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DOI: http://dx.doi.org/10.46375/relaec.

35338

INSURGÊNCIAS DECOLONIAIS: VALIDAÇÃO DO ESPAÇO E


DO FAZER TERAPÊUTICO DE LIDERANÇAS FEMININAS DE
TERREIRO NO CUIDADO E ATENÇÃO À SAÚDE MENTAL DA
MULHER NEGRA VIOLENTADA EM TEMPOS DE PANDEMIA
NO ESTADO DE SERGIPE
DECOLONIAL INSURGENCES: VALIDATION OF THE SPACE AND THERAPEUTIC
CARE OF FEMALE LEADERSHIP IN TERREIRO CARE AND ATTENTION TO THE
MENTAL HEALTH OF VIOLENTED BLACK WOMEN IN PANDEMIC TIMES IN
SERGIPE STATE

JOUSE MARA FERREIRA SANTOS (Ilê Axé Omon Tobi Oya Lokê)

RESUMO: O presente artigo chama atenção para a necessidade de desistitucionalizar espaços e


práticas de cuidado, decolonizar estruturas hegemônicas e validar outros fazeres, dinâmicas e
técnicas que podem se somar às já validadas pelo SUS para atenção e cuidado à saúde mental em
tempos de crise. O objetivo deste estudo busca ressaltar os recursos terapêuticos e como as
estratégias utilizadas no Território Terreiro se apresentam como opção terapêutica afrocentrada.
Para tanto, foi trazido para referendar, as práticas em tempos de pandemia do Ilê Axé Omon Tobi Oya
Lokê, situado na cidade de Aracaju/SE. Suas interventivas de acolhimento e escuta qualificada,
atendem às demandas locais e pontuais com dinâmicas para o cuidado de corpos sofridos, abusados
violentados e execrados. O atendimento reorientativo em particular à mulher negra violentada, se
desenvolve no assentar do itinerário interventivo de resolução. A perspectiva da Afrocentricidade
proposta por Molefi Asante, já qualifica metodologicamente a pesquisa, pois aqui não há conjunções
alternativas. Para validar o espaço como possibilidade de cuidado à saúde mental, trazemos além de
técnicas, as narrativas de cinco mulheres negras, constatando a subnotificação já observada pela
Secretaria de Segurança Pública do Estado de Sergipe no ano de 2020. Para análise, as epistemes
trazidas atendem tanto para a compreensão territorial como para a demanda situacional. No sulear
metodológico, contemplam-se indicadores que desorientam e outros que repotencializam. A técnica
do Storytelling (histórias orais) alinhada a técnica dos Itans (contos africanos) apresentam-se como
caminho de repotencialização. Esta última, que apesar de não exclusiva, possui tipicidade única, que
mesmo não trazida em antologias hegemônicas, permite elucidar em terapia, o aprisionamento
mental que as impede por exemplo de denunciar. A subnotificação da violência doméstica revela-se
nas narrativas. Observa-se também na análise dos indicadores, que a procura por estes espaços se
dão pelas possibilidades das aproximações sociais e das feridas coloniais. Constatou-se que traçar
um itinerário terapêutico potente e resolutivo que atenda para a dissolução de gatilhos abissais faz
alcançar na libertação, o empoderamento para a formalização da denúncia. Suas práticas propõem
no reORIentar o afroreconectar das africanidades, como a tecnologia da água das quartinhas,
recriando possibilidades, e legitimando o (re)sentir e a oralidade como fator potencial de higidez
ancestral e de autonomia relacional de seus agentes. Voltar um olhar ético e contemplativo nestes
espaços é a insurgência, pois quando se trata de questões com ameaças catastróficas à vida, são estes
espaços, com seus saberes, que estão para os seus, igualmente como suas práticas que tanto são
perseguidas e julgadas. Validar o fazer terapêutico de lideranças femininas pretas, é fixar mais uma
rota humanitária para a atenção e o cuidado da saúde mental da população negra. Trata-se de
suleamentos sem pretensão de finalizações, pois nesta cosmovisão, o ebó epistêmico é continuum.
Palavras-chave: Terapêutica de Terreiro; Pandemia; Violência doméstica; Afroreconectores.

Revista Latino-Americana de Estudos Cientifico – ISSN 2675-3855 – v. 02, n.10, 2021


ABSTRACT: This article draws attention to the need to abandon institutionalization of care spaces
and practices, to decolonize hegemonic structures and to validate other actions, dynamics and
techniques that can be added to those already validated by SUS for mental health care and care in
times of crisis. The aim of this study is to highlight the therapeutic resources and how the strategies
used in the Terreiro Territory are presented as afrocentric therapeutic options. For this purpose Ilê
Axé Omon Tobi Oya Lokê, located in the city of Aracaju / SE, was brought to endorse the practices in
times of pandemic. Their welcoming and qualified listening interventions meet local and punctual
demands with dynamics for the care of suffering, abused, abused and abused bodies. The
reorientative assistance in particular to the raped black woman, it develops on the basis of the
interventional resolution itinerary. The perspective of Afrocentricity proposed by Molefi Asante,
already qualifies the research methodologically, because here there are no alternative conjunctions.
To validate the space as a possibility of mental health care, we bring in addition to techniques, the
narratives of five black women, confirming the underreporting already observed by the Sergipe State
Public Security Department in the year 2020. For analysis, the epistemes brought meet both for
territorial understanding and for situational demand. In the methodological survey, indicators that
disorient and others that re-potentialize are contemplated. The Storytelling technique (oral stories)
in line with the Itans technique (African tales) are presented as a path to re-empowerment. The latter,
which although not exclusive, it has a unique characteristic, which, even if not brought in hegemonic
anthologies, allows to elucidate in therapy, the mental imprisonment that prevents them, for
example, from denouncing. The underreporting of domestic violence is revealed in the narratives. It
is also observed in the analysis of the indicators, that the search for these spaces is due to the
possibilities of social approaches and colonial wounds. It was found that tracing a potent and
resolutive therapeutic itinerary that attends to the dissolution of abyssal triggers leads to liberation,
the empowerment for the formalization of the complaint. Their practices propose in reORIent the
afroreconnection of Africanities, such as water technology in the small rooms, recreating
possibilities, and legitimizing (re) feeling and orality as a potential factor of ancestral health and
relational autonomy of its agents. Returning an ethical and contemplative look at these spaces is the
insurgency, because when it comes to issues with catastrophic threats to life, it is these spaces, with
their knowledge, that are for theirs, as well as their practices that are both pursued and judged. To 44
validate the therapeutic practice of black female leaders is to establish yet another humanitarian
route for the attention and care of the mental health of the black population. These are stretches
without pretending to finish, because in this worldview, the epistemic ebó is a continuum.
Key words: Terreiro Therapeutics; Pandemic; Domestic violence; Afroreconnectors.

Santos
Introdução reconstruções de processos
identitários, uma importante reflexão
Mo jú́ bà Òjí́ṣẹ́ ! Ò àno dẹ doiṣ mil quando entendemos que temos o
e vinte marca um período de grandes direito de buscar caminhos,
mortes, violências e inúmeros possibilidades e itinerários de
desafios. Debates em redes virtuais atendimentos que nos contemple,
retomam discussões acerca dos rumos tanto quanto for necessário. Nesta
da Política Nacional de Atenção à elucidação, pensar em estratégias de
Saúde Mental em tempos de crise. cuidado e atenção à saúde mental dos
Neste ano, vivenciamos um colapso povos de comunidades tradicionais é
sanitarista mundial e um total responsabilidade de todos.
desmantelo do Ministério da Saúde O Candomblé, espaço
Brasileiro. E mais uma vez é a Território Terreiro, mantém em sua
população negra quem mais sofre os tradição viva, práticas que reativam o
impactos. Mediante a emergência da registro bioancestral, a identidade, a
atual pandemia ocasionada pelo memória afetiva e de pertencimento
coronavírus SARS-CoV-2, causador da para o sobreviver em diáspora.
síndrome COVID-19, o distanciamento Atentar-se para como estas
e o isolamento estão sendo comunidades tradicionais de matriz
recomendados como medidas africana respondem aos impostos,
profiláticas por período restrições, atravessamentos, violações
indeterminado, abrindo caminhos e crises mundiais, é voltar um olhar
para o aumento da violência ético e contemplativo de validação de
doméstica, num imposto de violações suas práticas, pois, além de 45
de direitos que se agiganta, posicionarem-se em linha de frente,
oprimindo, silenciando e matando. acolhem corpos sofridos e
Nesta, a inclusão de outros espaços e violentados, nutrindo e
novos instrumentais são necessários repotencializando. Aqui faz-se
para somar com as redes de cuidado, necessário salientar que, as práticas
apresentando suas técnicas potentes e de cuidado não se restringem aos
resolutivas. serviços e instituições de saúde
As fronteiras das pública ou privada. Precisamos
desigualdades e de violação de entender que as práticas oferecidas
direitos como os epistemicídios, pela atual Política Nacional de Saúde
impõe no tempo e no espaço pautas como universalizadas, não atendem
difíceis de serem definidas, aos nossos porque não alcançam o
principalmente para alcançar nosso sentir. Universalizar é colocar
diretamente as mulheres negras, todos num mesmo barco e navegar,
pobres e periféricas. O descaso, a falta coisa que sabemos ser impossível
de assistência e planejamento trazem contemplar, basta observar o atual
mais sofrimentos e incidem sobre contexto, as atrocidades e as
estes corpos, um composto de realidades do tecido social brasileiro
anulações e desvalorizações, abusos em tempos de crise e outros contextos.
violentos que impactam Chamar a atenção das instâncias
significativamente suas existências. governamentais para fixar
Seus agravantes manifestam possibilidades e novas rotas de
implicações mentais, num cuidado e saúde, incluindo os espaços
descarrillamento que colide com a Terreiro, se faz necessário, pois
falta de espaços que promovam práticas de cuidado não são restritas

Santos
as instituições por fundarem suas Tobi Oyá Lokê, liderado pela Yalorixá
ações em conhecimentos Jouse Zuzarte, Terreiro que vamos
eurocientíficos, ela perpassam por trabalhar em questão, que possue suas
outros contextos como os sociais, práticas voltadas para o fazer
culturais e religiosos ancestrais. terapêutico preto, com itinerário
Ao entender sua importância afrocentrado, focando no
neste atual contexto e atendendo às distanciamento, a crise, o conflito e a
orientações da OMS (Organização reflexão. Neste último, as práticas
Mundial da Saúde) e aos decretos estão postas para alcançar mulheres
governamentais, espaços Territórios vítimas de violência doméstica que em
Terreiros, alteram suas dinâmicas isolamento estão impedidas de
internas e redesenham suas práticas. transitar e/ou denunciar. Os três
Ao redesenhar, propõem ofertar Terreiros citados, atendem para além
dentro das mais variadas de práticas de acolhimento em tempos
possibilidades, práticas de de pandemia, com dinâmicas
acolhimento por entender que o corpo interventivas potentes e resolutivas,
físico e a saúde mental das mulheres respondendo de forma militante e
negras precisam neste momento de com afinco as mais variadas situações
mais cuidados. Conscientes da e contextos sociais, rompem com o
necessidade de pôr em prática novas isolamento, colocando-se na linha de
ações, Lideranças Femininas Negras frente para o cuidado e sobreviência
Sergipanas de Comunidades dos seus, acolhendo pessoas em
Tradicionais Terreiro de Matriz situação de conflito, apresentando
Africana, a exemplo do: Ilê Axé Ojú Ifá práticas específicas tão quanto a 46
Ni Sahara, liderado pela Yalorixá Sônia tecnologia da água da quartinha1.
Oliveira, que além de incontáveis De maneira geral seus
ações em tempos de pandemia, posicionamentos centrados, técnicas e
destaca-se com o Projeto Ilerá Ara intervenções já são válidas porque
(Corpo Saudável), para o acolhimento atendem para as demandas dos
e cuidado de quem cuida do outro, nossos. Aqui é significativo apreender
com dinâmicas experenciadas, vividas como as estratégias utilizadas no Ilê
e sentidas, atendem filhas de santo, às Axé Omon Tobi Oyá Lokê se colocam
mulheres negras do seu Ègbé e seu como opção terapêutica de
entorno; O Nzo Águas da Penha, acolhimento em tempos de crise e
liderado pela Mamet´u de Nkisi Jaciara advoga-se sobretudo pelo
Chagas, que atua na linha de frente no reconhecimento e validação das
provimento de alimentos para o práticas deste espaço Terreiro. Kaô
sobreviver dos seus e com práticas de nos valha, porque Ketu falará!
cuidado com vistas ao acolhimento,
promovendo o bem estar psíquico em Referencial Teórico
momentos de incertezas como estes,
atendendo as demandas das mulheres Os dados estatísticos
e de sua comunidade e o Ilê Axé Omon brasileiros a respeito das

1
A água (omi) é o elemento vivo que nos dá vida. se despotencializando e se preenche quando
A quartinha de barro (amọ) representa o corpo promove um novo re+sentir vital. A tecnologia
físico que guarda o elemento vital. A junção das do balançar da água da quartinha, é uma
duas composições omi e amò, produzem efeitos tecnologia que possibilita a potencialização
significativos sentidos no no corpo (lara). O seu como elemento portador do axé de vida para o
balançar permite revitalização, quando esvazia- corpo.

Santos
desigualdades de gênero, evidenciam promovem ações e estratégias de
que a violência contra as mulheres, é enfrentamento à violência contra as
um fenômeno histórico por diversas mulheres em redes sociais, mas ainda
vezes denunciado e que apesar dos faltam para as mulheres negras, ações
posicionamentos das instâncias com visualizações mais específicas,
públicas e privadas, os números bem como de outros espaços que
crescem assustadoramente. O avanço acolha, cuide e que ao mesmo tempo
para esta pauta ainda atravessa um as guie na formalização da denúncia e
longo caminho, principalmente para o assegure na retomada, a proteção de
recorte racial. Todavia, já se ampliam sua existência. Compreender e
espaços de discussões, visando promover ações e estratégias que
alternativas para o enfrentamento e atendam a realidade e o contexto para
contenção das suas formas de a sobrevivência de vidas negras, suas
reprodução, no tocante a violência dimensões conflitivas e de cunho
contra a mulher negra, questão central social, é uma urgência na política
deste estudo. brasileira para a Saúde e Segurança
Impedidas e fragilizadas Pública. Execradas, cansadas,
emocionalmente, sucumbidas a confusas, doídas, sem recursos
atender a satisfação machista, a financeiros e sem perspectivas,
alienante #fiqueemcasa em tempos de práticas terapêuticas de acolhimento
crise pandêmica, reproduz em seu em tempos de crise oferecidas pelos
inconsciente, um modus espaços Territórios Terreiro, surgem
comportamental anestésico que as como farol quando vistas
despotencializam quando pensada na desamparadas. Acolhidas em suas 47
possibilidade de ajuda e/ou denúncia. dores, compreendidas e sentidos seus
Revela-se num ataque violento sofrimentos, cicatrizam feridas
operado por um sistema racista e invisíveis pelos espelhos, pois veem
excludente que provoca desarranjo refletidas suas dores em outras dores.
mental, submetendo-as à outras Chamo atenção aqui para as violências
violências, como somatizações e contra as mulheres negras lideranças
outros efeitos traumáticos de base de Terreiro, que em meio a um cenário
racial. Inertes permanecem a maioria de extrema incerteza e mortes,
destas mulheres, e não vislumbram também são violentadas, de forma
saídas eficientes ofertadas pelas contínua. Se permitir ser cuidada por
Políticas Públicas atuais difundidas estas mulheres e por estes espaços, é
para todos. Sobre isto Djamila Ribeiro encontrar possibilidades do (re)sentir
noṣ convidà à rẹflẹtir: “Qúàndo múitàṣ para curar como em diluições
vezes, é apresentada a importância de homeopáticas2, pois estas lideranças
se pensar políticas públicas para entendem como a violência atravessa
mulheres, comumente ouvimos que as de maneira devastadora às vidas de
políticas devem ser para todos. Mas mulheres negras.
qúẹm ṣão “todoṣ” oú qúàntoṣ càbẹm Quanto a comprrensão
nẹṣṣẹṣ “todoṣ”?” (RIBEIRÒ, 2019, p. territorial, a vertente epistemológica
40). trabalhada no espaço território
Com práticas universalizadas, Terreiro Ilê Axé Omon Tobi Oya Lokê
instâncias públicas e privadas não deve causar estranheza se

2
As diluições homeopáticas atendem para o
princípio geral de que semelhante cura
semelhante.

Santos
considerarmos os epistemicídios que Dados da violência contra
invalidaram nossos referenciais. Mais mulher em tempos de
que atribuir valor, é incubência nossa,
pandemia no Estado de
fomentar estas epistemes no nosso
fazer terapêutico e chamar a Sergipe.
responsabilidade daqueles que ainda
estão sob efeito jabuticaba3 , os Países em confinamento e
macaxeiras4, para o despertar da bilhões de pessoas tendo que se
hipnose do modo fazer colonial. A abrigar em casa contra a infecção
possibilidade encontrada na mundial do novo coronavírus.
Afrocentricidade como base Mulheres tendo que conviver dia e
epistêmica, alinhada as propostas do noite com seus parceiros violentos,
Mulherismo5, permite atender as separadas de seus núcleos familiares,
demandas apresentadas e trabalhá-las sem recursos financeiros e destruídas
alinhadas às práticas tradicionais emocionalmente, é o cenário perfeito
africanas, suas inquietações e para o aumento da violência
clamores. Ocorrer não contemplar doméstica e feminicídio. Segundo
e/ou desvincular estas epistemes, dados anteriores à pandemia, no mapa
atende para a lógica eurocentrista, da violência contra as mulheres, às
onde para o crivo do colonizador não mulheres negras são as mais
importa especificar se é uma prática vulneráveis e possuem mais chances
válida ou não. de serem violentadas que as mulheres
Como um desafio social a ser brancas. Estes dados fazem parte do
enfrentado devido a invisibilização estudo Atlas da Violência 2018,
apresentados pelo Instituto de 48
destes espaços, apoiar-se no
afrocêntrismo re+ORI+enta , pois
6 Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e
torna consciente cada ação, estratégia pelo Fórum Brasileiro de Segurança
e intervenção, objetivando realocar os Pública (FBSP). De acordo com
sujeitos em conflitos como agentes de Agência Brasil, em comunicado, a
seu processo. Para RIBEIRO (2019) a entidade FBSP, torna público registros
proposta trata particularmente disso, que confirmam queda nos boletins de
de centrar os povos em diáspora e ocorrência, evidenciando que, ao
reorientá-los na história, mesmo tempo em que as mulheres
possibilitando assim reencontrar sua estão mais vulneráveis durante a crise
localização e construir sua própria pandêmica, mais dificuldades
agência para denúncia e libertação. possuem para formalizar a queixa
contra os seus agressores (BOND,
2020).

3
Sobre o "efeito jabuticaba”, sulear entre a do povo preto. É o fazer de consciência preta e
Filósofa Katiuscia Ribeiro e Olorode Òjiyàn subjetividade branca.
5
Kálàfó Jayro Pereira, acerca dos impactos dos A proposta do Mulherismo nos objetiva pensar
destroços colonialistas, alertando para o atual o lugar das mulheres pretas a partir de nós.
6
movimento de luta antirracista faz refletir Re+ORI+enta enfatiza a ação de orientar
acerca das armadilhas da branquitude. novamente em outro sentido. Aqui mais central,
4
Macaxeiras, adjetivo comumente utilizado mais afrocentrado. Seu indicativo localiza o
pelo escritor aracajuano Severo D´Acelino, sujeito para que sua fala, pensamento e conduta
quando atenta para a não localização de em diáspora estam voltados para África num
sujeitos, ações e práticas que atendam a agenda ciclo de realinhamento afroconsciencial.

Santos
Estudos recentes, já apontam desempregadas, sem renda ou
que em dois e mil e vinte, no Brasil, há diminuída por conta dos impactos no
aumento da violência em algumas mercado de trabalho voltando-se mais
cidades. No nordeste brasileiro, vulneráveis do que antes (CRISPIM,
considerando o contexto atual, é 2020).
importante destacar que o Estado de Ainda de acordo com a
Sergipe apresentou uma menor taxa pesquisa do FBSP (2018), ressalta-se o
de violência doméstica durante a aumento dos casos de feminicídio no
pandemia. Para a Agência Eco Brasil de 22,2% durante a pandemia
Nordeste, os dados de crimes não da Covid-19. O levantamento feito
letais contra mulheres, durante a salienta que exemplo do ocorreu em
Covid-19, não refletem a realidade outros países, os dados demonstram
pois o isolamento dificulta ainda mais que as mulheres brasileiras
as denúncias por parte das mulheres encontram dificuldade para pedir
agredidas (CRISPIM, 2020). ajuda às autoridades (CRISPIM, 2020).
Este estudo de Violência Doméstica
Tabela 01 –Índice de violência doméstica no durante a pandemia de Covid-19, foi
Nordeste de março a abril de 2020. realizado a pedido do Banco Mundial,
com intuito é de medir o impacto da
pandemia e da quarentena sobre a
vida das mulheres brasileiras. Penso
que o estudo é significativo mas falta
especificar nos dados o aumento dos
números para as mulheres negras e 49
não somente universalizar, pois já
Fonte: Maristela Crispim. EcoNordeste, 2020. discorre na pesquisa que o Brasil
também viu crescer o número de
Na tabela acima constata-se denúncias registradas no Ligue 180,
que em quase todos os estados do que é a Central de Atendimento à
nordeste, houve uma redução dos Mulher em Situação de Violência junto
registros de lesão corporal dolosa em ao Ministério da Mulher, da Família e
decorrência de violência doméstica dos Direitos Humanos (MMFDH). Fato
quando comparada com o ano passado que nos chama atenção para
(CRISPIM, 2020). O estudo nos chama contemplarmos, quem são estas
atenção também para o estado do mulheres?
Maranhão pelo aumento de casos, com
variação de 166,7%, de 6 para 16 Metodologia
vítimas. Ainda explica que os dados
que apontam para a redução, o que Como fonte inicial para
reforça a dificuldade da formalização análises, foram coletadas cinco
da queixa pela da violência praticada narrativas de mulheres negras em
por seus parceiros neste período. situação de conflito que buscaram o
(CRISPIM, 2020) Entende-se que essa espaço território Terreiro Ilê Axó
redução é interpretada pela sua Omon Tobi Oya Lokê, como
subnotificação, ressaltando o cenário possibilidade de locus terapêutico.
perigoso onde a combinação de raça, Para delimitação, os critérios de
gênero e classe social exponenciam elegibilidade dos participantes foram
seus agravantes, onde muitas estão as narrativas em situações de
em condições precárias e violência doméstica. Para proteção de

Santos
seus agentes, foram identificados se investigam dois elementos centrais:
apenas com as iniciais do nome e a desorganização sentida pela
idade. Os dados foram coletados no problemática conflitiva e as
fim de março e meados de julho de atribuições explicativas que vinculam
dois mil e vinte. A técnica de coleta de códigos excludentes naturalizados.
dados foi a entrevista
semiestruturada, que teve como Resultados e Discussão
instrumento um roteiro composto por
questões semiabertas que versavam A violência doméstica contra as
sobre informações de cunho mulheres e principalmente contra as
identitário e social. Os atendimentos mulheres negras que está
foram realizados no Terreiro, subnotificada neste contexto de crise
gravados e tiveram duração média de nos assusta e nos inquieta, pois nos
40 minutos. Posteriormente, foram mata. Sobre a morte, (FOUCAULT
transcritos para suleamentos 2010 apud ALMEIDA, 2019, p. 115),
empíricos. Para elucidação e ṣàliẹntà qúẹ “à mortẹ àqúi não é à
compreensão das narrativas e do retirada da vida, mas tambem é
campo conflitivo e situacional, a entendida como a exposição ao risco
transcrição de algumas partes da morte, a morte política, a expulsão
contempla aquilo que compõe a ẹ à rẹjẹição”. Sua face fria e sombria
origem deste artigo. nos desafia e movimenta outros
O campo de análise proposto é espaços que estão em linhas de frente
o Afro-Cêntrico7, pois entende-se aqui e de apoio às Políticas Públicas.
que para análises e suleamentos a Phumzile Mlambo-Ngcuka diretora 50
perspectiva Afrocêntrica é posta para executiva da ONU Mulheres, chama
posicionar e/ou localizar o lugar de atenção em documento na ONU
fala das mulheres negras cujos quando relata que o confinamento é
episódios narrados elucidam a uma tempestade perfeita para
violência como elemento central da controlar o comportamento violento a
problemática a ser trabalhada. Nesta portas fechadas (NAÇÕES UNIDAS,
perspectiva a Afrocentricidade já 2020). Neste observa-se também que
qualifica metodologicamente a importantes medidas são apontadas
pesquisa, pois não há conjunções por ela, como linhas de ajuda para
àltẹrnàtivàṣ, ẹlà “ṣẹ ànúncià como úmà mulheres, que devem ser um serviço
forma de ideologia antirracista, essencial e com financiamento
antiburguesa e antissexista que é específico, bem como o apoio às
nova, inovadora, desafiadora e capaz mulheres e comunidades de base em
de criar formas excitantes de adquirir seu atual papel de linha de frente.
conhecimento baseado no O poema de Beatriz
restabelecimento da localização de um Nascimento que retrata o querer
tẹxto, úmà fàlà oú úm fẹnômẹno.” viver, os sonhos rompidos, os anseios
(ASANTE, 2016, p. 03). Para das muitas mulheres negras de uma
direcionar o percurso metodológico, vida como tantas outras, mas

7
Molefi Asante salienta que a palavra "Afro- mudança social) em 1980 que a perspectiva
cêntrico" havia sido usada por Kwame Nkrumah, buscou privilegiar a identidade, os conceitos, os
líder de Gana, em 1961 em um discurso na pensamentos e as ações africanas, como a base
Universidade de Gana, em Legon e foi com a para uma nova abordagem do conhecimento.
publicação do livro Afrocentricity: The Theory of (ASANTE, 2016, p. 6).
Social Change (Afrocentricidade: A teoria de

Santos
compelida pelas estruturas do estrutura social racista que tenta
racismo, sexismo e capitalismo, nos invalidar suas práticas e seu fazer
fala: afroterapêutico. Apesar de, este
Território segue decolonizando e
Antes tudo acontecesse como desinstitucionalizando estruturas
antes aconteceu. Não vindo hegemônicas embranquecidas,
como algo novo seduzindo o que
não estava atento. Antes tudo
assegurando a estas mulheres outros
acontecesse como o aviso do itinerários humanitários, ainda que
ṣinàl Atẹnção! “Eṣtá prẹṣtẹṣ à ṣẹ invisibilizado, sem apoio de Políticas
concrẹtizàr”. E não como Públicas e por muitas vezes lhe
serpente silenciosa em seu faltando materiais, como por exemplo,
silvar. Antes tudo acontecesse
quando te sentisses forte Capaz
um bom computador e impressora
de reagir, que pudesses sangrar. para melhor atendimento,
Antes tudo acontecesse como se acompanhamento e planejamento.
fosse o previsto visto de trás ou Diante dos obastáculos, segue a pulso
de longe, antes que te atingisses firme apoiada por seus membros, one.
de frente. Antes tudo
acontecesse como acontecem as
apesar das dificuldades, suas práticas
histórias de encontros e legitimadas pela ancestralidade,
rompimentos, num mergulho avançam e alcançam mulheres de
sem demora. Antes tudo se outros estados.
passasse como passa o Arco-íris Observada às necessidades
Num momento luz, noutro
bruma e crepúsculo.
neste período de isolamento, os
(NASCIMENTO, 1987 apud serviços oferecidos pelo Terreiro em
RATTS, 2006, p. 44) questão, ao redesenhar seu fazer 51
terapêutico, divulga suas práticas em
Destarte, ao observar serem redes sociais, dando visibilidade aos
rompidos sonhos, e mergulhadas em atendimentos realizados no locus
frustações e desesperos, surge a Terreiro. As plataformas Telegram,
necessidade de acolher as dores Whatsapp, e-mail e telefone são
destas mulheres em situações disponibilizadas e nestas ebós
conflitos de violência. E assim faz a epistemológicos assumem a
liderança feminina de terreiro centralidade da práxis,
“Tẹrrẹiro dẹ Càndomblé”, do Ilê Axé potencializando as técnicas de
Omon Tobi Oyá Lokê, Yalorixá Jouse acolhimento e escuta qualificada. Para
de Oyá, conhecida como Banitaji, que contemplar a categoria de ebó
abre canais de comunicação on-line, epistemológico, a episteme já
para atendimento, apresentando difundida pelo Professor e Babalorixá
como mais uma possibilidade de Sidnei, nos alcança pois se refere ao
cuidado em tempos de pandemia e “ṣomàtório dà àfrocẹntricidàdẹ com
traz em suas práticas terapêuticas os saberes tradicionais das CTTro no
itinerários afrocentrados. Estas, já Bràṣil.” (NÒGUEIRA, 2020, p. 127)
consolidadas, são coordenadas por
suas duplas pertenças, conhecimento Narrativas de mulheres
e experiência do fazer Psicologia,
negras atendidas e em
alinhado-as aos saberes e pensares
pretos e de Terreiro, trazendo no viés situação de conflito.
militante, a aplicação de técnicas
inclusivas e contínuas, ainda que Para elucidar a importância do
ilhada em seu espaço Terreiro pela trabalho neste espaço, trago aqui nas
cinco falas abaixo, as narrativas de

Santos
mulheres negras em situação de dificultando a retomada de novos
conflito de violência doméstica, afetos. Seu campo emocional
atendidas no fim de março à julho de estilhaçado pelo relacionamento
2020. O período marcado como inicial, anterior abusivo e tóxico, ainda não foi
já se observa a violência após repotencializado. Observa-se na fala o
confirmação do primeiro caso de quanto o rompimento de seus vínculos
Covid-19 no Estado de Sergipe em familiares afetou quando atendia para
março, na cidade de Aracaju. Ao iniciar a imposição de seu agressor. Aqui
cada atendimento é apresentado o observa no quanto a imagem mental
formato do itinerário afrocentrado do agressor ainda a violenta,
para conhecimento. Elucidadas as deslocalizando-a de si. A isto salienta
premissas iniciamos as análises já BRASIL (2020, p. 10), quando diz que
contemplando nas narrativas trazidas: “àṣ múlhẹrẹṣ podẹm pàṣṣàr à tẹr
como a problemática conflitiva se menos contato com sua rede
interrelaciona com os marcadores da socioafetiva, afastamento que pode
cartilha de Saúde Mental e Atenção favorecer a perpetração de
Psicossocial na Pandemia COVID-19: violênciàṣ.”
violência doméstica e familiar na A segunda paciente, atendida
COVID-1 (BRASIL, 2020) e como em abril, intitula-se morena e traz em
analisar os códigos excludentes seu relato a dependência e humilhação
naturalizados, estes gatilhos estarão pública como formas de violência. “Ele
destacados e sublhinados para melhor já virou a cabeça disse que não me quer
visualização. já tem oito dias, mas é sempre assim,
A primeira paciente em por bobagem. Eu entendo porque 52
solicitação por telefone, inicia o tambem não fico calada, mas não sei o
itinerário terapêutico e nos fala do que fazer porque ele esta sem trabalho
motivo que a trouxe ao e era ele quem me ajuda a pagar o
atendimento.“Tô solteira, me separei. aluguel e a água. Fui atrás dele ontem.
Tô aliviada sabe, sofria muito com Foi pior, ele parecia bicho, me
aquele homem. Eu amava e não consigo empurrou e me xingou na frente dos
tirar ele de minha cabeça (choros). amigos (choros) Eu tô desesperada,
Ainda tô meio perdida. Não consigo mas queria que ele voltasse, porque
falar e nem me relacionar com mais estou sem dinheiro. (Paciente L., 25
ninguém. Tudo me lembra ele. Eu perdi anos)”. Neste relato observa-se como a
quase tudo na vida, até minha família estrutura social, com a falta de
se afastou de mim porque ele gritava, perspectiva e desemprego, anestesia a
me humilhava e me enganava. O pior é mulher violentada. Neste período de
que eu já sabia que tudo isso ia incertezas e em dependência total de
acontecer. A gente pensa estar seu agressor, BRASIL (2020, p. 11)
preparada mas não está. Voltei pra ẹnfàtizà qúẹ “o homẹm ẹ/oú à múlhẹr
casa de meus pais porque tá tudo difícil, podem ter o sustento da família
tive que ficar sem trabalhar porque o limitado ou ameaçado, resultando no
restaurante fechou com essa pandemia. aumentando do estresse e no
Tô bem, mas não é a mesma coisa, sinto agravamento da convivência
que esta me faltando algo em mim” conflitúoṣà ẹ/oú violẹntà.”
(Paciente C., 38 anos). Sua fala A terceira paciente, nos fala do
evidencia que apesar de apresentar sentimento de exclusão, da falta de
para si novos caminhos, o trauma representatividade e de recursos
conflitivo ainda está presente, financeiros.“Eu não tenho como pagar

Santos
uma boa consulta particular e nem vou A quarta paciente nos chama a
mais pro posto e nem mais pra canto atenção pela idade e pela violência que
nenhum. Da última vez que fui lá, a recai sobre si. É jovem, negra e mãe de
mulher parecia que tinha nojo de mim, um filho. Iniciou-se o atendimento
nem olhava na minha cara. Daí tem uns com escuta de base qualificada e
dias que eu soube que você também direcionada com vistas à
atendia. Te juro que só deu vontade de compreensão da problemática e da
vim, porque vi na foto a senhora estava possibilidade do itinerário de
de torso8. Daí, já vi logo que era do intervenção. É que eu tenho um filho do
babado9 como eu (risos). Eu convivo marido de minha tia. Estou com ele
com essa pessoa violenta tem mais de 8 desde que eu tinha 14 anos. Ele me dava
anos e de dois anos pra cá ele ficou pior. tudo até o dia que eu disse que não
Não me separei porque tô queria mais ele. Eu tô com um
desempregada e agora com essa namorado que nem sabe que ele é
pandemia piorou tudo. Nem pra sair marido de minha tia. Ele vive me
pra procurar emprego pode mais. Mas ameaçando. Já me bateu na rua e já
eu sinto que não gosto mais dele. Me dá brigou com meu namorado. Quando ele
até uma coisa por dentro só de pensar. bebe, vem direto atrás de mim. Se eu for
Quero viver minha vida.” (Paciente E., dar parte dele vai ser pior pra mim, né!.
27 anos). Observa-se na fala a Ele dá as coisas pro meu filho e sem isso
necessidade de desvinculação e como vai viver eu e meu filho? (Paciente
libertação de si do ciclo conflitivo. M., 16 anos). Observa-se nesta fala o
Observa-se também o que BRASIL abuso por familiares próximos e traz
(2020, p. 11) qúàndo ẹlúcidà, “à fàltà no seu relato o retrato social brasileiro 53
de recursos financeiros e o acesso quando em idade de adolescência
restrito aos serviços de saúde muitas vezes são violentadas, além do
dificultam o afastamento do agressor e agravante abusivo de alcool neste
o rompimento do ciclo dà violêncià”. A período segundo BRASIL (2020, p. 7),
importância de se ver representadas ondẹ “o àúmẹnto do úṣo àbúṣivo dẹ
nas redes de cuidado, podem ajudar álcool e outras drogas no ambiente
na formalização da denúncia. O familiar tendem a aumentar a
despreparo técnico dos agentes de probabilidade de ocorrer violência
saúde observados é ação recorrente (psicológica, física e sexual), pois a
em qualquer contexto de atendimento capacidade de contenção dos próprios
à saúde quando relacionada às vidas atos pode encontrar-ṣẹ rẹdúzidà.”
negras. O racismo permite que se Embora diferentes estatísticas da
negue suas existências. É urgente violência contra adolescentes não
desistitucionalizar práticas apresentem indicadores precisos, as
universalizadas hegemônicas racistas consequências traumáticas invalidam
e excludentes nos atendimentos do e impede as de denunciar.
SUS. É preciso capacitar profissionais, A quinta paciente ao saber que
para tão importante missão que é os atendimentos seguiriam em outro
acolher dores. formato, pergunta quando haveria a
possibilidade de falar com Dona

8 9
Torso ou Pano de Cabeça, é um elemento de O babado, adjetivo regional utilizado para
identificação. São usados em várias culturas. Faz explicar um boato, como também para localizar
parte do vestiário dos negros Áfricanos e o pertencer grupal, como por exemplo: Ela é do
Candomblecistas. “babado”, ou do “blé” referindo-se ao
Candomblé.

Santos
Maria. Dona Maria10. Avisada do justificam a problemática nas
interdito e das mudanças das práticas narrativas com vistas a pensar quais
em tempos de pandemia, o técnicas afrocentradas podem ser
atendimento durou menos que o aplicadas para dar uma resposta
previsto em relação aos outros. Ela rápida à situação conflitiva, pois as
relata em sofrimento, a violência falas já confirmam os dados
abusiva sofrida e traz sua experiência apresentados pela FASP de
de diálogos exuísticos11.“Eu tô subnotificação da violência contra
sofrendo muito por ele e queria falar mulheres em Sergipe durante a
com Dona Maria. Ela sempre me ajuda pandemia de Covid-19, reforçando
a resolver meus problemas. Fiquei com problemáticas sociais, e observadas a
uma dívida enorme depois que minha complexidade de implicações e
mãe faleceu. É tudo tão complicado. contextos sociais, os quais reafirmam
Tenho até vergonha de falar pra ser agravantes para naturalização de
senhora algumas coisas mas acho que a códigos excludentes
senhora sabe que ele me batia sem despotencializadores que incutem
necessidade. Mas deixe, eu só queria dependências e elucidam a
falar com ela. É que preciso entender permanência ao lado de seus
porque não consigo esquecer. Não sei, agressores. Independente dos dados
não sei, não sei. (Paciente P., 38 anos). estatísticos, entender que é no
Observa-se aqui a relação aproximada isolamento, onde muitas estão
com as múltiplas versões de Exu. como confinadas com seus companheiros,
possibilidade de conexão dialógica desempregadas, abaladas
exuística. Trazida nesta narrativa, emocionalmente, enclausuradas e 54
elucida também suas limitações silenciadas que são agredidas,
interrelacionais. A destruição psíquica ofendidas, denegridas,
causada pela violência impedem estas desrespeitadas, humilhadas, retiradas
mulheres de se relacionem sua potência de mulher e dominadas
socialmente, escondem suas dores, permanecem em aprisionamentos
evitando ser julgadas, preferem estar mentais, adoecendo e somatizando
para outras dinâmicas que mitiguem ferídas invisíveis e dores. Inundadas
suas dores. Trabalhar criteriosamente de pensamentos excludentes e
essa prática, apresentada como despotencializantes se autoanulam,
possibilidade de realinhamento, nos autoinativam, autoanestesiam e se
cobra uma postura ética, pois é autoimpedem de notificar.
preciso estar atentos para que novos Estas mulheres em isolamento,
atravessamentos não assumam aprisionadas e amedontradas por não
centralidades. mais suportas as dores invisíveis,
Dilucidados os pontos lutam pelo sobreviver de si e de suas
considerados como núcleos a serem descendências, num conflito psíquico
trabalhados e observados como se interno quando sua natureza clama
10
Dona Maria é um catiço feminino, pombagira membros da comunidade e adeptos num
que atende pelo nome de Maria Mulambo e transitar aproximal de vivências sentidas e
trabalha em prol do terreiro há 25 anos vividas, incidindo obsequiosamente
atendendo pessoas em situação de conflito. conselheiras na vida daqueles que os procura.
11
Alocadas nesta categoria a Pombagira, Diálogos Exuísticos é um termo trazido no
conforme Prandi (1996, p. 148) "trata dos casos texto para explicar as multiplas compreensões
de amor, protege as mulheres que a procuram, de diálogos que Exu possibilita, quando
é capaz de propiciar qualquer tipo de união apresentada as encruzilhadas conflitivas e
amorosa e sexual", elas aproximam-se de tensionais.

Santos
pela liberdade de mulher, colidindo bràṣilẹirà.” (NASCIMENTÒ, 2018, p.
com a reorganização de processos 144). O assegurar convida a esta
internos, identitários e de mulher negra em estado de
pertencimento. Atentando para os sofrimento a re+ORI+entar e repensar
elementos identitários, pensar que o processo conflitivo vivido.
elementos visuais culturais favorecem Saber-se violentada e
a vinda dessas mulheres, já contempla naturalizando atitudes agressivas,
satisfatoriamente a pesquisa, pois abusivas e violentas, apresentam
penso que uma prática terapêutica como atravessadas estão anestesiadas
preta traz grandes resultados sendo em seus sistemas reestruturantes.
trabalhadas por pessoas pretas, pois é Para trabalhar estas falas, a categoria
na visualização da representação de do ebó epistemológico assume os
seus semelhantes, que encontramos a realinhamentos pela episteme do
ética relacional nagô. A dinâmica afrossentido, desmistificando e
apresentada para contemplação das potẹnciàlizàndo, poiṣ “tẹm à vẹr com à
narrativas e compreensão da prática postura acolhedora que nasce
de acolhimento valida seu fazer justamente do cosmoṣẹntido.”
terapêutico, pois se deve entender que (NOGUEIRA, 2020, p. 128). Sua
há outras formas de se trabalhar aplicação é compreendida pela
empiricamente as coisas, os fatos e os possibilidade afrointerpretativa
fenômenos no mundo. quando em suleamento. E mais que
isto é importante entender que esta
A fala como técnica de cura na ẹpiṣtẹmẹ “ẹṣtá nà libẹrdàdẹ doṣ
validação do itinerário sentidos e das existências, na 55
liberdade das vivências, das
terapêutico afrocentrado de
experiências e do compromisso com o
terreiro. qúẹ ṣẹ é.” (NÒGUEIRA, 2020, p. 128).
Revisitar dores pulsantes e
Sair deste lugar de intensas, são feridas invisíveis que
subalternidade, de subserviência, de inflamam. Pensando na aplicação das
subordinação é um processo, tenso e técnicas para o resentir nos
doloroso. O itinerário interventivo provocamos quando
proposto, fomenta a autoescuta, num problematizamos em como restituir
fluir ético que assegure à sua uma identidade atravessada de
existência um bem estar psíquico. códigos excludentes
Sobre essa importânte colocação embranquecidos? Assim como num
NASCIMENTO (1980, p. 264) discorre exercício diário e reflexivo nos
qúẹ “àṣṣẹgúràr à condição húmànà dàṣ atentamos sempre para o decolonizar
massas afro-brasileiras há tantos de pensamentos hegemônicos para o
séculos tratadas e definidas de forma preenchimento de memórias
humilhante e opressiva, é o identitárias. Um dos primeiros passos
fúndàmẹnto étnico do qúilombiṣmo.” encontrados foi trabalhar os códigos
É por esta ética étnica que nos excludentes implantados e
voltamos pois entendemos que é naturalizados, gatilhos abissais,
preciso cuidar do nosso povo e obscuros e subterrâneos, assombros
pensarmos em nossa localização mentais internos que causam feridas
ẹnqúànto grúpo poiṣ “tẹmoṣ úmà invisíveis (FANON, 2008), para isto,
história e uma forma de vida, que nós afrocentrar a fala é indiscutível e
somos um grupo dentro de sociedade necessaário, poiṣ “fàlàr é àṣṣúmir úmà
brasileira, dentro da sociedade toral

Santos
cultura, é suportar o peso de uma perspectiva do tradicionalismo da
civilizàção.” (FANÒN, 2018, p. 33). oralidade, pela tradição viva
Este caminho abre importantes (HAMPATÉ BÂ, 2010), trará por si só,
dialógos epistemológicos com as caminhos identitários, já que para
teorias psicanalistas nos permitindo compreensão das violências que
trazer complementaridades, pois rẹcàẹm ṣobrẹ ṣi ẹ “númà ṣociẹdàdẹ
acessar o inconsciente estruturado à como a brasileira, de herança
dominação eurocêntrica, exige escravocrata, pessoas negras vão
estratégias e manejos específicos. experienciar racismo do lugar de
Ao desenhar o itinerário qúẹm é objẹto dẹṣṣà oprẹṣṣão.”
terapêutico preto de Terreiro para (RIBEIRO, 2019, p. 85).
atenção à saúde mental às mulheres Ao se perguntar: Mas o que
violentadas, a experenciação sentida e tudo isso tem a ver com as práticas de
vivida pela fala, foi trabalhada para lideranças de Terreiro? Tudo! Acolher
ressignificação, identificação e e escutar problemas, queixas e dores,
pertencimento, neste fazer trouxemos são exercícios diário das lideranças
os afroreconectores12, como códigos femininas destes espaços. E se faz
de alinhamentos baseados nas necessário validar, já que as práticas
tradições africanas, que se eurocêntricas ocidentalizadas
apresentam como técnicas potentes ofertadas pelo Sistema de Saúde, não
como os espelhos da fala, que trabalha alcançam muitas destas quando em
a autoescuta, elemento que contribuiu vulnerabilidades, nem compreendem
para o redirecionamento da situação suas dinâmicas e nesta
problema. Fazer uso deste incompreensão violam existências e 56
instrumental tradicional é contemplar experiências. Como bem salienta Lélia
novas estratégias alinhadoras de Gonzàlẹz, “nẹṣtẹ tràbàlho àṣṣúmimoṣ
consciências destroçadas em noṣṣà próprià fàlà.” (GÒNZALES, 1984,
resistências e sucumbidas à p. 225) e a posição que se ocupa
dominação machista, racista e assegura ações afirmativas. A isto
colonialista. NASCIMENTO (1981, p. 211) já
Analisada as narrativas ṣàliẹntà qúẹ “ṣẹú càrátẹr libẹrtário é
trazidas e as violências sofridas por considerado um impulsionador
estas mulheres em situação conflito, ideológico na tentativa de afirmação
entende-se que às intervenções ràciàl ẹ cúltúràl do grúpo.” Tràtà-se do
devem produzir ações concretas saber cuidar de vidas negras em todas
desde o acolhimento. As dinâmicas e o as suas dimensões, pois nos
vínculo terapêutico devem fomentar a reconhecemos e nos constituimos, e a
fala como elemento de emancipação, prática nos atende pois esta para a
pois se muito difícil é sair deste lugar compreensão sentida e vivida da
de submissão, mais difícil ainda é falar dororidade, expressão defendida pela
e/ou denunciar. A voz é um elemento feminista negra Vilma Piedade que
de potencialização para emancipação intersecciona a dor pelas opressões,
e aproximação. No acolhimento a de gênero e raça. PIEDADE (2017, p.
compreensão da própria escuta, as 18) diṣcorrẹ qúẹ “à Dororidàdẹ tràtà
localiza na retomada. É um sobre as violências que atingem as
mecanismo que, se utilizado pela múlhẹrẹṣ prẹtàṣ” ẹṣtẹ comprẹẹndẹr

12
Os afroreconetores são todos os elementos aquilo que possibilite o sentir de África em
que possibilitam a reconstrução de novos diáspora.
ressentir. São itans, orikis, aduras, enfim, tudo

Santos
alicerça as epistemes e possibilita no Compreendidas às narrativas e
reconectar da bioancestralidade, as a problemática social conflitiva,
recriações identitárias. devemos nos atentar para que as
As narrativas em primeira armadilhas colonialistas que
pessoa quando deixam emergir o delimitam fronteiras, não reduzam as
aprisionamento mental, os códigos narrativas sofridas a vitimismos (ditos
naturalizados e a fragilidade eurocidentalizados). Por exemplo, na
emocional, mostram a face abusiva da dinamização do itinerário terapêutico,
violência e a solidão da mulher negra. não contemplar a categoria exuística
Uma violência à qual todas nós trazida e seus desdobramentos é
mulheres negras somos submetidas. negar a existência de outras tradições
Forçadas a um brutal jogo de diaspóricas culturais e religiosas em
silenciamentos que impôem solo brasileiro. Assim, como
fronteiras abissais no modo de repotencializar estas mulheres sem
compreensão do conflito, entender fazê-las cair nas armadilhas da
qúẹ “àṣ múlhẹrẹṣ nẹgràṣ ṣão màiṣ branquitude? Como fazer destas
propensas a serem membros de um mulheres agentes conscientes de seu
grupo oprimido, têm uma lugar, de seu sofrimento e de seu
compreensão mais crítica sobre a corpo sofrido, agredido, humilhado e
condição de nossa opressão que execrado? Como trabalhar
aqueles que vivem fora dessas paralelamente um itinerário
ẹṣtrútúràṣ.” (CÒLLINS, 2015, p.122). E terapêutico rápido, potente e
aqui pela sentido da compreensão, profundo? A perspectiva Mulherista,
recai ao Terreiro de Candomblé, como materno-centrada e a AfrocêntricA13, 57
locus tido periférico, um modo de são epistemes que possibilitam a
produzir terapêutica pra saúde, que reconstrução do desmantelo psíquico,
assume como responsabilidade deste operando em múltiplas versões e
lugar e lhes particulariza. Aqui não se contextos, como num cordão de
nega o acolher e nem mais transferir o ligamentos em fluxos circulatórios,
cuidar. Sobre a particularização do esvaziando, preenchendo e
fàzẹr nẹṣtẹ lúgàr nóṣ, “não dẹṣẹjàmoṣ fluidificando, rompendo
transferir para outros as aprisionamentos, num ressentir com
responsabilidades que a História nos repousos constantes assim como a
oútorgoú.” (NASCIMENTÒ, 1978, p. água das quartinhas.
137). Manter as dinâmica ativas Da necessidade de reconexão,
destes espaços atendem para o todos sabemos, porém, poucos fazeres
reavivamento das tradições onde as em práticas terapêuticas de Terreiro
práticas trazem técnicas para direcionam-se à questão: em como as
sobrevivência, para cura e libertação. práticas de comunidades tradicionais
podem construir instrumentais de
Trabalhando as narrativas: intervenção afropositivos para
Storytelling de atender mulheres negras violentadas
e em situação de conflito. Embora
repotencialização através dos
saibamos que os elementos
itans. afroreconectores, estejam para nós e
para todos que buscam, manuseá-los,

13
AfrocêntricA, o termo aqui colocado em que no esvaziar, preencher de Áfricas, África
maíuscula no final, permite visualizar uma diásporica de África continental.
localidade afrocêntrica, chamar a atenção de

Santos
implica estar em África, pois é lá, E como já dizia minha mãe,
localizada ao Sul que estão seus Fátima Zuzarte, quem não sabe o que
referenciais de oralidade para ouve, também não sabe o que faz e
apreensão. Este movimento de nem sabe o que diz. Dito ancestral
validação das coisas africanas já é familiar que nos permite refletir
visto por NOBLES (2009, p. 280) e quando for localizar a intervenção, a
diṣcorrẹ qúẹ “àgir dẹ oútrà formà é técnica e a autoescuta como um
restringir o conhecimento africano e potencial libertador. Nas dinãmicas
as suas inspirações ao campo de visão utilizadas, a técnica das histórias orais,
dos instrumentos e das interpretações os itans14, apesar de não reconhecidos
ẹúropẹúṣ.” Eṣtà importàntẹ pelo sistema educacional brasileiro
compreensão contempla a técnica ṣão útilizàdoṣ “pàrà ẹnṣinàmẹntoṣ,
trazida pois também reconhece que tanto nos quartos de consulta de
“oṣ contoṣ oràiṣ viẹràm àntẹṣ doṣ terreiros de candomblé, quanto nas
textos escritos em todas as tradições rodas dos mais-velhos e também na
rẹligioṣàṣ” (SUNWÒLF, 2005, p. 306). contação de histórias entre os afro-
No Candomblé, os elementos descendentes, com objetivos didático-
afroreconectores são utilizados pẹdàgógicoṣ.” (PÓVÒAS, 2004, p. 25-
sempre e destacando sua importância 26). Trazê-los como proposta a ser
para aqueles que estão em aplicada edifica a técnica pois seus
aprendizado e em estado iniciático. alcances são extraordinários para
Observam-se resultados satisfatórios trabalhar subjetividades estilhaçadas.
quando nas mais variadas situações A técnica é potencializada sempre que
trabalham-se contextos sociais de e a cada uso pelo método Storytelling, 58
vulnerabilidades e seus agravantes, adquirindo habilidades específicas
além de ser uma fonte de sabedoria para respostas rápidas, o que
tradicional. Apesar das tentativas de particulariza o fazer terapêutico
silenciamento e perseguição do quando por diversas vezes a
Terreiro e sobre seu locus de reservas improvisação nos toma. Sulear
de técnicas e práticas, (GUATTARI E afrocentradamente deve um exercício
ROLNIK apud RAMÃO, MENEGHEL, para não cair nas armadilhas da
OLIVEIRA, 2005, p. 84) nos fala que ele branquitude. Neste movimento, ao
não foi completamente devastado trabalhar no itinerário afrocentrado,
pelas semióticas capitalísticas, “dispõe contempla-se a técnica quando
de reservas extraordinárias de meios percebemos estas mulheres passarem
de expressão não logocêntriocos, dẹ “oúvintẹṣ à contàdoràṣ” (RAMÃÒ,
podendo se articular em formas de MENEGHEL, OLIVEIRA, 2005, p. 84). A
criàção totàlmẹntẹ originàiṣ”. respeito da técnica das histórias orais,
Complementando o que traz VELECI (SUNWOLF, 2005, p. 307) explica que
(2017, p. 68) qúàndo diz “oṣ tẹrrẹiroṣ “dẹ fàto, podẹm ṣẹr úm rẹcúrṣo ímpar
foram constituídos para ser uma para alimentar o espírito, pois
recriação dos territórios africanos, um prodúzẹm impàcto ẹmocionàl”. Nẹṣtẹ
espaço onde aqueles que foram sentido, utilizar dos itans para no
escravizados e obrigados a deixar sua acolher repotencializar vivências
terra mãe pudessem retornar, só que assim como para realinhamentos,
ẹm ṣolo bràṣilẹiro.” posiciona a técnica como eficiente pois

14
Itan é o termo em iorubá/nagô dado para o moralidade, elas encerram ensinamentos.”
conjunto de todos os mitos, canções, histórias e (PÓVOAS, 2004, p.13).
outros componentes culturais. “Mais do que

Santos
não há necessidade de aceitação de (NONGENILE MASITHATHU ZENANI
outras conjunturas, ela apenas se apud SUNWOLF, 2005 p. 308) já
conecta numa linguagem sentida ṣàliẹntàm qúẹ “contàr hiṣtóriàṣ é úmà
como a materna intra-uterina, num junção sensorial de imagens e idéias,
ressoar relacional e existencial. um processo de recriar o passado nos
Ao narrarem suas vivências de tẹrmoṣ do prẹṣẹntẹ”. Dẹṣtàrtẹ, é
violências físicas e psicológicas que importante destacar que não basta
ferem e causam efeitos emocionais apenas contar qualquer itan, as
devastadores, a técnica permite a histórias devem ser bem selecionadas
estas mulheres um acolher com para que tracem rotas os
intervir concreto, que possibilite na realinhamentos. Sua aplicação requer
autoescuta trocas sentidas como sempre a junção de outras técnicas
pílulas de libertação. Na aplicação da que possibilitem mergulhos mais
técnica no Terreiro, os itans podem profundos. Os elementos
ser trabalhados através por exempo afroreconectores de aproximação
das histórias orais das Àyabás (Mães possibilitam pelo viés materno-
Rainhas) que atendem aqui a centrada um gestar e renascer de
demanda central. Neles podem ser potências no experenciar por
ressignificados os seus mais variados exemplo, como a água da quartinha
pàpéiṣ, “múlhẹrẹṣ, mãẹṣ, gúẹrrẹiràṣ, (líquido amniótico que nutre com
sedutoras, caçadoras, amantes, gotas diluídas de suas ascendências) e
independentes, profissionais, da quartinha (corpo preto resistente)
ṣàgràdàṣ ẹ mãẹṣ ṣẹm úm màrido”. para no perceber, o balançar de
(NOGUEIRA, 2020, p. 132). Neste, esvaziamento e preenchimento 59
repotencializar com histórias orais estejam refletidos os movimentos de
nos permite trabalhar traumas reativação de memórias ancestrais e
profundos, questões de fragilidades e de saberes pretos atendendo quando
autoimagem pelos espelhos Oxunicos no despertar de suas mentes,
por exemplo, para o descolonizar aprisionadas, adormecidas e
pensamentos hegemônicos e anestesiadas. Pela abordagem
potencializar o empoderamento, materno-cẹntràdà “é ẹṣṣẹnciàl
registrando novas memórias, num ressaltar que a abordagem materno-
balançar entre o presente, o passado e centrada não necessariamente está
o futuro. Seria a técnica do Storytelling ligada à gestação físico-uterina, mas,
uma apropriação cultural? Melhor sim, a todo um conjunto de valores e
saberia explicar o Babalorixá Rodney, comportàmẹntoṣ dẹ gẹṣtàr potênciàṣ.”
uma vez que o colonialismo provocou (NJERI; RIBEIRO, 2019, p. 600-601). E
epistemicídeos e com eles como feedback satisfatório, o
apagamentos de técnicas hoje compreendido MỌ WÁ! (EU EXISTO!),
reconstruídas mas com um já contemplado em atendimentos,
“ẹṣvàziàmẹnto dẹ ṣignificàdoṣ” representa o momento de
(WILLIAM, 2019, p. 170). Aqui não realinhamento afroconsciencial de si,
discutiremos este recorte, mas quando passam a reconhecer-se,
trazemos a técnica e incluimos aquilo embora estejam enfrentando
do Outro como tal e somente, até tormentas, que são potências de suas
quando não encontrarmos suas potências, num (re)sentir do existir de
origens. si, integrada ao ser mulher, à terra
A técnica de utilizar os itans é Mãe fecunda, sentindo-se enfim
potente, tradicional e milenar grandiosas pois são parte deste todo.

Santos
Reativadas memórias e suas O terreiro na rota humanitária
bioancestralidades, os diálogos da rede de cuidado e atenção à
voltam-se para a compreensão deste
saúde mental.
movimentar. Neusa Souza, em seu
livro “Tornàr-ṣẹ Nẹgro” noṣ
Como já pontualiza Phumzile
presenteia quando explica este
Mlambo-Ngcuka, (NAÇÕES UNIDAS,
processo, como sendo um momento
2020), a violência que está emergindo
importante, pois saber-se negra além
agora como uma característica
de experenciar vivida e sentida
sombria dessa pandemia é um espelho
violada em identidades, perspectivas e
e um desafio aos nossos valores, nossa
submetidas as mais variadas
resiliência e humanidade
ẹxigênciàṣ, “é tàmbém, ẹ ṣobrẹtúdo, à
compartilhada. As atuais estruturas
experiência de comprometer-se a
oferecidas pelas políticas públicas
resgatar sua história e recriar-se em
para o cuidado e atenção a saúde
ṣúàṣ potẹnciàlidàdẹṣ.” (SÒUZA, 1983,
mental em tempos de crise não
p. 17).
atendem aos nossos porque não
Um itinerário terapêutico de
alcançam as nossas demandas. Há
terreiro que atenda pela perspectiva
sérios problemas ainda antigos no
da afrocentricidade como método de
tecido social brasileiro quando não
base e dinâmica e técnica principal, de
percebem discriminando e
decolonização do pensamento
violentando seus semelhantes. Nele, o
hegemônico opressor e
racismo estrutural já instaurado e
desinstitucionalização de terapêuticas
mais violento vai se performando
embranquecidas ofertadas no
como controle social (ALMEIDA, 60
mercado das trocas ressignificativas, é
2020) fazendo reproduzir
válido. Trazer para esta
diariamente situações abusivas e
decolonização, tanto para o campo
devastadoras, alimentadas pela lógica
teórico como para o prático, na
colonialista, que naturaliza violências.
tentativa de (re)construção de
A falta de instrumentais afros
subjetividades, a perspectiva
que atendam os nossos nos
metodológica posta em questão, é tão
equipamentos públicos do sistema de
importante como a tecnologia
saúde com estratégias concretas para
ancestral das águas das quartinhas,
trabalhar corpos sofridos estilhaçados
que num balançar afroconsciencal de
por preconceitos, difamações,
re+ORI+entação, utiliza aquilo que se
calúnias, injúrias, hipersexualizações,
tem para aquilo que se é, pois é isto o
abandonos, abusos, violências,
que potencializa o fazer terapêutico.
humilhações, racismo, sexismo,
Esta metodologia nos contempla, pois,
dentre outros, faz recair para os
“ẹm vẹz dẹ ṣomàr idẹntidàdẹṣ,
espaços periféricos como os Terreiros
analisa-se quais condições estruturais
de Candomblé, o papel de cuidador.
atravessam corpos, quais
Percebido como um ato de negação
posicionamentos orientam
secular, de ataque desvalorativo, a
significados subjetivos destes corpos
falta de mecanismos, estratégias e
muitos já desestruturados pela matriz
representatividades, dificulta o acesso
dà oprẹṣṣão.” (AKÒTIRENE, 2019, p.
destas mulheres, por não se sentirem
43).
acolhidas em dororidade, afastando-
se cada vez mais destes espaços
universalizados quando buscam por
um atendimento acolhedor e

Santos
humanitário. Submeter estas possibilita trabalhar a reconstrução
mulheres a um ressentir de violências dẹ idẹntidàdẹṣ pẹlà “continúidàdẹ
é cruel e danoso. histórica da transferência do sagrada
Na ânsia e esperança de dà ṣàbẹdorià doṣ àncẹṣtràiṣ”
encontrar espaços que entendam e (D´ACELINO, 2019, p. 135).
acolham suas dores, é no Terreiro que Aqui provoco um exercício
avistam o farol de acolhimento da sua reflexivo, não despotencializando
dor. Enquanto Psicóloga e Yalorixá , outras práticas, mas fazendo
faço importante anunciar em todas as compreender que tão como é
oportunidades cabíveis, que a busca conveniente impor aos nossos
pelas práticas terapêuticas de práticas eurocenditalizadas, é
Terreiro já estão na rota das conveniente também aos nossos não
possibilidade de caminhos para à querer mais ser acolhidos em salas
saúde e saúde mental. Sobre isso, frias, diálogos mudos e divãs a meia
(ROSA, 2002; VALLA, 2001; luz. Insistir é violar, é atender e
VASCONCELOS, 2006; GOMBERG, reproduzir a lógica do crivo do
2008, apud, PORTUGAL, 2016, p. 2) colonizador. A prática antirracista
àdvogàm qúẹ é prẹciṣo “dẹṣpẹrtàr à consiste nisso, em reconhecer e
atenção e sensibilidade de aceitar que estes Terreiros são
pesquisadores e gestores de saúde espaços onde mulheres negras se
para os espaços religiosos como um acolhem e se cuidam. É chegado a hora
local que possui várias possibilidades de despertar da sepultura hipnótica
de realizações na promoção de saúde do efeito jabuticaba, e assumir
ẹ do ẹxẹrcício dẹ cidàdànià”, poiṣ, posturas afrocêntricas, que tanto 61
ceifados de validar suas terapêuticas, servem para estas lideranças, como
são as lideranças femininas de CTTro para Psicológos, Assistentes Sociais,
que seguem com suas práticas mesmo Médicos, Enfermeiros e tantos outros.
invalidadas e invisibilizadas pela Saber que estas técnicas favorecem
sociedade classista, elitista e quando ao analisar as estruturas
hegemônica brasileira. São estas conflitivas que atravessam corpos
lideranças que seguem atendendo e sofridos e excluidos; os discursos
acolhendo demandas em tempos de aprisionados em narrativas; os
crise. Nesta anunciação, é importante gatilhos naturalizados e todos os
buscar contemplar outras práticas de elementos despotencializadores de
Terreiros afrocentrados e que estão desorganização das estruturas
em linha de frente, e nesta busca mentais. Instrumentalizar-se nestes
enfatizar o que já salienta (SOUZA, saberes é emancipador pois, suas
2008, p. 106-107) qúẹ “ṣúàṣ técnicàṣ ṣão potẹntẹṣ “ondẹ ẹ
estratégias são as mais distintas sobretudo a cultura tradicional
possíveis, essas comunidades se pẹrmitẹ rẹconẹxõẹṣ” (D´ACELINÒ,
estabelecessem enquanto lócus de 2019, p. 135).
alteridade em relação a dita sociedade Fazer emergir afroconsciências
nacional e reivindicam o em potências, para que tomem o
reconhecimento de sua cultura, de controle e a centralidade de suas
seus costumes, de suas formas de próprias vidas e sejam seus próprios
orgànizàção.” Aqúi o rẹconhẹcimẹnto agentes de cura, de revolução, de
deste território, atende a lógica de libertação mental, política e social,
pertencimento que o fundamenta. desenvolvendo uma identidade de
Aqui as validamos, já que nos pertencimento é o que propõe o

Santos
itinerário terapêutico e a técnica É preciso destacar também que
utilizada. E como nossa proposta se faz necessário entender estes
também é afro-centrar, é para a Territótios enquanto espaços de
direção Sul que as localizamos. Não resistência e pensar junto ao
contemplar estas epistemes para estas movimento negro estratégias para o
problemáticas, é permitir que futuro, como já salientava Lélia
“cicàtrizẹṣ pṣicológicàṣ impoṣtàṣ pẹlo Gonzalez em entrevista cedida ao
ràciṣmo cotidiàno.” (KILÒMBA, 2019, Jornal MNU onde afirma que “nóṣ
p. 92), revivam traumas coloniais temos que estabelecer tarefas dentro
ondẹ “à múlhẹr nẹgrà continúà à ṣẹr o de um campo concreto e rapidinho
ṣújẹito vúlnẹrávẹl ẹ ẹxpoṣto.” desenvolver uma militância muito
(KILOMBA, 2019, p. 157). ativa junto às próprias comunidades
Considerando que as mulheres nẹgràṣ ẹṣpàlhàdàṣ pẹlo Bràṣil.” (MNU,
ẹm diáṣporà “já àcúmúlàm 1991, p. 8.). Este aquilombar para
discriminações e têm acesso alinhar esta para o exercício do
dificultado aos serviços de saúde e a fortalecer de vozẹṣ, poiṣ, à “qúẹṣtão dà
outros direitos sociais militância tem que ter esse sentido e aí
conṣtitúcionàlmẹntẹ gàràntidoṣ” nós temos que aprender com os
(FIOCRUZ, 2020, p. 2), fomentar esta nossos antigos, os africanos, esse
prática e seu itinerário terapêutico é sentido da sabedoria, esse sentido de
um caminho para a interlocução para saber a hora em que você vai interferir
fixação de mais uma extensão na rede e como você vài intẹrfẹrir.” (MNU,
de cuidado e atenção à saúde mental 1991, p.9). Este suleamento é
para a população negra. Pois vistos nẹcẹṣṣário pàrà “úmà àbẹrtúrà pàrà à 62
neste estado de MAAFA15, termo que interlocução entre SUS e terreiro para
“Màúlànà Kàrẹngà (2001) que novas redes de apoio e cuidado à
comprẹẹndẹ mààfà (oú o “holocàúṣto saúde possam se constituir,
àfricàno”) como à dẹṣtrúição dà possibilitando a otimização de
possibilidade de humanidade que recursos humanos e a potencialização
envolveu a redefinição da dẹ ẹqúipàmẹntoṣ ṣociàiṣ”. (ALVES,
húmànidàdẹ àfricànà pàrà o múndo”, 2012, p. 91). Assumir uma ética nagô
o caminho para sobrevivência e interventiva já pensada para trabalhar
permanência de acordo com Aza Njeri na linha de frente com às Políticas
diàntẹ dẹṣtẹ ẹṣtàdo “é nútrir-se de Públicas em tempos de crises, é levar
África e Améfrica Ladina para se as técnicas africanas e de sabedoria
apropriar, ressignificar e repetir as ancestral para o cuidar do nosso povo,
práticàṣ gẹnúinàmẹntẹ nẹgràṣ”. das nossas comunidades.
(MORAES, 2020, p. 197). Nutrir-se As ações concretas alinhadas
para emergir, como bem demarca no espaço Terreiro atendem ao
Phumzile Mlambo-Ngcuka quando princípio da equidade no Sistema
enfatiza que “dẹvẹmoṣ não àpẹnàṣ Único de Saúde (SUS) pois remete à
sobreviver ao coronavírus, mas premissa da Humanização e das
emergir renovadas, com as mulheres Práticas Integrativas e
como uma força poderosa no centro Complementares, contemplando o
da recuperação.” (NAÇÕES UNIDAS, “rẹconhẹcimẹnto doṣ difẹrẹntẹṣ
2020). valores e práticas civilizatórias que
conṣtitúẹm o Eṣtàdo bràṣilẹiro.”
15
O termo enfatiza que a negação da secular os efeitos contínuos de atrocidades
humanidade africana como um fenômeno infligidas ao povo africano e afrodiaspóricos.

Santos
(ALVES, 2015, p. 877). Mais do que embora e ainda seja considerada
uma tentativa de validações, este diferente das universais, já estão
estudo deve ser visto como uma consolidadas e podem atestar dados
proposta para aprofundamentos estatísticos e indicadores da violência
sempre que se apresentem contextos no estado, pois não envolve somente
e sujeitos em vulnerabilidade. Nesta um levante de comprovação.
luta estamos todas, porque somos Fixar os Terreiros como rotas
todàṣ, “ṣomoṣ ẹú, ṣomoṣ ṣújẹito, de cuidado e humanização vinculadas
somos quem descreve, somos quem às práticas do SUS é promover uma
narra, somos autoras/es e autoridade desinstitucionalização. A prática do
dà noṣṣà próprià rẹàlidàdẹ.” acolhimento e a escuta qualificada são
(KILOMBA, 2019, p. 238). Neste técnicas ancestrais de Terreiro com
sulear, a BI, bioética da intervenção, atuação em linha de frente em tempos
“crià compromiṣṣos com as de pandemia. Estar abertos a estas
populações historicamente práticas; atentos aos impostos de
dẹṣprivilẹgiàdàṣ ẹ vúlnẹràdàṣ” ẹ violações de direitos; ao manejo
assume a tarefa de denunciar práticas diagnóstico da situação conflitiva; as
universalistas e anunciar novas e dinâmicas e técnicas trabalhadas pela
velhas práticas e técnicas negras para episteme afrocentrada, onde itans e
cúidàr dẹ vidàṣ nẹgràṣ”. ebós epistemológicos são desenhados,
(NASCIMENTO, 2010, p. 296). é um fazer terapêutico que nos é caro
pois se reveste de alto valor ético,
Considerações Finais onde as encruzilhadas dialógicas
traumáticas, conflitivas e tensionais, 63
Insurgências são clamores em se entrecruzam onde a
tempos pandêmicos que já elucidam responsabilidade anuncia o caráter.
como espaços negros se movimentam Contemplar as dimensões
e se reinventam, dando seguimento à afrocêntricas e matrigestoras como
luta por uma sociedade antirracista e um referencial de retomada na
pelo direito à vida, como grito de perspectiva do voltar para si, é um
sobrevivência. caminho contemplativo pois nele o
Neste estudo, circunscrever (re)sentir são âncoras terapêuticas
somente as variáveis específicas da que nos equilibram, nos reorganizam
violência contra a mulher não atende e nos realinham. Situar estas mulheres
de forma justa a nossa luta, tratou-se na travessia, centrando-as na fala e na
aqui de elucidar também quem são e escuta, cura-se feridas invisíveis. A
onde estão estas mulheres, assim, técnica do Storytelling, manejada
anunciar que mulheres violentadas afrocentradamente assume como
buscam atendimento em outros fundamental no acolher interventivo
espaços não convencionais (dito pois os saberes africanos atuam como
colonialistas), não é um movimento referências tanto para a
promocional, é um fazer ético quando sobrevivência, como para o cuidado,
observa-se a necessidade de como para libertação, pois, quando se
reposicionamentos e trata de questões com ameaças e
redesenhamentos de práticas para crises catastróficas, são os nossos
atender as demandas dos seus como espaços e os nossos saberes pretos,
estratégias para o sobre+viver. que estão para os nossos, igualmente
Legitimar esta prática de como nossas práticas que tanto são
Terreiro é validar seu espaço, onde, julgadas que estão na linha de frente.

Santos
Aqui por diversas vezes re+ORI+entando Oris. Aqui, MỌ WÁ!
plurarizo pois sei que muitas destas Me curo e me liberto. E faço minha
práticas existem, só precisam emergir. existência ser vista como autora de
Falo então por todas elas em mim e já nossas histórias e outras existências,
faço reconhecer na minha produção os pois há em mim, ascestralidades de
seus fazeres, pois sei que quando uma lideranças negras em potências, que a
mulher negra, pesquisadora e de cada passo me alimenta e me faz
Candomblé elabora uma técnica pulsar Atlântica, é Oyá! Sem pretenção
inspirada na sua localidade e alinhada de finalizações, saúdo as
aos saberes pretos, rompe com as encruzilhadas que possibilitaram a
estruturas e invisibilidades nos Àlàáfíà de nós para este caminhar,
campos institucionais universalistas. tomo benção a todos e me despeço.
Neste finalizar divido estas Laróyè!
experiências pois compreendo como
Yzalú, que mulheres convencionais Referências
lutam contra o machismo e as negras
pra vencer o machismo, o preconceito, ALMEIDA, S. L. Racismo Estrutural.
o racismo. Aqui seguimos com nosso São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen, 2019.
compromisso ético, em manter a
tradição viva, num sirè libertador com ALVES, M. C. Desde dentro:
vozes de ancestralidades em processos de produção de saúde em
unicidade. uma comunidade tradicional de
Devo então (re)demarcar que terreiro de matriz africana.
trazer este fazer terapêutico não serve Pontifícia Universidade Católica do 64
apenas como mecanismo de Rio Grande do Sul, Faculdade de
contribuição, mas por ser um Psicologia, Rio Grande do Sul, 2012.
repara+dor da dívida histórica racial Disponível em:
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intensos e abusivos processos /bitstream/10923/5012/1/0004380
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traficadas, vendidas, violentadas, em: 30 jun. 2020.
abortadas, abolidas, execradas e
eliminadas. Neste tecer de ALVES, M. C.; JESUS, J. P. de; SCHOLZ,
compromisso ético-nagô seguimos D. Paradigma da afrocentricidade e
decolonizando pensares de nós e uma nova concepção de
destes espaços na América Latina, humanidade em saúde coletiva:
pois somos a episteme negra em Reflexões sobre a relação entre
movimento e nos ocorre agenciar saúde mental e racismo. Saúde em
outras formas de repotencializar Debate, 39(106), 869-880. 2015.
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canto Elza Soares, e fazer sair de todos 00869.pdf˃ Acesso em: 30 jun. 2020.
os espaços a mulher de dentro de cada
um. E se isto não ressoa como um fazer ASANTE, M. K. Afrocentricidade
Psicologia Preta de Terreiro, que seja como Crítica do Paradigma
mais um suleamento desta mulher Hegemônico Ocidental: Introdução
negra, desta Yalorixá, desta filha de a uma Ideia. Ensaios Filosóficos,
Oyá, que segue bebendo águas barris e Volume XIV– Dezembro/2016.

Santos
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