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Antônio Augusto de Queiroz

RIG EM TRÊS
DIMENSÕES

Trabalho parlamentar

Defesa de interesses perante os poderes públicos

Análise política e de conjuntura


Trajetória de um profissional de RIG
O livro RIG em três dimensões não poderia ter sido escrito por
alguém mais qualificado. Antônio Augusto de Queiroz é pioneiro
nessa atividade, pois acompanha profissionalmente os poderes da
República desde 1984. Monitora e produz estudos sobre os fluxos
decisórios no Poder Executivo desde o governo do Presidente Sar-
ney e no Poder Legislativo desde a votação do colégio eleitoral que
elegeu Tancredo Neves Presidente da República.
Iniciou sua trajetória como profissional de RIG no Departamento
Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), quando idealizou
e escreveu várias séries sobre estudos políticos, dentre as quais:
“Quem é Quem”, “Os Cabeças do Congresso Nacional”, “Estudos
Políticos” e “Educação Política”.
Dentre as principais publicações, na série “Quem é Quem”, po-
demos mencionar: “Quem é Quem do Diap”, sobre os deputados
candidatos à Constituinte em 1986; e “Quem foi Quem na Cons-
tituinte”, atribuindo nota aos Constituintes de 1987/88. Na série
“Estudos Políticos”: “Por dentro do processo decisório: como se fa-
zem as leis”; “Por dentro do Governo: como funciona a máquina
pública”; “Poder Legislativo: como é organizado, o que faz e como
funciona”; “Políticas Públicas e Ciclo Orçamentário”; e “Radiogra-
fia do Novo Congresso”. E na série “Educação Política”: “Noções
de Política e Cidadania no Brasil”; “Sistema Político e suas insti-
tuições”; “Reforma Política e Regime Representativo”; e “Eleições
gerais e municipais: orientação a candidatos e eleitores”.
Desde que deixou a Diretoria de Documentação do DIAP em
2021, dedica-se à função de consultor e analista político indepen-
dente, sendo este o primeiro livro nesta nova fase de sua vida pro-
fissional. O autor, por tudo isto, é referência e mentor na atividade
de relações institucionais e governamentais, sendo um dos analis-
tas e consultores políticos mais experientes e requisitados do Brasil.

Celso Napolitano
Professor aposentado da FGV-EAESP, foi presidente do DIAP e é
presidente da Federação dos Professores do Estado de São Paulo.
Antônio Augusto de Queiroz

RIG EM TRÊS DIMENSÕES


Trabalho parlamentar
Defesa de interesses perante os poderes públicos
Análise política e de conjuntura

Brasília
2022
RIG em três dimensões: trabalho parlamentar, defesa de interesses
perante os poderes públicos e análise política e de conjuntura

Editora: Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas


Editoração eletrônica e capa: Fernanda Medeiros da Costa
Revisão: Viviane Ponte Sena
Foto: Anny Campello

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Queiroz, Antônio Augusto de


RIG em três dimensões [livro eletrônico] : trabalho parlamentar,
defesa de interesses perante os poderes públicos e análise política e de
conjuntura / Antônio Augusto de Queiroz. -- Brasília, DF : Diálogo
Institucional, 2022.
PDF

Bibliografia.
ISBN 978-65-993033-1-9

1. Brasil - Relações institucionais 2. Lobby 3. Poder executivo - Brasil


4. Poder legislativo - Brasil 5. Relações governamentais I. Título.

22-124370 CDD-320

Índices para catálogo sistemático:


1. Ciências políticas 320
Eliete Marques da Silva - Bibliotecária - CRB-8/9380

É vedada a reprodução de qualquer parte deste livro sem expressa autorização do autor.
Todos os direitos reservados.

Edição: Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas


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CEP 70093-900 – Brasília-DF
Tel: (61) 3225-1804
E-mail: financeiro@dialogoinstitucional.com.br
AGRADECIMENTOS

E ste livro sobre as três principais dimensões da atividade de


Relações Institucionais e Governamentais (RIG) é produto do
esforço coletivo de instituições e pessoas, às quais gostaria de
fazer um agradecimento especial.
Quanto às instituições, meu primeiro agradecimento vai
para o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamen-
tar (DIAP), o qual editou muitas das publicações de minha
autoria que, de algum modo, estão sintetizadas neste livro;
e o segundo vai para a Consillium Soluções em Relações
Institucionais e Governamentais, empresa que tenho a honra
de ser sócio-diretor e da qual nasceu a sugestão de elaborar
um guia de formação, orientação e apoio aos profissionais da
área de RIG.
Ainda em relação às pessoas jurídicas, gostaria de fazer
um agradecimento especial ao escritório Mota & Advogados
Associados, pelo apoio e suporte à publicação deste livro, e à
Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas,
empresa que produz conteúdos e edita esta obra.
Quanto às pessoas, meus agradecimentos vão para os
amigos e especialistas que leram e criticaram o livro, trazendo
grandes contribuições para a qualidade da publicação: Adriano
Laureno, Alysson de Sá Alves, Anderson Luiz Dias, Carlos
Eduardo Esteves Lima, Clovis Scherer, Enrico Ribeiro, Francisco
Gaetani, Luiz Alberto dos Santos, Manoel Leonardo Santos,
Marcos Augusto de Queiroz, Marcos Lima, Miguel Gerônimo da
Nóbrega Netto, Thiago Queiroz e Ulisses Rapassi.

3
RIG em três dimensões

Um agradecimento especial à jornalista Viviane Cristina da


Ponte e Souza Sena, pelo apoio durante a elaboração do livro,
bem como pelas sugestões que contribuíram para o aperfeiçoa-
mento do texto e pela diligente revisão.
Não poderia também deixar de agradecer à profissional
Fernanda Medeiros da Costa, da F4 Comunicação, pelo trabalho
de formatação do livro e elaboração da capa.
Por fim, agradeço a cada um e registro que qualquer erro
ou omissão é de minha inteira reponsabilidade.

Antônio Augusto de Queiroz

4
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS............................................................................. 3
SUMÁRIO........................................................................................... 5
PREFÁCIO.......................................................................................... 9
INTRODUÇÃO................................................................................... 11

CAPÍTULO I ...................................................................................... 17
TRABALHO PARLAMENTAR............................................................... 17

SEÇÃO 1........................................................................................... 21
As formas de atuação no campo institucional........................................ 21

1. Conceitos fundamentais ................................................................. 22


1.1. Lobby – o que é e o que faz....................................................... 22
1.2. Atividade de Relações Institucionais e Governamentais – o que é e o
que faz.......................................................................................... 24
1.3. Advocacy – o que é e no que consiste......................................... 28
2. A importância da representação de interesses................................... 31
3. Legitimidade e a legalidade dos grupos de pressão............................. 38
4. Grupos de interesses e grupos de pressão – o que são e como atuam... 39
4.1. Como atuam os grupos de pressão............................................. 43
5. Frentes parlamentares ou bancadas informais................................... 45
6. Poder do governo como grupo de pressão......................................... 49
7. Ética e integridade na atuação dos grupos de interesses ou de pressão.51
8. Condições para o êxito no exercício da influência............................... 53

SEÇÃO 2 .......................................................................................... 55
Desenho institucional, requisitos e regras de atuação no âmbito do Poder
Legislativo......................................................................................... 5 5

5
1. O papel do Poder Legislativo e dos parlamentares.............................. 55
2. Transparência orçamentária e emendas parlamentares....................... 59
3. Organização dos trabalhos legislativos.............................................. 61
4. Desenho institucional e o processo decisório no Poder Legislativo........ 64
5. Atuação e monitoramento dos trabalhos no Congresso Nacional.......... 65
6. Escala de influência no processo decisório no Congresso Nacional....... 68
1ª) Consultoria legislativa (interna).................................................... 68
2ª) Assessorias parlamentares das bancadas (interna)......................... 69
3ª) Assessorias parlamentares de órgãos públicos (externa).................. 70
4ª) Servidores das Casas do Congresso Nacional e suas representações
de classe – sindicatos e associações (interna)................................ 70
5ª) Entidades, organizações não-governamentais e grupos de pressão, que
incluem empresas, corporações, enfim, da sociedade civil (externa)...... 71
6ª) Especialistas temáticos ou celebridades que defendem pontos de vista
ou causas específicas (externa)......................................................... 71
7. Os atores-chave do processo decisório no Poder Legislativo................. 72
8. Regras para o corpo a corpo no trabalho parlamentar......................... 77
9. Perguntas-chave para o acompanhamento de políticas públicas.......... 80
10. Dinâmica das Casas Legislativas.................................................... 81
11. Tramitação legislativa no Congresso Nacional – como se fazem as leis ...83
12. Jogo parlamentar – artifícios regimentais........................................ 87
13. Como se relacionar com os poderes Legislativo e Executivo............... 92
14. Conclusão do Capítulo ................................................................. 95

CAPÍTULO II ..................................................................................... 97
DEFESA DE INTERESSES PERANTE OS PODERES PÚBLICOS............... 97

1. O Estado, suas instituições e diretrizes .......................................... 100


2. Evolução da Administração Pública e sua governança ..................... 103
3. Sobre o Poder Executivo Federal.................................................... 110
3.1. Agência Reguladora e seu papel na economia............................ 113
3.2. Estrutura e organização da Administração Pública...................... 116

6
4. Complexidade do processo decisório............................................... 120
4.1 Desafios para a tomada de decisão........................................... 121
4.1.2. O que observar para entender o processo decisório............. 127
4.2. Fatores facilitadores e dificultadores do processo decisório.......... 130
4.2.1. Fatores dificultadores...................................................... 131
4.2.2. Fatores facilitadores........................................................ 134
5. Hierarquia do processo decisório no Poder Executivo........................ 136
5.1. A estrutura padrão de cada ministério....................................... 136
5.2. Nível de influência no conteúdo das políticas públicas pela área
técnica......................................................................................... 1 4 3
5.3. O checklist dos atos governamentais....................................... 146
5.3.1. Quanto ao diagnóstico .................................................... 147
5.3.2. Em relação às alternativas, identificar................................ 147
5.3.3. Relativamente às competências........................................ 147
5.3.4. Quanto ao ato ou instrumento recomendado....................... 148
5.3.5. Sobre a oportunidade da iniciativa..................................... 148
5.3.6. Em relação à exequibilidade............................................. 148
5.3.7. Sobre os aspectos orçamentários ou custos envolvidos......... 148
5.3.8. Quanto ao prazo.............................................................. 148
6. Tipologia ou arenas das políticas públicas....................................... 149
7. Como e por que se relacionar com o governo?................................. 152
7.1. Por que se relacionar com os poderes e órgãos governamentais?.......153
7.2. Para que se relacionar com os poderes e órgãos governamentais? .....154
7.3. Com quem se relacionar, do ponto de vista institucional?........... 155
7.4. A quem procurar – o técnico ou o político?................................ 156
8. Como se dá a tomada de decisão no governo? ................................ 158
8.1. Em que dimensões ocorrem as disputas no interior do governo a
respeito das políticas públicas? ...................................................... 160
8.2. Em geral, que critérios são utilizados para efeito de alocação de
recursos aos ministérios e órgãos?................................................... 162
9. Conclusões do Capítulo................................................................. 162

7
CAPÍTULO III .................................................................................. 165
ANÁLISE DE CONJUNTURA POLÍTICA............................................... 165

1. Por que a análise de conjuntura importa para a tomada de decisão?.. 169


2. Conceitos fundamentais ............................................................... 172
3. Os três setores do sistema social.................................................... 174
4. O que se entende por análise de conjuntura?................................... 178
5. Qual é o objetivo da análise de conjuntura?..................................... 179
6. Que erros devem ser evitados na análise de conjuntura?................... 181
7. Quais metodologias geralmente são empregadas na análise de
conjuntura?..................................................................................... 1 8 2
8. Quais os principais ou os maiores desafios na análise de conjuntura?.186
9. Quais elementos devem ser priorizados na análise de conjuntura?..... 187
10. Modelos ou categorias de análise com o passo a passo.................. 189
11. Quais as principais fontes de consulta numa análise de conjuntura?......193
11.1. No plano internacional.......................................................... 194
11.2. No plano local..................................................................... 194
12. O que uma boa análise de conjuntura permite perceber para a
propositura de ações?....................................................................... 196
13. Conclusão do Capítulo................................................................ 197

CAPÍTULO IV .................................................................................. 199


CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................. 199
Referências Bibliográficas................................................................. 204

8
PREFÁCIO

P oucas pessoas têm, como Antônio Augusto de Queiroz, uma


trajetória tão comprometida e profunda com o tema das
Relações Institucionais e Governamentais (RIG), abrangendo a
experiência prática, a formulação e a análise, e a abordagem
teórica e acadêmica.
Em mais de 35 anos como Diretor do Departamento Inter-
sindical de Assessoria Parlamentar (DIAP) e Sócio-Diretor das
empresas Consillium e Diálogo Institucional, o autor deste livro
não apenas consolidou profundos conhecimentos, como se tornou
referência obrigatória para quem quer que deseje entender os
meandros do processo decisório governamental.
Autor de inúmeros trabalhos sobre o tema, Antônio Augusto
dedicou-se, em seu Mestrado em Políticas Públicas e Governo,
a destrinchar a estrutura dos instrumentos de monitoramento do
Parlamento e sua efetividade como mecanismos de avaliação de
políticas públicas.
Agora, ele nos brinda com uma obra que refaz e comple-
menta, de forma sistemática e aprofundada, uma trajetória já
esboçada em publicações do DIAP, abordando o tema das rela-
ções institucionais e governamentais, lobby, advocacy, processo
decisório e estrutura governamental e análise de conjuntura.
Nos quatro capítulos deste livro, o leitor encontrará não
apenas informação, mas lições de uma vida e de uma experiência
impressionantes, estruturadas de forma metódica e didática, que
permitirão não apenas compreender, mas apreender o trabalho de

9
RIG em três dimensões

RIG sob a perspectiva profissional, sempre pautados pela ética,


pela transparência e honestidade que garantem a legitimidade
do exercício da influência no processo decisório.
Profissionais de RIG, servidores públicos do Executivo e
Legislativo, assessores parlamentares, acadêmicos, profissio-
nais da imprensa e o público em geral encontrarão, nesta obra,
valiosas lições sobre os limites e as possibilidades do processo
de políticas públicas e seus atores, a partir da visão qualificada
de quem, atuando junto ao Congresso Nacional, não somente
desenvolveu técnicas e métodos de grande utilidade, como, com
capacidade de análise política e legislativa invejáveis, granjeou
o respeito de todos os que lidam com a Política no país.
Estamos seguros de que esta obra suprirá uma lacuna, pois
não somente aborda o tema sob o prisma objetivo da prática,
como agrega a essa abordagem a qualidade de uma reflexão
teórica bem informada e consistente. A abordagem empírica
de quem sabe do que está falando, e não se deixa levar por
achismos, generalizações ou superficialidades, se associa à con-
tribuição de cientistas políticos, sociólogos e juristas, garantindo
a profundidade, precisão e qualidade da obra.

Luiz Alberto dos Santos


Consultor Legislativo, advogado, Mestre em Administração e Doutor em
Ciências Sociais. Professor Colaborador da FGV-EBAPE; Colaborador do Diap;
Sócio da Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas.

10
INTRODUÇÃO

A originalidade desta obra está em abordar de forma sistema-


tizada as três principais dimensões da atuação do profis-
sional de Relações Institucionais e Governamentais (RIG): 1) o
monitoramento do Poder Legislativo ou o trabalho parlamentar;
2) a defesa de interesses perante os poderes públicos; e 3) a
análise política e de conjuntura, que dá suporte à compreensão
das duas dimensões anteriores.
Na sociedade moderna, a atividade de RIG apresenta-se
como uma necessidade de pessoas e instituições (entidades, em-
presas, organizações não-governamentais – ONGs, movimentos
sociais etc.), que buscam, de um lado prestar esclarecimentos,
promover causas e defender pleitos e interesses perante as ins-
tituições públicas e os poderes da República, e, de outro, criar
capital social1, contribuir para a melhoria da qualidade do pro-
cesso decisório e credenciar-se como interlocutoras dos agentes
políticos decisores em temas de seu interesse, equiparando-se
aos concorrentes da dinâmica social e política em termos de
acesso às autoridades.
O trabalho de relacionamento com o Poder Executivo e o
Congresso Nacional, além disso, impõe-se como forma de mode-
rar os poderes do Estado, que, por intermédio das instituições de
governo, exerce os seguintes poderes sob a forma de monopólios2:

1
O conceito de capital social foi desenvolvido a partir dos trabalhos de Robert Putnam, para o qual
“capital social refere-se a aspectos da organização social, tais como redes, normas e confiança que facilita
coordenação e cooperação para benefícios mútuos. Capital social aumenta os benefícios de investimento
em capital físico e capital humano” (PUTNAM, Robert. Comunidade e Democracia. A Experiência da Itália
Moderna. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1996, p. 1).
2
Ver tópico 7.1. do Capítulo II deste livro (p. 153).

11
RIG em três dimensões

1) de impor conduta e punir seu descumprimento (poder coerci-


tivo); 2) de fazer leis obrigatórias para todos (poder de legislar);
e 3) de instituir e cobrar tributos ou arrecadar compulsoriamente
o excedente econômico da sociedade (poder de tributar).
Entretanto, para articular, defender e representar interesses
institucionais e corporativos perante os entes públicos, os pro-
fissionais de RIG, além de seguirem princípios éticos e morais,
precisam ter domínio sobre os quatro componentes comuns das
políticas públicas: 1) o institucional (autoridade formal); 2) o de-
cisório (escolha política); 3) o comportamental (ação ou inação);
e 4) o causal (efeitos sobre o sistema político)3.
No exercício da atividade de RIG, é preciso observar as boas
práticas e respeitar as diretrizes constitucionais e legais, além
de contar com profissionais bem formados e qualificados, que
tenham domínio sobre as regras, os procedimentos, as estruturas
e os atores que conduzem o processo decisório no âmbito dos
Poderes Executivo e Legislativo, mas que também saibam analisar
a conjuntura ou o ambiente político, uma etapa indispensável
para a montagem de cenários e estratégias.
Neste livro, sob a forma de Capítulos, serão apresentadas
as ferramentas para abordagem de três dimensões das atividades
de Relações Institucionais e Governamentais.
O primeiro Capítulo tem por objetivo principal apresentar
instrumentos para a capacitação de profissionais de relações
institucionais e governamentais e representantes de interesses
para o trabalho parlamentar, com dados, informações e análises
sobre o funcionamento, o papel e a missão do Poder Legislativo,
3
Ver Rua e Romanini (2013).

12
RIG em três dimensões

além de apontar ferramentas e estratégias de acompanhamento


do processo decisório no Congresso Nacional.
O segundo Capítulo, por sua vez, apresenta os elementos
para a formação de quadros para a defesa de interesses perante
os poderes públicos, proporcionando uma visão abrangente do
funcionamento do governo federal e de suas instituições, incluin-
do agências reguladoras, além de dicas, análises e informações
sobre o processo decisório, suas regras e atores centrais.
O terceiro Capítulo destina-se a orientar o profissional de
RIG a fazer análise de conjuntura ou análise política, apresen-
tando ferramentas e métodos que contribuam para compreender
a realidade, identificar os interesses em jogo, montar um mapa
de correlação de forças econômicas, políticas e sociais e definir
táticas e estratégias de intervenção na realidade. Essa dimen-
são do trabalho de RIG tanto pode ser uma atividade específica
ou exclusiva para os seus profissionais, quanto pode servir de
suporte ao desempenho das duas outras dimensões: o trabalho
parlamentar e a defesa de interesses perante os poderes públicos.
O quarto Capítulo, por fim, traz uma síntese com as prin-
cipais conclusões e recomendações sobre a atividade de RIG no
Brasil, que começa a ser percebida como fundamental para a
interação sadia entre os agentes econômicos e sociais e o Esta-
do, contribuindo para o aperfeiçoamento das políticas públicas.
Com esse know-how4 (saber-fazer), o profissional de RIG
poderá empregá-lo nas três dimensões do processo político: na
polity (instituições políticas ou estruturas do sistema político),

4
Conhecimento de normas, métodos e procedimentos em atividades profissionais, especialmente as que
exigem formação técnica ou científica.

13
RIG em três dimensões

na politics (processos políticos ou de negociação e barganha que


ocorrem dentro do sistema político, entre partidos, poderes, bu-
rocracia, governo, etc) e na policy (dimensão material e concreta
do sistema político, que são os resultados ou os conteúdos das
políticas públicas).
O processo decisório no âmbito dos poderes é muito com-
plexo e seu desfecho, em geral, é muito mais produto da negocia-
ção, das disputas internas (ideológica, política ou orçamentária
etc.), da pressão externa e da correlação de forças do que da
ação puramente racional, como sugere o senso comum. Ele é
influenciado, no caso brasileiro, por: prestígio pessoal; reputa-
ção; políticas clientelísticas; cooptação/captura; corporativismo;
economistas, administradores e técnicos/burocratas; repercussão
na mídia; e imediatismo eleitoral.
Em política não existe solução ideal em nenhuma das
arenas: distributiva, redistributiva, regulatória e constitutiva.
O que é solução para um pode ser problema para o outro. Por
exemplo, o aumento do valor do combustível é solução para a
Petrobras, mas é problema para o transportador ou proprietário
de veículo. Portanto, a negociação política, as pressões sociais, as
mobilizações e as correlações de forças, assim como os esclare-
cimentos técnicos e especializados, são elementos fundamentais
para reduzir o conflito, facilitar acordos, viabilizar o desejo das
maiorias ou mesmo o consenso.
Registre-se, ainda, que este livro, além de ampla bibliogra-
fia de outros especialistas, resume, sistematiza e atualiza dados,
informações e análises de outras publicações do autor, dentre
as quais: “Por dentro do processo decisório: como se fazem as

14
RIG em três dimensões

leis (2006); “Por dentro do Governo: como funciona a máquina


pública” (2009); “Poder Legislativo: como é organizado, o que
faz e como funciona” (2014); “Relações Institucionais e Gover-
namentais: o que é, como e onde se faz” (2015); “Análise de
Conjuntura: como e por que fazê-la” (2015); e “Políticas Públicas
e Ciclo Orçamentário” (2016), todas editadas pelo Departamento
Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP).
Embora este estudo esteja focado no trabalho de RIG no
âmbito do Poder Executivo Federal e do Congresso Nacional,
mediante a organização e a sistematização das ferramentas
aqui apresentadas para cada uma das citadas dimensões, pode
ser estendido para o trabalho nessas respectivas instâncias dos
Estados e dos Municípios.

15
CAPÍTULO I

TRABALHO
PARLAMENTAR
RIG em três dimensões

E ste Capítulo sobre o trabalho parlamentar conta com duas


Seções: uma apresenta conceitos sobre as diversas atividades
e formas de atuação no campo institucional, e a outra trata da
estrutura institucional, dos requisitos e das regras de atuação e
abordagem no âmbito do Poder Legislativo.
Assim, a primeira Seção traz uma visão geral e sistêmica
das diferentes modalidades de monitoramento e de influência
no trabalho parlamentar e a segunda Seção detalha o lócus de
atuação, as regras institucionais de tomada de decisão5 no âmbito
do Poder Legislativo, bem como o papel dos atores/decisores e
as formas de abordagem.
O termo instituição possui vários significados que vão desde
normas, leis, comportamentos e até organizações, públicas e
privadas. Seja qual for seu sentido, as instituições foram criadas
para reduzir custos de transação, mediante regras, procedimentos
e comportamentos esperados e aceitos como referências mais
estáveis e mais sólidas.
Segundo a definição de Polsby (1968), uma organização
possui sentido de instituição quando: 1) seu escopo de atuação
é relativamente bem delimitado; 2) seus membros são facil-
mente identificáveis; 3) é relativamente difícil tornar-se membro
dela; e 4) seus líderes são recrutados principalmente dentro da
organização.
De acordo com North (1990, p. 97), no sentido de normas
e comportamentos, as instituições são restrições humanamente
concebidas que estruturam a interação política, econômica e

5
A tomada de decisão é o processo por meio do qual se realiza a escolha entre alternativas ou formas de
resolver diferentes situações.

19
RIG em três dimensões

social, e que consistem tanto em restrições informais (sanções,


tabus, costumes, tradições e códigos de conduta), quanto em
regras formais (constituições, leis, direitos de propriedade), e
foram concebidas ao longo da história para criar ordem e reduzir
a incerteza. Na mesma linha, Almeida (2018, p. 30) afirma que
as instituições, com suas regras e normas, “moldam o comporta-
mento humano, tanto do ponto de vista das decisões e do cálculo
racional, como dos sentimentos e preferências”.
Aqui sempre que se mencionar a palavra instituição ela será
devidamente contextualizada, para que se saiba exatamente em
que sentido está sendo empregada.

20
SEÇÃO 1

AS FORMAS DE ATUAÇÃO
NO CAMPO INSTITUCIONAL

N esta Seção, apresentamos conceitos e formas de atuação


indispensáveis aos profissionais de relações institucionais
e governamentais e aos representantes de grupos de pressão,
dentre os quais: 1) os conceitos de: a) lobby; b) relações insti-
tucionais e governamentais; e c) advocacy; 2) a importância da
representação de interesse; 3) a legitimidade e legalidade dos
grupos de pressão; 4) o que são e como atuam os grupos de
interesse; 5) as frentes parlamentares ou bancadas informais; 6)
o poder do governo como grupo de pressão; 7) a ética na atu-
ação das diversas formas de representação, especialmente dos
grupos de pressão; e 8) as condições para o êxito no exercício
da influência.
No interior do Poder Legislativo existem atores institucio-
nais e não-institucionais. No primeiro grupo, estão os partidos
políticos, os blocos parlamentares e as lideranças dos partidos,
do governo, da maioria, da minoria e da oposição, que parti-
cipam efetivamente do processo decisório no âmbito do Poder
Legislativo. No segundo estão os grupos de pressão, as bancadas
suprapartidárias, também conhecidas como bancadas informais
ou frentes parlamentares, que articulam interesses e influenciam,
mas não tomam parte formalmente nas decisões. As frentes
podem ser apenas de deputados ou mistas (deputados e sena-

21
RIG em três dimensões

dores). Para serem formalizadas e poderem utilizar os espaços


físicos das Casas do Congresso Nacional, precisam contar com
assinatura de um terço dos parlamentares.
Conhecer os conceitos e instrumentos de atuação dos grupos
de pressão e outras formas de interação e abordagem, como lobby
e advocacy, proporciona aos profissionais de relações institucio-
nais e representantes de interesses uma visão ampla sobre essas
modalidades de influência perante as autoridades dos poderes da
República, em geral, e do Poder Legislativo, em particular.

1. Conceitos fundamentais
Inicialmente apresentamos os três principais conceitos das
ferramentas de atuação na representação de interesses: o lobby,
a atividade de RIG e a advocacy.

1.1. Lobby – o que é e o que faz


O instrumento ou meio mais utilizado pelas diversas formas
de influência junto às autoridades, em geral, e ao Parlamento, em
particular, é o lobby ou o processo de persuasão das autoridades.
Lobby pode ser definido como o processo ou instrumento
por meio do qual, valendo-se de técnicas e pessoas especiali-
zadas, as empresas ou os grupos de pressão fazem chegar ao
tomador de decisões seus pleitos, desejos ou reivindicações.
Ou, nas palavras de Galan (2012, p. 21), “o processo pelo qual
empresas, indivíduos, grupos ou associações tentam influenciar
as políticas públicas, as decisões governamentais, a legislação
e a regulação”.

22
RIG em três dimensões

O papel da comunicação, escrita e oral, é fundamental


na atividade de lobby, porquanto sua missão principal é ter
acesso e dialogar com os agentes públicos com o objetivo de
influenciar os processos públicos em favor de seus pleitos e
reivindicações.
A atividade de lobby pressupõe convencer, agir, atuar e fazer
corpo a corpo para buscar o convencimento dos tomadores de
decisão ou da opinião pública, ou seja, representar e substituir
o interessado (pessoa física ou jurídica) na relação com os go-
vernantes ou formadores de opinião.
O lobby, portanto, consiste na atuação direta de convenci-
mento dos formuladores de políticas públicas. E nessa perspec-
tiva – como uma ferramenta ou instrumento – é neutro porque
tanto pode ser utilizado para que agentes privados se apropriem
de benefícios públicos, quanto para tornar políticas públicas mais
eficazes e eficientes.
Segundo Oliveira (2004)6, são quatro os tipos de lobby,
que são representados pelos seguintes profissionais, entidades,
departamentos ou escritórios especializados: 1) o lobby público,
articulado pela assessoria de assuntos parlamentares ou pelo
setor de comunicação social dos Ministérios; 2) o lobby institu-
cional, gerenciado por executivos de relações governamentais,
alocados em departamentos ou diretorias de assuntos corpora-
tivos/institucionais das empresas; 3) o lobby classista, praticado
por entidades de classe; e 4) o lobby privado, executado por
escritório de lobby e consultorias.

6
Lobby e Representação de Interesses: lobistas e seu impacto na representação de interesse no Brasil. Tese
de Doutorado. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas – IFCH, Universidade de Campinas, 2004.

23
RIG em três dimensões

O lobby, então, é uma atividade ou processo de convenci-


mento pelo qual os grupos de pressão, as pessoas, as organiza-
ções da sociedade defendem interesses, inclusive causas trans-
versais7. É também o meio pelo qual as pessoas, as entidades ou
empresas buscam participar do processo estatal de tomada de
decisões, contribuindo para a elaboração das políticas públicas.
As atividades de lobby, tal como as de relações institucio-
nais e governamentais, segundo Oliveira8, incluem: 1) coleta de
informações; 2) propostas políticas; 3) estratégias apropriadas
para dar suporte às demandas; 4) realização de pesquisas; e 5)
procura por aliados.
Assim, o lobby deve ser entendido pelos fins pretendidos
e pelos meios empregados.
No Brasil, a palavra lobby é estigmatizada e por isso os grupos
de pressão, as empresas e as entidades têm preferido se apresen-
tar sob a denominação de atividade de Relações Institucionais e
Governamentais (RIG), uma denominação que foi reconhecida
na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), do Ministério do
Trabalho (CBO) em 2018, conforme detalhado no próximo tópico.

1.2. Atividade de Relações Institucionais e


Governamentais – o que é e o que faz
Conceitualmente, a atividade de relações institucionais
e governamentais (RIG) consiste no esforço de organização, de
gerenciamento e de educação e comunicação voltado para:

7
Exemplo: mulheres, meio ambiente, indígenas, saúde, etc.
8
O Lobbying institucional no Brasil: canal de comunicação entre Estado e sociedade civil? Cenários de
Comunicação, São Paulo, Vl. 6, nº 1, p. 57-64, 2007.

24
RIG em três dimensões

1) promover interação de instituições, ONGs, empresas ou


grupos e setores organizados da sociedade com o governo e com
o Congresso Nacional;
2) monitorar os atos e ações dos entes governamentais e
das instituições do Estado;
3) desenvolver estratégias de atuação política;
4) produzir, organizar, sistematizar e difundir informações
para subsidiar o processo de tomada de decisão, em defesa dos
interesses dos seus representados;
5) promover a defesa de interesses e articular a promo-
ção de causas e/ou defesa de pleitos perante os poderes e seus
agentes;
6) construir canais de interlocução confiáveis entre os
agentes de governo e as organizações da sociedade; e
7) ampliar a previsibilidade e minimizar os conflitos.
Consciente da importância e da necessidade da intera-
ção entre governo, sociedade e mercado, o então Ministério
do Trabalho e Emprego, em fevereiro de 2018, reconheceu a
atividade de representação de interesses como uma ocupa-
ção formal, incluindo a atividade de relações institucionais
e governamentais na Classificação Brasileira de Ocupações
(CBO), sob o código 1423-45, com as denominações de
“defesa de interesses (relações governamentais)”, “profissio-
nais de relações institucionais” e “profissionais de relações
governamentais”.
De acordo com a descrição da CBO, são competências
desses profissionais atuar em processos de decisão política para:

25
RIG em três dimensões

1) analisar impacto normativo;


2) analisar risco regulatório/normativo;
3) defender os interesses do representado no processo
decisório;
4) elaborar estratégia de relações governamentais;
5) elaborar peças e documentos para fundamentar defesa;
6) elaborar perfil de tomador de decisão, influenciadores
e interessados;
7) elaborar perfis (parlamentares e autoridades);
8) estabelecer estratégia de relação governamental;
9) gerir riscos regulatórios/normativos;
10) informar ao interessado sobre a agenda de trabalho
dos órgãos envolvidos;
11) mapear processo de decisão;
12) monitorar ações governamentais (Executivo, Legislativo
e Judiciário) com potencial impacto setorial e institucional;
13) organizar agenda de reuniões e de trabalho dos órgãos
envolvidos no processo de decisão política;
14) participar da formulação de políticas públicas;
15) planejar ação de mitigação de risco regulatório/nor-
mativo;
16) solicitar notas técnicas às áreas competentes; e
17) sugerir proposições legislativas/normativas; dentre
outras.

26
RIG em três dimensões

Trata-se, portanto, de uma atividade que envolve inteligên-


cia, organização e aconselhamento sobre ações estratégicas para
atingir objetivos, mas também inclui monitoramento e interação
com agentes públicos e privados. O profissional de RIG não é
apenas um despachante, que lida com trâmites burocráticos
junto à Administração Pública. É sobretudo um conselheiro e
um intérprete da realidade política e do conteúdo das políticas
públicas.
Cidade (2022), em texto sob o título “Profissional de RIG,
o Intérprete9”, resume com clareza o trabalho do profissional de
relações instituições e governamentais. Para ele:
O profissional de RIG é sobretudo um intérprete da informação, que
opera em duas direções, em uma espécie de “via de mão dupla” da
informação.
Na primeira direção, em decorrência do monitoramento de ambientes
específicos, identifica e interpreta para seus clientes o que e como
o legislador, o regulador ou o formulador de Políticas Públicas está
pretendendo disciplinar.
E, na outra direção, quando tem o objetivo de influenciar aquelas
legislações, regulamentos ou políticas públicas, traduz para os
decisores, utilizando informações técnicas, econômicas, sociais e
jurídicas, os efeitos daquelas Normas ou Políticas sobre as atividades
de seus clientes.

Em geral, as sociedades capitalistas têm características


e estruturas de poder estáveis, como o mercado (economia),
o Estado (governo), e a sociedade civil (as classes sociais)
que, embora duradouras, passam por momentos e ciclos de
transformações dependendo das relações, de disputas de
poder entre os agentes, das contradições e dos problemas
próprios da conjuntura.
9
A informação e o profissional de RIG | by Profissão RelGov | Medium.

27
RIG em três dimensões

Nessa perspectiva, as atividades de relações institucionais


e governamentais são indispensáveis ao equilíbrio da interação
entre os três setores do sistema social (1º Estado, 2º Mercado10
e 3º Sociedade Civil). Eles interagem, disputam poder e se fis-
calizam reciprocamente, à semelhança do sistema de freios e
contrapesos próprio da divisão das funções dos poderes - um
moderando ou controlando os excessos dos outros.
É fundamental que no processo de formulação de políticas
públicas exista interlocução, diálogo e pressão para que os inte-
resses da sociedade civil e do mercado sejam considerados nas
decisões de governo, inclusive como forma de validar e legitimar
determinadas políticas públicas e ajustá-las ao interesse púbico,
e não apenas aos interesses do próprio Estado e seus agentes.
Afinal, conforme Spiller (2008), “políticas públicas emergem de
um processo de tomada de decisão que envolve uma multiplicida-
de de atores políticos que interagem numa variedade de arenas.”
Além das denominações já mencionadas, tem sido comum
a prática da advocacy, um tipo de atuação presente em muitos
países, inclusive no Brasil.

1.3. Advocacy – o que é e no que consiste


Em um sentido mais amplo, a advocacy refere-se à cons-
trução de uma estratégia de argumentação com o objetivo de
defender uma causa, podendo, assim, ser exercida por qualquer
grupo de pressão. A advocacy, nessa perspectiva, é também uma
estratégia de argumentação que é utilizada quando se faz lobby.
A advocacy envolve identificar, adotar e promover uma
10
Mercado aqui é entidade na perspectiva do interesse do capital.

28
RIG em três dimensões

causa, sempre buscando influenciar decisões a favor do interesse


difuso ou coletivo patrocinado. Em geral, consiste numa ação
propositiva, oferecendo uma alternativa ou curso de ação, e não
apenas a oposição a uma eventual decisão.
É, em sentido mais restrito, uma atividade que consiste em
advogar a defesa de interesses difusos11, em geral, por intermédio
de Organizações Não-Governamentais (ONG)12.
A advocacy serve para dar voz política a causas huma-
nitárias, educacionais, ambientais ou a grupos excluídos ou
sub-representados no sistema político, como mulheres, indíge-
nas, negros, portadores de doenças incuráveis ou submetidos à
condição degradante de vida ou de trabalho.
Nesse sentido, a advocacy, como regra, não endossa nem
se opõe a uma legislação específica, mas busca informar à
sociedade como um todo sobre como uma decisão de política
pública pode afetar seus interesses. Entretanto, há exceção, pois
há situações em que setores econômicos fazem uso da advocacy,
a exemplo de grandes empresas do setor de fármacos, que se
utilizam de associações de pacientes para fazer lobby em favor
de determinado medicamento ou para algumas alterações em
marcos legais e regulatórios.
É comum, em países desenvolvidos, as pessoas doarem
recursos para a defesa ou a promoção de causas com as quais
tenham interesse ou identidade, sem participar da organização
de advocacy.
11
Entende-se por interesse ou direito difuso aquele cujo titular do direito é indeterminado.
12
As ONGs são entidades da sociedade civil, geralmente sem corpo social, geridas por pequeno grupo de
profissionais, como os movimentos de mulheres (Cfemea - Centro Feminista de Estudos e Assessoria); de
direitos humanos (Inesc - Instituto de Estudos Socioeconômicos e Ibase - Instituto Brasileiro de Análises
Sociais e Econômicas) e de indígenas (Cimi - Conselho Indigenista Missionário), dentre outros.

29
RIG em três dimensões

A advocacy, portanto, é uma estratégia de construção de


narrativa voltada para a promoção do bem público e de grandes
causas sociais.
Operacionalmente, a advocacy, em geral, se organiza por
intermédio de ONGs, e segue mais ou menos os passos abaixo,
que são praticamente iguais aos empregados nas atividades de
lobby e de relações institucionais e governamentais. O roteiro a
seguir foi reproduzido pela Ágere Cooperação em Advocacy13:
l identificação do problema
l definição do objetivo
l análise da situação
l identificação de atores sociais
l investigação e documentação
l escolha de método
l planejamento de atividades
l alianças
l execução
l monitoramento
l ajustes
l avaliação
No tópico a seguir, chamamos a atenção para a importância
da representação de interesses, um fenômeno cada vez mais
presente nas sociedades democráticas modernas.

13
Em “Oficina de Advocacy”, roteiro indicado no documento “Abrindo caminho para a infância: influência
política, um fator chave”, da Save the Children, fevereiro, 2011.

30
RIG em três dimensões

2. A importância da representação
de interesses
Em todas as democracias, as pessoas físicas e/ou jurídicas
se organizam sob diversas formas para, legitimamente, represen-
tar e defender seus interesses perante os poderes constituídos.
As instituições do Estado, nas democracias, são responsáveis
pela formulação de políticas públicas, pela mediação e resolução
de conflitos econômicos, políticos e sociais, além de articular
interesses.
A representação de interesses tem como escopo promover
o diálogo entre associações, empresas e instituições da so-
ciedade civil com autoridades do Poder Público (governantes,
parlamentares e altos burocratas) e oferecer dados, análises e
informações para que os agentes públicos decisores estejam bem
informados sobre os impactos – positivos ou negativos – que as
políticas públicas em debate ou em formulação possam ter sobre
determinados setores, segmentos e grupos sociais específicos.
Objetiva-se, assim, que o processo decisório seja o mais bem
estruturado e que sejam tomadas as melhores decisões possíveis
em prol da sociedade.
Segundo Santos (2015), os grupos de interesse atuam,
precipuamente, na articulação e agregação de interesses. Os
grupos de interesse complementam e suplementam a atuação
dos partidos políticos, podendo, porém, exercer influência sobre o
processo decisório – momento em que passam a ser considerados
como grupos de pressão14. De acordo com Farhat (2007, p. 195),
14
Ver SANTOS, L. A. dos. Regulamentação das atividades de lobby e seu impacto sobre as relações entre
políticos, burocratas e grupos de interesse no ciclo de políticas públicas – análise comparativa dos Estados
Unidos e Brasil. Tese de Doutorado apresentada ao CEPPAC/UNB em 2008. Brasília: Senado Federal, 2015.
909 p. (Coleção de teses, dissertações e monografias de servidores do Senado Federal).

31
RIG em três dimensões

a participação dos grupos de interesses e de pressão no processo


decisório (nacional, regional ou local) pressupõe cinco condições:
1) motivação; 2) informação; 3) avaliação; 4) organização; e 5)
disposição para agir.
Da parte do Poder Executivo (que aqui também será
tratado como governo) e do Parlamento, a interação com a
sociedade é uma necessidade essencial no processo de formu-
lação de políticas públicas nas arenas distributiva, redistribu-
tiva, regulatória e constitutiva. Isso é especialmente verdade,
principalmente para discussão de propostas e apresentação
de alertas sobre riscos de omissão, de excessos e/ou lacunas
e de erros que podem ser preventivamente equacionados com
o acompanhamento mais permanente por parte dos agentes
econômicos e sociais. O Estado e o governo não são autossu-
ficientes e, sem o controle social, tendem a decidir de forma
tecnocrática e até mesmo autoritária.
Registre-se que a “escuta” ou a interação entre agentes
públicos e privados segue protocolos, que incluem não apenas
a divulgação da agenda, dentro da lógica da publicidade e da
transparência, mas também a recomendação/determinação de
que o agente público que participar da audiência deverá, sempre
que possível, estar acompanhado de, no mínimo, outro agente
público do Poder Executivo Federal, conforme o art. 16 do De-
creto 10.889, de 9 de dezembro de 2021.
As políticas públicas traduzem a ideia de valor, de alocação
de recursos ou de benefícios para localidades, indivíduos ou
grupos, mas também regulam a relação entre pessoas e entre
estas e as instituições públicas e privadas, por isso devem estar
sujeitas à ação dos grupos de pressão e do controle social.

32
RIG em três dimensões

Para Souza (2007, p. 69), a política pública pode ser definida


como o campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo,
colocar o “governo em ação” e/ou analisar essa ação (variável in-
dependente) e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou
curso dessa ação (variável dependente). A formulação de políticas
públicas constitui-se no estágio em que governos democráticos
traduzem seus propósitos e plataformas eleitorais em programas
e ações, que produzirão resultados ou mudança no mundo real.
Nesse sentido, a literatura sobre políticas públicas dá conta
da existência de quatro tipos de arenas de políticas públicas,
sendo que duas concentram a oferta de bens e serviços à popu-
lação (distributivas e redistributivas) e duas regulam ou definem
as relações entre os atores sociais (regulatórias e constitutivas
ou estruturais), conforme detalhado no Capítulo II, Tópico 6,
desta publicação.
Desse modo, conhecer as diversas dimensões das políticas
públicas, assim como os fatores de influência em sua formulação,
é fundamental para o seu acompanhamento nas diferentes fases
do processo legislativo e decisório junto ao Poder Legislativo.
O governo e o Parlamento, em suas funções, interagem com a
sociedade (indivíduos, empresas, entidades, ONGs) e, por isso,
o contato com os grupos de pressão e com os representantes de
interesses é natural. Nenhuma autoridade (deputado, senador,
ministro, governador, presidente etc) ou seus assessores têm
conhecimento aprofundado sobre todos os assuntos e acesso a
todos os dados relativos aos temas sobre os quais devem de-
cidir. É através do relacionamento com os grupos de interesse
que se informarão, pelo menos parcialmente, do conteúdo das
temáticas em jogo.

33
RIG em três dimensões

Herbert Simon, nos anos 1950, desenvolveu a teoria da


“Racionalidade Limitada”, que explica esse fato. Segundo Simon,
a tomada de decisão é o processo por meio do qual se realiza a
escolha entre alternativas ou formas de resolver diferentes situa-
ções. Contudo, para ele, a “racionalidade humana está limitada.
Devido a limitações em seus conhecimentos e em sua capacidade
de processamento da informação, o ser humano busca níveis de
conformidade em lugar de maximizar utilidades” (Simon, 1957).
Assim, afirma Simon, a racionalidade dos decisores pú-
blicos, como a de qualquer outro agente, é sempre limitada
por problemas tais como informação incompleta ou imperfeita,
tempo restrito para a tomada de decisão, autointeresse dos
decisores, etc. Mas pode ser maximizada até um ponto satisfa-
tório pela criação de estruturas (conjunto de regras e incentivos)
que enquadrem o comportamento dos atores e modelem esse
comportamento na direção de resultados desejados, impedindo,
inclusive, a busca de maximização de interesses próprios15.
No Brasil, assim como nas demais democracias, é cada vez
mais necessária a participação da sociedade civil na formulação
das políticas públicas, por meio de grupos de pressão, de frentes
parlamentares ou das bancadas informais, de atividade de lobby,
de relações institucionais e governamentais, de relações públicas
e de advocacy ou mediante consultas públicas, iniciativa popular
e de participação em órgãos colegiados, conferências temáticas
e grupos de trabalho, dentre outros.
A mediação, a intermediação ou até o exercício de influência
no plano coletivo tanto podem ser exercidos por grupos de inte-
15
SIMON, Herbert A. Models of Man, Social and Rational: Mathematical Essays on Rational Human Behavior
in a Social Setting, New York: John Wiley and Sons, 1957.

34
RIG em três dimensões

resses/pressão, em suas diversas modalidades, quanto por partidos


políticos. Ambos são mecanismos que compartilham interesses ou
crenças e podem agir coletivamente e comunicar suas demandas ao
governo. Nessa perspectiva se complementam, porém, os partidos
possuem objetivos e dimensões distintos dos grupos de interesses/
pressão, indo além da defesa de pleitos, reivindicações e anseios
de segmentos específicos da sociedade organizada.
Assim, diferentemente dos partidos políticos, essas moda-
lidades de atuação e influência, não visam a conquista do poder
ou a substituição dos agentes públicos, mas somente influenciar
o processo decisório. Deste modo, mesmo não fazendo parte for-
mal ou institucional do sistema político, os grupos de interesses/
pressão participam, fiscalizam e ajudam no controle social dos
atos governamentais.
Segundo Frade (1996)16, os partidos políticos dispõem
de três funções exclusivas: 1) disputar diretamente o poder, 2)
expressar a democracia, e 3) gerir o Estado. E passaram a dividir
com outras organizações da sociedade civil ações que exerciam
com preponderância no passado, tais como: a transmissão
de questionamentos políticos; a mediação entre sociedade e
governo; o recrutamento político; a participação política; e a
integração social.
Para Thomas (2004), os partidos políticos devem ser vistos
como “uma coleção de grupos de interesses que se alimenta da
energia desses grupos e movimentos, com o objetivo de ganhar
as eleições e assumir o controle do Governo”.
16
Dissertação de mestrado, defendida na UnB, com o título “Bancadas Suprapartidárias no Congresso
Nacional Brasileiro 1995-1996”. Essas três funções, citadas pela autora, foram apontadas como privativas
dos partidos políticos por Gianfranco Pasquino no “Dicionário de Política”.

35
RIG em três dimensões

De fato, os grupos de interesses/pressão possuem um es-


copo amplo de atuação, podendo contribuir ou influenciar em
várias dimensões. Por exemplo, 1) na relação com o governo,
podem: a) contribuir com informação técnica ou política na for-
mulação e gestão de políticas públicas; b) facilitar o processo de
barganha e compromissos políticos; c) ajudar na implementação
de políticas públicas; 2) na educação política, podem: a) ajudar
a educação de seus membros e capacitá-los a participar mais
ativamente da vida pública e exercer papel de liderança política,
empoderando-os perante a sociedade e o governo; 3) no recru-
tamento político, tanto podem contribuir com o recrutamento de
candidatos a cargos políticos, quanto com recrutamento diverso;
4) nas campanhas eleitorais, podem: a) ajudar indicando fonte
de financiamento de campanha e suporte eleitoral a partidos;
e b) ser fonte de recursos financeiros e humanos no processo
eleitoral, etc.
O objetivo dessas formas de influência, representação ou
intermediação de interesses é ter acesso aos centros de poder
para obter decisões favoráveis ou bloquear decisões desfavoráveis
aos interesses representados nos três níveis de governo (federal,
estadual e municipal) e nos três poderes e órgãos (Executivo,
inclusive agências reguladoras, Legislativo, Judiciário e Ministério
Público).
Nessa perspectiva, o exercício da influência pode contribuir
para amenizar as externalidades17 desfavoráveis, ajustando as
decisões de modo a distribuir os seus ônus de forma mais equi-

17
Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), do ponto de vista
econômico, externalidades referem-se a “situações em que o efeito da produção ou consumo de bens e
serviços impõe custos ou benefícios a terceiros que não se refletem nos preços cobrados pelos bens e serviços
que estão sendo fornecidos”, ou são “mudanças na condição ou circunstâncias das unidades institucionais

36
RIG em três dimensões

librada entre os diferentes setores afetados. O trabalho de RIG


pode ajudar o governo a ver efeitos negativos (externalidades)
que deveriam ser traduzidos em medidas para sua atenuação.
Um bom exemplo disto é o conceito de poluidor-pagador, quem
mais polui tem que pagar mais por isso.
Trata-se, portanto, de trabalho de convencimento e persu-
asão, que consiste em oferecer dados, informações e análises
como elemento de convicção em favor de pleitos, reivindicações
e anseios de grupos sociais afetados por políticas públicas, além
de ampliar as alternativas de ação de autoridades e/ou tomadores
de decisão no Estado.
Serve, ainda, para se contrapor com dados e informações
às propostas que possam prejudicar seus interesses, auxiliando
os decisores a avaliar com maior amplitude os impactos das
políticas públicas.
Os grupos ou segmentos que não se organizam para defen-
der seus interesses podem ser prejudicados, já que as decisões
políticas são produto de negociação, de pressão e de correlação
de forças. Os concorrentes e/ou adversários podem atuar junto
aos decisores, por isso a importância e a necessidade da organi-
zação e da participação de interessados em determinadas causas.
A representação de interesses, especialmente por meio
do trabalho de RIG, é uma realidade nos países democráticos,
legal e legitimamente praticada, inclusive com amparo em
nível constitucional e infraconstitucional. No Brasil, entretan-
to, há uma enorme confusão entre lobby e atividade ilícita,

causadas pelas ações econômicas de outras unidades sem o consentimento das primeiras”. Ou seja: as
externalidades, que podem ser positivas ou negativas, surgem quando a ação de um agente, no mercado,
afeta a situação de outros agentes, sem o seu consentimento ou concordância.

37
RIG em três dimensões

quando o lobby é uma atividade lícita, regulamentada em


vários países, que consiste em aplicar técnicas de persuasão
e convencimento de agentes públicos na tomada de decisão.
Sua regulamentação poderá contribuir para o aperfeiçoamento
dessa atividade ao determinar ou exigir comportamento ético
tanto do agente público quanto dos profissionais que atuam
na defesa de interesses.
O trabalho de convencimento e persuasão, exercido nas
diversas modalidades, deve ter sempre a ética como guia fun-
damental.

3. Legitimidade e a legalidade
dos grupos de pressão
A legitimidade da atuação dos grupos de interesses e de pres-
são está associada ao conceito de democracia, na medida em que
não existiria esse sistema político sem a atuação de grupos organi-
zados da sociedade com a finalidade de acompanhar, fiscalizar ou
colaborar com as decisões governamentais e parlamentares, visto
que “os justos poderes dos governos derivam do consentimento dos
governados”, conforme as palavras aqui incorporadas da Declaração
de Independência dos EUA, de 177618.
A legalidade e constitucionalidade, por sua vez, estão as-
sentadas em nível constitucional, especialmente no art. 5º da
Constituição Federal, que assegura, dentro do Estado Democrá-
tico de Direito, o pluralismo político, a liberdade de expressão e
o direito de petição, princípios que dão base legal e legitimam
a interlocução entre a sociedade e o governo.
18
http://www.uel.br/pessoal/jneto/gradua/historia/recdida/declaraindepeEUAHISJNeto.pdf.

38
RIG em três dimensões

O exercício legítimo e legal dessa atividade está assegurado


e amparado nos direitos: 1) à liberdade de manifestação; 2) à
liberdade de expressão e de comunicação; 3) à liberdade de reu-
nião; 4) à liberdade de associação para fins lícitos; 5) ao acesso
à informação pública de interesse particular, coletivo ou geral;
e 6) de petição aos poderes públicos, em defesa de interesses e
direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder, inclusive como
substituto processual, no caso de entidades sindicais.
Para melhor conhecimento do tema, apresenta-se, a se-
guir, os principais conceitos e formas de atuação dos grupos de
pressão.

4. Grupos de interesses e grupos de


pressão – o que são e como atuam
Os grupos de interesses e os grupos de pressão não são
necessariamente sinônimos. Ainda que ambos dependam de um
interesse comum, os grupos de interesses só se transformam
em grupo de pressão quando entram em ação, ou seja, quando
passam da etapa de mera articulação de interesses para a etapa
de busca de influência sobre o processo decisório, interagindo
com o sistema político, o que caracteriza esse tipo de grupo.
Segundo Arthur Bentley, em sua clássica obra "The Process
of Government: A Study of Social Pressures” 19, publicada original-
mente em 1908, “não há grupo sem seu interesse. Um interesse,
como o termo será usado neste livro, é o equivalente de um grupo
(…). O Grupo e o interesse não são separáveis” (Bentley, 1994,

19
BENTLEY, Arthur F. The Process of Government: A Study of Social Pressures. New Brunswick: Transaction
Publisher, 1994, 501 p.

39
RIG em três dimensões

p. 211). Sempre que existem interesses comuns entre pessoas


ou entre instituições, há de existir um grupo de interesses, mas
ele só se transforma em grupo de pressão quando estiver em
ação ou quando for atuar sobre autoridades ou decisores com
poder sobre o tema objeto de interesse.
Assim, os grupos de pressão, que podem ser permanen-
tes ou temporários, surgem, em geral, quando os interesses ou
valores de determinado segmento estão sendo ameaçados ou,
ao contrário, quando o ambiente é favorável à promoção desses
interesses ou valores. Eles nada mais são do que uma atuação
organizada.
Numa definição simplificada, grupos de pressão seriam
pessoas físicas ou jurídicas que, unidas por um interesse co-
mum, sem objetivo de gerir o poder político, buscam influenciar
as opções ou comportamentos das autoridades ou tomadores
de decisão.
Para Santos (2015, p. 164), grupos de pressão podem ser
definidos como “grupos de interesse que exercem uma pressão”,
ou seja, que passam da etapa de mera articulação de interesses
para a etapa da busca de influência sobre o processo decisório,
passando a sua atuação do sistema social para o sistema político.
Segundo Santos (2015, p. 173-174):
De uma forma muito sintética, e visando demonstrar as relações
entre os diferentes subconjuntos que integram a organização da
sociedade a partir da noção de grupo como elemento constitutivo,
poderíamos ilustrar a subdivisão dos conceitos esboçados neste
item da forma a seguir, partindo do mais abrangente ou mais amplo
para o menos abrangente ou mais específico.

40
RIG em três dimensões

Diagrama 1 – Lobbies, Grupos de Interesses e


Grupos de Pressão no contexto da Sociedade

Elaboração: Luiz Alberto dos Santos.

Nesse sentido, assim como os grupos de interesse são um


desdobramento da sociedade a partir dos grupos latentes ou
potenciais, os grupos de pressão seriam uma derivação daqueles,
enquanto os lobbies seriam os grupos de pressão que instrumentalizam
recursos de poder em busca de influência, mas sem se constituírem
em partidos políticos. Num sentido mais amplo, grupos de interesse
e grupos de pressão seriam, somente, interesses organizados, em
oposição aos não-organizados, no âmbito da sociedade, atuem ou não
sob essa forma.

Cumpre destacar que a literatura sobre os grupos de


pressão no Brasil ainda é escassa. Poucos autores, além do
autor deste livro, tentaram organizar e sistematizar as práticas
dos grupos de pressão. Dentre eles merecem menção: Murilo
Aragão (1996), em sua dissertação de mestrado, e Andréa
Cristina de Jesus Oliveira (2004), Luiz Alberto dos Santos

41
RIG em três dimensões

(2008) e Manoel Leonardo Santos (2011), em suas teses de


doutorado, e Wagner Pralon Mancuso (2004), no livro “O Lobby
da Indústria no Congresso Nacional. Empresariado e Política
no Brasil Contemporâneo”.
Os grupos de pressão, segundo Oliveira (2004), podem ser
classificados por: 1) origem de interesse; 2) interesse represen-
tado; 3) organização de interesses; ou 4) origem dos recursos
utilizados. Os interesses patrocinados, de acordo com Aragão
(1994), podem ser: 1) governamentais; 2) empresariais; 3) de
trabalhadores; 4) de profissionais liberais e feministas; ou 5)
de natureza diversa, como ambientalistas, religiosos, cívicos,
recreativos; entre outros.
Já a classificação por interesse, segundo Oliveira (2004),
pode se dar: 1) por origem, público ou estatal, a exemplo dos
assessores parlamentares ou os departamentos de comunicação
social dos órgãos da Administração Pública; 2) por representa-
ção institucional, como executivos de relações governamentais,
responsáveis pelos departamentos corporativos ou institucionais
das empresas; 3) por organização classista, entidades de classe
como sindicatos, associações profissionais ou econômicas, como
DIAP e CNI; e 4) por origem dos recursos utilizados, privado, a
exemplo de escritórios de lobby e consultorias.
Três elementos, em geral, estão presentes nos grupos de
pressão: 1) associação; 2) poder; e 3) grau de influência. O pri-
meiro elemento, a associação, expressa e corporifica o esforço em
desenvolver e usar o poder social de maneira organizada. O segundo
elemento, o poder, representa a autoridade outorgada pelos filiados,
para o exercício da capacidade de organizar o grupo. E, por sua

42
RIG em três dimensões

vez, o terceiro elemento, o grau de influência, depende do número


de filiados, da capacidade financeira e da organização.
Assim, a capacidade de influência dos grupos de pressão
depende: 1) da quantidade de associados (quanto maior o
número de associados, maior será o poder da entidade); 2) da
congruência ou concordância dos associados (quanto maior for a
congruência com os interesses representados, maior a capacidade
de mobilização); e 3) da coesão ou similaridade das posições
políticas das unidades que compõem o grupo (quanto maior
for a coesão entre as distintas visões dentro do grupo, maior as
chances de êxito).

4.1. Como atuam os grupos de pressão


Para operar com eficiência frente aos desafios e princi-
palmente em face da complexidade e velocidade do processo
decisório, os grupos de pressão necessitam contratar uma em-
presa de consultoria ou dispor de estrutura, organização, pessoal
qualificado e também de uma causa legítima.
Os meios empregados são muitos e variados, e vão desde
estudos fundamentados, passando pela utilização das técnicas
de convencimento/persuasão, até manifestações de massa. Tra-
ta-se da soma ou da junção de fatos, argumentos e poder. Seu
público-alvo são os legisladores, a opinião pública e as demais
autoridades da Administração Pública.
Operacionalmente, conforme Frade (1996), os grupos de
pressão valem-se do envio de correspondências e documentos,
visitas e contatos pessoais, realização de eventos institucionais
ou sociais, participação em debates e audiências públicas,

43
RIG em três dimensões

realização de viagens, serviços de assessoria de imprensa e


propaganda, edição de publicações, apoio junto ao eleitorado,
organização ou coalizão de interesses e manifestações públi-
cas, entre outros. Atualmente, não pode ser ignorado o uso
de ferramentas como as redes sociais para exercer pressão
sobre os tomadores de decisão, mediante a sua utilização para
ampliar a repercussão de riscos ou externalidades advindos
de políticas públicas e projetos em discussão no Executivo ou
no Legislativo.
Segundo Santos e Resende (2016), as atividades de maior
relevância estratégica no trabalho dos profissionais de relações
institucionais junto ao Poder Legislativo, por ordem decrescente,
são: 1) contato direto com os parlamentares; 2) contato com os
líderes das bancadas suprapartidárias; 3) contato e ações articu-
ladas com outros grupos de pressão; 4) contatos com assessores
das comissões; 5) acompanhamento de reuniões plenárias; 6)
visita a gabinetes; 7) participação em audiências públicas; e 8)
contato com a consultoria legislativa.
Ainda de acordo com Santos e Resende (2016), o que
realmente funciona na articulação de influenciar do processo de-
cisório, são, em ordem decrescente: 1) oferecer “notas técnicas”
ou “estudos técnicos”; 2) sugerir minutas de emendas; 3) realizar
visitas preventivas para preparar/convencer parlamentares; 4)
fazer gestão junto ao relator; 5) sugerir minuta de proposição
legislativa; 6) participar em audiências públicas; 7) fazer gestões
junto aos líderes partidários; 8) fazer gestões junto ao líder do
governo; 9) tentar influir na indicação do relator; e 10) tentar
influir na agenda da comissão.

44
RIG em três dimensões

Nesse contexto, os grupos de pressão são fundamentais


para a democracia porque podem contribuir para: 1) o aperfei-
çoamento das políticas públicas; 2) o estabelecimento de limites
à ação dos poderes; e 3) a promoção do interesse público em
favor de determinados pleitos. No entanto, a busca de interesses
específicos, que podem, inclusive, ser contrários ao interesse
público, também é parte da natureza da atividade, e não pode
ser desconsiderada.
São muitas as modalidades de organização de interesse, in-
clusive no âmbito interno do Parlamento, em que tem sido comum
a articulação de frentes parlamentares ou bancadas informais.

5. Frentes parlamentares
ou bancadas informais
As frentes parlamentares ou bancadas informais são tam-
bém uma forma de organização da defesa de interesse, que se
articulam de modo suprapartidário no âmbito ou no interior do
Parlamento, com o objetivo de influenciar decisões em favor de
segmentos representados pelos parlamentares.
As bancadas regionais ou temáticas, inclusive as informais,
assim como as frentes parlamentares, são muito influentes porque
congregam parlamentares de diferentes partidos e tendências ide-
ológicas para: 1) promover valores cívicos, éticos ou morais, como
hipoteticamente a bancada evangélica; 2) viabilizar a defesa de
interesses regionais, como as bancadas estaduais ou federativas,
que recebem forte influência dos governadores e prefeitos; e 3)
promover a defesa de interesses econômicos, como exemplo a
bancada ruralista ou do agronegócio no Congresso Nacional.

45
RIG em três dimensões

Os pleitos e interesses das frentes parlamentares e/ou


bancadas informais vão desde reivindicação de setores eco-
nômicos, passando pelas demandas de categorias profissio-
nais até questões ambientais, religiosas, recreativas, cívicas,
dentre outras.
A articulação dos interesses suprapartidários, por inter-
médio das frentes parlamentares, é uma forma alternativa para
atender aos anseios de representatividade e romper as barreiras
das estruturas institucionais. Assuntos que por vezes sejam
inconciliáveis ou pequenos demais para a discussão partidá-
ria, mas importantes o suficiente para setores da sociedade,
encontram nas frentes parlamentares um canal de expressão,
um desaguadouro das expectativas sociais e o correspondente
comprometimento dos seus representantes no Legislativo.
No Congresso Nacional, as frentes parlamentares com
maior quantidade de parlamentares com vínculo direto e for-
mal são a empresarial e a da agricultura, que reúne a bancada
ruralista ou do agronegócio. Elas, assim como as bancadas
sindical, feminista, evangélica e de policiais/segurança, são
muito atuantes. As demais, como saúde, educação, transporte
etc, costumam ser apenas decorativas (meramente formais),
ou seja, não têm o mesmo nível de comprometimento e envol-
vimento direto com as causas que defendem ou patrocinam.
As de saúde e educação, por exemplo, só convergem quanto
ao aumento de investimento no setor, dividindo-se quanto à
destinação desses recursos em três segmentos: o privado, o
filantrópico e o estatal.

46
RIG em três dimensões

A Frente Parlamentar da Agricultura (FPA) certamente é a


mais influente, tanto em termos quantitativo e de engajamento
quanto em termos de organização e de resultados. Nascida sob
a liderança de ruralistas tradicionais foi mudando seu perfil e
incorporando o setor mais moderno do agronegócio e até da
agricultura familiar, de tal modo que se tornou a frente mais
eficaz. Ela conta com assessoria profissionalizada e adota uma
matriz de atuação, que consiste na indicação das figuras: 1) do
coordenador, que organiza as reuniões e prepara a documenta-
ção dos encontros; 2) do agitador, aquele que vai ao plenário
lembrar do poder da frente para inviabilizar outras pautas, caso
não atendam a dela; e 3) do negociador, aquele que ameniza
as bravatas do agitador e senta-se à mesa de negociação.
Para além da diversidade temática das frentes, constata-
se que nem todas são homogêneas em seu interior. É comum
haver parlamentares com visões distintas e até opostas fazendo
parte de uma mesma frente parlamentar. O exemplo da bancada
ambientalista é ilustrativo, pela presença de parlamentares
ruralistas, que aderem como forma de tentar combater ou
bloquear por dentro algumas agendas ambientais.
Estudo realizado por Santos (2019)20 apontou a existência,
naquela ocasião, de 172 frentes parlamentares, das quais 95
eram frentes mistas, e a perspectiva de que viessem a superar,
no curto prazo, 200 frentes parlamentares. Essas frentes assim
se distribuíam, por grupos temáticos:

20
SANTOS, L. A. dos. As Frentes Parlamentares no Congresso Nacional: Identidade, Composição, Densidade
e Efetividade. Mimeo, 2019, 28 p.

47
RIG em três dimensões

Quadro 1 – Distribuição das frentes temáticas


GRUPO
TOTAL % MISTA % CÂMARA
TEMÁTICO

Admin. Pública
e Governo
32 18,6% 17 18,6% 18,6%

Economia e
Des. Econômico
69 40,1% 42 40,1% 40,1%

Social 60 34,9% 29 34,9% 34,9%

Outros 11 6,4% 7 6,4% 6,4%

Total 172 94% 95 94% 94%

Segundo Santos (2019), a distribuição por área temática,


na Câmara dos Deputados, era a seguinte:

48
RIG em três dimensões

Algumas dessas frentes, porém, evidenciavam grande den-


sidade de membros, como ocorre com a Frente Parlamentar da
Agropecuária, composta por 226 membros, a Frente Parlamentar
da Saúde, com 205 membros, ou a Frente Parlamentar Mista da
Micro e Pequena Empresa, com 183 membros. A participação
de parlamentares, por partido, embora diferenciada, revelava que
cada parlamentar participa, em média, de 71 frentes parlamen-
tares. Em partidos como PCdoB, PROS e Patriotas, a participa-
ção verificada era superior a 90 frentes por parlamentar, com
grande variação entre as áreas temáticas, observando-se maior
intensidade nas frentes voltadas a temas sociais e econômicos.
Assim como os parlamentares, de modo suprapartidário,
se articulam em torno de frentes/bancadas e grupos ou movi-
mentos cívicos como o Acredito/RenovaBR, o Poder Executivo
também exerce influência sobre o Poder Legislativo, a partir das
assessorias parlamentares dos ministérios e da Administração
Indireta (empresas públicas, autarquias, fundações e sociedades
de economia mista), que cumprem a função de grupo de pressão.

6. Poder do governo como


grupo de pressão
Em termos operacionais (ainda que conceitualmente não
seja uma definição adequada chamar o governo de grupo de
pressão, mas sim “agente de interesses”), o principal e mais
organizado grupo de pressão é aquele articulado pelo Governo
Federal. O Poder Executivo Federal, sob a coordenação da Casa
Civil ou da Secretaria de Governo, estruturou o mais complexo
e abrangente sistema de acompanhamento da atuação do

49
RIG em três dimensões

Congresso Nacional, que envolve todos os ministérios, suas


autarquias, fundações e empresas.
Os assessores parlamentares dos órgãos governamentais
acompanham cotidianamente a tramitação de todas as proposi-
ções em curso no Congresso Nacional sobre políticas públicas.
O monitoramento inclui proposições de iniciativa de parlamen-
tares, do próprio governo, do Poder Judiciário e dos cidadãos. A
liderança dos partidos da base e, principalmente, as lideranças
do governo nas Casas, são os pontos de apoio para o trabalho
de acompanhamento.
A equipe está orientada para facilitar ou dificultar a trami-
tação das matérias, segundo o interesse do Poder Executivo. Os
recursos utilizados para tanto vão desde a distribuição de estudos
e pareceres sobre o mérito e constitucionalidade das matérias,
a negociação do conteúdo do texto, passando pela mobilização
de líderes, presidentes de comissões, relatores e demais parla-
mentares da base, todos devidamente orientados para recorrer
aos inúmeros instrumentos regimentais para apressar ou retardar
o andamento das proposições, o chamado kit obstrução, até a
liberação de verbas, obras, cargos e empregos de interesse dos
parlamentares diretamente envolvidos no processo de apreciação
e aprovação das propostas.
Pela organização e estrutura de que dispõe, o lobby gover-
namental é considerado ideal porque: 1) possui mapeamento
das votações de seu interesse no Congresso Nacional, como
o comportamento das bancadas estaduais e partidárias e por
parlamentar; 2) tem articuladores institucionais próprios junto
aos parlamentares (ministro de coordenação política, líder na
Câmara dos Deputados, no Senado Federal e no Congresso Na-

50
RIG em três dimensões

cional); 3) conta com operadores e articuladores, entre os quais


ministros com mandato, bem como os líderes dos partidos que
lhe dão sustentação; 4) atua no sistema de “amarração” de com-
promissos, com controle de atendimento de demandas sempre
às vésperas de votações importantes; 5) mobiliza personagens
que possuem ascendência sobre o Congresso Nacional, como
ministros e autoridades com capacidade de negociação, criando
ambiente para articulações e composições de última hora; e 6)
opera com o objetivo de assegurar controle sobre a organização
do Estado e do funcionalismo, sobre despesas públicas e sobre
a arrecadação fiscal.
Apesar de avassaladora, a estrutura governamental não
dispensa a presença física dos ministros em votações relevantes
e até a mobilização pessoal do Presidente da República em casos
excepcionais ou graves.
Um dos principais requisitos dos grupos de interesses ou
de pressão, seja qual for a modalidade, é a ética.

7. Ética e integridade na atuação dos


grupos de interesses ou de pressão
A atuação dos grupos de interesses e de pressão requer
o atendimento de algumas regras de conduta, que são indis-
pensáveis à integridade e à credibilidade dessa importante
forma de articulação de interesses da sociedade. O suporte
técnico é o principal elemento de convicção dos tomadores
de decisões. O método de atuação, o conteúdo dos pleitos e
os meios disponíveis são condições importantes para o êxito
dos pleitos apresentados.

51
RIG em três dimensões

O trabalho de convencimento e persuasão, para que goze


de credibilidade, deve ser realizado com profissionalismo, com
integridade e de forma transparente, fazendo uso de dados
e informações fidedignas como elementos de convicção para
favorecer o pleito. Logo devem ser descartados e rechaçados,
por se tratar de crimes, a prática de corrupção, a utilização de
tráfico de influência e o uso de métodos condenáveis ética e
moralmente, como chantagem, ameaça, intimidação e abuso
de poder econômico.
A ética e a integridade, portanto, são alicerces que devem
pautar a atuação, as atitudes e os comportamentos dos profis-
sionais de RIG. Nunca se deve transgredir normas éticas nem
legais no exercício da atividade de RIG. O emprego ou a utilização
apenas de instrumentos constitucionais, legais e transparentes
deve ser inerente à ação dos grupos de pressão e à atividade
de relações institucionais e governamentais, sob pena de sua
desmoralização ou perda de credibilidade.
Nessa perspectiva, a Associação Brasileira de Relações
Institucionais e Governamentais (ABRIG), por exemplo, adota o
guia “Prática Recomendada” (2020), elaborada em parceria com
a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Trata-se de
uma espécie de código de ética e conduta ou de autorregulamen-
tação, com rigorosas regras de compliance. Além disso, submete
todos os pedidos de filiação ao crivo da comissão responsável
pela aferição dos critérios de integridade, tanto para pessoas
físicas quanto jurídicas que peçam associação. Esses códigos ou
carta de princípios, que reprovam má-condutas, mesmo que não
tenham efeitos coercitivos, cumprem uma função importante e
reduzem o custo reputacional da atividade.

52
RIG em três dimensões

No plano da ação prática, além da renúncia a qualquer tipo


de discriminação por motivos políticos, ideológicos, partidários,
regionais, de gênero, racial ou religiosos, o trabalho de influên-
cia deve observar alguns pressupostos e condições ético-morais
quanto: 1) ao processo de persuasão e convencimento; 2) ao
conteúdo dos pleitos patrocinados; e 3) às condições para o êxito.
Assim, os pleitos patrocinados, em relação ao conteúdo,
precisam ser legais e legítimos, defensáveis ética e moralmente e
não devem constituir privilégios ou favores para setores específi-
cos, nem podem levar à concorrência desleal ou fraudulenta. De
preferência, devem coincidir com o interesse público e, de algum
modo, contribuir para o aperfeiçoamento das políticas públicas.
Além dos princípios éticos, existem também outras con-
dições para o êxito dos grupos de interesses ou de pressão. No
tópico a seguir, detalhamos outras condições para o êxito.

8. Condições para o êxito


no exercício da influência
O sucesso das várias modalidades de influência sobre os
tomadores de decisão em defesa de interesses, especialmente
no âmbito do Congresso Nacional, depende de múltiplos e va-
riados fatores.
Nesse sentido, os grupos de pressão permanentes, mais que
os temporários, necessitam de recursos materiais, reputacionais
e intelectuais para o bom desempenho de suas atividades. No
plano material, devem dispor de estrutura física, de meios, de
organização e de pessoal qualificado.

53
RIG em três dimensões

A reputação positiva de um grupo de pressão – a exem-


plo de credibilidade, capital de relações, representatividade,
transparência e ética na defesa de seus pleitos – facilita o
acesso aos principais decisores e contribui para aumentar as
chances de êxito.
No plano intelectual ou do conhecimento, o grupo pre-
cisa conhecer as regras do processo decisório, as instituições
ou locus onde as decisões são tomadas, suas estruturas e
atribuições, bem como ter capacidade de análise e senso de
oportunidade.
O poder político, a capacidade de mobilização e a quanti-
dade de filiados dão a exata dimensão do potencial de um grupo
de pressão, mas os profissionais podem ser decisivos na interação
parlamentar, por sua maior ou menor capacidade de transmitir
ideias e estabelecer conexões entre elas e os interesses de outros
grupos de interesses/pressão. Boas credenciais e conhecimentos
adequados importam na arena da disputa parlamentar.

54
SEÇÃO 2

DESENHO INSTITUCIONAL,
REQUISITOS E REGRAS DE ATUAÇÃO
NO ÂMBITO DO PODER LEGISLATIVO

N esta Seção abordamos, dentre outros, os seguintes aspectos


indispensáveis ao trabalho parlamentar: 1) o papel do Poder
Legislativo e dos parlamentares; 2) a organização dos trabalhos
legislativos; 3) o desenho institucional e o processo decisório; 4)
a atuação e monitoramento dos trabalhos no Congresso Nacional;
5) os níveis de influência no processo decisório no Congresso; 6)
os atores-chave no Poder Legislativo; 7) as regras para o corpo
a corpo no trabalho parlamentar; 8) o jogo parlamentar: instru-
mentos regimentais; e, operacionalmente, 9) o que observar para
o trabalho parlamentar.
Reunimos nesta Seção informações essenciais para um
trabalho parlamentar eficaz, com dicas e sugestões sobre ações,
comportamentos e posturas do representante de interesses.

1. O papel do Poder Legislativo


e dos parlamentares
O Poder Legislativo brasileiro é bicameral, formado pela
Câmara dos Deputados (composta de 51321 deputados federais,
21
A atual composição foi definida a partir da Lei Complementar nº 78, de 30 de dezembro de 1993,
que fixou o número máximo de deputados federais em 513, devendo a distribuição por Estados e DF ser
proporcional à população. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a partir dos cálculos da representação dos

55
RIG em três dimensões

eleitos pelo sistema proporcional de lista aberta22), que represen-


ta o povo, e pelo Senado Federal (composto de 81 senadores,
eleitos pelo sistema majoritário simples, ou em um só turno),
que representa os Estados e o Distrito Federal. A missão do Po-
der Legislativo é organizar, mediar e resolver, de forma pacífica
e democrática, as contradições que os indivíduos na sociedade
não podem nem devem assumir sob o fundamento da força.
A sede do Poder Legislativo da União fica em Brasília, Distri-
to Federal, e o Congresso Nacional se reúne em sessão legislativa
ordinária na Capital da República, anualmente, no período de 2
de fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro,
ou extraordinariamente quando for convocado durante o recesso
parlamentar. Durante o recesso parlamentar – que é dividido em
dois períodos, de 18 a 31 de julho e de 23 de dezembro a 1º
de fevereiro – o Congresso Nacional elege uma Comissão Repre-
sentativa, composta de 17 deputados e oito senadores, com os
respectivos suplentes, para responder pelo Poder Legislativo23.
O Poder Legislativo, por intermédio dos deputados federais

Estados e do DF, passou a fornecer aos tribunais regionais eleitorais e aos partidos políticos o número de
vagas a serem disputadas em cada eleição. Nenhum dos estados membros da Federação terá menos de oito
deputados federais, e o estado mais populoso será representado por 70 deputados federais.
22
No sistema de lista aberta é o eleitor, na hora de votar, quem define a ordem na lista partidária, enquanto no
sistema de lista fechada é o partido quem determina previamente essa ordem, para efeito de distribuição das
vagas a que os partidos têm direito pelo número de votos obtidos. A distribuição de vagas nas Casas Legislativas,
pelo sistema de lista aberta, é calculada com base no quociente eleitoral, que define os partidos que têm direito
a ocupar vagas na eleição proporcional (divisão total de votos válidos pelo total de votos obtido pela legenda) e no
quociente partidário (divisão do total de votos obtido pela legenda pelo quociente eleitoral), que define o número
inicial de vagas a que cada partido terá direito.
23
Essa comissão, porém, não exerce a plenitude das competências do Congresso Nacional, mas pode
deliberar sobre sustação de atos normativos do Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites
de delegação legislativa, desde que se caracterize a necessidade da medida cautelar em caráter urgente;
sobre projeto de lei relativo a créditos adicionais, desde que a Comissão Mista de Planos, Orçamentos
Públicos e Fiscalização (CMO) tenha emitido parecer sobre eles; sobre projetos que visem a prorrogar prazo
de lei ou tratem de atos internacionais, quando o prazo da lei ou a data limite para o Brasil se manifestar
sobre o acordo ocorra durante o período de recesso ou nos dez dias subsequentes a seu término; sobre
autorização para que o presidente ou o vice-presidente da República se afaste do país por mais de 15 dias;
sobre convocação de ministros de Estado; e sobre o encaminhamento de requerimentos de informações a
autoridades.

56
RIG em três dimensões

e dos senadores eleitos, atua nas dimensões políticas, legisla-


tivas e de agente de Governo. Os parlamentares, em nome do
Poder Legislativo, exercem quatro funções essenciais no sistema
democrático, que consistem em: 1) representar; 2) legislar; 3)
definir a alocação de recursos, por meio do orçamento público;
e 4) fiscalizar a aplicação dos recursos públicos.
Na função representativa, o parlamentar faz a mediação dos
conflitos sociais, intermedia demandas, abre canais de diálogo,
negociação e encaminhamento de solução entre os represen-
tantes de segmentos sociais, lideranças políticas e autoridades
do Governo, articula consensos, concilia interesses das diversas
correntes e segmentos sociais e econômicos, além de ouvir e
falar em nome da população.
Na função legislativa, o parlamentar participa da elabora-
ção, da discussão e da deliberação das matérias de competência
da União, envolvendo desde as leis de caráter regulatório, que
estabelecem obrigações ou assegurem direitos, passando pelas
que instituem ou aumentem tributos até as que distribuem be-
nefícios sociais, além da definição do gasto público (orçamento).
As atribuições legislativas do Congresso Nacional, para
facilitar o entendimento, podem ser classificadas em três níveis,
segundo a Constituição Federal (CF): geral, exclusiva e privativa.
As atribuições gerais (art. 48 da CF) consistem em elaborar as leis
da República, com a sanção do presidente da República, e emen-
dar a Constituição, fazendo uso do poder constituinte derivado.
As exclusivas (art. 49 da CF) compreendem atos que prescindem
de sanção do presidente da República e, portanto, são imunes
ao veto presidencial. Entre essas incluem-se a aprovação dos
tratados internacionais que acarretem encargos ou compromissos

57
RIG em três dimensões

gravosos ao patrimônio nacional, dos quais o Brasil faça parte,


e a promulgação, em sessão solene, das Propostas de Emenda
à Constituição (PECs). As privativas (arts. 51 e 52 da CF) estão
relacionadas aos assuntos internos da Câmara dos Deputados,
do Senado Federal e do Congresso Nacional, aos temas que lhes
foram delegados pela Carta Política, ou destinadas à ratificação
de atos dos Poderes Executivo e Judiciário, entre outros assuntos
previstos na Constituição Federal, a exemplo das competências
privativas do Presidente da República.
Na função alocativa, o parlamentar tem a missão de deba-
ter, propor mudanças, inclusive emendas com caráter impositivo,
e deliberar sobre todo o ciclo orçamentário, que inclui o Plano
Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a
Lei Orçamentária Anual (LOA), definindo os planos, as diretrizes
e as prioridades na aplicação dos recursos arrecadados compul-
soriamente de toda a sociedade.
Na função de fiscalização, que também pressupõe o con-
trole, o parlamentar possui: 1) na dimensão de fiscalização: as
prerrogativas de criticar atitudes, comportamentos e atos gover-
namentais, convocar autoridades, investigar fatos determinados,
inclusive via comissões parlamentares de inquéritos (CPI), apro-
var nome de autoridades, acusar, processar e julgar o presidente
da República, seu vice e ministros de Estado nos crimes de
responsabilidade, sustar/cancelar atos que exorbitem/extrapolem
os limites legais, julgar as contas do presidente da República,
dentre outras; e 2) na dimensão de controle: promover o controle
em relação aos aspectos contábeis, financeiros, orçamentários,
operacionais e patrimoniais da União e das entidades da Admi-
nistração direta e indireta, cuja operacionalização se processa por

58
RIG em três dimensões

intermédio das peças orçamentárias e fiscais, em conformidade


com os prazos e ritos definidos em lei e na Constituição Federal
quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das
subvenções e renúncias de receitas.
Os parlamentares (deputados e senadores), como se pode
depreender ao longo desta Seção, têm atuação multifacetada,
que incluem várias dimensões:
l ouvir a população
l falar em seu nome
l legislar
l articular maioria para consenso na esfera institucional
l mediar conflitos sociais
l intermediar entendimentos e demandas
l promover e sediar debates nacionais
l participar da formulação de políticas públicas
l aprovar o orçamento da União
l fiscalizar a aplicação dos recursos públicos

2. Transparência orçamentária
e emendas parlamentares
O orçamento público é o instrumento que os governos usam
para planejar e estabelecer as prioridades de gastos do Estado.
Um pressuposto da legitimidade do orçamento público, além
de sua destinação, está na clareza e na transparência, que são
duas condições indispensáveis para que haja controle social e a

59
RIG em três dimensões

sociedade seja ao mesmo tempo a protagonista e a beneficiária


efetiva dos recursos arrecadados compulsoriamente de todos. O
segredo na arrecadação de receitas, na efetivação de despesas
e na destinação de recursos financeiros é incompatível com a
forma republicana e o regime democrático de governo. Assim,
nem a elaboração do orçamento público nem a execução podem
ser secretos.
Historicamente existiam três tipos de emendas ao orça-
mento público federal brasileiro: as emendas individuais, as
emendas de bancadas estaduais e as emendas de comissões
temáticas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal,
estas últimas também conhecidas como emendas coletivas. A
execução dessas emendas se dá de forma transparente, com a
divulgação em portal público tanto de sua destinação quanto
de seus autores. A margem para fazer uso político delas é
baixa, pois os governos não podem utilizá-las como forma de
“comprar” apoio político.
A Emenda Constitucional nº 86, de 2015, introduziu a obri-
gatoriedade da execução das emendas individuais no montante
de 1,2% da receita corrente líquida, e a Emenda Constitucional
nº 100, de 2019, assegurou também essa obrigatoriedade para
as emendas de iniciativa de bancada de parlamentares de Es-
tado ou do Distrito Federal, no montante de até 1% da receita
corrente líquida. Essas modificações objetivaram reduzir o uso
da liberação de emendas como forma de coagir o parlamentar a
adotar posições a favor do governo, até ali o senhor e dono da
execução do orçamento.
Entretanto, a partir de 2020, surgiu uma nova modalidade
de emenda: a emenda de relator, por meio da qual o relator do

60
RIG em três dimensões

projeto de lei orçamentária introduz, para atender demandas de


parlamentares, programações orçamentárias ou acréscimos de
dotações, mas sem qualquer transparência nem controle social
sobre o real patrocinador da emenda. Essa programação orça-
mentária seria utilizada, em momento posterior, para negociar
apoio político de parlamentares, que seriam contemplados com
a liberação dessa “quota orçamentária” (fração das despesas
alocadas no orçamento por emendas do relator). Essa modalida-
de de emenda apresenta vários problemas e sua execução sem
transparência é condenável ética e moralmente.

3. Organização dos trabalhos


legislativos
Para cumprir a sua missão institucional, as atividades das
Casas do Congresso Nacional estão estruturadas em torno das
funções: 1) de direção; 2) de deliberação; 3) de controle interno;
e 4) de auxiliar ou de advocacia.
As funções de direção, com prerrogativas administrativas
e políticas, além do trabalho de coordenação dos trabalhos
legislativos, são exercidas, no caso da Câmara dos Deputados,
pela Mesa, e no Senado Federal, pela Comissão Diretora. Elas
possuem a seguinte composição: Presidência (um presidente
e dois vice-presidentes), quatro secretários (1º, 2º, 3º e 4º
secretários). Há ainda, quatro suplentes de secretários. Além
disso, há que se destacar os gabinetes dos parlamentares e a
lideranças partidárias.
A estruturação de direção da Câmara dos Deputados e
do Senado Federal é distinta, tanto do ponto de vista político

61
RIG em três dimensões

quanto administrativo. Na Câmara dos Deputados, a Mesa


exerce funções administrativas e políticas, além de coordenar
os trabalhos legislativos. No Senado Federal, a direção política
e administrativa cabe à Comissão Diretora, que – contando com
estrutura e por intermédio dos membros titulares da Mesa do
Senado Federal – organiza e formula as políticas, os objetivos,
as diretrizes e as metas, além de fazer a supervisão e a fiscaliza-
ção dos atos administrativos. A Comissão Diretora do Senado, a
quem cabe exercer a administração interna do Senado nos termos
das atribuições fixadas no Regulamento Orgânico24, é composta
pelos membros titulares da Mesa. As Mesas das duas Casas do
Congresso Nacional, conforme registrado acima, são integradas
por sete membros titulares e quatro suplentes: um presidente,
dois vice-presidentes, quatro secretários e quatro suplentes de
secretários cada, todos eleitos para um mandato de dois anos.
Os membros da Mesa da Câmara dos Deputados, exceto os
suplentes, não podem ser líder, vice-líder ou integrar comissão
permanente. No Senado Federal, os membros da Comissão Di-
retora podem fazer parte de outra comissão permanente, exceto
o seu Presidente25.
As funções deliberativas, na Câmara dos Deputados, com-
petem ao Colégio de Líderes, ao Plenário, à Mesa e às Comissões.
Já no Senado Federal são exercidas pelo Plenário e Comissões.
Em ambas as Casas, o Plenário é a instância máxima do Poder
Legislativo, que decide politicamente diversas matérias, a exem-
plo das proposições de Emenda à Constituição. Mas, na prática,

24
O Regulamento Orgânico é a Parte II do Regulamento Administrativo do Senado, aprovado pela Resolução
nº 13, de 2018.
25
RISF, art. 77, § 1º: Os membros da Comissão Diretora, exceto o Presidente da Casa, poderão integrar
outras comissões permanentes.

62
RIG em três dimensões

os acordos realizados entre os líderes tendem a ditar o escopo e


o ritmo de aprovação das matérias.
As funções de controle interno, em nível político, na Câmara
dos Deputados e no Senado Federal, são exercidas pela Corre-
gedoria e pela Ouvidoria Parlamentar. Por sua vez, as funções
administrativas de controle são exercidas pelas Secretarias de
Controle Interno.
As funções de advocacia em defesa dos parlamentares e
da instituição Poder Legislativo são exercidas, na Câmara dos
Deputados, pela Procuradoria Parlamentar, e, no Senado Fede-
ral, pela Procuradoria Parlamentar, apoiada tecnicamente pela
Advocacia da Casa.
Os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal, que respondem pela Casa quando ela se pronuncia
coletivamente, presidem e organizam as reuniões com os líderes
para a definição da pauta, supervisionam e ordenam os traba-
lhos legislativos, presidem as sessões em plenário, conduzem
as votações e anunciam os seus resultados. Eles são o segundo
(Câmara dos Deputados) e o terceiro (Senado Federal) na linha
sucessória presidencial, substituindo o Presidente da República
nas ausências ou impedimentos do seu Vice-Presidente.
Os presidentes das Casas Legislativas, segundo Vieira
(2011), possuem muitos poderes regimentais, que podem ser
convertidos em capital político próprio ou distribuídos entre seus
pares. Entre suas atribuições, as mais relevantes são presidir e
coordenar os trabalhos legislativos, dispondo de grande poder de
agenda, como, por exemplo: 1) levar para votação em plenário
matéria com prazo vencido nas comissões; 2) incluir matéria

63
RIG em três dimensões

na ordem do dia das sessões ordinárias e extraordinárias; 3)


convocar sessões extraordinárias; 4) criar comissões especiais
para apreciação de Proposta de Emenda à Constituição (PEC),
no caso da Câmara dos Deputados; e 5) indicar relator quando
a proposição for incluída na ordem do dia sem parecer das co-
missões, por exemplo, em projeto com urgência e também em
medida provisória.
Após esta breve apresentação do Poder Legislativo, abor-
daremos a importância da representação de interesses perante
os poderes da República, especialmente junto ao Congresso
Nacional.

4. Desenho institucional e o processo


decisório no Poder Legislativo
Cabe aos cidadãos, à sociedade civil, em geral, e aos se-
tores organizados, em particular, acompanhar e participar das
atividades dos Poderes, particularmente do Poder Legislativo,
cuja legitimidade decorre, precisamente, do voto popular e de
sua capacidade de expressar as demandas e aspirações da
sociedade. Deve-se fazê-lo com conhecimento pleno de suas
competências, atribuições e prerrogativas, bem como das ins-
tâncias decisórias e das regras que orientam as deliberações
no âmbito do Congresso Nacional.
Para o bom exercício do trabalho parlamentar, é fundamen-
tal conhecer o processo de decisão, as estruturas de poder, as
atribuições dos órgãos e cargos, a formação política e profissional
dos decisores e dos temas objeto de acompanhamento. Assim
sendo, faz-se necessário:

64
RIG em três dimensões

1) entender o processo (regras);


2) conhecer as estruturas/organizações (órgãos);
3) identificar quem decide (atores);
4) definir formas de atuação (táticas);
5) estabelecer canais de comunicação (fontes);
6) atuar como radar e promover o monitoramento constante
(sociedade, mercado, parlamento e governo); e
7) organizar e elaborar informações em defesa de seus
interesses, de forma lógica, coerente, tecnicamente consistente
e baseadas em evidências.
De posse desses conhecimentos, o representante de inte-
resses estará habilitado a fazer o monitoramento parlamentar,
uma atividade com razoável grau de complexidade, conforme
detalhado no tópico a seguir.

5. Atuação e monitoramento dos


trabalhos no Congresso Nacional
O acompanhamento do processo decisório no Congresso
Nacional é complexo e requer: 1) sensibilidade política; 2) capital
de relações; e 3) senso de oportunidade, além de pleno domínio
sobre as instituições, suas estruturas e atribuições; as regras e
procedimentos para a tomada de decisão; os principais atores
políticos; e o conteúdo da matéria em pauta.
O primeiro item (sensibilidade política) está associado à
capacidade de identificar se determinada matéria constitui ame-
aça ou oportunidade aos interesses que representa.

65
RIG em três dimensões

O segundo (capital de relações) diz respeito à facilidade de


contato e acesso aos decisores e seus auxiliares mais próximos
ou à capacidade de montagem de rede de informações que lhes
permitam acesso a dados e documentos de interesse.
O terceiro aspecto (senso de oportunidade) vincula-se à
capacidade de perceber o momento adequado para aprovar ou
rejeitar determinada matéria, à luz de seu impacto orçamentário
ou econômico, ao grau de mobilização dos segmentos afetados,
à complexidade do tema, à importância do autor, à opinião do
Congresso Nacional e ao interesse do governo sobre a matéria.
O conhecimento das estruturas inclui desde o papel da
Mesa Diretora, do Colégio de Líderes, das Comissões, do Ple-
nário, dos Líderes e Vice-líderes, até o papel das Consultorias
Legislativas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
As regras e os procedimentos do jogo parlamentar com-
preendem, no âmbito do processo legislativo: a tipologia das
proposições, a hierarquia, os prazos, os destaques, as possibili-
dades de votação, além dos recursos e instrumentos e estratégias
existentes para acelerar ou retardar a apreciação das matérias.
Isso inclui também o domínio da linguagem do Legislativo, como
os termos ordem do dia, questão de ordem, destaque para vo-
tação em separado, diversos tipos de requerimentos, recursos,
pareceres, etc.
Os parlamentares mais influentes do Congresso Nacional,
em geral, são especialistas, chefes de grupos políticos ou aque-
les que exercem algum posto na estrutura da Casa legislativa,
tais como membros da Mesa, líderes ou vice-líderes partidários,
presidente de comissão ou relator de matéria relevante, coorde-

66
RIG em três dimensões

nador de Frente Parlamentar. Mais detalhes sobre esse assunto


encontram-se no tópico “Atores-chave do processo decisório no
Congresso Nacional” desta Seção.
O ambiente político e o grau de aceitação da matéria são
fatores a serem observados, pois são contextos que influenciam
quem decide. O primeiro, o ambiente político, tem a ver com
o humor na sociedade e no Parlamento a respeito da política
pública em construção. Eventos-foco, como desastres, crises
e pandemias, como a do Coronavírus, são símbolos podero-
sos. Situações, fatos ou eventos que incomodam ou geram
insatisfação ou desconforto costumam criar clamor por po-
líticas públicas para solucioná-los. O grau de aceitação está
relacionado, por exemplo, com a percepção sobre os custos
e benefícios da política pública, especialmente seu impacto
financeiro e orçamentário.
O conhecimento do conteúdo da política pública, ou seja,
daquilo que se pretende aprovar, modificar ou rejeitar é essencial
para quem atua na área de RIG. O debate é rico e quem não
tiver argumentos consistentes para demonstrar que sua tese é
boa corre o risco de ser derrotado já nas comissões técnicas,
primeiras instâncias do exame da matéria. Trata-se do requisito
número um para quem acompanha determinado assunto no
Congresso Nacional, ou seja, sem o domínio pleno do tema,
corre-se o risco de já entrar derrotado na arena da disputa pelo
êxito do pleito levantado.
O domínio desse conjunto de conhecimentos é fundamental
para evitar manobras de adversários interessados no pleito. Quem
dominar essas ferramentas inerentes ao processo decisório terá

67
RIG em três dimensões

melhores condições de montar táticas e estratégias consistentes


no exame de seus pleitos no âmbito do Poder Legislativo.
O trabalho de acompanhamento parlamentar, como se
vê, exige acurada sensibilidade política e capacidade técnica
para captar, organizar, analisar, processar e emitir informações
de interesse da instituição, empresa, entidade ou grupo de
pressão a que pertence na perspectiva de alcançar os obje-
tivos desejados.
No tópico a seguir, trataremos da escala de influência no
processo decisório, no âmbito do Poder Legislativo.

6. Escala de influência no processo


decisório no Congresso Nacional
O processo decisório no Congresso Nacional – antes da
pressão da imprensa, da opinião pública e até dos eleitores –
recebe de forma mais próxima diversos tipos de influência
técnico-político-legislativa, hierarquizados mais ou menos na
seguinte ordem:

1º - Consultoria legislativa (interna)


As consultorias legislativas da Câmara dos Deputados e
do Senado Federal, órgãos institucionais de assessoramento
aos parlamentares, cumprem papel essencial na produção le-
gislativa. A esses órgãos internos, compostos de profissionais
de alta especialização, organizados em núcleos multidisciplina-
res, compete subsidiar os deputados e senadores em todas as
fases do processo legislativo. São, depois dos parlamentares,

68
RIG em três dimensões

os atores mais influentes na formulação dos estudos e textos


legais. Elaboram desde proposições legislativas, instrumentos
regimentais e pareceres, passando por estudos técnicos e
análises de políticas públicas, até a fundamentação de ação
parlamentar, incluindo importantes discursos. Como seus
trabalhos pautam-se pela confidencialidade e, em geral, são
feitos exclusivamente para os parlamentares que os solicitam,
os consultores evitam receber o público externo.

2º - Assessorias parlamentares
das bancadas (interna)
Enquanto as consultorias legislativas são órgãos da estru-
tura institucional das Casas legislativas, que atuam de modo
apartidário, os assessores dos partidos políticos e blocos parla-
mentares são técnicos e políticos. Trata-se de uma espécie de
filtro partidário da atuação das bancadas. Nesse sentido, cada
liderança partidária, desde que o partido tenha pelo menos
seis deputados ou um senador, possui seu corpo de assesso-
res, que atende às demandas dos deputados e senadores da
bancada, em geral, e do líder e vice-líderes, em particular.
Compete a eles dar parecer e orientar o posicionamento polí-
tico da representação sobre todas as proposições submetidas
a votos, tanto nas comissões quanto no plenário. Para ampliar
o debate, recebem o público externo sem qualquer restrição.
Em geral, são muito influentes perante os parlamentares da
bancada. Embora muitos deles tenham vinculação com os
respectivos partidos e sejam, mesmo, militantes, é comum que
sejam recrutados servidores de carreira, com alta qualificação
técnica, para atuar nas assessorias partidárias.

69
RIG em três dimensões

3º - Assessorias parlamentares
de órgãos públicos (externa)
Os ministérios e as entidades da Administração Indireta
(autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de eco-
nomia mista), sob a coordenação da Secretaria de Governo da
Presidência (o trabalho parlamentar do Poder Executivo já esteve
sob a coordenação da Casa Civil e da Secretaria de Relações
Institucionais da Presidência da República), mantêm assessoria
parlamentar para o acompanhamento das proposições de seu
interesse junto ao Congresso Nacional. Os assessores realizam
um trabalho de mão dupla: fornecem aos parlamentares os argu-
mentos técnicos e políticos para a defesa dos pleitos dos órgãos
e levam aos titulares desses órgãos os pleitos dos parlamentares
(deputados e senadores), que vão desde pedido de audiência,
passando pela liberação de emenda até a solução de demandas
específicas da base eleitoral do parlamentar. Essa assessoria goza
de razoável prestígio junto aos deputados e senadores.

4º - Servidores das Casas do Congresso


Nacional e suas representações de classe:
sindicatos e associações (interna)
Os servidores do Legislativo, notadamente os lotados nos
gabinetes, exercem influência direta sobre os parlamentares para
os quais trabalham. São eles, em grande medida, que sugerem
ações, prestam assessoria e resolvem pendências. As represen-
tações sindicais desses servidores valem-se dessa proximidade
para viabilizar seus pleitos, especialmente os de natureza salarial.
São contatos indispensáveis.

70
RIG em três dimensões

5º - Entidades, organizações não-


governamentais e grupos de pressão, que
incluem empresas, corporações, enfim, da
sociedade civil (externa)
Os setores organizados da sociedade, sob a forma de
grupos de pressão, assim como os escritórios de lobby exer-
cem influência, conforme demonstrado nos tópicos anteriores
desta Seção.

6º - Especialistas temáticos ou celebridades


que defendem pontos de vista ou causas
específicas (externa)
Os especialistas são chamados a opinar sobre os temas
relevantes objeto de debate nas comissões ou em grupos de tra-
balho em funcionamento nas Casas legislativas. São acadêmicos,
juristas, gestores, profissionais com notório saber e celebridades
que são convidados a contribuir com a construção de políticas
públicas nas diversas arenas.
As manifestações públicas e contatos diretos de autoridades
de alto nível do Executivo, como ministros, presidentes de agên-
cias reguladoras ou do próprio Presidente da República, também
têm forte influência no direcionamento da atuação parlamentar,
como indicativos das posições ou prioridades do governo relativos
ao processo legislativo.
A seguir, trataremos dos critérios empregados para identi-
ficar os parlamentares influentes ou os atores-chave do processo
decisório no Congresso Nacional.

71
RIG em três dimensões

7. Os atores-chave do processo
decisório no Poder Legislativo
A influência dos parlamentares no processo decisório, salvo
raríssimas situações, está diretamente associada à ocupação
de cargo, posto ou ao desempenho de missão. As exceções
ficam por conta da notória especialização ou credibilidade do
parlamentar, em geral decorrente de experiência acadêmica,
atuação no serviço público ou em atividade empresarial ou de
representação de classe.
Os cargos ou postos que asseguram poder capaz de
influenciar a tomada de decisão vão desde a presidência e vice-
presidência das Casas, assim como os demais cargos da Mesa
Diretora, passam pelos líderes e vice-líderes de partidos ou de
blocos parlamentares ou do governo, assim como a relatoria de
matérias relevantes. Os parlamentares orgânicos, que pertencem
à direção de seus partidos ou são chamados a cumprir missão
partidária, também exercem influência sobre a bancada.
Os parlamentares especialistas, aqueles que, independente-
mente de ocuparem algum posto, são chamados a opinar sobre
temas específicos, como infraestrutura, economia, finanças
públicas, legislação eleitoral e partidária, matérias orçamentá-
rias, questões trabalhistas e previdenciárias, sempre exercem
algum grau de influência nos temas de sua especialização. Em
geral são oriundos da academia, da liderança de movimentos
sociais ou empresariais e já ocuparam cargos relevantes na
Administração Pública.
É bom ter presente que o grau de influência é sempre
relativo e depende de uma série de fatores, como a conjuntura

72
RIG em três dimensões

e disputas políticas, o conteúdo do que está em debate e o


apoio da sociedade à matéria. O parlamentar ideal para um
tema não necessariamente o será para outros assuntos em
pauta no Legislativo.
Assim, cada ator político cumpre um papel. O cargo de
presidente de cada Casa, por exemplo, que coordena o Colégio de
Líderes, define a agenda e dirige as sessões de plenário, o torna
detentor de muito mais recursos e poder para criar as condições
para formar a maioria ou mesmo o consenso sobre determinada
matéria quando comparado ao posto de líder partidário, por mais
importante que seja a representação partidária.
É inquestionável que o líder do Governo – na Câmara dos
Deputados, no Senado Federal ou no Congresso Nacional – sendo
a matéria de iniciativa do Poder Executivo ou com forte impacto
sobre as finanças públicas, é um dos principais negociadores do
tema em debate. O líder de um grande partido político ou bloco
parlamentar, que seja o fiel da balança, podendo dar a vitória
ao governo ou à oposição, necessariamente possui peso decisivo
no desfecho da matéria.
Por outro lado, a ocupação de um cargo formal, a exemplo
de líder ou membro da Mesa Diretora, não faz necessariamente
de seu titular um parlamentar influente. O aspecto formal é im-
portante, mas pode não ser suficiente para que o parlamentar
exerça influência, uma vez que dependeria da conjuntura em
que foi escolhido, do modo de escolha ou da disputa em que o
posto foi ocupado.
O modo de escolha, portanto, pode ampliar ou reduzir o
potencial de influência. A definição de um líder, de um presidente

73
RIG em três dimensões

de comissão ou até mais raramente do presidente da Casa, por


exemplo, pode recair sobre um terceiro interessado, como forma
de evitar uma disputa que dividiria a bancada partidária, o que
não necessariamente seria o nome mais adequado para o mo-
mento político, na perspectiva da liderança política do colegiado.
O sistema de rodízio entre as bancadas partidárias também
pode levar a escolhas sem grande capacidade de articulação e
aglutinação. Nesse sentido, mesmo nos casos em que o escolhido
seja muito influente, nos momentos de crise política, ele pode se
tornar impotente por motivos diversos. O processo, nesse caso,
com todas suas implicações, é superior ao peso individual do
parlamentar, por mais importante que seja para o partido.
O mérito da política pública sob exame das Casas do
Congresso Nacional também interfere no nível de influência dos
parlamentares. Caso seja um tema com custos concentrados e
benefícios difusos, que mobiliza uma grande oposição, a influ-
ência maior muito provavelmente recairá em alguém que tenha
legitimidade perante os segmentos afetados.
A identificação dos parlamentares mais influentes, nesse
caso, passa por uma análise que leva em consideração o tema
da política pública, o ambiente político e, principalmente, as
credenciais do parlamentar.
É comum as pessoas associarem influência do parlamentar
apenas à sua capacidade de produzir decisões ou atos com re-
sultados concretos, que possam ser percebidos, sem embargos
de outras formas de influência. A abordagem da não-decisão,
caracterizada por ações de bastidores destinadas a ocultar ou
criar barreiras ou obstáculos à exposição do conflito, evitando

74
RIG em três dimensões

que matérias com potencial explosivo ou ameaçador sejam in-


cluídas na agenda política, também é uma forma de influência
reconhecida pela Ciência Política.
A não regulamentação do sistema financeiro é um exemplo
típico de não-decisão, como bem demonstrou Neiva (1995), em
sua dissertação de mestrado sobre “Estrutura de Poder e Processo
Decisório na Regulamentação do Sistema Financeiro Nacional”.
Outro exemplo significativo desse tipo de atuação, é o caso
da Convenção nº 87 da Organização Internacional do Trabalho
(OIT), sobre liberdade sindical, que foi enviada ao Congresso
em 31 de maio de 1949 sem que tenha sido votada conclu-
sivamente pelo Poder Legislativo, em razão de forças políticas
contrárias terem atuado nos bastidores para que a matéria não
fosse pautada.
Um exemplo extremo da não-decisão é a omissão das
Mesas Diretoras da Câmara dos Deputados e do Senado Federal
em promulgar a PEC nº 91/2019, que regulamenta a edição de
medidas provisórias. Essa Proposta de Emenda à Constituição foi
aprovada conclusivamente nas duas Casas do Congresso Nacio-
nal desde 12 de junho de 2019 e até julho de 2022 ainda não
havia sido promulgada, numa situação vexatória. Trata-se de um
exemplo não de ausência de deliberação, mas de omissão em
dar vigência a uma deliberação soberana do Congresso Nacional.
O método da não-decisão, embora menos visível que
outros, também envolve o manejo de regras, procedimentos,
instituições, mitos e valores. O parlamentar que consegue evitar
que o processo de coleta de assinaturas para a instalação de
uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) seja concluído ou

75
RIG em três dimensões

mesmo iniciado ou, ainda, aquele cuja simples não-manifestação


sobre determinado assunto contribui para que o tema sequer
seja aventado, também deve ser considerado como um agente
público influente.
O grau de influência, portanto, depende dos aspectos
institucionais (posto que ocupa na estrutura das Casas ou dos
partidos), reputacionais (como o parlamentar é visto por seus
colegas, consultores legislativos, assessores de bancadas, jor-
nalistas e analistas políticos) e decisionais (como se comporta
frente a situações concretas, como articulações, negociações,
votações), além do acesso aos tomadores de decisões.
Destaca-se como item importante nesse contexto a sensi-
bilidade política. Em determinadas situações, para aprovar uma
matéria de interesse do Poder Executivo, o caminho mais fácil é
aliar-se ao governo. Por outro lado, para rejeitá-la é melhor traba-
lhar em parceria com a oposição e com setores descontentes da
ação governamental. Já para evitar que determinada matéria seja
incluída em pauta um bom método é o contato nos bastidores
com o presidente da Casa e com o Colégio de Líderes, instâncias
essenciais para a definição das matérias que serão incluídas na
ordem do dia do Plenário. É preciso ter em mente que os mais
influentes parlamentares são aqueles que articulam, formulam,
negociam, enfim, influenciam a agenda legislativa.
O DIAP, na série “os Cabeças do Congresso Nacional”, pu-
blica anualmente, desde 1994, um levantamento com os 100
parlamentares mais influentes do Parlamento, que foi concebido
e continua sendo supervisionado por este autor, no qual os par-
lamentares mais influentes são identificados a partir de infor-

76
RIG em três dimensões

mações quantitativas e qualitativas, que levam em consideração


aspectos institucionais, reputacionais e decisionais. Mapeados os
parlamentares influentes, eles são classificados pelos seguintes
fatores de habilidade: 1) debatedor; 2) articulador; 3) formulador;
4) negociador; e 5) formador de opinião.
A seguir, trataremos do comportamento e das formas de
abordagem dos parlamentares, com dicas e sugestões a serem
observadas para o êxito do trabalho parlamentar.

8. Regras para o corpo a corpo


no trabalho parlamentar
São funções de quem atua no trabalho parlamentar:
1) visitar gabinetes; 2) manter contato direto com os parla-
mentares; 3) participar de audiência pública; 4) acompanhar
reuniões de comissões ou sessões do plenário; 5) manter
contato com assessores de comissões e de órgão de apoio ao
processo legislativo, de lideranças e consultores legislativos;
6) dialogar com representantes de grupos de pressão; e 7)
reunir-se com líderes, vice-líderes, presidentes de comissões,
membros da Mesa Diretora, presidentes ou coordenadores
de frentes parlamentares, relatores de matérias relevantes,
profissionais da imprensa que cobrem o Congresso Nacional,
entre outros agentes influentes.
Nesse contato direto com os parlamentares, o interlocutor
ou representante do grupo de pressão deve observar algumas
diretrizes e regras, como a forma de abordagem, o modo de
apresentação do conteúdo e a escolha das pessoas a serem
procuradas.

77
RIG em três dimensões

Como forma de contribuir com o debate sobre esse impor-


tante tema, apresentamos, a seguir, quatro advertências que
consideramos essenciais.
A primeira e principal advertência direcionada a quem atua
em trabalho parlamentar é ter em mente que o principal inte-
ressado na causa a ser levantada é o próprio interlocutor junto
a um deputado ou senador e não o contrário. Portanto, não se
deve exigir de forma abrupta o posicionamento do parlamentar,
que é o protagonista do voto.
A segunda recomendação, igualmente importante, refere-se
ao entendimento de que para a aprovação de uma proposição
necessita-se do voto da maioria parlamentar e, em consequên-
cia disso, não se pode deixar de articular com um parlamentar
em razão de seus votos no passado, da sigla de seu partido, de
ideologia ou de opção política. Dada a dinâmica dos trabalhos
legislativos, o posicionamento de um parlamentar pode ser al-
terado em eventos presentes e futuros.
A terceira advertência diz respeito à necessidade da presença
de urbanidade e de cordialidade no trato com os parlamentares.
Considerando-se que o objetivo de uma articulação é persuadir ou
convencer o parlamentar a se posicionar de acordo com os interes-
ses formulados, não se deve tratar os deputados ou senadores com
hostilidade ou de forma rude, independentemente de divergências
partidárias, ideológicas, regionais, religiosas ou de outra ordem.
A última recomendação tem a ver com a organização da
abordagem ao parlamentar. Nesse sentido, o trabalho de apro-
ximação deve ser planejado, ter objetivo específico e definido,
evitando a perda de tempo com a articulação de parlamentares

78
RIG em três dimensões

que não estejam vinculados à questão que se deseja definir.


A título de exemplo, não se deve perder tempo ao se procurar
um parlamentar da comissão “x”, quando o projeto estiver sob
exame da comissão “y”, exceto se for para ele mediar o contato
ou promover a aproximação ou acesso.
Quanto à forma de atuação, quem estiver fazendo o trabalho
de articulação deve: 1) ser cortês; 2) vestir-se adequadamente,
no caso de homem, com paletó e gravata, sob pena de não
ser autorizado a circular em todas as dependências da Câmara
dos Deputados e do Senado Federal; 3) identificar-se citando a
função que exerce ou a entidade a que pertence ou é vinculado;
4) conhecer antecipadamente a história do parlamentar e, se
possível, a opinião dele sobre o pleito; 5) iniciar a conversa, de
preferência, lembrando algum episódio em que o parlamentar
apareça bem; 6) priorizar argumentos e teses aderentes ao perfil
e posicionamento do parlamentar; e 6) lembrar sempre que é
você quem precisa do voto dele e não o contrário.
Em relação ao conteúdo, o interlocutor deve: 1) saber exa-
tamente o que deseja aprovar, modificar ou rejeitar; 2) conhecer
o conteúdo da proposição, suas implicações e impactos, para
mostrar a justeza do pleito ou o contrário, dependendo do viés;
3) apresentar, na medida do possível, argumentos técnicos,
que sustentem ou justifiquem o pleito favorável ou contrário,
dependendo do interesse; e 4) demonstrar, se for possível, que
os impactos sobre as finanças públicas, os consumidores ou os
usuários estão dentro da razoabilidade ou não, conforme o caso.
É de se destacar que o conhecimento sobre os procedimentos
do processo legislativo facilita sobremaneira o diálogo com os
parlamentares.

79
RIG em três dimensões

Sobre o público-alvo deve-se procurar, prioritariamente: 1)


os parlamentares das relações pessoais de quem está fazendo o
trabalho parlamentar ou de sua entidade; 2) o relator da matéria
de seu interesse; 3) os membros das comissões onde a proposição
se encontra em discussão, a começar pelo seu presidente; 4) os
líderes partidários; e 5) os demais parlamentares interessados
e influentes na matéria.
O tópico a seguir trata do checklist que o profissional de
relações institucionais ou o representante de interesse precisa
fazer em relação aos temas ou políticas públicas que acompanha.

9. Perguntas-chave para o
acompanhamento de políticas públicas
O profissional de relações institucionais e governamentais
ou o representante de interesses, para projetar um bom diag-
nóstico e fazer um bom prognóstico, precisa se questionar sobre
algumas perguntas-chave acerca da política pública sob monito-
ramento. Segundo Eduardo Ricardo, da Patri26, com adaptações
do autor, são as seguintes as indagações mais comuns a serem
levantadas para bem conhecer os impactos do tema sobre o
qual pretende atuar.
1) O que o tema implica?
2) Quanto à normatização, quais são os princípios consti-
tucionais e legais aplicáveis?
3) Quais as alternativas disponíveis?
4) Como o tema nos afeta?
26
Apresentação em PowerPoint com o título “Lobby; por quê?, com data de 15/05/2008.

80
RIG em três dimensões

5) Quem defende o quê no governo?


6) O que defendem os grupos de interesses sobre a matéria?
7) Qual a racionalidade de cada proposta?
8) Qual o interesse de quem defende cada proposta?
9) Quem se opõe ou pode se opor a cada proposta e por quê?
10) Quais são os estudos acadêmicos e relatórios sobre
o tema?
11) Quais são as perspectivas políticas?
12) Qual é o cronograma de tramitação?
13) Como os veículos de comunicação se posicionam sobre
o tema?
O Poder Executivo, no anexo ao Decreto nº 9191/2017, que
regulamenta, no âmbito deste Poder, a Lei Complementar nº 95,
de 1998, também estabelece um passo a passo com perguntas
que os formuladores de políticas públicas precisam fazer para a
elaboração dos atos legais. O checklist constante do tópico 5.3
do Capítulo II deste livro traz o roteiro com as perguntas-chave.
A seguir, trataremos das dimensões de atuação das Casas
Legislativas.

10. Dinâmica das Casas Legislativas


As duas Casas do Congresso Nacional possuem caraterís-
ticas próprias no encaminhamento de seus trabalhos. Embora
ambas sigam princípios comuns de decisão, há distinções no-
tórias quanto ao estilo de convivência entre seus membros e a

81
RIG em três dimensões

dinâmica legislativa de cada uma. Compreender as diferenças


entre esses dois ambientes é fundamental para o profissional de
relações institucionais obter êxito em sua atuação.
A Câmara dos Deputados é uma Casa mais aberta, aces-
sível e plural, onde vários segmentos da sociedade estão repre-
sentados. Dessa forma, o embate entre diferentes visões estimula
o debate do contraditório e torna o processo legislativo bastante
litigioso. Portanto, conhecer os procedimentos de seu regimento
interno é fundamental para o ordenamento e êxito dos trabalhos.
Os líderes partidários também possuem grande importância na
racionalização e no encaminhamento das decisões, pois atuam
como negociadores constantes.
Por sua vez, o Senado Federal é tradicionalmente inte-
grado por políticos mais experimentados, como ex-prefeitos,
ex-governadores e até ex-presidentes da República. A “Câmara
Alta” é menos acessível que a Câmara dos Deputados e menos
suscetível a pressões. Com um colegiado menor, cada senador
possui peso próprio, o que estimula a interação entre os pares
visando à construção de acordos. O seu regimento interno asse-
gura ainda a possibilidade de participação plena de cada senador
nas atividades legislativas. O processo legislativo interno é mais
aberto e oferece uma gama de possibilidades de intervenção,
mediante entendimentos entre os senadores. Em síntese, o estilo
de convivência no Senado Federal privilegia a negociação e os
acordos e desfavorece a disputa ideológica.
Como se pode notar, o jogo parlamentar possui várias nuan-
ces e conhecê-las é fundamental para um trabalho produtivo. No
próximo tópico, apresentaremos os procedimentos da tramitação
de proposições legislativas.

82
RIG em três dimensões

11. Tramitação legislativa no Congresso


Nacional – como se fazem as leis
A tramitação de matérias legislativas segue procedimentos
previstos nos regimentos internos de cada Casa e varia conforme
a natureza e a espécie normativa das proposições.
De uma forma geral, tanto a Câmara dos Deputados quanto
o Senado Federal adotam alguns processos comuns de tramita-
ção. Porém, com classificações e prazos próprios.
O mais comum deles é o procedimento tradicional, que
prevê análise prévia nas comissões temáticas e deliberação final
em Plenário. Esse rito é classificado na Câmara dos Deputados
como regime de tramitação ordinária e no Senado Federal como
matéria em tramitação normal.
Formalmente, os projetos seguem mais ou menos o seguin-
te roteiro nas duas Casas do Congresso: 1) leitura em plenário,
numeração e distribuição às comissões permanentes; 2) se dis-
tribuído a mais de três comissões de mérito, no caso da Câmara
dos Deputados, a matéria será apreciada em comissão especial;
3) as proposições passam primeiro pelas comissões de mérito
e, no caso da Câmara dos Deputados, a última é a Comissão de
Constituição, Justiça e de Cidadania; e 4) apreciação conclusiva
na comissão ou no plenário, dependendo da matéria.
Os procedimentos de apreciação podem ser o ordinário ou o
especial. No primeiro caso, existem três hipóteses de tramitação:
1) a normal, que passa pelo Plenário; 2) a abreviada, também
conhecida como conclusiva ou terminativa, que passa apenas
pelas comissões, exceto se houver recurso para o Plenário da
Casa; e 3) a sumária ou urgente, em que a matéria vai direto

83
RIG em três dimensões

para deliberação em plenário. No segundo, estão os casos de


tramitação especial, com rito e quorum diferenciados para apre-
ciação, como PEC, Códigos, etc.
O procedimento abreviado de tramitação, que incide sobre
a forma de apreciação de determinadas matérias, prevê delibe-
ração somente no âmbito das comissões, sem necessidade de
manifestação do Plenário. Em ambas as Casas, esse processo é
aplicado exclusivamente a projetos de lei ordinária, desde que
não versem sobre assuntos que não são passíveis de delegação,
relacionados no § 1º, art. 68 da Constituição Federal27. Na Câm-
ara dos Deputados, esse procedimento é chamado de apreciação
conclusiva e no Senado Federal de decisão terminativa.
O procedimento sumário consiste em regime de urgência e
objetiva acelerar a tramitação de proposições mediante delibe-
ração em Plenário com a dispensa de interstícios, prazos e outras
formalidades regimentais. Nem todas as proposições comportam
tal rito, pois se aplica apenas a projetos de lei ordinária, projetos
de lei complementar, projetos de decreto legislativo e projetos
de resolução.
Já o procedimento especial configura um curso de tramita-
ção diferenciado e específico para determinados tipos de propo-
sições. Denomina as matérias sujeitas a disposições especiais,
em que cada tipo possui um rito próprio. É o caso das Propostas
de Emenda à Constituição (PEC), Medidas Provisórias (MPV) e
projetos de Código.

27
Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência
privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a
legislação sobre: I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus
membros; II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais; III - planos plurianuais,
diretrizes orçamentárias e orçamentos.

84
RIG em três dimensões

Seja qual for o rito de tramitação, a apreciação das ma-


térias nas instâncias deliberativas (comissões e Plenário) deve
cumprir obrigatoriamente algumas etapas. Em resumo, tal roteiro
compreende:
1) emendamento – etapa em que os parlamentares podem
formular sugestões de alteração à matéria em análise;
2) parecer – apresentação de voto opinativo e instrutório
pelo relator;
3) discussão – debate parlamentar acerca da matéria;
4) encaminhamento/orientação – manifestação da posição
partidária pelo líder de bancada ou outro representante desig-
nado; e
5) Votação – coleta dos votos e proclamação do resultado final.
A deliberação das matérias legislativas também observa
quóruns de decisão, que são os números de presenças necessá-
rias para a realização de uma votação e de votos para a aprovação
de uma proposta. Esses quantitativos também variam conforme
a natureza e o tipo da proposição.
Os quóruns de votação podem ser de maioria simples ou
qualificados. No primeiro, a aprovação de uma matéria neces-
sita do voto favorável da maioria dos membros do colegiado em
questão, desde que esteja presente a maioria absoluta de sua
composição. Já os qualificados requerem uma maioria específica
de votos. São exemplos: maioria absoluta, que corresponde a
50% mais um do colegiado e é exigida em votação de Lei Com-
plementar, ou de 3/5 da composição da Casa, que é exigida em
votação de Proposta de Emenda à Constituiçao.

85
RIG em três dimensões

No quadro a seguir, apontaremos os principais quóruns


de decisão.
Quadro 2 – Quorum para deliberação no Congresso Nacional
Maioria
Tipo Maioria Simples 3/5 2/3
Absoluta

Projeto de Lei Proposta de


Processo de
Projeto de Lei (PL) Complementar Emenda à
impeachment
(PLP) Constituição (PEC)

Projeto de
Veto Presidencial Resolução sobre
Medida Provisória (MPV) -
(VET) alíquotas de ICMS
(PRS)*
Matéria

Projeto de Decreto
Legislativo
para aprovação
Projeto de Decreto de tratados e
- -
Legislativo (PDL) convenções
internacionais
sobre direitos
humanos

Projeto de Resolução
- - -
(PRC/PRS)

CD SF CD SF CD SF CD SF
Votos

Variável** Variável*** 257 41 308 49 342 54

* Competência constitucional privativa do Senado.


** Maioria dos votos favoráveis, desde que ao menos 257 deputados tenham votado.
*** Maioria dos votos favoráveis, desde que ao menos 41 senadores tenham votado.

No tópico a seguir, chamaremos atenção para a necessi-


dade de domínio dos instrumentos regimentais empregados nas
discussões e deliberações das políticas púbicas.

86
RIG em três dimensões

12. Jogo parlamentar – artifícios


regimentais
O regimento é a lei interna e, por assim dizer, a bíblia das
Casas que compõem o Congresso Nacional. Nele constam as
regras que orientam e disciplinam todas as etapas do processo
de elaboração legislativa, desde a iniciativa, passando pelo
emendamento, o rito de tramitação, os pedidos de vista, dis-
cussão, votação, promulgação até a apreciação de vetos. Cada
Casa do Congresso possui o seu regimento interno: Câmara dos
Deputados, Senado Federal e Congresso Nacional. Além disso,
há normas específicas, como as que regem a apreciação de
medidas provisórias e a apreciação da proposta orçamentária,
que também tem o status de normas regimentais.
As regras regimentais, entretanto, se subordinam à orienta-
ção política, pois, entre a vontade majoritária da Casa Legislativa
e a regra regimental, vale a primeira, que se materializa pela
“concertação” ou, não havendo acordo, pela aferição ou votação
ostensiva do colegiado. Ou seja, em política, o jogo de barganhas
vale mais que a regra, inclusive porque a missão primeira da
política é viabilizar o consenso ou formar a maioria possível na
conjuntura. De toda forma, há disposições regimentais inegoci-
áveis, como a tramitação especial de uma Proposta de Emenda
à Constituição quanto ao quórum especial de aprovação, três
quintos, e os dois turnos de discussão e votação, que devem ser
rigorosamente cumpridos.
Além disso, o processo de elaboração legislativa está sujeito
ao controle judicial, especialmente quando há descumprimento
de norma constitucional. Vícios de iniciativas, deliberação por

87
RIG em três dimensões

quórum insuficiente, supressão de fase, adulterações de votações,


dentre outras ilegalidades, ou inconstitucionalidades, podem
ser reparadas por decisão judicial. O Supremo Tribunal Federal,
entretanto, quando a violação é apenas de ordem regimental,
tem entendido que se trata de assunto interno das Casas.
O regimento, em geral, é o instrumento da maioria. Ape-
sar disso, a minoria faz uso dele para promover suas manobras
ou para não ser atropelada em muitos momentos do processo
legislativo, a exemplo da apresentação de recursos, situação
típica de preservação dos direitos das minorias. Os presidentes
da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, assim como
os presidentes de comissões, são os intérpretes das dúvidas
regimentais dos parlamentares, levantadas, em regra, por meio
de questão de ordem. Os presidentes das Casas, quase sempre,
pertencem aos partidos da base do governo e, nessa hipótese,
a situação do Poder Executivo fica muito facilitada. Podem, por
exemplo, convocar sessões extraordinariamente na conveniência
política, entre outras prerrogativas regimentais.
Os questionamentos, feitos sob a forma de reclamação,
de questão de ordem, de recurso ou de esclarecimento, são
respondidos pelos presidentes e, dependendo da matéria, as
respostas podem ser conclusivas, sem possibilidade de recurso
ao plenário. Nas situações em que há recursos ao plenário, quase
nunca com efeito suspensivo, exige-se que antes seja ouvida a
Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, havendo
casos que nunca são resolvidos por falta de interesse político
por parte das maiorias.
Os instrumentos regimentais e constitucionais, tanto da
oposição quanto da situação, são muitos. O governo, para evitar

88
RIG em três dimensões

que matérias indesejadas sejam votadas, maneja e em certa


medida controla a pauta do Congresso Nacional, particularmente
da Câmara dos Deputados, com a edição de medidas provisórias
e com os pedidos de urgência constitucional, que bloqueiam a
pauta depois de 45 dias de seu envio ao Poder Legislativo.
A oposição, por sua vez, faz uso de um vasto conjunto de
recursos para evitar ou retardar a votação de matéria de interesse
do governo, o que vai desde a obstrução ou negação de quórum,
passa por pedidos de retirada de pauta e/ou de adiamento, até
a apresentação de destaques para votação em separado.
O processo de obstrução é uma estratégia legal e legítima
de atuação característica das oposições na Câmara dos Depu-
tados, onde o grau de disputa entre os grupos políticos é mais
acirrado. No Senado Federal, em geral, as disputas se resolvem
por acordos. Portanto, os instrumentos de obstrução são poucos
utilizados.
Em tempos passados, o chamado “kit obstrução” da Câ-
mara dos Deputados, conjunto de expedientes regimentais que
visam dificultar o avanço de deliberações, já foi mais robusto.
Atualmente, após a aprovação da Resolução nº 21/2021, o
número de artifícios obstrutivos à disposição das minorias foi
reduzido consideravelmente.
Geralmente, o processo de obstrução inicia-se com a au-
sência do registro de presença no Plenário ou nas comissões.
Quando é alcançado o quórum de deliberação, que é de maioria
absoluta (no caso do Plenário da Câmara, 257 deputados e,
no do Senado, 41 senadores), os deputados ou senadores de
oposição solicitam a retirada da matéria de pauta.

89
RIG em três dimensões

Na Câmara dos Deputados, não cabe solicitação de retirada


se a matéria estiver sendo analisada na mesma sessão em que
tenha sido aprovado o regime de urgência para sua apreciação.
Caso o primeiro requerimento seja rejeitado, apresenta-se outro
com o pedido de adiamento da discussão. Nessa Casa Legisla-
tiva, o adiamento é permitido por até cinco sessões, a depender
do tipo de matéria e regime de tramitação. Após a discussão,
passa-se à votação da matéria. Nessa etapa também cabe novo
requerimento de adiamento. Cada requerimento é votado nomi-
nalmente, acompanhado de encaminhamento e orientação das
bancadas.
Esgotadas as possibilidades de adiamento, a oposição faz
uso do Destaque para Votação em Separado (DVS), um instru-
mento que permite aos partidos destacar partes de uma propo-
sição, em geral as partes polêmicas, para que sejam submetidas
a uma votação específica. O DVS é um eficiente meio utilizado
pela oposição, porque além da possibilidade real de vitória, a
matéria destacada vai obrigatoriamente a votos, multiplicando
a quantidade de votações. Nas matérias que exigem quorum
qualificado para aprovação – maioria absoluta para Projeto de Lei
Complementar (PLP), e 3/5 para Proposta de Emenda à Cons-
tituição (PEC) –, o ônus para a obtenção dos votos para evitar
retirada de trechos dos textos é de quem deseja a manutenção
do texto sem alteração, geralmente o governo.
O número de destaques por bancada é proporcional à re-
presentação partidária. Na Câmara dos Deputados, os partidos
ou blocos partidários com 5 a 24 deputados têm direito a um
destaque; com 25 a 49, a dois destaques; já os partidos com

90
RIG em três dimensões

50 a 74 têm direito a três destaques; e os que possuem mais


de 74 deputados têm direito a apresentar quatro requerimentos
de destaque. Já no Senado Federal, os partidos com entre 3 e
8 senadores dispõem de um destaque; aqueles com entre 9 e
14 fazem jus a dois destaques; e a partir de 15 têm direito a
três destaques.
Enquanto a oposição trabalha para evitar ou adiar a votação
das matérias de interesse do Poder Executivo, a situação empe-
nha-se para acelerar o processo de deliberação, fazendo uso dos
recursos regimentais disponíveis, entre os quais, a prerrogativa
de pedir encerramento de discussão de determinada matéria. Na
Câmara dos Deputados, isso pode ocorrer após 12 deputados
terem usado a palavra (seis a favor e seis contra). No Senado
Federal, após seis senadores discutirem a matéria (três a favor
e três contra).
Além desses, há outros instrumentos que permitem
acelerar ou retardar a votação de uma matéria. Os pedidos
de urgência, que visam conferir procedimentos sumários de
discussão e votação, são instrumentos muito utilizados. Na
Câmara dos Deputados, inclusive, existe a chamada urgência
urgentíssima, que permite a deliberação imediata da maté-
ria. Entretanto, apenas para submeter esse requerimento à
apreciação do Plenário, exige-se o apoio de 257 deputados
ou líderes e vice-líderes que representem esse número. Faz-se
necessário o mesmo número de votos para aprovar o reque-
rimento. Uma vez aprovada a urgência urgentíssima todas as
etapas e interstícios são mitigados, podendo a matéria objeto
do requerimento ser votada na sequência.

91
RIG em três dimensões

13. Como se relacionar com os poderes


Legislativo e Executivo28
O profissional de relações institucionais e governamentais,
na condição de representante, articulador e defensor de interes-
ses, deve observar alguns princípios gerais e pautar sua atuação
por algumas providências e condutas específicas, sob pena de
perda de credibilidade, tanto da instituição que representa quanto
dele próprio.
Esses princípios consistem em: 1) observar e respeitar a
função social do diálogo institucional e reconhecer o papel e a
responsabilidade dos agentes públicos; 2) observar os princípios
éticos e morais; 3) observar os princípios da transparência, da
participação e da prevalência do interesse público em todo pro-
cesso decisório em que atue; 4) respeitar a legislação vigente
relativa à integridade pública, às boas práticas e às normas de
conduta dos profissionais; e 5) não patrocinar pleitos que levem
à concorrência desleal.
Quanto às providências e condutas específicas a serem
observadas na interação com os decisores, três são fundamen-
tais. A primeira é estar preparado para o trabalho e para isso
é preciso sempre dispor de documentos instrutivos, bem como
saber quem são as autoridades a serem procuradas. A segunda
consiste em identificar o nível de prioridade dos temas a serem
acompanhados. E a terceira consiste em examinar as condições
ou possibilidades de deliberação frente aos interesses envolvidos.
Em relação à primeira providência, o profissional deve
sempre dispor de documentos instrutivos, seja para sua própria
28
Ver tópico 7 do Capítulo II deste livro (p. 152).

92
RIG em três dimensões

informação, seja para entregar às autoridades. Entre os docu-


mentos mais comuns, destacam-se: nota técnica, memoriais
com dados e fatos, manifestação com a posição do representado
frente ao tema e propostas concretas para a solução de demanda,
análise comparativa ou mesmo uma simples correspondência
com o pensamento do interessado (pessoa física ou jurídica) ou,
dependendo da situação, nota ou artigo de opinião publicado
na imprensa.
Além disso, de acordo com os interesses representados ou
de segmentos afetados pela medida, deve-se elaborar uma lista
das autoridades ou decisores a serem procurados para influenciar
na decisão, em conformidade com os interesses do representado.
No trabalho de convencimento e persuasão, após o exame
minucioso da conveniência e da oportunidade, o grupo de pressão
pode promover mobilizações e garantir visibilidade ao tema, em
geral, mediante entrevistas coletivas, campanhas publicitárias,
publicação de artigos de opinião nos jornais e revistas ou enco-
mendar pesquisas sobre o tema.
Já para identificar o que é prioritário, o que representa
ameaças e oportunidades, deve ficar atento ao impacto da
medida sobre os segmentos representados, e também à pers-
pectiva de ação do governo, do setor empresarial, da mídia e
de outros atores relevantes para que haja ou não deliberação
sobre o tema.
Assim, quanto mais uma matéria afetar os interesses dos
segmentos representados e quanto mais tiver chance de aprova-
ção ou adoção, mais efetiva será a prioridade de monitoramento
e ação sobre os decisores.

93
RIG em três dimensões

Para aferir a relevância de uma matéria legislativa, é re-


comendável pontuar o nível de prioridade de cada articulação,
que pode ser definido como baixo, médio, alto ou urgente, ou,
ainda, mediante pontuação de zero a dez. Quando o nível for alto
e a nota for dez, a prioridade é máxima e o assunto é urgente.
Em geral, as chances de aprovação são mais impactantes
do que o próprio conteúdo. A título de exemplo, um conteúdo
com médio impacto, porém com grandes chances de aprovação
e/ou adoção, é mais prioritário ou urgente do que um assunto
de grande impacto, mas sem chances reais de aprovação ou
adoção em médio prazo.
Relativamente às perspectivas de votação, dentre outras
variáveis, deve-se observar o interesse do governo no tema, a
receptividade do tema pelo Congresso Nacional, o prestígio,
importância e dedicação do autor da proposição, o perfil polí-
tico do relator, o apoio de partidos e de frentes parlamentares,
a complexidade da tramitação, o impacto financeiro para o
governo, para empresas e para cidadãos, a mobilização e
articulação dos setores envolvidos, o calendário legislativo ou
os prazos legais e, principalmente, o apelo popular do tema
sobre o Congresso Nacional ou governo federal. Os editoriais
de jornais e a opinião dos articulistas da grande imprensa
também influenciam a decisão, porque modulam, formam e
condicionam a opinião pública. Assim, se o tema conseguir
ingressar na agenda de políticas públicas do governo ou do
Legislativo, e houver uma proposta capaz de ser acatada ou
apoiada politicamente, isso poderá gerar a janela de oportu-
nidade para a sua aprovação.

94
RIG em três dimensões

A rejeição da Proposta de Emenda à Constituição (PEC)


37/2011, que tratava da chamada mordaça do Ministério Públi-
co, ilustra bem esse fato, pois a proposição somente foi rejeitada
pelo engajamento da opinião pública sobre o assunto durante as
manifestações populares de junho de 2013. Outro exemplo foi a
pressão da opinião pública sobre o Congresso Nacional, frente à
resistência do Poder Executivo, na iniciativa e aprovação de leis
de socorro aos Estados e Municípios, às empresas e aos vulnerá-
veis durante o período mais agudo da Pandemia da Covid-19. A
compra da vacina pelo governo federal ocorreu porque o governo
de São Paulo comprou a Coronavac da China, pressionando o
governo central a adquirir o produto no mercado interno.

14. Conclusão do Capítulo


Neste Capítulo, em suas duas Seções, tivemos oportunida-
de de apresentar as principais ferramentas para o acompanha-
mento do trabalho parlamentar, com dicas e informações sobre
a defesa de interesses perante o Poder Legislativo. Esperamos
ter apresentado um roteiro capaz de possibilitar a montagem
de estratégias e táticas para um trabalho exitoso em favor dos
interesses representados.
No próximo Capítulo, trataremos da representação de in-
teresses perante o Poder Executivo, com foco no desenho insti-
tucional do Governo Federal, nas regras que presidem a tomada
de decisão e no funcionamento ou operação das instituições
políticas, trazendo uma visão ampla do sistema decisório na
Administração Direta e nas Agências Reguladoras.

95
CAPÍTULO II

DEFESA DE
INTERESSES
PERANTE OS
PODERES PÚBLICOS
RIG em três dimensões

O
primeiro Capítulo teve como foco o trabalho parlamentar.
Neste segundo, trataremos da defesa de interesses perante
os poderes públicos, apresentando uma visão abrangente do
funcionamento do governo federal e de suas instituições, além
de dicas, análises e informações sobre o processo decisório, suas
regras e atores centrais.
Além de explicar porque se relacionar, como se relacionar
e com quem se relacionar no governo, apresentamos uma visão
ampla sobre o que é necessário ao trabalho de representação de
interesses e de relações institucionais e governamentais junto ao
Poder Executivo, com noções sobre:
1) as estruturas, as competências, os cargos em comissão
e as funções de confiança e os regulamentos internos de cada
órgão ou entidade, isto é, apresenta a estrutura organizacional,
as regras, os atores e a operacionalização ou o funcionamento
dos órgãos de decisão;
2) a complexidade do processo decisório, incluindo os
fatores facilitadores e dificultadores da tomada de decisão;
3) os tipos de políticas públicas e suas arenas;
4) as disputas no interior do governo (ideológica, política
ou orçamentária);
5) a hierarquia do processo decisório no governo;
6) a influência dos cargos técnicos e políticos no processo
decisório;
7) o nível de participação no processo decisório;
8) a estrutura padrão de cada ministério; e
9) os critérios para liberação de recursos pela junta orça-
mentária.
99
RIG em três dimensões

1. O Estado, suas instituições e


diretrizes
Os Poderes do Estado – exercidos pelas instituições públicas,
como os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário – fazem parte
de um sistema que atua de forma complementar e harmônica,
porém com interdependência recíproca, numa estreita relação de
freios e contrapesos, na qual um controla os excessos do outro.
Na classificação do jurista Ayres Brito, ex-presidente do
Supremo Tribunal Federal (STF), as Constituições dividem os
poderes e suas instituições entre os que governam, cujos titulares
são submetidos ao sufrágio universal, e os que impedem o des-
governo, cujos titulares são vitalícios e/ou pertencem ao núcleo
estratégico do Estado, incluindo o Executivo e o Legislativo no
primeiro eixo, e o Judiciário, o Ministério Público, os Tribunais
de Contas e a polícia no segundo eixo.
O Tribunal de Contas da União (TCU), como instituição de
controle externo e órgão auxiliar do Congresso Nacional na missão
de acompanhamento da execução orçamentária e financeira do
País, e o Ministério Público, como instituição essencial à Justiça e
responsável pela defesa dos direitos sociais e individuais indispo-
níveis, a defesa da ordem jurídica e do regime democrático, são
instituições fundamentais na instrução de ações em defesa dos
interesses da sociedade e dos preceitos constitucionais e legais,
com relevo para o combate a desvios de conduta, aos malfeitos
e à má gestão de recursos públicos. Entretanto, instituições com
tamanho poder também precisam estar sujeitas a algum tipo de
controle, pois, como qualquer organização conduzida por humanos,
cometem excessos e quando isto ocorre os danos à reputação de

100
RIG em três dimensões

governantes, à governabilidade e à própria economia do País são


enormes, como ocorreu recentemente no âmbito da Lava-Jato.
No Estado moderno, a política, como arte de governar,
possui três dimensões: 1) uma institucional, a forma como se
organiza o sistema de poder; 2) outra processual, o modo como
as instituições decidem, negociam e resolvem conflitos; e 3) uma
terceira sobre o conteúdo das políticas públicas.
O Estado, no exercício de suas macrofunções29, necessita
da participação e do controle social de suas ações e decisões,
tanto para calibrar o emprego de seus poderes e aperfeiçoar as
políticas e a gestão públicas, quanto para avançar no cumprimen-
to dos fundamentos da República Federativa do Brasil. O Estado
Democrático de Direito tem entre suas prioridades a proteção do
território, a garantia da ordem e da segurança pública, além do
provimento de direitos fundamentais à população, nos termos da
Constituição Federal, mediante funções alocativas (provimento
de bens públicos), distributiva (política de renda) e atendimento
à população (serviços públicos essenciais).
As diretrizes do Estado Democrático de Direito Brasileiro
estão expressas na Constituição Federal, especialmente por meio
dos fundamentos e objetivos da República, que são orientações a
serem seguidas e implementadas pelos governos e pelas institui-
ções públicas, assim como devem ser observados os princípios
que regem as relações internacionais. Essas diretrizes, entretanto,
não são cumpridas de maneira automática, pois não configuram
29
a) funções políticas, que consistem na definição de direitos e deveres dos cidadãos, assim como a relação
entre pessoas e entre estas e as instituições; b) funções executivas, voltadas para a implementação das
políticas públicas; c) funções jurisdicionais, direcionadas à solução de litígios; d) funções fiscalizatórias,
destinadas à garantia do cumprimento da ordem jurídica e da regulação estatal; e e) funções de defesa da
ordem e integridade do território.

101
RIG em três dimensões

apenas expressão de um ser, mas também de um dever ser.


Portanto, para serem implementadas, elas dependem, além de
condições materiais, da visão de mundo, da vontade e do com-
promisso político dos governantes, da pressão, da fiscalização e
do controle social. Essas diretrizes e princípios constitucionais
estão permanentemente em disputa.
O quadro a seguir sintetiza essas diretrizes, previstas nos
artigos 1º, 3º e 4º da Constituição Federal:
Quadro 3 – Direitos Fundamentais da Constituição Federal
PRINCÍPIOS NAS
FUNDAMENTOS OBJETIVOS RELAÇÕES
ART. 1º DA CF ART. 3º DA CF INTERNACIONAIS
ART. 4º DA CF

Estado Democrá- Constituem objetivos A República Federativa


tico de Direito e fundamentais da do Brasil rege-se nas suas
tem como funda- República Federativa relações internacionais
mentos: do Brasil: pelos seguintes princípios:
I - a soberania; I - construir uma I - independência
nacional;
II - a cidadania; sociedade livre, justa e
solidária; II - prevalência dos
III - a dignidade direitos humanos;
da pessoa huma- II - garantir o desen-
III - autodeterminação dos
na; volvimento nacional;
povos;
IV - os valores so- III - erradicar a IV - não-intervenção;
ciais do trabalho e pobreza e a margina-
V - igualdade entre os
da livre iniciativa; lização e reduzir as
Estados;
desigualdades sociais
V - o pluralismo VI - defesa da paz;
e regionais;
político. VII - solução pacífica dos
IV - promover o bem
conflitos;
de todos, sem pre-
VIII - repúdio ao terrorismo
conceitos de origem,
e ao racismo;
raça, sexo, cor, idade
e quaisquer outras for- IX - cooperação entre os
povos para o progresso da
mas de discriminação.
humanidade;
X - concessão de asilo
político.

102
RIG em três dimensões

2. Evolução da Administração Pública


e sua governança
Para compreender melhor a missão do Estado e, dentro
dele, o papel da gestão pública, é necessário conhecer a evolu-
ção da Administração Pública, pois são conceitos que ajudam
na estratégia de relacionamento com as instituições estatais.
A Administração Pública, segundo Osborne (2006, p. 377),
passou por uma evolução conceitual em três fases ou estágios,
com a coexistência de algumas delas em algum momento.
Para o autor, a Administração Pública moderna, posterior
ao patrimonialismo, passou a ser burocrática, mudou radical-
mente para a chamada Nova Gestão Pública e evoluiu para a
nova Governança.
A primeira fase, a burocrática, majoritariamente estatista,
teve longa duração, com vigência do final do século XIX até o
final dos anos 1970. Foi um período de profissionalização dos
serviços públicos, com valorização da impessoalidade e da me-
ritocracia na gestão pública.
A segunda fase, considerada uma mudança de paradigma,
de caráter gerencial, conhecida como Nova Gestão Pública –
com foco na liderança empreendedora, na gestão de custos, na
maior participação do mercado, na competição e nos contatos
para alocação de recursos e prestação de serviços dentro do
setor público – teve vigência transitória, situada entre os anos
de 1980 e o início do século XXI.
No Brasil ainda não se consolidou plenamente a etapa buro-
crática em todos os setores e esferas do governo, havendo órgãos

103
RIG em três dimensões

no governo federal que estão atrasados nesse quesito. São exem-


plos disso: os Ministérios da Saúde, da Educação e da Cidadania,
bem como de muitos Estados e Municípios, que não contam com
estruturas de carreira profissionalizadas. Ainda há um grande déficit
de capacidades institucionais e governativas no País.
A terceira fase, a da nova Governança Pública, ainda emer-
gente, combina aspectos da Administração Pública tradicional
e da Administração Pública gerencial, sendo a sucessora das
administrações burocrática e gerencial.
O conceito de governança, de acordo com Diniz (1996, p.
23), abarca um conjunto de mecanismos e procedimentos que
envolvem a dimensão participativa e plural da sociedade, numa
perspectiva de expandir e aperfeiçoar os instrumentos de interlo-
cução e de administração dos interesses. Seria intrínseca à gover-
nança, portanto, a flexibilização, a descentralização de funções e a
transferência de responsabilidades, como decorrência natural das
novas condições internacionais e da complexidade da ordem social,
que exige um Estado mais aberto à participação social, porém sem
renunciar aos seus instrumentos de controle e supervisão.
Para Bevir (2012, p. 75), o ponto central do debate sobre a
governança nos últimos 20 anos está associado ao papel do Estado
num contexto de profundas alterações da ordem global, no qual se
questiona sua condição de provedor direto dos serviços públicos.
O autor sustenta que, do ponto vista processual, “o Estado dirige e
regula cada vez mais conjuntos de organizações, governos e redes
complexas, em lugar de ele próprio prover ou fornecer os serviços
diretamente por meio de suas próprias burocracias”30.

30
Tradução livre.

104
RIG em três dimensões

Já o termo “nova governança” surge como resultado das


reformas do Estado dos anos 1980, e traz três dimensões,
conforme Peters e Pierre (2000, p. 54): 1) a entrada de atores
privados na prestação de serviços públicos; 2) a natureza parti-
cipativa e inclusiva da nova governança; e 3) as incorporações
de instrumentos e tecnologias do setor privado ao Estado e à
burocracia. Para eles, a ideia de que os governos nacionais são os
principais atores das políticas públicas e que podem influenciar
a economia e a sociedade por meio de suas ações agora parece
ser posta em dúvida (Peters e Pierre, 2000, p. 22).
Ainda segundo Peters e Pierre (2000) as estruturas e
interações são elementos inerentes à governança pública. En-
quanto as estruturas podem funcionar por meio de mecanismos
de hierarquia (governo), mecanismos autorregulados (mercado)
e mecanismos horizontais de cooperação (comunidade, socie-
dade, redes), as interações desses três tipos de estrutura são
fluidas, com pouca ou nenhuma distinção clara entre elas. Ou
seja, a governança inclui três setores: o setor público (atores e
instituições estatais), o setor privado (famílias e empresas) e a
sociedade civil, também conhecida como terceiro setor (organi-
zações não-governamentais).
Conforme Vidal (2020, p. 109), independentemente de a
governança resultar de “políticas neoliberais gestadas no contexto
da Nova Gestão Pública ou como causadora desta, o fato é que
a governança tem sido empregada sob enfoque bidimensional”.
Para ele, há quem a enxergue sob um ponto de vista fenome-
nológico, ou seja, uma mera descrição da relação de atores
posicionados dentro e fora do Estado em relação a questões
sociais. E existem os que veem a governança numa perspectiva

105
RIG em três dimensões

funcionalista, sob a lógica operacional e instrumental, voltada


para a busca de direcionar ações e avaliar resultados.
De acordo com Secchi (2009, p. 349), “o movimento
da governança pública (GP) se traduz em um modelo relacio-
nal porque oferece uma abordagem diferenciada de conexão
entre o sistema governamental e o ambiente que circunda o
governo”. Para ele, na perspectiva da governança pública, os
cidadãos e outras organizações são chamados de parceiros ou
stakeholders31, com os quais a esfera pública constrói modelos
horizontais de relacionamento e coordenação (p. 361).
Já em Queiroz e Santos (2020, p. 3), a ideia de nova go-
vernança está associada às reformas do Estado, de vertente neo-
liberal, que vem sendo implementada desde a década de 1970,
com base na experiência inglesa, sob o rótulo de “Nova Gerência
Pública”. Nesse contexto, essas reformas têm priorizado, como
regra, a dimensão da eficiência na perspectiva econômica, com
valorização da flexibilidade, da produtividade e da redução de
gastos, negligenciando os fins ou o sentido político que deve
guiar a Administração Pública. Seria a transposição, para o ser-
viço público, de concepções da Teoria da Escolha Racional, que
parte da suposição de superioridade da gestão privada frente à
burocracia pública.
Ainda segundo Queiroz e Santos (2020, p. 5), esses
modelos, baseados na lógica de mercado, não se sustentam
na administração pública e geralmente são questionados
pelos usuários de serviços públicos, porque adotam a lógica
da relação cliente-consumidor, uma relação própria para o
31
Stakeholder é visto aqui como qualquer grupo ou indivíduo que pode afetar ou ser afetado pela realização
dos objetivos de uma organização ou movimento.

106
RIG em três dimensões

setor privado, mas inadequada para o setor público. A relação


cliente-consumidor se pauta pela demanda, numa transação
de natureza mercantil ou comercial de troca, enquanto a re-
lação cidadã se orienta pela necessidade. A lógica do setor
público é a do conceito de cidadão, que, além da eficiência,
pressupõe equidade e justiça.
De acordo com Teixeira e Gomes (2019, p. 535), o debate
principal não é se o Estado continua sendo ou não o provedor de
bens e serviços públicos, mas sim se o desempenho público e os
resultados estão sendo alcançados pelos governos na provisão
pública à sociedade.
Em cumprimento à recomendação do Tribunal de Contas
da União (TCU), órgão de controle externo que tem sido pioneiro
no debate da governança, o Governo Federal baixou o Decreto nº
9.203/2017. Ele define o conceito de governança pública, seus
princípios, diretrizes e mecanismos de liderança, que devem ser
observados na relação com o governo. Esse decreto, entretanto,
está mais num plano ideal, por desconsiderar o contexto das
ações de governo. Está mais numa perspectiva de “dever ser”
do que de “expressão do ser” efetivamente.
Segundo o referido Decreto, governança pública é defini-
da como o “conjunto de mecanismos de liderança, estratégia e
controle postos em prática para avaliar, direcionar e monitorar
a gestão, com vistas à condução de políticas públicas e à pres-
tação de serviços de interesse da sociedade”, e seus princípios
consistem na: I - capacidade de resposta; II - integridade; III -
confiabilidade; IV - melhoria regulatória; V - prestação de contas
e responsabilidade; e VI - transparência.

107
RIG em três dimensões

As diretrizes da governança pública, também conforme o


Decreto nº 9.203/2017, consistem em: I - buscar resultados
para a sociedade, observadas a limitação de recursos e as
mudanças de prioridade; II - promover a simplificação admi-
nistrativa, a modernização da gestão pública e a integração dos
serviços públicos, especialmente aqueles prestados por meio
eletrônico; III - monitorar o desempenho e avaliar a concepção,
a implementação e os resultados das políticas e das ações
prioritárias para assegurar que as diretrizes estratégicas sejam
observadas; IV - articular instituições e coordenar processos
para melhorar a integração entre os diferentes níveis e esferas
do setor público, com vistas a gerar, preservar e entregar valor
público; V - fazer incorporar padrões elevados de conduta pela
alta administração para orientar o comportamento dos agentes
públicos, em consonância com as funções e as atribuições de
seus órgãos e de suas entidades; VI - implementar controles
internos fundamentados na gestão de risco, que privilegiará
ações estratégicas de prevenção antes de processos sancio-
nadores; VII - avaliar as propostas de criação, expansão ou
aperfeiçoamento de políticas públicas e de concessão de
incentivos fiscais e aferir, sempre que possível, seus custos
e benefícios; VIII - manter processo decisório orientado pelas
evidências, pela conformidade legal, pela qualidade regulatória,
pela desburocratização e pelo apoio à participação da socie-
dade; IX - editar e revisar atos normativos, pautando-se pelas
boas práticas regulatórias e pela legitimidade, estabilidade
e coerência do ordenamento jurídico e realizando consultas
públicas sempre que conveniente; X - definir formalmente as
funções, as competências e as responsabilidades das estruturas
e dos arranjos institucionais; e XI - promover a comunicação

108
RIG em três dimensões

aberta, voluntária e transparente das atividades e dos resulta-


dos da organização, de maneira a fortalecer o acesso público
à informação.
Ainda segundo o referido Decreto, os mecanismos para
o exercício da governança pública consistem em: I - liderança,
que compreende o conjunto de práticas de natureza humana ou
comportamental exercida nos principais cargos das organizações,
para assegurar a existência das condições mínimas para o exer-
cício da boa governança, quais sejam: a) integridade; b) compe-
tência; c) responsabilidade; e d) motivação; II - estratégia, que
compreende a definição de diretrizes, objetivos, planos e ações,
além de critérios de priorização e alinhamento entre organizações
e partes interessadas, para que os serviços e produtos de res-
ponsabilidade da organização alcancem o resultado pretendido;
e III - controle, que compreende processos estruturados para
mitigar os possíveis riscos com vistas ao alcance dos objetivos
institucionais e para garantir a execução ordenada, ética, eco-
nômica, eficiente e eficaz das atividades da organização, com
preservação da legalidade e da economicidade no dispêndio de
recursos públicos.
A literatura sobre "nova governança" enfatiza redes, barga-
nhas e interação, em vez de hierarquias, como a melhor forma
de governar e a melhor maneira de compreender a governança
(Peters, 2002). Ou, como afirma Osborne (2006, p. 377-387),
a governança opera em um estado plural, “onde vários atores
interdependentes contribuem para a prestação de serviços ou
onde vários processos informam o sistema de formulação de
políticas”.32
32
Tradução livre.

109
RIG em três dimensões

Portanto, qualquer que seja a abordagem adotada para a


governança, exceto a mais centrada no Estado, o próprio uso do
termo governança representa uma aceitação de algum movimento
de afastamento do estilo convencional de governo baseado na
autoridade. Esse movimento é a favor de abordagens de governo
que confiem menos na autoridade formal e mais na interação dos
atores do Estado e da sociedade. Além disso, o questionamento
da autoridade e da capacidade do Estado implícitas no uso da
governança significa que algumas das perspectivas racionalistas
sobre o papel dos governos também podem ser questionadas.
Ressalte-se, ainda, a heterogeneidade do Estado Brasileiro, que
é muito grande, e sua administração apresenta problemas de
capacidade governativa.
No tópico a seguir, trataremos do funcionamento do Poder
Executivo.

3. Sobre o Poder Executivo Federal


Os fundamentos, objetivos e princípios do Estado Democrá-
tico de Direito e da República Federativa do Brasil devem reger
e orientar a sociedade e os poderes públicos, particularmente
o Poder Executivo, que tem a missão de: 1) exercer a direção
superior da Administração Federal; 2) participar do processo
legislativo, por meio de iniciativa de leis, adoção de medidas
provisórias, aposição de vetos ou sanção aos projetos de lei,
promulgação, publicação e regulamentação das leis; 3) arrecadar
e administrar os tributos; 4) nomear e exonerar seus servidores
públicos, inclusive ministros de Estado; 5) nomear os membros
dos Tribunais; 6) celebrar tratados, declarar guerra e fazer a paz;

110
RIG em três dimensões

7) comandar as Forças Armadas; 8) decretar estado de defesa


e estado de sítio; e 9) decretar e executar intervenção federal
nos Estados.
O Poder Executivo Federal é exercido pelo Presidente da
República auxiliado pelos ministros de Estado. Suas atividades
são desenvolvidas e realizadas pela Administração Pública, que,
segundo o art. 37 da Constituição, deve obediência aos princípios
da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiên-
cia, além de outros previstos expressamente e implicitamente na
Constituição e nas Leis. Em especial na Lei nº 9.784, de 1999
(Lei do Processo Administrativo), que acrescenta, dentre outros,
os seguintes princípios: da finalidade, motivação, razoabilidade,
proporcionalidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurí-
dica e interesse público.
As competências dos órgãos da Presidência da República,
as atribuições dos Ministérios e o vínculo das entidades com-
preendidas na administração indireta, além da estrutura básica
dos Ministérios e dos órgãos da Presidência da República, estão
disciplinados, atualmente, na Lei nº 13.844, de 18 de junho de
201933. Ela é regulamentada por diversos decretos que dispõem
sobre a estrutura regimental dos órgãos e entidades, detalhando
as suas competências e definindo as unidades (secretarias, de-
partamentos, coordenações) que compõem as suas estruturas.
De acordo com o Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro
de 196734 (e suas atualizações), a Administração Pública
divide-se entre direta ou centralizada, exercida por meio dos
33
É comum que, no início de cada governo, o Presidente edite medida provisória, reorganizando os ministérios
e suas competências. Em cada período presidencial, costuma variar o número de órgãos com nível ministerial
assim como a estrutura interna desses órgãos, definida em secretarias e departamentos.
34
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm. Acessado em 8 de março de 2022.

111
RIG em três dimensões

Ministérios e órgãos diretamente vinculados à Presidência


da República, e indireta ou descentralizada, conduzida pelas
autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de
economia mista.
A Administração Direta é formada pelo conjunto de órgãos
que integram a estrutura administrativa da União (Presidência
da República e Ministérios) e responde pela direção superior,
regulamentação e administração. Já a Administração Indireta,
que responde pela execução de atividades específicas de cada
entidade, é constituída pelas autarquias, fundações, empresas
públicas e sociedades de economia mista, com características
próprias definidas em lei, inclusive os regimes trabalhistas, que
são diferentes para algumas delas. Em regra, enquanto os entes
de direito público (autarquias e fundações públicas) tem seus
trabalhadores e agentes sujeitos ao regime estatutário, de direito
público, nas empresas estatais (empresas públicas e sociedades
de economia mista), os empregados são subordinados ao regime
da CLT - Consolidação das Leis do Trabalho.
Dois aspectos são relevantes na relação entre a Adminis-
tração Direta e a Indireta. O primeiro é o tema de supervisão
ministerial, que não tem sido efetivo na Administração Indireta.
Se verificarmos, os desvios e práticas de corrupção estão mais
presentes na Administração Indireta do que na Direta. O segundo
é que as fundações e autarquias tinham seus servidores regidos
pela CLT até 1988, quando passaram a fazer parte do regime
estatutário dos servidores públicos e, em consequência, foram
integrados ao Orçamento Geral da União, sendo custeados com
recursos da conta única do Tesouro.

112
RIG em três dimensões

No âmbito da Administração Indireta, as agências regula-


doras cumprem um papel fundamental na regulação e fiscaliza-
ção de setores estratégicos da atividade econômica, conforme
descrito a seguir.

3.1. Agência Reguladora e seu


papel na economia
As agências reguladoras, autarquias de natureza especial35,
que atuam na regulação, normatização, controle e fiscalização
de atividades de bens transferidos ao setor privado, são um
dos principais locus de acompanhamento dos profissionais de
RIG. Elas exercem poder de polícia e incidem sua atuação em
setores estratégicos, concedidos pelo Estado para exploração
pela iniciativa privada, como medicamentos, seguros saúde,
transporte, energia, água, telecomunicações, mineração, petró-
leo e gás, dentre outros, incumbindo-lhes também monitorar e
acompanhar as práticas de mercado dos agentes dos setores
regulados. Assim, auxiliam os órgãos de defesa da concorrência
em contato e cooperação permanente.
Previstas nos arts. 21, XI, e 177, § 3º, e, de forma geral, no
art. 174 da Constituição, em vista de sua função normativa, as
agências reguladoras estão disciplinadas e sistematizadas na Lei
nº 13.848/2020, que “dispõe sobre a gestão, a organização, o
processo decisório e o controle social”. Outra legislação relevante
para as Agências Reguladoras é a Lei nº 9.986/2000, que trata
da gestão de recursos humanos desses órgãos de regulação. O
35
A natureza especial conferida à agência reguladora é caracterizada pela ausência de tutela ou de
subordinação hierárquica, pela autonomia funcional, decisória, administrativa e financeira e pela investidura
a termo de seus dirigentes e estabilidade durante os mandatos, bem como pelas demais disposições
constantes desta Lei ou de leis específicas voltadas à sua implementação.

113
RIG em três dimensões

Decreto nº 10.411/2020, por sua vez, regulamenta a análise de


impacto regulatório. Cada agência possui um Decreto específico
de regulamentação.
As agências reguladoras federais têm padrão institucional
semelhante, com pequenas variações. Suas principais caracte-
rísticas são: 1) autarquias sob regime especial, integrantes da
administração indireta; 2) vinculadas sem subordinação hie-
rárquica aos ministérios respectivos; 3) proteção do interesse
público; 4) defesa da concorrência e do direito do consumidor;
5) promoção da livre iniciativa; 6) prestação de contas, impes-
soalidade, transparência e publicidade; 7) autonomia decisória,
administrativa e financeira; 8) diretoria com mandato de cinco
anos, cuja nomeação depende da prévia aprovação do Senado
Federal, sendo vedada a recondução; 9) deliberação colegiada
por maioria absoluta de votos da diretoria; 10) estabilidade dos
servidores, que são ocupantes de cargos públicos, regidos pelo
regime jurídico único; e 11) previsibilidade das regras e princípios
considerados inquestionáveis perante os interesses da sociedade.
As agências reguladoras gozam de autonomia adminis-
trativa, que é caracterizada pelas competências de: 1) solicitar
diretamente ao Ministério da Economia: a) autorização para
a realização de concursos públicos; b) provimento dos cargos
autorizados em lei para seu quadro de pessoal, observada a
disponibilidade orçamentária; c) alterações no respectivo quadro
de pessoal, fundamentadas em estudos de dimensionamento,
bem como alterações nos planos de carreira de seus servidores;
2) conceder diárias e passagens em deslocamentos nacionais
e internacionais e autorizar afastamentos do País a servidores
da agência; e 3) celebrar contratos administrativos e prorrogar

114
RIG em três dimensões

contratos em vigor relativos a atividades de custeio, indepen-


dentemente do valor.
As agências reguladoras, de acordo com a vinculação com
o setor de atividade econômica e com a cronologia de criação,
podem ser classificadas em três gerações, sendo a primeira delas
na área de infraestrutura, a segunda geração no setor de saúde
e a terceira sem definição específica sobre tema e setor, inclui
até agência para o fomento de atividade, como a Ancine.
Em 2022, o Brasil possui doze agências na esfera federal,
conforme quadro a seguir.
Quadro 4 – Agências Reguladoras
Agência Ministério Setorial Legislação

Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de


ANEEL Minas e Energia
1996

Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997


ANP Minas e Energia
e Decreto nº 2.455/98

Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 e


ANATEL Comunicações
Decreto nº 2.338/97

ANVISA Saúde Lei nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999

ANS Saúde Lei nº 9.961, de 28 de janeiro de 2000


Desenvolvimento
ANA Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000
Regional
Cultura (atualmente
Medida Provisória nº 2.228-1, de 6 de
ANCINE absorvida pelo Min. do
setembro de 2001
Turismo)
ANTT
Infraestrutura Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2002
ANTAQ
Lei nº 11.182, de 27 de setembro de
ANAC Infraestrutura
2005 e Decreto nº 5.731/06
Lei nº 13.575, de 26 de dezembro de
ANM Minas e Energia
2017
Lei nº 14.222, de 15 de outubro de
ANSN Ciência e Tecnologia
2021

115
RIG em três dimensões

Além das agências reguladoras, há ainda autarquias que


exercem funções de fiscalização e regulação, como o Banco
Central do Brasil (BCB), a Comissão de Valores Mobiliários
(CVM), a Superintendência de Seguros Privados (Susep), a Su-
perintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc)
e a recentemente criada Autoridade Nacional de Proteção de
Dados (ANPD). Embora não tenham status de agência regu-
ladora, seu funcionamento e estrutura seguem regras bastante
próximas às daquelas.
Para melhor compreensão de como opera o Poder Exe-
cutivo, apresentaremos a seguir a estrutura e a organização da
Administração Pública.

3.2. Estrutura e organização


da Administração Pública
A Administração Pública se estrutura e se organiza com
base em processos institucionais, cujo objeto é articular ativida-
des ou ações interativas para transformar insumos em serviços
públicos, dentro da estratégia de obtenção de resultados. A
lógica de funcionamento da Administração Pública, comparti-
lhada por órgãos e cargos, consiste na observância dos ritos e
procedimentos nas diversas fases de tomada de decisão. O mo-
delo de organização das estruturas, dos órgãos e das unidades
administrativas internas, conforme o “Manual de Orientação
para Arranjos Institucionais de Órgãos ou Entidades do Poder
Executivo Federal”36 , atualizado em 2018 pela então Secretaria

36
https://www.gov.br/economia/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/guias-e-manuais/manual-de-
estruturas-organizacionais-do-poder-executivo-federal/arquivos/manual-de-estruturas-organizacionais-do-
poder-executivo-federal-2013-1a-edicao.pdf. Acessado em 8 de março de 2022.

116
RIG em três dimensões

de Gestão Pública, é classificado em quatro níveis para efeito


de gestão, de acordo com as competências institucionais: 1)
alta administração37; 2) linha de gerência; 3) assessoria; e 4)
suporte administrativo.
Conceitualmente, a Administração Pública possui duas
dimensões: a política (governo) e a técnica ou administrativa
(execução).
A primeira, formada pelo conjunto de órgãos com prerro-
gativas constitucionais para definir planos de ação e políticas
públicas, é responsável pela direção e pelo comando da Admi-
nistração Pública.
A segunda, formada de órgãos e agentes com o objetivo
de transformar em ação as decisões de governo, exerce funções
administrativas, em geral, mediante o poder de polícia, a pres-
tação de serviços públicos, o fomento e a intervenção no domí-
nio econômico. Assim, os governos, de modo geral, possuem
a mesma lógica de funcionamento, que consiste em dois tipos
de comandos: um formado por políticos e outro pela burocracia
profissionalizada do serviço público.
O comando político, em geral, é reservado aos ocupantes
de cargos de ministro de Estado, presidente de autarquias ou de
empresas públicas e secretários especiais, os quais cumprem
função de representação. Eles falam mais para fora do que para
dentro da máquina governamental e, como regra, pertencem
aos partidos e às organizações que integram a base social ou

37
O Decreto 9.203/2017 classifica como alta administração os cargos de Ministros de Estado, ocupantes de
cargos de natureza especial, ocupantes de cargo de nível 6 do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores
(DAS) e presidentes e diretores de autarquias, inclusive as especiais, e de fundações públicas ou autoridades
de hierarquia equivalente.

117
RIG em três dimensões

política de sustentação do governo. Os ocupantes de cargos


políticos têm como funções legitimar, sustentar e defender a
agenda do governo. Se for de agremiação diferente do partido
do presidente da República, tende a ter uma agenda própria e
buscará influenciar no direcionamento, nas prioridades e nas
linhas estratégicas da política. Trata-se de uma troca de apoio
legislativo por influência no governo38.
Por sua vez, o comando burocrático ou profissional, em
regra, é reservado aos titulares dos cargos voltados para a admi-
nistração da máquina, como os de secretário-executivo, secretá-
rio-executivo-adjunto, chefe de gabinete, secretários e diretores
de departamentos, chefes de divisões, seções, etc. Os ocupantes
de cargos técnicos – conhecedores dos ritos e normas da Ad-
ministração Pública, e familiarizados com o processo decisório
e seus principais atores – falam para dentro, harmonizando os
atos governamentais com as diretrizes de governo, formulando,
implementando e fiscalizando a aplicação das políticas públicas.
Eles tocam o dia a dia do governo.
A diferença entre a lógica administrativa ou burocrática e
a lógica política é que a primeira se pauta pelo conhecimento
técnico especializado e pelo controle da rotina governamental,
enquanto a segunda se baseia na valorização do consenso, na
legitimidade, na solução negociada dos conflitos, na coerência
política e, principalmente, nas posições estratégicas de gover-
no. A definição de preferência ou formalização de demandas,
bem como o manejo dos recursos de poder ou mobilização de

38
Ver Batista (2013). https://scholar.google.com.br/scholar?hl=pt-BR&as_
sdt=0%2C5&q=o+poder+no+executivo%3A+uma+an%C3%A1lise+do+papel+da+presid%C3%
AAncia+e+dos+minist%C3%A9rio+na+presidencialis+de+caqliz%C3%A7aao&btnG=.

118
RIG em três dimensões

apoio para a sustentação de suas iniciativas, devem pertencer


ao governante, cabendo à burocracia utilizar sua expertise na
elaboração e implementação de projetos políticos sufragados
nas urnas.
Geralmente, os governos formam suas equipes com
base em seis critérios: 1) político; 2) partidário; 3) técnico/
burocrático/administrativo; 4) regional; e, mais recentemente,
5) gênero; e 6) raça.
Os quadros dirigentes são recrutados nos partidos políticos,
no setor empresarial, nas universidades, nos movimentos sociais.
Já os quadros técnicos, principalmente na burocracia, como no
Banco Central, na Receita Federal, na AGU - Advocacia-Geral
da União, na CGU - Controladoria-Geral da União, no Banco do
Brasil, na Caixa Econômica Federal, no Ministério das Relações
Exteriores (Itamaraty), na carreira de gestores governamentais,
nas consultorias legislativas da Câmara dos Deputados e do
Senado Federal e na Polícia Federal, e, mais recentemente, nas
Forças Armadas.
Os governantes, tanto para os cargos políticos quanto para
os técnicos, priorizam pessoas identificadas com o projeto de
governo, especialmente as que, de algum modo, detenham poder
político, pertençam a grupos políticos ou tenham contribuído,
direta ou indiretamente, para o sucesso eleitoral do detentor de
mandato.
No próximo tópico, abordaremos a complexidade do pro-
cesso decisório no âmbito do Poder Executivo.

119
RIG em três dimensões

4. Complexidade do processo
decisório
O processo decisório no governo é muito complexo e seu
desfecho é muito mais produto da negociação e das disputas
internas do que da ação puramente racional, como sugere o
modelo de escolhas públicas, que parte do pressuposto de que
basta corrigir a assimetria de informações para que as pessoas
ajam racionalmente.
O processo decisório é essencialmente político e envolve
disputa de poder em variadas dimensões, tanto intragovernamen-
tal como intergovernamental. Os governantes, por mais que exis-
tam regras rígidas de tomada de decisão, têm que fazer entregas
e muitas delas para que cheguem ao consumidor ou usuário final
precisam superar uma verdadeira corrida de obstáculos, durante
a qual são forçados a fazer concessões, sob pena de paralisia.
O acesso à informação e a transparência são fundamentais
para que exista algum tipo de controle social, mas não bastam
para influenciar a construção de instrumentos de políticas públi-
cas. Saber que existe um determinado convênio ou parceria entre
um ente público e uma instituição privada, sem que o cidadão ou
uma instituição representativa seja chamada a opinar previamente
sobre seus critérios e objeto, por exemplo, atende ao princípio da
transparência e do acesso à informação, mas não assegura nem
possibilita o controle social ou poder decisório sobre o tema.
Os mecanismos racionais de escolha, por meio dos quais
supostamente qualquer pessoa na execução ou no comando
chegaria ao mesmo resultado, dentro da lógica de valorização do
mercado e despolitização das decisões, objetivam retirar espaço

120
RIG em três dimensões

da decisão política, cuja construção leva em conta ideologia, rela-


ção de poder, valores e princípios de equidade, fatos que podem
conduzir a tratamento desigual em determinadas situações para
que prevaleça a justiça.
Além disto, registre-se que a diferença, do ponto de vista
da liberdade, entre o Estado e os particulares é que a ação do
Estado é condicionada pelo princípio da legalidade, ou seja,
tudo é proibido, exceto o que a lei autoriza, enquanto no caso
do particular tudo é permitido, exceto o que a lei proíbe. Logo,
o gestor público não goza da mesma autonomia do setor priva-
do, pois só pode legitimamente adotar condutas se elas forem
determinadas ou autorizadas no ordenamento jurídico. As ações
governamentais ou a produção de políticas públicas, por sua
natureza, são complexas, apresentam muitos obstáculos políticos
e legais, possuem caráter coletivo e exigem mediação prévia,
por isso, são distintas das relações entre agentes privados que
transacionam no mercado.
A seguir, listaremos os desafios e disputas enfrentados na
tomada de decisão no governo federal.

4.1. Desafios para a tomada de decisão


O exercício da política, além do desafio permanente dos
governantes eleitos para conquistar a burocracia para os seus
projetos, evitando que ela articule discurso, escolha metas e
valores em reação ao comando político, requer habilidade dos
governantes para potencializar os instrumentos à disposição,
assim como superar os obstáculos estruturais e institucionais
existentes.

121
RIG em três dimensões

A tomada de decisão governamental – em qualquer go-


verno – considera as três dimensões da política: 1ª - as institui-
ções políticas (órgãos dos três poderes do Estado, organizações
da sociedade civil e partidos); 2ª - os processos políticos (as
regras do jogo ou o processo decisório); e 3ª - o conteúdo da
política (as políticas públicas e as demandas das organizações
da sociedade). Elas se expressam: 1) na prestação de serviços
públicos de qualidade; 2) na definição de regras de convivência
social, pacificando o País; e 3) na definição de prioridades, em
termos de bens e serviços que são destinados ao atendimento
das necessidades do povo.
Registre-se, ainda, que existem três atores principais que
influenciam as decisões: 1) a burocracia estatal; 2) os políticos;
e 3) os grupos de pressão.
O primeiro ator, a burocracia estatal, fala para dentro da
máquina pública e é encarregada da formulação e implementação
das decisões políticas adotadas pelos agentes políticos.
O segundo ator, os políticos, recebem a legitimidade popular
pelo voto e tomam as decisões, que devem ser executadas pela
burocracia39. Já o terceiro ator, os grupos de pressão, disputam
o conteúdo das políticas públicas, pressionando os decisores e
formuladores.
Porém, nem todos os burocratas exercem o seu ofício ideal-
mente, sem problemas, nem os políticos agem republicanamente,
havendo aqueles que priorizam seus princípios, regiões, catego-
39
Conforme Reed (2012), o burocrata tem o dever de obedecer e implementar a visão do líder, mas também
tem o direito de desafiar e até mesmo desobedecer sob certas circunstâncias: 1) quando a vida ou a saúde
humana estão sendo desnecessariamente arriscadas; 2) os bons costumes estão sendo violados; 3) o Estado
de direito está sendo sacrificado ao expediente; 4) o propósito da organização está sendo minado; 5) está
sendo negado um serviço básico às partes interessadas da organização; e 6) um grupo ou interesse específico
está sendo satisfeito à custa do bem comum.

122
RIG em três dimensões

rias, etc. Além disto, os burocratas estão sujeitos a pelo menos


três tipos de tentativas de captura: 1) pelos interesses regulados
ou licenciados; 2) por um triunvirato de atores políticos (setores
regulados, agências reguladoras e os comitês legislativos); e 3)
pelas elites políticas. Logo, a idealização tanto no aspecto ope-
racional quanto no ético pode ter suas exceções.
Os grupos de pressão tanto podem reforçar esses vieses
de técnicos e políticos, quanto enfrentá-los, dependendo dos
interesses que representam. Os grupos de pressão agem essen-
cialmente por interesse.
O nível de influência sobre as ações do Estado e de seus
dirigentes, por sua vez, depende do equilíbrio na relação entre
três atores do sistema social: estado, mercado e sociedade40.
A tomada de decisão na esfera política não depende apenas
de vontade política, pois mesmo legitimado pelo voto popular, o go-
vernante precisa considerar o que pensam outras forças e respeitar
as regras de tomada de decisão, nem sempre favoráveis. Assim, a
tomada de decisão compreende ou depende de muitos aspectos e,
também, da superação de muitos gargalos e obstáculos, que vão
desde a estrutura dos órgãos e suas atribuições institucionais, as
regras, os atores e a hierarquia dos decisores, a correlação de forças,
a conjuntura política, passando pelo conteúdo e abrangência da
política pública, além do impacto fiscal, financeiro e orçamentário
e, ainda, as estratégias e táticas empregadas.
No processo de tomada de decisão no Poder Executivo,
em geral, as disputas entre as áreas econômicas/financeiras
(Economia, Minas e Energia, Infraestrutura, Desenvolvimento

40
Ver tópico 3 do Capítulo III deste livro (p. 174-175).

123
RIG em três dimensões

Regional, Agricultura, etc.) e sociais (Previdência e Traba-


lho, Cidadania e Direitos Humanos, etc.), que normalmente
envolvem recursos orçamentários, são arbitradas pela Casa
Civil da Presidência da República ou pelo próprio Presidente
da República, muitas vezes em favor da área econômica e em
detrimento do aspecto social.
Além da pressão política e social no processo de alocação
de recursos e de avaliação de implementação das políticas de
governo, como bem lembra Gaetani (2006)41, existem outros
critérios plausíveis, como: capacidade de execução de gastos
dos ministérios considerados, empatia com a agenda da área
em questão e alinhamento político com os titulares dos órgãos
analisados, conforme detalhado no Tópico 8.2.
O processo decisório, por sua natureza já complexa – pela
fragmentação da Administração Pública – quando se dá em
ambiente instável, com mudanças e transferências de órgãos,
atribuições e pessoas com relativa frequência, torna-se mais
imprevisível. Circula a máxima, segundo a qual, “quanto mais o
processo se aproxima do topo da pirâmide decisória mais pessoas
que não entendem do assunto estão na sala e menos os donos
do problema estão presentes”.
A isso pode ser ainda acrescentado o amplo espectro de
atuação dos grupos de interesse, que exercem as atividades de
lobby num ambiente não regulado, em todos os ministérios,
com especial atuação nas áreas social e de infraestrutura e de
coordenação de governo. A busca de influência pelos lobbies por

41
Conferir o artigo de Francisco Gaetani, “Avaliação, monitoramento e o exercício da Presidência”,
apresentado no XI Congresso Internacional del Clad sobre a la Reforma del Estado y da la Administracion
Publica, Guatemala, 7-10 novembro, 2006, p. 35.

124
RIG em três dimensões

intermédio, tanto de organizações representativas de interesses


setoriais, quanto diretamente pelos agentes interessados, como
pelas empresas e entidades que atuam profissionalmente na
atividade de RIG, é caracterizada por intensas assimetrias.
Isso se observa no que se refere ao nível de acesso aos
decisores – que se tornam extremamente dependentes de maior
ou menor sensibilidade e da abertura dos dirigentes aos contatos
com os interesses opostos – e também nos meios empregados
para o exercício da pressão, indo do convencimento baseado em
credibilidade e expertise técnica até às não tão raras situações
em que o poder econômico propicia o surgimento da corrupção
e da influência indevida decorrente das trocas de favores e de
tráfico de influência. Porém, nem sempre o ponto de partida da
corrupção é externo. Às vezes a “abertura” é dada por quadros
permanentes do Estado.
O Presidente da República, quando vai tomar uma decisão,
por exemplo, sobre o conteúdo das políticas públicas precisa
considerar o que pensam: os outros poderes da República, espe-
cialmente os Legislativo, os outros níveis de governo – Estados
e Municípios – os empresários, os trabalhadores, o mercado, os
organismos e governos internacionais, a academia, a imprensa
e até as Forças Armadas. Além da judicialização da política,
com reiteradas decisões dos tribunais superiores sobre a inter-
pretação e implementação das políticas públicas, são muitos
vetores que têm poder de influenciar e até de veto em relação
às iniciativas presidenciais, por isto, a importância de conhecer
os meandros dos poderes e descobrir qual a forma mais eficaz
de se relacionar com eles.

125
RIG em três dimensões

Assim, mesmo o Poder Executivo sendo o centro de


gravidade do regime político e o Presidente da República
dispondo de amplas prerrogativas concernentes à direção da
administração pública e do processo legislativo, por força da
legitimidade que a eleição lhe garante, necessita fazer nego-
ciações e concessões para que avance na sua agenda política
e administrativa.
O fato é que o Brasil adota um modelo de consensualismo
elevado, o que explica a complexidade da tomada de decisões,
devido ao grande número de atores e instituições a serem consi-
derados, inclusive atores com poder de veto (STF, por exemplo).
Isso exige um alto grau de negociação política e o controle de
muitas variáveis. E esse argumento é central para o seu trabalho.
O debate na Ciência Política vem apontando para uma
erosão, pelo menos nos últimos dez anos, dos poderes de
agenda do presidente. O argumento é que a “caixa de ferra-
mentas” do presidente brasileiro vem sendo esvaziada ao longo
dos anos, através de mudanças institucionais incrementais.
Pequenas mudanças, sem maiores alardes, mas que corroem
aos poucos a capacidade de governar. Os períodos de mais
incidência ocorreram no segundo governo Dilma, avançaram
no governo Michel Temer e se aprofundaram no governo Jair
Bolsonaro. Um exemplo disto é a apropriação do orçamento
pelos partidos políticos42.
O próximo tópico traz uma visão macro das variáveis que
interferem e influenciam a decisão, especialmente o desenho
institucional do sistema decisório.

42
Ver box no tópico I, da Seção 2, do Capítulo 1 deste livro.

126
RIG em três dimensões

4.1.2. O que observar para entender


o processo decisório
Anastasia e Nunes (2006), em adaptação para o Brasil
dos modelos de democracia – o majoritário e o consensual43 –
de Lijphart (2003)44, apresentam as características dos quatro
eixos ou dimensões que devem compor um sistema decisório,
os quais podem pautar ou moldar os resultados. Prestar atenção
no desenho institucional do processo decisório e suas variáveis
é fundamental para entendê-lo, especialmente: 1) no método
de formação dos órgãos de decisão; 2) nas regras de tomada de
decisão; 3) na forma de composição dos órgãos decisórios; e 4)
no funcionamento ou operação efetiva das instituições políticas.
O primeiro eixo ou dimensão, referente ao método de
formação das instâncias decisórias relativo à distribuição de
direitos, recursos e atribuições entre os atores, seria constituído
das seguintes variáveis: 1) as formas de governos (monarquia x
república), que no Brasil é republicana; 2) o sistema de governo
(presidencialismo x parlamentarismo), que no País é presiden-
cialista; 3) a organização político-administrativa (unitarismo x
federalismo), que no Brasil é federalismo; 4) o sistema eleitoral
(majoritário x proporcional), que no Brasil se pratica os dois, sen-
do o majoritário na eleição do Presidente, Governador, Prefeito e
Senado, e o proporcional na eleição de deputados e vereadores;
e 5) o tipo de cameralismo (unicameralismo x bicameralismo
assimétrico), que no Brasil é bicameral: Câmara dos Deputados
e Senado Federal.

43
O modelo majoritário segue a lógica da concentração de poderes nas mãos de maiorias governativas,
enquanto o modelo consensual se pauta pela dispersão de poderes e pela garantia da expressão político-
institucional das minorias.
44
Ver Queiroz (2021, p. 37 a 41).

127
RIG em três dimensões

O segundo eixo seria formado pelas regras decisórias que


organizam a tomada de decisões nas democracias, quais sejam:
1) regras que definem as prerrogativas e os poderes legislativos
e não legislativos do Executivo (concentrados no Executivo x
mais dispersos), que no Brasil é mais concentrado no Poder
Executivo; 2) regras que definem a distribuição de atribuições e
competências do Poder Legislativo (prerrogativas de cada uma
das câmaras; direitos dos parlamentares; mais ou menos centra-
lizados nos órgãos de cada Casa), que no Brasil é centralizado na
Presidência das Casas e no Colégio de Líderes; 3) relações entre
os poderes (predomínio do Executivo x dispersão de poderes,
que no Brasil há predomínio do Poder Executivo; 4) aprovação
de proposições e propostas de emendas constitucionais (maioria
absoluta x qualificada), que no Brasil exige maioria qualificada
de 3/5 de votos em cada Casa do Congresso Nacional para a
alteração do texto constitucional; 5) regras referentes às revisões
constitucionais (órgão independente ou não), que no Brasil ocorre
apenas mediante emendas à Constituição; e 6) regras que orga-
nizam o status do Banco Central (dependente/majoritarismo ou
independente/consensualismo), cuja independência funcional é
caracterizada pelo mandato dos seus diretores, que são indicados
pelo Poder Executivo e aprovados pelo Senado Federal.
O terceiro eixo, por sua vez, se refere à composição das
instâncias decisórias, que trata da: 1) composição do Executivo
e da equipe de governo (coalizões x governos unipartidários), que
no Brasil é de coalizão; 2) configuração do sistema partidário
(multipartidarismo x bipartidarismo), que no Brasil é multi ou
pluripartidário; 3) composição do Poder Legislativo (expressão
da pluralidade societal x maior homogeneidade dos partidos),

128
RIG em três dimensões

que no Brasil expressa a pluralidade de visões, por força do


sistema proporcional de lista aberta; e 4) composição e natureza
das coalizões (maior continuidade ideológica e coalescência x
menor união e heterogeneidade), que no Brasil combina as
duas possibilidades, sendo ideológica na eleição proporcional,
que eliminou a coligação e passou a exigir federação partidária,
mais duradoura, e na eleição majoritária em que se mantém a
coligação, com possibilidade de coalizão, inclusive com partidos
que não fizeram parte da coligação que elegeu o prefeito, o
governador ou o Presidente da República.
Por fim, o quarto eixo, dispõe sobre a operação efetiva
das instituições decisórias (outputs) e inclui: 1) as relações en-
tre os poderes na produção legal (predomínio do Executivo x
maior equilíbrio), que no Brasil predomina o Poder Executivo; 2)
os padrões de interação entre os setores da coalizão governista
(coesão x disciplina x distributivismo), que no Brasil se pauta
pelo distributivismo; 3) os padrões de interação entre governo x
oposição (cooperação x competição), que no Brasil é mais de
competição e menos de cooperação; e 4) o sistema partidário
(bipartidarismo x pluralismo moderado x pluralismo polarizado),
que no Brasil prevalece o pluralismo polarizado.
O modelo proposto por Anastasia e Nunes (2006) orga-
niza o esquema de tomada de decisão, chamando atenção para
os quatro eixos ou aspectos que devem ser examinados quando
se avalia o desempenho governamental no processo de constru-
ção e aprovação de políticas públicas, apontando os principais
gargalos, inclusive para efeito de sua eventual superação por
intermédio de uma reforma do sistema político.

129
RIG em três dimensões

Quadro 5 – Quatro eixos do processo decisório


(ANASTASIA E NUNES, 2006)

Composição
Formação dos órgãos Regras da tomada Funcionamento das
dos órgãos
de decisão de decisão instituições políticas
decisórios

regras que definem composição


as relações entre os
as prerrogativas e os do Executivo e
as formas de governo poderes na produção
poderes legislativos e não da equipe de
legal
legislativos do Executivo governo

regras que definem a os padrões de


configuração
distribuição de atribuições interação entre os
o sistema de governo do sistema
e competências do Poder setores da coalizão
partidário
Legislativo governista

os padrões de
a organização relações entre os poderes composição interação entre
político- (predomínio do Executivo x do Poder governo x oposições:
administrativa dispersão de poderes Legislativo cooperação x
competição

o sistema partidário:
aprovação de proposições composição e bipartidarismo x
o sistema eleitoral e propostas de emendas natureza das pluralismo moderado
constitucionais coalizões x pluralismo
polarizado

o tipo de regras referentes às revisões


- -
cameralismo constitucionais

regras que organizam o


- - -
status do Banco Central

Fonte: Elaborado pelo autor, a partir de Anastasia e Nunes (2006).

No próximo tópico, apresentaremos os principais fatores


facilitadores e dificultadores do processo decisório no Brasil.

4.2. Fatores facilitadores e dificultadores


do processo decisório
Resumidamente, apresentaremos os principais fatores
dificultadores e facilitadores do processo decisório no âmbito do

130
RIG em três dimensões

Poder Executivo, que exigem do Presidente da República muita


habilidade e capacidade de coordenação e negociação.

4.2.1. Fatores dificultadores


O primeiro e principal deles é o nosso desenho federativo.
No Brasil, adotamos o Estado federativo ou federalismo com
autonomia dos três entes (União, Estado e Município), que se
caracteriza por:
1) desequilíbrio na representação política na Câmara dos
Deputados, por força da determinação constitucional de um mí-
nimo de oito deputados e um máximo de 70 deputados federais
por Estado ou pelo Distrito Federal45;
2) hipertrofia do Senado Federal, que representa os Esta-
dos e o Distrito Federal, e vota, em igualdade de condições com
a Câmara dos Deputados, que representa o povo, em todas as
matérias de interesse da cidadania;
3) pacto federativo (distribuição desigual de poder, atribui-
ções/encargos e recursos entre os entes federativos); e
4) influência dos governadores no Conselho Nacional de
Política Fazendária (Confaz), cujas decisões se dão por unani-
midade.
Todos os entes federativos (União, Estados/Distrito Federal
e Municípios) dispõem de autonomia administrativa, financeira
e orçamentária.

45
Se dividirmos o eleitorado nacional que está habilitado a votar em deputado federal em 2022 (155.756.933
eleitores), portanto excluindo eleitores do exterior, pelo número de deputados (513), precisaríamos de
303.620 votos para eleger um deputado. Assim, para que Roraima, que têm 366.240 eleitores, tivesse um
deputado, São Paulo, que possui 34.667.793 eleitores, teria que ter 114 deputados.

131
RIG em três dimensões

O segundo fator dificultador é o sistema de governo, que


sobrecarrega o Presidente da República. O sistema de governo
brasileiro é presidencialista, com o Chefe do Poder Executivo
exercendo seus poderes nas dimensões de:
1) Chefe de Governo, com atribuições e poderes para
exercer a chefia e direção superior da Administração Federal;
sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir
os decretos e regulamentos; enviar ao Congresso Nacional as
peças orçamentárias (PPA, LDO, LOA) e créditos suplementares
e demais proposições legislativas sobre a organização do Governo
e sobre políticas públicas, etc.
2) Chefe de Estado, com atribuições e poderes para man-
ter relações com outros Estados estrangeiros e acreditar suas
representações diplomáticas; declarar guerra, no caso de agres-
são estrangeira; exercer a função de comandante em chefe das
Forças Armadas; permitir que forças estrangeiras transitem pelo
território nacional.
3) Líder da Nação, com a responsabilidade de obedecer e
defender a Constituição Federal, manter a ordem interna e a paz
social entre brasileiros; defender a soberania nacional; zelar pela
defesa do Estado Democrático de Direito; cumprir a liturgia do
cargo e dar exemplo de decência, ética e compostura.
Merecem também destaque as principais características
do nosso presidencialismo, quais sejam:
1) o titular é eleito diretamente pela população;
2) o mandato é fixo, com possibilidade de uma reeleição
consecutiva; e

132
RIG em três dimensões

3) não se sujeita à destituição, exceto por processo de


impeachment.
O terceiro fator dificultador é o nosso sistema partidário
(pluripartidarismo), que se caracteriza por ser instável, fragmen-
tado, de frágil representação e que exige lideranças capacitadas.
De fato, o pluripartidarismo é instável porque criam-se
partidos facilmente. A decisão do Supremo Tribunal Federal
que transferiu a titularidade do mandato do parlamentar para o
partido, foi um avanço, na medida em que impede o troca-troca
partidário. Mas a alteração na legislação partidária, por meio da
janela partidária, que permite a mudança de partido sem perda
de mandato no sétimo mês que antecede a eleição, na prática
flexibilizou o princípio da fidelidade partidária.
A fragmentação partidária é outro problema presente no
sistema político brasileiro, que permite a existência de muitos e
pequenos partidos com representação no Parlamento. As mudan-
ças na legislação eleitoral e partidária para a eleição de 2022,
com os novos requisitos da cláusula de barreira (que exige 11
deputados eleitos ou 2% do eleitorado nacional, com pelo menos
1% em um terço dos Estados), o fim das coligações nas eleições
proporcionais e a mudança na conversão de votos em vagas nas
Casas Legislativas, especialmente pelo sistema de sobras, podem
contribuir para reduzir a fragmentação.
Nesse contexto, a fragilidade da representação se dá pela
ausência de clareza ideológica e falta de compromisso doutrinário
ou programático dos partidos, que, por sua vez, permitem que
os parlamentares atuem de acordo com os interesses que repre-
sentam, sem qualquer coerência com uma diretriz partidária.

133
RIG em três dimensões

O quarto fator dificultador, inerente ao sistema representa-


tivo, que funciona como contrapeso aos poderes do Presidente da
República, diz respeito ao fato de que, quando o Chefe do Poder
Executivo toma uma decisão, ele precisa levar em consideração
o que pensam os outros poderes, os outros níveis de governo,
as classes empresarial e trabalhadora, a oposição, a imprensa,
a academia, as igrejas e as organizações internacionais.
O quinto fator dificultador refere-se aos recursos da opo-
sição nas deliberações legislativas de interesse do governo, que
criam desgaste, custos e constrangimentos que atrasam ou
encarecem o processo decisório. Sobre esse aspecto, podemos
citar as diversas manobras regimentais, como: apresentar obstru-
ção, dificultar a obtenção de quórum, apresentar requerimentos
(retirada de pauta, adiamento de discussão e votação, etc.) e
destaques para votação em separado.
Com tantos atores com poder de veto na sociedade, nos
outros poderes, no parlamento e no mercado, o Presidente da
República precisa ser muito equilibrado e prudente, além de ter
muita disposição para o diálogo e a negociação.
É por isto que a Constituição Federal assegura ao Presidente
da República algumas prerrogativas que facilitam a superação
das dificuldades e possibilitam condições de governabilidade.

4.2.2. Fatores facilitadores


do processo decisório
O primeiro e principal fator facilitador, sem dúvida ne-
nhuma, está associado: 1) às prerrogativas constitucionais
de iniciativa legislativa ampla e também privativa em várias

134
RIG em três dimensões

matérias (orçamento, Administração Pública, previdência,


etc); 2) ao poder de requerer urgência constitucional para as
proposições de sua iniciativa (art. 64 da Constituição); 3) à
prerrogativa de editar medida provisória com força de lei (inciso
XXXVI do art. 84 e art. 62 da Constituição Federal); 4) ao po-
der de indicar líderes e vice-líderes do governo na Câmara dos
Deputados, no Senado Federal e no Congresso Nacional; e 5)
à facilidade de acesso aos veículos de comunicação, inclusive
a possibilidade de convocação de cadeia nacional de rádio e
televisão, dentre outros.
O segundo fator facilitador tem relação com os recursos
de poder que o Presidente da República dispõe para viabilizar
as políticas públicas no Congresso Nacional, dentre os quais
destacamos especialmente: 1) a negociação do conteúdo da
política; 2) a partilha da gestão, com distribuição de cargos aos
partidos integrantes da base de sustentação; 3) a liberação de
recursos do orçamento via emendas convênio ou liberalidade; e
4) a audiência aos parlamentares, incluindo levá-los em eventos
em seus estados de origem.
O terceiro, tal como o primeiro, tem a ver com prerrogativas
de poderes políticos ou constitucionais do cargo de Presidente
da República, como as de: 1) nomear ministros dos tribunais
superiores; 2) nomear os dirigentes de agências reguladoras; 3)
nomear livremente os ministros de estado, bem como os integran-
tes de órgãos colegiados vinculados à Presidência da República;
e 4) vetar projetos de lei aprovados pelo Congresso Nacional.
No tópico a seguir, apresentaremos a hierarquia formal e o
que ocorre na realidade, durante a tomada de decisão no governo.

135
RIG em três dimensões

5. Hierarquia do processo decisório


no Poder Executivo
Formalmente, o processo decisório no Poder Executivo
é hierarquizado a partir da Presidência da República, de cima
para baixo, observando-se a seguinte ordenação descendente:
1º - Presidente da República; 2º - Ministro de Estado; 3º - Se-
cretário-Executivo; 4º - Presidentes de empresas públicas ou
estatais; 5º - Dirigentes de agências reguladoras; 6º - Dirigentes
de autarquias e fundações públicas; e 7º - Burocratas de carrei-
ras de Estado (fisco, gestão, diplomacia, jurídicas, consultores
legislativos e carreiras do Banco Central do Brasil, etc.).
Na prática, entretanto, os níveis de participação e até de
influência no processo de formulação tendem a ser de baixo
para cima, com: 1º - os técnicos, na formulação; 2º - os secre-
tários-executivos, na coordenação; 3º - os ministros de Estado
e presidentes de empresas, na sustentação política; 4º - a Casa
Civil, no acompanhamento e coordenação; e 5º - o Presidente
da República, na solução e arbitramento de conflito.

5.1. A estrutura padrão de cada ministério


Formalmente, os ocupantes de cargos situados no topo
determinam, assinam, autenticam e comunicam, e os da base
produzem ou executam, na seguinte ordem: 1º - o Gabinete do
ministro; 2º - o Secretário-Executivo; 3º - a Consultoria Jurídica;
4º - os Órgãos específicos singulares: a) Secretarias e b) seus
Departamentos; e 5º - os Departamentos ou órgãos operacionais.
De acordo com o Decreto nº 9.739/2019 (atualizado pelo
Decreto nº 10.829/2021, que regulamenta a Lei nº 14.204/2021),
136
RIG em três dimensões

os Cargos em Comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Supe-


rior (DAS) e as Funções Comissionadas do Poder Executivo (FCPE)
serão constituídos das seguintes categorias: I – para DAS: a) dire-
ção, código 101; b) assessoramento, código 102; e c) direção de
projetos, código 103; e II – para FCPE: a) direção, código 101; b)
assessoramento, código 102; c) direção de projetos, código 103;
e d) assessoramento técnico especializado, código 104.
Somente os cargos e as funções de direção (código 101)
correspondem a unidades administrativas. Os cargos e as fun-
ções da categoria assessoramento (código 102) destinam-se ao
assessoramento direto e imediato aos titulares dos cargos ou
funções de direção, como os ocupantes de cargo de natureza
especial e ministros de Estado. Os cargos e as funções de cate-
goria de projetos (código 103) destinam-se ao desenvolvimento
de projetos. As funções da categoria assessoramento técnico
especializado (código 104) destinam-se ao exercício de atividade
de assessoramento correspondente às competências da unidade
prevista na estrutura organizacional do órgão ou da entidade,
o que exige conhecimentos técnicos específicos, caracterizados
por especial nível de conhecimento.
Quadro 6 – Categorias dos cargos e funções comissionadas

CATEGORIA
CATEGORIA
CATEGORIA CATEGORIA ASSESSORAMENTO
DIREÇÃO DE
DIREÇÃO ASSESSORAMENTO TÉCNICO
PROJETOS
ESPECIALIZADO

DAS 101.6 / DAS 102.6 / FCPE


-
FCPE 101.6 102.6

DAS 101.5 / DAS 102.5 / FCPE DAS 103.5 /


FCPE 101.5 102.5 FCPE 103.5

137
RIG em três dimensões

CATEGORIA
CATEGORIA
CATEGORIA CATEGORIA ASSESSORAMENTO
DIREÇÃO DE
DIREÇÃO ASSESSORAMENTO TÉCNICO
PROJETOS
ESPECIALIZADO

DAS 101.4 / DAS 102.4 / FCPE DAS 103.4 /


FCPE 104.4
FCPE 101.4 102.4 FCPE 103.4

DAS 101.3 / DAS 102.3 / FCPE DAS 103.3 /


FCPE 104.3
FCPE 101.3 102.3 FCPE 103.3

DAS 101.2/ DAS 102.2 / FCPE DAS 103.2 /


FCPE 104.2
FCPE 101.2 102.2 FCPE 103.2

DAS 101.1 / DAS 102.1 / FCPE DAS 103.1 /


FCPE 104.1
FCPE 101.1 102.1 FCPE 103.1

Essa estrutura, entretanto, parece estar com os dias con-


tados. Segundo os arts. 17 e 18 da Lei nº 14.204, de 16 de
setembro de 2021, ficarão extintos até 31 de outubro de 2022,
para os alocados em autarquias ou em fundações públicas, e
até 31 de março de 2023 , para os alocados em órgãos da
administração pública direta ou sem alocação definida, se não
forem transformados em Cargo Comissionado Executivo (CCE) ou
em Função Comissionada Executiva (FCE), respectivamente os
cargos alocados em autarquias ou em fundações públicas e os
utilizados em órgão da Administração Pública direta ou sem alo-
cação definida, com as seguintes denominações: a) os cargos em
comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores (DAS),
instituídos pelo inciso I do caput do art. 2º da Lei nº 5.645, de
10 de dezembro de 1970; b) as Funções Comissionadas do Po-
der Executivo (FCPE), instituídas pela Lei nº 13.346, de 10 de
outubro de 2016; c) as Funções Comissionadas Técnicas (FCT),
de que trata o art. 58 da Medida Provisória nº 2.229-43, de 6 de

138
RIG em três dimensões

setembro de 2001; d) as Funções Gratificadas (FG), instituídas


pelo art. 26 da Lei nº 8.216, de 13 de agosto de 1991; e) as
gratificações de representação dos órgãos integrantes da Presi-
dência da República, de que trata o art. 13 da Lei nº 8.460, de
17 de setembro de 1992, previstas na tabela c do Anexo III da
Lei nº 11.526, de 4 de outubro de 2007; e f) as Gratificações
Temporárias pelo exercício na Advocacia-Geral da União, de que
trata o art. 17 da Lei nº 9.028, de 12 de abril de 1995.
Na nova conformação, os cargos e funções de confiança –
logo abaixo dos ministros de Estado – serão hierarquizados em
dez posições, sob a denominação de Cargo Comissionado Exe-
cutivo (CCE) e Função Comissionada Executiva (FCE), variando
numa escala de 1 a 18, sendo a menor variação correspondente
a 1 e a maior a 18, que expressa maior status ou poder na es-
trutura. Os CCEs e as FCEs, que são destinados às atividades de
direção, de chefe e de assessoramento, conferem ao seu ocupante
o conjunto de atribuições de responsabilidades correspondente
às competências da unidade prevista na estrutura organizacional
do órgão ou da entidade.
A ordem de importância e influência do CCE/FCE será a
seguinte: 1º - de nível máximo ou nível 18, destina-se ao titular
de Secretaria-Executiva, Secretaria Especial, Subchefia ou ou-
tro Cargo de Natureza Especial; 2º - de nível 17, destina-se ao
titular máximo de Entidade Autárquica, Fundacional, Secretaria
ou unidade semelhante; 3º - de níveis 15 e 16, destinam-se aos
titulares de Diretorias, Departamentos, Subsecretarias ou unidades
semelhantes, 4º - de níveis 13 e 14, destinam-se aos titulares de
Coordenações-Gerais ou unidades semelhantes; 5º - de níveis
10 a 12, destinam-se aos titulares de Coordenações ou unidades

139
RIG em três dimensões

semelhantes; 6º - de níveis 7 a 9, destinam-se aos titulares


de Divisões ou unidades semelhantes; 7º - de níveis 5 e 6,
destinam-se aos titulares de Serviços ou unidades semelhantes;
8º - de níveis 3 e 4, destinam-se aos titulares de Seções ou
unidades semelhantes; 9º - de nível 2, destina-se ao titular de
Setor ou unidade semelhante; e 10º - de nível 1, destina-se ao
titular de Núcleo ou unidade semelhante.
De acordo com o art. 13 da Lei nº 14.204, de 16 de se-
tembro de 2021, nas nomeações ou nas designações de cargos
em comissão e de funções de confiança, serão observadas as
seguintes regras: 1ª - para os CCEs dos níveis 1 a 4, somente
poderão ser nomeados servidores ocupantes de cargo efetivo,
empregados permanentes da administração pública e militares;
2ª - para as FCEs somente poderão ser designados servidores
ocupantes de cargos efetivos oriundos de órgão ou de entidade
de quaisquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios; e 3ª - para os cargos em comissão
existentes na Administração Pública federal direta, autárquica e
fundacional, no mínimo, 60% (sessenta por cento) do total serão
ocupados por servidores de carreira.
Segundo o art. 15 do Decreto nº 10.829/2021, que regula-
menta a Lei nº 14.204/2021, são critérios gerais para a ocupação
de cargos em comissão e de funções de confiança na Administração
Pública federal, autárquica e fundacional: 1) idoneidade moral e
reputação ilibada; 2) perfil profissional ou formação acadêmica
compatível com o cargo em comissão ou com a função de confian-
ça para o qual tenha sido indicado; e 3) não enquadramento nas
hipóteses de inelegibilidade previstas no inciso I do caput do art.
1º da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990.

140
RIG em três dimensões

De acordo com o art. 16 do referido Decreto nº


10.829/2021, para ocupar Cargo Comissionado Executivo (CCE)
ou Função Comissionada Executiva (FCE) nos níveis 5 a 8, os
postulantes terão que atender, no mínimo, um dos seguintes
critérios específicos: 1) possuir experiência profissional de, no
mínimo, dois anos em atividades correlatas às áreas de atuação
do órgão ou da entidade ou em áreas relacionadas às atribuições e
às competências do cargo ou da função; 2) ter ocupado cargo em
comissão ou função de confiança em qualquer Poder, inclusive na
Administração Pública indireta, de qualquer ente federativo por,
no mínimo, dois anos; 3) possuir título de especialista, mestre
ou doutor em área correlata às áreas de atuação do órgão ou
da entidade ou em áreas relacionadas às atribuições do cargo
ou da função; 4) ser servidor público ocupante de cargo efetivo
de nível superior ou militar do círculo hierárquico de oficial ou
oficial-general; ou 5) ter concluído ações de desenvolvimento
com carga horária mínima acumulada de cento e vinte horas ou
obtido certificação profissional em áreas correlatas ao cargo ou
à função para o qual tenha sido indicado.
Ainda segundo o Decreto acima mencionado, para ocupar
CCE ou FCE de níveis 9 a 11, os postulantes terão que atender,
no mínimo, um dos seguintes critérios específicos: 1) possuir
experiência profissional de, no mínimo, três anos em atividades
correlatas às áreas de atuação do órgão ou da entidade ou em
áreas relacionadas às atribuições e às competências do cargo
ou da função; 2) ter ocupado cargo em comissão ou função
de confiança em qualquer Poder, inclusive na Administração
Pública indireta, de qualquer ente federativo por, no mínimo,
três anos; 3) possuir título de especialista, mestre ou doutor em

141
RIG em três dimensões

área correlata às áreas de atuação do órgão ou da entidade ou


em áreas relacionadas às atribuições do cargo ou da função; ou
4) ter concluído ações de desenvolvimento com carga horária
mínima acumulada de cento e vinte horas ou obtido certificação
profissional em áreas correlatas ao cargo ou à função para o qual
tenha sido indicado.
Já para ocupar CCE ou FCE de níveis 12 a 14, os postulan-
tes terão que atender, no mínimo, um dos critérios específicos a
seguir: 1) possuir experiência profissional de, no mínimo, quatro
anos em atividades correlatas às áreas de atuação do órgão
ou da entidade ou em áreas relacionadas às atribuições e às
competências do cargo ou da função; 2) ter ocupado cargo em
comissão ou função de confiança em qualquer Poder, inclusive
na Administração Pública indireta, de qualquer ente federativo
por, no mínimo, quatro anos; 3) possuir título de especialista,
mestre ou doutor em área correlata às áreas de atuação do órgão
ou da entidade ou em áreas relacionadas às atribuições do cargo
ou da função; ou 4) ter realizado ações de desenvolvimento de
liderança, estabelecidas pelo Ministério da Economia, com carga
horária mínima de cento e vinte horas.
Por fim, para ocupar CCE ou FCE de níveis 15 a 17, os
postulantes terão que atender, no mínimo, um dos critérios espe-
cíficos a seguir: 1) possuir experiência profissional de, no mínimo,
seis anos em atividades correlatas às áreas de atuação do órgão
ou da entidade ou em áreas relacionadas às atribuições e às
competências do cargo ou da função; 2) ter ocupado cargo em
comissão ou função de confiança equivalente a CCE de nível 13
ou superior em qualquer Poder, inclusive na administração públi-
ca indireta, de qualquer ente federativo por, no mínimo, seis anos;

142
RIG em três dimensões

3) possuir título de mestre ou doutor em área correlata às áreas


de atuação do órgão ou da entidade ou em áreas relacionadas
às atribuições do cargo ou da função; ou 4) ter realizado ações
de desenvolvimento de liderança, estabelecidas pelo Ministério
da Economia, com carga horária mínima de cento e vinte horas.
É no nível de diretorias de departamentos, coordenações
gerais, coordenações e chefias de divisões, que muitas vezes
sequer figuram no organograma dos ministérios, onde as ati-
vidades operacionais de fato se realizam. Os cargos de chefia
dessas instâncias, em grande escala, são ocupados ou exerci-
dos por servidores de carreira, que aliam delegação política e
conhecimento técnico.

5.2. Nível de influência no conteúdo das


políticas públicas pela área técnica
No processo de formulação e implementação das polí-
ticas públicas no governo federal, as áreas técnicas dispõem
de elevado poder de veto e de persuasão perante os decisores,
especialmente nos quatro órgãos ou espaços institucionais a
seguir: 1) a Advocacia-Geral da União (AGU), por intermédio
das consultorias jurídicas dos ministérios, 2) a Subchefia de
Análise Governamental (SAG), da Casa Civil da Presidência da
República, que trata do mérito das matérias; 3) a Subchefia para
Assuntos Jurídicos (SAJ), da Secretaria-Geral da Presidência
da República, responsável pelos filtros jurídicos das políticas
públicas; e 4) o Gabinete Pessoal do Presidente da República,
que faz o filtro político. Eles instruem, validam e levam para o
despacho os atos governamentais submetidos aos ministros ou
ao Presidente da República.
143
RIG em três dimensões

A Consultoria Jurídica dos ministérios tem a função de for-


mular os textos e controlar a constitucionalidade e a legalidade
dos atos governamentais sobre políticas públicas, bem como
opinar sobre contratos e licitações. Pode facilitar ou dificultar a
tomada de decisão.
A Subchefia de Análise Governamental (SAG), da Casa
Civil da Presidência da República, tem a função de monitorar e
compatibilizar os atos governamentais com as diretrizes de go-
verno. Faz análise de mérito, da oportunidade e da conveniência
da adoção das políticas públicas propostas pelos ministérios ou
pelo Congresso Nacional.
Regulamentada pelo Decreto nº 10.907/2021, a SAG é
uma espécie de mini governo, que conta com mais de 80 técnicos
de notória especialização e está estruturada em seis núcleos.
Além do subchefe, que faz a coordenação-geral, de um subche-
fe-Adjunto Executivo e uma assessoria especial, conta com seis
subchefes-adjuntos e respectivos substitutos, responsáveis pelos
núcleos de: 1) Política Econômica; 2) Política de Infraestrutura;
3) Segurança Pública e Defesa; 4) Políticas Sociais; 5) Finanças
Públicas; 6) Gestão Pública; e 7) Análise Legislativa.
A SAG faz a articulação intragovernamental para identificar
e superar obstáculos institucionais/legais e atingir os objetivos
na implementação das políticas.
A Subchefia para Assuntos Jurídicos (SAJ), que conta com
aproximadamente uma centena de técnicos de notória especia-
lização, está estruturada em núcleos. Além do subchefe, que
faz a coordenação-geral, de um subchefe-adjunto executivo e
uma assessoria especial, conta com nove subchefes-adjuntos,

144
RIG em três dimensões

responsáveis pelos núcleos de: 1) Políticas Sociais; 2) Políticas


de Infraestrutura, 3) Política Econômica, 4) Gestão Pública; 5)
Análise de Atos de Pessoal; 6) Assuntos Internos; 7) Assuntos
Institucionais, 8) Assuntos Legislativos; e 9) Estudos Jurídicos,
Revisão e Consolidação Normativa. A SAJ sempre pertenceu à
Casa Civil, mas no governo do Presidente Bolsonaro foi transferida
para a Secretaria-Geral da Presidência da República46.
Regulamentada pelo Decreto nº 11.144/2022, a SAJ é
uma subchefia muito poderosa, que tem como função: 1) coor-
denar as atividades de elaboração, redação e tramitação de atos
normativos, verificando a constitucionalidade e a legalidade
de todos os atos submetidos ao Presidente da República; 2)
gerir o SIDOF (Sistema de Geração e Tramitação de Documen-
tos Oficiais); 3) controlar os atos (decretos, MPs e proposições
legislativas); 4) registrar, controlar e analisar as indicações para
provimento de cargos e funções de confiança em nível de Direção
e Assessoramento Superior; e 5) preparar os atos e comparecer
ao despacho presidencial para explicar o conteúdo das políticas
públicas ao Presidente.
No gabinete pessoal do Presidente, além do chefe, existem
seis adjuntos de: 1) Gestão Interna; 2) Documentação Históri-
ca; 3) Ajudância de Ordens; 4) Agenda; 5) Informações; e 6)
Cerimonial. Duas dessas subchefias adjuntas, a de agenda e a
de informação, ao lado da assessoria especial da Presidência da
República, são fundamentais para o acesso e para a instrução
das decisões presidenciais, conforme explicado a seguir.
46
A transferência da SAJ da Casa Civil para a Secretaria-Geral da Presidência, uma espécie de prefeitura do
Palácio, foi inusitada. Ela se deu porque o Subchefe da SAJ, Jorge de Oliveira, atual ministro do Tribunal de
Contas da União, então na Casa Civil, condicionou o “aceite” ao convidado para assumir a titularidade da
Secretaria-Geral da Presidência à inclusão em sua estrutura da Subchefia para Assuntos Jurídicos (SAJ), no
que foi atendido pelo Presidente da República.

145
RIG em três dimensões

O chefe de gabinete adjunto de Agenda coordena a agenda


presidencial, os eventos, cerimônias e viagens do presidente,
e prospecta nos demais órgãos temas que possam integrar a
agenda futura do presidente da República.
O chefe de gabinete adjunto de Informações, além do apoio
às decisões, acompanha as audiências, prepara as informações
de apoio, orienta os ministros quanto à preparação de informa-
ções e registra, monitora e cobra o andamento das decisões e
dos compromissos públicos do Chefe do Poder Executivo.
Por sua vez, a assessoria especial elabora estudos e prepara
a correspondência do Presidente com autoridades estrangeiras.
No próximo tópico, apresentaremos o roteiro ou checklist
que os formuladores de políticas públicas precisam observar
quando da elaboração dos atos governamentais.

5.3. O checklist dos atos governamentais


O Anexo do Decreto nº 9.191, de 1º de novembro de 2017,
lista as questões a serem analisadas quando da elaboração dos
atos normativos no Poder Executivo, geralmente no âmbito das
consultorias jurídicas e dos departamentos dos ministérios, bem
como da Subchefia de Análise Governamental da Casa Civil da
Presidência da República e da Subchefia para Assuntos Jurídicos,
da Secretaria-Geral da Presidência da República.
Trata-se de um checklist realizado pelos formuladores
de políticas do Poder Executivo que inclui desde apresentação
de diagnóstico e levantamento de alternativas, de competência
legislativa, de necessidade de lei, de exame da reserva legal, de

146
RIG em três dimensões

vigência da norma, do tipo de norma (se Decreto, Medida Pro-


visória, Projetos de Lei ou Proposta de Emenda à Constituição),
passando pela oportunidade do ato normativo, pela densidade
do ato, pelo tipo de direito (se fundamental ou não, tributário,
penal), até pela análise dos custos envolvidos, dos prazos de
vigência e da avaliação de resultados.
Do ponto de vista do profissional de relações institucionais
ou do representante de interesse, as questões a serem levantadas
e analisadas seriam:

5.3.1. Quanto ao diagnóstico


1) Que repercussões tem o tema em relação ao interesse
dos clientes?
2) Quem mais está sendo afetado pela medida?
3) É preciso tomar alguma providência ou o ato em análise
basta?

5.3.2. Em relação às alternativas, identificar
1) Quais são as alternativas à proposição sob exame?
2) Onde se situam as causas do problema? Sobre quais
causas pode incidir a ação que se pretende executar?
3) Quais os instrumentos mais adequados para a situação?

5.3.3. Relativamente às competências


1) Quem deve ser acionado para resolver o problema?
2) De quem é a competência: Executivo ou Congresso?
147
RIG em três dimensões

5.3.4. Quanto ao ato ou instrumento


recomendado
1) Projeto de lei, decreto legislativo, emenda, destaque
supressivo, promover audiência pública?
2) Contratar um parecer, dar destaque na mídia, produzir
uma nota técnica?

5.3.5. Sobre a oportunidade da


iniciativa
1) O momento é oportuno?
2) Espera-se uma proposição com pertinência temática
para emendar?

5.3.6. Em relação à exequibilidade


1) O ato proposto é exequível?
2) Há conflito de interesse?
3) Qual a opinião preponderante sobre o tema?

5.3.7. Sobre os aspectos orçamentários ou


custos envolvidos
1) Existe relação equilibrada entre custos e benefícios?
2) Há margem orçamentária para tanto?

5.3.8. Quanto ao prazo


1) Com que prazo se conta?

148
RIG em três dimensões

Este talvez seja um dos principais aspectos a serem consi-


derados na formulação e implementação de políticas públicas.
Nada mais inadequado do que uma decisão fora do prazo.
No entanto, a Administração, rotineiramente, negligencia o
cumprimento de prazos, e o processo decisório, com frequência,
protela o encaminhamento de medidas até que o prazo seja in-
suficiente. Nesses casos, vale-se de seus recursos de poder para
reabrir ou prorrogar prazos, adiando medidas que deveriam ter
sido adotadas ou encaminhadas com antecedência.
A seguir, apresentaremos a tipologia das políticas públicas.

6. Tipologia ou arenas das


políticas públicas
Existem pelo menos quatro tipos de políticas públicas: 1)
as distributivas; 2) as redistributivas; 3) as regulatórias; e 4)
as constitutivas/estruturais. De acordo com Lowi (1972), que
desenvolveu a tipologia envolvendo as três primeiras, a relação
política é determinada pelo tipo de política em formulação. As
políticas distributivas e as redistributivas concentram a oferta de
bens e serviços à população, e as regulatórias e as constitutivas/
estruturais regulam ou definem as relações entre os atores sociais.
No primeiro grupo estão as políticas: 1) distributivas – de
custos e benefícios difusos, com baixo nível de conflito – que se
destinam a promover a alocação de bens ou serviços a frações
específicas da sociedade (categoria de pessoas, localidades,
regiões, grupos sociais), mediante recursos provenientes dos
tributos, e 2) redistributivas – de custos e benefícios concentra-
dos, com alto nível de conflito – que promovem a distribuição de
149
RIG em três dimensões

bens e serviços a segmentos particularizados da população por


intermédio de recursos oriundos de outros grupos específicos.
A segunda política deste primeiro grupo tem o objetivo
de redistribuir renda na forma de recursos e/ou financiamen-
tos de equipamentos e serviços, tais como reforma agrária,
distribuição de royalties do petróleo, política de transferência
de recursos inter-regionais, política tributária, a exemplo de
imposto progressivo (IR), previdência social, seguro-desem-
prego/defeso, cotas raciais.
No segundo grupo estão as políticas regulatórias e as
constitutivas.
As primeiras do segundo grupo (regulatórias) possuem
grau de conflito variando de acordo com o setor regulado e
combinam um padrão de demanda fragmentada e um sistema
decisório concentrado. Com custos concentrados e os benefícios
difusos, as políticas regulatórias são sempre muito mediadas e
se destinam a estabelecer imperativos, proibições, interdições
e condições por meio das quais podem e devem ser realizadas
determinadas atividades ou admitidos certos comportamentos.
Elas podem variar de regulamentações simples e operacionais
a regulações complexas, de grande abrangência. Exemplo: Có-
digo de Trânsito, Lei de Eficiência Energética, Código Florestal,
Legislação Trabalhista.
As segundas do segundo grupo (constitutivas ou estrutu-
rais) combinam demandas concentradas e um sistema decisório
fragmentado, e, em tese, são neutras. Elas definem as regras e
procedimentos utilizados na formulação e implementação das
outras três arenas (distributivas, redistributivas e regulatórias).

150
RIG em três dimensões

As políticas constitutivas ou estruturais lidam com instituições


e procedimentos, leis e regras. Tratam da consolidação das
regras do jogo político, tais como regras constitucionais diver-
sas, legislação eleitoral, regimentos das Casas Legislativas e do
Congresso Nacional, relações internacionais, defesa, inteligência,
governança, reforma administrativa, etc.
Wilson (1973), ao contestar vigorosamente o argumento
de Lowi e sua classificação das políticas públicas, construiu uma
tipologia cujo critério é o padrão de distribuição dos benefícios e
dos custos da policy ou do conteúdo da política pública.
As modalidades resultantes são: 1) Políticas Clientelistas:
as quais têm benefícios concentrados e custos dispersos, ou
seja, toda a sociedade arca com o seu custo para que alguns
grupos tenham benefícios. Ex.: subsídios, renúncias fiscais, etc.;
2) Políticas Majoritárias: nas quais os custos e benefícios são
distribuídos pela coletividade. Ex.: serviços públicos de saúde,
segurança pública, energia, educação, etc.; 3) Políticas Empre-
endedoras: nas quais os benefícios são coletivos e os custos
ficam concentrados sobre certas categorias. Implicam mudanças
que oneram alguns em benefício de todos. Ex.: reforma admi-
nistrativa, política ambiental, etc.; e 4) Políticas de Grupos de
Interesses: nas quais os custos e benefícios estão concentrados
sobre certas categorias, ou seja, alguns grupos arcam com todo
o custo e outros grupos recebem todo o benefício. Ex.: reforma
agrária, política tributária, etc.
O próximo tópico apresentará as principais razões de re-
lacionamento com o governo, bem como a forma que deve ser
realizada e os princípios que devem ser observados.

151
RIG em três dimensões

7. Como e por que se relacionar


com o governo?
Entende-se por “se relacionar”: manter contato, dialo-
gar, interagir, pressionar, apresentar pleitos, propor ações e
políticas públicas, contestar atos governamentais ou cobrar
providências.
Os poderes públicos têm a prerrogativa não apenas de
elaborar políticas públicas de caráter impositivo, mas também
de regular as relações entre pessoas e entre estas e as institui-
ções. Por isso a importância e a necessidade de relacionamento
dos agentes econômicos e sociais com os governos. Existe uma
máxima em relações institucionais e governamentais, segundo
a qual, “quem não está à mesa é parte do cardápio”.
Sentar-se à mesa para apresentar seus pleitos e defendê-los
perante as autoridades não é apenas um direito, mas também
uma obrigação, tanto para ampliar previsibilidade ou enxergar
oportunidades, quanto para evitar ou minimizar perdas ou pre-
juízos.
É de se destacar que o relacionamento com o governo
possui regras de postura, que precisam ser observadas. Os
próximos tópicos abordam exatamente sobre esses aspectos,
chamando atenção para as razões que devem ser consideradas
para a manutenção da interlocução com os governos, para a
forma de fazer e com quem se relacionar para inteirar-se das
decisões relativas a políticas públicas que possam afetar, po-
sitiva ou negativamente, os interesses e negócios dos cidadãos
ou das empresas.

152
RIG em três dimensões

7.1. Por que se relacionar com os poderes e


órgãos governamentais?
São muitas as motivações que levam pessoas, empresas ou
instituições a se relacionarem com o governo, mas apresentamos
aqui apenas três, a título ilustrativo.
Em primeiro lugar, para moderar os poderes estatais. En-
quanto não surgir outra forma de organização social, o Estado
vai continuar exercendo, em sua plenitude, os três poderes, sob
a forma de monopólios, inerentes à sua criação, quais sejam:
1) o poder de impor conduta e punir seu descumprimento
(poder coercitivo);
2) o poder de legislar (fazer leis obrigatórias para todos); e
3) o poder de tributar (arrecadar compulsoriamente o ex-
cedente econômico da sociedade).
Em segundo lugar, para ter acesso às autoridades e poder
opinar na formulação das políticas públicas nas diversas arenas,
tais como distributiva, redistributiva, regulatória ou constitutiva,
além de participar do processo político e social, na perspectiva
de evitar retrocessos, mitigar prejuízos ou avançar nas pautas
de interesse.
Em terceiro, porque o Estado, por meio de suas institui-
ções, regula a relação entre pessoas e entre estas e as demais
instituições, e o poder de favorecer ou dificultar a sobrevivência
do segmento a que pertence o grupo político ou social.
Registre-se que a interação da sociedade e do mercado com
os poderes constituídos é de interesse recíproco. Da parte da
entidade ou empresa, para viabilizar o networking, que consiste

153
RIG em três dimensões

na capacidade de estabelecer redes de contatos ou de conexões


com os decisores, tanto para obter informações e orientações
úteis para seu negócio ou representados, quanto para o exercício
da influência saudável, isto é, para a defesa de pleitos, demandas
ou reivindicações que sejam defensáveis ética e moralmente.
Da parte do governo e do Congresso Nacional, essa inte-
ração é fundamental, porque nenhuma autoridade (deputado,
senador, ministro, secretário-executivo, etc.) ou seus assessores
têm conhecimento pleno sobre todos os temas acerca dos quais
devem decidir. Apesar do crescente uso de tecnologias, inteli-
gência artificial e sistemas de informação, a escassez de tempo,
o excesso de demandas e sua complexidade são impeditivos a
que essas autoridades dominem os temas sobre os quais têm
que decidir; e mesmo contando com assessorias qualificadas,
equipes técnicas, consultores e estudos diversos, ainda assim
é virtualmente impossível, dada a racionalidade limitada, que
tenham capacidade de processar, previamente, todas as infor-
mações relevantes. Os agentes de interesses têm um papel de
relevo ao destacar os pontos que devem ser considerados pelos
decisores, segundo as suas próprias visões e posições.
No tópico a seguir, apresentaremos as principais razões
para a interação com os poderes constituídos, especialmente
junto ao Poder Executivo.

7.2. Para que se relacionar com os poderes


e órgãos governamentais?
Para acompanhar e influenciar o processo decisório,
além de: 1) prestar esclarecimento ou defender causas, pleitos

154
RIG em três dimensões

e interesses; 2) criar capital social; 3) credenciar-se como inter-


locutor do setor ou segmento que representa; e 4) equiparar-se
aos concorrentes em termos de informação e acesso ao poder.
De acordo com Noda (2021), em sua dissertação de mes-
trado sobre a performance e eficiência do trabalho de relações
institucionais e governamentais, a ação de RIG junto aos poderes
constituídos pode impactar positivamente os negócios ajudando a:
1) conter a criação de restrições adicionais para a operação
do negócio;
2) evitar aumentos de custos operacionais, como impostos,
licenças de operação e custos de operações diárias;
3) estimular a criação de um melhor ambiente de negócios
para a companhia, visando maior vantagem competitiva; e
4) aumentar a capacidade de resposta às necessidades
do mercado.
Além disso, a experiência demonstra que os grupos ou
segmentos que não se organizam para defender seus interesses
podem ser prejudicados, já que as decisões políticas são produto
de negociação, de pressão e de correlação de forças. É preciso
ter em mente que muito provavelmente os adversários ou con-
correntes atuarão junto aos decisores, por isso a importância e
a necessidade da organização e da participação.

7.3. Com quem se relacionar, do ponto


de vista institucional?
Os ministérios e as agências governamentais estão di-
vididos por área temática e, para que a atuação seja efetiva, é

155
RIG em três dimensões

preciso que os pleitos, reclamações ou esclarecimentos sejam


direcionados aos órgãos que tenham pertinência com a pauta da
empresa ou entidade, sob pena de perda de tempo e recursos.
Então, necessário se faz identificar a agência ou o órgão com
a responsabilidade, competência, atribuição ou prerrogativa de
debater ou resolver o problema.

7.4. A quem procurar – o técnico


ou o político?
É preciso examinar a situação para ter clareza sobre o
melhor interlocutor para equacionar o problema, podendo ser
um técnico ou um político. Pode ser um ou outro, ou mesmo
ambos. Para fazer a escolha certa, é necessário conhecer o papel
de cada um no processo decisório.
Em tese, os políticos dão as ordens e os burocratas47 obede-
cem. Na prática, entretanto, quase nunca é assim. Os servidores
de carreira ou a burocracia profissionalizada – formada pelos
funcionários que formulam, validam e implementam as políticas
públicas – só costumam colocar em prática uma ordem se esti-
verem convencidos de seu respaldo legal ou se tiverem certeza
da credibilidade e legitimidade do ordenador.
Por isso, os servidores de carreira contam com importante
grau de independência e autonomia dentro de suas atribuições.
Quando há conflito de posições, costuma ocorrer o fenômeno da
“adaptação burocrática” o que significa que no curso da execu-
ção, às vezes de forma gradual e lenta, os burocratas reformulam

47
Burocrata típico é um profissional comprometido com suas responsabilidades e persegue, principalmente,
o que ele percebe como o interesse público.

156
RIG em três dimensões

as políticas, tornando-as mais ajustadas às suas visões, ou se


adaptam à orientação do governo. Quando isso não é possível,
o conflito se resolve pela exoneração e substituição dos titu-
lares de cargos em comissão ou reformulação de estruturas e
competências, evitando o exercício do “poder de veto” por um
determinado setor da burocracia.
Os burocratas, que não são eleitos nem aparecem nos
jornais, são cumpridores de rituais e exercem algum controle
sobre a situação porque conhecem as leis, portarias e normas
que ativam ou travam um governo. Em geral, se uma ordem parte
de alguém alheio à máquina, que exerce provisória ou transito-
riamente um posto de mando, a desconfiança tende a ser muito
grande entre os funcionários de carreira. Entretanto, se a ordem
vier de um funcionário de carreira com posto de mando aumenta
a credibilidade e, em consequência, a chance de efetivação. Os
funcionários de carreira, que, com maior frequência, ocupam
cargos em escalões inferiores, exercem muita influência. Isto
explica, em grande medida, a presença desses funcionários em
posto de mando.
Segundo Howlett (2000), “os burocratas são, frequente-
mente, os atores centrais em processos políticos e as figuras cen-
trais em muitos subsistemas de políticas, dada a impossibilidade
de que políticos generalistas controlem ou mesmo percebam as
atividades específicas de governo nominalmente sob seu con-
trole. Eles também têm o poder de filtrar as demandas a serem
encaminhadas para decisão superior.
A quantidade de funcionários com esse perfil, segundo
Barros (2002), que divulgou excelente artigo sobre quem man-

157
RIG em três dimensões

da no Brasil, não passa de 1.50048. Com a criação de novas


carreiras de excelência no serviço público desde então, esse
número deve ter aumentado, mas dificilmente seria superior a
2.000 servidores. Segundo o articulista – e isso também pouco
se alterou – esses servidores são oriundos do Banco Central, do
Ministério da Fazenda (atual Ministério da Economia), da Secre-
taria do Tesouro, da Receita Federal do Brasil, do Itamaraty, da
Advocacia-Geral da União, do Banco do Brasil, de carreiras como
as de analistas de comércio exterior e de gestores governamentais
e das consultorias legislativas da Câmara dos Deputados e do
Senado Federal. Enfim, são servidores de carreiras de Estado,
experientes, bem remunerados e bem treinados e que, em muitos
momentos, compartilham de poder real de decisão, viabilizando
ou inviabilizando iniciativas políticas dos governos.
Assim, quando se busca a resolução efetiva de um proble-
ma, o recomendável é procurar preferencialmente um funcionário
de carreira com posto de mando. Ele, além de conhecer os ritos
e processos, goza de mais credibilidade do que alguém fora da
máquina, tanto perante seus colegas de trabalho quanto frente
ao superior hierárquico que lhe outorgou ou delegou poderes.
No tópico a seguir, apresentaremos os métodos mais co-
muns de tomada de decisão nos governos.

8. Como se dá a tomada de
decisão no governo?
A tomada de decisão no governo, como regra, segue um rito
cujo desfecho pode resultar: 1) de “concertação” intragovernamen-
48
Conferir artigo na seção de opinião, Revista Exame, edição de 05/12/2002.

158
RIG em três dimensões

tal, em que todos cedem para viabilizar o consenso; 2) de aferição


ou votação, em que prevalece a opinião da maioria; ou 3) em situ-
ação de impasse, que exige arbitramento da autoridade superior.
Assim, nem sempre as decisões refletem o pensamento
individual do encarregado de sua formulação ou mesmo de sua
comunicação à sociedade. São produtos do pensamento médio,
de disputa no interior do governo ou do arbitramento presiden-
cial, e isso invariavelmente favorece ou contraria interesses no
interior do governo.
A seguir, exemplos de decisões conflituosas tomadas por
governos.
A Lei Complementar nº 147, de 2014, que promoveu gran-
des alterações ao Estatuto da Microempresa, é um exemplo de
disputas internas que levaram à construção de uma posição me-
diada, mas na qual a orientação presidencial arbitrou a solução
de forma mais favorável ao setor interessado. Naquela ocasião,
durante meses, a Secretaria da Micro e Pequena Empresa e os
Ministérios da Fazenda e do Planejamento defenderam posições
opostas. A Secretaria, mais interessada em aumentar o alcance
da Lei e os benefícios para o setor, desconsiderava os impactos
fiscais e as dificuldades para implementação da norma. Já a
área econômica, como de praxe, resistia à universalização do
Supersimples e à redução de carga tributária. Ao final, prevaleceu
a tese da universalização, mas com tabelas de tributação mais
próximas das defendidas pela área econômica.
Outro exemplo importante é a Lei que instituiu o Prouni
(Programa Universidade para Todos). O Ministério da Educação
(MEC) e o Ministério da Fazenda debateram, durante meses, a

159
RIG em três dimensões

concepção do programa, sem chegar a um acordo. Ao final, o


Presidente da época arbitrou a favor do MEC, permitindo que a
política fosse adotada, envolvendo robustos incentivos fiscais às
instituições privadas de ensino.
A criação do Programa Bolsa Família também foi cercada de
disputas internas. Na época, Ministérios como o da Educação e o
da Saúde perderiam o protagonismo e relevância com a unificação
dos benefícios já existentes (Bolsa Escola, Bolsa Alimentação)
sob a gestão de uma nova Pasta ministerial (o Ministério do
Desenvolvimento Social - MDS), que acabou por ser criada para
gerir o Programa e implementar as políticas de assistência social
e segurança alimentar do governo do Presidente Lula). Num pri-
meiro momento, a resistência das Pastas trouxe grande desafio
à Casa Civil como instância de coordenação responsável pela
elaboração de uma proposta que atendesse ao compromisso de
campanha do governo Lula. Ao final, com o forte apoio do então
Presidente da República e o envolvimento direto do ministro da
Casa Civil, as resistências foram minimizadas e o programa foi
lançado em outubro de 2003.
As disputas no interior dos governos são muito comuns e,
em geral, se dão em três dimensões, conforme a seguir apre-
sentado.

8.1. Em que dimensões ocorrem


as disputas no interior do governo a respeito
das políticas públicas?
A disputa no interior do governo é regra. Democracia é
conflito de visões, porém com regras acordadas e votadas. As

160
RIG em três dimensões

disputas e conflitos se dão nos planos ideológico, burocrático


e político. No plano ideológico, quando as políticas contrariam
posições já definidas no âmbito dos partidos que integram a
base do governo e os interesses setoriais representados pelas
Pastas.
No âmbito burocrático, quando visões distintas, tecni-
camente defensáveis, são adotadas por diferentes setores da
burocracia, responsáveis pela sua formulação e crítica, ou ava-
liação de viabilidade técnica, custos financeiros e juridicidade.
Nesses casos, os setores da burocracia, na defesa de suas
prerrogativas técnicas, travam embates, materializados em no-
tas técnicas, pareceres ou posições defendidas, pessoalmente,
em audiências públicas que são decisivas para a definição do
destino de uma política.
Já no plano político, as disputas e interesses dos partidos
políticos, notadamente quando envolvem a realocação de re-
cursos ou a mudança de titularidade da Pasta responsável pela
implementação de uma política, são aspectos relevantes que
podem gerar uma paralisia no âmbito interno do governo.
Um exemplo dessas dimensões foram as disputas, em
2008, entre a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) e o
Ministério do Meio Ambiente pela condução do Programa Ama-
zônia Sustentável. A decisão em favor da SAE acabou sendo
o estopim do pedido de demissão da então ministra do Meio
Ambiente Marina Silva.
Por mais desorganizado que seja um governo, ele costuma
ter critério para a liberação do escasso recurso orçamentário,
conforme apresentaremos a seguir.

161
RIG em três dimensões

8.2. Em geral, que critérios são utilizados


para efeito de alocação de recursos aos
ministérios e órgãos?
Como regra, a liberação de recursos para os ministérios
e órgãos obedece a alguns critérios, observado o fluxo de caixa
da Administração Federal. O primeiro critério é o de capacidade
de gasto. Ministério que não consegue gastar os recursos aloca-
dos, no exercício seguinte, tende a perder dinheiro. O segundo
aspecto se relaciona com a capilaridade e distribuição de bens e
serviços, ou seja, com a agenda de políticas públicas da Pasta. O
terceiro critério tem relação com a proximidade ou alinhamento
político entre o ministro e o Presidente da República. O quarto
tem a ver com a flexibilidade de gasto dos ministérios, para os
quais os parlamentares destinam recursos de suas emendas e
nos quais exercem maior influência. E o quinto é a determinação
presidencial.
Segundo esses critérios, o melhor “executor” é o que mais
gasta ou gasta todo o orçamento colocado à sua disposição,
enquanto os gestores mais prudentes têm seus orçamentos
reduzidos. E como a aversão ao risco cresce na burocracia sim-
plesmente vão executar cada vez menos.

9. Conclusões do Capítulo
Neste Capítulo tivemos a oportunidade de apresentar as
principais ferramentas para o acompanhamento do trabalho
junto ao governo federal, com dicas e informações sobre a de-
fesa de interesse perante o Poder Executivo. Buscamos trazer
uma visão ampla do sistema decisório na Administração Direta

162
RIG em três dimensões

e nas agências reguladoras, e outros órgãos do Executivo, bem


como apresentar um roteiro capaz de possibilitar a montagem
de estratégias e táticas para um trabalho exitoso em favor dos
interesses representados.
No Capítulo III, trataremos do tema “como fazer análise de
conjuntura”, com a finalidade de demonstrar que a conjuntura
importa quando se pensa em decisões públicas.

163
CAPÍTULO III

ANÁLISE
POLÍTICA E DE
CONJUNTURA
RIG em três dimensões

N os dois primeiros Capítulos, discorremos sobre o trabalho


parlamentar e a defesa de interesses perante os poderes
públicos. Neste vamos tratar das ferramentas e metodologias
indispensáveis à análise política ou à análise de conjuntura,
chamando atenção para o fato de que a conjuntura importa
quando se pensa em decisões públicas.
A análise política ou a análise de conjuntura tem por finali-
dade ajudar a compreender a realidade, identificar os interesses
em jogo, montar um mapa de correlação de forças econômicas,
políticas e sociais como subsídio para a definição de táticas e
estratégias de intervenção na realidade. Ou seja, é uma ferra-
menta muito útil para a elaboração de estudos prospectivos e
de planejamento estratégico.
Nesse contexto, a análise de conjuntura busca relacionar os
acontecimentos, o palco em que os mesmos ocorrem, os atores
e interesses envolvidos, as relações de força, a articulação entre
estrutura e conjuntura, as tendências, os riscos e oportunidades.
Essas categorias de análise permitirão ter uma visão sistêmica
do fenômeno examinado.
É de se destacar que a conjuntura é influenciada ou alterada
por decisões de governo, de mercado, da sociedade civil ou até
por fenômenos naturais. E, mais recentemente, pela influência
da mídia programada que, fazendo uso de algoritmos, direciona
a comunicação para públicos específicos.
Se, de um lado, o uso de novas tecnologias de captação
de dados e informações em grande quantidade pode facilitar a
análise política ou da conjuntura, como é o caso do big data,
de outro, a complexidade do mundo em rede, em que há co-

167
RIG em três dimensões

municação direcionada sem filtros nem controle, muitas vezes


dissemina-se fake news (notícias falsas).
O valor da análise política ou de conjuntura está em permitir
elaborar bons prognósticos, com base nas informações dispo-
níveis. Embora o futuro seja incerto e indeterminado, algumas
técnicas podem ser empregadas para antecipar cenários possíveis
para o futuro.
Assim, analisar a conjuntura exige conhecimento, dados e
informações, bem como capacidade de entender e descobrir sen-
tido, relações e tendências do ambiente e dos atores envolvidos.
Toda análise de conjuntura deve trazer a lista de riscos,
mesmo que não componham o cenário central, porque podem
alterar a conjuntura de modo significativo.
Nessa perspectiva, a arte, a cultura, a bagagem, a expe-
riência e as habilidades do analista podem fazer diferença na
qualidade da análise, tanto em captar tendências, enxergar riscos
ou mudanças de cenários, quanto na capacidade de diferenciar
a aparência da essência, especialmente em um ambiente de
redes sociais, que difundem narrativas imaginárias sobre fatos e
acontecimentos que afetam a percepção da realidade por todos
os atores, influenciando, estimulando e manipulando compor-
tamentos.
Neste Capítulo vamos focar: 1) nos conceitos de conjuntura,
estrutura e superestrutura; 2) no objetivo da análise de conjuntu-
ra; 3) nos elementos e indicadores a serem observados na análise
de conjuntura; 4) na apresentação de algumas metodologias de
análise de conjuntura, inclusive com exemplos práticos; 5) nos
erros a serem evitados na análise de conjuntura; 6) na inter-re-

168
RIG em três dimensões

lação das partes que formam o todo, mediante mapeamento


da correlação das forças econômicas, políticas e sociais; 7) na
sistematização dos recursos de poder que os atores envolvidos
podem mobilizar para tornar efetiva suas ações políticas; 8) nos
principais desafios na análise de conjuntura; e 9) nas categorias
de análise – passo a passo da análise de conjuntura; principais
fontes nacionais e internacionais para análise de conjuntura.
O objetivo do Capítulo, portanto, é apresentar uma ferra-
menta de análise da realidade, abordando o tema em diversas
dimensões, com o propósito de mostrar que a análise de con-
juntura importa quando se trata de decisões políticas.

1. Por que a análise de conjuntura


importa para a tomada de decisão?
As sociedades capitalistas possuem características e estru-
turas de poder estáveis, como o mercado (economia), o Estado
(governo) e a sociedade civil (as classes sociais) que, embora
duradouras, passam por momentos e ciclos de transformações
dependendo das relações, de disputas de poder entre os agentes,
das contradições e dos problemas próprios da disputa.
Salvo em momentos de ruptura, as mudanças acontecem
por modificações incrementais na conjuntura. Nesse sentido, a
melhor forma de identificar e impulsionar ou se antecipar a esses
movimentos é promovendo análise de conjuntura.
Para compreender a complexidade da formulação e imple-
mentação das políticas públicas, o analista precisa:
1) entender o processo decisório (regras);

169
RIG em três dimensões

2) conhecer as estruturas/organizações decisórias (órgãos);


3) identificar quem decide (atores);
4) fazer boa análise do ambiente político e econômico ou
do “humor nacional”; e
5) elaborar cenários alternativos, no caso de ser necessário
adotar um curso de ação ou outro.
Com isso, é possível elaborar uma lista dos fatores faci-
litadores e dificultadores da tomada de decisão e, a partir daí,
montar um roteiro de análise49.
A realidade é uma só. Ela leva, porém, a diferentes inter-
pretações e formas de ação ou de intervenção, dependendo da
abordagem ou do interesse do governo, do segmento, do grupo
político ou social ou da pessoa que faz a análise ou que necessita
tomar uma decisão.
Por exemplo, na economia, o governo utiliza várias formas
e instrumentos de política econômica para incentivar ou desa-
celerar o crescimento e alterar a distribuição funcional da renda,
tais como:
1) política fiscal – receitas, despesas e transferências do
governo;
2) política monetária – controle da oferta de moeda, da
taxa de juros, e do custo do crédito;
3) política cambial – atuação sobre a taxa de câmbio e ou-
tros mecanismos de controle das relações econômicas externas; e
4) política social – controle da remuneração, dos salários,
49
Ver detalhes no tópico 4.2. do Capítulo II deste livro (p. 130).

170
RIG em três dimensões

dos benefícios a grupos sociais vulneráveis e outros fatores que


incidem sobre a distribuição da renda.
Outro exemplo refere-se à remuneração dos fatores de
produção: mão de obra (salários); capital financeiro (juros);
espaço utilizado para produção (aluguéis); e os investimentos
empresariais (lucros e/ou dividendos).
A renda nacional, por sua vez, é constituída de cinco ele-
mentos:
1) rendas do exterior – pagamento pelo uso de propriedade
intelectual e royalties;
2) aluguéis – arredamento de terras, propriedade, imóveis;
3) lucros – remuneração do capital, que pode ser reinvestido;
4) juros – remuneração do capital financeiro; e
5) salários – remuneração da mão de obra, a parte mais
fraca da relação econômica, social e política.
O modo como os governos manuseiam esses instrumentos
depende principalmente da visão política e ideológica dos gover-
nantes, assim como do papel que eles atribuem ou desempenham
junto ao Estado.
Além disto, as novas tecnologias da informação, a inter-
net, o uso intenso de redes sociais50, as ferramentas de busca
avançada, dentre outras novidades digitais, contribuem para: 1)
facilitar a interação social e mudar a conjuntura; 2) influenciar
alterações na estrutura; e 3) questionar os fundamentos da
superestrutura, especialmente nesses tempos de pós-verdade,
50
Segundo Galan (2012, p. 30), “as redes sociais acabaram por identificar, mapear e distribuir em grupos
as mais diversas “tribos”, criando novos mecanismos de expressão”.

171
RIG em três dimensões

de fake news e até de negacionismo. Por outro lado, o maior


acesso a informação e conjunto de atores envolvidos torna ainda
mais aguda a questão da “racionalidade limitada”, demandando
ainda mais recursos tecnológicos para que decisões baseadas
em evidências possam ser adotadas.
E uma boa análise de conjuntura pode desvendar isso com
clareza.

2. Conceitos fundamentais
Pelo menos três conceitos são indispensáveis: 1) o de
conjuntura; 2) o de estrutura; e 3) o de superestrutura. Embora
esses conceitos, isoladamente, não deem mais conta de capturar
toda a dimensão da realidade, por força da revolução tecnológica,
continuam fundamentais no processo de leitura e percepção dos
movimentos políticos, econômicos e sociais.
O primeiro conceito, o de conjuntura, está relacionado a
um ciclo de curta duração. A conjuntura transmite a ideia de
combinação de fatos e acontecimentos, demarcados no tempo
e no espaço, que explicam uma realidade política, econômica
ou social.
Nessa perspectiva, a conjuntura consiste em encontro, com-
binação ou concorrência de acontecimentos, numa dada situação
ou circunstância e num determinado período ou espaço de tempo,
que pode ser favorável ou desfavorável à realização de algo. Por
exemplo: uma greve, uma manifestação, uma guerra, etc.
O segundo conceito, de estrutura, por sua vez, tem a ver
com fundamentos e características básicas, mais estáveis ou

172
RIG em três dimensões

mais duradouras, da sociedade. Padrão tecnológico, divisão do


trabalho (produção) ou complexidade econômica, que se verifica
pelo peso de cada setor de atividade na produção, emprego,
renda, relações com o exterior, etc.
Em geral, as estruturas possuem herança histórica e, ex-
ceto em caso de rupturas, suas mudanças se dão a longo prazo
ou com generosas regras de transição, a partir dos sucessivos
movimentos conjunturais.
A estrutura é entendida como a base do sistema econômi-
co ou o modo como se organizam a economia e a produção, os
grupos ou classes sociais, o Estado, a cultura, etc.
Conforme Alves (2008), a estrutura (ou infraestrutura) re-
presenta a base econômica da sociedade, sobre a qual se ergue
a superestrutura (relações jurídicas, políticas e demais formas
de consciência social). Para ele:
Uma análise de conjuntura deve levar em conta tanto as mudanças
estruturais, quanto as mudanças institucionais. A análise de conjun-
tura deve abranger o conjunto dos problemas quer sejam estruturais
ou institucionais. Neste aspecto, mesmo sendo uma análise de curto
prazo, abarca as variações conjunturais da estrutura.

A superestrutura está relacionada ao conjunto de ideias,


das representações sociais, dos sistemas de atitudes e compor-
tamentos sociais, a moral e a ética, resumidos nas lutas políticas
e ideológicas.
Trata-se de um sistema duradouro de regras estabelecidas
que estruturam as interações sociais, incluindo relações jurídicas,
políticas, econômicas e demais formas de consciência social. In-
clui regras formais, como leis e constituições, e informais, como
normas de comportamento, as convenções sociais, os códigos

173
RIG em três dimensões

de conduta autoimpostos, que definem a estrutura de incentivos


da sociedade.
A superestrutura, portanto, corresponde às relações ineren-
tes ao sistema político-jurídico-institucional que inclui as leis e as
organizações do Estado, passa por todas as formas e instrumentos
de reprodução da consciência social, até alcançar os aspectos
culturais e ideológicos dominantes, como o modo de pensar, as
visões de mundo, as ciências, as religiões, as artes, etc.
As redes sociais são hoje as principais protagonistas da
superestrutura. É por meio delas que são veiculadas majori-
tariamente as narrativas que reforçam ou questionam valores
socioculturais. Elas afetam a percepção da realidade por todos
os atores, influenciando, estimulando e até manipulando com-
portamentos. Para captar e compreender a magnitude desse
fenômeno, é preciso analisá-lo em todas as suas dimensões:
o alcance, os emissores, as plataformas e as redes políticas
envolvidas.
A compreensão do papel e da interação nos três setores
do sistema social capitalista (estado, mercado e sociedade) e a
forma como o analista concebe essa interação continuam fun-
damentais para uma boa análise de conjuntura, apesar desses
novos fenômenos.

3. Os três setores do sistema social


Para fazer análise de conjuntura, é fundamental conhecer
os três setores do sistema social ou os atores do sistema social
e suas relações:

174
RIG em três dimensões

1º setor – o Estado – deve ser pautado pelo interesse


público e pela busca e manutenção do poder e tem a primazia
sobre os demais setores por deter poderes exclusivos de impor
conduta, legislar e tributar.
2º setor – o Mercado – pauta-se pela lei da oferta e da
procura e pela busca do lucro e tem a primazia da competição.
3º setor – a Sociedade Civil – guia-se por objetivos volun-
tários e tem a primazia das ações públicas não estatais.
Nesse contexto, o sistema social de qualquer País capita-
lista democrático está estruturado em três setores.
O primeiro setor, o Estado, é formado pelos entes estatais
e tem por finalidade administrar o uso de bens públicos para fins
públicos. Não tem fins lucrativos e seus meios e fins são públicos
e tem gestão burocrática, com um corpo funcional especializado
que age segundo normas objetivas e impessoais. Tem primazia
sobre os demais setores porque detém os monopólios ou poderes
exclusivos de legislar, tributar e de polícia.
O segundo setor, o Mercado, formado por agentes econô-
micos privados, pauta-se pela lei da oferta e da procura e tem a
primazia da competição. Ele também tem influência, por força
do poder econômico, para distorcer a soberania do Estado. Na
verdade, o mercado sempre busca o lucro e o poder de mono-
pólio/oligopólio/cartel, que contornam competição, pois isso
leva à maximização do lucro. Tem fins lucrativos e seus meios
e fins são privados e tem gestão privada e exercida por regras
adaptáveis às circunstâncias, com vistas à eficiência competitiva
das organizações.

175
RIG em três dimensões

E o terceiro setor, a Sociedade Civil, formada por organi-


zações e movimentos não-governamentais ou privados, os quais
têm a primazia das ações públicas não estatais. Ela não tem
fins lucrativos, emprega meios privados e fins públicos, e seus
objetivos sãos voluntários e virtuosos.
Por sua natureza, a Sociedade Civil pode se insurgir
tanto contra o Estado (contra o autoritarismo estatal, por
exemplo), quanto contra o mercado (contra a manipulação das
empresas privadas que colocarem em risco o abastecimento
de gêneros e bens necessários à vida social, por exemplo). A
eficácia das mobilizações da Sociedade Civil depende de que
o Estado incorpore reivindicações transformando-as em leis,
regulamentos, etc.
A Sociedade Civil, por fim, atua em quatro estágios:
1) prestação de serviços para suprir uma deficiência ime-
diata (comida, abrigo, água, saúde);
2) organização focada no desenvolvimento local;
3) atuação para mudar políticas e instituições locais, na-
cionais e globais; e
4) movimentos sociais, formação de redes nacionais e
transnacionais, movidas por ideologia e pela visão de um mundo
melhor.
Atualmente, já se fala num “quarto setor”, que correspon-
de às organizações privadas que atuam em atividades ilícitas,
as organizações criminosas. Exemplo: qualquer tipo de tráfico
(de pessoas, de drogas e de influência) e cartéis. O enriqueci-
mento é ilícito. A balança financeira é superavitária; o foco está

176
RIG em três dimensões

nos interesses pessoais; e o resultado é ilícito. Há autores que


incluem nesse “quarto setor” também o mercado informal e as
práticas corruptivas.
Para que cada um dos três setores cumpra adequadamen-
te sua função – e o faça com princípios republicanos, éticos e
morais –, eles devem se manter fiéis aos seus interesses, meios
e fins. O Quadro 7, a seguir resume, com clareza, as principais
características de cada setor.
Quadro 7 – Características dos três setores
do sistema social

Setor Interesses Meios Fins Objetivos

1º - Estado Não lucrativos Burocráticos Públicos Públicos


2º - Mercado Lucrativos Competitivos Privados Privados
Privados Coletivos
3º - Sociedade
Não lucrativos (Voluntários e Públicos (públicos
Civil
Virtuosos)* não-estatais)
*Embora devesse ser, nem todas as entidades da sociedade civil atuam voluntariamente ou agem
virtuosamente patrocinando apenas causas coincidentes com o interesse público e defensáveis
ética e moralmente.

O equilíbrio desse sistema passa, necessariamente, pela


política e pelo sistema de freios e contrapesos, no qual um setor
controla os excessos cometidos pelos outros.
A disputa entre eles geralmente tem fundo ideológico. O
Estado com visão liberal, o mercado com visão neoliberal e a
sociedade civil preocupada com o bem-estar social.
No próximo tópico, abordaremos sobre a compreensão que
se tem a respeito do conceito, dos objetivos e do que motiva a
análise de conjuntura.

177
RIG em três dimensões

4. O que se entende por análise


de conjuntura?
Análise de conjuntura é a leitura da realidade, que se faz
por interesse ou necessidade, objetivando conhecer a correla-
ção de forças econômicas, políticas e sociais ou as relações de
poder existentes ou presentes na estrutura e na superestrutura
da sociedade em interpretar ou prever os seus efeitos.
Ela consiste na: 1) investigação da realidade política, eco-
nômica, cultural e social; 2) observação das forças em disputa
pela condução do poder; e 3) descrição de ações dos movimentos
e dos atores sociais envolvidos.
Trata-se de uma ferramenta utilizada para compreender um
dado problema, a situação em que se insere, e a inter-relação
ou a correlação de forças existente entre os agentes ou atores
políticos, institucionais, econômicos e sociais para tomar deci-
sões estratégicas.
Nessa perspectiva, é um instrumento metodológico que
usa diversas técnicas, por meio das quais se busca compre-
ender e prognosticar o comportamento de atores em diversas
arenas, inclusive na esfera institucional (OLIVEIRA, 2014). Faz
um retrato dinâmico da realidade (ALVES, 2008). É uma leitura
especial da realidade, que combina conhecimento e descoberta.
(SOUZA, 1984).
Fazer análise de conjuntura é uma tarefa complexa que
exige conhecimento, dados e informações, bem como capaci-
dade de entender e descobrir sentidos, relações e tendências do
ambiente e dos atores envolvidos.

178
RIG em três dimensões

A arte, a cultura e a experiência do analista podem con-


tribuir enormemente para separar a aparência da essência, no-
tadamente nesses tempos de narrativas imaginárias nas redes
sociais que costumam manipular informações para influenciar
comportamentos.
Além disto, a análise de conjuntura deve incorporar os no-
vos elementos tecnológicos e as novas ferramentas de captura e
sistematização de informação, inclusive como forma de permitir
fazer predições e elaborar cenários alternativos, quando for o caso.
A análise de conjuntura, portanto, é uma forma de in-
terpretar acontecimentos. Ela resulta de ações das pessoas, em
contextos específicos. Para fazê-la bem, é preciso ter clareza de
seus objetivos.

5. Qual é o objetivo da análise


de conjuntura?
A análise de conjuntura tem o objetivo de orientar pautas,
táticas e decisões para solucionar problemas reais ou potenciais.
Ela é feita por necessidade ou interesse.
Nessa perspectiva, a análise de conjuntura nunca é neutra,
assim como não o são os atores “sociais e econômicos” que a
fazem.
A própria escolha das variáveis a serem consideradas na
análise já caracteriza uma opção frente à realidade.
A análise só adquire sentido quando usada de forma
consciente e intencional como elemento de transformação da
realidade.

179
RIG em três dimensões

Entretanto, quando os agentes públicos, em qualquer nível


de governo, vão tomar uma decisão é preciso levar em consi-
deração o que pensam a imprensa, os partidos de oposição, as
outras esferas de governo, o Poder Legislativo, a opinião pública
e os setores afetados pela decisão, sob pena de impedir sua
implementação pela resistência dos opositores ou pela ausência
de apoio.
Assim, a análise de conjuntura tem por objetivo:
1) identificar e compreender a realidade;
2) identificar os interesses em jogo;
3) fazer um mapeamento da correlação de forças econô-
micas, políticas e sociais, identificando e compreendendo os
pontos fortes e fracos de cada um na disputa;
4) compreender a inter-relação das partes com vistas à
tomada de decisão;
5) definir estratégias e táticas de intervenção na realidade;
6) transformar a realidade na perspectiva do interesse ou
necessidade de quem faz a análise de conjuntura; e
7) antecipar a evolução dos acontecimentos conforme curso
alternativo das ações dos atores, das consequentes interações
e dos acontecimentos.
Embora feita de modo intencional, com base em interesse
ou necessidade, a análise de conjuntura precisa ser objetiva e
para tanto deve evitar um conjunto de erros que podem compro-
meter a sua qualidade. É o que trataremos a seguir.

180
RIG em três dimensões

6. Que erros devem ser evitados na


análise de conjuntura?
Na análise de conjuntura, o analista não pode se guiar
somente pela vontade e pelas crenças e valores e ignorar
aspectos da realidade que não lhe agradem, tampouco deve
supervalorizar as forças aliadas ou desprezar os recursos dos
adversários.
Ou seja, a análise de conjuntura, para ser eficaz, precisa
considerar, de forma equilibrada, os princípios do interesse e da
realidade.
Ela deve buscar dimensionar as forças que participam da
dinâmica social, distinguindo as condições subjetivas (vontade)
das objetivas (realidade).
Assim, para não comprometer a qualidade da análise, o
analista deve evitar erros, tais como:
1) superficialidade – não analisar causas e consequências;
2) unilateralidade – somente avaliar alguns aspectos e
desprezar outros;
3) subjetivismo – misturar o que se deseja que aconteça
com a análise dos fatos;
4) voluntarismo – desconsiderar as outras forças envolvidas;
5) reducionismo – enquadrar tudo num único slogan;
6) sectarismo – achar que somente seu pensamento é
correto; e

181
RIG em três dimensões

7) miopia – supervalorizar acontecimentos recentes, des-


considerando aspectos estruturais anteriores.
Na análise de conjuntura, o analista deve adotar uma
metodologia de análise, que reúna as principais categorias
de análise.

7. Quais metodologias geralmente são


empregadas na análise de conjuntura?
A análise de conjuntura pressupõe um posicionamen-
to assumido previamente, que pode consistir em justificar a
manutenção de uma política ou de um cargo ou em mudar a
realidade. Para tanto, é preciso considerar as principais vari-
áveis que possam interferir no resultado desejado, positiva ou
negativamente. Vejamos:
1) acontecimentos, que são fatos que adquirem sentido
especial, por sua repercussão, para um País, uma classe, um
grupo, uma família, uma pessoa;
2) cenário ou palco dos acontecimentos, que é o ambiente
onde se passam os acontecimentos ou onde as disputas ocorrem;
3) atores, que são as pessoas ou instituições que repre-
sentam um papel, que se destacam na situação em análise, tais
como: grupos, classes ou países, que assumem ideias, reivindi-
cações, projetos, promessas, denúncias, ideologia;
4) relações de força, que podem ser de domínio, de
igualdade ou de subordinação ou de conflito ou cooperação
entre as classes sociais, grupos de pessoas, empresas, países,
partidos;

182
RIG em três dimensões

5) articulação, que é a relação entre estrutura e conjuntura,


que pode incluir estratégias defensivas/reativas/alternativas;
6) tendências, que indicam sinalizações do que pode ocor-
rer como resultado do fenômeno social;
7) riscos e oportunidades, que consistem nas tentativas de
avaliar incertezas em distintas dimensões, tais como organiza-
cionais, financeiras, legislativas, de mercado; e
8) análise de custos e benefícios ou pelo menos os
custos de oportunidade, que não deve ser monopólio da área
econômica.
A partir dessa matriz, com as categorias e indicadores
geralmente empregados, é possível fazer análise de conjuntura
com relativa facilidade, como no exemplo do Quadro a seguir
sobre o enfrentamento à pandemia da Covid-19.
Quatro 8 – Matriz para o exemplo do enfrentamento
à pandemia da Covid-19

Medidas de enfrentamento
Acontecimento
da pandemia da Covid-19

Congresso Nacional, Poder Executivo, Governos


Local (palco)
Estaduais e Anvisa.
Parlamentares, Presidente da República, Mininistério
Atores
da Saúde, Presidente da Anvisa e Governadores.
Pressões da mídia, pressão da sociedade, pressão
Relações de
de especialistas, pressões do mercado (indústria
Força
farmacêutica e de medicamentos).
Mercado, cientistas, mídia, atores políticos, profissionais
Articulação
e instituições prestadoras de serviço em saúde.
Dominância de medidas de redução dos impactos
Tendência na economia; negação de tratamento sem eficácia;
ampliação da vacinação.

183
RIG em três dimensões

Medidas de enfrentamento
Acontecimento
da pandemia da Covid-19

Elevação do déficit público (verificado).


Queda na atividade econômica.
Dependência tecnológica.
Riscos e Oportunidades Riscos à saúde pública. Perda de legitimidade do(s)
Governo(s).
Imagem do país no exterior.
Ganhos eleitorais imediatos.

Outros três exemplos podem ser lembrados no Quadro


a seguir, tais como: combustíveis, Impeachment de Dilma e
Mensalão.
Quadro 9 – Exemplos de análise de conjuntura

Votação dos
Ação Penal
projetos sobre Impeachment
Acontecimento 470
preço dos de Dilma
Mensalão
combustíveis

Local (palco) Congresso Nacional Congresso STF


Nacional
Atores Parlamentares, Parlamentares, Ministros, réus,
governo federal, mercado, mídia, partidos de oposição,
Petrobras/ manifestações da advogados, etc
produtores de sociedade civil e
combustíveis e partidos políticos
consumidores
Relações de Domínio: Domínio: Domínio:
Força desfavorável ao desfavorável à desfavorável
governo, que teve ex-presidente, aos réus
que ceder sob percepção de
pena de perda descontrole e
de popularidade, corrupção no
pressão sobre os governo
preços em razão
da guerra Rússia x
Ucrânia

184
RIG em três dimensões

Votação dos
Ação Penal
projetos sobre Impeachment
Acontecimento 470
preço dos de Dilma
Mensalão
combustíveis

Articulação Dos produtores de Mercado Da mídia, da


combustíveis, dos financeiro, oposição, da classe
transportadores e ruralistas, média descontente
dos condutores de militares, mídia, com o governo
veículos órgãos de controle,
Vice-Presidente
da República e
parlamentares
descontentes com
a gestão Dilma
Tendência De aprovação dos De cassação Condenação dos
projetos réus
Riscos e Desvalorização de Desestabilização Riscos: onda
Oportunidades ações da Petrobras política moralista-justiceira

Perda de Radicalização das Desqualificação da


capacidade de posturas políticas política
investimento
na indústria do Agravamento Deslegitimação
petróleo das políticas da representação
neoliberais política
Redução/contenção
dos preços de Deslegitimação do Desconfiança nos
combustíveis governo agentes políticos

Ganhos eleitorais Espaço para


imediatos aventureiros, etc

Oportunidades:
espaço para
aprovação de leis
de transparência e
combate à corrupção

Fortalecimento
dos órgãos de
fiscalização e
controle, etc

185
RIG em três dimensões

Os exemplos dos quadros 8 e 9 apresentam os principais


modelos ou categorias de análise de conjuntura. No próximo tó-
pico, chamaremos a atenção para os aspectos centrais a serem
considerados na análise de conjuntura.

8. Quais os principais ou os maiores


desafios na análise de conjuntura?
São basicamente três: 1º - compreender a inter-relação das
partes que formam o todo; 2º - mapear a correlação das forças
econômicas, políticas e sociais; e 3º - identificar e sistematizar
os recursos de poder que os atores envolvidos podem mobilizar
para tornar efetiva sua estratégia política.
Para compreender os indicadores-força de determinado
grupo ou segmento político ou social, segundo Jiménez (1905),
é preciso analisar, entre outros favores:
1) a quantidade e qualidade dos atores que aglutinam,
como militantes, simpatizantes e mobilizáveis;
2) o espaço ou importância dos atores aglutinados ou ar-
ticulados na estrutura social;
3) a forma de consciência, clareza, unidade ideológica em
relação ao interesse em disputa;
4) o nível de incidência ou alcance geográfico e setorial
do grupo: rural ou urbano, local ou regional, nacional ou inter-
nacional;
5) o preparo estratégico – capacidade e disposição para
envolver-se na luta política e social;

186
RIG em três dimensões

6) as alianças – estratégia de longo prazo, táticas; e


7) os recursos políticos, econômicos, tecnológicos, jurídi-
cos, militares, entre outros.
Para perceber e superar os principais desafios na análise
de conjuntura, é preciso priorizar alguns elementos da análise
de conjuntura, que serão abordados no tópico a seguir.

9. Quais elementos devem ser


priorizados na análise de conjuntura?
Na análise de conjuntura política, normalmente considera-
se, além dos aspectos institucionais, a conformação das forças
políticas, o alinhamento do governo a essas forças, a ideologia
dos governantes, a relação colaborativa ou conflituosa entre as
forças sociais e políticas.
Isso inclui, por exemplo, a troca de governantes, as dispu-
tas entre os poderes, o resultado de votações no Legislativo, o
conteúdo das políticas públicas, o comportamento dos partidos
políticos, as opções governamentais na política internacional, etc.
Na análise da conjuntura econômica, são considerados índi-
ces e indicadores como o desemprego, o crescimento econômico, a
variação do PIB per capita, a distribuição de renda, a balança co-
mercial, a inflação, o investimento produtivo, inclusive o estrangeiro.
Inclui, também, estatísticas e dados sobre indicadores
como o mercado de trabalho, a produção, a distribuição e o
consumo de bens, a arrecadação e as dívidas governamentais,
a abertura e a falência de empresas, o crédito, os índices da
bolsa de valores, etc.

187
RIG em três dimensões

Na análise de conjuntura social, como regra, além das


políticas de saúde, educação, assistência social e previdenciá-
ria, e dos indicadores a elas relacionados, analisa-se a ação dos
movimentos sociais, as greves, as manifestações e protestos dos
sindicatos e associações estudantis, os sem-terra, os sem teto,
os atingidos por barragens, etc.
Na análise de conjuntura militar, investiga-se a política de
segurança nacional, as forças armadas, a polícia, o policiamento
de fronteira, a produção bélica e a política de defesa do território
nacional.
Na análise de conjuntura ideológica, por sua vez, busca-se
compreender valores, concepções, costumes que se expressam
por intermédio dos meios de comunicação, sistemas educativos,
a família, a igreja, seitas, formas de expressão artística, etc.
Todo cuidado deve ser tomado com o que é publicado nas
redes sociais, buscando ir além do número de interações e seu
conteúdo. É preciso entender também seu nível de disseminação
entre os diferentes grupos sociais das redes, para saber se a
narrativa ficou dentro de uma bolha ou se ganhou repercussão
geral. Trata-se de importantíssimo elemento de composição da
conjuntura, que influencia os comportamentos, as atitudes e a
escala de engajamento das pessoas.
Assim, além da visão dos organismos multilaterais, que
regulam as relações globais, os seguintes aspectos merecem
análise:
1) político – institucionais e correlação de forças;
2) econômico – índice e indicadores econômicos;

188
RIG em três dimensões

3) social – políticas sociais e ação dos movimentos;


4) militar – política de segurança nacional, forças armadas;
5) ideológico – valores, concepções e costumes; e
6) cultural – reação da sociedade a tendências e a mudan-
ças de comportamentos envolvendo valores (conservadorismo,
mudanças de padrão, a exemplo de casamento entre pessoas
do mesmo sexo, aborto e pautas identitárias).
Conhecidos os diversos tipos de análise de conjuntura e
o que priorizar em cada um deles, é hora de organizarmos um
passo a passo, tema abordado no próximo tópico.

10. Modelos ou categorias de


análise com o passo a passo
Alves (2008), em “Análise de conjuntura: teoria e méto-
do”, organiza as etapas para promover análise de conjuntura na
seguinte ordem:
1ª - principais fatos econômicos, sociais, políticos e cultu-
rais ocorridos no período;
2ª - análise do material pesquisado buscando identificar
os elementos comuns que representam novas tendências (o ele-
mento novo que supera o velho) e as invariantes da conjuntura;
3ª - exame do material contrapondo uma análise das partes
para o todo e do todo para as partes;
4ª - explicação da correlação de forças, tanto atual quanto
projetada, entre os diversos atores sociais e como as alterações
nesta correlação explicam a dinâmica do movimento social;

189
RIG em três dimensões

5ª - análise sincrônica (ao mesmo tempo) dos elementos


da contemporaneidade;
6ª - explicação das mediações que traduzem as caracterís-
ticas abstratas dos vetores de transformação capazes de agregar
os fatos dispersos da realidade concreta;
7ª - comprovação empírica (por meio de pesquisas ou da-
dos estatísticos) das tendências enunciadas nos itens anteriores;
8ª - análise diacrônica (sucessão de acontecimentos) da
evolução longitudinal (por longo período) dos dados e fatos;
9ª - definição de tendências futuras que poderão ser che-
cadas e verificadas em análises posteriores; e
10ª - verificação de alternativas de ação e de intervenção
social diante do quadro de correlação de forças nacional e in-
ternacional.
Já Silva (2014), em “Metodologia de Análise de Conjun-
tura”, propõe um método baseado nas seguintes etapas, inter-
ligando teoria e prática:
1ª - definir o objeto e os objetivos, ou seja, definir a con-
juntura que se quer analisar, e escolher qual será a análise, se
econômica, política, social, etc;
2ª - descrever ou pesquisar, colocando todos os fatos e
acontecimentos ocorridos no período que pode encerrar sentido
em relação à análise;
3ª - explicitar os pressupostos de análise, identificando a base
comum ou patamar mínimo para análise, escolhendo e explicitando
os paradigmas de visualização da sociedade em análise;

190
RIG em três dimensões

4ª - analisar, definindo os principais cenários da conjun-


tura, e respondendo às perguntas referentes à importância do
problema, os grupos envolvidos, sua composição, recursos de
que dispõem, seus projetos, e a relação de forças;
5ª - sintetizar a busca de uma visão da totalidade do pro-
cesso, estabelecendo as inter-relações entre os dados levantados
em cada cenário; e
6ª - repercutir a análise sobre a prática, identificando novos
elementos, a partir da análise, que deverão modificar a prática,
e que experiências devem ser reforçadas, ou exigidas para a
realização da estratégia.
Por sua vez, para Daniel da Silva Martins, em “Análise de
Conjuntura”, a análise deverá permitir:
1º - a identificação da situação no momento inicial do
estudo;
2º - a visão clara das principais variáveis e dos indicadores;
3º - a identificação dos atores e a compreensão de seus
respectivos papéis;
4º - a tabulação das principais informações;
5º - a identificação de rupturas;
6º - a identificação de fatos portadores de futuro; e
7º - o refinamento dos limites da dimensão em estudo.
Sintetizando, definir os quatro passos são fundamentais
para organizar um bom roteiro de análise de conjuntura:

191
RIG em três dimensões

1º - definir o objeto e objetivo/ tema, assunto ou problema


em disputa que se pretende analisar – delimitado no tempo;
2º - organizar material de apoio, incluindo estatísticas,
dados e informações sobre a análise, recorrendo a fontes
diversas;
3º - construir argumento consistente para interpretar e
diagnosticar o comportamento dos atores envolvidos; e
4º - elaborar síntese e identificar suas repercussões – mon-
tar os cenários e as estratégias para alterar a realidade diagnos-
ticada – e procurar as soluções.
Um roteiro simplificado, com nove fases, consistiria no
seguinte:
1ª - coletar dados;
2ª - listar os acontecimentos;
3ª - identificar os atores;
4ª - identificar o clima dos acontecimentos;
5ª - identificar os cenários;
6ª - avaliar as relações de forças;
7ª - projetar as tendências;
8ª - listar os riscos à análise; e
9ª - precificar alternativas.
Quadro a seguir reúne três importantes modelos ou cate-
gorias de análise:

192
RIG em três dimensões

51
Quadro 10 – Modelos ou categorias de análise

Modelo de José Eustáquio Modelo de Luiz Eduardo Modelo de Daniel da


Diniz Alves51 Prates da Silva52 Silva Martins

Seleção de material Definir o objeto e os Identificar fatos e


empírico objetivos acontecimentos

Relacionar fatos e
Análise desse material Descrever ou pesquisar acontecimentos

Explicitar os pressupostos Relacionar conjuntura e


Exame do material de análise estrutura

Analisar, definindo os
Explicação da correlação Identificar os palcos dos
principais cenários da
de forças acontecimentos
conjuntura

Sintetizar e buscar uma


Análise sincrônica visão da totalidade do Identificar os atores
processo

Repercutir a análise sobre Identificar a correlação


Explicação das mediações a prática de forças

Identificar os “fatos
Comprovação empírica - portadores de futuro”

Análise diacrônica - -

Tendências futuras - -

Alternativas de ação - -
Fonte: Sistematização do autor.

11. Quais as principais fontes de


consulta numa análise de conjuntura?
É importante observar, nas fontes nacionais e internacio-
nais, aspectos centrais da conjuntura, como:52

51
http://ism.edu.br/periodicos/index.php/estudos_teologicos/article/view/1171/1134.
52
http://ftmrs.org.br/arquivos/file_512ff95260e4c.pdf.

193
RIG em três dimensões

11.1. No plano internacional


1) a situação econômica e os investimentos nas e das
grandes potências (como Estados Unidos da América, Ale-
manha, França, Itália, Reino Unido, Japão, China e Rússia)
e nos principais países da América Latina (Brasil, México e
Argentina);
2) os dados sobre a produção de mercadorias de grande
importância para a economia mundial (petróleo, produtos agro-
pecuários, minérios, etc.);
3) as projeções e as medidas que vêm sendo apresentadas
e implantadas por organismos internacionais como o Banco Mun-
dial, o Fundo Monetário Internacional e a Organização Mundial
do Comércio; e
4) as lutas e a postura das classes trabalhadoras desses
países.

11.2. No plano local


1) na Economia: inflação; PIB (Produto Interno Bruto);
comércio exterior (importação e exportação); dívida interna, ex-
terna e percentual dos juros da dívida; taxa de juros; e taxa de
câmbio (valorização ou desvalorização do Real frente ao Dólar,
ao Euro, etc.);
2) na Política: ação dos partidos (alianças, interesses, pro-
jetos); ações políticas do governo; ação dos movimentos sociais
organizados; relação entre Executivo, Legislativo e Judiciário; e)
tendências de voto e simpatia do eleitorado;

194
RIG em três dimensões

3) no Mercado de Trabalho: a População Economicamente


Ativa (PEA); a taxa de desemprego, medida pelo IBGE e pela
Seade/Dieese; quantidade de pessoas ocupadas, medida pelo
IBGE; o emprego formal e informal, medido pelo IBGE; rendi-
mentos nominais e reais do trabalho, medidos pelo IBGE e CNI,
este apenas para a indústria; e a criação/destruição de postos de
trabalho, medida pelo CAGED (Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados, do Ministério do Trabalho e Previdência);
4) na Ideologia: peso das instituições (ex: Igreja, TV, etc.);
valores, ideias e comportamentos estimulados; e
5) nas Relações Internacionais: G7 (Grupo dos sete países
mais ricos); FMI (Fundo Monetário Internacional); BM (Banco Mun-
dial) ou BIRD; OMC (Organização Mundial do Comércio); OCDE
(Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Ou seja, é preciso prestar atenção:
1) no aparato jurídico e repressivo: modificações de leis;
mudanças no funcionamento do aparato repressivo;
2) nas instituições de governo: Ipea, Banco Central, IBGE,
CGU, TCU, Receita Federal, Caged, balança comercial, etc;
3) nas instituições privadas: FGV, DIEESE, IBASE, impren-
sa, partidos políticos, etc;
4) nos organismos internacionais: OCDE, ONU, Banco
Mundial, FMI;
5) nas entidades globais por tema: OMS, OIT, OMC, FAO; e
6) nos organismos regionais: Mercosul, OEA, Celac, Una-
sul, etc.

195
RIG em três dimensões

12. O que uma boa análise


de conjuntura permite perceber
para a propositura de ações?
De acordo com Daniel da Silva Martins, a análise de con-
juntura deverá permitir:
1) a identificação da situação no momento inicial do estudo;
2) a visão clara das principais variáveis e dos indicadores;
3) a identificação dos atores e a compreensão de seus
respectivos papéis;
4) a tabulação das principais informações;
5) a identificação de rupturas;
6) a identificação de fatos portadores de futuro; e
7) o refinamento dos limites da dimensão em estudo;
Isto significa que o analista deve:
1) identificar os eventos, atores, disputas: a situação no
momento do levantamento de dados;
2) relacionar a causalidade entre os fatos coletados: as
principais variáveis e indicadores;
3) relacionar e descobrir sentido nos acontecimentos, es-
pecialmente qual a intencionalidade ou o que está por trás de
cada acontecimento, prestando atenção nos atores e seus papéis
na conjuntura;
4) prestar atenção no palco do acontecimento, que pode
se deslocar dos palácios para a rua ou vice-versa;

196
RIG em três dimensões

5) observar o movimento dos atores, como países, gover-


nos, instituições, pessoas: o agente social ou político;
6) olhar a correlação de forças, descobrindo o que pode
fazer a diferença, novos atores, tendências, etc; e
7) identificar os “fatos portadores de futuro”, considerar
os potenciais riscos políticos, econômicos e sociais, e traçar
cenários.

13. Conclusão do Capítulo


Sempre que vamos tomar uma decisão, qualquer que seja,
consideramos as informações que temos, buscamos novos da-
dos, avaliamos possibilidades, analisamos custos e benefícios,
olhamos as forças e fraquezas de cada opção. Isso é análise de
conjuntura. Segundo Alves (2008)53:
O desafio de qualquer análise de conjuntura é compreender as in-
ter-relações das partes que formam o todo, pois a totalidade é um
conjunto de múltiplas determinações.

Nesse diapasão, buscamos apresentar ferramentas e meto-


dologias que habilitem o analista a: 1) compreender a inter-rela-
ção das partes que formam o todo; 2) mapear a correlação das
forças econômicas, políticas e sociais; 3) identificar e sistematizar
os recursos de poder que os atores envolvidos podem mobilizar
para tornar efetivas suas ações políticas; e 4) desenvolver táticas
e estratégias para o enfrentamento da conjuntura ou problema
que deseje resolver.

53
Análise de conjuntura: teoria e método. Disponível em http://ftmrs.org.br/arquivos/file_512ff95260e4c.
pdf.

197
CAPÍTULO IV

CONSIDERAÇÕES
FINAIS
RIG em três dimensões

N este livro tivemos a oportunidade de apresentar uma aborda-


gem abrangente de três dimensões da atuação do Profissional
de Relações Institucionais e Governamentais: 1) o trabalho par-
lamentar; 2) a defesa de interesses perante os poderes públicos;
e 3) a análise política e de conjuntura.
Em cada uma dessas dimensões, buscamos apresentar as
ferramentas de atuação, as formas de abordagem e principalmen-
te o modus operandi dos poderes, sempre chamando atenção
para aspectos relevantes, que certamente irão contribuir para
uma boa análise e uma intervenção qualificada na relação com
os poderes na defesa de interesses.
Nas várias dimensões do trabalho de RIG, na lição de Rua e
Romanini (2013), é necessário que o profissional tenha domínio
sobre os quatro componentes comuns das políticas públicas:
1º - o institucional (autoridade formal); 2º - o decisório (escolha
política); 3º - o comportamental (ação ou inação); e 4º - o causal
(efeitos sobre o sistema político). Ou seja, é preciso conhecer:
1) as instituições políticas, como os órgãos dos três poderes do
Estados, as organizações da sociedade civil e os partidos; 2)
os processos políticos ou as regras de tomada de decisão; 3) o
comportamento ou atitude dos atores políticos que impactam e
são impactados pelas políticas públicas; e 4) o sistema político.
O monitoramento e a análise das ações do Estado, em seus
três níveis de governo (União, Estados/DF e Municípios), como
advertem Peters e Pierre (2000), além da incorporação das tec-
nologias, deve considerar as três modalidades ou mecanismos
de funcionamento das estruturas: hierárquico (governo), autor-
regulado (mercado) e horizontais de cooperação (comunidades,
sociedade, redes).

201
RIG em três dimensões

O escopo da atividade de RIG vai além das três dimensões


tradicionais: 1) a análise técnica; 2) o monitoramento; e 3) o
relacionamento com os decisores estatais. Ele também inclui a
interpretação do ambiente político e do conteúdo das políticas
públicas, a tradução dos impactos dos atos governamentais
sobre a economia, a política e a área social, em geral, ou sobre
atividades específicas, em particular, além de um trabalho de
inteligência que consiste em estratégias de atuação de acordo
com a conjuntura política, de proatividade para aproveitar
oportunidades ou de resistência para neutralizar ou minimizar
os riscos, a partir da lógica da contenção de danos.
Além disto, a atividade de RIG passa por um acelerado
processo da profissionalização, no qual se valoriza cada vez mais
o conhecimento técnico, os aspectos éticos e a capacidade de
interpretação da realidade, de antecipar ameaças e oportunidades
para o cliente, de montar estratégias e cenários, valorizando-se
cada vez menos o acesso baseado em clientelismo, em relações
informações, de parentesco ou de amizade. A transparência, a
ética, a integridade, o respeito aos princípios republicanos são
cada vez mais exigidos na atividade de RIG.
Assim, ao participar do processo de decisão política, o
profissional de RIG, segundo a Abrig (2019, p. 16), deve primar
por: 1) qualidade da informação; 2) consistência nos argumentos;
3) transparência na defesa do interesse; 4) disposição sincera ao
diálogo; 5) definição clara de mandato; e 6) busca de consenso
em torno de soluções por meio das quais prevaleça o interesse
público sobre o privado.

202
RIG em três dimensões

Nessa perspectiva, o livro fornece uma visão ampla do


processo decisório nos Poderes Legislativo e Executivo; alerta
para a complexidade da tomada de decisão na esfera pública;
sugere ferramentas para a leitura dos movimentos da conjuntura
política, econômica e social; assim como organiza roteiros, com
passo a passo, capazes de possibilitar a montagem de estratégias
e táticas para um trabalho exitoso em favor dos interesses repre-
sentados, sempre respeitando os princípios éticos e as regras de
compliance indispensáveis ao trabalho de relações institucionais
e governamentais.
Embora se reconheça que, dentre os diversos fatores, os
que mais influenciam a decisão sejam a opinião pública e a
repercussão do tema nos múltiplos veículos de comunicação e
mídia, inclusive nas redes sociais, considera-se o trabalho de
relações institucionais e governamentais indispensável para de-
terminar o comportamento do decisor. O domínio das técnicas
e ferramentas empregadas no trabalho parlamentar, na defesa
de interesses perante os poderes públicos e na análise política
certamente será um diferencial importante na relação com os
poderes constituídos. As empresas, os grupos de pressão e as
instituições que contarem com esse suporte terão um diferencial
em relação a quem não os possui, pois dispõem de meios para
realizar diagnósticos precisos, de capacidade para fazer bons
prognósticos e, portanto, de mais condições de montar melhores
estratégias com maiores chances de êxito.

203
RIG em três dimensões

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Ética e Transparência. Brasília, 2019.
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Foto: Anny Campello

Antônio Augusto de Queiroz, um profissional com quase 40 anos


de experiência em RIG, é jornalista, mestre em Políticas Públicas e
Governo (FGV), Analista e Consultor Político. Foi diretor do Centro
de Acompanhamento da Constituinte da Universidade de Brasília
(UnB) e, por 35 anos, diretor de Documentação do Departamen-
to Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP). É membro do
Conselho Superior da Associação Brasileira de Relações Institucio-
nais e Governamentais – ABRIG. Sócio das empresas Consillium
Soluções em Relações Institucionais e Governamentais e Diálogo
Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas, é autor
de dezenas de publicações sobre processo decisório, tendo sido
o idealizador e principal redator da publicação “Os Cabeças do
Congresso Nacional” – uma pesquisa sobre os 100 parlamentares
mais influentes – editada anualmente desde 1994. Convidado para
aulas, palestras e conferências, é um observador atento da cena po-
lítica brasileira e uma das principais referências em análise política.

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