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UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS

FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS


CURSO DE GEOGRAFIA-LICENCIATURA

THIAGO FERREIRA MEDEIROS

A LUTA PELA PERMANÊNCIA NA TERRA NO ASSENTAMENTO


ALTEMIR TORTELLI “ESTRELA”, MUNICÍPIO DE SIDROLÂNDIA-MS

Dourados-MS

2022
THIAGO FERREIRA MEDEIROS

A LUTA PELA PERMANÊNCIA NA TERRA NO ASSENTAMENTO


ALTEMIR TORTELLI “ESTRELA”, MUNICÍPIO DE SIDROLÂNDIA-MS

Monografia apresentada ao Curso de


Geografia, da Faculdade de Ciências
Humanas, da Universidade Federal da Grande
Dourados (UFGD), como parte dos requisitos
para obtenção do grau de Licenciado em
Geografia.

Orientador (a): Profª. Drª. Márcia Yukari


Mizusaki

Dourados-MS

2022
THIAGO FERREIRA MEDEIROS

A LUTA PELA PERMANÊNCIA NA TERRA NO ASSENTAMENTO


ALTEMIR TORTELLI “ESTRELA”, MUNICÍPIO DE SIDROLÂNDIA-MS

Monografia apresentada ao Curso de


Geografia, da Faculdade de Ciências
Humanas, da Universidade Federal da Grande
Dourados (UFGD), como parte dos requisitos
para obtenção do grau de Licenciado em
Geografia.

Dourados-MS

2022
BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________________
Profª. Drª. Márcia Yukari Mizusaki (presidente e orientadora)

________________________________________________________
Profª. Ma. Clariana Vilela Borzone (membro titular)

________________________________________________________
Prof. Me. João Evaldo Ghizoni Dieterich (membro titular)
DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus filhos,


Guilherme, Jose Gabriel e Emanuel, e a
minha esposa Josiane. Dedico também à
assentada, dona de casa, pequena
produtora rural, camponesa, agente de
saúde e amorosa Mãe Veronice, e ao
assentado, pequeno produtor rural,
camponês, Professor de História e
amoroso Pai José, por serem meu
alicerce durante toda a minha vida.
AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, José Beltrão de Medeiros e Veronice Ferreira P. Medeiros,


pelo incentivo, auxílio, apoio, confiança, puxões de orelhas e forças dadas a mim
desde o início da minha graduação. Minha eterna gratidão e admiração.

A minha amada companheira Josiane Peixoto, pelo carinho e


companheirismo, que além de ser meu porto seguro, pude contar com o seu apoio,
que foi fundamental no desenvolvimento da pesquisa.

Aos meus filhos, Guilherme Peixoto Medeiros, Jose Gabriel Peixoto Medeiros
e Emanuel Peixoto Medeiros, pela compreensão, que prontamente entenderam a
importância da minha formação, pois precisei renunciar a vários momentos em
família para me dedicar aos estudos.

As famílias camponesas assentadas no Assentamento Estrela, sujeitos da


pesquisa, os quais dedicaram parte do seu tempo para conversar comigo e
responder aos meus questionamentos.

A minha sogra, Maria da Silva Peixoto, pelo incentivo e confiança.

Ao amigo e tio, Luiz da Silva Peixoto, por me ajudar nas conversas e nos
textos sobre assentamentos e reforma agrária.

A Profª. Drª. Lisandra Pereira Lamoso que me guiou no início do meu


trabalho.

A minha orientadora, a Prof.ª Drª. Márcia Yukari Mizusaki que teve paciência e
que me ajudou bastante a concluir este trabalho.

A todos os professores do curso de Geografia da UFGD, que foram tão


importantes na minha vida acadêmica.
RESUMO

Este estudo é resultado de uma pesquisa sobre a conquista e a luta pela terra e na
terra das famílias camponesas do Assentamento Estrela no município de
Sidrolândia, Mato Grosso do Sul. Neste estudo, procuramos analisar as experiências
de vida dos camponeses, as suas relações de trabalho, as memórias, as lutas e as
formas de resistências para na terra permanecerem. Para este estudo foi utilizado
como metodologia a pesquisa qualitativa, por meio de entrevista semiestruturada.
Através dela buscamos descrever a trajetória de luta das famílias camponesas, em
especial as lutas vividas pelas famílias camponesas no acampamento, na conquista
e permanência em seus lotes. No decorrer do texto foi feito um resgate da origem
dos camponeses, do papel do Estado enquanto fomentador na implementação de
políticas públicas destinadas ao Assentamento Estrela, das mudanças ocorridas na
vida dos camponeses a partir da conquista da terra e em como têm se dado as
formas de resistências pelos sujeitos que ali vivem e sobrevivem da terra e na terra.
Buscamos então, com este estudo, apontar que a luta dos camponeses não para
quando eles adquirem os seus lotes, pelo contrário, ela apenas se modifica, deixa de
ser a luta pela terra e se torna a luta na terra para nela permanecer.

Palavras chaves: Reforma Agrária; Assentamento Estrela; Conquista da terra;


Agricultura Camponesa; Resistência.
ABSTRACT

This study is the result of a research on the conquest and struggle for land and to
remain on the land of peasant families from the Estrela Settlement in the municipality
of Sidrolândia, Mato Grosso do Sul. In this study, we seek to analyze the life
experiences of peasants, their work relationships, memories, struggles and forms of
resistance to remain on the land. For this study, qualitative research was used as the
methodology, through semi-structured interviews. Through it we seek to describe the
struggle trajectory of peasant families, especially the struggles experienced by
peasant families in the encampment, in the conquest and permanence in their plots
of land. Throughout the text, it was made a survey of the origin of the peasants, the
role of the State as a promoter in the implementation of public policies aimed at the
Estrela Settlement, the changes that have taken place in the peasants' lives since
the conquest of the land and which forms of resistance were adopted by the subjects
who live there and survive on and from the land. We seek, with this study, to point out
that the peasants' struggle does not stop when they acquire their plots, on the
contrary, it just changes, it ceases to be the struggle for land and becomes the
struggle on the land to remain on it.

Keywords: Agrarian Reform; Estrela Settlement; Conquest of the land; Peasant


Agriculture; Resistance.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Planta geral do Assentamento Estrela com as divisões dos lotes-


Sidrolândia-MS……………………………………………………………….………....p. 55

Figura 2 – Acampamento São Pedro à beira da estrada…………………………..p. 57

Figura 3- Momento em que as famílias estavam montando os seus barracos no


Acampamento São Pedro………………………………………………………………p. 57

Figura 4- Barraco no Acampamento Bom Futuro da família camponesa Adoaldo e


Cicera………………………………………………………………………………….….p. 58

Figura 5, 6 e 7– Camponeses em frente às suas casas onde constam as placas


com os respectivos nomes dos seus sítios. Da esquerda para direita Deusvaldo e
Maria; Adoaldo e Cícera e José e Veronice…………………...……............……….p. 61

Figura 8 - Trator da Associação dos camponeses do Assentamento Estrela...…p. 68

Figura 9 - Plantação de Urucum do camponês Adoaldo Alves…………………….p.69

Figura 10 - Primeira colheita de Urucum feita pelo camponês Adoaldo Alves…...p.70

Figura 11 - Vista aérea do lote da família camponesa Adoaldo e Cicera………...p. 70

Figura 12 - Parte do lote da família camponesa Adoaldo e Cícera que foi arrendada
para o cultivo da monocultura………………….....................……………….……….p. 71

Figura 13 - Cultivo do milho no lote de um de seus vizinhos não pioneiros…..…p. 72

Figura 14 - Cultivo do milho no lote de um de seus vizinhos pioneiros…………..p. 72


Figura 15 - Denúncia de vários lotes no Assentamento “Estrela” serem de uma
mesma pessoa…………………….…………………………………….............……..p. 77

Figura 16 e 17- Gado leiteiro família camponesa Deusvaldo e Maria……...….…p. 83

Figura 18 e 19 - Gado leiteiro família camponesa José e Veronice………………p. 84

Figura 20 e 21 - Produção de queijo Família camponesa José e Veronice e Élio e


Débora, destinado ao consumo e venda do excedente…………………………….p. 84

Figura 22 - Resfriador de leite do Assentamento Estrela………………………..…p. 85


Figura 23- Plantio de Melancia no lote da família camponesa do José e
Veronice…………………………………………………………………………………..p. 87

Figura 24 e 25 - Colheita de abóbora, abacaxi e mandioca no lote da família


camponesa José e Veronice…………………………………………………………...p. 87

Figura 26 - Plantio de mandioca, maxixe e ao fundo uma pequena lavoura de


banana para o consumo no lote da família camponesa do Adoaldo e
Cicera……...............................................................................................................p.88

LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Utilização de terras no Mato Grosso do Sul - 1985………………..…..p. 28
Gráfico 2 - Utilização de terras no Mato Grosso do Sul - 1995/96………………..p. 29

Gráfico 3- Utilização de terras no Mato Grosso do Sul – 2006…………………….p.30

Gráfico 4- Utilização de terras no Mato Grosso do Sul - 2017………………….…p. 30

Gráfico 5 - Assentamentos criados em Mato Grosso do Sul 2001-2019…………p. 35

Gráfico 6- Ocupações de terras em Mato Grosso do Sul- (1988 a 2019…………p. 45

Gráfico 7 – Escolarização dos Camponeses do Assentamento Estrela- Sidrolândia-


MS………………………………………………………………...……………….……...p. 74

Gráfico 8- Números de famílias pioneiras e não pioneiras, residentes e não


residentes. Assentamento Estrela- Sidrolândia-MS.……………………………...…p. 75

Gráfico 9 - Produção animal dos camponeses do Assentamento Estrela-


Sidrolândia-MS.......................................................................................................p. 80

Gráfico 10 – Renda e trabalho. Assentamento Estrela- Sidrolândia- MS……..…p. 81

Gráfico 11 – Produtos comercializados pelas famílias entrevistadas (%).


Assentamento Estrela- Sidrolândia- MS…………………...………………………....p. 86

Gráfico 12 – Número de famílias e ano que acessaram o PRONAF. Assentamento


Estrela- Sidrolândia- MS……………………………………………………….….....…p. 93
LISTA DE MAPAS

Mapa 1- Município de Sidrolândia- MS…………………………………………..…...p. 48


Mapa 2 –Sidrolândia-MS: Projetos de Assentamentos da Reforma Agrária-2022.p.53

LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Estrutura Fundiária – MS- 1985 e 1995/96………………………....…....p.24
Tabela 2 - Estrutura Fundiária – MS- 2006 e 2017………………….……….………p.25

Tabela 3 - Estrutura Fundiária – Sidrolândia-MS- 2006 e 2017...………………....p.50


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AAGRIFAT= Associação dos Agricultores familiares do Assentamento Altemir Tortelli
“Estrela”
AGRAER= Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural.
APROLAT= Associação dos produtores de leite e/ou hortifrutigranjeiros do
Assentamento Altemir Tortelli “Estrela”.
CAND= Colônia Agrícola Nacional de Dourados.
CONTAG= Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e
Agricultoras Familiares.

CUT= Central Única dos Trabalhadores.

CPT= Comissão Pastoral da Terra.

FAF= Federação da Agricultura Familiar.

FETAGRI= Federação dos Trabalhadores na Agricultura.

FETRAF= Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura


Familiar do Brasil.

FHC= Fernando Henrique Cardoso.

IBGE= Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

INCRA= Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.

MDA= Ministério do Desenvolvimento Agrário

MP=Medida Provisória.

MS= Mato Grosso do Sul.

MST= Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

NMRF=Núcleo Municipal de Regularização Fundiária.

PA= Projeto Assentamento.

PAA= Programa de Aquisição de Alimentos .

PNAE= Programa Nacional de Alimentação Escolar.

PNCF= Programa Nacional de crédito fundiário.


PNRA= Plano Nacional de Reforma Agrária.

PRONAF=Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar.

STRs=Sindicato dos Trabalhadores Rurais

SENAR= Serviço Nacional de Aprendizagem Rural

SIPRA= Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária.

UFGD= Universidade Federal da Grande Dourados


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................... p.16

1. A QUESTÃO AGRÁRIA NO MATO GROSSO DO SUL .................................. p. 20

1.1. Processo histórico de concentração de terras em Mato Grosso do Sul.........p. 20

1.2. Uso da terra no Mato Grosso do Sul…………………………….………..…......p. 27

1.3. Aspectos históricos da luta pela terra em Mato Grosso do Sul.......................p. 32

1.4. Criação dos assentamentos no Mato Grosso do Sul 2001-2019……............p. 35

1.5. Ocupação de terras em Mato Grosso do Sul……………………………......….p. 44

2. HISTÓRIA E ESTRUTURA AGRÁRIA DO MUNICÍPIO DE


SIDROLÂNDIA-MS…………..……………………...................................................p.48

3. CARACTERIZAÇÃO E ORGANIZAÇÃO TERRITORIAL DO ASSENTAMENTO


ESTRELA...............................................................................................................p. 54

3.1. Localização e caracterização do Assentamento Estrela.................................p. 54

3.2. As lutas pela conquista da terra: De acampados a assentados...………....... p. 56

3.3. A conquista da terra e o início de alguns problemas para nela


permanecer…………...…………………………….…………………………..……....p. 63

3.4. Algumas soluções adquiridas pelos camponeses para evitar as evasões e se


manterem na terra que tanto lutaram para conquistar....................….…….……...p. 66

4. CARACTERÍSTICAS SOCIOECONÔMICAS DAS FAMÍLIAS CAMPONESAS DO


ASSENTAMENTO ESTRELA................................................................................p. 73

4.1. Sexo, idade, escolaridade e famílias pioneiras e não pioneiras.....................p. 73

4.2. Renda, trabalho, produção e destino da produção.........................................p. 80

4.3. Programas de créditos acessados pelas famílias camponesas durante a


trajetória de vida e luta no Assentamento Estrela..................................................p. 88

CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................….……p.98
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................p. 101

ANEXOS..............................................................................................................p. 108
16

INTRODUÇÃO
Atualmente, a agricultura camponesa vem perdendo cada vez mais espaço
para o agronegócio, mesmo ela tendo grande importância na produção alimentar, na
geração de renda e empregos do nosso país. De acordo com o Censo Agropecuário
de 2017, 3.897.408 de estabelecimentos foram classificados como agricultura
familiar, representando assim 77% dos estabelecimentos agropecuários do país,
mas, esses estabelecimentos ocupam apenas uma área de 81 milhões de hectares,
sendo o equivalente a apenas 23% da área total dos estabelecimentos
agropecuários brasileiros. Enquanto isso, as propriedades consideradas não
familiares ocupam uma área de 270.398.732 ha, o equivalente a 77% da área total.
Além disso, segundo o Censo Agropecuário de 2017, a agricultura familiar
camponesa colabora com 23% do total do valor da produção agropecuária nacional,
mesmo ela estando em uma área muito menor que a área considerada não familiar,
ou seja, áreas em que temos a produção voltada praticamente para o mercado
internacional de commodities (IBGE, Censo Agropecuário, 2017).
Contudo, ao entendermos que esse modelo de agricultura familiar camponesa
tem grande importância na produção alimentar, na geração de renda e empregos no
nosso país, devemos entender também que esse modelo de agricultura só foi e
tornou-se possível por meio da luta pela terra de muitas famílias camponesas. E,
famílias camponesas essas que tiveram e continuam tendo grande contribuição no
processo de formação do território brasileiro e sul mato-grossense.
Para isso, devemos ressaltar a histórica marginalização, desigualdade e
exclusão, a qual foram e são submetidas essas famílias camponesas, pois com a
modernidade dos equipamentos e abandono do Estado perante os camponeses e
camponesas, a luta pela permanência na terra se torna cada dia mais difícil.
Sendo assim, o interesse pelo tema da pesquisa surgiu por me situar como
filho de família camponesa que foi sem-terra e que se tornou assentada e, durante a
graduação senti o desejo de aprofundar as minhas reflexões sobre a Questão
Agrária, e assim conhecer os desafios enfrentados pelos camponeses para
conquistar a terra e nela permanecer.
Dessa forma, a partir da Geografia comecei a entender um pouco mais sobre
a dinâmica da reforma agrária no nosso país e pude comprovar como a reforma
agrária foi e é importante para o nosso país, tanto em questões sociais, econômicas
e de território.
17

A Geografia, portanto, possibilitou que eu passasse a olhar para o


Assentamento Estrela, Sidrolândia, MS, com outros olhos e me vi na obrigação de
pesquisar mais a fundo a Questão Agrária para assim eu poder escrever a minha
monografia sobre este tema, e isso foi impulsionado tanto pelo fato dos meus pais
viverem no/do Assentamento Estrela e ter acompanhado todas as suas lutas pela
conquista e permanência na terra, quanto pela relação que tenho com alguns
moradores de lá.
Portanto, a escolha deste tema se justifica pela necessidade de aprimorar os
conhecimentos acerca do processo de Reforma Agrária, pois não podemos entender
a reforma agrária como uma mera distribuição de terras. E para isso devemos
considerar que a situação agrária no Brasil e no Mato Grosso do Sul tem na sua
origem a má distribuição de terras e de créditos, onde o Estado sempre privilegia os
grandes latifundiários. No entanto, a fim de diminuir essa desigualdade de acesso à
terra, nascem as organizações de movimentos socioterritoriais1 com o objetivo de
redistribuir essas terras que estavam nas mãos de poucos, e assim proporcionar o
acesso a ela para quem quer viver na terra e da terra. E, é a partir daí que nascem
as ocupações e acampamentos, e, posteriormente vem a conquista dos
assentamentos, e o Assentamento Estrela em Sidrolândia-MS, recorte espacial de
análise desta monografia foi um deles.
A partir do tema, vamos apresentar a estrutura agrária de um assentamento,
sua organização social e a luta diária das famílias camponesas para na terra
permanecer.
Como objetivo principal, iremos buscar a compreensão em torno da formação
do Assentamento Estrela, e as lutas das famílias camponesas pela permanência na
terra e sobrevivência da terra. Como objetivos específicos propomo-nos a identificar
as trajetórias de lutas das famílias assentadas para entrar na terra e quais foram as
suas estratégias para nela permanecer; resgatar a origem das famílias e suas
formas de organização do trabalho; analisar o papel do Estado na implementação de
políticas públicas destinadas ao Assentamento Estrela; compreender qual foi a
mudança socioeconômica na vida dos assentados; e por fim compreender como têm
se dado as formas de resistência pelos sujeitos que ali vivem.

1
O movimento territorializado ou socioterritorial está organizado e atua em diferentes lugares ao mesmo
tempo, ação possibilitada por causa de sua forma de organização, que permite espacializar a luta para
conquistar novas frações do território, multiplicando-se no processo de territorialização. (FERNANDES, 2000. p.
68)
18

Para realização deste trabalho, iniciamos com uma pesquisa teórica sobre a
Questão Agrária no estado de Mato Grosso do Sul e, especificamente, em
Sidrolândia. Iniciando a discussão sobre a concentração de terras, a reforma agrária
e a luta pela terra, a fim de proporcionar um maior embasamento ao trabalho, de
forma que a base teórica, servisse de alicerce para o campo. De acordo com
LACOSTE, (1985, p. 20), conforme citado por ALENTEJANO & ROCHA-LEÃO
(2006.p. 57,58)

[...], o trabalho de campo como pesquisa em grande escala que precisa,


necessariamente, ser articulada com outras escalas: “O trabalho de campo
para não ser somente um empirismo, deve articular-se à formação teórica
que é, ela também, indispensável. Saber pensar o espaço não é colocar
somente os problemas no quadro local; é também articulá-los eficazmente
aos fenômenos que se desenvolvem sobre extensões muito mais amplas.

Assim sendo, além das leituras bibliográficas sobre a Questão Agrária,


fizemos a análise documental do mapa do assentamento, dados do IBGE, dados do
INCRA, dados do DataLuta e dos arquivos pessoais dos entrevistados, além da
pesquisa de campo.

A pesquisa de campo foi realizada no Assentamento Estrela na cidade de


Sidrolândia-MS, entre os meses de novembro e dezembro de 2021. Para esta
pesquisa usamos como procedimento metodológico a pesquisa qualitativa.
Realizamos entrevista semiestruturada, que possibilitou aos entrevistados discorrer
mais livremente sobre o tema abordado, expondo as suas vivências e lutas.

Esse roteiro foi aplicado a 18 famílias camponesas, sendo uma das famílias
não pioneira no assentamento. O critério de escolha das famílias se deu pela
proximidade com algumas famílias e também busquei conversar com famílias que
antes viviam da produção camponesa e passaram a viver da produção capitalista,
ou seja do agronegócio, a fim de tentar entender quais foram os motivos que os
levaram à mudança na produção do lote.

A pedido de alguns entrevistados, optamos por trocar seus nomes


verdadeiros por fictícios, para assim preservarmos suas privacidades.

Durante a entrevista, foram levantados dados socioeconômicos (escolaridade,


idade, sexo, estado civil, renda, composição familiar etc.); também foi realizado um
19

levantamento histórico da sua trajetória de vida, desde o acampamento até o


presente momento.

A entrevista serviu como base para o entendimento de como as famílias


camponesas do Assentamento Estrela, que não tiveram acesso a nenhum recurso
financeiro no início e que também não receberam nenhuma ajuda do governo no
início da criação do assentamento, resistiram e resistem até hoje na terra.
20

1. A QUESTÃO AGRÁRIA NO MATO GROSSO DO SUL

De acordo com o IBGE (2010), o estado de Mato Grosso do Sul, possui uma
área de 357.147,994 km², e uma população estimada de 2.868.279 pessoas,
representando, portanto, uma baixa densidade demográfica (6,86 habitantes por
quilômetro quadrado), ficando em 21º lugar no ranking do país no quesito população.
E mesmo o nosso estado tendo uma grande extensão territorial possui apenas
setenta e nove municípios, ou seja, poucos municípios e grandes propriedades
rurais, e assim atingindo de índice Gini 0,867 em concentração de terras do país,
ficando entre os estados com mais desigualdades fundiárias (IBGE, Censo
Agropecuário, 2017).

E essa alta concentração de terras está ligada ao fator histórico de Mato


Grosso do Sul, que sempre esteve pautado em cima da criação de latifúndios seja
expulsando os povos indígenas de suas terras originárias e/ou excluindo as famílias
camponesas do campo, e com isso aumentando os conflitos agrários e por fim, se
consolidando em uma economia rural e excludente.

1.1. Processo histórico de concentração de terras em Mato Grosso do


Sul

De acordo com Fabrini (1996) o processo histórico de posse e concentração


de terras no que atualmente se constitui o Mato Grosso do Sul, foi marcado
inicialmente pela disputa da posse dos territórios entre os países europeus (Espanha
e Portugal).

A disputa pela posse das terras do sul de Mato Grosso do Sul originou-se
em um passado distante, iniciando-se praticamente com a chegada dos
europeus ao continente americano, quando (Portugal e Espanha) passaram
a disputar entre si o domínio desta terra, procurando deslocar a linha
divisória de Tordesilhas, a fim de ampliar seu território. Em l750, o Tratado
de Madri, que levou em consideração o princípio do usucapião, garantia a
posse da terra àquele que tivesse efetivamente ocupado. No Tratado de
Santo Ildefonso, em 1777, portugueses e espanhóis chegaram a um acordo
sobre a fronteira de Mato Grosso do Sul com o Paraguai, quando foi
revalidada a lindeira de Igurey. (FABRINI, 1996, p. 23).

Logo após a colonização e disputa por posse dos territórios feita pelos
europeus, ocorreu a disputa de território do Brasil com o Paraguai, por meio da
Guerra do Paraguai:
21

Em 1815 com a independência do Paraguai do Vice-Reino do Prata,


liderada por D. Gaspar Garcia de Francia, entra em vigor, no Paraguai, uma
política de isolamento que permitiu o desenvolvimento das suas forças
produtivas e militares. [...] O desenvolvimento dos transportes, com a
construção de uma ferrovia e o monopólio da navegação interior, permitiu ao
Estado controlar todo o comércio de exportação e importação. [...] chega ao
governo do Paraguai Carlos Antônio Lopes e abandona a política de
isolamento adotada por Francia, procurando criar condições para
proporcionar a expansão paraguaia e para que suas mercadorias pudessem
entrar no Uruguai, Argentina e Brasil, principalmente na província de Mato
Grosso, sendo para isso necessário o controle das vias fluviais e a
ocupação das terras do atual Mato Grosso do Sul, onde os limites das
fronteiras não possuíam a dimensão atual. A Tríplice Aliança entre Uruguai,
Argentina e Brasil, financiada por banqueiros ingleses, tomou providências,
em lugar da Inglaterra, para impedir a expansão do Paraguai. A partir de
l865, a fronteira de Mato Grosso do Sul com o Paraguai foi palco de
operações de guerra, onde praticamente não existia resistência brasileira, a
não ser o pequeno destacamento da Colônia Militar de Dourados, formado
por 16 homens, que foram atacados por forças paraguaias com o objetivo
de ocupar a província de Mato Grosso, sendo destruído neste mesmo ano e
restabelecido somente com o final da guerra. [...] após a destruição da
colônia, as terras do sul de Mato Grosso do Sul, apropriadas por Martins
Urbieta em nome do governo paraguaio, foram transferidas à Madame Elisa
Lynch, que as adquiriu por uma quantia de 155.000 pesos entre outros
bens, em dezembro de l865. [...] Desde a Retirada de Laguna até 1870,
data final da guerra, ocorreram muitas batalhas nos variados pontos do
Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai. (FABRINI, 1996, p. 25 e seg).

E nesse processo de povoamento do sul de Mato Grosso, Almeida (2003, p.


110) destaca que, no período da Guerra do Paraguai ocorreu uma estagnação no
povoamento do estado, principalmente na parte do Sul do estado.

Basta lembrarmos que a partir de 1856 o sistema comercial da província de


Mato Grosso foi articulado a partir da navegação do rio Paraguai até
Corumbá, única via de comunicação entre as cidades platinas e a capital da
Província, Cuiabá. Consequentemente, durante dois anos (1864-1866), a
região meridional do Mato Grosso viveu uma fase de abandono.

Com o fim da Guerra do Paraguai, foi firmado o tratado de limites entre Brasil
e Paraguai, e a partir daí se deu início à demarcação de terras no Brasil feita através
da Comissão de demarcação com Rufino Eneas Gustavo Galvão “Barão de
Maracaju” no comando. Sendo assim, foi através dessa Comissão de demarcação
que Tomaz Laranjeira tomou conhecimento das terras devolutas e dos ervais no Sul
do estado de Mato Grosso e graças à influência de Rufino Eneas Gustavo Galvão, o
“Barão de Maracaju” e do General Antônio Maria Coelho (primeiro governador de
Mato Grosso), em 1882 Tomaz Laranjeira toma posse do monopólio de terras e dos
ervais da região, e junto com a família Murtinho, amplia a sua área arrendada
chegando a mais de 3 milhões de hectares em terras devolutas da União voltadas
para a exploração de erva-mate, terras essas que faziam parte dos territórios dos
22

Guarani e Kaiowá, contribuindo assim para uma grande concentração de terras por
parte da Cia Mate Laranjeira. (FABRINI, 1996, p. 32-33).

Além desse controle dos territórios pela Cia Mate Laranjeira que a levou a ter
uma receita cinco vezes maior que a do estado, ela também era a maior credora e
tinha fortes influências e poder de interferências nas decisões políticas, econômicas
e sociais do estado, chegando, por exemplo, a questionar a vinda dos gaúchos para
o Sul do estado de Mato Grosso, como Fabrini (1996) destaca:

Fixaram-se na terra, mas contra a sua permanência existiam os indígenas e


a empresa monopolista Mate Laranjeira, que os considerava intrusos, já que
representavam uma ameaça de limitação da área de exploração, pois as
reivindicações dos migrantes pela posse eram constantes, mas raramente
seus requerimentos de terra junto ao Estado obtinham despacho favorável
em vista do protesto da Cia Mate Laranjeira. Isso dificultou a ocupação e o
povoamento da região. (FABRINI, 1996, p. 35).

Em 1889 tivemos a Proclamação da República e com ela veio a


descentralização do poder da União sobre as terras, e a política fundiária ficou a
cargo dos estados resolverem. A partir daí as oligarquias regionais começaram a pôr
em prática a política de concentração de terras:

Com a Proclamação da República, a política fundiária passou para a


competência dos Estados. A descentralização do poder da União com a
República transferiu o poder sobre a terra para as oligarquias regionais, que
passam a decidir sobre a sua propriedade dentro do domínio estadual,
monopolizando a sua posse e colocando em prática a política de
concentração, quando ocorre a transferência das terras devolutas do Estado
através da venda e arrendamento a grandes fazendeiros e empresas
capitalistas que atuam neste setor. [...] A concessão gratuita de terras soaria
como uma atração para trabalhadores despossuídos de terra de outras
regiões, política que o Estado abandonou, deixando por conta dos
colonizadores particulares, cujo empreendimento está exclusivamente
voltado para o lucro, impedindo a intensificação do processo migratório de
trabalhadores que não possuíam recursos para comprar terra. (FABRINI,
1996, p. 29-31).

Foi nesse momento então que, os políticos do norte do estado impetraram


uma política de latifúndio na região sul do estado, pois, havia uma rivalidade política
entre o norte e o sul de Mato Grosso, e por causa dessa rivalidade acabou-se
criando uma estagnação no crescimento demográfico no sul do estado.

No ano de 1909, um deputado do Norte, João da Costa Marques,


apresentou um projeto à Assembléia Legislativa Estadual, autorizando a
venda de extensas áreas de terras, por preço mínimo, na zona fronteiriça;
com o que se criaria imensos latifúndios, que dificultariam sobremaneira o
povoamento do Sul, que para o deputado e autor do projeto, seria um
grande mal para o Norte no futuro. (LIMA, 1978, p. 156 apud FABRINI,
1996, p. 32).
23

Outro processo que colaborou para a concentração de terras no estado de


Mato Grosso do Sul se deu através da (CAND) Colônia Agrícola Nacional de
Dourados, entre 1943-1946, sendo este um projeto do governo federal, da Era
Vargas, que visava a formação de pequenas propriedades, sendo denominado de
“Marcha para Oeste”.

Inicialmente, na política de nacionalização das fronteiras impetrada pelo


Estado Novo de Vargas, teremos, na primeira metade do século XX, uma
política de colonização estatal voltada a estimular a formação de pequenas
propriedades no Sul de Mato Grosso, como exemplo temos a CAND –
Colônia Agrícola de Dourados. (ALMEIDA, 2003, p. 113).

E assim, após todos esses fatos que estimularam as criações de latifúndios


no Sul de Mato Grosso, tivemos em 1977 a divisão do estado de Mato Grosso,
surgindo então a partir daí o estado de Mato Grosso do Sul. Não podemos esquecer
que esse movimento foi feito pelos políticos e grandes proprietários de terras da
parte Sul do estado de Mato Grosso.

[...] A estrutura agrária calcada na concentração fundiária engendrou, ao


longo do século passado, a formação da classe dominante
sul-matogrossense: os grandes proprietários rurais. Poder-se-ia dizer que o
seu fortalecimento econômico, aliado ao isolamento físico em relação ao
centronorte do antigo Mato Grosso, levou-a a postular a criação de um
estado para si. [...]. Por isso, mesmo quando conquistou espaço significativo
naquele governo, que, aliás, não considerava seu, ela não se viu realizada.
Sua completa realização de classe só ocorreu com a concretização de um
sonho, um objetivo histórico do qual ela mais se orgulha: a criação de Mato
Grosso do Sul. (BITTAR, 1997, p. 210 apud ALMEIDA, 2003, p. 115).

E assim, o poder político de Mato Grosso do Sul formado por proprietários de


terras teve o seu início na fundação do estado em 1977 e durou até o ano de 1998,
com a vitória do ex-governador do estado de Mato Grosso do Sul, do Partido dos
Trabalhadores (PT) José Orcírio Miranda dos Santos “Zeca do PT”.

Entretanto, mesmo com a vitória do Zeca do PT em 1998, o controle político


por parte dos latifundiários continuou, pois a base política da câmara estadual e
federal se constituía praticamente por representantes das famílias tradicionais
possuidoras de terra no estado, e assim ficava difícil para o governo do estado pôr
em prática as políticas de reforma agrária necessárias para diminuir a concentração
de terras no estado.

Infelizmente, este cenário de controle político exercido pelo latifúndio sul


mato-grossense acabou sofrendo poucas mudanças, apesar de o resultado
das eleições, de 1998, ter colocado no Governo do Estado um candidato do
PT – Partido dos Trabalhadores. Esta realidade é duradoura em virtude da
24

permanência, no Legislativo estadual e federal e nos Governos Municipais,


de representantes das tradicionais oligarquias, nas quais destacam-se as
famílias: Coelho; Pedrossian; Derzi; Barbosa Martins; Miranda; Tebet;
Schimidt; Dias, dentre outras. (ALMEIDA, 2003, p. 115).

Portanto, sem uma política de reforma agrária impetrada pelo governo do


estado, Mato Grosso do Sul acabou ganhando “o título de Estado latifundiário dado
pelos trabalhadores rurais”. (ALMEIDA, 2003, p. 117)

Essa concentração de terras nas mãos de poucos, gerou no estado de Mato


Grosso do Sul, como descreve Almeida (2003, p. 116), “graves problemas sociais,
especialmente o conflito agrário como reflexo da luta contra o elevado nível de
concentração de renda, aliado à crescente concentração de terras”.

E para demonstrar essa elevada concentração de terras Almeida (2003) nos


apresenta uma tabela, onde constam os dados da estrutura fundiária de Mato
Grosso do Sul baseados nos Censos Agropecuários de 1985 e 1995/96. Para
entendermos melhor a situação de Mato Grosso do Sul nos anos que a autora faz
alusão apresentamos, portanto, a tabela 1 com os dados da autora.

Tabela 1 - Estrutura Fundiária – MS- 1985 e 1995/96

Grupo Censo Agropecuário (1985) Censo Agropecuário (1995-96)


de
classes Nº de (%) Área (ha) Área Nº de (%) Área (ha) Área
(há) Estabele % Estabele (%)
cimentos cimentos

Menos 14.916 27.4 64.490 0,2 9.170 18.6 39.681 0,1


de 10

10 a 18.750 34.4 670.575 2.2 17.753 36 637.163 2,1


menos
de 100

100 a 14.674 26.8 5.406.315 17.3 15.423 31.4 5.992.676 19,4


menos
de
1000

Acima 6.215 11.4 24.967.434 80.3 6.902 14 24.273.252 78,4


de
1000

Total 54.555 100 31.108.814 100 49.248 100 30.942.772 100

Fonte: Censos Agropecuários, 1985-1995/96 apud ALMEIDA, 2003, p. 117


25

A tabela 1 nos evidencia que, no censo de 1985 os estabelecimentos com


menos de 10 ha representavam 0,2% da área ocupada sendo o equivalente a
14.916 estabelecimentos. Já no censo de 1995/96 houve uma redução no número
de estabelecimentos, caindo para 9.170 passando a ocupar uma área de 0,1%.
Verifica-se, dessa forma, uma redução considerável do número de estabelecimentos
menores que 10 ha. Podemos destacar ainda que, no período compreendido pelo
Censo 1995/96, a área média dos estabelecimentos rurais no Mato Grosso do Sul
era de 628,3 ha, enquanto a área média dos estabelecimentos rurais no Brasil era
73,1 ha, justificando, portanto, o título de estado latifundiário. Nessa mesma época,
houve também uma drástica diminuição da condição de arrendatário, posseiro e
parceiro no Mato Grosso do Sul, justificando, portanto, a queda dos
estabelecimentos com menos de 100ha. (ALMEIDA, 2003, p. 116-117).

Contudo, em 2021, a história continua a mesma. Com base no Censo


Agropecuário de 2017, Mato Grosso do Sul está em quarto lugar entre os estados
com mais desigualdade de acesso à terra e concentração de terras do Brasil. Sendo
que, a área média do estabelecimento agropecuário no Brasil era de 69 ha,
enquanto Mato Grosso do Sul apresentou uma média de 430 ha, ou seja, a
diferença entre o nosso país e o nosso estado é gritante. (IBGE, Censo
Agropecuário, 2017).

E para exemplificar essa concentração de terras, elucidamos a tabela 2 com


os dados do censo de 2006 e 2017.

Tabela 2 - Estrutura Fundiária – MS- 2006 e 2017

Grupo Censo Agropecuário (2006) Censo Agropecuário (2017)


de
classes Nº de (%) Área (ha) Área Nº de (%) Área (ha) Área
(há) Estabele (%) Estabele (%)
cimentos cimentos

< 10 (ha) 13.398 20,7 64.819 0,2 18.628 26,2 95.376 0,3

10 a 24.830 38,6 563.436 1,8 26.271 37,0 565.534 1,9


– 50(ha)

50 a 4.447 6,9 310.264 1,0 4.346 6,2 303.339 0,9



100(ha)
26

100 a 10.539 16,3 2.675.999 8,8 10.100 14,2 2.573.606 8,4



500(ha)

500 a 4.689 7,2 3.315.350 4.774 6,8 3.389.200 11,1


1000 (ha) 11,0

+ 1000 6.661 10,3 23.345.109 77,2 6.843 9,6 23.622.125 77,4


(ha)

Total 64.564 100 30.274.975 100 70.962 100 30.549.179 100

Fonte: IBGE – Censos Agropecuários, 2006-2017

Na tabela 2, podemos observar que, as áreas que tiveram um aumento


significativo foram as áreas de 10 a 100 ha em comparação com os Censos de
1985-1995/96. Nos Censos Agropecuários de 1985 e 1995/96 as áreas de 10 a 100
ha ficaram em média com 653.869 ha, enquanto no Censo Agropecuário de 2017 as
áreas de 10 a 100 ha ficaram com 964.249 ha.

No entanto, se relacionarmos os estabelecimentos de 10 até 100 ha com os


mais de 100 ha, vemos que temos uma grande concentração de terra em
estabelecimentos maiores de 100 ha, principalmente os com mais de 1000 ha, pois
enquanto os estabelecimentos de 10 até 100 ha concentram uma área de apenas
964.249 ha divididos em 49.245 estabelecimentos, os estabelecimentos com mais
de 100 ha concentram 29.584.931 ha, isso dividido em apenas 21.717
estabelecimentos. Sendo que, a maior parte dessa concentração de terras está nos
estabelecimentos com mais de 1000 ha registrando uma concentração de
23.622.125 ha de área divididos em apenas 6.843 estabelecimentos, e isso nos faz
pensar ainda mais no quanto a distribuição de terras no nosso estado é desigual.

Diante disso, o cenário do estado de Mato Grosso do Sul não está muito
diferente do visto no censo de 1985 e 1995/96, pois, mesmo com todas as lutas pela
terra, ocupações e criações de assentamentos que tivemos no estado até o ano de
2017, data do último censo agropecuário, as áreas com até 100 ha continuam ainda
tendo pouca representação.

Contudo, para tentar diminuir essa desigualdade e concentração de terras em


Mato Grosso do Sul, a luta pela terra e pela reforma agrária se fez necessária, ou
seja, foi e é, através dos movimentos socioterritoriais, que as ocupações,
27

acampamentos e assentamentos foram e são criados no estado de Mato Grosso do


Sul, sendo o MST como um dos primeiros movimentos socioterritoriais aqui no nosso
estado a lutar pela desconcentração fundiária.

Foi através do MST que muitos assentamentos foram criados no estado de


Mato Grosso do Sul, pois, desde a sua fundação o MST luta por três objetivos,
sendo eles: “Lutar pela terra; lutar por Reforma Agrária; lutar por uma sociedade
mais justa e fraterna” (MST, 2022).

E através destas lutas pela terra e pela reforma agrária, foram criados até
2017 em Mato Grosso do Sul, data da última atualização do INCRA sobre os
assentamentos da reforma agrária, 204 assentamentos, sendo assentadas 27.764
famílias e desapropriados e ocupados 716.212,19 ha. Mas, mesmo assim, o estado
continua sendo composto por grandes propriedades e apesar da criação dos
assentamentos, Mato Grosso do Sul ainda continua com grande concentração de
terras.

[...], a concentração de terras no Sul de Mato Grosso do Sul foi resultado da


política de apropriação promovida pelo Estado e não necessariamente
resultado da expropriação e aglutinação de pequenas propriedades no
processo de expansão capitalista de produção. A estrutura fundiária no Sul
de Mato Grosso do Sul “nasceu” concentrada, o que se desdobrou em
conflito e exclusão dos camponeses da terra. A apropriação capitalista da
terra comandada por uma oligarquia regional dificultou a expansão da
pequena propriedade no Sul de Mato Grosso do Sul, pois o Estado, desde
passado distante, promoveu a transferência de terras públicas por meio da
venda ou arrendamento aos grandes proprietários. A atuação do Estado,
somada às ilegalidades na apropriação da terra, proporcionou estrutura
fundiária altamente concentrada. (FABRINI, 2019, p. 151-152).

Portanto, por mais que tenham sido conquistados vários assentamentos no


nosso estado, ainda continuamos sendo um dos estados com a maior concentração
de terras do país, e isso se dá pelo fato, da concentração de terras no nosso estado
estar sempre ligada ao fator histórico de formação de latifúndio, e assim, portanto,
dificultando a expansão da pequena propriedade e consequentemente excluindo as
famílias camponesas de suas terras.

1.2. Uso da terra no Mato Grosso do Sul

Em relação à utilização das terras no Mato Grosso do Sul, esse monopólio de


terras está relacionado à forma que foi explorada a terra, desde a época em que
28

Mato Grosso do Sul ainda pertencia ao estado de Mato Grosso, onde historicamente
a pecuária foi desenvolvida de forma extensiva. (ALMEIDA, 2003, p. 118).

Como nos diz Fabrini (1996) “a vocação do estado de Mato Grosso do Sul”
que é a pecuária, se consolida com a construção da Ferrovia Noroeste do Brasil
financiada por capitalistas franceses e belgas.

A construção da Ferrovia Noroeste do Brasil é o fato que consolida a


verdadeira "vocação" de Mato Grosso do Sul e que acaba provocando
transformações na pecuária, principalmente nas áreas próximas aos trilhos
da ferrovia, além de outras transformações na economia do Estado. [...],
Mato Grosso do Sul assume sua verdadeira "vocação", que, em vez de
diversificar a sua produção, exportaria gado bovino em pé. É neste sentido
que a pecuária do Estado passa a desenvolver-se e, com ela, a
concentração de terra. (FABRINI, 1996, p. 40-41).

Portanto, somos um estado marcado pelo desenvolvimento capitalista, que


buscou na pecuária um meio de justificar a grande concentração de terras. E para
demonstrar isso, elucidamos 4 gráficos com os dados dos censos de 1985, 1995/96,
2006 e 2017, em que neles podemos constatar as grandes parcelas de terras
voltadas para as pastagens.

Gráfico 1 - Utilização de terras no Mato Grosso do Sul – 1985

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário-MS-1985. Org.: Medeiros, 2021.


29

Gráfico 2 - Utilização de terras no Mato Grosso do Sul - 1995/96

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário-MS-1995/96. Org.: Medeiros, 2021.

Ao analisar os gráficos 1 e 2 podemos ver claramente a predominância do


uso da terra para pastagens, sendo no censo de 1985, 70,5% da área e no censo de
1995/96, 70,8%, constatando, portanto, o que Almeida (2003) nos diz.

Esse monopólio da terra em Mato Grosso do Sul está diretamente


relacionado à forma de exploração, onde a pecuária foi historicamente
desenvolvida em moldes extensivos, situação de tal modo extremada que,
atualmente, o próprio INCRA vem denunciando o baixo índice de
produtividade das fazendas do Estado, num claro diagnóstico da prática
conhecida como gado para esconder a terra. (ALMEIDA, 2003, p. 118).

Nesse mesmo contexto, elucidamos os gráficos 3 e 4 do Censo Agropecuário


de 2006 e 2017, para demonstrar que, mesmo com todos os conflitos agrários,
criações dos assentamentos e lutas pela terra, Mato Grosso do Sul ainda utiliza as
suas terras no mesmo molde de 1985-1995/96, ou seja, ainda continua sendo um
estado pautado na concentração fundiária que se dá através dos moldes da
pecuária, e agora nos moldes das lavouras voltada para a produção e exportação de
commodities.
30

Gráfico 3- Utilização de terras no Mato Grosso do Sul – 2006

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário-MS-2006. Org.: Medeiros, 2021.

Gráfico 4- Utilização de terras no Mato Grosso do Sul – 2017

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário-MS-2017. Org.: Medeiros, 2021.


31

Conforme demonstrado nos gráficos 3 e 4, a diferença que tivemos de lá para


cá foi a mudança da porcentagem das terras utilizadas para as lavouras. Em relação
às lavouras, tínhamos no Censo Agropecuário de 1985, 6,2%, no entanto no Censo
Agropecuário de 1995/96 ocorreu uma queda na área voltada para as lavouras
caindo para 4,5%, já no Censo Agropecuário de 2006 subiu para 7,0 % e no Censo
Agropecuário de 2017 tivemos a área destinada à lavoura aumentada para 12,2%
sendo de 3.628.356 ha. Mas se observamos em relação a parcela de terra que é
voltada para as pastagens, a diferença é descomunal, ficando a área voltada para
pastagens com 61,9% e com isso concordamos quando Almeida (2003, p. 118, grifo
do autor) nos diz que a pecuária é usada apenas para esconder terra, ou seja, “num
claro diagnóstico da prática conhecida como gado para esconder a terra”.

Com relação ao aumento na área voltada para lavoura no estado e redução


das pastagens, podemos concluir que este aumento, está ligado diretamente ao
modelo de economia que o estado de Mato Grosso do Sul vem adotando, que é o
modelo que está voltado totalmente para exploração agrícola, sendo pautado
principalmente no abastecimento do mercado internacional de commodities e das
indústrias nacionais e internacionais, ou seja, a economia do agronegócio, ao qual o
camponês não se encaixa.

Essa diminuição das áreas de pastagens e aumento das áreas voltadas para
as lavouras de acordo com Mitidiero e Goldfarb (2021, p.5), está relacionada com o
rumo que o Brasil vem tomando economia, “o Agro vêm levando o Brasil a inserir-se
de forma regressiva na economia mundial, reprimarizando sua economia e criando
uma enorme dependência industrial, tecnológica e financeira estrangeira, com
impactos sociais, econômicos e ambientais destrutivos”.

Mitidiero e Goldfarb (2021, p.5) nos diz que o “agronegócio possui


pouquíssima tecnologia nacional (não é tech), que não gera emprego e renda para a
população (não é pop) e está longe de ser tudo”.

[...], o agronegócio é um modelo de produção e gestão resultante da


associação do capital agroindustrial nacional e internacional com a grande
propriedade fundiária. Dessa associação, acarretam o envolvimento cada
vez maior do capital bancário e financeiro, da ciência, da tecnologia e da
informação na apropriação das terras e na imposição e consolidação de um
tipo de uso da terra e um tipo de produção alimentar, com uma série de
impactos sociais e ambientais. (MITIDIERO; GOLDFARB, 2021, p.5).
32

Contudo, infelizmente, por mais que os dados comprovam os impactos


sociais e ambientais que o agronegócio traz, a concentração de terras voltadas para
o agronegócio no Brasil e no Mato Grosso do Sul continua gigantesca.

Dessa maneira Mitidiero e Goldfarb (2021, p. 32) nos dizem que:

A alta dos preços das commodities alimentares nos últimos 20 anos,


somada ao incentivo dos sucessivos governos com a pauta primária
exportadora (Lei Kandir é um exemplo cabal), não só faz com que o Agro
sonhe em vender tudo para fora, mas também em se especializar na
produção de quatro ou cinco produtos, [...].

O que acabou ocasionando uma substituição de culturas alimentares para


produção de commodities de exportação, resultando, segundo Porto Gonçalves
(2021) conforme citado por Mitidiero & Goldfarb (2021, p. 32), numa redução de
áreas voltadas para o cultivo dos produtos da cesta básica, “em 1988, o Brasil
possuía 24,7% da sua área ocupada pela agricultura com o cultivo dos principais
produtos da cesta básica (arroz, feijão, mandioca) e, em 2018, essa área despencou
para 7,7%”, ou seja, o agronegócio não alimenta o Brasil, ele apenas destrói o solo,
contamina a água, desmata, causa insegurança alimentar, entre outros fatores
negativos.

1.3. Aspectos históricos da luta pela terra em Mato Grosso do Sul

Conforme nos diz Fernandes (1994, p. 46), “com a expansão do capitalismo


no campo e, consequentemente, com a sujeição da renda da terra ao capital, a luta
pela terra é, antes de mais nada, uma luta contra a essência do capital: a
expropriação e a exploração”.

[...]. Desta forma, a luta pela reforma agrária não passa apenas pela
distribuição de terras, vai além... vai em direção da construção de novas
formas de organização social que possibilitem a (re) conquista da terra de
trabalho - a propriedade familiar. Vai em direção à (re) construção da
propriedade coletiva dos meios de produção, e, mais importante ainda: vai
em direção à construção de novas experiências realizadas cotidianamente
pelos trabalhadores rurais no movimento de luta pela terra. Entender esse
processo é o nosso desafio.

A partir do pensamento de Fernandes (1994) vamos discorrer a respeito da


luta pela terra no Mato Grosso do Sul.

A situação de monopólio das terras no Mato Grosso do Sul começa a ser


questionada pelos camponeses no final dos anos de 1970 e início dos 80, quando os
movimentos de rendeiros entram em conflito com fazendeiros, e acabam rompendo
33

o contrato que tinham entre si, sendo as fazendas Entre Rios, Água Doce e
Jequitibá, todas no município de Naviraí, mas essa situação se agravou com o
assassinato do advogado dos arrendatários. E como resposta dos latifundiários a
todas essas revoltas no campo ocorreu um maior aprofundamento da violência e
expulsão dos rendeiros. Foi nesse processo de expulsão e recusa aos rendeiros que
ocorreu a primeira grande ocupação de terras no Mato Grosso do Sul, sendo feita
por aproximadamente 800 famílias e ocuparam a fazenda Baunilha no município de
Itaquiraí. (ALMEIDA, 2003, p. 120).

Nesse sentido, Fabrini (2019, p. 158) acrescenta que, por causa da escassez
de florestas para derrubada e formação de pastagens nas grandes propriedades, a
partir 1980, ocorre a expulsão dos camponeses das terras, que até então estavam
nelas como arrendatários, parceiros, peões, entre outros, ou seja, eles não eram os
proprietários da terra, apenas trabalhavam na terra, e juntamente com eles também
tivemos as famílias proprietárias de pequenas propriedades que através do processo
de modernização da agricultura no início da década de 70 tiveram as suas terras
expropriadas. Portanto, serão esses camponeses, juntamente com a CPT que darão
início à luta pela terra no Mato Grosso do Sul e com o apoio também da CPT,
nascerá o MST, primeiro movimento socioterritorial formado em Mato Grosso do Sul.

Na década de 80, mais precisamente em 1983, tivemos o início do


nascimento do MST no estado de Mato Grosso do Sul e se consolidando em abril de
1984, fazendo a sua primeira ocupação na fazenda Santa Idalina. Essa ocupação
marcou a luta pela terra no Mato Grosso do Sul contra a concentração fundiária e
violência contra os trabalhadores do campo. (FERRARI, 2001 apud ALMEIDA, 2003,
p.122-123).

Como nos diz Fernandes (1999) na década de 80, houve a gestação do MST,
por meio de ocupações, assembleias e encontros dos trabalhadores sem-terra.

O conjunto de decisões e os objetivos definidos no Encontro foi constituindo


o caráter político do MST. Nesse processo de formação estão contidos os
princípios que consolidariam o Movimento. Nesse contexto nasceu o MST,
fruto da luta popular, das experiências das lutas camponesas. Desde sua
gênese em 1979 até o seu nascimento em 1984, o Movimento foi se
desenvolvendo pelas suas práxis, procurando compreender e mudar suas
realidades. Assim os trabalhadores construíram e conquistaram seus
espaços políticos, enfrentando desafios nos debates e embates da luta.
(FERNANDES, 1999, p. 75).
34

Foi, portanto, por meio dessas lutas, conquistas e derrotas, que o MST se
consolidou como o maior movimento socioterritorial no campo brasileiro e na
América Latina, e foi por meio das ocupações de terra, que o MST se territorializou
no nosso estado. Desde então, junto com outros movimentos socioterritoriais lutam
por justiça e reforma agrária, tendo como foco principal a ocupação de terras.

Por meio de suas lutas, conquistas e derrotas, o MST se consolidou na


atualidade como maior movimento socioterritorial no campo brasileiro e na
América Latina. Em Mato Grosso do Sul, no contexto do latifúndio e da
exploração dos trabalhadores no campo, o MST e outros movimentos
socioterritoriais lutam por justiça e reforma agrária. Neste sentido, a
ocupação de terras é a principal e mais polêmica ação estratégica do MST.
(MELO, 2017, p. 144).

Assim sendo, essas lutas e conquistas pela terra e da terra, de acordo com
Almeida (2003, p. 125 e seg), pode ser dividida em quatro períodos, dando destaque
para atuação do MST, FETAGRI, CUT e outros, que seriam assentamentos com
coordenações de vários movimentos (MISTO).

O primeiro período seria de 1980-1985, e de acordo com a autora,


representou a conquista de seis assentamentos, sendo eles: Padroeira do Brasil
criado em 1984 pelo TERRASUL; Tamarineiro I criado em 1984 pelo INCRA;
Retirada da Laguna criado em 1985 pelo INCRA, Sucuriú criado em 1985 pelo
INCRA, Nioaque criado em 1985 pelo INCRA e Canaã criado em 1985 pelo
TERRASUL.

No segundo período compreendido entre 1986-1990, de acordo com a autora,


corresponde à mesma época da implantação do I PNRA (Plano Nacional de
Reforma Agrária), sendo este período identificado pela crescente expectativa de
acesso à terra por parte dos trabalhadores do campo de Mato Grosso do Sul. No
entanto, tal expectativa se tornou em aflição, pois de acordo com o projeto do PNRA
a meta era assentar 41.200 famílias, mas foram assentadas 4.130, sendo
implantados 16 assentamentos.

No terceiro período de 1991-1995, conforme descreve a autora, acabou sendo


o mais trágico para os trabalhadores do campo, pois a política de assentamentos foi
reduzida pelo Estado, e apenas seis assentamentos foram criados e as ocupações
de terras feitas pelos movimentos socioterritoriais, combatidos sistematicamente. A
violência institucionalizada foi uma das formas de reprimir e intimidar os
35

trabalhadores rurais, sendo essas medidas implantadas pelo então governador do


estado de Mato Grosso do Sul, Pedro Pedrossian. O que ocorria era criminalização
dos trabalhadores do campo de um lado e, do outro, um incentivo à modernização
do campo através de programas do governo como: Novilho Precoce; Fronteiras do
Futuro e Terra Viva.

O quarto e último período analisado pela autora foi o de 1996-2000. Esse


período, de acordo com a autora, foi um dos melhores para os movimentos do
campo, pois foram criados 67 assentamentos, totalizando 97 assentamentos no
Mato Grosso do Sul, 13.921 famílias assentadas e 382.656,5100 ha desapropriados.

Dando prosseguimento à análise das lutas e conquistas da terra e pela terra,


iremos analisar as conquistas e lutas pela terra a partir do ano de 2001 até o ano de
2020. Sendo assim, vamos fazer uma análise desde o final do governo FHC,
passando pelos governos petistas, pelo governo golpista do Temer e finalizar no
trágico governo do Bolsonaro.

1.4. Criação dos assentamentos no Mato Grosso do Sul 2001-2019

Antes de começar a falar sobre o processo histórico de criação de


assentamentos em Mato Grosso do Sul a partir dos anos de 2001 até 2019
apresentaremos o gráfico 5, onde nele constam a quantidade e os anos em que
foram criados os assentamentos em Mato Grosso do Sul, sendo desde o final do
governo FHC até o primeiro ano do mandato do governo Bolsonaro.

Gráfico 5 - Assentamentos criados em Mato Grosso do Sul 2001-2019

Fonte: DATALUTA, 2020. Org.: Medeiros, 2021


36

Através do gráfico 5 podemos evidenciar que ao fim do mandato do governo


FHC foram criados 15 assentamentos no total. Por seguinte, durante o governo Lula
houve algumas oscilações enquanto criações de assentamentos, como por exemplo:
durante o seu primeiro mandato foram criados 45 assentamentos, tendo o seu pico
maior de criação de assentamentos em 2005 onde foram criados 21 assentamentos
e já no seu segundo mandato foram criados 41 assentamentos, e o ano em que ele
mais criou assentamento foi em 2007, sendo criados neste ano 25.

A partir de 2011 quando iniciou o mandato da Presidenta Dilma tivemos a


criação de apenas um assentamento sendo no ano de 2013, o Assentamento
Nazareth.

Por fim, o governo Temer e Bolsonaro nada fizeram pela reforma agrária,
durante a gestão Temer e Bolsonaro não tivemos nenhum assentamento criado.

Dito isso, vamos iniciar a nossa análise com o Governo do Presidente


Fernando Henrique Cardoso (FHC) já no fim do seu segundo mandato sendo entre o
período de 2001 a 2002. Durante esse período, conforme as informações do
SIPRA/INCRA e do DATALUTA, foram criados 15 assentamentos, assentadas 2.066
famílias e desapropriados 51.978,93 ha de terras.

No entanto, no segundo mandato do Presidente Fernando Henrique, a


estratégia tomada por ele foi denominada de “reforma agrária de mercado”, e essa
estratégia não foi muito aceita pelos movimentos socioterritoriais, como: MST,
Comissão Pastoral do Campo (CPT) e Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Agricultura (CONTAG), pois ela era uma política de créditos que contava com o
apoio financeiro do Banco Mundial, e ela funcionava de uma forma que em vez de
ocorrer a desapropriação de terras, era fornecido um empréstimo em dinheiro para
os sem terras para que eles pudessem comprar o “tão sonhado pedaço de terra”. No
entanto, os movimentos socioterritoriais entendiam que essa política acabaria
transformando a reforma agrária “num grande negócio”.

Os movimentos sociais do campo entendiam o Banco da Terra como a


transformação da reforma agrária num ‘grande negócio’, particularmente,
para os grandes proprietários de terras interessados em vendê-las. Nos
discursos do governo, o Banco da Terra era um avanço e se caracterizava
como mais uma alternativa para que os trabalhadores adquirissem terra e
recebessem benefícios, pois, com o financiamento, podiam escolher a
propriedade que desejassem, negociando diretamente com o vendedor.
37

Além disso, esse ‘tipo’ de reforma agrária evitaria conflitos, enfim,


contribuiria com a ‘paz’ no campo. (COELHO, 2016, p.165)

E apesar dos movimentos socioteritoriais não aceitarem essa política de


compra e venda de terras, Mitidiero & Cosme (2018, p. 253) nos diz que: “essa
política teve certa abrangência e adesão de uma parte do campesinato que decidiu
ficar longe das ações de luta e dos acampamentos”. E assim, muitos assentamentos
foram criados com essa política, mas esse modelo de “reforma agrária” teve as suas
consequências e quem sofreu com elas foram os camponeses, pois, através desse
modelo de “reforma agrária” o camponês acabou adquirindo uma dívida impagável,
e assim se tornando inviável essa política de “reforma agrária”.

Outra medida tomada pelo Governo FHC com o intuito de fazer os


movimentos socioterritoriais, principalmente o MST, recuarem nas ocupações de
terras foi a medida provisória (MP) nº 2.027-39, de 1º de junho de 2000 ficando
conhecida como “lei anti-invasão”, essa (MP) criminalizava as ocupações de terras,
e o seu objetivo era reduzir o número de invasões que vinha ocorrendo desde a
década de 1990, sendo então ela considerado um marco para a história da reforma
agrária no país, mas os movimentos socioterritoriais não se deram por vencidos e
continuaram as suas lutas na terra e pela terra.

Deste modo, o Governo do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso,


apesar de ter baseado a sua política de reforma agrária voltada para a compra de
terra e não na desapropriação da terra, o seu governo foi considerado o que mais
criou assentamentos no Brasil e em Mato Grosso do Sul em comparação com os
governos anteriores ao dele, mas, o crédito de criação dos assentamentos não pode
ser dado a ele, pois, de acordo com Fernandes (2000, p. 241) apud Coelho (2018, p.
170), “A Razão pela qual o governo assentou foi porque os sem-terra ocuparam.
Não existiria o número atual de assentamentos se dependesse única e
exclusivamente de projetos do governo”.

Fernandes (2003, p. 3) também nos diz que:

Embora FHC tenha propagandeado que realizou a maior reforma agrária da


história do Brasil, essa realidade produziu pelo menos dois resultados
lamentáveis: o represamento com o crescimento do número de famílias
acampadas, que em 2003, chegou a cento e vinte mil famílias, e a
precarização dos assentamentos implantados, que foram implantados como
projetos incompletos, que além de não terem infra-estrutura básica, a maior
parte também não recebeu crédito agrícola e de investimento.
38

Sendo assim, de nada adianta criar assentamentos, assentar as famílias e


depois abandoná-las, aumentando assim o empobrecimento das mesmas. E esse
não foi o caso do Governo Lula, em que ao mesmo tempo que criou assentamentos
ele deu assistência aos mesmos.

Por seguinte, iremos analisar os governos petistas a partir do ano de 2003


quando o Presidente Lula assume a presidência e segue por dois mandatos e passa
para a Presidenta Dilma em 2011 e segue até o ano de 2016, ano do golpe político.

Primeiro vamos fazer uma breve análise a respeito da política de reforma


agrária impetrada pelo governo Lula.

A política de reforma agrária do governo Lula, não foi executada da forma que
ele havia prometido no início do seu primeiro mandato. Tomamos como exemplo o II
PNRA, quando foi elaborada a sua primeira versão pela equipe de Plínio de Arruda
Sampaio, “ela visava a desapropriação, regularização, permuta, compra e venda, e
tinha como meta assentar um milhão de famílias no Brasil. (SAMPAIO; CARVALHO
FILHO, 2005, apud COELHO, 2017, p. 177). Mas, infelizmente foi reprovada, e a
que foi colocada em prática foi a do ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário,
Miguel Soldatelli Rosseto, que tinha como principais objetivos: “paz, produção e
qualidade de vida no meio rural. Eventualmente esse plano objetivava assentar 400
mil famílias, entre os anos de 2003 e 2006; financiar a aquisição de terras para 130
mil famílias e regularizar as terras de 500 mil famílias” (COELHO, 2017, p. 177).

E esse II PNRA da forma que foi elaborado, acabou gerando muitas críticas e
resistência tanto dos movimentos socioterritoriais quanto dos estudiosos do tema
reforma agrária, pois, ficou entendido que o mesmo funcionaria apenas como uma
política compensatória, que visava resolver apenas os problemas pontuais e não
resolveria o grande problema da concentração de terras. Sendo assim, o Plano não
foi executado em sua plenitude de metas e consequentemente não obteve sucesso.
Como ressalta Coelho (2017, p. 178): “A reprovação do II PNRA, elaborado por
Plínio de Arruda Sampaio e sua equipe, já evidenciava as tensões e os caminhos
que o governo Lula iria trilhar face à reforma agrária”.

Além desse II PNRA ser totalmente diferente do que aquele que os estudiosos
da área haviam elaborado, outro fator que sinalizava para o não enfrentamento ao
39

latifúndio e a concentração de terras, foi a mudança do representante dos


movimentos sociais no INCRA, e essa substituição apontou o que os movimentos
mais temiam, que era um não enfrentamento à concentração de terras por parte do
governo.

No geral, o governo Lula e Dilma não tocaram um grão de areia na


concentração fundiária. O índice de GINI brasileiro continua superando a
cifra de 0,85, o que indica intensa concentração de terras. Durante o
governo Lula a política de crédito fundiário teve continuidade, porém com
outro nome: o Banco da Terra tornou-se Programa Nacional de Crédito
Fundiário (PNCF), que a um só tempo visava a não realização de
desapropriações de terras, o não enfrentamento dos latifundiários e a
desmobilização da luta pela reforma agrária. (MITIDIERO; COSME, 2018, p.
257)

Outro fator que indicava que o governo Lula não faria aquilo que havia
prometido quando ainda estava no palanque e quando ganhou as eleições, segundo
Mitidiero e Cosme (2018, p. 256) foi:

[...] o PT recebeu o governo federal com uma grande quantidade de


terras/assentamentos conquistados pelos movimentos sociais em uma
situação jamais vista em nosso território, isso fez com que o governo
direcionasse o discurso para o desenvolvimento dos assentados em
pequenos produtores, desfocando, assim, as ações do governo dos
processos de desapropriação de terras, portanto, longe de confrontar a
propriedade privada da terra concentrada.

No quesito desapropriação de terras, o governo Lula deixou a desejar, pois,


ao invés de realizar a desapropriação o governo Lula optou pela compra e venda de
terras, e esse fator acabou ocasionando um aquecimento no mercado de terras e
assim elevando o valor das propriedades e, por conseguinte dificultado a aquisição
de mais terras para a realização da reforma agrária, o que pode ser sentido nos
finais do seu mandato e início do mandato da Presidenta Dilma

Desse modo Coelho e Freitas (2021) nos dizem:

O governo Lula priorizou a compra de terras como forma de aquisição de


propriedades rurais para a reforma agrária em MS. Durante seus mandatos
foram adquiridas 56 propriedades pela modalidade compra e venda,
enquanto no governo FHC foram adquiridas 3 propriedades nesta
modalidade. Por outro lado, em MS, durante o governo FHC foram
realizadas 83 desapropriações voltadas à reforma agrária, enquanto que no
governo Lula foram realizadas 21, o que evidencia o perfil da política de
reforma agrária estabelecido por cada um dos governos. Ao priorizar a
aquisição por compra e venda e não considerar outras modalidades
gerou-se uma contradição na política fundiária local, pois, ao intensificar a
criação de assentamentos rurais via compra e venda, contribuiu para o
aquecimento do mercado de terras, elevando o valor das propriedades que,
por sua vez, encareceu e dificultou a aquisição de outros imóveis rurais para
reforma agrária. Além disso, deixou-se de promover uma melhor distribuição
40

fundiária, na medida em que os recursos pagos pelas terras aos antigos


proprietários dos imóveis adquiridos acabaram sendo utilizados para
reinvestir na aquisição de novas propriedades (COELHO e FREITAS, 2021,
p. 90).

E foi com essa política de reforma agrária vista por muitos


estudiosos/simpatizantes da área e pelos movimentos socioterritoriais como uma
política que deixou a desejar, que o governo Lula conforme a informação do
SIPRA/INCRA criou de 2003 a 2010 em Mato Grosso do Sul, 86 assentamentos,
assentou 14.328 famílias e desapropriou 229.191,94 ha de terras.

As críticas dos movimentos sociais e simpatizantes da reforma agrária ao


governo Lula repousam fortemente no fato de que o governo não enfrentou
o agronegócio/latifúndio, consequentemente, a terra continuou concentrada
e os pequenos produtores permaneceram às margens das políticas voltadas
para o campo. O governo Lula não rompeu com a “hegemonia do
agronegócio”, pelo contrário, fortaleceu-a. (COELHO, 2018, p. 181).

Após o governo Lula, tivemos a eleição da Presidenta Dilma Rousseff, e sua


gestão seguiu por um mandato e meio, até que foi interrompido pelo golpe. O
período do seu primeiro mandato foi de 2011 até 2014 e seu segundo mandato de
2015 a 2016, quando foi interrompido pelo golpe político. E esse período da Dilma
no governo, pode se dizer que foi um dos períodos em que um governante do
Partido dos Trabalhadores menos fez, o governo praticamente abandonou os
trabalhadores sem-terra, deixando a política de reforma agrária sem nenhum
espaço.

De acordo com a Comissão Pastoral da Terra (CPT):

Nunca um governo, desde o final dos anos de chumbo da ditadura militar, foi
tão surdo às demandas populares, no campo e nas cidades, quanto o
governo Dilma. Foi o governo que menos reconheceu terras indígenas e
territórios quilombolas e o que menos fez assentamentos de sem-terra.
(CPT, 2015, p. 224).

No governo Dilma, no estado de Mato Grosso do Sul foi criado apenas um


assentamento rural, denominado PA Nazareth, localizado no município de
Sidrolândia, com 2.491,73 hectares, abrigando 171 famílias. E assim, evidenciando
o que a Comissão Pastoral da Terra (CPT), havia dito, sobre ser o governo que
menos fez.

Contudo, o discurso da Presidenta Dilma, sempre foi o de intensificar os


fomentos agrícolas para os assentamentos que já haviam sido criados, como por
exemplo: Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF);
41

Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA); Programa de


Aquisição de Alimentos (PAA) e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)
além de outros investimentos voltados para as famílias assentadas. Como descreve
Fernandes (2018, p. 75), “Em 2010, o discurso da candidata Dilma Rousseff com
relação à reforma agrária era que seria necessário investir mais nos assentamentos
criados do que criar novos assentamentos”.

Assim foi feito, o governo da Presidenta Dilma não criou muitos


assentamentos em seus um mandato e meio, apenas fomentou os que já haviam
sido criados, por isso houve uma grande negação por parte dos movimentos
socioterritoriais ao governo Dilma.

Mitidiero e Cosme (2018, p. 261) nos dizem que o período entre 2011 e 2014
a política de desapropriação de terras foi praticamente abandonada pela Presidenta
Dilma, sendo o ano de 2015, o pior para os movimentos socioterritoriais, pois a
Presidenta Dilma não assinou nenhum decreto de desapropriação de terra e assim
entrando para a história com zero decretos em um ano. Mas, em 2016, ano do golpe
político, ela assinou 21 decretos, e de acordo com o autor, esse ato foi um meio de
retaliar o agronegócio, que o governo dela e de seu antecessor tanto glorificaram,
pois durante o golpe o apoio do agronegócio foi unânime.

E todos esses assentamentos que foram criados até 2013, ano do último
assentamento criado no Mato Grosso do Sul, estão todos ligados à luta pela terra
dos movimentos socioterritoriais, e que a partir do golpe acabaram perdendo forças
ficando estagnados.

Os assentamentos rurais criados em MS estão relacionados às tensões dos


contextos e as ações dos grupos que lutam pela terra. Isto é, a conquista
dos assentamentos rurais está associada muito mais aos grupos que se
organizam e lutam pela reforma agrária do que por uma política planejada
dos governos. Se há lutas existe maior possibilidade de criação de
assentamentos rurais. O cenário da reforma agrária no Brasil é tenso,
lastimável, e não tem perspectivas de melhoras. (COELHO e FREITAS,
2021, p. 95).

Governos pós golpe, Temer e Bolsonaro.

Durante a gestão Temer, não foi criado nenhum assentamento no Mato


Grosso do Sul. O que ocorreu foi a perda de direitos, estagnação dos movimentos
42

sociais, ameaça aos assentamentos rurais que já haviam sido criados, corte em 95%
dos recursos voltados para a reforma agrária e assim sepultando de vez a reforma
agrária. E nas letras de Chico Buarque, conforme citado por Mitidiero e Cosme
(2018, p. 270) “não é cova grande, é cova medida. É a terra que querias ver
dividida”.

Mitidiero e Cosme (2018, p. 269) ressalta que:

Na face agrária do golpe, que colocou o ilegítimo presidente Michel Temer a


frente da presidência da República, os interesses do agronegócio são
explicitamente os de sepultar de uma vez por todas as desapropriações de
terra para a reforma agrária; usurpar as terras indígenas e quilombolas;
implodir a proteção ambiental em áreas de interesse ruralistas; legalizar o
roubo de terras (grilagem); se apropriar privadamente de recursos
financeiros do Estado; e garantir a continuidade e impunidade da violência e
dos crimes de corrupção no campo. [...], o governo golpista teve a coragem
de editar a infame e violenta Portaria nº1129, publicada no Diário oficial da
União de 16 de outubro de 2017, que praticamente destrói o conceito de
trabalho escravo contemporâneo e garante a impunidade aos escravocratas
modernos.

Após o golpe, Cleps Júnior (2018, p. 650) aponta que o governo Temer foi um
dos mais violentos no campo desde o ano de 2003. Durante a gestão de Temer,
somente em 2017 foram assassinadas 70 pessoas no Brasil, sendo eles
trabalhadores sem-terra, posseiros, assentados, quilombolas e indígenas.

A Comissão Pastoral da Terra também destaca essas mortes em uma notícia


publicada em seu site intitulada “2016, ano do golpe e do aumento da violência no
campo”, através dessa notícia é destacado todos os confrontos e assassinatos no
campo contra os indígenas, quilombolas e trabalhadores sem-terra.

2016 foi o ano com maior número de ocorrências de conflitos por terra
registrados nos últimos 32 anos. Foram contabilizados 1.079 conflitos, uma
média de 2,9 registros por dia. Os assassinatos tiveram um aumento de
22% em comparação com o ano de 2015 e é o maior número de casos
desde 2003.Com a instabilidade política de 2016 questões como combate
ao trabalho escravo, demarcação das terras e a defesa dos direitos
indígenas e combate aos conflitos no campo tiveram um enfraquecimento
dentro das instituições governamentais e os grupos políticos responsáveis
pelos conflitos ganharam ainda mais força. (CPT, 2017).

No entanto, essa violência não acabaria ali com o mandato golpista de


Temer, se achávamos que estava ruim, conforme Mitidiero e Cosme (2018, p. 270)
nos indaga no final do seu texto, “Michel Temer e a questão agrária contemporânea
fará com que sintamos saudades dos governos FHC, Lula e Dilma?” É porque mal
sabíamos do que estava por vir.
43

Infelizmente, em 2018, Jair Messias Bolsonaro seria eleito presidente da


República do Brasil e com ele uma nova fase, em que a luta pela terra ficaria ainda
mais difícil. Se no governo Temer as perspectivas não foram as melhores para os
movimentos sociais no campo, no governo Bolsonaro o quadro ficou ainda mais
difícil. “A vitória de Jair Bolsonaro mudou o rumo das disputas neoliberais e
pós-neoliberais e inaugurou uma nova fase”. (FERNANDES et al., 2020, p. 335)

E essa fase está sendo caracterizada pelo fascismo, onde o uso de armas
contra o campesinato, indígenas e quilombolas que lutam pela terra e territórios é
defendido claramente pelo governo Bolsonaro, onde o ódio contra a esquerda,
xenofobia, homofobia, aporofobia e aversão às relações sociais não capitalistas é
propagado a todo momento. (FERNANDES et al., 2020, p. 338).

Segundo Cattelan; Moraes; Rossoni (2020, p. 157) Bolsonaro:

[...] representante político da extrema-direita, é publicamente defensor dos


ruralistas e contrário aos movimentos sociais de luta pela terra. Assim, é
pouco provável a retomada da criação de assentamentos rurais em MS,
tanto pelo cenário político nacional quanto pela redução das manifestações
e das ocupações de terra, apesar da existência de uma grande demanda
pela reforma agrária no estado.

O governo Bolsonaro defende declaradamente o uso da violência contra as


ocupações de terra no país, e sabemos nós que as ocupações de terra são as
principais ações para pressionar os governos na criação de assentamentos de
reforma agrária. No entanto, no ano de 2019, foram realizadas apenas 43
ocupações no Brasil e apenas 2 no Mato Grosso do Sul, mas nenhum assentamento
foi criado, e de acordo com Fernandes et al. (2020, p. 340) esse foi:

O menor número desde 1990 durante o governo Collor que também se


utilizou da criminalização das ocupações como forma de impedir a luta pela
terra. [...]. Estima-se que cerca de 130 mil famílias sem-terra ainda lutam
para ser assentadas em todo o país, contudo, as ações de despejos por
meio do uso da força policial multiplicaram no ano de 2019, envolvendo
praticamente ações de reintegração de posses em diversos estados como
no Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Maranhão, Bahia, Alagoas, Pará, Mato
Grosso do Sul entre outros. As ações de reintegração de posses também
ocorrem com famílias acampadas em áreas ocupadas há décadas cujas
pessoas encontram-se produzindo.

E conforme nota de posicionamento do MST em 2019:


Nenhum país se afirma enfrentando questões sociais como é o caso da
concentração da terra e de riquezas com ações de combate armado, nem
com o uso da força policial e muito menos com a divisão da sociedade entre
os que merecem viver e os que não merecem viver, sendo que os que têm
direito à vida são os proprietários e os que não têm direito à vida são os
44

camponeses/as sem-terra ou os grupos que lutam por terra e território. Esta


é a lógica defendida pelo atual governo, uma vez que trata movimentos e
grupos de luta social pela terra e território como invasores, mas ao mesmo
tempo é leniente e fecha os olhos para outros grupos, fazendeiros e grileiros
que invadem e exploram propriedades públicas ou áreas de reservas
ambientais. A luta pela terra e pelo território é legítima, portanto, os
movimentos sociais organizados, camponeses e camponesas sem-terra,
têm todo o direito de reivindicar sim a Reforma Agrária e de ocupar toda e
qualquer área improdutiva, assim como também os povos indígenas e
comunidades tradicionais tem direito aos seus territórios. Neste sentido, não
é aceitável e plausível que um governo em regimes democráticos tome
partido autorizando e fomentando que proprietários usem da força e da
violência para enfrentar aqueles que lutam de forma legítima por seus
direitos. (MST, 2019, nota de posicionamento)

Enfim, só quando esse presidente sair do poder saberemos se esse quadro


de extremismo, criminalização e violência contra os camponeses, trabalhadores sem
terras e os movimentos socioterritoriais vai mudar. Enquanto isso, permanecemos
lutando e resistindo.

1.5. Ocupação de terras em Mato Grosso do Sul

Quando relembramos da implantação desses assentamentos através da


reforma agrária no estado de Mato Grosso do Sul, devemos deixar claro que foi
através das lutas dos movimentos socioterritoriais e da organização dos
trabalhadores rurais que através das suas ocupações de terras e acampamentos
impuseram pressão sobre os governantes para que então os assentamentos fossem
estabelecidos. E para evidenciar as ocupações em Mato Grosso do Sul elucidamos
o gráfico 6, com os dados das ocupações de 1988 a 2019.
45

Gráfico 6- Ocupações de terras em Mato Grosso do Sul- (1988 a 2019)

Fonte: DATALUTA, 2020. Org:. Medeiros, 2021


Assim sendo, as ocupações no Mato Grosso do Sul, conforme demonstrado
no gráfico 6, tiveram um crescente aumento, do ano de 1988 até o ano 2000,
porém, as ocupações a partir de 2001 apresentaram um decréscimo, e as prováveis
causas seriam a desistência dos acampados por causa da morosidade em que se
estava ocorrendo a reforma agrária, dificuldade do MST e de outros movimentos
socioterritoriais lutar contra um governo amplamente apoiado por suas bases,
redução da pobreza da população urbana, entre outros fatores. (MELO, 2017, p.
149).

E após o golpe de 2016 tivemos uma queda maior ainda nos números de
ocupações. Nos dois anos pós-golpe tivemos no estado apenas 16 ocupações, e os
principais fatores podem ser: extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário
(MDA), criminalização, aumento da violência, mortes no campo, entre outros,
agravantes esses que fizeram com que diminuíssem as ocupações, e sem ocupação
e sem pressão sobre o governo dificilmente teremos reforma agrária.

Contudo, no atual contexto em que temos graves problemas sociais, o conflito


agrário é o de maior destaque no nosso estado, e os movimentos socioterritoriais
estão na luta pela terra/território. E no contexto do decréscimo das ocupações do
MST, principal movimento da luta pela terra e a paralisação da reforma agrária,
46

temos a ascensão da luta indígena pela terra, resultando então, em uma mudança
de protagonismo na luta pela terra. (MELO, 2017, p. 149).

Como já dito por Porto-Gonçalves (2015, p.97) conforme citado por Melo
(2017, p. 148) A ascensão da luta indígena resultou na alteração do protagonismo
da luta pela terra em Mato Grosso do Sul e no Brasil:

No Brasil inteiro, independentemente da região geoeconômica, são as


populações tradicionais que vêm ocupando a cena do enfrentamento
fundiário e sinalizando para a ressignificação da questão (da reforma)
agrária. Elas estão no caminho e são vistas como obstáculos ao progresso,
pelas forças que se autodenominam progressistas do agronegócio, do
hidronegócio, do econegócio, da financeirização da natureza, da mineração,
da construção civil.

E essa ascensão da luta indígena em Mato Grosso do Sul é resultado da


resistência histórica desses povos à invasão dos seus territórios, e tanto a situação
indígena quanto a questão agrária estão relacionadas ao processo histórico de
ocupação do estado de Mato Grosso do Sul, sendo o Estado brasileiro o principal
ator nesse processo, pois foi ele que criou e revogou leis e decretos a fim de atrair
um contingente populacional para o sul de Mato Grosso, ignorando totalmente os
povos tradicionais que aqui já habitavam, e nesse contexto, quando os indígenas
não eram escravizados como, por exemplo, quando eram sujeitados a trabalhar na
Companhia Mate Laranjeira; ou assassinados por fazendeiros, eram confinados em
reservas criadas pelo Governo Federal juntamente com a SPI para poder liberar a
terra para o fazendeiro desenvolver a economia desenvolvimentista e capitalista
(MELO, 2017).

Um exemplo foi o controle da Companhia Matte Laranjeira sobre a


exploração dos ervais na região Centro-Sul do estado, concedida após a
Guerra do Paraguai (1864-1870). Ao controlar as terras ervateiras, a
Companhia procurou implantar a política de "espaços vazios”, contando com
polícia própria, dizimando a população indígena presente na área e
impedindo a ocupação das terras por pequenos proprietários ou posseiros
(GUILLEN, 1999; MORENO, 1994 apud MELO, 2017, p.152).

Por fim, a política fundiária criada e fomentada pelo Estado brasileiro no


estado de Mato Grosso do Sul antes e depois de sua criação, foi o principal
mecanismo criador de desigualdade social no campo e concentrador de terra, pois
através do Estado brasileiro o trabalhador do campo e o indígena foram
expropriados, para que se pudesse criar uma agricultura capitalista e excludente, e
através do levante dos trabalhadores do campo e dos indígenas contra esse sistema
47

perverso e excludente que temos o início das ocupações, desapropriações de terras


e criações dos assentamentos e retomadas e demarcações de alguns territórios
indígenas.
48

2. HISTÓRIA E ESTRUTURA AGRÁRIA DO MUNICÍPIO DE SIDROLÂNDIA-MS

O município de Sidrolândia (mapa 1), insere-se no processo histórico da


dinâmica territorial que configurou a formação do estado de Mato Grosso do Sul e se
insere nos municípios com grandes concentrações de terras, mesmo Sidrolândia
sendo o município do Mato Grosso do Sul com mais assentamentos no estado.

Mapa 1- Município de Sidrolândia- MS

Fonte: O autor, em colaboração com Pedro Antônio Araújo da Silva, 2022.


O município de Sidrolândia está situado na região centro-norte do estado de
Mato Grosso do Sul, a 63 km da Capital, Campo Grande, com uma área de
5.265,695 km², e uma população de 42.132 pessoas (IBGE, 2010), sendo 27.783
habitantes residentes na área urbana e 14.349 pessoas residentes na área rural.

Em relação ao processo histórico de formação do município, relaciona essa


formação com a chegada dos bandeirantes ainda no século XVII e XVIII.

De acordo com (IBGE, 2021):

As terras que atualmente constituem o Município de Sidrolândia, apesar de


conhecidas desde os primórdios do século XVII, quando foram devassadas
por sertanistas bandeirantes, somente passaram a ser povoadas com a
49

chegada do sertanista mineiro Gabriel Francisco Lopes, que, logo a seguir,


trouxe seu sogro Antônio Gonçalves Barbosa, acompanhado de seu irmão
Inocêncio Barbosa. Nos meados do século XIX, os Barbosas estabeleceram
as primeiras fazendas de gado, da região, que, mercê da abundância do
pasto, da boa qualidade e fertilidade do solo, prosperaram com rapidez. O
fato atraiu novos migrantes que ae se radicaram dedicando-se
especialmente à criação de bovinos. [...] deve assim o Município de
Sidrolândia seu povoamento aos membros da família Barbosa que, tempos
depois, partindo da já então florescente região de Vacaria, promoveram o
povoamento de outros rincões do sul do Estado, instalando fazendas para a
criação de bovinos e erigindo novos núcleos populacionais. [...] os
fundamentos da próspera cidade que é hoje Sidrolândia foram, entretanto,
fincados por Vicente de Brito, tronco da família Brito e José Pereira Martins,
que, após a guerra do paraguai, já no ano de 1870, vieram fundar suas
fazendas, naquelas paragens.

No entanto, o município de Sidrolândia tem o seu início de criação, em 1926,


com o catarinense Sidrônio Antunes de Andrade que recebeu de seu sogro 5.400 ha
após o falecimento de sua esposa, sendo metade desse local onde hoje se situa a
cidade de Sidrolândia.
Dos filhos de Vicente de Brito, distinguiu-se Porfírio que fundou mais 4
fazendas e empregou todos seus esforços para evitar a dispersão de seus
descendentes. Uma das filhas de Profírio desposou Sidrônio Antunes de
Andrade, catarinense de Lages. Alguns anos mais tarde, em consequência
do falecimento de sua esposa, Sidrônio resolveu, em 1926, lotear a parte da
Fazenda São Bento, que lhe coubera por herança; só concretizando, porém,
a idéia, em 1942, quando colocou à venda os lotes já há muito demarcados;
dando à nova povoação que ali surgia a denominação de Sidrolândia.
(IBGE, 2021).

Sidrônio também usou de sua influência para fazer com que a estrada de ferro
Noroeste Brasil passasse perto de sua fazenda. Quando a estrada de ferro começou
a funcionar, os loteamentos de Sidrônio foram sendo vendidos mais rápido e a vila
Sidrolândia começou a ganhar densidade populacional. Em 11 de dezembro de
1953, conquista a sua emancipação político-administrativa, tendo como primeiro
prefeito Gumercindo Pereira de Souza, e assim se formou o município, mas
trazendo junto com a sua formação, um grande predomínio de latifúndios.
No dia 25 de abril de 1944, foi inaugurada a Estação Ferroviária e
Telegráfica da NOB, fazendo um ramal ligando Campo Grande a Ponta
Porã, com o nome de Estação Anhanduí. Com a implantação da Estação
Anhanduí, as parcelas dos loteamentos implantados por Sidrônio foram
vendidas e a vila começou a ganhar densidade populacional. A vila de
Sidrolândia foi elevada à categoria de Distrito de Paz em 1º de dezembro de
1948, conquistando sua emancipação político-administrativa em 11 de
dezembro de 1953. Em 31 de janeiro de 1955 instalou-se a primeira Câmara
de Vereadores e também tomou posse o primeiro prefeito eleito de
Sidrolândia, Gumercindo Pereira de Souza. E desde então o município foi
sendo formado com o predomínio de grandes propriedades onde se
desenvolvia a pecuária extensiva, contribuindo assim para a concentração
fundiária. (REIS, 2009, p. 03).
50

Em Sidrolândia a concentração de terras se deu da mesma forma que ocorreu


no resto do estado de Mato Grosso do Sul, o governo brasileiro, na tentativa de
controlar e demarcar o poder sobre esse território, concede às empresas
estrangeiras os direitos de exploração, como por exemplo a Companhia Mate
Laranjeira, que se estabeleceu na região de fronteira, tomando para si os ervais
pertencentes os povos Guarani e Kaiowá e a Companhia norte-americana Brasil
Land and Paching Company quando foi presenteada com um total de 145.705
hectares dos Campos da Vacaria em 1912. (ASSUNÇÃO; SILVA, 2014, p. 2).
Portanto, o Município de Sidrolândia já surge com grandes concentrações de
terra, fruto da invasão e tomada para si dos territórios que antes eram dos povos
indígenas Guarani e Kaiowá.

Sidrolândia é o município do estado de Mato Grosso do Sul com a segunda


maior concentração de assentamentos da reforma agrária do Brasil. E não tão
diferente dos outros municípios do estado tem a sua estrutura fundiária marcada por
grandes latifúndios, gerando assim uma grande desigualdade de terras no
município. (ASSUNÇÃO; SILVA, 2014, p. 1).

E para demonstrar essa desigualdade e concentração de terras elucidamos a


tabela 3, onde nela apresentamos a Estrutura Fundiária de Sidrolândia, com base
nos Censos Agropecuário de 2006 e 2017.

Tabela 3 - Estrutura Fundiária – Sidrolândia-MS- 2006 e 2017

Grupo de Censo Agropecuário (2006) Censo Agropecuário (2017)


classes
(ha) Nºde (%) Área (%) Nº de (%) Área (%)
Estabele (ha) Estabele (ha)
cimentos cimentos

< 10 (ha) 130 5,9 503 0,1 1.405 34,5 11.517 2,8

10 a 1.585 72,0 32.158 7,9 2.265 55,5 37.270 9,1


– 50(ha)

50 a 56 2,6 3.810 0,9 68 1,6 4.515 1,1


– 100(ha)

100 a 220 10,1 57.070 14,0 144 3,5 37.970 9,2


– 500(há)

500 a 1000 87 3,9 58.468 14,3 97 2,3 65.582 15,9


(ha)
51

+ 1000 119 5,5 256.893 62,8 107 2,6 255.485 61,9


(ha)

Total 2.207 100 408.902 100 4.086 100 412.339 100


Fonte: IBGE- Censos Agropecuários 2006 e 2017. Org.: Medeiros, 2021
A partir da tabela 3 podemos analisar a estrutura fundiária de Sidrolândia em
dois momentos. O primeiro deles, a partir do Censo Agropecuário de 2006 e o
segundo a partir do Censo Agropecuário de 2017.

No primeiro momento, a partir do censo de 2006, podemos perceber que os


estabelecimentos com mais de 1.000 ha, apesar de representarem apenas 5,5% do
total sendo de apenas 119 estabelecimentos, eles totalizam 62,8% da área ocupada
por todos os estabelecimentos rurais em Sidrolândia. Enquanto que, os
estabelecimentos com até 50 ha, no censo de 2006 representaram 77,9% sendo
1.715 estabelecimentos e ocuparam apenas 7,9 % da área. Portanto, nota-se uma
estrutura fundiária fortemente concentrada em Sidrolândia até o ano de 2006, data
do Censo Agropecuário.

A segunda situação nos diz respeito ao censo de 2017, onde podemos notar
uma pequena mudança, mas fundamental na estrutura fundiária, pois enquanto no
censo de 2006 tínhamos 5,5% dos estabelecimentos com mais de 1000 ha, em 2017
os mesmos estabelecimentos caíram para 2,6% do total e totalizam 61,9% da área
do município, enquanto que os estabelecimentos com até 50 ha representavam 90%
e ocupavam uma área de 11,9% do município. Ainda podemos notar uma grande
concentração fundiária, mas vemos que, com as criações dos assentamentos que
ocorreram no município de Sidrolândia a partir de 2006, ocorreram também uma
mudança na estrutura fundiária, tanto que, do censo de 2006, para o de 2017 houve
um aumento no número de estabelecimentos de até 50 ha, passando de 1.715 para
3.670, ou seja, dobrou o número de estabelecimentos, e esse aumento no número
de estabelecimentos de até 50 ha está relacionado aos movimentos socioterritoriais
que através da luta pela terra e pela reforma agrária fez com que os governos
criassem mais assentamentos e assim desconcentrando um pouco da terra das
mãos dos latifundiários.

No município de Sidrolândia, a primeira ocupação feita através da reforma


agrária foi na Fazenda Capão Bonito, e através dessa ocupação foi criado no ano de
52

1989 o Assentamento Capão Bonito e posteriormente, em 1997, o Assentamento


Capão Bonito II.

Conforme Reis (2009) nos descreve:

No dia 05 de agosto de 1989, algumas famílias apoiadas pelo Sindicato dos


Trabalhadores Rurais de Sidrolândia invadem a Fazenda Capão Bonito, no
dia 10 de agosto a polícia retirou as famílias que ficaram acampadas no
Sindicato durante um mês, ai começa as negociações com o governo do
Estado e o INCRA para liberação da área, e termo efetivo de posse foi
emitido no dia 20 de outubro de 1989. A meta era assentar 133 famílias de
trabalhadores rurais em lotes de 14.0, 16.0, 19.0 ou 22 ha. [...] em 1997,
membros do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Sidrolândia, da
FETAGRI e do MST, invadem a outra parte da fazenda Capão Bonito e
ficam 17 dias acampados na área invadida, em acordo com o INCRA, os
acampados são transferidos para uma área pertencente ao INCRA
localizada no Assentamento Capão Bonito, no período de maio a dezembro
de 1997. E no mês de dezembro de 1997 foi oficializado a criação do
assentamento Capão Bonito II, atendendo assim a 320 famílias assentadas
nessa área. (REIS, 2009, p. 3).

Sendo essa ocupação o gatilho para outras lutas pela terra e pela reforma
agrária no município de Sidrolândia, pois através dessa ocupação outros
movimentos se mobilizaram para que outros assentamentos fossem implantados,
sendo o Assentamento Altemir Tortelli “Estrela” um deles. O último Assentamento a
ser criado no município de Sidrolândia foi o PA Nazareth, sendo desapropriados
2.491,731 ha e assentadas 171 famílias.

Assim sendo, o município de Sidrolândia possui 23 assentamentos2, conforme


pode ser observado parcialmente no (mapa 2), e juntos totalizam mais de 4.000
lotes da reforma agrária, e mais de 70 mil ha de latifúndio desapropriado e
transformado em assentamentos.

2
PA Capão Bonito; PA Capão Bonito II; PA São Pedro; PA Vista Alegre; PA Vacaria; PA Gibóia; PA
Capão Bonito III; PA Geraldo Garcia; PA Santa Terezinha; PE Terra Solidária; PE Terra Solidária II; PA
Eldorado Parte; PA Eldorado; PA Eldorado II; PA Altemir Tortelli “Estrela”; PA Barra Nova; PA Barra
Nova-FETAGRI; PA Santa Lúcia I; PA João Batista; PA Alambari-FETAGRI; PA Alambari-FAF; PA
Alambari-CUT; PA Nazareth.
53

Mapa 2 – Sidrolândia-MS: Projetos de Assentamentos da Reforma Agrária – 2022.

Fonte: O autor, em colaboração com Pedro Antônio Araújo da Silva, 2022.

No (mapa 2), aparecem apenas 17 assentamentos, pois, os shapefiles3 de


alguns assentamentos são em conjunto com outros, de tal maneira que, alguns são
conquistas de um mesmo latifúndio por diferentes movimentos socioterritoriais, como
é o caso dos Assentamentos Barra Nova e Barra Nova-FETAGRI, do Alambari -
FETAGRI, Alambari - FAF e Alambari - CUT, além de outros assentamentos serem
de origem Estadual, como o Terra Solidária e o Terra Solidária II e por serem
Projetos do estado os seus shapefiles não estão disponíveis no IBGE/INCRA.

3
Um shapefile é um formato de armazenamento de dados de vetor da Esri para armazenar a posição,
a forma e os atributos de feições geográficas. É armazenado como um conjunto de arquivos
relacionados e contém uma classe de feição. Disponível em:
https://enterprise.arcgis.com/pt-br/portal/latest/use/shapefiles.htm#:~:text=Um%20%20shapefile%20%
C3%A9%20um%20%20formato,cont%C3%A9m%20uma%20%20classe%20de%20fei%C3%A7%C3
%A3o.
54

3. CARACTERIZAÇÃO E ORGANIZAÇÃO TERRITORIAL DO ASSENTAMENTO


ESTRELA

Neste capítulo iremos abordar a geohistória do Assentamento Altemir Tortelli


“Estrela” de Sidrolândia-MS e dos camponeses que ali residem e resistem. E para
isso, fizemos um recorte temporal, onde procuramos analisar a trajetória dos
camponeses, desde o primeiro momento em que se tornam sem-terra e começam a
enfrentar os desafios do acampamento até o momento de posse do lote e por
conseguinte analisando quais foram os desafios após a posse do lote.

Sendo isso possível por meio do diálogo com os camponeses que


participaram desta pesquisa, resgatando as suas memórias e as transformando em
escrita, para que as realidades deles pudessem ultrapassar o espaço do
Assentamento Estrela e outras pessoas pudessem conhecer e reconhecer as lutas
das famílias camponesas.

3.1. Localização e caracterização do Assentamento Estrela

O Assentamento Altemir Tortelli “Estrela” (figura 1), está localizado na área


rural de Sidrolândia, município do estado de Mato Grosso do Sul, a 140 km da
Capital do estado, Campo Grande. É um projeto criado pelo Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (INCRA), em que no ano de 2005 assentou 114
famílias.
55

Figura 1 - Planta geral do Assentamento Estrela com as divisões dos lotes-


Sidrolândia-MS

Fonte: INCRA- MS, 20214


A figura 1 apresenta a planta geral do Assentamento Estrela feita pelo INCRA.
Nela temos todas as divisões e numeração dos lotes, bem como as divisas com os
Assentamentos Barra Nova e Barra Nova-FETAGRI e as divisas com as fazendas
Primavera e São Francisco.

O Assentamento Estrela foi mais um entre tantos outros Projetos de


Assentamentos criados no governo do Presidente Lula em Mato Grosso do Sul. No
entanto, isso aconteceu principalmente pela atuação do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais (STRs), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Federação

4
O mapa contendo a planta geral do assentamento Estrela foi cedido pelo funcionário do Núcleo Municipal de
Regularização Fundiária (NMRF), Geovane Ferreira, setor vinculado à Secretaria Municipal de Desenvolvimento
Rural e Meio Ambiente de Sidrolândia, MS.
56

dos Trabalhadores na Agricultura (FETAGRI) e Central Única dos Trabalhadores


(CUT) e Federação da Agricultura Familiar (FAF).

3.2. As lutas pela conquista da terra: de acampados a assentados

A origem das famílias camponesas do Assentamento “Estrela” em grande


maioria era proveniente dos municípios vizinhos como: Nova Alvorada do Sul, Rio
Brilhante e Dourados. Famílias essas que, antes de conquistarem a terra faziam
parte de alguns movimentos socioterritoriais, sendo eles: MST (Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra), FAF (Federação da Agricultura Familiar) e
FETAGRI (Federação dos trabalhadores na agricultura). Nota-se que as famílias
passaram por movimentos distintos enquanto acampados, mas ao conquistarem a
terra o movimento ao qual estavam filiados era a FAF.

Sendo assim, a conquista da terra no Assentamento Estrela teve o seu início


nos acampamentos Bom Futuro, no município de Nova Alvorada do Sul, 3M, no
município de Rio Brilhante, Forquilha, no município de Dourados e São Pedro no
município de Ponta Porã e depois mais um ano e meio acampados na sede da
fazenda Estrela, evidenciando, nesse processo, o que Fernandes (2001, p. 74-75)
nos diz: “Ser acampado é ser sem-terra. Estar no acampamento é resultado de
decisões tomadas a partir de desejos e de interesses, objetivando a transformação
da realidade. O acampado é o sem-terra que tem por objetivo ser um assentado”.

Portanto, o acampamento é o momento que antecede a conquista do


assentamento. No entanto, esta fase é caracterizada por muitas privações aos
acampados como, condições inadequadas de moradia, alimentação, saneamento,
educação, segurança, entre outros; enfim, essas condições a que eles são privados
são indispensáveis à dignidade humana, ou seja, eles chegam a viver em condições
desumanas para alcançar aquilo que almejam. Sendo então a fase do
acampamento, o momento relatado pelas famílias de muitas dificuldades e
momentos de muita luta.

Assim sendo, para evidenciar essa transição de acampados a assentados,


trago a seguir alguns relatos e imagens que demonstram essa transição.
57

Figura 2 – Acampamento São Pedro à beira da estrada.

Fonte: Acervo pessoal da família camponesa José e Veronice, 2021.


Figura 3- Momento em que as famílias estavam montando os seus barracos no
Acampamento São Pedro

Fonte: Acervo pessoal da família camponesa José e Veronice, 2021.


58

Figura 4- Barraco no Acampamento Bom Futuro, da família camponesa Adoaldo e


Cicera

Fonte: Arquivo Pessoal Adoaldo e Cicera, 2021.


A partir das análises de Fernandes (2001) e das figuras 2, 3 e 4, fizemos uma
indagação: o que levou essas famílias ao acampamento? E para responder a essa
indagação, trouxemos alguns relatos dos camponeses que participaram da luta pela
conquista da terra, explicando o que os levaram a acampar; como foi a fase do
acampamento até a conquista da terra.

Relato do camponês José e da camponesa Veronice:

A primeira investida e a possibilidade de nos tornarmos acampados,


aconteceu por volta de 2002, por influência de uma irmã, que já era
acampada havia mais de dois anos pelo MST no acampamento Forquilha
em Dourados. Foi então que, após algumas conversas com as lideranças do
acampamento, acertamos a compra de um barraco e a vaga de um
companheiro que havia desistido. E para maior comodidade minha e de
minha família e por questões de trabalho, a nossa participação no
acampamento se daria duas vezes por mês nos finais de semana. E essa
participação bastante confortável, para nós os andorinhas, só era possível
mediante o pagamento de uma “taxa, mensalidade”, que era estipulada
pelos coordenadores do movimento para “custear” a manutenção do
barraco, garantir a vaga no acampamento e de certa forma ajudar quem
morava diuturnamente no acampamento. Mas a nossa participação nesse
acampamento durou pouco tempo, pois a comunidade no final do ano de
2002, levantaram acampamento para outra região distante de Dourados e
assim impossibilitando a nossa participação no acampamento e assim
tivemos que sair do MST. Portanto, o nosso começo como acampados foi
assim começamos como andorinhas. No início de 2004, surgiu uma nova
oportunidade de fazermos parte de um novo movimento social, dessa vez
seria a FETAGRI, no acampamento São Pedro, próximo ao assentamento
59

Itamarati I. Nesse acampamento iniciamos a nossa vida de acampado


novamente como “andorinha”, mas passado alguns meses as lideranças
começaram a exigir a presença de todos os andorinhas no acampamento e
quem não viesse para o acampamento e se tornar-se morador no
acampamento perderia a sua vaga. Diante desse fato, minha esposa
Veronice e meus dois filhos menores Vinicius e Lucas foram morar no
acampamento. Quanto a mim José Beltrão de Medeiros, continuei na cidade
de Dourados, MS, com meus outros dois filhos mais velhos, Thiago e
Diógenes, trabalhando, na época eu era Professor de História na E.E
Menodora Fialho de Figueiredo, sendo assim eu ia visitar a minha esposa e
os outros dois filhos aos finais de semana. Passados alguns meses a
liderança do acampamento começou a entrar em conflito com alguns
acampados até que de um dia para o outro eles sumiram e nos largaram
desolados e novamente eu me vi sem nenhuma perspectiva. Foi então que
por intermédio de alguns amigos que já haviam adquirido lotes em
assentamentos eu fui indicado a uma pessoa que poderia resolver o meu
desalento de novamente estar acampado e não conseguir nada. Foi então
que me encontrei com essa pessoa e ela me indicou à liderança do
acampamento da fazenda Estrela, feito isso saímos do acampamento São
Pedro e fomos para o acampamento da fazenda Estrela, que se localizava
dentro da fazenda. Quando fomos para o acampamento da fazenda Estrela,
novamente a minha esposa foi com os meus outros dois filhos e eu fiquei
novamente na cidade, mas agora era diferente o acampamento era muito
longe de Dourados e eu não conseguia visitar a minha esposa e filhos todos
os finais de semana, foi então que pedi exoneração do meu cargo de
Professor de História e fui embora para o acampamento aguardar a divisão
dos lotes. (JOSÉ e VERONICE, 2021).

Trago também o relato dos camponeses Carlos e Tina. Eles iniciaram as suas
vidas como sem-terra em um acampamento do MST em 1997, no município de Rio
Brilhante. Eu perguntei o nome do acampamento a eles, mas não puderam me
informar, me disseram que o sofrimento, a pobreza e a desumanidade por parte dos
governantes que sofreram lá, fez com que eles esquecessem toda aquela vida
sofrida.

Nossa história de acampado para assentado começa em 1997, quando


entramos para o MST, em um acampamento em Rio Brilhante. Mas, para
chegar até o acampamento eu preciso contar como tudo começou. O meu
pai tinha uma chacrinha e eu sempre tive a vontade de ter um pedaço de
terra para mim, mas a minha história é meio complicada de explicar.
Primeiro eu me casei com a minha esposa Tina, daí fomos embora da
casa do meu pai que era em Novo Horizonte do Sul onde ele tinha a
chacrinha dele tentar a vida na cidade grande em São Paulo, mas não deu
muito certo não, então nós voltamos de novo para a chacrinha do meu pai,
só que ficamos pouco tempo, coisa de um mês e pouco, daí foi quando
ficamos sabendo de um acampamento do MST em Rio Brilhante. Daí
fomos para lá, com a cara e a coragem, a única coisa que tínhamos era o
nosso filho mais velho e uns trapos veio de roupa, e lá ficamos seis anos.
Durante esses seis anos, levamos uma vida muito difícil, nós nunca tinha
tranquilidade, quando não era a polícia invadindo o acampamento e
derrubando os barracos, eram os jagunços da fazenda a qual estávamos
pleiteando, éramos discriminados pela população de Rio Brilhante,
raramente conseguíamos serviço, nós só comia mesmo, porque de vez
em quando fechávamos a br e saqueávamos alguns caminhões, eu sei
que não é bonito falar isso, mas esse era o jeito dos governantes verem a
gente e o jeito da gente não morre de fome, era um sofrimento que eu
60

não sei como explicar. Daí depois de tanto sofrimento e luta por um
pedaço de chão em Rio Brilhante no acampamento do MST, surgiu a
oportunidade através de um amigo nosso de nós ir se acampar na sede
fazenda Estrela, mas para isso tínhamos que sair do MST e se filiar na
FAF, não pensamos duas vezes e fomos se acampar na sede da fazenda
estrela la já era bem melhor, tinha energia, água, lá na sede estávamos no
céu, e ficamos ali acampado em torno de um ano e meio até que cortaram
os lotes e mandaram cada um ir para o seu lote. (CARLOS e TINA, 2021)

Podemos observar que a luta pela terra vem por uma vontade de ter um
pedaço de terra para chamar de meu, e são sonhos que são compartilhados entre
todos os camponeses que conversei.

Nos relatos dos camponeses, pudemos observar uma grande ligação deles
com o meio rural, seja, na condição de rendeiro, funcionário de fazenda e/ou filhos
de familiares que vieram e/ou moraram no campo a vida inteira.

Ao me reportar sobre o período e a condição que viveram quando


acampados, muitos afirmaram que passaram por várias dificuldades, problemas
financeiros, fome, fragilidade dos barracos, risco de violência de capangas dos
fazendeiros, violência praticada pelo Estado, por meio das forças policiais,
destruição dos barracos, remontagens constantes de barracos, entre outros, mas
que mesmo com todos esses obstáculos se mantiveram firmes nesse tempo, pois, o
sonho deles eram de adquirir um “pedaço” de terra, pois muitos não tinham nada
antes de estarem acampados, tinham apenas a força e a coragem para trabalhar na
terra, por isso almejavam um “pedaço de terra” para poderem nela plantar, dar e ter
uma qualidade de vida melhor para eles e seus familiares.

Nós vivemos durante sete anos acampados antes de termos o nosso tão
sonhado pedaço de terra, primeiro acampamos por um breve período em
Angélica, depois ficamos acampado no acampamento Forquilha lá em
Dourados por quase dois anos, depois no acampamento Bom Futuro em
Nova Alvorada do Sul, e por fim mais um ano e meio acampado aqui na
sede da fazenda Estrela. Enquanto estávamos acampados no Forquilha e
no Bom Futuro só não passávamos dificuldade como por exemplo: falta de
comida, porque a muié é aposentada, mas vi e ajudei vários companheiros
de acampamento que estavam passando necessidade. A dificuldade que
nós mais tivemos enquanto acampado era a falta de água constante nos
barracos, pouca comida e a discriminação por parte da sociedade, as
pessoas tratavam nós como bicho, eramos chamados de vagabundos que
só queria terra dos outros para depois vender. (ADOALDO e CICERA, 2021)

O sítio, o lote, o recanto era o sonho de todos que entrevistei, tanto que os
nomes dos sítios dos entrevistados retratam aquilo que eles sentiam antes de
receber o tão esperado “pedaço de terra”.
61

Figura 5, 6 e 7– Camponeses em frente às suas casas onde constam as placas com


os respectivos nomes dos seus sítios. Da esquerda para direita Deusvaldo e Maria;
Adoaldo e Cicera e José e Veronice

Fonte: Autor, 2021


Vemos, portanto, através das imagens que os nomes dos “sítios, lotes,
recantos” representam aquilo que eles buscavam enquanto acampados e/ou
representa aquilo que passaram para estarem ali.

E assim como Woortmann (1990) nos diz, sobre os pequenos produtores não
verem a terra apenas como um objeto de trabalho, acreditamos que para os
camponeses do Assentamento Estrela, o sítio é algo que para eles faz parte das
62

suas vidas, e esse “pedaço de terra” fez parte dos sonhos deles por muitos e muitos
anos e hoje esse sonho está realizado. Portanto, os camponeses do Assentamento
Estrela:

[...], não vê a terra como objeto de trabalho, mas como expressão de uma
moralidade; não em sua exteriodade como fator de produção, mas como
algo pensado e representado no contexto de valorações éticas. Vê-se a
terra, não como natureza sobre a qual se projeta o trabalho de um grupo
doméstico, mas como patrimônio da família, sobre a qual se faz o trabalho
que constrói a família enquanto valor. Como patrimônio, ou como dádiva de
Deus, a terra não é simples coisa ou mercadoria. Estou tratando, pois, de
valores sociais; não do valor-trabalho, mas do trabalho enquanto um valor
ético. (WOORTMANN, 1990, p. 12)

Em relação à renda e trabalho enquanto estavam acampados, alguns dos


camponeses que entrevistei não tinham nenhum tipo de renda enquanto estavam
acampados, outros a esposa era aposentada ou o próprio entrevistado que era, e
outros eram acampados, mas mantinham um emprego fixo na cidade ou nas
fazendas da região e ia no acampamento só nos dias que tinha reuniões, esse era o
acampado tipo andorinha. Com isso trago o relato do camponês Barbosa que era
acampado do tipo andorinha.

Eu fui acampado, mas eu era do tipo andorinha, na época eu pagava 50,00


reais para a coordenação do acampamento Bom Futuro, para que no
decorrer da semana eles mantivessem o espaço a qual o meu barraco
estava montado limpo, acendesse um fogo de vez em quando para dar a
demonstração de que tinha alguém no local caso o INCRA chegasse lá de
surpresa. Eu fazia isso porque na época eu trabalhava de empregado em
uma fazenda em Nova Alvorada, daí para não perder o emprego eu usava
essa tática, mas assim que falaram nós iríamos acampar na sede da
fazenda Estrela e depois de lá já teríamos o nosso pedaço de chão no
mesmo instante eu deixei o meu emprego e fui acampar na sede da fazenda
Estrela e aguardar o meu tão sonhado pedaço de terra. (BARBOSA, 2021)

Fernandes (1999, p. 272-273, grifo do autor), traz uma observação importante


sobre esse tipo acampado, “Há também os que são chamados de andorinhas, que
são os que aparecem vez ou outra no acampamento. Esses são a expressão da
indecisão ou do oportunismo”. Observando o relato dos camponeses que entrevistei,
a expressão que me passaram a respeito de ser um andorinha, era mais o medo de
largar o pouco que ainda tinha para embarcar em uma jornada sem nenhuma
garantia ainda. De acordo com o relato do camponês Barbosa e do camponês José
eles tinham empregos fixos e família, por isso tinham medo de largar o que tinham e
se acampar sem nenhuma garantia de que conquistariam a terra de que tanto
sonhavam. Vemos, portanto, muitos que optam pela condição de andorinha o fazem
não por oportunismo, mas por uma necessidade.
63

E assim, após ficarem acampados como andorinhas ou então fixos em outros


acampamentos, as famílias camponesas entrevistadas, com exceção de uma família
camponesa que veio depois que o assentamento estava criado, ficaram acampados
fixo morando no acampamento da fazenda Estrela e em dezembro de 2005,
finalmente o sonho de possuir um pedaço de terra, começou a se concretizar para
eles e para outros, e assim beneficiando 114 famílias que tanto lutaram por essa
conquista, verificando assim um movimento contrário ao da expropriação rural, ou
seja, cessou o deslocamento pelo menos por um curto período, de pessoas que
saiam do campo para a cidade, para ocorrer no sentido contrário cidade-campo.

3.3. A conquista da terra e o início de alguns problemas para nela permanecer

Entretanto, a conquista do assentamento não significou o fim imediato das


privações e para superá-las foram incansáveis lutas, tanto dentro do assentamento,
com a organização de associações, grupos de vizinhos ajudando um ao outro, além
de cobranças por demandas de políticas públicas.

No entanto, essas políticas públicas demoraram a chegar, e é aí que se


iniciam os problemas com a “evasão” das famílias. Segundo as famílias
entrevistadas, as “evasões pela desistência e/ou venda dos lotes” ocorreram desde
o primeiro ano em que o assentamento foi criado.

Conforme relatos dos entrevistados, fatores como falta de uma casa para
morar, água para beber, energia elétrica, escola para os filhos ficava distante, falta
de experiência na agricultura aliada com a falta de assistência técnica, solo fraco e
inadequado para a agricultura aliado a falta de recurso para corrigi-lo, desencorajou
logo no início muitos assentados sem recursos financeiros, e assim gerando aos
mesmos, uma sensação de euforia e desespero o que acarretou logo no início
alguns abandonos de lotes.

Além das dificuldades de se trabalhar na terra e falta de apoio por parte do


poder público, tivemos relatos de famílias que só não se evadiram porque algum
membro da família trabalhava fora e todas as famílias que assim o fizeram, afirmam
que sem isso não seria possível se manter no lote. Abaixo trago alguns relatos das
famílias camponesas.
64

Quando estávamos acampados na sede recebíamos cesta de alimentos,


mas quando foi repartido os lotes e cada família designado para o seu lote,
começou os problemas, fomos para o lote sem nenhum centavo no bolso,
lote sem casa, água, energia aí bateu o desespero, e o que fazer nessa
situação. E o nosso maior desafio a partir do momento que recebemos o
nosso tão sonhado pedaço de terra foi ter que enfrentar o desafio de
produzir o mínimo para sobrevivência sem nenhum centavo no bolso e
esperando do INCRA nem que seja uma assistência, mas que não veio,
esse foi o nosso maior desafio e o de muitos também, a falta de assistência
do INCRA do governo. (CARLOS e TINA, 2021)
Nós ficamos acampados primeiro em Nova Alvorada no Acampamento Bom
Futuro uns seis meses e depois viemos para a sede da fazenda Estrela e
aqui ficamos acampados mais um ano, durante todo esse tempo éramos
“mantidos” pelo governo via cesta básica, mesmo assim nunca dava a cesta
sempre faltava algo e para suprir essa falta eu fazia algumas diárias nas
fazendas aqui da região ou ia até a Nova Alvorada trabalhar de pedreiro.
Quando fomos para o lote ficou mais complicado, a partir daí não
recebíamos mais cesta básica e nem ajuda financeira e/ou técnica, ficamos
praticamente abandonados, daí a solução que eu encontrei foi trabalhar na
usina, primeiro no corte de cana manual depois de motorista, mas eu só fui
trabalhar fora porque naquele momento eu não conseguia tirar nem o
necessário para o nosso sustento aqui do meu lote. (VALDO, 2021)
Quando entramos no lote, sofremos um pouco, porque pegamos o lote sem
nada né, não tinha casa, água, energia, nem estrada tinha. Primeiro fizemos
um barraco improvisado aqui, cavamos um poço e fomos começar a
trabalhar na terra. O que nos ajudou foi que tínhamos uma casa em Nova
Alvorada do Sul que estava alugada na época e com o dinheiro do aluguel e
mais a produção que tínhamos aqui tanto da roça quanto dos animais íamos
nos mantendo. Aí depois a Marli conseguiu se aposentar e melhorou mais
ainda a nossa vida aqui no Assentamento, mas o nosso começo aqui não foi
fácil e não só nosso, mas de vários outros companheiros. (LALO e MARLI,
2021)

E para evidenciar esse problema relatado pelas famílias camponesas, trago


um trecho de uma notícia da CUT/SP onde é exposto que um dos maiores
obstáculos encontrados pelas famílias assentadas é ausência de apoio técnico, de
crédito e políticas públicas voltadas para o campo:

Assistência técnica, crédito, apoio à comercialização de produtos e políticas


voltadas à educação, saúde, habitação rural e juventude – estes são alguns
dos principais desafios para garantir o desenvolvimento dos assentamentos
brasileiros com qualidade de vida aos seus moradores e produção de
alimentos para toda a sociedade. Segundo a Federação da Agricultura
Familiar do Estado de São Paulo (FAF-CUT/SP), um dos principais
problemas desse cenário está na assistência técnica, que não é qualificada.
Outro é o acesso aos Créditos de Instalação - para desenvolvimento inicial
do assentamento, como construção de moradia e fornecimento de água, por
exemplo – e aos recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar, para compra de máquinas, equipamentos ou
infraestrutura de produção. (CUT/SP, 2013)

Portanto, para os assentados do Assentamento Estrela sem “aptidão”


agrícola, sem recursos financeiros e sem ajuda do governo, a perspectiva de
65

permanecerem na terra ficou cada vez mais escassa, sobrando-lhes apenas a


dignidade e a frustração por um “sonho que virou pesadelo”.

Diante disso, Silva (2000, p. 63-64) nos diz que:

[...], as dificuldades são muitas no Projetos Assentamentos Rurais e as


desistências têm sido justificadas pelos seguintes fatores: solos
inadequados para a produção; ausência de assistência técnica; [...]
experiência na agricultura; dificuldade de acesso; ausência de infraestrutura.
É importante dizer que para que os Projetos de Assentamentos sejam
realmente viáveis algumas mudanças devem ser efetuadas no sentido de
transformar a Reforma Agrária num instrumento de desenvolvimento
socioeconômico sustentável no meio rural.

E Almeida (2012, p. 66):

[...], entendemos que a Reforma Agrária deve ser acompanhada de uma


política agrícola com instrumentos creditícios, assistência técnica e
extensão rural de qualidade, principalmente no início do processo de
assentamento. Observa-se isto pelo fato de que no acampamento, o qual
invariavelmente tem precedido ao assentamento, a expropriação material do
trabalhador é completa. Assim, o grande desafio da Reforma Agrária hoje é
promover a sobrevivência e viabilidade econômica dos assentamentos.
Todavia, essa não tem sido a tônica de nossa Reforma Agrária, na medida
em que a própria assistência técnica é oficialmente reconhecida como
deficiente tendo sofrido pressão dos movimentos sociais. [...].
Consequentemente, o analfabetismo, a ausência de assistência técnica
aliada aos problemas inerentes ao solo destinado ao assentamento, assim
como a completa inexistência de um projeto de valorização da agricultura
familiar no país produz um quadro de múltiplas determinações.

E esses agravantes supracitados pelas autoras em seus respectivos trabalhos


estão presentes no Assentamento Estrela e foram eles os maiores causadores das
evasões de assentados, pois muitos deles, sem terem condições de permanecer no
lote, começaram a vendê-los por qualquer preço para poderem retornar à cidade,
fugindo do abandono do governo e da falta de assistência técnica mínima
necessária na produção da agricultura para a sua subsistência.

A partir disso, podemos observar algumas dessas dificuldades, no


depoimento do camponês Adoaldo Alves:

A Dinâmica da reforma Agrária no papel é muito bonita, entretanto, quando


colocada na prática para milhares de famílias assentadas no Brasil se torna
inviável por questões como: falta de um técnico agrícola para o auxílio na
correção do solo, falta de apoio dos governos na questão de
financiamentos, abandono por parte do governo, eles “o governo” acham
que é só cortar a terra e fazer a doação para nós que estávamos em busca
de uma terra, de um novo modo de sobrevivência, e pronto, não precisa
mais ajudar, por que é isso que acontece quando se fala em reforma
agrária, nos dão a terra quase sempre infértil e não nos dão assistência
para que possamos sobreviver da terra. Eu passei por muita necessidade só
não desisti da terra pelo fato da minha esposa ser aposentada e eu sempre
ir em busca de diárias nas fazendas aqui da região, mas agora estamos
66

melhores depois de quatro anos de assentamento veio o fomento e em


seguida o PRONAF, que nos ajudou a mudar consideravelmente a nossa
vida. (ADOALDO, 2021)

Outro condicionante para o ”abandono e/ou venda do lote” foi o recebimento


tardio do PRONAF e a falta orientação das pessoas ao receber o PRONAF. De
acordo com os relatos dos entrevistados o primeiro acesso ao PRONAF pelas
famílias camponesas se deu no final do ano de 2009, quase quatro anos após a
conquista da terra pelas famílias camponesas, no entanto mesmo com o
recebimento do PRONAF, algumas famílias “evadiram” do assentamento.

No relato dos entrevistados algumas das famílias que “abandonaram e ou


venderam” os lotes mesmo tendo recebido o crédito do governo foi porque, fizeram
negócios errados como, fraudaram notas com fazendeiros do local e ao invés de
investir no lote, em gado, cerca, como fizeram as outras famílias, pegavam o
dinheiro e compraram carro velho, televisão, rádio, celular, e assim por diante, e
quando chegou a hora de pagar o crédito não tinha o dinheiro, o que levava a venda
ou abandono do lote e o retorno novamente para a cidade. Conforme Camacho
(2020) nos diz:

Já em relação aos motivos da inadimplência alta na quitação dos


financiamentos pode estar relacionado com a falta de orientação técnica de
como deve ser investido. Há casos de que o dinheiro do financiamento foi
utilizado para outros fins e o retorno do investimento não veio e, assim,
acarretou o endividamento. [...] Como é exposto nos relatos dos
entrevistados; “eu não soube investir o dinheiro, também não tive retorno”
[...] “desviei o dinheiro para outros fins” (CAMACHO, 2020, p. 215).

Assim sendo, se as famílias camponesas tivessem recebido apoio técnico e


assistência governamental por meio de recursos e políticas públicas não teriam se
“evadido” do assentamento, e hoje, talvez, poderíamos ter um assentamento onde
se priorizasse a agricultura familiar camponesa ao invés da agricultura capitalista.

3.4. Algumas soluções adquiridas pelos camponeses para evitar as evasões e


se manterem na terra que tanto lutaram para conquistar

Durante a conversa com os entrevistados, para sanar os problemas que eles


estavam tendo com a evasão das famílias, foi criado uma associação em 2010
sendo ela: AAGRIFAAT - Associação dos Agricultores Familiares do Assentamento
Altemir Tortelli, tendo como primeira presidenta a camponesa Andrea Cirlene da
Cruz Leite. Essa associação permaneceu por quatro anos no comando da
67

camponesa Andrea Cirlene, e foi através dessa associação que os assentados viram
uma esperança a mais naquilo que buscavam.

No início da criação da associação, era cobrada uma taxa mensal de 10 reais


daqueles que pudessem colaborar, pois o intuito era criar a associação para que
eles tivessem um pouco mais de poder para chegar aos órgãos públicos, e as idas
até Sidrolândia, MS, eram custeadas através do pagamento da taxa e de doações
de outros assentados com um pouco mais de condição. Depois de seis meses,
quando a associação já estava caminhando e eles haviam conseguido algumas
benfeitorias para o assentamento como calcário, adubo, entre outros, começaram a
cobrar uma taxa mensal de R$35,00.

Uma das soluções encontradas pela AAGRIFAAT, a primeira Associação, foi


um projeto do Banco da Terra que visava a produção de Urucum por famílias
camponesas. Sendo esse projeto implantado no Assentamento Estrela em 2010 e
pouco mais de dez famílias aderiram essa cultura.

Contudo, durante esses quatro anos, a associação só funcionou bem durante


os primeiros dois anos, foi quando vieram as benfeitorias para o assentamento e
para os camponeses. Mas após os dois primeiros anos, a associação foi perdendo
os associados por causa da morosidade da presidenta até que em 2014 foi desfeita
a associação e os camponeses ficaram novamente abandonados, sem ajuda e
sem assistência técnica. Mas, agora era diferente, porque eles tinham o dinheiro do
PRONAF que havia começado a ser pago para alguns camponeses na gestão da
camponesa Andrea, mas não tinham o acompanhamento necessário na hora de
usar o dinheiro e isso acarretou um mal-uso do dinheiro por parte de alguns
camponeses.

Entretanto, no final de 2015, o camponês Élio Espindola de Souza,


juntamente com outros camponeses do Assentamento Estrela se propuseram a criar
outra associação para que através dela, pudessem trazer os benefícios necessários
para o assentamento que a outra gestão não trouxe. Foi então que criaram a
APROLAT - Associação dos produtores de leite e/ou hortifrutigranjeiro do
Assentamento Altemir Tortelli - Sidrolândia/MS.
68

Através dessa associação e tendo no comando do camponês Élio, além da


taxa mensal que era cobrada, ele organizava festas com o fim de arrecadar dinheiro
para custear as visitas técnicas que eram solicitadas pelos associados e por ele.

Além das visitas técnicas que eram solicitadas pela associação, o


Assentamento Estrela contou também com a parceria do SENAR (Serviço Nacional
de Aprendizagem Rural) que desenvolveu e ministrou vários minicursos voltados
para a agricultura familiar. A associação, por meio do sindicato dos trabalhadores
rurais de Sidrolândia, da AGRAER (Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão
Rural) e do governo municipal de Sidrolândia, fez a aquisição de um trator (figura 8),
e esse trator, além de prestar o serviço para os associados e não associados, ele
presta serviço para os outros assentamentos no entorno, e a manutenção do trator é
toda custeada pelos camponeses que pagam uma taxa pela hora dos serviços
prestados.

Figura 8 - Trator da Associação dos camponeses do Assentamento Estrela

Fonte: Autor, 2021

Como uma das soluções adquiridas pela comunidade do Assentamento


Estrela através da primeira Associação, a AAGRIFAAT, trago o relato do camponês
Adoaldo Alves, um dos camponeses do Assentamento Estrela que aderiu a Cultura
do Urucum, e ele nos disse:

No começo foi muito trabalhoso e o Urucum não era tão valorizado, mas a
partir de 2012 quando fiz a minha primeira colheita eu ganhei até um bom
dinheiro, e após essa colheita o Urucum foi ganhando um pouco mais de
valor no mercado chegando a R$ 11,30 o KG e a tendência achávamos que
era de melhorar, essa era minha esperança. E além do mais o Urucum é
69

uma cultura prática, não precisa ficar plantando todo ano, a gente planta
uma vez e ela produz durante 25 anos, então eu não tinha tanto trabalho, o
maior trabalho mesmo era só na época da colheita e eu conseguia tirar um
bom dinheiro ainda. Mas, a esperança que eu tinha lá atrás se acabou, pois,
com esses governos, tanto Municipal, Estadual quanto Federal, a
assistência ao pequeno produtor praticamente acabou, e isso foi dificultando
em muito a vida do produtor de Urucum aqui da região, e não sou só eu,
conheço vários produtores de Urucum daqui e de outros assentamentos
vizinhos que estão parando também, estão arrancando todos os pés de
Urucum e plantando soja, tem cara aí oferecendo 15 saca de soja por ha,
imagina a gente ganhar mais de 15 mil por ano sem fazer nada, nós
sabemos que a cultura da soja e do milho não se encaixa na reforma
agrária, mas fazer o que, não temos incentivo algum. (ADOALDO ALVES,
2021).

Vemos, portanto, que a grande dificuldade deste camponês se deu pela falta
de políticas públicas de investimento e de incentivo, além da disputa com o
agronegócio, que está tomando de conta no assentamento. Em seguida trago as
figuras 9, 10 e 11, e nelas demonstramos como era o lote da família camponesa
Adoaldo e Cícera antes aderirem ao cultivo de monocultura.

Figura 9 - Plantação de Urucum do camponês Adoaldo Alves

Fonte: Acervo pessoal da família camponesa Adoaldo e Cicera, 2012.


70

Figura 10 - Primeira colheita de Urucum feita pelo camponês Adoaldo Alves

Fonte: Acervo pessoal da família camponesa Adoaldo e Cicera, 2012


Figura 11 - Vista aérea do lote da família camponesa Adoaldo e Cicera

Fonte: Acervo pessoal da família camponesa Adoaldo e Cicera, 2011


Nesta imagem podemos ver uma diversidade de plantações, como pés de
Urucum, muitas árvores frutíferas ao redor da casa, lavoura de banana, de mandioca
e capim napier para alimentação do gado, além de outras plantações. No entanto,
essa diversidade de plantações será trocada por um único tipo de plantação: a da
monocultura. Em seguida, trago a figura 12 para demonstrar como está hoje o seu
lote.
71

Figura 12 - Parte do lote da família camponesa Adoaldo e Cícera que foi arrendada
para o cultivo da monocultura

Fonte: Autor, 2021

Quando eu o questionei por que ele abandonou o sonho de trabalhar com o


Urucum e arrendou uma parte da sua terra para o plantio de soja e milho, ele me
disse que foi tudo por falta de investimento do Estado e abandono ao pequeno
produtor, e me disse;

Olhe em volta o que nós vemos, só lotes com casas abandonadas e com
soja plantada na terra, nesse meu travessão dos moradores que estão aqui
desde o início sou só eu, seu pai, a Eneil, o Vicente, o Val e o Oliveira que
vem de vez em quando, o restante dos lotes foram todos vendidos, alguns
dos lotes aí já está no terceiro ou quarto dono, e os donos aparecem aqui só
de vez em quando para olhar como está a sua lavoura e já vai embora, e
isso me dá um desespero, pois eu não sei nem quem são os meus vizinhos,
aqueles companheiros que tinham os mesmos sonhos que eu foram embora
por falta de assistência e os que sobraram estão mexendo com lavoura de
soja e milho, uns arrendaram e outros estão tocando por conta. (ADOALDO
ALVES, 2021)

Para evidenciar com a fala do camponês Adoaldo, trago as figuras 13 e 14 a


fim de demonstrar como está o entorno do seu lote. Praticamente todos os seus
vizinhos já aderiram ao cultivo da monocultura.
72

Figura 13 - Cultivo do milho no lote de um de seus vizinhos não pioneiros

Fonte: Autor, 2022

Figura 14 - Cultivo do milho no lote de um de seus vizinhos pioneiros

Fonte: Autor, 2022

Portanto, o relato do camponês Adoaldo e as figuras 13 e 14 evidenciam


aquilo que já vem sendo dito em muitos trabalhos acadêmicos que a falta de
políticas públicas de investimento, incentivo, de infraestrutura e de assistência
técnica faz com que muitos camponeses “vendam ou abandonem” o seu lote e
voltem para a cidade ou então se submetam ao arrendamento para assim poderem
permanecer na terra.
73

4. CARACTERÍSTICAS SOCIOECONÔMICAS DAS FAMÍLIAS CAMPONESAS DO


ASSENTAMENTO ESTRELA

O presente capítulo tem como objetivo analisar as características


socioeconômicas dos camponeses no Assentamento Estrela, além de buscar uma
compreensão a respeito da produção de alimentos, resistências, dificuldades e
invasão do agronegócio. Para isso, temos como base os depoimentos das famílias
camponesas do Assentamento Estrela.

A partir disso, vamos refletir a respeito das famílias camponesas que resistem
no Assentamento Estrela e continuam produzindo e se reproduzindo a partir de uma
lógica da agricultura camponesa e buscar compreender o que levou algumas
famílias a deixarem a lógica da agricultura camponesa para viverem da agricultura
capitalista o “agronegócio”.

4.1. Sexo, idade, escolaridade e famílias pioneiras e não pioneiras

Durante a pesquisa de campo foi identificado o predomínio da figura


masculina como titular do lote, e em sua maioria com mais de 50 anos de idade. Das
18 famílias camponesas entrevistadas, 17 estavam desde o início do assentamento
em 2005 e cada família na época continha em média de três a cinco pessoas no lote
e atualmente a média é de duas a três pessoas apenas.

No que diz respeito à escolaridade, durante a pesquisa foi constatada uma


baixa escolaridade entre os camponeses entrevistados, uma vez que grande parte
dos entrevistados não chegou a concluir o ensino fundamental, conforme
demonstrado no gráfico 7.
74

Gráfico 7 – Escolarização dos Camponeses do Assentamento Estrela- Sidrolândia-


MS.

Fonte: Pesquisa de campo, 2021. Org.: Medeiros.


Parte dessa não conclusão de pelo menos o ensino fundamental no
depoimento dos entrevistados, se deu pelo fato de sempre terem que trabalhar, seja
quando fossem mais jovens para ajudar os pais no campo, seja após saída da casa
dos pais e formação de sua própria família. Essa lógica permaneceu. Sempre
viveram na precariedade e a busca pelos estudos naquele momento não era
possível, pois era muito difícil conciliar os estudos com o trabalho.

No entanto, denota-se um maior nível de escolaridade dos filhos em relação


aos pais, tendo alguns filhos desses camponeses ingressado no Ensino Superior.

Em relação às famílias pioneiras e não pioneiras, além de ter ocorrido uma


redução no número de pessoas que residiam nos sítios com seus familiares, o
percentual de famílias moradoras consideradas pioneiras, infelizmente, também
caiu.

Durante a pesquisa foi constatado que havia muitos lotes vazios. Fizemos
então, alguns questionamentos às famílias camponesas a respeito dos lotes
abandonados e eles nos falaram que a maioria das famílias que eram pioneiras
haviam vendido e/ou abandonado o lote e que restavam poucas famílias ali no
assentamento que eram pioneiras.
75

E para constatar esse fato busquei ajuda no assentamento com o meu Pai Sr.
José e com a minha Mãe a Srª Veronice que é Agente de Saúde no Assentamento
Estrela. Por meio da ajuda deles fizemos um levantamento através das fichas das
famílias residentes, comparando com os dados fornecidos pelo SIPRA/INCRA da
relação dos beneficiados com o Programa Reforma Agrária do Assentamento
Estrela, foi então que a partir deste levantamento pudemos constatar que apenas 48
famílias de um total de 114 eram pioneiras e além disso, destas 48, apenas 36
estavam residindo no assentamento, conforme demonstrado no gráfico 8.

Já os outros 66 lotes, foram adquiridos há menos tempo por outras pessoas


através da compra e/ou troca, e muitas delas, os moradores do assentamento nem
conhecem, sendo também algumas dessas pessoas detentoras de cinco a seis lotes
no assentamento.

Gráfico 8- Números de famílias pioneiras e não pioneiras, residentes e não


residentes. Assentamento Estrela- Sidrolândia-MS.

Fonte: Pesquisa de campo, 2021. Org.: Medeiros.


76

Para evidenciar com a fala dos entrevistados a respeito dos lotes


abandonados e/ou com outros moradores, não sendo os pioneiros, trago um recorte
noticiário de um jornal on-line de Sidrolândia-MS (figura 15), onde no recorte é
apresentado uma notícia onde o MST denuncia que lotes que haviam sido invadidos
no Assentamento Estrela eram de um mesmo dono, e essa pessoa era detentora de
17 lotes ao total no assentamento.

De acordo com relato dos entrevistados, essa notícia só foi exposta neste site
porque o dono dos lotes foi até a polícia dar queixa das famílias dizendo que
pessoas ligadas ao MST haviam invadido o seu lote e os lotes de outros vizinhos
dele no Assentamento Estrela, foi então que o INCRA foi acionado e juntamente
com a polícia foram até o Assentamento Estrela para realizar o despejo das famílias,
mas ao chegarem lá eles descobriram que os lotes que haviam sido invadidos era
de uma pessoa só e que ela havia adquirido através da compra. A partir disso não
foi realizado o despejo das famílias e está em trâmite a legalização dos lotes para
essas famílias.

Essa pessoa que comprou esses lotes no assentamento Estrela, como


evidenciado na notícia era dona de 17 lotes no assentamento, lotes esses adquiridos
através da compra. No relato dos entrevistados ele comprava os lotes e mantinha a
titularidade do antigo dono, para assim ele poder evitar qualquer problema com o
INCRA.
77

Figura 15 - Denúncia de vários lotes no Assentamento “Estrela” serem de uma


mesma pessoa

Fonte:https://www.regiaonews.com.br/sidrolandia-15-08-2020/mst-denuncia-que-lote
s-invadidos-no-estrela-sao-do-mesmo-dono-de-17-areas-no-assentamento
Essa notícia evidencia o que vem ocorrendo no Assentamento Estrela desde
o começo de sua criação, a “venda e o abandono dos lotes”, mas a notícia não nos
traz quais seriam as causas dessas vendas, mas sabemos que essas vendas estão
atreladas à falta de assistência técnica, de infraestrutura e apoio do governo.

O título da notícia também nos revela aquilo que os camponeses do


Assentamento Estrela haviam me dito a respeito de muitos dos que estão ali não
são mais os pioneiros e além disso, são os mesmos que são detentores de seis ou
mais lotes.

No entanto, a notícia nos traz um subtítulo tendencioso que faz com que as
pessoas questionem a luta pela terra. Ele leva os leitores a crer que os
trabalhadores rurais só querem a terra para num futuro ela ser valorizada e com isso
terem especulação fundiária, mas a lógica dos camponeses é totalmente diferente
da lógica do capitalismo, como reitera o próprio MST dentro da reportagem, “o MST
é contra a compra e venda de lotes da Reforma Agrária. Acreditamos que o
78

processo de luta pela terra, por anos, não pode ser perdido por compra e venda de
lotes, pois são a garantia de sustento das famílias camponesas” (MST, 2021 apud
PAES, 2021).

Oliveira (2007, p. 66), nos explica sobre a lógica do capitalismo que vê a terra
como mercadoria, e ele nos diz:

No capitalismo, a terra, transformada também em mercadoria, tem um


preço, mas não tem valor, porque não é produto criado pelo trabalho
humano. A propriedade capitalista da terra é renda capitalizada; é direito de
se apoderar de uma renda, que é uma fração da mais-valia social e,
portanto, pagamento subtraído da sociedade em geral. [...] É por isso que o
proprietário de terra é um personagem de dentro do capitalismo. Ao se
apropriar de grandes extensões de terra, ele retém essa terra como reserva
de valor, ou seja, com o objetivo de especular, de poder se apropriar da
renda da terra.

Mas, diferente do capitalismo, os camponeses e os movimentos


socioterritoriais veem a terra de outra forma. As famílias camponesas vivem na terra
e da terra, e se reproduzem por meio dela, sendo essa relação totalmente diferente
das relações capitalistas. Conforme nos explica Arroyo (2011) apud Arroyo (2012, p.
560): “Na agricultura camponesa, o camponês e toda a sua família produzem
alimentos e vida, e se produzem em todas as dimensões como humanos”.

Assim sendo, essas pessoas que adquiriram os lotes posteriormente à criação


do assentamento estão reproduzindo uma lógica de produção totalmente diferente
das famílias camponesas que são pioneiras e estão ali vivenciando o assentamento
dia a dia.

Através da pesquisa de campo pudemos constatar essa lógica de produção


capitalista, pois grande parte dos lotes arrendados para a monocultura são lotes de
famílias não pioneiras. Portanto, a lógica dos não pioneiros em sua grande maioria é
a lógica do agronegócio, que se concentra na produção da monocultura, no uso dos
agrotóxicos e na concentração de terras, e essa lógica de produção está
acarretando grandes impactos na produção familiar camponesa do assentamento.

Podemos evidenciar esse impacto no depoimento da família camponesa do


Sr. Élio e Srª. Débora:

Essas pessoas que compraram os lotes não entendem a lógica da reforma


agrária, não entendem a lógica da agricultura familiar, estão aos poucos
transformando o assentamento em uma fazenda de novo e assim o
79

assentamento está se tornando em um latifúndio novamente. Nós não


conseguimos ter nem uma fruta mais sadia, as nossas árvores e plantas
vivem doentes por causa de tanto veneno, não conseguimos respirar o
mesmo ar puro de quando chegamos aqui. Nós temos uma relação
totalmente diferente de trabalho com a terra, nós buscamos dela o nosso
sustento, e esses que aqui estão arrendando e/ou comprando os lotes dos
meus vizinhos que eu nem conheço, estão nos envenenando diariamente
com esse trator de veneno aí, eles só visam o lucro. Chegaram até a vir
aqui no meu lote e me oferecer 15 sacas de soja por hectares para eu
arrendar o meu lote, mas eu falei que enquanto eu tiver forças para lutar
contra esse sistema que só gera lucro e depreda a natureza e puder
sobreviver da Agricultura Familiar camponesa eu estarei aqui firme e forte.
Sabe, isso nos entristece, não somos contra o assentado que é morador
aqui do assentamento plantar lavoura de monocultura, se ele achar que o
único jeito dele permanecer aqui no lote é arrendando a sua terra para
lavoura, que seja, pelo menos ele estará aqui, vivendo o dia a dia do
assentamento, agora esses aí só vem aqui no assentamento uma vez por
mês e olhe lá, não entendem nada da dinâmica do assentamento, não
conhece nossas lutas e nossos sonhos, é isso que nos deixa mais
indignados, cadê os órgãos do Governo, INCRA, desde quando foi cortado
a fazenda e repassado os lotes para nós de lá para cá recebemos apenas
uma visita do INCRA e olha que já estamos aqui a 15 anos, então é isso, o
nosso assentamento está virando um latifúndio novamente e os órgão
competentes nada fazem.(ÉLIO e DÉBORA, 2021).

Enfatizando o depoimento da família camponesa do Sr. Élio e Srª. Debora


sobre os produtores do agronegócio no assentamento não entender a lógica da
Agricultura Camponesa, Camacho, (2016) conforme citado por Camacho, (2020) nos
diz:

Assim, surgem as críticas ao modelo do agronegócio, se contrapondo ao


modelo da agricultura camponesa, que valoriza a agricultura de trabalho
familiar, a produção de alimentos para o autoconsumo e uma relação de
equilíbrio ambiental. Nesta perspectiva partimos da ideia de que a
sobrevivência dos povos do campo e a reprodução das suas relações de
trabalho com a terra é de extrema importância, haja vista que esta é uma
condição primordial para a manutenção da existência da nossa
sócio-biodiversidade, principalmente porque esses povos possuem uma
relação com a natureza de respeito e preservação, e esta é uma dinâmica
inerente à sua sobrevivência que se contrapõe ao agronegócio que enxerga
a natureza como fonte de exploração para o lucro (CAMACHO, 2016, apud
CAMACHO, 2016, p. 207).

Além disso, muitos desses lotes antes do arrendamento e/ou venda tinham a
sua produção voltada para a pecuária de leite e produção familiar de subsistência.
Contudo, com a falta de assistência governamental a solução encontrada por muitos
foi o arrendamento. E como nos diz Camacho; Almeida; Conceição (2020):

A bovinocultura leiteira vem sendo extinta uma a uma, e no lugar da


bovinocultura foi substituída pela produção da soja e do milho destinadas ao
agronegócio. É desastroso ver em um assentamento onde se produzia para
o sustento das famílias, ser invadido pela monocultura, tudo isso porque os
pequenos produtores não encontraram outro meio para garantir renda.
“Nesta monocultura, tudo que se produz é destinado às grandes empresas,
para o assentamento nada fica, apenas a destruição do meio ambiente, com
80

o uso de agrotóxicos e insumos”. (CAMACHO; ALMEIDA; CONCEIÇÃO,


2020, p. 60-61)

É, portanto, esse um dos agravantes no Assentamento Estrela, a mudança no


modelo de agricultura, saindo de um modelo onde as famílias camponesas
produziam para a sua subsistência para um modelo de agricultura onde atende
apenas aos interesses do capital. Sendo, portanto, essa mudança ocasionada pela
falta de assistência às famílias camponesas.

4.2. Renda, trabalho, produção e destino da produção

Durante a pesquisa de campo das 18 famílias entrevistadas, foi constatada o


predomínio da produção animal, principalmente a bovina e galinácea em lotes de 12
famílias camponesas, e além da venda do leite e do queijo é feita também a venda
dos bezerros e o consumo da carne. A produção de galináceos é para o consumo e
venda do excedente. A produção suína está presente em 6 lotes, contudo, a
produção suína é apenas para consumo.

Gráfico 9 - Produção animal dos camponeses do Assentamento Estrela-


Sidrolândia- MS

Fonte: Pesquisa de campo, 2021. Org. Medeiros.

Assim sendo, as produções animais estão presentes em todos os lotes das


famílias camponesas que não se concentram na produção de monocultura, ou seja,
81

os lotes que estão voltados para a produção de monocultura não foram encontrados
nenhum tipo de produção animal.

Com relação aos locais de venda da produção animal, o gado é vendido ali
mesmo na região, principalmente os bezerros e bezerras. Os entrevistados
relataram que sempre aparecem alguns compradores “atravessadores” e fecham as
compras dos bezerros com vários camponeses ali do assentamento, pois assim fica
mais fácil de receber um preço melhor pelo animal.

Com relação à renda, trabalho e produção das famílias camponesas pode-se


observar no gráfico 10 que 44,4 % dos assentados entrevistados declararam que
trabalham e tiram a renda somente do sítio; 38,9% tiram a renda do sítio e
complementam com a aposentadoria e 16,7% tiram a renda do sítio e
complementam com emprego formal e/ou diárias.

Gráfico 10 – Renda e trabalho (%). Assentamento Estrela- Sidrolândia- MS.

Fonte: Pesquisa de campo, 2021. Org.: Medeiros.

Contudo, nem sempre foi assim, como falado anteriormente. Para terem uma
renda no início da criação do assentamento, muitos deles recorreram ao trabalho
formal na Usina de cana de Açúcar “Passa Tempo”, e informal, nas fazendas da
região do Assentamento Estrela, sendo essa a forma encontrada por muitos para
82

poderem permanecer na terra, como podemos evidenciar no depoimento de alguns


entrevistados.

Tive que sair para trabalhar para fora, trabalhei em três usinas aqui da
região, porque a assistência para nós os assentados aqui do assentamento
demorou demais, foram quase quatro anos para que eles começassem a
liberar o PRONAF, ficamos praticamente abandonados pelo governo
durante os primeiros anos, sem assistência nenhuma, e a terra aqui era
muito fraca não conseguíamos colher praticamente nada aqui no início,
então a solução encontrada por muitos foi o trabalho formal até que saísse
os recursos do governo. (BARBOSA, 2021)
Assim que foi dividido os lotes nós tivemos que ir para lá se não corríamos o
risco de perder, a partir desse momento começou outra luta a da
permanência na terra. Imagina nós, sem nenhum tostão furado no bolso,
num lote onde a terra era muito fraca, sem água, sem energia, sem nada. A
solução encontrada por mim foi a de trabalhar na usina naquele momento,
ainda bem que tinha a usina, lá eu trabalhei desde cortador de cana até de
motorista de ônibus. (DEUSVALDO, 2021)
Os desafios para a permanência no lote foram inúmeros, a começar pela
decisão de ter que abdicar da profissão de Professor em Dourados-MS, com
um salário razoável, para me tornar um assentado desempregado e sem
recursos nenhum oferecido por parte do governo. Largamos uma vida
estabilizada na cidade, filhos, para morar em um barraco de lona, sem água,
sem energia, sem infraestrutura nenhuma. A terra era muito fraca, não
conseguíamos produzir quase nada nela. Tudo era muito difícil. A solução
encontrada por nós no início foi a de buscar um trabalho na usina como
cortador de cana, lá eu fiquei por um curto período, até que eu consegui um
contrato temporário na Escola Municipal Monteiro Lobato, que fica
localizada no Assentamento Capão Bonito II, a partir daí a nossa vida foi
melhorando, mas se não fosse a usina e a Escola não sei como seria a
nossa situação. (JOSÉ e VERONICE, 2021)

Como foi falado anteriormente, a maioria dos que estão e estavam ali
assentados, no início quando ainda estavam acampados na beira da estrada e
quando ficaram acampados na sede da Fazenda Estrela, recebiam um benefício em
forma de cesta básica através do benefício social “Fome Zero e do Segurança
Alimentar e Nutricional- SAN” o que lhes permitiam a permanência no
acampamento, ou seja, eram “mantidos” mesmo que muito mal pelo benefício social
provenientes dos governos Federal e Estadual.

Porém, quando a terra foi dividida em lotes de 10 ha para cada família, os


benefícios foram automaticamente suspensos, dificultando em muito a vida deles. A
partir do momento que foi feita a divisão dos lotes, não foi oferecido nenhum tipo de
assistência e/ou recurso por parte dos governos e do INCRA, e no depoimento da
camponesa Tina, esposa do camponês Carlos foi dito assim para eles:

Não era a terra que vocês queriam, pronto está cortado, agora cada um vai
para o seu lote, porque se continuarem aqui na sede perderão a posse da
terra. Foi então, a partir deste momento que se iniciaram muitas das vendas
83

e abandono dos lotes, pois como nós éramos, vou dizer “mantidos” pelo
Governo através das cestas básicas que recebíamos mensalmente, ainda
tínhamos uma expectativa de permanência, mas quando todos os
benefícios foram cortados e nós nos vimos num mato sem cachorro, sem
ajuda de ninguém, nem água no lote tínhamos, era apenas um descampado
enorme de 10 ha, tínhamos apenas a nossa dignidade e que graças a Deus
temos até hoje, nossa coragem e nossa força para trabalhar na terra e viver
da terra. E foi a partir daí que vimos que a nossa vida nesse início não seria
fácil, mas com fé em Deus superaríamos e superamos. Portanto, eu digo se
tivéssemos recebido, nem que seja, uma instrução, uma ajuda nesse início
garanto a você que hoje estariam todas as famílias que iniciaram com nós.
(TINA e CARLOS, 2021)

Portanto, podemos evidenciar aquilo que temos trazido durante a pesquisa,


que a falta de assistência, de infraestrutura e de recursos são os maiores agravantes
para o abandono e/ou a venda dos lotes e na mudança no modo de produção do
Assentamento Estrela.

Com relação às atividades produtivas e rentáveis desenvolvidas pelas famílias


camponesas no lote, temos a produção de leite e seus derivados como uma das
principais fontes de renda. Para demonstrar essa produção, trago logo abaixo as
figuras 16, 17, 18, 19, 20 e 21.

Figura 16 e 17- Gado leiteiro família camponesa Deusvaldo e Maria

Fonte: Autor, 2021.


84

Figura 18 e 19 - Gado leiteiro família camponesa José e Veronice

Fonte: Autor, 2021.


Figura 20 e 21 - Produção de queijo Família camponesa José e Veronice e Élio e
Débora, destinado ao consumo e venda do excedente

Fonte: Autor, 2021.

O leite é entregue em dois resfriadores que se encontram no assentamento,


sendo um deles do Laticínios Camby5 e o outro resfriador é próprio do
assentamento, adquirido através da junção entre os produtores de leite do
Assentamento Estrela, AGRAER e Prefeitura Municipal de Sidrolândia, e o leite
entregue nesse resfriador é direcionado ao Dica6 Laticínios. Os caminhões que
buscam o leite no assentamento tanto do resfriador do Laticínios Camby quanto do
Dica Laticínios vêm duas vezes na semana fazer a coleta.

5
Camby: Laticínio do município de Dourados que compra a produção de leite no Assentamento Estrela.

6
DICA: Laticínio de Deodápolis que compra a produção de leite no Assentamento Estrela.
85

Figura 22 - Resfriador de leite do Assentamento Estrela

Fonte: Autor, 2021

Os derivados do leite, boa parte são consumidos pelas famílias camponesas e


o excedente é vendido ali mesmo no assentamento, e quando algum membro da
família vai para a cidade de Rio Brilhante e/ou Sidrolândia os produtos são vendidos
lá.

Elucidamos também o gráfico 11, onde nele demonstramos a porcentagem de


famílias e quais as suas produções.
86

Gráfico 11 – Produtos comercializados pelas famílias entrevistadas (%).


Assentamento Estrela- Sidrolândia- MS

Fonte: Pesquisa de campo, 2021. Org. Medeiros

A partir do gráfico 11 vemos que, 66,7% das famílias entrevistadas têm como
principal produção rentável no lote, a venda do leite e de seus derivados. Vemos
também que 33,3% das famílias camponesas entrevistadas vivem da monocultura.

Em relação ao cultivo da monocultura realizado pelas famílias entrevistadas,


nem sempre foi assim. Algumas dessas famílias que hoje vivem da monocultura já
trabalharam com gado e leiteria. Entretanto, por causa da desvalorização do leite, a
grande oferta de “ganhos” com o agronegócio e a falta de políticas públicas voltadas
para as produções familiares fez com que mudassem a sua produção, optando pelo
arrendamento de suas terras e/ou pelo plantio das monoculturas de soja e milho.

Deste modo, com o agronegócio tomando de conta do Assentamento Estrela


está ficando difícil para as famílias camponesas que ainda não optaram pelo cultivo
da monocultura resistirem na terra e dela tirarem o seu sustento, pois com o uso
excessivo dos agrotóxicos, as plantações e os pomares estão deixando de produzir.

Em relação às plantações encontradas nos lotes das famílias que ainda não
optaram pelo cultivo de monocultura, além dos pomares de frutas diversas, podemos
87

perceber uma pluralidade de cultivos, sendo de hortaliças, abacaxi, mandioca,


abóbora, quiabo, maxixe, melancia, milho e feijão de corda, sendo elas propriamente
para o consumo próprio.

Figura 23- Plantio de Melancia no lote da família camponesa do José e Veronice

Fonte: Autor, 2021


Figura 24 e 25 - Colheita de abóbora, abacaxi e mandioca no lote da família
camponesa José e Veronice

Fonte: Autor, 2021


88

Figura 26 - Plantio de mandioca, maxixe e ao fundo uma pequena lavoura de


banana para o consumo no lote da família camponesa do Adoaldo e Cicera

Fonte: Autor, 2021


Contudo, ao ponto que a monocultura está tomando de conta do
Assentamento Estrela, essa diversidade de cultivo está se extinguindo. As famílias
que participaram da entrevista relataram que está ficando cada vez mais difícil
produzir um produto saudável e orgânico no lote. Antes o problema era com o
entorno do assentamento, pois por estarem ao lado de duas fazendas que estão
arrendadas para o cultivo de cana, os agrotóxicos que eram passados na cana da
usina Passa-tempo afetavam a produção de alimentos saudáveis e orgânicos. Hoje
o problema já está dentro do assentamento, pois cada vez mais os camponeses
estão aderindo ao cultivo da monocultura e, assim, o agrotóxico está se fazendo
presente com mais frequência.

4.3. Programas de créditos acessados pelas famílias camponesas durante a


trajetória de vida e luta no Assentamento Estrela

No Assentamento Estrela, o primeiro programa de crédito voltado para os


beneficiários do programa de reforma agrária veio através do Fomento Rural no final
de 2008 para início de 2009, no valor de R$2.500,00. Antes de explicar sobre como
foi usado esse dinheiro, primeiro vamos conhecer um pouco como funciona o
recebimento e o uso desse dinheiro.

De acordo com o Ministério da Cidadania, o Programa Fomento Rural destina


um crédito no valor de 2.400,00 a 3.000,00 reais para as famílias residentes no meio
rural que estejam em situação de vulnerabilidade social. Assim sendo, o Fomento
Rural tem como objetivo promover a redução da insegurança alimentar e nutricional
89

e contribuir para que as famílias melhorem a sua capacidade produtiva e assim


comecem a gerar renda.

Programa Fomento Rural combina duas ações: o acompanhamento social e


produtivo e a transferência direta de recursos financeiros não-reembolsáveis
às famílias para investimento em projeto produtivo, no valor de R$ 2,4 mil ou
R$ 3 mil. O programa foi criado pela Lei 12.512/2011 e é regulamentado
pelo Decreto 9.221/2017. Essas duas ações são articuladas com o objetivo
de apoiar a estruturação produtiva das famílias rurais mais pobres e o
desenvolvimento do projeto produtivo de cada uma, a fim de que ampliem
ou diversifiquem a produção de alimentos e as atividades geradoras de
renda, contribuindo para a melhoria da segurança alimentar e nutricional e a
superação da situação de pobreza. (MINISTÉRIO DA CIDADANIA,
FOMENTO RURAL, 2021)

Inicialmente este era o projeto no Assentamento Estrela. O dinheiro seria


destinado para compra de ferramentas, mudas e/ou sementes e alimentos para a
subsistência.

No entanto, de acordo com os entrevistados, esse dinheiro não foi entregue


diretamente para eles, e com base nos depoimentos dos entrevistados, cada família
na época fez uma lista do que queria comprar, desde alimentos até ferramentas e
depois essa lista foi passada para a liderança do assentamento, que na época ainda
estava sob a tutela da Federação de Agricultura Familiar (FAF),(digo tutela, pois
quando foi cortada a fazenda e dividida em lotes, as pessoas que estavam na
liderança enquanto eles estavam acampados continuaram a liderar o assentamento,
e desde o início mesmo enquanto acampados essa liderança era questionada pelas
pessoas que ali estavam, seja pela divisão das cestas básicas, pela morosidade em
cobrar o INCRA e até de beneficiamento de localização dos melhores lotes para as
pessoas que eram aliadas a eles). Dito isso, voltamos ao recebimento e uso do
dinheiro do Fomento Rural. Quando foi passada a lista para os coordenadores da
FAF, que também eram assentados do Assentamento Estrela, eles começaram a
determinar o que seria e o que não seria comprado da lista que haviam enviado. Foi
nesse momento que começaram os questionamentos por parte dos camponeses,
mas sem resultado.

Foi então que, foi estabelecido o dia e o local onde seria realizado a compra.
Chegado o dia e com a lista “pré-aprovada”, os camponeses se direcionaram à
cidade no ônibus que havia sido locado pela liderança do assentamento, mas ao
chegar no município de Nova Alvorada do Sul-MS, ao ver o mercado que haviam
90

escolhido perceberam que alguma coisa não estava certa, mesmo assim realizaram
a sua compra.

No retorno para o assentamento ocorreu outro problema. Eles pensaram que


voltariam para casa com as ferramentas e os alimentos que haviam comprado, mas
isso não ocorreu, eles voltaram para casa apenas com os alimentos, e só depois
que seriam entregues as ferramentas que eles haviam comprado. Contudo, quando
foram entregues as ferramentas, elas não eram as mesmas que as famílias haviam
escolhido durante a compra. Após esse ocorrido, as pessoas que estavam na
liderança do assentamento foram afastadas e colocadas outras pessoas no lugar.

Eu trago esse relato, pois com todas as famílias que eu conversei e abordei a
temática envolvendo os créditos recebidos por eles, eles me relataram esse mesmo
problema. Quando eu iniciava a conversa a respeito dos benefícios recebidos do
governo, eles me traziam essa indignação, e pude perceber que nessa hora eles
queriam desabafar frente ao desrespeito e o descaso a qual foram acometidos na
época, e me senti na obrigação de registrar o ocorrido.

Outro programa de crédito que foi acessado por eles foi o Programa Nacional
de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) sendo acessado pela primeira
vez no final do ano de 2009.

Contudo, antes de falarmos sobre o acesso e uso do PRONAF no


Assentamento Estrela pelas famílias camponesas, faremos uma breve análise a
respeito da criação e do funcionamento do PRONAF.

Porém, antes de analisarmos a respeito da criação e do funcionamento do


PRONAF, precisamos entender que as políticas públicas de créditos voltados para a
agricultura familiar camponesa sempre foram uma das principais reivindicações dos
movimentos socioterritoriais e dos agricultores familiares camponeses, pois, antes
da criação das políticas públicas de acesso a crédito voltado para as famílias
camponesas, os principais beneficiários das linhas de créditos eram os grandes
proprietários de terras que tinham como base de produção a agricultura
convencional, o “agronegócio”. E o pequeno produtor, que tinha como base a
agricultura familiar camponesa, ficava desassistido, sem incentivo algum por parte
do governo.
91

Sendo assim, dentre os programas criados pelo governo voltado para a


agricultura familiar camponesa, tivemos: o PROCERA e o PRONAF.

O PROCERA (Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária), que foi


o antecessor ao PRONAF, foi criado em 1986, e tinha como objetivo:

Garantir aos agricultores assentados acesso a recursos financeiros, em


condições diferenciadas, para investimentos em processos produtivos, a fim
de aumentar a produção dos assentados e possibilitar a inserção nos
mercados e, dessa forma, os assentados se emancipariam, obtendo a
titulação definitiva da terra. [...] dividido em três linhas de crédito: custeio,
investimento e coletivo. (VERGES, 2011, p. 53)

Verges (2011, p. 54) nos diz que, apesar do programa ter permitido a
introdução de novas tecnologias e a geração de renda para as famílias assentadas,
houve limitações e impasses para sua execução.
Dentre os impasses, pode-se citar a insuficiência, a descontinuidade e a
demora nos processos de liberação, contratação e pagamento dos mesmos,
o que trouxe consequências negativas quanto à produção e renda dos
agricultores assentados, com reflexo direto sobre a capacidade de
pagamento. Além disso, o acesso ao crédito estava associado a
determinados pacotes técnicos de modernização da agricultura, o que gerou
forte dependência dos assentados em relação às assistências, que, quase
sempre, não ocorreram. [...]. Outro grande problema do programa esteve
relacionado com o fato da não criação de mecanismos que elevassem as
taxas de retorno dos investimentos feitos, ou seja, o governo assumia
elevados riscos, o que gerou a falência do programa. Além disso, a falta de
políticas públicas complementares a de crédito rural colocavam os
assentados a enfrentarem a terra em condições bastante precárias para o
cultivo. (VERGES, 2011, p. 54)

Sendo assim, em meio a todos esses impasses e problemas o PROCERA


acabou sendo extinto e no lugar dele foi implantado o PRONAF.

O PRONAF, portanto, surgiu em meio às intensas mobilizações dos


movimentos socioterritoriais e dos agricultores familiares camponeses que
reivindicavam ações governamentais a favor da Reforma Agrária, envolvendo a
questão do crédito rural. Sendo então que, após essas reivindicações, criou-se em
1996 no Governo de Fernando Henrique Cardoso o Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar PRONAF, substituindo o antigo PROCERA,
que tinha como principal objetivo combater as desigualdades no campo. (AQUINO E
SCHNEIDER, 2015, P. 54).

O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) foi


instituído oficialmente através do decreto presidencial nº 1.946, de 28 de
junho de 1996, sendo concebido com a finalidade de apoiar o
desenvolvimento rural, tendo como fundamento o fortalecimento da
agricultura familiar, como segmento gerador de emprego e renda, “de modo
92

a estabelecer um novo padrão de desenvolvimento sustentável que vise ao


alcance de níveis de satisfação e bem‑estar de agricultores e consumidores,
no que se refere às questões econômicas, sociais e ambientais, produzindo
um novo modelo agrícola nacional”. (BRASIL, 1996, p. 1996 apud AQUINO;
SCHNEIDER, 2015, p. 57)

Tendo o programa no início de sua criação quatro objetivos, sendo eles:

● Criação e melhorias das políticas públicas condizente com a


realidade dos agricultores familiares;
● Melhoria na infraestrutura para maior desempenho produtivo
dos agricultores familiares;
● Viabilização de acesso aos novos padrões de tecnologia e de gestão
social para elevar o nível de profissionalização dos agricultores
familiares;
● Proporcionar estímulos ao acesso dos agricultores aos mercados de
insumos e produtos. (MATTEI, 2005 p 145 apud SANTOS;
CAMACHO; CONCEIÇÃO, 2020, p. 204).

Assim sendo, devemos considerar que o PROCERA e o PRONAF foi uma


conquista dos movimentos socioterritoriais e das famílias camponesas, conquista
essa que veio através de suas lutas por políticas públicas de crédito rural, para que
assim as famílias camponesas pudessem se manter no campo, pois através do
crédito poderiam ampliar a sua produção, aumentar a renda familiar e
consequentemente ter uma melhoria na sua qualidade de vida.

Hoje, o PRONAF, possui várias linhas de crédito, nesse sentido Brasil (2017)
apud Santos; Camacho; Conceição (2020, p. 204-205), elencam as suas diversas
linhas de créditos, sendo elas:

● Pronaf custeio, com a finalidade do custeio de atividades agrícolas e


pecuárias, inclusive aquisição de animais para recria e engorda.
● Pronaf Investimento (Mais Alimentos): Investimento da infraestrutura
de produção e serviços agropecuários e não agropecuários no
estabelecimento rural.
● Pronaf Agroindústria: Investimento em atividades que agreguem
renda à produção e aos serviços desenvolvidos pelos beneficiários
do Pronaf.
● Pronaf floresta: Investimento para implantação de projetos de
sistemas agroflorestais, exploração extrativista ecologicamente
sustentável, plano de manejo e manejo florestal.
● Pronaf semiárido: Investimento em infraestrutura hídrica (50% do
valor financiado) e demais infraestruturas de produção.
● Pronaf jovem: Investimento para atividades agropecuárias, turismo
rural, artesanato e outras atividades no meio rural.
● Pronaf Microcrédito da Reforma Agrária: Financiamento de
atividades agropecuárias desenvolvidas no estabelecimento rural.
● Pronaf Mulher Grupo “B”: Nas condições da linha Microcrédito
Produtivo Rural - Grupo“B.
● Pronaf Mulher Investimento: Nas condições da linha Pronaf
Investimento (Pronaf Mais Alimentos).
93

No Assentamento Estrela, a linha de crédito oferecido e acessado pelas


famílias camponesas foi o PRONAF custeio, e das 18 famílias camponesas que
participaram da entrevista, 12 delas acessaram o PRONAF custeio no valor de
R$21.500,00. Para acessar o PRONAF custeio todos fizeram projetos voltados para
compra de gado leiteiro, e no projeto além do gado leiteiro foi incluído também,
materiais para cerca, ordenhadeira e triturador, com exceção do camponês Adoaldo
Alves que além do gado leiteiro adquiriu também as mudas de Urucum e a máquina
de bater e separar da casca o Urucum.

O primeiro acesso ao PRONAF custeio feito pelas famílias entrevistadas foi


no final de 2009 e seguiu durante os anos seguintes, tendo no ano de 2010 o maior
número de acessos por parte dos entrevistados, conforme demonstrado no gráfico
12.

Gráfico 12 – Número de famílias e ano que acessaram o PRONAF. Assentamento


Estrela- Sidrolândia- MS

Fonte: Pesquisa de campo, 2021. Org. Medeiros.

Em relação ao uso do PRONAF, como mencionado anteriormente, todos que


acessaram fizeram projetos para produção leiteira e para ser realizado esse projeto,
94

contaram com assistência técnica. No entanto, conforme relatado pelas famílias


camponesas, a assistência parou aí. Após a obtenção do crédito, não houve
acompanhamento técnico e eles ainda destacaram que os técnicos, assim que
receberam o dinheiro que era direcionado a eles, sumiram e não voltaram para dar o
suporte necessário.

De acordo com o depoimento dos entrevistados que acessaram o PRONAF, o


dinheiro do técnico foi automaticamente debitado da conta deles e, na época, foi
R$1.500,00 o valor destinado ao técnico e o questionamento que eles têm a respeito
da assistência técnica, é que os técnicos receberam o dinheiro, mas os camponeses
não receberam nenhuma visita para auxiliar na gestão do dinheiro.

E para evidenciar esses fatos, trago alguns depoimentos dos camponeses:

O dinheiro foi descontado, mas não apareceu ninguém para me auxiliar,


pelo menos aqui no meu lote não veio ninguém. (ANTONIO, 2021).

Eu mesmo que sou o técnico aqui do meu lote, não apareceu ninguém aqui
para me ajudar não. (BARBOSA, 2021).

Nunca recebemos visita de técnico nenhum, só receberam o dinheiro e não


apareceu ninguém depois. (ELIAS, 2021).

A gente se virou sozinho, não veio ninguém não, acessamos o PRONAF


para a compra de gado leiteiro, mas não veio ninguém aqui me auxiliar em
como fazer o manejo do gado, se eu não soubesse mexer com gado de leite
não sei o que eu ia fazer. (MANOEL, 2021).

Vemos, portanto, que a assistência técnica voltada para os camponeses não


aconteceu dentre as famílias entrevistadas, e essa falta de assistência vem desde o
começo do Assentamento Estrela. Foi dito que desde que foi dividido os lotes, eles
não receberam assistência alguma.

Referente à quitação do financiamento, foi constatado que dos 12


entrevistados que acessaram, 8 já haviam quitado o crédito junto ao banco. Quando
perguntado se pretendiam acessar o próximo crédito do PRONAF, disseram que não
iriam acessar, pois o outro, o valor era muito alto e não tinha subsídio e nem
carência. A partir do momento que acessasse, tinham apenas noventa dias de
carência e já teria que iniciar o pagamento e as parcelas eram de mais de
R$1.500,00.
95

Além disso, muitos me disseram que pelo lote ser de apenas 10 ha, o gado
que estava ali já era o suficiente, e se fizessem o acesso a outro crédito para
compra de mais gado, não teriam onde colocar o restante do gado. Portanto, ou eles
teriam que vender as vacas que tem e melhorar o rebanho, ou teriam que ficar
arrendando lotes de vizinhos que não conseguiram acessar o PRONAF e ainda não
arrendaram para a lavoura. E o valor proposto a ser acessado por eles era de no
mínimo, R$50.000,00, por isso não aderiram ao programa novamente.

Em relação aos camponeses que não acessaram o PRONAF, temos seis


camponeses, são eles: a família camponesa do Lalo e Marli, a família camponesa do
José e Veronice, família camponesa Celso e Silvia, o camponês Oliveira, a
camponesa Eneil e o arrendatário do assentamento Sr. Antunes.

Em relação à família camponesa do José e Veronice foram impedidos de


acessarem o PRONAF por serem funcionários públicos. Contudo, se eles pudessem
acessar o PRONAF o fariam, pois na percepção deles seria um dinheiro que iria
colaborar em muito no desenvolvimento de seu lote.

O Sr. Oliveira também não acessou o PRONAF, porque sua esposa é


funcionária pública, mas que também queria acessar se tivesse a oportunidade.

Em relação ao Sr. Antunes, ele não acessou o PRONAF e nem tem pretensão
de acessar. O Sr. Antunes é um dos moradores do assentamento que arrenda vários
outros lotes para o plantio de monocultura. Desde o início do assentamento ele
sempre plantou lavouras de soja e milho no lote dele e buscava arrendar os lotes de
outros camponeses. Antes de ir para o assentamento, ele já tinha uma renda que
era adquirida através do arrendamento de outras terras na região de Rio Brilhante. O
Sr. Antunes, é um dos que têm a perspectiva de que a monocultura da soja e do
milho deve prevalecer no assentamento, pois nos dizeres dele é o que movimenta o
mundo. Tivemos alguns problemas com a entrevista do Sr. Antunes e não
conseguimos realizar a entrevista como planejado.

Referente ao PRONAF, o camponês Lalo, relatou que veio a proposta para


que ele pudesse acessar o PRONAF, mas como na época a sua esposa já estava
aposentada e ele já tinha um pouco de vaca leiteira no seu sítio, e já vivia
96

praticamente da renda do sítio e da aposentadoria da esposa preferiu não acessar,


pois ele viu vários companheiros ali do assentamento acessando e depois, quando
tinham que pagar não conseguiram, e acabaram ficando inadimplentes com o
banco, e ele ainda disse:

Nós só temos o nosso nome para honrar, por isso eu não peguei, porque vai
que eu pego e não consigo pagar e daí o meu nome ia sujar e nós
precisamos do nome limpo, para podermos comprar as coisas pro sítio
parcelado na cidade quando nós tá sem dinheiro, e eu não ia conseguir
descansar a minha cabeça no travesseiro sabendo que eu to devendo pro
banco e correndo o risco de eles vir aqui tomar alguma coisa minha. Por
isso não peguei, não sabemos o dia de amanhã, teve companheiro que
pegou e pagou certinho, teve outros que pegou veio a seca o gado morreu e
na hora de pagar ele não conseguiu daí acabaram ficando desanimados
com o sítio e foram embora de volta para a cidade, mas teve também
aqueles que pegaram o dinheiro fizeram negócios errados, e na hora de
pagar cadê o dinheiro, daí a solução foi abandonar e/ou vender o lote, e eu
não quero isso, porque aqui é o meu lugar, o meu sonho o meu pedacinho
do céu (LALO, 2021).

E em relação ao PRONAF, a camponesa Eneil, não acessou o crédito por


impedimentos judiciais, por ela ser aposentada desde a época de acampada. Foi
impedida de requerer o PRONAF, além de ter sido notificada duas vezes por ser
aposentada e estar ali participando de um programa da reforma agrária. No
depoimento dela;

Quando eu fiz a inscrição para participar do programa de reforma agrária e


fiquei acampada ninguém nunca me falou que eu não poderia pegar lote em
assentamentos e receber benefícios por meio de crédito rural. (ENEIL
DUTRA, 2021)

E isso nas palavras dela é o que mais a deixa triste, mas também é o que
mais a deixa com vontade de lutar pela terra, pois desde quando ela entrou no lote
ela nunca recebeu ajuda alguma do governo, tudo foi construído com o suor dela,
conforme depoimento:

Se hoje eu ainda tenho essas vaquinhas, esses porquinhos, e essas


galinhas, essa casa e essa lavoura de Urucum que infelizmente por falta de
apoio do governo tanto Estadual quanto Municipal vai acabar é porque eu
batalhei dia após dia para ter, e vi muitos companheiros nossos daqui do
assentamento que teve o acesso ao PRONAF, mas por falta de
conhecimento e abandono por parte do governo ficou inadimplente, vendeu
o lote e voltou para a cidade com menos do que tinha quando chegou aqui e
com mais dívida do que tinha, eu queria ter acessado o Pronaf lá atrás
quando eu mais precisava, mas não consegui e hoje se vierem me oferecer
eu não quero, por medo de me endividar, pois eles te oferecem o crédito,
você acessa, mas cadê a assistência, cadê a ajuda de um técnico, a gente
tem que se virar pra correr atrás de tudo, assim é difícil, se esse sistema
não mudar o abandono dos lotes serão frequentes. (ENEIL DUTRA, 2021)
97

A família camponesa Celso e Silvia é a única família entrevistada que veio


depois que o assentamento foi criado. Eles vieram para o assentamento no ano de
2013. Contudo, até hoje eles não conseguiram regularizar a situação deles junto ao
INCRA, e por esse motivo de não estar regular, não conseguiram acessar o
PRONAF.

No entanto, no relato deles, assim que a situação for regularizada e tiverem a


oportunidade de acessar o PRONAF o farão, pois na perspectiva deles é um
dinheiro que se for bem empregado ajuda em muito o assentado nas lutas para
permanecerem na terra e nos dizeres deles “a vida no campo é cheia de desafios,
mas é muito mais saudável e tranquila, ao contrário da cidade que é mais difícil,
complicada e desgastante”.

Portanto, como visto, tivemos famílias que acessaram o PRONAF e outras


famílias que não acessaram, contudo, na percepção de todos os entrevistados no
que se refere à permanência na terra, mesmo os que receberam o PRONAF se não
tivessem recebido o crédito estariam até hoje na terra e na luta pela sobrevivência
através da terra, pois, eles não só não desejam abandonar seus lotes e irem embora
de volta para a cidade, como também se referem à cidade como um espaço hostil
para se viver.
98

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho foi desenvolvido com o intuito de conhecer melhor a realidade


das famílias camponesas do Assentamento Estrela, do município de Sidrolândia, no
estado de Mato Grosso do Sul. Assim, como apresentado no trabalho, pudemos
identificar as diversas mudanças ocorridas na vida das famílias camponesas do
Assentamento Estrela. Contudo, essa mudança só foi possível por meio de suas
lutas e resistências desde os acampamentos até a conquista da terra e permanência
no Assentamento Estrela.

No entanto, com a conquista da terra no Assentamento Estrela, os desafios e


dificuldades não cessaram eles apenas se modificaram, pois não tinham casa para
morar, água para beber, energia elétrica, escola para os filhos ficava distante, a terra
era fraca e precisava ser corrigida para que assim pudessem retirar o mínimo para a
sobrevivência, e, o que mais agravou a situação das famílias, foi a falta do Estado
com os investimentos em políticas públicas necessárias para que as famílias
camponesas pudessem da terra tirar o seu sustento.

Segundo as famílias camponesas, essa falta de apoio do Estado foi o


principal condicionante para as evasões no assentamento, sendo preciso os
camponeses buscarem soluções para sanar essas evasões. E a partir disso foram
criadas duas associações e adotados alguns projetos voltados para a agricultura
familiar camponesa, além de muitas famílias terem buscado fora do lote um meio de
adquirir uma renda, seja através de emprego formal e ou diárias em fazendas
vizinhas para que pudessem permanecerem no lote.

Como apresentado, o PRONAF tardou a chegar às famílias do Assentamento


Estrela, mesmo esse crédito representando um importante papel para o
desenvolvimento do assentamento e permanência dos camponeses. Embora,
mesmo o crédito vindo tarde, contribuiu para com a permanência na terra pela
maioria das famílias que o acessou e também por uma melhora significativa na vida
da maioria dos produtores, pois através do acesso ao PRONAF muitos ali deixaram
de buscar uma renda fora do lote e começaram a viver e sobreviver apenas da terra.

Entretanto, mesmo com acesso ao PRONAF tivemos relato de pessoas que


não conseguiram pagar o crédito e estão endividados, mas isso se deu pela falta de
99

assistência técnica para com as famílias ao receberem o crédito, o que ocasionou


em muitos casos, o investimento de forma errada.

E isso nos leva ao questionamento de que, por mais que o programa seja
acessado pelas famílias camponesas, se ele não vier junto de um acompanhamento
técnico e profissional, dificilmente terá êxito e no fim, aquilo que era para ser uma
solução, acaba se transformando em mais um problema.

Contudo, mesmo os camponeses buscando soluções através de projetos


voltados para a agricultura camponesa, da criação das associações e do
recebimento do PRONAF, ocorreram muitas evasões no assentamento,
possibilitando que a lógica da produção camponesa tivesse parte de seu espaço
apropriado pela lógica do agronegócio. Sendo então, a partir deste momento, que
começa a haver uma mudança na lógica de produção do assentamento, saindo da
lógica de produção de alimentos destinados ao consumo e venda do excedente,
para a produção de monocultura da soja e do milho.

E essa mudança na lógica da produção, vem prejudicando muito o


assentamento, pois, por causa do uso excessivo de agrotóxicos nas lavouras de
monocultura, a produção de alimentos para o consumo está cada vez menor e
assim, impedindo os camponeses de terem a vida saudável e tranquila que eles
tanto almejaram.

Assim sendo, as lutas das famílias camponesas pela permanência na terra no


Assentamento Estrela vão além da luta pela terra. Ela está sendo também a luta
pela manutenção e permanência do modo de vida camponês e, de fato, essas lutas
reforçam e retratam que os assentados, mesmo limitados e não assistidos pelo
Estado, buscam de todas as formas uma solução para que possam realizar os seus
sonhos.

Nesse sentido, as famílias camponesas do Assentamento Estrela, procuram,


de todas as formas possíveis, se manter no assentamento justamente para não
voltarem a uma condição pior a que estavam quando conquistaram o tão sonhado
“pedaço de terra”.
100

Deste modo, eu finalizo esse trabalho agradecendo a todas as famílias do


Assentamento Estrela que de forma direta e indireta contribuíram e colaboraram
com a elaboração e execução desta pesquisa. Gratidão!
101

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108

ANEXOS

Questionário das entrevistas semiestruturadas

Universidade Federal da Grande Dourados

Local do Trabalho de campo: Assentamento Altemir Tortelli “Estrela”

Período da realização das entrevistas: Será realizada entre setembro a novembro de


2021

Elaboração: Thiago Ferreira Medeiros

Orientadora: Profa. Drª. Márcia Yukari Mizusaki

Entrevistador: Thiago Ferreira Medeiros


Data: __/__/__

Roteiro Geral

1-Elementos de identificação do entrevistado:

1.1-Nome do entrevistado:

1.2-Número do Lote:

1.3- Você é o titular do Lote? Se não, quem é?

1.3-Sexo:( ) Feminino ( ) Masculino

1.4-Grau de Escolaridade:

1.5- Naturalidade:

1.6- Idade:

1.7-Sua família é composta por quantas pessoas?

( )1a3 ( )3a5 ( )5a7( )7a9

2-Trajetória do assentado até o momento da posse do seu lote:


109

2.1- Mora no assentamento desde o início? Se sim, participava de qual movimento


social? Se não, como que adquiriu o lote?

2.2- Ficou acampado? Por quanto tempo? Onde ficou? Quais foram às dificuldades
encontradas?

2.3- Por que resolveu acampar?

2.4- Onde residia antes de ficar acampado e adquirir o seu lote no assentamento?

2.5- Exercia alguma função remunerada antes de adquirir o lote? Se sim qual?

3- Trajetória do assentado no assentamento. Desafios para a permanência no


lote:

3.1- Você e sua família tinham conhecimento da realidade de um assentamento,


como viver, trabalhar, se organizar em grupo?

3.2- Qual a sua maior dificuldade a partir do momento que entrou no lote e começou
a trabalhar na terra?

3.3- A partir do momento que adquiriu o lote, você recebeu alguma assistência
técnica? Se sim qual?

3.4-Você recebeu algum benefício de crédito do Governo Federal? Se sim, qual? E


qual o valor?

3.5-Considerando que você tenha recebido os benefícios de crédito do Governo


Federal, ele foi usado de qual maneira por você?

3.6- Considerando que você tenha recebido os benefícios de crédito do Governo


Federal, ele já foi quitado? Teve acesso a outra linha de crédito?

3.7- Você recebeu alguma assistência técnica quando recebeu o PRONAF? Qual?

3.8- Continua recebendo assistência técnica? Se sim, de quem?

4- Fontes de rendimento:
110

4.1- Atualmente alguém da família trabalha fora do lote? ( ) Não trabalha ( )


Assalariado c/ carteira de trabalho ( )Assalariado s/ carteira de trabalho ( )
Trabalhador Rural ( ) Aposentado( ) outro

4.2- Qual é a Renda Familiar?

4.3- Da renda familiar, quanto é gerado a partir da produção no lote?

4.4- Participa de algum programa do Governo Federal? Qual?

5- Produção do lote:

5.1- O que você produz no lote?

5.2- Tem produção animal no lote? Quais?

5.3- Quem cuida da produção?

5.4- Qual a finalidade da produção do lote? Venda ou só para o consumo?

5.5- Para onde ela é vendida?

5.6- Antes do PRONAF você teve alguma dificuldade para produzir no lote? Quais?

5.7- Sua produção teve um aumento depois de adquirir o PRONAF?

6. Evasões no Assentamento causas e soluções


6.1-Quando começaram as evasões?
6.2- Na sua opinião, quais poderiam ter sido as dificuldades encontradas pelos
assentados para a não permanência no lote?
6.3- Na sua opinião, o que poderia ter sido feito de início para evitar a evasão das
famílias?

6.4-Foi feito algo por parte do Governo e dos movimentos sociais para controlar
essa evasão? E por parte dos assentados foi feito algo?

6.5- E hoje como está a organização do assentamento?

7- Reflexões do entrevistado
111

7.1- O que motivou a sua permanência na terra?

7.2- Quais os desafios encontrados para a permanência na terra?

7.3- Fazendo uma comparação da sua vida antes e depois do assentamento, que
mudanças ocorreram em sua vida? O que melhorou a situação da sua família nos
aspectos financeiros, de moradia, saúde e alimentação? Quais foram as mudanças
mais significativas?

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