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UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRA

PRÓ-REITORIA ACADEMICA
CURSO DE HISTÓRIA

WASHINGTON LUIZ DA SILVA RIBEIRO

A PERCEPÇÃO DA VIOLÊNCIA URBANA


NO CONTEXTO DA DITADURA MILITAR:
O CASO DE SÃO GONÇALO (RJ) NA DÉCADA DE 1970

SÃO GONÇALO
2018
WASHINGTON LUIZ DA SILVA RIBEIRO

A PERCEPÇÃO DA VIOLÊNCIA URBANA


NO CONTEXTO DA DITADURA MILITAR:
O CASO DE SÃO GONÇALO (RJ) NA DÉCADA DE 1970

Artigo científico apresentado a Pós Graduação do Curso


de História do Brasil da Universidade Salgado de Oliveira
- UNIVERSO, como parte dos requisitos para conclusão
do curso.

Orientador: Prof. José Luis Honorato Lessa

SÃO GONÇALO
2018
WASHINGTON LUIZ DA SILVA RIBEIRO

A PERCEPÇÃO DA VIOLÊNCIA URBANA


NO CONTEXTO DA DITADURA MILITAR:
O CASO DE SÃO GONÇALO (RJ) NA DÉCADA DE 1970

Artigo científico apresentado ao Curso de História da Universidade Salgado de Oliveira –


UNIVERSO, como parte dos requisitos para conclusão do curso.

Aprovado em _____ de ________________ de 2018

Banca Examinadora:

______________________________________________

______________________________________________

______________________________________________

Professor Orientador
AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por te me concedido forças para concluir este trabalho e também
agradeço aos professores da Universidade Salgado de Oliveira – UNIVERSO pelo empenho e
dedicação aos alunos.
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 7

2 VIOLÊNCIA URBANA ........................................................................................................ 8

3 A VIOLÊNCIA ESTATAL................................................................................................. 10

4 VIOLÊNCIA CAUSADA PELAS FORÇAS ARMADAS ............................................... 11

5 A PESQUISA COM MORADORES DA DÉCADA DE 70.............................................12

6 A PESQUISA EM JORNAIS E OS REGISTROS DE VIOLÊNCIA URBANA..........14

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................16

REFERÊNCIAS......................................................................................................................17

ANEXO A - QUESTIONÁRIO DA PESQUISA.................................................................19


RESUMO

A violência urbana se caracteriza pelas ações criminosas que são praticadas, em grande parte, nas
médias e grandes cidades. À impressa cabe um papel relevante: gerar notícia sobre a violência e a
criminalidade. O presente trabalho se propõe a avaliar a percepção da violência urbana por um grupo
de moradores na década de 1970 no Município de São Gonçalo, no Estado do Rio de Janeiro. Tem o
objetivo de compreender essa percepção a partir dos relatos dos sujeitos que a vivenciaram dentro de
um contexto político ditatorial, no qual os meios de comunicação eram submetidos à censura prévia, e
de alguma forma, contribuíram para a manipulação da opinião pública, já que dependiam das
concessões do governo para funcionar. O estudo baseia-se em traçar um paralelo entre a opinião do
grupo pesquisado e os noticiários dos jornais da época em relação à violência no município, fazendo
um recorte temporal entre 1970 e 1975. Observam-se ainda, as ações de torturas cometidas pelas
Forças Armadas como parte dessa violência e o papel da imprensa nesses acontecimentos. Para o
desenvolvimento do estudo foi elaborada uma pesquisa utilizando o questionário para obtenção dos
dados e também os relatos orais baseados nas memórias de percepção ou não de violência no período
mencionado.

Palavras-chave: Violência; Percepção; Política; Censura; Imprensa.


ABSTRACT

Urban violence is characterized by criminal actions that are made mostly in medium and large
cities. To the press is due a relevant part: create news about violence and criminality. The
present work seeks to evaluate the perception of urban violence by a droup of inhabitants
from the 1970s in the city of São Gonçalo, in Rio de Janeiro state. It has the objective of
understanding this perception from what is told by people who lived it within a political
context of a dictatorial period, in which means of communication were submitted to previous
censorship, and somehow, contributed to manipulation of public opinion, since they depended
on the government allowances to remain functioning. The study is based upon in tracing a
parallel between the opinion of the researched group and the news from the time about
violence in the city, showing the point of view from 1970 to 1975. It's also taken in account
the actions of torture made by the Military Force as a part of the violence and the part of the
press in this event. For the development of the study a research was made using a form for
data obtaining and also spoken reports based on the memories of whether there was a
perception of violence or not in that period
Keywords: Violence; Perception; Politics; Censorship; Press
7

1 INTRODUÇÃO

A história de São Gonçalo data do século XVI, e nos seus primórdios foi Freguesia e
Distrito da Vila Real da Praia Grande (Niterói) do qual se emancipou politicamente em 1890.
Somente em 1929 recebe o título de cidade e a partir daí inicia seu caminho independente.
Anos mais tarde, vive sua fase de euforia industrial e torna-se uma das cidades mais
relevantes no cenário econômico do estado fluminense. O crescimento desordenado e o
aumento substancial da população foram importantes para demonstrar que a infraestrutura da
cidade não atendia à demanda industrial e com isso a indústria gonçalense entra em
decadência.
São Gonçalo chega à década de 70 enfrentando graves problemas estrutural e
populacional que se junta à crise do recém-criado estado do Rio de Janeiro. Embora, a
propaganda do governo anunciasse o milagre econômico e a copa do mundo de futebol de
1970, o que preocupava era a fusão do estado da Guanabara com o estado do Rio de Janeiro
em 1975. Com a fusão diminuiu- se a arrecadação e o Rio perdeu os repasses destinados à
antiga capital federal. Os impactos dessa mudança foram sentidos em toda a Região
Metropolitana.
Com a queda na economia surgiram os problemas do desemprego, do crescimento das
favelas, e consequentemente, do aumento da violência. Esta violência atingiu, logicamente, as
periferias da metrópole como a Baixada Fluminense e São Gonçalo de forma contundente,
segundo os noticiários da imprensa da época.
A motivação deste trabalho surgiu após ouvir os relatos de pessoas que viveram nesta
região durante o período e descreveram a época como um tempo em que não havia violência
como os assassinatos e a tortura. É sabido que as informações e divulgações das notícias eram
seletivas, que o acesso à informação era restrito a quem possuía um rádio ou podia comprar os
jornais, a televisão era um bem de consumo ausente das residências dos mais pobres. A
imprensa oficial estava a serviço do Regime e a imprensa alternativa era cassada e censurada
nas suas publicações.
Diante desse quadro, como perceber a violência? Na percepção deste grupo a violência
se caracterizava pelos “ladrões de galinhas”, indivíduos que praticavam pequenos furtos sem
maiores consequências. Para obter as respostas que subsidiaram este trabalho foi elaborado
um questionário (Anexo A) contendo uma pergunta fechada e cinco perguntas abertas e para
complementar este estudo foi feita uma investigação nas notícias veiculadas sobre violência
8

urbana, no jornal “O São Gonçalo”1 , entre os anos de 1970 a 1975, e no jornal “O


Fluminense”2 , a partir de 1972. “O Fluminense” tem sua sede na cidade vizinha de Niterói.
O objetivo dessa investigação jornalística foi traçar um paralelo entre o noticiário
veiculado e as respostas dadas pelos colaboradores, observando o contexto histórico, político
e social no qual esses indivíduos estavam inseridos.

2 VIOLÊNCIA URBANA

A violência não é um fato novo na história humana. Sempre foi objeto de pesquisa de
estudiosos de diversas áreas da ciência como a Antropologia e a Sociologia. Assim, também
Sigmund Freud, na Psicanálise, caracterizou a violência como inerente ao homem e no seu
estudo afirma: “Em tudo o que se segue, adoto, portanto, o ponto de vista de que a inclinação
para a agressão constitui, no homem, uma disposição instintiva original e autossubsistente, e
retorno à minha opinião, de que ela é o maior impedimento à civilização”. 3
A violência por definição da Organização Mundial da Saúde pode ser entendida como:

O uso intencional da força física ou do poder, real ou em a meaça, contra si próprio,


contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comun idade, que resulte ou tenha
grande possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de
desenvolvimento ou privação. (KRUG EG et al., eds./ Relatório Mundial sobre
violência e saúde. Geneva, Organização Mundial da Saúde, 2002)

É interessante observar nesta definição a intencionalidade da ação de violência. Sendo


assim, pode-se inferir nestes dois fragmentos que é inato ao homem o instinto para a violência
e o seu uso é intencional, isto é, de alguma maneira usa-se a violência a fim de obter algum
resultado.

Não é incomum também observar que os mais altos índices de violência ocorrem em
áreas de periferia e atingem as populações menos favorecidas pelos recursos econômicos e
esquecidas pelas políticas públicas na área de segurança, produzindo uma relação de
causalidade entre violência e pobreza. Esse conjunto de fatores - econômico político e social
- são determinantes para explicar o contexto da violência no Estado do Rio de Janeiro, na
década de 1970. Logicamente, não é pretensão de este auto r elaborar um estudo científico

1
Jornal circu lante em São Gonçalo fundado em 1931 pelo jo rnalista Belarmino de Mattos.
2
Jornal circulante em Niterói fundado em 1878 por Francisco Rodrigues de Miranda e Prudêncio Luís Ferreira
Travassos.
3
https://cei1011.files.wordpress.com/2010/04/freud_o_mal_estar_na_civilizacao.pdf
9

aprofundado a respeito da violência neste trabalho, porém, essas observações são pertinentes
aos objetivos propostos.

O final dos anos 60 foi denominado por alguns grupos como os “anos de chumbo”,
referência ao período mais violento do regime militar no Brasil. A ideia do milagre
econômico, da modernização e de um “país do futuro” transmitia à população, principalmente
àquela que não tinha acesso à informação, a imagem de um Brasil próspero e pacífico.

Contudo, os crimes ocorriam cotidianamente nas periferias das grandes cidades, cabe
destacar a região da Baixada Fluminense que enumerava os casos de assassinatos cometidos
pelos “esquadrões da morte”, sequestros e tráfico de drogas.

Se a violência urbana sempre esteve presente no cotidiano da população brasileira, em


São Gonçalo não foi diferente. Portanto, quais foram às razões que levaram as pessoas a
mencionar que na década de 70 não havia violência em São Gonçalo?

Durante o período da industrialização, São Gonçalo teve um elevado aumento


populacional. Muitos migrantes vinham em busca de uma vida mais barata, já que havia no
município muitos loteamentos que foram vendidos sem qualquer infraestrutura de saneamento
ou urbanização. Essa população que chegava à cidade era na sua maioria de baixa renda, que
usava a cidade apenas como “dormitório”, pois sua força de trabalho era levada para Niterói
ou para o Rio de Janeiro. Sendo um município com uma população pobre e sem acesso aos
bens culturais, pode-se depreender que o acesso à informação, aos jornais e revistas era
incomum, o que de certa forma pode justificar a falta de percepção ou desconhecimento da
onda de violência urbana no seu entorno.

O próprio regime político não permitia a circulação de determinadas notícias, e um ou


outro jornal alternativo conseguia driblar a censura prévia dos militares. Nesse contexto social
da periferia, é razoável inferir que devido às condições financeiras, as camadas mais pobres
do município não tinham ideia dos acontecimentos ao seu redor. E, se não possuíam acesso
aos meios de comunicação mais baratos como jornais e revistas, é imaginável que o rádio e os
televisores fossem artigos de luxo distante da sua realidade. Deste modo, a falta desses
elementos dificultava a percepção em relação à violência e dava aos moradores a sensação de
não existência da criminalidade, no que se refere aos crimes violentos como os assassinatos, e
restringe a prática criminosa aos pequenos furtos dos “ladrões de galinhas”
10

3 A VIOLÊNCIA ESTATAL

A violência no Brasil é histórica. Atravessa os períodos da formação do país se


constituindo uma manifestação sistêmica na esfera social. No início da colonização pelos
portugueses, a população indígena e os africanos escravizados foram submetidos às mais
duras formas de violência. Passou o tempo, mas o objetivo de encontrar mais riquezas e
expandir o território para o interior do país promoveu a morte e a captura de grande número
de indígenas e negros fugidos do cativeiro: eram os desbravadores do sertão, os bandeirantes.

Durante o período denominado regencial, ou seja, após a abdicação do Imperador


Dom Pedro I, diversas revoltas aconteceram e até mesmo uma Revolução, a Farroupilha.
Todo esse clima de confrontos e violência persistiu por bastante tempo no Brasil e não foi
diferente na Velha República, cuja política se pautava na força dos coronéis e nos desmandos
contra os trabalhadores rurais. No mesmo passo se encaminhava a Nova República, dessa vez
com a violência urbana e com as perseguições no campo político.

No seguimento da história, em 1964 advém o golpe militar e a tomada do poder pelas


Forças Armadas. Inicia-se um dos momentos mais conturbados e violentos da nação.
Violência policial, guerrilha, cassação dos direitos políticos, repressão aos meios de
comunicação, sequestros e mortes. Dentro desta conjuntura política e social, a violência recai
novamente sobre uma população quase que esquecida no contexto brasileiro: os indígenas.

Em Março de 1971 o indigenista Orlando Villas Boas declarou, segundo relatos no


livro “A política de genocídio contra os índios do Brasil” 4 :

“Genocídio não é só matar selvagens a tiros de espingarda. Genocídio é também


fazer in justiça, colaborar para que o índio e sua cultura desapareçam [...] não
podemos, em nome do desenvolvimento vilipendiar, tomar terra do índio, massacrá -
lo. Absolutamente, não!”

Documentos e relatos colhidos durante as investigações recentes da Comissão


Nacional da Verdade (CNV) apontam mortos em conflitos e em remoções forçadas, crises de
abastecimento, epidemias inoculadas propositalmente. 5

Em contínuo andamento, a ditadura militar segue adiante exercendo seu papel de


governar com mãos de ferro, decretando Atos Institucionais de repressão e violência e
4
Este livro não tem autores declarados, consta na sua ficha esta inscrição: Trabalho elaborado por um grupo de
antropólogos patriotas brasileiros que não podem revelar seus nomes por agora, dado o regime fascista existente
no Brasil. Na sua capa tem a inscrição A EPPA – Associação de Ex –Presos Polít icos Antifascistas. 16/03/1974.
5
Vio lência contra os indígenas durante a Ditadura. Instituto Vladimir Herzog.
http://memoriasdaditadura.org.br/creditos/index.ht ml
11

contrariando o mito do “homem cordial”, do país pacífico cantado em versos. A história


mostra a face de uma pátria violenta, e não só da violência física, mas que também emprega o
poder estatal para impor à força suas ideologias.

Figura 1 : Método de dominação do escravo

Fonte: Google.co m. br

A imagem mostra um escravo sendo espancado na época colonial, contudo, anos


depois as mesmas práticas de tortura foram retomadas no período da ditadura. Este é apenas
um breve relato sobre a linha histórica do uso da violência na sociedade brasileira em vários
momentos, a fim de contextualizar o entendimento sobre o assunto abordado.

4 VIOLÊNCIA CAUSADA PELAS FORÇAS ARMADAS

Relato de preso no Quartel da Marinha na Ilha das Flores, em São Gonçalo:

Nós, os prisioneiros detidos na Ilha das Flores (Ilha Flower), no Rio de Janeiro,
escreveu esta carta, num mo mento em que o público brasileiro co meça a ser
informado sobre as atrocidades cometidas contra os presos políticos em nosso país e
ainda podem duvidar que estes crimes estejam realmente acontecendo. Nós podemos
assegurar a todos que a tortura existe no Brasil. E mais, tudo que é dito sobre
métodos de tortura é muito pouco, comparado com os verdadeiros fatos . Temos sido
vítimas e testemunhas de torturas infligidas aqui e nós consideramos que é nosso
dever para com a verdade e a justiça para denunciá-los. Muitos podem perguntar por
que só agora é que as denúncias estão aparecendo de todos os cantos do nosso país.
Ameaças de mais torturas e até mesmo a morte tem, até agora, nos manteve em
silêncio. Recentemente, no entanto, declarações do Presidente da República e do
Ministro da Justiça,bem co mo os relatórios da imp rensa local e internacional, fazem-
nos crer que estamos mais protegidos contra represálias.6

6
https://www.documentosrevelados.com.br/depoimentos -torturas-denuncias-ditadura/denuncias-de-torturas-na-
ilha-das-flores/
12

É importante enfatizar que a ditadura militar também teve a sua contribuição para a
violência em São Gonçalo (RJ), e não se pode desconsiderar esse tipo de crime cometido
pelas Forças Armadas durante o regime. Mas, a análise aqui se detém na década de 1970 na
Base Militar de Fuzileiros Navais da Ilha das Flores que foi local dos crimes de tortura
conforme conclusão dos integrantes da Comissão Nacional da Verdade (CNV). Várias
pessoas foram torturadas, calculam-se duzentas almas entre 1969 e 1971 que padeceram nas
mãos dos militares.

Figura 2: Método de tortura denominado pau de arara

Em outra década, a Ilha das Flores foi utilizada como presídio na Revolução de 1930.
Mas, a Ilha já serviu a bons propósitos. Foi hospedaria para imigrantes quando acabou o
tráfico de africanos e os políticos da época passaram a incentivar a vinda de estrangeiros para
compor a força de trabalho livre. A ilha servia também para receber os refugiados que
chegavam ao país, em outros momentos, como no pós- Segunda Guerra Mundial. Atualmente
a ilha serve de base para a Tropa de Reforço dos Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil e
conserva o espaço do Centro de Memória da Imigração da Ilha das Flores.

5 A PESQUISA COM MORADORES DA DÉCADA DE 70

Para o presente artigo apresento o resultado dos relatos dos colaboradores que
responderam à pesquisa-questionário (anexo A) a respeito da percepção da violência no
Município de São Gonçalo na década de 1970. Pude observar que alguns se mostraram
receosos para falar sobre o assunto da violência urbana, principalmente em relação aos
militares, devido a atual situação do aumento da violência na cidade
13

O questionário foi elaborado em duas partes, com quinze questões, alternando


perguntas abertas e fechadas. Na primeira parte estão os dados dos colaboradores e na
segunda as perguntas abertas (discursivas). Os questionamentos foram ordenados no sentido
de entender se esse grupo tinha conhecimento ou se percebia a violência no seu entorno,
traçando um paralelo entre as respostas do grupo e as notícias veiculadas nos meios de
comunicação, sendo esse o intuito essencial da pesquisa.

Para o desenvolvimento desta pesquisa doze (12) pessoas foram entrevistadas. Sendo
duas (2) mulheres e dez (10) homens com idades entre cinquenta e cinco e oitenta e cinco
anos. Do total pesquisado seis nasceram em São Gonçalo, três em outros municípios do
Estado, dois em outro estado do Brasil e um era estrangeiro.

No momento em que são perguntados sobre a escolaridade, alguns ficaram tímidos de


falar porque têm um baixo nível de instrução.

Ao serem perguntados por quais meios eles tinham acesso às informações entre os
anos de 1970 e 1975, e tendo como opções para assinalar o rádio, a televisão, o jornal ou
nenhuma das opções, as respostas foram: sete pessoas sabiam das notícias por meio do rádio,
apenas uma pela televisão e quatro não tinham nenhum acesso.

No entanto quando a pergunta fazia menção à lembrança de casos de violência: oito


presenciaram ou ouviram falar e quatro responderam que na década de 70 não tinha violência.
Transcrevo alguns trechos dos relatos obtidos utilizando nomes fictícios para os entrevistados.

 Qual sua lembrança de casos de violência urbana na década de 70?

Senhor Souza, aposentado, trabalhava em estaleiro, morador do bairro Neves,


recorda: “eu me lembro de um caso de um amigo que foi assassinado a navalhadas nesse
período.”

Senhor Walmir, aposentado pela indústria de reparos naval, também morador do


bairro Neves, responde: “não lembro! Naquele tempo não existia violência, as coisas eram
mais calmas”.
No questionamento sobre a percepção da atuação da policia nas ruas, sete
responderam que nunca perceberam e cinco perceberam algum tipo de violência.
Senhora Bi- ida, aposentada, trabalhou como domestica, contribui respondendo: “eu
me lembro de ter visto policiais dando tapas em meninos na rua, mas tinha que ficar quieta”.
14

Senhor Antonio Gomes, aposentado, trabalhou no porto de Paranaguá na área naval


também afirma: “eu nunca percebi violência policial. E vou completar: não tinha! eles
tratavam as pessoas com respeito”.
Quando a pergunta foi sobre se percebiam atuação das forças armadas nas ações de
violência e de que forma elas atuavam, seis responderam que nunca perceberam nada e seis
perceberam algum tipo de atuação das forças armadas. Eis uma das respostas:
Senhor Antonio de Oliveira, aposentado como pedreiro, responde: “sim, eles sempre
arrochavam as pessoas nas ruas pedindo documentos, nessa época tinha que ter carteira
profissional assinada, se não tivesse “ia em cana” “.
Na indagação sobre se a violência e a pobreza tem relação direta, nove pessoas
responderam que violência e pobreza têm relação e três argumentaram que não encontram
ligação entre uma coisa e outra. Descrevo aqui duas posições dos entrevistados:
Senhor Antonio, morador de São Gonçalo há trinta anos: “Eu acho que não. A pessoa
pode ser pobre ou rica, quando dá para fazer coisas erradas não tem jeito”.
Senhor Emanuel, do bairro Neves, tem outra opinião. “Eu acho que sim, porque uma
coisa puxa a outra, e por isso a pobreza tem relação com a violência”.
No diálogo com os colaboradores e as experiências vivenciadas por eles percebe-se
um equilíbrio nos depoimentos, e isso agregou muito valor qualitativo ao trabalho e
contribuiu essencialmente para o entendimento dos acontecimentos da época já mencionada.

6 A PESQUISA EM JORNAIS E OS REGISTROS DE VIOLÊNCIA URBANA

A investigação para obter informações sobre violência urbana foi direcionada, a


priori, para o Jornal O São Gonçalo (RJ), entre os anos de 1970 a 1975, para fazer uma
comparação com os resultados do questionário respondido pelos colaboradores. Mas, diante
das poucas informações no referido jornal, encontrou-se outra fonte de pesquisa, no caso o
Jornal O Fluminense (RJ) que fica no município de Niterói onde as informações só foram
conseguidas a partir de 1972. Abaixo, um pequeno demonstrativo com dados dos jornais
mostrando números de casos de violência urbana no município de São Gonçalo.
Indubitavelmente, os números noticiados confirmam o índice elevado de violência na cidade.
15

Tabela 1: Casos de violência urbana entre 1970 a 1974 – O São Gonçalo


Janeiro de 1970 22 casos de violência Em 14 dias

Janeiro de 1971 5 casos de violência Em 5 dias

Janeiro de 1972 22 casos de violência Em 15 dias

Janeiro de 1973 17 casos de violência Em 13 dias

Janeiro de 1974 17 casos de violência Em 12 dias

Fonte: Jornal O São Gonçalo. 7

Tabela 2: Casos de violência urbana entre 1972 a 1975 – O Fluminense


Janeiro de 1972 12 casos Em 09 dias

Janeiro de 1973 33 casos de violência Em 18 dias

Janeiro de 1974 23 casos de violência Em 14 dias

Janeiro de 1975 29 casos de violência Em 19 dias

Assim, o trabalho aqui elaborado não tem o objetivo de fazer comparações entre a
década de 70 com a atualidade, e sim analisar os depoimentos das pessoas que vivenciaram
esta época e comparar com outras fontes documentais com o objetivo de entender o contexto
político-social relacionado ao tema da violência urbana. Portanto, é uma contribuição para
desconstruir a ideia de que neste período específico havia mais segurança, especialmente em
São Gonçalo.

7
“Ho mem morto em Neves é desconhecido”. (O São Gonçalo. p. 4, ano 1970. Edição nº 5488).
“Foi esfaqueado na praia da lu z”. (O São Gonçalo. p. 4, ano 1971. Ed ição nº 5678).
“Ate no ônibus: vítima que estava “dura” foi surrada pelos assaltantes”. (O São Gonçalo. p.4 , ano 1972. Ed ição
nº 5954).
“Choveu tiros, socos e pontapés na cidade”. (O São Gonçalo. p.4, ano 1973. Ed ição n 6248).
“Gang levou todo o dinheiro e vinho para comemorar o ano novo ”. (O São Gonçalo. p. 4, ano 1974. Ed ição nº
5819)
16

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao encerrar este trabalho pode-se concluir que a violência urbana tem motivações
derivadas de vários fatores que afetam profundamente a sociedade. Desde a motivação
originária do instinto agressivo do homem até as causas sociais provocadas pela política e
pela economia.
Foi observado que a história da nação é repleta de elementos de violência em vários
períodos históricos, o que de certa forma, desconstrói a imagem de país pacífico e seguro,
inclusive no tempo de governo dos militares.
Na conjuntura que o país atravessava na década analisada, há uma dissonância quanto
aos índices elevados de violência e a falta de percepção dessa mesma violência pelo grupo
pesquisado. Portanto, é compreensível que as respostas dos colaboradores se enquadrem neste
contexto temporal onde o poder do Estado decidia e manipulava as informações conforme as
circunstâncias. É compreensível também que em áreas de periferia - onde as políticas públicas
de atendimento à população não chegam, - exista um elevado índice de violência,
confirmando que existe uma estreita relação entre a violência e a pobreza.
Num tempo de intensa repressão à imprensa, associado à falta de recursos financeiros
e vivendo em uma cidade na periferia da metrópole, fica evidente que todo esse conjunto de
fatores influencia a percepção dos colaboradores sobre a violência urbana existente no seu
entorno. É admissível concluir que esse fenômeno decorre da deficiência de informação e da
ignorância sobre os eventos ocorridos e isso é justificado pela dificuldade de acesso aos meios
de comunicação existentes na época.
17

REFERÊNCIAS

AEPPA. Associação de Ex-Presos Políticos Antifascistas. (Trabalho elaborado por um grupo


de antropólogos patriotas brasileiros que não podem revelar seus nomes por agora, dado o
regime fascista existente no Brasil). A política de genocídio contra os índios do Brasil.
1974.
FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização. Editora Companhia das Letras, 2011.

KRUG, G. Etienne... [e outros]. Relatório mundial sobre violência e saúde. Organização


Mundial da Saúde (OMS). Genebra, 2002.

PALMAR, Aluizio. Denúncias de tortura na Ilha das Flores. Disponível em:


<https://www.documentosrevelados.com.br/depoimentos-torturas-denunciasditadura/denuncias
-de-torturas-na- ilha-das- flores/> Acesso em 25 de Março de 2018.

O FLUMINENSE, Jornal. Acervo histórico. Disponível em:


<http://memoria.bn.br/DocReader/docreaderaspx?bib=100439_11&pasta=ano%20197&pesq
=viol%C3%AAncia.> Acesso em 13 de Março de 2018.

Material Pesquisado in loco:


O SÃO GONÇALO, Jornal. p. 4, ano 1970. Edição nº 5488
O SÃO GONÇALO, Jornal. p. 4, ano 1971. Edição nº 5678
O SÃO GONÇALO, Jornal. p. 4, ano 1972. Edição nº 5954
O SÃO GONÇALO, Jornal. p. 4, ano 1973. Edição nº 6248
O SÃO GONÇALO, Jornal. p. 4, ano 1974. Edição nº 5819
18

ANEXO A – QUESTIONÁRIO DA PESQUISA

São Gonçalo, de 2017.

Senhor (a),
Este questionário é parte de uma pesquisa para meu Trabalho de Conclusão de Curso
da pós-graduação em História do Brasil, intitulado “A percepção da violência urbana no
contexto da Ditadura Militar: o caso de São Gonçalo (RJ) na década de 1970”. Suas respostas
serão muito importantes para o desenvolvimento deste estudo. O seu nome será substituído
por um fictício e o conteúdo desse questionário será incorporado ao meu trabalho. Desde já,
agradeço- lhes por sua colaboração!
1ª parte

1. Nome:_______________________________________________________________
2. Empresa que trabalhou:_________________________________________________
3. Bairro:_______________________________________________________________
4. Nível de escolaridade:___________________________________________________

5. Sexo: ( ) masculino ( ) Feminino

6. Idade:

Menos de 60 anos ( ) 60 a 65 anos ( ) 66 a 75 anos ( )


76 a 85 ( ) Mais de 86 ( )

2ª parte
7. O senhor (a) era morador (a) de São Gonçalo na década de 1970?

______________________________________________________________________
______________________________________________________________________

8. Por qual meio de comunicação o senhor (a) tinha acesso ao noticiário na década de 1970?

( ) Radio ( ) Televisão ( ) Jornal ( ) Nenhuma


19

9. Qual é sua lembrança de casos de violência urbana entre os anos de 1970 a 1975?

___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

10. E quais os tipos de crimes eram mais comuns?

___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

11. O senhor (a) percebia violência por parte da polícia?


___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

12. Qual era sua percepção da atuação dos militares das Forças Armadas?

___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

13. De que forma atuavam?

___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

14. Em sua opinião: Violência e pobreza têm relação direta?

___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
15. Alguma outra consideração que gostaria de externar?

___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

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