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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA

Turma: B, Sala São Mateus

TEMA:
Literatura Moçambicana antes e Pós-colonial

Estudante:
Lezito Hortêncio Armando
Código: 708206782

Curso: Português
Disciplina: Literatura Africana de Expressão em Língua Portuguesa II
Tutor: Fernando Mualava
Ano de Frequência: 4º

Quelimane, Abril de 2023


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Tutor
Capa 0.5
Índice 0.5
Aspectos Introdução 0.5
Estrutura
Organizacionais Discussão 0.5
Conclusão 0.5
Bibliografia 0.5

Descrição dos objectivos 1.0

Metodologia adequada
2.0
ao objecto do trabalho
Articulação e domínio do
discurso académico
(expressão escrita 2.0
cuidada, coerência /
Análise e coesão textual)
Discussão Revisão bibliográfica
nacional e internacionais
2.
relevantes na área de
estudo
Exploração dos dados 2.0
Contributos teóricos
Conclusão 2.0
práticos
Paginação, tipo e
Aspectos tamanho de letra,
Formatação 1.0
Gerais parágrafo, espaçamento
entre linhas
Normas APA 6ª
Rigor e coerência das
Referências edição em
citações/referências 4.0
Bibliográficas citações e
bibliográficas
bibliografia

Folha para recomendações de melhoria: A ser preenchida pelo tutor


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Índice
1. Introdução ......................................................................................................................... 3
1.1. Objectivos ...................................................................................................................... 3
1.1.1. Geral: .......................................................................................................................... 3
1.1.2. Específicos .................................................................................................................. 3
1.2. Metodologia ................................................................................................................... 3
1.3. Estrutura do Trabalho ..................................................................................................... 3
2. História da Literatura Moçambicana .................................................................................. 4
2.1. Literatura Moçambicana no Período Colonial ................................................................. 4
2.2. A Razão de Ser da Literatura Colonial ............................................................................ 6
2.3. Os Percursos da Literatura Colonial ................................................................................ 8
2.4. Literatura Moçambicana no Período Pós-colonial ......................................................... 10
3. Conclusão ....................................................................................................................... 13
4. Bibliografia ..................................................................................................................... 14
Anexos ................................................................................................................................ 15
1. Introdução
A literatura colonial constitui, sem sombra de dúvida, um empreendimento
verdadeiramente delicado. Isto, pelas razões que seguidamente se apresentam: Primeiro,
porque há um enorme e generalizado desconhecimento do que seja a literatura colonial, daí
verificarem-se reacções de natural estranhamento com indisfarçados sinais de incompreensão.
Segundo, mesmo para os que aparentemente manifestam algum conhecimento sobre a
literatura colonial, rapidamente se verifica que assentam em bases precárias e que os levam
erroneamente a identificar essa literatura com toda a literatura que se fazia nas antigas
colónias.
Terceiro, porque o termo “colonial” desperta alguns fantasmas que têm a ver com
sentimentos de culpa, ressentimentos e mágoas ainda latentes. Quarto, porque para muitos,
com esta pesquisa corre-se o perigo de desenterrar questões que não são muito bem-vindas
pela incomodidade que provocam na actual conjuntura em que os discursos, oficiais ou não,
são dominados pelo império terminológico da globalização, cooperação, solidariedade,
parceria, intercâmbio, encontro de culturas, etc.
1.1. Objectivos
1.1.1. Geral:
 Conhecer a literatura moçambicana antes e pós-colonial.
1.1.2. Específicos
 Descrever a história da literatura moçambicana;
 Identificar a razão de ser da literatura colonial;
 Apontar os percursos da literatura colonial.
1.2. Metodologia
O trabalho em alusão teve como metodologia as fontes bibliográficas que consistiu na
recolha, selecção, leitura e fichamento das obras e documentos normativos que abordam a
temática.
1.3. Estrutura do Trabalho
O presente trabalho de pesquisa apresenta a seguinte estrutura: capa, feedback, índice,
desenvolvimento, conclusão e bibliografia.

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2. História da Literatura Moçambicana
Os primeiros manuais de literaturas africanas de língua portuguesa tratavam da
história dessas literaturas sem considerar suas especificidades nacionais. É nesse sentido
generalizante, a fim de localizarmos a literatura moçambicana no contexto mais amplo das
literaturas africanas de língua portuguesa, que observaremos, inicialmente, a proposta do
escritor e crítico português Manuel Ferreira (1987), em Literaturas africanas de expressão
portuguesa.
Os trabalhos de autores que se voltam exclusivamente para a literatura moçambicana.
Dentre os poucos textos existentes no Brasil sobre a historiografia literária de Moçambique,
escolhemos fazer uma leitura comparativa das propostas de Fátima Mendonça (1988), em
Literatura moçambicana: a história e as escritas; Manuel de Souza e Silva (1996), no seu
livro Do alheio ao próprio: a poesia em Moçambique; e de Pires Laranjeira (1995a e 2001),
respectivamente, primeiro, no capítulo intitulado “Moçambique: periodização”, em
Literaturas africanas de língua portuguesa, e, depois, no artigo “Mia Couto e as literaturas
africanas de língua portuguesa”.
Importa salientar que os textos são de natureza diversa: trata-se do livro de ensaios de
Fátima Mendonça; da tese de doutorado de Manuel de Souza e Silva; de um capítulo do
manual didáctico de Pires Laranjeira e de um artigo científico também de sua autoria. Todos
os textos, porém, tratam do mesmo problema: apresentar em linhas gerais a produção literária
de Moçambique.
Um perfil histórico da formação e consolidação da poesia moçambicana à luz dos
fatos que engendram o “complexo colonial de vida e pensamento em Moçambique. O livro
de Pires Laranjeira, por sua vez, traça um panorama das literaturas dos cinco países africanos
de língua portuguesa.
Olhando o posicionamento do autor acima, pode-se afirmar que as literaturas são
completamente diferentes entre si, por outro acredito que elas tenham percursos semelhantes,
saberes compartilhados, patrimónios em comum e referências culturais que se aproximam. O
factor colonialismo apresenta-se como uma importante contingência compartilhada entre
todas as nações. São os desdobramentos da experiência da dominação colonial que permitira
o surgimento de uma tradição histórico cultural que se aproximam e cria uma rede de
solidariedade.
2.1. Literatura Moçambicana no Período Colonial
Entre o século XIX e a década de 1930, a literatura moçambicana ainda não tinha
encontrado sua individualidade, sendo fortemente influenciada pela estética literária
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portuguesa: “Os escritores imitavam os moldes e as formas dos escritores europeus de
mentalidade e sensibilidade muito diferentes” (Días-Szmidt, 2010, p. 3).
Até mesmo os discursos progressistas direccionados à África carregavam o peso dessa
influência. Kaczorowski e Fujisawa (2016, p. 176) apontam uma distinção sutil entre a
“africanidade” da época e o sentimento nacionalista que surgiria nos anos seguintes: “Até
meados da década de 30, a produção literária dos autores colonizados parece dedicar-se mais
a uma auto afirmação de “africanidade” do que necessariamente a uma oposição sistemática à
cultura da metrópole”. Também é notável que o índice de analfabetismo era imenso entre os
colonizados e, portanto, a noção de literatura como produção cultural ainda estava vinculada
à cultura exógena (Kaczorowski; Fujisawa, 2016, p. 175).
Como é de praxe nos estudos literários, a problemática do marco inicial se faz
presente na história da literatura de Moçambique. Tanto Campos Oliveira (1847-1911)
quanto Rui de Noronha (1909-1943) são frequentemente apontados como o primeiro poeta
verdadeiramente moçambicano (Días-Szmidt, 2010, p. 3; Albuquerque; Motta, 1996, p. 27).
Campos de Oliveira encontravam inspiração na poesia romântica portuguesa; a sua obra, 31
poemas escritos entre os anos 1860 e 1880, pode ser encontrada na colectânea O Mancebo e
Trovador (1985), trabalho de resgate historiográfico realizado pelo escritor português Manuel
Ferreira.
Já Rui de Noronha marcou a literatura moçambicana com Sonetos (1946), uma obra
pioneira acerca de questões raciais e outros problemas que são frutos do domínio colonial
(Fonseca; Moreira, 2007, p. 48). Poeta prolífico, dedicou-se a explorar “temas e cenários
moçambicanos, ainda que com o uso recorrente de perspectivas pautadas pelo cristianismo
europeu e de estruturas poéticas clássicas” (Kaczorowski; Fujisawa, 2016, p. 176). Em sua
literatura, está evidenciada a admiração por Antero de Quental e outros autores lusitanos
imersos no movimento romântico.
O jornalista e escritor João Albasini (1876-1922), também recebe destaque como um
autor importante dessa época fundacional. É de sua autoria O livro da dor (1925), publicado
postumamente, um volume epistolar influenciado pelo ultra-romantismo europeu.
Albuquerque e Motta (1996, p. 27) afirmam que alguns autores consideraram O livro da dor
como o ponto de partida da literatura moçambicana, e contestam essa informação com
veemência, pois acreditam que o livro de Albasini é uma obra modesta, incapaz de ter
“marcado uma viragem ou um início concreto e objectivo de determinadas características
literárias ou culturais”.

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A literatura do período era, portanto, uma vertente da produção colonial, e não fazia
parte de uma tradição artística propriamente moçambicana. Aliás, muitas obras dessa época
foram vinculadas em publicações coloniais como o Boletim do Governo da Província de
Moçambique (1854) e a Revista Africana (1881).
A primeira oposição aos típicos periódicos coloniais ocorre em 1908 com a criação do
jornal O Africano pelos irmãos José Albasini e João Albasini; mais tarde, em 1919, os
mesmos irmãos continuariam seu trabalho de divulgação literária através de O Brado
Africano (Kaczorowski ; Fujisawa, 2016, p. 199). Esse último é creditado por viabilizar a
publicação de textos literários que contestavam a realidade social, incentivando movimentos
de resistência política e cultural. Priorizando poesias e narrativas curtas, e dando voz a
escritores nacionalistas pela primeira vez, os jornais e revistas foram “o maior veículo de
divulgação literária em Moçambique, especialmente até o final das lutas de libertação”
(Kaczorowski; Fujisawa, 2016, p. 177).
A imprensa, a literatura moçambicana e a reivindicação da independência
caminharam juntas, e fortaleceram uma a outra. O presente remonta esse passado, pois,
“vários dos agentes intelectuais em Moçambique têm ocupado lugares de destaque quer a
nível do Estado, quer da sociedade civil”É notável que muitos dos poetas moçambicanos da
primeira metade do século XX também foram jornalistas e/ou militantes políticos, o que
reforça a conexão entre a produção intelectual do país e a constituição identitária que estava
se formando: intensamente anticolonial e independente da cultura portuguesa.
2.2. A Razão de Ser da Literatura Colonial
Pensar a literatura colonial, implica ter como pano de fundo um processo histórico (a
colonização) e um sistema (o colonialismo). Inevitavelmente, a literatura colonial acaba por
ser ou co-actuante ou consequência de um fenómeno que tem subjacentes motivos de ordem
psicológica, social, cultural, ideológica, estética, ética, económica, religiosa e política.
A propósito da inevitabilidade desta literatura, Augusto dos Santos Abranches, numa
das pioneiras reflexões sobre a literatura colonial, conclui que Provável seria, pois, que a
actividade colonizadora tivesse também a sua representação, a sua estética peculiar,
oferecendo através da realidade criada a sua forma de arte. Seria natural dar-se como
verdadeiro o dístico «literatura colonial». (Mendonça, 1988).
Reside, portanto, nesta incontornável contaminação extra-literária, a grande fonte de
constrangimento, de desprazer e de repúdio que a alusão à literatura colonial fatalmente
provoca. Várias têm sido as interpretações avançadas sobre a especificidade da literatura

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colonial. Pela sua importância, destacamos, algumas dessas interpretações, na certeza, porém,
de que nenhuma delas esgota a discussão, mas enriquece-a.
Assim, partindo de Santos Abranches, verificamos que este procura definir a literatura
colonial: Antes de mais nada, entenda-se que, por “literatura colonial’’, nos referimos à que
pretende contar as reacções do branco perante o meio ambiente do negro, isto é: a toda essa
espécie de descrição mais ou menos ficcionista que nos introduz perante as pessoas
imaginariamente vindas de ambientes culturais desenvolvidos, civilizados, para meios
ambientes primitivos», (Mendonça, 1988).
Mais tarde, Manuel Ferreira (1989, p. 241-249) define a colonialidade literária, a
partir da análise do romance O Vélo d’Oiro de Henrique Galvão, sustentando-se nos
seguintes critérios:
 Superioridade numérica das personagens brancas;
 Melhor tratamento estético dado a essas personagens;
 O estatuto a que têm direito: são normalmente protagonistas;
 O espaço físico é normalmente inóspito e que justifica acção do branco;
 O tom épico é dominante, numa espécie de “celebração colonial”,
 O ponto de vista dominante é europeu: visualização lusocentrista;
 O destinatário da ficção é o homem português vivendo em Portugal;
 O autor é português com vivência africana; O narrador apresenta uma “intencionalidade
patriótica”. Este autor conclui que a literatura colonial “é a expressão de uma prática e de
um pensamento que assentam no pressuposto da superioridade cultural e civilizacional do
colonizador” (Ferreira 1989, p. 250).
A literatura colonial caracteriza-se justamente pelo facto de os seus cultores não
abdicarem da sua identidade, das referências culturais e civilizacionais dos seus países,
embora tentem mostrar-se integrados no meio e na sociedade nova de que fazem parte. A
literatura colonial pretende ser, fundamentalmente, um hino de louvor à civilização
colonizadora, à metrópole e à nação do colono, cujos actos de heroicidade e de
aventureirismo, de humanidade e de estoicismo são, quase sempre, enquadrados por uma
visão maniqueísta da vida e do mundo envolvente, (Brunschwig, 1971).
Num desenvolvimento posterior, Edward Said, uma das vozes mais autorizadas do
nosso tempo na teorização sobre a literatura colonial, considera que esta literatura
“efectivamente silencia o Outro, reconstitui a diferença como identidade, regula e representa
espaços dominados por forças de ocupação, e não por habitantes inactivos.”

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Por sua vez, fazendo do estereótipo (racial e cultural) o fundamento da sua
interpretação não especificamente da literatura colonial, mas do discurso colonial, em geral,
Homi Bhabha defende que “a construção do discurso colonial é uma articulação complexa
dos tropos de fetichismo a metáfora e a metonímia e formas de identificação narcísica e
agressivas próprias do Imaginário”.
Uma percepção abrangente destas interpretações ajuda-nos a ter um entendimento
mais circunstanciado da literatura colonial, a partir exactamente da identificação dos pontos
comuns ou seja, o facto de essa literatura ser toda a produção de ficção processada em
“situação colonial” e que traduz, globalmente considerada, a visão do mundo do colonizador,
e que é, neste caso, a visão do mundo dominante, em confronto com outras visões do mundo
latentes ou raramente explícitas, invariavelmente distorcidas ou manipuladas e representando
tipos humanos degenerados. Não é, pois, por acaso que o discurso colonial é essencialmente
auto justificativo, (Brunschwig, 1971).
2.3. Os Percursos da Literatura Colonial
Como é sabido há todo um conjunto de factores de ordem política, económica e social
que acaba por ser determinante para o relançamento da ocupação colonial em África no
século XIX, em que as potências europeias adoptam uma nova fórmula “oposta às operações
de conquista e de prestígio da colonização tradicional” (Brunschwig 1971, p. 24). Durante o
séc. XIX, período em que é relançada a influência ocidental no mundo colonizado, a Europa
sentiu necessidade de reescrever o seu passado, de reinventar a sua própria tradição de modo
a dar-lhe maior dignidade e legitimidade, o que se traduzirá na produção de obras literárias
que se instituirão como panegíricos da saga imperial. O exemplo mais conhecido é o do
romancista inglês Joseph Conrad.
Porém, numa etapa preliminar, os exploradores oitocentistas vão desempenhar um
papel fundamental no relançamento da colonização africana o que faz com que eles apareçam
como os precursores mais próximos da literatura colonial, obrigados que estavam a narrar a
sua saga e a descrever as paisagens e os seres que iam encontrando.
Portanto, decorrência da situação colonial e do relançamento do movimento
ocupaccionista catalisado, por um lado, pela Conferência de Berlim (1885), e pelo
movimento do Estado Novo (1926), em Portugal, a literatura colonial pode ser vista, em
certos momentos, e devido a formas inequivocamente rudimentares, como expressão quase
transparente de motivações políticas e ideológicas.
Contudo, esta literatura não deve ser avaliada de modo uniforme e minimalista, pois
ela irá conhecendo com o tempo um processo evolutivo irrecusável, tanto na forma como nas
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temáticas, denunciando percepções e representações extremamente reveladoras do imaginário
e da sociedade coloniais. Assim, temos um primeiro momento, em que no seguimento do tom
dominante na literatura de viagens de exploração, a literatura colonial representa a emoção do
escritor perante terras e gentes estranhas e diferentes fase exótica.
Um autor que se destaca, neste período, é Eduardo Correia de Matos com obras como
Sinfonia bárbara (1935), Terra conquistada (1946) esta obra ganhará o 1º prémio da
literatura colonial e Aconteceu em África (1955). É da obra Sinfonia bárbara, onde retiramos
algumas passagens particularmente elucidativas desta vertente em que o exótico se institui
como valor dominante: Nem a mais leve brisa acaricia as vergônteas, imóveis como se
houvessem sido petrificadas, nem as borboletas, abundantes por estes sítios, tão vistosas em
sua garridice de cores, procuram com a tromba espiralada o pólen adocicado de escassas
leguminosas. O activo colibri africano não adeja agora em torno às corolas procurando os
insectos da sua alimentação.
Não se ouve o gemer enamorado das rolas nem o grito metálico do galo do mato.
Afundou-se a vida na tumba do silêncio. A Natureza adormeceu, amodorrada pelo soalheiro,
exausta de calor e de sede. Paira no ambiente uma expectativa tenebrosa. Recolhidos em seus
quartéis, os habitantes deste lugar que vivem em contacto com o mundo da matéria bruta e
conhecem os seus ardis, dispõem-se resignados a suportar os rigores da calamidade.
Um dos aspectos que torna particularmente expressiva a representação do exótico é a
localização das próprias histórias que se desenvolvem dominantemente no mato. Aliás, há
uma relação metonímica entre África e o mato e que será explorada até à exaustão na
literatura colonial, validando a afirmação de Bernard Mouralis de que “O discurso exótico
ordena-se assim segundo uma retórica que visa a expressão e a caracterização de uma
realidade considerada como fundamentalmente diferente” (Brunschwig, 1971, p. 95).
Num segundo momento, a partir de meados da década de 40, a escrita colonial é
dominado por um tipo de mensagem que vangloria a acção (gesta) individual e colectiva de
um povo que se julga superior a outro – fase ideológica. É aqui onde encontramos como
figura de relevo Rodrigues Júnior. Nas três obras em referência, nomeadamente, Sehura, O
branco da Motasse, Calanga, é manifesto o peso de uma ideologia que encontra no
preconceito a sua principal base de sustentação.
O preconceito racial e cultural, que é uma manifesta negação do direito à diferença,
institui-se como uma das imagens de marca desta literatura. Preconceito que no entender de
Bhabha é um modo de conhecimento (ou pseudo-conhecimento?) e um modo de poder

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(Bhabha 1995: 66). Por outro lado, trata-se de um exercício fantasista e defensivo,
cristalizado no estereótipo, mecanismo particularmente complexo, ambíguo e contraditório.
Finalmente, sem estarem perdidas as características das duas fases anteriores, define-
se um terceiro momento – fase cosmopolita -, a partir dos inícios da década de 60. Temos a
partir desta altura, um maior amadurecimento estético e discursivo, em que os cruzamentos
culturais e sociais são visivelmente mais complexos, e em que a retórica que exprime a
sobreposição cultural e civilizacional apresenta contornos mais sofisticados e notoriamente
ambíguos.
Esta é, inequivocamente, a fase adulta da literatura colonial e que terá a ver, com os
processos intrínsecos à criação literária, por um lado, e com o desenvolvimento crescente das
tensões internas e externas nas colónias portuguesas, por outro. Destacamos, nesta fase, dois
autores: Agostinho Caramelo, com uma trilogia romanesca intitulada Fogo (1961, 1962 e
1964) e Eduardo Paixão, o autor que mais livros vendeu, com Cacimbo (3 edições, 1972,
1972 e 1974), Os espinhos da Micaia (também com 3 edições, 1972, 1973 e 1974), O
Mulungo (duas edições, 1973 e 1974) e Tchova, Tchova (1975).
2.4. Literatura Moçambicana no Período Pós-colonial
Moçambique conquista a independência em 1975, mas isso não marca o fim dos
conflitos e nem o início de um sistema de governo democrático. Entre 1977 e 1992, o país foi
palco de uma sangrenta guerra civil entre duas forças que se opunham: a Frelimo (Frente de
Libertação de Moçambique), um partido político fundado em princípios marxistas-leninistas,
e a anticomunista Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), inicialmente um grupo
guerrilheiro de direita, que surgiu como resposta ao único partido no poder.
Na década de 1980, a nação estava desestabilizada, e os muitos conflitos isolavam a
capital urbanizada de grande parte da região rural; nesse clima distópico e insular, em que a
tão sonhada paz permanecia distante, a literatura moçambicana trilhou um rumo marcado
pelo “lirismo mais intimista, metalinguístico e autocrítico, passando a se debruçar com mais
liberdade sobre o indivíduo e as relações que o constituem” (Kaczorowski; Fujisawa, 2016, p.
180).
Os anos 1980 abrem espaço para a criação da AEMO (Associação dos Escritores
Moçambicanos), que teve a participação de autores como Luís Bernardo Honwana,
Marcelino dos Santos e Rui Nogar. Em 1984, a revista Charrua, publicada pela AEMO, passa
a projectar autores como Ungulani Ba Ka Khosa, Armando Artur, Juvenal Bucuane, Luís
Carlos Patraquim e Eduardo White. Em 8 edições, publicadas entre Junho de 1984 e
Dezembro de 1986, a Charrua deu nome e voz a um novo movimento literário: a “Geração da
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Charrua”, como viria a ser conhecida, rompe com a literatura política em favor de
experimentos líricos e da reapropriação da língua portuguesa, agora ressignificada através de
um olhar pós-colonial essencialmente moçambicano.
Mia Couto, actualmente um dos escritores mais conhecidos de África, estreia com
Raiz de Orvalho e outros poemas (1983), livro que reúne poemas intensos e íntimos sobre
questões existenciais, a vida e a morte, o amor e o erotismo, sendo um marco dessa época em
que os escritores passaram a tocar em subjectividades antes ignoradas (Kaczorowski;
Fujisawa, 2016, p. 181).
Nos anos que se seguiram, o autor explorou diversos géneros literários: crónicas,
contos, romances e livros infantis. Destacamos o romance Terra sonâmbulo (1992),
considerado amplamente como um marco da literatura africana. No entanto, ao se tratar de
moçambicanidade, toda sua obra merece ser considerada: Suas obras problematizam a
instabilidade na qual está mergulhado o povo moçambicano, a corrupção em todos os níveis
do poder, as injustiças como consequência de um racismo étnico, a subserviência perante o
estrangeiro, a perplexidade face às rápidas mudanças sociais, o desrespeito pelos valores
tradicionais, a despersonalização, a miséria (Fonseca; Moreira, 2007, p. 55).
Em 1990, Paulina Chiziane, a primeira mulher moçambicana a publicar um romance,
lança Balada de amor ao vento. O seu livro mais celebrado viria a ser Niketche: uma história
de poligamia (2002), porém, já nessa primeira obra, a autora antecipa sua impactante
atividade literária, incitando debates sociais acerca da prática da poligamia em Moçambique,
e encontrando uma intersecção entre o discurso feminista e o anticolonial: Paulina
universaliza as particularidades femininas da sociedade moçambicana actual, através de um
narrar intimista que encena uma subjectividade singular, que relembra a aprendizagem da
mulher em relação a seu lugar milenarmente ocupado no campo e na cidade, os rituais e os
condicionamentos do lobolo, a dramática solidão que a poligamia paradoxalmente incute, os
esquemas perversos das proibições sociais, a guerra, a intolerância ao colonialismo, a
precariedade espiritual e material circundante (Freitas, 2014, p. 198).
Días-Szmidt (2010, p. 6) identifica certos aspectos típicos da literatura moçambicana
pós-independência: a ambiguidade na forma como o realismo é retratada, a preocupação com
as tradições e costumes locais, e o uso da oralização como símbolo de africanidade. Esse
último aspecto, ligado ao uso deneologismos e demais “brincadeiras” com a unidade
sintáctica e lexical da língua, propicia o surgimento da originalidade moçambicana na
estrutura normativa do português imperial: Paulina Chiziane, Suleiman Cassamo, Borges
Coelho e Ungulani Ba Ka Khosa, tal como Mia Couto, introduzem nas suas narrativas
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escritas em língua europeia as palavras das línguas chope e ronga atribuindo-lhes o carácter
dos contos orais contados à noite à volta da fogueira (Días-Szmidt, 2010, p. 6).
A questão do realismo também é levantada por Paradiso (2015), que recusa os termos
“realismo maravilhoso”, “realismo mágico” e “realismo fantástico” das tradições ocidentais,
e defende o conceito de Realismo Animista como inerente ao estudo das literaturas africanas.
Essa percepção particularmente africana da realidade é retratada nas obras de Suleiman
Cassamo, Paulina Chiziane, Mia Couto, entre outros. No já citado Terra sonâmbula, as
memórias são apagadas por feitiço, os mortos conversam com os vivos e, enquanto os
homens dormem, a paisagem está em constante metamorfose: “Em África, certos fenómenos
considerados mesmo absurdos, incomuns ou impossíveis às demais civilizações, são comuns
e fazem parte intrínseca de uma percepção do real, de uma realidade animista” (Paradiso,
2015, p. 273). Além disso, a valorização da religiosidade ancestral, dos ritos e da relação com
o sagrado, é ubíqua nas literaturas africanas: ainda mais naquelas inseridas na estética pós-
colonial, que abordam a religiosidade tradicional africana para solapar o discurso colonial,
como por exemplo, o Xipoco, narrador fantasma de A Varanda do Frangipani (2007),
personagem construído na perspectiva anímica para denunciar o longo período de guerra civil
(1975-1992) em Moçambique (Paradiso, 2015, p. 278).
Em diversos sentidos, os escritores pós-coloniais gozam de maior liberdade criativa,
utilizando-se de diversas experimentações estilísticas para fins de subversão dos valores
eurocêntricos. O consagrado romance Ualalapi (1987), de Ungulani Ba Ka Khosa, serve
como exemplo dessa tendência: representando a aficção historiográfica no âmbito da estética
pós-moderna, apropria-se do legado europeu voltado à escrita para, logo em seguida,
subvertê-lo através da oralidade africana (Dosoudilová, 2008, p. 41).
Nos tempos actuais, a poesia moçambicana ainda está em confronto com os valores
coloniais, e buscando uma identidade própria: “O imaginário poético vem se desprendendo
de uma costura outrora forjada pelo autoritarismo que impunha a sua leitura e desenho de si
como se fosse o do Outro” (Lima, 2014, p. 120).
Lima (2014, p. 118) também afirma que a produção poética moçambicana estabelece
“um diálogo com o passado, através de procedimentos estilizados como intertextualidades,
retomadas, citações, entre outras”. Dessa forma, o passado colonial é insistentemente
revisitado para produzir discursos que evidenciam uma reinterpretação da cultura local
conduzida pelo povo moçambicano.

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3. Conclusão
A literatura moçambicana desenvolve-se na encruzilhada entre os valores tradicionais
de África e as imposições do colonizador europeu. A problemática identitária resulta na
formação da moçambicanidade, reflectindo os problemas socioculturais causados pelo
sistema colonial: o governo autoritário, a manipulação da mídia, as injustas condições de
trabalho, a desigualdade social, a segregação e o preconceito racial, a desvalorização das
culturas africanas, entre tantos outros.
Não duvidamos de que face ao conjunto de contaminações extra-literárias, mais ou
menos evidentes, deparamo-nos, em muitos casos, quer com obras esteticamente pouco
conseguidas, quer com textos que sob a capa da literatura são verdadeiros manifestos da
ideologia colonial. Contudo, essa mesma literatura não deixa de assumir-se como uma
modelização do mundo, como um sistema semiótico particular, como um policódigo em que
estão naturalmente presentes os diferentes códigos (compositivo, semântico-pragmático,
estilístico, etc) que asseguram a sua literariedade e a sua polifuncionalidade.
Daí que com a pesquisa que iremos alargar e aprofundar, queremos explorar as linhas
de força que caracterizaram o imaginário colonial na sua expressão estética. Para isso iremos
naturalmente recorrer, até à exaustão aos fundamentos da teoria e da crítica literárias,
instrumentos que não nos impedirão de confrontar outros suportes teóricos e metodológicos
sejam eles antropológicos, psicológicos, etnográficos, sociológicos ou historiográficos.
Portanto, não se trata de reler a História, gratuitamente, mas de revisitar um
imaginário com toda a sua carga de preconceitos, contradições, manipulações, de formações e
conspirações, precavendo, talvez o futuro, e o presente, naturalmente dos estigmas da
incomunicabilidade cultural e civilizacional.

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4. Bibliografia
Días-Szmidt, R. (2010). O Legado Tradicional Africano e as Influências Ocidentais: a
Formação da Identidade e da Moçambicanidade na Literatura Pós-colonial de Moçambique.
Lisboa.
Dosoudilová, K. M. (2008). Metaficção Historiográfica e o Romance “Ualalapi” de
Ungulani Ba Ka Khosa. Tese de bacharelado. Universidade de Masaryk, Brno.
Ferreira, M. (1987). Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa. São Paulo: Ática.
Fonseca, M. N. S.; Moreira, T. T. (2007). Panorama das Literaturas Africanas de Língua
Portuguesa. In: Cadernos CESPUC de Pesquisa. Belo Horizonte.
Kaczorowski, J.; Fujisawa, M. (2016). Literatura e Sociedade em Moçambique: Breve
Panorama Histórico. In: Cadernos CERU (USP), v. 27.
Laranjeira, P. (1995a). La Littérature Coloniale Portugaise.
Lemos, V. (1999a). Eroticus Moçambicanus: Breve Antologia da Poesia Escrita em
Moçambique (1944/1963). Rio de Janeiro: Nova Fronteira.
Lima, N. S. R. (2014). A Poesia Contemporânea em Moçambique e a Concepção de
Identidade.
Maquet, J. (1967). Africanité Traditionnelle et Moderne. Paris: Présence Africaine.
Mendonça, F. (1988). Literatura Moçambicana. A história e as escritas, Maputo, U.E.M.
Mouralis, B. (1982). Les Contre-Littératures Ed. ut.: As Contraliteraturas. Coimbra,
Almedina.
Paradiso, S. R. (2015). Religiosidade na Literatura Africana: a Estética do Realismo
Animista. In: Estação Literária, Londrina, v. 13.

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Anexos

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Distinção da Literatura Colonial da Nacional
Literatura Colonial
A literatura colonial, identificada com um conjunto de textos que inclui romance, poes
ia, narrativas de viagem, relatos de missionários, diários, livros de notas e outros que propaga
ndearam a ideia de império sobretudo a partir do século XIX, tem origem em textos muito ant
eriores aos quais vai beber metáforas e imagens, como sejam as descrições de selvajaria de H
eródoto, os relatos de Marco Polo, Mandeville ou Haklyut. Seria, contudo, na viragem do séc
ulo, com a expansão colonial como a Inglaterra e a França, que iria desenvolver-se. A África,
continente redescoberta pelos europeus nos anos 80 do século passado, surge então como cen
ário de inúmeros textos de autores como H. Rider Haggard, John Buchan, Mary Kingsley, Flo
rence Dixie ou Joseph Conrad em Inglaterra e Pierre Loti, Paul Vigne D’Octon ou Paul Bonn
etain em França. Também o império britânico na Índia é tema de Rudyard Kipling, E. M. For
ster, G. A. Henty ou Alice Perrin.
Literatura Nacional
A partir da década de 1940, após a Segunda Guerra Mundial, uma Portugal abalada p
olítica e economicamente tenta reafirmar o poder sobre suas colónias de forma incisiva. A res
istência por parte do governo colonial afecta diversas produções culturais através da censura.
O próprio O Brado Africano já tinha sido impedido de circular entre 1932 e 1933. Mas agora,
mesmo quando liberados, as entidades oficiais acompanhavam os jornais e revistas com rigor
, o que impedia a circulação de textos revolucionários inflamados.
Em suma, essa fase foi marcada por uma conscientização nacional e consequentement
e anticolonial, com produções de cunho político-ideológico, muitas vezes vistas como panflet
árias pelos críticos contemporâneos.
O Contributo da Imprensa
Ao longo do processo histórico, Moçambique testemunhou um avanço significativo
na reflexão, produção, partilha e consumo de meios da informação. As formas de comunicar,
como a imprensa, os telefones, a radiofonia, a televisão, o cinema e a internet, estão cada vez
mais em ritmo acelerado devido a tecnologia de ponta e a sua rápida propagação. Os jornais
sempre representaram um elemento de difusão das preocupações dos povos na história dos
meios de comunicação social, pois neles se encontram reflectidos vários assuntos da
sociedade de índole política, social, cultural, económico e ideológico.
Os últimos anos da história recente do país foram marcados por temas ligados a
imprensa, Estado, cidadania e democracia que têm levado acesos debates na esfera académica
moçambicana, tendo por vezes ocupado grandes espaços nos meios de comunicação social.
Estes debates se multiplicaram de forma diversificada desde a emergência das organizações e
associações da sociedade civil consolidadas pela aprovação da nova constituição de 1990 que
abriu espaço para a liberdade de imprensa, o multipartidarismo e democratização do Estado.
A partir de então, criou-se um espaço para as novas relações entre os diferentes
actores da sociedade moçambicana, estabelecendo-se uma postura de negociação assente na
possibilidade de uma actuação conjunta entre a imprensa e o Estado, tendo como base que o
jornalismo não admite um estilo, mas vários. Cada órgão de comunicação social tem um
determinado estilo, como pensava Sousa (2001), na sua publicação intitulada “As notícias e
os seus efeitos”, ao considerar que cada órgão de comunicação social tem um determinado
estilo. Todavia, encontram-se elementos estilísticos comuns a vários órgãos jornalísticos.
Trata-se de uma reflexão alicerçada na alteração da Constituição de Moçambique, em
1990, que foi precedida pela assinatura do Acordo Geral de Paz no dia 4 de Outubro de 1992.
Este acordo veio marcar o fim de 16 anos de guerra civil que opunha as forças
governamentais e a Resistência Nacional de Moçambique (Renamo) e a implantação do
regime democrático e multipartidário.
O cenário da democracia permitiu que o Estado moçambicano abrisse um espaço para
o funcionamento das instituições do direito privado, possibilitando desta forma, à emergência
de novos actores, como são os casos de partidos políticos, empresas privadas, o que permitiu
uma maior abertura do mercado, o aumento acentuado do capital estrangeiro, aparecimento
massivo das organizações não-governamentais (ONG).
Outrossim, reside no facto da imprensa ter conquistado um espaço relevante na arena
política e sendo cognominados de quarto poder em paralelo aos outros três poderes: o poder
executivo, o legislativo e o judicial. Na verdade, os médios estabelecem uma relação
intrínseca e complementar entre os poderes acima referenciados. Outro factor que motivou
para esta pesquisa foi o facto de estar relacionado com a importância social, ideológica e
educativa que a imprensa desenvolveu na construção da cidadania activa e do Estado
democrático.
Uma outra razão não menos importante prende-se com os estudos sobre o contributo
da imprensa em Moçambique constituírem uma das áreas negligenciadas em pesquisas
sociais, em particular, no âmbito da ciência política, pois a literatura existente é predominante
do período colonial, ou seja, é uma literatura com teor eurocêntrico.
Assim, a pesquisa tem como titulo: “O contributo da imprensa na construção da
cidadania activa e do Estado democrático em Moçambique: caso do Semanário Savana entre
1994-2005”. Objectivo prende-se como a análise do contributo da imprensa na construção do
Estado democrático e da cidadania activa em Moçambique.
Jornal Msaho
Considerada uma das revistas literárias mais importantes do actual território
moçambicano, Msaho é uma folha de poesia cujo nome designa dança e música do povo
chope do sul da então colónia portuguesa. Com apenas um número publicado, em 1952, foi
fundada por Virgílio de Lemos, Reinaldo Ferreira e Augusto dos Santos Abranches. Ela se
propunha romper com os moldes coloniais que tentavam aprisionar a literatura produzida na
época, circunscrita ainda em um momento de tentativa de formação de uma conscientização
das características particulares do território do actual Moçambique.
Objectivos do Jornal Msaho
Msaho pretendia uma visão aberta, liberta de preconceitos e militâncias
estigmatizadas. A nossa militância era poética: fundia contenção e rigor, mas buscava
também as pulsões e sensações da poesia, ou seja, um corpo a corpo silabar com a linguagem
do desejo. (...) Portanto, Msaho, embora tenha tido um único número, foi precursora da
modernidade na poesia moçambicana. Foi ela quem apontou para a urgência da ruptura com
as práticas literárias existentes, até então, em Moçambique. (Lemos, 1999, p. 153).
Dessa forma, o projecto literário concebido objectivava não apenas voltar os olhos
para o que estava ocorrendo no mundo, mas tentar buscar uma espécie de isolamento, sob
uma dupla reflexão: voltar-se para dentro do actual território moçambicano, valorizar suas
culturas, ritmos e cores; e lançar-se para fora, observando as vanguardas artísticas e literárias
da época, como o dadaísmo e o surrealismo.
A poesia de Moçambique será uma poesia que se liberta de todas as amarras. E no seu
corpo interior, seu corpo e espírito, seu desejo, de olhos abertos, ela será uma poesia singular
sendo universal. Ela não poderá ser apenas uma poesia de militância e de protesto. (...) As
nações demoraram séculos a construir-se através do mundo. Aqui devemos aceitar as pontes
de respeito e ligação entre o português e as línguas maternas, respeito pelas culturas de cada
um dos povos, minorias e maiorias que constituem este xadrez étnico e cultural.
(Lemos, 2009, p. 604-605)
Essa importância do nome na própria concepção existencial das coisas se revela na
criação heteronímica do poeta, que, por conta da censura da época, precisou inicialmente
assinar seus poemas com outro nome: Duarte Galvão. Essa “teia de fugas” acaba se
complexificando e culmina na criação de diversos personagens - poeta que interagem entre si
e, algumas vezes (como é o caso do Duarte), elaboram poemas em parceria com o próprio
Virgílio, corroborando o desgarramento deles em relação a Lemos. É o caso do trecho do
poema abaixo, que reflecte sobre algumas das propostas poéticas e políticas da revista
Msaho.
Pani-africanismo
O pan-africanismo nasceu no início do século XX entre os negros de língua inglesa,
particularmente dos Estados Unidos e das Antilhas Britânicas. A primeira conferência pan-
africana foi organizada em Londres em 1900 por um advogado de Trinidad, Henry S.
Williams. Depois da primeira Guerra Mundial, ela se amplificou sob a iniciativa de Georges
Padmore e W. E. B. Dubois. Em sua ótica, a luta de um povo para sua independência
nacional reforçava a luta dos outros e vice- versa e era reforçada pela luta desses outros. Ou
seja, o regime colonial deveria ser combatido em conjunto e não isoladamente. A negritude,
posição intelectual e o pan-africanismo, posição política, convergia ao afirmar
respectivamente que todos os africanos tinham uma civi- lização comum e que todos os
africanos deviam lutar juntos. Nesse sentido, o movimento da negritude e o movimento do
pan-africanismo pertencem à africanidade no plano da acção (Maquet, 1967, p. 7-15).
Os negros apareciam desprovidos de um património cultural próprio, porque seus
antepassados trazidos da África chegaram “nus”, sem poder carregar nada com eles, até
porque eram “oriundos de um continente povoado de tribos selvagens e sanguinárias”.
Embora os especialistas considerassem com reserva e nuances essa visão simples, o conjunto
dos americanos brancos a considerava evidente. Aceitavam que seus compatriotas negros,
pelo fato de não possuírem nenhuma bagagem cultural legada por seus ancestrais, não tinham
consequentemente um passado criador de valores. Os escravizados eram evidentemente
descendentes de inúmeras gerações africanas, mas como no mundo animal essas gerações só
transmitiram o único bem preciso: a vida. O “resto”, isto é, as técnicas de produção dos bens,
as organizações sociais como a família, as crenças religiosas e mágicas, etc. era pobre,
rudimentar, viciado e sem progresso.
A Negritude
A negritude é uma atitude total de resposta a uma situação. Aimé Césaire, com
Léopold Sedar Senghor, Léon Damas e outros, cria o termo negritude e o define como
“consciência de ser negro, simples reconhecimento de um fato que implica aceitação –
assumir sua negritude, sua história e sua cultura”. E Senhor escreve: “É antes de mais nada
uma negação, mais precisamente a afirmação de uma negação”. É o momento necessário de
um movimento histórico: o recuso de assimilar-se, de se perder no outro. Mas como este
movimento é histórico, ele é ao mesmo tempo dialéctico, pois a recusa do outro é a afirmação
de si.
Essa afirmação de si diante da civilização ocidental conduziu esses intelectuais negros
vivendo na Europa a tomar consciência de uma civilização africana, apesar das diferenças
entre suas diversas heranças sociais. Assim, o conceito de negritude transcende as
particularidades étnicas e nacionais. É, segundo as palavras de Senghor, “o património
cultural, os valores e, sobretudo o espírito da civilização negro-africana”.
A negritude criticava a relação de dependência cultural que o colonizador tentava
restabelecer e dava fundamento à luta para a reconquista da independência africana. O exame
da produção discursiva dos escritores da negritude permite levantar três objectivos principais:
buscar o desafio cultural do mundo negro (a identidade negra africana), protestar contra a
ordem colonial, lutar pela emancipação de seus povos oprimidos e lançar o apelo de uma
revisão das relações entre os povos para que se chegasse a uma civilização não universal
como a extensão de uma regional imposta pela força mas uma civilização do universal,
encontro de todas as outras, concretas e particulares. Entre os três desafios que acabamos de
levantar, o que impressiona imediatamente por sua amplitude e pela variedade das disciplinas
mobilizadas à sua compreensão é a afirmação e a reabilitação da identidade cultural, da
personalidade própria dos povos negros.
Vida e obra de Escritores Moçambicanos no Período antes e Pós- independência
Escritor / Poeta Obra Ano
Rui de Noronha Surge et Ambula 1943
Noémia de Sousa Sangue Negro 1954
José Craveirinha Cela 1 1980
Rui Knopfli Mangas Verdes com Sal 1969
Luís Bernardo Honwana Nós Matámos o Cão -Tinhoso 1964
Mia Couto Terra Sonâmbula 1993

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