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________________________________________
A Importância do Aprimoramento
das Medidas de Proteção Ambiental
no Aterro Sanitário de Brasília: uma
Análise das Condicionantes do seu
Licenciamento Ambiental e Eventos de
Contaminação de Água e Solo em 201934
34 Essa pesquisa é um dos resultados específicos do Projeto “Recursos hídricos, saneamento básico
e os efeitos da mineração no Distrito Federal” (Edital Demanda Espontânea 04/2017), com
financiamento da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF).
35 Doutora (2014) em Direito pela Universidade Aix-Marseille (França) e pelo Centro Universitário
de Brasília (Brasil), em regime de cotutela, com bolsa CAPES em um dos períodos do Doutorado.
Mestre (2009) e Bacharel (2007) em Direito. Especialista (2008) em Direito Internacional Ambiental.
Professora Adjunta na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (Área Direito Ambiental).
E-mail para contato: gabrielalima@unb.br.
36 Graduando em Engenharia Ambiental pela Universidade de Brasília (UnB) e bolsista (Apoio
Técnico) da FAP-DF (2018-ago/2020), no Projeto de Pesquisa “Recursos hídricos, saneamento básico
e os efeitos da mineração no Distrito Federal” (Edital Demanda Espontânea 04/2017). Membro do
Grupo de Estudos Direito dos recursos naturais e sustentabilidade (GERN-UnB). E-mail: hiark.
oliveira@hotmail.com; hiark.oliveira@gmail.com.
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Introdução
O Aterro Sanitário de Brasília, inaugurado em 2017, apresentou alguns
episódios de contaminação37 em 2019, que chamaram a atenção para um estu-
do da efetividade jurídica38 da proteção ambiental relacionada ao seu funcio-
37 Para se ter como exemplo, o primeiro da série de vazamentos de chorume no Aterro ocorreu no
dia 28 de Janeiro de 2019, tendo atingido o rio Melchior, que fica entre as regiões de Samambaia,
Ceilândia e Taguatinga, no Distrito Federal. Metrópoles. Chorume de Aterro Sanitário de
Brasília vaza e atinge córrego Melchior. 2019. Disponível em: <https://www.metropoles.com/
distrito-federal/meio-ambiente/chorume-de-aterro-sanitario-de-brasilia-vaza-e-atinge-corrego-
melchior>. Acesso em 16 de Julho de 2020.
38 Efetividade jurídica significa a realização do Direito. Podendo ser expressa em termos de implementação,
impactos sobre o comportamento humano, realização de objetivos. E variando em grau, seja resolvendo o
problema ou o amenizando. (VARELLA & LAUTENSCHLAGER, 2016. p. 297-304).
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39 O rio Melchior tem suas cabeceiras nos córregos Taguatinga e Cortado, na região de Taguatinga –
DF. Esses dois corpos hídricos se unem e, posteriormente, ao receber a contribuição dos córregos
do Valo e Gatumé, o ribeirão Taguatinga passa a se chamar rio Melchior e percorre as regiões de
Samambaia e Ceilândia (GDF, 2006, p. 112).
40 Agência Brasília. Unidade de Recebimento de Entulho inicia operação com 1,4 mil toneladas de
materiais. 2018. Disponível em: <https://www.agenciabrasilia.df.gov.br/2018/01/29/unidade-de-
recebimento-de-entulhos-inicia-operacao-com-14-mil-toneladas-de-materiais/>. Acesso em 17 de
Julho de 2020.
41 Para se ter um exemplo, 61% dos resíduos receberam destinação imprópria no DF entre 1966 e 1971
(CODEPLAN, 1972, p. 108-110).
42 Dentre os estudos analisados que abordam contaminação em decorrência do antigo lixão estão:
KOIDE e BERNARDES, 1998; CARNEIRO, 2002; e CAVALCANTI, 2013.
43 Entre os estudos socioeconômicos abordando os catadores que viviam e/ou moram nas adjacências
do antigo lixão estão: HOEFEL, 2013; MOURA, SERRANO e GUARNIERI, 2016; e SANTOS, 2011.
44 A 1ª Promotoria de Justiça de Defesa do meio Ambiente e do Patrimônio Cultural ajuizou, em 1996,
a Ação Civil Pública nº 36947/96, cuja sentença transitou em julgado em abril de 2007 (MPDFT,
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Ambiente (art. 2º, II, Lei nº 6.938/198150) e com a Lei de Crimes Ambientais (art.
54, V, Lei nº 9.605/199851). Como base legal geral, a PNRS visa o gerenciamento
ambientalmente adequado dos resíduos sólidos (art. 4º, Lei nº 12.305/201052), mas
não aprofunda acerca dos padrões técnicos específicos que irão conferir seguran-
ça e eficiência ao projeto. Para isso, há a regulação pelas entidades competentes, fe-
derais, estaduais e municipais, no campo do Poder Executivo, que regulamentam
as regras de prevenção e de precaução para cada tipo de atividade.
A nível federal, além da regulação do licenciamento ambiental de modo
geral (Lei Complementar nº 140/2011 e a Resolução do Conselho Nacional do
Meio Ambiente -CONAMA, nº 237/1997), no caso da gestão de resíduos, há a
Resolução CONAMA nº 404/2008, que estabelece critérios e diretrizes para o
licenciamento ambiental de aterro sanitário de pequeno porte de resíduos só-
lidos urbanos, sendo ainda possível que tenham resoluções a nível estadual de
atuação da administração pública. Além da atuação do Estado, vale mencionar
as Normas Técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que
abordam diretamente os parâmetros operacionais, como os sistemas de dre-
nagem, impermeabilização da base e monitoramento. Entre elas, destaca-se a
Norma Brasileira Regulamentadora (NBR) n° 8419, que aponta as diretrizes téc-
nicas para aterros sanitários de resíduos sólidos urbanos não perigosos; a NBR
nº 8418, para projetos de aterros sanitários de resíduos industriais perigosos; a
NBR nº 10157, que normatiza os critérios para projeto, construção e operação de
aterros de resíduos perigosos; e a NBR nº 13896, que define critérios para proje-
to, implantação e operação para aterros de resíduos não perigosos.
50 “Art. 2º. A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e
recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao
desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade
da vida humana, atendidos os seguintes princípios: (...) II - Racionalização do uso do solo, do
subsolo, da água e do ar.” Art. 2º, II, Lei Federal 6.938 de 1981.
51 “Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em
danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da
flora: (...) V - ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou
substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos”. Art.
54, V, Lei Federal 9.605 de 1998.
52 “Art. 4o. A Política Nacional de Resíduos Sólidos reúne o conjunto de princípios, objetivos,
instrumentos, diretrizes, metas e ações adotados pelo Governo Federal, isoladamente ou em regime
de cooperação com Estados, Distrito Federal, Municípios ou particulares, com vistas à gestão
integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos.” Lei 12.305/2010.
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60 Ao todo foram 18 parâmetros ambientais, sociais e econômicos como interferências com unidades
de conservação, proximidade com centros urbanos e facilidade de acesso. Estudo de Impacto
Ambiental do Aterro Sanitário de Brasília. PROGEA Engenharia e Serviços Ambientais. Brasília,
2005. p. 43-49.
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61 Uma estação de tratamento de lixo próxima possibilitaria um maior aproveitamento dos resíduos
(reciclagem) e faria com que somente os rejeitos fossem destinados ao aterro, aumentando sua vida
útil e ganho ambiental.
62 Art. 19, § 1º, Lei Complementar nº 17, de 28 de janeiro de 1997.
63 Estudo de Impacto Ambiental do Aterro Sanitário de Brasília. PROGEA Engenharia e Serviços
Ambientais. Brasília, 2005. p. 23-28.
64 Cada classe de água está apta a receber determinados tipos de uso, de forma que esses usos ditam a
qualidade da água que o corpo hídrico deve atender. A classe 4 é a menos restritiva e atende a destinações
menos ‘nobres’, o que implica em menores exigências para a qualidade da água do corpo hídrico.
65 O rio Melchior faz parte da Bacia Hidrográfica do Descoberto, que é importante para o Distrito
Federal, ao atuar na preservação dos ecossistemas locais, ser objeto de lazer, abastecimento público
e irrigação. Portanto, mesmo que este rio represente apenas um trecho que integra a bacia, o
impacto também pode ser sentido nos trechos a montante, uma vez que o rio Melchior ainda recebe
as contribuições dos córregos Guariroba e Salta Fogo até, por fim, desaguar no rio Descoberto
(GDF, 2006, p. 112).
66 Estudo de Impacto Ambiental do Aterro Sanitário de Brasília. PROGEA Engenharia e Serviços
Ambientais. Brasília, 2005. p. 49.
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67 Uma condicionante interessante, mas que não é aqui objeto de estudo, é a condicionante 10 da
Licença de Instalação n° 13/2013 que condiciona “A formalização de termo de compromisso para o
cumprimento da compensação ambiental deverá preceder a concessão da licença de operação”. Por
se tratar do licenciamento de um empreendimento de significativo impacto ambiental, é obrigatório
que os responsáveis pelo Aterro Sanitário de Brasília apoiem a implantação e manutenção de
unidades de conservação de Proteção Integral ou unidades que sejam diretamente afetadas pelo
empreendimento em questão, conforme o art. 36 do Sistema Nacional de Unidade de Conservação
(Lei nº 9.985/2000). A compensação ambiental deveria ter sido feita ao Refúgio de Vida Silvestre
do Gatumé, o que ainda não ocorreu. O Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do
Distrito Federal - Brasília Ambiental (IBRAM) informou, em 28.07.2020, através de uma solicitação
feita em 11.07.2020, pelo Sistema Eletrônico do Serviço de Informação ao Cidadão do Distrito
Federal (e-SIC), conforme Protocolo n° 00391000085202021, que o Plano de Manejo da ARIE JK,
que abrange a área do Refúgio de Vida Silvestre do Gatumé, está sendo revisado. E que a partir
da entrega da revisão deste plano, será elaborado um Plano de Manejo específico Refúgio de Vida
Silvestre do Gatumé, pelo qual será possível definir os produtos e serviços a serem empregados por
meio de Compensação Ambiental.
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68 BIM, Eduardo Fortunato. Licenciamento Ambiental. 5ª Edição. Belo Horizonte: Editora Fórum,
2020, capítulo VII (versão Kindle).
69 Aterro Sanitário de Brasília começa a funcionar. Agência Brasília. Disponível em: < https://www.
agenciabrasilia.df.gov.br/2017/01/17/aterro-sanitario-de-brasilia-comeca-a-funcionar/>. Acesso
em: 30 de agosto de 2019.
70 Informação contida no Relatório Técnico de Monitoramento e Avaliação SEI-GDF n.º 3/2019 -
IBRAM/PRESI/SUBIO/DIREA, contido no Processo SEI 00391-00000864/2019-57. p. 14-16.
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71 CORREIO BRASILIENSE. GDF vai contratar empresa para tratar chorume do Aterro Sanitário.
2020. Disponível em: <https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2020/07/01/
interna_cidadesdf,868485/gdf-vai-contratar-empresa-para-tratar-chorume-do-aterro-sanitario.
shtml>. Acesso em: 04 de Novembro de 2020.
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Figura 01: Percurso e direção do fluxo de chorume, marcado com as setas amarelas, do pri-
meiro vazamento. Partindo da caixa de passagem, atravessando o Reservatório de Qualidade
e Quantidade e chegando ao Rio Melchior. Fonte: Relatório Técnico de Monitoramento e Ava-
liação SEI-GDF nº 2/2019, IBRAM/PRESI/SUBIO/DIREA, de 30.01.2019, p. 02, processo nº
00391-00000864/2019-57, IBRAM.
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Figura 02: Um dos pontos de extravasamento do chorume no Aterro. Fonte: Metrópoles (2019).
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por lixões e aterros mal operados82, por ser um empreendimento habitual com
vida útil considerável e de grande potencial poluidor, mesmo após desativação,
deve-se estar sempre atento às normas técnicas e legislações pertinentes para que
acidentes e problemas com contaminações sejam evitados.
Após a análise dos impactos, ações de mitigação da equipe técnica e do o Pla-
no de Atendimento às Emergências - PAE, o IBRAM definiu nove ações a serem
feitas no Aterro. As nove solicitações do IBRAM foram: a identificação da causa
de obstrução da tubulação; a limpeza da via atingida; a elaboração de novo Plano
de Atendimento à Emergência; a apresentação de Relatório Técnico, ilustrando as
ações de limpeza, transporte e disposição final dos resíduos; o encaminhamen-
to dos resultados laboratoriais das análises de qualidade da água, realizado pela
ADASA ou relatório técnico emitido pelo IBRAM; a elaboração de Novo Plano
de Atendimento à Emergência conforme roteiro encaminhado; a verificação e o
encaminhamento de Relatório Técnico referente à possibilidade de instalação e
manutenção de tubulações secundárias paralelas às linhas principais; o protocolo
de contenção de forma a evitar que novos vazamentos atinjam os corpos hídricos
e o solo; a existência de equipamentos de emergência, que devem estar à dispo-
sição no Aterro, como bombas de sucção e tanques de armazenamento; e o PAE
deveria avaliar alternativas para impedir que o chorume atinja o RQQ 83.
Na visita realizada pelo IBRAM, em consequência do vazamento ocorrido
no dia quatro de abril de 2019, foi possível notar melhorias na eficiência das estra-
tégias e abordagens utilizadas pela equipe técnica do aterro. Como exemplifica-
ção: já haviam instalado um conjunto motorbomba para transportar o chorume
para a bacia de contenção e estavam fazendo a recomposição do maciço do pri-
meiro vazamento. Isso auxiliou nas medidas de prevenções posteriores, como no
82 Por exemplo, a reportagem mostra o lixão em Jangurussu, Fortaleza, que mesmo desativado a 17
anos, na época, continuava gerando chorume e contaminando o Rio Cocó. Diário do Nordeste.
Antigo Lixão ainda gera impactos. Disponível em: <https://diariodonordeste.verdesmares.com.
br/editorias/metro/antigo-lixao-ainda-gera-impactos-1.1321532>. Outro exemplo é o aterro
sanitário da região metropolitana de Belém onde não há nenhum tipo de impermeabilização do
solo, tratamento de chorume e drenagem das águas pluviais, acarretando múltiplas contaminações
(MATOS, 2011, p. 301-302).
83 Conforme SEI-GDF n.º 5/2019, de 11.02.2019, IBRAM/PRESI/SUBIO/DIREA, contido no processo
00391-00000864/2019-57 no IBRAM.
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caso de um vazamento ocorrido no dia seguinte, dia cinco de abril de 2019, que
foi detectado imediatamente, em função das operações que estavam sendo feitas84.
Por ser um aterro sanitário devidamente licenciado, planos de ações
para lidar com esses tipos de acidentes são cruciais de serem aprimorados.
Um monitoramento constante das tubulações poderia ter verificado a pre-
sença de sólidos junto ao chorume que, posteriormente, contribuiu para que
ocorresse o entupimento.
Em geral, lidar com resíduos é lidar com riscos futuros: as consequências
do seu gerenciamento ineficiente podem não repousar no horizonte temporal
imediato, mas anteceder um verdadeiro desastre tecnológico crônico ambien-
tal85. A aplicação do princípio da prevenção86 e da precaução87 pelos instru-
mentos de contenção de riscos de acidentes e danos ambientais são funda-
mentais, ampliando a vida útil do aterro. No caso, pela existência de diretrizes
e regras específicas para aterros, enquadra-se a necessidade de agir conforme
o princípio da prevenção (para quando há parâmetros a serem seguidos, para
se evitar a poluição), seguindo as normas existentes.
Do ponto de vista de conformidade com as normas aplicáveis, a obstrução
do sistema de drenagem do percolado estava em desacordo com a NBR nº 13896
que, em seu capítulo 5.2.2, propõe que o aterro seja construído de forma que o
sistema de drenagem não sofra obstrução durante todo o período de vida útil e
do pós-fechamento do aterro. Outro desacordo com a norma supracitada88 é que a
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89 Informação exposta no Relatório Técnico elaborado pelo IBRAM acerca dos primeiros vazamentos
ocorridos no dia 28 e 29 de janeiro de 2019. Relatório Técnico de Monitoramento e Avaliação SEI-GDF
n.º 2/2019. IBRAM/PRESI/SUBIO/DIREA, contido no processo 00391-00000864/2019-57 no IBRAM.
90 CONSÓRCIO SAMAMBAIA AMBIENTAL ATERRO SANITÁRIO DE BRASÍLIA. Nº Doc. 23/2019.
Resposta Documento SEI 18490101, contido no processo 00391-00000864/2019-57 no IBRAM.
91 Conforme o Relatório Técnico de Monitoramento e Avaliação SEI-GDF n.º 2/2019 -IBRAM/PRESI/
SUBIO/DIREA, de 30.01.2019, p. 6, contido no processo 00391-00000864/2019-57 no IBRAM.
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tação de tratamento, já que não foi preparada para receber o efluente bruto.
Desta forma, para não mais sobrecarregar a ETE Melchior, o SLU lançou um
edital para contratar uma empresa para realizar o tratamento do chorume
antes de ser lançado no rio Melchior.
Embora tenham sido múltiplos vazamentos, houve um aprimoramento
nas ações de contenção dos vazamentos, o que amenizou os prejuízos ambien-
tais. Entretanto, o número alarmante de vazamentos, num curto espaço de tem-
po, exige maior atenção às ações que garantam a adequada operação do aterro
durante toda sua vida útil e após seu fechamento, proporcionando segurança
ao solo e aos recursos hídricos da região. Isso porque, conforme será visto em
seguida, são eventos danosos que influenciam na qualidade do meio ambiente
ao redor, no caso, a qualidade hídrica do rio Melchior e a contaminação do solo.
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Figura 03: Rio Melchior turvo e com escuma após contaminação com chorume do Aterro
Sanitário de Brasília. Fonte: Rede Globo (2019).
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98 A autodepuração representa o mecanismo com o qual o corpo hídrico consegue restabelecer, por
meios naturais, o equilíbrio do meio aquoso que sofreu com o lançamento de algum afluente.
Embora este equilíbrio nem sempre seja o mesmo do momento anterior ao lançamento da carga
poluidora. (SPERLING, 1996, p. 93-94).
99 Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000. Disponível
em: http://apambiente.pt/dqa/assets/01-2000_60_ce---directiva-quadro-da-%c3%a1gua.pdf
100 São objetivos ambientais propostos pela DQA que os Estados-Membros devem evitar a deterioração,
proteger e recuperar os corpos hídricos presentes em seus territórios, de forma a promover o
potencial ecológico destes corpos hídricos. Parlamento Europeu e Conselho da União Europeia,
Diretiva 2000/60/CE – Diretiva Quadro da Água. Art. 4°.
101 A exemplo dos objetivos ambientais previstos no art. 4º da Diretiva. Diretiva 2000/60/CE do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2000. Disponível em: http://apambiente.
pt/dqa/assets/01-2000_60_ce---directiva-quadro-da-%c3%a1gua.pdf
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aos moradores que utilizam esta bacia hidrográfica como fonte de recreação,
conforme mostrado em reportagem102. Um agravante é o fato de a população
não ter sido imediatamente alertada acerca dos vazamentos, expondo-os a um
material extremamente tóxico e ferindo os princípios da informação103 e da
educação (Art. 2º, X, Lei Federal 6938 de 1981), já que o uso do rio Melchior
para recreação, mesmo este sendo um corpo hídrico não classificado a receber
estes usos, mostra a falta de medidas de informação e de educação ambiental,
o não conhecimento dos riscos pela população e o conflito dos usos.
102 Chorume vaza no Aterro Sanitário de Samambaia, no DF, e atinge córrego Melchior. Bárbara Lins,
TV Globo. Disponível em: <https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/2019/01/31/chorume-
vaza-no-aterro-sanitario-de-samambaia-no-df-e-atinge-corrego-melchior-veja-imagens.ghtml>.
Acesso em: 06 de agosto de 2019.
103 Este princípio tem o dever de assegurar que todos os cidadãos tenham direito à informação,
incluindo aos assuntos que englobam o meio ambiente. Servindo para educar, conscientizar e
proteger a sociedade. (FERNANDES, 2009, p. 134).
104 Os indicadores de sustentabilidade reúnem dados científicos brutos sobre diversas ciências de
forma que a análise destes dados seja assimilável por juristas e legisladores. Há, assim, o auxílio
na identificação dos agentes causadores de pressão sobre o meio ambiente, na análise do estado de
qualidade ambiental e na escolha de respostas mais eficazes (SANTOS, 2019. p. 168-176).
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Estudos de Direito das Águas
105 De modo geral, nos termos do art. 4°, Resolução CONAMA n° 357/2005: a classe especial é destinada ao
abastecimento público, ao equilíbrio natural dos ecossistemas aquáticos e à preservação de unidades
de conservação de proteção integral. Já a classe 1 permite o abastecimento público (tratamento
simplificado), proteção dos ambientes aquáticos, recreação de contato primário, irrigação de
hortaliças, árvores frutíferas que são consumidas cruas e à proteção de comunidades aquáticas
presentes em Terras Indígenas. As atividades em acordo com a classe 2 são: o abastecimento público
(tratamento convencional), proteção das comunidades aquáticas, recreação de contato primário,
irrigação de hortaliças, árvores frutíferas, parques em que o usuário tem contato direto, aquicultura
e à atividade pesqueira. A classe 3 possibilita o abastecimento público (tratamento convencional ou
avançado), irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forrageira, pesca amadora, recreação de
contato secundário (contato esporádico ou acidental, com pouca possibilidade de ingestão da água)
e a dessedentação de animais. A classe 4 permite apenas a navegação e a harmonização paisagística.
106 Nesse sentido, uma reportagem do DF-TV entrevista moradores e pessoas que circulam próximo ao
rio, e retrata o incômodo com o mau cheiro no rio Melchior, embora o Aterro informe a existência
do tratamento do chorume antes do seu despejo. REDE GLOBO, DF-TV. Moradores se queixam
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109 Este princípio objetiva a definição, pela Administração Pública, de parâmetros de qualidade
ambiental que não sejam prejudiciais ao ser humano e ao meio ambiente. (FARIAS, 2006, p. 145).
110 O biogás é gerado pela decomposição anaeróbia da matéria orgânica presente no lixo, sendo
composto tipicamente por 60% de metano, 35% por dióxido de carbono e 5% de outros gases, como
hidrogênio e gás sulfúrico (FIGUEIREDO, 2011, p. 20).
111 Esta informação foi fornecida pelo SLU através do Sistema Eletrônico do Serviço de Informação ao
Cidadão do Distrito Federal (e-SIC), conforme Protocolo n° 00094000081201964.
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tecer uma cidade de 18 mil habitantes112. Este aterro conta com uma usina de
bioenergia construída com o investimento de 15 milhões de reais da empresa
Estre Energia Renovável. É válido ressaltar que o Aterro Sanitário de Guatapará
recebe menos resíduo diariamente que o Aterro Sanitário de Brasília, que obteve
mais de 2.500 toneladas de resíduos domésticos diariamente em 2019.
Durante a construção do Aterro, foram instalados uma série de drenos
que guiam o biogás gerado. Contudo, ao invés de aproveitá-lo, há a sua quei-
ma, para que o biogás seja reduzido a CO2, diminuindo, assim, o seu potencial
de contaminação de solo. Entretanto, o CO2 também é um gás poluente e um
dos responsáveis pelo efeito estufa113.
Ademais, o gás metano presente no biogás e gerado pela decomposição
anaeróbia da matéria orgânica, por se tratar de uma molécula instável ener-
geticamente, apresenta grande potencial energético que também poderia ser
uma fonte de geração de energia. Um estudo realizado em 2015, a fim de ava-
liar o potencial de aproveitamento energético a partir dos resíduos no Aterro,
na época em fase de construção, teve como resultado que o Aterro apresenta-
ria um elevado potencial de geração de energia, na ordem de 142.122,83 m³/
ano, caso houvesse uma política pública ou incentivo de mercado para o seu
aproveitamento (MARTINS, 2015, p. 25). Entretanto, ainda hoje, esse poten-
cial energético do Aterro não é aproveitado.
Um dos motivos é o fato de não haver incentivo financeiro e/ou de políti-
cas públicas em prol do aproveitamento do biogás gerado no Aterro Sanitário
de Brasília, nem no Aterro Controlado do Jóquei, mesmo sendo parte da rota
de Valorização Energética pelo Plano Distrital de Gestão Integrada de Resídu-
os Sólidos (PDGIRS)114. Adicionalmente, manter uma situação de não aprovei-
tamento do biogás gerado, entra em conflito com as condicionantes nº 03 da
Licença Prévia n° 004/2012 e a nº 10 da Licença de Operação n° 044/2016, que
112 Entra em operação 1ª usina do interior de SP a gerar energia a partir do lixo. Disponível em: < http://
g1.globo.com/sp/ribeirao-preto-franca/noticia/2014/08/entra-em-operacao-1-usina-do-interior-
de-sp-gerar-energia-partir-do-lixo.html>. Acesso em 30 de janeiro de 2020.
113 Efeito estufa. Disponível em: <http://www.usp.br/qambiental/tefeitoestufa.htm>. Acesso em 08 de
novembro de 2019.
114 A Rota de Valorização abarca a conversão de rejeitos para combustível derivado de resíduos; geração
de energia através da biodigestão e o aproveitamento do biogás do Aterro Sanitário de Brasília e
Aterro do Jóquei. GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL. Plano Distrital de Gestão Integrada de
Resíduos sólidos. 2018, p. 106.
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Estudos de Direito das Águas
Conclusão
Embora o histórico do Distrito Federal não seja um total exemplo no que
diz respeito à correta destinação dos resíduos sólidos, nos últimos anos houve
uma intensificação das políticas públicas que visam esta adequação. Dentre
elas destacam-se a criação do Aterro Sanitário de Brasília, que deve ser visto
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Referências
Lei nº 9.605/1998
Lei nº 9.985/2000
Lei nº 12.305/2010
Lei nº 12.651/2012
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Lei nº 6.454/2019
Decreto nº 38.903/2018
Decreto nº 40.487/2020
NBR n° 8419
NBR nº 8418
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NBR nº 10157
NBR nº 13896
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