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ISSN: 2238-1112

Condução (in)nas danças de salão: a arte das proposições


conducorporificadas

Rodolfo Marchetti Lorandi (FURB/UDESC)

Dança em Múltiplos Contextos Educacionais: práticas sensíveis de movimento

Resumo: Trato aqui do conceito de condução nas danças de salão (DS), um


fenômeno mais-que-humano, in-formação, no continuum do movimento partilhado e
que envolve toda a ecologia de uma prática. Trato das proposições dançadas como
cortes topológicos desse plano imanente, do qual emergimos em danças-dançadas,
onde condução pode ser entendida como força de forma, como linguagem não
humana e como uma arte de extrair proposições possíveis de serem validadas in-
par, proposições conducorporificadas. Este texto desdobra-se de minha dissertação
de mestrado (2020), de minha pesquisa de doutorado pelo mesmo programa de
Pós-graduação em Teatro (PPGT) da Universidade do Estado de Santa Catarina
(UDESC) e a partir de minha prática docente, pela componente Teoria e prática
pedagógica da Dança de salão, na Licenciatura em Dança da Universidade Regional
de Blumenau (FURB).

Palavras-chave: CONDUÇÃO. PROPOSIÇÃO. CORPORIFICAÇÃO. DANÇAS DE


SALÃO. FILOSOFIA PROCESSUAL.

Abstract: I deal here with the concept of conduction (and not lead and follow
technical) in social dancing, a more-than-human phenomenon, in-formation, in the
continuum of shared movement and involving the whole ecology of a practice. I treat
dance-propositions as topological cuts of this immanent plane, from which we
emerge in dance-dancing, where conduction can be understood as force of form, as
non-human language, and as an art of extracting propositions possible to be
validated in-pair, conduct-embodied propositions. This text unfolds from my master's
thesis (2020), from my doctoral research by the same program of Postgraduate
Studies in Theater (PPGT) of the State University of Santa Catarina (UDESC) and
from my teaching practice, of the component Theory and Pedagogical Practice of
Social Dance, in the Degree in Dance of the Regional University of Blumenau
(FURB).

Keywords: CONDUCTION. PROPOSITION. EMBODIMENT. SOCIAL DANCING.


PROCESSUAL PHILOSOPHY.

1. Condução em formação

Pedimos somente um pouco de ordem para nos proteger do caos. Nada é


mais doloroso, mais angustiante do que um pensamento que escapa a si
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mesmo, ideias que fogem, que desaparecem apenas esboçadas, já


corroídas pelo esquecimento ou precipitadas em outras, que também não
dominamos. São variabilidades infinitas cuja desaparição e aparição
coincidem. São velocidades infinitas, que se confundem com a imobilidade
do nada incolor e silencioso que percorrem, sem natureza nem pensamento.
É o instante que não sabemos se é longo demais ou curto demais para o
tempo. Recebemos chicotadas que latem como artérias. Perdemos sem
cessar nossas ideias. E por isso que queremos tanto agarrarmo-nos a
opiniões prontas. Pedimos somente que nossas ideias se encadeiem
segundo um mínimo de regras constantes, e a associação de ideias jamais
teve outro sentido: fornecer-nos regras protetoras, semelhança,
contiguidade, causalidade, que nos permitem colocar um pouco de ordem
nas ideias, passar de uma a outra segundo uma ordem do espaço e do
tempo, impedindo nossa "fantasia" (o delírio, a loucura) de percorrer o
universo no instante [...] isso que pedimos para formar uma opinião, como
uma espécie de "guarda-sol" que nos protege do caos. Nossas opiniões são
feitas de tudo isso. Mas a arte, a ciência, a filosofia, exigem mais: traçam
planos sobre o caos [...]. (DELEUZE e GUATTARI, 2010, p. 237)

A arte verdadeiramente engajada com aquilo que ainda não encontrou sua
forma própria intuitivamente se afasta da reprodução mimética. Para ser
artisticiosa – ativamente conectada à diferenciação da experiência, na
prática – não deve nunca buscar, de antemão, a definição de seu valor, nem
nunca reclamar saber como o inframince se fará sensível. A assombração
da preensão negativa deve continuar um assombro. Tomar-forma é o risco
da arte. Não há como escapar à tomada-de-forma. A experiência não se
faria cognoscível sem isso. A tomada-de-forma, contudo, não deve
submeter-se à categoria da pré-valoração. A experiência não deve saber a
priori o que pode sua formação [...]. (MANNING, 2016, p. 32).

Alguém filmou? Nos perguntávamos nos ensaios da Cia. Grão1...


Curiosamente, nos momentos que tornar-se-iam mais relevantes, ninguém havia
registrado dessa forma. E não é apenas porque a atenção estava em outro lugar,
mas também porque há um excesso na experiência e que não pode ser gravado.
Aqueles momentos eram jogos de improviso com os quais a companhia movia-se
entre consignas e estratégias em condução, mas também um dançar onde nenhuma
dessas proposições dava conta de tudo o que nos acontecia. Eram proposições que
se dobravam sobre proposições, excedendo à experiência tal como éramos capazes
de perceber. E essas experiências se desdobravam em discussões infinitas, em um
experienciar do dançar-sentir-pensar que nos colocava em mais e mais movimento,
de onde saiam mais e mais proposições e que se desdobravam em ações
performáticas: entre sensações, proposições, experimentações e conversas, sempre
o vislumbre do caos, o sentir de existir uma porção muito maior do que nós e de
onde extraíamos sensações, movimentos, conceitos. Nesses momentos, em que
ninguém filmava e algo acontecia, e ninguém poderia explicar, nesses momentos em
que a dança em condução excede nossas próprias noções de eu, de dançar com,

1
Para saber mais sobre a Cia., ver Lorandi (2020). Ver também https://www.graodanca.com/. 445
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uma certeza crescia: há um excedente na experiência do dançar em condução para


além de qualquer ponto de vista passível de ser descrito, controlado e previsto. Há
um excedente sobre a experiência de dançar em condução com a(o) outra(o/e).

2. Continuum

Na Botânica, área em que a ideia de condução refere-se ao sistema


complexo de distribuição de nutrientes (e que suportam a vida de uma planta), essa
retirada de substâncias da terra, pela planta, envolve toda uma processualidade e
relacionalidade. É um fenômeno observável, abrange toda a fisiologia da planta,
envolve seu entorno, os vasos condutores e as micorrizas (a associação
mutualística e simbiótica entre fungos, bactérias, raízes). A condução da seiva não
pode ser pensada sem envolver o clima, processos ascendentes e descendentes,
ela tem relação com o meio, com diferentes forças físicas, com a fotossíntese, enfim,
a condução é afetada pelos nutrientes, pela incidência de luz, pela temperatura, pela
relação entre-com outras plantas no entorno, etc. Neste caso, condução também é
vista como um fenômeno e sua analogia aponta para considerarmos aspectos
complexos de toda uma ecologia envolvida. Condução aqui é um fenômeno mais-
que-humano2 (LORANDI, 2020). É um fenômeno entre corpos (e muito mais que
dois corpos), ecologicamente situados, implicados rizomaticamente, que dançam
negociando movimentos, proposições, passagens, toques, trocas, vidas. A
passagem de movimentos na relação está para a condução na dança, como as
trocas simbióticas e rizomáticas3 estão para a condução nas plantas.
Há, aqui, uma política imanente à condução sendo tecida e que refere-se
a esses múltiplos toques e trocas sensíveis que dão sentido e sustentação aos
movimentos e modos de existir, dançando. Quando eu falo em uma política
imanente da condução, falo em uma política do dançar in-par (de dentro da relação),
onde não há um fim a ser alcançado e nem precisa-se responder a condições
extrínsecas, mas ao con-tato (o entre-com de tudo aquilo que, ali, se toca), um

2
Para mais sobre os conceitos de mais-que humano e mais-que-humano, ver Manning (2013, 2019).
3
Para Deleuze (1995), não há começo ou fim em um rizoma, o rizoma está sempre no meio, entre as
coisas, ele é a aliança entre as existências, não é um verbo ‗ser‘ mas uma conjunção ‗e‘ (como entre
‗elas dançando e o chão e a música e as proposiç es e as formas e as forças e as outras pessoas e
o ar e a os sentires e as roupas e os movimentos e etc‘). Não uma correlação localizável, não é uma
dicotomia, mas sim uma multiplicidade, um movimento transversal entre heterogêneos e que carrega
sempre mais de uma coisa e nunca poderá ser reduzida a nenhuma delas. Não por filiações, nem por
causa efeito, não por semelhança, mas pela aliança entre heterogêneos que se multiplicam. 446
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dançar em(in)-condução para além do humano (para além do que se tem entendido
como humano até aqui), onde se têm excluído, por exemplo, todo um mundo
sensível de afetos que são percebidos em mutualidade. Falo então de uma política
tátil, tal como definida por Erin Manning (2016), onde o toque é apresentado como
um nó que nasce entre sujeitas(es/os), um entremeio, uma tensão, conflito e que
desestabiliza as fontes de contato, tornando-se uma política baseada na
discordância e onde sempre há uma fricção transformadora. Manning sugere que
essa política não deve ser definida na base do sujeito pré-existente, nem da polis ou
do estado-nação (e, analogamente à minha pesquisa, com base nos códigos e
papéis nas danças sociais), mas na relação e escreve: ―a fala pol tica deve envolver
um argumento que nem é pré-estabelecido nem regurgitado. Uma política do toque
não deve ser concebida como uma política da comunidade; com o tato o centro não
pode ser formulado, tampouco alcançado‖ (MANNING, 2006, p. 14). Condução, da
mesma forma, não deve ser definida na base do sujeito pré-existente, nem das
categorias e agências humanas sobre danças de salão (DS), mas na imediação
sentida de uma relação ecologicamente situada.
Esse processo nos fornece pistas para entender como os corpos extraem
movimentos do mundo e das relações que emergem com ele, de movimentos
possíveis de serem validados e de proposições que já estão em movimento e tornar-
se-ão mais e mais movimentos para o par (a partir do par ou a partir do entre-com o
par, in-par) - condução é sobre o continuum da vida-vivida em movimento, da dança-
dançada, relacionalmente, qualitativamente e intensivamente. Ou seja, um
movimento proposto na relação (um ajuste, um passo, uma transferência, um giro,
uma direção, uma inclinação) pode ser simplesmente um movimento que já está em
movimento ou que já está sendo proposto (ao par, entre-com o par, pelo par, pela
relação, por diferentes partes dos corpos, pelo meio, pela relação com outras
existências no meio, etc.). Estes movimentos contínuos podem estar emergindo, e
corporificando-se como possibilidade, de diferentes formas e forças de forma - de
qualquer parte dos corpos e de qualquer parte de qualquer movimento apreendido
em mutualidade, sentido, pode surgir então uma proposição conducorporificada e
que qualquer movimento (virtual ou atual) pode potencializar ou que nossas
escolhas, atenção e reciprocidade, podem validar, ceder, co-compor, simpatizar,
cortar, fluir, contrapor, etc.

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3. Forças de forma

Quando dançamos a duas/a dois, percebemos que qualquer ajuste,


qualquer intenção e movimento da percepção, do corpo, da percepção como corpo,
do meio, da música, dos espaços onde se dança, pode desencadear toda uma
sequência de outros movimentos, ajustes e passos de dança, conhecidos ou não.
Percebemos que qualquer desses movimentos podem mudar a forma com que um
passo venha a tomar sua forma, mudar o modo como o corpo emerge e será
percebido em seu processo de individuação4, naquela troca, assim como mudam,
durante uma dança-dançada, os abraços, as direções, as possibilidades, as
qualidades, e o tempo todo influenciadas pelas relações que se formam. Também
percebemos que existem proposições menores, e intensivas, ou que existem
qualidades e intensidades que não tem um espaço e tempo definidos, qualidades e
intensidades que criam espaços e tempos para aterrizarmos juntes(as/os) e que já
estão atuando, que já indicam que uma condução está (in)em-formação. Que já
indicam proposições de movimentos possíveis de serem contempladas, fabuladas,
vividas, sentidas. Assim, condução não se mostra como um movimento com fim em
si mesmo ou como uma ação com início e fim localizáveis em um gesto extensivo e
que começou, do nada, em uma das pessoas. Como escrevem Deleuze e Guattari
(2010), uma tela em branco não é uma tela vazia, mas uma soma de potenciais,
possibilidades, recheada recheando-se de movimentos do mundo e que estão
ressoando entre si, fazendo de nossas decisões cortes situados entre-com a outra
pessoa. A proposição em movimento inclinada/declinada, decidida/sentida,
validade/não validada, toma sua forma, e força, justamente do processo de
condução em formação.
Um hábito comum nas DS é tomarmos o chão como parceiro, nós não o
generalizamos como uma superfície lisa ou comum, hegemônica ou constante, mas
consideramos que, em sua repetição5, o que se repete é a diferença no núcleo de

4
Manning (2013, 2016) escreve que o indivíduo é emergente e não pré-constituído e que existe uma
relação intr nseca ―entre a individuação (o processo), a pré-individuação (a força da forma) e o
individual (o ponto de inflexão que abre o processo para individuaç es outras)‖ (MANNING, 2016, p.
53). O indivíduo não é o ponto de partida, ele é o que emerge do meio da individuação, ―o indiv duo é
aquilo pelo qual o acontecimento se expressa, nunca aquilo que o p e em movimento‖ (2016, p. 53).
5
Para Deleuze (2020, p.14), a diferença se disfarça na repetição e é da vida a coexistência de
repetições, mas de modo a se distribuírem, na verdade, através de diferenças. E alerta sobre duas
questões: a diferença não é subordinada ao idêntico, não é uma oposição nem uma contradição, é
apenas outra coisa. E ―a outra concerne a um conceito de repetição tal que as repetiç es físicas, 448
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sua composição (DELEUZE, 2020). Consideramos o par chão como uma paleta de
possibilidades a serem descobertas e como um corpo gerador de forças, texturas,
equilíbrios, contrastes, ritmos. Consideramos as relações por vir, com um chão,
como um campo de forças de forma. Além de possibilidades como tração,
deslocabilidade, apoio, sustentação - e proposições que se apresentam
diferentemente das que conhecíamos e imaginávamos. Devires-chão são ativos e
ativam danças o tempo todo. Dançar não seria dançar se não fossem os muitos
‗chãos‘ que nos individuam (e que tendemos a generalizar). Ainda nas micorrizas, se
pensarmos nestas simbioses plantas-chão-fungos, perceberemos que algumas
plantas, raízes e fungos não existiram da forma como as observamos não fossem
suas simbioses. Sem um chão, as danças teriam tomado outros rumos. Sem cada
chão sobre o qual os descobrimos dançando, não seriam aquelas danças que duram
em nós até aqui. Outras existências como estas participam de um simples passo do
forró sobre o chão, seja de reboco, de madeira, no piso da garagem de uma casa,
no carpete da sala ou sobre o gramado em volta de uma fogueira de São João. O
corpo extrai movimento dessas relações entre múltiplos corpos, forças e existências
tanto quanto a planta extrai vida e possibilidades dessas simbioses e micorrizas.

4. A arte dos jeitinhos

Quem planta em seu jardim, frequentemente é confrontado por toda uma


ecologia envolvida, percebendo que qualquer mudança ou qualquer proposição sua
para com as plantas e das plantas para consigo, em mutualidade e ressonância,
indicam movimentos possíveis de serem fabulados juntas(os/es). Com um pouco
mais de atenção, podemos inclusive notar que um jeitinho com que a planta
expressa um movimento (ou uma simples diferença na expressão da planta, como
um inclinar-se em direção ao sol), pode ser força para movê-la. Esse gesto, que

mecânicas ou nuas (repetição do Mesmo) encontrariam sua razão nas estruturas mais profundas de
uma repetição oculta, em que se disfarça e se desloca um ‗diferencial‘‖. Tal questão é objeto de
minha atual pesquisa de doutorado, onde tenho me perguntado como então propor a partir de uma
diferença em nossas práticas artístico-pedagógicas em condução. 449
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existe na relação, é um jeitinho6 com o qual negociamos e com o qual aquela


relação se expressa. Proposição que, se validada ou cedida, se desdobrará em mais
e mais movimentos possíveis e em outros modos de viver uma vida e, através da
qual, podemos propor nos mover mais e mais. O jeitinho aqui é então a expressão
do gesto da planta sentido na relação e em direção ao seu movimento por vir.
Talvez, quando eu dançar um próximo forró7, uma inclinação como esta em direção
aos outros modos possíveis, e que já estão se expressando entre-com a(o) par,
poderá ser validada, poderá ser cortada por uma decisão de instante de qualquer
uma das existências envolvidas. Jeitinhos dão passagens às negociações políticas e
táteis que só se expressam nos entremeios da relação, por um instante,
conducorporificando modos outros de se mover. E esse devir-planta, aqui instaurado
como conceito, se torna então ressonante com a ideia de condução nas DS.

5. Um plano metaestável para corpos desejantes

Ainda quanto ao chão, e as relaç es que estabelecemos com ‗eles‘, elas


mudam completamente as possibilidades inscritas para uma dança de par, pois
mudam os passos possíveis, mudam as direções que podem vir a ser contempladas,
mudam as texturas, etc. É bem comum, por exemplo, bailarinas(es/os) de DS
levarem diferentes calçados para um mesmo baile, os quais são trocados ao longo
da noite (ou após percebermos o chão, dançando, assim como o clima, a música, a
luz, a umidade, etc). Essas in-formações chegam nas trocas com nossas(os) pares,
corporificando muitos modos possíveis de se mover, de propor, de dançar. Mas, ao
observar ‗de fora‘, testemunhamos uma dança que pode se expressar de modo

6
Ao dançar, sentimos jeitinhos necessários para podermos acessar um movimento, um passo, uma
forma, um abraço, uma direção e que se fazem possíveis na experiência, como se fosse uma
fechadura que exige um jeitinho específico (e uma negociação com aquela emergência), para abrir
sua porta. Esses jeitinhos são coloridos por gestos menores sentidos na relação, para além do
humano, gestos transindividuais, e menores não porque são pequenos, mas por serem precários e os
ignorarmos, embora entremeiam e colorem completamente a relação dançada, são sentidos na
experiência e antes de tomarmos consciência daquilo que acontece, são gambiarras que se fazem
necessárias às técnicas. Manning (2016, p. 1) escreve que seus improvisados fios de variabilidade
―seguem ignorados, a despeito de estarem entremeados a tudo‖. Para saber mais sobre gestos
menores, ver Manning (2016).
7
Este artigo segue-se à apresentação feita no Congresso Virtual da ANDA, 2021, edição online, Ver:
https://portalanda.org.br/. Momento também em que atravessamos o segundo ano da pandemia da
Sars-Cov-19, onde o Brasil já ultrapassa a marca de 500 mil mortes devido à gestão irresponsável do
atual governo brasileiro. Seguimos sem eventos, bailes, encontros e práticas coletivas com DS,
embora muitas práticas e profissionais desrespeitem com eventos clandestinos. Ver:
https://www.instagram.com/covidnosalao/. 450
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passageiramente estável (na execução e repetição de passos de dança, códigos,


normas). Mas é preciso considerar que sentimos toda a sua metaestabilidade,
através dos (re)ajustes necessários, dos sentidos que emergem ou de variações
mínimas entre forças físicas (equilíbrios, tônus, pesos, contrapesos), forças virtuais
(como em movimentos já esboçados na relação8) e reais (intensidades, qualidades,
afetos e devires em operação), ou seja, uma ressonância entre qualidades,
possibilidades, tendências, jeitinhos, formas e forças de forma.
O processo de condução, muito antes de sua estabilidade passageira,
toca nesses planos de pré-movimento, pré-linguagem e pré-forma. Muito antes das
proposições corporificadas (conducorporificadas), a condução indica apenas uma
ressonância entre possibilidades, intensidades, qualidades e corpos vibráteis,
relacionais e em movimento contínuo. Durante as investigações com a Cia. Grão,
aprendemos com a fisioterapeuta e biomecanicista Catarina Cortez Cunha 9, que o
corpo é assimétrico justamente por se colocar sempre em movimento, há um desejo
já instaurado de mover-se com o mundo, para o mundo, pelo mundo, entre-com o
mundo. Há um excesso de desejos tanto quanto há um excesso de possibilidades
corporais se cambiando, por exemplo entre diferenças de tensões músculo-
esqueléticas. Há desejos de movimento, imanentes ao corpo, movendo o corpo. E o
corpo, por sua vez, vai constantemente (re)configurando cadeias musculares e
articulares, permitindo-se explorar cada vez mais o mundo e as relações. Um corpo
emerge sempre na diferença entre tensões, o que nos leva a agir e a desejar agir,
explica Cortez. Assim como no excesso da produção de e pelos desejos que
povoam um corpo, como escrevem Deleuze e Guattari (1995, 2011). Os corpos
sempre estão, mesmo aparentemente parados, em movimento e inclinados a
movimentos possíveis e desejam se mover (isso quando não oprimidos pelo sistema
capitalista e liberal que nos achata e achata nossas subjetividades). Ao abraçar,
esse excesso de movimento e desejos, possibilidades e relaç es (e + e + e…), seus
contrastes e (re)configurações, chegam ao par muito antes do próprio abraço ou de
nossas escolhas conscientes, nos explicou Cortez em suas oficinas para
bailarinas(os/es) de DS (entre 2005 e 2012).

8
Para mais sobre O plano virtual de condução: as proposições já esboçadas, ver Lorandi (2020).
9
Observo a importante influência do trabalho de Catarina C. Cunha na construção de corporalidades
nas DS em Florianópolis, SC. Ela, por exemplo, entre os anos 2000 e 2005, foi quem questionou, nós
professores(as) de DS, sobre se obrigar as mulheres a dançarem sobre as pontas dos pés (ou salto
alto), além de diversas crenças enraizadas sobre corpo, relação e condução que eram muito fortes. 451
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6. Proposições como cortes topológicos10

Dizer que há um processo imanente de condução, me aproxima da noção


proposta na filosofia de José Gil (2001): dançar é fluir na imanência. E que participa
desta dança um corpo virtual em movimento infinito infinito, como escreve Manning
(2014). E, na tentativa de delimitação deste fator, a condução revela então uma
dança que acontece a partir de múltiplos eventos-em-formação. Quando estamos
dançando com outro corpo, sentimos que o encontro nos leva para um quarto
lugar11. Não nos movemos apenas pelo resultado de forças físicas ou de códigos
das linguagens e nem para a direção final prevista, mas também para outra
qualidade de espaço-tempo, para outra localização no espaço, para outros
movimentos possíveis e criando outros espaços e tempos - a relação nos moveu, as
forças em atuação na relação nos moveram, fomos impulsionados entrelaçando-nos
no infinito-infinito do mover-se entre-com toda a ecologia do salão de dança. Mesmo
que apoiados em um vocabulário tradicional, é perceptível que um conjunto outro de
movimentos, para além dos conhecidos, participa e isto indica uma força condutora
para além das proposições que se tornarão passos de dança.
Aqui também encontro o que Massumi define como a topologia da
experiência, algo que não é localizável, mas instaurado através da cinética do
instante (MASSUMI, 2002). Dançar no mundo é mover a percepção para uma
relação por entre o movimento do mundo. É realizar um passo ao lado sem nunca
ter tido a necessidade de se ver dono desse ‗passo de dança‘, pois essa seria uma
ilusão formal, muito menor do que a dança e seria desconsiderar questões
importantes no movimento da relação em condução - como os afetos. O sujeito da
proposição aqui é a condução localizada no evento, condução como acontecimento.
Mesmo que estejamos certos de que era a única possibilidade de nos movermos,

10
Pense em uma porção de terra, depois em um corte nela. Você não terá a visão de toda ela, muito
menos a noção de continuidade em suas relações continuamente em movimento, nem a totalidade de
todas as vidas e proposições trocadas, se relacionando em um ambiente vivo. Pensar uma
proposição como um corte topológico, na relação, traz a mesma ideia, a decisão por validar uma
proposição, dentre tantas outras dobrando-se entre si, como uma dobra e um corte no plano de
condução, mas de modo algum, esse corte, indica um fim ou um início para um movimento extensivo
(um passo, uma forma). Nem indica quais partes daquele corte importam mais ou menos na
construção de um ―nexo‖ (WHITEHEAD, 2010) ou quais proposiç es, no mesmo corte, tem mais ou
menos participação. Por sua vez, constituem um todo muito maior, uma porção de terra repleta de
vida em relação, uma ecologia. Ver capítulo 3.5 em Lorandi (2020).
11
Como quarto lugar, me refiro ao espaço criado pelo encontro, quando o encontro nos leva a outros
espaços e modos de criar e habitar espaços e temporalidades. 452
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quando o movimento acontece e não há possibilidade de outra coisa acontecer (e


um sentimento nos enche de satisfação), há que se considerar tudo que compôs
esse nós (e esse entre-com nós). Um problema na DS tradicional é que homens
aprenderam a crer que só as proposições que passam por suas decisões importam.
E, no silêncio dos corpos femininos ou de corpos neurodiversos, aprenderam a crer
que controlam tudo o que acontece com o corpo da parceira. Desejo e satisfação
seguem atrelados às crenças patriarcais, machistas, sexistas e neurotípicas
presentes nas DS, e a um modo de dançar que alimenta tais estruturas decisivas
saciadas pela crença e opinião de que o que acontece no corpo do outro, da outra,
partiu deles, começou neles, é e deve ser previsto, decidido e controlado por eles12.
Manning (2014) escreve que o movimento não deve ser reduzido ao
deslocamento. Do mesmo modo, as DS não devem ser reduzidas às suas diferentes
linguagens que emergiram até aqui e condução não pode ser reduzida a nada disso,
muito menos ser reduzida aos passos que tomam forma ou aos gestos e ações que
expressam um código, uma direção ou um caminho. Nem há como reduzir condução
às combinações conhecidas de movimentos possíveis ou a um modo/técnica de
olhar para uma dança. Condução é, nesse sentido, contranatural e contracultural
(LORANDI, 2020). Não é sobre técnica, não é pergunta/resposta, não é relegada ao
humano. Se continuarmos a ignorar seu espaço-tempo de in-formação, iremos forçar
para dentro da relação sempre as mesmas formas de relação. Neste sentido,
executar um desenho ou forma prévia, ao longo da intenção de fluxo em par, não é o
que determina nem o que sugere condução, pelo contrário, ela está no núcleo dos
desenhos que se formam, como uma força. Em outras palavras, isso sugere uma
possibilidade de perceber, em um estado de atenção e cumplicidade, hospitalidade e
alteridade, que nos moveremos sempre a partir do entre-com, em complexas
relações sentidas no fazer, onde possibilidades são então conducorporificadas.

7. A arte da relação

12
Quanto à contribuição das políticas neurodiversas para as DS, ver Lorandi (2020). Para mais sobre
neurodiversidade e políticas táteis, ver Manning (2014, 2016). Também destaco algumas pesquisas,
em andamento, contemporaneamente a esta: Francisca Jocélia de Oliveira Freire com espaços de
superação ou manutenção do machismo e heteronormatividade. Carolina Polezi com o conceito de
condução compartilhada. Marlyson de F. Barbosa com DS e as relações com o patriarcado. Tatiana
Maria Asinelli da L. Keiber estuda sobre a autonomia da mulher nas DS. Paola Vasconcelos Silveira
sobre gênero e a mulher bruxa nas DS. Katiusca Marusa Cunha Dickow com gênero nas DS.
Matheus Assis com a não-binaridade nas DS. Para mais autoras(es) e pesquisas, ver Lorandi (2020). 453
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O relato sobre linguagem da artista e ativista pela neurodiversidade,


Amanda Mel Baggs13 (2007), é preciso para nos auxiliar a abordar a ideia de
condução-em-formação. Baggs, uma mulher-pesquisadora-artista-autista, descreve
que percebe o mundo nas muitas possibilidades de o fazer e ela explica que sua
maneira de se mover é uma resposta contínua ao seu redor, e aponta:
―Ironicamente, o jeito como me movo ao responder a tudo ao meu redor é descrito
como ‗estar em meu próprio mundo‘, enquanto que se eu interagir com um conjunto
muito mais limitado de respostas e só reagir a uma parte muito mais limitada do meu
entorno, as pessoas afirmam que estou ‗abrindo uma verdadeira interação com o
mundo‘‖ ( AGGS, 2007, apud MANNING, 2008, p. 2). É recorrente a redução sobre
a percepção austista, onde pessoas típicas dizem que essas pessoas vivem em
outro mundo, outra realidade. O que Amanda diz é: na verdade vocês esperam que
eu me relacione com o mundo como vocês o reduzem, baseado em seus códigos,
suas linguagem, normas, regras, lógicas, capital, utilidade, etc. É o mesmo mundo
útil que Ailton Krenak (2020) critica, o mundo do consumo, o mundo da verdade
baseado em um único modo de se relacionar com a vida e que exclui outras formas
de se viver e sentir uma vida. Um mundo de DS como mercadoria ou, como escrevi
em outro momento, DS como commodities (LORANDI, 2020), uma DS que abstrai o
que se tem de mais precioso em suas práticas, a vida em condução.
Para Krenak (2020), há um erro no conceito de humanidade, pois
excluímos toda uma série de seres vivos e relações para cunhar esse termo, pois
nos desconectamos como partes do organismo terra para viver presos em aparatos
sem sentido (e abstraindo sentires), uma vida sem pensar nossa relação de
mutualidade, mas o que há é ―uma imensidão de seres vivos‖, muito além de nós
(KRENAK, 2020, p. 9), como os afetos e existências que nos movem e que
participam de nossas proposiç es. ―Temos que parar de nos desenvolver e começar
a nos envoler‖, escreve Krenak (2020, p. 24). Para o autor, e índígena-ativista pelos
direitos dos povos ameríndios, quando se pisa no chão, se pisa junto - é o nosso
rastro, ele escreve. Um rastro de experiência sensível de mundo que é vivido sem
utilidade, sem finalidade, por que é vivido, sentido, como ele sugere, é um meio. A
vida é fruição e é preciso escapar dessa captura, experimentar uma existência que

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―Minha linguagem não é sobre projetar palavras ou mesmo s mbolos visuais para as pessoas
interpretarem. É sobre estar em uma conversa constante com todos os aspectos do meu ambiente‖
(BAGGS, 2007). Ver também: https://www.nytimes.com/2020/04/28/health/mel-baggs-dead.html. 454
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não se rendeu ao sentido utilitário da vida (KRENAK, 2020), tal como também alerta
Amanda Baggs: tenho o direito de sentir e viver com o mundo e à minha maneira.
Aqui, condução é então sobre sentir e se envolver, ecologicamente, relacionalmente.
Manning (2008, p. 2) reforça que, para aggs, ―a comunicação através da
linguagem permanece inadequada às experiências singulares de sensação que o
mundo exprime, onde aquilo que seria articulável na forma não alcança
completamente a complexidade da experiência‖. Quero destacar aqui as implicaç es
cruciais para os estudos das DS ao considerar que os movimentos e gestos
extensivos resumem o que é condução (como acontece na DS tradicional). O que se
articula nas formas e linguagens destas danças não alcança toda a extensão do que
se experiencia em suas práticas. Quero também destacar aqui um problema central,
o de considerar DS apenas como uma linguagem formal e o corpo em condução
apenas como um receptáculo que executa uma representação mimética destas
danças. Descobrir, sentir e se mover por direito próprio em Baggs (2007) é
precisamente descobrir, pensar, sentir e dançar por direito próprio nas DS. Se
envolver e fruir na relação em condução, nas DS, é precisamente se envolver como
nossa mais que humanidade, em Krenak (2020).
Estas crenças limitantes (condução como técnica formal, DS como
linguagem fixa e mercadoria, passos de dança como mimética de um gênero de
DS), são uma abstração do mais-que em jogo em cada uma de suas atualizações e
em cada uma de nossas individuações. Uma arte das DS verdadeiramente engajada
na relação em condução precisa incluir seus processos de formação e emergência e
que excedem os corpos e danças tal como testemunharemos. E precisa incluir um
mundo de corpos sensíveis, relacionais, permeados por afetos, devires, simbioses.
―Tomar-forma é o risco da arte. Não há como escapar à tomada-de-forma. A
experiência não se faria cognoscível sem isso. A tomada-de-forma, contudo, não
deve submeter-se à categoria da pré-valoração. A experiência não deve saber a
priori o que pode sua formação‖ (MANNING, 2016, p. 32). Condução inclui então
este risco, e também inclui o processo de tomar-forma e pensar-sentir o emergir de
proposições que já estão em movimento na relação. Condução em-formação indica
então uma ponta de emergência para o movimento partilhado, localizada no
processo de corporificação dessas possibilidades, a partir de uma dança ainda por
acontecer, uma DS ainda disforme, modulada pelos eventos e que preenche nossos

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corpos e relações com movimentos e proposições possíveis - aqui, condução


envolve então um processo de conducorporificação (LORANDI, 2019, 2020).

8. Considerações por uma linguagem não humana

Meu objetivo aqui é tensionar os limites entre sentidos e indicativos


narrados sobre DS, para validar as singulares individuações possíveis de quem está
ali, dançando, e esboçar assim uma política das práticas de DS pelo direito de sentir:
―Há algo sobre a experiência de Amanda aggs que nunca saberemos, porque
saber é sentir (...). O que Amanda Baggs faz é começar a nos ensinar a articular o
pensamento do sentir‖ (MANNING, 2008, p. 2). Há algo sobre condução que só
pode ser sentido, pois diz respeito ao como um movimento, conducorporificado,
emergirá como uma proposição possível para ambas(os/es) e como será negociado.
Manning (2008, p. 2) descreve que ―a comunicação através da linguagem
sempre será curta. Ainda assim, a linguagem é capaz de transmitir uma certa
complexidade dos conceitos em jogo, conectando os mundos de tal forma que o
diálogo entre os mundos-em-formação pode ser iniciado‖. No tomar-forma (corpos,
passos e danças), não está em jogo apenas uma gramática, direção, ou
direcionalidade, tampouco somente gêneros, identidades e papéis pré-definidos,
mas também o destaque de um espaço-tempo de suspensão da relação para
aterrizarmos, juntas(es/os), em uma nova coordenada e em outras tantas
identidades possíveis em composição, assim como no vivenciar de uma diferença
em processo, mesmo em repetições complexas (já que sempre incluem uma
diferença). Este espaço de in-formação pode ser descrito como o ambiente em
movimento e como ―uma multidimensional multiplicação de eventos-em-formação‖
(MANNING, 2008, p. 1) que, como plano potencial, já contém formas e movimentos,
forças de formas, afetos, virtualidades e já nos coloca em processo de condução, a
relação é sujeito da condução, para além do humano e para além das linguagens
humanas (sejam escritas, faladas, dançadas, arquitetadas, desenhadas, etc). No
dançar, os sentidos podem ser processados nessa complexidade móvel do ambiente
e a ecologia do salão pode ser incluída e incluir muitas forças de proposição.
Apesar de nos empenharmos em responder, ao dançar com a(o) par, aos
aspectos curtos da linguagem (como um passo de dança, um giro na salsa, uma
transferência de peso, uma direção e velocidade, ritmo ou peso do corpo em uma
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das pernas, forma do abraço, enfeites ou um estilo de um gênero tradicional), é


fundamental mover discursos, sintonizando-se ao excedente excluído desses
códigos ensinados em sala de aula, sobre o como se darão essas danças na prática.
É fundamental também lembrar que o corpo é movimento e que DS é uma dança
entre corpos em movimento, seria mentira considerar o ―corpo linguisticamente sem
que seja (re)conhecida a justaposição complexa de sentidos, já que o corpo é, acima
de qualquer instância, um aparato sensório de movimento em direção ao mundo, um
corpo-sensorial-em-movimento que mundifica‖, escreve Manning (2008, p. 58).
Manning também adverte que isso ―não exclui a importância da linguagem textual do
gesto, ou de uma ‗gramática‘ do corpo, mas exalta a importância de conceber o
corpo enquanto movimento‖, ou seja, o corpo enquanto produção de sentidos
(dançando com o mundo), para além das linguagens de DS, um corpo que
―responde várias camadas e texturas de articulaç es e gestos, incorporando e
expelindo um espectro de incongruências, sensoriais ou textuais, que ocorrem no
encontro com um outro‖ (MANNING, 2007, p. 58).
Condução-em-formação assim sugere que a forma, ou o passo de dança,
as linguagens, não são dados, mas uma tensão entre possibilidades onde a força de
forma precede a forma (onde condução precede as proposições possíveis que
precedem as formas de DS testemunhadas). Para Manning (2016, p. 91), estar ―in-
formação sugere que a forma não é um algo dado, mas uma tensão entre
possibilidades díspares onde o tornar-se precede o ser‖. As conduç es em-formação
precedem as possibilidades propositivas validadas. E isso ocorre, escreve Manning
(2016, p. 91), através do ―processo de individuação: conforme o meu corpo se
forma, a minha matéria (o meu potencial energético) é in-formado por uma casca
que nunca contém completamente o processo‖. Essa suspensão provocada pela
condução é então um entrelaçamento entre ―o que é absolutamente aquilo o que se
tornou ou está se tornando (uma ocasião actual) e o que está no campo do potencial
e pode se expressar‖ (WHITEHEAD, 1978, apud MANNING, 2014, p. 163). Em
outras palavras, condução é um entrelaçamento entre as forças de forma e o que
toma forma, entre as forças potenciais e as nossas tendências e entre as
proposições conducorporificadas (entre corpos que são plenos e se multiplicam) e
tudo o que de fato será proposto ao/pelo/entre-com o(a) par.

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Rodolfo Marchetti Lorandi


FURB/UDESC
rodolfolorandi@hotmail.com
Professor Me. docente pela Universidade Regional de Blumenau, Mestre e
Doutorando em Teatro pelo Programa de Pós-graduação em teatro da Universidade
do Estado de Santa Catarina. Bailarino, produtor e conteudista pela Cia. Grão, de
Florianópolis, SC. Ver: https://www.instagram.com/maisquedancar/.

Bianca Scliar Cabral Mancini


UDESC
bibimove@gmail.com
Orientadora deste autor, a Profa. Dra. pelo curso de Teatro e Pós-Graduação em
Teatro da Universidade do Estado de Santa Catarina. Doutora em Artes e Filosofia.
Artista multimídia e trabalha com performance e vídeo nas intersecções entre a
dança e as artes visuais.

Referências

BAGGS, Amanda. In My Language. 2007. (8m36s). Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=JnylM1hI2jc&t=1s. Acesso em: 02 de out. 2019.
DELEUZE, Gilles. Diferença e repetição. 2 ed. Tradução de Luiz B. L. Orlandi. São
Paulo: Paz e terra, 2020.
DELEUZE, Gilles. e GUATTARI, Felix. Mil platôs - capitalismo e esquizofrenia.
Vol. 1. Tradução de Tradução de Aurélio Guerra Neto e Célia Pinto Costa.. São
Paulo: Editora 34, 1995.
DELEUZE, Gilles. e GUATTARI, Felix. O anti-édipo: capitalismo e esquizofrenia.
2 ed. Tradução de Luiz B. L. Orlandi. São Paulo: Editora 34, 2011.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix. O que é a filosofia? Tradução de Bento Prado
Jr. e Alberto Alonso Muñoz. São Paulo: Editora 34, 2010.
GIL, José. Movimento total: o corpo e a dança. Tradução de Miguel Serras
Pereira. Lisboa: Relógio D´Água Editores, 2001.
KRENAK, Aiton. A vida não é útil. São Paulo: Companhia das letras, 2020. 2 ed.
KRENAK, Aiton. Ideias para o fim do mundo. São Paulo: Companhia das letras,
2020.
LORANDI, Rodolfo M. Condução em formação nas danças de salão. 2020. 112 p.
Dissertação (Mestrado em Teatro). Universidade do Estado de Santa Catarina,
Centro de Artes, Programa de Pós-graduação em Teatro, Florianópolis, 2020.
LORANDI, Rodolfo M; MANCINI, Bianca C. S. Condução e danças de salão:
Conducorporificação. Revista Interfaces Brasil/Canadá. Florianópolis/Pelotas/São
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MANNING, Erin. In: THAIN, Alanna. Affective Commotion Minding the Gaps in
Research-creation. Inflexions - a journal for research creation. n 1. p. 1 - 24, mai.
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MANNING, Erin. Politics of touch: sense, movement, sovereignty. University of
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MANNING, Erin. Toward a Politics of Immediation. Frontier in Sociology. v 3. n.


42. p. 1 - 11. Jan. 2019. Disponível em:
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WHITEHEAD, Alfred. N. Processo e realidade: ensaio de cosmologia. Tradução
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