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S E G R E D O S

PARA SUCESSO NO

Casamento

R A B I N O
G O U R A R I E
Este insight, em forma de ebook, tem dupla
finalidade: (i) salvar casamentos; e (ii)
fornecer ferramentas para aqueles que
pretendem construir um relacionamento
estruturado em valores éticos e morais. De
certa forma, esse livro tem um toque
brasileiro.
As ideias são tiradas da Bíblia, da Cabala,
da filosofia judaica e quedevem ser
ensinadas a todos, servindocomo
instrumento para uma vida conjugal
sólida.

Rabino Gourarie
PREFÁCIO

Na feitura deste livro surgiu uma pergunta: o que um leitor, ao se deparar com
mais um livro sobre casamento, poderia pensar num primeiro momento? Por certo,
seria até natural surgir um flash mental “Mais um livro sobre casamento? que tema
tedioso!” Não me surpreenderia com este tipo de pensamento já que, para muitos, o
casamento é uma instituição falida. Estamos na era da banalização do
casamento?
Com base nisso, lembrei-me de uma história contada pelo meu sogro – Isac
Korik – z”l – de abençoada memória:

Um pai, preocupado com a sustento do seu filho, decidiu que o melhor negócio era a
venda de chapéus. Para o pai, a decisão era certeira. Não havia espaço para dúvidas!
As vendas seriam um sucesso. Convicto disso, alugou uma loja no centro da cidade
para que o filho iniciasse o comércio do inusitado acessório para homens. Após um
mês, foi visitá-lo. Tinha certeza de que os chapéus estavam sendo vendidos aos
borbotões. Um sucesso de vendas. Mas não! Para a sua surpresa não foi vendido
absolutamente nada. Literalmente zero de venda. Um fracasso acachapante. O
estoque estava intocável desde o aluguel do imóvel. O pai, não compreendendo
aquele fracasso, declarou ao filho: “não entendo, com tantos chapéus bonitos na
loja; com tantas pessoas passando em frente à loja e você não consegue vender
sequer um chapéu? O filho retrucou: pai, não sei vender chapéus. E sabe por quê?
Porque quem tem chapéu não precisa de outro; e quem não usa simplesmente não
gosta. E, num tom consolatório, dirigiu-se ao pai e afirmou: não tem jeito de vender
chapéus! O pai, inconformado com a justificativa do filho, disse-lhe: você não pode
ser tolo! Em relação àqueles que usam chapéus, deve convidá-los a entrar na loja e
lhes ofereça um novo chapéu e, nunca se esqueça, por um preço mais acessível.
Quanto àqueles que não usam, deve igualmente chamá-los a entrar na loja e diga-
lhes que ficam mais bonitos, mais elegantes com chapéus. Simples, não!? Cada
pessoa, que passa na rua, é seu público!
O âmago dessa história tem uma amplitude que pode ser aplicada em muitas
questões de nossas vidas. Pensei em escrever esse livro para que todos pudessem
aproveitá-lo. Os solteiros vão compreender que podem, sim, encontrar um
casamento feliz e duradouro. Os que estão casados poderão aproveitar a leitura para
melhorar ainda mais os seus casamentos. Por isso, cada capítulo; cada fraseado
inserido no texto, instigando um insight, pode ter “o seu público”.
É um texto poliédrico em seu conteúdo, com muitas faces geométricas. Por isso,
não se analisa apenas um princípio do casamento, mas uma variedade deles, cuja
finalidade servirá para pavimentar um caminho para futuros casamentos; e, para os
que estão casados, a possibilidade de reestruturá-los; tornar a convivência entre os
cônjuges num profundo equilíbrio respeitoso, mesmo sendo o texto elaborado com
maior ênfase em favor das mulheres.
Durante os anos de meu rabinato sempre me dediquei a construir casamentos.
Divórcio, ao contrário, é algo triste. Conforme diz o Talmud, o próprio altar chora
quando é realizado (Sanhedrin 22a:16). Apesar disso, a própria Torah apoia e sugere
o divórcio em certos casos, mas sempre é acompanhado de tristeza e o sentimento,
que permeia a todos que dele participam, é de um colapso e tristeza. Em
contrapartida, o casamento é um evento alegre resultante da conjugação de opostos
que se tornam “UM” para a construção de valores em comum. Sobre esse tema
– divórcio – conto-lhes um fato marcante.
Meses depois de assumir o rabinato na Congregação atual – Mischan Menachem
– houve um divórcio de um casal na nossa comunidade. O casal compareceu à
Sinagoga para alguns conselhos, mas a separação era irremediável por clara opção
deles. Não tinha muito o que se fazer, além de alguns poucos conselhos de apoio que
lhes foram ditos. No momento, contaram-me como foi a separação. Disseram-me
que ficaram casados por quase trinta anos. No dia, trouxeram fotos das crianças; dos
momentos felizes pelos quais passaram; e, no final, choraram profusamente. Eu,
diante daquele panorama triste, fiz uma pergunta ao casal: viveram momentos tão
felizes, mas por que optaram pelo divórcio? Esse casamento poderia ter sido salvo.
E por que lhes digo isso?
Neste singelo livro de ensinamentos, existem lições primorosas para compreender
a importância de um casamento e descobrirão que a palavra amor em hebraico é
Ahava. Trata-se de um verbo, como andar, comer etc, exigindo-se uma conduta
proativa. Esse tipo de ação, ativa em relação a outro cônjuge, pode, sim, salvar um
casamento. Diz o Talmud: quem salva uma vida salva o mundo inteiro. Salvar um
casamento significa também salvar vidas. Isso porque sabemos que o rompimento
tem reflexos inimagináveis, sob o ponto de vista psicológico do casal e, sobretudo, o
impacto do rompimento na mente dos filhos. Infelizmente, naquele caso, não houve
possibilidade de reversão.
Segui o conselho dos meus mestres, de cujas lições aprendi que, para transmitir
um conselho, a melhor maneira é fazê-lo com bom humor. Quando um casal está
à minha frente e relata alguma dificuldade, após ouvir as duas partes em litígio, digo-
lhes o que exatamente cada um está fazendo. Mas sempre o conselho é falado com
nuance de humor. Isso é extremamente importante. Ameniza o sentimentalismo de
conflituosidade entre os cônjuges e, sobretudo, favorece a autocrítica. O humor
judaico tem algo de peculiar. As pessoas riem de si mesmas.
Lembro-me de uma tia-avó que reclamou a vida inteira sobre o casamento.
Estavam casados havia sessenta anos. Ela tinha uma frase que me marcou
profundamente. Dizia copiosamente: “meu marido me deixa doente, mas ele me
manda para os melhores médicos”. É tão comum ver alguém, que está fora do
relacionamento, ter uma percepção equivocada sobre os defeitos de um dos
cônjuges. Porém, dentro do próprio casamento, aquilo que para terceiro é um defeito,
transforma-se numa virtude máxima para o casal. No caso da minha tia-avó, um
suposto vício do casamento não estava na improvável doença ocasionada pelo
esposo, mas o amor oculto era revelado pela procura dos melhores médicos pelo
marido. A frase, quiçá paradoxal, na verdade dizia o quanto ela amava o esposo.
Ficaram até o fim. Amavam-se profundamente.
Humor não é zombar. Quando percebemos a nossa própria tolice conseguimos
estampar um sorriso verdadeiro. O quarto Rebe do Chabad dizia que “não se pode
enganar D’us. É proibido enganar o nosso semelhante. Podemos apenas enganar a
nós mesmos. Será que existe grandeza em enganar um tolo? Quando percebemos
que o verdadeiro tolo da situação somos nós, simplesmente surge um plácido sorriso.
Aquele sorriso que aflora do íntimo de nossa alma. Ou seja, se o leitor se identificar
com as situações descritas neste livro, o meu objetivo foi alcançado com a ajuda do
bom D’us. Se, além disso, causar um sorriso, o texto cumpriu a sua função
pedagógica.
Estudei com os maiores mestres da nossa geração. Grandes rabinos que não
somente tinham conhecimento em Cabala, a parte revelada da Torah, mas eram
gênios em emoções. Gênios em sua completude. Um deles – Rabbi Mendel z”l –
uma vez me disse: “Eu aprendi de muitos, mas um professor é aquele que realmente
ensina a ser alegre e sempre positivo”.
A Chassidut e a Cabala fazem muita alusão à luz. A luz ajuda a encontrar aquilo
que estava oculto. Quando estamos imersos numa escuridão, não conseguimos
encontrar o que pretendemos. Absolutamente tudo está lá. Contudo, pelo eclipse da
nossa racionalidade, temos uma percepção de que as coisas estão desaparecidas.
Com a luz acha-se aquilo que se pretende. Se, durante a leitura deste livro, o leitor
sentir “uau, isso está acontecendo na minha vida”, porém não sabia explicar o
porquê daquilo que estava passando, a leitura terá utilidade para beneficiá-lo e
transformá-lo.
É uma característica conhecida na Chassidut que, quando alguém está confuso,
mas consegue ser iluminado, seja através de um amigo e/ou livro, surge um sorriso
em agradecimento. Isso porque sabemos que a palavra panim em hebraico significa
face e p’nim aquilo que é interno. Ou seja, a face revela aquilo que de fato foi
internalizado. A minha esperança é que esse livro possa trazer muita luz e
alegria para todos.
Faço uma pequena observação que este e-book foi escrito com base nas aulas por
mim gravadas. Por isso, para facilitar a leitura e torná-la fluida, a linguagem não
ficou tão presa à rigidez formal. A transcrição foi complementada com lições de
grandes rabinos para elastecer a compreensão daquilo que foi falado nas aulas. Por
isso, com grande alegria espero que o livro seja motivo de muita simcha (alegria),
possibilitando que todos os casamentos sejam ainda mais fortalecidos com lições
extraídas dos sagrados livros da Torah; e que seja uma luz para aqueles que, por
certo, encontrarão um relacionamento feliz e duradouro.
São Paulo, janeiro de 2023.

São Paulo, Janeiro de 2023


SUMÁRIO

1• Amor e Paixão

2• Amor e Respeito

3• Amor ou Paixão? O
que vem primeiro?

4• Comunicação e Amor
Capitulo 1
AMOR E PAIXÃO
AMOR E PAIXÃO

Bem-vindos ao nosso curso – workshop – casamento.

Hoje, vamos começar com o princípio número um. Falaremos que, para o casamento
ser bem-sucedido, devemos seguir os dez princípios do casamento.
O princípio número um – que é a base – é o amor no casamento, e, logo surge uma
grande pergunta: o que é o amor? Fala-se muito sobre o amor e achamos que possuímos
o dom, a qualidade de amar, e que merecemos igualmente ser amados. Mas o que é o
amor? Normalmente, quando surge essa pergunta, é porque não temos certeza se
realmente amamos ou ainda se somos amados. Essas dúvidas nos atormentam e devemos
logo entender que quando estamos verdadeiramente engajados em dar ou receber amor,
jamais ponderamos tais questões filosóficas. Vamos tentar responder a pergunta de forma
objetiva.
Já vimos que os dois cenários, que geralmente nos levam a contemplar o que é o amor,
são: sou amado ou será que eu amo?
Qando somos amados tendemos a sentir isso intuitivamente nas nossas entranhas.
Sentimos isso por dentro e não temos dúvida, pois existe uma percepção extrassensorial
no coração que nos capacita a ler os sentimentos do coração de outra pessoa. Realmente
temos essa capacidade de sentir o que está acontecendo no coração de outra pessoa! Não é
um tipo de profecia, tampouco é algo etéreo ou sobrenatural. É bem prático e realista. E
por quê?
Nossos corações recebem sugestões de nossos sentidos. Tudo que vemos, ouvimos,
provamos, tocamos ou cheiramos nos ensinam sobre o nosso universo. Nossos órgãos
sensoriais relatam ao nosso cérebro, que, por sua vez, interpreta esses dados, enviando
“um relatório” ao nosso coração. Ou seja, se percebemos um sorriso amoroso; se ouvimos
palavras amorosas ou sentimos um toque amoroso, o cérebro processa está informação e
conclui: ei well! estamos sendo amados agora.
Em suma, ninguém pode ou deve se sentir amado sem a existência de provas tangíveis.
Não é um pensamento ou um sentimento abstrato, mas, ao contrário, o amor é concreto e
evidenciado. É algo bem tangível.
O Rei Salomão escreve em Provérbios “como a água reflete o rosto do homem de volta
para ele, assim é o coração do homem para outro[1]”. Isso significa que quando alguém
é tratado com amor, o coração sente esse amor. O amor recíproco é reflexivo e por uma
simples razão: o coração sente o amor quando é tratado com amor!

[1] Provérbios, capítulo 27, versículo 19.


AMOR E PAIXÃO

Agora já temos uma resposta direta sobre o que é o amor. Quando nos comportamos
amorosamente com alguém, isto significa que amamos essa pessoa. Amar alguém exige
um comportamento amoroso. O amor é uma ação. Ele é prático. Por isso, não podemos
defini-lo conceitualmente de forma abstrata, a exemplo de perguntas como “o que é
liberdade” ou mesmo “boa sorte”. Ele é prático, concreto e tangível. Não está no plano da
teoria, mas da realidade.
No hebraico a palavra Ahava[1] – amor – também vem da palavra hav e cujo
significado é dar, compartilhar. Trata-se, portanto, de um verbo. Da mesma forma como
“nadar” e “andar” Quando existe de um verbo “amar”, numa forma tangível – atos
amorosos –, segue naturalmente um sentimento. Se, todavia, tentamos conceituar o que é o
amor, numa perspectiva abstrata-filosófica, surge uma pergunta sem resposta[2].
Aquele livro conhecido do Stephen R. Covey – “Os Sete Hábitos das Pessoas
Altamente Eficazes” – cujo objetivo é servir de guia para tornar cada um de nós mais bem
sucedido –, relata um fato interessante que chamou a minha atenção.
Ele conta ter encontrado um amigo de muitos anos, quando então melancolicamente
afirmou: “[...] minha esposa e eu não sentimos mais as mesmas coisas de antigamente um
pelo outro. Creio que não a amo mais, e que ela também não me ama. O que posso fazer?
- O sentimento desapareceu? - Isso mesmo - ele confirmou. - E nós temos três filhos, o que
gera muitos problemas e receios. O que sugere? - Ame sua esposa - respondi. - Acabei de
dizer, o sentimento desapareceu. - Ame-a. - Você não compreende. Este sentimento, o
amor, não existe mais. - Então ame-a. Se o sentimento desapareceu, você tem um bom
motivo para amá-la. - Mas como amar alguém que a gente não ama? - Meu caro, amar é
um verbo. O amor, o sentimento, é um fruto do verbo amar. Sendo assim, ame-a. Seja
bom para ela. Sacrifique-se. Ouça os problemas de sua esposa. Faça um esforço de
compreensão. Goste. Compareça. Está disposto a tanto?”[3].
Esse relato traduz aquilo que anteriormente já mencionamos: o amor demanda um
sorriso amoroso; palavras amorosas; um toque amoroso. Vamos compreender que os atos
amorosos têm uma força que despertam os sentimentos e, com isso, podemos até ganhar o
nosso amor de volta através dos atos. A importância dos atos é indiscutível para
acompanhar o nosso amor. É o básico. Portanto, o primeiro dos nossos dez princípios é a
definição do amor como também estabelecer as diferenças entre o amor e a paixão.

[1] Rabbi Jonathan Sacks, no livro “Ceremonia Y Celebracion – Introduccion a las Festividades”, escreve: “La primera vez que em la Tora hallamos el
verbo a-h-v, “amar”, es al princípio de la prueba más grande de todas: la atadura de Itzjak “Toma tu hijo, tu único hijo, a quien amas, a Itzjak”.
Tradução livre: “A primeira vez que a Torah fala sobre o verbo a-h-v, ‘amar’, está no início do maior teste de todos: amarração de Itzhak Toma teu filho,
teu único, a quem amas, a Itzhak” (Rabbi Sacks, Jonathan, Edição em Espanhol traduzida por Aryeh Coffman, Koren Publishers Jerusalém/2019, pág.
262).
[2] “O amor é definível? De fato, toda tentativa de definição esbarra em algumas objeções (Wolff, Francis, Não Existe amor perfeito. Edições Sesc São
Paulo, 2018, pag. 27).
[3] Covey, Stephen R. “Os 7 Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes”, Editora Best Seller Ltda, 98ª Ed., pág. 114. Título Original: The 7 Habits Of
Highly Effective People.
AMOR E PAIXÃO

Paixão versus Amor


A importância de definir e diferenciar amor e paixão surge pelo fato de que
invariavelmente as pessoas confundem amor e paixão. Está confusão pode-nos
causar grandes transtornos.
Muitos jovens de hoje, como também as pessoas mais velhas, têm dificuldades em
entender esta diferença. Ambos – tanto o amor quanto a paixão – são sentimentos
extremamente fortes e, por isso, torna-se difícil distingui-los e entender a razão pela
qual ambos são necessários. Enfim, qual a diferença entre amor e paixão e será que
realmente ambos são necessários?
A paixão é um estado de ser; é uma fase temporária e de completo êxtase e
euforia. Todos nós já tivemos esse tipo de sentimento e qual era a sensação naquele
momento? Tomare que isso dure para sempre! Paixão não dura e devemos saber
disso justamente para prevenir e conhecer os passos corretos que devemos tomar.
Aliás, se durasse para sempre não seríamos capazes de realizar e fazer nada. Todos
nós estaríamos muitos distraídos e presos na outra pessoa. Na verdade, embora isso
possa parecer algo positivo, na vida prática não funciona pela singela razão de que
paixão é efêmera, passageira.
Por outro lado, o amor é um estado da vida. O amor, embora seja mais
trabalhoso, é duradouro. Embora possa ocorrer, atipicamente, eventual discussão
entre o casal, se existe um amor recíproco, os problemas serão efetivamente
superados. Com amor, eles sabem que não são apenas “meros companheiros”, mas,
sim, “grandes parceiros”.
Quando começamos as nossas vidas com paixão, nada mais parece se importar. A
outra pessoa personifica a perfeição aos nossos olhos. Não se importam se o
outro(a) é perfeito(a) ou não. Tanto faz! O apaixonado dará tudo de si e passará cada
minuto do dia com a pessoa por quem está apaixonado. Não poupará dinheiro ou
mesmo esforços necessários para fazê-la feliz. Isso são sinais de paixão. A paixão
causa uma mudança nas substâncias químicas, impactando os nossos cérebros.
Mas o amor é diferente. É muito mais que romance e paixão. É classificado por
princípios e valores compartilhados, a saber: respeito, honestidade, gentileza,
apoio, habilidades, solução de problemas e uma ótima comunicação.
AMOR E PAIXÃO

Para o romance-paixão essas habilidades não são tão importantes. Mas para o amor
verdadeiro esses valores desempenham um grande papel. Ou seja, aqui já podemos
estabelecer a diferença entre paixão e o amor. A paixão dura pouco tempo, mas o amor
dura muito tempo; o amor é uma compreensão mais profunda, enquanto a paixão
não exige isso.
Mas D’us, na sua infinita bondade, nos deu tanto o amor quanto a paixão como maneiras
de juntar um casal. E por que ambos são necessários? O que acontece se alguém vive só
com amor? Só paixão já vimos que não dura muito tempo. E por que não dura muito
tempo? Tantos casais começam totalmente apaixonados e acreditam piamente que isso
durará para a eternidade. O que está por trás desta combinação de paixão e amor? Isso
realmente é algo que vale a pena se aprofundar bem.
Somos hoje influenciados pela psicologia moderna. Com efeito, a informação
prevalecente é que o casamento está em falência total. Alguns o acham uma péssima ideia,
afirmando que “não pode dar certo, ou, ainda, é um mal necessário e que, portanto,
devemos ser consolados com a afirmação “Aguente firme, pois é assim que o mundo deve
continuar”.
Esta incompreensão, sobre a diferença entre amor e paixão, pode levar a uma conclusão
errada no sentido de que não podemos sentir positividade nesta entidade chamada
casamento. E realmente numa perspectiva lógica, ele, o casmento, não deve funcionar.
Então trata-se de um assunto que é contra a lógica? Mas quem de nós está a fim de não
usar a lógica?
Vamos começar com um Midrash antigo onde relata uma história segundo a qual uma
senhora de destaque, residente em Roma na época dos Césares, aproximou-se de um
grande Rabino chamado Yossi e falou: diga-me o seguinte: quantos dias durou para D’us
criar o mundo? Rav Yossi respondeu: seis dias. Quando então a senhora lhe indagou:
Desde aquele tempo o que D’us faz?
O Rabi Yossi respondeu: A principal ocupação e preocupação de D’us é arranjar
casamento. Ele é um grande casamenteiro e, por isso, combina a filha de tal pessoa para
se casar com o filho de outro e vice-versa. O que? – retrucou aquela senhora –. Para
fazer algo tão simples precisa do envolvimento de D’us? É algo que posso fazer, pois
tenho tantos servos e servas que possibilitará inúmeras combinações para realização de
muitos casamentos; e, ao final serão felizes. Não vejo nenhuma dificuldade para arranjar
casamentos! Então a senhora assumiu esse grande desafio! Naquela noite, ela chamou mil
servos e mil servas e falou: olhe, você vai se casar com essa; você vai se casar com esse
etc. Ela realmente fez mil combinações e achou que havia conseguido, mas isso durou até o
dia seguinte.
Quando o Rabi Yossi encontrou os mil casais – recém-casados –, percebeu que a grande
maioria estava bem machucada. Alguns estavam mancando e outros com os olhos
maculados de preto. Cada um demonstrou que havia passado uma noite de brigas e
desentendimentos.
AMOR E PAIXÃO

Diante daquela cena, a senhora atônita perguntou: o que aconteceu? Achei


que vocês estavam bem-casados. Eles responderam: o que?! Você mandou me
casar com aquela senhora, ela não é bonita suficiente[1]. Outro disse: “você
mandou me casar com aquele rapaz; ele é um cara tão preguiçoso; acho que não
existe no mundo uma pessoa mais preguiçosa. Para ele se levantar da cadeira é um
grande esforço. Por isso, partimos para a briga; ninguém aguenta este casamento.
Ao final, ela voltou a falar com o Rav Yossi: realmente para o casamento
funcionar precisamos da benção e da mão de D’us.
Temos tanto para aprender neste trecho Talmúdico. Mas uma coisa podemos logo
deduzir: arranjar casamentos, casar-se; encontrar uma esposa ou um esposo que se
combinam, não é uma tarefa simples. E o que se chama combinar? Quando os
dons e talentos da esposa conseguem, de uma certa forma, cobrir as fraquezas
do marido e vice-versa.
É uma tarefa realmente difícil para combinar duas pessoas, juntando qualidades
ao invés de serem destacadas as diferenças entre eles. E a razão é simples: pessoas
são diferentes. Cada um possui talentos e habilidades diferentes. Temos também
imperfeições e falhas diferentes do outro. Gostos diferentes e cada um de nós possui
algo em nossa personalidade que o outro não gosta.
É tão comum no casamento ouvir: “olhe, o meu marido é desorganizado. Nunca
imaginei que fosse me casar com uma pessoa tão desorganizada. Sou tão
organizada de tal forma que cada coisa tem que estar no seu lugar. Ele, ao
contrário, quando entra em casa, tira os sapados; um vai para oeste; o outro vai
para o leste; as meias encontram-se em todos os quartos, tudo desorganizado; não
sei como vou aguentar isso! No fim aguenta. Mas as pessoas são diferentes, até
porque possuímos temperamentos totalmente diferentes. Cada um tem à sua forma
ou estilo de como resolver as coisas. Na vida prática, percebemos que têm pessoas
disciplinadas; outras, ao contrário, não esquentam a cabeça!

[1] Rabbi Jonatan Sacks, no capítulo “Amar e ser Amado”, do livro “Ceremonia Y Celebracion – Introduccion a las Festividades escreve que: “Platão
sustentava que amamos o que é belo. No judaísmo acredita-se em algo sutil, porém fundamentalmente diferente: que o que amamos se torna belo. A beleza não
cria o amor. O amor cria a beleza” (Rabbi Sacks, Jonathan, Edição em Espanhol traduzida por Aryeh Coffman, Koren Publishers Jerusalém/2019, pág. 268).
AMOR E PAIXÃO

Diferenças de opiniões são enormes e não precisamos ir muito longe. Podemos dar o
exemplo daquilo que ocorre com as sociedades comerciais. Apesar de os sócios terem
uma percepção inicial que são feitos um para o outro e acreditarem na sociedade, com o
decorrer do tempo invariavelmente chega ao fim. Ora, se uma sociedade – no business
–, tem tanta dificuldade para durar em razão das diferenças do caráter e personalidade
que aparecem com o tempo, acabando com a parceria comercial, por mais razão um
casamento, que, como se diz hoje, é 24-7. Ou seja, vinte e quatro horas por sete dias
ininterruptos.
Interessante que quando encontramos casais que estão juntos há muito tempo,
perguntamos a nós mesmos: como eles se aguentaram e se suportaram, um ao outro, e
ainda continuam a se amar apesar das diferenças?
Sabemos muito bem – daquele livro conhecido do John Gray – Men Are from Mars,
Women Are from Venus – que homens e mulheres são de planetas diferentes. Ou,
como a versão mais conhecida entre judeus: os homens são de Jerusalém e as
mulheres de Tel Aviv ou de Bnei Brak. John Gray escreve que:

“tantas pessoas são frustradas nos seus relacionamentos! Elas amam seus parceiros,
mas, quando há tensão, não sabem o que fazer para melhorar as coisas. “[...]. Não
somente homens e mulheres se comunicam diferentemente, mas pensam, sentem,
percebem, reagem, respondem, amam, precisam e apreciam diferentemente. Eles
quase parecem ser de planetas diferentes, falando línguas diferentes e
necessitando de diferentes nutrientes. [...]. Essa compreensão ampliada das nossas
diferenças ajuda a resolver muito da frustação em lidar e tentar entender o sexo oposto.
Desentendimentos podem então ser rapidamente dissipados ou evitados. Expectativas
incorretas são facilmente corrigidas. Quando você se lembrar de que seu (sua) parceira
(a) é tão diferente de você quanto uma pessoa de outro planeta, você então poderá
relaxar e cooperar com as diferenças em vez de resistir ou tentar mudá-las”[1].

[1] Gray, John, “Homens são de Marte, mulheres são de Vênus, Editora Rocco Ltda, 1995, pág. 15.
AMOR E PAIXÃO

Com efeito, homens e mulheres são diferentes; têm ideias diferentes. Mas qual é a
mágica que D’us usa para ligar um casal, incutindo-lhes que durará para sempre,
mesmo quando as diferenças estão eclipsadas pela paixão ou que, mesmo quando
reconhecidas, não é-lhes dada tanta importância? Qual é essa força?
Devemos saber que o bom D’us quis que os casamentos fossem bem-sucedidos e
repletos de alegria. Por esse motivo, D’us, na sua infinita bondade, criou alguns
instrumentos e ferramentas que nos proporcionam habilidades e um dom para que o
homem e mulher venham a se juntar. Como diz o versículo: que a pessoa abandone
a casa de seu pai e mãe; se junte com sua esposa e se tornem UM mesmo, com tanto
amor e afeto. Qual é o instrumento que D’us usa? E a grande resposta é: D’us nos
deu a dádiva da paixão!!
Aqui no Brasil, quando se fala “paixão” é do que se fala nos Estados Unidos.
Nos Estados Unidos usa-se uma palavra infatuation. Vi que em português também
existe está palavra – infatuação –, mas aqui ninguém a conhece e nem soa tão bem.
Aqui é a paixão! E quando se fala “paixão” é paixão mesmo! É o início de nosso
casamento. E os efeitos da paixão são poderosos.
É tão comum ouvir: “tivemos uma conversa e nós nos conhecemos. Então, olhei
nos olhos dela; ela olhou nos meus olhos e – pah! Welll! – . De repente, um jovem
rapaz bem equilibrado, bem-sucedido na vida, está nas ruas cantando; não apenas
alegre, mas está apaixonado. Da mesma forma, uma mulher madura, bem
equilibrada e absorta em pensamentos apaixonantes, não consegue se concentrar em
mais nada além do jovem que o encontrou. Isso é paixão.
Eles enxergam o mundo diferente e realmente comportam-se totalmente diferentes
daquilo que se comportavam anteriormente. Interesses diferentes; dedicações
diferentes pelo fato de estarem numa fase de paixão. Agora podemos concluir:

Deus criou paixão para nos dar a oportunidade, de homens e mulheres casarem-se, e, em
seguida, criarem famílias amorosas; para realmente juntar duas pessoas que têm naturezas
totalmente diferentes; que foram criados e educados diferentes. Mas para que eles fiquem juntos –
com amor –, devem antes passar por essa fase; essa transition chamada paixão.
AMOR E PAIXÃO

Paixão é uma droga. Mas, claro, funciona de forma positiva! Ela vai
influenciando na maneira como se pensa e sente. Quando alguém está apaixonado
tudo é mil maravilhas. O mundo está dançando repleto de alegria e positividade.
Estudos científicos mostram que a paixão realmente muda a química do nosso
cérebro. Dopamina, serotonina, adrenalina, que são neurotransmissores, são
potencializados. Um casal apaixonado sente uma influência na adrenalina e cujo
efeito é uma elevação e alegria enormes. Eles são daqueles que estão num “high”
(êxtase). Os estudos mostram que paixão tem efeito sobre o nosso cérebro; algo
similar a cocaína. Poucos sabem deste fato e realmente ela – a paixão – trabalha
como uma droga. Um psicólogo definiria isso como uma psicose leve.
E, nesse estado, tudo é perdoado; além do que são super tolerantes; eles têm
toda a paciência do mundo e aceitam tudo. Gostam tanto da companhia um do
outro que abrem mão de qualquer outro prazer; sentem a necessidade de se
aproximar da pessoa por quem está apaixonado. Eles não veem defeitos, já que
estão totalmente envolvidos. Na verdade, ficam sem limites. Ou seja, a paixão
cega e cada um projeta no outro uma perfeição para além da realidade porque não
se vê defeito. Estão num eclipse apaixonante.
E, aqui, chegamos para diferenciar paixão e amor. Paixão nos engana. O amor
é verdadeiro. Quando alguém está apaixonado é fácil não enxergar os defeitos da
pessoa por quem ele(a) realmente está apaixonado(a). A atração e a alegria cegam
a pessoa para não perceber as falhas do outro. E mesmo quando eles enxergam,
veem de uma forma diminuída e sem importância.
Diferente é o amor. Quando alguém ama tem pleno conhecimento das falhas da
outra pessoa. Sabe que a esposa/esposo está longe de ser perfeita(o), mas o(a) ama
de qualquer jeito. Eles aceitam o outro por aquilo que é. Isso é uma linha
importante do amor. Paixão, ao contrário, engana! Enxerga a outra pessoa por
aquilo que não é, ou, talvez, nunca foi. Amor permite e dá a possibilidade de
aceitar aquilo que o outro é realmente, sem fantasias. Paixão e amor são situações
totalmente diferentes.
AMOR E PAIXÃO

O amor exige muito de nós e demora-se muito para realizar o amor. É muito
comum, casais que tiveram uma vida amorosa sólida, responderem a seguinte
pergunta: me diga o seguinte: quando vocês se encontraram no início, se conheciam
tão bem quanto agora? Dizem: NÃO!! Realmente não!! Agora, sim, nós nos
conhecemos!! O nosso amor, agora, é muito mais profundo em comparação à época
em que éramos jovens e apaixonados; é bem diferente daquilo que aconteceu no
decorrer da vida”.
Não sei se a palavra “diferente” é de fato uma palavra boa. Isso porque a palavra
“diferente” é insuficiente para descrever o amor. O amor é muito mais profundo e
edificante comparado com a paixão. Devemos saber que o sentimento de amor não
acontece por si só. Ele cresce e brota quando trabalhamos o nosso casamento com
base em atos amorosos. Ou seja, é um esforço contínuo e árduo para enxergar o
esposo ou a esposa com as suas virtudes e falhas. Por isso, devemos aceitar o outro
não somente em sua glória, mas também no seu ponto fraco. Isso é um grande
aprendizado. Essa transformação não surge de um minuto para o outro, porquanto
exigem atos práticos.
Infelizmente, muitos casais não assimilam. A partir do casamento eles fazem a
seguinte declaração. “Olhe, o nosso casamento foi tão bonito. Uau!! Era uma
demonstração de paixão que não existia igual. Isso vai demorar; vai durar para a
vida inteira; não precisamos investir no casamento, pois ela vai funcionar por
inércia. E o grande segredo é: vão ter dificuldades!!
Porque o segredo do amor é transformar a paixão em amor. D’us nos deu
paixão para iniciar o processo. Porém, após o início, temos que aprender o dom e o
talento de mudar “paixão” para ser o amor. Devemos saber que o amor não é
apenas paixão mais elevada.
Temos muitos casais que começaram com paixão. Porém, não evoluíram no amor.
E já que paixão é algo temporário, inevitavelmente vai desaparecer num momento
crítico. Mas muitas pessoas tiveram inteligência emocional e prepararam-se para
isso. Então, quando termina a paixão, sentem um profundo amor em substituição à
paixão.
Em conclusão: quando a paixão se transforma em amor, o casamento brota e
se torna frutífero. E isso é a regra número um – o primeiro dos nossos princípios –.
Aprenda a técnica e o instrumento que D’us nos entregou para tornar o nosso
casamento bem-sucedido. D’us nos deu os dons da paixão e do amor. Entenda a sua
força.
AMOR E PAIXÃO

Para terminar, e internalizar todos esses conceitos, em Jerusalém morava um grande rabino cujo
nome era Rabino Levin. Ele sempre é citado para mostrar o que significa um casal que se torna
um. Conta-se a história segundo a qual a sua esposa estava sofrendo em razão de a perna estar bem
machucada. Aí, foram juntos ao médico. O rabino sentou-se com esposa e falou para o médico:
“estamos aqui hoje porque a nossa perna está nos doendo”. Não era mais a perna dela; era “a
nossa perna que está nos doendo”. O amor era tão profundo; a união entre eles era de tal grandeza
que não era mais a perna da esposa, mas, sim, “a nossa perna”!! Mas para isso, precisa-se do
verdadeiro amor.
E agora, respondendo à pergunta: o casamento é difícil? Com dons e talentos que D’us nos
deu, é bem acessível e a fonte de nossa alegria. Paixão e amor, cada um em seu respectivo
momento e com a sua intensidade!! Assim vamos construir lares amorosos e quando se tem
amor, o sucesso é cem por cento garantido!
Capitulo2
AMOR E RESPEITO
AMOR E RESPEITO

Muitas matérias-primas contribuem para a construção de um casamento saudável. Amor, é


claro, é necessário, assim como o sentido de reverência e respeito – o respeito que cada
cônjuge sente pelo outro e a reverência que tanto o marido como a esposa sentem por
D’us.[1]

Sabemos que tanto o amor quanto o respeito são necessários no casamento. Mas
o princípio número dois começa com uma grande pergunta: o que vem antes, o
amor ou o respeito num relacionamento? Para respondermos está pergunta
precisamos lembrar de algo fundamental.
O casamento judaico começa com a assinatura da Ketuba. O que é Ketuba? É
um documento de casamento legal no qual um noivo compromete-se a ser um
marido bom e fiel. No parágrafo de abertura, o marido obriga-se dizendo: “Vou
trabalhar para você, respeitá-la, sustentá-la e honrá-la”. No entanto, está faltando
uma palavra importante: falta a palavra amor! Será que deveria estar escrito vou
te amar!?
Todos nós sabemos que o casamento bem-sucedido é aquele em que o marido e a
esposa sentem um profundo amor. De fato, o amor é o que une e cria no casal uma
profunda união harmoniosa. Com efeito, o amor é essencial no casamento. Mas por
que esse ingrediente essencial – a palavra amor - está faltando no documento do
casamento? Para entendermos isso precisamos examinar o desenvolvimento dos
ensinamentos que vimos no capítulo anterior.
Os bebês nascem incrivelmente auto-absorvidos. Eles se veem no centro de toda a
existência. Durante os primeiros anos estão centrados em si mesmos.

1] Schneerson, Menachem Mendel. "Rumo a uma vida significativa: a sabedoria do Rebe Menachem Mendel”. Adaptação Simon
Jacobson; tradução Benjamimn Albagli.Título Original: Toward a meaningful life. Ed. Maayanot/2019; pág. 84.
AMOR E RESPEITO

quando decidem é hora de correr o mundo pode parar e isso é sinalizado


normalmente com um sonoro choro ou até mesmo com um grito. Neste momento,
deixam claro – I am the first – “eu sou o primeiro” –.
Essa é uma parte intencional no design da criação. É assim que D’us nos criou.
Na verdade, os anos de formação são necessários para que possamos descobrir e
criarmos as nossas próprias identidades. E o que o bebê sente? “sou muito
importante. Não quero saber o que os outros sentem; é hora de descobrir o que
preciso e quem sou eu.
Mas na medida em que amadurecemos começamos a formar relacionamentos e já
devemos aprender que essas novas experiências servem para irmos além de nós
mesmos. Depois de estabelecermos as nossas próprias identidades, os
relacionamentos oferecem oportunidades incríveis para ampliar as nossas
experiências. Fortalecemos a nossa personalidade através da conexão com pessoas
que pensam, sentem e veem o mundo de maneira diferente.
Porém, exige-se uma condição para que isso possa acontecer: precisamos
respeitar e valorizar a outra pessoa como individuo único fora de nós mesmos.
Precisamos reconhecer que as diferenças do outro trazem uma nova dimensão ou
perspectiva no relacionamento. Quando reconhecemos as diferenças de outro,
introduzimos uma nova dimensão para o relacionamento se desenvolver. Isso não
conseguimos sozinhos.
Com esse panorama inicial já poderíamos conceituar o que seria “respeito”, o
qual, como já sabemos, é fundamental no casamento. Mas antes de avançar,
devemos fazer uma observação importante. O amor pode ser egocêntrico e aquilo
que as vezes interpretamos como um amor intenso pode significar uma expressão de
interesse próprio e uma busca de prazer.
Infelizmente, não é incomum ver relacionamentos cujo início foi intenso, mas
com o tempo começam a se deteriorar. Isso ocorre quando uma pessoa percebe que a
outra não era o seu lado perfeito, como inicialmente se pensou. No entanto, não
podemos nos esquecer que o amor real, e de longo prazo, deve ser construído sobre
uma base de profundo respeito. Somente quando respeitamos genuinamente a
individualidade de outro(a), com quem nós nos relacionamos sem egocentrismo,
podemos realmente amar. Ou seja, o que vem em primeiro lugar: o amor ou
respeito? O respeito. Quando tem uma base de respeito podemos realmente amar a
pessoa.
AMOR E RESPEITO

Já vimos que a ketuba – que é o documento de casamento – estabelece as bases


do casamento. Sabemos também que o objetivo do casamento é o amor e a sua
íntima conexão com o(a) amado(a). Não há dúvidas sobre isso. Mas para que o amor
verdadeiro seja alcançado o respeito deve existir em primeiro. Ou seja, o
relacionamento será duradouro e feliz quando a fundação é construída com respeito.
Com isso abrimos o segundo princípio - respeito - que é estrutura fundamental do
casamento e serve como entrada para o amor genuíno. Mas o que é o respeito e
como podemos demonstrá-lo?
No capítulo anterior vimos que o verdadeiro amor exige algo fundamental. Ou
seja, devemos aceitar alguém pelo que é, sem projeções e fantasias individuais. Mas
agora é hora de refletirmos se de fato isso é a maneira sobre a qual pensamos.
Todos nós sabemos daquele clássico exemplo em que as pessoas dizem “eu amo
peixe”! Mas será que a pessoa realmente ama o peixe? Ora, se existisse o amor de
que falam, por certo colocariam o peixe numa boa água, dando-lhe uma boa comida,
e, logo em seguida, seria colocado para nadar livremente. Contudo, o que fazemos
com “todo esse amor que temos pelo peixe”? Simplesmente nós o comemos para a
nossa plena satisfação.
Quando falamos “amo o peixe”, na verdade nós nos amamos. O peixe está
apenas ajudando-nos a satisfazer os nossos prazeres e vontades. Muitas vezes um
casal fala: “Uau, como amo o meu esposo!!” Será que está de fato amando o esposo
ou, ao contrário, apenas aquilo que ele está fazendo? Pode ser que a pessoa está se
amando e para isso projeta os seus sonhos e fantasias no suposto “amado” em
relação ao qual nutre a esperança de receber aquilo que pretende.
Antes de mais nada devemos saber que uma relação de dominação não expressa
amor. O judaísmo ensina que o amor significa abrir um espaço dentro de si
para inclusão do outro. Somente quando duas pessoas se doam, um a outro, e se
ajudam dentro de um relacionamento de respeito mútuo, poderão experimentar o
poder e o milagre do amor verdadeiro.
Contudo, pode surgir a seguinte pergunta: “Mas rabino, está escrito claramente
na bíblia que, após aquele incidente da fruta proibida, D’us falou que o marido iria
governar sobre a mulher”. Será que esse versículo é fonte justificável para o
domínio do homem sobre a mulher? A resposta é: NÃO! Como assim rabino? A
própria Torah diz que o homem dominará sobre a mulher. Estou seguindo a bíblia e
quero que a minha esposa seja exatamente conforme os meus planos, sonhos e
fantasias! Tenho esse direito! Está escrito claramente na bíblia. Ora, rabino, você
conhece esse assunto!! Mais uma vez a resposta é NÃO!
AMOR E RESPEITO

A bíblia[1], especificamente a Torah, está nos dizendo que isso é uma maldição;
isso é um castigo. Não é a norma e não é o ideal pelo qual devemos lutar. Somos
responsáveis por anular está maldição. Assim como a tecnologia aplicada na
agricultura está anulando a maldição “maldita é a terra por sua causa”, da mesma
forma ninguém vai falar: “olhe, já que D’us amaldiçoou a terra não vamos usar a
tecnologia moderna”. Quando se trata sobre o versículo – “ele governará sobre a
mulher”, devemos saber que a Torah está nos dizendo que devemos lutar contra essa
maldição! Ou seja, a maldição da denominação masculina foi anulada nos
relacionamentos amorosos de todos patriarcas e matriarcas do povo judeu.
Lembramos que D’us disse ao nosso patriarca Abraão “Faça tudo que Sara lhe
disser. Escute sua voz”. Sabemos sobre a grandeza do nosso patriarca Abraão, mas a
tradição oral ensina-nos que esse versículo indica que o sentido profético de Sarah
era mais forte do que o nível de profecia do próprio Abraão.[2]
Rebeca também dificilmente poderia ser descrita como subordinada a seu marido
Isaac. Foi ela quem persuadiu corajosamente o seu filho Jacó para se disfarçar como
o seu irmão Esaú. Rebeca teve a percepção de saber que Jacó era quem merecia as
bênçãos. Por isso, orquestrou essa peça para ajudar Isaac a perceber a triste verdade
sobre a manipulação de Esaú.
Já percebemos que tanto Sarah quanto Rebeca não eram subordinadas aos seus
esposos. Elas conseguiram superar a maldição – ele governará sobre vocês –.
Também quando Jacó quis sair da casa de seu sogro – Labão[3] –, precisou buscar
seriamente a concordância de suas esposas Raquel e Lea. Ele não estava disposto a
implementar uma decisão sem a opinião e consentimento delas. Aqui, percebemos o
respeito mútuo existente dos patriarcas em relação às matriarcas. Algo tão
fundamental no casamento.

1] TaNaCh (bíblia) é um conjunto composto pela Tora escrita, pelos livros dos Nevi’im (profetas) e pelos livros de Ketuvim (escritos).

[2] Rabenu Shlomo ben Yitzhak, Rashi, comentarista do século XI, diz que “Avraham era secundário a Sará no seu grau de profecia” (Shemot Rabá
1:1 Tanchuma Shemot - 1).

[3] O nome originário é Lavan, cujo significado em hebraico é branco. Isso significa que a externalidade jamais pode ser identificada com a
essência de uma pessoa. Lavan representa o arquétipo daquele que engana e que, nos dias atuais, seria diagnosticado como um sociopata. A
palavra em hebraico begued (roupa) pode ser lida como bagad(traiu). Da mesma forma, a palavra meil (capa) pode ser lida como máal (profanar).
AMOR E RESPEITO

Aliás para demonstrar o conceito de respeito vamos contar uma anedota judaica
segundo a qual um jovem, cuja uma mentalidade realmente considerava a maldição
da dominação masculina como padrão ideal, iniciou a conversa com uma
pretendente deste modo:
“Você gosta de cozinhar? Ela disse: não, eu odeio isso. Bem – ele perguntou –
você gosta de limpar a casa? Não, odeio - ela respondeu. E gosta de lavar roupas?
Absolutamente não! Mas a jovem logo percebeu que as respostas estavam deixando
o sujeito chocado. Então ela fez uma pergunta direta: me diga o seguinte: o nosso
encontro é uma entrevista para emprego? Por acaso, você está me entrevistando
para um emprego?”
Ficou claro pelas perguntas que ele não estava procurando uma esposa, mas, sim,
uma governanta. As mulheres podemcometer também o mesmo erro, se,
eventualmente e na mesma situação, perguntarem sobre o status de se ganhar
dinheiro ou mesmo as chances de o pretendente se tornar uma pessoa de posse.
Devemos saber que o amor significa aceitá-la(o) pelo que ela(e) é. Por isso, não
pode ser a projeção de uma fantasia ou sonho.
Nas frases iniciais da Torah é-nos falado que o primeiro ser humano foi criado à
imagem de D’us. E o que era essa imagem? O primeiro o ser humano era uma
entidade única que inclui os dois sexos – “E Deus criou o homem, criou à Sua
imagem, à imagem de Deus o criou; macho e fêmea criou-os” –. Assim diz o
versículo Gênesis 1-27.
Dessa união de opostos – de masculina e feminino – o primeiro ser humano
refletiu a imagem de D’us. Uma unidade que inclui alteridade de ambos os sexos e
ainda assim permaneceu “um”. Temos um homem e uma mulher e só uma entidade.
Este é um conceito que vale a pena refletir com profundidade.

Os “sábios talmúdicos concordam em que Eva não nasceu simplesmente da costela de Adão,
como de certo modo nos acostumamos a pensar, mas que Adão e Eva (ou melhor, Adam
Harishon, ‘o homem primordial’) veio a existir como uma só criatura com dois rostos, ou
lados, - um masculino; outro, feminino. A palavra bíblica tsêla, comumente entendida como
significando ‘costela’, pode ser interpretada com o sentido de ‘lado’, como na expressão tsêla
hamischcan’ (‘um lado do Tabernáculo – Êxodo 26:26). A mulher foi criada da tsêla de Adão
porque deveria começar com uma tsêla – um lado – ou um aspecto do homem primordial, que
assim veio a constituir duas pessoas distintas[1]”.

1] Steinsaltz, Adin – (Even-Israel), Biblical Imagens, Copyright 1984, pág. 23.


AMOR E RESPEITO

Um indivíduo solitário não reflete a imagem de D’us. Um indivíduo em


unidade com outra pessoa é que se completa. Ou seja, quando um indivíduo abre
espaço para inclusão de outro, permitindo-se também que ele faça o mesmo, temos
então uma unidade que reflete a imagem de D’us. Ou seja, para refleti-Lo deve-se
abrir um espaço para inclusão do outro e vice-versa. Vamos entender isso um
pouco melhor.
A Torah registra que depois que o ser humano foi criado, D’us disse: “Não é bom
que o homem esteja só. Far-lhe-ei uma companheira frente a ele[1]”. Deus
determinou e determina que o ser humano precisa de uma ajudante. Mais ainda: essa
ajudante tem que ser igual a ele. Mas antes de D’us entregar a Eva para Adão o
versículo conta-nos algo superinteressante. Diz a Torah:
E o Eterno D’us formou da terra todo o animal do campo e toda a ave dos céus, e
trouxe ao homem para ver como lhe chamaria; e tudo o que chamasse o homem à
alma viva, esse seria o seu nome. E o homem deu nomes a todos animal, ave dos
céus e a todo animal do campo, mas para si não achou uma companheira frente a
ele[2].
Vamos à ordem para melhor compreender isso: (a) D’us criou todos os pássaros,
animais e Adão deu o nome para cada um; (b) depois que ele nomeou todos os
animais diz o versículo que ele não encontrou uma companheira. Mas o que nomear
as criaturas tem a ver com encontrar uma companheira? Por que, depois que Adão
nomeou todas as criaturas, ele não encontrou uma companheira, conforme diz
claramente a Torah? Qual a ligação dos assuntos?
O Midrash explica-nos que D’us estava brincando de casamenteiro. Mas haveria
possibilidade de Adão realizar um daiting?A resposta é bem simples. Os animais são
subordinados ao homem, não sendo o seu igual. Foi ordenado à Adão dominar sobre
todos os peixes, sobre a ave dos céus, sobre todos os animais, mas ele não poderia
superar a sua solidão encontrando o seu amor verdadeiro com um ser que lhe fosse
subordinando e sobre o qual foi determinado governar. Isso não funcionaria.

[1] Gênesis, 2-17.


[2] Gênesis, 2-20.
AMOR E RESPEITO

O animal pode ser de uma grande ajuda, mas não é significativo para o homem
nesta perspectiva. Por isso diz a Torah: Far-lhe-ei uma companheira frente a ele.
Interessante que a expressão em hebraico é Ezer Kenegdo[1], cuja compreensão é
uma auxiliar adequada, ou seja, oposta e em paralelo a ele. “Daí porque, sobre a
criação da mulher, ser dito “frente a ele – e não contra ele – pois a ideia de uma
relação conjugal é que cada um atue a partir de seu próprio lugar. Desta forma,
‘frente a ele’ significa que a mulher há de atuar na mesma linha direção do homem,
porém em outro lugar à sua frente. [...]. D’us criou a mulher para que ela atue ao
lado do homem, não abaixo e não acima, cada um desempenhando a sua missão
em seu próprio lugar, complementando-se e completando-se mutualmente[2].”
Num discurso do sexto Rebe do Chabad – em 1940 – há uma profunda
explicação sobre a palavra echad. O que significa se tornar um? Palavras do Rebe:
Um é somente quando os opostos se juntam. Vayehi Êrev Vayehi bôker Yom Echad
(“...e foi tarde e foi a manhã, dia um”). Dia representa a existência de luz. Noite
corresponde a escuridão. Um dia, de 24h só de luz, não é dia. Da mesma forma, um
dia, somente com escuridão, também não é considerado dia. Contudo, quando se tem
noite e dia os opostos se juntam e se tornam echad. Isso aplica-se claramente ao
casamento. Aliás, pessoas amadoras na área sempre procuram alguém para ser igual
ao pai, dizem: “quero alguém exatamente como o meu pai ou ainda exatamente
como é a minha mãe. Mas será que isso é o que queremos? Ou pretendemos alguém
que pode ser totalmente diferente de nós, com outra visão ou com estilo
diametralmente diferente? Em suma, tornar-se “UM” quando juntam-se dois
opostos. Isso, sim, é o verdadeiro echad. Na Cabala, quando fala da unicidade D’us,
diz que Ele junta os opostos. Nosso casamento tem que ter esse foco. Opostos que
se tornam UM.
D’us criou a mulher de uma maneira muito positiva e respeitosa para ficar “frente
a ele”, envolvendo-o em terreno paralelo. Homens e mulheres precisam formar um
casal para refletir a imagem de D’us. Mas o que é o respeito e como podemos
realmente averiguar se temos essa qualidade de respeito?
Nós vimos até agora como o respeito é essencial para um casamento ser bem-
sucedido. O Talmude diz as seguintes palavras: “o homem deve amar sua esposa
tanto quanto a si mesmo, mas deve respeitá-la mais do que a si mesmo” Então
quando o homem respeita a sua esposa, mais do que a si próprio, o lar será de paz.

1] Existe uma indagação Talmúdica sobre a expressão: trata-se de uma ajuda ou “contra ele”? A resposta é significativa: se o homem merecer a
sua esposa, será uma ajuda. Ao contrário disso, sua esposa será contra.
[2] Rabbi Raphael Hirsch (1808-1888). Torah Interpretada. Publicação em 1877 – Frankfurt.
AMOR E RESPEITO

John Gotman – professor muito conhecido, por ser especialista sobre relacionamentos
no casamento –, diz que pode antever o divórcio quando percebe a ausência de respeito
entre um casal. Isso significa que não existe relacionamento amoroso, de longo prazo, sem
está condição fundamental. Em suas palavras:
De acordo com a pesquisa realizada, existe mais de 80% de chance de um casamento
falhar quando um homem se recusa a compartilhar o poder com a sua parceira, pois um
casamento não pode ser estável se o marido não tratar com respeito a sua esposa.
Quando os relacionamentos de 130 casais foram estudados, os casamentos mais felizes
foram aqueles em que os maridos foram influenciados por suas esposas.
O respeito pode ser muito difícil de definir. Por isso, vamos pegar a palavra “respeito”
em inglês – respect – para, a partir das sete letras que a formam, utilizarmos cada letra
para definirmos o real significado de respeito na prática. Vamos, portanto, utilizar a
palavra respect como um acrônimo ou acróstico[1].
Em primeiro lugar o “R” representa “row models” – “modelo-padrão” –. Ou seja,
exemplos a serem seguidos.
Em termos práticos devemos encontrar um “casal modelo” a partir do qual podemos
observar a forma como o casal se respeita. Ao estudar a bíblia, podemos utilizar como
modelo os nossos patriarcas cujo respeito às matriarcas revela algo fundamental para nossa
compreensão. Com base nesses row models podemos aprender como um casal deve se
respeitar. É importante observarmos exemplos para adaptarmos em nossa vida. Isso é algo
fundamental.
Sempre é bom usar uma história intimamente relacionada à nossa vida para
compreendermos esse grande ensinamento.
Meus pais viveram muito bem. Meu pai – já falecido –Z’L[2]–, nunca se levantou do
jantar antes de perguntar para a minha mãe: posso lhe fazer um copo de chá? E sempre
pensávamos: uau, por que a pergunta? Diante desta pergunta, com tanto respeito, a minha
mãe respondia: “pode!”. Então ele se levantava e fazia um copo de chá para ele e para a
minha mãe.
Temos que ter essas imagens em nossas cabeças!!

[1] Acrônico significa a formação de uma palavra extraída da inicial de uma frase, por exemplo: Amen (El- Melech - Neeman -
D’us, Rei Fiel). Para melhor compreensão deste assunto, inclusive sobre guimátria (cálculos numerológicos das palavras em
hebraico), conferir o excelente livro “Coincidências numéricas na Torá, de Osmar Lewinski. Ed. Maayanot.

[2] Acrônimo em hebraico da expressão ‘Zichronô Livrachá, cujo significado é “de abençoada memória”.
AMOR E RESPEITO

Aliás, quando faleceu a esposa[1] do Rebe do Chabad, ele estava em luto e várias pessoas
chegaram para lhe fazer uma visita para tentar consolá-lo, conforme a lei. O Rebe estava sentado
numa cadeira baixa e várias pessoas passaram, quando uma pessoa renomada passou e lhe disse:
olhe, eu ouvi falar que ela era uma pessoa muito especial. Rebe respondeu: “isso é
understatement, ou seja, “isso é falar muito pouco. Somente, o bom Deus, o altíssimo, sabe sobre
a grandeza da minha esposa”. Isso foi dito pelo Rebe do Chabad. O respeito que ele teve por sua
esposa foi de tal forma que quando alguém falou que a sua esposa era especial, Rebe disse: “era
muito mais que especial. A verdadeira grandeza dela somente D’us que sabe. Ninguém poderia
dimensionar essa grandeza”.
Vamos para o segundo assunto, o “E”, da palavra respeito - esteem (estima).
Temos estima por quem respeitamos. Portanto, a chave para um grande casamento é pensar em
seu cônjuge como sendo aquele que ostenta as qualidades mais admiráveis e surpreendentes. Não é
incomum ouvirmos de um marido, que realmente ama a sua esposa, olhe, você me pegou de
surpresa. Sempre soube que você tinha grandes qualidades. Mas dessa vez, superou tudo!
Não podemos nos esquecer da época do noivado em que os noivos sentiram incrível admiração
um pelo outro. Essa admiração deve ser renovada, ano após ano, dia após dia. Essa continuidade
tem a força para descobrir mais qualidades especiais um do outro.
Vamos agora para a lição número três. O “S” do respeito – speak (fala).
O que nos define como seres humanos não é tanto o nosso intelecto. Mas, sim, a nossa capacidade
de se comunicar, de falar. Falar, portanto, é a principal forma de comunicação. Isso é muito
importante no casamento. Respeito é, antes de tudo, falar com respeito. Infelizmente, nos
deparamos com alguns casais cujo tratamento em relação a outro é de total falta de respeito. Mas
isso é um erro gravíssimo. Vamos exemplificar com dois exemplos para compreensão do poder da
fala e da expressão.
Um casal de noivos, eclipsados pela paixão, estava andando pela rua, quando então o noivo
tropeçou num obstáculo. Sua noiva, com uma voz suave e com um tom de preocupação, pergunta-
lhe: Meu bem, o que aconteceu com você, está tudo certo? Em retribuição a voz doce e com
expressão de profunda paixão pela noiva diz: Meu amor, está tudo ótimo. Nada aconteceu! Ela
respira aliviada e termina: “uffa, que bom meu amor”. Agora imagine a mesma situação, mas
depois de três anos de casados. O esposo leva o mesmo tropeção. A sua esposa, com expressão
corporal de profunda irritação coloca as mãos na cintura e absolutamente irritada diz: “Novamente
isso, será que não presta atenção. Até isso tenho que fazer por você. Não consegue prestar
atenção nas coisas mínimas?
Qual a diferença da primeira situação para o segundo caso? Antes eram noivos; agora estão
casados. Note-se que a forma de se expressar e o modo como se fala, quando falta respeito, são
extremamente prejudiciais para o relacionamento e não tenham dúvidas: com o tempo acaba o
amor.
Agora vamos para a palavra “P”, de public (público).

[1] Rebetzin Chaya Mushka Schneerson era a segunda das três filhas do Rabi Yossef Yitzchak e Nechama Dina Schneerson.
Tinha 86 anos quando faleceu. Conferir capítulo “A Sra Schneerson, da President Street” do livro de Telushkin, Joseph, “O
Rebe: A vida e os ensinamentos de Menachem M Schneerson, o rabino mais influente na história moderna”: tradução Lilia
Wachsmann -1ª Ed. -São Paulo; Bait, 2020, pág 372.Conferir também edição em espanhol, Edicion Michann.
AMOR E RESPEITO

Existem pessoas que têm uma mania de rir de seu cônjuge, zombando dele publicamente.
Acham que isso pode lhes trazer uma certa grandeza ao rebaixar o outro cônjuge. Muitos contam
sobre as suas dificuldades em público. Acham isso interessante. Hoje é tão comum abrir um
facebook e percebemos pessoas “lavando as suas roupas sujas” publicamente. Então descobrimos
que muitos casais, que achávamos que tinham um casamento tão feliz e com tanto respeito,
revelam publicamente os problemas pelo quais estão passando. Isso é terrível. Ao contrário
disso, comece a elogiar o seu cônjuge em público nos próximos trinta dias. Faça isso pelo menos
uma vez por dia. Fale para outra pessoa o quanto admira e aprecia o(a) seu(sua) cônjuge.
Quando estiver fora de casa nunca critique ou discuta com seu cônjuge, pois ninguém precisa
saber dos problemas do seu casamento. Sempre valide ou apoie o seu cônjuge, mesmo quando
possa transparecer o cometimento de eventual erro. Mas não desdenhe dela(e) publicamente. Por
fim, apesar de aparecer algo irrelevante, não podemos nos esquecer que apelidos “fofos” podem
ser divertidos em casa. Mas fora disso, não os utilize em público.
Vamos agora para a letra “E”, de empaty (empatia).
Mostre empatia! Mostrar empatia significa que os sentimentos da esposa devem ser
compreendidos e igualmente levados a sério. Isso é fundamental. Um dos livros que li sobre
casamento tem uma história interessante.
Narra a história de um casal que foi falar com o rabino sobre uma grande dificuldade pelo
qual passava. O rabino ficou curioso sobre o que havia de errado com aquele casal, que, até o
momento, parecia estar bem. Mas o esposo começou o relato dizendo que num dia levantou-se
cedo; fez a sua reza habitual e saiu para o trabalho como todos os dias.
De repente, já no escritório do trabalho, o seu celular começou a tocar ininterruptamente. Da
mesma forma, o telefone de sua mesa e os telefones do escritório. Então alguns funcionários
entraram em sua sala e disseram-lhe que a esposa estava querendo falar urgentemente. Ele parou
tudo para atender o telefone da esposa. Deparou-se com ela em prantos: “Vem rápido para casa,
tem um problema enorme e vou lhe contar quando chegar em casa. Mas o que ocorreu? – dizia o
esposo em pavor –. Ela respondia que falaria depois, mas ele teria que sair rápido do seu trabalho
para ajudá-la. O esposo, sem saber o que estava acontecendo com a esposa em prantos, deixou
absolutamente tudo e foi ao encontra dela. Vinte e cinco minutos depois chegou em sua casa. A
porta estava aberta. Ela estava sobre uma cadeira gritando em desespero. Embaixo – no chão –
uma pequena barata andando tranquilamente. A esposa dizia: me salve disso! me salve disso! O
esposo mecanicamente matou a pequena barata destemidamente, quando então friamente falou
para a esposa descer da cadeira e arrematou a situação com a seguinte frase: posso voltar a
trabalhar? Achei que alguém havia morrido ou até mesmo um desastre aconteceu. Ela ficou
perplexa diante da incompreensão do marido e pelas palavras frias que lhe foram ditas diante do
seu pavor pela barata. Esse fato insólito foi relatado para o rabino. O marido, esperando uma
resposta que o apoiasse, principalmente porque achou tudo aquilo desproporcional a seu
entendimento, foi surpreendido com a resposta direta do rabino que lhe afirmou categoricamente:
AMOR E RESPEITO

Ela está com toda razão pra ela tudo o que ocorreu era assustador, embora para
você não o seja. Mas dependeu de você para tirá-la daquela situação. Mas o que
você fez? Faltou-lhe empatia!
Os homens muitas vezes falham nisso pelo fato de que são ensinados a
concentrarem-se em grandes problemas, não se preocupando com algumas situações,
que, ao entendimento deles, são insignificantes. As mulheres, ao contrário, têm uma
forma de compreensão diferente e, por isso, não podem ser subestimadas
sentimentalmente. Então, uma ótima dica do casamento: nunca fale para a sua
esposa expressões que demonstram absoluta falta de empatia, a exemplo de: “como
você pode pensar assim” ou ainda: “como isso pode ocupar espaço na sua cabeça”;
ou, até mesmo, isso não é grande coisa. Porém, para a mulher pode ser algo cuja
dimensão não podemos desconsiderar. Por isso, deve-se ter empatia, ou seja,
entender o sentimento de sua esposa e levá-la a sério. Isso é também uma forma de
respeito.
Sobre a letra “C”, temos a palavra em inglês – calendar (calendário).
O calendário está relacionado com a importância do tempo. Pode-se utilizar o
tempo para mostrar respeito de duas maneiras: (i) organize o seu tempo para estar
presente aonde e quando necessário; e (ii) doe o seu tempo. Quando se está presente
é uma declaração de “eu a respeito”. Além disso, mostre de uma forma proativa que
se importa de forma suficiente em dar o deu tempo a seu cônjuge. Dedique um
tempo para se comunicar com o seu cônjuge cara a cara, transformando um lugar de
encontro em um momento de encontro. Nessa hora, marido e esposa não podem
estar centrados em seus celulares, smartphones, facebook. É o momento em que se
compartilha profunda admiração um para com outro. Isso também se chama
respeito. Não é hora de resolver problemas ou resoluções de conflito. Reserve um
momento para renovar a sua amizade a cada dia.
Já falamos sobre exemplos que devemos seguir – row models – e temos um
exemplo-modelo a ser seguido dado pelo Rebe, o qual reservava um momento para
conversar com a sua esposa todos os dias:
AMOR E RESPEITO

Rebe, confidenciou ao dr. Weiss o quão importante era para ele reservar um tempo, todos os
dias, para uma conversa calma com sua esposa, tomando uma xícara de chá. Ele considerava
sacrossanto esse intervalo para o chá e disse que, para ele, era tão importante quanto colocar o
tefilin – um reconhecimento nada pequeno vindo de um homem que transformou o uso dos tefilin
na mitzavá mais associada ao Chabad[1].
E por último, na palavra respect temos a letra “T” – Toque.
Na consciência judaica o toque físico é considerado a forma mais poderosa de conexão
entre uma mulher e um homem. Tao poderosa que só é apropriado dentro do casamento.
Algumas pessoas gostam de dar a mãos; outros de serem abraçados; e, por fim, outros de toques
leves, mas com frequência. Ao se esforçar para entender o que a outra pessoa precisa, mostra-se o
respeito.
Estudos mostram que as mulheres precisam ser tocadas, seja um abraço, seja um beijo ou
mesmo um abraço caloroso. São estudos interessantes, aliás. Isso dá o equilíbrio em seus corpos.
Mas aqui cabe um registro extremamente importante. Não segure o toque apenas quando se
pretende relacionar-se intimamente com à sua esposa. Na verdade, isso mostra uma grande
falta de respeito. Esse assunto vamos estudar detalhadamente no capítulo chamado “intimidade
no casamento”. Evidente que, pela lei judaica, deve-se observar as leis de Taharat Hamishpachá,
ou pureza familiar.
Mas, por ora, já devemos saber que existem quatro formas de comunicação: verbal, emocional,
física e espiritual. Somente depois que se conecta com esses quatro níveis, a intimidade conjugal
será a expressão máxima da unidade de um casal. Como as paixões do amor jovem diminuem
com o passar do tempo e o amor maduro entre em cena, o lado físico pode ficar em segundo
plano. Porém, o toque amoroso não pode deixar de acontecer, mesmo que seja mediante pequenos
gestos.
Agora que passamos pelos sete itens da palavra respect, já sabemos que respeito é a base de
todo e qualquer amor entre um casal. Compreendemos também que amor significa abrir um
espaço para inclusão de outra pessoa, sem tirar a individualidade dela, mas, ao contrário,
respeitando-a. Quando isso ocorre, o casal torna-se “um”, espelhando então a imagem de D’us.

[1] Telushkin, Joseph, “O Rebe: A vida e os ensinamentos de Menachem M Schneerson, o rabino mais influente na história moderna”:
tradução Lilia Wachsmann -1ª Ed. -São Paulo; Bait, 2020, pág 372.Conferir também edição em espanhol, Edicion Michann.
Capitulo3
AMOR OU CASAMENTO, O QUE VEM
PRIMEIRO?
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

“Na imagem de D’us, Ele o criou macho e fêmea, Ele os criou. D’us os abençoou. D’us
lhes disse: Sejam férteis e tornem-se muitos. Encham a terra e a conquistem. Dominem o
peixe do mar, os pássaros do céu e todo animal que rasteja sobre a terra”
(Gênesis, 1:28).

“O casamento é a maior fonte de beleza na vida comum - beleza moral -, uma canção
pontuada por duas vozes em harmonia complexa”
(Rabbi Jonathan Sacks).

Desde o início da civilização, o casamento tem sido mais do que um acordo


privado entre duas pessoas. Tem sido um momento de celebração coletiva e
comunitária e revestido de solenidade de um ritual religioso[1]. Vamos encontrar
isso claramente na Torah quando diz que “Labão convidou as pessoas do local e fez
uma festa de casamento[2]. Portanto, desde os tempos imemoriais o casamento é
algo significativo na vida de um casal.
No entanto, aos longos dos anos incutiu-se, até mesmo de forma inconsciente na
sociedade, a banalização do casamento, tornando-o a eternização da paixão
ilusória. Esse tipo de padronização de pensamento, em que se põe em destaque a
ideia de que o casamento deve ser pautado pela persistente paixão, é tema
recorrente, aliás, em filmes hollywoodianos. Esse tipo de sentimentalismo
apaixonante é gerador de deturpações imaginativas em função das quais essas
emoções fantasiosas ditam a formação de um padrão de pensamento.
Mas isso gera um grande problema. Cria-se uma irreal expectativa de que no
casamento não existe espaço para enfrentamento e soluções de problemas. Para esse
tipo de pensamento, apenas a paixão, e somente ela, deve ser a estrutura de um
relacionamento duradouro. Temos então uma indissolúvel mistura equivocada de
dois sentimentos diferentes – paixão e amor – com finalidades igualmente distintas.
E já sabemos que sentimento de paixão é um desejo passageiro. Amor, ao contrário,
é pautado por valores

[1] Sacks, Jonathan, The Power of Ideas – Words of Faith and Wisdom, Hodder-Stoughton, 2021, pág, 11.
[2] Gênesis: 29-22
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

Com base nisso, já concluímos que se o desejo por uma paixão for apenas estruturado como
mera projeção dos nossos prazeres e vontades, esse sentimento será apenas o alvorecer de uma
paixão passageira, e, sobretudo, uma expressão de interesse próprio em busca de prazer. Por
isso, quando desejamos uma paixão, projetando sobre outra pessoa a realização de sonhos
idílicos, eventual frustação dessas expectativas inevitavelmente porá fim ao casamento.
Infelizmente, isso é o que ocorre hoje.
Em suma, a incompreensão desses dois conceitos diferentes – paixão e amor – produz
experiências frustrantes. Por isso, para alguns, o casamento é uma entidade falida, como já
mencionado no capítulo anterior. E por que dizem isso? Porque as emoções, que modulam esse
tipo de padrão de pensamento, ditam que as relações vão durar desde que as expectativas
sejam cumpridas a qualquer custo e que, por sua vez, criam um arremedo de paixão. Sabemos,
porém, que o descompasso entre a expectativa e a realidade gera o término do relacionamento
quando o sentimento tem por objetivo apenas a realização de satisfações próprias.
Daí que, a expressão “be yourself” (“torne-se o que você é”) ou, como se diz à lá brasileira,
“seja feliz”[1], é tomada como conselho de conforto para aqueles cuja duração de um
relacionamento depende da realização de sonhos individuais ou de uma paixão apenas
conectada com o aspecto físico, notadamente em face de uma sociedade tão arraigada a valores
hedonistas.
Vale lembrar que, sob esse ponto de vista, “Platão[2] sustentava que amamos o que é belo.
No judaísmo acredita-se em algo sutil, porém fundamentalmente diferente: que o que amamos
se torna belo. A beleza não cria o amor. O amor cria a beleza[3]”. Essas palavras devem ser
refletidas e internalizadas, sobretudo quando sabemos que a palavra Peer (beleza), ao ser lida
em sentido contrário em hebraico, transforma-se em Efer (cinzas).
Viktor Frankl[4], psiquiatra sobrevivente dos campos de concentração, nos dá exemplos
singulares para compreensão sobre a diferença entre amor e paixão. Imaginemos a situação
segundo a qual uma pessoa sente um profundo amor por outra. Porém, circunstancialmente,
vem a perdê-la, seja porque morreu ou até mesmo por conta de uma viagem em função da qual
ficarão distantes e sem possibilidade de comunicação por longo tempo. Para aplacar a saudade,
é-lhe apresentada uma sósia, ou seja, uma pessoa cujos traços físicos

[1] equivalente em hebraico “Ani veafssi od”(eu e ninguém além de mim” – Isaias 47:8).
[2] Platão dizia que amor “é o que não temos, o que não somos, o que nos falta. Esse são os objetos do desejo e do amor”. Na verdade, é o
sentimento que toma, que deseja a posse. Interessante que embora seja popular a expressão “amor platônico” (desejar aquilo que não tem), a
Torah já expressava esse tipo de desejo possessivo na figura de Caim, que, em hebraico, significa adquirir, obter, possuir (Kaniti). A palavra Kaniti
expressa, como diz Rabbi Jonathan Sacks, “o poder como propriedade, propriedade com poder. A palavra hebraica Baal, o nome do principal deus
canaanita, tem o mesmo alcance e significado. A raiz significa ‘deter, possuir, exercer o poder sobre alguém ou sobre algo. Esse fato, para a Bíblia,
é considerado idolatria (vide livro “Não em Nome de D’us).

[3]Rabbi Sacks, Jonathan, Edição em Espanhol traduzida por Aryeh Coffman, Koren Publishers Jerusalém/2019, pág. 268.
[4]Em relação ao vínculo do Rebe de Lubavitch e o psiquiatra Viktor Frankl, conferir a publicação do texto escrito no site “pt.chabad.org” “Por
Que o Rebe Escolheu Frankl”. Conferir igualmente o livro “A Herança Judaica na vida e Obra de Viktor Emil Frankl, de Bela Rebeca Hertz, Ed.
Juruá.
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

Quem de fato ama não tem em mente, enquanto ama, uma peculiar idade física ou psíquica , qualquer que ela seja, e que se
dá na pessoa amada; não há dúvida de que não tem em mente esta ou aquela qualidade que ela tem, mas antes o que ela é,
no seu caráter de algo único . Ora, enquanto pessoa única nenhum sósia a pode representar jamais, por muitos semelhantes
que seja . Já o mesmo não sucede com o apaixonado , que decerto se contentaria com o sósia ; a sua mera paixão de
namorado aceitaria, sem mais, a ttransferência, pois na sua paixão toma uma atitude que visa simplesmente o caráter
superficial que a outra parte tem e não a pessoa na sua essencialida de em prespectiva espiritual A pessoa espiritual como
objeto da atitude de genuíno amor é, portanto, para o homem que ama realmente, insubstituível, ninguém a podendo representar,
dando o seu caráter de algo único e irrepetível. Disto resulta, entretanto, que, simultaneamente, o verdadeiro amor garante, por si
só, a sua duração no tempo.[1]”

Algo fundamental na chassidut é que o cérebro domina o coração. A nossa alma,


animal, apesar de ela ser composta por dez atributos, três intelectuais e sete
emotivos, funciona sobre o prisma de que tudo começa nas emoções. Em
contrapartida, a nossa alma divina, que também possui os dez atributos, inicia o
processo intelectualmente e somente após gera emoções. Baseado sobre o sagrado
Zohar, o cérebro domina o coração. Portanto, a demarcação entre paixão e amor fica
mais clara.
Alter Rebe – Rabi Shneor Zalman de Liabi[1] – descreve nossos patriarcas
como carruagem de Deus (Tanya[2], capítulo 23). Uma carruagem não possui
vontade própria. Ou seja, o máximo de subjugação e anulação própria é
exemplificado através de nossos patriarcas. Portanto, apesar das infinitas distinções
entre nós e nossos patriarcas, D’us, com a sua infinita bondade e sabedoria, nos
ofereceu alguns exemplos de relacionamentos louvareis e duradouros, os quais
servem como row models – exemplo-modelos –, abrindo, assim, a possibilidade de
pautarmos as nossas vidas dentro da forma de condução dos patriarcas a partir das
fontes sagradas. Aliás, o Talmud diz que cada um de nós deve falar “quando que
meus atos vão se igualar aos dos nossos patriarcas”. Ou seja, a exigência não é
alcançar a grandeza essencial dos patriarcas, mas, sim, aprender sobre os seus atos
e comportamentos. Vejamos.
A primeira vez que a expressão amor – ahavah – aparece na Torah ocorre quando
D’us diz a Abraão: “Toma teu filho, teu único, a quem amas, a Isaac”. Mas a palavra
relaciona-se ao amor sentido entre um pai e filho. Porém, esse tipo de relação não
depende de nenhum tipo de motivação externa. O amor é

[1] Rabi Shneor Zalman (1745-1812), foi o primeiro Lubavitcher Rebbe, Foi discípulo do Magid de Mezritch. Publicou, além do Tanya, Likutei
Torah, Shulchan Aruch HaRav.
[2] “Carruagem e cavaleiro: “quando a Torá fala em carruagens, o equivalente de hoje seria um carro e o motorista, o cavaleiro. Um carro não tem
vontade independente, ele não pode escolher ou influenciar o motorista para onde ir. Pelo contrário, o carro é completamente subserviente ao
motorista e executa suas ordens. E embora seja, de certo modo completamente dedicado e comprometido, sua obediência ainda não ocorre
automaticamente. O motorista tem que dirigir ativamente o carro. Além disso, o motorista não está unido ao carro. Eles permanecem entidades
separadas (GPS da Alma, Rabino Nadav Cohen, Publicação pela Associação Israelita de Beneficência Beit Chabad do Brasi, Organização e revisão
Rabino Eliahu Stiefelmann – Beit Chabad Central, tradutora Debora Kopelowicz, Pub. 2022, pag. 165).
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

conatural, ou melhor, surge pela relação de consanguinidade. Diferente do sentimento


amoroso sentido entre um homem e uma mulher.
Por outro lado, em Gênesis 24:67, a Torah nos diz: E Isaque tomou Rebeca, ela se
tornou sua esposa, e ele a amou” (Vayehavêa). Embora não seja o primeiro
relacionamento matrimonial descrito na Torá, é o momento no qual encontramos a
expressão“amor” entre cônjuges.
E aqui surgem algumas perguntas para enfrentarmos:

(i) o que isso tem de tão significativo em relação a outros relacionamentos descritos na
Bíblia, a exemplo daquele havido entreAbrão e Sara, Isaac e Rebeca; e, por fimentre Jacó
e Raquel?
(ii) o que cada um desses relacionamentossignifica? Podemos estabelecer um link entre as três
rezas diárias judaicas? O que é um amanhecer (Abrão), tarde (Isaac) e noite (Jacó) numa
relação estabelecida entre cônjuges? O casamento também contém esses três elementos?

1- Abraão e Sara -manhã

Abrão Sara passam por grandes desafios. “Casados por muitas décadas sem filhos,
desbravaram juntos uma nova trilha na história. Eles ouviram a voz de D'us para deixar suas
famílias para trás e traçar um novo caminho para mudar o mundo. Sara arriscou sua vida duas
vezes por Abraão quando afirmou ser sua irmã, não sua esposa. Abraão se recusou a coabitar
com sua serva Hagar, mas concordou somente depois que ela insistiu que ele o fizesse. Abraão
atendeu à voz de Sarai”. Abraão ouviu o conselho de Sara para expulsar Ismael de sua casa,
mesmo quando ele discordava pessoalmente. Após a morte de Sarah, sente-se a profundidade
da dor de Abraham e suas intrincadas negociações para conceder a sua esposa sua honra final,
enterrando-a na caverna onde ele também seria enterrado um dia[1].
Por isso, são considerados “como parceiros, trabalhando juntos pelos mesmos objetivos,
caminhando juntos pelo mesmo caminho, unidos no pensamento, na palavra e atos. [...].
Abrahão e Sara viveram juntos por muitos anos, durante os quais eles trabalharam como
equipe, parceiro, iguais e líderes realizando um ideal com a qual estavam comprometidos”[2].
Rabbi Steinsaltz Zt"l registra que “são descritos como uma equipe, uma dupla e
invariavelmente como iguais – como, por exemplo, onde a Bíblia fala de Abrahão e Sara como
‘velhos e avançados em anos’ ” (Gênesis 18:11)[3].

[1] Rabbi YY Jacobson, Weekly Internet parsha Sheet, pág.3.


[2] Rabbi Adin Steinsaltz, Figuras da Bíblica, Editora e Livraria Sefer Ltda, pág.43-44 e 48,2020.
[3] Ibidem pág. 43
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

Contudo, para além disso, Abrão e Sarahrepresentam a “manhã” do judaísmo. E a


razão é singela.
Abraão, como diz Rabbi YY Jacobson, “trouxe um alvorecer de uma nova era para a
terra. Ele abriu a humanidade para uma nova realidade, umanova visão. Ele anunciou
um romance, uma mensagem. O mundo não é uma selva sem esperança; é um palácio
divino. Não somos uma partícula insignificante de poeira na superfície do infinito; nós
importamos. A humanidade não é umpovo indefeso submetido aos caprichos de deuses
concorrentes, mas parte de uma única narrativa, unida à imagem de um Criador moral e
amoroso. Abraão ensinou que havia propósito na história e significado na vida”.
Abraão inaugura a manhã para a civilização. Ele instituiu a oração da manhã (shacharit).
A partir deste momento, o mundo não poderia ficar sobre o jugo da multiplicidade de
existências de deuses humanos. Foi ele, Abraão, quem se levanta de madrugada (shachar
– aurora) e, por isso, representa uma mudança de paradigma.
II Isaac e Rebeca - tarde

Antes de entrar nas nuances do relacionamento de Isaac com Rebeca, podemos


perceber que a personalidade de Isaac é diferenciadados demais patriarcas. Não
existe um impulso revolucionário, a exemplo daquilo que ocorre com seu pai
Abraão. Da mesma forma, não existem dramas experenciados pelo seu filho Jacó,
cuja vida foiinteiramente permeada por grandes conflitos entre irmãos, desafios
internos, fugas, engano, a longa espera por ter Raquel e, ainda, a situação da dor pela
suposta perda do filho mais amado – José –. Não existe oscilações bruscas na vida
de Isaac.
Sobre a sua vocação, a Torá relata-nos que ele cultivou grãos e cavou muitos
poços. Isaque representa “a tarde” da história judaica. A resiliência do povo
judeu.
Mas quando analisamos o relacionamento de Isaac e Rebeca tem algo
surpreendente. A Torá reserva o termo amor entre cônjuges para Isaque e Rebeca:
“E Isaque tomou Rebeca, ela se tornou sua esposa e ele a amou”. Mas, ao contrário
do que ocorre com Jacó e Raquel, o amor entre Isaac e Rebeca sobreveio ao
casamento. Não estamos diante de uma história salpicada de romantismo. Não, não
houveisso! O amor do casal é oculto, profundo, estruturado e fortalecido pelo
respeito mútuo do casal. E apesar de Rebeca possuir uma personalidade diferente de
Isaac, não existe relato de confronto entre o casal. Com diz Rabbi Steinsaltz Zt"l
“amava seu marido como também o admirava”. Ou seja, o amava em sua expressão
máxima.

[1] Ibid. 10
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

Eles não tiveram filho por vinte anos. Isso não interferiu no relacionamento. A Torah
nãomenciona qualquer atrito envolvendo o casal, como jávimos. “Isso não foi porque
eles nunca discordaram. Ao contrário, a Torá afirma que Rebeca amava Jacó, enquanto
Isaque amava Esaú. Enquanto Isaque deseja abençoar Esaú, Rebeca instrui Jacó a se
vestir como seu irmão e obter as bênçãos para si mesmo. Isso poderia facilmente ter
resultado em umadisputa - mas nada disso ocorreu. Em contraste, entre Isaac e Rebecca,
nenhum atrito é registrado”.
Percebemos, portanto, que Isaac, bem como o seu casamento com Rebeca, significa a
continuidade. Não “simboliza uma força que rompe limitações e cria, mas um vigor que
conserva a mantém as coisas em seu lugar. Isaac se empenhou em preservar as antigas
formas, para impedir que se estragassem. Demonstrou marcante inclinação para a
estabilidade, não tentou quaisquer novos experimentos nem criar novas formas,
mantendo-se sempre preso a uma atitude de temor a D’us”.
III Jacó e Raquel - noite

Nenhuma personalidade na Torá está tãoligada à noite quanto Jacó. Ele foi o
patriarca cujas maiores visões lhe ocorreram quando estavaabsolutamente sozinho e,
sobretudo, à noite, longe de casa, fugindo de um perigo para o outro. Diz a Torahque
Jacó ficou sozinho, e um homem lutou com ele até o amanhecer. Ele diz a Lavan: “Há
vinte anos estou com você [...] um calor abrasador me assolou duranteo dia e a geada
durante a noite. E, ainda, para exemplificarmos, diz a Torá, “chegou a um certo lugar e
dormiu ali porque o sol havia se posto”. Esse foiJacó, o homem que nos momentos mais
baixos de sua vida teve suas maiores visões do céu”. Jacó, portanto,encarna a noite
do judaísmo.
Em relação à Rachel, a Torá nos diz. “E Jacó amava Raquel, e ele disse [ao pai dela]:
“Eu trabalharei para você por sete anos por sua filha maisnova, Raquel.” Com Jacó e
Rachel, o amor precede o casamento. Com Isaac e Rebecca, o amor segue
ocasamento, não sofrendo qualquer interferência, tampouco há quaisquer sinais de
oscilações. O amor de Isaac e Rebeca é linear.
Por outro lado, sabemos que Jacó amou Raquel, mas existem pontos de tensão no
relacionamento. A Torah relata que Raquel disse a Jacó: “Dá-me filhos, ou senão eu
estou morta! E o furor de Jacó cresceu contra Raquel e disse: Acaso estou eu em lugar
de D’us, que te negou o fruto do ventre?” Palavras causticas, duras.

[1] Ibid 11
[1] Ibid. 10
[1] Ibid, pág, 55.
[1] Gênesis 32:24
[1] Gênesis 31:38
[1] Gênesis 28:11
[1] Sacks, Jonathan, Lessons In Leadership, A Weekly Reading of the Jewish Bible, 2015, pág, 32.
[1] Gênesis 29:18
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

temos também fagulhas de atrito entre Abrão e Sara. Isso em relaçãoà sua esterilidade,
quando diz a Abrão: ‘Minha afrontaestá sobre ti!’ Ou mesmo a exigência de Sara para
expulsar a serva e eu filho, no que “desagradou muito aos olhos de Abraão [...].
Vimos os exemplos dos casamentos dos nossos patriarcas. Pela lei judaica devemos rezar
três vezes ao dia. As três rezas foram introduzidas originalmente pelos nossos patriarcas.
Abraão constituiu a reza do shacharit (reza matutina); Isaac,minchá (oração da tarde), e Jacó,
Arvit (reza da noite).Será que existe uma correlação entre as suas vidas, seus casamentos e as
rezas que eles estabeleceram?
Com efeito, nossas vidas têm aspectosdiurnos e noturnos. Há momentos de luz e
escuridão. Também nossos relacionamentos inicia-se com momentos de luz: um amanhecer
sentimental. Quandoum jovem ao encontrar a sua alma gêmea, um novo amanhecer começa a
iluminar o seu caminho que até então estava enevoado, não se vislumbrando um horizonte.
Mas de repente, pelo encontro com uma jovem, ele é tomado de esperanças. O encontro o faz
suspirar de modo diferente pelo frescor de uma paixão e do vislumbre de um amor. Esse
sentimento tem a capacidade de transformá-lo. Aquilo que era noite(solidão), num encontro
de almas gêmeas, possibilita a pavimentação de um novo caminho. O desânimo abre espaço
para a luminosidade da paixão e novos vislumbres de esperança. Um futuro florido
tomaconta de ambos. Tudo é revolucionário, capaz, inclusive, de modular novos
comportamentos. Esse entusiasmo surgido pelo sentimento de paixão é representado por
“Abrão do casamento, a manhã – shacharit – de um relacionamento.
Quando acordarmos, após recitar o Mode Ani, lavamos as mãos. Essa lavagem é chamada
rachatz). Contudo, ela não – ‫"(רחץ‬Netilat Yadayim. Em hebraico há uma palavra para "lavar
‫ ְנִט יַל ת ָיַד ִים‬consta no texto da bênção. Isso porque são utilizadas as seguintes palavras
significa levantar-se; e elevar-se. Após o repouso de‫ נטל‬Netilat Yadayim), uma vez que(
uma noite, levantamos cheios de esperanças. Isso é apaixão entre um casal. Um alvorecer
(manhã) que deve ser transformado num amor na linha temporal(tardes e noites do
relacionamen

[1] Gênesis 21:11.


[1] Modi aní lefanecha Melech chái vecaiám, shehechezárta bi nishmatí bechemlá. Rabá Emunatechá (“Dou graças a Ti, Rei Vivo e eterno, pois Tu misericordiosamente
restauraste minha alma dentro de mim. Tua fidelidade é grande”).
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

Mas na perspectiva temporal, logo chegaremos à noite. Por conta dos desafios da vida, o
casal vai encontrar naturalmente “as noites” do relacionamento, ou por outras palavras, pelos
desafios do casal diante dos problemas surgidos na vida. Jacó, diz a Torá, “chegou a um certo
lugar e parou ali para passar a noite, pois o sol havia se posto. Jacó ensinou ao povo judeu e ao
mundo como encontrar o Divino durante a turbulência e obscuridade da noite[1]. Este é o
elemento “Jacó” do casamento, a noite – “maariv” – de um relacionamento. Trata-se da
capacidade de um casal se ver envolvido, unidos para enfrentar o desconhecido. Um casal,
ligado por um casamento sólido, é consciente de que “a noite” faz parte do relacionamento;
noite aqui metaforicamente compreendida naqueles momentos difíceis diante dos quais o casal
se vê sozinho para o enfrentamento dos problemas surgidos e cuja decisão deve ser
solucionada pelo casal.
Claro, não podemos nos esquecer que o “casamento também tem aqueles momentos
especiais de mistério e drama e um luar. A paixão e a eletricidade que vêm do desconhecido,
da descoberta das incontáveis camadas de profundidade da alma de nosso cônjuge; a
consciência especial que nasce ao lidar com a escuridão e a incerteza.”[2]
Sobre o elemento “Jacó” do casamento (a noite – “maariv” – de um relacionamento), temos
uma história surpreendente. Certa vez, ‘o grande sábio rabino Rabi Israel Salanter estava
passando a noite na casa de um sapateiro. Tarde da noite, Salanter viu que o homem ainda
trabalhava à luz de uma vela tremulante, quase se extinguindo. O rabino Salanter aproximou-se
dele, “Senhor, é tarde, sua vela em breve vai se apagar. Por que ainda está trabalhando a uma
hora dessas? Sem se deixar influenciar pelas palavras do rabino, o sapateiro respondeu
“Enquanto houver luz, é possível remendar”[3]. Da mesma forma, no relacionamento
encontramos as noites, mas havendo luz – amor -, todas as situações desafiantes serão
suplantadas.
Já que entendemos as manhãs e noites de um relacionamento, cabe saber qual a
contribuição das tardes e, sobretudo, qual a energia que nos ilumina nas tardes monótonas. É a
história de Isaque.
Rabbi Jacobson nos diz que a “vida de Isaac pode carecer da grandeza, emoção, desafio e
mística de Abraão e Jacó, mas ele incorpora a essência e o fundamento do judaísmo: o
compromisso diário consistente e inabalável com D'us e Sua obra. Abraham foi um
revolucionário; ele lançou uma nova luz sobre o mundo, mas foi Isaac quem criou os vasos
para conter e interiorizar a luz. Isaac cavou os poços do judaísmo: ele mergulhou
profundamente em si mesmo e no mundo ao seu redor e revelou as fontes vivas subterrâneas de
fé e compromisso, garantindo que o fluxo nunca cessasse. O relativo silêncio de Isaac no livro
do Gênesis não deve ser confundido com passividade; foi antes um silêncio que vem com a
interiorização. Isaac sabia que as revoluções podem durar algumas décadas”.

[1] Ibid 10
[1] Ibid. 10
[1] Rabbi, Telushkin, Joseph, O livro dos valores judaicos: um guia diário para uma vida ética, Editora Livros de Safra, 2015, pág. 69
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

Prossegue: “Isaac em um ponto de sua vida estava em um altar, pronto para se


tornar uma oferenda a D'us. Isso se tornou a marca registrada de sua vida: ele
personificava dedicação e resiliência absolutas, consistente, inabalável e inflexível.
Isaac é o fundador da oração da tarde, a “mincha” do judaísmo. “E Isaque saiu para
meditar no campo ao entardecer”, afirma a Torá na porção desta semana. Isaac
aproveitou a energia espiritual das “tardes chatas”, mostrando-nos que um
relacionamento com D'us não consiste apenas na inspiração espontânea e
exuberante da manhã, ou no drama e romance da noite. Um relacionamento
com D'us é expresso ainda mais profundamente no compromisso diário e nos
sacrifícios que fazemos pela verdade, amor, bondade e santidade. Ele nos legou
a resiliência interna e a força para trazer D'us para as jornadas monótonas e
tediosas da vida. Mas há a “mincha” do casamento – o compromisso simples, não
romântico e não dramático de duas pessoas, uma com a outra, durante os dias chatos
e monótonos da vida. Duas almas de mãos dadas nas vicissitudes da vida, nos
momentos difíceis, nos momentos serenos, nos momentos monótonos e nos
momentos emocionantes. É a lealdade e a confiança construídas ao longo de anos
de apoio mútuo. Isso cria um tipo único de amor. Existe o amor nascido da
emoção, do drama e da alegria. Este é o amor que precede o casamento. Você se
apaixona por seu novo parceiro, você é arrebatado pelo nascer do sol em sua
vida. Mas existe um outro tipo de amor que nasce do empenho e dedicação
diários de uns para com os outros. Esse amor nunca pode ser experimentado
antes do casamento, somente depois. Este era o amor de Isaque. É o amor
“mincha”, aquele que vem de um vínculo contínuo e consistente na rotina diária da
vida”.
“É por isso que a Torá declara: E Isaque tomou Rebeca, ela se tornou sua esposa,
e ele a amou.” Primeiro Isaac se casa com ela, e só então ele passa a amá-la. O
primeiro casamento descrito na Torá é o de Isaque e Rebeca, a fim de nos ensinar
um dos princípios mais importantes do casamento: Paixão e romance são
impressionantes, mas à medida que nossas circunstâncias mudam, eles podem
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

desaparecer. Um casamento deve ser construído com base no bom senso, na


razão sólida, na apreciação das qualidades e valores internos e duradouros da
outra pessoa, e deve possuir o compromisso duradouro de um casal um com o
outro, dia após dia, em um vínculo de fidelidade e confiança firme e simples,
“criando assim amor perpétuo”. Entre parênteses, esta é a razão pela qual a lei
judaica insiste em nenhuma relação física antes do casamento. Isso garante que o
casal decida se casar não apenas com base na atração física, porque isso pode mudar
com o tempo, mas com a valorização dos traços de caráter, personalidade interior e
valores da outra pessoa, pois estes não mudarão. Frequentemente, quando homens
ou mulheres se envolvem fisicamente, eles ficam intoxicados pelo prazer e seus
pontos cegos os levam a ignorar informações cruciais que podem vir à tona alguns
anos depois e, infelizmente, cortar a conexão”.
Para terminar, sempre é bom termos row models – exemplos de amor mincha.
Em recente reportagem - dezembro de 2022 - foi veiculada nas mídias sobre a
história de um casal de idosos - Hubert e June -, cujo falecimento ocorreu
praticamente concomitante. O casal se conheceu em 1941. Ele, ao retornar da
Segunda Guerra Mundial, casou-se com a Sra. June. Ao longo da vida, tiveram três
filhos, sete netos e 11 bisnetos. No entanto, a esposa, centenária, foi internada em
novembro de 2022. Hubert, diante da situação da esposa, foi igualmente internado.
Ambos estavam com 100 anos e conviveram por quase oito décadas. Hubert faleceu
às 21h15 de dia 30 de novembro de 2022. Depois de 20 horas, após a morte dele,
June morreu às 17h40m do dia 1º de dezembro.
Pela breve reportagem, percebe-se que o casal passou por todas as fases da vida e
perpassaram por todos os ciclos do casamento. Por certo enfrentaram todos os tipos
de problemas, mas souberam passar por todas as “noites” (dificuldades), construindo
um relacionamento – mincha – segundo o qual não foram apenas dois
companheiros, mas dois grandes parceiros.
Da mesma forma, Rabino Lorde Jonathan Sacks Zt"l[1], cujo falecimento ocorreu
em 07/11/2020, nos deixou um legado extraordinário e não somente ao povo judeu,
mas à toda humanidade em função de sua capacidade singular em transmitir a Torah
de modo pedagógico, inclusive transitando por vários temas filosóficos em tom
desafiante, revelando, nos mais das vezes, as incoerências da filosofia laica.
Contudo,

[1] R Jonathan Sacks Zt"l, narra o primeiro encontro com o Rebe, a partir do qual marcou profundamente a trajetória de sua vida. Sobre esse
singular encontro diz que “tinha-me dito que o Rebe era um homem com milhares de seguidores. Após tê-lo conhecido, entendi que, na verdade, era
o contrário. Um bom líder cria seguidores. Um grande líder cria líderes. Mais do que ser um líder, o Rebe desenvolvia a liderança nos outros.
Telushkin, Joseph, “O Rebe -1ª Ed. -São Paulo; Bait, 2020, pág 372.Conferir também edição em espanhol, Edicion Michann.
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

sempre manteve o diálogo construtivo e respeitoso, fato que lhe era peculiar em
função de sua personalidade amistosa. Num artigo publicado em 10/06/2000, cujo
título era “Casamento”, escreveu lindamente sobre o seu casamento, e que, pela
profundidade das palavras, merece ser lido e internalizado por todos. Vejamos o que
foi escrito.
“Elaine e eu éramos jovens casados. Ela tinha 21 anos, eu 22. Nessa altura, não
tínhamos ideia do que a vida traria. Como diz o ditado iídiche: "A única coisa que
faz Deus rir é ver os nossos planos para o futuro". Eu tinha ido para a universidade
para estudar economia. Mudei então para a filosofia. Durante algum tempo, brinquei
com a perspectiva de me tornar um advogado. Após um breve encontro, porém,
concluí que a profissão de advogado era destinada a mentes mais exaltadas do que a
minha. Demorou vários anos até que atendi a voz interior a chamar-me para o
rabinato. [...]. A nossa vida tem tido as suas reviravoltas, as suas inesperadas
bênçãos e crises. Mas, olhando para trás, sei que tudo o que fiz não poderia ter feito
sozinho, e tento dizê-lo o mais frequentemente possível. [...]. Para a maioria de nós a
vida é apenas uma longa viagem para o desconhecido. Raramente sabemos de
antemão o que a próxima curva trará. A única certeza que tínhamos era que
estaríamos lá um pelo outro, e foi mais do que suficiente. Sabíamos - e certamente
que o conhecimento é o que o casamento significa - que encontraríamos força na
presença oculta do amor, aconteça o que acontecer. Isso tornou os momentos mais
difíceis suportáveis. Olhando para trás, percebemo-nos do poder desse laço estreito
pelo qual duas pessoas se comprometem um com o outro, transformando o amor em
lealdade e numa fonte de vida nova. Pagámos um preço pesado por entender mal
uma das palavras-chave da Bíblia hebraica, emuna, geralmente traduzida como 'fé'.
Porque a Bíblia entrou na civilização ocidental através do grego, e porque para os
gregos a maior vocação era a busca do conhecimento. Há séculos que pensamos na
fé como uma espécie de conhecimento: intuitivo, visionário talvez, mas cognitivo.
Nesta visão, ter fé é conhecer, ou acreditar, certos factos sobre o mundo. Esta não é
de todo a visão judaica. Emuna é sobre a relação. É aquele laço pelo qual duas
pessoas, cada uma respeitando a liberdade e integridade da outra, se comprometem
por um juramento de lealdade a permanecerem juntas, a fazerem o que nenhuma das
duas pode fazer sozinhas. Significa, não "fé", mas "fidelidade", o compromisso de
estar um para o outro, especialmente em tempos
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

difíceis. Em termos humanos, o melhor exemplo é o casamento. Em termos


religiosos, é o que chamamos um pacto, do qual o exemplo clássico é o penhor entre
Deus e um povo antigo, Israel, no Monte Sinai, há trinta e três séculos atrás. A fé é
um casamento. O casamento é um ato de fé. Por isso, em todo o caso, os profetas de
Israel acreditaram. Até hoje, os homens judeus, enquanto amarram as tiras dos seus
filactérios ao dedo como uma aliança de casamento, recitam as adoráveis palavras de
Deus citadas pelo profeta Oséias: "Desposar-te-ei comigo em fidelidade e
conhecerás a Deus" (Oséias 2:22). Acho difícil dizer como é triste que o casamento
esteja em declínio. Foi e é a maior fonte de beleza na vida comum - beleza moral,
uma canção pontuada por duas vozes em harmonia complexa”[1]".
No livro do Rabino Joseph Telushkin, “Rebe”, após descrever o amor do Rebe
por sua esposa – Rebetzin Chaya Mushka – diz que “A devoção da Rebetzin a ele
não era menos intensa. Mesmo nos dias mais cheios, como ela contou a várias
amigas, ela não se deitava antes que seu marido voltasse para casa. E quando ele
chegava, não importa a que horas fosse, ela servia-lhe o jantar que ela mesmo havia
preparado. Daniele Gorlim Lassner, cujos pais eram amigos da Rebetzin da época
em que eles moraram em Paris, passou, certa vez, um longa tarde na companhia da
Rebetzin, durante a qual lhe deu muitas informações sobre a vida que ela e seu
marido levavam na América do Sul. A Rebetzin parecia fascinada com os detalhes,
e, de repente disse: ‘Sabe, meu marido chega em casa muito tarde, às vezes às duas,
três da madrugada, Quando ele chegar hoje, teria tanta coisa para lhe contar sobre
esta visita tão especial’. Durante seus quase 60 anos de casados eles tiveram
muito orgulho um do outro. Quando Jules Lassner, o marido de Daniele, teve, a
seguir, um encontro com o Rebe, ele lhe disse: ‘Depois de conhecer sua esposa,
entendo a expressão: ‘Atrás de todo grande homem, existe uma grande mulher’, e eu
conheci a grande mulher’. Quando disse isso, Jules relembra, o Rebe abriu um
sorriso de lado a lado[2]”
Palavras que merecem ser lidas e relidas continuamente.
Para finalizarmos, estabelecemos neste capítulo a correlação entre as três orações
judaicas com os três elementos do casamento. Sabemos também que as rezas têm
por objetivo a nossa íntima
.

[1] Sacks, Jonathan, The Power of Ideas – Words of Faith and Wisdom, Hodder-Stoughton, 2021, pág, 61.
[2] Telushkin, Joseph, “O Rebe: A vida e os ensinamentos de Menachem M Schneerson, o rabino mais influente na história moderna”: tradução Lilia
Wachsmann -1ª Ed. -São Paulo; Bait, 2020, pág 372.Conferir também edição em espanhol, Edicion Michann
AMOR OU CASAMENTO, O QUE
VEM PRIMEIRO?

conexão com D’us. Quando isso ocorre, não como mero ato formal, mas com
profunda intenção (kavaná), este nível de Tefilá (oração) correlaciona-se com o
verbo Tofel, que, em hebraico, representa quando duas partes quebradas de um
recipiente são unidas para torná-lo inteiro.
Da mesma forma, quando um casal passa por todas as fases do relacionamento –
shacharit, minchá e o arvit ou maarivi – o casamento será Tofel, a partir do qual
duas pessoas diferentes, porém iguais, pavimentam um caminho no qual todas as
fases serão vivenciadas. As noites poderão ser longas, mas o alvorecer chegará e o
casamento será aquilo que Isaac e Rebeca nos legou como exemplos de resiliência e
por cuja razão o casamento precede ao amor. Ou seja, nossos patriarcas/matriarcas
são representativos do amor sólido no relacionamento e, tal como já analisado no
primeiro capítulo, o amor exige muito de nós e, ao contrário do que se imagina,
demora-se muito para realizar o amor.
Capitulo 4
COMUNICAÇÃO E AMOR
COMUNICAÇÃO E AMOR

“...e irá alegrar a mulher que tomou” (Devarim, 24:5)

“O amor está fundamentado na similitude de opiniões”


(Rabbi Menachen Ben Solomon Meiri (1249-1309)

Normalmente quando se fala sobre comunicação, intuitivamente relacionamos


com a “fala” ou, até mesmo, com a comunicação escrita. Obviamente que a fala,
depois da linguagem corporal de um bebê, é o primeiro instrumento de
comunicação sem a qual não há possibilidade de transmitir ideias primárias,
pensamentos, etc.
Na verdade, “a fala é o mecanismo pelo qual até uma ideia abstrata, que existe
apenas na dimensão mais elevada do pensamento, pode ser trazida ao mundo
material: quando falamos, transformamos ideias em meios físicos como o som,
tangível o suficiente para que os outros ouçam com as ferramentas físicas da
audição. É claro que os outros imediatamente transformam nossas palavras em
seu estado abstrato de ideias em suas próprias mentes. Usamos o meio físico da
fala para transmitir até ideias não-físicas; conectamos o abstrato com o
material[1], motivo pelo qual já sabemos que a fala é o principal atributo do
homem quando em comparação com os demais seres vivos. Isso já falamos em
capítulo anterior.
Neste capítulo não se pretende analisar a “fala” em si mesma, mas saber qual é
a forma correta de comunicação entre um casal. Ora, se homens e mulheres são
naturalmente diferentes, a comunicação entre ambos tem igualmente os seus
componentes diferenciais. Por isso, muitas discussões estão relacionadas
justamente por problemas relacionados à comunicação. Em casos extremos, pode
gerar até mesmo o término

[1] Em português o quinto livro da Torah é chamado de Deuteronômio.


[1] Tatz, Akiva, A máscara do mundo – São Paulo: Ed. Maayanot, 2003, pág. 127.
CONEXAO E AMOR

Qual é a habilidade mais importante


num casamento bem-sucedido ?

Para uma melhor compreensão imaginemos homens e mulheres separados em


duas salas diferentes. As mulheres, diante da pergunta acima formulada, respondem
que o mais importante é comunicar-se. Para os homens, a resposta seria algo bem
diferente, mas por certo não seria isso. Ou seja, para as mulheres o assunto mais
importante é a comunicação. Eles, ao contrário, não responderiamcomo sendo a
primeira alternativa e as respostas seriam variáveis. Na perspectiva dos homens
existemassuntos diferentes que podem ocupar um espaço principal em suas mentes.
Isso já foi objeto de estudo e, portanto, não se trata de mera pergunta hipotética.
Estudiosos, sobre relacionamentos entre casais, observam que para as mulheres
intimidade significa conversar, e, principalmente, conversar em relação ao próprio
relacionamento no qual estão envolvidas. Homens, na sua maioria, não entendem
sobre o que as mulheres querem conversar. Preferem fazer algo mais prático, tal
como passear, ir a um restaurante. Porém, sentar-se para uma conversa não é algo
que lhes seja natural. Com efeito, quem trabalhacom terapia de casais, dando-lhes
conselhos, sabe que essa diferença é bastante comum. Ou seja, existe
umdescompasso entre casais em relação à forma que se comunicam. A maior
reclamação das mulheres é que os homens não conversam. Contrariamente, os
homens dizem que conversam o suficiente. E como podemosentender uma situação
dessa? Alguém está no exagero. Mas será?
Vamos aprender neste capítulo que, para os homens, “falar”, conversar e/ou se
comunicar têm aspectos diferentes em relação às mulheres. Isso é a fonte da
dificuldade. É bom saber que no versículo3:20 de Gênesis diz que “O homem
chamou a sua esposa Chava (ou em português Eva), porque ela era a mãe de todos
os seres humanos”. O comentarista com nome Baal HaTurim, explica que Chava
tem mais uma conotação cujo significado é conversar, falar. Adão chamou a sua
esposa de Eva, já que ela era um ser falante. Falar para ela era algo fundamental
eimportante. Mais ainda, quando olhamos no Talmud encontramos algo
superinteressante.
CONEXAO E AMOR

O Talmud diz que dez medidas deconversa desceram para o nosso mundo. As
mulheres levaram nove (kidushin, 19b). Ou seja, noventa por cento das medidas da
conversa estão nas mãos das mulheres. Os homens, todos juntos, têm apenas dez por
cento. Percebe-se que as mulheres gostam de falar mais. Mas não se trata apenas de
um parâmetro quantitativo, mas a forma de se conversar e a intenção são diferentes.
Deborah F. Tannen, uma linguística social, que inclusive fez vários livros best
sellers, diz quehomens e mulheres conversam por motivos diferentes. Homens
conversam porque querem dividir ideias.Objetivam transmitir a ideia para uma
outra pessoa.Mulheres, ao revés disso, conversam com a pretensãode se conectarem
com outra pessoa. Mas não é só: oconteúdo da conversa não é tão importante para
elas, mas, sim, a ligação ou conexão que se estabelece por meio da conversa. Para as
mulheres, a conversa écomo se fosse uma cola, cuja finalidade é se conectarcom o
ouvinte, tendo por objetivo formar umrelacionamento. Ou seja, o objetivo de se
conectarem é mais importante que o assunto em si. Mulheresconversam para aquilo
que no inglês significa “to bond” para se conectar. Homens conectam-se quando
praticam atividades em conjunto. Eles conversam para passar informação sobre o
assunto que têm em comum.
É muito comum as mulheres falarem sobre temas que já aconteceram e fazem isso
nos mínimos detalhes. Para o homem é um assunto até prosaico, podendo parecer
irrelevante à primeira vista. Na verdade, a conversa da esposa é iniciada para moldar
um relacionamento. Ela está se conectando; dividindo com marido a sua vida íntima.
Ela estáesperando que do lado dele a conversa flua.
E mesmo casais superinteligentes às vezes falham nesse sentido. Eles esquecem que
conversar é algo diferente para ambos. Para mulheres a conversa é essencial e faz
parte da sua natureza. Ela procura relacionar-se o tempo inteiro. Algo dentro dela diz
que é a sua responsabilidade construir um relacionamento. Ela precisa do “to bond”
para se conectar.
Homens, já vimos, não falam para construir relacionamentos. Quando conversam
estãoapenas passando informação para o outro. Não estãopensando em se conectar
com outrem, mastransmitindo informação. Homens conversam para dividir
informações. Isso é um grande motivo pelo qual homens e mulheres, marido e
esposas têm dificuldade na feitura de uma conversa. A dificuldade na comunicação
do casal ocorre porque justamentenão entendem essas diferenças. Vamos para um
exemplo prático:
CONEXAO E AMOR

Um casal recém-casado está se dando super bem no relacionamento. Porém, num


determinado dia, o jovem marido, após um dia de trabalho, chega em sua casa e vai
ao encontro de sua esposa para cumprimentá-la, quando então ela pergunta: como
foi o seu dia? Ele responde de forma monossilábica com um singelo “foi bom”. E
nada mais. Ela, não se conformando com aquela resposta sem qualquer tipo de
complementação, novamente refaz a mesma pergunta e o jovem marido reitera: “foi
um bom dia e nada aconteceu”. Eles não perceberam que isso será o início de
uma grande divergência.
Ele pensa: Não estou entendendo o porquê dela está perguntando, já falei que foi
um bom dia, o que ela quer que eu conte, alguma catástrofe ou uma tragédia?
Quando falei que foi um “bom dia”, foi realmente isso. Por que ela está fazendo
todas essas perguntas? Será que ela está antecipando algum problema; alguma
dificuldade. O que está por trás dessa pergunta? Isso é que o marido pensa.
Ela, diferentemente, pensa: Por que ele não está conectado comigo? Por que
ele está querendo ficar distante e não se conecta? Ele quer viver longe de mim! Por
isso ela fica com medo, insistindo em perguntar numa circularidade de indagações
sem fim e as respostas são as mesmas. Chega um momento em que ele se irrita. Será
que ela está querendo me controlar com essas perguntas, querendo saber tudo que
aconteceu no meu trabalho. Isso não vai funcionar bem!
Temos aqui o início de uma divisão; de uma separação. Na verdade, ele não
pretende afastá-la de sua vida. Isso porque a maioria dos homens não fala sobre
aquilo que acontece no dia a dia e nos mínimos detalhes ou, melhor, em seus
pormenores. Quando ele responde “foi um bom dia”, a frase corresponde exatamente
aquilo que ele quis dizer, ou seja, que foi “um bom dia” e só! Por sua vez, ela não
quer controlá-lo. A esposa quer se conectar através da comunicação, compartilhando
tudo que acontece em sua vida. Ela, na verdade, quer fazer parte de tudo.
As mulheres gostam de small talk, cujo significado literal é um tipo de “conversa
pequena”. Evidente que o termo não pode ser interpretado num sentido pejorativo.
Porém, as mulheres gostam de estabelecer conversas que, para os homens, podem
parecer até mesmo trivial. Essas “conversas pequenas” têm grande importância para
as mulheres. Em situação oposta, para os homens, o tempo
COMUNICAÇÃO E AMOR

deveria ser usado de forma construtiva e, via de consequência, não compreendem o


significado ou profundidade do small talk.
Com efeito, se entendermos essa diferença vamos compreender o porquê de os
homens reclamarem muito, dizendo “elas não param de conversar”. Elas, ao
contrário, dizem que os homens nunca conversam. Para sabermos essas assimetrias,
basta perguntamos as esposas quantas horas num dia elas conversavam com as suas
amigas antes do casamento? Não vamos nos surpreender se a resposta for entre três
a quatro horas. Entretanto, quando formulamos essa mesma pergunta para marido, a
resposta era de que falavam entre 10 minutos 15 minutos, no máximo. Aqui
percebemos uma grande diferença antes mesmo do casamento.
Aliás, na fase inicial do casamento (fase da paixão), antes de o amor se
estabelecer de uma forma firme e forte, o casal se conecta através da conversa. Na
fase primeva, a conversa é fluida e o marido é coparticipativo nas multiplicidades de
conversas realizadas entre o casal. Conversam e falam sobre tudo, seja presencial ou
até mesmo por inúmeros telefonemas diários. Isso acontece durante o início do
casamento quando a paixão está forte
Mas, quando essa mágica acaba sendo minimizada, iniciando-se a fase do
verdadeiro trabalho do amor, o homem deverá a reaprender a se comunicar e a
dividir a sua vida com a esposa. Da mesma forma, a esposa deverá compreendê-lo,
pois ele não tem uma propensão natural para small talk. Entretanto, o casal deve ter
a responsabilidade de saber sobre esses diferenciais. Ele tem que aprender a se
conectar por meio de uma conversa, embora não lhe seja natural. Por sua vez, a
esposa tem que aprender sobre a natureza do esposo e, com base nessas premissas,
deverão encontrar um ponto de equilíbrio, ou seja a linha do meio.
Logo, se se pretende ter um casamento forte e feliz, deve-se começar a conversar
com a esposa. Comece a falar!! Talvez isso não venha naturalmente. Mas se se
objetiva que a esposa seja feliz, inevitavelmente deve haver comunicação. A
conversa deve ser fluída e real, tornando-se um ritual entre o casal. Conversem na
hora do almoço e no jantar. Ambos devem reservar um tempo para construção de
uma boa conversa. Isso é fundamental num bom relacionamento.
Como é um capítulo mais prático do que teórico, vamos para novo exemplo.
Falamos anteriormente que os homens gostam de fazer algo mais prático, como por
exemplo, ir à um restaurante. Esse fato – ir a um restaurante – não se incompatibiliza
em se conectar com esposa
COMUNICAÇÃO E AMOR

mediante uma conversa prazerosa. A iguaria escolhida pelo casal não precisa ser a
centralidade do encontro, ou seja, o motivo pelo qual vão ao restaurante, mas, sim, a
conversa entre os dois deve ser a protagonista do encontro. Contudo, se,
eventualmente, forem num restaurante, desliguem o celular. Não se trata apenas de
um momento para apreciação de um bom prato. Ao contrário, o local deve ser
otimizado para estabelecer uma conversa em tom de afeto, amor. Infelizmente,
percebemos casais que, apesar de sentados na mesa de um belo restaurante e por
apenas centímetros de distância, estão infinitamente apartados pelo fato de que cada
um está querendo conferir a última notícia na internet ou a nova foto postada no
Instagram. A partir daí, segue-se um ritual bem previsível. O prato escolhido chega.
Porém, o distanciamento continua.
Inicia-se então a fase na qual ambos começam a tirar um selfie do prato pedido.
Ato contínuo, inicia-se a terceira fase: a publicação da foto no Instagram. A
concentração está rarefeita porque nasce então a premente necessidade de consultar
o Instagram, para saber quem de fato “curtiu’ a foto postada. Logo em seguida, a
amiga e/ou amigo, que curtiram a foto do Instagram perguntam sobre o restaurante
ou entabulam alguma conversa trivial, sem significado nenhum.
Então as horas passaram-se em branco. O jantar findou-se e as conversas reais,
que poderiam ser bem estruturadas com trocas de informações extremamente
importantes para o casal, foram dissipadas pela intermediação de um celular. Isso é
um grande erro! Mas não é só: as mídias sociais têm a capacidade de gerar uma
obesidade de informações, mas podem criar um raquitismo de conexão com a
esposa e vice-versa. Então, as mídias sociais devem ser utilizadas com parcimônia,
sem exageros, sob pena de esses novos meios de comunicação, tão atrativos, serem
grandes obstáculos para a comunicação real entre os casais.
Para relembramos, no primeiro capítulo, falávamos que ahava significa amor em
hebraico. Trata-se de um verbo e, por isso mesmo, demanda uma ação. Portanto,
amar não é somente um sentimento, mas uma ação proativa. Assim, uma
comunicação correta, enquanto instrumento de conexão entre um casal, pode se
transformar numa ação adequada que serve para a construção de um amor
sólido.
I-OUVIR
Faz parte da própria comunicação a capacidade de ouvir e sobre isso vamos
aprender agora. Iniciemos com outro exemplo prático.
COMUNICAÇÃO E AMOR

O casal está tendo uma conversa. Após vinte minutos de conversa, ela declara
para o esposo: você não está escutando nenhuma palavra daquilo que estou
falando! O marido perplexo responde: como não estou escutando? Posso repetir
palavra por palavra tudo o que você falou até o fim. Ela então arremata: isso é
mais uma prova do que você não está ouvindo nada.
Ele não se conformando com aquilo, diz à esposa: Ora, não estou entendendo
essa conversa. Posso repetir tudo e você diz que não estou escutando? Realmente
ele não está entendendo o que a esposa quer lhe dizer com isso.
Vamos a outra situação prática.
Entre numa sinagoga, num Shabat ou qualquer outro dia festivo, e tente perceber
a diferença do kidush entre mulheres e homens. Não precisa prestar atenção sobre
aquilo que elas estão falando, mas para os sinais de comunicação que estão no ar. No
lado das mulheres, além das conversas, as expressões são fundamentais, revelando
que estão se conectando. “Quando uma mulher ouve outra mulher, ela continua a
reassegurar à locutora que está ouvindo e que se importa. Instintivamente, quando
a locutora faz uma pausa, a ouvinte feminina reassegurará à locutora dando
respostas asseguradoras como ‘oh, uh-hun, hummmm, ah, hum-hum, ah, ah-ah,
hump’ Sem essas respostas tranquilizadoras, o silêncio de um homem pode ser
bastante ameaçador.[1]”.
No lado dos homens a situação é bem diferente. Quando um homem está falando
o assunto é entrecortado. Entre uma explicação e outra há um silêncio entre aqueles
que estão ouvindo. O assunto flui de forma diferente. Aqui temos uma diferença
fundamental. Mulheres fazem sons para afirmação de que estão ouvindo, porquanto
o motivo da conversa é focado na conexão. Elas precisam desse feedback. A mulher
pergunta para si mesma: será que está acontecendo alguma conexão? Por isso, as
conversas são mais sonoras, a significar que, por meio da participação sonora, está
havendo a conexão entre as demais participantes.
No primeiro exemplo – conversa entre o marido e a esposa -, pouco importa se ele
consegue repetir a conversa inteira. Repetir a conversa para a esposa não diz nada
daquilo que lhe é importante, pois ela não sabe se houve um feedback. Essa falta de
feedback ocorre pelo fato de que os homens sentem-se mais a vontade falar sobre
política, negócios, esportes e sobre outros assuntos. Mas não

1] Gray, John, Homens são de Marte, mulheres são de Vênus – Rio de Janeiro: Rocco, 1995, pág 82.
COMUNICAÇÃO E AMOR

tanto sobre pessoas e as suas experiências. Quando sua esposa está falando é preciso
sentir o que está sendo desenvolvido na conversa; o que ela está sentindo. Ela está
descrevendo uma experiência? Descubra o que está experiência significa para ela.
Entre no mundo dela. Isso é extremamente importante.
II- VALIDAR SENTIMENTO
Aqueles que têm filhas ou netas e netos vão perceber a diferença muito grande
entre eles. Meninos pequenos raramente olham para o seu rosto. Sempre estão
ocupados com alguma coisa. Meninas, bem ao contrário, não vão tirar os olhos de
você. Assim que estabelecemos um contato com as filhas e/ou netas, elas olham-no o
tempo inteiro. O nosso rosto é janela para nossas emoções. Interessante que a palavra
panim em hebraico significa face e p’nim aquilo que é interno. E meninas já tem
wiring para emoções, ou seja, a fiação necessária para “o sentir”.
Quando mulheres conversam entre si, elas olham bem nos olhos da outra. Ficam
bem focadas. Não tiram o contato. Homens não tem está características quando
entabulam uma conversa com o seu interlocutor. Eles podem fazer inúmeras
atividades juntos, entretanto não estabelecem a contact pois não estão envolvidos em
emoções, mas focados no intelecto. Mulheres, pelo fato de já terem uma fiação
totalmente montada para sentimentos, ficam olhando e captando emoções. Aí a razão
pela qual a mulher pode achar que o marido não está ouvindo. Mas ele está, sim,
ouvindo, embora não haja a mesma comunicação visual. Aqui não se trata de certo ou
errado, mas, sim, naturezas distintas quanto à forma de comunicação. Aí surge a
seguinte pergunta: o que seria então validar os sentimentos de outra pessoa?
Vamos compreender melhor com exemplos. Vejamos.
Presenciei uma comemoração em homenagem ao Rebe do Chabad. Um dos
grandes oradores foi o Rabino Elberg, cujo relato laudatório foi sobre a grandeza do
Rebe em ouvir e escutar atentamente as pessoas que lhe pediam conselhos. Confesso
que naquela hora pensei: será que ouvir não é algo natural? Lembro-me que Rabino
Elberg disse que os olhos do Rebe ficavam focados na pessoa que lhe pedia um
conselho (eitzá), revelando o seu absoluto empenho em compreender pacientemente
sobre o que lhe estava sendo relatado. Ficava centrado o tempo inteiro. Não estava
apenas captando o assunto de uma forma genérica ou numa camada superficial. Ao
contrário, cada detalhe lhe era importante. Jamais interrompia uma conversa. Deixava
a pessoa expressar-se com todos os detalhes. Relatou ainda que o Rebe tinha um
costume peculiar. Após o término do relato, o Rebe repetia os pontos centrais daquilo
que ele ouviu e perguntava: será que ouvi bem? Após isso, emitia o seu conselho. Isso
significa ouvir, escutar e validar o sentimento de outra pessoa.
COMUNICAÇÃO E AMOR

Essa capacidade de ouvir realmente é uma grandeza. É uma arte, principalmente


porque fomos acostumados àquilo que se chama problemns solves - para resolver
problemas –. Mas já vimos que devemos superar a nossa tendência natural e
aprendermos a escutar. O esposo deve olhar nos olhos de sua esposa e assentir
sinceramente, passando-lhe a informação de que estão juntos por meio deste tipo de
certificação. Vale dizer, não basta apenas o assentimento por meio de frases
monossilábicas, e, sim, que as palavras sejam acompanhadas por uma linguagem
corporal que lhe transmita a certificação ou validação daquilo que ela está querendo
transmitir, que, por sua vez, tem por objetivo conectar-se com o seu esposo por meio
da comunicação.
Aliás, tem um estudo segundo o qual as pessoas escutam apenas dos sete até aos
dezessete segundos antes de responder ou falar com seu interlocutor. Isso é o
máximo de tempo que demos para alguém antes de começarmos a falar. Isso revela
que para poder ouvir sem interromper é uma habilidade. E as vezes, no anseio de dar
uma resposta imediata, sem refletir sobre aquilo que ouvimos, cometemos erros pela
precipitação.
A paciência em ouvir deve ser também exercitada constantemente. Sobre a prática
de filtrar aquilo que se está ouvindo, tem um fato registrado pelo físico Leonard
Mlodinow, que, como colaborador e amigo do cosmólogo britânico Stephen
Hawking, o qual era portador de esclerose lateral amiotrófica, relata que Hawking
conseguia apenas “compor as suas sentenças em um ritmo de apenas cerca de seis
palavras por minuto. Por essa razão, normalmente era preciso esperar vários
minutos para ele formular uma simples resposta a algo que eu dissesse. No começo
eu ficava impaciente, meio devaneando enquanto esperava Stephen concluir sua
composição. Mas um dia eu estava olhando para a tela do computador por cima do
ombro dele, onde a sentença que estava articulando era visível, e comecei a pensar
sobre a sua resposta. No momento em que ele a concluía, eu tivera alguns minutos
para refletir sobre as ideais que expressava. Esse incidente me levou a uma
revelação. Numa conversa normal, espera-se que respondamos um para o outro
em segundos, e por conseguinte nossos voleios discursivos acontecem quase
automaticamente, a partir de um lugar superficial na mente. Nas minhas
conversas com Stephen, o alongamento desses segundos em minutos tinha um efeito
imensamente benéfico. Permitia que eu considerasse mais profundamente suas
observações, possibilitando que minhas novas ideias e minha reação às dele, se
sedimentassem de uma forma que nunca acontece numa conversa normal. Com o
resultado, o ritmo mais lento conferia às minhas
COMUNICAÇÃO E AMOR

interações uma profundidade de pensamento que não é possível na precipitação da


comunicação normal.[1]
E ste é um exemplo extremamente importante para aplicação nos relacionamentos. Ou
seja, é imperativo desenvolvermos a capacidade de, pacientemente, refletirmos sobre
aquilo que está sendo dito pelas nossas esposas, antes de lançarmos as nossas
precipitadas opiniões, e, erroneamente, não atentar para aquilo que elas estão nos
dizendo, sobretudo quando não podemos nos esquecer do termo mencionado na Torah
no capítulo anterior – Ezer Kenegdo –, a significar que a mulher foi criada para uma
ajuda ao homem ou “contra ele”. Nossos sábios explicam-nos que se o homem merecer a
sua esposa, será uma ajuda. Ao contrário disso, sua esposa será contra.
Nesta ótica, devemos aprender o dom de não interrompermos as nossas esposas,
aprendendo a ouvir e a validar os sentimentos. Para isso, devemos ouvi-las
constantemente. Validar, portanto, significa “eu te entendo” Isso se chama validar o
sentimento. É claro: a comunicação deve ocorrer com afeto e amor. A maneira de falar
espelha muito sobre o amor sentido entre os casais. O amor nos transforma. Por isso,
devemos reaprender a falar; ouvir e como dividir nossos sentimentos com os nossos
cônjuges. A partir daí, ambos não viverão uma vida solitária dentro do casamento.
Temos que aprender a não ser mesquinho com palavras, não respondendo de forma
“bom”, “isso”, “sim”, “não”, mas construir um diálogo por meio do qual ambos saem
fortalecidos do relacionamento. Isso demanda a remodelar a forma de se falar, a ouvir de
modo efetivo, dando sinais de que estamos prestando atenção e assimilando as
dificuldades por elas sentidas, validando a conversa. Comunicação é a alma do
casamento e isso não podemos nos esquecer.
É imperativo colocarmos essas lições no plano da prática. A boa notícia é que, a partir
desse momento para frente, as coisas vão melhorar. Entretanto, a notícia, talvez difícil, é
que nunca vamos aprender o suficiente e por mais que haja o aperfeiçoamento constante,
sempre há algo que pode ser trabalhado.
Em suma, neste capítulo, embora tenha sido muito mais direcionado para os homens
em termos práticos, tem também conselhos para as mulheres. Portanto, se
internalizarmos todos esses conselhos encontraremos o pleno equilíbrio entre o casal.

[1] Mlodinow, Leornado, Elástico, como o pensamento flexível pode mudar as nossas vidas. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2019, págs 158-159.
PÓSFACIO

Em razão da banalização do casamento, e para além de tudo o que está


acontecendo hoje, percebe-se que as pessoas não estão maisenxergando o
casamento de uma forma profunda e verdadeira. Nesses quatro capítulos já
sabemos que o casamento não pode ser compreendido de uma forma
epidérmica, ou seja, superficial. A realização de um casamento demanda a
compreensão de algo profundo. Infelizmente, a maioria das pessoas
desconhece o real significado sobre o que é efetivamente um casamento.
Estão preocupadas com detalhes periféricos do enlace, a exemplo do dia
festivo do casamento self, viagem, anel, etc. Mas poucos se dão conta acerca
docommitment, ou seja, do compromisso exigido no casamento. Vamos
entender isso melhor.
Em termos da Cabala existemdois tipos de regras: temos (i) uma regra
geral composta de detalhes; e (ii) uma regra específica a partir da qual
brotam detalhes. Vamos exemplificarpara melhor compreensão.
De uma forma geral, se perguntarmos às pessoas a definição sobre o que é
um casamento (regra geral), a grande maioria forneceria respostas (detalhes)
como: casamento é ter alguémcomo companheiro; não morar sozinho; para
ajudarna velhice; para ter uma relação íntima; para alguémsustentar
financeiramente outrem etc.
Enfim, as respostas seriam variáveis. Sob esse ângulo, o conceito de
casamentoseria apenas estabelecido a partir do preenchimento dealgum tipo
de checklist individual. Contudo, se juntássemos todo esse conjunto de fatores,
poderíamos conceituar ou definir o que seria um casamento? A resposta é
negativa, porquanto teríamos uma grande dificuldade para defini-lo, pois o
casamento seria apenas compreendido quando os nossos checklists
estivessem em consonância com nossas vontades particulares.
PÓSFACIO

Logo, se, à evidência, a definição do casamento dependesse do


preenchimento desses “enes” fatores individuais, bastaria subtrair um deles
para estarmos diante de um não casamento.Portanto, o conceito de
casamento não pode ser definido por aquilo que o nosso “eu” quer apenas
receber.
Nesses quatro capítulos játemos um recorte conceitual sobre o que
efetivamente deve ser um casamento. É algo absolutamente profundo.
Casamento é onde almas se unem e onde conseguimos despertar a nossa
infinitude. E, como visto anteriormente, o judaísmo ensina que o amor
significa abrir um espaço dentro de si para inclusão do outro e cujo ato de
doar/contribuir é muito mais profundo que apenas receber. Quando essas
premissas básicas são internalizadas, um casal poderáexperimentar o poder e
o milagre do amor verdadeiro.Isso, sim, é o casamento. Além disso, quando se
está casado, ciente sobre o que realmente é o casamento emsua essência, o
respeito, o amor, a intimidade, a ajuda mútua, etc, brotam naturalmente e,
finalmente, teremos uma unidade que reflete a imagem de D’us.
Nos próximos capítulos serão acrescentados novos princípios – partes II e
III – paraa completude deste mosaico formativo daquilo que é o casamento na
perspectiva judaica.
Por fim, não podemos nos esquecer de algo fundamental: yes, we can,
podemos e, ainda, com o máximo de alegria (simcha).

São Paulo, janeiro de 2023.


Rabino Shalom Ber Gourarie, é natural de
Montreal no Canadá, vindo de uma família
tradicional Chabad desde o início do
movimento
Tanto seu pai, Rabino Nathan Gourarie
(dam*) como seu avô Rabino Moshe
Gourarie, são reconhecidos como grandes
mestres nos ensinamentos de Kabala e da
Chassidut.
Aos 15 anos o Rabino
Gourarie foi para Israel
estudar com seu avô.
Durante este tempo
adquiriu um interesse
profundo pelos estudos
esotéricos, místicos e
chassidicos.
Com o tempo desenvolveu
uma linha de pensamento
e raciocínio diferenciado
e compatíveis com o
cotidiano e a vida prática.
Israel Simões
Transcritor, Revisor e Editor
isrjunio@yahoo.com.br
11 98166-4620

Yuri Orlando
yuryp4@gmail.com
Diretor de Marketing, Diretor comercial e Diagramação
11 98822-9072

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