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FOTOS
Andréia Solha
ARTE DA CAPA
Acrílica sobre tela de WJ. Solha.
"f: tão difícil!'". do acervo da lJFPB
CAPA E DIAGRAMAÇAO
Ricardo A. O. Paixão
l+8P.:2lcst.
ISB'.\ 978-85-69033-32-5
I POESIA I. Tito.
CDD 8869.1
Prefácio
UM 29
DOIS 33
TRÊS 35
QUATRO .. 37
CINCO . 41
SEIS 43
SETE .... 45
OITO 48
NOVE ....... ~
DEZ 53
ONZE. 56
DOZE . 59
TREZE . 60
CATORZE 65
QUINZE .... 67
DEZESSEIS 71
DEZESSETE . 73
DEZOITO ... 76
DEZENOVE . 78
VINTE 80
VINTE E UM
VINTE E DOIS 92
VINTE E TRÊS 93
VINTE E QUATRO a 4 a 4 _ i _ 94
VINTE E CINCO
VINTE E SEIS 04
VINTE E SETE 105
VINTE E OITO 108
VINTE E NOVE 110
TRINTA 13
DEUS 14
TRINTA E UM............................................................................... 117
TRINTA E DOIS . 123
TRINTA E TRÊS 24
TRINTA E QUATRO 125
TRINTA E CINCO 127
TRINTA E SEIS 28
TRINTA E SETE 31
TRINTA E OITO....................................................................... 132
TRINTA E NOVE 135
QUARENTA..................................................................... 138
Para lone,
pelas nossas bodas realmente de ouro.
2. PAZ, Octavio. Los hijos del limo: del romanticismo a la vanguardia. In: La casa de
la presencia. Pocsía e História. Obras completas. México: Fondo de Cultura Económi-
ca, 1994, p. 396-397.
Pouco antes, referindo-se à concepção de poesia
em Charles Baudelaire, ele registrara também esta com-
preensão do universo como linguagem, muito próxima
daquilo que nos sugere o poema de Solha.
29
DeS 1 PrObIEMAS
Ah,
nem ao menos tenho um plano de como flagrar coisas
como o trem que me leva, estação a estação, no ano!
31
Deu$ + PrObIEMAS
Quem
tal poema ... evolucionista ... superaria?
-oa
u
33
DeuS E OU1Ros PrObIEMAS
•
1gua ] ar... e - por que nao..-
- 3 3
superar:,
mesmo com todas as sumidades e mil entidades de todas
as áreas,
reais ou imaginárias,
que vieram depois dele,
para a todos ... assessorar?
Mesmo com os grandes momentos - tantos - que têm
ocorrido
no tempo até então decorrido,
que ... poderiam ... ser temas ... de grandes poemas, de obras
densamente dramáticas
e estéticas,
como a Revolução Francesa, de trágica beleza,
ou o fim do império otomano, britânico, francês,
do espanhol, português,
a União Soviética,
mais as guerras - mundiais -, o Holocausto, explosões
nucleares ...
e o ma1s:
o computador,
meu deus,
que foi desmesurado avanço na ... shakespeariana ... pena
de ganso!
u
dl
o:
F-
Porque há,
em ti,
momentos próprios pra ouvir... uma delicada peça pra piano
de Satie,
em que seria ... heresia ... uma Paixão segundo Mateus,
de Bach,
que normalmente te extasia.
37
Deu$ touros PrObIEMAS
ou tudo:
prazer, silêncio, a solidão da leitura seletiva, contínua, cir-
cular, interconectada e
dispersiva.
39
Deu$ 1 PrOblEMAS
40
W. ]. Solha
Mando-lhe um poema,
como Franklin ao empinar pipa com para-raios durante a
tempestade, e me surpreendo com a carta entusiasmada,
tão brilhante, que deslumbra Affonso Romano de SantAn-
na, Ivo Barroso, Esdras do Nascimento, Ruy Espinheira,
Carlos Trigueiro e Sérgio de Castro Pinto.
0
2
-
z
à
41
DeuS t PrObIEMAS
E,
se a sua meta de perfeição é séria, vai, realmente, ficar na
miséria,
pois passará tudo que tem nos cobres, que repassará aos
pobres.
E,
se nesse processo de excesso, levar porrada numa face e
oferecer a outra ao tapa,
e se lhe roubarem a roupa, der também - como se manda
- a capa,
nem será preciso tanta indústria pra que entregue, tam-
bém, a pátria, pois não resiste ao mal e, por irreal que seja
a onda de castigos, amará os seus inimigos.
Tudo bem, porém, pois, se nessas alturas já não tiver, real-
mente, ego
e,
de superego,
nada,
não se preocupará se, de repente, ficar maneta e cego, pois
o velho evangelho diz que Se o seu olho lhe causa escândalo,
arranca-o como um vândalo,
e
se o pecado é o de sua mão, corte-a, sem hesitação.
Afinal,
algo que - se você for cristão - o confortará, em toda essa
anarquia que tem o Céu como utopia,
é que ... nada importa,
42
W. ]. Solha
-
u
ILI
,n
43
PrObIEMAS
++
w.J. Solha
- 1ama1s
recue.
I
t-
I
"'
O primeiro gole de cerveja - bem gelada em dia de mm-
to calor: perfeito!
Ronaldinho Gaúcho dando um lençol em Rey, driblando
o goleiro Rojas e marcando seu primeiro gol pela Seleção
Brasileira: perfeito!
O amigo Balduíno acocorando-se no que gira o corpo nos
calcanhares e dispara - quase simultâneos - um tiro em
cada vértice de um pequeno triângulo na parede, a vários
45
PrOblEMAS
46
w.J. Solha
0
-
F
0
Séculos,
pra que Brooklyn, Nova Iorque - where dreams come true
- gere, além de
Manhattan, Rhapsody in Blue... e Viena tenha o requinte
de Klimt, quando Londres se permite Virgínia Woolf e o
Eliot na mesma Queen Victoria Street.
W. J. Solha
LI
~
z
Em sonho,
vejo auroras boreais, austrais,
("Neva", suponho ),
49
DuS1 PrObIEMAS
51
DeuS PrObIEMAS
52
W. J. Solha
N
I
a
53
Deu$S1 1Ro PrObIEMAS
Mas ... há, sim, ... gentileza... em quem faz arranjo de flo-
res, de versos, de sons, de aromas, sabores, formas ... e
cores
buscando prazer
W. J. Solha
... e beleza.
Há uma ... delicadeza em seu ápice ... em quem junta ma-
deira e grafite ... num lápis .
)9
Deus PrOIEMAS
LLI
N
z
0
Do mesmo modo,
o que se vê é isto:
todo traidor é um judas,
toda vítima,
cristo.
Todo começo é um
gênesis,
um lindo lugar,
paraíso,
e,
se há um bombardeio, ciclone, erupção, tsunami, cismo,
eclipse:
apocalipse,
assim como - é óbvio - toda multidão em fuga é um êxodo,
toda enchente,
dilúvio.
Ah,
e quem opta por dor é
masoquista.
O básico, se gosta de maltratar:
sádico.
58
w. J. Solha
I
N
0
o
94,
não lembro o dia.
Paro, na calçada larga da Gran Vía,
con el sentimiento de no estar del todo,
o do engodo,
o de que, de repente, la vida - de realismo tão ferrenho -
es... realmente
sueno
e Madri - porque lá está o Prado - my... dream,
com a multidão-a vida, enfim - aqui, no meio e no outro
lado da avenida,
num sol que não arde a las tres de la tarde, me dando a
impressão ( minh alma não me engana) de que estou ante
a cidade - de que estou me despedindo - na próxima se-
mana,
ou a de que aí está o mundo... sem, mais, minha presença,
completamente indiferente
a essa ausência.
59
Deu$ PrOblEMAS
LLI
N
LLI
0:
1-
Véu:
pode-se dizer que, como o céu, não é, nem deixa de ser.
Flores,
de secretos nomes em latim, são caravaggios e correggios,
miguelangelos, botticellis e rembrandts
do jardim.
60
W. ]. Solha
Vejo,
da calçada,
numa vitrina,
a rua e tudo que nela - às minhas costas - se passa,
e,
atrás da vidraça,
a criança traquina
que - degusto - vê que vem a gangue palhaça, com um
gorilão, me dar susto,
e acha graça.
6l
DeuS tu1Ros PrOblEMAS
batendo,
bagunceira e lépida,
retinindo e zoando
oca,
e cheia
até que- num salto - esvazia-se no que gira,
louca,
e bate
no closape.
62
W. J. Solha
Ah,
o envolvimento dramático e o esforço físico de Pavarotti
pra alcançar e dar forma ao maravilhoso e dificílimo suste-
nido final de Nessun Dorma!
Tão grandes,
que,
quando termina,
em esgotado êxtase,
seus olhos estão fixos fora do mundo ( que o aplaude em
desvario, gritando Perfezione assoluta!, Prova dell'esistenza
di Dio!).
63
Deu$ E ou1os PrObIEMAS
o+
w.J. Solha
Visto isso,
algo maciço:
65
DeuS toutRo PObIEMAS
66
w.]. Solha
I
N
-
z
::,
0
67
Deus PrObIEMAS
69
DeuS PrOblEMA
signo de Virgem,
sua orgem,
porque a constelação ( que preside setembro ),
em 24 pra 25 de dezembro domina, no Oriente, seus ho-
rizontes,
de modo que a luz do mundo, quando nasce, entre os
montes,
parece - e a imagem é bela - estar sendo dado à luz
por ela.
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tn
I
n
w
N
I
o
71
PrOBIEMAS
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t-
I
,n
,n
I
N
LI
a
73
DeuS1 IRO»
No século seguinte,
XX,
numa das trezentas capas que faz pro The Saturday Eve-
ning Post,
Rockwell,
triste,
põe a menina negra que vai à escola - sob escolta, como a
lei determina -, o que não impede que a gangue branca -
que é de coca-cola mas que quer sangue - jogue o tomate
que estala feito relho, vermelho, no termo nigger,
duro,
que denigre o muro.
4
W. J. Solha
P6e,
poeta,
sentado no estribo da camioneta - também surrada - à
beira da estrada,
o ruralista esgotado que tem, ao lado, o filho adolescente
endomingado,
que aguarda,
teso,
com mala e livros,
aceso,
o lotação - que o livrará, pra sempre ( ou não )- de tudo
que quer dizer
» e 99
rmcao .
75
DeuS PrObIEMAS
ol
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LI
o
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I
o
Também se vê,
com nexo,
que a causa do bebê é o sexo
e a do sexo,
o bebê.
Foi fundamental,
s1m,
absolutamente ... irreal,
o dia em que,
entre todos os planetas sem vida, nem coisa parecida - se-
res ... começaram a se... soltar... no mundo,
que,
de repente,
se revelou
fecundo,
79
PrObIEMA
De modo que,
quando nada, mais, tem sentido,
geralmente quando se está deprimido, pelos fracassos, tão
nossos,
basta que atentemos - em nossas mãos - nos premedita-
dos
ossos,
na proteção torácica
flexível,
por isso fantástica
e... no estranho que é o nosso eu
no premeditado crânio,
capaz de ... hominizar a Terra,
já envolta na nuvem - a World Wide Web - que a encerra.
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l
-
z
>
Largo riso, jovem majestade,
o Burt Lancaster de A Um Passo da Eternidade volta,
maduro ... e com garbo,
$0
W. J. Solha
S]
DeuS E ou1Ros PrOblFMAS
O angélico Mário
Quintana
brilha
quando diz que o relógio de parede de sua casa já lhe co-
mera três gerações da família
mas,
nessa trilha, que a tantos assusta e humilha,
acrescenta,
noutro poema,
que isso não lhe é um problema,
pois é um estranho no ninho, já que não morre, porque -
poeta - tem cláusula secreta,
pela qual todos passarão,
ele,
não:
passarinho.
$3
DeuS PrObIEMAS
Bem ou mal,
Big Ben, Tj Mahal,
meu passado aí está,
encalhado
e agora,
ora, ora,
del mezzo del cammin para o fim,
mais clamantis in deserto do que antes,
vive o último afã ... tipo Van Gogh, Rembrandt. .. e Gauguin.
Mais irreal,
no entanto,
e com isso me encanto,
é que a câmera nos dá- de cada cena comum de um
drama - um fotograma,
o flash, memória... incrível, porque
transferível.
54
w. J. Solha
0,
claro,
a bela Angela del Moro foi modelo- com mínimo de deco-
ro, excesso de zelo - do nada provinciano Ticiano,
e envelheceu, morreu,
seus seios e a suave face hoje longe de nossos anseios, no
seu século XVI, pelo que sei,
mas lá está, na Galleria degli Ufizzi, "eterna", ... moderna,
porque teve o glorioso destino
de ser a Vênus
de Urbino.
Irreal é o cinema,
a metralha de fotos disparadas uma a uma, tão depressa
que não se vê nenhuma,
só o somatório de todas, tão... real, que me abruma.
É irreal a estátua,
tão natural,
do museu de cera,
que,
no clique,
é flagrada - como o rompimento de um dique- a mover-se
$85
PrOblEMAS
com visitantes,
como nunca se viu antes.
A escadaria - apanhada de surpresa, depois de tanto tem-
po presa - se derrama, na sucessão de degraus,
até o chão,
como que na correnteza.
A ponte - que se vê da janela - tem tanta leveza,
graça e beleza,
que parece cruzar o lago - como em balés em pontas de pés.
ó,
e a lua corre, acesa, por trás das árvores
negras,
na aceleração de meu carro,
o que é ... bizarro ... como os jardins de pedra em Kioto
e o lago que - maroto, em pleno Saara - em miragem
mortal se escancara.
A vida é um rio,
que,
"pobre de mim!",
"pobre de nós",
chega,
inapelavelmente,
à foz.
E Arte... é o que dele no ar escapa, desaparece do mapa,
no céu,
pra onde vai, feito um véu.
Sente-se,
ao ver o Homem com uma Câmera - que Vertov rodou em
plena euforia da Revolução de Outubro - que é como se
nos implantasse a memória de um porão na História,
em que, surpreendentemente, o trânsito já é intenso na
megalópole, em 29, com tudo que já se automove,
carros e caminhões, motos e carroças, bondes de todos
os lados,
bancos, lojas, restaurantes, calçadas, teatros, cinemas, ba-
res lotados,
frenéticas locomotivas,
DeuSI PrObIEMAS
E aí. .. sai-se,
depois de tudo que alardeia o filme,
mudo:
aquele mundo de gente, à vida apegado, lhe deixa impres-
são muito forte.
Anos depois do apogeu, a Revolução ... feneceu, e nin-
guém, ali, a sofreu,
pois antes viveu
a morte.
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:::,
I
I
b=
-
z
>
Que fazer dos problemas de Demóstenes, de dicção;
dos de Beethoven, de audição?
E dos de Guignard que tinha lábios leporinos-,e dos de
Sivuca e Hermeto Paschoal,
albinos?
Mirá,
à falta de controle motor ( que o torna incapaz, veja só, de
nos laços dos sapatos dar nó),
deve o tranquilo primor do taquigráfico estilo.
89
Deu$t PrObIEMAS
como um poeta,
que o prêmio do gênio que lhe fora dado,
livrara-os de chamá-los de ... escrotos.
Note:
Mahler, Kerouac, Lorca, Gide, Genet, Whitman, Proust,
Nureyev e
Capote,
Byron, Mário de Andrade, Pasolini, Fernando Pessoa, Ver-
laine, Puig, Leonardo
e Eliot,
9)
W. J. Solha
9]
UcuS 1 PrOblEMAS
I
H
1- -
zo
>- a
02
W. J. Solha
E aí,
às vésperas da vitória ( que acaba não acontecendo),
ele põe - não convencendo - as unhas de fora, como qua-
se todos os líderes, História afora:
- Minha boca será, agora, o parlamento da Inglaterra!
w
W e
± ae
> ...
O Livro dos Porquês, do Thesouro da Juventude, tinha de tudo.
De questões - de todos os povos - como De que é feito o
Sol e Como as moscas andam no teto,
até Por que nos inquietamos,
ou
galinhas sabem que hão de sair pintos dos seus ovos?
Aí, tempos novos, a informação arremete, o céu agora é o
limite, na internet,
sobre tudo que se quiser:
do lerdo Verbo aos jogos platônicos do Logos,
ou da ... revelação ... sobre a enigmática precisão ... fotográ-
fica .. de um Caravaggio, Ingres, Vermeer,
93
Deu$SI PrOblEMAS
Um dia,
que o queira a santa Sophia,
tudo
estará,
finalmente,
diretamente ... na mente,
de modo que tudo o ... menino ... verá ... face a face,
como se fosse... divino.
Anos mais tarde, sem alarde, soube que aquele deus é ...
terrestre,
nada de autorretrato do mestre.
E
pela TV, vi que o Chê, ao tentar - como numa sina - um
surto revolucionário na América Latina,
tivera em La Higuera, Bolívia, o Horto das Oliveiras
e isso me deixou
morto.
Só,
no restaurante do Sindicato,
paro de almoçar,
seis meses antes daquela outra espécie de fim, que será a
queda do muro em Berlim,
olhando pra parede em frente,
quando, de repente, "vi" o impacto de Leonardo ante o
pé-direito, intacto, do refettorio, na missão que recebera,
da igreja de Santa Maria delle Grazie, de Milão,
de criar A Ceia,
95
D)eu'S o1Ros PrOblEMAS
Ah
e Gorbachev comove, pois- por incrível que pareça - eu o
vi com uma das mãos na cabeça, na angústia das mais agudas:
- Judas!
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ILI 0
}- Ó
zz
--
>2
A Terra é o mais denso p(r)o(bl)ema
do sistema.
a)
97
Deu$S 1 PrObIEMAS
98
w. ]. Solha
Terra,
o mais denso poema
do sistema:
tem de tudo e ainda sobra
como massa de manobra,
Nossos corpos,
ao contrário de nós
99
Deu$S PrOIEMAS
Y)
Terra,
o mais denso poema
do sistema,
que tem de tudo e ainda sobra
como massa de manobra,
E eis,
de repente, a ... irreal invenção, que é o Adão, que, peladão,
vai ao luminoso fruto ( pra tantos ... ominoso) na "selva oscura,
com anjos- em gravidade zero, auréolas apagadas - nas
arquibancadas!
l(j()
w. J. Solha
e o de um buraco de bala,
fatal,
num crânio de Australopithecus , provando o crime - de-
pois de milênios - de um
Neanderthal.
6)
Terra,
o mais denso poema
do sistema,
que tem de tudo e ainda sobra
como massa de manobra,
I0l
PrOblEM AS
Assim,
sem cerimônia,
podemos ver, também, no Auschwitz, o cativeiro
da Babilônia.
Terra
é o mais denso poema do
sistema... irreal,
I02
W. J. Solha
103
Deu$ 1 PrOblEMAS
w
w
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z-
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>n
Por que - escravo-, escrevo,
se a frase a que me atrevo é a mesma que, com certeza,
dirá a mulher sem beleza,
se lhe perguntam por que - demoradamente - se banha
e se perfuma e se penteia e se veste e se pinta e se adorna,
com joias que várias vezes - criteriosamente - estorna,
chegando,
por incrível que pareça,
a coqueterias
como a de pôr,
com ... graça,
uma boina inclinada na cabeça?
l()-j
W. J. Solha
uI
uI
... w
z• ...ll
>n
É uma porrada:
não há,
em nossa memória remota,
nada - parece um complô - que rivalize com as pinturas
rupestres de Altamira e Lascaux,
nem com a criação da escrita,
105
PrOEIEMAS
do zero,
da roda.
Nada.
É foda.
Não.
I06
w. ]. Solha
Coerentemente,
nada
na memória recente.
I07
PrOblEMAS
Não à toa, Newton disse ter visto mais longe e ... mais ...
do que antes
por estar nos ombros de gigantes,
e,
claro,
temos os nossos colossos,
mas nada pode uma obra-prima e outra - como Grande
Sertão: Veredas, Que País É Este? e Os Sertões - se ela
... pareça menor que as aventuras extraconjugais de duas
burguesas ociosas como Ana Kariênina e Madame Bovary,
que poderiam ser três,
com a Capitu,
que é daqui.
w
LI
z ot-
t-
--
>O
O engenheiro-arquiteto, pintor, multiartista Flávio Carva-
lho desenha - passo a passo, ao vivo -, toda a agonia da
IS
W. J. Solha
velha Ophélia,
mas o fato só se toma, para os parentes, "horrendo, quan-
do dão, no Museu de Arte de São Paulo,
com a "Série Trágica - Minha Mãe Morrendo",
09
Deus PrOblEMAS
I
W g
1- >
Zo
>z
O que seria da Paraíba
sem Menino de Engenho, A Bagaceira,
Papa-Rabo, Augusto dos Anjos,
Quadera,
A Compadecida?
E da Bahia,
o que sena
sem Gabriela, Tieta e Dona Flor,
Capitães de Areia,
ou de Alagoas
sem Fabiano, Memórias do Cárcere,
Baleia?
ll (J
W. J. Solha
O que seria dos judeus sem o livro que inventou seu deus?
I2
W. ]. Solha
Vivem juntos,
até que - exasperado - Gauguin se cansa de Van Gogh,
quando a coisa desanda,
e se manda.
O insigne ficante,
então,
no auge da depressão,
pinta,
intrigante,
a tela com a própria cadeira tendo no assento um detalhe.
Sutil:
seu cachimbo
vaz1o;
e outra - ainda mais marcante - com a cadeira do amigo -
sem sutileza - tendo em pé, sobre o assento,
uma vela
acesa.
113
IJcuS 1 PrOblEMAS
n
:::,
w
o
115
Deu$ too PrObIEMAS
II6
W. J. Solha
Sapato-e-meia,
parafuso-e-porca,
meio-fio/calçada,
II7
DeuS 1 PrOblEMAS
Bufíuel-e-Lorca,
corrimão/escada,
Palma-e-Maiorca.
II8
W. ]. Solha
119
Deu$ I PrObIEMAS
E,
de repente,
depois de ver as Trinta e Seis Vistas do Monte Fuji, de ...
Hokusai, a dupla Cézanne e Monet... sai ... com a visão
nítida... da estúpida incompletude de tudo que na Europa
se faz
e que lhes pede atitude:.
Cézanne, agarre-se ao Sainte-Victoire
12l
Deu$S 1 PrObIEMAS
e as vastas,
ridículas,
leoninas perucas,
pelas quais eram ... loucos,
em mil e seiscentos,
mil e setecentos e
pouco,
W. J. Solha
123
Deu$ PrObIEMAS
Aí,
minhas mãos,
ele repente,
como se com livre arbítrio,
fora do que controlo no átrio ele minha mente,
digitam
que, de repente, minhas mãos, como se com livre arbítrio,
fora de tudo que controlo no átrio de minha mente, digi-
tam ... o que leio - com estupor- na tela elo computador,
dando-me conta - como tanta gente já se deu - de que
cada letra necessária ao que quero dizer. .. e que aparece
na tela,
ali se atrela
sem que eu pense nela,
I2+
w.J. Solha
125
eu$ 1 PrOblEMAS
Busco a clareza,
mas a sensação é a de ser, ao sol, só urna lâmpada acesa.
Mas ...
17
l)vnS 1 PrObIEMAS
e VI:
e
z l
-
o tn
t-W
Motor - que os esquis não têm, mas que lhe dão velocida-
de - existe ... no subsolo
da gravidade.
I28
w. J. Solha
Daí que:
quando se acorda sem siso, baleias nadando no piso
e,
da janela,
se vê alguém que, num telão, no Edifício Spleen ( sacadas
em trampolim ) se esgoela, preso na ficção,
e o diacho da faixa amarela - lá embaixo - sai do asfalto,
atropelando o meio-fio
e sobe, pela parede, em que se abre em flor,
é hora de em calma se pôr,
pois à noite você verá, lhe juro, laranjas ... acesas no escu-
ro,
e sentirá - sem sossego - que o seu guarda-chuva tem um
quê de morcego,
e que a chuva,
em volta,
é... toda... de bulbos... de lâmpadas... em lento ...
espatifamento no barro e no carro,
129
Deu$ t PrOblEMAS
O mundo é louco.
E,
se a escada - prosaica - em simultâneo crescendo e dimi-
nuendo é pouca pra que nisso se acredite,
que a isso se credite,
também,
a caravana de água,
em c1ma,
viajando pra regiões distantes;
ou,
antes,
um claír de !une - imagine - erguendo a maré em ressacas
enormes, todo má fé.
E aí está o umbigo,
. .
consigo, com1go,
que vem da era do encaixe - antediluviano - do Brasil no
continente africano.
130
w. J. Solha
O mundo é louco.
131
DeuS 1 PrOblEMAS
132
W. J. Solha
Egomachine.
E nem cogito - imagine! - no que o corpo andou maqui-
nando nesse meio tempo, como a respiração, coração, o
foco de minha visão,
além do trabalho das glândulas - sudoríparas e salivares,
133
PrObIEMAS
134
W. J. Solha
Em tudo há,
como no LP,
o lado B,
sem o qual não há
o lado A.
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Deu$S ORos PrObIEMAS
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w. ]. Solha
Mas é a norma:
nada se cria, nada se perde,
tudo se trans
forma.
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Deu$S PrObIEMAS
sem precisar de pá
e picareta.
Vão envelhecer e morrer - é claro - mas neste momento,
contentes, o que não é nada raro, estão ali -e Cest la vie!
Em tudo há,
como se vê,
o lado B,
sem o qual não há
o lado A.
De grau em grau
e vão em vão,
a luz, que se reduz a um brilho no verniz no corrimão,
chega, lá em cima, à galeria que,
de tão louca e arteira,
parece do Inconsciente,
como o museu ... diferente,
de Nise da Silveira:
Deu$ PrObEMAS
]41)
Posfácio
Soares Feitosa, autor de Psi, a Penúltima (heroica, telúrica e lírica), edita o foma/ de
Poesia na rede mundial de computadores.
Imediato, comprei o livro que guardo até hoje, digi-
talizado, e ando com ele pra cima e pra baixo no compu-
tador, aliás, na "rede". Agora, a acrescer-lhe este outro, um
livro de ressurreições, DeuS E OUTROS QUARENTA
PrOblEMAS, de W. J. Solha.
O adultério (ou não) de dona Capitu teria sido apenas
uma notícia policial, mero deleite de comadres, não fora a
genialidade de Machado. A Arte, só a Arte nos salva. Hoje,
muito fácil comprovar se Capitu era ou não a mulher de José
de Alencar, boato disseminado por Humberto de Campos.
Suficiente um DNA das ossadas, inclusa a do filho, Mário
de Alencar, que seria de Machado, herdando-lhe inclusive a
epilepsia. (O talento, não, que talentos não se herdam). Con-
tudo, ainda assim, aqueles "mortos' estariam redivivos na ge-
nialidade de Machado de Assis. (Sou contra esse exame, por
sua absoluta inutilidade: Capitu continuará existindo mesmo
jeito). Prefiro acreditar que dona Capitu é real, porque ela é
mais real que a supostamente infiel mulher do cearense, a
francesa. Em suma, vivemos sob uma realidade muito mais
real do que a do dia a dia: o mito, a obra de Arte.
A verdade? Ah, a verdade, meu caro Pôncio, são três, o
Cristo não lhe disse? A jurídica, a histórica e o mito. Claro que
a jurídica, ainda que possa produzir grandes benefícios ou da-
nos terríveis, inclusa a prisão ou a morte, é a mais precária das
três Sou inocente! Juiz ladrão!- brada o condenado. A
outra, a histórica, os fatos à vista de anotações e documentos,
também imprestável. Reúnam-se três historiadores e teremos
três versões diferentes. A terceira verdade, o mito, a obra de
arte, não. Como afirmar que Capitu, Bovary e Karennina
(citadas por Solha) não existiram?! Alguma dúvida sobre a
Transfiguração? Abra qualquer livro de arte e lá está: Rafael
Sanzio de Urbino.
Os cavaleiros do Apocalipse não seriam quatro,
vide Jane Jacobs; há este outro: o esquecimento. Então, se
morremos pela fome, a guerra, a peste ou a morte, há uma
outra morte, a supramorte, o esquecimento.
O livro de Solha, também destinado ao não-mor-
rer, faz, em tom poético, a grande viagem sobre a Arte
que mantém vivos estes séculos todos que carregamos nas
costas. Um livro multi, que não aborda apenas a poesia
dos clássicos, nem suas literatices; envereda por todos os
ramos, incluso o cinema, a dança, pedras, riscos, traços
e o popular. Em suma, tudo sobre o Todo. Até mesmo a
comoção do encantamento mais simples quando o poeta
registra o mero fabrico de um lápis:
Mas... há, sim, ... gentileza ... em quem faz arranjo de flo-
res, de versos, de sons, de aromas, sabores, formas... e cores
buscando prazer
... e beleza.
Há uma... delicadeza em seu ápice... em quem junta ma-
deira e grafite... num lápis.
■ wjsolha@superig.com.br
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