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SISTEMAS POLÍTICOS, PARTIDÁRIOS, E ELEITORAIS

1
Sumário
NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2

INTRODUÇÃO ......................................................................................... 3

COMPARANDO SISTEMAS PARTIDÁRIOS: O NÍVEL DE


INSTITUCIONALIZAÇÃO ................................................................................... 6

A ESTABILIDADE DA COMPETIÇÃO PARTIDÁRIA: VOLATILIDADE


ELEITORAL...................................................................................................... 10

SISTEMAS ELEITORAIS ....................................................................... 23

FREQUÊNCIA DA REALIZAÇÃO DAS ELEIÇÕES E DURAÇÃO DOS


MANDATOS ..................................................................................................... 25

DISTRIBUIÇÃO DOS ASSENTOS NO PODER LEGISLATIVO ............ 26

OS SISTEMAS ELEITORAIS E PARTIDÁRIO ...................................... 28

ORGANIZAÇÃO TERRITORIAL DO ELEITORADO ............................. 29

REGRAS, REFORMAS E CONDICIONANTES DA TRANSFERÊNCIA


DIRETA DE DINHEIRO PÚBLICO AOS PARTIDOS POLÍTICOS ................... 30

FORMULAÇÃO E MUDANÇAS NAS REGRAS PARA O


FINANCIAMENTO PARTIDÁRIO-ELEITORAL NO BRASIL ............................ 32

FUNDO PARTIDÁRIO ........................................................................... 46

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................... 54

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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INTRODUÇÃO
Até meados dos anos 1990, a maioria dos trabalhos sobre partidos e
sistemas partidários negligenciou esse fato, dado que tinha o alto nível de
institucionalização como pressuposto. Não obstante, sem examinar a
institucionalização, é impossível entender características importantes dos
sistemas partidários da maioria das democracias e semidemocracias pós-1978.

Os eleitores, partidos e sistemas partidários na maioria dos regimes


competitivos desse período são qualitativamente diferentes daqueles das
democracias industriais avançadas.

Tratamos das duas primeiras dimensões da institucionalização de um


sistema partidário que Mainwaring e Scully (1995) e Mainwaring (1999, p. 22-39)
desenvolveram: a estabilidade da competição entre partidos e a profundidade
das raízes partidárias na democracia, que mostram diferenças grandes e
persistentes entre a maioria das democracias e semidemocracias pós-1978 e as
democracias industriais avançadas.

Além da maior estabilidade na competição entre partidos, o enraizamento


social partidário é muito mais forte na maioria das democracias industriais
avançadas, comparado à maioria das democracias e semidemocracias pós-
1978.

Esse grau de enraizamento partidário social varia de forte a fraco e nós


analisamos duas manifestações dessa força variável. Primeiro, uma quantidade
considerável da literatura teórica e comparativa pressupõe que os vínculos
programáticos ou ideológicos estão na raiz dos vínculos estáveis entre eleitores
e partidos.

Nessas teorias, os eleitores escolhem um partido ou candidato com base


em suas preferências ideológicas ou programáticas. Porém, na maioria das
democracias e semidemocracias pós 1978, esses vínculos são fracos e
constituem uma parte fundamental do frágil enraizamento partidário na
sociedade.

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A outra manifestação empírica desse frágil enraizamento é que os
vínculos entre eleitores e candidatos são mais personalistas na maioria dos
regimes competitivos pós 1978 do que nas democracias industriais avançadas.
Fora destas, muitos eleitores escolhem os candidatos com base em suas
características pessoais, sem levar em conta partido, ideologia ou questões
programáticas.

O alto grau de personalismo reflete esse enraizamento e vai contra o que


se espera, tomando como base a maior parte da literatura teórica sobre eleitores
e sistemas partidários. O personalismo introduz um critério importante para
avaliar a institucionalização dos partidos: a despersonalização dos partidos e da
competição partidária (MÉNY, 1990, p. 67).

A fraca institucionalização tem consequências negativas para a


accountability eleitoral. Sistemas partidários pouco institucionalizados são mais
vulneráveis a permitir que políticos anti-partidos cheguem ao poder, causando
efeitos adversos na democracia, como por exemplo, Fujimori, no Peru entre
1990-2000, e Hugo Chávez, na Venezuela de 1998 até o presente.

Até a década de 1980, a literatura teórica sobre partidos e sistemas


partidários ou concentrava-se em sistemas bem institucionalizados ou os
pressupunha implicitamente. Havia poucas democracias ou semidemocracias
com sistemas partidários pouco institucionalizados.

Porém, desde o início da terceira onda de democratização


(HUNTINGTON, 1991), esses sistemas se tornaram lugar comum nos regimes
políticos competitivos. Eles têm características e dinâmicas diferentes dos
sistemas bem institucionalizados.

Os cientistas sociais precisam modificar a literatura teórica dominante


para compreender esses sistemas partidários menos institucionalizados. Este
artigo baseia-se em Mainwaring e Scully (1995) e Mainwaring, que geraram
grande parte do trabalho contemporâneo sobre institucionalização do sistema
partidário.

Avançamos em relação a esses trabalhos mais antigos de quatro


maneiras. Primeiro, oferecemos mais provas empíricas sistemáticas, usando

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surveys em vários países para demonstrar algumas das proposições anteriores
sobre essa institucionalização.

Com base nesses dados, também desenvolvemos novos indicadores para


avaliar a força das raízes programáticas dos partidos na sociedade.

Em segundo lugar, analisamos uma variedade maior de países do que


naqueles trabalhos e outros estudos anteriores sobre esse tema. Em terceiro
lugar, analisamos alguns aspectos novos da teoria dos sistemas partidários, que
aqueles trabalhos não trataram em detalhe; em particular, questionamos o
pressuposto dos vínculos programáticos e ideológicos que permeia uma parte
da literatura.

Por fim, apresentamos testes mais rigorosos para algumas proposições


empíricas, ao mesmo tempo que abandonamos algumas afirmações difíceis de
testar sobre as consequências da baixa institucionalização.

A segunda metade do artigo, ao mesmo tempo que desenvolve os


conceitos e teorias presentes nos trabalhos citados, apresenta novos
argumentos e evidências.

Diferentemente de Mainwaring e Scully (1995), não comparamos


sistemas partidários em todas as quatro dimensões de sua institucionalização.
Devido às dificuldades de se obter informações empíricas válidas comparáveis
para todas as quatro dimensões em uma ampla gama de países, preferimos
desenvolver alguns pontos em maior profundidade e para um grande número de
países do que oferecer uma discussão superficial de todas as dimensões. Nossa
análise limita-se exclusivamente a democracias e semidemocracias; os partidos
que funcionam em regimes autoritários estão fora de nossa esfera de estudo.

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COMPARANDO SISTEMAS PARTIDÁRIOS: O NÍVEL DE
INSTITUCIONALIZAÇÃO
Um sistema partidário é um conjunto de partidos que interagem de
maneiras padronizadas. Essa definição implica três diferenças entre sistemas e
não sistemas.

Primeiro, como Sartori (1976) mostrou, um sistema deve ter pelo menos
dois elementos constitutivos; portanto, precisa ter ao menos dois partidos.

Segundo, a noção de interações padronizadas sugere que há algumas


regularidades na distribuição do apoio eleitoral por partidos ao longo do tempo,
mesmo que alguns deles ascendam e outros declinem.

Terceiro, a ideia de um sistema implica alguma continuidade nos


componentes que o formam. Portanto, “sistema partidário” implica alguma
continuidade nos partidos, ou seja, a institucionalização das agremiações.

Os sistemas partidários variam em muitas dimensões, mas os cientistas


sociais se empenham em identificar as mais importantes para facilitar a
classificação e a comparação.

Como, então, deveriam os cientistas sociais comparar e classificar os


sistemas partidários?

Sartori (1976) identificou duas dimensões desses sistemas como sendo


de particular importância: o número de partidos relevantes e o grau de
polarização ideológica. Porém, conceituou inadequadamente uma propriedade
igualmente importante dos sistemas partidários: o nível de institucionalização.

Em sua discussão sobre a diferença entre sistemas partidários


consolidados e não-sistemas, Sartori (1976, p. 244-248) foi pioneiro ao
reconhecer a importância da institucionalização (que ele chamou de
“consolidação”). No entanto, discordamos de três aspectos de sua conceituação
de institucionalização. Primeiro, ele postulou uma dicotomia entre sistemas
consolidados e não-sistemas, enquanto nós julgamos muito mais útil conceber a
institucionalização como um continuum. Nada na definição de “sistema” justifica
uma demarcação rígida dicotômica entre um sistema e um não-sistema, desde
que haja algum padrão na competição entre partidos e alguma continuidade nos

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principais partidos do sistema. Esses dois critérios são fáceis de cumprir
minimamente.

As categorias dicotômicas de Sartori ignoram variações importantes


dentro de cada uma dessas categorias. Além disso, uma dicotomia requer um
ponto de corte preciso e inevitavelmente arbitrário: um caso precisa ser
classificado ou como consolidado ou como não-consolidado.

Seguimos as definições de democracia e semidemocracia de Mainwaring,


Brinks e Pérez-Liñan (2001). Incluímos ambas quando nos referimos a regimes
políticos competitivos.

Em segundo lugar, Sartori estabelece um patamar excessivamente alto


para o que constitui um sistema partidário. Por exemplo, ele sustentou que a
Colômbia não tinha um sistema partidário na década de 1970, quando, na
verdade, o país tinha um dos mais antigos do mundo.

Liberais e conservadores eram os principais adversários eleitorais havia


décadas, sempre quando as eleições eram relativamente livres e legítimas, e
ambos os partidos tinham fortes raízes na sociedade.

Em terceiro lugar, pelo fato de que considerava os não-sistemas como


exteriores à sua teorização principal e não examinava a variação na
institucionalização entre sistemas partidários ou entre o que ele considerava não
sistemas, Sartori relegou a institucionalização a um segundo plano. Por exemplo,
as considerações sobre institucionalização estão totalmente ausentes de sua
classificação dos sistemas partidários.

Ao contrário, acreditamos que a institucionalização deve estar no centro


do palco, pois algumas das diferenças mais importantes entre sistemas
partidários giram em torno das diferenças em institucionalização. Uma
classificação dos sistemas partidários baseada no número de partidos e no nível
de polarização negligencia diferenças substanciais no grau de institucionalização
e, portanto, como a competição entre partidos funciona em contextos menos
institucionalizados.

Ao comparar e classificar os sistemas partidários para além das


democracias industriais avançadas, os cientistas políticos que trabalham sobre

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a América Latina reconheceram cada vez mais a necessidade de dar atenção ao
nível de institucionalização, além das duas dimensões de Sartori.

Sistemas partidários institucionalizados estruturam em alto grau o


processo político. Em sistemas fluidos, os partidos são, de alguma forma, atores
importantes, mas não possuem o mesmo efeito estruturador.

Outros estudiosos trataram da institucionalização dos partidos (DIX, 1992;


GUNTHER e HOPKIN, 2002; HUNTINGTON, 1968, p. 12-28; JANDA, 1980;
LEVITSKY, 2003; MÉNY, 1990; PANEBIANCO, 1988; RANDALL e SVÅSAND,
2002). A institucionalização dos partidos nas democracias está forte e
positivamente correlacionada à institucionalização do sistema partidário, mas a
relação não é linear, como observaram Mainwaring e Scully (1995), Randall e
Svåsand (2002), Stockton (2001) e Wallis (2003).

Institucionalização refere-se a um processo pelo qual uma prática ou


organização se torna bem estabelecida e amplamente conhecida, senão
universalmente aceita. Os atores desenvolvem expectativas, orientações e
comportamentos baseados na premissa de que essa prática ou organização
prevalecerá no futuro previsível.

Em política, institucionalização significa que os atores políticos têm


expectativas claras e estáveis em relação ao comportamento dos outros atores.
Nas palavras de Huntington (1968), “institucionalização é o processo pelo qual
organizações e procedimentos adquirem valor e estabilidade”. Desse modo, um
sistema partidário institucionalizado é aquele em que os atores desenvolvem
expectativas e comportamentos baseados na premissa de que os contornos e
as regras fundamentais da competição e do comportamento partidários
prevalecerão no futuro previsível.

Num sistema partidário institucionalizado, os principais partidos e seu


comportamento serão estáveis. A noção de institucionalização não deve ser
teleológica, nem o processo é linear; não há progressão necessária de uma
institucionalização fraca para uma maior.

Os sistemas partidários podem se desinstitucionalizar, como mostram os


casos da Itália, do Peru e da Venezuela nos anos 1990.

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Seguindo Mainwaring (1999, p. 22-39) e Mainwaring e Scully (1995),
conceituamos quatro dimensões da institucionalização do sistema partidário.
Primeiro, sistemas mais institucionalizados manifestam considerável
estabilidade nos padrões de competição entre partidos (PRZEWORSKI, 1975).
Essa é a dimensão mais fácil de medir e talvez a mais importante, porque a
institucionalização está conceitualmente muito vinculada à estabilidade. Em
segundo lugar, em sistemas mais institucionalizados, os partidos têm raízes
fortes na sociedade, a maioria dos eleitores tem ligações partidárias e algumas
associações de interesse estão intimamente ligadas a eles. Um forte
enraizamento partidário na sociedade ajuda a proporcionar a regularidade na
competição eleitoral que a ideia de institucionalização implica.

Raízes na sociedade e estabilidade da competição entre partidos, embora


analiticamente separáveis, estão entrelaçadas porque o forte enraizamento
social estabiliza a competição. Se a maioria dos cidadãos apoia o mesmo partido
de uma eleição para outra, há menos eleitores flutuantes e, portanto, menor
probabilidade de mudanças eleitorais em massa que se refletem em alta
volatilidade.

Ao contrário, onde os partidos possuem raízes fracas na sociedade, é


provável que mais eleitores troquem de partido de uma eleição para outra,
abrindo assim a possibilidade de uma maior volatilidade. Em terceiro lugar, em
sistemas mais institucionalizados, os atores políticos conferem legitimidade aos
partidos, considerando-os uma parte necessária da política democrática, mesmo
quando criticam determinados partidos e manifestam ceticismo em relação aos
partidos em geral (TORCAL, GUNTHER e MONTERO, 2002).

A legitimidade ajuda a estabilizar os sistemas partidários e, portanto, é


uma dimensão atitudinal significativa da institucionalização.

Por fim, em sistemas mais institucionalizados, as organizações partidárias


não estão subordinadas aos interesses de uns poucos líderes ambiciosos; elas
adquirem um status e um valor independente próprio (HUNTINGTON, 1968,).

A institucionalização partidária é limitada quando um partido é instrumento


pessoal de um líder ou de um pequeno grupo (JANDA, 1980). Quando os

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partidos eleitoralmente bem-sucedidos são veículos personalistas, o nível de
institucionalização do sistema é baixo nessa quarta dimensão.

Embora discordemos de Sartori quando concebemos a institucionalização


como um continuum, em vez de uma dicotomia, ele merece grande crédito por
reconhecer que há profundas diferenças nos sistemas partidários conforme o
nível de institucionalização. Após sua obra clássica, essa questão foi
completamente esquecida até Bendel (1993) e Mainwaring e Scully (1995).

Os sistemas partidários caracterizados por um grau baixo de


institucionalização podem ser denominados fluidos ou fracamente
institucionalizados. A institucionalização é uma variável contínua que vai de
sistemas partidários institucionalizados a fluidos. Comparados com sistemas
mais institucionalizados, os sistemas fluidos caracterizam-se por menos
regularidade nos padrões da competição, raízes mais fracas na sociedade,
menor legitimidade conferida aos partidos e organizações partidárias mais
débeis, dominadas frequentemente por líderes personalistas.

A ESTABILIDADE DA COMPETIÇÃO PARTIDÁRIA:


VOLATILIDADE ELEITORAL
Para desenvolver o argumento de que os sistemas partidários
competitivos contemporâneos diferem em aspectos importantes que não podem
ser captados pela tipologia de Sartori, comparamos 39 países conforme a
primeira dimensão da institucionalização: a regularidade dos padrões de
competição partidária. Das quatro dimensões mencionadas, é a mais fácil de
medir sistematicamente, comparando especificamente a volatilidade eleitoral.
Essa volatilidade refere-se à transferência agregada de votos de um partido para
os outros, de uma eleição para a próxima (PEDERSEN, 1983; PRZEWORSKI,
1975; ROBERTS e WIBBEL, 1999).

Uma vez que a discussão de Huntington sobre institucionalização é bem


conhecida, vale a pena observar que nosso conceito difere do dele. Nosso foco
é sobre os sistemas partidários, o dele era sobre partidos. Mais importante, ele
considerava os partidos mais institucionalizados quando eram mais autônomos

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em relação aos grupos sociais. Ao contrário, nós acreditamos que vínculos fortes
entre partidos e grupos sociais manifestam raízes partidárias mais profundas na
sociedade e maior institucionalização é computada somando-se a mudança
líquida em porcentagem de votos ganhos ou perdidos por cada partido de uma
eleição para outra e depois dividindo-se por dois.

Limitamos a seleção de casos a países que até 2003 haviam tido pelo
menos três eleições consecutivas para a câmara baixa, quando o escore
combinado atribuído pela Freedom House ao país era 10 ou menos. O país com
um escore combinado médio de 11 ou mais tinham regimes autoritários e são
classificados pela Freedom House como “não livres”. Em regimes autoritários,
os partidos possuem funções diferentes do que nas democracias e
semidemocracias. Esses regimes não permitem eleições livres e justas, seu
controle das eleições favorece o partido governante e tende a limitar a
volatilidade eleitoral. Portanto, costuma ser enganador comparar a volatilidade
eleitoral entre os dois tipos de regimes. Assim, somente o período democrático
mais recente é levado em conta nos países onde houve uma interrupção da
democracia e, dessa forma, usamos apenas eleições posteriores a 1978.

A Freedom House publica um relatório anual sobre o estado das


liberdades civis e dos direitos políticos na maioria dos países. Os escores variam
de 1 (melhor) a 7 (pior). Combinamos os dois escores, criando um índice de 2
(mais democrático) a 14 (mais autoritário). Não incluímos Bangladesh e as
Filipinas devido à ausência de resultados eleitorais completos. Para o Equador,
usamos resultados para deputados selecionados em um distrito de âmbito
federal, não os resultados separados para deputados federais eleitos em distritos
de âmbito provinciais. 8 Para Bélgica, França, Itália, Holanda, Reino Unido e
Alemanha Ocidental, usamos o European Election Study 1994.

Os sistemas partidários variam de muito estáveis (Estados Unidos,


Austrália etc.) a extremamente voláteis (Ucrânia, Letônia, Romênia, Peru,
Rússia, Polônia e Estônia). A mudança eleitoral é, em média, muito maior nas
democracias e semidemocracias em desenvolvimento do que nas democracias
industriais avançadas, ainda que nestas últimas, como Dalton, McAllister e
Wattenberg (2000) afirmam, a volatilidade tenha aumentado em décadas
recentes. Nos Estados Unidos, o resultado da eleição anterior para a câmara

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baixa serve como excelente preditor do resultado da eleição subsequente por
partido, com um erro médio de apenas 3,2%. Em contraste, na Ucrânia, o
procedimento idêntico oferece pouca capacidade de previsão, com um erro
médio de 59,2% (dezoito vezes maior do que nos EUA).

Lipset e Rokkan (1967) caracterizaram os sistemas partidários da


Europa Ocidental como “congelados”. Ao contrário, muitos sistemas
partidários contemporâneos em regimes políticos competitivos são
altamente fluidos. Os escores de volatilidade ressaltam a vantagem de
conceber a institucionalização como uma variável contínua e qualquer
tentativa de estabelecer um ponto de corte dicotômico seria arbitrária.
A mesma observação se aplica aos outros indicadores desenvolvidos
mais adiante neste artigo.

Em geral, os países mais ricos possuem volatilidade eleitoral menor. Em


uma regressão OLS com a volatilidade média dos países como a variável
dependente e o IDH deles como a única variável independente, esta última foi
significativa no nível 0,000 e teve um forte impacto substantivo; cada aumento
de 0,100 no IDH levou a uma diminuição esperada de 12,5% na volatilidade
eleitoral. O IDH respondeu por 46,3% da variação em escores de volatilidade.
Numa segunda regressão OLS, com apenas uma variável independente, o PIB
per capita foi um preditor ainda mais forte da volatilidade, respondendo por
60,6% da variação nos escores de volatilidade.

A variável PIB per capita foi significativa no nível de 0,000 e teve um forte
impacto substantivo; um aumento de US$ 1.000 nela produz uma diminuição
esperada de 1,29% na volatilidade eleitoral. Esses resultados mostram que as
democracias industriais avançadas possuem sistemas partidários mais estáveis
do que as democracias e semidemocracias menos desenvolvidas.

A correlação entre renda per capita dos países e sua volatilidade eleitoral
média foi um impressionante –0,78, significativa no nível de 0,000 (2-tailed). Os
dezesseis países com o IDH mais alto (IDH ≥ 0,892) estão entre os dezoito
países com a volatilidade eleitoral mais baixa. As causas da forte correlação
entre um alto nível de desenvolvimento e a baixa volatilidade eleitoral requerem
pesquisas além do que é possível fazer aqui; oferecemos apenas algumas
breves reflexões. O fato de que a maioria dos sistemas partidários da Europa

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Ocidental tenha se estabilizado antes da Segunda Guerra, quando esses países
tinham padrões de vida muito mais baixos do que os atuais, indica que a principal
explicação não é o argumento baseado na modernização, segundo o qual um
nível mais alto de desenvolvimento causa volatilidade eleitoral mais baixa. Na
maioria do que agora são democracias industriais avançadas, os partidos foram
veículos de integração social e política das massas de novos cidadãos
(CHALMERS, 1964; PIZZORNO, 1981).

Eles construíram organizações integradoras e solidificaram fortes


lealdades. Na maioria dos países de democratização tardia, os partidos
ocuparam um lugar menos central na luta para expandir a cidadania e nunca
tiveram as funções sociais de amplo alcance ou fomentaram fortes identidades,
tal como fizeram nas democracias mais antigas (GUNTHER e DIAMOND, 2003).
Essas diferenças de padrões históricos (path dependence) ajudam a explicar as
altas correlações entre um nível maior de desenvolvimento e um sistema
partidário mais estável. O mau desempenho econômico em muitos países
menos desenvolvidos contribuiu também para a alta volatilidade eleitoral
(REMMER, 1991; ROBERTS e WIBBLES, 1999).

Um fator contribuinte final dessa alta volatilidade em muitos países menos


desenvolvidos são as frequentes mudanças do lado da oferta, na medida em que
as elites políticas mudam de um partido para outro (ROSE e MUNRO, 2003).

Converse (1969) sustentou que os sistemas partidários se tornariam


mais estáveis ao longo do tempo, à medida que os eleitores
passassem a se identificar com determinados partidos9. Porém,
pesquisas recentes indicaram que a maioria dos eleitores aprende
rapidamente a localizar as posições dos partidos (KITSCHELT et al.,
1999) e que os sistemas partidários em países menos desenvolvidos
não tendem, em média, a se tornar mais estáveis ao longo do tempo
(BIELSIAK, 2002). Nossos dados sobre volatilidade eleitoral parecem
confirmar esse argumento.

Raízes partidárias e voto personalista. Nesta seção, examinamos um


aspecto diferente das raízes dos partidos na sociedade. A disseminação do voto
baseado nas características pessoais dos candidatos, sem conteúdo
programático ou ideológico, é um sinal revelador da fraqueza das raízes
partidárias.

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Quando há laços fortes entre eleitores e partidos, sejam construídos por
vínculos programáticos/ideológicos, clientelistas ou tradicionais/afetivos, os
eleitores permanecem fiéis ao seu partido e a personalidade dos candidatos tem
importância secundária. Não temos dados que nos permitam comparar o grau
de voto clientelista em diferentes países. Indícios consideráveis – embora não
sistemáticos – sugerem que o clientelismo é mais disseminado na maioria das
democracias das terceira e quarta ondas do que nas democracias industriais
avançadas.

Líderes e personalização tornaram-se cada vez mais importantes em


resultados de eleições, mesmo em países com sistemas de governo
parlamentaristas, constituindo o fenômeno chamado de “presidencialização das
campanhas eleitorais modernas” (CREWE e KING, 1994; KAASE, 1994).

Nas democracias industriais avançadas, a avaliação dos líderes pelos


cidadãos contém componentes programáticos, ideológicos ou de identificação
partidária. Nos sistemas partidários fluidos, o personalismo desprovido de
componentes programáticos e ideológicos desempenha usualmente um papel
muito maior no voto (SILVEIRA, 1998).

Em sistemas mais institucionalizados, é mais provável que os eleitores se


identifiquem com um partido, e os partidos dominam os padrões de recrutamento
e deliberação política. Em sistemas fluidos, muitos eleitores escolhem mais de
acordo com a personalidade do que com o partido, políticos anti partidos têm
mais chance de ganhar eleições e o populismo e a anti política são mais comuns.

A cena política é dominada mais por personalidades do que por partidos.


O voto personalista é um fenômeno político importante e parcialmente
mensurável (KING, 2002a e 2002b), mas tem sido negligenciado na maior parte
da literatura sobre voto, inclusive nos modelos espaciais e nos trabalhos
baseados no esquema esquerda-direita.

Em sistemas fluidos, personalidades independentes de partidos e


preferências programáticas têm um impacto considerável nas campanhas
eleitorais e políticos independentes podem ter sucesso em suas candidaturas a
altos cargos. O espaço para os populistas é maior, especialmente nos sistemas
presidencialistas, uma vez que os candidatos apelam diretamente aos eleitores,

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sem necessidade de se elegerem presidentes de partidos para se tornarem
chefes de Estado. Um modo de avaliar a importância do personalismo em
campanhas eleitorais são os dados sobre os candidatos outsiders à presidência.

Candidatos a presidente eleitoralmente competitivos, sejam


independentes ou de partidos novos, refletem um alto grau de personalismo e a
abertura dos eleitores para candidaturas externas aos partidos estabelecidos.
Por motivos operacionais, definimos esses candidatos outsiders como
independentes (sem filiação partidária) ou que pertencem a um partido que
obteve menos de 5% dos votos para a câmara baixa na eleição anterior e não
apresentaram candidatura à presidência em qualquer eleição antes da anterior.

Silveira (1998) realiza um excelente estudo do voto personalista no


Brasil. Ele enfatiza os aspectos não-programáticos e não-ideológicos
dos eleitores brasileiros pobres. Esse tema tem ressonâncias em
alguns trabalhos sobre os Estados Unidos (CONVERSE, 1964;
HIBBING e THEISS-MORSE, 2002), mas vai no sentido oposto da
maior parte do trabalho recente sobre as democracias industriais
avançadas.

A literatura sobre populismo é relevante para a análise do voto


personalista, dado que os líderes populistas estabelecem uma relação direta e
personalista com as massas. Os outsiders ganharam a eleição presidencial no
Peru em 1990, na Venezuela em 1993 e 1998 e na Colômbia e no Equador em
200221. A recorrência extraordinária desses eventos políticos revela a fraca
institucionalização do sistema partidário existente. Outro outsider (Evo Morales)
foi para o segundo turno na eleição presidencial da Bolívia em 2002. Na
Colômbia, na Venezuela, no Equador e na Bolívia, os outsiders obtiveram pelo
menos 50% dos votos válidos em uma das duas últimas eleições presidenciais.

Alguns detalhes adicionais sobre como codificamos os candidatos


outsiders ou não: nossa intenção é levar em conta somente os partidos que são
realmente novos. Portanto, se um partido mudou de nome da Eleição t para a
Eleição t+1, não o consideramos como partido novo em t+1. Pela mesma razão,
não contamos uma aliança (coalizão) de partidos anteriormente existentes como
um novo partido. Não contamos a fusão de dois partidos anteriormente
existentes como um partido novo. Em casos de cisão de um partido, nenhum dos

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partidos resultantes foi contado como novo. Contamos como independentes os
candidatos que não tinham uma filiação partidária. Dentre esses três pares de
partidos, mostramos os resultados do par que teve o maior coeficiente
estandardizado para a variável esquerda-direita.

O voto mais claramente ideológico entre os três maiores pares de partidos


nos diz mais sobre o voto ideológico do que uma média dos coeficientes
estandardizados. Mesmo nos sistemas em que a ideologia é um aspecto
poderoso da competição partidária, ela não é um preditor forte do voto entre cada
e todos os pares de partidos.

A ideologia deveria ser antes um bom preditor do voto entre partidos que
são relativamente distantes ideologicamente. Se entre os três maiores partidos,
dois são de centro-esquerda e o terceiro é de centro-direita, não esperaríamos
que a ideologia fosse um preditor poderoso da preferência de voto entre os dois
partidos de centro-esquerda.

Há dois tipos de outsiders: aqueles que jamais foram políticos nacionais


e concorrem contra o establishment – como Alberto Fujimori, Hugo Chávez e
Lucio Gutiérrez – e aqueles que estão fora do sistema partidário – como Rafael
Caldera e Álvaro Uribe Vélez.

Os primeiros não têm experiência anterior de política nacional e os últimos


são dissidentes de partidos tradicionais. Aqui, nos concentramos nos políticos
que estão fora do sistema partidário estabelecido.

No Brasil, o presidente Fernando Collor de Mello (1990-92) criou um


partido com o objetivo de concorrer à presidência em 1989 e derrotou os
candidatos dos partidos estabelecidos. Sete meses depois de sua posse, seu
partido conquistou apenas 40 das 503 cadeiras da Câmara de Deputados nas
eleições parlamentares de outubro de 1990. Com um claro apelo personalista e
não partidário, seu partido desapareceu depois que ele renunciou em 1992, a
fim de evitar o impeachment.

O presidente peruano Alberto Fujimori (1990-2000) também criou um


partido para concorrer à presidência, fez campanha contra os partidos e depois
evitou esforços para construir um partido. No Peru, os políticos independentes

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dominaram as eleições municipais de 1995 e a possibilidade dos apelos anti
partidários conquistarem o apoio popular levou ao surgimento de um novo grupo
de políticos antipartidos. Fujimori controlava pessoalmente as escolhas de
candidatos ao congresso em seu partido altamente personalizado (CONAGHAN,
2000) em um processo oposto ao que se encontra em um sistema
institucionalizado. Além disso, é possível aos candidatos terem acesso às
eleições sem um partido e vencê-las como independentes.

O ex-líder golpista Hugo Chávez criou um partido novo em sua investida


bem-sucedida à presidência da Venezuela, em 1998. Do mesmo modo, no
Equador, em 2002, o ex-líder golpista Lucio Gutiérrez criou um novo partido em
sua campanha vencedora à presidência. O personalismo e os políticos anti
partidos são também comuns em alguns países pós-comunistas. O ex-
presidente russo Boris Iéltsin não era membro de um partido e solapou os
partidos.

Alexander Lebed, que terminou em terceiro lugar na eleição presidencial


da Rússia em 1996, concorreu como independente. Os candidatos não-
partidários saíram-se bem nas eleições para as duas casas do parlamento russo.
Nas eleições de 1993, bem mais da metade dos candidatos de distritos de um
único representante à câmara baixa eram independentes sem filiação partidária,
e somente 83 dos 218 deputados eleitos pertenciam a um partido (MOSER,
1995).

Em 1995, mais de mil dos 2.700 candidatos nessa categoria eram


independentes. Dos 225 assentos destinados a representantes únicos, 78 foram
ganhos por independentes; o maior partido conseguiu obter apenas 58 cadeiras
(WHITE, ROSE e MCALLISTER, 1997).

O ex-rei Simeão II da Bulgária também criou um veículo político


personalista bem-sucedido eleitoralmente.

Por que o voto personalista é comum em alguns sistemas partidários,


mesmo depois de um tempo considerável de regime democrático?

17
Não podemos responder a essa questão plenamente aqui, mas é possível
fazer algumas especulações. Primeiro, as sequências históricas na construção
dos partidos são importantes.

Nas democracias antigas e bem estabelecidas, os partidos enraizaram-se


na sociedade antes do surgimento dos meios modernos de comunicação de
massa, em especial da televisão.

Na Europa Ocidental, os partidos da classe operária integraram os


trabalhadores no sistema político e proporcionaram fontes fundamentais de
identidade (CHALMERS, 1964; PIZZORNO, 1981).

Fenômeno semelhante ocorreu com os partidos democratas cristãos


(KALYVAS, 1996). Em contraste, na maioria dos sistemas pouco
institucionalizados, a televisão tornou-se um fenômeno de massa antes dos
partidos estarem bem enraizados. Os candidatos a cargos executivos podem
apresentar suas mensagens na televisão sem a necessidade de contar com
organizações partidárias bem desenvolvidas (SARTORI, 1989), o que permite o
surgimento de partidos altamente personalistas (GUNTHER e DIAMOND, 2003,
p. 187).

Em segundo lugar, o mau desempenho de muitos regimes competitivos


pós-1978 desacreditou os partidos governantes (REMMER, 1991; ROBERTS e
WIBBLES, 1999; TAVITS, 2005) e, até de uma maneira mais ampla,
desacreditou os partidos como veículos de representação. Esse fenômeno abriu
as portas para as cruzadas personalistas anti partidárias. Em terceiro lugar, em
muitos regimes competitivos pós-1978, os partidos são programaticamente
difusos (KITSCHELT et al., 1999, p. 164-190; OSTINGUY, 1998), dificultando
que os eleitores possam determinar qual deles está mais próximo de suas
posições, ou então podem ser ideologicamente pouco confiáveis, fazendo
mudanças radicais em seus posicionamentos (STOKES, 2001). Nessas
circunstâncias, os eleitores são voláteis e é mais provável que se voltem para
candidatos personalistas, que frequentemente fazem campanha contra os
partidos.

18
Em quarto lugar, o voto personalista é provavelmente mais forte nos
sistemas presidencialistas do que nos parlamentaristas e a maioria das
democracias industriais avançadas possui sistemas desse último tipo, ao passo
que muitos dos regimes competitivos pós-1978 são presidencialistas.

A predominância do personalismo está relacionada com a segunda e a


quarta dimensões da institucionalização do sistema partidário. Os vínculos
personalistas entre eleitores e candidatos tendem a ser mais fortes onde as
raízes partidárias na sociedade são mais fracas.

Em sistemas fluidos, os partidos possuem recursos precários e são pouco


profissionalizados. Muitos partidos são veículos personalistas (CONAGHAN,
2000). O voto baseado na avaliação racional de líderes poderia, em princípio,
ser um sinal de sofisticação política e maior accountability eleitoral. King (2002a)
chama tais avaliações, que têm conteúdo programático/ideológico, de efeitos
indiretos das avaliações dos candidatos. Porém, em muitos sistemas partidários
fluidos, a relação entre a posição ideológica dos indivíduos e sua avaliação dos
líderes políticos é fraca pois essa avaliação não se baseia em princípios
programáticos e ideológicos.

A relação entre avaliação da liderança e ideologia é alta nas democracias


industriais avançadas, mas baixa nos países com sistemas partidários pouco
institucionalizados. Em alguns países (México, Peru e Taiwan), essa relação foi
quase zero. A correlação entre a correlação média de Pearson dos países na
Tabela 5 e sua volatilidade eleitoral é 0,41 (n=18, p < 0,10), demonstrando um
vínculo um pouco mais forte entre posição ideológica e avaliação da liderança
em sistemas partidários institucionalizados22.

A avaliação da liderança poderia ser, em princípio, um meio razoável de


promover a representação e a accountability eleitoral, mas onde não está bem
conectada a questões ideológicas ou programáticas, essa avaliação indica
personalismo não-programático.

De acordo com muitas visões (BARNES, 1977; CONVERSE e PIERCE,


1986), a representação desprovida de conteúdo programático não tem sentido;
a representação só existe graças à correspondência programática/ideológica
entre as ideias dos representantes e dos cidadãos (ver também LUNA e

19
ZECHMEISTER, 2005). Essa representação ocorre somente por acaso, se é que
acontece, quando não há relação entre as posições ideológicas dos cidadãos e
a avaliação que fazem dos líderes políticos. Em muitos regimes competitivos
pós-1978, a conexão entre a posição ideológica dos cidadãos e seus líderes
políticos preferidos é fraca.

A importância do voto personalista desprovido de muito conteúdo


ideológico em sistemas partidários menos institucionalizados sugere, mais uma
vez, a necessidade de cautela na aplicação de modelos teóricos baseados no
pressuposto de que a escolha eleitoral é programática ou ideológica. Com
frequência, não é este o caso em sistemas partidários fluidos.

A consciência da importância da institucionalização do sistema partidário


aumentou na última década, mas os cientistas sociais que trabalham sobre
sistemas fluidos precisam continuar a repensar o modo como teorizamos e
comparamos os sistemas partidários. Algumas teorias que foram apresentadas
como universais – por exemplo, as teorias espaciais do voto e da competição
partidária – são, na verdade, mais úteis para analisar as democracias industriais
avançadas do que os sistemas fluidos.

É essencial estar consciente dessas diferenças entre os dois sistemas e


evitar a pressuposição de que teorias supostamente universais, construídas
implicitamente com base nas democracias industriais avançadas, serão
aplicáveis a sistemas partidários fluidos.

Os sistemas partidários variam muito em níveis de institucionalização, e


esta varia independentemente do número de partidos e do nível de polarização.
Os analistas que comparam sistemas partidários com base no número de
partidos põem no mesmo grupo os casos multipartidários, sem levar em conta o
nível de institucionalização, mas os casos pouco institucionalizados diferem
bastante daqueles solidamente enraizados.

É enganoso tratar todos os sistemas multipartidários como uma categoria


indiferenciada quando há enormes diferenças em institucionalização. Equador,
Noruega, Peru, Rússia e Suécia possuem sistemas multipartidários, mas os da
Noruega e da Suécia são muito mais institucionalizados do que os dos outros
três países citados.

20
Misturar indiscriminadamente esses casos de multipartidarismo esconde
diferenças profundas na natureza dos sistemas. A institucionalização varia
também de modo significativo em relação à distância ideológica no sistema
partidário. Alguns sistemas polarizados (por exemplo, a França dos anos 1960
aos anos 1980, a Itália dos anos 1940 aos 1980) estavam bem
institucionalizados. Outros sistemas polarizados (o Brasil de meados a fins dos
anos 1980, a Venezuela desde 1998) são menos institucionalizados e funcionam
de maneira diferente.

Uma questão fundamental no estudo comparativo de sistemas partidários,


tanto quanto o número de partidos e a distância ideológica entre eles, é o seu
nível de institucionalização. Nosso foco neste artigo concentrou-se nas
diferenças cruciais na institucionalização do sistema partidário e em como essas
diferenças exigem que se repense a teoria do sistema partidário. Nossa intuição
é de que a institucionalização tem consequências importantes para a política
democrática. De outro modo, não seria uma questão essencial no estudo dos
sistemas partidários.

Desse modo, encerramos com duas observações sobre as


consequências da fraca institucionalização do sistema. Primeiro, a pouca
institucionalização introduz mais incertezas quanto aos resultados eleitorais e
pode enfraquecer os regimes democráticos. A transferência de votos de um
partido para o outro é maior, as barreiras de entrada para novos partidos são
mais baixas e a probabilidade de que políticos personalistas antissistemas
possam chegar à chefia do governo é muito maior. Essa incerteza revelou-se
inimiga da democracia até os anos 1980, quando o fim da Guerra Fria reduziu o
nível do conflito político e facilitou a expansão pós-1989 das democracias e
semidemocracias no mundo. Mas, mesmo no contexto do pós-Guerra Fria, o
grau muito mais alto de personalismo em sistemas partidários pouco
institucionalizados pode abrir caminho para o autoritarismo (por exemplo,
Fujimori no Peru em 1992) ou para uma erosão dos regimes democráticos e
semidemocráticos (por exemplo, Hugo Chávez na Venezuela desde 1998)
(MAYORGA, no prelo; TANAKA, no prelo).

21
Em segundo lugar, a institucionalização fraca é inimiga da accountability
eleitoral. Na maioria das democracias, os partidos são o mecanismo primário
dessa accountability e, para que esta funcione bem, os eleitores devem poder
identificar – em termos amplos – o que são os principais partidos e o que
defendem (HINICH e MUNGER, 1994).

Em contextos nos quais os partidos aparecem e desaparecem com


frequência, onde a competição entre eles é ideológica e programaticamente
difusa e onde personalidades costumam ofuscar os partidos como rota para o
poder executivo, as perspectivas de uma accountability eleitoral efetiva sofrem
abalos consideráveis.

Para que essa accountability e a representação política funcionem bem,


o ambiente político precisa proporcionar aos cidadãos elementos efetivos de
informação que lhes possibilitem votar de forma racional, sem gastar tempo
desmedido para chegar a essas decisões. Em sistemas institucionalizados, os
partidos oferecem uma referência ideológica que dá certa ancoragem aos
eleitores, reduzindo os custos da informação e aumentando assim os níveis de
accountability eleitoral. A estabilidade limitada de sistemas partidários menos
institucionalizados e o fraco conteúdo programático/ideológico que as siglas dos
partidos oferecem nesses contextos reduzem os elementos informativos que
esses sistemas oferecem aos eleitores, por sua vez, dificultando a racionalidade
e diminuindo o potencial para uma accountability eleitoral baseada em uma
avaliação racional de políticas, governos e líderes. Onde essa accountability
sofre, pode romper-se a promessa da democracia representativa de que os
políticos eleitos servirão de agentes dos eleitores para promover algum bem
comum ou defender os interesses de eleitorados específicos (LUNA e
ZECHMEISTER, 2005).

Em uma das citações mais famosas da história da análise dos partidos


políticos, Schattschneider (1942) escreveu que os “partidos políticos
criaram a democracia moderna e a democracia moderna é impensável
exceto em termos dos partidos”. Se a história da democracia moderna
está alicerçada sobre os partidos políticos, então podemos esperar que
a democracia apresente algumas deficiências onde os partidos são
mecanismos menos estáveis de representação, accountability e
estruturação do que foram nas democracias industriais avançadas.

22
A accountability eleitoral também sofre onde os partidos fazem mudanças
radicais de orientação, como ocorreu em muitos países latino-americanos nos
anos 1980 e 1990 (STOKES, 2001). Em alguns sistemas fluidos, um grande
número de legisladores muda de partido durante seus mandatos (HELLER e
MERSHON, 2005).

SISTEMAS ELEITORAIS
Os sistemas eleitorais constituem o conjunto de técnicas e procedimentos
que se empregam na realização das eleições, destinados a organizar a
representação do povo no território nacional.

Em uma definição mais detalhada, os autores Jefferson Dalmoro e David


Fleischer afirmam que: “A elaboração de uma lei eleitoral para um determinado
país ou estado é a definição das regras que levarão a cabo a representação dos
habitantes dessa região em seus órgãos legislativos e executivos, ordenando
preferências através da distribuição de um ou mais assentos (principalmente das
câmaras baixas) em conformidade com aquilo que for expresso pelos eleitores
em seus votos […]. É um conjunto de regras que vai determinar como se dará a
representação, quantos representantes, como serão escolhidos e o prazo de
seus mandatos, além de outros aspectos como propaganda, recursos para
campanhas, prazos de filiação e os de inelegibilidade e acrescenta a grande
influência que as regras do sistema eleitoral podem exercer sobre a disputa de
poder entre partidos: “Mas acima de tudo, a Lei eleitoral tem o poder de limitar
ou ampliar a participação dos partidos políticos nos órgãos de representação
popular conforme o seu tamanho. Ela pode, de acordo com sua confecção, dar
maior ou menor peso aos votos de uma determinada circunscrição. Pode ainda
dar maior peso aos votos de uma determinada circunscrição.

Pode ainda dar maior peso aos votos de determinados partidos, e fazer
variar os custos de uma cadeira de um partido para outro, isso conforme os
mecanismos de competição estabelecidos e a forma de distribuição das vagas,
principalmente das sobras, ou também de acordo com as diferenças entre os
diversos quocientes eleitorais e tamanhos das circunscrições eleitorais”.

23
Além disso, defende que nenhuma lei eleitoral pode ser considerada
definitiva, assim como nenhum dos métodos eleitorais (proporcionais ou
majoritários) é considerado definitivo nem isentos de críticas.

No direito brasileiro, após um longo período de regime autoritário,


marcado pela manipulação de algumas regras eleitorais, mas também pela
realização de eleições, a disciplina das eleições vem sendo feita pela Lei 9504
de 1997 e outras leis esparsas.

O Líbano, por sua vez, possui uma complexa estrutura eleitoral que foi
pensada para manter um equilíbrio entre a representação política das diferentes
comunidades religiosas do país. Com exceção do período entre 1974 e 1989,
marcado pela guerra civil, eleições multipartidárias têm sido realizadas
regularmente.

As eleições no Líbano são administradas e organizadas pelo Ministério do


Interior e Municipalidades e, atualmente, se regem por algumas disposições da
Constituição Libanesa, pelo Pacto Nacional de 1943 (acordo não escrito) e, mais
especificamente, pela Lei n. 25 de 2008. Segundo a organização IFES
(“International Foundation for Electoral Systems”), voltada no Líbano para dar
suporte ao processo de reforma eleitoral e ao avanço na condução das eleições,
há grande demanda por reforma eleitoral.

A Lei eleitoral de 2008 já introduziu alguns avanços, como o limite de


gastos campanha, regulação da cobertura da mídia, garantias para observação
eleitoral e acesso para pessoas com deficiências, além medidas implementadas
pelo Ministério do Interior que melhorou a transparência e encorajou a
participação, o que levou a avaliações positivas por parte de organizações como
a “Lebanese Transparency Association”, a “National Democratic Institute” e os
grupos de observação da União Europeia.

As demandas ainda existentes são, entre outras, pela adoção do sistema


de representação proporcional, uso de cédulas padronizadas, possibilidade de
maiores de 18 anos votarem, adoção de quota de gênero e estabelecimento de
uma Comissão Eleitoral independente. Tratando justamente dos cenários para o
sistema eleitoral nas próximas eleições, cujo ponto de partida são os principais
projetos de lei em discussão, Arda Arsenian Ekmekji, esclarece que as

24
possibilidades são: a atual configuração, o projeto de lei da Comissão Boutros,
da qual faz parte e acredita ser necessária a implementação em prol de um
Líbano moderno e democrático, e o projeto apresentado ao parlamento pelo
atual Ministro do Interior96. Esclareça-se, entretanto, que o presente trabalho se
baseia na atual configuração.

FREQUÊNCIA DA REALIZAÇÃO DAS ELEIÇÕES E DURAÇÃO


DOS MANDATOS
No sistema eleitoral libanês, o Presidente da República é eleito a cada
seis anos, sem direito a reeleição para o período subsequente; Primeiro Ministro
designado por decreto do presidente, após consulta de caráter vinculante ao
parlamento98; eleições legislativas acontecem a cada quatro anos; e o
Presidente Constituição libanesa, art. 53, 2 e 3. do Parlamento é eleito na
primeira sessão de toda nova Câmara dos Deputados.

As próximas eleições legislativas devem ocorrer em junho de 2013 e as


próximas eleições presidenciais em 2014. No direito constitucional brasileiro, o
Presidente da República é eleito a cada quatro anos, com direito à reeleição. Os
deputados são eleitos para mandatos de quatro anos. Os senadores, por sua
vez, serão eleitos para mandatos de oito anos (artigo 46, parágrafo 1º).

A representação de cada Estado e do Distrito Federal será renovada de


quatro em quatro anos, alternadamente, por um e dois terços. Com relação ao
Chefe do Poder Executivo e Poder Legislativo dos Estados, Distrito Federal e
municípios, a duração dos mandatos é a mesmo do nível Federal. A duração dos
mandatos é a mesma nos dois Poderes (Legislativo e Executivo) nos demais
níveis da federação. A diferença está, portanto, no mandato do chefe do poder
executivo que é de seis anos no Líbano e quatro no Brasil, podendo ser reeleito
neste último caso, recordando-se que, no Líbano, tem-se a forma parlamentar
de governo e, no Brasil, a forma presidencial.

25
DISTRIBUIÇÃO DOS ASSENTOS NO PODER LEGISLATIVO
O Parlamento libanês é unicameral, integrado por 128 deputados
diretamente eleitos. Desde 1926, durante o Mandato Francês, o sistema eleitoral
no Líbano é baseado na representação confessional. De acordo com a atual
Constituição, os assentos do Parlamento são igualmente divididos entre cristãos
e muçulmanos.

Essas regras se baseiam no Acordo de Taif, que pôs fim à guerra civil e
instituiu uma nova constituição, se baseando numa suposta igualdade
demográfica entre cristãos e muçulmanos na população libanesa, muito embora
não haja um censo oficial.

Certo é, entretanto, que, após quinze anos de guerra civil (1975-90),


diversas invasões israelenses, mudanças demográficas e migrações, a
proporção de cristãos e muçulmanos foi alterada. A composição do Parlamento
Libanês se baseia na alocação de um número específico de assentos para cada
um dos vários grupos confessionários minoritários. Em cada comunidade, o
candidato que receber o maior número de votos representa aquele grupo no
Parlamento. Assim, além da divisão entre cristãos e muçulmanos, os assentos
são subdivididos em onze ramos confessionais.

De acordo com a Lei n. 25 de 2008, os muçulmanos (64), se dividem em


sunitas (27), xiitas (27), druzos (8) e alauítas (2). Os cristãos (64), por sua vez,
se dividem em maronitas (34), ortodoxos gregos (14), católicos gregos (8),
ortodoxos armênios (5), católicos armênios (1), evangélicos (1) e minorias
(1)103. Nesse sentido, os assentos somente podem ser pleiteados por
candidatos que sejam da comunidade religiosa para a qual foram alocados,
embora não haja exigência de que o candidato prove o seu status religioso104.
O direito de voto, entretanto, não é confessional, isto é, os eleitores podem votar
para todos as vagas no Parlamento, independentemente do grupo religioso do
eleitor.

Uma das questões surgidas a partir desse sistema eleitoral foi o fato de
que os cristãos muitas vezes reclamaram que a maioria de seus membros era
eleita por votos de muçulmanos, o que levaria a uma igualdade artificial,
levando a que o membro eleito não estivesse mais voltado às necessidades

26
daquela comunidade. Outra reclamação foi da Comunidade Ortodoxa, que se
sente marginalizada dentro da própria comunidade Cristã1. O Acordo de Taif
previu ainda a abolição do confessionalismo no sistema político libanês. Assim,
com a eleição do primeiro Parlamento em uma base nacional e não sectária, o
Senado deverá ser formado, e todas as famílias espirituais serão representadas
nele, cujos poderes se restringirão a questões cruciais. A partir daí o sistema
seria bicameral.

A autora Arda Arsenian não considerou plausível essa ideia, e acredita


que seja por isso que não se tenha podido implementar o Acordo de Taif no
tocante às reformas eleitorais. Acrescente-se que muitos acreditam que se o
confessionalismo for removido, os grandes vencedores serão os xiitas, porque
seu número vem aumentando, por sua presença militar no Hezbollah, e pelo
suporte de vizinhos como Síria e Irã.

Os sunitas tendem a preferir um presidente cristão sob um sistema


confessional do que um xiita presidente em outro sistema.

O sistema libanês sempre foi baseado em um sistema majoritário, e a


divisão em distritos (que será vista no próximo tópico) era a forma de contenção
para o ganhador não levar tudo. Nos distritos em que há apenas um assento
para a comunidade religiosa, este será ocupado pelo candidato daquela
comunidade que obtiver mais votos (“first past the post system”). Onde houver
mais de uma cadeira para a comunidade religiosa, as vagas serão ocupadas
pelos candidatos daquela comunidade que tiverem recebido mais votos.

A Constituição Federal Brasileira, por sua vez, adotou tanto o sistema


majoritário quanto o proporcional, sendo, em nível federal, o Congresso Nacional
bicameral e unicameral nos níveis estaduais e municipais.

Quanto à adoção do sistema majoritário, esclarece José Elaeres Teixeira


que se baseia no princípio segundo o qual eleito é o candidato que obtém o maior
número de votos no colégio eleitoral.

No Poder Legislativo, essa técnica foi adotada para a eleição de membros


do Senado Federal. Nas eleições de senadores, serão eleitos os candidatos com
maior número de votos, seja na renovação de um terço do Senado ou de dois

27
terços. Quanto à adoção do sistema proporcional, José Eleares Teixeira afirma
ser idealizado como garantia às minorias contra os abusos das maiorias, sendo
previsto na Constituição para a composição da Câmara dos Deputados, das
Assembleias Legislativas e das Câmeras de Vereadores”.

A ideia da representação proporcional é gerar no corpo representativo


uma distribuição de poder entre as correntes políticas o mais similar possível ao
conjunto de preferências eleitorais.

O Brasil adota o sistema de lista aberta, em que o partido seleciona, de


forma não-ordenada, os candidatos que vão concorrer.

OS SISTEMAS ELEITORAIS E PARTIDÁRIO


Partidos e coligações eleitorais no Brasil, in A lógica das coligações no
Brasil, p. 43. 52 às eleições. A literatura especializada é unanime em apontar
que a lista fechada combateria o personalismo na política brasileira.

O funcionamento do sistema proporcional, explica o autor, se encontra


nos artigos 106 e 107 do Código Eleitoral (Lei 4.737/65) e se baseia
fundamentalmente nos conceitos de quociente eleitoral e quociente partidário. O
primeiro é obtido a partir da divisão do número de votos válidos e votos em
branco, apurados no Estado ou Município, pelo número de cadeiras reservadas,
para se obter o número de votos necessários ao partido para conseguir eleger
um representante. O segundo, quociente partidário, aplicável para cada partido
ou coligação, resulta da divisão do número de votos válidos obtidos pelo partido
ou coligação pelo quociente eleitoral, para se saber quantos representantes o
partido conseguiu eleger.

Quanto ao funcionamento das coligações e o sistema proporcional, Aline


Machado salienta que, no Brasil, o que acontece na prática é o seguinte: quando
um partido concorre sozinho, os votos de um candidato fracassado, já que
pertencem à legenda, são transferidos a outros candidatos, sem que o eleitor
seja consultado a respeito. Da mesma forma, os votos obtidos por um candidato
que excede a quota eleitoral são transferidos àqueles que individualmente não a
alcançaram. Até aqui, a migração de votos é intrapartidária, mas, no Brasil,

28
diante da permissão de coligações nas eleições proporcionais, verifica-se a
transferência de votos, inclusive, a outros partidos.

Quanto a distribuição dos assentos no poder legislativo, parece estar


nesse ponto uma das maiores diferenças entre os dois sistemas. O parlamento
libanês é dividido levando em consideração um equilíbrio de poder entre as
diferentes comunidades religiosas, adotando o sistema majoritário, enquanto o
brasileiro, bicameral, adota o sistema proporcional (entre partidos políticos) para
preenchimento da Câmara dos deputados, e o sistema majoritário para o
preenchimento do Senado Federal.

ORGANIZAÇÃO TERRITORIAL DO ELEITORADO


A lei eleitoral de 2008 alocou os 128 assentos do Parlamento entre os
vinte e seis distritos. O consenso político sobre esses distritos foi uma parte
crucial do Acordo de Doha em maio de 2008.

Com relação aos distritos, há cinco grandes divisões administrativas,


chamadas muhafazat (Norte, Monte Líbano, Sul, Beqaa e Beirute), que são
subdivididos em menores eleitorados (qadaas), aproximadamente vinte e seis.
A capital Beirute é dividida em três distritos.

Os atuais distritos eleitorais variam amplamente no tamanho de seus


eleitorados: o maior distrito Baalbeck-Hermel tem em torno de 250.000 eleitores
enquanto o menor distrito tem menos de 45.000 eleitores.

De acordo com a lei atual, o número de assentos alocados nos distritos


varia de dois a dez. Não há um critério formal que delineie as bases de
distribuição dos assentos dos diferentes distritos ou entre as comunidades
religiosas presentes no distrito.

29
REGRAS, REFORMAS E CONDICIONANTES DA
TRANSFERÊNCIA DIRETA DE DINHEIRO PÚBLICO AOS
PARTIDOS POLÍTICOS
Este capítulo parte da aceitação de que as regras delimitam o
comportamento dos atores políticos e sociais. Nesse sentido, sua construção se
deu com o propósito de acompanhar a trajetória das normas que orientam o
financiamento do sistema partidário eleitoral no Brasil, mais especificamente em
relação à participação pública para seu custeio. Com base nesse intento, buscar-
se-á identificar os dispositivos legais que definem o repasse de recursos públicos
para os partidos, pela via direta.

Para tanto, será feita a análise textual das regras, desde o Código Eleitoral
de 1950 e seus desdobramentos, até as regras que regeram as eleições de
2006. A participação do Estado no custeio do sistema partidário, em geral, e no
financiamento das eleições, em particular, ganha mais adeptos a cada crise em
que o cenário de fundo é a relação entre dinheiro e política. O argumento a favor
do financiamento público se cerca de justificativas importantes como o controle
(ou mesmo redução) das distorções na competitividade do sistema eleitoral pela
discrepância promovida pelo financiamento privado e a dependência dos
candidatos de grandes doações.

O financiamento público nivelaria as regras do jogo eleitoral e garantiria


condições mínimas de equidade em relação às competências político-eleitorais
individualizadas dos partidos (e candidatos). Teria, também, a função de
estabelecer uma relativa independência e autonomia dos partidos em relação às
incertezas quanto ao montante das doações privadas, uma vez que a garantia
dos repasses públicos poderia reduzir os custos de captação de dinheiro no setor
privado (Nassmacher, 2003; Speck, 2004b).

A parcela pública do financiamento direto pode ser decomposta a partir


das suas aplicações no processo partidário-eleitoral. Dada a pluralidade das
atividades partidárias, o Estado determina alguns pontos nos quais os recursos
orçamentários podem ser utilizados pelos partidos.

30
A alocação direta de recursos públicos para os partidos políticos (e/ou
candidatos), como parte do financiamento público, diferencia-se pelo tipo de
atividades ou de propósitos a que se destina (Calle, 2004; Fierro, 2005).

O repasse direto de fundos públicos pode se dar por dois principais


motivos: um se refere ao custeio das atividades elementares de funcionamento
e arregimentação efetuadas pelos partidos políticos de maneira rotineira e de
forma atemporal; e o outro, com a finalidade de cobrir parte dos gastos de
campanha, efetuados durante um espaço temporal delimitado e previsto em lei.
Este capítulo se dedica ao estudo desse sistema de financiamento para o caso
brasileiro, através da análise das regras e dos dados que alimentam o
financiamento público no País. Sem exceção, os autores que trabalham com o
financiamento eleitoral assinalam que o desempenho nas urnas não depende
unicamente do acesso aos recursos financeiros (ou estimáveis).

O aporte de recursos para uma campanha eleitoral por meio do seu


financiamento público (e privado) não é condição suficiente para o sucesso nas
disputas eleitorais (Speck, 2003b). Esta seria, portanto, uma análise estéril. É
consenso, também, que os recursos constituem um fator de contribuição direta
para esse sucesso (ou o insucesso pela sua carência) nas disputas eleitorais e
de importância inconteste para a manutenção da estrutura partidária.
Independentemente da ideologia partidária, o dinheiro é uma das variáveis que
interferem nos resultados eleitorais. Assim, o financiamento político sempre vai
representar uma questão importante para a construção de qualquer processo
democrático. Não há como dissociar uma coisa da outra.

Os partidos políticos necessitam eleger o maior número possível de


representantes para também sobreviverem na arena eleitoral. Além disso,
necessitam de um volume expressivo de recursos para a manutenção de suas
atividades políticas, dadas as necessidades práticas de funcionamento da
estrutura partidária (Sorauf, 1976; Williams, 2000; PintoDuschisky, 2002;
Walecki, 2004b).

Esta tese não ignora, porém, o peso de outras variáveis no desempenho


partidário eleitoral, apenas não se propõe a estudá-las. Talvez esse
descolamento (não ingênuo) permita um aprofundamento maior nos estudos

31
sobre a estrutura de financiamento do sistema partidário-eleitoral brasileiro ou
contribua para o entendimento de como a estrutura do sistema partidário no
Brasil ganha reforço a partir do momento em que os recursos oriundos do Fundo
Partidário passam a ter um peso maior na composição financeira dos partidos.
Enfim, busca-se estudar aqui os formatos de repasses diretos de recursos
públicos ao sistema partidário. Será analisado como o modelo adotado de
financiamento partidário eleitoral trata do custeio desse sistema por meio de
transferência direta de dinheiro para os partidos políticos. Em seguida, buscar-
se-á identificar o que as regras refletem em termos de valores para os partidos.
Pretende-se, ainda, apontar questões sobre os custos financeiros do sistema
partidário-eleitoral para os cofres públicos, de modo que se possa viabilizar o
entendimento do papel do Estado. Busca-se, assim, dar uma resposta preliminar
à questão sobre o quanto se gasta de recursos públicos com o sistema
partidário-eleitoral no Brasil.

FORMULAÇÃO E MUDANÇAS NAS REGRAS PARA O


FINANCIAMENTO PARTIDÁRIO-ELEITORAL NO BRASIL
As análises sobre o processo de reformas das regras de financiamento
partidário eleitoral serão feitas a partir da vigência do Código Eleitoral de 1950.
Essa legislação demarca o começo do processo de formulação de regras sobre
a condução do sistema partidário-eleitoral no Brasil, mais especificamente,
tomando como ponto de partida o lado financeiro desse sistema.

Contudo, por ser um aspecto ainda incipiente, em termos de regulação, a


questão do financiamento partidário-eleitoral não foi tratada de forma
contundente por essa legislação. Mas, de qualquer forma, o Código definiu que
a proposta orçamentária ficaria a cargo do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a
partir de demandas ad hoc, encaminhadas pelos Tribunais Regionais Eleitorais
(TREs). A legislação considerou também que, em caso de créditos adicionais
necessários ao custeio do processo eleitoral, os pedidos de aportes seriam
direcionados ao Legislativo por intermédio do Executivo, depois de analisado o
pelo TSE.

32
No tocante aos partidos esse Código estabelecia que as organizações
partidárias com registro no TSE deveriam ter propósitos estatutários com
“alcance nacional”. Portanto, já em 1950, a legislação reforçava o caráter
federativo dos partidos políticos, da mesma forma que as regras estatutárias
(com caráter nacional) definiam a organização e o funcionamento dos seus
diretórios e comissões provisórias. Adicionalmente, a legislação estabeleceu
critérios de constituição partidária, como o número mínimo de filiados por
circunscrição eleitoral.

O Código Eleitoral de 1950 previa regras de funcionamento e de


organização partidária. Nesses termos, assumia o caráter de Lei Orgânica, ao
definir que os estatutos partidários deveriam conter regras específicas que
obrigassem os partidos a “fixar e apurar as quantias máximas [de recursos] que
os candidatos poderiam despender pessoalmente com a própria eleição”. Além
da questão do limite de gastos (que prevaleceu nas legislações seguintes), o
Código considerou que os partidos contemplassem em seus estatutos os limites
para as contribuições e os auxílios dos seus filiados. A legislação abordou de
forma superficial questões envolvendo as doações para partidos e candidatos,
porém apenas no sentido de estabelecer o que seria vedado aos partidos
receberem. Como será observado, a maior parte das fontes consideradas ilegais
para a doação não sofreu alterações substanciais nas legislações subsequentes.

Para o Código Eleitoral Lei nº 1.164, de 1950. Ver artigo 199, parágrafo
único, da Lei nº 1.164, de 1950. Ver artigo 132, § 1º, da Lei nº 1.164, de 1950.
27 1950, foi considerado ilegal o recebimento de recursos das seguintes fontes
de financiamento:

(1) contribuições diretas ou indiretas em dinheiro (ou estimável) de procedência


estrangeira;

(2) “receber de autoridade pública recursos de proveniência ilegal”; e

(3) recursos diretos ou indiretos de sociedades de economia mista e das


concessionárias de serviço público.

As determinações desse Código prevaleceram até o início do regime


autoritário no Brasil. Na análise da trajetória das regras que normatizaram o

33
financiamento do sistema partidário-eleitoral, as alterações na legislação
ganham importância para o contexto aqui delineado, principalmente por se tratar
de mudanças efetivadas no início do regime militar, um ano após o golpe militar
de 1964, com a aprovação de um novo Código Eleitoral.

Em se tratando da questão do financiamento partidário-eleitoral, esse


Código e o anterior fizeram menção apenas à dotação orçamentária destinada à
Justiça Eleitoral, que deveria ser anualmente elaborada pelo TSE e de acordo
com as propostas de aporte financeiro que lhes fossem remetidas pelos TREs.

Os pedidos de créditos adicionais para os serviços eleitorais durante o


exercício deveriam ser encaminhados segundo uma relação trimestral dos
valores a serem enviados à Câmara dos Deputados. Todavia, tais medidas não
garantiriam o financiamento para os pleitos, mas apenas a cobertura dos custos
dos processos eleitorais.

O que a legislação de 1965 definiu como fonte de recursos refere-se ao


custeio da Justiça Eleitoral propriamente dita, situação que não faz parte da
proposta deste trabalho. Dando prosseguimento às análises das regras, cabe
destacar que, paralelamente à criação do Código Eleitoral, foi introduzida
também a Lei Orgânica dos Partidos Políticos (LOPP7) no contexto político de
um regime de exceção. Entre outras prerrogativas, a LOPP de 1965 estabelecia
que a constituição de um partido seria efetivada somente com a anuência de
pelo menos 3% do eleitorado que votou na última eleição geral. A quantidade de
eleitores teria de ser distribuída em 11 ou mais estados da federação, com o
mínimo de 2% em cada um, ou um total de 12 deputados federais, distribuídos
em, pelo menos, sete estados. A esses limites foi acrescida uma votação de
legenda (que abrangesse no mínimo 3% do eleitorado) em eleições gerais.
Essas alterações demonstram um maior rigor nas regras de funcionamento
partidário, comparadas às estabelecidas pelo Código Eleitoral de 1950. A partir
dessas determinações, foram estabelecidos critérios mais específicos para o
cancelamento do funcionamento dos partidos que não cumprissem esses
percentuais mínimos.

34
Ademais, as regras de funcionamento partidário previstas pela LOPP de
1965 exigiam, como anteriormente, percentuais mínimos de eleitores filiados aos
partidos em cada circunscrição eleitoral. Em outras palavras, o ordenamento das
regras partidárias influi na questão financeira dos partidos, por regular o
processo de funcionamento das organizações, mesmo não se referindo
diretamente ao aspecto do financiamento partidário-eleitoral. Tal condição pode
ser percebida a partir de proibições quanto ao recebimento de dinheiro de
determinadas fontes, assim como a delegação de poderes aos partidos quanto
à definição dos montantes permitidos para o dispêndio em campanhas eleitorais
dos seus candidatos.

Vale lembrar que a LOPP de 1965 foi precedida pelo Ato Institucional nº
2, editado logo após as eleições para governadores, em que se extinguiram os
partidos políticos, sendo responsável direto pela criação do sistema bipartidário
composto por ARENA e MDB10. O AI-2 vigeu até março de 1967. Por esse
decreto, o regime autoritário estabeleceu que só poderiam funcionar os partidos
que agregassem pelo menos 1/3 dos congressistas. Como a ARENA, por razões
óbvias, logo congregou quase 2/3, só sobraram deputados para constituir mais
um partido. Portanto, as regras estabelecidas pela LOPP de 1965 não teriam
relevância prática ou qualquer impacto sobre a configuração do sistema
partidário: o bipartidarismo já havia sido instituído por decreto (Melo, 2007). Já
na legislação de 1965 foram previstos critérios para a condução financeira das
agremiações partidárias com o propósito de adequarem seus objetivos
estatutários e estratégicos de financiamento. Nos seus estatutos, de acordo com
essa regra, os partidos deveriam fixar e apurar as quantias máximas de
dispêndio com propaganda partidária e com gastos com candidatos, além de
fixarem os limites das contribuições e auxílios de seus filiados. Essa medida
estabelecia, também, critérios para a composição financeira dos partidos
políticos, assim como a fixação, nos pleitos eleitorais, de limites para o
recebimento de doações, contribuições ou despesas de cada comitê eleitoral.
Tal condição demonstra uma tendência à regulamentação do poder econômico
no interior dos partidos. Isso porque o limite estabelecido pela legislação, no que
se refere à arrecadação financeira, foi atribuído ao partido político, e um dos itens
a serem fiscalizados pela Justiça Eleitoral era o cumprimento desse limite. Os

35
diretórios partidários e comissões provisórias seriam constituídos, de acordo
com a Lei nº 4.740, de 1965, a partir de um número mínimo de filiados, em
condições de participar de eleições, de acordo com o total de eleitores em cada
municipalidade.

No entanto, ficaria definida a “fixação, nos pleitos eleitorais de limites para


donativos, contribuições ou despesas de cada comitê”. Tal condição limitaria o
montante de doação por financiador e, assim, inviabilizaria que um único doador
pudesse financiar toda a campanha. A adoção desses critérios poderia evitar o
controle de legenda por parte de membros ou grupos econômicos. Ou seja,
independentemente da capacidade financeira isolada dos filiados, bem como
dos doadores, a decisão do processo de custeio dos candidatos ficaria a cargo
dos partidos, o que lhes conferiria maior autonomia para refutarem os chamados
“donos de legenda”. Mais ainda, a regra prevista nesse Código estabelecia que
todos os gastos realizados na condução da campanha, bem como o alistamento
de eleitores e a propaganda institucional fossem manifestadas unicamente
através dos partidos ou comitês, não sendo permitida a nenhum candidato a
manifestação individualizada dessas funções.

Nessa mesma linha de condução e de ordenamento financeiro dos


partidos, o poder público passaria a assumir uma parcela do custeio direto do
sistema partidário-eleitoral, através da criação do Fundo Especial de Assistência
Financeira aos Partidos Políticos (ou Fundo Partidário) pela LOPP de 1965, cujos
repasses aos partidos se dariam em cotas trimestrais. Os propósitos da criação
desse fundo se estenderam ao longo do tempo: manter as sedes e os serviços
dos partidos, assegurar o custeio da propaganda doutrinária e política, o
alistamento e as campanhas eleitorais, a manutenção de um instituto de
instrução política e de formação e renovação de quadros e líderes políticos.

O Fundo Partidário seria composto por:

(1) multas e penalidades aplicadas nos termos do Código Eleitoral e leis


conexas;

(2) pelos recursos financeiros que lhes forem destinados por lei, em caráter
permanente ou eventual; e

36
(3) doações de particulares ao Fundo Partidário.

Vale ressaltar que o montante do Fundo Partidário não era representativo,


comparado ao período pós 1995. Em outros termos, durante 30 anos o custeio
público direto do sistema partidário-eleitoral, através do repasse de dinheiro
orçamentário, não representou um diferencial importante para os partidos
políticos.

Esse tema só recebeu tratamento específico em 1998. Antes disso a


questão foi tratada conjuntamente com outras questões da legislação eleitoral.

A regulamentação da fonte orçamentária proveniente de multas e leis


conexas foi tratada de forma isolada do restante da legislação, apenas pela
Resolução nº 20.405, de1998 que regulamentou o recolhimento das multas e a
aplicação das leis conexas junto ao Fundo Partidário.

Em tempo: leis conexas se referem a leis ad hoc, com vistas a suprir


problemas orçamentários específicos relativos à composição do fundo de
financiamento público dos partidos políticos. Ver artigos 60 a 71 da Lei nº 4.740,
de 1965. Influi no sucesso eleitoral, esse fato, per se, condicionaria a
interferência do poder econômico nas eleições brasileiras, em qualquer época
que se queira tomar como referência. Outro aspecto que merece atenção é o
fato de que a legislação não teria estipulado tetos (ou limites) para doações ao
fundo provenientes de fontes privadas. Apenas inseriu a permissão para
doações, sem estabelecer regras para esse financiamento. Para esse item,
houve variações nas legislações posteriores, mas, ainda assim, manteve-se a
permissividade desse tipo de doação nos interstícios eleitorais, ao contrário dos
dois primeiros itens, que permaneceram inalterados.

As dotações orçamentárias previstas para a composição do Fundo


Partidário no Código Eleitoral de 1965 passariam a ser registradas no Tribunal
de Contas da União (TCU) e distribuídas ao Tesouro Nacional que, a partir daí,
faria o encaminhamento ao TSE. Este órgão ficaria encarregado de distribuir os
recursos aos órgãos de direção nacional dos partidos políticos, obedecendo aos
seguintes critérios:

37
(1) 20% do total do Fundo Partidário destacados para distribuição, em partes
iguais, a todos os partidos;

(2) 80% distribuídos proporcionalmente ao número de cadeiras na Câmara dos


Deputados. Nos cálculos de proporção para distribuição dos recursos, de acordo
com a LOPP de 1965, seria considerada a filiação partidária que constasse da
diplomação (não pela eleição) dos candidatos eleitos.

Esses critérios de distribuição dos recursos do fundo, mesmo


privilegiando os partidos com maior representatividade na Câmara dos
Deputados, ofereciam aos partidos menores uma parcela importante de
recursos. Do total recebido pelo órgão de direção nacional de cada partido, a
regra estabeleceu a seguinte redistribuição:

(1) para os diretórios regionais, a distribuição seria de 80%, no mínimo, em


proporção ao número de representantes nas Assembleias Legislativas;

(2) desse montante, os diretórios regionais teriam de redistribuir 60% para os


diretórios municipais, proporcionalmente ao número de cadeiras que o partido
tivesse obtido na eleição municipal.

O critério federativo de repasse de recursos para os diretórios


subnacionais sofreu alterações ao longo dos anos, recaindo essa atribuição aos
próprios partidos políticos, por meio de definições estatutárias sobre os critérios
de rateio dos recursos do fundo. Esse formato de redistribuição, entre os
diretórios regionais e municipais, dos recursos provenientes do Fundo Partidário,
por estabelecer previamente o montante a ser repassado, de certa forma,
retiraria a autonomia da direção partidária nacional ou de membros isolados do
partido quanto à alocação dos recursos. O destino dos recursos, estabelecido
por lei tenderia a dificultar a manutenção de privilégios por parte da direção
nacional ou mesmo individualismos dos dirigentes partidários.

Nesse ponto, vale lembrar que a manifestação partidária não encontrava


respaldo no seio do regime militar. Os partidos eram vistos com maus olhos pela
ditadura. Portanto, faz sentido a lógica do enfraquecimento das direções
nacionais a partir da diluição dos recursos para os municípios, mesmo que esses
recursos não representassem um diferencial para os partidos. Posteriormente,

38
isso passou a fazer mais sentido ainda, uma vez que, com o tempo, a ARENA
firmou-se nos pequenos municípios, e o MDB nas grandes localidades (Melo,
2007). Por essa regra de distribuição dos recursos orçamentários, os diretórios
municipais (ou as comissões provisórias) passariam a contar com uma parcela
expressiva do fundo (o que não significaria muito em valores absolutos, dada a
pouca expressividade desses recursos). No tocante aos impedimentos para o
recebimento de recursos para as campanhas eleitorais, ou mesmo para o custeio
dos partidos políticos, como na legislação anterior, a LOPP de 1965 vetou as
seguintes ações:

(1) receber, direta ou indiretamente, contribuição ou auxílio pecuniário ou


estimável em dinheiro, procedente de pessoa ou entidade estrangeira;

(2) receber recurso de autoridades ou órgãos públicos;

(3) receber qualquer espécie de auxílio ou de contribuição das sociedades de


economia mista e das empresas concessionárias de serviço público;

(4) receber contribuição, auxílio ou recurso procedente de empresa privada com


finalidade lucrativa. Este último item não havia sido contemplado no Código
anterior.

Até 1965 havia a permissão para se efetuarem doações privadas


diretamente aos partidos e aos candidatos. Esse dispositivo seria retomado em
legislação posterior.

Em 1971, transcorridos seis anos da edição da Lei Orgânica dos Partidos


Políticos de 1965, as regras foram recondicionadas através da aprovação de
uma nova LOPP.

Como alteração importante no escopo do texto, o funcionamento


parlamentar foi condicionado ao partido político que contasse com 5% do total
de votos na última eleição para a Câmara considerando os critérios
estabelecidos pela legislação a distribuição dos recursos do Fundo Partidário
(em valores hipotéticos atuais) ficaria da seguinte maneira: o partido teria direito
a R$100,00, sendo que o órgão de direção nacional ficaria com R$20,00 e
repassaria R$80,00 para os regionais. Os diretórios regionais pegariam esses
R$80,00 ficariam com 40% (ou R$32,00) e redistribuiriam os outros 60% (ou

39
R$48,00) para os diretórios municipais, tomando como critério o número de
cadeiras obtidas nas eleições proporcionais.

Foi excluída do Código anterior a parte do texto que dizia “recursos de


proveniência ilegal”. Foi acrescida pelo artigo 91 da LOPP, Lei nº 5.682, de 1971,
a seguinte redação: “(...) inclusive através de publicidade de qualquer espécie,
de autarquias, empresas públicas (...) sociedades de economia mista e
fundações instituídas em virtude de lei e para cujos recursos concorram órgãos
ou entidades governamentais”. Foi acrescida pelo artigo 91 da Lei nº 5.682, de
1971, a seguinte redação: “(...) entidade de classe ou sindical”.

Por funcionamento parlamentar entende-se o conjunto de regras que


definem a atuação dos partidos na Casa, como o direito à liderança, poder
participar da divisão proporcional dos cargos da mesa, das comissões
permanentes e da comissão mista de orçamento, além das CPI’s e das
comissões especiais destinadas a examinar projetos de lei.

Deputados, distribuídos em sete ou mais estados, com o mínimo de 7%


em cada um deles. Do contrário, os partidos teriam cancelado seu direito de
funcionamento.

O que se pode perceber com essa alteração é uma restrição maior quanto
às prerrogativas para funcionamento dos partidos políticos. Esse aumento de
66,67% (de 3% para 5%) da exigência dos votos válidos para que o partido
político tivesse acesso a cadeiras no parlamento tenderia a dificultar as
manifestações por meio dos organismos partidários. Adicionalmente, os critérios
regionais para a manutenção dos partidos políticos foram redirecionados,
restringindo ainda mais a continuidade do funcionamento dos partidos políticos.
Em outras palavras, as regras eleitorais passariam a refletir com mais
intensidade o contexto político vivido pelo País, reforçando o caráter bipartidário
estabelecido pelo regime. Um ano após a promulgação do novo texto para a
LOPP, em 1972, o TSE lança uma resolução que trata especificamente do Fundo
Partidário.

Essa norma ratifica as regras já previstas na LOPP de 1971. Mantiveram-


se inalterados a composição dos recursos orçamentários destinados ao fundo e
os formatos de distribuição de recursos entre os órgãos de direção nacional dos

40
partidos (20% de forma igualitária entre os partidos e 80% de forma
proporcional). Também foi mantida a regra de distribuição entre os demais
diretórios subnacionais.

A mesma resolução do TSE de 1972 endossa o fato de que a distribuição


das cotas do fundo somente seria efetuada aos diretórios partidários com registro
na Justiça Eleitoral e com mandato em vigor. A composição orçamentária dos
recursos destinados ao fundo permaneceu inalterada até a legislação de 1995.
Da mesma forma, permaneceram inalterados o gerenciamento dos recursos e a
provisão orçamentária destinados aos partidos, assim como as regras para a
distribuição para os diretórios nacionais dos partidos políticos e sua partilha com
as seções regionais e municipais. A aplicação, pelos partidos políticos, dos
recursos financeiros provenientes do Fundo Partidário foi corroborada, em
grande parte, por resolução específica do TSE. Acrescentou-se a ela a
autonomia de cada diretório (nacional, regionais, municipais e zonais) para
decidir sobre a aplicação dos recursos em reunião plenária, após receber a cota
que lhes fosse destinada.

Assim, o texto da resolução do TSE concede poder de decisão aos


dirigentes regionais e locais, quando da aplicação desses fundos. Tal medida
pode ser vista como uma maior descentralização das decisões partidárias, mas
também poderia significar maior poder às lideranças partidárias locais.

Apresenta, no entanto, um aspecto não considerado anteriormente: a


redistribuição pelos diretórios regionais, aos diretórios municipais, somente seria
possível se requerida pelos diretórios, com cotas limitadas até o valor de 1/3 do
maior salário-mínimo vigente à época. Essa determinação, em vigor a partir da
resolução emitida pelo TCU, somente foi efetivada em lei aprovada em 1976,
quando foi alterada parte do texto da LOPP, acrescentando esse item ao texto
original.

No tocante ao controle e à fiscalização dos recursos transferidos pelo


fundo, ficaria a cargo do TCU delimitar as normas sobre as prestações de contas
dos partidos políticos. As regras definidas pelo TCU nada mais foram do que
uma ratificação do que já havia sido previsto na LOPP e em leis complementares.
Caberia a esse órgão a execução das auditorias financeira e orçamentária sobre

41
os recursos do Fundo Partidário recebidos pelos diretórios ou comissões
executivas dos partidos políticos e seu emprego pelos responsáveis diretos, a
partir da conferência da prestação de contas encaminhada anualmente.

Na falta de prestação de contas no prazo estabelecido pela legislação, ou


na sua desaprovação, total ou parcial, era prevista a suspensão de recebimento
de novas cotas do Fundo Partidário. Além desse impedimento, ficariam sujeitos
também à responsabilização civil e criminal os membros faltosos das comissões
executivas ou dos diretórios dos partidos inadimplentes.

Ainda sobre esse aspecto, a Justiça Eleitoral poderia proceder a


investigações sobre a aplicação de recursos do Fundo Partidário em esfera
nacional, regional ou municipal, adotando as providências que julgasse
convenientes e comunicando o fato ao TCU.

Pelas regras de fiscalização do TCU, os partidos seriam organizados de


forma a permitir o acompanhamento da execução orçamentária e o
levantamento dos balanços gerais e das prestações de contas, inclusive nos
diretórios municipais. Neste caso, os critérios de fiscalização das contas dos
diretórios quanto ao repasse dos recursos do Fundo Partidário seria feito:

(1) nos municípios de primeira categoria que recebessem cotas de até 100 vezes
o valor do maior salário mínimo do País [à época];

(2) nos municípios de segunda categoria que recebessem cotas de valor superior
a esse limite. Por meio dessa regra os agentes do TCU passariam a estabelecer
critérios distintos para a fiscalização dos diretórios partidários. Tal medida fazia
uso do critério de relevância para a formalização das diligências junto aos
diretórios pelos órgãos fiscalizadores, o que, em certa medida, tornaria mais ágil
o processo de controle e de fiscalização dos recursos. Se, por um lado, essa
medida padronizaria e estabeleceria critérios que auxiliariam na condução do
processo de controle e de fiscalização, por outro poderia induzir a um
pragmatismo que inibiria uma fiscalização mais atenta e in loco junto aos
municípios de menor relevância.

Ora, deve-se considerar que a probabilidade de uma má interpretação do


texto legal é maior em localidades menores, com menor acesso informacional,

42
além de mais distantes da fiscalização. Enfim, de acordo com as regras previstas
pela legislação do TCU, a prevalência das fiscalizações recairia sobre os maiores
municípios, embora as chances de descumprimento das regras fossem as
mesmas (ou maiores) nas localidades menores. Apenas no final do regime
autoritário houve reformulação nos formatos de redistribuição entre as seções
regionais e municipais. No tocante à prestação de contas dos recursos oriundos
do Fundo Partidário, a fiscalização permaneceu como incumbência do TCU, bem
como a aplicação das penalidades pelo descumprimento dos preceitos legais.

Em 1979, já nos últimos anos do regime militar, houve importantes


alterações no texto da LOPP de 1971. A nova lei pôs fim ao sistema bipartidário
instituído pelo regime, possibilitando a criação de outros partidos políticos.

Estabeleceu também outros aspectos que merecem destaque, como a


perda do mandato do parlamentar de qualquer esfera que, por atitude ou pelo
voto, se opusesse às diretrizes estabelecidas pelos órgãos de direção partidária
ou deixasse seu partido, salvo para participar, como fundador, da constituição
de um novo partido.

A contabilidade dos partidos é organizada de acordo com a lei que trata


dos preceitos da contabilidade pública (Lei nº 4.320, de1964), segundo a qual a
prestação de contas deve conter o balanço orçamentário, financeiro e
patrimonial e as demonstrações das variações patrimoniais dos partidos. Nas
prestações de contas dos diretórios subnacionais relativos à primeira categoria,
foi prevista a apresentação do registro de recebimentos e pagamentos efetuados
e o respectivo saldo procedente dessa operação, além do balancete de receita
e de despesa do período.

Já os diretórios da segunda categoria, além das obrigações da categoria


anterior, deveriam possuir o diário contábil de movimentação financeira e
orçamentária, de modo que pudesse ser evidenciado o montante dos créditos
orçamentários, bem como os recursos recebidos de qualquer procedência e a
despesa realizada.

Em relação ao controle financeiro, a Justiça Eleitoral fica encarregada do


cumprimento das regras, exercendo fiscalização sobre o movimento financeiro
dos partidos, que compreende o recebimento, o depósito e a aplicação de

43
recursos, inclusive escrituração contábil, e atendendo às normas específicas
para essa função, permanecendo iguais às previstas na legislação anterior.

Nesse último caso, o parlamentar somente poderia participar como


fundador uma vez durante um quadriênio. Pode-se perceber aí uma
centralização das funções da direção dos partidos, o que, por sua vez, poderia
implicar maior insulamento da burocracia partidária. Dessa forma, a legislação
concederia maior autonomia aos diretórios partidários, em detrimento do
legislador individual, enfatizando, inclusive, o procedimento referente à fidelidade
partidária, amplamente debatida pela literatura. Tais determinações, ao
considerarem a migração ou mesmo a indisciplina como infrações sujeitas à
perda de mandato, de certo modo, ordenariam o comportamento dos atores
políticos, o que tenderia a tornar menos voláteis as suas posições individuais.
Quanto à permissão de funcionamento para os partidos políticos, as alterações
no texto passaram a considerar que, para o registro no TSE, os partidos políticos
teriam de apresentar pelo menos 10% de representantes do Congresso
Nacional, além de possuírem uma votação de, no mínimo, 5% do eleitorado na
última eleição geral para a Câmara dos Deputados, em pelo menos nove estados
da federação, com o mínimo de 3% em cada um deles. Em comparação com o
formato anterior, as condições para o funcionamento partidário mantiveram-se
difíceis. Por essa regulamentação, não teria direito à representação no Senado
Federal, na Câmara dos Deputados e nas Assembleias Legislativas o partido
que não cumprisse tais critérios. Constatada essa condição, os votos dados aos
candidatos seriam declarados nulos pela Justiça Eleitoral, preservando o partido
e sua organização para habilitar-se a novo pleito, desde que seus órgãos
dirigentes fossem mantidos36. Tais regras reduziam a possibilidade de
funcionamento dos partidos, estabelecendo critérios rígidos para a manutenção
das legendas. No entanto, não foram aplicados na eleição de 1982, tornando-se
“letra morta” (Melo, 2007). Se o fossem, o País voltaria ao bipartidarismo, e PT,
PTB e PDT não teriam se viabilizado.

44
O formato de distribuição dos recursos provenientes do Fundo Partidário
para os órgãos de direção nacional dos partidos políticos foi alterado pelo texto
de 1979, passando a vigorar com os seguintes critérios de repasse:

(1) 10% do total do Fundo Partidário destacados em partes iguais aos partidos
em funcionamento;

(2) 90% distribuídos proporcionalmente ao número de cadeiras na Câmara dos


Deputados. Essa nova regra mostra uma tendência a deslocar os parcos
recursos do Fundo Partidário para os partidos com maior estruturação,
privilegiados pelo critério da proporcionalidade.

A mudança da regra, feita sob o regime autoritário, apontaria para uma


redução do percentual distribuído de forma igualitária e aumento do percentual
a ser alocado de forma proporcional à representatividade na Câmara dos
Deputados. A base de cálculo para a repartição proporcional foi mantida,
tomando por referência a filiação partidária que constasse na diplomação dos
candidatos eleitos.

Portanto, se o candidato eleito migrasse de partido no período entre a


proclamação dos resultados das eleições e a diplomação, levaria seus votos
para efeito de cálculo da fração do Fundo Partidário. Esse formato seria alterado
mais adiante.

A LOPP de 1971, regulamentada pela Lei nº 6.767, de 1979, foi a última


legislação a trazer alterações importantes para a condução do processo eleitoral
no Brasil até o término do regime autoritário. O que se pode perceber em relação
ao arcabouço que define e regula a estrutura partidário-eleitoral ao longo do
regime militar foi que se buscou reduzir as manifestações políticas ao se
imporem regras mais rígidas de funcionamento ao sistema partidário. Nesse
contexto, a legislação operava no sentido de restringir a participação por meio
da representação partidária, ao tornar mais rigorosos os limites para o
funcionamento dos partidos políticos. Tanto é assim que o sistema bipartidário
teve vigência no País ao longo de quase todo o regime. Assim como antes, a
questão federativa poderia ser imaginada como uma composição estratégica
adotada pelo regime.

45
A pulverização dos recursos, por meio da legislação, entre os diversos
estados e municípios tenderia a enfraquecer nacionalmente os partidos. Da
mesma forma como se estabeleceu uma restrição à competição partidária,
percebe-se que há uma combinação desse argumento com uma distribuição
mais equilibrada do Fundo Partidário, em termos da alocação entre os níveis da
federação.

O que se contrapõe aqui, mais uma vez, é a pouca significância, em


termos monetários, dos recursos que compunham o orçamento do sistema
político às novas forças partidárias não seria fruto, no entanto, de uma tendência
puramente irrevogável de proximidade com a democracia. Antes de tudo, na
visão de especialistas, seria como uma forma de pulverizar os votos da esquerda
entre mais de um partido.

A extinção dos dois partidos vigentes teria como resultado a manutenção


da estrutura do partido da situação (ARENA), com alteração no nome (PDS) e a
divisão dos partidos oposicionistas e vários outros (Mainwaring, 2001). No
entanto, o MDB, amparado pelo descontentamento da população com o regime
autoritário, aglutinava uma força eleitoral extrema, fato que o credenciaria a
ocupar o lugar dos herdeiros da ARENA no cenário político nacional. Desse
modo, com a divisão da esquerda brasileira e a “implosão do PMDB”, além da
criação de novos partidos, o PDS não seria surpreendido com os resultados das
urnas (Melo, 2002a). A história não comprovaria essa estratégia.

FUNDO PARTIDÁRIO
Os recursos públicos de custeio direto do sistema partidário-eleitoral vão
ganhar uma importância maior somente em meados da década de 1990.

A descentralização partidária, associada a uma melhor distribuição dos


recursos, pode ser contrabalançada pela prerrogativa legal concedida aos
órgãos de direção nacional para intervirem nos diretórios hierarquicamente
inferiores, seja para manter a estabilidade dos partidos, promover ajustes
financeiros ou, mesmo, para destituir a direção local do partido, caso o
comportamento das lideranças locais fosse divergente do previsto pelo estatuto.

46
A partir da segunda metade de década de 1980, portanto, após o fim do regime
autoritário, foram editadas as Leis nos 7.664 e 7.773, que estabeleceram normas
para as eleições de 1988 e 1989 e trouxeram alterações relevantes quanto à
condução do processo eleitoral no País. No entanto, no que se refere ao tema
desta tese, impuseram apenas mudanças ad hoc e, em grande medida, se
referiam ao formato das propagandas eleitorais em rádio e televisão. Manteve-
se a possibilidade de relacionar como gastos eleitorais as despesas relativas à
propaganda gratuita e às pesquisas ou testes pré-eleitorais, e permaneceram as
multas aplicadas aos partidos ou aos candidatos por infração ao disposto na
legislação eleitoral. A esse respeito não houve alteração na regra.

Ora, se as multas podem ser consideradas como gastos das


candidaturas, o que se poderia supor, pelo fato de o financiamento de
campanhas contar com uma parcela pública dos recursos, é que os recursos
públicos seriam também utilizados para pagamento de multas decorrentes de
infrações dos candidatos ou dos partidos políticos. Esse procedimento vigora até
os dias atuais. Enfim, ao longo da década de 1980, a legislação eleitoral
brasileira não trouxe grandes mudanças que pudessem se refletir diretamente
sobre o foco de discussão deste capítulo.

Apenas no último ano dessa década, com o desfecho da eleição


presidencial de 1989, a temática sobre o financiamento eleitoral viria à tona. Mas,
em linhas gerais, as regras de financiamento eleitoral que vigoraram até essa
eleição foram as mesmas estabelecidas pela Lei nº 6.767, de 1979.

Aqui vale lembrar que a necessidade premente de reforma na legislação


eleitoral acabou sendo uma resposta à crise de corrupção alastrada no governo
Collor de Mello, quando vieram à tona os financiamentos privados nas
campanhas eleitorais, no chamado “Esquema PC”, o que culminou, juntamente
com as demais denúncias de corrupção, no impeachment do presidente Collor.
Isso se deu sob a égide de uma legislação eleitoral que proibia doações de
pessoas jurídicas para as campanhas eleitorais. Somente a partir da década de
1990 um formato mais definitivo quanto ao financiamento público eleitoral ganha
espaço, como uma resposta às crises e aos escândalos eleitorais amplamente
divulgados pela mídia.

47
Como decorrência, a temática sobre o financiamento político ganharia um
lugar de destaque entre os analistas políticos, assim como a participação pública
mais efetiva no custeio desse sistema (Speck, 2004b).

Os procedimentos quanto à doação de recursos para as campanhas


eleitorais foram alterados pela Lei nº 8.713, de 1993. No imbróglio dos episódios
de malversação de recursos e de comprometimento dos resultados eleitorais, a
maior participação do financiamento público (parcial ou exclusivo) poderia ser
uma solução (ainda que paliativa) que reduziria o poder do grande capital privado
na condução das campanhas eleitorais. Tal modelo de financiamento poderia se
refletir na idoneidade dos mandatos públicos. Essa lógica desembocaria em um
aumento dos recursos públicos destinados ao custeio do sistema partidário-
eleitoral ao longo da segunda metade da década de 1990. Sobre esse aspecto,
Wanderley Guilherme dos Santos (1994) considera que, dada a condição prévia
de “democracia de massa”, qualquer medida no sentido de redução dos custos
da competição partidário-eleitoral não teria efeito direto. A questão, portanto,
muda de foco. Não se refere mais à redução dos custos, mas, sim, a
proporcionar condições para que o financiamento desse custo não afete o
princípio da igualdade de oportunidades nas competições eleitorais. Esse
princípio seria o norte a ser perseguido pelas reformas que trataram desse tema.
Mas este é apenas um lado da questão. Afinal, a participação pública não alijaria,
por completo, o capital privado no custeio do processo democrático. Portanto, a
lógica da regulação do sistema de financiamento da política, com mais (ou
apenas) dinheiro público, não visaria atacar a desigualdade, mas a falta de
transparência, mesmo porque as doações de empresas foram legalizadas a
partir dessa regra. No entanto, de início, as regras definidas no governo Itamar
Franco regulavam apenas a participação privada no custeio do sistema
partidário-eleitoral. Não estabeleciam o formato da participação pública direta e
efetiva nesse custeio, através de definições quanto à constituição orçamentária
do Fundo Partidário. As considerações definitivas sobre a parcela pública na
composição do fundo somente ganhariam corpo no governo seguinte. De todos
os partidos políticos os resultados obtidos, bem como informações sobre
métodos utilizados e fonte financiadora dos respectivos trabalhos.

48
No governo Fernando Henrique Cardoso, houve uma reconfiguração das
regras para o funcionamento parlamentar. Frente às exigências estipuladas nas
legislações anteriores, as restrições foram reduzidas pela Lei nº 9.096, de 1995.
Essa regra reforça o caráter nacional dos partidos, definido estatutariamente, da
mesma forma que considera como critério para o funcionamento partidário uma
votação correspondente a pelo menos 0,5% dos eleitores na última eleição geral
para a Câmara dos Deputados, distribuídos por 1/3 dos estados da federação,
com um mínimo de 0,10% do eleitorado em cada um. Apenas nesses casos o
partido teria direito ao recebimento de recursos do Fundo Partidário e acesso
gratuito ao rádio e à televisão.

Outro ponto merecedor de destaque é que essa legislação estabelece


com antecedência (e validade até as eleições gerais de 2006), o direito a
funcionamento parlamentar, em todas as Casas Legislativas (para as quais
tenha elegido representante), do partido que, em cada eleição, obtenha o apoio
de no mínimo 5% dos votos apurados, distribuídos em pelo menos 1/3 dos
estados da federação, com um mínimo de 2% do total de cada um deles.

A adoção de tal procedimento parece evidenciar um caráter mais


concentrado na força eleitoral, para que o partido tenha acesso aos recursos
públicos diretos. Além dessas determinações, a Lei nº 9.096, de 1995, que
dispõe sobre os partidos políticos, estabelece que tem direito ao funcionamento
parlamentar o partido que tenha elegido e mantenha filiados, no mínimo, três
representantes de diferentes estados da federação, além de ter elegido
representante em duas eleições gerais consecutivas. Concomitantemente, o
direito de funcionamento parlamentar se daria na Câmara dos Deputados toda
vez que o partido elegesse representante em, no mínimo, cinco estados da
federação e obtivesse 1% dos votos apurados no País. Vale ressaltar que os
partidos que não.

Mesmo sem as condições formais de funcionamento parlamentar, o


partido continuaria existindo para além da Câmara dos Deputados, mas sem
espaços no interior da Casa. Em relação aos recursos públicos (diretos e
indiretos), os partidos passariam a ter apenas um minuto de espaço no horário
eleitoral gratuito, anualmente, e o equivalente a 1% do Fundo Partidário por se
tratar da distribuição igualitária.

49
Essa determinação foi revogada em 2006 pelo TSE. Tais determinações
são observadas na Resolução nº 19.406, de 1995 do TSE.

Vale ressaltar que essas últimas considerações quanto ao funcionamento


partidário foram estabelecidas nesta legislação, porém, com data de vigência
para as eleições gerais de 2006 – a chamada “cláusula de barreira”. Ou seja,
transcorridos 11 anos da aprovação da Lei nº 9.096, de 1995, os partidos teriam
um período para se ajustarem à nova regra que entraria em vigor para as
eleições gerais de 2006. Assim se procedeu. No entanto, após as eleições, o
TSE julgou inconstitucional tal medida, retornando ao que era antes.

A legislação anterior, Lei nº 6.767, de 1979, estabelecia como requisitos


para o funcionamento partidário uma votação de, no mínimo, 5% na última
eleição geral para a Câmara dos Deputados46, pelo menos por nove estados da
federação, com o mínimo de 3% em cada um deles. Foram mantidas as demais
condições, mas houve redução do percentual de 3% para 2% (o equivalente a
uma redução de 33,33%) dos votos válidos nos estados. Portanto, as condições
para funcionamento partidário foram facilitadas. Pode-se inferir uma tendência
maior em abrir espaços para as manifestações democráticas, pela via da
representação partidária, em comparação com os períodos anteriores, porém,
mantidas algumas das exigências em vigor no período militar. Além do que se
pôde perceber com a leitura das legislações, vale uma nota sobre os efeitos
práticos das regras. Por esse ângulo, pode-se dizer que a legislação editada
entre 1965 e 1979 não teve impacto sobre a dinâmica partidária real, já que o
bipartidarismo havia sido imposto. Para ARENA e MDB tanto fazia se a barreira
fosse de 3% ou 10%. As determinações de 1979 e de 1985 nunca foram
aplicadas de fato (Melo, 2007). Por outro lado, a relevância dessa análise não
se encerra com a empiria. Isto é, apesar de a história ter demonstrado que tais
regras, na prática, eram inoperáveis pelo próprio sistema bipartidário, vale a
ressalva de que foram homologadas justamente pela estrutura política autoritária
que regia o País e, portanto, compõem o arcabouço legal do sistema partidário-
eleitoral brasileiro.

50
O funcionamento partidário ganha relevância para este estudo pelo fato
de que a simples existência legal de um partido político já lhe concede o direito
de receber recursos públicos originários do Fundo Partidário e tempo de acesso
aos espaços na mídia eletrônica.

Ainda tendo como foco a Lei nº 9.096, de 1995, no tocante à reforma do


financiamento político no Brasil, essa regra foi modificada de forma contundente.
Desde então, o sistema de financiamento passa a contar com regras mais claras
para a condução do processo partidário eleitoral, inclusive com a participação
direta do poder público, ao dispor fundos orçamentários, de forma permanente
(repasses mensais, e não em cotas trimestrais) para o seu custeio.

No que se refere à composição do Fundo Partidário, o texto dessa


legislação estabelece uma provisão orçamentária específica para cada ano, de
acordo com o número de eleitores inscritos no TSE, não dependendo
unicamente das multas e das leis conexas. A partir da consolidação da fonte
orçamentária para o financiamento partidário-eleitoral, o modelo brasileiro daria
um formato definitivo ao que pode ser classificado como financiamento público
direto efetivo, com dotação orçamentária significativa e regular, através da
destinação “conta a conta” de recursos públicos para o custeio do sistema. O
Tesouro Nacional continuaria a ser o órgão encarregado de depositar a cada
mês o valor referente aos duodécimos (1/12 avos) em conta específica no Banco
do Brasil, à disposição do TSE.

Também nessa conta ficaria depositado o dinheiro decorrente do


recebimento de multas contra o sistema partidário-eleitoral. O fundo contaria
também com doações diretas, tanto de pessoas físicas como jurídicas49, além
de recursos específicos previstos em lei ad hoc. Outra mudança importante no
modelo de financiamento público dos partidos decorre das alterações na
distribuição dos recursos provenientes do Fundo Partidário entre os partidos
políticos.

De acordo com o artigo 41 da legislação eleitoral de 1995, a


distribuição aos órgãos de direção nacional dos partidos ocorreria a
partir de duas cotas, obedecendo aos seguintes critérios: Formato de
distribuição dos recursos do Fundo Partidário (artigo 41, incisos I e II –
Lei nº 9.096, de 1995)

51
(1) 1% do total do Fundo Partidário será destacado para entrega, em partes
iguais, a todos os partidos que tenham seus estatutos registrados no TSE; e

(2) 99% do total do Fundo Partidário serão distribuídos aos partidos que tenham
preenchido as condições do artigo 13, na proporção dos votos obtidos na última
eleição geral para a Câmara dos Deputados.

O Fundo Partidário é regido pela Lei nº 9.096, de 1995, que veio em


substituição à Lei nº 5.682, de 1971. O Sistema Integrado de Administração
Financeira (SIAFI) classifica os recursos repassados pelo Fundo Partidário aos
partidos políticos como transferência financeira a instituições privadas sem fins
lucrativos, como determina a ordenação jurídica dos partidos.

De acordo com Wladmir Caetano, responsável técnico pela COEPA/TSE,


as doações efetuadas diretamente ao Fundo Partidário constam apenas da
legislação. Na realidade não ocorrem.

O artigo 13 da Lei nº 9.096, de 1995, estabelece que: “tem direito a


funcionamento parlamentar, em todas as Casas Legislativas para as
quais tenha elegido representante, o partido que, em cada eleição para
a Câmara dos Deputados obtenha o apoio de, no mínimo, 5% dos
votos apurados, não computados os brancos e os nulos, distribuídos
em, pelo menos, 1/3 dos estados, com um mínimo de 2% do total de
cada um deles”.

No entanto, nas “disposições finais e transitórias” dessa mesma legislação


(e por serem transitórias, o período de vigência se estenderia até 2006), o critério
para a distribuição dos recursos públicos ganharia nova configuração que
complementaria o estabelecido acima, com a introdução da cota de 29% do
Fundo Partidário, que passaria a ser destacada para distribuição aos partidos na
proporção da representação parlamentar no início da sessão legislativa, de
acordo com as instruções estabelecidas pelo TSE.

Assim dos recursos totais do fundo, 29% seriam distribuídos de acordo


com os critérios descritos previamente. Dos 71% restantes, 1% seria repassado
de forma igualitária a todos os partidos que cumprissem a exigência de registro
no TSE e 99% iriam para os partidos que ultrapassassem a cláusula de
desempenho. Essa regra valeria até as eleições de 2006, inclusive.

52
(1) Aos partidos políticos que tiverem obtido 5%, no mínimo, dos votos válidos,
sendo estes distribuídos em pelo menos nove estados, com um mínimo de 2%
do total de cada um deles; (e/ou)

(2) Aos partidos que tenham elegido representantes em cinco estados, no


mínimo, e obtido 1% dos votos válidos no País.

Os partidos que cumprissem quaisquer desses critérios de desempenho


definidos pela legislação (ou os dois) teriam o direito a receber essa cota do
fundo. Portanto, a adoção dessa cota nada mais foi do que um reforço ao critério
da proporcionalidade na distribuição dos recursos do fundo entre os partidos
políticos.

Cabe ressaltar que em 2007 a legislação que define a distribuição dos


recursos do Fundo Partidário foi alterada, prevalecendo o seguinte critério:

(1) 5% distribuídos de forma igualitária aos partidos com estatutos registrados


no TSE; e

(2) 95% distribuídos de forma proporcional aos votos obtidos na última eleição
geral.

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