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ADRIANO DUARTE
JACAREZINHO – PR
2015
ADRIANO DUARTE
JACAREZINHO – PR
2015
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE DO PARANÁ
UENP – CAMPUS DE JACAREZINHO
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
CURSO DE DIREITO
ADRIANO DUARTE
________________________________________________________
Orientador: Professor Doutor Edinilson Donisete Machado
RESUMO
RESUMEN
INTRODUÇÃO .....................................................................................................08
Considerações Finais............................................................................................84
Referências Bibliográficas.....................................................................................86
8
INTRODUÇÃO
ponderar essas diferenças. A intolerância gera guerras em nome da religião, por isso
muitas pessoas foram perseguidas até a morte, isso perdura até os dias de hoje em
alguns lugares do mundo.
Muitas tentativas de explicar como surgiram as religiões já foram registradas.
O homem acreditava que todos os seres eram animados e possuíam espíritos, como
o sol, a lua, a montanha, os rios. Essa crença foi batizada de animismo pelo
antropólogo E. B. Tylor (1832 – 1917) influenciado pela teoria de Darwin sobre a
evolução.
O sagrado tornou-se palavra chave para os pesquisadores da religião, pois
eles descrevem a religião no que ela tem de especial, o seu poder de resgatar o ser
humano de seus medos e aflições e o envolver com o mais puro sentimento de amor
a si próprio e ao próximo.
1.2 O politeísmo
1.3 O monoteísmo
Uma lei que cria uma religião oficial cria uma tensão no direito de livre
exercício da cidadania, ao contrário, que a lei não deve provocar um excessivo
envolvimento entre Estado e religião, isso deveria ser considerado constitucional.
São dirigidos às Cortes americanas casos complexos envolvendo religião
por três religiões minoritárias instaladas no país: Mórmons, Adventistas do Sétimo
Dia e Testemunhas de Jeová. Na maioria desses casos, não envolve discórdia entre
governo e religiões, envolve conflitos oriundos de práticas de algumas religiões, o
que exige a delimitação da liberdade religiosa, mesmo os EUA terem sido formados
fortemente pelo fenômeno religioso.
Há um antagonismo de pensamento, há os que defendem a religiosidade
dos EUA, outros defendem a secularização e essa variedade de pensamentos tem
graves consequências na forma de se interpretar constitucionalmente a liberdade
religiosa nesse país.
26
política”, impõe uma ressalva: “salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal
a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”. Fábio
Carvalho Leite esclarece:
quando fora do serviço, o direito de professar uma crença, mas que esta não tenha
nenhuma repercussão no seu trabalho.
Outra característica relativa à neutralidade é a implicação da laicidade no
plano financeiro, o que impede que o Estado detenha qualquer tipo de vantagem
econômica de qualquer culto religioso.
Atualmente, têm surgido na França várias questões relacionadas à religião,
em sua grande parte pelo islamismo, o que rende muitas notícias na mídia. Há
também a assistência religiosa nos presídios, presente também nas Forças
Armadas.
Outro problema observado é a ausência de amparo religioso nos hospitais,
já que nesse setor, lida-se com a vida e a morte diariamente. As mulheres
muçulmanas recusam-se a ser atendidas por médicos do sexo masculino e alguns
empregados recusam-se a obedecer a ordens de seus superiores do sexo feminino.
Segundo a Comissão Stasi, esses comportamentos são prejudiciais, pois as
mulheres muçulmanas se submetem às tarefas subalternas, atitudes de
autodiscriminação. Questões estas marcadas pelo cunho religioso.
Na escola também se observa a alteração de seu curso normal; há pedidos
de alunos de dispensa em dias da semana por motivo de reza ou jejum,
comportamentos contrários em relação aos programas das disciplinas de história e
ciências, que questionam a origem da vida. Professoras e diretoras de escolas veem
sua autoridade desrespeitada por alunos ou seus pais muçulmanos.
Neste sentido, a jurisprudência tem tomado alguns posicionamentos como,
um aluno (a) muçulmano (a) poderá deixar de frequentar as aulas quando cumprir as
obrigações de estudos, a recusa de não participar da aula de educação física não é
admitida e até se pode pedir às alunas a tirarem o véu durante essas aulas. Toda a
manifestação religiosa dentro de uma escola que cause grave tumulto ou
perturbação será punida (Conselho de Estado 27.11.1996 – Liga Islâmica do Norte).
No que se refere às escolas, Fábio Carvalho Leite comenta:
metodista, Sr. Justus H. Nelson que ficou preso durante um mês só porque não tirou
seu chapéu enquanto passava uma procissão católica. Caso que chegou ao
conhecimento do Presidente dos Estados Unidos que exigiu medidas diplomáticas
junto ao governo brasileiro.
Neste cenário, a doutrina espírita também sofreu muito preconceito por parte
das autoridades e da sociedade. Médiuns receitistas eram enquadrados no Código
Penal de 1890, assim também os que se dispusessem a curar por meio do
espiritismo, delito como curandeirismo – artigos 156 a 158 do Código Penal de 1890.
Percebe-se, destarte, que a liberdade religiosa na Constituição de 1891
deixou muito a desejar. As minorias religiosas quando se viam prejudicadas,
recorriam à Carta e o direito lhes era negado, diferentemente da maioria que sempre
tinha seus direitos garantidos. Portanto, não teve nenhuma eficácia o dispositivo na
prática, pois a Constituição favorecia somente a religião Católica.
Mas é claro que esse direito não é absoluto, ele sofre limitações, ele vai até
onde começa outro direito fundamental. Diante de uma colisão, pondera-se os
interesses e se harmonizá-los for impossível, um deverá prevalecer em face do
outro.
O inciso VI do art. 5º da Constituição garante a liberdade de crença e de
culto, garante que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a
proteção aos locais de culto e as suas liturgias”. A liberdade de crença também é
protegida pelo inciso VII do mesmo artigo: “ninguém será privado de direitos por
motivo de crença nos quais os poderes públicos e as entidades privadas devem
respeitar, no qual se cria uma esfera jurídico-subjetiva ao redor do indivíduo”.
Com isso, o indivíduo é livre para crer nas suas divindades e poderá mudar
de religião ou crença quando bem quiser e também de não crer em nenhuma
religião ou transcendente.
Cabe aqui, uma distinção entre liberdade de crença e liberdade de culto,
Humberto Martins aduz que “a liberdade de religião implica escolher uma fé
religiosa, alterar seu vínculo com a igreja escolhida ou mesmo deixar de acreditar
em determinada expressão da religiosidade”. (MARTINS, 2009, p. 161). Refere-se
aqui à liberdade de crença.
Por outro lado, a liberdade de culto seria uma exteriorização da crença que
poderá manifestar-se de várias formas como reuniões em igrejas, cultos, ritos,
dentre outros. Sobre a liberdade de culto, sábias são as palavras de José Afonso da
Silva:
Essa aliança deve ser interpretada de maneira restritiva. Não é regra, trata-
-se de uma ressalva concedida pela Constituição, pois na maioria das vezes, há
transferência de recursos públicos para a manutenção de programas de interesse
comunitário promovidos pela instituição religiosa e de preferência que haja uma
previsão legal. “Separação é separação, não confessionalidade é não
confessionalidade, a par da tolerância, mas todos devem ser otimizados e
harmonizados”. (WEINGARTNER NETO, 2007, p. 180).
Conclui-se, portanto, que ao Estado está vedado a manter aliança ou
dependência com qualquer entidade religiosa, com exceção para colaborar com o
interesse público. Nesse caso, não estará violando o princípio da laicidade, pois a
própria Constituição Federal autoriza o vínculo entre Religião e Estado somente
nestas condições.
1
Fim da imunidade tributária para as entidades religiosas. Disponível em
<http://www12.senado.gov.br/ecidadania/visualizacao?id=38723>. Acesso em 02/07/2015.
48
Por outro lado, Ives Gandra Martins (1995, p.82) entende que o Estado não
deve transferir uma obrigação que é sua, por isso, é de responsabilidade a cessão
de salas de aula para o ensino religioso, bem como a remuneração dos professores.
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O que pode ocorrer é que alguns interesses da religião podem coincidir com
os do Estado, como por exemplo, a proteção da cultura e do patrimônio histórico
nacional. Nisso podemos perceber que não há um total distanciamento entre Estado
e religião.
No Estado não-confessional, a aproximação do Governo, por meio de suas
entidades públicas ou órgãos a alguma religião, é uma burla ao princípio da
separação entre Estado e Igreja, com exceção de alguns casos em que a própria
Constituição autorizou a participação do Estado em assuntos religiosos, como por
exemplo, a colaboração para o interesse público, como reza o inciso I do art. 19 da
Constituição Federal.
O Estado deve manter uma igualdade entre entidades religiosas, indivíduos
e crenças para garantir a plena liberdade religiosa. “Se houver tratamento desigual,
cai por terra a liberdade religiosa ampla, que cede espaço a algumas exceções que
prejudicam o todo”. (TAVARES, 2009, p. 60).
Por outro lado, deve ter um tratamento diferenciado para as confissões
religiosas, pois há uma situação em que há elementos culturais fortes, neste caso,
não estará o Estado desrespeitando a igualdade, porque esses elementos culturais
fortes exigem uma diferenciação pontual. É um tratamento especial, não privilegiado.
O privilégio não tem justificativa concreta, é concedido arbitrariamente, já o
tratamento especial é aplicado em virtude de uma situação fática que exige a sua
aplicação para manter um equilíbrio de igualdade. Neste contexto, defendem
Vladimir Brega Filho e Fernando de Brito Alves:
2
Disponível em <www.//tj-mg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/205022309/acao-direta-inconst-
10000140725037000-mg>. Acesso em 10/07/2015.
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nº 63/02, alterada pela Lei nº 11.507, de 20 de julho de 2007, que criou o Programa
de Diversidade na Universidade com o intuito de criar estratégias para promover o
acesso ao ensino superior de indivíduos que fazem parte de grupos que são
desfavorecidos socialmente como os indígenas e negros. Até hoje esse assunto
gera grande polêmica na sociedade brasileira.
Mas apesar disso, ainda persiste no meio social o preconceito, muitas vezes
camuflado. Cabe aqui uma distinção entre preconceito e discriminação, segundo
Szklarowsky (2007, p. 339), preconceito é um conceito, opinião antecipada que se
faz de alguém, de um grupo que leva a intolerância, o ódio ou a aversão às raças, às
religiões, etc. Já a discriminação é ato de separar, segregar, apartar do mesmo meio
de convívio pessoas ou grupos por não aceitarem suas características próprias.
A lei nº 11.635, de 27 de dezembro de 2007, instituiu o Dia Nacional de
Combate à Intolerância Religiosa a ser comemorado no dia 21 de janeiro em todo o
território nacional.
No dia 07 de junho de 2015, domingo, na Parada Gay de São Paulo se
protestou contra o preconceito que a LGBT vem sofrendo em decorrência de suas
orientações sexuais. Não obstante, a atriz e modelo Viviany Beleboni desfilou nesse
evento imitando Cristo crucificado, o que provocou muita polêmica entre os
religiosos que viram este ato como uma afronta e uma intolerância religiosa. A atriz
alega que a intenção era alertar contra a violência sofrida pelos homossexuais. O
caso foi noticiado da seguinte maneira:
internas_polbraeco,485934/atriz-crucificada-na-parada-gay-diz-que-
nao-quis-afrontar-religiosos.shtml>. Acesso em 14/06/2015.
Como sabemos, a jurisdição tem seus limites, mas poderão ocorrer algumas
colisões entre a autodeterminação das entidades religiosas com o princípio da
inafastabilidade da jurisdição que na realidade se converteu ao princípio da
onipresença do Judiciário o que nos remete a uma reflexão sobre tais limites. Nessa
linha de raciocínio, Aloísio Cristovam dos Santos Júnior oferece alguns exemplos:
3
Servidor que não ficou em pé para leitura da bíblia é expulso de Câmara de Vereadores. Disponível
em <http://www.pragmatismopolitico.com.br/2012/10/servidor-leitura-biblia-piracicaba-expulso-
camara-vereadores.html> Acesso em 25/05/2015.
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Igreja Católica, por exemplo, prefere a forma escrita, que é o Código Canônico.
Também a Igreja Presbiteriana do Brasil é regida por uma Constituição de 152
artigos.
Os cultos afro-brasileiros preferem a tradição oral, apresentando um
ordenamento totalmente costumeiro. “Em qualquer caso, a autorregulamentação das
organizações religiosas sempre é livre”. (SANTOS JÚNIOR, 2010, p. 40).
O Estado não se resume apenas ao Executivo, estende-se também ao
Legislativo e ao Judiciário, ou seja, os três poderes. Estende-se também o conceito
de Estado às unidades federativas. Vimos isso claramente quando o texto
constitucional veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios,
embaraçar o funcionamento dos cultos religiosos ou igrejas.
Uma vez que as organizações religiosas são pessoas jurídicas de direito
privado, são titulares da garantia de serem defendidas e respeitadas pelo Estado em
seu direito de autodeterminação.
Esse direito de autodeterminação das organizações religiosas, incluindo o de
autorregulamentadora é instituído em prol dos grupos religiosos e de seus indivíduos
e sua violação constitui ofensa à liberdade religiosa para cada um de seus membros.
Um exemplo é quando há uma intervenção indevida do judiciário no âmbito interno
de uma organização religiosa para privilegiar somente um dos integrantes de um
determinado grupo religioso que se desvia do padrão de comportamento imposto
pela entidade religiosa. Afastar uma sanção aplicada, de acordo com o ordenamento
dessa instituição, é ofendido nesse caso, não somente o direito de
autodeterminação da igreja ou do culto, mas também o direito de todos os indivíduos
que professam de tal religião, de verem o ordenamento ser aplicado de acordo com
suas regras, que na verdade, todos os membros a aderiram democraticamente.
Também nas regras das organizações religiosas pode ocorrer a
discriminação, como por exemplo, uma função a ser exercida apenas por homens ou
mulheres. Qualquer medida do Estado para obrigar qualquer organização religiosa a
não discriminar, ofende a liberdade religiosa. Aloísio Cristovam dos Santos Júnior
defende:
[...] É crucial lembrar, nesse passo, que quando alguém adere a uma
organização religiosa está se sujeitando ao seu ordenamento
peculiar, tanto no que diz respeito aos direitos quanto aos deveres
que lhe são atribuídos como integrante do grupo. (2010, p. 41).
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Podemos citar, como exemplo do assunto aqui tratado, uma decisão judicial
com liminar que determinou que a igreja realizasse o casamento de uma seguidora
que estava grávida, mesmo contrariando valores, regras e princípios de uma
confissão religiosa. A imprensa brasileira noticiou a decisão judicial da 12ª Vara
Cível de Goiânia no ano de 2005.4
É óbvio que esta decisão judicial violou gravemente o direito à liberdade
religiosa garantida às confissões religiosas. Destarte, violou também o direito de
autodefinição doutrinária e autodeterminação das organizações religiosas.
Neste caso, os noivos aderiram às regras da igreja e estavam cientes disso
e decidiram ser submetidos a esses preceitos. Se num dado momento não
concordaram mais com a doutrina da igreja, eram livres para abandonarem a
crença, sem precisarem recorrer ao judiciário. Isso cerceia o direito dos outros
indivíduos dessa mesma religião que desejam ver o ordenamento interno da igreja
sendo respeitado e aplicado a todos que professam dessa religião: “o indivíduo que
adere voluntariamente a uma confissão submete-se aos dogmas e práticas da igreja
respectiva; se não for aderente, tais dogmas e práticas das igrejas não lhe podem
ser impostos”. (WEINGARTNER NETO, 2007, p. 246).
Para as organizações religiosas se resguardarem neste sentido, foi sugerida
a Proposta de Emenda Constitucional 99/2011, que acrescenta ao art. 103 da
Constituição Federal, o inciso X, que dispõe sobre a capacidade postulatória das
Associações Religiosas para propor ação de inconstitucionalidade e ação
declaratória de constitucionalidade de leis, atos normativos ou decisões judiciais
quando contrariarem os interesses dessas organizações religiosas, da autoria do
Deputado João Campos de Araújo do PSDB/GO. Projeto este que foi arquivado em
31/01/2015 nos termos do art. 105 do Regime Interno da Câmara dos Deputados e
desarquivada em 14/05/2015 nos termos do art. 105 do RICD, em conformidade
com o despacho exarado no REQ-48/2015.
4
Juiz obriga igreja a fazer casamento. Disponível em
<http://expresso-noticia.jusbrasil.com.br/noticias/135807/juiz-obriga-igreja-a-fazer-casamento>.
Acesso em 15/06/2015.
66
5
Disponível em <www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=52459>.
Acesso em 21/08/2015.
67
Outro aspecto relevante que merece ser considerado é quanto ao prazo para
interpor recurso perante as autoridades eclesiásticas preclui e o interessado não
observa o prazo que essa organização religiosa estabeleceu para que ele recorra
contra decisão que lhe foi desfavorável. Mesmo que a ninguém possa ser vedado o
acesso ao Judiciário quando um direito é lesionado, deve-se verificar que esse
indivíduo, tendo o direito de interpor recurso mediante a autoridade eclesiástica para
modificar a decisão não o faz, permanecendo inerte, essa omissão deve ser
considerada como uma aceitação da punição imposta, como pode ele obter uma
decisão judicial favorável? Diferentemente das organizações religiosas que em seus
ordenamentos não preveem recursos internos de revisão das suas decisões, neste
caso, o indivíduo poderá acessar diretamente o Judiciário.
Repita-se que o poder estatal, em decorrência da laicidade, não caberá
ajuizar-se nos conceitos teológicos e doutrinários que integram o conjunto de
crenças das organizações religiosas, seja no sentido de invalidar ou de interpretar,
caso contrário, o Estado estará simplesmente substituindo as crenças dos grupos
religiosos pelas suas próprias convicções filosóficas ou religiosas.
O magistrado deverá decidir com base no conteúdo objetivo do ordenamento
jurídico religioso e não em suas próprias convicções teológicas ou filosóficas,
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resguardando assim, como bem afirmado neste trabalho, a liberdade religiosa dos
cidadãos e a liberdade de autodeterminação das organizações religiosas.
Nesse cenário existem problemas: o poder público dificilmente poderá
declarar quais práticas adotadas por uma organização religiosa e se apresenta ou
não matéria exclusivamente religiosa sem que isso possa incorrer em ofensa ao
princípio da laicidade do Estado.
No entanto, se algumas práticas podem ser identificadas como
exclusivamente religiosas como o ato de cultuar em uma celebração pública, outras
são de difícil constatação, como por exemplo, a eleição e a destituição de ministros
que representarão a entidade religiosa externamente. “A organização religiosa não
possui duas naturezas jurídicas, mas uma só”. (SANTOS JÚNIOR, 2010, p. 51).
A Constituição Federal atribui tratamento diferenciado às organizações
religiosas e reconhece a sua existência mesmo antes de sua inscrição no Ofício de
Pessoas Jurídicas.
Ademais, não existe nenhum amparo legal que possa limitar a autonomia
das organizações religiosas, sendo em vários casos impossível tentar separar o que
é da essência do culto com o que é um mero desdobramento da natureza jurídica.
Exemplo disso é um ato no qual o ordenamento jurídico confere os mesmos efeitos
jurídicos de um casamento celebrado perante o magistrado civil.
Portanto, as organizações religiosas merecem respeito e amparo do Estado
e este deve conceder-lhes uma proteção especial, que é garantida pelo texto
constitucional. Esse tratamento diferenciado fundamenta-se na singularidade de sua
natureza jurídica que não se deve confundir com personalidade jurídica.
Porém, poderão ocorrer colisões entre a liberdade religiosa com outros valores
estatais.
A Constituição de 1988 foi fundada nos princípios da democracia liberal e os
direitos fundamentais devem ser ponderados e interpretados no caso de uma colisão
com outros valores, pois não há direitos absolutos em nosso ordenamento jurídico.
Os direitos fundamentais podem sofrer restrições por parte do Estado,
inclusive a liberdade religiosa. Merece atenção as palavras de Aldir Guedes Soriano
neste sentido:
A lei de Liberdade Religiosa portuguesa, no seu art. 26, dispõe que o “abate
religioso de animais deve respeitar as disposições legais aplicáveis em matéria de
proteção dos animais”. Já o Tribunal Constitucional Alemão (TCA) decidiu pela
prevalência do componente religioso diante de casos concretos que envolviam
crentes sumitas (muçulmanos que usavam a degola para alimentar-se da carne de
animais sacrificados, como ordena as regras de sua religião).
Por outro lado, a lei de proteção aos animais é garantir seu bem estar, pois
eles merecem respeito e cuidados, porque nenhum animal deve ser submetido, sem
justo motivo, à dor e ao sofrimento. Isso é de interesse da comunidade. No caso em
tela, esse açougueiro muçulmano deveria buscar outra maneira de subsistência,
abandonando assim a degola.
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-la não haverá liberdade religiosa. E de nada adiantaria ter plena liberdade em crer e
ser proibido em praticar e seguir seus mandamentos.
Quando um indivíduo ou grupo adota uma religião, as crenças e valores
dessa religião são absorvidos e seguidos pelos fiéis que passam a questionar
valores que englobam política, ética, moral, cultura e sociedade, influenciando assim
no modo de agir desses seguidores, formando verdadeiros grupos de interesses.
Voltando às questões de políticas mistas, o Estado deve manter posturas de
não imposição, não adotar posturas que possam obrigar ou proibir comportamentos,
deixando os cidadãos construírem suas próprias convicções e seu destino. O
Estado, ao tratar das políticas públicas que se referem a assuntos polêmicos já
citados, como, contraceptivos, aborto, casamento homossexual e células-tronco,
deve manter uma postura de total neutralidade, respeitando assim, as escolhas
individuais de cada cidadão. Se o Estado obrigar ou proibir os cidadãos, estará
privilegiando as concepções de uma determinada organização religiosa em
detrimento das demais que não tiveram acolhido, pelo Estado, seu pensamento.
Percebe-se, então, a impossibilidade do Estado em solucionar questões
referentes às políticas mistas em que apresentam matérias de forte cunho religioso,
moral, ético ou filosófico, um campo muito delicado. Neste sentido, deve o Estado
abster-se de substituir a vontade dos cidadãos.
Portanto, espera-se das autoridades públicas, incluindo o Judiciário e o
Supremo Tribunal Federal, que reconheçam suas obrigações em definir a proteção
da liberdade de todos.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Atriz crucificada na Parada Gay diz que não quis afrontar religiosos. Disponível
em <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2015/06/09/
internas_polbraeco,485934/atriz-crucificada-na-parada-gay-diz-que-nao-quis-
afrontar- religiosos.shtml>. Acesso em 14/06/2015.
SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição, 5ª ed. São Paulo:
Malheiros. 2007.
______. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27ª ed. São Paulo: Malheiros.
2006.