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Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP

Programa de Mestrado Profissional em Direito


As bases políticas da judicialização dos conflitos

Texto: O Reconhecimento da União Homoafetiva na


Perspectiva da Judicialização da Política
Autora: Juliana Fabbron Marin Marin

Lucas Sérvio Gonçalves Ramadas


RA: 2114341

BRASÍLIA - DF
Outubro, 2021
Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP
Programa de Mestrado Profissional em Direito
As bases políticas da judicialização dos conflitos

INTRODUÇÃO DA OBRA

O texto “O reconhecimento da União Homoafetiva na Perspectiva da Judicialização da


Política” de autoria de Juliana Fabbron Marin Marin, é um capítulo expositivo e explicativo da
necessidade da judicialização dos méritos tocantes aos direitos e garantias requeridos pela
população LGBT. Além do arcabouço técnico, fala-se também da desigualdade com o qual tais
direitos são tratados e como são deixados invisíveis no trâmite legislativo. A autora com bastante
propriedade evidenciou que, se a comunidade LGBT hoje tem direitos e garantias foi graças à
judicialização de suas principais demandas, as quais até hoje seguem sem positivismo oriundo
do poder Legislativo Federal.

DESENVOLVIMENTO

Inicialmente é feito um paralelo sobre a igualdade devidamente garantida na


Constituição Federal de 88, com a falta de tratamento equânime com essa parcela da população.
Motivado pelas diferenças sociais definidas como padrão com base no comportamento e nas
tradições. O padrão1 aqui relatado se trata do que se considera tradicional, normativo e
conservador, este último longe do sentido político o qual se atribui conservador ao indivíduo que
vê no Estado um ente de segurança jurídica, que deseja a segurança e proteção às instituições e
ser contra revoluções.
O padrão discutido é o padrão de heteronormatividade que ainda impera na sociedade,
trazendo como normal tradicional e comum apenas às relações heterossexuais ou
heteroafetivas, com a união estável e o casamento entre pessoas de diferentes sexos, onde o
homem possui um determinado tipo de comportamento que se espera dele, no tocante ao modo
de se expressar, vestir e falar, o mesmo para as mulheres. Desse modo, tudo aquilo que foge do
padrão, conforme observa a autora, gera uma oposição binária entre heteroafetivo e
homoafetivo, dando ensejo, ao nós e eles.
Esse padrão é o que alimenta o discurso de, “nós”, que somos os normais, devem ser
preferenciais nas considerações Legislativas, e que o Congresso se manifestar a favor a união
civil, adoção, tratamento de saúde entre outros direitos, seria algo como ir contra o padrão,

1
Padrão aqui é utilizado para autora como rótulo de comportamento.
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contra o normal. Esse “modus operandi” de pensamento, obstrui o verdadeiro debate, que
deveria se tratar da escassez de representatividade que essa minoria da população sofre. O
movimento LGBT e sua existência, bem como suas lutas é inegavelmente necessário,
principalmente pelo distanciamento de ideias e representatividade, na visão da autora, também
causados pelo “nós e eles”.
Por mais que a Constituição Federal tenha alçado a igualdade para todos como direito
fundamental, essa realidade está longe de chegar à população LGBT do Brasil. Pois essa
igualdade só foi relativamente atingida por força de medidas judiciais, motivadas pelo altíssimo
grau de violência física e moral cometida contra pessoas da comunidade. Em 2020, pelo 12º ano
consecutivo o Brasil figurou no topo da lista dos países que mais assassinava membros da
comunidade LGBT, no caso os transexuais.2 E dentre esses dozes anos consecutivos, nenhuma
medida foi tomada pelo poder Legislativo para represar esse comportamento, exemplificando o
preconceito arraigado na instituição, que entre outros motivos, teme a opinião pública se voltar
contra seus representantes por legislarem algo desta natureza.
Fazendo um paralelo com a violência doméstica ou especificamente contra a violência
contra a mulher, assim que os índices que sempre foram preocupantes romperam a bolha da
percepção Legislativa Federal e a luta foi levada para dentro do Congresso, leis específicas,
como a Maria da Penha foram elaboradas, mas o mesmo até hoje não aconteceu com a
comunidade LGBT. Ainda no tocante a Lei Maria da Penha, também por iniciativa do poder
judiciário, as mulheres lésbicas que sofressem violência doméstica, receberam proteção
equiparada. Algumas das consequências das lutas do movimento LGBT, além da
conscientização, de explicar o óbvio que são apenas indivíduos, como todos os outros, mas
também detentores de direitos, os quais todos os dias, ainda hoje são desrespeitados a céu
aberto.
Apesar da homoafetividade sempre estar presente na sociedade desde seu alvorecer,
vale destacar que até 17 de Maio de 1990, ainda era tratada como doença, grafada com o sufixo
“ismo” que indicava síndrome ou patologia. A decisão da OMS veio com um atraso de 42 anos,
pois em 1948 foi promulgada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que assegurava a
todos o direito de igualdade, sem preconceitos de raça, origem ou gênero.

2
https://exame.com/brasil/pelo-12o-ano-consecutivo-brasil-e-pais-que-mais-mata-transexuais-no-
mundo/ acesso em 21/10/2021
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O texto deixa clara a ausência de interesse do Legislativo Federal em atuar nessas


causas, o que motivou a própria sociedade civil a se mobilizar em prol de resguardar não só
seus direitos materiais, mas salvaguardar inclusive sua integridade física. As lutas assertivas e
políticas pelos direitos LGBT enquanto movimentos organizados são relativamente jovens, e até
hoje, além das decisões judiciais, só contaram com iniciativas do Legislativo Estadual, como por
exemplo, Decreto Estadual nº 54.032/2009 que criou a Coordenação de Políticas para a
Diversidade Sexual.3 Em 2012, foi criado o Conselho Estadual dos Direitos da População LGBT
via Decreto Estadual nº 58.527.4 Em sede de Lei, foram promulgadas a 10.948/01 a qual
dispunha de penalidades para combater a discriminação da pessoa homoafetiva.5 Bem como a
14.363/11 que adotava providências contra a discriminação no uso de elevadores, a qual
abrangeu também a comunidade LGBT.6
O que se extrai do texto e dos Decretos e Leis supra, absolutamente nenhuma desses
dispositivos legais alcançou o poder Legislativo Federal, o primeiro diploma legal que tentou
garantir direitos à comunidade foi de iniciativa de Marta Suplicy do PT/SP, onde era disciplinada
a união civil entre pessoas do mesmo sexo no ano de 1995 e após ela, diversos outros foram
apresentados, tanto a favor, tanto contra os direitos e garantias da comunidade LGBT, até mais
recentemente o ano de 2017, PDL 639 de autoria de Professor Victório Galli do PSC/MT que
buscava sustar a resolução nº 175/2013 ou Conselho Nacional de Justiça. Ou seja, o Legislativo
Federal não se movimenta nem para garantir, nem para subtrair direitos já conquistados por
outros meios legais.
Quando políticos de siglas não muito identificadas com as causas LGBT são
entrevistados sobre a falta de protagonismo do Legislativo Federal no tocante as decisões
relativas aos direitos dessa comunidade, a resposta é sempre unanime: “O fato do Legislativo
Federal não legislar sobre o assunto, por si, já é uma tomada de posição”.
O que ocorre, é que a comunidade que todo o dia sofre com preconceito e impedimento,
este que vai contra a Constituição Federal no que concerne à garantia à igualdade, não pode
crer e aceitar que o poder Legislativo ao não se manifestar dê como matéria resolvida tais
demandas.

3
https://www.al.sp.gov.br/norma/154836
4
https://www.al.sp.gov.br/norma/168572
5
https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/2001/lei-10948-05.11.2001.html
6
https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/2011/lei-14363-15.03.2011.html
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É a esta altura que se entra no que se convencionou chamar de “ativismo judicial” por
partes dos membros do judiciário na sua tomada de decisão. Como marco histórico para a
comunidade LGBT, no julgamento pelo STF DA ADPF nº 132-RJ7, que mudou o entendimento
do artigo 1.732, trecho do voto do Ministro Ayres Britto,:
Técnica da “interpretação conforme” para viabilizar o descarte de qualquer
intelecção convivência estável desfavorecedora de servidores homoafetivos,
em comparação com a tutela juridicamente conferida à união igualmente
estável de servidores heterossexuais.
Dois anos depois dessa decisão histórica do STF, foi proposto o PL 6.583/2013, que
dispõe sobre o Estatuto da Família, e em seu texto os argumentos delineados pelos Ministros na
confecção dos votos foram incorporados, sendo trazidos também os argumentos sobre a
importância da família no desenvolvimento do indivíduo. Tem-se a crença de que o fator religioso
é um dos impeditivos principais, que dificultam o trâmite das Leis Federais favoráveis à
população LGBT, mas a autora esclarecesse que se trata de aparência, e que esse não é mais o
motivo fundamental que faz os deputados omitir essa matéria.
Para fins de regulação e já com a vanguarda do STF, o Conselho Nacional de Justiça no
de 2013 aprovou a resolução 1758 dispondo e regulando a celebração do casamento civil ou
conversão de união estável, para pessoas do mesmo sexo. Novamente, a regulação não partiu
do Legislativo Federal.
Geralmente, quando o judiciário por intermédio de seus poderes, concedem direitos e
garantias ou modificam entendimentos de textos, ocorre o efeito “Backlash”, que se quantifica
em uma reação política, em virtude do resultado de uma decisão judicial, que á princípio caberia
ao congresso. Conforme se extrai do texto, mesmo após todos esses anos da decisão do STF e
do CNJ, e em que pese propostas terem sido apresentadas, nenhuma reação efetiva veio do
Legislativo Federal, preterindo ainda mais a comunidade LGBT, rotulando seus direitos e
garantias como resultado de mero “ativismo judicial”.
Recentemente, também em razão do vácuo legislativo, o STF na ADO 26 9, enquadrou a
homofobia e transfobia ao crime de racismo, o que trouxe proteção e regulação ao crime de
homofobia, o qual também não conta com texto Legislativo Federal.

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njur.com.br%2Fdl%2Fvoto-ministro-ayres-britto-julgamento.pdf&clen=145074&chunk=true
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https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/1754
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http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=414010
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As únicas reações advindas do Legislativo Federal neste sentindo, são as tentativas de sustar
tais decisões judiciais, como é trazido no texto, a Frente Parlamentar Evangélica (FPE), em duas
tentativas diferentes, tentou desfazer o que foi sentenciado nos processos judiciais, no entanto
não levantaram argumentos apenas de natureza religiosa, mas sim que o STF estaria invadindo
competências do Legislativo Federal. O que se extrai da observação da autora, é que de todos
os textos apresentados entre 1995 e 2017, houve mudança na base dos argumentos, no
sentindo que se encontravam menos discursos de tradicionalismo e religião e mais sobre a
autonomia Legislativa e o perigo do ativismo judicial.
O que se deve levar em conta, é um diagnóstico simples de ser evidenciado, caso não
fossem as decisões judiciais, obtidas na luta dos membros da comunidade LGBT, esse grupo
social até hoje não teria direito nenhum! A atuação do Judiciário para sanar a omissão do poder
público, na proteção de um grupo social de risco, foi vanguarda na garantia e respeito ao
individuo homoafetivo, pois são mais de 20 anos desde a primeira propositura de ação no
Congresso, neste ano completou-se 10 anos da decisão do STF que reconheceu a união
homoafetiva como legítima e ainda não há nenhuma decisão definitiva por parte do Congresso
Federal sobre a questão de Leis e políticas para a população LGBT.
A comunidade LGBT existe, seus indivíduos trabalham, estudam, pagam seus impostos,
participam do desenvolvimento da sociedade com seu intelecto, sua perseverança, são sujeitos
detentores de direitos e garantias e necessitam, como tantos outros grupos minorizados e
marginalizados, lutar por seu espaço na sociedade. Não há Legislação Federal que regulamenta,
adoção, imposto de renda em conjunto, dentre outras definições que são simples e
imperceptíveis para quem é heteroafetivo, mas que sua ausência, marginaliza e traz indignidade
ao grupo homoafetivo. Esse vácuo de decisão precisa ser preenchido, e a judicialização desses
direitos, foi o caminho que trouxe dignidade e segurança jurídica para a comunidade LGBT, o
que é a base de um estado democrático de direito.

CONCLUSÃO

Hoje vigora a união estável entre pessoas do mesmo sexo, também em decisão judicial
histórica o STF removeu a restrição preconceituosa que impedia membros da comunidade LGBT
de doarem sangue. A autora enfatiza bem, que os interesses ou a falta deles do Legislativo
Federal também se trata de jogo político, pois nem sempre o argumento é religioso ou
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tradicional, mas que também envolve a queda de braço na Praça dos Três Poderes, onde apoio
a um projeto pode significar perda de sustentação de outro, que a troca de votos e o conchavo
político, no tocante aos direitos da pessoal homoafetiva, acabam se sobressaindo, impedindo um
debate claro e conclusivo sobre os direitos e garantias de um grupo da sociedade que sofre
todos os dias com o preconceito e a marginalização. Ainda há muito pelo que se lutar quando a
matéria envolve o direito homoafetivo, e enquanto as instituições se digladiam entre si em busca
do protagonismo e da palavra final a comunidade LGBT segue cada vez mais na sub-
representação e sem ver seus direitos garantidos a nível Federal em virtude de Lei.

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