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Os Maias – Resumo

Capítulo 1
Os Maias eram uma antiga família da Beira, que acabou por ficar reduzida ao avô,
Afonso da Maia, e ao neto, Carlos Eduardo.
No outono de 1875, Carlos da Maia e o avô, Afonso da Maia, vieram instalar-se na sua
casa de Lisboa, conhecida pelo nome de “ Ramalhete “.
A casa do Ramalhete estava abandonada, desde que a família se tinha retirado para a
quinta de santa Olávia, nas margens do Douro.
O procurador da família enumerou a Afonso da Maia os inconvenientes da decisão de
se dar habitabilidade ao Ramalhete, pois a casa precisava de muitas obras, tinha apenas
um quintal no lugar de um jardim e, além disso, havia uma lenda segundo a qual eram
sempre fatais aos Maias as paredes do Ramalhete (indício de fatalidade). No entanto,
Afonso da Maia manteve-se firme na sua decisão.
Carlos, que era um rapaz de gosto e de luxo, entregou a reconstrução do Ramalhete a
um arquitecto e decorador inglês e da casa antiga só restou a sua fachada, por imposição
de Afonso.
Terminada a reconstrução, a casa manteve-se fechada, enquanto Carlos fez uma longa
viagem pela Europa, após ter terminado o curso de medicina em Coimbra, e foi na
véspera da chegada do neto que Afonso se veio também instalar no Ramalhete,
deixando a casa da quinta de santa Olávia. Carlos alimentava projetos de exercer a sua
carreira e o avô queria estar perto dele.
Afonso gostava do Ramalhete e do próprio bairro onde a casa se situava, embora lhe
desagradasse o facto de os prédios construídos em redor terem ocultado quase
completamente a paisagem que se vislumbrava do terraço, tendo-lhe restado apenas uma
“ pequena tela marinha “ com o rio e os seus barcos entre dois prédios de cinco andares.
O terraço comunicava com o escritório de Afonso, onde Carlos tinha preparado
especialmente um recanto ao avô, ao lado do fogão.
De santa Olávia, Afonso mantinha a saudade das suas ricas águas, que o tinham mantido
robusto até à velhice.
Carlos via o avô como um Afonso de Albuquerque, “ um varão esforçado das idades
heróicas “, embora Afonso se considerasse apenas “ um antepassado bonacheirão que
amava os seus livros, o aconchego da sua poltrona, o seu whist ao canto do fogão “. Por
sua vez, o procurador Vilaça via-o como um patriarca, quando o vinha encontrar ao
canto da chaminé, com o seu livro na mão e o seu velho gato aos pés, o “ Reverendo
Bonifácio “.
No passado, Afonso tinha sido um rebelde jacobino, ou seja, um liberal, admirador da “
Enciclopédia “, de Rousseau, Volney e Helvécio, o que chocou o seu pai, Caetano da
Maia, um português dos antigos, que, sentindo-se desonrado com as ideias liberais do
seu filho, o expulsou de casa, desterrando-o para a sua quinta de santa Olávia.
Após alguns meses de desterro em santa Olávia, Afonso, saturado do ambiente de
marasmo da quinta, voltou, aparentemente arrependido, a pedir ao pai que o deixasse ir
para Inglaterra.
Em contacto com o luxo inglês, Afonso depressa esqueceu as suas ideias
revolucionárias e só regressou a Lisboa quando o seu pai morreu. Nessa altura conheceu
D. Maria Eduarda Runa, com quem veio a casar-se e de quem teve um filho.
A família Maia vivia num palacete, em Benfica, mas Afonso vivia desgostoso com a
política miguelista, alimentando saudades de Inglaterra e da sua requintada aristocracia.
A ideologia política de Afonso tornou-se conhecida e um dia a sua casa foi invadida e
revistada pela polícia, que procurou, em vão, papéis e armas, que esperava encontrar
escondidos.
Depois das buscas efetuadas pela polícia, a família Maia não abriu mais as portas do
seu palacete e partiu para Inglaterra, tendo-se instalado com luxo, nos arredores de
Londres.
A família Maia vivia rodeada de conforto, mas Eduarda Runa definhava em Londres,
com saudades do seu país, pois não apreciava o clima de Inglaterra nem o seu
protestantismo.
Odiando tudo o que era inglês, Eduarda Runa também não aceitara que Pedro estudasse
num colégio inglês, tendo mandado ir de Lisboa o padre Vasques para educar o seu
filho, ensinando-lhe o catecismo e o Latim. Afonso vivia desgostoso com o tipo de
educação que Pedro recebia, querendo proporcionar-lhe o contacto com a natureza, mas
não conseguiu sobrepor-se à influência da mulher.
Maria Eduarda não deixava de alimentar as saudades do seu país, que nem uma viagem
por Itália acalmou, e foi necessário regressar a Benfica.
Uma vez em Lisboa, o padre Vasques marcava presença na casa dos Maias, que era
também constantemente visitada por outros religiosos, que exploravam as esmolas de
Maria Eduarda Runa, o que despertava a revolta de Afonso contra igrejas e padres.
Pedro estava um homem, mas tinha um carácter frágil e melancólico, não ousando
sequer contestar o padre Vasques, a quem detestava.
Afonso quis mandar Pedro para Coimbra, mas mais uma vez viu-se forçado a obedecer
à mulher, que não quis separar-se do filho.
Do carácter de Pedro, sobressaiu uma grande tendência amorosa, o que fez com que aos
dezoito anos já tivesse o seu “ bastardozinho “.
Quando Maria Eduarda Runa morreu, Pedro passou por um longo período de agonia,
em que visitava todos os dias a campa da mãe, tendo passado, depois, a frequentar
botequins, para afogar a sua dor, e tendo regressado, finalmente, ao mesmo estado de
abatimento.
Um dia as crises de Pedro acabaram, pois ele estava apaixonado, alimentando um amor
que tinha nascido de uma simples troca de olhares com uma bela senhora loira que viu
passar numa caleche, acompanhada do seu pai, numa tarde em que estava no Marrare.
Um rapaz chamado Alencar, poeta romântico, vendo o interesse com que Pedro seguia a
caleche que transportava aquele rapariga loira pelo Chiado, propôs-se dar-lhe
informações sobre ela, em troca de uma garrafa de champanhe.
Segundo Alencar, a rapariga chamava-se Maria Monforte e tinha aparecido em Lisboa
dois anos antes, tendo o pai alugado uma casa em Arroios e tendo a rapariga começado
a causar impressão no teatro de S. Carlos. O passado do velho Monforte não era muito
abonatório, pois uma facada nos Açores tinha-o levado a fugir num navio americano,
mais tarde tinha sido feitor numa plantação da Virgínia e, por fim, tinha feito fortuna no
tráfego de negros. Por isso Maria, que causava o despeito das senhoras, devido às suas
jóias, à sua beleza e aos seus magníficos cabelos loiros, recebeu o apelido de “ negreira
“.
Pedro soube por Alencar que um amigo chamado Melo conhecia os Monforte e, duas
semanas depois, já Pedro acompanhava esta família no teatro de S. Carlos.
Os velhos amigos dos Maias depressa comunicaram a Afonso os amores de Pedro,
embora Afonso já suspeitasse de alguma paixão do filho, devido ao movimento do
escudeiro que todos os dias partia da quinta com um ramo de flores e regressava a
cheirar o perfume de um envelope.
Depois de conhecer o passado desonroso do pai Monforte, Afonso só aceitava que
Maria fosse amante do filho, embora mesmo esse lugar fosse vergonhoso.
Entretanto Afonso começou a sentir-se inquietado com as saídas do filho e com os
comentários dos amigos, que sugeriam que o Pedro fizesse uma longa viagem e
manifestavam o seu desagrado pelo facto de Lisboa estar tão mal frequentada.
No verão Pedro partiu para Sintra, pois os Monforte tinham lá alugado uma casa.
Entretanto Vilaça informou Afonso que Pedro o tinha questionado sobre os seus bens e
sobre a possibilidade de levantar dinheiro.
Afonso pensava que Pedro quereria apenas sustentar alguns caprichos de amante, não
imaginando que o filho alguma vez se atrevesse a desonrar o nome da família, casando
com Maria.
Um dia Afonso cruzou-se com Maria, tendo-a visto passar na caleche do seu filho,
sentada ao lado de Pedro e abrigada numa sombrinha escarlate, que envolvia Pedro
como se fosse uma mancha de sangue (indício de fatalidade).
Finalmente Pedro veio pedir a Afonso licença para casar e, como o pai recusou, Pedro
abandonou a casa de Benfica e hospedou-se num hotel.
Quando Vilaça informou Afonso que Pedro tinha casado e que iria partir para Itália, em
lua de mel, Afonso, mostrando a maior serenidade, limitou-se a dizer ao escudeiro que
retirasse da mesa o talher de Pedro. No final do almoço, ao levantar-se Afonso apoiou-
se no braço de Vilaça, “ como se lhe tivesse chegado a primeira tremura da velhice “.
Entretanto falaram de política e não se mencionou mais o nome de Pedro.

Capítulo 2
Pedro da Maia e Maria Monforte passeavam por Itália, conhecendo as suas cidades, mas
por fim Maria mostrou-se saturada, manifestando o seu desejo de ir a França, e Pedro
satisfez prontamente o seu capricho.
Em Paris vivia-se um ambiente de revolução, que despertou o nervosismo de Pedro e o
levou a apressar o regresso a Portugal.
Maria, a quem desagradava a hostilidade do sogro, sentindo a necessidade da sua
aprovação, pediu a Pedro que escrevesse uma carta ao pai. Maria estava grávida e por
isso prometia que, caso tivesse um rapaz, lhe daria o nome de Afonso.
Quando o casal chegou a Lisboa, Pedro apressou-se a visitar o pai, mas Afonso
tinha partido para a sua quinta de santa Olávia.
Pedro sentiu-se de tal modo ferido com a reação do seu pai que também não
mostrou interesse em comunicar-lhe a notícia acerca do nascimento da sua filha. Por sua
vez Maria manifestava o seu despeito em relação ao sogro, chamando-lhe os piores
nomes.
Alguns amigos de Pedro, que já frequentavam a sua casa, nomeadamente
Alencar e D. João da Cunha, começaram a concordar que o comportamento de Afonso
era sintoma de uma certa teimosia e de alguma dificuldade em acompanhar a evolução
das mentalidades.
Quando a filha Maria Eduarda (nome escolhido em homenagem à avó) fez um
ano, o casal deu uma grande festa, à qual compareceu a sociedade lisboeta.
As festas foram-se tornando mais frequentes na casa de Pedro e de Maria
Monforte, distinguindo-se sobretudo pela beleza e pelo luxo de Maria.
Pedro começava já a ficar saturado do ambiente repetido de festas em sua casa,
nas quais Maria estava permanentemente rodeada de homens que a admiravam.
Afonso da Maia teimava em refugiar-se em santa Olávia, o que despertava o
rancor de Maria e ao mesmo tempo a alegria do velho Monforte, a quem intimidava a
perspectiva de se ver na presença daquele distinto fidalgo.
Quando Maria teve outro filho, Pedro delineou novamente o plano de se
aproximar do pai, o que agradou a Maria, que se prontificou a visitar Afonso,
acompanhada do filho, quando ele regressasse a Benfica.
Pedro quis dar ao filho o nome de Afonso, mas Maria andava a ler uma novela,
cujo herói era o último Stuart, o príncipe Carlos Eduardo, e quis dar esse nome ao filho,
porque lhe parecia prometer-lhe um destino “ de amores e façanhas “ (novo indício de
fatalidade).
Pedro saiu numa caçada, organizada na sua quinta da Tojeira, para lá de Almada,
em honra de um príncipe italiano, que tinha chegado a Lisboa e de quem se fizera
amigo. (Será que este príncipe italiano vem introduzir alguma agitação no tédio desta
vida burguesa? AGUARDEMOS O RUMO DOS ACONTECIMENTOS!!!).
Pedro feriu o amigo italiano durante a caçada e por isso hospedou-o em sua casa,
chamando o médico e duas enfermeiras para o tratarem.
A estadia de um príncipe italiano em sua casa excitou a curiosidade de Maria
que, na manhã seguinte, incumbiu a sua criada de subir ao quarto do hóspede,
inquirindo sobre o seu estado de saúde e aproveitando o ensejo para apreciar o seu
aspeto físico.
A criada de quarto ficou extasiada com a beleza do príncipe, comunicando a sua
impressão a Maria.
A deferência com que Pedro tratava o napolitano indignava Maria, que ainda
convalescia do parto e por isso ansiava ver-se livre do seu hóspede.
Quando finalmente o italiano regressou ao seu hotel, sem ainda ter visto Maria,
em agradecimento da sua hospitalidade, mandou-lhe um admirável ramo de flores,
acompanhado de um belíssimo poema que fizera em sua homenagem.
No dia do baptizado de Carlos Eduardo, o italiano compareceu, causando em
todos uma boa impressão.
Pedro foi informado que o pai regressaria a Lisboa para ser operado e logo
comunicou a Maria a sua intenção de tentar uma nova aproximação, mas Maria pediu-
lhe calma, considerando que seria mais sensato diminuírem o ambiente de festas em
casa, levando uma existência mais doméstica, e só depois seria adequado procurarem
Afonso. Além disso seria também sensato esperarem que o velho Monforte, que receava
a presença de Afonso da Maia, partisse para as águas, nos Pirinéus.
Os hábitos de Maria mudaram, tendo-se tornado muito mais recatada e passando
as noites apenas entre alguns íntimos, entre os quais de destacava o italiano Tancredo
(ADIVINHAM ALGUM INDÍCIO NESTA MUDANÇA DE COMPORTAMENTO
POR PARTE DE MARIA?).
Entretanto, durante o dia, Maria dedicava-se à caridade e frequentava também as
igrejas.
Maria demonstrava cada vez mais uma maior paixão pela filha, de quem o italiano fez
alguns retratos.
Quando o velho Monforte partiu para os Pirinéus e Pedro se quis, mais uma vez,
aproximar-se de Afonso, Maria sugeriu que esperassem pelo Inverno.
Numa tarde de Dezembro, Pedro apareceu em casa do pai, surpreendendo-o com
o seu aspecto desalinhado e comunicando-lhe que Maria o tinha abandonado, tendo
partido com o italiano e tendo levado a filha consigo.
Afonso avaliou o vexame a que Pedro o sujeitava, lançando o seu nome pela
lama, por não ter respeitado a sua autoridade, mas mesmo assim reprimiu a sua cólera e
tentou consolá-lo, mostrando-lhe, assim, todo o seu carinho de pai.
Maria tinha apenas deixado uma carta, onde comunicava a sua decisão,
apresentando-a como uma fatalidade.
Pedro chamou a ama, que estava com o seu filho, e apresentou a criança a
Afonso, que logo lhe dispensou todas as atenções, esquecendo os problemas que o
inquietavam.
Pedro não se cansava de dar razão ao pai e manifestou o propósito de esquecer
aquele desaire da sua vida, talvez fazendo uma viagem pela América.
Quando chegou a hora do jantar, Pedro não acompanhou Afonso, mas o talher
de Pedro foi posto novamente na mesa e os criados moviam-se em silêncio, como se
estivessem num ambiente de luto.
Apesar da dor que o dominava, Afonso sentia uma vaga alegria, devido à
presença do neto.
Afonso foi encontrar Pedro na varando do seu quarto, exposto à chuva e ao
vento, e forçou-o a sair dali, para que os criados pudessem arrumar o quarto.
Pedro fez companhia ao pai durante alguns momentos, mas depressa manifestou
o seu propósito de se recolher ao seu quarto, porque se sentia muito cansado.
Afonso demorou-se ainda um pouco no escritório, auscultando algum rumor que
porventura viesse do quarto de Pedro e por fim dirigiu-se ainda ao quarto do neto, para
o observar e aconchegar.
Antes de ele próprio se recolher ao seu quarto, Afonso foi ainda despedir-se de
Pedro e encontrou-o a escrever, tendo ele declarado que estava a redigir um recado para
o procurador Vilaça, para que se encarregasse de trazer de Arroios os seus pertences.
Durante a noite, Afonso esteve apreensivo e vigilante, atento aos passos do filho
e quando, pela manhã, começava já a cair no sono, foi despertado pelo som de um tiro,
que atroou a casa.
Afonso acorreu imediatamente ao quarto de Pedro, tendo vindo a encontrar o
filho morto e uma carta que ele deixara.
Daí a dias fechou-se a casa de Benfica e Afonso partiu com o neto e com todos
os criados para a quinta de santa Olávia.
Quando Vilaça foi a santa Olávia, em Fevereiro, acompanhar o corpo de Pedro,
que ia ser depositado no jazigo de família, encontrou Afonso da Maia tão em baixo que
voltou para Lisboa a dizer que o velho homem não duraria um ano.

Capítulo 3
Neste episódio assistimos a uma mudança de espaço. Acomodemos a nossa fantasia no
comboio da imaginação e viajemos até à quinta de santa Olávia, nas margens do Douro.
O percurso é fascinante, rumo aos belíssimos socalcos e vinhedos do norte. Depois
poderemos instalar-nos confortavelmente à mesa das refeições e usufruir de um
opulento jantar, no qual não faltarão as boas iguarias da cozinha portuguesa, começando
nos aperitivos e terminando no aromático café. O assunto abordado na conversa dos
convivas será sobre o ainda tão actualizado tema da “ Educação “.
Numa manhã de Abril, nas vésperas da Páscoa, Vilaça fez uma visita a santa
Olávia.
Teixeira, o mordomo, conduziu Vilaça à sala de jantar, onde Gertrudes, a velha criada,
o cumprimentou.
Vilaça teve dificuldade em reconhecer Afonso, quando o viu a subir a rua,
robusto e corado, embora os seus cabelos estivessem todos brancos.
Afonso e Vilaça cumprimentaram-se com emoção e, ao ver Carlos, Vilaça ficou
deslumbrado com o seu crescimento, beijando-o arrebatadoramente.
Carlos pendurou-se e balançou-se num trapézio, enquanto Vilaça o contemplava,
embevecido, reconhecendo nele os traços da família dos Maias, nomeadamente os
olhos e o cabelo.
Afonso perguntou se tinham preparado o quarto ao senhor Vilaça, já que o
quarto onde ele habitualmente dormia tinha sido ocupado pela senhora viscondessa,
uma prima da mulher de Afonso, que tinha ficado viúva e pobre e Afonso recolhera.
Afonso comunicou, entretanto, que eram horas de jantar, justificando que havia novas
regras, devido à necessidade de impor um regime a Carlos. Assim almoçava-se às sete,
antes de Carlos partir para a quinta, e jantava-se à uma hora. (No campo o pequeno-
almoço corresponde ao almoço da cidade e o almoço ao jantar).
Em conversa com o Teixeira, Vilaça comentou que era Carlos que fazia reviver
aquela casa e calculou que o menino seria alvo de todos os mimos, mas Teixeira
desenganou-o, informando-o que Carlos estava a ser sujeito a uma educação muito
rigorosa, inspirada no modelo inglês. Seguindo as regras desta educação, Carlos tinha
rigor na alimentação e beneficiava de um contacto directo com a natureza, podendo
correr, subir às árvores, cair, molhar-se e apanhar sol, tal como o filho de um caseiro.
Carlos estava a ser educado por um percetor inglês, que, mal tinha chegado, o
tinha logo ensinado a remar e a fazer habilidades no trapézio.
Quando Vilaça chegou à sala, já o esperavam Afonso, Carlos, Brown, o abade
Custódio e a senhora viscondessa.
Falando-se sobre a viagem de Lisboa, o abade manifestou a sua pouca
familiaridade com os comboios, mas Vilaça lembrou que também podia haver acidentes
quando se circulava pelas estradas.
Durante o jantar, foi também abordado o tema da educação, na sequência de
Vilaça ter perguntado a Carlos se já ia adiantado nos seus estudos.
Carlos disse que já sabia montar muito bem a sua eguazita, mas, quando Vilaça
perguntou se Carlos conhecia alguns escritores clássicos, o abade referiu ironicamente
que ali o Latim, segundo ele a base da educação, era visto como algo muito antigo.
Brown entendia que era necessário desenvolver primeiro os músculos, posição
que Afonso aprovava, alegando que era importante apostar-se primeiro na saúde e na
força.
Segundo Afonso, a instrução não poderia consistir apenas em saber recitar, mas
sobretudo em aprender coisas úteis e práticas. (É IMPORTANTE REFLETIREM
SOBRE A QUESTÃO DA EDUCAÇÃO, ABORDADA NESTE ROMANCE, E
CONFRONTAREM AS DUAS CONCEPÇÕES DEFENDIDAS: EDUCAÇÃO À
INGLESA E À PORTUGUESA).
Entretanto os convivas puderam apreciar a desenvoltura com que Carlos falava
inglês, no seu diálogo com o preceptor.
Carlos falou ao ouvido do avô, para lhe fazer um pedido, e o avô acabou por lhe
dar assentimento, apenas porque era dia de festa, devido à presença do Vilaça. Carlos
podia então ir buscar a Teresinha, que era a sua namorada.
O café foi tomado no terraço, enquanto observavam Carlos, que se balouçava no
trapézio.
Enquanto Afonso elogiava as virtudes da ginástica, o abade comentou que aquela
educação poderia fazer atletas, mas não fazia bons cristãos, insistindo que Carlos, como
único herdeiro de uma casa tão grande e com futuras responsabilidades na sociedade,
deveria aprender a doutrina.
O abade referiu mesmo que, numa ocasião em que uma senhora tinha pedido a
Carlos para lhe recitar o Ato de Contrição , ele respondera que o não sabia.
Afonso argumentava que era mais correto uma criança assimilar a recusa dos
maus actos por serem indignos de um cavalheiro e de um homem de bem do que do que
por serem atentatórios contra os mandamentos de Deus e puníveis com as penas do
inferno. Seria mais correto agir por respeito a códigos de honra e de virtude do que por
receio das penas do inferno ou pela esperança de conquistar o paraíso.
De regresso a casa, após um passeio pelo campo, já os esperavam as Silveiras,
senhoras ricas de uma quinta próxima, uma delas com dois filhos, o Eusebiozinho e
Teresinha, a noiva de Carlos.
Eusebiozinho, que tinha um aspeto frágil, sombrio e melancólico, em contraste
com o vigor de Carlos, era um menino que revelava, desde o berço, um grande interesse
por livros e por tudo o que dizia respeito ao saber, traçando letras e algarismos sobre um
caderno.
Na sala estava também o doutor delegado, um presumível candidato ao
casamento com a Silveira viúva, cujo pedido formalizado acabava sempre por ser
adiado.
Após o café, os homens dirigiram-se à sala de jogo, enquanto as senhoras
ficaram a conversar na sala.
Carlos apareceu na sala com a sua noiva, relatando as brincadeiras com que se
tinham ocupado. A tia Ana, a quem assustava a impetuosidade de Carlos, fazia
recomendações a Teresinha, dizendo-lhe que devia ter propósitos.
Carlos entretanto precipitou-se sobre Eusebiozinho, querendo arrastá-lo para
África, num combate aos selvagens, mas a mãe acorreu em seu socorro, já que o
menino tinha uma saúde muito frágil.
Quando deram as nove horas e Carlos viu o perceptor Brown aparecer, suplicava
que ainda era cedo para se deitar, ainda por cima sendo aquele um dia de festa, em que
tinham visitas, mas o avô manteve-se impassível e obrigou Carlos a retirar-se. Todos os
presentes estranhavam aquela rigidez, mas Afonso alegava que era necessário método.
D. Ana Silveira desabafou com Vilaça que aquela educação à inglesa, ministrada
por um herético e protestante, nunca fora aprovada pelos amigos da casa, tendo em
conta que Afonso tinha ao seu dispor o abade Custódio, que daria certamente à criança
uma boa preparação para fazer boa figura em Coimbra.
D. Ana referiu ainda que Carlos, para além de algum conhecimento do inglês,
poucos talentos possuía. Depois, querendo pôr à prova os dotes de Eusebiozinho,
incitou-o a declamar uns versos que ele conhecia e foi com a promessa de dormir essa
noite com a mamã que o menino acedeu a cumprir esse pedido. Vilaça mostrou-se
impressionado com o talento do rapaz, confirmando que ele era um prodígio.
Depois de os convidados se retirarem, Vilaça ainda acompanhou Afonso à
livraria, enquanto ele, à boa maneira inglesa, bebia o seu conhaque.
Afonso fez referência à educação de Eusebiozinho que, naquela idade, vivia sob
a protecção da criadagem, da mãe e da tia, passando dias inteiros a decorar versos e
páginas do catecismo.
Vilaça tentava abordar um assunto com Afonso, acabando por conseguir
comunicar-lhe que tinha notícias de Maria Monforte, pois o poeta Alencar, que tinha
sido frequentador da casa em Arroios, tinha estado com ela em Paris.
Afonso, após a morte de Pedro, tinha feito todos os esforços para localizar
Maria, querendo retirar-lhe a filha, mas, não conseguindo saber nada sobre o seu
paradeiro, acabara por desistir.
Soube-se que Maria tinha vivido em Áustria e depois no Mónaco, tendo levado
mais tarde em Paris uma vida de dissipação. O italiano tinha morrido num duelo e mais
tarde também o senhor Monforte, a quem a filha arruinara com o seu luxo. Maria estava
reduzida à miséria, entregando-se a uma existência de excessos.
Sobre a neta, Afonso acabou por aceitar que ela estaria morta, de contrário, tal
como Vilaça alegava, seria natural que Maria viesse reclamar a legítima que cabia à
criança. Ficou então decidido que não se abordaria mais o nome de Maria.
Quando Vilaça partiu, Afonso ainda lhe comunicou que iria contactar um primo
que vivia em Paris, para que tentasse abordar Maria, oferecendo-lhe dinheiro para
entregar a filha ao avô, caso ela estivesse ainda viva.
Vilaça achou o plano arriscado, pois a menina já ia nos seus treze anos, o seu
carácter estava formado e ela teria saudades da mãe.
Carlos irrompeu pelo quarto, reclamando a presença do avô e de Vilaça, para
apreciarem uma coruja que o Brown tinha encontrado. Era necessário apressarem-se,
pois tinham que colocar a ave no ninho, porque a mãe podia dar pela falta da cria e ficar
aflita.
Afonso entretanto contou a Vilaça que o Carlos sabia que o pai se tinha
suicidado, pois teria ouvido os comentários de algum criado e tinha questionado o avô
sobre o assunto. Como o avô não lhe escondeu nada, a reacção de Carlos foi a de pedir
uma pistola e o avô mandou comprar no Porto uma pistola de vento.
Passadas duas semanas após a sua partida, Vilaça enviou uma carta a Afonso,
com a notícia de que Alencar tinha visto em casa de Maria o retrato de uma menina que
Maria apresentara como a filha que lhe tinha morrido em Londres.
Afonso não deixou de escrever ao seu primo, mas as informações que conseguiu
recolher foi que Maria tinha fugido com um acrobata de circo para a Alemanha e
Afonso, saturado das aventuras desta mulher, decidiu que seria melhor esquecê-la.
Como iria ser aberta a linha de caminho de ferro até ao Porto, Vilaça tinha
manifestado, por carta, o seu propósito de fazer uma visita demorada a Afonso,
acompanhado do seu filho, mas essa visita já não chegou a concretizar-se, visto que o
pai Vilaça morreu de uma apoplexia.
Carlos, observando a tristeza do avô, sugeriu-lhe que fizesse um belo jazigo a
Vilaça, tal como tinha feito a Pedro.
Anos mais tarde, em Coimbra, o filho de Vilaça, que herdara o cargo de
procurador dos bens da família dos Maias, entrou no hotel Mondego, para comunicar a
Afonso que Carlos tinha feito o seu primeiro exame, mostrando um desempenho
brilhante.
Afonso abraçou-se ao neto, muito comovido, não conseguindo conter as
lágrimas.

Capítulo 4
Temos finalmente Carlos formado em medicina, com muita distinção. Em educação e
carácter e também força de vontade, tudo parece contribuir para termos um homem útil
ao país. Será que algo vai falhar?
Vamos então apreciar como é que Carlos se irá desembaraçar no meio social lisboeta.
Será que o irão levar a sério? Parece-nos previsível que isso aconteça, tendo em conta os
seus anos de estudo e todo o investimento na sua formação. A partir deste capítulo,
vamos observar como o ambiente do século XIX nos é apresentado, sob o olhar crítico
de Eça.

Carlos ia formar-se em Medicina, curso para o qual tinha descoberto a vocação,


quando, ainda criança, encontrou no sótão “ um rolo manchado e antiquado de estampas
anatómicas “, tendo passado dias a recortá-las e a distribuí-las pelas paredes. Um dia
irrompeu mesmo pela sala, a mostrar às Silveiras e ao Eusebiozinho a imagem de um
feto no útero materno, o que escandalizou as senhoras, mas obteve a indulgência de
Afonso, que louvou a curiosidade do neto em relação ao funcionamento do corpo
humano. A partir daí, D. Ana não consentiu mais que Carlos brincasse sozinho com
Teresinha, mas as outras pessoas concordavam que Carlos mostrava vocação para a
Medicina.
Em Coimbra, enquanto estudou no Liceu, Carlos interessou-se sempre mais por
anatomia e, numas férias, a criada Gertrudes, num momento em que desfazia as malas
de Carlos, fugiu espavorida, ao deparar com uma caveira. Aliás, sempre que algum
criado da quinta adoecia, Carlos consultava os livros, tentando fazer diagnósticos, e já
merecia o respeito do médico da quinta, que o tratava por colega. Alguns frequentadores
da quinta viam o Direito como uma escolha mais acertada para um fidalgo de tão alta
estirpe, mas Afonso entendia que a opção do neto deveria ser levada muito a sério,
querendo que Carlos viesse a ser útil ao país, tal como o mais vulgar cidadão.
Para se instalar em Coimbra, Carlos teve direito a verdadeiras honras de fidalgo, já que
o avô lhe preparou uma casa em Celas, que recebeu o epíteto de “ paços de Celas “,
devido à raridade dos seus luxos.
No início o diletantismo de Carlos inspirou a desconfiança dos mais democratas, mas a
constatação do interesse de Carlos pelos ideais revolucionários depressa venceu as
distâncias e por fim os “ paços de Celas “ eram frequentados por pessoas das mais
diversas ideologias.
Os frequentadores dos “ paços de Celas “ entregavam-se a ocupações tão diversas como
a esgrima, o whist, o debate das novas ideias que alastravam na Europa (a Democracia,
o Positivismo, o Realismo...). Estas tertúlias contavam sempre com a presença de um
criado, que servia croquetes aos convivas, acompanhados de cerveja.
Carlos, ao mesmo tempo que se dedicava à Medicina, ocupava-se também com a Arte e
a Literatura, tendo publicado alguns sonetos e um artigo sobre o Pártenon e tendo
mesmo chegado a compor contos arqueológicos e a tentar a pintura a óleo.
Carlos foi obrigado a moderar o seu diletantismo e a sua dissipação intelectual, pois, se
não fosse um fidalgo tão rico e conhecido, ter-se-ia arriscado a chumbar.
Afonso da Maia vinha, às vezes, passar umas semanas a Celas e se a princípio a sua
presença causava intimidação, a sua simpatia, interesse pela arte e literatura foram
cativando os frequentadores da casa.
Carlos passava as férias grandes em Lisboa, Paris ou Londres, mas os Natais e Páscoas
eram passados em Santa Olávia, que Afonso ia embelezando com luxos de um requinte
francês e inglês, mas a existência neste espaço ia-se tornando mais triste, devido à
doença, ao envelhecimento e à morte de alguns dos seus habituais frequentadores. As
férias só eram divertidas para Carlos quando tinha com ele o seu amigo João da Ega,
que também merecia a simpatia de Afonso.
Ega estudava Direito em Coimbra, com pouco afinco, e a sua mãe, uma mulher viúva,
rica e beata, que vivia retirada numa quinta, perto de Celorico de Basto, na companhia
de uma filha, também viúva, rica e beata, contentava-se com a promessa, feita pelo
padre Serafim, de que o seu filho terminaria um dia o curso. Aliás, convinha mais à
senhora, envergonhada com a heresia e a rebeldia do filho, que ele se mantivesse
afastado em Coimbra.
Ega, cuja fama de fidalgo rico lhe dava o reconhecimento das famílias, vivia enredado
em amores por meninas de quinze anos, filhas de empregados, e o próprio Carlos, que
escarnecia destes amores, acabou por se envolver num amor adúltero com a mulher de
um empregado do Governo Civil, mas, num dia em que viu o marido enganado a
passear com o filho pela mão, sentiu vergonha do seu acto, desistindo da sua aventura.
A segunda aventura sentimental de Carlos em Coimbra foi quando instalou uma
rapariga espanhola, com aspecto de “ Dama das Camélias “, numa casa ao pé de Celas.
Esta espanhola começou a tornar-se insuportável aos amigos de Carlos, devido ao seu
conservadorismo e apreço pela monarquia, de modo que, quando Baptista, o criado de
quarto de Carlos, a surpreendeu com um ator de teatro, foi usado o pretexto para que,
depois de bem paga, pudesse ser recambiada para Lisboa, o seu espaço de origem.
No acto da formatura de Carlos, houve uma enorme festa em Celas, à qual acorreram
todos os amigos, tendo havido mesmo uma serenata.
Carlos partiu para uma viagem de um ano pela Europa e finalmente, no Outono de
1875, veio instalar-se com o avô no Ramalhete. (DÁ-SE NESTE CAPÍTULO O FINAL
DA LONGA ANALEPSE INICIADA NO 1º CAPÍTULO. ESTA ANALEPSE FOI
NECESSÁRIA PARA SE PERCEBEREM AS ORIGENS DE CARLOS, TENDO EM
CONTA A INFLUÊNCIA DE FATORES COMO A HEREDITARIEDADE E A
EDUCAÇÃO, NA FORMAÇÃO DO SEU CARÁCTER.)
Carlos alimentava grandes projectos de trabalho e, por isso, tinha enviado da Europa
caixotes recheados de livros e aparelhos de laboratório. Afonso incentivava o neto nos
seus planos, dando-lhe apoio monetário.
Carlos acabou por instalar o consultório no Rossio e criou também um laboratório num
antigo armazém, junto ao Largo das Necessidades.
Embora os amigos não levassem estes preparativos a sério, Carlos abusou do luxo na
decoração do seu consultório e eram de tal modo sérios os seus projectos de trabalho
que chegou a fazer anunciar no jornal a abertura deste consultório.
Entretanto as obras no laboratório arrastavam-se e Vicente, o seu mestre, um homem
democrata que desejava expulsar a família real do país, de modo a desimpedi-lo para
que pudessem governar as pessoas de saber, ia prometendo o seu avanço.
No Ramalhete, almoçava-se pontualmente ao meio dia. Os almoços eram demorados,
prolongando-se para além da uma hora, pois requeriam vagares para se saborear a
requintada cozinha, preparada pelo chef francês que os Maias tinham ao seu serviço.
Nesses almoços participava também o próprio Reverendo Bonifácio (o gato de Afonso),
deliciando-se com as suas sopas de leite.
No final do almoço, Carlos precipitava-se para o trabalho, mas nunca aparecia um único
doente e Carlos, juntamente com o criado, entregavam-se à ociosidade, fumando,
bocejando e lendo revistas. Por fim Carlos, cansado daquela dormência, abandonava o
consultório, dando por terminado mais um dia de trabalho perdido.
Uma manhã, Carlos recebeu a visita do seu amigo Ega, que tencionava instalar-se em
Lisboa, com o acordo da mãe e da irmã, já que em Celorico se tinha espalhado uma
epidemia de anginas, que foi explicada como uma manifestação da ira divina, perante a
presença de tão acérrimo ateu. O certo é que, com o afastamento de Ega, a epidemia
desapareceu.
Ega apreciava o consultório, pasmado com o seu luxo, e Carlos apreciava também Ega,
elogiando a sua figura e querendo obter esclarecimentos sobre uma Madame Cohen, de
quem Ega lhe falava nas cartas e que era, afinal, uma judia, a mulher do banqueiro
Cohen, com quem Ega alimentava uma aventura.
Ega inquiria sobre Afonso e o Ramalhete, informando-se sobre os seus frequentadores:
D. Diogo, o Sequeira, o conde de Steinbroken, o Taveira, empregado no Tribunal de
Contas, Cruges, um maestro e pianista, o marquês de Souselas e por fim o Eusébio
Silveira, que entretanto tinha enviuvado. Faltavam as mulheres, porque não havia quem
as recebesse. Ega opinou que era necessário introduzir-se a arte e a literatura nas soirées
do Ramalhete, falando do Craft, um coleccionador de arte que tinha herdado uma
fortuna.
Carlos e Ega discutiam as novas ideias, comentando o atraso de Portugal, mas, quando
bateram as quatro horas, Ega apressou-se a sair, revelando sinais de aventura.
- Ega estava hospedado no hotel Universal e não aceitou o convite de Carlos para se
hospedar no Ramalhete.
À saída, Ega ainda informou Carlos que iria publicar o seu livro, aquele livro sobre o
qual tinha falado durante dois anos, cujo título seria “ Memórias de Um Átomo “ e cujo
assunto seria a “ História das grandes fases do Universo e da Humanidade “.

Capítulo 5
Neste momento da ação, toma-se contacto com alguns tipos sociais, nomeadamente a
família dos Gouvarinhos e dos Cohen, gente da política e da banca. Já agora é
importante que se recorde a definição de personagem tipo (personagem que representa
um grupo social, pretendendo-se, através dela, criticar os vícios da classe a que
pertence). Conhece-se o teatro da vida burguesa, com os seus representantes, entregues
a uma vida de diletantismo e de ociosidade. São apontados, como locais de encontro e
espaço físico da vida social, o Chiado, o Rossio, os cafés e o teatro de S. Carlos.
CAPÍTULO V
De regresso a casa, após uma visita à sua primeira doente, uma bela rapariga de origem
alsaciana, casada com um padeiro do bairro, que tinha sido atingida por uma
pneumonia, Carlos ainda veio encontrar o avô envolvido numa partida de whist com os
seus amigos. Afonso sentia-se grato para com esta doente, que possibilitava o
reconhecimento de Carlos como médico, tendo por isso chegado a enviar-lhe umas
garrafas de Bordéus.
Carlos pediu informações acerca de Ega, que andava desaparecido, e entretanto Vilaça
esclareceu que ele tinha aparecido no escritório, indagando sobre os preços da
decoração do consultório de Carlos. Constava-se que Ega pretendia montar casa e, na
opinião de Vilaça, ele vinha talvez meter-se na política, mas, segundo D. Diogo, a
ocupação de Ega relacionava-se com uma mulher.
No Ramalhete jogava-se também bilhar e discutia-se política. Cruges alegrou o
ambiente com a sua música, tocando piano. Os escudeiros serviam bebidas (St Emilion,
Porto, ponche quente), croquetes e sanduíches.
É feita uma descrição da sala, referindo-se o seu luxo, a sua decoração, estilo
Luís XV, as tapearias, as poltronas, etc.
Vilaça confidenciou com Eusebiozinho acerca das extravagâncias dos Maias,
referindo o facto de Carlos ter “ tomado uma frisa de assinatura “, em S. Carlos, quando
afinal ia tão poucas vezes ao teatro, acabando a frisa por ser mais frequentemente
ocupada pelos amigos. Gastava-se muito em esmolas, pensões, empréstimos que nunca
mais eram pagos, não se fazendo reservas de dinheiro, embora a casa tivesse
rendimentos bastantes para suportar todas as despesas.
Conversando-se sobre ópera,Taveira fez alusão ao conde Gouvarinho, par do
reino, e à sua mulher, condessa de Gouvarinho. Este casal também tinha tomado uma
frisa de assinatura no teatro, ao lado da de Carlos. Respondendo a uma pergunta de
Carlos sobre o seu amigo Ega, Taveira esclareceu ainda que o tinha visto na frisa dos
Cohens e fizeram-se comentários sobre a possível aventura de Ega com Raquel Cohen,
mulher do banqueiro Cohen. Os convivas foram, entretanto, abandonando o Ramalhete.
O laboratório de Carlos estava finalmente pronto e Carlos tinha entretanto ganho
alguma fama de médico, devido à cura de Marcelina, a mulher do padeiro. Tinha, assim,
alguns doentes no bairro e recebia algumas visitas no consultório. Os colegas que, a
princípio, lhe atribuíam algum reconhecimento, começaram a considerá-lo “ um asno “,
devido à sua reduzida clientela. Carlos pouco mais fazia do que ocupar-se dos seus
cavalos, do seu luxo e do seu bricabraque (objetos de arte / antiguidades). Para além
disto, tinha escrito dois artigos para a “ Gazeta Médica “, planeava escrever um livro
com o título “ Medicina Antiga e Moderna “ e sentia-se, ainda, atraído pela ideia de
criar uma revista, proposta por Ega, que entretanto se esquivava a discutir este plano,
pois andava sempre fugido, sendo visto no teatro na companhia dos Cohen.
Ega dizia que andava muito ocupado a procurar casa, mas era visto a deambular
constantemente pelo Chiado e pelo Loreto, em jeito de aventura. O romance do Ega já
começava a ser comentado no “ Grémio “ e na “ Casa Havanesa “.
Um dia Ega irrompeu pelo consultório de Carlos, para lhe ler um excerto do seu
livro, “ Memórias de um Átomo “, um capítulo que remetia para a Idade Média, sobre
os amores contrariados de uma judia por um poeta e cavaleiro. Carlos percebeu
perfeitamente, nessa judia, a representação da amada Raquel Cohen. Uns dias depois,
Carlos encontrou num jornal uma referência à leitura deste capítulo das “ Memórias de
um Átomo “, em casa dos Cohen, num artigo que causou a indignação de Ega, que não
gostou das apreciações dos jornalistas.
Ega falou a Carlos no interesse que a família Gouvarinho tinha manifestado em
conhecê-lo, sobretudo a condessa. Carlos lembrou-se, então, dos olhares que madame
Gouvarinho lhe dirigia à noite, no teatro. Carlos foi então essa noite a S. Carlos, mas a
saída revelou-se inútil, porque esse dia não estavam presentes nem Ega nem os Cohen
nem os Gouvarinho. Ao deitar-se, em conversa com Baptista, o seu criado de quarto,
Carlos procurou obter informações sobre a família dos Gouvarinhos, já que Baptista
conhecia o criado de quarto do conde. Carlos soube então que o conde era um sovina,
que tinha oferecido ao criado um fato já em tão mau estado que o criado o tinha deitado
fora. Além disso o casal também não se dava bem, tendo o criado presenciado uma cena
em que madame Gouvarinho tinha partido a loiça, durante uma discussão.
Carlos foi finalmente apresentado aos Gouvarinho, uma noite, em S. Carlos. A
condessa observou a Carlos que o tinha visto, no verão, em Paris. No final do
espectáculo, o conde mostrou-se honrado por conhecer um homem com a distinção de
Carlos, e a condessa informou-o que recebiam às terças-feiras.

Capítulo 6
Neste capítulo dá-se um encontro à entrada do Hotel Central, em Lisboa, que parece
sugerir a chegada de alguma perturbação. Carlos e Craft deparam com a visão de uma
lindíssima senhora loira, servida por um preto de “ casaca e calção “ e com uma bonita
cadelinha. Que estará esta senhora a fazer em Lisboa, hospedada no Hotel Central e que
estranho magnetismo explica o fascínio que ela exerceu em Carlos?
Carlos decidiu ir visitar Vila Balzac, a casa do Ega, alugada na Penha de França.
Ninguém o veio receber, embora lhe parecesse ter ouvido barulhos vindos do interior da
casa.
Conforme sugestão do Ega, no dia seguinte Carlos voltou e Ega já o esperava,
tendo-o recebido com todas as cerimónias. A casa estava pobre de decoração, como
convinha a um filósofo.
Entretanto Carlos tinha estado na casa de Madame Gouvarinho e os dois amigos
falaram sobre isso. Carlos tinha experimentado algum interesse por esta mulher, mas
acabou por confessar a Ega, que a Madame Gouvarinho logo perdeu para ele o encanto.
Este era uma grande defeito de Carlos, que o tornava incapaz de se fixar numa mulher,
acabando apenas por ficar amigo de todas.
Ega disse a Carlos que ele era como D. Juan, eternamente à procura do amor e,
quando julgava encontrá-lo, verificava que se tinha enganado, decidindo continuar à
procura, aproximando-se de outras mulheres. Ega lança aqui um prognóstico, dizendo a
Carlos que ele pode vir a acabar como D. Juan (outro indício de fatalidade).
Saíram e, no caminho, encontraram Craft, colecionador de bricabraque, que
tinha uma bonita casa nos Olivais. Ega ainda quis voltar a casa para oferecer uma
bebida, mas Craft libertou-o, dizendo que aproveitava o facto de estar ali para visitar um
amigo.
Entretanto Ega convidou-os para um jantar no Hotel Central, no dia seguinte.
Entretanto o jantar foi sendo adiado, pois Ega foi incluindo mais pessoas e acabou por
transformá-lo numa homenagem ao seu amigo Cohen.
No dia do jantar, Carlos veio a encontrar Craft numa loja de um hebreu antiquário.
Falaram sobre a casa de Craft nos Olivais e do seu precioso bricabraque, mas Craft
confessou que queria desfazer-se de tudo aquilo.
Entraram então no Hotel Central e nesse momento viram chegar um coupée. De
dentro saiu uma senhora loira, muito bonita, que deixou Carlos e Craft num estado de
atracção e admiração e arrancou de Craft o elogio em Francês “ três chic “.
Em cima, Ega já estava presente, conversando com Dâmaso Salcede,
representante do novo-riquismo da época.
Craft comentou o facto de terem visto à entrada do hotel uma mulher bonita,
com uma cadelinha ao colo, e Dâmaso, que estava a conversar com Ega, decidiu
vangloriar-se de a conhecer. Tratava-se da família dos Castros Gomes com quem tinha
viajado de comboio, vindos de Bordéus. Dâmaso falou no seu interesse por Paris e
referiu também o seu tio anarquista, que vivia na capital francesa. Apareceu em seguida
o poeta Alencar, a quem Ega também apresentou Carlos. Alencar ficou emocionado, po
conhecer o filho do seu grande amigo Pedro.
Alencar explicou a Carlos que ele tinha tido alguma influência na escolha do seu
nome, pois a mãe não tinha querido dar-lhe o nome Afonso, do avô, e então, como ela
andava a ler um romance cuja personagem principal era Carlos Eduardo, o último dos
Stuarts, Alencar sugeriu-lhe que desse esse nome ao filho. Apareceu por fim Cohen, o
grande convidado do jantar.
Falou-se então de crimes na Mouraria, entre fadistas. Carlos achava que esses
crimes mereciam um romance, o que levou à discussão sobre o realismo. Alencar, poeta
romântico, era contra o realismo, por mostrar os aspetos feios da realidade. Alencar
achava que não se devia mencionar o “ excremento “, enquanto comiam. Craft estava do
lado de Alencar, sendo contra o realismo e o naturalismo. Achava que a arte devia ser
uma idealização, mostrando as formas mais belas da vida e não as feias. Carlos achava
que o mais intolerável no realismo eram os “ ares científicos”, a ideia do positivismo e
do experimentalismo. Ega então achava que o realismo ainda devia ser mais científico e
dar-se menos à fantasia.
A conversa desviou-se para uma pergunta feita a Cohen, a propósito de
empréstimos e Cohem disse mesmo que as grandes fontes de receitas no país eram os
empréstimos e os impostos. Carlos então achava que assim o país ia para a bancarrota e
Cohen disse que essa bancarrota já ninguém a podia evitar.
Então Ega achava que o melhor era a bancarrota e depois uma revolução que
acabasse com a monarquia. Portugal livrava-se depois da dívida e das velhas pessoas.
Cohen dizia a Ega para não ser tão radical, já que havia homens de talento no país.
Cohen era o director do Banco Nacional e não queria ver assim enxovalhados os
homens de talento em Portugal, mas reconhecia que o país precisava de reformas.
Ega então achava que era precisa a invasão espanhola e Dâmaso disse que
fugiria logo para Paris. Ega riu-se e criticou a cobardia de alguns portugueses, mas
Alencar defendia o patriotismo.
Os empregados serviram um prato à Cohen, que Ega tinha encomendado em
honra do amigo. Por fim serviu-se o café e levantaram-se da mesa. Começaram a falar
outra vez sobre literatura e Ega criticava o romantismo. Finalmente Ega discutia com
Alencar e quase que haveria pancadaria se os outros não os separassem. Aquele hotel
tão chique estava a ganhar um ambiente de taverna, à maneira portuguesa.
A discussão acabou com os dois a fazerem as pazes e a elogiarem-se um ao
outro. No final Ega saiu com Cohen e Carlos foi com Dâmaso e Alencar a pé pelo
Aterro. Dâmaso não parava de fazer elogios a Carlos, que ao mesmo tempo ia sabendo
informações sobre a tal senhora brasileira que tinha visto à entrada do hotel e que
Dâmaso disse que conhecia. Dâmaso partiu e Carlos continuou acompanhado de
Alencar, que lhe falava do tempo em que era amigo de Pedro. Afastaram-se à porta do
Ramalhete. Já no quarto, Carlos lembrou-se da história dos pais, que Ega um dia lhe
tinha contado, durante uma bebedeira, a mãe que tinha fugido com outro e o suicídio do
pai. Assim que adormeceu começou a sonhar com a senhora que tinha visto à entrada do
hotel. Ela passava e o Craft dizia “ Trés chic “.

Capítulo 7
Sumário dos acontecimentos mais importantes:
-Craft, um gentleman inglês, e também Dâmaso (protótipo do novo rico), tornam-se
frequentadores do Ramalhete;
-Os Castro Gomes, que estavam no Porto, regressam a Lisboa e Carlos cruza-se no
Aterro com a mulher cuja imagem ocupa permanentemente a sua mente;
-Ega ocupa-se com a organização de um baile de máscaras, na casa dos Cohens;
-A condessa Gouvarinho serve-se do pretexto de que o filho está doente, para poder
aproximar-se de Carlos, visitando-o no seu consultório;
-Carlos sabe que a senhora Castro Gomes está em Sintra e convida Cruges para um
passeio na vila, na esperança de poder rever a mulher dos seus sonhos.

A ação narrada no capítulo VII inicia-se no Ramalhete, com Afonso e Craft a jogarem
uma partida de xadrez depois do almoço. Craft torna-se assim íntimo da casa dos Maias
e, à sua semelhança, também Dâmaso começa a frequentar esta casa, seguindo Carlos
para todo o lado e procurando imitá-lo.
Carlos, que tem poucos doentes, deixa de investir tanto no consultório e, face aos boatos
lançados por médicos ‘rivais’ de que ele fazia horríveis experiências com os doentes,
abandona um pouco a investigação no laboratório. Assim, dedica então os seus dias a
escrever o seu livro.
Os Castro Gomes regressam a Lisboa, depois de uma ida ao Porto.
Ega, que anda ocupado com a organização de um baile de máscaras na casa dos Cohen,
vai ao Ramalhete pedir dinheiro emprestado a Carlos, para pagar uma dívida que tem
com Eusebiozinho. Os cinco convivas presentes acabam por pôr a conversa em dia e os
que tencionam ir ao baile de máscaras decidem sobre se vão e como vão mascarados ao
acontecimento na casa dos Cohen.
Dâmaso deixa de aparecer no Ramalhete por uns tempos e ninguém sabe dele.
Carlos avista Maria Eduarda, num dia em que passeia pelo Aterro, na companhia de
Steinbroken. Para Steinbroken, o Aterro estava particularmente monótono e triste
naquele dia, mas, contrariamente, Carlos considerou-o lindo, puro e perfeito, depois de
ter visto a sua musa. Numa segunda visita ao Aterro, Carlos vê novamente Maria
Eduarda, acompanhada do marido. A partir dessa altura desloca-se várias vezes, durante
a semana, ao Aterro, na esperança de ver novamente Maria Eduarda.
A condessa Gouvarinho, com a desculpa de que o filho se encontra doente, procura
Carlos no consultório. Carlos examina o menino e percebe que este está bem de saúde,
tendo apenas uma borbulhinha no pescoço. A visita ao consultório é, portanto, apenas
um pretexto de madame Gouvarinho para se aproximar de Carlos e ter um romance com
ele.
À saída do consultório, Carlos vê Dâmaso num coupé. Numa subtil alusão a Maria
Eduarda, Dâmaso diz-lhe, de passagem, que anda a ter um romance com uma linda
mulher.
Ao serão, no Ramalhete, joga-se dominó, ouve-se música e conversa-se. No meio da
conversa, Carlos fica a saber que a mulher com quem Dâmaso diz ter por aí um
romance é a Sra. Castro Gomes.
Carlos, indignado com a falta de fidelidade de Dâmaso, por este ter criticado e
repugnado dias antes a família Castro Gomes, fica furioso. Este convida então Cruges a
ir a Sintra no dia seguinte, pois tomara conhecimento, por intermédio de Taveira, que
Maria Eduarda aí se encontrava na companhia de seu marido e de Dâmaso.

Previsões para os próximos episódios:


-Afigura-se que o baile de máscaras vai ser um acontecimento social importante,
badalado na imprensa da época;
-Prevê-se um romance entre Carlos e a madame Gouvarinho;
-Em relação a Maria Eduarda, aconselha-se a leitura dos próximos capítulos, para se
desvendar se Carlos vai realmente conseguir cruzar-se com ela…

Capítulo 8
Acontecimentos importantes neste capítulo:
-É descoberto o romance de Ega com Raquel Cohen, a mulher do banqueiro Cohen;
-Carlos fica mais próximo da família Castro Gomes, quando é chamado a dar uma
consulta à pequena Rose;
-Acende-se o romance entre Carlos e a madame Gouvarinho.

Já no Ramalhete, no final da semana, Carlos recebe uma carta a convidá-lo para jantar
no Sábado seguinte nos Gouvarinhos.
Entretanto chega Ega, preocupado em arranjar uma espada conveniente para o fato que
leva nessa noite ao baile dos Cohen, em honra dos anos de Raquel Cohen. Dâmaso
também aparece de repente, pedindo a Carlos para ver um doente "daquela gente
brasileira", os Castro Gomes. Trata-se da filha, a menina Rosa. Os pais tinham partido
essa manhã para Queluz, a visitar o palácio.
Ao chegar ao Hotel, Carlos verifica que a pequena já estava ótima. Carlos dá uma
receita a Miss Sara, a governanta.

Às 10 horas da noite, ao preparar-se para o baile de máscaras, aparece Ega (mascarado


de Mefistófeles / diabo), dizendo que o Cohen o expulsara da sua casa (ao que parece,
descobrira o caso dele com Raquel, a sua mulher), e Ega quer desafiar o Cohen para um
duelo, mas Carlos e Craft desmotivam-no. Carlos e Craft fazem ver a Ega que Cohen é
que pode realmente querer um duelo, pelo facto de ser o ofendido a quem Ega traíra,
sendo amante da sua mulher.
Na manhã seguinte ficam à espera que chegue o aviso para o esperado desafio, mas
realmente nada acontece, exceto a vinda da criada de Raquel Cohen, a anunciar que a
senhora tinha sido espancada pelo marido e que partiam nesse dia para Inglaterra,
deixando Portugal. Ega dorme nessa noite no Ramalhete e decide deixar Lisboa.
Na semana seguinte, só se ouve falar do Ega e do seu comportamento imoral.
Todos lhe “ caem em cima" e, além disso, só lhe acontecem desgraças, pois está
completamente arruinado, precisando mais uma vez de recorrer à generosidade de
Carlos, pedindo-lhe dinheiro emprestado.
Carlos vai progressivamente ficando íntimo dos condes de Gouvarinho. Ele visita a
Gouvarinho e dá-lhe um tremendo beijo, mesmo antes da chegada do conde
Gouvarinho.

Pistas para os próximos episódios:


-Como irá Ega superar o desaire provocado pela descoberta do seu romance com Raquel
Cohen?
-Será que Carlos vai finalmente ser apresentado a Maria Eduarda?
Sondemos os próximos capítulos.
Capítulo 9
Acontecimentos importantes neste capítulo:
-É descoberto o romance de Ega com Raquel Cohen, a mulher do banqueiro Cohen;
-Carlos fica mais próximo da família Castro Gomes, quando é chamado a dar uma
consulta à pequena Rose;
-Acende-se o romance entre Carlos e a madame Gouvarinho.

Já no Ramalhete, no final da semana, Carlos recebe uma carta a convidá-lo para jantar
no Sábado seguinte nos Gouvarinhos.
Entretanto chega Ega, preocupado em arranjar uma espada conveniente para o fato que
leva nessa noite ao baile dos Cohen, em honra dos anos de Raquel Cohen. Dâmaso
também aparece de repente, pedindo a Carlos para ver um doente "daquela gente
brasileira", os Castro Gomes. Trata-se da filha, a menina Rosa. Os pais tinham partido
essa manhã para Queluz, a visitar o palácio.
Ao chegar ao Hotel, Carlos verifica que a pequena já estava ótima. Carlos dá uma
receita a Miss Sara, a governanta.

Às 10 horas da noite, ao preparar-se para o baile de máscaras, aparece Ega (mascarado


de Mefistófeles / diabo), dizendo que o Cohen o expulsara da sua casa (ao que parece,
descobrira o caso dele com Raquel, a sua mulher), e Ega quer desafiar o Cohen para um
duelo, mas Carlos e Craft desmotivam-no. Carlos e Craft fazem ver a Ega que Cohen é
que pode realmente querer um duelo, pelo facto de ser o ofendido a quem Ega traíra,
sendo amante da sua mulher.
Na manhã seguinte ficam à espera que chegue o aviso para o esperado desafio, mas
realmente nada acontece, exceto a vinda da criada de Raquel Cohen, a anunciar que a
senhora tinha sido espancada pelo marido e que partiam nesse dia para Inglaterra,
deixando Portugal. Ega dorme nessa noite no Ramalhete e decide deixar Lisboa.
Na semana seguinte, só se ouve falar do Ega e do seu comportamento imoral.
Todos lhe “ caem em cima" e, além disso, só lhe acontecem desgraças, pois está
completamente arruinado, precisando mais uma vez de recorrer à generosidade de
Carlos, pedindo-lhe dinheiro emprestado.
Carlos vai progressivamente ficando íntimo dos condes de Gouvarinho. Ele visita a
Gouvarinho e dá-lhe um tremendo beijo, mesmo antes da chegada do conde
Gouvarinho.

Pistas para os próximos episódios:


-Como irá Ega superar o desaire provocado pela descoberta do seu romance com Raquel
Cohen?
-Será que Carlos vai finalmente ser apresentado a Maria Eduarda?
Sondemos os próximos capítulos.

Capítulo 10
Este capítulo contém o célebre episódio das corridas, um episódio crítico, onde se
apresenta a alta sociedade lisboeta, num evento social que se presume de civilizado.
Querendo parecer chiques, os portugueses imitavam os costumes estrangeiros,
importando as suas modas, neste caso as corridas inglesas de cavalos. Verifica-se que
seriam mais apropriadas as touradas, tendo em conta a tradição portuguesa e também a
facilidade com que afinal “ estalava o verniz “, mesmo nas pessoas da alta sociedade.
Ocorre uma situação caricata e ridícula, quando irrompe uma discussão, sob o
pretexto de que tinha havido “ batota “ nas apostas, havendo insultos e pancadaria. As
mulheres fogem em gritos histéricos, perdendo também a pose e os bons modos.

O capítulo X começa com a narração do desfecho de um encontro de Carlos com


Gouvarinho e revela que Carlos já se sente farto dela: “E nessa tarde, como não havia
ainda outro esconderijo, tinham abrigado os seus amores dentro daquela tipóia de praça.
Mas Carlos vinha de lá enervado, amolecido, sentindo já na alma os primeiros bocejos
da saciedade. Havia três semanas apenas que aqueles braços perfumados de verbena se
tinham atirado ao seu pescoço – e agora, pelo passeio de S. Pedro de Alcântara, sob o
ligeiros chuvisco que batia as folhagens da alameda, ele ia pensando como se poderia
desembaraçar da sua tenacidade, do seu ardor, do seu peso…”.
Quando, depois, Carlos ia a descer a rua de S. Roque, encontrou o marquês. Durante a
conversa, Carlos apercebeu-se que a corrida de cavalos tinha sido antecipada para o
Domingo seguinte. Maia ficou contente, pois daí a cinco dias iria, finalmente, conhecer
a mulher que ele vira à entrada do Hotel Central, pois certamente também iria estar nas
corridas, um acontecimento social tão divulgado.
Enquanto Carlos e o marquês vão falando das corridas, Maria Eduarda passa no seu
coupé, deixando Carlos ali estagnado a observá-la, enquanto Rose o aponta à mãe,
explicando-lhe, talvez, que fora ele o médico que a tinha consultado: “Carlos olhou,
casualmente; e viu, debruçado à portinhola, um rosto de criança, de uma brancura
adorável, sorrindo-lhe, com um belo sorriso que lhe punha duas covinhas na face.
Reconheceu-a logo. Era Rosa, era Rosicler: e ela não se contentou em sorrir, com o seu
doce olhar azul fugindo todo para ele – deitou a mãozinha de fora, atirou-lhe um grande
adeus. No fundo do coupé, forrado de negro, destacava um perfil claro de estátua, um
tom ondeado de cabelo loiro. Carlos tirou profundamente o chapéu, tão perturbado, que
seus passos hesitaram. “Ela” abaixou a cabeça, de leve;”.
No fim de ver passar o coupé, Carlos e o marquês dirigem-se ao Ramalhete; Maia, pelo
caminho, vai traçando um plano para se encontrar com Maria Eduarda. Chegando ao
Ramalhete juntam-se todos, estando também presente o Dâmaso.
Durante o jantar Carlos vai contar a Dâmaso o seu plano para conhecer os Castro
Gomes: este levá-los-ia até aos Olivais para lhe mostrar a coleção de Craft e em seguida
jantariam no Ramalhete.
Depois do sarau no Ramalhete, chega o dia das corridas. Carlos vai ao hipódromo na
esperança de ver Maria Eduarda, mas fica desiludido, pois ela não aparece.
É Domingo, um dia quente, com o céu azul. No Hipódromo Carlos fala com a sua velha
amiga D. Maria da Cunha e conhece Clifford, que era o dono do cavalo que tinha mais
expectativas de ganhar e por causa de quem as corridas tinham sido antecipadas.
Entretanto, a Gouvarinho diz a Carlos que seu pai faz anos e ela tem de ir ao Norte.
Propõe-lhe então que se encontrem na estação e que sigam juntos no comboio até
Santarém, onde passarão a noite juntos; depois, ela seguirá até ao Porto e ele regressará
a Lisboa. Carlos hesita.
Houve algumas complicações durante a prova das corridas, que causaram uma
desordem, provando-se, assim, que as pessoas de sociedade que ali estavam, embora
pretendessem dar-se ares de civilizadas, facilmente perdiam a postura, deixando “
estalar o verniz “.
Carlos, para animar as corridas, decide apostar num cavalo que aparentemente não
promete sair vencedor, mas, surpreendentemente, o animal acaba por ser o primeiro a
chegar à meta e Carlos consegue ganhar muito dinheiro.
Aqui podemos aplicar o provérbio “Sorte no jogo, azar no amor ”. Este é o primeiro
presságio do capítulo: “- Ah, monsieur – exclamou a vasta ministra da Baviera, furiosa
– mefiez-vous… Vous connaissez le proverbe: heureux au jeu…”
Entretanto Carlos vai falar com Dâmaso e ele conta-lhe que Castro Gomes partira para o
Brasil e que Maria Eduarda está num apartamento no prédio do Cruges.
De regresso a casa, Carlos pensa na desculpa de querer falar com Cruges, só para poder
passar pelo prédio onde também está Maria Eduarda, alimentando assim a esperança de
a ver. No entanto, quando chega ao prédio, a criada diz que Cruges não está e Carlos
acaba também por não ver Maria Eduarda.
Carlos regressa ao Ramalhete, onde encontra Craft. Um criado entrega uma carta a
Carlos. Ao abri-la depara com uma agradável surpresa, pois a autora é a senhora Castro
Gomes, que lhe pede para ir consultar na manhã seguinte uma pessoa de família que se
encontra doente. Carlos resplandece de tal modo de felicidade que Craft percebe que lhe
terá acontecido algo de muito bom. Respondendo a Craft, dá-se então um segundo
presságio, nas palavras de Carlos:
“- A gente, Craft, nunca sabe se o que lhe sucede é, em definitivo, bom ou mau.
-Ordinariamente é mau.”
Prefigura-se, então, o tão ansiado encontro entre Carlos e Mª Eduarda, as duas
personagens entre as quais o leitor já adivinhou a existência de uma grande atração. É
altura de nos embrenharmos nesta história de amor.

Capítulo 11
O presente capítulo representa um ponto alto na ação, uma vez que Carlos conhece
finalmente a mulher por quem se sentiu atraído desde o primeiro momento em que a
viu. Essa oportunidade surgiu quando menos se esperava, porque Mª Eduarda enviou
um bilhete a Carlos, solicitando os seus serviços de médico para a governanta miss Sara,
que se encontrava doente.
A emoção fica ao rubro, quando Carlos se vê na presença de Maria Eduarda. Nesta
altura perguntamo-nos como é que Carlos conseguirá disfarçar o seu embaraço e manter
a pose de médico, escondendo o encantamento com que absorve as palavras e os gestos
da amada, ao mesmo tempo em que aprecia a sua beleza.

Carlos visita a senhora Castro Gomes, para dar a consulta solicitada no bilhete que
havia recebido, e acaba por descobrir que a senhora se chama Maria Eduarda,
admirando-se com a semelhança existente entre o nome de ambos (Carlos Eduardo / Mª
Eduarda). Carlos descobre também que é a governanta, miss Sara, que se encontra
doente.
Carlos conversa com Maria Eduarda e, depois de observar miss Sara, passa-
lhe uma receita e diz-lhe quais os cuidados que deve ter com a governanta, explicando
ainda que ele próprio irá observá-la diariamente.
Nessa noite Carlos tinha o encontro que a madame Gouvarinho planeara para
a fantástica noite em Santarém, porém Carlos começava já a odiá-la, pela posse que ela
presumia ter sobre ele, tomando decisões que o envolviam. Por sorte, o senhor
Gouvarinho, querendo visitar o sogro, decidiu à última da hora ir com a mulher para o
Porto, o que acabou por beneficiar Carlos. Na estação dos comboios Carlos também
encontrou Dâmaso, que ia ao funeral de um tio. Dâmaso chegou mesmo a pensar que
Carlos estava ali para lhe dar os sentimentos e Carlos não o desiludiu. Com madame
Gouvarinho e Dâmaso afastados, Carlos poderia assim desfrutar em paz as visitas a casa
de Maria Eduarda, para dar assistência a miss Sara, enquanto ela estivesse doente.
Nas semanas seguintes, Carlos foi-se familiarizando com Maria Eduarda, tudo
graças à doença de miss Sara. Ambos falavam das suas vidas e até mesmo dos seus
conhecidos. Entretanto Dâmaso voltou de Penafiel, onde fora ao funeral do tio, e
decidiu ir visitar Maria Eduarda.
Ao chegar, Dâmaso estranhou a presença de Carlos naquela casa e a deferência com que
parecia ser recebido, estando com "Niniche" (a cadela de Maria) ao colo, que lhe rosnou
e ladrou. Dâmaso acabou por ficar zangado e cheio de ciúmes.
Carlos foi o primeiro a sair, porque se saturou do facto de Dâmaso se demorar, impondo
a sua presença.
Sabe-se, no final do capítulo, que os Cohen regressam de Inglaterra.

Neste momento da ação justifica-se que o leitor intensifique a avidez com que se
embrenha na leitura, pois surge aqui um ingrediente que a vai colorir e que consiste na
clássica disputa entre dois pretendentes à mesma mulher. Será que Dâmaso desiste da
sua presunçosa pretensão de que pode ter uma aventura com Mª Eduarda? Aceitará
facilmente a preferência de Mª Eduarda por Carlos? Até onde o irão conduzir os
ciúmes? As respostas encontram-se nos próximos episódios.

Capítulo 12
Neste capítulo os dois apaixonados assumem finalmente o seu amor um pelo outro.
Entretanto, para que este amor possa escapar à exposição pública, Carlos aluga ao Craft
a sua quinta nos Olivais e compra-lhe os móveis e as coleções, para lá instalar Mª
Eduarda.

Carlos estava a regressar ao seu Ramalhete e encontrou Ega no seu quarto.


Carlos e Ega abraçaram-se, mas Ega disse que apenas vinha a Lisboa por uns dias. De
seguida perguntou a Carlos se tinha quarto para ele, ali no Ramalhete, apesar de estar
instalado no Hotel Espanhol. Claro que a resposta de Carlos foi positiva.
Ega tinha viajado de comboio, onde encontrara a Madame Gouvarinho. Ega
começou a “picar” Carlos por causa da senhora Gouvarinho, e Carlos disse que nunca
tinha tido nada para além de relações superficiais com essa senhora. Carlos também
informou Ega sobre o regresso dos Cohen, mas Ega já sabia da novidade, supondo-se
que talvez fosse esse o motivo da sua vinda para a capital.
Ega foi então cumprimentar Afonso, que o questionava sobre o facto de ele não concluir
os seus livros. Afonso incitava os dois jovens a fazerem algo pelo país, lamentando a
inércia em que eles se afundavam.
Numa segunda-feira chuvosa, Ega e Carlos foram ao jantar dos Gouvarinho.
Enquanto estavam a caminho, Ega perguntou a Carlos sobre uma tal brasileira, na
companhia da qual Dâmaso dissera que ele passava todas as manhãs. Dâmaso andava a
espalhar no Grémio que Carlos se interpusera entre ele e essa senhora, aproveitando a
sua ausência para a conquistar e que ela teria preferido Carlos por ele ser mais rico.
Carlos percebeu então como a sua relação com a Mª Eduarda começava a ser
enxovalhada pela “ tagarelice “ e impertinência de Dâmaso.
Enquanto se dirigiam à mesa, à hora do jantar, madame Gouvarinho tomou o
braço de Carlos e aproveitou logo para lhe fazer alusões à “ brasileira “. Durante a
refeição falou-se sobre viagens, a propósito de países como a Rússia e a Holanda, e
sobre um livro que censurava a colonização portuguesa em África. Então debateram
sobre a escravatura, defendida por Ega e condenada pelo deputado Sousa Neto,
representante da Administração Pública, que tinha a seu cargo a Instrução. Falaram
ainda de criados e do gosto por paradoxos. O conde Gouvarinho tentava lembrar-se de
um paradoxo brilhante, da autoria de um senhor Barros, ministro do reino, mas
atraiçoava-o a sua falta de memória. Comentou-se a sobremesa, que estava deliciosa, e
falaram também de animais, a propósito de um cão que pertencia a madame Gouvarinho
e que já tinha morrido, causando-lhe um enorme desgosto. Entretanto a condessa de
Gouvarinho pertencia à Sociedade Protetora de Animais e Ega declarou pertencer à
Sociedade de Geografia.
O ambiente tornou-se mais descontraído e, no meio do clamor das conversas, Carlos
explicou à condessa que a razão para frequentar a casa da senhora de quem Dâmaso
falava se devia aos seus serviços de médico, uma vez que a governanta estava doente.
Aliás até tinha sido o Dâmaso que primeiro o levara à família, para tratar da filha dessa
senhora. Assim, Carlos e a madame Gouvarinho acabaram por se reconciliar e o pé da
condessa já apertava o de Carlos, mostrando o desejo de uma aproximação. A mulher de
Sousa Neto continuava a falar da Rússia, tendo-se depois percebido as razões da sua
preocupação com esse país, porque o seu filho ia como segundo-secretário para a
legação de São Petersburgo. D. Maria da Cunha comentava entre dentes que ele era um
rapaz medíocre, que nem francês sabia falar. Ao café, Sousa Neto mostrou a Carlos o
seu prazer em tê-lo conhecido, falando-lhe também no avô e nos pais.
Abordou-se depois o tema das mulheres e Ega afirmou que a mulher não precisava de
instrução, tendo apenas o dever de ser bela, “ cozinhar e amar bem “. O conde
concordava, dizendo que o lugar da mulher era “ junto do berço, não na biblioteca “.
Ega entretanto questionava Sousa Neto a propósito de Proudhon, um filósofo francês
muito lido na época, que tinha escrito sobre o amor. Não querendo revelar a sua
ignorância, Sousa Neto procurava fugir às perguntas e declarou não querer discutir com
Ega.
Sousa Neto entabulou depois conversa com Carlos, falando de Paris e de Londres e
pedindo-lhe as suas impressões sobre essas cidades. Mais tarde a condessa Gouvarinho
justificou o pretexto de o seu filho estar constipado para pedir a Carlos que o fosse ver.
Quando se apanhou sozinha com ele beijou-o e impôs-lhe um encontro para o dia
seguinte em casa da sua tia. Entretanto Charlie dormia tranquilamente no seu berço.
Chegaram por fim Teles da Gama e o conde Steinbroken. O resto da noite passou-se no
salão, ao som dos fados de Teles da Gama e de melodias da Finlândia.
No dia seguinte, depois do encontro com a condessa, Carlos correu a casa de
Maria Eduarda, que já o esperava, estranhando a sua demora. Carlos conversou
animadamente com Rosa e preparava-se para beber chá com Mª Eduarda, quando
Domingos veio anunciar a visita de Dâmaso. Então Mª Eduarda mandou responder que
não recebia. Depois de o sentirem bater a porta, Mª Eduarda comunicou os
inconvenientes daquela casa, tão acessível a visitas importunas.
Mª Eduarda manifestou o desejo de arranjar uma casa de campo onde pudesse passa os
meses de verão com a filha e Carlos lembrou-se logo da casa do Craft, nos Olivais.
Depois disso Carlos declarou-se a Mª Eduarda. Maria Eduarda também amava Carlos,
mas antes de tudo tinha uma revelação a fazer-lhe.
Carlos interrompeu-a, dizendo-lhe que ela era a eleita do seu coração e que queria fugir
com ela e com Rose para um lugar onde pudessem viver tranquilamente o seu amor.
No dia seguinte Carlos procurou Craft nos Olivais, para lhe alugar a casa e a quinta e
comprar-lhe os seus móveis e decoração. Assim que pôde Carlos foi comunicar a
novidade a Mª Eduarda. De repente tudo correspondia a um conto de fadas e entravam
naquela casa com luzes acesas e as jarras cheias de flores, sem precisarem de transportar
nada. Afonso da Maia aprovou a aquisição do neto.
Entretanto Ega estranhava o facto de Carlos não lhe confidenciar nada sobre a sua
paixão. Por fim Carlos acabou por contar toda a sua história de amor ao amigo e Ega
ficou impressionado, percebendo que Carlos tinha encontrado o seu destino.

O capítulo XII é decisivo no desenrolar da ação. É impossível resistir-se à dúvida acerca


da possibilidade de um final feliz para a ligação de Carlos e Mª Eduarda, já que se
começam a desenhar tantos entraves. Por enquanto vamos entregar-nos à ilusão do
amor, enquanto pudermos fazê-la durar, e vivê-la com a intensidade que ela merece.

Capítulo 13
Este capítulo dá conta da bisbilhotice de Dâmaso, que continua a apregoar em Lisboa a
história dos amores de Carlos e Mª Eduarda, mostrando-se despeitado e humilhado no
seu orgulho pelo facto de ter sido rejeitado, ele que se considerava irresistível entre as
mulheres.
Carlos cruza-se com Dâmaso na rua, que está acompanhado de Gouvarinho e de Cohen,
e ameaça-o de lhe arrancar as orelhas. Dâmaso reage de um modo cobarde, como é
próprio do seu caráter.
Chega depois o dia em que Carlos leva Mª Eduarda a conhecer a quinta dos Olivais,
tendo os dois decidido chamar-lhe a Toca. No dia seguinte o aniversário de Afonso
reúne os seus amigos no Ramalhete e Afonso comunica a sua decisão de ir passar uns
dias à quinta de santa Olávia. Baptista avisa Carlos que tem alguém à porta, numa
carruagem, que lhe quer falar. Trata-se da madame Gouvarinho, que deseja obter
explicações sobre as faltas de Carlos aos encontros. No final despedem-se abruptamente
e a condessa dirige insultos a Carlos, ameaçando vingar-se.

Capítulo 14
Neste capítulo, começa a levantar-se o véu sobre o passado de Mª Eduarda. Apesar de
todas as hesitações de Carlos, o leitor tem oportunidade, mais uma vez, de conhecer o
seu “ bom coração “ e é fácil perceber-se que nada fará abalar o seu amor por Mª
Eduarda.

Afonso da Maia partiu para santa Olávia e Mª Eduarda instalou-se nos Olivais. Por sua
vez Ega partiu para Sintra, por alguns dias. Carlos saiu depois do jantar e encontrou o
amigo Taveira no Grémio, que o advertiu contra Dâmaso. Taveira ainda arrastou Carlos
até ao Price, mas Carlos pouco se demorou. Ao sair, Carlos encontrou Alencar e o
senhor Guimarães, tio de Dâmaso.
Carlos começava a alimentar mais fortemente o seu desejo de fugir com Mª Eduarda
para Itália e pensava no desgosto que poderia dar ao avô, mas o seu desejo de felicidade
vencia todos os seus receios. Carlos visitava todos os dias Mª Eduarda nos Olivais,
sendo descritos os seus encontros no quiosque japonês.
Os encontros de dia tornaram-se insuficientes e ambos começaram a desejar estar juntos
também à noite. Carlos combinou então um encontro para uma noite e depois disso
descobriu uma casa perto dos Olivais, que ele alugou para esperar aí os encontros
noturnos. Numa dessas noites Carlos descobriu miss Sara no jardim envolvida com um
jornaleiro. Carlos ficou chocado com a hipocrisia de miss Sara e estava decidido a
contar a Mª Eduarda, mas depois resolveu calar-se, depois de refletir que também os
amores entre os dois, embora com uma aparência de mais nobres e divinos, tinham
também o seu teor de clandestinos.
Chegou o mês de Setembro e Craft, que estivera com Afonso em santa Olávia, fez uma
visita a Carlos para lhe dizer que o avô lhe parecera desgostoso pelo facto de Carlos não
ter aparecido por lá. Então Carlos comunicou a Mª Eduarda a sua decisão de visitar o
avô e ela pediu-lhe que a deixasse ir fazer antes uma visita ao Ramalhete. Esta visita
ficou combinada para o dia em que Carlos partia para santa Olávia.
Depois de percorrerem a casa, Mª Eduarda mostrou-se angustiada, lamentando o facto
de Carlos se dispor a deixar todos os seus confortos no Ramalhete, querendo partir com
ela para longe.
Ao jantar Mª Eduarda comentou que Carlos lhe fazia lembrar a sua mãe, em
certos jeitos, nos seus modos e na maneira de sorrir (mais um indício de tragédia).
Falando da mãe, Mª Eduarda contou que ela era natural da ilha da Madeira e que casara
com um austríaco. Mª Eduarda tivera uma irmãzinha que morrera em pequena.
Apareceu Ega, que regressava de Sintra, trazendo notícias acerca de quem por
lá passeava (os Cohen acompanhados de Dâmaso e a madame Gouvarinho) e Carlos
mandou-o subir, pedindo-lhe para se juntar a eles no jantar.
Iam-se fazendo horas e Carlos teve que partir, instalando-se num coupé com
destino a santa Apolónia, que depois levaria Mª Eduarda de volta à Toca.
Carlos regressou então no sábado seguinte. Almoçando com Ega,
confidenciou-lhe que ambicionava instalar Maria em Itália e visitar regularmente o país,
revelando gradualmente ao avô o amor que o unia a Mª Eduarda. Discutindo com
Carlos, Ega era de opinião que a melhor cidade para se viver um amor era Paris. Assim
os dois amantes podiam embrenhar-se durante o dia no movimento das ruas, das
compras, da entrada nos clubes e nos museus, etc, para à noite se dedicarem um ao
outro, sem nunca se aborrecerem. Chegou depois o Baptista, que entregou a Carlos um
bilhete de Castro Gomes, que o esperava na antecâmara. Carlos disse então a Baptista
que o mandasse entrar para o salão grande.
Castro Gomes mostrou a Carlos uma carta anónima que tinha recebido no
Brasil, a denunciar a relação de Carlos com Mª Eduarda. Então Castro Gomes revelou a
Carlos que Mª Eduarda não era sua mulher e que Rose também não era sua filha,
portanto, para não passar pela fama de marido atraiçoado, se limitava a retirar-lhe o seu
nome, deixando-a com o nome de madame Mac Green, que ela tinha anteriormente.
Após a saída de Castro Gomes, Carlos contou tudo a Ega, que simplificou a situação aos
olhos de Carlos, dizendo-lhe que o facto de Mª Eduarda não ser casada com Castro
Gomes diminuía os problemas que Carlos teria de enfrentar para alimentar a sua paixão.
Carlos pensou primeiro em escrever uma carta a Mª Eduarda a terminar a
relação entre eles, enviando-lhe dinheiro. Por fim, após muito refletir, decidiu deslocar-
se aos Olivais. Confidenciando com Carlos, Ega assegurou-lhe que teria sido o Dâmaso
o autor da carta anónima dirigida a Castro Gomes e então Carlos lembrou-se da
conversa de Taveira, em que ele lhe contava sobre insinuações de Dâmaso, a propósito
de se preparar um grande escândalo em Lisboa, envolvendo tiros e um duelo.
Baptista preparou então a tipóia e acompanhou Carlos aos Olivais. Quando
estavam a chegar à quinta apareceu Melanie, que estava à procura de uma carruagem
que levasse Mª Eduarda ao Ramalhete. Depois da visita de Castro Gomes, Mª Eduarda
tinha ficado muito nervosa e chorosa, querendo morrer. Melanie foi confidenciando que
Mª Eduarda já não levantava o dinheiro que Castro Gomes lhe enviava, por isso Carlos
a tinha encontrado um dia à porta do Montepio, onde tinha ido empenhar uma pulseira
da senhora.
Ao chegar aos Olivais Carlos foi encontrar Mª Eduarda debulhada em
lágrimas e ela quis-lhe contar o seu passado, mostrando que a mãe é que tinha sido a
culpada da sua desgraça. Mª Eduarda em choro pediu perdão a Carlos, relembrando o
dia em que tinha tentado falar com ele, insistindo que tinha algo para lhe dizer, quando
se declararam um ao outro. Carlos insistia em mostrar-se ultrajado com a mentira de Mª
Eduarda, mas por fim não resistiu mais e, tomado pela emoção, pediu-a em casamento.

Capítulo 15
Neste capítulo dá-se o importante episódio do “ Sarau no Teatro da Trindade “. Aqui o
enredo atinge um ponto culminante, quando surge, à maneira da tragédia clássica, uma
situação que contribui para a mudança súbita dos acontecimentos. O senhor Guimarães,
tio de Dâmaso que vive em Paris, torna-se o instrumento da fatalidade que se abate
sobre Carlos e Mª Eduarda, quando entrega a Ega o cofre que Mª Monforte lhe confiara
em Paris, onde se encontram documentos com a revelação de que Carlos e Eduarda são
irmãos.
Com Maria já instalada na Rua de S. Francisco, terminara aí o jantar, e Ega insistia com
Carlos para irem ao sarau de beneficência que se realizava no Teatro da Trindade, a
favor das vítimas das cheias.
Carlos, relutantemente a principio, rendeu-se à ideia de ir, já que o Cruges era um dos
atuantes. Juntamente com Ega, suportou estoicamente o discurso de um parlamentar
arrebatado, ouviu a atuação do Cruges, tocando ao piano a Sonata Patética de Bethoven,
e assistiu ao triunfo do Alencar, que recitou um poema da sua autoria, dedicado à
Democracia, tudo intercalado com idas ao botequim e conversas de corredor com os
conhecidos.
No botequim, por intermédio de Alencar, Ega travou conhecimento com o Sr.
Guimarães, o tio de Dâmaso, que vivia em Paris. O senhor Guimarães tinha mostrado
vontade de falar com Ega, porque se sentia atingido pelas declarações do sobrinho, na
carta que o Ega redigira e o fizera assinar, fazendo-o confessar que tinha uma tendência
hereditária para se entregar à bebida.
Dâmaso alegara que assinara a carta sob coação. Mas, sabendo-o mentiroso, o Sr.
Guimarães (em Paris no Rappel onde trabalhava, era conhecido por monsieur
Guimaran) apenas desejava que o Sr. Ega declarasse que não o considerava um bêbedo
– coisa que Ega fez sem dificuldades, pois, além do mais, simpatizara com aquele
patriarca anarquista e republicano.
Carlos, tendo visto Eusebiozinho a sair do sarau, foi atrás dele e cobrou-lhe com uma
tareia a intervenção que tivera no caso do Jornal da Corneta. Mas, quando se tratou de
regressarem a casa, os dois amigos, Carlos e Ega, desencontraram-se, e Ega caminhava
com o Cruges pela Rua Nova da Trindade, quando ouviu o Sr. Guimarães a chamá-lo.
O caso é que o Sr. Guimarães sabia que o Sr. Ega era íntimo do Sr. Carlos da Maia. E
ele, Sr. Guimarães, fora muito amigo, em Paris, da mãe de Carlos, que lhe confiara,
antes de morrer, um cofre onde estariam, segundo ele, papéis importantes. Como estava
de partida, pedia ao Sr. Ega que entregasse o cofre ou ao Sr. Carlos ou à irmã. E,
perante a estupefação do Ega, o Sr. Guimarães revela candidamente ao Ega que Maria
Eduarda era irmã de Carlos – aliás, o Sr. Ega devia estar ao corrente…Ega não estava ao
corrente, mas, sem se dar por achado, arranca do Sr. Guimarães a história que, em tudo
e por tudo, condiz com a que Maria Eduarda contara a Carlos. E, de posse do cofre,
correndo para o Ramalhete, Ega realiza, atordoado, a enormidade da situação: Carlos
era amante da sua própria irmã. Indeciso, primeiro, toma depois a resolução de não
pactuar com essa situação hedionda e de contar tudo ao Vilaça, o procurador dos Maias,
para que seja este a dar a notícia a Carlos.

Com a revelação de que Carlos e Mª Eduarda são irmãos, percebe-se que a ação se
aproxima do desenlace trágico. Alguns leitores ficarão talvez dececionados com o
desfecho inesperado desta história de amores sublimes entre duas criaturas dotadas de
grandeza, mas, de acordo com as regras de tragédia, os finais funestos dão-se,
precisamente, com personagens de caráter e de condição nobre.
Capítulo 16
Neste capítulo dá-se o importante episódio do “ Sarau no Teatro da Trindade “. Aqui o
enredo atinge um ponto culminante, quando surge, à maneira da tragédia clássica, uma
situação que contribui para a mudança súbita dos acontecimentos. O senhor Guimarães,
tio de Dâmaso que vive em Paris, torna-se o instrumento da fatalidade que se abate
sobre Carlos e Mª Eduarda, quando entrega a Ega o cofre que Mª Monforte lhe confiara
em Paris, onde se encontram documentos com a revelação de que Carlos e Eduarda são
irmãos.

Com Maria já instalada na Rua de S. Francisco, terminara aí o jantar, e Ega insistia com
Carlos para irem ao sarau de beneficência que se realizava no Teatro da Trindade, a
favor das vítimas das cheias.
Carlos, relutantemente a principio, rendeu-se à ideia de ir, já que o Cruges era um dos
atuantes. Juntamente com Ega, suportou estoicamente o discurso de um parlamentar
arrebatado, ouviu a atuação do Cruges, tocando ao piano a Sonata Patética de Bethoven,
e assistiu ao triunfo do Alencar, que recitou um poema da sua autoria, dedicado à
Democracia, tudo intercalado com idas ao botequim e conversas de corredor com os
conhecidos.
No botequim, por intermédio de Alencar, Ega travou conhecimento com o Sr.
Guimarães, o tio de Dâmaso, que vivia em Paris. O senhor Guimarães tinha mostrado
vontade de falar com Ega, porque se sentia atingido pelas declarações do sobrinho, na
carta que o Ega redigira e o fizera assinar, fazendo-o confessar que tinha uma tendência
hereditária para se entregar à bebida.
Dâmaso alegara que assinara a carta sob coação. Mas, sabendo-o mentiroso, o Sr.
Guimarães (em Paris no Rappel onde trabalhava, era conhecido por monsieur
Guimaran) apenas desejava que o Sr. Ega declarasse que não o considerava um bêbedo
– coisa que Ega fez sem dificuldades, pois, além do mais, simpatizara com aquele
patriarca anarquista e republicano.
Carlos, tendo visto Eusebiozinho a sair do sarau, foi atrás dele e cobrou-lhe com uma
tareia a intervenção que tivera no caso do Jornal da Corneta. Mas, quando se tratou de
regressarem a casa, os dois amigos, Carlos e Ega, desencontraram-se, e Ega caminhava
com o Cruges pela Rua Nova da Trindade, quando ouviu o Sr. Guimarães a chamá-lo.
O caso é que o Sr. Guimarães sabia que o Sr. Ega era íntimo do Sr. Carlos da Maia. E
ele, Sr. Guimarães, fora muito amigo, em Paris, da mãe de Carlos, que lhe confiara,
antes de morrer, um cofre onde estariam, segundo ele, papéis importantes. Como estava
de partida, pedia ao Sr. Ega que entregasse o cofre ou ao Sr. Carlos ou à irmã. E,
perante a estupefação do Ega, o Sr. Guimarães revela candidamente ao Ega que Maria
Eduarda era irmã de Carlos – aliás, o Sr. Ega devia estar ao corrente…Ega não estava ao
corrente, mas, sem se dar por achado, arranca do Sr. Guimarães a história que, em tudo
e por tudo, condiz com a que Maria Eduarda contara a Carlos. E, de posse do cofre,
correndo para o Ramalhete, Ega realiza, atordoado, a enormidade da situação: Carlos
era amante da sua própria irmã. Indeciso, primeiro, toma depois a resolução de não
pactuar com essa situação hedionda e de contar tudo ao Vilaça, o procurador dos Maias,
para que seja este a dar a notícia a Carlos.

Com a revelação de que Carlos e Mª Eduarda são irmãos, percebe-se que a ação se
aproxima do desenlace trágico. Alguns leitores ficarão talvez dececionados com o
desfecho inesperado desta história de amores sublimes entre duas criaturas dotadas de
grandeza, mas, de acordo com as regras de tragédia, os finais funestos dão-se,
precisamente, com personagens de caráter e de condição nobre.

Capítulo 17
Ega tem em mãos a tarefa difícil de fazer chegar a Carlos a revelação de que ele é irmão
de Maria Eduarda. Faltando-lhe a coragem, incumbe o procurador Vilaça de entregar ao
amigo o cofre deixado por Maria Monforte. Vive-se um momento dramático, tendo em
conta a mudança de rumo que seguem os amores das duas personagens principais do
romance. A ação avança precipitadamente em direção a um desfecho trágico.

No Ramalhete, Ega foi acordado por Baptista às sete horas da manhã. Não tendo
coragem para revelar a verdade a Carlos acerca do seu parentesco com Maria Eduarda,
Ega inventou uma ida a Sintra como desculpa para não passar a tarde com o amigo. Para
resolver o problema da entrega a Carlos dos papéis que o senhor Guimarães lhe
confiara, Ega tinha marcado um encontro com o procurador Vilaça.
Quando Ega finalmente se encontrou com o procurador, contou-lhe toda a história,
incumbindo-o de revelar a verdade a Carlos.
Vilaça apareceu então no Ramalhete e expôs a situação a Carlos. Sentindo-se
desesperado, Carlos convocou a presença do avô, na esperança de que houvesse um
desmentido, mas o avô não tinha respostas para lhe dar.
Afonso revelou a Ega que conhecia a relação que unia Carlos a Mª Eduarda e que
naquele momento se tornava incestuosa.
Entretanto Carlos planeou uma mentira para ganhar tempo, enquanto não contava a Mª
Eduarda a verdade sobre eles. Acontece, no entanto, que Carlos, na presença de Mª
Eduarda, não soube resistir-lhe e cometeu incesto conscientemente, por vontade própria.
Apesar da grande paixão que existia entre ambos, Carlos começou então a sentir
repugnância física por Maria Eduarda, devido à consciência de que ela era sua irmã.
Carlos começava também a ter consciência do sofrimento que causava a seu avô, ao seu
amigo Ega e mesmo a si próprio.
Uma noite, quando regressava de um encontro com Maria Eduarda, procurando entrar
sub-repticiamente em casa, sem ninguém dar conta, cruzou-se com o avô, que o
esperava, para o acusar com o seu olhar reprovador, sem lhe dizer uma palavra.
Na manhã seguinte Carlos foi chamado ao jardim, onde os criados tinham encontrado o
seu avô morto, caído sobre a mesa.
Carlos sentiu-se culpado e atormentado pelo remorso, pois sabia que o seu avô tinha
morrido de desgosto. Afonso da Maia, depois de ter enfrentado todos os desaires da sua
vida, não conseguiria sobreviver à dura prova de ver o seu neto a cometer incesto
voluntariamente.
Após o funeral do avô, Carlos viajou para a quinta de Santa Olávia, deixando dinheiro a
Ega para que o entregasse a Mª Eduarda, juntamente com o conteúdo da carta de Mª
Monforte.
Maria partiu então no comboio que a levaria a França. Ega acompanhou-a até ao
Entroncamento, onde saiu, para depois ir ao encontro de Carlos à quinta de Santa
Olávia.

A leitura deste capítulo permite-nos reconhecer uma característica do caráter de Carlos,


que é hereditária. Assim, apesar da educação à inglesa a que fora sujeito, com o
propósito de se fazer um homem de caráter forte, ele acaba por se revelar um ser frágil,
num momento em que precisa de pôr determinadamente um termo à sua relação
incestuosa. Neste momento da ação Carlos assemelha-se ao pai, mostrando-se incapaz
de tomar uma decisão e adiando sempre para mais tarde a tarefa de revelar a verdade a
Maria Eduarda.
O romance poderia certamente terminar neste momento da ação, mas o certo é que a
vida de Carlos continua, assim como a do amigo Ega, de Mª Eduarda e da filha…
Como se irá desenrolar a vida destas personagens. E como irá evoluir o ambiente socio-
político-cultural em Portugal???

Capítulo 18
Chegamos enfim ao capítulo final e ao desfecho do romance, onde tudo se resolve,
dando-se uma solução à intriga e um destino às personagens.

Passaram-se semanas após a partida de Mª Eduarda para França. Entretanto saiu na “


Gazeta Ilustrada “ a notícia acerca da partida de Carlos e Ega numa longa viagem pelo
mundo: Londres, Nova York, China, Japão. Ega regressou um ano e meio depois desta
viagem, informando que Carlos tinha ficado em Paris, onde alugara um apartamento e
de onde não desejava regressar, tendo perdido o interesse por Portugal. Entretanto Ega
revelou o seu propósito de escrever um livro com o título “ Jornadas de Ásia “.
Dez anos depois Carlos visita Lisboa, regressando da sua longa viagem. Carlos não tem
intenções de se demorar muito tempo, querendo apenas tratar de alguns assuntos e matar
saudades dos amigos.
Carlos almoça com Ega no hotel Bragança. Ega conta, então, as últimas novidades: a
sua mãe morrera, tendo-lhe deixado uma boa herança; madame Gouvarinho tinha
herdado uma fortuna de uma tia e tinha então melhores carruagens, continuando a
receber às terças-feiras. Apareceram então o poeta Alencar e o maestro Cruges. Alencar
tinha ao seu cuidado uma sobrinha que tinha ficado sem mãe e Cruges escrevera uma
ópera cómica, a “ Flor de Granada “, que lhe valera o merecido reconhecimento.
Por fim separaram-se, após Carlos os ter convidado para jantar, combinando um
encontro às seis horas.
Entretanto Carlos e Ega iam visitar o Ramalhete. Passaram pelo Largo do Loreto e
Carlos espantava-se com o facto de nada ter mudado. Ao descerem o Chiado, Carlos
teve também a mesma impressão, encontrado às portas dos cafés as mesmas pessoas que
por lá se detinham dez anos atrás, com o seu ar triste e apagado.
Pelo caminho cruzaram-se com o Dâmaso, que casara com a filha dos condes de
Águeda, uma gente arruinada. Dâmaso sustentava a família e além disso a mulher traía-
o, mas ele até parecia dar-se bem com isso, uma vez que até tinha engordado. Passaram
em frente do consultório de Carlos e reviveram momentos do passado, quando se
instalaram em Lisboa, cheios de projetos. Recordaram também alguns amigos, como o
Sequeira, o marquês de Sousela e a D. Maria da Cunha, que já tinham morrido, D.
Diogo, que tinha casado com a cozinheira, Craft, que se tinha mudado para Londres,
Steinbroken, que era ministro em Atenas, Taveira, que continuava igual.
Chegaram depois à avenida, que tinha sido renovada, mas Carlos espantava-se com o
aspeto molengão dos rapazes que por ali passeavam, vestindo segundo os figurinos
franceses, mas de um modo servil, exagerado e ridículo, sem nenhuma originalidade.
Os dois amigos concluíram então que o que se mantinha genuíno em Lisboa era o alto
da cidade, com o seu castelo, o casario, os palacetes, os conventos e as igrejas.
A certa altura viram passar uma vitória com duas éguas inglesas, que trazia uma rapaz
loiro, com um aspeto delicado. Carlos não o reconheceu e Ega lembrou-lhe que era
Charlie, o filho de madame Gouvarinho, seu antigo doente. Ele estava já um homem,
mas mantinha uma amizade com um velho, revelando tendências homossexuais.
Depararam ainda com Eusebiozinho, que subia a avenida, de braço dado com uma
mulher muito forte. Ele tinha sido obrigado a casar com essa mulher, porque o pai dela,
dono de um prego, os tinha apanhado num encontro. Eusebiozinho tinha um aspeto
ainda mais triste e molengão e dizia-se que a mulher lhe batia.
Carlos, recordando o artigo publicado no jornal “ A Corneta do Diabo “, a mando de
Dâmaso e de Eusebiozinho, perguntou então por Palma Cavalão e Ega esclareceu que
ele tinha deixado a literatura e se dedicava à política.
Apanharam depois uma tipóia para o Ramalhete. Viram Alencar ao longe e Ega
explicou a Carlos a sua amizade por ele, por ser um dos poucos homens que se
mantinha genuíno e com um sentido de honestidade, lealdade e generosidade.
O procurador Vilaça já os esperava à porta do Ramalhete e apresentou-lhes o jardineiro
que ali vivia com a mulher e o filho, guardando o casarão.
Os dois amigos percorreram então a casa, passando pelas diversas salas, onde se
guardavam os móveis e outros objetos trazidos da Toca. Entraram emocionados no
escritório de Afonso, onde romperam em espirros, devido a um pó que Vilaça colocara
sobre os móveis e os lençóis que os tapavam. Alguns móveis já estavam preparados
para serem levados para Paris, onde Carlos fixara a sua morada. Relembrando o
reverendo Bonifácio, o gato de estimação de Afonso, Carlos falou sobre a sua morte em
Santa Olávia e sobre o mausoléu que Vilaça lhe mandara fazer.
Sentaram-se no terraço e observaram o jardim, que tinha um aspeto melancólico,
simbolizando a decadência da família, com a estátua de Vénus coberta de alguma
ferrugem, o pranto da cascata e o cipreste e o cedro envelhecendo juntos, “ como dois
amigos num ermo “.
A propósito de Maria Eduarda, Carlos comunicou então ao amigo a notícia de que ela ia
casar, numa resolução de encarar a velhice com o apoio de um homem de bem e que
tinha afinidades com ela.
Já no quarto de Carlos, revendo a sua mocidade, os dois concluíram que ambos tinham
falhado na vida, não tendo levado por diante os seus projetos. Carlos refletiu que só
tinha vivido dois anos naquela casa, mas que era ali que estava toda a sua vida. Ega não
se admirou, porque fora nesses dois anos que Carlos viveu uma paixão. Esta era uma
ideia de românticos, mas Ega reconheceu que afinal todas as criaturas são românticas,
governando-se pelo sentimento mais do que pela razão.
Por fim decidiram fixar a sua teoria sobre a vida, o “ fatalismo muçulmano “, que
consistia em não ter ambições nem esperanças e tudo aceitar com resignação e com a
consciência acerca da impossibilidade de se ter qualquer controlo sobre a vida.
Em suma, qualquer esforço se tornava inútil e não valia a pena correr para nada, “ nem
para o amor nem para a glória nem para o dinheiro nem para o poder “. Por fim, já na
rua, aperceberam-se do adiantado da hora (6.15h) e correram desesperadamente para
apanhar um americano. Afinal, tendo eles decidido que não valia a pena correr fosse
para o que fosse, apenas apressavam o passo para satisfazerem os apetites do estômago,
pois estavam atrasados para o jantar que Carlos tinha marcado no hotel Bragança e
Carlos tinha vontade de ainda mandar preparar um prato de paio com ervilhas.

A intriga principal terminou com a descoberta dos laços de parentesco existentes entre
Carlos e Mª Eduarda, o que levou à morte de Afonso, à partida de Mª Eduarda para
França e à decisão de Carlos de viver no estrangeiro, mas podemos considerar que a
ação continua em aberto, surgindo as seguintes perguntas: Será que Carlos vai continuar
a levar uma vida fútil de homem rico, passeando por Paris, ou, quem sabe, poderá até
voltar a apaixonar-se, abandonando a ociosidade e entregando-se finalmente aos seus
projetos da mocidade? E Ega, virá enfim a escrever os sus livros? Considerando o
decadentismo da geração de 70, da qual fazia parte Eça de Queirós, o leitor fica
certamente desencantado com este desfecho que nos aponta para uma situação de
desistência nas personagens e de crise e estagnação no país, já tão familiar aos
portugueses. Os episódios da vida social não se esgotam no final desta trama realista,
sendo sempre fácil imaginar outros que poderiam dar sequência a este romance. Quem
sabe talvez até pudéssemos imaginar outros enredos nos quais nos surgissem
portugueses empenhados em “ arregaçar as mangas “, teimando em vencer a decadência
para onde de vez em quando nos conduzem as forças da inércia?
Neste capítulo final, percebemos como esta obra mantém ainda a sua atualidade,
justificando-se a sua leitura, pelas linhas de reflexão que nos propõe.

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