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Resumo Abstract
NATO’s Afghan Mission: an Evaluation
O presente estudo visa avaliar sumariamente os
resultados atingidos pelos Aliados no Afeganistão. Between 2001 and 2007, the United States and NATO
Entre 2001 e 2007, os EUA e a NATO abando- gradually abandoned the strategy of a light military
naram gradualmente a abordagem militar do footprint, initially adopted to avoid becoming entangled
“light footprint”, inicialmente adoptada para evitar in Afghanistan the way the Soviet Union did. After
2004, there was a military build-up driven by internal
um envolvimento militar semelhante ao da URSS
and external events. As a result, the militants mobilized
no Afeganistão. Vários factores, endógenos e exó-
effectively to face up to the growing foreign military
genos, conduziram inadvertidamente a um reforço
presence and violence increased. The increase in
militar a partir de 2004, o que levou igualmente combat troops has highlighted the limitations and
os militantes afegãos a mobilizaram-se para fazer counterproductive effects of the military approach to
frente à crescente presença estrangeira. O aumento defeat the militants. This approach has undermined
das forças de combate pôs em relevo as limitações NATO’s stabilization and nation-building function
e efeitos contraprodutivos da abordagem militar in Afghanistan, thus pointing to a fundamental
para combater a guerrilha. Apesar de algumas contradiction in the mission. The findings suggest
PRTs terem obtido sucesso na implementação that the ISAF is restricted in its conduct of operations
dos respectivos programas de intervenção, outras as caveats are drawn up nationally, mainly because
evidenciam uma nítida escassez de iniciativa e re- of domestic politics. The mission suffers from a
cursos logísticos e financeiros, contribuindo para lack of coherent political strategic understanding
um panorama geral insatisfatório e revelador de of the mission, the tasks and strategy. It is being
ausência de uma estratégia global clara e susten- implemented with a lack of holistic strategy and
resources. The PRTs´ performance, whose mission is
tável para o desenvolvimento do país. A tendência
to promote governance, security and reconstruction,
repercute-se, aliás, no cenário macro da missão
is characterized by a proliferation of national models,
da NATO, na medida em que a inexistência de and multiple approaches to security and development,
coordenação estratégica entre os diversos contin- and lacks the financial and human resources required to
gentes nacionais é agravada por problemas in- tackle local problems. ISAF success is being thwarted
ternos do Afeganistão, tais como a economia do by a number of other factors, such as the rise of the
ópio, as divergências étnicas e políticas, a difícil Taliban, internal ethnic and political chasms, narcotics
relação com os vizinhos e corrupção endémica, trafficking, the lack of cooperation from Pakistan and
entre outros. endemic corruption.
Outono-Inverno 2009
N.º 124 – 4.ª Série 203 Nação e Defesa
pp. 203-216
Uma Avaliação da Missão da NATO no Afeganistão
1 Seth G. Jones, “Getting Back on Track in Afghanistan”, Testimony, RAND Corporation, Abril
de 2008, p. 4 (em http://foreignaffairs.house.gov/110/Jon04022008.pdf).
2 Astri Suhrke, “A Contradictory Mission? NATO from Stabilization to Combat in Afghanistan”,
International Peacekeeping, vol. 15, nº 2, 2008, p. 215 (em http://www.informaworld.com/smpp/
title~content=t713635493).
3 Ibid.
4 O peacebuilding é uma actividade multifacetada e complexa, na qual o peacekeeping é um factor
coadjuvante numa missão de contornos mais amplos, que se destina a trazer a paz e a alicerçar
o desenvolvimento após um conflito. Por regra, obedece aos seguintes pressupostos: (1) ocorre
após a conclusão de um tratado de paz entre os beligerantes e no pressuposto de que os beli-
gerantes o respeitarão; (2) implica actividades de reconstrução do estado após o conflito nas
suas vertentes políticas, económicas e sociais; (3) envolve por regra uma forte componente civil
(ONGs, peritos em várias áreas, polícia civil – CIVPOL, organizações do sistema das Nações
Unidas ligadas às actividades humanitárias e de desenvolvimento) e (4) a componente do
9 Id., p. 216.
10 Id., p. 219.
11 Peter Dahl Thruelsen, “NATO in Afghanistan – What Lessons Are We Learning and Are We
Willing to Adjust?”, DIIS Report 2007:14, Danish Institute for International Studies, 2007, pp. 29-30
(em http://www.diis.dk/graphics/Publications/Reports%202007/DIIS_2007-14_UK_F_WEB.
pdf), pp. 19-20.
12 Ibid.
13 Suhrke, op. cit., p. 225.
mas cuja concretização tem sido obstruída pela escassez de segurança.19 Apesar da
reinvenção formal, as ISAF PRT continuam a enfrentar os mesmos dilemas das JRT,
como a indefinição da missão, dos objectivos e dos papéis a desempenhar, além da
insuficiência dos recursos destinados à concretização das acções empreendidas.
Indubitavelmente, as eleições de 2004 representaram um exemplo de sucesso na
garantia da segurança e democraticidade do acto eleitoral, reforçando a projecção
e legitimidade do governo de Hamid Karzai. Contudo, este incremento securitário
pode ser atribuído ao reforço das forças da ONU e da ISAF,20 que genericamente
não sofreu continuação nos momentos pós-eleitorais e não exerceu repercussões
significativas sobre o nível global de segurança no país. O contributo concedido
neste âmbito pelas PRTs, apesar de positivo, enfrenta o obstáculo fundamental da
falta de coordenação entre Aliados, sendo marcado por divergências substanciais na
visão estratégica, nos instrumentos operacionais e recursos alocados para o efeito.
A natureza destas Equipas permanece nacional, sem responsabilização efectiva pe-
rante os altos quadros da ISAF, cabendo ao critério do Estado contribuinte definir
os fundos atribuídos e as linhas coordenadoras da intervenção (frequentemente
dependentes da agenda política externa/interna nacional) de cada PRT.21 O resultado
traduz-se na elevada dificuldade das autoridades e populações afegãs em avaliar
objectivamente o desempenho destas Equipas de Reconstrução.
A escassez de coordenação internacional é, aliás, uma característica estruturante
da participação da NATO no âmbito da ISAF. Apesar da unidade do comando
constituir um princípio basilar das operações da Aliança, na prática os contingentes
participantes divergem não apenas nas estratégias empreendidas para concretizar
as respectivas missões, como também na filosofia subjacente às mesmas e aos objec-
tivos pretendidos. Conforme sublinha Julian Lindley-French,22 a operação no Afe-
ganistão traduz uma luta entre o bastão militar norte-americano e a cenoura civil
europeia, “com os britânicos, holandeses e canadianos forçados a ser a carne no
meio da sanduíche”.
O papel fundamental do Paquistão no cenário da estabilização afegã tem sido
reconhecido pelos Aliados e restantes actores internacionais com interesse na distri-
buição do poder naquele particular contexto geopolítico. A destabilização relativa
23 James Dobbins, “Ending Afghanistan’s Civil War”, Testimony, RAND Corporation, Janeiro de
2007, p. 6 (em http://www.rand.org/pubs/testimonies/CT271/).
24 Id., pp. 2-3.
25 Peter Bergen, “Afghanistan 2007: Problems, Opportunities and Possible Solutions”, Readings in
European Security, Vol. 4, nº 1, CEPS Paperback Series, 2007, p. 227.
26 O número inicial de peacekeepers deslocados per capita era o mais baixo de todas as operações
de manutenção da paz desde a Segunda Guerra Mundial (v. Peter Bergen, op. cit., p. 227).
27 Mohammad Masoom Stanekzai, “Thwarting Afghanistan’s Insurgency: A Pragmatic Approach
toward Peace and Reconciliation”, Special Report 212, United States Institute of Peace, Setembro
de 2008, p. 9 (em http://www.usip.org/pubs/specialreports/sr212.html).
conflito cada vez mais globalizado entre as forças americanas e o Islão militante.
Os grupos radicais no Iraque e no Médio Oriente em geral, começaram a apelar
ao apoio para a luta no Afeganistão. Para os líderes talibãs, tal representou novas
oportunidades para reforçar os apoios, o treino e a confirmação ideológica da sua
luta contra as forças estrangeiras: “O contexto internacional de uma jihad mais
ampla transformou gradualmente o movimento, permitindo-lhe incorporar novas
técnicas de luta, organização e propaganda, ao mesmo tempo que mantinha uma
certa autonomia de recursos devido à produção e comércio do ópio”.28
Em 2003, foram registados, em média, 44 incidentes violentos por mês no Afe-
ganistão, enquanto os dados de 2008 apontam para 573 ocorrências, o que repre-
senta um aumento de 1.300%.29 Os ataques suicidas, que antes não constituíam
uma táctica privilegiada dos talibãs, passaram a integrar a estratégia de luta do
movimento e assumem hoje dimensões preocupantes, sendo complementados
por sequestros e acções de propaganda. Esta reorganização interna, coadjuvada
pela ajuda financeira oriunda de alguns países islâmicos e pelas receitas do ópio,
reforçou a vitalidade dos insurrectos e levou alguns especialistas a denominá-los
de “neo-talibãs”.30
Entre as causas imediatas do ressurgimento talibã, constam a acumulação das
operações securitárias da NATO nas regiões transfronteiriças entre 2003 e 2004 e
o lançamento da terceira fase de expansão das PRT para o sudeste afegão, que
reactivaram o movimento de resistência até aí encoberto. Nessa mesma altura, o
comandante talibã Mullah Dadullah afirmou possuir uma força de 12 mil insurrectos
com alto nível de preparação militar e equipamento sofisticado, declaração essa va-
lidada por diversos especialistas.31 A adesão da população afegã aos agrupamentos
de resistência deriva, com efeito, da atracção financeira exercida pelo movimento,
na medida em que as receitas de ópio permitem proporcionar aos combatentes um
salário mensal médio de 100 dólares, superior ao das forças de segurança nacionais,
que auferem cerca de 70 dólares.32
O dilema do ópio é, aliás, transversal à resolução dos problemas estruturais da
sociedade e classe política afegãs. Actualmente, as receitas geradas pela cultivação do
ópio representam a força motora da economia afegã, incomparavelmente superioras
à modesta dimensão da ajuda internacional. Pelas estimativas mais optimistas, cada
afegão beneficiou, nos primeiros anos subsequentes à intervenção, de 50 dólares
38 Id., p. 13.
39 Thruelsen, op. cit., p. 15; Jalali, op. cit., p. 9.
40 Jalali, op. cit., p. 10; Thruelsen, op. cit., p. 16.
41 Os Estados Unidos assumiram a responsabilidade pela criação do Exército nacional afegão
(ANA), Alemanha – da Polícia nacional afegã (ANP), Itália – pela reforma judicial, Reino
Unido – pelo combate ao cultivo de droga, e Japão – pelo desarmamento, desmilitarização e
reintegração (DDR) das milícias (v. Vincent M. Dreyer, “Retooling the Nation-building Strategy
in Afghanistan”, USAWC Strategy Research Project, U.S. Army War College, 2006, p. 3, em
http://www.stormingmedia.us/85/8568/A856844.html).
42 Nathaniel C. Fick, “Tell Me Why We’re There? Enduring Interests in Afghanistan (and Pakistan)”, Policy
Brief, Center for a New American Security, Janeiro de 2009, p. 1 (em http://www.cnas.org/node/675).
mais ou menos positiva deste objectivo definirá, com efeito, o sucesso da missão
da ISAF e o próprio prestígio da Aliança transatlântica.
Conclusão