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FACULDADE DE DIREITO
MESTRADO EM DIREITO
ÀREA DE ESPECIALIZAÇÃO:
DIREITO CIVIL
LISBOA
2021
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE DIREITO
LISBOA
2021
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE DIREITO
serem a família
que escolhi.
RESUMO
PALAVRAS-CHAVE:
KEY WORDS:
Aos meus pais e irmãs que desde sempre me incentivaram nos estudos e na
busca do conhecimento em qualquer lugar.
Aos amigos que fiz em Portugal e aos colegas da Universidade de Lisboa, foram
tantos momentos bons que torna-se difícil mencionar qual foi o mais especial. A
vocês, que facilitaram a minha trajetória em Lisboa, o meu muito obrigada.
ART - ARTIGO.
CF - CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
CC - CÓDIGO CIVIL.
RE - RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
MG - MINAS GERAIS.
SP - São PAULO.
RJ - RIO DE JANEIRO.
DF - DISTRITO FEDERAL.
Só o amor é eterno”.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................11
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................155
BIBLIOGRAGIA....................................................................................160
11
INTRODUÇÃO
1
FACHIN, Edson. Voto do Recurso Extraordinário 878.694 Minas Gerais. Pág. 4. Disponível
em: redir.stf.jus.br.
12
A verdade é que todo ser humano é um ente frágil por si só, que
dificilmente conseguiria subsistir na vida em sociedade, sem o amparo do seu
grupo familiar. Historicamente, o acasalamento sempre existiu entre os seres
vivos, quer em decorrência do instinto de perduração da espécie, quer pela
incontestável repulsa que toda a gente tem à solidão2.
2
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 12ª edição revista, atualizada e
ampliada, Editora Revista dos Tribunais. 2017, pág. 37.
3
Entendendo ser usado de forma errônea o termo família como organização sócio-política, o
Professor Pamplona nos faz refletir sobre o posicionamento da perspectiva institucional da
família, de índole publicista, com normas imperativas, não representando verdadeiramente a
índole jurídica do direito de família. Afinal, o direito de família é o ramo do direito mais livre e
íntimo, não cabendo ao Estado impor normas cogentes ou imperativas. Trata-se de uma
autonomia pessoal, intimista e geradora de uma convivencialidade perfeitamente recortada pelos
sujeitos que a partilham, tocando ao Estado normas para proteção da intimidade da vida familiar.
CORTE REAL, Carlos Pamplona. Relance crítico sobre o direito de família português. in: Textos
de Direito de Família. Para Francisco Pereira Coelho, coordenação de Guilherme de Oliveira.
Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2016, pág. 108.
4
Afirma a jurista Maria Margarida Silva Pereira: “a família é uma entidade social inerente à vida
humana. As formas através das quais se pode constituir e o comportamento dos sujeitos na vida
familiar exprimem determinantes da existência e são, por isso, bem identificados pelas pessoas”.
PEREIRA, Maria Margarida Silva. Direito da Família. AAFDL Editora. Lisboa, 2018, págs. 13 e
14.
5
“A família se relaciona e interage com a sociedade, atendendo-a em suas principais
necessidades estas identificadas como de ordem sexual, reprodutiva, educacional, social,
económica, política, espiritual e psicológica, abrangendo, assim todas as esferas da vida do
indivíduo na organização social.”
OLIVEIRA. José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família: Editora
Revista dos Tribunais, São Paulo, 2002, pág. 21.
15
6
CAMPOS, Diogo Leite de. A família: do direito aos direitos. Revista brasileira de direito
comparado, Rio de Janeiro, n.º 32, pág. 226.
7
A família é uma instituição natural, que nasceu com o homem, existindo antes mesmo da criação
do Estado ou de qualquer outra sociedade.
8
VARELA, Antunes. Direito da Família, 1º volume – 5 edição Lisboa, Livraria Petrony, LDA, 1999,
p. 42.
9
CAMPOS, Diogo Leite de. A família como grupo. As duas agonias do Direito de Família.
Revista da Ordem dos Advogados. ISSN: 0870-8118. Págs. 918 e 919.
10
CAMPOS, Diogo Leite de. Op. cit. Págs. 919 e 920.
16
11
Essa nova família trouxe como satisfação das necessidades essenciais da família, a
responsabilidade do marido em sair para o trabalho e garantir o sustento, enquanto surgiu para
a mulher o papel de se encarregar das tarefas do lar, fenómeno este característico do século XIX
e início do século XX.
CAMPOS. Diogo Leite de. Op. cit. Págs. 921 e 922.
12
A jurista Maria Berenice Dias aduz que: “a expressão direito das famílias é a que melhor atende
à necessidade de enlaçar, no seu âmbito de proteção, as famílias, todas elas, sem discriminação,
tenham a formação que tiver”.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 12ª edição revista, atualizada e ampliada,
Editora Revista dos Tribunais. 2017, pág. 38.
17
13
MARIANO, João Cura. O Direito de Família na Jurisprudência do Tribunal Constitucional
Português. Julgar n.º 21 – 2013: Coimbra Editora. Pág. 28.
14
Ressalta-se a influência vigorosamente do direito canônico a respeito do modelo de família
português, assim como no modelo do direito brasileiro.
15
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 12ª edição revista, atualizada e
ampliada, Editora Revista dos Tribunais. 2017, Pág. 144.
16
SOUZA, Miguel Teixeira de. Do Direito da Família aos Direitos Familiares. in: Textos de Direito
de Família. Para Francisco Pereira Coelho, coordenação de Guilherme de Oliveira. Coimbra:
Imprensa da Universidade de Coimbra, 2016, Pág. 553.
17
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Direito da Família tópicos para uma
Reflexão Crítica – 2ª edição actualizada. AAFDL, 2011, Pág. 119.
18
Nas palavras da socióloga Sofia Aboim, “As conjugalidades contemporâneas ver-se-iam, por
conseguinte, divididas entre um ideal de fusão afetiva, onde se concentram expectativas de
felicidades pessoal, e o investimento na realização individual”.
ABOIM, Sofia. Conjugalidade, afectos e formas de autonomia individual. Análise Social. Vol. XXI,
Pág. 802
19
MIRANDA, Jorge. Sobre a relevância constitucional da família in: SCIENTIA IVRIDICA. Revista
de Direito Comparado Português e Brasileiro. Tomo LXIV – n. 338 – Maio /Agosto, 2015, pág.268.
18
20
Art. 67º, n.º 1 e 2 e da CRP.
1. A família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à proteção da sociedade e
do Estado e à efetivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus
membros. 2. Incumbe, designadamente, ao Estado para proteção da família: a) Promover a
independência social e económica dos agregados familiares; […] d) Garantir, no respeito da
liberdade individual, o direito ao planeamento familiar, promovendo a informação e o acesso aos
métodos e aos meios que o assegurem, e organizar as estruturas jurídicas e técnicas que
permitam o exercício de uma maternidade e paternidade conscientes; […] g) Definir, ouvidas as
associações representativas das famílias, e executar uma política de família com carácter global
e integrado;
21
Art. 226, § 8º, CFB.
22
Nessa linha, assentam os professores Guilherme de Oliveira e Pereira Coelho “Em face do art.
1576.º CCiv, pode entender-se que, além das que foram mencionadas, não haja outras relações
familiares que como tais devam ser consideradas para a generalidade dos efeitos no direito
português. Sendo relações familiares as referidas naquele preceito legal, pode dizer-se que a
família abrange todas as pessoas ligadas por essas relações. À família de uma pessoa
pertencem, pois, não só o seu cônjuge como ainda os seus parentes, afins, adotantes e
adotados: este conceito assim tão lato é que corresponde à noção jurídica de família. Mas
também pode haver quem desvalorize o elenco expresso, aliás incorretamente, no art. 1576.º e
julgue que devem ser acrescentadas as relações emergentes da união de facto”.
COELHO, Francisco Pereira e OLIVEIRA, Guilherme de. Curso de Direito da Família. Introdução
Direito Matrimonial, volume I, 5ª ed. Coimbra, 2016. Pág 34.
19
23
PINHEIRO, Jorge Duarte. O Direito da Família Contemporâneo – 6ª ed. – AAFDL Editora,
Lisboa, 2018. Pág.31
24
PINHEIRO, Jorge. Duarte. Op. Cit. Pág 31.
25
Em mesma linha, MENDES, 1991, Pág. 16; MOTA, 2001, Pág 537.
26
COELHO, Francisco Pereira e OLIVEIRA, Guilherme de. Pág 37
27
Sobre o assunto, vale destacar as palavras do Professor Jorge Duarte Pinheiro a respeito dos
40 anos após a Reforma do Código Civil de 77, e aduz que, “a reforma do Código Civil, de 1977,
é, sem dúvida, um dos grandes trabalhos legislativos da segunda metade do século XX. Novos
princípios constitucionais exigiram uma mudança do regime jurídico codificado da família, mais
precisamente os princípios da igualdade dos cônjuges e da não discriminação dos filhos nascidos
fora do matrimônio...” Entretanto, afirmando ser uma fraqueza do código é a conservação formal
da hegemonia do casamento no quadro familiar perante a filiação. E, observa ainda, que após
40 anos da Reforma, o Código Civil é o código do nosso descontentamento uma vez que
consagra grandes vulnerabilidades como, “prioridade e centralidade do casamento, em contraste
com a evolução social. E a insuficiente consideração da união de facto, novamente em contraste
com a evolução social”.
PINHEIRO, Jorge Duarte. Atualidade e pertinência do Código Civil em matéria de familia e
sucessões. in: Edição Comemorativa do Cinquentenário do Código Civil / coord. (de) Elsa Vaz
de Siqueira, Fernando Oliveira e Sá – Lisboa, Universidade Católica Editora, 2017. Págs. 582 a
585.
20
letra da lei, uma vez que reconheceu a afinidade como uma relação familiar,
sendo que esta causa uma produção de efeitos praticamente nula, e não incluiu
a união de facto, que possui “bem mais expressividade na sua consequência
jurídica”28.
Cumpre ressaltar que a carta magna portuguesa não trouxe em seu texto
cláusulas limitadoras do que deva ser entendido como família, não havendo
restrição que omita as uniões informais. Sendo assim, a parte da doutrina que
entende que para que uma relação familiar seja caracterizada como tal, deverá
estar prevista em lei, acaba por não entender que a Constituição da República,
em seu artigo 36.º, apresentou que “todos têm direito de constituir família e de
contrair casamento em condições de plena igualdade”.
28
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Pág. 118.
29
XAVIER, Rita Lobo. Novas Sobre a União “More Uxorio” em Portugal in: Estudos dedicados
ao Prof. Doutor Mário Júlio de Almeida Costa. Lisboa: Universidade Católica, 2002. ISBN:
9789725400449. Págs. 1396 e 1397.
30
Em sentido contrário, destaca-se à previsão da Carta Magna brasileira. Art. 226, §3º: Para
efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como
entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. Art. 226, §4º: Entende-se,
também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus
descendentes.
21
31
Nesse sentido, é o posicionamento defendido por Gomes Canotilho e Vital Moreira, ao afirmar
que o “direito de constituir família” e de “contrair casamento”, conferido pelo artigo 36º, n.º 1, 1ª
parte da Constituição visa substancialmente a união de facto. A constituição não admite, todavia
a redução do conceito de família à união conjugal baseada no casamento, isto é à família
“matrimonializada”. Desse modo, o conceito constitucional de família não abrange, apenas a
“família jurídica”, havendo assim uma abertura constitucional, se não mesmo uma obrigação,
para conferir o devido relevo jurídico às uniões familiares “de facto” Constitucionalmente, o casal
nascido da união de facto juridicamente protegida também é família.
CANOTILHO, Gomes e MOREIRA Vital. Constituição da República Portuguesa Anotada –
Volume I, 4ªed: Coimbra Editora, 2007, Pág. 561
32
LÔBO, Paulo. Direito Civil – Famílias 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020. ISBN: 9788553616893
(ebook).
33
Tribunal da Relação de Lisboa: Processo: 6284/2006-8 de 15/02/2007. Disponível em:
http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/f2c9a606d4e26131802572960
04e5975?OpenDocument
34
DIAS, Cristina M. Araújo. Da inclusão constitucional da união de facto: Nova relação familiar
in: Estudo de Homenagem ao Prof. Doutor Jorge Miranda. Volume VI. Pág. 454.
22
35
Em sentido contrário, parte da doutrina entende que não há como invocar o princípio da
igualdade pois não se trata de situações idênticas (casamento e união de facto) tendo em vista
a ausência do vínculo jurídico na união de facto.
23
36
Ressalta-se, que partindo de uma visão ultrapassada, o nobre autor afirmou que o
reconhecimento familiar das uniões de facto trazido pela Constituição trouxe um desmerecimento
ao casamento, relação tida como legítima, corroborando o preconceito com as relações criadas
fora do casamento.
VARELA, ANTUNES. Op. Cit. Pág. 27.
37
Destaca-se os artigos a respeito da vida privada e familiar e sobre o direito de casar e constituir
família. Art. 7º. “Todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo
seu domicílio e pelas suas comunicações”. Artigo 9. “O direito de contrair casamento e o direito
de constituir família são garantidos pelas legislações nacionais que regem o respectivo
exercício”.
Nesse sentido, afirma COELHO e OLIVEIRA, “Nem pode esquecer-se o papel das organizações
internacionais em vista da harmonização das legislações dos Estados membros, sendo
numerosas as convenções em que se contêm princípios respeitantes ao direito das pessoas e
da família. Note-se que o cumprimento dessas convenções é assegurado, por vezes, por
tribunais internacionais cujas decisões os Estados se comprometem a acatar”.
COELHO, Francisco Pereira e OLIVEIRA, Guilherme de. Op. Cit. Pág. 176.
38
O documento internacional aprovado pela ONU em 1948, estabelece em seu art. 12º o respeito
à família e a vida privada. E o art. 16º dispõe sobre o direito de casar e de constituir família (n.º1)
e discorre sobre a família ser elemento natural e fundamental da sociedade, tendo direito à
proteção desta e do Estado (n.º3).
24
39
Susana Almeida apud Dias, Cristina M. Araújo. Pág. 459
40
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra. N. 160/20.4T8FIG.C1. de 15-07-2020. Em:
http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/381c1faf7e3384cb802585ea0
03c9b27?OpenDocument&Highlight=0,uni%C3%A3o,de,facto%20.
41
ASCENSÃO, Oliveira. 2005, pág 501 e ss.
42
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Pág. 118.
43
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Pág. 118.
44
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Pág. 118.
25
45
PINHEIRO, Jorge. Págs. 42 e 43.
26
Aduz ainda o autor que a família deve ser encarada em um viés plural e
aberto, entendida como espaço de uma autoconstituição existencial, no qual não
cabe interferência nem do Estado e nem da comunidade na maneira em que
essa autoconstituição será desenvolvida ou sustentada pelos sujeitos da
relação. A esperança é de que o Estado procure respeitar as diferenças e acatar
às escolhas pessoais de cada um não sendo um meio de intolerância. Afinal,
todas as uniões, em igual dignidade jurídica, são fontes de relações familiares.
E, tendo em vista que são relações construídas através de laços afetivos, negar
46
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. Direito da Família e das Sucessões - Relatório. Lisboa,
1995.Pág. 74.
47
DIAS, Maria Berenice. Pág. 44
48
FACHIN, Luiz Edson. Famílias: entre o público e o privado. ANAIS VIII Congresso Brasileiro
de Direito de Família. São Paulo: IOB Thomson, 2012, Pág. 161.
27
49
FACHIN, Luiz Edson. Op. Cit. Pág. 161 e 162.
50
FACHIN, Luiz Edson. Op. Cit. Pág. 164.
51
Direitos reforçados constitucionalmente. Artigo 26.º Outros direitos pessoais 1. A todos são
reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à
capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da
intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação.
2. A lei estabelecerá garantias efetivas contra a obtenção e utilização abusivas, ou contrárias à
dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA.
28
relação entre pessoas, para que seja entendida como relação familiar, deve ser
apresentada perante o meio social em que se insere, possuindo como caráter
intrínseco à sua natureza a publicidade.
52
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Pág. 119.
29
53
Cumpre ressaltar as alterações sofridas por esse artigo no decorrer do tempo. No Código Civil
de 66, o art. 1577 estabelecia que “casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de
sexo diferente que pretendem constituir legitimamente a família mediante uma comunhão plena
de vida”. Após a Reforma de 77, Decreto-Lei n.º 496/77 de 25/11, esse mesmo artigo
determinava que “casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que
pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições
deste Código”. Com a mudança houve a supressão do termo “legitimamente” da regra jurídica,
traduzindo o novo sentido de família a partir da Constituição de 76 (art. 36º, n.º 1 e 4), de que se
pode constituir família legitimamente sem ser pelo casamento. Todavia, a fundamental alteração
no conceito de casamento só ocorreu com a Lei n.º 9/2010 de 31 de maio, que permitiu o
30
58
Quando analisamos a exacerbada intervenção do Estado nas relações afetivas assim como a
imposição coacta de direitos e deveres conjugais, faz-se curioso informar a origem da palavra
“cônjuge”, determinando quem está unido pelos sagrados laços do matrimônio. O vocábulo
“jugum” era o nome dado pelos romanos à canga ou aos arreios que prendiam as bestas às
carruagens. O verbo “conjugare” significava a união de duas pessoas sob a mesma canga. E a
junção conjugis, significava jungidos ao mesmo jugo ou ao mesmo cativeiro.
DIAS, Maria Berenice. Pág. 184
59
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Pág. 129.
60
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. Relance Crítico sobre o Direito de Família Português in:
Textos de Direito da Família para Francisco Pereira Coelho: Imprensa da Universidade de
Coimbra, 2016, Pág. 112. ISBN DIGITAL: 978-989-26-1113-6.
61
Maria Margarida em sua obra, afirma que esta modificação de “uma comunhão plena de vida”
para “uma plena comunhão de vida”, não foi acidental e que o seu propósito foi retirar o sentido
tradicional à comunhão de vida imposta aos cônjuges: a total e abnegada comunhão de vida; e
admitiu-se que esta mesma comunhão de vida, sem dúvida intensa fosse moldada pela vontade
de cada casal, traduzindo uma ideia de liberdade de ambos os cônjuges.
PEREIRA, Maria Margarida Silva. Op. Cit. Pág. 249.
32
Embora a lei não estabeleça de forma explícita o que seria uma união
constituída com “comunhão plena de vida”, seguindo o pensamento dos mesmos
autores, os sujeitos além de estarem submetidos aos deveres conjugais,
deveriam também seguir uma comunhão de vida exclusiva (art. 1601.º, al. “c”) e
uma união não livremente dissolúvel63.
62
COELHO, Francisco Pereira. OLIVEIRA, Guilherme de. Pág 196.
63
À título comparativo, o doutrinador brasileiro Carlos Roberto Gonçalves afirma em sua obra,
que o casamento ao estabelecer “comunhão plena de vida” (art. 1511º, do CCB), baseia-se na
igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges, implicando obrigatoriamente “união exclusiva”,
tendo em vista que o art. 1566º do CCB determina como primeiro dever imposto aos cônjuges a
fidelidade recíproca. Para ele, a referida comunhão liga-se ao princípio da igualdade substancial,
pressupondo o respeito à diferença entre os cônjuges e a consequente preservação da dignidade
das pessoas casadas.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume VI – Direito de Família. 6ª ed. Rev.
E atual: Editora Saraiva, 2009, Pág. 168.
64
Código Civil Português. Op. Cit.
65
Código Civil Brasileiro. Op. Cit.
33
66
PINHEIRO, Jorge Duarte. Pág. 356.
67
PINHEIRO, Jorge Duarte. Pág. 359
68
CHAVES, Adalgisa Wiedmann. A (ir)relevância da discussão da culpa na separação judicial in:
O Moderno Direito de Família. Revista do Ministério Público do RS, 2006, pág.12.
69
VARELA, Antunes. Págs. 339 a 341.
34
70
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Pág. 134
71
Corroborando esse entendimento de inconformismo, cabe destacar o posicionamento antigo
dos juristas alemães, a respeito do modelo francês, que assim como o modelo português,
descreveram conceitos para os deveres conjugais. “Enneccerus, Kipp e Wolf apelidaram o
modelo francês de “designação de velha sabedoria”, criticando-o, por não entenderem não caber
ao legislador concretizar o dever de comunhão de vida, pois normas que o tentassem nunca
conseguiriam fixar o regime para todos os casamentos e envelheceriam rapidamente”.
FAVARO, Daniela. PEREIRA, Fernanda Daniele de Abreu Pereira. O Fim da Culpa no Direito de
Família. Pág. 11. Disponível em: publicadireito.com.br/artigos.
72
CHAVES, Adalgisa Wiedmann. A (ir)relevância da discussão da culpa na separação judicial in:
O Moderno Direito de Família. Revista do Ministério Público do RS, 2006, pág.13
73
PINHEIRO. Jorge Duarte. Pág. 360.
74
PINHEIRO. Jorge Duarte. Pág. 362.
75
COELHO, Francisco Pereira e OLIVEIRA, Guilherme de. Pág. 411.
35
76
PINHEIRO. Jorge Duarte. Pág. 363 e 364.
77
O dever de coabitação compreende as obrigações que os cônjuges têm, de viver em comum,
sob o mesmo teto. Mas abrange sobretudo as relações sexuais (o ius in corpus), que constituem
o dever conjugal por excelência (debitum conjugale).
VARELA, Antunes. Pág. 345.
78
CAMPOS, Diogo Leite de. e CAMPOS, Mónica Martinez de. A Comunidade Familiar in: Textos
de Direito da Família para Francisco Pereira Coelho. Coordenação Guilherme de Oliveira.
Imprensa da Universidade de Coimbra, 2016, Pág. 14.
79
A obrigação de socorro pressupõe uma ajuda a superar situações anormais e graves, de crise
ou emergência do outro cônjuge. Já a obrigação de auxílio implica uma colaboração indicada a
fazer face aos problemas do dia-a-dia.
PINHEIRO. Jorge Duarte. Pág. 366
80
Na obrigação de socorro e auxílio mútuos, que integra o dever de coperação, cabem
especialmente os cuidados exigidos na vida e saúde de cada um dos cônjuges, bem como a
colaboração necessária ao exercício da sua profissão.
VARELA, Antunes. Pág. 350.
81
PINHEIRO. Jorge Duarte. Pág. 368
36
82
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Pág. 130 e 131
83
PINHEIRO, Jorge Duarte. Pág. 532
84
Nesse sentido, aduz Antunes Varela: A Igreja considera a família como uma sociedade natural
que, através do casamento, experimenta ao homem uma ligação por toda vida, até a morte, a
uma outra pessoa. É essa plena comunhão natural de dois seres humanos que vem palidamente
retratada na análise descritiva do artigo 1672º. Trata-se de um elemento essencial do casamento,
devendo considerar-se nulas e não escritas quaisquer cláusulas derrogatórias dos deveres
recíprocos a que esse preceito legal se refere, situados no cerne do novo modelo de matrimônio
aceite na Reforma de 1977.
VARELA, Antunes. Pág. 182.
37
85
“A tendência de algumas legislações mais avançadas, como a alemã, é orientada no sentido
de reduzir os deveres pessoais impostos coercitivamente aos cônjuges, abandonando também
nesse domínio o modelo clássico (único) do casamento e franqueado aos nubentes a
possibilidade de darem outros possíveis conteúdos à relação matrimonial”.
VARELA, Antunes. Pág. 341.
86
Segundo Carbonnier, ao mencionar os deveres pessoais do Código Civil Francês, estabeleceu
que os efeitos pessoais do casamento caracterizam restrições que cada cônjuge voluntariamente
permite em sua liberdade pessoal por um sistema de ordem pública, suficiente a configurar a
culpa (faute) como causa de pedir do divórcio.
CARBONNIER, Jean. Droit Civil: Introduction, Les pdersonnes, La famille, l'enfant, le couple.
Paris: PUF, 2004, Pág. 1290.
87
COELHO, Francisco Pereira e OLIVEIRA, Guilherme de. Pág. 407.
88
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. Relance crítico sobre o direito de família português. in: Textos
de Direito de Família. Para Francisco Pereira Coelho, coordenação de Guilherme de Oliveira.
Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2016, págs. 116 e 117.
38
da culpa89.
89
Dispõe o art. 1781º, al. “d” do CCP, que são fundamento de um divórcio sem consentimento
de um dos cônjuges: d) Quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges,
mostrem a ruptura definitiva do casamento.
Código Civil Português. Op. Cit.
90
HENRIQUES, Teresa de Souza (Relatora). Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.
Processo n.º 249/11.0TMLSB.L1-1. 19/02/2013. Disponível em: www.dgsi.pt.
91
COSTA, Eva Dias. A eliminação do divórcio litigioso por violação culposa dos deveres
conjugais in: e foram felizes para sempre? Coimbra Editora, 2010, pág. 71.
92
O Professor Carlos Pamplona Corte-Real, admite que a não observância desses deveres não
traz uma consequência específica em sede de divórcio.
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. SILVA, José Pereira. Pág. 17
93
Em sentido contrário, temos o Professor Jorge Duarte Pinheiro, que afirma que a violação aos
deveres conjugais independe do divórcio ou da separação de pessoas e bens, podendo suscitar
responsabilidade civil (cf. Art. 483º e s.), caso seja verificado os pressupostos da obrigação de
indenizar, tendo em vista que o casamento não cria uma “área de exceção”.
PINHEIRO, Jorge. Pág. 377 e 378.
94
Segundo Diogo Campos e Mónica Martinez, em nome do direito à liberdade (de divórcio),
excluem a possibilidade de um cônjuge indenizar o outro por danos decorrentes diretamente da
violação dos deveres conjugais.
39
99
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Quid Juris Sociedade
Editora Ld, Lisboa, 2017, Pág. 25. ISBN 978-972-724-776-9.
41
100
A expressão pejorativa “concubina” deriva da expressão latina “cuni cubare”, que significa “ir
para cama com”.
101
OLIVEIRA, Guilherme de. Notas sobre a Lei n.º 23/2010, de 30 de Agosto (Alterações à Lei
das Uniões de Facto). Lex Familiae. Revista Portuguesa de Direito da Família, Coimbra, a.7n.14.
Pág. 139.
102
OLIVEIRA, Guilherme de. Op. Cit. Pág. 140.
103
XAVIER, Rita Lobo. Novas Sobre a União “More Uxorio” em Portugal in: Estudos dedicados
ao Prof. Doutor Mário Júlio de Almeida Costa. Págs. 1403 e 1404.
42
104
OLIVEIRA, Guilherme. Notas. Op. Cit. Pág. 140.
105
LEITE, Sofia. A União de Facto em Portugal in: Revista de Estudos Demográficos, n.º 33. Pág.
104. Disponível em: censos.ine.pt.
43
106
Afirma Coelho e Oliveira que esse tipo de união era chamado de “casamento aliança”. Este
configurava-se quando o casamento entre os seus membros era determinado por grupos a que
pertenciam os noivos, a vida matrimonial respeitava valores e exigências cumprindo um destino
pré-definido, possuindo relevância fundamentalmente econômica e reprodutiva.
Coelho, Francisco Pereira. e OLIVEIRA, Guilherme de. Pág. 121
107
LEITE, Sofia. A União de Facto em Portugal. Pág. 97
108
Vale destacar que nos anos 60 a cada cem casamentos, noventa e um eram religiosos e que
nos anos 70 eram celebrados mais de cem mil casamentos em Portugal.
109
Nesse sentido, Carlos Pamplona adverte: “Daí a relevância do “olhar à volta” (e não só em
termos estritamente jurídicos) para bem se poder aferir das influências ou afinidades subjacentes
ao Direito de Família português, que diga-se, desde já, acompanhou “entusiasticamente” (nem
sempre tao científica quanto entusiasticamente), na Reforma de 77-78, os sinais dos tempos”.
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. Direito da Família e das Sucessões - Relatório. Lisboa, 1995.
Pág. 67 e 68.
44
só, pode ser entendido como crise da família ou crise da conjugalidade. Desse
modo, surge o seguinte questionamento: até que ponto essas alterações não
foram vistas como uma “crise do casal”?
Sobre esse fato o censo nos apresenta que entre 1995 e 2012 a
percentagem de casamentos na qual os casais já possuíam residência anterior
comum tem vindo a expandir, correspondendo em 2012 a praticamente metade
do total de casamentos realizados em Portugal, situação bem diferente da que
se encontrava no ano de 1995, na qual em sua maioria os nubentes não
possuíam residência anterior comum111.
110
Entre 2001 e 2011, a expressão de casamentos católicos, no total de casamentos, passou de
62,5% (36 509) para 39,5% (14 121) e a de casamentos civis passou de 37,5% (21 881) para
60,2% (21 481), respetivamente (INE 2013).
NUNES, Cátia. Transformações familiares recentes: uma perspectiva territorial. in: Famílias nos
Censos 2011. Anabela Delgado, Karina Wall (Coord.), Lisboa: Instituto Nacional de Estatística:
ICS. Imprensa de Ciências Sociais, 2014. Pág. 112.
Disponível em: https://www.cig.gov.pt/siic/pdf/2015/FamiliasCensos2011_a.pdf.
111
PINA, Cláudia. MAGALHÃES, Graça. Principais tendências demográficas: as últimas
décadas. in: Famílias nos Censos 2011. Anabela Delgado, Karina Wall (Coord.), Lisboa: Instituto
Nacional de Estatística: ICS. Imprensa de Ciências Sociais, 2014. Pág. 36.
45
acaba por antecipar a vivência em casal. Além desses, há também os casos das
uniões de facto que surgem de transições familiares envolvidas por rupturas
anteriores112.
112
Em 2011, aproximadamente 6 em cada 10 casais recompostos viviam em união de facto
(59,2%), o que representa um crescimento de 139,5% face a 2001, altura em que perfaziam
55,9% do total.
ATALAIA, Susana. As famílias recompostas em Portugal: dez anos de evolução (2001-2011) in:
Portugal in: Famílias nos Censos 2011. Anabela Delgado, Karina Wall (coord.), Lisboa: Instituto
Nacional de Estatística: ICS. Imprensa de Ciências Sociais, 2014. Pág. 238.
113
WALL, Karin. CUNHA, Vanessa. RAMOS, Vasco. Evolução das estruturas domésticas em
Portugal, 1960-2011. in: Famílias nos Censos 2011. Anabela Delgado, Karina Wall (coord.),
Lisboa: Instituto Nacional de Estatística: ICS. Imprensa de Ciências Sociais, 2014. Pág. 44.
114
Entre 1991 e 2011, os casais «de facto» registaram uma variação positiva de 278,8%. Trata-
se de um aumento consistente e regular ao longo do tempo, na medida em que o número de
casais «de facto» praticamente duplicou entre 1991 e 2001 (93,6%) e, novamente, entre 2001 e
2011 (95,7%), o que permite afirmar a coabitação como uma das grandes tendências de
mudança na conjugalidade em Portugal, aliás, já identificada por Ferreira (2003). Em
contrapartida, a diminuição (absoluta e relativa) dos casais «de direito» constitui um fenómeno
emergente, que marca a primeira década do novo milénio. Se na última década do século XX
estes casais registavam ainda uma variação positiva de 4,9%, de algum modo acompanhando o
aumento dos núcleos conjugais no seu todo, entre 2001 e 2011, os casais «de direito» passaram
a registar uma variação negativa de 4,8%. Assim, não obstante o número de núcleos conjugais
em Portugal continuar a aumentar, constata-se que há uma diminuição do número de casais «de
direito», isto é, que formalizam a relação através do casamento. Já os casais «de facto» têm
vindo paulatinamente a ganhar relevância, representando 13,3% do total de casais em 2011,
contra 3,9% em 1991.
CUNHA, Vanessa. ATALAIA, Susana. A evolução da conjugalidade em Portugal in: Famílias nos
Censos 2011. Anabela Delgado, Karina Wall (coord.), Lisboa: Instituto Nacional de Estatística:
ICS. Imprensa de Ciências Sociais, 2014. Págs. 157 e 158.
46
115
Podemos citar como exemplos no CCP, os artigos: 495, n.º 3; 953; 1111 n.º 2 e n.º 3, “c”;
1871, n.º 1, “c”; 1911, n.º 3; 2020, n.º 1.
Código Civil Português.
116
Nesta ocasião faz-se necessário demonstrar uma respectiva histórica dos acontecimentos
que antecederam a Lei n.º 135/99. Foi no mês de fevereiro de 1987 que o Partido Comunista
Português trouxe um projeto exclusivo garantindo a proteção aos membros em união de facto.
No mês de novembro do mesmo ano, foi a vez do Partido Ecologista “Os Verdes” apresentar um
projeto de lei de revisão constitucional, sugerindo o alargamento no conceito de família de forma
a adequá-lo à realidade, incluindo direitos no âmbito da segurança social e do arrendamento
urbano, de forma que o art.13, n.º 2 da CRP passasse a proibir a discriminação em razão do
estado civil. Em junho de 1988 foi a vez dos Comunistas buscarem a renovação do projeto
anterior, incluindo artigos relativos ao destino da morada do casal na cessação da união de facto.
Passou-se seis anos em um interregno e, no ano de 1994, o partido “os verdes” insistiu no seu
projeto de lei de revisão constitucional, visando não somente alargar o conceito de família como
ajustar o princípio da igualdade às novas e diversas expressões familiares a que a sociedade
assume. Seria aqui incluído um n.º 3 no art.36 da CRP, que passaria a ditar a equiparação da
união de facto ao casamento para todos os efeitos nos termos da lei. No mesmo ano, os
Comunistas divulgaram um novo projeto de lei com intuito de substituir o Decreto Regulamentar
n.º 1/94 por um diploma mais brando quanto à exigência da prova da união de facto. Já em março
de 1996 os Verdes trouxeram um novo projeto de lei de revisão constitucional incluindo no art.13,
n.º 2 a discriminação em razão da opção sexual, mais tarde chamada de, orientação sexual. No
mês de maio de 1997, os Verdes avançaram mais uma vez, com um projeto de lei ordinária
concentrado inteiramente às uniões de facto. Ocorre que neste recuaram mais ao diminuir os
47
Nesse ínterim, iniciaremos nossa descrição pela parte que mais chamou
atenção no dispositivo legislativo que foi a exigência de que as pessoas tivessem
sexo diferente para que fossem protegidas pela união de facto. Ao nosso ver a
regulamentação do instituto da união de facto foi em decorrência da necessidade
de acompanhar a evolução nos contextos familiares, baseado no direito de
livremente cada pessoa constituir a sua família.
Desse modo, como entender que um dispositivo que veio nos trazer a
aceitação de que a relação constituída em união de facto deveria ser protegida
juridicamente, se nela podemos encontrar ainda a discriminação entre as
pessoas?! Sendo assim, vamos analisar a evolução da ordem legal das relações
homoafetivas em Portugal para melhor compreendermos.
efeitos de atribuição da união de facto ao restringir para prestações de segurança social, casos
de acidente de trabalho, direito ao arrendamento e imposto sobre o rendimento. No mês de junho
do mesmo ano, foi a vez dos Comunistas de apresentarem um projeto de lei mais extenso e
complexo do que os Verdes, correspondendo nas palavras do autor, a um “mini-casamento
alternativo”, uma vez que delimitava o conceito de união de facto, inclusão nas fontes das
relações familiares, modos de dissolução, efeitos quanto às pessoas e bens, definindo, ainda,
através de remissão para normas aplicáveis aos cônjuges, A POSIÇÃO SUCESSÓRIA DO
SOBREVIVO DA UNIÃO DE FACTO e a questão de alimentos. Decorre que no dia 25/06/1997,
dia D, os projetos infelizmente não foram aprovados (“chumbados”). E, após esse fato, com a
junção dos partidos socialistas, reuniaram os projetos que viriam a ser a Lei n.º135/99.
CID, Nuno de Salter. A comunhão de vida à margem do casamento: entre o facto e o Direito,
Almedina, 2005. Págs. 636 a 642. Depósito Legal: 232615/05.
117
CID, Nuno de Salter. Op. Cit. Pág. 643.
118
Lei n.º 135/1999.
48
Para quem acreditou que a novidade trazida pela nova lei da união de
facto resolveria o problema da discriminação e do preconceito homofóbico que
perpassa pela nossa sociedade, ao permitir a união de duas pessoas que
optassem por viver uma relação afetiva e com possibilidade de tutela jurídica,
não compreendeu que a intenção do legislador ao definir o instituto da união de
facto era o de regulamentar uma situação entre duas pessoas em uma relação
inferior, marginalizada ou de segunda categoria em relação ao casamento.
Nesse sentido, ficaria muito mais fácil regular uma relação afetiva entre pessoas
do mesmo sexo, mantendo o casamento restrito a casais heterossexuais.
119
Projeto 384/VII 11/03/2020.
Disponível em: https://debates.parlamento.pt/catalogo/r3/dar/s2a/07/02/053/1997-06-
19/1051?pgs=1049-1056&org=PLC&plcdf=true.
120
Lei 7.2001. Art. 1º. 2- A união de facto é a situação jurídica de duas pessoas que,
independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois
anos.
121
CORTE-REAL, Carlos Pamplona e PEREIRA, José Silva. Pág 148.
49
institutos tanto do casamento quanto da união de facto, uma vez que os dois
possuem os mesmos valores da dignidade, da liberdade, da intimidade, do
respeito pelo próximo e da boa-fé. Ora, não faria sentido essa diferenciação de
tratamento jurídico e a superioridade do casamento 122.
122
Op.Cit. Pág. 148.
123
A Lei n.º 9/2010, de 31 de maio, alterou o art. 1577 do CCP: “Casamento é o contrato
celebrado entre duas pessoas que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão
de vida, nos termos das disposições deste Código”. Antes da Lei, o dispositivo de lei era “contrato
celebrado entre duas pessoas de sexo diferente…”.
124
Vale ressaltar que a publicação da lei reconhecendo o casamento homoafetivo não foi aceita
por unanimidade. O projeto de lei foi aprovado em fevereiro de 2010, porém o presidente
requereu a fiscalização preventiva quanto à constitucionalidade do decreto n.º 9/XI, no que tange
aos artigos 1º, 2º, 4º e 5º, excluindo da apreciação o artigo que proibia a adoção por casais
homoafetivos. O Tribunal Constitucional de maneira não unânime, se manifestou, pelo não
pronunciamento da inconstitucionalidade de normas do Decreto da Assembleia da República,
estando na esfera do legislador ordinário se posicionar. O projeto voltou para o presidente que
promulgou a lei.
125
ASCENSÃO, José de Oliveira. O Casamento de Pessoas do Mesmo Sexo in: Revista da
Ordem dos Advogados, Lisboa, a.71n.2 (Abr. - Jun. 2011), Pág. 391 e 392.
50
126
ASCENSÃO, José de Oliveira. Op. Cit.
127
A título de interesse, vale destacar que há ainda uma ressalva quanto a total igualdade entre
as relações afetivas. Esta ressalva veio disposta na Lei de PMA, ao garantir o acesso aos casais
heterossexuais e os casais homossexuais desde que composto por mulheres.
51
Observa-se que na passagem das leis da união de facto, tanto a Lei n.º
135/99, quanto a Lei n.º 7/2001 na sua primeira versão não mencionaram a
expressão “condições análogas às dos cônjuges”. Foi a Lei n.º 23/2010, de 30
de agosto, quem trouxe o termo, “condições análogas às dos cônjuges”, na
intenção de esclarecer as dúvidas por parte de alguns doutrinadores, como por
exemplo, quanto a possível exclusão dos benefícios do art. 2020.º do CCP aos
unidos de facto homossexuais, isso claro, antes da aprovação do casamento
homoafetivo (Lei. n.º 9/2010).
128
Art. 1, n. 2º da Lei. 7/2001 (atualizada).
129
Lei n.º 6/2001, de 11 de maio, art. 2º, 1- Entende-se por economia comum a situação de
pessoas que vivam em comunhão de mesa e habitação há mais de dois anos e tenham
estabelecido uma vivência em comum de entreajuda ou partilha de recursos.
130
PINHEIRO, Jorge Duarte. Direito da Família Contemporâneo. Pág. 524.
131
“A união de facto pressupõe uma comunhão de vida análoga à dos cônjuges, ou seja, uma
coabitação, na tripla vertente de comunhão de leito, mesa e habitação”.
SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Processo: 6380/16.9T8CBR.C1.S1. de 22-03-2018.
132
De acordo com Antunes Varela e Pires de Lima, o termo “condições análogas às dos cônjuges”
quer dizer que os conviventes mantêm não somente relações sexuais, como também vivem
também de casa e purcarinho um com o outro, com comunhão de mesa, leito e habitação, agindo
como se casados fossem.
VARELA, Antunes, e LIMA, Pires de. Código Civil Anotado.
52
relação seja partilhada nos mesmos moldes, “não será nunca possível negar
uma analogia indesdizível no plano convivencial entre a situação dos
companheiros e a dos cônjuges”133.
133
CORTE-REAL, Carlos Pamplona e PEREIRA, José Silva. Pág. 152.
134
PINHEIRO, Jorge Duarte. Direito de Família Contemporâneo. Pág. 524
135
PEREIRA, Maria Margarida Silva. Direito da Família. Pág. 599.
53
atualizações136.
Todavia, devemos observar que essa regra citada pelo professor merece
ser analisada com especial atenção, caso a caso, tendo em vista que nem
sempre é da vontade dos membros da união de facto deixarem de coabitar o
mesmo teto. Pode ocorrer dos companheiros terem que necessariamente
deixarem de coabitar por razões não queridas por eles, como por exemplo, um
emprego que obriga um dos conviventes a se instalar em outra cidade.
Por fim, após a análise do art. 1.º, n.º 2 da LUF, cabe agora tratar o último
requisito para que uma relação afetiva seja configurada uma união de facto.
136
Falaremos sobre a união estável em capítulo próprio, mas nos antecipamos para citar que no
Brasil a união informal tinha prazo mínimo de cinco anos e evoluiu para uma união sem prazo
mínimo.
137
PINHEIRO, Jorge Duarte. Direito de Família Contemporâneo. Pág. 525 e 526.
54
Registra-se que a Lei n.º 135/99 e a Lei n.º 7.2001 trouxeram como idade
mínima para a configuração de união de facto, terem os membros 16 anos. Foi
a lei n.º 23/2010 que estabeleceu a mudança de idade mínima para o
reconhecimento da união de facto ser 18 anos e, essa análise da idade deve ser
observada após os dois anos exigidos para a constituição da união de facto 139.
138
Arts. 1601º e 1602º do CCP.
139
Nas palavras de Guilherme de Oliveira, com o fato da idade mínima de 16 anos e a
necessidade de coabitação em um período de 2 anos, esta relevância não se compaginava com
às normas penais que defendem a autodeterminação sexual de menores de 16 anos. Sendo
assim, a nova lei atenuou o defeito legislativo.
OLIVEIRA, Guilherme de. Notas…Pág. 141.
140
OLIVEIRA, Guilherme de. Op. Cit. Pág. 141.
55
Por fim, cabe demonstrar ainda, que o art. 2.º- A, da Lei 7/2001, de 11
de maio, alterado pela Lei 23/2010, de 30 de agosto, trouxe disposições de como
deve ser realizada a prova da relação de união de facto. Destaca-se os seguintes
requisitos: na falta de disposição legal ou regulamentar em contrário, admite-se
a prova por qualquer meio legal (n.1º); a prova poderá ser realizada pelos
companheiros através de uma declaração emitida pela Junta de Freguesia do
interessado, bem como declaração de ambos os membros de que convivem
juntos pelo menos há dois anos, sob compromisso de honra, e também de
certidões de cópia integral do registro de nascimento de cada um deles (n.º 2);
Em caso de união de facto dissolvida, a declaração da Junta deverá mencionar
quando cessou a relação, e, se um dos companheiros não se dispuser a
subscrever a declaração, o outro companheiro poderá apresentar declaração
singular (n.º3); Caso a dissolução se dê em razão da morte do companheiro, a
declaração já citada deverá atestar o tempo em que viveram juntos, à data do
falecimento, a declaração do interessado de que viviam juntos há mais dois anos,
além da certidão de nascimento do companheiro vivo e a certidão de óbito do
falecido (n.º4). E, o n.º 5 adverte que as falsas declarações são penalmente
puníveis.
Vimos que a união de facto é uma relação entre duas pessoas que
livremente decidem coabitar e viver em condições análogas às dos cônjuges, e
que dessa coabitação ainda é necessário à observância dos requisitos para que
56
141
Na obra de França Pitão há um capítulo que trata dos efeitos da união de facto decorrentes
de legislações avulsas, nós, a título de exemplo, citaremos alguns efeitos somente para
corroborar o entendimento de que a união de facto aproxima-se cada vez mais da união em
casamento, são eles: Indenização por danos não patrimoniais no caso de morte, art. 496º do
CCP; casos de impedimentos e suspeições de magistrados, art. 115 do CPC; recusa legítima
para depor como testemunha, art. 497, n.º1, “d” do CCP e Art. 134, n.º 1, “b”, do CPP;
possibilidade de constituição como assistente em processo penal, art. 68, n.º 1 “c” do CPP; casos
de violência doméstica e proteção das suas vítimas Art. 152, n.º 1 do CP, Transmissão mortis
causa do arrendamento rural e florestal art.20 do Decreto-Lei n.º 294/2009; entre outros.
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Op.cit. Pág. 327e
seguintes.
57
casos de morte do outro unido de facto, por aplicação do regime geral e especial
de segurança social; f) prestações por morte decorrentes de acidente de trabalho
ou doença ocupacional; e g) pensão por preço de sangue e por serviços
excepcionais e relevantes prestados ao País142.
Em toda a nossa escrita mencionamos que cada vez mais há fatos que
corroboram a aproximação estrutural entre os institutos da união de facto e o
casamento. Nesse sentido, entendemos que deve haver mais semelhanças
também quanto aos seus efeitos.
Efeitos Pessoais:
142
O art. 3º é um artigo meramente exemplificativo, tendo em vista que a LUF descreveu somente
os casos mais recorrentes na vida prática e que foram exigidas na época da aprovação da Lei.
143
Art. 1671, n.º 1 e 2 do Código Civil Português.
58
144
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Op. Cit. Pág. 97.
59
145
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Op. Cit. Págs. 101 e
102.
60
146
Nesse sentido, observa-se o disposto no art. 483, n.º 1 do CCP. “Aquele que, com dolo ou
mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a
proteger interesses alheios fica obrigado a indenizar o lesado pelos danos resultantes da
violação”.
Código Civil Português.
147
A presunção do art. 1871, n.º 1, al. c) do CCP é diferente do art. 1826, n.º 1, que é uma forma
de estipulação de paternidade; A presunção prevista no art.1871, somente será utilizada para,
em caso de investigação de paternidade, inverter o ónus da prova da filiação, determinando a
paternidade por decisão judicial. Na visão de Guilherme de Oliveira e Pereira Coelho, essa
diferença entre os filhos nascidos dentro ou fora do casamento, justifica-se pela diversidade das
condições do nascimento, não ferindo o princípio constitucional da não discriminação dos filhos.
OLIVEIRA, Guilherme de. e COELHO, Francisco Pereira. Págs. 81 e 82.
61
148
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Pág. 154.
149
Art. 3º, alínea “e” da Lei n.º 135/99 – “Quem vive em união de facto tem direito a: e) Adoptar
nos termos previstos para os cônjuges no artigo 1979º do Código Civil, sem prejuízo das
disposições legais respeitantes à adopção por pessoas não casadas”.
150
Art. 7º da Lei n.º 7/2001 – “Nos termos do actual regime de adopção, constante do livro IV,
título IV, do Código Civil, é reconhecido às pessoas de sexo diferente que vivam em união de
facto nos termos da presente lei o direito de adopção em condições análogas às previstas no
artigo 1979º do Código Civil, sem prejuízo das disposições legais respeitantes à adopção por
pessoas não casadas”.
62
151
Encontra-se no artigo 1979º do CCP os requisitos para a possibilidade da adoção.
152
“Art. 5º - Convenção de união de facto. 1- Até o início da coabitação, e durante o decurso do
prazo estabelecido no artigo 3º, podem os membros do casal, através de escritura notarial ou de
auto lavrado perante o conservador do registo civil, celebrar convenção de união de facto,
estabelecendo o regime de bens, a responsabilidade por dívidas e o regime de administração
dos bens”. Disponível em: pcp.pt/artigos.
63
153
Resumidamente, podemos mencionar que o regime de bens define a propriedade sobre os
bens do casal, que são eles: a) O regime de adquiridos é aquele no qual há ou pode haver bens
próprios e bens comuns a serem analisados, não se comunicando os bens levados para o casal
e nem os adquiridos a título gratuito. Esse regime também é o regime supletivo nos casos quando
há ausência de convenção antenupcial ou quando houver invalidade ou ineficácia da convenção.
Encontra-se disposto no artigo art. 1721 e seguintes do CCP; b) A comunhão geral é quando o
patrimônio comum é formado por todo os bens sejam presentes ou futuros, salvo os
incomunicáveis. Encontra-se disposto no art.1732 e seguintes do CCP; c) Já a separação de
bens ocorre por imposição legal ou escolha dos cônjuges, na qual cada cônjuge pode dispor
livremente dos bens presentes e futuros. Encontra-se disposto nos arts. 1735 e 1736 do CCP.
Código Civil Português.
154
OLIVEIRA, Guilherme de e COELHO, Francisco Pereira. Pág. 82
64
Nesse sentido, Carlos Pamplona Corte-Real nos traz uma crítica ao citar
que, se o regime de separação de bens é o regime que se sobrepõe ao regime
que foi escolhido na união de facto, não faz sentido não aceitar que os
companheiros não poderão em um contrato e diante da sua autonomia de
vontade, exercitando a liberdade no campo patrimonial, da mesma forma que
ocorre no pacto antenupcial, escolher um regime de adquiridos, por exemplo,
uma vez que a liberdade é um atributo da união dos conviventes. 157
Todavia, não significa dizer que todo o regime patrimonial dos cônjuges
é transponível à união de faco. No entender de Maria Margarida, não cabe
aplicação por analogia da figura matrimonial do regime de bens à união de facto,
fundamentada na informalidade desta união, não exprimindo legitimidade tal
equiparação158. Posicionamento contrário aduz Pamplona, quando afirma que
justifica ao intérprete, dentro das possibilidades e por razões de uma evidente
analogia legis, utilizar todos e cada um dos aspectos que possam ser
transponíveis de forma satisfatória159.
155
Op. Cit. Págs. 84 e 85.
156
Op. Cit. Pág. 83.
157
CORTE-REAL, Carlos Pamplona e PEREIRA, José Silva. Págs. 171 e 172.
158
PEREIRA. Maria Margarida Silva. Pág. 615.
159
CORTE-REAL, Carlos Pamplona e PEREIRA, José Silva. Pág. 153.
65
160
CAHALI, 2002. Francisco José. Contrato de Convivência na União Estável. São Paulo: Editora
Saraiva, 2002, Págs. 55 e 56.
66
companheiro que embora não tenha contribuído financeiramente por não possuir
uma profissão remunerada cooperou com o trabalho na vida do lar que
estabeleceram juntos?
161
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Pág. 176.
67
162
Op. Cit. Pág. 173 e 174.
163
Art. 473 – Princípio geral 1. Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem
é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou. 2. A obrigação de restituir, por
enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que indevidamente recebido, ou
o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que
não se verificou.
Código Civil Português.
164
Para uma melhor compreensão do assunto, examinar a decisão do STJ, Acórdão de 20 de
março de 2014, Processo: 2152/09.5TBBRG.G1.S1 no artigo “Dissolução da União de Facto e
Enriquecimento sem causa”.
68
168
O acórdão citado, na visão de Francisco Coelho, foge um pouco da realidade das decisões
jurisprudenciais, uma vez que neste caso não foi a companheira que realizou os trabalhos
domésticos, quem intentou com a ação fundamentada no enriquecimento sem causa.
COELHO, Francisco Manuel de Brito Pereira. Op. Cit.
169
Op. Cit. Págs. 116 e 117.
170
Cabe destacar sumário do acórdão do STJ, recente, sobre os requisitos da fundamentação
do princípio do enriquecimento sem causa na relação de união de facto.
“I. A crescente relevância social da união de facto, constituída quando duas pessoas se “juntam”
e passam a viver em comunhão de leito, mesa e habitação, determinou a intervenção do
legislador, que estabeleceu requisitos para o seu reconhecimento jurídico e passou a
regulamentar os seus efeitos em vários domínios, nada prescrevendo, porém, no âmbito dos
efeitos patrimoniais, optando o legislador por não estabelecer um regime patrimonial geral,
atinente aos bens dos membros da união de facto, nem definir regras sobre a administração e
disposição desses bens, outrossim, sobre as dívidas contraídas pelos conviventes e a liquidação
e partilha do património, em virtude da dissolução da união. II. É inviável para a resolução dos
casos de divisão do acervo patrimonial constituído no seio da união de facto, o recurso ao regime
previsto para as sociedades de facto, outrossim, o recurso ao instituto da compropriedade,
restando-nos o instituto do enriquecimento sem causa, como solução no plano do direito comum,
com vista a regular e disciplinar os efeitos patrimoniais da cessação da união de facto. III. O
instituto do enriquecimento sem causa tem natureza subsidiária, donde só deve ser chamado
quando a lei não concede ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído. IV. A
obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa pressupõe a verificação
cumulativa de três requisitos, quais sejam, a existência de um enriquecimento; sem causa
70
justificativa; e à custa de quem requer a restituição. V. O nosso direito substantivo civil, no que
respeita a um dos exigidos requisitos atinentes ao enunciado instituto do enriquecimento sem
causa, traduzido na ausência de causa justificativa, conquanto tenha identificado um
critério de orientação, uma linha de rumo interpretativa, pressupõe, numa enumeração
exemplificativa, três situações especiais de enriquecimento desprovido de causa: condictio
in debiti (repetição do indevido), condictio ob causam finitam (enriquecimento por
virtude de causa que deixou de existir) e condictio ob causam datorum (enriquecimento derivado
da falta de resultado previsto). VI. O desaparecimento posterior da causa, condizente à
tradicional condictio ob causam finitam (enriquecimento por virtude de causa
que deixou de existir), caracteriza-se por alguém ter recebido uma prestação em virtude de uma
causa que, entretanto, deixou de existir, donde, verificada a deslocação patrimonial mediante
uma prestação, a causa há-de ser a relação jurídica que essa prestação visa satisfazer, e se
esse fim falta, a obrigação daí resultante fica sem causa. VII. Para se reconhecer a
obrigação de restituir sustentada no enriquecimento, não é suficiente que se demonstre a
obtenção duma vantagem patrimonial, à custa de outrem, sendo exigível ainda exigível mostrar
que não exista uma causa justificativa para essa deslocação patrimonial, importando anotar que
a falta originária ou subsequente de causa justificativa do enriquecimento assume a
natureza de elemento constitutivo do direito à restituição, impondo-se, assim, ao demandante
que reclama a restituição, por enriquecimento sem causa, o ónus da demonstração dos
respectivos factos constitutivos que contém a falta de causa justificativa desse enriquecimento”.
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. Processo n.º 2048/15.1T8STS.P1.S1 04/07/2019.
Disponível em: www.dgsi.pt.
71
ausência legislativa sobre o tema, o companheiro que figure como devedor será
responsável pela dívida, ainda que esta tenha sido contraída em benefício de
ambos.
Por fim, cabe destacar que os efeitos patrimoniais não esmiuçados neste
tópico, como o direito a alimentos, a pensão da seguridade social, e a casa de
morada da família, serão explorados de forma mais detalhada nos tópicos
seguintes, tendo em vista ter maior relevância com o tema do trabalho.
171
PITÃO. Págs. 180 a 182.
72
Contudo, o n.º 2, do art. 8.º da LUF, regulariza que será necessária uma
declaração judicial de dissolução, quando houverem direitos dos quais dependa
a sua existência. Essa declaração constitui um elemento importante para a
comprovação da cessação dos efeitos jurídicos da união de facto 172.
172
Destaca-se posicionamento da jurisprudência sobre o assunto: “…IV- Por imposição
decorrente da conjugação do preceituado na al. B) do nº 1 do art 8º da Lei nº 7/2001 com o
disposto no nº2 do mesmo art., quando um dos unidos (de facto) pretenda exercer direitos
dependentes da dissolução da união de facto prevista em tal al., tem, conjuntamente com a
correspondente pretensão, de pedir também a declaração judicial de dissolução de união de
facto, a qual, como estatuído no nº3 do mesmo art., tem de ser proferida em tal ação, ou em
ação que siga o regime processual das ações de estado”.
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. Processo n.º 2637/04.0TBVCD-L.P1.S1 14/07/2016.
Disponível em: www.dgsi.pt.
73
Foi através da Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, alterada pela Lei n.º
23/2010, de 30 de agosto, que o legislador regulamentou a proteção da casa de
morada da família em casa de ruptura entre os conviventes173.
173
Art. 4º da LUF: Proteção da casa de morada da família em caso de ruptura. “O disposto nos
artigos 1105º e 1793º do Código Civil é aplicável, com as necessárias adaptações, em caso de
ruptura da união de facto”.
Lei n.º 7/2001. Disponível em: pgdlisboa.pt/leis.
74
174
PEREIRA, Maria Margarida Silva. Direito da Família. Pág. 614.
175
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. PEREIRA, José Silva. Pág. 153.
75
176
DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 4º ed ver., atual. e ampl. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2015. Pág. 34.
76
177
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. Direito da Família e das Sucessões - Relatório. Lisboa,
1995.Págs. 12 e 13.
178
CAMPOS, Diogo Leite. Apud. Jorge Duarte Pinheiro. O Direito das Sucessões
Contemporâneo. 3ª Ed, Editora AAFDL, Lisboa/2019. Págs. 30 e 31.
179
PINHEIRO, Jorge Duarte, O Direito das Sucessões Contemporâneo. 3ª Ed, Editora AAFDL,
Lisboa,2019. Págs. 31 e 32.
77
180
Nesse sentido, dispõe o Código Civil Português, “Art. 2024º - Noção: Diz-se sucessão o
chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade das relações jurídicas patrimoniais de uma
pessoa falecida e a consequente devolução dos bens que a esta pertenciam.” Art. 2032º -
Chamamento de herdeiros e legatários 1. Aberta a sucessão, serão chamados à titularidade das
relações jurídicas do falecido aqueles que gozam de prioridade na hierarquia dos sucessíveis,
desde que tenham a necessária capacidade. 2. Se os primeiros sucessíveis não quiserem ou
não puderem aceitar, serão chamados os subsequentes, e assim sucessivamente; a devolução
a favor dos últimos retrotrai-se ao momento da abertura da sucessão.
Código Civil Português.
181
Aqui destacamos que quanto ao momento de transmissão, os dois países possuem sistemas
diferentes. O Brasil segue o modelo francês e, em razão do princípio da saisine, a aceitação da
78
herança tem efeito confirmatório da transmissão. Desse modo, com a morte, há a abertura da
sucessão e a transmissão automática da herança, sem necessidade de consentimento ou
aceitação. Já Portugal, atualmente, adere ao modelo romano, no qual compreende que o ponto
de partida não é a morte, mas o “chamamento” das pessoas à titularidade das relações jurídicas
patrimoniais do decujus e a devolução dos bens que o falecido deixou.
LÔBO, Paulo. Direito Civil – Sucessões, 6ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2020. ISBN Digital:
9788553616756 (ebook).
182
DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 4ª ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2015, pág. 120.
183
Ressalta-se que no caso do Brasil, iremos analisar em capítulo próprio, o companheiro como
herdeiro necessário. Neste momento, cabe somente destacar o cônjuge, os ascendentes e os
descendentes.
184
Dispõe o art. 1846 do Código Civil Brasileiro, que a legítima é a parte da herança que cabe
aos herdeiros necessários.
Código Civil Brasileiro.
79
que dispõe o CCB, em seu art. 1.788, ao afirmar que se a pessoa morrer sem
deixar testamento, a herança é transmitida aos herdeiros legítimos.
185
Vale frisar que o art.2133, n.º 1 do CCP ao determinar que poderão ser suscetíveis os
descendentes do irmão do falecido, sem impor limites em razão do grau de parentesco, permitiu
que pudesse haver sucessão legítima em benefício de parentes na linha colateral além do quarto
grau.
Código Civil Português.
186
Em Portugal, dispõe o art. 2133 do CCP – Classes de sucessíveis “1. A ordem por que são
chamados os herdeiros, sem prejuízo do disposto no título da adopção, é a seguinte: a) Cônjuge
e descendentes; b) cônjuge e ascendentes; Irmãos e seus descendentes; d) Outros colaterais
até ao quarto grau; e) Estado. No Brasil, o art. 1829 do CCB aduz a ordem a ser seguida: I- aos
descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente; II- aos ascendentes em
concorrência com o cônjuge sobrevivente; III- ao cônjuge sobrevivente; IV- aos colaterais. …”.
187
Art. 2134, CCP. “Os herdeiros de cada uma das classes de sucessíveis preferem aos das
classes imediatas”.
188
Art. 2135, CCP. “Dentro de cada classe os parentes de grau mais próximo preferem aos de
grau mais afastado”.
189
Para uma análise dos direitos sucessórios dos cônjuges e companheiros luso-brasileiros.
80
190
Com a permissão do casamento pelos casais homoafetivos em Portugal a partir de 2010, os
legisladores garantiram a igualdade entre os gêneros quando se tratava de direitos dos cônjuges,
restando ainda necessário fazer alterações quanto ao direito dos companheiros.
191
CORTE REAL, Carlos Pamplona. Direito da Família e das Sucessões. Pág. 31
192
Nesse sentido, o Doutor Professor Carlos Pamplona ao refletir sobre a noção do cônjuge
sobrevivo como herdeiro legitimário, nos chama atenção ao fato de que a inclusão do cônjuge
trouxe uma perspectiva ou visão de família que parece apontar para a sobrevalorização da
família nuclear ou conjugal, revelando que a intenção do legislador foi dar um certo protecionismo
82
de caráter econômico, à mulher casada doméstica, tendo em vista a estatística de que a cônjuge-
mulher sobrevive mais que o cônjuge-marido.
CORTE REAL, Carlos Pamplona. Curso de Direito das sucessões: Quid Juris Sociedade Editora,
Lisboa, 2012, Pág. 68.
193
O art. 2147, do CCP de 1966, estabelecia que na falta de parentes das três primeiras classes
sucessíveis, (descendentes, ascendentes, irmãos e seus descentes), o cônjuge sobrevivo era
chamado à sucessão da totalidade da herança.
194
Nas palavras de Rolf Madaleno, a origem do direito sucessório decorre do entendimento de
que os filhos herdam dos pais suas qualidades genéticas e particularidades dos laços familiares,
suas caraterísticas físicas, os traços e expressões dos seus ascendentes, suas patologias, os
valores morais e os caracteres psíquicos. Vale destacar, que a cadeia ininterrupta que une as
gerações familiares é o mesmo nexo sucessório que resulta na continuidade da fruição de bens,
sendo que esta, é em decorrência de uma construção do Direito Civil e não uma consequência
natural como ocorre com as transferências das características genéticas.
MADALENO, Rolf. Conheça a origem do Direito Sucessório. 2019. Disponível em:
http://genjuridico.com.br/2019/09/13/origem-do-direito-sucessorio/.
195
CAMPOS, Diogo Leite. O Estatuto Sucessório do Cônjuge Sobrevivo. Revista dos Advogados.
Lisboa, julho, 1990. Págs. 450 e 451.
83
196
No campo sucessório são considerados descendentes do decujus, os filhos biológicos, os
filhos que tenham sido adoptados, os filhos nascidos na sequência de PMA heteróloga, bem
como os filhos e outros descendentes de todos aqueles filhos.
PINHEIRO, Jorge. Direito das Sucessões. Op. Cit. Pág. 66.
197
Temos ainda como causa de exclusão do cônjuge ao chamamento da herança, os casos de
casamentos inexistentes (art. 1630, CCP) ou ainda daqueles casamentos que foram declarados
nulos ou anuláveis mesmo que a sentença de invalidade transite após a morte do decujus. A
exceção é o caso do casamento putativo, por se tratar de um terceiro de boa-fé e desde que a
sentença de anulação transite em julgado após a morte do outro cônjuge.
Op. Cit. Pág. 66.
84
Quanto aos valores, de acordo com o CCP, em seu art. 2158.º, a legítima
do cônjuge, quando não concorre com descendentes nem com ascendentes é
de metade da herança. Todavia, quando há concurso do cônjuge sobrevivo com
descendentes, a quota da legítima é de 2/3 da herança (art. 2159.º, n.º 1). E, no
caso de não haver cônjuge, a legítima dos filhos é de ½ ou 2/3, quando houver
respectivamente um ou dois ou mais filhos. Além do mais, na circunstância de
não haver descendentes, o cônjuge concorre com ascendentes pela quota da
legítima de 2/3 da herança (art. 2161.º, n.º 1). Somente na situação de não haver
cônjuge e nem descendentes, é que os ascendentes herdarão a quota da
legítima de ½ ou 1/3 conforme forem chamados a suceder (art. 2161.º, n.º 2).
198
Atualmente, o cônjuge sobrevivo é, pois, um sucessível legitimário privilegiado.
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. Da imputação de liberalidades na sucessão legitimária, Lisboa,
Centro de Estudos Fiscais, 1989, Págs. 917 e 918.
85
199
“Não é possível proceder à partilha sucessória dos bens de um decjus que era casado num
regime com um componente de comunhão, antes de ter sido feita a partilha dos bens comuns
do casal; e esta partilha, que é prévia à hereditária, pressupõe o conhecimento das normas
jusfamiliares sobre convenções antenupciais, regimes de bens, administração, disposição e
dívidas”.
PINHEIRO, Jorge Duarte. Estatuto do Sobrevivente da União: Pontos de Conexão e Ruptura
entre o Direito das Sucessões e o Direito da Família in: Termas Controvertidos de Direito das
Sucessões o Cônjuge e o Companheiro: Editora AAFDL, 2015. Pág.40.
200
Frase mencionada pelo Galvão Teles, Sucessão legítima e sucessão legitimária, Coimbra,
Coimbra Editora, 2004. Pág. 19 apud Jorge Duarte Pinheiro. Op. Cit. Pág. 45.
86
201
Chama atenção para essa situação o fato de o cônjuge sobrevivo muitas vezes não ter
contribuído para a formação do patrimônio comum, e por conta das regras sucessórias, gerar um
enriquecimento sem causa no momento da sucessão.
202
Essa proteção ao cônjuge em desmedida, chega a conflitar quando observamos que, o
cônjuge em separação judicial de bens não obsta ao fato que os cônjuges continuam como
sucessores legítimos um do outro e, um casal unido de facto, nem após uma relação duradoura,
é consagrado como herdeiro.
203
Este Projeto de Lei estabeleceu no Capítulo III – Direito das sucessões, art. 22, quanto ao
unido de facto e os direitos sucessórios na sucessão legítima, que: “Dissolvendo-se a união de
facto por morte de um dos membros do casal, estes integram a 1ª e 2ª classe de sucessíveis
estabelecidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do art. 2133 do Código Civil, nos termos dos cônjuges,
beneficiando na sucessão do mesmo regime para estes estabelecido, excepto quando o autor
da sucessão tenha descendentes de anterior casamento”. Vale ressaltar ainda a menção à
sucessão legitimária, no artigo 23 do mesmo texto legal, no qual determinou que: os membros
do casal na situação referida no número anterior são herdeiros legitimários, nos mesmos termos
dos cônjuges, sendo a sua legítima e a dos restantes herdeiros legitimários determinada,
segundo as circunstâncias, pelas regras definidas nos artigos 2159, 2160,2161 e 2162 do Código
Civil.
Projeto de Lei n.º 384/VII. Disponível em: pcp.pt.
87
204
O nobre Professor nos chama atenção ainda, a respeito do cônjuge ser herdeiro
independentemente do regime de bens, principalmente nos casos do regime de separação de
bens, quando o estatuto do cônjuge sobrevivo permanece igual a de qualquer outro cônjuge.
PINHEIRO, Jorge Duarte. Direito das Sucessões, 2019, Pág. 78 e 79.
205
Destaca-se que no último tópico deste capítulo, veremos os legados sucessórios conferidos
aos membros da união de facto, especificando aqueles mais importantes, quais sejam, a Casa
de Morada da Família, a Pensão de Sobrevivência e o Direito a Alimentos.
88
206
Chama-se atenção ao fato de que até o Estado é herdeiro legítimo garantido pela legislação
civil portuguesa, e o membro da união de facto não.
207
PINHEIRO, Jorge Duarte. Atualidade e pertinência do Código Civil em matéria de família e
sucções in: Edição Comemorativa do Código Civil, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2017,
Pág. 579 e seguintes.
208
Nas Palavras do Doutor Professor Carlos Pamplona, “A posição do cônjuge como herdeiro
forçado e, mais como herdeiro forçado privilegiado, não encontra aparentemente suporte, pelo
menos direto nos princípios constitucionais, que se limitam a estatuir a igualdade absoluta dos
direitos e deveres dos cônjuges “quanto à capacidade civil e política e à manutenção e educação
dos filhos”. E se o texto constitucional se reposta várias vezes ao propósito estatal de proteção
da família, nunca o faz em termos que pareçam impor as soluções que vingaram no campo
sucessório, assentes realmente numa nova perspectiva ou visão de família que parece apontar
para a sobrevalorização da família nuclear ou conjugal”.
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. Direito das Sucessões 2012. Pág. 68.
90
209
Art. 1º. “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na
vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”. Destaca-
se que a dignidade da pessoa humana encontra-se regulamentada em muitos dispositivos
constitucionais, assim como é no Brasil, no art. Art.1º, III da CFB, no título I dos Princípios
Fundamentais. “A República Federal do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos: III- a dignidade da pessoa humana”.
Constituição da República Portuguesa.
210
MIRANDA, Jorge. A Constituição e a dignidade da pessoa humana in: DIDASKALIA. Revista
da Faculdade de Teologia – Lisboa, Vol. XXIX, 1999, Págs. 473 a 485.
91
211
MIRANDA, Jorge. Sobre a relevância constitucional da família in: SCIENTIA IVRIDICA.
Revista de Direito Comparado Português e Brasileiro. Tomo LXIV – n. 338 – Maio /Agosto, 2015,
págs. 271 e 272.
212
O Professor Doutor Carlos Pamplona afirma que “o cônjuge é assim um sucessível legitimário
privilegiado, privilégio acrescido, inclusive, pelo facto de o cônjuge não estar sujeito a colação
(art. 2104) e, por fim, por ter “o direito a ser encabeçado, no momento da partilha, no direito de
habitação da casa de morada de família e no direito de uso do respectivo recheio.
CORTE REAL, Carlos Pamplona. Direito das Sucessões, 2012. Págs. 67 e 68.
92
sem mencionar que essa proteção demasiada à relação conjugal fere o Princípio
da Igualdade213.
213
A respeito desta questão, a título comparativo Brasil e Portugal, destaca-se artigo sobre o
assunto.
BONETTI, Yelba Nayara Gouveia. Necessidade da Igualação da posição do companheiro à do
cônjuge no momento sucessório. in: Termas Controvertidos de Direito das Sucessões o Cônjuge
e o Companheiro: Editora AAFDL, 2015.
214
LOBO, Paulo. Direito das Sucessões. (ebook).
215
“As alterações e evoluções sociais são acompanhadas por modificações e actualizações
constitucionais e o conceito de família patente na Constituição também deve acompanhar essas
evoluções e não continuar a receber um conceito histórico desadequado à realidade social. Por
isso se fala actualmente nas novas formas de família”.
DIAS, Cristina M. Araújo. Da inclusão constitucional da união de facto: nova relação familiar in:
Esyudps de Homenagem ao Prof. Doutor Jorge Miranda. Pág. 454.
216
Há doutrinadores que afirmam que o diferente tratamento do casamento e da união de facto
não viola o princípio da igualdade, tendo em vista que o casamento e a união de facto são
situações materialmente distintas, pois os casados assumem o compromisso de vida em comum,
além de encontrar uma solidariedade patrimonial concretizada no dever de assistência,
cooperação recíproca e responsabilidade comum por dívidas, nomeadamente as contraídas em
decorrência dos encargos normais da vida familiar, o que não seria o caso dos companheiros
em união de facto. Todavia, contrariando esse entendimento, podemos destacar o fundamento
encontrado em algumas jurisprudências (americanas) de que a similitude de características entre
a união de facto e o casamento justifica a aplicação dos princípios que regulam as relações
patrimoniais entre os cônjuges à união de facto. É que assim como no casamento, também na
união de facto a convivência e os comportamentos das partes fazem nascer expectativas de
participação nos respectivos patrimônios. Sendo assim, considera-se que o fato de viverem em
comum as coloca numa situação semelhante ao casamento com os mesmos direitos.
93
Op. Cit.
217
Os doutrinadores brasileiros, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho estabelecem que “A
solidariedade, portanto, culmina por determinar o amparo, a assistência material e moral
recíproca, entre todos os entes familiares, em respeito ao princípio da maior dignidade da pessoa
humana. É ela, por exemplo, que justifica a obrigação alimentar entre parentes, cônjuges ou
companheiros […].”
GAGLIANO, Pablo Stolze e FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, direito de
família, volume 6, 9 ed. São Paulo, Saraiva, 2019. ISBN: 9788553606474 (ebook).
94
que não podemos garantir aos companheiros os mesmos direitos aos quais os
cônjuges possuem? E mais, por que se a família é garantida
constitucionalmente, como pode o legislador ordinário intentar que o conceito de
família seja aquele conceito desatualizado que encontra-se regulado na
legislação civil?
218
As decisões do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem servem muitas vezes de impulso às
reformas legislativas ou jurisprudenciais nos diferentes Estados contratantes. Daí que o
enquadramento jurídico dado pelo Tribunal Europeu às novas formas de família acaba por ter
reflexo na sociedade europeia.
219
Como já afirmado no capítulo anterior, não estamos aqui tratando de uma simples relação de
namoro, ou de uma relação na qual o casal não pretende construir uma família. Aqui é o caso
daquelas relações, que assim como no casamento, pretendem viver efetivamente uma relação
afetiva familiar sem a necessidade de se submeterem a formalidade do casamento.
220
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. Direito da Família. Tópicos para uma reflexão crítica. 2ª ed.
actual. Lisboa: AAFDL, 2011. Pág. 153.
95
221
Cid. Nuno Salter de. A comunhão de vida à margem do casamento: entre o facto e o direito:
Editora Almedina, 2005.
222
Art. 8º, Lei n.º 7/2001, 1- A união de facto dissolve-se: a) Com o falecimento de um dos
membros.
Lei n.º 7/2001.
96
não há como não ponderar que mesmo com algumas disposições, o legislador
manteve a omissão concernente ao estatuto pessoal e patrimonial dos membros
da união de facto.
223
Dispõe o art. 65, n.º 1 da CRP que, “Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma
habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a
intimidade pessoal e a privacidade familiar”.
Constituição da República Portuguesa.
224
Cid, Nuno Salter. A Proteção da Casa de Morada da Família no Direito Português: Editora
Almedina, Coimbra, 1996, Pág. 31.
225
Nesse sentido, cumpre colacionar decisão do Tribunal da Relação de Coimbra sobre o
assunto: “A casa de morada de família consubstancia a sede da vida familiar em condições de
habitabilidade e de continuidade, o centro da organização doméstica e social da comunidade
familiar”.
Ac. TRC. Processo n.º: 677/13.7TBACB.C1 de 28-06-2016. Disponível em: www.dgsi.pt.
97
Por outro lado, no art. 5º e seus incisos, da Lei n.º 7/2001, de 11 de maio,
encontra-se regulado a proteção da casa de morada da família nos casos de
dissolução da união de facto por falecimento de um dos membros. Nestas
situações, regulamentam-se regimes distintos na hipótese de a casa de morada
seja bem próprio do decujus ou compropriedade de ambos os conviventes, ou
ainda se se trate de um imóvel arrendado.
Insta salientar que o referido artigo estabelece que no caso dos membros
da união de facto serem comproprietários da casa de morada e do respectivo
recheio, restará ao companheiro sobrevivo os já citados direitos de forma
exclusiva, na forma do disposto nos números 1 e 2 do artigo, pelo que inexiste
fundamento legal para uma prestação pecuniária pela utilização da casa
enquanto o companheiro seja titular de um direito real de habitação (n.º 3) 226.
226
Vale destacar que não poderá ser incumbida a casa de morada da família a um dos
companheiros da união de facto, a seu pedido, se o outro apenas detiver o bem em
compropriedade com terceiros, como por exemplo, compropriedade com os seus filhos de um
99
casamento ou união anterior. Nesse caso, não há como impor judicialmente a constituição de
um arrendamento a pessoa estanha à relação fática.
227
À semelhança com o casamento, art. 2103.º-A do CCP, salvo nos casos previstos no n.º 2 do
artigo 1093 do CCP.
228
“...X- O legislador de 2010, tendo em atenção que a atribuição deste direito real onera o direito
de propriedade dos sucessores do membro da união de facto falecido, numa composição de
interesses contrapostos, entendeu excluir aquele direito nas situações em que o membro
sobrevivo dispunha de uma casa própria, com uma localização próxima, onde podia estabelecer
a sua habitação”.
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra. Processo n.º 1267/10.1TBCBR.C1, de 19/02/2013,
disponível em: www.dgsi.pt.
100
caso vivam com ele e, no caso de filhos comuns, deverá seguir o seu genitor que
se tornou titular do direito em questão.
229
COELHO, Francisco Pereira e OLIVEIRA, Guilherme de. Curso de Direito da Família.
Introdução Direito Matrimonial, volume I, 5ª ed. Coimbra, 2016. Pág 98.
230
A Constituição da República prevê os princípios do sistema público de solidariedade e da
segurança social, assim como as iniciativas privadas com fins análogos e, estes, encontram-se
resguardados na Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, as bases gerais do sistema de segurança
social.
101
231
Dispõe o art. 3º, da Lei n.º 7/20001, que: As pessoas que vivem em união de facto nas
condições previstas na presente lei têm direito a: e) Proteção social na eventualidade de morte
do beneficiário, por aplicação do regime geral ou de regimes especiais de segurança social e da
presente lei; f) Prestações por morte resultante de acidente de trabalho ou doença profissional,
por aplicação dos regimes jurídicos respectivos e da presente lei; g) Pensão de preço de sangue
e por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País, por aplicação dos regimes jurídicos
respectivos e da presente lei.
232
“Pensões de sobrevivência são prestações pecuniárias que têm por objetivo compensar os
familiares do beneficiário da perda dos rendimentos de trabalho determinada pela morte deste
(art. 4º, n.º 1), destinando-se a compensar o acréscimo dos encargos decorrentes da morte do
beneficiário, tendo em vista facilitar a reorganização da vida familiar (n.º 2).
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Op.cit. Pág. 256.
102
233
A jurisprudência não era unânime quanto ao sistema de acessão às prestações da segurança
social por morte de um dos seus beneficiários, quando era o caso de uma união de facto. Uma
corrente entendia que era necessário ao membro sobrevivo intentar com duas ações, uma contra
a herança do falecido beneficiário em que não lhe fosse reconhecido o direito a alimentos por
insuficiência dessa herança, e outra contra a instituição de segurança social. Nesse sentido
foram as decisões do Tribunal da Relação de Lisboa de 30.11.95 / 18.04/96, assim como a
jurisprudência do Tribunal da Relação do Porto de 13.01.97, “...estabelecendo que a lei exige
sentença judicial transitada, quer para a autora demonstrar que tem direito a alimentos da
herança, quer para provar que nesta não existem bens e, no último caso, exige nova sentença
transitada a declarar que a autora tem direito às prestações...”.
Em contrapartida, a outra corrente, entendia que bastava o pleito de uma só ação para o
reconhecimento da já citada pensão de sobrevivência. Em outras palavras, ou o companheiro
pleiteava contra herança, no caso de a ação reconhecer o direito alimentos, ou somente contra
a instituição de Seguridade Social. Sendo assim, cumpre colacionar decisão do Tribunal da
Relação de Évora, de 05.12.96, ao estabelecer que: ”...basta a propositura de uma ação para o
reconhecimento do direito à pensão de sobrevivência – se reconhecido por sentença o direito a
alimentos da herança. Em ação contra ela instaurada, comprovados estão todos os requisitos
para atribuição da pensão de sobrevivência; se a herança não tiver bens ou se forem
insuficientes, bastará a instauração de ação contra a instituição de segurança social...”.
Op. Cit. Págs. 258 a 260.
234
O legislador nesse inciso somente confirmou o que já havia dito no inciso anterior. Para Pitão,
houve uma duplicação inexplicável e desnecessária nos números 2 e 3 transcritos.
OP. Cit. Pág. 266.
235
Nesse inciso, trata-se da questão fundamental quanto a desnecessidade de propositura de
duas ações distintas.
103
Numa via mais protetiva, a solução regulada pelo novo art. 6.º, n.º 1 da
Lei 7/2001, com a redação alterada pela Lei n.º 23/2010, de 30 de agosto,
dispensa a necessidade alimentos e, aceita que o companheiro sobrevivo
recorra às instituições competentes em busca das pensões por morte do
companheiro, ao afirmar que: “o membro sobrevivo da união de facto beneficia
dos direitos previstos nas alíneas e), f) e g) do artigo 3.º, independentemente da
necessidade de alimentos”.236
236
Ressalta-se que somente com a alteração em 2010 foi eliminada a remissão ao art. 2020 do
CCP, motivo de confusão tendo em vista a possibilidade união de facto homoafetiva, anterior a
previsão do casamento homoafetivo.
104
A alínea f), do art. 3.º, da LUF, estabelece a pensão por morte decorrente
de acidente de trabalho ou doença profissional, regulamentada com a nova
redação da lei em 2010.
237
PITÃO. Op. Cit. Págs. 273 a 274.
105
238
Dispõe a citada lei n.º 4/2007, art. 107: “A lei estabelece o regime jurídico da proteção
obrigatória em caso de acidente de trabalho, definindo os termos da respetiva responsabilidade”.
Disponível em: dre.pt.
106
A citada lei traz na divisão III a respeito das prestações por morte e,
segundo o art. 57, alínea a), “são titulares do direito à pensão por morte, pessoa
com ele viva em união de facto”239.
239
Sobre o assunto, cumpre colacionar decisão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24.04.2016,
que estabelece: “I- É através da Lei nº 7/2001 de 11/5 (Lei de Proteção das Uniões de Facto),
com redação dada pela lei nº 23/2010 de 30/8, que se afere quais os casos em que, embora
possa haver uma situação de vivência em união de facto, a mesma não é juridicamente
reconhecida. II- Dos arts. 2º-c) e 3º-f) da Lei nº 7/2001decorre que só existe união de facto
juridicamente relevante quando duas pessoas vivam em condições análogas aos dos cônjuges
e desde que nenhuma delas tenha o estado civil de casado ou e casado não separado
judicialmente de pessoas e bens. III- Sendo o casamento de um dos membros da união de facto
uma das causas de dissolução da união de facto (art. 8º-c) da Lei nº 7/2001) mal se
compreenderia que a união de facto pudesse juridicamente existir tendo no seu seio um dos seus
membros no estado de casado com terceiro. IV- Para efeitos do disposto nos arts. 57º, 59º e 65º
da LAT/2009, não é beneficiária legal de sinistrado falecido em acidente de trabalho quem com
este vivia em condições análogas aos dos cônjuges, sendo o sinistrado casado com terceira
pessoa, à data da sua morte. Processo n.º 36/13.1TTLSB.L1-4, de 20/04/2016. Disponível em:
www.dgsi.pt.
240
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Op.cit. Págs. 280 a
282.
241
O art. 65 dispõe sobre o subsídio por morte; e o art. 66 regula o subsídio por despesas de
funeral.
Lei n.º 98/2009. Disponível em: dre.pt.
107
242
Essa disposição foi introduzida pela Lei n.º 23/2010, de 30 de agosto, que alterou a anterior
redação do Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de novembro, na qual estabelecia: “Aquele que, no
momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, viva
com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges, tem direito a exigir
alimentos da herança do falecido, se os não puder obter nos termos das alíneas a) a d) do artigo
2009”.
Código Civil Português.
108
Dispõe o art. 2003.º, n.º 1, do CCP, que alimentos é tudo aquilo que for
indispensável ao sustento, habitação e vestuário. Quanto a medida dos
alimentos, regulamenta o art. 2004.º, n.º 1, do CCP, que aqueles serão prestados
de forma proporcional, observando o binômio necessidade-proporcionalidade,
sob a análise da necessidade do alimentando e em caso de possibilidade do
alimentante.
243
Sobre o assunto, José António Pitão cita em sua obra, decisão do Tribunal da Relação do
Porto que estabeleceu que “a herança indivisa não deve ser onerada com o encargo de
pagamento de alimentos À companheira do autor da herança, que com ele viveu em união de
facto, quanto resulte prejuízo grave para herdeiros legitimários do falecido”.
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Op.cit. Pág. 187.
109
244
COELHO, Francisco Pereira e OLIVEIRA, Guilherme de. Curso de Direito da Família.
Introdução Direito Matrimonial, volume I, 5ª ed. Coimbra, 2016. Pág. 97.
245
Nesse caso, “introduz-se, assim, uma cláusula geral de limitação e exceção do benefício de
alimentos, que permitirá à jurisprudência aferir a relevância ou não dos factos alegados por
aquele que esteja obrigado a prestar os alimentos”.
PITÃO. José António de França. União de Facto no Direito Português. Op.cit. Pág. 194.
110
246
PINHEIRO, Jorge Duarte. Direito das Sucessões, 2019. Pág. 74 a 78.
247
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. Curso de Direito das Sucessões, 2012. Pág. 43.
111
Contudo, analisaram essa perspectiva não somente pelo dano à própria vítima,
como também, pelo dano moral sofrido pelo terceiro, sendo um dano próprio,
que surgiu em decorrência da morte da vítima 248.
O art. 496.º, n.º 3 do CCP, alterado pela Lei n.º 23/2010, de 30 de agosto,
superou a antiga redação legal ao trazer como beneficiário desse direito a
indenização, aquele que ainda é muito negligenciado quando constatamos os
direitos resultantes da relação afetiva249. Esse artigo atribuiu ao membro
sobrevivo da união de facto (legatário legítimo), o direito a indenização pela
morte do seu companheiro, nos mesmos moldes do cônjuge sobrevivo. Vale
ressaltar, que o art. 495.º, n.º 3, estabelece que o convivente sobrevivo possui
direito a uma indenização por danos patrimoniais, se o falecido lhe prestava
alimentos.
248
Art. 496, n.º 4, segunda parte do CCP.
249
Nesse sentido, cabe mencionar o acórdão n.º 275/2002 da 2ª Secção do Tribunal
Constitucional, em 19.6.2002, que julgou inconstitucional, por violação ao art. 36, n.º 1, da CRP,
em conformidade com o princípio da proporcionalidade, o dispositivo do art. 496, n.º 2, do CCP,
no trecho em que, no caso de morte da vítima de um crime doloso, exclui a atribuição de um
direito de “indenização por danos não patrimoniais pessoalmente sofridos pela pessoa que
convivia com a vítima em situação de união de facto, estável e duradoura em condições análogas
às dos cônjuge”. Esse acórdão considerou ainda violação ao princípio da igualdade, regulado no
art. 13 da CRP, concluindo que “as disposições relativas ao casamento seriam virtualmente
aplicáveis à união de facto, não podendo o legislador, sem uma justificativa razoável, desproteger
a união de facto em face do casamento”.
COELHO, Francisco Pereira e OLIVEIRA, Guilherme de. Curso de Direito da Família. Introdução
Direito Matrimonial, volume I, 5ª ed. Coimbra, 2016. Pág 103.
112
Para terminar, podemos concluir que embora a Lei n.º 7/2001 e suas
alterações, tenha regulado direitos decorrentes da relação fática ao conceder
alguns efeitos patrimoniais resultante da morte do membro da união de facto,
confirmamos, diante de todo o exposto, que há uma grande omissão legislativa,
seja, por não dispor no Código Civil Português a união de facto como fontes das
relações jurídicas familiares; seja, por não garantir direitos de acordo com a
realidade e problemática da união de facto; seja, por não estabelecer efeitos
patrimoniais semelhantes ao casamento; e, seja, por não regulamentar o
companheiro como herdeiro, pois, para efeitos sucessórios, tratou o convivente
como qualquer outro estranho, sendo visto como elemento externo.
250
São legatários legítimos da indenização o cônjuge não separado de pessoas e bens, ou o
membro da união de facto, os filhos ou outros descendentes; os pais ou outros ascendentes; os
irmãos ou sobrinhos que os representem. Vale ressaltar que nesse caso a ordem dos legatários
é própria.
113
251
CANOTILHO, Gomes e MOREIRA Vital. Constituição da República Portuguesa Anotada –
Volume I, 4ªed: Coimbra Editora, 2007, Págs. 856 e 857.
252
CORTE-REAL, Carlos Pamplona.
114
253
A respeito da decisão em questão e sobre a efetividade das decisões de inconstitucionalidade
dos Tribunais Constitucionais (em Portugal o Tribunal Constitucional, no Brasil o Supremo
Tribunal Federal), cabe destacar as palavras do Doutor Professor Carlos Blanco: “Os tribunais
com funções de controlo de constitucionalidade nasceram idealisticamente como um poder
independente e imparcial, pese a sua natureza de jurisdição de cunho político, para defender as
normas constitucionais em relação a violações oriundas do poder político, mormente para o
legislativo”.
MORAIS, Carlos Blanco de. As mutações constitucionais de fonte jurisprudencial: a fronteira
crítica entre a interpretação e a mutação in: Mutações constitucionais. Coord: Gilmar Ferreira.
115
Mendes e Carlos Blanco de Morais, São Paulo: Editora Saraiva, 2016. ISBN 978-85-472-00639-
0 (ebook).
254
Contudo, embora não houvesse ainda reconhecimento constitucional, a jurisprudência já
admitia direito aos conviventes, como os concubinos. Ex: Súmula 380 também do STF, de
03/04/1964, que estabelecia: Comprovada a existência de sociedade de fato entre os
concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo
esforço comum.
255
Foi nesse sentido que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu o seguinte artigo: Art. 226.
A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é civil e
gratuita a celebração. § 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º Para
efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como
entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. § 4º Entende-se, também,
como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. § 5º
Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e
116
pela mulher. § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. § 7º Fundado nos princípios
da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre
decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o
exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou
privadas. § 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a
integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
Constituição da República Federativa do Brasil.
256
AZEVEDO, Álvaro Villaça. Curso de direito civil: direito de família – 2. Ed, São Paulo: Editora
Saraiva Educação, 2019. ISBN 9788553609673 (ebook).
257
Ressalta-se que não é recomendado o uso da expressão concubinato puro. Atualmente, o
termo tido como correto é união estável, que encontra-se em conformidade com o Código Civil
Brasileiro de 2002.
258
Todavia, vale ressaltar, que anteriormente a previsão do texto na Constituição e da Lei n.º
8.971/94, que surgiu para dar efetividade ao dispositivo constitucional, a primeira norma a tratar
do assunto foi o Decreto-lei n.º 7.036, de 10 de novembro de 1944, que reconheceu a
companheira como beneficiária da indenização no caso de acidente de trabalho de que foi vítima
o companheiro. E, nesse seguimento, destaca-se a Lei n.º 6015/1973, Lei de Registros Públicos,
que no art. 57, §2º, passou a admitir a possibilidade da companheira usar o sobrenome do
companheiro; Outrossim a Lei n.º 5.478/1968, Lei de Alimentos, que garantia direito a alimentos
aos companheiros.
117
sobrevivo ter colaborado com os bens deixados pelo decujus, aquele teria direito
à metade dos bens.259
Após a edição da Lei n.º 8.971/94, foi a vez da Lei n.º 9.278 de 10 de
maio de 1996, Lei da União Estável, baseada em um projeto idealizado pelo
Professor Álvaro Villaça Azevedo, que regulamentou a união estável para que
não existissem abusos entre os companheiros, que em sua opinião, deveriam
ser livres na convivência, porém com responsabilidades. E, quanto a revogação
da primeira lei após a promulgação da segunda lei, o entendimento do professor,
que foi balizado por doutrina e jurisprudência, era de que a segunda não havia
revogado a anterior, apenas derrogado, ocorrendo uma aplicação conjunta
dessas duas normas naquilo que não fosse incompatível.
259
Quanto a exigência do prazo mínimo de 5 anos, destaca-se súmula do Supremo Tribunal
Federal, de 3/4/1964, n.º 382, que dispensava o requisito da convivência more uxorio sob o
mesmo teto. Nesse sentido, era o entendimento doutrinário de que a exigência quanto ao prazo
não possuía incidência prática por conta da súmula aprovada. Disponível em: stf.jus.br.
260
A primeira lei trouxe a denominação “companheiro” e a segunda lei estabeleceu a palavra
“convivente”. Hoje entendemos como sinónimos e, todas elas, foram utilizadas no decorrer do
trabalho como definição para aquela pessoa que se encontra numa relação fática.
118
261
De acordo com este artigo, encontra-se a forma de dissolução da relação fática através de
“rescisão” e, este termo, significava desfazimento culposo da relação. Desse modo, a segunda
lei sobre a união estável, aplicava a ideia de culpa como fundamento para o dever de prestar
alimentos entre os membros da relação fática, assim como a Lei do Divórcio, lei n.º 6.515/1977,
exigia a culpa para determinar os alimentos nos casos de dissolução do casamento.
262
Esse direito será analisado em tópico próprio ao tratar dos direitos sucessórios dos
companheiros.
263
No Brasil, a corrente que defendia que a união de pessoas do mesmo sexo constitui uma
entidade familiar, foi encabeçada pela Desembargadora aposentada do TJ/RS, atualmente
advogada, Maria Berenice Dias, que sempre inovou e defendeu a aplicação, por analogia, das
mesmas regras previstas para a união estável.
119
sexo também. Aduz os Professores Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, que “no
sistema aberto, inclusivo e não discriminatório inaugurado a partir da
Constituição de 1988, espaço não há para uma interpretação fechada e
restritiva”264.
Por consequência, cabe aqui destacar que pelo fato de o dispositivo legal
não ter sofrido alteração relativamente a união estável ser uma convivência entre
pessoas, sejam elas de sexo diferente ou não, desencadeou diversas ações
judiciais decididas pelas Cortes Superiores, tendo em vista a discriminação do
artigo em não proteger a união estável homoafetiva265. Nesse sentido, destaca-
se a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 132, do Rio de
Janeiro, proposta pelo então governador do Estado à época e, a Ação Direta de
Inconstitucionalidade n.º 4277, do Distrito Federal, proposta pela Procuradoria
Geral da República, no histórico julgamento conjunto ocorrido em 5 de maio de
2011, que tiveram como Relator o Ministro Ayres Britto e, como objeto, o
requerimento da aplicação analógica do art. 1.723 do CC brasileiro às uniões
homoafetivas, baseado na nominada “interpretação conforme a Constituição”,
observando a inconstitucionalidade do artigo e o reconhecimento jurídico da
união homoafetiva, alegando a violação aos seguintes preceitos fundamentais
constitucionais: direito a igualdade (art. 5º, caput); direito a liberdade (art. 5º, II);
o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III); e o princípio da
segurança jurídica (art. 5º, caput).266
264
GAGLIANO, Pablo Stolze e FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil, vol. 6, 9ª
ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2019. ISBN 9788553606474 (ebook).
265
A decisão que deu início a afirmação dos direitos homoafetivos foi determinada pelo Superior
Tribunal de Justiça, no ano de 2008, sustentando que a união homoafetiva deveria ser
reconhecida como entidade familiar. Cumpre colacionar a referida decisão: “… onde se pretende
a declaração de união homoafetiva, não existe vedação legal para o prosseguimento do feito…É
possível, portanto, que o magistrado de primeiro grau entenda existir lacuna legislativa, uma vez
que a matéria conquanto derive de situação fática conhecida de todos, ainda não foi
expressamente regulada. Ao julgador é vedado eximir-se de prestar jurisdição sob o argumento
de ausência de previsão legal. Admite-se, se for o caso, a integração mediante o uso de analogia,
a fim de alcançar casos não expressamente contemplados… (STJ, REsp 820475/RJ,
02.09.2008). Disponível em: stj.jusbrasil.com.br.
266
Ementa: 1. Arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). Perda parcial de
objeto. Recebimento, na parte remanescente, como ação direta de inconstitucionalidade. União
homoafetiva e seu reconhecimento como instituto jurídico. Convergência de objetos entre ações
de natureza abstrata. Julgamento conjunto. Encampação dos fundamentos da ADPF nº 132-RJ
pela ADI nº 4.277-DF, com a finalidade de conferir “interpretação conforme à constituição” ao art.
1.723 do Código Civil. Atendimento das condições da ação ... 2. Proibição de discriminação das
pessoas em razão do sexo, seja no plano da dicotomia homem/mulher (gênero), seja no plano
da orientação sexual de cada qual deles. A proibição do preconceito como capítulo do
120
Não caracteriza uma união estável, uma relação entre duas pessoas que
namoravam há cerca de oito anos e que não chegaram a constituir família. Nesse
caso, mesmo que houvesse um relacionamento amoroso público, contínuo e
duradouro, faltou um requisito essencial que era o objetivo de constituir família
(Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Processo: 70008361990, de
13.08.2004). O que podemos vislumbrar desse julgado, é que o objetivo de
constituir família é essencial para que haja a configuração da união estável, o
mero namoro longo, em que não haja intuito de constituir família, não configura
união estável.
269
GAGLIANO, Pablo Stolze e FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil, vol. 6, 9ª
ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2019. ISBN 9788553606474 (ebook).
270
STJ, REsp 1.454.643/RJ; STJ, REsp 1.263.015/RN. Disponíveis em: stj.jusbrasil.com.br.
271
VELOSO, Zeno. É namoro ou união estável?, 2016. Disponível em: www.ibdfam.org.br.
272
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito de família – v. 5, 14ª ed., Rio de Janeiro: Editora
Forense, 2019, Pág. 358.
122
273
O art. 1521 estabelece aquelas pessoas que não podem se casar e, de acordo com o §1º do
art. 1723, também estão impedidas de constituírem uma união estável: 1- os ascendentes com
os descendentes, seja no parentesco natural ou civil; 2- os afins em linha reta; 3- o adotante com
quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante; 4- os irmãos , unilaterais
ou bilaterais, e demais colaterais até o terceiro grau; 5- o adotado com o filho do adotante; 6- as
pessoas casadas (exceto os separados de fato, judicial ou extrajudicialmente); 7- o cônjuge
sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte.
Código Civil Brasileiro.
274
Destaca-se o posicionamento de Maria Berenice Dias a respeito do assunto, ao estabelecer
que: “Em que pese a proibição legal, se ainda assim a relação se constitui, não é possível dizer
que ela não existe...Negar-lhe a existência em face do impedimento é atitude meramente
punitiva. Rejeitar qualquer efeito a esses vínculos e condená-los à invisibilidade gera
irresponsabilidades e enriquecimento ilícito em desfavor do outro…Com ou sem impedimentos
à sua constituição, entidades familiares que se constituem desfocadas do modelo oficial
merecem proteção como núcleo integrante da sociedade”.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 12ª edição revista, atualizada e ampliada,
Editora Revista dos Tribunais. 2017, Págs. 263 e 264.
123
Outro efeito pessoal que a lei civil não regulamentou na união estável,
foi referente ao estado civil dos companheiros. Porém, embora não haja um
elemento objetivo definindo seu início, não é por isso que não há como produzir
as consequências jurídicas desde a sua constituição276.
Seguindo com a lei civil, o art. 1.725 do CC/2002, trata dos efeitos
patrimoniais dos companheiros, ao regulamentar que em uma união estável,
salvo estipulação contrária em contrato (de convivência no Brasil, e de
coabitação em Portugal) pelos companheiros, será atribuído o regime de
comunhão de bens parcial nas relações fáticas 277.
275
STJ, REsp 1.306.196/MG, de 22/10/2013. Disponível em: stj.jusbrasil.com.br.
276
O Código de Processo Civil brasileiro, regulamenta no art. 319, II, que na petição inicial deverá
ser indicado se a parte vive em união estável.
Código de Processo Civil Brasileiro.
277
O Regime de comunhão de bens parcial encontra-se regulamentado nos artigos 1.658 a 1.666
do Código Civil. Nesse seguimento, cabe destacar ainda dois enunciados das Jornadas de
Direito civil, do Conselho da Justiça Federal, sobre o assunto: n.º 115 – “Há presunção de
comunhão de aquestos na constância da união extramatrimonial mantida entre os companheiros,
sendo desnecessária a prova do esforço comum para se verificar a comunhão de bens”; n.º 346
– “Na união estável o regime patrimonial obedecerá à norma vigente no momento da aquisição
de cada bem, salvo contrato escrito”. Disponíveis em: cfj.jus.br.
278
STJ – REsp 1.459.597/SC. Disponível em: stj.jusbrasil.com.br
124
279
Sobre o assunto, Enunciado n.º 526 das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça
Federal: “É possível a conversão de união estável entre pessoas do mesmo sexo em casamento,
observados os requisitos exigidos para a respectiva habilitação”. Disponível em: cfj.jus.br.
280
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 12ª edição revista, atualizada e
ampliada, Editora Revista dos Tribunais. 2017, Pág. 277.
125
Vale ressaltar que hoje a realidade é bem distinta, tendo em vista que
com a possibilidade do divórcio, a união estável que era constituída por falta de
opção, passou a ser reconhecida como verdadeira escolha de constituição
familiar, aplicada por aqueles casais que desejam constituir uma família sem a
necessidade da formalidade do matrimônio.
Sabemos que o anterior Código Civil, de 1916, estabelecia para que uma
relação fosse percebida como familiar, a necessidade de que a constituição da
relação decorresse do casamento. Anteriormente, o matrimônio era a única
forma de constituição familiar respeitada e aceita pela sociedade e pela lei 282.
281
BARROSO, Luís Roberto. Voto da decisão RE n.º 878.694/MG. Disponível em: redir.stf.jus.br.
282
“No Código Civil de 1916, a família somente se constituía pelo casamento. Esta devia se
manter coesa, como uma unidade que se legitimava por si mesma. Neste cenário, a proteção
atribuída à família tinha por finalidade afastar toda e qualquer ameaça à estrutura familiar,
justificando a indissolubilidade do vínculo matrimonial, a chefia da sociedade conjugal exercida
pelo marido, enquanto a mulher casada era incluída no rol dos relativamente incapazes, e a
discriminação dos filhos não matrimoniais”.
NEVARES, Ana Luiza Maia. A tutela sucessória do cônjuge e do companheiro na legalidade
constitucional, Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2004, Pág. 187.
127
283
Nas palavras de Paulo Lobo, “a família, tutelada pela Constituição, está funcionalizada ao
desenvolvimento da dignidade das pessoas humanas que a integram. A entidade familiar não é
tutelada para si, senão como instrumento de realização existencial de seus membros”.
LOBO, Paulo. Direito Civil – Famílias 10ª ed. São Paulo; Saraiva, 2020. ISBN: 9788553616893
(ebook).
284
TEPEDINO, Gustavo. O Novo Código Civil: duro golpe na recente experiência constitucional
brasileira. in: ____. Temas de direito civil, Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2006.
285
Ressalta-se que nesse sentido é o nosso posicionamento nos capítulos anteriores quando
desenvolvemos os institutos da união de facto e do casamento em Portugal. Nos filiamos ao
entendimento doutrinário de que a Constituição da República Portuguesa regulamentou no art.
36, a aceitação de outras formas de constituição da família além do casamento. E, do mesmo
modo, o Código Civil Português não observou as disposições constitucionais de aceitação da
relação fática, não determinando de forma expressa a união de facto como fontes das relações
jurídicas familiares no art. 1576º do CCP.
128
286
Vale ressaltar um exemplo de um posicionamento a respeito da supremacia do casamento na
constituição da família. Nesse sentido, foi o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de São
Paulo, “há erro de perspectiva na afirmação de que a Constituição da República equiparou o
concubinato à família. Não houve equiparação, já que não foi abolido o casamento como base
legal da constituição da família (…) O texto constitucional não usou a expressão equiparar em
seu art. 226. A família continua sendo a base da sociedade e, o casamento, a base da
constituição da família. Apenas reconheceu para efeito da proteção do Estado a união estável
entre o homem e a mulher como entidade familiar, programando a facilitação do casamento.
Manteve, portanto, a distinção entre casamento e acasalamento”.
NEVARES, Ana Luiza Maia. A tutela sucessória do cônjuge e do companheiro na legalidade
constitucional, Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2004, Pág. 196.
287
Destaca-se que a jurisprudência, antes mesmo da CF/88, era constantemente acionada para
solucionar questões relativas aos direitos dos conviventes, à época denominados concubinos.
Um exemplo é a Súmula 35 do Supremo Tribunal Federal, em 13/12/1963, que regulava: “Em
caso de acidente do trabalho ou de transporte, a concubina tem direito se der indenizada pela
morte do amásio, se entre eles não havia impedimento para o matrimônio”. Disponível:
lexml.gov.br.
129
garantindo, com muita parcimônia, direitos aos conviventes, inclusive, com base
na Lei n.º 6.858/80, a condição de dependente, pelo menos para créditos de
natureza previdenciária288, faz-se necessário mencionar ainda, que
anteriormente a esta lei, já havia a previsão do Decreto-Lei 7.036/1944 que
concedeu a companheira benefício no caso de acidente de trabalho de que foi
vítima o seu companheiro.
288
GAGLIANO, Pablo Stolze e FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil, volume 7:
direito das sucessões, 6ª ed., São Paulo: Editora Saraiva Educação, 2019 (ebook).
289
No art. 2º da Lei, foi atribuído ao companheiro sobrevivente que não constituísse uma nova
união, o direito ao usufruto de quarta parte dos bens do falecido, no caso de haver filhos deste
ou em comum (inciso I). No caso de não haver filhos e embora sobrevivam ascendentes do
falecido, o usufruto legal recairia sobre a metade dos bens, desde que o convivente sobrevivo
não constituísse uma nova união (inciso II). E, na possibilidade de não haver descendentes e
nem ascendentes ao companheiro caberia a totalidade da herança. O art.3º regulamentou que
quando os bens deixados pelo falecido resultar de esforço comum, caberia ao convivente,
metade dos bens.
Lei n.º 8.971/1994.
130
290
Nesse sentido, cabe ressaltar julgado sobre o assunto: “Com a entrada em vigor da Lei
9.278/1996 não foi revogado o art. 2º da Lei 8.971/1994 que garante à companheira sobrevivente
direito à totalidade da herança quando inexistirem ascendentes e descendentes. Quanto aos
direitos do companheiro sobrevivente, não há inconstitucionalidade entre a Lei 9.278/1996 e a
Lei 8.971/1994, sendo possível a convivência dos dois diplomas. (STJ, REsp 747.619/SP, Rel.
Ministra Nancy Andrighi, 07.06.05. Disponível em: stj.jusbrasil.com.br.
291
O entendimento dos doutrinadores era de que as leis anteriores possuíam a clara intenção de
equiparar a situação dos cônjuges e dos companheiros. Todavia, lecionou Sílvio Rodrigues: “Em
suma, o Código Civil regulou o direito sucessório dos companheiros com enorme redução, com
dureza imensa, de forma tão encolhida, tímida e estrita, que se apresenta em completo divórcio
com as aspirações sociais, as expectativas da comunidade jurídica e com o desenvolvimento de
nosso direito sobre a questão. Não tenho dúvida em dizer que o art. 1.790 terá vida muito breve,
isto se não for alterado durante a vacacio legis do Código”.
RODRIGUES, Silvio. Direito civil, vol. 7, de acordo com o novo Código Civil, 2002. Págs. 119 e
120.
131
Desse modo, o art. 1.790 do Código Civil que regula o direito dos
conviventes deveria estar no Título II que corresponde à sucessão legítima,
assim como é o caso dos cônjuges (art. 1.829, CC). Ocorre que, a má
organização do legislador a respeito do art. 1.790 não é o único fato que merece
ser destacado relativamente à discriminação, pois o principal é analisar o texto
aprovado.
292
“O Código Civil de 2002 não foi capaz de acompanhar essa evolução no tratamento do regime
sucessório aplicável aos companheiros e aos cônjuges”.
BARROSO, Luís Roberto. Voto da decisão RE n.º 878.694/MG. Pág. 10. Disponível em:
redir.stf.jus.br.
132
293
Destaca-se que o direito dos companheiros existe sempre, independentemente do regime de
bens.
294
Nas palavras de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, a disciplina apresentada com o Código
Civil de 2002 acerca da sucessão pelo companheiro foi confusa. Ao inserir o regramento na parte
das “Disposições Gerais” foi realizado de maneira formalmente atécnica e topologicamente
equivocada, uma vez que a matéria é típica da regulamentação da sucessão legítima, e não da
parte introdutória, o que talvez insira um preconceito sub-reptício em face da união estável.
GAGLIANO, Pablo Stolze e FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil, volume 7:
direito das sucessões, 6ª ed., São Paulo: Editora Saraiva Educação, 2019 (ebook).
295
Destaca-se que a existência da meação e a sua extensão depende do regime de bens
escolhido pelo casal no casamento. Somente no caso do regime de separação convencional de
bens (arts. 1.677 e 1.678, CCB) o cônjuge não recebe a meação, pois não há bens comuns entre
o casal. Nos demais regimes de bens, ao cônjuge sobrevivo corresponderá a metade dos bens,
que será distribuída da seguinte forma: se o regime for de comunhão universal de bens (arts.
1.667 a 1.671), a meação é estabelecida sobre a totalidade dos bens que correspondem ao
133
acervo hereditário; se for o regime de comunhão parcial de bens (arts. 1.658 a 1.666), a meação
é definida sobre os bens adquiridos durante o período da vida em comum; se for o caso do
regime de participação final nos aquestos (arts. 1.672 a 1.686), calcula-se a meação sobre os
bens que foram adquiridos a título oneroso na constância do casamento.
Código Civil Brasileiro.
296
HINORAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Posição sucessória do companheiro (membro
da união de facto/união estável) nos direitos brasileiro e português in: Escritos de Direito das
Famílias: uma perspectiva luso-brasileira / Coordenado por: Maria Berenice Dias e Jorge Duarte
Pinheiro, Porto Alegre: Editora Magister, 2008. Pág. 437.
134
297
Nesse dispositivo, verifica-se que o legislador concedeu um tratamento preferencial ao
companheiro sobrevivo no caso da concorrência com filhos comuns, sem nenhum fundamento
para tanto. Diante dessa situação, por consequência da distinção apresentada, observa-se que
no caso de uma situação híbrida, casal de conviventes que possui filhos comuns e filhos somente
do falecido, a lei civil não regulou essa circunstância, gerando mais uma controvérsia
relativamente ao dispositivo que trata da sucessão dos companheiros.
298
Segundo o art. 1.833, entre os descendentes, os de grau mais próximo, exclui os remotos,
com exceção ao direito de representação. E os descendentes de mesma classe possuem os
mesmos direitos à sucessão dos seus antecedentes (art. 1.834).
Código Civil Brasileiro.
135
DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões, 4ª ed. rev., atual. E ampl. – São Paulo: Editora
299
da herança. Não importa nem quem são e nem quantos são os herdeiros,
sempre ficarão com o dobro da herança que cabe ao companheiro.
300
VELOSO, Zeno. A história de Nagibão e o art. 1.790 do Código Civil, 2018. Disponível em:
ibdfam.org.br/artigos.
137
Segundo o art. 1.847, a legítima é calculada sobre o valor dos bens que
existir no momento da abertura da sucessão, excluídas as dívidas e as despesas
com funeral e, salvo houver justa causa, não pode o testador atribuir cláusula de
inalienabilidade, impenhorabilidade ou incomunicabilidade nos bens da legítima
(art. 1.848).
301
Nas palavras do professor Zeno Veloso: “A lei não está imitando a vida, nem está em
consonância com a realidade social, quando decide que uma pessoa que manteve a mais íntima
e completa relação com o falecido, que sustentou com ele uma convivência séria, sólida,
qualificada pelo animus de constituição de família, que com o autor da herança protagonizou, até
a morte deste, um grande projeto de vida, fique atrás de parentes colaterais dele, na vocação
hereditária”.
VELOSO, Zeno. Do direito sucessório dos companheiros in: Direito de família e o novo código
civil, Coord. Maria Berenice Dias; Rodrigo da Cunha Pereira, 2005. Pág. 249.
138
Por fim, verifica-se que diante das situações mencionadas, o que mais
surpreende é o fato de a lei ter tratado de forma desigual situações que são
idênticas, resultando em consequências que afastam o desejo daquelas pessoas
que somente querem ter uma relação respeitada e garantia quanto aos direitos.
Se a Carta Maior garantiu tratamento isonômico aos institutos do casamento e
da união estável, e a lei civil assegura a possibilidade de eleição de regime de
bens seja através do pacto antenupcial ou do contrato de convivência, não há
justificativa para o legislador impor uma divisão de patrimônio de forma
discriminatória.
302
TARTUCE, Flávio. Direito Civil, direito das sucessões, v.6, 12ª ed., Rio de Janeiro: Editora
Forense, 2019, Pág. 328.
303
Pelo entendimento da inconstitucionalidade do artigo em questão, cabe ressaltar muitos
nomes, como: Caio Mário da Silva Pereira, Giselda Maria Fernandes Novaes Hinoraka, Luiz
Paulo Vieira de Carvalho, Maria Berenice Dias, Gustavo Tepedino. Contudo, a grande maioria
possuía entendimento diverso amparada na dicção do art. 1.845, CC/2002, são eles: Christiano
Cassettari, Eduardo de Oliveira Leite, Flávio Augusto Monteiro de Barros, Francisco José Cahali,
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Maria Helena Diniz, Mário Delgado, entre outros.
304
Nesse seguimento, destaca-se, decisão que deferiu a constitucionalidade do art. 1.790 do
CC/2002, repercussão geral no RE 646.721 de 07/12/2011. Já em 2013, o Superior Tribunal de
Justiça, na 4ª Turma, Agravo de Instrumento no REsp. 1.291.636/DF, arguição de
inconstitucionalidade do art. 1.790, caput do CC brasileiro. Disponíveis em: stf.jusbrasil.com.br e
stj.jusbrasil.com.br.
305
STJ, AI no REsp. 1.291.636/DF, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, de 11/06/2013. Disponível
em: stj.jusbrasil.com.br.
140
306
Supremo Tribunal Federal, RE n.º 878.694/ MG. Relator: Ministro Luís Roberto Barroso,
Disponível em: redir.stf.jus.br.
141
Vale destacar que, para alguns, a questão não era clara e evidente e,
sob outra perspectiva, lançou o entendimento de que a equiparação produzida
pelo STF relativamente às regras aplicadas a união estável, limitava-se à
concorrência sucessória e ao cálculo dos quinhões hereditários. Desse modo,
restaria aos companheiros os seguintes dispositivos: art. 1.829 (ordem da
vocação hereditária e concorrência com os descendentes); art. 1.831 (direito real
de habitação); art. 1.832 (quota hereditária mínima na concorrência com filhos
comuns); arts. 1.836 e 1.837 (concorrência com os ascendentes; art. 1.838 e
1.839 (prioridade do companheiro sobre os colaterais), não tocando o emprego
do art. 1.845 que trata da condição de herdeiro necessário ao companheiro
sobrevivo, tendo em vista a regra da obrigatoriedade da legítima aos herdeiros
necessários ser uma norma restritiva de direitos, na qual limita o livre exercício
da autonomia privada309.
308
Op. Cit.
309
DELGADO, Mário. Diferenças entre união estável e casamento: quando a desigualdade é (in)
constitucional. Famílias e Sucessões, Belo Horizonte, 2018, Págs. 386 e 387.
143
310
BARROSO, Luís Roberto. Voto do Embargos de Declaração no RE 878.694/ MG. Disponível
em: redir.stf.jus.br.
311
BARROSO, Luís Roberto. Voto da decisão RE n.º 878.694/MG. Disponível em: redir.stf.jus.br.
144
312
BARROSO, Luís Roberto. Op. Cit.
313
BARROSO, Luís Roberto. Op. Cit.
145
314
BARROSO, Luís Roberto. Op. Cit.
315
BARROSO, Luís Roberto. Op. Cit.
316
Embora a aceitação da inconstitucionalidade do art. 1.790 não tenha sido unânime entre os
Ministros do STF, cumpre conferir o voto do Ministro Celso de Mello que de forma clara
manifestou seguir o Relator Barroso ao destacar que “o Supremo Tribunal Federal, ao proferir
este julgamento, está a viabilizar a plena realização dos valores da liberdade, da igualdade e da
não discriminação, que representam fundamentos essenciais à configuração de uma sociedade
verdadeiramente democrática, tornando efetivo, assim, o princípio da isonomia, assegurando o
respeito à liberdade pessoal e à autonomia individual, conferindo primazia à dignidade da pessoa
humana, rompendo paradigmas históricos, culturais e sociais e removendo obstáculos que se
antepõem, até mesmo em matéria sucessória, como se vê das diversas posições jurisprudenciais
dos tribunais locais, em relação aos integrantes de uniões estáveis, tanto as heteroafetivas,
quanto as homoafetivas”.
Op. Cit.
146
317
Vale ressaltar que a decisão do STF ao julgar o RE 878.694/MG foi sustentada nas técnicas
processuais. Ocorre que, um dos princípios que regem a atividade decisória do juiz, é o princípio
da congruência. De acordo com esse princípio, o pleno do STF ficou impedido de ampliar a
discussão sobre o regime sucessório do companheiro e analisar a condição de herdeiro
necessário. Todavia, o entendimento é de que essa seria uma grande oportunidade de analisar
a condição de herdeiro necessário do companheiro.
HINORAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Cônjuge e companheiro são herdeiros
necessários? in: Direito das sucessões: problemas e tendências Coord: Ana Caolina Brochado
Teixeira e Ana Luiza Maia Nevares: Editora Foco, 2022, Pág. 68.
318
Sendo assim, cabe destacar qual seria a redação ideal para o artigo 1.845 do CC brasileiro:
“São herdeiros necessários, os descendentes, os ascendentes e o cônjuge ou o companheiro do
falecido”.
HINORAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Concorrência do companheiro e do cônjuge, na
sucessão dos descendentes. Pág. 14. Disponível em: www.ibdfam.org.br.
319
STJ, REsp 1.357.117/MG, de 26.03.2018. Disponível em: stj.jusbrasil.com.br
320
No mesmo sentido, foi a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, TJRJ, AI n.º
0005018-70.2018.8.19.0000, de 18.04.2018 na qual afirmou “…Companheiros que, assim como
cônjuges sobreviventes, devem ser reconhecidos como herdeiros necessários amparados pelo
art. 1.829, III do CC…”. Disponível em: tj-rj.jusbrasil.com.br.
321
TJSP, AI n.º 2067760-05.2018.8.26.0000, de 30.01.2019. “...Incabível a distinção de regimes
sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado o regime do artigo 1.829 do
CC/2002. Companheira sobrevivente que deve ser considerada herdeira necessária
independentemente do regime de bens...”. Disponível em: tj-sp.jusbrasil.com.br.
147
322
NEVARES, Ana Luiza Maia. A condição de herdeiro necessário do companheiro
sobrevivente. Revista Brasileira de Direito Civil – RBDCivil I, Belo Horizonte, 2020. Pág. 23.
323
DELGADO, Mário Luiz. A sucessão na união estável após o julgamento dos embargos de
declaração pelo STF: o companheiro não se tornou herdeiro necessário. Disponível em:
ibdfam.org.br.
148
324
JERÓNIMO. Patrícia. Lições de Direito Comparado. 1ª ed., Editora: Elsa Uminho, 2015, Pág.
11.
150
325
Embora o Código Civil Português tenha sido influenciado primeiramente pelo Direito Francês,
o Código de Seabra sofreu influência do Código Civil alemão (BSB), assim como o Código Civil
brasileiro de 1916.
Sobre o assunto, destaca-se o artigo “A influência do Código Civil alemão de 1900”. Disponível
em: www.conjur.com.br.
326
JERÓNIMO. Patrícia. Op. Cit. Pág. 59.
151
327
Reforçando a influência alemã no Direito português, dispõe o art. 2º, n.º 1 da Constituição da
República Federal da Alemanha, que: “todos têm direito ao livre desenvolvimento da sua
personalidade desde que não violem os direitos dos outros nem infrinjam a ordem constitucional
e a lei moral”. Já a CRP consagra o direito ao desenvolvimento da personalidade e a reserva da
vida privada e familiar no art. 26º, 1: “A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal,
ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e
reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção
legal contra quaisquer formas de discriminação”. Quanto ao Brasil, a CFB em seu art. 5º, inciso
X, regulamenta que: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra, a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação”.
152
Sendo assim, não há como ser constitucional o dispositivo que trata dos
herdeiros no direito português, perante a ausência de uma posição sucessória
do companheiro na legislação civil. É inconcebível que a forma constitutiva da
união gere aos companheiros tratamento tão distinto daquele reservado ao
cônjuge.
328
PINHEIRO. Jorge Duarte. O estatuto do sobrevivente da união: pontos de conexão e de rutura
entre o direito das sucessões e o direito da família in: Temas Controvertidos de Direito das
Sucessões o Cônjuge e o Companheiro. Coord. Adisson Leal; Carlos Pamplona Corte-Real e
Victor Macedo dos Santos: Editora AAFDL, 2015, Pág. 53.
329
CORTE-REAL, Carlos Pamplona. A não sujeição do cônjuge à colação no Direito Sucessório
Português. Outros considerandos críticos sobre a vocação sucessória do cônjuge e do
companheiro in: Temas Controvertidos de Direito das Sucessões o Cônjuge e o Companheiro.
Coord. Adisson Leal; Carlos Pamplona Corte-Real e Victor Macedo dos Santos: Editora AAFDL,
2015, Pág. 202.
155
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por fim, peço licença neste momento, para contar a minha história e
reafirmar o porquê de, no meu entendimento, não entender as inúmeras
desigualdades de direitos entre os sujeitos que se relacionam através do
casamento ou união de facto.
158
Ao refletir sobre isso, compreendi que se não fosse esse papel que não
foi assinado no dia da celebração do casamento, o registro civil que gera a
certidão de casamento, meus pais seriam “verdadeiramente casados”.
Todavia já que casados não são, pois não assinaram o documento civil
de casamento, meus pais são companheiros em uma relação de união estável
há mais de 40 anos, construindo uma família com três filhas e três netos,
mantiveram por todo esse tempo a família com seus subsídios juntos,
participaram de todos os eventos como se casados fossem, e nunca precisaram
demonstrar que não eram casados pois nunca isso foi questionado socialmente,
uma vez que agiam como se fossem.
Observo se supostamente a relação dos meus pais fosse regida pela lei
portuguesa sucessória e se no Brasil acontecesse o mesmo tratamento. Nesse
caso, por serem conviventes, eles não poderiam ser herdeiros um do outro. Ora,
meus pais passaram mais da metade da vida deles compartilhando tudo juntos
e, por conta de um papel que não foi assinado, meus pais não poderiam ser
herdeiros um do outro. A verdade é que eles teriam menos direitos que um casal
que permaneceu casados por um ano, a título de exemplo.
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dedicados ao Prof. Doutor Mário Júlio de Almeida Costa. Lisboa: Universidade
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