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Faculdade de Economia

Universidade do Algarve

Sociologia
Sexualidade e Sociedade

Trabalho
A prostituição em Portugal

Docente: António José Filhó

Discentes: Pietro Serrano Cardoso Nº72819

Bruno Ramos Nº71677

Diogo Henriques Nº71653


Introdução

Tendo em conta que a sexualidade e a forma como nós a exercemos possui muita
influência da componente social e todos os seus mecanismos adjacentes, destaca-se que essa
construção da sexualidade é um processo que se inicia ainda na infância. Pode-se compreender
também que a sexualidade é uma construção transversal, que vai desde a compreensão do corpo
até o campo psíquico. Sendo o universo da sexualidade um território tão amplo, a temática da
prostituição demonstra-se como sendo um tema legítimo para ser abordado no campo das
ciências sociais. Fizemos então a pergunta inicial de “Como se caracteriza o fenómeno da
prostituição em Portugal?”.

A prostituição é defendida por muitos como a profissão mais antiga do mundo, sendo um
“território fértil” para mitos, lendas, tragédias, narrativas de acontecimentos vividos desde 4500
anos atrás, dando conta de que já nesta altura existiam actos de prostituição. O seu conceito é
atribuído a atividade que consiste em oferecer satisfação sexual em troca de remuneração, de
maneira habitual e promíscua. A atividade sexual remunerada é baseada em valores culturais que
diferem de sociedade para sociedade, geralmente referem-se ao comércio sexual de mulheres
para clientes do sexo masculino, sendo que também existem homens na prostituição e os
primeiros relatos de prostituição eram feitos por homens e não por mulheres. Existem ainda hoje
homens na prostituição ainda que seja em menor número que as mulheres. Nas culturas mais
tolerantes a prostituição torna-se uma prática que não é muito falada ou até desnecessária, já em
culturas demasiado rígidas, é perseguida e punida como crime (Costa,1983).

História

Ao falarmos de prostituição diante da antiguidade, é indispensável destacar o caráter


sexista a qual esta atividade era relacionada. Em sua grande maioria, a prostituição era
caracterizada pela submissão sexual da mulher face ao homem e visando o prazer masculino, já
que a atenção dada ao prazer da mulher era escassa, dificilmente eram relatados atos de
efetividade da liberdade sexual feminina. As exceções eram desempenhadas por membros da alta
sociedade ou da nobreza, que conquistavam sua autonomia e assim podendo definir os seus
amantes. O ato da prostituição de luxo, foi durante muitos séculos um dos poucos espaços de
autonomia e liberdade feminina, que assim poderia organizar a sua vida e escolher os seus
parceiros sexuais. Obviamente não se pode descartar as dificuldades sociais das pessoas que se
submetiam a tal atividade, como por exemplo: a perda da honra e da reputação, a exclusão social,
e a exposição ao risco de violência ou à doença (Costa,1983).

Um dos primeiros relatos da criminalização da prostituição no contexto português,


ocorreu em 1985 no Congresso Católico Internacional de Lisboa, onde José de Saldanha Oliveira
(1º Marquês de Rio Maior), discursou sobre a proibição da prostituição e alegou ser totalmente
favorável. Algum tempo depois, observamos em 1926, o primeiro Congresso Abolicionista
Português, organizado pela Liga Abolicionista Portuguesa (LAP) em parceria com o Conselho
Nacional das Mulheres Portuguesas, cujo seu presidente apresentou uma tese em que defendia a
proibição da prostituição, intitulada “Abolição do Registo Policial das Meretrizes”. O termo
“meretriz” deriva do Latim “meretrix”, e já era utilizado na antiguidade para caracterizar as
mulheres que desempenhavam relações sexuais em troca de recompensas financeiras ou de
status. Ao entrarmos no contexto do Estado Novo, observa-se que a perspectiva qual afirma que
as prostitutas colocam em causa a moralidade do regime, ganharam muita força ideológica. Esta
vertente conservadora desencadeou na nova legislação abolicionista de 1962, a qual incrimina,
para além do ato em si de prostituir-se, todos os indivíduos que intervenham, com fins lucrativos,
na prostituição (Alves,2009).

Desde 1962 que o exercício da prostituição é marginalizado em Portugal, mesmo com a


descriminalização do ato em 1982. Não há punição para a prostituição, mas qualquer pessoa que
contribua para o seu exercício, desde auxiliando na organização do trabalho, fornecimento de
sítios para descanso, está sujeito a pena. A prostituição manteve-se ativa nas décadas de 60 e 70,
apesar de grandes líderes do Estado Novo fazerem de tudo para desmoralizar e marginalizar este
fenómeno. Nas décadas de 80 e 90, a prostituição de rua estava principalmente associada ao uso
abusivo de drogas e ambientes insalubres, contudo segundo Alves as prostitutas (os) estão em
diferentes lugares da sociedade, desde a elite financeira até os bairros mais pobres dentro das
metrópoles portuguesas (Alves,2009).

Âmbito Jurídico-Penal

Atualmente, o exercício da prostituição já não é mais considerado crime em Portugal. O


art.º 169.º do Código Penal apenas incrimina quem “profissionalmente ou com intenção lucrativa
fomentar, favorecer ou facilitar o exercício por outra pessoa de prostituição”. Não se encontra
abrangido pela incriminação do crime, mesmo que facilite ou favoreça o ato, não atua
profissionalmente nem com intenção lucrativa. Existem duas situações em que é punido o cliente
da pessoa que se prostitui. No contexto do tráfico de pessoas para fins de exploração sexual, a
pessoa que se prostitui é considerada vítima, pois se encontra num contexto em que o seu
agenciador pode ter agido de forma violenta e abusado da força. A lei afirma que o utilizador
dos serviços da vítima tendo conhecimento da situação de exploração, também pode ser
considerado vítima do crime de tráfico de pessoas, pois o agenciador apenas age para benefício
próprio com desconsideração dos bens jurídicos da vítima (Leite,2016).

O cliente da prostituição de menores também é considerado infrator e punido de acordo


com o art.º 174.º do CP, desde que o agente seja maior e a vítima seja menor entre os 14 e os 18
anos. Este intervalo de idades está relacionado com a entrada na adolescência dos jovens, os
quais abaixo de 13 anos ainda são considerados crianças. Quando tratamos de um menor de 14
anos, o recurso à prostituição deste constitui um verdadeiro abuso sexual, pois a oferta de
dinheiro ou de outras vantagens económicas corresponde a uma forma de persuasão criminosa,
cujo pode viciar e corromper a mente de um menor, que segundo a lei da maioridade, ainda não
está apto para tomar decisões de alto risco.(Leite, 2016)

Prostituição dos transexuais

Segundo Ramalho, a população que procurava satisfazer-se com travestis era


maioritariamente portuguesa, e contendo uma mínima percentagem de estrangeiros, e que a
maioria dos indivíduos recebia bastante bem e tinha uma vida comum, como qualquer ser
humano, mas que apenas escondia um desejo indesejado socialmente. Uma das maiores dúvidas
que pairava nesta comunidade era, qual seria a sua orientação sexual, então acabavam por
debater muito sobre esse assunto. Pode-se ainda concluir que os t-lovers não procuram homens,
nem mulheres, nem tão pouco transexuais. Procuram, sim, a personificação de uma prática
transgressiva e experimental, que encerra em si profundas ambiguidades e contradições, na
medida em que põe em causa os pressupostos da heteronormatividade e da masculinidade
hegemónica. Acabam por viver uma vida dupla por não conseguirem expressar livremente em
sociedade. “Em Portugal, a população travesti trabalhadora do sexo não tem sido alvo de
interesse científico. Ao não haver um real entendimento sobre ela, os discursos produzidos, na
sua maioria a partir de um contacto superficial, têm favorecido a construção de imagens
estigmatizantes, com consequências ao nível da sua exclusão.” (Ramalho,2016).
Influência Religiosa

Dentro das ideologias de religiões cristãs, principalmente o catolicismo e o evangélico, a


prostituição é vista como imoral e um pecado severo. Porém, isso não significa que os
trabalhadores do sexo são ateus ou agnósticos. Segundo Cunha, as prostitutas(os) em sua grande
maioria são cristãs, e buscaram a religião católica com o objetivo de se redimir ou buscar ajuda
para sair da situação. A homossexualidade e o fenómeno dos transexuais, são vistos de forma
pejorativa, pois segundo a bíblia cristã, estes conceitos da sexualidade, são considerados pecados
severos. Contudo, existem casos em que travestis procuram espiritualidade em igrejas
evangélicas e são recebidas por líderes religiosos de forma pacífica (Cunha,2014).

Legalização X Criminalização

Um grande debate presente dentro do campo sociológico e da sexualidade, é o da


possível criminalização da prostituição em Portugal. De um lado, vemos um movimento
progressista e feminista que apoia o desempenho legalizado dos trabalhadores do sexo. E do
outro lado, existe um conjunto de líderes políticos conservadores e representantes religiosos, que
condenam esta situação profissional. No que toca às opções de descriminalização e
regulamentação, os casos sexuais criminosos como a exploração, podem ser totalmente relativos
e terão de passar por um longo julgamento. O exercício da prostituição é considerado uma
atividade económica que se compreende com uma das esferas mais sensíveis da intimidade
humana e pode gerar consequências negativas no desenvolvimento da personalidade e de
integração social.

A prostituição na Europa

No contexto europeu diante do debate referido acima, surgem dois exemplos relevantes
para serem explorados, o caso da Suécia e o da Holanda. A Suécia foi um dos primeiros países
europeus a criminalizar a prostituição e apresentou recentemente os seguintes resultados:
diminuição da prostituição de rua; aumento da percentagem de mulheres estrangeiras traficadas
para fins de exploração sexual em território sueco; aumento nos incidentes de violência contra
mulheres e feminicídios; O processo de incriminação dos clientes na Suécia desencadeou em o
afastamento dos clientes de rua e uma crescente nos casos de prostituição nos ambientes
luxuosos e de alta riqueza. No caso da Holanda, o país adotou uma solução de legalização, onde
ocorreu uma diminuição na prostituição de rua, a qual deixou de ser mais prejudicial às
condições higiênicas dos trabalhadores e clientes, para tornar-se um mercado de livre
empreendimento. Segundo Silva, as trabalhadoras do sexo passaram a agenciar sua própria
carreira profissional e aumentaram a qualidade dos serviços prestados. Pelo outro lado, as
condições de vida de quem exerce a prostituição pioraram significativamente na Suécia, que
segundo as fontes locais, aumentaram os números de contaminados com doenças sexualmente
transmissíveis, como a gonorreia, a sífilis, o cancro mole e VIH. Após a análise desde dois
contextos da Europa, podemos concluir que a legalização não implica a eliminação de toda a
marginalização e criminalidade, e não diminui a utilização dos serviços, pois apenas muda-se o
local de consumação (Sai das ruas e migra para os ambientes elitizados) (Silva, 2007).

Conclusão

Para concluirmos o nosso trabalho, optamos por cada um dar a opinião pessoal sobre o
tema abordado e sobre qual a nossa posição acerca da criminalização da prostituição ou se devia
ser considerado um trabalho digno e legalizado. De acordo com um dos participantes do nosso
grupo, Pietro: “Após reflexão sobre a temática da prostituição e o debate acerca de sua
criminalização em Portugal, acredito que o exercício da atividade sexual como fonte de renda e
situação profissional é totalmente legítima. Chego a essa conclusão após compreender o
fenómeno de mercado que existe por trás deste ramo e de como pode ser uma saída profissional
digna para homens e mulheres, cisgêneros ou transgéneros, que pretendem gerar dinheiro apenas
com o seu próprio corpo. Também levo esse debate para o âmbito de liberdades individuais, pois
a meu ver, o Estado deve ser totalmente isento de burocracias que impeçam o direito de trabalho
de cada indivíduo. Acredito ainda que o Estado poderia regulamentar este setor, pois assim os
serviços prestados poderiam aumentar sua qualidade e auxiliaria na prevenção de possíveis
problemas de saúde". Segundo o outro membro Diogo Henriques: “Refletindo sobre a
prostituição em Portugal acho que seria benéfico para a sociedade se a prostituição fosse algo
legal e bem organizado, se conseguiria controlar melhor os casos de tráfico de seres humanos de
outros países para Portugal, dando assim melhor qualidade de vida aos profissionais do sexo,
melhores postos de trabalho e melhor higiene e cuidados, cursos com profissionais de saúde e
sexólogos, como forma a existir mais profissionalismo nesta área que é tão importante nos dias
que correm.”. Por fim temos Bruno:
Referências Bibliográficas

Alves, A. (2009) Percursos de Vida: a prostituição no Porto na década de 60/70, Dissertação de


Mestrado, Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

Costa, J. (1983) Droga e Prostituição em Lisboa, Lisboa, Dom Quixote.

Ramalho, N. (2016) Quem são os clientes das travestis trabalhadoras do sexo em Portugal?
Artigo Científico, Instituto Universitário de Lisboa.

Cunha, L. (2014) Prostituição e Religião, Tese de Mestrado, Universidade Católica de São


Paulo.

Leite, I. (2016) Prostituição feminismo e capitalismo no debate legalização vs. Incriminação,


Artigo Publicado em Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

Silva, S. (2007) Classificar e silenciar: vigilância e controlo institucionais sobre a prostituição


feminina em Portugal, Artigo Publicado em Universidade do Minho, 184,789-810.

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