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Relatório Final

Mapa do associativismo em Porto Alegre

Marcelo Kunrath Silva


(Departamento de Sociologia/PPG Sociologia – UFRGS)
mksilva@ufrgs.br

Porto Alegre, novembro de 2007


SUMÁRIO

Introdução. Associativismo e democracia: o caso de Porto Alegre .................... 3

Referências bibliográficas ........................................................................... 7

Base de Dados I. Pesquisa com 167 entidades comunitárias/2003 ...................... 9

Apresentação ............................................................................................... 10
Relação das entidades entrevistadas ........................................................... 12
Caracterização do universo de entidades pesquisadas ................................ 15
Caracterização da estrutura das entidades comunitárias pesquisadas ......... 21
Caracterização da organização e funcionamento interno das entidades
comunitárias pesquisadas ............................................................................ 30
Caracterização da atuação das entidades comunitárias pesquisadas ........... 40
Considerações finais ................................................................................... 63
Bibliografia citada ....................................................................................... 65

Base de Dados II. Pesquisa com 116 entidades participantes do Orçamento


Participativo (1999) ................................................................................................. 67

Apresentação ............................................................................................... 68
Relação das 116 entidades pesquisadas ...................................................... 69
Caracterização das entidades pesquisadas .................................................. 72
Participação no Orçamento Participativo .................................................... 82
Efeitos do Orçamento Participativo sobre as organizações sociais ............ 94
Avaliação do OP ......................................................................................... 102
Considerações Finais .................................................................................. 106
Bibliografia citada ....................................................................................... 107

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Introdução. Associativismo e democracia: o caso de Porto Alegre

Diversos enfoques de análise da construção democrática enfatizam uma


relação positiva entre formas de organização societária e processos de democratização.
Esta perspectiva, por exemplo, encontra-se em autores clássicos do pensamento político,
como Rousseau e John Stuart Mill, analisados pelo trabalho de Pateman (1992).
Segundo a autora, estes autores fornecem fundamentos para uma teoria da democracia
participativa, que rejeita os argumentos da incapacidade de participação do cidadão
comum e da ameaça que tal participação traria para a estabilidade democrática,
argumentos estes constituintes do chamado “elitismo democrático”. Nas palavras da
autora,
A existência de instituições representativas a nível nacional não basta para
a democracia; pois o máximo de participação de todas as pessoas, a
socialização ou ‘treinamento social’, precisa ocorrer em outras esferas, de
modo que as atitudes e qualidades psicológicas possam se desenvolver.
Esse desenvolvimento ocorre por meio do próprio processo de participação.
A principal função da participação na teoria da democracia participativa é,
portanto, educativa; educativa no mais amplo sentido da palavra, tanto no
aspecto psicológico quanto no de aquisição de prática de habilidades e
procedimentos democráticos. Por isso, não há nenhum problema quanto à
estabilidade de um sistema participativo; ele se auto-sustenta por meio do
impacto educativo do processo participativo. A participação promove e
desenvolve as próprias qualidades que lhe são necessárias; quanto mais os
indivíduos participam, melhor capacitados se tornam para fazê-
lo.(PATEMAN, 2002:60-61)

Esta articulação entre práticas associativas, participação sócio-política e


democracia é defendida também pelo trabalho de Alexis de Tocqueville sobre “A
democracia na América”. Nesta obra clássica, o autor ancora sua explicação dos
avanços da sociedade norte-americana, em termos de igualdade e liberdade, na
existência de uma sólida base associativa entre a população. É esta vida associativa
intensa que constitui o contraponto às tendências de individualização excessiva e, como
a outra face desta individualização, de ameaça de despotismo por parte de um Estado
que concentra poder e não encontra mais os limites impostos pelos poderes particulares
das sociedades aristocráticas. Através da vida associativa, então, indivíduos comuns
aprenderiam a desenvolver práticas coletivas e a importância destas para si e para a vida
em sociedade. Como salienta Tocqueville (2000:143), os homens, nas associações,

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aprendem a submeter sua vontade à de todos os outros e a subordinar seus
esforços particulares à ação comum, coisas que não é menos necessário
saber nas associações civis do que nas associações políticas. (...) Portanto,
as associações políticas podem ser consideradas como grandes escolas
gratuitas, em que todos os cidadãos vão aprender a teoria geral das
associações. (...) Quando os deixam [os indivíduos] associar-se livremente
em todas as coisas, acabam vendo, na associação, o meio universal e, por
assim dizer, único, que os homens podem utilizar para atingir os diversos
fins que se propõem. Cada nova necessidade desperta imediatamente a
idéia de se associar.

Aqui, novamente, encontra-se a noção de que a participação social e política


constitui uma verdadeira “escola” de associativismo, ensinando as habilidades
necessárias ao agir coletivo e, ao mesmo tempo, forjando uma predisposição a tal agir,
em contraposição às tendências individualizantes da sociedade moderna.
A teoria habermasiana também salienta esta conexão entre associativismo e
democracia. Na medida em que a existência de uma efetiva democracia depende da
articulação entre a esfera político-institucional e a esfera societária, através da mediação
da esfera pública, na qual as demandas, interesses e problemas sociais consigam
expressar-se e, de alguma forma, orientar a atuação dos agentes e instituições político-
administrativas, torna-se imprescindível a existência de atores sociais capazes de
organização e atuação autônoma. Como destaca Costa (1994:44), A sociedade civil, com
seu conjunto de associações voluntárias, independentes do sistema econômico e
político-administrativo, absorve, condensa e conduz de maneira amplificada para a
esfera pública os problemas emergentes nas esferas privadas, no mundo da vida. Ou
seja, são as formas de associativismo civil, na medida em que tiverem capacidade e
autonomia, que irão garantir que o fluxo de influências se oriente da sociedade para as
instituições políticas, garantindo o controle e a abertura destas para os interesses
societários, e não ao contrário, com a subordinação da sociedade e seus atores aos
interesses e à racionalidade da esfera político-administrativa.
Por fim, outra fonte teórica que tem destacado a relação positiva entre
associativismo e democracia encontra-se nos trabalhos de autores que adotam a
abordagem do “capital social”. Colocando os agentes em relação, estabelecendo
processos de comunicação entre eles, forjando identidades coletivamente
compartilhadas, criando compromissos e responsabilidades com o coletivo, as
organizações e as redes que compõem o tecido associativo tendem a gerar relações de
confiança. Tal confiança, por sua vez, é fundamental no desenvolvimento de processos

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associativos, na medida em que é a partir dela que se podem estabelecer objetivos
comuns e, mais do que isso, haver um engajamento dos agentes na realização destes
objetivos em função de uma expectativa de que todos (ou pelo menos uma parcela
significativa) irão igualmente engajar-se. Como salienta Putnan (1996:180), A confiança
promove a cooperação. Quanto mais elevado o nível de confiança numa comunidade,
maior a probabilidade de haver cooperação. E a própria cooperação gera confiança.
Assim, as práticas associativas contribuem para a constituição daquilo que
alguns autores têm conceituado como “capital social”, ou seja, confiança, normas e
sistemas, que contribuam para aumentar a eficiência da sociedade, facilitando as ações
coordenadas (PUTNAN, 1996:177). Este “capital social” tende a ser produzido e
acumulado através da ação e cooperação coletiva, forjando articulações e relações de
confiança que facilitam a geração de práticas coletivas em outros campos, não
necessariamente relacionados com aquele das relações originais.
Para Putnan, este “capital social” acumulado, este estoque de confiança e
cooperação, é um fator central na explicação do bom desempenho das instituições
políticas democráticas, condicionando as mesmas. Nas suas palavras,
o contexto social e a história condicionam profundamente o desempenho
das instituições. Quando o solo regional é fértil, as regiões sustentam-se das
tradições regionais, mas quando o solo é ruim, as novas instituições
definham. A existência de instituições eficazes e responsáveis depende, no
jargão do humanismo cívico, das virtudes e práticas republicanas.
Tocqueville tinha razão: diante de uma sociedade civil vigorosa, o governo
democrático se fortalece em vez de enfraquecer.(1996:191 – destaque no
original)

O ponto em comum entre as diversas abordagens esboçadas acima é, apesar


de suas importantes diferenças (e, no limite, divergências) teóricas, o destaque à
importância dos processos organizativos e da atuação dos atores sociais para a
implantação, sustentação e/ou aprofundamento da democracia. Sejam funcionando
como “escolas” de cidadania, sejam possibilitando a expressão pública de
representações e interesses sociais, sejam controlando e orientando a ação estatal, sejam
desenvolvendo relações de confiança e envolvimento coletivo, entre outras
potencialidades, as organizações sociais desempenhariam um papel fundamental para a
efetivação da democracia, ao mesmo tempo que são fortalecidas pela própria
experiência da participação democrática.

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Esta relação entre associativismo e democracia, tal qual enunciada pelos autores
referidos acima, se coloca como uma das vertentes centrais da já significativa literatura
de análise das experiências de organização e participação social que marcam a trajetória
recente de Porto Alegre (Abers, 2000; Araújo, 1999; Avritzer e Navarro, 2003;
Baiocchi, 2005; Fedozzi, 2000; Santos, 2002; Silva, 1997; Silva, 2001).
Esta literatura tem enfatizado, de um lado, a importância da trajetória e da
configuração do associativismo municipal, especialmente dos segmentos populares,
para a instituição e efetivação de experiências participativas como o Orçamento
Participativo e os Conselhos de Políticas Sociais. Ou seja, o êxito dos fóruns
participativos implantados no município, no sentido da sua constituição como canais de
efetiva participação social, estaria, em grande medida, relacionado à existência de uma
sociedade civil formada por organizações sociais com relativa autonomia, capacidade de
mobilização, enraizamento e reconhecimento sociais.
Por outro lado, esta mesma literatura enfatiza que as próprias experiências de
participação, pela forma como se constituíram em Porto Alegre, criaram condições e
estímulos que fomentam os processos organizativos da sociedade civil, contribuindo,
assim para o seu fortalecimento e vitalidade.
Neste sentido, então, Porto Alegre seria um caso exemplar de uma “relação
virtuosa” entre as dinâmicas associativas e os processos de ampliação da democracia
através da participação social: estes processos encontram uma de suas principais bases
naquelas dinâmicas, que, por sua vez, são alimentadas pela participação social. Tal
“relação virtuosa” seria um dos fatores que fizeram com que Porto Alegre se destacasse
internacionalmente, trazendo para a cidade um grande número de pesquisadores,
gestores públicos, representantes de organismos internacionais, militantes políticos,
entre outros.
No entanto, apesar da significativa literatura já existente sobre o tema, parece
haver uma certa fragilidade em termos da base empírica sobre a qual se fundam grande
parte das análises que abordam o associativismo porto-alegrense e sua relação com a
democratização no âmbito da gestão municipal. Na verdade, a idéia da existência de
uma sociedade civil “forte, autônoma e participativa” acabou se transformando em um
“dado”, em um pressuposto de grande parte dos estudos.
Neste sentido, cabe retomar a afirmação de Bachelard (1996:18): Diante do real,
aquilo que cremos saber com clareza ofusca o que deveríamos saber. Ou seja, a
presença de uma certa reificação e idealização da sociedade civil porto-alegrense

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acabou se colocando como um entrave para um conhecimento mais adequado de um
tecido associativo dinâmico e complexo, particularmente no que se refere às suas
significativas diferenças regionais e às mudanças pelas quais passa este associativismo,
nas últimas duas décadas, em função das alterações mais ou menos profundas nos
padrões de relacionamento entre a sociedade civil e a esfera municipal do Estado.
O presente estudo visa, exatamente, buscar, através da reunião e sistematização
de duas bases de dados sobre a sociedade civil e a participação social em Porto Alegre,
cobrir tal lacuna e oferecer informações e análises que possibilitem uma compreensão
mais qualificada tanto das implicações da configuração do associativismo local sobre os
processos de participação quanto os impactos destes processos sobre as práticas
associativas. Além disto, a partir deste trabalho são identificados diversas lacunas em
termos do conhecimento do tecido associativo de Porto Alegre, abrindo novas frentes de
trabalho para futuras investigações tanto no âmbito do Observatório Social de Porto
Alegre quanto nas instituições acadêmicas.

Referências bibliográficas

ABERS, Rebecca. Do clientelismo à cooperação: governos locais, políticas


participativas e organização da sociedade civil em Porto Alegre. Cadernos da
CIDADE, n°7, volume 5, maio/2000.
ARATO, Andrew; COHEN, Jean. Sociedade civil e teoria social. In: AVRITZER,
Leonardo (coord.). Sociedade civil e democratização. Belo Horizonte: Del Rey,
1994.
ARAUJO, Margarete Panerai. Orçamento Participativo e a formação para a cidadania.
Porto Alegre: PUC/RS, 1999. (Dissertação de Mestrado apresentada no Curso de
Pós-Graduação em Serviço Social).
AVRITZER, Leonardo (coord.). Sociedade civil e democratização. Belo Horizonte: Del
Rey, 1994.
AVRITZER, Leonardo. A moralidade da democracia: ensaios em teoria habermasiana
e teoria democrática. São Paulo: Perspectiva; Belo Horizonte: Editora da
UFMG, 1996.
AVRITZER, Leonardo; NAVARRO, Zander (orgs.). A inovação democrática no
Brasil: o Orçamento Participativo. São Paulo: Cortez, 2003.
BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico. Rio de Janeiro: Contraponto,
1996.
BAIOCCHI, Gianpaolo. Militants and citizens: the politics of participatory democracy
in Porto Alegre. Stanford: Stanford University Press, 2005.
COSTA, Sérgio. Esfera pública, redescoberta da sociedade civil e movimentos sociais
no Brasil – uma abordagem tentativa. Novos Estudos, São Paulo, nº 38,1994.
FEDOZZI, Luciano. O poder da aldeia: gênese e história do Orçamento Participativo
de Porto Alegre. Porto Alegre: Tomo Editorial, 2000.

7
PATEMAN, Carole. Participação e teoria democrática. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1992.
PUTNAN, Robert D.. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. Rio
de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1996.
SANTOS, Boaventura de Souza (org.). Democratizar a democracia: os caminhos da
democracia participativa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.
SILVA, Deise Nepomuceno da. A ação comunicativa no processo do Orçamento
Participativo em Porto Alegre – Região Centro. Porto Alegre: PUC/RS, 1997.
(Dissertação de Mestrado em Serviço Social, Curso de Pós-Graduação em
Serviço Social).
SILVA, Marcelo Kunrath. Construção da “participação popular”: análise comparativa
de processos de participação social na discussão pública do orçamento em
municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre/RS. Porto Alegre: UFRGS,
2001 (Tese de Doutorado em Sociologia, Curso de Pós-Gradução em
Sociologia)
TOCQUEVILLE, Alexis de. A democracia na América: sentimentos e opiniões. São
Paulo: Martins Fontes, 2000.

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Base de Dados I
Pesquisa com 167 entidades comunitárias/2003

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Apresentação
A presente seção traz informações e análises produzidas a partir do banco de
dados da pesquisa realizada com 167 entidades comunitárias da cidade de Porto Alegre,
no ano de 2003. A pesquisa foi realizada pelos pesquisadores Gianpaolo Baiocchi
(Universidade de Pittsburgh - EUA) e Marcelo Kunrath Silva (Universidade Federal do
Rio Grande do Sul), sendo os seus dados inéditos no Brasil.
Esta pesquisa, inicialmente, foi planejada para abranger a totalidade das
entidades comunitárias de três regiões da cidade: Norte, Nordeste e Partenon. A partir
de diversas bases de informações sobre as entidades comunitárias destas três regiões, foi
constituída uma listagem de entidades a serem entrevistadas. Durante a pesquisa de
campo, no entanto, observou-se que diversas entidades preliminarmente identificadas
não existiam ou não se encontravam em funcionamento no período da pesquisa.
Ademais, ao serem consultados, os entrevistados passaram a indicar lacunas na listagem
prévia de entidades, informando sobre a existência de algumas entidades que não
constavam daquela relação. Neste sentido, a lista inicial foi sendo corrigida e
complementada através das indicações dos próprios entrevistados, seguindo o método
denominado de “bola de neve”.1
Na medida em que o número estimado de entidades nas três regiões previamente
definidas se mostrou significativamente menor do que inicialmente previsto, abriu-se a
possibilidade de estender o trabalho de pesquisa para entidades de outras regiões da
cidade. Neste sentido, foram selecionadas aleatoriamente entidades a partir do cadastro
constituído no início da pesquisa. No entanto, assim como ocorreu nas três regiões,
muitas das entidades selecionadas não existiam ou não estavam em atividades, levando
à necessidade de repetidas seleções de novas entidades para o fechamento do número
preestabelecido de entrevistas.
Um aspecto que chama a atenção na relação final das entidades entrevistadas é
sua distribuição muito desigual em termos regionais. Excluídas as três regiões
totalmente cobertas pela pesquisa, observa-se uma significativa variação no número de
entidades entrevistadas em cada uma das regiões. Tal variação, certamente, não reflete
as diferenças no associativismo realmente existente nestas regiões, mas sim a
1
Este método consiste na utilização das indicações obtidas nas próprias entrevistas para a definição do
universo de entrevistados. Este método é particularmente adequado em situações, como a desta pesquisa,
nas quais não é possível delimitar de forma segura o universo da pesquisa a partir das informações
previamente disponíveis.

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desigualdade de registro das entidades no cadastro disponível e as diferenças em termos
do conhecimento/habilidade dos aplicadores dos questionários2. Este aspecto indica a
necessidade de um investimento na elaboração de um mapeamento detalhado do tecido
associativo da cidade, que, esperamos, começa a ser desenvolvido a partir desta
primeira pesquisa.
Em função desta desigualdade nas distribuições regionais, os dados devem ser
vistos como oferecendo uma caracterização geral do associativismo comunitário da
cidade, o qual pode apresentar significativas diferenças regionais. Tais diferenças, por
sua vez, podem ser apreendidas através da comparação entre os dados das três regiões
cujas entidades foram apreendidas na totalidade.
Apesar destas limitações, o material produzido apresenta a possibilidade ímpar
de esboçar uma caracterização qualificada do associativismo “comunitário”, que marca
de maneira particular o município de Porto Alegre, constituindo-se em elemento
importante de sua configuração sócio-política. Na medida em que o cadastro de
entidades utilizado como base, no início da pesquisa, indicava a existência de 541
entidades “comunitárias”, uma pesquisa que atinge 167 entidades (ou seja, mais de 30%
do que seria o total de entidades) possibilita a construção de análises e avaliações com
alto grau de confiabilidade. Além disto, no decorrer do trabalho de pesquisa, observou-
se que este cadastro tende a super-estimar o número de entidades realmente ativas, o
que pode ser exemplificado pelo fato de que a primeira relação de entidades a serem
entrevistadas apresentou o percentual de praticamente 25% de entidades desativadas ou
inexistentes. Generalizando esta proporção para o universo das entidades contidas no
cadastro, pode-se inferir a existência de algo em torno de 400 entidades em
funcionamento no período da pesquisa, o que faz com que a amostra de 167 entidades
passe a representar aproximadamente 40% daquele universo, aumentando a sua
significância e confiabilidade.
Feitas estas considerações introdutórias, passa-se à apresentação do material
constante deste relatório:
1. Relação das 167 entidades entrevistadas;
2. Informações e análises das principais variáveis do Banco de Dados.

2
A aplicação dos questionários foi realizada pelo coordenador da pesquisa, Prof. Marcelo Kunrath Silva,
e por auxiliares de pesquisa contratados. Entre estes últimos havia estudantes do curso de graduação de
ciências sociais da UFRGS e militantes “comunitários”. Estes militantes, por seu maior conhecimento do
universo da pesquisa, tiveram muito mais êxito em localizar e desenvolver suas entrevistas do que os
estudantes. Em vista disso, as regiões nas quais os militantes realizaram a pesquisa, como na Leste,
acabaram tendo um número maior de entrevistas.

11
Uma observação importante a ser feita, refere-se ao fato de que foi excluído do
banco de dados as informações existentes de identificação das entidades e dos
entrevistados. Este procedimento visa garantir o total anonimato das informações, tanto
no que se refere àqueles que as forneceram quanto em termos das entidades
pesquisadas. Cumpre-se, assim, com o princípio ético que deve orientar as relações de
confiança estabelecidas entre pesquisadores e pesquisados.

Relação das entidades entrevistadas

Artesanato Marista Santa Isabel


Associação 10 de Junho
Associação Alto da Embratel-Primeiro de Maio
Associação Amigos da Vila Nossa Senhora de Fátima
Associação Amigos do Jardim Sabará
Associação Comunitária Almirante Tamandaré
Associação Comunitária Amigos do Bairro Sarandi
Associação Comunitária Barro Vermelho
Associação Comunitária Condor
Associação Comunitária da Extrema
Associação Comunitária da Vila Planalto
Associação Comunitária da Vila Santíssima Trindade
Associação Comunitária da Vila São José
Associação Comunitária da Vila São Miguel
Associação Comunitária do Bairro Costa e Silva
Associação Comunitária do Bairro Farrapos
Associação Comunitária do Bairro Petrópolis
Associação Comunitária do Bairro Teresópolis - ACBT
Associação Comunitária do Campo da Tuca
Associação Comunitária do Jardim Bento Gonçalves
Associação Comunitária do Jardim Cascata
Associação Comunitária do Lami
Associação Comunitária do Loteamento Wenceslau Fontoura
Associação Comunitária do Passo d'Areia
Associação Comunitária dos Moradores da Ilha das Flores
Associação Comunitária dos Moradores da Rua 6 de Novembro
Associação Comunitária dos Moradores do Bairro Anchieta
Associação Comunitária dos Moradores do Jardim Brasília
Associação Comunitária e Beneficiente Restinga Velha
Associação Comunitária Intercap
Associação Comunitária Jardim dos Coqueiros
Associação Comunitária Jardim Geraldo Santana e Ana Carvalho
Associação Comunitária Jardim Protásio Alves
Associação Comunitária Morro da Cruz
Associação Comunitária Nossa Senhora Aparecida da Vila Vargas
Associação Comunitária Padre Mascarenhas

12
Associação Comunitária São Guilherme
Associação Comunitária Setor Leste da Vila União (União Leste)
Associação Comunitária Unidos da Paineira
Associação Comunitária Vovó Nair
Associação Cristovão Colombo
Associação da Vila dos Sargentos
Associação da Vila Graciliano
Associação de Moradores 5ª Unidade da Restinga
Associação de Moradores Cosme e Galvão
Associação de Moradores da Estrada dos Alpes
Associação de Moradores da Estrada dos Batillanos
Associação de Moradores da Grande Santa Rosa (Nova Santa Rosa)
Associação de Moradores da Linha de Tiro Federal
Associação de Moradores da Mariano de Matos
Associação de Moradores da Nova Gleba
Associação de Moradores da Padre Cacique
Associação de Moradores da Rua Santa Clara
Associação de Moradores da Safira Velha
Associação de Moradores da Santa Helena
Associação de Moradores da Vila 14 de Novembro
Associação de Moradores da Vila Asa Branca
Associação de Moradores da Vila Batista Flores
Associação de Moradores da Vila Camaquã
Associação de Moradores da Vila Castelo
Associação de Moradores da Vila Clarel
Associação de Moradores da Vila Dois Irmãos
Associação de Moradores da Vila Dona Teodora
Associação de Moradores da Vila Esperança-Cordeiro
Associação de Moradores da Vila Fraternidade
Associação de Moradores da Vila Grécia - AMOVIG
Associação de Moradores da Vila João Goulart
Associação de Moradores da Vila Mato Grosso
Associação de Moradores da Vila Minuano
Associação de Moradores da Vila Nazaré
Associação de Moradores da Vila Nossa Senhora Aparecida
Associação de Moradores da Vila nossa Senhora de Lourdes
Associação de Moradores da Vila Nova Brasília
Associação de Moradores da Vila Nova Esperança
Associação de Moradores da Vila Operária do Passo das Pedras
Associação de Moradores da Vila Páscoa
Associação de Moradores da Vila Protásio Alves
Associação de Moradores da Vila Restinga - AMOVIR
Associação de Moradores da Vila Santana II - Quadra 166
Associação de Moradores da Vila São Borja
Associação de Moradores da Vila São Francisco
Associação de Moradores da Vila Silva Paes
Associação de Moradores da Vila Sossego
Associação de Moradores da Vila Teresina
Associação de Moradores da Vila Tronco 1 - Postão
Associação de Moradores da Vila Vicente Monteggia
Associação de Moradores da Vila Viçosa

13
Associação de Moradores das Vilas Elizabeth-Parque
Associação de Moradores David Canabarro
Associação de Moradores Divina Providência
Associação de Moradores do Bairro Humaitá
Associação de Moradores do Bairro Jardim do Salso
Associação de Moradores do Bairro Jardim Itu - AMBAJAÍ
Associação de Moradores do Bairro Ponta Grossa
Associação de Moradores do Bairro Santo Antônio
Associação de Moradores do Conjunto Residencial Protásio Alves
Associação de Moradores do Jardim Alvorada (Vila Chimarrão e Nossa Senhora Aparecida)
Associação de Moradores do Jardim da FAPA
Associação de Moradores do Jardim das Paineiras
Associação de Moradores do Jardim das Paineiras
Associação de Moradores do Jardim Floresta
Associação de Moradores do Jardim Ipiranga
Associação de Moradores do Jardim Vitória da Conquista
Associação de Moradores do Jardim Zona Sul
Associação de Moradores do Morro Alto
Associação de Moradores do Núcleo Residencial CEFER II
Associação de Moradores do Parque 20 de Maio
Associação de Moradores do Parque dos Maias II
Associação de Moradores do Residencial Guapuruvu
Associação de Moradores do Vale dos Canudos
Associação de Moradores Dutra Jardim
Associação de Moradores e Amigos da Nova Chácara da Fumaça
Associação de Moradores e Amigos da Vila Chico Mendes
Associação de Moradores e Amigos da Vila Planalto
Associação de Moradores e Amigos da Vila Safira Nova
Associação de Moradores Jardim das Colinas - Timbaúva III
Associação de Moradores Jardim Guanabara
Associação de Moradores Jardim Pôr do Sol
Associação de Moradores Parque das Orquídeas
Associação de Moradores Quinta do Portal
Associação de Moradores Recanto do Sabiá
Associação de Moradores Recreativa Beneficiente União
Associação de Moradores São Judas Tadeu
Associação de Reciclagem Ecológica Rubem Berta
Associação do Bairro Três Figueiras
Associação do Condomínio Residencial machado
Associação do Conjunto Residencial Parque Alto Petrópolis - Vila Tijuca
Associação dos Amigos da Avenida Ganzo
Associação dos Moradores da Chácara Sperb
Associação dos Moradores da Ilha do Pavão
Associação dos Moradores da Vila dos Eucaliptos
Associação dos Moradores da Vila Esperança - AMOVIESP
Associação dos Moradores da Vila Floresta
Associação dos Moradores da Vila Maria da Conceição
Associação dos Moradores da Vila Mimo de Vênus
Associação dos Moradores da Vila Paris
Associação dos Moradores da Vila União II
Associação dos Moradores do Bairro Menino Deus

14
Associação dos Moradores do Loteamento Timbaúva
Associação dos Moradores do Rubem Berta
Associação Reivindicativa e Esportiva Santo Agostinho
Centro Comunitário Alto Erexim
Centro Comunitário da Vila Orfanatrófio I
Centro Comunitário da Vila Pinto
Centro Comunitário de Desenvolvimento da Tristeza, Assunção e Conceição
Centro Comunitário do Morro da Cruz
Centro Comunitário São José Operário
Centro dos Moradores do Bairro Rio Branco
Clube de Mães Bárbara Maix
Clube de Mães Novo Mundo
Clube de Mães Raio de Sol
Comissão da Travessa José Bonifácio e Deodoro
Comitê de Desenvolvimento da Região Medianeira-Tronco
Comitê de Desenvolvimento do Campo da Tuca
Conselho Comunitário do Bairro Cavalhada
Cooperativa Habitacional de Ação Comunitária Ipê-São Borja
Cooperativa Habitacional Vida Nova - Vila Athemis
Creche Turminha do Barulho
Nova Cooperativa Comunitária e Habitacional dos Moradores da Vila São Borja
ONG NACIPAZ - Natureza, Cidadania e Paz
Sociedade Amigos da Vila Leão
Sociedade Amigos do Jardim Itu
Sociedade Comunitária Heróphilo de Azambuja
Sociedade Comunitária Jardim Medianeira
Sociedade dos Moradores da Vila da Fonte
Sociedade dos Moradores da Vila São Pedro
União das Associações dos Bairros Navegantes, Farrapos, Humaitá e Arquipélago

Caracterização do universo de entidades pesquisadas

A pesquisa foi realizada no ano de 2003, através de entrevistas com membros


das diretorias ou pessoas identificadas como ocupantes de posições importantes nas
entidades selecionadas. A vinculação dos respondentes com as entidades se expressa no
Quadro abaixo:
Quadro 1. Vinculação institucional dos entrevistados, de acordo com o cargo ocupado
nas entidades – Porto Alegre/2003
Freqüência % % cumulativo
Presidente 117 70,1 70,1
Vice-Presidente 11 6,6 76,6
Secretário 10 6,0 82,6
Tesoureiro 4 2,4 85,0
Outros cargos 20 12,0 97,0
Não ocupa cargo 3 1,8 98,8
NS/NR 2 1,2 100,0
Total 167 100,0

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Conforme os números do Quadro, observa-se que a grande maioria dos
entrevistados (85%) ocupava cargos na diretoria das entidades, sendo pouco expressivo
o número de respondentes sem qualquer vinculação formal com as mesmas.
Em relação à divisão de gênero dos entrevistados, as informações são as
seguintes:
Quadro 2. Divisão dos entrevistados por gênero – Porto Alegre/2003
Freqüência % % cumulativo
Feminino 70 41,9 41,9
Masculino 97 58,1 100,0
Total 167 100,0

As informações do Quadro 2 indicam uma relativa assimetria de gênero entre os


entrevistados. Na medida em que um número significativo destes entrevistados integra a
diretoria das entidades, sendo 70% ocupando o cargo de presidente, esta assimetria pode
ser um indicador da existência de uma desigualdade de gênero no âmbito das
associações comunitárias e/ou nos locais onde estas se constituem.
Outra informação para a caracterização inicial do universo pesquisado é a
divisão regional das entidades entrevistadas, apresentada no Quadro abaixo:
Quadro 3. Distribuição das entidades entrevistadas por Região do Orçamento
Participativo – Porto Alegre/2003
Freqüência % % cumulativo
Norte 31 18,6 18,6
Nordeste 28 16,8 35,4
Partenon 26 15,6 51
Leste 16 9,6 60,6
Glória 9 5,4 66
Noroeste 9 5,4 71,4
Eixo-Baltazar 8 4,8 76,2
Sul 8 4,8 81
Restinga 6 3,6 84,6
Humaitá-Navegantes/Ilhas 6 3,6 88,2
Centro-Sul 5 3 91,2
Cruzeiro 5 3 94,2
Centro 4 2,4 96,6
Lomba do Pinheiro 3 1,8 98,4
Extremo-Sul 2 1,2 99,6
Cristal 1 0,6 100,0
Total 167 100,0

Os números mostram uma distribuição bastante desigual das entidades


entrevistadas nas dezesseis regiões da cidade. Esta desigualdade, conforme salientado
na apresentação desta seção, se deve, em parte, à metodologia da pesquisa. Assim, foi a
opção metodológica de apreender todas as entidades comunitárias atuantes em três
regiões que explica o fato das regiões Nordeste, Norte e Partenon apresentarem os

16
maiores números de entidades entrevistadas (juntas, elas respondem por mais de 50%
das entidades entrevistadas). De outra parte, limitações de informações e diferenças no
conhecimento dos auxiliares de pesquisa sobre o associativismo comunitário3 explicam
as significativas variações observadas entre o número de entidades entrevistadas nas
outras treze regiões, que pode ser melhor visualizada no Gráfico abaixo:
Gráfico 1. Distribuição das entidades entrevistadas por Região do Orçamento
Participativo – Porto Alegre/2003

30

20

31
28
26

10

16

9 9
8 8
6 6
5 5
4
3
2
1
0
Norte Leste Restinga Centro-Sul Cruzeiro Eixo Baltazar Noroeste Cristal

Nordeste Partenon Centro Extremo Sul Glória Humaitá-... Lomba do... Sul

Apesar disto, tendo por base os números encontrados nas três regiões cujas
entidades foram pesquisadas na totalidade, pode-se inferir que as regiões tendem a
apresentar entre 25 e 30 entidades comunitárias, com uma disseminação relativamente
equilibrada deste padrão organizativo.
Em relação ao tempo de existência das entidades pesquisadas, as informações
coletadas foram as seguintes:

3
Ver nota 2, acima.

17
Quadro 4. Ano de Fundação da Entidade, por ano de fundação – Porto Alegre/2003
Freqüência % % cumulativo
1947 1 ,6 ,6
1954 1 ,6 1,2
1957 2 1,2 2,4
1960 2 1,2 3,6
1962 2 1,2 4,8
1963 1 ,6 5,4
1965 1 ,6 6,0
1968 1 ,6 6,6
1969 1 ,6 7,2
1970 3 1,8 9,0
1972 6 3,6 12,6
1973 1 ,6 13,2
1975 6 3,6 16,8
1976 2 1,2 18,0
1978 6 3,6 21,6
1979 5 3,0 24,6
1980 2 1,2 25,7
1981 13 7,8 33,5
1982 9 5,4 38,9
1983 6 3,6 42,5
1984 3 1,8 44,3
1985 5 3,0 47,3
1986 8 4,8 52,1
1987 9 5,4 57,5
1988 12 7,2 64,7
1989 1 ,6 65,3
1990 6 3,6 68,9
1991 2 1,2 70,1
1992 8 4,8 74,9
1993 2 1,2 76,0
1994 3 1,8 77,8
1995 2 1,2 79,0
1996 5 3,0 82,0
1997 6 3,6 85,6
1998 6 3,6 89,2
1999 3 1,8 91,0
2000 3 1,8 92,8
2001 2 1,2 94,0
2002 4 2,4 96,4
2003 1 ,6 97,0
NR 5 3,0 100,0
Total 167 100,0

Organizando estas informações por período, obtém-se o seguinte Gráfico:

18
Gráfico 2. Ano de fundação da entidade, por períodos – Porto Alegre/2003

Ano de fundação
6 da entidade
3,59% Até 1960
5 1961-1964
3
2,99% 1,8% 1965-1978
1979-1988
27 Após 1989
16,17% NS/NR
54
32,34%

72
43,11%

Estes números permitem identificar alguns aspectos importantes da dinâmica do


associativismo comunitário em Porto Alegre. Em primeiro lugar, observa-se a existência
de um associativismo com relativa antiguidade e permanência na história da cidade, que
se reflete no fato de mais de 20% das entidades pesquisadas terem, no período da
pesquisa (2003), 25 anos ou mais de existência. Tendo presente a instabilidade que
caracteriza não apenas as organizações sociais, mas as próprias instituições brasileiras,
esta longevidade parece expressar uma significativa consolidação destas práticas
associativas.
Por outro lado, os números do Gráfico dão sustentação às conclusões
apresentadas por outras pesquisas (Boschi, 1987) sobre a ocorrência de um “surto
associativo” no período de redemocratização brasileiro. Isto se reflete, no caso do
associativismo comunitário de Porto Alegre, no fato de que mais de 40% das entidades
pesquisadas foram constituídas no período entre 1979-1988. Este momento histórico foi,
sem dúvida, um marco em termos da ampliação dos processos de organização popular
no Brasil (e, mais especificamente, em Porto Alegre), permitindo a “entrada em cena”
de novos atores sociais (Sader, 1988) até então excluídos ou inseridos de forma
totalmente subordinada no jogo político das elites.4
Por fim, as informações acima também apontam para algo que, em certa medida,
contesta algumas avaliações sobre a dinâmica associativa no Brasil dos anos 90. Ao
4
Em que medida este “surto associativo” se deveu à conjuntura da redemocratização e/ou à indução de
determinadas iniciativas governamentais (como o Programa do Ticket do Leite, do Governo José Sarney
– 1985-1989), é algo a ser analisado em futuras investigações.

19
contrário do que foi afirmado por alguns estudos desde o final dos anos 80, quando
autores passaram a apontar para o declínio do “surto associativo” do período da
redemocratização, os números apresentados mostram a manutenção de uma dinâmica de
constituição de novas entidades comunitárias, na medida em que praticamente um terço
das entidades pesquisadas foram criadas a partir do ano de 1989. Ou seja, pelo menos
no município de Porto Alegre, não é correto falar de um estancamento e, muito menos,
refluxo no processo organizativo nos anos 90.
Esta manutenção da dinâmica de organização social parece estar associada,
conforme apontado por alguns autores (Abers, 2000; Silva, 2001 e 2002), às
experiências participativas implantadas na cidade, especialmente a partir do início das
gestões da “Frente Popular” em 19895, quando é ampliado o sistema de participação
social existente no âmbito municipal, com destaque para o Orçamento Participativo
(OP).
Esta dinâmica de constituição de entidades comunitárias apresenta, no entanto,
variações importantes em termos regionais, as quais tem impactos significativos para o
entendimento das especificidades do associativismo comunitário nas diferentes regiões
da cidade. Tais variações podem ser claramente observadas quando se observa período
de fundação das entidades nas três regiões para as quais os dados estão completos:
Quadro 5. Ano de fundação da entidade, por região (Nordeste, Norte e Partenon) – Porto
Alegre/2003
Norte Nordeste Partenon
Até 1960 Freqüência 2 1 3
% na Região 6,5% 3,6%
1961-1964 Freqüência 2 2
% na Região 6,5%
1965-1978 Freqüência 2 3 5
% na Região 6,5% 11,5%
1979-1988 Freqüência 14 6 11 31
% na Região 45,2% 21,4% 42,3%
Após 1989 Freqüência 10 20 11 41
% na Região 32,3% 71,4% 42,3%
NS/NR Freqüência 1 1 1 3
% na Região 3,2% 3,6% 3,8%
Total Freqüência 31 28 26 85
% na Região 100,0% 100,0% 100,0%

Os números do Quadro mostram três temporalidades distintas na dinâmica de


criação de entidades em cada uma das regiões: a Região Norte apresenta um processo
mais antigo e que, apesar de manter-se, tem seu ápice no período da redemocratização

5
Coligação eleitoral vitoriosa nas eleições municipais de 1988, formada inicialmente pelo Partido dos
Trabalhadores (PT) e Partido Comunista do Brasil (PCB), se manteve à frente da Prefeitura de Porto
Alegre até o ano de 2004.

20
(1979-1988); a Região Partenon, por sua vez, apresenta um processo associativo mais
concentrado, dividindo-se basicamente entre o período da redemocratização e o período
pós-89; por fim, a Região Nordeste apresente uma expressiva concentração da criação
de suas entidades no período pós-89.
Tais diferenças estão, em grande medida, relacionadas à própria temporalidade
diferenciada do processo de ocupação destas três regiões: a Região Norte é uma região
de ocupação mais antiga; a Região Partenon apresenta uma intensificação na sua
ocupação em período um pouco mais recente; a Região Nordeste, apesar de alguns
núcleos habitacionais bastante antigos (como mostram os dados, nela se localiza uma
das entidades com maior longevidade), é incorporada à malha urbana da cidade entre os
anos 80 e 90. Estas informações sobre as diferenças regionais, que, como veremos não
se resumem ao tempo de criação das entidades, indicam a importância de novas
investigações que permitam qualificar a presente análise, explorando as especificidades
do associativismo comunitário nas dezesseis regiões de Porto Alegre.
Por fim, para finalizar esta caracterização geral das entidades entrevistadas, o
Quadro abaixo apresenta a situação de registro formal das 167 entidades:
Quadro 6. Situação de registro legal da entidade – Porto Alegre/2003
Freqüência % % cumulativo
Entidade com registro legal 157 94,0 94,0
Entidade sem registro legal 9 5,4 99,4
NSA/NR 1 ,6 100,0
Total 167 100,0

O Quadro indica que as entidades comunitárias de Porto Alegre apresentam um


grau bastante elevado de formalização, sendo quase insignificante o número de
entidades que não possuem registro legal. Esta “institucionalização” é uma
característica marcante das entidades comunitárias, que tendem, imediatamente após sua
constituição, proceder ao registro legal que as dota de personalidade jurídica.
Com base nestas primeiras informações, pode-se identificar a existência, em
Porto Alegre, de um associativismo comunitário disseminado em praticamente todo
território do município, com um histórico relativamente longo de atuação, ao mesmo
tempo em que mantém uma dinâmica de constituição de novas entidades, e marcado por
um alto grau de “institucionalização”.

Caracterização da estrutura das entidades comunitárias pesquisadas

21
Conforme salientado anteriormente, uma das dificuldades da investigação do
associativismo comunitário se refere à instabilidade no funcionamento das entidades, as
quais, por não contarem, muitas vezes, com fontes de recursos estáveis e com pessoal
profissionalizado, tendem a uma atuação cíclica, alternando períodos de maior ativismo
e períodos de baixa atuação (chegando, no limite, à desativação da entidade). Esta
realidade se expressa no Quadro abaixo:
Quadro 7. Ocorrência de paralisação nas atividades da entidade – Porto Alegre/2003
Freqüência % % cumulativo
Sim 42 25,1 25,1
Não 123 73,7 98,8
NSA/NR 2 1,2 100,0
Total 167 100,0

De acordo com os números do Quadro, um quarto das entidades pesquisadas já


apresentou períodos de paralisação das suas atividades. O tempo de duração destas
paralisações é difícil de ser apreendido através do instrumento de pesquisa utilizado,
mas, como ilustração, aponta-se para o fato de que, de acordo com os entrevistados, 29
entidades ficaram paralisadas por dois anos ou mais.
Uma relação que pode ser feita é entre o ano de fundação da entidade e a
ocorrência ou não de paralisação da mesma. Os números encontram-se no seguinte
Quadro:
Quadro 8. Ocorrência de paralisação nas atividades da entidade, por ano de fundação
das entidades – Porto Alegre/2003
Sua entidade já esteve paralisada?
Sim Não NSA/NR Total
Ano de Até 1960 Freqüência 1 5 0 6
fundação % ano de fundação 16,7% 83,3% ,0% 100,0%
da entidade 1961-1964 Freqüência 3 0 0 3
% ano de fundação 100,0% ,0% ,0% 100,0%
1965-1978 Freqüência 10 16 1 27
% ano de fundação 37,0% 59,3% 3,7% 100,0%
1979-1988 Freqüência 18 53 1 72
% ano de fundação 25,0% 73,6% 1,4% 100,0%
Após 1989 Freqüência 8 46 0 54
% ano de fundação 14,8% 85,2% ,0% 100,0%
NS/NR Freqüência 2 3 0 5
% ano de fundação 40,0% 60,0% ,0% 100,0%
Total Freqüência 42 123 2 167
% ano de fundação 25,1% 73,7% 1,2% 100,0%

22
De acordo com o Quadro, observa-se a tendência esperada de que as entidades
mais antigas tenham, proporcionalmente, maior número de paralisações. Por outro lado,
no entanto, também se observa que entre as entidades mais “novas”, criadas a partir de
1989, há um número expressivo (praticamente 15%) de paralisações.
Mas como funcionam estas entidades? Uma primeira aproximação à resposta a
esta pergunta pode ser extraída das informações sobre a estrutura existente nas mesmas,
conforme expressas no Quadro abaixo:
Quadro 9. Estrutura existente nas entidades comunitárias – Porto Alegre/2003
Possui Estrutura Sede Própria Jornal Boletim
Freqüência % Freqüência % Freqüência %
Sim 115 68,9 97 58,1 33 19,8
Não 51 30,5 69 41,3 133 79,6
NS/NR 1 ,6 1 ,6 1 ,6
Total 167 100,0 167 100,0 167 100,0

De acordo com os dados do Quadro, observa-se que as entidades comunitárias


de Porto Alegre tendem a possuir algum tipo de estrutura que contribui para a
continuidade das suas atividades ao longo do tempo. Isto se expressa no fato de quase
70% dos entrevistados responderem que sua entidade tinha algum tipo de estrutura
permanente.
Uma informação que se destaca do Quadro é o fato de praticamente 60% das
entidades possuírem sede própria. Na medida em que se tratam de entidades, conforme
será visto na seqüência deste relatório, que possuem escassas fontes de renda, esta
presença de um alto número de entidades com sede própria pode representar uma
expressiva capacidade de acesso a recursos públicos (principalmente na forma da
concessão de áreas públicas para a instalação das sedes e de materiais de construção
para sua edificação) ou uma significativa capacidade de mobilização dos moradores
para a obtenção de recursos e mão-de-obra que viabilizem a construção da sede.
De uma forma ou de outra, a existência de uma sede própria constitui um
aspecto importante para a autonomia das entidades, na medida em que esta deixa de
estar vinculada a um morador (em geral, o Presidente) que cede as dependências de sua
residência particular para as atividades cotidianas da entidade, como tradicionalmente
ocorre nos casos em que não há sede própria. Além disto, a sede própria confere a
muitas entidades uma fonte permanente de renda, através do seu aluguel para a
realização de atividades particulares dos associados e/ou dos moradores da comunidade.
Por fim, a presença da sede própria é um elemento que tende a contribuir na reprodução
das entidades, ao materializar uma organização que pode ser vista, identificada e

23
buscada pelos moradores quando estes se confrontam com determinados problemas
sociais.
Em relação à existência de algum tipo mais formal de comunicação entre as
entidades e os moradores, através da elaboração de jornais ou boletins permanentes,
observa-se um número relativamente baixo de entidades (menos de 20%) que
desenvolve esta prática. Além do custo significativo, tanto de recursos financeiros
quanto humanos, para manter uma publicação permanente, a baixa presença de jornais
ou boletins parece indicar que a comunicação entre membros das entidades e os
moradores tende a ocorrer muito mais pelas conversas cotidianas, seja nas atividades da
própria entidade seja nos encontros informais nas redes de vizinhança, parentesco e/ou
amizade.
Outro aspecto para a caracterização das entidades é a forma como se estruturam
as relações entre as entidades e os moradores. Uma informação que permite uma
primeira aproximação a este aspecto refere-se à existência ou não de quadro formal de
associados na entidade:
Gráfico 3. Existência de associação formal na entidade – Porto Alegre/2003
Sua entidade
possui
associados?
Sim
Não

71
42,51%
96
57,49%

Segundo o gráfico, quase 60% das entidades comunitárias possuem alguma


forma de registro de seus associados, tendendo à constituição de uma relação mais
formalizada com aqueles (sócios) que ela pretende representar. Por outro lado, é
significativo o número de entidades (mais de 40%) que não possuem nenhum tipo de
associação formal, apresentando-se como pretensas representantes do conjunto dos
moradores das suas áreas de abrangência.

24
A contribuição dos associados para a manutenção financeira da entidade se
expressa no gráfico abaixo:
Gráfico 4. Pagamento de mensalidade pelos associados da entidade – Porto Alegre/2003
Em caso de
possuir
associados, eles
1 pagam
1,04% mensalidade?
Sim
Não
NSA/NR

42
43,75%
53
55,21%

Entre as 96 entidades que declararam ter associados, em pouco mais da metade


delas existe o pagamento de mensalidade por parte destes associados. Em muitos casos,
esta mensalidade possibilita ao associado usufruir dos serviços prestados pela entidade
e/ou da estrutura física da mesma (acesso a atividades esportivas e festas, uso do espaço
físico da entidade para eventos particulares etc.). Assim, observa-se que é um número
relativamente pequeno de entidades que encontra nas contribuições financeiras de seus
associados uma fonte de recursos permanente para a sua atuação. Este aspecto, além de
implicar numa significativa carência e/ou instabilidade na arrecadação de recursos por
parte destas entidades, também traz o risco da subordinação das mesmas aos interesses
daqueles agentes externos que podem viabilizar o acesso aos recursos dos quais
necessitam para manutenção de suas atividades.
Aprofundando um pouco mais este aspecto do financiamento das entidades
comunitárias, o gráfico abaixo traz informações sobre a existência ou não de fontes de
recursos para a manutenção das entidades:

25
Gráfico 5. Existência de fonte de renda para manutenção da entidade – Porto Alegre/2003
A entidade possui
fonte de renda
Sim
Não

41
24,55%

126
75,45%

Conforme o gráfico, três quartos das entidades possuem alguma forma de


arrecadação de fundos para o financiamento de suas atividades. Por outro lado, um
quarto das entidades pesquisadas respondeu que não possui nenhuma fonte de recurso.
Este dado indica que uma parcela significativa das entidades comunitárias de Porto
Alegre (uma em cada quatro entidades) atua basicamente a partir de recursos
disponibilizados pelos próprios membros da entidade, o quê pode implicar num
constrangimento importante na capacidade de atuação destas organizações na medida
em que as mesmas dispõem de recursos muito limitados para arcar com os custos
implicados na intervenção social e/ou institucional.
Além da contribuição dos associados, já abordada acima, as outras fontes
significativas de recursos destas 126 entidades que declararam possuir alguma forma de
arrecadação financeira encontram-se nos gráficos abaixo:

26
Gráfico 6. A entidade realiza festas e rifas para arrecadação de recursos – Porto
Alegre/2003
Festas e Rifas
Sim
Não

49
38,89%

77
61,11%

Gráfico 7. A entidade possui alguma tipo de convênio para arrecadação de recursos –


Porto Alegre/2003
Convênios
Sim
Não

49
38,89%

77
61,11%

27
Gráfico 8. A entidade recebe recursos através de doações – Porto Alegre/2003
Doações
Sim
Não

38
30,16%

88
69,84%

Gráfico 9. A entidade arrecada recursos através de aluguel da sede – Porto Alegre/2003

Aluguel de sala
Sim
Não

37
29,37%

89
70,63%

De acordo com os dados dos gráficos, a forma mais utilizada pelas entidades
para buscar recursos é a realização de atividades eventuais de arrecadação de fundos
(festas e rifas), que estão presentes em mais de 60% das 126 entidades que declararam
ter alguma fonte de renda. Este tipo de atividade, no entanto, se caracteriza pela
eventualidade, não oferecendo, em geral, uma fonte permanente e estável de recursos.
Neste sentido, a significativa presença desta forma de arrecadação de recursos indica
uma tendência de instabilidade na fonte de renda das entidades.

28
A segunda forma mais comum de obtenção de recursos pelas entidades é o
estabelecimento de convênios, especialmente com os órgãos públicos municipais.6
Quase 40% das 126 entidades comunitárias que declaram ter fonte de renda indicaram a
existência de algum tipo de convênio no financiamento das suas atividades. Esta
presença expressiva de convênios tende a oferecer às entidades uma fonte mais estável
de recursos, propiciando, assim, uma maior estabilidade na sua atuação. No entanto,
conforme será retomado na seqüência deste relatório, a dependência destes recursos
externos, especialmente quando provenientes do governo, pode ser um obstáculo
importante para a manutenção da autonomia das entidades comunitárias.
Em terceiro lugar nas formas mais destacadas de arrecadação de recursos das
entidades comunitárias colocam-se as doações: estas foram indicadas por 30% das 126
entidades com alguma fonte de renda. Este aspecto indica a existência de importantes
fluxos de recursos (não necessariamente financeiros) que circulam por fora dos canais
institucionais do Estado e do mercado, contribuindo para viabilizar a atuação das
entidades pesquisadas. As doações, no entanto, tendem a apresentar as mesmas
limitações das atividades eventuais de arrecadação (festas e rifas), vistas acima, na
medida em que tendem a não representar um fluxo permanente e estável de recursos.
Além disto, na medida em que tendem a depender de forma direta da disponibilidade e
interesse dos doadores, as doações apresentam um forte risco de descontinuidade.
Por fim, a quarta forma de arrecadação de recursos que obteve maior número de
referências foi o aluguel do espaço da entidade para a realização de atividades
particulares. Praticamente 30% das 126 entidades comunitárias utilizam este tipo de
prática, corroborando uma afirmação feita anteriormente sobre a importância da
existência de uma sede própria para, entre outros aspectos, a manutenção financeira da
entidade.

6
Observe-se a existência de uma diferença entre o número/percentual de entidades que fazem referência à
existência de convênios como fonte de renda para a entidade e o número/percentual de entidades que
fazem referência à existência de convênio para a execução de serviços de interesse público, abordado na
seqüência deste relatório. Tal diferença se deve, entre outros aspectos, ao fato de que alguns convênios
para a prestação de serviços não oferecem recursos que podem ser utilizados para o financiamento de
outras atividades da entidade, não sendo contabilizados pelos entrevistados como uma verdadeira fonte de
recursos para a entidade. Além disto, muitas vezes as entidades comunitárias constituem entidades
específicas para a realização de convênios (como uma creche comunitária, por exemplo), com
personalidade jurídica própria, o que faz com que o recurso do convênio fique nesta outra entidade, sem
chegar a ser diretamente utilizado no financiamento das outras atividades desenvolvidas pelas entidades
comunitárias.

29
Caracterização da organização e funcionamento interno das entidades
comunitárias pesquisadas

As entidades comunitárias de Porto Alegre tendem a apresentar um padrão muito


semelhante de organização, na medida em que, na sua grande maioria, seguem um
modelo comum de estatuto para a composição das suas diretorias, o qual reproduz a
forma presidencialista e vertical de organização encontrada na estrutura sindical
brasileira oficial7. As diretorias, comumente, compõem-se dos seguintes cargos:
Presidente, Vice-Presidente, Secretário(s) e Tesoureiro(s). Além disto, em geral, há
também a escolha de um Conselho Fiscal para compor a diretoria da entidade. O
número de pessoas que participam das diretorias das entidades pesquisadas encontra-se
no gráfico abaixo:
Gráfico 10. Número de participantes na diretoria da entidade – Porto Alegre/2003
Quantas pessoas
6 participam da
3,59% diretoria da
1 entidade?
0,6% Até 5 pessoas
6 a 10 pessoas
Mais de 10
pessoas
43
25,75% NS/NR

117
70,06%

Os dados do gráfico mostram que a tendência, expressa por 70% das entidades, é
de diretorias que envolvam mais dez pessoas. Em um quarto das entidades, a diretoria
apresenta entre seis e dez membros, sendo que menos de 4% das entidades possuem até
cinco membros nas suas diretorias.
No entanto, estes dados podem apresentar uma certa distorção, na medida em
que os respondentes tiveram duas possibilidades de interpretação: por um lado, podem
7
O padrão organizativo das entidades comunitárias, de fato, reproduz modelo similar da estrutura sindical
brasileira, com organizações de base (Associações de Moradores, Sociedades Amigos de Bairro,
Conselhos Comunitários etc.), Uniões Municipais (no caso de Porto Alegre, a União das Associações de
Moradores de Porto Alegre – UAMPA), Federações Estaduais (no caso do Rio Grande do Sul, a
Federação Riograndense de Associações Comunitárias e de Amigos de Bairros - FRACAB) e
Confederação Nacional (Confederação Nacional das Associações de Moradores – CONAM).

30
ter informado o número de membros que formalmente compõem a diretoria; por outro,
podem ter informado o número de membros que efetivamente compõem a diretoria. No
primeiro caso, teríamos uma distorção pela super-estimativa dos participantes nas
diretorias das entidades comunitárias, uma vez que muitos dos componentes das chapas
que assumem estas diretorias tendem a não apresentar uma participação efetiva ao longo
da gestão. Quantas pessoas efetivamente participam nas diretorias das entidades
comunitárias ainda é uma questão que exige uma investigação mais aprofundada.
O processo de escolha das diretorias também apresenta um padrão bastante
claro, conforme o gráfico abaixo:
Gráfico 11. Forma de escolha da direção da entidade – Porto Alegre/2003
De que forma é
escolhida a
8
diretoria da
4,79%
entidade?
1 Eleição
0,6%
Indicação da
diretoria anterior
Outra forma

158
94,61%

Em quase 95% das entidades a escolha das diretorias se dá através de um


processo eleitoral. Mesmo entre os entrevistados que indicaram outras alternativas,
observa-se que estas se deveram a algum fator conjuntural (vacância da diretoria,
ausência de candidaturas etc.), sendo a eleição, no entanto, o mecanismo prescrito pelos
estatutos para a escolha das diretorias.
Freqüência com que são realizadas as eleições pode ser visualizada no seguinte
gráfico:

31
Gráfico 12. Periodicidade das eleições para escolha da diretoria da entidade – Porto
Alegre/2003
Periodicidade das
1 eleições
0,6% Anual
9 A cada dois anos
11 5,39% 24 A cada três anos
6,59% 14,37% Mais de três
anos
10
Não faz eleições
5,99%
NS/NR

112
67,07%

Mais de 80% das entidades pesquisadas apresentam diretorias com mandatos


relativamente curtos, realizando eleições anualmente ou, principalmente, a cada dois
anos. O número de entidades que apresentam diretorias com mandatos mais longos é
baixo, com pouco mais de 12% das entidades realizando eleições a cada três anos ou
mais. O quanto esta periodicidade curta dos mandatos e esta freqüência de eleições
induzem uma tendência de renovação nas diretorias das entidades ou, ao contrário, o
quanto estas entidades se caracterizam pela presença de diretorias que, apesar das
eleições constantes, se reproduzem por longo tempo com a mesma composição é algo
que também mereceria novas pesquisas.
Para qualificar um pouco mais o processo de escolha das diretorias das entidades
comunitárias é necessário analisar que são os eleitores que participam deste processo.
Isto pode ser visto no gráfico:

32
Gráfico 13. Detentores do direito de voto nas eleições da diretoria da entidade – Porto
Alegre/2003
Direito de voto nas
1 eleições
0,6% Todos os
moradores
9
Associados
5,39%
Não faz eleições
NS/NR

53
31,74%

104
62,28%

Conforme o gráfico, a prática mais comum, presente em mais de 60% das


entidades, é que todos os moradores tenham direito de participar da eleição da diretoria.
Somente em pouco mais de 30% das entidades, a participação na eleição fica restrita
àqueles formalmente associados na entidade.
Uma vez identificada esta tendência de ampla oportunidade de participação nas
eleições das diretorias das entidades, coloca-se a questão de quantas pessoas
efetivamente participam das eleições. Este é um dado de difícil apreensão através do
instrumento utilizado nesta pesquisa (questionário), mas as respostas obtidas encontram-
se no gráfico abaixo:

33
Gráfico 14. Numero de votantes na última eleição da diretoria da entidade – Porto
Alegre/2003
Quantas pessoas
votaram última
eleição da
entidade?
24 Até 50 pessoas
14,37% 51 a 100
40 pessoas
9
23,95% 101 a 150
5,39%
pessoas
1 151 a 200
0,6% pessoas
201 a 300
21 pessoas
12,57% Mais de 300
pessoas
27
Não houve
16,17%
eleição
13
Não faz eleição
7,78%
NS/NR
17 15
10,18% 8,98%

Praticamente metade das entidades pesquisas (49%) respondeu que o número de


votantes nas últimas eleições realizadas chegou, no máximo, a 150 pessoas. Em quase
um quarto das entidades, o número de votantes foi de até 50 pessoas. Por sua vez, em
30% das entidades foi ultrapassado o número de 150 eleitores, sendo que em 21
entidades este número ficou acima de 300 eleitores.
Estes dados tendem a indicar que a maior parte das diretorias das entidades
comunitárias é eleita por um número relativamente pequeno dos moradores das
comunidades nas quais se situam. Esta baixa mobilização eleitoral pode ser, em parte,
explicada pelas informações apresentadas o gráfico abaixo:
Gráfico 15. Número de chapas concorrentes na última eleição da diretoria da entidade –
Porto Alegre/2003
5 1 9 Quantas chapas
2,99% 0,6% 5,39% concorreram na
1
última eleição da
0,6%
entidade?
7 1
4,19% 2
3
mais de 3
NSA/NR
Não houve
eleição
35
20,96% Não faz eleição
109
65,27%

34
De acordo com este gráfico, observa-se que em praticamente dois terços das
entidades comunitárias as eleições tiveram apenas uma chapa concorrendo. Ou seja, a
grande maioria das eleições não teve uma real disputa, o que pode fazer com que não
tenha se colocado uma efetiva necessidade ou capacidade de mobilizar um maior
número de eleitores para participar.
Esta relação entre o número de chapas participantes da eleição e o número de
eleitores participantes fica clara no seguinte quadro:
Quadro 10. Número de chapas concorrentes pelo número de votantes na última eleição
da entidade – Porto Alegre/2003
Quantas chapas concorreram na última eleição da
entidade?
Não
mais NSA/ houve Não faz
1 2 3 de 3 NR eleição eleição Total
Quantas Até 50 pessoas 39 1 0 0 0 0 0 40
pessoas 51 a 100 pessoas 22 5 0 0 0 0 0 27
votaram
última 101 a 150 pessoas 10 4 0 1 0 0 0 15
eleição da 151 a 200 pessoas 12 5 0 0 0 0 0 17
entidade? 201 a 300 pessoas 7 5 1 0 0 0 0 13
Mais de 300 pessoas 6 9 6 0 0 0 0 21
Não houve eleição 0 0 0 0 0 1 0 1
Não faz eleição 0 0 0 0 0 0 9 9
NS/NR 13 6 0 0 5 0 0 24
Total 109 35 7 1 5 1 9 167

O quadro mostra uma tendência de correlação direta entre o número de votantes


na eleição com o número de chapas concorrentes: quanto maior o número de chapas
concorrentes maior a tendência de ter um número elevado de eleitores. Assim, a maior
parte das entidades que tiveram um baixo número de eleitores também apresentaram
apenas uma chapa concorrendo. Por outro lado, as entidades que tiveram duas e,
especialmente, três chapas concorrendo nas eleições tenderam a apresentar maior
participação dos eleitores. Neste sentido, em seis dos sete casos nos quais houve três
chapas concorrendo, o número de eleitores ficou acima de 300.
Além da participação eleitoral, a pesquisa também buscou apreender outras
formas ou momentos de participação dos moradores na vida das entidades comunitárias.
Uma destas formas seria através da realização de reuniões ou assembléias da entidade
com os moradores, cujos dados encontram-se no gráfico:

35
Gráfico 16. Realização de reuniões ou assembléias com a comunidade e/ou associados –
Porto Alegre/2003
A sua entidade
realiza reuniões ou
assembléias com a
7 comunidade e/ou
4,19% os associados?
Sim
Não

160
95,81%

Conforme se observa neste gráfico, a quase totalidade das entidades pesquisadas


(mais de 95%) realizam reuniões ou assembléias com os moradores ou associados. Ou
seja, além das reuniões da diretoria da entidade, também existe uma prática disseminada
de reuniões diretamente com aqueles que, pretensamente, são representados pela
entidade. A freqüência com que se realizam estas reuniões ou assembléias encontra-se
no gráfico que segue:
Gráfico 17. Freqüência de realização de reuniões ou assembléias com a comunidade
e/ou associados – Porto Alegre/2003
Neste ano, quantas
reuniões ou
assembléias foram
realizadas?
13 14 1
7 7,78% 8,38%
2a3
4,19%
4a6
7 a 10
22 35 Mais de 10
13,17% 20,96% Não faz
assembléia
NS/NR

35
20,96%
41
24,55%

A freqüência destas reuniões ou assembléias é bastante variável: quase 30% das


entidades informaram que realizaram entre uma e três reuniões no período de um ano;

36
por volta de 45% das mesmas indicaram que, neste período, realizaram entre quatro e
dez reuniões; por fim, 13% responderam que fizeram mais de dez reuniões em um ano.
Assim, percebe-se que existe um número significativo de entidades comunitárias que
busca manter uma interlocução com os moradores das comunidades que pretendem
representar. O quanto estes moradores respondem a esta iniciativa das entidades pode
ser aferido pelos seguintes dados:
Gráfico 18. Número de presentes nas reuniões ou assembléias com a comunidade e/ou
associados – Porto Alegre/2003

Quantas pessoas
9 compareceram, em
5,39% média, nestas
7 reuniões ou
4,19% assembléias?
7 31 Até 20 pessoas
4,19% 18,56% 21 a 40 pessoas
41 a 70 pessoas
14 71 a 100
8,38% pessoas
101 a 150
pessoas
Mais de 150
24 36 pessoas
14,37% 21,56% Não faz
assembléia
NS/NR

39
23,35%

Estes números indicam que a grande maioria das reuniões ou assembléias feitas
pelas entidades com suas bases (ou seja, praticamente, dois terços delas) reuniu até 70
pessoas (sendo que 40% reuniram até 40 pessoas). Além disto, um número expressivo
de entidades (pouco mais de 25% delas) informou que reuniu, em média, mais de 70
pessoas em suas reuniões e assembléias. Estas informações, mesmo podendo estar
marcadas por uma super-estimativa o número de participantes, tendem a indicar a
existência de um expressivo enraizamento das entidades comunitárias entre a população
dos locais onde atuam, o qual se expressa na capacidade de reunir parcelas expressivas
desta população nas atividades que realizam.
Além destas reuniões e assembléias, outro espaço de participação da
comunidade nas atividades da entidade poderia se dar através de comissões constituídas
pela entidade para tratar de temas específicos. A presença ou não de comissões é
apreendida no gráfico que segue:

37
Gráfico 19. Existência de comissão em funcionamento na entidade – Porto Alegre/2003
Sua entidade
possui alguma
comissão ativa?
1 Sim
0,6% Não
NSA/NR

78
88 46,71%
52,69%

Um pouco menos da metade das entidades pesquisadas apresentava, no período


da pesquisa, algum tipo de comissão em funcionamento. Isto indica que este não é um
formato organizativo que abranja a maior parte destas entidades. Nestas, ao contrário,
tende a predominar a concentração das ações entre os membros das diretorias eleitas
(especialmente, na figura do presidente).
Desdobrando esta informação para identificar os tipos de comissão mais
freqüentes, chega-se aos seguintes números:

38
Quadro 11. Freqüência das comissões em funcionamento nas entidades – Porto
Alegre/2003
Comissão Freqüência
Habitação/Urbanização/Regularização Fundiária 15
Saúde
14
Obras
Transporte/Trânsito 9
Cultura
7
Esporte e Lazer
Comissão de Rua/de Moradores
Delegados/OP
6
Plano Diretor/Planejamento/Desenvolvimento
Eventos/Promoções
Temas Específicos 4
Social
3
Assistência Social
Praças/Parques
DMAE/Água 2
Meio Ambiente
Mulheres
Visitas
Lixo
Trabalho
Arrecadação de Fundos 1
Áreas de Risco
Reivindicações
Jovens
Segurança

Os dados do Quadro mostram que os principais temas em torno dos quais são
formadas comissões específicas nas entidades comunitárias são
Habitação/Urbanização/Regularização Fundiária, Saúde e Obras. O primeiro tema
indica um foco importante da atuação das entidades comunitárias de Porto Alegre
(particularmente aquelas constituídas nas vilas populares marcada pela irregularidade na
posse da terra), que se refere às iniciativas para a legalização e urbanização das áreas de
habitação popular. Além do problema objetivo da ameaça de perda da moradia vivido
em diversas vilas, esta questão da Habitação/Urbanização/Regularização Fundiária
também foi objeto de intensa atuação de lideranças comunitárias e ONGs da cidade, que
viam nesta questão um tema que, além de problematizar a propriedade privada do solo
urbano, teria um grande potencial de mobilização popular (Silva, 2004).
O segundo tema que se destaca é a Saúde, indicando, por um lado, uma certa
tradição de envolvimento de entidades comunitárias de algumas regiões da cidade com
esta temática (Réos, 2003). Este envolvimento, além da existência de Comissões de
Saúde nas entidades, vai se expressar na participação de representantes destas entidades
nas instâncias de participação do SUS (Comissões de Postos de Saúde, Conselhos

39
Locais de Saúde e Conselho Municipal de Saúde). Por outro lado, observa-se que a
constituição de um setor específico para lidar com o tema da Saúde nas entidades se
deve, também, à indução de programas governamentais, como o Programa de Saúde da
Família (PSF). Na medida em que membros das entidades passam a atuar como agentes
comunitários nas equipes do PSF ou junto aos Postos de Saúde, existe uma certa
tendência de que a temática da saúde passa a fazer parte do cotidiano das entidades.
Por fim, o terceiro tema que mais gera a constituição de comissões nas entidades
é Obras. Ou seja, as entidades formam um grupo específico de representantes para
acompanhar, fiscalizar e avaliar a execução de obras públicas nas suas áreas de atuação.
Em geral, estas comissões de obras fazem o acompanhamento daquelas obras definidas
pela população através do OP.
Observando aqueles temas que geraram um menor número de comissões é
possível perceber alguns aspectos importantes. Entre estes temas encontram-se alguns
dos temas que, nos últimos anos, têm uma presença central na agenda do debate público
na cidade: meio ambiente, trabalho e, sobretudo, segurança. No entanto, os números
mostram que, apesar da relevância dos temas, eles parecem não ter a mesma
centralidade na atuação das entidades. Particularmente no caso da segurança, é evidente
a discrepância entre o grau de interesse social neste tema e o grau em que este tema é
objeto de uma intervenção das entidades. Tal discrepância indica que, por diversos
fatores a serem investigados, um determinado problema social não se converte,
automaticamente, em um problema a ser enfrentado pelas entidades comunitárias. Na
verdade, estas “filtram”, no universo de temas passíveis de serem objeto de sua ação,
alguns nos quais se detém, enquanto outros acabam sendo secundarizados ou, até
mesmo, desconsiderados.

Caracterização da atuação das entidades comunitárias pesquisadas

Caracterizada a estrutura existente nas entidades comunitárias e sua organização


e funcionamento interno, torna-se importante enfocar como estas atuam. Esta
caracterização pode ser realizada, inicialmente, a partir das informações sobre a
distribuição das ações das entidades em quatro tipos de atividades: recreativas,
educativas, reivindicativas e atuação institucional.

40
9 Atividades recreativas –
Gráfico 20. Realização de festa ou churrasco nos últimos doze meses – Porto
Alegre/2003
Realizou festa ou
churrasco
Sim
1 Não
0,6% NS/NR

68
40,72%
98
58,68%

Gráfico 21. Realização de atividades para crianças nos últimos doze meses – Porto
Alegre/2003
Realizou atividades
para crianças
Sim
1 Não
0,6% NS/NR

55
32,93%

111
66,47%

De acordo com estes dados, observa-se que uma parcela significativa das
entidades comunitárias tende a desenvolver atividades de recreação e confraternização
entre os moradores: quase 60% delas realizam festas e dois terços fazem atividades para
as crianças (geralmente em datas comemorativas, como Dia das Crianças, Natal,
Páscoa, São João etc.). Isto permite avaliar que estas entidades podem apresentar, em
muitos casos, um papel significativo na constituição de vínculos entre os moradores, na
medida em que propiciam um espaço para o encontro dos mesmos. Estes vínculos, por
sua vez, podem ser um recurso importante tanto para a disseminação de informações no
âmbito da comunidade quanto para a viabilização de iniciativas de organização e

41
mobilização dos moradores em determinadas conjunturas. O quanto estas atividades
recreativas conseguem de fato forjar este “capital social”, no entanto, é algo que exigiria
uma investigação qualitativa, especialmente através da observação direta deste tipo de
atividade.

9 Atividades educativas –
Gráfico 22. Realização de atividade educativa nos últimos doze meses – Porto
Alegre/2003
Realizou Atividade
Educativa
Sim
1 Não
0,6% NS/NR

79
87 47,31%
52,1%

Gráfico 23. Realização de debates nos últimos doze meses – Porto Alegre/2003
Realizou debates
Sim
Não
1 NS/NR
0,6%

71
42,51%
95
56,89%

Além do papel recreativo e agregador, observa-se que uma parcela significativa


das entidades comunitárias (um pouco menos da metade delas) tende a desenvolver
atividades educativas nas vilas e bairros onde atuam. Estas atividades podem ser de
prestação de serviços de educação (seja infantil, através das creches comunitárias, seja

42
educação para jovens e adultos, através da manutenção de turmas do MOVA8) ou
atividades (in)formativas através da realização de encontros, seminários e debates sobre
temas de interesse comunitário. Através destas atividades, constitui-se uma rede
importante de transmissão de informações, opiniões e conhecimentos, que, na medida
em que se ancora e se articula com as redes de sociabilidade existente no âmbito das
comunidades, pode ter um papel importante na conformação de uma esfera pública que
reflita, discuta e opine sobre temas e problemas locais, regionais e/ou municipais.

9 Atividades reivindicativas –

Gráfico 24. Realização de abaixo-assinado nos últimos doze meses – Porto Alegre/2003
Realizou abaixo-
assinado
Sim
1 Não
0,6% NS/NR

53
31,74%

113
67,66%

8
O Movimento de Alfabetização (MOVA), foi implantado pela Prefeitura de Porto Alegre no ano de
1997. Os alfabetizadores do MOVA são indicados por entidades sociais e contratados pela Prefeitura
através de convênio. As turmas do MOVA funcionam nas próprias entidades ou em Igrejas, sindicatos e
residências de moradores. Para maiores informações sobre este Programa ver o sítio:
http://www2.portoalegre.rs.gov.br/smed/default.php?p_secao=72

43
Gráfico 25. Realização de protesto ou reivindicação nos últimos doze meses – Porto
Alegre/2003
Realizou protesto
ou reivindicação
Sim
1 Não
0,6% NS/NR

63
37,72%

103
61,68%

Gráfico 26. Realização de denúncia para imprensa nos últimos doze meses – Porto
Alegre/2003
Realizou denúncia
para imprensa
Sim
1 Não
0,6% 28 NS/NR
16,77%

138
82,63%

Um papel tradicional desenvolvido pelas entidades comunitárias é a


identificação, formulação e expressão pública de demandas dos moradores. Conforme
diversas pesquisas já demonstraram (Baierle, 1992; Fedozzi, 2000; Ferretti, 1984;
Guareschi, 1980; Silva, 2001 e 2002), Porto Alegre possui um importante histórico de
associativismo reivindicativo, o qual teve uma intervenção marcante nas mobilizações e
protestos que marcaram a redemocratização do país, a partir do final dos anos 70.
Os dados apresentados acima indicam que, em certa medida, ainda se mantém
uma tradição de mobilização reivindicativa entre as entidades comunitárias de Porto

44
Alegre: quase 40% delas fizeram algum tipo de protesto ou reivindicação pública no
período pesquisado. Ou seja, apesar da existência de canais institucionais com uma
significativa capacidade de absorção das reivindicações sociais (especialmente o
Orçamento Participativo), observa-se ainda a presença de ações reivindicativas por fora
destes canais.
Por outro lado, os dados acima indicam um significativo declínio de uma das
práticas mais tradicionais das entidades comunitárias: a realização de abaixo-assinados.
Embora pouco mais de 30% das entidades ainda lancem mão deste tipo de instrumento
de reivindicação, é significativo que quase 70% delas tenham deixado de utilizá-lo
como forma de construção e encaminhamento de suas demandas. Este declínio do uso
do abaixo-assinado pode indicar a institucionalização e publicização dos canais e
procedimentos de encaminhamento das demandas sociais, através da rede de
participação social constituída na cidade, com a conseqüente perda de eficácia e, assim,
de prestígio das formas mais particularistas de acesso aos bens e serviços públicos.
Por fim, os dados dos gráficos acima indicam uma utilização pouco significativa
de um dos canais de expressão mais poderosos na sociedade contemporânea, que é a
mídia. Ou seja, menos de 20% das entidades utiliza a mídia como instrumento de
expressão pública de suas reivindicações, indicando um distanciamento entre os meios
de comunicação da cidade e a rede associativa formada pelas entidades comunitárias.
Em que medida este distanciamento expressa um fechamento da mídia às reivindicações
sociais (especialmente aquelas das camadas populares), uma rejeição das lideranças
comunitárias em manterem contato com a imprensa ou, ainda, um desconhecimento
recíproco, é algo a ser avaliado com estudos mais aprofundados. Parece possível
levantar a hipótese, no entanto, de que há uma rede formada pelo associativismo
comunitário de Porto Alegre, pela qual circula um volume significativo de informações,
que conforma uma esfera pública com relativa autonomia em relação à atuação da
mídia.

9 Atuação institucional –

45
Gráfico 27. Realização de reuniões com Secretarias nos últimos doze meses – Porto
Alegre/2003
Realizou reunião
com Secretarias
Sim
1 Não
0,6% NS/NR

51
30,54%

115
68,86%

Gráfico 28. Realização de reunião com Prefeito ou Vice-Prefeito nos últimos doze meses
– Porto Alegre/2003
Realizou reunião
com Prefeito ou
Vice
1 Sim
0,6% Não
34 NS/NR
20,36%

132
79,04%

46
Gráfico 29. Realização de reunião com Vereador ou Deputado nos últimos doze meses –
Porto Alegre/2003
Realizou reunião
com Vereador ou
Deputado
1 Sim
0,6% Não
NS/NR
39
23,35%

127
76,05%

Gráfico 30. Realização de reunião com órgãos policiais nos últimos doze meses – Porto
Alegre/2003
Realizou reunião
com Polícia
Sim
1 Não
0,6% NS/NR

67
40,12%

99
59,28%

47
Gráfico 31. Participação no Orçamento Participativo nos últimos doze meses – Porto
Alegre/2003
Participação no
Orçamento
Participativo?
8 Sim
4,79% Não

159
95,21%

Gráfico 32. Prestação de serviço de interesse público nos últimos doze meses – Porto
Alegre/2003
Desenvolve serviço
de interesse
público
Sim
Não

83 84
49,7% 50,3%

Apesar da atuação reivindicativa por fora dos canais institucionais ainda manter
uma certa presença entre as entidades comunitárias de Porto Alegre, observa-se
claramente, desde o final dos anos 80, uma crescente “institucionalização” da atuação
destas entidades. Por um lado, esta “institucionalização” expressa o aprofundamento de
uma relação mais ou menos próxima (que não significa harmônica) que
tradicionalmente existe entre o associativismo comunitário e as instituições
governamentais, na medida em que a quase totalidade destas entidades apresenta como
objetivo central da sua atuação a busca do atendimento de suas demandas pelos

48
governos. Por outro lado, no entanto, observa-se que a “institucionalização” dos anos 90
e do início do século XXI se caracteriza por uma nova relação entre as organizações
sociais e as instituições governamentais, na qual as primeiras passam, crescentemente, a
ocupar um lugar permanente no processo de tomada de decisão e/ou na execução de
serviços de interesse público.
Observando os dados dos gráficos acima, identifica-se uma significativa
interação direta entre as entidades comunitárias e diversos representantes das
instituições governamentais. Em primeiro lugar, em termos de maior volume de
relacionamento, quase 70% das entidades realizaram, no período de um ano, reuniões
com secretarias do governo municipal. Este alto percentual indica a existência de uma
relação bastante intensa entre aquelas entidades e os órgãos que são os responsáveis
diretos pela execução das políticas e ações governamentais.
Em segundo lugar, encontram-se as atividades reunindo entidades comunitárias
e representantes dos aparatos policiais, que foram realizadas por 40% das entidades.
Este número significativo de reuniões com representantes da polícia pode ser tomado
como um indicador do aumento da preocupação com crescimento da criminalidade
violenta na cidade, que tem afetado diretamente a atuação das entidades e lideranças
comunitárias de Porto Alegre (Fonseca, 1993; Silva, 2003).
Em terceiro lugar, pouco menos de um quarto das entidades realizaram reuniões
com representantes do Legislativo, seja estadual (deputados) seja municipal
(vereadores). Apesar de ser um número significativo, quando comparado ao percentual
de entidades que mantiveram reuniões com secretarias (quase 70%) identifica-se uma
presença bem menos expressiva dos parlamentares como interlocutores das entidades
comunitárias. Esta posição pode ser expressão de uma perda de importância dos
parlamentares como mediadores no acesso aos bens e serviços públicos, em virtude da
consolidação de mecanismos institucionalizados de participação, conforme tem sido
abordado pela literatura sobre a dinâmica política de Porto Alegre (Dias, 2002). Tal
hipótese, no entanto, exigiria análises mais aprofundadas.
Por fim, mais de um quinto das entidades mantiveram reuniões com o Prefeito
e/ou Vice-Prefeito. Apesar de ser a relação com menor valor percentual, é significativo
que 20% das entidades comunitárias pesquisadas tenham tido pelo menos um contato
direto, no período de um ano, com os dirigentes máximos do governo municipal. Esta
freqüência de contato indica uma abertura das forças políticas à frente do governo

49
municipal na época da pesquisa (2003) para uma interlocução direta com setores da rede
associativa comunitária.
Além desta interação direta com representantes governamentais, os gráficos
acima informam sobre duas outras formas de atuação institucional que adquiriram
grande centralidade para as entidades comunitárias de Porto Alegre. Conforme os dados
do gráfico 31 percebe-se que o Orçamento Participativo se constituiu em um espaço de
atuação para praticamente toda a rede de entidades comunitárias: mais de 95% das
entidades entrevistadas indicaram que participaram ou participam do OP. A distribuição
do tempo de participação entre as entidades pesquisadas encontra-se no seguinte
gráfico:
Gráfico 33. Período de ingresso das entidades no Orçamento Participativo – Porto
Alegre/2003
Período em que
ingressou no OP
Desde o início
8
4,79% Durante a
8 Gestão Olívio
4,79% (1990-1992)
16 Durante a
9,58% 48 Gestão Tarso
28,74% (1993-1996)
Durante a
Gestão Pont
(1997-2000)
Durante a
Gestão
Tarso/Verle
44 (2001-2003)
26,35% 15
Não participou
8,98% do OP
NS/NR
28
16,77%

Estes dados mostram que a participação no OP encontra-se relativamente


consolidada entre as entidades comunitárias, na medida em que praticamente 55%
destas apresentavam sete anos ou mais de participação no período da pesquisa (sendo
que quase 30% informaram que participavam do OP desde 1990, ou seja, vinham
participando por quatorze anos).
Assim, a participação no OP se tornou a atividade mais disseminada entre as
entidades comunitárias, se consolidando como o espaço privilegiado de
encaminhamento das demandas destas entidades. Esta consolidação do OP, por sua vez,
parece estar diretamente relacionada à capacidade de obter, através da participação,
respostas para aquelas demandas. Esta “eficácia” da participação se expressa no
seguinte gráfico:

50
Gráfico 34. Obtenção de obra ou benefício com a participação no Orçamento
Participativo – Porto Alegre/2003
Sua entidade
obteve alguma
8
obra ou benefício
4,79%
com esta
3 participação no
1,8% OP?
23 Sim
13,77% Não
NSA/NR
Não participou

133
79,64%

Praticamente 80% das entidades pesquisadas informaram que já haviam obtido


alguma obra ou serviço através do OP, o que demonstra que este canal de participação
efetivamente responde, mesmo que parcialmente, às demandas da população que dele
participa. Tal aspecto, sem dúvida, foi um dos fatores fundamentais tanto para a
legitimação do OP quanto para sua constituição como espaço privilegiado de
intervenção das entidades comunitárias (Abers, 2000; Silva, 2001).
Na medida em que o OP criou uma dinâmica (o “ciclo do OP”) que se estende
ao longo de todo ano, presume-se que ele tenha passado a pautar de forma importante a
dinâmica e a forma de atuação das entidades. Neste sentido, um dos aspectos que podem
ser destacados é que, ao criar momentos e espaços de encontro, convivência,
articulação, negociação, disputas e discussão entre um amplo leque de organizações
sociais que nele intervêm (Plenárias Regionais, Fóruns de delegados, Conselho do OP),
o OP parece ter se constituído como instrumento importante na constituição e
reprodução dos vínculos que tecem a rede associativa de Porto Alegre. Isto pode ser
apreendido através da seguinte informação:

51
Gráfico 35. Ocorrência de votação conjunta com outras entidades no Orçamento
Participativo – Porto Alegre/2003
A sua AMs votou
junto com alguma
outra AMs no OP
6 do ano passado?
11 3,59% SIM
6,59% Não
Não participou
NSA/NR

37
22,16%

113
67,66%

Os dados do gráfico indicam que o OP propicia um espaço importante de


articulação entre as entidades que dele participam: quase 70% das entidades pesquisadas
informaram que se articulavam com outras entidades para votarem juntas nas
deliberações do OP. Ou seja, ao contrário de ser um mero espaço de disputa entre
grupos movidos por interesses particularistas (que, obviamente, sempre estão presentes),
o OP de Porto Alegre também se constituiu em um fórum marcado por um intenso
processo de negociação, de construção de acordos, de alianças táticas e de articulações
diversas, no qual determinadas demandas passam a ser defendidas por outros segmentos
que não aqueles diretamente interessadas nas mesmas. Mesmo que, no curto prazo, isto
signifique que alguns participantes precisam abrir mão de suas demandas em prol do
atendimento das de outros participantes, no longo prazo tende há ocorrer uma ampliação
da possibilidade de atendimento das mesmas na medida que se passa a contar com
apoios que vão além do círculo estreito daqueles que compartilham tais demandas. Em
termos hipotéticos, pode-se afirmar que a possibilidade desta dinâmica “inclusiva” está
relacionada pelo menos a três aspectos: a efetividade do processo, que cria um horizonte
de expectativas de que, pelo menos no longo prazo, as demandas podem ser satisfeitas;
a continuidade do processo, que permite a postergação do atendimento das demandas
em função de uma expectativa de atendimento futuro; a atuação de lideranças movidas
por determinados princípios político-ideológicos, as quais incorporam aos processos de
tomada de decisão outros elementos além da mera busca imediata de bens e serviços
públicos.

52
Em virtude desta disseminação e consolidação, pode-se observar que, em
determinadas regiões, as instâncias do OP tenderam, ao longo do tempo, a substituir
e/ou se fundir com as instâncias de auto-organização social (especialmente os
Conselhos Populares e Uniões de Vilas), gerando uma certa indeterminação entre os
espaços de organização da sociedade civil e os espaços de participação institucional. O
mapeamento de como este processo se expressa nas distintas regiões da cidade e suas
implicações em termos da conformação da rede associativa municipal e suas relações
com as instituições e atores estatais, é algo que deverá ser objeto de maior investigação.
Além da participação no OP, o Gráfico 32 indica que um outro tipo de atividade
apresenta um peso importante nas práticas desenvolvidas pelas entidades comunitárias
de Porto Alegre: a prestação de serviços de interesse público. Praticamente metade das
organizações entrevistadas prestava, em 2003, algum tipo de serviço de interesse
público. Entre os principais serviços prestados, destacam-se:

Gráfico 36. Prestação de serviço de interesse público pela entidade: creche comunitária
– Porto Alegre/2003
Creche
Comunitária
Sim
Não
26 Não presta
15,57% serviço

83
49,7%

58
34,73%

53
Gráfico 37. Prestação de serviço de interesse público pela entidade: MOVA – Porto
Alegre/2003
MOVA
Sim
Não
Não presta
serviço

46
27,54%

83
49,7%

38
22,75%

Gráfico 38. Prestação de serviço de interesse público pela entidade: atividades


assistenciais – Porto Alegre/2003
Atividades
assistenciais
Sim
Não
12
7,19% Não presta
serviço

83
49,7% 72
43,11%

Conforme os dados apresentados nos gráficos acima, observa-se que predomina


a prestação de serviços de interesse público vinculados a determinados programas ou
políticas governamentais: as creches comunitárias estavam presentes em mais de 15%
das entidades pesquisadas e o MOVA, que foi o tipo de serviço mais referido pelos
entrevistados, estava presente em quase 30% das entidades. Por outro lado, as atividades
assistenciais (distribuição de alimentos, auxílio a necessitados etc.), que foi o terceiro
tipo de atividade mais referida, limitavam-se a pouco mais de 7% das entidades
comunitárias. Mesmo com o possível viés causado pela tendência de destacar mais os

54
serviços que envolvem maior formalização e institucionalização (como as Creches e o
MOVA), em detrimento das atividades voluntárias informais (como são muitas das
atividades assistenciais), é significativa a importância adquirida por estes serviços na
atuação cotidiana de muitas entidades comunitárias pesquisadas.
Os dados obtidos na pesquisa permitem identificar que este envolvimento das
entidades na prestação de serviços de interesse público é algo que vem crescendo de
forma significativa no período mais recente. Tal fato é ilustrado pelas informações do
gráfico abaixo:
Gráfico 39. Tempo de prestação de serviço de interesse público pela entidade – Porto
Alegre/2003
Quanto tempo
desenvolve este
serviço
Até 2 anos
5
5,95% 3 a 5 anos
6 a 10 anos
19
22,62% Mais de 10 anos
NS/NR

28
33,33%

19
22,62%

13
15,48%

Os dados do gráfico indicam que apenas um terço das 84 entidades que


desenvolvem serviços de interesse público prestam estes serviços por uma década ou
mais. A maior parte das entidades (mais de 60%) passou a prestar tais serviços na última
década (ou seja, a partir do início dos anos 90), sendo que quase 45% das 84 entidades
apresentavam, na época da pesquisa (2003), menos de cinco anos de prestação destes
serviços. Assim, pode-se identificar um crescente envolvimento das entidades
comunitárias de Porto Alegre na provisão de serviços de interesse público na cidade,
fazendo com que, em algumas áreas como a educação infantil, estas entidades se
constituam em agentes importantes na garantia do acesso de parcelas significativas da
população a tais serviços.
A forma como se dá o financiamento destes serviços pode ser observada no
gráfico abaixo:

55
Gráfico 40. Existência de convênio para o financiamento da prestação de serviço de
interesse público pela entidade – Porto Alegre/2003
Sua entidade
possui algum
convênio para a
1 realização desta(s)
1,19% atividade(s)?
Sim
17
Não
20,24%
NSA/NR

66
78,57%

Segundo este gráfico, quase 80% das entidades que prestam serviços de interesse
público (ou seja, 66 das 84 entidades que prestam estes serviços) possuem algum tipo de
convênio para a sustentação destas atividades. Isto indica que tais atividades tendem a
se sustentar, na sua grande maioria, em fontes de recursos externos às comunidades e
que apresentam alguma permanência ao longo do tempo. São poucos os casos (em torno
de 20%) nos quais as fontes de recursos não são formalizadas através de convênios ou
projetos, mas sim ocorrem através de colaborações voluntárias de membros das próprias
comunidades e/ou de doações externas.
Na medida em que os convênios sustentam a quase totalidades dos serviços de
interesse público prestado pelas entidades comunitárias, resta saber com quem são
celebrados tais convênios. Tal informação encontra-se no seguinte gráfico:

56
Gráfico 41. Instituições com quem a entidade tem convênio para a prestação de serviço
de interesse público – Porto Alegre/2003
1 Com quem tem
1,52% convênio
Prefeitura
1 Municipal
1,52%
Órgãos
1 Governamentais
1,52%
Empresas
Privadas
Organizações
Religiosas

63
95,45%

O gráfico mostra que a quase totalidade dos convênios existentes (mais de 95%)
são realizados entre as entidades comunitárias e a Prefeitura Municipal de Porto Alegre.
Surpreendentemente, na medida em que se observa uma crescente presença na mídia do
tema da “responsabilidade social”, é quase nula a existência de convênios com
instituições públicas não vinculadas ao governo municipal, empresas privadas e
organizações religiosas.
Esta significativa presença das entidades comunitárias na prestação serviços de
interesse público, ao mesmo tempo em que a manutenção de tais serviços depende
quase que exclusivamente da obtenção de recursos junto ao governo municipal, traz à
discussão o tema da autonomia das organizações sociais perante o Estado. Na medida
em que a prestação de serviços vem se tornando um foco central de atuação das
entidades comunitárias (sendo, em muitos casos, sua atividade principal) e a
viabilização de tais serviços implica no acesso a recursos públicos municipais, não
haveria um risco crescente de que as entidades tenham que evitar relações mais
conflitivas com o governo de forma a não verem ameaçados os recursos dos quais
dependem? Na medida em que as entidades passam a ser fiscalizadas pelos órgãos
governamentais responsáveis pelos convênios, devendo se adequar à legislação vigente
para poderem desenvolver os serviços e receber os recursos, não existiria uma ameaça
de ingerência e controle do poder público sobre a dinâmica de atuação das entidades?
Estas são questões bastante pertinentes em virtude de um longo histórico de repressão e
controle do Estado sobre as organizações sociais no Brasil, devendo ser objeto de

57
futuras análises para ver quais as implicações que a expansão da prestação de serviços
de interesse público pelas entidades sociais tem gerado para a autonomia destas
entidades.
Para finalizar esta caracterização da atuação das entidades pesquisadas, um
último aspecto a ser abordado se refere às formas de articulação entre as mesmas, as
quais configuram isto que foi denominado de rede associativa comunitária de Porto
Alegre. Além da informação já apresentada anteriormente sobre as articulações entre as
entidades para intervenção no OP, a qual mostra uma significativa ocorrência de
alianças entre as entidades para as votações no OP, outra informação que permite
visualizar algumas características desta rede associativa é presença de relações pessoais
entre as lideranças das entidades, conforme o gráfico abaixo:
Gráfico 42. Existência de vínculos pessoais entre membros de diretorias de distintas
entidades comunitárias – Porto Alegre/2003

Você tem
conhecidos em
diretorias de outras
3 AMs da região?
12 Sim
1,8%
7,19% Não
NSA/NR

152
91,02%

Mais de 90% dos entrevistados declararam que possuem algum tipo de vínculo
pessoal com indivíduos que participam das diretorias de outras entidades da região na
qual se inserem. Este aspecto ficou evidente no trabalho de campo, quando muitos
entrevistados se mostraram uma fonte fundamental para obter contato com participantes
de outras entidades que deveriam ser entrevistadas.
O contato entre as lideranças comunitárias de diversas vilas e bairros é, em
grande medida, propiciado pela participação destas lideranças nos diversos fóruns
institucionais (Fóruns de Delegados do OP, Conselho do OP, Conselhos de Políticas
Públicas, Comitês Gestores de Programas Governamentais etc.) e sociais (Conselhos

58
Populares, Uniões de Vilas, Fóruns de Entidades etc.). A freqüência desta participação
encontra-se no seguinte gráfico:
Gráfico 43. Participação da entidade em fóruns institucionais ou sociais – Porto
Alegre/2003

A entidade
participa de algum
fórum institucional
ou social
24 Sim
14,37% Não

143
85,63%

Mais de 85% das entidades pesquisadas participam de algum fórum institucional


e/ou social, indicando um alto grau de inserção destas entidades em fóruns que
permitem o contato com outras entidades, o acesso a informações diversas, a construção
de vínculos pessoais e/ou institucionais etc.
Esta informação pode ser qualificada a partir da diferenciação entre os dois tipos
de fóruns (institucional e social) e alguns sub-tipos que os integram. Começando pelos
fóruns institucionais, os gráficos abaixo distinguem entre a participação em instâncias
do OP e a participação em outros fóruns institucionais:

59
Gráfico 44. Participação da entidade nas instâncias do Orçamento Participativo – Porto
Alegre/2003
Participa nas
instâncias do OP
Sim
Não
24 NSA
14,37%

85
50,9%
58
34,73%

Gráfico 45. Participação da entidade em fóruns institucionais (exceto OP) – Porto


Alegre/2003
Participa de fóruns
institucionais
(exceto o OP)
Sim
24 Não
14,37% NSA

73
43,71%

70
41,92%

Os gráficos mostram que os fóruns institucionais tendem a ocupar uma posição


importante como espaços de intervenção das entidades comunitárias. Praticamente a
metade delas informou que tinha representante, no período da pesquisa, em alguma das
instâncias do OP (especialmente nos Fóruns de Delegados)9. Além disto, quase 45%
informaram que participavam de algum outro fórum institucional de âmbito

9
Na verdade, a participação das entidades comunitárias nas instâncias do OP parece estar subestimada
nos dados apresentados. Tal avaliação se deve não apenas ao fato de um número muito maior de
entidades (mais de 95%) participar do OP, mas, especialmente, pelo fato de que 82% das entidades
declararam terem eleito delegados no OP de 2002.

60
local/regional (CLIS, CRAS, Comissão de Praça etc.) ou municipal (CMS, CMAS,
COMATHAB etc.).
Em termos dos fóruns sociais, as informações disponíveis são as seguintes:
Gráfico 46. Participação da entidade em articulação regional ou fóruns de entidades –
Porto Alegre/2003

Participa de
articulação regional
ou fórum de
entidades
24 Sim
14,37% Não
NSA

67
40,12%

76
45,51%

Gráfico 47. Participação da entidade na União das Associações de Moradores de Porto


Alegre – Porto Alegre/2003
Participa da
UAMPA
Sim
Não
24 NSA
14,37% 33
19,76%

110
65,87%

De acordo com os dados dos gráficos, observa-se que 40% das entidades estão
inseridas em alguma articulação regional de entidades ou em algum fórum de entidades
relacionado a uma determinada áreas de política pública (assistência social, criança e
adolescente etc.). É significativo que, apesar do número relativamente elevado de

61
entidades inseridas em fóruns sociais, o percentual desta inserção fique abaixo daquele
observado em relação aos fóruns institucionais. Esta é mais uma informação que
corrobora à hipótese, já apontada anteriormente, sobre uma significativa
“institucionalização” das entidades comunitárias.
Outra informação significativa é o número relativamente baixo da inserção das
entidades comunitárias naquela que seria sua entidade de representação coletiva: apenas
20% das entidades declararam participar da UAMPA. Comparando este dado com o da
inserção das entidades em outros fóruns sociais, identifica-se a manutenção de uma
tendência, já apontada em outras análises (Baierle, 1992; Silva, 2001), de perda de
importância da UAMPA no associativismo comunitário, ao mesmo tempo em que
cresce a importância de outros fóruns sociais e institucionais de inserção e intervenção
das entidades.
Além dos contatos pessoais e da participação em diferentes fóruns sociais e
institucionais, outro indicador da rede formada pelo associativismo comunitário em
Porto Alegre se expressa no desenvolvimento de atividades conjuntas entre as entidades.
Esta informação encontra-se no gráfico abaixo:

Gráfico 48. Realização de trabalho ou atividade com outra entidade – Porto Alegre/2003
Realizou trabalho
ou atividade com
outra entidade
1 Sim
0,6% Não
NS/NR
42
25,15%

124
74,25%

De acordo com este gráfico, identifica-se uma expressiva tendência de


desenvolvimento de atividades conjuntas entre as entidades comunitárias da cidade:
praticamente três quartos das mesmas informaram que já haviam realizado algum tipo
de ação conjuntamente com outra(s) entidade(s).

62
Considerações finais

Para concluir o presente relatório, esta seção busca sintetizar alguns aspectos
destacados na caracterização do associativismo comunitário de Porto Alegre, de forma a
identificar algumas continuidades e mudanças neste tipo de prática organizativa que
caracteriza de forma marcante a sociedade civil porto-alegrense. Em primeiro lugar, os
dados apresentados indicam que o associativismo comunitário, baseado em associações
de moradores e entidades similares, mantém-se como um modelo de organização
importante, especialmente entre os moradores dos bairros e vilas populares da cidade.
Neste sentido, observa-se a manutenção da dinâmica de criação de novas entidades
comunitárias ao longo dos anos 90 e nos primeiros anos do século XXI. Tal crescimento
quantitativo das entidades comunitárias corrobora a interpretação de que a configuração
política da cidade neste período, marcada por mudanças significativas na forma de
relação entre as organizações sociais e o poder público municipal, tendeu a estimular as
práticas associativas. Ou seja, as organizações sociais de Porto Alegre (entre elas, as
organizações comunitárias) tenderam a assumir um papel importante na mediação entre
as demandas e propostas da sociedade civil da cidade e os novos espaços de
participação política (direta ou por representação) constituídos a partir da segunda
metade dos anos 80 (Conselhos, OP, Comitês Gestores etc.), estimulando, assim, a
constituição de novas organizações e o conseqüente adensamento do tecido associativo
da cidade.
Esta dinâmica de crescimento quantitativo, que poderia levar a um diagnóstico
apressado de fortalecimento da sociedade civil, precisa ser articulada a uma análise que
apreenda as mudanças qualitativas do associativismo porto-alegrense, para que se
chegue a uma interpretação mais qualificada de sua configuração recente. Os dados
apresentados mostram uma mudança expressiva que pode ser sintetizada na hipótese de
uma crescente “institucionalização” dos atores sociais de Porto Alegre nos últimos anos.
Retomando a história do associativismo comunitário de Porto Alegre, pode-se
identificar dois padrões de relação com as instituições e os atores políticos: de um lado,
a tendência, presente tanto na tradição populista-clientelista quanto na tradição
autoritária-clientelista, de uma inserção subordinada das entidades comunitárias no jogo
político, através da barganha de apoio eleitoral em troca do acesso a determinados bens
e serviços públicos; de outro, a tendência mais recente, forjada no processo de

63
redemocratização do país, de uma ação de confrontação das entidades comunitárias com
os atores e/ou instituições políticos, buscando o acesso a bens e serviços públicos
através da pressão por fora dos canais institucionais (protestos, mobilizações de rua
etc.).
Os dados apresentados no relatório mostram que, ao lado destas duas formas
mais tradicionais de relacionamento sociedade civil-Estado (que, em maior ou menor
grau, ainda mantém-se), houve a introdução de novas formas de relacionamento: a
atuação em canais institucionais, através dos quais ocorre a reivindicação de bens,
serviços e políticas públicas; a formalização da prestação de serviços de interesse
público por parte das entidades sociais, que passam a receber recursos públicos para tal
atividade. Estas novas formas de relacionamento entre os atores sociais e o Estado
implicam numa significativa institucionalização da atuação dos atores e, especialmente
no caso da prestação de serviços, na sujeição das entidades a um conjunto de regras e
controles exercidos por instâncias governamentais.
A questão que se coloca em função destas mudanças se refere à capacidade de
manutenção da autonomia das organizações comunitárias frente a este processo de
institucionalização. Ou seja, na medida em que estas organizações enfrentam
dificuldades constantes do ponto de vista da sua manutenção financeira, ao mesmo
tempo que são atores fortemente marcados pelas disputas político-partidárias e as
decisões governamentais, há um risco significativo de que a institucionalização tenda a
se desdobrar em perda de autonomia. Tal perda de autonomia não significa,
necessariamente, a subordinação da entidade aos interesses de agentes políticos e/ou
governamentais, mas sim uma dificuldade de definição autônoma da agenda (no sentido
de temas e de dinâmicas de intervenção) da entidade. Em outras palavras, haveria uma
tendência crescente de que a atuação das entidades seja pautada pelas ações e propostas
dos agentes políticos e/ou governamentais, frente às quais as entidades atuariam mais de
forma reativa do que de forma protagonista.
No entanto, se este processo de institucionalização pode apresentar este risco de
perda de autonomia, por outro lado os dados apresentados indicam que esta mesma
institucionalização tem contribuído para um adensamento e fortalecimento dos vínculos
entre as entidades que conformam a rede associativa da cidade. Ao contrário de
períodos anteriores, quando a atuação tendia a ser mais fragmentada, formou-se na
cidade um conjunto de lideranças comunitárias cujo raio de ação transcende os âmbitos
mais restritos dos bairros/vilas e regiões, intervindo de fato no âmbito municipal. Esta

64
ampliação do grau de articulação de entidades pode propiciar recursos de diferentes
tipos (informação, conhecimento, apoio político, pessoal, material etc.), que são
fundamentais para viabilizar uma atuação autônoma das organizações comunitárias,
contrabalançando, assim, a tendência de subordinação identificação acima.
Frente a este quadro complexo, no qual apresentam-se tendências que indicam
um fortalecimento do associativismo comunitário (fundação de novas entidades, maior
articulação entre as mesmas, entre outros aspectos) e, ao mesmo tempo, uma maior
dependência governamental (dependência de recursos de convênios, concentração da
intervenção nos espaços institucionais, entre outros aspectos), conclui-se este relatório
com um alerta contra as análises simplistas que enfatizam determinados elementos em
detrimento de outros, perdendo, assim, a riqueza que caracteriza a rede associativa de
Porto Alegre e suas relações com as instituições e atores políticos. Apreender esta
complexidade é um elemento fundamental para o aprofundamento da democracia, na
medida em que auxilia os atores sociais e políticos refletirem de forma mais adequada
sobre as possibilidades e limites colocados para suas intervenções. Contribuir para esta
reflexão e, assim, para a construção democrática é o objetivo central deste relatório e, de
forma mais ampla, do próprio Observatório Social de Porto Alegre.

Bibliografia citada

ABERS, Rebecca. Do clientelismo à cooperação: governos locais, políticas


participativas e organização da sociedade civil em Porto Alegre. Cadernos da
CIDADE, n°7, volume 5, maio/2000.
BAIERLE, Sérgio Gregório. Um novo princípio ético-político: prática social e sujeito
nos movimentos populares urbanos em Porto Alegre nos anos 80. Campinas:
Unicamp, 1992. Dissertação (Mestrado em Ciência Política), Universidade de
Campinas, 1992.
BOSCHI, Renato Raul. A arte da associação: política de base e democracia no Brasil.
São Paulo: Vértice; Rio de Janeiro: IUPERJ, 1987.
DIAS, Márcia Ribeiro. Sob o signo da vontade popular. Belo Horizonte: Editora
UFMG; Rio de Janeiro: IUPERJ, 2002.
FEDOZZI, Luciano. O poder da aldeia: gênese e história do Orçamento Participativo
de Porto Alegre. Porto Alegre: Tomo Editorial, 2000.
FERRETTI, Rosemary Brum. Uma casa nas costas: análise do movimento social
urbano em Porto Alegre (1975-1982). Porto Alegre: UFRGS, 1984. Dissertação
(Mestrado em Sociologia), Curso de Pós-Graduação em Antropologia,
Sociologia e Política/Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1984.
FONSECA, Claudia Lee Williams. Bandidos e mocinhos : antropologia da violência
no cotidiano. Humanas, Porto Alegre Vol. 16, n. 2, p. 67-89, jul./dez. 1993.

65
GUARESCHI, Pedrinho. Urban social movements in brazilian squatter settlements.
Madison: University of Wisconsin-Madison, 1980. Tese (Doutorado em
Sociologia), Univesity of Wisconsin-Madison, 1980.
RÉOS, Janete. Participação em saúde na gerência distrital 5 de Porto Alegre
Glória/Cruzeiro/Cristal (1980-2000). Porto Alegre: UFRGS, 2003. (Dissertação
de Mestrado em Sociologia)
SADER, Eder. Quando novos personagens entraram em cena. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1988.
SILVA, Marcelo Kunrath. O problema habitacional e a democratização da gestão
municipal em Porto Alegre. In: DIAZ ORUETA, Fernando; LOURES
SEOANE, Maria Luisa (orgs.). Desigualdad social y vivienda. Alicante:
Editorial Club Universitário, 2004.
SILVA, Marcelo Kunrath. Criminalidade, violência e movimentos sociais: novos
obstáculos à organização popular. Trabalho apresentado no II Seminário
Internacional de Educação Intercultural, Gênero e Movimentos Sociais,
Florianópolis, abril de 2003.
SILVA, Marcelo Kunrath. Cidadania e exclusão: os movimentos sociais urbanos e a
experiência de participação na gestão municipal em Porto Alegre. Porto Alegre:
Editora da UFRGS, 2002.
SILVA, Marcelo Kunrath. Construção da “participação popular”: análise comparativa
de processos de participação social na discussão pública do orçamento em
municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre/RS. Porto Alegre: UFRGS,
2001. (Tese de Doutorado em Sociologia).

66
Base de Dados II
Pesquisa com 116 entidades participantes do Orçamento Participativo
(1999).

67
Apresentação

O presente relatório traz informações e análises produzidas a partir de um


questionário aplicado, em 1999, a 116 entidades de Porto Alegre que tiveram
intervenção no OP no ano de 1998. O trabalho de aplicação do questionário foi
realizado pelo autor do presente relatório, sendo que este levantamento de dados se
inseria na pesquisa “Sociedade Civil, Espaço Público e Poder Local: uma análise do
Orçamento Participativo em Belo Horizonte e Porto Alegre”, desenvolvida pelo Prof.
Leonardo Avritzer, da Universidade Federal de Minas Gerais, a quem agradeço a
disponibilização dos dados da pesquisa.
A construção da amostra de entidades a serem pesquisadas foi feita com base
nos registros dos participantes das plenárias regionais e temáticas do OP de 1998. A
partir dos dados constantes destes registros, foi elaborada uma lista de entidades que
tiveram membros presentes nas plenárias, chegando-se a uma relação de 1102
entidades. Baseado nesta relação de entidades, foi selecionada uma amostra de 120
entidades a serem entrevistadas. Esta amostra foi estratificada de acordo com a seguinte
tipologia de entidades e suas respectivas proporções naquele universo de 1102
entidades:
Tabela 1. Distribuição percentual das entidades da amostra, segundo tipo de
entidade.
Freqüência %
Entidades Comunitárias 88 73,2
Grupos/entidades religiosos 2 1,7
Associações Profissionais 3 2,5
Entidades educacionais 8 6,7
Entidades ligadas à saúde 3 2,5
Entidades sindicais 2 1,7
Associações esportivas/recreativas 5 4,2
Associações de amparo/caridade 2 1,7
Associações culturais 3 2,5
Cooperativas 4 3,3
Total 120 100

Selecionadas as entidades, um problema que se colocou para o desenvolvimento


da pesquisa foi o fato de que, com exceção principalmente das entidades comunitárias,
muitas das entidades sorteadas não se mostraram capazes de responder o questionário,
na medida em que não tinham tido uma participação coletiva/institucional no OP. Ao
contrário, a participação foi de membros da entidade, mas que não se constituíram em
representantes da mesma. Assim, a amostra inicialmente desenhada ficou prejudicada e

68
novas entidades foram incorporadas na amostra, distorcendo, em certa medida, a
proporcionalidade entre os tipos de entidades.
Feitas estas considerações introdutórias, passa-se à apresentação do material
constante deste relatório:
1. A relação das 116 entidades entrevistadas;
2. Informações e análises das principais variáveis do Banco de Dados.

Uma observação importante a ser feita, refere-se ao fato de que foi excluído do
banco de dados as informações existentes de identificação das entidades e dos
entrevistados. Este procedimento visa garantir o total anonimato das informações, tanto
no que se refere àqueles que as forneceram quanto em termos das entidades
pesquisadas. Cumpre-se, assim, com o princípio ético que deve orientar as relações de
confiança estabelecidas entre pesquisadores e pesquisados.

Relação das 116 entidades pesquisadas

Afro-Sul ODOMODE
Associação Comunitária Alto Embratel / Primeiro de Maio
Associação Comunitária Amigos do Bairro Sarandi
Associação Comunitária Bairro Vermelho
Associação Comunitária Beneficiente da Vila Cristal (Sanga da Morte)
Associação Comunitária Campos Velho
Associação Comunitária Colina Verde
Associação Comunitária da Extrema
Associação Comunitária da Vila dos Sargentos
Associação Comunitária da Vila Graciliano Ramos
Associação Comunitária da Vila Monte Cristo
Associação Comunitária do Bairro Teresópolis
Associação Comunitária do Lami
Associação Comunitária do Morro da Cruz
Associação Comunitária do Parque Araribóia
Associação Comunitária do Parque Tamandaré
Associação Comunitária dos Moradores da Vila Hipódromo-Taquari
Associação Comunitária dos Moradores da Vila Nossa Senhora de Fátima
Associação Comunitária dos Moradores da Vila Vargas
Associação Comunitária dos Moradores do Jardim Camaquã
Associação Comunitária dos Moradores do Parque dos Maias
Associação Comunitária Jardim Bento Gonçalves
Associação Comunitária Jardim das Oliveiras

69
Associação Comunitária Nova Gleba
Associação Comunitária Residencial Machado
Associação Comunitária Sargento Raimundo Corrêa da Silva
Associação da Vila Dois Irmãos
Associação das Federações Esportivas do RGS
Associação de Amigos e Moradores Nossa Senhora dos Navegantes
Associação de Desenvolvimento Comunitário da Vila Farrapos
Associação de Moradores Chácara de Banco
Associação de Moradores da Nova São Carlos
Associação de Moradores da Santa Helena
Associação de Moradores da Via Tarso Dutra
Associação de Moradores da Vila Agrovet
Associação de Moradores da Vila Asa Branca
Associação de Moradores da Vila Mapa
Associação de Moradores da Vila Nossa Sra. da Esperança
Associação de Moradores da Vila Pinto
Associação de Moradores da Vila Rio Branco
Associação de Moradores da Vila Safira Nova
Associação de Moradores da Vila São Francisco do Boqueirão
Associação de Moradores Divina Providência
Associação de Moradores do Bairro Ipanema
Associação de Moradores do Beco Adelar
Associação de Moradores do Serra Verde
Associação de Moradores Dona Teodora
Associação de Moradores e Amigos do Bairro Três Figueiras
Associação de Moradores Geraldo Santana e Ana Carvalho
Associação de Moradores Maria da Conceição
Associação de Moradores São Francisco de Assis
Associação de Moradores Soldado João Alfredo
Associação de Moradores Triângulo Esmeralda
Associação de Moradores Vila Grécia-Jardim Carvalho.
Associação de Moradores Vila Pedreira Bairro Cristal
Associação dos Amigos da Vila Jardim
Associação dos Moradores Amigos da Nova Chácara do Fumaça
Associação dos Moradores da Estrada dos Alpes
Associação dos Moradores da Quinta do Portal
Associação dos Moradores da Vila Batista Flores
Associação dos Moradores da Vila Colina do Prado
Associação dos Moradores da Vila do IAPI
Associação dos Moradores da Vila Figueira
Associação dos Moradores da Vila Icaraí II
Associação dos Moradores da Vila Jardim Alvorada
Associação dos Moradores da Vila Orfanotrófio II
Associação dos Moradores da Vila Parque Belém

70
Associação dos Moradores da Vila Renascença II
Associação dos Moradores Di Primo Beck II
Associação dos Moradores do Bairro Anchieta
Associação dos Moradores do Bairro Guarujá
Associação dos Moradores do Bairro Parque Humaitá
Associação dos Moradores do Chapéu do Sol
Associação dos Moradores do Conjunto Habitacional Alto Petropólis/Vila Tijuca
Associação dos Moradores do Núcleo Residencial Cefer 2
Associação dos Moradores e Amigos do Passo das Pedras.
Associação dos Moradores Jardim das Acácias
Associação dos Moradores Parque das Orquídeas
Associação dos Moradores Vila Parque Belém
Associação dos Moradores Vila São Vicente Martir
Associação dos Pescadores Artesanais do RS
Associação Evangélica Luterana de Caridade
Associação Jardim Leopoldina
Associação Moradores Vila Boa Vista
Associação Recreativa Carnavalesca União da Vila do IAPI
Associação Santo Agostinho
Centro comunitário da Vila do IAPI
Centro Comunitário São José Operário
Centro de desenvolvimento comunitário do Jardim Residencial Alto Petropólis
Clube de Mães da Vila União
Clube de Mães Lar das Laranjeiras
Clube de Mães Rubem Berta II
Conselho da Entidades da Vila Mapa
Conselho Popular da Grande Glória
Conselho Popular da Zona Norte
Conselho Popular Santa Tereza
Cooperativa Cre-Ser (Educação para portadores de deficiência)
Cooperativa Habitacional Diretor Pestana LTDA.
Cooperativa Habitacional Vale das Pedras
Creche Arco-Íris Encantado
Fraternidade Cristã de Doentes e Deficientes - FCD
GAPA-RS
Instituto Popular Arte e Educação
Liga de Amparo aos Necessitados
Movimento Educacional Especial
Núcleo Esperança
Sindicato dos Metroviários
Sindicato dos Municipários de Porto Alegre
Sindicato dos Taxistas de POA.
Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados no Estado do Rio Grande do
Sul

71
Sociedade Beneficiente e Recreativa Mocidade Independente da Lomba do Pinheiro
Sociedade Beneficiente, Recreativa e Cultural Afro-Tchê
Sociedade Comunitária Herophilo Azambuja
Sociedade Comunitária Jardim Medianeira
Sociedade dos Amigos da Vila Safira
Sociedade Literária e Caritativa Santo Agostinho / Creche Madre Tereza
União Sul-Brasileira de Educação e Ensino

Caracterização das entidades pesquisadas

Conforme salientado na Introdução desta seção do relatório, o objetivo inicial da


pesquisa era constituir uma amostra que reproduzisse, com relativo grau de fidelidade, a
distribuição proporcional dos tipos de entidades que constituíam o universo de 1102
identificadas nos registros do OP de 1998. No entanto, dificuldades surgidas no trabalho
de aplicação do questionário e, em alguns casos, na própria forma de classificação das
entidades, levaram a uma certa discrepância entre a proporção dos tipos de entidades no
universo e na amostra pesquisada. A distribuição presente nesta última encontra-se no
gráfico abaixo:
Gráfico 1. Distribuição das entidades entrevistadas, de acordo com o tipo de
entidade – Pesquisa Entidades OP/1999.

1
Associações Profissionais 0,86%

1
Entidades ligadas à saúde 0,86%

1
Grupos/entidades religiosas 0,86%

3
Cooperativas 2,59%
Tipo de entidade

3
Associações culturais 2,59%

3
Entidades Educacionais 2,59%

Associações de 3
amparo/caridade 2,59%

4
Entidades Sindicais 3,45%

Associações 5
esportivas/recreativas 4,31%

92
Entidades Comunitárias 79,31%

0 20 40 60 80 100

72
Comparando os dados do gráfico com as proporções inicialmente identificadas
no universo, observa-se um pequeno aumento da proporção de entidades comunitárias
(de 73,2% no universo para 79,3% na amostra), de entidades sindicais (de 1,7% para
3,45%) e de associações de amparo/caridade (de 1,7% para 3,45%) entre as entidades
pesquisadas. Por outro lado, há uma pequena queda na proporção de grupos/entidades
religiosos (de 1,7% para 0,86%), de associações profissionais (de 2,5% para 0,86%), de
entidades educacionais (de 6,7% para 2,59%), de entidades ligadas à saúde (de 2,5%
para 0,86%) e de cooperativas (de 3,3% para 2,59%). Mantiveram-se praticamente com
os mesmos valores as associações esportivas/recreativas e as associações culturais.
Apesar destas pequenas variações, observa-se que a amostra reflete um aspecto
bastante significativo do universo de entidades que é o claro predomínio do
associativismo comunitário em termos da participação das organizações sociais no OP
de Porto Alegre. Em torno de três quartos das entidades participantes situam-se neste
tipo de prática associativa, o que corrobora os resultados de pesquisas feitas por outros
pesquisadores.
Tal predomínio indica a manutenção uma tendência que marca o OP desde o seu
processo de implantação, no ano de 1989: um processo de participação que repousa, em
grande medida, sobre a rede associativa comunitária existente em Porto Alegre. A
introdução das Plenárias Temáticas, no ano de 1994, que tinha como um de seus
objetivos trazer novos participantes para o OP, incluindo outros tipos de entidades
constitutivas da sociedade civil porto-alegrense, parece ter se revelado pouco eficaz no
sentido de alterar a centralidade das entidades comunitárias no OP.
Analisando as informações sobre o ano de constituição destas entidades,
conforme o gráfico abaixo, percebe-se que a maior parte dos casos (em torno de 80%)
se concentra a partir de 1976, ou seja, no processo da redemocratização e no período
posterior. Assim, apesar da presença de um associativismo mais antigo, pode-se
concluir que a retomada da democracia abriu oportunidades para a constituição e
atuação das organizações sociais em Porto Alegre, contribuindo para uma significativa
ampliação do tecido associativo da cidade.
Outra informação que chama a atenção neste gráfico é o significativo número de
entidades constituídas a partir de 1989: praticamente um terço do tecido associativo
participante do OP em 1998 havia se estruturado a partir de 1989. Esta informação nos
permite inferir que a dinâmica política local, a partir de 1989, ampliou ainda mais as
oportunidades políticas para a criação de entidades sociais (no caso, especialmente para

73
as entidades comunitárias), corroborando conclusões de outras pesquisas realizadas em
Porto Alegre (ABERS, 2000; FEDOZZI, 2000; SILVA, 2001).
Uma questão que se coloca para futuras investigações é se este crescimento
associativo é um processo generalizado entre diferentes tipos de entidades. Os dados
desta pesquisa, em virtude do forte peso das entidades comunitárias e do pequeno
número de casos de outras entidades não possibilita responder tal questão.
Gráfico 2. Distribuição das entidades, de acordo com o ano de fundação das
entidades - Pesquisa Entidades OP/1999.

3
NS/NR 2,59%

38
A partir de 1989
32,76%

20
1986-1988
17,24%

33
1976-1985
28,45%

14
1964-1975
12,07%

7
1946-1963
6,03%

1
1924-1945 0,86%

0 10 20 30 40

Uma característica muito expressiva deste associativismo participante do OP é


sua alta institucionalização, conforme demonstra o gráfico abaixo:

74
Gráfico 3. Distribuição das entidades segundo o tipo organização formal ou
informal - Pesquisa Entidades OP/1999.

Tipo de Organização?
Formal
Informal
1
0,86% NR

8
6,9%

107
92,24%

De acordo com as informações do gráfico, mais de 90% das entidades


pesquisadas possuíam registro formal, o quê lhes conferia uma personalidade jurídica e,
assim, um conjunto de prerrogativas em termos, por exemplo, do estabelecimento de
convênios e parcerias com órgãos públicos ou empresas privadas. Os poucos casos de
entidades sem registro formal se limitavam a fóruns de articulação de entidades ou a
entidades que, por seu caráter recente ou por problemas de funcionamento, ainda não
haviam obtido tal registro.
Passando para a análise da dinâmica de funcionamento das entidades
pesquisadas, uma primeira informação refere-se à periodicidade de reuniões das
diretorias/coordenações das entidades, conforme o gráfico abaixo:

75
Gráfico 4. Freqüência das reuniões da diretoria da entidade, nos últimos 12 meses -
Pesquisa Entidades OP/1999.

5
Não faz reunião 4,31%

2
NR
1,72%

10
Outro
8,62%

4
Trimensalmente
3,45%

55
Mensalmente
47,41%

21
Quinzenalmente
18,1%

19
Semanalmente
16,38%

0 10 20 30 40 50 60

De acordo com as informações deste gráfico, observa-se que a grande maioria


das entidades (mais de 80%) realiza ao menos uma reunião por mês com os membros de
suas diretorias/coordenações. Entre estas entidades, em torno de 15% realizam reuniões
semanais de diretoria/coordenação e quase 20% realizam reuniões quinzenais. Tal
periodicidade indica uma relativa vitalidade no funcionamento destas entidades.
O gráfico mostra, também, um pequeno número de entidades (cinco) que
informaram não realizarem reuniões de suas diretorias/coordenações no período da
pesquisa, em função de um processo de desmobilização. Apesar do número
relativamente pequeno, que representa pouco mais de 4% da amostra, a presença destas
entidades indica uma relativa instabilidade na trajetória de algumas organizações sociais
(em especial, daquelas que, devido à baixa institucionalização e/ou à carência de
recursos, dependem fundamentalmente da manutenção da capacidade de mobilização de
suas bases ao longo do tempo).
Em que medida e de que forma a presença de canais institucionais de
participação como o OP, que estabelecem uma agenda permanente para a atuação da
sociedade civil, contribui para a manutenção de um funcionamento regular das
entidades (e, mais especificamente, seu impacto sobre diferentes tipos de entidades) é
outra questão importante para futuros estudos.

76
A quantidade de membros das diretorias/coordenações que comparecem às
reuniões encontra-se no seguinte gráfico:
Gráfico 5. Número de participantes nas reuniões de diretoria/coordenação das
entidades - Pesquisa Entidades OP/1999.

4
NS/NR
3,45%

5
Não faz reunião
4,31%

11
mais de 20
9,48%

8
16 a 20
6,9%

30
11 a 15
25,86%

44
6 a 10
37,93%

14
1a 5
12,07%

0 10 20 30 40 50

De acordo com o gráfico, identifica-se o predomínio de reuniões com


participação de até dez integrantes de diretorias/coordenações, as quais representam
50% das entidades pesquisadas. Além disto, 25% das entidades reúnem entre onze e
quinze membros de suas diretorias/coordenações. Chama a atenção, ainda, a informação
de que quase 17% das entidades realizam reuniões de diretoria/coordenação com mais
de dezesseis participantes, o que pode ser considerado um número alto de participantes
(especialmente para as entidades comunitárias). Mesmo com o possível viés de uma
avaliação superestimada por parte dos entrevistados, estas informações indicariam que,
além de se reunirem com freqüência, as entidades pesquisadas tendem a apresentar um
número significativo de participantes que acompanham a dinâmica cotidiana da
organização.
Além das reuniões de diretoria/coordenação, grande parte das entidades realiza
reuniões com suas “bases”, sendo que somente duas entidades informaram não realizar
tais reuniões. A freqüência com que estas reuniões são realizadas encontra-se no gráfico
abaixo:

77
Gráfico 6. Freqüência das reuniões com a comunidade/base representada pela
entidade - Pesquisa Entidades OP/1999.

5
NS/NR
4,31%

Não faz reunião 2


1,72%

7
Bimestralmente
6,03%

33
Outro
28,45%

11
Anualmente
9,48%

21
Semestralmente
18,1%

13
Trimestralmente
11,21%

24
Mensalmente
20,69%

0 10 20 30 40

De acordo com o gráfico, observa-se uma significativa diversidade entre as


entidades em termos da freqüência de reuniões com suas “bases”, destacando-se aquelas
que realizam reuniões mensais (20,69%), semestrais (18,1%) e trimestrais (11,21%).
Uma informação significativa é que entre as entidades enquadradas na categoria “outras
periodicidades”, dezoito informaram a inexistência de uma periodicidade fixa,
realizando reuniões/assembléias com suas “bases” quando necessário.
Em relação ao número de participantes nestas reuniões, as informações estão no
gráfico abaixo:

78
Gráfico 7. Número de participantes nas reuniões com a comunidade/base
representada pela entidade - Pesquisa Entidades OP/1999.

15
NS/NR
12,93%

Não faz reunião 2


1,72%

19
mais de 100
16,38%

8
81 a 100
6,9%

9
61 a 80
7,76%

23
41 a 60
19,83%

33
21 a 40
28,45%

7
1 a 20
6,03%

0 10 20 30 40

Segundo o gráfico, em torno de 50% das entidades realizam reuniões com um


público que varia de 21 a 60 participantes. Destaca-se a informação de que quase 20%
das entidades teriam mais de 100 participantes nas suas reuniões, expressando uma
significativa capacidade de mobilização.
Uma pesquisa em profundidade seria necessária para qualificar estas
informações, identificando e analisando os fatores que viabilizam tal mobilização por
parte das organizações sociais. Um dado que pode auxiliar na compreensão deste
aspecto refere-se aos temas que mais mobilizam as “bases” das organizações
pesquisadas, presente na seguinte tabela:
Tabela 2. Temas que mais mobilizam as comunidades/bases das entidades -
Pesquisa Entidades OP/1999.

Freqüência %

Regularização Fundiária 30 20,7


Infra-estrutura urbana 27 18,2
Saúde 21 14,5
Segurança Pública 15 10,3
Assistência Social 10 6,9
Educação 10 6,9

79
Transporte 8 5,6
Orçamento Participativo 4 2,8
Cultura 3 2,2
Outros 12 8,3
Nenhum 3 2,2
NS/NR 2 1,4
Total 145 100,0

Obs: O total excede o número de entidades (116), pois algumas indicaram mais de um tema.

Os dados da tabela mostram que os temas que mais mobilizam as bases das
entidades pesquisadas referem-se, em grande medida, a determinados “problemas
sociais” que são objetos de políticas públicas do governo municipal. Neste sentido, o
público mobilizado por estas entidades tende a ser aquelas populações sujeitas a
determinadas carências em termos de acesso a bens e/ou serviços públicos ou, ainda,
que dependem destes bens e serviços para sua reprodução social.
Este predomínio de entidades demandantes de bens e serviços públicos é, em
parte, resultado da própria conformação do OP, que pode ser caracterizado como um
processo público de deliberação sobre a distribuição de bens e serviços públicos na
cidade através da decisão sobre a alocação dos investimentos do governo municipal. Ou
seja, este espaço participativo tende a mobilizar e atrair aqueles segmentos da população
e do tecido associativo de Porto Alegre que buscam ou querem manter o acesso àqueles
bens e serviços públicos. Neste sentido, pode-se inferir que o OP cria um ambiente
político que estimula um determinado tipo de associativismo reivindicativo, com forte
enraizamento nos bairros e vilas populares da cidade, ao instituir um canal de
participação que se funda na mobilização social em torno da construção e expressão
pública de reivindicações coletivas.
Em momentos anteriores deste relatório foram feitas referências à “rede
associativa” e ao “tecido associativo” constituído por estas entidades que participam do
OP de Porto Alegre, indicando a existência de relações entre as mesmas. Tais relações
podem ser inferidas das informações do gráfico abaixo:

80
Gráfico 8. Distribuição das entidades segundo a existência de relações regulares
com outras organizações sociais - Pesquisa Entidades OP/1999.
Sua entidade se
relaciona regularmente
com outras
organizações?
8 Sim
6,9%
Não
1
0,86% NS/NR

107
92,24%

Os dados do gráfico mostram que praticamente todas as entidades pesquisadas


possuíam relações regulares com outras entidades e/ou organizações, sendo incomum a
presença de entidades (apenas um caso) que responderam realizar suas atividades de
forma totalmente isolada, sem constituir vinculações com outras entidades ou
organizações seja de sua área temática de atuação seja do seu espaço geográfico de
intervenção.
Como seria esperado, em função da composição da amostra da pesquisa (que,
por sua vez, é decorrência da composição do universo associativo atraído pelo OP), as
principais entidades que atuam na construção dos vínculos que tecem a rede associativa
analisada são as entidades comunitárias. De acordo com a tabela abaixo, mais de 80%
das entidades comunitárias possuem relações com outras entidades comunitárias,
indicando a existência de uma significativa articulação entre estas organizações. Esta
articulação, por sua vez, conforma uma rede vínculos internamente às Regiões e,
também, no âmbito municipal, através da qual, provavelmente, fluem informações,
influências, propostas e recursos diversos.
Além dos vínculos com as outras entidades comunitárias, observa-se também
que as associações comunitárias apresentam vínculos significativos com outros tipos de
entidades, entre as quais se destacam as organizações religiosas (com as quais se
relacionam quase 25% das entidades comunitárias) e as ONGs (com as quais se

81
relacionam 12% das entidades comunitárias). Além disto, praticamente em todos os
outros tipos de entidades pesquisadas, à exceção dos sindicatos, foram coletadas
informações sobre a existência de relações com as entidades comunitárias.
Uma informação que se destaca na tabela é o forte “internismo” das relações dos
sindicatos. Ou seja, estes tendem a ter seu círculo de relações inter-organizacionais
restrito ao próprio campo sindical, observando-se poucas referências a relações entre
sindicatos e outros tipos de organizações sociais.10
Tabela 3. Relações das entidades pesquisadas com outras organizações sociais,
segundo o tipo de entidade - Pesquisa Entidades OP/1999.
Associações Grupos Sindicatos ONGs
Comunitárias religiosos/igrejas
Associações
Comunitárias (92)
75 (81,5%) 22 (23,9%) 1 (1,1%) 11 (12%)
Grupos/entidades
religiosos (1)
1 (100%) 1 (100%) 0 1 (100%)
Associações Profissionais
(1)
1 (100%) 0 0 0
Entidades Educacionais
(3)
2 (66,7%) 1 (33,3%) 0 0
Entidades ligadas à
saúde (1)
1 (100%) 0 1 (100%) 1 (100%)

Associações Sindicais (4) 0 0 4 (100%) 0


Associações
esportivas/recreativas (5)
2 (40%) 2 (40%) 0 0
Associações de
amparo/caridade (3)
1 (33,3%) 1 (33,3%) 0 0

Associações culturais (3) 1 (33,3%) 0 1 (33,3%) 0

Cooperativas (3) 1 (33,3%) 0 0 0

Participação no Orçamento Participativo

Na medida em que as entidades pesquisadas foram selecionadas entre o universo


de entidades participantes no OP, não há surpresa no fato de todos os entrevistados
responderem que participaram/participam deste processo. No entanto, observa-se uma
significativa variação em termos de tempo de participação entre as entidades, conforme
os dados do gráfico abaixo:

10
No entanto, os dados sobre os sindicatos, assim como sobre os outros tipos de organizações sociais, à
exceção das entidades comunitárias, não possibilitam nenhuma interpretação mais conclusiva em função
do número muito limitado de casos. Apenas permitem inferências a serem aprofundadas em futuras
investigações.

82
Gráfico 9. Distribuição das entidades segundo o tempo participação no Orçamento
Participativo - Pesquisa Entidades OP/1999.

58
Todos os anos
50,0%

6
Nove a dez anos
5,17%

11
Sete a oito anos
9,48%

10
Cinco a seis anos
8,62%

16
Três a quatro anos
13,79%

15
Um a dois anos
12,93%

0 10 20 30 40 50 60

De acordo com os dados do gráfico, entre as 116 entidades pesquisadas,


exatamente a metade delas (58 entidades) respondeu ter participado de todas as onze
edições do OP realizadas até o ano da pesquisa (1999). Somando todas as entidades que
tiveram cinco ou mais anos de participação, ou seja, que participaram em pelo menos
metade das edições do OP, chega-se a praticamente três quartos das entidades (73,3%).
Ou seja, observa-se um alto grau de continuidade da participação entre as entidades
pesquisadas, demonstrando que o OP apresentava, no período pesquisado, um forte
potencial de mobilização e de manutenção da adesão das entidades participantes.
Este potencial se expressa, também, pelo fato de que, ao longo dos anos, a
participação das entidades no OP sempre mostrou uma tendência de crescimento,
conforme os dados do seguinte gráfico:

83
Gráfico 10. Evolução do número de entidades participantes no OP, no período de
1989 a 1999 – Pesquisa Entidades OP/1999.
120

100

80

60

40

20

0
90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 2000

De acordo com o gráfico, observa-se que o número de entidades participantes


praticamente dobrou ao longo das onze edições do OP abordadas nesta pesquisa:
enquanto 61 das entidades pesquisadas informaram terem participado no OP/199011, no
OP/2000 esta participação envolveu 110 das entidades pesquisadas.
Tal crescimento da participação deveu-se a duas dinâmicas que se combinam: de
um lado, a crescente incorporação ao OP das entidades já constituídas na cidade; de
outro lado, a entrada no processo das novas entidades que foram sendo criadas ao longo
da década de 90. Nestes dois casos, destaca-se, mais uma vez, a forte atração exercida
pelo OP de Porto Alegre sobre as organizações sociais da cidade (e, em especial, sobre
o associativismo comunitário), tornando-se, assim, um espaço privilegiado de atuação
destas organizações. Esta constatação fundamenta a avaliação sobre uma crescente
institucionalização da sociedade civil porto-alegrense ao longo das últimas décadas,
sendo ainda necessário analisar de forma mais aprofundada os efeitos de tal processo
sobre o tecido associativo da cidade.
Quando perguntados sobre os motivos do seu ingresso no OP, os entrevistados
daquelas entidades que não participaram nos primeiros anos apresentaram as seguintes
respostas:

11
Como o orçamento público é elaborado durante um ano para ser aplicado no ano seguinte, as edições
do OP utilizam como referência o ano de aplicação do orçamento. Assim, o OP/1990 refere-se ao
processo de elaboração do orçamento ocorrido no ano de 1989.

84
Tabela 4. Fatores que levaram ao ingresso no Orçamento Participativo – Pesquisa
Entidades OP/1999.
Fatores que levaram ao ingresso no OP Casos
Conhecimento do OP pela mídia 6
Informação por outra organização social 15
Informação por agentes da Prefeitura Municipal 13
Posse de nova diretoria 11
Credibilidade no OP 13
Única alternativa para o atendimento de demandas 17

Os dados da tabela mostram, por um lado, que o ingresso no OP está relacionado


com o acesso a informações sobre o processo, a partir de distintas fontes disponíveis aos
membros das entidades: os meios de comunicação e, especialmente, outras organizações
sociais e os representantes do governo municipal. Esta constatação traz apoio à
afirmação feita anteriormente sobre a importância da rede associativa para o fluxo de
informações na cidade e, neste caso, à mobilização para o OP.
Por outro lado, a tabela mostra que a composição das direções das entidades é
um fator que afeta a participação ou não no OP. Neste sentido, onze entrevistados
declararam que sua entidade passou a participar do OP em função da eleição de uma
nova diretoria marcada por uma avaliação positiva do OP ou, pelo menos, pela ausência
de oposição em relação a este processo. Tratando-se de uma experiência fortemente
marcada pelas disputas político-partidárias, não surpreende que a participação e a não
participação estejam diretamente relacionadas aos alinhamentos político-ideológicos das
diretorias das entidades.
Por fim, destacam-se dois aspectos em relação às motivações para a
participação. Em primeiro lugar, treze entrevistados declararam que suas entidades
passaram a participar a partir da construção de uma imagem de credibilidade do OP. Em
segundo lugar, dezessete entrevistados responderam que o OP se constituiu no único
canal disponível para o encaminhamento de demandas ao governo municipal. Esta
última resposta possibilita uma dupla interpretação: a participação no OP se coloca
como única alternativa na falta de outras possibilidades; a participação no OP se tornou
o único canal eficaz de reivindicação junto à Prefeitura de Porto Alegre. Ou seja, os
entrevistados podem estar indicando uma crítica ao fechamento dos espaços de
encaminhamento de demandas ou, ao contrário, podem indicar que o OP se tornou
atrativo por ser um canal eficaz de reivindicação.
Em relação aos poucos casos de entidades que deixaram de participar do OP, são
três as razões apontadas pelos entrevistados para tal ação: o não atendimento das

85
demandas da entidade (dois casos); o atendimento de tais demandas (um caso); a
mudança de diretoria (três casos). Ou seja, tanto o atendimento como o não atendimento
podem ser motivos para sair do OP. No entanto, o escasso número de casos em que se
observa a saída do processo indica que as entidades que não conquistam suas demandas
tendem a retornar ao processo no ano seguinte para tentar novamente e, por seu turno,
as entidades que obtém suas demandas tendem a produzir novas demandas, mantendo
sua presença no OP. No que se refere às saídas pela mudança de diretoria, retoma-se o
mesmo argumento apresentado acima sobre a mudança de diretoria como motivo para
entrada no OP: os alinhamentos político-partidários e/ou ideológicos das diretorias das
organizações afeta a participação em um processo que objeto de profundas disputas
políticas na cidade.
Quando é feito o cruzamento entre o tempo de participação e os tipos de
entidades participantes, observa-se, conforme a tabela abaixo, que as entidades
comunitárias são as mais importantes em termos da manutenção de uma participação
continuada no OP de Porto Alegre. Ou seja, a dinâmica de participação está, em grande
medida, assentada na mobilização e atuação da rede associativa comunitária identificada
anteriormente.

86
Tabela 5. Distribuição das entidades de acordo com o tempo de participação no
Orçamento Participativo, segundo o tipo de entidade – Pesquisa Entidades
OP/1999.

Tempo de participação no OP
Um a dois Três a Cinco a Sete a oito Nove a
anos quatro anos seis anos anos dez anos Todos os anos Total
Tipo de Associações 8 10 5 9 6 54 92
entidade Comunitárias
53,3% 62,5% 50,0% 81,8% 100,0% 93,1% 79,3%
% Tempo no OP
Grupos/entidades 1 1
religiosos
1,7% ,9%
% Tempo no OP
Associações Profissionais 1 1

9,1% ,9%
% Tempo no OP
Entidades Educacionais 3 3

18,8% 2,6%
% Tempo no OP
Entidades ligadas à saúde 1 1

6,7% ,9%
% Tempo no OP
Associações Sindicais 1 3 4

6,7% 30,0% 3,4%


% Tempo no OP
Associações 3 1 1 5
esportivas/recreativas
20,0% 6,3% 9,1% 4,3%
% Tempo no OP
Associações de 1 2 3
amparo/caridade
10,0% 3,4% 2,6%
% Tempo no OP
Associações culturais 2 1 3

13,3% 10,0% 2,6%


% Tempo no OP
Cooperativas 2 1 3

12,5% 1,7% 2,6%


% Tempo no OP
Total 15 16 10 11 6 58 116

100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%


% Tempo no OP

Estes dados mostram que as associações comunitárias respondem pela quase


totalidade dos casos de maior tempo de participação: 100% das entidades com
participação entre nove e dez anos; 93% das entidades que participaram em todas as
onze edições do OP realizadas até 1999 (sendo que praticamente 60% das 92
associações comunitárias pesquisadas participaram de todas as edições do OP).
No caso dos outros tipos de entidades, apesar de algumas apresentarem uma
longa trajetória de inserção no OP, observa-se uma concentração nas três faixas de
menor tempo de participação. Este dado indica que o OP, ao longo do tempo, tem
incorporado outros tipos de organizações sociais, além daquelas que constituem a rede
associativa comunitária, sem, no entanto, romper com o predomínio deste tipo de
associativismo.
A longevidade da participação das organizações sociais no OP e o número
inexpressivo de entidades que deixam o processo estão, em grande medida, relacionados
ao fato de que o OP se constituiu em um canal relativamente eficaz de processamento

87
das demandas dos seus participantes. Esta interpretação é sustentada pelo grande
número de pesquisados (mais de 85%) que respondeu já haver obtido o atendimento de
suas solicitações de bens e serviços públicos via OP, conforme o gráfico abaixo:
Gráfico 11. Distribuição das entidades segundo a obtenção de ganhos (bens e/ou
serviços públicos) com a participação no Orçamento Participativo – Pesquisa
Entidades OP/1999.
A população
representada pela
entidade já obteve
ganhos com a
2 participação no OP?
1,72% Sim
15
Não
12,93%
NR

99
85,34%

Assim, de acordo com os números do gráfico, conclui-se que, mesmo com


limitações evidentes (que foram identificadas pelos entrevistados e serão analisadas
mais adiante), o poder de atração do OP está diretamente relacionado à sua capacidade
de oferecer respostas às demandas da população que participa do processo. Como outras
experiências de OP já demonstraram, a ausência ou perda desta capacidade, seja por
limitações de recursos seja por mudanças na orientação política do governo municipal,
tende a deslegitimar o OP e, assim, diminuir a participação social (SILVA, 2001).
Um aspecto importante observado na pesquisa de campo refere-se à existência
de padrões diferenciados de participação no OP entre os distintos tipos de entidades. Por
um lado, entre as entidades comunitárias observa-se o predomínio de uma intervenção
coletiva no processo do OP, a partir de um processo de mobilização que envolve não
apenas os membros da diretoria da entidade, mas também segmentos de moradores das
“comunidades” que, em grande medida, não participam da entidade. Por outro lado,
entre entidades como sindicatos e entidades ligadas à educação, por exemplo, observou-
se a tendência a uma participação individualizada no OP, a partir do interesse e

88
disponibilidade de algum(ns) membro(s) da entidade. Neste caso, em geral, não há um
processo de mobilização coletiva. Este aspecto é claramente apreendido na resposta de
um entrevistado, representante de uma entidade sindical, para quem “Há uma forte
visão de que os sindicatos só devem atuar na questão salarial/profissional. Os
sindicatos não possuem assembléias de base para formar propostas. As demandas
acabam sendo de alguns militantes que atuam no processo”.
Esta diferença nos padrões de participação no OP gerou, inclusive, problemas
metodológicos para a realização da pesquisa, uma vez que algumas entidades
selecionadas não puderam ser incluídas na amostra, pois, quando procuradas,
informaram que, de fato, não houve uma participação da entidade enquanto ator
coletivo, mas sim de um ou mais membros (sendo que, em alguns casos, estes já não
estavam mais na entidade). Em outros casos, foram entrevistados indivíduos que
participavam do OP, mas enquanto iniciativa pessoal e não institucional.
Estas diferenças de tipos de participação trazem um aspecto importante a ser
aprofundado por futuras investigações, pois, em geral, as análises sobre a participação
da sociedade civil do OP têm tomado esta participação como algo homogêneo, como se
houvesse apenas diferenciações em termos quantitativos. Os dados desta pesquisa, ao
contrário, identificam uma significativa heterogeneidade qualitativa na participação de
distintos tipos de entidades no OP. Assim, identificar os diferentes padrões de
participação e suas implicações é um tema significativo para novos estudos.
Em relação à distribuição das entidades pesquisadas em termos do âmbito de sua
participação no OP (regional ou temático), os dados encontram-se no gráfico abaixo:

89
Gráfico 12. Distribuição das entidades segundo o principal âmbito de atuação
(regional ou temático) no Orçamento Participativo – Pesquisa Entidades OP/1999.
Participa regional ou
temática
Regional
Temática
3 NS/NR
7 2,59%
6,03%

106
91,38%

De acordo com os dados do gráfico, observa-se uma grande concentração da


participação das entidades nas 16 regiões do OP: mais de 90% dos entrevistados (106)
declararam que este era o âmbito principal de intervenção da entidade no OP. Somente
sete entidades entrevistadas identificaram as temáticas como o espaço privilegiado de
participação.
Cruzando esta informação com o tipo de entidade, tem-se a seguinte Tabela:
Tabela 6. Distribuição das entidades segundo o principal âmbito de atuação
(regional ou temático) no Orçamento Participativo, por tipo de entidade – Pesquisa
Entidades OP/1999.
Participa regional ou temática
Total
Regional Temática NS/NR
Tipo de
entidade
Associações Comunitárias 92 0 0 92

Grupos/entidades religiosos 0 1 0 1

Associações Profissionais 1 0 0 1

Entidades Educacionais 2 0 1 3

Entidades ligadas à saúde 1 0 0 1

Associações Sindicais 1 2 1 4

90
Associações
esportivas/recreativas
5 0 0 5
Associações de
amparo/caridade
1 2 0 3

Associações culturais 1 1 1 3

Cooperativas 2 1 0 3
Total 106 7 3 116

As informações da tabela mostram que, conforme seria esperado, as entidades


comunitárias têm no âmbito regional seu principal campo de atuação no OP. Este é o
espaço priorizado pela totalidade das entidades deste tipo entrevistadas.
Outros tipos de entidades (como as esportivas/recreativas e as educacionais)
também tendem a privilegiar a atuação regional, contrariando uma expectativa de que as
mesmas dirigissem sua participação para as temáticas. As poucas entidades que
priorizam a intervenção nas temáticas (apenas sete) são, na quase totalidade, entidades
maiores e com uma atuação em todo município (e, algumas vezes, até fora dele). Assim,
pode-se concluir que espaço de intervenção das entidades (regional ou temático) não se
encontra associado apenas ao tipo de entidade, mas também à conformação e à forma de
atuação destas entidades.
Esta informação sobre os espaços privilegiados de intervenção das entidades não
significa, no entanto, que as mesmas restrinjam sua participação a estes espaços. Ao
contrário, estudos têm identificado uma tendência das entidades buscarem diversificar
suas intervenções, incidindo tanto nas suas regiões como nas temáticas, como forma de
ampliar as possibilidades de encaminhamento e obtenção de demandas.
Buscando aprofundar a análise da dinâmica de atuação das entidades
pesquisadas no OP, é importante observar como as mesmas definem as suas posições
em relação a determinados aspectos do processo. Na presente pesquisa, foram feitas
perguntas sobre duas escolhas centrais no OP: a escolha das prioridades e a escolha dos
representantes (delegados e conselheiros).
No que se refere à escolha das prioridades apresentadas pela entidade no OP,
observa-se, de acordo com o gráfico abaixo, que praticamente três quartos das entidades
respondeu possuir algum mecanismo através do qual os membros da entidade podem
discutir e definir coletivamente suas demandas e propostas para o OP.

91
Gráfico 13. Distribuição das entidades segundo o mecanismo de escolha das
prioridades para o Orçamento Participativo – Pesquisa Entidades OP/1999.

2
NR
1,72%

8
outro
6,9%

a asembléia/reunião de 86
moradores 74,14%

16
a diretoria
13,79%

o presidente 4
3,45%

0 20 40 60 80 100

Por outro lado, destaca-se o fato de quase 20% das entidades pesquisadas
informarem que a tomada de decisão sobre as demandas é realizada pelo Presidente e,
especialmente, pelas Diretorias das entidades. Tal fato indica uma significativa
centralização e, no limite, personalismo nas relações internas de uma parcela
significativa das entidades pesquisas.
A mesma conclusão resulta das informações sobre o processo de escolha dos
representantes das organizações sociais no OP: apesar do significativo predomínio das
entidades que possuem mecanismos participativos de escolha, observa-se a presença de
um número expressivo de entidades nas quais esta escolha é concentrada na Diretoria
e/ou Presidência.

92
Gráfico 14. Distribuição das entidades segundo o mecanismo de escolha dos
representantes no Orçamento Participativo (delegados e conselheiros) – Pesquisa
Entidades OP/1999.

3
NR
2,59%

7
outro
6,03%

82
a assembléia
70,69%

19
a diretoria
16,38%

5
o presidente
4,31%

0 20 40 60 80 100

Conforme analisado anteriormente, o OP se constituiu num canal relativamente


eficaz de encaminhamento das demandas sociais relativas a bens e serviços públicos
municipais. Além do fato de mais de 85% das entidades pesquisadas afirmaram já terem
obtido ganhos no OP, esta eficácia também pode ser avaliada a partir das informações
sobre o processo de implementação das prioridades definidas no processo, conforme a
seguinte tabela:
Tabela 7. Avaliação dos entrevistados sobre a realização das obras aprovadas no
Orçamento Participativo – Pesquisa Entidades OP/1999.
Foi necessário intervir de alguma
forma para garantir o bom
andamento das obras aprovadas no
Freqüência %
OP?
Sim 35 30,2
Não 59 50,9
NR 22 19,0
Total 116 100,0

Entre os entrevistados, 50,9% afirmaram não ter sido necessário nenhum tipo de
intervenção para garantir o bom andamento das obras e serviços aprovados no OP. Por
outro lado, quase um terço declarou que a efetivação da conquista no OP exigiu uma
intervenção das entidades e/ou da população demandante, indicando que a

93
implementação das decisões do OP não se dão, necessariamente, de forma automática e
tranqüila. Ao contrário, esta implementação pode tornar-se, em determinados casos, um
longo e conflitivo processo. Em que medida tais demoras e dificuldades se devem à
Administração Municipal ou a outros atores ou instituições, no entanto, é algo a ser
analisado. Da mesma forma, parece existir variações importantes entre diferentes tipos
de ações, em virtude de diferenças de complexidade e/ou conflitualidade (por exemplo,
processos de regularização fundiária tende a se estender por muito mais tempo que as
pavimentações de ruas).
Quando questionados sobre quais os procedimentos adotados para garantir a
implementação das decisões do OP, 25 dos 35 entrevistados que declararam ter sido
necessário algum tipo de ação responderam que foi preciso realizar alguma forma de
negociação ou pressão diretamente com os setores da prefeitura responsáveis pelas
obras e/ou serviços. Quatorze entrevistados, por sua vez, informaram que tiveram de
recorrer aos Centros Administrativos Regionais e/ou a algum outro órgão do governo
municipal. No entanto, nenhum entrevistado respondeu ter recorrido aos vereadores
municipais para resolver problemas no encaminhamento de suas demandas.
Estas respostas indicam que, no período estudado, houve um claro predomínio
do recurso a uma interlocução direta com o Executivo municipal em detrimento do
recurso à intermediação dos membros do Legislativo municipal. Mesmo reconhecendo
uma provável tendência de subestimação do recurso aos vereadores, esta informação
pode sinalizar para uma importante mudança nos mecanismos de relacionamento entre
Poder Público Municipal e sociedade civil de Porto Alegre, com uma perda de
importância da mediação dos vereadores. Tal mudança pode ser um dos fatores
explicativos para o tradicional conflito estabelecido entre vereadores oposicionistas e
OP (DIAS, 2002).

Efeitos do Orçamento Participativo sobre as organizações sociais

Além dos ganhos de obras e serviços públicos, a experiência de participação no


OP apresenta um conjunto de efeitos sobre as entidades participantes que, em geral, não
tem sido analisado com profundidade nas pesquisas realizadas. Mesmo reconhecendo os
limites da metodologia empregada para apreender estes efeitos, este foi um dos

94
objetivos desta pesquisa, tendo sido perguntado aos entrevistados sobre a ocorrência ou
não de um conjunto de mudanças em função da participação das entidades no OP.
Em primeiro lugar, os entrevistados foram questionados sobre os efeitos do OP
na credibilidade da entidade junto ao segmento por ela representado. As respostas foram
as seguintes:
Gráfico 15. Efeito da participação no Orçamento Participativo sobre a
credibilidade da entidade – Pesquisa Entidades OP/1999.
A entidade se
fortaleceu e ganhou
mais credibilidade junto
à comunidade?
3 Sim
2,59% Não
NR

33
28,45%

80
68,97%

Segundo a grande maioria dos entrevistados (quase 70%), o OP teve um efeito


de ampliação da credibilidade da entidade, fortalecendo sua presença junto às bases. Na
medida em que a grande maioria das entidades atraídas pelo OP são entidades voltadas à
construção e expressão de demandas por bens e serviços públicos, torna-se
compreensível que um processo que tenha possibilitado a que estas entidades tivessem
ao menos parte daquelas demandas atendidas contribua para o fortalecimento das
mesmas. Em outras palavras, a relativa eficácia do OP, indicada anteriormente e
identificada pelos entrevistados, tende a contribuir para a ampliação da credibilidade
daquelas lideranças de organizações sociais que dirigem sua atuação para a intervenção
neste processo.
Um segundo efeito do OP sobre as organizações participantes refere-se a
mudanças nas suas relações com outras organizações sociais, constantes na tabela
abaixo:

95
Tabela 8. Efeitos da participação no Orçamento Participativo nas relações entre as
organizações sociais – Pesquisa Entidades OP/1999.
Sim
Freq %
Aprenderam negociar/reivindicar seus interesses com
outros grupos
108 93,1%
Criou união entre associações vizinhas que não se
conheciam/relacionavam antes do OP
94 81%
Passaram a atuar junto com outras
associações/entidades, fora das atividades dos OP
76 65,5%

As informações desta tabela indicam que o OP se constituiu num processo


importante no sentido de colocar as organizações em contato e, mais do que isto,
estabelecer uma dinâmica que propiciou a formação de vínculos e articulações entre as
mesmas. Na medida em que o êxito no OP (no sentido estrito do atendimento de
demandas) depende não apenas da capacidade de mobilização individual de cada
entidade, mas também da capacidade de construir alianças com outros participantes,
cria-se uma relação de interdependência que tende a “recompensar” aquelas entidades
mais hábeis na constituição e manutenção de tais articulações. Esta dinâmica, ao longo
do tempo, gerou não apenas vínculos importantes para a própria participação no OP,
mas também para a atuação das entidades em outros contextos de ação.
Além desta dimensão pragmática, a dinâmica de contatos freqüentes entre
pessoas e entidades compartilhando problemas, demandas, propostas, ideologias e/ou
posições político-partidárias comuns criou novas oportunidades de identificação e
atuação conjunta para tais pessoas e entidades, estimulando a ação coletiva.12
Estas informações indicam que o OP teve um efeito de ampliar as relações entre
as organizações sociais de Porto Alegre, contribuindo para um significativo
adensamento da rede associativa do município. Neste sentido, por exemplo, muitas
entidades comunitárias que tinham uma atuação localizada, restrita a um determinado
bairro ou vila, passaram a atuar intensamente em âmbito regional e, mesmo, municipal.
Um terceiro efeito do OP se refere à ampliação de conhecimentos dos
participantes:

12
Isto não implica em negar a existência de diversas divisões e conflitos entre os participantes do OP. Ao
contrário, estes conflitos estão presentes e, por vezes, estimulam a construção de articulações entre os
atores envolvidos nas disputas que compartilham determinadas posições contra os eventuais adversários
comuns.

96
Tabela 9. Efeitos da participação no Orçamento Participativo nos estoques de
conhecimento das organizações sociais – Pesquisa Entidades OP/1999.
Sim
Freq %
Passaram a compreender melhor como funciona o
governo e qual a função dos órgãos públicos
105 90,5%
Conheceram pessoas/associações com idéias e práticas
diferentes
99 85,3%

As informações da tabela indicam que o OP se constituiu, por um lado, num


espaço importante de obtenção de informações sobre a organização e o funcionamento
do governo municipal, possibilitando a socialização de um conhecimento fundamental
tanto para a participação quanto para o exercício do controle social. Mesmo que esta
ampliação das informações dos participantes não elimine a assimetria na distribuição do
conhecimento técnico, ela possibilitou que muitos participantes estabelecessem relações
mais igualitárias nas discussões e, especialmente, disputas com técnicos e quadros
políticos do governo municipal.
Por outro lado, ao ampliar os espaços de circulação e atuação dos participantes,
o OP também contribuiu para que estes entrassem em contato com novos ambientes,
instituições e pessoas, oportunizando o acesso a distintas realidades e visões de mundo.
Em um contexto social no qual a reprodução da desigualdade tem como um de seus
mecanismos a segregação sócio-espacial e relacional (CALDEIRA, 2000; MARQUES
et all., 2007), tal oportunidade gerada pelo OP adquire particular relevância política.
Outro tipo de mudança abordada pela pesquisa refere-se ao funcionamento das
entidades participantes do OP: 71 entrevistados (61,2% da amostra) declararam que a
participação no OP provocou alterações na dinâmica das entidades. As informações
sobre as alterações identificadas encontram-se na tabela abaixo:
Tabela 10. Efeitos da participação no Orçamento Participativo no funcionamento
das organizações sociais – Pesquisa Entidades OP/1999.
Aumentou apenas
Aumentou Diminuiu
durante o OP
Freq % Freq % Freq %
Alterou a periodicidade das reuniões da
entidade
43 37,1% 6 5,2% 4 3,4%
Alterou o número de participantes nas
reuniões da entidade
46 39,7% 7 6% 3 2,6%

Estes dados mostram que o OP teve, para um número significativo de entidades,


um efeito de dinamização, ampliando tanto a freqüência de reuniões quanto o número
de participantes nestas reuniões. Mesmo que tal dinamização esteja vinculada

97
basicamente ao processo do OP (o quê seria algo a ser analisado), ela tende a criar
novas oportunidades de recrutamento de membros para as entidades, contribuindo para
o surgimento e a renovação das lideranças sociais.
Como seria esperado, o OP também provocou mudanças na forma como as
entidades buscam do atendimento de suas demandas, na medida em que criou um
espaço institucional para tal fim. Quando perguntados sobre os mecanismos utilizados
antes do OP, os entrevistados apresentaram as seguintes respostas:
Tabela 11. Mecanismos utilizados para o encaminhamento das demandas das
organizações sociais, anteriormente ao Orçamento Participativo – Pesquisa
Entidades OP/1999.13
Freqüência %
Mobilização/Pressão 20 26,7
Negociação com políticos 17 22,7
Negociação e mobilização 13 17,3
Não Conseguia 10 13,3
Outra 13 17,3
NR 2 2,7
Total 75 100,0

Segundo os dados da tabela, o principal mecanismo que as entidades utilizavam


para o encaminhamento de suas demandas antes do OP era a mobilização e a pressão
coletiva junto às autoridades do Executivo Municipal. A significativa presença deste
tipo de atuação, indicada por mais de um quarto das entidades pesquisadas, sustenta os
resultados de outros estudos, que identificam a constituição de um expressivo
associativismo popular reivindicativo em Porto Alegre, na década de 80 (SILVA, 2001).
No entanto, juntamente com este tipo de prática mais conflitiva, destaca-se
também o recurso a diversas formas de negociação e barganha com atores políticos do
Legislativo e/ou do Executivo municipais. Seja em combinação com as mobilizações
(17,3% dos casos) seja, especialmente, como alternativa àquelas (22,7% dos casos),
observa-se que as formas de intermediação particularistas de demandas sociais, muitas
delas a partir de uma relação clientelista, constituíram um canal fundamental para que as
reivindicações de parcela significativa da sociedade civil local fossem reconhecidas e
obtivessem uma resposta do Poder Público Municipal.
Além destes mecanismos orientados para reivindicações junto ao Governo
Municipal, identificou-se que uma parcela significativa das entidades pesquisadas

13
Dados referentes às 75 entidades cuja fundação é anterior ao surgimento do OP, em 1989.

98
(17,3%) se valia de outros meios para obter a realização de seus interesses: formas de
auto-ajuda, recurso à caridade privada, vínculos com instituições religiosas etc. Estes
mecanismos, que configuram a denominada “Sociedade Providência”, possuíam
importância considerável para aqueles segmentos incapazes de acessar os bens e
serviços públicos (seja pela ação coletiva seja pelos canais particularistas).
Por fim, deve-se destacar, ainda, um contingente significativo (13,3%) de
entidades que declarou não ter obtido bens e serviços públicos anteriormente à
implantação do OP. Mesmo que haja algum viés nesta resposta, ela se coloca como mais
um indicador da legitimidade adquirida pelo OP enquanto canal de relativa eficácia na
distribuição de bens e serviços públicos aos seus participantes.
Outra informação que reforça este argumento encontra-se no Gráfico abaixo:
Gráfico 16. Distribuição das entidades segundo acesso a bens e serviços públicos
fora do Orçamento Participativo – Pesquisa Entidades OP/1999.
Em anos recentes, sua
entidade conseguiu
alguma conquista fora
do OP?
6 Sim
5,17% Não
NS/NR

53
45,69%

57
49,14%

De acordo com as informações dos entrevistados, nos últimos anos, praticamente


50% das entidades pesquisadas tiveram no OP o único espaço eficaz para o
encaminhamento de demandas. Além disto, quando analisados os ganhos das 53
entidades que declararam ter obtido conquistas fora do OP, observa-se que a quase
totalidade destas conquistas se divide entre o acesso a determinados serviços públicos
municipais que não implicam investimentos e o acesso a bens/serviços públicos
fornecidos por outros níveis de governo (especialmente o governo estadual). Ou seja,
não há referência à obtenção de bens públicos do mesmo tipo daqueles que são objeto

99
de deliberação no OP (ou seja, resultados de investimentos municipais). Esta
informação indica a existência, no período estudado, de uma consolidação do OP como
espaço de distribuição de determinados investimentos públicos, com o fechamento de
“canais alternativos” de acesso a tais recursos.
O último aspecto a ser analisado em termos das mudanças provocadas pelo OP
nas entidades participantes refere-se às formas de relação com os atores políticos (tanto
do Legislativo quanto do Executivo municipal). Conforme analisado anteriormente, o
contato direto e particularista com os atores políticos foi um mecanismo usual e
importante para o encaminhamento das demandas da sociedade civil porto-alegrense.
Quando perguntados sobre a existência de mudanças nesta relação em função do OP, os
entrevistados apresentaram as seguintes respostas:
Gráfico 17. Efeitos da participação no Orçamento Participativo na relação das
organizações sociais com os atores políticos – Pesquisa Entidades OP/1999.
A existência do OP
mudou a relação da
entidade com os
políticos?
Sim
10
8,62% Não
NS/NR

26
22,41%

80
68,97%

Praticamente 70% dos entrevistados identificam que o OP provocou uma


mudança na relação entre atores sociais e atores políticos, alterando de forma
significativa os padrões tradicionais de intermediação e representação de interesses na
cidade. Tal mudança foi apreendida em outras pesquisas (BAIOCCHI, 2005) como a
construção de um novo regime Estado-Sociedade, deslocando o regime anterior
fortemente marcado pelas relações de clientelismo.
Apesar do número expressivo de entrevistados que identificam tais mudanças,
deve-se destacar a existência de um contingente importante de entrevistados (22,4%)

100
que não percebem mudanças significativas, apontando para uma relativa continuidade
nos padrões de relações políticas.
As principais mudanças identificadas pelos entrevistados foram:
Gráfico 18. Mudanças nas relações entre organizações sociais e atores políticos em
função do Orçamento Participativo – Pesquisa Entidades OP/1999.

14
NS/NR
12,07%

26
NSA
22,41%

3
Outras 2,59%

3
Menor autonomia 2,59%

21
Maior proximidade
18,1%

49
Maior autonomia
42,24%

0 10 20 30 40 50

A principal mudança destacada nas entrevistas (42,24%) refere-se ao


enfraquecimento dos atores políticos que atuavam como intermediários das demandas
sociais (especialmente os vereadores), com o conseqüente aumento da autonomia e do
protagonismo das organizações sociais. Ou seja, para um número significativo de
entrevistados, o OP instituiu uma dinâmica de relação entre sociedade e Estado que
desvalorizou significativamente o papel de intermediação historicamente desempenhado
por atores políticos, possibilitando às organizações sociais atuarem diretamente no
processo de deliberação sobre a distribuição dos recursos públicos da cidade.
Esta relação direta e permanente entre organizações sociais e agentes do
Executivo municipal, instituída pelo OP, trouxe uma segunda mudança importante que é
a aproximação entre Poder Público e população. Esta mudança foi identificada por
18,1% dos entrevistados, que destacaram a existência de um acesso mais fácil aos
agentes e setores governamentais.
Por fim, um número praticamente inexpressivo de entidades informou que o OP
teve um efeito negativo em relação à sociedade civil da cidade, uma vez que levou a

101
uma perda de autonomia das organizações sociais e a submissão destas aos interesses e
dinâmicas do Poder Públicos municipal.

Avaliação do Orçamento Participativo

Para apreender a avaliação dos entrevistados sobre o Orçamento Participativo foi


solicitado, primeiramente, que o entrevistados manifestassem sua concordância ou
discordância com alguns problemas destacados por outros estudos ou pelo próprio
debate público sobre o OP. Os resultados foram os seguintes:
Tabela 12. Distribuição dos entrevistados de acordo com a concordância com
avaliações sobre os problemas do Orçamento Participativo – Pesquisa Entidades
OP/1999.
Sim Não NS/NR
Freq % Freq % Freq %

Demora na execução das obras 22 19% 93 80,2% 1 0,9%

Pouco recurso financeiro 44 37,9% 71 61,2% 1 0,9%

Não aprovar obras caras 7 6% 108 93,5 1 0,9%


Dificuldade de entendimento do
processo/falta de informação
21 18,1% 94 81% 1 0,9%

Segundo as informações da tabela, o principal problema identificado pelos


entrevistados (obtendo quase 40% de respostas afirmativas), entre as opções oferecidas,
foi a limitação dos recursos financeiros do Poder Público Municipal para o atendimento
das demandas sociais expressas no OP. Ou seja, apesar de reconhecerem a eficácia
relativa deste processo, os entrevistados também identificam limitações estruturais do
governo municipal para responder de forma efetiva ao grande número de reivindicações
da sociedade civil porto-alegrense. Observa-se, assim, que o processo do OP encontra-
se em uma posição de relativa fragilidade, uma vez que sua legitimidade repousa, pelo
menos em parte, na sua eficácia e esta, por sua vez, depende da disponibilidade de
recursos – limitados – do governo municipal.
Em relação às outras alternativas, identifica-se que, apesar de atingirem índices
significativos de respostas afirmativas, são problemas destacados por um número bem
menor de entrevistados. Assim, 19% destes salientaram que existem problemas na
execução das obras aprovadas no OP, levando a atrasos em relação aos cronogramas
definidos no momento de planejamento das obras (confirmando a informação
anteriormente analisada sobre a necessidade de intervenção dos atores para garantir a

102
execução de uma parte das obras aprovadas no OP). 18,1% dos entrevistados, por sua
vez, salientam que as dificuldades de entendimento do funcionamento do OP e a falta de
informações são problemas significativos, prejudicando a participação e o controle
social sobre a implementação das decisões. Por fim, apenas 6% identificaram a
existência de limitações no valor das obras como um problema do OP. Isto tanto pode
ser um sinal de que não há um limitador na definição das obras, quanto do fato de que a
grande maioria das demandas sociais são ações de custo relativamente baixo.
Apesar das avaliações acima permitirem identificar aspectos importantes, a
oferta de opções para as respostas dos entrevistados tende a reduzir a riqueza de tais
respostas. Neste sentido, quando formulada de maneira aberta, a pergunta sobre os
problemas e dificuldades do OP possibilita a emergência de um quadro muito mais
diversificado e complexo, conforme se expressa no conjunto de respostas dos
entrevistados listado abaixo:
1) Interesses políticos não permitem que sejam aprovadas certas demandas.
2) Muito controle do PT.
3) Loteamentos irregulares não conseguem o atendimento de suas demandas
4) Como processo o OP é trabalhoso. Ocorrem problemas conjunturais no andamento
das obras que não dependem só da prefeitura.
5) Discussão muito marcada pelas demanda imediatas
6) Muita disputa interna - algumas associações têm muito mais força e acabam
ganhando.
7) Os critérios técnicos, que inviabilizam o acesso das vilas irregulares às obras.
8) Grande trabalho das lideranças, mas sem reconhecimento da comunidade.
9) Poucas verbas para educação e saúde.
10) Muita reunião e pouco sentido concreto.
11) Intervenção de Política partidária no processo, criando muita disputa.
12) O empreguismo, a partir do mandato de Raul Pont (1997-2001).
13) Ação de pessoas de outros partidos, que atuam só para denegrir o processo.
14) Um pouco burocratizado, muita reunião
15) Não regulamentação que permite as manipulações políticas. Controle dos
investimentos pelos "espertos" do OP.
16) Informalidade do processo, que não segue regras. O controle da prefeitura e não das
entidades comunitárias. Uso político eleitoral do processo, enfraquecendo e cooptando
as entidades comunitárias.
17) Dificuldade de negociar. Intimidação que alguns usam para negociar.
18) Dificuldade de manter a participação da comunidade, pois querem sonhos
imediatos.
19) Não aprovar obras que impliquem custeio, como escolas.
20) Falta transparência e disputa entre as regiões. Muita presença do PT no processo,
impedindo manifestação de pessoas de outros partidos.
21) Falta de argumentação
22) Necessidade de discutir as políticas de serviço/custeio e de pessoal da PMPA.
23) Que o principal critério para ter demanda atendida seja o número de pessoas que
vão nas reuniões.

103
24) Leis e critérios técnicos ultrapassados.
25) Necessidade de maior presença dos órgãos da prefeitura e vereadores para verem a
luta do povo - estão muito distantes.
26) Tirar o poder do presidente de associação.
27) Conseguir aprovar as obras. Comunidades que dão inchaço.
28) Perigo da legalização, querem tirar o poder das comunidades.
29) População cobra das entidades e não do governo. Disputa entre as entidades por
poucos recursos.
30) Às vezes as secretarias não comparecem às reuniões.
31) Dificuldade de divulgação e de mobilização. Critérios técnicos.
32) Dificuldade de contato mais direto com os representantes do Executivo, como havia
no início da administração popular.
33) Não realização de tudo o que é definido.
34) A forma como se dá o processamento no Conselho, que altera as prioridades
definidas pela população. Interesses muito particulares dos que participam, que só
querem saber de suas demandas.
35) Os conselheiros deveriam ficar mais tempo, pois quando estão aprendendo precisam
sair. Falta preparação/qualificação.
36) Muitos não vêem necessidade de participar (ainda querem conseguir as coisas indo
“pedir” individualmente aos órgãos públicos).
37) Infiltração de políticos. Não precisa ter tanta gente convocada - esvazia a
participação. Presidente da associação deveria ter maior autonomia.
38) Problema do voto que às vezes não é democrático.
39) Ainda é muito burocrático. Interesses muitos pessoais.
40) Faltam informações mais detalhadas sobre a peça orçamentária. A Prefeitura deve
dispor de informações mais atualizadas.
41) Engessamento da comunidade: o governo coloca as prioridades; o processo é
manipulado.
42)Processo lento; demandas são encaminhadas, mas não é possível saber com rapidez
o que realmente será feito.
43) Falta mais atenção das Secretarias; que os responsáveis viessem para a comunidade.
44) Excesso de democracia.
45) Há uma forte visão de que os sindicatos só devem atuar na questão
salarial/profissional. Os sindicatos não possuem assembléias de base para formar
propostas. As demandas acabam sendo de alguns militantes que atuam no processo.
Excesso de controle governamental.
46) Inchaço nas reuniões.
47) Muito fechado, esvaziando o processo.
48) Existência de pessoas (grupos) que tentam controlar e manipular o processo só para
defender seus interesses.
49) Determinadas questões (como educação) não deveriam ser via Orçamento
Participativo.
50) Certas questões que deveriam ser prioridade (atendimento à criança), mas têm que
disputar com outros temas. Excesso de reuniões/atividades.
51) Critérios técnicos dentro do Orçamento Participativo.
52) Limite do município para enfrentar o crescimento da demanda.
53) Muita interferência governamental (controle).
54) Determinadas demandas deveriam ter mais prioridade (saneamento básico).
55) Discussão limitada a apenas uma parte do orçamento - o poder de decisão é relativo.
56) Excesso de reuniões.

104
Estas respostas oferecem uma caracterização bastante rica dos problemas
identificados pelos participantes. Estes vão desde as limitações na autonomia do
processo de discussão e deliberação, até as críticas às dificuldades de mobilização das
bases das organizações para a participação, passando por problemas de funcionamento e
de limitações de recursos.
Apesar destas críticas, o OP é avaliado positivamente pela quase totalidade dos
entrevistados. Os motivos destacados por eles para esta avaliação se encontram
sintetizados no gráfico abaixo:
Gráfico 19. Resultados positivos da introdução do Orçamento Participativo –
Pesquisa Entidades OP/1999.

NS/NR 5
4,31%

Nenhum 3
2,59%

5
Outro
4,31%

11
Desenvolvimento da cidadania
9,48%

Melhoria na relação entre 11


governo e população 9,48%

16
Maior união/mobilização social
13,79%

Maior participação/transparência 42
nas decisões 36,21%

23
Conquista de obras
19,83%

0 10 20 30 40 50

De acordo com 36,21% entrevistados, o principal ponto positivo do OP é a


abertura de um espaço público, institucional, que possibilita a participação social no
processo de tomada de decisões sobre os investimentos do governo municipal. Esta
abertura, além de possibilitar a incorporação das demandas sociais, também possibilitou
um maior controle social tanto sobre as decisões quanto sobre a execução orçamentária.
Em segundo lugar, 19,83% entrevistados destacaram a eficácia do OP no sentido
de propiciar o acesso dos participantes à obtenção dos bens e/ou serviços públicos
demandados. Mesmo que não seja um processo fácil e isento de problemas (como
indicam claramente as críticas identificadas anteriormente), ele viabilizou para setores

105
significativos da população de Porto Alegre, especialmente os moradores das vilas e
bairros populares, o acesso a investimentos públicos até então inexistentes.
Para 13,79% dos entrevistados, o OP adquire positividade na medida em que
estimula o processo de organização, mobilização e articulação das populações e
organizações sociais participantes. Ou seja, o OP teria um efeito de dinamização da
sociedade civil da cidade, instituindo uma dinâmica que contribuiria para o
fortalecimento do tecido associativo local.
O quarto aspecto positivo, destacado por 9,48% dos entrevistados refere-se à
melhoria das relações entre a população/organizações sociais e o Poder Público
Municipal. Para estes entrevistados, o OP aproximou o Executivo municipal da
população, facilitando tanto o acesso da população aos membros do governo quanto a
obtenção de informações sobre a estrutura e dinâmica de funcionamento do governo.
Por fim, 9,48% dos entrevistados responderam que o OP funciona como um
instrumento de desenvolvimento da cidadania, na medida em que, por um lado, gera
uma consciência de direitos em substituição à lógica do favorecimento clientelista e, por
outro, cria espaços nos quais os cidadãos têm a possibilidade de exercer tais direitos de
uma forma efetiva.

Considerações Finais

Buscando sintetizar alguns resultados da pesquisa realizada, observa-se,


primeiramente, que o contexto político dos anos 90, em Porto Alegre, ofereceu
condições favoráveis ao crescimento e adensamento do tecido associativo da cidade.
Sendo o OP um dos elementos centrais na configuração deste contexto político, pode-se
inferir que tais crescimento e adensamento foram, pelo menos em parte, estimulados
pela introdução e desenvolvimento da experiência do OP durante o período abordado na
pesquisa.
Identifica-se, no entanto, que esta sociedade civil foi marcada, em anos recentes,
por um significativo processo de institucionalização das suas formas de organização e
ação. Assim, de um lado, encontramos um associativismo legalmente constituído e
enquadrado nas normas estabelecidas pelo registro civil. De outro lado, observa-se a
crescente centralidade dos espaços institucionais (no caso, principalmente o OP) como
campos privilegiado da atuação das organizações sociais.

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Tal institucionalização pode ser interpretada como um resultado “natural” do
processo de democratização brasileiro, na medida em que os atores da sociedade civil
reivindicaram intensamente o direito de participar diretamente dos processos de
discussão, formulação, decisão, implantação e/ou controle das políticas governamentais.
Neste sentido, a conquista de espaços institucionais de participação tendeu a produzir
uma canalização da intervenção dos atores para tais espaços. Um aspecto importante de
ser analisado, no entanto, são as implicações desta institucionalização para a
conformação da sociedade civil e a configuração de suas relações com os atores e
instituições do campo político-institucional. Temas como a autonomia das organizações
sociais e as relações de poder com o Estado, por exemplo, devem ser objeto de estudos
aprofundados.
Os dados sobre o caso de Porto Alegre mostram que esta institucionalização
possibilitou às organizações sociais alterarem de forma significativa sua relação com os
atores políticos do Executivo e, especialmente, do Legislativo municipal. A
possibilidade de acesso direto ao governo municipal rompeu, em grande parte, os
mecanismos de intermediação de interesses sociais a partir dos quais se constituíam as
relações entre mediadores políticos e organizações sociais. O OP, oportunizando um
canal eficaz de encaminhamento as demandas da sociedade civil, foi um dos
instrumentos fundamentais para estas mudanças. Sob este ponto de vista, pode-se
identificar que esta institucionalização contribuiu para uma relativa ampliação da
autonomia das organizações sociais. Se, por outro lado, novas formas de dependência
foram construídas neste mesmo processo, é algo que novos estudos sobre o
associativismo de Porto Alegre deverão investigar.

Bibliografia citada

ABERS, Rebecca. Do clientelismo à cooperação: governos locais, políticas


participativas e organização da sociedade civil em Porto Alegre. Cadernos da
CIDADE, n°7, volume 5, maio/2000.
BAIOCCHI, Gianpaolo. Militants and citizens: the politics of participatory democracy
in Porto Alegre. Stanford: Stanford University Press, 2005.
CALDEIRA, Teresa Pires do Rio. Cidade de muros: crime, segregação e cidadania em
São Paulo. São Paulo: Ed. da USP, 2000.
DIAS, Márcia Ribeiro. Sob o signo da vontade popular. Belo Horizonte: Editora
UFMG; Rio de Janeiro: IUPERJ, 2002.
FEDOZZI, Luciano. O poder da aldeia: gênese e história do Orçamento Participativo
de Porto Alegre. Porto Alegre: Tomo Editorial, 2000.

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MARQUES, Eduardo et all.. Redes pessoais e pobreza: considerações preliminares
para as políticas públicas. Caxambu: XXXI Encontro Anual da ANPOCS, 2007.
SILVA, Marcelo Kunrath. Construção da “participação popular”: análise comparativa
de processos de participação social na discussão pública do orçamento em
municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre/RS. Porto Alegre: UFRGS,
2001. (Tese de Doutorado em Sociologia).

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