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Romance popular, em verso, que se cantava ao som da
viola, ainda frequente no Brasil; pequeno canto épico.
W. J. SOLHA
A ENGENHOSA TRAGÉDIA DE
EDITORA PENALUX
Guaratinguetá, 2018
y
edito;~ ~~na lux
penalux@editorapenalux.com.br
www.editorapenalux.com.br
ISBN: 978-85-5833-369-5
Índice sistemático:
1. Literatura Brasileira
Alta
e ancestral no meio do plaino,
a Pedra do Reino,
rocha dupla na vertical, no sertão pernambucano,
insufla no povo (mesmo quando se camufla em profano)
a estupenda lenda de que tem,
dentro, no centro, a catedral
na qual,
el-rey D. Sebastião, de Portugal, o Afoito,
sumido (ou abduzido) na batalha de Alcácer Quibir,
de 1578,
Ao fundo,
um grupo de camponeses - que passa
com suas reses - confunde-se,
dócil,
com as figuras de barro do mestre Vitalino
e as de Manuel Eudócio.
A BandNews dá ao Brasil,
em panorâmica (que deixa de lado os
helicópteros - agora meras libélulas e coleópteros)
a leva - romântica - de romeiros,
que lembra a de cangaceiros.
ANHK,
nesse momento,
mostra as louras - do Paraná - tão musculosas
quanto as motos (poderosas) em
que chegam a um bar, reduto de jornalistas - onde,
a que mais aparece em TV e revistas
dispara o insulto maluco
- Eunuco!,
transara mal,
num resort,
e escrevera (sobre ela e as outras) - numa espécie
de rebate - que não passavam de castrati!!!
ACBS,
doutro lado,
faz um travelling na caatinga,
até o nonsense circense
de um gargalhante Coringa.
O Sebo,
de João Pessoa,
põe banca - vasta e boa - das obras de mais tutano
do Ariano,
do Auto da Compadecida e Farsa da Boa
Preguiça ao Torturas de um Coração;
passando pelO Santo e a Porca, Uma Mulher
Vestida de Sol, Cantam as Harpas de
Sião,
e nem se precisa de muito treino pra ver
que A Pedra do Reino é o que ele mais traz
pra vender.
O Ariano,
que a cavalo é um ás,
salta pra porta
dum school bus,
E,
ante o riso,
o improviso:
- Esta história,
que aqui se deslancha,
é homenagem,
quase que... vassalagem...
ao...
tinhoso e
ingenioso
... Quixote,
lá de La Mancha,
criação de Cervantes,
gênio, sim, sem rival (que ninguém leve a mal),
nem adispois,
nem antes.
Pausa
por justa causa.
Aí,
revolta:
fala-se alto,
em volta.
Um guia,
de típica mistura de ciência com pinga,
diz
com orgulho guerreiro,
que a savana estépica tem biorna exclusivo,
sem igual no estrangeiro:
o da caatinga.
Ariano,
V1vaz,
salta do amarelo school bus:
Mas,
neste mundo,
que adoro,
nesta hora de glória,
eu anuncio a chegada
do grande herói desta estória!:
o valeroso Trancoso,
que entra,
com muito gozo,
na vossa vasta
memória!
Faz,
dali,
a tribuna:
- Mas atenção,
multidão!
Além de contorcionistas,
de clowns e equilibristas,
além de frevistas, sambistas, de bandas de choro
e
repentistas,
teremos graaandes poetas... que são,
também,
graaandes profetas!
O escritor é aplaudido
com alarido, alegria,
pois tudo que diz é engraçado
e de nordestina ousadia.
Emoldure-o:
empunadura de la espada: dorada ai mercúrio.
O paraibano diz,
com fair-play,
mas nada, nada feliz:
- Os que não acreditam na vinda,
amanhã,
del-rey,
não acreditarão também, é claro (não me causa espanto),
que este,
que aqui está
é o célebre, garanto, Manco de Lepanto,
sepultado - eu vi! - na cripta de las Trinitarias,
Madrid!
Ariano,
senhor do mistério de quem tem o respeito sem falar sério,
Astier,
voltando-se a Didier:
- Você ouviu? Portunhol!
Pelo jeito, o idioma não foi,
como ele,
conservado em formo!!
Cervantes,
enrolando a mão,
como antes:
- ~Hombre:
tuvimos una hija,
Isabel,
a quien le di mi nombre!.
E,
de supetão,
Bozo,
falando baixo,
rindo,
pra Trancoso:
Lourona,
a Sonia Carona,
de El País,
interpela Cervantes.
Ariano,
com el hermano:
tanto quanto
- su templo de Carrara.
A IMPREVISTA ENTREVISTA
O Astier bestunta:
- Minha mente, então, me pergunta, como
lhe compete: como é que sabe de tudo,
se é do século XVII?
Sonia se arrepia.
O grupo se sente -- em parte - demente,
em parte de mente ... vazia.
E Ariano vê aquele de quem é discípulo,
tentar,
pela epístola do apóstolo - cheio de
escrúpulo - ser... explícito:
Trancoso,
extremoso,
espera.
Quando o momento a si mesmo supera,
levanta a questão ... capciosa,
ante a plateia já mais ...
respeitosa:
- É certo que o senhor... e Shakespeare, como
tanto já se arguiu, morreram no mesmo
ano, ... , em 23 de abril?
- Sí.
Yno.
Astier, já saindo,
vê Ariano,
que lhe pisca um olho,
rindo.
Mas,
embora tocado,
não se dá por achado:
- Isso é o senhor - célebre dramaturgo-
com seu ator à beira do... expurgo!
BOZO MEDITA,
MINIMAMENTE MÍMICO,
POSE de RODIN,
ENTRE UM CAMINHÃO E UMA VAN,
NO SANITÁRIO QUÍMICO:
Ariano,
comprido,
estira-se,
desinibido,
entre os romeiros radiantes,
pra sair na foto com Cervantes!
Ela se abraça.
O Astier a encara
e há,
entre os dois (dando-se os nomes aos
bois), uma dessas coisas incríveis:
o ronronar das antenas invisíveis,
the sound
de que fala
Pound.
DULCINEIA
Ao começar a chover,
após a estreia moderna,
cheia de danças,
dAs Conchambranças de Quaderna,
Ariano,
seguindo o Plano,
vê,
de cima do terraço do Centro Cultural de Garanhuns,
alguns,
depois um mundo de guarda-chuvas de luto - como
num reduto de viúvas - abrir-se de quatro em quatro,
ao sair do teatro,
quando... uma determinada sombrinha .
iluminada por dentro (coisa banal, mas pra
ele... um sinal),
floresce.
E ele...
Já vira,
no palco,
o raivoso Bozo - a cara branca de talco - dizer
que "elas",... insatisfeitas-porque-imperfeitas,
iludem os pobres romeus
com seios e a esbelta cintura, cheiros e a bela estatura,
que não são seus.
Ao que Ariano,
sorrindo,
lembrou-se,
até que se divertindo,
de que já vira Trancoso - delícia pura!
- cantarolando, bem langoroso,
A MOÇA ESCOLHIDA,
(a da sombrinha florida),
consente nesse lance, contente,
e Só Leo,
que a considera (coisa de idoso) "um pitéu!",
dá-lhe todo um banho de loja,
a que ela - surpreendentemente - se arroja.
Aceita as tais lingeries e outros ardis,
que incluem cabelos e
cílios postiços,
a pele com novos viços,
tinta, maquiagem, cinta, rinsagem,
mais manicure, saltos altos, a pedicure,
tudo que a torna... letal,
fatal,
graças ao sonho de que se sente vassala,
com filhos,
conta no banco,
marido,
tudo sensato na sala.
Diz-lhe o Ariano,
decano:
Tome o tento que puder com Bozo,
que não gosta de mulher.
De repente,
o susto,
e a que custo:
rompe-se o colar de pérolas,
que,
numa chuva de esférulas,
se espalha no piso,
em metralha,
e ela diz:
- É aviso!
Vai-se do vestido - no espelho - o vermelho.
E vêm nuvens,
a ribombar beethovens.
MANDREIKE SUSSURRA:
- Hurra!
e empurra as contas,
que saem,
tontas,
rumo a Trancoso,
que sente,
nervoso,
a pulsação na aorta.
Abre... a porta ... e vê,
Pura loucura,
a da multidão que se crê na iminência de ver -
na vigésima primeira centúria - a Pedra
do Reino se abrir,
mediante sacrifícios humanos (lendas de lusitanos),
e,
de dentro dela,
o Sumido,
o Desejado, o Encoberto,
o Adormecido
sa1r,
no sebastianismo que,
aqu1,
já deu tanta vida ceifada
por absolutamente nada.
Maior,
ainda,
é a insânia,
extemporânea,
dessa paixão histérica,
Ariano,
que,
mais do que antes,
via em Sonia a única a crer na
presença... real... de Cervantes,
ru
Mas acredite:
a Keynes, Ricardo, Marx, Adam Smith
se deve a expansão - de grande ou menor extensão -
do nosso
limite.
NÃO,
A HUMANIDADE É o CÂNCER DO
PLANETA TERRA - diz o Bozo,
furioso:
- concordo com o cara da ficção Matrix.
Há fome e guerra,
sempre,
e doentias ... psiques.
O horror!,
diz Kurtz, no Coração das Trevas,
O horror!,
Pausa.
Causa:
o Astier,
a rebater:
- Mas Nel mezzo del cammin... há uma Pedra.
-Sim,
mas tenho pra mim... que Suassuna e Saavedra,
que, aparentemente, só cuidam do estético - sabem
que vem aí um especialista em demolições,
um técnico,
pra implosão dela - e é pena, porque
bela - com máquinas tirânicas,
titânicas,
prontas pra lhe recolher os pedaços
e abrir de vez os espaços.
Os helicópteros, todos já viram.
Talvez,
no entanto,
prefiram...
caças a jato,
que vêm pra dar uns rasantes... no Ariano e Cervantes,
se vão às vias de fato.
-No,
el peor villano dEspana - Don Juan Tenório,
El Burlador de Sevilla - es de Tirso de
Molina y de José Zorrilla.
Cervantes,
de repente lívido,
diz ao Ariano que
se ele se volta agora,
ávido ou não,
conhecerá o vilão.
Ah,
o caos
em altíssimos graus
no que todos - naquele lugar - se põem a gritar:
Outro
vê a bala
que lhe destroça a cabeça,
na sala,
Marcelo morre
em cirrose,
Bozo se vê fuzilado,
Trancoso ao lado.
o Salvador, enforcado.
Já o Astier,
aos noventa,
ri do vigor que ostenta,
Aí o que se vê é um clarão,
apagão.
A luz do dia retorna,
transtorna,
causando cegueira,
até que - da romeira ao monge, lá longe
- o susto do mundo vai fundo:
um tronco - que irrompe do subsolo num
solo, bronco, de tuba - sobe - em trombos
e clarinadas - pra fantástica juba,
em que a Morte,
embuçada,
surge - forte - na trovoada,
de alfanje que a tudo abrange,
BOZO,
NERVOSO:
- Não vos ocupeis com o dia de amanhã,
disse Jesus.
-...Mas - diz o Trancoso, odioso - não se
zangue se à véspera da cruz lhe falte o elã
e ele sue sangue.
- Claro,
como qualquer filho de Deus.
Como qualquer de todos esses bilhões de eus.
Mas... você não crê no Cervantes... mais do que
antes. Nem na vinda de el-rey, Dom Sebastião,
apesar da visão. Não acredita... em nada!
-- A "senhora" está enganada:
MOVEM-SE OS TANQUES,
CRUSTÁCEOS,
E O ASTIER - EM SONHO - vê os vários cetáceos,
ou zepelins,
com feixes de peixes - aeronaves
menores - nos seus arredores.
Vê,
pelas frestas,
serestas,
e,
no relento,
fogos-fátuos, centelhas acesas, vermelhas,
ao vento.
ARIANO DELIRA,
DIZ "BOM",
NO SERVIÇO DE SOM,
SUSPIRA,
E,
COMO SE NUMA PEÇA,
COMEÇA:
- Senhores de grandes feitos,
damas de brandos peitos:
todos verão que os dragões
que vêm com seus batalhões,
e em forma de escavadeiras,
são as fatais "matadeiras"
astrosas e furiosas
que destruíram Canudos,
matando os povos miúdos,
CERVANTES SOBE,
CONFIANTE,
NO DORSO DE UM ELEFANTE.
Ergue a destra (a sinistra, oculta) que estava
pousada na empunhadura da espada,
e extasia,
no que aponta pra longe
e anunc1a:
- Yo veo a los reyes, reinas
en esta gente que llega;
caballos,
torres,
coringas
con damas biancas y negras,
a/files con mismas llamas vienem de todos los lados;
obispos junto a peones,
valientes y apressurados.
De fato:
- Lá vêm, sim! - diz o Trancoso a
Bozo. - E é tudo de fino trato:
são as rainhas... e reis, como ele disse, visse?
Tintim por tintim!
É então que,
do alto da sua altura e da idade,
Ariano vê a novidade:
- Lá vêm - e como! - os raparigueiros, tropeiros!
O Cariri, Moxotó
e o Pajeú
festeiros!
E lamenta
(quase acalenta):
ASTIER
DIZ PRA TRISTONHA SONIA,
SEM SABER POR QUÊ:
- Como yo... ,
desde que vi la iglesia de Santa Bárbara de las tormentas
con pararrayos!
Trancoso,
Jocoso,
ao deter,
também,
buscando não lhe causar dano,
Ariano:
- Que tal? O senhor não é imortal?
- Só a obra! O resto fica pelo caminho,
feito couros de cobra!
AÍ
A TEMIDA DA CRISTANDADE FALA,
COM VOZ QUE ABALA:
- Escuchen mi vaticínio!
Mirem la fiesta dei Trancoso cuando,
~por pasión!
ARIANO RESPONDE
NO MESMO PLANO:
- Pois olhe a paisagem alucinada,
a região revoltada:
as árvores - secas - são os neurônios
(atormentados pelos demônios),
da multidão agitada!
A ORAÇÃO CRESCE,
VELOZ,
COBRE-LHE
AVOZ.
A Morte,
no entanto,
A multidão,
no escuro,
geme e teme, abandonada,
mais do que tudo,
o Nada!
Aí,
há o rumor cavernoso da Pedra do Reino a se abrir,
e um vulto oculto - a catedral! - começa, então, a emergir,
Trancoso,
sempre bem cauteloso,
vê esse ser (como todos os outros:
mais leves-que-o-ar) a falar,
e ... sabe - embora não seja descrente - que não se
trata da Virgem, mas de algo na própria mente,
o feminino em seu eu,
que lhe fala,
insinuante, mas muito
atuante:
- Assim que conhecer Dulcineia,
viverá, com ela, a epopeia,
à frente de todo esse povo,
o que o fará um homem novo.
- A senhora quer é um Moisés! ...
- E não me meta as mãos pelos pés! ...
- Mas ... pelo que sei,
além do Cervantes, virá - do além - Lampião, ou não?,
pra desencantar el-rey!?
E aí,
embargo na voz:
- Nós... somos,
sempre,
... SOS.$
Não vemos,
do Outro,
nada além dos olhos... que também,
angustiados, olham os nossos,
de um cofre de ossos.
A sua mente é a minha, Rainha! Algo claro e
confuso. Feito legendas... num filme luso.
- Sei que você não é santo - ela lhe
diz, ajeitando o manto - mas,
cá entre nós,
Nesse instante,
elefantes do circo,
deselegantes,
fazem das trombas trombetas,
e a Virgem... some,
(feito fome em quem come),
com anjos e a catedral.
E aí a Pedra se fecha,
sem brecha,
etc e tal,
Cervantes,
fiel,
pede ao céu,
nessa hora:
- A ti me vuelvo,
Senora
y vos toca el darme la ayuda.
Que a Dulcinea y Trancoso vuestro favor acuda.
Dulcinéia,
tremendo,
embora louca de alegria
diz:
- Afe Maria!,
Eu não vou me fazer de rogada!
Mas Ariano,
Cervantes,
isso não será uma roubada?
OS JORNALISTAS ESCREVEM,
E A INTERPRETAR OS FATOS
SE ATREVEM:
AO GRUPO DE REPÓRTERES,
QUE JÁ É GRANDE,
juntam-se os do Der Spiegel,
Osservatore Romano
... e o da Time,
que atribui o delírio coletivo
ao Santo
Daime.
Para,
Por isso,
amanhã de manhã - nosso comando não o segreda,
é um compromisso - haverá a implosão da Pedra!
Era só o que faltava,
Bozo,
pra ela,
maldoso:
- Já vejo numa revista, escrito em língua estrangeira:
Paixão à primeira vista
... pena que derradeira.
Ariano,
que vê em Bozo uma bisca,
pisca pro Cervantes,
o que o faz lembrar (por angustiantes instantes) Camões,
e,
sem jeito pra sermões,
grita pra moçada:
- Solta o frevo,
cambada!
Ah,
Dulcineia,
quando freva,
parece amalucada:
dança, de sombrinha armada, toda destrambelhada!
Mas para,
impaciente:
- Gente,
cadê o Trancoso?
Será que está ciente de nosso caso amoroso?
Aí
um moleque,
correndo,
os braços abertos de aeroplano,
imita breque de carro,
barra o Ariano
e diz,
coçando o nariz,
fôlego que se abala, atrapalhando a fala,
os olhos no camaleão (que vem, no chão, na
disparada, os braços arqueados, como em
escada deitada):
- O canto ijexá,
que vem acolá,
em ioruba,
acompanhado de tuba,
tão vendo? Grande - parece que sendo, não
sendo? - é dos Filhos de Gandhy!
Diz Ariano:
- Então:
é o próprio Gandhy,
que,
mais do que grande - titânico - embora nanico,
enfrenta o Império Britânico!
- Vamos frevar,
minha gente,
vamos saudar,
noutra frequência,
o homem da Não-Violência!
- Si,
que el Maracatu Elefante cante,
exultante!!!
Ah,
tudo bem!, Dulcineia diz,
impaciente,
com a incógnita,
O XIS.
Vem,
devagar,
-Bem,
há o ser
e o não ser.
Se o vão entre as colunas têm nome,
que é o inter. .. colúnio,
e o tempo em que não se vê a lua,
o ... interlúnio,
não vejo razão pra que alguém que
não crê no que vê ... calune-o.
Dulcineia se anima :
- Você agora me deixou sem rima...
Bozo,
maldoso:
Trancoso,
quase que langoroso:
- Então é você a Dulcinéia,
que eu herdei de Quixote!
Pia como late meu peito: mais que um coiote: alcateia!
Sabe que me sentiria um blefe,
sem ás,
Oliveiras desarmado, desafiado por Ferrabrás,
se eu agora acordasse e visse que isto é um sonho?
Seria,
suponho,
um junho sem Santo Antonio,
petróleo sem Petrobras.
O casal para.
Se encara.
Bozo,
ardoroso:
- Por que uma mulher entre os dois?
Por que, se,
depois,
é o adúltero útero...
e os seios, que - apagadas as chamas -
são mamas no corpo efêmero?
Paixão?
Não.
É um lauto banquete, de que se omite,
cacete!, o arroto escroto
e o esgoto!
- Senhoras e senhores!,
acabam de ser assassinados na Grata dos
Angicos, pelos milicos, depois de cercados,
e de mil horrores
Aí,
de repente,
ele larga o aparelho:
- Afundo!,
sente um tempo ... anterior
ao mundo.
A alma de Dulcineia,
leve como de vime,
pesa,
com esse crIme,
e ela se irrita
e grita:
- Bozo! Saavedra! Trancoso: pra Pedra!!!. ..
O épico é hípico!
Trancoso monta,
liga o terremoto da moto,
e
- Decolar! Decolar! - grita Sô Leo a
Ticiana e a Bonner e a seus câmeras,
e a Didier,
e a Sonia e ao Astier.
Coopta, áspero,
do helicóptero - o chão, já, a se afundar - "Decolar!,
todos - de imediato - a filmar!",
e tanto o dono do circo,
quanto o piloto (Birko)
e Sô Leo,
entusiasmado,
dão arrancada de galopes que se repete nos laptops,
e lá se vão as trombetas, cornetas, bombos,
tombos, carreiras, trombadas,
quedas,
viradas,
sustos e derrapadas,
doses de Filhos de Gandhy,
Mandreike - dândi, realmente elegante,
de fraque e cartola, num elefante,
a multidão - sedenta de guerra - dos Sem-Terra,
e a zoe1ra,
a poeira,
a leva de TVs cobrindo - com sanha já destravada,
partindo - a grande avançada.
À PEDRA!
Chove molotov.
Ariano vibra,
com fibra,
Insano,
. .
corcove1a, morro acima,
e a rima que vê, do camelo - Saavedra-e-zebra
- faz com que se arrepie, dos cotovelos
aos tornozelos
e nem se dê conta- ao vê-los - do repentino
avanço (que não tem quem tranque) dos
tanques,
de modo que, quando pensa em mudar de rumo,
ca1,
a prumo.
No entorno da Pedra,
balas traçantes tiram finos em Cervantes,
e uma acerta o Mahatma
e o mata.
O espanhol,
na entrevista pra Ticiana sobre o que vem do futuro,
dissera,
em belíssimo furo,
sem alegria:
- Poesía. Dê-lhe, hasta el verso derradeiro,
- disse com pasión - la atención, ... de quien
conta dinero... ou lê notas en sinfonía!
E,
de fato:
da palavra ao ato,
vemos a Morte criar,
sob nós - algoz - um rastro de sangue que nos aterra
e que vem dos etruscos e Tróia,
passa- em estúpida paranoia - pelos
desastres de la guerra,
de Goya
e dizima Hiroshima.
Trancoso acelera,
põe Rocinante ao par do Fogoso
no que ruge a Bozo,
feito uma fera:
- Vamos ao bang-bang, ao banho de sangue!
Bozo só vê Dulcineia:
- Megera!
Sô Leo,
então,
faz com que o povo cante
de novo,
agora do céu,
pelos alto-falantes do helicóptero,
know-how
do Apocalypse Now:
Trancoso,
na Rocinante à toda,
intrêmulo,
sai das veredas
no estrépito do lábaro estrelado - estalos de labaredas.
Tático,
tem de ser acrobático,
pois a metralha que o ataca, a tudo retalha, estraçalha.
Um estilhaço - a ricochetear - bate no
sidecar e na armadura de aço.
E eis o Trancoso
ceifando,
matando.
Acorda
ante a plateia;
vê Dulcineia - toda beleza, despida e
presa- na rocha mais baixa
e tudo se encaixa:
o Bozo,
choroso,
no vão entre os dois,
braços e pernas em xis,
o pelotão,
lá embaixo,
os fuzis,
e
lá atrás
a multidão - no estado de suspensão - à
espera do grande escarmento:
um triplo... fuzilamento.
A ordem,
que vem da Morte,
passa pelo Comando
e diz:
-- Mesmo que o Governo se
zangue,
antes que se desintegre a Pedra, que
haja o banho de sangue!,
e que o mundo veja - aberta a fenda - que só há,
nela,
a lenda!
Na escuridão
resplandece,
com todos os seus vitrais,
com profusão de torres
e imensidão de portais,
a catedral alumbrante
como se fora diamante.
E os anjos,
aos milhares,
... vão
do alto de seus pedestais,
prosares!
De Mandreike e Sô Leo,
ao Comandante e Astier,
de Ticiana a William Bonner,
à Sonia, Joubert, Didier,
o mundo... boquiaberto... vê o céu
- que Existe! - de perto,
com todos os seus sons - de violinos a
sinos, de coros a clarins - divinos!
DANIEL ZANELLA
editor do Jornal RelevO