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SITUAÇÃO JURÍDICA DO TRABALHADOR

I. ATIVIDADE LABORAL E DEVERES ACESSÓRIOS


11º + 115º - atividade laboral como objeto do CT (prestação principal do trabalhador no CT).
Características da atividade laboral:
• Atividade positiva do ponto de vista jurídico, ainda que, em termos materiais, possa consistir numa atividade
de simples presença ou mesmo de abstenção;
• Atividade continuada, porque se prevê que venha a ser executada ao longo de um certo tempo;
• Atividade de conteúdo relativamente indeterminado, tanto no momento da celebração do contrato - porque
carece de ser concretizada pelo empregador, através da atribuição de uma função integrada por
determinados conteúdos -, como posteriormente - pela exigência de adequação permanece da atividade
definida à evolução das necessidades do empregador, dentro de certos limites;
• Atividade exercida em situação de subordinação, uma vez que o trabalhador se sujeita aos poderes laborais
de direção e disciplina do empregador.

Configuração essencial da atividade laboral: o objeto da prestação principal do trabalhador no CT é o


desenvolvimento de uma atividade e não a sua atitude de disponibilidade para o trabalho. A disponibilidade do
trabalhador é um conceito auxiliar do conceito de atividade, que relevará nas situações em que a prestação da
atividade não seja possível, por motivos não imputáveis ao trabalhador e desde que não seja meramente aparente.

a) DIREITO DO TRABALHADOR À OCUPAÇÃO EFETIVA


O problema coloca-se quando não é, na prática, integrado o conteúdo da prestação do trabalhador por
nenhuma tarefa ou serviço concreto, ainda que continue a ser-lhe paga a retribuição —> problema de inatividade
do trabalhador. Este problema não pode ser confundido com:
• Desocupação temporária do trabalhador por razões técnicas ligadas à atividade produtiva da empresa (ex:
trabalhador desocupado porque se verificou uma quebra de produção - a inatividade é justificada
objetivamente em razões de gestão);
• Falta de cooperação creditória do empregador: o problema é de incumprimento, por parte do empregador,
do seu dever de cooperação creditória, uma vez que não realiza os atos necessários para viabilizar o
cumprimento da prestação pela outra parte (813º CC).

➡ O problema surge quando o empregador, de forma deliberada e independente de qualquer causa


objetiva ligada às vicissitudes da produção ou organização empresarial, nada dá ao trabalhador para
fazer.

O trabalhador tem direito a ser efetivamente ocupado e a ser ressarcido pelos prejuízos que a inatividade
lhe provocou?
A desocupação deliberada e injustificada é uma das formas frequentes de assédio moral. Uma visão
simplista considera que a desocupação do trabalhador é uma falsa questão, na medida em que o trabalhador
mantém o direito à retribuição sem ter de trabalhar, e o maior prejudicado com esta situação é o empregador.

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PALMA RAMALHO não concorda com este entendimento: o envolvimento integral da personalidade do
trabalhador no CT torna evidentes os danos profissionais e psicológicos que podem advir dessa situação.
Na doutrina, alguns autores eram reticentes quanto a este direito: o empregador apenas tem um ónus e
não o dever de ocupar o trabalhador; outros autores inclinaram-se para reconhecer um direito genérico do
trabalhador a ser ocupado, bem como a ser compensado pelos prejuízos decorrentes.
A jurisprudência começou por admitir o direito de ocupação efetiva do trabalhador apenas em
profissões em que a inatividade prolongada é mais suscetível de fazer diminuir o valor profissional (ex: funções
de relevante visibilidade), mas passou a reconhecer tal direito na generalidade dos CT, com o correspondente
dever na esfera do empregador. Argumentos: 58º/1 CRP + 58º/1, c) CRP + 19º LCT + 863º CC. Hoje, é
consagrado no CT: 129º/1, b). Esta garantia dos trabalhadores deve ser articulada com a previsão geral do
assédio moral (29º), sempre que a frustração deste direito revista um caráter reiterado.

Âmbito positivo: 129º/1, b)


Âmbito negativo: 129º/1, b) - a desocupação pode ser justificada.

É necessário objetivar o critério do carácter injustificado da inatividade do trabalhador: podemos recorrer à


figura da mobilidade funcional ou jus variandi (120º), aplicando os seus requisitos:
• Transitoriedade da situação
• Interesse objetivo da empresa na variação
• Não modificação substancial da posição do trabalhador

A verificação destes requisitos, nos casos de inatividade do trabalhador, permitirá aferir, em concreto e
de forma objetiva, se tal inatividade é justificada ou não e, por consequência, se se consubstancia ou não
a violação do direito do trabalhador à ocupação efetiva.

Violação do dever do empregador —> incumprimento contratual:


• Tutela positiva: direito do trabalhador de reclamar o exercício da atividade contratada
• Tutela negativa: direito do trabalhador a ser compensado pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que a
inatividade lhe tenha causado (323º) (Ac. STJ 31/03/2004).
• Para além desta dupla tutela, constitui justa causa para resolução do contrato por iniciativa do trabalhador
(394º/2, b) e com direito a indemnização.

b) DEVERES ACESSÓRIOS DO TRABALHADOR


É o conjunto destes deveres e a sua conjugação com o dever principal de prestação da atividade de
trabalho que evidencia a complexidade da situação juslaboral do trabalhador.
• 128º - enumeração exemplificativa dos deveres acessórios (+351º/2 a contrario sensu + outros deveres
resultantes do IRCT, regulamento da empresa, usos laborais ou CT).
Subjacente a estes deveres está o princípio geral da boa fé (126º/1). No que respeita ao trabalhador, manifesta-se
especialmente no 126º/2, 1ª parte.

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Critério classificativo laboral:


• Deveres acessórios integrantes da prestação principal: deveres estreitamente ligados à prestação principal e
que, por isso, acompanham as respetivas vicissitudes, sendo apenas exigíveis na pendência daquela prestação
(ex: dever de obediência, deveres de assiduidade e pontualidade, dever de zelo e diligência da realização do
trabalho, dever de promover a melhoria da produtividade da empresa).
• Deveres acessórios independentes da prestação principal: deveres que não dependem da prestação principal,
pelo que se mantêm nas situações de não prestação de trabalho e nas situações de suspensão do contrato
(295º/1) (ex: dever de lealdade - dever de sigilo e de não concorrência -, deveres de respeito e urbanidade,
dever de custódia).

c) DEVERES ACESSÓRIOS INTEGRANTES DA PRESTAÇÃO PRINCIPAL


• DEVER DE OBEDIÊNCIA (128º/1, e) e 2) - dever acessório mais importante, a par do dever de lealdade,
ao ponto de ser reconhecido pela doutrina que “cumprir é, essencialmente, obedecer” e pela jurisprudência
como “a pedra angular do CT”.
• Em termos extensivos, envolve o cumprimento das ordens e instruções do empregador respeitantes a
execução ou disciplina do trabalhador (128º/1, e). Ou seja, o trabalhador deve obediência não apenas às
diretrizes do empregador emanadas do poder diretivo, como do poder disciplinar prescritivo.
• É especialmente intenso, uma vez que se estende às diretrizes emanadas do empregador e dos superiores
hierárquicos do trabalhador (128º/2).

Limites gerais:
• Direitos e garantias do trabalhador (128º/1, e) - deve ser articulado com o 129º/1
• Direitos fundamentais e de personalidade do trabalhador
• Licitude da própria ordem (o trabalhador não deve obediência a um comando ilegal)
Limites específicos: autonomia técnica ou deontológica inerente à atividade profissional desenvolvida
(116º)

➡ Incumprimento do dever de obediência: infração disciplinar (328º e ss.); se for grave e culposa, pode
consubstanciar justa causa para despedimento imediato (351º/2, a).

• DEVERES DE ASSIDUIDADE E DE PONTUALIDADE (128º/1, b): presença física no local de


trabalho e no dia de trabalho; chegada ao local de trabalho à hora fixada para o início da atividade. A
modelação destes deveres em concreto depende da situação de cada trabalhador, no que toca ao período
normal de trabalho (número de horas de trabalho que o trabalhador se obrigou a prestar, por dia e por
semana - 197º/1 e 198º) e ao horário de trabalho (modo como as horas estão distribuídas ao longo do dia -
200º).

➡ Quebra do dever de assiduidade —> situação de falta (248º/1 + 256º/2 + 248º/2) (249º e 256º/1 +
256º/2 + 351º/2, g).
➡ Quebra do dever de pontualidade —> 256º/3.

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• DEVER DE ZELO E DILIGÊNCIA (128º/1, c): permite avaliar o modo de cumprimento da prestação
principal. A medida do zelo do trabalhador na execução da atividade laboral deve ser aferida segundo o
critério geral do bom pai de família, mas tendo em conta o contexto laboral em concreto: a atuação do
trabalhador é diligente quando corresponde ao comportamento normalmente exigível para aquele tipo de
trabalhador, naquela função em concreto.

➡ Incumprimento do dever de forma repetida e revelando desinteresse do trabalhador —> justa causa
para despedimento (351º); 351º/2, m); 374º/1, a) e 2.

• DEVER DE PROMOVER A MELHORIA DA PRODUTIVIDADE DA EMPRESA (128º/1, h)

d) DEVERES ACESSÓRIOS AUTÓNOMOS DA PRESTAÇÃO PRINCIPAL


• DEVER DE LEALDADE (128º/1, f): surge com a celebração do contrato e mantém-se ao longo da
respetiva execução, incluindo nas situações de não prestação da atividade do trabalho, seja em sede de
execução normal do contrato, seja em situações de suspensão do contrato.
• Dimensão restrita: dever de não concorrência e dever de sigilo (128º/1, f). Dotado de pós-eficácia, na
medida em que o trabalhador continua obrigado ao sigilo após a cessação do seu CT e porque são
admitidos pactos de não concorrência para o tempo subsequente à cessação do CT, ainda que sujeitos a
limites temporais (136º/2).
• Dimensão ampla: dever orientador geral da conduta do trabalhador no cumprimento do CT.
• Dimensão obrigacional: 762º/2 CC + 126º/1 - exigência geral em matéria de contratos.
• Dimensão especificamente laboral
• Componente de envolvimento pessoal do trabalhador no vínculo: a lealdade do trabalhador no CT
é, até certo ponto, uma lealdade pessoal, cuja quebra grave pode constituir motivo para a cessação
do contrato.
• Componente organizacional do contrato: o dever de lealdade não se esgota apenas em regras de
comportamento para a contraparte, mas também na exigência de um comportamento correto do
ponto de vista dos interesses da organização (126º/2, 1ª parte + 128º/1, h).

• DEVER DE RESPEITO E URBANIDADE (128º/1, a): o dever de respeito aponta genericamente para a
necessidade de observância das regras de conduta social adequadas, quer em matéria de tratamento quer em
matéria de apresentação pessoal e de conduta do trabalhador.

➡ Limites do dever de respeito: direitos de personalidade (direito à liberdade de expressão na empresa,


direito à imagem e direito à reserva da vida privada)

• DEVER DE CUSTÓDIA (128º/1, g + 168º): dever de zelar sobre a boa utilização e a conservação do
equipamento de trabalho, bem como de qualquer bem que o empregador coloque ao seu serviço.

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➡ Violação do dever: se determinar danos patrimoniais graves para o empregador, poderá


consubstanciar-se uma situação de justa causa para o despedimento (351º/2, e) + 323º.

• DEVERES ATINENTES À DISCIPLINA NA ORGANIZAÇÃO (128º/1, i) e j) + 281º).

➡ Violação dos deveres: justa causa para despedimento (351º/2, h).

• DEVERES ATINENTES À FORMAÇÃO PROFISSIONAL (128º/1, d) + 130º e ss.

c) ATIVIDADE LABORAL, DIREITOS DE PERSONALIDADE E DIREITOS FUNDAMENTAIS


• 126º/2 - reconhecimento dos elementos de pessoalidade no CT
• 14º e ss. - proteção dos direitos de personalidade

• DIREITO À RESERVA DA INTIMIDADE DA VIDA PRIVADA (16º + 17º a 22º + 26º/1 CRP + 80º
CC): deve ser entendido em termos amplos, incluindo a esfera íntima, pessoal e vida familiar (16º/2).
• Veda as ingerências do empregador em aspetos da vida privada do trabalhador não diretamente relevantes
para a atividade laboral por ele desenvolvida (16º/2, 17º/1 a 3 e 19º + 19º/1 e 3).
• Determina a proibição de certas formas de controlo da atividade do trabalhador na empresa (20º e 21º).
• Torna, em princípio, irrelevantes para o CT, tanto em sede de execução como no contexto da sua
cessação, as condutas extra-laborais do trabalhador.

• DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA E À LIBERDADE RELIGIOSA E


DE CULTO (41º CRP): poderá, em alguns casos, justificar a recusa da prestação de trabalho.

• DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO E À IMAGEM (26º/1 e 37º/1 CRP + 79º CC + 14º)

• Limites imanentes dos direitos fundamentais e dos direitos de personalidade: decorrem do princípio geral
segundo o qual as situações jurídicas devem ser exercidas dentro dos parâmetros de adequação funcional ou
de admissibilidade para que foram conferidas. Ultrapassados estes limites: 334º CC (abuso do direito).
• Limites extrínsecos: decorrem do relevo de outros interesses ou direitos que entrem em colisão com aqueles
(esta cedência de direitos deve ser tratada nos termos gerais - 335º CC). Os direitos dos trabalhadores podem
ter que ceder a interesses do empregador.
• Limites voluntários: do próprio trabalhador, por acordo, no CT ou IRCT (18º CRP + 81º CC).

d) DETERMINAÇÃO DA ATIVIDADE LABORAL


• Categoria: 115º/2, 118º/2 e 106º/3, c) + 26º/2, 62º/3, b), 127º/1, j), 129º/1, e), 162º/5, 164º/1, a), 276º/3,
360º/2, d), 368º/2, 369º/1, b) e 389º/1, b) + 129º/1, e) e 119º
• Função: 118º/1 + 118º/2 e 3 + 120º
• Cargo e posto de trabalho: 351º/2, d) + 367º e 368º + 161º
• Carreira: 118º/3

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• Função:
• Em sentido formal: corresponde ao cargo, lugar ou posto de trabalhado ocupado pelo trabalhador;
• Em sentido substancial: corresponde ao conjunto de tarefas, mais ou menos definidas, que cada posto de
trabalho inclui no seio da organização do emprego.

A função é um conceito intra-empresarial que não tem a ver com as habilitações nem com as aptidões
profissionais do trabalhador, embora deva ser atribuída pelo empregador tendo em conta esses aspetos
(118º/1). A função intra-empresarial do conceito de função explica ainda o facto de uma função
nominalmente idêntica em 2 empresas diferentes poder corresponder materialmente a um conjunto de
tarefas não totalmente coincidentes em cada uma das empresas.

A atribuição da função cabe ao empregador. A partir desta delimitação, o empregador apenas poderá, em
princípio, exigir ao trabalhador o desempenho das tarefas compreendidas no objeto do contrato - princípio da
invariabilidade da prestação (118º/1, 1ª parte).
Princípio da substancialidade ou efetividade: a função corresponde ao conjunto de tarefas que, de facto, o
trabalhador realiza e não a uma determinada designação formal (em caso de discrepância entre esta e aquelas, é a
função efetiva e não a nominal que prevalece).

• Categoria:
• Profissional: qualificações e aptidões profissionais do trabalhador. Aqui, o conceito de categoria é
anterior e exterior ao CT e à integração do trabalhador na organização.
• Normativa: designação formal dada pela lei ou pelos IRCT a determinado conjunto de tarefas.
• Interna à empresa: posição do trabalhador no seio da hierarquia empresarial. A categoria é fixada no
momento da celebração do CT ou no inicio da execução do trabalho e vai sendo sucessivamente ajustada
à evolução do trabalhador na pirâmide empresarial.

129º/1, e) - garantia da irreversibilidade da categoria, que obsta, em princípio, à mudança do trabalhador


para uma categoria inferior.

115º/1 e 2 + 118º - modo de determinação da atividade laboral:


• Definição genérica da atividade laboral é feita pelas partes, CT ou IRCT (115º/1 e 2);
• A esta definição genérica sucede a atribuição concreta de uma função pelo empregador (118º/1) - primeira
manifestação do poder de direção e é do exercício desta prerrogativa que surge o princípio da invariabilidade
da prestação.

118º/1, 2 e 3 - dois núcleos de funções:


• Conteúdo nuclear da atividade laboral (118º/1)
• Sentido amplo de atividade laboral (118º/2 e 3) - exercidas acessoriamente à atividade laboral nuclear.
• O desenvolvimento de funções afins está sujeito aos requisitos (cumulativos) da:

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• afinidade das funções: para integrar o conceito de afinidade ou conexão funcional, a lei recorre ao
critério do 118º/3. A lei admite que sejam estabelecidos outros critérios, o que confere natureza
convénio-dispositiva a esta norma (3º/5).
• qualificação profissional do trabalhador: deve ser entendido em termos substanciais, ou seja, ter em
conta a aptidão substancial do trabalhador para as desempenhar e não tanto a sua habilitação formal e
certificada para o efeito.
• não desvalorização profissional: envolve um juízo subjetivo sobre o conceito de “desvalorização
profissional” - não decorre a proibição, pura e simples, da exigência de funções que correspondam a
uma categoria inferior, mas obsta à exigência de tarefas que diminuam significativamente o estatuto do
trabalhador no seio da empresa, designadamente perante os colegas.

Desde que observem estes requisitos, as funções afins do núcleo central da atividade contratada
integram o objeto do contrato e podem ser exigidas pelo empregados, nos mesmos termos do núcleo
central da atividade. Únicas especificidades: 267º/1 + 118º/4.

Problemas:
• Transitoriedade no exercício destas funções: decorre do regime do CT que o exercício das atividades afins
não se encontra sujeito a qualquer limite temporal.
• Estas funções têm que ser acessórias da atividade nuclear ou podem ser exercidas em substituição dessa
atividade? O CT não é claro (118º/4 + 267º/1). Para PALMA RAMALHO, estas funções devem ser
exercidas a título acessório da atividade nuclear do trabalhador porque 1) esta solução pretende ultrapassar a
rigidez do princípio da invariabilidade da prestação, facilitando o desempenho de tarefas adicionais ou
complementares da atividade principal; 2) a solução inversa poderia dar lugar a uma alteração da função
nuclear do trabalhador em termos unilaterais e definitivos.

e) VARIAÇÃO DA ATIVIDADE LABORAL: MOBILIDADE FUNCIONAL


É relativamente ao sentido mais amplo que se deve configurar o princípio da invariabilidade da prestação
de trabalho - 118º/1, 1ª parte: o débito negocial do trabalhador fica, por regra, circunscrito às tarefas que
integrem aquele atividade e às tarefas afins ou funcionalmente ligadas àquela atividade, definidas nos termos do
118º/2 e 3.
O jus variandi é o direito que assiste ao empregador de, temporariamente, exigir ao trabalhador o
desempenho de funções não compreendidas na atividade laboral, tal como foi definida (no sentido estrito e no
sentido amplo). Ou seja, permite-se que o empregador, unilateralmente, introduza uma modificação no objeto do
contrato, o que constitui um desvio ao princípio da invariabilidade da função e, genericamente, ao princípio do
cumprimento pontual dos contratos (406º/1 CC).
• 120º - mobilidade funcional.
• Limite máximo - 120º/3
• Caducidade para as cláusulas - 120º/2
• Variação de função na categoria - 120º/5

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Fundamento do jus variandi: necessidades de gestão do empregador.

120º - requisitos cumulativos:


• Só é admissível se corresponder ao interesse da empresa (120º/1 - exigência de um fundamento objetivo de
gestão para que o empregador possa exercer o direito de variação. Apenas uma razão objetiva e série pode
justificar o desvio ao princípio da invariabilidade (norteador do desenvolvimento da atividade laboral). 120º/
3.
• A variação da função só pode ser imposta ao trabalhador a título transitório (120º/1): a dificuldade reside no
modo de aferição da transitoriedade da situação. Tendo em conta que as necessidades de gestão são muito
diversas, este requisito deve ser aferido caso a caso, nomeadamente verificando se não se justificaria o
recurso a medidas alternativas, como a contratação de um trabalhador a termo. 120º/3 procura objectivar
este requisito.
• Do jus variandi não pode resultar uma modificação substancial da posição do trabalhador (120º/1): um setor
da doutrina tem entendido que este requisito veda o recurso ao jus variandi para o desempenho de uma
função que corresponda a uma categoria inferior à do trabalhador; mas a maioria dos autores subscreve o
critério de FELICIANO DE RESENDE: haverá uma modificação substancial sempre que o trabalhador
seja colocado numa situação injustamente penosa, isto é, uma situação vexatória ou atentatória da sua
dignidade (independente da categoria a que formalmente corresponda a atividade solicitada). Para PALMA
RAMALHO, este requisito deve ser articulado com outros 2 critérios:
• Da afinidade mínima das funções: afasta-se o recurso ao direito quando a função exigida pelo
empregador não tenha qualquer conexão com a função habitual do trabalhador;
• Do estado de necessidade: ponderar em conjunto o interesse objetivo da empresa, que tem que
fundamentar o jus variandi, e o grau de sacrifício que decorre da variação para o trabalhador. Assim, o
interesse objetivo de gestão, que justifica o jus variandi, pode configurar-se como uma situação de
necessidade, que permite a violação de um direito alheio (direito do trabalhador à invariabilidade da
prestação) para prossecução de um interesse superior (o interesse de evitar os prejuízos que podem advir
para o empregador de não proceder à variação). Por isso, a medida admissível ao sacrifício imposto ao
trabalhador deve ser proporcional ao prejuízo previsível para o empregador, admitindo-se uma variação
mais significativa da função quando a necessidade do empregador seja mais grave ou mais urgente.

120º/2 - as partes podem acordar no alargamento ou na restrição do jus variandi, mas caduca ao fim de 2 anos se
não for aplicado. Para PALMA RAMALHO, o preceito presta-se, facilmente, a abusos (ex: renovação dos
referidos acordos antes de completado o prazo dos 2 anos; criação de situações artificiais de variação apenas para
evitar a caducidade dos acordos). Por isso, justifica-se a interpretação restritiva do preceito: possibilita tanto a
restrição como o alargamento do instituto, mas não a modificação do seu regime jurídico, o que obrigará à
verificação dos requisitos do instituto sempre que o empregador dele se pretenda prevalecer.
O 120º/2 não obsta a que os IRCT disponham sobre esta matéria - 120º/6.

Na falta de qualquer requisito, a desobediência do trabalhador é lícita.

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120º/4 - trabalhador mantém o direito à remuneração.


129º/1, d) e e) - o regime pretende acautelar as garantias da irredutibilidade da retribuição e da irreversibilidade
da categoria. Se o trabalhador for chamado a desempenhar uma função que corresponde a uma categoria
superior à sua, tem direito ao tratamento correspondente a essa função, de acordo com uma regra de
substancialidade (120º/4). O não pagamento da retribuição mais elevada não torna a variação ilegal, apenas
confere ao trabalhador um crédito salarial.
120º/5
Não correspondem a uma mudança de categoria nem se sujeitam à garantia da irreversibilidade da categoria as
situações de desempenho acessório de função afim da função nuclear (118º/2), nem as situações em que o
trabalhador é chamado temporariamente ao desempenho de uma função não correspondente ao objeto d seu
contrato (120º), mesmo se tal desempenho conferir ao trabalhador o direito a um tratamento mais favorável, pelo
facto de essas funções correspondem formalmente a uma categoria interna superior. Em suma, no desempenho
destas funções, o trabalhador tem direito ao tratamento mais favorável que lhes corresponda e não ao que
corresponde à sua categoria; mas, uma vez cessadas estas funções, o trabalhador volta a sujeitar-se ao tratamento
que corresponde à sua categoria, que, entretanto, se manteve. Ainda assim, esta regra pode ser afastada (120º/5,
primeira parte) - de categoria inferior para superior, não ao contrário (sob pena de atentar o princípio da
irreversibilidade da categoria - 129º/1, e).

II. POSICIONAMENTO DO TRABALHADOR NA ORGANIZAÇÃO DO EMPREGADOR


Relevante para o recorte da posição do trabalhador na organização empresarial: categoria normativa e categoria
interna à empresa (podem não coincidir absolutamente).
• Categoria interna: determinada com a atribuição, pelo empregador, de um determinado posto de trabalho ao
trabalhador no seio da sua organização (118º/1). Este posto de trabalho corresponde a uma certa posição na
escala hierárquica daquela organização ou empresa. Sujeita a variações:
• Promoção
• Despromoção

a) PRINCÍPIO DA IRREVERSIBILIDADE DA CATEGORIA


129º/1, e) - caráter imperativo.
Descida de categoria - 119º.
Subida de categoria - 406º/1 CC: exige o acordo das partes para a modificação.

b) ANTIGUIDADE: valoriza a integração ou o vínculo de pertença do trabalhador a uma dada organização,


desde o início da execução do contrato até à respetiva cessação. A antiguidade pode reportar-se à categoria
interna, identificando o tempo de permanência do trabalhador em determinada posição na hierarquia da
empresa.

Efeitos da antiguidade:
• Remuneratórios: diuturnidades (262º/2, b)
• Na carreira do trabalhador: pode determinar o direito a ser promovido à categoria superior.

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• Em situações de ausência do trabalhador: 255º/1 + 256º/1


• Na concessão de licenças: 317º/3, b)
• Em situações de redução e de suspensão do CT: 295º/2 + 65º/1 + 536º/3
• Em matéria de cessação do contrato: 366º/1, 372º e 379º + 391º/1 + 396º/1 e 2 + 363º/1, 371º/3 e 378º/2,
345º/1.

Contagem da antiguidade: 112º/6. PALMA RAMALHO considera que a formulação desta norma não é a mais
adequada: 1) o período experimental pode ser excluído pelas partes (111º/3); 2) as regras do CT sobre a
contagem do período experimental remetem para a prestação efectiva do trabalho (113º), enquanto o regime da
antiguidade valoriza a integração do trabalhador na organização do empregador e não aquela prestação. Por isso,
interpreta-se a norma no sentido de a contagem da antiguidade se iniciar não com a celebração do contrato, mas
com o começo da sua execução (112º/6 + 113º/1).
129º/1, j).

III. LOCAL DE TRABALHO


Local de trabalho: centro estável ou predominante do desenvolvimento da atividade laboral.
• 193º a 196º
• 129º/1, f) - garantia da inamovibilidade do trabalhador
• 193º/1 - determinado pelas partes
• 106º/3, b) - quando o CT não tem forma escrita. Quando não haja uma determinação expressa do local de
trabalho, ele retira-se implicitamente das declarações negociais ou por integração do CT, tendo em conta a
prestação laboral a executar.
• Uma vez determinado, o local de trabalho vincula o trabalhador (193º/1) - situação de falta o
desenvolvimento da atividade laboral fora desse local, salvo autorização do empregador.

Princípio da inamovibilidade: o local de trabalho só pode ser alterado por acordo das partes ou por determinação
unilateral do empregador (neste último caso, nas situações previstas na lei ou IRCT e mediante conjunto de
requisitos). Este princípio não se mete em questão nas situações de local de trabalho diluído ou externo e de
deslocações em serviço. Mesmo quando o local de trabalho seja fixo, o princípio não aponta para um espaço
físico determinado, mas para uma área organizacional ou empresarial - uma parte da doutrina considera
“transferências internas”; PALMA RAMALHO não fala sequer em transferência, porque o centro estável da
atividade na empresa não é alterado.

a) MODIFICAÇÃO DO LOCAL DE TRABALHO


Transferência do trabalhador é prevista em 2 tipos de situações:
• Modificação do local de trabalho de um trabalhador determinado (mudança individual): pode ocorrer a título
transitório ou definitivo; pode ter origem no acordo das partes, em determinação unilateral do empregador,
ou num pedido do trabalhador (194º/1, b) e 2) e 195º).
• Mudança do estabelecimento (mudança coletiva): transitória ou definitiva (194º/1, a) e 2).

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b) MODIFICAÇÃO INDIVIDUAL
Requisitos substanciais cumulativos (194º/1, b):
• Mudança deve ser justificada pelo interesse da empresa: este requisito deve ser apreciado em termos
objetivos (como um interesse de gestão); 196º/2
• Mudança não deve causar prejuízo sério ao trabalhador: a jurisprudência tem considerado que configura um
prejuízo sério quando acarrete desvantagens económicas ou pessoais para o trabalhador (e não quando
determine inconvenientes de ordem subjetiva). Tem sido admitida a relevância de um prejuízo meramente
virtual, a par do real, desde que objetivamente comportável. O ónus da prova do prejuízo sério deve recair
sobre o trabalhador.

194º/2 - permite que as partes alarguem ou restrinjam a possibilidade de transferência do trabalhador (caráter
supletivo do regime legal da modificação do local de trabalho) - cláusulas de mobilidade geográfica. No sentido
da natureza supletiva depõe ainda o 129º/1, f).
• Impõe-se uma interpretação das cláusulas contratuais nesta matéria particularmente cuidadosa e que atenda
aos valores da boa fé e do abuso do direito, nomeadamente condenando-se, à partida, o estabelecimento de
cláusulas de mobilidade excessivamente vagas ou que resultem na indeterminação do local de trabalho.
• 194º/2, parte final: os acordos caducam ao fim de 2 anos se não forem utilizados (visa evitar a eternização da
instabilidade da situação jurídica do trabalhador).
• 194º/6 - IRCT

Requisitos procedimentais e formais: 196º


194º/4 - parece estar fora do âmbito deste dever do empregador o pagamento das despesas de alojamento do
trabalhador (se o trabalhador tiver que mudar de casa, o empregador pagará essa mudança, mas não o acréscimo
da renda da nova casa relativamente à renda que o trabalhador pagava anteriormente).

➡ Preenchidos os requisitos substanciais e procedimentais, a decisão de mudança do local de trabalho


configura um direito do empregador que se sobrepõe ao acordo das partes, pelo que o trabalhador
deve obediência — > infração disciplinar. Caso contrário, ele pode recusar, ao abrigo do princípio
da inamovibilidade.
➡ Sobrevindo prejuízo sério da ordem de transferência individual e definitiva, o trabalhador pode
resolver o contrato, tendo direito à compensação da antiguidade (366º, 194º/5) - não é preciso
provar a culpa do empregador como no 394º. A norma deve ser interpretada com cuidado: o
trabalhador pode simplesmente não cumprir a ordem de transferência (não se devendo concluir que
ele apenas pode resolver o contrato por justa causa).

Traços específicos:
• 196º/1
• 194º/3; a lei não parece impedir que o trabalhador seja transferido mais do que uma vez a título temporário.
• 194º/4 - o dever que impende sobre o empregador de custear as despesas é mais amplo, porque a situação é
transitória, prevendo-se o regresso do trabalhador à situação anterior.

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• No caso da transferência temporária, a lei não prevê a possibilidade de resolução do CT. Ainda assim, pode
recusar a ordem, alegando prejuízo sério e, haja ou não, pode sempre resolver o contrato com justa causa
através do 394º/3, b).

Pode obrigar-se a aplicação cumulativa dos requisitos da mudança individual do local de trabalho (194º)
com os requisitos do jus variandi (120º), quando a exigência ao trabalhador de uma função diferente da atividade
contratada seja acompanhada da sua deslocação geográfica.
É possível prever a transferência do trabalhador como uma sanção disciplinar, designadamente em
IRCT, visto que 328º? Não: o princípio da inamovibilidade constitui uma garantia do trabalhador, que se impõe à
intervenção dos IRCT em matéria disciplinar (328º/2) e a modificação unilateral do local de trabalho só se
justifica por motivos de gestão e não por motivos disciplinares.

c) MUDANÇA DO ESTABELECIMENTO
• A modificação do local de trabalho decorre da mudança ou da extinção, total ou parcial, do estabelecimento,
mas, para efeitos desta norma, o termo “estabelecimento” deve ser interpretado em sentido amplo.
• Ao contrário do que sucede com a modificação individual do local de trabalho, a transferência do
trabalhador por força da mudança do estabelecimento não depende da ausência de prejuízo sério para o
trabalhador e já pressupõe o interesse da empresa, porque se reconduz a uma projeção de uma decisão de
gestão que ultrapassado o próprio CT.
• Também na mudança coletiva a lei prevê que as partes possam alargar ou restringir a faculdade de
transferência do trabalhador em sede do CT, caducando tal acordo ao fim de 2 anos se não tiver sido
executado (194º/2) - interpretação restritiva da norma porque a convenção das partes apenas poderá ir no
sentido de excluir a transferência do trabalhador, mas mesmo uma convenção deste tipo só faz sentido no
caso de transferência parcial do estabelecimento; 194º/6.
• Não se coloca a possibilidade de recusa da modificação do local de trabalho pelo trabalhador - se não aceitar,
pode resolver o contrato se a mudança lhe causar prejuízo sério e com direito à indemnização (194º/5). O
requisito do prejuízo sério é para a resolução do CT e não um requisito da próprio modificação do local de
trabalho. Mesmo na ausência de prejuízo sério, o trabalhador tem o 394º/3, b) e o 400º, sem direito a
indemnização.

194º/4 e 196º

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