Você está na página 1de 5

T O R Á G U I M ÁT R I A

O DNA dos Números da Bíblia


Prefácio
Pelo Rabino Y. David Weitman

assados poucos dias após a festa de Chanucá (Festa das Luzes), ainda somos
P inspirados por sua luz e pelas 36 velas que acendemos durante os oito dias
festivos.

Este número 36 não é mera coincidência. É sabido que na história de Chanucá a


ferrenha oposição dos gregos-pagãos era principalmente à Lei Oral da Torá, quando eles
proibiram várias práticas judaicas na Terra Santa, há cerca de 2.200 anos. Os macabeus
lutaram contra os gregos e os expulsaram, e depois reiniciaram milagrosamente o
serviço da Menorá (o Grande Candelabro) no Templo de Jerusalém, que resultou nas 36
velas que acendemos anualmente em Chanucá.

A Lei Escrita não incomodava tanto os gregos-pagãos como a Lei Oral, quesão
explanações diversas do texto bíblico1. Na sua concepção limitada, eles não entendiam
como interpretações rabínicas podiam ser consideradas sagradas. Todavia, é um
princípio fundamental da nossa fé que a Lei Escrita e as interpretações da Lei Oral são
Divinas e foram outorgadas juntamente no Monte Sinai.

Durante os seis dias da Criação, no Gênese, houve uma luz especial que brilhou
durante 36 horas e depois foi ocultada pelo Criador2. De acordo com as nossas

1 - Reunidas em grande parte no Talmud, que contém a Mishná e a Guemará.

2 - Midrash Pessikta Rabati 46.

- 31 -
O DN A DOS N Ú ME ROS DA BÍ BL I A

tradições, esta luz original revela-se atualmente nas 36 velas de Chanucá e nos 36
Tratados do Talmud, que é parte da Lei Oral3.

A Lei Oral possui 32 formas de interpretação da Torá.4 Somando-se a elas os quatro


níveis de interpretação da Torá (Peshat, sentido literal; Remez, sentido alusivo; Drash,
homilética moral; e Sod, sentido esotérico), chegamos a um total de 36 formas diferentes5,
demonstrando mais uma vez que a luz Divina original encontra-se nesses diversos
métodos de interpretação.

O método da Numerologia Judaica (Guimátria) é uma dessas 36 formas de


interpretação e consiste no fato de que cada letra do alfabeto hebraico possui um valor
numérico. Assim, cada palavra ou conjunto de palavras tem um valor numérico que é a
soma do valor numérico de suas letras.6

O sistema da Guimátria existe somente no idioma sagrado, o hebraico. Apesar de


que todas as línguas são convencionais e meramente uma ferramenta com a qual o
homem constrói e expressa as suas ideias, no entanto há uma exceção. O hebraico
– embora seja peculiar ao povo judeu – é o veículo para a palavra de D’us, usada para criar o
universo.7 Consta nos livros místicos que as línguas humanas e convencionais são
comparadas a tijolos, enquanto a língua sagrada é comparada a pedras. Tijolos são feitos
pelos homens; pedras são feitas por D’us.8

3 - Benei Issachar, em nome do Rokeach, e Rabi Pinchas de Koritz.

4 - Braita de 32 Midot, de Rabi Eliezer, filho de Rabi Yossi Haglilí (encontra-se no Talmud, após o Tratado de

Berachot).
5 - Nitei Gavriel, Chanucá, p. 20.

6 - Duas palavras com o mesmo valor numérico possuem, consequentemente, uma correlação. 7 - Tanya, parte II,

Shaar Hayichud Vehaemuná, cap. 1.

8 - Likutei Torá, Shir Hashirim 28a.

- 32 -
T O R Á G U I M ÁT R I A

Antes do pecado na Torre de Babel e a consequente dispersão pelos quatro cantos


do mundo, o hebraico era o único idioma existente9 e refletia a unidade de D’us no
universo. Hoje, a presença de D’us neste mundo não se manifesta de forma evidente.
A natureza, com sua variedade de elementos, oculta a unicidade do Altíssimo. Nossa
missão na terra é revelar esta unidade Divina e demonstrar que a multiplicidade de
aspectos no universo é apenas uma fachada, e sua independência, uma ilusão. O mundo
e tudo que nele existe são criações do Todo-Poderoso, e ―Sua glória preenche toda a
terra‖10.

Os nossos Sábios na Ética dos Pais já prezavam a ciência da Numerologia Ju-


daica — a Guimátria (Pirkei Avot 3:18). Rabi Eliezer ben Chismá disse: ―O cálculo dos
ciclos da astronomia e o cálculo numerológico das palavras são condimentos da
sabedoria‖. E como explicam os nossos comentários, esses cálculos abrem o apetite e
incentivam as pessoas a se aprofundar mais no estudo da Torá.

Encontramos em diversos lugares que a Numerologia Judaica é usada como apoio


para se tomar decisões haláchicas (legais),11 e grandes comentaristas clássicos da Torá
são conhecidos por usar o método da Guimátria, como Rabi Yaacov Baal Haturim e
Rabi Eliezer de Worms, o Rokeach.

Com relação à palavra Guimátria, existem várias interpretações. Alguns dizem que a
raiz etimológica da palavra é grega, referindo-se à ―geometria‖, que em hebrai co passou
a ter um sentido mais amplo, incluindo todo o tipo de cálculo e números.

9 - Gênesis 11:1.

10 - Isaías 6:6.

11 - Berachot 8a, Shabat 10b, 145b, etc.

- 33 -
O DN A DOS N Ú ME ROS DA BÍ BL I A

Alguns se aventuram e afirmam que ―Guimátria‖ vem de duas palavras — gama e tria
— que significa que a letra gama é a terceira letra do alfabeto grego, indicando a
metodologia da Guimátria.

Todavia, parece-me interessante citar aqui a explicação do grande mestre e


legislador Rabi Yossef Karo, o autor do Código da Lei, Shulchan Aruch12: ―Guimátria é
composta por duas palavras Guei (vale) mitúria (da montanha)‖. Isto significa que quando
somos confrontados com algo que não entendemos, parecendo uma montanha, a
Guimátria a transforma num vale de compreensão.

Sem dúvida, a ciência da Guimátria desperta a alma e estimula a vontade de obter


mais conhecimento Divino. Os segredos mais profundos da Torá encontram-se ocultos
nas letras — os agentes criadores (DNA) deste universo —, e através dos diferentes códigos,
valores numéricos e substituições de palavras desvendamos os mistérios Divinos neles
embutidos. A Guimátria praticamente transforma a montanha num vale, assim como o
vento dissipa as nuvens.

Grande e valioso é o trabalho do engenheiro Dr. David Zumerkorn, que


praticamente conseguiu reunir e catalogar os diversos métodos da Guimátria com
exemplos práticos e acessíveis, utilizando também a sua criatividade e originalidade.
Grandioso é o fato de desvendar a numerologia judaica no vernáculo, permitindo assim
que a chave desse conhecimento profundo esteja agora ao alcance daqueles que não são
familiarizados com o hebraico. Sem dúvida, esta obra reafirma a unidade de D’us
usando a língua das nações e revigora a fé dos leitores.

12 - Em Klal HaGuemará.

- 34 -
T O R Á G U I M ÁT R I A

O Talmud 13
afirma: ―O homem tem inveja de tudo, menos de seu filho e de seu
discípulo‖. É realmente uma grande satisfação ver um aluno crescer e progredir nos
estudos, a tal ponto de ele hoje já ensinar e redigir o seu próprio livro, que já se
transformou nas edições anteriores em um grande best-seller. Que o Todo-Poderoso o
abençoe e a toda sua família com muita saúde e sucesso para divulgar cada vez mais a
sabedoria da Torá.

E para os leitores, temos a certeza de que encontrarão neste texto uma forma de
saciar a sua curiosidade sobre numerologia nesta obra baseada em textos talmúdicos e
comentários clássicos autênticos. Lembramos, porém, que a Ética dos Pais, mencionada
acima, chamou este tipo de ciência de ―condimento‖. Qualquer tempero precisa ser
acrescentado a um alimento principal, que é o estudo profundo da Torá, tanto a Lei
Escrita como a Lei Oral. Ninguém se alimenta apenas de condimentos. É imperativo
que se estude Torá, Talmud, Halachá (Lei Judaica), Midrashim e Chassidut de forma
sistemática para lograr um conhecimento abrangente. E este excelente livro com toda a
certeza servirá de grande estímulo no despertar para o estudo. Boa leitura!

5 de Tevet, 5782
9 de dezembro, ’021
Rabino Y. David Weitman

13 - San’hedrin 105b.

- 35 -

Você também pode gostar