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O “Exército Secreto” dos EUA e a Guerra Global
contra o Terror.
Alvaro de Souza Pinheiro(*)

Derrotar as organizações terroristas de contexto, avulta a participação do De-


alcance global, eliminando sua capacida- partamento de Defesa (DoD) no desen-
de de operar, por meio de ataques a seus
refúgios, lideranças, militantes, finanças, cadeamento de “Special Operations” e da
comando, controle e comunicações. (Ob- Agência Central de Inteligência (CIA) nas
jetivo Estratégico estabelecido na “USA “Paramilitary Operations”.
National Strategy for Combating Terro- As operações especiais desenvolvidas
rism”, setembro de 2006.)
no âmbito do DoD pelas Special Opera-
tions Forces (SOF) são conduzidas sob
1 INTEGRANDO as SOF e a CIA responsabilidade do US Special Opera-
A recém divulgada “2008 USA Natio- tions Command (USSOCOM), Grande
nal Defense Strategy” define que, embo- Comando Unificado responsável pelo
ra sem perder a perspectiva das graves planejamento, direção e execução das
implicações de um conflito episódico e operações especiais na condução da cha-
multidimensional contra estados nacio- mada “Guerra Global contra o Terror”
nais potencialmente oponentes, avaliado (GWOT), tudo com a finalidade de obs-
como mais complexo e diversificado do truir, derrotar e destruir redes terroristas
que a confrontação com o comunismo na que ameacem os EUA. Na verdade, existe
“Guerra Fria”, a luta contra a Al Qaeda e uma região nebulosa que dificulta, princi-
outras organizações terroristas continua- palmente para leigos, diferenciar as ope-
rá a ser a prioridade militar de maior re- rações especiais das SOF das operações
levância nas décadas a seguir. O Iraque e paramilitares da CIA. No Congresso dos
o Afeganistão permanecem como os tea- EUA, parlamentares da oposição criticam
tros de operações centrais desse combate. uma possível superposição de tarefas, e,
Porém, outros ambientes operacionais, até mesmo, a existência de uma rivali-
como é o caso do Irã, estado nacional no- dade entre as agências governamentais
tório patrocinador de organizações ter- militares e civis diretamente envolvidas,
roristas, particularmente, do Hezbollah, fato que, no passado, teria provocado re-
não são perdidos de vista. percussões muito graves no contexto da
Nessa luta em que o terrorismo trans- segurança nacional.
nacional é reconhecido como o inimigo Na verdade, esse binômio, que cons-
prioritário e mais urgente, destaca-se titui, na atualidade, o que conceituados
como condição imprescindível de suces- analistas militares de diferentes países
so uma diversidade de missões a serem identificam como o “Exército Secreto dos
cumpridas, tendo como base a obtenção EUA”, foi estabelecido a partir da profun-
de dados específicos obtidos em Opera- da reforma efetuada no Sistema de Inte-
ções de Inteligência desenvolvidas tanto ligência, fruto, sobretudo, da retificação
por pessoal militar quanto civil. Nesse das contundentes vulnerabilidades levan-

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tadas no “Relatório da Comissão Nacio- cução dessas operações deverão ser con-
nal sobre os Ataques Terroristas contra solidados com as capacitações de treina-
os EUA” (The 9/11 Commission Report). mento, direção e execução de operações
O DoD conceitua operações especiais similares sendo desenvolvidas pelo Co-
como “aquelas conduzidas em território mando de Operações Especiais.” Nessa
hostil, negado ou politicamente sensível, ocasião, o Presidente Bush determinou
visando À consecução de objetivos milita- ao Secretário da Defesa e ao Diretor Na-
res, políticos, psicossociais e/ou econômi- cional de Inteligência (cargo criado na
cos, empregando capacitações militares reforma do Sistema) que estudassem essa
não disponíveis nas forças convencio- Recomendação e apresentassem, em feve-
nais”. Esse alto órgão também define for- reiro de 2005, a sua avaliação a respeito.
ças paramilitares como “forças ou grupos Na verdade, não ocorreu uma trans-
não integrantes das forças armadas regu- ferência radical de responsabilidades.
lares de qualquer país, porém, semelhan- Como uma consequência das experiên-
tes a elas na organização, equipamento, cias desenvolvidas nessa área crítica de
treinamento ou na missão”. Assim, o ter- grande sensibilidade, nos anos que se se-
mo operações paramilitares é utilizado guiram ao desencadeamento da “Guerra
para identificar as operações conduzidas Global contra o Terror”, a responsabili-
pela CIA, cujos agentes e funcionários dade pelas operações paramilitares pas-
não fazem parte das Forças Armadas dos sou a ser atribuída, pelo National Secu-
EUA. rity Council, a cada uma das partes, com
De uma maneira geral, as operações base numa política de que “cada caso é
especiais são diferenciadas das opera- um caso”. Há que se destacar, todavia,
ções militares convencionais pelo eleva- um aspecto altamente positivo: desde
do grau de risco político e físico, técnicas 2001, ainda nos primórdios da Campa-
operacionais e forma de emprego, dentre nha do Afeganistão, tornou-se rotineiro
outros aspectos. Um tema comum às ope- que, temporariamente, equipes operacio-
rações das SOF e da CIA é diretamente nais da CIA passassem ao controle opera-
relacionado à preservação do sigilo do cional de comandantes de destacamentos
patrocinador. As operações especiais de- das SOF e vice-versa.
senvolvidas no âmbito do DoD pelas SOF Israel, na qualidade de um aliado in-
são frequentemente de baixa visibilidade, dispensável dos EUA, tem um relevante
cobertas ou clandestinas. O mesmo ocor- papel em todo esse processo. Além de um
re com as operações paramilitares da CIA. suporte de informações extremamente
Ambas as instituições preocupam-se que, valioso em termos de levantamento das
no planejamento e na execução das suas atividades de organizações terroristas
operações, seja evitada qualquer implica- operando no Oriente Médio, a experiên-
ção envolvendo o Governo dos EUA. cia israelense de integração entre os seus
A Recommendation 32 do 9/11 Com- organismos de Inteligência e as suas SOF,
mission Report tornou público que “a na prevenção e combate ao terrorismo, é
responsabilidade pela liderança da dire- ímpar, e tem sido estudada como um mo-
ção e execução das operações paramili- delo a ser seguido.
tares, tanto cobertas quanto clandestinas, O presente artigo tem por objetivo ana-
deve passar ao Departamento de Defesa.” lisar as táticas, técnicas, e procedimentos
Acrescenta que “o planejamento e a exe- empregados por esse “Exército Secreto”

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dos EUA em diferentes ambientes opera- algum tempo e facilitaram, sobremaneira,


cionais, concluindo sobre os resultados a obtenção da confiança dos Aliados do
obtidos nessas ações. Norte nos operadores das SOF infiltra-
dos. O contato entre as partes envolvidas
2 TEATRO DE OPERAÇÕES produziu uma inteligência rica na desig-
DO AFEGANISTÃO nação de alvos que, a curto prazo, foram
gradativamente destruídos pela Força Aé-
Como medida retaliatória imediata, rea. Paralelamente à crescente capacitação
após os dramáticos episódios de 11 de do apoio aéreo aproximado, os operado-
setembro de 2001, o Governo dos EUA res das SOF, reforçados pelos agentes da
desencadeou a “Guerra Global contra o CIA, alguns deles árabes de nascimento,
Terror”, cujo ato inicial foi a invasão do e profundamente conhecedores do am-
Afeganistão, “Operation Enduring Free- biente operacional, implementaram, em
dom”. muito, a capacitação operacional das for-
Ao início de novembro de 2001, ao ças irregulares aliadas.
mesmo tempo em que Companhias de Uma terceira Força-Tarefa Combinada
Rangers conquistavam e mantinham ae- de Operações Especiais, K-BAR (multina-
ródromos em diferentes localidades – uti- cional), foi constituída por 110 agentes
lizados como bases para operações fu- operacionais da CIA e 350 combaten-
turas –, Destacamentos Operacionais de tes das SOF, incluindo, além dos EUA,
Forças Especiais (SFOD), Equipes SEAL soldados de operações especiais de oito
(Sea, Air, Land – US Navy) e elementos países: Alemanha, Austrália, Canadá, Di-
do 1st Special Forces Operational Deta- namarca, França, Grã-Bretanha, Noruega
chment Delta(Delta Force), reforçados e Nova Zelândia. Em 49 dias, essas FO-
por USAF Combat Control Teams (Con- pEsp, conduzindo cerca de 15.000 irre-
troladores Aéreos Avançados da Força gulares aliados do Norte, conquistaram
Aérea), infiltraram-se no Afeganistão e Cabul e impuseram uma fragorosa derro-
estabeleceram contato com forças irregu- ta ao exército talibã, estimado em 50.000
lares anti-talibãs da “Aliança do Norte”. irregulares mais cerca de 6.000 militantes
Sua missão era a derrubada do Regime da Al Qaeda. Desse total, em torno de
Talibã e a captura de Osama bin Laden, 10.000 soldados talibãs foram mortos e
líder maior da Al Qaeda, cuja presença 7.000 foram aprisionados; 4.500 militan-
na área era confirmada por inequívocos tes da Al Qaeda foram mortos ou feitos
indícios, juntamente com seu segundo em prisioneiros. Nesse período, foram con-
comando, Ayman al-Zawahiri. Inicial- duzidas, aproximadamente, 100 surtidas
mente, duas Forças Tarefas Combinadas de apoio aéreo diárias, na sua maioria,
de Operações Especiais foram constituí- desencadeadas em regiões extremamente
das: TF DAGGER (apenas FOpEsp EUA) altas – não raro, acima de 12 000 pés –
e TF 11 (FOpEsp EUA e SAS britânico). em terreno montanhoso bastante aciden-
No cumprimento dessa típica missão tado, o que evidenciou o elevado nível de
de guerra irregular e contraterrorismo, adestramento do pessoal envolvido – tan-
o apoio de equipes operacionais da CIA to no ar quanto no solo – , bem como
mostrou-se fundamental. Essas já se en- a tecnologia de ponta das comunicações,
contravam operando naquele país havia armamentos e munições empregados.

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Muito embora o regime talibã tenha nos do país, de modo a permitir que os
sido deposto e um novo governo tenha Reconstruction Teams restabeleçam os
sido empossado numa campanha funda- serviços públicos essenciais. Novas for-
mentalmente baseada nas SOF reforçadas ças de segurança afegãs foram estabele-
por equipes operacionais da CIA, perdeu- cidas. O novo exército possui, inclusive,
se uma oportunidade ímpar. Numa loca- um componente de operações especiais.
lidade identificada como Tora Bora, Bin Tanto essa nova força terrestre quanto
Laden e Zawahiri foram localizados e uma nova polícia já estão sendo empre-
uma operação especial foi desencadeada gados, com desempenhos satisfatórios,
para capturá-los. Esse evento ficou co- no combate aos focos rebeldes talibãs
nhecido como a “Batalha de Tora Bora”, e na manutenção da ordem, o que está
desenvolvida entre 6 e 18 de dezembro possibilitando que a missão prioritária do
de 2001. O Comando da FT K-BAR so- componente SOF-CIA seja uma campa-
licitou ao Gen Tommy Franks, então Co- nha seletiva contra as lideranças talibãs e
mandante do Central Command (CEN- da Al Qaeda. Organizações de seguran-
TCOM) e autoridade maior em presença, ça privadas, como é o caso da empresa
o reforço de um batalhão de Rangers – Blackwater – cuja grande maioria de
que havia sido empregado na conquista funcionários são antigos operadores de
de aeródromos na região oeste do país – forças especiais e policiais da reserva se-
para ocupar posições de bloqueio, numa lecionados –, têm sido contratadas para
típica operação de “martelo-bigorna”. tarefas específicas, como, por exemplo, a
Esse reforço não foi autorizado e tanto segurança de autoridades locais e pontos
Bin Laden quanto al-Zawahiri escaparam sensíveis específicos, contribuindo no es-
incólumes para o Paquistão. Esse fato, forço de reconstrução do País.
até hoje, é tremendamente lamentado no
seio da comunidade SOF-CIA. 3 APOIO DE ISRAEL
Na atualidade, a situação ainda é ins-
tável em determinadas regiões do Afe- A experiência israelense na integra-
ganistão, onde existem focos de ressur- ção entre os organismos de Inteligência
gimento do Movimento Talibã. A região e as SOF é única em todo o mundo. Um
fronteiriça com o Paquistão permanece exemplo característico dessa integração
conflagrada e os indícios de que Osama foi a ação de retaliação determinada pela
bin Laden e a liderança da Al Qaeda es- Primeira Ministra Golda Meir, desenca-
tão homiziados em território paquistanês deada em diferentes países da Europa
permanecem fortes. A segurança está contra o “Setembro Negro”, organiza-
sendo responsabilidade de uma força da ção terrorista palestina responsável pelo
OTAN, International Security Assistance massacre da delegação israelense nos
Force (ISAF), que conta com um compo- Jogos Olímpicos de Munique, em 1972.
nente de operações especiais SOF-CIA, A integração entre o Mossad (operações
diretamente subordinado ao mais alto externas), o Shin Bet (operações inter-
escalão em presença, incluindo, ainda, nas) e as FOpEsp, em particular, com o
contingentes de operações especiais de Sayaret Matkal (Commando 101, unida-
diferentes países. de responsável pelo famoso resgate em
O foco da atual fase é a manutenção Entebbe, em 4 de julho de 1976) tem
da segurança nos maiores centros urba- fundamentado ao longo dos anos a polí-

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tica tipicamente israelense do “Olho por tros favores. As autoridades israelenses


Olho, Dente por Dente”. não se iludem com os resultados a obter.
A cooperação EUA-Israel em termos Não existem expectativas de informações
de Inteligência é tradicional e vital para espetaculares. O objetivo é a obtenção de
ambas as partes. Um exemplo dessa in- pequenos indícios de informações confi-
dispensável cooperação é o emprego de áveis que, integrados e processados por
uma verdadeira parafernália eletrônica analistas e especialistas de área altamente
de vigilância. Entretanto, apesar do em- competentes, venham a produzir infor-
prego de meios diversificados de Inteli- mações valiosas.
gência de Sinais e de Imagens, incluindo Desde as mais poderosas agências,
satélites e veículos aéreos não tripulados como a CIA e a FSB (Federal Security Ser-
(VANT) de diferentes alcances e finalida- vice – sucessora da KGB russa), passando
des, muitos dos quais monitorados pelos pelas menores, porém, extremamente
EUA, as autoridades israelenses enfatizam competentes, agências francesa, britânica
que a fonte prioritária, e ainda insubsti- e alemã, todas têm significativo respeito
tuível, de obtenção das informações é a pela Inteligência Israelense, a qual é abso-
Inteligência Humana, focada no terro- lutamente indispensável às atividades do
rista capturado vivo e na organização de “Exército Secreto” dos EUA na “Guerra
redes de informantes, recrutados no seio Global contra o Terror”.
das comunidades locais.
Em julho de 2008, o Governo do Irã 4 TF BLACK NO IRAQUE
condenou à morte o cidadão iraniano Ali
Embora a Task Force Black esteja
Ashtari, preso 18 meses antes, por espio-
operando naquele teatro de operações
nagem em favor de Israel. Segundo au-
há mais de três anos, em função de seu
toridades iranianas, o foco das ações do
elevado grau de sigilo, o nível de conhe-
espião teria sido o desenvolvimento de
cimento sobre suas atividades é mínimo.
sistemas de armas e a implantação de ins-
Seus quadros pertencem às mais secretas
talações nucleares. O Governo de Israel
organizações militares contraterroristas
rejeitou todas as acusações de conexões
com Ashtari. do mundo ocidental, as norte-americanas
Muito embora as negativas sejam uma 1st SFOD Delta e o SEAL Team Six, e a
marca registrada das atividades da contra- britânica SAS, oportunamente reforçadas
inteligência de Israel, é público e notório por equipes operacionais da CIA, per-
que as agências israelenses são pródigas fazendo um efetivo aproximado de 300
na condução de atividades de Inteligência combatentes.
Humana, particularmente, no interroga- Essa FTCbnOpEsp multinacional tem
tório de terroristas capturados e na coop- como missão precípua a neutralização
tação de elementos de diferentes origens, das diferentes células terroristas em pre-
em diferentes países do Oriente Médio. sença, com ênfase na Al Qaeda iraquiana,
As conexões comerciais de pessoas físicas visando, sobretudo, a neutralização dos
e de empresas em países estrangeiros são planejamentos e execuções de atentados
habilmente utilizadas nas atividades da a bomba suicidas, que estavam matando
inteligência. Não raro, indivíduos, por milhares de iraquianos por mês até o final
vezes, até com um passado anti-semita, do ano passado.
são comprados por dinheiro ou por ou- Os terroristas responsáveis por aten-

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tados suicidas, sejam eles com explosivos de cerca de 25.000 soldados oriundos de
conectados ao próprio corpo ou em viatu- bases nos EUA –, desenvolvida ao final do
ras de natureza diversificada, deslocam-se muito bem sucedido Comando da Força
para os seus objetivos com os detonado- Multinacional do Iraque, pelo Gen Da-
res desligados, só os ativando nos minu- vid Petraeus, atualmente Comandante do
tos finais que antecedem o acionamento Central Command), a FT Black havia eli-
da carga. Os indivíduos voluntários para minado ou capturado aproximadamente
a condução dos explosivos (“bombers”) 4.000 terroristas islâmicos, na sua maio-
não necessitam de um preparo técnico ria pessoal técnico experiente, de difícil
mais refinado, diferentemente daqueles substituição. O resultado se fez sentir de
em que repousa o sucesso dos ataques, imediato. Houve uma significativa redu-
que são os preparadores das cargas, pes- ção de um pico de mais de 100 atentados
soal de suporte logístico e pessoal de a bomba por mês, em Bagdá, para apenas
escolta. Essa foi uma evidência colhida dois, no mesmo período.
pelas autoridades de segurança de Israel O Gen Petraeus, num de seus mais re-
que, há cerca de cinco anos, passaram a centes depoimentos ao Congresso, teceu
priorizar, como alvo, o pessoal de apoio referências altamente elogiosas à Task
das organizações terroristas palestinas, Force Black, ressaltando que sua partici-
muito mais difícil de recrutar e preparar pação na reversão das expectativas viven-
do que os próprios suicidas. O resulta- ciadas naquele teatro foi imprescindível.
do foi altamente positivo. O número de Enfatizou, entretanto, que se pagou um
acidentes provocados por explosivos mal significativo preço em sangue, pois, nes-
preparados e a quantidade de terroristas se período, a FT sofreu cerca de 20% de
suicidas neutralizados antes de atingirem baixas.
seus alvos cresceram significativamente.
A FT Black adotou essa tática e ex- 5 A CAMPANHA ESTRATÉGICA
plorou, com rara propriedade, uma in-
A partir de 2004, o Presidente e o
teligência com base numa larga rede de
Secretário de Defesa atribuíram ao US-
informantes, visando a identificação e
SOCOM a responsabilidade de liderar a
localização das áreas de homizio das cé- “Guerra Global contra o Terror”, no âm-
lulas terroristas. Além da confrontação bito do DoD. Dentre inúmeras medidas
principal com a Al Qaeda iraquiana, a FT implementadas, aquele Grande Coman-
viveu momentos de grande tensão quan- do Operacional ativou, na sua estrutu-
do, há cerca de um ano, terroristas xiitas ra organizacional, o Center for Special
passaram a realizar ataques suicidas con- Operations (CSO), com a finalidade de
tra as comunidades sunitas, numa tenta- integrar as funções de inteligência, ope-
tiva de acirrar um clima de guerra civil. rações, estratégia e planejamento a lon-
Graças a uma inteligência humana muito go prazo. A chefia desse Centro, além de
bem estabelecida, foi possível buscar e estabelecer ligações interagências, capita-
coletar dados cada vez mais consistentes, lizou a sinergia de todas essas funções
que culminaram por neutralizar a sinistra sob uma única direção, e passou a exer-
ação xiita. cer, nas melhores condições, o comando
Ao início deste ano, por ocasião do e controle de todas as operações das SOF
término da ofensiva do Surge – reforço no planeta.

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O USSOCOM não tem mais a inten- - Prevenir a emergência de novas ame-


ção de desdobrar, lutar e vencer “any aças terroristas;
place”, “any time” (em qualquer lugar, a - Isolar as ameaças terroristas de suas
qualquer hora). Esse conceito não reflete bases de apoio;
mais a necessidade de um judicioso uso - Derrotar ou destruir as ameaças ter-
dos limitados recursos num conflito glo- roristas; e
bal. Tornou-se impositiva uma nova pers- - Prevenir a reconstituição das ameaças
pectiva para adequar a exigência de uma terroristas após terem sido derrotadas.
grande demanda de SOF. A nova filosofia Hoje, está claro, para as autoridades
está sintetizada na idéia de “presence for maiores responsáveis pelas operações
purpose” (presença por finalidade), cujo especiais dos EUA, que, diferentemente
significado é sintetizado pela idéia de da antiga União das Repúblicas Socialis-
estar no “right place, at the right time, tas Soviéticas (URSS), a Al Qaeda não é
facing the right adversary” (lugar certo, um estado centralizado, verticalmente
na hora certa, enfrentando o adversário hierarquizado, cujas ações de comando e
certo). Essa foi considerada a melhor controle eram, de alguma forma, simples
perspectiva para uma campanha de longa de prever. A Al Qaeda e seus aliados ex-
duração. tremistas constituem redes integradas por
Nesse contexto, as conexões no ex- células dotadas de suficiente autonomia,
terior, com governos estrangeiros e suas agregadas por ideologias fundamentalis-
forças armadas, permanecem cruciais na tas radicais de caráter etno-religioso, ins-
consecução desse conceito. Há que se ter piradas e orientadas, porém não-contro-
sempre em mente que organizações ter- ladas, por lideranças carismáticas. A Al
roristas planejam globalmente, suprem- Qaeda, diferentemente da antiga URSS,
se regionalmente e atuam localmente. O não possui território nacional nem cida-
USSOCOM incrementou a presença de des constituídas como centros político-
SOF em pontos-chave ao redor do globo, administrativos. Trata-se de um ator não-
visando trabalhar em conjunto com mi- estatal, que opera nas sombras e busca
litares e forças de segurança das nações áreas de homizio e santuários em regiões
parceiras ou anfitriãs na localização, iden- de difícil acesso em países falidos, onde
tificação e derrota das ameaças comuns. sua liderança pode planejar seus ataques
Quando as ameaças o exigem, as SOF, terroristas, concentrar recursos logísti-
juntamente com seus parceiros estran- cos, recrutar e treinar operadores, sem
geiros, passam a operar. Isso não signi- ser detectada por recursos de inteligência
fica que elas estejam permanentemente de tecnologia de ponta.
desdobradas ou posicionadas em bases O chamado “Exército Secreto”, carac-
avançadas. Mas, sim, tendo em mente terizado pela profunda integração entre
“a presença por finalidade”, que as SOF as operações especiais e a inteligência,
estejam baseadas em pontos estratégicos é mais um dos instrumentos eficazes de
do terreno, em condições de otimizar o contraterrorismo empregado pelos EUA
cumprimento de uma missão específica, na defesa de seus interesses vitais.
no prazo certo de tempo. Tudo isso levando em consideração a
Assim, as quatro atuais diretrizes estra- mais moderna concepção de prevenção e
tégicas do USSOCOM são as seguintes: combate ao terror, a qual, baseada numa

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inteligência eminentemente próativa, não Howard, Russel D. , “Intelligence in De-
espera que as células terroristas ataquem, nied Areas: New Concepts for a
para só depois, reagir. Antecipam-se, ex- Changing Security Environment”,
plorando, imediatamente após a sua ob- Joint Special Operations Universi-
tenção, as informações obtidas e, assim, ty (JSOU) Report 07-10, December
neutralizando essas células antecipada- 2007, Hurlburt Field / Florida.
mente às suas ações, numa doutrina emi- Dunnigan, James F., “The Secret Ameri-
nentemente próativa. can Army”, Strategy Page, News as
History, July 12, 2008.
Dunnigan, James F., “Task Force Black”,
REFERÊNCIAS Strategy Page, News as History, Sep-
The 9/11 Commission Report: Executive tember 13, 2008.
Summary, Washington D.C.
United States Special Operations Com-
mand: Posture Statement 2006, Mc
Dill Air Force Base / Florida. (*)O autor é General-de-Brigada da
A. Best Jr, Richard and Feickert, Andrew, Reserva do Exército Brasileiro, Analista
“Special Operations Forces (SOF) Militar especialista em Operações Es-
and CIA Paramilitary Operations: peciais e Guerra Irregular. (EMail: pi-
Issues for Congress”, CRS Report nheioa@terra.com.br).
for Congress; Foreign Affairs, De-
fense and Trade Division; Order
Code RS22017; Updated December
6, 2006.

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