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MANUAL

DE

PALEOHISTOLOGIA

© Sandra Assis

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SANDRA ASSIS

2009
TABELA DE CONTEÚDOS

Índice de figuras

1. BREVE INTRODUÇÃO À HISTOLOGIA ÓSSEA 1

1.1. O tecido ósseo: estrutura e função 1

1.2. Estrutura macroscópica do tecido ósseo 1

1.2.1. Anatomia de um osso longo 2

1.2.2. Anatomia de um osso chato 3

1.3. As células ósseas 4

1.4. Estrutura microscópica do tecido ósseo 8

1.5. Histogénese óssea ou osteogénese 16

2. HISTOPATOLOGIA EM IMAGENS 20

3. O MICROSCÓPIO ÓPTICO 26

4. PREPARAÇÃO DO TECIDO ÓSSEO PARA SECCIONAMENTO 27

4.1. Descalcificação 27

4.2. Osso não descalcificado 28

4.2.1. Seccionamento com parafina 28

4.2.2. Secções congeladas 29

4.2.3. Polimento (“ground sections”) 29

4.3. Preparação de amostras ósseas para estudo paleohistológico 29

5. BIBLIOGRAFIA 37
Índice de figuras

Figura 1. Representação esquemática da anatomia de um osso longo. 2

Figura 2. Cortes histológicos de fémur. Tecido compacto (à esquerda). Tecido esponjoso (à 2


direita). Adaptado de: http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 3. Corte histológicos de um osso chato. Adaptado de: 3


http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 4. Representação esquemática das células ósseas. 4

Figura 5. Corte histológico de fémur evidenciando os osteoblastos. Adaptado de: 5


www.ouhsc.edu/histology.

Figura 6. Corte histológico de fémur evidenciando os osteócitos. Adaptado de: 5


www.ouhsc.edu/histology.

Figura 7. Corte histológico evidenciando os osteócitos nas lacunas. Adaptado de: 6


http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 8. Corte histológico evidenciando os osteoclastos. Adaptado de: 6


http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 9. Corte histológico evidenciando os osteoclastos em lacuna. Adaptado de: 7


www.ouhsc.edu/histology

Figura 10. Corte histológico evidenciando os três tipos de células. Adaptado de: 7
www.cell.utmb.edu.

Figura 11. Representação esquemática da microestrutura óssea. 8

Figura 12. Corte histológico evidenciando as diferenças entre o osso lamelar e o osso woven. 9

Figura 13. Cortes histológicos evidenciando a estrutura do tecido woven. 10

Figura 14. Cortes histológicos evidenciando a estrutura do tecido lamelar. 11

Figura 15. Cortes histológicos evidenciando a estrutura do tecido compacto. Adaptado de: 12
www.lab.anhb.uwa.edu.au.

Figura 16. Corte histológico de tecido compacto. Adaptado de: 12


http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 17. Cortes histológicos evidenciando as lamelas circunferenciais. Adaptado de: 13


www.lab.anhb.uwa.edu.au.

Figura 18. Cortes histológicos evidenciando os sistemas intersticiais do tecido lamelar. 14


Adaptado de: http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html

Figura 19. Pormenor de um sistema intersticial do tecido lamelar. Adaptado de: 14


http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 20. Cortes histológicos evidenciando a estrutura do tecido trabecular. Adaptado de: 15
www.lab.anhb.uwa.edu.au.
Figura 21. Pormenor da estrutura do tecido trabecular. Adaptado de: 15
www.lab.anhb.uwa.edu.au.

Figura 22. Representação esquemática da ossificação intramembranosa. 16

Figura 23. Corte histológico evidenciando a ossificação intramembranosa. Adaptado de: 17


www.ouhsc.edu/histology.

Figura 24. Representação esquemática da ossificação endocondral. 17

Figura 25. Ossificação endocondral. Adaptado de: 18


http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 26. Ossificação endocondral. Pormenor dos centros de ossificação primários e 19


secundários. Adaptado de: http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 27. Ossificação endocondral. Pormenor da plataforma de crescimento. 20

Adaptado de: http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 28. Zonas da plataforma epifiseal. 20


1. BREVE INTRODUÇÃO À HISTOLOGIA ÓSSEA

1.1. O tecido ósseo: estrutura e função

O osso é um material anisotrópico, não heterogéneo, e composto em 60% por uma porção
orgânica, de onde sobressai o colagénio, e em 40% por constituintes minerais, dos quais o cálcio
é um dos componentes principais (Rothschild & Martin, 1993; Frassico et al., 1997; Lieberman,
1997; Kumar, 2001). As fibras de colagénio conferem ao tecido ósseo a flexibilidade e a
capacidade para resistir à tensão exercida pelo movimento, enquanto que os componentes
minerais ricos em cálcio e fósforo providenciam a rigidez e dureza que subsiste à compressão
(Lieberman, 1997; Gonçalves e Bairos, 2006).

O tecido ósseo é dinâmico, multifuncional e em constante adaptação às exigências ambientais


(Gross & Bain, 1993; Lieberman, 1997; Cullinane & Einhorn, 2002; Roberts et al., 2004). A
multifuncionalidade do esqueleto manifesta-se primariamente na capacidade de resistir à
deformação imposta por forças internas (principalmente, as que decorrem da actividade muscular),
e por forças externas (Currey, 2002 in Pearson & Lieberman, 2004). A importância do esqueleto
não se esgota nas demandas mecânicas. A solidez que o caracteriza torna-o num pilar indelével
que edifica e suporta o nosso organismo, intervindo simultaneamente na protecção de órgãos
vitais. Concomitantemente assume-se como importante receptáculo de minerais e de lípidos e
como fonte de produção hematopoiética (Gross & Bain, 1993; Lieberman, 1997; Frassico et al.
1997; Cullinane & Einhorn, 2002; Pearson & Lieberman, 2004).

Apesar da sua rigidez, os ossos não constituem estruturas de sustentação passiva, sendo um
tecido dinâmico, metabolicamente muito activo, e que está continuamente a ser formado e
reabsorvido ao longo da vida (Gonçalves e Bairos, 2006). A remodelação e reorganização do
tecido ósseo resultam de vários factores que incluem:
o Estímulo mecânico
o Causas metabólicas (deficiência em calico, doença ou idade)
o Alterações endócrinas
o Efeito de drogas

1.2. Estrutura macroscópica do tecido ósseo

Estruturalmente é possível identificar dois tipos de tecido ósseo: compacto ou cortical e esponjoso
ou trabecular (Wynsberghe et al., 1995; Whiting & Wernicke, 1998; White, 2000). O tecido cortical
é a camada sólida e densa presente nas paredes dos ossos longos, que lhe dá consistência. O
tecido esponjoso, mais poroso e leve, é composto por uma malha trabalhada tridimensional de
tecido trabecular primário (longitudinal) e secundário (transverso) separado por medula

1
hematopoiética ou amarela (Keaveny et al., 2001; Buckwalter et al., 1996 in Niva, 2006). O tecido
esponjoso está presente nas vértebras e nas terminações ósseas (epífises). No esqueleto em
crescimento o tecido esponjoso corresponde às áreas de produção hematopoiética, ou seja, de
células sanguíneas, integrando a medula vermelha (Wynsberghe et al., 1995; White, 2000;
Keaveny et al., 2001).

1.2.1. Anatomia de um osso longo

Os ossos longos (figura 1) são formados


por uma porção tubular central que aloja a
medula óssea, a diáfise; e por terminações
opostas designadas por epífises
(Wynsberghe et al., 1995; McGuinnis,
1999). Entre as epífises e a diáfise existe
uma zona de transição denominada por
metáfise (Carter & Beaupré, 2001).

No esqueleto imaturo as epífises e as


metáfises encontram-se separadas por
uma plataforma epifíseal de natureza
cartilagínea, responsável pelo crescimento
longitudinal do osso (McGuinnis, 1999;
Scheuer & Black, 2000; Carter & Beaupré,
2001).

Figura 1. Representação esquemática da anatomia


de um osso longo.

A superfície interna das diáfises denomina-se por endósteo. A superfície externa é composta por
uma membrana fibrosa ricamente vascularizada chamada de periósteo (figura 2), onde residem
células com grande potencial osteogénico: os osteoblastos, os osteoclástos e os osteócitos
(Wynsberghe et al., 1995; Carter & Beaupré, 2001). O periósteo encontra-se conectado ao osso
subjacente por fibras de colagénios chamadas fibras perfurantes do periósteo ou fibras de
Sharpey. Estas fibras penetram a camada interna do periósteo, encontrando-se embebidas na
matriz óssea (Wynsberghe et al., 1995).

2
Figura 2. Cortes histológicos de fémur. Tecido compacto (à esquerda). Tecido esponjoso (à direita). Adaptado de:
http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

1.2.2. Anatomia de um osso chato

Os ossos chatos ou membranosos (figura 3) são formados por tecido ósseo compacto e por tecido
ósseo esponjoso, disposto numa estrutura em “sandwich” (Wynsberghe et al., 1995). Nesta
organização sobressai uma camada compacta de osso, a tábua externa; uma camada interna de
tecido esponjoso que contem a medula e vasos, o diploe; e uma camada interna de tecido
compacto, a tábua interna. O periósteo cobre o osso chato na camada externa. Na camada interna
o periósteo é mais espesso encontrando-se em continuo com a duramater (membrana meningeal
externa do encéfalo) (Wynsberghe et al., 1995; Gonçalves e Bairos, 2006).

Figura 3. Corte histológicos de um osso chato. Adaptado de: http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

3
1.3. As células ósseas

Figura 4. Representação esquemática das células ósseas.

As células osteoprogenitoras (figura 4) caracterizam-se por um grande potencial osteogénico, isto


é, têm a capacidade de se diferencial em células ósseas por divisão mitótica (Wynsberghe et al.,
1995). Estas células achatadas e pouco diferenciadas derivam de tecidos conectivos
embrionários, o mesênquima e encontram-se na face mais profunda do periósteo e do endósteo
(Wynsberghe et al., 1995; Gonçalves e Bairos, 2006). Morfologicamente são difíceis de distinguir
dos fibroblastos, com os quais partilham uma origem comum. As células osteoprogenitoras são os
precursores inactivos dos osteoblastos (Gonçalves e Bairos, 2006).

Os osteoblastos e os osteócitos (figura 5) são células produtoras, responsáveis pela síntese


óssea, ou seja, pela formação de osso novo (Whiting & Wernicke, 1998). Os osteoblastos
constituem uma classe de células do mesênquima, localizada na superfície óssea e responsável,
não apenas pela síntese de colagénio e pela secreção de minerais (cálcio e fósforo), como
também pelo incitamento de outras células, como os osteócitos, durante a regulação das funções
metabólicas e sensoriais do osso (Whiting & Wernicke, 1998; Pearson & Lieberman, 2004). Na
óptica de Gross & Bain (1993), os osteoblastos são determinantes na elaboração da arquitectura
tridimensional do esqueleto mineralizado e na sua hegemonia. Assim que os osteoblastos
preenchem a sua circunferência com suficiente matriz mineralizada, ficam aprisionados no interior
das lacunas, transformam-se em osteócitos (Wynsberghe et al., 1995; Whiting & Wernicke, 1998;
Gonçalves e Bairos, 2006). Esta metamorfose provoca um decréscimo no volume celular em cerca
de 30%, ainda que continue a diminuir à medida que os osteócitos vão preenchendo as lacunas
com matriz (Whiting & Wernicke, 1998).

4
Figura 5. Corte histológico de fémur evidenciando os osteoblastos. Adaptado de: www.ouhsc.edu/histology.

Os osteócitos (figura 6 e 7) não se encontram isolados no interior da respectiva lacuna,


comunicam entre si através de finos prolongamentos citoplasmáticos localizados em canais ou
canalículos da matriz extracelular que irradiam de cada lacuna (Whiting & Wernicke, 1998;
Gonçalves e Bairos, 2006). Segundo Miller & Jee (1992 in Whiting & Wernicke, 1998) esta
comunicação entre distintos estados celulares parece ser determinante nas funções fisiológicas do
tecido ósseo, nomeadamente, na conversão de sinais mecânicos em actividade de remodelação e
no fluxo de minerais intra e extra osso. Os osteócitos são as células ósseas mais abundantes que
integram o osso maduro (Sommerfeldt & Rubin, 2001; Nijweide et al., 2002).

Figura 6. Corte histológico de fémur evidenciando os osteócitos. Adaptado de: www.ouhsc.edu/histology.

5
Figura 7. Corte histológico evidenciando os osteócitos nas lacunas. Adaptado de:
http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Os osteoclastos (figura 8 e 9) são células grandes e multinucleadas (± 100μm), localizadas em


recessos da superfície das trabéculas ósseas, designadas de lacunas de Howship (Gonçalves e
Bairos, 2006). Os osteoclastos são responsáveis pela reabsorção óssea. A osteocladogénese tem
início quando algumas células hematopoiéticas são estimuladas para produzir células
mononucleadas, compostas por 10 a 20 fagócitos, libertadas na corrente sanguínea e que
constituem as células percursoras dos osteoclastos (Takahashi et al., 2002; Teitelbaum et al.,
1996 e Boyle et al., 2003 in Pearson & Lieberman, 2004; Robling et al., 2006). Após maturação, os
osteoclastos iniciam a reabsorção óssea libertando H 2CO8, como forma de reduzir o pH, e
induzindo a secreção de enzimas proteolíticas que irão digerir o colagénio (Pearson & Lieberman,
2004) (figura 10).

Figura 8. Corte histológico evidenciando os osteoclastos. Adaptado de:


http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

6
Figura 9. Corte histológico evidenciando os osteoclastos em lacuna. Adaptado de: www.ouhsc.edu/histology.

Figura 10. Corte histológico evidenciando os três tipos de células. Adaptado de: www.cell.utmb.edu.

As células de revestimento ósseo estão presentes na superfície da maioria dos ossos do


esqueleto adulto (Wynsberghe et al., 1995). Estas células são interpretadas como o resultado da
involução dos osteoblastos, ou seja, de osteoblastos que cessaram a sua actividade fisiológica e
que de “depositaram” na superfície óssea (Wynsberghe et al., 1995; Gonçalves e Bairos, 2006).
São células em quiescência, mas quando estimuladas podem reverter à condição anterior
(Gonçalves e Bairos, 2006).

7
A matriz óssea extracelular é constituída por (Gonçalves e Bairos, 2006):

 Porção orgânica formada por colagénio, proteínas não colagénicas e proteoglicanos. O


colagénio de tipo I representa 80% do colagénio total do tecido ósseo. De entre as proteínas não
colagénicas, salientam-se a osteocalcina, a osteonectina, a osteopontina, a sialoproteína óssea, a
a osteoprogerina e o factor estimulante de colónias de macrófagos.

 Porção inorgânica formada por hidroxiopatite e por iões de fosfato e de carbonato responsáveis
pela rigidez do osso. Em redor de cada cristal de hidroxiopatite existe um revestimento aquoso,
cuja função é facilitar a troca de iões entre os cristais e a fluído extracelular.

1.4. Estrutura microscópica do tecido ósseo

Figura 11. Representação esquemática da microestrutura óssea.

A organização microscópica do tecido ósseo (figura 11) permite identificar dois tipos de osso:
primário (também designado por imaturo, em formação ou woven) e secundário (também
apelidado de maduro ou lamelar) (Gonçalves e Bairos, 2006) (figura 12).

8
Matos et al. 2008.Journal of Orthopaedic Surgery and Research, 3:4

Figura 12. Corte histológico evidenciando as diferenças entre o osso lamelar e o osso woven.

O osso do tipo primário ou woven (figura 13) constitui uma massa desorganizada de fibras de
colagénio e osteócitos de crescimento rápido (Rothschild & Martin, 1993; Lieberman, 1997;
Whiting & Wernicke, 1998). Constitui uma forma de tecido ósseo primitivo que pode ser
identificado por uma ausência de ordem nas lacunas (osteócitos) e por uma rede espessa e
irregular de fibras de colagénio na matriz (Gonçalves e Bairos, 2006). O osso woven é encontrado
primariamente no embrião em desenvolvimento, antes da remodelação que conduz ao
desenvolvimento de osso lamelar. Este tipo de não é comum em pessoas com idade superior a 14
anos, excepto nas suturas cranianas, nos alvéolos dentários e nalgumas zonas de inserção de
tendões. O osso woven também se desenvolve, temporariamente, durante o processo de
consolidação das fracturas ósseas. Este tipo de tecido pode ser observado nalgumas condições
patológicas, tais como as de cariz infeccioso e neoplásico (ex. osteosarcoma) (Schultz, 1997).

9
http://www.histol.chuvashia.com/atlas-en/connective-01-en.htm

Legenda:

1. Matriz óssea intercelular


2. Osteócitos
3. Periósteo
4. Osteoclastos

Figura 13. Cortes histológicos evidenciando a estrutura do tecido woven.

Invariavelmente, o osso secundário ou maduro (figura 14) apresenta um crescimento lento e uma
estrutura laminar formada por várias camadas, nas quais as fibras de colagénio se dispõem de
modo organizado (Gonçalves e Bairos, 2006). O osso lamelar é constituído por lamelas ósseas
dispostas concentricamente onde os osteócitos se encontram alojados em cavidades ou lacunas a
partir das quais irradiam canalículos que comunicam com as lacunas adjacentes (Schultz, 1997;
Gonçalves e Bairos, 2006). As lacunas (osteócitos) encontram-se regularmente organizadas tal
como as fibras de colagénio da matriz. O termo lamela refere a camada da matriz compreendida
entre duas secções da lacuna. A organização do osso lamelar encontra-se bem ilustrado no tecido
compacto das diáfises dos ossos longos. O tecido lamelar pode ser compacto ou esponjoso
(Schultz, 1997). O osso secundário é depositado durante o processo de remodelação, substituído
o tecido ósseo pré-existente (Whiting & Wernicke, 1998).

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http://www.histol.chuvashia.com/atlas-en/connective-01-en.htm

Legenda:
1. Osteónio ou Sistema de Havers
2. Canal de Havers
3. Sistema intersticial
Figura 14. Cortes histológicos evidenciando a estrutura do tecido lamelar.
4. Lamela cortical
5. Periósteo
6. Osteócito

O tecido ósseo lamelar é composto por três arranjos distintos :


1) Osteónios (Sistema de Havers)
2) Sistemas circunferenciais
3) Sistemas intersticiais

1) Osteónios ou Sistema de Havers


Os osteónios (figura 15 e 16) são estruturas cilíndricas de osso compacto que em norma
transversa, são formados por 4 a 20 lamelas regulares concêntricas que envolvem um canal
vascular (canal de Havers) (Gonçalves e Bairos, 2006). O diâmetro de cada osteónios ronda entre
os 20-110um. As fibras de colagénio de cada lamela estão organizadas de modo regular e
apresentam anisotropia. Na periferia de cada osteónios, a separá-los dos osteónios adjacentes ou

11
sistema intersticial, encontra-se uma linha cimentante (Gonçalves e Bairos, 2006). Esta linha não
calcifica, apresenta poucas fibras de colagénio, contudo é rica em glicoproteínas e cora de modo
distinto da matriz da lamela. Cada canal de Havers contém um vaso sanguíneo que nutre o
osteónios com sangue proveniente dos vasos sanguíneos localizados no periósteo. Os vasos
sanguíneos penetram transversalmente os osteónios e são designados de canais de Volkmann’s.
Os canais de Volkmann são identificados por não possuírem lamelas concêntricas a envolvê-los
(Wynsberghe et al., 1995; Gonçalves e Bairos, 2006). Os osteónios constituem a principal unidade
morfo-funcional do tecido compacto.

Figura 15. Cortes histológicos evidenciando a estrutura do tecido compacto. Adaptado de: www.lab.anhb.uwa.edu.au.

Figura 16. Corte histológico de tecido compacto. Adaptado de: http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

12
2) Sistemas circunferenciais

Imediatamente abaixo do periósteo, na periferia do tecido compacto da diáfise dos ossos longos,
uma lamela envolve o osso de modo contínuo. Esta lamela é designada de lamela circunferencial
(figura 17) externa. Um sistema idêntico de lamelas contínuas é observado junto ao endósteo.
Estas designam-se de lamelas circunferenciais internas. Um conjunto de fibras de colagénio, as
fibras de Sharpey’s ou fibras perforantes, que ancoram o periósteo à lamela circunferencial
adjacentes, particularmente na zona de inserção dos tendões (Schultz, 1997; Gonçalves e Bairos,
2006).

Figura 17. Cortes histológicos evidenciando as lamelas circuferencias. Adaptado de: www.lab.anhb.uwa.edu.au.

3) Sistemas intersticiais

A remodelação do osso é um processo contínuo que envolve a reabsorção e a


formação/reconstrução de novos osteónios. Os sistemas intersticiais (figura 18 e 19) presentes no
osso compacto representam os restos ou remanescentes de osteónios que sobreviveram ao
processo de erosão por acção dos osteoclastos (Schultz, 1997; Gonçalves e Bairos, 2006). Os
sistemas intersticiais localizam-se entre os osteónios regulares e podem ser identificados como
estruturas lamelares irregulares que não possuem um canal de Havers central. A reabsorção dos
osteónios envolve a activação de osteoclastos dos canais de Havers que vão erodir porções da

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lamela conduzindo à formação de cavidades de reabsorção (Ortner, 2003). Estes podem
comunicar com cavidades de reabsorção de osteónios adjacentes. Quando o processo fica
concluído, os osteoblastos surgem na cavidade de reabsorção e começam a sintetizar uma nova
geração de osteónios. Quando os novos osteónios estão completos, os restos dos osteónios
formam os sistemas intersticiais. Este processo de remodelação prolonga-se ao longo da vida
(Ortner, 2003).

Figura 18. Cortes histológicos evidenciando os sistemas intersticiais do tecido lamelar. Adaptado de:
http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Figura 19. Pormenor de um sistema intersticial do tecido lamelar. Adaptado de:


http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

14
O tecido ósseo trabecular ou esponjoso (figura 20 e 21) também é formado por lamelas, contudo,
estas não estão organizadas em sistemas tal como acontece com o osso compacto. Em oposição
ao tecido compacto, o tecido esponjosos não é penetrado por vasos sanguíneos, recebendo a sua
nutrição via difusão a partir do endósteo que circunda os espaços da medula óssea (Ortner, 2003).

Figura 20. Cortes histológicos evidenciando a estrutura do tecido trabecular. Adaptado de: www.lab.anhb.uwa.edu.au.

Figura 21. Pormenor da estrutura do tecido trabecular. Adaptado de: www.lab.anhb.uwa.edu.au.

15
1.5. Histogénese óssea ou osteogénese

O esqueleto desenvolve-se mediante um processo designado por ossificação (ou osteogénese).


No embrião pode ser observado dois tipos de osteogénese:

1) Ossificação intramembranosa

Ocorre durante o desenvolvimento embrionário de muitos ossos chatos do crânio e mandíbula


(Wynsberghe et al., 1995; Ortner, 2003; Gonçalves e Bairos, 2006) (figura 22). Inicia-se mediante
a proliferação e condensação de células do mesênquima, seguido pelo desenvolvimento de
múltiplos vasos sanguíneos (figura 23). As células presentes na condensação apresentam uma
forma estrelada, contactando entre si por prolongamentos citoplasmáticos (Gonçalves e Bairos,
2006). O espaço entre as células é preenchido por fibras de colagénio dispostas em várias
direcções. Algumas das células do mesênquima agregam-se e adoptam uma forma cúbica ou
cilíndrica, diferenciando-se em osteoblastos (Gonçalves e Bairos, 2006). O anel de células que se
forma em torno dos vasos sanguíneos é designado de centro de osteogénese ou de ossificação
(Wynsberghe et al., 1995). Os osteoblastos iniciam a síntese de osteóide ou matriz óssea que se
vai depositar em seu redor, mineralizando-se em seguida. Após esta fase os osteoblastos
assumem a designação de osteócitos (Wynsberghe et al., 1995; Ortner, 2003; Gonçalves e Bairos,
2006).

Gartner and Hiatt, Color Textbook of Histology, p. 122, Figure 7-12

Figura 22. Representação esquemática da ossificação intramembranosa.

16
Figura 23. Corte histológico evidenciando a ossificação intramembranosa. Adaptado de: www.ouhsc.edu/histology.

2) Ossificação endocondral

Quando a ossificação ocorre por substituição da cartilagem hialina o processo designa-se de


ossificação endocondral1 (figura 23). Este processo encontra-se subjacente à formação dos ossos
longos e a todos os ossos não formados por ossificação intramembranosa. Durante a ossificação
endocondral a cartilagem não se transforma em osso, mas é substituída por este (Wynsberghe et
al., 1995).

Stevens and Lowe, Human Histology, p. 246, Figure 13.24.

Figura 24. Representação esquemática da ossificação endocondral.

1 O termo endocondral deriva do grego endo (dentro) e khondros (cartilagem) que significa dentro da
cartilagem (Wynsberghe et al., 1995).

17
A ossificação endocondral pode ser considerada a nível celular ou dos tecidos (figura 24).

Na ossificação endocondral celular observa-se:

1) Os condrócitos contidos no interior de lacunas e embebidos numa matriz cartilaginosa;


2) Verifica-se um aumento nos condrócitos e nas lacunas. Os condrócitos segregam
fosfatase alcalina que irá induzir reacções químicas na matriz conduzindo à sua
mineralização;
3) A matriz calcificada bloqueia a circulação de nutrientes para os condócitos provocando a
sua morte ou apoptose. Os condrócitos são reabsorvidos, deixando cavidades irregulares
na cartilagem minealizada;
4) Células pluripotentes (as células de revestimento ósseo) começam a diferenciar-se em
osteoblastos e osteócitos. Os osteoblastos depositam osteóide na cartilagem
mineralizada, formando uma fina camada de tecido esponjoso.

Figura 25. Ossificação endocondral. Adaptado de: http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Na ossificação endocondral dos tecidos observa-se:

1) Desenvolvimento de um molde de cartilagem hialina que é envolvido por pericôndrio;


2) A hipertrofia do modelo cartilagíneo é seguida por uma invasão de capilares, observando-
se a transformação do pericôndrio em periósteo (a membrana fibrosa que cobre a
superfície externa dos ossos). Posteriormente, um anel de osso woven (colar periosteal)
desenvolve-se em torno da diáfise central da cartilagem. Este processo resulta de
ossificação intramembranosa;

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3) Os condrócitos sofrem hipertrofia e começam a segregar o factor de crescimento de
endótelio vascular (VEGF), que por sua vez induz a formação de vasos sanguíneos a
partir do pericôndrio. Células osteoprogenitoras e hematopoiéticas surgem com os novos
vasos recém-formados. Deste acontecimento, resulta a formação do centro de ossificação
primário (figura 26). Nos futuros ossos longos do esqueleto, o centro de ossificação
primário aparece na zona central que virá a ser a futura diáfise.
4) Por acção dos osteoclastos forma-se a cavidade medular a partir da degradação do tecido
esponjoso primário. A cavidade medular aumenta de tamanho associado também a um
incremento na vascularização.
5) Os centros de ossificação secundários surgem no interior do molde cartilaginoso das
epífises, sofrendo um processo de expansão e acabando por se fundir na altura da
puberdade com o centro de ossificação primário, que, entretanto, também se expandem
em direcção às extremidades.

Figura 26. Ossificação endocondral. Pormenor dos centros de ossificação primários e secundários.
Adaptado de: http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

6) Entre os centros de ossificação forma-se uma plataforma epifiseal responsável pelo


crescimento longitudinal do osso (figura 27).

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Figura 27. Ossificação endocondral. Pormenor da plataforma de crescimento.
Adaptado de: http://www.technion.ac.il/~mdcourse/274203/lect5.html.

Na plataforma epifiseal ou de crecimento (figura 21) é possível diferenciar várias zonas:

Zona de repouso (pequenas lacunas achatadas)

Zona proliferaria (espaço de mitoses; lacunas grandes elípticas)

Zona hipertrofia (condrócitos grandes e arredondados)

Zona calcificação (degeneração dos condrócitos; calcificação


da matriz)

Zona ossificação (formação de trabéculas por acção dos


osteoblastos)

Tecido esponjoso primário (o novo tecido é continuamenre


erodido e remodelado pela acção dos osteoclastos)

Figura 28. Zonas da plataforma epifiseal. Adaptado de: http://www.bioscience.org/1998/v3/d/naski/4.htm

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