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A Gota Fria

– Paulo, tá bem?
– Ãh? Tô...tô sim.
Na verdade, o que eu realmente queria, era que ela
percebe a minha insatisfação, me desse um beijo e me
deixasse confortável, mas Júlia não sabe lidar com a
tristeza dos outros, nem quando são suspeitos de serem
serias killers. Ela é como eu.
– Hm... – resmungou ela.
– É, sério. – A mentira enfraquecia minha voz.
Ela me surpreendeu, sentou na cama do meu lado, e se
recostou no meu ombro, passando a mão entre os meus
curtos e ásperos cachos. Por um momento eu pude jurar
que ela realmente ia me dar um beijo no rosto, mas claro
que não deu, talvez com medo de ultrapassar a amizade.
– Porque, parece tanto que fui eu? Até eu, tenho que
admitir isso. – Sussurrei.
– Você vai ficar bem. Declarou, com a voz depressiva – Eu
conheço você, é uma das únicas pessoas que eu confio no
mundo.
– Até hoje, ninguém sabe como aquele homem morreu, e
não pareceu ser uma coisa humana. – Eu lembrei.
– Shhhh! Para de ser tão negativo homem.
Depois de passar a mão sobre o meu peito, ela levantou e
ficou olhando o horizonte pela janela.
– É hora de eu ir, Júlia.
Ela se virou com seus pequenos olhos, num susto. Parou
para pensar.
– Eu vou com você.
– Não precisa. – Gostei da ideia de ela ir, mas tentei não
parecer vulnerável.
– Para de bobeira. Eu acho que vou com essa blusa rosa
aqui mesmo que eu tô. O que acha, tô feia pra ir num
interrogatório, do FBI?
Abri um sorriso. – Tá não!
Meu peito pareceu explodir de dor e minhas mãos
tremeram, quando ouvi um estrondo na porta. Puxei a faca
de cima do pequeno armário e andei em alerta para a
porta.
– Alguém ficou de vir no apartamento?
– Claro que não! – Ela sussurrou.
Antes de eu pegar na maçaneta, vi as mãos pálidas dela
segurando um revolve e passando por mim. Nós
recostamos ao lado da porta, cada um em uma lateral.
– Engatilha e não estica o braço, se não, vão acabar te
desarmando.
Ela encolheu o braço e aproximou a arma do peito.
Quando me permiti olhar pra baixo, uma poça de sangue
vazando pela frecha da porta começou a envolver nossos
pés. Um estrondo ainda mais forte, parecia ser alguém
caindo. Girei a maçaneta e abri a porta com toda a minha
força, deixando o fio da lâmina ir na minha frente.
Recuei na hora. O grito agudo da Júlia, deixou tudo mais
tenso. O sangue escurecido e carregado que escorria até a
porta, vinha do corpo jogado no meio do corredor.
– MEU DEUS!
Os gritos da Júlia, ficaram maiores à medida que ela se
dava conta da situação. Eu não conseguia ficar lúcido, não
conseguia respirar. Aquilo acontecendo de novo?
– Isso de novo, não! De novo não! – Júlia começou a
chorar.
Ouvi a perna dela bater uma na outra até fraquejar e cair
no chão. Levantei a mão em sinal, para ela ficar ali, e
caminhei para perto do morto. Quando vi como estava o
homem, o vomito subiu até minha boca, mas eu engoli. O
rosto dele estava em uma situação que eu não consegui
entender, o coro cabeludo branco dele estava desarraigado
do resto da cabeça, o sangue jorrava de dentro do crânio,
do que parecia ser um cérebro esfolado. E onde estava os
olhos e a boca dele? Ainda estavam ali? Não sei. Descobri,
quando senti uma gota fria pingar por cima do meu olho
esquerdo e minha visão ficar vermelha. Olhei pra cima e
tinha dois olhos sem vida grudado no teto me observando e
embaixo dele o que parecia ser pele de lábios em formato
de sorriso, que não parava de pingar sangue. Dessa vez
não pude segurar, vomitei até sentir meu estomago
esvaziar.
– SOCORROOOO!! – Demorei a pedir.
O que tá acont

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