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Autor:
Equipe Materiais Carreiras
Jurídicas, Marcos Gomes, Allan
Montoni Joos
09 de Fevereiro de 2022
Sumário
3 – Conceito .................................................................................................................................................. 15
4 – Método ................................................................................................................................................... 16
5 – Objeto ..................................................................................................................................................... 18
7 – Questões ................................................................................................................................................. 48
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O presente curso é diferenciado e inovador! A partir de um estudo direcionado para a Defensoria Pública e
com um material verdadeiramente completo, o aluno terá o diferencial que faltava para a preparação.
O material será didático, objetivo e irá destacar aqueles temas importantes que constituem uma espinha dorsal
para os certames da instituição. Além disso, o curso irá apresentar questões de concurso, para aqueles que
possuem maior facilidade praticando!
O curso irá procurar fornecer um raciocínio defensorial para que os alunos tenham capacidade de responder
toda e qualquer questão sobre Criminologia e possa ter uma reflexão defensorial sobre determinados temas..
Entrementes, os alunos irão notar que, em que pese a objetividade, o material irá aprofundar bastante as
matérias, não só com doutrina, como também com o diferencial do nosso curso, que é um tempero defensorial
dos temas ministrados. Muitas vezes, esse tempero é o detalhe que faltava para que o concurseiro conheça a
realidade da Defensoria Pública.
Por fim, existe uma preocupação desse professor com questões práticas e com a memorização da matéria
por vocês. As questões serão direcionadas não só ao passado, como também às possíveis questões que serão
cobradas no futuro, sempre relacionando a casos práticos e o cotidiano dos defensores!
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O presente curso irá elaborar uma análise detalhada da matéria de Criminologia, por meio de aulas
ministradas em pdf. Será realizado um estudo doutrinário, sempre com um viés defensorial.
O professor irá destacar aqueles assuntos que estão em evidência sobre a Defensoria Pública, alertando os
alunos para as questões controvertidas e polêmicas. Se cabível, será destacada a legislação pertinente.
De forma a permitir que o aluno tenha uma visão prática da matéria apresentada, serão fornecidas não só
questões de provas anteriores, inclusive com seu respectivo gabarito, como também será realizado um
prognóstico de questões para o futuro, permitindo que os estudiosos saibam como determinado tema poderá
ser cobrado em eventual prova. Vejamos o caminho a ser percorrido:
Jurisprudência
Apresentação da
Doutrina (quando
Matéria
pertinente)
Mapas
Mentais Questões Conclusão
(quando
pertinente)
Como se não bastasse o incrível material a ser apresentado, o aluno poderá contar com aulas em vídeo, as
quais servirão como complementação do material a ser apresentado. O aluno terá disponível um conjunto de
aulas para assistir como e onde quiser: as aulas poderão ser visualizadas online ou baixadas em arquivos por
meio de download. Importante consignar que as aulas em vídeo não abrangem todos os pontos das aulas em
pdf, mas tão somente aqueles pontos que o professor considera mais importantes.
4
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APRESENTAÇÃO PESSOAL
Meu nome é Allan Joos, sou natural do estado de São Paulo, porém sou defensor público no estado de Goiás
há quase 05 (cinco) anos. Possuo especialização em Direito Público e estou cursando especialização em Direitos
Humanos. Estou presidente da Associação Goiana das Defensoras e dos Defensores Públicos e diretor de
assuntos legislativos da ANADEP. Sou também professor universitário nas cadeiras de Direito Penal e Processual
Penal da Universidade Alves Faria. Atualmente, sou professor de Criminologia, Direito Penal, Direito Processual
Penal e Execução Penal do Estratégia Carreiras Jurídicas.
Meu nome é Marcos Gomes, sou natural do estado do Rio de Janeiro, mas sou defensor público no estado de
São Paulo há cerca de 10 anos. Possuo especialização em Direito Público e sou coordenador e escritor da
Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto - única coleção de livros jurídicos direcionada especificamente aos
certames da Defensoria Pública. Atualmente, sou professor de Direito Constitucional e Princípios Institucionais
da Defensoria Pública do Estratégia Carreiras Jurídicas.
Saibam que podem contar com a gente para o que precisar nessa caminhada: é sangue verde!!!
Instagram: @allanmjoos
Telegram: t.me/allanjoos
Instagram: @marcoslopesgomes
Telegram: t.me/marcoslopesgomes
CONTEÚDO DO CURSO
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De forma a conferir um curso bem completo aos nossos alunos, teremos 04 aulas a serem ministradas da
seguinte forma:
MATÉRIA: Crimininologia
CONCURSO: DPE-SP
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A matéria de Criminologia está cada vez mais presente nos concursos da Defensoria Pública. Em um período
inicial, o tema não era nem mesmo cobrado nos certames da Instituição. Posteriormente, a matéria passou a
ser cobrada dentro do conteúdo inerente ao Direito Penal. Atualmente, nota-se uma clara tendência da
cobrança cada vez maior da matéria em diversos certames da Defensoria Pública, até mesmo como conteúdo
autônomo, demonstrando a necessidade de um viés crítico do sistema penal por parte dos futuros defensores
públicos.
A defensoria pública exerce um papel contramajoritário dentre as instituições do Sistema da Justiça e o estudo
da criminologia contribui para a formação de pensadores críticos do modelo atual. E é justamente esse
pensamento crítico que deve nortear o defensor público e a Defensora Pública durante a realização de suas
funções institucionais. Justamente por isso as Defensorias públicas de todo o país passaram a exigir cada vez
mais o conhecimento da referida matéria em seus certames.
Entrementes, ao longo dos anos lecionando aulas de Criminologia, nota-se grande desconhecimento dos alunos
sobre da matéria, notadamente por estar simplesmente ausente da grade de muitas universidades do país ou,
quando muito, ser lecionada como matéria optativa.
Seguindo essa linha de raciocínio, buscaremos não apenas expor a matéria de forma didática e aprofundada
aos alunos, mas também conferir a abordagem defensorial necessária para os certames da instituição,
trazendo o diferencial que faltava para sua aprovação!
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Conforme a doutrina, a Política Criminal, a Criminologia e o Direito Penal são os três pilares de sustentação
da denominada ciências criminais1. Trata-se de um gênero do qual a Política Criminal, a Criminologia e o
Direito Penal são espécies autônomas entre si. Seguindo essa linha de raciocínio, inicialmente, estudar-se-á a
ideia de cada pilar, bem como sua interdependência recíproca.
Ciências
Criminais
Política
Criminologia Direito Penal
Criminal
A Política Criminal consubstancia-se em um conjunto de princípios e recomendações que possuem como objetivo
a crítica e reforma do Direito Penal. Nota-se que a Política Criminal irá trilhar estratégias para alcançar o
controle social – prevenção e repressão dos delitos. Em apertada síntese, trata-se da forma pelo qual o Estado
1
MAIA, Erick de Figueiredo. Execução Penal e Criminologia. Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto.
Coordenação: Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes. São Paulo: Editora Saraiva, 2021.
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enfrentará a criminalidade. Assim, podemos destacar que os defensores públicos fazem uma análise de Política
Criminal ao estudar como diminuir a violência obstétrica ou a violência doméstica, almejando realizar
críticas e recomendações para reforma da legislação em vigor. Vejamos a doutrina de Nilo Batista sobre o
tema, demonstrando análises que podem ser elaboradas por meio da Política Criminal:
“Do incessante processo de mudança social, dos resultados que apresentem novas ou antigas propostas
do direito penal, das revelações empíricas propiciadas pelo desempenho das instituições que integram
o sistema penal, dos avanços e descobertas da criminologia, surgem princípios e recomendações para
a reforma ou transformação da legislação criminal e dos órgãos encarregados de sua aplicação. A
esse conjunto de princípios e recomendações denomina-se política criminal”2.
“Já a política criminal, como parte da política, constitui a sistematização das estratégias, táticas e meios
de controle social da criminalidade, penais e não penais; diz respeito, enfim, à gestão política dos
conflitos humanos por parte do Estado; gestão que compete não só ao legislado e autoridades
administrativas, mas a todos aqueles que de algum modo lidam com o direito penal, especialmente
juízes, membros do Ministério Público, polícias etc.3.
Observação importante para os certames da Defensoria pública é ensinada por Nilo Batista, citando Fragoso:
2
BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Revan, 11ª Edição,
2007. Página 34.
3
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal – v. 1 – Parte Geral. 14 ed. ver., ampl. e atual. Salvador: JusPODVM,
2020. Página 60.
4
BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Revan, 11ª Edição,
2007. Página 36.
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Porém, conforme será verificado, a Política Criminal irá buscar na Criminologia bases sólidas para sua visão
crítica e de reforma.
2.2 – CRIMINOLOGIA
A palavra Criminologia se origina do latim crimino - que significa crime - e do grego logos (estudo do crime).
A primeira vez em que a referida expressão foi empregada foi por Paul Topinard, em 1883. Entretanto,
somente em 1885, Raffaele Garófalo, no livro Criminologia, difundiu o termo internacionalmente.
Ainda quanto ao aspecto histórico, prevalece que Césare Lombroso, na obra “O homem delinquente” – escola
positivista – tratou, de forma pioneira, da criminologia como uma ciência. Porém, não se pode deixar de lado
o importante papel de Cesare Beccaria na obra “Dos delitos e das penas” que introduziu, antes, o estudo
criminológico (não com este nome e não com a característica de uma ciência autônoma).
A criminologia é uma ciência, empírica5 e interdisciplinar6, que estuda o crime, o criminoso, a vítima e o controle
social dos comportamentos delitivos. Explica-se: o método da criminologia para estudar o crime, o criminoso, a
vítima e o controle social é empírico e interdisciplinar. A Criminologia irá buscar compreender a realidade
para poder explicá-la. Perceba, então, que a Política Criminal irá se utilizar da Criminologia. Como assim?
Vejamos as lições de Sérgio Salomão Shecaira:
5
Embora não transmita uma certeza concludente típica das ciências exatas, confere uma ética
procedimental coerente e segura para problemas criminais, por meio de análises empíricas, que buscam
conhecer e explicar a realidade.
6
A criminologia irá trabalhar com temas da antropologia, história, sociologia, filosofia, psicanálise e
outras.
10
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“Assim, a criminologia fornece o substrato empírico do sistema, seu fundamento científico. A política
criminal, por seu turno, incumbe-se de transformar a experiência criminológica em opções e estratégias
concretas assumíveis pelo legislador e pelos poderes públicos”7.
“A criminologia – expressão que remonta ao antropólogo francês Topinard (1879) – é uma ciência
empírica e interdisciplinar que se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do
controle social do comportamento criminoso, e que trata de subministrar uma informação válida,
contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime, assim como os programas de
prevenção e controle social”8.
Portanto, quando se fala em Defensoria Pública, os defensores públicos irão se utilizar da experiência
criminológica para instituir e formular políticas públicas, como, por exemplo, medidas visando diminuir a
violência obstétrica ou a violência doméstica. Ou, então, os defensores públicos poderão se utilizar da
criminologia para servir de base à sua atuação:
“Enfim, a constatação científica pela criminologia de que não se deve usar a prisão e o próprio sistema
punitivo, por serem instâncias criminógenas, é que motiva os operadores do direito à utilização da
chamada política criminal em seu cotidiano”9.
A criminologia, então, estará na base, no substrato teórico para as estratégias de política criminal. Por fim,
conforme será demonstrado, o Direito Penal irá instrumentalizar, convertendo em proposições jurídicas o saber
criminológico esgrimado pela política criminal10. Conforme a doutrina, “na atualidade, a dogmática penal
7
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2021. Páginas 46/47.
8
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal – v. 1 – Parte Geral. 14 ed. ver., ampl. e atual. Salvador: JusPODVM,
2020. Página 60.
9
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2021. Página 48.
10
Nesse sentido, SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters
Brasil – Revista dos Tribunais, 2021. Página 47.
11
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deverá ser influenciada pela política criminal. O operador do direito penal deverá construir um sistema penal
finalisticamente orientado para a consecução da função do direito penal”11. Passamos a análise da
diferenciação da Criminologia do Direito Penal.
O Direito Penal irá se utilizar da Política Criminal para verificar os comportamentos humanos indesejados,
definindo quais devem ser qualificados como crimes ou contravenções penais e fixando as sanções penais.
Trata-se de uma ciência do dever ser. Vejamos, de forma didática, algumas diferenciações apontadas pela
doutrina12:
Retrata o delito enquanto fato (ciência do ser). Retrata o delito enquanto norma (ciência do dever-
ser).
11
MARQUES, Alexandre Pinheiros Paranhos. Direito Penal. Parte Geral. Coleção Defensoria Pública Ponto
a Ponto. Coordenador: Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes. 2ª Edição. São Paulo: Saraiva Educação,
2019. Página 49.
12
Conforme SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil –
Revista dos Tribunais, 2021. Páginas 45/47.
12
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Paulo Queiroz13 faz um juízo crítico à distinção entre Direito Penal e Política Criminal ao dizer que “o direito
é um fenômeno político, com fins e limites também políticos. E como fenômeno político, é explicável, legitimável
e também deslegitimável politicamente.
De forma a não restar dúvidas aos nossos alunos, destacamos as definições de Erick Figueiredo Maia:
“O direito penal é uma ciência normativa, lógica, abstrata, dedutiva que se ocupa do crime enquanto
norma, preocupada com o campo do “dever ser”.
Por outro lado, a criminologia é uma ciência empírica (baseada na observação e na experiência) e
interdisciplinar que tem por objeto de análise o crime, a personalidade do autor do comportamento
delitivo e da vítima, e o controle social das condutas criminosas, preocupada com o campo do “ser” e
se ocupa do crime enquanto fato.
(...)
Por sua vez, a política criminal, nas palavras de Antonio Garcia-Pablos de Molina, é a disciplina que
oferece aos poderes públicos as opções científicas concretas mais adequadas para o controle do crime.
13
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal – v. 1 – Parte Geral. 14 ed. ver., ampl. e atual. Salvador: JusPODVM,
2020. Página 61.
13
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Para o autor, a política criminal é a ponte eficaz entre a Criminologia e o Direito Penal. Ocupa-se do
crime enquanto valor”14.
Finalizamos o presente ponto com didático quadro elaborado por Rogério Sanches15, almejando fixar ainda
mais a matéria:
14
MAIA, Erick de Figueiredo. Execução Penal e Criminologia. Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto.
São Paulo: Editora Saraiva, 2021, citando também Penteado Filho, Nestor Sampaio. Manual esquemático
de criminologia. 10. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 16.
15
CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal. Parte Geral. 3ª Edição. Editora Jus Podivm, 2015.
Página 34.
14
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Ao tratarmos a criminologia como ciência e analisarmos o seu processo histórico de evolução, não se pode
olvidar a denominada concepção enciclopédica, proveniente da escola austríaca, que parte de uma premissa
ampla e sistematiza todas as disciplinas que tratam do fenômeno criminal. Assim, para a referida concepção,
a criminologia integraria o seguinte sistema (classificação de Ernst Seeling e estruturada por Antonio Garcia-
Pablos de Molina):
3 – CONCEITO
Didaticamente, a criminologia é uma ciência, empírica e interdisciplinar, que estuda o crime, o criminoso, a
vítima e o controle social dos comportamentos delitivos.
15
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Porém, no momento de prova, o aluno poderá se deparar com alguns conceitos complexos, mas cuja ideia
permanece a mesma. Vejamos:
Conforme Antonio García-Pablos de Molina, a criminologia é “uma ciência (ou uma área do saber, conforme
o entendimento) empírica e interdisciplinar, que se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima
e do controle social do comportamento delitivo, e que trata de subministrar uma informação válida,
contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime – contemplando este como problema
individual e como problema social, assim como sobre os programas de prevenção eficaz do mesmo e técnicas
de intervenção positiva no homem delinquente”16.
A partir dos conceitos apresentados, de maneira detalhada, iremos destrinchar o conceito, trabalhando o
método, o objeto e a finalidade da criminologia.
4 – MÉTODO
4.1. EMPÍRICO
O objeto da criminologia está presente no mundo real. Trata-se de um método que irá observar, experimentar
e conhecer a realidade fática.
16
MOLINA, Antonio Garcia-Pablos; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia - Introdução a seus fundamentos
teóricos. 2ª ed. São Paulo: RT, 1999. Página 39.
16
87
Na lição de Schecaira, pode-se afirmar que a abordagem criminológica é empírica, o que significa dizer que seu
objeto (delito, delinquente, vítima e controle social) se insere no mundo real, do verificável, do mensurável, e não
no mundo axiológico (como o saber normativo)17.
4.2. INDUTIVO
A Criminologia partirá de fatos específicos para o geral. Irá iniciar analisando conhecimentos específicos para
alcançar leis gerais. Mas, a realidade fática subjacente é extremamente rica. Por isso, para uma análise
completa, passaremos à característica a seguir.
4.3. INTERDISCIPLINAR
Almejando possibilitar uma visão completa da realidade fática, a Criminologia irá se utilizar de diversas áreas
do saber, a exemplo da sociologia, da antropologia, da história, da estatística, da psiquiatria etc. Conforme
a doutrina:
17
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 8ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2020. Página 67.
18
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2021. Páginas 68.
17
87
Importante neste ponto não confundirmos o conceito de interdisciplinaridade com mera multidisciplinaridade.
Segundo a doutrina:
“Contudo, como bem aponta o setor doutrinário, interdisciplinaridade não se confunde com mera
multidisciplinaridade. Essa significa, apenas, a participação de diversas disciplinas, ao passo que
aquela traduz uma ideia de coordenação e integração. Em modo de síntese, pode-se dizer que a
interdisciplinaridade representa maior grau de influxos entre as ciências, ao passo que a
multidisciplinaridade, menor grau de relação”19.
Ao final da presente aula, iremos abordar o tema inerente ao encarceramento no Brasil, o que tornará cristalino
aos nossos alunos a análise transversal entre as mais diversas áreas do saber.
5 – OBJETO
A Criminologia possui como objeto o delito, o delinquente a vítima e o controle social. Assim, de forma
sistematizada, passaremos à análise de cada um desses objetos da criminologia.
5.1. DELITO
O conceito de delito para a criminologia distingue-se daquele utilizado pelo Direito Penal. Conforme
entendimento dominante entre os penalistas, o delito consiste em uma ação ou omissão típica, ilícita e culpável,
sendo certo que se trata de um juízo de subsunção puramente individual.
19
VIANA, Eduardo. Criminologia. 6 ed. rev., atual. e ampl. Salvador: JusPODVM, 2018. Página 148.
18
87
Por seu turno, a criminologia irá analisar o delito sob uma visão coletiva e social, almejando identificar
critérios para que determinados fatos sejam coletiva e socialmente identificados como crimes.
1º elemento - Incidência massiva na população: o fato deve ser reiterado. Por exemplo, o crime
de roubo ocorre diariamente, nas mais variadas formas, reiteradamente. Exemplo de crime que
não possui incidência massiva: molestamento intencional de cetáceo (art. 1º da Lei n. 7643/87).
A referida tipificação surgiu após um filhote de baleia encalhar em uma praia carioca e um
banhista introduzir um palito de sorvete no orifício de respiração do animal20. Pode-se notar que
referida conduta provavelmente nunca se repetiu desde o fatídico dia em que o referido fato
ocorreu.
20
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 8ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2020. Páginas 49.
21
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 8ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2020. Página 49.
19
87
5.2. DELINQUENTE
Conforme será verificado, o entendimento acerca da figura do criminoso irá variar no tempo e no espaço.
Assim, analisar-se-á as diferentes perspectivas acerca do delinquente para, ao final, concluirmos com aquela
visão que consideramos mais adequada.
20
87
4ª perspectiva – Criminoso sob um viés Marxista: o criminoso seria uma vítima da sociedade. A
figura do criminoso decorreria das estruturas econômicas da sociedade, sendo certo que o
criminoso seria uma vítima inocente (determinismo social e econômico).
Importante visão sobre o tema é exposta por Shecaira, notadamente por não excluir algumas das diferentes
perspectivas. Vejamos:
“entende-se que o criminoso é um ser histórico, real, complexo e enigmático. Embora seja, na maior
parte das vezes, um ser absolutamente normal, pode estar sujeito às influências do meio (não aos
determinismos). Se for verdade que é condicionado, tem vontade própria e uma assombrosa
capacidade de transcender, de superar o legado que recebeu e construir seu próprio futuro. Está sujeito
a um consciente coletivo, como todos estamos, mas também tem a capacidade ímpar de conservar sua
própria opinião e superar-se, transformando e transformando-se. Por isso, as diferentes perspectivas
21
87
não se excluem; antes, completam-se e permitem um grande mosaico sobre o qual se assenta o direito
penal atual”22.
Por exemplo, no estudo da criminologia crítica, veremos que determinados grupos da sociedade sofrem as
consequências de um sistema punitivo racista, higienista, que acaba atingindo de forma mais incisiva os mais
pobres, negros e com menor escolaridade. Não é equivocado dizer que referidos grupos sociais, sob um vier
Marxista, são vítimas de uma estrutura social capitalista que exclui os mais pobres. Da mesma forma, para a
perspectiva correicionalista, seriam criminosos que merecem correção. Ainda, sob o ponto de vista dos
positivistas, esses grupos seriam pessoas que supostamente já tivessem nascido com a predisposição de cometer
crimes. Note-se que são visões distintas, independentemente de serem ou não corretas, da figura do homem
delinquente baseadas em contextos históricos, sociais e culturais. Ademais, tais pontos de vista variam
justamente de acordo com o próprio processo de evolução histórica das ciências criminais, em especial da
criminologia.
5.3. VÍTIMA
No presente momento, iremos analisar mais um objeto da criminologia: a vítima. Muitos doutrinadores
denominam esse estudo como “vitimologia”, ou seja, o estudo da vítima e sua relação com o criminoso e com
22
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2021. Páginas 53.
22
87
a sociedade. Passamos a analisar o protagonismo da vítima expostos em três grandes momentos históricos,
conforme a maioria dos doutrinadores:
1º momento – Idade de ouro da vítima: fase marcada por grande protagonismo da vítima,
notadamente em virtude da autotutela.
Destacamos excelente resumo sobre o tema expostos por Erick de Figueiredo Maia:
“A idade de ouro da vítima é compreendida desde os primórdios da civilização até o fim da alta
idade média, em que era comum a autotutela, a pena de talião e a composição. Com a adoção do
processo penal inquisitivo, a vítima perde seu papel de protagonista, passando a ter função meramente
acessória. A vítima então caminha rumo ao ostracismo, sendo substituída pelo soberano. Na fase de
neutralização da vítima, ela perde o poder de reação ao fato delituoso, que é assumido pelo poder
23
87
público. A pena passa a ser uma garantia coletiva e não individual. Mais recentemente, tem-se buscado
novamente valorar o papel da vítima no processo”23.
Importante consignar que a Defensoria Pública também possui preocupação em prestar assistência jurídica à
vítima, o que demonstra a necessidade de garantir uma atenção holística para eventual grupo vulnerável.
Vejamos:
O CRAVI foi criado como uma polícia pública para dar efetividade ao art. 245, da Constituição Federal:
"a lei disporá sobre as hipóteses e condições em que o Poder Público dará assistência aos herdeiros e
dependentes carentes de pessoas vitimadas por crime doloso, sem prejuízo da responsabilidade do autor
do ilícito". A Constituição do Estado de São Paulo de 1989, no art. 278, incisos V e VI, seguindo a Magna
Carta, também prevê políticas de apoio às vítimas de violência. Seguem, nessa linha, os itens 106, 107,
108 do Programa Estadual de Direitos Humanos, a Lei Federal 9.807/99, a Lei Estadual 10.354/99 e
a Declaração das Nações Unidades sobre os Princípios Básicos de Justiça para Vítimas de Crime e Abuso
de Poder.
23
MAIA, Erick de Figueiredo. Execução Penal e Criminologia. Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto.
Coordenador: Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes. São Paulo: Editora Saraiva, 2021.
24
87
Seguindo essa linha de raciocínio, a Defensoria Pública, instituição essencial à Justiça (art. 134, da
Constituição Federal), aparece como importante parceira para a concretização dos direitos dos usuários
do Cravi, principalmente aqueles fundamentais.
Cotidianamente, são inúmeras as atuações dos Defensores Públicos atuantes no Centro de Referência e
Apoio à Vítima, imprescindíveis para um atendimento eficiente e de qualidade. Dentre as inúmeras
atribuições, destacamos: orientação jurídica, orientação extrajudicial, a participação e a apresentação
de palestras voltadas à educação em direitos, no local do atendimento, bem como a elaboração de
cartilhas com temas afetos à prestação de atendimento e serviços de vítimas, a participação em reuniões,
elaboração de relatórios de atendimento, a participação na construção da rede de apoio jurídico para
os usuários, encaminhamentos dos assistidos à rede de atendimento ou órgãos do sistema de justiça, e a
elaboração de declarações e petições iniciais.
Apenas como matéria exemplificativa, ressalto a participação dos defensores públicos em palestras e
seminários, abordando temas sensíveis, tal como integração com a rede de atendimento, violência
doméstica, direitos das crianças e dos adolescentes, dentre outros.
Tais atividades são exercidas em parceria com a Defensoria Pública, que presta auxílio jurídico, integral
e gratuito, eficiente e de qualidade, primando por um atendimento humanizado dos usuários.
Ressalto que o plexo de atividades não se resume à orientação dos usuários, uma vez que, diariamente,
os defensores conversam os psicólogos e agentes sociais, buscando, de forma preventiva e conciliadora,
alcançar os objetivos do atendimento integral e humanizado.
Ademais, os defensores, no cotidiano de seu trabalho, não atuam somente de forma demandista ou
repressiva. Pelo contrário: buscam, juntamente com os psicólogos e agentes sociais, medidas não-
demandistas, preventivas, conciliadoras e estratégias.
No ponto, ressaltamos a participação dos Defensores Públicos na orientação jurídica dos servidores do
Cravi sobre a atuação nas audiências de custódias, sempre se colocando à disposição para
esclarecimentos, encaminhamentos e atuando sempre que solicitado.
25
87
Por fim, conforme destacamos acima, algumas ações pela Defensoria Pública permitem melhor
tutela e promoção dos direitos das vítimas, fortalezando esse momento histórico de revalorização
da vítima: realizar a justiça restaurativa, projetos de educação em direitos, representação das vítimas
em audiências ou outros atos processuais e propondo políticas públicas para melhor tutela de seus
direitos.
Outro ponto importante da presente matéria para os certames da Defensoria Pública refere-se ao estudo da
vitimização, que pode ser classificada em primária, secundária e terciária.
26
87
violência sexual sofrida e começa a exclui-la do convívio social24. Shecaira aborda o acusado de
delito que sofre sevícias, torturas ou outros tipos de violência – até mesmo de outros presos25.
Há quem aborde, ainda, a vitimização difusa, tal como ocorre em crimes ambientais, em que não temos uma
vítima específica, mas os danos são suportados por toda a sociedade.
Entrementes, talvez, um dos debates mais instigantes sobre o colorido plural da Defensoria Pública seja
relacionado o que a doutrina de nomina de esquizofrenia institucional26. Acerca do presente tema,
apresentamos a seguinte indagação: um defensor público poderia levantar a tese inerente a legítima defesa
da honra perante o Tribunal do Júri em um caso envolvendo feminicídio? O tema é extremamente polêmico.
Por um lado, há quem defenda que, em virtude da plenitude de defesa no Tribunal do Júri e da necessidade
de concretização dos princípios da ampla defesa e do contraditório, o defensor poderia levantar todas as
teses possíveis para a defesa do acusado. Ademais, importante ressaltar que a Defensoria Pública é instituição
plural, sendo certo que, comumente, poderá estar atuando em polos diferentes em uma mesma ação. Por conta
disso, há quem defenda que tolher a liberdade do defensor em tais situações violaria o princípio da
24
MAIA, Erick de Figueiredo. Execução Penal e Criminologia. Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto.
Coordenador: Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes. São Paulo: Editora Saraiva, 2021.
25
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2021. Páginas 57.
26
COSTA, Renata Tavares da. Os Direitos Humanos como Limite Ético na Defesa dos Acusados de
Feminicídio no Tribunal do Júri. Livro de Teses e Práticas Exitosas. Curitiba: ANADEP, 2015, p. 203.
27
87
independência funcional. Uma outra corrente defende que não seria possível a alegação de determinadas
teses e nem mesmo a elaboração de alguns questionamentos. Para essa corrente, a atuação defensorial
encontraria limites éticos e limites na própria dignidade da pessoa humana, impedindo a alegação de teses
que fosse de encontro com as vocações institucionais. Portanto, conforme se observa, em decorrência do art.
4º-A, V, da LC n. 80/94, será necessário defensores públicos distintos para hipóteses em que a instituição atue
para partes diversas em um mesmo processo, sendo certo que a pluralidade de pensamentos poderá estar
presente em posições antagônicas.
Conforme a doutrina, o controle social refere-se a um conjunto de mecanismos e sanções sociais que almejam
submeter o indivíduo aos modelos e normas comunitários. Aborda que se trata de mecanismos disciplinares que
asseguram a convivência entre seus membros, pautando e orientando as condutas humanas27. O controle social
poderá ser informal e formal:
Exemplo: família, escola, Igreja, clubes, opinião Exemplo: Polícia, Ministério Público, Defensoria
pública. Pública, Poder Judiciário.
27
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2021. Páginas 58.
28
87
Importante consignar que a pena privativa de liberdade é o extremo do controle social formal. Para os
concursos da Defensoria Pública, citamos importante posicionamento exposto por Antonio García-Pablos de
Molina e Luiz Flávio Gomes, citados por Shecaira:
“mais leis, mais penas, mais policiais, mais juízes, mais prisões significam mais presos, porém não
necessariamente menos delitos. A eficaz prevenção do crime não depende tanto da maior efetividade
do controle social formal, senão da melhor integração ou sincronização do controle social formal e
informal”28.
Como se sabe, no Brasil, em relação as finalidades da pena, ainda prevalece a Teoria Mista ou Eclética. Assim,
pena tem como escopo a retribuição e a prevenção. Em nosso país, a pena possui tripla finalidade: prevenção,
retribuição e ressocialização.
A prevenção pode ser geral, isto é, direciona-se à sociedade. A prevenção geral (social) poderá ser negativa
ou positiva. A prevenção geral negativa almeja evitar que o indivíduo pratique um crime. A prevenção geral
positiva busca afirmar a validade da norma que restou violada e desafiada pela prática de um crime.
Por seu turno, a prevenção também poderá ser especial, direcionando-se ao delinquente. A pena em abstrato,
que opera em um momento anterior ao crime, está relacionada à prevenção geral – positiva e negativa. A
28
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2021. Páginas 63.
29
87
pena em concreto, que se opera após a prática delitiva, possui a finalidade retributiva (aplicação de pena
ao causador de um dano) e de prevenção especial (almejando evitar a reincidência). Por fim, a execução da
pena possui a finalidade preventiva, retributiva, bem como ressocializadora.
Sobre a finalidade da pena, ainda é interessante trazer o pensamento de Eugenio Raúl Zaffaroni que difundiu
a denominada “Teoria Agnóstica da Pena”, para a qual a pena cumpre apenas uma única finalidade:
degenerar e destruir aqueles que são a ela submetidos. Para Juarez Cirino, a pena seria apenas um ato de
poder político, similar a um estado de guerra declarada.
Neste ponto, é interessante fazer um pequeno parêntese para tratar da denominada “Teoria da Reação
Social”. Pela teoria da reação social (Labelling Approach), a criminalidade somente poderia ser explicada
como uma forma de reação do sistema penal ao fato concretamente praticado, desde o momento inicial de
criação da lei (normas abstratas - criminalização primária) até a reação pelas agências de controle (polícia,
Ministério Público, Poder Judiciário etc.). Assim, o Labelling Approach inverte o paradigma criminológico que
busca as causas etiológicas do desvio em fatores biológicos ou estruturais do criminoso e propõe a análise do
fenômeno do crime não mais a partir do plano de ação, mas do plano de reação29. Partindo-se da premissa
de que essa teoria desloca o foco do olhar para a reação, por exemplo, possível imaginar a conduta de um
filho adolescente que abre a carteira do pai e “furta” determinada quantia em dinheiro. Sob o olhar do pai
e da sociedade, apesar de reprovável do ponto de vista moral, ético, a conduta desse filho não é criminosa.
Porém, ao se alterar o sujeito ativo da subtração para o filho do vizinho a reação ao fato será bem diferente,
certamente voltada para a responsabilização criminal.
Por fim, atualmente, podemos dizer que caminhamos de uma justiça retributiva para uma justiça restaurativa.
Vejamos excelente quadro esquemático realizado por Rogério Sanches30:
29
VIANA, Eduardo. Criminologia. 6 ed. ver., atual. e ampl. – Salvador: JusPODVM, 2018. p. 184/185.
30
CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal. Parte Geral. 3ª Edição. Editora Jus Podivm, 2015.
Página 386.
30
87
Seguindo essa linha de raciocínio, concluímos importante posicionamento para os concursos da Defensoria
Pública no sentido de a pena privativa de liberdade ser a ultima ratio. Os mecanismos de controle formal, em
especial a pena privativa de liberdade, que é sua forma mais extrema, deverá ser aplicada quando falharem
ou foram insuficientes as demais formas de controle. Portanto, o princípio da ultima ratio - intervenção mínima
- deverá guiar o denominado direito penal mínimo, o que demonstra o caráter subsidiário do direito penal. A
Constituição Federal de 1988, marco para a consagração do Estado de opção democrática, foi importante
fator para a limitação do Poder Estatal, estabelecendo garantias individuais que limitam o poder punitivo
estatal, culminando até mesmo com teorias que restringem a incidência da norma penal, a exemplo do princípio
da insignificância, da tipicidade material e da imputação objetiva.
6 – O ENCARCERAMENTO NO BRASIL
31
87
Atualmente, temos duas fontes de dados que compilam dados acerca do encarceramento no Brasil. Há
levantamentos realizados pelo CNJ por meio do Banco Nacional de Monitoramento de Prisões – BNMP e os
relatórios do Infopen. O mais detalhado é o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias realizado
pelo Infopen, datado de junho de 202031.
Segundo o levantamento realizado, em dezembro de 2019 o total da população carcerária brasileira era de
702.069.
Verifica-se que, pela primeira vez após muitos anos, a população carcerária diminuiu e certamente isso é
atribuído à pandemia em que o Poder Judiciário concentrou esforços no desencarceramento, a fim de evitar a
proliferação da contaminação da COVID-19 nos presídios, em especial no que tange aos delitos de menor
gravidade.
31
https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMjU3Y2RjNjctODQzMi00YTE4LWEwMDAtZDIzNWQ5YmIzMzk1Ii
widCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9
32
87
No que tange às informações criminais, por categoria de crimes e gênero, veremos que entre os homens a
maior incidência de delitos são os patrimoniais (39,3%), seguido dos delitos relacionados ao tráfico de drogas
(31,23%) e crimes contra a pessoa (15,41%). Já em relação às mulheres, os delitos relacionados ao tráfico de
drogas é extremamente elevado (57,76%), seguidos dos crimes patrimoniais (24,56%) e crimes contra a
pessoa (9,98%). Nesse ponto, verificamos como o tráfico de drogas pesa no encarceramento, decorrente da
falida política de guerra às drogas. Outro fator interessante é analisarmos que os crimes relacionados às
drogas são maioria entre as mulheres que muitas vezes são punidas em conjunto com seus maridos.
33
87
Outro dado que impressiona é o número elevado de pessoas pretas e pardas em comparação ao número de
brancos. Segundo o levantamento, 66,31% da população carcerária é preta ou parda, ao passo em que
apenas 32,52% da população é branca, 098% amarela e 0,19 indígena. Lembremos que, segundo o IBGE,
56,2% do total da população brasileira é preta ou parda. Observamos, diante disso, que a população preta
e parda é um alvo com maior potencial do sistema punitivista brasileiro, obviamente em razão da
desigualdade, do racismo estrutural e da seletividade do direito penal.
Vejamos as estatísticas:
34
87
Outro dado preocupante é a existência de filhos nos estabelecimentos e as respectivas faixas etárias. Há hoje
um total de 1.850 filhos nos estabelecimentos com suas mães.
35
87
36
87
Outro dado relevante é o pequeno número de pessoas em atividade educacional dentre a população
carcerária. Segundo levantado, apenas 12,28% desenvolvem algum tipo de atividade educacional. Vejamos:
37
87
38
87
Infelizmente, os últimos dados desconsideram inúmeros critérios que antes eram analisados pelos antigos
relatórios do Infopen. Por exemplo, a escolaridade dos presos é um dado que deixou de existir na atual
plataforma.
Impressiona ver que 51,35% da população prisional possui apenas ensino fundamental incompleto, ao passo
em que apenas 0,04% possuem ensino superior completo. Realidade muito distinta da população brasileira
39
87
em geral que é composta por apenas 33% com ensino fundamental incompleto e 17% com ensino superior
completo. Vejamos os gráficos32:
32
https://www.gov.br/depen/pt-br/sisdepen/mais-informacoes/relatorios-infopen/relatorios-
sinteticos/infopen-jun-2017.pdf
40
87
Da análise dos dados acima elencados, é fácil perceber que o sistema penal brasileiro tem um público certo:
as pessoas negras, pobres e de baixa escolaridade.
41
87
Tais dados somente reforçam o racismo estrutural existente que também se reflete no sistema prisional.
A importância do conhecimento de referidos dados, em especial na atuação defensorial na seara criminal vem
refletindo nas provas dos últimos certames da defensoria pública. Veremos nas questões abaixo que não são
poucas as questões que cobram o conhecimento dos dados e do reflexo do racismo no encarceramento
brasileiro.
Interessante também trazermos aqui a denominada “`Política criminal e penitenciária no Brasil”, intimamente
ligada às estatísticas acima e que representa o modelo de política criminal adotado pelo Brasil nos últimos e
nos próximos anos.
Sobre a política criminal e penitenciária no Brasil, um dos principais documentos que podemos utilizar para
subsidiar o tópico é o denominado “Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária”, elaborado em 2019
para vigorar durante os anos de 2020 a 2023. Assim, o referido documento traça as opções do Brasil acerca
das normas fundantes do Direito Penal, da criminologia e da aplicação das normas penais pelo Poder
Judiciário. É um verdadeiro planejamento da política criminal a ser seguida pelo Estado brasileiro.
Trata-se de documento de leitura importante (disponível nesta aula junto esta apostila).
Essa primeira diretriz, como forma de prevenção, se alinha ao que dispõe o artigo 1.1 da Convenção
Americana de Direitos Humanos que preceitua que cabe ao Estado zelar pelo respeito dos direitos humanos,
42
87
ressaltando uma obrigação de fazer ao estado “que consiste na organização, pelo Estado, de estruturas capazes
de prevenir, investigar e mesmo punir toda violação, pública ou privada, dos direitos fundamentais da pessoa
humana”.
Após uma abordagem acerca da necessidade de o Estado garantir e efetivar medidas que previnam a prática
de novos delitos, o Plano estabelece as seguintes, como, por exemplo, a objetiva distinção entre a figura do
usuário e do traficante, mediante alteração da lei n. 11.343/06.
a.2) Diretrizes e medidas logo após o crime e investigação eficiente nos inquéritos (investigação) (medidas
mais voltadas à futura repressão e punição dos crimes);
Neste tópico, o plano busca a adoção de medidas eficientes de investigação, abordando propostas para os
seguintes objetivos: a integração dos órgãos e atores dos sistemas de segurança pública e do Sistema da
Justiça; capacitação dos atores responsáveis pela repressão; qualificação e aparelhamento dos órgãos do
Sistema de Segurança e Justiça; criação de sistemas de informações criminais eficientes; medidas de bloqueios
de bens e valores eficientes que busquem a os proventos obtidos com as práticas criminosas; execução da pena
a partir da segunda instância; eficiência no cumprimento de mandados de prisão; investigação eficiente dos
inquéritos; criação de banco nacional de perfil genético e banco nacional multibiométrico (o primeiro já foi
instituído pelo Pacote Anticrime); alargamento das possibilidades de interceptação telefônica; aprovação de
projetos de lei que aperfeiçoam a infiltração de agentes; informantes do bem; combate às organizações
criminosas, dentre diversas outras propostas.
Aqui temos medidas que objetivam garantir maior celeridade dos processos.
Sugere o incentivo às soluções negociadas (ANPP por exemplo). Outra sugestão é a execução provisória da
pena após a condenação em segunda instância, de forma diametralmente oposta ao posicionamento atual do
Supremo Tribunal Federal. Além disso, incentiva a alteração do rito especial do Tribunal do Júri e o
43
87
estabelecimento do imediato cumprimento da pena após a condenação em primeiro grau pelo conselho de
sentença.
Ainda, incentiva a instrução por videoconferência e a consolidação do processo eletrônico. Também busca a
implementação de Juízo Especializado em Saúde Mental e Drogas para o Brasil.
No que tange às medidas de cumprimento da pena, o Plano sugere a revisão e reestruturação da política de
execução penal no Brasil.
Dentre as sugestões estão a observância das capacidades de lotação dos presídios, a criação de um censo
prisional e especial atenção às penas restritivas de direitos. Novamente o Plano ressalta aqui a criação de um
banco de perfil genético.
Uma sugestão que já fora acolhida ainda é a criação de outros critérios subjetivos para a progressão do
regime, com uma crítica no Plano ao anterior critério objetivo de 1/6.Outra medida agravadora é a sugestão
de aumento do limite máximo de pena, o que também já fora acolhido pela aprovação do Pacote Anticrime
(hoje de 40 anos).
O Plano ressalta a importância da adoção de políticas públicas que evitem a reincidência e sugere uma série
de medidas.
Dentre as medidas sugeridas estão a inclusão de dados sobre os egressos; a construção de um pacto
interinstitucional entre os Poderes Executivo e Judiciário e definição de programas e projetos de reinserção do
egresso; ampliação das fontes de arrecadação do FUNPEN; fomento de medidas de atendimento/orientação
dos egressos etc.
44
87
Também há sugestões que visam a atender as vítimas, como, por exemplo, a instituição de plantão
especializado para atendimento às vítimas; o encaminhamento a serviços públicos; programas de Justiça
Restaurativa etc.
Não há dúvidas de que o Plano possui pontos positivos no que tange a um olhar mais humano à pessoa presa,
ao mesmo ponto em que falha ao estabelecer medidas punitivistas e inconstitucionais como por exemplo a
prisão imediata após condenação perante o Tribunal do Júri, em primeiro grau, e a execução da pena após
condenação em segunda instância.
Outro tema de bastante relevância e que vem sendo constantemente cobrado nas provas das Defensorias
Públicas e a “Privatização do Controle Penal”.
O tema é polêmico, traz muitas posições divergentes, mas é de suma importância para os nossos estudos.
São muitos os pontos que rodeiam o modelo de privatização dos presídios. Um primeiro grande problema que
se questiona é o preso como mercadoria, o lucro de sua prisão como objetivo das empresas e o ideal de
encarceramento como solução para a criminalidade. Certamente esses fatores reunidos fazem da privatização
do controle penal um modelo de potencial risco para o sistema penitenciário. Os defensores da privatização,
por outro lado, apontam a possibilidade de melhor estruturação das unidades prisionais e a possível melhora
da dignidade das pessoas presas.
O Defensor Público do Estado de São Paulo Patrick Cacicedo, doutor e mestre em Direito Penal pela USP e
examinador presente em diversas bancas de concursos da defensoria pública, em especial da FCC, aponta33
graves problemas do modelo de privatização adotado pelos Estados Unidos. O autor destaca que em
setembro de 2019 o Estado de São Paulo iniciou processo de privatização poucos dias antes de, nos Estados
33
Disponível em: <https://www.ibccrim.org.br/publicacoes/edicoes/36/244> acessado em 30/01/2022.
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87
Unidos, o Estado da Califórnia aprovar lei que encerra a privatização de suas prisões, indicando que o modelo
estadunidense, inspiração dos defensores da medida, é uma experiência fracassada. Segundo o autor:
“Com efeito, para além da privatização de uma função essencialmente pública, os resultados
esperados não só foram reversos aos propostos, como ultrapassaram os muros das prisões. Dos
objetivos eleitos, o lucro das empresas foi de fato alcançado. Anunciado como uma “nova fronteira”
de investimentos em Wall Street no final dos anos 1980, em meados da década seguinte a Corrections
Corporartion of America estava entre as cinco empresas mais lucrativas do país. Todavia, como
política penitenciária, o modelo privado não tardou a entrar em crise”.
No que tange à mercantilização dos presos, o autor destaca o tratamento da pessoa como mercadoria e a
influência do mercado no endurecimento penal34:
Por outro lado, a conversão da pessoa presa em mercadoria insere o sistema de justiça criminal na
dinâmica do mercado, de modo que os interesses privados passam a influenciar de maneira mais
decisiva e direta a seara da política criminal. Aos empresários do ramo interessa um progressivo
endurecimento penal, a fim de que sua fonte de lucro não falte. No plano concreto, as empresas do
ramo passaram a exercer um lobby concreto por leis penais mais duras, que representassem um número
ainda maior de presos e o cumprimento de penas mais longas. Movimento semelhante foi realizado no
campo do controle de imigrantes, já que essas empresas também se dedicam ao mercado dos centros
de controle de imigrantes.
A avaliação negativa sobre os efeitos do encarceramento em massa identificou o nefasto papel das
prisões privadas nas dinâmicas da política criminal e penitenciária. Na esteira desse movimento, foi
aprovada na Califórnia a lei AB32, que alterou o Código Penal local para proibir, a partir de 1º de
janeiro de 2020, a celebração de novo contrato – ou a renovação de contrato existente – do
34
Disponível em: <https://www.ibccrim.org.br/publicacoes/edicoes/36/244> acessado em 30/01/2022.
35
Disponível em: <https://www.ibccrim.org.br/publicacoes/edicoes/36/244> acessado em 30/01/2022.
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Departamento Penitenciário com prisão privada com fins lucrativos. A lei, que engloba os centros de
detenção de imigrantes, excepciona apenas a renovação desse tipo de contrato em razão de decisão
judicial sobre limite de população prisional. A lei impõe ainda, que após 1º de janeiro de 2028
nenhuma pessoa deve estar presa em estabelecimento privado.
O que se verifica é que os Estados Unidos funcionam como um verdadeiro laboratório da privatização e dele
se constata um verdadeiro fracasso que agravou o encarceramento no país e somente piorou a qualidade de
vida no cárcere.
No Brasil, as poucas experiências com a privatização também não foram proveitosas até o momento. No
Estado do Maranhão, os massacres no Complexo de Pedrinhas, em 2013, privatizado, mostra que o modelo
não modificou a precariedade do cárcere e a segurança interna dos presídios.
A privatização das prisões é mais uma medida que se adota com algum atraso e escassa reflexão. O
processo de encarceramento em massa estadunidense, que antecedeu o nosso, já proporcionava
reflexões críticas, que foram ignoradas ao trilharmos semelhante caminho. Uma vez mais a experiência
histórica nos revela, se não a estrada a percorrer, ao menos que um dos destinos nos levará ao
fracasso. É o aviso do tempo presente. Ele está passando na janela, mas Carolina parece não querer
ver.
Não há dúvidas, portanto, apesar dos discursos contrários, que todas as experiências vividas com a
privatização do sistema penal, seja nos Estados Unidos e seja as que estão aos poucos sendo realizadas no
Brasil, somente impactaram negativamente, ensejando a mercantilização da pessoa presa, o encarceramento
em massa e o agravamento da situação degradante dos presídios.
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Disponível em: <https://www.ibccrim.org.br/publicacoes/edicoes/36/244> acessado em 30/01/2022.
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7 – QUESTÕES
01. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO – FGV 2015). Sobre a relação entre sistema
penal e pobreza é correto afirmar que
b) tal qual o processo de criminalização, a vitimização também é um processo seletivo que tem como alvo
preferencial os mais pobres.
c) por se tratar de uma questão de saúde, a internação das pessoas com transtorno mental pelas medidas
de segurança não se dá de maneira seletiva como no processo de criminalização.
d) o surgimento da prisão como forma de punição por excelência nos séculos XVIII e XIX teve como fulcro
a substituição de penas cruéis, mas somente nas últimas duas décadas passou a ser um mecanismo de
controle social da pobreza.
e) o efetivo respeito ao garantismo penal é capaz de reverter o caráter seletivo do sistema penal brasileiro
e sua consequente gestão autoritária da miséria.
02. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE GOIÁS – FCC 2021) Considere a notícia veiculada na imprensa
reproduzida abaixo.
LB, suspeito de matar uma família em Ceilândia, no DF, foi morto em troca de tiros com policiais nesta segunda-
feira (28). Ele foi preso ferido, mas com vida, e morreu chegando a hospital de Águas Lindas de Goiás, no Entorno
do DF. O criminoso estava há 20 dias fugindo de uma força-tarefa com mais de 270 agentes. Aos 32 anos, ele tinha
uma extensa ficha criminal, fugiu três vezes da prisão e era acusado de diversos crimes.
48
87
O procurado foi atingido por vários tiros. Após ser baleado, ele foi levado por uma viatura do Corpo de Bombeiros
para o Hospital Municipal Bom Jesus, mas morreu. Por volta de 11h10 min. uma viatura do Instituto Médico Legal
(IML) chegou aos fundos da unidade de saúde e levou o corpo dele para ser periciado em Goiânia. O secretário de
Segurança Pública de Goiás comemorou o fim da operação: “Missão cumprida. Restabelecemos a paz e
tranquilidade nessa comunidade de bem”.
b) são instâncias de controle social formal das sociedades democráticas que auxiliam a população na
prevenção da criminalidade ao noticiar as áreas de sua maior incidência.
c) têm papel nos processos de criminalização primária e secundária ao reproduzir discursos de emergência
e contribuir na formação do estereótipo do criminoso.
e) exerceram um papel fundamental na denúncia de crimes dos poderosos e no fim da seletividade penal
em grandes operações nos últimos anos no Brasil.
03. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE GOIÁS – FCC 2021) A Defensoria Pública do Estado de Goiás
(DPE-GO) publicou uma nota de repúdio sobre a abordagem policial de que o ciclista Filipe Ferreira foi
alvo em Cidade Ocidental, no Entorno do Distrito Federal. Segundo a entidade, a ação teve “nítidos
contornos racistas” e considera “inadmissível” que seja tolerada. Filipe, de 28 anos, trabalha como
eletricista e, na sexta-feira (28), gravava vídeos de manobras com a bicicleta para o canal que tem no
YouTube quando foi surpreendido pelos policiais militares. A câmera que ele usava para filmar os
movimentos registrou a abordagem: os PMs descem do carro apontando armas contra ele, exigem que
ele coloque as mãos na cabeça, mas o jovem questiona o motivo de estar sendo tratado daquela forma.
Em nota, a Polícia Militar informou que está “verificando todas as informações relativas a este fato” para
49
87
se posicionar sobre o que aconteceu. Caso seja comprovado algum excesso na conduta dos militares, as
providências legais serão tomadas. (Disponível em: www.g1.globo.com, acessado em: 31/05/2021)
a) a seletividade do sistema penal brasileiro tem como um de seus motores a abordagem policial, fundada
no estereótipo do criminoso, cujo elemento racial é determinante.
b) o sistema penal brasileiro instituiu um programa oficial de criminalização da população negra levado
a efeito pela polícia, mas contido por meio da atuação judicial.
c) a criminologia brasileira tomou a questão racial de forma crítica desde seus primórdios com Nina
Rodrigues e seu positivismo que denunciava o racismo da justiça criminal brasileira em oposição ao
positivismo italiano de Cesare Lombroso.
d) a nota da Defensoria Pública é correta sobre os contornos racistas da ação policial, mas não seria
correta se falasse da atuação policial como um todo.
e) a nota da Polícia Militar confirma que a justiça criminal brasileira atua de maneira enérgica diante de
fatos isolados e consegue prevenir condutas discriminatórias das agências policiais.
04. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE GOIÁS – FCC 2021)As dinâmicas contemporâneas das prisões
brasileiras
c) confirmam sua condição de instituição total, isolando os indivíduos por completo de contato com o
mundo exterior, retirando sua personalidade construída na vida antes da prisão.
e) são caracterizadas pelo encarceramento em massa da pobreza gerado notadamente pelo predomínio
de prisões privatizadas nas últimas três décadas.
50
87
A criminologia classifica como vitimização secundária a coisificação, pelas esferas de controle formal do
delito, da pessoa ofendida, ao tratá-la como mero objeto e com desdém durante a persecução criminal.
( ) CERTO
( ) ERRADO
Na visão do marxismo, a responsabilidade pelo crime recai sobre a sociedade, tornando o infrator vítima
do determinismo social e econômico.
( ) CERTO
( ) ERRADO
De acordo com a teoria positivista, o criminoso é um ser inferior, incapaz de guiar livremente a sua conduta
por haver debilidade em sua vontade: a intervenção estatal se faz necessária para correção da direção de
sua vontade.
( ) CERTO
51
87
( ) ERRADO
O trecho abaixo integra uma letra musical do grupo Facção Central. Dentre as várias formas de
interpretação desse fragmento escrito, pode-se dizer que ele suscita a reflexão sobre as técnicas de
prevenção dos delitos e as formas alternativas de solução de conflitos.
Com relação às funções da criminologia, e com base no trecho apresentado acima, é correto afirmar que
b) a criminologia é uma matéria jurídica que veda reflexões teóricas sobre as realidades fáticas ou as
narrativas artísticas.
c) a identificação da autoria do crime, o isolamento do local do fato e a realização das perícias são
abordagens exclusivas da criminologia.
e) a criminologia se ocupa do “dever ser” e, por isso, representações sociais (como expressões artísticas)
devem ser excluídas de qualquer estudo.
a) Diferentemente do que ocorre em diversos países, no Brasil a vítima e a reparação da vítima não
constituem pauta de preocupação dos penalistas na orientação da política criminal.
52
87
b) As últimas alterações legislativas em matéria criminal garantem que a atuação do Poder Judiciário,
além da condenação do agente do crime, resulte na ideal reparação para a pessoa ofendida e até mesmo
para a sociedade.
c) No Poder Judiciário não se adota o direito penal de emergência: essa função é desempenhada
exclusivamente pelo Poder Legislativo.
d) As constantes edições de leis penais emergenciais pelo Poder Legislativo, com o objetivo de impor
reformas pontuais na legislação, melhoram a eficiência da política criminal.
e) A reforma do Código Penal e a revisão de toda a legislação especial são exemplos de sugestões
apresentadas pelos doutrinadores criminalistas para a melhoria da política criminal.
( ) CERTO
( ) ERRADO
Para a escola clássica, o modelo ideal de prevenção do delito ou do desvio é o que se preocupa com a
pena e seu rigor, compreendendo-a como um mecanismo intimidatório; já para a escola neoclássica, mais
eficaz que o rigor das penas é o foco no correto funcionamento do sistema legal e em como esse sistema
é percebido pelo desviante ou delinquente.
( ) CERTO
( ) ERRADO
53
87
b) A injúria racial impede a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos.
d) A despeito do grande número de pessoas negras presas no Brasil, não se pode afirmar que o sistema
penal brasileiro atue de forma discriminatória em virtude dos princípios constitucionais.
d) a utilização da justiça restaurativa na solução de conflitos penitenciários aumentou o poder das facções
prisionais.
a) a eficiência do trabalho policial pode ser verificado pelo baixo índice de letalidade e o alto índice de
prisões efetuadas.
54
87
c) a construção de presídios tem sido uma política eficaz de redução do encarceramento em massa.
e) a proteção de direitos humanos tem sido o principal resultado da política criminal brasileira, uma vez
que o aumento da população prisional demonstra que os bens jurídicos estão sendo cada vez mais
protegidos por meio do direito penal.
15. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – FGV 2021) “Em março de 2021, foi
tornado público o Relatório ‘Mulheres nas audiências de custódia no Rio de Janeiro’, com os dados
referentes ao ano de 2019 recolhidos e analisados pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro”.
“De acordo com a pesquisa, considerando os 533 casos das mulheres que, no momento da audiência de
custódia, atendiam aos critérios objetivos para prisão domiciliar, foi possível observar que 25% das
mulheres, apesar de cumprir os requisitos legais, permaneceram presas preventivamente. Verificou-se
também que, em decisões judiciais que aplicaram prisão preventiva para mulheres que atendiam aos
critérios objetivos para prisão domiciliar, aproximadamente 65,5% contêm alguma referência à prisão
domiciliar. Ou seja, essa questão foi de alguma forma introduzida no curso da audiência de custódia e,
mesmo assim, essas custodiadas continuaram presas.”
Fonte: Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Diretoria de Estudos e Pesquisas de Acesso à
Justiça, Relatório “Mulheres nas audiências de custódia no Rio de Janeiro”, 2019. Disponível em:
https://www.defensoria.rj.def.br/uploads/arquivos/153960d0ac82483580bc117104cac177.pdf
Em linha com o pensamento criminológico feminista brasileiro contemporâneo, é correto afirmar que o
lastro epistemológico para análise do processo de criminalização de mulheres parte:
a) da constatação de que existem crimes próprios das mulheres, tais quais o infanticídio, o aborto, os
envenenamentos, que ficaram sempre impunes, por serem ignorados ou desconhecidos, já que mais
presentes na esfera doméstica (A. Peixoto);
55
87
c) da conclusão de que a criminalidade feminina é largamente mascarada, pois não há interesse da polícia
em investigar mulheres que praticam crimes, e, além disso, em grande parte dos crimes, elas funcionam
como cúmplices ou receptadoras de bens, fazendo com que as mulheres fiquem ocultas e não sejam
punidas. (O. Pollak);
e) da impossibilidade de uma etiologia criminal, pois cada caso traz consigo as peculiaridades das histórias
de vida e das experiências das mulheres e, com estas, as razões que impulsionaram as práticas criminosas,
que podem tanto ser relativas à subsistência da mulher e de sua família ou a situações específicas de
violências das mais diversas ordens. (E. Pimentel).
16. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA – FCC 2021) 02. De acordo com o Anuário
Brasileiro de Segurança Pública de 2021: “A taxa de letalidade policial entre negros é de 4,2 vítimas a
cada 100 mil, já entre brancos ela é de 1,5 a cada 100 mil, o que equivale a dizer que a taxa de letalidade
policial entre negros é 2,8 vezes superior à taxa entre brancos”.
(Disponível em: http://forumseguranca.org.br)
a) o exercício da soberania diante do poder e da capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer,
com a eliminação dos corpos negros, tidos como descartáveis pelos agentes de repressão estatal.
b) a reação ao sensacionalismo midiático, que conduz à sensação de impunidade diante dos crimes
patrimoniais, praticados primordialmente pela população negra, pobre e periférica, o que conduz à maior
repressão estatal e a abusos.
56
87
c) o racismo estrutural por retirar dos jovens negros, pobres e periféricos as oportunidades de emprego,
reduzindo-os às práticas delitivas como única forma de sobrevivência, o que gera confrontos com a polícia
e aumento dos índices de letalidade.
a) o acesso garantido a diversos setores da sociedade, como imprensa, ONGs e associações de familiares
às prisões, proporcionou maior transparência e redução dos problemas humanitários.
c) a prisão evidencia o racismo do sistema penal com sua composição populacional e contribui para sua
reprodução e sustentação.
d) o ideal de prevenção geral da pena foi alcançado com a ampliação da privatização e modernização
ampla do sistema prisional brasileiro.
57
87
Classicismo, o Direito Penal paralelo para os “subcidadãos”, legitimado no Direito Penal do autor
consolidado pela tradução marginal do paradigma racial-etiológico, que, por sua vez, situa seu
fundamento na periculosidade que exala dos corpos negros, um sistema outrora identificado por Lola
Aniyar de Castro (2005, p. 96) como “subterrâneo” que aqui jamais se ocultou, sendo operacionado sob os
olhos de quem quiser enxergar.” (GÓES, Luciano. Abolicionismo penal? Mas qual abolicionismo, “cara
pálida”?. Revista InSURgência. Brasília. Ano 3. v.3. n.2. 2017. Pg. 98).
(A) a Escola Clássica e a Escola Positiva partem do paradigma de uma ciência penal integrada na qual
está abarcada tanto a ciência jurídica propriamente dita, quanto a concepção geral do ser humano em
sociedade, o que conflui para o que se chama de ideologia da defesa social;
(B) a teoria das técnicas de neutralização encontra-se em posição diametralmente oposta à teoria das
subculturas criminais na medida em que a primeira explica o crime a partir de suas causas e a segunda,
a partir de seus efeitos;
(C) a mudança promovida no sentido de considerar o direito penal como um sistema estático de normas,
e não dinâmico de funções, permitiu desmascarar o direito penal como um sistema que supostamente
protege a todas e todos de maneira igual;
58
87
(D) teria por missão a construção de uma teoria ideológica do desvio, dos comportamentos socialmente
negativos e da criminalização, e a elaboração das linhas de uma política criminal alternativa, de uma
política das classes subalternas no setor do desvio;
(E) acerca das teorias do conflito, dentro de uma visão pluralista e mecanicista da concorrência entre
grupos, o autor as toma como explicativas da criminalização primária (fase de formação da lei) e da
criminalização secundária (fase de aplicação da lei).
59
87
7.2 - GABARITOS
Questão 02 – C Questão 12 – C
Questão 03 – A Questão 13 - B
Questão 04 – D Questão 14 - B
Questão 08 – D Questão 18 - B
Questão 09 – E Questão 19 - A
01. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO – FGV 2015). Sobre a relação entre sistema
penal e pobreza é correto afirmar que
60
87
b) tal qual o processo de criminalização, a vitimização também é um processo seletivo que tem como alvo
preferencial os mais pobres.
c) por se tratar de uma questão de saúde, a internação das pessoas com transtorno mental pelas medidas
de segurança não se dá de maneira seletiva como no processo de criminalização.
d) o surgimento da prisão como forma de punição por excelência nos séculos XVIII e XIX teve como fulcro
a substituição de penas cruéis, mas somente nas últimas duas décadas passou a ser um mecanismo de
controle social da pobreza.
e) o efetivo respeito ao garantismo penal é capaz de reverter o caráter seletivo do sistema penal brasileiro
e sua consequente gestão autoritária da miséria.
A alternativa A está incorreta porque para as teorias do conflito a pobreza não é a razão da
criminalidade, mas sim a razão da punição de determinados grupos excluídos da sociedade. Vale dizer
que as vertentes criminológicas do conflito não explicam a criminalidade como realidade ontológica.
Não buscam a etiologia da criminalidade (razões da criminalidade), mas, na realidade, contestam os
valores existentes.
A alternativa B está CORRETA porque diante do modelo seletivo do direito penal, não só os autores,
mas as vítimas também são selecionadas. Basta exemplificarmos com situações cotidianas em que os
mais ricos moram em condomínios, se locomovem com veículos blindados e pagam pela segurança
particular, ao passo em que os mais pobres estão sujeitos à criminalidade porque não possuem
capacidade econômica de se protegerem, ao passo em que o próprio Estado não lhes garante a
segurança devida, num processo de exclusão social.
A alternativa C está errada porque as mesmas pessoas que são objeto do encarceramento (negros e
pobres como estudamos nas estatísticas acima) são também destinatárias das medidas de segurança.
A alternativa D está incorreta porque historicamente as prisões sempre serviram como um verdadeiro
mecanismo de exclusão.
A alternativa E está errada porque o garantismo penal, sozinho, é incapaz de resolver o problema da
seletividade penal. Políticas públicas de inclusão e de diminuição das desigualdades sociais é que são
sim medidas eficazes.
61
87
02. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE GOIÁS – FCC 2021) Considere a notícia veiculada na imprensa
reproduzida abaixo.
LB, suspeito de matar uma família em Ceilândia, no DF, foi morto em troca de tiros com policiais nesta segunda-
feira (28). Ele foi preso ferido, mas com vida, e morreu chegando a hospital de Águas Lindas de Goiás, no Entorno
do DF. O criminoso estava há 20 dias fugindo de uma força-tarefa com mais de 270 agentes. Aos 32 anos, ele tinha
uma extensa ficha criminal, fugiu três vezes da prisão e era acusado de diversos crimes.
O procurado foi atingido por vários tiros. Após ser baleado, ele foi levado por uma viatura do Corpo de Bombeiros
para o Hospital Municipal Bom Jesus, mas morreu. Por volta de 11h10 min. uma viatura do Instituto Médico Legal
(IML) chegou aos fundos da unidade de saúde e levou o corpo dele para ser periciado em Goiânia. O secretário de
Segurança Pública de Goiás comemorou o fim da operação: “Missão cumprida. Restabelecemos a paz e
tranquilidade nessa comunidade de bem”.
b) são instâncias de controle social formal das sociedades democráticas que auxiliam a população na
prevenção da criminalidade ao noticiar as áreas de sua maior incidência.
c) têm papel nos processos de criminalização primária e secundária ao reproduzir discursos de emergência
e contribuir na formação do estereótipo do criminoso.
e) exerceram um papel fundamental na denúncia de crimes dos poderosos e no fim da seletividade penal
em grandes operações nos últimos anos no Brasil.
Comentários do professor:
62
87
A alternativa B está incorreta os meios de comunicação social são instâncias de controle social informal
e não formal.
A alternativa E está errada porque os meios de comunicação em massa fazem exatamente o oposto
03. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE GOIÁS – FCC 2021) A Defensoria Pública do Estado de Goiás
(DPE-GO) publicou uma nota de repúdio sobre a abordagem policial de que o ciclista Filipe Ferreira foi
alvo em Cidade Ocidental, no Entorno do Distrito Federal. Segundo a entidade, a ação teve “nítidos
contornos racistas” e considera “inadmissível” que seja tolerada. Filipe, de 28 anos, trabalha como
eletricista e, na sexta-feira (28), gravava vídeos de manobras com a bicicleta para o canal que tem no
YouTube quando foi surpreendido pelos policiais militares. A câmera que ele usava para filmar os
movimentos registrou a abordagem: os PMs descem do carro apontando armas contra ele, exigem que
ele coloque as mãos na cabeça, mas o jovem questiona o motivo de estar sendo tratado daquela forma.
Em nota, a Polícia Militar informou que está “verificando todas as informações relativas a este fato” para
se posicionar sobre o que aconteceu. Caso seja comprovado algum excesso na conduta dos militares, as
providências legais serão tomadas. (Disponível em: www.g1.globo.com, acessado em: 31/05/2021)
a) a seletividade do sistema penal brasileiro tem como um de seus motores a abordagem policial, fundada
no estereótipo do criminoso, cujo elemento racial é determinante.
b) o sistema penal brasileiro instituiu um programa oficial de criminalização da população negra levado
a efeito pela polícia, mas contido por meio da atuação judicial.
c) a criminologia brasileira tomou a questão racial de forma crítica desde seus primórdios com Nina
Rodrigues e seu positivismo que denunciava o racismo da justiça criminal brasileira em oposição ao
positivismo italiano de Cesare Lombroso.
63
87
d) a nota da Defensoria Pública é correta sobre os contornos racistas da ação policial, mas não seria
correta se falasse da atuação policial como um todo.
e) a nota da Polícia Militar confirma que a justiça criminal brasileira atua de maneira enérgica diante de
fatos isolados e consegue prevenir condutas discriminatórias das agências policiais.
A alternativa A está CORRETA porque, à luz do estudo que fizemos acima (encarceramento no Brasil)
vemos, facilmente, que o sistema penal tem um público certo: o pobre, o negro e morador de zonas
periféricas (favelas, periferias etc.).
A alternativa B está incorreta porque a atuação judicial, no mais das vezes, repete a seletividade que
se origina na atuação policial. Basta vermos as estatísticas das pessoas encarceradas e lembrarmos que
somente por ordem judicial é que alguém pode ser mantido preso.
A alternativa C está errada porque, conforme estudaremos nas próximas aulas, Nina Rodrigues
replicou o positivismo criminológico e, diversamente do que diz o enunciado da questão, reproduziu
uma ideia racista do criminoso.
A alternativa D está incorreta porque o caso concreto narrado na verdade repete a seletividade
existente nas agências de controle, não configurando uma exceção, mas sim uma regra.
A alternativa E está errada porque a nota da polícia militar somente repete a inércia das agencias de
controle.
04. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE GOIÁS – FCC 2021)As dinâmicas contemporâneas das prisões
brasileiras
c) confirmam sua condição de instituição total, isolando os indivíduos por completo de contato com o
mundo exterior, retirando sua personalidade construída na vida antes da prisão.
64
87
e) são caracterizadas pelo encarceramento em massa da pobreza gerado notadamente pelo predomínio
de prisões privatizadas nas últimas três décadas.
A alternativa A está errada porque as estatísticas acima trazidas demonstram exatamente o oposto.
A alternativa B está incorreta porque o previdenciarismo penal está ligado à ressocialização, o que,
diante da realidade prisional brasileira, é impossível de se concretizar.
A alternativa C está errada porque, na realidade, há ainda uma iteração social entre o sistema prisional
e o mundo exterior, em especial diante do sistema de progressão de regime existente no Brasil.
A alternativa D está CORRETA porque a ausência do Estado nos presídios somente fortalecem as
facções criminosas.
A alternativa E está errada porque a privatização dos presídios brasileiros não é uma realidade.
A criminologia classifica como vitimização secundária a coisificação, pelas esferas de controle formal do
delito, da pessoa ofendida, ao tratá-la como mero objeto e com desdém durante a persecução criminal.
( ) CERTO
( ) ERRADO
Vitimização primária: o indivíduo sofre danos diretamente do fato criminoso, a exemplo de danos
físicos, morais, psicológicos ou patrimoniais.
65
87
Vitimização secundária: a vítima primária sofre novos danos por parte do Poder Público. Assim, em
virtude da burocracia estatal, a vítima sofre novos danos nas instituições estatais. Basta pensar que
uma vítima de estupro pode ser revitimizada ao ter que relembrar, diversas vezes, a situação de
violência. Por isso, a Defensoria Pública almeja, cada vez mais, um atendimento humanizado, evitando-
se qualquer tipo de revitimização. Atualmente, diversas Defensorias Públicas possuem, por exemplo,
áreas especializadas em violência doméstica, inclusive com apoio de psicólogos e agentes sociais
(atendimento multidisciplinar).
Vitimização terciária: a vítima sofre novas violências em razão da estigmatização acarretada pelo crime
ou até mesmo um sofrimento excessivo que vai além daqueles previstos na legislação. Erick Maia cita
como exemplo o momento em que parte da própria sociedade culpa a mulher por uma violência sexual
sofrida e começa a exclui-la do convívio social37. Shecaira aborda o acusado de delito que sofre sevícias,
torturas ou outros tipos de violência – até mesmo de outros presos38.
Na visão do marxismo, a responsabilidade pelo crime recai sobre a sociedade, tornando o infrator vítima
do determinismo social e econômico.
( ) CERTO
( ) ERRADO
A alternativa está CORRETA justamente porque para a vertente marxista responsabilidade do crime é
da sociedade; o delinquente, convertido em vítima, é produto da estrutura econômica do Estado.
Assim, o criminoso é considerado fruto da exploração capitalista patrocinada pelas classes dominantes.
37
MAIA, Erick de Figueiredo. Execução Penal e Criminologia. Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto.
Coordenador: Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes. São Paulo: Editora Saraiva, 2021.
38
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 9ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos
Tribunais, 2021. Páginas 57.
66
87
De acordo com a teoria positivista, o criminoso é um ser inferior, incapaz de guiar livremente a sua conduta
por haver debilidade em sua vontade: a intervenção estatal se faz necessária para correção da direção de
sua vontade.
( ) CERTO
( ) ERRADO
A assertiva está ERRADA justamente porque esse é o conceito da escola correicionalista e não da teoria
positivista.
O trecho abaixo integra uma letra musical do grupo Facção Central. Dentre as várias formas de
interpretação desse fragmento escrito, pode-se dizer que ele suscita a reflexão sobre as técnicas de
prevenção dos delitos e as formas alternativas de solução de conflitos.
67
87
Com relação às funções da criminologia, e com base no trecho apresentado acima, é correto afirmar que
b) a criminologia é uma matéria jurídica que veda reflexões teóricas sobre as realidades fáticas ou as
narrativas artísticas.
c) a identificação da autoria do crime, o isolamento do local do fato e a realização das perícias são
abordagens exclusivas da criminologia.
e) a criminologia se ocupa do “dever ser” e, por isso, representações sociais (como expressões artísticas)
devem ser excluídas de qualquer estudo.
A alternativa A está incorreta porque as hipóteses de perdão judicial também podem ser analisadas
sob o ponto de vista criminológico.
A alternativa B está incorreta porque, diversamente, a criminologia é uma ciência multidisciplinar que
se apoia em diversas áreas do saber, conforme estudado acima.
A alternativa C está errada porque a identificação da autoria, isolamento do local do fato e realização
da perícia são abordagens da criminalística que não se confunde com a criminologia.
A alternativa D está CORRETA porque uma das funções da criminologia é questionar, fazer um juízo
crítico da realidade.
A alternativa E está errada porque a dogmática e não a criminologia é que se ocupa do “dever ser”.
a) Diferentemente do que ocorre em diversos países, no Brasil a vítima e a reparação da vítima não
constituem pauta de preocupação dos penalistas na orientação da política criminal.
b) As últimas alterações legislativas em matéria criminal garantem que a atuação do Poder Judiciário,
além da condenação do agente do crime, resulte na ideal reparação para a pessoa ofendida e até mesmo
para a sociedade.
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87
c) No Poder Judiciário não se adota o direito penal de emergência: essa função é desempenhada
exclusivamente pelo Poder Legislativo.
d) As constantes edições de leis penais emergenciais pelo Poder Legislativo, com o objetivo de impor
reformas pontuais na legislação, melhoram a eficiência da política criminal.
e) A reforma do Código Penal e a revisão de toda a legislação especial são exemplos de sugestões
apresentadas pelos doutrinadores criminalistas para a melhoria da política criminal.
A alternativa A está incorreta porque a reparação da vítima também é uma pauta de preocupação dos
penalistas, por exemplo quando se fala em justiça restaurativa.
A alternativa B está incorreta porque, diversamente, as últimas alterações legislativas estão mais
voltadas á punição do criminoso do que à reparação das vítimas.
A alternativa C está incorreta porque o Poder Judiciário, reiteradamente, atua sim como verdadeiro
repetidor do “Direito penal de emergência”. Temos como exemplo os recentes julgados da boate Kiss,
muito criticados pelos penalistas.
A alternativa D está incorreta porque as edições de leis penais emergenciais, pelo contrário, somente
pioram a eficiência da política criminal.
A alternativa E está CORRETA justamente porque somente com reformas legislativas é que podemos
adotar uma postura voltada à melhora do tratamento dado pelo legislador aos fatores da
criminalidade.
( ) CERTO
( ) ERRADO
69
87
A alternativa está ERRADA simplesmente porque a análise das influências sociais e ambientais
dependerá da abordagem que se fará.
Por exemplo, as escolas sociológicas priorizam os estudos da influência das relações sociais no crime,
criminoso, vítima e controle social do delito. Por exemplo, a Escola de Chicago avalia a influência do
desenvolvimento social da cidade de Chicago para explicar os fatores de criminalidade.
Para a escola clássica, o modelo ideal de prevenção do delito ou do desvio é o que se preocupa com a
pena e seu rigor, compreendendo-a como um mecanismo intimidatório; já para a escola neoclássica, mais
eficaz que o rigor das penas é o foco no correto funcionamento do sistema legal e em como esse sistema
é percebido pelo desviante ou delinquente.
( ) CERTO
( ) ERRADO
A alternativa está CERTA porque essas são exatamente as concepções da escola clássica e neoclássica
que estudamos nesta aula e nos aprofundaremos ainda mais na próxima.
b) A injúria racial impede a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos.
d) A despeito do grande número de pessoas negras presas no Brasil, não se pode afirmar que o sistema
penal brasileiro atue de forma discriminatória em virtude dos princípios constitucionais.
87
A alternativa A está errada porque, como vimos, o racismo ainda existe no processo de criminalização
secundária.
A alternativa B está errada porque não há vedação à substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, à injúria racial, à luz do artigo 44 do Código Penal.
A alternativa C está CORRETA porque os estudos que fizemos, acima, no tópico relativo ao
encarceramento no Brasil, demonstra exatamente que o racismo estrutural se reflete no racismo
institucional vivido no cárcere.
A alternativa D está incorreta porque é exatamente o oposto do que vimos nos dados acima trazidos
nesta aula.
A alternativa E está errada porque a criminalização primária é vista com a edição da Lei n. 7.716/85.
d) a utilização da justiça restaurativa na solução de conflitos penitenciários aumentou o poder das facções
prisionais.
A alternativa A está incorreta porque é evidente que a seletividade do sistema penal ainda existe, basta
analisarmos as estatísticas das pessoas presas.
A alternativa B está CORRETA porque a solução não está na construção dos presídios, mas sim na
modificação do sistema penal.
A alternativa C está errada porque é evidente que a situação dos presídios somente piorou nos últimos
anos. Basta vermos os inúmeros julgados do STF, inclusive o reconhecimento do estado de coisas
inconstitucional do sistema penitenciário brasileiro.
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87
A alternativa D está errada porque tais modelos poderiam, se aplicados de forma efetiva, reduzir o
encarceramento e diminuir o poderio das facções que agem nos presídios.
A alternativa E está errada porque é evidente que o encarceramento feminino cresceu principalmente
com a política de “guerra às drogas” em que as mulheres são encarceradas normalmente em razão dos
crimes praticados por seus companheiros, muitas vezes em situação de grave opressão e violência
doméstica.
a) a eficiência do trabalho policial pode ser verificado pelo baixo índice de letalidade e o alto índice de
prisões efetuadas.
c) a construção de presídios tem sido uma política eficaz de redução do encarceramento em massa.
e) a proteção de direitos humanos tem sido o principal resultado da política criminal brasileira, uma vez
que o aumento da população prisional demonstra que os bens jurídicos estão sendo cada vez mais
protegidos por meio do direito penal.
A alternativa A está incorreta errada porque, na atualidade, o índice de letalidade somente aumentou,
conforme rotineiramente noticiado em nosso país.
A alternativa B está CORRETA porque apesar das garantias introduzidas pela Constituição Federal, a
política de encarceramento com diversas legislações emergenciais somente potencializaram o
encarceramento no Brasil.
A alternativa C está errada porque a construção de presídios no Brasil não repercute na causa do
encarceramento. Pelo contrário, somente viabiliza o aumento da população prisional.
A alternativa D está incorreta porque é evidente que as estatísticas demonstram que há uma grande
diferença entre o encarceramento masculino e feminino, seja pelo número da população prisional, seja
pela natureza das infrações praticadas.
72
87
A alternativa E está errada porque se houvesse verdadeiramente uma preocupação com os direitos
humanos, o olhar do Estado estaria mais voltado para a adoção de políticas públicas inclusivas e não
para o encarceramento de determinados grupos da sociedade.
15. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – FGV 2021) “Em março de 2021, foi
tornado público o Relatório ‘Mulheres nas audiências de custódia no Rio de Janeiro’, com os dados
referentes ao ano de 2019 recolhidos e analisados pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro”.
“De acordo com a pesquisa, considerando os 533 casos das mulheres que, no momento da audiência de
custódia, atendiam aos critérios objetivos para prisão domiciliar, foi possível observar que 25% das
mulheres, apesar de cumprir os requisitos legais, permaneceram presas preventivamente. Verificou-se
também que, em decisões judiciais que aplicaram prisão preventiva para mulheres que atendiam aos
critérios objetivos para prisão domiciliar, aproximadamente 65,5% contêm alguma referência à prisão
domiciliar. Ou seja, essa questão foi de alguma forma introduzida no curso da audiência de custódia e,
mesmo assim, essas custodiadas continuaram presas.”
Fonte: Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Diretoria de Estudos e Pesquisas de Acesso à
Justiça, Relatório “Mulheres nas audiências de custódia no Rio de Janeiro”, 2019. Disponível em:
https://www.defensoria.rj.def.br/uploads/arquivos/153960d0ac82483580bc117104cac177.pdf
Em linha com o pensamento criminológico feminista brasileiro contemporâneo, é correto afirmar que o
lastro epistemológico para análise do processo de criminalização de mulheres parte:
a) da constatação de que existem crimes próprios das mulheres, tais quais o infanticídio, o aborto, os
envenenamentos, que ficaram sempre impunes, por serem ignorados ou desconhecidos, já que mais
presentes na esfera doméstica (A. Peixoto);
c) da conclusão de que a criminalidade feminina é largamente mascarada, pois não há interesse da polícia
em investigar mulheres que praticam crimes, e, além disso, em grande parte dos crimes, elas funcionam
como cúmplices ou receptadoras de bens, fazendo com que as mulheres fiquem ocultas e não sejam
punidas. (O. Pollak);
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e) da impossibilidade de uma etiologia criminal, pois cada caso traz consigo as peculiaridades das histórias
de vida e das experiências das mulheres e, com estas, as razões que impulsionaram as práticas criminosas,
que podem tanto ser relativas à subsistência da mulher e de sua família ou a situações específicas de
violências das mais diversas ordens. (E. Pimentel).
Comentários do Professor:
Nessa linha, Elaine Pimentel, ao dissertar sobre a relação entre criminologia e feminismo, constatou
um verdadeiro empobrecimento do estudo relativo às mulheres na criminologia, pois o estudo
criminológico tem uma perspectiva preponderantemente masculina e deixou em uma espécie de
segundo plano os aspectos típicos dos sujeitos femininos, bem como questões de gênero. Basta
lembrarmos das concepções clássicas, positivistas e até mesmo contemporâneas que tratam da figura
do “homem delinquente”.
Essa ausência de estudos da criminologia da mulher só se tornou de alguma forma visível com o
surgimento dos movimentos feministas nas décadas de 1960 e 1970 do século XX, os quais trouxeram
conceitos importantes no campo da criminologia, tais como, patriarcado, dominação, opressão entre
outros.
Assim, a criminologia feminista surgiu como uma resposta crítica sobre o processo de vitimização e
criminalização da mulher dentro de uma realidade sociocultural de opressão compartilhada por
mulheres em todo o mundo.
74
87
Vale lembrar, também, que a criminologia feminista derivou a criminologia queer e a criminologia
feminista negra: Criminologia queer: perspectiva de estudos voltados à comunidade LGBTQI. Se os
estudos feministas permitiram problematizar a dominação masculina sobre as mulheres, os estudos
queer agregam o debate sobre a heterossexualidade. Criminologia feminista negra: as feministas
negras criticaram a ausência de estudos das mulheres negras na criminologia feminista e passaram a
contribuir com a inclusão dos estudos das perspectivas de raça e gênero.
A alternativa A está incorreta porque a questão não trata de impunidade, estando a assertiva destoada
do texto trazido como parâmetro.
A alternativa B está incorreta porque o predomínio masculino é histórico e nada tem relação com as
redes sociais.
A alternativa C está errada, na realidade, a criminalidade feminina não é mascarada, mas sim pouco
estudada.
A alternativa D está incorreta porque a citação da alternativa não possui coerência com o texto exposto
no enunciado da questão.
A alternativa E está correta justamente porque à luz do pensamento de Elaine Pimentel a criminologia
feminista contemporânea destaca a impropriedade de se conceber um estudo genérico sobre a causa
da existência de delitos praticados por mulheres sem considerar a relevância de um estudo empírico
que busque conhecer e explicar aspectos das práticas cotidianas mediadas por relações de gênero e
relativas a realidade de cada mulher, como, por exemplo, a maternidade, o trabalho e a relação de tais
atividades com o patriarcado.
16. (DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA – FCC 2021) 02. De acordo com o Anuário
Brasileiro de Segurança Pública de 2021: “A taxa de letalidade policial entre negros é de 4,2 vítimas a
cada 100 mil, já entre brancos ela é de 1,5 a cada 100 mil, o que equivale a dizer que a taxa de letalidade
policial entre negros é 2,8 vezes superior à taxa entre brancos”.
(Disponível em: http://forumseguranca.org.br)
a) o exercício da soberania diante do poder e da capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer,
com a eliminação dos corpos negros, tidos como descartáveis pelos agentes de repressão estatal.
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87
b) a reação ao sensacionalismo midiático, que conduz à sensação de impunidade diante dos crimes
patrimoniais, praticados primordialmente pela população negra, pobre e periférica, o que conduz à maior
repressão estatal e a abusos.
c) o racismo estrutural por retirar dos jovens negros, pobres e periféricos as oportunidades de emprego,
reduzindo-os às práticas delitivas como única forma de sobrevivência, o que gera confrontos com a polícia
e aumento dos índices de letalidade.
Comentários do Professor:
Trata-se de uma questão complexa de criminologia (incluída aqui dentro da matéria de direito
processual penal pela banca) que exige o conhecimento, pelo candidato, da denominada necropolítica,
do racismo estrutural e dos processos de etiquetamento social.
Para ele, necropolítica é o poder de ditar quem pode viver e quem deve morrer. Com base no biopoder
e em suas tecnologias de controlar populações, o “deixar morrer” se torna aceitável. Mas não aceitável
a todos os corpos. O corpo ”matável” é aquele que está em risco de morte a todo instante devido ao
parâmetro definidor primordial da raça.
“Mbembe explica que, com esse termo, sua proposta era demonstrar as várias formas pelos quais, no
mundo contemporâneo, existem estruturas com o objetivo de provocar a destruição de alguns
grupos. Essas estruturas são formas contemporâneas de vidas sujeitas ao poder da morte e seus
39
Disponível em: < https://www.politize.com.br/necropolitica-o-que-e/> acessado em 15/12/2021.
76
87
respectivos “mundos de morte” – formas de existência social nas quais vastas populações são
submetidas às condições de vida que os conferem um status de “mortos-vivos”. Sabemos que em cada
sociedade existem normas gerais para o povo – homens e mulheres livres e iguais. A política é o nosso
projeto de autonomia por meio de um acordo coletivo nos diferenciando de um estado de conflito.
Nesse sentido, Mbembe afirma que cabe ao Estado estabelecer o limite entre os direitos, a violência
e a morte. Mas, ao invés disso, os Estados utilizam seu poder e discurso para criar zonas de morte. O
filósofo levanta exemplos modernos: a Palestina, alguns locais da África e o Kosovo. Nessas zonas, a
morte se torna o último exercício de dominação. O autor afirma que quem morre em zonas como estas
são grupos biológicos geralmente selecionados com base no racismo. Funciona assim: é apresentado
o discurso de que determinados grupos encarnam um inimigo (por vezes fictício). A resposta é que,
com suas mortes, não haverá mais violência. Assim, matar as pessoas desse grupo pode ser aceito
como um mecanismo de segurança”.
A alternativa A está correta exatamente porque essa é uma das consequências da necropolítica aliada
a uma criminologia pautada no denominado a selecionando vidas negras por serem, à luz do poder
público, corpos descartáveis.
A alternativa B está incorreta porque é errado dizer que os crimes patrimoniais são praticados
primordialmente por pessoas negras, pobres e periféricas, mas sim que essas pessoas são as que
efetivamente são “selecionadas” pelo sistema punitivo, consequencia de um racismo estrutural
existente na sociedade.
A alternativa C está incorreta porque a questão não discute a existência de confrontos, mas sim um
público alvo da letalidade policial: a população negra.
A alternativa D está incorreta porque os dados citados demonstram que os negros são as maiores
vítimas e reflexo de um sistema racista.
A alternativa E está incorreta, apesar de não deixar de ser verdadeira. Na realidade, está incorreta
porque destoa do conteúdo do enunciado que destaca os altos índices de letalidade policial contra
pessoas negras, em contraposição aos baixos índices de letalidade contra pessoas brancas.
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a) o acesso garantido a diversos setores da sociedade, como imprensa, ONGs e associações de familiares
às prisões, proporcionou maior transparência e redução dos problemas humanitários.
c) a prisão evidencia o racismo do sistema penal com sua composição populacional e contribui para sua
reprodução e sustentação.
d) o ideal de prevenção geral da pena foi alcançado com a ampliação da privatização e modernização
ampla do sistema prisional brasileiro.
Comentários do Professor:
A questão em estudo possui alto grau de dificuldade e exigiu dos candidatos e candidatas
conhecimento acerca do sistema carcerário brasileiro e do racismo estrutural aliado a alguns conceitos
de criminologia.
O item “A” está nitidamente errado, pois na realidade os acessos a esses diversos setores não foi capaz
de reduzir os problemas humanitários do sistema prisional brasileiro. Pelo contrário, as estatísticas
oficiais demonstram que a realidade é cada vez mais degradante.
Sobre o previdenciarismo penal, constante na assertiva “B”, inicialmente é importante trazer o seu
conceito.
O previdenciarismo penal é um movimento político criminal que se desenvolveu o longo dos anos 50
e 60 sob as bases do estado de bem-estar social, do predomínio do modelo fordista-keynesiano
ancorado no trabalho estável na fábrica e em um contexto de baixos níveis de criminalidade.
Esse “mundo inclusivo, uno e concorde”, como designou Jock Young, cuja tônica estava na assimilação
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das faixas cada vez mais amplas da sociedade (a baixa classe operária, mulheres e jovens), forneceu as
condições ideias ao aperfeiçoamento e consolidação da concepção ressocializadora da pena40.
Ocorre que o item “B” erra ao associar esse modelo a uma suposta existência de programas que geram
oportunidades futuras à população prisional, uma vez que é notório o fato de que essas políticas são
escassas e indicam exatamente o oposto, ou seja, a não prevalência desse modelo.
Já o item “C” está correto porque todas as estatísticas mostram o reflexo do racismo estrutural dentro
dos presídios brasileiros.
Estudos que podem ser extraídos do Infopen demostram que 66,31% da população carcerária é preta
ou parda, ao passo em que apenas 32,52% da população é branca, 098% amarela e 0,19 indígena.
Ressalte-se que segundo o IBGE 56,2% do total da população brasileira é preta ou parda. Verifica-se,
diante disso, que a população preta e parda é um alvo com maior potencial do sistema punitivista
brasileiro, obviamente em razão da desigualdade, do racismo estrutural e da seletividade do direito
penal41..
O item “D”, por sua vez, está errado porque a privatização ainda é uma realidade incerta no Brasil.
Primeiro porque possui uma efetividade e até mesmo legalidade questionável. Segundo porque não
há, na atualidade, um modelo de privatização ampla no Brasil. Pelo contrário, hoje prevalece a
manutenção das prisões pelos Poderes Executivos dos Estados, Distrito Federal e União.
Por fim, o item “E” está errado porque a prevenção especial positiva é conceituada como sinônimo de
ressocialização do agente preso mediante políticas públicas de reinserção social. Já a ideia de prisão-
deposito é exatamente o oposto, pois reforça as violações do Estado e acentuam ainda mais as
desigualdades, refletindo em um incremento da criminalidade, inclusive das organizações criminosas
que atuam nos presídios.
Resumindo:
40
Disponível em: <https://www.ibccrim.org.br/noticias/exibir/453> acessado em 29/12/2021.
41
https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMjU3Y2RjNjctODQzMi00YTE4LWEwMDAtZDIzNWQ5YmIzMzk1Ii
widCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9
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A alternativa A está errada porque a esses diversos setores não foi capaz de reduzir os problemas
humanitários do sistema prisional brasileiro.
A alternativa B está incorreta porque erra ao associar esse modelo a uma suposta existência de
programas que geram oportunidades futuras à população prisional, uma vez que é notório o fato de
que essas políticas são escassas e indicam exatamente o oposto, ou seja, a não prevalência desse
modelo.
A alternativa C está CORRETA porque todas as estatísticas mostram o reflexo do racismo estrutural
dentro dos presídios brasileiros. Exemplo disso é que os dados do Infopen demostram que 66,31% da
população carcerária é preta ou parda, ao passo em que apenas 32,52% da população é branca, 098%
amarela e 0,19 indígena.
A alternativa D está incorreta porque a privatização ainda é uma realidade incerta no Brasil.
A alternativa E está incorreta porque a prevenção especial positiva é conceituada como sinônimo de
ressocialização do agente preso mediante políticas públicas de reinserção social. Já a ideia de prisão-
deposito é exatamente o oposto, pois reforça as violações do Estado e acentuam ainda mais as
desigualdades, refletindo em um incremento da criminalidade, inclusive das organizações criminosas
que atuam nos presídios.
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Vamos lá.
2) Racismo sob a concepção institucional: o racismo constitui uma relação de poder desigual entre
grupos raciais. O termo "racismo institucional" foi usado pela primeira vez no livro Black Power: Politics
of Liberation in America, de Charles V. Hamilton e Kwame Ture. Sob essa concepção, o racismo opera,
em regra, de forma indireta, através das instituições que são hegemonizadas por grupos raciais que
impõem os seus padrões, com o privilégio de determinados grupos raciais no acesso a cargos de
liderança, cargos públicos, postos de poder, acesso a saúde, educação. As instituições reproduzem o
racismo e carregam internamente a luta de grupos sociais.
3) Racismo sob a concepção estrutural: o racismo é parte da estrutura social. A ordem social tem o
racismo como um de seus elementos estruturantes. Em virtude disso, a atuação meramente inerte ou
42
Fonte: "Racismo Estrutural", de Silvio Luiz de Almeida
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"normal" das instituições resulta em práticas racistas, pois as instituições reproduzem a ordem social
racista. Comportamentos individuais e institucionais derivam da sociedade em que o racismo é a regra
e não a exceção. Dessa forma, as instituições e os indivíduos devem ser antirracistas para se combater
o racismo. Exige-se uma atuação efetiva. O racismo estrutural pode ser desdobrado em processo
político e processo histórico. "Consciente de que o racismo é parte da estrutura social e, por isso, não
necessita de intenção para se manifestar, por mais que calar-se diante do racismo não faça do indivíduo
moral e/ou juridicamente culpado ou responsável, certamente o silêncio o torna ética e politicamente
responsável pela manutenção do racismo".
Prospectivo;
Assim, é fácil fazer uma correção entre o racismo estrutural que exclui um grupo específico da
sociedade e criminaliza condutas que reforçam essa exclusão, trazendo a ideia de que determinados
grupos são considerados verdadeiros inimigos do Estado, ainda que em um prisma de uma finalidade
não declarada da pena.
Resumindo:
A alternativa A está errada porque, como dito, o texto trata do denominado racismo estrutural.
A alternativa B está correta porque é exatamente a relação que a questão quis trazer, apontando um
racismo em um contexto social aliado a uma ideia de repressão com finalidade de exclusão social de
determinados grupos raciais, em uma vertente voltada ao denominado Direito Penal do Autor que
coaduna com a ideia de Direito Penal do Inimigo.
A alternativa C está errada porque a questão não aborda a ideia de minimalismo penal.
A alternativa D está errada porque também não trata do abolicionismo penal, mas sim de um
punitivismo exacerbado em face de determinados grupos sociais sob o ponto de vista racial.
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A alternativa E está incorreta porque a prevenção especial positiva é conceituada como sinônimo de
ressocialização do agente preso mediante políticas públicas de reinserção social. Já a ideia de prisão-
deposito é exatamente o oposto, pois reforça as violações do Estado e acentuam ainda mais as
desigualdades, refletindo em um incremento da criminalidade, inclusive das organizações criminosas
que atuam nos presídios.
(A) a Escola Clássica e a Escola Positiva partem do paradigma de uma ciência penal integrada na qual
está abarcada tanto a ciência jurídica propriamente dita, quanto a concepção geral do ser humano em
sociedade, o que conflui para o que se chama de ideologia da defesa social;
(B) a teoria das técnicas de neutralização encontra-se em posição diametralmente oposta à teoria das
subculturas criminais na medida em que a primeira explica o crime a partir de suas causas e a segunda,
a partir de seus efeitos;
(C) a mudança promovida no sentido de considerar o direito penal como um sistema estático de normas,
e não dinâmico de funções, permitiu desmascarar o direito penal como um sistema que supostamente
protege a todas e todos de maneira igual;
(D) teria por missão a construção de uma teoria ideológica do desvio, dos comportamentos socialmente
negativos e da criminalização, e a elaboração das linhas de uma política criminal alternativa, de uma
política das classes subalternas no setor do desvio;
(E) acerca das teorias do conflito, dentro de uma visão pluralista e mecanicista da concorrência entre
grupos, o autor as toma como explicativas da criminalização primária (fase de formação da lei) e da
criminalização secundária (fase de aplicação da lei).
Comentários do professor:
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Trata-se de uma questão com elevado grau de dificuldade que exige o conhecimento de diversos
referenciais teóricos de criminologia à luz do pensamento de Alessandro Baratta.
Sobre a resposta contida na alternativa “A”, é importante trazer o seguinte ensinamento de Alessandro
Baratta:
(...) "Seja qual for a tese aceita, um fato é certo: tanto a escola clássica quanto as escolas
positivistas realizam um modelo de ciência penal integrada, ou seja, um modelo no qual a ciência
jurídica e concepção geral do homem e da sociedade estão estreitamente ligadas. Ainda que suas
respectivas concepções do homem e da sociedade sejam profundamente diferentes, em ambos os
casos nos encontramos, salvo exceções, em presença da afirmação de uma ideologia da defesa
social, como nó teórico e político fundamental do sistema científico." FONTE: Alessandro Baratta -
Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal (Introdução à sociologia do direito penal) Editora Revan.
Tradução: Juarez Cirino dos Santos. (página 41. CAPÍTULO II.
"A descrição das técnicas de neutralização, entendidas como componente essencial do comportamento
desviante, não representa, em nossa opinião, uma verdadeira e própria alternativa teórica à teoria das
subculturas, mas, antes, uma correção e uma integração dela." FONTE: Alessandro Baratta -
Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal (Introdução à sociologia do direito penal) Editora Revan.
Tradução: Juarez Cirino dos Santos. p. 79)
Assim, a alternativa “B” está errada justamente porque no pensamento do referido autor existe uma
relação de correção e integração entre as teorias, não de oposição.
O item “C”, por sua vez, pode ser solucionado pelo seguinte trecho da mesma obra acima citada:
''O direito penal seria objeto privilegiado de estudo como sistema dinâmico de
funções (compreendendo os mecanismos de produção, aplicação e execução das normas penais), e
como direito desigual por natureza: o direito da desigual proteção de bens jurídicos e da desigual
distribuição social da criminalização.'' (pág. 15)
Para Baratta, portanto, o Direito Penal é um sistema dinâmico de funções e não estático como
mencionado na alternativa “C”.
"No interior destas premissas está em curso, atualmente, um processo de elaboração teórica voltado
para a construção de uma teoria materialista do desvio, dos comportamentos socialmente negativos e
da criminalização. Ela representa, segundo pensamos, o momento emergente e mais suscetível de
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Assim, a alternativa “D” está incorreta porque para Baratta está em curso uma construção de uma
teoria materialista do delito, dos comportamentos socialmente negativos e da criminalização e não
uma teoria ideológica do desvio como citado na assertiva.
Por fim, o item “E” está errado porque a visão pluralista e mecanicista é uma característica
da sociologia do conflito que considera somente a criminalização primária (formação da lei) como
mecanismo seletivo de criminalização, desconsiderando, neste aspecto, a criminalização secundária.
Resumindo:
A alternativa A está correta porque correta porque reflete exatamente o pensamento de Alessandro
Baratta, para quem “tanto a escola clássica quanto as escolas positivistas realizam um modelo de
ciência penal integrada, ou seja, um modelo no qual a ciência jurídica e concepção geral do homem e
da sociedade estão estreitamente ligadas. Ainda que suas respectivas concepções do homem e da
sociedade sejam profundamente diferentes, em ambos os casos nos encontramos, salvo exceções, em
presença da afirmação de uma ideologia da defesa social, como nó teórico e político fundamental do
sistema científico.
A alternativa B está errada justamente porque no pensamento do referido autor existe uma relação
de correção e integração entre as teorias, não de oposição.
A alternativa C está errada porque para Baratta, portanto, o Direito Penal é um sistema dinâmico de
funções e não estático como mencionado.
A alternativa D está errada porque, para Baratta, o Direito Penal é um sistema dinâmico de funções e
não estático como mencionado.
A alternativa E está incorreta porque a visão pluralista e mecanicista é uma característica da sociologia
do conflito que considera somente a criminalização primária (formação da lei) como mecanismo
seletivo de criminalização.
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V.
II. Após o fato, Maria passou a perceber que seus vizinhos, que já sabiam do ocorrido, a
olhavam de forma sarcástica, como se ela tivesse dado causa ao fato e até tomou conhecimento
de comentários maldosos, tais como: “também com as roupas que usa (...)”, “também como
anda, rebolando para cima e para baixo” e etc., o que a deixou profundamente magoada,
humilhada e indignada.
VI. Em novembro, fora à Delegacia de Polícia prestar informações, quando relatou o ocorrido,
relembrando todo o drama vivido. Em dezembro fora ao fórum da Comarca, onde mais uma
vez, Maria foi questionada sobre os fatos, revivendo mais uma vez o trauma do ocorrido.
Comentários do professor:
A alternativa A está errada porque os itens II e III tratam da vitimização terciária e secundária
respectivamente. Conforme estudamos, o processo de vitimização realizado pela sociedade, pelo
julgamento da vítima, é a vitimização terciária, ao passo que a secundária consiste no processo de
vitimização ocorrido dentro das agências formais de persecução penal.
A alternativa B está CORRETA porque está exatamente de acordo com as hipóteses de vitimização
estudadas. A situação I reflete o primeiro momento em que a vítima recebe a ação do criminoso. No
item II há o processo de vitimização terciária com o julgamento da sociedade o item III traduz
exatamente a revitimização realizada pelas instituições de persecução penal.
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8 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Prezados(as) candidatos(as), nesta primeira aula estudamos os conceitos iniciais da criminologia, os métodos
da criminologia, objeto e o encarceramento no Brasil.
Da leitura dos tópicos acima percebe-se que o estudo da criminologia para as provas da Defensoria Pública
tem uma perspectiva bem distinta daquele estudo desenvolvido para outras carreiras.
Ademais, as questões acima também indicam que as provas variam umas das outras em graus de
profundidade, porém com as concepções até aqui estudadas pode-se desenvolver um raciocínio que leva à
resposta.
Allan Joos
Defensor Público do Estado de Goiás
Instagram: @allanmjoos
Telegram: t.me/allanjoos
Instagram: @marcoslopesgomes
Telegram: t.me/marcoslopesgomes
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