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SÃO GONÇALO
2021
A QUESTÃO DA SECA NAS CONSTITUIÇÕES FEDERAIS
E A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE ASSISTÊNCIA
1824 -1988
SÃO GONÇALO
2021
RESUMO
The semi-arid is the largest area of the Northeast region and for geographical and
climatic reasons is beset by long periods of extreme drought since colonial times.
During the Empire, relief measures for the affected population were charitable and
emergency in nature, in order to avoid increased mortality of both humans and flora
and fauna. In the Republic, the first government actions focused on the issue of drought
such as the construction of dams and the drilling of wells took place, although they
were not enough to solve the problem. Some states experienced a nefarious scenario:
unemployment, hunger, disease and death. The government of Ceará, in the drought
of 1932 created the concentration camps to welcome migrants, a way to prevent the
entry into the capital of thousands of migrants from the Sertão, now called scourges of
drought. The migration policy was stimulated by the illusion of urban centers and the
Amazon, many have never returned to their homeland. The Federal Constitutions
dedicated specific articles to the theme of drought in the semi-arid northeast, however,
the achievements were always below the desired. The creation of federal agencies
such as DNOCS and SUDENE allowed a greater effectiveness in the management of
the region's water problem. The mobilization of civil society with rural workers
promoted a change in the perspective of facing the phenomenon of drought: learning
to live with drought in the semi-arid and using technological resources such as the
transposition of watersheds, construction of cisterns for the capture of rainwater, in
addition to modernizing legislation regarding water resources. This work aims to
analyze the issue of drought in the semi-arid northeast and the implementation of
public policies of assistance in the texts of the Federal Constitutions, the time frame
will be from 1824 to 1988. The research hopes to demonstrate through the bibliography
and researched documents that there were failures in the planning of government
actions, and that only with the intervention of civil society in joint actions with the
population there was a change in understanding regarding living with drought in the
semi-arid.
Keywords: Semiarid. Federal Constitution. Public Policy. Dry. Coexistence.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 5
6 A CONSTITUIÇÃO DE 1988.................................................................................. 16
REFERÊNCIAS......................................................................................................... 22
5
1 INTRODUÇÃO
O drama das secas tem uma longa história: o primeiro registro da ocorrência
de seca nos documentos portugueses é de 1552, três anos após a chegada
do primeiro governador-geral, Tomé de Souza. [...] no decorrer do século XVII
houve seis grandes secas [...] que afetaram principalmente a paraíba, o Rio
Grande do Norte e o Ceará. [...]no século XVIII ocorreram sete grandes
secas...[...] os efeitos foram muito mais devastadores que os das secas do
século anterior, em parte devido ao crescimento da população vinculada à
atividade da pecuária, que acabara por ocupar parte significativa do sertão
nordestino. (VILLA, 2001, p. 18).
Bem penosa é para a Câmara dos Deputados a ideia do terrível flagelo que
caiu sobre algumas das províncias do Império; consoladora, porém lhe é a
segurança de que o governo de Vossa Majestade Imperial procurou minorar
males tão graves, enviando para aquelas províncias desoladas os socorros
de que podia dispor, e muito apraz à Câmara que o mesmo governo esteja
na intenção de continuar tais socorros enquanto forem necessários. (FALAS
DO TRONO, 2019, p. 320)
2Varíola: doença virótica infectocontagiosa. Era conhecida popularmente como “bexiga negra”, em
sua forma mais grave, e alastrim, em sua forma mais benigna.
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3 O ENFRENTAMENTO À SECA
A presidência da República sob o comando de Rodrigues Alves (1902-1906),
se diferenciou dos governos anteriores no entendimento da questão da seca. A partir
da Grande Seca de 1877-1879, houve uma mudança no tratamento que se dava a
esse fenômeno climático. Não era mais possível apenas remediar os problemas
advindos com a estiagem prolongada; era necessário um enfrentamento do problema
com obras de infraestrutura hidráulica permanentes, como “[...] a criação de açudes,
abertura de poços e estradas de ferro”. (VILLA, 2001, p. 92).
Para consolidar esse entendimento, em 1905 o governo editou o Decreto que
4“dispunha sobre as obras preventivas, feitas por conta da União contra os efeitos da
seca”, e já bem no final do mandato, criou a Superintendência de Estudos e Obras
Contra os Efeitos da Seca, que em conjunto com a Comissão de Açudes e Irrigação
se tornaram os órgãos do governo que efetivamente cuidavam do combate à seca.
Após alguns anos de existência e desenvolvimento de perfuração de poços em vários
estados do Nordeste, a Superintendência foi extinta em 1909, sendo substituída, no
mesmo ano pela Inspetoria federal de Obras Contra as Secas (IFOCS) e manteve o
mesmo caráter institucional, que era bastante focado na construção de açudes, 5“a
açudagem ganhou nova força durante a presidência do paraibano Epitácio Pessoa
(1919-1922), mantendo-se até o final da década de 1920 como o principal meio de
combate à seca”.
4
DECRETO Nº 1.396, DE 10 DE OUTUBRO DE 1905
5Arquivo Nacional – MAPA: Memória da Administração Pública Brasileira
http://mapa.an.gov.br/index.php/dicionario-primeira-republica/932-inspetoria-de-obras-contra-as-secas
11
Apesar de essa Superintendência contra a seca ter sido criada, pouco adiantou
para a prevenção de outra estiagem severa, como aconteceu em 1915.
Diferentemente da seca de 1877-1879 que afetou particularmente o Ceará, dessa vez,
praticamente todos os estados da região foram atingidos pela calamidade. A imprensa
fazia as principais denúncias da inércia do governo federal e da Câmara dos
Deputados que demoravam em atender aos apelos dos governadores; “o governo
federal não pode permanecer indiferente diante de tamanha calamidade. O seu dever
é agir quanto antes em socorro das populações flageladas, que não podem ficar no
desamparo”. (VILLA, 2001, p. 103). Os relatos se tornam cada vez mais
desesperadores e exigem esforços grandiosos, que não ocorrem como seria
necessário. De acordo com Villa (2001, p. 106), o bispo do Ceará relata aos jornais
cariocas:
Além de toda a tragédia humana provocada pela fome, havia a violência, que
crescera absurdamente com os saques, roubos e assassinatos. Diante de uma
situação de caos, havia por parte do governo e de alguns setores da sociedade uma
maior preocupação com o controle dos gastos públicos, que poderia “resultar em
danos maiores a reconstrução econômica e financeira do país”. (VILLA, 2001, p. 116).
Essa cautela financeira não foi demonstrada em 1925, quando “curiosamente, foram
destinados 83 mil contos de réis para novas obras em outras regiões do país” (p.139).
Em toda a década de 1920, o país passa por diversos momentos de ebulição,
seja na esfera política, econômica e social, e bem no final da década, as disputas
políticas se intensificam pela presidência da República. Há um contexto de revolução
em vários estados, sob a direção de Getúlio Vargas, candidato do Rio Grande do Sul.
A Revolução realmente acontece em outubro de 1930 e forma-se uma Junta
Provisória para governar o Brasil; em sequência transmitem o poder ao líder da
Revolução, Getúlio Vargas. Era o fim da Velha República e o começo da Era Vargas.
4 A SECA DE 1932
12
Um novo governo não era sinal de solução para o velho problema da seca.
Mais uma vez ela chegou intensa e castigante em 1932. Novamente foram criadas
algumas frentes de trabalho para construção de açudes, porém já ficara demonstrado
que essas obras emergenciais, pouco resolvia de fato. Em alguns locais, contratavam
homens que mal tinham forças para trabalhar, tão debilitados estavam pela fome e
desnutrição. Cada vez mais, os sertanejos do interior rumavam para a capital
Fortaleza; “pelas estradas do estado, milhares de retirantes se dirigiam aos maiores
centros em busca de trabalho e comida”. (VILLA, 2001, p.146). As ações do governo
federal se concentravam na contratação de retirantes para as frentes de trabalho e na
migração para outros estados, principalmente São Paulo. Em tempos de repressão
política, pouco se falava da ineficiência do Governo Provisório, mesmo assim, para
evitar mais exposição do flagelo, a política de migração para o sul foi retirada e a
população era mantida nos seus locais. Contudo, a conjuntura local era muito difícil.
Fortaleza estava repleta de famintos; e nesse cenário caótico foi criado o primeiro
campo de concentração de seres humanos no Brasil. Segundo Rios (2014, p. 30), “Em
meados de abril, sete Campos de Concentração foram construídos em todo Estado,
sendo dois na Capital”.
Os Campos de Concentração, também chamados de “currais”, receberam “185.000
mil pessoas no ápice da seca, distribuídos em sete campos.” (VILLA, 2001, p. 154).
6
Art.177 - A defesa contra os efeitos das secas nos Estados do Norte obedecerá a um plano sistemático e será
permanente, ficando a cargo da União, que dependerá, com as obras e os serviços de assistência, quantia nunca
inferior a quatro por cento da sua receita tributária sem aplicação especial. (DOU de 16.7.1934 - Suplemento e
republicado em 19.12.1935).
13
Apesar de algumas políticas terem sido efetivadas ao longo dos anos, a cada
período de seca ficava demonstrado que essas políticas não resolviam os problemas
definitivamente, eram políticas de emergência e de assistência por um tempo
determinado. Depois da morte de Vargas em 1954 e já na presidência de Juscelino
Kubitscheck, o antigo DNOCS estava despreparado para enfrentar mais uma seca,
no ano de 1958. Havia relatos de desvio de verbas, e no Ceará “a oligarquia tinha
tomado conta do DNOCS e transformado o órgão em um apêndice de seus interesses
políticos e econômicos.” (VILLA, 2001. p.190). Ao final da década de 1950, alguns
atos do governo de Juscelino evidenciavam relevante interesse pela região
nordestina: criou-se o Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste
(GTDN) e em 1959 a 9SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste),
os órgãos foram criados sob a inspiração do economista Celso Furtado que após
longo período de estudo e trabalho na região, afirmava: “o flagelo [da seca] tinha
origem social e não ambiental”. (GODOY,2016, apud FURTADO,1963). Todavia, o
projeto de levar desenvolvimento à região nordeste que se iniciara em anos anteriores
tomou um rumo diferente, posto que “a evolução política do Brasil acabou
enfraquecendo a Sudene e o planejamento regional, ao recentralizar o poder no
Governo Federal após 1964”. (NYS, Erwin de. et al. 2016, p. 29).
9
LEI No 3.692, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1959: Institui a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste e
dá outras providências.
16
Desde 1958, não sofria o Nordeste seca tão ampla, insistente, penosa e
devastadora: 8 Estados, 605 municípios, quase 600 mil quilômetros
quadrados de terra calcinada, meio milhão de homens deixando o chão de
seu trabalho, 3 milhões de criaturas atingidas, rebanhos descarnados e
tristes, lavouras perdidas e, todo dia, o ano inteiro, um milhão de cruzeiros
injetados para acudir o infortúnio. (BIBLIOTECA DA PRESIDÊNCIA DA
REPÚBLICA. Discurso “A seca que se foi”. 08/06/1971, p.23.)
6 A CONSTITUIÇÃO DE 1988
Após vinte e um anos de Ditadura Militar e um longo processo de
redemocratização, a nova Carta Magna trouxe um vigor democrático ao país e às
instituições públicas, além de representar um recomeço para a população brasileira.
Inovadora na questão dos direitos sociais, a Constituição de 1988, no seu 11artigo 42,
define que parte dos recursos destinados à irrigação, 50% para o nordeste, sejam
aplicados “preferencialmente no semiárido”. É a primeira vez que o termo semiárido é
citado nominalmente como área de preferência de recursos financeiros e
posteriormente, a região do semiárido é 12 “inserida na área de atuação da
Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste – Sudene”.
A ECO-92, Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente realizada no Rio de
Janeiro, consolida o termo 13“desertificação” e surge um planejamento de combate a
esse fenômeno que atinge diversas áreas no Brasil. No capítulo 12 da 14Agenda 21,
o foco é a “ luta contra a desertificação e a seca”, logicamente, o documento enfatiza
o “fortalecimento da base de conhecimentos e desenvolvimento de sistemas de
informação e monitoramento para regiões propensas à desertificação e seca, sem
esquecer os aspectos econômicos e sociais desses ecossistemas”.(SENADO
FEDERAL, Agenda 21, p. 13). Em 1993, ano seguinte a Conferência, mais uma seca
severa assola a região. Dessa vez, porém, uma forte mobilização de trabalhadores
rurais exigiu medidas eficazes para o enfrentamento de mais um período difícil. A
população experimentava uma nova realidade em que a participação popular iria
ajudar a formular políticas para a região, fato diferente do que ocorria no passado em
que a população atingida pela seca eram apenas os atores sofridos de um drama
recorrente.
[...] antes da falta de água, é a falta de terra a causa da baixa inclusão social
da maior parte da população desta parte do Nordeste brasileiro. Sem terra
suficiente, parte das famílias fica no círculo vicioso de fome, sede,
degradação ambiental, abandono da terra e migração para os centros
urbanos. (GNADLINGER, SILVA, BRITO. Teresina, 2005.)
O desafio inicial foi se mostrando complexo assim como a região. Porém, com
programas de assistência voltados para a implementação de tecnologia e projetos de
convivência com o semiárido, a formação de uma consciência de participação em
todas as fases do processo mostrou que “é plenamente possível a vida no semiárido.
16 https://www.asabrasil.org.br/acoes/cisternas-nas-escolas#categoria_img
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8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A questão da seca no semiárido do Nordeste foi tratada durante muito tempo
como um problema regional localizado, até porque a seca não atingia toda a região
ao mesmo tempo. Alguns Estados sofreram com menos intensidade os períodos
secos; outros foram arrasados com longas estações sem chuvas. Por ser um
fenômeno recorrente, a população foi se adaptando àquela dura realidade e esperava
sempre o auxílio dos órgãos governamentais. Inicialmente, durante o Império,
enviavam o socorro como uma dádiva da família Imperial à população atingida pelo
flagelo da seca.
REFERÊNCIAS