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A Divindade e a Personalidade do Espírito Santo

 O Espírito Santo não é uma criatura subordinada ao Pai e ao Filho


Ozeas Caldas Moura
 Ideias heréticas sobre a divindade e a personalidade do Espírito Santo já vêm de longe. “Macedônio, bispo de
Constantinopla de 341 a 360 d.C., já ensinava que o Espírito Santo era ‘ministro e servo’ no mesmo nível dos anjos. Cria
que o Espírito Santo era uma criatura subordinada ao Pai e ao Filho. Isso era uma negação da verdadeira divindade do
Espírito Santo”. Em 381 d.C., o Concílio de Constantinopla condenou essas idéias de Macedônio.No entanto, vê-se hoje
que essas velhas heresias sobre a pessoa do Espírito Santo vêm sendo ressuscitadas, seja por mera curiosidade teológica
especulativa, seja como meio de atacar a Igreja e suas doutrinas. O certo é que o conselho dado pelo apóstolo João, no I
século, continua bastante válido para os nossos dias: “Amados, não deis crédito a qualquer espírito; antes, provai os
espíritos se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo mundo fora” (I João 4:1).

Concordamos que, devido à nossa limitação humana, não nos é possível abarcar tudo o que Deus é. Em relação com a
pessoa do Espírito Santo, não é diferente: o que dEle podemos e devemos saber está revelado nas páginas das Escrituras,
quer seja lógico ou não à razão humana. Com esse cuidado em mente, analisemos o que nos diz a Palavra de Deus sobre a
Terceira Pessoa da Trindade. O que passar disso é mera especulação perigosa, que pode e tem desencaminhado da fé
aqueles que se deixam levar “por todo vento de doutrina” (Efés. 4:14).

1. O Espírito Santo é Deus, pois tem os mesmos atributos de Deus.  Por exemplo: santidade – em muitas passagens
das Escrituras o adjetivo “santo” é acrescido ao nome do divino Espírito (Mar. 13:11; Tito 3:5); eternidade – (Heb.
9:14); onisciência – (I Cor. 2:10 e 11); onipotência – (em Lucas 1:35, o Espírito Santo é chamado de “poder do Altíssimo”;
confira, ainda, a palavra “poder” ligada ao Espírito em Isa. 11:2; Miq. 3:8; Luc. 4:14 e Atos 1:8); onipresença – (Sal. 139:7-
12); Criador – (Gen. 1:2; Jó 33:4; Sal. 104:30 e Eze. 37:14). Uma vez que só Deus tem esses atributos, e o Espírito Santo os
tem, então ele é Deus, como Deus Pai e Deus Filho. Por isso Pedro disse a Ananias que mentir ao Espírito Santo é mentir a
Deus (Atos 5:3 e 4).
2. O Espírito Santo é uma Pessoa. Os que dizem que o Espírito Santo é apenas uma força e não uma pessoa, deveriam
atentar para os atributos pessoais com que a Bíblia O apresenta. Ele tem inteligência, pois “perscruta” ou investiga (I Cor.
2:10 e 11) e “ensina” (João 14:26 e I Cor. 2:13); tem vontade, pois distribui os dons “como Lhe apraz” (I Cor. 12:11); tem
emoção, pois pode ser “contristado” (Isa. 63:10) ou “entristecido” (Efés. 4:30). Ele fala (II Sam. 23:2 e Atos 13:2); ensina
(João 14:26); guia (Rom. 8:14); convence (João 16:8); contende ou age (Gên. 6:3); testifica (Rom. 8:16); separa e envia
(Atos 13:2); intercede (Rom. 8:26). A palavra grega com a qual Jesus descreve a obra do Espírito Santo é PARÁKLETOS (João
14:16, 26; 15:26; 16:7; aparece também em I João 2:1), vocábulo cuja tradução é “Ajudador”, “Intercessor”, “Advogado”
(na Versão Almeida, o vocábulo é traduzido por “Consolador”). Esses significados de PARÁKLETOS indicam que o Espírito
Santo é uma pessoa, pois uma mera força não poderia ser um Ajudador, um Intercessor, um Advogado e um Consolador.
Deve-se dizer ainda que o fato de as Escrituras apresentarem o Espírito Santo como uma pessoa divina, não contraria
Deuteronômio 6:4: “Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor”. A palavra “único”, no original hebraico,
é Echad (pronuncia-se “errad”), a qual indica uma “unidade composta”. Em Gên. 1:5, uma tarde e uma manhã é igual a
uma echad – dia. Em Gênesis 2:24, um homem e uma mulher, mediante o casamento, são uma (echad) só carne. Se
Moisés quisesse dizer que Deus é uma só pessoa, teria empregado Yachid (pronuncia-se “iarrid”), como se pode ver no
caso de Isaque, que era filho “único” (Yachid) de Abrão e Sara (Gen. 22:2). O fato de Moisés ter empregadoEchad e
não Yachid para falar de Deus, indica que Deus é uma “unidade composta”: Pai, Filho e Espírito Santo (Mat. 28:19). Sendo
que as três pessoas da Trindade são co-iguais, coeternas, da mesma natureza, da mesma qualidade e com os mesmos
propósitos, então é correto dizer que adoramos Um Deus, que Se manifesta ou Se apresenta em três pessoas divinas. Em
outras palavras, adoramos o Deus Triúno. Isso pode não parecer lógico à nossa pobre mente humana, limitada, finita e
imperfeita, mas é o que Deus revelou acerca de Si mesmo nas páginas das Escrituras. Caberia aqui nos lembrar do
conselho divino dado em Deuteronômio 29:29: “As coisas encobertas pertencem ao Senhor, nosso Deus, porém as
reveladas nos pertencem, a nós e a nossos filhos, para sempre…”
 Deveríamos também atentar para o que Ellen White escreveu sobre a pessoa do Espírito Santo: “O Consolador que
Cristo prometeu enviar depois de ascender ao Céu, é o Espírito em toda a plenitude da Divindade… Há três pessoas vivas
pertencentes à Trindade celeste; em nome destes três grandes poderes – o Pai, o Filho e o Espírito Santo – os que recebem
a Cristo por fé viva são batizados, e esses poderes cooperarão com os súditos obedientes do Céu em seus esforços para
viver a nova vida em Cristo. …Os eternos dignitários celestes – Deus, Cristo e o Espírito Santo – munindo-os [aos discípulos]
de energia sobre-humana, … avançariam com eles para a obra e convenceriam o mundo do pecado.

“Precisamos reconhecer que o Espírito Santo, que é tanto uma pessoa como o próprio Deus, está andando por esses
terrenos. O Espírito Santo é uma pessoa, pois dá testemunho com o nosso espírito de que somos filhos de Deus. …O
Espírito Santo tem personalidade, do contrário não poderia testificar ao nosso espírito e com e com nosso espírito que
somos filhos de Deus.

Deve ser também uma pessoa divina, do contrário não poderia perscrutar os segredos que jazem ocultos na mente de
Deus. “O príncipe da potestade do mal só pode ser mantido em sujeição pelo poder de Deus na terceira pessoa da
Trindade, o Espírito Santo. Cumpre-nos cooperar com os três poderes mais altos no Céu – o Pai, o Filho e o Espírito Santo –
e esses poderes operarão por meio de nós, fazendo-nos coobreiros de Deus.”3
Referências:
1. CAIRNS, E. E. O Cristianismo Através dos Séculos (São Paulo: Vida Nova, 1992), pág. 109.
2. Pedro Apolinário, As Testemunhas de Jeová e sua Interpretação da Bíblia (São Paulo: Gráfica do IAE, 1986), pp. 84 e 85.
3. Ellen White, Evangelismo. 2ª. Ed. (Santo André: Casa Publicadora Brasileira, 1978), pp. 615-617.

Fonte: Revista Adventista, novembro de 2002, pp. 16 e 17.

A Trindade na Bíblia 
“Há um só Deus: Pai, Filho e Espírito Santo, uma unidade de três Pessoas coeternas” – Crença
Fundamental nº 2
Gerhard Pfandl
Ph.D., diretor associado do Instituto de Pesquisa
Bíblica da Associação Geral da IASD

 A doutrina da Trindade (do latim trinitas = “triunidade” ou “três-em-unidade”) é uma das mais importantes doutrinas da
fé cristã. Mas ultimamente alguns têm questionado sua validade. Por exemplo, em uma monografia, Fred Allaback
argumenta que “a Igreja Adventista do Sétimo Dia não cria na doutrina da Trindade até muito tempo depois da morte de
Ellen G. White”.1 “Os pioneiros adventistas”, escreveu ele, “acreditavam que em um ponto longínquo da eternidade
somente um Ser divino existia. Então esse Ser divino teve um Filho.”2 Dessa forma, Cristo teve um começo. Com respeito
ao Espírito Santo, Allaback crê que Ele é o Espírito de Deus e de Cristo; não um outro Ser divino.3

A mesma visão é adotada por Bill Stringfellow,4 Rachel Cory-Kuehl5 e Allen Stump.6 Todos esses ensinam que em um ponto
no tempo Jesus não existia; e que o Espírito Santo é apenas uma força. Stringfellow diz: “Houve um certo e específico dia
quando Deus deu à luz Seu Filho … Houve um tempo (embora seja impossível identificá-lo precisamente no passado)
quando Cristo não existia.”7

O MISTÉRIO
Embora a palavra Trindade não seja encontrada na Bíblia (nem a palavra encarnação), o ensinamento que ela descreve é
encontrado ali. A doutrina da Trindade estabelece o conceito de que há três Seres plenamente divinos: Pai, Filho e Espírito
Santo, que formam um Deus.8 Por sua vez, Ellen White usa o termo “Divindade” que é encontrado em Romanos 1:20 e
Colossenses 2:9. Através dessa palavra ela transmite a mesma idéia contida no termo Trindade, ou seja, há três Seres
viventes na Divindade. Segundo uma de suas declarações, “há três pessoas vivas pertencentes ao Trio celeste; em nome
destes três grandes poderes – o Pai, o Filho e o Espírito Santo – os que recebem a Cristo por fé viva são batizados, e esses
poderes cooperarão com os súditos obedientes do Céu em seus esforços para viver a nova vida em Cristo”.9

O próprio Deus é um mistério,10 quanto mais a encarnação ou a Trindade. Entretanto, isso não deveria nos embaraçar, já
que os diferentes aspectos desses mistérios são ensinados nas Escrituras. Embora não possamos compreender tudo sobre
a Trindade, necessitamos tentar entender, tanto quanto possamos, o ensino bíblico a seu respeito. Todas as tentativas
para explicá-la serão insuficientes, “especialmente quando refletimos sobre a relação das três pessoas com essência divina
… todas as analogias são limitadas e nós nos tornamos profundamente conscientes de que a Trindade é um mistério muito
além da nossa compreensão. É a incompreensível glória da Divindade”.11

Portanto, é sábio admitir que o homem “não pode compreendê-la nem torná-la compreensível. É compreensível em
algumas de suas relações e modos de se manifestar, mas ininteligível em sua natureza essencial”.12 Certos elementos se
tornarão claros, e outros permanecerão um mistério, pois “as coisas encobertas pertencem ao Senhor nosso Deus; porém
as reveladas nos pertencem a nós e a nossos filhos para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei” (Deut.
29:29). Onde não temos uma palavra clara das Escrituras o silêncio é ouro.13

NO ANTIGO TESTAMENTO
Algumas passagens do Antigo Testamento sugerem, ou implicam a existência de Deus em mais de uma pessoa. Quando
não necessariamente em uma Trindade, pelo menos em duas pessoas.
Gênesis 1. No relato da criação em Gênesis 1, a palavra traduzida como Deus é ’Elohim, a forma plural
de ’Eloha. Geralmente essa forma é interpretada como um plural de majestade ao invés da idéia de pluralidade.
Entretanto, G. A. F. Knight argumenta que essa interpretação corresponde a ler um conceito moderno no texto hebraico
antigo, desde que os reis de Israel e Judá são tratados na forma singular, no relato bíblico.14 Knight aponta que as palavras
hebraicas para água e céu também são plurais. Os gramáticos nomeiam esse fenômeno como plural quantitativo. A água
pode aparecer em forma de pequenas gotas ou grandes oceanos. Essa diversidade quantitativa em unidade, segundo
Knight, é uma forma adequada de compreender o plural ’Elohim. E também explica por que o substantivo
singular ’Adonai é escrito como plural.15

Em Gênesis 1:26, lemos: “Também disse Deus [singular]: Façamos [plural] o homem à nossa [plural] imagem, conforme a
nossa [plural] semelhança…” O que é significativo aqui é a mudança do singular para o plural. Moisés não está usando o
verbo no plural com ’Elohim, mas Deus está usando um verbo e um pronome no plural, em referência a Si mesmo. Alguns
intérpretes acreditam que Deus está falando aqui de anjos. Mas, de acordo com as Escrituras, os anjos não participaram da
criação. A melhor explicação é que, já no primeiro capítulo de Gênesis, há uma indicação de pluralidade de pessoas em
Deus.

Deuteronômio 6:4. De acordo com Gênesis 2:24, “deixa o homem pai e mãe, e se une à sua mulher, tornando-se os dois
uma só [’echad] carne”. É uma união de duas pessoas distintas. Em Deuteronômio 6:4, é usada a mesma palavra em
relação a Deus: “Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único [’echad] Senhor.” Segundo Millard J. Erickson,
“aparentemente alguma coisa está sendo afirmada aqui sobre a natureza de Deus – Ele é um organismo, isto é, uma
unidade de partes distintas”.16 Moisés bem poderia ter usado a palavra yachid (“um”; “único”), mas o Espírito Santo
escolheu não fazê-lo.

Outros textos. Após a queda do homem, Deus disse: “Eis que o homem se tornou como um de nós” (Gên. 3:22). E algum
tempo depois, quando o homem começou a construir a torre de Babel, o Senhor ordenou: “Vinde, desçamos e
confundamos ali a sua linguagem” (Gên. 1:7). Em cada caso, a pluralidade da Divindade é enfatizada.

Em sua visão do trono de Deus, Isaías ouviu o Senhor perguntando: “A quem enviarei, e quem há de ir por nós?” (Isa. 6:8).
Aqui encontramos Deus usando o singular e o plural na mesma sentença. Muitos eruditos modernos tomam isso como
uma referência ao Concílio Celestial. Mas, pediria Deus algum conselho às Suas criaturas? Em Isaías 40:13 e 14, Ele parece
refutar essa noção. Deus não necessita aconselhar-Se nem mesmo com criaturas celestiais. Portanto, o uso do plural em
Isaías 6:8, embora não especifique a Trindade, sugere que há uma pluralidade de seres no Orador.

O anjo do Senhor. A frase “anjo do Senhor” aparece 58 vezes no Antigo Testamento. “O anjo de Deus” aparece onze vezes.
A palavra hebraica para “anjo” – mal’ak – significa mensageiro. Se o “anjo do Senhor” é Seu mensageiro, então deve ser
distinto do Senhor. Todavia, em alguns textos, o “anjo do Senhor” também é chamado “Deus” ou “Senhor” (Gên. 16:7-13;
Núm. 22:31-38; Juí. 2:1-4; 6:22). Os pais da Igreja identificavam esse anjo com o Logos pré-encarnado. Eruditos modernos
vêem-nO como um Ser que representa Deus, como o próprio Deus, ou como algum poder externo de Deus. Por sua vez,
eruditos conservadores geralmente aceitam que “este ‘mensageiro’ deve ter sido como uma manifestação especial do Ser
do próprio Deus”.17 Se isso é correto, temos aqui outra indicação da pluralidade de pessoas na Divindade.

NO NOVO TESTAMENTO 
A verdade, na Bíblia, é progressiva. Por isso, é no Novo Testamento que encontramos um quadro mais explícito da
natureza trinitária de Deus. A declaração de que Ele é amor (I João 4:8) implica que deve haver uma pluralidade dentro da
Divindade, considerando-se que o amor só pode revelar-se em um relacionamento pluralístico.

Por ocasião do batismo de Jesus, encontramos os três membros da Divindade em ação ao mesmo tempo: “Batizado Jesus,
saiu logo da água, e eis que se Lhe abriram os Céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba, vindo sobre Ele. E eis
uma voz dos Céus que dizia: Este é o Meu Filho amado, em quem Me comprazo” (Mat. 3:16).

Eis uma notável manifestação da doutrina da Trindade. Ali estava Cristo em forma humana, visível a todos; o Espírito Santo
desceu sobre Ele na forma de uma pomba; e a voz do Pai foi ouvida dos Céus: “Este é o Meu Filho amado, em quem me
comprazo”. Em João 10:30 Cristo fala de Sua igualdade com o Pai, e em Atos 5:3 e 4, o Espírito Santo é identificado como
Deus. É impossível explicar a cena do batismo de Jesus por qualquer outra maneira senão assumindo que há três pessoas,
iguais em natureza ou essência divina.

No batismo, o Pai referiu-Se a Jesus como “Meu Filho amado”. Essa filiação, entretanto, não é ontológica, mas funcional.
No plano da salvação, cada membro da Trindade aceitou um papel específico, com o propósito de cumprir um alvo
particular. Não se trata de mudança de essência oustatus. Millard J. Erickson o explica desta maneira:
“O Filho não Se tornou inferior ao Pai durante a encarnação, mas subordinou-Se funcionalmente à vontade do Pai.
Semelhantemente, o Espírito Santo agora está subordinado ao ministério do Filho (ver João 14-16) bem como à vontade
do Pai, mas isso não implica inferioridade em relação a Eles.”18 No pensamento ocidental, os termos “Pai” e “Filho” contêm
a idéia de origem, dependência e subordinação. Na mente oriental ou semítica, entretanto, eles enfatizam igualdade de
natureza. Assim, quando as Escrituras falam de “Filho” de Deus, estão afirmando a divindade de Cristo.

Ao terminar Seu ministério terrestre, Jesus ordenou aos discípulos: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações,
batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (Mat. 28:19). Nessa comissão, nota-se claramente a Trindade.
Primeiramente, notamos que a frase “em nome” [eis to onoma] é singular, não plural (nos nomes). Ser batizado em nome
de três pessoas da Trindade significa identificar-se com tudo o que Ela representa; comprometer-se com o Pai, Filho e
Espírito Santo.19 Em segundo lugar, a união desses três nomes indica que o Filho e o Espírito Santo são iguais ao Pai. Seria
estranho, para não dizer blasfemo, unir o nome do Deus eterno com um “ser criado” e uma “força” ou “energia” na
fórmula batismal.

“Quando o Espírito Santo é colocado na mesma expressão e no mesmo nível das outras duas pessoas, é difícil evitar a
conclusão de que Ele também é visto como sendo igual ao Pai e ao Filho.”20

Paulo e outros escritores do Novo Testamento geralmente usam a palavra “Deus” para se referir ao Pai; “Senhor”, em
referência ao Filho, e “Espírito”, em referência ao Espírito Santo. Em I Coríntios 12:4-6, o apóstolo fala dos três no mesmo
texto: “Ora, os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo. E também há diversidade nos serviços, mas o Senhor é o
mesmo. E há diversidade nas realizações, mas o mesmo Deus é quem opera tudo em todos.” Da mesma forma, em II
Coríntios 13:13, ele enumera as três pessoas da Trindade, ao mencionar “a graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e
a comunhão do Espírito Santo”.

Embora não possamos dizer que esses textos sejam uma enunciação formal da Trindade, eles e outros como, por exemplo,
Efésios 4:4-6, são trinitarianos em caráter. E embora a Igreja tenha elaborado os detalhes dessa doutrina em tempos
posteriores, ela o fez sobre o fundamento dos escritores bíblicos.

DIVINDADE DE CRISTO
Um elemento crucial na doutrina da Trindade é a divindade de Cristo. Diante do ensinamento de que há um Deus em três
pessoas, e que cada uma dessas pessoas é plenamente divina, é importante verificarmos o que as Escrituras ensinam
sobre a divindade de Cristo. Existem passagens no Novo Testamento que confirmam a plena deidade de Cristo.

João 1:1-3;14. “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus.” A frase introdutória “no
princípio” nos leva de volta ao começo do tempo. Se o Verbo estava “no princípio”, então Ele não teve princípio, que é
outra forma de dizer que era eterno.

“O Verbo estava com Deus” nos diz que o Verbo era uma pessoa ou personalidade separada. O Verbo não estava em (en)
Deus, mas com (pros) Deus. Desde que o Pai e o Espírito Santo são Deus, a palavra “Deus” muito provavelmente inclui
esses dois outros membros da Trindade.

“E o Verbo era Deus”. O Verbo não era uma emanação de Deus, mas Deus mesmo. Embora o verso 1 não diga quem é o
Verbo, o verso 14 claramente O identifica: “E o Verbo Se fez carne, e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade, e
vimos a Sua glória, glória como do unigênito do Pai.” Como disse Arthur W. Pink, “é impossível conceber uma afirmação
mais enfática e inequívoca da deidade absoluta do Senhor Jesus Cristo”.21

João 20:28. “Respondeu-Lhe Tomé: Senhor meu e Deus meu.” Essa é a única vez, nos evangelhos, em que alguém se dirige
a Cristo, chamando-O de “meu Deus” (ho Theos mou). É significativo que nem Cristo nem João desaprovaram a declaração
de Tomé; pelo contrário, esse episódio constituiu um ponto alto da narração do evangelista, que imediatamente fala a
seus leitores: “Na verdade fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro. Estes,
porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em Seu
nome” (vs. 30 e 31). Este evangelho, diz João, foi escrito para persuadir outros indivíduos a imitarem Tomé no
reconhecimento de Cristo como “Senhor meu e Deus meu”.

Filipenses 2:5-7. Essa passagem foi escrita para ilustrar a humildade. Mas é um dos textos de apoio à divindade de Cristo.
“Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois Ele, subsistindo em forma [morphé] de Deus
não julgou como usurpação [harpagmos] o ser igual a Deus; antes a Si mesmo Se esvaziou, assumindo a forma [morphé] de
servo, tornando-Se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana…”
Morphé, que significa “forma” ou “aparência visível’, é uma palavra descritiva da natureza genuína, a essência, de uma
coisa. “Não se refere a qualquer forma mutável, mas uma forma específica da qual dependem a identidade e
o status.”22 Morphé contrasta com schema (2:8), que também significa “forma” porém no sentido de aparência superficial,
ao invés de essência. O substantivo harpagmosaparece apenas nesse texto, no Novo Testamento, e o verbo
correspondente significa “roubar, tirar à força”. No grego secular, o substantivo significa “roubo”.

O contexto deixa claro que Jesus não cobiçou, não tentou roubar “o ser igual a Deus”; não tentou agarrar-Se à igualdade
com Deus a qual Ele possuía intrinsecamente. Em outras palavras, não tentou reter Sua igualdade com Deus pela força. Em
vez disso, “tratou-a como uma oportunidade para renunciar qualquer vantagem ou privilégio decorrentes; como uma
oportunidade para auto-empobrecimento e sacrifício próprio sem reserva”.23 Esse é o significado da expressão “antes a Si
mesmo Se esvaziou”. Sua igualdade com Deus era algo que Ele possuía intrinsecamente; e alguém igual a Deus deve ser
Deus. Assim, essa “é uma passagem que demanda a compreensão de que  Jesus era divino no mais pleno sentido”.24

Colossenses 2:9. “Porquanto nEle habita corporalmente [somatikos] toda a plenitude [pleroma] da Divindade.” O termo
grego pleroma tem o significado básico de “plenitude”, “plenamente”. No Antigo Testamento ele é aplicado à plenitude da
Terra ou do mar (Sal. 24:1; cf. 50:12; 89:11; 96:11; 98:7), que é citada em I Coríntios 10:26. No grego
secular, pleroma referia-se à totalidade da tripulação de um navio, ou à quantia necessária para completar uma transação
financeira. Em Colossenses 1:19 e 2:9, Paulo usa a palavra para descrever a soma total de cada função da divindade.25

Essa plenitude habita corporalmente em Cristo, mesmo durante Sua encarnação, Ele reteve todos os atributos essenciais
da divindade, embora não os empregasse em benefício próprio. “… Foi claramente visto que a divindade habitava na
humanidade, pois através do invólucro terrestre, vez após vez cintilavam lampejos de Sua glória.”26

Tito 2:13. Paulo descreve os santos como “aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande
Deus e Salvador Cristo Jesus”. Notemos que: 1) De acordo com uma regra da gramática grega, o artigo o antes de “Deus” e
“Salvador” une esses dois substantivos como designações do mesmo objeto. Assim, Jesus Cristo é “o grande Deus e
Salvador”. 2) Todo o Novo Testamento aguarda a segunda vinda de Cristo. 3) O contexto do verso 14 fala apenas de Cristo.
4) Essa interpretação está em harmonia com outras passagens, tais como João 20:28; Rom. 9:5; Heb. 1:8; II Ped. 1:1, de
modo que esse texto é mais uma afirmação da divindade de Cristo.

Mateus 3:3. “… Voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor.” De acordo com o verso 1, esse texto de
Isaías refere-se a João Batista que era o precursor do Messias. Em Isaías 40:3, a palavra traduzida como “Senhor”
é Yahweh. Assim, o Senhor cujo caminho João prepararia não era outro senão o próprio Jeová.

Romanos 10:13. “Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.” O contexto (vs. 6-12) deixa claro que, ao
se referir ao “nome do Senhor”, Paulo está pensando em Cristo. O texto é uma citação de Joel 2:32, onde novamente a
palavra Senhor é tradução do hebraico Yahweh.

Hebreus 1:8 e 9. “O Teu trono, ó Deus, é para todo o sempre… por isso Deus, o Teu Deus Te ungiu…” Neste capítulo, são
usados sete textos do Antigo Testamento para apoiar o argumento de que Cristo é superior aos anjos. O quinto texto,
citado nos versos 8 e 9, é Sal. 45:6 e 7, onde um rei da casa de Davi é mencionado como “Deus”. Seria isto uma hipérbole
poética, como algumas vezes é encontrada em cortes orientais, ou está o texto apontando para outra pessoa além do
Antigo Testamento, príncipe da casa de Davi? Para os poetas e profetas hebreus, um príncipe da casa de Davi era o vice-
regente do Deus de Israel; pertencente à dinastia à qual Deus fizera promessas especiais ligadas ao cumprimento de Seu
propósito no mundo. Ao lado disso, o que era apenas parcialmente verdadeiro na linhagem e no governo histórico de Davi,
ou mesmo em sua pessoa, deveria ser compreendido plenamente quando aparecesse o filho de Davi, no qual todas as
promessas e ideais associados com a dinastia deveriam ser incorporados. Agora, finalmente, o Messias aparecera. Em
sentido pleno, era possível para Davi, ou qualquer dos seus sucessores, que este Messias pudesse ser referido não apenas
como Filho de Deus (v. 5), mas como realmente Deus, pois Ele é o Messias da linhagem de Davi, a refulgente glória de
Deus e a própria imagem de Sua substância.27 Todas essas passagens indicam que Cristo e Yahweh são um.

AUTOCONSCIÊNCIA DE JESUS
Cristo nunca afirmou diretamente Sua divindade, mas dizia ser o Filho de Deus (Mat. 24:36; Luc. 10:22; João 11:4). E, de
acordo com a idéia hebraica de filiação, tudo o que o pai é o filho também é. Os judeus entenderam que assim Ele estava
reivindicando igualdade com o Pai: “Por isso, os judeus ainda mais procuravam matá-Lo, porque não somente violava o
sábado, mas também dizia que Deus era Seu próprio Pai, fazendo-Se igual a Deus” (João 5:18; cf. 10:33).

Repetidas vezes Cristo disse possuir o que só pertence a Deus. “Ele falou dos anjos de Deus (Luc.12: 8 e 9; 15:10) como
Seus anjos (Mat. 13:41). Referiu-Se ao reino de Deus (Mat. 12:28; 19:14 e 24; 21:31 e 34) e aos eleitos de Deus (Mar.
13:20) como Suas propriedades.”28 Em Lucas 5:20 Jesus perdoou os pecados do paralítico, e os judeus, com base em Isaías
43:25, argumentaram: “Quem pode perdoar pecados senão Deus?” Dessa forma, a ação perdoadora de Jesus O
identificava como Deus.

A divindade de Cristo também é indicada no uso que fez do tempo presente em Sua resposta aos judeus: “Antes que
Abraão existisse [genesthai] Eu sou [ego eimi]” (João 8:58). Ao usar o termogenesthai – “nascesse” ou “se tornasse” –
e ego eimi – “Eu sou” –, Jesus contrasta Sua existência eterna com o início histórico da existência de Abraão. Pelo menos
os judeus compreenderam dessa maneira, ou seja, que Jesus reivindicava ser Yahweh, o “Eu sou” da sarça ardente (Êxo.
3:14); por isso, apanharam pedras para matá-Lo (João 8:59).

Finalmente, o fato de que Jesus aceitou adoração evidencia que Ele próprio reconhecia Sua divindade. Depois que Jesus
apareceu aos discípulos andando sobre as águas, “eles O adoraram” (Mat. 14:33). O cego que teve a visão restaurada,
depois de lavar-se no tanque de Siloé, “O adorou” (João 9:38). Após a ressurreição, os discípulos foram para a Galiléia
onde Cristo lhes apareceu. E eles “O adoraram” (Mat. 28:17).

E Ellen White assegura: “Em Cristo há vida original, não emprestada, não derivada. ‘Quem tem o Filho tem a vida.’ I João
5:12. A divindade de Cristo é a certeza de vida eterna para o crente.“29

“Falando de Sua preexistência, Cristo conduz a mente através de séculos incontáveis. Afirma-nos que nunca houve tempo
em que Ele não estivesse em íntima comunhão com o eterno Deus.”30

TEXTOS DIFÍCEIS
Os antitrinitarianos usam alguns textos para apoiar a idéia de que Jesus, em algum tempo na eternidade, foi gerado, isto é,
que Ele teve um começo e que não é absolutamente igual a Deus.

Apocalipse 3:14. Aqui, Jesus, “a Testemunha fiel e verdadeira”, é mencionado como “o princípio da criação de Deus”, o
que leva alguns a interpretarem que Ele foi criado em algum ponto no passado, sendo assim a primeira obra de Deus.

Mas a palavra grega traduzida como “princípio” é arché. Além de “princípio”, ela também significa “causa primeira ou
principal”, “soberano”, “regente”. O próprio Pai também é chamado “princípio”, em Apoc. 21:6.

O mesmo título é novamente aplicado a Cristo em Apoc. 22:13. Embora a palavra arché possa ter um sentido passivo, o
que poderia fazer de Jesus o primeiro ser criado, o sentido ativo do termo O torna a “causa principal” o “criador”. Que
Jesus não é o primeiro ser criado, mas o próprio criador, é o testemunho de outras passagens do Novo Testamento (João
1:3; Col. 1:16; Heb. 1:2).

Provérbios 8:22-31. “Eu nasci…” (v. 24). Argumenta-se que esse verso se refere a Jesus, ensinando que Ele foi nascido ou
criado. Mas o contexto da passagem fala da sabedoria, não sobre Jesus. A personificação da sabedoria é uma figura
literária que ocorre também em outras partes das Escrituras. Em Salmo 85:10-13, temos “misericórdia e verdade”
encontrando-se, “justiça e paz” se beijando. Em Salmo 96:12, “os campos” se alegram, e “todas as árvores dos bosques
regozijarão diante do Senhor”. (Ver também I Crôn. 16:33; Isa. 52:9; Apoc. 20:13 e 14). Esse tipo de alegoria não deve ser
interpretada literalmente. “A personificação é uma figura literária e poética que serve para criar atmosfera e para avivar
idéias abstratas e objetos inanimados, ao representá-los como se  fossem seres humanos.”31

A personificação do divino atributo da sabedoria começa no capítulo 1: “Grita na rua a sabedoria, nas praças levanta a sua
voz” (v. 20). No capítulo 3, é-nos dito que ela “mais preciosa é do que pérolas” e “os seus caminhos são… paz” (vs. 15 e
17). No capítulo 7 ela é chamada “irmã” (7:4); e no capítulo 8, a sabedoria mora junto com a prudência (8:12). Sabedoria
personificada também é o tema de Provérbios 9:1-5. Aplicar tais passagens a Cristo exige um modelo alegórico de
interpretação que nos leva a métodos incompatíveis com outras passagens. Foi justamente esse tipo de hermenêutica que
suscitou a rejeição do método alegórico de interpretação pelos reformadores. É importante notar que nenhum verso
dessa passagem é citado no Novo Testamento.

Provérbios 8:22-31 contém imagens poéticas que necessitam ser bem interpretadas. A primeira frase no verso 22 pode ser
traduzida como “o Senhor me possuiu”, “o Senhor me criou”, ou “o Senhor me gerou”. O significado básico do
verbo qanah é “comprar”, “adquirir” e “possuir”. Mas as outras duas traduções são também possíveis. Além
de qanah, duas outras palavras referem-se à sabedoria nesse texto: nasak = “estabelecer” (v. 23) e chil = “nascer” (vs. 24 e
25). O pensamento básico é sempre o mesmo, isto é, a sabedoria estava com Deus antes do início da criação. Se Deus a
criou, se foi gerada ou simplesmente possuída, não é o foco. O que é central não é o modo de sua origem, mas sua
antiguidade e precedência dentro da criação de Deus. Considerando a linguagem poética e metafórica da passagem, ela
não deve ser usada para estabelecimento de qualquer doutrina sobre uma suposta origem de Cristo.

Ellen White, às vezes, aplicou homileticamente Provérbios 8 a Cristo; mas ela usou o texto para apoiar Sua preexistência
eterna. Antes de usar Provérbios 8, ela disse que “Cristo era, essencialmente e no mais alto sentido, Deus. Estava Ele com
Deus desde toda a eternidade, Deus sobre todos, bendito para todo o sempre”.32

Colossenses 1:15. Cristo é “o primogênito de toda a criação”. Considerando que Ele é chamado primogênito (prototokos),
argumenta-se que deve ter tido um começo. Mas o termo “primogênito”, nesse texto, é um título e não a definição de
uma condição biológica. Segundo 1:16, tudo foi criado por Jesus. Portanto, Ele não poderia criar a Si mesmo.

A palavra “primogênito” tem um significado especial para os hebreus. Em geral, o primogênito era o líder de um grupo de
pessoas ou uma tribo, o sacerdote na família, e o único que recebia a herança duas vezes mais que seus irmãos. Ele tinha
certos privilégios e responsabilidades. Algumas vezes, entretanto, o fato de que alguém fosse o primogênito não
importava aos olhos de Deus. Por exemplo, embora Davi fosse o filho mais novo, Deus o chamou de “Meu primogênito”
(Sal. 89:20 e 27). A segunda linha do paralelismo no verso 27 nos diz que isso significava que Davi devia se tornar o rei mais
exaltado. Vejamos também as experiências de Jacó (Gên. 25:25 e 26; Êxo. 4:22) e Efraim (Gên. 41:50-22; Jer. 31:9). Nesses
casos, “primeiro”, no sentido de tempo, foi desconsiderado. O importante era apenas a distinção e a dignidade de quem
era chamado primogênito. No caso de Jesus, esse termo também se refere à Sua posição exaltada e não a um ponto no
tempo no qual Ele tenha sido criado.

Em Colossenses 1:18, Cristo é chamado “o primogênito de entre os mortos”, embora não o tenha sido cronologicamente.
Sabemos que Moisés e outros O precederam. O sentido é que Ele é o preeminente.

João 1:1-3. “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus.” Alguns dizem que aqui há uma
distinção entre Deus o Pai, que é o Deus, e Jesus, que é apenas um deus. O termo grego para Deus (theos) é encontrado
com artigo (ho), “o Deus”, ou sem artigo, “deus” ou “Deus”. Em João 1:1-3, o Pai é chamado ho theos ao passo que o Filho
é chamado theos. Será que isso justifica a argumentação de que o Pai é Deus Todo-poderoso, enquanto o Filho é apenas
um deus menor?

O termo theos sem artigo freqüentemente também é usado para o Pai, inclusive no mesmo capítulo (João 1:6, 13 e 18;
Luc. 2:14; Atos 5:39; I Tess. 2:5; I João 4:12; II João 9).

Jesus também é chamado o Deus (Heb. 1:8 e 9; João 20:28). Em outras palavras, o uso do termo Deus, com ou sem artigo,
não pode ser argumento para se fazer distinção entre Deus o Pai e Deus o Filho. Deus o Pai é theos e ho theos, assim como
o Filho.

Muitas vezes, a ausência do artigo, no idioma grego, denota qualidade especial. Nesse caso, o substantivo não deveria ser
traduzido com o artigo indefinido “um”.

Se João tivesse usado o artigo definido cada vez em que aparece theos, ele estaria indicando a existência de apenas uma
pessoa divina. Mas João 1:1 diz: “No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus, e o verbo era theos.” Caso tivesse
usado apenas ho theos, deveríamos ler: “No princípio era o Verbo e o Verbo estava com ho theos, e o Verbo era ho theos.”
Segundo João 1:14, o Verbo é Jesus. Portanto, substituindo “Verbo” por “Jesus” temos a sentença “no princípio era Jesus e
Jesus estava com ho theos, e Jesus era ho theos.” Ho theos refere-se claramente ao Pai. O texto modificado seria: “No
princípio era o Verbo e o Verbo estava com o Pai, e o Verbo era o Pai.” Isso é teologicamente errado. Falando de duas
pessoas da Divindade, João não teve escolha senão usar ho theos uma vez e, na seguinte vez, usar theos. A ausência de
artigo no segundo caso não pode ser usada como argumento contra a igualdade entre Pai e Filho.

João 1:14 e 18; 3:16 e 18; I João 4:9. Esses versos falam de Jesus como o Filho unigênito (monogenes) do Pai. Em razão
disso, algumas pessoas sugerem que a palavra grega monogenes indica que Jesus foi gerado literalmente.

A palavra monogenes significa “único de uma espécie”. Seu uso ocorre nove vezes no Novo Testamento. Três vezes em
Lucas (7:12; 8:42; 9:38) sempre se referindo a um único filho. Nos escritos de João, ela aparece cinco vezes (1:14 e 18; 3:16
e 18; I João 4:9), como uma designação do relacionamento de Cristo com o Pai. Em Hebreus 11:17, ela se refere a Isaque
como o filho unigênito de Abraão. Sabemos, entretanto, que Isaque não era o único filho do patriarca. Era o único filho da
promessa. A ênfase aqui não é sobre o nascimento, mas sobre a unicidade do filho.
O termo normalmente traduzido como “gerado” é gennao. Ele aparece em Hebreus 1:5 e pode estar se referindo à
ressurreição ou à encarnação de Cristo. Na versão Septuaginta, a palavra monogenes é a tradução da palavra
hebraica yachid, cujo significado é “único” ou “amado” (cf. Mar. 1:11, em conexão com o batismo de Jesus).

Não é claro se monogenes se refere apenas ao Senhor ressuscitado, histórico, ou também ao Senhor preexistente. Mas é
interessante notar que nem João 1:1-14, nem 8:58 e nem o capítulo 17 usam o termo Filho para o Senhor preexistente.

Mateus 14:33. “És Filho de Deus!”. Esse é um título messiânico (Sal. 2:7; Atos 13:33; Heb. 1:5), que enfatiza a deidade de
Jesus. Embora seja um dos muitos títulos que possuía, Ele o usava muito raramente para referir-Se a Si mesmo (João 11:4).
Na tentativa de compreender quem era Cristo, todos esses títulos necessitam ser investigados para termos um quadro
coerente. Que o título “Filho de Deus” salienta a divindade de Jesus é evidente em João 10:29-36. Isso é apoiado
posteriormente pelo fato de que o Filho é a exata imagem de Deus, sendo igual ao Pai (Col. 1:15; Heb. 1:3; Filip. 2:6)

A palavra “Filho” tem um amplo significado na linguagem original. Portanto, não é possível reduzi-la aos limites de idiomas
modernos, dando-lhe um significado literal. A filiação de Jesus é atestada em conexão com o Seu nascimento (Luc. 1:35),
batismo (Luc. 3:22), transfiguração (Luc. 9:35) e ressurreição (Atos 13:32 e 33). A Bíblia silencia quanto a se esses títulos
descrevem o eterno relacionamento entre Pai e Filho. Em qualquer caso, as Escrituras atribuem existência eterna a Jesus
(Isa. 9:6; Apoc. 1:17 e 18). Durante a encarnação, Jesus subordinou-Se voluntariamente ao Pai, sendo o Filho de Deus. Isso
incluiu a entrega de prerrogativas, mas não a natureza da deidade. O Senhor ressuscitado, ao ser entronizado como Rei e
Sacerdote, também aceitou voluntariamente a prioridade do Pai, mas Ele e o Pai são, conforme a Escritura, personalidades
iguais e coeternas da Divindade.

O ESPÍRITO SANTO
Que o Espírito Santo é uma pessoa divina, igual em substância, poder e glória com o Pai e o Filho, podemos observar nas
Escrituras.

É um Ser pessoal. Alguns crêem que o Espírito Santo é um “poder” ou uma “energia” de Deus. Mas há muitos versos onde
o Ele é mencionado junto com o Pai e o Filho (Mat. 28:19; I Cor. 12:4-6; II Cor. 13:14). Isso indica que o Pai e o Filho são
pessoas; portanto, o Espírito Santo deve também ser uma pessoa. Freqüentemente, o pronome masculino “Ele” é usado
em referência ao Espírito Santo (João 14:26; 15:26; 16:13 e 14), embora a palavra grega para Espírito (pneuma) seja neutra
e não masculina. A palavra “consolador” ou “confortador” (parakletos) refere-se a uma pessoa, não a uma força.

O Espírito Santo fala (Atos 8:29), ensina (João 14:26), dá testemunho (João 15:26), intercede por outros (Rom. 8:26 e 27),
distribui dons (I Cor. 12:11) e proíbe ou permite certas coisas (Atos 16:6 e 7). De acordo com Efés. 4:30, o Espírito Santo
pode também ser entristecido. Essas atividades são características de uma pessoa, não de uma força.

É Deus. As Escrituras vêem o Espírito Santo como Deus. Desde a eternidade de Deus o Espírito Santo participa da
Divindade como Seu terceiro componente. Em Mat. 28:19, os discípulos foram ordenados a batizar “em nome do Pai, do
Filho e do Espírito Santo”. Esse verso coloca o Espírito Santo em igualdade com o Pai e o Filho. Ao repreender Ananias,
Pedro lhe disse que mentindo ao Espírito Santo, ele tinha mentido “não a homens mas a Deus” (Atos 5:3 e 4).

“O Espírito Santo é onipotente. Ele distribui dons espirituais ‘como Lhe apraz, a cada um individualmente’ (I Cor. 12:11).
Ele é onipresente; habitará com Seu povo para sempre (João 14:16). Ninguém pode fugir à Sua influência (Sal. 139:7-10).
Ele também é onisciente, porque ‘a todas as coisas perscruta, até mesmo as profundezas de Deus’ e ‘as coisas de Deus
ninguém conhece, senão o Espírito de Deus’ (I Cor. 2:10 e 11).”33

Ellen White acreditava na personalidade do Espírito Santo: “Precisamos reconhecer que o Espírito Santo, que é tanto uma
pessoa como o próprio Deus, está andando por esses terrenos.”34

Vimos então que a Divindade existe em uma pluralidade; que Jesus é Deus, coexistente desde a eternidade com o Pai, e
que o Espírito Santo é a terceira pessoa da Divindade. Há muitos outros detalhes sobre o tema, os quais somente no Céu
entenderemos plenamente.

Textos difíceis da Bíblia são melhor compreendidos em harmonia com o restante da Escritura. Embora o mistério da
Trindade nunca possa ser completamente entendido pelo homem finito, é uma doutrina bíblica, apoiada por escritos de
Ellen White e é uma das 27 crenças fundamentais da Igreja.

 Fonte: Revista Ministério – março/abril de 2005, pp. 15-22


PDF: A Trindade na BíbliaX

Referências:

1. Fred Allaback, No Leaders … No New Gods (Creal Spring, Ill, 1966), pág. 11.

2. Ibidem, pág. 15.

3. Ibidem, pág. 30.

4. Bill Stringfellow, Tue Red Flag Is Waving (Spencer, TN: Concerned Publications, s/d).

5. Rachel Cory-Kuehl, The Persons of God (Aggelia Publications, 1966).

6. Allen Stump, The Foundation of Our Faith (Smyma Gospel Ministry, s/d).

7. Bill Stringfellow, Op. Cit., pág. 15.

8. W. Grudem, Systematic Theology (Zondervan, 1994), pág. 226.

9. Ellen G. White, Evangelismo, pág. 615.

10. ___________, Testimonies For the Church, vol. 8, pág. 295.

11. Louis Berkhof, Systematic Theology (Eerdmans, 1941), pág. 88.

12. Ibidem, pág. 89.

13. Escreveu Ellen White: “Há muitos mistérios que não busco compreender nem explicar; eles são muito elevados para
mim e para vocês. Em alguns desses pontos, o silêncio é ouro” (Manuscrito 14,pág. 179).

14. G. A. F. Knight, A Biblical Approach to the Doctrine of the Trinity (Edimburgo, 1953), pág. 20.

15. Ibidem.

16. Millard J. Erickson, Christian Theology (Baker, 1983), vol. 1, pág. 329.

17. G. Ch. Aalders, Genesis (Zondervan, 1981), pág. 300.

18. Millard J. Erickson, Op. Cit., pág. 338.

19. Alguns comentaristas acreditam que atrás desta fórmula está a linguagem utilizada para transferência de dinheiro, na
era helenista. Desse modo, a fórmula expressa figuradamente que a pessoa batizada é “transferida” para a conta do
Senhor e se torna Sua possessão. Outros interpretam “nome” como “autoridade”. Nesse caso, a pessoa é batizada pela
autoridade do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

20. W. Grudem, Op. Cit., pág. 320.

21. Arthur W. Pink, Exposition of the Gospel of John (Zondervan, 1945), pág. 22.

22. W. Poehlmann, Exegetical Dictionary of the New Testament (Eerdmans, 1981), vol. 2, pág. 443.

23. F. F. Bruce, Philippians, Hendrickson, 1989), pág. 69.

24. Leon Morris, The Lord from Heaven: A Study of the New Testament Teaching in the Deity and Humanity of
Jesus (Eerdmans, 1958), pág. 74.

25. Alguns comentaristas definem pleroma em termos do pensamento gnóstico, segundo o qual essa palavra significa uma
nova emanação que se tem encarnado no Redentor.
26. John Eadie, Colossians, Classic Commentary Library (Zondervan, 1957), pág. 145.

27. F. F. Bruce, Hebrews (Eerdmans, 1964), págs. 19 e 20.

28. Millard J. Erickson, Op. Cit., pág. 326.

29. Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, pág. 530.

30. ___________, Evangelismo, pág. 615.

31. Kenneth T. Aitken, Proverbs (Westminster Press, 1986), pág. 85.

32. Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, vol. 1, pág. 247.

33. Seventh-day Adventists Believe (Hagerstown, 1988), pág. 60.

34. Ellen G. White, Evangelismo, pág. 616.

A Trindade nas Escrituras


Gerhard Pfandl, Ph.D.
Diretor associado do Biblical Research Institute
da Associação Geral da IASD, Silver Spring, Maryland, EUA
Resumo: O presente artigo provê uma investigação das evidências bíblicas que apóiam a doutrina da Trindade. Várias
referências, tanto do Antigo quanto do Novo Testamento, são consideradas em seus respectivos contextos linguísticos
hebraicos e/ou gregos. O autor aponta, ainda, os erros mais comuns na interpretação de alguns desses textos.

Introdução
Embora a palavra Trindade (do lat. trinitas, “tri-unidade” ou “tri-unicidade”) não se encontre na Bíblia (tampouco a
palavra “encarnação”), o ensinamento que ela descreve está claramente contido nas Escrituras. 1 Brevemente definida, a
doutrina da Trindade compreende o conceito de que “Deus existe eternamente como três pessoas: Pai, Filho e Espírito
Santo; cada pessoa é plenamente Deus; e há um só Deus.”2
O próprio Deus é um mistério – quanto mais a encarnação ou a Trindade! Contudo, embora não sejamos capazes de
compreender logicamente os vários aspectos da Trindade, precisamos tentar entender o melhor possível o ensino
escriturístico a ela concernente. Todas as tentativas para explicar a Trindade não atingirão o seu objetivo, “especialmente
quando refletimos sobre a relação das três pessoas com a divina essência [...] todas as analogias falham e nos tornamos
plenamente cônscios do fato de que a Trindade é um mistério muito além do nosso entendimento. É a incompreensível
glória da Divindade.”3 Portanto, procedemos melhor em admitir que “o homem não pode compreendê-la e torná-la
inteligível. É inteligível em algumas de suas relações e modos de manifestações, mas ininteligível em sua natureza
essencial.”4
Precisamos conscientizar-nos de que podemos atingir apenas uma compreensão parcial do que é a Trindade. Ao
ouvirmos a Palavra de Deus, certos elementos da Trindade se tornarão claros, enquanto outros permanecerão um
mistério. “As coisas encobertas pertencem ao SENHOR, nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem, a nós e a nossos
filhos, para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei” (Dt 29:29).

A Trindade no Antigo Testamento


Várias passagens do Antigo Testamento sugerem ou mesmo implicam que Deus existe em mais do que uma pessoa,
não necessariamente em uma Trindade, mas ao menos em uma relação binária.

GÊNESIS 1
No relato da Criação em Gênesis 1, a palavra hebraica para Deus é ‘Elohim, a forma plural de‘Eloha. Geralmente, este
plural tem sido interpretado como um plural majestático, em vez de uma pluralidade. Todavia, G. A. F. Knight tem
argumentado corretamente que tomar esta forma como um plural majestático é ler no antigo texto hebraico um conceito
moderno, desconsiderando que os reis de Israel e de Judá são todos tratados no singular no texto bíblico.5 Além disso,
Knight ressalta que as palavras hebraicas para “água” e “céu” são ambas plurais. Os gramáticos têm denominado este
fenômeno de plural quantitativo. A água pode aparecer em forma de pequenas gotas ou grandes oceanos. Esta
diversidade quantitativa em unidade, diz Knight, é uma maneira adequada de compreender o plural ‘Elohim. Também
explica por que o substantivo singular ‘Adonai é escrito como um plural.6
Lemos em Gênesis 1:26: “Também disse [singular] Deus: Façamos [plural] o homem à nossa [plural] imagem, conforme
a nossa [plural] semelhança.” Moisés não está usando um verbo plural com ‘Elohim, mas Deus, em sua fala, usa um verbo
plural e pronomes plurais com referência a Si mesmo. Alguns intérpretes crêem que Deus aqui está falando aos anjos. No
entanto, segundo as Escrituras, os anjos não participaram da Criação. A melhor explicação, portanto, é a de que já no
primeiro capítulo de Gênesis há uma indicação de uma pluralidade de pessoas na própria Divindade.
GÊNESIS 2:24
De acordo com Gênesis 2:24, o homem e a mulher devem tornar-se “uma só [heb. ‘echad] carne”, uma união de duas
pessoas distintas, individuais. Em Deuteronômio 6:4, a mesma palavra é empregada para Deus: “Ouve, Israel, o SENHOR,
nosso Deus, é o único [‘echad] SENHOR.” Diz Millard J. Erickson: “Parece que aqui algo está sendo afirmado acerca da
natureza de Deus – Ele é um organismo, isto é, uma unidade de partes distintas.”7 Moisés poderia ter usado a
palavra yachid (somente um, singular) em Deuteronômio 6:4, mas o Espírito Santo preferiu que assim não fosse.

Outros Textos que Expressam uma Pluralidade


Disse Deus após a queda do homem: “Eis que o homem se tornou como um de nós” (Gn 3:22). E, algum tempo depois,
quando os homens começaram a construir a torre de Babel, disse o SENHOR: “Desçamos e confundamos ali a sua
linguagem” (Gn 11:7). Vez após outra a pluralidade da Divindade é enfatizada.

Em sua famosa visão do trono divino, Isaías ouve o SENHOR indagando: “A quem enviarei, e quem há de ir por nós?”
(Is 6:8). Aqui vemos Deus utilizando o singular e o plural na mesma sentença. Muitos eruditos modernos tomam isto como
uma referência ao concílio celestial. Mas Deus alguma vez convocou Suas criaturas para conselho? Em Isaías 40:13 e 14 Ele
parece refutar esta mesma noção. Ele não precisa aconselhar-Se com Suas criaturas, nem mesmo com os seres celestiais.
Portanto, este plural, embora não prove a Trindade, sugere que há uma pluralidade de seres nAquele que fala.

O Anjo do Senhor
A expressão “Anjo do SENHOR” aparece cinqüenta e oito vezes no Antigo Testamento, e “o anjo de Deus”, onze vezes.
A palavra hebraica mal’ak (anjo) significa simplesmente “mensageiro”. Portanto, se o “Anjo do SENHOR” é um mensageiro
do SENHOR, ele deve ser distinto do próprio SENHOR. No entanto, em vários textos o “Anjo do Senhor” é também
chamado “Deus” ou “SENHOR” (Gn 16:7-13; Nm 22:31-38; Jz 2:1-4; 6:22). Os Pais da Igreja O identificavam com o Logos
pré-encarnado. Eruditos modernos O têm visto como um ser que representa a Deus, como o próprio Deus, ou alguma
força externa de Deus. Eruditos conservadores geralmente concordam que “esse ‘mensageiro’ deve ser visto como uma
manifestação especial da existência ou essência do próprio Deus.” 8 Se isto está correto, temos aqui outro indicador da
pluralidade de pessoas na Divindade.

A Trindade no Novo Testamento


Nas Escrituras a verdade é progressiva. Quando chegamos, portanto, ao Novo Testamento, encontramos um quadro
mais explícito da natureza trinitária de Deus. O próprio fato de se dizer de Deus que Ele é amor (1Jo 4:8) implica em que
deve existir uma pluralidade dentro da Divindade, uma vez que o amor só pode existir em uma relação entre seres
diferentes.

No Evangelho de Mateus
(a) No batismo de Jesus encontramos os três membros da Divindade em atividade ao mesmo tempo:

Batizado Jesus, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba,
vindo sobre ele. E eis uma voz dos céus, que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo. (Mt 3:16-17)
O relato do batismo de Jesus é uma notável manifestação da doutrina da Trindade – ali estava Cristo em forma
humana, visível a todos; o Espírito Santo descendo sobre Cristo em forma corpórea, como uma pomba; e a voz do Pai falou
do céu: “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo.” Em João 10:30, Cristo reclama igualdade com o Pai, e, em
Atos 5:3, o Espírito Santo é identificado como Deus. Portanto, é difícil, se não impossível, explicar a cena do batismo de
Cristo de qualquer outra forma a não ser admitir que há três pessoas na natureza ou essência divina.

No batismo de Jesus, o Pai O chamou de “meu Filho amado”. A filiação de Jesus, porém, não é ontológica, mas
funcional. No plano da salvação, cada membro da Trindade aceitou uma função específica. É uma função com a finalidade
de atingir um objetivo específico, não uma mudança de essência ou condição. Millard J. Erickson explica isto deste modo:

O Filho não Se tornou menos do que o Pai durante Sua encarnação terrestre, mas subordinou-Se funcionalmente à
vontade do Pai. Igualmente, o Espírito Santo está agora subordinado ao ministério do Filho (veja João 14-16), bem como à
vontade do Pai, mas isto não implica em que Ele é menos do que são Eles.9  Os termos “Pai” e “Filho”, no pensamento
ocidental, trazem consigo as ideias de origem, dependência e subordinação. Na mentalidade semítica ou oriental, porém,
eles enfatizam igualdade ou identidade de natureza. Desse modo, quando as Escrituras falam do “Filho” de Deus, elas
afirmam Sua divindade.
No final do Seu ministério, Jesus disse aos Seus discípulos que eles deveriam ir e fazer “discípulos de todas as nações,
batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 28:19). Neste, que é o rito introdutório de cada crente
na religião cristã, a doutrina da Trindade é claramente ensinada. Primeiro, notamos que “em nome” (gr. eis to onoma) é
singular, não plural (“nos nomes”). Ser batizado em nome das três pessoas da Trindade significa identificar-se a si próprio
com tudo o que a Trindade representa; confiar-se ou entregar-se ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo.10 Segundo, a união
destes três nomes indica que o Filho e o Espírito Santo são iguais ao Pai. Seria um tanto estranho, para não dizer blasfemo,
unir o nome do Deus eterno a um ser criado (quer tenha sido criado na eternidade ou em algum momento do tempo), e a
uma força ou poder impessoal nesta fórmula batismal.
Quando o Espírito Santo é posto na mesma expressão e no mesmo nível que as outras duas pessoas, é difícil evitar a
conclusão de que o Espírito Santo é também visto como uma pessoa e de igual posição que o Pai e o Filho.11

Nos Escritos de Paulo


Paulo e os demais escritores do Novo Testamento geralmente usam a palavra “Deus” ao se referirem ao Pai, “Senhor”
quando se referem ao Filho, e “Espírito” referindo-se ao Espírito Santo. Em 1 Coríntios 12:4-6, Paulo se refere aos três no
mesmo texto:

Ora, os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo. E também há diversidade nos serviços, mas oSenhor é o mesmo.
E há diversidade de realizações, mas o mesmo Deus é quem opera tudo em todos.
Semelhantemente, em 2 Coríntios 13:13, ele enumera as três pessoas da Trindade:

A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós.
Conquanto não possamos dizer que estes textos sejam uma enunciação formal da Trindade, estas passagens e outras
semelhantes (p. ex., Efésios 4:4-6) são de caráter distintamente trinitariano. Foi a Igreja em tempos posteriores quem
elaborou os detalhes da Trindade, mas eles construíram sobre os fundamentos dos escritores bíblicos.

A divindade de Cristo
Um elemento decisivo na doutrina da Trindade é a divindade de Cristo. Sendo que a doutrina da Trindade ensina que
há um Deus em três pessoas, e que cada uma dessas pessoas é plenamente Deus, torna-se importante verificar o que as
Escrituras ensinam acerca da divindade de Cristo.

A divindade de Cristo no Novo Testamento


Há várias passagens no Novo Testamento que afirmam claramente a plena divindade de Cristo:

JOÃO 1:1-3, 14
“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus.” A frase introdutória “no princípio” (sem o
artigo) nos leva de volta ao início do tempo. Se o Verbo era “no princípio”, então Ele mesmo era sem princípio, que é outra
maneira de dizer que Ele era eterno.

“O Verbo estava com Deus” nos diz que o Verbo é uma pessoa ou personalidade distinta. O Verbo não estava “em”
(gr. en) Deus, mas “com” (pros) Deus.
“E o Verbo era Deus”, ou, mais lieteralmente: “e Deus era o Verbo.” O Verbo não era uma emanação de Deus, mas o
próprio Deus. Conquanto o verso 1 não nos diga quem é o Verbo, o verso 14 claramente O identifica com Cristo. “Uma
afirmação mais enfática e inequívoca da absoluta Divindade do Senhor Jesus Cristo é impossível de conceber.”12
JOÃO 20:28
“Respondeu-lhe Tomé: Senhor meu e Deus meu!” Esta é a única ocasião nos Evangelhos em que alguém diz a Cristo
“Deus meu” (ho Theós mou). Quando Tomé viu o Cristo ressurreto, o duvidoso foi transformado num adorador. É
significativo que nem Cristo, na ocasião em que isto ocorreu, nem João ao escrever o Evangelho, tenham desaprovado o
que Tomé disse. Ao contrário, tanto quanto se referia a João, esse episódio constituiu um ponto importante em sua
narração, pois ele imediatamente diz ao leitor:
Na verdade, fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro. Estes, porém, foram
registados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome. (20:30, 31)

O que João está dizendo, portanto, é que “este livro foi escrito para persuadir as pessoas a imitarem Tomé, que
chamou Jesus de ‘Senhor meu e Deus meu’”.

FILIPENSES 2:5-7
Apesar de esta passagem ter sido escrita para ilustrar a humildade, ela é um dos textos fundamentais do Novo
Testamento para apoiar a divindade de Cristo. “Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus,
pois ele, subsistindo em forma [gr. morfê] de Deus, não julgou como usurpação [harpagmós] o ser igual a Deus; antes, a si
mesmo se esvaziou, assumindo a forma [morfê] de servo, tornando-se em semelhança de homens.”
Morfê (“forma” ou “aparência visível”) descreve a natureza genuína de uma coisa, sua essência. “Não se refere a
qualquer forma mutável, mas à forma específica da qual dependem identidade e condição.” 13 Morfê contrasta
com skéma (2:7), que também significa “forma”, mas no sentido de aparência superficial em vez de essência. O
substantivo harpagmós aparece somente neste texto do Novo Testamento; o verbo correspondente significa “roubar,
tomar à força”. No grego secular o substantivo significa “roubo”. Todavia, o contexto esclarece que Jesus não cobiçou, ou
não tentou roubar a “igualdade com Deus”. Ao contrário, Ele não tentou apegar-Se à igualdade com Deus que Ele possuía
de modo intrínseco. Em outras palavras, Ele não tentou reter pela força Sua igualdade com Deus, mas “tratou-a como uma
ocasião para renunciar a cada vantagem ou privilégio que desse modo Lhe pudesse ter vindo, como uma oportunidade
para auto-empobrecimento e sacrifício de Si mesmo sem reservas.” 14 Este é o significado de “a si mesmo se esvaziou”. Sua
igualdade com Deus era algo que Ele possuía de maneira intrínseca; e alguém que é igual a Deus deve ser Deus. Por
conseguinte, Filipenses 2:5-7 “é uma passagem que exige para sua compreensão a ideia de que Jesus era divino no mais
pleno sentido.”15
COLOSSENSES 2:9
“Porquanto, nele habita, corporalmente [gr. somatikôs], toda a plenitude [pleroma] da Divindade.” A
palavra pleroma tem o significado básico de “plenitude, cumprimento”. No Antigo Testamento, ela se refere
repetidamente à terra e “toda a sua plenitude” (Sl 24:1; cf. 50:12; 89:11; 96:11; 98:7), que é citada em 1 Coríntios 1:26, 28.
No grego secular, pleroma se referia ao pleno complemento da tripulação de um navio ou à quantidade necessária para
completar uma transação financeira. Em Colossenses 1:19 e 2:9, Paulo usa a palavra para descrever a soma total de cada
função da divindade.16 Essa plenitude habita em Cristo “corporalmente”; isto é, mesmo durante Sua encarnação, Cristo
reteve todos os atributos essenciais da divindade, embora não os utilizasse em Seu próprio proveito. A plenitude da
Divindade: fez sua habitação em Sua humanidade sem consumi-la ou deificá-la, ou mudar quaisquer de suas propriedades
essenciais… Via-se facilmente que a Divindade habitava naquela humanidade (ou natureza humana), pois lampejos de Sua
glória brilhavam freqüentemente através de sua cobertura terrestre.17
TITO 2:13
Paulo descreve os santos como “aguardando a bendita esperança e o glorioso aparecimento do nosso grande Deus e
Salvador Jesus Cristo” (NKJV [New King James Version]). A KJV traduz esta passagem como “o glorioso aparecimento do
grande Deus e nosso Salvador Jesus Cristo”, apresentando os santos à espera do Pai e do Filho. Conquanto esta tradução
seja possível, a NKJV deve ser preferida pelas seguintes razões: (1) Os dois substantivos “Deus” e “Salvador” estão ligados
por um só artigo, indicando que, por via de regra, os dois substantivos são duas designações para um único objeto. (2)
Todo o Novo Testamento aguarda a segunda vinda de Cristo. (3) O contexto do verso 14 fala somente de Cristo. (4) Esta
interpretação está em harmonia com outras passagens tais como João 20:28; Romanos 9:5; Hebreus 1:8; 2 Pedro 1:1. O
texto de Tito 2:13 é, portanto, é uma asserção explícita à divindade de Cristo.

O testemunho da divindade de Cristo no Antigo Testamento


Não somente é Jesus chamado Deus no Novo Testamento, mas Ele é também chamado Senhor e Deus em citações do
Antigo Testamento onde a palavra hebraica é Yahweh ou Elohim.
MATEUS 3:3
“Voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor.” Segundo o verso 1, este texto de Isaías se refere a João
Batista, que foi o precursor de Jesus. Em Isaías 40:3, a palavra para Senhor éYahweh. Portanto, “o Senhor” cujo caminho
João devia preparar não era nenhum outro senão o próprio Yahweh.
ROMANOS 10:13
“Porque: Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.” O contexto (vs. 6-12) deixa claro que Paulo está
pensando em Cristo quando se refere ao “nome do SENHOR”. O texto é uma citação de Joel 2:32 onde a palavra para
SENHOR no hebraico é, outra vez, Yahweh.
ROMANOS 14:10
Neste texto, Paulo relembra a seus leitores que “todos havemos de comparecer ante o tribunal de Cristo” (Versão
Almeida Revista e Corrigida). Ele, então, adiciona uma citação de Isaías 45:23 que diz: “Pela minha vida, diz o Senhor, todo
joelho se dobrará diante de mim, e toda língua confessará a Deus.” Em Isaías o que fala é Yahweh; no livro de Romanos, o
mesmo texto é aplicado a Cristo.
HEBREUS 1:8, 9
“O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre… Deus, o teu Deus te ungiu.” Neste capítulo, sete textos do Antigo
Testamento são usados para apoiar o argumento de que Cristo é superior aos anjos. O quinto texto, citado nos versos 8 e
9, vem do Salmo 45:6, 7, no qual um rei da casa de Davi é tratado como “Deus”. Trata-se de uma hipérbole poética – como
é, às vezes, encontrada em cortes orientais – ou está esse texto apontando para uma outra pessoa além do príncipe do
Antigo Testamento da casa de Davi?

Para os poetas e profetas hebreus, um príncipe da casa de Davi era o vice-regente do Deus de Israel; ele pertencia a
uma dinastia à qual Deus havia feito promessas especiais ligadas à realização de Seu propósito no mundo. Além disso, o
que era apenas parcialmente verdade de qualquer um dos governantes históricos da linhagem de Davi, ou mesmo do
próprio Davi, seria realizado em sua plenitude quando aparecesse o Filho de Davi em quem todas as promessas e ideais
associados com a dinastia seriam incorporados. E agora, finalmente, o Messias havia surgido. Em um sentido mais amplo
do que era possível para Davi ou qualquer dos seus sucessores nos dias antigos, esse Messias pode ser tratado não
meramente como Filho de Deus (verso 5) mas realmente como Deus, pois Ele é o Messias da linhagem de Davi e também o
resplendor da glória de Deus e a própria imagem de Sua substância.18
Todas estas passagens indicam que Cristo, Deus e Yahweh são um.

Jesus e a sua consciência de Si mesmo


Jesus nunca afirmou diretamente Sua divindade; todavia, Seu ensino estava permeado de conceitos trinitarianos. De
acordo com a idéia hebraica de filiação (ou seja, tudo que o pai é, o filho é também), Jesus afirmou ser o Filho de Deus (Mt
9:27; 24:36; Lc 10:22; Jo 9:35-37; 11:4). Os judeus entenderam que pela reivindicação de ser o Filho de Deus Ele estava
reivindicando igualdade com Deus: “Por isso, pois, os judeus ainda mais procuravam matá-lo, porque não somente violava
o sábado, mas também dizia que Deus era seu próprio Pai, fazendo-se igual a Deus” (Jo 5:18; cf. 10:33). Repetidamente,
Jesus afirmou possuir o que propriamente só pertence a Deus. “Ele falou dos anjos de Deus (Lc 12:8-9; 15:10) como Seus
anjos (Mt 13:41). Ele considerava o reino de Deus (Mt 12:28; 19:14, 24; 21:31, 34) e os eleitos de Deus (Mc 13:20) como
Sua propriedade.”19 Em Lucas 5:20, Jesus perdoou os pecados ao paralítico, e os judeus, baseados em Isaías 43:25, argüiram
corretamente: “Quem pode perdoar pecados, senão Deus?” Destarte, estava implícita na ação de Jesus de perdoar a
pretensão de ser Deus.
A divindade de Cristo é também indicada pelo Seu uso do tempo presente em Sua resposta aos judeus: “Antes que
Abraão existisse [genesthai], EU SOU [ego eimi]” (Jo 8:58). Usando os termosgenesthai (“nasceu” ou “se tornou”) e ego
eimi (EU SOU), Jesus contrasta Sua existência eterna com o início histórico da existência de Abraão. É a eternidade do ser,
e não simplesmente a preexistência antes de Abraão, que é expressa aqui. Ao menos os judeus entenderam isto desse
modo; perceberam que Jesus reivindicava ser Yahweh, o EU SOU da sarça ardente (Êx 3:14), e pegaram em pedras para
matá-Lo (8:59).
Finalmente, o fato de que Jesus aceitava a adoração de outros é evidência de que Ele mesmo reconhecia Sua
divindade. Após Jesus ter vindo aos discípulos andando sobre a água, eles “o adoraram” (Mt 14:33). O cego cuja vista foi
restaurada depois de lavar-se no tanque de Siloé “o adorou” (Jo 9:38). Depois da ressurreição, os discípulos foram para a
Galiléia, onde Jesus lhes apareceu e eles “o adoraram” (Mt 28:17).

Reiteradamente Jesus aceitou a adoração como algo perfeitamente correto. Ele, desse modo, demonstrou direta
pretensão à divindade.

Textos difíceis 20
Os antitrinitarianos usam vários textos bíblicos para apoiar sua alegação de que Jesus foi “gerado” em algum tempo da
eternidade (quer dizer, Ele teve um princípio e, portanto, não é absolutamente igual a Deus).

APOCALIPSE 3:14
“Jesus, o princípio da criação de Deus.” Alega-se que Jesus foi criado em algum momento no passado, que Ele foi a
primeira obra de Deus.

Resposta:

(a) A palavra grega arquê pode ser traduzida por “princípio”, “ponto de origem”, “primeira causa” ou “governante”. O
próprio Pai é chamado “princípio” em Apocalipse 21:6.
(b) O mesmo título é usado para Jesus em Apocalipse 22:13. Conquanto a palavra arquê possa ter um sentido passivo,
que faria de Jesus o primeiro ser criado, o sentido ativo da palavra torna-O a primeira causa (ou causa primária), agente
motor, ou o Criador. Que Jesus não é o primeiro ser criado, mas o próprio Criador, é o testemunho de outros textos do
Novo Testamento (veja Jo 1:3; Cl 1:16; Hb 1:2).
PROVÉRBIOS 8:22-31
“Eu fui gerada.” Afirma-se que esta passagem, se refere a Jesus e ensina que Jesus nasceu ou foi criado.

Resposta:

(a) O contexto fala acerca da “sabedoria”, não de Jesus. A personificação da sabedoria é um artifício literário que
ocorre também noutras partes das Escrituras. No Salmo 85:10-13 temos “misericórdia e verdade” se encontrando, “justiça
e paz” se beijando, e a “verdade” brotando da terra. No Salmo 96:12, “o campo” está alegre, e “todas as árvores do
bosque” se regozijam “na presença do Senhor.” (Veja também 1 Cr 16:33; Is 52:9; Ap 20:13-14). Esta espécie de linguagem
não deve ser interpretada literalmente. “A personificação é um artifício literário e poético que serve para criar atmosfera,
e para avivar idéias abstratas e objetos inanimados, representando-os como se fossem seres humanos.”21
(b) A personificação do divino atributo da sabedoria como uma mulher inicia-se no capítulo 1. “Grita na rua a
Sabedoria, nas praças levanta a voz” (1:20). No capítulo 3 nos é dito: “Mais preciosa é do que pérolas” e “todas as suas
veredas” são “paz” (3:15, 17). No capítulo 7, ela é chamada de “irmã” (7:4), e, no capítulo 8, a sabedoria habita com a
prudência, outra persofinicação (8:12). A sabedoria personificada é também o assunto de Provérbios 9:1-5. A aplicação
destas passagens a Jesus requer um método alegórico de interpretação bíblica que conduz a pontos de vista incompatíveis
com outras passagens. Foi esta espécie de hermenêutica que levou os Reformadores a rejeitar o método alegórico de
interpretação. Também deve-se notar que nenhum verso desta passagem é citado no Novo Testamento.

(c) Provérbios 8:22-31 contém imagem poética que precisa ser cuidadosamente interpretada. A primeira frase do verso
22 pode ser traduzida por: “O SENHOR me possuía” (KJV, NIV); “O SENHOR me criou” (RSV, NEB); ou “O SENHOR me
gerou” (NAB). O significado básico do verbo qanah é “comprar, adquirir”, donde vem “possuir”; mas as duas outras
traduções são possíveis. Ao lado deqanah, duas outras palavras se referem à origem da sabedoria: nasak (“estabelecer”;
8:23), e chil(“nascer”; 8:24, 25). O pensamento básico desta passagem é sempre o mesmo: a sabedoria estava com Deus
antes do início da Criação. Quer Deus a tenha criado ou quer ela tenha sido gerada ou simplesmente possuída, não é o
ponto focal. O que é fundamental não é a maneira de sua origem, mas, antes, sua antigüidade e precedência dentro da
Criação de Deus. Sendo que a linguagem é poética e metafórica, não deve ser usada para estabelecer coisa alguma
concernente à suposta origem de Cristo.
Ellen White às vezes aplicou Provérbios 8 homileticamente a Cristo, mas ela usou o texto para sugerir Sua
preexistência eterna. Antes de citar Provérbios 8 ela diz: “Cristo era, essencialmente e no mais alto sentido, Deus. Estava
Ele com Deus desde toda a eternidade, Deus sobre todos, bendito para todo o sempre.”22
COLOSSENSES 1:15
“Jesus, o primogênito.” Sendo que Jesus é chamado o “primogênito” (prototokos), argumenta-se que Ele deve ter tido
um princípio.
Resposta:

(a) A expressão prototokos (“primogênito”) neste texto é um título, não uma definição de Sua condição biológica. De
acordo com 1:16, tudo foi criado por Jesus. Portanto, Ele não pode ter criado a Si mesmo.
(b) O termo “primogênito” tinha um significado especial para os hebreus. Em geral, o primogênito era o líder de um
grupo de pessoas ou de uma tribo, o sacerdote da família, e o que recebia duas vezes mais da herança do que seus irmãos.
Ele tinha certos privilégios bem como responsabilidades. Às vezes, porém, o fato de que alguém era o primogênito não
importava aos olhos de Deus. Por exemplo, embora Davi fosse o filho mais novo, Deus o chamou de “meu primogênito” (Sl
89:20, 27). A segunda linha do paralelismo no verso 27, nos diz que isto significava que ele deveria se tornar o rei mais
exaltado. Veja também a experiência de Jacó (Gn 25:25-26 e Êx 4:22) e Efraim (Gn 41-50-52 e Jr 31:9). Nestes casos, o
elemento tempo “primeiro” foi apagado. Era importante apenas a posição especial e a dignidade da pessoa chamada o
“primogênito”. No caso de Jesus, este termo também se refere à Sua exaltada posição e não a um momento do tempo no
qual Ele nasceu. Em Colossenses 1:18, Cristo é chamado “o primogênito de entre os mortos.” Embora Ele não fosse
cronologicamente o primeiro (Moisés e outros O haviam precedido), Ele é o preeminente.

(4) João 1:1-3

“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus.” Alega-se que há uma distinção entre Deus
o Pai, que é o Deus, e Jesus, que é apenas um deus. O termo grego para Deus (theós) é encontrado com o artigo ‘o (ho), “o
Deus”, ou sem o artigo, “um deus” ou “Deus”. Em João 1:1-3 o Pai é chamado ho theós, ao passo que o Filho é
chamado theós. Justifica isto a alegação de que o Pai é o Deus Todo-poderoso, enquanto que o Filho é apenas um deus?
Resposta:

(a) O termo theós sem o artigo é freqüentemente usado também para o Pai, até no mesmo capítulo (veja Jo 1:6, 13,
18; Lc 2:14; At 5:39; 1Ts 2:5; 1Jo 4:12 e 2Jo 9). Jesus é também “o Deus” (Hb 1:8-9; Jo 20:28). Em outras palavras, o uso do
termo Deus – com ou sem o artigo – não pode ser usado para fazer uma distinção entre Deus o Pai e Deus o Filho. Deus o
Pai é theós e ho theós, e assim também é o Filho.
Muitas vezes, a ausência do artigo em grego denota qualidade especial e não deve ser traduzido com o artigo
indefinido “um”.

(b) Se João tivesse usado o artigo definido cada vez que ocorre theós, ele estaria afirmando que há apenas uma pessoa
divina. O Pai seria o Filho. Diz João 1:1: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com ho theós, e o Verbo era théos. Se
João tivesse usado apenas ho theós, ele estaria dizendo: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com ho theós, e o
Verbo era ho theós. De acordo com João 1:14, o Verbo é Jesus. Portanto, substituindo “Verbo” por “Jesus” obtemos a
sentença: “No princípio era Jesus, e Jesus estava com ho theós, e Jesus era ho theós.” Ho theós se refere claramente ao
Pai. O texto modificado diria: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com o Pai, e o Verbo era o Pai.” Isso está
teologicamente errado. Falando acerca das duas pessoas da Divindade, João não tinha outra escolha senão usar uma
vez ho theós e na próxima vez theós. Portanto, a ausência do artigo no segundo caso não pode ser usada para argumentar
contra a igualdade entre o Pai e o Filho.
JOÃO 1:14, 18; 3:16, 18; 1 JOÃO 4:9
“O Filho unigênito (monoguenês).” Sugere-se que a palavra monoguenês aponta para uma geração literal de Jesus.
Resposta:

(a) A palavra monoguenês significa “único, único de uma espécie, singular”. Ocorre nove vezes no Novo Testamento.
Encontra-se três vezes em Lucas (7:12; 8:42; 9:38), onde sempre se refere a um único filho. É encontrada cinco vezes nos
escritos de João (Jo 1:14, 18; 3:16, 18; 1 Jo 4:9) como uma designação da relação de Jesus com Deus. Ocorre somente uma
vez em Hebreus 11:17, onde Isaque é chamado o filho monoguenês de Abraão. Isaque não era o filho único de Abraão,
mas era o filho singular, invulgar, o único filho da promessa. A ênfase não é sobre o nascimento, mas sobre a singularidade
do filho. Portanto, a tradução “único” ou “singular” deve ser preferida. A tradução “unigênito” pode ter se originado com
os primeiros Pais da Igreja e se encontra na Vulgata. A última, por sua vez, influenciou traduções posteriores.
O termo normal para gerado é gennao, que se encontra em Hebreus 1:5 e pode apontar para a ressurreição ou
encarnação de Cristo.
Na LXX (Septuaginta) o termo monoguenês é a tradução do hebraico yachid, que significa “único, singular” ou “amado”
(cf. Mc 1:11, em conexão com o batismo de Cristo).
Não está claro se monoguenês se refere apenas ao Senhor histórico e ressurreto ou também ao Senhor preexistente. É
de interesse notar, porém, que nem em 1:1-14, nem em 8:58, nem no capítulo 17, João usa o termo “Filho” para o Senhor
preexistente.
(6) Mateus 14:33 “Tu és o Filho de Deus.” Pode o título “Filho de Deus” ser compreendido literalmente?

Resposta:

(a) Esse título é um título messiânico. (veja Sl 2:7; At 13:33; Hb 1:5). Enfatiza a divindade de Cristo. Jesus usou este
título muito raramente para Si mesmo (somente em João, p. ex., Jo 11:4). É um dos muitos títulos que Jesus possuía. Na
tentativa de compreender o que Jesus é, todos eles precisam ser investigados a fim de se obter uma visão coerente. Que o
título “Filho de Deus” enfatiza a divindade de Cristo é evidente de João 10:29-36. Isso é ainda mais apoiado pelo fato de
que o Filho é a imagem exata de Deus, sendo igual a Deus (Cl 1:15; Hb 1:3; Fp 2:6).

(b) A palavra “filho” tem uma ampla extensão de significados na língua original. Portanto, não é possível reduzi-la aos
estreitos limites da língua inglesa (ou portuguesa) e defini-la de uma maneira puramente literal. A filiação de Jesus é
atestada em conexão com o Seu nascimento (Lc 1:35), batismo (Lc 3:22), transfiguração (Lc 9:35) e ressurreição (At 13:32-
33). A Bíblia silencia quanto à questão sobre se este título descreve a relação eterna entre Pai e Filho. Em qualquer caso, as
Escrituras atribuem existência eterna a Jesus (Is 6:6; Ap 1:17, 18).

Durante Sua encarnação, Jesus subordinou-Se voluntariamente ao Pai, sendo o Filho de Deus. Isto incluía a entrega das
prerrogativas, mas não a natureza da divindade. O Senhor ressurreto, sendo entronizado como rei e sacerdote, também
aceita voluntariamente a prioridade do Pai, mas Ele e o Pai são – segundo as Escrituras – ambos Deus, personalidades
coeternas e coiguais de uma só Divindade.

O Espírito Santo como a terceira pessoa da Trindade


Que o Espírito Santo é uma pessoa divina, igual ao Pai e ao Filho em poder, substância e glória, manifesta-se através
das Escrituras.

O Espírito Santo como ser pessoal


Alguns têm indagado se o Espírito Santo é uma pessoa distinta ou apenas o “poder” ou a “força” de Deus. Há vários
versos onde o Espírito Santo é mencionado junto com o Pai e o Filho (Mt 28:19; 1Co 12:4-6; 2Co 13:13). Uma vez que o Pai
e o Filho são pessoas, isto indica que o Espírito Santo deve ser também uma pessoa.

Freqüentemente, o pronome masculino “ele” é usado com referência ao Espírito Santo (Jo 14:26; 15:26; 16:13, 14)
apesar do fato de que a palavra para Espírito em grego (pneuma) é neutra e não masculina.
A palavra “conselheiro” ou “consolador” (parakletos) uniformemente se refere a uma pessoa, não a uma força.
É dito que o Espírito Santo fala (At 8:29), ensina (Jo 14:26), dá testemunho (Jo 15:26), intercede em favor de outros
(Rm 8:26-27), distribui dons a outros (1Co 12:11), e proíbe ou permite certas coisas (At 16:6-7). De acordo com Efésios
4:30, o Espírito Santo pode ser também entristecido pelas pessoas. Todas estas atividades são características de uma
pessoa, não de uma força.

O Espírito Santo como Deus


Vários textos das Escrituras descrevem o Espírito Santo como Deus:

(a) Mateus 28:19 “…batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo.” Este texto coloca o Espírito Santo
em um nível igual ao do Pai e do Filho.

(b) Pedro disse a Ananias que, mentindo ao Espírito Santo, ele havia mentido não “aos homens, mas a Deus” (At 5:3-4).

(c) O Espírito Santo é onipotente. Ele distribui dons espirituais “a cada um individualmente como lhe apraz” (1Co
12:11). Ele é onipresente. Habitará com o Seu povo “para sempre” (Jo 14:6). Ninguém pode furtar-se à Sua influência (Sl
139:7-10). Ele é também onisciente, “porque o Espírito a todas as cousas perscruta, até mesmo as profundezas de Deus” e
“as cousas de Deus ninguém as conhece, senão o Espírito de Deus” (1Co 2:10, 11).23
(d) Ellen White cria firmemente na personalidade do Espírito Santo. “Precisamos reconhecer que o Espírito Santo, que
é tanto uma pessoa como o próprio Deus, está andando por esses terrenos.”24

Conclusão
Embora com a doutrina da Trindade haja certas dificuldades textuais e conceituais, nosso estudo do Antigo e do Novo
Testamento tem produzido algumas possíveis respostas. Temos visto que a Divindade existe em uma pluralidade, que
Jesus é Deus, coexistente com o Pai desde a eternidade, e que o Espírito Santo é a terceira pessoa da Divindade.

Os textos difíceis da Bíblia são melhor compreendidos em harmonia com o restante das Escrituras. É de pouco valor
para a Igreja causar divisão por causa de diferentes compreensões de alguns aspectos da Divindade. Conquanto o mistério
da Trindade jamais possa ser plenamente compreendido pelo homem finito, é uma doutrina bíblica que faz parte da Fé
Cristã.

Referências:
1. Artigo traduzido do original em inglês por Francisco Alves de Pontes. Salvo indicação diversa, os textos bíblicos
utilizados na tradução são extraídos da Versão Almeida Revista e Atualizada.

2. W. Grudem, Teologia Sistemática (São Paulo: Vida Nova, 2002), 165.


3. Louis Berkhof, Systematic Theology (Eerdmans, 1994), 88.
4. Ibid.

5. G. A. F. Knight , A Biblical Approach to the Doctrine of the Trinity (Edinburgh, 1953), 20.
6. Ibid.
7. Millard J. Erickson, Christian Theology (Grand Rapids, MI: Baker, 1983), 1:329.
8. G. Ch. Aalders, Genesis (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1981), 300.
9. Erickson, 1:338.

10. Alguns comentaristas crêem que por trás da fórmula está a linguagem das transferências de dinheiro da era
helenística, de sorte que a fórmula expressa figurativamente que a pessoa batizada é “transferida” para a conta do Senhor
e assim se torna Sua propriedade. Outros interpretam “nome” como “autoridade”. Destarte, alguém é batizado pela
autoridade do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

11. Grudem, 230.

12. Arthur W. Pink, Exposition of the Gospel of John (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1945), 22.
13. W. Poehlmann, “Morfê”, Exegetical Dictionary of the New Testament, 3 vols., eds. H. Balz e G. Schneider (Grand
Rapids, MI: Eerdmans, 1981), 2:443.
14. F. F. Bruce, Philippians, NIBC (Peabody, MA: Hendrickson, 1989), 69.
15. Leon Morris, The Lord from Heaven: A Study of the New Testament Teaching in the Deity and Humanity of
Jesus (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1958), 74.
16. Alguns comentaristas definem pleroma em função do pensamento gnóstico, pelo qual pleromasignifica o
novo éon (ou emanação gnóstica) que encarnou-se no Redentor (Kaeseman, Essays on New Testament Themes [Londres,
1964], 158). C. F. D. Moule, porém, tem ressaltado que pleroma era uma palavra tão comum na LXX que seria preciso forte
evidência para levar alguém a procurar em uma fonte externa seu significado primário em um escritor tão imergido no
Antigo Testamento como Paulo (The Epistles to the Colossians and to Philemon, Cambridge Greek Testament Commentary
[Cambridge, 1957], 166).
17. John Eadie, Colossians, Classic Commentary Library (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1957), 145.
18. F. F. Bruce, Hebrews, NICNT (Grand Rapids, MI: Eerdmans,. 1964), 19, 20.
19. Erickson, 326.

20. Sou grato ao meu colega Ekkehardt Mueller pelo material deste parágrafo.

21. Kenneth T. Aitken, Proverbs (Westminster Press, 1986), 85.


22. Mensagens Escolhidas, 1:247.
23. Nisto Cremos: 27 ensinos bíblicos dos adventistas do sétimo dia (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1988), 90.
24. Evangelismo, 616.

Fonte: Parousia, ano 4, nº 2 (2º semestre de 2005), p. 7-17. Usado com permissão.


PDF: A Trindade nas Escrituras

A Trindade sem Mistério – I


Alberto Ronald Timm

Em contraste com a filosofia grega, cuja base repousa no conhecimento de si mesmo, o Cristianismo tem como
fundamento o conhecimento de Deus. Esse conhecimento é o “principio da sabedoria” (Prov. 9:1) e a condição para a
“vida eterna” (João 17:3). Somente através da revelação divina, conforme expressa em Sua Palavra, poderemos chegar a
uma correta compreensão de Deus. Entretanto, ao estudarmos a respeito de Deus não nos devemos olvidar de que
estamos em terreno sagrado.

Muito embora a palavra “Trindade” não se encontre na Bíblia, a ideia por ela expressa é uma das verdades fundamentais
das Escrituras. Na Bíblia, as prerrogativas divinas são atribuídas a três pessoas distintas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
Todos os demais conceitos teológicos são afetados direta ou indiretamente pela noção que tivermos dessa doutrina.

Evidência da Trindade no Antigo Testamento


Ainda que o Antigo Testamento não apresente provas tão claras para a doutrina da Trindade quanto às do Novo
Testamento, nele podem ser encontradas grande número de evidências que atestam a existência de uma pluralidade na
Divindade.

Em Gênesis 1, o nome hebraico para Deus é Elohim. Esse nome ocorre ao todo cerca de 2.500 vezes no Antigo
Testamento, sendo ele a forma plural de El, que é o nome comum para Deus entre os semitas. Para alguns, o fato
de Elohim ser um nome plural não prova a Trindade, mas apenas indica “a riqueza e a plenitude do Ser Divino”.1 Porém A.
H. Strong nos adverte que “o fato de Elohim ser algumas vezes usado num sentido restrito, como aplicável ao Filho (Sal.
45:6; cf. Heb. 1:8), não nos deve impedir de crer que o termo era originalmente considerado como contendo uma alusão a
certa pluralidade na natureza divina”.2 E João 1:1-3 lança luz sobre o fato de que o Pai e o Filho estavam unidos na obra da
Criação do mundo, e em Gênesis 1:2 temos o Espírito Santo também envolvido nessa obra.

No Antigo Testamento, encontramos ainda referências nas quais Deus fala de Si mesmo no plural, como por exemplo:
“Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança” (Gên. 1:26). Há quem interprete o plural como
incluindo os anjos, “mas qualquer inferência de que outros tenham tomado parte em nossa criação é completamente
alheia ao capítulo como um todo e ao desafio presente em Isaías 40:14: ‘Com quem tomou Ele conselho?’ Trata-se antes
do plural de plenitude, que … haveria de ser revelado como tri-unidade, nos posteriores ‘nós’ e ‘nossa’ de São João 14:23
(com 14:17)”.3Encontramos, portanto, na peculiar fraseologia de Gênesis 1:26 “uma alusão a um sublime concílio entre as
pessoas da Divindade”.4 (Ver também Gênesis 3:22; 11:7; Isa. 6:8.).

Outra evidência importante encontramos nos textos que se referem às manifestações do “Anjo do Senhor” (Gên. 16:7-13;
18:1-13; 19:1-28; 22:11-16; 31:11-13; etc.), os quais apresentam “uma indicação de distinções pessoais em Deus”.5 Em
Malaquias 3:1 e Atos 7:35-38 o “Anjo do Senhor” é identificado como sendo Cristo, o Filho de Deus, que em Gênesis 31:11-
13 é declarado ser Deus. Portanto, “exatamente como ‘o Espírito de Deus’ era uma expressão veterotestamentária
aguardando seu esclarecimento completo no Pentecostes, assim ‘o Anjo do Senhor’, como expressão referente ao próprio
Senhor, ganha significado somente à luz dAquele ‘que o Pai… enviou ao mundo’, o Filho preexistente”.6

Segundo John Bright, “a religião de Israel não se fundamentava em proposições teológicas abstratas, mas na memória de
uma experiência histórica interpretada e correspondida… Israel acreditava que Iahweh, seu Deus, o havia livrado do Egito
pelo poder de Sua onipotência e que, mediante uma aliança o havia constituído Seu povo”.7 Entretanto, mesmo nas
profecias messiânicas encontramos indícios de uma pluralidade na Divindade. Em Isaías 9:6 o Messias é chamado “Deus
Forte, Pai da Eternidade”, e no Salmo 45:6 e 7 o “Ungido de Deus” é dito ser Deus, à semelhança dAquele que O ungiu. No
Salmo 33:4-6 e em Provérbios 8:12-31, aparecem a “Palavra” e a “Sabedoria” de Deus sendo personificadas como uma
antecipação ao “Verbo” de Deus de São João 1:1-14.

Já em Isaías 48:16 aparece uma distinta referência à Trindade: “Agora o Senhor Deus (o Pai) Me enviou a Mim (o Filho) e o
Seu Espírito (o Espírito Santo).” Há também quem considere as palavras do rei Nabucodonosor, encontradas em Daniel
2:47, como uma referência à trindade: “Certamente, o vosso Deus é Deus dos deuses (o Pai), e o Senhor dos reis (o Filho),
e o Revelador dos mistérios (o Espírito Santo)”. Portanto, reconhecemos que “o Velho Testamento contém uma clara
antecipação da plena revelação da Trindade no Novo Testamento”.8

A Trindade no Novo Testamento


Uma vez que a revelação da verdade é progressiva, encontramos no Novo Testamento provas concretas da doutrina da
Trindade, que lançam luz sobre as evidências encontradas no Antigo Testamento. O cumprimento das profecias
messiânicas e a promessa do Espírito Santo são sumamente elucidativas para a compreensão deste tema.

Na promessa feita pelo anjo a respeito do nascimento de Jesus, encontramos uma referência distinta aos membros da
Trindade (Luc. 1:35), que viria a tornar-se ainda mais notória por ocasião do Seu batismo. Nessa ocasião, o Filho de Deus
foi batizado, o Espírito Santo desceu sobre Ele em forma corpórea como uma pomba, e o Pai falou: “Este é o Meu Filho
amado, em quem Me comprazo” (Mat. 3:16 e 17; Mar. 1:10 e 11; Luc. 3:21 e 22; João 1:32 e 33).

Os ensinos de Cristo são igualmente de natureza a enfatizar essa distinção. Na promessa do espírito Santo, Ele fala a
respeito de “outro Consolador” (João 14:16 e 26), e todos os que viessem a crer deveriam também ser batizados “em
nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (Mat. 28:19).

Igualmente na bênção apostólica aparece novamente referida a Trindade: “A graça do Senhor Jesus Cristo e o amor de
Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós” (II Cor. 13:13). O apóstolo São Pedro inicia a sua primeira
epístola com uma clara referência à Trindade (I Ped. 1:2), e em São Judas 20 e 21 ela também é mencionada.

Portanto o Novo Testamento reconhece o Pai como Deus (João 6:27, Efé. 6:23; I Pedro 1:2; etc.), aJesus Cristo como Deus
(João 1:1 e 18; 20:28; Rom. 9:5; Col. 2:2 e 9; Tito 2:13; Heb. 1:8; I João 5:20; etc.), e ao Espírito Santo como Deus (Atos 5:3
e 4; I Cor. 2:10 e 11; I Cor. 3:16; etc.).

A Distinção Entre os Membros da Trindade


Muito embora a expressão “porque três são os que testificam no céu: o Pai, a Palavra, e o Espírito Santo; e estes três são
um”, que algumas versões da Bíblia trazem em I São João 5:7 e 8, provavelmente não fazia parte do original e tenha sido
acrescentada posteriormente,9 isto não invalida em nada a doutrina bíblica da Trindade. Alegar que o Pai, o Filho e o
Espírito Santo são simplesmente três aspectos diferentes de um único Ser Divino Se manifestar, é confundir o conceito
bíblico a respeito. Se assim fosse, a quem Jesus Cristo estaria Se dirigindo ao orar ao Pai? Por que então deveriam ser
mencionados separadamente os membros da Trindade tanto na fórmula do batismo (Mat. 28:19), como na bênção
apostólica (II Cor. 13:13) e em outros textos? A Bíblia não apenas reclama natureza espiritual para os membros da
Trindade, como também personalidades distintas entre o Pai, o Filho, e o Espírito Santo. Isto é claro não apenas nas
características pessoais atribuídas aos três, como também no fato de o Pai ter enviado o Filho (João 14:24; 20:21) e o Pai e
o Filho enviarem o Espírito Santo (João 14:16 e 26; 16:7). Alguns têm tido dúvidas quanto ao Espírito Santo, imaginando
ser Ele apenas um poder despersonalizado proveniente de Deus; porém os ensinos de Cristo não deixam dúvidas a esse
respeito. Ao prometer o Espírito Santo, Ele disse: “Convém-vos que Eu vá, porque se Eu não for, o Consolador não virá
para vós outros; se, porém, Eu for, eu vo-lo enviarei” (João 16:7). A palavra “Consolador” é a tradução do termo
grego Paracleto, que em São João 14:26 é identificado como sendo o Espírito Santo.

De acordo com James Robertson, “do ensino de Jesus, não resta a menor dúvida que o outroParacleto é uma pessoa. A
cada passo, Jesus fala desta maneira: ‘Ele vos ensinará todas as coisas’; ‘Ele Me glorificará’. Personalidade está implicada
no título ‘Paracleto’, o qual, em algumas versões, é traduzido impropriamente “Confortador”. A palavra significa ‘um que é
chamado para ficar ao nosso lado, especialmente em ocasiões de dificuldade e conflito’. É, portanto, a palavra que designa
um advogado, e é assim usada a respeito de Jesus mesmo, em I João 2:1, onde lemos: ‘Nós temos umParacleto (advogado)
com o Pai, Jesus Cristo, o justo.’ “Está implicada também, no ensino de Jesus, que o outro Paracleto é uma pessoa divina.
Jesus não poderia dizer que era melhor que Ele fosse, se o Seu substituto fosse menos do que divino. Nem poderia ter dito
que ‘ao que disser alguma palavra contra o Filho do homem, isso lhe será perdoado; porém, ao lhe falar contra o Espírito
Santo, não lhe será perdoado, nem neste mundo, nem no vindouro’ (Mat. 12:32). Também não poderia ter juntado ‘o Pai,
o Filho e o Espírito Santo’, como faz na fórmula do batismo (Mat. 28:19), se todos os três não fossem divinos”.10

Portanto, a doutrina da Trindade não está baseada em especulações e conjeturas humanas, mas na própria Revelação
Divina – a Sua Palavra. Porém, uma vez que tenhamos compreendido a distinção que a Bíblia estabelece entre as pessoas
da Trindade, deveremos também analisar o relacionamento existente entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

 Referências:

1. Herman Bavinck, The Doctrine of God. (Edinburg: The Banner of Truth Trust, 1979), p. 256.

2. Augustus H. Strong, Systematic Theology. (Valley Forge: Judson Press, 1979), p. 318.

3. Derek Kidner, Genêsis – Introdução e Comentário. (São Paulo: Editora Mundo Cristão, 1979), pp. 48 e 49.

4. The Pulpit Commentary. (Gran Rapids:Wm. B. Eerdmans Publ. Co., 1975), vol. 1, The Book of Genesis, p. 29.

5. Louis Berkhof, Systematic Theology. (Edinburg: The Banner of Truth Trust, 1976), p. 86.

6. Kidner. op. cit., p. 32.

7. Jonh Bright, História de Israel. (São Paulo: Edições Paulinas, 1978), p. 190.

8. Berkhof. op. cit., p. 86.

9. Bruce M. Metzger, A Textual Commentary on the Greek New Testament. (London: United Bible Societies,

1975), pp. 715-717.

10. James Robertson, Ensinos de Jesus. (São Paulo: União Cultural Editora Ltda., 1952), pp. 146 e 147.

Fonte: Revista Decisão, agosto de 1985, pp. 22-24.

PDF: A Trindade sem Mistério – I


A Trindade sem Mistério – II
Alberto Ronald Timm
 Uma vez que a Bíblia atribui as prerrogativas divinas tanto ao Pai quanto ao Filho e ao Espírito Santo, passaremos a
analisar, à luz da Palavra de Deus, o relacionamento existente entre os membros da Trindade. Este aspecto é muito
importante, porque dele dependerá os demais conceitos da teologia cristã, os quais são por ele afetados.
Para uma correta compreensão a respeito, deveremos fazer a distinção entre a unidade essencial e a subordinação
funcional existente entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo; isto é, entre o modo divino de existir e a maneira funcional como
tem sido revelado através da Criação e da Redenção. Confundir esses dois aspectos distintos, levar-nos-ia a conclusões
totalmente distorcidas a respeito da doutrina de Deus.

 A Unidade Essencial da Trindade


Vimos anteriormente que a Bíblia reconhece as prerrogativas divinas a três personalidades distintas. Porém, isto não
sanciona de forma alguma uma idéia triteísta de Deus; ou seja, que a Bíblia reconheça três deuses diferentes como
formando a Divindade. Esta espécie de politeísmo é totalmente contrária ao pensamento bíblico. A religião bíblica é
essencialmente monoteísta. Já na promulgação do decálogo aparecem as palavras: “Eu sou o Senhor teu Deus… Não terás
outros deuses diante de Mim” (Êxo. 20:2 e ). Também a religião judaica tinha por fundamento o texto de Deuteronômio
6:4: “Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor”. Igualmente o apóstolo São Paulo fala que “há um só Deus” (I
Cor. 8:6). Esses e outros textos nos deixam claro o fato de que existe uma unidade essencial entre os membros da
Trindade. O Pai, o Filho e o Espírito Santo são três pessoas distintas que formam um só Deus, e não três deuses.
Nesse sentido é que Jesus disse: “Eu e o Pai somos um” (João 10:30; cf. João 17:21 e 22). É por isso que a respeito de
Cristo pode ser dito que desde o principio Ele “estava com Deus, e … era Deus” (João 1:1), que Ele é “igual a Deus” (Filip.
2:6), pois “nEle habita corporalmente toda a plenitude da Divindade” (Col. 2:9), sendo Ele “Deus Forte, Pai da Eternidade”
(Isa. 9:6).

Mesmo o título “Filho” ao ser aplicado a Cristo não é sinônimo de inferioridade, mas sim de igualdade com o Pai. Ele
significa que o Filho participa da mesma natureza do Seu Pai. Foi por essa razão que os judeus acusaram a Jesus de
blasfêmia, ao chamar a Deus de “Meu Pai” (João 5:17 e 18). É importante considerarmos ainda que a palavra “Filho” é
sempre empregada para Cristo no contexto da Encarnação, e nunca encontraremos menção a um “Filho Eterno”. 1
Por sua vez, não apenas o fato de o Espírito Santo ser chamado de o “outro consolador” (“Paracleto”, João 14:16; etc.)
e o “Espírito de Deus” (Rom. 8:9; I Cor. 3:16; etc.) atesta Sua natureza divina, como também o fato de a Ele serem
atribuídas todas as características divinas. Isto é especialmente enfatizado em I Cor. 2:10 e 11, onde lemos: “Mas Deus no-
lo revelou pelo Espírito; porque o Espírito a todas as coisas perscruta, até mesmo as profundezas de Deus. Porque, qual
dos homens sabe as coisas do homem, senão o seu próprio espírito que nele está? Assim as coisas de Deus ninguém as
conhece, senão o Espírito de Deus”. Neste caso, “perscruta não significa que o Espírito perscrute com vistas a obter
informação. Antes, é um modo de dizer que Ele penetra todas as coisas. Não há nada que esteja além do Seu
conhecimento. Em particular, Paulo especifica asprofundezas de Deus… Não se pode contestar que esta passagem atribui
plena divindade ao Espírito… Porque o Espírito que revela é verdadeiramente Deus, o que Ele revela é a verdade de
Deus”.2Portanto não podemos negar a unidade essencial existente entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo, os quais formam
um só Deus (Tri-unidade).

A Subordinação Funcional da Trindade


A Bíblia menciona a Trindade envolvida tanto na Criação (Gên. 1:1 e 2; João 1:1-3 e 10; Heb. 1:1-3; Jó 33:4; etc.), como
na Redenção (Heb. 9:14; I Pedro 1:2; etc.). Para não incorrer em problemas teológicos, devemos ter em mente que a Bíblia
é a revelação de Deus aos homens no contexto da história da salvação”, e que o seu objetivo primordial não é elucidar o
“Ser” essencial de Deus. Portanto a chave para a compreensão da revelação de Deus encontra-se no “mistério da
encarnação”; isto é, que Cristo, sendo Deus no mais alto sentido da palavra, “a Si mesmo Se esvaziou, assumindo a forma
de servo, tornando-Se em semelhança de homens” (Filip. 2:5-8). Nesse contexto encontraremos o Pai, o Filho e o Espírito
Santo assumindo funções diferentes que poderão ser interpretadas como uma aparente “hierarquia” na Trindade, mas
que não alteram a essência da natureza divina. Veremos, assim, o Filho dizendo que “o Pai é maior do que Eu” (João
14:28), que “o Filho nada pode fazer de Si mesmo” (João 5:19), e também pôr-Se de joelhos e orar ao Pai (Luc. 22:41 e 42).
Mas não devemos nos esquecer que Ele também orou: “Eu Te glorificarei na Terra, consumando a obra que Me confiaste
para fazer; e agora, glorifica-Me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que Eu tive junto de Ti, antes que houvesse mundo”
(João 17:4 e 5), e que após a Sua humilhação Ele reassumiu toda a plenitude da Sua Divindade (Col. 2:9; cf. Filip. 2:9-11).

Alguns têm procurado ver nos títulos “unigênito” e “primogênito” evidências de que o Filho tenha sido gerado pelo Pai
antes da criação do mundo; isto é, que Ele foi a primeira criação do Pai. Mas isso é decorrente de uma profunda ignorância
do significado desses termos. A palavra traduzida por “unigênito” (João 1:14 e 18; 3:16 e 18; I João 4:9) é o termo
grego monogeneses. Por algum tempo cria-se erroneamente que esse termo significava “único gerado”; porém o certo é
que monogeneses é derivado de geneos, que significa “espécie” ou “condição”, e não de gennao, que significa “gerar”.3 A
prova para isso encontra-se no fato de monogeneses ser escrito com um “n” apenas, e não com dois.4Assim o termo
grego monogeneses não subentende nada mais do que “único” ou “solitário”.5 Ao ser esse termo aplicado em relação ao
“Filho de Deus”, deixa claro que Jesus é “o único em Sua classe”. 6A Bíblia de Jerusalém está correta ao traduzir o referido
termo por “Filho único” em São João 3:16. Portanto, isso significa que Jesus desfruta de um relacionamento único e
especial com o Pai. A prova para tal é “o fato de que Jesus jamais fala de Deus como ‘nosso Pai’ de modo a colocar-Se no
mesmo relacionamento com Deus que Seus discípulos”. 7 (Ver João 20:17).
Cabe mencionar ainda que o termo monogenesis é usado em Hebreus 11:17 em relação a Isaque, que realmente não
era o “único gerado” por Abraão, e sim o seu filho predileto. 8 Igualmente a palavra “primogênito” (Col. 1:15-18), traduzida
do termo grego prototokos, é usada no relacionamento de Cristo com o Pai, “expressando a Sua prioridade e preeminência
sobre a criação, e não no sentido de ter sido o primeiro a nascer”. 9 Esse sentido de distinção aparece também em
Deuteronômio 21:15-17. é igualmente nesse sentido que Davi, sendo o filho mais novo de Jessé, é chamado de
primogênito (Sal. 89:20-27; cf. I Sam. 16:10-12), bem como Jacó (Êxo. 4:21 e 22; cf. Gên. 25:25 e 26) e Efraim (Jer. 31:9; cf.
Gên. 41:50-52). Ao ser Ele chamado de “o princípio (grego arche) da criação de Deus” (Apoc. 3:1), isso não se refere a
Cristo no sentido passivo de que no princípio Ele fora criado por Deus, mas no sentido ativo de que Cristo é a Origem, a
Fonte e o Princípio ativo através do qual a criação veio à existência (cf. João 1:1-3 e 10; Heb. 1:2; Col. 1:15-18). Se Cristo
realmente fora criado na Eternidade, então Ele jamais poderia ter sido chamado “Deus Forte, Pai da Eternidade” (Isa. 9:6).
Mas, pelo contrário, João afirma que “o Verbo era Deus” (João 1:1). “Nada mais eminente poderia ser dito. Tudo o que
pode ser dito a respeito de Deus, pode apropriadamente ser dito a respeito do Verbo”.10

Um Ministério a Ser Aceito Pela Fé


Talvez a razão pudesse nos levar a crer na Unidade de Deus; porém somente a revelação pode nos desvendar o
mistério da Trindade de Deus. 11 Pode parecer difícil para a mente humana conviver com o fato de Deus ser três pessoas
distintas e ainda assim continuar sendo apenas um Deus, e não três deuses. A Bíblia apenas estabelece esse fato, mas não
apresenta maiores detalhes de como isso pode ser explicado. Portanto, assim como “pela fé entendemos que foi o
Universo formado pela palavra de Deus” (Heb. 11:3), igualmente pela fé precisamos aceitar a maneira como Deus Se
revelou a nós através da Sua Palavra, sem entrarmos em especulações (Deut. 29:29).
Provavelmente não avaliaremos a importância da doutrina da Trindade enquanto não compreendermos o que seria a
teologia cristã sem ela. A. H. Strong nos esclarece o fato de que “se não há Trindade, Cristo não é Deus, e não pode
conhecer ou revelar perfeitamente a Deus. O cristianismo não é mais a única e final revelação; porém apenas um dos
muitos sistemas conflitantes e competitivos, cada um dos quais tem as suas porções de verdade, mas também as suas
porções de erro. O mesmo com respeito ao Espírito Santo. ‘Como Deus pode apenas ser revelado através de Deus, assim
também Ele pode apenas ser apropriado através de Deus. Se o Espírito Santo não é Deus, então o amor e a auto-
comunicação de Deus para a alma humana não são uma realidade.’ Em outras palavras, sem a doutrina da Trindade nós
recuamos a uma mera religião natural e ao afastado e distante Deus do deísmo…”12
Entretanto, de acordo com Edwin R. Thiele, “o quadro bíblico de Deus não é de um singular ser supremo sozinho
consigo mesmo, anti-social, solitário e afastado. Deus é amor, e o amor anela companheirismo. Certamente Deus poderia
conversar com os homens ou os anjos; porém mesmo Deus necessitaria de companheirismo e associação com alguém
igual, que pudesse pensar como Ele. E assim Deus comunga com Deus, compartilhando e levando a efeito planos em
comum acordo”.13 E neste contexto tornam-se mais claras as referências a planos sendo traçados no próprio seio da
Divindade (Gên. 1:26; 11:7; Isa. 6:8; etc).
Portanto, mantenhamos firme a profunda convicção de que o Pai muito nos ama (João 3:16), que Jesus Cristo, após
haver oferecido Sua vida por nós, permanece como o nosso Advogado junto ao Pai (I João 2:1) e que o Espírito Santo está
conosco para nos assistir em nossas fraquezas (Rom. 8:26). E, no dizer do apóstolo São Paulo, que “a graça do Senhor Jesus
Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós” (II Cor. 13:13).

Referências:
1. Guillermo N. Clarke, Bosquejo de Teologia Cristiana. (Buenos Aires: Compañia de Publicidade Literária “La Aurora”,
s.d.), p. 181.
2. Leon Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário. (São Paulo: Editora Mundo Cristão, 1981), p. 46.
3. George E. Ladd, A Theology of the New Testament. (Grnad Rapids: Wm. B. Eerdmans Publ. Co.,1977), p. 247.
4. Leon Morris, The Gospel According to John. (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publ. Co., 1979), p. 105, nota de rodapé.
5. Ibid.
6. Ladd. op. cit., p. 247.
7. Ibid.
8. Para um estudo mais detalhado sobre a palavra monogenes, veja o artigo intitulado “O Único Filho de Deus” de autoria
de Dale Moddy em: Raul Dederen. Cristologia. (São Paulo: Instituto Adventista de Ensino, 1984), pp. 11-26.
9.W. E. Vine, Expository Dictionary of New Testament Words. (London: Oliphants, 1979), vol. II, p. 104.
10. Morris The Gospel According to John, p. 76.
11. Augustus H. Strong, Systematic Theology. (Valley Forge: Judson Press, 1979), p. 304.
12. Ibid., p. 349.
13. Edwin R. Thiele, Knowing God. (Nashville: Southern Publ. Ass., 1979), p. 28.

Fonte: Revista Decisão, setembro de 1985, pp. 17-19.

PDF: A Trindade sem Mistério – II


Como Cristo pode ser “o primogênito de toda a criação” (Colossenses
1:15) sem ter sido criado?
Alberto R. Timm
Ao longo da história do cristianismo, houve muita discussão a respeito do significado do termo “primogênito”
(grego protótokos) quando usado em relação a Cristo. No Novo Testamento, Cristo é chamado de “o Primogênito” (Hb
1:6), “o primogênito de toda a criação” (Cl 1:15), “o Primogênito dos mortos” (Ap 1:5), “o primogênito de entre os mortos”
(Cl 1:18) e “o primogênito entre muitos irmãos” (Rm 8:29).
Para entender essa questão, é importante ter em mente que, entre os israelitas, todo o primogênito deveria ser
consagrado ao Senhor (Êx 13:1-16; ver Lc 2:22-24), recebendo herança “dobrada” em relação aos demais irmãos (Dt 21:15-
17). Embora o termo “primogênito” seja normalmente usado para designar o primeiro filho de um casal, ele é também
empregado na Bíblia em relação a um dos demais filhos, que não o mais velho, mas que tenha se destacado entre os seus
irmãos. É neste sentido que Deus qualificou a Israel, que não era a nação mais antiga da terra, de “meu primogênito” (Êx
4:22); a Efraim, o segundo filho de José e Azenate, de “o meu primogênito” (Jr 31:9); e a Davi, o mais novo dos oito filhos
de Jessé, de “meu primogênito, o mais elevado entre os reis da terra” (Sl 89:27).

Cristo é qualificado de “o primogênito de toda a criação” (Cl 1:15) em um contexto que O enaltece como o Criador que
está acima de toda a criação. Em Colossenses 1:15-17, Paulo afirma que Cristo “é a imagem do Deus invisível, o
primogênito de toda a criação; pois nEle foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis,
sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dEle e para Ele. Ele é antes
de todas as coisas. NEle tudo subsiste.”

Se o próprio Cristo fosse uma criatura do Pai, como alegam alguns pretensos cristãos, como poderia o texto acima
afirmar que “tudo” o que foi criado foi “por meio dEle” criado? Se Cristo houvesse sido gerado em algum momento da
eternidade, como poderia ser chamado em Isaías 9:6 de “Deus Forte” e “Pai da Eternidade”? Nesse caso, Ele não seria “Pai
da Eternidade”, mas simplesmente uma criatura que veio à existência em algum momento específico da eternidade!
Cremos, porém, que como “o primogênito de toda a criação” Cristo é o Soberano absoluto sobre toda a criação, pois “nEle
habita corporalmente toda a plenitude da Divindade” (Cl 2:9).

Fonte: Sinais dos Tempos, novembro/dezembro de 2001. p. 30 (usado com permissão)

Oração certa
Devemos orar somente a Deus o Pai, em nome de Cristo, ou podemos orar também ao próprio Cristo?
Alberto R. Timm
Cristo orava sempre e exclusivamente ao Seu Pai (Mt 11:25 e 26; 26:39, 42; Lc 23:34, 46; Jo 12:27 e 28; 17:1-26).
Quando indagado por Seus discípulos a respeito de como deveriam orar, Ele os ensinou a também se dirigirem
diretamente ao Pai (ver Lc 11:1-4; Mt 6:5-13). Mas, além disso, os discípulos foram instruídos a orarem ao Pai, em nome
de Cristo. Em João 15:16 o próprio Cristo afirmou: “…a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em Meu nome, Ele vo-lo
conceda.” E João 16:23 complementa essas palavras com a declaração: “Em verdade, em verdade vos digo, se pedirdes
alguma coisa ao Pai, Ele vo-la concederá em Meu nome.”

Mas as orientações de que devemos nos dirigir ao Pai em nome de Cristo não excluem a possibilidade de também
orarmos diretamente a Cristo. Em João 14:13 e 14 o próprio Cristo fala de “pedirdes em Meu nome” e de “Me pedirdes”.
Assim, não é de se surpreender que Estêvão haja orado: “Senhor Jesus, recebe o meu espírito!” (At 7:59), e que a última
oração das Escrituras seja: “Amém. Vem, Senhor Jesus!” (Ap 22:20). Mas essa possibilidade só é aceitável pelo fato de
Cristo ser plenamente Deus e digno de adoração (Cl 2:9; Fp 2:10 e 11).

Fonte: Sinais dos Tempos, agosto de 1999, p. 29 (usado com permissão)

Do que consiste o pecado imperdoável?


Daniel Oscar Plenc
Judas: Jesus e os seus discípulos estavam jantando. O Diabo já havia posto na cabeça de Judas, filho de Simão Iscariotes, a
ideia de trair Jesus. (João 13:2). E, logo após o bocado, entrou nele Satanás. Disse-lhe, pois, Jesus: O que fazes, faze-o
depressa. (João 13:27).

O que Jesus quis dizer quando falou do pecado contra o Espírito Santo em Mateus 12:31 -32? Ellen White comenta sobre
esse assunto desta maneira: Os fariseus atribuíram influencias satânicas ao poder de Deus, manifestando isso nas obras de
Cristo. Deste modo, pecaram contra o Espírito Santo. Obstinados, sombrios e duos de coração, decidiram fechar os olhos a
toda e qualquer evidencia, e assim cometeram o pecado imperdoável (Review and Herald, 18 de Janeiro de 1898,
em Comentário Bíblico Adventista 5:1067). A aplicação espiritual transcende a experiência dos fariseus. Nos nossos dias, os
homens se têm colocado onde são completamente incapacitados para preencher as condições de arrependimento e
confissão; portanto não podem encontrar misericórdia e perdão. O pecado da blasfêmia contra o Espírito Santo não se
consuma em qualquer palavra ou ação súbita, mas na firme e determinada resistência contra a verdade e a evidencia (MS
30, 1890, em Comentário Bíblico Adventista, 5:1068). Sua tese principal se adverte nas seguintes palavras: Ninguém
necessita considerar o pecado contra o Espírito Santo como algo misterioso e indefinido. O pecado contra o Espírito Santo
é o pecado de uma rejeição persistente a responder ao convite de arrependimento. (Review and Herald, 29 de Junho de
1897 em A Fin de Conocerle, p. 245). A manifestação mais comum do pecado contra o Espírito Santo se baseia em ignorar
constantemente o convite do Céu e se arrepender. (O Desejado de Todas as Nações, PP. 291 – 292).

Diante de uma consulta definida sobre este pecado, Ellen White escreveu uma carta pessoal com pensamentos
iluminadores e consoladores sobre este tema. Irmão P, você me pergunta se já cometeu o pecado imperdoável. Então te
digo que não vejo a menos evidencia de que seja este o caso. Do que consiste o pecado contra o Espírito Santo? Em
atribuir a Satanás a obra do Espírito Santo… É por meio do Seu espírito que Deus opera no coração humano; e quando os
homens rejeitam voluntariamente ao Espírito, e declaram que são de Satanás, cortam o meio pela qual Deus usa para
comunicar-se com eles. Ao negarem a Deus, apagam a luz que havia resplandecido em seus corações, e como resultado
são desejados nas trevas. Meu irmão, o Espírito te convida hoje. Escute a Jesus com todo o seu coração. Arrependa-se de
seus pecados, faça a sua confissão à Deus e abandone toda a sua iniquidade. “Olhem para mim e serão salvos” (Isa. 45:22),
este é o sei misericordioso convite. (Joyas de Los Testimonios 2:265 – 266). Em síntese, o pecado contra o Espírito Santo é:

a) Persistir na impertinência;

b) Rejeitar permanentemente e definitivamente ao Espírito Santo, que convence do pecado e guia na verdade (João 16:8 –
13);

c) Não confessar o pecado e nem desejar o perdão;

d) Atribuir a Satanás a obra do Espírito Santo.

A personalidade do Espírito Santo


É o Espírito Santo um mero poder despersonalizado ou uma pessoa real?
Alberto R. Timm
Algumas pessoas têm grande dificuldade para entender o que a Bíblia diz a respeito da natureza do Espírito Santo. Isso
se deve, em grande parte, ao fato de enfatizarem determinadas características deste Ser divino em detrimento de outras,
e de não conseguirem conciliar os atributos da personalidade e da onipresença em um só Ser. Para elas, se o Espírito Santo
é uma Pessoa, então Ele não pode estar em toda parte ao mesmo tempo; e, por outro lado, se Ele é onipresente, então
não pode ser uma Pessoa. Baseados nessa pressuposição, chegam mesmo a crer que Deus Pai e Deus Filho, sendo Seres
pessoais, só conseguem ser onipresentes através do Espírito Santo, que, por sua vez, não pode ser mais do que um mero
poder despersonalizado.

Se o critério para se estabelecer a verdade é apenas a lógica humana, então o argumento acima até poderia ser
considerado correto. Mas se analisarmos detidamente o que a Palavra de Deus nos diz a respeito do Espírito Santo,
perceberemos que Ele é um Ser tanto onipresente como pessoal. Isso significa que a natureza do Espírito Santo é um
mistério a respeito do qual a lógica humana deve se curvar diante da revelação divina.

Na Bíblia encontramos vários textos que confirmam a onipresença do Espírito Santo (ver Sl 139:712; Jo 14:16 e 17; 1
Co 3:16; 6:19). Além disso, existem pelo menos quatro importantes evidências bíblicas de que o Espírito Santo é também
um Ser pessoal distinto do Pai e do Filho. Uma delas são as alusões à Divindade como composta de três Personalidades
distintas. Por exemplo, no batismo de Jesus a voz do Pai foi ouvida do Céu, e o Espírito Santo desceu na forma de uma
pomba (Lc 3:21-22). Tanto na fórmula batismal (Mt 28:19) quanto na bênção apostólica (2 Co 3:13) as três Pessoas são
mencionadas de forma distinta.

Outra evidência da personalidade do Espírito Santo é o fato de Cristo referir-Se a Ele em João 14:16 como “outro
Consolador” (grego állon parácleton) que seria enviado pelo Pai em nome de Cristo (Jo 14:26). Se o Espírito Santo fosse o
próprio Pai, como alegam alguns, como poderia o Pai enviar-Se a Si mesmo? Referindo-Se ao Espírito Santo como
“Consolador”, Cristo usa o mesmo termo gregoparácleton que é traduzido em 1 João 2:1 como “Advogado”. Assim como
este “Advogado” (Cristo) está “junto ao Pai”, sem ser o próprio Pai, também aquele “Consolador” (o Espírito Santo) é
qualificado como “outro Consolador”, enviado pelo Pai sem ser o próprio Pai.
Uma terceira evidência de que o Espírito Santo é um Ser divino encontra-se nos vários textos que O associam a várias
características de uma personalidade distinta dentro da Divindade. Por exemplo, Ele “a todas as coisas perscruta, até
mesmo as profundezas de Deus” (1 Co 2:10); Ele derrama o amor de Deus em nosso coração (Rm 5:5); Ele distribui os dons
espirituais a cada um “como Lhe apraz” (1 Co 12:11); e Ele pode ser entristecido (Ef 4:30).

Além disso, a Bíblia declara também que o Espírito Santo “intercede por nós” diante do Pai “com gemidos
inexprimíveis” (Rm 8:26). Como poderia o Espírito Santo interceder diante do Pai se Ele mesmo fosse o Pai? A fim de
perscrutar “as profundezas de Deus”, o Espírito Santo precisa ser plenamente Deus; e para interceder com o Pai, o Espírito
Santo precisa ter uma Personalidade distinta do Pai.

Cremos, portanto, no testemunho bíblico de que o Espírito Santo é um Ser plenamente divino, onipresente e pessoal.

Fonte: Sinais dos Tempos, março/abril de 2003, p. 30 (usado com permissão)

Em Manuscript Releases, vol. 14, págs. 23 e 24, estaria Ellen White


sugerindo que Cristo e o Espírito Santo são a mesma pessoa?
 Alberto R. Timm
O texto diz: “Limitado pela humanidade, Cristo não podia estar pessoalmente em toda parte; portanto, era para
benefício deles que Ele os deixasse, fosse para o Seu Pai, e enviasse o Espírito Santo para ser o Seu sucessor na Terra. O
Espírito Santo é Ele próprio despojado da personalidade humana e independente dela. Ele representaria a Si mesmo como
presente em todos os lugares pelo Seu Espírito Santo, como o Onipresente. ‘Mas o Consolador, o Espírito Santo, a quem o
Pai enviará em meu nome, esse (embora invisível para vós) vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que
vos tenho dito’ [João 14:26]. ‘Mas eu vos digo a verdade: convém-vos que eu vá, porque, se eu não for, o Consolador não
virá para vós outros; se, porém, eu for, eu vo-lo enviarei’ [João 16:7].”

Para entendermos essa declaração é indispensável que interpretemos corretamente a segunda e a terceira sentenças,
que no original em inglês aparecem da seguinte forma: “The Holy Spirit is Himself divested of the personality of humanity
and independent thereof. He would represent Himself as present in all places by His Holy Spirit, as the Omnipresent”.
Isoladas do seu contexto, essas sentenças acabam se tornando ambíguas. Conseqüentemente, o pronome reflexivo
“Himself”, que aparece na expressão “the Holy Spirit is Himself”, poderia ser interpretado como se referindo ao Espírito
Santo ou a Cristo. Se optarmos pela primeira alternativa, então teríamos que entender a sentença da seguinte forma: O
próprio Espírito Santo é despojado da personalidade humana e independente dela. Mas nesse caso os pronomes “He”,
“Himself” e “His” da sentença seguinte teriam que ser interpretados como também se referindo ao Espírito Santo, o que
nos obrigaria a entender a sentença como segue: O Espírito Santo representaria a Si mesmo como presente em todos os
lugares pelo Seu Espírito Santo, como o Onipresente. Mas tal interpretação é destituída de sentido e, portanto, inaceitável.

A despeito de qualquer ambiguidade, o contexto confirma que os pronomes “He”, “His” e “Himself” se referem a
Cristo e não ao Espírito Santo. Assim sendo, as sentenças podem ser entendidas da seguinte forma: “O Espírito Santo é
Cristo despojado da personalidade humana e independente dela. Cristo representaria a Si mesmo como presente em
todos os lugares pelo Seu Espírito Santo, como o Onipresente.” Essa interpretação é confirmada por uma declaração
paralela encontrada em O Desejado de Todas as Nações, pág. 669, na qual é dito que “o Espírito Santo é o representante
de Cristo, mas despojado da personalidade humana, e dela independente”. Alguns pretendem que, ao afirmar que o
Espírito Santo é Cristo, Ellen White estaria afirmando que o Espírito Santo é uma mera energia despersonalizada que
emana de Cristo. Mas tal interpretação não é corroborada pelo contexto em que aparecem as referidas expressões. Ao
asseverar que o Espírito Santo é Cristo “despojado da personalidade humana e independente dela”, Ellen White sugere
uma clara distinção entre a naturezadivina do Espírito Santo e a natureza divino-humana de Cristo. Além disso, as
declarações de que o Espírito Santo seria enviado pelo Pai em nome de Cristo (João 14:26) e pelo próprio Cristo (João
16:7), citadas no mesmo parágrafo, confirmam que o Espírito Santo é distinto tanto do Pai como do Filho. Para ser enviado
por ambos, o Espírito Santo precisa ter uma personalidade distinta de ambos, pois ninguém se auto-envia.
Ao sugerir que o Espírito Santo é Cristo, Ellen White empregou uma força de expressão semelhante a que Cristo usou
ao dizer “Eu e o Pai somos um” (João 10:30). Essas expressões enfatizam a unidade essencial entre o Espírito Santo e
Cristo, e entre Cristo e o Pai, respectivamente, sem com isso negar a distinção de personalidade entre cada um deles. Para
serem consistentes, os que interpretam literalmente essas declarações deveriam interpretar da mesma forma também a
expressão “Eu sou a videira verdadeira” (João 15:1) e várias outras semelhantes. Portanto, ao dizer que o Espírito Santo é
Cristo, Ellen White sugere que a presença do Espírito Santo no mundo, como representante de Cristo, não representaria
qualquer perda para os discípulos. Por mais que alguns busquem endosso para suas teorias antitrinitarianas na declaração
de Manuscript Releases, tais tentativas jamais conseguirão ofuscar os claros ensinos bíblicos e de Ellen White a respeito da
Divindade como formada por três Pessoas distintas – Pai, Filho e Espírito Santo.

Fonte: (publicado na revista do Ancião em jul – set 2005)

PDF: Em Manuscript Releases, vol. 14, págs. 23 e 24, estaria EGW sugerindo que Cristo e o ES são a mesma pessoa?

A sabedoria em Provérbios
Jesus é a sabedoria mencionada em Provérbios 8?
Alberto R. Timm
Diferentes teorias foram propostas ao longo da história do cristianismo para identificar a “sabedoria” mencionada em
Provérbios 8:22-31. Alguns teólogos do 2º século d.C. a viam como sendo o Espírito Santo. Já no 3.º século, essa
interpretação deu lugar a uma generalizada identificação dela com Cristo, a segunda pessoa da divindade. Comentaristas
mais recentes continuam discutindo se ela foi realmente uma companheira (ser distinto) do Senhor em Sua obra criadora
ou meramente uma característica(atributo) dEle.
Para compreendermos a sabedoria de Provérbios 8:21-31, devemos ter em mente: (1) que ela não é apresentada
como um ser divino em nenhuma das demais passagens de Jó, Provérbios e Eclesiastes onde aparece personificada; (2)
que ela assume neste texto as prerrogativas divinas de haver existido com Deus antes da obra da criação e de haver sido o
“arquiteto” dessa obra; e (3) que ela é descrita como havendo nascido antes da obra da criação (versos 24 e 25).
Reconhecendo a Cristo como a “sabedoria de Deus” (I Co 1:24 e 30) e Aquele “em quem todos os tesouros da
sabedoria e do conhecimento estão ocultos” (Cl 2:3), o Novo Testamento também O identifica como igual a Deus o Pai, e
por conseguinte, coeterno com Ele (Fl 2:6-7; Cl 2:8-9; Hb 1:2-3). Assim, se a sabedoria mencionada em Provérbios 8:22-31
teve realmente um início (como sugere a expressão “eu nasci” nos versos 24 e 26), então ela não pode ser a pessoa eterna
de Cristo ou um dos atributos eternos do Pai, mas apenas uma manifestação específica da eterna sabedoria de Deus em
Cristo na obra da criação, descrita pelo próprio texto em consideração (ver Jo 1:1-5 e 10; Cl 1:15-17; Hb 1:1-14; Ap 3:14).

Fonte: Sinais dos Tempos, julho de 1997, p. 29 (usado com permissão).

Idolatria
Não seriam as ilustrações que aparecem em publicações religiosas uma transgressão do mandamento
que ordena “Não farás para ti imagem de escultura…”? (Êx 20:4)
Alberto R. Timm
O segundo mandamento do Decálogo ordena: “Não farás para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do
que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. Não as adorarás, nem lhes darás
culto…” (Êx 20:4 e 5). Algumas pessoas crêem que esse mandamento proíbe o uso de quaisquer esculturas e pinturas
religiosas. Mas tal interpretação é inaceitável, pois acaba conflitando com outros textos bíblicos.

O livro do Êxodo menciona que Deus, depois de haver enunciado o Decálogo, ordenou a Moisés que dois querubins
“de ouro batido” fossem colocados sobre a arca que guardaria as tábuas de pedra contendo a transcrição do próprio
mandamento acima mencionado (ver Êx 25:17-22). Deus instruiu também que vários querubins fossem bordados nas
cortinas e no véu do tabernáculo em que essa arca seria depositada (ver Êx 26:1 e 31). Assim, se interpretássemos o
segundo mandamento como proibindo a elaboração de quaisquer ilustrações religiosas, teríamos que admitir também que
o próprio Deus induziu Moisés a transgredir esse mandamento, o que é completamente inadmissível.

Ilustrações de personagens bíblicos (incluindo Jesus e os seres angelicais), já contemplados por seres humanos, são
aceitáveis quando não destinadas à veneração e quando não desvirtuam o caráter do respectivo personagem. Mas Deus o
Pai, “que habita em luz inacessível, a quem homem algum jamais viu, nem é capaz de ver” (1 Tm 6:16), jamais deveria ser
reproduzido pela imaginação humana, quer em esculturas ou em pinturas. João 4:24 diz que “Deus é espírito; e importa
que os Seus adoradores O adorem em espírito e em verdade”.

Cremos, por conseguinte, que o segundo mandamento do Decálogo proíbe a elaboração, não de simples ilustrações
religiosas, mas de qualquer objeto que desvirtue de alguma forma a adoração devida exclusivamente a Deus.
Fonte: Sinais dos Tempos, julho/agosto de 2001. p. 30 (usado com permissão)

O debate adventista sobre a Trindade


Jerry Moon, Ph.D.
Diretor do Departamento de História Eclesiástica do Seminário Teológico Adventista, Andrews University, Berrien Springs,
Michigan; editor da Andrews University Seminary Studies.
Resumo: Este artigo descreve o desenvolvimento da compreensão adventista da doutrina da Trindade ao longo de
mais de um século e meio de história. O autor divide esse desenvolvimento em seis períodos, nos quais são mencionadas
as respectivas contribuições literárias mais significativas sobre o assunto. Especial atenção também é dada à superação do
antitrinitarianismo inicial e ao ressurgimento contemporâneo desta teoria entre grupos dissidentes do adventismo.
Abstract: This article describes de development of the Seventh-day Adventist understanding of the doctrine of the
Trinity over more then a century and a half of history. The author divides that development in six phases, in which the
respective most important literary contributions on the subject are mentioned. Special attention is given to the
supperation of early antitrinitarianism and its  contemporary reapearence among Adven-tist offshut groups.
Introdução
Quarenta anos se passaram desde que Erwin R. Gane demonstrou que a maioria dos líderes entre os primeiros
adventistas do sétimo dia defendiam uma teologia antitrinitariana. 1 Ele também apresentou forte evidência para uma
segunda hipótese: que a co-fundadora Ellen G. White era uma exceção à opinião da maioria. “Ela era”, asseverou, “uma
monoteísta trinitariana”.2 Gane não tentou reconstruir a história da mudança desde a rejeição até à aceitação do
trinitarianismo, mas tratou amplamente da atuação de Ellen White na mudança teológica. Documentando, porém, dois
importantes pontos de partida, ele preparou o cenário para que outros investigadores levem adiante sua obra.
Desde então, vários autores têm aceitado aspectos destes dois grandes pontos de debate. Russell Holt, em 1969,
baseado na tese de Gane, adicionou outra significativa evidência concernente a Tiago White, J. N. Andrews, A. C.
Bourdeau, D. T. Bourdeau, R. F. Cottrell, A. T. Jones, W. W. Prescott, J. Edson White e M. L. Andreasen. Concluindo, Holt
afirmou que até 1890 o “campo era dominado por” antitrinitarianos; de 1890 a 1900, “o rumo da denominação foi
decidido por declarações de Ellen G. White”, e durante o período de 1900 a 1930 morreram muitos dos principais
antitrinitarianos, de sorte que por volta de 1931 o trinitarianismo “havia triunfado e se tornado o ponto de vista oficial
denominacional.” Assim, Holt aproximou a trajetória histórica da presente pesquisa, embora o tamanho de sua tese não
permitisse tratamento em profundidade.3
Dois anos depois, L. E. Froom, em Moviment of Destiny, apresentou um início mais antigo de trinitarianismo, afirmando
que E. J. Waggoner, já no ano de 1888, tinha se tornado essencialmente trinitariano ou, no mínimo, “anti-ariano”, mas
somente por “súplica especial” poderia ele sustentar este aspecto de sua hipótese.4 Contudo, Moviment of
Destiny apresenta um exame mais detalhado das fontes primárias sobre trinitarianismo e antitrinitarianismo no
movimento adventista do que pode ser encontrado em qualquer  outro lugar. Pela magnitude, sua obra dá uma
importante contribuição para a história da teologia adventista da Divindade.
Em 1996, Merlin Burt contribuiu com detalhes e necessária profundidade para a compreensão da doutrina na primeira
metade do século vinte.5 Woodrow Whidden ampliou a discussão teológica sistemática unindo os avanços em soteriologia
e a nova abertura ao trinitarianismo durante a década de 1888-1898.6
Todas estas contribuições basicamente comprovam a tese original de Gane. Como resultado, sua afirmação de que
muitos dos principais pioneiros do adventismo do sétimo dia eram antitrinitarianos em sua teologia, tornou-se história
adventista aceita. Em 2003, porém, o significado dessa história para a fé e prática passou a ser mais calorosamente
debatido do que nunca. Por um lado, alguns adventistas têm envolvido o antitrinitarianismo dos pioneiros em uma teoria
de conspiração ecumênica, alegando que os dirigentes adventistas traíram a “verdade” original por amor às relações
públicas, como um meio de desfazer a imagem sectária da denominação. 7Por outro lado, a questão sobre se a crença em
Deus como uma Trindade é realmente bíblica recebe força adicional do fato de que alguns teólogos contemporâneos da
mais vasta comunidade protestante estão aceitando novamente o questionamento histórico do trinitarianismo
tradicional.8
A finalidade deste artigo é examinar o processo de mudança na opinião adventista da Trindade, a fim de descobrir o
que motivou as alterações, e também se elas resultaram de uma crescente compreensão bíblica ou se foram
impulsionadas pelo desejo de sermos vistos como ortodoxos pela mais ampla comunidade cristã.

O desenvolvimento da doutrina da Divindade no adventismo do sétimo dia pode ser dividido em seis períodos: (1)
Predominância antitrinitariana (1846-1888); (2) Insatisfação com o antitrinitarianismo (1888-1898);  (3) Mudança de
paradigma (1898-1913);  (4) Declínio do antitrinitarianismo (1913-1946);  (5) Predominância trinitariana (1946-1980); e
Tensões renovadas (1980 até o presente). Os três primeiros períodos foram discutidos por Gane, Holt e Froom, e o período
de 1888-1957, por Merlin Burt. Entretanto, nenhum desses lidam extensamente com os problemas trinitarianos durante a
crise de Kellogg9ou o período a partir de 1980.10

Predominância antitrinitariana  (1846-1888)


De cerca de 1846 a 1888, a maioria dos adventistas rejeitava o conceito da Trindade – ao menos como eles o
entendiam. Todos os principais escritores foram antitrinitarianos, embora a literatura contenha referências ocasionais a
membros que mantinham opiniões trinitarianas. Ambrose C. Spicer, pai de William Ambrose Spicer, Presidente da
Associação Geral, tinha sido um ministro batista do sétimo dia antes da sua conversão ao Adventismo em 1874.
Evidentemente, ele continuou trinitariano, porque W. A. Spicer relatou a A. W. Spalding que seu pai “ficou tão ofendido
ante a atmosfera antitrinitariana de Battle Creek que deixou de pregar.”11 S. B. Whitney tinha sido trinitariano, mas no
processo de sua doutrinação como adventista em 1861, tornou-se um convicto antitrinitariano. Sua experiência evidencia
que no mínimo alguns ministros ensinavam o antitrinitarianismo como um elemento essencial da instrução dos novos
conversos.12 R. F. Cottrell, por outro lado, escreveu na Review que, embora ele não acreditasse na Trindade, jamais “tinha
pregado contra ela” ou escrito anteriormente sobre isto. 13 Uma terceira partícula de evidência de que nem todos
concordavam com o antitrinitarianismo foi a observação de D. T. Bourdeau em 1890: “Embora afirmemos ser crentes e
adoradores de um só Deus, tenho pensado que há tantos deuses entre nós como existem concepções da Divindade.”14
Aqueles que rejeitavam a doutrina tradicional da Trindade dos credos cristãos eram crentes sinceros no testemunho
bíblico concernente à eternidade de Deus o Pai, à divindade de Jesus Cristo “como Criador, Redentor e Mediador” e à
“importância do Espírito Santo.”15 Conquanto alguns, muito cedo na história adventista, sustentassem que Cristo fora
criado,16 era amplamente aceito por volta de 1888 que Ele tinha preexistido “em tempos tão remotos nos dias da
eternidade que para a compreensão finita Ele era “praticamente sem princípio”. Seja qual for o princípio que possa estar
envolvido, não foi por “criação”.17 Além disso, eles não estavam inicialmente convictos de que o Espírito Santo fosse uma
Pessoa divina individual e não meramente uma expressão para a presença, poder ou influência divina.
“Com respeito à trindade, concluí que me era impossível crer que o Senhor Jesus Cristo, o Filho do Pai, fosse também o
Deus Todo-poderoso, o Pai, um e o mesmo ser”, escreveu José Bates concernentemente à sua conversão em 1827. Disse
ele ao seu pai: “Se você puder me convencer de que somos um neste sentido, de que você é meu pai, e eu seu filho; e
também que eu sou seu pai, e você meu filho, então eu posso crer na trindade.” Por causa desta diferença, ele preferiu
unir-se à Conexão Cristã em vez de à Igreja Congregacional de seus pais. 18 Alguém poderia ser tentado a descartar a
afirmação de Bates como simples ignorância do significado de Trindade, mas havia então, e permanece ainda hoje, uma
variedade de pontos de vista reivindicando o termo “Trindade”. Cottrell observou em 1869 que havia “uma multidão de
opiniões” sobre a Trindade, “todas elas ortodoxas, eu suponho, desde que havia um assentimento nominal à doutrina.”19
Os primeiros adventistas apresentavam no mínimo seis motivos para sua rejeição do termo “Trindade”. O primeiro era
que eles não viam evidência bíblica para três pessoas em uma Divindade. Isto não era uma nova objeção. 20 Em sua forma
mais simples, o conceito de Trindade é o resultado de afirmar, pela autoridade das Escrituras, tanto a “unidade” quanto a
“triunidade” de Deus, a despeito da incapacidade humana de compreender plenamente a Realidade pessoal e divina para
a qual esses termos apontam. A maneira como isto pode ser explicado tem sido o objeto de muita reflexão e especulação
através dos séculos. A influência da filosofia grega sobre o desenvolvimento doutrinal da história cristã primitiva e
medieval é bem conhecido.21
O segundo motivo dado pelos primeiros adventistas para a rejeição da Trindade era a concepção errônea que tornava
o Pai e o Filho idênticos. Já notamos o testemunho de Bates: “Com respeito à Trindade, concluí que me era impossível crer
que o Senhor Jesus Cristo, o Filho do Pai, era também o Deus Todo-poderoso, o Pai, um e o mesmo ser.” 22 D. W. Hull, J. N.
Loughborough, S. B. Whitney e D. M Canright partilhavam desta opinião.23 O conceito de que o Pai e o Filho são idênticos
aproxima-se de uma antiga heresia chamada Monarquianismo Modalista, ou Sabelianismo (de Sabélio, um dos seus
proponentes do terceiro século). Os modalistas “afirmavam que na Divindade a única diferenciação era uma mera
sucessão de modos ou operações.” Os modalistas negavam a  triunidade de Deus e asseveravam que Pai, Filho e Espírito
Santo não são personalidades separadas.24
Uma terceira e oposta objeção à doutrina da Trindade baseava-se na compreensão equivocada de que ela ensina a
existência de três Deuses. “Se Pai, Filho e  Espírito Santo são cada um de per si Deus, seriam três Deuses”, escreveu
Loughborough em 1861.25
Uma quarta opinião era que a crença na Trindade diminuiria o valor da expiação.26 Eles arrazoavam que como “o Deus
sempre vivo e auto-existente” não pode morrer, então se Cristo tivesse existência própria como Deus, Ele não poderia ter
morrido no Calvário. Se apenas a humanidade morreu, então Seu sacrifício era meramente um sacrifício humano,
inadequado para a redenção.27 Destarte, a fim de proteger a realidade de Sua morte na cruz, os primeiros adventistas
achavam que eles tinham de negar que Cristo, em Sua preexistência, possuía divina imortalidade. Conquanto este
raciocínio pudesse ter parecido lógico a alguns, suas premissas básicas foram terminantemente rejeitadas por Ellen White
em 1897. Ela declarou que quando Jesus morreu na cruz, “a divindade não morreu. A humanidade morreu.” 28 Sua
influência sobre os leitores adventistas, e a confiança destes na fonte de sua informação era tal que as implicações de tal
pronunciamento não podiam ser ignoradas, dando aos eruditos adventistas mais um motivo para reavaliar seu paradigma
básico concernente à Divindade.
Quinto, o fato de que Cristo é chamado “Filho de Deus” e “o princípio da criação de Deus” (Ap 3:14) era cogitado para
provar que Ele devia ser de origem mais recente do que Deus o Pai.29
Sexto, argumentava-se que “há várias expressões concernentes ao Espírito Santo que indicavam que ele [sic] não podia
adequadamente ser considerado como uma pessoa, tais como sendo ‘derramado’ no coração [Rm 5:5], e ‘derramarei
sobre toda a carne’ [Jl 2:28].” 30 Estes argumentos, porém, dependiam de dar uma interpretação muito literal a expressões
que podiam também ser vistas como figuras de linguagem. Estes argumentos faziam sentido dentro de um paradigma
totalmente antitrinitariano, mas quando esse paradigma foi posto em dúvida, estes pontos foram reconhecidos como
sendo capazes de se ajustarem a uma ou outra interpretação.
Nenhum destes é uma objeção válida ao conceito básico trinitariano de um Deus em três Pessoas. 31No entanto, todos
eles eram baseados em textos bíblicos. Finalmente os adventistas mudaram seu ponto de vista da Divindade porque
chegaram a uma compreensão diferente dos textos bíblicos.

Insatisfação com o antitrinitarianismo  (1888-1898)


O enfoque em “Cristo nossa justiça”, dado pela sessão da Conferência Geral de 1888, e a consequente exaltação da
cruz de Cristo, pôs seriamente em dúvida se uma divindade derivada, subordinada, podia adequadamente esclarecer o
poder salvador de Cristo. E. J. Waggoner insistiu na necessidade de “apresentar a legítima posição de Cristo em igualdade
com o Pai, a fim de que Seu poder para redimir pudesse ser melhor apreciado.” 32 Conquanto por volta de 1890 Waggoner
ainda não tivesse compreendido plenamente a infinitamente eterna preexistência de Cristo, 33 ele argumentava
convincentemente que Cristo não era criado, que “Ele tem ‘vida em Si mesmo’ [Jo 10:17]; Ele possui imortalidade inerente
a Si mesmo.”  Waggoner insistiu na “Divina unidade do Pai e do Filho” e afirmou que Cristo é “por natureza, da própria
substância de Deus, e tendo vida em Si mesmo, Ele é adequadamente chamado Jeová, o Deus vivo” (Jr 23:36), “que está
em uma igualdade com Deus (Fp 2:6, ARV), “tendo todos os atributos de Deus.” 34. Waggoner não era ainda plenamente
trinitariano, mas ele via claramente que uma concepção mais exaltada da obra de redenção realizada por Cristo exigia uma
concepção mais alta do Seu ser como Divindade. “O fato de que Cristo é uma parte da Deidade, possuindo todos os
atributos da Divindade, sendo igual ao Pai em todos os aspectos, como Criador e Legislador, é a única força que há na
expiação… Cristo morreu ‘para levar-nos a Deus’ (1Pe 3:18); mas se Lhe faltava um jota de ser igual a Deus, não poderia
levar-nos a Ele.”35 A força deste raciocínio leva inevitavelmente ao reconhecimento da plena igualdade de Cristo também
em preexistência.
Desse modo, a dinâmica da justiça pela fé e suas consequências para a doutrina de Deus provê o contexto histórico
para o provocante comentário de D. T. Bourdeau de que “embora afirmemos ser crentes e adoradores de um só Deus,
tenho pensado que há tantos deuses entre nós como existem concepções da Divindade.” 36 Tal observação de um
evangelista e missionário altamente respeitado parece indicar que a confiança coletiva no paradigma antitrinitariano
estava mostrando algumas rupturas.  Outra evidência de que isto era assim apareceu dois anos depois, em 1892, quando a
Pacific Press publicou um panfleto intitulado The Bible Doctrine of the Trinity (A Doutrina Bíblica da Trindade), de Samuel T.
Spear. O panfleto corrigia dois conceitos equivocados prevalecentes da doutrina da Trindade, mostrando que ela “não é
um sistema de triteísmo, ou a doutrina de três Deuses, mas é a doutrina de um Deus subsistindo e agindo em três pessoas,
com a qualificação de que o termo ‘pessoa’… quando usado nesta relação, não deve ser compreendido em qualquer
sentido que o tornaria incompatível com a unidade da Divindade.”37
Em 1898, Uriah Smith preparou Looking Unto Jesus, a mais compreensiva e cuidadosamente matizada exposição do
ponto de vista não trinitariano entre os adventistas. Smith repudiou enfaticamente sua opinião anterior de que Cristo
tinha sido criado, mas ainda mantinha que “somente Deus [o Pai] é sem princípio. Na época mais antiga quanto um
princípio poderia ser – um período tão remoto que para mentes finitas é essencialmente eternidade –, apareceu o Verbo.”
Através de algum meio não claramente revelado nas Escrituras, Cristo fora “gerado”, ou “por algum impulso ou processo
divino, não criação”, Cristo fora trazido à existência pelo Pai. Em um parágrafo Smith surpreendentemente se aproxima de
uma declaração trinitariana: “Esta união entre o Pai e o Filho não diminui a nenhum dos dois, mas fortalece a ambos. Por
meio dela, em conexão com o Espírito Santo, temos toda a Divindade.”38   Mas esse vagaroso esforço em direção de uma
compreensão mais ampla foi eclipsado pelas ousadas declarações de O Desejado de Todas as Nações, publicado no mesmo
ano. O livro O Desejado de Todas as Nações produziu uma mudança de paradigma nas percepções adventistas da
Divindade.

Mudança de paradigma  (1898-1913)


O período de 1898-1913 testemunhou uma quase completa inversão do pensamento adventista sobre a Trindade.
Digo quase porque essa mudança de paradigma não levou à unanimidade sobre o assunto. Como documentou Merlin
Burt, alguns líderes pensantes que tendiam para a “velha opinião” permaneceram vocais, mas com influência decrescente,
por muitos anos.39
Contudo, a publicação de O Desejado de Todas as Nações, de Ellen White, em 1898, tornou-se a linha divisória para a
compreensão adventista da Trindade. Começando com o primeiro parágrafo do livro, ela pôs em dúvida a opinião
dominante dos primeiros adventistas concernente à relação de Cristo com o Pai. Declarava sua terceira sentença do
Capítulo 1: “Desde os dias da eternidade o Senhor Jesus Cristo era um com o Pai” (ênfase suprida). Todavia, mesmo isto
não foi suficientemente inequívoco para esclarecer o seu ponto de vista no tocante à divindade de Jesus, pois como temos
visto, outros tinham usado linguagem semelhante sem crer na infinitamente eterna preexistência de Cristo.
Posteriormente no livro, escrevendo sobre a ressurreição de Lázaro, ela citou as palavras de Cristo: “Eu sou a ressurreição
e a vida”, e fez, em seguida, um comentário de sete palavras que começaria a mudar a maré da teologia antitrinitariana
entre os adventistas: “Em Cristo há vida original, não emprestada, não derivada” (ênfase suprida).40 Em última análise,
Cristo não derivava Sua vida divina do Pai. Como um homem sobre a Terra, Ele subordinou Sua vontade à vontade do Pai
(Jo 5:19, 30), mas como Deus auto-existente, Ele tinha poder para depor Sua vida e tornar a tomá-la.  Desse modo,
comentando sobre a ressurreição de Cristo, outra vez Ellen White asseverou Sua plena divindade e igualdade com o Pai,
declarando: “O Salvador saiu do sepulcro pela vida que havia em Si mesmo.” 41
Essas declarações vieram como um choque para a liderança da Igreja. M. L. Andreasen, que havia se tornado
adventista apenas quatro anos antes, na idade de 18 anos, e que eventualmente lecionaria no seminário norte-americano
da Igreja, afirmou que o novo conceito era tão diferente da compreensão anterior que alguns líderes preeminentes
duvidaram sobre se Ellen White realmente o havia escrito.  Depois que Andreasen ingressou no ministério em 1902, ele fez
uma viagem especial ao lar de Ellen White na Califórnia para investigar o assunto por si mesmo. Ellen White o recebeu e
deu-lhe “acesso aos manuscritos”. Ele havia levado consigo “várias citações” para “ver se elas estavam no original do
próprio manuscrito dela. Ele relembrou: “Eu estava certo de que a Irmã White jamais tinha escrito: ‘Em Cristo há vida
original, não emprestada, não derivada.’ Mas agora eu descobri em seu próprio manuscrito precisamente como ele tinha
sido publicado. E assim era com outras declarações. Ao examinar, descobri que elas eram as próprias expressões da Irmã
White.”42
O Desejado de Todas as Nações continha declarações igualmente inflexíveis concernentes à divindade do Espírito
Santo. Empregava repetidamente o pronome pessoal “ele” ao referir-se ao Espírito Santo, culminando com a
impressionante declaração: “O Espírito Santo… ia ser dado como agente de regeneração, sem o qual o sacrifício de Cristo
de nenhum proveito teria sido… Ao pecado só se poderia resistir e vencer por meio da poderosa operação da terceira
pessoa da Trindade, a qual viria, não com energia modificada, mas na plenitude do divino poder” (ênfase suprida).43 [O
texto em inglês diz: Third Person of the Godhead – Terceira Pessoa da Divindade. A palavra Trinity (Trindade) não existe
nos escritos de E. G. White. – Nota do Tradutor].
Estas e outras declarações similares levaram alguns a um novo exame da evidência bíblica acerca da Divindade. Outros,
descrendo que tivessem estado em erro por tantos anos, estudaram para sustentar os velhos argumentos. O testemunho
de Ellen White, porém, chamando a atenção para as Escrituras cujo significado tinha sido negligenciado, 44 criou uma
mudança de paradigma que não poderia ser revertida. Ao se voltarem os adventistas para as Escrituras para ver “se estas
coisas eram assim” (Atos 17:11), chegaram finalmente a um crescente consenso de que o conceito básico da Trindade era
uma verdade bíblica a ser aceita e abraçada.
Conquanto O Desejado de Todas as Nações pusesse em movimento uma mudança de paradigma no tocante à
compreensão adventista da Divindade, ele não era a última palavra de Ellen White sobre o assunto. Posteriormente,
durante a crise de Kellogg de 1902-1907, ela usou repetidamente expressões como “três pessoas vivas do trio celestial”,
embora continuasse mantendo a unidade essencial da Divindade. Assim, ela afirmou a pluralidade e a unidade,
a triunidade e a unicidade, os elementos fundamentais de uma compreensão simples e bíblica da Trindade.45
Evidência de que ao menos uma porção da liderança da Igreja reconheceu as declarações de O Desejado de Todas as
Nações como removendo as objeções a uma doutrina bíblica da Trindade é um sumário das crenças adventistas publicado
por F. M. Wilcox na Review and Herald, em 1913. Wilcox, editor do mais influente periódico denominacional, escreveu que
“os adventistas do sétimo dia crêem 1) Na Trindade divina. Essa Trindade consiste do eterno Pai,… do Senhor Jesus Cristo,
… [e] do Espírito Santo, a terceira pessoa da Divindade.”46

Declínio do antitrinitarianismo (1913-1946)


A despeito da declaração de Wilcox na Review (ou talvez por cauda dela), o debate sobre a Trindade intensificou-se
nas primeiras décadas do século vinte. Na Conferência Bíblica de 1919, a eternidade de Cristo e Sua relação com o Pai
foram os principais e não resolvidos assuntos do debate. Curiosamente, em vista da declaração de Ellen White, em O
Desejado de Todas as Nações, de que a vida de Cristo era “não derivada”, até mesmo W. W. Prescott, o mais notável
proponente de uma opinião trinitariana na conferência, defendia que a existência de Cristo era sob certos aspectos
“derivada” do Pai.47 Isto pode constituir evidência de que a liderança não estava contente em simplesmente aceitar o
pronunciamento de Ellen White sem examiná-lo por si mesmos nas Escrituras. Ou talvez, mostre a consciente ou
inconsciente reflexão de Prescott sobre fontes clássicas trinitarianas.48
A polarização do Cristianismo americano entre modernismo e fundamentalismo nas primeiras duas décadas do século
20 tendia a aproximar os adventistas de uma posição trinitariana, sendo que em tantas outras áreas – como evolução,
crença no sobrenatural, nascimento virginal de Cristo, milagres, ressurreição literal – os adventistas estavam em oposição
aos modernistas e simpatizavam com os fundamentalistas.49
Em 1930, a Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia recebeu uma solicitação de sua Divisão Africana de que
“uma declaração de fé dos adventistas fosse impressa no Year Book para ajudar “os oficiais do governo e outros a
compreender melhor a nossa obra.” Em resposta, a Comissão da Associação Geral apontou uma subcomissão (que
consistia de M. E. Kern, secretário associado da Associação Geral; F. M. Wilcox, editor da Review and Herald;  E. R. Palmer,
gerente da Review and Herald; e C. H. Watson, presidente da Associação Geral) a fim de preparar uma declaração das
crenças adventistas.50 Wilcox, como o principal escritor entre eles, esboçou uma declaração de 22 pontos, que foi
subseqüentemente publicada no SDA Year Book de 1931.51 O segundo ponto falava da “Divindade, ou Trindade”, e o
terceiro afirmava “que Jesus Cristo é verdadeiro Deus”, um eco do credo niceno. Para que ninguém pense que os
adventistas pretendiam formar um credo, “nenhuma aprovação formal ou oficial” foi procurada para a declaração. Quinze
anos mais tarde, quando a declaração havia obtido aceitação geral, a assembléia da Associação Geral de 1946 a tornou
oficial, votando que “nenhuma revisão desta Declaração de Crenças Fundamentais, como aparece agora no Manual da
Igreja, deve ser feita em qualquer tempo exceto em uma assembléia da Associação Geral.”52 Isto assinalou o primeiro
endosso oficial de uma opinião trinitariana pela Igreja, embora “o último dos bem conhecidos expositores” continuasse a
“defender a ‘velha’ opinião” até a sua morte em 1968.53

Predominância trinitariana        (1946-1980)


Desde a aposentadoria de F. M. Wilcox em 194454 até à publicação de Movement of Destiny em 1971,55 L. E. Froom foi o
mais visível campeão do trinitarianismo entre os adventistas do sétimo dia. Seu livro The Coming of the Comforter (A Vinda
do Consolador) foi sem precedentes entre os adventistas (exceto em algumas passagens de Ellen White) em sua exposição
sistemática da personalidade do Espírito Santo e da natureza trinitariana da Divindade. 56 A importante atuação de Froom
no preparo da obra de 1957, Questions on Doctrine, tem sido amplamente documentada em outra parte. 57 Questions on
Doctrine despertou uma tempestade de controvérsia por certas declarações sobre cristologia e a expiação, mas sua clara
afirmação da “Trindade celestial”58 permaneceu virtualmente incontestada – talvez porque M. L. Andreasen, o principal
crítico do livro em outras áreas era um trinitariano convicto. 59A palavra final de Froom foi seu livro de 700
páginas Movement of Destiny publicado em 1971. Apesar dos “exemplos de defesa especial” e problemas de preconceitos
históricos que “diminuem um pouco a obra como história confiável”,60 ele todavia documenta inteiramente o movimento
da teologia adventista em direção de um consenso bíblico trinitariano.
O clímax desta fase de desenvolvimento doutrinal foi uma nova declaração de crenças fundamentais, votada pela
assembléia da Associação Geral de 1980 em Dallas.  A nova declaração de vinte e sete “Crenças Fundamentais”, como a
declaração de 1931, afirmava explicitamente a crença na Trindade. A afirmação vinha no segundo artigo da declaração (em
seguida a um preâmbulo e um primeiro artigo sobre a inspiração e autoridade das Escrituras). “2. A Trindade[.] Há um só
Deus: Pai, Filho e Espírito Santo, uma unidade de três Pessoas coeternas.”61 O artigo 4 afirma que “Deus o eterno Filho
encarnou-Se em Cristo Jesus… Para sempre verdadeiro Deus, Ele tornou-Se também verdadeiro homem.”62 O artigo 5
declara que “Deus o eterno Espírito estava ativo com o Pai e o Filho na Criação, encarnação e redenção”, e foi “enviado
pelo Pai e o Filho para estar sempre com Seus filhos.”63 Em vários pontos, a declaração ecoa a terminologia dos credos
clássicos trinitarianos, até mesmo incluindo a cláusula do Filioquê com referência ao Espírito Santo.64
Uma breve recapitulação das declarações de fé adventistas pode esclarecer o significado do voto de 1980. A
primeira Declaração de Princípios Fundamentais Ensinados e Praticados pelos Adventistas do Sétimo Dia (1872) foi a obra
de Uriah Smith.65 Seus dois primeiros artigos tratam do Pai, Filho e Espírito Santo.
-I-

Que há um só Deus, um ser pessoal e espiritual, o criador de todas as coisas, onipotente, onisciente e eterno, infinito
em sabedoria, santidade, justiça, bondade, verdade e misericórdia; imutável  e  presente em toda parte pelo seu
representante, o Espírito Santo (Sl 139:7).

- II -

Que há um só Senhor Jesus Cristo, o Filho do Eterno Pai, por meio de quem Deus criou todas as coisas, e por meio de
quem elas consistem; que ele tomou sobre si a natureza da semente de Abraão para a redenção de nossa raça caída; que
ele habitou entre os homens cheio de graça e de verdade, viveu como nosso exemplo, morreu como nosso sacrifício,
ressurgiu para nossa justificação, ascendeu às alturas para ser nosso único mediador no santuário do céu, onde, com o seu
próprio sangue faz expiação por nossos pecados.66
É notável que embora não haja nenhuma referência ao termo Trindade, não há qualquer manifestação polêmica
contra uma posição trinitariana. Smith estava se esforçando claramente para aderir tanto quanto possível à linguagem
bíblica. A declaração representava um consenso na época, mas, em harmonia com sua explícita desaprovação no
preâmbulo de qualquer declaração de credo,67nunca lhe foi dada a aprovação oficial.
A segunda declaração de “Princípios Fundamentais” (1889), também de Uriah Smith, 68 é igualmente uma declaração de
consenso que evita estimular quaisquer pontos de discordância. Como acontece com a declaração de 1872, o preâmbulo
mantém “nenhum credo senão a Bíblia”, e além disso  afirma que “as seguintes proposições podem ser compreendidas
como um sumário das principais características de sua [dos adventistas do sétimo dia] fé religiosa, sobre a qual existe,
tanto quanto sabemos, inteira unanimidade em todo o corpo de crentes” (ênfase suprida).69 Evidentemente, Smith não
considerava os excelentes pontos da doutrina da Divindade como tendo destaque entre as “principais características” da
fé adventista naquele tempo, porque dificilmente ele poderia ter deixado de perceber que havia certos  desacordos de
pouca importância relacionados com a Trindade. 70 O artigo I de 1872 (citado acima), foi reproduzido sem mudança na
declaração de 1889. O artigo II da declaração de 1889 tem algumas modificações na linguagem acerca da obra de Cristo,
mas nenhuma mudança substancial em sua referência à pessoa de Cristo. 71 Uma vez que esses artigos aderem
estritamente à terminologia bíblica, podem ser interpretados favoravelmente tanto por antitrinitarianos quanto por
trinitarianos.
A terceira declaração de “Crenças Fundamentais dos Adventistas do Sétimo Dia”,72  preparada sob a direção de uma
comissão, foi realmente escrita por F. M. Wilcox, editor da Review and Herald.73Quinze anos mais tarde, em 1946, ela
tornou-se a primeira declaração a ter o endosso oficial de uma sessão da Associação Geral.74   Declara o artigo 2:
Que a Divindade, ou Trindade, consiste do Pai Eterno, um Ser pessoal, espiritual,  onipotente, onipresente, onisciente,
infinito em sabedoria e amor; o Senhor Jesus Cristo, o Filho do Eterno Pai, por intermédio de quem todas as coisas foram
criadas e através de quem a salvação das hostes redimidas será realizada; o Espírito Santo, a terceira pessoa da Divindade,
o grande poder regenerador na obra de redenção (Mt 28:19).75
Destarte, a declaração votada em Dallas em 1980 foi a quarta declaração de crenças fundamentais dos adventistas do
sétimo dia, mas apenas a segunda a ser votada oficialmente por uma assembléia da Associação Geral. Poder-se-ia esperar
que a adoção oficial da explicitamente trinitariana declaração de Dallas trouxesse encerramento ao debate de um século,
mas ela demonstrou ser a precursora de tensões renovadas.

Tensões renovadas e prosseguimento do debate  (1980 ao presente)


O período de 1980 até o presente tem sido caracterizado por renovado debate ao longo de um espectro de idéias
desde as reacionárias às contemporâneas. Logo depois da declaração de Dallas – e talvez em reação a ela – vozes das
“extremidades” da Igreja começaram a defender que as antigas opiniões dos pioneiros estavam corretas, que as
declarações aparentemente trinitarianas de Ellen White tinham sido mal-interpretadas e que a declaração de Dallas
representava apostasia das crenças bíblicas dos pioneiros.76 Alguns, em aparente ignorância do voto de 1946, criam que a
declaração de Dallas era a primeira declaração de fé adventista oficialmente votada, e portanto, que sua própria existência
era uma aberração do modelo histórico.77   Citações das fontes primárias, extraídas do seu contexto histórico e
reacondicionadas em plausíveis teorias conspiratórias, mostravam-se bastante convincentes para muitos.78
Um incremento mais substancial era a incessante investigação para articular uma doutrina bíblica da Trindade,
claramente diferenciada das pressuposições filosóficas gregas que envolviam as tradicionais declarações dos credos. Raoul
Dederen havia apresentado em 1970 uma breve exposição da Divindade do Antigo e do Novo Testamento. 79 Ele rejeitava a
“Trindade do pensamento especulativo” que criava filosóficas “distinções dentro da Divindade para o que não havia base
definível dentro do conhecimento revelado de Deus.” Em vez disso, ele defendia o exemplo dos apóstolos: “Rejeitando os
termos da mitologia grega ou da metafísica, eles expressavam suas convicções em uma despretenciosa confissão de fé
trinitariana, a doutrina de um só Deus subsistindo e agindo em três pessoas.”80
Edificando sobre esta linha de raciocínio, Fernando Canale, aluno de Dederen, apresentou em 1983 uma crítica radical
das pressuposições filosóficas gregas destacando o que Dederen havia classificado como “pensamento especulativo”. A
tese doutoral de Canale, A Criticism of Theological Reason,afirmava que a teologia católica romana e a teologia clássica
protestante tiravam seus mais básicos pressupostos acerca da natureza de Deus, tempo e existência, de uma “estrutura”
provida pela filosofia aristotélica. Canale afirmava que para a teologia cristã tornar-se realmente bíblica, ela deveria
derivar seus “pressupostos primordiais” das Escrituras, não da filosofia grega.81
No mais recente Handbook of Seventh-day Adventist Theology (2000), editado por Dederen, Canale foi o autor de um
artigo magistral sobre as descobertas de sua contínua obra no que tange à doutrina de Deus. Novamente, Canale faz
explicitamente a diferenciação entre uma doutrina de Deus baseada nas pressuposições filosóficas gregas e uma baseada
nos pressupostos bíblicos,82 defendendo fortemente sua opinião de que somente através de uma disposição de “partir da
concepção filosófica de Deus como atemporal” e “abraçar a concepção histórica de Deus conforme apresentada na Bíblia”,
pode alguém descobrir um ponto de vista realmente bíblico da Trindade.83
A terceira linha de raciocínio procura localizar o trinitarianismo adventista no contexto da teologia sistemática
contemporânea. Aprovando o descontentamento de Canale com a teologia clássica, mas conduzindo a crítica em uma
direção diferente, estava a obra The Reign of God, de Richard Rice (1985). Rice afirmava que a Trindade estava implícita,
embora não explícita, nas Escrituras.84 Fritz Guy, em Thinking Theologically (1999), concorda que “as formulações
tradicionais” da doutrina da Trindade “não são inteiramente satisfatórias.” 85 Ele deprecia uma percebida tendência em
direção do triteísmo86e favorece a atualização da linguagem para torná-la mais “funcional e do gênero neutro.” 87 O livro de
Guy, porém, não é uma exposição sistemática da doutrina de Deus ou da Trindade, e os leitores devem acautelar-se de ler
demasiado em breves referências ilustrativas. A forma como suas sugestões finalmente afetarão a discussão ainda está
para ser vista.

Conclusão
O longo processo de mudança desde a rejeição inicial do trinitarianismo dos credos pelos primeiros adventistas até à
sua eventual aceitação de uma doutrina da Trindade poderia ser corretamente chamada de uma busca por uma Trindade
bíblica.  Eles não eram tão preconceituosos contra as fórmulas tradicionais, mas estavam decididos a seguir à risca sua
doutrina o mais perto possível das Escrituras. A fim de basear suas crenças somente nas Escrituras e privar a tradição de
exercer qualquer autoridade teológica, eles achavam metodologicamente essencial rejeitar toda doutrina não claramente
fundamentada apenas nas Escrituras. Sendo que a doutrina tradicional da Trindade continha claramente elementos não
escriturísticos, eles a rejeitaram.

Finalmente, porém, eles se convenceram de que o conceito básico de um só Deus em três pessoasera realmente
encontrado nas Escrituras. Um artigo a ser publicado na próxima edição de Parousiaconsiderará mais detalhadamente a
atuação de Ellen White neste processo.

Referências
1
 Artigo traduzido do original em inglês por Francisco Alves de Pontes. Salvo indicação diversa, os textos bíblicos utilizados na
tradução são extraídos da Versão Almeida Revista e Atualizada. ↑
2
 Erwin R. Gane, “The Arian or Anti-Trinitarian Views Presented in Seventh-day Adventist Literature and the Ellen G. White
Answer” (dissertação de mestrado, Andrews University, 1963). ↑
3
 Russel Holt,  “The Doctrine of the Trinity in the Seventh-day Adventist Denomination: Its Rejection and Acceptance”
(Monografia, Seventh-day Adventist Theological Seminary, 1969), 25. ↑
4
 LeRoy Edwin Froom, Movement of Destiny (Washington, DC: Review and Herald, 1971), 279. Uma resenha crítica
contemporânea chama o argumento de Froom a esta altura de um exemplo de “defesa especial” (C. Mervyn Maxwell,
resenha crítica de Movement of Destiny por LeRoy Edwin Froom, inAUSS 10 [janeiro de 1972]: 121). ↑
5
 Merlin Burt, “Demise of Semi-Arianism and Anti-Trinitarianism in Adventist Theology, 1888-1957” (monografia, Andrews
University, 1996). Ellen G. White Research Center, Andrews University. A dissertação de Burt estende alguns elementos da
história até 1968. ↑
6
 Woodrow W. Whidden, “Salvation Pilgrimage: The Adventist Journey into Justification by Faith and Trinitarianism,” Ministry,
abril de 1998, 5-7. ↑
7
 David Clayton, “The Omega of Deadly Heresies,” s.e., s.d. [ca. 2000], nos arquivos do autor.  Cf. Idem, “Some Facts
Concerning the Omega Heresie,” www.restorationministry.com/open face/ html/2000/open face/2000.html;  acessado em
10 de março de 2003. Veja também Bob Deiner e outros em nn. 76-78 abaixo. ↑
8
 Veja e.g., Anthony F. Buzzard e Charles F. Hunting, The Doctrine of the Trinity, Christianity’s Self-Inflicted Wound (Bethesda,
MD: Christian Universities Press, 1998). ↑
9
 Veja Froom, 349-356. A aceitação do trinitarianismo por J. H. Kellogg será explorada em artigo a ser publicado na próxima
edição de Parousia. ↑
10
 Veja Fernando L. Canale, “Doctrine of God,” em Handbook of Seventh-day Adventist Theology, ed. Raoul Dederen,
Commentary Reference Series, vol. 12 (Hagerstown, MD: Review and Herald, 2000), 117-118, 126, 128-129, 132, 138-140,
145, 148-150. ↑
11
 A. W. Spalding para H. C. Lacey, 2 de junho de 1947, Adventist Heritage Center, Andrews University.↑
12
 Seymour B. Whitney, “Both Sides,” Review and Herald, 25 de fevereiro e 4 de março de 1862, 101-103, 109-111. ↑
13
 R. F. Cottrell, “The Doctrine of the Trinity,” Review and Herald, 1º de junho de 1869. ↑
14
 D. T. Bourdeau, “We May Partake of the Fullness of the Father and the Son,” Review and Herald, 18 de novembro de 1890,
707. ↑
15
 Gane, 109. ↑
16
 E.g., Uriah Smith, Thoughts, Critical and Practical on the Book of Revelation (Battle Creek, MI: Seventh-day Adventist
Publishing Association, 1865), 59. Posteriormente ele repudiou esta opinião (idem, Looking Unto Jesus [Battle Creek:
Review and Herald, 1898], 12, 17). ↑
17
 E. J. Waggoner, Christ and His Righteousness (Oakland, CA: Pacific Press, 1890), 21-22; cf. Uriah Smith, Looking Unto Jesus,
12, 17. ↑
18
 Joseph Bates, The Autobiography of Elder Joseph Bates (Battle Creek, MI: SDA Publishing Association, 1868), 205. ↑
19
 Cottrell, The Doctrine of the Trinity. ↑
20
 Os nomes de Ário, Serveto e Socino vêm à mente. Deuteronômio 6:4 ensina claramente que Deus é um, mas embora o
escritor pudesse ter usado o termo yakid para denotar um solitário “um”, o termo escolhido foi o hebraico ‘ekad, que
denota um composto “um” ou um de um grupo, em contraste com um solitário ou enfático “um”. A mesma palavra, ‘ekad,
é usada em Gênesis 2:24 para a unidade de marido e mulher, que se tornam “um”, mas dentro desta unidade, ainda retêm
sua individualidade (Woodrow Whidden, “The Strongest Bible Evidence for the Trinity,” in The Trinity: Understanding
God’s Love, His Plan of Salvation, and Christian Relationships, Woodrow Whidden, Jerry Moon e John Reeve [Hagerstown,
MD: Review and Herald, 2002], 33-34). Uma extensa discussão da evidência bíblica está além do escopo deste artigo, mas
basta dizer que o Antigo e o Novo Testamento contêm indicações de que o Único Deus não é meramente solitário, e o
Novo Testamento explicitamente se refere ao Pai, Filho e Espírito Santo (veja, por ex., Mt 28:19, 2Co 13:13) (ibid., 21-
117). ↑
21
 Veja Jerry Moon, “The Trinity in the Reformation Era: Four Viewpoints,” in The Trinity: Understanding God’s Love, His Plan
of Salvation, and Christian Relationships, 166-181. ↑
22
 Bates, 205. ↑
23
 Gane, 104. ↑
24
 F. L. Cross, ed., Oxford Dictionary of the Christian Church, 2d ed. (Oxford: Oxford University Press, 1983), “Monarchianism”
(veja também  “Modalism” e “Sabellianism”). ↑
25
 J. N. Loughborough, “Questions for Bro. Loughborough,” Advent Review and Sabbath Herald de 5 de novembro de 1861,
184. ↑
26
 Gane, 105. ↑
27
 J. H. Waggoner, The Atonement [Oakland, CA: Pacific Press, 1884), 173. Smith faz uma argumentação semelhante
em Looking Unto Jesus, 23. ↑
28
 E. G. White, Manuscrito 131, 1897, citado em SDA Bible Commentary, ed. Francis D. Nichol (Washington, DC: Review and
Herald, 1954), 5:1113. Posteriormente ela escreveu outra vez: “A humanidade morreu: a divindade não morreu” (idem,
“The Risen Savior,” Youth’s Instructor, 4 de agosto de 1898, parágrafo 1). ↑
29
 Uriah Smith, Thoughts on the Book of Daniel and the Revelation (Battle Creek, MI: Review and Herald, 1882), 487;
idem, Looking Unto Jesus, 10. ↑
30
 Uriah Smith, “In the Question Chair,” Review and Herald, 23 de março de 1897, 188. ↑
31
 O termo “pessoa”, conforme aplicado a Deus indica um ser com personalidade, intelecto e vontade. Dessemelhantes dos
múltiplos deuses do politeísmo, as três pessoas da Divindade bíblica são profundamente “um em propósito, em mente, em
caráter, mas não em pessoa.” Assim, a despeito de sua individualidade, eles nunca estão divididos, nunca em conflito, e
deste modo não constituem três deuses, mas um só Deus. ↑
32
 Waggoner, 19. ↑
33
 Ibid., 21-22. ↑
34
 Ibid., 22-23, 25. ↑
35
 Ibid., 44. ↑
36
 Bourdeau, 707. ↑
37
 Samuel T. Spear, “The Bible Doctrine of the Trinity, Bible Students,” Library, nº 90 (março de 1892), 3-14, reimpresso
de New York Independent, 14 de novembro de 1889. ↑
38
 Smith, Looking Unto Jesus, 3, 10, 17, esp. 13. ↑
39
 De acordo com Burt, 54, o último dos adventistas antitrinitarianos dos “velhos tempos” morreu em 1968. Uma nova
geração de neo-antitrinitarianos surgiria na década de 1980 (veja abaixo). ↑
40
 E. G. White, O Desejado de Todas as Nações, 22ª ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2003), 530. ↑
41
 Ibid., 785, veja também os próximos dois parágrafos. ↑
42
  M. L. Andreasen, “The Spirit of Prophecy,” palestra em Loma Linda, Califórnia, 30 de novembro de 1948, Adventist
Heritage Center, Andrews University, 3-4. ↑
43
 White, O Desejado de Todas as Nações, 669-671. ↑
44
 Textos bíblicos citados por Ellen White apoiando vários aspectos de uma opinião trinitariana inclusive Rm 8:16
(Evangelismo, 3ª ed [Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1999], 617); 1Co 2:10-14 (ibid.); Jo 16:7-14 (ibid., 616); Jo
14:16-18, 26; 16:8, 12-14 (O Desejado de Todas as Nações, 669-671); e Cl 2:9 (Evangelismo, 614). ↑
45
 Estas declarações e seu contexto na crise de Kellogg serão tratados com mais detalhes em artigo a ser publicado na
próxima edição de Parousia. ↑
46
 [F. M. Wilcox], “The Message for Today,” Review and Herald, 9 de outubro de 1913, 21. Sou grato a Bill Fagal do Centro de
Pesquisa Ellen White da Andrews University por me chamar a atenção para esta fonte. ↑
47
 >W. W. Prescott, “The Person of Christ,” apresentação de 2 de julho de 1919 in “Bible Conference Papers 1-8, 1-19 de julho
de 1919” [paginação contínua, p. 69; 2 de julho, sessão da tarde, p. 20], Adventist Heritage Center, Andrews University;
veja também Burt, 25-27. ↑
48
 A geração do Filho pelo Pai é uma formulação agostiniana (Oxford Dictionary of the Christian Church, “Trinity, Doctrine of
the.” Cf. W. W. Prescott, The Doctrine of Christ: A Series of Bible Studies for Use in Colleges and Seminaries (Washington,
DC: Review and Herald, 1920), 3, 20-21; veja também Burt, 30-33. ↑
49
 Prescott, 33. ↑
50
 “General Conference Committee Minutes”, 29 de dez. De 1930, 195, Adventist Heritage Center, Andrews University. ↑
51
 Froom, 413-414. ↑
52
 “Fifteen Meeting,” General Conference Report Nº 8, Review and Herald, 14 de junho de 1946, 197. Froom, 419, atribui esse
voto à sessão de 1950. Ele, evidentemente, leu sua fonte com muita pressa; a sessão de 1950 apenas reiterou o voto da
sessão de 1946 (“Fifteen Meeting,” General Conference Report Nº 10, Review and Herald, 23 de julho de 1950, 230). ↑
53
 Burt, 54. ↑
54
 Wilcox foi editor da Review and Herald (atualmente Adventist Review), o periódico geral da Igreja dos Adventistas do
Sétimo Dia, de 1911 a 1944 (SDA Encyclopedia [Hagerstown, MD: Review and Herald, 1996], “Wilcox, Francis
McClellan”). ↑
55
 Veja nota 3, acima. ↑
56
 LeRoy Edwin Froom, The Coming of the Comforter, ed.rev. (Washington, DC: Review and Herald, 1949), 37-57. Cf. E. G.
White, Special Testimonies, Series B, nº 7 (1905), 62-63. ↑
57
 [L. E. Froom, W. E. Read e R. A. Anderson,] Seventh-day Adventists Answer Questions on Doctrine(Washington, DC: Review
and Herald, 1957); cf. T. E. Unruh, “The Seventh-day Adventist Evangelical Conferences of 1955-1956,” Adventist
Heritage Nº 4 (Fourth Quarter 1977), 35-46; e Jerry Moon, “M. L. Andreasen, L. E. Froom, and the Controversy over
Questions on Doctrine” (monografia, Andrew University, 1988). ↑
58
 Froom, Read e Anderson, 36-37, 645-646. ↑
59
 M. L. Andreasen, “Christ, the Express Image of God,” Review and Herald, 17 de outubro de 1946, 8; veja também Burt,
43. ↑
60
 Maxwell, 119-122. ↑
61
 Manual da Igreja (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2003), 9. ↑
62
 Ibid., 33. ↑
63
 Ibid. ↑
64
 Veja Oxford Dictionary of the Christian Church,  “Filioque.” ↑
65
 Uriah Smith, A Declaration of the Fundamental Principles Taught and Practiced by the Seventh-day Adventists (Battle Creek,
MI: SDA Publishing Association, 1872), 1. ↑
66
 Ibid., 2-3. ↑
67
 O parágrafo inicial de Smith declara: “Ao apresentar ao público esta sinopse de nossa fé, desejamos que seja distintamente
compreendido que não temos nenhum artigo de fé, credo ou disciplina, além da Bíblia. Não apresentamos isto como
tendo qualquer autoridade sobre nosso povo, nem é destinada a assegurar uniformidade entre ele, como um sistema de
fé, mas é uma breve declaração do que é e tem sido, com grande unanimidade, mantida por ele. Com freqüência achamos
necessário responder a indagações sobre este assunto… Nosso único objetivo é satisfazer a esta necessidade” (ibid., 1). ↑
68
 “Fundamental Principles,” SDA Year Book, (Battle Creek, MI: SDA Publishing Association, 1889), 147-151. ↑
69
 Ibid., 147. ↑
70
 A declaração de D. T. Bourdeau, atestando que havia entre os adventistas do sétimo dia “muitas… concepções da
Divindade”, apareceu na Review and Herald, da qual Smith era o editor, somente um ano mais tarde. ↑
71
 A única mudança na parte que se referia à pessoa de Cristo foi a substituição do pronome “ele” [sic] pelo nome pessoal
“Deus” na primeira sentença. Diz a declaração de 1889: “Há um só Senhor Jesus Cristo, o Filho do Eterno Pai, aquele por
quem ele criou todas as coisas” (“Fundamental Principles,”Seventh-day Adventist Year Book [1889], 147). ↑
72
 “Fundamental Beliefs of Seventh-day Adventists,” Seventh-day Adventist Year Book, (Washington, DC: Review and Herald,
1931), 377-380. ↑
73
 Para detalhes do processo, veja Froom, 413-415. ↑
74
 “Fifteen Meeting,” General Conference Report Nº 8, Review and Herald, 14 de junho de 1946, 197. ↑
75
 “Fundamental Beliefs of Seventh-day Adventists,” Seventh-day Adventist Year Book, (1931), 377. ↑
76
 “The Doctrine of the Trinityin Adventist History,” Liberty Review [5250] Johnstown Road, Mt. Vernon, Ohio], outubro de
1989, 4-5, 7-8. Cf. Lynnford Beachy, “Adventist Review Perpetuates the Omega,” Old Paths Smyrna Gospel Ministries,
HC64, Box 128-B, Welch, WV; website www.smyrna.org], vol. 8, nº. 7, julho de 1999, 1-14. ↑
77
 “The Doctrine of the Trinity in Adventist History,” Liberty Review, outubro de 1989, 7. ↑
78
 Veja esp. Clayton, ref. nº 6 acima; e Bob Diener, The Alpha and the Omega (Creal Springs, IL: Bible Truth Productions, n.d.
[ca. 1998], videocassete. ↑
79
 Raoul Dederen, “Reflections on the Doctrine of the Trinity,”AUSS 8 (1970) 1-22. ↑
80
 Ibid., 13, 21. ↑
81
 Fernando Luis Canale, A Criticism of Theological Reason: Time and Timelessness as Primordial Presuppositions, Andrews
University Seminary Doctoral Dissertation Series, vol. 10                                                                               (Berrien Springs, MI:
Andrews University Press, 1983), 359; 402, nº 1. ↑
82
 Canale, “Doctrine of God,” 105-159; veja esp. 117-118, 126, 128-129, 132, 138-140, 145, 148-150. ↑
83
 Ibid., 150. ↑
84
 Richard Rice, The Reign of God, 2ª ed. (Berrien Springs, MI: Andrews University Press, 1985), 60-61.↑
85
 Fritz Guy, Thinking Theologically: Adventist Christianity and the Interpretation of Faith (Berrien Springs, MI: Andrews
University Press, 1999), 130; veja também 70, 88, 151, e suas notas. ↑
 Ibid., 70. ↑
86

 Ibid., 151. ↑
87

Fonte: Revista Parousia, 2° Semestre de 2005, UNASPRESS

O Espírito Santo: Quem? Como? Por Quê?


Alberto R. Timm
A obra fundamental do Espírito Santo no mundo é chamar os pecadores ao arrependimento e conduzi-los à salvação
em Cristo. Sua missão individual é bem descrita nas palavras: “Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a Minha voz e
abrir a porta, entrarei em sua casa, e cearei com ele e ele comigo.” (Apoc. 3:20). E o conselho divino é: “Hoje, se ouvirdes a
Sua voz, não endureçais os vossos corações…” (Heb. 3:15).

Cristo afirmou que o Espírito Santo viria para O glorificar (João 16:14), e para convencer “o mundo do pecado, da
justiça e do juízo” (João 16:8). Estes são aspectos cruciais da salvação; pois a consciência da pecaminosidade própria é
indispensável para a aceitação da justiça de Cristo que, por sua vez, é o único meio pelo qual podemos ser provados no
juízo divino. E o Espírito Santo é também o agente regenerador (Tito 3:5) que torna eficaz o sacrifício de Cristo na vida do
crente. Outro aspecto da Sua missão aparece na declaração de Cristo: “Quando vier, porém, ‘o Espírito da verdade’, Ele
vos guiará a toda a verdade” (João 16:13). “O Espírito é chamado ‘o Espírito da verdade’, pois sua obra é guiar os
seguidores de Jesus ‘a toda a verdade’. Enquanto os dias passam, o Espírito os guiará mais e mais profundamente no
conhecimento da verdade.”1 Esta é uma obra de santificação, pela qual o próprio Cristo orou em Sua oração sacerdotal:
“Santifica-os na verdade; a Tua Palavra é a verdade” (João 17:17). E o salmista acrescenta: “A Tua Lei é a própria verdade”
(Salmo 119:142). Foi o Espírito Santo quem inspirou as Sagradas Escrituras e é Sua missão guiar a vida dos seguidores de
Cristo em conformidade com a Palavra de Deus e com a Sua Lei, tornando-os mais semelhantes a Cristo, que é a Verdade
personificada (João 14:6). O Espírito Santo não iniciou Sua obra por ocasião do Pentecostes. Desde Gênesis 1:2, Ele é
inúmeras vezes mencionado no Antigo Testamento. Deus já prometera aos israelitas após o êxodo: “O Meu Espírito
habitará no meio de vós” (Ageu 2:5). E, mesmo antes do Pentecostes, Cristo afirmou a Seus discípulos: “o Espírito da
verdade… habita convosco e está em vós” (João 14:17).

A obra especial do Espírito Santo


A Bíblia menciona também uma obra especial do espírito Santo entre os crentes, e é a esta obra que Cristo Se referiu
ao prometer a Seus discípulos: “Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis Minhas
testemunhas…” (Atos 1:8). Portanto a obra especial do Espírito Santo significa uma capacitação especial dos crentes para a
proclamação do evangelho. À semelhança da obra universal do Espírito Santo quanto à salvação, também esta obra é de
natureza cristológica – Cristo disse que eles receberiam poder para serem Suas testemunhas! O apóstolo São Paulo
denomina essa capacitação especial de “dons espirituais” (I Cor. 12:1), e acrescenta que esses dons não são concedidos
sem motivo, mas “visando um fim proveitoso (I Cor. 12:7), e que este fim é o aperfeiçoamento dos santos para o
desempenho do Seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo” (Efé. 4:12).
O exemplo clássico desta capacitação especial para testemunhar de Cristo é o dom de línguas que os discípulos
receberam no Pentecostes. Nesta ocasião, estavam em Jerusalém pessoas das mais diversas nacionalidades (Atos 2:5, 9-
11), as quais, ao ouvirem o testemunho dos discípulos ser-lhes dado na sua “própria língua materna” (Atos 2:8),
maravilharam-se profundamente; e o resultado para a igreja cristã foi um acréscimo naquele dia de quase três mil
pessoas” (Atos 2:41). Portanto a manifestação do dom de línguas no Pentecostes não tinha um fim em si mesmo, para a
satisfação e orgulho pessoal dos apóstolos, mas sim um objetivo evangelístico. E o próprio apóstolo São Paulo esclarece
ainda mais este assunto ao dizer que “as línguas constituem um sinal, não para os crentes, mas para os incrédulos” (I Cor.
14:22), e ele acrescenta: “Contudo, prefiro falar na igreja cinco palavras com o meu entendimento, para instruir outros, a
falar dez mil palavras em outra língua” (I Cor. 14:19)
A Bíblia afirma ainda que “os dons são vários, mas o Espírito é o mesmo” (I Cor. 12:4), e que esses dons são concedidos
a cada um individualmente, segundo apraz ao Espírito Santo (I Cor. 12:11). Portanto não é o indivíduo que escolhe os dons
que deseja possuir, pois isso cabe ao Espírito Santo. A Parábola dos Talentos, em São Mateus 25:14-30, ilustra bem esse
princípio.

Condições para o recebimento do Espírito Santo


Uma vez que a iniciativa da nossa salvação é divina (Apoc. 3:20), a parte que nos corresponde para o recebimento do
Espírito Santo é simplesmente aceitarmos o Seu convite; pois é Ele quem efetua em nós “tanto o querer como o realizar”
(Filip. 2:13). Todos os impulsos de nossa parte para aceitarmos a salvação, são por ele motivados; porém cabe a nós a
decisão de os aceitar ou de os rejeitar. Mas “a todos os que aceitam a Cristo como o Salvador pessoal, o Espírito Santo vem
como Consolador, Santificador, Guia e Testemunha”. 2
A Bíblia menciona, entretanto, algumas condições para o Espírito Santo permanecer em nós e capacitar-nos com um
poder especial para sermos testemunhas de Cristo. Em primeiro lugar, é necessário arrepender-nos dos nossos pecados:
“Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos pecados, e recebereis
o dom do Espírito Santo” (Atos 2:38). Em segundo lugar, é necessário crermos: “a fim de que recebêssemos pela fé o
espírito prometido” (Gál. 3:14). Em terceiro lugar, é necessário que obedeçamos toda a vontade de Deus como expressa
em Sua Palavra: “… o Espírito Santo, que Deus outorgou aos que Lhe obedecem” (Atos 5:32). “Se Me amais, guardareis os
Meus mandamentos. E Eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará um outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco”
(João 14:16). “Dar-vos- ei coração novo, e porei dentro em vós espírito novo; tirarei de vós o coração de pedra e vos darei
coração de carne. Porei dentro em vós o Meu Espírito, e farei que andeis nos Meus estatutos, guardeis os Meus juízos e os
observeis” (Ezeq.36:26 e 27). Em quarto lugar, é necessário que perseveremos em oração: “… o Pai celestial dará o espírito
Santo àqueles que Lho pedirem” (Luc. 11:13). “Tendo eles orado, tremeu o lugar onde estavam reunidos; todos ficaram
cheios do Espírito Santo, e, com intrepidez, anunciavam a palavra de Deus” (Atos 4:31). Mas mesmo a nossa oração deve
ser sempre submetida à vontade de Deus: “Faça-se a Tua vontade, assim na Terra como no Céu” (Mat. 6:10). Biblicamente
o batismo em nome de Cristo e do Espírito Santo são simultâneos. Assim como Cristo recebeu a unção do Espírito Santo
por ocasião do Seu batismo por João Batista (Mar. 1:10), todos aqueles que aceitarem as boas novas da salvação devem
ser batizados ao mesmo tempo “em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo” (Mat. 28:19).
Cada cristão deve buscar com profundo ardor e insistência diariamente o poder regenerador e santificador do Espírito
Santo na vida; porém a escolha dos “dons espirituais” não lhe cabe decidir, pois isto pertence à vontade do Espírito santo,
de acordo com as necessidades e conveniências (I Cor. 12:11). É por este motivo que Cristo condena a busca de milagres,
ao declarar que “uma geração má e adúltera pede um sinal” (Mat.16:4). E em Seu diálogo com Tomé, Cristo valoriza a fé
sem milagres, ao afirmar: “Porque viste, creste? Bem-aventurados os que não viram e creram” (João 20:29).

Evidências do recebimento do Espírito Santo


Muito embora um cristão que seja cheio do Espírito Santo possa receber poder para operar milagres, como ocorreu
com os apóstolos por ocasião do Pentecostes, não é esta a evidência decisiva de alguém possuir o Espírito Santo na vida.
Cristo, com o Seu olhar profético, declarou que nos últimos dias surgiria um grande movimento de simulação da
verdadeira obra do Espírito Santo: “Porque surgirão falsos cristos e falsos profetas operando grandes sinais e prodígios
para enganar, se possível os próprios eleitos” (Mat. 24:24). E Ele acrescenta: “Nem todo o que Me diz: Senhor, Senhor!
entrará no dos Céus, mas aquele que faz a vontade de Meu Pai que está nos Céus. Muitos, naquele dia, hão de dizer-Me:
Senhor, Senhor! porventura, não temos nós profetizado em Teu nome, e em Teu nome não expelimos demônios, e em Teu
nome não fizemos milagres? Então lhes direi explicitamente: Nunca vos conheci. Apartai-vos de Mim, os que praticais a
iniquidade” (Mat. 7:21-23).

A experiência ocorrida no Egito, quando os sábios de Faraó simularam os milagres que o Senhor operara através de
Moisés e Arão (Êxo. 7:11), repetir-se-ia nos últimos dias (II Tes. 2:9-11). É por essa razão que o próprio Espírito Santo
inspirou o apóstolo João a alertar os crentes a esse respeito: “Amados, não deis crédito a qualquer espírito: antes provai os
espíritos se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo mundo fora” (I João 4:1). E a Bíblia
acrescenta: “ À lei e ao testemunho! Se eles não falarem desta maneira, jamais verão a alva” (Isaías 8:20). E ela ainda
adverte que os sensuais… não têm o Espírito” (Jud. 19).

Mas qual é a verdadeira evidência de que alguém possui o Espírito Santo? Na verdade, a evidência da presença do
Espírito Santo na vida de uma pessoa “é tão ampla quanto a Sua obra”. 3 Cristo disse que “pelos seus frutos os
conhecereis” (Mat. 7:20), e o apóstolo São Paulo acrescenta que “o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade,
benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio” (Gál. 5:22 e 23). Portanto a evidência concreta é o fato de
sua vida ter sido transformada de acordo com o padrão divino, procurando conhecer e viver em conformidade com
“toda a verdade”, pois esta é a obra do espírito Santo. Jesus disse que os que entrarão no reino do Céus são aqueles que
fazem a vontade de Deus (Mat. 7:21) A Bíblia declara que João Batista era “cheio do Espírito Santo” (Luc. 1:15), mas “não
fez nenhum sinal, porém tudo quanto disse a respeito dEste era verdade” (João 10:41). E isto foi suficiente para Cristo
afirmar que “entre os nascidos de mulher, ninguém é maior do que João” (Luc. 7:28). Muito embora a obra universal do
Espírito Santo seja universalmente a mesma, não podemos generalizar a Sua obra especial no vida dos crentes. Como “os
dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo” (I Cor. 12:4), e esses dons são distribuídos pelo Espírito a cada um, “como
Lhe apraz” (I Cor. 12:11); o fato de um genuíno cristão viver em plena conformidade com a vontade de Deus, mas não
possuir determinado dom, não é evidência de que ele não seja cheio do Espírito Santo. Por outro lado, o próprio fato de
alguém vangloriar-se de possuir determinado dom que outra pessoa não possui, é evidência clara de que ele não está
sendo guiado pelo Espírito Santo (Gál. 5:25 e 26).
Na verdade “todos quanto anseiam ter semelhança de caráter com Deus, serão satisfeitos. O Espírito Santo nunca
deixa sem assistência a alma que está olhando a Cristo. …Se o olhar se mantiver fixo em Jesus, a obra do Espírito não
cessa, até que a alma esteja conforme a Sua imagem”. 4 E “não há limites à utilidade de uma pessoa que, pondo de parte o
próprio eu, oferece margem à operação do Espírito Santo na alma, e vive uma vida de inteira consagração a Deus”. 5
PDF: O Espírito Santo – Quem? Como? Por Quê?

Referências:
1. Leon Morris, The Gospel According to John. (Grand Rapids: Michigan, Wm. B. Eerdmans Publ. Co., 1979), p. 700.
2. Ellen G. White, Atos dos Apóstolos, p. 49.
3. Wilson H. Endruweit, Movimento Carismático. Um Estudo Exegético e Teológico de Suas Principais Características.
(São Paulo, Instituto Adventista de Ensino, 1977), p. 27.
4. Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações. p. 285.
5. Ibid., p. 227.
O Espírito Santo e o Trono
Como explicar o fato de que o trono apocalíptico é chamado apenas de “trono de Deus e do Cordeiro”
(Apocalipse 22:1 e 3), sem qualquer alusão ao Espírito Santo?
Alberto R. Timm
Um dos argumentos mais comuns contra a doutrina da Trindade é a alegação de que o livro do Apocalipse não
apresenta qualquer alusão a um “trono” do Espírito Santo. Para entendermos esta questão, é importante considerarmos
primeiro o significado do “trono” de Deus nas Escrituras. Quase todos os textos bíblicos falam desse “trono” no singular.
Por exemplo, o profeta Isaías teve o privilégio de ver “o Senhor assentado sobre um alto e sublime trono” (Isa. 6:1; ver
também Sal. 9:7; Apoc. 4:2; 22:1, 3; etc.). Mas alguns textos mencionam a existência de “tronos” nas cortes celestiais,
especialmente quando outros seres celestiais participam de uma sessão de julgamento. Por exemplo, o profeta Daniel diz
que continuou olhando “até que foram postos uns tronos” no céu (Dan. 7:9). Também o apóstolo João afirma ter visto em
visão “tronos” sobre os quais se assentavam “aqueles aos quais foi dada autoridade de julgar” (Apoc. 20:4). As visões e
descrições de Deus assentado em Seu trono revelam primariamente a Sua soberania e majestade sobre o Universo. Por
exemplo, no Salmo 45:6 é dito: “O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre, cetro de equidade é o cetro do teu reino”.
Mas, em muitos casos, Deus Se assenta em Seu trono para julgar as nações. Um exemplo disso é encontrado no Salmo 9:7
e 8: “Mas o Senhor permanece no seu trono eternamente, trono que erigiu para julgar. Ele mesmo julga o mundo com
justiça; administra os povos com retidão”. Outra cena judicial, já mencionada, aparece em Daniel 7:9 e 10, onde é dito que
“foram postos uns tronos, e o Ancião de dias se assentou”, e que “assentou-se o tribunal, e se abriram os livros”.
Independentemente da ocasião e das circunstâncias envolvidas, a expressão “trono”, quando usada em relação a Deus,
possui geralmente uma conotação mais funcional do que essencial. É interessante observarmos que Cristo exerce ao
mesmo tempo os ofícios sacerdotal e real em Seu trono. Já em Zacarias 6:13 encontramos a seguinte profecia messiânica:
“Ele mesmo edificará o templo do Senhor e será revestido de glória; assentar-se-á no seu trono, e dominará, e será
sacerdote no seu trono; e reinará perfeita união entre ambos os ofícios”. Como rei, Cristo exerce também a função de juiz.
Em João 5:22 é dito: “E o Pai a ninguém julga, mas ao Filho confiou todo julgamento”. Portanto, é plenamente evidente
que Cristo deva compartilhar com o Pai o trono do Universo.
O Espírito Santo, por Sua vez, exerce funções diferentes nos planos divinos. Entre elas estão as de representar a Deus
no Universo (Sal. 139:7-12), convencer os seres humanos “do pecado, da justiça e do juízo” (João 16:8), glorificar a Cristo
(João 16:14), derramar “o amor de Deus” no coração dos crentes (Rom. 5:5), edificar internamente a igreja (1 Cor. 12) e
capacitá-la para o testemunho (Atos 1:8). Mesmo depois da final erradicação do pecado, o Espírito Santo continuará
exercendo a função de Mantenedor do Universo (cf. Gên. 1:2). Não é de surpreender, por conseguinte, que Ele não seja
mencionado como soberano ou juiz sobre o trono do Universo. Alguns indivíduos não se constrangem em usam a
expressão “trono de Deus e do Cordeiro” (Apoc. 22:1 e 3) para alegar que, como o Espírito Santo não aparece nesse trono,
Ele não pode ser considerado uma Pessoa divina. Mas esse tipo de argumento envolve pelo menos dois problemas
fundamentais: Primeiro, ele desconhece a conotação funcional da expressão “trono”, que descreve mais o status e o ofício
de Deus do que a Sua natureza essencial. Em segundo lugar, esse argumento está baseado em uma espécie de raciocínio
generalizante, sugerindo que alguém só existe se mencionado em todas as alusões aos demais componentes de seu grupo
de pares. Neste caso, se o nome do Espírito Santo não aparece sempre que o Pai e o Filho são mencionados juntos, então
o Espírito Santo não pode ser considerado parte da Divindade.

Na Bíblia encontramos vários textos que mencionam ao mesmo tempo o Pai, o Filho e o Espírito Santo (ver Isa. 48:16;
Mat. 28:19; Luc. 3:21 e 22; 1 Cor. 12:4-6; 2 Cor. 13:13; Efés. 4:4-6; Tito 3:4-7; etc.). Embora o Espírito Santo não seja
mencionado explicitamente em Apocalipse 22:1 e 3 com o Pai e o Filho sobre o trono do Universo, esse fato jamais deveria
ser usado para invalidar os demais textos bíblicos que mencionam o Espírito Santo como exercendo funções distintas do
Pai e do Filho.

 Fonte: (publicado na revista do Ancião em abr – jun 2006)

O Espírito-parákletos no Quarto Evangelho


Amin A. Rodor, Th.D.
Professor de Teologia Sistemática e Diretor do SALT, Unasp, Campus Engenheiro Coelho, SP
Resumo: Este artigo trata do título grego parákletos no quarto evangelho, atribuído, como é bíblica e historicamente
evidente, ao Espírito Santo, a terceira pessoa da Trindade. O autor enfatiza que, embora o parákletos seja o dom da nova
era, Ele possui profundas raízes bíblicas. Atenção especial é dada ao paralelismo entre Jesus e o “outro parákletos”,
sugerindo que Este representa o “retorno” de Jesus para os Seus discípulos, a fim de permanecer com eles, conforme
havia prometido. O parákletosé o verdadeiro elo entre a Igreja e Jesus desde o Pentecostes até a “consumação do século”.
Por meio do parákletos, Jesus é reinterpretado e feito contemporâneo para as sucessivas gerações de cristãos.
Abstract: This article deals with the Greek title parákletos in the fourth gospel, attributed, as biblical and historically
evident, to the Holy Spirit, the third Person of the Trinity. The author emphasizes that, even though the parákletos is the
gift of the new age, He has deep biblical roots. Special attention is given to the parallelism between Jesus and the
“other parákletos,” suggesting that He represents the  “return” of Jesus to His disciples, in order to abide with them, as He
had promised. The parákletos is the true link between the Church and Jesus from the Pentecost till “the end of the world.”
Through theparákletos Jesus is reinterpreted and made contemporary to the successive generations of Christians.

Introdução
A palavra grega parákletos*, na literatura bíblica, é exclusiva do Novo Testamento, e ocorre de forma restrita, apenas
nos escritos joaninos. Como um epíteto, o termo é aplicado uma vez a Jesus (1Jo 2:1), que atua como
um intercessor/advocatus junto ao Pai, na corte celestial. Em cinco outras passagens, no quarto evangelho,
contudo, parákletos como um título é aplicado a alguém que: (a) não é Jesus; (b) não é primariamente um intercessor; e
(c) não exerce sua função no céu, junto ao Pai. A tradição cristã, desde tempos primitivos, 1 e com boas razões, identificou
o parákletos no Evangelho de João, como sendo o Espírito Santo, a terceira pessoa da Trindade.2
Considerando-se as objeções recentes ao ensino bíblico quanto à personalidade do Espírito Santo e à Trindade, 3 o
estudo deste tema no quarto evangelho é crucial, levando-se em conta que o Evangelho de João, provavelmente o último
livro do Novo Testamento a ser escrito, representa o mais alto desenvolvimento teológico das Escrituras, 4 e, nas palavras
de Vincent Taylor, “o clímax e coroa da revelação bíblica a respeito do Espírito Santo”. 5 Não seria difícil, portanto,
estabelecer que o estudo do tema no evangelho joanino é de fundamental importância para se verificar como os cristãos,
no final do primeiro século, entenderam e consideraram o Espírito Santo.
Como observado por Raymond E. Brown, reconhecida autoridade no quarto evangelho, as cinco passagens em que
o parákletos é mencionado no evangelho de João (Jo 14:15-17, 26; 15:26-27; 16: 7-11, 12-14), podem ser organizadas em
quatro grupos:
(1)   A vinda do parákletos e Seu relacionamento com o Pai: O parákletos virá, mas apenas quando Jesus partir (Jo
15:26; 16:7,8, 13). Ele procede do Pai (Jo 15:26). O Pai concederá o parákletos a pedido de Jesus (Jo 14:16). Jesus, quando
partir, enviará o parákletos da parte do Pai (Jo 16:7).
(2)   A identificação do parákletos: Ele é chamado “outro parákletos” (Jo 14:16). É, também, o Espírito de Verdade (Jo
14:17; 15:226), e o Espírito Santo (Jo 14:26).
(3)   A relação do parákletos com os discípulos: Os discípulos reconhecem o parákletos (Jo 14:17). O parákletos estará
com os discípulos e permanecerá com eles (Jo 14:16, 17). Ele ensinará aos discípulos todas as coisas (Jo 14:26). Guiará os
discípulos a toda a verdade (Jo 16:13). Anunciará aos discípulos as coisas que hão de vir (Jo 16:13). Receberá e anunciará o
que é de Jesus (Jo 16:14). Glorificará a Jesus (Jo 16:14). Testemunhará em favor de Jesus (Jo 15:26). Relembrará aos
discípulos tudo o que Jesus lhes ensinou (Jo 14:26). O parákletos falará apenas o que ouvir e nada de Si mesmo (Jo 16: 13).
(4)   A relação do parákletos com o mundo: O mundo não pode receber o parákletos (Jo 14:17); O mundo não O vê
nem O conhece (Jo 14:17). No contexto do ódio e perseguição movidos pelo mundo (Jo 15:18-25),
o parákletos testemunhará de Jesus (Jo 15:26). Ele tornará evidente o erro do mundo acerca do pecado, da justiça e do
juízo (Jo 16:8-11) .6
Da sistematização das cinco referências ao parákletos no quarto evangelho mencionadas acima, algumas
características quanto à sua identidade emergem claras e além da dúvida razoável.
(1) O parákletos não é Jesus ou o Pai:7 Jesus fala de “outro parákletos”,8 implicando que seus discípulos já possuíam
um, que só podia ser Ele mesmo. De fato, como mencionado em 1 João 2:1, Jesus é chamado de “parákletos”.9 E é
precisamente Sua [de Jesus] partida, como veremos posteriormente, que abre espaço para o ministério deste
outro parákletos, “para compensar a perda da presença visível de Jesus.”10 A idéia de que o parákletos não é Jesus se
fortalece pelas diferentes ocorrências, nas quais o parákletos testemunha de Jesus, O glorifica e age como Seu
representante. Por outro lado, é evidente que o parákletos não é o Pai, pois é precisamente o Pai quem O envia, em nome
de Jesus, e apenas depois que Jesus tenha partido (Jo 14:26).11 Deve-se observar ainda que, ao contrário de Jesus
como parákletos, em 1 João 2:1, o parákletos no quarto evangelho não é primariamente um intercessor dos discípulos
diante do Pai, mas o ajudador deles em relação ao mundo. Significativamente, contrariando a errônea idéia de que a
doutrina da Trindade tenha sido originada em um período posterior ao Concílio de Nicéia (325 d.C.), Tertuliano (160-220
d.C.) claramente identifica oparákletos com o Espírito Santo, distinguindo-O das pessoas do Pai e do Filho. Diz ele, em sua
famosa apologia Contra Praxeas:
…[o Evangelho de João] continua a fornecer-nos declarações do mesmo tipo, distinguindo o Pai e o Filho com as
propriedades de cada um. Então também há o Paracleto ou Consolador, acerca do qual Ele prometeu orar ao Pai, e enviá-
lo do céu, depois que Ele tivesse ascendido para o Pai. Ele é chamado “outro Consolador”… Assim, a conexão do Pai com o
Filho, e do Filho com o Paracleto, produz três Pessoas coerentes, as quais, contudo, são distintas uma da outra. Estes três
são uma essência, não uma Pessoa, como é dito “Eu e o Pai somos Um” em respeito à unidade de substância, não à
singularidade de número.12
No mesmo texto, Tertuliano observa:

O Espírito Santo, de fato, é o terceiro, distinto de Deus [o Pai] e do Filho… Eu testifico que o Pai, e o Filho e o Espírito
são inseparáveis de cada um… e que eles são distintos um dos outros.

Tertuliano então conclui com lógica que dificilmente poderia ser melhorada:

Além disto, não é o próprio fato de que eles tem nomes distintos [Pai, Filho e Espírito-Paracleto] equivalente a uma
declaração de que eles são distintos em personalidade?13
(2) Que o parákletos não é mera força ou influência é claro das diversas atividades exercidas, possíveis apenas a uma
pessoa:14 Ele ensina, guia, é enviado, anuncia, recebe, glorifica, testemunha em favor, relembra, fala, convence, acusa, etc.
Além disso, ao parákletos são atribuídos pronomes pessoais. João torna a personalidade do Espírito mais evidente,
atribuindo a Ele o título masculinoparákletos e referindo-se ao Espírito-parákletos com pronomes pessoais
(ékeinos e autós).15
(3) Com relação às funções do parákletos, fica também evidente que Ele vem para os discípulos e habita com eles,
guiando-os, ensinando a respeito de Jesus: Devemos observar, contudo, que João O retrata como o Espírito Santo, como já
sugerido, numa função específica: como a presença pessoal de Jesus com os cristãos, durante o período de Sua ausência.
(4) A respeito do relacionamento do parákletos com o mundo, é óbvio que Ele é hostil ao mundo, colocando este em
julgamento por seu pecado de descrença. O mundo não O pode receber, porque não O vê nem O conhece (Jo 14:17).

O parákletos joanino
Do estudo quanto à identidade do parákletos no quarto evangelho, algumas questões emergem naturalmente: Se Ele
realmente é o Espírito Santo, como mantido pelos cristãos e claramente indicado pelo próprio João: “Mas
aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome” 16 (Jo 14:26), por que é este título atribuído ao
Espírito? Quais aspectos particulares das funções do Espírito Santo são atribuídas ao parákletos? Além disto, por que o
título é encontrado exclusivamente no evangelho joanino? Para estas questões cruciais voltaremos nossa atenção, mais
tarde, neste estudo. Nesta seção concentraremos a atenção nos aspectos lingüísticos do termo.
O background histórico e o significado lingüístico do termo parákletos no Evangelho de João têm sido buscados em
uma variedade de fontes e alternativas,17 e seria desnecessário repeti-los aqui. Esforços têm sido feitos, por exemplo, na
tentativa de se encontrar um equivalente semítico para o título grego. Tais tentativas parecem enfatizar a convicção de
que se uma palavra hebraica ou aramaica, que tenha servido de base para a tradução de parákletos, fosse encontrada,
provavelmente saberíamos o significado primário do termo. Contudo, até o momento, os mais minuciosos estudos não
conseguiram produzir um candidato semítico verdadeiramente aceitável.18 De fato, como Brown observa, “Esta busca para
um equivalente hebraico pode ser em vão,”19 provavelmente porque tanto no hebraico quanto no aramaico, a palavra foi
transliterada do grego.20 Além disto, como indicado por Johannes Behn, no seu clássico estudo do termo, no Theological
Dictionary of the New Testament, o uso joanino do termoparákletos não se ajusta facilmente à história da palavra em
fontes seculares.
Concluímos, então, que, embora os antecedentes históricos, religiosos e lingüísticos do termoparákletos possam ser
considerados importantes para se determinar o seu significado no Novo Testamento, as decisões quanto a tal significado
serão consideravelmente subjetivas e de valor limitado, ao mesmo tempo que limitador. O significado de parákletos tem
sido traduzido por uma variedade de palavras 21 tais como “Consolador,” “Advogado,” “Ajudador,” 22 “Espírito de Verdade,”
“Amigo,” etc. No entanto, deve-se observar que nenhuma destas traduções consegue capturar de forma plena a
complexidade das funções atribuídas ao parákletos no quarto evangelho.
Se, a palavra parákletos usada por João em seu evangelho não parece ser uma tradução direta de um título hebraico
específico, nem tem ela sua origem em um título no grego secular, talvez isto sugira que foi o uso cristão que deu ao termo
uma conotação exclusiva a ele e, portanto, o seu significado é melhor decidido pelo contexto do que por deduções léxicas.
O que é, portanto, o parákletos? Gerard Manley Hopkins está provavelmente correto em sua resposta, lembrando que o
termo é frequentemente traduzido por Consolador, mas o parákletos faz muito mais do que consolar. A palavra é grega,
não possui um equivalente exato em nossa língua. É esclarecedor ter em mente que Jerônimo, ao traduzirparákletos, tinha
à sua disposição, além dos termos latinos advocatus e consolator, o costume da transliteracão. Enquanto ele
adota advocatus em 1 João 2:1, no evangelho, contudo, ele seguiu a alternativa da transliteração, mantendo a palavra
transliterada como Paracleto. R. Brown apropriadamente observa que seria sábio fazermos o mesmo em tempos
modernos, e optarmos porParacleto, uma transliteração aproximada do grego parákletos, o que preserva a singularidade
da palavra, sem enfatizar um único aspecto do conceito em detrimento de outro. No mínimo, isto serve como advertência
para aqueles que querem comprimir o termo dentro de limites dogmáticos.
Devemos observar, ainda, dois aspectos básicos quanto à identidade do parákletos no quarto evangelho: Por um lado,
embora ele possa ser considerado o “dom da nova era,” o parákletos não é um estranho, uma “novidade,” ou simples
invenção joanina, desconectado de raízes bíblicas. De fato, João “não pinta um quadro sem paralelo em outras descrições
do Espírito Santo no Novo Testamento, mas enfatiza certos aspectos que já estão presentes [aí], e dá a eles nova
orientação.”23 Esta conexão e convergência de identidade entre o Espírito Santo e o parákletos será o foco de discussão na
seção seguinte deste trabalho.
Por outro lado, João não faz uma simplista identificação entre o Espírito e o parákletos, sem os refinamentos
teológicos que são uma marca inconfundível do seu evangelho. Devemos ter em consideração que, independentemente
do que ele tenha dito no evangelho acerca do parákletos, ele está escrevendo tendo em mente a obra completa de Cristo
na cruz. Ele escreve da perspectiva do período posterior à ascensão, antecipando o relacionamento entre o ressuscitado
Cristo e os Seus discípulos, além do relacionamento dEle com o mundo, através do parákletos. Portanto,
o parákletosincorpora uma enorme complexidade de funções. Ele é uma testemunha de defesa de Jesus, e o
representante dEle no contexto do Seu julgamento pelos Seus inimigos. O Paracleto é, por outro lado, um consolador dos
discípulos, assumindo o lugar de Jesus entre eles. O Paracleto é o mestre, guia, e conselheiro dos discípulos e, assim, um
ajudador. O relacionamento entre o parákletos e Jesus é o tema da última seção do nosso estudo. E é precisamente aí que
detectamos a profunda contribuição teológica de João em relação à pessoa do parákletos.
O Espírito-parákletos
Pneumatologia tem sido considerada uma das mais distintivas características do quarto evangelho.24Referências diretas
e indiretas ao Espírito são inúmeras e complexas, de tal forma que qualquer estudo do tópico seria, no mínimo, muito
extenso.25 Devemos notar que neste evangelho o Espírito Santo é regularmente associado com Jesus (como em 1:19-34;
3:5, 7:39, etc). A plena apresentação do Espírito Santo, contudo, é encontrada nas passagens concernentes
ao parákletos (14:16, 17, 26; 15:26; 16:7-15).
Em João não encontramos uma fórmula trinitariana como em Mateus26 ou Paulo,27 mas há, pelo menos, quatro
instâncias do modelo trinitário (1:29-35; 14:16, 26; 16:15). Mais claramente do que qualquer outro escritor do Novo
Testamento, João apresenta a divindade do Filho, e a personalidade do Espírito. Mais enfaticamente do que qualquer
outro ele indica a distinção do Espírito, tanto em relação ao Pai como ao Filho. Mais diretamente do que qualquer outro,
ele indica a missão do Espírito-parákletos. Nisto João estabelece os fundamentos para a doutrina de uma Trindade co-
igual, e fornece muito do material sobre o qual esta doutrina seria formulada.
Voltando nossa atenção para o relacionamento entre o parákletos e outros textos dos evangelhos sinóticos e do livro
de Atos, observamos em primeiro lugar que no quarto evangelho, se Jesus havia estado com os discípulos por alguns
poucos anos, e voltou para o Pai, o Espírito Santo, contudo, permanece para sempre com eles, respondendo a questões
enfrentadas pela Igreja no final do primeiro século. A doutrina do parákletos em João implica a partida de Jesus do mundo
e, naturalmente, oparákletos é retido em sua plenitude até a cruz (Jo 7:39). Não é senão quando Cristo afirma “Eu vou
para o meu Pai”, que torna-se necessário, ou mesmo possível, acrescentar: “O Pai vos enviará um outroparákletos.” O
Espírito é o outro parákletos, que assume o lugar de Cristo, como advogado dos discípulos. Até então, Jesus fôra o
defensor deles enquanto estivera na Terra (Mc 2:18, 24). Agora Jesus cumpre este ofício “junto ao Pai”, enquanto o
Espírito, cuja esfera de ação é a Terra, silencia os adversários terrenos do corpo de Cristo, ao longo da era cristã.
Esta função forense de “dar testemunho”, “falar pelos discípulos” e “condenar o mundo”, enfatizada nos textos
do parákletos joanino, não está dissociada da mesma ênfase em outros textos em que o Espírito Santo aparece com as
mesmas funções. Isto é evidente, por exemplo, em Mateus 10:20 (“visto que não sois vós quem falais, mas o Espírito do
vosso Pai é quem fala por vós”), Marcos 13:11 (“Quando, pois, vos levarem e vos entregarem, não vos preocupeis com o
que haveis de dizer, mas o que vos for concedido naquela hora, isso falai; porque não sois vós os que falais, mas o Espírito
Santo”) e Atos 6:10, onde o Espírito Santo é apresentado protegendo os discípulos também em contexto de julgamento.
Além disto, se o parákletos vem apenas depois da partida de Jesus, o mesmo é verdade na descrição de Lucas em Atos,
quanto à vinda do Espírito. Isto se torna ainda mais distintivo quando observamos que a compreensão de Lucas da
ascensão de Jesus partilha com João o conceito da ressurreição (Jo 20:17). O Pai concede o parákletos a pedido de Jesus
(Jo 14:16), da mesma forma que o Pai concede o Espírito Santo àqueles que O pedem (Lc 11:13). Se
o parákletos testemunha em favor de Jesus por meio do testemunho dos discípulos, assim é a vinda do Espírito Santo em
Atos, pois é precisamente Ele quem impulsiona os discípulos a falarem de Jesus e a demonstrarem ao mundo que Deus O
havia ressuscitado.
Verificamos um íntimo relacionamento entre João 15:26, 27 e Atos 5:32: “Ora, nós somos testemunhas destes fatos, e
bem assim o Espírito Santo, que Deus outorgou aos que Lhe obedecem”.28Encontramos ainda uma convergência entre a
função de ensino do parákletos em João 14:26, onde é afirmando que “Ele ensinará [aos discípulos] todas as coisas e vos
fará lembrar de tudo o que vos tenho dito,” e a função do Espírito Santo em Lucas 12:12: “…o Espírito Santo vos ensinará,
naquela mesma hora, as coisas que deveis dizer.” Desta forma, quando João 14:26 identifica o parákletos como o Espírito
Santo, “isto não é mera junção editorial de dois conceitos distintos”, 29 como R. Brown observa. As similaridades e
convergências entre o parákletos e o Espírito Santo emergem mesmo num estudo comparativo superficial, entre aquilo
que João diz e aquilo que os evangelhos sinóticos e o livro de Atos, em particular, afirmam a respeito dele. Tentar se evadir
à força das evidências, sugerindo que o Espírito-parákletos é Pai ou Filho, ou apenas uma força, o ruach/pneuma30 de Deus,
é simplesmente fazer uma leitura equivocada, preconceituosa e dogmática de evidências irrefutáveis, leitura informada
por conclusões e preconceitos desenvolvidos fora do círculo da revelação.

Parákletos e Jesus
É importante observar que no pensamento joanino encontramos uma íntima conexão entre oparákletos e Jesus.
Praticamente tudo aquilo que João afirma deste personagem é dito de Jesus em outras partes do evangelho. Em outras
palavras, o relacionamento entre o primeiro parákletos [Jesus]31e o segundo [o Espírito Santo] é dominante no quarto
evangelho. Não é de surpreender que o Espírito seja chamado pelo próprio Jesus, como já visto, de “outro parákletos.” O
detalhado e preciso paralelismo entre o ministério do parákletos e o ministério de Jesus é exato para ser entendido como
mera coincidência. Assim, uma vez que o parákletos pode vir apenas quando Jesus partir, oparákletos, para todos os
efeitos, “é a presença de Jesus quando Jesus está ausente”32 Não é possível deixar passar despercebido o fato de que
no parákletos Jesus cumpre Sua promessa de voltar para Seus discípulos (Jo 18:14). Percebemos, então, que de todas as
funções do parákletos nenhuma é mais central do que a de continuar a obra de Jesus. Observemos as precisas
semelhanças:
Desta forma, o paradoxo apresentado pela promessa de Jesus de que Sua obra na terra continuará porque Ele irá para
o Pai é resolvido pelo Seu “retorno,” na pessoa do parákletos. De fato, a vinda do Paracleto é o “retorno” de Jesus para os
seus: Agora eles estão nEle e Ele neles (Jo 14:20). Como J. Louis Martyn observa:
Mas esta é uma união dramática desempenhada em um drama de dois níveis, de tal forma que ela cria uma crise
epistemológica. O mundo, certamente, vê apenas um nível deste drama.33
O mundo, devemos acrescentar, pode “ver” a tradição histórica de Jesus de Nazaré, uma figura do passado, cuja
identidade pode ser debatida num formato midráshico, sem, contudo, perceber a atuação do Paracleto, a qual torna
Jesus contemporâneo e presente nos atos e palavras dos discípulos (Jo 14:17).
Como observado acima, daquilo que João diz do parákletos em seu evangelho, é esta íntima relação entre Ele e Jesus
que emerge como o aspecto dominante. Não é de surpreender que alguns intérpretes cheguem a identificar o Espírito-
parákletos, como o “alter ego de Jesus”34 ou “o outro Jesus.” 35Devemos observar, por um lado, que aquilo que
o parákletos ensina ou revela não constitui algo novo. Ele relembra aos discípulos aquilo que Jesus havia ensinado. Ele
testemunha em favor de Jesus e O glorifica, tendo com Jesus a mesma relação que Este tivera com o Pai. Assim como Jesus
não falou de Si, mas apenas aquilo que o Pai o ensinara (Jo 5:28). Da mesma forma que Jesus glorificara o Pai (Jo 12:28,
14:13, 17:14), o parákletos dá testemunho dEle, e O glorifica. Por outro lado, contudo, o gênio da obra do parákletos,
como já sugerido, é que Ele não meramente repete ou reencena Jesus. Oparákletos reinterpreta Jesus, torna-O presente e
permanentemente atual na Igreja. Jesus e a glória manifesta em Seu ministério, morte e ressurreição, não representam
um período ideal no passado, quando o reino de Deus irrompeu entre os homens, um período para o qual seus discípulos
olham com uma aura de saudosismo. O parákletos não é apenas um intérprete de Jesus, mas Aquele que O reatualiza e
reinterpreta para cada geração, tornando-O sempre atual, relevante e contemporâneo, não importando as mudanças e
variáveis do contexto.
Como R. Brown sugere, o quadro joanino do Espírito-parákletos responde a dois problemas importantes na própria
composição do quarto evangelho, que não podem ser desconsiderados em nossa discussão, e de fato, respondem à
questão suscitada anteriormente neste artigo, quanto à razão pela qual João atribui o título parákletos ao Espírito. O
primeiro problema tem a ver com a dificuldade criada pela iminente morte da última testemunha ocular, que constituía o
último elo visível entre a Igreja no final do primeiro século e Jesus de Nazaré.36 Como deveria a igreja reagir em face desta
nova situação, quando o último vínculo com Jesus parecia estar sendo cortado? Como enfrentar o perigo dela mesma
tornar-se uma instituição auto-suficiente, desconectada de Cristo? O conceito do Espírito-parákletosresponde a esta
questão. Se as testemunhas oculares, como o próprio discípulo amado, haviam dado seu testemunho e guiado a Igreja,
isto não fôra primariamente por causa da conexão direta com Jesus. Uma vez que eles próprios não O haviam entendido
(Jo 14:9).
Portanto, o testemunho apostólico não é válido porque estes apóstolos houvessem estado com Jesus, ou mesmo
dependido da compreensão que eles haviam tido dEle. A validade do testemunho deles dependeu primariamente
do parákletos, o qual tomou, depois da ressurreição, o lugar de Jesus, para que os discípulos pudessem ser ensinados e
relembrados de tudo o que Jesus ensinara. Os apóstolos foram habilitados a testemunhar e interpretar Jesus,
precisamente porque eles haviam recebido oparákletos. Este permanece com todos aqueles que amam a Jesus (Jo 14:17),
mesmo depois do desaparecimento das testemunhas oculares. Assim, a morte do último apóstolo não quebra a corrente
entre Cristo e a Igreja, porque o parákletos, que havia ensinado aos primeiros apóstolos, continua com a Igreja, para guiá-
la em toda a verdade, e permanece com as contínuas gerações de discípulos. Oparákletos é o verdadeiro vínculo entre a
Igreja e Jesus Cristo. João enfatiza que a função de ensino doparákletos não envolve nada novo, como observado acima;
entretanto, isto não significa mera repetição. O papel do Espírito-parákletos é reinterpretativo, tornando Jesus
contemporâneo para as sucessivas gerações de discípulos37.
O segundo problema que o conceito do parákletos joanino responde é a questão da demora daparousia. Na conclusão
do Evangelho de João (Jo 21:18-23), Pedro, em diálogo com o Cristo ressuscitado, face à sugestão do tipo de morte que ele
sofreria (v. 18-19), vendo o “discípulo amado”, pergunta ao Senhor: “e quanto a este?” (v. 21). Jesus, como em outras
circunstâncias, repreende a curiosidade quanto ao futuro, formulando uma pergunta hipotética “[e] Se eu quero que ele
permaneça até que eu venha, que te importa?” (v. 22). A frase “até que eu venha”, implica um evento futuro, juntamente
com a possibilidade de que este evento (a parousia) aconteceria dentro do período de vida de João. O verso 23 acrescenta
uma frase chave: “Então se tornou corrente entre os irmãos o dito que aquele discípulo não morreria.” Isto fortemente
sugere um quadro da Igreja no final do primeiro século, convivendo com os evidentes sinais da proximidade da morte de
João, sem o cumprimento do esperado retorno do Senhor.38
Assim, como R. Brown observa, “a ênfase joanina no Espírito-parákletos como a presença de Jesus é a resposta do
evangelista ao desencorajamento acerca da demora do segundo advento” 39. O apóstolo indica que a aparente demora
da parousia não deveria gerar solidão ou desencanto, uma vez que Jesus já está presente com seus seguidores na pessoa
do parákletos. Isto não significa negar o cumprimento futuro do advento de Jesus, mas assegurar que, enquanto os
cristãos aguardam este glorioso evento, eles não precisam ser vítimas do pessimismo escatológico, ou gastarem suas
energias em expectativas especulativas. Ao contrário, eles devem ser confortados pelo parákletos, o qual traz Jesus a eles.
Desta maneira, combinada com outros aspectos de uma escatologia parcialmente realizada no quarto evangelho, a ênfase
no parákletos sugere aos cristãos a permanente certeza da presença de Jesus com eles. Ellen White belamente sumariza
esta ênfase: “O Espírito Santo é o Consolador, em nome de Cristo. Ele personifica Cristo”. Mas desfazendo qualquer
confusão quanto à pessoa do parákletos, ela afirma: “Contudo, ele [o parákletos] é uma personalidade distinta.”40

Sumário e conclusões
Qualquer que seja a origem final do termo parákletos, as linhas principais de interpretação do conceito são
estabelecidas pelo próprio João no evangelho, e são suficientemente claras. Tais linhas de interpretação são perceptíveis
se sumarizarmos as características do parákletos no quarto evangelho como as estudamos, e então considerarmos a forma
com que João descreve como Jesus introduziu Suas promessas acerca deste Personagem:
Em João 14:15-17, descobrimos que: (1) Jesus intercederá junto ao Pai e o Pai concederá outroparákletos; (2) este
outro parákletos estará com os discípulos para sempre, em aparente contraste com Jesus, que agora os está deixando; (3)
o outro parákletos é o Espírito de Verdade; (4) o mundo não O vê ou conhece; (5) mas os discípulos O conhecem, pois Ele
permanece com eles (cf. 20:22); (6) oparákletos é o Espírito Santo (Jo 14:25 e 26); (7) Ele ensina os crentes todas as coisas
e (8) trará à lembrança dos discípulos tudo o que Jesus ensinou; (9) o parákletos dá testemunho de Jesus (Jo 15:26-29);
(10) quando o parákletos vier, Ele acusará, julgará, e condenará o mundo (Jo 16:5-11); (11) o parákletos não falará de Si,
mas glorificará a Jesus, dando testemunho dEle (Jo 16:12-15); e, finalmente, (12) Ele ensinará aos crentes as coisas
vindouras. Deste esboço, e daquilo que discutimos ao longo deste artigo, é claro que o parákletos, embora Se pareça com
Cristo e esteja intimamente ligado a Jesus, é um outro consolador, cuja função principal é continuar a obra de Cristo, não
podendo ser confundido quer com Jesus, quer com o Pai.
Outro aspecto observado é a clara convergência e identificação entre o Espírito e o parákletos. Embora as cinco
passagens que tratam do parákletos no quarto evangelho possam ser consideradas uma unidade, quando tomadas em
conjunto, tais passagens são também consistentes com outras referências ao Espírito nos evangelhos sinóticos e livro de
Atos. Particularmente Mateus 10:20 (“visto que não sois vós quem falais, mas o Espírito do vosso Pai é quem fala em vós”),
e Marcos 13:11 (“Quando, pois, vos levarem e vos entregarem, não vos preocupeis com o que haveis de dizer, mas o que
vos for concedido naquela hora, isso falai; porque não sois vós os que falais, mas o Espírito Santo”), identificam a ajuda
que seria dada aos discípulos quando eles testemunhassem de Jesus em contexto forense, e fizerem sua defesa em corte,
em termos idênticos à ação do parákletos descrita no quarto evangelho.
Sobretudo, este artigo, de certa forma, concentrou-se no relacionamento entre Jesus e o parákletos, pois é
precisamente aqui que descobrimos a chave para o caráter crucial da missão dEle no evangelho joanino, respondendo
questões cruciais enfrentadas no final do primeiro século, mas com projeções para toda a era cristã, até o final dos
tempos. Não é, portanto, acidental que a primeira passagem contendo a promessa de Jesus quanto ao parákletos (Jo
14:16), seja seguida imediatamente pelo verso no qual Cristo afirma: “Não vos deixarei órfãos, voltarei para vós outros” (v.
17-18). Jesus “retorna” para os discípulos por meio do Espírito-parákletos, que é enviado para permanecer com eles,
depois que Jesus parte. Isto constitui a contribuição joanina quanto ao Espírito Santo: o parákletos continua, no período
pós-ressurreição, reatualizando a presença de Jesus com e na Igreja, por meio da era cristã, até o fim dos tempos. É
precisamente a presença do Espírito-parákletos que impede que a Igreja se torne órfã, desconectada do seu divino
fundador. É precisamente Ele que impede que os cristãos se tornem poços de água estagnada.
O que é então o parákletos nas passagens do quarto evangelho? Ele é o Espírito Santo, investido da função específica
de continuar a presença de Cristo com os Seus discípulos. Ele não é meramente a operação do poder divino no homem. Ele
é uma pessoa. Uma pessoa distinta, mais explicitamente afirmada no evangelho de João do que em qualquer outro lugar
do Novo Testamento. Uma pessoa distinta do Pai, pois, como vimos, Ele é enviado pelo Pai (Jo 14:26), e como a lógica
básica exige, ninguém envia-se a si mesmo; dado pelo Pai (14:16) e procedendo do Pai (Jo 15:26). Distinto do Filho, pois Ele
é enviado “em nome do Filho”(Jo 14:26), enviado pelo Filho (Jo 15:26), recebendo o que é do Filho (Jo 16:14), e é um
“outro parákletos” (Jo 14:16). Não há também qualquer dificuldade real quanto à Sua personalidade. Ele não é meramente
um dom impessoal ou poder abstrato, um fôlego, nem é Ele uma metáfora a respeito de Jesus. Ele é uma pessoa real, tão
real quanto o próprio Cristo, cuja presença na vida da Igreja, era e continua sendo, tão crucial e crítica, a ponto de o
próprio Jesus afirmar, com Sua fórmula de introduzir questões solenes: “Mas eu vos digo a verdade: convém que Eu vá,
porque, se Eu não for, o Consolador [parákletos] não virá para vós outros” (Jo 16:7).
O que poderia ser mais importante para os discípulos do que a presença de Cristo com eles? Difícil como isto possa
parecer, aqui Jesus ensina claramente que a vinda do parákletos era mais vantajosa para Seus seguidores no período pós-
cruz e ressurreição, do que a presença dEle mesmo. Assim, contrariamente às teorias antitrinitarianas, antigas e modernas,
em relação ao Espírito Santo, não estamos diante de uma questão superficial, uma luxúria interessante, mas dispensável e
de importância secundária, sujeita às especulações infundadas de teologias precárias. A crucial importância do Espírito
Santo para a Igreja pode ser percebida quando deixamos os evangelhos e entramos no livro de Atos, e testemunhamos aí a
realização daquilo que Jesus profetizara do parákletos. Aqui entramos num novo mundo e sentimos o sopro de uma brisa
nova. Nas palavras de J. Ritchie Smith, “em uma única hora, o Espírito operou nos discípulos a transformação que três anos
de comunhão com Jesus não tinha efetuado”41. Seria, então, incompreensível que Jesus tivesse dito: “É para a vossa
vantagem que Eu vá…”? Seria incompreensível por que o Espírito Santo seja vital para a Igreja hoje, como foi no passado?
Ou, seria difícil entender por que Satanás está tão ativo, confundindo cristãos e obscurecendo a compreensão deles sobre
a pessoa e obra do Espírito Santo?
Finalmente, os cristãos não crêem na Trindade em função de qualquer dogma inventado pela tradição ou concílios da
Igreja. Da mesma maneira que eles não descrêem dela porque vozes confusas e mal-informadas surgem com “fogo
estranho” no altar do Senhor. Além de nossa lógica fraca e razão finita, não dizemos, irracionalmente, que cremos em três
deuses e um deus, ou, em três pessoas e uma pessoa, mas, logicamente, afirmamos que a Bíblia ensina um único
verdadeiro Deus em três Pessoas divinas: Pai, Filho e o Espírito Santo. Somos exortados a crer no que Deus nos revela em
Sua Palavra, mesmo que não possamos entender isto plenamente, aqui e agora. Assim, se por um lado não ousamos crer
mais do que aquilo que nos foi revelado, por outro lado, não nos atrevemos a aceitar menos do que aquilo que nos é
ensinado nas Escrituras. Nossa consciência

Referências
*Adotamos neste texto o termo parákletos transliterado do grego em vez de Paracleto, do latim.
1
 Para esta identificação em um período muito antigo da história do cristianismo, veja Shepherd of Hermas, Mandate iii. 4,
comparando com v. 1-2, em Ante-Nicene Fathers (Eerdmans: Grand Rapids, MI, 1976), 2:43. Tertuliano (160-225), em um
período consideravelmente anterior a Nicéia, deu à Igreja a sua linguagem da “Trindade,” e das pessoas dentro da
Trindade, distinguindo claramente a pessoa e obra do Espírito Santo, do Pai e do Filho. Tertuliano identifica o
Paracleto/Consolador com o Espírito Santo, em. Against Praxeas xxv, vii-ix, Ante-Nicene Fathers, 3:621, 603-604. ↑
2
 A doutrina da Trindade é dogma central da teologia cristã, isto é, que Deus existe em três pessoas e uma substância. Esta
doutrina, ao longo dos séculos, tem sido mantida pelos cristãos como um mistério. Se, por um lado, ela não pode ser
conhecida pela razão humana desajudada ou independente da revelação, por outro lado, ela também não pode ser
plenamente demonstrada pela razão, mesmo depois de ter sido revelada. Embora os cristãos afirmem que tal
mistério esteja acima da razão, ele não é, contudo, contrário à razão, ou incompatível com os princípios do pensamento
racional. Tem havido em diferentes períodos da história do cristianismo os que, em arrogância, buscaram comprimir a
Divindade dentro dos limites da fraca lógica e razão humanas, sem se aperceberem, talvez, de que quando pudermos
entender Deus plenamente, seremos como Ele, e, portanto, já não precisaremos dEle. Nas Escrituras nós não temos
revelação absoluta, apenas revelação necessária. Não sabemos tudo sobre Deus. Não dizemos a Deus o que Ele deve ou
não revelar de Si, mas em humildade e gratidão recebemos e aceitamos aquilo que Ele, em Sua graça e sabedoria, decidiu
revelar. Evidentemente, se lógica humana fosse o teste para nossa aceitação de Deus e de Suas verdades, seríamos
forçados a deixar de fora a maior parte das categorias bíblicas: criação, pecado, queda, eleição divina, existência de
Satanás, milagres, encarnação, graça, salvação, ressurreição de Jesus, segundo advento, ressurreição dos mortos, apenas
para citar algumas. Todas estas noções, em sua plenitude, encontram-se além de nossa razão fraca e enferma. Ou será
que, para sermos “lógicos”, devemos também nos descartar delas? ↑
3
 O ensino bíblico quanto à Trindade, ao longo da história do cristianismo, tem se deparado com sérios desvios da ortodoxia,
variando de ênfase e enfoques. Sabelianismo, monarquianismo modalista, pneumatoquianismo, arianismo,
macedonianismo e socinianismo são antigas noções unitarianas que ressurgiram em tempos recentes entre os mórmons,
testemunhas de Jeová e Ciência Cristã, sem essencialmente nenhuma novidade. Mas, como sabemos, a mentira não morre
fácil. Outras versões recicladas e pioradas têm surgido na periferia do adventismo do sétimo dia, maquiadas com retoques
precários e pouco criativos. Este é o caso de alguns panfletos e folhetins que circulam em vários lugares e em sites da
internet. Os livros A Divindade, que se apresenta como uma “compilação de diversos autores,” e “Eu e o Pai Somos Um”,
de Ricardo Nicotra, caem nesta categoria: mal informados, sem solidez bíblica, teológica, histórica ou lógica simples. ↑
4
 W. F. Howard observa que João é “pela maioria dos cristãos considerado o clímax da revelação bíblica”. The Fourth Gospel
in Recent Criticism and Interpretation (London: The Epworth Press, 1965), 3. Em volume posterior, Howard insiste que a
teologia joanina “é a mais altamente desenvolvida do Novo Testamento”. Christianity According to St. John (London:
Duckworth, 1973), 19. Tal avaliação da importância do pensamento joanino para a teologia do Novo Testamento é comum
entre outros eruditos bíblicos. Embora possamos admitir que, como geralmente observado, a teologia paulina seja
obviamente mais abrangente, prevalece a compreensão de que “João é o Everest do estudo do Novo Testamento, tanto
exegeticamente como teologicamente.” W. Boyd Hunt, “John’s Doctrine of the Spirit,” Soutthwestern Journal of Theology,
7/8, 1966, 45. A. M. Hunter defende a mesma idéia ao afirmar que nas mãos de João o evangelho é reexpresso para
satisfazer as necessidades de uma comunidade espiritual mais ampla. “[João] buscou uma [nova] categoria para expressar
o significado do evangelho para todos os homens, judeus e gregos”. Introducing New Testament Theology(Naperville: SCM
Book Clook, 1957), 150. Veja também C.K. Barrett, The Gospel According to St. John (Philadelphia: The Westminster Press,
1978), 32, 49. Por outro lado, embora cristologia seja a ênfase primária do quarto evangelho, sua peneumatologia é
reconhecidamente um dos seus maiores temas e “uma das mais distintivas características do [quarto] evangelho” (ver
Hunter, 25). De fato, o cristinaismo “de acordo com João é interpretado em termos do Espírito” (Hunt, 46). ↑
5
 Vincent Taylor, et. al., The Doctrine of the Holy Spirit (London: The Epworth Press, 1938), 66. ↑
6
 Raymond E. Brown, The Gospel According to John XIII-XXI (New York: Doubleday & Company,  1979), 1135. ↑
7
 Na compreensão truncada de Nicotra, o Espírito Santo/Paracleto é ora confundido com Deus o Pai, ora com Deus o Filho. O
que realmente surpreende, contudo, é a natureza precária dos argumentos. Ver, por exemplo, sua interpretação de Atos
20:28 (“Eu e o Pai Somos Um”, p. 19): “Atendei por vós e por todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu
bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a qual ele comprou com o seu próprio sangue.” Dando sua interpretação,
Nicotra arremata: “No texto acima, Deus, através de Sua Palavra, está afirmando que o Espírito Santo comprou a igreja
com o seu proprio sangue. Sabemos que quem comprou a igreja com o Seu próprio sangue foi Jesus. Assim, não é difícil
perceber que Deus está chamando Jesus de Espírito Santo.” Fantástico, não fosse o caráter grosseiro do argumento. No
primeiro nível, o erro da conclusão de Nicotra se explica por confusão gramatical, pura e simples, ou, pior ainda, por má
interpretação básica de leitura de textos. O pronome pessoal ele (que “comprou com o seu próprio sangue”), não se refere
ao Espírito Santo (na primeira parte da frase), mas a Deus (aquele a quem pertence a Igreja), na cláusula imediatamente
anterior. Não fosse a apologia que Nicotra faz da ignorância para a leitura da Bíblia (ver “Eu e o Pai Somos Um”, p. 9-13),
ele poderia ter facilmente evitado este absurdo (ver F. F. BruceThe Book of Acts [Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1980], 416,
nota 59). Bruce discute o grego deste texto, concluindo que a melhor leitura seria “por meio do sangue do Seu próprio
[idiou] filho.” Veja em suporte, J. H. Moulton, Grammar of NT Greek, I [Edinburgh, 1906], 90). Por outro lado, A.T.
Robertson, indiscutível autoridade no grego do NT, argumenta com base na leitura de alguns manuscritos (por exemplo,
Aleph B Vulg), que tou theou refere-se a Jesus, chamado aqui, como em outras partes do Novo Testamento, de “Deus,”
que derramou o Seu sangue pelo Seu rebanho (Robertson, Introduction to Textual Cristicism of the N. T. A.[Nashville,
Broadman Press, 1930], 189); veja, ainda, Robertson, Word Pictures in the New Testament, Vol. III, The Act of the
Apostles(Nashvile: Broadman Press, 1931), 353. Nas páginas 20 e 21 do seu “Eu e o Pai Somos Um”, Nicotra, com o seu
curioso método de perguntas circulares, capaz de “provar” absolutamente qualquer coisa, indaga quem é o Consolador.
Citando então 2 Coríntios 1:3 e 4, onde o apóstolo Paulo fala do “Deus de toda consolação, que nos conforta em toda a
nossa tribulação,” ele conclui que Deus, o Pai é o Consolador. O argumento de Nicotra seria cômico, se não fosse trágico.
Para dizer o mínimo, parece que para Nicotra a Bíblia foi escrita em português. Embora Paulo afirme que Deus,
aparentemente em referência ao Pai, nos consola, ele não está dizendo que o Pai seja o parákletos, um título técnico,
utilizado apenas no quarto evangelho para alguém que não é o Filho e também não é o Pai (veja acima, p. 53 e 54), e é
claramente indentificado como sendo o Espírito Santo (Jo 14:26). Além disto, devemos observar, ainda, que a tradução
“Consolador” não esgota o rico significado do parákletosjoanino e da complexidade de Suas funções (veja abaixo).
Finalmente, em Atos 9:31, é o Espírito Santo quem conforta. ↑
8
 Como geralmente indicado, allos significa outro do mesmo tipo. C. K. Barret observa que, tomada
adjetivamente, allov ou parákleton, pode ser traduzido: Ele dará: (a) outro Paracleto, ou (b) outra pessoa para ser um
Paracleto (ver Barret, The Gospel According to St. John, 461) ↑
9
 A palavra traduzida em português por “advogado”, é derivada do latim advocatus, considerada um dos equivalentes do
termo grego parákletos (veja Johannes Behen, Parakleto, Theologiacal Dictionary of the New Testament [Grand Rapids, MI,
Eerdmans 1979], 801). O texto de 1 João 2:1, no qual Jesus é apresentado como exercendo um mistério intercessor, como
advogado, junto ao Pai, no céu, reflete, evidentemente, um contexto legal. Para ampla discussão sobre o significado
de parákletos em 1 João 2:1, ver I. Howard Marshal, The International Comentary on the New Testament: The Epistles of
John (Grand Rapids, MI: Eerdmans), 118. F. F. Bruce observa que em 1 João 2:1, a “advocacia de Jesus é exercida na corte
celestial…. [em João 14:16-17] está implícito que Ele [Jesus] tinha sido o advogado ou o parákletos dos discípulos na Terra.
Isto Ele inha sido realmente, enquanto estivera com eles: Ele tinha sido o ajudador e o defensor deles, Aquele em cuja guia
e apoio eles poderiam descansar; mas agora Jesus estava para deixá-los. Ele havia estado com eles por um curto período
de tempo, mas o ‘outro parákletos’… estaria com eles permanentemente e não apenas com eles, mas neles” F. F.
Bruce, The Gospel of John (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1983), 302. ↑
10
 F. F. Bruce. 302. Ellen White, em vários textos, concorre com esta noção ↑
11
 Uma indicação da unidade de ação entre as pessoas da divindade, Pai e Filho, é vista em João 15:26, onde é o próprio Jesus
quem envia o parákletos. O texto não deve ser visto como contrário a 14:26. Aqueles familiarizados, contudo, com a
teologia medieval se lembrarão como a controvérsiafilioque proveu o ambiente para a divisão entre o cristianismo
ocidental e oriental, em 1054. ↑
12
 Tertuliano. Against Praxeas xxv, vii-ix, em Ante-Nicene Fathers, 3:621, 603-604. ↑
13
 Ibid. Aqueles que defendem a insustentável teoria de que Trindade é um dogma de Constantino, posterior a Nicéia,
deveriam melhor se familiarizar com a história do Cristianismo. Referências à Trindade são abundantes em fontes
insuspeitas, mais de dois séculos antes do Concílio de Nicéia. Sugerimos a leitura de alguns volumes: o reconhecido, J. N.
Kelly, Early Cristian Doctrines (New York: Harper & Row, 1978), e Stanley M. Burgess, The Spirit & the Church:
Antiquity (Peabody, Massachusetts: 1984); Edmund J. Fortman, The Triune God, A Historical Study of the doctrine of the
Trinity (Grand Rapids: Baker, 1982); e ainda o recente, Roger E. Olson e Christopher A. Hall, The Trinity, (Grand Rapids, MI:
Eerdmans, 2002). Estas obras focalizam o testemunho do cristianismo primitivo quanto à pessoa e obra do Espírito Santo,
a partir do final do primeiro século. ↑
14
 Como geralmente reconhecido, os três atributos primários da personalidade são: mente/intelecto, emoções e vontade.
Mera “força” ou “influência” ou ruach/pneuma em sentido de fôlego, não possui estes atributos. Claramente em João,
bem como em uma outra enorme variedade de textos das Escrituras, o Espírito Santo exibe tais atributos. A “mente” do
Espírito Santo, por exemplo, é claramente mencionada em 1 Cor. 2:10 “…porque o Espírito a todas as coisas perscruta, até
mesmo as profundezas de Deus.” A palavra grega traduzida aqui por “perscruta” significa “cuidadosa investigação, exame
minucioso.” O Espírito, com Sua mente investiga as coisas de Deus, e as torna conhecidas por revelação (o mesmo verbo é
usado em João 5:39, “examinai as Escrituras…” como uma atividade possível apenas a pessoas). Devemos observar que em
Romanos 8:27 direta referência é feita à mente do Espírito: “E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do
Espírito…” Aqui é Deus o Pai quem perscruta a mente do Espírito. Novamente o mesmo verbo é utilizado. Como observa o
altamente respeitado Arndt e Gingrich, em Lexicon of the New Testament, a palavra traduzida por “mente” neste verso
significa, “modo de pensar, disposição mental, alvo, aspiração, busca” (Willian F. Arndt e F. Wilbur Gingrich, A Greek-
English Lexicon of the New Testament and Other Early Christian Literature [Chicago: The University Press, 1957], 874). E
evidentemente, uma mera força não tem um “modo de pensar, disposição mental, alvo,” ou “aspiração.” No livro de Atos,
em inúmeras referências, o Espírito Santo é descrito em termos que indicam ser Ele uma pessoa: que fala (1:16, 8:29),
proíbe (16:6), pensa (15:28); indica (20:28); envia (13:4); testemunha (5:32); arrebata (8:39); impede (16:7); contra Ele se
mente (5:3); tenta (5:9); Ele pode ser resistido (7:5). A estas citações do livro de Atos podem ser acrescentadas incontáveis
outras do Novo Testamento em geral. E, francamente, se a linguagem tem qualquer significado, é impossível compreender
como tais evidências podem ser desconsideradas. ↑
15
 Ékeinos em João 14:26, 15:26; 16:8 e 14; autós em 16:7. ↑
16
 Como indicado pela autoridade de Barret, esta é a leitura da “maioria dos manuscritos” embora alguns manuscritos
omitam tó agion (ver Barret, 467). ↑
17
 Um exaustivo estudo sobre o termo parákletos, do ponto de vista lingüístico e histórico, aparece em Gerhard Kittel,
ed., Theological Dictionary of the New Testament (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1979), vol. V, 800-814. Ver também, M.
Miguéns, El Paráclito (Jerusalém, 1963); Para bibliografia exaustiva no tópico, veja Barret, The Gospel According to John,
462. Veja, ainda, sobre a palavraparákletos de vários autores, Journal of the theologial Society, new series I (1950): 7-15; J.
G. Davies, idem, 4 (1953): 35-38; G. Bornkam, idem,  68-89, 90-103. ↑
18
 O. Betz, por exemplo, examina uma série de palavras usadas em Qumran para descrever pessoas com funções semelhantes
àquelas do parákletos no quarto evangelho, sem, contudo, estabelecer que qualquer destas palavras representem um
equivalente real. Der Paraklet (Leidenm, 1963), 137, citado por J. Louis Martyn, History & Theology in the Fourth
Gospel (Nashville: Abingdon, 1979), 144. Para alguns intérpretes, o termo grego foi transliterado para o hebraico e
aramaico (Veja Barret, 462) ↑
19
 R. Brown, The Gospel According to John,  1136. ↑
20
 Para bibliografia neste ponto veja Barret, ibid., 462 ↑
21
 Para C.K. Barret, o significado de parákletos no Evangelho de João é melhor configurado considerando-se o uso
de parakalein e outras palavras cognatas no Novo Testamento (The Gospel of John, 462). Encontramos, assim, uma
considerável variedade de significados atribuídos aoparákletos. (1) Como forma passiva de parakalein, em seu sentido
elementar (“chamar para o lado de”), significando “alguém que é chamado ao lado para ajudar;” assim, um advogado,
como no famoso texto de Tetuliano, “Paracletus, id est advocatus ad exorandum judicem” (Tertuliano, De jejunio, 13). Em
algumas das antigas versões latinas, advocatus, é uma tradução literal deste sentido. Freqüentemente esta interpretação
aparece combinada com o quadro extraído de outras referências do Novo Testamento, onde o Espírito Santo age em
defesa dos discípulos, quando estes são colocados em julgamento (Mt 10:20, At 6:10). Assim, o parákletos se torna um
advogado de defesa, o que sugere uma dimensão forense à Sua obra. Tal função é evidente em João 15:26, onde
oparákletos atua como testemunha no julgamento de Jesus. O. M. F. Berrouard acrescenta que “Oparákletos [também] é
o defensor de Cristo diante da consciência dos crentes” (Jean xvi.8-11, R.S.P.T. xxxiii [1949], 361-389). Devemos ter em
mente, ainda, que o contexto das passagens relacionadas ao parákletos indicam que os discípulos enfrentarão perseguição
(Jo 15:18-25; 16:1-3, 32; 18:15), e em tais situações o parákletos os ensinará o que dizer, o que reforça o aspecto forense
de Sua obra. (2) Em sentido ativo, refletindo parakalein, em seu significado de “interceder, apelar,” daí um intercessor, um
mediador, um representante. Em João 15: 13-14, o parákletos é um representante do ausente Cristo. A maioria dos Pais
Gregos entendeu o parákletos como um intercessor, embora alguns traduzam a palavra como “consolador” (veja Miguéns,
213). O Espírito Santo é claramente um intercessor em Romanos 8:26. Mas todo o contexto aqui tem que ver com as
orações dos santos, das quais o Espírito se torna o intérprete. Assim, por meio do Espírito Santo, Deus o Pai, ouve aquilo
que nós não poderíamos dizer por nós próprios; pelo Espírito Ele “aceita aquilo que Ele mesmo tem a oferecer” (Karl
Barth, The Epistle to the Romans [London: Oxford University Press, 1968], 317. (3) Algumas traduções vertem
o parákletos como um “ajudador,” um “amigo,”como, por exemplo, na Tweentieth Century Translation, Moffatt,
Goodspeed, etc. (4) Em sentido ativo, refletindo parakalein, como “confortar,” daí “confortador/consolador.” Isto é
refletido nas versões Antiga Latina, Lutero e Wycliffe, traduzindo parákletos como “consolator.” O elemento de consolação
aparece no contexto do último discurso (Jo 14:18,17; 16:16, 20-22). Assim, embora “confortador” não seja uma tradução
adequada de parákletos, a palavra lança luz em uma faceta do papel dele. (4) Relacionado com paraklesis, isto é,
exortação e encorajamento, encontrado na pregação do testemunho apostólico. C. K. Barret (“The Holy Spirit in the Fourth
Gospel,” J.T. S. I [1950]:1-15), sugere que o parákletos pode ser o título do Espírito, o qual falou
na paraklesis(admoestação/advertência/consolação) apostólica, como em Atos 9: 31, uma referência à Igreja andando
na paraklesis do Espírito Santo. Em João, embora o termo paraklesis não seja utilizado, há muito que se ajusta à sugestão
do parákletos como mestre e guia dos discípulos. ↑
22
 A idéia do parákletos como Ajudador é afirmada em relação ao Espírito Santo em Romanos 8:26, onde Espírito “ajuda em
nossas fraquezas.” “Ajudar” aqui é o termo grego compostosuvavtilambanomai, que aparece apenas em Lucas 10:40,
quando Marta pede a Jesus que mande Maria “ajudá-la”. Nestas duas únicas ocorrências, o verbo é utilizado em relação a
pessoas. ↑
23
 Brown, pág. 1139. ↑
24
 Ver W. Howard, Christianity According to John, 71-72. ↑
25
 A literatura tratando do Espírito Santo no quarto evangelho é extensa. Veja o clássico Henry Barclay Swete, The Holy Spirit
in the New Testament (Grand Rapids, MI: Baker, 1976), 143 em diante. Para introducão à farta bibliografia veja W. Boyd
Hunt, “John’s Doctrine of the Spirit,” 43-65. ↑
26
 Mateus 28:19, contendo a fórmula batismal trinitariana, representa uma das mais sérias evidências quanto à doutrina
bíblica da Trindade, uma das razões pelas quais Tertuliano utilizou a palavra latinatrinitas, para descrever a divindade. O
grego, neste texto, é de clareza inconfundível: o batismo é para ser administrado em um nome, não em três, o que implica
considerável noção de unidade. Contudo, o batismo é para ser realizado em nome de: o Pai, e o Filho e o Espírito Santo.
Deve-se notar que cada um dos três substantivos está conectado pela conjunção grega kai (“e”) com o artigo definido,
denotando, por outras construcões gramaticais semelhantes no Novo Testamento, três pessoas distintas. Seria
inconcebível falar-se em Mateus 28:19 de duas pessoas e uma influência, ou fôlego, como quer Nicotra em relação ao
Espírito Santo. A gramática e a lógica simplesmente não permitem tal uso. Curioso é que mesmo a Tradução Novo
Mundo, a Bíblia das Testemunhas de Jeová, tendenciosa em seu unitarianismo, é absolutamente silente quanto a este
texto de Mateus. Tal a força da passagem, que não encontramos nenhum apendix, comentário, ou nota de rodapé em
Mateus 28:19, oferecedo qualquer “explicação” jeovista para a lúcida e transparente implicação dele para o cardinal
ensino cristão da Trindade. Ver Robert H. Countess, The Jehovah’s Witnesses’ New Testament, A Critical Analysis of the
New Word Translation of the Christian Greek Scriptures(Phillipsburg, NJ.: Presbyterian and Reformed, 1987), 72-73. Entre
os antitrinitarianos adventistas, porém, tornou-se comum argumentar contra a autenticidade de Mateus 28:19 (Ver
Nicotra, “Eu e o Pai Somos Um”). Novamente, a desinformação é o grande problema de Nicotra. Alberto Timm trata em
seu artigo, nesta edição de Parousia, minunciosamente quanto à autenticidade deste texto. Aqui é suficiente referir-nos ao
testemunho de alguém do porte de Alfred Plummer, em seu indisputável comentário: “Quanto à questão da genuinidade
deste verso [Mt 28:19], podemos responder com a mais absoluta confiança: a passagem é encontrada em cada Manuscrito
Grego existente, quer uncial ou cursivo e cada versão existente que contenha esta porção de Mateus.” (Alfred
Plummer, Exegetical Commentary on the Gospel According to St. Matthew [Grand Rapids, MI: Baker, ed. 1982], 431).
Plummer avança para desacreditar toda a teoria criada em torno da forma como Eusébio de Cesareia utilizou o famoso
texto de Mateus (ibid., 432). ↑
27
 Ver 1 Coríntios 12:4-6 (“O Espirito é o mesmo… O Senhor é o mesmo… Deus é o mesmo;” Estas são reproduções fiéis do
grego. Como em Mateus há um paralelismo triúno de três substantivos, tal paralelismo seria destruído e perderia o seu
sentido, se dois dos nomes são pessoas e o outro, um mero fôlego/força/influência. Em 2 Coríntios 13:13 encontramos o
que tem sido chamado de bênção trinitariana: a imerecida graça do Senhor Jesus, e o amor de Deus e a comunhão do
Espírito Santo. Como em Mateus e 1 Coríntios, mencionados acima, o artigo está presente antes de cada nome. Paulo tem
em vista três entidades distintas. Além disto, cada artigo está na forma genitiva singular –tou, embora o substantivo
“espírito” seja neutro (masculino e neutro são idênticos, no genitivo singular). Veja Robert H. Coutess, 72-73. O mesmo
modelo trinitariano encontramos na introdução da carta aos Efésios (Ef 1:3, 5, 13). Para uma introdução à Trindade em
Paulo, veja Edmund J. Fortman,The Triune God, 16 em diante; ver, ainda, Alasdair I. C. Heron, The Holy Spirit,
(Philadxelphia: The Westminstr Press, 1983), 44-ss. ↑
28
 Os primeiros discípulos eram tanto arautos das boas novas como testemunhas delas, e isto não por iniciativa própria. Mas
testemuhas sob a direção da Testemunha Divina, o Espírito Santo. Comunicado por Deus a todos os que obedecem o
evangelho. “Nestas palavras temos a marca da consciência apostólica de serem possuídos e habitados pelo Espírito, de tal
forma que eles foram o Seu órgão de expressão,” afirma F. F. Bruce, The Book of Acts, 32. Bruce, então, faz neste contexto,
a conexão com João 15:26 e 27: “Quando, porém, vier o Paracleto, que eu vos enviarei da parte do Pai, O Espírito da
verdade que dele procede, esse dará testemunho de mim, e vós também testemunhareis, porque estais comigo desde o
princípio.” ↑
29
 R Brown, 1.140. ↑
30
 Nicotra tenta justificar seu antitrinitarianismo afirmando que o Espírito (ruach/pneuma), é apenas o fôlego de Deus, como
no caso do homem e, portanto, impessoal (ver “Eu e o Pai Somos Um”). Além do caráter precário deste tipo de teologia,
que busca explicar Deus a partir do homem, revertendo ao absurdo de tentar “criar Deus à imagem e semelhança do
homem”, (como no famoso dito de L. Feuerbach, “O homem criou Deus segundo a sua imagem”, ainda hoje muito
estimado pela propaganda ateísta), tal teologia não passa num teste simples de lógica. Se o Espírito não tem realidade
concreta porque ruach/pneuma no homem significa apenas o seu folêgo/vento, Nicotra será forçado a admitir que Deus o
Pai não tem realidade concreta, uma vez que as Escrituras afirmam que “Deus é espírito [pneuma]” (Jo 4:24). O mesmo é
verdade em ralação aos anjos claramente identificados como “espíritos [pneumata] ministradores” (Hb 1:14). O que dizer
dos espíritos [pveumatwv] malignos/imundos, na enorme quantidade de textos bíblicos? (ex.: 1Sm 16:14-15; 1Rs 22:23;
Mt 10:1; Mc 1:23-27; 5:2-20; Lc 7:21, etc.). Ou será que eles também não têm realidade concreta, porque são descritos
como ruach e pneuma? Nicotra e seus seguidores deveriam considerar que as palavras, em qualquer língua,
particularmente no hebraico e no grego, podem ter significados diferentes, dependendo do seu contexto. A estatística
torna evidente que a palavra “espírito” (ruach) aparece 389 vezes no Antigo Testamento. Em 113 destes casos, o termo
significa vento, 136 vezes ele designa o Espírito de Deus, e em 116 casos ele significa o espírito/fôlego do homem; 10
vezes ruach se refere a animais, 3 vezes a ídolos (Ver Herman Brandt, O Espírito Santo[São Leopoldo, RS: Sinodal, 1985],
124). Esta diversidade de usos, sugere, de início, cautela na interpretação de “ruach”; do contrário, o termo pode ser
reduzido a uma mera dimensão antropológica, obscurecendo o fato de que, por sua natureza complexa, ruach deve ser
visto, como indicado por H.W. Wolff, como uma “noção teo-antropológica” (H.W. Wolff, Antropologia do Antigo
Testamento [São Paulo, SP: Loyola, 1975], 52). Para uma significativa discussão sobre a variedade de significados das
palavras ruach e pneuma, veja Alasdair I. C. Heron, The Holy Spirit, (Philadelphia: The Westminster Press, 1983), 3-38. ↑
31
 Embora Jesus tenha se tornado um parákletos no céu, indo para o Pai, depois da Sua ascensão, como indicado em 1 João
2:1, as funções do Espírito-parákletos são paralelas em cada detalhe em relação ao ministério terreno dEle [Jesus]. Este
segundo paracleto faz precisamente o que Jesus fez (ensinando, testemunhando contra o mundo, guiando, e ajudando os
discípulos). A conclusão de que Jesus foi o “primeiro Paracleto” em seu ministério terreno parece inevitável. ↑
32
 Brown, 128. ↑
33
 Martyn, History & Theology in the Fourth Gospel, 150. ↑
34
 Ver F. F. Bruce, The Gospel of John, 302. ↑
35
 Ver Herschel H. Hobbs, “Word Studies in the Gospel of John”, em Soutwestern Journal of Theology,37 (1985), 78. ↑
36
 Alguns eruditos bíblicos mantêm que um dos propósitos do quarto evangelho foi demonstrar a verdadeira conexão entre a
vida da Igreja no final do primeiro século com o já distante Cristo. Eles consideram o evangelho como uma tentativa de
neutralizar o perigo de a igreja tornar-se, em si mesma, um tipo de salvador, suficiente em si própria. Assim, o quarto
evangelho busca enfatizar a necessidade de fé em Jesus, e demonstrar através de atos simbólicos, que a Igreja está
diretamente relacionada com o Senhor. Daí, concluímos, a ênfase no parákletos, como o verdadeiro vínculo entre a vida
da Igreja e Jesus. ↑
37
 O ato do parákletos de “relembrar” (upomimvnskeiv), aos discípulos, participa no caráter daavamvnsis bíblica, isto é, a
reinterpretação de maneira viva. O próprio Evangelho de João pode ser considerado um perfeito exemplo de como Ele
exerceu Seu ministério de guiar os homens na verdade das palavras e atos de Jesus. O quarto evangelho representa a
melhor demonstração da ação doparákletos, uma vez que aí, João é guiado a reintepretar os desdobramentos e profundas
implicações das palavras e atos de Jesus, em um período já consideravelmente distante do ministério histórico de Jesus.
Desta forma, o evangelho joanino é o melhor exemplo, ou mesmo o exemplo ideal, do papel doparákletos. Ao mesmo
tempo, devemos ter em mente que a obra do parákletos não está confinada ou restrita ao testemunho do discípulo
amado, ou a qualquer outra das testemunhas primitivas de Cristo. Em outras palavras o parákletos não foi privilégio
apenas dos doze ou da igreja apostólica. Aqueles são apenas modelos, tipos, daquilo que cada discípulo de Cristo, através
da era cristã, deve ser. Oparákletos não é, ainda, privilégio exclusivo de qualquer grupo dentro da Igreja. Em 1 João 2:20,
27, o apóstolo amplia a função de ensino do Espírito Santo: “E vós possuís unção que vem do Santo e todos tendes
conhecimento… a unção que dEle recebestes permanece em vós, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine,
mas com a sua unção vos ensina a respeito de todas as coisas…” ↑
38
 O elemento de ligação entre João 21:18-23 e os propósitos da composição do quarto evangelho foi trazido à minha atenção
por Wilson Paroschi. ↑
39
 Brown, 1.131. ↑
40
 White, 20 Marnuscript Release, 324. ↑
41
 J.Ritchie Smith, The Holy Spirit in the Gospels (New York: The Macmillan Company, 1926), 298. Smith foi um professor em
Princeton, particularmente interessado na teologia joanina. Seu livro pode parecer antigo, mas sua compreensão é
equilibrada e judiciosa. ↑
Fonte: Revista Parousia, 2° Semestre de 2005, UNASPRESS

Pecado Fatal
O que significa pecar contra o Espírito Santo? (Mt 12:31 e 32)
Alberto R. Timm
A questão do pecado contra o Espírito Santo é mencionada por Cristo no contexto da cura de um endemoninhado
cego e mudo (Mt 12:22-32; Mc 3:20-30). Essa cura levou “toda a multidão” que seguia a Jesus a indagar se não seria Ele,
“porventura, o Filho de Davi”. Mas os fariseus, invejosos da popularidade de Jesus, contestaram: “Este não expele
demônios senão pelo poder de Belzebu, maioral dos demônios” (Mt 12:23 e 24). É evidente que os fariseus atribuíam a
Satanás a obra que o Espírito de Deus realizava através de Cristo.

Para entender melhor o assunto, é preciso lembrar que uma das obras mais importantes do Espírito Santo é levar os
seres humanos ao arrependimento dos seus pecados e à aceitação de Cristo como Salvador e Senhor. Mas essa obra acaba
sendo neutralizada na vida daqueles que resistem persistentemente aos apelos do Espírito Santo. Assim, entristecem o
Espírito Santo (Ef 4:30) e apagam a Sua influência sobre a consciência individual (I Ts 5:19). Com o coração endurecido pelo
orgulho (Hb 3:7-15), perdem a sensibilidade espiritual e as percepções morais, e acabam formando uma escala de valores
distorcida, na qual a obra do Espírito Santo é muitas vezes atribuída a Satanás e a de Satanás, ao Espírito Santo.

Nas Escrituras encontramos vários casos de pessoas que pecaram contra o Espírito Santo. Por exemplo, Faraó, diante
do qual Moisés e Arão realizaram grandes sinais e maravilhas, endureceu o seu coração a ponto de o Espírito de Deus não
mais ter acesso a ele (Êx 5 a 12). Judas Iscariotes não permitiu, a despeito das advertências de Cristo (Mt 26:21-25), que o
Espírito Santo o dissuadisse de trair o Mestre. Já Ananias e Safira mentiram ao Espírito Santo e foram punidos por isso (At
5:1-11). Sem dúvida, essas pessoas se perderam porque não permitiram que o Espírito Santo as levasse ao
arrependimento.

Por outro lado, a Bíblia menciona também alguns indivíduos que se afastaram de Deus e acabaram se arrependendo.
Sansão, a respeito do qual é dito que “ele não sabia ainda que já o Senhor Se tinha retirado dele” (Jz 16:20), clamou depois
e a sua oração foi atendida (Jz 16:28-30). Seu nome aparece entre os heróis da fé (Hb 11:32). Manassés foi talvez o pior rei
hebreu, mas, após ser levado em cativeiro pelo exército assírio, ele se humilhou perante Deus e empreendeu uma
significativa reforma religiosa em Judá (II Rs 21:1-18; II Cr 33:1-20). Esses exemplos revelam que mesmo casos
aparentemente sem esperança podem ser revertidos, se a pessoa se humilhar perante Deus e clamar por socorro.

O problema dos fariseus é que o orgulho e a auto-suficiência os haviam endurecido a ponto de não mais perceberem
os milagres de Cristo como sinais operados “pelo Espírito de Deus” para evidenciar a chegada do “reino de Deus” (Mt
12:28). Como o arrependimento é a condição para o perdão dos pecados (At 2:38), eles jamais seriam perdoados
enquanto continuassem atribuindo a Satanás a própria obra do Espírito Santo efetuada para levá-los ao arrependimento.

Diante disso, podemos concluir que o pecado contra o Espírito Santo é jamais reconhecer os próprios erros. Enquanto
a pessoa reconhece que está errada e que deve mudar, ela pode ter certeza de que não foi longe demais. Aqueles que
indagam se por acaso não cometeram o pecado imperdoável demonstram por essa atitude que sua consciência não
perdeu completamente a sensibilidade. Quando a pessoa não mais reconhece seus próprios erros, ela se encontra no
caminho perigoso. Mesmo assim, não podemos perder a esperança. Experiências como as de Sansão e Manassés revelam
que mesmo pessoas totalmente degeneradas podem voltar a Deus, se derem ao Espírito Santo a oportunidade de realizar
a Sua obra regeneradora.

Fonte: Sinais dos Tempos, novembro/dezembro de 2003, p. 30 (usado com permissão)

Deus
Podemos considerar a Deus como a Natureza globalizada pelas leis instituídas
bioquimifisiologicamente e matematicamente?
Alberto R. Timm
Para explicar a misteriosa origem do mundo e do Universo, só existem duas alternativas plausíveis. Ou cremos na
existência de um Ser Supremo (Deus), que é a Causa sem causa de tudo o que existe; ou teremos de admitir que, em
determinada época, a própria matéria era inteligente, com capacidades criadoras e organizadoras que ela não mais possui.
Isso implica no fato de que, para descrer de Deus, o indivíduo “deve assumir que efeitos são maiores do que suas causas;
que os maiores efeitos são totalmente sem causa; na realidade, que algo, e algo poderoso ainda por cima, veio do nada.”
(Lucas A. Reed, Astronomy and the Bible, p. 14).
Não resta a menor dúvida de que todo ser humano possui uma necessidade inerente de algo, superior a ele mesmo, a
quem ser grato pelos triunfos da vida e a quem recorrer em busca de auxílio para os seus problemas existenciais. Não
conhecendo o Deus das Escrituras, adeptos das religiões naturais têm venerado vários elementos da própria Natureza, aos
quais admiram e/ou temem. Por conseguinte, seres humanos adoraram, ao longo da História, mais de 2.500 divindades
diferentes (ver Michael Jordan, Encyclopedia of Gods: Over 2,500 Deities of the World [New York: Facts On File, 1993]).
A Bíblia, no entanto, reivindica um culto monoteísta ao Deus Criador e Mantenedor do Universo, considerando todos
os demais deuses como falsos (ver Êx 20:1-6). Sem qualquer tentativa de provar cientificamente a existência de Deus, as
Escrituras declaram que “no princípio, criou Deus os céus e a terra” (Gn 1:1), e qualificam como “insensato” aquele que diz
que “não há Deus” (Sl 14:1; 53:1). Mesmo obtendo um conhecimento parcial dos atributos de Deus “por meio das coisas
que foram criadas” (Rm 1:2), não podemos nos esquecer que é somente “pela fé” que “entendemos que foi o Universo
formado pela Palavra de Deus, de maneira que o visível veio a existir das coisas que não aparecem” (Hb 11:3).

Em relação à natureza de Deus, devemos ser cuidadosos para não cairmos no extremo do deísmo, que afasta
completamente a Deus da Sua criação (ver Ez 8:12), nem no extremo oposto do panteísmo, que confunde a Deus com a
Sua criação (ver Rm 1:25). A despeito de Sua onipresença (ver Sl 139:7-10), Deus é um Ser pessoal e distinto da Sua criação
(ver Gn 1; Sl 33:9; Jo 1:1-13; Cl 1:15-17; etc.). Mas essa natureza divina, ao mesmo tempo transcendente e onipresente, é
algo que foge completamente à nossa compreensão. Como criaturas, não temos acesso ao Ser interior de Deus (ver I Co
2:10 e 11), que “habita em luz inacessível, a quem homem algum jamais viu, nem é capaz de ver” (I Tm 6:16). Se
pudéssemos explicar plenamente a misteriosa natureza de Deus, seríamos iguais a Ele.

Fonte: Sinais dos Tempos, fevereiro de 1999, p. 29 (usado com permissão)

A plena divindade de Cristo


Por que Ellen White afirma que Deus o Pai “exaltou” o Seu Filho diante das hostes angélicas por
ocasião da criação do mundo, se Este sempre foi plenamente Deus?
Dr. Alberto Timm
Ellen White menciona em seus livros História da Redenção (cap. 1) e Patriarcas e Profetas (cap. 1) que Deus o Pai
confirmou a plena autoridade do Seu Filho diante das hostes angélicas na época em que a criação deste mundo estava
sendo planejada nos conselhos divinos. Para entendermos essa “exaltação” de Cristo, devemos ter em mente, em primeiro
lugar, que ela ocorreu em uma situação de crise, em que a Sua posição estava sendo invejada e desafiada por Lúcifer.
Insatisfeito por não ser convidado para os conselhos divinos dos quais Cristo participava, Lúcifer começou a propagar seu
descontentamento pessoal entre os anjos.
Em face dessa situação, Deus confirmou diante das hostes angélicas o poder e  autoridade de Cristo. Mas esse ato do
Pai não representou qualquer capacitação adicional de poder que o Filho ainda não possuísse. Ellen White esclarece, no
mesmo contexto, que não houve “mudança alguma na posição ou autoridade de Cristo. A inveja e falsa representação de
Lúcifer, bem como sua pretensão à igualdade com Cristo, tornaram necessária uma declaração a respeito da verdadeira
posição do Filho Deus; mas esta havia sido a mesma desde o princípio.” – Patriarcas e Profetas, pág. 38. Estudando
detidamente as Escrituras, percebe-se que sempre existiu e sempre existirá uma eterna unidade essencial entre o Pai, o
Filho e o Espírito Santo (João 5:17, 18; 10:30; I Cor. 2:10), e que também houve uma planejadasubordinação
funcional entre Eles no contexto da Criação (Gên. 1:2; Heb. 1:2; Apoc. 3:14) e da Redenção (João 14:26 e 28; 16:14). É
provável que Lúcifer tenha se valido dessa evidente subordinação funcional por ocasião do planejamento da Criação, para
propagar entre as hostes angélicas o sofisma de que Cristo não tinha o direito de reivindicar para Si qualquer unidade
essencial com a própria Divindade. É lamentável que, ainda hoje, muitas pessoas usam o mesmo argumento para negar a
plena divindade de Cristo. Se Ellen White não cresse que Cristo era co-eterno com o Pai, ela jamais teria afirmado que “em
Cristo há vida original, não emprestada, não derivada” (O Desejado de Todas as Nações, pág. 530); que “desde toda a
eternidade esteve Cristo unido ao Pai” (Mensagens Escolhidas, vol. 1, pág. 228); que “nunca houve tempo em que Ele não
estivesse em íntima comunhão com o eterno Deus” (Evangelismo, pág. 615); e que devemos proclamar ao mundo “que
somos crentes em Cristo, que, cremos na divindade de Cristo e em Sua preexistência” (Testemunhos para Ministros, pág.
253). Se a vida de Cristo tivesse sido derivada do Pai, mesmo em algum momento remoto da eternidade, como Cristo
poderia ser chamado em Isaías 9:6 de “Deus Forte” e “Pai da Eternidade”? Luiz Nunes, em sua obra Crises na Igreja
Apostólica e na Igreja Adventista do Sétimo Dia (Engenheiro Coelho, SP: Imprensa Universitária Adventista, 1999), págs.
24-33 e 71- 79, compara e contrasta algumas compreensões distorcidas sobre a natureza de Cristo, que apareceram tanto
na Era Apostólica como nos primórdios da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Praticamente todas essas distorções se
originaram com uma leitura parcial e tendenciosa dos textos bíblicos e, no caso de alguns adventistas, também dos
escritos de Ellen White. Distorções doutrinárias acabam surgindo toda vez que alguém superenfatiza algumas declarações
da Bíblia ou da Sra. White, em detrimento de outras igualmente importantes.
As declarações de Ellen White sobre a “exaltação” de Cristo, no contexto da criação do mundo, não devem ser isoladas
de outras declarações que se referem a Cristo como sempre havendo possuído a plenitude do poder divino. Uma
compreensão correta da natureza de Cristo só pode ser obtida se não enfatizarmos a subordinação funcional entre Cristo e
Deus o Pai em detrimento da unidade essencialque sempre houve entre Eles. Embora durante a encarnação Cristo tenha
Se humilhado, assumindo a forma de servo, nunca houve um tempo em que Ele não fosse plenamente Deus (Fil. 2:5-11).
Como cristãos adventistas, cremos que em Cristo sempre habitou e sempre habitará “toda a plenitude da Divindade” (Col.
2:9).

Fonte: Revista do Ancião (janeiro – março de 2003).

Arcanjo Miguel
Quem é o “arcanjo Miguel” mencionado em Judas 9?
Alberto R. Timm
Muita especulação surgiu através dos tempos, nas tradições judaica e cristã, sobre a natureza e obra dos anjos, bem
como sobre a identificação do arcanjo Miguel. Na literatura pseudo-epígrafa, por exemplo, Miguel é apresentado como
um dos sete arcanjos celestiais (I Enoque 20:1-7; 81:5; 90:21-22; Tobias 12:15), e um dos quatro que se encontram mais
próximos do trono de Deus (I Enoque 9:1; 40:1-10; 54:6; 71:8, 9 e 13). Essas tradições extrabíblicas têm sido usadas por
muitos comentaristas contemporâneos para alegar que Miguel é apenas um anjo, criado por Deus, que exerce a função de
principal líder das hostes angélicas.

Nas Escrituras, Miguel, cujo nome significa “Quem é como Deus?”, é descrito como “arcanjo” (Jd 9), o líder das hostes
angélicas no conflito com Satanás e os anjos maus (Ap 12:7), “um dos primeiros príncipes” (Dn 10:13), “vosso príncipe” (Dn
10:21) e “o grande príncipe, o defensor dos filhos do teu povo” (Dn 12:1). Uma análise detida dessas expressões dentro do
contexto bíblico deixa claro que Miguel é apresentado no texto sagrado como um Ser divino, cujas características refletem
a glória messiânica do Antigo Testamento.

Miguel é apresentado em Judas 9 como o “arcanjo” que, na disputa “a respeito do corpo de Moisés” (Dt 34:5 e 6),
enfrentou o diabo com as palavras: “O Senhor te repreenda!” Essa alusão identifica Miguel como o “Anjo do Senhor” que,
na contenda sobre o “sumo sacerdote Josué”, disse igualmente ao diabo: “O Senhor te repreenda, ó Satanás” (Zc 3:1 e 2).
É interessante notarmos que, tanto em Zacarias 3 como em Gênesis 22:11-18; Juízes 6:11-24; 13:2-22 e Atos 7:30-33 e 38,
o Anjo do Senhor é identificado como sendo o próprio Senhor!

Em Apocalipse 12:7, Miguel e Satanás são apresentados em direto antagonismo, num conflito cósmico que se originou
no Céu, e que se estende ao longo da história humana (Ap 12:1-17; 20:1-10). O Novo Testamento esclarece que esse
conflito se polariza entre Cristo e Seus seguidores e Satanás e seus adeptos (ver Mt 4:111; Jo 12:31 e 32; 14:30; Ef 6:10-20;
Cl 1:13 e 14; etc.).

Já em Daniel 10:13 e 21; 12:1, Miguel é chamado de “príncipe” e “o grande príncipe”. Em todo o restante das
Escrituras, quando não aplicado a seres humanos, o título “príncipe” é usado exclusivamente para Cristo (Js 5:14 e 15; Is
9:6; Dn 8:11 e 25; 9:25; At 5:31) ou para Satanás (Jo 12:31; 14:30; 16:11; Ef 2:12), mas nunca para qualquer outro ser
angelical. Em Josué 5:14 e 15, o Senhor Se apresentou a Josué como o “príncipe do exército do Senhor”, aceitando
adoração, o que seria uma blasfêmia se esse príncipe fosse apenas um anjo (ver Mt 4:10; Ap 22:8 e 9), e ordenando que
Josué tirasse as suas sandálias porque o lugar se tornara santo (ver Êx 3:4-6; At 7:30-33). No próprio livro de Daniel, Cristo
é chamado também de “príncipe do exército” (Dn 8:11) e “Princípe dos Princípes” (Dn 8:25).

Uma das características básicas do conteúdo profético do livro de Daniel é a “repetição para ampliação”. Cada uma das
quatro grandes seções proféticas do livro emprega símbolos diferentes para descrever a mesma seqüência profética,
culminando sempre com a manifestação gloriosa de Cristo para a implantação do Seu reino eterno. Essa manifestação de
Cristo é simbolizada em Daniel 2, pela pedra cortada sem auxílio de mãos (versos 34 e 35; 44 e 45; comparar com At 4:11;
Ef 2:20; I Pe 2:4-8); em Daniel 7, pelo aparecimento do Filho do Homem (verso 13; comparar com Mt 16:27; 24-27 e 30;
25:31 e 32; etc.); em Daniel 8, pelo surgimento do Príncipe dos Príncipes (verso 25; comparar com Ap 19:11-21); e,
finalmente, em Daniel 10-12, pela vinda de “Miguel, o grande príncipe, o defensor dos filhos do teu povo” (capítulo 12:1;
comparar com Sl 91). Alegar que Miguel seja um simples anjo significa quebrar o paralelismo estrutural do livro.

Fundamentados nas semelhanças que a Bíblia apresenta entre as características da missão do Arcanjo Miguel com as
de Cristo, podemos concordar com outros comentaristas, como João Calvino e Matthew Henry, que identificam Miguel
como Cristo.

Fonte: Sinais dos Tempos, agosto de 1998, p. 29 (usado com permissão)

Resenha crítica do livro


‘Eu e o Pai Somos Um’
Alberto R. Timm, Ph.D.1
Resumo: O presente artigo provê uma resenha crítica do livro antitrinitariano “Eu e o Pai Somos Um”, 2ª ed. (São
Paulo: Ministério Bíblico Cristão, 2004), de autoria de Ricardo Nicotra. Após a menção de alguns antecedentes históricos, o
artigo analisa criticamente a referida obra da perspectiva da relevância do tema abordado, do uso de fontes bibliográficas,
das pressuposições do autor, dos recursos retóricos empregados, dos princípios de interpretação sugeridos e das
interpretações pessoais do autor. Entre as interpretações pessoais analisadas se encontram a preservação das Escrituras, o
conceito bíblico de mistério, a teoria da “Bindade”, o Filho gerado, a emanação do Espírito divino, oparákletos divino, o
trono do Espírito Santo e a autenticidade de Mateus 28:19.

Introdução
Muitos cristãos preferem hoje acreditar em um Deus mais imanente e explicável, recriado à própria imagem e
semelhança humanas, do que no Deus transcendente e infinito, como revelado nas Escrituras (Rm 11:33). A própria
essência da religião cristã tem sido desafiada por diferentes teorias que questionam a doutrina bíblica da Trindade e
tentam redefinir a natureza de Deus. Várias dessas teorias são analisadas criticamente na obra God under Fire: Modern
Scholarship Reinvents God (2002), editada por Douglas S. Huffman e Eric L. Johnson.2 Lamentavelmente, porém, desde a
década de 1990 algumas dessas teorias vêm se infiltrando também em círculos adventistas cuja suposta crença na
inspiração dos escritos de Ellen G. White parecia mantê-los imunes a elas.
Os dissidentes antitrinitarianos adventistas contemporâneos pretendem restaurar os ensinos antitrinitarianos dos
pioneiros adventistas,3 mas diferem radicalmente deles no que diz respeito à confiabilidade nas Escrituras. Os pioneiros
adventistas criam que os manuscritos originais da Bíblia e de Ellen G. White são plenamente confiáveis em todos os seus
ensinos,4 pois Deus os preservou e ainda os preserva livres de interpolações heréticas, em suas línguas originais. Já os
atuais antitrinitarianos não se constrangem em questionar a integridade dos escritos inspirados, alegando que estes foram
distorcidos pelo acréscimo de interpolações heréticas com o propósito de apoiar a doutrina supostamente “antibíblica” da
Trindade. Se esse fosse o caso, então nem a Bíblia e nem os escritos de Ellen G. White poderiam ser considerados
plenamente confiáveis.
Em resposta às alegações antitri-nitarianas, a Review and Herald Publishing Association publicou em 2002 a obra de
288 páginas intitulada The Trinity, de autoria de Woodrow Whidden, Jerry Moon e John W. Reeve. 5 O livro foi traduzido e
lançado em língua portuguesa, pela Casa Publicadora Brasileira, sob o título A Trindade (2003).6 A obra ajudou muitas
pessoas a entender melhor, não apenas as raízes históricas das discussões contemporâneas, mas também o embasamento
da doutrina da Trindade na Bíblia e nos escritos de Ellen G. White. Mas a circulação desse livro acabou desafiando alguns
antitrinitarianos brasileiros a publicar suas próprias idéias de maneira mais contundente e acusatória, tentando responder
a alguns dos argumentos apresentados em A Trindade e desconsiderando a muitos outros.
Uma das publicações antitrinitarianas que apareceram no Brasil, após o lançamento de A Trindade, foi o livro de 108
páginas intitulado “Eu e o Pai Somos Um” (2004), de Ricardo Nicotra.7 O título aparece grafado entre aspas no original por
ser uma expressão bíblica extraída de João 10:30. Publicado pelo assim chamado “Ministério Bíblico Cristão”, o livro foi
impresso em Contenda, Paraná, na gráfica do Ministério 4 Anjos, ministério este que compartilha das mesmas idéias. Além
disso, o livro foi também disponibilizado em alguns websites antitrinitarianos. Com um estilo simples, retórico e
homilético, o conteúdo de “Eu e o Pai Somos Um” é de fácil compreensão e auto-elucidativo, podendo-se detectar com
facilidade suas inconsistências. Mas diante de freqüentes solicitações de uma resposta mais detalhada ao conteúdo do
livro, julgamos conveniente preparar e publicar a presente análise crítica.
É difícil avaliar precisamente quanto das idéias de “Eu e o Pai Somos Um” são de fato originais do autor. Mas, como o
próprio livro identifica a Ricardo Nicotra como o seu autor, assumimos no presente estudo que todas as idéias não
devidamente creditadas a outras fontes são de sua própria autoria ou, pelo menos, endossadas por ele. As páginas
indicadas entre parênteses, ao longo do conteúdo básico do presente artigo, se referem sempre à paginação da 2ª edição
do livro “Eu e o Pai Somos Um” em que as respectivas informações mencionadas podem ser encontradas.
Antecedentes históricos8
Ricardo Nicotra, filho de João Nicotra e Maria Garcia Nicotra, nasceu no dia 28 de dezembro de 1972 em São Paulo, SP.
Naquela cidade estudou Matemática (1989); graduou-se em Ciências da Computação (1990-1993); freqüentou por dois
anos um curso de Administração de Empresas (1994-1995); concluiu um programa de MBA (2003-2004); e freqüentou
ainda por um semestre a Faculdade de Direito (2005). Sua carreira profissional inclui passagens por algumas empresas
multinacionais e instituições bancárias. Em setembro de 2005 mudou-se para Washington, DC, onde passou a exercer a
função de Consultor de Sistemas do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Como filho de família adventista,
Nicotra foi batizado na Igreja Adventista do Sétimo Dia do Ipiranga, São Paulo, em 4 de dezembro de 1982 pelo pastor
Edgard da Silva Pereira. Naquela igreja, exerceu as funções de professor dos Juvenis, diretor de Jovens Adventistas, diretor
de Ação Missionária e diretor da Escola Sabatina. Em setembro de 1993, passou a freqüentar o recém-formado grupo
adventista de São João Clímaco, onde exerceu as funções de pianista do Coral e da congregação, bem como diretor e
tesoureiro. Quando a congregação foi organizada como Igreja, Nicotra passou a ser um dos anciãos. A primeira sede do
grupo era num imóvel alugado, e a sede própria só foi comprada em 1996. O valor pago pelo terreno e pelo prédio foi de
aproximadamente R$ 67.000,00. O caixa da Igreja dispôs de R$ 25.000,00, a Associação Paulistana contribui com R$
5.000,00, o pastor Voltaire Cavalieri com aproximadamente R$ 10.000,00 e o valor restante foi parcelado com notas
promissórias. Nicotra pagou com recursos próprios as notas no valor de R$ 10.000,00, e ao longo dos dois anos seguintes a
igreja local reembolsou esse valor.

Insatisfeito com o valor doado pela Associação local, Ricardo pesquisou o Livro de Praxes da Divisão Sul-Americana 9 e
começou a questionar os relatórios financeiros da Associação local e a estrutura administrativa da igreja em geral, por
meio de artigos na Internet e chats adventistas. Por causa das suas críticas, foram convocadas duas reuniões para tratar do
assunto, uma na Igreja de São João Clímaco e outra na sede da Associação Paulistana. Na segunda reunião estiveram
presentes os pastores Leonício Lisboa, departamental de Mordomia (hoje também chamado de Ministério da Fidelidade);
Jetro Ferreira da Silva, secretário Ministerial; e Valter da Silva Araújo, pastor distrital. Nicotra solicitou um relatório
simplificado das entradas e saídas da Associação, mas não foi atendido, o que gerou mais críticas de sua parte.
Entre 1998 e 1999, Nicotra fundou o Movimento de Obreiros Voluntários Adventistas (Mova) que arrecadava doações
de membros da Igreja Adventista para financiar obreiros bíblicos. Ele canalizava o seu próprio dízimo para o referido
movimento, que continuaria apenas até abril de 2000. O nome de Ricardo Nicotra foi removido do rol de membros da
Igreja de São João Clímaco em 11 de dezembro de 1999, época em que Valter da Silva Araújo ainda era o pastor distrital.
Nicotra ficou aguardando a comunicação por escrito da igreja sobre sua exclusão, mas isso não ocorreu. Ele solicitou então
sua readmissão como membro, com direito a uma reunião plenária com a igreja local para expor sua defesa. Isso não lhe
foi concedido, mas ele a continuou freqüentando até 2001.

Em 14 de julho de 2001 ele começou a freqüentar reuniões na casa de Mário Ângelo Fragnan, no Jardim Vera Cruz, São
Paulo, com um grupo de aproximadamente 20 ex-membros da Igreja do Parque São Rafael, São Paulo. Em julho de 2003,
esse novo grupo comprou um terreno para a construção de uma igreja e, em julho de 2004, começou a congregar no
prédio ainda inacabado. Em 16 de julho de 2005 inauguraram a nave da nova igreja com capacidade para 100 pessoas,
com o nome de “Igreja Cristã Bíblica Adventista”, com sede no Jardim Vera Cruz. Em setembro de 2005 o grupo contava
com aproximadamente 50 membros, mas a mudança de Nicotra para os Estados Unidos acabou enfraquecendo o grupo.

Em 2002, as idéias antitrinitarianas passaram a ser propagadas mais enfaticamente no Brasil pela Internet. No ano
seguinte (2003), o grupo dissidente que já se reunia na casa do sr. Mário começou a discutir se deveria ou não tomar
alguma posição sobre o assunto. No final daquele ano, Nicotra começou a pesquisar mais detidamente o tema, e passou a
aceitar tais idéias. Já em 2004 ele publicou o livro “Eu e o Pai Somos Um”, cujo conteúdo é o objeto básico da análise
crítica provida no presente artigo.

Relevância do tema
O livro “Eu e o Pai Somos Um” reflete a compreensão de Ricardo Nicotra sobre Deus, com especial ênfase em sua
interpretação do inter-relacionamento entre o “Pai” (pessoa), o “Filho” (pessoa) e o “Espírito Santo” (apenas espírito). Sem
questionarmos ainda a validade dessa interpretação, podemos dizer que o tema sobre o qual o autor escolheu dissertar é
de suprema relevância teológica, histórica e escatológica. Da perspectiva teológica, devemos reconhecer que o
conhecimento experiencial de Deus é não apenas o mais importante conhecimento que seres humanos podem obter (Pv
9:10), mas também a própria condição para a vida eterna (Jo 17:3). No entanto, como um dos pilares da fé cristã, o
assunto da natureza de Deus deve ser tratado com o máximo de reverência e de cuidado possíveis, permitindo que a razão
e a lógica humana se curvem diante da revelação divina.
Já a importância histórica deriva do fato de este ter sido o tema central de muitos debates teológicos dos primeiros
séculos da Era Cristã. O assunto mereceu atenção especial também dos adventistas do sétimo dia entre o final do século
19 e o início do século 20. A despeito de toda a literatura já produzida sobre o assunto, esta é, sem dúvida, uma questão
cíclica que tem sido debatida em outros momentos da história cristã, e que ressurgiu em anos recentes também em alguns
círculos adventistas. Como parte dos debates teológicos contemporâneos, o tema merece ser analisado em mais
profundidade, de modo a prover respostas convincentes a todos aqueles que sincera e honestamente indagam a respeito
da razão de nossa fé (cf. 1Pe 3:15).

Em face à relevância teológica e histórica da doutrina de Deus, é de se esperar que ela assuma também uma
importância escatológica nos conflitos finais entre a verdade e o erro, que se intensificarão antes da segunda vinda de
Cristo (ver 1Tm 4:3, 4). A pergunta básica nesses conflitos é: Quem é digno de adoração? – a besta ou Deus (Ap 13:12;
14:7, 9-12)? Não é de surpreender, portanto, que nestes últimos dias Satanás procurará confundir a mente dos “próprios
eleitos” a respeito da natureza de Deus (cf. Mt 24:24). Além disso, como o assim chamado “alfa da apostasia” envolvia a
negação da personalidade de Deus através da teoria panteísta de John H. Kellogg, 10 não seria possível que o “ômega da
apostasia”11 representasse a negação da personalidade de pelo menos um dos membros da Divindade (neste caso a do
Espírito Santo)? Não seria de se esperar que, numa época da história em que a Igreja mais precisa do poder do Espírito
Santo por meio da “chuva serôdia” (Jr 5:24; Os 6:3; Jl 2:23), os poderes do mal tentariam levar as pessoas a questionar a
própria personalidade do Espírito Santo a fim de neutralizar a Sua obra?
Seja como for, a doutrina de Deus é demasiadamente importante para ser considerada uma questão de mera
“interpretação pessoal”, ou de “ponto de vista particular”, ou mesmo de “consciência individual”. Este assunto precisa ser
bem compreendido pelos filhos de Deus, para não serem levados pelos assoladores vendavais de falsas doutrinas que
soprariam nos últimos dias (Ef 4:14). É com esta preocupação em mente que passamos a analisar criticamente o livro “Eu e
o Pai Somos Um”.
Uso de fontes
Fundamental para se entender um livro controvertido como o “Eu e o Pai Somos Um” é a identificação crítica das
fontes bibliográficas usadas pelo autor. Essa identificação permite que se tenha uma noção mais precisa e acurada, não
apenas do grau de atualização e familiaridade bibliográfica do autor, mas também das obras que ele reconhece como mais
autoritativas e abalizadas na área. Deve-se reconhecer, no entanto, que alguns autores adventistas, mesmo crendo em
Ellen G. White, evitam mencionar seus escritos ao público não adventista, a fim de minimizar preconceitos. Mas como o
livro“Eu e o Pai Somos Um” tem circulado basicamente entre pessoas adventistas e ex-adventistas, cremos que essa
precaução não se aplica a ele.
É provável que no processo de pesquisa, Nicotra tenha consultado outras fontes não mencionas explicitamente em seu
livro. Mas, além de diferentes versões do texto bíblico, o autor se limita a citar, quase que exclusivamente, obras de
referência geral como o Código de Processo Penal 12(p. 42); aEncyclopaedia Britannica, 11ª edição13 (p. 49); a Encyclopaedia
of Religions, de M. A. Canney14 (p. 49); a New International Encyclopaedia15 (p. 49); a Encyclo-paedia of Religion and Ethics,
editada por James Hastings16 (p. 49, 53); os comentários de rodapé da Bíblia de Jerusalém17 (p. 50); a Gramática Elementar
da Língua Hebraica, de Hollenberg & Budde18 (p. 62); a enciclopédia Wikipedia da Internet19(p. 87); e o Catecismo do
Católico de Hoje20 (p. 88-89). A única obra adventista mencionada é o livro O Terceiro Milênio e as Profecias do Apocalipse,
de Alejandro Bullón21 (p. 50). Nicotra reconhece também como autoridades confiáveis, em suas respectivas áreas, o antigo
historiador eclesiástico Eusébio de Cesaréia (p. 52-53)22; um “estudioso inglês” chamado A. Ploughman (p. 53); e o teólogo
George Howard, que é dito ter concluído o “seu Ph.D.” no Hebrew Union College (p. 54).
Ao tratar de um tema tão significativo como a natureza de Deus, seria de se esperar que Nicotra citasse pelo menos
algumas obras clássicas de Teologia Sistemática 23 e outras mais específicas sobre a doutrina de Deus, 24 mas todas acabaram
sendo desconsideradas. Nem mesmo aparecem quaisquer alusões a obras fundamentais da literatura adventista sobre o
assunto como, por exemplo, os capítulos 2-5 do livro Nisto Cremos (disponível em língua portuguesa desde 1989)25; o
capítulo “Doctrine of God”, do livro Handbook of Seventh-day Adventist Theology (2000)26; o livro Understanding the
Trinity(2001), de Max Hatton27; e o próprio livro A Trindade,28 já mencionado. É digno de nota que Nicotra também não cita
uma única vez os escritos de Ellen G. White sobre o assunto.
Diante disso, alguns leitores de “Eu e o Pai Somos Um” poderão indagar: Desconhece o autor a literatura básica sobre a
doutrina de Deus, ou seria ele suficientemente tendencioso a ponto de ignorá-la? E mais, estaria ele já tão distante do
pensamento adventista contemporâneo que nem mais considera confiável a literatura denominacional, incluindo os
escritos de Ellen G. White? É curioso observarmos que, ao mesmo tempo em que Nicotra tenta convencer seus leitores de
que os teólogos adventistas não são confiáveis (p. 6, 68, 69), ele cita de forma elogiosa teólogos não-adventistas para
justificar suas teorias (p. 54). Com isso, ele tenta distanciar seus leitores do pensamento teológico adventista.
Mas, além de desconhecer inúmeras fontes teológicas abalizadas, o autor de “Eu e o Pai Somos Um” também
demonstra sérias inconsistências na forma como usou os próprios documentos históricos dos primeiros séculos da era
cristã. Por exemplo, ao focalizar sua atenção tardiamente em Eusébio de Cesaréia como sugerindo que a expressão
“batizando-os em nome do Pai e do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 28:19) não fazia parte do texto original de Mateus,
Nicotra acabou ignorando vários outros documentos patrísticos anteriores, que comprovam a autenticidade da expressão.
Lamentavelmente, Nicotra não informa seus leitores que a autenticidade dessa expressão de Mateus já havia sido
confirmada anteriormente, por exemplo, pelo Didaquê, bem como por Clemente, o Pastor de Hermas, Irineu, Tertuliano
de Cartago, Hipólito de Roma, e Orígenes de Alexandria. 29 Mas como tais informações não ajudam a construir o argumento
de “Eu e o Pai Somos Um”, Nicotra preferiu continuar ignorando-as. Tendenciosa parcialidade no uso de fontes é evidente
também na forma como Nicotra escolheu de Eusébio de Cesaréia apenas o que favorece a sua teoria antitrinitariana (ver
pp. 52-53), desconhecendo completamente o que a contradiz. Por exemplo, em nenhum momento os leitores de “Eu e o
Pai Somos Um” são informados a respeito da existência do Credo de Cesaréia, escrito por Eusébio e por ele apresentado
diante do Concílio de Nicéia.30 Nesse credo Eusébio não apenas nomeia explicitamente ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo,
mas também confirma a autenticidade de Mateus 28:19:
Cremos em um Deus o Pai Onipotente, Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis; e em um Senhor Jesus Cristo, o
Verbo de Deus, Deus de Deus, Luz de Luz, Vida de Vida, e Filho unigênito, o primogênito de toda criação, gerado de Deus o
Pai antes de todas as eras, por quem todas as coisas foram feitas; que pela nossa salvação foi feito carne e habitou entre
os homens; e sofreu; e ressuscitou no terceiro dia; e ascendeu ao Pai; e virá outra vez em glória, para julgar vivos e mortos.
[Cremos] também em um Espírito Santo.

Cremos que cada um deles é e existe, o Pai verdadeiramente Pai, e o Filho verdadeiramente Filho, e o Espírito Santo
verdadeiramente Espírito Santo; como nosso Senhor, ao enviar seus discípulos a pregar, disse: “Ide, portanto, fazei
discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”.31
O mesmo Eusébio, tão laureado por Nicotra, é descrito por Ellen G. White como o “amigo íntimo e adulador de
Constantino” que “propôs a alegação de que Cristo transferira o sábado para o domingo”. Esse argumento, “infundado
como era, serviu para incentivar os homens a desprezarem o sábado do Senhor”.32 O próprio Eusébio chegou a escrever
uma obra sobre a vida de Constantino, na qual afirma que “Deus honrou a Constantino” por ser este “um poderoso luzeiro
e o mais eloqüente arauto da genuína piedade”.33 No Concílio de Nicéia (325), Eusébio demonstrou considerável
instabilidade teológica entre o arianismo e a ortodoxia.34 A admissão de que “no final de sua vida, após o Concílio de
Nicéia”, Eusébio passou a incorporar em seus escritos a própria fórmula trinitariana de Mateus 28:19 (p. 53) confirma a
inconsistência desse historiador. Em realidade, de acordo com Benjamin J. Hubbard, “Eusébio tinha o hábito de citar as
Escrituras de forma inexata”.35 Mas, a despeito de tudo isso, Nicotra ainda o considera como “de boa reputação no tocante
à sua precisão” (p. 52).
A fragilidade documental de “Eu e o Pai Somos Um” transparece também em várias outras ocasiões. Por exemplo, na
p. 49 do livro, o autor assevera de forma dogmática: “… Mateus 28:19 tem sua autenticidade questionada. A história
demonstra que na era apostólica batizava-se apenas em nome de Jesus, sendo que batismos em nome do Pai, do Filho e
do Espírito Santo só foram realizados muitos anos após a morte dos apóstolos. Vejamos o que as enciclopédias dizem a
respeito…” Sinceramente, enciclopédias são fontes secundárias, úteis para quem deseja começar a estudar determinado
assunto, mas jamais deveriam ser usadas em substituição a uma análise acurada das próprias fontes primárias existentes,
como o próprio autor sugere nas páginas 51-52 do seu livro. Só que, depois de afirmar que as “citações de versos bíblicos
feitas por autores antigos são de grande valor para a crítica literária” (p. 52), Nicotra menciona apenas a Eusébio de
Cesaréia, desconhecendo todos os “autores antigos” que o precederam. Será que “de grande valor” para Nicotra são
apenas aqueles autores que concordam com as suas idéias?
Na página 53, Nicotra assevera categoricamente que Eusébio de Cesaréia “baseou seus escritos em manuscritos
anteriores e mais fidedignos do que os que temos hoje”. Lamentavelmente, Nicotra declara mais uma vez algo que ele
mesmo não comprova. Quais seriam esses “manuscritos anteriores e mais fidedignos”? Se a expressão “batizando-os em
nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” é espúria e mesmo herética, como sugerido por Nicotra, por que Ellen G.
White a citou muitas vezes em seus escritos? 36 Será que Eusébio de Cesaréia e o próprio Nicotra seriam mais esclarecidos e
confiáveis nesse particular do que a voz profética de Deus para os últimos dias, através dos escritos de Ellen G. White?
Outro problema no uso de fontes ocorre na p. 50, onde aparece uma citação de O Terceiro Milênio e as Profecias do
Apocalipse, de Alejandro Bullón. Nicotra transcreve a citação da seguinte forma:“Naquele período, a Igreja cristã passou a
ter conflitos internos por causa de doutrinas entranhas que pretendiam misturar-se às verdades bíblicas. Entre as doutrinas
em conflito, podemos mencionar: o pecado original, a trindade, a natureza de Cristo, o papel da virgem Maria, o celibato e
a autoridade da Igreja” (grifo acrescido por Nicotra). É evidente que Bullón menciona como “doutrinas em conflito”
algumas doutrinas biblicamente aceitáveis e outras, espúrias. Mas a maneira como Nicotra grifou o texto acaba induzindo
o leitor desatento a crer que o próprio Bullón considera a doutrina da “trindade” como uma das “doutrinas estranhas que
pretendiam misturar-se às verdades bíblicas. Que Nicotra creia desta forma, é mais que evidente em “Eu e o Pai Somos
Um”; mas sugerir que Bullón esteja qualificando a Trindade como uma doutrina estranha e antibíblica só é possível quando
se lê a referida citação de forma tendenciosa.
Existem também outras dificuldades de precisão no uso das fontes. Um exemplo é a alegação de que o Evangelho de
Mateus tenha sido escrito em aramaico, sem nem ao menos citar qualquer fonte mais sólida sobre o assunto (p. 42). Na
página 53, alusão é feita a Ploughman, sem identificar explicitamente a fonte de onde a informação foi extraída. Na página
54 é mencionado que em 1960 a Sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira publicou um Novo Testamento grego, mas
nenhuma fonte é apresentada que identifique a procedência dessa informação. Já na página 88 aparece uma citação
atribuída equivocadamente ao “Credo de Nicéia” (325 d.C.), quando ela é, em realidade, uma versão condensada do
posterior Credo Niceno-Constantinopolitano (381 d.C.).37
É lamentável que o livro “Eu e o Pai Somos Um” seja parcial e tendencioso no uso de fontes extra-bíblicas. Mas o
assunto se torna bem mais comprometedor ao se descobrir que o mesmo problema de parcialidade transparece também
no uso de textos bíblicos. Os adventistas do sétimo dia sempre enfatizaram o princípio protestante da tota Scriptura, que
leva em consideração a totalidade das Escrituras. Em contraste, Nicotra se vale de um uso seletivo da Bíblia, em que alguns
textos são usados em substituição a outros, fazendo com que importantes passagens bíblicas sejam desconsideradas. Um
exemplo típico é a maneira como o referido autor usa os textos que falam no batismo em “nome de Jesus” (At 2:38; 8:16;
10:48; 19:5; Rm 6:3; Gl 3:27) para desfazer a relevância de Mateus 28:19 (pp. 45-49). Como se isso não bastasse, ele não se
constrange em desfazer o princípio da sola Scriptura(exclusividade das Escrituras) ao estudar o texto de Mateus 28:19 à luz
de Eusébio, Encyclopaedia Britannica, enciclopédia Wikipedia e outras fontes secundárias (p. 49, 52-53, 87). Para Nicotra, é
irrelevante o fato de não existir nenhum manuscrito grego (ou mesmo aramaico!) antigo que apresente resquícios de
supostas supressões ou variantes textuais em Mateus 28:19.38
Mas a seletividade e a fragilidade bibliográficas de Nicotra podem ser mais facilmente compreendidas ao se considerar
as pressuposições básicas que sustentam o conteúdo do livro “Eu e o Pai Somos Um”.

Pressuposições do autor
Existem várias pressuposições básicas que fundamentam o conteúdo do livro “Eu e o Pai Somos Um” de Ricardo
Nicotra. Talvez a mais importante, que sumariza a própria essência do livro, seja que “a Palavra de Deus apresenta duas
pessoas que possuem atributos divinos”, e que “a doutrina da trindade carece de embasamento bíblico quando afirma que
o Espírito Santo é a terceira pessoa de uma tríade divina” (p. 28). Como todo o conteúdo do livro gravita em torno dessa
pressuposição, a doutrina clássica da Trindade ou Tri-unidade é reduzida a uma espécie de “Bindade” ou Duo-unidade.
Diante dessa proposta, alguns leitores poderão indagar se Nicotra não estaria sendo motivado mais pelo ditado popular
“um é pouco; dois é bom; três é demais”, do que por uma acurada exegese do texto bíblico!
Outra pressuposição básica é que o conceito de “pessoa” só pode ser compreendido dentro dos limites da pessoa
humana. Nicotra argumenta que, como o espírito do ser humano não existe separadamente do próprio ser humano,
também o Espírito Santo, chamado na Bíblia de “Espírito de Deus” e o “Espírito de Cristo” (Rm 8:9), não pode existir como
uma “pessoa” distinta do Pai e do Filho (p. 10-27, 59). Para o mesmo autor, “uma pessoa deve ter corpo e espírito”. Como
a Bíblia “não fala que o Espírito Santo tem um corpo” e nem que Ele “tem um espírito” que poderia ser chamado de “o
Espírito do Espírito Santo”, conseqüentemente, “o Espírito Santo não é uma pessoa, mas sim o próprio Espírito do Pai e o
Espírito de Cristo” (p. 107).

Por mais lógica e persuasiva que possa pretender ser, essa forma de argumentação possui sérias implicações. Primeiro,
ela sugere uma compreensão antropocêntrica de Deus, na qual a natureza do ser humano finito se transforma no
referencial para se entender a natureza do Ser Divino infinito. Não resta a menor dúvida de que o ser humano foi criado
originalmente à imagem e semelhança de Deus (Gn 1:26, 27), mas jamais podemos dizer que Deus é semelhante ao ser
humano, pois isso acabaria divinizando o ser humano ou humanizando a Deus.39 Mas, além disso, a argumentação de
Nicotra também nega a pluralidade de significados dos termos hebraico ruach40 e grego pneuma41, traduzidos como
“espírito” nas Escrituras, dando a impressão que o sentido desses termos é sempre o mesmo, independente de se
referirem ao ser humano ou a Deus.
Nicotra afirma também que a doutrina da Trindade está completamente ausente no Antigo Testamento (p. 68), e que,
no Novo Testamento, ela recebe apoio apenas aparente de alguns poucos textos bíblicos espúrios e/ou mal interpretados
(pp. 48, 75). Esse tipo de alegação é característico daqueles que desconhecem, consciente ou inconscientemente, os textos
bíblicos usados nas exposições teológicas sobre o assunto, acima mencionadas.42 A tentativa de apenas rotular tais
exposições (p. 68-69) e então ignorá-las completamente é inaceitável em qualquer pesquisa séria de alguém que pretenda
ser honesto para com “as inúmeras evidências bíblicas” sobre a “obra e natureza” do Espírito Santo (p. 67).
Além disso, para Nicotra, a crença no Espírito Santo como “uma pessoa divina” não passa de uma mera teoria satânica.
Ele não se constrange em afirmar que “o inimigo busca confundir nossa adoração criando mais uma pessoa divina cujo
nome é Espírito Santo, quando na verdade o Espírito Santo é um atributo do Pai e do Filho que nós podemos receber, mas
não um deus que devamos adorar ou louvar” (p. 95). Com esse tipo de arrazoado Nicotra acaba sugerindo que todas as
evidências bíblicas da personalidade do Espírito Santo e as declarações explícitas de Ellen G. White que falam do Espírito
Santo como uma “pessoa” (inglês person) e uma “pessoa divina” (inglês divine person), distinta do Pai e do Filho,43 são de
origem satânica! A alegação de que o termo person (em inglês) tem um sentido diferente da palavra pessoa (em
português) não é convincente para quem conhece bem ambas as línguas. Para os verdadeiros adventistas do sétimo dia
continua plenamente válido o seguinte conselho inspirado de Ellen White: “Precisamos reconhecer que o Espírito Santo …
é tanto uma pessoa como o próprio Deus”.44 Nicotra também argumenta que Mateus foi escrito originalmente em
aramaico, porque o seu objetivo era “alcançar os judeus convencendo-os de que Jesus Cristo era o Messias descrito pelos
profetas do Antigo Testamento” (p. 42), e que o texto original aramaico de Mateus 28:19 não continha a expressão
“batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (p. 42-56). A teoria de que Mateus tenha sido escrito
originalmente em aramaico (dialeto hebraico) é baseada na alusão que Eusébio de Cesaréia faz à seguinte declaração de
Papias: “Mateus escreveu os oráculos [grego logia] em língua hebraica, e cada um os interpretava como podia.”45 Para se
aceitar essa teoria, é necessário interpretar o termo logia como uma alusão ao próprio Evangelho de Mateus, e assumir
que o “hebraico” mencionado por Eusébio não seja realmente hebraico e sim aramaico. No entanto, é importante ter-se
em mente que (1) até hoje não foi encontrado nenhum fragmento hebraico ou aramaico desse evangelho; (2) “o grego de
Mateus não apresenta qualquer indício de ter sido traduzido do aramaico”; e (3) “existem abundantes evidências de que o
grego de Mateus é dependente de Marcos”.46
Já a teoria de que a expressão “batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” não fazia parte do
suposto texto aramaico de Mateus 28:19 não passa de mera teoria especulativa inferida também dos escritos de Eusébio
de Cesaréia, sem nenhum manuscrito bíblico, quer em aramaico ou em grego, para a substanciar. É interessante notarmos
que mesmo as antitrinitarianas Testemunhas de Jeová preservam o texto em sua Tradução do Novo Mundo das Escrituras
Sagradas, onde a referida expressão é vertida da seguinte forma: “batizando-as em o nome do Pai, e do Filho, e do espírito
santo”.47 Se a expressão não fosse autêntica, essa tradução certamente a omitiria.
Merece ser salientada ainda a pressuposição de que, segundo Nicotra, a doutrina da Trindade é uma teoria herética
imposta ao cristianismo pelo Concílio de Nicéia (325 d.C.). Conseqüentemente, Nicotra relê as Escrituras como se nelas não
existissem quaisquer evidências genuínas que suportassem essa doutrina, pois, em sua opinião, ela é parte do processo
pós-apostólico de “paganização do cristianismo” (p. 89). Se esse fosse realmente o caso, por que então Ellen G. White não
incluiu essa doutrina entre os falsos ensinos pós-apostólicos e medievais mencionados em seus livros Spiritual Gifts, vol. 1
(1858)48; The Spirit of Prophecy, vol. 4 (1884)49; e O Grande Conflito (1888; edição revisada de 1911)50? Por que essa
“importante” questão não foi tratada explicitamente em nenhum dos seus demais escritos? Será que Nicotra, em resposta
a essas perguntas, preferiria assumir que Ellen G. White tenha suprimido tendenciosamente a verdade sobre o assunto ou,
então, que ela haja permitido indevidamente que a liderança da Igreja Adventista do Sétimo Dia “adulterasse” todos esses
escritos? Seja qual for a preferência de Nicotra, a única resposta correta a estas indagações é que Ellen G. White não
incluiu a doutrina da Trindade entre os falsos ensinos pós-apostólicos e medievais simplesmente porque ela cria nessa
doutrina, e jamais a qualificou pejorativamente como Nicotra e seus seguidores o fazem.
As pressuposições anteriores são indispensáveis para se entender a argumentação que Nicotra usa em seu livro “Eu e o
Pai Somos Um”. Mas, somadas a elas, existem também alguns recursos retóricos que o autor usa para convencer seus
leitores de que as idéias dele são bem mais confiáveis e fidedignas do que as da Igreja Adventista do Sétimo Dia, de cuja
denominação ele já foi membro.

Recursos retóricos
Algumas pessoas sem formação teológica buscam espaço e reconhecimento nessa área, questionando de forma
generalizada a idoneidade e a credibilidade dos teólogos. Maior êxito é conseguido quando o questionador assume uma
postura irônica para com seus antagonistas, e apela de forma populista para que outras pessoas sem formação teológica
(mas “sinceras”!) também rompam com a “tradição” teológica predominante. O argumento se torna quase irresistível
quando o questionador não se contenta apenas em demonstrar a coerência bíblica de seus postulados, mas chega mesmo
a discursar como um confiável porta-voz de Deus para uma comunidade em pretensa apostasia.

Valendo-se desses recursos apologéticos, Ricardo Nicotra questiona subliminarmente a credibilidade dos “acadêmicos
da religião” e dos assim chamados “doutores em divindade”, que é um título honorífico não recebido por nenhum dos
atuais teólogos adventistas brasileiros.51 Já no “Prefácio” (p. 6) de sua obra, ele argumenta:
Apelo a todos os crentes sinceros que se desprendam de idéias pré-concebidas e dogmas arraigados a fim de receber
da Palavra de Deus um conhecimento progressivo de Deus. …

O conhecimento progressivo de Deus é possível! Mas para avançarmos, temos que estar dispostos a deixar muitos
conceitos já arraigados para trás. Através da leitura deste livro você perceberá que a verdade bíblica é simples e fácil de
ser compreendida, não é exclusividade dos acadêmicos da religião e dos doutores em divindade. Até mesmo pessoas
simples, sem educação formal, podem conhecer esse maravilhoso Deus que não é um Deus misterioso e complicado, mas
um Deus simples que tem prazer em revelar-se aos seus filhos mais humildes.

Na “Introdução” (p. 8), Nicotra ironiza outra vez: “Afinal de contas, há pastores e professores de religião com mestrado
e doutorado, experts em divindade. Eles não podem estar errados, podem?” Posteriormente em sua discussão (p. 68 e
69), ele volta a insinuar desdenhosamente: “talvez o argumento mais sofrível utilizado pelos doutores em divindade
trinitarianos esteja relacionado com…”, e mesmo ironicamente: “os doutos teólogos pretendem sugerir que…” Alguns
leitores poderão indagar: Até que ponto o rompimento de Nicotra com a organização adventista e sua liderança
administrativa acabou gerando um efeito dominó, levando-o a questionar também a liderança teológica da denominação?
Seja como for, essa é uma questão pessoal, não pertinente ao propósito da presente análise crítica.

É certo que mestrados e doutorados não tornam qualquer ser humano infalível. Mas a forma irônica e pejorativa como
essas expressões são usadas por Nicotra acaba rotulando negativamente os teólogos que não aceitam seus pressupostos.
Desta forma, o leitor é vacinado subliminarmente contra quaisquer respostas teológicas que questionem os postulados
de “Eu e o Pai Somos Um”. Rotu-lações pejorativas, como as que aparecem nesse livro, são normalmente usadas pelos
críticos como um complemento retórico para suprir a carência de argumentos academicamente convincentes. É curioso
ver também como Nicotra, ao mesmo tempo em que critica genera-lizadamente os teólogos, usa palavras hebraicas (p. 12-
15, 62, 68-69, etc.) e gregas (p. 16-27, 70-85, etc.), e reproduz textos bíblicos nessas línguas (p. 22, 23, 38, 55), como se
fosse um especialista na área teológica e com mais conhecimentos que os demais teólogos.
Valendo-se de uma espécie de apologia da ignorância e da instabilidade doutrinária, Nicotra procura gerar uma
dicotomia artificial entre teólogos (orgulhosamente equivocados) e leigos (humildemente corretos) que predisponha o
leitor a aceitar sua “teologia leiga” como mais honesta e confiável do que o pensamento acadêmico da denominação (p. 6,
8-9). Ao mesmo tempo em que o estudo é tido como importante (p. 9), os estudiosos são considerados como irrelevantes;
pois, se o indivíduo estudar o bastante para se tornar um teólogo, ele passa a ser desprezível para Nicotra (p. 6, 8). Mas é
importante notarmos que mesmo o preconceito deste para com os teólogos não é plenamente consistente, pois, com
base na sua conveniência apologética, ele os polariza entre os que prestam (p. 53-54) e os que não prestam (p. 68-69). A
dicotomia entre teólogos e leigos tende a desaparecer da mente daqueles que reconhecem que Paulo e os grandes
reformadores do século 16 eram teólogos por excelência, com sólidos princípios de interpretação bíblica.

Outro importante recurso retórico usado por Nicotra é a forma como ele define e aplica em seu livro os conceitos de
“conhecimento progressivo de Deus” e de “humildade”. Para ele, o “conhecimento progressivo de Deus” só pode ser
alcançado por aqueles que estão dispostos “a deixar muitos conceitos já arraigados para trás” (p. 6). Por sua vez, “o
humilde é flexível” e “não se apega a conceitos pré-estabelecidos”. À primeira vista, esses conceitos parecem neutros e
aceitáveis; mas, depois de observar como Nicotra os usa ao longo do seu livro, percebe-se que eles são fundamentais para
o seu discurso antitrinitariano. Com eles, o autor sugere que as pessoas que não rompem com a doutrina da Trindade não
são humildes, nem possuem um “conhecimento progressivo de Deus”.

É certo que toda a tradição antibíblica é inaceitável (ver Mt 15:6, 9, 13). Mas igualmente inaceitável é romper com os
grandes componentes da “fé que uma vez por todas foi entregue aos santos” (Jd 3). A igreja primitiva apegava-se a
conceitos preconcebidos chamados de “doutrina dos apóstolos” (At 2:42). Paulo insta com os cristãos a que não aceitem
outro “evangelho que vá além do que vos temos pregado” (Gl 1:8, 9; cf. Rm 1:1-6). A própria mensagem de salvação é
denominada no livro do Apocalipse de “evangelho eterno” (Ap 14:6). Por outro lado, a teoria de que toda a tradição
religiosa é má e deve ser abandonada acaba suscitando uma geração de cristãos sem raízes e descomprometidos. Alguém
poderia usar facilmente o argumento de que o humilde, que “não se apega a conceitos pré-estabelecidos”, deve romper
também com a tradição adventista da observância do sábado!

Mas, além das pressuposições básicas e dos recursos retóricos, é indispensável que se identifiquem também os
princípios de interpretação sugeridos pelo autor. Especial atenção deve ser dada, não apenas à validade dos princípios
enunciados, mas também ao grau de coerência demonstrada pelo autor no uso desses princípios em sua interpretação do
texto bíblico.

Princípios de interpretação
Nicotra não fornece em “Eu e o Pai Somos Um” uma exposição sistemática dos princípios de interpretação bíblica por
ele utilizados, mas prefere mencioná-los esparsamente, enunciando alguns deles onde julga mais oportuno. Vários
princípios mencionados são válidos e oportunos. Mas deve-se levar em consideração o fato de que a mera enunciação de
princípios corretos de interpretação não garante que estes tenham sido aplicados corretamente no próprio processo de
interpretação bíblica. Falando a respeito dos princípios advogados por Agostinho, Bernard Ramm declara que “dificilmente
existe uma regra por ele estabelecida que ele mesmo não violasse freqüentemente.” 52 Cremos que o mesmo problema
interpretativo também ocorre em “Eu e o Pai Somos Um”.
Uma das mais significativas declarações hermenêuticas do livro aparece na página 41, onde Nicotra afirma que “o
melhor conselho para evitar erros doutrinários” é: (1) “analisar o texto controvertido dentro do seu contexto”; (2)
“analisar outros textos bíblicos que abordam o mesmo assunto”; e (3) “quando possível, recorrer ao original hebraico ou
grego para desfazer dúvidas remanescentes”. Esses princípios gerais são pertinentes e devem ser usados no estudo das
Escrituras, mas Nicotra não os aplica consistentemente em sua própria interpretação do texto bíblico.

A análise adequada do contexto é fundamental para se compreender um texto, e Nicotra chega mesmo a afirmar que
“analisar o verso dentro do contexto é a chave para chegarmos” a uma “conclusão” correta (p. 73). Mas as análises
contextuais realizadas por Nicotra nem sempre são tão confiáveis como aparentam ser. Por exemplo, nas páginas 83-85
de “Eu e o Pai Somos Um”, ele se propõe a elucidar contextualmente o significado de João 16:14, onde aparecem as
seguintes palavras de Cristo: “Ele me glorificará, porque há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar”. O pronome
“Ele” (grego ekeînos) refere-se nesse verso ao “Espírito da verdade” mencionado no verso anterior (v. 13), que é o seu
antecedente natural. Só que Nicotra, para confirmar sua teoria antitrinitariana, não se constrange em desconhecer esse
antecedente natural, impondo ao referido pronome um antecedente artificial que vem depois do próprio pronome, ou
seja, o “Pai” do verso seguinte (v. 15). O referido autor chega mesmo a dizer que “é incontestável que o verso 14 refere-se
ao Pai, pois este é quem glorifica o Filho”. Mas o fato de o Filho glorificar o Pai (Jo 17:4) e o Pai glorificar o Filho (Jo 8:54;
17:1, 5) não exclui a possibilidade de o Espírito Santo também glorificar o Filho, como confirmado em João 16:14, onde o
próprio Cristo se refere ao Espírito Santo nos seguintes termos: “Ele me glorificará.” A interpretação de Nicotra contradiz
diretamente a seguinte declaração de Ellen G. White: “O Salvador veio glorificar o Pai pela demonstração de Seu amor;
assim o Espírito havia de glorificar a Cristo, revelando ao mundo a Sua graça.”53
A idéia de “analisar outros textos bíblicos que abordam o mesmo assunto” (p. 41) também é indispensável, só que
Nicotra, ao tentar implementar esse princípio, acaba incorrendo em graves problemas interpretativos. Para resolver as
tensões entre textos aparentemente contraditórios, Nicotra se vale freqüentemente da abordagem dicotômica
do either/or (ou isso, ou aquilo), que o leva a enfatizar o conteúdo dos textos que mais lhe são úteis em sua interpretação,
e a desconhecer aqueles que não se enquadram em seu sistema interpretativo. Por exemplo, entre os textos do Novo
Testamento que descrevem pessoas sendo batizadas em nome de Jesus (At 2:38; 8:16; 10:48; 19:5; Rm 6:3; Gl 3:27), por
um lado, e o texto que ordena o batismo “em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 28:19), por outro, Nicotra
fica com os primeiros e simplesmente nega a autenticidade do último (p. 45-55). Ele tenta justificar sua postura dicotômica
com a imagem de uma “Balança das Evidências” (p. 48), sugerindo que a maior quantidade de textos é determinante para
a interpretação. Como num dos pratos da balança aparece “apenas um verso ‘em nome do Pai, do Filho e do Espírito
Santo’”, e no outro aparecem “36 versos ‘em nome de Jesus’’, a conclusão de Nicotra é que o batismo “em nome de Jesus”
é a única fórmula batismal aceitável para os cristãos. A ênfase quantitativa desse autor transparece também na expressão
“o mais importante é destacar a quantidade de referências…” (p. 100).
Esse método de interpretação, por mais lógico que possa parecer para quem gosta de matemática e estatística, é
inaceitável para aqueles que buscam uma harmonia geral nas Escrituras, em vez de simplesmente selecionar delas as
porções que mais lhes convêm. Se aplicássemos o mesmo método a outros assuntos bíblicos, acabaríamos mutilando
inevitavelmente o equilíbrio temático das Escrituras. Talvez considerássemos como muito importante o assunto da
idolatria, porque os profetas do Antigo Testamento falaram muito sobre ele, e menosprezaríamos a profecia das “duas mil
e trezentas tardes e manhãs”, por ser mencionada apenas em Daniel 8:14. Também a cerimônia do lava-pés (Jo 13:1-20) e
as três mensagens angélicas (Ap 14:6-12), por serem mencionadas apenas uma única vez na Bíblia, se tornariam
irrelevantes para nós. Outro sério problema da interpretação de Nicotra é que a experiênciapessoal ou coletiva da igreja
apostólica acaba se tornando mais normativa do que as própriasordenanças de Cristo. Se meia dúzia de textos afirma que
pessoas foram batizadas em nome de Jesus (At 2:38; 8:16; 10:48; 19:5; Rm 6:3; Gl 3:27), então a ordenança do batismo
“em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 28:19) pode ser considerada espúria. Se “toda a doutrina deve ser
obtida da pura Palavra de Deus, não de escritos de homens, por mais fidedignos que eles sejam” (p. 53), por que Nicotra
prefere usar Eusébio de Cesaréia (p. 52-54) em vez do testemunho unânime da crítica textual (p. 50-51) em favor da
autenticidade de Mateus 28:19?
Já o conselho de que devemos, “quando possível, recorrer ao original hebraico ou grego para desfazer dúvidas
remanescentes” (p. 41) é oportuno para aqueles que conhecem bem essas línguas e são honestos no uso delas. Em muitos
casos, porém, o apelo às línguas originais, por pessoas sem um conhecimento abalizado delas, não passa de uma forma
sofisticada de revestir teorias pessoais com uma pretensa roupagem acadêmica. Como a maioria dos leitores não conhece
as línguas originais, eles são induzidos a crer no discurso “mais acadêmico” daquele que se vale desse recurso. Devemos
ressaltar, no entanto, que não é nossa intenção questionar aqui o interesse de Nicotra pelas línguas nas quais a Bíblia foi
originalmente escrita. Mas o uso que ele faz delas deixa muito a desejar.

Um exemplo claro dessa deficiência é a forma reducionista e parcial como Nicotra entende o termo
hebraico ruach (“espírito”) (p. 12-16). Mas essa questão é tratada à frente mais detalhadamente. Outro exemplo é a forma
como esse autor interpreta o substantivo grego parákletos (Confortador) (p. 70-85). Cristo prometeu que rogaria ao Pai
para que Este enviasse “outro Consolador”, distinto de Ambos (Jo 14:16, 26). Crendo que esse “outro Consolador” deve ser
o próprio Cristo, Nicotra mais uma vez argumenta que não se pode defender uma doutrina baseada “em um verso” ou
“uma única palavra” (p. 75). Conseqüentemente, os textos de João 14:16 e 26 perdem seus significados naturais, e acabam
tendo que assumir o sentido artificial que Nicotra lhes atribui. Como em 1 João 2:1 o mesmo termoparákletos é usado
para Cristo como “Advogado”, todas as referências ao mesmo termo grego encontradas no Evangelho de João são tidas
como se referindo, não ao Espírito Santo, mas ao próprio Cristo. Esse tipo de raciocínio acaba negando a assim chamada
“fluidez dos símbolos”, ou polissemia, onde um mesmo símbolo (ou nome) pode significar diferentes entidades em
diferentes contextos. Um exemplo disso é o termo “leão”, que simboliza na Bíblia o próprio animal (Jz 14:5-9; Dn 6:7-27), o
Império Babilônico (Dn 7:4; cf. 2:37, 38), Satanás (1Pe 5:8) e Cristo (Ap 5:5). Se usássemos a interpretação generalizadora
de Nicotra, teríamos sérias dificuldades em entender a riqueza de significados de muitos termos bíblicos.
Nicotra também se vale das línguas originais para neutralizar o argumento de que o nome “Espírito Santo” é um nome
próprio, grafado nas Escrituras com iniciais maiúsculas. Ele argumenta nas páginas 21-22 do seu livro que os manuscritos
mais antigo do Novo Testamento são alguns fragmentos de papiro escritos em uncial. O padrão uncial utilizava-se de letras
maiúsculas apenas. Este padrão continuou sendo utilizado nos pergaminhos até o século XI, quando a escrita minúscula
começou a ser adotada. Fica claro que escrever “Espírito Santo” com iniciais maiúsculas é uma convenção adotada
posteriormente.

À primeira vista, Nicotra parece invalidar quaisquer discussões sobre maiúsculas e minúsculas em relação ao texto
bíblico. Só que, logo depois de afirmar que os manuscritos mais antigos eram escritos com todas as letras maiúsculas,
Nicotra reproduz uma versão mais recente do texto grego de Atos 13:9 para demonstrar que o nome Paulo (grego Paûlos)
aparece grafado com o “P” maiúsculo, mas o nome “espírito” (grego pneûma) aparece com “p” minúsculo (p. 22). Com
base em uma versão grega de 1 Coríntios 2:11 onde o “espírito” do homem e o “espírito” de Deus são grafados igualmente
em minúsculas, Nicotra conclui que “não há porque interpretar que o espírito de Deus é uma outra pessoa e o espírito do
homem não é uma outra pessoa” (p. 23-24). Ora, se os manuscritos mais antigos eram escritos com todas as letras
maiúsculas, que sentido teria esse argumento de maiúsculas e minúsculas? Por que Nicotra ainda insiste em mostrar que
nos manuscritos gregos posteriores a palavra “espírito” aparece em Atos 13:9 e 1 Coríntios 2:11 com inicial minúscula?
Não é de surpreender que Nicotra mais uma vez usa determinado argumento, quando lhe é conveniente, e o rejeita,
quando não favorece suas teorias pessoais.
Outro princípio básico usado por Nicotra é de que não se pode basear uma doutrina em um só texto bíblico. Só que ele
usa esse princípio para minimizar, como já mencionado, a força de alguns textos claros das Escrituras. Na tentativa a
desfazer a declaração trinitariana de Mateus 28:19, ele argumenta na página 48 de seu livro que “não podemos
estabelecer uma conclusão definitiva com relação a uma doutrina ou prática basendo-se apenas em um verso da Bíblia”. Já
na páginas 54 ele volta a insistir que a autenticidade de Mateus 28:19 “é bastante questionável e, portanto, não deve ser
utilizado para provar qualquer doutrina. Ademais, é sempre conveniente lembrar que nenhuma doutrina bíblica pode ser
estabelecida com base em apenas um verso”.

Em relação à expressão “outro Consolador” (Jo 14:16), Nicotra (p. 75) usa novamente o mesmo argumento:

Defender uma doutrina baseado em um verso é algo muito perigoso, principalmente se o contexto não for analisado
apropriadamente e se outras passagens sobre o assunto não forem consultadas. Mas o mais perigoso é basear um
argumento sobre uma única palavra. E o risco de cometer um erro aumenta quando esta palavra está inserida entre
elementos simbólicos, como é o caso do verso 16 [de João 14].

Quem insiste em tomar a sério o conteúdo de qualquer desses textos (Mt 28:19 e Jo 14:16) acaba sendo rotulado por
Nicotra como alguém que se aproveita “de alguns pontos isolados para impor seus ensinos” e alguém que ignora a “regra
geral”, apegando-se “fortemente nas exceções” (p. 40). Como já mencionado, é certo que toda uma doutrina não pode ser
construída baseada apenas em um verso bíblico; mas, por outro lado, é igualmente perigoso construir uma doutrina
desconsiderando-se textos bíblicos. Os adventistas do sétimo dia seguem o princípio da tota Scriptura, ou seja, da analogia
das Escrituras. Em contraste, para Nicotra, textos bíblicos podem ser rejeitados, ou pelo menos reinterpretados, toda vez
que discordarem dos postulados antitrinitarianos por ele advogados. Com esse critério, a razão humana acaba se
sobrepondo inegavelmente à revelação divina.
As considerações anteriores são suficientes para se ter uma idéia geral das inconsistências hermenêuticas encontradas
no livro “Eu e o Pai Somos Um”. Vários assuntos diferentes acabaram sendo mencionados tangencialmente ao longo da
discussão. Mas cremos ser conveniente abordar um pouco mais detidamente alguns assuntos tratados no livro.

Interpretações pessoais
O livro “Eu e o Pai Somos Um” apresenta uma releitura antitrinitariana de vários temas bíblicos. A natureza mais
sintética do presente texto não permite que analisemos todos eles. Mesmo assim, consideraremos criticamente ainda
algumas idéias adicionais relacionadas com a preservação das Escrituras, o conceito bíblico de mistério, a teoria da
Bindade, o Filho gerado, a emanação do Espírito divino, o parákletos divino, o trono do Espírito Santo e a autenticidade de
Mateus 28:19.

A Preservação das Escrituras


Se alguém que ainda não leu o livro “Eu e o Pai Somos Um” o abrisse casualmente na página 41, com certeza se
impressionaria com a atitude respeitosa de Nicotra para com as Escrituras, expressa na seguinte declaração: “Acreditamos
plenamente que Deus preservou sua Palavra ao longo dos séculos e que não houve perda de sua essência”. Já na página 38
somos assegurados de que “podemos confiar na Palavra de Deus pois ela mantém a verdade original sem perda de
essência” (p. 38). Mas um estudo mais atento do conteúdo do livro revela que Nicotra possui sérias ressalvas ao conceito
da preservação do conteúdo das Escrituras ao longo dos séculos. Enquanto que os cristãos em geral admitem que Deus
permitiu apenas algumas interpolações não heréticas ao texto bíblico, Nicotra fala enfaticamente a respeito de
“adulterações” heréticas do próprio texto bíblico em suas línguas originais. Segundo ele, “textos bíblicos foram
adulterados em favor da teoria trinitariana” e “alterações foram feitas para ‘beneficiar’ algumas doutrinas pagãs” (p. 38).
Nicotra menciona que nos manuscritos gregos antigos não aparece a interpolação trinitariana de 1 João 5:7-8, que na
versão Almeida Revista e Corrigida foi vertida como “no céu: o Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um. E três
são os que testificam na terra”. Esse detalhe pode surpreender àqueles que nunca estudaram o texto, mas é mais do que
óbvio para os que conhecem a literatura adventista sobre o assunto. Por exemplo, já em 1949 Walter Schubert esclareceu
na revista O Pregador Adventista (precursora de O Ministério Adventista e atual Ministério) que nenhum manuscrito grego
anterior ao século 16 trazia essa expressão, e que ela não passava de mera anotação marginal de Cipriano, bispo de
Cartago, que Prisciliano acabou acrescentando à Vulgata Latina.54 Em 1957 oSeventh-day Adventist Bible
Commentary confirmou que “evidências textuais atestam a omissão da passagem”.55 Em 1986, Pedro Apolinário
acrescentou que “a Crítica Textual, através de notáveis comentaristas e insignes exegetas têm provado que [essas
palavras] não são de autoria do apóstolo João”.56 É interessante notarmos que uma pesquisa no CD-ROM The Complete
Published Ellen G. White Writings (versão 3.0) não revela qualquer referência de Ellen G. White ao texto de 1 João 5:7-
8.57 Mas, em contraste, no mesmo CD-ROM aparece cerca de 168 vezes a expressão de Mateus 28:19 “batizando-os em
nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo”.58 Portanto, Mateus 28:19 não pode ser considerado uma interpolação
semelhante à de 1 João 5:7-8.
Como adventistas do sétimo dia, não podemos aceitar a teoria de Nicotra a respeito de supostas adulterações
heréticas do texto bíblico em suas línguas originais. Essa teoria representa um sério desrespeito para com as Escrituras
Sagradas, e acaba minando a confiabilidade da Palavra de Deus. Somos advertidos por Ellen G. White: “Se não quisermos
construir nossas esperanças celestiais sobre um falso fundamento, precisamos aceitar a Bíblia como se lê e crer que o
Senhor quer dizer o que diz”.59

O conceito bíblico de mistério


A compreensão cristã da Trindade como um “mistério” é vista por Nicotra como mera invenção de teólogos que não
conseguem explicar a Trindade. Na página 5 do seu livro ele diz: Na interpretação dos trinitarianos (assim chamados quem
crê na teoria da Santíssima Trindade) este ensino é um mistério! Por que um mistério?

Como tais ensinos carecem de uma base mais sólida e contêm contradições internas de difícil conciliação, seus
defensores também ensinam que há um grande mistério por trás destes fatos e que ao ser humano não é dado
compreender os mistérios de Deus. “A Santíssima Trindade é um Mistério para ser aceito, não para ser compreendido”, foi
a voz de muitos sacerdotes ao longo da Idade Média e que continua ressoando no século 21.

Diante de tais interpretações questionáveis, muitos crentes sinceros acabam aceitando a “doutrina do mistério” e
acreditam que sua salvação não depende do pleno conhecimento de Deus, já que o mesmo é um mistério não revelado.

Na página 7 do livro, Nicotra reconhece que, “em nossa limitação, jamais seremos capazes de compreendê-lo
completamente, pois Ele é infinito”. Mas já na página 8, o mesmo autor volta a argumentar a respeito da “atuação e
essência” do Espírito Santo:

Lamentavelmente quando se fala sobre o Espírito Santo, sua atuação e essência, muitos preferem fechar os ouvidos
por considerarem um assunto oculto, um mistério que o homem não deve se atrever a sondar, um tema onde “o silêncio é
ouro”. Infelizmente tais pessoas demonstram que não conhecem o Deus de amor, um Deus infinito que se revela ao mais
simples e humilde pecador. Nosso Pai é um Deus de revelação, não de mistério. Tais crentes nominais não buscam o
conhecimento por si mesmos, mas se acomodam e preferem aceitar os dogmas impostos pela liderança espiritual.

Nessas declarações, Nicotra enfatiza a mesma dicotomia acima mencionada, entre leigos humildes que conseguem
explicar a natureza de Deus e teólogos heréticos que escondem sua ignorância acerca de Deus atrás da “doutrina do
mistério”. Sob o intertítulo “O Espírito: Mistério ou Revelação” (p. 7-9) ele sugere que algo já revelado não pode ser
considerado mais mistério. Nesse ponto, Nicotra acaba desconhecendo a diferença bíblica entre “mistério”, que é uma
verdade revelada, mas não conceituada (1Co 2:9-11), e as “coisas ocultas”, que se referem ao que Deus não revelou (Dt
29:29). Além disso, o mistério mencionado em Efésios não diz respeito à encarnação de Cristo, e sim à co-participação dos
gentios com os judeus no plano da salvação (Ef 3:1-13; ver também Cl 1:26, 27).
Não sabemos se Nicotra ainda crê na inspiração dos escritos de Ellen G. White; mas, se este é o caso, então ele deveria
tomar mais a sério a seguinte declaração encontrada no livro Atos dos Apóstolos:
A natureza do Espírito Santo é um mistério. Os homens não a podem explicar, porque o Senhor não lho revelou. Com
fantasiosos pontos de vista, podem-se reunir passagens da Escritura e dar-lhes um significado humano; mas a aceitação
desses pontos de vista não fortalecerá a igreja. Com relação a tais mistérios – demasiado profundos para o entendimento
humano – o silêncio é ouro.60
A despeito disso, Nicotra não se constrange em afirmar que somente aqueles “que não conhecem o Deus de amor” é
que dizem que “o silêncio é ouro” sobre a natureza do Espírito Santo (p. 8). Fica evidente em mais esse ponto que Nicotra
já se distanciou significativamente, não apenas do pensamento teológico adventista contemporâneo, mas também dos
próprios escritos de Ellen G. White.

Teoria da “Bindade”
Nicotra usa de ironia para desfazer o conceito da Trindade, por ele chamada de “tríade divina” (p. 28) e de conjunto
pagão “de três deuses” (p. 93). Já no Prefácio do livro (p. 5) encontramos a seguinte declaração:

Há ainda quem defenda que há um só Deus composto por três pessoas divinas, co-iguais, co-eternas, co-substanciais, a
Santíssima Trindade. Esta última forma de crença, a mais comum, é adotada pela Igreja Católica e pela maioria das igrejas
protestantes. Para eles, Deus não é um ser pessoal, ou seja, Deus não é uma pessoa, mas três pessoas. Não são três
deuses, nem uma só pessoa, mas um Deus Composto, um Deus-Tríplice, ou Deus-Triúno. Complicado? Sim…

Um dos aspectos mais curiosos da teoria antitrinitariana de Nicotra é que três Pessoas na Divindade é “complicado” e
inaceitável para ele, mas um só espírito para duas Pessoas (p. 20) é plenamente aceitável. É certo que a teoria da
“Bindade” (duas pessoas divinas em vez de três), como sugerida em“Eu e o Pai Somos Um”, pelo menos não superenfatiza
os textos monoteístas da Bíblia (Êx 20:3; Dt 6:4; etc.) em detrimento dos que falam de uma pluralidade na divindade (Gn
1:26, 27; etc.). No entanto, essa teoria revela sérias dificuldades em sua tentativa de acomodar o Espírito Santo dentro do
conceito de apenas duas Pessoas divinas.
Os cristãos em geral crêem na existência de uma unidade essencial entre os membros da Divindade, ou seja, que Pai,
Filho e Espírito Santo são um em natureza e propósito. Mas Nicotra sugere uma unidade pneumática pela qual “o Pai e seu
Filho Jesus compartilham o mesmo pneuma, qual seja, o Espírito Santo” (p. 24), e “por essa razão são um” (p. 26).
Assumindo que o Espírito Santo não passa de um “atributo intrínseco” do Ser divino (p. 30), Nicotra não teme afirmar que
“não há diferença entre Espírito de Deus, Espírito de Cristo e Espírito Santo” (p. 24). Ele chega mesmo a propor a fórmula:
“Espírito de Cristo = Espírito de Deus = Espírito Santo” (p. 27).
Agora, se o Espírito Santo é um mero “atributo intrínseco” do próprio Deus, que “não pode ser separado dEle” (p. 24),
como poderia esse Espírito ser enviado pelo Pai em nome de Cristo (Jo 14:26; cf. 14:16; Is 48:16) sem ser distinto de
ambos? Se o Espírito Santo é o mesmo Espírito de Cristo, como explicar o texto que diz que Maria “achou-se grávida pelo
Espírito Santo” (Mt 1:18, 20)? Quando a Bíblia afirma que Jesus era “cheio do Espírito Santo” (Lc 4:1), estaria ela dizendo
que Jesus Se encontrava cheio de Si mesmo? E quando Jesus foi levado “pelo mesmo Espírito” ao deserto para ser tentado
pelo diabo (Lc 4:1; cf. Mt 4:1; Mc 1:12, 13), teria o próprio Jesus Se autoconduzido ao deserto para se expor às tentações?
61 
Se nesses casos o Espírito não era o Espírito de Cristo, e sim o Espírito de Deus, então teríamos que admitir que ambos os
Espíritos são distintos um do outro, o que conspira contra a teoria de que “não há diferença entre Espírito de Deus,
Espírito de Cristo e Espírito Santo” (p. 24).
Para manter sua teoria da Bindade divina, Nicotra se vale de alguns textos que mencionam apenas o Pai e o Filho para
sugerir, de forma generalizante, que, se tais textos não mencionam o Espírito Santo, então Este não existe como Pessoa.
Por exemplo, esse autor crê que, se a Trindade existisse, então Jesus teria dito “Eu, o Pai e o Espírito Santo somos um” (p.
29), e não apenas “Eu e o Pai somos um” (Jo 10:30). As saudações das cartas de Paulo que mencionam apenas o Pai e o
Filho são usadas para comprovar que o Espírito Santo não existe como Pessoa distinta (p. 30-32). Por que Nicotra não
menciona também as bênçãos finais dessas mesmas cartas? Será que essas não lhe interessam porque entre elas se
encontra 2 Coríntios 13:13 onde é dito: “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo
sejam com todos vós”?

Nicotra tenta resolver alguns problemas interpretativos com a sua teoria da Bindade, mas ela acaba gerando
problemas ainda mais graves, com os quais não se deparam aqueles que crêem, como Ellen G. White, que o Espírito Santo
“é tanto uma pessoa como o próprio Deus”.62

Filho gerado
O livro “Eu e o Pai Somos Um” apresenta também uma compreensão ariana de Cristo, ou seja, que “Jesus foi gerado
por Deus”. Essa geração é apresentada, não como se referindo à encarnação de Cristo (Mt 1:18:25; Lc 1:26-38; 2:1-7; Jo
1:14; Gl 4:4), e sim, como uma pretensa origem de Cristo antes que todas as coisas viessem à existência. Qualquer
indagação quanto ao tempo em que ela teria ocorrido é descartada por Nicotra com a seguinte afirmação: “A questão do
tempo da geração de Cristo é tão absurdo quanto uma possível questão do local da geração de Cristo, sendo ele gerado
com o atributo da onipresença” (p. 105). Em resposta à pergunta: “Houve um tempo em que Cristo não tenha existido?”,
Nicotra alega simplesmente que essa questão “não faz qualquer sentido”, pois “Cristo é o ‘Pai da Eternidade’ [Is 9:6], é o
Criador do Tempo” (p. 105). Mas esse argumento não resolve a questão, pois permanece a teoria de que, antes que o
tempo fosse criado, Cristo foi gerado pelo Pai.
Não há como negar o fato de que a cristologia de Nicotra está fundamentada na noção ariana de um “semi-Deus”
gerado pelo Pai. Para não inferiorizar a Cristo, Nicotra teria que admitir que Cristo é plenamente coeterno com o Pai, sem
jamais ter sido gerado por Ele. Mas Nicotra prefere resolver a questão valendo-se de uma analogia artificial entre a origem
de Eva e a origem de Cristo. O autor argumenta que, como “Eva foi gerada de Adão” e “tem a mesma natureza humana de
Adão”, “Jesus Cristo, por ter sido gerado de Deus, é tão divino quanto o Pai” (p. 104). Neste ponto, Nicotra se esquece que
Eva não foi gerada de Adão. Ela veio à existência por um ato criador direto de Deus, transformando uma costela de Adão
em uma mulher (Gn 2:21, 22). À primeira vista, essa analogia parece confirmar que Cristo, mesmo gerado, pode ter os
mesmos atributos do Pai; mas ela não resolve a questão da eternidade de Cristo. Enquanto o Pai sempre existiu, o Filho
acaba sendo visto como havendo tido um início, mesmo que esse início tenha sido antes do tempo e da eternidade.

Endosso para a teoria de que Cristo tenha sido gerado por Deus antes que o tempo viesse à existência é buscado em
Hebreus 5:5 e 1 João 4:9. Em Hebreus 5:5 aparece a expressão do Salmo 2:7: “Tu és meu Filho, eu hoje te gerei”. O verbo
“gerar” é usado nesses textos, não no sentido de uma pretensa origem do Filho antes da eternidade, como pretendem
alguns, e sim, de entronização como Rei sobre as nações (Sl 2:6-9) e de inauguração como sacerdote “segundo a ordem de
Melquisedeque” (Hb 5:5, 6). Que o prometido Messias exerceria simultaneamente os ofícios real e sacerdotal é evidente
em Zacarias 6:13: “Ele mesmo edificará o templo do Senhor e será revestido de glória; assentar-se-á no seu trono, e
dominará, e será sacerdote no seu trono; e reinará perfeita união entre ambos os ofícios.” Nicotra poderia ter evitado
distorcer o sentido do verbo “gerar” se tão somente houvesse dado mais atenção ao contexto bíblico no qual o verbo é
usado nos textos acima mencionados.

Por sua vez, na versão Almeida Revista e Atualizada de 1 João 4:9 é dito que Deus enviou “o seu Filho unigênito ao
mundo”. O adjetivo grego monogenés (aqui traduzido como “unigênito”) é usado em relação a Cristo também em João
1:14, 18; 3:16, 18. Nicotra parece desconhecer o fato de quemonogenés é um termo composto de mónos (único)
e gínomai (espécie), e não de gennáo (gerar). Isso é confirmado pelo fato do sufixo genés ser grafado apenas com um “n”
em vez de dois.63 Por conseguinte, o termo mono-genés não significa necessariamente o único gerado, mas também o
“único da espécie”, alguém que é “singular”. É nesse sentido que Hebreus 11:17 chama a Isaque de “unigênito”, como filho
“singular” da promessa, sendo ele o segundo filho de Abraão (ver Gn 16:1-16; 21:1-7). A Tradução Ecumênica da Bíblia
(TEB) traduz corretamente 1 João 4:9 como “Deus enviou seu Filho único ao mundo”.
Em Isaías 9:6 Cristo é chamado de “Deus Forte, Pai da Eternidade”. Mesmo que Nicotra coloque a pretensa geração de
Cristo antes do tempo e da eternidade, ela continua em direto antagonismo com a declaração de Ellen White de que “em
Cristo há vida original, não emprestada, não derivada”.64

A emanação do Espírito divino


Um dos componentes básicos da teoria antitrinitariana de Nicotra é a noção de que o Espírito Santo não é um Ser
pessoal, mas apenas “um abributo que não pode ser separado” de Deus (p. 24), e que deve ser entendido como a “mente”
de Deus (p. 15-16). Só que essa teoria acaba conflitando com o ensino bíblico que fala a respeito da “mente do Espírito”
(Rm 8:27). Se o Espírito Santo fosse apenas a “mente” de Deus, como poderia o próprio Espírito Santo ter “mente”?
Teríamos então que acreditar na existência de uma mente da mente? Se confrontado com o texto de Romanos 8:26 e 27,
talvez Nicotra preferisse desconversar o assunto alegando simplesmente, como em outras ocasiões, que não podemos
construir uma doutrina baseada em um único texto bíblico (p. 48-49, 54, 75). Seja como for, os leitores que procuram viver
“de toda palavra que procede da boca de Deus” (Mt 4:4; cf. Ap 22:18, 19) certamente apreciariam encontrar em “Eu e o
Pai Somos Um” uma explicação convincente do que significa a “mente do Espírito”.
Equacionando o Espírito de Deus com o espírito dos seres humanos, Nicotra não se constrange em afirmar: “Tanto o
Espírito de Deus quanto o espírito do homem são escritos absolutamente da mesma forma em grego. Portanto não há
porque interpretar que o espírito de Deus é uma outra pessoa e o espírito do homem não é uma outra pessoa” (p. 24).
Nesta afirmação, Nicotra não apenas desconhece que um mesmo termo pode ter vários sentidos diferentes na Bíblia, mas
também se vale de um “silogismo grego” semelhante ao que ele mesmo condena nas páginas 100-101 do seu livro. O
silogismo seria o seguinte: Premissa A: O homem tem um espírito que não possui existência própria fora do
corpo. Premissa B: Deus tem um espírito. Conclusão: Logo, o Espírito de Deus também não possui existência própria fora
do corpo de Deus.
Mesmo reconhecendo que “a Bíblia emprega diversas figuras de linguagem” em relação ao Espírito Santo (p. 58),
Nicotra não reluta em interpretar de forma literal algumas delas em sua tentativa de invalidar a personalidade do Espírito
Santo. O autor indaga de forma irônica: “Uma pessoa pode ser derramada sobre outras [Is 44:3; Ez 39:29; Jl 2:28, 29]?
Logicamente não!” e mais: “Uma pessoa pode ser soprada sobre outras [Jo 20:22]? É claro que não!” (p. 61). Mas, por que
Nicotra prefere interpretar literalmente apenas os verbos “derramar” e “soprar”, e não também o verbo “revestir”? Em
Romanos 13:14, o apóstolo Paulo ordena aos cristãos: “revesti-vos do Senhor Jesus Cristo”. Se usássemos a mesma forma
de argumentação de Nicotra, teríamos que admitir que também Cristo não pode ser uma pessoa, mas apenas uma roupa,
pois nenhuma pessoa pode ser revestida em outra! E ainda, como Nicotra explicaria o texto de Isaías 53:12, onde é dito
que o próprio Cristo “derramou a sua alma na morte”? Além disso, devemos lembrar que pessoas cheias do Espírito Santo
(Êx 31:2; 35:31; Mq 3:8; Lc 1:15, 67; 4:1; At 2:4; 4:8, 31; 6:3, 5; 7:55; 9:17; 11:24; 13:9) são pessoas que estão sob a
influência do Espírito Santo.
É curioso observarmos também como textos bíblicos que falam da morte de Cristo (Lc 23:46) e de outros seres
humanos (Ec 12:7) são usados, em uma falsa analogia, para provar que o Espírito Santo não tem existência própria fora do
corpo de Deus. Nicotra chega mesmo a afirmar que “um espírito (pneuma) sem corpo, com autonomia, existência e
personalidade própria (independente do possuidor) é um conceito defendido pelo Espiritismo e pelo Trinitarianismo” (p.
24). Com esse tipo de argumento Nicotra consegue rotular sutilmente os trinitarianos, que crêem na personalidade do
Espírito Santo, como pessoas que advogam idéias espíritas. Se o leitor não tiver um embasamento doutrinário mais sólido,
ele acabará convencido por esse recurso retórico destituído de fundamentação bíblica.
Na tentativa de negar a personalidade do Espírito Santo, Nicotra chega mesmo a sugerir que o conceito de que “o
corpo sem espírito é morto” (Tg 2:26) se aplica tanto a seres humanos quanto ao próprio Deus (p. 19-20). Esse tipo de
analogia é demasiadamente frágil e artificial. Como Nicotra explicaria o fato de que, quando o espírito sai das pessoas, elas
morrem (Sl 146:4), e que, quando o Espírito Santo sai de Deus (Jo 15:26), Este não morre? E mais, por que o Espírito Santo
é passível de ser enviado por Deus (Is 48:16; Jo 14:16, 26), e os seres humanos não conseguem enviar o seu próprio
espírito? Não seria o caso de que, embora o Espírito de Deus e o espírito do homem sejam “escritos absolutamente da
mesma forma em grego” (p. 24), eles são de natureza diferente e, portanto, devem ser interpretados de forma distinta?

Em vez de reconhecer essa distinção (p. 24), Nicotra prefere crer que o ato de Deus enviar o Espírito Santo não passa
de mera emanação espiritual. Na página 79 de “Eu e o Pai Somos Um”Nicotra interpreta a expressão “que procede do Pai”
(Jo 15:26) nos seguintes termos: “O Espírito de Deus está dentro de Deus e não fora dEle, assim como o espírito do homem
está dentro do corpo do homem. De dentro de Deus o Espírito emana para os seus filhos”. Diante dessa afirmação, não há
como evitar a pergunta: Se a analogia entre o espírito do homem e o Espírito de Deus (p. 10-27) é válida, por que o Espírito
de Deus emana, e o do homem, não?
Por mais sincero e honesto que Ricardo Nicotra pretenda ter sido em seu estudo (p. 6), cremos que a sua teoria da
emanação divina reflete bem mais de perto a filosofia de Plotino (205-270) e de Schelling (1775-1854) do que o conceito
bíblico. Esses filósofos consideravam a “emanação” como um “processo no qual a divindade suprema irradia, emite ou
propaga sua própria substância, criando o universo, uma extensão de sua natureza divina, de maneira processual, contínua
e permanente”.65 Nicotra certamente não iria tão longe como esses filósofos na definição de referido termo, mas as
implicações lógicas da teoria dele não diferem muito desse conceito filosófico, pois a suposta emanação teria que realizar
a ampla obra atribuída nas Escrituras ao Espírito Santo. Por contraste, os adventistas do sétimo dia crêem que o Espírito
Santo possui uma personalidade distinta do Pai e do Filho, diferindo radicalmente da mera emanação divina proposta por
Nicotra.

O parákletos divino
Boa parte dos argumentos que Nicotra usa para reinterpretar o parákletos divino no Evangelho de João, como sendo
exclusivamente Cristo, já foram mencionados sob o intertítulo “Princípios de Interpretação”, do presente artigo. Como o
termo parákletos é usado para Cristo em 1 João 2:1, Nicotra se sente na liberdade de afirmar, desconhecendo os
diferentes contextos do Evangelho de João, que todos os usos do termo naquele evangelho também se referem apenas a
Cristo (p. 70-85). Mas, se o Consolador fosse o próprio Cristo, como interpretar a seguinte declaração de Cristo: “convém-
vos que eu vá, porque, se eu não for, o Consolador não virá para vós outros; se, porém, eu for, eu vo-lo enviarei” (Jo 16:7)?
E como explicar que o mesmo Consolador viria com a missão de glorificar a Cristo (Jo 16:14)? A pretensa “clareza
meridiana” interpretativa que Nicotra alega ter encontrado, a ponto de asseverar que “não há mais dúvidas” (p. 85), não
parece tão clara assim.
James Robertson, em sua obra Ensinos de Jesus, declara de forma convincente: Do ensino de Jesus, não resta a menor
dúvida que o outro Paracleto é uma pessoa. A cada passo Jesus fala desta maneira: “Ele vos ensinará todas as coisas”;
“Ele me glorificará”. Personalidade está implicada no título “Paracleto”, o qual, em algumas versões, é traduzido
impropriamente “Confortador”. A palavra significa “um que é chamado para ficar ao nosso lado, especialmente em
ocasiões de dificuldade e conflito”. É, portanto, a palavra que designa um advogado, e é assim usada a respeito de Jesus
mesmo, em 1 João 2:1, onde lemos: “Nós temos um Paracleto (advogado) com o Pai, Jesus Cristo, o justo.” Como, porém,
a palavra significa “um que, em qualquer circunstância, pela sua presença, dá força”, ela pode ser traduzida também por
Ajudador, Consolador, Encorajador. Ela designa alguém que, em comunhão conosco, nos sustenta no dever e nos conforta
na tristeza. Mas, à vista da ênfase com que Jesus representa o Paracleto tomando parte com os discípulos na luta contra
um mundo hostil, ela pode bem ser traduzida ainda por Socorredor e Campeão. Na ante-visão que Jesus nos dá, tão
distintamente, da hostilidade do mundo, em João 15:18-17:11, e no conflito contra o mundo, e no testemunho que os seus
discípulos teriam de dar, o Paracleto surge como um Campeão, cuja intervenção na luta seria decisiva. “Quando o
Paracleto vier … dará testemunho de mim”. “Quando ele vier, convencerá o mundo de pecado, de justiça e de Juízo; de
pecado, porque não crêem em mim; de justiça, porque vou para o Pai, e não me vereis mais; de juízo, porque o príncipe
deste mundo está julgado.” (João 16:8-11). A intervenção do Paracleto é “robusta e enérgica”; é mais do que animar e
confortar. Está implicada também, no ensino de Jesus, que o outro Paracleto é uma pessoa divina. Jesus não poderia dizer
que era melhor que Ele fosse, se o seu substituto fosse menos do que divino. Nem poderia ter dito que “ao que disser
alguma palavra contra o Filho do Homem, isso lhe será perdoado; porém, ao que falar contra o Espírito Santo, não lhe será
perdoado, nem neste mundo, nem no vindouro” (Mat. 12:32). Também não poderia ter juntado “o Pai, o Filho e o Espírito
Santo”, como o faz na fórmula do batismo (Mat. 28:19), se todos os três não fossem divinos.66
Cremos, portanto, que a interpretação de James Robertson sobre o parákletos no Evangelho de João como o Espírito
Santo é bem mais coerente com o contexto bíblico do que a teoria de uma mera emanação de Cristo, proposta por Nicotra
(p. 79).

O trono do Espírito Santo


Um dos argumentos mais comuns contra a doutrina da Trindade é a alegação de que o livro do Apocalipse não
apresenta qualquer alusão a um “trono” do Espírito Santo. Nicotra chega mesmo a desafiar: “O livro do Apocalipse
menciona apenas o trono de Deus e do Cordeiro [Ap 22:1, 3]. Onde está o trono do Espírito Santo?” (p. 34-35). Aqui
Nicotra parece se valer mais uma vez de um “silogismo grego” semelhante aos que ele condena nas p. 100-101 do seu
livro. Desta vez, o argumento básico seria o seguinte: Premissa A: Todas as pessoas da Divindade devem ocupar um lugar
no trono do universo. Premissa B: O Espírito Santo não é mencionado como estando nesse trono. Conclusão: Logo, o
Espírito Santo não é uma pessoa.
As Escrituras mencionam o “trono” de Deus existente nas cortes celestiais tanto no singular (Sl 9:7; Ap 4:2; 22:1, 3;
etc.) como no plural (Dn 7:9). Um breve estudo do uso bíblico desse termo é suficiente para esclarecer que ele indica não
apenas soberania e majestade (Sl 45:6; Is 6:1-4; etc.) como também julgamento (Sl 9:7, 8; Dn 7:9, 10; etc.). Ellen White
descreve o início do juízo investigativo pré-advento em 1844 como envolvendo um deslocamento tanto do Pai quanto do
Filho de sobre o trono do Lugar Santo para outro trono no Lugar Santíssimo do santuário celestial (cf. Dn 7:9-
14).67 Portanto, independente da ocasião e das circunstâncias envolvidas, a expressão “trono”, quando usada em relação a
Deus, possui geralmente uma conotação mais funcional do que essencial.
É interessante observarmos que Cristo exerce ao mesmo tempo os ofícios sacerdotal e real em Seu trono. Já em
Zacarias 6:13 encontramos a seguinte profecia messiânica: “Ele mesmo edificará o templo do Senhor e será revestido de
glória; assentar-se-á no seu trono, e dominará, e será sacerdote no seu trono; e reinará perfeita união entre ambos os
ofícios”. Como rei, Cristo exerce também a função de juiz. Em João 5:22 é dito: “E o Pai a ninguém julga, mas ao Filho
confiou todo julgamento”. Portanto, é plenamente evidente que Cristo deva compartilhar com o Pai o trono do universo.

O Espírito Santo, por Sua vez, exerce funções diferentes nos planos divinos. Entre elas estão as de representar a Deus
no universo (Sl 139:7-12), convencer os seres humanos “do pecado, da justiça e do juízo” (Jo 16:8), glorificar a Cristo (Jo
16:14), derramar “o amor de Deus” no coração dos crentes (Rm 5:5), edificar internamente a igreja (1Co 12) e capacitá-la
para o testemunho (At 1:8). Mesmo depois da final erradicação do pecado, o Espírito Santo continuará exercendo a função
de Mantenedor do universo (cf. Gn 1:2). Não é de surpreender, por conseguinte, que Ele não seja mencionado como
soberano ou juiz sobre o trono do universo.

Na Bíblia encontramos vários textos que mencionam ao mesmo tempo o Pai, o Filho e o Espírito Santo (ver Is 48:16; Mt
28:19; Lc 3:21, 22; 2Co 13:13; Tt 3:4-7; etc.). Embora o Espírito Santo não seja mencionado explicitamente em Apocalipse
22:1 e 3 com o Pai e o Filho sobre o trono do universo, esse fato jamais deveria ser usado para invalidar os demais textos
bíblicos que mencionam o Espírito Santo como exercendo funções distintas do Pai e do Filho.

A autenticidade de Mateus 28:19


Muito já foi dito acima sobre a expressão “batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” de Mateus
28:19. Mas cremos que ainda seria conveniente transcrevermos o seguinte comentário de R. V. G. Tasker sobre esse
assunto:
Afirma-se muitas vezes que as palavras em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo não são asipsissima verba de
Jesus, mas, ou são palavras do evangelista postas em sua boca, ou um acréscimo litúrgico posterior. Argumenta-se que nos
lábios de Jesus elas seriam um anacronismo; que a igreja primitiva na verdade não as empregou como fórmula batismal
até o século segundo; e que Eusébio de Cesaréia, ao citar esta passagem, muitas vezes omite ou altera estas palavras. Por
outro lado, as palavras se acham em todos os MSS existentes; e é difícil ver por que o evangelista as teria inserido se na
ocasião em que estava escrevendo não faziam parte da liturgia da igreja. Também é difícil supor que, se Eusébio tivesse
realmente sabido de MSS que omitiam estas palavras, não sobrevivesse algum traço da influência destes MSS na tradição
textual. Ademais, bem pode ser que a verdadeira explicação por que a igreja primitiva não ministrou logo o batismo no
nome tríplice seja que as palavras de 28:19 não foram ditas originalmente por nosso Senhor com a intenção de serem uma
fórmula batismal. Ele não estava dando instruções sobre as palavras a serem de fato usadas no ofício do batismo, mas,
como já se sugeriu, estava indicando que, pelo batismo, a pessoa batizada passaria a ser possessão do Pai, do Filho e do
Espírito Santo. Há boa evidência de que o idiotismo grego, eis to onoma (“para dentro do nome”, não “no nome”) poderia
comunicar este significado. Além disso, parece que o batismo que o Cristo ressurreto está aqui ensinando os seus
discípulos a praticarem não era uma simples restauração do batismo de João para arrependimento, nem a continuação do
batismo praticado por Ele e seus discípulos antes, no seu ministério. Era essencialmente o novo sacramento, pelo qual
homens e mulheres haviam de submeter-se à influência do Trino Deus para serem usados em seu serviço. As palavras, em
nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo são, pois, enfáticas e essenciais ao texto. Sem elas, a referência ao batismo seria
indeterminada e convencional.
Tampouco o fato de ser um tanto surpreendente ver as três Pessoas da Trindade mencionadas por Jesus é um
insuperável argumento contra a historicidade das palavras. Ele falara constantemente do “Pai”; em [Mateus] 11.27 e em
24.36, e muitas vezes no quarto evangelho, Ele é apresentado falando de Si como “o Filho”; e muitas vezes fizera
referência ao “Espírito” que seria “o outro Consolador” quando findasse o seu ministério terreno. Quão, natural, é pois,
que em sua comissão final a seus discípulos, desse, nas palavras de Swete, “um magnífico sumário de todo o seu disperso
ensino sobre o Pai, o Espírito, e as suas próprias relações com ambos … não o dando como um dogma a ser pregado, mas
comunicando uma vida de comunhão, de consagração, de divina plenitude e poder”! E quão estreitamente esta
“comunicação” se liga às fortalecedoras palavras com que o evangelho termina! O Cristo ressurreto garante aos seus
seguidores, no que Levertoff chama de “a maior conclusão que qualquer livro poderia ter”, que, o que quer que o futuro
lhes reserve[,] Ele estará com eles no Espírito que lhes enviará da parte do Pai, sempre, até o fim do mundo (VA), isto é,
conforme o significado do grego, heos tes sunteleias tou aionos, “até à consumação da era presente” (RA: até à
consumação do século), quando terá início a nova era, inaugurada pelo retorno do Senhor em glória.68
As considerações anteriores confirmam nossa convicção de que (1) Deus preservou a Bíblia em suas línguas originais,
evitando que nela fossem acrescidas quaisquer interpolações heréticas; (2) a natureza do Espírito Santo é um mistério que
pode ser entendido apenas até onde Deus julgou conveniente revelar nas Escrituras; (3) a teoria da Bindade é parcial e não
corresponde à revelação bíblica de Deus como uma Tri-unidade; (4) Deus o Filho é co-eterno com o Pai, jamais tendo um
início, mesmo antes do tempo ou da eternidade; (5) o Espírito Santo é uma Pessoa e não meramente uma emanação
despersonalizada de Deus; (6) o parákletos divino no Evangelho de João é o Espírito Santo, e não Cristo, como em 1 João
2:1; (7) a palavra “trono” na Bíblia possui uma conotação funcional que jamais deveria ser usada para negar a existência do
Espírito Santo como um Ser distinto do Pai e do Filho; e (8) a expressão “batizando-os em nome do Pai, e do Filho e do
Espírito Santo” em Mateus 28:19 deve ser considerada como autêntica, e seu conteúdo, como um resumo adequado dos
próprios ensinos de Cristo.

Considerações finais
O presente artigo fornece uma análise crítica das idéias e conceitos básicos de “Eu e o Pai Somos Um”. Mesmo em face
de tudo o que foi dito, é bem provável que os antitrinitarianos simplesmente desconheçam todos os argumentos acima
apresentados, e busquem questiúnculas não abordadas no presente estudo, para dizer que suas idéias não foram
respondidas a contento. Não é de surpreender também que rotulações e ataques pessoais sejam usados como um
mecanismo de autodefesa, na tentativa de neutralizar o conteúdo deste artigo. Sugerimos, porém, que o leitor jamais
permita que recursos retóricos ofusquem a objetividade de uma clara análise conceitual do texto bíblico, comparando e
contrastando o conteúdo do livro “Eu e o Pai Somos Um” com a presente análise crítica. Cada cristão deveria seguir o
exemplo dos bereanos, que examinavam “as Escrituras todos os dias para ver se as coisas eram, de fato, assim” (At 17:11).
A compreensão da natureza de Deus em geral, e do Espírito Santo em particular, é demasiadamente importante e
sagrada para alimentarmos idéias especulativas a respeito. Nicotra asseverou, de forma pertinente, que “blasfemar contra
o Espírito Santo é desprezar as inúmeras evidências bíblicas sobre sua obra e natureza. É se agarrar a conceitos pré-
estabelecidos desprezando a luz que emana da Palavra de Deus” (p. 67). Nicotra poderia ter evitado muitos
constrangimentos desnecessários, houvesse ele tão somente colocado em prática em “Eu e o Pai Somos Um” esse sábio
conselho. Sua maior falha foi, sem dúvida, aventurar-se em estudos demasiadamente profundos para a lógica humana (ver
Rm 11:33), sem princípios hermenêuticos suficientemente sólidos, e sem aplicá-los de modo consistente.
Cremos que a doutrina da Trindade possui um sólido fundamento bíblico, e que Joroslav Pelikan está correto em
afirmar que essa doutrina “foi apenas confirmada, e não inventada, em Nicéia”. 69 Algumas pessoas podem descrer da
personalidade do Espírito Santo e até mesmo negar a Sua existência como um Ser distinto do Pai e do Filho. Mas para os
adventistas do sétimo dia a aceitação do Espírito Santo como uma “pessoa divina” é uma questão de fidelidade ao texto
inspirado.70 Num momento em que a igreja mais precisa do poder do Espírito Santo para finalizar a pregação do “evangelho
eterno” no mundo (Ap 14:6), não podemos permitir que pessoas dividam as comunidades adventistas com idéias espúrias
sobre a natureza e obra do Espírito Santo.
Referências:
1. O conteúdo da presente resenha crítica reflete idéias compartilhadas por uma comissão avaliadora composta pelos
seguintes professores do Curso de Teologia do Unasp, Campus Engenheiro Coelho: Alberto R. Timm (relator), Amin A.
Rodor, Emilson dos Reis, José Carlos Ramos, José Miranda Rocha, Natanael B. P. Moraes, Reinaldo W. Siqueira, Rodrigo P.
Silva, Ruben Aguilar dos Santos e Wilson L. Paroschi.

2. Douglas S. Huffman e Eric L. Johnson, eds., God under Fire: Modern Scholarship Reinvents God(Grand Rapids, MI:
Zondervan, 2002).
3. Para um estudo mais detalhado do antitrinitarianismo dos pioneiros adventistas, ver Woodrow Whidden, Jerry
Moon e John W. Reeve, A Trindade: como entender os mistérios da pessoa de Deus na Bíblia e na história do
cristianismo (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2003), 217-230.
4. Alberto R. Timm, “A History of Seventh-day Adventist Views of Biblical and Prophetic Inspiration (1844-
2000)”, Journal of the Adventist Theological Society 10/1-2 (1999): 486-499.
5. Woodrow Whidden, Jerry Moon e John W. Reeve, The Trinity: Understanding God’s Love, His Plan of Salvation, and
Christian Relationships (Hagerstown, MD: Review and Herald, 2002).
6. Whidden, Moon e Reeve, A Trindade.
7. Ricardo Nicotra, “Eu e o Pai Somos Um”. E o Espírito Santo? Não faz parte da Trindade?, 2ª ed. (São Paulo: Ministério
Bíblico Cristão, 2004).
8. As informações biográficas e históricas contidas no subtítulo “Antecedentes históricos” foram fornecidas por
Fabiano Ramos Medes, aluno do 3º ano do Curso de Teologia do Unasp – Campus Engenheiro Coelho, com base em
entrevista pessoal por ele realizada com Ricardo Nicotra no dia 5 de setembro de 2005, em São Paulo, SP.

9. Livro de Praxes da Divisão Sul-Americana (Brasília, DF: Divisão Sul-Americana, 1993).


10. Ver Lewis R. Walton, Ômega (São Paulo: Instituto Adventista de Ensino, s.d.), 5-65; idem,Omega II: God’s Church at
the Brink (Glennville, CA: Lewis R. Walton, 1995), 5-120.
11. Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, 2ª ed. (Santo André, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1985), 1:193-208.
12. Legislação Brasileira, Código de Processo Penal, 42ª ed. (São Paulo: Saraiva, 2002).
13. Hugh Chisholm, ed., The Encyclopaedia Britannica, 11ª ed., 29 vols. (Nova York: Encyclopaedia Britannica, 1910).
14. Maurice A. Canney, An Encyclopaedia of Religions (Londres e Nova York: G. Routledge & Sons / E. P. Dutton & Co.,
1921).
15. Frank M. Colby e Talcott Williams, eds., The New International Encyclopaedia, 2ª ed., 24 vols. (Nova York: Dodd,
Mead and Co., 1917).
16. James Hastings, ed., Encyclopaedia of Religion and Ethics, 12 vols. (Nova York: Charles Scribner’s Sons, 1922).
17. A Bíblia de Jerusalém (São Paulo: Paulinas, 1981).
18. Hollenberg e Budde, Gramática Elementar da Língua Hebraica, 5ª ed. (São Leopoldo, RS: Sinodal, 1985).
19. Wikipedia: The Free Encyclopedia, em http://en.wikipedia.org.
20. Catecismo do Católico de Hoje, 28ª ed. (Aparecida, SP: Editora Santuário, 2002).
21. Alejandro Bullón, O Terceiro Milênio e as Profecias do Apocalipse: como viver sem medo do futuro  (Tatuí, SP: Casa
Publicadora Brasileira, 1998).
22. Uma clássica exposição antitrinitariana das alusões de Eusébio de Cesaréia a Mateus 28:19 foi provida por Fred. C.
Conybeare, “The Eusebian form of the Text Matth. 28, 19,” Zeitschrift für die neutestamentliche Wissenschaft und die
Kunde des Urchristentums (1901): 275-288.
23. Ver, por exemplo, Augustus H. Strong, Systematic Theology (Valley Forge, PA: Judson Press, 1907), 243-352; Charles
Hudge, Systematic Theology (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1995), 1:366-534; Louis Berkhof, Systematic
Theology (Edinburgh: Banner of Truth Trust, 1958), 19-99; Millard J. Erickson, Christian Theology (Grand Rapids, MI: Baker,
1985), 261-342; Gordon R. Lewis e Bruce A. Demarest, Integrative Theology (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1987), 1:175-
289; Wayne Grudem,Systematic Theology: An Introduction to Biblical Doctrine (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1994), 139-
261; Alister E. McGrath, Christian Theology: An Introduction (Oxford: Blackwell, 1994), 205-308.
24. Ver, por exemplo, Herman Bavinck, The Doctrine of God (Edinburgh: Banner of Truth Trust, 1979); Millard J.
Erickson, God in Three Persons: A Contemporary Interpretation of the Trinity (Grand Rapids, MI: Baker, 1995);
idem, Making Sense of the Trinity: 3 Crucial Questions (Grand Rapids, MI: Baker, 2000).
25. Nisto Cremos: 27 ensinos bíblicos dos adventistas do sétimo dia (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1989), 31-98.
26. Fernando L. Canale, “Doctrine of God”, in Raoul Dederen, ed., Handbook of Seventh-day Adventist Theology,
Commentary Reference Series, vol. 12 (Hagerstown, MD: Review and Herald, 2000), 105-159.
27. Max Hatton, Understanding the Trinity (Alma Park Grantham, Lincolnshire, Inglaterra: Autumn House, 2001).
28. Whidden, Moon e Reeve, Trindade.
29. Alusões às declarações desses autores, confirmando a autenticidade de Mateus 28:19, podem ser encontradas em
José Carlos Ramos, “Mateus 28:19 – falso ou autêntico?”, Revista Adventista(Brasil), maio de 2005, 10-11; Rodrigo P. Silva,
“Trindade: um dogma de Constantino?” Revista Adventista (Brasil), julho de 2005, 14-16.
30. A noção de que o Credo de Cesaréia, escrito por Eusébio, tenha servido de base para a elaboração do Credo Niceno
é contestada por J. N. D. Kelly em sua obra Early Christian Creeds, 3ª ed. (Harlow, Inglaterra: Longman, 1972), 181-230. De
acordo com Kelley, o Credo de Cesaréia é autêntico e foi escrito, provavelmente com a “terminação mais longa”, por
Eusébio (ibid., 182), e apresentado por ele diante do Concílio de Nicéia com o propósito de “livrar-se das nódoas de
heresia [ariana] e obter, desta forma, sua reabilitação teológica” (ibid., 226). Ver também Jaroslav Pelikan, The Christian
Tradition: A History of the Development of Doctrine (Chicago: University of Chicago Press, 1971), 1:201-202.
31. Philip Schaff, ed., The Creeds of Christendom (Grand Rapids, MI: Baker, 1990), 2:29-30.
32. Ellen G. White, O Grande Conflito entre Cristo e Satanás, 41ª ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2001), 574.
Philip Schaff, em sua History of the Christian Church (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1910), 2:866, também qualifica o bispo
Eusébio de Cesaréia de “amigo e elogiador” do imperador Constantino.
33. Eusébio de Cesaréia, A Vida de Constantino, I, IV. Tradução baseada em NPNF, 2ª série, 1:482.
34. Edward Gibbon, The Decline and Fall of the Roman Empire (Nova York: Modern Library, s.d.), 1:683, 693; E.
Venables, “Eusebius of Caesarea”, in Henry Wace e William C. Piercy, eds., A Dictionary of Christian Biography (Peabody,
MA: Hendrickson, 1994), 318-319; Arthur C. McGiffert, A History of Christian Thought (Nova York: Charles Scribner’s Sons,
1954), 258-275; Bernhard Lohse, A Short History of Christian Doctrine, ed. Americana rev. (Philadelphia: Fortress, 1985),
53.
35. Benjamin J. Hubbard, The Matthean Redaction of a Primitive Apostolic Commissioning: An Exegesis of Matthew
28:16-20, SBL Dissertation Series 19 (Missoula, MT: Scholars’ Press, 1974), 175.
36. No CD-ROM The Complete Published Ellen G. White Writings (versão 3.0) aparece 168 vezes a expressão
“batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”, levando-se em consideração as variantes “Holy Spirit” e
“Holy Ghost”. Se essa expressão fosse uma interpolação herética, como alegam alguns, cremos que Ellen White não a teria
repetido tantas vezes em seus escritos publicados.
37. Cf. Bernhard Lohse, A Short History of Christian Doctrine, ed. Americana rev. (Philadelphia: Fortress, 1985), 52: “A
confissão de Nicéia não deve ser confundida com a confissão que hoje nos cultos é freqüentemente chamada de Credo
Niceno. Em realidade, este último deveria ser designado como Credo Niceno-Constantinopolitano (381).”
38. Ver Nestle-Aland, eds., Greek-English New Testament – Editio XXVII, 8ª ed. rev. (Stuttgart: Deutsche
Bibelgesellschaft, 1994), 87 (em grego).
39. Strong, Systematic Theology, 7.
40. Para um estudo mais minucioso do termo hebraico ruach, ver J. Barton Payne, “rûah”, em R. Laird Harris,
ed., Theological Wordbook of the Old Testament (Chicago: Moody, 1980), 2:836-837; Tengström e Fabry, “rûah”, em G.
Johannes Botterweck, Helmer Ringgren e Heinz-Josef Fabry,Theological Dictionary of the Old Testament (Grand Rapids, MI:
Eerdamns, 2004), 13:365-402.
41. Para um estudo mais detido do termo grego pneuma, ver Gerhard Friedrich, ed., Theological Dictionary of the New
Testament (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1968), 6:332-455; E. Kamlah e J. D. G. Dunn, “Espírito, Espírito Santo”, Colin
Brown, ed., O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento (São Paulo: Vida Nova, 1982), 2:122-149.
42. Ver referências bibliográficas 23-28, acima.

43. Ver, por exemplo, Ellen G. White, Evangelismo, 3ª ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1997), 613-617;
idem, O Desejado de Todas as Nações, 22ª ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2003), 671; comentários de E. G.
White em Seventh-day Adventist Bible Commentary, ed. rev. (Washington, DC: Review and Herald, 1980), 6:1074. Para um
estudo mais detido do assunto, ver Whidden, Moon e Reeve, A Trindade, 231-261.
44. E. G. White, Evangelismo, 617.
45. Eusébio de Cesaréia, História eclesiástica, III, XXXIX, 16. Tradução baseada em NPNF, 2ª série, 1:173.
46. Donald A. Hagner, Matthew 1-13, World Biblical Commentary, vol. 33A (Dallas, TX: Word, 1993), xiv.
47. Tradução do Nôvo Mundo das Escrituras Sagradas (Brooklyn, Nova York: Watchtower Bible and Tract Society,
1967), 1052.
48. Ver Ellen G. White, Spiritual Gifts, [vol. 1] – “The Great Controversy, between Christ and His Angels, and Satan and
His Angels” (Battle Creek, MI: James White, 1858), 103-119; republicado em português em idem, Primeiros Escritos, 6ª ed.
(Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1999), 210-222.
49. Ver Ellen G. White, The Spirit of Prophecy, vol. 4 – “The Great Controversy between Christ and Satan from the
Destruction of Jerusalem to the End of the Controversy” (Oakland, CA: Pacific Press, 1984), 39-65; republicado
parcialmente em português em idem, História da Redenção, 9ª ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2002), 320-334.
50. Ver Ellen G. White, The Great Controversy between Christ and Satan during the Christian Dispensation (Oakland,
CA: Pacific Press, 1888), 49-60; idem, The Great Controversy between Christ and Satan: The Conflict of the Ages in the
Christian Dispensation (Washington, DC: Review & Herald, 1911), 49-60; publicado em português como O grande conflito,
49-60.
51. Quanto é do nosso conhecimento, o pastor Enoch de Oliveira foi o único adventista brasileiro a receber o título
honorífico de “Doutor em Divindade”, que lhe foi conferido pela Andrews University (Joel Sarli, “Andrews University
confere ao Pastor Enoch de Oliveira o título honorífico de Doutor em Divindade”, O Ministério Adventista (Brasil),
novembro-dezembro de 1975, 14-15). O pastor João Wolff recebeu o título de “Doutor Honoris Causa” da Southwestern
Adventist University (“Universidade americana outorga título ao Pastor Wolff”, Revista Adventista (Brasil), junho de 1993,
14).
52. Bernard Ramm, Protestant Biblical Inter-pretation: A Textbook of Hermeneutics, 3ª ed., rev. (Grand Rapids, MI:
Baker, 1970), 37.
53. E. G. White, O Desejado de Todas as Nações, 671.
54. W[alter] S[chubert], “Caixa de perguntas”, O Pregador Adventista, janeiro-fevereiro de 1949, 22-23.
55. Francis D. Nichol, ed., The Seventh-day Adventist Bible Commentary (Washington, DC: Review and Herald, 1957),
7:675.
56. Pedro Apolinário, Estudo de passagens com problemas de interpretação (São Paulo: Instituto Adventista de Ensino,
1986), 302; ver também p. 302-307.
57. CD-ROM The Complete Published Ellen G. White Writings (versão 3.0).
58. Ver nota 36, acima.

59. Ellen G. White, Testimonies for the Church (Mountain View, CA: Pacific Press, 1948), 5:171.
60. Ellen G. White, Atos dos Apóstolos, 8ª ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1999), 52.
61. Cf. E. G. White, O Desejado de Todas as Nações, 114: “Quando Jesus foi levado ao deserto para ser tentado, foi
levado pelo Espírito de Deus. Não convidou a tentação.”
62. E. G. White, Evangelismo, 616.
63. Leon Morris, The Gospel According to John, The New International Commentary on the New Testament (Grand
Rapids, MI: Eerdmans, 1971), 105, n. 93.
64. E. G. White, O Desejado de Todas as Nações, 530.
65. Antônio Houaiss, Mauro de Salles Villar, e Francisco Manoel de Mello Franco, Dicionário Houaiss da Língua
Portuguesa, 1ª reimpressão com alterações (Rio de Janeiro: Objetiva, 2004), 1114 (“emanação”).
66. James Robertson, Ensinos de Jesus (São Paulo: União Cultural, s.d.), 146-147.
67. Ver E. G. White, Primeiros Escritos, 54-56, 92-93.
68. R. V. G. Tasker, Evangelho Segundo Mateus: introdução e comentário (São Paulo: Vida Nova / Mundo Cristão,
1980), 218-219.
69. Jaroslav Pelikan, The Vindication of Tradition (New Haven: Yale University Press, 1984), 27.
70. Ver E. G. White, Evangelismo, 613-617.

Fonte: Parousia, ano 4, nº 2 (2º semestre de 2005), p. 69-93. Usado com permissão.

rindade: um dogma de Constantino?


Rodrigo P. Silva, doutor em Teologia
Professor de Novo Testamento no Salt, Unasp, Campus Engenheiro Coelho, SP

Resumo: Grupos antitrinitarianos dissidentes do adventismo têm alegado que a doutrina da Trindade foi formulada no
Concílio de Nicéia (325 d.C.), sob a influência do imperador romano Constantino. O presente artigo demonstra a existência
de várias alusões à Trindade já nos escritos dos Pais da Igreja pré-nicenos. O autor analisa o significado histórico daquele
evento e seus antecedentes teológicos, bem como o real papel de Constantino no processo.

Abstract: Adventist off shut anti-Trinitarian groups have claimed that the doctrine of the Trinity was formulated at the 
Council of Nicea (A.D. 325), under the influence of the Roman emperor Constantine. The present article demonstrates the
existence of several  allusions to the Trinity in the writings of the ante-Nicean Church Fathers. The author  analyzes the
historical meaning of that event and its theological antecedents, as well as the real role of Constantine in that process.

Introdução
Entre os vários ataques produzidos por movimentos antitrinitarianos está o argumento histórico de que a Trindade é fruto
do Concílio de Nicéia e constitui, portanto, um dogma de Constantino. Tal alegação pode ser encontrada tanto em sites da
Internet quanto nos materiais publicados por grupos dissidentes do adventismo.

Em matéria veiculada pelo site www.adventistas.com, Ennis Meier declarou que “o Concílio de Nicéia deu origem à crença
em três deuses. A crença na trindade de pessoas Divinas não teve origem na Bíblia, mas no Concílio ou Sínodo de Nicéia, o
primeiro concílio ecumênico da história, no qual participaram 318 bispos, no ano 325 da era cristã”.1.X

Suas considerações acerca do encontro chegam ao ponto de sustentar que “a formulação do dogma contra Ário marcou
oficialmente o surgimento da Besta do Apocalipse”.2 Tal afirmação destoa fortemente de todas as interpretações do
adventismo histórico,3 inclusive de Ellen White,4 que viam nesta besta uma alusão não a Constantino, mas ao papado,
especialmente a partir do quarto século.X

Embora com Constantino a Igreja enfrente um profundo processo de apostasia, é importante lembrar que as nuances
proféticas de Apocalipse 13 aludem a um período posterior que se inicia com a supremacia papal e o início dos 1.260 anos
em 538 d.C. Constantino não foi um papa. Mesmo que tenha agido como líder da Igreja nalgum momento, nunca arvorou
para si o título de Pontifex Maximus do cristianismo.  Ademais, o bispo de Roma não possuía no quarto século o poder
político-absolutista que faria do papado a maior autoridade no mundo ocidental. Logo, seria estranho vincular Constantino
à imagem da Besta de Apocalipse 13.5X

Munido da referência a um site que promove o ateísmo, outro escritor que se denomina “irmão X” também se valeu da
contundente afirmação de que “com Constantino começa a criação da Trindade”.6Ele ainda acrescenta que o voto dos
bispos a favor da posição trinitariana se deu por pressão do imperador, que precisava do respaldo conciliar. Ora, o
estranho é que Constantino não se valia de “votos” para fazer cumprir seus desígnios. Apenas expedia um decreto (como o
fez no edito de Milão e no decreto dominical) e todos se sujeitavam. Por que, então, no caso da Trindade, dependeria do
apoio episcopal da Igreja? Bastava-lhe um anúncio imperial e o dogma estaria oficializado. Esta questão não parece ter
sido avaliada por nenhum dos artigos até agora apresentados.X

Seguindo no mesmo viés de Meier e do “irmão X”, Ricardo Nicotra também advoga que este período de “paganização”
[sic] do cristianismo foi o berço da trindade, e ainda acentua que é “importante lembrar que o Concílio de Nicéia não
estabeleceu apenas os fundamentos para a doutrina da Trindade. Outras decisões foram tomadas pelos bispos da igreja
católica em 325.”7 Estas decisões, conforme exemplifica o autor, envolviam a transferência do dia de descanso semanal do
sábado para o domingo.X

Embora este último autor, citando uma fonte da Internet (Wikipedia), cometa um erro de natureza histórica ao vincular o
domingo a Nicéia – pois é sabido que o decreto dominical de Constantino data de quatro anos antes do Concílio (321
d.C.)8 – sua conclusão deve ser analisada para ser bem compreendida. Para ele, uma vez que Constantino convocou a
reunião, conclui-se que o mesmo homem que promulgou a primeira lei dominical foi o “pai do dogma da Trindade”. Isto, é
claro, deduzindo como certa a idéia de que tal doutrina teria seu início em Nicéia. Se for assim, a crença em um Deus
Triúno seria tão herética quanto a guarda do domingo, pois viriam da mesma fonte apóstata.X

O objetivo, portanto, deste artigo é avaliar a procedência histórica de tal afirmação. Ou seja, seria a Trindade um dogma
de Constantino? Suas origens se devem ao Concílio de Nicéia?

Para responder a estas perguntas, é necessário que recorramos aos escritos dos primeiros pensadores cristãos que
viveram entre o segundo e o terceiro século, isto é, imediatamente depois do período apostólico e antes do Concílio. A
lógica é simples: se o argumento antitrinitariano estiver certo, ou seja, se a Trindade é mesmo uma doutrina
constantiniana, não devemos encontrar neste período inicial nenhuma defesa à ideia de um Deus Triúno. Pelo contrário, o
ensinamento da época deverá ser bem diferente, afirmando que Cristo é apenas um segundo ser existente depois do Pai, e
o Espírito Santo uma emanação impessoal de ambos.

Em seguida a este excurso pelos Pais da Igreja, apresentaremos brevemente uma análise dos elementos que motivaram o
Sínodo Niceno. É importante verificar qual a real atuação de Constantino em todo o processo. Ademais, um balanço
desapaixonado do evento revelará que consequências, de fato, Nicéia trouxe para a Igreja, pois, pelo que se percebe
nalguns autores, há a tendência de se atribuir ao encontro elementos de apostasia que não fizeram parte de sua pauta.9X

Não se trata, portanto, de um artigo bíblico-exegético, mas de uma pesquisa de cunho histórico. Logo, não se deve
estranhar a ausência de textos bíblicos neste estudo. As bases bíblicas da Trindade são apresentadas noutros artigos e se
mostram excelentes. A discordância de alguns não autoriza concluir que tais bases não existam. Afinal, muitos também
negam a validade do sábado no Novo Testamento, embora os adventistas há mais de um século venham evidenciando a
solidez bíblica deste ensinamento.

Pais da Igreja
Em relação ao recurso que se faz aos Pais da Igreja que viveram antes de Nicéia,10 percebe-se que existe uma aproximação
por demais piedosa por parte de autores católicos e outra mais cautelosa por parte de autores protestantes. É que o
catolicismo sempre aceitou a tradição pós-bíblica como legítima fonte de doutrinas,11 o que eleva os Pais da Igreja à
categoria de “ autores inspirados”, cuja função norteadora era a mesma atribuída aos escritores bíblicos.12 Já o
protestantismo com seu ideal de sola scriptura preferiu ver nos escritos dos Pais apenas uma loca probantia da teologia
sistemática, ou seja, estudá-los como testemunhas históricas do comportamento progressivo de uma doutrina através dos
tempos e não como fonte autoritativa de uma crença.13X

Com estes elementos em mente, é importante desdobrar alguns esclarecimentos em relação às citações patrísticas que, a
seguir, serão feitas. Uma abordagem adventista destes escritores compreenderá que:

1) Os Pais da Igreja testemunham o modo como o cristianismo primitivo, antes de sofrer qualquer influência do
catolicismo medieval, entendia certas passagens das Escrituras. Assim, podem oferecer uma visão mais desanuviada das
doutrinas apostólicas, pois alguns deles, como Clemente de Roma e Policarpo, conheceram pessoalmente os apóstolos e
receberam aprovação destes como líderes da Igreja.
2) Embora não se possa dizer que houvesse uma perfeita “unanimidade de pensamento” neste período, é possível afirmar
que eles já tinham bem nítida a diferença entre ensino apostólico (ortodoxia)14 e os movimentos heréticos, especialmente
aqueles oriundos de Marcion e do gnosticismo.15 Elementos básicos da fé como a filiação divina de Cristo, sua encarnação,
o juízo final e outros já estavam firmemente estabelecidos desde os tempos antigos.X

3) Devido ao caráter historicamente inicial de seus tratados, é importante que o leitor não busque em seus argumentos a
nomenclatura teológica própria dos tempos pós-nicenos. Termos que mais tarde passaram a ser técnicos na teologia não
possuíam ainda aquele tratamento unânime e cuidadoso que se exigirá de um tratado teológico
contemporâneo. Hypostasis, por exemplo, era um termo usado por alguns escritores para referir-se à pessoa, enquanto
outros o empregavam como sinônimo de substância.16  O mesmo se dá com seus conceitos que por estarem numa
sistematização inicial não abarcarão todos os detalhes de uma discussão que lhes é posterior.X

4) A despeito de seu grande valor testemunhal, os Pais da Igreja não devem ser usados como fonte de doutrina. Na
verdade nenhum deles reclamou para si inspiração divina ou se declarou profeta. A fonte básica e única da fé cristã era e
continua sendo a Bíblia. Quaisquer escritos posteriores servirão apenas para facilitar a compreensão do que está no Santo
Livro e não para produzir novas crenças.

5) O valor testemunhal destes escritores está representado profeticamente na carta apocalíptica à Igreja de Esmirna (Ap
2:8-11), pois foi neste período que eles viveram. Note que nenhuma repreensão é apresentada em relação aos cristãos
daquele tempo. Pelo contrário, sua fé é elogiada com muito vigor, pois muitos deles tiveram que assinar seu testemunho
com o próprio sangue de seu martírio.

6) É importante repetir que o proposto neste artigo não é endossar indiscriminadamente toda doutrina dos Pais da Igreja,
mas verificar, pelo seu testemunho, se a Trindade era crida na Igreja pré-nicena ou se, como dizem alguns, seria fruto
apenas do Concílio ocorrido no quarto século.

Trindade antes de Nicéia

Uso do termo “Trindade”

Uma verificação no index geral da Ante-Nicene Fathers e da Sources Chrétiennes17 que formam a coleção de todos os
escritores cristãos mais antigos (inclusive os anteriores a Nicéia) nos mostra que muito antes do Concílio, a crença na
Trindade já havia sido sistematizada entre os cristãos. Aliás, o próprio termo latino “Trindade” foi usado em 212 d.C. por
Tertuliano, 113 anos antes de Nicéia! Falando da Igreja de Deus, ele menciona o Espírito “no qual está a Trindade de uma
Divindade: Pai, Filho e Espírito Santo” (in quo est trinitas unius diuinitatis, Pater et Filius et Spiritus sanctus)18.X

A tradução latina da obra de Orígenes também menciona o termo ao considerar que “o batismo de salvação não está
completo a não ser [que seja exercido] pela autoridade da excelentíssima Trindade de todos eles, que é constituída do Pai,
do Filho e do Espírito Santo. Assim, temos ajuntado o nome do Espírito Santo ao Deus eterno e ao seu único Filho”.19  Tal
comentário torna-se relevante se entendermos que, talvez já nesse tempo, houvesse alguma controvérsia quanto à
fórmula batismal e a genuinidade de Mateus 28:19.X

Teófilo, escrevendo quase meio século antes de Tertuliano e Orígenes, usa a expressão Triados, que certamente seria uma
equivalência semântica de trinitas ou seu original em grego. Note a comparação poética que ele usa ao relacionar a
Trindade ao primeiro capítulo de Gênesis: “os três dias que estão antes dos três luminares [da Criação] são tipos da
Trindade (Triados) de Deus”.20X

Levando-se em consideração que Teófilo fala de “tipos da Trindade”, é razoável supor que ele não esteja falando de algo
novo ou criando um neologismo. A expressão textual supõe o uso de um termo já conhecido entre os leitores. Logo, não
seria estranho imaginar que o mesmo vocábulo aparecesse em outros escritos do mesmo período que se encontram
perdidos em nossos dias.

Assim, retrocede para cerca de um século e meio antes de Nicéia o uso técnico do termo Trindade, legitimamente
reconhecido na literatura cristã. Mas talvez alguém pergunte: por que este termo não aparece na Bíblia? Para responder a
esta questão é preciso compreender que, a partir do século segundo, o centro missiológico da Igreja transferiu-se em
definitivo do ambiente judeu-palestino para o mundo greco-romano. O trabalho iniciado por Paulo entre os gentios vê-se
finalmente estabilizado no ambiente gentílico e começa a gravitar em torno de questões que não haviam sido levantadas
no ambiente judaico.

A Igreja viu-se, então, obrigada a expressar sua fé de um modo compreensível para aqueles que não vinham de uma
cultura vétero-testamentária, mas tinham seu pensamento regido pelos conceitos da filosofia grega. Questões ontológicas
antes não sistematizadas começaram a invadir os círculos cristãos e, deste modo, os escritores tiveram de cunhar termos
helenísticos para tornar inteligível a fé do Novo Testamento. Contudo, tal exercício não significava de modo nenhum uma
apostasia do ensino apostólico. O próprio João usou o conceito filosófico do logos para expressar com continuidades e
diferenças a doutrina da encarnação numa linguagem compreensível aos efésios influenciados pela doutrina de Heráclito.

Conceitos patrísticos sobre a Trindade

Clemente de Roma, que viveu no fim do primeiro século, escreveu por volta do ano 96 uma carta de conforto aos cristãos
de Corinto, que estavam sendo perseguidos por Domiciano (o mesmo imperador que deportou João para a ilha de
Patmos). Ao falar da união da Igreja ele diz: “Não temos nós [todos] um único Deus e um único Cristo? E não há um único
Espírito da Graça derramado sobre nós?”21Embora este não seja um texto de “defesa” da Trindade, chama-nos a atenção
sua “linguagem trinitariana” que subentende uma ideia triúna de Deus. Outros autores são ainda mais claros em sua
exposição.X

Inácio († 105 d.C.), que foi o segundo sucessor de Pedro como pastor em Antioquia,22 também ensinava a doutrina da
Trindade. Mártir durante o reinado de Trajano, ele escreveu uma epístola aos cristãos da Trália, dizendo-lhes que, a
despeito do sofrimento, continuassem “em íntima união com Jesus Cristo, o nosso Deus”23 – o que acentua a ideia da
divindade de Cristo. Num outro manuscrito, onde uma versão mais longa é preservada, o mesmo autor adverte os irmãos
contra aqueles que ensinavam doutrinas contrárias à fé dos apóstolos. Entre seus ensinos equivocados estaria a ideia de
que “o Espírito Santo não existe” e que “o Pai, o Filho e o Espírito Santo seriam a mesma pessoa”.24X

Justino, cognominado “o Mártir”, foi outro que escreveu várias apologias em favor do Cristianismo e contra a supremacia
da filosofia grega. Num de seus textos, concluído por volta de 160 d.C., ele diz: “Já que somos considerados ateus, nós
admitimos nosso ateísmo em relação a estes [vários] tipos de deuses [do politeísmo]. Mas, no que diz respeito ao
verdadeiro Deus, o Pai da justiça e temperança …, ao Filho, … e ao Espírito Profético, [saibam que] nós os adoramos e
reverenciamos.”25X

Atenágoras, também respondendo à acusação de serem os cristãos chamados de ateus por não aceitarem o politeísmo
pagão, escreveu em 175 d.C.: “Ora, quem não ficaria perplexo em ouvir chamar de ateus pessoas que pregam de Deus o
Pai, de Deus o Filho e do Espírito Santo e que declaram serem um no poder, mas distintos na ordem?”26 Noutra passagem
ele ainda diz:  “Os cristãos reconhecem a Deus e a seu Logos. Eles também reconhecem o tipo de unicidade que o Filho
tem com o Pai e que tipo de comunhão o Pai tem com o Filho. Ademais, eles sabem o que é o Espírito e que a unidade é
[formada] destes três: O Espírito, o Filho e o Pai”.27 “Nós reconhecemos um Deus, um Filho e um Espírito Santo, os quais
são unidos na essência.”28X

Ireneu de Lion é outro importante autor deste período. Convertido na adolescência, ele foi discípulo de Policarpo que, por
sua vez, foi discípulo do apóstolo João. Sua principal obra, intitulada Contra heresias, dispõe de cinco volumes e foi escrita
por volta de 177 d.C. Respondendo às idéias gnósticas de seu tempo, ele toma o cuidado de diferenciar, por exemplo, o
“fôlego [espírito] de vida” dados às criaturas em geral, do “Espírito Santo”, que é Deus habitando com o crente.29X

Explicando ainda que Deus é diferente dos homens, Ireneu fala da Palavra e da Sabedoria do Criador como sendo duas
pessoas divinas unidas a uma terceira (o Pai) numa única divindade.30X

Hipólito (c. 205 d.C.), autor do mais antigo comentário de Daniel de que dispomos, disse que “a Terra é movida por estes
três: o Pai, o Filho e o Espírito Santo”.31 Noutra passagem, após citar a fórmula batismal em nome do Pai, do Filho e do
Espírito, ele demonstra que já no seu tempo havia os que negavam esta doutrina, pois diz: “qualquer um que omitir um
destes três, falha em glorificar a Deus de um modo perfeito. Pois é por meio desta Trindade (Triados) que o Pai é
glorificado.”32X

Sendo o último teólogo de peso a escrever em grego e não em latim, Hipólito merece um destaque por ter sido, nas
palavras de W. Walker, “um dos primeiros antipapas” da história.33 Ele foi veemente em sua oposição a Calixto, bispo de
Roma, que já naqueles idos pretendia a centralização do poder. Calixto chegou a disciplinar Hipólito por sua teologia
acerca do Logos divino, o que demonstra que seus conceitos trinitarianos provinham de sua consciência, e não de uma
imposição arbitrária do bispo de Roma.X

Cipriano ( † 250 d.C.), que também cita como válida a fórmula batismal mateana,34 explicando que “ele [o evangelista]
sugere aqui a Trindade, na qual as nações foram batizadas”.35X

Embora a crítica textual coloque como espúrio o texto de 1 João 5:7,36  é digno de nota que Cipriano parece fazer
referência a esta interpolação quando diz: “O Senhor disse: ‘Eu e o Pai somos um’  e novamente está escrito acerca do pai
do Filho e do Espírito Santo: ‘e estes três são um’”.37 É claro que tal citação, indireta, não é suficiente para qualificar como
digna a interpolação da comma joanina. Não obstante, é possível assumir que esta interpolação ou parte dela já fosse
conhecida pelos pais latinos bem antes de Nicéia.X

O que aconteceu em Nicéia?

Antecedentes teológicos

Por volta de 325 d.C. a igreja estava dividida por uma polêmica teológica iniciada no Egito. Um grupo liderado por Ário e
Eusébio de Nicomédia, ensinava que Cristo era um semi-deus “semelhante”, porém não totalmente igual, ao Pai. Outro,
liderado por Alexandre, ex-bispo de Ário, e por Atanásio, via nisto uma aproximação muito perigosa com o gnosticismo
divulgado no Egito. Eles lembravam que a confissão mais antiga dos cristãos dizia que Cristo está em pé de igualdade com
Pai. Já um terceiro grupo liderado por Eusébio de Cesaréia (um adulador de Constantino, segundo Ellen White38), via com
neutralidade a questão e preferia propor com urgência uma declaração que abarcasse os dois lados.X

Para entender as bases do ensino ariano e da preocupação de Atanásio quanto a este tipo de abordagem, é importante
compreender a sedução intelectual da filosofia grega sobre a teologia do quarto século. Ellen White comenta de modo
muito apropriado que “mesmo antes do estabelecimento do papado, os ensinos filosóficos pagãos haviam recebido
atenção e exercido influência na igreja”.39X

O que era para ser apenas uma abordagem da fé para o mundo greco-romano tornou-se uma sobreposição do helenismo
sobre a teologia cristã. Embevecidos pela cultura grega, Ário e seus discípulos não conseguiram escapar à sedução da
filosofia gnóstica tão disseminada entre os alexandrinos. Para estes, o maior problema da existência humana estava no
dualismo idealizado por Platão e aprofundado por correntes posteriores. Era um pressuposto inquestionável acreditar que
o espírito (naturalmente bom) e a matéria (naturalmente má) jamais coexistiam em sintonia. Se assim o fosse, o primeiro
seria contaminado pelo último.

Portanto, o desafio agora era adequar doutrinas judaico-cristãs a este universo de idéias que não admitia a matéria como
criação direta de um Deus-Espírito, nem a encarnação como uma realidade tangível. Se Deus houvesse criado o mundo ou
se encarnado de verdade, sua divindade estaria seriamente comprometida – pensavam os gnósticos.

Assim, modelos alternativos foram criados para acomodar a doutrina cristã a este padrão filosófico. Um destes pode ser
visto nos manuscritos coptas (sahidico) encontrados por James Bruce, em 1769. Para resolver o problema da existência da
matéria que não poderia ser atribuída a um Deus-Espírito, eles diziam que o Altíssimo criou um deus menor que exerceu o
papel de artífice (demiurgo) para a criação do mundo. Assim, a matéria veio à existência sem que Deus se contaminasse
criando-a diretamente com as mãos. Cristo era este artífice que hoje se faz presente no mundo através do espírito
(pneuma) que é sua energia impessoal. O conhecimento disto (gnosis) é o que salva a humanidade.

Convocação conciliar

Enquanto o cristianismo apostólico era a democratização do mistério de Deus – conceito herdado do judaísmo – o
gnosticismo era a sofisticação do mistério, pois o seu entendimento não advinha de uma revelação mas da compreensão
racional dos iniciados que não tinham dificuldades intelectuais para explicá-lo. Para eles, o que fugia à compreensão
racional não era doutrina de Deus e isso estava causando uma preocupante divisão no cristianismo do Egito e de Antioquia
(cidade natal de Ário). Por isso, Alexandre e Atanásio escreveram cartas a Roma pedindo um encontro que pusesse termo
à questão.
Eusébio e seus seguidores também queriam a todo custo pôr fim à disputa, não porque estivessem preocupados com a
ortodoxia da doutrina, mas porque temiam que uma divisão, àquela altura dos acontecimentos, fizesse a Igreja perder os
privilégios que Constantino estava promovendo.

O próprio imperador, ao contrário do que muitos pensam, não tinha interesse algum em “promulgar” uma doutrina
trinitária para a Igreja. Já fizemos menção no início de que, se este fosse o seu intento, não precisaria convocar um Concílio
para endossar o seu desejo. Bastava-lhe repetir o ato de quatro anos antes, quando promulgou o decreto dominical, e
assinar um edito ordenando a todos que adorassem ao Deus-Triúno.

Ademais, Constantino nem possuía conhecimento suficiente para se posicionar diante da controvérsia que ocupava a
teologia grega.40 Uma carta por ele enviada por meio do bispo Hósio de Córdova confirma seu desconhecimento
doutrinário a este respeito. Ali ele afirma que o problema que os bispos estavam discutindo acerca da natureza de Cristo
era “uma questão sem proveito”.41X

Foram os próprios bispos que o convenceram a convocar o Concílio para resolver a questão e o partido trinitariano de
Alexandre era, sem dúvida, o mais fraco de todos. Chega a ser um milagre que o texto de Nicéia não tenha favorecido o
arianismo porque estes, certamente, tinham mais recursos políticos que Atanásio e Alexandre. Tanto o é que, embora os
arianos fossem derrotados no Concílio, os partidários de Eusébio de Nicomédia empreenderam uma verdadeira
campanha, após Nicéia, para derrotar Atanásio e restaurar Ário ao poder.

O mais surpreendente é que, protegido pelo imperador, Ário começou, de fato, a reconquistar seu poder que perdera e a
influenciar a política da igreja. Eusébio, por sua vez, convenceu Constantino a enviar Atanásio para o desterro e recolocar
Ário em seu lugar como bispo de Alexandria – o que quase aconteceu, não fosse o falecimento de Ário na noite anterior à
cerimônia de sua investidura, em 336 d.C. Assim, o plano era que o imperador convocasse um novo Concílio corrigindo
Nicéia e desse ganho de causa aos arianos.

Sob tais circunstâncias, a fé trinitária parecia, se não oficialmente renegada, praticamente condenada, principalmente
depois que Constantino declarou seu desejo de ser batizado por Eusébio de Nicomédia num ritual antitrinitariano. A
chamada fé nicena só não chegou ao fim, porque Constantino acabou morrendo em 22 de maio de 337, poucos dias
depois de ser batizado.

Dois últimos aspectos ainda precisam ser esclarecidos: a grande discussão do Concílio de Nicéia não era a Trindade em
primeiro lugar, mas a natureza de Cristo em relação ao Pai. Foi somente no credo de Atanásio, produzido posteriormente,
que o assunto “Trindade” apareceu de modo mais claro. Além disto, é importante notar que o credo niceno não diz nada
quanto ao Espírito Santo ser ou não uma pessoa. A literatura antitrinitária se confunde na seqüência histórica
apresentando como “Credo Ciceno” o que na verdade seria o Credo Niceno-Constantinopolitano de 381, proclamado
depois da morte de Constantino.42X

A Confissão Nicena de 325 se apresenta da seguinte maneira:

Cremos em um só Deus, Pai onipotente, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis; e em um só Senhor Jesus cristo, o
Filho de Deus gerado pelo Pai, unigênito, isto é, da substância do Pai, Deus de Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro de Deus
verdadeiro, gerado não feito, de uma só substância com o Pai, pelo qual foram feitas todas as coisas, as que estão no céu e
as que estão na Terra; o qual, por nós homens e por nossa salvação, desceu, e se encarnou e se fez homem e sofreu e
ressuscitou ao terceiro dia, subiu ao céu, e novamente deve vir e no Espírito Santo.

Segue-se a esta confissão os juízos emitidos em relação a alguns ensinos heréticos:

E a quantos dizem: “Ele era quando não era” e “antes de nascer, Ele não era” ou que “foi feito do não existente”; bem
como a quantos alegam ser o Filho de Deus “de outra substância ou essência” ou “feito” ou “mutável” ou “alterável” a
todos estes a igreja católica e apostólica anatematiza.43X

Conclusão
Como se vê, a despeito das insatisfações de alguns, prevaleceu em Nicéia a idéia de formular um texto enxuto, sem muitas
explicações e que agradasse ao máximo a todas as correntes. Se houve, portanto, uma atmosfera política por detrás do
documento conciliar, esta foi a da neutralidade – desviar a questão para evitar mais divisões. Constantino, é bom lembrar,
havia acabado de vencer Licínio na luta pelo poder e sua prioridade era manter o império unido. Um cisma no cristianismo
não seria bem-vindo naquele contexto. Daí o tom neutro sobre um assunto que, em princípio, geraria muitas
controvérsias.

No fim das reuniões, restou aos arianos o incômodo maior, pois, apesar das tentativas de neutralidade, o documento
acabou ecoando uma antiga tradição apostólica que apresentava a Cristo como consubstancial ao Pai. E o mais curioso é
que Eusébio e a maioria dos arianos assinaram o documento em concórdia com seu conteúdo. Apenas Ário e dois amigos
se recusaram a fazê-lo.

O sentido exato destas assinaturas é difícil precisar. Contudo, vê-se como infundada a declaração de que Constantino seria
o Pai da doutrina trinitária usada para atrair o politeísmo para a Igreja. Pelo contrário, vinha de Ário e Eusébio a tentativa
de trazer uma doutrina politeísta para dentro do cristianismo, pois estes apresentavam a Cristo como um “segundo” deus,
menor que o Pai, mas igualmente divino e que se assemelhava muito ao “demiurgo”, ou deus menor do gnosticismo
alexandrino. Em Nicéia, em todo o caso, a Igreja pelo menos não tentou penetrar o mistério de Deus ou descrevê-lo como
o fez Ário imbuído pela idéia de transcendência vinda da filosofia grega. Esta foi a verdadeira natureza da discussão que de
modo nenhum pode ser tomada como a genitora de uma teologia trinitária.

Referências
 

1
 Ennis Meier, “O Concílio de Nicéia, origem da crença em três deuses”. Disponível em
<http://www.adventistas.com/artigos/html>. Acesso em 13 de janeiro de 2004. ↑X

2
 Ennis Meier, “História: como Constantino tornou-se o pai do dogma católico da Trindade”. Disponível em
<http://www.adventistas.com/artigos/html>. Acesso em 13 de janeiro de 2004. Grifo acrescentado.↑X

3
 Urias Smith, Daniel and Revelation – The Response of History to the Voice of Prophecy A Verse by Verse Study of These
Important Books of the Bible (Mountain View, CA: Pacific Press, 1918), 558ss.; Stephen N. Haskell, The Story of the Seer of
Patmos (Nashville, TN: Southern Publishing Association, 1977), 228-230. Haskell ainda estabelece o fato de que a Besta
papal de Apocalipse 13 é uma institução que deveria surgir após a divisão de Roma em dez reinos, o que aconteceu apenas
em 476 d.C. ↑X

4
 Ellen G. White, O Grande Conflito (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1996), 52, 438 e 439. ↑X

5
 Sobre a importância da data de 538 d.C. para o entendimento adventista da profecia, ver A. Timm, “A Importância das
datas de 508 e 538 d.C. para a supremacia papal”, in Parousia (2005:1), 7-18. ↑X

6
 Irmão X, “Cristianismo é ridicularizado pelos ateus por causa da crença na Trindade”. Disponível em
<http://www.arquivoxiasd.com.br/ateu.htm>, acesso em 22 de setembro de 2005. ↑X

7
 Ricardo Nicotra, “Eu e o Pai Somos Um” (São Paulo: Ministério Bíblico Cristão, 2004), 89. ↑X

8
 O decreto dominical constantiniano foi promulgado em março de 321. Seu texto pode ser encontrado no Codex
Justinianus, Corpus Júris Civilis Codicis  Líber 3, tit. 12, parágrafo 3. ↑X

 Além do já mencionado erro de Nicotra, que atribui ao Concílio a mudança do sábado para o domingo (vide nota 7),
9

autores como Dan Brown (autor do best seler O Código Da Vinci) sugerem que foi o Concílio de Nicéia que determinou o
Cânon escriturístico, de modo que a Bíblia que temos hoje seria composta de acordo com o decreto constantiniano e não
conforme um real desígnio de Deus. ↑X

10
 O título “pais da Igreja” será aqui usado em seu sentido técnico, conforme a adoção dos estudos de patrística e não no
sentido católico de guardiões absolutos da ortodoxia cristã. ↑X

11
 F. Ardusso, “Tradizione”, in: G. Barbaglio, S. Dianich, Nuovo Dizionario di Teologia (Roma: Paoline, 1979), 1772. ↑X
 Esta equiparação com a Bíblia não é sempre explícita, na literatura católica, mas é facilmente detectada nas entrelinhas
12

do discurso. É que o catolicismo, especialmente aquele posterior ao Vaticano II, parece ter compreendido a
impopularidade teológica de tal afirmação diante do mundo protestante.  A primeira redação da Constituição
dogmática Dei Verbum, que mantinha ainda a concepção católica de duas fontes de revelação (Bíblia e Tradição) recebeu
uma severa intervenção do bispo belga De Smedt que convenceu o comitê a reformular completamente o texto original.
Ele declarou: “Segundo o nosso parecer, o esquema atual falha notadamente em seu caráter ecumênico. Ele não
representa progresso para o encontro com não católicos, mas um empecilho; muito mais: é prejudicial.” Citado por João
Batista Libânio, Teologia da Revelação a partir da Modernidade (São Paulo: Loyola, 1992), 386. Para uma discussão pré-
conciliar sobre esta questão veja: Pierre Benoit,L’actualité dês pères de l’Eglise (Neuchâtel: Éditions Delachaux et Niestlé
S.A., 1961), 10-15; F. Cayré, Patrologie et Histoire de la Theologie (Paris: Desclée & Cie, 1953), 3-7; J. Quasten, Iniciation
aux peres de l’Eglise (Paris: Ed. Du Cerf, 1955), 4-8. ↑X

 Reynold Seeberg, Manual de Historia de las Doctrinas (Buenos Aires: Casa Bautista de Publicaciones, 1967), 1: 29-37; J. N.
13

D. Kelly, Early Christian Doctrines (Londres: A&C Black, 1977), 21-37. ↑X

 Embora este termo seja tardio (século XV), seu conceito já está presente nos primeiros escritos apologéticos do
14

cristianismo. Cf. David W. Bercot, [ed.], A Dictionary of Early Christian Beliefs(Peabody, MA: Hendrickson Publishers, 2003),
xiii. ↑X

 Walter Bauer foi o pioneiro a chamar a atenção para a falta de unidade doutrinária nos primeiros séculos do cristianismo
15

(Orthodoxy and Heresy in Earliest Christianity, eds. Robert A. Kraft, Gehard Krodel [Philadelphia: Fortress Press, 1971]).
Mas hoje reconhece-se que, embora seu insight esteja correto, houve um exagero em suas conclusões. Ele chega a afirmar
que “os hereges eram maioria em relação aos ortodoxos” (p. 194). A tendência atual, conforme observa J. R. Flora – que
fez uma tese sobre o trabalho de Bauer, é que, a despeito da diversidade, havia uma unidade de pensamento nalguns
pontos centrais que permitia configurar o que constituía pensamento cristão ou ensino dissidente. Cf. Jerry Rees Flora, A
Critical Analysis of Walter Bauer’s Theory of Early Christian Orthodoxy and Heresy, PhD Dissertation (Louisville: Southern
Baptist Theological Seminary, 1972). ↑X

 Compare, por exemplo, o uso do termo em Dionísio de Alexandria (Fragmentos extensos V, 15) e Dionísio de Roma
16

(Contra os sabelianos 1). ↑X

 A. Roberts., e J. Donaldson, [eds] Ante-Nicene Fathers (New York: Charles Scribner’s Sons, 1913), esta coleção antiga traz
17

uma tradução em inglês dos textos patrísticos.  H. Lubac, J. Danielou, et. alli,Sources Chrétiennes (Paris: les édition du Cerf,
1941), esta é a mais importante coleção de textos dos Pais da Igreja. Ela traz o texto original em grego, latim, copta etc.
ladeado de uma tradução para o francês. Além disto apresenta as variantes que possam existir entre um e outro
manuscrito. Salvo indicações em contrário, vamos seguir aqui a numeração da Ante Nicene Fathers. ↑X

 Tertuliano, Sobre a Modéstia, XXI. ↑X
18

 Orígenes, Dos Princípios,  I, 3,2. O original grego perdeu-se; o que nos resta são pequenas citações e uma tradução latina
19

feita por Rufino. Assim, é possível que Orígenes tenha utilizado o termo TriadoV que veremos nos textos de Teófilo de
Antioquia. ↑X

 Teófilo, A Autólico, XV ↑X


20

 Clemente, I Epístola aos Coríntios, XLVI. ↑X


21

 Eusébio de Cesaréia, História Eclesiástica, III, 36, 5-11. ↑X


22

 Inácio, Epístola aos Tralianos, VII, (recensão curta). ↑X


23

 Idem, (recensão longa). Para uma revisão bibliográfica do debate acerca das recensões textuais de Inácio, com acentuada
24

defesa da recensão longa, veja Ch. Monier, Où en est la question d’Ignace d’Antioche? Bilan d’un siècle de recherches 1870-
1988, in Aufstieg und Niedergang der römischen Welt [Hildergard Temporini e W. Haase, organizadores] (Berlim e Nova
Iorque: Walter de Gruyter & Co., 1993), II. 27.1, 359-484. ↑X
 Justino, I Apologia, VI. ↑X
25

 Atenágoras, Súplica pelos Cristãos, X. ↑X


26

 Idem, XI. ↑X
27

 Idem,  XXIII. ↑X
28

 Ireneu, Contra Heresias,  V, XI, 2 ↑X


29

 Idem, IV, XX, 2 e 3. ↑X


30

 Hipólito: Fragmentos de Comentários, 10 (ANF, vol. V, 174.) ↑X


31

 Hipólito, Contra Noeto, 14. ↑X
32

 W. Walker, História da Igreja Cristã (Rio de Janeiro: JUERP/ASTE, 1980), 105. ↑X


33

 Cipriano, Epístolas, LXXII, 5. ↑X


34

 Idem. ↑X
35

 Bárbara Aland, et. alli., [eds], The Greek New Testament, Forth Revised Edition (Stutgart: Deutsche Bibelgesellschaft
36

/United Bible Societies, 2001), 819. ↑X

 Cipriano, Tratados, I, 6. ↑X
37

 E. G. White, Ibid., p. 580. ↑X


38

 Idem, p. 56. ↑X
39

 Bernard Lohse, A Fé Cristã Através dos Tempos (São Leopoldo, RS: Sinodal, 1981), 57. ↑X
40

 Uma reprodução da carta de Constantino pode ser encontrada em Eusébio de Cesaréia, Vida de Constantino, II, 64-
41

72. ↑X

 Um exemplo está no livro de Ricardo Nicotra,  88. ↑X


42

 O texto original em grego com uma antiga versão latina encontra-se em Henrique Dezinger e Clemente
43

Bannwart, Enchiridion Symbolorum – definitionum et declarationum de rebus fidei et morum Friburgo: Herder and Co.,
1922, , p. 29 [credo 54]. ↑X

Fonte: Revista Parousia, 2° Semestre de 2005, UNASPRESS

Uma pessoa maravilhosa chamada Espírito Santo


José Carlos Ramos, D.Min.
Professor de Daniel e Apocalipse no Salt, Unasp, Campus Engenheiro Coelho, SP
Resumo: O Espírito Santo é revelado nas Escrituras como uma Pessoa divina semelhante ao Pai e ao Filho e, ao mesmo
tempo, distinta de ambos. Mas grupos dissidentes do adventismo insistem que o Espírito Santo não passa de mera energia
despersonalizada proveniente de Deus. Em resposta a essa teoria, o presente artigo provê um estudo bíblico-exegético
sobre a natureza da terceira Pessoa da Divindade. O autor também procura restaurar o sentido original de algumas
citações dos escritos de Ellen G. White distorcidas pelos antitrinitarianos.
Abstract: The Holy Spirit is revealed in the Scriptures as a divine Person like the Father and the Son but, at the same
time, distinct to both. However, Adventist offshut groups insist that the Holy Spirit is only a mere despersonalized energy
from God. In response to this theory, the present article provides a biblical-exegetical study on the third Person of the
Godhead. The author also tries to restaure the original meaning of some quotations from the writings of Ellen G. White
that have being distorted by anti-Trinitarians.

Introdução
Dos membros da Trindade, o terceiro é Aquele de Quem há menos informações objetivas, precisas, que definam o seu
próprio Ser. O Filho Se tornou um de nós. Sua manifestação foi visível, material, em nosso nível. O Pai foi por Ele revelado.
Mas o Espírito permanece um tanto imperceptível, à parte, despretensioso, operando sem autoprojeção, não Se impondo,
não falando “de Si mesmo” (Jo 16:13). E no próprio ato do desprendimento, Ele cumpre a divina obra que O faz conhecido.
É parte de Sua glória exaltar e glorificar o Filho e, através do Filho, o Pai, fazendo com que a revelação de ambos se efetive
na consciência humana. Que exemplo de abnegação!

No quarto Evangelho, o Espírito executa pelo menos sete atividades, todas em exaltação a Jesus:

(1) Ensinar, e
(2) Fazer lembrar tudo o que Jesus disse – João 14:26
(3) Dar testemunho de Jesus – João 15:26
(4) Convencer do pecado, porque o mundo não crê em Jesus; da justiça, porque Ele foi para o Pai; e do juízo, porque
Satanás foi julgado e derrotado – João 16:8
(5) Guiar a toda a verdade, e Jesus é a verdade (14:6) – João 16:13
(6) Declarar ou anunciar o que Jesus, da parte do Pai, Lhe entrega – João 16:13, 14, 15
(7) Glorificar a Jesus – João 16:14
O Apocalipse refere-se a Ele como os sete Espíritos de Deus (Ap 1:4, 5; 4:5). Sete é o número da plenitude. O Espírito
alcança a plenitude nesta atividade cristocêntrica sétupla.

Isso é tão fundamental para o plano da redenção, que, sem o operar do Espírito, seria como se Jesus nunca tivesse
encarnado e Deus nunca tivesse Se manifestado. Ele habilita o homem a entender a salvação e responder positivamente a
ela. Sem Ele, a Igreja não poderia cumprir Sua missão e estaríamos fadados a permanecer neste mundo indefinidamente.

Objeto de especulação
Talvez o fato de existir pouca informação sobre o Espírito Santo faça com que uma conceituação sobre Ele se torne
mais susceptível de especulação. Nos dias de Ellen G. White havia aqueles que afirmavam que o Espírito era uma “luz
derramada” e “uma chuva caída”. Ela considerou essas ideias como de cunho espiritualista, ou espiritista, e as condenou
por rebaixarem a Deus.1
Igualmente afrontoso é tomá-Lo por criatura. Há os que acreditam que Ele e Gabriel se equivalem. A inspiração nega
isso fazendo clara distinção entre ambos no registro das palavras deste anjo a Maria: “Descerá sobre ti o Espírito Santo…”
(Lc 1:35). Gabriel não poderia estar falando de si mesmo. E Ellen G. White assegura que o seguidor de Jesus pode sentir-se
confiante e seguro no conflito “contra as hostes espirituais da maldade”, porque “mais que anjos estão nas fileiras. O
Espírito Santo, o representante do Capitão do exército do Senhor, desce para dirigir a batalha.”2 Rebaixar o Espírito Santo à
categoria de anjo é, na realidade, minimizar a Deus, algo muito a gosto de Satanás.
Outra forma especulativa no tratamento de tão sublime tema é despojar o Espírito de Sua personalidade. Entre os que
negam a Trindade, é comum a afirmação de que Ele é apenas uma influência ou energia – o poder de Deus. Esta idéia é tão
antiga quanto o século terceiro, quando Paulo de Samosata, monarquista/adocionista e bispo de Antioquia entre 260 e
272, a difundiu. No tempo da Reforma, Lélio Socino e seu sobrinho Fausto, ambos antitrinitaristas, propagaram a teoria.

Não há como negar que este conceito rebaixa o valor do Espírito Santo para a Igreja. L. E. Froom a isto se refere
quando afirma que negar a personalidade do Espírito não é

mera questão técnica, acadêmica ou simplesmente teórica. É de suprema importância e do mais elevado valor prático.
Se Ele é uma Pessoa divina e O consideramos como influência impessoal, estamos roubando desta Pessoa divina a
deferência, honra e amor que Lhe são devidos. E mais: Se o Espírito é mera influência ou poder, podemos então procurar
apropriar-nos dEle e usá-Lo.3
Continua Froom:

Não, o Espírito Santo não é uma tênue, nebulosa influência imanente do Pai. Não é algo impessoal, vagamente
reconhecido, apenas um invisível princípio de vida… Jesus foi a personalidade mais influente e marcante neste velho
mundo, e o Espírito Santo foi designado para preencher Sua vaga. Nada a não ser uma Pessoa poderia substituir Aquela
maravilhosa Pessoa. Nenhuma simples influência seria suficiente.”4
Para substituir uma Pessoa maravilhosa só outra Pessoa maravilhosa.

Espírito de Deus, Espírito de Cristo, e o gênero neutro de Pneuma


Dissidentes se valem do fato de a Bíblia identificar o Espírito Santo como Espírito de Deus ou de Cristo (1Jo 4:2; 1Co
3:16; Gl 4:6; 1Pe 1:11, entre outros textos), para afirmar que o Espírito Santo é algo inerente a Deus, tal como a Sua
energia, virtude, fôlego, glória, etc., e que, portanto, ao ser enviado, “parte de dentro (do interior) do Pai”.5
Ricardo Nicotra e Jairo de Carvalho, como exemplos, presumem que o verbo ekporeúomai, empregado em João 15:26
(um dos textos que registram a promessa do envio do Espírito), e vertido como “proceder” na Almeida Revista e
Atualizada, significa originalmente sair, ou partir, ou vir de dentro de, do interior de.6 Não se sabe de onde eles copiaram
esta idéia, mas o que temos aqui é uma dedução apressada e temerária. Quando tão somente ekporeúomai é
registrado, não é feita referência ao ponto de partida do movimento que ele expressa; nesse aspecto, o verbo significa
simplesmente sair, partir, encaminhar-se, conduzir-se, proceder, etc. (no sentido de ida e de vinda), tal como aparece em
algumas passagens, como Lucas 3:7, que fala de multidões que “saíam para serem batizadas” (saíam de onde?), ou Atos
9:28, informando que, estando Paulo em Jerusalám, entrava e saía com toda a liberdade (entrava e saía sem sair de
Jerusalém, isto é, ele se movimentava livremente na cidade).
Às vezes, o sentido de procedência de ekporeúomai está implícito, mas normalmente ele é dependente da preposição
que rege o ponto de origem explícito na frase. Por esta razão, é totalmente supérfluo se valer de outros textos em que
este verbo é empregado aparentemente com o significado aludido pelos dissidentes, se, nesses textos, a preposição é
distintamente outra. Três exemplos alegados por Nicotra, com as referidas preposições aqui italizadas, são como seguem:
(1) “Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que procede da boca de Deus” (Mt 4:4);
(2) “O que sai do homem, isso é o que o contamina” (Mc 7:20); e
(3) “Então vi sair da boca do dragão, da boca da besta…” (Ap 16:13).7
O original de (3) não consigna verbo algum, e é levado em conta apenas na pretensão do dissidente, razão porque
desconsideramos esse exemplo. Observamos, então, que em (1), a preposição é diá cujo sentido principal é através de;
qualquer palavra, normalmente, é emitida através da boca, daí procedendo. Alegar que antes que uma palavra seja dita
ela se formulou na mente, o que pode até ser um fato, 8 e que, portanto, significa “sair de dentro”, é impor ao verbo um
sentido que ele, por si só, não reúne. É a preposição que se liga ao ponto de onde parte o movimento que poderá dar esse
significado.9
Por exemplo, em (2), a preposição é ek, “de, desde”, e pode implicar o sentido “de dentro de”, como o emprego
de ésôten, “de dentro”, em Marcos 7:21 e 23 demonstra. Dizemos que pode, porque nem sempre é isto o que ocorre,
ainda que seja empregada a preposição ek. Exemplos: “Do trono [ek tou thrónou] saem relâmpagos, vozes trovões…” (Ap
4:5), e “rio da água da vida… que sai do trono [ek tou thrónou] de Deus” (22:1) não significam necessariamente que os
relâmpagos, vozes, trovões e o rio saem de dentro do trono.
Ademais, se o sentido original de ekporeúomai fosse mesmo “vir de dentro”, como querem os dissidentes, seria uma
desnecessária redundância Marcos 7:21 e 23 registrar ésôthen ekporeúetai, “procedem de dentro”; seria o mesmo que
dizer em português: sair para fora, entrar para dentro, subir para cima e descer para baixo.
Assim, a preposição é importante para se estabelecer o ponto de origem do movimento expressado por ekporeúomai.
Em João 15:26, a preposição é pará, também “de, desde”, mas com a acepção deposição, colocação, etc. (cf. à nossa
palavra paralelo). Segundo Robertson, uma das maiores autoridades no estudo do koiné, o grego popular do Novo
Testamento, pará significa “ao lado de”, “junto com”.10 Em outras palavras, o Espírito Santo procede de onde o Pai está,
não do íntimo dEle.
Assim, o verbo ekporeúomai, para ter o significado requerido por Nicotra e Carvalho na aplicação que fazem ao
Espírito Santo, teria que, no mínimo, estar ligado à preposição ek, ou, então, apó, como na construção “saía de Jericó” em
Marcos 10:46. E este não é o caso em João 15:26.
Portanto, a fórmula “Espírito de Deus”, ou “de Cristo”, indica procedência e não inerência, e implica que a obra do
Espírito Santo é executada em subordinação ao Pai e ao Filho. Parte desta obra é arepresentação vicária de Ambos neste
mundo. De fato, Jesus prometeu aos discípulos que, juntamente com o Pai, retornaria para eles na pessoa do Espírito
Santo (Jo 14:16-18, 23).
Outro expediente utilizado pelos que rejeitam a personalidade do Espírito Santo é o gênero neutro do grego pneuma,
espírito. “A Bíblia não empregaria uma palavra neutra para identificar uma personalidade,” dizem. Contra esta hipótese se
verifica que o termo é usado em referência a entidades reconhecidamente pessoais. “São todos
eles espíritos ministradores…”, afirma o escritor sagrado acerca dos anjos (Hb 1:14).

Especulação na ordem do dia


Condenando as especulações, o Espírito de Profecia adverte: “A natureza do Espírito Santo é um mistério. Os homens
não a podem explicar, porque o Senhor não revelou. Com fantasiosos pontos de vista, pode-se reunir passagens das
Escrituras e dar-lhes um significado humano; mas a aceitação desses pontos de vista não fortalecerá a Igreja. Com relação
a tais mistérios – demasiado profundos para o entendimento humano – o silêncio é ouro.”11
Quanto a esse assunto (natureza do Espírito Santo), está na ordem do dia o que Ellen White classifica de “fantasiosos
pontos de vista”. Dissidentes oportunistas e aventureiros, com “comichões nos ouvidos” (2Tm 4:3), imaginam ser crime de
apostasia a aceitação da divindade do Espírito Santo, e, inescrupulosamente, intentam arrancar das páginas sagradas
alguma noção que lhes satisfaça as divagações; com isto, acabam preterindo o criterioso ensino bíblico e do Espírito de
Profecia sobre tão sublime tema, por arrazoados fantasistas e inconsequentes que, no mínimo, denigrem o caráter
sacratíssimo deste Ser. E isso, sim, é crime. E o que é pior: julgam-se os portadores da verdade, enquanto o povo de Deus,
em sua totalidade, está errado.

Não obstante, o que acontecia no tempo de Ellen G. White, e que mereceu sua veemente censura, está literalmente
ocorrendo hoje, pois tal como a serva do Senhor denunciou, os atuais dissidentes igualmente reúnem um punhado de
“passagens bíblicas”, arbitrariamente catadas aqui e ali e, sem o mínimo respeito às mais elementares regras
hermenêuticas, colocam-nas numa cadeia temática ilegítima que as obriga a afirmar aquilo que eles pretendem. O
resultado é uma interpretação barata, superficial, abusiva, tendenciosa, sem o necessário respaldo de pesquisa séria e
responsável, o que, inevitavelmente, conduz a conclusões confusas e contraditórias; ora o Espírito é definido em termos
de pessoalidade, ora em termos de abstração.

Para se confirmar esse fato, basta uma olhadela em publicações produzidas por separatistas. Algumas colocações aí
feitas quanto ao Espírito Santo são de estarrecer mesmo o leitor casual. “Entre outras, cada qual mais descomunalmente
absurdas,”12 são feitas as seguintes declarações:
O Espírito Santo…

(1) …é o sopro, o fôlego de Deus,13 no sentido de que da mesma forma que o homem tem fôlego (isto é, espírito) Deus
também tem fôlego (isto é, espírito). 14 Em outras palavras, a teoria transforma uma simples analogia empregada por Paulo
(ver 1Co 2:11) numa realidade substancial que toma o homem por modelo. Mas se isto é o que Espírito de Deus significa, é
inevitável a ideia de que oantropomorfismo divino, longe de ser um engano,15 é um conceito correto: o homem é a
padronização de Deus – como é com ele, assim é com Deus!!! Mas vejamos: não importando se o homem tem fôlego
porque respira ou respira porque tem fôlego, uma questão aqui pertinente é: Deus respira? (bem, esse seria o caso se Ele
tivesse fôlego como o homem). Tem Ele um sistema respiratório que inclui, por exemplo, pulmões? Há no céu uma
camada atmosférica para suprir a respiração dos que ali habitam?
(2) …é o próprio Senhor,16 no sentido de que o Espírito Santo equivale ou a Cristo, ou ao Pai, ou a ambos. Este raciocínio
descamba para uma variação de outra heresia; seria um sabelianismo17dicotômico.
(3) …é isto.18 O dissidente Jairo Carvalho afirma que é “um total desprezo chamar mesmo um ser humano de ‘isto’”,
quanto mais Deus, o que para ele é “uma prova de que o Espírito Santo não pode ser um Deus”, 19 já que, como ele supõe,
Atos 2:33 O identifica como “isto”. Mas nesse caso, não importando o que ou quem Ele seja, o Espírito Santo é, segundo
esse raciocínio, inferior ao próprio homem, pois “isto”, que não é cabível a este, é próprio para o Espírito Santo.
Pena que o Sr. Carvalho não tenha percebido que o demonstrativo neutro não se aplica à pessoa do Espírito Santo
propriamente, mas ao efeito poderoso da Sua operação, o milagre que todos testemunharam! O texto diz: “Exaltado, pois,
à destra de Deus, tendo recebido do Pai a promessa do Espírito Santo, derramou isto que vedes e ouvis.” Por um lado,
“Espírito Santo”, o assunto da promessa, e “isto”, o que foi derramado, não se correspondem necessariamente; por outro
lado, segundo o discurso de Pedro à multidão atônita, o “isto” foi referido como aquilo que “vedes e ouvis”. O que eles
viam e ouviam? Era o Espírito Santo ou era a Sua operação? Bem, ali estava um grupo de iletrados galileus falando, nos
vários idiomas representados, as grandezas de Deus (vs. 6-8, 11 e 12), e isto eles estavam muito bem vendo e ouvindo; em
outras palavras, eles testemunhavam o poder do Espírito em exercício, e era exatamente o poder do Espírito, e não Sua
pessoa, que fora derramado.

Com efeito, Atos não afirma que Deus derramou o Seu Espírito, mas do Seu Espírito (ver 2:17). Em 10:45, é o “dom do
Espírito” que “foi derramado.” À luz de 1 Coríntios 12, o Espírito Santo é tanto dom como doador. Derramar significa
conceder generosamente, e refere-se fundamentalmente aos recursos do Espírito. Dias antes, Jesus havia prometido isso
aos discípulos; receberiam poder ao descer sobre eles o Espírito (At 1:8). É a Pessoa quem desce; é o poder que é
“derramado”. O que aconteceu com a igreja primitiva foi a repetição do que já acontecera com Jesus (10:38). Neste texto,
o Espírito é distinto de poder, e vice-versa. De fato, ao ser batizado, o Espírito Santo desceu sobre Jesus em forma de
pomba (Mt 3:16), e o resultado foi um poderoso ministério. O senso de derramamento transparece no relato de Marcos,
que afirma que “os céus rasgaram-se” (1:10), enquanto o de pessoalidade é notado em Lucas, ao afirmar que o Espírito
veio em “forma corpórea” (3:22).
Houve, portanto, uma compreensão equivocada de Atos 2:33 por parte do Sr. Carvalho. O demonstrativo isto se refere
antes à consequência da manifestação do Espírito, que à Sua pessoa.
(4) …é a mente de Deus.20 Mas a Bíblia diz que o próprio Espírito tem mente (Rm 8:27); seria correto falar em mente da
mente?
(5) …é o dedo de Deus.21 Nesse caso, o Espírito Santo seria uma pequena parte d[o corpo d]e Deus. E aí pergunta-se:
“Deus tem corpo?”
(6) …é qualquer anjo fiel22 com especial menção primeiramente a Lúcifer,23 então a Gabriel, quando aquele que se
tornou Satanás foi expulso do céu.24 Na verdade, o autor confundiu a verdade afirmando que Gabriel é um Espírito Santo,
mas não o Espírito Santo, o qual é a glória de Deus. 25 Mas quantos Espíritos Santos existem? A Bíblia diz que é apenas um
(Ef 4:4). Para Carvalho, entretanto, qualquer anjo fiel pode ser um Espírito Santo; Gabriel é a terceira pessoa da Divindade
(que ele insiste em dizer que é “a partir da Divindade”),26 e deve ser distinguida do Espírito Santo. Mas a inspiração afirma
que ambos, a terceira pessoa e o Espírito Santo, são o mesmo ser: “O príncipe da potestade do mal só pode ser mantido
em sujeição pelo poder de Deus na terceira pessoa da Divindade,27 o Espírito Santo.”28
(7) …é a glória de Deus. 29 Aqui o dissidente se aproximou consideravelmente de uma das abstrações espíritas
condenadas por Ellen G. White; havia em seu tempo aqueles que diziam que o Espírito Santo era uma “luz
derramada”.30 Mas o mais deplorável é consignado ao final das colocações de Carvalho: como o Espírito Santo é
meramente a glória divina, então mesmo o “pior inimigo de Deus”, Satanás, tem o Espírito Santo, pois ele “ainda possui
um pouco da glória que recebeu de Deus.”31Simplesmente estarrecedor!
É espantoso como determinados elementos, como fruto de seus devaneios, chegam ao extremo de nescidades como
esta; isto é sacrilégio de elevada ordem, diante da qual as palavras de Jesus soam oportunas: “…a blasfêmia contra o
Espírito não será perdoada. … Se alguém falar contra o Espírito Santo, não lhe será isso perdoado, nem neste mundo nem
no porvir… visto que é réu de pecado eterno”(Mt 12:31, 32; Mc 3:29).  Dizer que o Espírito Santo é a glória de Deus, que o
próprio diabo ainda retém e emprega em sua obra de engano, como o Sr. Carvalho afirma, é, na realidade, dizer que o
Espírito Santo é um instrumento nas mãos do diabo para a operação do mal e serviço do pecado!!! Na esperança de, quem
sabe, despertar um pouco a consciência do dissidente, pergunto: “O Espírito Santo continua ainda glorificando a Cristo,
como João 16:14 afirma que é uma de Suas tarefas, quando Ele é usado pelo diabo em sua obra satânica?”

Um Ser pessoal e divino


Impugnadas as lucubrações meramente humanas quanto ao Espírito Santo, observemos agora o que a revelação tem a
dizer sobre tão excelso tema.

Quando Ellen G. White afirma que “a natureza do Espírito Santo é um mistério”,32 não significa que nada podemos
aprender sobre Ele. Aquilo que a revelação nos transmite não é especulação; é a realidade que temos o dever de, pela fé,
aceitar.
Dois pontos sobre o Espírito Santo estão devidamente assentados nas páginas sagradas: Ele é uma pessoa, e é Deus.
“O Espírito Santo tem personalidade, do contrário não poderia testificar ao nosso espírito e com nosso espírito que somos
filhos de Deus. Deve ser uma pessoa divina, do contrário não poderia perscrutar os segredos que jazem ocultos na mente
de Deus.”33

A Personalidade do Espírito Santo


A personalidade do Espírito Santo é claramente inferida do testemunho bíblico. As seguintes referências não deixam
dúvida a respeito:

(1) Ele é citado entre pessoas: “Pois pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo…” (At 15:28).
Além disso, Ele aparece na fórmula batismal junto ao Pai e ao Filho (Mt 28:19); seria redundância Jesus mencionar o
Espírito Santo, tendo já mencionado o Pai, fosse Ele a mera energia dEste, ou Seu sopro, ou Sua glória; também não faria
sentido Jesus ordenar o batismo em nome de uma Pessoa, o Pai, de outra Pessoa, o Filho, e agora em nome de uma
energia, ou sopro, ou glória, o Espírito.34
(2) Pode e deve ser mantida comunhão com Ele (Fp 2:1; 2Co 13:14). Não se mantém comunhão com uma energia, nem
com um sopro, ou glória.
(3) Não é mero poder, mas tem poder (Rm 15:19). Seria outra redundância a Bíblia falar do poder do Espírito Santo,
fosse Ele mero poder; seria “o poder do poder”, o que é um contra-senso, da mesma forma que “mente da mente” visto
acima.
(4) Pode-se mentir a Ele (At 5:3). Mente-se a uma pessoa e não a uma energia, a uma luz, ou à glória.
(5) Pode-se-Lhe resistir (At 7:51). É possível cumprir o papel de um resistor (componente que impede, ou atenua, o
fluxo da corrente elétrica) para com o Espírito Santo? Sim, e isto o pecador faz quando, diante do apelo divino, prefere
permanecer no erro. Mas tal não significa que o Espírito Santo não seja uma pessoa, pois não é apenas a uma energia que
se resiste. Pessoas também podem ser resistidas, incluindo Deus (11:17). O texto fala de se resistir às claras evidências da
verdade, apresentadas pelo Espírito Santo.
(6) Pode-se guerrear contra Ele (Gl 5:17). O que é uma intensificação de resistência ao Espírito Santo.
(7) Pode-se ultrajá-Lo (Hb 10:29). Como é possível ultrajar uma energia, o sopro, a glória? Ultrajar se liga naturalmente
ao sentido de afrontar, insultar, difamar, injuriar, ofender, deprimir, vilipendiar, desacatar, vituperar, envergonhar. Como
se pode fazer tudo isso a uma abstração?
(8) Pode-se blasfemar contra Ele como se blasfema contra o Filho (Mt 12:31). É possível blasfemar contra o sopro,
contra uma energia? Blasfema-se contra uma pessoa, como é caso de Jesus aqui.
(9) Ele executa específicas funções próprias, não de uma abstração, mas de uma pessoa:
• sonda, perscruta a Deus – 1Co 2:10
• concede dons para a edificação da Igreja – 1Co 12:8, 12
• manifesta-Se nesses dons –1Co 12:7 (em outras palavras, ao conceder dons à Igreja o Espírito Se dá a ela)
• contende com pecadores – Gn 6:3
• ordena sobre itens relevantes para a obra e o povo de Deus – At 8:39; 10:19, 20
• envia pessoas no processo do cumprimento de alguma missão – At 10:19, 20
• ensina o que uma vez ouviu – Jo 16:13 (ouvir não é próprio de uma energia), ver também 14:26; 1Co 2:13
• revela, especialmente pelo exercício profético – At 1:16; 2Pe 1:21; 1Tm 4:1
• testifica através da intuição na consciência, bem como com o testemunho da Igreja – Rm 8:16; At 5:32; Ap 22:17
• move o agente humano na captação da revelação divina – 1Pd 1:21
• incute novas realidades ainda não percebidas – Hb 9:8
• indica a correta compreensão do que é revelado – 1Pd 1:11
• guia os filhos de Deus – Rm 8:14, inclusive na busca de “toda a verdade” – Jo 16:13
• assiste nas fraquezas – Rm 8:26
• intercede corrigindo nossas orações – Rm 8:26
• produz frutos na vida dos que se submetem a Ele – Gl 5:22, 23
• lava e renova, o que resulta em salvação – Tt 3:5. Em João 3:5, 6 este ato é referido por Jesus em termos do novo
nascimento
• escreve a lei de Deus nas tábuas do coração – 2Co 3:3
• santifica – 2Ts 2:13; 1Pd 1:2
• sela os que são de Deus – Ef 1:13
(10) Ele possui mente (Rm 8:27). O termo grego, traduzido “mente” neste texto em algumas versões,
é phrónema (alguma coisa que se tem em mente, que passa pela mente, o pensamento), em contraste com nous (a mente
como sede da consciência, da reflexão, da percepção, do entendimento, do julgamento crítico e da determinação). O
importante é que phrónema pressupõe a existência de nous. Apenas um ser pessoal é dotado de nous, e pode
exercer phrónema. O Espírito Santo é um ser pensante, o que implica inteligência e consciência. Ele não pode ser menos
que uma pessoa.
Mas o que é uma entidade pessoal? É aquela que afeta outras entidades pessoais e é afetado por elas. Afeta-nos
Deus? Naturalmente. Podemos afetá-Lo? Bem, Sua tristeza e alegria, misericórdia e justiça, interesse por nós e
condescendência, amor e ira indicam que sim. Deus é afetado por Suas criaturas porque antes de mera consciência das
coisas, Ele tem autoconsciência; esta é o traço fundamental da personalidade porque é a capacidade que uma pessoa tem
de referir a si mesma a consciência de qualquer coisa ou experiência pela qual passa. Isso não acontece com um animal,
porque ele não pode distinguir entre o ego pessoal e a momentânea sensação que experimenta. Por não ser um ente
pessoal, ele não consegue formar uma noção objetiva de seus sentimentos e das ações que estes geram, e aplicá-los a si
mesmo. O ser humano, ao contrário, torna-se, por exemplo, consciente de erros cometidos, reconhece-os como tais, e
chega à autoconsciência da culpa. Isso porque é um ser pessoal, dotado de mente e razão.
Aplicando isso a Deus, dizemos que Sua autoconsciência é prova irretorquível de Sua personalidade. Isaías 55:8 fala de
Seus pensamentos. Ele pensa porque tem mente, e ter mente O faz pessoal. Então, quando nos é afirmado que também o
Espírito Santo tem mente, não podemos senão concordar que Ele é, de fato, um ser pessoal. Se assim é, perguntamos:
afeta Ele a cada um de nós? Por suposto que sim. 35 Afetamos igualmente a Ele? Claro, pois a Bíblia fala da tristeza (Ef 4:30),
do anseio (Tg 4:5), da alegria (1Ts 1:6), da vontade (1Co 12:11), do amor (Rm 15:30), e até do ciúme (Tg 4:5) do Espírito
Santo.
(11) Além disso, o Novo Testamento emprega fartamente pronomes pessoais gregos em referência ao Espírito Santo.
Apenas em João 14-16 isso ocorre 24 vezes, e Ele próprio faz referência a Si com o pronome pessoal: “Disse o Espírito [a
Pedro]: Estão aí dois homens que te procuram; levanta-te, pois, desce e vai com eles nada duvidando; porque Eu os enviei”
(At 10:19, 20).
(12) Finalmente, a palavra inconteste de Jesus não deixa qualquer margem para dúvida no que respeita à
personalidade do Espírito Santo. “Eu rogarei ao Pai,” prometeu Ele à Igreja, “e Ele vos dará outro Consolador, o Espírito
Santo” (Jo 14:16, 26). Chamando-O “Consolador”, Jesus evocou Sua personalidade. O
original parákletos (etimologicamente chamado para estar ao lado de), é masculino e aplica-se à pessoa que apóia,
conforta, orienta, defende, etc., o que uma abstração não faz.

A Divindade do Espírito Santo


Um estudo mais atento da Palavra de Deus, e, acima de tudo, desprovido de idéias pré-concebidas, atesta
naturalmente a divindade do Espírito Santo. Pode Ele ser menos que Deus, se possui os atributos exclusivamente divinos
de Eternidade (Hb 9:14), Onisciência (1Co 2:10 e 11) e Onipresença (Sl 139:7)? Quem menos que Deus pode criar e
comunicar vida (Jó 33:4), convencer do pecado, da justiça e do juízo (Jo 16:8), regenerar (Tt 3:5), santificar (2Ts 2:13; 1Pe
1:2), escrever Sua lei nas tábuas do coração (2Co 3:3), ressuscitar (Rm 8:11), e selar o crente para o dia da redenção (Ef
4:30)?
Como um ser menor que Deus pode perscrutá-Lo? (1Co 2:10). Como pode a blasfêmia contra o Espírito Santo não ser
perdoada, enquanto que aquela contra Jesus pode (Mt 12:31)? Porventura, pecar contra uma coisa, ou uma criatura, é
algo mais sério que pecar contra Deus? E como é possível que, segundo a fórmula batismal (28:19), alguém deva ser
batizado em nome do Pai (que é Deus), do Filho (que também é Deus), e do Espírito Santo (que seria uma coisa ou uma
criatura, como supõem os antitrinitaristas)?

Além disso, é-nos afirmado que, no próprio ato de mentirem ao Espírito Santo, Ananias e Safira mentiram “a Deus” (At
5:4). Nesse mesmo sentido de correspondência, Paulo primeiramente declara que somos santuário “de Deus, e que o
Espírito de Deus habita em” nós (1Co 3:16; ver também 6:19), para então afirmar que “somos santuário do Deus vivente”,
e que é o próprio Deus que habita em nós (2Co 6:16, 17). Percebemos claramente aqui que o Espírito Santo habitando no
coração é Deus se fazendo aí presente. Isso não seria possível se Ele mesmo, o Espírito Santo, não fosse Deus.

E quanto a Jesus? Reconheceu Ele a divindade do Espírito Santo? Bem, deixemos mais uma vez que Ele fale. Ele
prometeu “outro Consolador” (Jo 14:16). “Outro” pressupõe um Consolador prévio, o próprio Jesus, também identificado
como Parákletos (1Jo 2:1). Dois termos gregos são vertidos “outro” em nossas Bíblias: állos e héteros, o primeiro,
empregado aqui, significando “outro da mesma espécie”, enquanto o segundo “outro de natureza diferente”. O prometido
Consolador é Alguém tão divino quanto Jesus. Fosse Ele Gabriel, como querem os dissidentes, teria que ser
classificado héteros, e não állos.
Mas, qual a qualidade da divindade de Jesus? A Bíblia e o Espírito de Profecia não deixam por menos: Ele é tão divino
quanto o Pai, e é um com Este desde toda a eternidade (Jo 1:1; 10:30). “Cristo era Deus em essência e no mais alto
sentido. Ele esteve com Deus desde toda a eternidade…” 36 Se assim é com o primeiro Consolador, não será diferente com o
segundo. O mesmo Espírito de Profecia confirma esse fato: “O Consolador que Cristo prometeu enviar depois de ascender
ao Céu, é o Espíritoem toda a plenitude da Divindade, tornando manifesto o poder da graça divina a todos quantos
recebem e crêem em Cristo como um Salvador pessoal.”37 “Toda a plenitude da divindade” é precisamente o que
Colossences 2:9 afirma residir corporalmente em Cristo. De fato, o Espírito Santo é o segundo Consolador, da mesmíssima
natureza do primeiro.
É-nos afirmado ainda: “Precisamos reconhecer que o Espírito Santo, que é uma pessoa, como o próprio Deus, está
andando por estes terrenos.”38 Pode ainda haver dúvida que, à luz da inspiração, o Espírito Santo seja uma pessoa, e seja
Deus?
Um com o Pai e um com o Filho
Um último ponto referente à divindade do Espírito Santo se faz necessário. Pela doutrina da Trindade entendemos que
Jesus é um com o Pai porque possui a mesma natureza divina dEle. São distintos como Pessoas, mas iguais em Divindade.
Isto resulta em que onde Um está pessoalmente, ali o Outro estará essencialmente. Enquanto o Filho estava pessoalmente
na Terra, o Pai estava essencialmente aqui (embora pessoalmente continuasse no Céu), pois Jesus afirmou: “Não estou só,
porque o Pai está comigo” (Jo 16:32). Da mesma forma, enquanto O Pai estava pessoalmente no Céu, Jesus estava
essencialmente ali, pois disse a Nicodemos muito antes da ascensão: “Ninguém subiu ao Céu, senão Aquele que de lá
desceu, o Filho do homem que está no Céu” (3:13).39
Devemos crer que é exatamente isso o que ocorre em relação ao Espírito Santo? A resposta é “sim!”, pois, como
vimos, Ele é állos, isto é, da mesma natureza divina de Jesus. É por isso que o Salvador, imediatamente após prometer a
vinda do “outro Consolador” que estaria não apenas “com”, mas “nos” discípulos (Jo 14:16, 17), pôde também assegurar-
lhes que, por este Consolador, Ele, Jesus, voltaria para eles (v. 18) e, com o Pai, faria neles morada (v. 23). Isto porque o
Espírito Santo é igual a Jesus e ao Pai em divindade. Assim, onde Ele estiver, Pai e Filho também estarão. É por esta razão
que Jesus declarou ser vantajoso aos discípulos que voltasse ao Céu, pois assim lhes enviaria o Espírito (Jo 16:7), e, através
dEle, estaria em todo o tempo com toda a Sua comunidade de seguidores.
O Espírito Santo é o representante de Cristo, mas despojado da personalidade humana, e dela independente. Limitado
pela humanidade, Cristo não poderia estar em toda a parte em pessoa. Era, portanto, do interesse deles [os discípulos]
que fosse para o Pai, e enviasse o Espírito como Seu sucessor na Terra. Ninguém poderia ter então vantagem devido a sua
situação ou seu contato pessoal como Cristo. Pelo Espírito, o Salvador seria acessível a todos. Nesse sentido, estaria mais
perto deles do que se não subisse ao alto.40
Com isto em mente, não há qualquer dificuldade para se entender o que Ellen G. White quis dizer quando declarou:

Impedido por Sua humanidade, Cristo não poderia estar em todos os lugares pessoalmente; então foi para benefício
deles que Ele deveria deixá-la, ir para o Pai, e enviar o Espírito Santo para ser Seusucessor na Terra. O Espírito é Ele
mesmo, despojado da personalidade humana e independente dela. Ele Se representaria como estando presente em todos
os lugares por Seu Espírito, como onipresente.41
Como ela afirma, o Espírito Santo reunindo, a exemplo de Jesus, a plenitude da divindade, é o sucessor de Cristo, e
pode tão perfeitamente representá-Lo neste mundo, que se torna uma bendita realidade a presença essencial dEle aqui,
isto é, “Ele mesmo,” Cristo, “despojado da personalidade humana e independente dela… como estando presente [com Seu
povo] em todos os lugares por Seu Espírito, como onipresente.” “O Senhor Jesus age através do Espírito Santo, pois é Seu
representante.”42
Quão surpreendentemente fascinante é o plano de Deus e Seu trato com os pecadores! Enaltecido seja o Seu nome.

Conclusão
Que pessoa maravilhosa é o Espírito Santo! Que humildade, que interesse, que desvelo! Ele nos ama a ponto de instar
conosco a que sejamos salvos. Ele está disposto a aplicar em nossa vida a obra redentora da cruz em toda a Sua extensão.
A exemplo do Pai e do Filho, Ele anseia por nossa presença no reino de Deus. Já Lhe agradecemos por isso?

De fato, Ele é um precioso amigo. Se O resistirmos, magoá-Lo-emos, e Ele poderá se afastar triste e pesaroso por nossa
indelicadeza e apego a ideias que O desmerecem, e que resultarão finalmente em nossa ruína eterna. Mas se O
valorizarmos como Ele merece, e O acolhermos em nossa vida, Ele tomará posse do nosso ser, far-nos-á crescer em
semelhança com Jesus, até que coloquemos nossos pés na cidade celestial.

“Hoje, se ouvirdes a Sua voz, não endureçais os vossos corações” (Hb 4:7).

Referências
1
 Ellen G. White, Evangelismo (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1997), 614. ↑
2
 Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2001), 352. Esta afirmação do Espírito
de Profecia denota claramente a personalidade e divindade do Espírito Santo. ↑
3
 LeRoy E. Froom, A Vinda do Consolador (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1988), 40. À página 36 da edição castelhana,
acrescenta-se ao final do parágrafo a seguinte colocação: “Mas se O reconhecemos como Pessoa, estudaremos como nos
submeter a Ele de modo que nos use segundo Sua vontade.” ↑
4
 Ibid, 41, 42. ↑
5
 Ricardo Nicotra, “Eu e o Pai Somos Um” (São Paulo: Ministério Bíblico Cristão, maio/2004), 9, 34 e 35; Jairo Carvalho, A
Divindade (Contenda, PR: Ministério 4 anjos, s.d.), 114. ↑
6
 Ibid, 35. ↑
7
 Ibid. ↑
8
 Embora, de vez em quando, palavras sejam proferidas ou escritas por aí sem, ao menos, se pensar nelas. ↑
9
 É bom lembrar neste momento que Jesus é chamado Logos, “Palavra” (a Almeida verte “Verbo”), nos escritos joaninos (Jo
1:1, 14; 1Jo 1:1; Ap 19:13), e nem por isso iríamos afirmar que Ele, na encarnação, procedeu de dentro do Pai. O emprego
da preposição prós, “com”, no prólogo do quarto Evangelho indica que Jesus veio da íntima companhia do Pai, de um
relacionamento face a face, de um companheirismo como iguais (ver A. T. Robertson, A Grammar of the Greek New
Testament in the Light of Historical Reserarch [Nashville, TN: Broadman, 1934], 613, e The Divinity of Christ in the Gospel of
John [New York: Fleming H. Revell, 1916], 39): “O Verbo estava com [prós] Deus… Ele estava no princípio com [prós] Deus”
(Jo 1:1, 2). Vemos, então, que é sempre importante levar em conta a preposição usada e sua conotação. ↑
10
 Robertson, A Grammar, 613; ver pp. 553-649 para uma abordagem geral das preposições gregas. ↑
11
 Atos dos Apóstolos (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1986), 52. ↑
12
 A fórmula é de Rui Barbosa em alusão às prerrogativas papais de infalibilidade (ver O Papa e o Concílio [Rio de Janeiro: Elos,
s/d], I:113). ↑
13
 Nicotra, 8, 9. Carvalho, 44-46, 74, 110. ↑
14
 Nicotra, 8, 9, 11. ↑
15
 Por exemplo, muito da “teologia” grega do tempo dos apóstolos era antropomórfica, o que naturalmente recebeu o
repúdio da fé cristã. ↑
16
 ↑Nicotra, 12, 32, 33, 36; Carvalho, 18, 19, 20, 21, 26, 31, 32, 50, 51,
17
 Sabelianismo, de Sabélio, herege do terceiro século, que afirmava que uma única Pessoa na Divindade se manifesta de três
modos distintos: às vezes como Pai, outras como Filho, e ainda outras como Espírito Santo. Assim, para Sabélio, o Espírito
Santo era às vezes o Pai, outras vezes o Filho. ↑
18
 Carvalho, 21. ↑
19
 Ibid. ↑
20
 Nicotra, 8. ↑
21
 Ibid, 28. ↑
22
 Carvalho, 24. ↑
23
 Ibid, 132, 133. ↑
24
 Ibid., 80, 134, 135, 136, 137. ↑
25
 Ibid., 80, 137. ↑
26
 Ver nota a seguir. ↑
27
 “A partir da Divindade”, em vez de “da Divindade”, é como Jairo Carvalho verte o original inglês “of the Godhead”, do texto
em apreço de Ellen G. White. Ele recorre ao Webster’s Dictionary em apoio à sua versão, afirmando que, segundo este, “of
” é sinônimo de “from”, que ele afirma significar “a partir de” (107). Mas, na acepção que o dissidente requer, é duvidoso
atribuir tal significado à preposição “from”. Em sua edição mais completa, o aludido dicionário supre os diversos casos de
equivalência entre “of” e “from”, e nenhum deles coincide com o que o dissidente imagina (ver “of ” em Webster’s
Dictionary of the English Language – Unabridged – Encyclopedic Edition [Chicago, IL.: J. G. Ferguson Publishing Company,
1979], II:1241, 1242). Igualmente não pode ser alegado que, “na época em que o texto [de Ellen G. White] foi escrito, por
volta de 1890”, um dos significados de “of ” era “a partir de” (Carvalho, 107, 128), pois o mesmo Dicionário supre os
significados obsoletos do termo e também nenhum deles é o que o dissidente pretende. Quisesse a serva do Senhor
declarar o que ele afirma, teria registrado algo como “starting from” em lugar do simples “of ”. ↑
28
 Evangelismo, 617. Se é apenas pelo poder do Espírito Santo que se vence o inimigo, o que será dos que O negam e
rejeitam? Senhores dissidentes, pensem nisso! ↑
29
 Carvalho, 22, 52, 114, 116, 117, 118, 121, 122, 124, 125, 142, 143, 159. ↑
30
 Evangelismo, 614. ↑
31
 Carvalho, 165. ↑
32
 Atos dos Apóstolos, 52. ↑
33
 Evangelismo, 617. ↑
34
 Afirmar, como o Sr. Nicotra faz (18-24), que a fórmula batismal no tríplice nome de Deus em Mateus 28:19 foi interpolada
posteriormente ao texto original do Evangelho, sendo, portanto, apócrifa, não é verdade, como ficou evidenciado em Jose
C. Ramos, “Mateus 28:19 ¯ falso ou autêntico?”, Revista Adventista, maio de 2005, 10, 11. ↑
35
 Veja, por exemplo, Lucas 2:27; João 3:5, 6; 16:8; Romanos 8:4, 23; 14:17; Gálatas 5:17, 22, 23; 1 Pedro 1:2; 2 Pedro 1:21. ↑
36
 Ellen G. White, “The Word Made Flesh,” Review and Herald, 5 de abril de 1906, 8. ↑
37
 Evangelismo, 615 (itálicos supridos). ↑
38
 Ibid., 616. ↑
39
 Quanto à genuinidade da fórmula “que está no céu” em João 3:13, ver José C. Ramos, “La Revelación de Dios em JesuCristo
en el Cuarto Evangelio”, Theologika VII, 2 (1993) 93: 112-127, principalmente 117-121. ↑
40
 O Desejado de Todas as Nações, 669. Ênfase suprida. ↑
41
 Manuscrito 14, 23 e 24. Ênfase suprida. ↑
42
 Ellen G. White, “Our Battle with Evil”, Review and Herald, 10 de fevereiro de 1903, 8. ↑

Fonte: Revista Parousia, 2° Semestre de 2005, UNASPRESS

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