados por outros íons e seguem equações de

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 171


troca aproximadamente estequiométricas. A valência do íon, o grau de hidratação, a
concentração e a seletividade dos grupos funcionais afetam a fisiossorção (adsorção
não-específica).
Nos complexos de esfera interna, não há interposição de moléculas de água,
implicando na aproximação máxima do adsorvato à superfície do colóide (camada
de Stern). A atração eletrostática é maximizada e a ligação deve apresentar um
significativo caráter covalente, sendo considerada uma adsorção específica ou
quimissorção. Quanto maior for o número de ligações formadas com um mesmo íon
ou molécula, maior é a energia da interação colóide-adsorvato. Consequentemente,
os íons não são considerados trocáveis e é comum para os metais pesados, sobretudo
o cobre e o chumbo, e para o fosfato (Parfitt, 1978; Rheinheimer, 2000).
Um exemplo interessante diz respeito aos hidróxidos de Fe3+, como a goethita
(a-FeOOH), cujas velocidades de dissolução são fortemente dependentes das
ligações coordenadas que existem em sua superfície, especialmente como resultado
da reação do grupo funcional –FeOH com prótons, hidroxilas, íons metálicos e
determinados ligantes. Há vários estudos de laboratório mostrando que complexos
binucleares de superfície com cátions multivalentes e com oxiânions (como o fosfato)
atuam como inibidores para a dissolução dos hidróxidos de Fe3+, em determinadas
condições de pH. Uma explicação para isso é a formação de complexos de superfície
de esfera interna bi ou multinucleares (que se liga a dois ou mais centros metálicos
na rede cristalina da superfície). Esse tipo de complexo estabilizaria a superfície, já
que é necessário muito mais energia para remover simultaneamente dois centros de
átomos da rede cristalina do que para remover apenas um (Stumm, 1997).
A quimissorção de cátions pode envolver a liberação de prótons, e a de ânions,
hidroxilas. A estabilidade do complexo de esfera interna depende do tipo de grupo
funcional, das características dos íons ou moléculas e das condições geoquímicas.

5.4.3 Modelos químicos para a distribuição dos poluentes na água e nos


sedimentos

A partição dos poluentes entre a fase aquosa e a superfície dos colóides


é uma tarefa difícil. Há vários modelos matemáticos que tentam explicar e prever
a distribuição dos poluentes. A maioria deles considera que os íons ou moléculas
presentes na água são atraídos pelo residual de cargas dos grupos funcionais ou pela
sua característica hidrofóbica. Eles concentram-se nas proximidades dos colóides,
criando um gradiente de concentração em relação àqueles que permanecem livres
na água. Os modelos podem considerar a existência de uma, duas, três ou quatro
camadas, entre a superfície do colóide até o espaço onde os íons e moléculas estão
livres na água. Adicionalmente, os modelos prevêem que os hidrogênios dos grupos
funcionais podem se dissociar em uma ou duas etapas (1-pK ou 2-pK) (Tabela 5.3).
Os modelos matemáticos mais comuns são os da capacitância constante
(MCC), da dupla camada difusa (DDL), o modelo básico de Stern (BSM), o modelo de
três planos (TPM), o modelo da tripla camada (TLP) e o modelo de quatro camadas
(VSC-VSP - Stern Variabe Surface Charge – Variable Surface Potential) (Sparks,

172 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


1995).

Tabela 5.3 – Principais modelos utilizados para a descrição da distribuição dos


poluentes na interface sólido/solução


1-pK Stern 2-pK Stern
DDL Modelo Puramente Difuso
DDL + 1 camada eletrostática Modelo Básico de Stern
DDL + 2 camadas eletrostáticas Modelo do Triplo Plano Modelo da Tripla Camada
Fonte: Ponthieu (2003)

5.4.3.1 Modelos matemáticos empíricos ao equilíbrio químico instantâneo

A expressão matemática mais simples é o coeficiente de distribuição (Kd),


que expressa a relação entre a quantidade de poluente presente na água e a retida
pelos colóides presentes nos sedimentos. O principal problema na utilização do Kd
é que o valor é constante mesmo se variando a quantidade de íons ou moléculas
presentes na água e/ou com as alterações nas condições geoquímicas do meio
aquático.
Na literatura, há vários modelos empíricos conhecidos como isotermas.
Esses modelos são simples equações que ajustam os dados experimentais de teores
de um poluente presente na fase sólida (sedimentos) e na fase aquosa. Os mais
comuns são as isotermas de Langmuir, Langmuir competitiva, Langmuir multisítio,
Freundlich, Langmuir-Freundlich, Freundlich generalizada, de Toth, de Redlich-
Petersen, de Dubinin-Raddushkevich normal e modificada, de Lineweaver-Burk e de
Leadie-Hoffstee (Altin et al., 1998; Hinz, 2001; Selim, 2002; Bradt, 2004).
A isoterma de Langmuir ajusta os dados experimentais segundo a Equação
5.2:

Qmax K L M água
M adsorvido  (Equação 5.2)
1  K L M água

com a qual é possível obter a concentração máxima do poluente adsorvido
(Qmax) e o valor de KL (semelhante ao Kd), em função da quantidade de poluente livre
na água (Mágua).
Esse modelo considera apenas adsorção física em monocamada e que há
apenas um tipo de grupo funcional, consequentemente, o valor de KL não varia com a
cobertura dos grupos funcionais e nem com as variações das condições geoquímicas.
Pode-se incluir a competitividade entre dois íons no mesmo modelo, já que, em tese,
eles são trocáveis. Também há possibilidade de estender-se a equação de Langmuir
para vários grupos funcionais (multisítios). Os grupos funcionais são distribuídos de
forma discreta, cada um apresentando uma afinidade própria pelo próton e pelo íon

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 173


em estudo. Assim, os dados experimentais passam a ser ajustados pela Equação
5.3:

z Qi max KiL M água


M iadsorvido  
j 1 1  KiL M água (Equação 5.3)

Onde a quantidade do íon adsorvido depende do teor livre na água e das constantes
de afinidades desse íon com cada grupo funcional.
A isoterma de Freundlich ajusta-se aos dados experimentais pela Equação
5.4:

M adsorvido  K F M água
n
(Equação 5.4)

Onde:
KF varia conforme aumenta a quantidade de poluente dissolvido na água,
cuja atenuação do KF é dado pela constante n, geralmente menor do que a unidade.
Esse modelo considera a adsorção física e química. Similarmente ao modelo
anterior, é possível de considerar-se a competitividade entre os íons pelo mesmo
grupo funcional. Mesmo assim, o modelo de Freundlich não pode ser utilizado para
prever variações nos constituintes coloidais e nem nas condições geoquímicas. Para
tal, pode-se linearizar o modelo (logaritmo) e incluir outros parâmetros físico-químicos
dos sedimentos e da água na equação (equação linear múltipla), como o teor de
matéria orgânica dos sedimentos, a quantidade de carbono orgânico dissolvido na
água, os teores de argila e de óxidos, a capacidade de troca de cátions e a atividade
do próton.
Para metais pesados, a variação do teor dissolvido na água (solução do solo
quando se trabalha com solo) é bem ajustada pelo teor total do metal nos colóides
e o teor de matéria orgânica e pH. O aumento no coeficiente de determinação pela
adição de um novo parâmetro é difícil, salvo em solos e sedimentos que contenham
altos teores de óxidos e argilas e baixos teores de matéria orgânica. Nesse sentido,
Schröder et al. (2005), ao compararem esse procedimento estatístico com modelos
mecanísticos geoquímicos para a relação metais pesados e arsênio da solução /
adsorvido em 194 amostras de solos alagados, e que recebem sedimentos dos rios
Rhine e Meuse na Holanda, constataram que, através da utilização de equações
lineares múltiplas, foi possível predizer com alta precisão as variações na quantidade
de íons na solução a partir de atributos do solo-sedimento. No caso do cobre, por
exemplo, a expressão foi:

log Cusolução = -3,692 + 0,414 log Cutotal + 0,374 log COS + 0,108 pH + 0,404 log COD – 0,368 log Fetotal
(Equação 5.5)

Se for considerado que a afinidade do próton e dos íons pelos grupos


funcionais varia de forma contínua, os dados experimentais podem ser ajustados por
modelos um pouco mais complexos, como o de Langmuir-Freundlich:

174 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


[ t M adsorvido

K M 
LF água

] (Equação 5.6)
1  K M 

LF água

de Freundlich Generalizado:

K M 
[ t M adsorvido   F água  ] (Equação 5.7)
1 M 
 água 

e de Toth (Equação 5.8):


KT M água
[ t M adsorvido 
1  K M  
T água
 1/ 
] (Equação 5.8)

Onde:
zt é a isoterma total.
Nos três modelos, é suficiente introduzir o parâmetro b (índice de
heterogeneidade), que varia de 0 a 1. Quando ele é igual a 1, não há heterogeneidade
e a isoterma retorna ao modelo de Langmuir normal.
Independentemente do modelo utilizado, os dados experimentais são bem
ajustados matematicamente. No entanto, o problema que se põe é a dificuldade
de extrapolação dos valores das constantes obtidas pelos modelos para condições
geoquímicas diferentes e para previsão de como o sistema evoluirá no futuro.

5.4.3.2 Modelos matemáticos mecanísticos ao equilíbrio químico instantâneo

Um modelo mecanístico de adsorção deve levar em consideração a reação


do íon ou molécula dissolvido na água com os grupos funcionais dos sedimentos para
formar um complexo de superfície. O modelo deve considerar a atração eletrostática
(complexo de esfera externa), a formação de orbitais moleculares (complexo de esfera
interna), as diferentes fases reativas dos colóides e a competição entre os íons ou
moléculas. Ainda, outros processos físico-químicos, como as ligações de hidrogênio,
as forças de Van der Waals, a precipitação e a oxi-redução devem ser considerados
no modelo. Assim, há várias possibilidades de desenvolver um modelo mecanístico
em função da diversidade de proposições existentes quanto a descrição da natureza
dos grupos funcionais, das cargas superficiais, do número e posição das camadas
em torno do colóide e a posição dos íons adsorvidos. Até o momento, para se utilizar
um modelo mecanístico, deve-se separar, identificar e quantificar individualmente os
diferentes tipos de colóides presentes no solo ou no sedimento. Após a purificação,
os parâmetros exigidos pelos modelos são determinados ou estimados por meio de
equações empíricas. Após, para cada tipo de colóide ou grupo de colóides, há um
modelo específico (Weber et al., 1991).
Para os colóides orgânicos, há dois modelos. O primeiro deles é denominado
de Non-Ideal Competitive Adsorption (NICA-Donnan) ou Non-Ideal Competitive

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 175


Thermodynamically Consistent Adsorption (NICA-Donnan) (Kinniburgh et al., 1999;
Milne et al., 2003). Os autores proponentes desse modelo combinam as isotermas
locais com uma distribuição perfeitamente contínua (equações de Henderson-
Hasselbalch) com a modelização das cargas e o potencial elétrico gerado pela matéria
orgânica. As substâncias húmicas são consideradas estruturas tridimensionais
semelhantes a um gel polieletrólico eletricamente neutro, onde os íons podem entrar
e sair do gel. Devido à complexidade do desenvolvimento do modelo, sugere-se
que maiores informações podem ser obtidas em Rheinheimer et al. (2006a). Para
utilização desse modelo são necessários vários parâmetros, como o teor de ácidos
húmicos e ácidos fúlvicos, a curva de titulação de prótons, a quantidade de sítios
carboxílicos e fenólicos em cada um dos dois tipos de ácidos, a titulação com o íon
em estudo para cada um dos dois tipos de ácidos e em diferentes valores de pH e, os
atributos da solução do solo ou da água (pH, COS, cátions e ânions, Eh, entre outros)
necessários à especiação química em solução. Após, deve-se ajustar e/ou estimar
matematicamente vários outros parâmetros. Por exemplo, para a caracterização da
adsorção do próton nos grupos funcionais carboxílicos e fenólicos são necessários
oito parâmetros: duas densidades de grupos funcionais, duas constantes médias
de afinidade pelos grupos funcionais; dois valores da amplitude de variação das
afinidades e dois valores da não idealidade do próton. Para o primeiro íon (metal),
são necessários mais seis parâmetros, duas constantes médias de afinidade do metal
pelos grupos funcionais, dois valores da amplitude da distribuição dos valores das
constantes de afinidades e dois valores do parâmetro de não idealidade na adsorção
do metal. Isso evidencia a preferência dos pesquisadores das áreas agronômicas
e ambientais pelos modelos empíricos em detrimento aos modelos baseados em
princípios químicos e físicos.
Similarmente, o segundo modelo “Model Humic Ion-Binding – Model VI”
(Tipping, 1998) considera:
(a) a distribuição discreta das afinidades;
(b) que os metais podem formar complexos bi e tridentados com as
substâncias orgânicas;
(c) os efeitos eletrostáticos;
(d) que a competição entre o próton e o metal necessita de vários parâmetros
e é ainda pouco utilizado em estudos agronômicos e ambientais.
As substâncias orgânicas são consideradas esferas rígidas e de tamanho
definido, onde os íons são adsorvidos superficialmente. Há oito tipos de grupos
funcionais, quatro carboxílicos e quatro fenólicos, ignorando-se a presença de outros
tipos de grupos funcionais, inclusive com alta afinidade pelos metais pesados (Croué
et al., 2003).
A adsorção de íons (cátions e ânions) pelos óxidos pode ser feita pelo modelo
mecanístico desenvolvido por Hiemstra e co-autores (Hiemstra & van Riemsdijk, 1996):
CD-MUSIC (Charge Distribution – Multi Sites Complexation). O modelo é baseado na
atração eletrostática dos íons pelas cargas superficiais (complexo de esfera externa)
e pela troca de ligantes (complexo de esfera interna). O modelo CD-MUSIC considera
os íons como pontos de carga, a distribuição das afinidades é discreta, cada face
do mineral tem diferentes tipos e densidades de grupos funcionais (mono, bi e tri

176 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


coordenados) e cada um tem uma afinidade pelo próton e pelo íon. A dissociação dos
grupos funcionais pode ser feita em uma (1-pK) ou duas (2-pK) etapas, podendo ser
considerado como modelo de três planos ou modelo de três camadas (Tabela 5.3).
Há uma camada de adsorção específica e duas de adsorção eletrostática, indicando
que a camada de Stern é separada por um plano eletrostático. Esse modelo estima
a valência do oxigênio de cada grupo funcional levando em consideração a distância
característica da ligação oxigênio – metal, e não apenas a valência de Pauling. Para
a utilização do CD-MUSIC é preciso conhecer as características do óxido (área
superficial específica, densidade de cada tipo de grupo funcional, a constante de
afinidade pelo próton, entre outras), as constantes de afinidades de cada íon por
cada um dos grupos funcionais, os valores das capacitâncias dos três planos e as
condições geoquímicas do meio. Isso dificulta a sua utilização, a não ser que se
usem os parâmetros já disponíveis na literatura (Hiemstra & van Riemsdijk, 1996;
Venema et al., 1998; Ponthieu, 2003).
Além das dificuldades de obtenção dos parâmetros exigidos pelos modelos
mecanísticos, deve-se considerar as limitações de integração dos diferentes modelos
para prever o comportamento do íon no solo ou sedimento como um todo, uma vez
que os constituintes coloidais estão sempre unidos em associações organominerais.
O simples somatório das capacidades individuais de adsorção de íons ou moléculas,
como estimado pelos modelos específicos para cada tipo de colóide, geralmente
superestima a capacidade de adsorção do sedimento, pois o número de grupos
funcionais disponíveis à adsorção é diminuído. Muitos autores utilizam artifícios para
corrigir esse problema, como é o caso de considerar diferentes frações ativas da
matéria orgânica (Croué et al., 2003), diferentes proporções entre ácidos húmicos
e fúlvicos, diferentes relações entre os teores de ferro e manganês extraídos e a
quantidade destes elementos que se encontra na forma de óxidos (Cancès et al.,
2003), diferentes valores de capacidade de troca de cátions para os minerais de
argila (Weng et al., 2001) e até mesmo diferentes valores para as constantes de
adsorção (Milne et al., 2003).

5.4.3.3 Modelos matemáticos cinéticos

Contrariamente aos modelos em equilíbrio químico instantâneo, os modelos


de não equilíbrio têm limitações cinéticas (modelo químico) ou difusivas (modelo físico).
Os modelos empregam análises estatísticas para ajustar os dados experimentais,
mas são baseados em hipóteses físico-químicas. Quando o movimento da água em
relação ao do sedimento ou o consumo do poluente pelos organismos aquáticos for
maior do que a velocidade da sua reposição, então o processo cinético de dessorção/
adsorção controlará a composição da água. Mesmo que não haja limitações cinéticas
de dessorção química, poderá haver limitações físicas de migração do poluente da
superfície ou do interior do colóide à água. Nos modelos de não equilíbrio físico, a
água é dividida em móvel (zona convectiva) e água imóvel (zona estagnada) contida
no interior de agregados dos sedimentos. A troca de poluentes entre a água imóvel
e móvel é limitada por processos difusivos e pode ser expressa por uma equação de

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 177


transferência de primeira ordem, como:


im Cim Cm Cim 
t (Equação 5.9)

Onde:
iim é o conteúdo de água na fase móvel;
Cim e Cm são a concentração de poluentes nas fases imóvel e móvel,
respectivamente; e,
~ é o coeficiente de transferência de massa.
Esse modelo é bastante utilizado em estudos de migração de poluentes em
solos e deve ter aplicação restrita no estudo da dinâmica de poluentes em sedimentos.
Os modelos de cinética química consideram que os poluentes estão adsorvidos
aos grupos funcionais em complexos de esfera interna e, então, os processos de
adsorção e dessorção são dependentes de temperatura e tempo. Existem vários
procedimentos analíticos para descrever as reações de cinética química em solos
(Weber et al., 1991; Selim, 2002), como, por exemplo:

M adsorvido 
  M água  M adsorvido (primeira ordem) (Equação 5.10)
t 
M adsorvido 
  M água  M adsorvido (n ordem)
n

t  (Equação 5.11)

M adsorvido 
  M águaQmax  M adsorvido  M adsorvido (Langmuir cinética)
t  (Equação 5.12)

M adsorvido 
  M água M adsorvido (Poder) (Equação 5.13)
n m

t 

M adsorvido
 BG (Elovich) (Equação 5.14)
 Ae
t

Onde:
a and m representam as taxas de formação e degradação, respectivamente;
n é o expoente cinético; e,
m, A, B e G são parâmetros de ajuste.

Recentemente, Fangueiro et al. (2005) propuseram um modelo baseado


numa dupla reação de primeira ordem para ajustar os dados de extração cinética
de íons do solo e de sedimentos. Esse modelo baseia-se na hipótese da distribuição
discreta dos grupos funcionais do sedimento:

 
Q  Q1 1  et  Q2 1  et   (Equação 5.15)

178 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


Onde:
Q é a quantidade de íon dessorvido no tempo t;
Q1 é a fração do íon rapidamente dessorvido, associada a taxa cinética
constante l;
Q2 é a fração do íon dessorvido lentamente, associada a taxa cinética
constante a.

A fração do íon não dessorvida (Q3) é obtida pela diferença entre a quantidade
total do íon no sedimento (QT) e o valor de Q. Fangueiro et al. (2005) concluíram que
esse modelo foi uma ferramenta adequada para estudar a mobilidade de metais
pesados em sedimentos. Rheinheimer et al. (2006b) obtiveram sucesso com esse
modelo no estudo da dinâmica de metais pesados (Zn e Pb) em solos contaminados,
relacionando a fração Q1 com a transferência desses elementos ao lençol freático.

5.4 | REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ABREU, C. A.; ABREU, M. F.; BERTON, R. S. 2002. Análise Química de Solo para Metais
Pesados. In: ALVAREZ, V. V. H.; SCHAEFER, C. E. G. R.; BARROS, N. F.; MELLO,
J. W. V.; COSTA, L. M. (eds). Tópicos Especiais em Ciência do Solo, SBCS, Viçosa,
v.II, pp.645-692.

ABREU Jr., C. H. A.; BOARETTO, A. E.; MURAOKA, T.; KIEHL, J. C. 2005. Uso agrícola de
resíduos orgânicos potencialmente poluentes. In: VIDAL-TORRADO, P.; ALLEONI,
L. R. F.; COOPER, M.; SILVA, A. P.; CARDOSO, E. J. (eds). Tópicos Especiais em
Ciência do Solo, SBCS, Viçosa, v.IV, pp.391-470.

ACCIOLY, A. M. A.; SIQUEIRA, J. O. 2000. Contaminação Química e Biorremediação Solo. In:


NOVAIS, R.F.; ALVAREZ, V. V. H.; SCHAEFER, C. E. G. R. (eds) Tópicos Especiais
em Ciência do Solo, SBCS, Viçosa, v.1, pp.299-352.

ALABURDA, J.; NISHIHARA, L. 1998. Presença de compostos de nitrogênio em águas de


poços. Revista Saúde Pública, v.32, n.2, pp.160-165.

ALLEONI, L. R. F.; BORBA, R. P.; CAMARGO, O. A. 2005. Metais Pesados: da Cosmogênese


aos Solos Brasileiros. In: TORRADO, P. V.; ALLEONI, L. R. F.; COOPER, M.: SILVA,
A. P. ; CARDOSO, E.J. 2005. Tópicos Especiais em Ciência do Solo, SBCS, Viçosa,
v.IV, pp.1-42.

ALTIN, O.; OZBELGE, H. O.; DOGU, T. 1998. Use of general purpose adsorption isotherms
for heavy metal – clay mineral interactions. Journal of Colloid and Interface Science,
v.198, pp.130-140.

ATKINS, P.; DE PAULA, J. 2002. Físico-Quimica. Vol.2, 7a Edição, LTC, Rio de Janeiro.
593p.

AZEVEDO A. C.; DALMOLIN, R. S. D.; PEDRON, F. A. (editores). 2004. Solos & Ambiente: I
Forum. Santa Maria, Ed. Pallotti. 167p.

BASSO, C. J. 2003. Perdas de Nitrogênio e Fósforo com Aplicação no Solo de Dejetos


Líquidos de Suínos. Santa Maria, Tese (Doutorado em Agronomia), Universidade
Federal de Santa Maria, 125p.

BERWANGER, A. L. 2006. Alterações e Transferência de Fósforo do Solo para o Meio Aquático


com o Uso de Dejeto Líquido de Suínos. Santa Maria, Dissertação (Mestrado em

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 179


Ciência do Solo), Universidade Federal de Santa Maria, 101p.

BOLT, G. H.; BOODT, M. F.; HAYES, M. H. B.; MCBRIDE, M. B. 1991. Interaction at the soil
colloid – soil solution interface. Kluwer Academic Publisher, Dordrech. 602p.

BRADL, H. B. 2004. Adsorption of heavy metal ions on soils and soils constituents. Journal of
Colloid and Interface Science, v.277, pp.1-18.

COMPANHIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO


PAULO. CETESB. 2005. Valores orientadores para solos e águas subterrâneas
no Estado de São Paulo. www.cetesb.sp.gov.br/solo/solo-geral.asp (acessado em
31/08/2006).

CANCÈS, B; PONTHIEU, M.; CASTREC-ROUELLE, M.; AUBRY, E.; BENEDETTI, M. F.


2003. Metal ions speciation in a soil and its solution: experimental data and model
results. Geoderma, v.113, pp.41-355.

COLEMAN, D. C.; OADES, J. M.; UEHARA, G. 1989. Dynamics of soil organic matter in
tropical ecosystems. Univ. of Hawaii. Capítulos I (p.5-31) e III (pp.69-95).

COTTON, F. A.; WILKINSON, G.; GAUS, P. L. 1995. Basic Inorganic Chemistry. John Wiley
& Son, New York. 838p.

CROUÉ, J. P.; BENEDETTI, M. F.; VIOLLEAU, D.; LEENHEER, J. A. 2003. Characterization


and copper binding of humic and nonhumic organic matter isolated from the South
Platte River: evidence for the presence of nitrogenous binding site. Environmental
Science and Technology, v.37, n.2, pp.328-336.

CRUZ-GUZMÁN, M.; CELIS, R.; HERMOSÍN, M. C.; LEONE, P.; NÈGRE, M.; CORNEJO, J.
2003. Sorption-desorption of lead (II) and mercury (II) by model associations of soil
colloids. Soil Science Society American Journal, v.67, pp.1378-1387.

DUDAL, Y.; GERARD, F. 2004. Accounting for natural organic matter in aqueous chemical
equilibrium models: a review of the theories and applications. Earth-Science
Reviews, v.66, pp.199-216.

FANGUEIRO, D.; BERMOND, A.; SANTOS, E.; CARAPUÇA, H.; DUARTE A. 2005. Kinetic
approach to heavy metal mobilization assessment in sediments: choose of kinetic
equations and models to achieve maximum information. Talanta, v.66, pp.844-857.

GARNIER, C. 2004. Modélisation et évaluation des équilibres de complexation entre la


matière organique naturelle, les métaux traces et le proton : Applications aux eaux
naturelles. Thèse de Doctorad - Université du Sud Toulon. 202p.

GONÇALVES, C. S. 2003. Qualidade de Águas Superficiais na Microbacia Hidrográfica do


Arroio Lino – Nova Boêmia – Agudo – RS. Santa Maria, Dissertação (Mestrado em
Agronomia), Universidade Federal de Santa Maria, 125p.

GIACOMINI, S. J.; AITA, C. 2006. Uso de dejetos de animais em sistemas agrícolas. In:
ALVES, B. J. R.; URQUIAGA, S.; AITA, C.; BODDEY, R. M., JANTALIA, C. P.;
CAMARGO, F. O. (Eds.) Manejo de sistemas agrícolas: impacto no seqüestro de C
e nas emissões de gases de efeito estufa. Gênesis, Porto Alegre, pp.171-215.

GUILHERME, L. R. G.; MARQUES, J. J.; PIERANGELI, M. A. P.; ZULIANI, D. Q.; CAMPOS,


M. L.; MARCHI, G. 2005. Elementos-Traço em Solos e Sistemas Aquáticos. In:
TORRADO, P. V.; ALLEONI, L. R. F.; COOPER, M.: SILVA, A. P.; CARDOSO, E. J.
Tópicos Especiais em Ciência do Solo, SBCS, Viçosa, v.IV, pp.345-390.

HIEMSTRA, T.; VAN RIEMSDIJK, W. H. 1996. A surface structural approach to ion adsorption:
the charge distribution (CD) model. Journal of Colloid and Interface Science, v.179,
pp.488-508.

HINZ, C. 2001. Description of sorption data with isotherm equations. Geoderma, v.99,
pp.225-243.

180 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


HUHEEY, J. E. 1978. Inorganic Chemistry: Principles of Structure and Reactivity. Second
Edition, Harper & Rom, New York. 889p.

KUNNIBURGH, D. G.; VAN RIEMSDIJK, W. H.; KOOPAL, L. K.; BORKOVEC, M.;


BENEDETTI, M. F.; AVENA, M. J. 1999. Ion binding to natural organic matter:
competition, heterogeneity, stoichiometry and thermodynamic consistency. Colloids
and Surfaces A: Physicochemical and Engineering Aspects, v.151, pp.147-166.

MACEDO, J. A. B. 2002. Introdução à Química Ambiental – Química & Meio Ambiente &
Sociedade. Juiz de Fora, 487p.

MACHADO, S. L. O. 2003. Sistemas de estabelecimento do arroz irrigado, consumo de


água, perda de nutrientes, persistência de herbicidas na água e efeito no jundiá.
Santa Maria, Tese (Doutorado em Agronomia), Universidade Federal de Santa
Maria, 154p.

MCBRIDE, M. B. 1994. Environmental Chemistry of Soils. New York, Oxford University Press,
406p.

MELO, W. J.; MARQUES, M. O. ; MELOV, P. 1999. Resíduos urbanos e industriais e qualidade


do ambiente. In: ENCONTRO BRASILEIRO DE SUBSTÂNCIAS HÚMICAS, 3.
Anais... Santa Maria. pp.49-64.

MILNE, C. J.; KINNIBURGH, D. G.; VAN RIEMSDIJK, W. H.; TIPPING, E. 2003. Generic
NICA-Donnan model: Parameters for metal-ion binding by humic substances.
Environmental Science and Technology, v.37, pp.958-971.

PARFITT, R. L. 1978. Anion adsorption by soil and soil materials. Advances in Agronomy,
v.30, pp.01-46.

PELLEGRINI, J. B. R. 2005. Fósforo na Água e no Sedimento na Microbacia Hidrográfica do


Arroio Lino – Nova Boêmia – Agudo – RS. Santa Maria, Dissertação (Mestrado em
Ciência do Solo), Universidade Federal de Santa Maria, 85p.

PONTHIEU, M. 2003. Spéciation des éléments traces métalliques dans le sols et les solutions
de sols : du modèle au terrain. Thèse de Doctorad – Université de Droit, d’Economie
et des Sciences d’Aix-Marseille. 251p.

REYNOLDS, C. S.; DAVIES, P. S. 2001. Sources and bioavailability of phosphorus fractions


in freshwaters: a British perspective. Biology Review, v.76, pp.27-64.

RHEINHEIMER, D. S. 2000. Dinâmica do fósforo em sistemas de manejo de solos. Porto


Alegre, Tese (Doutorado em Ciência do Solo), Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, 210p.

RHEINHEIMER, D. S.; CAMBIER, P.; LABANOWSKI, J.; ELSASS, F.; TESSIER, D. 2006a.
Heavy metals transport modelling in soil: sorption/desorption phenomena, water
fluxes and contaminant fate. Water Research.

RHEINHEIMER, D. S.; TESSIER, D.; LABANOWSKI, J.; CITEAU, L.; FERNANDEZ, C.;
LAMY, I.; VAN OORT, F.; CAMBIER, P. 2006b. Modeling the long-term transport of
Zn and Pb in contaminated soils based on present characteristics of soil horizons
and leachates with Hydrus-2D. Environmental Pollution.

RUSSEL, J. B. 1994. Química Geral. Volume 2, 2a Edição. São Paulo, Makron Books, 1268p.

SCHLTEN, H. R.; SCHNITZER, M. 1997. Chemical model structures for soil organic matter
and soils. Soil Science, v.162, pp.115-130.

SCHULZE, D. G. 1989. An introduction of soil mineralogy. In: DIXON, J. B.; WEED, S. B.


Capítulo I, pp.1-34.

SELBACH, P. A.; TEDESCO, M. J.; GIANELLO, C.; CAMARGO, F. A. O. 1999. Resíduos


urbanos e industriais e a qualidade do ambiente. In: ENCONTRO BRASILEIRO DE
SUBSTÂNCIAS HÚMICAS, 3. Anais... Santa Maria. pp.65-77.

Poluentes orgânicos e inorgânicos | Capítulo 5L 181


SELIM, H. M. 2002. Modelling the transport and retention of inorganic in soils. Advances in
Agronomy, v.47, pp.331-385.

SHARPLY, A. N. 1995. Soil phosphorus dynamics: agronomic and environmental impacts.


Ecological Engineering, v.5, pp.261-279.

SCHRÖDER, T. J.; HIEMSTRA, T.; VINK, J. P. M.; VAN DER ZEE, S. E. A. T. M. 2005. Modeling
of the solid – solution partitioning of heavy metals and arsenic in embanked flood
plain soils of the rivers Rhine and Meuse. Environmental Science & Technology,
v.39, n.18, pp.7176-7184.

SPARKS, D. L. 1995. Environmental soil chemistry. San Diego: Academic Press. 263p.

SPOSITO, G. 1994. Chemical equilibria and kinetics in soils. New York: Oxford University
Press. 268p.

STUMM, W. 1997. Reactivity at the mineral-water interface: dissolution and inhibition. Colloids
and Surfaces A: Physicochemical and Engineering Aspects, v.120, pp.143-166.

TIESSEN, H. (ed). 1995. Phosphorus in the global environment: transfers, cycles and
management. Chichester: John Wiley & Sons. 462p.

TIPPING, E. 1998. Humic Ion Binding Model VI: An improved description of the interactions of
protons and metal ions with humic substances. Aquatic Geochemistry, v.4, pp.3-48.

VENEMA, P.; HIEMSTRA, T.; WEIDLER, P. G.; VAN RIEMSDIJK, W. H. 1998. Intrinsic proton
affinity of reactive surface groups of metal (hydr)oxides: application to iron (hydr)
oxides. Journal of Colloid and Interface Science, v.198, pp.282-295.

WEBER, W. J. JR.; MCGINLEY, P. M.; KATZ, L. E. 1991. Sorption phenomena in subsurface


systems: Concepts, models and effects on contaminant fate and transport. Water
Research, v.25, n.5, pp.499-528.

WENG, L.; TEMMINGHOFF, E. J. M.; VAN RIEMSDIJK, W. H. 2001. Contribution of individual


sorbents to the control of heavy metal activity in sandy soil. Environmental Science
& Technology, v.35, n.25, pp.4436-4443.

ZSOLNAY, A. 2003. Dissolved organic matter : artefacts, definitions, and functions. Geoderma,
v.113, pp.187-209.

182 M Capítulo 5 | Poluentes orgânicos e inorgânicos


Qualidade das Amostras e
Valores de Referência
Capítulo 6

QUALIDADE DAS AMOSTRAS E VALORES DE REFERÊNCIA


Cristiano Poleto & Gilberto Rodrigues Gonçalves

6.1 | INTRODUÇÃO
Muitos estudos mostram que a maior parte das falhas detectadas durante
o desenvolvimento e análise dos dados em projetos e pesquisas são devidas a
problemas tanto da falta de um planejamento adequado quanto de um conhecimento
técnico sobre as diversas fontes de contaminação das amostras durante sua coleta,
armazenamento e manipulação nos laboratórios.
Assim, uma atenção especial deve ser dada aos riscos em se adquirir
informações que possam sofrer algum tipo de influência externa, o que limitaria ou
impossibilitaria a sua utilização.
Um outro fator, também muito importante, é o que fazer depois com esses
dados, se eles mostram ou não a contaminação de um determinado local. Outro
assunto de interesse é o fato de muitos estudos apresentarem comparações de
dados ou valores de referência (Guidelines) de determinadas regiões com as de
outros continentes. Muitos se perguntam até que ponto isso é válido, ou se não passa
de um erro ou mesmo falta de aprofundamento sobre o assunto. Em muitos casos, a
falta de valores de referência local, ou regional, faz com que sejam utilizados esses
valores como parâmetros.
Neste capítulo, procurou-se abordar esses tópicos, dando uma ênfase
principal para os estudos comparativos e procurando esclarecer alguns aspectos
importantes de como se obtém um valor de referência.

6.2 | PROTOCOLO DE CONTROLE PARA ESTUDOS DE QUALIDADE


Ao se planejar um projeto que prime por resultados confiáveis e essencialmente
necessários para estudos de qualidade de sedimentos, deve-se levar em consideração
os seguintes elementos:
a) Descrição detalhada do projeto com sua estruturação, e os responsáveis
por cada parte a ser executada ou coordenada;
b) Definição clara do objetivo principal do projeto a ser desenvolvido;
c) Detalhamento dos procedimentos adotados para a realização das coletas
e análises;

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 185


d) Previsão de metodologia a ser aplicada para a averiguação da qualidade
dos procedimentos que estão sendo realizados durante a coleta e
análises de amostras;
e) Definição dos desvios que possam ocorrer e, neste caso, sugestões de
como contornar tais problemas;
f) Cronograma preventivo visando a aplicação da manutenção de
equipamentos em geral;
g) Desenvolvimento de um plano de treinamento prévio para todos os
envolvidos no projeto, principalmente do corpo técnico, procurando
garantir a execução adequada de todos os passos anteriores.
Uma outra categoria importante de observações diz respeito à adequação
dos dados que serão obtidos e aos estudos estatísticos que serão empregados
nos resultados adquiridos durante o projeto. Discussões com profissionais da área
sempre podem trazer bons frutos, além de que, pode-se pagar um preço alto ao se
chegar ao fim de um ano ou mais de estudo e perceber que os resultados estão
incompletos ou mesmo inapropriados para se obter respostas conclusivas.
Os procedimentos básicos que um estudo como esse deve prever são:
a) Serão utilizados estudos de ecotoxicidade em organismos vivos, e qual
a melhor maneira para proceder durante essas avaliações, quais os
números e formas de observações?
b) Haverá avaliações sobre a precisão e exatidão das coletas e análises
laboratoriais das amostras? E como essas avaliações serão realizadas?
c) Qual será a frequência e o número de amostragens?
d) Qual será o número de réplicas utilizadas nas análises?

6.3 | CUIDADOS NOS PROCEDIMENTOS E CONSERVAÇÃO DAS AMOSTRAS


Ao contrário das fontes de contaminação provenientes dos reagentes utilizados
durante os procedimentos de coleta e análises, e que podem ser quantificadas, a
maior parte do risco de contaminação das amostras é durante o seu processamento
e armazenamento, aumentando ainda mais quando os frascos utilizados para a sua
conservação são reaproveitados ou reutilizados.
O grande problema é que, para se reutilizar esses frascos e vidrarias, os
mesmos deverão receber uma limpeza adequada, evitando-se contaminação futura
das amostras que serão acondicionadas neles; porém não existe um procedimento
universal para essa limpeza. Segundo Mudroch & Azcue (1995), isso ocorre
justamente porque métodos específicos de limpeza poderão ser muito eficientes
para um elemento específico, mas não o suficiente para outro.
A escolha do procedimento de limpeza e manutenção de frascos e vidrarias
envolvidos em todos os procedimentos de campo e laboratório deverá basear-se
em estudos que objetivem quais as metas a serem atingidas e quais os elementos
a serem determinados, ficando, assim, a cargo do responsável pelo programa de
amostragem, processamento e armazenamento das amostras de sedimentos.

186 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


Há exceções sobre o rigor desses procedimentos, ocorrendo casos em que
estes se tornam menos necessários. Um exemplo disso é quando os elementos a serem
analisados nas amostras de sedimentos apresentam-se em altas concentrações. Mas
deve-se ficar claro que, mesmo assim, um procedimento mínimo de limpeza deverá ser
adotado, tal como lavar o interior dos frascos com água quente e detergente apropriado,
seguido de um enxágue abundante com água deionizada e um subsequente banho
ácido, bem como um nítrico, para estudos de elementos inorgânicos, ou a limpeza com
solventes, quando os estudos estiverem direcionados para elementos inorgânicos.
Nas Tabelas 6.1 e 6.2, pode-se observar procedimentos específicos a
serem aplicados durante a limpeza de frascos destinados a estudos de elementos
inorgânicos e orgânicos.

Tabela 6.1 – Procedimentos de limpeza para frascos destinados ao armazenamento


de sedimentos para estudos de constituintes inorgânicos
1. Lavar com detergente especial (livre de P) e água quente
2. Enxaguar abundantemente com água comum
3. Lavar com detergente desengordurante especial
4. Enxaguar três vezes com água deionizada
5. Deixar em banho de ácido nítrico (6M) por 72 horas
6. Enxaguar com água bi-destilada e secar em ambiente livre de poeira
7. Guardar os frascos em sacos de polietileno
Adaptado de: Nriagu et al. (1992)

Para as análises que envolvam testes biológicos, um dos principais cuidados


a serem tomados é o de se evitar secar os frascos e vidrarias a temperatura ambiente
ou em temperaturas amenas, e sim esteriliza-los com temperaturas variando de
160ºC a 180ºC, ou se possível, coloca-los em uma autoclave.

Tabela 6.2 – Procedimentos de limpeza para frascos destinados ao armazenamento


de sedimentos para estudos de constituintes orgânicos
1. Lavar com detergente especial (livre de fósforo) e água quente
2. Enxaguar abundantemente com água comum
3. Lavar com detergente desengordurante especial
4. Enxaguar três vezes com água deionizada
5. Enxaguar duas vezes com álcool metílico ou metanol
6. Enxaguar duas vezes com diclorometano
7. Secar à 360ºC por pelo menos 6 horas
Adaptado de: Mudroch & Azcue (1995)

De uma forma geral, não se recomenda a utilização de um mesmo frasco


para diferentes tipos de análises. Esse pequeno cuidado poderá reduzir muito os
riscos de contaminação das amostras.

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 187


6.4 | AMOSTRAS EM “BRANCO” PARA CONTROLE
Em estudos que primam por altíssima qualidade dos resultados obtidos
através de análises de sedimentos, busca-se introduzir formas de se avaliar como
o processo de coleta, transporte e armazenamento pode estar interferindo nos
resultados finais. Isso porque pode ocorrer, em qualquer uma dessas fases, a
introdução de um elemento ou composto que não faz parte dessas amostras.
Portanto, é necessário assegurar um controle que seja realmente efetivo
na detecção e mensuração de elementos e compostos, que podem estar sendo
adicionados aos resultados reais. Uma das ferramentas que podem ser introduzidas
para esse controle é a amostra em branco, que é definida como uma matriz que
possui níveis insignificantes ou imensuráveis dos elementos ou parâmetros que
serão avaliados.
Assim, o principal objetivo do “branco” é detectar e quantificar materiais
estranhos que foram introduzidos nas amostras durante os procedimentos
anteriormente descritos. A sua utilização vai depender dos objetivos a serem atingidos
durante o projeto, devendo a mesma passar por um planejamento prévio que deverá
levar em consideração inclusive os custos de sua utilização.
Apesar das amostras de sedimentos geralmente não requererem o uso de
amostras em branco (Mudroch & Azcue, 1995), quando utilizados, essas deverão
receber os mesmos tratamentos e manuseios despendidos com as amostras obtidas
durante as coletas de campo. Pode-se testar a sua transferência apenas para os
frascos de armazenamento, ou mesmo realizar um verdadeiro rastreamento de
falhas aplicando-os aos equipamentos e frascos de coleta e amostragem.

6.5 | AMOSTRAS DE BACKGROUND OU DE BASE


Amostras de “background” ou amostras de base são aqueles utilizados em
estudos ambientais, onde são obtidas sob as mesmas condições locais e em áreas
geograficamente próximas à área de estudo. Assim, considera-se que os resultados
obtidos através das análises dessas amostras sejam representativos para as
concentrações dos elementos naturalmente presentes nessa região.
A realização desse tipo de controle nas áreas de estudo torna-se crítica,
não somente devido a uma grande variedade de tipos de solos, mas também
devido a uma grande heterogeneidade de matrizes de sedimentos gerados. Não
obstante, é comum áreas com diferentes formações geológicas possuírem diferentes
concentrações de metais e elementos traço.
Assim, esse tipo de amostra de base é fundamental em estudos ambientais de
sedimentos, onde a mesma é utilizada para comparações entre os níveis considerados
naturais dos elementos presentes na área de estudo e os encontrados nas amostras
de sedimentos, ela funciona, portanto, como um indicador local de poluição. Sua
utilização poderá resultar em interpretações desastrosas, caso não façam realmente
parte da bacia hidrográfica contribuinte para a geração dos sedimentos que estão

188 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


sendo coletados durante o estudo.
Assim, as amostras de base ou “background” deverão possuir características
geológicas similares as dos sedimentos em estudo, além de serem submetidas aos
mesmos procedimentos analíticos.
A escolha do local mais apropriado para a obtenção dessas amostras
poderá variar de um local para o outro, mas é de fundamental importância levar em
consideração que a área escolhida para a amostragem não tenha sofrido alterações
antrópicas diferenciadas, ou seja, que conserve as características originais. Áreas com
fragmentos naturais de florestas ou com vegetação original (Campelo et al., 2005) são
os locais mais recomendados, mas pode-se obter, ainda, amostras retiradas do fundo
de corpos d’água, como lagos, que sofreram deposição de sedimentos originários da
área de estudo. Um cuidado especial neste tipo de procedimento é não deixar que a
parte superior da amostra contida no amostrador contamine a porção inferior.

6.6 | MATERIAL DE REFERÊNCIA PADRÃO OU CERTIFICADO


Existe uma grande variedade de tipos de sedimentos devido às diferentes
composições que poderão originá-los, e isso desempenhará um papel fundamental
na distribuição dos elementos associados a eles. Porém, a falta de um padrão
comparativo fixo entre essas matrizes formadas pelos sedimentos, e as análises que
estão sendo realizadas com esses materiais, pode conduzir a conclusões errôneas.
Para fechar essa lacuna e fornecer um bom parâmetro de avaliação da
qualidade do trabalho que está sendo desenvolvido, foi inserido o conceito do Material
de Referencia Padrão (MRP), ou Material Certificado. Esses materiais são estáveis
e homogêneos, bem caracterizados quanto às concentrações totais dos elementos
que possuem, além de ter uma matriz similar ou idêntica a das amostras em estudo.
Assim, esses materiais são introduzidos durante os procedimentos de uma
determinada metodologia, para se determinar o grau de exatidão deste processo. Isso
é feito aplicando-se a mesma técnica, que está sendo utilizada com as amostras em
estudo, aos materiais de referência, já que os mesmos possuem suas concentrações
pré-determinadas. Segundo Mudroch & Azcue (1996), a aplicação de materiais de
referência pode atingir várias áreas e usos, tais como a validação de métodos,
controle de qualidade interna e externa de laboratórios, além de sua utilização para
o monitoramento e pesquisas ambientais.
Mas a implementação de materiais de referência, com uma frequência
adequada ao controle de qualidade de grandes programas de monitoramento, poderá
se tornar inviável devido aos custos extremamente altos. Portanto, segundo Hall
(1996), o ideal é que esses materiais sejam utilizados ao menos para testar novas
metodologias ou novos laboratórios, e em segundo plano, ser utilizado como uma
ferramenta no controle da qualidade das análises de rotina utilizadas nos laboratórios.
O autor salienta ainda que os MRP poderão não refletir necessariamente a exatidão
das amostras em estudo. Isso ocorre porque esses materiais são extremamente
homogeneizados, compondo apenas uma fração mais fina (geralmente <74 μm), e

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 189


quase sempre possui uma estrutura mineralógica diferente.
O número de materiais de referência padrão internacionais para sedimentos
tem crescido rapidamente, principalmente devido à necessidade do controle de
qualidade das análises que estão sendo realizadas. A Tabela 6.3 apresenta apenas
algumas organizações para a obtenção de materiais de referência padrão, e os
elementos traço para o qual estes materiais são certificados, isso porque haveria
uma lista exaustiva de centros onde esses materiais poderiam ser obtidos.

Tabela 6.3 – Materiais de Referência Padrão (MRP) Internacionais para estudos de


Sedimentos
MRP Fonte Elementos Traço Certificados
MESS-2, NRCC Ag, As, Be, Cd, Co, Cr, Cu, Li, Mo, Ni, Pb, Sb, Se, Sn, Sr, V, Zn
marinho
BEST-1, NRCC As, Cd, Co, Cr, Cu, Hg, Mo, Ni, Pb, Sb, Se, Sn, Sr, V, Zn
marinho
LKSD 1-4 Ag, As, Au, B, Ba, Be, Br, Ce, Co, Cr, Cs, Cu, Dy, Eu, F, Hf, La, Li,
series, lacustre CCRMP Lu, Nb, Nd, Ni, Pb, Rb, Sb, Sc, Sm, Sn, Tb, Th, U, V, Y, Yb, Zn, Zr
STSD 1-4 Ag, As, Au, B, Ba, Be, Br, Ce, Co, Cr, Cs, Cu, Dy, Eu, F, Hf, La,
series, canais CCRMP Li, Lu, Nb, Ni, Pb, Rb, Sb, Sc, Sm, Sn, Tb, Th, U, V, Y, Yb, Zn, Zr
B, Ba, Be, Cd, Ce, Co, Cr, Cs, Cu, Dy, Eu, F, Ga, Gd,
MAG-1, USGS Hf, Ho, La, Li, Lu, Nd, Ni, Pb, Rb, Sb, Sc, Se, Sm,
marinho Sr, Tb, Th, Tm, U, V, Y, Yb, Zn, Zr
SL-1, As, Ba, Br, Cd, Ce, Co, Cr, Cs, Cu, Dy, Hf, La, Nd, Ni, Pb, Rb,
IAEA
lacustre Sb, Sc, Sm, Th, U, V, Yb, Zn
SL-3, As, Br, Ce, Cs, Dy, Eu, Hf, La, Lu, Nd,
IAEA
lacustre Rb, Sb, Sc, STa, Tb, Th, U, Yb
Ag, As, B, Ba, Be, Bi, Cd, Ce, Co,Cr, Cs, Cu, Dy, Er, Eu, F, Ga,
GSD 1-8, IGGE Gd, Ge, Hg, La, Li, Mo, Nb, Nd, Ni, Pb, Pr, Rb, S, Sb, Sc, Sm,
canais Sn, Sr, Tb, Th, Tl, Tm, U, V, W, Y, Yb, Zn, Zr
Ag, As, B, Ba, Be, Bi, Cd, Ce, Co, Cr, Cs, Cu, Dy, Er, Eu, F, Ga,
GSD 9-12 IGGE Gd, Ge, Hf, Hg, I, In, La, Li, Lu, Mo, Nb, Nd, Ni, Pb, Pr, Rb, Sb,
Sc, Se, Sm, Sn, Sr, Tb, Th, Tl, Tm, U, V, W, Y, Yb, Zn, Zr
SARM 51, MINTEK Co, Cr, Cu, Nb, Ni, Pb, Rb, Sr, V, Y, Zn, Zr
52, canais
1646, As, Be, Cd, Ce, Co, Cr, Cs, Cu, Eu, Ge, Li, Mo, Ni, Pb, Rb, Sb,
NIST
estuários Sc, Se, Te, Th, Tl, V, Zn
As, Ba, Br, Cd, Ce, Co, Cr, Dy, Dy, Eu, Ga, Hf, Hg, La, Li, Lu, Ni,
2704, rios NIST Pb, Rb, Sb, Se, Sm, Sr, Th, Tl, U, V, Yb, Zn, Zr
Jsd 1-3, As, Be, Ce, Co, Cr, Cs, Cu, La, Li, Nd, Ni, Pb, Rb,
GSJ
canais Sc, Sr, V, Y, Yb, Zn, Zr
As, B, Ba, Ce, Cl, Co, Cs, Cu, Dy, Er, Eu, Ga, Gd, Ho,
GSMS-1, IRMÃ La, Li, Lu, Mo, Nd, Ni, Pb, Pr, Rb, Sb, Sc, Sm,
marinho Sr, Tb, Th, Tm, U, V, W, Y, Yb, Zn Zr
OOK 201- Ag, Au, B, Ba, Co, Cr, Cs, Cu, Ga, Ge, La, Li, Mo,
RIAP
204 Nb, Ni, Pb, Rb, Sc, Sn, V, Y, Yb, Zn, Zr
*Nota: NRCC: National Research Council of Canada; CCRMP: Canadian Certified Reference Materials
Project; USGS: United States Geological Survey; IAEA: International Atomic Energy Agency, Viena;
IGGE: Institute of Geophysical and Geochemical Exploration, China; MINTEK: Council for Mineral
Technology, Africa do Sul; NIST: National Institute of Standards and Technology, EUA; GSJ: Geological
Survey of Japan; IRMA: Institute of Rock and Mineral Analysis, China; RIAP: Research Institute of
Applied Physics, Irkutsk, Russia.
Adaptado de: Hall (1996)

190 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


Devido aos altos custos para obtenção desses materiais, alguns laboratórios
que os utilizam em uma maior quantidade, ou frequência, costumam desenvolver os
seus próprios materiais de referência. Um bom exemplo disso pode ser observado
nos trabalhos realizados por Cheam & Chau (1984) e Cheam et al. (1989), onde os
autores apresentam os testes para verificar a qualidade dos materiais que estavam
sendo desenvolvidos em seus estudos, dentre eles, os estatísticos, para verificar o
grau de homogeneidade das amostras, e inúmeros métodos para determinar o maior
número de elementos traço presentes nesses materiais.
Além disso, para Mudroch & Azcue (1995), para se obter materiais de
referência padrão confiáveis, é necessário que se realizem procedimentos mínimos,
como:
• Estabelecer pelo menos 120 determinações para cada elemento traço;
• Aplicar no mínimo dois métodos independentes para a determinação dos
elementos traço;
• Testar os resultados de cada elemento em pelo menos três laboratórios
independentes;
• Estabelecer um limite de tolerância de 95% para cada elemento.

6.7 | GUIDELINES OU VALORES DE REFERÊNCIA


Em estudos de qualidade ambiental, é necessário avaliar as concentrações
de metais com respeito a valores de referência, possibilitando uma avaliação da
extensão da poluição e seus possíveis impactos ecológicos. Segundo CCME (1995),
os valores de referência são limites numéricos ou recomendações narrativas, a fim
de dar suporte ou conservar designados usos do meio ambiente aquático.
Segundo OMEE (1993), o propósito dos valores de referência na qualidade
de sedimentos é proteger o ambiente aquático, propondo níveis seguros para as
concentrações de metais, nutrientes (substâncias na qual promovem o crescimento
de algas) e compostos orgânicos.
De um modo geral, segundo o Departamento de Proteção Ambiental da
Florida-EUA (Florida Department of Environmental Protection, 1994), eles podem ser
úteis para:
a) Interpretar dados obtidos nas análises químicas de sedimentos;
b) Desenvolver programas de monitoramento;
c) Embasar decisões regulatórias;
d) Conduzir avaliações sobre o risco de contaminação das áreas;
e) Desenvolver objetivos de remedição de áreas degradadas.
Historicamente, devido à necessidade de orientar o destino ou gerenciar
materiais originados de dragagens, inúmeras agências internacionais desenvolveram,
ou estão desenvolvendo, critérios para a qualidade dos sedimentos. O primeiro
“Guideline” ou valor de referência em sedimentos foi desenvolvido pelo Órgão Federal
de Administração da Qualidade da Água (Estados Unidos da América) e adotado pela
Agência de Proteção Ambiental dos EUA (United States Environmental Protection

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 191


Agency - U.S.E.P.A., 1973). Os critérios incluíam sete parâmetros de avaliação, e
se algum valor numérico fosse excedido, o sedimento era classificado como poluído
e deveria ser tratado. Posteriormente, eles desenvolveram um “Guideline” para
avaliar a região dos Grandes Lagos em 1977, baseando-se na concentração total de
contaminantes dos sedimentos (Tabela 6.4).
Esse trabalho foi desenvolvido principalmente para estudos do melhor destino
a ser dado ao material dragado dessa área, mas segundo Mudroch & Azcue (1995), o
impacto dos sedimentos sobre esses lagos não foi adequadamente relatado.
Mais recentemente, o Ministério de Energia e Meio Ambiente de Ontário -
Canadá (Ontario Ministry of the Environment and Energy – OMEE, 1993) desenvolveu
um “guia” com três níveis de efeitos ecotoxicológicos, sendo esses baseados em
efeitos crônicos e de longo prazo sobre os organismos bentônicos. As concentrações
fixadas por essa agência podem ser observadas na Tabela 6.5, e o nível médio é
obtido entre a soma dos dois limites apresentados e que deverá ser multiplicado por
0,5.
Esses valores de referência recomendam limites para contaminantes
individuais, onde a preocupação do seu desenvolvimento foi baseada nos efeitos
dessas substâncias na biota (fauna e flora) associadas aos sedimentos (organismos
bentônicos).

Tabela 6.4 – Valores de referência para classificação de poluição dos sedimentos


desenvolvido pela U.S. EPA (concentração total em μg.g-1)

Não poluído Moderadamente Muito poluído


Variável (menor que) poluído (maior que)
DQO 40.000 40.000 - 80.000 80.000
Óleo e graxa 1.000 1.000 - 2.000 2.000
Ntotal 1.000 1.000 - 2.000 2.000
Amônia 75 75 - 200 200
PCB 10 - 10
Arsênio 3 2-8 8
Bário 20 20 - 60 60
Cádmio - - 6
Cromo 25 25 - 75 75
Cobre 25 25 - 50 50
Ferro 17.000 17.000 - 25.000 25.000
Chumbo 40 40 - 60 60
Manganês 300 300 - 500 500
Mercúrio 1 - 1
Níquel 20 20 - 50 50
Fósforo 420 420 - 650 650
Zinco 90 90 - 200 200
Adaptado de: United States Environmental Protection Agency – U.S. EPA (1977)

Para se formular esses critérios ou limites são utilizadas comparações entre

192 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


sedimentos contaminados de uma determinada localização e suas respectivas
amostras base (backgrounds), que são consideradas como material de referência,
já que os níveis de contaminação são aceitáveis devido à presença de organismos
indicadores (Mudroch & Azcue, 1995).
Além disso, a presença de um parâmetro para a concentração de carbono
orgânico total é um bom diferencial desse “guideline”. Em trabalhos realizados por
Perin et al. (1997), estes parâmetros foram adequados para as condições locais da
área de estudo.
Na Holanda, que tem uma longa história de políticas de proteção da qualidade
dos solos e sedimentos desde 1962, os valores de referência foram reformulados
em meados dos anos 90, usando-se métodos ecotoxicológicos e considerando-se
o potencial humano de exposição aos contaminantes (Bird et al., 2003; Lee et al.,
2005).

Tabela 6.5 – “Guideline” de qualidade de sedimentos do Ontario Ministry of the


Environment and Energy para nutrientes, metais e compostos orgânicos
(concentração total em μg.g-1 de peso seco)

Nível de efeito: Nível de efeito: Nível de efeito:


Variável nenhum (μg.g-1) baixo (μg.g-1) severo (μg.g-1)
Nitrogênio total - 550 4.800
COT - 1% 10%
Fósforo - 600 2.000
Arsênio - 6 33
Cádmio - 0,6 10
Cromo - 26 110
Cobre - 16 110
Ferro (%) - 2 4
Chumbo - 31 250
Manganês - 460 1.100
Mercúrio - 0,2 2
Níquel - 16 75
Zinco - 120 820
Cobalto - - 50
DDT (total) - 0,007 12
PCB (total) 0,01 0,07 530
Adaptado de: OMEE (1993)

Esses critérios têm sido adotados por muitos países da Europa e usados
em numerosos estudos de poluição por metais em diversos países, como meio de
avaliação dos níveis de contaminação (Macklin & Klimek, 1992; Visser, 1993; Macklin
et al., 2003; Bird et al., 2003; Lee et al., 2005). Além disso, os valores de referência
holandeses têm sido usados em muitas bacias hidrográficas no mundo todo, porque
esses se estabeleceram há muito tempo, foram muito experimentados e testados

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 193


(Bird et al., 2003). Na Tabela 6.6, são apresentados alguns valores de referência
estabelecidos pelos critérios do VROM (2000).
Em ambos os “guidelines”, não basta apenas classificar as concentrações
de contaminantes associados aos sedimentos dentro dos valores de referência,
tais como “baixo ou limite” e “severo ou de intervenção”, pois esses resultados
necessitam de uma melhor avaliação. Os efeitos causados aos organismos vivos
por concentrações dentro da mesma faixa de classificação como, por exemplo, as
próximas aos limites inferiores, serão diferentes dos causados pelas concentrações
próximas aos limites superiores.

Tabela 6.6 – Valores de referência holandeses para concentrações totais de metais em


sedimentos, com valores de referência limites e de intervenções (μg.g-1
do peso seco) – Valores expressos para solos padrão (10% de MO e 25%
de argila)

Concentração do Concentração Concentração de


Variável valor de referência limite (μg.g-1) intervenção (μg.g-1)
nacional (μg.g-1)
Arsênio 29 29 55
Bário 160 160 625
Cobalto 9 9 240
Cádmio 0,8 0,8 12
Cromo 100 100 380
Cobre 36 36 190
Chumbo 85 85 530
Mercúrio 0,3 0,3 10
Níquel 35 35 210
Zinco 140 140 720
Óleo mineral - 50 5.000
DDT - 0,01 4
Adaptado de: VROM (2000)

Segundo OMEE (1993), para as concentrações de poluentes nos sedimentos


que ultrapassarem os limites de severo ou intervenção, esses devem ser considerados
altamente contaminados e sugere-se o controle da fonte e a limpeza destes
sedimentos. Além de que, concentrações acima desse limite, podem potencialmente
eliminar a maioria dos organismos bentônicos.
Apesar de sua grande utilidade em estabelecer parâmetros para se avaliar
a qualidade dos sedimentos, os valores de referência possuem várias limitações.
Para MacDonald et al. (2000), todos eles possuem certas vantagens e desvantagens
quanto a sua aplicação no processo de avaliação da qualidade dos sedimentos.
Segundo Giesy et al. (1990), a maior limitação desses critérios é a falta de informações
toxicológicas agregadas aos limites estabelecidos, o que no estudo canadense e
holandês, procurou-se implementar com novas técnicas e informações geradas em
seus diversos estudos.

194 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


Segundo Mudroch & Azcue (1995), a maior objeção imposta aos “guidelines”
é a sua falta de universalização, pois estes são completamente específicos ao local
onde foram desenvolvidos. Mas, para o Instituto de Meio Ambiente do Canadá
(Environment Canadá, 2003a), entre as limitações dos valores de referência, estão
que eles não são desenvolvidos para muitos elementos químicos. Além disso, há
uma dificuldade em identificar impactos químicos específicos.
A especificidade de cada valor de referência fica nítida ao compararmos os
valores limites do Holandês com os do Canadense ou outros valores de referência
(Figura 6.1). Os valores encontrados para estudos na Holanda são muito altos em
comparação aos do Canadá, isso devido, principalmente, às diferenças mineralógicas
de cada região, e possibilitando um bom exemplo de como é extremamente arriscado
utilizar-se de estudos produzidos em outras regiões ou países.

100

90

80

70
As (mg.g-1)

60

50

40

30

20

10

0
out-03 mar-04 ago-04 dez-04 mai-05

Arsênio (As) CONAMA: Nível I e OMEE: baixo


CONAMA: Nível II Background e VROM: intervenção
OMEE: severo VROM: limite

Figura 6.1 – Variabilidade dos valores de referência quando comparados entre si e os valores
de background de um local específico.

Para melhorar a avaliação dos níveis de metais encontrados nas áreas de


estudo, é muito importante a utilização de valores de amostras base (background)
locais. A utilização de concentrações dos valores de base pode ser útil tanto
para comparações entre os resultados de estudos em áreas degradadas quanto
para a tomada de decisões, bem como a remediação de áreas contaminadas,
ou potencialmente contaminadas. Os valores de amostras de base só podem ser
derivados de áreas que não foram afetadas por descargas de contaminantes (OMEE,
1993).

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 195


No caso do estudo de metais, a vantagem na obtenção do “background” está
na indicação das concentrações que ocorrem de forma natural na área em estudo.
Segundo OMEE (1993), se a concentração de contaminantes dos sedimentos
exceder os níveis mais baixos dos valores de referência, estas devem ser comparadas
primeiramente com os valores de amostras de base do local em estudo. Segundo
Hursthouse (2001), o não reconhecimento dos valores de amostras de base local
poderão sub, ou superestimar, a significância dos níveis de contaminação. Ainda
assim, deve-se lembrar que, mesmo analisando as amostras base de áreas não-
contaminadas, os valores poderão variar muito devido a uma série de fatores, como
mineralogia, granulometria e matéria orgânica.
Entretanto, a maior desvantagem na utilização apenas dos valores de
amostras de base está na falta de parâmetros biológicos ou análises ecotoxicológicas
que poderão afetar os organismos (OMEE, 1993). Porém a falta de modelos que
possam avaliar a exposição humana, principalmente porque estes estudos compõem
um complexo conjunto que não é tão simples de ser avaliado, ou mesmo com variáveis
que fogem a qualquer tipo de controle, também é um fator extremamente limitante
desses estudos, que propõem valores rígidos para casos extremamente flexíveis ou
dependentes de regiões específicas.

6.8 | ANÁLISES ECOTOXICOLÓGICAS


A Ecotoxicologia é a ciência que estuda os efeitos adversos das substâncias
químicas nos ecossistemas e a sua ação nos organismos. Ela estuda os agentes de
estresse que afetam o crescimento, a reprodução, o comportamento e a sobrevivência
dos indivíduos. Segundo Truhaut (1978), a ecotoxicologia está relacionada a efeitos
tóxicos das substâncias químicas e dos agentes físicos sobre os organismos vivos,
especialmente em populações e comunidades dentro de um ecossistema definido,
e inclui os caminhos da transferência desses agentes e sua interação (Fernicola et
al., 2004).
O âmbito da Ecotoxicologia compreende a identificação e estudo dos
poluentes ambientais, bem como seus respectivos efeitos toxicológicos. Ela permite
efetuar uma avaliação de risco, identificando os efeitos adversos resultantes da
exposição do ecossistema a um ou mais fatores de perturbação ambiental, prevenindo
a sua degradação. Contudo, muitos testes de toxicidade são realizados a partir de
substâncias químicas dissolvidas em água, enquanto o uso de sedimentos pode
prover um ótimo grau da realidade ambiental e aumentar a habilidade para predizer
os efeitos ambientais.
Os sedimentos muitas vezes afetam a toxicidade de substâncias químicas
(Chapman, 1986). Eles podem:
(1) Prover um refúgio para os organismos do ecossistema (e.g. Oseid &
Smith, 1974; Wallace et al., 1975; Buikema & Benfield, 1979), principalmente os
macroinvertebrados bentônicos (Rodrigues, 1996; Albertoni et al., 1998.);
(2) Mitigar a toxicidade pela adsorção química (e.g., Cairns et al., 1984;

196 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


Solomon, 1986); ou ainda,
(3) Ser uma fonte de toxicidade (e.g., Mauck & Olson, 1977; Malueg et al.,
1984; Giesy et al., 1988; Schuiytemna et al., 1988).
Por essas razões, os sedimentos devem ser contemplados para a sua
utilização em testes de toxicidade, bem como os macroinvertebrados, que ocorrem
em associação com o substrato de fundo, e são os organismos ideais para os testes
de toxicidade de sedimentos. No entanto, dentro de um universo de organismos,
poucos são avaliados para sua utilização devido à negligência no desenvolvimento
de métodos contemplados até o momento.
Os estudos de toxicidade têm sido realizados a mais de 100 anos, porém
muitos testes conectados começaram a ocorrer na década de 70, e isto resultou em
mudanças na legislação ambiental. Portanto, o desenvolvimento de novos métodos
de testes de toxicidade e o uso de novos organismos, como os macroinvertebrados,
têm sido lento. Isto permanece devido à proteção da qualidade do ambiente ter sido
centrada em testes já existentes, testes padronizados ou versões refinadas destes,
com o objetivo de elencar os efeitos químicos e dos efluentes. Não obstante, a proteção
da qualidade ambiental também requer proteção da integridade dos ecossistemas,
além da manutenção das tramas alimentares.

6.8.1 Tipos de testes de toxicidade

Os testes de toxicidade formam um continuo de complexidades, que envolve


testes que consideram uma única espécie, até os conduzidos em nível de ecossistema
(Boyle, 1983).
Três tipos básicos de toxicidade são utilizados: testes agudos para uma
única espécie, testes crônicos para uma única espécie e testes para mais de uma
espécie (multiespécies) (Tabela 6.7). Os testes para uma única espécie são os mais
frequentemente utilizados. Muitos têm sido realizados para confirmar ou expandir sua
utilidade no biomonitoramento, mas eles permanecem simplistas e não representam
a realidade do ambiente (Boyle, 1983). Não é fácil predizer os efeitos de uma
substância química no ecossistema se analisarmos somente os efeitos sobre suas
partes (e.g. Kimball & Levin, 1985). No entanto, testes com multiespécies utilizam
assembléias de organismos artificiais, ou componentes da comunidade natural, e
seguem os estudos da dinâmica da comunidade após exposições relativamente
episódicas, e/ou efêmeras, ou em longo prazo.
Por este motivo, todos os testes de toxicidade requerem informações
ecológicas básicas em nível de populações. Para os testes agudos utilizando
macroinvertebrados, esta informação é de extrema importância para o cultivo destes
e para os testes de manutenção dos organismos, bem como para o delineamento
padronizado dos métodos-testes. Para os testes crônicos de toxicidade em
multiespécies, as informações ecológicas básicas geralmente não são tão válidas.
Além disto, se os dados forem possíveis de serem avaliados, suas interpretações e
aplicações, em muitos casos, ainda desponta inúmeros problemas.

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 197


Tabela 6.7 – Comparação dos diferentes tipos de testes de ecotoxicologia usando
macroinvertebrados
Fonte de coleta
Tipos de testes Duração Resultados finais
dos organismos
Cultivados, M, COMP, C
Única espécie: agudo 48 a 96 horas adquiridos, (deposição)
coletados
Única espécie: crônico
Ciclo de vida Uma geração cultivado M, C, R
Sub-ciclo de vida cultivado M, C, ME
Ovos a morte, ou até
História de vida cultivado M, C, R, CO, ME
cessar a reprodução
Multiespécies
Dias, a semanas, ou M, C, COMP, INT,
Assembléia artificial cultivado
a meses B, D, DIV, S, MET
S, MET, PROD,
Dias, a semanas, ou
Assembléia natural coletado COMP, M, C, CP,
a meses INT, B, D, DIV, GF
Legenda: B=biomassa, C=crescimento, CP=competição, COMP=comportamento, D=densidade,
DIV=diversidade, GF=grupos funcionais alimentares, INT=interação presa-predador, M=mortalidade,
ME=metamorfose, MET=metamorfose, PROD=produção secundária, R=reprodução, S=riqueza de taxa.
Modificado de: Buikema et al. (1993)

6.8.2 Testes de toxicidade aguda

Os testes agudos de toxicidade são os de curta duração e ocorrem no


mínimo de 48 a 96 horas. Sua duração é geralmente limitada pela falta alimentação,
porque os organismos no estágio de vida inicial não se alimentam durante o teste. Os
testes são geralmente conduzidos com espécies únicas (e.g., APHA, 1985); porém,
exposições simultâneas com outros organismos já têm sido realizadas. Um exemplo
clássico foi os testes de toxicidade agudos realizados por Ewell et al. (1986), no qual
foram expostos sete taxas de macroinvertebrados do grupo dos crustáceos (Isopoda,
Daphinia, Amphipoda), moluscos, planárias e oligoquetos a 27 substâncias químicas.
Estas espécies-teste foram escolhidas com base na importância ecológica que
apresentam, na diversidade da forma de vida e na facilidade de cultivo. Os valores de
toxicidade aguda encontrados foram comparados aos obtidos em testes individuais,
e os resultados foram satisfatórios. Esses resultados mostram uma redução na
quantidade de substâncias químicas necessárias e a quantidade de descarga ao
final do experimento, aumentando o número de dados coletados em um experimento.
No entanto, permanece ainda o problema quanto à segurança de que os suficientes
números para que todos os organismos sejam avaliados ao mesmo tempo pelos testes.
Quanto às perspectivas dos testes de toxicidade aguda, esses devem
enfatizar a continuidade de elencar substâncias químicas e controlar a poluição,
porém, as pesquisas devem não somente ser direcionadas no refinamento existente
dos métodos-testes, mas também no uso de espécies mais sensíveis, ou ainda, no
desenvolvimento de novos métodos. Muitos testes apresentam um impacto nominal

198 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


sobre os valores de toxicidade. Neste caso, o limite dos valores de toxicidade aguda
obtido abaixo da quantidade de condições de testes, e para várias substâncias
químicas, variou menos do que cinco vezes do que o valor de 80% do tempo (Mayer
& Ellersieck, 1986).
Estudos devem ser direcionados na identificação das espécies de
macroinvertebrados, pois estes podem providenciar informações relevantes
para predizer efeitos ecológicos, considerando ainda a preservação dos recursos
ecológicos. Slooff et al. (1986) sugeriram que a adição de testes agudos deve ser
desenvolvida, especialmente para aqueles que apresentem funções ecológicas e
fisiológicas, e que esses podem ser usados em vez dos mais caros e complexos
testes de mortalidade.
Sem dúvidas, a meta para a proteção dos sistemas aquáticos é encontrar
espécies sensíveis que podem ser facilmente manuseadas e cultivadas em laboratório,
além de buscar o desenvolvimento continuado de testes de toxicidade por meio de
espécies de macroinvertebrados. Winner et al. (1980), Sheehan (1980), Sloof (1983),
Mayer & Ellersieck (1986) and Hilsenhoff (1987) forneceram valores de referência
(guidelines) para a seleção de organismos a serem utilizados em testes de toxicidade
aguda. As prioridades seriam o uso de insetos aquáticos (Figura 6.2), especialmente
os que apresentam hábito bentônico, como os plecopteras, efemeropteras e
trichopteras. Esses organismos são sensíveis a poluentes e a condições adversas
do meio (Rodrigues, 2001).

Figura 6.2 – Larvas de insetos aquáticos. A. Ephemeroptera, B. Odonada(libélulas), C.


Plecoptera, D. Megaloptera, E. Coleóptera (besouros), F e G Diptera (mosquitos).

O aumento dos testes utilizando os cavadores de sedimento, como a


efeméride Hexagenia (Ephemeroptera), foi bem sucedido nos EUA (Fremling &

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 199


Mauck 1980). No entanto, muitos quironomídeos (Chironomidae, Diptera, Insecta)
são os mais elencados, devido às características de serem considerados tolerantes
à poluição (Winner et al., 1980; Hilsenhoff, 1987). Os quironomídeos são organismos
ideais pra os testes de toxicidade, porque são essenciais para o funcionamento das
comunidades naturais e fáceis de serem cultivados (Andrerson, 1980; Giesy et al.,
1988), além de muitos serem altamente sensíveis (Giesy et al., 1988) e resistentes a
variáveis químicas (Rodrigues & Scharf, 2001; Rodrigues, 2001).
A utilização de espécies nativas de macroinvertebrados em testes agudos
deve ser cada vez mais incentivada e utilizada, se essas espécies forem coletadas,
identificadas e aclimatadas às condições dos testes. A escolha de espécies-chave é
adequada para esta finalidade. O cultivo destes organismos em laboratório é viável
e proporciona informações sobre seus ciclos de vida, sendo possível seu uso em
testes crônicos.

6.8.3 Testes de toxicidade crônica

O segundo tipo básico de testes são os testes de toxicidade crônico, que


envolvem três tipos de efeitos subletais:
(1) No ciclo de vida;
(2) No sub ciclo de vida; e,
(3) Na história de vida do organismo (Buikema & Benfield, 1979) (Tabela
6.7).
No teste de ciclo de vida, o organismo completa uma geração (e.g., fases
de ovo, larva, adulto e postura de ovo) (Figura 6.3). Os testes de sub ciclo de vida
são menores e enfatizam a sensibilidade dos estágios iniciais de vida. Nos testes
de história de vida, um organismo progride do ovo ou estágio de desenvolvimento
inicial (larval e/ou ninfa) até a morte ou até cessar a reprodução. A duração dos
estudos de toxicidade crônica varia de 2% a 100% de duração da vida do organismo.
Muitos testes são conduzidos em organismos fáceis de serem cultivados, como
os crustáceos (Amphipoda), camarões-de-água-doce (Decapoda) e Chironomidae
(Insecta, Diptera).
O desenvolvimento de testes de toxicidade crônica começou após a imposição
da legislação para alcançar o controle dos objetivos da poluição. Tendo como objetivos
primários o controle da preservação das águas superficiais e profundas por meio de
fonte de poluição local, testes crônicos de curto-prazo (4 – 7 dias) começaram a
ser difundidos na década de 80, utilizando estudos com organismos de vida livre
(planctônicos), como algas e Ceriodaphnia (Crustacea) (Horning & Weber 1985).
No entanto, a proteção da qualidade da água para a propagação da vida aquática
requer o estabelecimento de critérios de exposição a longo-prazo e, até o momento,
os dados continuam sendo limitados.

200 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


Figura 6.3 – Ciclo de vida de insetos aquáticos. À esquerda: Ciclo de vida de inseto com
metamorfose completa (holometábolos); À direita: Ciclo de vida de inseto com
metamorfose incompleta (hemimetábolos).

Problemas também existem na interpretação dos dados de toxicidade crônica.


Muitos testes crônicos têm sido conduzidos com animais que são criados, ao invés de
cultivados. Consecutivamente, os outros que sobrevivem, não se conhece a informação
dos estágios de vida inicial que podem ser relacionados aos efeitos em longo tempo
no crescimento e reprodução, ou ainda, na nutrição ou no estágio de mudas e no
ciclo de vida, que afetam a sensibilidade dos organismos aos poluentes. Além disso, o
significado ecológico da reprodução debilitada não é ainda bem compreendido.
Quanto às perspectivas da utilização dos testes de toxicidade crônica, esses
são usados para derivar os critérios de exposição a longo tempo para a proteção dos
recursos aquáticos (e.g., Larson & Hyland, 1987). Imensuráveis dados de toxicidade
crônica ainda são necessários para proteger os recursos aquáticos, mas isto não
ocorrerá até os métodos serem desenvolvidos para outros macroinvertebrados.
Inúmeras outras espécies podem ser elencadas para o uso de testes crônicos,
porém, informações ecológicas e biológicas devem ser avaliadas. As espécies de
macroinvertebrados que são fáceis de ser cultivadas, como caramujos (Gastropodes,
Mollusca) e oligoquetos (Annelida), têm sido avaliadas (Buikema & Benfield, 1979). Em
testes crônicos de toxicidade de sedimentos, os oligoquetos, por serem detritívoros
de sedimentos (Rodrigues, 1996), têm sido utilizados para os testes de sensibilidade
(e.g., Schuytema et al., 1988) e para elementos químicos puros (Ewell et al., 1986).

6.8.4 Testes de toxicidade para multiespécies

O terceiro tipo de testes de toxicidade que utilizam macroinvertebrados


são os testes com mais de uma espécie (multiespécies) (Tabela 6.7). Para isto,

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 201


são necessários testes contendo duas ou mais espécies que interajam entre si
(Cairns, 1985), por exemplo, interações presa-predador (Rodrigues & Hartz, 2001).
Esses testes são mais próximos da realidade do ambiente do que os outros dois
tipos básicos. Os testes de multiespécies são muitas vezes os mais próximos do
natural ou de um compartimento mais complexo do ecossistema (e.g., um trecho
da comunidade de um rio). Existem duas categorias de testes de multiespécies: os
testes em microcosmos e mesocosmos.
O bom seria a condução de experimentos em todo o ecossistema natural
(Figura 6.4), mas o uso de todo o ecossistema apresenta incomensuráveis problemas,
pelas seguintes razões:
a) são difíceis de se obter réplicas;
b) os experimentos estão a mercê das condições naturais e, por isso, são
difíceis de se controlar totalmente;
c) o acesso para manipular os corpos da água podem ser um impedimento;
d) os corpos da água podem ser contaminados por substâncias que são
testadas;
e) a complexidade dos ecossistemas naturais usualmente significa altos
custos para estes estudos.
O uso de testes de multiespécies mitiga alguns destes problemas, sendo,
portanto, o mais próximo da realidade ambiental.

Espécie Microcosmos Mesocosmos Ecossistema


Única Natural

Precisão Exatidão

Simplificação, Repetitividade – Complexidade, Aplicabilidade

Figura 6.4 – Características dos diferentes níveis de testes de ecotoxicologia.


Modificado de: Boyle (1983) e Buikema et al. (1993)

6.8.5 Perspectivas gerais

A proteção da integridade dos ecossistemas requer um aumento no número


de organismos bentônicos (macroinvertebrados) no uso de testes de toxicidade.
Porém, a seleção de espécies-teste e métodos-testes depende do incentivo das
agências de regulação e fiscalização.
Partindo deste pressuposto, se o objetivo é regular as descargas ou elencar

202 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


a toxicidade dos efluentes ou componentes, então quase nenhuma espécie, coletada
ou cultivada, pode ser usada nos testes agudos. Se o objetivo é regular as descargas
ao longo do tempo, então uma espécie possível de ser cultivada provavelmente
será mais adequada para o uso, porque o suprimento constante de organismos do
mesmo tamanho ou faixa etária pode ser obtido. Se o objetivo é o entendimento do
efeito dos testes crônicos sobre o crescimento e reprodução, então, deve-se avaliar
os efeitos nos diferentes estágios de vida, ou determinar fatores que modifiquem a
sensibilidade à toxicidade, para isto, novos métodos-testes são necessários, devido
as poucas espécies de organismos bentônicos que são possíveis, no momento, de
serem cultivadas em laboratório. Se o objetivo é predizer efeitos do ambiente, então
não somente os novos métodos são necessários, mas também informações sobre
o papel ecológico e interações tróficas de espécies dominantes são extremamente
necessárias. Esse objetivo tem sido o mais difícil de se obter.
O desenvolvimento de critérios para a qualidade do sedimento e da água,
desenvolvidos por países com know-how em tecnologias, demonstrou a necessidade
de se aumentar métodos-testes e utilizar tais informações. Como premissa
fundamental, os organismos bentônicos nativos podem ser usados em estudos de
testes agudos, caso seja viável a coleta e aclimatação às condições dos testes. As
pesquisas podem ser direcionadas para a identificação de organismos sensíveis ou
dos seus estágios de vida, bem como variáveis ecológicas pertinentes que modificam
a sensibilidade dos organismos; e os processos podem começar por meio do uso de
informações da história de vida dos organismos. Como retorno, essa informação será
utilizada para o cultivo de organismos-teste e o desenvolvimento de métodos-testes.
Subsequentemente, essa informação pode, também, prover um mecanismo para
elencar a sensibilidade potencial dos ecossistemas às substâncias ou elementos
químicos.

6.9 | EXPOSIÇÃO HUMANA A SEDIMENTOS CONTAMINADOS


Para estudos da exposição humana a sedimentos contaminados foi
desenvolvido o modelo SEDISOIL, no qual três elementos são reconhecidos pelo
modelo:
a) Distribuição de contaminantes através das suas fases móveis no solo e
no sedimento;
b) Transferência de contaminantes através das suas diferentes fases móveis
no solo e no sedimento;
c) Exposição humana direta e indireta.
Esse modelo apresenta-se de forma simplificada, porém ele é bastante
útil para facilitar a compreensão de como os seres humanos estão expostos aos
sedimentos contaminados. Na Figura 6.5, pode-se observar as diferentes formas
de contato humano com os sedimentos e a distribuição destes dentro das quatro
diferentes fases.

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 203


Distribuição
das frações
Sedimentos
de no ambiente
sedimentos

Processos Concentração Concentração


de de na água
transferência partículas superficial
suspensas

Exposição Ingestão, Ingestão Ingestão Contato ou


Direta inalação e/ou de e/ou contato ingestão de
contato sedimentos através da sedimentos
através da pele pelos peixes
pele
Exposição Consumo de
Indireta peixes

Figura 6.5 – Organograma de distribuição e contato do ser humano com sedimentos.


Adaptado de: Swartjes (1999)

Segundo Swartjes (1999), o modelo segue uma distribuição de rotinas


que inclui as principais formas de contato dos seres humanos com os sedimentos
contaminados, estando, portanto, inclusos:
a) A ingestão de sedimentos e água superficial;
b) A ingestão de partículas em suspensão junto com a água superficial;
c) O consumo da pesca (peixes, mexilhões e camarões);
d) Contato direto da água e sedimentos contaminados sobre a pele.
Além disso, as concentrações presentes em cada organismo criarão um limiar
entre ser, ou não, um contaminante carcinogênico. Em geral, os limites estabelecidos
para esse tipo de avaliação representam a tolerância humana à exposição de
contaminantes, considerando a ocorrência de efeitos adversos toda vez que esses
limites forem excedidos. A Tabela 6.8 apresenta um exemplo dessas concentrações
limites estabelecidas pelo VROM (2000). Deve-se ter em mente que esses valores
são baseados em decisões políticas (Swartjes, 1999).

6.1 RISCOS À SAÚDE HUMANA

A exposição humana aos vários contaminantes que hoje são lançados ao meio
ambiente pode provocar vários tipos de doenças e reações diversas nos organismos
vivos. Assim, para o Instituto de Meio Ambiente do Canadá (Environment Canadá,
2003a), a presença de sedimentos contaminados, além de implicações negativas
para qualidade da água, pode alterar o equilíbrio do ecossistema aquático através da
eutrofização, ou seja, um aumento da disponibilidade de nutrientes (especialmente do
fósforo), causando um aumento na produção da biomassa vegetal (algas e macrófitas).
Essa condição associada ao fluxo de material orgânico (efluentes domésticos) terá

204 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


como maior consequência a redução do oxigênio dissolvido na água, e com isso
também haverá uma redução de uma parte importante das espécies que compõem
a biota aquática, como peixes e macroinvertebrados (Rodrigues, 1996). Segundo
Banerjee (2002), os sistemas urbanos são altamente sofisticados e complexos, onde
a contaminação com metais pesados causa uma maior preocupação devido a sua
toxidade e a eminente ameaça à vida humana e o ambiente.

Tabela 6.8 – Valores de referência holandês (com valores limites diários e de


intervenção para efeitos toxicológicos em humanos)
Risco máximo Valores toxicológicos em humanos
Variável permissível (μg.kg-1.dia-1) para intervenção (μg.kg-1)
Arsênio 2,1 678
Bário 20 4260
Cobalto 1,4 452
Cádmio 1,0 34,9
Cromo 5,0 2250
Cobre 140 15700
Chumbo 3,6 300
Mercúrio 0,61 197
Níquel 50 6580
Zinco 1000 56500
Óleo mineral - -
DDT 20 11300
Adaptado de: VROM (2000)

Os efeitos, sobre a saúde humana e ambiental, dos metais traço em


sedimentos de ruas dependem da mobilidade e biodisponibilidade dos elementos, que
têm relação com seu compartimento geoquímico dentro do sedimento. Portanto, não
apenas a determinação das concentrações dos metais, mas também a identificação
dos “sites” de ligação e associações, são essenciais para uma avaliação da qualidade
ambiental e da saúde humana em áreas urbanas (Lee et al., 2005).
Os recursos biológicos que podem ser potencialmente impactados por
sedimentos contaminados, se expandem por uma longa faixa. Nela estão inclusos
organismos que podem ser impactados diretamente, chamados de organismos
bentônicos que vivem ou se alimentam de sedimentos, e organismos da coluna
d’água, que podem sorver contaminantes liberados dos sedimentos para a água, e/
ou através do consumo de organismos bentônicos (detalhes no Capítulo 8).
Os sedimentos contaminados afetam diretamente os organismos bentônicos,
tais como insetos, vermes, moluscos e peixes, que passam uma grande parte do ciclo
de vida dentro ou sobre os sedimentos, mas também podem afetar outras formas de
vida que se alimentam de organismos bentônicos (Environment Canada, 2003a).
Além desses, existem os seres que sofrem os impactos indiretamente, tais como os
consumidores não-aquáticos (humanos e todos os organismos silvestres), que estão

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 205


no topo da lista dos predadores aquáticos dos peixes (OMEE, 1993).
Segundo o Centro de Prevenção e Controle de Doenças (Center for Disease
Control and Prevention, 2003), o aumento das concentrações desses metais no corpo
humano, pode causar aumento da pressão arterial, anemia, lesões no rim, lesões no
sistema nervoso, paralisias, problemas nos ossos de crianças, edemas e fibroses
pulmonares, cânceres, cardiopatites e dermatites.
Segundo o Instituto de Meio Ambiente do Canadá (Environment Canadá,
2003b), os sedimentos contaminados que foram depositados no fundo de lagos e
rios representam um importante componente do ecossistema aquático, servindo
de habitat para uma grande faixa de organismos bênticos e epibênticos, expondo-
os a certas substâncias que representam um risco potencial para a saúde desses
organismos. Segundo Goyette et al. (1988), pesquisas de campo identificaram efeitos
sutis causados por poluentes ambientais, tais como o desenvolvimento de tumores
e outras anomalias em peixes que se alimentam no fundo de ambientes aquáticos
poluídos.
Mas não apenas o ambiente aquático sofre diretamente os efeitos da
urbanização. Segundo Banerjee (2002), em seus estudos em Deli (Índia), as crianças
estão diretamente expostas aos sedimentos contaminados das ruas, e sofrem as
consequências dessa exposição, já que as mesmas são suscetíveis a colocar as
mãos sujas, com esses poluentes, diretamente na boca. Segundo Akhter & Madany
(1993), em Bahrain foram encontradas altas concentrações de Pb no sangue de
crianças expostas a esse tipo de contaminação.

6.11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AKHTER, M. S.; MADANY, I. M. 1993. Heavy Metals in Street and House Dust in Bahrain.
Water, Air and Soil Pollution, v.66, pp.111-119.

APHA, (American Public Health Association). 1985. Standart Methods for the Examination of
Water and Waste Water. 16th ed. American Public Health Association, Washington,
DC.

BANERJEE, A. D. K. 2003. Heavy Metal Levels and Solid Phase Speciation in Street Dusts
of Delhi, India. Environmental Pollution, v.123, pp.95-105.

BIRD, G.; BREWER, P. A.; MACKLIN, M. G.; BALTEANU, D.; DRIGA, B.; SERBAN, M.;
ZAHARIA, S.; 2003. The Solid State Partitioning of Contaminant Metals ans As in
River Channel Sediments of the Mining Affected Tisa Drainage Basin, Northwestern
Romania and Eastern Hungary. Applied Geochemistry, v18, pp.1583-1595.

BOYLE, T. P. 1983. Role and application of semicontrolled ecosystem research in


the assessment of environmental contamination. In: Aquatic Toxicology and
HazardAssessment: Sixth Symposium. eds. W.E. Bischop, R.D. Cardwell, and B.B.
Heidolph, pp.406-13. American Society for Testing and Materials Special Technical
Publication 802. American Society for Testing and Materials, Philadelphia, PA.

BUIKEMA, A. L., JR.; BENFIELD, E. F. 1979. Use of macroinvertebrates life history onformation
in toxicity tests. Journal of the Fischeries Research Board of Canada, 36, pp.321-
328.

BUIKEMA JR., A. L.; VOSHELL JR. R. 1993. Toxicity Studies Using Freshwater Benthic
Macroinvetebrates., pp.344-398. In: David M. Rosenberg & Vincent H. Resh (eds.).

206 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


Freshwater Biomonitoring and benthic macroinvertebrates. Chapman & Hall, New
York, 1993. 488p.

CAIRNS, J., Jr. ed. 1985. Multispecies Toxicity Testing. Pergamon Press, New York.

CAIRNS, M. A.; NEBEKER, A. V.; GAKSTATTER, J. H.; GRIFFIS, W. L. 1984. Toxicity of


cooper-spiked sediments to freshwater invertebrates. Environmental Toxicology and
Chemistry, 3, pp.435-46.

CAMPELLO, F. D.; BRAGA, C. F.; GONCALVES, C. V.; GONCALVES, C. S.; FUHRO, D.;
SANTOS JUNIOR, J. E.; RODRIGUES, G. G. ; GUERRA, T.; HARTZ, S. M. 2005.
Avaliação preliminar da qualidade das águas da Floresta nacional de São Francisco
de Paula, RS, Brasil. Brazilian Journal of Biosciences, v.3, Porto Alegre.

CANADIAN COUNCIL OF MINISTERS OF THE ENVIRONMENT (CCME). 1995. Protocol for


the Derivation of Canadian Sediment Quality Guidelines for the Protection of Aquatic
Life. Ottawa: Preparado por Environment Canada, Guidelines Division Technical
Secretariat of the CCME Task Group on Water Quality Guidelines. CCME EPC-98E.

CENTER FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION (CDC). 2003. Second National
Report on Human Exposure to Environmental Chemicals. Atlanta, Georgia: NCEH
Pub. No. 02-0716. 251p.

CHAPMAN, P. M. 1986. Sediment quality criteria from the sediment quality triad: an example.
Environmental Toxicologgy and Chemistry, 5, pp.957-64.

CHEAM, V.; CHAU, A. S. Y. 1984. Analytical Reference Materials IV. Development and
Certification of the First Great Lakes Sediment Reference Material for Arsenic,
Selenium and Mercury. Analyst. v.109. 775p.

CHEAM, V.; ASPILA, K. I.; CHAU, A. S. Y. 1989. Analytical Reference Materials VIII.
Development and Certification of a new Great Lakes Sediment Reference Material
for Eight Trace Metals. Science of the Total Environment. v.87-88. pp.517-524.

CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente. 2004. Resolução nº 344, de 25 de março


de 2004. Minestério do Meio Ambiente.

ENVIRONMENT CANADA. 2003a. Sediment Assessment Series: Basic Concepts and


Program Highlights. Factsheet 1. Ottawa: Environmental Protection Publications.

ENVIRONMENT CANADA. 2003b. Sediment Assessment Series: Chemical-Specific Sediment


Quality Guidelines. Factsheet 2. Ottawa: Environmental Protection Publications.

EWELL, W. S.; GORSUCH, J. W.; KRINGLE, R. O.; ROBILLARD, K. A.; SPIEGEL, R. C.


1986. Simultaneous evaluation of the effects of chemicals on seven aquatic species.
Environmental Toxicology and Chemistry, 5, pp.831-40.

FERNICOLA, N. A. G. G.; BOHRER-MOREL, M. B.; BAINY, A. C. D. 2004. Ecotoxicologia,


pp.221-243. In: Fausto A. de Azevedo & Alice A. da M. Chasin (coord.). As Bases
Toxicológicas da Ecotoxicologia. São Carolos : RiMa, 2003. São Paulo: Intertox.

FREMLING, C. R.; MAUCK, W. L. 1980. Methods for using nymphs of burrowing mayflies
(Ephemeroptera, Hexagenia) as stoxicity test organisms. In: Aquatic Invertebrate
Biosassays, eds. A.L. Buikema, Jr. and J. Cairns, Jr., pp.81-97. American Society for
Testing and Materials. Specieal TEchinical Publications 715. American Society for
Testing and Materials, Philadelphia, PA.

FLORIDA DEPARTMENT OF ENVIRONMENTAL PROTECTION. 1994. Approach to the


Assessment of Sediment Quality in Florida Coastal Waters. Tallahassee, Florida:
MacDonald Environmental Science Ltd. v.2. 49p.

GIESY, J. P.; ROSIU, C. J.; GRANEY, R. L.; HENRY, M. G. 1990. Benthic Invertebrate
Bioassays with Toxic Sediment and Pore Water. Environmental Toxicology and
Chemistry, v.9, pp.233-248.

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 207


GIESY, J. P.; GRANEY, R. L.; NEWSTED, J. L.; ROSIU, C. J. BENDA, A.; KREIS JR., R.
G.; HORVATH, F. J. 1988. Comparison of three sediment bioassays methods using
Detroit River sediments. Environmental Toxicology and Chemistry, 7, pp.483-498.

GOYETTE, D.; BRAND, D.; THOMAS, M. 1988. Prevalence of Idiopathic liver lesions in
English sole and Epidermal Abnormalities in Flatfish from Vancouver Harbour, British
Columbia, 1986. Vancouver: Environment Canada. 48p.

HALL, G. E. M. 1996. Determination of Trace Elements in Sediments. In: Mudroch, A.; Azcue,
J.; Mudroch, P. Manual of Physico-Chemical Analysis of Aquatic Sediments. Florida,
EUA: CRC Press. 287p.

HILSENHOFF, W. L. 1987. An improved biotic index of organic stream pollution. Great Lakes
Entomologist, 20, pp.31-9.

HORNUING, W. B.; WEBER, C. I. 1985. Short-Term methods for Estimationg the Chronic
Toxicity of Effluents and Receiving Waters to Freshwater Organisms. EPA/600/4-
85/014. U.S. Environmental Protection Agency, Cincinnati, OH.

HURSTHOUSE, A. S. 2001. The Relevance of Speciation in the Remediation of Soils and


Sediments Contaminated by Metallic Elements-an overview with specific examples
from Central Scotland. Journal Environmental Monitoring, v.3, pp.49-60.

Kimball, K. D.; Levin, S. A. 1985. Limitations of laboratory bioassays: the need for ecossistem-
level testing. BioScience, 35, pp.165-171.

LARSON, L.; HYLAND, J. 1987. Ambient Aquatic Life Water Quality Criteria for Zinc-1987.
EPA/440/5-87/003. U.S. Environmental Protection Agency, Washington, DC.

LEE, P. K.; YU, Y. H.; YUN, S. T.; MAYER, B. 2005. Metal Contamination and Solid Phase
Partitioning of Metals in Urban Roadside Sediments. Chemosphere. Disponível em:
http://www.elsevier.com/locate/chemosphere.

MACDONALD, D. D.; INGERSOLL, C. G.; BERGER, T. A. 2000. Development and Evaluation


of Consensus-Based Seiment Quality Guidelines for Freshwater Ecosystems.
Environmental Contamination and Toxicology, v.39, pp.20-31.

MACKLIN, M. G.; KLIMEK, K. 1992. Dispersal, Storage and Transformation of Metal


Contaminated Alluvium in the Upper Vistula Basin, Southwest Poland. Applied
Geochemistry, v.12, pp.7-30.

MACKLIN, M. G.; BREWER, P. A.; BALTEANU, D.; COULTHARD, T. J.; DRIGA, B.; HOWARD,
A. J.; ZAHARIA, S. 2003. The Long Term Fate and Environmental Significance of
Contaminant Metals Released by the January and March 2000 Mining Tailings Dam
Failures in Maramures County, upper Tisa Basin, Romania. Applied Geochemistry,
v.18, pp.241-257.

MAYER, F. L., JR.; ELLERSIECK, M. R. 1986. Manual of Acute Toxicity: Interpretation and
Data Base of 410 Chemicals and 66 Species of Freshwater Animals. Resource
Publication 160. Fish and Wildlife Service. U.S. Department of Interior, Washington,
DC.

MAUCK, W. L.; OLSON, L. E. 1977. Polychlorinated biphenyls in adult mayflies (Hexagenia


bilineata) from the upper Missippi River. Buletin of Environmental Contamination and
Toxicololgy, 17, pp.387-90.

MALUEG, K. W.; SCHUYTEMA, G. S.; GAKSTATTER, J. H.; KRAWCZYK, D. F. 1984. Toxicity


of sediments from three metal-contaminated areas. Environmental Toxicology and
Chemistry, 3, pp.279-291.

MUDROCH, A.; AZCUE, J. 1995. Manual of Aquatic Sediment Sampling. Florida, EUA: CRC
Press. 219p.

MUDROCH, A.; AZCUE, J.; MUDROCH, P. 1996. Manual of Physico-Chemical Analysis of

208 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


Aquatic Sediments. Florida, EUA: CRC Press. 287p.

NRIAGU, J. O.; LAWSON, G.; WONG, H.; AZCUE, J. M. 1992. A Protocol for Minimizing
Contamination in the Analysis of Trace Metals in Great Lakes Waters. Journal Great
Lakes Resources, v.19, pp.175.

ONTARIO MINISTRY OF THE ENVIRONMENT AND ENERGY (OMEE). 1993. Guidelines


for the Protection and Management of Aquatic Sediment Quality in Ontario. Toronto:
Ontario Ministry of the Environment and Energy.

OSEID, D. M.; SMITH, JR. 1974. Factors influencing acute toxicity estimates of hydrogen
sulfide to freshwater invertebrates. Water Research, 8, pp.739-46.

PERIN, G.; FABRIS, R.; MANENTE, S.; WAGENER, R. A.; HAMACHER, C.; SCOTTO, S.
1997. A Five-Year Study on the Heavy Metal Pollution of Guanabara Bay Sediments
(Rio de Janeiro, Brazil) and Evaluation of the Metal Biovailability by Means of
Geochemical Speciation. Water Resources, v.31, n.12, pp.3017-3028.

RODRIGUES, G. G.; HARTZ, S. M. 2001. Food dynamics of fish and the interaction with
macroinvertebrates from a shallow lake from southern Brazil. Verh. Internat. Verein
Limnol., Stuttgart, v.6, n.27, pp.3309-3314.

RODRIGUES, G. G. 2001. Benthic Fauna of Extremely Acidic Lakes, pH 2-3. UFZ-Berich nº


23/2001. Leipzig, 130p.

RODRIGUES, G. G.; SCHARF, B. W. 2001 Review of the Benthic Invertebrate Fauna in


Extremely Acidic Environments (pH\eq 3). Mine Water and The Environment, Berlin,
Germany, v.20, n.3, pp.114-121.

SOLOMON, K. R.; CHAIRMAN, P. 1986. Pyrethroids: Their Effects on Aquatic and Terrestrial
Ecossystems. NRCC No. 24376. Associate Committee on Scientific Criteria for
Environmental Quality, National Research Council of Canada, Ottawa, ON.

SLOOFF, W.; OERS, J. A. M. VAN; ZWART, D. 1986. Margins of uncertainly in ecotoxilogical


hazard assessment. Environmental Toxicology and Chemistry, 5, pp.841-852.

SHEEHAN, P. J. 1980. The ecotoxicology of cooper and zinc: studies on a stream


macroinvertebrate community. Ph.D. dissertation, Univ. of California, Davis, CA.

SLOOF, W. 1983. Benthic macroinvertebrates and water quality assessment: some


toxicological considerations. Aquatic Toxicology, 4, pp.73-82.

SCHUYTEMA, G. S.; KRAWCZYK, D. F.; GRIFFIS, W. L.; NEBEKER, A. V.; ROBIDEAUX,


M. L.; BROWNAWELL, B. J.; WESTALL, J. C. 1988. Comparative luptake of
hexachlorobenzene by fathead minnows, amphipods and oligochaete worms from
water and sediment. Environmental Toxicology and Chemistry, 7, pp.1035-1046.

SWARTJES, F. A. 1999. Risk-Based Assessment of Soil and Groundwater Quality in the


Netherlands: Standards and Remediation Urgency. Risk Analysis, v.19, n.6, pp.1235-
1249.

TRUHAUT, R. 1978. Introduction. In: G.C. Butler. Principles of toxicology. Scientific Committee
Problems of the Environment (SCOPE) of the International Council of Scientific
Unions. SCOPE report 12. John Wiley & Sons, 350p.

VISSER, W. J. F. 1993. Contaminated Land Policies in Some Industrialised Countries.


Technical Soil Protection Committee (TCP), The Hague.

VROM. 2000. Circular on Target Values and Intervention Values for Soils Remediation:
DBO/1999226863. Netherlands Government Gazette, v.39, pp.1-11.

WALLACE, R. R.; YNES, H. B. N.; KAUSHIK, N. K. 1975. Laboratory experiments on the


factors affecting the activity of Gammarus pseudolimnaus Bousfield. Freshwater
Biology, 5, pp.533-46.

Qualidade das amostras e valores de referência | Capítulo 6L 209


WHITTEMORE, R. C. 2002. Handbook on Sediment Quality. Special Publication. Water
Environment Federation, 394p.

WINNER, R. W.; BOESEL, M. W.; FARRELL, M. P. 1980. Insect community structure as an


index of heavy-metal pollution in lotic ecosystems. Canadian Journal of Fischeries
and Aquatic Sciences, 37, pp.647-655.

WÜRDIG, N. L.; ALBERTONI, E.; OZÓRIO, C. O.; WIEDENBRUG, S.; RODRIGUES, G. G.


1988. The Influence of Environmental Parameters in the Structure of the Benthic
community in Coastal Laggons of Rio Grande do Sul, Brazil. Verh. Internat. Verein
Limnol, v.26, pp.1541-1517.

210 M Capítulo 6 | Qualidade das amostras e valores de referência


Processamento de Amostras
e Extrações Sequenciais
Capítulo 7

PROCESSAMENTO DE AMOSTRAS E EXTRAÇÕES SEQUENCIAIS


Cristiano Poleto & Elba Calesso Teixeira

7.1 | INTRODUÇÃO
Os estudos voltados para qualidade dos sedimentos apresentam uma vasta
opção de procedimentos e que irão seguir diferentes metodologias, sendo essas as
mais adequadas a cada local ou tipo de estudo.
O que passa muitas vezes desapercebido é como as amostras de água foram
resultar em pequenas amostras de sedimentos e, assim, todo processo envolvido
nesse procedimento não recebe a devida atenção. Este capítulo apresentará algumas
possibilidades de processamento de sedimentos, que poderão ser utilizadas para a
obtenção de amostras secas de sedimentos e para estudos de elementos dissolvidos.
Na sequência, serão expostas as principais metodologias de extração
sequencial química de metais, suas limitações e sua utilização como uma ferramenta
para os estudos ambientais.

7.2 | PROCESSAMENTO DE AMOSTRAS DE SEDIMENTOS APÓS A COLETA


Um passo importante após a coleta de amostras de sedimentos, para se
dar início as análises das amostras de sedimentos, é como proceder para separar a
parte líquida (em maior quantidade) da pequena porção sólida (sedimentos).
Uma solução para grandes quantidades de amostras seria deixar que as
amostras decantassem naturalmente para reduzir a quantidade de água e, em
seguida, as amostras fossem colocas em estufas para secar a 105°C, ou utilizar
essa primeira etapa como uma forma de otimização de um segundo processo como,
por exemplo, a centrifugação.
Apesar do processo de decantação de amostras poder, de uma certa forma,
agilizar todo o processo de obtenção de sedimentos, segundo Horowitz et al. (1989),
esse procedimento poderá causar alterações físico-químicas e/ou biológicas das
amostras. Mesmo se essas amostras fossem mantidas sob refrigeração, estaria
se criando um novo problema na logística do trabalho, pois como poderia ser
armazenado um volume tão grande de amostras? Além disso, deve-se lembrar que
a acidificação das amostras para sua estabilização é inaceitável para posteriores
estudos de elementos traço em sedimentos (Horowitz, 1986).

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 213


Assim, para se processar grandes quantidades de amostras, dois processos
são mais comumente encontrados, filtragem com fluxo tangencial e centrifugação
com fluxo contínuo.
A utilização da filtragem com fluxo tangencial, que emprega membranas
filtrantes formando uma espécie de “sanduíche”, apresenta a vantagem de
possibilitar estudos quantitativos sobre elementos traço presentes no seu efluente
(metais dissolvidos). Apesar disso, esse processo é mais complexo e lento do que a
centrifugação (Horowitz et al., 1989).
Uma outra alternativa para estudos de elementos dissolvidos é a utilização de
um pequeno filtro que segue a mesma metodologia do “empilhamento” de membranas
filtrantes (0,45 µm), e que é vendido o conjunto completo (pronto). Esse conjunto
requer uma pequena bomba utilizada para bombear a amostra de um container para
um pequeno filtro com membranas filtrantes (Figura 7.1). O filtro, as mangueiras
e a proteção plástica, utilizados durante o procedimento de filtragem, deverão ser
descartados após a sua utilização. Portanto, antes de se iniciar um novo processo de
filtragem de uma nova amostra, um novo conjunto deverá ser disponibilizado, sendo
posteriormente descartado também.
Um cuidado todo especial é dado quando se trabalha com metais dissolvidos,
onde, além de todo o material ser descartável, todos os objetos e equipamentos devem
ser envolvidos em dois sacos plásticos de proteção para se evitar contaminações.

Figura 7.1 – Conjunto para filtragem de amostras (bomba e filtro).


A união dos dados resultantes das análises dos elementos dissolvidos


com os dos presentes nos sedimentos possibilitará a geração de gráficos sobre a
distribuição dos elementos dentro dessas duas fases e sua real importância nos
estudos. Segundo Horowitz (1995), a porcentagem de elementos dissolvidos é muito
menor do que a presente como elemento sorvido pelos sedimentos. A proporção
que foi encontrada pelo autor em seus estudos pode ser observada nas Figuras 7.2
e 7.3, ficando visível as alterações das proporções quando as concentrações de
sedimentos por volume de água são diferentes.
Mas essa relação não pode ser considerada totalmente estável dentro de
um sistema, principalmente porque dentro de um ambiente aberto, como é o caso
de uma bacia hidrográfica, é impossível prever todas as mudanças ao longo de um

214 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


determinado período. Um exemplo disso é o estudo das concentrações de metais
em um longo período de estiagem, onde o fluxo de base é o principal ou o único
responsável pela vazão do sistema. Nesse caso, principalmente para os estudos
sobre os elementos dissolvidos, a sua representatividade perante a concentração
total dos elementos, torna-se indispensável.

-1
10 mg L (concentração de sedimentos em suspensão)
100

80
Porcentagem

60

40

20

0
Cu Zn Cd Cr Pb Co Ni As Sb Se Hg

Contribuição dos sedimentos Dissolvidos

Figura 7.2 – Proporção entre as concentrações de alguns elementos, distribuídas entre a fase
sólida (sedimentos) e a dissolvida.
Fonte: Horowitz (1991)

-1
100 mg L (concentração de sedimentos em suspensão)
100

80
Porcentagem

60

40

20

0
Cu Zn Cd Cr Pb Co Ni As Sb Se Hg

Contribuição dos sedimentos Dissolvidos

Figura 7.3 – Proporção entre as concentrações de alguns elementos distribuídas entre a fase
sólida (sedimentos) e a dissolvida.
Fonte: Horowitz (1991)

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 215


Deve-se salientar que, apesar dos estudos com elementos dissolvidos
requererem um cuidado maior para se evitar contaminações, estes tornam-se mais
rápidos e práticos durante as análises químicas para a obtenção das concentrações
totais. Isso porque, para esse tipo análise com essas amostras, requerem apenas a
sua acidificação, geralmente empregando 1,0 ou 2,0 mL de ácido nítrico.
No processo de centrifugação com fluxo contínuo, a água (amostra completa)
é bombeada continuamente para dentro do dispositivo, que irá reter a parte sólida
(sedimentos) enquanto descarta o efluente (água clarificada). Esse sistema tem a
vantagem de ser rápido e poder ser movido tanto a combustível quanto eletricamente,
e atinge rotações de 11.000 rpm. O conjunto formado por esse motor, que pode ser
tanto a gasolina quanto elétrico, e pode ser observado na Figura 7.4. Um conjunto
móvel, como o da citada figura, apresenta grande vantagem sobre o conjunto fixo
(elétrico), que é a realização do procedimento de centrifugação diretamente no
campo, evitando-se o transporte de uma grande quantidade de amostra líquida até
o laboratório.

Figura 7.4 – Conjunto formado por motor e centrífuga de fluxo contínuo (movida à gasolina) e
utilizada para a realização de centrifugação diretamente no campo.

Nesse processo, a água é bombeada pela entrada principal do equipamento,


localizada na parte superior (Figura 7.5), e é distribuída pela aleta. A separação dos
sólidos durante a centrifugação é feita através de sua acumulação entre as diversas
câmaras existentes dentro do equipamento. Há uma tendência de que as frações
mais grosseiras de sedimentos se acumulem nas câmaras centrais, enquanto que os
mais finos se acumulem nas câmaras adjacentes.
Mas, mesmo a utilização do processo de centrifugação requer alguns cuidados,
além de apresentar um determinado risco de contaminação, o procedimento pode
acarretar a perda de material. A Figura 7.6 apresenta a cúpula de uma centrífuga
pronta para sua utilização e a Figura 7.7 uma cúpula desmontada, podendo-se assim
visualizar as várias partes que a compõem.

216 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


Amostra
(água + sedimentos)

Efluente
(água clarificada)
Aleta

Câmara 1

Câmara 2

Câmara 3

Câmara 4
(Cúpula)

Figura 7.5 – Vista interna da cúpula de uma centrifuga de fluxo contínuo.


Fonte: Savile (1980)

Figura 7.6 – Cúpula de inox de uma centrífuga.

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 217


A limpeza de todas as peças da cúpula deverá ser rigorosa, limpando-se
todas as peças, uma a uma e, além disso, cada conjunto deverá ser utilizado apenas
uma única vez (para uma única amostra ou local amostrado) e, novamente, lavado
para sua posterior utilização.

Figura 7.7 – Partes internas constituintes da cúpula de inox de uma centrífuga.


Após a centrifugação de uma amostra, todas as partes constituintes da
centrífuga acumulam pequenas porções de sedimentos e, portanto, precisarão ser
lavadas com água deionizada (Figura 7.8), para que haja a recuperação de toda a
amostra que foi centrifugada. Como diferentes frações se acumulam em diferentes
partes da centrífuga, todas as partes deverão receber o mesmo tratamento. Esse
procedimento deve ser cuidadoso, para se evitar que todo o trabalho anterior, de se
evitar contaminações, seja perdido.

Figura 7.8 – Recuperação dos sedimentos acumulados em uma das partes constituintes da
cúpula de uma centrífuga.

218 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


Como este mecanismo é feito de aço inox e está sujeito a desgaste, deve-se
ocasionalmente testar a centrífuga com o auxílio de Materiais de Referência Padrão,
certificando-se que não está ocorrendo qualquer tipo de contaminação durante o
processamento das amostras.
Com a obtenção dos sedimentos, mas ainda com uma porção de água que
restou durante os procedimentos de “limpeza” das peças da centrífuga, podem ser
realizados dois procedimentos:
1. Congelar a amostra e depois utilizar um liofilizador; ou,
2. Secar a amostra diretamente na estufa a 105ºC.
A utilização do liofilizador é recomendada por inúmeros autores, mas
demanda a aquisição de um equipamento especial, o que nem sempre é possível,
além de exigir a adoção de procedimentos de limpeza e aquisição de bandejas feitas
de Teflon®. A maior desvantagem acaba sendo o tempo exigido para a adoção desse
procedimento, mas vale a pena lembrar que, quanto mais etapas forem implantadas
nos procedimentos, maior será o risco de se contaminar as amostras.
No caso de se adotar a utilização direta da estufa para se secar a amostra
a 105ºC, deve-se lembrar que a utilização dessa temperatura inviabilizará futuros
estudos granulométricos, ou seja, as amostras serão especificamente para estudos
de elementos traço.
A utilização direta da estufa para se obter uma amostra seca é muito criticada,
principalmente devido à possibilidade de se perder alguns elementos traço presentes
nas amostras. Porém, alguns estudos realizados nos Estados Unidos com Materiais
de Referência Padrão, obtidos de vários centros de referência, mostraram que as
perdas são insignificantes e, por isso, esse procedimento foi adotado nos laboratórios
da USGS.
Mas, na realidade, o volume de amostras a serem analisadas, que acabará
determinando qual o procedimento a ser adotado, levando-se em consideração,
principalmente, que deve-se evitar a escolha de um método que crie uma rotina
inexequível e que, provavelmente, incorrerá em erros.

7.3 MÉTODOS DE EXTRAÇÃO SEQUENCIAL

O conceito de extração sequencial baseia-se no fato de que um reagente


específico ataca uma fase ou mecanismo também específico. A extração sequencial é
uma técnica, que quando aplicada de forma comparativa, pode fornecer informações
que ressaltam as diferenças de mobilidade e reatividade de um elemento em um
determinado ambiente (Hursthouse, 2001).
As análises das concentrações totais de metais poderão fornecer informações
sobre o possível enriquecimento de sedimentos com metais pesados, mas, geralmente,
e para a maioria dos elementos, isso não é um critério suficiente para estimar as
implicações ambientais de sua presença (Ramos et al., 1999). As análises das
concentrações totais de metais podem quantificar os elementos metálicos presentes
em sedimentos, porém não permitem avaliar quantitativamente a contribuição

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 219


antropogênica e o risco potencial de liberação desses metais. Os poluentes
podem concentrar-se nos sedimentos do sistema aquático e sua acumulação nas
diferentes fases geoquímicas é atribuída, geralmente, aos processos de adsorção
que são fortemente dependentes das condições físico-químicas do meio aquático.
Esses poluentes associados às frações do sedimento podem ser liberados para a
coluna d’água, sendo essa uma função dos processos geoquímicos que ocorrem no
ambiente aquático (Tessier & Campbell, 1987). Esse tipo de resultado poderá alterar
toda a concepção de um projeto de recuperação ou preservação de uma área.
Alguns autores questionam a real existência de várias frações, sendo
geralmente aceito que existam pelo menos duas frações, uma que é rapidamente
dessorvida e outra mais lentamente liberada (Brower & Cecchine, 2002).
Havendo ou não mais de duas frações, o que realmente importa, segundo
Horowitz (1991), é que as extrações sequenciais, além de possibilitarem a
diferenciação de amostras com concentrações químicas similares, possibilitam
meios de estimar sua biodisponibilidade. Isso porque amostras com as mesmas
concentrações totais de metais poderão apresentar diferentes tempos e formas de
liberação para os mesmos elementos.
Krishnamurti et al. (1995) argumentam que o delineamento das várias formas
dos elementos e sua especiação em sedimentos é essencial para a avaliação de
sua biodisponibilidade e toxidade. As possíveis aplicações incluem a avaliação dos
efeitos de operações de dragagens e a predição do comportamento de metais traço
em águas de estuários ou em sistemas lacustres anóxicos.

7.3.1 Protocolo desenvolvido por Tessier

A metodologia empregada por Tessier et al. (1979) é considerada uma


metodologia padrão entre as análises de extração sequencial. Tornou-se comum a
utilização dessa metodologia quando se quer comparar novos procedimentos, ou
mesmo para se comparar os resultados obtidos entre pesquisadores. Em trabalho
realizado por Ho & Evans (1997), para avaliar uma nova metodologia, a extração
sequencial pelo método BCR (Community Bureau of Reference), os autores utilizaram
os Materiais de Referência Padrão NIST 2710 e 2711 (como visto anteriormente,
são materiais com concentrações de metais conhecidas e utilizados para testar a
precisão de análises ou metodologias) e concluíram que esta metodologia reproduziu
resultados concordantes com os obtidos por Tessier et al. (1979).
O esquema proposto por Tessier et al. (1979), na qual dividem-se os
compartimentos geoquímicos em cinco fases, e é descrito por Yuan et al. (2004), é
apresentado a seguir:
• Fração de trocáveis (Fase 1 – F1): Os metais relacionados com essa fração
podem ser facilmente liberados pelo processo de troca iônica. Geralmente,
ficam retidos na superfície dos sedimentos por interações eletrostáticas
relativamente fracas, o que torna essa fração muito importante em estudos
de avaliação ambiental;

220 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


• Fração ligada a carbonatos (Fase 2 – F2): Os metais nesta fração
encontram-se co-precipitados com minerais carbonatos e, portanto, são
sensíveis a alterações do pH. A liberação de metais ocorre pela dissolução
da fração do material sólido dos carbonatos em pH próximo de 5;
• Fração ligada aos óxidos de ferro e manganês (Fase 3 – F3): Os óxidos
que podem aparecer em sedimentos como nódulos, cimento entre as
partículas, ou simplesmente recobrindo parcial ou totalmente os sedimentos
(coatings), são ligantes excelentes para metais traço. Mas estes são
termodinamicamente instáveis em condições anóxicas, sendo a adsorção
e dessorção dos metais controladas pelo Eh e pH;
• Fração ligada à matéria orgânica (Fase 4 – F4): Nos sedimentos, os
metais traço podem estar associados com a matéria orgânica, organismos
vivos, “coatings” orgânicos em partículas inorgânicas e detritos bióticos.
Em condições oxidantes os materiais orgânicos podem ser destruídos, e os
metais traço associados a eles podem ser liberados para o sistema aquático.
Os metais nesta fração são mais estáveis e difíceis de se tornar parte do
ciclo geoquímico. Mas, uma vez que esta fase atua como um “depósito” de
poluentes, essa fração também representa riscos ao ambiente;
• Fração residual (Fase 5 – F5): Os metais pertencentes à fração residual
são mais estáveis, oferecendo baixo risco ao ambiente devido a sua baixa
mobilidade e biodisponibilidade. Para que os metais ligados a esta fração
possam ser remobilizados, é necessária a destruição da estrutura cristalina
do mineral, o que é mais difícil de ocorrer.
A aplicação das metodologias de extração sequencial oferece, como opção,
a geração dos resultados em gráficos de colunas, como exemplificado na Figura 7.9,
e que facilitam a visualização das cinco fases citadas acima.

Elemento: Zinco
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
média
Amostra 1

Amostra 2

Amostra 3

Amostra 4

Amostra 5

Amostra 6

Amostra 7

Residual M.O. Óxidos Carbonatos Trocáveis

Figura 7.9 – Gráficos de colunas gerados pelos resultados obtidos através de extrações
sequenciais.

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 221


Para a aplicação desta metodologia, as amostras previamente secas
e congeladas são homogeneizadas em um almofariz de ágata ou em agitor com
esferas de Teflon®, ressaltando que uma boa homogeneização das amostras pode
representar resultados mais uniformes. Esse procedimento deve ser realizado apenas
com as amostras que serão utilizadas na presente extração.
Para cada fase da extração sequencial deve ser retirado e pesado 0,5
gramas de amostra para cada fase, e as amostras devem ser analisadas em
duplicata ou triplicata, e mais 01 branco. O teste em branco é feito utilizando-se os
mesmos reagentes e procedimentos, mas sem a adição da amostra de sedimentos,
e é utilizado para se verificar possíveis contaminações durante os procedimentos.
Na Tabela 7.1 consta o protocolo e as condições necessárias para aplicação
do método de extração sequencial. Nessa Tabela também é apresentada uma
alteração do protocolo na fase nº 5 (F5), onde foram inseridos 12 mL de Acqua régia
(HNO3 - HCl 3:1) para a destruição de compostos de enxofre, que poderiam ocasionar
explosões durante a utilização de HClO4.

Tabela 7.1 – Protocolo de extração sequencial de metais proposto por Tessier et al.
(1979)
Tempo de agitação,
Estágio Reagentes (concentrações ou
Fração ou de reação, e
ou Fase quantidades) temperatura
1 Trocáveis 8 mL 1 mol MgCl2 (pH = 7) 25ºC por 1 hora
Associado aos
2 8 mL 1 mol NaOAc (pH = 5) 25ºC por 5 horas
carbonatos
Associado aos 20 mL 0,04 mol NH2OH.HCl em
3 óxidos de Fe-Mn 96ºC por 6 horas
(ou reduzíveis) 25% v/v HOAc
3 mL 0,02 mol HNO3 5 mL 30% v/v H2O2 85ºC por 2 horas
Associado a +
4 matéria orgânica 3 mL 30% m/v H2O2 85ºC por 3 horas
(ou oxidáveis) +
5 mL 3,2 mol NH4OAc 25ºC por 30 minutos
12 mL Acqua régia 200ºC até quase secar
(HNO3 - HCl 3:1) (aparência gelatinosa)
+
6 mL HF – 2 mL HClO4 200ºC até quase secar
+
5 Residual 6 mL HF – 2 mL HClO4 200ºC até quase secar
+
2 mL HClO4 200ºC até quase secar
+
Diluição: 5 mL 5% v/v HNO3 em 50
mL H2O

Uma simplificação pode ser aplicada durante o desenvolvimento dessa


metodologia, da mesma forma que está sendo utilizada pela USGS (United States
Geological Survey), e que diminui os riscos de erros e resultados não-coerentes.
Nessa simplificação, ao invés de se utilizar os sobrenadantes, realiza-se a digestão
apenas dos sedimentos resultantes de cada fase.

222 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


Assim, ao final de cada fase, as amostras devem ser centrifugadas a pelo
menos 4.000 rpm por 10 minutos. Alguns autores recomendam até 10.000 rpm para
que ocorra a total separação entre a parte sólida e a líquida. Retiram-se as amostras
da centrifuga e, com uma pipeta de Pasteur, retira-se o sobrenadante e descarta-o.
Adiciona-se 10 mL de água deionizada aos sedimentos, agita-se suavemente e
centrifuga-se novamente as amostras por 10 minutos. Ao final, retira-se novamente
o sobrenadante, finalizando o processo de “lavagem” dos sedimentos. Esse
procedimento desse ser empregado ao final de cada fase do protocolo de extração
sequencial.
Na Figura 7.10, pode-se observar de forma simplificada os passos a serem
desenvolvidos durante o procedimento de extração sequencial, onde a sequência das
amostras que estão sendo analisadas forma um esquema piramidal. Portanto, para
cada fase em que as amostras forem submetidas, deve-se retirar uma e reservá-la
para que seja realizada a sua digestão total pelo procedimento da Fase 5.

“in natura” F5

F5
F1: MgCl

F5
F2: NaOAc + HOAc

F5
F3: NH2OH.HCl

F4: H2O2 + HNO3 F5

Digestão com HClO4 + HF

Figura 7.10 – Esquematização do procedimento de extração sequencial.

A digestão total dos sedimentos empregada na fase 5 é realizada para


assegurar que toda a matrix do sedimento seja digerida. Assim, deve-se ter um certo
cuidado ao se escolher a metodologia a ser empregada, pois caso a digestão não
esteja sendo completa, os resultados dos ensaios não irão expressar a real situação
das amostras.

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 223


7.3.2 Protocolo desenvolvido pela União Européia

A extração sequencial proposta pela Comunidade Européia estudou esta


técnica com a finalidade de propor um esquema único e proporcionar um MRC
específico para extrações sequenciais. Os resultados referentes a este estudo
permitiram que fosse obtido certo conhecimento dos possíveis problemas que
podem ocorrer durante aplicação da técnica de especiação. Este esquema possui
condições definidas para que ele possa ser utilizado por diferentes laboratórios e
sejam viabilizadas as comparações dos resultados (Fidler, 1995).
Cabe observar que os dados obtidos através destas análises nem sempre
levam ao conhecimento detalhado dos níveis de contaminação, ou melhor, da poluição
real observada no meio. Tal fato deve-se ao tipo de extrator utilizado, cuja ação na
liberação dos metais nem sempre é bem definida, e às dificuldades na interpretação
dos resultados. A seletividade da extração vai depender do tipo de reagente utilizado,
da duração do teste e da razão sedimento / extrator (Fiedler et al., 1994).
A Tabela 7.2 mostra o esquema de extração sequencial proposta pela
Comunidade Européia (López-Sanchez et al., 1998), que consiste em três etapas:
1. Carbonática;
2. Redutível;
3. Oxidável.
A quarta etapa a ser incluída corresponde à fase residual, possibilitando a
obtenção de um balanço de massa para cada elemento estudado (Teixeira et al.,
2001;Teixeira et al., 2004; Rodrigues & Formoso, 2006).
O balanço de massa é realizado no esquema da Comunidade Européia (CE),
comparando-se a concentração total com a soma das fases da extração sequencial,
comparação esta que permite a obtenção da exatidão analítica dos esquemas da
CE, que é padronizado para determinados elementos.
Como a certificação do MRC BCR-601 (Lopez Sanchez et al., 1998;
Quevauvillier et al., 1994) é dada para determinados elementos (Ni e Cd para as 3
fases, Cr para primeira fase, Zn para as duas primeiras fases e Pb para a primeira e
terceira fases), é importante determinar a exatidão das análises dos demais elementos
(Mn, Cu, Fe, Co, Al e outros), que serão determinados utilizando-se a comparação
entre a soma das concentrações obtidas nas quatro etapas da extração sequencial
com o teor total do metal.
Para a determinação do teor total de metais bem como a extração realizada
na quarta etapa, recomenda-se os procedimentos do método analítico EPA 3052
(1996), que prevê a adição de ácido fluorídrico, nítrico e clorídrico, com o emprego
do ácido bórico para eliminar possíveis resíduos de ácido fluorídrico.
A exatidão das análises da extração total pode ser avaliada aplicando-se o
Material de Referência Certificado (MRC CANMET STSD-3).
O material coletado é acondicionado em sacos plásticos e refrigerado a
4ºC, para que seja feito seu transporte até o laboratório, onde pode permanecer
congelado a –20ºC até o momento de preparação das amostras. Após a separação por
quarteamento, uma fração é peneirada com a água do ponto de coleta em malha de
nylon com abertura de 63 μm para a obtenção da fração silte-argila. Após a secagem

224 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


em estufa, a uma temperatura menor que 40ºC, as amostras são desagregadas em
gral de ágata e acondicionadas em frascos de polietileno.

Tabela 7.2 – Esquema de extração sequencial proposto pela CE (Original)


Condições de extração do material sólido (1 g
amostra em tubo de Nalgene)
40 ml CH3COONa 0,11 mol.L-1
Fase 1 Agitador end.over.end por 16 horas a 20°C;
Trocável + Carbonática Centrifugação.
Lavagem do resíduo.
40 ml NH2OH.
Fase 2 HCl 0,1 mol.L-1 (pH 2).
Redutível (Associada a
óxidos ou hidróxidos de Agitador end.over.end por 16 horas a 20°C.
Fe/Mn) Centrifugação.
Lavagem do resíduo.
10 ml H2O2 30% ajustado (pH 2 a 3).
Digestão por 1 hora a T amb + 1 h a 85°C em banho
maria.
Fase 3 10 ml H2O2 30% ajustado (pH 2 a 3).
Oxidável (Associada a MO e Digestão por 1 hora a 85°C em banho maria e redução
Sulfetos) de volume até alguns mL.
50 ml NH4Ac 1M (pH 2) agitador end.over.end (30 rpm)
por 16 horas, 20°C.
Centrifugação.
Fase 4* Extração total com adição sucessivas de HF / HClO4 em
Residual (Aluminossilicática) cápsulas de Teflon e chapa quente
*Fase 4: foi incluída neste estudo para a realização do balanço de massa.

Deve ser pesado 0,5 gramas de amostra para se iniciar a primeira etapa da
extração sequencial, e as amostras devem ser analisadas em duplicata, mais 01
branco e o Material de Referencia Certificado em triplicata.
A Tabela 7.3 mostra um exemplo de dados de sedimentos CRM-601,
aplicando-se o esquema de extração sequencial da Comunidade Européia. Como
os dados certificados são apresentados somente para determinados elementos, a
exatidão para os demais elementos estudados foi realizada, conforme relatado acima,
através da comparação entre o somatório das etapas das extrações sequenciais e a
digestão total.
Para os elementos que apresentam certificação, os resultados foram, de
forma geral, satisfatórios, diminuindo na fração redutível, principalmente para o Ni.
Um erro maior do Ni na fração redutível também foi relatado pela equipe da CE
(Lopez Sanchez et al., 1998).
O Cr e o Zn apresentaram erro na fase carbonática, cerca 18%, e, em menor
intensidade, o último elemento também mostrou um erro de 11% para a fase redutível,
evidenciando uma certa compensação de extração entre estas duas fases.

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 225


Tabela 7.3 – Esquema de extração sequencial proposto pela Comunidade Européia
aplicado ao material de referência certificado CRM-601
Extração Cd Cu Ni N1 Zn Zn1 Cr Cr1 Mn Fe Al Co
sequencial μg/g μg/g μg/g μg/g μg/g µg/g μg/g µg/g μg/g μg/g μg/g μg/g

Primeira 3.99 11.4 7.44 8.01 215 264 0.3 0.36 255 41.4 93.2 1.93
etapa
Segunda 2.97 47.2 10.9 6.05 202 182 7.5 1.43 161 3048 2948 3.49
etapa
Terceira 1.71 99.6 6.96 8.55 120 137 24.2 18.3 64.5 2918 1579 2.10
etapa
Quarta 0.48 56.1 57.8 --- 195 --- 102 --- 644 41600 59696 13.2
etapa
R 9.15 215 83.1 --- 733 --- 134 --- 1125 47608 64316 20.7
Extração 10.6 210 71.1 --- 785 --- 139 --- 1127 49950 66449 22.4
total
Erro % 13,7 2,00 16,9 --- 6,60 --- 3,30 --- 0,20 4,70 3,20 7,60
1
CRM–601 Material de referência certificado

Esses dados revelam a complexidade de se obter a seletividade no esquema


de extração de metais. Mesmo que o somatório das frações móveis seja similar,
não significa que a extração de cada fração seja seletiva. Isso pode ser atribuído
a diversos fatores, dentre os quais citam-se alguns, como o pH final do extrato,
que pode provocar menor extração do metal na solução e, consequentemente,
menor quantidade de metal será detectada. Outro fator que pode ser apontado é o
elevado nível de matéria orgânica do sedimento, já que esta nem sempre terá sido
completamente destruída com H2O2.
Para avaliar fontes de incertezas no BCR de três estágios do procedimento de
extração sequencial, diferentes fatores, tais como o pH do extratante, a temperatura,
a duração do extratante, o desempenho da extração em uma atmosfera inerte, o tipo
de reagente e a concentração são estudadas.
A Tabela 7.4 mostra um resumo dos resultados do estudo interlaboratorial,
onde constam as seguintes etapas:
1. Este é o mesmo em ambos os protocolos e nenhuma diferença significante
foi obtida entre os procedimentos para os seis metais estudados (Cd,
Cr, Ni, Pb, Zn e Cu). Cu não foi certificado previamente, suspeita-se de
uma instabilidade inferida a 40ºC, provavelmente devido as mudanças na
fase matéria orgânica ou óxidos Fe-Mn que são processos contínuos da
cristalização;
2. Na modificação do protocolo, os valores de pH no final do extrato do BCR
original e o protocolo modificado são 2,9 ± 0,3 e 1,9 ± 0,1, respectivamente.
O decréscimo do pH (1,9 ± 0,1) e o aumento da concentração do reagente
(0,5 mol.L-1) acarretava melhoria na reprodutibilidade, atribuída ao aumento

226 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


da quantidade do metal extraído. Os valores de Cr e Zn são similares aos
valores certificados. Cd, Ni e Pb obtiveram desvios padrão maiores, mas
também são consistentes com os valores certificados. Nas concentrações
de Cu, a quantidade extraída é mais elevada;
3. Quando se aplica o procedimento modificado, pequenas quantidades de
metais, ou similares, são extraíveis na terceira etapa e as incertezas são
parecidas para aqueles obtidos com o procedimento original.

Tabela 7.4 – Resumo dos resultados do estudo interlaboratorial do conteúdo extraível

Resultados em mg.kg-1 (média ± incerteza a 95% de nível de confiança)

Protocolo Etapa Cd Cr Cu Ni Pb Zn

CRM 1º 4,14±0,23 0,36±0,04 (8,32± 0,46) 8,01±0,73 2,86 ±0,35 264± 5


601:Certificado e 2º 3,08±0,17 1,43±1,01 5,69± 3,19 6,05± 1,09 33,1 ±10,0 182± 11
valor indicativo 3º 1,83±0,20 18,3±4,5 116 ± 26 8,55±1,04 109± 13 137± 30

BCR original: 1º 4,43±0,63 0,35±0,09 10,2 ± 0,8 8,22± 0,83 2,07 ±0,49 259± 13
Protocolo de 2º 3,09±0,88 1,42±0,79 7,87 ± 5,14 5,55± 1,42 37,3± 17,7 175 ±15
extração sequencial 3º 2,01±1,22 20,1±2,0 116± 9 6,75 ±0,82 108± 18 124± 17

BCR Modificado: 1º 4,45±0.67 0,35±0,08 10,5± 0,8 7,82± 0,84 2,28± 1,17 261± 13
Protocolo de 2º 3,95±0.53 10,6±0.9 72,8 ± 4,9 10,6 ±1,3 205 ±11 266± 17
extração sequencial 3º 1,91±1,43 14,4±2,6 78,6± 8,9 6,04± 1,25 19,7± 5,8 106± 11

Fonte: Rauret et al. (1999)

7.1.1 Vantagens e limitações das Extrações Sequenciais

Segundo Alborés et al. (2000), a aplicação dos métodos de extração sequencial


para a análise de amostras possibilita informações relevantes sobre a possível
liberação dos elementos traço dentro do ambiente aquático. Mas, o longo tempo
empregado durante os procedimentos e a quantidade de reagentes utilizados para a
realização dessas análises torna seu custo muito alto e sua utilização relativamente
complicada. Uma alternativa para reduzir o tempo nos procedimentos de extração,
é a extração sequencial individual. Esta pode ser mais facilmente aplicada e é mais
indicada para quando forem ser analisadas muitas amostras (Tack & Verloo, 1995).
Apesar desses inconvenientes, a extração parcial tem sido extensivamente usada,
com sucesso considerável, para se obter informações sobre a biodisponibilidade e a
geoquímica dos elementos traço (Belzile et al., 1989).
Porém, Horowitz (1991) ressalta que a maior dificuldade está na comparação
entre os métodos empregados, já que diferentes metodologias podem gerar
diferentes resultados. Portanto, um cuidado especial deve ser tomado ao se delinear

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 227


qual procedimento será seguido, e com quais resultados se está interessado em
realizar comparações, pois caso sejam metodologias diferentes, a comparação se
torna inviável.
Segundo Ramos et al. (1999), os métodos descritos por Tessier et al.
(1979) e Salomons & Förstner (1980) receberam grande aceite, mas a carência de
uniformidade entre os procedimentos utilizados nos diferentes estudos realizados
por outros pesquisadores dificulta a comparação dos resultados, já que estes são
altamente dependentes do procedimento utilizado.
A literatura científica reconhece que o fracionamento dos elementos traço
obtidos por esse procedimento é operacional, já que ele é influenciado por fatores
experimentais, tais como a escolha de reagentes e o tempo de extração, bem como
problemas analíticos inerentes a incompleta seletividade e readsorção. Segundo
Horowitz (1991), o maior problema é que os reagentes extratores não são tão
seletivos quanto muitos usuários afirmam.
Apesar da falta de seletividade de alguns reagentes e problemas de
readsorção de alguns metais pelos sedimentos (Kheboian & Bauer, 1987; Belzile et
al., 1989), de todos os métodos disponíveis de fracionamento da fase sólida (Tessier
et al., 1979; Kersten & Förstner, 1986), os procedimentos de extração sequencial
ainda são uma ferramenta útil para prever a longo prazo os efeitos adversos de
solos e sedimentos contaminados, e para que se possam avaliar as diferenças da
mobilidade e da biodisponibilidade no contexto ambiental (Hursthouse, 2001).
Portanto, a não-seletividade de extratores e a redistribuição de elementos
traço entre as fases durante as extrações são os principais problemas encontrados
no procedimento de extração sequencial. Apesar de todas essas restrições, os
procedimentos de extração sequencial têm provado ser muito úteis no campo
da química analítica ambiental. De qualquer forma, é muito importante aceitar
um esquema comum, na qual os resultados de diferentes cientistas possam ser
comparados em um banco de dados comum a todos, e que apresente a ocorrência
de metais em solos e sedimentos (Tack & Verloo, 1995).

7.2 | APLICABILIDADE AO GERENCIAMENTO AMBIENTAL


A contaminação de ecossistemas aquáticos por metais tem preocupado
órgãos ambientais nos mais diversos países, principalmente porque muitos são
persistentes e potencialmente perigosos para os organismos aquáticos. Além disso,
é provável que nossa civilização continue lançando metais para dentro destes
sistemas, através de seus efluentes e resíduos, por um longo período de tempo, até
mesmo podendo ocorrer um aumento destas taxas.
Em águas naturais, apenas uma pequena porção de todos os elementos
traço apresenta-se dissolvida e, dessa parte, é mínima a fração que apresenta-se
como cátions livres ou hidratados, isso porque íons metálicos formam complexos
estáveis com uma grande variedade de ligantes orgânicos e inorgânicos. Isso tem
uma influência direta sobre sua biodisponibilidade, toxidade e mobilidade dentro de

228 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


um ecossistema aquático. Segundo Mota & Santos (1995), entre os diferentes tipos
de espécies metálicas presentes em águas naturais, podemos considerar:
a) Íons livres (hidratados);
b) Complexos inorgânicos dissolvidos;
c) Complexos orgânicos dissolvidos;
d) Espécies metálicas na forma de colóides dispersos;
e) Metais adsorvidos em colóides ou material em suspensão (fração fina).
A extração sequencial de elementos traço, baseados em Tessier (1979),
pode fornecer uma indicação da sua biodisponibilidade (Droppo et al., 1998), mas
uma avaliação direta dessa biodisponibilidade só pode ser feita através de testes de
toxidade (Charlesworth et al., 2003) realizados com diversos organismos vivos que
sejam representativos em determinado ambiente.
Mesmo assim, sabe-se que os poluentes aquáticos se ligam aos sedimentos
através de processos de adsorção e que, segundo Belzile et al. (1989), no caso dos
elementos traço, os principais processos envolvidos são os de co-precipitação e de
co-reação com óxidos e hidróxidos de manganês e ferro, ácidos húmicos, sulfetos
e argilas. Esses processos podem ocorrer ao mesmo tempo ou se desenvolver
sucessivamente sobre esses “coatings” de sedimentos; mas, em alguns casos, um
prevalece sobre os outros, dependendo das condições ambientais de pH, Eh, OD,
etc. (Perin et al., 1997).
Estas características também afetam a liberação dos metais contidos nos
sedimentos, pois isso vai depender de alterações causadas ao ambiente aquático. As
alterações nas condições do ambiente aquático, tais como a acidificação, o potencial
de oxi-redução, ou o aumento nas concentrações de ligantes orgânicos, podem
causar a mobilização dos elementos traço (Yuan et al., 2004). Segundo Hursthouse
(2001), o pH aparece como a variável de impacto mais rápido neste controle. As duas
primeiras fases (F1 e F2, relacionadas com a extração sequencial pelo método de
Tessier et al., 1979) podem liberar sua carga de metais pela diminuição do pH, seja
pela alteração do tipo de cargas predominantes nos sedimentos (cargas negativas)
ou pela dissolução dos carbonatos. Assim, as frações de trocáveis e ligadas a
carbonatos podem facilmente liberar suas cargas de metais com o decréscimo do
pH (ex.: chuvas ácidas e atividades antrópicas) e, portanto, possuem uma maior
mobilidade do que as outras frações determinadas pela especiação (Banerjee, 2003).
Em particular, frações de metais obtidas de extrações sequenciais podem se
correlacionar com concentrações em microorganismos. Frações de cátions trocáveis,
solúveis em ácidos fracos, reduzíveis e oxidáveis são consideradas as frações que
são mais ou menos disponíveis para a biota aquática (Tack & Verloo, 1995). Segundo
Tessier et al. (1979), as frações de óxidos de Fe e Mn, e matéria orgânica constituem
importantes fontes potenciais de biodisponibilidade de metais traço.
A mobilidade de metais traço, sua biodisponibilidade e relativa ecotoxidade
para plantas dependem de sua forma química específica ou os tipos de ligações.
Consequentemente, estes são os parâmetros que devem ser determinados,
preferencialmente a concentração total do elemento contido em cada fase, para fins
de avaliação dos efeitos tóxicos e da trajetória da geoquímica (Pueyo et al., 2001).
Outras fases relacionadas com a extração sequencial apresentam uma

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 229


menor mobilidade, podendo ser consideradas fixas em um longo período de tempo.
Segundo Horowitz (1991), elementos traço associados ao cristalino dos minerais
são essencialmente indisponíveis, mas os associados com óxidos de ferro ou
manganês serão estáveis ou indisponíveis até que haja uma redução significante
no oxigênio dissolvido ou um aumento significativo na atividade biológica. Esse caso
pode ser típico em situações de grande aporte de matéria orgânica, representada
nos ambientes urbanos pelos esgotos, onde ocorre o consumo do O2 e propicia a
formação de ambientes anóxicos.
Além disso, as características mineralógicas podem interferir neste complexo
sistema. Segundo o Environment Canada (2003a), as diferenças nas características
físico-químicas dos sedimentos, tais como tamanho e forma, ou quantidade de
matéria orgânica contida nos sedimentos, podem influenciar profundamente
a biodisponibilidade e o grau de toxidade dos contaminantes associados aos
sedimentos.
Para Hursthouse (2001), o impacto ambiental de contaminantes metálicos
em solos e sedimentos depende tanto da especiação química do metal quanto
das condições físico-químicas do ambiente. É neste contexto que a especiação
dos componentes metálicos auxilia tanto na avaliação do risco potencial quanto no
caminho para uma solução aceitável de remediação ambiental.
Em resumo, a mobilidade desses metais está relacionada a sua solubilidade
e forma geoquímica, e esta mobilidade diminui conforme se avança nas fases de
especiação da extração sequencial:
Trocáveis > Carbonatos > Óxidos de Fe e Mn > MO > Fração Residual

7.3 | ESTUDO DE CASO


Um bom exemplo da utilização das extrações sequenciais pode ser observado
na Figura 7.11, onde Gibbs (1977) apresenta os resultados das concentrações
divididas em um fracionamento de quatro fases, e os agrupa com os valores obtidos
através dos estudos dos elementos dissolvidos.
Os dados desse estudo foram gerados através de uma extração sequencial
baseada em quatro passos analíticos para amostras de sedimentos em suspensão
obtidas no rio Amazonas. Sendo assim, considerou-se a fase dos trocáveis, os óxidos,
a matéria orgânica e a fração residual.
Através dos gráficos, pode-se observar que a maior parte do Cr, Co e Cu está
concentrada na fase cristalina, ou fração residual; o Mn e o Ni possuem a maior parte
das suas concentrações associadas com os “coatings” de ferro-manganês (óxidos).
A fração de trocáveis (absorded), não apresentou uma contribuição significante na
concentração dos elementos traço, e a matéria orgânica possibilitou uma maior
contribuição apenas no caso do Co e do Ni.
Esses resultados possibilitam uma discussão da potencial disponibilidade
ambiental desses elementos. Os elementos associados com a parte cristalina dos
sedimentos são essencialmente indisponíveis (Horowitz, 1991).

230 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


Os elementos traço associados com os óxidos de ferro-manganês,
provavelmente, serão estáveis, ou indisponíveis no ambiente, até que ocorra um
decréscimo significativo nas concentrações de oxigênio dissolvido, que pode ser
ocasionado principalmente por um aumento da atividade biológica. Segundo Diks &
Allen (1983), os elementos associados aos óxidos de ferro-manganês também podem
ser liberados através do sistema digestivo de alguns organismos. Os elementos traço
presentes na fração matéria orgânica poderão ser disponibilizados para o ambiente,
particularmente se ingeridos por organismos (Horowitz, 1991).

Cromo Cobre

Trocáveis Óxidos M.O. Fração Residual Solução Trocáveis Óxidos M.O. Fração Residual Solução

Cobalto Níquel

Trocáveis Óxidos M.O. Fração Residual Solução Trocáveis Óxidos M.O. Fração Residual Solução

Figura 7.11 –
Extração sequencial de elementos traço associados com sedimentos em
suspensão e a porcentagem das concentrações desses elementos dissolvidos.
Adaptado de: Gibbs (1977)


Porém, a fase que proporciona a maior disponibilidade é a trocável, que
nesse caso apresenta-se como a menor concentração presente nos sedimentos
em suspensão. É interessante perceber que os elementos dissolvidos apresentam
concentrações significativas para todos os elementos traço.
Em um estudo realizado por Poleto & Merten (2007), em uma bacia urbana
na região metropolitana de Porto Alegre, os autores aplicaram uma adaptação da
metodologia de Tessier et al. (1979) utilizada em laboratórios americanos, e obtiveram
os resultados apresentados em cinco compartimentos geoquímicos, conforme é visto
na Figura 7.12.
Os resultados englobaram amostras de sedimentos em suspensão coletadas
em um período de 4 anos, e contemplaram elementos como Co, As e Zn. Os resultados

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 231


mostraram que apesar de haver diferentes afinidades entre os elementos traço e uma
determinada fase ou compartimento geoquímico, a predominância de uma fração
sobre outra pode interferir e gerar diferentes proporções. Em áreas urbanas, nas
quais as concentrações de matéria orgânica são elevadas devido ao lançamento
de esgoto “in natura”, esta poderá apresentar uma forte influência nos processos de
sorção e dessorção de elementos traço.

100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Co As Zn

Residual M.O. Óxidos Carbonatos Trocáveis

Figura 7.12 – Extração sequencial de elementos traço associados com sedimentos em


suspensão apresentando cinco fases, em amostras coletadas em uma bacia
urbana na região metropolitana de Porto Alegre - RS.
Fonte: Poleto & Merten (2007)

7.4 | REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALBORÉS, A. F.; CID, B. P.; GÓMEZ, E. F.; LÓPEZ, E. F. 2000.Comparison Between


Sequential Extraction Procedures and Single Extractions for Metal Partitioning in
Sewage Sludge Samples. The Analyst, v.125. pp.1353-1357.

BANERJEE, A. D. K. 2003. Heavy Metal Levels and Solid Phase Speciation in Street Dusts
of Delhi, India. Environmental Pollution, v.123. pp.95-105.

BELZILE, N.; LECOMTE, P.; TESSIER, A.; 1989. Testing Readsorption of Trace Elements
during Partial Chemical Extraction of Bottom Sediments. Environmental Science
Technology, v.23. pp.1015-1020.

BROWER, J.; CECCHINE, G. 2002. Bioavailability in Sediments. In: Whittemore, R. C. 2002.


Handbook on Sediment Quality. Special Publication. Water Environment Federation.
394p.

CHARLESWORTH, S.; EVERETT, M.; MCCARTHY, R.; ORDÓÑEZ, A.; MIGUEL, E. 2003.
A Comparative Study of Heavy Metal Concentration and Distribution in Deposited

232 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


Street Dusts in a Large and a Small Urban Area: Birmingham and Conventry, West
Midlands, UK. Environment International, v.29. pp.563-573.

DROPPO, I. G.; IRVINE, K. N.; MURPHY, T. P.; JASKOT, C. 1998. Fractionated Metals in
Street Dust of a Mixed Land Use Sewershed, Hamilton, Ontario. Hydrology in a
Changing Environment (British Hydrological Society). v.3. pp.383-394.

ENVIRONMENT CANADA. 2003. Sediment Assessment Series: Basic Concepts and


Program Highlights. Factsheet 1. Ottawa: Environmental Protection Publications.

EPA. 1996. Microwave Assisted Acid Digestion of Siliceous and Organically Based Matrices.
Method 3052-1-20.

FIEDLER, H. 1995. Doctorat These. Universitat de Barcelona, Spain. 283p.

FIELDER, H. D.; LÓPEZ-SÁNCHES, J. F.; RUBIO, R.; RAURET, G.; QUEVAUVILLER, P.


H.; URE, A. M.; MUNTAU, H. 1994. Study of the Stability of Extractable Trace Metal
Contents in a River Sediment using Sequential Extraction. Analyst., v.119. pp.1109-
1114.

GIBBS, R. 1977. Transport Phases of Transition Metals in the Amazon and Yukon Rivers.
Geological Society of America Bulletin., v.88. pp.829-843.

HO, M. D.; EVANS, G. J. 1997. Operational Speciation of Cadmium, Copper, Lead and Zinc
in the NIST Standard Reference Materials 2710 and 2711 (Montana Soil) by the
BCR Sequential Extraction Procedure and Flame Atomic Absorption Spectrometry.
Analytical Communications, v.34. pp.363-364.

HOROWITZ, A. J. 1991. A primer on sediment-trace element chemistry. 2 ed. Chelsea, EUA:


Lewis Publishers. 136p.

HOROWITZ, A. J. 1986. Comparison of Methods for the Concentration of Suspended


Sediment in River Water for Subsequent Chemical Analysis. Environmental Science
and Technology, v.20 pp.155-160.

HOROWITZ, A. J. 1995. Use of Suspended Sediment and Associated Trace Elements in


Water Quality Studies. International Association of Hydrological Sciences, IAHS
Press: Oxfordshire. IAHS Special Publication n.4. 64p. ISBN 0-947571-79-5.

HOROWITZ, A. J.; ELRICK, K. A.; HOOPER, R. C. 1989. A Comparison of Instrumental


Dewatering Methods for the Separation and Concentration of Suspended Sediment
for Subsequent Trace Element Analysis. Hydrological Processes, v.2. pp.163-184.

HURSTHOUSE, A. S. 2001. The Relevance of Speciation in the Remediation of Soils and


Sediments Contaminated by Metallic Elements-an overview with specific examples
from Central Scotland. Journal Environmental Monitoring, v.3, pp.49-60.

KERSTEN, M.; FÖRSTNER, U. 1986. Chemical Fractionation of Heavy Metals in Anoxic


Estuarine and Coastal Sediment. Water Science Technology, v.18, pp.121-130.

KHEBOIAN, C.; BAUER, C. F. 1987. Accuracy of Selective Extraction Procedure for Metal
Speciation in Model Aquatic Sediments. Analitical Chemistry, v.59, pp.1417-1423.

KRISHNAMURTI, G. S. R.; HUANG, P. M.; VAN REES, K. C. J.; KOZAK, L. M.; ROSTAD,
H. P. W. 1995. Speciation of Particulate-bound Cd of Soils and its Bioavailability.
Analyst., v.120, pp.659-665.

LÓPEZ-SÁNCHEZ., J. F.; SAHUQUILLO, A.; FIEDLER, H. D.; RUBIO, R.; RAURET, G.;
MUNTAU, H.; QUEVAUVILLER, P. 1998. Analyst., v.123, pp.1675-1677.

MOTA, A. M.; SANTOS, M. M. C. 1995. Trace Metal Speciation of Labile Chemical Species
in natural Waters: Electrochemical Methods. In: Tessier, A.; Turner, D. R. Metal
Speciation and Bioavailability in Aquatic Systems. England: John Wiley & Sons Ltd.
v.3. 679p.

Processamento de amostras e extrações sequenciais | Capítulo 7L 233


MUDROCH, A.; AZCUE, J.; MUDROCH, P. 1996. Manual of Physico-Chemical Analysis of
Aquatic Sediments. Florida, EUA: CRC Press. 287p.

PERIN, G.; FABRIS, R.; MANENTE, S.; WAGENER, R. A.; HAMACHER, C.; SCOTTO, S.
1997. A Five-Year Study on the Heavy Metal Pollution of Guanabara Bay Sediments
(Rio de Janeiro, Brazil) and Evaluation of the Metal Biovailability by Means of
Geochemical Speciation. Water Resources, v.31, n.12, pp.3017-3028.

POLETO, C. MERTEN, G. H. The Distribution of Metal Concentration, as Co, As and Zn,


in a Residential Urban Watershed, Typical in Brazilian Suburbs. XXIV IUGG 2007.
Perugia, Italia.

PUEYO, M.; RAURET, G.; LÜCK, D.; YLI-HALLA, M.; MUNTAU, H.; QUEVAUVILLER, PH.;
SÁNCHEZ, J. F. L. 2001. Certification of the Extractable Contents of Cd, Cr, Cu,
Ni, Pb and Zn in a Freshwater Sediment Following a Collaboratively Tested and
Optimised Three-step Sequential Extraction Procedure. Journal Environmental
Monitoring – JEM, v.3, pp.243-250.

QUEVAUVILLER, P. H.; RAURET, G.; MUNTAU, H.; URE, A. M.; RUBIO, R.; LOPEZ-
SANCHEZ, J. F.; FIEDLER, H. D.; GRIEPINK, B.; FRESENIUS J. 1994. Anal. Chem.,
v.349, pp.808-814.

RAMOS, L.; GONZÁLEZ, M. J.; HERNÁNDEZ, L. M. 1999. Sequential Extraction of Copper,


Lead, Cadmium, and Zinc in Sediments from Ebro River (Spain): Relationship
with Levels Detected in Earthworms. Bulletin of Environmental Contamination and
Toxicology. Springer-Verlag New York Inc., v.62, pp.301-308.

RAURET, G.; LÓPEZ-SÁNCHEZ. J.F.; SAHUQUILLO, A..; RUBIO, R.; DAVIDSON, C.; URE,
A.; QUEVAUVILLER, PH. J. 1999. Environ. Monit., v.1, pp.57-61.

SAHUQUILLO, A.; LÓPEZ-SÁNCHEZ, J. F.; RUBIO, R.; RAURET, G.; HATJE, V. Sequential
Extraction of Trace Metals from Sediments. J. Anal. Chem, v.351, pp.197-203.

SALOMONS, W.; FÖRSTNER, U. 1980. Trace Metal Analysis on Polluted Sediments. Part II.
Evaluation of Environmental Impact. Environmental Technology Letter, v.1, pp.506-
517.

SAVILE, H. 1980. CCIW/NWRI Operating and Maintenance Manual for Westphalia Clarifiers.
National Water Research Institute. Canada Center for Inland Waters. ES-1087. 71p.

TACK, F. M.; VERLOO, M. G. 1995. Chemical Speciation and Fractionation in Soil and
Sediment Heavy Metal Analysis: A Review. International Journal of Environmental
Analytical Chemistry, Gordon and Breach Publishers, v.59, pp.225-238.

TEIXEIRA, E. C.; ORTIZ, L. S.; SANCHEZ, J. C. D.; ALVES, M. C. C . 2001. Environ. Geol.,
v.41, pp.128-144.

TEIXEIRA, E. C.; RODRIGUES, M. L. K.; ALVES, M. C. 2004. Aplicação do esquema


de extração seqüencial em sedimentos de áreas impactadas pela mineração de
carvão In: E. C. Teixeira; M. Pires. Estudos ambientais em Candiota: Carvão e seus
impactos. Cadernos de Planejamento e Gestão Ambiental. N.4. Porto Alegre.

TESSIER, A.; CAMPBELL, P.; BISSON, M. 1979. Sequential Extraction Procedure for the
Speciation of Particulate Trace Metals. Analytical Chemistry, v.51, pp.844-851.

YUAN, C.; JIANG, G.; LIANG, L.; JIN, X.; SHI, J. 2004. Sequential Extraction of Some
Heavy Metals in Haihe River Sediments, People´s Republic of China. Bulletin of
Environmental Contamination and Toxicology, v.73, pp.59-66.

234 M Capítulo 7 | Processamento de amostras e extrações sequenciais


Influência do Sedimento em
Ecossistemas Aquáticos
Capítulo 8

INFLUÊNCIA DO SEDIMENTO EM ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS


Gilberto Rodrigues Gonçalves

8.1 | INTRODUÇÃO
O universo de formas em que os sedimentos influenciam os ecossistemas
aquáticos não é pequeno. Diversos são os estudos que enfatizam as influências
químicas, físicas e biológicas (biogeoquímica) dos sedimentos nos corpos d’água.
Os sedimentos são constituídos de partículas de grande variedade de
tamanhos, formas geométricas e composições químicas, que são transportados
por água, ar ou degelo de seus locais de origem, nos ecossistemas terrestres, e
depositados no fundo de rios, lagos e oceanos (Mudrock & MacKnight, 1994a),
constituindo um dos compartimentos dos ecossistemas aquáticos. Além dessas
origens, os sedimentos depositados contêm materiais precipitados em grande
número de processos químicos e biológicos nesses ambientes aquáticos, sendo que
a proporção entre as partículas de origem terrestre (fontes alóctones) e as de origem
interna (fontes autóctones) varia muito para diferentes ambientes e em escalas de
observações.
Muito já se comentou a respeito da influência do sedimento nos sistemas
aquáticos, desde a gênese dos corpos lagunares (e.g., Vilwock, 1972; 1994;
Schwarzbold & Schäfer, 1984), sua influência na distribuição de organismos, como
plantas aquáticas – macrófitas, invertebrados bentônicos, aves aquáticas, entre
outros (Figura 8.1) -, os quais podem resultar em classificações ou tipologias dos
sistemas aquáticos. No entanto, se considerarmos as particularidades de cada
ecossistema, natural ou impactado, a influência do sedimento pode estar diretamente
relacionada a trofia, ou seja, a produtividade de matéria e trocas de energia, tornando
os sistemas muitas vezes possíveis de serem classificados e avaliados do ponto de
vista ecológico, que em pesquisas avançadas de restauração ecológica, estão no
topo como sistemas mais próximos do natural (van Andel & Aronson, 2006).
Porém, o sedimento pode ser considerado a base da maioria dos processos,
tanto em nível morfológico como ecossistêmico.
Por outro lado, estas classificações servem tanto de base para o
desenvolvimento de novas tecnologias e engenharia do meio ambiente, quanto para
a elaboração de programas de avaliação e monitoramento de impactos em sistemas
aquáticos e suas relações com a paisagem. Mas será que é suficiente avaliar apenas
o compartimento físico e/ou químico se não avaliarmos o compartimento de fundo

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 237


“bental” com sua biota e seus processos ecológicos? Afinal, ao estudarmos um
compartimento isolado, ou em uma escala de menor abrangência, deixamos de vê-
lo como um todo. E mesmo que estudos em n-compartimentos sejam realizados,
projetos com estas dimensões demandam um trabalho exaustivo e, em curto prazo,
se tornam inviáveis.
Contudo, análises envolvendo estudos do metabolismo de sistemas
aquáticos relacionados aos efeitos oriundos do compartimento de fundo, e a influência
principalmente dos sedimentos nos ecossistemas, podem prover informações em
várias escalas e parâmetros, resumidos em uma percepção facilmente compreensível,
como, por exemplo, os processos ecológicos de produção, consumo ou decomposição
(Gessner & Chauvet, 2002; Pascoal et al., 2003), ou ainda, a interação do sedimento
com os organismos, ou o conjunto destes – as populações, ou com a estrutura das
comunidades biológicas ou assembléias de organismos (quanto se tratar de um
grupo taxonômico, por exemplo: aves aquáticas, peixes, macroinvertebrados, plantas
aquáticas) (Rodrigues & Würdig, 2000), que vivem e/ou interagem diretamente com
os sedimentos (Casas & Gessner, 1999; Gessner & Chauvet, 2002) (Figura 8.1).
Além disto, em uma abordagem de menor abrangência, verifica-se a
importância de traçar um paralelo sobre a influência dos sedimentos em nível de
organismo, populações, comunidades biológicas e ecossistemas.

Figura 8.1 – Ecossistema aquático. Interação dos organismos (aves, macroinvertebrados,


peixes e plantas aquáticas) com os sedimentos.
Fonte: Cartilha Fibras vegetais, Desma/Ong Anama (2006)

O sedimento per se é o resultado da acumulação de materiais autóctone


e alóctone, parcialmente degradado durante e após a sedimentação (Premazzi &
Revea, 1976). O sedimento associado à matéria orgânica, e micro e macronutrientes,
são um dos fatores primários determinantes para a presença de determinadas
espécies em uma área particular (Wolz & Shiozawa, 1995) bem como para o
metabolismo dos sistemas aquáticos (Barbosa, 2005). Wolz & Shiozawa (1995)

238 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos


atribuem a distribuição e abundância dos invertebrados bentônicos às características
dos tipos de microhabitats, estabelecidos a partir da dinâmica do sistema, que
controla as condições de fluxos e determina o tamanho das partículas de sedimento.
Para Cranwel (1976), os teores de matéria orgânica no sedimento são derivados
da produção primária nos ecossistemas aquáticos (autóctones) e também da biota
terrestre (alóctones) pelo transporte e erosão de materiais para dentro sistemas
lacustres.
Na década de 70 (Reiss, 1976a; 1977a; 1977b), estudos em lagos da
Amazônia, já haviam verificado um padrão de distribuição da comunidade de
organismos bentônicos, fortemente influenciado pelas variáveis abióticas do
sedimento, como teores de nitrogênio total e matéria orgânica. Woodin (1981)
encontrou correlações positivas entre a abundância de organismos bentônicos e a
heterogeneidade e porosidade do sedimento.
A distribuição dos sedimentos em ecossistemas aquáticos pode ser observada
através de um plano horizontal, onde se observam manchas e/ou mosaicos de
diferentes fácies sedimentares, quantidades de matéria orgânica e concentrações
de substâncias húmicas e valores do pH do sedimento, como mostrado na Figura
8.2, ou em uma dimensão longitudinal, desde as nascentes de um curso d’água
até sua foz. Esta paisagem sedimentar não é estática, uma vez que configura as
características do ambiente em resposta a influência de escalas hierárquicas, por
exemplo, escala continental, regional, bacia hidrográfica, secção e trecho do riacho,
e assim por diante, e reflete na qualidade do sedimento.
Os invertebrados bentônicos, por sua vez, são conhecidos por atuarem na
ciclagem de nutrientes dos ecossistemas aquáticos, através do biorrevolvimento,
atividade de cavação dos organismos bentônicos, e também através da mineralização
metabólica dos sedimentos (Petr, 1976; Gardner et al., 1983; Novick & Nixon, 1985),
podendo ser chamados de espécies-engenheiras.
As construções de tubos no sedimento, produzidas pelos organismos
bentônicos, aceleram o transporte de substâncias na interface sedimento-água,
aumentando a superfície de área do sedimento (Fukuhara & Sacamoto 1987;
Meadows, 1991a; Meadows, 1991b).
O aumento da liberação de nutrientes através do sedimento pode ser resultado
do biorrevolvimento do sedimento, através da mistura das partículas produzidas pelos
invertebrados bentônicos e pela excreção metabólica (Tátrai, 1986). A presença de
macroinvertebrados nos sedimentos, como Tubificidae (Anellida, Oligochaeta) e
larvas Chironomidae (Insecta, Diptera) é, geralmente, afetada pela entrada da taxa
de produção de fósforo e atividades de biorrevolvimento na superfície do sedimento,
expondo mais a superfície para o fluxo da água (House et al., 1995; Fukuhara &
Sakamoto, 1987).

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 239


Figura 8.2 – Distribuição do sedimento em um ecossistema lagunar denotando as maiores
concentrações em áreas mais profundas e centrais: a) pH do sedimento; b) matéria
orgânica (%); c) substâncias húmicas (µg.g-1); d) granulometria do sedimento.
Fonte: Rodrigues (1996)

240 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos


8.2 | INFLUÊNCIA DO SEDIMENTO EM DIFERENTES NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO
ECOLÓGICA: ORGANISMO, POPULAÇÃO, COMUNIDADE E ECOSSISTEMA.

Considerando a influência dos sedimentos em ecossistemas aquáticos,


em nível de organismo e população biológica, é notável que alguns indivíduos e/
ou populações apresentam preferências por determinados microhabitats. Alguns
ocorrem somente em sedimentos com a maior predominância de finos, devido a
seu hábito cavador, como as ninfas de libélulas (Odonata, Insecta) e efemérides
(Ephemeridae, Insecta), outros como as larvas de mariposa (Trichoptera, Insecta) e
microcrustáceos (Tanaidacea), utilizam os grãos de areia para a fabricação de seus
pequenos tubos, onde vivem a maior parte de seu ciclo de vida.
Os macroinvertebrados aquáticos associados ao sedimento estão confinados
a um microhabitat, onde o material autóctone e alóctone acumula continuamente, e
onde os processos heterotróficos são efetivos (Milbrink, 1983). Por outro lado, esses
organismos bentônicos, por sua vez, também influenciam a qualidade do sedimento,
alterando as condições físicas e químicas do sedimento através de sua atividade
biológica sobre o mesmo, representando um elo importante na cadeia trófica dos
ecossistemas aquáticos. Esses organismos servem de alimento para níveis tróficos
subsequentes, através da transformação de detrito orgânico em biomassa de
invertebrados, e servem de base alimentar as comunidades de peixes e aves (Figura
8.3).

Recursos alimentares

Microcrustáceos

Moluscos

Insetos

Peixes
Titel X-Achse

Algas

Macrófitas

outros Insetos

Detrito

Sedimento

0 10 20 30 40 50 60 70 80
Freqüencia [%]
Figura 8.3 – Distribuição de frequência dos recursos alimentares na dieta de peixes em
uma lagoa costeira do Rio Grande do Sul. Sedimento, detritos e invertebrados
bentônicos (insetos, microcrustáceos, entre outros) correspondem aos itens
consumidos.
Fonte: Hartz (1997); Rodrigues & Hartz (2001)

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 241


Os macroinvertebrados bentônicos respondem também às influências dos
sedimentos em suspensão, considerando a concentração destes e o tempo de
exposição. A riqueza de espécies, densidade e biomassa, parâmetros de medidas
de comunidades biológicas, decrescem com o aumento da entrada de sedimento
(Johnson, 1993).
A influência da sedimentação tanto em ambientes lóticos quanto em lênticos
tem sido objeto de estudos bem detalhados. No entanto, nestes sistemas, o declínio
na densidade, biomassa e riqueza de espécies, acompanhado pelos deslocamentos
da composição taxonômica é, geralmente, associada à sedimentação aguda (Nutall
& Bielby, 1973; Gray & Ward, 1982; Lenat, 1984; Quinn et al., 1992). Tais estudos têm
demonstrado que a fauna de macroinvertebrados de ambientes lóticos é afetada pela
sedimentação por vários mecanismos diretos e indiretos.
Dentre os mecanismos diretos está incluída a perda de recursos alimentares
– detritos (Lenat et al., 1981) e o acúmulo de partículas sedimentares em estruturas
respiratórias e alimentares dos organismos macroinvertebrados (Lemly, 1982).
Muitos mexilhões (Mollusca, Bivalvia) que possuem hábito filtrador, com estruturas
em forma de sifões, respondem a este mecanismo.
Dentre os mecanismos indiretos, estão incluídas desde mudanças que
alteram a produtividade de algas, bactérias e fungos associados ao sedimento,
até as que afetam a decomposição de detritos de plantas aquáticas, devido aos
elevados regimes de material suspenso, a redução de oxigênio e pH e a introdução
de poluentes adsorvidos às partículas de sedimento (Boto & Patrick, 1978; Lenat
et al., 1981; Lemly, 1982; Davies-Colley et al., 1992; Quinn et al., 1992). Estudos
sobre a interação do sedimento à flora têm sido documentados recentemente como
as interações na indução de sedimento na germinação de sementes (Neely & Wiler,
1993; Jurik et al., 1994; Dittmar & Neely, 1999), na produtividade primária (van de
Valk et al., 1983; Ewing 1996) e na decomposição de plantas (Vargo et al., 1998).
Em ambientes onde a ausência de regimes de fluxos significativos de
sedimentação é relatada, como as áreas úmidas ou as de influência da planície
de inundação, o potencial para a disruptura da estrutura da comunidade de
macroinvertebrados é aplicável igualmente em mecanismos diretos e indiretos.
A retenção de sedimento em uma bacia de áreas úmidas é considerada uma
característica benéfica e importante para estes ambientes (Bohwmik & Demissie,
1986; Kuenzler, 1989; Fennessy et al., 1984; Kleiss, 1996). No entanto, eventos
de sedimentação induzidos pelo homem, como a urbanização e as atividades
agriculturáveis (Martin & Hartman, 1987; Ewing, 1986), resultam em numerosas
consequências ecológicas (Johnson et al., 1984).
A literatura mostra claramente que a sedimentação causa impacto negativo
na densidade (e.g., Nuttall & Bielby, 1973; Wagener & LaPerriere, 1985; Quinn et
al., 1992) e riqueza taxonômica (Lenat, 1984; Quinn et al., 1992) em muitos grupos
da comunidade de invertebrados lóticos. Poucas razões existem para se esperar
que as comunidades de invertebrados em hábitats lênticos ou de áreas úmidas são
menos sensíveis a sedimentação. De fato, a deposição de sedimento pode afetar
mais severamente invertebrados lênticos do que organismos lóticos (Martin, 2001).
Habitats em rios e riachos podem ser resistentes à deposição de sedimentos

242 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos


ou à constante ressuspensão de material particulado no fluxo da água. Em adição, a
comunidade de macroinvertebrados pode se deixar locomover rio abaixo – à deriva,
para escapar dos efeitos de assoreamento (Culp et al., 1996). Em áreas úmidas,
as condições são estagnantes, tanto na ressuspensão e remoção de sedimentos
quanto na relocação de invertebrados.
Dittmar & Neely (1999), em estudos da sedimentação envolvendo a vegetação,
encontraram que a resposta das plantas poderia somente ser entendida num contexto
de estratégia de histórias de vida. Antes disso, as diferenças táxon-especificas
e o estágio de maturação podem ser um significativo determinante à resposta
dos invertebrados a sedimentação com larvas de insetos, demonstrando ótima
susceptibilidade à sedimentação de muitos grupos taxonômicos (e.g., Megaloptera
e Coleoptera). Cordone & Lekkey (1961) relataram similares observações na qual
os adultos de invertebrados de diferentes espécies em riachos parecem ser mais
tolerantes, o que torna esta predição em relação ao efeito da sedimentação difícil de
ser analisada. Nesses casos, estudos em longo prazo devem ser delineados.
Estas generalizações são similarmente verdadeiras em um contexto funcional,
isto é, a sedimentação afeta ou não os grupos funcionais, ou seja, um conjunto de
organismos que se alimentam do mesmo recurso e da mesma forma (Figura 8.4).

Figura 8.4 – Compartimento bental de um ecossistema aquático. Á direita, grupos funcionais de


invertebrados bentônicos (raspadores, filtradores, coletores e fragmentadores);
à esquerda, organismos com hábito bentônico e recursos autóctone e alóctone
associados ao sedimento.
Fonte: Rodrigues (2001)

Em estudos desenvolvidos por Martin (2001), predadores, filtradores e


raspadores foram adversamente afetados pela adição de sedimento. Os predadores,

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 243


como as larvas de insetos (Diptera) e os adultos de besouros (Dysticidade,
Coleoptera), são dois grupos particularmente adversos afetados pela sedimentação.
Tais declínios podem parecer intuitivos porque se observa o decréscimo nas presas
ou decréscimo visual das habilidades devido ao alto nível de turbidez da água. Em
contraste, a densidade de dois outros predadores parece aumentar em experimentos
em mesocosmos (tanques de sedimentação).
O grupo funcional raspador exibe uma influência uniforme aos efeitos da
sedimentação. Muitos declínios são comumente atribuídos aos declínios em biomassa
perifítica, avaliados pelo consumo. Graham (1990) encontrou que o acúmulo de
sedimento síltico reduz os conteúdos orgânicos do perifíton epilítico (biofilme algal,
fúngico-bacteriano, que ocorre sobre pedras e rochas) somente 22% de biomassa
seca (comparado com 52% em um riacho controle). Similarmente, Davies-Colley et
al. (1992) encontraram que depois de descargas de sedimento argiloso em cursos
d’água, a redução da luminosidade em função do aumento da turbidez causou
significativa redução da produtividade primária, reduzindo a quantidade e /ou
qualidade de alimento disponíveis para os raspadores.
Entretanto, é necessária a realização de estudos designados especificamente
para determinar os mecanismos precisos da influência da sedimentação, e não
somente o distúrbio pontual ocorrido com o evento do impacto de entrada do
sedimento no sistema, ou a causa através do qual a sedimentação afeta a biota
aquática em nível de organismo, população, e comunidade biológica, em estudos em
longo ou médio prazo.
É óbvio que os mecanismos, diretos e indiretos, ou ambos, podem estar
envolvidos. Provavelmente, os mecanismos diretos incluem o assoreamento de
fontes de recurso ou a interferência nas estruturas alimentares, onde os mecanismos
indiretos primariamente manifestam alterações na química da água e na alteração do
pH, por exemplo. Davies–Colley et al. (1992) listaram cinco possíveis mecanismos
para os efeitos deletérios da descarga sedimentos finos, principalmente da fácie
argila, em organismos aquáticos lóticos, a seguir:
(1) Reduz a penetração de luminosidade e aumenta a turbidez da água, que
reduz a produção primária;
(2) Reduz a qualidade de epilíton como alimento para os organismos,
principalmente os macroinvertebrados;
(3) Preenche o habitat disponível para a colonização da biota;
(4) Evita a colonização de áreas para invertebrados, peixes e aves aquáticas;
(5) Proporciona o acúmulo de partículas de sedimento sobre a superfície do
corpo de invertebrados e estruturas respiratórias.

8.3 | QUALIDADE DO SEDIMENTO E OS INDICADORES BIOLÓGICOS


O sedimento serve para avaliação da qualidade do ecossistema como uma
importante ferramenta a ser utilizada, pois este se relaciona diretamente aos processos
e padrões dos ecossistemas em questão e serve como mecanismo confiável para

244 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos


detectar fragilidades ambientais.
Os distúrbios e/ou as perturbações físicas oriundas pela presença dos
sedimentos, quer naturais ou antrópicos, que podem influenciar a estruturação das
assembléias de organismos aquáticos, ocorrem de forma dinâmica apresentando
diversos cenários em determinados espaços de tempo.
No que tange a avaliação da integridade dos ecossistemas, as variáveis
biológicas apresentam vantagens sobre os parâmetros convencionais físicos e
químicos no monitoramento dos sistemas aquáticos. A vantagem mais importante é
que elas integram os efeitos de muitas variáveis ambientais sobre um longo período
de tempo e permitem a detecção de perturbações ocasionais, pois os organismos
de uma forma geral e, principalmente, os associados ao sedimento (organismos
bentônicos), indicam o estado passado e presente do ecossistema aquático, incluindo
efeitos cumulativos de descargas, e refletem em longo prazo os efeitos crônicos da
poluição (Rosas et al., 1985).
Assim, os invertebrados bentônicos têm sido utilizados com grande potencial
como indicadores da qualidade do sedimento (Reinoldson et al., 1995), da qualidade
da água (Milbrink, 1983; Resh & Price, 1984), da qualidade ambiental (Wolz &
Shiozawa, 1995; Doke et al., 1995), da poluição (Rosas et al. 1985; Timmerman et al.,
1992; Milbrink, 1994) e de programas de monitoramento (Hynes, 1970; Wiederholm,
1980b; Lenat, 1983; Kansanen, 1984; Rosenberg, 1992, Rodrigues & Barbosa, 2006).
No Brasil, estudos envolvendo a relação do sedimento associado a
macroinvertebrados aquáticos, como indicadores da qualidade do sedimento e
da água ou até mesmo em tentativas de classificações dos sistemas, vêm sendo
largamente apresentados pela comunidade científica, porém sua implantação e
reconhecimento devem ser intensificados e incentivados em todas as instâncias.
Um dos atuais desafios no uso adequado do sedimento como apetrecho para
a avaliação e monitoramento dos ecossistemas aquáticos consiste na percepção
da escala temporal e espacial em que os impactos estão sendo avaliados. Atribui-
se alguns fatores para a utilização pouca efetiva dos sedimentos associados a
macroinvertebrados aquáticos como prática viável no Brasil, dentre eles, inclui-se a
falta de interatividade entre pesquisadores e instituições de fiscalização ambiental
como veículo incentivador para o reconhecimento desta análise mais refinada.
Também, a percepção da inter-relação dos padrões e processos dos sedimentos
relacionados à biota em diferentes escalas, o qual vislumbra perspectivas de maior
amplitude no entendimento, reconhecimento e detecção destas inter-relações.
Estudos vinculados, ou em parcerias com os órgãos ambientais, permitem
a aplicação do conhecimento acadêmico no âmbito das políticas públicas. Assim,
medidas e análises do sedimento associado à biodiversidade de organismos
aquáticos aumentam a resolução da análise, porém, em alguns casos, apresentam
respostas limitadas quanto à dinâmica do sistema em questão. Nesse caso, quando
as análises são associadas aos processos ecossistêmicos, torna-se possível detectar
não somente a ocorrência destes eventos como também identificar e monitorar o
metabolismo do sistema aquático (Rodrigues et al., 2006).
Como mencionado por Mozeto (2004), os sedimentos de ambientes
lacustres foram estudados por muitos anos, apenas com o intuito de caracterizar

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 245


sua natureza e suas propriedades por diversas razões. Mais recentemente, desde o
reconhecimento de que esse compartimento tem o papel efetivo de não só acumular
ou estocar espécies, nutrientes e contaminantes, mas também de efetuar trocas
destes com a coluna d’água, estudos de sedimentos contaminados por grande
variedade de compostos orgânicos e inorgânicos, oriundos de múltiplas atividades
antrópicas, garantiram sua importância e constituem eixos de projetos ambientais que
passaram a envolver, inclusive, órgãos governamentais de gerenciamento ambiental
e a preocupar legisladores, como já enfatizado por Mozeto (2004).
A questão central que norteia os estudos de sedimentos de ambientes
aquáticos, especialmente os degradados, é que hoje se reconhece que uma avaliação
mais inequívoca do impacto ambiental negativo da presença de contaminantes
nesses ambientes só poderá ser realizada se, estrategicamente, os sedimentos forem
incluídos nos protocolos de programas de monitoramento da qualidade ambiental
(Mozeto, 2004), assim como da biota associada a estes (Rodrigues et al., 2006).
Exigindo, para tais fins, o desenvolvimento de valores de referências (Guidelines)
para os procedimentos corretos de coleta, determinações biogeoquímicas in situ
e subsequentes manipulações de campo e laboratório, até a etapa de análises
biogeoquímicas dos sedimentos, que são necessários e podem ser efetuados pela
abordagem em que as fases apropriadas dos sedimentos, como as águas intersticiais,
sejam separadas, bem como sejam realizadas extrações de contaminantes em
determinadas faixas granulométricas que tenham real significado ecotoxicológico.
Além destes procedimentos, tal abordagem deve prever a execução de bioensaios
com diversos tipos de organismos (ver Capítulo 6) e de estudos biológicos in situ,
como avaliação da estrutura das comunidades e processos ecológicos (Barbosa &
Rodrigues, 2006).
Os sedimentos contaminados por metais pesados podem exercer um
grande impacto sobre a vida aquática, contribuindo para a bioacumulação e mesmo
biomagnificação destes contaminantes na rede trófica. Além disto, eles podem
prejudicar a capacidade reprodutiva de muitos organismos e mesmo tornar algumas
áreas inabitáveis para as populações bentônicas (Usepa, 1998). A avaliação das
comunidades de macroinvertebrados e do perifíton constitui uma importante ferramenta
para estimar a qualidade relativa entre águas e sedimentos de um ambiente aquático.
As comunidades bentônicas refletem o estado de preservação e conservação
ecológica como um todo e integram os efeitos de diferentes agentes estressores,
fornecendo uma medida holística de impacto agregado (Gurrieri, 1998). Enquanto
as análises físicas e químicas são usadas para determinar as concentrações dos
contaminantes de interesse nos sedimentos, visando a uma posterior comparação
com valores de referência, os inventários de campo sobre a comunidade bentônica
são empregados para obter uma avaliação direta dos efeitos tóxicos dos depósitos
contaminados sobre a biota local (ver Capítulo 6). Esses métodos de abordagem
são complementares, fornecendo uma resposta única que não pode ser obtida com
a aplicação individual de cada procedimento (Sednet, 2004; Rodrigues et al., 2006).

246 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos


8.4| LEITURA DE EVENTOS PRETÉRITOS E ATUAIS EM ECOSSISTEMAS
AQUÁTICOS

Os sedimentos depositados no fundo de ecossistemas aquáticos constituem


verdadeiros arquivos de informações de natureza química, biológica e física, uma
vez que as camadas de deposição são temporais e sequencialmente acumuladas.
Estudos da reconstrução de ambientes aquáticos têm sido realizados
através de estudos paleolimnológicos (Walker, 1987b; 1991b; Hoffmann, 1986a,
1988; Crisman, 1988; Fry, 1988). Em sedimentos de lagos, as cápsulas cefálicas
de larvas de Chironomidae (Insecta, Diptera) (Figura 8.5) são bem representadas.
A concentração de cápsulas cefálica em finas camadas de deposição do sedimento
indica a natureza e qualidade do sedimento, devido às informações que se agregam
ao tipo de habitat que estes organismos viveram e quais os eventos pretéritos que
ocorreram.

Figura 8.5 – Cápsula cefálica de uma larva sub-fóssil de Chironomidae (Insecta, Diptera),
coletada em frações de sedimento acumuladas ao longo do tempo.

Em análises de eventos atuais, impactos severos, ocasionados


pelas descargas de substâncias tóxicas, também podem ser revelados através da
presença de organismos com deformidades. Como estes organismos possuem pouca
mobilidade e respondem rapidamente às influências do ambiente, os organismos
podem apresentar ausência de estruturas no aparelho bucal – deformidades no
mento e dentes, ou em órgãos sensoriais, como as antenas, quando os eventos
ocorrem de forma frequente e aguda.

8.4 | SEDIMENTO E A RESTAURAÇÃO ECOLÓGICA


A formação de microhabitats e aumento da biodiversidade serve como
premissa básica para a restauração de ecossistemas degradados. Interações do
sedimento nos processos ecossistêmicos (produtividade, consumo e decomposição),

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 247


nas comunidades e populações biológicas e colonização de organismos são relatados
por Rodrigues (2001).
Experimentos a partir do aporte de sedimentos em restauração de cursos
d’água podem também ser realizados. No entanto o distúrbio inicial pelo aporte
dos sedimentos pode afetar a estrutura das assembléias de organismos (como a
abundância e/ou a composição de espécies). Porém, em longo prazo, é possível
verificar a influência do sedimento na formação de novos microhabitats, aumentando
a abundância dos organismos. Muitos dependem de grãos de areia para a construção
dos tubos onde vivem; outros se alimentam da comunidade microbial perifítica e
fitobentos, que se aderem aos grãos de areia. Em áreas degradadas por atividades
antrópicas, como cursos d’água oriundos da drenagem de áreas de mineração,
experimentos que fornecem sedimento nutrido e/ou substrato natural podem ser
utilizados como forma de aumentar a biodiversidade por meio da colonização de
demais organismos no ecossistema aquático. Rodrigues (2001) observou um aumento
da diversidade de macroinvertebrados em lagos com pH < 3, quando oferecido
substrato natural na superfície do sedimento. Nestes ecossistemas extremamente
ácidos, os sedimentos apresentam grande quantidade de metais (Fe++) e sulfatos
SO4-2 que acarretam na diminuição drástica da biodiversidade (Figura 8.6) e na perda
da integridade dos ecossistemas (Figura 8.7).
A restauração ecológica desses ecossistemas aquáticos requer conhecimento
sobre os processos biogeoquímicos que ocorrem na interface dos sedimentos-
água. O conhecimento das populações de bactérias associadas ao sedimento, que
reduzem o Fe+2 e Fe+3 e os eventos de bioturbação dos sedimentos por invertebrados
bentônicos são importantes para a restauração destes ecossistemas.

Figura 8.6 – Relação da riqueza de espécies de invertebrados bentônicos em um gradiente


de pH em ecossistemas aquáticos. O círculo mostra o número de espécies em
ecossistemas com pH < 3.
Fonte: Rodrigues (2001)

248 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos


Figura 8.7 – Representação do compartimento bental com influência do impacto da mineração
do carvão na fauna associada ao sedimento em ecossistemas extremamente
ácidos (pH<3). As setas indicam os caminhos dos recursos disponíveis.
Fonte: Rodrigues (2001)

Rodrigues (2001) conduziu experimentos para verificar o efeito da bioturbação


no sedimento por larvas de Chironomidae (Insecta, Diptera) em lagos originados da
atividade de mineração. Neste experimento, foi observado o efeito da alimentação de
Chironomus crassimanus, espécie-chave, em bactérias, sob condições laboratoriais.
O sedimento, após coletado, foi peneirado em malha 0,2 μm e incubado em quatro
microcosmos (vidros de Becker com 500 mL), em laboratório. Estes microcosmos
foram aerados em temperatura de 8,5°C, e durante 28 dias perfis verticais de
oxigênio foram medidos com um micro-eletrodo, até a estabilização da concentração
de oxigênio. Dez larvas Chironomidae foram incubadas no sedimento em dois
microcosmos, e os perfis de oxigênio foram observados nos microcosmos com e
sem larvas de Chironomidae durante 13 dias (Figura 8.8). O número de bactérias
redutoras de ferro (cel.mL-1) foi determinado nos microcosmos contendo sedimento
com e sem a presença de larvas de Chironomidae.

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 249


Figura 8.8 – Microcosmo para avaliar os efeitos da bioturbação do sedimento e a alimentação
de larvas de Chironomidae em bactérias redutoras de ferro em experimentos
de laboratório. Seta A: microeletrodo de medição de oxigênio; seta B: larva de
Chironomus crassimanus (Chironomidae, Diptera).
Fonte: Rodrigues (2001)

A microtopografia do sedimento foi afetada pela presença de larvas de


Chironomidae, e os níveis de O2 aumentaram durante a incubação. O número
de bactérias diminuiu na presença das larvas em um fator de 2,5 (Tabela 8.1),
evidenciando que as larvas influenciaram no decréscimo significativo na população
de bactérias. A população desta espécie de Chironomidae, que é uma espécie-chave
e pioneira para os ecossistemas extremamente ácidos (pH < 3), serve de alimento
para outros insetos aquáticos, predadores-topo, o que aumenta a biodiversidade
destes ecossistemas.

Tabela 8.1 – Número de bactérias redutoras de ferro (cel/ml) em sedimento de lago


acidificado por atividades de mineração, em microcosmos com e sem a
presença de larvas de Chironomidae (Diptera, Insecta)
Profundidade (+) Ch. crassimanus ( - ) Ch. Crassimanus
do Sedimento Fator
(mm) média min. máx. média min. máx.

0-4 mm 99.12 46.90 124.38 193.4 100.96 209.50 2.0

4-8 mm 80.66 37.89 105.04 262.6 138.20 324.10 3.2

8 mm 49.44 25.04 59.66 247.3 129.80 275.90 5.0


Fonte: Rodrigues (2001)

250 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos


8.6 | REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARBOSA, A. F. 2005. Desenvolvimento de metodologia para análise de impacto e
monitoramento ambiental a partir do estudo do metabolismo de sistemas aquáticos
utilizando os processos de decomposição e colonização foliar por macroinvertebrados
como indicativo da qualidade ecológica da água. Dissertação de Bacharelado. Curso
de Ciências Biológicas, Instituto de Biociências, UFRGS.

BHOWMIK, N. G.; DEMISSIE, M. 1986. Momence Wetland: Influence on sediment and water,
pp. 71–77. In: Sly, P.G. (ed.), Sediment and Water Interactions. Springer-Verlag,
New York, New York, USA.

BOTO, K. G.; PATRICK, W. H. 1978. Role of wetlands in the removal of suspended sediments,
pp. 479–489. In: Greeson, P.E. and Clark, J.R. (eds.), Wetland Functions and
Values: The State of Our Understanding. American Water Resources Association,
Minneapolis, Minnesota, USA.

CASAS, J. J.; GESSNER, M. O. 1999. Leaf litter breakdown in a Mediterranean stream


characterised by travertine precipitation. Freshwater Biology. 41, pp.781-793.

CORDONE, A. J.; KELLEY, D. 1961. The influence of organic sediment on aquatic life of
streams. Cal. Fish & Game, 47, pp.189–228.

CRANWEL, P. A. 1976. Organic compounds as indicators of allchtonous and autochthonous


input to lake sediment. In: Golterman, H.L. Interactions beteween sediments amd
fresh waters. Proceedings of an International Symposium held at Amsterdam, The
netherlands.

CRISMAN, T. L. 1988. The use os subfossil benthic invertebrates in aquatic resource


management, pp.71-88. In: Aquatic Toxicology and Hazard Assessment: 10th
Volume, eds. W.J. Adamns, G.A. Chapman, and W.G. Landis, American Society
for Testing and materials Special Technical Publication 971. American Society for
Testing and materials, Philadelphia, PA.

CULP, J. M.; WRONA, F. J.; DAVIES, R. W. 1986. Response of stream benthos and drift to
fine sediment deposition versus transport. Can. J. Zool. 64, pp.1345–1351.

DAVIES-COLLEY, R. J.; HICKEY, C. W.; QUINN, J. M.; RYAN, P. A. 1992. Effects of clay
discharges on streams. 1. Optical properties and epilithon. Hydrobiologia, 248,
pp.215–234.

DESMA/ONG ANAMA. 2006. Fibras vegetais: Plantas aquáticas e Cipós. Cartilha. 10p.

DITTMAR, L. A.; NEELY, R. K. 1999. Wetland seed bank response to sedimentation varying
in loading rate and texture. Wetlands, 19, pp.341–351.

DOKE, J. L. 1995. Habitat availability and benthic invertebrate population changes following
alum treatment and hypolimenetic oxygenation in Newman Lake, Washington.
Journal of Freshwater Ecology. 10(2), pp.87-101.

EWING, K. 1996. Tolerance of four wetland plant species to flooding and sediment deposition.
Env. Exp. Botany, 36, pp.131–146.

FENNESSY, M. S.; BRUESKE, C. C.; MITSCH, W. J. 1994. Sediment deposition patterns in


restored freshwater wetlands using sediment traps. Ecol. Enging. 3, pp.409–428.

FRY, D. G. 1988. Littoral and offshore communities of diatoms, cladocerans and dipterous
larvae, and their interpretation in paleolimnology. Journal of Paleolimnology, 1:179-
91.

FUKUHARA, H.; SACAMOTO, M. 1987. Enhancement of inorganic nitrogen and phosphat


release from lake sediment by tubificid worms and chironomid larvae. Oikos, 43,
pp.312-320.

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 251


GARDNER, W. S. 1983. Patterns and rates of nitrogen release by benthic Chironomidae and
Oligochaeta. Canadian Journal of Fisheries and Aquatic Sciences. 40(3):p.--

GESSNER, M. O.; CHAUVET, E. 2002. A case for using litter breakdown to assess functional
stream integrity. Ecological Applications. 12(2), pp.498-510.

GRAHAM, A. A. 1990. Siltation of stone-surface periphyton in rivers by clay-sized particles


from low concentrations in suspension. Hydrobiologia, 199, pp.107–115.

GRAY, L. J.; WARD, J. V. 1982. Effects of sediment releases from a reservoir on stream
macroinvertebrates. Hydrobiologia, 96, pp.177-184.

GURRIERI, J. T. 1998. Distribution of metals in water and sediment and effects on aquatic biota
in the upper Stillwater River basin, Montana, Journal of Geochemical Exploration,
64, pp.83-100.

HARTZ, S. M. Alimentação e estrutura da comunidade de peixes da lagoa Cconde, RS. Litoral


Norte do Estado do Rio Grande do Sul, Brasil. São Carlos, SP. Tese de doutorado.
UFSCar.

HOFFMANN, W. 1986a. Chironomid analysis, pp.715-727. In: Handbook of Holocene


Palaeoecology and Palaeohydrology, ed. B.E. Berlung, John Wiley, Chichester,
England.

HOFFMANN, W. 1988. The significance of chironomid analysis (Insecta: Diptera) for


paleolimnological research. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Plaeoecology,
62, pp.501-509.

HOUSE. 1995. Comparison of the uptake of inorganic phosphorous to a suspended and


stream bed-sediment. Wat.Res. 29(3), pp.767-779.

HYNES, H. B. N. 1970. The ecology of running waters. Toronto. Univ. Toronto Press.

JOHNSON, R. K.; WIEDERHOLM, T.; ROSEMBERG, D. M. 1993. Freshwater biomonitoring


using individual organisms, populations, and species assemblages of benthic
macroinvertebrate, pp.40–158. In: Rosemberg, D. M. & Resh, V. (eds.) 1993
Freshwater biomonitoring and benthic macroinvertebrates.

JURIK, T. S.; WANG, S. C.; VAN DER VALK, A. G. 1994. Effects of sediment load on seedling
emergence from wetland seed banks. Wetlands, 14, pp.159–165.

KANSANEN, P. H. 1984. Testing the benthic lake type concept based on chironomid
association in some Finninsh lakes using multivariate statistical methods. Ann. Zool.
Fennici., 21, pp.55-76.

KLEISS, B. A. 1996. Sediment retention in a bottomland hardwood wetland in eastern


Arkansas. Wetlands, 16, pp.321–333.

KUENZLER, E. J. 1989. Value of forested wetlands as filters for sediments and nutrients,
pp.85–96. In: Hook, D.D. and Lea, R. (eds.), Proceedings of the symposium: The
Forested Wetlands of the Southern United States, 1988 July 12–14, Orlando, Florida,
USA. USDA-Forest Service, Southeastern Forest Experiment Station, Asheville,
North Carolina, USA. Gen. Tech. Rep. SE-50.

LENAT, D. R. 1983. Chironomid taxa richness: natural variation and use in pollution
assessment. Freshwat. Invertebr. Biol. 2(4):p.--

LENAT, D. R. 1984. Agriculture and stream water quality: a biological evaluation of erosion
control practices. Env. Manag., 8, pp.333–344.

LENAT, D. R.; PENROSE, D. L.; EAGLESON, K. W. 1981. Variable effects of sediment


addition on stream benthos. Hydrobiologia, 79, pp.187–194.

LEMLY, A. D. 1982. Modification of benthic insect communities in polluted streams: combined

252 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos


effects of sedimentation and nutrient enrichment. Hydrobiologia, 87, pp.229–245.

MARTIN, D. B.; HARTMAN, W. A. 1987. The effect of cultivation on sediment composition


and deposition in prairie potholes. Water, Air & Soil Poll. 34, pp.45–53.

MEADOWS, A. 1991a. Burrows and burrowing animals: an overview. Symp. Zool. Soc. Lond.,
63, pp.1-13.

MEADOWS, P. 1991b. The environmental impact of burrows and burrowing anmals –


conclusion and a model. Symp. Zool. Soc. Lond. 63, pp.328-338.

MILBRINK, G. 1983. An improved environmental index based on the relative abundance of


Oligochaetea species. Hydrobiologia, 102, pp.89-97.

MILBRINK, G. 1994. Oligochaeta and water pollution in two deep Norwegian lakes.
Hydrobiologia, 278, pp.213-222.

MOZETO, A. A. 2004. Sedimentos e particulados lacustres: Amsotragens e análises


biogeoquímicas, pp.295-317. In: Carlos E.M. Bicudo, Denise de C. Bicudo (Org.).
Amostragem em Limnologia. São Carlos: RiMa, 317p.

MUDROCK, A.; MACKNIGHT, S. C. 1994a. Introduction, pp.1-3. In: Mudrock, A.; Macknight,
S. D. (Eds). Handbook of techniques for aquatic sediment sampling. Boca Raton.
Lewis Publishers.

NEELY, R. K.; WILER, J. A. 1993. The effect of sediment loading on germination from the
seed bank of three Michigan wetlands. The Mich. Bot. 32, pp.199–207.

NOVICK, B. L.; NIXON, S. W. 1985. Benthic community metabolism in a coastal lagoon


ecosystem. Mar. Ecol. Progr. Ser., 22, pp.21-30.

NUTTALL, P. M.; BIELBY, G. H. 1973. The effect of china-clay wastes on stream invertebrates.
Env. Poll., 5, pp.77–86.

PASCOAL, C.; PINHO, M.; CÁSSIO, F.; GOMES, P. 2003. Assessing structural and functional
ecosystem condition using leaf breakdown: studies on a polluted river. Freshwater
Biology, 48, pp.2033-2044.

PETR, T. 1976. Bioturbação e trocas químicas na interface sedimento-água. pp.216-226. In:


Golterman, H.L. Interactions beteween sediments amd fresh waters. Proceedings
of an International Symposium held at Amsterdam, The Netherlands, September,
1976.

PREMAZZI, G.; REVEA, O. 1976. Chemical characteristics of lake Lugano sediments.


pp.121.124. In: Golterman, H.L. Interactions beteween sediments amd fresh waters.
Proceedings of an International Symposium held at Amsterdam, The Netherlands,
September, 1976.

QUINN, J. M.; DAVIES-COLLEY, R. J.; HICKEY, C. W.; VICKERS, M. L.; RYAN, P. A. 1992.
Effects of clay discharges on streams. 2. benthic invertebrates. Hydrobiologia, 248,
pp.235–247.

RESH, V. H.; PRICE, D. G. 1984. Sequencial sampling: a cost-effective approach for monitoring
benthic macroinvertebrates. Environmental impact assessments: environmental
management, 8(1), pp.75-80.

REISS, F. 1976a. Charakterisierung zentralamazonischer Seen aufgrund ihrer


Makrobenthosfauna. Amazoniana, 6(1), pp.123-134.

REISS, F. 1977a. Qualitative and quantitative invetigations on the macrobenthic fauna of


central Amazon lakes. Amazoniana, 6(2), pp.203-235.

REISS, F. 1977b. The benthic zoocenoses of central Amazon várzea lakes and their
adaptations to the annual water level fluctuations. Geo. Eco. Trop., 1(2), pp.65-75.

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 253


REINOLDSON, T. B. 1995. Biological guidelines for freshwater sediment based on benthic
assessment of sediment T (the Beast) using a multivariate approach for predicting
biological state. Australian Journal of Ecology, 20, pp.198-219.

RODRIGUES, G. G. 1996. Aspectos dinâmicos e estruturais da macrofauna bentônica da


Lacoa Canconde, Osório, Rio Grande do Sul, Brasil. Dissertação de mestrado.
PPG-Ecologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 205p.

RODRIGUES, G. G.; WÜRDIG, N. L. 2000. The Chironomidae community of a small coastal


lake (Lake Caconde) from southern Brazil, pp.339-344. In: Odwin Hoffrichter. (Org.).
Late 20th Century Research on Chironomidae: an Anthology from 13th International
Sympoisum on Chironomidae. Aachen: Slaker Verlag.

RODRIGUES, G. G. 2001. Benthic fauna in extremely acidic lakes (pH 2-3). UFZ-Bericht.
Leipzig, Alemanha. 130p.

RODRIGUES, G. G.; HARTZ, S. M. 2001. Food dynamics of fish and the interaction with
macroinvertebrates from a shallow lake from southern Brazil. Verh. Internat. Verein
Limnol., Stuttgart, 6(27), pp.3309-3314.

RODRIGUES, G. G.; BARBOSA, A. F. 2006. Concepção ecossistêmica para avaliação da


qualidade da água na bacia do Lajeado Grande, pp.85-96. In: Niro Afonso Pieper
(Eds.). Controle da contaminação ambiental decorrente da suinocultura no Rio
Grande do Sul: Manual Técnico/ Secretaria Estadual do Meio Ambiente, Porto
Alegre, Vol.2.

RODRIGUES, G. G.; SILVEIRA, T. C. L.; BARBOSA, A. 2006. Macroinvertebrados aquáticos


e o licenciamento ambiental. Boletim da Sociedade Brasileira de Limnologia, 35(2),
pp.47-51.

RODRIGUES, M. L. K.; BARBOSA, A. F.; BINOTTO, R. B.; RODRIGUES, G. G.; RODRIGUES,


A. L. M. 2006. Avaliação de sedimentos e macroinvetebrados bentônicos em
ambiente fluvial afetado por atividades agrícolas na bacia do rio Lajeado Grande
(U030, RS, Brasil). 7º. Encontro Nacional do Sedimento. IPH/UFRGS, Porto Alegre.

ROSENBERG, D. M. 1992. Freshwater biomonitoring and Chironomidae. Netherlands


Journal of Aquatic Ecology. 26(2-4), pp.101-122.

ROSAS et al. 1985. Benthic organisms as indicators of water quality in Lake Patzcuaro.
México. Water, air, and Soil Pollution. 25, pp.401-414.

SCHWARZBOLD, A.; SCHÄFER, A. 1984. Gênese e morfologia das lagoas costeiras do Rio
Grande do Sul, Brasil. Amazoniana, 9(1), pp.87-104.

SEDNET, 2004. Contaminated Sediment in European River Basins, Disponível em: http://
sednet.org/materiale/SedNet_booklet_final_version.pdf Accesso em: Nov 2004.

TÁTRAI, I. 1986. Rates of ammonia release from sediments by chironomid larvae. Freshwater
Biology, 16, pp.61-66.

TIMMERMAN, K. R. 1992. Cadimium, zinc, lead and cooper in Chironomus riparius (Meigen)
larvae (Diptera, Chironomidae): uptake and effects. Hydrobiologia, 241, pp.119-134.

USEPA. 1998. Usepa/Office of Water. Contaminated Sediment. Disponível em: http://


www,epa,gov/ost/cs/manage/coverlet,html, acesso em: 30 janeiro 2001.

VARGO, S. M.; NEELY, R. K.; KIRKWOOD, S. M. 1998. Emergent plant decomposition and
sedimentation: response to sediments varying in texture, phosphorus content and
frequency of deposition. Env. Exp. Bot., 40, pp.43–58.

VAN DER VALK, A. G.; SWANSON, S. D.; NUSS, R. F. 1983. The response of plant species
to burial in three types of Alaskan wetlands. Can. J. Bot., 61, pp.1150–1164.

VAN ANDEL, J.; ARONSON, J. 2006. Restoration ecology: The new frontier. Blackwell publ.
319p.

254 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos


VILLWOCK, J. A. 1884. Geology of the Rio Grande do Sul Coastal province. In: Rabassa, J.
(Ed.) Quartenary of South America and Antartic Peninsula. Rotterdam, Balkma, 4,
pp.79-97.

VILLVOCK, J. A. 1972. Contribuição à geologia do Holoceno da privincia Costeira do Rio


Grande do Sul. Dissertação mestrado em Geociências. UFRGS. Porto Alegre, 113p.

WAGENER, S. M.; LAPERRIERE, J. D. 1985. Effects of placer mining on the invertebrate


communities of interior Alaska streams. Freshw. Inv. Biol., 4, pp.208–214.

WALKER, I. R.; MATHEWES, R. W. 1987b. Chironomids, lake trophic status, and climte.
Quartenary Research, 28, pp.431-437.

WALKER, I. R.; SMOL, J. P.; ENGSTROM, D. R.; BIRKS, H. J. B. 1991b. An assessment of


Chironomidae as quantitative indicators of past climatic change. Canadian Journal
of Fisheries and Aquantic Sciences, 48, pp.975-87.

WOLZ, E. R.; SHIOZAWA, D. K. 1995. Soft sediment benthic macroinvertebrate communities


of the Green River at the Ouray National Wildlife Refuge. Uintah Country. Utah.
Breat Basin naturalist., 55(3), pp.213-224.

WOODIN.1981. Disturbance and community structure in a shallow water sand flat. Ecology,
62(4), pp.1052-1066.

WIEDERHOLM, T. 1980b. Use of benthos in lake monitoring. J. Wat. Polut. Cont. Fed., 52(3),
pp.537-547.

WÜRDIG, N. L.; ALBERTONI, E.; OZORIO, C. O.; WIEDENBRUG, S.; RODRIGUES, G.


G. 1998. The Influence of environmental parameters in the structure of the benthic
community in coastal lagoons of Rio Grande do Sul, Brazil. Verh. Internat. Verein
Limnol., 26, pp.1541-1517.

Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos | Capítulo 8L 255


256 M Capítulo 8 | Influência do sedimento em ecossistemas aquáticos
Aplicação das Características Químicas
e Físicas dos Sedimentos na Modelagem
dos Processos de Emissão de Sedimentos
em Bacias Hidrográficas
Capítulo 9

APLICAÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS QUÍMICAS E FÍSICAS DOS


SEDIMENTOS NA MODELAGEM DOS PROCESSOS DE EMISSÃO DE
SEDIMENTOS EM BACIAS HIDROGRÁFICAS
Jean Paolo Gomes Minella & Gustavo Henrique Merten

9.1 | INTRODUÇÃO
Os crescentes problemas ambientais relacionados com a degradação dos
solos, qualidade da água e a saúde humana enfatizam a urgente necessidade de
estudos com características multidisciplinares capazes de esclarecer os efeitos da
dinâmica do uso e manejo do solo e seus impactos aos recursos naturais. Parte
significativa dos impactos negativos à qualidade da água é causada pelos sedimentos
erodidos, especialmente daqueles originados de áreas com presença de poluentes,
como os agrícolas, os de mineração e os urbanos. Sedimentos são vetores de
poluentes, pois a sua natureza geoquímica (agregados formados pela presença de
partículas primárias, óxidos e matéria orgânica) permite tanto a adsorção como a
liberação de poluentes capazes de afetar severamente a biota aquática e a qualidade
da água. Sendo assim, dados referentes à “qualidade dos sedimentos” são importante
para a compreensão dos processos de degradação ambiental. Abaixo são citados
alguns exemplos de aplicação dos estudos de qualidade de sedimentos:
a) características e potencial dos microagregados, flocos, e partículas
primárias na adsorção e desorção de contaminantes (Horowitz, 1991; Droppo et al.,
1998; Droppo, 2001);
b) transporte de contaminantes para rios, lagos e planícies fluviais
associados aos sedimentos (Walling et al., 2003; Minella et al., 2004), e os fatores
que regulam a interação entre sedimentos e contaminantes em ambientes aquáticos
(Förstner & Wittmann, 1983; Salomons & Stigliani, 1995);
c) uso de propriedades traçadoras dos sedimentos para identificação de
fontes de sedimentos (Walling & Woodward, 1995; Collins et al., 1997; Foster et al.,
2002; Minella et al., 2008).
Para Förstner & Wittmann (1983), o desenvolvimento de análises mais
detalhadas e precisas das características dos sedimentos, subsidiaram o surgimento
de uma nova área de pesquisa denominada “qualidade de sedimento”, a qual integra
áreas como a sedimentologia, a hidrologia, a biologia e a química. Algumas linhas de
pesquisa têm investigado como a “qualidade dos sedimentos” pode contribuir para
a compreensão dos mecanismos de transferência dos sedimentos das vertentes

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 259
para a rede de drenagem. Uma linha importante destes estudos está baseada em
métodos diretos de comparação das características físicas e químicas dos sedimentos
transportados nos rios com a qualidade dos sedimentos nas suas fontes (Walling,
1990).

9.2| PROCESSOS DE LIGAÇÃO ENTRE OS ECOSSITEMAS TERRESTRES E


AQUÁTICOS

O crescimento agrícola e urbano, com a ocupação desordenada das


bacias hidrográficas, gera um dos maiores impactos negativos ambientais e sócio-
econômicos negativos, que é a erosão e a produção de sedimentos. Mesmo tendo
mais de meio século de investigações, as relações entre os fatores relacionados com
a geração dos sedimentos e sua transferência para a calha fluvial representa um
desafio para a pesquisa.
Denomina-se de “produção de sedimentos” a quantidade de sedimentos que
é removida para fora de uma determinada área de drenagem considerada (Carvalho,
1994). A produção de sedimentos representa uma parcela do total de sedimentos que
foi produzido em uma bacia em decorrência de todos os processos erosivos atuantes.
A quantidade total de sedimentos mobilizado em uma bacia hidrográfica denomina-se
de “erosão bruta”. A produção de sedimentos representa a diferença entre a erosão
bruta e a quantidade de sedimentos (depositada nos sopés das vertentes, retida pela
vegetação, em depressões do relevo, dentro dos canais de drenagem, etc):

= EB − DS (Equação 9.1)
PS

Onde:
PS é a produção de sedimentos (t.km-2.ano-1);
EB é a erosão bruta (t.km-2.ano-1); e,
DS é a quantidade de material erodido depositado na bacia (t.km-2.ano-1)

O conhecimento da conexão entre a quantidade sedimento produzida nas
vertentes (erosão bruta) e a quantidade de sedimento que chega no exutório da
bacia (produção de sedimento) é importante para a avaliação do impacto do uso das
terras na degradação das bacias e para a investigação do movimento dos sedimentos
associados com nutrientes e poluentes (Walling, 1988). A relação entre a erosão
bruta nas vertentes e a produção de sedimento monitorada nos rios é conhecida
como “razão de emissão de sedimentos” ou “SDR - sediment delivery ratio”:

PS
SDR = (Equação 9.2)
EB

Onde:
SDR é a razão de emissão de sedimentos (adimensional);

260 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
PS é a produção de sedimentos (t.km-2.ano-1); e,
EB a erosão bruta (t.km-2.ano-1).

A razão de emissão de sedimentos é influenciada por uma larga quantidade
de fatores geomorfológicos, hidrológicos e humanos, incluindo a natureza, a extensão
e a localização das fontes de sedimentos. Sabe-se que apenas uma pequena fração
do solo erodido que é convertido em sedimento nas vertentes chega até o exutório
da bacia, sendo que a magnitude desta fração diminui principalmente com o aumento
do tamanho da bacia (Walling, 1988; NCASI, 1999). Esta relação inversa entre o
tamanho da bacia e a emissão de sedimentos é explicada pelo decréscimo dos
gradientes das rampas e canais, e pelo aumento das condições de deposição e
interceptação (Walling, 1988). Em geral, o suprimento dos sedimentos é controlado,
primariamente, pelo uso e manejo do solo e pelo clima, enquanto que a emissão de
sedimentos é controlada, principalmente, por aspectos relacionados com a fisiografia
local (Coleman & Scatena, 1986).
NCASI (1999) descreve características importantes dos sedimentos e da
bacia que influenciam a complexidade da conexão entre os processos que ocorrem
nas vertentes e o que monitoramos no rio que são denominados “efeitos cumulativos
de bacia”. Para os sedimentos do tamanho silte e areia, os principais problemas
estão relacionados com a descontinuidade do movimento das partículas em direção
ao exutório, e os fatores controladores seriam a declividade e a forma das vertentes
(NCASI, 1999). Para os sedimentos do tamanho argila ou microagregados, os
principais problemas estão relacionados com os processos de floculação e dispersão
das argilas que dependem das condições físico-químicas do meio e do tipo de
material que compõe os sedimentos finos (Hillel, 1998). O transporte de sedimentos
provenientes de áreas fontes através das vertentes e sistemas de canais é controlado
por uma sequência de processos descontínuos, o qual alterna eventos de transporte
rápido com eventos de longo período de armazenamento (NCASI, 1999).
A partir da década de 70, alguns estudos iniciaram a investigação da
variabilidade espacial e temporal da emissão de diferentes fontes de sedimentos
para o exutório da bacia (Wolman, 1977; Walling et al., 1979; Grimshaw & Lewin,
1980; Ongley, 1982; Yu & Oldfield, 1989). O objetivo fundamental desses estudos foi
identificar a contribuição de diferentes ambientes de uma bacia para a produção total
de sedimentos. O princípio fundamental é utilizar as características dos solos das
fontes e comparar com as dos sedimentos em suspensão coletados nos rios. Esses
estudos são classificados como “métodos diretos” de modelagem da erosão hídrica
na escala da bacia. Com essa informação, foi possível avançar significativamente
na compreensão dos processos que determinam as taxas de emissão da bacia e
na quantificação real do potencial poluidor de cada fonte. Sendo assim, os métodos
diretos são úteis e importantes para a modelagem dos processos erosivos e
ambientais na escala de bacia.
Algumas características naturais dos solos e dos sedimentos apresentam
propriedade traçadora. A viabilidade e a eficiência da modelagem dependem da
conservatividade desses elementos e da sua capacidade de distinguir as diferentes
fontes. Consequentemente, um dos principais pressupostos para a utilização das

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 261
características dos solos e dos sedimentos erodidos nessa metodologia é que os
sedimentos erodidos devem manter na sua estrutura as mesmas características do
elemento ou a característica traçadora presente na fonte. Sendo assim, a escolha
dos elementos traçadores deve considerar seu comportamento no ambiente. Cada
elemento químico ou substância apresenta um comportamento diferente em relação
aos inúmeros fatores ambientais que influenciam nesse percurso. As taxas de
enriquecimento e depleção podem comprometer a aplicação de métodos diretos.
Sabendo que muitos poluentes são transportados associados com os
sedimentos é importante conhecer em que situação ambiental (pH, oxidação-redução,
temperatura, etc.) os contaminantes podem dissociar-se dos sedimentos e ficar em
uma forma reativa ou disponível. No próximo item, iremos explorar as principais
características dos sedimentos e os fatores ambientais que afetam a interação entre
os elementos químicos e os sedimentos.

9.3| INTERAÇÕES ENTRE SEDIMENTOS, CONTAMINANTES E ELEMENTOS


TRAÇADORES

Neste item é feita uma breve abordagem dos principais fatores químicos e
físicos que determinam: (i) a capacidade de alguns elementos serem utilizados como
traçadores naturais, e (ii) dos fatores que afetam a capacidade de dos sedimentos
em transportar e tornar disponíveis os contaminantes das diferentes fontes. No
primeiro caso, o ponto de interesse é estabelecer em que condições os elementos
químicos estão retidos pelos sedimentos e em que condições irão dissociar-se. No
segundo caso, nos interessa saber como os contaminantes são transportados pelos
sedimentos e em que condições esses contaminantes se tornam disponíveis ao
ambiente, ocasionando os problemas de poluição.
A compreensão dos diferentes mecanismos de associação entre os elementos
ou substâncias químicas e sedimentos, baseia-se no entendimento dos mecanismos
de enriquecimento/depleção que ocorrem nos ambientes úmidos e/ou aquáticos.
Inúmeras reações de sorção podem ocorrer entre a superfície de minerais e colóides
com os poluentes. A abrangência na qual as reações ocorrem é determinada pelos
mecanismos de fixação e pelas características do meio, às quais influenciam esses
mecanismos. Apesar das diferentes origens e formas químicas dos elementos, e
dos diferentes meios em que ocorrem, eles apresentam semelhanças quanto aos
mecanismos de conexão, o que possibilita compreendermos, em parte, a dinâmica
geoquímica desses elementos nos ambientes aquáticos.
Nesses termos, o estudo dos fenômenos relacionados com a qualidade dos
sedimentos tem se mostrado muito importante nos fatores que afetam a distribuição
espacial e temporal, e principalmente, a dinâmica biogeoquímica nos solos e
sedimentos.

262 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
9.3.1 Composição dos sedimentos em ambientes tropicais e propriedades
conservativas dos elementos traçadores

Nas regiões tropicais, o principal componente da fração argila dos solos é o mineral
do tipo Caulinita (argilo-mineral 1:1). A Caulinita apresenta uma baixa área superficial
específica (ASE), definida como uma medida de superfície exposta de um objeto em
relação ao seu volume. A ASE das caulinas varia entre 10 e 20 m².g-1, a da vermiculita
(argilo-mineral 2:1) apresenta valores de ASE entre 300 e 500 m².g-1 e a das partículas
primárias, como o silte e a areia fina, apresentam uma ASE < 1 m².g-1 e < 0,1 m².g-1,
respectivamente. A importância da ASE sobre as propriedades químicas dos sedimentos
está relacionada a sua reatividade química. Assim, à medida que aumenta a ASE, maior
será a reatividade dos sedimentos com moléculas orgânicas ou íons do meio.
Entretanto, Förstner & Wittmann (1983) alertam que os minerais de argila
podem não apresentar uma relação direta com a concentração de elementos traçadores
e os poluentes, sendo que a principal função dos argilo-minerais seria a de servir como
substrato mecânico para floculação e precipitação de matéria orgânica e minerais
secundários (p.ex., sesquióxidos de ferro e manganês). Os argilo-minerais, uma vez
combinados com os óxidos e a matéria orgânica, formam microagregados estáveis e,
dessa forma, apresentam um grande potencial para concentrar e transportar elementos
traçadores e poluentes nos ecossistemas aquáticos.
Os óxidos hidratados de manganês, alumínio e ferro, conhecidos como
sesquióxidos, são também componentes importantes da fração argila em regiões
tropicais. Os sesquióxidos atuam como agentes cimentante na estabilização de
agregados. Os sesquióxidos de ferro e manganês constituem a mais importante fração
mineral de comportamento coloidal na água nos ambientes tropicais. Por causa de sua
estrutura e alta área superficial por unidade de peso, os sesquióxidos apresentam uma
alta tendência de se unir com substâncias químicas e minerais (Hillel, 1998).
Os óxidos de ferro são resultantes do intemperismo e da pedogênese que
ocorrem em regiões tropicais com boa disponibilidade de umidade. Os óxidos de
manganês são o resultado das mesmas condições anteriores associados a áreas
onde haja alteração constante de condições de oxi-redução. Exemplos dessas áreas
seriam as vertentes convergentes e margens dos rios. Estes elementos químicos
podem apresentar grande estabilidade no ambiente, devido ao estado de oxidação
presente (Inda, 2002). Elementos traços, associados aos óxidos de ferro e manganês,
serão estáveis ou ambientalmente indisponíveis, a menos que exista um decréscimo
substancial na quantidade de oxigênio ou um aumento significativo na atividade
biológica (Inda, 2002). Dessa forma, os elementos associados a esse compartimento
químico apresentam uma boa conservatividade e ótima capacidade discriminante
(Collins et al., 1997; Walling & Collins, 2000).
A matéria orgânica é outra fração que tem um papel importante nas trocas
de cátions e na formação de complexos com poluentes. Devido ao seu baixo
peso molecular, grande área superficial e elevada quantidade de cargas negativas
superficiais, as moléculas orgânicas podem formar complexos estáveis com metais,
aumentando a capacidade de deslocamento dos poluentes metálicos.
Já para os elementos químicos que se encontram associados à estrutura

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 263
cristalina dos sedimentos estes apresentam uma alta conservatividade, entretanto,
se não existem diferenças significativas na geologia ou tipo de solo na bacia, a
concentração dos elementos traçadores associados à fase cristalina é similar entre as
fontes, ou seja, não apresenta propriedade discriminante.
Um exemplo que ilustra a conservatividade de alguns metais ligados
aos sedimentos é apresentado na Tabela 9.1 (Horowitz, 1991). Neste trabalho, o
autor procurou avaliar a presença de alguns elementos químicos nos diferentes
compartimentos geoquímicos formadores do sedimento. Assim aqueles elementos
químicos encontrados nos componentes geoquímicos, cujo processo de ligação são
mais estáveis (óxidos e fase cristalina), estariam representando uma condição de
conservatividade desse elemento traçador.

Tabela 9.1 – Fracionamento químico de elementos traçadores associados com


sedimentos em suspensão
Fase Cr Mn Fe (%) Co Ní Co
Adsorvida 3,5 0,8 0,007 6,5 3,2 3,5
Orgânica 11 6,7 9,0 16,4 15,0 4,5
Óxidos de Fe, Al e Mn 5,2 54,8 43,6 28,8 47,2 5,7
Cristalina 80,3 37,8 47,4 48,3 34,6 86,2
Fonte: Horowitz (1991)

Esses resultados permitem também verificar o potencial da disponibilidade


ambiental dos traçadores e dos contaminantes. Para cada estudo devemos escolher
qual o compartimento químico que está relacionado com o mecanismo químico de
interesse. Em geral, as concentrações dos elementos associados à fase cristalina
são indisponíveis e conservativos. Os elementos associados aos óxidos apresentam
uma boa conservatividade e uma ótima capacidade discriminante entre as fontes, e
por isso são bons traçadores. Os elementos adsorvidos ou associados à fase orgânica
são disponíveis, não conservativos e são utilizados nas análises do potencial de
contaminação dos recursos hídricos.
Em geral, os estudos de identificação de fontes de sedimentos e contaminantes
geram um grande número de amostras. Consequentemente, é importante otimizar o
número de análises químicas baseado no conhecimento prévio do comportamento do
contaminante ou do traçador no ambiente. A análise deve indicar quais elementos e
compartimentos apresentam, simultaneamente, conservatividade e discriminação entre
as fontes, e, nos casos dos contaminantes, quais os compartimentos que realmente
afetam a poluição do ambiente. Essa análise está baseada nos mecanismos de interação
entre sedimentos e elementos químicos e nos fatores ambientais que influenciam nessas
interações. Nos itens seguintes apresentamos um resumo desses mecanismos e fatores.

9.3.2 Mecanismos de sorção entre sedimentos e contaminantes ou


elementos traçadores

Sedimentos e solos são conhecidos pela sua capacidade em remover/liberar

264 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
íons por meio de reações de adsorção e desorção, respectivamente. Segundo
McBride (1994), adsorção é a transferência de íons da fase aquosa para a fase
sólida; e desorção a transferência da fase sólida para a aquosa. O termo sorção é um
processo complexo que engloba a adsorção e a absorção. A liberação ou a fixação
de poluentes nos sedimentos dependerá das características físicas e químicas
do sedimento, do poluente e do meio em que se encontram. A compreensão dos
diferentes mecanismos de associação entre poluentes e sedimentos (Tabela 9.2) é
fundamental para o entendimento dos níveis reais da concentração de poluentes, e
principalmente do potencial de liberação destes para os sistemas aquáticos (Forstner
& Wittmann, 1983).

9.3.3 Características do meio aquoso que afetam a relação sedimentos e


poluentes ou elementos traçadores

Os fenômenos de oxidação e redução são altamente significativos na química


dos corpos de água. O redox, assim como o pH, também é um parâmetro controlador
da conservatividade e da disponibilidade de elementos químicos nos sistema
aquáticos e no solo. Sobre condições de saturação de água, a falta molecular de
oxigênio pode resultar no desencadeamento de uma sequência de reações de redox
que irá influenciar o pH do meio. Sendo assim, estes dois parâmetros controladores,
reações de redox e pH, exercem forte influência. O estudo dessas variáveis pode
contribuir para o estudo dos elementos traçadores e do potencial de poluição dos
sedimentos.

Tabela 9.2 – Principais mecanismos de sorção entre sedimentos e poluentes

1. Sorção de Cátions Metálicos (Mt+)

a) Reações de troca de cátions - forças eletrostáticas não específicas, dependentes


de:
• Valência, raio atômico e efeito de hidratação,
• Concentração e o pH da solução,
• Reações que envolvem cátions hidrolisados,
• Reações específicas entre trocadores inorgânicos e cátions,

b) Sorção química nos alumino-silicatos e óxidos - forças eletrostáticas específicas


M-OH + Mt+Z E M-OMtZ-1 + H+ ou M-OH + MtL+Z E M-OMtLZ-1 + H+ ou
M-OH + MtL+Z E M-OMtLZ+1 + OH- ou

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 265
Processo seletivo com sorção preferencial de cátions específicos:
• SiOH-, AlOH2- e AlOH- $ minerais de argila
• FeOH-, MnOH- $ sesquióxidos de ferro e manganês
• Fenólicos e carboxílicos OH- $ substâncias orgânicas (L)

2. Sorção de Ânions
a) sítios de troca positivos dos colóides dos solos

3. Complexão de Metais na Matéria Orgânica

a) troca iônica entre H+ e o metal, em um grupo funcional ácido


M+x + >LHy = >L-M(x-y)+ + yH+
b) efeito quelatação, aumento na complexidade da reação
>L
MX+ + 2 >LH = M(X-2)+ + 2H
>L

4. Precipitação e de Íons Inorgânicos

MtXZ(s) E Mt+Z(aq) + ZX-(aq)

Principais metais precipitados em diferentes particulados:


• Sesquióxidos de Fe $ V, Mn, Ni, Cu, Zn, Mo
• Sesquióxidos de Mn $ Fe, Co, Ni, Zn, Pb
• Carbonatos de Ca $ V, Mn, Fe, Co, Cd
• Minerais de argila $ V, Ni, Co, Cr, Zn, Cu, Pb, Ti, Mn, Fe

5. Complexos Ternários

a) complexo ternário A, um íon metálico (Mx+), une a superfície (S) com o ânion (An-)
>S-OH + M + A = >S-O-M-A + H+
b) complexo ternário B, na qual um ânion forma uma ponte entre a superfície e o
metal
>S-OH + M + A = >S-A-M + OH-

Fontes: McBride (1994); Salomons (1995); Forstner & Wittmann (1983)

a) oxidação e redução (redox)


Condições de redox são controladas, principalmente, pela degradação
microbiana da matéria orgânica e por mudanças na estratificação térmica de lagos,
reservatórios e rios (Salomons, 1995). Reações de oxidação e redução (redox) são

266 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
aquelas que envolvem mudanças no estado de oxidação dos reagentes, havendo
uma transferência de elétrons entre elementos (Manahan, 2000).

*
+e-
OXIDAÇÃO REDUÇÃO
-e-

Geralmente, a transferência de elétrons em uma reação de redox é


acompanhada por transferência de íon H+. Por isso, as reações redox influenciam o
parâmetro controlador pH. Por exemplo, se ferro (II) solúvel perde um elétron em pH
7 (oxidação), três íons de hidrogênio serão liberados para o ambiente alterando o pH
e formando hidróxido de ferro (III), altamente insolúvel (Atkins, 1978).
Fe(H2O)6+2 m e- + Fe(OH)3 (s) + 3 H2O + 3H+
Em corpos de água com pouca turbulência e profundidade significativa,
pode ocorrer uma estratificação térmica. Na parte superior (epilímio), tem-se maior
luminosidade, temperatura e atividade fotossintetizante. Estas características irão
determinar as condições oxidativas do meio. Na parte inferior (hipolímio), a luz do
sol chega com pouca intensidade, diminuindo a temperatura e com baixa atividade
fotossintetizante, determinando a característica redutora do meio.
As Figuras 9.1(a) e 9.1(b) ilustram o fenômeno redox e suas relações
em um sistema aquático. Em profundidades maiores, ambiente redutor, ocorre a
predominância de elementos na sua forma reduzida (p.ex., NH4+ para o nitrogênio,
H2S para o enxofre, Fe(H2O)62+ para o ferro). Na superfície a saturação de oxigênio
atmosférico e o resultado da fotossíntese aquática mantêm a camada superficial
relativamente oxidada. Nesse caso haverá elementos na sua forma oxidada (CO2
para o carbono, NO3- para o nitrogênio, Fe(OH)3 para o ferro, SO4-2 para o enxofre)
(Tabela 9.3) (Manahan, 2000).

Tabela 9.3 – Metais traçadores inorgânicos que podem estar estáveis sobre condições
de oxidação e redução
Metal Condição de oxidação Condição de redução
Cádmio CdCO3 CdS
Cobre Cu2(OH)2CO3 CuS
Ferro Fe2O3 . x(H2O) FeS, FeS2
Mercúrio HgO HgS
Manganês MnO2 . x(H2O) MnS, MnCO3
Níquel Ni(OH)2 , NiCO3 NiS
Chumbo Fe2O3 . x(H2O) PbS
Zinco ZnCO3 , ZnSiO3 ZnS
Fonte: Manahan (2000)

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 267
CO2 O2

CO2 + H2O CH2O + O2


fotossíntese
* alta concentração de O2
* elementos na forma oxidada

transição da temperatura e densidade da água

* baixa concentração de CO2


* elementos na forma reduzida

troca de elementos
químicos com sedimentos

Figura 9.1(a) – Estratificação térmica e da concentração de oxigênio em corpos de água


profundos e com pouca turbulência.
Fonte: Manahan (2000)

O2

CO2 SO42- MnO2


NO3 - Fe(OH)3

Oxidação

Redução
Baixo nível de O2

H 2S CH4 NH4 Fe2+ +Mn2+

Figura 9.1(b) – Dinâmica dos elementos químicos em corpos de água profundos e com pouca
turbulência.
Fonte: Manahan (2000)

b) Acidez (pH)
Na química ambiental o pH é um parâmetro controlador, influenciando a
troca de íons, dissolução/precipitação, adsorção e reações de complexão. Porém,

268 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
o seu valor corresponde à quantidade de H+, e não de todos os cátions que estão
competindo pelos sítios de adsorção dos sedimentos. Para o caso da capacidade
de troca de cátions a ocorrência de um ambiente ácido irá diminuir a possibilidade
de cátions metálicos e de outros poluentes em fixarem-se aos minerais de argila,
óxidos, colóides, etc. A alta/baixa concentração de íons H+ em um sistema aquoso,
irá determinar a dissolução/adsorção de cátions metálicos pela competição dos sítios
de troca (McBride, 1994; Atkins, 1978).
Como mostra a Figura 9.2, a adsorção de metais é altamente dependente
do pH e de forma não linear. Isto significa que pequenas alterações no pH causam
um grande aumento ou decréscimo nos níveis de metal dissolvidos. Uma diminuição
de duas unidades na escala de pH pode dissociar, praticamente, 100% dos metais.

Figura 9.2 – Relação entre adsorção de cátions e pH em hematita.


Fonte: Atkins (1978)

Os íons H+ e OH- são responsáveis pela transferência de cargas positivas e


negativas entre a solução e a superfície de um mineral ou de um óxido. A superfície
destes materiais pode estar desprovida de carga e o pH a que isto ocorre é chamado
de ponto de carga zero (PCZ). Se o pH se elevar acima do PCZ, ocorre a dissociação
de hidroxilas da superfície do mineral, com liberação de cargas negativas e aumento
na capacidade de troca de cátions. Essas cargas negativas obrigatoriamente serão
contrabalançadas por cátions trocáveis. Por outro lado, com a acidificação do meio
(pH baixo), a superfície desse material absorve íons H+, passando a apresentar
capacidade de troca de aniônica e a possibilidade de reter ânions, ou seja, a troca de
ânions aumenta com a diminuição de pH, ao contrário do que ocorre com a troca de
cátions, que aumenta com a elevação do pH (Atkins, 1978).

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 269
9.4 | IDENTIFICAÇÃO DE FONTES DE SEDIMENTOS

9.4.1 Histórico

A utilização de propriedades naturais dos sedimentos como um método direto


de identificação de fontes de sedimentos teve início na década de 70 (Wolman, 1977;
Walling et al., 1979). Inicialmente foram estudadas as propriedades magnéticas e
geoquímicas dos sedimentos, por meio de investigação mais detalhada da descarga
sólida e das variações das mesmas propriedades nas respectivas fontes. O método
foi visto como barato, rápido e eficiente, propondo conceitos importantes para o
desenvolvimento da pesquisa em qualidade de sedimentos.
Na década seguinte, vários trabalhos foram desenvolvidos visando à
identificação das fontes de sedimentos por meio da comparação entre as propriedades
dos sedimentos em suspensão e as fontes. Grimshaw & Lewin (1980), estimaram a
influência das fontes na descarga sólida aplicando um método direto associando
a cor dos sedimentos com a análise dos sedimentogramas e hidrogramas. A
variabilidade sazonal e espacial da cor do material das fontes foi comparada com a
cor do material em suspensão, em diferentes partes do sedimentograma (ascensão
e declínio). Foi identificado que o padrão de cores variava conforme a evolução do
evento, possibilitando com isso determinar a influência de cada fonte em diferentes
partes do hidrograma. As principais dificuldades encontradas na utilização das
cores como propriedade traçadora foram a influência das estações do ano na cor
dos sedimentos e os efeitos de lavagem (flushing) da onda de cheia, que carreia
os sedimentos prontamente disponíveis. Na primavera, o fim da floração adiciona
uma grande quantidade de matéria orgânica afetando a cor dos sedimentos. Da
mesma forma, no outono a queda das folhas também altera a cor dos sedimentos.
Esses efeitos são mais pronunciados nas regiões de clima subtropical e temperado,
aonde as estações são mais definidas. A fase inicial do escoamento superficial
(efeito flushing) transporta, além de sedimentos, substâncias como matéria orgânica
e poluentes que se acumulam entre os eventos de chuva. A cor dessa carga de
lavagem é escura, principalmente nas áreas urbanas, afetando a análise da cor dos
sedimentos provenientes de diferentes fontes.
A influência da contribuição de diferentes fontes de produção de sedimentos
e o efeito da sazonalidade sobre o potencial poluidor dos sedimentos em suspensão
foram estudados por Ongley (1982). Neste trabalho, o autor verificou que as
concentrações dos principais elementos naturais, como os óxidos e as razões entre
as fases orgânicas e minerais dos sedimentos fluviais, apresentavam valores muito
próximos daqueles medidos nas fontes. Ele observou também que a quantidade de
matéria orgânica associadas aos sedimentos e a relação silte/argila apresentavam
uma dependência com as estações do ano.
Ainda na década de 80, Peart & Walling (1986) aplicaram um método de
identificação de fontes de sedimentos baseado na comparação das propriedades dos
sedimentos em suspensão com as propriedades do material de fontes em potencial.
Dentro da evolução do método, foi proposto um estudo preliminar das fontes que

270 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
apresentavam diferenças na composição química e física dos solos. Desta forma,
foram encontrados pequenos grupos de variáveis, capazes de explicar a variabilidade
total das fontes. O segundo passo importante dado em direção à evolução do
método de identificação de fontes de sedimentos foi a classificação das amostras
de sedimento em suspensão, a partir de um modelo estatístico multivariado (Peart &
Walling, 1986). O trabalho deteve-se na distinção dos sedimentos provenientes do
leito dos rios e dos solos superficiais.
A utilização do Cs137 como elemento traçador determinou um avanço importante
na modelagem direta dos processos erosivos. O uso desse elemento possibilitou uma
grande evolução no entendimento da dinâmica dos processos de transferência dos
sedimentos da bacia vertente para a calha fluvial. Desde 1945, testes e acidentes
nucleares injetaram na atmosfera uma grande quantidade deste radionucleotídeo,
que, gradativamente, se depositou em toda a superfície terrestre, principalmente no
hemisfério norte. As partículas de argila da superfície do solo adsorvem fortemente
o Cs137, tornando-o um bom traçador para discriminar fontes oriundas de camadas
superficiais e subsuperficiais do solo. Walling (1990) sugere que as concentrações
de Cs137 do material das fontes e sedimentos em suspensão oferecem uma excelente
capacidade identificadora de fontes de sedimentos. Diferentes fontes de sedimentos
são caracterizadas por diferentes concentrações de Cs137, as quais irão refletir seu
grau de incorporação com o solo e a profundidade do processo erosivo. O solo
atingido pela precipitação do Cs137 adsorverá fortemente o elemento na fração fina,
sendo preferencialmente concentrado perto da superfície. Nos locais em que o solo é
cultivado, a camada superficial é constantemente revolvida, diluindo a concentração
do Cs137, sendo que a concentração do Cs137 na superfície do solo será menor que
aquelas encontradas em solos não cultivados (Walling & Bradley, 1988; Walling &
Bradley, 1990). Além do Cs137, outros elementos radioativos, como Pb210, Be7, Ra226,
também são utilizados para identificação de fontes de sedimentos (Peters et al.,
1993; Foster et al., 2002; Walling & Quine, 1991; Olley et al., 1993).
Outras propriedades traçadoras que têm sido utilizadas são os constituintes
orgânicos do solo, como o carbono e o nitrogênio. Peart (1995) monitorou uma
bacia de 20 km² na região de Hong Kong com o objetivo de reconhecer duas fontes
potenciais a partir da análise de parâmetros orgânicos nos sedimentos em suspensão
e do leito. As fontes avaliadas foram solos superficiais e subsuperficiais, este último
foi dividido em dois grupos: estradas e construções. O primeiro resultado foi que o
parâmetro nitrogênio total não apresentou diferenças significativas entre as fontes;
e, por isso, não poderia ser utilizado como discriminante. Os outros três parâmetros,
carbono orgânico, relação carbono/nitrogênio e matéria orgânica total, apresentaram
diferenças entre o material superficial e subsuperficial, mas não foi possível separar
as duas fontes do grupo dos solos subsuperficiais (estradas e construções). Para os
sedimentos do leito, as médias dos parâmetros carbono orgânico e matéria orgânica
total estiveram próximos aos valores da fonte solos subsuperficiais, entretanto,
os valores da razão C/N encontrados foram próximos aos valores da fonte solo
superficial, sugerindo que poderia haver contribuição desta fonte também. Para os
sedimentos em suspensão, os valores da matéria orgânica total assemelham-se com
a fonte solos superficiais. Em contraste, o valor de carbono orgânico situava-se entre

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 271
as fontes solo superficial e subsuperficial, o que sugeria que a fonte subsuperficial
poderia também estar contribuindo para os sedimentos em suspensão (Peart,
1995). O mesmo autor concluiu que, quando há mobilidade dos sedimentos do leito,
é possível usar os parâmetros orgânicos para a identificação de fontes. Por outro
lado, na condição onde os sedimentos do leito estão estáveis, a matéria orgânica de
plantas aquáticas e da ictiofauna se acumula e, certamente, altera as relações C/N
e os valores de matéria orgânica total. Tal fato impossibilitaria a comparação dos
sedimentos no rio com aqueles das fontes.
Outra propriedade importante dos sedimentos utilizada para a identificação
das fontes de sedimentos está relacionada com as propriedades magnéticas.
Propriedades magnéticas ocorrem devido à presença de minerais magnéticos que
compõem a massa dos sedimentos. A partir da intensidade magnética emitida por
estes materiais, parâmetros são estabelecidos, e estes são utilizados como variáveis
traçadoras. Tal como na outra propriedade, são comparadas as características
magnéticas das fontes com as mesmas características medidas nos sedimentos
erodidos presentes no rio. Entretanto, existem componentes dos sedimentos aonde
essas propriedades são mais efetivas, bem como as faixas granulométricas.
Caitcheon (1998) estudou quais os componentes do material de fundo de um
rio que apresentam propriedades magnéticas que podem auxiliar na determinação
das fontes de sedimentos em bacias hidrográficas. O estudo mediu a contribuição
das diferentes frações que compõem os sedimentos: fração leve (componentes
associados à superfície dos minerais e componentes constituintes das partículas) e
fração mineral pesada. Foi analisada a areia fina de amostras de sedimento de fundo.
Os resultados mostram que mais que 60% dos componentes minerais magnéticos
estão associados com as partículas de sedimentos (fração leve).
Horowitz (1991) estudou em quais frações granulométricas ocorre maior
reatividade (magnetismo), possibilitando usá-las como elementos traçadores. Os
resultados demonstram que a eficiência da utilização das propriedades magnéticas
é maior nos sedimentos finos.
A distribuição dos tamanhos das partículas, a constituição química, a morfologia
e a mineralogia foram analisadas por Boer & Crosby (1995) para distinguir fontes de
sedimentos de áreas de uso com floresta e com agricultura por meio de microscopia
eletrônica de varredura e espectometria. A análise da distribuição do tamanho das
partículas, a mineralogia e a constituição química não foram capazes de distinguir
as fontes. Entretanto, uma importante diferença ocorreu na morfologia das argilas.
As argilas provenientes das áreas florestais apresentaram formas irregulares, e as
argilas provenientes das áreas agrícolas apresentaram formas arredondadas. Isto
reflete a alteração das condições físicas do solo que a mecanização impõe aos solos
agrícolas. O revolvimento pelas práticas de cultivo causa o aumento do atrito entre
as partículas, que gradativamente perdem suas formas originais, assumindo formas
arredondadas. Desta forma, a microscopia eletrônica pode auxiliar na comparação
entre os sedimentos em suspensão com os sedimentos das fontes.
A grande evolução do método de identificação de fontes de sedimentos por
propriedades traçadoras ocorreu na década de noventa quando se passou a utilizar
um conjunto de propriedades traçadoras combinado com uso de testes estatísticos

272 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
rigorosos e um modelo que permitiu não só discriminar fontes, mas também informar
a contribuição de cada fonte. Um trabalho pioneiro nesta nova direção foi realizado
por Collins et al. (1997), que aplicou uma técnica de identificação de fontes em
duas bacias experimentais, utilizando um modelo multivariado que combina várias
propriedades. A principal contribuição deste trabalho foi a descrição quantitativa
dos tipos de fontes em quatro níveis de avaliação (contribuição média das fontes
no período de monitoramento, variabilidade sazonal, variabilidade entre eventos e
variabilidade nos eventos de chuva-vazão).
Dois aspectos devem ser considerados como importantes na aplicação
do método de identificação de fontes de sedimentos. O primeiro diz respeito à
importância de selecionar corretamente o grupo de parâmetros discriminantes
das fontes de sedimentos (Collins & Walling, 2002). Este fato é muito importante
para a aplicação das técnicas de traçamento de sedimentos, visto que cada região
geográfica apresenta particularidades geológicas e pedológicas importantes que
podem auxiliar na capacidade discriminante das fontes. Por exemplo, nas regiões
tropicais o grupo dos óxidos de Mn, Fe e Al podem ser considerados elementos
com grande potencial de discriminação de fontes. O segundo aspecto diz respeito
ao uso de composições de propriedades traçantes combinadas com procedimentos
estatísticos eficientes e adequados, como análise de discriminação e classificação
multivariada. A combinação deste procedimento possibilita a identificação de fontes
com um baixo grau de incerteza.
Fatores limitantes relacionados com a técnica de identificação das fontes de
sedimentos foram discutidos por Symader & Strunk (1992) e Small & Rowan (2002).
Segundo esses autores, os fatores limitantes da aplicação do método podem ser
agrupados em três fatores:
a) efeito de enriquecimento dos sedimentos - o processo seletivo da erosão
hídrica remove e transporta em maiores quantidades as frações finas
(enriquecimento físico), e como as argilas apresentam maior reatividade,
os teores químicos vinculados com o enriquecimento da matéria orgânica
podem aumentar significativamente, impossibilitando a comparação
direta entre sedimentos em suspensão e fontes;
b) efeito de conservação das propriedades físico-químicas e magnéticas
utilizadas como traçadoras – em condições de ambiente fluvial ocorrem
alterações químicas, físicas e biológicas (pH, redox, concentração iônica,
oxigênio dissolvido, biodisponibilidade, etc.) diferentes dos ecossitemas
terrestres sendo que essa alteração poderia influenciar as condições das
propriedades dos sedimentos utilizadas como traçadoras;
c) efeito do tempo de residência dos sedimentos na calha fluvial – condições
de longo tempo de armazenamento de sedimentos na calha fluvial e
posterior remobilização dos sedimentos possibilitam maiores chances das
propriedades traçadoras serem modificadas em relação a sua condição
de origem no ecossistema terrestre.
Por outro lado Walling & Collins (2000) e Förstner & Wittmann (1983)
consideram que as limitações da aplicação do método de identificação das fontes
de sedimentos discutidos no parágrafo acima poderiam ser superadas a partir das

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 273
seguintes condições:
a) determinação das frações específicas de cada elemento, que sejam mais
estáveis;
b) seleção das propriedades que apresentem uma dinâmica geoquímica
mais conservativa sobre as condições ambientais da área de estudo;
c) avaliação da proximidade das áreas fontes em relação ao local de
amostragem dos sedimentos em suspensão;
d) aplicação de fatores de correção, como a granulometria do material e as
quantidades de matéria orgânica;
e) utilização de modelos estatísticos mais robustos e com a análise de
incertezas.

9.4.2 Exemplo de aplicação da técnica de identificação de fontes de


sedimentos

Este item se refere a um estudo de identificação de fontes de sedimentos


realizado em uma bacia rural localizada na região centro-norte do estado do Rio
Grande do Sul (Minella et al., 2008). Essa bacia representa um ecossistema típico
de exploração agrícola, realizado por pequenos agricultores que cultivam fumo em
áreas marginais, com consequências severas aos recursos naturais. Um método
de identificação das fontes de sedimentos foi aplicado para determinar as principais
áreas que estão contribuindo para produção de sedimentos e, com isso, fazer
inferências sobre a variabilidade temporal e espacial das fontes de sedimentos, bem
como o potencial poluidor desses sedimentos.

9.4.2.1 Características da bacia

A região de estudo é uma bacia localizada na cabeceira do rio Guaporé afluente


do rio Jacuí região centro-norte do estado do Rio Grande do Sul. A bacia estudada
tem área de drenagem de 119 ha, a qual se localiza no município de Arvorezinha,
no Rio Grande do Sul (Figura 9.3). Nessa bacia, o relevo predominante é ondulado
(declividade média 7%) e os solos são pouco desenvolvidos (profundidade média
0,50 m), onde predominam as unidades taxonômicas do tipo Argissolos, Neossolos e
Cambissolos. A drenagem apresenta uma declividade média de 8% e um tempo de
concentração de, aproximadamente, 40 minutos.
O uso do solo envolve o cultivo do tabaco como atividade principal, além de
áreas com pastagem, pousio, reflorestamento e floresta. O sistema de manejo da
cultura do tabaco é realizado de forma tradicional com grande revolvimento do solo
e a partir de 2003 iniciou-se a implementação do cultivo mínimo, como alternativa de
conservação do solo para a solução dos problemas associados à erosão hídrica. Os
principais problemas visualizados na bacia são a erosão nas lavouras, estradas e
rede de drenagem.

274 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
Figura 9.3 – Localização da área de estudo.

Tabela 9.4 – Porcentagem dos diferentes usos e manejo do solo em relação a área
total da bacia experimental de Arvorezinha
Floresta, pastagem Lavouras sem Lavouras com
Períodos e pousio conservação do solo conservação do solo
(Abril-Março)
% % %
2001-2002 67,9 32,1 0
2002-2003 55,9 44,1 0
2003-2004 49,3 29,7 21,0
2004-2005 38,6 42,3 19,1
2005-2006 36,0 20,8 43,2
Fonte: Minella et al. (2008)

Sendo assim, o estudo se concentrou na discriminação e identificação das


contribuições das fontes de lavouras, estradas e rede de drenagem quantificando a
variabilidade espacial e temporal das fontes de sedimentos entre um período sem

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 275
conservação do solo (2002-2004) e num período com conservação do solo (2004-
2006).

9.4.2.2 Coleta das amostras das fontes de sedimentos e dos sedimentos em


suspensão

A escolha das fontes de produção de sedimentos e a sua caracterização


química e física é um ponto crucial na eficiência da metodologia. Basicamente,
devem ser verificados quais os principais processos erosivos que ocorrem na bacia
e definidas as principais fontes que contribuem para os sedimentos em suspensão.
A coleta de amostras deve ser realizada na camada superior do solo (0 – 5 cm), e o
número de amostras é determinado pela heterogeneidade de cada fonte. É importante
lembrar que o aumento do número de amostras por fonte diminui as incertezas dos
resultados, e que um grande número de fontes diminui a eficiência do modelo em
classificar corretamente os sedimentos em suspensão.
A quantidade de material coletado para cada amostra deve permitir as
análises físicas e químicas. Para diminuir as incertezas com amostras contaminadas
ou não representativas, a coleta de subamostras pode ser uma boa alternativa.
Depois de secas, as amostras são peneiradas em malha de 2000 μm, sendo esse
material encaminhado para realização de análises físicas; para as análises químicas
são separadas as partículas menores que 63 μm.
A coleta de sedimentos em suspensão para a identificação das fontes de
sedimentos foi realizada com um amostrador semi-automático que coleta uma
amostra somente durante os eventos significativos de chuva (Figura 9.4). O período
de monitoramento foi de abril de 2002 até março de 2006. Esse período abrangeu
as principais mudanças de uso do solo na bacia, tais como pousio, preparo do solo,
cultivo e crescimento do tabaco. Nesse período foram amostrados os eventos de
maior magnitude, em um total de 10 eventos.

Figura 9.4 – Amostrador de sedimentos em suspensão para as análises de identificação de


fontes de sedimentos.

276 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
9.4.2.3 Caracterização física e química das amostras

As análises granulométricas das amostras foram determinadas utilizando-


se o método da peneiragem e pipetagem (Carvalho, 1994). A concentração dos
elementos químicos dos sedimentos nas fontes e em suspensão foram determinados
segundo os seguintes métodos:
a) Teores totais de N, P, K, Ca, Na, Mg, Cu, Pb, Cr, Co, Zn, Ni, Fe, Mn e Al
com extração por digestão de ácido sulfúrico (Tedesco, 1995);
b) C orgânico total pelo método de Walkley-Black (Tedesco, 1995);
c) Al+3 extraído por KCl (1M) e titulação com NaOH (Tedesco, 1995);
d) Óxidos de Fe, Mn por extração com Ditionito-Citrato Bicarbonato de
sódio (Inda, 2002);
e) Óxido de Fe com extração com Oxalato de Amônio ácido (Inda, 2002).

A comparação da concentração dos sedimentos das fontes e dos sedimentos


em suspensão exige a aplicação de um fator de correção. Os elementos traçadores
estão associados às partículas de tamanho argila ou microagregados de tamanho
inferior a 63 μm e, por isso, é necessário corrigir o efeito de diluição das partículas de
tamanho maior presentes nas amostras das fontes. Para isso, utilizou-se a Equação
9.3 (Horowitz, 1991).

Zsi= Co[100/(100-Fars)] (Equação 9.3)

Onde:
Zsi é a concentração corrigida das fontes e do elemento químico analisado (i);
Co é a concentração média original do elemento químico analisado; e,
Fars é a porcentagem da fração maior que 63 μm das amostras da fonte.

9.4.2.4 Discriminação das fontes de sedimentos

A fase de discriminação tem como objetivo estabelecer para quais elementos


químicos existe diferença significativa entre as fontes. Essa fase é dividida em duas
etapas: um teste não paramétrico e uma análise de discriminação multivariada.
Para a primeira etapa o teste-H ou Kruskall-Wallis (Walling & Collins, 2000). O qual
permite testar uma hipótese nula em que k amostras aleatórias independentes são
provenientes de uma mesma população (Equação 9.4).

12 k
Rs2
H 
n(n  1) s1 nl
 3(n  1) (Equação 9.4)

Onde:
Rs refere-se à soma dos ranks ocupados pela fonte s;
nl é o número de observações da fonte s;
n a soma dos nl’s;

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 277
k o número de fontes.

Para cada variável o teste foi aplicado verificando-se sua capacidade
discriminante entre as fontes. A hipótese nula (H0) a ser testada é que as populações
são idênticas, e a hipótese alternativa (H1) é que as populações diferem.
Quando o valor de H calculado exceder o valor crítico de H, com k-1 graus de
liberdade e grau de significância 5%, dizemos que a hipótese nula deve ser rejeitada,
ou seja, a probabilidade é pequena (5% ou menos) de serem observadas diferenças
entre as amostras, se as observações são provenientes da mesma população, ou
seja, a variável apresenta capacidade discriminante entre as fontes (Tabela 9.5).
Os resultados do teste Kruskal-Wallis mostra que 9 elementos foram
selecionados usando um nível de significância de 99% (Hcrítico = 9,21), e 10
elementos foram selecionados quando o nível de significância foi reduzido para 90%
(Hcrítico = 4,61). Esse conjunto representa um número suficiente de elementos para
o procedimento de identificação das fontes; além disso, são distintos em relação a
suas propriedades químicas e ambientais (Minella et al., 2008).

Tabela 9.5 – Eficiência discriminante das variáveis químicas


Concentrações (μg.g-1) Teste Kruskal-Wallis
Variável
Drenagem Estradas Lavouras Valor de H Probabilidade

P 300 100 600 29,00 < 0,0001


Mnoxal 2523 1189 3966 20,26 < 0,0001
K 3885 3182 6572 19,56 0,0001
Mnt 1470 812 1854 15,97 0,0003
Fet 62100 67600 66300 14,55 0,0007
Feoxal 900 300 700 14,22 0,0007
Ca 165 76 159 13,40 0,001
Na 5638 4899 8450 13,26 0,001
Cu 18 23 20 10,92 0,004
Zn 80 86 88 4,84 0,08
Mg 560 476 606 3,46 0,17
Fedit 5200 3900 4100 1,25 0,53
Mndit 4957 3590 8152 0,88 0,64
Média da porcentagem de silte e argila das amostras (%)
<63μm 42 44 47

Fonte: Minella et al. (2008)

A análise de discriminação multivariada permitiu determinar qual o melhor


conjunto de variáveis que possibilita separar as fontes com o mínimo de variáveis
necessárias. O conjunto de propriedades a serem escolhidas deve refletir diferentes

278 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
controles e comportamentos do processo de emissão de sedimentos para maximizar
o grau de discriminação fornecido pelo conjunto de variáveis (Collins et al., 1997). Isso
foi realizado com o auxílio do programa GENSTAT@, através de um algoritmo do tipo
“stepwise”, baseado na minimização do parâmetro Wilks’ lambda (K*) (Equação 9.5),
teste F de Snedecor e a distribuição Qui-quadrada (|2) (Johnson & Wichern, 1992).

W
  (Equação 9.5)
B W

Onde:
|W| é o determinante da matriz da soma dos quadrados devido ao erro;
|B + W| é o determinante da matriz da soma dos quadrados totais corrigido
pela média, sendo que B é a matriz da soma dos quadrados devido ao tratamento.

Quanto menor for K*, a hipótese de rejeitar H0 é mais evidente, indicando que
o conjunto de variáveis testadas apresenta capacidade discriminante. A comparação
dos valores de K* determinou o melhor conjunto de variáveis que maximiza a análise
discriminante e que minimiza a quantidade de variáveis a serem utilizadas, para as
quais os resíduos (erros) são minimizados.
Os resultados da análise de discriminação multivariada, através da
determinação dos parâmetros Wilk`s Lambda (K*), aproximação do teste F de
Snedecor e distribuição Qui-quadrado (|2), determinaram o grupo de variáveis que
otimiza a discriminação das fontes e diminui a dimensionalidade (Tabela 9.6). O
método testou a contribuição de cada variável e selecionou o menor conjunto que
minimiza o valor de K* e os correspondentes valores de F e |2.

Tabela 9.6 – Resultados da análise da função discriminante gradual com o acréscimo


gradual de cada variável e os valores correspondentes da minimização
do Wilks’ Lambda (Λ*)
Λ* P Ca K Mnt Cu Na Zn Fet
Parciala 0,128 0,094 0,088 0,089 0,083 0,079 0,077 0,072
Acumuladob 0,251 0,220 0,194 0,147 0,089 0,078 0,072 0,071
a
Valor parcial que representaria o valor total de Λ* quando retiramos a variável do conjunto;
b
Valores acumulados com a adição de cada variável.

Além de encontrar o conjunto que minimiza o valor do parâmetro K*, outro


objetivo dessa avaliação é que esse conjunto represente diferentes processos
associados com a erosão hídrica e o transporte dos sedimentos. As variáveis
devem reproduzir mecanismos diferentes que ocorrem nas fontes no que se refere,
por exemplo, ao intemperismo, condições de redox e manejo do solo. O conjunto
proposto apresentou variáveis associadas com o manejo do solo (P e Ca), processos
de intemperismo e condições de redox (óxidos de ferro, manganês e alumínio) e a
presença de metais traços (Fetot, Mntot, Zn e Cu).
As variáveis carbono orgânico (COT) e nitrogênio total (N) não foram

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 279
utilizadas como variáveis traços, apesar de selecionadas na análise discriminante.
As concentrações destes elementos nos sedimentos em suspensão apresentaram
enriquecimento, acima dos quais os fatores de correção são capazes de corrigir. A
hipótese provável é que o aporte de adubos solúveis e os dejetos animais lançados
na rede de drenagem estão aumentando a adsorção de N e COT nos sedimentos,
além da variabilidade temporal de produção de biomassa.

9.4.2.5 Classificação das amostras de sedimentos em suspensão

A segunda fase do método de identificação de fontes é a determinação das


contribuições de cada fonte para cada amostra de sedimentos em suspensão. O
modelo linear que descreve essa relação numérica entre as proporções das fontes
e os parâmetros dos sedimentos em suspensão pode ser escrito na forma (Yu &
Oldfield, 1989):
n
  ais Ps (s = 1,2,3,...,n) e (i = 1,2,3,...,m)
yi (Equação 9.6)
s 1

Onde:
yi é o valor da variável i obtida no sedimento em suspensão;
ais são os coeficientes do modelo linear (concentração do elemento químico
i na fonte s);
Ps é a proporção da massa da fonte s, que podem ser apresentados como
um conjunto de funções lineares de m variáveis e n fontes.

A estimativa dos valores de P’s é realizada pela minimização de uma função
objetiva (Walling & Woodward, 1995; Collins et al., 1997):
2
m 
  n  

  Ci    Ps C si Z s   / C
i (Equação 9.7)
i 1
  s 1  

Onde:
I é a concentração da variável traçadora i na amostra de sedimento em
suspensão;
Ps é a proporção de contribuição da fonte s;
Csi é o valor médio da variável traçadora i obtida na fonte s;
Zs é o fator de correção da granulometria para a fonte s.

Os resultados finais da proporção de cada fonte são apresentados na Tabela
9.7. O modelo de otimização foi eficiente na minimização da função objetivo e na
determinação dos valores da contribuição relativa das três fontes de sedimentos
para cada evento. Os baixos valores dos erros médios relativos (EMR) demonstram
que os resultados da minimização da função objetivo são aceitáveis. Os resultados
fornecem as estimativas da contribuição relativa das três fontes para a produção de
sedimentos de cada evento amostrado e uma estimativa da contribuição média total

280 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
dos eventos ponderada pela produção de sedimentos medida das três fontes de
sedimentos para os períodos pré e pós-tratamento.

Tabela 9.7 – Contribuição relativa dos três grupos de fontes de produção de


sedimentos dos eventos amostrados

Sem conservação do solo Com conservação do solo


Produção Relativa de Sedimentos (%) Produção Relativa de Sedimentos (%)
Canal Estrada Lavoura ERM Canal Estrada Lavoura ERM
1 3,7 19,2 77,1 7,8 20 11,6 8,2 80,2 6,2
2 2 42,8 55,2 7,2 21 16,1 30,3 53,6 5,2
3 3,5 3,5 93 5,7 22 29,9 29,1 41 11,6
4 0,2 42,8 57 5,6 23 23,4 39,8 36,8 10,4
5 1,2 35,3 63,5 8,3 24 18,8 39,7 41,5 4,9
6 1,9 34,7 63,4 8,4 25 32,1 23,9 44 9,4
7 0,6 48,5 50,9 13,3 26 21,8 2,2 76 12,1
8 1,3 36,8 61,9 6,5 27 11,5 24,4 64,1 10,7
9 0,4 57 42,6 14,3 28 9,8 20,9 69,3 7,9
10 0,1 56,8 43,1 16,8 29 28,8 7,1 64,1 11,8
11 0,6 59,2 40,2 15,9 30 4,7 41,3 54 16,4
12 0,5 45,4 54,1 12,8 31 12,4 16,9 70,7 14,3
13 0,6 32,6 66,8 13,8 32 1,9 35,6 62,5 17,1
14 4,7 1,5 93,8 12,9 33 0 91,8 8,2 27,5
15 1,7 60,9 37,4 15,2 34 9,5 13 77,5 8,9
16 2,9 28,1 69 11,4 35 29,4 31 39,6 7,2
17 1,2 30,8 68 11,6 36 1,1 35,2 63,7 15,2
18 2,5 31,1 66,4 12,8 37 43,7 37,6 18,7 8,2
19 0,5 41,4 58,1 17,1 38 0 92,1 7,9 27,6
39 10 13,9 76,1 8,7
40 10 31,7 58,3 11,3
41 10,4 50,1 39,5 4,4
42 30 31,2 38,8 13,5
43 24,8 3 72,2 9,7
44 7,9 33,5 58,6 8
45 0,9 89,8 9,3 11,1
46 28,5 31,5 40 9,1
47 34,3 18,7 47 10
48 31,1 23,7 45,2 10,1
49 18,2 41,2 40,6 11,1
50 20,9 36,3 42,8 12,1
Média 1,6 37,3 61,1 11,4 Média 18,4 29 52,6 10,3
Fonte: Minella et al. (2008)

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 281
Os resultados apresentados indicam que a melhoria nas práticas de manejo
do solo na bacia de Arvorezinha resultou numa significativa mudança na importância
relativa das três fontes de sedimentos. Uma comparação entre a média ponderada
dos períodos sem e com conservação do solo indicam que as contribuições das
lavouras e das estradas reduziram de 61% e 37% para 53% e 29% respectivamente,
enquanto a contribuição do canal aumentou de 2% para 18%.
A contribuição relativa das fontes foi sensível quando houve sedimento
disponível nas mesmas, como na retificação das estradas ou no revolvimento das
lavouras, a proporção é sensivelmente alterada. Igual suposição é aplicada quando
protegemos uma fonte e mantemos a outra em condições normais. Por exemplo,
quando a cobertura vegetal nas lavouras aumenta no inverno e as estradas
permanecem nas mesmas condições.
A redução na importância relativa das lavouras e estradas como fontes
de sedimentos é consistente com a adoção da prática de cultivo mínimo, com a
consequente redução do escoamento superficial, redução na erosão e redução da
mobilização de sedimentos das lavouras. O aumento na importância da contribuição
da fonte canal de drenagem reflete o aumento na capacidade de transporte do
escoamento proveniente das lavouras e estradas com menor concentração de
sedimentos (Minella et al., 2008).

9.5 | CONSIDERAÇÃO FINAL


O desenvolvimento de técnicas que utilizam as características químicas
e físicas dos sedimentos tem melhorado a habilidade de identificar as fontes de
sedimentos finos e distinguir a contribuição das diferentes fontes para a produção
de sedimentos e contaminantes presentes nos rios. Desta forma, é importante
considerar que programas de monitoramento hidrossedimentométrico não sejam
limitados apenas às quantificações da quantidade de sedimentos, mas que também
sejam incorporadas nesses estudos avaliações da qualidade desses sedimentos.
A combinação dos estudos quantitativos e qualitativos sem dúvida irá possibilitar
grandes avanços no que diz respeito à gestão integrada dos recursos hídricos.

9.6 | REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ATKINS, P. W. 1978. Physical Chemistry. v.3, 6ªed. Oxford University Press, 159p.

BOER, D. H. de; CROSBY, G. 1995. Evaluating the potential of SEM/EDS analysis for
fingerprinting suspended sediment derived from two contrasting topsoils. Catena,
Amsterdam, v.24, pp.243-258.

CAITCHEON, G. G. 1998. The significance of various sediment magnetic mineral fractions


for tracing sediment sources in Killimicat Creek. Catena, Amsterdam, v.32, pp.131-
142.

CARVALHO, N. O. 1994. Hidrossedimentologia prática. Rio de Janeiro: CPRM. 372p.

282 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
COLEMAN, D. J.; SCATENA, F. N. 1986. Identification and evaluation of sediment sources.
In: Drainage Basin Sediment Delivery (ed. by R. F. Hadley), IAHS Publ. 159, pp.3-
18.

COLLINS, A. L.; WALLING, D. E.; LEEKS, G. J. L. 1997. Source type ascription for fluvial
suspended sediment based on a quantitative composite fingerprinting technique.
Catena, 29, pp.1-27.

COLLINS, A. L.; WALLING, D. E. 2002 Selecting fingerprint properties for discriminating


potential suspended sediment sources in river basins. Journal of Hydrology, n.261,
pp.218-244.

DROPPO, I. G. 2001. Rethinking what constitutes suspend sediment. Hydrol. Proced. 15,
pp.1551-1564.

DROPPO, I. G.; LEPPARD, G. G.; FLANNIGAN, D. T.; LISS, S. N. 1997. The freshwater
floc: a functional relationship of water and organic and inorganic floc constituents
affecting suspend sediment properties. Water Air Soil Pollut. 99, pp.43-53.

FÖRSTNER, U.; WITTMANN, G. T. W. 1983. Metal Pollution in the Aquatic Environment.


Springer – Verlag.

FOSTER, I. D. L.; LEES, J. A.; JONES, A. R.; CHAPMAN, A. S.; TURNER, S. E.;
HODGKINSON, R. 2002. The possible role of agricultural land drains in sediment
delivery to small reservoir, Worcestershire, UK: a multiparameter fingerprint
study. In: DYER, F. J.; THOMS, M. C.; OLLEY, J. M. (Ed.) The structure, funcion,
and management implications of fluvial sedimentary. Wallingford: International
Association of Hydrological Sciences. pp.433-442. (IAHS Publications, n.276).

GRIMSHAW, D. L; LEWIN, J. 1980. Source identification for suspended sediment. Journal


of Hydrology, v.47, pp.151-162.

HILLEL, D. 1998. Environmental Soil Physics. San Diego: Academic. 771p.

HOROWITZ, A. J. 1991. A Primer on Sediment Trace Element Chemistry. 2th.ed. Chelsea:


Lewis Publishers.

INDA JUNIOR, A. V. 2002. Caracterização da Goethita e Hematita em Solos Poligênicos.


Tese (Doutorado) Programa de Pós-Graduação em Ciência do Solo. Faculdade de
Agronomia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

JOHNSON, R. A.; WICHERN, D. W. 1992. Applied Multivariate Statistical Analysis. London:


Prentice-Hall International. 642p.

MANAHAN, S. E. 2000. Environmental Chemistry. 7ª ed. Boca Raton: Lewis Publishers, 898p.

MCBRIDE, M. B. 1994. Environmental Chemistry of Soils. New York: Oxford University Press,
406p.

MINELLA, J. P. G.; WALLING, D. E.; MERTEN, G. 2008. Combining sediment source


tracing techniques with traditional monitoring to assess the impact of improved land
management on catchment sediment yields. Journal of Hydrology, v.348, pp.546–
563.

MINELLA, J. P. G; MERTEN, G. H.; GIONGO, A. 2004 Nitrogen and phosphorus discharge


in a tobacco-producing catchment. Anais. In: XV Reunião Brasileira de Manejo e
Conservação do Solo e da Água. Santa Maria, RS, Brazil.

NATIONAL COUNCIL FOR AIR AND STREAM IMPROVEMENT. 1999. Scale considerations
and the detectability of sedimentary cumulative watershed effects. Research Triangle
Park. Technical Bulletin, n.776. 327p.

OLLEY, J. M.; MURRAY, A. S.; MACKENZIE, D. H.; EDWARDS, K. 1993. Identifying sediment
sources in a gullied catchment using natural and anthropogenic radioactivity. Water
Resources Research, Washington, v.29, n.4, pp.1037-1043.

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 283
ONGLEY, E. D.; BYNOE, M. C.; PERCIVAL, J. B. 1982. Physical and geochemical
characteristics of suspended-solids, Wilton Creek, Ontario. Hydrobiologia, v.2, n.91,
pp.41-57.

PEART, M.R. 1995. Fingerprint sediment sources: an example from Hong Kong. In:
FOSTER, I. D. L.; GURNELL A. M.; WEBB, B.W. Sediment and Water Quality in
River Catchments. Chichester: John Wiley. p.179-186.

PEART, M.R.; WALLING, D.E. 1986. Fingerprinting sediment sources: the example of a
drainaged basin in Devon, U.K. In: HADLEY, R.F. (Ed.) Drainage basin sediment
delivery. Wallingford: International Association of Hydrological Sciences. p. 41-56.
(IAHS publications, n. 159).

PETERS, N. E. et al. (Ed.) 1993. Tracers in Hydrology. Wallingford: International Association


of Hydrological Sciences. 350p. (IAHS publications, n. 215).

SMALL, I. F.; ROWAN, J. S.; FRANKS, S. W. 2002. Quantitative sediment fingerprinting


using a Bayesian uncertainty estimation framework. In: DYER, F. J.; THOMS, M.
C.; OLLEY, J. M. (Ed.) The structure, funcion, and management implications of
fluvial sedimentary. Wallingford: International Association of Hydrological Sciences.
pp.443-450. (IAHS Publications, n. 276).

SALOMONS, W.; STIGLIANI, W. M. 1995. Biogeodynamics of Pollutants in Soils and


Sediments. Berlin: Springer. 320p.

SYMADER, W.; STRUNK, N. 1992. Determining the source of suspended particulate


material. In: WALLING, D. E.; DAVIES, T. R.; HASHOLT, B. (Ed.) Erosion, debris
flow and environment in mountain regions. Wallingford: International Association of
Hydrological Sciences. pp.177-185. (IAHS Publication, n. 209).

TEDESCO, M. J. 1995. Análises de solo, plantas e outros materiais. 2.ed. rev. e ampl. Porto
Alegre: Departamento de solos da UFRGS. 174p. (Boletim Técnico Solos/UFRGS,
Departamento de Solos, n.5).

WALLING, D. E.; PEART, M. R.; OLDFIELD, F.; THOMPSON, R. 1979. Suspended sediment
sources identified by magnetic measurements. Nature, London, v.281, pp.110-113.

WALLING, D. E.; OWENS, P. N.; CARTER, J.; LEEKS, G. J. L.; LEWIS, S.; MEHARG, A. A.;
WRIGHT, J. 2003 Storage of sediment-associated nutrients and contaminants in
river channel and floodplain systems. Applied Geochemistry 18, pp.195-220.

WALLING, D. E.; WOODWARD, J. C. 1995. Tracing sources of suspend sediment in river


basins: A case study of the River Culm, Devon, UK. Mar. Freshwater Res., v.46.
pp.327-336.

WALLING, D. E. 1988. Measuring sediment yield from river basins. In: Lal, R. (Ed.) Soil
Erosion Research Methods. Ankeny: Soil and Water Conservation Society. pp.39-
74.

WALLING, D. E. 1990. Linking the field to the river: sediment delivery from agricultural land.
In: Boardman, J.; Foster, I. D. L.; Dearing, J. A. (Ed.) Soil Erosion on Agricultural
Land. Chichester: John Wiley. pp.130-152

WALLING, D. E.; BRADLEY, S. B. 1988. The use of cesium-137 measurements to investigate


sediment delivery from cultivated areas in Devon, UK. In: BORDAS, M. P.; WALLING,
D. E. (Ed.) Sediment Budgets. Walligford: International Association of Hydrological
Sciences. pp.325-336 (IAHS Publications, n. 174).

WALLING, D. E.; BRADLEY, S. B. 1990. Some applications of cesium-137 measurements


in the study of erosion transport and deposition. In: WALLING, D. E.; YAIR, A.;
BERKOWICZ, S. (Ed.) Erosion, transport and deposicion processes. Wallingford:
International Association of Hydrological Sciences. pp.179-203 (IAHS Publication,
n.189).

284 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]
WALLING, D. E.; QUINE, T. A. 1991. Recent rates of soil loss from areas of arable cultivation
in the UK. In: PETERS, N. E.; WALLING, D. E. Sediment and stream water quality
in a changing environmental: trends and explanation. Wallingford: International
Association of Hydrological Sciences. pp.123-131. (IAHS Publication, n. 203).

WALLING, D. E.; COLLINS, A. L. 2000. Integrated assessment of catchment sediment


budgets: a technical manual. Exeter: Department for International Development.
168p.

WOLMAN, M. G. 1977. Changing needs and opportunities in the sediment field. Water
Resources Research, Washington, v.13. pp.50-54.

YU, L.; OLDFIELD, F. 1989. A multivariate mixing model for identifying sediment source from
magnetic measurements. Quaternary Research, v.32, pp.168-181.

Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...] | Capítulo 9L 285
286 M Capítulo 9 | Aplicação das características químicas e físicas dos sedimentos na modelagem dos processos [...]

Você também pode gostar