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CENTRO UNIVERSITÁRIO AUGUSTO MOTTA

GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

BÁRBARA REGINA DOS SANTOS BEZERRA


FELLIPE DA SILVA ELLER DE ALMEIDA
GABRIEL VITOR DE SOUZA BARBOSA
MÁRCIO DE OLIVEIRA SANTOS
THAIS BORGES DA SILVA

Relato de Experiência de Urbana

RIO DE JANEIRO
2021
Em nosso trabalho, entrevistamos Gabriel Borges da Silva, pesquisador e
doutor em Ciências Sociais e professor de Direito, ex morador de Senador Camará
que durante a pandemia do COVID-19, realizou um trabalho junto aos moradores de
seu antigo local de moradia e identificou diversas nuances que a segregação
socioespacial trazia para os indivíduos daquele espaço, e, principalmente, como
eles compreendiam as adversidades do ambiente no qual viviam perante o período
pandêmico.
Em seu relato, Gabriel nos conta como os moradores não enxergavam o
coronavírus como uma verdadeira ameaça às suas vidas, já que, dentro da favela.
Em diversas falas, a frase que mais ouvia era “eu não posso deixar de trabalhar”. Os
moradores declararam que suas vidas não haviam mudado com a pandemia, pois
continuavam diariamente utilizando de transporte público lotado para deslocar-se
aos seus lugares de trabalho pois não tiveram a opção de realizar o isolamento, e
seguiam por duas ou mais horas de trajeto para chegar aos seus locais de trabalho.
Inclusive, um dos moradores relata que durante o isolamento, sua carga horário
aumentou no condomínio onde trabalhava para poder suprir a necessidade dos
condôminos que estavam em isolamento.
A retirada dos direitos desses indivíduos de poderem passar por esse
momento conturbado seguros em suas casas, causou um efeito onde os moradores
não temiam a crise de saúde e seguiam seu modo de vida dentro da favela
rotineiramente, até mesmo com os bailes, que para aqueles que já estavam
trabalhando a semana inteira para prestar serviço em outras regiões da cidade era
diversão sem nenhum risco.
No entanto, enquanto coronavírus não abalava a massa dos moradores da
favela, existe o chamado “caverão vírus”, como eles mesmo começaram a chamar,
que era uma preocupação real daquela população. Em meio a pandemia, Gabriel
informa que houveram diversas incursões policiais da favela, em uma delas um
pedreiro foi morto pelo caverão com um tiro na cabeça quando saía às 5 horas da
manhã para ir trabalhar. Esse era apenas um dos diversos casos que ele
contabilizou naquele período.
As investidas da polícia sempre trouxeram a sensação de perigo aos
moradores, e durante a pandemia até os poucos que puderam estar em isolamento
sofreram em suas casas, relatando a impossibilidade de manter a sanidade em tal
situação. Na favela as casas costumam ser muito próximas, toda circulação era
incômoda, e nos dias de operação policial tornavam-se ainda piores, pois o
isolamento somado aos tiros mexia com saúde mental dessas pessoas.
A opção de não ficar isolado e nem estimular o isolamento, principalmente por
fatores econômicos, foi praticamente uma unanimidade dos moradores, eles
precisam suprir suas necessidades básicas, e, portanto, trabalhar. Pessoas tiveram
que continuar trabalhando, não necessariamente em serviços essenciais, mas para
manter privilégios e a tranquilidade daqueles que podiam se manter em isolamento.
E daí, a idealização fatídica de que na favela o que poderia matar não era a Covid e
sim um tiro.
É preciso compreender a dinâmica de compreensão das realidades sociais e
dos fenômenos sociais que nele ocorrem. A forma como os indivíduos desse
ambiente segregado criam suas próprias regras de sobrevivência gira em uma
realidade completamente diferente, tendo a morte como uma consequência natural,
tanto por repressão do Estado ou pelo descaso já evidenciado. O processo
fragmentador imposto, inserindo, principalmente, classes sociais em espaços
urbanos distintos, frente a realidades opostas. Na favela vemos a marca da
insegurança, da precariedade e da falta de estrutura em diversos serviços, mas
precisamos falar sobre a violência que vem de fora, e chega para matar. Vivenciar
diariamente essa realidade sem uma perspectiva de mudança é adoecedor, e a
psicologia se faz fundamental no enfrentamento às diferenças com desenvolvimento
ambiental includente e socioeducador.

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