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Capítulo ‘Uma ampla margem para o maravilhoso’: Robert Louis Stevenson

Shaw, Valerie. The Short Story: A Critical Introduction London: Longman, 1983.

Tradução livre: Prof. Dr. Jean Paul d'Antony

Ele deixa uma margem tão ampla para o maravilhoso que ele escapa do perigo de ser
criado pelos casos pelos quais ele não permitiu: quando ele concede Sr. Hyde, ele
concede tudo - é improvável que tenha maior personagem, porque ele envolve os mais
belos sentimentos...

(Henry James sobre Stevenson)

Entre os contistas capazes de aceitar riscos artísticos e prolíficos, Stevenson


fornece um caso exemplar. Ele incorpora certas forças que são cruciais para uma
compreensão da maneira que o gênero se desenvolveu. O amálgama das influências e
condicões prevalecentes no último quarto do século XIX é discernível na obra de
Stevenson, e por esta razão o breve capítulo presente investigará seus métodos e
realizações. Parte da intenção é demonstrar em relação a uma figura única e
transacional alguns dos assuntos que passam por este estudo inteiro, embora, é claro,
Stevenson amplamente retribui o estudo tanto em seu próprio direito como uma
grande influência de um escritor aparentemente muito mais sofisticado como Borges.

A realização de Stevenson como escritor de contos os decididamente ímpar. Ele


foi competente em examinar algo incoerente como ‘The Pavilion on the Links’ (1882),
o qual ele descreveu como uma ‘uma grandiosa estória sobre carpintaria em nove
capítulos e eu devo hesitar em dizer quantos quadros’. Esta estória foi feita para
ganhar dinheiro, não testar nenhuma noção de forma artística. Mesmo assim, ele foi
igualmente capaz de produzir estórias que têm merecidamente se tornado parte da
tradição literária britânica (e em certo ponto, da mitologia popular); a mais notável é
‘The Strange Case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde’ (1886), mas há também a bela ‘Thrawn
Janet’ (1887), a qual Stevenson ‘não conseguiu deixar’ de entregar para publicação
porque mesmo que seu dialeto escocês pudesse deter os leitores, ‘era boa demais’. A
estes deve se adicionar ‘Markheim’ (1887), onde os efeitos macabros são
aprofundados pela seriedade alegórica, e ‘Will O’ the Mill’ (1887), na qual Henry James
encontrou ‘ a qualidade mais fascinante que uma obra de imaginação pode ter – um
traço de mistério alternativo ao seu significado, um ar (o ar da própria vida) de meio
convidando, meio provocando você a interpretar. Estas provocantes obras primas co-
existem com produções efêmeras o cenário cômico de ‘Providence and the Guitar’
(1882), e ‘The Misadventures of John Nicholson’, que Stevenson certamente teve
razão em chamar de ‘uma boba estória de natal’.

A obra de Stevenson é uma tal mistura do valoroso e do medíocre que ela tenta
desconsiderar as estórias soltas e escritas em excesso em favor do punhado de
narrativas que torna plausível argumentar que ele é um dos criadores do conto
moderno. Uma questão para Stevenson como um hábil artífice pode certamente ser
feita se a ênfase for dada aos seus diversos usos da voz narrativa: sua habilidade de
moldar seu material de acordo com o ponto de vista de um forasteiro solitário e
isolado fornece base para a consequente vantagem de James e afirmando que a
questão da forma esteve sempre viva em Stevenson. Uma questão viva
indubitavelmente foi que Stevenson pegou o princípio da unidade do efeito com uma
firmeza que o torna o herdeiro direto de Edgar Allan Poe. Mas não há nada secamente
teórico com a maneira que Stevenson explora tópicos estéticos: quando ele proclama
a necessidade de alcançar o inteiro orgânico na ficção curta, é com todo verve de um
autor praticante que está ansioso para alcançar o público. Como o seguinte trecho de
uma carta para Colvin mostra, Stevenson tem firmeza de como sua arte funciona
melhor:

Fazer um outro fim para isto? Oh, sim, mas não é assim que escrevo; os efeitos
que devem se seguir; é disso que uma estória consiste. Fazer um outro fim, é fazer o
começo todo errado. O desfecho de uma estória longa não é nada; é apenas um
‘fechamento completo’, do qual você pode se aproximar e acompanhar como quiser –
é uma coda, não um membro essencial do ritmo; mas o corpo e o fim de um conto é o
osso do osso e o sangue do sangue do começo.

Similarmente, e na língua que é mais notoriamente reminiscente de James, Stevenson


declara no Prefácio de Familiar Studies of Men and Books (1882) que o escritor de
‘estudos de contos’, ‘por ter se prendido ao seu ‘ponto de vista’ deve ficar com os
olhos fixos nisso’, pois esses pequenos pedaços ‘são, ou deveriam ser, coisas tecidas
como um carpete, do qual é impossível tirar um cordão.’

Como teoria, isto chega notavelmente próximo à visão prevalecente do século


XX de que o conto difere do romance em termos de estrutura e concepção, não
meramente em comprimento. Mas a prática de Stevenson nem sempre corrobora sua
compreensão em assuntos formais; mesmo em pequenos contos, ele tende a ser
melhor nos começos do que nos fins, e relativamente poucas de suas estórias têm o
tipo de avanço narrativo e temático que faz a conclusão uma consequência satisfatória
e inevitável da abertura. As melhores coisas na ficção curta de Stevenson na verdade
têm pouco a ver com a forma, exceto como um ideal artístico, e isto não é ao todo
surpreendente se for dada consideração às circunstâncias que estavam vinculadas a
restringir qualquer avanço que ele pudesse fazer rumo ao conto verdadeiramente
moderno. Primeiro, há um fato sério que no século XIX não se achava de modo algum
estranho serializar contos assim como romances: ‘Providence and Guitar’, por
exemplo, apareceu pela primeira vez sob o título mais específico ‘Leon Berthilini’s
Guitar’ em quatro seriados semanais no periódico London (2-23 Nov. 1878); e os
primeiros leitores de ‘ The Pavilion on the Links’ teriam tido que esperar um mês para
descobrir o que acontece com o narrador, abandonado no fim do primeiro seriado,
solitário pelo pavilhão varrido pelo vento com apenas uma luz de uma persiana
rachada para conforto. Publicar contos pouco a pouco era comum, Thomas Hardy foi
um outro autor da época a fornecer contos para serialização; tanto ‘The Melancholy
Hussar of the German Legion’ (1894) quanto ‘The Withered Arm’ (1888) apareceram
pela primeira vez desse jeito. Mesmo quando um escritor não gostava da prática,
como Henry James, não havia muito a se fazer a não ser reclamar quando suas estórias
cuidadosamente estruturadas eram cortadas: Lamento que o senhor tenha que
publicar [‘Lady Barberina] como três’, James escreveu para o editor da The Century in
1884, ‘o interesse não é calculado para isso’. Em outras ocasiões, quando James de
fato atendeu ao hábito de fragmentar estórias em seções, ele ainda achou que seus
próprios desejos poderiam ser deixados de lado, como foram quando ‘The Aspern
Papers’ (1888), que ele pediu para ser dividida em duas partes (‘nenhuma outra’,
estipulou ele), foi publicada em três.

Independente do que o escritor possa acreditar sobre ‘o corpo e o fim de um


conto’ ser ‘o osso do osso e o sangue do sangue do começo’, a publicação periódica
significava que o fim seria separado do começo, com o resultado de que uma
tendência em pensar em termos de episódios ou até seções semelhantes a capítulos
fosse perpetuada. Até James modificou sua irritação a respeito da divisão de ‘Lady
Barberina’ porque ela parcialmente o fundamentou para encontrar ‘o processo de
escrever uma estória muita curta’ crescentemente difícil: ‘A medida que a pessoa fica
mais velha, e vê e aprende mais, torna-se mais difícil espremer este assunto ampliado
em brevidade de forma, e eu acho que eu devo abrir espaço. A serialização forneceu as
todos esses escritores e aos seus contemporâneos o ‘espaço’, mas da mesma maneira
suprimiu as tentativas de se alcançar a forma compacta. Este problema não ficou só
confinado aos escritores anglo-saxões: Chekhov tinha razão para resmungar a cerca
das condições de publicação e adotar uma postura provocadora. ‘Em apenas caso’,
escreveu ele, ‘é essencial co-operar com as grandes revistas: - uma obra longa não
pode ser fragmentada em pedaços, dever ser publicada por inteiro’: nenhum outra
consideração poderia ter feito Chekhov parecer estar cortejando ‘os periódicos de
imposição’, os únicos a que poderiam ser confiados as obras longas.

Uma segunda, mas não necessariamente danificante circunstância que restringiu os


poderes inovadores de Stevenson foi que atrás dele tinha uma tradição de contar
estórias como a primeira atividade recreacional. ‘Ficção’, escreve Stevenson em seu
‘Gossip on Romance’ (1887), ‘é para o adulto o que peça é para a criança; é lá que ele
muda a atmosfera e o sentido de sua vida.’ Em sua crença de que ficção oferece um
amálgama de prazer e instrução, Stevenson olha para trás mais do que para frente; ele
olha para trás para o gosto do começo do século XVIII pelas reflexões morais no trajeto
da simples narrativa e da caracterização típica. O objetivo de seu título escolhido para
a coleção New Arabian Nights (1882) é óbvio, e vale a pena lembrar que foi no período
de Tatler e Spectator que o original Arabian Nights teve popularidade na Inglaterra, o
conto oriental que desempenhou um papel proeminente no início da ficção periódica.
Diferente de seus antecessores do século XVIII em várias formas, Stevenson faz uso
comparável de ambientes exóticos e estranhos, misturando a modo de um ensaísta
moral e um narrador, mesmo embora sua moralidade seja muito mais ambígua e
elusiva do que qualquer coisa a ser encontrada nos contos didáticos de Addison ou Dr.
Johnson.

Enquanto certos aspectos do conto de Stevenson são superficialmente reminiscentes


do jornalismo do século XVIII, contudo, as inclinações mais profundas que caracterizam
sua obra estão totalmente fora da limitação neo-clássica; a escrita de Spectator ele
achou ‘tudo muito bom’, porém enfadonho. Sua afinidade foi mais com a
extravagância que, mas perto de sua própria época, provara uma força dominante no
desenvolvimento do conto, especialmente na América. Edgar Allan Poe em 1840 tinha
garantido que a fantasia e o exagero substituiriam a beletrista, e Hawthorne ampliara
decisivamente o escopo do conto usando o ponto de vista solitário para explorar os
mistérios negros do coração humano. Os dois escritores foram agradáveis com
Stevenson, embora ele reconhecesse a maior estatura de Hawthorne, em cuja obra ele
encontrou qualidades chaves de ‘unidade’, uma ‘propósito criativo inabalável’ e uma
habilidade para criar uma ‘impressão única e vívida’. A América ofereceu lições
estilísticas também: ler Thoreau, para Stevenson, era encontrar ‘um escritor parabólico
e exagerado’, entender por completo que Thoreau estava apenas ‘no ponto de vista’ –
que ‘o método adequado de literatura e por seleção, que é um tipo de exagero
negativo’. Em todos esses escritores, que trabalharam numa tradição estrangeira, mas
cada uma pertencente inicialmente, como Stevenson, a uma cultura regional, ele
provavelmente encontrou suporte para sua crença de que a ficção deveria
constantemente retornar as suas origens primitivas na fábula e no entretenimento
caseiro, favorecendo o exagero mais do que a discrição e a elegância. Ao mesmo
tempo, os exemplos americanos o ensinaram os perigos de exagerar muito
descaradamente, como Thoreau fizera, e fortaleceram sua convicção de que o
caminho para emocionar os leitores era omitir e selecionar, exagerando
negativamente.

De importância aqui é a própria teoria de fábula de Stevenson, a qual ele


esboçou numa primeira análise de Fables in Song de Lord Lytton (1874). Este ensaio
mostra claramente o tipo de tensão a ser encontrado em Stevenson entre sua
consciência de que as possibilidades literárias estavam mudando e seu profundo amor
simples formas antigas. Stevenson analisa a fábula típica como uma forma que usa
uma concepção puramente fantástica e normalmente um tanto trivial para estabelecer
algum preceito moral; elementos essenciais são o lúdico e a concisão e a lição deve ser
apreendida pela fantasia em meio a uma sugestão. O valor do tipo original de fábula,
de acordo com Stevenson, estava num ‘tipo de impropriedade bem humorada’, um
tipo de liberdade e exuberância que ele percebeu que não poderia facilmente
sobreviver a crescente sofisticação e seriedade dos leitores modernos.

Stevenson parece nostálgico pela irrealidade palpável e a simplicidade moral


das formas antigas: o ‘tipo primitivo de fábula’ expressou ‘uma humanidade, uma
ternura de verdades duras; para que assim no fim de alguma estória, em que o vívido e
a loucura se tinham se encontrado com sua punição destinada, o fabulista pode ser
capaz de assegurar a seus ouvintes, como nós temos frequentemente que assegurar a
crianças chorosas em ocasiões similares de que elas podem secam seus olhos pois
nada daquilo foi verdadeiro’. Ao trabalhar contra esta simplicidade Stevenson vê
forças que ele resume na frase ‘a centralização progressiva do pensamento moderno’;
novas tendências, acredita ele, vão deixar a fábula menos fabulosa restringindo o
lúdico do autor. Ainda haverá brevidade e uma ideia moral a compreender
intelectualmente ao invés do envolvimento emocional; a caracterização ainda será
‘mecânica’; mas ‘o fabulista agora busca analogias onde antes ele meramente buscava
situações engraçadas. Agora haverá um nexo lógico entre a moral expressa e a
maquinaria empregada para expressá-la.

Enquanto Stevenson continua a descrever esta forma artística mais rigorosa e


alterada, é difícil dizer exatamente se ele está exultante ou deprimido pelo desafio
apresentado. Ele observa que o leitor destas estórias vai ser deixado mais para si
mesmo resolver ‘o vago, problemático, e ainda não criado sentimento moral, e ele
enfatiza que a própria moralidade terá que se tornar penetrante e difusa por todo
material:

Deixa de ser possível anexar [a moral], numa etiqueta, ao fim do fragmento,


como se pudesse escrever o nome de uma caricatura; e a fábula começa a ser superior
a todas outras formas de literatura, como algo ambicioso demais, apesar de suas
dimensões em miniatura, a ser retomada em qualquer fórmula sucinta sem a perda de
tudo que é mais profundo e mais sugestivo sobre isto.

Assim o ganho pode ser uma sugestividade que Stevenson claramente valoriza e
importa na mais moralmente ambígua de suas próprias estórias, mas a perda é de algo
agradável – o que ele chama de ‘elemento incrível, o ponto da audácia com a qual o
fabulista estava habituado zombar de seus leitores’. Contra esta prática, é possível
encontrar nos contos de Stevenson um número de tentativas para estabelecer seu
senso moderno de que a moralidade não é uma questão de etiquetas elegantes, e para
fazer isto sem renunciar a ‘impropriedade engraçada’, ilogismo fantasioso e lúdico – se
não inteiramente ridicularizante – a relação entre o autor e o leitor, tudo que ele
valorizou na fábula antiquada. Um conto menor mas enormemente influente, ‘ A
Lodging for the Night’ (1882) ilustra claramente as técnicas nas quais Stevenson
conseguiu evitar ‘o nexo lógico entre a moral expressa e os mecanismos empregados
para expressá-la’, oferecendo ao invés uma narrativa que combina o grotesco
semelhante a Poe e a seletividade sagaz, ou ‘o exagero negativo’. Insatisfatório em
diversos quesitos, ‘A Lodging for the Night’ porém apresenta características que indica
uma direção que o conto devia tomar, e é significativo que quando vinte e quatro
autores foram questionados pelo New York Times em 1914, ‘Qual é o melhor conto
em inglês?’, o conto de Stevenson, junto com o de Bret Harte ‘Outcasts of Poker Flat’
(1870), deveria ter saído favoritos. Obviamente, sentiu-se que Stevenson tinha
superado as primeiras conquistas de Poe e Hawthorne em emancipar o conto do
ensaio.

Neste quesito, é importante observar que para o próprio Stevenson a estória


representava um ponto de virada, e também que ‘ A Lodging for the Night’ evoluiu de
um ensaio sobre François Villon que ele tinha tencionado escrever no começo de 1875,
mas que só se materializou dois anos depois. Em maio de 1877, seguindo o conselho
de Leslie Stephen, abandonou o plano de publicar um livro de ensaios, e até agosto (o
mês em que seu retrato-ensaio de Villon apareceu na Cornhill Magazine) ele estava
procurando em outro lugar uma melhoria na sua renda: ‘Eu começo’, ele disse a
senhora Sitwell, a ter mais esperança no curso da estória. Era evidente que Stevenson
estava indo para uma nova direção, e esta impressão é fortalecida pela recente
descoberta de Roger Swearingen de uma estória de Stevenson chamada ‘An Old Song’
que apareceu anonimamente em quatro séries semanais da ‘Feuilleton’ na revista
London (24 fev. – 17 mar. 1877). Três anos antes disso, Stevenson planejara um ‘Livro
de Contos’, mas a ideia tinha sido abandonada; agora, parecia que escrever e publicar
contos devia se tornar uma preocupação primordial, envolvendo alguns ajustes de
métodos artísticos e em particular uma determinação clara de evitar bela escrita e
embelezamentos estilísticos. Após publicar seus ensaios sobre Villon, ele escreveu, na
mesma carta para senhora Sitwell: ‘Estou contente que tenha gostado de Villon; uma
parte dele não ficou tão boa quanto devia, mas no todo parece bastante vívido e os
traços fortemente marcados. Vivacidade e falta de estilo é minha direção agora; estilo
está todo muito bem, mas vivacidade é a real direção do país. Então, num comentário
caracteristicamente descartado que talvez reflita na sua pobre opinião do público
leitor geral, ele adiciona o truísmo maçante: ‘se algo deve ser lido, parece bom tentar
deixá-lo legível.

Mas embora 1877 possa ser tomada como a data depois da qual a ficção começou a
substituir o ensaio na obra de Stevenson, sua percepção de que o poder do conto pode
depender de resistir ao invés de cultivar a bela escrita emergira alguns anos antes. Há
uma carta fascinante de janeiro de 1874 na qual Stevenson conta a Colvin a cerca dos
problemas que ele está tendo com uma estória que ele nunca terminou. ‘The Curate of
Anstruther’s Bottle’. Obviamente Stevenson está insatisfeito com os modelos literários
herdados; ele está se incomodando a respeito da restritividade de uma convenção que
o atinge tão possivelmente ‘bem no estilo daquelas curiosidades decadentes, poemas
sem a letra E, poemas iniciando com o alfabeto e coisas do tipo’. Stevenson mostra o
quão ciente ele está dos perigos da pura ingenuidade no conto, propondo como freio
necessário nas tendências decorativas e de auto-exibição a virtude da credibilidade. A
necessidade de convencer o leitor, independente da convenção, torna apropriado para
o escritor ‘confiar no interesse essencial de uma situação e não paparicar e validar
fracos tramas com cenários e escritas bons e incidentais, e exibições pirotécnicas de
esperteza e sensibilidade impróprios, para reforçar sua ênfase na primazia do sujeito
em narração, Stevenson se recorda de uma conversa com seu primo Bob a cerca do
que um artista poderia fazer com o quadrilátero na Universidade de Edinburgh. Vale a
pena comentar sobre o episódio porque ele tão forçosamente demonstra três grandes
princípios que são evidentes nas mais bem sucedidas e mais inovadoras estratégias de
narrativa de Stevenson.

Primeiro, há sua crença de que o local e a topografia deve sempre servir um


propósito narrativo direto e deve estar disponível ao leitor não em exposição, mas
através de ação; isto tem se tornado um artigo de fé para maioria dos escritores
posteriores. Segundo, associa caracteristicamente efeitos de luz com as situações
específicas dos personagens dentro da estória; este invenção ocorre por toda sua
ficção, onde um ponto de luz simples e (frequentemente vulnerável) é posta contra os
arredores da escuridão, criando um contraste dramático e comovente. A luz de vela
oscilante em ‘Markheim’; a vela que Sr. Soulis em ‘Trawn Janet’ carrega de seu
presbitério para a escuridão, onde ela queima no ar com firmeza sinistra; e a lanterna
do narrador na cena climática de The Beach of Falesá (1892) são exemplos notáveis;
em todas as três obras a preocupação artística de Stevenson em iluminar a cena
colabora eficazmente com seu interesse psicológico do ponto de vista subjetivo e
solitário sobre os eventos. Por fim, as palavras de Stevenson para Bob revelam sua
atenção constante a integridade e unidade narrativa. Ele lembra dizendo

Que as portas e escadarias diferentes devem ser trazidas diante do leitor não
pela mera recapitulação, mas pelo uso delas, pelo declínio de pessoas diferentes uma
após a outra por cada uma delas. E que o grande traço da sombra e da luz de uma
luminária no canto deva também ser introduzida só para que elas possibilitassem às
pessoas na estória ver uma a outra ou preveni-las. E finalmente que o que não pudesse
ser assim trabalhado dentro da evolução da ação não tinha direito de ser celebrado.
Afinal de contas, é uma estória que você esta contando; não um lugar que você tem
que descrever; e tudo que não se anexe à estória está fora de lugar.

Como seu antecessor americano Poe, Stevenson viu como era essencial fazer cada
detalhe contar no conto, onde o momento da narrativa tinha que ser mantido se o
auto fosse se beneficiar completamente de ter atenção ininterrupta do leitor durante
o simples assento no qual uma estória poderia ser lida.
Stevenson estava obviamente ciente das possibilidades especiais, assim como
das limitações do conto, mas seria tolo afirmar que na prática suas estórias sempre
alcançaram unidade, a qual poderia ser chamada de ‘orgânica’. ‘The Merry Men’ por
exemplo, que ele anunciou para Henley em 1881 como ‘minha primeira inovação
numa estória’ e que ele pretendia ter o efeito da música (‘uma fantástica sonata sobre
o mar e os naufrágios’), foi concebida episodicamente, em termos de capítulos, ao
invés de tematicamente. Provavelmente o bastante, quando estiver terminada eu
descartarei todos capítulos; pois a coisa é escrita diretamente’, diz ele a Henley,
admitindo a um procedimento que sugere uma certa quantidade de tensão entre o
momento de escrever a estória ‘direta’ e o tradicional hábito vitoriano de dividir a
ficção em seções ou capítulos.

Teóricos modernos discutiriam que um conto não deveria ser divisível em


capítulos em nenhuma etapa de sua composição ou apreciação, mas mesmo em tal
tentativa inicial como ‘A Lodging for the Night’ o desejo de Stevenson de fazer algo
novo no conto é evidente, a estória de fato tem qualidades que corroboram a
afirmação de Stevenson de que ele estava aprendendo a ser vívido sem se tornar
elegante demais. Começa com uma descrição objetiva que estabelece tempo e lugar
de uma maneira realística porém portentoso, criando uma atmosfera sem vida que é
apropriada aos eventos da singela noite a ser retratada;

Era tarde em novembro de 1456. A neve caía sobre Paris com persistência
rigorosa e severa; às vezes havia uma calmaria, e floco após floco caía do ar da noite
negra, silencioso, tortuoso, interminável. Para os pobres, olhando para cima com olhos
úmidos, parecia uma surpresa de onde ela vem.

Se há risco de alegorias na descrição dos flocos de neve caindo, então é rapidamente


neutralizado pela simplicidade da resposta dos pobres – ‘parecia uma surpresa de
onde ela vem’. O ambiente inicial da estória estabelece uma ligação bastante óbvia
entre o frio extremo e o sofrimento físico, uma associação que funciona por toda a
estória e envolve a prolixa discussão entre Villon e o nobre Brisetout, que oferece a ele
abrigo, carne de carneiro fria e um conselho moral estimulante. Até certo ponto, a
precisão com a qual Stevenson retrata o ambiente e os movimentos de Villon dentro
ele, resgata esta discussão do esquematismo – mas só parcialmente. O confronto entre
Villon e Brisetout, o qual prega que as necessidades do coração (honra, fé e amor)
superam todos os desejos corpóreos, é claramente destinado a fornecer um climáx e é
característico de Stevenson colocar dois pontos de vista extremos da vida em oposição
irreconciliável. O cínico Villon argumenta que a vida moral é meramente o produto de
circunstâncias felizes, ao passo que Brisetout afirma que a possibilidade ilimitada de
arrependimento and graça cristã. Mas enquanto em estória maduras como ‘Markeim’
e ‘Dr. Jekyll and Mr. Hyde’, Stevenson devia encontrat maneiras de dramatizar o
conflito e a moralidade que se dispersa por toda a estória, aqui a oposição permanece
inerte e fixa. O próprio Brisetout é uma figura alegórica demais, sua postura moral
revelada completamente pela tapeçaria nas paredes, ‘representando a crucificação de
nosso Senhor por completo, e numa outra cena de pastores e pastoras num riacho
corrente’ – em suma, Cristianismo e pastoral-clássico unidos.

O que torna ‘A Lodging for the Night’ memorável não é as ideias levantadas
nela pelo gosto de Stevenson pelo análise moral, mas ao invés diversos elementos que
o mostram experimentando as técnicas que o intrigou quando debateu com Bob como
o quadrilátero da Universidade poderia ser tratado com meios artísticos diferentes.
Estes elementos incluem o uso da luz e perspectiva, como quando ele faz algo sinistro
e grotesco através do personagem menor Dom Nicolas, o monge de Picardy ‘ com suas
saias apegadas as suas pernas gordas descobertas pelo calor confortável. Sua sombra
dilatada cortou o quarto pela metade; e a luz do fogo só escapou de um lado de sua
ampla pessoa, e num pequeno espaço entre seus pés espalhados’. Então vem uma
descrição razoavelmente estereotipada da face ébria do monge, antes de Stevenson
retornar ao efeito misterioso da figura: ‘Então ele esta indeciso. Resmungando e
cortou o quarto pela metade com a sombra de sua estrutura corpulenta.
Discretamente, Stevenson preparou para o crime violento com a qual esta cena
culmina.

Mais tarde na estória, um efeito similarmente bizarro é criado pela


manipulação de Stevenson de experiência-sentido registrada de perto quando Villon
para se esconder da patrulha pula da luz reluzente das ruas de neve para a escuridão
de uma varanda meio em ruínas: ‘ele estava tateando para frente com as mãos
estendidas quando ele tropeçou sobre alguma substância que ofereceu uma mistura
indescritível, dura e suave, firme e solta’. Como a palavra ‘indescritível’ confirma, isto
é, ‘algo’ não especificado que está constantemente em mão para alarmar os sentidos
em inúmeros contos góticos antes da época de Stevenson e como muitos filmes de
terror de nossa época. A reação de Villon é apropriadamente estereotipada: ‘Seu
coração deu um salto, e ele deu dois passos para trás e olhou terrivelmente para o
obstáculo.’ Mas novamente Stevenson dá uma nova reviravolta à função secular que
pode ser chamada de “colapso do terror na certeza’: Então ele deu uma risadinha de
alívio. Era só uma mulher, e ela está morta. Ela estava extremamente fria e rígida
como um bastão. Um pequeno enfeite esfarrapado esvoaçava no vento sobre seu
cabelo e suas bochechas estavam muito avermelhadas naquela mesma tarde.
Localmente, isto é um sensacionalismo um pouco normal, próprio de um ‘piolho’
Stevensoniano e uma maneira apropriada de sublinhar a forte indiferença de Villon,
mas na verdade Stevenson aprofunda o impacto deste quadro repetindo-o de forma
severamente moderada depois, quando Villon descreve a mulher morta para
Brisetout: ‘tão morta quanto César, pobre rapariga e tão fria quanto a igreja com
pedaços de fitas grudados no cabelo’. O que fora previamente um patos decorativo
fornecido pelo autor – ‘um pequeno enfeite esfarrapado esvoaçava no vento sobre
seu cabelo’ – torna-se forte e coloquial – ‘pedaços de fitas grudados no cabelo’.
A simplicidade robusta desta dicção e o fato que realmente não tem nenhuma
contribuição a fazer nos interesses intelectuais da estória, pode oferecer um lembrete
de uma outra influência em Stevenson – John Bunyan. Stevenson admirava o estilo de
Bunyan por seu ‘gosto e precisão’ e por sua capacidade para servir, para ir além, os
confins de uma propósito alegórico central. Em The Pilgrim’s Progress, Stevenson
discerniu não só o que ele chamou de ‘privilégio rústico do estilo de [Bunyan], mas
também os benefícios eventuais de uma dificuldade aparente, a saber a divisão de
interesse entre estória e alegoria. Em sua análise de 1882 de The Pilgrim’s Progress
ilustrado de Bagster, Stevenson argumenta que porque ‘a mera estória e o plano
alegórico teve talvez de [Bunyan] igual tratamento’ a estória nunca cai na simples
subserviência ao plano moral, mas afirma seu próprio charme e interesse. Na verdade,
o que ele acha mais excitante sobre Bunyan é um traço que caracteriza a própria
narração de Stevenson em seu melhor – algo que ele descreve como ‘literalidade de
visão triunfante’, um senso intransigente das coisas nelas mesmas. É uma visão que
Stevenson prontamente admite, arrisca cair no ridículo e de fato buscar
inconsistências, mas é tudo bem-vindo: o que Stevenson parece estar incitando é
precisamente o paradoxo porque somos mostrados detalhes que não se encaixam no
esquema alegórico, não estamos inclinados a dar consentimento ao trabalho como um
todo: ‘Christina morrendo “deu ao Sr. Stand-fast um anel” sem nenhuma possível
razão na alegoria, meramente porque o toque foi humano e afetivo.

Stevenson teria encontrado exemplos de ‘literalidade’ fortalecendo e ainda de


alguma forma ficando no aspecto exterior, um plano alegórico total em Hawthorne
assim como em Bunyan e crescentemente em sua própria obra ele usava detalhes
literais vívidos para aumentar o interesse moral. De fato os patéticos ‘pedaços de fita’
em ‘A Lodging for the Night’ são diretamente reminiscentes das fitas rosa de Faith em
‘Young Goodman Brown’ (1846) de Hawthorne, onde um simples objeto do cotidiano é
dado uma força similarmente emblemática. Às vezes a intenção de Stevenson parece
meramente adicionar um toque que é ‘humano e afetivo’, como as fitas da mulher
morta, mas em outro parte, e mais ambiciosamente, a literalidade é usada para criar
efeitos que sugerem o supernatural. Uma atmosfera misteriosa é feita de forma
arrepiante quando mostra-se emanando de fontes puramente físicas, um princípio que
pode ser observado em muitos contos que objetivam enervar o leitor. Exemplos
modernos seriam aqueles das vilas suburbanas sinistras no contos de Elizabeth Bowen,
que eles mesmos devem algo aos ambientes usados por Agernon Blackwood para
estabelecer um tipo de supernaturalismo suprimido. Stevenson foi pioneiro de tais
técnicas e elas podem ser vistas na obra ‘The Merry Men’, particularmente no
momento quando o narrador, que está procurando por um navio do tesouro perdido,
o Espirito Santo, vem sobre um objeto inútil porém eloquente.

Eu voltei escalando sobre as rochas e joguei o rebento de cordas em meus pés.


Algo no mesmo momento tocou bruscamente, como uma moeda em queda. Eu parei e
lá, com certeza, encrostada com ferrugem vermelha, lá estava uma fivela de sapato de
ferro. A visão desta pobre relíquia humana me emocionou de coração, mas não com
esperança ou medo, só com uma melancolia desolada. Eu a tive em minha mão, e o
pensamento de seu dono apareceu diante de mim como a presença de um homem
real. Sua face castigada pelo tempo, suas mãos de marinheiro, rouca voz do mar com o
canto no cabrestante, os convés errantes – o ser humano por completo, como uma
criatura como eu mesmo com cabelo, sangue e olhos me assombraram naquele lugar
solitário e ensolarado, não como um espectro, mas como um amigo que eu tinha
machucado.

A realidade e finalidade da morte é apoiada sobre este narrador (um habitante da


planície que se orgulhou de si mesmo por suas habilidades mecânicas), não por um
experiência espiritual saltitante, mas pelo patos de um pequeno objeto; mais
alarmante do que um espectro de outro mundo é o “ser humano por completo’ do
homem morto convocado pela fivela do sapato enferrujado. Como ele confronta com
o ‘homem real’, o narrador se torna simultaneamente ciente da mortalidade e de sua
própria cumplicidade em pobres condutas humanas.

O olho agudo de Stevenson em contar o detalhe físico está muito provavelmente


relacionado a sua retenção de uma clareza de visão infantil, algo que ele cultivou
através de um interesse na ilustração do livro. Não parece nenhum acidente que ele
deva, como A.E Coppard depois dele, ter admirado tanto os desenhos japoneses. E
suas orientações para Henley sobre os quadros para A Child’s Garden of Verse (1885)
sugere a profundidade inerente de sua ‘triunfante literalidade de visão’: ‘ quando o
artista não acha nada para ilustrar, um bom desenho de qualquer objeto mencionado
no texto, só uma vara de pão ou um candelabro é a coisa mais agradável para um
criança jovem. Eu me lembro disto fortemente. Isto é precisamente o ‘glamor da
realidade’ o qual Stevenson achou Thoreau tentando capturar escrevendo
ardentemente sobre os aspectos ordinários do mundo externo. O uso do detalhe de
Stevenson em sua ficção pretende pegar a imaginação ou recapturar um senso de
surpresa, e só por esta razão ele tende a isolar os detalhes, adotando uma estratégia
diretamente oposta ao que ele considerou ser a ‘busca insana de completude’ dos
realistas do século XIX. Em sua famosa ‘Note on Realism’ ele lamenta que após Scott, a
pobre estória ‘uma vez nas mãos de Voltaire, tão abstrato quanto uma parábola’, caído
na futilidade, ‘cheio dos fatos’ e arrastando uma pesada bagagem de detalhes. Em sua
crítica e cartas, Stevenson é perspicaz com o princípio artístico da seleção: Balzac, ele
explicou à Bob, o permitiu se tornar ‘sufocado pelos detalhes fúteis e forçosos’,
incapaz de suprimir o impulso para expandir a descrição:

Ele não poderia consentir em ser enfadonho, e assim se tornou. Ele não deixaria nada
não desenvolvido, e assim sumiu de vista em meio a multidão de choro e detalhes
incongruentes. Há só uma arte – omitir! Ah se eu soubesse como omitir, eu não pediria
nenhum outro saber. Um homem que soubesse omitir transformaria um jornal diário
numa Ilíada.

Aqui, com paixão considerável, Stevenson afirma a habilidade paradoxal de prosa bem
comprimida e estilizada para alcançar distância épica em seu impacto. Nos próprios
contos de Stevenson, personagem, pensamento e emoção são frequentemente
incorporados num único ato, atitude ou gesto, embora seja frequentemente com uma
teatralidade que lembra o melodrama tão forte quanto o épico. Particularmente onde
a situação narrativa é extravagantemente romântica ou até grotesca, Stevenson pode
fazer belíssimo uso dos detalhes mais prosaicos e triviais.

Em ‘A Lodging for the Night’, por exemplo, ele transforma o fato inócuo que
Thevenin, um dos associados de Villon, tem cabelo ruivo, numa imagem assombrosa
da força obsessiva. A própria informação é dada primeiro pelo autor tão brandamente
que dificilmente registra: ‘sua cabeça careca brilhou numa guirlanda de cachos ruivos.
Mas quando esta figura angélica é, um pouco depois no conto, um cadáver preso
numa cadeira por seu assassino, Stevenson usa o detalhe do cabelo ruivo para
estabelecer diretamente o ilogismo e adequação completamente humana da reação
de Villon ao espetáculo macabro. ‘Maldita cabeça gorda!’ ele desobstruiu. ‘Gruda na
minha garganta como catarro. Que direito tem um homem de ter cabelo ruivo quando
ele está morto? Requer ousadia de um escritor flertar com o absurdo num momento
dramático crucial como Stevenson faz aqui. A explosão de Villon tem aquela mesma
simplicidade que se desvia rumo ao cômico que Stevenson salientou em seu ensaio
sobre ‘The Pilgrim’s Progress’, mas o de Bunyan não é a única influência discernível
aqui. Stevenson foi, sem dúvida, mais incentivado neste tipo de extravagância por sua
leitura de Poe, cujas obras ele analisou em The Academy (2 de Jan. de 1875). A
teatralidade de Poe, sua disposição rumo às atmosferas portentosas e pressagios de
melancolia, sua tendência de inflar sua prosa com alusões aprendidas e cadências
decorativas, mas acima de tudo sua insistência em fatos precisos: todos esses traços
têm equivalentes nos contos de Stevenson. Em sua análise, Stevenson é devidamente
crítico do aspecto ‘ de falcatrua, descaramento e audácia’ daqueles contos de Poe que
nos ‘engana’ no terror, e ele rejeita os contos posteriores como repulsivamente
inúteis, reservando sua maior admiração para a maneira que Poe consegue,
especialmente nos seus primeiros contos, fazer detalhes triviais produzirem sons
harmônicos que prendem a imaginação do leitor: ‘Ele tem o verdadeiro instinto do
narrador. Ele sabe que os pequenos detalhes que fazem os contos ou os destroem. Ele
sabe coo aumentar o significado de qualquer situação e dar cor e vida a pormenores
aparentemente irrelevantes’. O exemplo que Stevenson dá para ilustrar este ponto é
soberbamente pertinente:

Assim, o espírito inteiro de The Cask of Amontillado depende da fantasia de


carnaval de Fortunato de boné, sinos e manta de retalhos. Quando Poe acertara uma
vez sobre a função de vestir a vítima grotescamente ele encontrara a chave para o
conto; e então ele o envia com passos irregulares junto das catacumbas dos
Montresors e o último som que ouvimos dos muros é o tilintar dos sinos sobre seu
boné.

Isto, Stevenson argumenta astutamente, é um caso de um autor que obtém valor por
suas próprias fantasias fazendo a imaginação do leitor adotar o detalhe e aceitá-lo
como verdade no sentido artístico.

A questão do que tornou a imaginação de Poe ‘sincera’ num conto, mas ‘fustão’
em outro e a questão mais ampla do que faz um conto verdadeiro ou falso, continuou
a preocupar Stevenson. Quando seu volume de contos The Merry Men and Other Tales
and Fables apareceu em 1887, ele escreveu para Lady Taylor (para quem a coleção foi
dedicada):

O problema com Ollala é que de alguma forma soa falso... Mas o problema
estranho é: o que torna um conto verdadeiro? Markheim é verdadeiro; Ollala, falso; e
eu não sei por que nem senti enquanto trabalhava neles; de fato eu tive mais
inspiração com Ollala, como o estilo mostra... eu admiro o estilo dela eu mesmo, mais
do que talvez seja bom para mim; está tão solidamente escrito. E isso traz de volta
(quase com a voz de desespero) minha irrespondível pergunta: por que é falso?

Stevenson está na verdade sugerindo uma resposta para sua própria pergunta
quando ele faz do estilo a medida da ’inspiração’ que ele sentiu ao trabalhar com
Ollala: os resultados que aqui a inspiração vieram a significar quase o oposto –
autoconsciência em seu velho modo beletrista. Ambos os termos da pergunta de
Stevenson - o que faz um conto verdadeiro? – e sua contínua perplexidade com a
resposta para isto, enfatiza a natureza instintiva de sua imaginação e ao ponto que
consciência demais sobre a técnica e o estilo poderiam prejudicar sua escrita. Instinto
foi algo para ser guardado, justificando como fez a crença de Stevenson que a tarefa
do escritor era restaurar as pessoas para uma esfera romântica: ‘o grande escritor
criativo’, declara ele em “A Gossip´on Romance’, ‘nos mostra a percepção e a apoteose
dos devaneios dos homens comuns. Seus contos podem ser nutridos com realidades
da vida, mas sua verdadeira marca é satisfazer o anseios desconhecidos do leitor e
obedecer as leis ideais do devaneio. Só por esta razão, teorizar era obrigado a ser
contrário a atividade de Stevenson como escritor de contos e sua contribuição para a
evolução do conto tinha mais em seu molde reminiscente do conto do que em
qualquer avanço rumo a ‘modernidade’. Foi escrevendo contos o que lembrou a
atemporalidade da fábula e manteve viva a associação entre fábula e peça, ao invés de
forjar qualquer convenção inteiramente nova que Stevenson renasceu o conto no fim
do século XIX. Há em sua obra um reconhecimento da parte desempenhada pela
recorrência e familiaridade do entretenimento da literatura popular e da importância
do que Katherine Mansfield ia descrever em 1919 como a sensação de parecer um
meio sabido e mesmo assim não saber o que está por vir a medida que um conto
procede: ‘ ter ouvido tudo isto antes e e mesmo assim nosso espanto é o máximo, e
quando acaba, ele se torna nosso.

Como Stevenson estava constantemente tentando preservar este sensação,


que (como Katherine Mansfield destacou) remete o leitor adulto a condição de
criança, não é gratificante procurar qualquer desenvolvimento óbvio em sua obra.
Porém, isto não é para dizer que o truque não é um fator chave em sua escrita: suas
melhores estórias dependem de uma vigorosa tensão entre as propriedades
subliminares ou instintivas de seu sujeito-matéria (a paixão humana
preeminentemente anárquica) e a disciplina artística com o qual o material é moldado
e padronizado. A mistura é poderosamente estabelecida no conselho que Stevenson
deu ao Trevor Haddon:

Em sua própria arte, incline sua cabeça sobre a técnica. Pense na técnica
quando levantar e quando for dormir. Esqueça os propósitos no meio tempo; ame os
processo técnicos; exulte os sucessos técnicos; veja o mundo por inteiro mediante
óculos técnicos, vê-lo por inteiro nos termos do que você pode fazer. Então quando
você tiver qualquer coisa a dizer, a linguagem estará apta e abundante... Arte não é
como teologia; nada é forçado. Você não tem que representar o mundo. Você tem que
represnetar só o que você tem que representar com prazer e efeito e o único caminho
de descobrir o que é isso é pelo exercício técnico.

A ênfase de Stevenson na técnica é equilibrada por um interesse igual pelo que o


artista ‘tem a dizer’, em suas próprias excursões controladas e famosas dentro do caos
moral coo ‘Markheim’ e Dr Jekyll and Mr Hyde não são apenas o produto do cálculo do
autor. Pode ser que a apreciação de Stevenson pelas formas antigas lhe deram escopo
para criar o gnomo gótico Sr. Hyde, um gnomo ‘fora de uma mina profunda, onde ele
guarda a fonte de lágrimas’, assim como escrever contos que se destinavam não para
perturbar, mas simplesmente para entreter, como o original Arabian Nights fizera.
Como Stevenson escreveu para Meiklejohn:

Quando eu sofro da mente, os contos são meu refúgio: eu os tomo como ópio; e eu
considero aquele que os escreve como o médico da mente. E francamente... não é
Shakespeare que tomamos quando estamos mal; nem, certamente, George Eliot –
não, nem mesmo Balzac. É Charles Reade ou velho Dumas, ou the Arabian Nights, ou o
melhor de Walter Scott; são os contos que queremos, não a alta função poética que
representa o mundo; somos então feito o Asiático com seu improvisatore ou o de
meia-idade com seu trouvère. Queremos incidente, interesse, ação: que se dane a
filosofia. Quando estivermos bem novamente e estivermos com a mente calma,
examinaremos sua obra importante; mas o que queremos agora é uma droga.

Visto que a época de Stevenson se tornou inaceitável recorrer a Charles Reade, Dumas
pére, e a the Arabian Nights ao adiar Shakespeare, George Eliot e Balzac ‘até estarmos
bem novamente e estivermos com a mente calma’, como recomendou Stevenson. O
Modernismo não deu sanção literária para ninguém ter mente calma jamais. E os
conto do século XX surge precisamente fora do sentido de que a vida só pode ser
apresentada em fragmentos e episódios subjetivos comprimidos que estimulam ao
invés de drogar a mente. Atualmente, são os sub-genêros como o conto de detetive ou
o suspense ou em meios não-literários como filme e televisão que a narrativa de linha
forte preferida por Stevenson deve ser encontrada e isto em si indica as limitações
assim como as atrações de suas ideias sobre ficção. O mesmo ponto foi feito de um
ângulo diferente por V.S. Pritchett, que comentou numa entrevista que a televisão
‘parece um meio ideal para o conto, mesmo que a TV dependa muito do enredo,
muitos contos bons não são considerados adequados’. Certamente, nos meios visuais
populares os contos de Stevenson continuaram a fluir, um fenômeno que pode de fato
diminuir, ao invés de aumentar sua reputação como artista. S.S. Prawer argumentou
que Dr Jekyll and Mr Hyde tem sido filmado com tanta frequência e interessantemente
porque o cinema e mais em casa com obras de arte menores ‘tiradas do
subdesenvolvimento da publicação em massa’ e então ‘transformadas em obras de
arte’ com tratamento fílmico.

De jeito nenhum vale a pena ler todos os contos que emergem ‘do
subdesenvolvimento da publicação em massa’, que em qualquer caso não é um
enredo igualmente tenebroso em todas as fazes da história literária; a maioria dos
escritores considerados neste estudo almejam agradar os leitores que são capazes de
apreciar Shakespeare assim como Dumas père – e de distinguir a relativa grandeza
deles. Mas embora uma visão do conto como anódino puro é claramente inadequado,
permanece verdadeiro que o contista que segue, como muitos dos melhores seguem,
a máxima de Stevenson que a tarefa do artista ‘não é simplesmente convencer, mas
encantar’ pode estar tacitamente renunciando ‘a alta função poética que representa o
mundo’ em favor das mais modestas, embora imensamente valorosas, aspirações.

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