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Jacques-Yves Cousteau (1910-1997)

Carta aos Mergulhadores

Como todos os seres humanos, nascemos no coração da mãe Terra.


Temos braços e pernas, respiramos oxigênio que entra em pequenos
pulmões. Passamos grande parte da nossa vida na posição vertical,
que nos dá uma maior autonomia e conforto na Terra. Vistos
superficialmente, somos iguais a todos os seres humanos.

Mas, analisando um pouco mais fundo, alguma coisa nos faz


diferentes. Nascemos com os olhos acostumados ao azul das águas.
Temos um corpo que anseia pelo braço do mar e um pulmão que
aceita grandes privações de ar, apenas para prolongar a nossa
vida no mundo azul.

Somos homens e mulheres de espírito inquieto. Buscamos, na


nossa vida, mais do que nos foi dado. Passamos por grandes provas
para nos aproximar dos peixes. Transformamos nossos pés em
grandes nadadeiras, seguramos o calor do nosso corpo com peles
falsas e chegamos até a levar um novo pulmão em nossas costas. E
tudo isto para quê? Para podermos satisfazer uma paixão, um
sonho. Porque nós, algum dia, de alguma forma, fomos apresentados
a um mundo novo. Um mundo de silêncio, calma, mistério, respeito
e amizade. E esta calma e este silêncio nos fizeram esquecer da
bagunça e da agitação do nosso mundo natal. O mistério envolveu
nosso coração sedento de aventura.

O respeito que aprendemos a ter pelos verdadeiros habitantes


deste mundo, respeito esse que, só depois de ter sentido a
inocência de um peixe, a inteligência de um golfinho, a majestade
de uma baleia ou mesmo a força de um tubarão, podemos
compreender.

E a amizade. Quando vamos até o fundo do mar, descobrimos que


ali jamais poderíamos viver sozinhos. Então, levamos mais alguém.
E esta pessoa, chamada de dupla, companheiro ou simplesmente
amigo, passa a ser importante para nós. Porque, além de poder
salvar nossa vida, passa a compartilhar tudo que vimos e
sentimos. E em duplas, passamos a ter equipes, e estas passam a
ser cada vez maiores e mais unidas. E assim entendemos que somos
todos velhos amigos mesmo que não nos conheçamos. E este elo que
nos une é maior do que todos os outros que já encontramos.

E isso faz com que nós, mais do que amigos, sejamos irmãos.
Faz de nós, mergulhadores. 1
À memória de Márcio Monteiro...

Márcio Monteiro
NAUI
DAN Brasil
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… também de Randy Shaw e de Sergio Viegas

Randy Shaw Sergio Viegas


NAUI Worldwide DAN Brasil
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Universidade Federal de Viçosa
Departamento de Física
Unidade de Mergulho Científico

Amadurecimento de Ostwald em Bolhas de Ar e


Doença Descompressiva: Aspectos Fenomenológicos

Professores: Estudantes:
Oswaldo M. Del Cima (Instrutor NAUI #48926) César M. da Rocha (DSc)
Alvaro V.N.C. Teixeira Paulo C. de Oliveira (BSc)
Hallan S. Silva Leonardo A.B. Caumo (BSc)

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Viçosa – Zona da Mata – Minas Gerais

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Universidade Federal de Viçosa – UFV

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Universidade Federal de Viçosa – UFV

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Unidade de Mergulho Científico – DPF-UFV

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Unidade de Mergulho Científico – DPF-UFV

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O mergulho como atividade:

Meio – Mergulho Científico
➣ Arqueologia Subaquática (Curso: Arqueologia Subaquática -
Prof. Rambelli)
➣ Oceanografia
➣ Biologia
➣ Geomorfologia
➣ História
➣ Geologia


Fim – Física do Mergulho
➣ Física (biomecânica, hidrodinâmica...)
➣ Fisiologia (hiperbárica, hipobárica...)
➣ Dinâmica de bolhas (Palestra: Regeneração e Expansão de Bolhas e
Impactos Hipotéticos em Protocolos de Descompressão –
Prof. Wienke)
➣ Teoria de descompressão (modelos teóricos (RGBM...) e empíricos)
➣ Equipamentos (reguladores, nadadeiras, BC's, computadores,
sensores de gás, rebreathers...)
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Mergulho
recreativo comercial

militar científico

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Mergulhador de Segurança Pública

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Vamos mergulhar… na Física!!!

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A Física no mergulho
Princípio de Arquimedes → mergulho; navegação;
coletes equilibradores (BCs), cilindros; roupas; lastro...
Fisiologia: parâmetros biométricos (densidade corporal, volume pulmonar...)...

Imersão (E<P) → flutuabilidade negativa


Cota fixa (E=P) → flutuabilidade neutra (imponderabilidade)
Emersão (E>P) → flutuabilidade positiva

Mecânica do continuum → SCUBA (BCs+cilindros+reguladores); nadadeiras; roupas;


modelos descompressivos, dinâmica de bolhas, tabelas e computadores de mergulho... Fisiologia:
barotraumas (orelha, facial, dental, abdominal, pulmonar, ocular...), hiperdistensão pulmonar, embolia
arterial gasosa, narcose, doença descompressiva...

Leis de Newton e leis de conservação; deformação; ondas sonoras;


efeito Doppler; Fluidostática; Pascal {p(z)=patm+ρgz};

Barométrica {p(z)=p0exp(-Mgz/(kT))}; Tensão interfacial;

Laplace {pint=pext+2σ/R}; Viscosidade; Fluidodinâmica;

Força de arraste (f=-αv); Bernoulli; Navier-Stokes;


Poiseuille...

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A Física no mergulho
Termodinâmica → misturas gasosas (ar, nitrox, heliox, trimix...); reguladores; roupas;
modelos descompressivos, dinâmica de bolhas, tabelas e computadores de mergulho... Fisiologia:
barotraumas (orelha, facial, dental, abdominal, pulmonar, ocular...), hiperdistensão pulmonar, embolia
arterial gasosa, narcose, doença descompressiva...

Leis da termodinâmica; Boyle {P~1/V}; Charles {V~T};


Gay-Lussac {P~T}; Avogadro {V~n}; Gases ideais {PV=nRT};
Gases reais {PV=Z(n,P,V,T)nRT}; Graham {r~1/M1/2}; Dalton {P=Σpi};
Henry {p~c}; Fick-Onsager {J=-D∇c e dc/dt=D∇2c}; Fourier {Q=-k∇T};
Darcy {v=-(κ/μ)∇p}; Einstein {D~T}...

Óptica: → mascáras; máquinas, lentes e flashes para fotosub; lanternas... Fisiologia:


alterações oftálmicas em ambiente hiperbárico...

Reflexão; Refração; Difração; Interferência;


Absorção...

Eletromagnetismo: → bússola, sensores de gases...

Campo magnético; Campo elétrico...

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A dinâmica do mergulhador

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Mecanismos de formação de bolhas – macro

Cavitação: processo (~ isotérmico) de “ruptura” da
fase líquida por redução da pressão do líquido.


Ebulição: processo (~ isobárico) de “ruptura” da fase
líquida por aumento da temperatura do líquido.

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Mecanismos de formação de bolhas – micro

Nucleação: processo de natureza estocástica
(flutuações microscópicas) que inicia a formação de
nova fase ou estrutura.

Heterogênea: em interfaces (líquido-sólido, gás-
líquido e gás-sólido)


Homogênea: no corpo da fase (gasosa, líquida ou
sólida)

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Mecanismos de formação de bolhas – micro

Tribonucleação: processo de formação de micro bolhas
de gás devido ao movimento relativo entre o líquido,
contendo gás dissolvido, e uma superfície sólida.

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Mecanismos de evolução de bolhas

Descompressão (compressão): redução (aumento) da
pressão do meio.


Coalescência: fusão de duas ou mais bolhas.

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Mecanismos de evolução de bolhas

Difusão: fluxo de substância (moléculas ou átomos) de
regiões de maior concentração para as de menor
concentração.

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Mecanismos de evolução de bolhas

Contradifusão isobárica:
➣ Difusão de diferentes gases para dentro e para fora
dos tecidos enquanto sob pressão ambiente constante.
➣ Troca isobárica de mistura gasosa: o componente
inerte da mistura inicialmente respirada pelo
mergulhador começa a ser eliminada (off-gassing)
pelos tecidos, enquanto o componente inerte da
segunda mistura começa a ser absorvida (in-gassing)
pelos tecidos.

Não há variação de pressão e os gases movem-se em
sentidos opostos, isto chama-se “contradifusão
isobárica” (Lambertsen and Idicula, 1975; Lambertsen,
1978; Wienke, 2001).
C.J. Lambertsen and J. Idicula, 1975, “A new gas lesion syndrome in man, induced by “isobaric gas
counterdiffusion”, J. Appl. Physiol. 39, 434.

C.J. Lambertsen, 1978, “Advantages and hazards of gas switching: Relation ofdecompression
sickness therapy to deep and superficial isobaric counterdiffusion”, Proceedings of the Symposium
on Decompression Sickness and Its Therapy.


B.R. Wienke, 2001, “Technical Diving in Depth”, Best Publishing Company, Flagstaff
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Mecanismos de evolução de bolhas

Amadurecimento de Ostwald: pequenos cristais
(pequenas partículas) em solução (em suspensão) se
dissolvem e se redepositam sobre cristais maiores
(partículas maiores) – Wilhelm Ostwald (1896).

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Amadurecimento de Ostwald – bolhas de ar

Amadurecimento de Ostwald: transferência de gás de
bolhas menores para bolhas maiores!!!
A “pedra fundamental” do grupo (1º vídeo)

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Formação e evolução de bolhas de gás


Formação:
➣ Nucleação ⟹ homogênea ou heterogênea
➣ Tribonucleação


Evolução:
➣ Descompressão (compressão) Modelos de descompressão

➣ Difusão
➣ Contradifusão isobárica
➣ Coalescência
➣ Amadurecimento de Ostwald ?

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Doença descompressiva

Ambiente hiperbárico ✗
Ambiente hipobárico

Tenho alguns sonhos...


eis dois!!!

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Doença descompressiva: lesões por bolhas

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Amadurecimento de Ostwald
Bolhas menores podem “alimentar” bolhas maiores!!!

2σ 2σ 1 1
P1= + P amb P2 = + Pamb C r∼ C B : líquido C R∼
r R r R

t
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O experimento

Sistema de bolhas de ar em um fluido com alguns parâmetros reológicos
do sangue humano:
➣ density r
➣ surface tension s
➣ viscosity h


Descrição estatística (evolução temporal):
➣ Radio médio R(t)
➣ Número de bolhas N(t)
➣ Distribuição de raios (frequência) f(R,t)
➣ Distribuição normalizada de raios (probabilidade) p(R,t)

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O experimento

Sangue humano*:

1,00 ≤ ρ ≤ 1,15 (g/cm3)

15 ≤ s ≤ 80 (mN/m)

1,00 ≤ η ≤ 4,00 (mPa.s)
* B.R. Wienke, 2009, “Diving decompression models and bubble metrics: Modern computer syntheses”,
Comp. Biol. Med. 39, 309.

✗ Solução líquida (v/v): 75% glicerol + 25% H2O (deionizada)



r = (1,17 ± 0,01) g/cm3

s = (65,3 ± 0,01) mN/m

h = (34,530 ± 0,002) mPa.s

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O experimento

Câmera conectada
ao PC

Microscópio
óptico
Lente 10x

Câmara de
Mesa de bolhas
deslocamento

Bolhas produzidas (por cavitação) usando-se um


“mixer”

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O experimento: distribuição de raios

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O experimento: distribuição de raios

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O experimento: distribuição de raios

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O experimento: distribuição de raios

35
O experimento: distribuição de raios

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O experimento: raio médio R(t)

R (0)=18,42μ m

experiment χ=0,1956 ; K =2,0×10


7

Lifshitz-Slyozov-Wagner

3
K =6,1×10

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O experimento: número de bolhas N(t)

Lifshitz-Slyozov-Wagner

experiment K =6,1×103

χ=0,1956 ; K=2,0×107 ; λ=0,48

R (0)=18,42μ m

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Amadurecimento de Ostwald: uma bolha

raio crítico
RGBM: raio de excitação

R c =10μ m

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Amadurecimento de Ostwald: três bolhas

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Amadurecimento de Ostwald: cinco bolhas

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Ostwald: vinte bolhas (sem tecido)

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Ostwald: vinte bolhas (tecido off-gassing)

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“Gedankenexperiment”

Início: 0:00h Fim: 13:00h

tempo do mergulhador ~ 1/8 tempo do experimento


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N2 bubbles and the Ostwald ripening

Objectives:
✗ Investigate the Ostwald ripening due to N2 bubbles into blood and tissues;

Implement the Ostwald ripening to the Reduced Gradient Bubble Model
(RGBM)*;
* B.R. Wienke, 1989, “N2 transfer and critical pressures in tissue compartments”, Mathl. Comput.
Modelling. 12, 1;

* B.R. Wienke, 1990, “Reduced Gradient Bubble Model”, Int. J. Biomed. Comput. 26, 237;

* B.R. Wienke and T.R. O'Leary, “Reduced Gradient Bubble Model with coupled phase and material
dynamics”, RGBM Technical Series 8, NAUI Technical Diving Operations.


Probe and testify if the Ostwald ripening contributes to the decompression
sickness risk;

Develop dive tables and a dive computer prototype.

Challenges:

Complexity of blood (non-newtonian fluid, biologically activ, particulate,
heterogeneous…) and tissues;

Search mechanisms that shall suppress or raise the Ostwald ripening.

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Tudo vale a pena se a alma não é pequena (Fernando
Valeu Pessoa)
a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

Fernando Pessoa

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