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Aspetos contabilísticos e fiscais das entidades do setor não lucrativo

Liliana Ivone da Silva Pereira


Instituto Politécnico do Cávado e do Ave
lsilva@ipca.pt

Maria de Lurdes Ribeiro da Silva


Instituto Politécnico do Cávado e do Ave
lsilva@ipca.pt

Cristiana Vendeiro Lopes


Instituto Politécnico do Cávado e do Ave
cristianalopes@live.com.pt

Área Temática: I - Setor Público e Não Lucrativo


Resumo:

As Entidades do Setor Não Lucrativo (ESNL) são compostas por grupos de pessoas que se

reúnem com o objetivo de tornarem uma sociedade mais humanitária e igual para todos, com

melhor educação e cultura, com o intuito de melhorarem o meio em que vivem. Devido à

disseminação e peso que estas entidades representam na economia, foram reforçadas as

obrigações de prestação de informação fidedigna sobre a gestão dos recursos que são confiados

pelos stakeholders. O SNC-ESNL, aplica-se às entidades privadas sem fins lucrativos, que

prosseguem atividades de caráter social e que não podem distribuir pelos seus membros

qualquer ganho económico ou financeiro. A nível fiscal, as ESNL estão sujeitas a variados

impostos, beneficiando também de algumas isenções. As entidades da economia social têm

obrigações e deveres contabilísticos e fiscais para cumprir, mas ao mesmo tempo também são

detentoras de incentivos fiscais.

Palavras Chave: Entidades do setor não lucrativo; Norma Contabilística e de Relato


Financeiro para Entidades do Setor não Lucrativo; Contabilidade; Fiscalidade

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Introdução:

As entidades do terceiro setor existem em todo o mundo, sendo o seu crescimento notório. No

atual contexto socioeconómico, verifica-se uma crescente importância deste Setor Não

Lucrativo (SNL) através do aumento de entidades e do crescente peso e dimensão que

desempenham na economia (Santos et al., 2015).

O terceiro setor abrange um vasto conjunto de entidades privadas, com personalidade jurídica,

criadas com o intuito de satisfazer as privações dos seus membros e produzindo bens ou

serviços, sem finalidade lucrativa. São exemplos de entidades que integram o terceiro setor: as

Entidades Sem Fins Lucrativos (ESFL), as Instituições Particulares de Solidariedade Social

(IPSS), as cooperativas, as fundações, as mutualidades, as misericórdias, entre muitas outras.

Estas entidades sociais diferenciam-se pela sua eficácia de atuação, substituindo os outros

setores, com uma solução criativa e económica de problemas sociais. Não tendo como

finalidade o lucro, não ficam expostas às diferentes forças de mercado, assim como,

pertencendo ao setor publico, não se encontram sujeitas às mesmas normas governamentais

(Magalhães, 2012; Rocha, 2013). Devido à crescente expansão das ESNL sentiu-se a

necessidade de reforçar as exigências de transparência no que respeita às suas atividades e aos

recursos que estas utilizam (Jesus & Costa, 2012).

Este é um trabalho com uma abordagem qualitativa onde predomina a pesquisa descritiva ao

normativo contabilístico e regulamentação fiscal. O trabalho tem como objetivo a análise às

entidades do terceiro setor, nomeadamente, no âmbito contabilístico e fiscal. Assim, o mesmo

está dividido e três pontos, sendo o primeiro dedicado à contextualização destas entidades na

economia, o segundo o seu enquadramento no âmbito contabilístico, nomeadamente, na norma

Contabilística e de Relato Financeiro para Entidades do Setor Não Lucrativo (NCRF-ESNL) e,

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por fim, uma breve abordagem aos principais aspetos fiscais destas entidades. O trabalho

termina com as principais conclusões.

1. As entidades do setor não lucrativo

A nível mundial, podemos verificar que a cada segundo que passa surgem inesperadamente

factos perturbadores e que inquietam os cidadãos, podendo estar relacionados com fatores de

natureza ambiental, política, económica e social. Estes acontecimentos interferem na vida das

comunidades, das organizações e dos cidadãos (Antão et al., 2012), fazendo surgir organizações

que devido à problemática de uma exclusão social crescente, num contexto de falência dos

mecanismos estatais, desenvolvem atividades económicas que não tem como princípio base o

lucro, mas englobam atividades produtivas que criam postos de trabalho e ao mesmo tempo

contribuem para o combate ao desemprego, geram rendimentos e satisfazem necessidades.

Além disso, promovem a coesão social, a luta contra a pobreza, a exclusão social, a igualdade

de oportunidades, valorizam a multiplicidade cultural e ambiental, sendo que tudo isto deve ser

baseado numa boa gestão e eficiência (Santos, 2010).

Estas ESNL recorrem a meios materiais, financeiros e humanos para conseguirem desenvolver

as suas atividades. No que diz respeito aos recursos materiais e financeiros, estes são compostos

por apoios de entidades externas, particularmente os financiadores e os doadores, estando quase

sempre dependentes destes apoios. Os recursos humanos são constituídos por colaboradores

que podem ser remunerados ou não remunerados, sendo estes últimos designados por

voluntários (Andrade & Franco, 2007).

Terceiro setor ou SNL são designações que normalmente são utilizadas quando nos queremos

referir a este tipo de organizações, no entanto, para além destas, existe um amplo número de

denominações que podem ser empregues, e que são utilizadas não só em Portugal, mas também

mundialmente (Andrade & Franco, 2007). Designações como organizações não-

governamentais sem fins lucrativos; organizações da sociedade civil; organizações

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filantrópicas; entidades não-governamentais; ESNL; setor sem fins lucrativos; setor

cooperativo; associativismo; e voluntariado são as mais comuns (Francisco, 2005). De um

modo mais amplo, a economia que abrange este setor pode ser referenciada como economia

social, economia comunitária, economia de interesse geral, e economia solidária (Muehombo,

2013), descrevendo-se, genericamente, como entidades que aplicam um amplo conjunto de

experiências em volta de novas formas de iniciativa e solidariedade (Filho, 2002). Partilhando

esta ideia, Muehombo (2013) define economia social como um conjunto de empresas privadas,

organizadas, com autonomia de decisão e liberdade de adesão, concebidas com o intuito de

colmatar as necessidades dos seus membros através do mercado, produzem bens e serviços

assegurando o seu financiamento e onde a tomada de decisão não está intimamente ligada ao

capital ou a quotizações.

Apesar de condicionados a estas divergências de conceitos e à falta de uma única definição

universal, temos de cair na realidade e fazer com que não se negue a criação e o

desenvolvimento destas organizações, uma vez que as ESNL são uma realidade em crescente

difusão na sociedade atual (Muehombo, 2013). É através da iniciativa dos cidadãos e do espírito

empreendedor que as ESNL resultam para eliminar as necessidades que as organizações

empresariais ou o Estado não conseguem satisfazer por motivos de ordem ideológica, religiosa,

altruísta e caritativa (Francisco, 2012).

Segundo Santos (2010), estas organizações desenvolvem, pelo menos, um dos seguintes

objetivos sociais: assistência social; cultura; defesa e conservação do património artístico,

cultural e histórico; serviços gratuitos de educação e saúde; serviços de segurança alimentar e

nutricionismo; defesa, preservação e conservação do meio ambiente; promoção do

voluntariado, do desenvolvimento económico e social e de combate à pobreza; promoção de

direitos estabelecidos; construção de novos direitos e assessoria jurídica; promoção da ética, da

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cidadania, da democracia e dos direitos humanos; esteja relacionado com estudos e pesquisas,

desenvolvimento de tecnologias, produção e divulgação de informações.

As ESFL são representadas por um vastíssimo grupo de entidades, das quais as mais

representativas em Portugal são:

 Associações - organizações constituídas por um conjunto de pessoas que se juntam para

prosseguir determinado fim onde os associados não se encontram obrigados a direitos e

obrigações recíprocas, mas, segundo as regras estabelecidas por eles, de modo a

poderem partilhar as vantagens da cooperação e o conjunto de objetivos e de vontades

apresentadas pelos diversos membros (Carvalho, 2007).

 Fundações – O elemento fulcral destas entidades é o património afeto a um fim, em que

se deve assegurar que este é suficiente para a sua prossecução. As fundações assentam

num objetivo a concretizar, instituído pelo fundador (Rocha, 2013).

 Cooperativas – são entidades, pessoas coletivas autónomas, de livre constituição, de

capital e composição variável, que através da cooperação e entreajuda dos seus

membros, com obediência aos princípios cooperativos, visam, sem fins lucrativos, a

satisfação das necessidades e aspirações económicas, sociais ou culturais daqueles (Lei

n.º 51/96, de 7 de setembro).

 Associações Mutualistas – são constituídas por um número ilimitado de associados,

capital indeterminado e duração indefinida que, essencialmente através da quotização

dos seus associados, praticam, no interesse destes e das suas famílias, fins de auxílio

recíproco (DL n.º 72/90, de 3 de março).

 IPSS - são pessoas coletivas, sem finalidade lucrativa, constituídas exclusivamente por

iniciativa de particulares, com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral

de justiça e solidariedade, contribuindo para a efetivação dos direitos sociais dos

cidadãos, desde que não sejam administradas pelo Estado ou por outro organismo

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público, regendo a sua implementação pelos princípios orientadores da Economia Social

(DL nº 119/83, de 25 de fevereiro).

2. A Contabilidade no contexto das Entidades Sem Fins Lucrativos


Serão descritos neste ponto, de uma forma resumida, os principais aspetos contabilísticos

relacionados com as entidades que compõem o SNL.

2.1- Enquadramento

O Sistema de Normalização Contabilística (SNC), publicado pelo DL n.º 158/2009, de 13 de

julho surgiu com o objetivo de homologação das normas internacionais de contabilidade em

Portugal, adotadas pela União Europeia (UE), nos termos do regulamento n.º 1606/2002, de 19

de julho, tendo revogado o Plano Oficial de Contabilidade e legislação complementar.

O DL 36-A/2011, de 9 de março surgiu pela necessidade de uma disposição sólida no que

respeita a aspetos concetuais, critérios de reconhecimento e mensuração, respondendo às

exigências de relato financeiro. Esta normativa veio criar de regras contabilísticas próprias e

adequadas a entidades que prossigam, a título principal, atividades sem fins lucrativos e que

não possam distribuir pelos seus membros qualquer ganho económico ou financeiro direto,

assegurando uma correta prestação de contas aos utilizadores da informação (Marcelo, 2012;

Trindade, 2013),

Com sucessivas alterações aos DL 36-A/2011, de 9 de março, surge no ano de 2015 o DL n.º

98/2015, de 2 de junho, que passou a incorporar no SNC a NCRF-ESNL.

2.2 – Instrumentos que compõem o SNC-ESNL

O Sistema estabelecido pelo SNC-ESNL é composto pelos seguintes instrumentos:

2.2.1 Bases para apresentação das Demonstrações Financeiras

As Bases para apresentação das Demonstrações Financeiras apresentam como função a

regulação dos requisitos que permitem assegurar a comparabilidade, quer com as

Demonstrações Financeiras de períodos anteriores da mesma entidade, quer com as de outras

entidades (Antão et al., 2012; Tavares et al., 2014).


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As Demonstrações Financeiras são uma representação estruturada da posição e desempenho

financeiro de uma entidade. Um conjunto completo de Demonstrações Financeiras inclui um

Balanço (ativos; passivos; Fundos patrimoniais), uma Demonstração dos Resultados

(rendimentos e ganhos), uma Demonstração dos Fluxos de Caixa, uma Demonstração das

Alterações nos Fundos Patrimoniais e um Anexo. Uma vez que o objetivo destas é apresentar

apropriadamente a posição financeira, o desempenho financeiro e os fluxos de caixa, exige-se

que haja uma representação fidedigna dos efeitos das transações, outros acontecimentos e

condições de acordo com as definições e critérios de reconhecimento estabelecidos na NCRF-

ESNL (Antão et al., 2012; Araújo et al., 2012; Tavares et al., 2014).

No contexto que se afigura, de modo a que os objetivos sejam atingidos, torna-se imprescindível

respeitar os pressupostos de continuidade; regime do acréscimo ou da periodização económica;

consistência de apresentação; materialidade e agregação; compensação; informação

comparativa.

2.2.2 Código de contas

A alteração no código de contas decorrente da Portaria n.º 218/2015, de 23 de julho, reflete-se

numa estruturação do código de contas específico para as ESF, coincidente com o código de

contas do regime geral do SNC, contando apenas com a introdução de algumas contas dirigidas

especificamente às ESFL, assim como de um quadro síntese e notas de enquadramento às contas

publicadas.

2.2.3 Modelos de Demonstrações Financeiras

Em 2015, decorrente das alterações publicadas no DL 98/2015, de 2 de junho, a informação a

ser apresentada no Balanço e na Demonstração dos Resultados pode ser, excecionalmente,

apresentados itens adicionais para facilitar a compreensão da posição financeira. Define-se

ainda que sempre que não existam quantias a apresentar, as linhas correspondentes do Balanço

devem ser eliminadas.

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Ainda no que se refere ao Balanço, uma entidade deve apresentar como classificações separadas

os ativos correntes e não correntes e os passivos correntes e não correntes. Os itens a apresentar

na Demonstração dos Resultados deverão basear-se numa classificação que atenda à natureza

ou função de uma transação e não à frequência. No que respeita às notas do Anexo, estas devem

ser apresentadas de uma forma sistemática, sendo que cada item constante no Balanço ou na

Demonstração dos Resultados que tenha merecido uma nota no Anexo, deve ter uma referência

cruzada.

2.2.4 NCRF-ESNL

A NCRF-ESNL foi publicada pelo Aviso n.º 6726-B/2011, de 14 de março, alterada pelo DL

98/2015, de 2 de junho, sendo homologada pelo Aviso n.º 8259/2015, de 29 de julho.

Apresenta-se com uma estrutura muito semelhante à da Norma Contabilística de Relato

Financeiro para Pequenas Entidades (NCRF-PE), podendo-se até considerar como uma

transposição desta com as devidas adaptações às ESFL (Magalhães, 2012; Antão et al., 2012;

Santos et al., 2015).

Dada a extensão das matérias contempladas na norma, iremos apenas abordar as matérias que

sofreram alterações mais recentes.

Assim, foi alterada a aplicação das alterações das políticas contabilísticas, as quais passam a

ser aplicadas retrospetivamente. Foram ainda incluídos os capítulos 19 (Acontecimentos após

data de Balanço) e 20 (Agricultura); foi, igualmente, incluído um parágrafo referindo que as

propriedades de investimentos são reconhecidas como ativo fixo tangível; os ativos intangíveis,

ainda que com vida útil indefinida, são amortizados num período máximo de 10 anos. Ao nível

dos custos de empréstimos obtidos que sejam diretamente atribuíveis à aquisição, construção

ou produção de um ativo que se qualifica, é obrigatório que estes custos sejam imediatamente

considerados como parte do custo do ativo que se qualifica. No âmbito dos instrumentos

financeiros, passa a considerar-se os investimentos em subsidiárias, associadas e

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empreendimentos conjuntos. Neste âmbito, foi ainda acrescentada a forma de mensuração das

perdas por imparidade em ativos financeiros, assim como a proibição de reversão de perdas por

imparidades em instrumentos de capital próprio de uma outra entidade que não sejam

negociados publicamente.

2.2.5 Normas Interpretativas

Em 2015, foi publicado o Aviso n.º 8258/2015, de 29 de julho, com a homologação das normas

interpretativas, contudo, a informação publicada não tem aplicação para as ESFL.

2.3 - Entidades dispensadas do SNC-ESNL: Opção pelo regime de caixa

Atendendo à diversidade de entidades que compõe o SNL, entendeu o legislador, conforme

descreve no art. 10º n.º 1 do DL n.º 36-A/2011, de 9 de março, substituído pelo art. 10º n.º 2 do

DL n.º 98/2015, de 2 de junho, dispensar da aplicação da normalização contabilística as ESFL

quando as suas vendas e outros rendimentos não excedam, em nenhum dos dois exercícios

anteriores, € 150.000,00, sendo que no período de início de atividade, o limite referido reporta-

se ao valor anualizado do total dos rendimentos estimados.

No caso do limite referenciado ser atingido, cessa a dispensa da aplicação da normalização

contabilística, ficando a entidade obrigada a partir do exercício seguinte, inclusive, a aplicar a

normalização contabilística para as ESFL. Contudo, esta norma não se aplica nos casos em que

as entidades integrem o perímetro de consolidação de uma entidade que apresente DF

consolidadas ou estejam obrigadas à apresentação de qualquer das DF referidas nos decretos

supramencionados.

Ainda com base nos princípios acima mencionados, as ESNL que estejam enquadradas no

âmbito dos pressupostos que induzem à dispensa supramencionada do SNC-ESNL, ficam

obrigadas, no caso de aceitação da dispensa, à prestação de contas em regime de caixa (art. 10º

n.º 4 do DL n.º 98/2015, de 2 de junho).

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Resumidamente, este regime foi estabelecido com o intuito de dispensar as ESFL de pequena

dimensão de um conjunto de obrigações, todavia, a decisão final da opção pelo SNC-ESNL ou

pelo regime de caixa cabe às ESFL.

A aplicação deste regime impõe na prestação de contas a divulgação da informação respeitante

aos pagamentos e recebimentos, ao património fixo e aos direitos e compromissos futuros. Esta

informação é obtida através dos mapas financeiros, aprovados na Portaria n.º 105/2011, de 14

de março, aditado pelo Anexo 17 da Portaria n.º 220/2015, de 24 de julho.

De notar que esta Portaria prescreve os modelos de mapas financeiros, no entanto, não

contempla quaisquer disposições acerca dos critérios de reconhecimento e mensuração dos

respetivos itens, situação que poderá prejudicar a qualidade e comparabilidade destes mapas,

uma vez que é suscetível de diferentes interpretações (Araújo et al., 2012).

Para melhor entendermos este regime, iremos de seguida analisar os modelos de mapas

financeiros que fazem parte da prestação de contas em regime de caixa.

2.4 - Prestação de contas

As necessidades e exigências em se querer mais e melhor informação sobre as ESFL podem ser

supridas mediante um processo de prestação de contas, através do qual as entidades

disponibilizam informação fidedigna sobre a gestão dos fundos que lhe são confiados, bem

como sobre os resultados obtidos no decorrer da atividade a todos os seus interessados. Assim,

o ato de prestar contas, para além da divulgação de informação consiste em reconhecer e

assumir com responsabilidade e transparência os impactos das políticas, decisões, ações,

produtos e desempenho a ele associados (Araújo et al., 2012).

Uma prestação de contas completa inclui, pelo menos, um plano de atividades; um orçamento;

um relatório de atividades; um conjunto de DF (um Balanço, uma Demonstração dos

Resultados, uma Demonstração dos Fluxos de Caixa, um Anexo e, por opção ou por exigência,

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uma Demonstração das Alterações nos Fundos Patrimoniais); uma certificação legal das contas,

se aplicável; e um parecer do órgão de fiscalização, quando exista.

O plano de atividades é um documento estruturante que em conjunto com o orçamento permite

alcançar visibilidade e garantir um acompanhamento das atividades a desenvolver ao longo do

novo exercício económico. Um orçamento bem elaborado e que esteja em harmonização com

o plano de atividades (criado com base em pressupostos e projeções financeiras) assume-se

como uma importante ferramenta de gestão (Araújo et al., 2012). Segundo os mesmos autores,

o relatório de atividades tem como função principal discriminar os objetivos atingidos, o grau

de realização das atividades e os recursos utilizados.

As Demonstrações Financeiras completam o processo do relato financeiro e destinam-se a

satisfazer as necessidades da maioria dos utilizadores, proporcionando informação acerca da

posição financeira, das variações desta e dos resultados das operações (Araújo et al., 2012).

Já no caso das entidades dispensadas e que não optem pela aplicação da normalização

contabilística para as ESNL, estas terão de apresentar as contas em regime de caixa e por

conseguinte, divulgar a informação através dos mapas de pagamentos e recebimentos, de

património fixo e de direitos e compromissos futuros (Antão et al., 2012).

3 – Aspetos fiscais das ESNL

As ESFL, apesar de não prosseguirem atividades que visem o lucro, ou pelo menos não o

fazerem a título principal, são entidades sujeitas a diversos impostos, acabando, no entanto, por

beneficiar, em alguns casos, de um tratamento fiscal mais favorável, assente em benefícios

fiscais, o que reconhece as suas funções de utilidade pública e interesse geral. Não existe, no

ordenamento jurídico português, um regime fiscal que concentre toda a informação dos

benefícios e isenções aplicáveis a este setor, encontrando-se o enquadramento fiscal destas

entidades disperso pelos vários códigos fiscais e alguma legislação avulsa (Antão et al., 2012).

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3.1 – Impostos sobre o Rendimento

O Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) incide sobre o rendimento da

generalidade das pessoas coletivas, independentemente do seu fim lucrativo ou não, desde que

enquadradas na definição de sujeito passivo, conforme resulta dos artigos 1.º e 2.º do Código

do IRC (CIRC). O legislador faz, no entanto, uma importante distinção: por um lado, as

sociedades comerciais, que exercem a título principal uma atividade económica e têm uma

finalidade lucrativa, que são tributadas sobre o lucro obtido no período de tributação (art. 3.º,

n.º 1, al. a) CIRC); por outro, as entidades que não exercem a título principal uma atividade

económica, que não têm ânimo de lucro, onde se inserem as ESFL, que são tributadas sobre o

rendimento global que resulta da soma algébrica dos rendimentos líquidos das várias categorias

consideradas para efeitos de IRS (art. 3.º, n.º 1, al. b) CIRC). A tributação, no entanto,

acontecerá apenas para as entidades que não gozem de isenção, estando reconhecidas, no artigo

10.º do CIRC algumas isenções de que podem beneficiar as ESFL. Assim, por força do art. 10º

n.º 1, al. a) e b) do CIRC, são sujeitos passivos isentos de IRC as pessoas coletivas de utilidade

pública administrativa, as IPSS e pessoas coletivas legalmente equiparadas, cuja isenção é

automática. Com base na al. c) do mesmo artigo estão isentas de IRC as pessoas coletivas de

mera utilidade pública que prossigam fins científicos, culturais, de caridade, assistência,

beneficência, solidariedade social e defesa do meio ambiente. Neste último caso a isenção é

condicionada, carecendo de reconhecimento prévio por parte da Autoridade Tributária (AT), a

requerimento dos interessados, mediante despacho publicado no Diário da República, que

define a respetiva amplitude, de harmonia com os fins prosseguidos e as atividades

desenvolvidas para a sua realização, conforme refere o art. 10.º n.º 21. Estas isenções não

abrangem, no entanto, os rendimentos empresariais derivados do exercício de atividades

1Para além disso, estas isenções do artigo 10.º, n.º 1 do CIRC, estão dependentes do cumprimento dos requisitos estabelecidos
nas alíneas do nº 3 do art. 10º do CIRC.

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económicas realizadas fora do âmbito dos fins estatutários assim como os rendimentos de títulos

ao portador (n.º 3 do art. 10.º CIRC). De salientar que, no caso das ESFL a quem a isenção é

reconhecida automaticamente, terão que ser elas a determinar se existem ou não estes

rendimentos obtidos em atividades económicas realizadas fora dos fins estatutários, os quais

não estão abrangidos pela isenção. No caso das ESFL cuja isenção tem que ser requerida, o

despacho que definirá o âmbito da isenção acabará por definir quais os rendimentos que ficam

isentos e os que, por decorrerem de atividades fora dos fins estatutários, não gozam do

benefício.

Para além disso, o artigo 11.º do CIRC isenta os rendimentos de atividades culturais, recreativas

e desportivas obtidos por associações legalmente constituídas para o exercício dessas

atividades. Também esta isenção é condicionada à verificação dos requisitos do art. 11.º, n.º 2

e não abrange os rendimentos decorrentes do exercício de qualquer atividade comercial,

industrial ou agrícola, ainda que exercida a título acessório, designadamente rendimentos de

publicidade, de imóveis, de aplicações financeiras e de jogo do bingo. Acrescente-se o art. 54.º

do EBF isenta de tributação em IRC os rendimentos brutos considerados sujeitos a tributação,

obtidos pelas entidades enquadradas no art. 11º do CIRC desde que não excedam o montante

de € 7.500,00.

Figura 1 - Esquema das isenções existentes para ESNL

Fonte: Santos et al. (2015, p. 98)

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Adicionalmente, no âmbito da determinação do rendimento global consideram-se rendimentos

isentos os incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito, destinados à realização de fins

estatutários, como por exemplo doações de que sejam beneficiárias (art. 54.º n.º 4 CIRC) e

consideram-se como rendimento não sujeito a IRC as quotas pagas pelos associados em

conformidade com os estatutos, bem como os subsídios destinados a financiar a realização de

fins estatutários (art. 54.º n.º 3,CIRC).

Nos termos do art. 15.º, n.º 1, al. b) do CIRC, a matéria coletável destes sujeitos passivos obtém-

se através da dedução ao rendimento global e incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito

dos gastos comuns imputáveis ao rendimento sujeito a imposto e dele não isento e ainda dos

benefícios fiscais existentes. No âmbito da determinação do rendimento global serão tidos em

consideração os rendimentos líquidos das diversas categorias (B, E, F e G)2 previstas nos termos

do IRS, incluindo os incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito3.

Assim, a primeira fase do processo de apuramento de IRC passa pela determinação do

rendimento global sujeito a imposto, sendo necessário identificar os gastos específicos de cada

categoria, que serão considerados na determinação do respetivo rendimento líquido.

Relativamente aos restantes gastos das ESFL, temos que: se estiverem apenas relacionados com

rendimentos isentos ou não sujeitos, não serão considerados na medida em que os rendimentos

associados não são objeto de tributação4; se estiverem apenas relacionados com a obtenção de

rendimentos sujeitos e não isentos, são deduzidos na totalidade ao rendimento global; caso

estejamos perante gastos comuns, ou seja, ligados à obtenção de rendimentos sujeitos e não

isentos, bem como à de rendimentos não sujeitos ou isentos, deduz-se ao rendimento global a

2 As categorias A e H (rendimentos do trabalho dependente e pensões), face à sua natureza não contribuem para o rendimento
global das entidades que não exercem a título principal atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola.
3 Considera-se como valor de aquisição o seu valor de mercado, não podendo ser inferior ao que resultar da aplicação das regras

de determinação do valor tributável previstas no CIS, conforme art. 21.º n.º 2, CIRC.
4 Em princípio, se o rendimento é afastado de tributação (isentos e não sujeitos), os gastos também são, exceto no caso do n.º

7 do art. 53.º do CIRC segundo o qual ao rendimento global são dedutíveis, até à respetiva concorrência, os gastos
comprovadamente relacionados com a realização dos fins de natureza social, cultural, ambiental, desportiva ou educacional
prosseguidos por essas pessoas coletivas ou entidades, desde que não exista qualquer interesse nos resultados da exploração
das atividades económicas por elas prosseguidas.

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parte dos gastos comuns que for imputável aos rendimentos sujeitos e não isentos (art. 54.º do

CIRC). Esta imputação dos gastos comuns faz-se, nos termos do n.º 2 deste artigo, através da

repartição proporcional desses gastos ao total dos rendimentos brutos sujeitos e não isentos e

dos rendimentos não sujeitos ou isentos, ou de acordo com outro critério considerado mais

adequado aceite pela AT.

Havendo matéria coletável, sobre esta incide a taxa de 21%, nos termos do art. 87.º, n.º 5 do

CIRC, coincidindo, atualmente, com a taxa geral de IRC que se aplica também às sociedades

comerciais e outras pessoas coletivas.

Já no que se refere a tributações autónomas, as ESFL estão também sujeitas ao pagamento de

tributações autónomas, mesmo que apenas tenham rendimentos isentos ou não sujeitos a IRC.

Assim, as ESFL podem estar sujeitas às seguintes tributações autónomas5: despesas não

documentadas, à taxa de 70% (n.º 2); despesas de representação, à taxa de 10% (n.º 7);

importâncias pagas a não residentes submetidos a um regime fiscal mais favorável, à taxa de

55% (n.º 8); encargos relativos a ajudas de custos e compensação pela deslocação em viatura

própria do trabalhador, à taxa de 5% (n.º 9).

As entidades do terceiro setor, mesmo estando abrangidas pelas isenções, enquanto sujeitos

passivos de IRC têm também o dever de cumprir algumas obrigações declarativas. Desde logo

estão sujeitas à obrigação de declarar o início de atividade, de comunicar alterações e de

declarar a cessão de atividade, nos termos dos artigos 117.º, n.º 1, al. a), 118.º e 119.º do CIRC.

No que respeita à apresentação da declaração periódica de rendimentos (mod. 22), as ESFL

estão atualmente obrigadas à sua apresentação, nos termos e prazos normais, ainda que sejam

sujeitos passivos totalmente isentos ou com rendimentos não sujeitos a IRC, conforme decorre

dos artigos 117.º, n.º 1, al. b) e 120.º. No caso de existirem rendimentos isentos, assim como

quando exista rendimento global a calcular, estas entidades têm que preencher o Anexo D da

5 As taxas de tributação autónoma previstas no artigo 88.º são elevadas em 10% nos casos em que os sujeitos passivos
apresentem prejuízo fiscal no período a que respeitem quaisquer dos factos tributários.

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declaração anual. Da mesma forma, as ESFL estão obrigadas a apresentar a declaração anual

de informação contabilística e fiscal (IES), nos termos do art. 121.º do CIRC.

No que respeita ao pagamento de IRC, de salientar que as ESFL não têm que realizar pagamento

por conta nem pagamento especial por conta uma vez que não exercem a título principal uma

atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola (art. 104.º e 106.º, CIRC).

Finalmente, no âmbito do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares

(CIRS), as ESFL, enquanto pagadoras de rendimentos sujeitos a retenção na fonte, estão

obrigadas a efetuar as respetivas retenções e a comunicá-las, nos termos gerais do CIRS.

3.2 - Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA)

As ESNL, como pessoas coletivas que exercem atividades económicas, são sujeitos passivos

de IVA, encontram-se obrigadas ao cumprimento das disposições estabelecidas no Código do

IVA (CIVA). Contudo, verificamos que grande parte das atividades desenvolvidas por estas

entidades da economia social beneficiam de isenção, embora sejam isenções incompletas, ou

seja, não liquidam IVA mas também não têm direito a deduzir o IVA suportado a montante.

As ESFL na qualidade de consumidoras não têm direito a qualquer isenção, no entanto, de

acordo com o descrito no art. 9.º do CIVA, enquanto prestadoras de serviços são contempladas

com isenções objetivas, relativamente a certos serviços prestados, tais como:

 Serviços ligados à segurança e assistência sociais efetuadas pelo sistema de segurança

social, incluindo as IPSS (n.º 6);

 Creches, jardins-de-infância, estabelecimentos para crianças e jovens deficientes,

centros de reabilitação, lares de idosos, centros de dia e centros de convívio, colónias

de férias, albergues de juventude ou outros equipamentos sociais pertencentes a pessoas

coletivas de direito público ou a IPSS (n.º 7);

17
 Serviços efetuados por organismos sem finalidade lucrativa (OSFL) que explorem

instalações destinadas à prática de atividades artísticas, desportivas, recreativas e de

educação física (n.º 8);

 Locações de livros e outras publicações, partituras musicais, discos, bandas magnéticas

e outros suportes de cultura, desde que efetuadas por OSFL (n.º 12);

 Visitas, guiadas ou não, a bibliotecas, arquivos, museus, galerias de arte, castelos,

palácios, monumentos, parques, perímetros florestais, jardins botânicos, zoológicos e

semelhantes, pertencentes ao Estado ou OSFL (n.º 13);

 Congressos, colóquios, conferências, seminários, cursos e manifestações análogas de

natureza científica, cultural, educativa ou técnica, efetuados por pessoas coletivas de

direito público e OSFL (n.º 14);

 As prestações de serviços efetuadas no interesse coletivo dos seus associados por

organismos sem finalidade lucrativa, desde que esses organismos prossigam objetivos

de natureza política, sindical, religiosa, humanitária, filantrópica, recreativa, desportiva,

cultural, cívica ou de representação de interesses económicos e a única contraprestação

seja uma quota fixada nos termos dos estatutos (n.º 19);

 Manifestações ocasionais destinadas à angariação de fundos (n.º 20).

Grande parte destas isenções apenas se aplicam às atividades descritas mas quando realizadas

por OSFL, considerando-se como tais os que cumpram cumulativamente os requisitos do artigo

10.º do CIVA, ou seja: não distribuam lucros e os seus corpos gerentes não tenham, por si ou

interposta pessoa, algum interesse direto ou indireto nos resultados da exploração; disponham

de escrituração que abranja todas as suas atividades e a ponham à disposição dos serviços

fiscais; pratiquem preços homologados pelas autoridades públicas ou, não havendo

homologação, preços inferiores aos exigidos pelas empresas comerciais sujeitas de imposto;

não entrem em concorrência direta com sujeitos passivos do imposto. Importa notar que o

18
conceito de OSFL é próprio do IVA, ao contrário das IPSS e pessoas de utilidade pública que

se regem por estatutos e regulamentos próprios (Antão et al., 2012; Ribeiro & Santos, 2013). A

qualificação de OSFL deve ser efetuada à luz da finalidade por ele prosseguida, não devendo

ter como objetivo gerar lucros a favor dos membros, ainda que procure gerar excedentes que

depois afeta à execução das suas prestações (contrariamente às empresas comerciais cujo fim é

obter lucros a fim de os distribuir pelos seus membros). Refere al. d) do art. 10.º do CIVA, que

os OSFL estão condicionados à observância, entre outras condições, de não estarem em

concorrência direta com sujeitos passivos de imposto. Assim, importa que a atividade

desenvolvida não se insira no âmbito do mercado concorrencial, submetida à lógica do mercado

e da livre concorrência. Neste âmbito, não deve, nomeadamente, servir a mesma zona

geográfica, o mesmo mercado e coletividade, ficando, por consequência, excluída a

concorrência direta com outras empresas comerciais sujeitas a IVA, que desenvolvam a mesma

atividade.

Note-se que hoje, no âmbito do chamado marketing social, muitas ESFL procuram outras

atividades complementares como forma de obtenção de novas receitas. Tratando-se de

manifestações ocasionais, que possam ser consideradas no âmbito da isenção do art. 9.º, n.º 20

do CIVA6, os rendimentos obtidos nessas atividades ocasionais gozarão de isenção de IVA. No

entanto, se se tratar de atividades empresariais (comerciais, industriais, prestações de serviços)

não abrangidas por qualquer das isenções do artigo 9.º do CIVA, praticadas de forma habitual

e reiterada, estarão sujeitas a IVA nos termos normais, fazendo com que as ESFL possam,

nestes casos, ser sujeitos passivos mistos.

6 Nos termos do Despacho Normativo 118/85, para efeitos da isenção do n.º 20 do artigo 9.º do CIVA, é fixado em 8 o número
anual de manifestações ocasionais promovidas por estas entidades; a isenção referida incidirá não só sobre o direito de acesso
às manifestações e aos espetáculos realizados, mas também sobre o conjunto das receitas recebidas pelas entidades beneficiárias
relativamente às diversas operações efetuadas nessa ocasião, como, por exemplo, bufete, bar, aluguer de stands, venda de
programas, lembranças, receitas publicitárias, etc.; deverão as entidades referidas participar previamente tal facto à repartição
de finanças da área da sede, indicando, nomeadamente, o local, a data e o género de manifestação a realizar.

19
Assim, as ESFL, quando conjugam atividades isentas de IVA, que não conferem direito à

dedução, e atividades sujeitas e que, como tal, permitem a dedução do IVA suportado,

assumem-se como sujeitos passivos mistos, tendo que se reger, no que respeita ao direito à

dedução do IVA suportado na compra de bens e serviços de utilização mista, pela disciplina do

artigo 23.º do CIVA, adotando um dos métodos de dedução parcial: pro rata ou afetação real.

Finalmente, saliente-se que, apesar da impossibilidade de deduzir o imposto suportado na

aquisição de bens e serviços, quando sejam totalmente isentos de IVA, algumas ESFL têm

gozado da possibilidade de obter o reembolso do IVA suportado nalgumas despesas. O

Orçamento de Estado para 2017 (Lei 42/2016, de 28/12), no seu art. 239.º, contempla,

novamente, a possibilidade de às IPSS ser restituída parte do IVA gasto em serviços de

construção, manutenção e conservação de imóveis; ativos fixos tangíveis, à exceção de viaturas

e respetivas reparações; e na aquisição de géneros alimentares, bebidas ou serviços de

alimentação.

No que respeita às obrigações em sede de IVA, saliente-se que, tal como referido no âmbito do

CIRC, as ESFL estão obrigadas a apresentar declaração de início de atividade, de alterações e

de cessação de atividade (art. 29.º, 31.º, 32.º e 33.º do CIVA). Quando à obrigação de entrega

da declaração periódica do IVA, esta apenas se verifica caso não sejam sujeitos passivos

totalmente isentos (art. 29.º, n.º 1, al. c) e n.º 3, al. a) do CIVA). Quanto à emissão de faturas,

se forem sujeitos passivos totalmente isentos pelo art. 9.º do CIVA, as ESFL estão dispensadas

da obrigação de emissão de fatura (art. 29.º, n.º 1, al. b) e n.º 3, al. a) do CIVA). No entanto, se

forem sujeitos passivos mistos, ficam obrigados à emissão de faturas.

3.3 – Outros impostos

Para as ESNL podem, ainda, identificar-se isenções em sede de tributação do património,

nomeadamente ao nível do Imposto Municipal de Imóveis (IMI), do Imposto Municipal sobre

20
as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e do Imposto do Selo (IS), como também no

âmbito do Imposto sobre Veículos (ISV) e do Imposto Único de Circulação (IUC).

O IMI incide sobre o valor patrimonial tributário dos prédios situados em território nacional,

constituindo receita dos municípios onde os mesmos se localizam. Segundo o art. 8.º do Código

do IMI (CIMI) é sujeito passivo deste imposto o proprietário7 do prédio em 31 de dezembro do

ano a que o imposto respeita. Ao abrigo do art. 44.º do EBF, um conjunto alargado de ESNL

estão abrangidas por isenção neste imposto, para prédios ou partes de prédios que se destinem

diretamente à realização dos seus fins estatutários, salvo no que respeita às Misericórdias, caso

em que a isenção abrange todos os prédios8. Contudo, a isenção cessa logo que deixem de se

verificar os pressupostos que determinaram a respetiva isenção (n.º 10 do art. 44.º do EBF),

devendo as ESFL comunicar tal facto à AT nos termos do art. 13.º do CIMI.

O IMT, segundo o disposto nos art. 1.º e 2.º do Código do IMT (CIMT), incide sobre as

transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade sobre bens imóveis situados em

território nacional e figuras parcelares desse direito, sendo devido por pessoas singulares ou

coletivas a quem se transmitam os bens. À semelhança do IMI, este imposto também contempla

isenções para as diversas ESNL no art. 6.º do CIMT, quanto aos bens destinados diretamente à

realização dos seus fins estatutários9.

No que respeita ao IS, este incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e

outros factos previstos na Tabela Geral do CIS, incluindo as transmissões gratuitas de bens. No

7 Nos casos de usufruto ou de direito de superfície é sujeito passivo de imposto o usufrutuário ou o superficiário.
8 As isenções são reconhecidas pelo chefe do serviço de finanças da área da situação do prédio, após apresentação de
requerimento devidamente documentado, no prazo de 60 dias contados da verificação do facto determinante da isenção (n.º 8
do art. 44.º do EBF).
9 Este tipo de isenção é de reconhecimento automático, competindo a sua verificação e declaração ao serviço de finanças onde

for apresentada a declaração mod. 1 de IMT, antes do ato ou do contrato que originou a transmissão (art. 10.º, n.º 8, al. a) do
CIMT). Tais isenções ficam sem efeito quando os imóveis forem vendidos ou lhes for dado outro destino sem autorização
prévia do Ministro das Finanças, autorização que só será de conceder quando se verificar a impossibilidade ou se reconhecer a
inconveniência de aos bens ser dado o primitivo destino e o novo destino desses bens ou dos adquiridos com o produto da sua
venda justificar igualmente a isenção (n.º 1 e 2 do art. 11.º do CIMT).

21
que concerne a isenções em IS, o art. 6.º do CIS prevê uma isenção subjetiva para as IPSS e

entidades legalmente equiparadas, quando este imposto constitua seu encargo10.

No âmbito da tributação sobre veículos, o ISV é um imposto que incide sobre a primeira

matriculação de um veículo em Portugal e é pago uma única vez. Nos termos do art. 52.º do

Código do ISV (CISV), as IPSS estão isentas deste imposto na aquisição de viaturas de

transporte de passageiros com lotação de nove lugares, incluindo o condutor, em estado novo,

desde que se destine ao transporte em atividades de interesse público e que se mostrem

adequados à sua natureza e finalidades, desde que, em qualquer caso, possuam um nível de

emissão de CO2 até 180 g/km11.

No que diz respeito ao IUC, segundo o art. 2.º do Código do IUC (CIUC), a sua incidência recai

sobre diversos veículos matriculados ou registados em Portugal, sendo os sujeitos passivos

deste imposto os proprietários do veículo. As IPSS encontram-se isentas deste imposto, pelo

facto de serem reconhecidas como pessoas coletivas de utilidade pública (art.5.º n.º 2 al. b) do

CIUC)12.

3.4 - Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF)

Para além das isenções fiscais consagradas na legislação, existem ainda no sistema fiscal

português outros mecanismos fiscais, através dos quais o Estado difunde e incita a atividade

exercida pelas ESFL, destacando-se a figura do mecenato (Antão et al., 2012), envolvendo

donativos (em dinheiro ou em espécie), concedidos sem contrapartidas que configurem

obrigações de caráter pecuniário ou comercial às entidades públicas ou privadas, cuja atividade

consista predominantemente na realização de iniciativas nas áreas social, cultural, ambiental,

desportiva ou educacional.

10 Esta isenção é automática em função da sua qualidade, não dependendo de qualquer pedido ou autorização.
11 O reconhecimento desta isenção depende de pedido dirigido à AT, devendo as viaturas objeto de isenção ostentar dizeres
identificadores da entidade beneficiária, inscritos nas partes laterais e posterior, em dimensão não inferior à da matrícula.
12 A isenção tem que ser requerida.

22
Com base no disposto no art. 64.º do EBF, sublinhe-se que em sede de IVA não estão sujeitas

a imposto as transmissões de bens e as prestações de serviços efetuadas a título gratuito, pelas

entidades a quem sejam concedidos donativos abrangidos pelo regime fiscal do mecenato, em

benefício direto das pessoas singulares ou coletivas que os atribuam, quando o correspondente

valor não ultrapassar, no seu conjunto, 5% do montante do donativo recebido. Caso contrário,

se se verificar que o conjunto das operações efetuadas a título gratuito pelo beneficiário do

donativo ultrapassam os 5% do valor do donativo recebido, a entidade é obrigada a liquidar

IVA, não sendo, no entanto, obrigatória a sua repercussão.

As ESFL beneficiárias de donativos estão obrigadas ao cumprimento de algumas obrigações

acessórias estabelecidas no art. 66.º do EBF, nomeadamente:

 Emitir documento comprovativo dos montantes recebidos dos mecenas, com a

indicação do seu enquadramento, bem como a menção de que o donativo é atribuído

sem contrapartidas;

 Possuir registo atualizado das entidades mecenas, do qual constem, nomeadamente, o

nome, o NIF, bem como a data e o valor de cada donativo que lhes tenha sido atribuído;

 Entregar à AT, até ao final do mês de fevereiro de cada ano, a declaração modelo 25,

referente aos donativos recebidos no ano anterior.

Ainda a este respeito, refira-se uma medida anti abuso na exigência de meio de pagamento por

cheque ou transferência bancária para os donativos concedidos em dinheiro de valor superior a

€ 200,00, para que seja permitida a identificação do mecenas.

Ainda no âmbito dos benefícios fiscais, saliente-se que as ESFL podem beneficiar de

consignação de 0,5% do valor do IRS, atribuída pelos contribuintes, que abrange IPSS ou as

pessoas coletivas de utilidade pública que prossigam fins de beneficência, de assistência ou

humanitários, pessoas coletivas religiosas e mais recentemente instituições culturais com

23
estatuto de utilidade pública (artigos 78.º-F e 152.º do CIRS, artigo 32.º da Lei n.º 16/2001, de

22 de junho e o artigo 14.º da Lei n.º 35/98, de 18 de julho). Cada vez mais instituições fazem

campanhas publicitárias no sentido de captar a atenção dos contribuintes e poderem, dessa

forma, obter o maior volume de imposto consignado.

Conclusão

As ESNL têm um papel cada vez mais importante no meio económico-social, criando bases de

apoio, produzindo bens e prestando serviços nas mais diversas áreas sociais. Estas entidades

são aquelas que desenvolvem uma atividade sem fins lucrativos, são privadas e organizadas,

não têm como objetivo principal uma atividade comercial, respondem a objetivos de interesse

público, nomeadamente de âmbito social. Além disso, estas entidades utilizam, não só, os

recursos de mercado e financiamentos públicos, mas também os recursos não monetários que

derivam da sociedade civil (Rocha, 2013). As ESFL têm vindo a desempenhar um papel

importante na economia, o que induz a que cada vez mais se reforcem as exigências de

transparência relativamente às atividades e recursos utilizados.

Neste estudo procurámos analisar as particularidades das ESNL na sociedade e nos âmbitos

contabilístico e fiscal. Assim, propusemo-nos analisar o modo como as ESNL prestam contas

da sua atividade decorrentes das obrigações contabilísticas e fiscais impostas pelos normativos

em vigor.

A NCRF-ESNL apresenta-se como o instrumento que apoia a gestão das ESFL, a qual está

elaborada tendo em conta as particularidades deste setor, porém em termos gerais, não difere

muito da contabilidade aplicada aos outros setores, nomeadamente através da NCRF-PE.

Ressalve-se, no entanto, que grande parte das ESNL estão abrangidas pela contabilização pelo

regime de caixa, no qual se enquadram as entidades com um volume de vendas e outros

rendimentos que não excedam, em nenhum dos dois exercícios anteriores, € 150.000,00.
24
No âmbito fiscal, as diversas matérias se encontram-se repartidas pelos vários códigos dos

impostos e legislação avulsa, não existindo assim um regime fiscal que concentre toda a

informação de tributação, benefícios e isenções aplicáveis a este setor (Antão et al., 2012). De

facto, as ESFL são sujeitas a diversos impostos, podendo obter isenções ou tratamento

específico relativamente a cada imposto. Neste âmbito, saliente-se como mais visíveis as

isenções contempladas no EBF, no CIRC e no CIVA. O principal problema no que respeita ao

enquadramento fiscal destas entidades poderá prender-se com a conjugação, a par das

atividades de natureza social, de beneficência e humanitárias, que permitem o reconhecimento

de benefícios fiscais, designadamente isenções, de outras atividades, de natureza empresarial e

lucrativa, cada vez mais frequentes nas ESFL com vista à obtenção de receitas, e que as tornam

sujeitos passivos “mistos”. Embora não tão salientes, existem ainda diversas isenções em outros

impostos, nomeadamente IS, IMI, IMT e ISV.

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