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waller
benjamin
sobre
o programa
da filosofia
por vir
tradução e posFÂcio iielapo ribeiro
Q L E T R A aJ
Copyright da tradução © 2019 Helano Ribeiro
Do original alemão "Über das Programm der kommenden Philosophie”.
A tradução do ensaio “Über das Programm der kommenden Philosophie” teve como
base a edição dos escritos reunidos de Walter Benjamin [Gesammelte Schriften], edita
dos pela Suhrkamp, sob direção de Theodor Adorno e Gershom Scholem e organiza
dos por Hermann Schweppenhäuser e R olf Tiedemann.
Produção editorial
Alice Garambone
Isadora Travassos
João Saboya
Julia Roveri
Rodrigo Fontoura
Sofia Vaz
Revisão do alemão
Marcus Tulius Franco Morais
B416S
2019
Viveiros de Castro Editora Ltda.
Rua Visconde de Pirajá, 580/sl. 320 - Ipanema
Rio de Janeiro - r j - cep 22410-902
Tel. (21) 2540-0076
editora@7letras.com.br - www.7letras.c0m.br
Sumário
P O S F Á c io
10
A tarefa cen tral d a filo so fia p o r v ir se rá a p re e n d e r as m ais
d ire tam en te c o m a e x te n sã o e a p ro fu n d id a d e d o c o n h e
d e q u e o c o n h e c im e n to m a is p r o fu n d o será, a o m e sm o
tem p o , a q u e le d o q u a l c o n ta m o s c o m a m a is p u ra ju s t ifi
cativa. E le s n ã o b a n ira m a e x ig ê n c ia d e p r o fu n d id a d e d a
u
ankündigt, desto tiefer muß sie nach G ew iß heit ringen deren
Kriterium die systematische E inheit oder die Wahrheit ist.
D ie bed eu ten d ste H e m m u n g w e lc h e d e m Anschluß
13
mit der Gegenstandsweh jener Wissenschaft identisch; und
hung nicht nur auf das reine sondern zugleich auch a u f das
von der Welt. Daß Kant sein ungeheures Werk gera d e unter
14
idêntica ao mundo dos objetos daquela ciência; e mesmo
se tivesse chegado a sê-lo, como foi para os pensadores
neokantianos, o conceito de experiência assim identifi
cado e determinado continuaria ainda a ser, com efeito,
o mesmo conceito antigo de experiência, cujo traço mais
significativo é, desse modo, sua relação não apenas com a
consciência pura, mas, simultânea e da mesma maneira,
com a consciência empírica. É uma questão que envolve,
precisamente, isso: a representação da nua experiência pri
mitiva e evidente, a qual para Kant parecia a única possível
e a única aceita para quem, como ele, compartilhou o hori
zonte de sua época. No entanto, essa experiência foi, como
já indicado, uma forma singular, de limitação temporal e,
mais além dessa forma, que, de certo modo, compartilha
com toda experiência que também poderia ser chamada,
num sentido preciso, de visão de m undo, a visão de mundo
do Esclarecimento.3 M as ela não diferia muito daquela dos
outros séculos da Idade Moderna em suas características
mais essenciais. Essa foi uma das experiências ou visões do
mundo edificadas no nível mais inferior. O fato de Kant ter
sido capaz de lidar precisamente com seu trabalho extraor
dinário sob a constelação do Esclarecimento significa que
isso foi feito em uma experiência reduzida ao ponto zero,
ao mínimo de significado. Pode-se até dizer que, mesmo
a amplitude de sua tentativa e o radicalismo que lhe era
15
Erfahrung zur Voraussetzung hatte d e re n E ig e n w e r t sich
stand den man als die religiöse und historisch e B lin d h eit
16
característico, tinham com o pressuposto aquela experiên
cia realmente sem valor e que só poderia ter obtido um
sentido (poderíam os dizer: triste) por m eio de sua cer
teza. Nenhum filósofo pré-kantiano havia se confrontado
com tal tarefa no âm bito da epistem ologia, e nenhum teve,
todavia, tam anha liberdade para operar com ela, uma vez
que uma experiência, cuja quintessência era o m elhor da
física newtoniana, com toda sua exatidão, podia ser abor
dada grosseira e tiranicam ente sem sofrer danos. Para o
Esclarecimento não havia autoridades - não no sentido
de que elas se sujeitassem sem possibilidade de crítica
- mas autoridades que fossem forças espirituais capazes
de permitir à experiência um conteúdo maior. O consti
tutivo do plano m ais inferior e profundo da experiência
dessa época, de onde vem seu extraordinário e limitado
peso em termos especificam ente m etafísicos, só pode ser
notado na percepção de com o esse conceito inferior de
experiência também influenciou restritivamente o que é
o pensamento kantiano. Trata-se do mesm o fato, claro,
que muitas vezes tem sido enfatizado com o a cegueira
religiosa e histórica do Esclarecim ento, sem reconhecer
em que sentido essas características do Esclarecimento se
aplicam ao conjunto da Idade M oderna.
É da maior importância para a filosofia por vir reco
nhecer e diferenciar quais elementos do pensamento
17
mente des Kantischen Denkens aufgenommen und gepfl^
welche umgebildet und welche verworfen werden müssen
Jede Forderung eines Anschließens an Kant beruht auf der
Überzeugung, daß dieses System, welches eine Erfahrung
vor sich fand deren metaphysischer Seite ein Mendelssohn
und Garve gerecht geworden sind, aus der bis zum Genialen
gesteigerten Nachforschung nach Gewißheit und Rechtferti
gung der Erkenntnis diejenige Tiefe geschöpft und entwickelt
hat, die es einer noch kommenden neuen und hohem Art
der Erfahrung wird adäquat erscheinen lassen. Damit ist die
Hauptforderung an die gegenwärtige Philosophie aufgestellt
und zugleich ihre Erfüllbarkeit behauptet: unter der Typik
des Kantischen Denkens die erkenntnistheoretische Fundie
rung eines hohem Erfahrungsbegriffes vorzunehmen. Und
das eben soll zum Thema der zu erwartenden Philosophie
gemacht werden, daß eine gewisse Typik im Kantischen Sys
tem aufzuzeigen und klar abzuheben ist die einer hohem
Erfahrung gerecht zu werden vermag. Die Möglichkeit der
Metaphysik hat Kant nirgends bestritten, nur die Krite
rien will er aufgestellt haben an denen eine solche Möglich
keit im einzelnen Fall erwiesen werden könnte. Die Erfah
rung des Kantischen Zeitalters bedurfte keiner Metaphysik;
zu Kants Zeit war es historisch das einzig Mögliche ihre
Ansprüche zu vernichten, denn der Anspruch seiner Mitge
nossen auf sie war Schwäche oder Heuchelei. Es handelt sich
18
kantiano devem ser apreendidos e desenvolvidos, quais
devem ser modificados e quais devem ser rejeitados. Toda
exigência de conexão com Kant se baseia na convicção de
que esse sistema, que se deparou com uma experiência
cujo aspecto metafísico Mendelssohn e Garve4 lhe fize
ram justiça, criou e desenvolveu aquela profundidade
para permitir o surgimento adequado de um novo tipo
de experiência, superior e ainda por vir, a partir da busca
de certeza e justificação do conhecimento, em uma inves
tigação elevada até o genial. Assim, é colocada a exigência
principal para a filosofia presente e, também, afirmada
sua exequibilidade: elaborar, dentro do sistema do pen
samento kantiano, os fundamentos epistemológicos de
um conceito superior de experiência. Esse deverá ser,
justamente, o tema da filosofia esperada: que uma certa
tipologia, a qual consiga fazer justiça a uma experiência
superior, possa ser demonstrada e claramente extraída
do sistema kantiano. Kant nunca negou a possibilidade
da metafísica, querendo tão somente estabelecer os crité
rios pelos quais tal possibilidade poderia ser manifestada
em casos particulares. A experiência da era kantiana não
requeria metafísica; na época de Kant, a única possibi
lidade histórica era extinguir as pretensões próprias da
metafísica, pois a exigência de seus contemporâneos em
relação a ela era fraqueza ou hipocrisia. Por isso, trata-se
19
darum Prolegomena einer kün ftigen M etaph ysik a u f Grund
feln ist auch auf die Hohlheit der ihm gegenw ärtigen Erfah
20
de ganhar prolegômenos de uma metafísica vindoura5
com base na tipologia kantiana, enquanto aguardamos essa
metafísica vindoura, essa experiência superior.
No entanto, não é apenas do princípio da experiência
e da metafísica que a filosofia vindoura deve revisar Kant.
Ela não deve realizar tal revisão a partir desse princípio,
mas sim, em termos metodológicos, ou seja, como filoso
fia autêntica, segundo os preceitos do conceito de conhe
cimento. Os erros decisivos da doutrina do conhecimento
de Kant são também, sem dúvida, reduzidos ao vazio da
experiência de seu tempo, e assim a dupla tarefa de criar
um novo conceito de conhecimento e uma nova represen
tação do mundo com base na filosofia também será uma
só. O ponto fraco do conceito kantiano de conhecimento
tem sido, com frequência, sentido pela falta de radicalismo
e pela falta de consistência de sua doutrina, uma vez que sua
epistemologia não abre o campo da metafísica, porque ela
própria carrega em si elementos primitivos de uma meta
física infecunda que exclui qualquer outra. Na epistemolo
gia, todo elemento metafísico é um germe patogênico que
se manifesta na exclusão do conhecimento do domínio da
experiência em toda a sua liberdade e profundidade. É de
se esperar, então, que o desenvolvimento da filosofia ocorra
no momento em que toda aniquilação desses elementos
metafísicos na epistemologia a conduza, ao mesmo tempo,
21
der Erkenntnistheorie zugleich diese a u f ein e tiefere meta
physisch erfüllte Erfahrung verweist. E s besteht, und hier
22
a uma experiência metafisicamente realizada e mais pro
funda. Existe, a esse respeito - e aqui está o germe histórico
da filosofia por vir uma relação profunda entre aquela
experiência cuja pesquisa mais profunda não poderia levar,
jamais, a verdades metafísicas e aquela teoria do conheci
mento que não era capaz de determinar suficiente e efetiva
mente o lugar lógico que corresponde à investigação m eta
física como tal; todavia, de fato, o sentido em que Kant usa o
terminus “metafísica da natureza” parece ir inteiramente ao
encontro da investigação da experiência com base em prin
cípios consolidados pela epistemologia. A s deficiências em
termos de experiência e metafísica se manifestam dentro da
própria epistemologia como elementos da metafísica espe
culativa, ou seja, de uma metafísica rudimentar. Os mais
importantes desses elementos são, em prim eiro lugar, a
concepção de conhecimento como um a relação entre certos
sujeitos e objetos ou entre um certo sujeito e um objeto, que
Kant não conseguiu decisivamente superar, apesar de todas
as tentativas de fazê-lo; em segundo lugar: a relação, também
apenas superada hipoteticamente, entre o conhecimento e a
experiência com a consciência humana empírica. Esses dois
problemas estão estreitamente relacionados, e, mesmo que
Kant e os neokantianos tenham superado, de certa forma,
a natureza objetiva da coisa em si como a causa das sensa
ções, a natureza-sujeito da consciência cognoscente ainda
23
immer noch die Subjekt-Natur des erkennenden Bewußt,
seins zu eliminieren. Diese Subjekt-N atur des erkennenden
24
precisava ser eliminada. No entanto, a natureza subjetiva da
consciência cognoscente provém do fato de ter sido cons
tituída analogicamente a respeito da consciência empírica,
diante da qual, com efeito, encontram-se os objetos. O todo
é um rudimento completamente metafísico na epistemolo-
gia, uma porção, precisamente, daquela “experiência” plana
desses séculos que se introduziu na epistemologia. Não há
dúvida, pois, que, no conceito kantiano de conhecimento, o
papel principal é desempenhado pela representação mesmo
que sublimada de um eu individual, corpóreo e espiritual,
que recebe através dos sentidos as sensações e com isso
produz suas representações a partir dessa base. Entretanto,
essa representação é pura mitologia e seu conteúdo de ver
dade equivale a qualquer outra mitologia do conhecimento.
Sabemos que os povos primitivos da chamada etapa evo
lutiva pré-animista identificavam-se com animais e plantas
sagrados, e se denominavam como eles; sabemos de lou
cos que igualmente se identificam em parte com os obje
tos de sua percepção, que não são mais objecta, opostos a
eles; sabemos de enfermos que não referem as sensações de
seus corpos a si mesmos, mas a outros seres; e temos ciência
de clarividentes que, pelo menos, afirmam ser capazes de
receber as percepções dos outros como suas. A represen
tação corrente do conhecimento sensível (e do espiritual),
tanto a nossa quanto a kantiana, e também a do período
25
Erkenntnis sow ohl u nserer als d e r Kantischen cd
27
aufs empirische Bewußtsein was die Wahrheit angeht kk
28
ou da alucinação. Isso porque, efetivamente, a existência
de uma relação objetiva entre a consciência empírica e o
conceito objetivo da experiência é simplesmente im pos
sível. Toda experiência autêntica é baseada na pura cons
ciência epistemológica (transcendental), se esse terminus
ainda é utilizável sob a condição de retirá-lo de toda sub
jetividade. A consciência pura transcendental é diferente
de qualquer consciência empírica e, portanto, a questão
aqui é se a aplicação do term inus consciência é admissível.
A maneira como o conceito psicológico da consciência
se relaciona com o conceito da esfera do conhecimento
puro continua a ser um problem a fundamental da filo
sofia e talvez só possa ter seu resgate a partir da época da
escolástica. Aqui está o lugar lógico de muitos problemas
que a fenomenologia, há pouco, levantou novamente. A
filosofia é baseada no fato de que na estrutura do conhe
cimento está também a de experiência e deve ser desen
volvida a partir dela. Essa experiência inclui também a
religião, isto é, a verdadeira religião, na qual nem Deus
nem o ser humano são objeto ou sujeito da experiência,
f
29
W orten d ie a u to n o m e ureigne Sphäre der Erkenntnis
30
alcançar a esfera autônoma própria do conhecimento, em
que esse conceito não mais denote a relação entre dois
entes metafísicos.
Deve ser estabelecida como tarefa da filosofia vindoura
que, com essa apuração, a epistemologia, tornada possível
e necessária por Kant enquanto problema radical, teria que
fazer frente não somente a um novo conceito de conheci
mento, mas também a um novo conceito de experiência,
de acordo com a relação que Kant descobriu entre ambos.
É claro que, como dito anteriormente, a experiência, tão
pouco quanto o conhecimento, deveriam estar relaciona
dos à consciência empírica; mas aqui também ficaria assim,
e só então ganharia seu verdadeiro sentido de que as con
dições do conhecimento são as da experiência. Esse novo
conceito de experiência, baseado em novas condições do
conhecimento, seria ele mesmo o lugar e a possibilidade
lógicos da metafísica. Por qual motivo Kant tornou, amiúde,
a metafísica num problema, e a experiência na única base
que poderia surgir do conhecimento? Porque a partir desse
conceito de experiência, a possibilidade de uma metafísica
que tivesse o mesmo significado das anteriores (mas não a
possibilidade de uma metafísica em geral) teria que parecer
como excluída. No entanto, evidentemente, o característico
no conceito de metafísica não se encontra na ilegitimidade
de seus conhecimentos - ao menos não para Kant, que, de
31
K a n t d e r sonst k e in e P ro le g o m e n a z u ih r geschrieben k-,
32
outra forma, não teria escrito seus prolegòmenos à metafí
sica mas em seu poder universal, para reunir, de imediato,
com suas ideias, a totalidade da experiência com o conceito
de Deus. Assim, a tarefa da filosofia por vir pode ser apreen
dida, portanto, como a descoberta ou criação desse conceito
de conhecimento que, ao mesmo tempo que relaciona exdu-
sivamente o conceito de experiência à consciência trans
cendental, possibilita logicamente não apenas a experiência
mecânica, mas também a experiência religiosa. Isso não
quer dizer, em absoluto, que é possível chegarmos ao conhe
cimento de Deus, mas sim que o conhecimento pode tomar
plenamente possível, a princípio, a experiência e a doutrina
remetente a Ele.
O neokantismo possibilita-nos vislumbrar já um indício
do desenvolvimento da filosofia aqui reivindicado e con
siderado apropriado. Um dos problemas fundamentais do
neokantismo foi a distinção entre intuição e entendimento,
um rudimento metafísico que, como toda doutrina das facul
dades, na obra de Kant, deve ser suprimido. Porém, com a
mudança do conceito de conhecimento, muda-se também
o conceito de experiência. Na prática, é indubitável que a
redução de toda experiência à experiência científica não foi
pensada por ele nessa exclusividade, por mais que ela seja,
em alguns aspectos, um desdobramento do Kant histórico.
Verificou-se, sem dúvida, uma tendência em Kant contra a
33
Kant eine Tendenz gegen d ie Z e r fä llu n g u n d A u ft e ilu n g
34
desintegração e divisão da experiência aos campos particula
res da ciência. E m esm o se, em relação a eles, a epistemologia
posterior tiver que se desprender do recurso à experiência em
seu sentido com um , do m odo apresentado por Kant, então,
por outro lado, será insuficiente no interesse do continuum
da experiência sua apresentação como o sistema das ciências,
35
nicht nur der der Erfahrung sondern auch der der Freiheit
eine entscheidende Umbildung erfahren.
Man könnte nun hier überhaupt die M einung vertreten,
fen, ob der zweite Teil des Systems (von der Schwierigkeit des
36
de experiência, mas também o de liberdade, passarão por
uma transformação decisiva.
Poder-se-ia argumentar então, aqui, de modo geral,
que, com a descoberta de um conceito de experiência que
exprimisse um lugar lógico da metafísica, a diferença entre
os domínios da natureza e da liberdade seria suprimida por
completo. Contudo, aqui pode ser suficientemente dito: tra
ta-se apenas de um programa de investigação e não de com
provação. Quanto mais necessária e inevitável for, partindo
dessa nova lógica transcendental, a modificação do domí
nio da dialética e da passagem entre doutrina da experiên
cia e doutrina da liberdade, menos essa remodelação deverá
resultar em uma mistura entre liberdade e experiência,
mesmo que o conceito de experiência se transforme metafi-
sicamente em um sentido, talvez ainda estranho ao de liber
dade. Por mais imprevisíveis que possam ser as mudanças
que se abrirão à investigação, é fato que a tricotomia do sis
tema kantiano pertence às principais partes daquela tipolo
gia que deve permanecer e, acima de tudo, ser preservada.
Pode-se questionar se a segunda parte do sistema (para não
mencionar a dificuldade da terceira) ainda deve se referir
à ética, ou se a categoria de causalidade pela ótica da liber
dade talvez tenha um significado diferente; a tricotomia,
cujas relações metafisicamente mais profundas ainda não
foram descobertas, tem, sem dúvida, sua base mais decisiva
37
System schon an der Dreiheit der Relationskategorien ihre ent
ist die Tafel der Kategorien wie es jetzt allgem ein gefordert
38
no sistema kantiano, já na tríade de categorias de relações.
Uma das superioridades históricas do sistema kantiano
reside, em relação ao de seus antecessores, na tricotomia
absoluta do sistema, que com essa tripartição já se refere a
todo o campo da cultura. A dialética formalista dos siste
mas pós-kantianos, no entanto, não se baseia na definição
da tese como relação categórica, na antítese como hipotética
e na síntese como disjuntiva. Entretanto, além do conceito
de síntese, será também de enorme importância, do ponto
de vista sistemático, o conceito de uma certa não síntese de
dois conceitos em um outro, uma vez que, além da síntese, é
possível outra relação entre tese e antítese. Todavia, isso difi
cilmente levará a um quadrinômio de categorias de relação.
Se a grande tricotomia, no entanto, deve permanecer
mantida para a articulação da filosofia, mesmo com a inde-
terminação dessas partes, isso não se aplica, sem mais nem
menos, a todos os esquemas particulares do sistema. A escola
de Marburg já começou a suprimir a diferença entre lógica
transcendental e estética (embora ainda tenhamos que nos
perguntar se um a analogia dessa distinção não terá que rea
parecer em um nível superior), e, quanto à tábua de catego
rias, devemos revê-la completamente, como, em geral, já é
exigido. Precisamente, a esse respeito, será anunciada a
mudança do conceito de conhecimento para a elaboração
de um novo, já que as categorias aristotélicas, por um lado,
39
neuen Begriffs von lirfahrung unkundigen, da die aristokli
4«
fo ra m e sta b e le c id a s arbitrariam ente, mas, por outro lado,
e b a se a d a lo g ic a m e n te em protoconceítos anteriores ou
41
aus dem Irren erklärt werden, wie die W ahrheit nicht länger
aus dem rechten Verstand. Auch f ü r diese Erforschung der
logischen Natur des Falschen und des Irrtum s sind voraus
sichtlich in der Lehre von den Ordnungen die Kategorien auf
zusuchen: überall in der modernen Philosophie regt sich die
Erkenntnis, daß die kategoriale und verw andte Ordnung von
zentraler Wichtigkeit fü r die Erkenntnis mannigfach abge
stufter und auch nicht mechanischer E rfah ru n g sei. Kunst,
Rechtslehre und Geschichte, alle diese u n d andere Gebiete
haben sich mit ganz andrer Intensität als K ant es getan hat an
der Kategorienlehre zu orientieren. D och erhebt sich zugleich
mit Beziehung auf die transzendentale Logik eines der größ
ten Probleme des Systems überhaupt, näm lich die Frage nach
seinem dritten Teil mit andren Worten nach denjenigen wis
senschaftlichen Erfahrungsarten (den biologischen), die Kant
auf dem Boden der transzendentalen Logik nicht behandelt
hat und warum er es nicht tat. Ferner die Frage nach dem
Zusammenhang der Kunst mit diesem dritten, der Ethik mit
dem zweiten Teil des Systems. - D ie F ixieru n g des bei Kant
42
entendimento justificado. Neste estudo da natureza lógica
do falso e do erro, as categorias devem ser procuradas,
também, presumivelmente, na doutrina das ordenações.
Em toda parte da filosofia moderna há o conhecimento
de que as ordenações anexas e categoriais são de central
im portância para o conhecimento de uma experiência não
m ecânica de m últiplas nuances. Arte, jurisprudência e his
tória, todas essas e outras áreas, têm que se orientar, com
uma intensidade bastante diferente da feita por Kant na
doutrina das categorias. Mas, ao mesmo tempo, surge, com
referência à lógica transcendental, um dos maiores proble
mas do sistem a em geral, a saber, a questão de sua terceira
parte e, em outras palavras, aqueles tipos de experiência
43
begründen. Die transzendentale D ialektik h i eist schon in der
ten. Diese Tatsache ab er d ü rfte sich letzten E ndes als die ei
44
d ialética tran scendental já apresenta, na versão kantiana,
con ceito d e con tinu idad e, e, nas ideias, deve ser apresen
45
sehe Suprematie der Philosophie w ie über alle Wissenschaft
so auch über die Mathematik letzten E ndes zu behaupten.
Ein in der Reflexion au f das sprachliche Wesen d er Erkennt
nis gewonnener Begriff von ihr w ird einen korrespondie
renden Erfahrungsbegriff schaffen d er auch Gebiete deren
wahrhafte systematische Einordnung K ant nicht gelungen ist
umfassen wird. Als deren Oberstes ist das Gebiet der Religion
zu nennen. Und damit läßt sich die Forderung an die kom
mende Phibsophie endlich in die Worte fassen: A u f Grund
des Kantischen Systems einen Erkenntnisbegriff zu schaffen
dem der Begriff einer Erfahrung korrespondiert von der die
Erkenntnis Lehre ist. Eine solche Philosophie wäre entweder
in ihrem allgemeinen Teile selbst als Theologie zu bezeich
nen oder wäre dieser sofern sie etwa historisch philosophi
sche Elemente einschließt übergeordnet.
Erfahrung ist die einheitliche und kontinuierliche Man
nigfaltigkeit der Erkenntnis.
46
é decisivo e, por essa razão, deve ser afirmada a supremacia
sistemática da filosofia sobre todas as ciências, incluindo a
matemática. Um conceito de conhecimento adquirido na
reflexão sobre sua essência linguística permitirá a elaboração
de um conceito correspondente de experiência, que incluirá,
também, áreas cuja verdadeira classificação sistemática Kant
não atingiu. Entre essas áreas, talvez a religião seja a mais
superior. Com isso, podemos finalmente formular, expres
samente, a exigência da filosofia por vir: criar, com base no
sistema kantiano, um conceito de conhecimento que cor
responda ao conceito de uma experiência para a qual esse
conhecimento seja sua doutrina. Uma tal filosofia seria, ela
mesma, chamada de teologia em sua generalidade, ou, seria
posta acima da teologia, uma vez que ela inclui, porventura,
elementos historicamente filosóficos.
A experiência é a multiplicidade unificada e contínua
do conhecim ento.
47
NACH TRAG
zur Religion ist der Gehalt des vo rig en so fern es das sys
48
SU PLEM EN TO
49
zusammenfällt, so erhebt sich n a tu rg e m ä ß d ie F ra g e nach
50
d o g m á t ic a n ã o é u m a c iê n c ia p articu lar, a questão é natu
51
Erkenntnis von der Religion. A u ch d ie F ra g e nach dem
52
filosófica, embora apenas por meio da questão sobre o que
é o conhecimento filosófico dessa mesma existência. A filo
sofia sempre indaga sobre o conhecimento, em relação ao
qual a questão do conhecimento de sua existência é apenas
uma modificação, embora uma modificação incompara
velmente extraordinária, da questão do conhecimento em
geral. Mais ainda, deve ficar claro que a filosofia, ao levantar
questões, nunca pode se deparar com unidades existentes,
senão unicamente com novas unidades de leis, cuja integral
nomeamos “existência”. O protoconceito epistemológico-
-teórico original tem uma função dupla. Por um lado, ele é
aquele que, por meio de sua especificação, de acordo com o
fundamento lógico geral do conhecimento, chega aos con
ceitos de tipos separados de conhecimento e tipos especiais
de experiência. Isso é na verdade seu significado teórico-
-epistemológico, tornando-se, ao mesmo tempo, o aspecto
mais fraco de seu significado metafísico. Contudo, o proto
conceito ou conceito original do conhecimento não alcança,
nesse contexto, a totalidade concreta da experiência, muito
menos qualquer conceito de existência. Mas há uma uni
dade de experiência que não pode, de forma alguma, ser
entendida como a soma de experiências à qual o conceito de
conhecimento se refira diretamente como doutrina em seu
desdobramento contínuo. O objeto e o conteúdo dessa dou
trina, essa totalidade concreta da experiência, é a religião,
53
Entfaltung unmittelbar bezieht. D er Gegenstand und Inhalt
Religion, die aber der Philosophie zunächst nur als Lehre gege
ben ist. Die Quelle des Daseins liegt nun aber in der Totalität
der Erfahrung und erst in der Lehre stößt die Philosophie auf
54
inicialmente dada à filosofia, no entanto, apenas como uma
doutrina. A fonte da existência, no entanto, está na totali
dade da experiência, e é somente na doutrina que a filosofia
encontra um absoluto, como existência, e assim essa conti
nuidade na essência da experiência, cujo menosprezo deve
ser atribuído a um a deficiência do neokantismo. De um
ponto de vista puram ente metafísico, o conceito original de
experiência ultrapassa a totalidade dessa experiência num
sentido muito distinto de como ela o faz em suas especifi
cações particulares, as ciências. Fá-lo sem dúvida de modo
imediato, em bora o sentido dessa imediação ainda não
tenha sido determinado em face daquela mediação. Que
um conhecim ento seja metafísico significará stricto sensu
que ele se refere, por meio do conceito original de conheci
mento, à totalidade concreta da experiência, ou seja, à exis
tência. O conceito filosófico de existência deve legitimar-se
55
io t a s
57
posfácio
W a lle r Benjamin:
a filosofia por vir
nos braços do Messias
por Helano Ribeiro
I
63
exemplo, a utilização de vírg u las e p ro b le m a s de ortografia.
64
II
65
estar diante da imagem significa não som ente estar diante
do tempo, mas também da linguagem e da história.
No caso de Benjamin, isso indicaria, já precocemente,
escovar a história da filosofia kantiana e seu conceito de
experiência a contrapelo, ao proceder m ais ou menos da
mesma forma: ele procura nas m argens do lógos o que
não pode ser dado à visão ofuscada pelo excesso de cla
ridade das luzes do Esclarecimento. Trata-se, portanto,
de investigar o outro lado de lógos, que não o da razão
triunfante, mas o da linguagem. Isso significa resgatar o
phántasma, a imagem enquanto D arstellung como uma
III
66
O s cham ados textos de juventude irão fazer jus a uma
ideia de juventude portadora da voz revolucionária que
B en jam in tanto valorizava - não por acaso, ele mesmo
participou ativamente do movimento estudantil, ao lado
de seu mentor, Gustav Wyneken [com quem Benjamin
rom pe em 1915] de modo que, toda essa potência mili
tante da juventude entra, profusamente, nos escritos
dessa época, revelando-se através de uma renovação espi
ritual na sociedade alemã contra a má experiência reacio
nária do adulto. São exemplos de textos desse período:
O p o sicio n a m en to religioso da nova juventude [Die reli-
giòse Stellu n g d e r neuen Jugend] (1914); A vida dos estu
67
experiência como conceito aliado de sua ética da memó
ria na produção crítica vindoura.
No ensaio de 1917/1918, ao final da Prim eira Guerra,
Benjamin entrega-se a uma discussão do conceito de
experiência, que surgia para ele, dessa vez, não como um
antagonista da juventude revolucionária, mas sim, como
investigação da filosofia de Kant. Benjam in propõe-se
a pensar nesse conceito, partindo das possibilidades na
filosofia que fujam da dicotomia sujeito-objeto, bem
como dialoguem diretamente com a ideia de lingua
gem enquanto M édium, a partir da discussão iniciada
no ensaio de 1916: Sobre a linguagem em gera l e sobre a
linguagem do homem [ Über Sprache überhaupt und über
68
IV
69
V
70
que mergu^ar realmente no universo
A p r im o r o s a tra d u çã o de H elano
R ib e iro d e Über das Programm
er kommenden Philosophie, texto
á rd u o e m su a ab ord agem até certo
UI
Assim, é colocada a exigência principal para a fllosolla
presente e, também, afirmada sua exequlbllidade: elaborar,
dentro do sistema do pensamento kantiano, os fundamentos
epistemológicos de um conceito superior de experiência.