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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO – POSEAD

Curso: Revisão Prática de Texto


Disciplina: Análise do Discurso
Professora/Tutora: Ednaira Dayanna Dantas e Dantas de Menezes
Nome completo: Nélia Gonçalves de Paiva
Atividade: Tarefa 2.2 - Unidade 2

Análise da notícia “Deputado chama ministro do STF


de ‘moreno escuro’ em reunião”

Contextualização

No dia 22 de março de 2011, o deputado Júlio Campos (DEM-MT), em


reunião da bancada do DEM, defendeu que na reforma do Código Penal não
seria tão importante manter o foro privilegiado quanto seria manter a prisão
especial para autoridades. E sustentou a sua posição, citando como exemplo o
ex-deputado Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB) que precisou renunciar ao
mandato para escapar de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). O
ex-parlamentar estava sendo acusado de tentativa de homicídio, e o relator do
processo era o Ministro Joaquim Barbosa. E foi nesse contexto, que Campos
se referiu ao Magistrado como ‘moreno escuro’.

Análise da notícia

O jornal Folha de São Paulo (publicação online) divulgou o


acontecimento com a manchete Deputado chama ministro do STF de
‘moreno escuro’ em reunião. A fim de apreender os efeitos de sentidos
produzidos no discurso da notícia em questão, alguns aspectos foram
observados.
O perfil atrativo da manchete, delineado pelas letras garrafais negritadas
e composto por frases concisas e diretas, além de atrair a atenção do leitor, ao
expor sucintamente o assunto a ser abordado, ofereceu subsídios para que ele
fizesse as próprias inferências a respeito do texto.
É possível identificar na manchete a relação de pressuposição recíproca
entre o enunciado e a enunciação, e observar como o sujeito da enunciação e
o sujeito do enunciado construíram a materialidade do discurso oferecido ao
enunciatário. A notícia, portanto, será analisada a partir dos elementos
constitutivos da manchete e os efeitos de sentido que eles possam ter
produzido no leitor serão examinados tendo como ponto de partida alguns
questionamentos.
- Deputado: qual o nome do deputado? Qual a sua filiação partidária?
Essas perguntas só poderão ser respondidas se a notícia for lida.
- Chama: por que o deputado não se referiu ao ministro do STF pelo
nome?
No contexto apresentado, o verbo “chamar” tem a conotação de
‘xingamento’.
- Ministro do STF “moreno escuro”: imediatamente o leitor identifica
Joaquim Barbosa como o Ministro do STF ‘moreno escuro’.
- Em reunião: qual reunião? Qual o objetivo da reunião? Onde ela foi
realizada? Quem participou do encontro?
No primeiro parágrafo da notícia, o deputado é identificado como Júlio
Campos, porém sem fazer alusão à sua filiação partidária. Também nesse
parágrafo, o leitor tem a confirmação de que Joaquim Barbosa é o ministro do
STF chamado de ‘moreno escuro’ pelo deputado.
Apenas nos parágrafos três e quatro, a filiação partidária de Júlio
Campos é declarada, por meio da informação de que a reunião era da bancada
do DEM e que o deputado ACM Neto (BA), que presidia a reunião, defendeu o
deputado ao afirmar que a frase dita por Campos foi analisada fora de contexto
e que ela não teve caráter preconceituoso. Entretanto, não é esclarecido, em
nenhum dos parágrafos referidos, em que contexto o deputado Júlio Campos
se referiu ao Ministro do STF como ‘moreno escuro’.
Nos parágrafos cinco e seis, diante da má repercussão da sua fala, Júlio
Campos, em nota à imprensa, declara que não teve intenção de desmerecer o
Ministro do STF, que o chamou de ‘moreno escuro’ por ter esquecido, no
momento da sua fala, o nome do magistrado. Mas que já tinha enviado pedido
de desculpas ao Ministro.
No texto, a transcrição literal de algumas falas do deputado revelam dois
discursos: o discurso preconceituoso e o discurso do esquecimento. Ambos
foram vestidos com a roupagem da ironia.
No último parágrafo (sete), a notícia esclarece que o gabinete de
Barbosa (aqui surge o aposto que é o primeiro negro do STF) confirmou o
telefonema de Jaime Campos e que o parlamentar enviaria, por escrito, um
pedido de desculpas ao Ministro. A omissão da qualificação de ‘Ministro’ no
aposto, referindo-se a Joaquim Barbosa apenas como o primeiro negro do
STF, faz emergir o discurso oposicionista à atuação do Magistrado no STF.
Ressalta-se que no segundo parágrafo, o texto faz referência ao fim da
prisão especial na reforma do Código Penal, sem estabelecer qualquer relação
dessa informação com os demais tópicos da notícia. O fato de o enunciador
deixar essa informação solta, descontextualizada, evidencia apenas a intenção
de mencionar o assunto que ambientou o discurso do parlamentar, sem, no
entanto, conceder ao tema a importância devida e sem relacioná-lo ao discurso
de Campos.
De acordo com Esteves e Nascimento, em O ethos e a ideologia no
discurso político de Dilma Rousseff, Bakhtin afirma que a natureza da
enunciação é social e ideológica. E, na notícia dada pelo jornal, a ideologia
silenciou o principal aspecto da notícia que deveria vir a público: que o
parlamentar defendia a prisão especial para autoridades, pelo fato de que o
foro privilegiado em nada poderia ajudar os parlamentares que ficassem na
mira da justiça. E, para confirmar sua posição, Campos cita o ex-deputado
Ronaldo Cunha Lima que, para não ser julgado por homicídio pelo STF, cujo
processo estava sob a relatoria de Joaquim Barbosa, precisou ter a ‘coragem’
de renunciar ao mandato para escapar do julgamento.
O fato é que, quando o sujeito do enunciado e o sujeito da enunciação
foram construídos, eles mantiveram, diante dos enunciatários, um discurso
silencioso a respeito da conduta do deputado Jaime Campos e das reações
negativas que a fala do parlamentar provocou na própria Câmara dos
Deputados. E desse silêncio, emerge o apoio à manutenção de poder da
classe dominante (em foco, a política), que não tem interesse em promover
mudanças que possam colocar em risco a estabilidade desse poder.

Referências
ESTEVES, L.B,; NASCIMENTO, D.M. O Ethos e a ideologia no discurso político de Dilma
Roussef. Faculdade Unyleya. Disponível em:
https://portalaluno.unyleya.edu.br/951309/curso/118164/modulo/2257864/sala/161617/.
Acesso: maio 2021.

PAIVA, Marcelo. Análise do Discurso. Faculdade Unyleya. Cap. 3 – Análise do Discurso no


Jornalismo. Disponível em:
https://portalaluno.unyleya.edu.br/951309/curso/118164/modulo/2257864/sala/161617/.
Acesso: maio 2021.

Fonte: http://g1.globo.com/politica/noticia/2011/03/deputado-chama-ministro-do-stf-joaquim-
barbosa-de-moreno-escuro.html. Acesso em 14/05/2021.

Fonte:https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2011/03/23/
interna_politica,244115/deputado-causa-polemica-ao-chamar-ministro-do-stf-de-moreno-
escuro.shtml. Acesso em 14/05/2021

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/poder/892569-deputado-chama-ministro-do-stf-de-moreno-
escuro.shtml. Acesso em 20/02/2015.

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