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Apontamentos Teóricos

de
Cálculo I

Paulo Saraiva
16 de Outubro de 2020
2
Conteúdo

1 Cálculo Diferencial de Funções Definidas em R 1

1.1 Definições Iniciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1


1.1.1 Conjuntos e números . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.1.2 Generalidades sobre funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.1.3 Uma aplicação à Economia: funções oferta e procura . . . . . . . 18
1.2 Gráficos e propriedades das funções elementares . . . . . . . . . . . . . 20
1.2.1 Funções algébricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
1.2.2 Funções transcendentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
1.3 Limite e Continuidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
1.3.1 Limite: perspectivas numérica, gráfica e analı́tica . . . . . . . . . 39
1.3.2 Limites Infinitos e Limites no Infinito: assı́ntotas . . . . . . . . . 44
1.3.3 Outras Propriedades dos Limites . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
1.3.4 Funções Contı́nuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
1.4 Derivadas e Diferenciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
1.4.1 Derivada: definição e primeiras interpretações. . . . . . . . . . . 57
1.4.2 Regras de Derivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
1.4.3 Derivação Implı́cita . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
1.4.4 Diferenciais e Aproximação Linear de Funções . . . . . . . . . . 69
1.4.5 Aplicações das Derivadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
1.4.6 Aplicações à Economia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99

2 Cálculo Diferencial de Funções Definidas em Rn 111


2.1 Domı́nios e Representações Gráficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
2.1.1 Alguns tipos de funções de duas variáveis . . . . . . . . . . . . . 116
2.1.2 Alguns tipos de funções de n variáveis . . . . . . . . . . . . . . . 123
2.2 Limite e Continuidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
2.3 Derivadas Parciais e Diferenciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137
2.3.1 Definições, Interpretações e Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . 137
2.3.2 Equação do Plano Tangente à Superfı́cie z = f (x, y) num Ponto . 144
2.3.3 Vector Gradiente e Matriz Hessiana . . . . . . . . . . . . . . . . 147
2.3.4 Diferenciais e Aproximação Linear de Funções . . . . . . . . . . 152
2.3.5 Funções Homogéneas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157

3
4 CONTEÚDO

2.4 Derivada Direccional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 162


2.4.1 Caso das funções reais de duas variáveis reais . . . . . . . . . . . 162
2.4.2 Caso das funções reais de três ou mais variáveis reais . . . . . . . 168
2.5 Regras da Cadeia e Funções Implı́citas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 176
2.6 Extremos Livres de Funções Reais de n Variáveis Reais . . . . . . . . . . 186
2.6.1 Pontos Estacionários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 186
2.6.2 Condições Suficientes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 191
2.7 Extremos Condicionados de Funções Reais de n Variáveis Reais . . . . . 199
2.7.1 Método de Substituição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 199
2.7.2 Método dos Multiplicadores de Lagrange . . . . . . . . . . . . . 205
Introdução
Os apontamentos aqui disponibilizados destinam-se aos estudantes de Cálculo I da
licenciatura em Economia da FEUC. Constituem uma versão remodelada em Setem-
bro de 2020 dos que foram redigidos e utilizados desde o ano lectivo 2007/2008 e, como
qualquer obra deste género, traduzem a visão daquilo que o autor considera essencial e
básico num curso de Cálculo Diferencial de funções reais de uma ou mais variáveis re-
ais. Para além dos aspectos teóricos diversamente ilustrados através de exemplos, são
incluı́dos inúmeros exercı́cios. Embora as demonstrações sejam inegavelmente impor-
tantes (mesmo para futuros economistas), o autor foi parco na sua inclusão, optando por
remeter o leitor para as fontes bibliográficas citadas. Por escassez de tempo, são igual-
mente poucas as aplicações aqui incluı́das.

A divisão usual do curso em aulas teóricas e aulas práticas deixará de existir em


2020/2021, sendo substituı́das por aulas teórico-práticas. O propósito principal desta
medida é a promoção de uma maior interligação entre os conteúdos teóricos e os exemplos
e problemas práticos, tornando, por outro lado, mais imediata e visı́vel a aplicabilidade
dos resultados teóricos.
Em cada aula, o docente apresentará os fundamentos teóricos e resultados necessários
para a compreensão dos assuntos, fornecerá alguns exemplos, propondo de seguida a
discussão de exercı́cios do Caderno Prático Tutorial. Este segundo texto, complemen-
tar aos presentes Apontamentos Teóricos, obedece a um paradigma de ensino tutorial,
o qual assenta em dois pressupostos: em primeiro lugar, assume-se que cada estudante
deverá tentar compreender as listas de exercı́cios resolvidos e procurar resolver as listas
de exercı́cios propostos presentes naquele volume; em segundo lugar, admite-se como
propósito (caracterı́stico do ensino universitário) que haja um crescente volume de traba-
lho autónomo por parte de cada estudante. Aos docentes caberá a tarefa de orientadores
das aprendizagens, fornecendo a exposição da matéria e apoiando na sua compreensão.
Os presentes Apontamentos Teóricos contêm também listas de exercı́cios aqui deixa-
dos como material complementar.

Algumas notas sobre organização do trabalho


De um estudante de primeiro ano espera-se que leia atentamente o texto teórico e
perceba os exemplos antes de abordar os exercı́cios propostos. Para complementar ou
obter uma visão mais precisa dos temas aqui apresentados, incentiva-se o estudante a
consultar outras referências indicadas na Bibliografia. Por outro lado, pressupõem-se
adquiridos os conhecimentos sobre Cálculo Diferencial apresentados durante o ensino
secundário. A este respeito, consulte o documento Programa e Metas Curriculares de
Matemática A - Ensino Secundário. Caso o estudante sinta que possui lacunas nestes
pré-requisitos, não deve hesitar, sendo encorajado a procurar os docentes no decor-
rer dos respectivos atendimentos: eles não resolverão o problema por si, mas saberão
encaminhá-lo no seu esforço de revisão das matérias. A Biblioteca da FEUC dispõe de

i
ii CONTEÚDO

inúmeros recursos bibliográficos onde todo o estudante que revele tais lacunas pode pro-
curar exemplos em dose q.b. que lhe permitam recuperar os conhecimentos em assuntos
básicos do Cálculo (e também da Álgebra). Por outro lado, a internet possui hoje em dia
imensos recursos que lhe permitirão aceder a conhecimentos básicos do Cálculo (e não
só), como por exemplo o WolframAlpha e o Symbolab. Para uma primeira análise das pos-
sibilidades destes portais, consulte http://www.wolframalpha.com/examples/Math.html e
https://www.symbolab.com/.

No decorrer das aulas, o estudante deverá tomar os apontamentos que julgue ne-
cessários para a compreensão do texto, acrescentando-lhe notas pessoais que melhor o
ajudem nessa tarefa. O estudante não deve esperar que numa aula sejam abordados todos
os aspectos e com o mesmo detalhe que estes apontamentos ou as referências o fazem. En-
quanto estudante a tempo inteiro, cabe-lhe a tarefa de completar ou redigir os raciocı́nios
do modo que mais se adeque à sua maneira de assimilar as matérias. Por seu turno, tendo
por base os planos semanais de trabalho, a parte prática de cada aula deve ser entendida
como um perı́odo de discussão dos exercı́cios propostos (ou até mesmo sugeridos pelos
próprios estudantes). Por forma a tornar mais dinâmicas as aulas, é essencial que o estu-
dante tenha tentado, aplicando uma considerável dose de trabalho individual, resolver
as listas de exercı́cios indicadas.

A frequência dos horários de atendimento, por último, revela-se essencial ao preen-


chimento de eventuais lacunas resultantes das aulas ou do estudo individual, clarificando
pontos delicados ou aspectos eventualmente expostos de maneira menos clara, ou mesmo
permitindo uma outra visão dos assuntos abordados.

Com doze anos de frequência do ensino, o estudante-leitor terá já notado que não se
estuda Matemática do mesmo modo como se apreendem outras matérias. A leitura, a
tentativa de resolução, a perseverança, o esforço individual de compreensão são factores
que intervêm de maneira preponderante no sucesso das aprendizagens nesta disciplina.
Por outro lado, um trabalho responsável e assı́duo evitará uma acumulação de questões
por esclarecer.

A versão do texto agora publicado beneficiou do contributo dos restantes docentes de


Cálculo I, na leitura atenta e na proposta de alterações da redacção feita em 2007, bem
como nas revisões levadas a cabo em sucessivos anos. As incorrecções que eventualmente
subsistam são da inteira responsabilidade do autor, o qual está aberto a sugestões e crı́ticas
devidamente fundamentadas.

Finalmente, o autor deseja aos estudantes-leitores um bom trabalho ao longo do se-


mestre e uma adequada utilização do presente manual.

O docente: Paulo Saraiva


Capı́tulo 1

Cálculo Diferencial de Funções


Definidas em R

No presente capı́tulo, abordaremos alguns aspectos essenciais relativos ao estudo das


funções reais de uma variável real. Embora muitos deles tenham sido tratados no en-
sino secundário, serão aqui apresentados com diversos complementos. Por outro lado,
far-se-á a introdução a outros assuntos, como sejam a derivada da função inversa (ilus-
trada através do caso das funções trigonométricas inversas), o conceito de diferencial e a
aproximação polinomial de funções.
Para um estudo mais completo dos temas aqui desenvolvidos, aconselha-se a consulta
de outras fontes, nomeadamente, os livros que constam na bibliografia destes apontamen-
tos. Apesar de neste texto se privilegiar a perspectiva analı́tica, sempre que se verificar
adequado procuraremos mostrar as vertentes gráfica e numérica dos tópicos tratados.

1.1 Definições Iniciais


1.1.1 Conjuntos e números
Um conjunto é uma colecção de objectos aos quais é usual chamar elementos ou mem-
bros do conjunto. A tı́tulo de exemplo, a força de trabalho de uma empresa pode ser con-
siderada um conjunto cujos elementos são os seus trabalhadores. O alfabeto português é
também um conjunto cujos elementos são as 26 letras que o compõem. Matematicamente,
estamos bastante habituados a conjuntos cujos elementos são números, ou ainda a outros,
como por exemplo uma recta, cujos membros são os seus pontos.
Um dado conjunto pode ser definido por extenso, listando todos os seus membros, ou
em compreensão, identificando uma propriedade ou condição a que os elementos devem
obedecer. Assim, tem-se, por exemplo:

A = {1, 2, 3, 6, 9, 18} = {n ∈ N : n é divisor de 18}.


| {z } | {z }
por extenso em compreensão

1
2 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

(recorde que N = {1, 2, 3, ...} é o conjunto dos números naturais).


Ao longo destes apontamentos, recorreremos à linguagem simbólica envolvendo quan-
tificadores e operações lógicas que agora resumiremos sucintamente. Tem-se:

quantificador sı́mbolo lê-se


universal ∀ ”qualquer que seja” ou ”para todo o ”
existencial ∃ ”existe pelo menos um” ou ”para algum”

No contexto da lógica proposicional, eis as principais operações lógicas:

operação lógica sı́mbolo lê-se


negação ∼ ”não” ou ”negação de”
conjunção ∧ ”e”
disjunção ∨ ”ou”
implicação =⇒ ”implica” ou ” se...então...”
equivalência ⇔ ”equivale a” ou ”... se e só se ...”

As quatro últimas operações lógicas desempenham um papel relevante no contexto da lin-


guagem matemática, ao permitirem ligar proposições - isto é, enunciados sobre os quais é
possı́vel afirmar se são verdadeiros ou falsos - e condições - como por exemplo, equações
e inequações (em uma ou mais variáveis). Para mais detalhes - nomeadamente, sobre a
definição e tabelas de verdade das operações lógicas - consulte o texto Lógica e teoria de
conjuntos: um resumo (publicado na página de Cálculo I em NONIO/Inforestudante).
Dado um conjunto C, diremos que D é um subconjunto de C se todo o elemento de
D for elemento de C. Escreveremos então

D ⊂ C.

Simbolicamente:
D ⊂ C se e só se ∀x , x ∈ D =⇒ x ∈ C.
O conjunto vazio, usualmente denotado por ∅ ou por {}, é aquele que não possui nenhum
elemento. Qualquer conjunto C não vazio possui sempre pelo menos dois subconjuntos:
C e ∅.
Dados dois conjuntos, A e B, o conjunto

A\B = {x ∈ A : x ∈
/ B} .

diz-se complementar de B em A ou diferença entre A e B (também dito ”A menos B”).


Por outro lado, se A é um subconjunto de um universo U, chamamos complementar de
A ao conjunto U\A, usualmente representado por AC .
Dados A e B dois subconjuntos de U, os conjuntos

A ∩ B = {x ∈ U : x ∈ A ∧ x ∈ B} e A ∪ B = {x ∈ U : x ∈ A ∨ x ∈ B}

dizem-se, respectivamente, intersecção e reunião dos subconjuntos dados.


1.1. DEFINIÇÕES INICIAIS 3

Alguns dos seguintes conjuntos de números são por certo do seu conhecimento:
N = {1, 2, 3, ...} conjunto dos números naturais,
Z = {..., −3, −2, −1, 0, 1, 2, 3, ...} conjunto dos números inteiros relativos,
Q= m

n
: m, n ∈ Z e n 6
= 0 conjunto dos números racionais,
R conjunto dos números reais.
O conjunto R terá a maior importância no presente capı́tulo e pode ser descrito como a
reunião (disjunta) de Q com o conjunto do números irracionais (i.e., com QC , o comple-
mentar de Q). Alternativamente, podemos afirmar que um número real é todo aquele que
é representável em dı́zima finita, ou dı́zima infinita periódica ou dı́zima infinita não
periódica. Como sabemos, existe uma correspondência biunı́voca entre R e os pontos de
uma recta orientada, dita recta real.

Figura 1.1: Recta real e alguns dos seus pontos.

Os chamados intervalos de números reais são conjuntos também representáveis na


recta real. Dados a, b ∈ R arbitrariamente fixos ((onde a ≤ b) segue-se a notação e a
representação em compreensão de alguns intervalos tı́picos:
[a, b] = {x ∈ R : a ≤ x ≤ b} , ]a, b[ = {x ∈ R : a < x < b} ,
[a, b[ = {x ∈ R : a ≤ x < b} , ]a, b] = {x ∈ R : a < x ≤ b} ,
[a, +∞[ = {x ∈ R : x ≥ a} , ]a, +∞[ = {x ∈ R : x > a} ,
]−∞, b] = {x ∈ R : x ≤ b} , ]−∞, b[ = {x ∈ R : x < b} ,
R+ +
0 = [0, +∞[ , R = ]0, +∞[ , R = ]−∞, +∞[ .
Num intervalo [a, b], os pontos a e b dizem-se extremos do intervalo, sendo conside-
rados pontos interiores do intervalo todos os que não são extremos (i.e., ]a, b[).
Dados a ∈ R e δ > 0, todo o intervalo da forma
]a − δ, a + δ[
é dito bola aberta de centro em a e raio δ ou também por vizinhança δ de a. Denotar-
se-á por Bδ (a). Mais geralmente, uma vizinhança de a é qualquer conjunto que contém
uma bola aberta centrada em a (em particular, Bδ (a) é uma vizinhança de a).
Um ponto x diz-se interior a um dado conjunto A se existir alguma bola aberta cen-
trada em x totalmente contida em A. Em termos de notação, o conjunto de todos os
pontos interiores de um conjunto A - dito interior de A - será simbolizado por int(A).
Tem-se então:
x ∈ int(A) ⇐⇒ ∃δ>0 : ]x − δ, x + δ[ ⊂ A.
Um conjunto A diz-se aberto se A = int (A) e diz-se fechado se AC for aberto.
4 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Nota 1. (i) Um conjunto pode não ser nem aberto nem fechado. Os dois únicos subcon-
juntos de R simultaneamente abertos e fechados são ∅ e R.
(ii) Certas propriedades das funções apenas se verificam em conjuntos fechados e daı́ a
importância desta noção.

Exemplo 1. Dados os conjuntos

A = {x ∈ R : −2 < x ≤ 4} e B = {x ∈ R : x ≤ 3} ,

poderá concluir que A =] − 2, 4] e B =] − ∞, 3], de onde resulta:

A ∩ B = ]−2, 3] e A ∪ B = ]−∞, 4] ,

tendo-se ainda

A\B = ]3, 4] .

Figura 1.2: Visualização de A ∩ B e A ∪ B.

É ainda possı́vel ver que

6 A, pelo que A não é aberto;


int (A) = ]−2, 4[ =
B0.01 (1) = ]0.99; 1.01[ constitui uma bola aberta centrada em 1;
]0, 2.5[ é uma vizinhança de 1 (mas não uma bola aberta centrada em 1).

A manipulação algébrica de número reais é assunto coberto desde o Ensino Básico ao


Secundário, de modo que assumiremos que domina identidades como

(a + b)2 = a2 + 2ab + b2 , (quadrado da soma)


(a − b)2 = a2 − 2ab + b2 , (quadrado da diferença)
(a + b) (a − b) = a2 − b2 , (diferença entre quadrados)

válidas para quaisquer a, b ∈ R, assim como outras relativas a operações algébricas.

Nota 2. Nesta fase, será conveniente que o estudante reveja outras técnicas algébricas,
como sejam a resolução de equações e inequações polinomiais, com ou sem módulos,
pois estas poderão ser requisitadas nas secções e subsecções seguintes.
1.1. DEFINIÇÕES INICIAIS 5

Recordamos que o próprio plano pode ser visto como um conjunto, denotado por
2
R , dada a correspondência biunı́voca entre pares ordenados (x, y) de números reais e
pontos P assinalados num referencial (usualmente) ortonormado (o.n., doravante), ou
seja, aquele cujos eixos são perpendiculares (referencial ortogonal) e em que as unidades
de comprimento em cada um dos eixos são iguais (referencial monométrico) e coincidem
com a unidade de comprimento prefixada no plano. Tem-se:

R2 = R × R}
| {z = {(x, y) : x ∈ R ∧ y ∈ R} .
produto cartesiano

Recordemos brevemente a nomenclatura habitualmente utilizada:


O origem do referencial;
eixo dos XX (ou eixo OX) eixo das abcissas;
eixo dos Y Y (ou eixo OY ) eixo das ordenadas;
(x, y) ponto do plano de abcissa x e ordenada y.

Figura 1.3: Pontos de R2 num plano XOY .

Apesar de R2 ocupar um lugar central no Capı́tulo 2 (no contexto dos domı́nios de


funções de duas variáveis reais), deixamos aqui alguns exemplos.

Exemplo 2. (a) Toda a linha recta ou curva no plano é um subconjunto de R2 .


(b) O primeiro quadrante, também conhecido por quadrante não-negativo, que se define
através de
(x, y) ∈ R2 : x ≥ 0 ∧ y ≥ 0 ou ainda por R+ +

0 × R0 ,

é um subconjunto com particular relevo nas aplicações à Economia.


(c) Todo a região plana delimitada por uma curva ou recta é um subconjunto de R2 .

A respeito de rectas no plano, é importante recordar algumas das suas equações car-
tesianas. Assim, sendo A, B e C constantes reais (A e B não simultaneamente nulas),

r: Ax + By + C = 0
6 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

é a equação geral de uma recta, r, no plano. Quando dada nessa forma, prova-se que

~u = (B, −A) é um vector director de r;


~v = (A, B) é um vector perpendicular a r.

A equação reduzida de r é escrita na forma

y = mx + b,

onde as constantes reais m e b representam, respectivamente, o declive de r e a ordenada


na origem. Por último, se conhecermos o declive m da recta r e um dos seus pontos,
(x0 , y0 ), a chamada equação ponto-declive assume a forma

y − y0 = m (x − x0 ) .

Exercı́cio 1. Considere a recta r no plano definida pelos pontos (3, 0) e (1, 2). Relativa-
mente a r, determine

(1) a sua equação reduzida;


(2) a sua equação ponto-declive;
(3) a sua equação geral.

Represente tal recta num referencial ortonormado XOY .

No que diz respeito a funções quadráticas, é por vezes útil recorrer à chamada técnica
do completamento do quadrado, a qual permite transformar equações da forma

y = ax2 + bx + c

na forma
y = a(x + h)2 + k.
Veja-se o seguinte exemplo.

Exemplo 3. Considere a equação y = x2 + x + 1. Tem-se


 2  2  2
2 1 2 1 1 1 3
y =x +x+1=x +2× ×x+ − +1= x+ + .
2 2 2 2 4

É justamente esta técnica que permite obter a usual fórmula resolvente para equações
polinomiais quadráticas (cf. Apêndice 1.1).

Exercı́cio 2. Utilizando a mesma técnica, mostre que

y = −2x2 + 16x − 24 ⇔ y = −2 (x − 4)2 + 8.


1.1. DEFINIÇÕES INICIAIS 7

A técnica do completamento do quadrado permite escrever a equação de uma cónica


- i.e., parábolas, circunferências, elipses e hipérboles - na sua forma reduzida, com
vantagens claras para o seu traçado no plano. Por exemplo, uma parábola com eixo de
simetria vertical está escrita na forma reduzida se assumir a forma:

y − β = a (x − α)2 ,

onde:
(α, β) designa o vértice da parábola; x = α é a equação do eixo de
 simetria;
para cima, se a > 0;
a 6= 0 é um parâmetro cujo sinal indica o sentido da concavidade:
para baixo, se a < 0.

Assim, se resolveu o exercı́cio anterior, sabe que

y = −2x2 + 16x − 24 ⇔ y = −2 (x − 4)2 + 8 ⇔ y − 8 = −2 (x − 4)2 .

Trata-se da equação reduzida de uma parábola cujo vértice é (4, 8), cujo eixo de simetria
é a recta x = 4 e que é côncava, pois a = −2 < 0. Deixamos como exercı́cio o traçado
da parábola num referencial ortonormado XOY .

Exercı́cio 3. Uma parábola pode ter eixo de simetria horizontal. A equação reduzida da
parábola será, nesse caso, dada por

x − α = a (y − β)2 .

Identifique o seu vértice, a equação do seu eixo de simetria e descreva a concavidade em


função do sinal de a (onde a 6= 0).

No caso de uma circunferência, recordamos a sua equação na forma reduzida:

(x − α)2 + (y − β)2 = r2 ,

onde (α, β) designa o centro e r > 0 o raio da circunferência.

Exercı́cio 4. Recorra à técnica do completamento do quadrado para mostrar que

x2 − 4x + y 2 + 2y = 4

é a equação de uma circunferência centrada no ponto (2, −1) e de raio 3. Esboce-a num
referencial ortonormado XOY .

Nota 3. Adiante, referiremos as equações reduzidas da elipse e da hipérbole.


8 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

1.1.2 Generalidades sobre funções


Uma função
f : A −→ B
é uma relação entre dois conjuntos, A e B, que a cada elemento x ∈ A faz corresponder
um único elemento y ∈ B, através de uma dada regra:
y = f (x). (1.1)
Os elementos de A dizem-se objectos e o conjunto por estes formado diz-se domı́nio da
função, representado por Df . Na igualdade (1.1), que permite obter a imagem ou trans-
formado y de cada objecto por meio de f , as variáveis x e y dizem-se, respectivamente,
variável independente e variável dependente. Convém salientar que, na mesma igual-
dade, x é uma variável muda: pode ser substituı́da por qualquer outra letra. Quer isto
dizer que se
f (x) = x2 ,
então também
f (p) = p2 .
O conjunto B é dito conjunto de chegada de f . Uma função fica completamente carac-
terizada quando conhecemos Df e a expressão de y = f (x).
No decorrer deste capı́tulo iremos focar a nossa atenção nas funções reais de (uma)
variável real (doravante, f.r.v.r.), isto é, funções do tipo
f : Df −→ R
onde Df ⊂ R é, usualmente, um intervalo ou reunião de intervalos de números reais.
É possı́vel definir funções com domı́nio discreto (por oposição a domı́nio contı́nuo)
ou numerável (1 ), como por exemplo as conhecidas sucessões, cujo domı́nio é N. Estas
surgirão, ainda que esporadicamente, no presente texto. Para já, fiquemos com a ideia
de que, embora muitos dos conceitos que de seguida recordamos a respeito de funções
sejam comuns a todos os tipos de funções, há técnicas do Cálculo Diferencial que não
se aplicam a sucessões.
Uma função f pode ser visualizada através de uma representação gráfica, usual-
mente feita num referencial cartesiano, ortonormado e monométrico XOY . Mas, em
termos analı́ticos, chamamos gráfico de f ao seguinte conjunto denotado por Gf :
Gf = (x, y) ∈ R2 : x ∈ Df ∧ y = f (x) .


Esta subtil diferença tem a sua razão de ser. De facto, enquanto o gráfico de uma função
é um conceito analı́tico bem preciso (2 ), qualquer representação geométrica adequada dos
1
Um conjunto A diz-se numerável se for finito ou se existir alguma bijecção de N em A,
2
O conceito de gráfico de f é mais geral do que o aqui apresentado. De facto, para f : A → B, tem-se:
Gf = {(x, y) ∈ A × B : y = f (x)} ,
onde A × B = {(x, y) : x ∈ A e y ∈ B} designa o produto cartesiano de A por B.
1.1. DEFINIÇÕES INICIAIS 9

pontos de Gf serve, proporcionando visualizações distintas do gráfico de f . Assim, seja


manualmente, seja através de ferramentas computacionais gráficas (calculadoras gráficas
ou programas com capacidade gráfica), é possı́vel ver que na seguinte figura estão três
representações gráficas da função f tal que

f (x) = x2 , x ∈ R.

Figura 1.4: Diferentes representações gráficas da mesma função.

Dito isto, iremos frequentemente cometer o abuso de linguagem, chamando gráfico a algo
que na realidade é uma representação gráfica.

As intersecções de Gf com o eixo dos xx, caso existam, são os pontos (x, 0) tais que

f (x) = 0, x ∈ Df .

Por outro lado, caso tenhamos 0 ∈ Df , a determinação de

b = f (0) ,

dar-nos-á a intersecção com o eixo dos yy, ou seja, o ponto (0, b).

Embora não essencial para definir uma função, reveste-se de alguma importância o
conjunto das imagens ou transformados, mais usualmente conhecido por contra-domı́nio
de f , denotado por Df0 , CDf ou f (Df ). Simbolicamente, tem-se:

Df0 = {y ∈ R : y = f (x), x ∈ Df } .

A observação de uma representação gráfica pode dar-nos a entender qual o domı́nio e qual
o contra-domı́nio de uma dada função, mas não qual o conjunto de chegada, o qual deverá
ser especificado.
Recordemos que uma f.r.v.r. f se diz sobrejectiva se

Df0 = R.

Simbolicamente, podemos ainda dizer que f é sobrejectiva se

∀y∈R , ∃x∈Df : y = f (x).


10 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Por outro lado, uma f.r.v.r. diz-se injectiva se a objectos diferentes faz corresponder
imagens diferentes. Simbolicamente (abreviando ”se e só se”através de ”sse”):

f é injectiva sse ∀x,x0 ∈Df , x 6= x0 =⇒ f (x) 6= f (x0 )


sse ∀x,x0 ∈Df , f (x) = f (x0 ) =⇒ x = x0 .

Assim, a função módulo, definida por



x, se x ≥ 0
f (x) = |x| =
−x, se x < 0

não é injectiva, ao passo que a função g tal que

g (x) = x

- conhecida por função identidade, denotada por g = id - é injectiva.

Figura 1.5: Gráficos das funções identidade e módulo, respectivamente.

Graficamente, o ”teste das rectas horizontais” permite decidir quando é que uma
função é ou não injectiva. Se o traçado de rectas horizontais intersectar o gráfico em
dois ou mais pontos, então a função não será injectiva. Procure explicar analiticamente
este teste.
O conceito de injectividade está associado ao de inversa de uma função. Recordemos
que se f : Df −→ B é injectiva no seu domı́nio, então é possı́vel definir uma função
g : Df0 → Df tal que

∀y∈Df0 , g (y) = x ⇐⇒ y = f (x) .

Esta função g diz-se função inversa de f e escrevemos g = f −1 . Assim, a equivalência


acima toma a seguinte forma:

∀y∈Df0 , f −1 (y) = x ⇐⇒ y = f (x) .


1.1. DEFINIÇÕES INICIAIS 11

Figura 1.6: Diagrama de f e f −1 .

O processo habitual para determinar a inversa de uma dada função f é o seguinte:

(i) verificar se f é injectiva;


(ii) determinar Df0 ;
(iii) resolver y = f (x) em ordem a x.

Por último, permutando entre si x e y, obtemos a expressão de f −1 (x) .


Exercı́cio 5. (a) Considere as f.r.v.r. f e g tais que
1
f (x) = 2x, x∈R e g(x) = , x ∈ R\{0}.
f (x)
1
Defina f −1 e mostre que f −1 (x) 6= .
f (x)
3x + 1
(b) Defina f −1 , aplicando o processo antes descrito à f.r.v.r. f tal que f (x) = .
x−2
Pode acontecer que f não seja injectiva no seu domı́nio e, contudo, se possa restringir
Df a um seu subconjunto A onde f seja injectiva. A função
f|A : A → R
diz-se restrição de f a A e é invertı́vel.
Exemplo 4. Estudemos a invertibilidade de algumas funções.
(a) Considere a função f tal que f (x) = 2x + 1. É possı́vel ver que
f (x1 ) = f (x2 ) =⇒ x1 = x2 ,
pelo que f é injectiva em Df = R. Dado que
1
y = 2x + 1 ⇐⇒ x= (y − 1) ,
2
e como Df0 = R (note que se trata de uma função afim), podemos caracterizar f −1 como
se segue:
f −1 : R → R
1
x 7−→ f −1 (x) = (x − 1) .
2
12 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

(b) A função f tal que f (x) = x2 não é invertı́vel uma vez que não é injectiva no seu
domı́nio. Contudo, é possı́vel considerar uma restrição de f ao conjunto R+ 0 = [0, +∞[,
que denotaremos por g. Tal restrição é já injectiva e a sua inversa é
g −1 : [0, +∞[ → R

x 7−→ g −1 (x) = x

Figura 1.7: Gráficos de g e de g −1 .

Nota 4. Repare que


(x, y) ∈ Gf ⇐⇒ (y, x) ∈ Gf −1 .
A consequência gráfica desta propriedade é a seguinte:

”Os gráficos de f e de f −1 são simétricos um do outro em relação à recta y = x ”.

Evidentemente, pressupõe-se que o referencial é ortonormado e monométrico.


Algumas famı́lias de gráficos têm a mesma forma básica. Verifica-se que cada um da-
queles resultará de um gráfico após aplicação de certas transformações geométricas - e.g.,
translações (verticais ou horizontais) e reflexões. Falamos então de transformações dos
gráficos de funções. Descrevemos de seguida as transformações básicas mais frequentes
e seus respectivos efeitos.

Tipos Básicos de Transformações


Gráfico original y = f (x)
Translação associada ao vector (c, 0) y = f (x − c)
(para a direita se c > 0; para a esquerda se c < 0 )
Translação associada ao vector (0, c) y = f (x) + c
(para cima se c > 0 para baixo se c < 0);
Reflexão (ou simetria) em relação ao eixo dos xx y = −f (x)
Reflexão em relação ao eixo dos yy y = f (−x)
Reflexão em relação à origem y = −f (−x)
1.1. DEFINIÇÕES INICIAIS 13

Eis a ilustração destas situações, dada a função f tal que f (x) = x3 − x2 − 2x.

Figura 1.8: Transformações por translações na direcção do eixo OX.

Figura 1.9: Transformações por translações na direcção do eixo OY .

Figura 1.10: Transformações por reflexões (ou simetrias).


14 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Destacamos de seguida outras importantes transformações de funções: as dilatações


e as contrações. Para tal, seja f uma f.r.v.r. definida em Df e cujo gráfico é Gf .

• Relação entre Gf e Gg , onde g (x) = αf (x), com α ∈ R+


Este tipo de transformações não altera o domı́nio, pelo que Dg = Df . Contudo,
0 0
pode suceder que Dg 6= Df .

– Se α ∈ ]0, 1[, então o Gg obtém-se do Gf através de uma contração vertical


de coeficiente α.
– Se α > 1, então o Gg obtém-se do Gf através de uma dilatação vertical de
coeficiente α.

Exemplo 5. Seja f tal que f (x) = sin x, e construam-se os gráficos de g1 e g2 tais que
1
g1 (x) = sin x e g2 (x) = 3 sin x.
2
0 0
= − 21 , 12 e Dg2 = [−3, 3].
 
Pode-se observar que Dg1

Figura 1.11: Contração vertical e dilatação vertical do Gf .

• Relação entre Gf e Gh , onde h (x) = f (βx), com β ∈ R+


Este tipo de transformações podem alterar o domı́nio. De facto,
 
x
Dh = {x ∈ R : βx ∈ Df } = ∈ R : x ∈ Df .
β
0 0
Contudo, Dh = Df .

– Se β ∈ ]0, 1[, então o Gh obtém-se do Gf através de uma dilatação horizontal


de coeficiente β1 .
– Se β > 1, então o Gh obtém-se do Gf através de uma contração horizontal
de coeficiente β1 .
1.1. DEFINIÇÕES INICIAIS 15

Exemplo 6. Seja f tal que f (x) = sin x, e construam-se os gráficos de h1 e h2 tais que
 
1
h1 (x) = sin x e h2 (x) = sin (3x) .
2
Temo-los esboçados na figura seguinte.

Figura 1.12: Dilatação horizontal e contração horizontal do Gf .

Dados os gráficos de duas f.r.v.r., f e g, os pontos de intersecção entre os dois gráficos


são os pontos (x, y) que satisfazem
(
y = f (x)
y = g (x)

e, portanto, a abcissa de cada um desses pontos há-de resultar de

f (x) = g (x) .

Recorde agora o conceito de composição de funções. Dadas duas f.r.v.r., f : Df → R


e g : Dg → R, chamamos composta de f com g ou g após f à função denotada por g ◦ f
cujo domı́nio é:
Dg◦f = {x ∈ Df : f (x) ∈ Dg }
e que se define através de:
(g ◦ f ) (x) = g [f (x)] .
Exemplo 7. Sejam f e g tais que f (x) = ln x e g(x) = |x|. Então
( (
ln x, se ln x ≥ 0 ln x, se x ≥ 1
(g ◦ f ) (x) = g [f (x)] = |ln x| = = .
− ln x, se ln x < 0 − ln x, se x ∈ ]0, 1[

Caracterize f ◦ g.
Ainda a respeito de funções invertı́veis, note que se considerarmos a composta de f
com a sua inversa, temos:

f −1 ◦ f (x) = x, ∀x ∈ Df

(1.2)
16 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

ou seja,
f −1 ◦ f = id,
a função identidade, cujo gráfico é a bissectriz dos quadrantes ı́mpares (ver Figura 1.5)(3 ).
Em termos gráficos, (1.2) reafirma o que havı́amos concluı́do acerca da simetria entre os
gráficos de f e de f −1 em relação à recta y = x.

Um aspecto essencial num gráfico é a chamada monotonia de uma função. Uma


função f definida em ]a, b[ diz-se monótona crescente (respectivamente, estritamente
crescente) nesse conjunto se

∀x,y∈]a,b[ , x < y =⇒ f (x) ≤ f (y) (resp., f (x) < f (y)).

Por outro lado, f dir-se-á monótona decrescente (resp., estritamente decrescente) em


]a, b[ se
∀x,y∈]a,b[ , x < y =⇒ f (x) ≥ f (y) (resp., f (x) > f (y)).
Dada uma f.r.v.r., f , diremos que ela é limitada no seu domı́nio, Df , se Df0 for um
conjunto limitado. Dito de outro modo, se existirem números reais m, M tais que

m ≤ f (x) ≤ M, ∀x∈Df . (1.3)

Qualquer valor m (resp., M ) que satisfaça (1.3) diz-se minorante (resp., majorante) de
Df0 . É uma tarefa simples mostrar que f é limitada se e só se existe L ≥ 0 tal que:

|f (x)| ≤ L, ∀x∈Df .

Seja agora f uma f.r.v.r definida em ]a, b[ e considere x0 ∈ ]a, b[. Diremos que f
atinge um máximo relativo (ou local) em x0 ou que f (x0 ) é um máximo relativo de f
se
∃δ>0 : f (x) ≤ f (x0 ) , ∀x∈Bδ (x0 ) . (1.4)
Mutatis mutandis, diremos que f atinge um mı́nimo relativo (ou local) em x0 ou que
f (x0 ) é um mı́nimo relativo de f se

∃δ>0 : f (x) ≥ f (x0 ) , ∀x∈Bδ (x0 ) . (1.5)

Máximos e mı́nimos relativos de f são chamados extremos relativos. Se a desigualdade


em (1.4) (respectivamente, em (1.5)) se verificar para todo o x em Df , diremos que f (x0 )
é máximo (resp., mı́nimo) absoluto de f .
O conceito de paridade de uma função tem consequências gráficas importantes. Re-
cordemos que uma função f : D ⊂ R −→ R se diz par se

∀x,(−x)∈D , f (−x) = f (x).


3
Note que também se tem
f ◦ f −1 (x) = Id(x), ∀x ∈ Df −1 .


Contudo, pode acontecer que f ◦ f −1 6= f −1 ◦ f , pois Id e id podem diferir nos respectivos domı́nios.
1.1. DEFINIÇÕES INICIAIS 17

Isto significa que o gráfico de uma função par é simétrico relativamente ao eixo OY . São
exemplos de gráficos de funções pares as parábolas de equação

y = x2 + C, C ∈ R,

e, mais geralmente, as funções definidas pelas equações

y = xn + C, C ∈ R,

com n par. Também são pares a função módulo e as funções cos e sec (ver na próxima
secção). Por outro lado, uma função f diz-se ı́mpar se

∀x,(−x)∈D , f (−x) = −f (x).

Uma função ı́mpar tem gráfico simétrico relativamente à origem. Para este tipo de funções,
a parte do gráfico correspondente a x < 0 obtém-se por rotação de um ângulo π em torno
da origem da parte relativa a x > 0 (e vice-versa). São exemplos de funções ı́mpares as
funções definidas através de
1
y = xn , y = n ,
x
com n ı́mpar, assim como as funções sin, tg , cotg e cossec.
Cabe aqui dizer que a análise da paridade apenas faz sentido num conjunto simétrico
relativamente à origem da recta real, isto é, em todo o A tal que

∀x , x ∈ A ⇒ −x ∈ A.

Problema 1. Admita que o gráfico de uma função é simétrico relativamente a uma recta
vertical, x = a. Como definir analiticamente este facto?

Por último, uma f.r.v.r. diz-se periódica se existir T 6= 0 tal que

∀x∈D , ∀x+T ∈D , f (x + T ) = f (x). (1.6)

Sendo f uma função periódica, T diz-se perı́odo de f . Torna-se fácil perceber que

f (x + kT ) = f (x), k ∈ Z.

Ao menor T > 0 que satisfaz (1.6) chamamos perı́odo fundamental ou perı́odo positivo
mı́nimo. São exemplos de funções periódicas as funções trigonométricas directas: sin e
cos, de perı́odo 2π, e tg e cotg, de perı́odo π.
18 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

1.1.3 Uma aplicação à Economia: funções oferta e procura


Dado o mercado de um bem, uma função procura é toda aquela que nos fornece a quan-
tidade, q, que um determinado comprador pretende adquirir do referido bem enquanto
função do seu preço unitário, p. Por seu turno, uma função oferta descreverá a quanti-
dade, q, que o vendedor está disposto a transacionar como função do seu preço unitário,
p. Usualmente, estas funções são designadas por D e S (do inglês demand e supply)
respectivamente. Considerações económicas simples expressas nas leis da oferta e da
procura levam-nos a afirmar que, idealmente, uma função procura é decrescente e uma
função oferta é crescente: os consumidores desejarão adquirir uma menor quantidade do
bem à medida que o seu preço unitário aumenta; os vendedores estarão dispostos a vender
uma maior quantidade perante um aumento do preço unitário (numa interpretação alterna-
tiva, um maior valor do preço unitário induz, eventualmente, maior empenho e tempo dos
trabalhadores empregues na produção do referido bem, o que se traduz numa maior quan-
tidade disponı́vel para venda). O ponto de equilı́brio do mercado, E, obtém-se quando a
oferta iguala a procura.
Suponhamos que a função procura de um determinado bem é dada por q = D (p) tal
que
q = 8 − 4p.
O gráfico desta função é a recta definida (por exemplo) pelos pontos (0, 8) e (2, 0), com
declive negativo, o qual reflecte a mencionada lei da procura. Por outro lado, admitamos
que a função oferta q = S (p) para o referido bem é dada por

q = p + 3,

cujo gráfico é a recta definida pelos pontos (0, 3) e (−3, 0). O declive positivo traduz
agora a lei da oferta. O gráfico das duas funções está representado num referencial Opq,
na figura abaixo, onde a parte relevante em termos económicos diz respeito ao primeiro
quadrante, uma vez que nem p nem q podem assumir valores negativos.

Figura 1.13: Funções oferta e procura no mercado de um bem, e ponto de equilı́brio.


1.1. DEFINIÇÕES INICIAIS 19

O ponto de equilı́brio resulta de

D (p) = S (p) ⇔ 8 − 4p = p + 3 ⇔ p = 1.

Substituindo p por 1 em qualquer uma das funções, virá

D (1) = S (1) = 4.

Assim, o ponto de equilı́brio do mercado será (1, 4).


Por razões históricas, os economistas tendem a representar as leis de oferta e da pro-
cura colocando os valores de q no eixo horizontal e os valores de p no eixo vertical. Isto
consegue-se algebricamente, determinando as funções procura-inversa e oferta-inversa,
como se segue:

q = 8 − 4p
q
⇔ p=2− função procura-inversa (i.e., D−1 )
4
e

q = p+3
⇔ p = −3 + q função oferta-inversa (i.e., S −1 ).

A primeira relação reflecte agora o maior preço a que uma quantidade q do bem em causa
encontrará compradores, ao passo que a segunda traduz o menor preço que os produtores
estão dispostos a vender uma determinada quantidade q do bem produzido. Obtemos
assim o gráfico seguinte:

Figura 1.14: Funções oferta e procura inversa no mercado de um bem.

ao qual também se podia chegar através da simetria descrita na anterior subsecção. Note
que, como é evidente, o ponto de equilı́brio é agora (4, 1).
20 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

1.2 Gráficos e propriedades das funções elementares


Muitos fenómenos da vida real – e as ciências económicas não são excepção – podem
ser modelizados recorrendo a colecções de funções ditas elementares. Nesta secção
iremos recordar os gráficos e as principais propriedades das funções elementares mais
frequentemente utilizadas, sem nos preocuparmos com grandes detalhes. Mais adiante,
com a revisão das noções de limite, continuidade e derivada poderemos tratar das devidas
justificações.
A primeira grande classificação de f.r.v.r. elementares divide-as em funções algébri-
cas e funções transcendentes. Embora possamos dizê-lo de maneira mais rigorosa
(para tal, consulte o Apêndice 1.2), as funções algébricas na variável x são aquelas
cuja expressão designatória envolve esta variável operada através das quatro operações
algébricas, de potências de expoente inteiro e quocientes entre estas, e de potências de ex-
poente racional. Trata-se pois do conjunto das funções polinomiais, das funções racionais
e das funções irracionais, como por exemplo as funções f , g e h tais que
3 x2 − 1 1
f (x) = x − 2x + 1, g (x) = 3 e h (x) = √
5
,
x +1 x3 + 1
definidas nos respectivos domı́nios. As f.r.v.r. que não são algébricas dir-se-ão transcen-
dentes. São exemplos destas as funções exponenciais e logarı́tmicas, a função exponencial-
potência e as funções trigonométricas (directas e inversas).

1.2.1 Funções algébricas


Vamos pois recordar quais as funções algébricas bem como as respectivas propriedades
principais.

Funções polinomiais
Chamamos função polinomial ou polinómio a toda a f.r.v.r. p, de domı́nio R, da forma
p (x) = an xn + an−1 xn−1 + ... + a1 x + a0 ,
onde n ∈ N e os ai ∈ R são ditos coeficientes do polinómio. Diremos que o grau do
polinómio é n, escrevendo então gr (p) = n, se an 6= 0. São exemplos de polinómios as
seguintes funções p:
• as funções constantes:
p (x) = C, com C ∈ R,
representadas graficamente pelas rectas horizontais y = C;
• as funções afins:
p (x) = m x + b, com m 6= 0,
representadas graficamente pelas rectas não verticais com declive m e ordenada na
origem b;
1.2. GRÁFICOS E PROPRIEDADES DAS FUNÇÕES ELEMENTARES 21

• as funções quadráticas:

p (x) = ax2 + bx + c, com a 6= 0, (1.7)

representadas por parábolas convexas se a > 0 e côncavas se a < 0, podendo


intersectar o eixo dos xx nos eventuais zeros da função;

• as funções do tipo xn , com n ∈ N, n 6= 1, cujos gráficos passam na origem, sendo


pares se n for par e ı́mpares se n for ı́mpar.

Figura 1.15: Gráficos dos polinómios p tais que p(x) = xn , com n = 2, 3, 4, ....

Nota 5. Em diversos livros e disciplinas de Economia é frequente ver as funções afins


apelidadas de funções lineares, o que constitui, no mı́nimo, um abuso de linguagem.
Com efeito, apenas podem ser chamadas lineares as funções afins cujo gráfico passa na
origem, i.e., aquelas cuja expressão é:

p (x) = m x,

porquanto são estas as únicas que satisfazem a linearidade, a saber:

p (x1 + x2 ) = p (x1 ) + p (x2 ) , ∀x1 ,x2 ∈R e p (αx) = αp (x) , ∀x∈R ,

onde α é uma constante real. A explicação para esta designação errónea – que evitaremos
– residirá no facto de as funções afins serem representadas por linhas rectas.
A respeito da representação de rectas, recorde que, conforme os dados, há vantagem
na utilização de uma ou de outra equação cartesiana da recta (consulte a subsecção 1.1.1).
Assim, por exemplo, conhecidos o declive, m, e um ponto (x0 , y0 ) da recta, é manifesta-
mente mais cómodo recorrer à equação ponto-declive:

y − y0 = m (x − x0 ) ,

pois esta evita o cálculo do valor de b na equação reduzida da recta.


A respeito da parábola de equação

y = ax2 + bx + c,
22 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

recorde que o seu vértice é atingido no ponto de abcissa

b
− .
2a
Assim, o máximo ou mı́nimo da função quadrática p definida por (1.7) será atingido em
  
b b
− ,p − .
2a 2a

Vimos já de que forma a técnica do completamento do quadrado nos permite escrever
a equação da parábola na forma reduzida:

y − y0 = k (x − x0 )2 ,

a qual, como já se sublinhou, evidencia o seu vértice, (x0 , y0 ), o seu eixo de simetria – a
recta x = x0 – e a sua concavidade, consoante o sinal de k. Eis outro exemplo.

Exemplo 8. Considere a função quadrática f tal que

f (x) = 2x2 + 8x + 9.

Podemos escrever:

f (x) = 2(x2 + 4x) + 9


= 2(x2 + 4x + 4) − 8 + 9
= 2 (x + 2)2 + 1.

Assim, a parábola representativa do gráfico de f terá equação

y = 2 (x + 2)2 + 1,

ou seja
y − 1 = 2 (x + 2)2 ,
patenteando que o vértice é o ponto

(−2, 1)

e o eixo de simetria será


x = −2.
A parábola será convexa, uma vez que k = 2 > 0.

Mais adiante, falaremos novamente de parábolas no contexto das cónicas.


1.2. GRÁFICOS E PROPRIEDADES DAS FUNÇÕES ELEMENTARES 23

Funções racionais
Chamamos função racional a toda aquela que se exprime como quociente de dois po-
linómios. Assim, será toda a função do tipo

p (x)
R(x) = , ∀x∈R:q(x)6=0 .
q (x)

Uma função racional diz-se própria se gr p (x) < gr q (x). Caso não seja própria, pode-
se efectuar a divisão de modo a exprimir R(x) na forma:

r (x)
R(x) = s(x) + ,
q (x)

r (x)
em que é já função racional própria.
q (x)
Exemplo 9. (a) São exemplos de funções racionais próprias as funções f tais que
1
f (x) = x−n = , com n ∈ N.
xn
Repare que ambas as famı́lias de funções têm domı́nio R\{0}, sendo os eixos coordena-

Figura 1.16: Gráficos das funções definidas por y = x−n .

dos assı́ntotas dos respectivos gráficos.


3x + 1
(b) Considere a seguinte função racional não própria: g(x) = . Temos:
x−2
3x + 1 7
g(x) = =3+ .
x−2 x−2
Uma representação gráfica de g é dada na figura seguinte. Esta inclui, a tracejado, as
rectas x = 2 e y = 3. Como se recordará certamente, tais rectas são as assı́ntotas vertical
e horizontal do Gg , respectivamente.
24 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

3x + 1
Figura 1.17: Gráfico de g tal que g(x) = .
x−2

Funções irracionais
Uma função diz-se irracional se a variável independente está sob o sı́mbolo de radical
(e não pode escrever-se na forma de função racional). Assim, funções f , g e h tais que
√ p √
f (x) = x, g (x) = |x + 3| e h (x) = 3 x + 2

são exemplos de funções irracionais.


Dentro destas, assumem particular destaque as funções f definidas por
m √
f (x) = x n = n xm , com m, n ∈ N, m 6= n.

Estas têm por domı́nio R+ 0 , se n for par, e R, se n for ı́mpar. A tı́tulo de exemplo, tomemos
as funções f e g tais que
√ √
f (x) = x, x ∈ R+ 0 e g (x) = 3 x, x ∈ R.

Eis os respectivos gráficos.

√ √
Figura 1.18: Gráficos de f e de g tais que f (x) = x e g (x) = 3
x.
1.2. GRÁFICOS E PROPRIEDADES DAS FUNÇÕES ELEMENTARES 25

1.2.2 Funções transcendentes


Dentro das funções transcendentes, iremos destacar as funções exponenciais e logarı́tmicas,
a função exponencial-potência e as funções trigonométricas (directas e inversas).

Funções exponenciais e logarı́tmicas


CASO a > 1

Chamamos exponencial de base a > 1 à f.r.v.r. tal que f (x) = ax . Trata-se de uma
função tal que Df = R, estritamente crescente no seu domı́nio e cujo contra-domı́nio é
R+ . O seu gráfico é o seguinte:

Como se pode observar, a0 = 1 e

lim ax = 0 e lim ax = +∞ .
x→−∞ x→+∞

Sendo uma função injectiva, faz sentido definir a sua função inversa, à qual se dá o
nome de função logaritmo de base a, denotada por loga x. Por definição de inversa,
temos:
y = loga x ⇐⇒ x = ay .

Nota 6. Esta relação reflecte a habitual definição de logaritmo. Como deve recordar,
logaritmo de x na base a é o número y a que se tem de elevar a base de modo a obter x.

Trata-se de uma função que é também estritamente crescente, com domı́nio R+ e


contra-domı́nio R. O seu gráfico é o seguinte:
26 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

É possı́vel observar que loga 1 = 0 e também que

lim loga x = −∞ e lim loga x = +∞.


x→0+ x→+∞

Recordemos por fim que quando a base é o número de Neper, e = 2.718..., em vez de
escrevermos loge x utilizamos as seguintes notações para o logaritmo dito neperiano ou
natural:
log x = ln x.

CASO 0 < a < 1

Chamamos exponencial de base a ∈ ]0, 1[ à f.r.v.r. tal que f (x) = ax , definida em


R. É uma função estritamente decrescente no seu domı́nio e cujo contra-domı́nio é R+ .
O seu gráfico é o seguinte:

O gráfico evidencia igualmente que a0 = 1, sendo agora:

lim ax = +∞ e lim ax = 0 .
x→−∞ x→+∞

Dada a injetividade desta função, podemos definir agora a sua inversa, a função loga-
ritmo de base a, com a ∈ ]0, 1[. O seu gráfico é:

Tem-se assim:

lim loga x = +∞ e lim loga x = −∞ .


x→0+ x→+∞
1.2. GRÁFICOS E PROPRIEDADES DAS FUNÇÕES ELEMENTARES 27

Em ambos os casos, a > 1 ou a ∈ ]0, 1[ , temos as seguintes propriedades, fruto da


composição de uma função com a sua inversa:

loga ax = x, ∀x ∈ R e aloga x = x, ∀x ∈ R+ .

Por outro lado, recordamos também as seguintes propriedades:

1) ax ay = ax+y , ∀x, y ∈ R

ax
2) = ax−y , ∀x, y ∈ R
ay

3) loga (x y) = loga x + loga y , ∀x, y ∈ R+


 
x
4) loga = loga x − loga y , ∀x, y ∈ R+
y

5) loga xk = k loga x , ∀x ∈ R+ , ∀k ∈ R

logc a
6) logb a = logc b
, ∀a, b, c ∈ R+ \ {1}

Interpretação económica do número e e sua generalização


O número e pode ser interpretado em termos económicos através da seguinte situação.
Admita que um banqueiro excêntrico oferece um taxa de juro (nominal) de 100% ao ano,
permitindo juro simples ou composto m vezes ao ano (i.e., em cada perı́odo o juro obtido
no perı́odo anterior é recapitalizado no perı́odo seguinte). Se o principal - capital inicial
investido - for de 1 e e se V (m) for o valor do capital inicial investido ao fim de um ano,
onde m é a frequência de composição (i.e., de recapitalizaçoes) ao longo do ano, temos o
seguinte quadro:

m V (m)
1
1 V (1) = 1 + 100% × 1 = 1 (1 + 100%) = 1 1 + 11
2
2 V (2) = 1 + 50% × 1 + (1 + 50% × 1)50% = (1 + 50% × 1)(1 + 50% × 1) = 1 1 + 12
4
4 V (4) = (1 + 25% × 1)(1 + 25% × 1)(1 + 25% × 1)(1 + 25% × 1) = 1 1 + 14
.. ..
. . m
m V (m) = 1 1 + m1
28 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

A situação em que o juro é composto continuamente durante o ano significa que m tende
para infinito. Assim o activo inicial valerá ao fim de um ano:
 m
1
lim 1 1 + = e ( e ).
m→+∞ m
Assim, o número e ≈ 2.71828 pode ser interpretado como o valor que um principal de
1 e atinge ao final de um ano se o juro à taxa (nominal) de 100% ao ano for composto
continuamente (4 ).
O processo de juros compostos continuamente pode ser generalizado em três direcções:
1. uma taxa de juro nominal de r% (em vez de 100%);
2. um principal qualquer A (em vez de 1 e);
3. um número t de anos de composição (em vez de apenas 1 ano).
Não é difı́cil perceber que a fórmula de juro composto assumirá então a forma:
 r mt
V (m) = A 1 + (1.8)
m
Nesta, A traduz o capital inicialmente investido (o principal), mt o número de composições
em t anos e mr significa que em cada um dos perı́odos de composição em cada ano apenas
1
m
da taxa nominal r será realmente aplicável (i.e., recapitalizada).
Note que neste processo generalizado de composição tem-se:
 r mt
V = lim A 1 + = Aert .
m→+∞ m
Razões teóricas e conceptuais permitem-nos tomar t como variável contı́nua e definir
a função V tal que
V (t) = Aert . (1.9)
Nota 7. Note que o juro composto surgiu aqui como mero exemplo para uma interpretação
ilustrativa de e e, generalizando, do crescimento exponencial. Poderı́amos ter optado pelo
crescimento populacional, da riqueza ou do capital real.

Função exponencial-potência
Chamamos função exponencial-potência a toda a função de base e expoente variáveis.
Sendo h uma f.r.v.r deste tipo, temos:
g(x)
h(x) = [f (x)]g(x) = eln [f (x)] = eg(x) ln f (x)
.

O domı́nio desta função é:

Dh = {x ∈ R : x ∈ Df ∩ Dg ∧ f (x) > 0} = {x ∈ Df ∩ Dg : f (x) > 0} .


4 2.71828−1
A taxa de juro efectiva correspondente é aproximadamente de 1 ≈ 172%.
1.2. GRÁFICOS E PROPRIEDADES DAS FUNÇÕES ELEMENTARES 29

Um exemplo de função exponencial-potência é


 x
1
h(x) = 1 + .
x

Recorde que lim h(x) = e. Havemos de voltar a estas funções aquando da abordagem
x→+∞
de certo tipo de indeterminações.

Funções trigonométricas
As funções seno e cosseno estão definidas e são contı́nuas no seu domı́nio, R. São
periódicas de perı́odo 2π e assumem valores em [−1, 1] . A primeira é ı́mpar e a segunda
é par. Eis o gráfico de cada uma delas:

Figura 1.19: Gráficos das funções seno e cosseno.

Para além destas, são conhecidas as funções trigonométricas tangente, cotangente, se-
cante e cossecante, definidas como se segue:
sin x nπ o 1 nπ o
tg x = , x ∈ R\ + kπ : k ∈ Z sec x = , x ∈ R\ + kπ : k ∈ Z
cos x 2 cos x 2
cos x 1
cotg x = , x ∈ R\ {kπ : k ∈ Z} cossec x = , x ∈ R\ {kπ : k ∈ Z}
sin x sin x
Seguem-se os gráficos das funções tangente e cotangente.
30 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Figura 1.20: Gráficos das funções tangente e cotangente.

As funções tangente e cotangente são contı́nuas nos respectivos domı́nios, têm infini-
tas assı́ntotas verticais, são ı́mpares, sobrejectivas e periódicas de perı́odo π.
Nas figuras seguintes encontramos os gráficos de pares de funções: tangente/cotangente,
seno/cossecante e cosseno/secante. Em cada figura, procure perceber as relações existen-
tes entre as funções aı́ representadas.

Figura 1.21: Gráficos das funções tangente e cotangente num mesmo referencial.

Figura 1.22: Gráficos das funções seno e cossecante num mesmo referencial.

Exercı́cio 6. À semelhança do que foi feito para as funções tangente e cotangente, des-
creva as propriedades gráficas das funções secante e cossecante.
1.2. GRÁFICOS E PROPRIEDADES DAS FUNÇÕES ELEMENTARES 31

Figura 1.23: Gráficos das funções cosseno e secante num mesmo referencial.

As funções trigonométricas seno, cosseno, tangente e cotangente não são invertı́veis,


uma vez que não são injectivas. Contudo, é possı́vel considerar as inversas de restrições
dessas funções a intervalos onde tal propriedade se verifique, como veremos mais adiante.
Estas funções têm também, como recordará para as que já conhecia, uma representação
no chamado cı́rculo trigonométrico.

Figura 1.24: Cı́rculo trigonométrico.

Recorde ainda a tabela das razões trigonométricas de alguns ângulos notáveis no pri-
meiro quadrante.
π π π
6 4
√ 3

1 2 3
sin 2
√ √2 2
3 2 1
cos √2
3
2 √
2
tg 1 3
√3 √
3
cotg 3 1 3

Por último, a par da Fórmula Fundamental da Trigonometria:

sin2 x + cos2 x = 1,

deixamos aqui as principais fórmulas trigonométricas de eventual utilidade posterior.


32 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

1 + tg2 x = sec2 x 1 + cotg2 x = cossec2 x

sin (x ± y) = sin x cos y ± sin y cos x cos (x ± y) = cos x cos y ∓ sin x sin y

sin (2x) = 2 sin x cos x cos (2x) = cos2 x − sin2 x

tg x ± tg y 2tg x
tg (x ± y) = tg (2x) =
1 ∓ tg x tg y 1 − tg2 x

Funções trigonométricas inversas


Como antes se disse, nenhuma das funções trigonométricas é injectiva no respectivo
domı́nio, o que invalida a existência das respectivas inversas. Contudo, é possı́vel restrin-
gir cada um dos domı́nios a subconjuntos que sejam, simultaneamente, representativos
da função e onde as restrições sejam injectivas. Fá-lo-emos em pormenor para a função
seno.

Função Arco-Seno
h π πi
Dada a f.r.v.r. sin : R −→ [−1, 1], consideremos a sua restrição ao conjunto − , ,
2 2
definida por: h π πi
f = sin |" π π # : − , −→ [−1, 1]
− , 2 2
2 2
x 7−→ sin x
Esta função é injectiva e a sua inversa define-se do seguinte modo:
h π πi
−1
f : [−1, 1] −→ − ,
2 2
x 7−→ f −1 (x)

Temos então:

y = f −1 (x) ⇐⇒ x = f (y) ⇐⇒ x = sin y.

A função f −1 tem o nome de arco-seno, denota-se por arcsin, e quando escrevermos

y = arcsin x

leremos ”y é o arco cujo seno é x” ou ”y é o ângulo cujo seno vale x”. Temos então:
h π πi
arcsin : [−1, 1] −→ − ,
2 2
x 7−→ y = arcsin x
1.2. GRÁFICOS E PROPRIEDADES DAS FUNÇÕES ELEMENTARES 33

onde
y = arcsin x ⇐⇒ x = sin y.
Por abuso de linguagem, será frequente dizermos que o arco-seno é a função in-
versa do seno, quando na realidade nos estamos a referir à inversa de uma das possı́veis
restrições da função seno.
h π π igráfica de f pode obter-se a partir da representação da restrição da
Uma representação
função seno a − , , por simetria desta relativamente à recta y = x. Seguem-se duas
2 2
versões: uma obtida manualmente e outra recorrendo a uma ferramenta gráfica.

Figura 1.25: Gráficos das funções seno e arco-seno.

Função Arco-Cosseno
Seja
cos |[0,π] : [0, π] −→ [−1, 1]
x 7−→ cos x
a restrição da função cos ao conjunto [0, π] Estamos na presença de uma função injectiva
cuja inversa se designa por função arco-cosseno e se define do seguinte modo:
arccos : [−1, 1] −→ [0, π]
x 7−→ y = arccos x
34 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Temos então:

y = arccos x ⇐⇒ x = cos y , ∀x∈[−1,1] .

Ao escrevermos y = arccos x leremos ”y é o arco (ou ângulo) cujo cosseno vale x”.

Exercı́cio 7. Mostre que uma representação gráfica da função arccos obtida a partir da
representação da restrição da função cosseno a [0, π], por simetria desta relativamente à
recta y = x é semelhante à que surge na seguinte figura:

Função Arco-Tangente
Seja i π πh
tg|# π π : − ,
" −→ R
− , 2 2
2 2
x 7−→ tg x
i π πh
a restrição da função tg ao conjunto − , . Esta é já uma função injectiva cuja inversa
2 2
se designa por função arco-tangente e se define do seguinte modo:
i π πh
arctg : R −→ − ,
2 2
x 7−→ y = arctg x

Temos então:
y = arctg x ⇐⇒ x = tg y , ∀x∈R .
Ao escrevermos y = arctg x leremos ”y é o arco (ou ângulo) cuja tangente vale x”.

Exercı́cio 8. Mostre que uma representação gráficai da função arc tg obtida a partir da
π πh
representação da restrição da função tangente a − , , por simetria desta relativa-
2 2
mente à recta y = x é semelhante à que surge na seguinte figura:
1.2. GRÁFICOS E PROPRIEDADES DAS FUNÇÕES ELEMENTARES 35

Função Arco-Cotangente
Por último, considere
cotg|]0,π[ : ]0, π[ −→ R
x 7−→ cotg x
a restrição da função cotg ao conjunto ]0, π[. Trata-se de função injectiva cuja inversa se
designa por função arco-cotangente e se define do seguinte modo:
arccotg : R −→ ]0, π[
x 7−→ y = arccotg x
Temos então:
y = arccotg x ⇐⇒ x = cotg y , ∀x∈R .
Ao escrevermos y = arccotg x leremos ”y é o arco (ou ângulo) cuja cotangente vale x”.
Exercı́cio 9. Mostre que uma representação gráfica da função arc cotg obtida a partir da
representação da restrição da função cotangente a ]0, π[, por simetria desta relativamente
à recta y = x é semelhante à que surge na seguinte figura:

Nota 8. 1. Mais adiante, poderemos justificar em pormenor tanto a monotonia como as


concavidades do gráfico de cada uma das funções trigonométricas inversas.
2. É também possı́vel definir inversas para restrições das funções secante e cossecante -
as funções argumento-secante e argumento-cossecante - , mas não nos deteremos nestas.
36 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

FOLHA DE EXERCÍCIOS E PROBLEMAS N.o 1

1. Em cada uma das alı́neas, dados os conjuntos A e B, represente sob a forma de


intervalo de números reais os conjuntos
A, B, A ∩ B, A ∪ B, A\B e B\A.

(a) A = {x ∈ R : |3x + 1| < 4} e B = x ∈ R : (x − 3)2 ≤ 9




(b) A = {x ∈ R : |x − 1| ≥ 5} e B = {x ∈ R : 4 − x2 < 0}
(c) A = x ∈ R : x1 + 3 > 1 e B = {x ∈ R : x3 − x2 − 2x < 0}


2. Recorra à técnica do completamento do quadrado para escrever as equações das


cónicas na forma reduzida. Para cada uma delas, identifique os seus elementos
geométricos essenciais e esboce as respectivas curvas num referencial o.n. XOY .
(a) y = 2x2 + x + 1; (b) y = −x2 − 4x − 5;
(c) x2 − 4x + y 2 + 2y = −1; (d) x2 − 2x + y 2 − 2y = 0.

3. Esboce o gráfico de cada uma das seguintes funções.


x+1
(a) f (x) = 1 − |x − 1| (b) g(x) =
x
4. Determine o domı́nio de cada uma das funções definidas pelas expressões dadas.
3x + 1 1
(a) f (x) = (b) g (x) = √ (c) h (x) = ln |x2 − 2|
x3 − x2 − 2x 4
x4− 81
1
(d) j (x) = ex2
(e) p (x) = tg (2x − 1) (f) q (x) = cotg (2x − 1)
(g) r (x) = arcsin |2x − 1| (h) s (x) = arctg |2x − 1| (i) t (x) = cos (arcsin x)

5. Defina a função inversa de cada uma das seguintes funções.


√ √ x+2
(a) f (x) = x (b) g (x) = x2 − 4, x ≥ 2 (c) h (x) = 3x (d) i (x) =
x
6. Esboce o gráfico de cada uma das funções seguintes e identifique as suas princi-
pais caracterı́sticas (domı́nio, monotonia, contra-domı́nio, existência de extremos e
paridade).
(a) f (x) = ln x + 3 (b) f (x) = ln (x + 3) (c) f (x) = ln |x + 3|
x
 √ x
(d) f (x) = |ln (x + 3)| (e) f (x) = e− 2 (f) f (x) = 23
x
(g) y = 3 2 (h) y = log2 (x − 1) (i) y = log 1 (x − 1)
2

1 |x|
x
(k) y = 21

(j) y = log 1 |x − 1| (l) y = 2
2
1.2. GRÁFICOS E PROPRIEDADES DAS FUNÇÕES ELEMENTARES 37

7. Seja f uma f.r.v.r. tal que f (x) = cos x. Obtenha o gráfico de cada uma das funções
definidas, descrevendo a transformação subjacente a cada alı́nea.

(a) f1 (x) = 3f (x); (b) f2 (x) = 13 f (x); (c) f3 (x) = f (3x); (d) f4 (x) = f 13 x .


8. Em cada alı́nea, determine o valor dos números dados sem recorrer à calculadora.
1

(a) log5 125 (b) log5 125 (c) log8 64 (d) log8 4 (e) log8 256
1

(f) log 1 125 (g) log 1 125 (h) log 1 64 (i) log 1 4 (j) log 1 256
5 5 8 8 8

9. Utilize propriedades dos logaritmos para expandir a função logarı́tmica dada em


cada caso. r
2
5 4x − 1
(a) ln 2
(b) ln [(x2 + 1) (x − 1)]
4x + 1
10. Em cada alı́nea, escreva a expressão como logaritmo de uma única expressão.

(a) ln 3 + 31 ln (4 − x2 ) − ln x (b) 3 [ln x − 2 ln (x2 + 1)] + 2 ln 5

11. Resolva cada uma das equações dadas na variável real x.



(a) ln x + 1 = 2 (b) ln x + ln (x − 3) = 0

12. Recorrendo às propriedades que relacionam as funções trigonométricas com as suas
inversas e a identidades trigonométricas, calcule:

(a) sin arcsin 21 (b) cos arcsin 12


 
(c) tg (arctg 2) (d) sin (arctg 2)
  √ 
(e) sec (arctg (−1)) (f) arccos (cos π) (g) cos (arctg 3) (h) sin arccos − 23

13. Determine o domı́nio de cada uma das seguintes funções exponencial-potência.

(a) f (x) = (1 + x)x (b) g (t) = (ln t)t−1 (c) h (s) = (tg s)s
  2 −y
1 −1+e
(d) i (x) = (arcsin x)x (e) j (x) = (arctg x)x (f) k (y) = −
y

14. Admita que a procura (D) e a oferta (S) de um determinado bem são dadas por

q = 11 − 3p e q = 1 + 2p,

respectivamente. Esboce o gráfico de ambas as funções num referencial Opq e


determine o ponto de equilı́brio do mercado do referido bem.

15. As funções procura e oferta (D e S, respectivamente) de um determinado bem estão


representadas graficamente na figura seguinte.
38 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

(a) Determine as expressões de D (p) e de S(p).


(b) Determine o ponto de equilı́brio do mercado, designado por E.
16. A função procura de um determinado bem é dada por q = D (p), onde
D (p) = 75e−3p , p ≥ 0.
(a) Esboce o gráfico da função D num referencial Opq.
(b) Determine a função procura-inversa.
(c) Represente a função procura-inversa num referencial Oqp.
17. Se um banco pagar 5% de juros compostos anualmente, ao fim de t anos o valor de
um depósito inicial de D euros após t anos é dado por P V (t) = D (1.05)t .
(a) Quantos anos são necessários para duplicar o depósito inicial?
(b) Se D = 1000 euros, qual será o montante acumulado após 10 anos?
(c) Compare a situação em (b) com outra em que o depósito incial rende juros de
5% ao ano, compostos mensalmente (para o mesmo D e o mesmo perı́odo).
18. (*) (5 ) Um dado fenómeno é modelizado através de uma função f cujo gráfico é o
seguinte. Na figura, T e X representam constantes reais e positivas.

(a) A figura sugere que a função f é periódica. Qual o seu perı́odo.


(b) Indique a expressão que define f no intervalo [0, T [.
(c) Atendendo a (b), indique agora a expressão de f para todo o seu domı́nio.
(d) Indique uma situação da vida real que possa ser modelizada por esta função.

5
Os exercı́cios marcados com (*) são considerados de dificuldade acima da média.
1.3. LIMITE E CONTINUIDADE 39

1.3 Limite e Continuidade


O conceito de limite encontra-se entre os fundamentais do Cálculo Diferencial. Embora
todos tenhamos a noção intuitiva do que significa dizer que f (x) tende para um certo
valor L quando x tende para c, o facto é que a clarificação rigorosa desta afirmação só
foi feita no séc. XIX (com Cauchy). Evidentemente, na prática, isto não foi óbice para
o cálculo de limites. Trata-se de calcular os diferentes valores de uma função para listas
de pontos cada vez mais próximos, quer à direita quer à esquerda, de c. Com as actu-
ais capacidades numéricas e gráficas das calculadoras ou dos programas computacionais
(Derive, Mathematica, Maple, para só referir alguns), esta tarefa torna-se fácil na maior
parte dos casos. Contudo, em bom rigor, o que estamos fazendo nesses casos é obter uma
estimativa do limite, caso exista, recorrendo às abordagens numérica ou gráfica. Ora, se
em muitos casos nos basta uma estimativa, outros há em que se requer rigor, havendo
ainda a registar situações em que tais ferramentas são insatisfatórias e até enganadoras.
A este propósito, e caso tenha acesso fácil a algum dos programas referidos ou a uma
calculadora gráfica, tenha em atenção as diversas ”Armadilhas Tecnológicas” que o livro
de texto Cálculo (Larson et al, [5] e [6]) vai referindo ao longo dos diversos capı́tulos.

1.3.1 Limite: perspectivas numérica, gráfica e analı́tica


Suponha que f é uma f.r.v.r. tal que

x2 − 3x + 2
f (x) = , para x ∈ R\ {2} .
x−2
Pretendendo estudar o comportamento do gráfico de f na vizinhança de 2, poderá cons-
truir a seguinte tabela para valores cada vez mais próximos de 2, quer à direita quer à
esquerda (na tabela, ”N.D”abrevia ”não definida”):

x 1.9 1.99 1.999 2 2.001 2.01 2.1


f (x) 0.900 0.990 0.999 N.D. 1.001 1.010 1.100

O que se deduz desta tabela é o seguinte: quando x se aproxima arbitrariamente de 2, f (x)


estará arbitrariamente próximo de 1. Dito de outro modo, esta tabela parece evidenciar
que o limite de f (x) quando x tende para 2 existe e é igual a 1. Simbolicamente:

lim f (x) = 1.
x→2

Mais: esta tendência faz-se quer x se aproxime por valores menores quer o faça por
valores maiores que 2, ou seja:

lim f (x) = 1 = lim+ f (x).


x→2− x→2

A estimativa fornecida pela tabela parece ser corroborada através de uma ferramenta
gráfica.
40 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

x2 −3x+2
Figura 1.26: Gráfico de f tal que f (x) = x−2
e recta y = 1.

Nota 9. Ao contrário do que a representação parece sugerir, observe que 2 ∈


/ Df .
Embora estas abordagens sejam relevantes em termos intuitivos, deverão ser confir-
madas através de uma abordagem analı́tica, recorrendo a técnicas do cálculo e da álgebra.
Sem ir mais longe, pode reparar que a tentativa de substituir x por 2 anula quer o numera-
dor quer o denominador. Isto quer dizer que 2 é raiz comum aos polinómios x2 − 3x + 2
e x − 2. Logo, podemos escrever:
x2 − 3x + 2 (x − 2) (x − 1)
f (x) = = = x − 1, para x ∈ R\ {2} .
x−2 (x − 2)
Assim,
lim f (x) = lim (x − 1) = 1.
x→2 x→2
Abordagens numérica e gráfica permitem igualmente estabelecer o que se afirma nos
seguintes exemplos.
Exemplo 10. (a) A função sinal definida por

 −1, se x < 0
sgn (x) = 0, se x = 0
1, se x > 0

é tal que lim sgn(x) não existe. Com efeito, esboçando o gráfico de sgn é fácil perceber
x→0
que:
lim− sgn(x) = −1 6= 1 = lim+ sgn(x).
x→0 x→0
1
(b) A função f tal que f (x) = , x 6= 0, cresce ilimitadamente quando x se aproxima
x2
1
de zero, quer à esquerda quer à direita. Assim, não existe lim 2 , embora seja lı́cito
x→0 x
1 6
escrever lim 2 = +∞. ( ) Esboce o gráfico de f .
x→0 x
6
Não existe aqui contradição. Dizemos que não existe limite uma vez que +∞ (e também −∞) não
constituem números reais.
1.3. LIMITE E CONTINUIDADE 41
 
1
(c) Para a função g tal que g(x) = sin , x 6= 0, não existe lim g(x) uma vez que g(x)
x x→0
não se aproxima de nenhum valor real quando x tende para 0. Eis uma representação
gráfica desta função numa vizinhança de 0.

 
1
Figura 1.27: Gráfico de g tal que g(x) = sin .
x

Feita esta introdução, apresenta-se agora a definição formal de limite segundo Cauchy.

Definição 1 (Limite). Seja f uma f.r.v.r. definida num intervalo aberto contendo c, ex-
cepto eventualmente em c, e seja L um número real. Dizemos que f (x) tende para L
quando x tende para c, se para todo o ε > 0 existe algum δ > 0 tal que f (x) está a uma
distância de L inferior a ε sempre que x esteja a uma distância de c inferior a δ (x 6= c).
Simbolicamente, escreveremos:

lim f (x) = L ⇔ ∀ε>0 , ∃δ>0 : [ 0 < |x − c| < δ =⇒ |f (x) − L| < ε ] (1.10)


x→c

Ao valor de L, caso exista, chamamos limite de f (x) quando x tende para c.

Figura 1.28: Ilustração da definição ”ε − δ”de limite.


42 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Graficamente, o que se passa é que apenas existe limite (igual a L) quando, uma vez
fixado arbitrariamente o intervalo ]L − ε, L + ε[ , é possı́vel encontrar alguma vizinhança
]c − δ, c + δ[ \ {c}, tal que a imagem de qualquer ponto nesta vizinhança é um valor em
]L − ε, L + ε[.
Nota 10. 1. Decorre da presente definição e do exemplo dado que uma função pode ter
limite num ponto c sem que esteja definida nesse ponto.
2.Esta definição terá de ser adaptada para os casos em que f apenas está definida em
]c, d[ (ou ]d, c[), e ainda para aqueles em que L = +∞ (ou L = −∞). Assim, se f
apenas estiver definida num intervalo ]c, d[, c, d ∈ R , define-se o chamado limite lateral
à direita em c, como se segue: lim+ f (x) = L se
x→c

∀ε>0 , ∃δ>0 : [ 0 < x − c < δ =⇒ |f (x) − L| < ε ] .


Deixamos ao leitor o cuidado de escrever as versões da definição nos restantes casos:
lim− f (x) (dito limite lateral à esquerda em c), lim f (x) e lim f (x) .
x→c x→−∞ x→+∞

Exemplo 11. Para mostrar que lim (3x + 1) = 7 recorrendo à definição basta que, fixado
x→2
arbitrariamente ε > 0, encontremos algum δ > 0 que verifique a implicação em (1.10).
Ora, para qualquer ε > 0 tem-se:
|3x + 1 − 7| = |3x − 6| = 3 |x − 2| < ε
ε ε
desde que |x − 2| < . Logo, para qualquer ε > 0 existe δ = > 0 tal que
3 3
0 < |x − 2| < δ =⇒ |(3x + 1) − 7| < ε,
o que mostra o pretendido.
A definição de limite é utilizada essencialmente em resultados teóricos, para estabe-
lecer a existência ou inexistência de limites. Para o cálculo corrente de limites vamos
recorrer a métodos analı́ticos mais expeditos do que a definição (mas que, em última
análise, dela resultam).
Em muitos casos, lim f (x) calcula-se simplesmente por substituição directa, i.e.,
x→c
calculando f (c). Assim procedendo, estamos a subentender que a função é contı́nua
(como iremos recordar, mais adiante).
O seguinte resultado garante a unicidade do limite, caso exista. Nele introduzimos a
seguinte notação:
R = ]−∞, +∞[ ∪ {−∞, +∞} ,
que não deve ser entendido como conjunto, mas como a recta real à qual, por comodidade,
juntámos os sı́mbolos −∞ e +∞.
Teorema 2. Seja f uma f.r.v.r. e a = −∞, c− , c, c+ ou +∞ (c ∈ R). Se lim f (x) existir,
x→a
então é único. Além disso, sendo L ∈ R, tem-se:
lim f (x) = L ⇐⇒ lim f (x) = L = lim− f (x) .
x→c x→c+ x→c
1.3. LIMITE E CONTINUIDADE 43

Segue-se um lista de propriedades operatórias do cálculo de limites.

[Propriedades dos limites] Sejam α, c ∈ R e n ∈ N. Admita que as funções f e g são


tais que:
lim f (x) = L e lim g (x) = K,
x→c x→c

com L, K ∈ R. Então:

1. limα = α. 2. lim [α f (x)] = α L.


x→c x→c

3. lim [f (x) ± g (x)] = L ± K. 4. lim [f (x) g (x)] = L K.


x→c x→c
 
f (x) L
5. lim = , desde que K 6= 0. 6. lim [f (x)]m = Lm , desde que m ∈ R+ .
x→c g (x) K x→c
 √ √
 lim n x = n c, se n é ı́mpar, ∀c ∈ R
 x→c
7.
 lim √
 n

x = n c, se n é par, ∀c ∈ R+
x→c

[Limites de funções polinomiais e de funções racionais] Sejam p, q funções polinomi-


p (x)
ais e r uma função racional, com r (x) = . Então:
q (x)

p (c)
lim p (x) = p(c) e lim r (x) = , desde que q (c) 6= 0.
x→c x→c q (c)

[Limite da função composta] Sejam f e g duas funções tais que lim g (x) = L e
x→c
lim f (x) = f (L). Então:
x→L

lim (f ◦ g) (x) = lim f (g (x)) = f (L).


x→c x→c

[Limite das funções trigonométricas] Se c é valor real pertencente ao domı́nio de cada


uma das funções trigonométricas, então:

1. lim sin x = sin c 2. lim cos x = cos c 3. lim tg x = tg c


x→c x→c x→c

4. lim cotg x = cotg c 5. lim sec x = sec c 6. lim cossec x = cossec c


x→c x→c x→c

Vimos já uma técnica algébrica que permite determinar o cálculo de um limite sem
recorrer à definição. A segunda que iremos apresentar consiste na racionalização de ex-
pressões envolvendo radicais, através da multiplicação e divisão pelo conjugado.
44 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

x+1−1
Exemplo 12. Pretende-se calcular lim . Temos:
x→0 x
√ √  √ 
x+1−1 x+1−1 x+1+1 x+1−1
lim = lim √  = lim √ 
x→0 x x→0 x x+1+1 x→0 x x+1+1
1 1
= lim √ = .
x→0 x + 1 + 1 2

Nota 11. Quer no exemplo inicial quer neste, a substituição de xpelo


 valor para o qual
0
tende conduz a uma forma indeterminada ou indeterminação: . Outras existem,
∞ 0
como , (∞ × 0) e (∞ − ∞). Havemos de voltar a elas e apresentaremos outras

relacionadas com as funções exponencial-potência, quando abordarmos uma técnica bas-
tante eficaz para o levantamento de indeterminações dos dois primeiros tipos. Para uma
primeira abordagem, refira-se que o nome ”indeterminação” resulta do facto de poder-
mos obter qualquer resultado quando deparamos com limites deste tipo.

1.3.2 Limites Infinitos e Limites no Infinito: assı́ntotas


Tratemos primeiramente dos casos em que lim f (x) = +∞ ou lim f (x) = −∞ ou
x→c x→c
algum dos limites laterais é infinito (c ∈ R). Em termos gráficos, se isto sucede diremos
que a recta vertical x = c é uma assı́ntota vertical do gráfico de f .

Nota 12. É importante desde já reter que o sinal de igualdade quando, por exemplo, se
escreve
lim f (x) = +∞
x→c

não significa que o limite existe, mas tão-só que, apesar de o limite não existir, é possı́vel
explicitar o comportamento ilimitado (positivo) de f quando x tende para c.
1
Exemplo 13. (a) O gráfico da função f tal que f (x) = tem uma assı́ntota
2 (x + 1)
vertical de equação x = −1, uma vez que

lim f (x) = −∞ e lim f (x) = +∞.


x→(−1)− x→(−1)+

x2 + 1
(b) O gráfico da função f tal que f (x) = 2 tem duas assı́ntotas verticais: as rectas
x −1
x = −1 e x = 1.
(c) O gráfico da função f tal que f (x) = cotg x tem infinitas assı́ntotas verticais: as
rectas x = kπ, com k ∈ Z.

Tratemos agora brevemente do cálculo de limites no infinito. Falemos do caso particu-


lar das funções racionais, nos quais é frequente estarmos na presença de indeterminações
1.3. LIMITE E CONTINUIDADE 45
∞
do tipo . Sem recurso a derivadas, a técnica usual para levantamento destas indeter-

minações consiste em colocar em evidência a maior potência de x presente em cada um
dos polinómios em numerador e em denominador.
Exemplo 14.
 
5 5
x 2+ 2+
2x + 5 x x  =0
(a) lim = lim   = lim 
x→+∞ 3x2 + 1 x→+∞ 1 x→+∞ 1
x2 3 + 2 x 3+ 2
x x
2x2 + 5 2
(b) lim = (· · · ) =
x→+∞ 3x2 + 1 3
2x3 + 5
(c) lim = (· · · ) = +∞
x→+∞ 3x2 + 1

Estes exemplos permitem extrapolar uma regra prática para cálculo de limites no infi-
nito de funções racionais.
[Limites no infinito de funções racionais] Sejam A(x) e B(x) polinómios de graus k e
p, respectivamente (k , p ∈ N0 ), isto é:
A(x) = ak xk + ak−1 xk−1 + ... + a1 x + a0

e
B(x) = bp xp + bp−1 xp−1 + ... + b1 x + b0 .
Então:
A(x) ak x k
lim = lim
x→+∞ B(x) x→+∞ bp xp
e
A(x) ak x k
lim = lim .
x→−∞ B(x) x→−∞ bp xp

Como consequência deste resultado, verifica-se que


A(x) A(x)
1. Se k < p, então lim = lim =0
x→+∞ B(x) x→−∞ B(x)
A(x) A(x) ak
2. Se k = p, então lim = lim =
x→+∞ B(x) x→−∞ B(x) bk
A(x) A(x)
3. Se k > p, então lim = +∞ (−∞) e lim = +∞ (−∞),
x→+∞ B(x) x→−∞ B(x)
ak
dependendo do sinal de .
bp
O comportamento das funções no infinito, avaliado através dos limites lim f (x) e
x→−∞
lim f (x), tem também uma interpretação geométrica importante. De facto, se
x→+∞

lim f (x) = L ∈ R (respectivamente, lim f (x) = L)


x→−∞ x→+∞
46 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

diremos que a função f tem uma assı́ntota horizontal de equação y = L na parte es-
querda (resp., na parte direita) do gráfico.
2x − 1
Exemplo 15. (a) O gráfico da função f tal que f (x) = tem uma assı́ntota hori-
x+1
zontal de equação y = 2, tanto na parte direita como na parte esquerda do gráfico. De
facto:
2x − 1 2x − 1
lim = 2 e lim = 2.
x→−∞ x + 1 x→+∞ x + 1
3x − 2
(b) O gráfico da função g tal que g(x) = √ tem duas assı́ntotas horizontais: as
2
√ √ 2x + 1
rectas y = 3 2 2 na parte direita e y = − 3 2 2 na parte esquerda do gráfico.
(c) O eixo dos XX é uma assı́ntota horizontal, tanto na parte direita como na parte
2
esquerda do gráfico da função h tal que h(x) = e−x .
Como é evidente, haverá casos em que uma função não tem assı́ntotas horizontais.

Por último, pode suceder que o gráfico de f no infinito se aproxime não de uma recta
horizontal mas de uma recta oblı́qua, r, de equação
y = m x + b, com m ∈ R\ {0} e b ∈ R.
Sejam C e C 0 , respectivamente, as partes direita e esquerda do gráfico de f . Assim, dire-
mos que:
r é assı́ntota oblı́qua de C ⇐⇒ lim [f (x) − (m x + b)] = 0
(
x→+∞
r é assı́ntota oblı́qua de C 0 ⇐⇒ lim [f (x) − (m x + b)] = 0
x→−∞

Uma vez que m e b não são conhecidos a priori, temos de arranjar maneira de os deter-
minar. Prova-se que os valores de m e b são dados, respectivamente por:
  
f (x)
m = lim e b = lim [f (x) − m x] (assı́ntota oblı́qua de C)


x


 x→+∞ x→+∞

 

 f (x)
 m = lim e b = lim [f (x) − m x] (assı́ntota oblı́qua de C 0 )


x→−∞ x x→−∞

Exemplo 16. A função f tal que


x2 − 2x + 4
f (x) =
x−2
tem uma assı́ntota oblı́qua de equação y = x em ambas as partes do seu gráfico. De
facto,  
f (x)
m = lim = (· · · ) = 1 e b = lim [f (x) − m x] = 0,
x→+∞ x x→+∞

obtendo-se os mesmos valores quando x → −∞.


1.3. LIMITE E CONTINUIDADE 47

1.3.3 Outras Propriedades dos Limites


Vamos alargar as propriedades operatórias dos limites incluindo os casos em que estes
podem ser infinitos ou no infinito. Admitamos que a ∈ R ou que a = c+ ou a = c− . Os
limites da soma, do produto e do quociente de duas funções funções podem ser obtidos
a partir dos limites das parcelas, dos factores ou do dividendo e divisor, respectivamente,
de acordo com as seguintes tabelas.

lim [f (x) + g(x)]


x→a

lim f (x) = −∞ L +∞
x→a
−∞ −∞ −∞ ind.
lim g(x) = K −∞ L + K +∞
x→a
+∞ ind. +∞ +∞

lim [f (x) · g(x)]


x→a

lim f (x) = −∞ L<0 0 L>0 +∞


x→a
−∞ +∞ +∞ ind. −∞ −∞
K<0 +∞ LK 0 LK −∞
lim g(x) = 0 ind. 0 0 0 ind.
x→a
K>0 −∞ LK 0 LK +∞
+∞ −∞ −∞ ind. +∞ +∞
 
f (x)
lim
x→a g(x)

lim f (x) = −∞ L<0 0 L>0 +∞


x→a
−∞ ind. 0 0 0 ind.
L L
K<0 +∞ K
0 K
−∞
lim g(x) = 0 −∞ ou +∞ −∞ ou +∞ ind. −∞ ou +∞ −∞ ou +∞
x→a
L L
K>0 −∞ K
0 K
+∞
+∞ ind. 0 0 0 ind.

O sı́mbolo ind. traduz uma indeterminação. No caso da soma poderemos ter in-
determinações do tipo (∞ − ∞) ou (−∞ + ∞); no caso do produto, podemos obter
indeterminações do tipo (∞ × 0)ou(0 × ∞); no caso do quociente, podemos obter
∞ 0
indeterminações do tipo ou .
∞ 0
Mais adiante, trataremos dos limites possı́veis para as exponenciais-potência e das
indeterminações que eventualmente daı́ resultem.
48 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Teorema 3 (T. do enquadramento de funções). Seja c ∈ R e considere um intervalo I


contendo c. Se h(x) ≤ f (x) ≤ g(x) para todo o x ∈ I\ {c} e se

lim h(x) = lim g(x) = L ∈ R,


x→c x→c

então limf (x) = L.


x→c

Figura 1.29: Teorema do enquadramento.

Nota 13. O teorema é também válido, mutatis mutandis, para os casos em que c =
a+ , a− , +∞ ou −∞.

Este resultado justifica por exemplo as seguintes propriedades.

Teorema 4 (propriedades dos limites). Seja a nas circunstâncias do teorema anterior.


1. Dada uma f.r.v.r. f , tem-se:

lim f (x) = 0 ⇐⇒ lim |f (x)| = 0.


x→a x→a

2. Se lim f (x) = 0 e g é limitada (numa vizinhança de a) então:


x→a

lim [f (x) · g (x)] = 0.


x→a

A segunda propriedade justifica que se tenha, por exemplo:

sin x
lim = 0,
x→+∞ x

sin x 1 1
uma vez que x
= x
sin x, sendo que lim = 0 e sin é limitada.
x→+∞ x
1.3. LIMITE E CONTINUIDADE 49

Nota 14. Note que ambas as hipóteses do ponto 2. do resultado anterior são necessárias.
Assim, deve notar, por exemplo, que

lim ex sin x
x→+∞

não existe. De facto, apesar de sin ser limitada, tem-se lim ex = +∞ 6= 0. O que
x→+∞
sucederá é que os valores de ex sin x oscilarão ilimitadamente quando x assume valores
infinitamente grandes positivos. Será que o mesmo sucede quando x → −∞?

Para finalizar, eis alguns limites notáveis envolvendo funções elementares:

[Limites notáveis] Tem-se:


sin x 1 − cos x tg x ex − 1
1. lim =1 2. lim = 0 3. lim =1 4. lim =1
x→0 x x→0 x x→0 x x→0 x
x
ex

ln x 1
5. lim = 0 6. lim = +∞ 7. lim 1 + =e
x→+∞ x x→+∞ x x→+∞ x

Conjugando cada um destes resultados com o limite da função composta, podemos


obter generalizações dos mesmos. Assim, e.g., se

lim u(x) = 0,
x→a

então também
sin [u(x)]
lim =1
x→a u(x)
(o que pode ser demonstrado recorrendo a uma simples mudança de variável).

Exercı́cio 10. Procure obter generalizações análogas para os restantes limites notáveis.

1.3.4 Funções Contı́nuas


Definição 2 (função contı́nua num ponto). Uma f.r.v.r. f diz-se contı́nua num ponto
c ∈ Df se e só se
limf (x) = f (c).
x→c

Deste modo, são necessárias três condições para que uma função seja contı́nua em c:

1) c ∈ Df 2) limf (x) = L ∈ R 3) L = f (c) .


x→c

Caso f não seja contı́nua em c, c diz-se um ponto de descontinuidade de f ou dire-


mos que f é descontı́nua em c. A descontinuidade pontual pode então acontecer devido
à negação de alguma destas três condições.
50 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Admita que existe limf (x) = L ∈ R. Se c ∈


/ Df ou L 6= f (c) diremos que c é uma
x→c
descontinuidade removı́vel de f . Nestes casos, é possı́vel definir uma nova função g tal
que
f (x), se x ∈ Df \ {c}
(
g(x) = .
limf (x), se x = c
x→c

Esta diz-se prolongamento de f por continuidade no ponto c.

Outras classificações de pontos de descontinuidade podem surgem no Apêndice 1.3.


Pode acontecer que uma função f esteja definida num intervalo do tipo [a, b] . Nos ex-
tremos do intervalo apenas podemos falar de continuidade lateral. Assim, f será contı́nua
à direita em a (respectivamente, contı́nua à esquerda em b) se lim+ f (x) = f (a) (resp.,
x→a
se lim− f (x) = f (b)).
x→b

Teorema 5 (continuidade da função composta). Se f é contı́nua em c e g é contı́nua em


f (c), então g ◦ f é contı́nua em c.

Uma função definida em A ⊂ Df diz-se contı́nua em A se for contı́nua em todos os


pontos de A (continuidade lateral quando f for apenas definida à esquerda ou à direita de
um ponto). Assim, f diz-se contı́nua em [a, b] se for contı́nua em ]a, b[, à direita em a e à
esquerda em b.
Evidentemente, para se estudar a continuidade de uma função f deve-se começar por
determinar Df , pois f não pode ser contı́nua onde não estiver definida.

Exemplo 17.
     
1 1
 sin , se x 6= 0  x sin , se x 6= 0

 

x x
1) f : f (x) = 2) g : g(x) =

 

0, se x = 0 0, se x = 0
 
é contı́nua em R\ {0} . é contı́nua em R.

Outra propriedade importante das funções contı́nuas é a manutenção do sinal numa


vizinhança do ponto.

Teorema 6. Se f é contı́nua em c ∈ Df e f (c) > 0 (resp., f (c) < 0), então f é positiva
(resp., negativa) numa bola aberta centrada em c. .

O seguinte resultado dá-nos as propriedades operatórias das funções contı́nuas.

[Propriedades das funções contı́nuas] Sejam f e g duas f.r.v.r. contı́nuas em A e B,


1.3. LIMITE E CONTINUIDADE 51

respectivamente.

(i) Se α ∈ R, então αf é contı́nua em A.


(ii) As funções f + g, f − g e f · g são contı́nuas em A ∩ B.
(iii) A função h1 : h1 (x) = [f (x)]n , n ∈ N é contı́nua em A.
(iv) A função h2 : h2 (x) = |f (x)| é contı́nua em A.
(
p A, se n for ı́mpar
(v) A função h3 : h3 (x) = n f (x) é contı́nua em
{x ∈ A : f (x) ≥ 0}, se n for par
f (x)
(vi) A função h4 : h4 (x) = é contı́nua em {x ∈ A ∩ B : g (x) 6= 0}.
g(x)
(vii) Se f (A) ⊂ B, então g ◦ f é contı́nua em A.

Podemos afirmar que as funções elementares apresentadas na subsecção anterior são


contı́nuas nos respectivos domı́nios.
De seguida apresentamos um exemplo de função ”em escada”, com infinitos pontos
de descontinuidade.
Exemplo 18. Seja [[ ]] : R → R a chamada função caracterı́stica, tal que

[[x]] = ”maior inteiro menor ou igual que x.”

Para cada n ∈ Z, temos

lim [[x]] = n − 1 e lim+ [[x]] = n = [[n]] .


x→n− x→n

Assim, [[ ]] é contı́nua em R\Z.


Eis outra função interessante.
Exemplo 19. Seja A um subconjunto de R. Chamamos indicatriz de A à f.r.v.r. denotada
por IA tal que (
1, se x ∈ A
IA (x) = .
0, se x ∈
/A
Assim, se A = [0, 1], tem-se
(
1, se x ∈ [0, 1]
I[0,1] (x) = .
0, se x ∈
/ [0, 1]

Facilmente se observa que I[0,1] é contı́nua em R\{0, 1}. Deixa-se como desafio o esboço
e estudo da continuidade de f tal que

f (x) = IR+0 (x)(ex − 1), x ∈ R.


52 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

De seguida apresentamos dois teoremas muito importantes.

Teorema 7 (T. de Bolzano-Cauchy ou dos Valores Intermédios). Seja f uma função


contı́nua em [a, b] e y um valor entre f (a) e f (b). Então existe algum valor c ∈ [a, b] tal
que f (c) = y.

Este resultado diz-nos que uma função contı́nua não pode passar de um valor a outro
sem tomar todos os valores intermédios. Dito de outro modo: o gráfico de uma função
contı́nua é uma curva contı́nua.

Corolário 1. Se f uma função contı́nua em [a, b] e f (a) × f (b) < 0, então existe pelo
menos um c ∈ ]a, b[ tal que f (c) = 0.

A aplicação sucessiva deste resultado fornece-nos um processo para encontrar cada


vez melhores aproximações para os zeros reais de uma função  em [a,b]. Se sa-
 contı́nua 
a+b a+b
bemos que existe um zero de f em ]a, b[, este deverá estar em a, ou em ,b
 2 2
a+b a+b
(claro, se não for mesmo ). Comparando o sinal de f com o de f (a) e f (b)
2 2
saberemos qual o intervalo a  escolher. Supondo que é o primeiro, como f ainda satisfaz
a+b
as condições do corolário em a, , aplique-se novamente o processo. Este procedi-
2
mento é conhecido por método da bissecção. A sucessão dos pontos intermédios dá-nos
as sucessivas aproximações do zero da função.

Exercı́cio 11. Considere a f.r.v.r. f tal que f (x) = ln x − 1.


(a) Determine analiticamente o único zero da função.
(b) Obtenha uma aproximação do referido zero com 3 casas decimais correctas, come-
çando com um intervalo fechado adequado (pode utilizar calculadora para determinar
os diversos pontos intermédios). Indique o número de iterações (vezes que se aplica o
processo) utilizado.

O corolário anterior é também muitas vezes utilizado para determinar o sinal de uma
função num dado intervalo I. Com efeito, se uma dada função contı́nua não se anula num
intervalo I, então basta determinar o sinal de f (c), c ∈ I, para saber qual o sinal de f em
I. Temos: (
f (c) > 0 =⇒ f (x) > 0 , ∀x ∈ I
.
f (c) < 0 =⇒ f (x) < 0 , ∀x ∈ I

Exemplo 20. Vamos mostrar que



x+1> x2 + x + 1, ∀x ∈ R+ . (1.11)

Considere a função f tal que



f (x) = x + 1 − x2 + x + 1,
1.3. LIMITE E CONTINUIDADE 53

contı́nua em R+ , ou seja, em ]0, +∞[ (e, portanto, em qualquer intervalo fechado contido
em R+ ). Note que

f (x) = 0 ⇐⇒ x + 1 = x2 + x + 1 ⇐⇒ (x + 1)2 = x2 + x + 1 ⇐⇒ x = 0.

Ora, 0 ∈ / R+ . Como f (1) = 2 − 3 > 0, podemos concluir que f é positiva em R+ , ou
seja, (1.11) verifica-se.

Por último, recordamos um conhecido resultado sobre extremos de uma função.

Teorema 8 (T. de Weierstrass). Se f é uma função contı́nua em [a, b], então é limitada
em [a, b] e atinge nesse intervalo um máximo e um mı́nimo.

A continuidade e o facto de o intervalo ser fechado são essenciais para a conclusão.


Por exemplo, se pensarmos em f (x) = ln x, contı́nua em qualquer intervalo do tipo ]0, b],
b > 0, é imediato concluir que f não tem mı́nimo.
A conjunção deste teorema com o dos valores intermédios permite-nos concluir que
se f é contı́nua em [a, b], então
Df0 = [m, M ] ,
onde
m = mı́n {f (x) : x ∈ [a, b]} e M = máx {f (x) : x ∈ [a, b]} .
54 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

FOLHA DE EXERCÍCIOS E PROBLEMAS N.o 2

1. Calcule cada um dos seguintes limites, caso existam.



t2 − 9 4+x−2
(a) lim 3 |y − 1| (b) lim (c) lim
y→4 t→3 t − 3 x→0 x
1 h π  i 1
√ −1 sin + ∆x −
1+s 6 2 cos θ tg θ
(d) lim (e) lim (f) lim
s→0 s ∆x→0 ∆x θ→0 θ
2
x −4 sin(2x) 1
(g) lim (h) lim (i) lim
x→2 |x − 2| x→+∞ x x→+∞ 2x + sin x
!

r
 x 1 2 5x3/2
(j) lim 4x − 16x2 − x (k) lim + x +x (l) lim
x→+∞ x→−∞ 2 4 x→+∞ 4x2 + 1

2. Determine o domı́nio de continuidade de cada uma das funções cuja expressão é


dada.
2
 3x − x − 2 , se x 6= 1

r
x+1  πx 
(a) f (x) = x−1 (b) f (x) = (c) f (x) = cossec
 x 2
0,x=1
x x+2
(d) f (x) = 2 (e) f (x) = 2
x −x x − 3x − 10
3. Determine o domı́nio de continuidade e esboce o gráfico de cada uma das funções
cuja expressão é dada.
  x
0, se u < 0
 , se 0 < x < 2

 
4

2
(a) F (u) = u , se 0 ≤ u < 1 (b) f (x) = x


 1, se u ≥ 1  1 − , se 2 < x < 4

 4
 0, se x < 0 
0, se u < 1


 x2 , se 0 ≤ x < 2

 


8
(c) F (x) = (d) F (u) = (u − 1)3 , se 1 ≤ u < 2
x2


 − 8 + x − 1, se 2 ≤ x < 4 

 1, se u ≥ 2


( 1, se x ≥ 4

0, se x < 0
(e) F (x) = −x
(f) f (x) = 21 e−|x|
1 − e , se x ≥ 0

4. Seja A um subconjunto de R. Chamamos indicatriz de A à f.r.v.r. denotada por IA


tal que (
1, se x ∈ A
IA (x) = .
0, se x ∈
/A
1.3. LIMITE E CONTINUIDADE 55

Em cada um dos casos, esboce o gráfico de IA e identifique os respectivos pontos


de descontinuidade.
(a) A = R+
0 (b) A = [0, 1[; (c) A = R; (d) A = N.

5. Determine os valores das constantes reais b e c para os quais a seguinte função é


contı́nua em toda a recta real.
(
x + 1, 1 < x < 3
f (x) = .
x2 + bx + c , |x − 2| ≥ 1
6. Considere as seguintes funções
3x2 2x x
(A) f (x) = 2 (B) f (x) = √ (C) f (x) =
x +2 x2 + 2 x2
+2
x2 4 sin x 2x2 − 3x + 5
(D) f (x) = 2 + 4 (E) f (x) = 2 (F) f (x) =
x +1 x +1 x2 + 1
e sejam dados os gráficos

nos quais estão assinaladas as respectivas assı́ntotas horizontais. Estabeleça a cor-


respondência adequada entre as funções (A) a (F) e os referidos gráficos.
7. Determine, caso existam, as assı́ntotas horizontais, verticais e oblı́quas dos gráficos
de cada uma das funções dadas.
4x 3x + 2 3x
(a) f (x) = 2
(b) f (x) = (c) f (x) = √
4−x |x − 2| x2 + 2
2 2
2x − 8x − 15 4 x − 6x + 12
(d) f (x) = (e) f (x) = x + 2 (f) f (x) =
x−5 x +1 x−4
56 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

8. Uma indústria de produção queima carvão para gerar electricidade. O custo C em


euros para remover p% dos poluentes do ar nas emissões das chaminés é:
80 000 p
C(p) = , 0 ≤ p < 100 .
100 − p
(a) Determine o custo de eliminar (i) 15%, (ii) 50%, (iii) 90% dos poluentes.
(b) Determine lim − C(p).
p→100

tg (2x)
9. Considere a f.r.v.r. f tal que f (x) = .
x
(a) Determine o domı́nio de continuidade de f .
(b) Verifique se existe lim f (x).
x→0

10. Seja P (3, 4) um ponto na circunferência C, de equação x2 + y 2 = 25.

(a) Qual o declive (ou coeficiente angular) da recta definida pela origem e por P ?
(b) Determine uma equação da recta tangente à circunferência em P .
(c) Seja Q (x, y) outro ponto de C situado no primeiro quadrante. Determine o
declive mx da recta definida pelos pontos P e Q, em função de x.
(d) Calcule lim mx . De que forma este limite está relacionado com a resposta
x→3
dada em (b)?

11. (*) No contexto de certas equações, as soluções são famı́lias de funções da forma
f (x) = xk eαx ,
onde α ∈ R e k ∈ N0 são parâmetros. Discuta a existência de
lim f (x)
x→+∞

em função dos possı́veis valores de α e k.


Sugestão: Na análise do caso k ∈ N e α < 0, tenha em conta que, tomando
β = −α > 0, se tem:
(k + 1)! 1
xk e−βx < , se x > 0.
β k+1 x
12. (*) No contexto de certas equações, as soluções são famı́lias de funções da forma
f (x) = eαx sin (βx) e g (x) = eαx cos (βx) ,
onde α e β são parâmetros reais. Discuta a existência de
lim f (x)
x→+∞

em função dos possı́veis valores de α e β.


1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 57

1.4 Derivadas e Diferenciais


Tal como aconteceu com a noção de limite, o conceito de derivada começou por ser utili-
zado com alguma hesitação, depois foi aplicado (ao longo do séc. XVII) na resolução de
inúmeros problemas e só por fim se clarificou a sua definição formal. Os problemas a que
nos referimos enquadram-se em quatro tipos:

1. Problema da recta tangente.

2. Problema da velocidade e da aceleração.

3. Problema da determinação dos extremos de uma função.

4. Problema da área.

A noção básica para a resolução destes problemas é a de limite. Fermat, Descartes,


Huygens e Barrow estão entre os precursores do Cálculo Diferencial, ao darem respostas
parciais ao primeiro dos problemas. Contudo, a génese desta área da Matemática reside
na resolução daquele problema por parte de Newton e Leibniz, através de trabalhos inde-
pendentes.
Ao longo desta secção iremos motivar o conceito de derivada começando por apresen-
tar a abordagem relativa ao conceito de recta tangente. De seguida, daremos uma definição
formal de derivada e quais as interpretações que esta tem em diversos contextos. Apre-
sentaremos as regras de derivação usuais e as relativas às principais funções elementares,
deduzindo-as no caso das funções trigonométricas inversas. Abordaremos o problema da
aproximação do gráfico de uma função através da recta tangente e a sua relação com o
conceito de diferencial de uma função. Veremos de que modo os diferenciais podem ser
utilizados para obter valores aproximados. Por último, iremos debruçar-nos sobre cinco
aplicações das derivadas: os teoremas das funções regulares e suas consequências, o le-
vantamento de indeterminações, o esboço completo de gráficos de funções, a optimização
de funções e a aproximação de funções através dos polinómios de Taylor.

1.4.1 Derivada: definição e primeiras interpretações.


Declive da recta tangente
Quando procuramos a recta tangente a uma curva num dos seus pontos, a primeira noção
que nos ocorre é a de uma recta que passa por esse ponto, tocando-a apenas nesse ponto.
Assim, para uma circunferência de centro em C é claro que a recta tangente à circun-
ferência num ponto P desta é a recta que passa em P e é perpendicular à recta radial
definida por C e P .
58 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Contudo, esta noção complica-se ao falarmos de curvas genéricas, como se pode ob-
servar nos seguintes três exemplos.

O problema da clarificação do conceito de recta tangente pode ser feito através da


abordagem gráfica, por meio das rectas secantes ao gráfico de um função.

De facto, se considerarmos uma função f definida num intervalo aberto contendo


c ∈ R e se tomarmos os pontos (c, f (c)) e (c + ∆x, f (c + ∆x)), podemos observar que a
recta secante ao gráfico de f definida por estes dois pontos tem declive
∆y f (c + ∆x) − f (c)
msec = = ,
∆x ∆x
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 59

que corresponde a uma taxa de variação da função no intervalo [c, c + ∆x] ([c + ∆x, c],
se ∆x < 0). Como se pode observar na figura seguinte, fixando (c, f (c)) e fazendo
∆x −→ 0, vemos que as rectas secantes estão a tender para a recta tangente ao gráfico de
f em (c, f (c)) e que, por conseguinte, o declive da recta tangente será

f (c + ∆x) − f (c)
m = lim , (1.12)
∆x→0 ∆x
caso este limite exista.
Assim, é natural a seguinte definição.
Definição 3 (reta tangente com declive m). Dada uma função f definida num intervalo
aberto contendo x0 , chamamos recta tangente ao gráfico de f no ponto de abcissa x0 à
recta passando em (x0 , f (x0 )) cujo declive é (1.12) (com x0 no lugar de c). Assim sendo,
uma equação desta recta é
y − f (x0 ) = m(x − x0 ).
Nota 15. 1. Ao declive é também usual chamar coeficiente angular ou inclinação. Por
seu turno, é ainda possı́vel dizer que o gráfico de f em x = x0 tem inclinação m.
2.A recta normal ao gráfico de f no ponto de abcissa x0 passa em (x0 , f (x0 )) e é per-
pendicular à recta tangente no referido ponto. Da Geometria Analı́tica, sabe-se que se m
é o declive da recta tangente, então
1
m0 = −
m
será o declive da recta normal (desde que m 6= 0). Uma equação desta será:
y − f (x0 ) = m0 (x − x0 ).
3. Caso se tenha
f (x0 + ∆x) − f (x0 ) f (x0 + ∆x) − f (x0 )
lim = +∞ ou lim = −∞,
∆x→0 ∆x ∆x→0 ∆x
60 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

diremos que a recta tangente é vertical, sendo x = x0 a sua equação.


4. Caso a função esteja definida em [a, b], nos pontos extremos apenas podemos falar em
semirrecta tangente à direita de a e à esquerda de b, respectivamente.
Exemplo 21. (a) Dada uma função afim, f (x) = ax + b, verifica-se que a recta tangente
ao seu gráfico em qualquer ponto tem sempre declive m = a. Assim, esta recta coincide
com o próprio gráfico da função, que é uma recta. A recta normal num ponto (x0 , f (x0 ))
terá equação    
1 1
y =− x+ b+ a+ x0 ,
a a
desde que a 6= 0 (prove-o!). E se fosse a = 0?
(b) Dada a função, f (x) = x2 + 1, o declive da recta tangente ao gráfico de f num ponto
genérico (x0 , f (x0 )) é igual a 2x0 . Assim, uma equação de tal recta é

y − x20 + 1 = 2x0 (x − x0 ) (−2x0 ) x + y = 1 − x20 .



⇐⇒

Deixamos ao leitor a tarefa de determinar a equação da recta normal no referido ponto.

Derivada: definição e primeiros resultados


Feita esta motivação inicial, estamos agora em condições de apresentar a definição formal
de derivada de uma função.
Definição 4 (derivada de uma f.r.v.r.). A derivada de uma f.r.v.r. num ponto x0 perten-
cente a um intervalo aberto onde f esteja definida define-se através do seguinte limite
f (x0 + ∆x) − f (x0 )
lim ,
∆x→0 ∆x
caso exista. Neste caso, e sendo y = f (x), utilizaremos uma das seguintes notações:
df dy
f 0 (x0 ) , y 0 (x0 ) , (x0 ) , (x0 ) ou Dx [y] (x0 ) .
dx dx
Nota 16. 1. A terceira e a quarta notações devem-se a Leibniz. A quarta deve ler-se
”derivada de y em ordem a x” no ponto x0 , ou simplesmente ”dy dx”, tendo-se portanto:
dy ∆y
(x0 ) = lim = f 0 (x0 ) .
dx ∆x→0 ∆x

2. Sempre que nos queiramos referir à derivada num ponto genérico, podemos omitir
”(x0 ) ”.
3. Uma vez que ∆x = x − x0 , é também recorrente exprimir a derivada em x0 por meio
do seguinte limite:
f (x) − f (x0 )
lim .
x→x0 x − x0
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 61

Uma função diz-se derivável num ponto x se f 0 (x) ∈ R ou se f 0 (x) for infinita; dir-
se-á derivável num intervalo ]a, b[ se for derivável em todos os pontos deste intervalo.
Dir-se-á diferenciável em x se tiver derivada finita nesse ponto.
Se f estiver definida em [a, b], apenas podemos definir as derivadas laterais à direita
em a e à esquerda em b:
f (a + ∆x) − f (a) f (x) − f (a)
fd 0 (a) = lim + = lim+
∆x→0 ∆x x→a x−a
e
f (b + ∆x) − f (b) f (x) − f (b)
fe 0 (b) = lim − = lim− .
∆x→0 ∆x x→b x−b
No caso de f 0 (x) = +∞ (ou −∞) diremos que a derivada é infinita.
Ainda a respeito das derivadas laterais, temos:

Teorema 9. A derivada f 0 (x0 ) existe se e só se fd 0 (x0 ) e fe 0 (x0 ) existem e são iguais.

Dada uma f.r.v.r. f , podemos definir uma nova função, f 0 , para todos os pontos onde
f seja diferenciável. Esta função diz-se função primeira derivada. Para todos os pontos
onde f 0 seja diferenciável, podemos definir a função segunda derivada, cuja notação é
d2 f
f 00 ou 2 . Tem-se portanto
dx
d2
:D → R
dx2
d2 f
 
d df
x 7−→ 2
(x) = (x) = (f 0 )0 (x) = f 00 (x)
dx dx dx
onde D é o conjunto dos pontos de Df onde f 0 é diferenciável. De uma maneira geral,
define-se a derivada de ordem n por recorrência, à custa da derivada de ordem (n − 1):
dn f d dn−1 f
 
(n)
f (x) = n (x) = (x) .
dx dx dxn−1
Exemplo 22. Recorrendo à definição, é possı́vel mostrar que:
x3 + 2x, temos: f 0 (x) = 3x2 + 2, para todo o x ∈ R.
(a). Dada f tal que f (x) =√
(b) Sendo g tal que g(x) = x, x ∈ R+ 0 , temos:

1
g 0 (x) = √ , ∀x ∈ R+ .
2 x
√ 
Assim, para qualquer ponto x0 , x0 ) tal que x0 > 0,
√ 1
y− x0 = √ (x − x0 )
2 x0
é uma equação da recta tangente ao gráfico no ponto dado. No ponto x = 0, o gráfico
tem uma semirrecta tangente vertical, x = 0, uma vez que gd 0 (0) = +∞.
62 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Que relações se podem estabelecer entre derivabilidade e continuidade? Desde logo,


é mais ou menos intuitivo perceber que uma função descontı́nua num ponto nunca poderá
ser derivável nesse ponto. Mas será que continuidade√implica derivabilidade? Se pensar-
mos nas funções f e g tais que f (x) = |x| e g(x) = 3 x, facilmente se vê que a resposta
é negativa. Efectivamente, apesar de ambas serem contı́nuas em R, nenhuma delas é de-
rivável na origem, conclusões que podem ser extraı́das deduzindo as expressões de f 0 e g 0
e vendo que f 0 (0) não existe e g 0 (0) = +∞.
Contudo, é possı́vel estabelecer o seguinte importante resultado:

Teorema 10. Se f é uma função diferenciável em c, então f é contı́nua em c.

Demonstração. Atendendo à definição de continuidade, precisamos de mostrar que

limf (x) = f (c) .


x→c

Ora, temos:
  
f (x) − f (c) f (x) − f (c)
lim [f (x) − f (c)] = lim (x − c) = lim × lim (x − c)
x→c x→c x−c x→c x−c x→c

= f 0 (c) × 0 = 0.

Daqui resulta a igualdade que pretendı́amos encontrar.

Na prática, o que é mais frequente utilizar é a contra-recı́proca deste teorema: mos-


trando que uma dada função é descontı́nua num ponto, prova-se que não é diferenciável
nesse ponto.

Exemplo 23. Seguem-se três exemplos onde se analisam questões de diferenciabilidade


e continuidade.   
 x sin 1 , se x 6= 0

1. A f.r.v.r. f tal que f (x) = x é contı́nua em R, mas dife-

 0, se x = 0
renciável apenas em R\ {0}.
2. A f.r.v.r. g tal que g(x) = |x
 − 2| é diferenciável
  em R\ {2}.
 2 1
x sin , se x 6= 0
3. A f.r.v.r. h tal que h(x) = x é contı́nua em R e diferenciável
0, se x = 0

em R. Além disso, temos:
    
1 1
2x sin − cos , se x 6= 0

dh 
(x) = x x
dx 
 0, se x = 0
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 63

A noção de derivada aparece em muitos contextos em que se necessita de calcular a


taxa de variação de uma variável em relação a outra. Assim, se encararmos

∆y f (x0 + ∆x) − f (x0 )


=
∆x ∆x
como a taxa de variação (média) de f no intervalo [x0 , x0 + ∆x], então

df ∆y f (x0 + ∆x) − f (x0 )


(x0 ) = lim = lim
dx ∆x→0 ∆x ∆x→0 ∆x
pode ser interpretado como a taxa de variação de f em x0 . Sempre que a variável
independente for o tempo, t, esta taxa de variação diz-se instantânea (no instante t0 ).
Nos mais diversos contextos, deparamos com taxas de variação:

∆y df
y = f (x)
∆x dx
deslocamento velocidade média velocidade (instantânea)
velocidade aceleração média aceleração (instantânea)
custo custo médio custo marginal
lucro lucro médio lucro marginal

1.4.2 Regras de Derivação


A maioria das regras de derivação das funções elementares são do conhecimento do lei-
tor que tenha frequentado Matemática A no ensino secundário. Apresentá-las-emos na
seguinte tabela na notação de Leibniz, para que o leitor também a ela se habitue.
Sejam f e g duas f.r.v.r. deriváveis em algum conjunto e C uma constante real. As
seguintes funções são deriváveis em conjuntos adequados, exprimindo-se as derivadas
como se segue:
64 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

d d df
(C) = 0 [Cf ] = C
dx dx dx
d df dg d df dg
[f ± g] = ± [f × g] = g+f
dx dx dx dx dx dx
df dg
 
d f g−f d n df
= dx dx [f ] = nf n−1
dx g g2 dx dx

d d
[sin x] = cos x [cos x] = − sin x
dx dx
d 1 d −1
[tg x] = = sec2 x [cotg x] = = −cossec2 x
dx cos2 x dx sin2 x
d x d x
[a ] = ax ln a [e ] = ex
dx dx
d 1 d 1
[loga x] = [ln x] =
dx x ln a dx x
A tı́tulo de exemplo, mostraremos que
d
[sin x] = cos x ,
dx
recorrendo à definição. Temos:
d sin(x + ∆x) − sin x sin x cos (∆x) + cos x sin (∆x) − sin x
[sin x] = lim = lim
dx ∆x→0
 ∆x ∆x→0
 ∆x
cos (∆x) − 1 sin (∆x)
= lim sin x + cos x
∆x→0 ∆x ∆x
= sin x × 0 + cos x × 1 = cos x .
Na tabela anterior, algumas das fórmulas podem ser generalizadas para o caso da
composta de funções. Para tal, necessitamos da chamada regra da cadeia, ou seja, a
derivada da função composta.
Teorema 11 (regra da cadeia ou da derivada da composta). Sejam f : ]a, b[ −→ R
e g : ]c, d[ −→ R duas f.r.v.r. tais que f (]a, b[) ⊂ ]c, d[. Seja ainda x0 ∈ ]a, b[ tal que
y0 = f (x0 ). Se f 0 (x0 ) existe e g 0 (y0 ) existe, então (g ◦ f )0 (x0 ) existe e tem-se:
(g ◦ f )0 (x0 ) = g 0 (y0 ) f 0 (x0 ) .
(ou seja, (g ◦ f )0 (x0 ) = g 0 (f (x0 )) f 0 (x0 )). Na notação de Leibniz, se y = f (x) e
u = g(y), então
du du dy
(x0 ) = (y0 ) (x0 ) .
dx dy dx
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 65

Tendo em conta este resultado, temos também a seguinte tabela:

du
d du d (x) du
[sin u (x)] = (x) cos (u (x)) [tg u (x)] = dx2 = (x) sec2 u (x)
dx dx dx cos u (x) dx

du
d du d − (x) du
[cos u (x)] = − (x) sin (u (x)) [cotg u (x)] = dx2 = − (x) cossec2 u (x)
dx dx dx sin u (x) dx

du
d  u(x)  du d (x)
a = (x) au(x) ln a [loga u (x)] = dx
dx dx dx u (x) ln a

du
d  u(x)  du d (x)
e = (x) eu(x) [ln u (x)] = dx
dx dx dx u (x)

Exercı́cio 12. Deduza a regra da derivada da exponencial-potência.

Por último, recordemos a regra da derivada da função inversa.

Teorema 12 (regra da derivada da função inversa). Seja f : ]a, b[ −→ Y uma f.r.v.r.


invertı́vel e f −1 : Y −→ X a sua inversa. Se f é derivável em x0 ∈ ]a, b[ e f −1 é contı́nua
em y0 = f (x0 ), então f −1 é derivável em y0 se e só f 0 (x0 ) 6= 0. Em tal caso,
0 1
f −1 (y0 ) = .
f 0 (x0 )

Nota 17. Na notação de Leibniz, se y = f (x) (e, portanto, x = f −1 (y)), nas condições
enunciadas, temos:
dx 1
(y0 ) = .
dy dy
(x0 )
dx

Exercı́cio 13. Deduza a regra da derivada do logaritmo de base a, a ∈ R+ \ {1}, recor-


rendo a este teorema e à derivada da exponencial de base a.

Vamos agora deduzir a derivada da função arcsin, recorrendo ao teorema da derivada


da função inversa. Sendo
h π πi
y = f (x) = sin x, x ∈ − , ,
2 2
66 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

temos x = f −1 (y) = arcsin y. Portanto,


0 1 1 i π πh
(arcsin y)0 = f −1 (y) = 0
= , x∈ − , .
f (x) cos x 2 2
Ora, de
sin2 x + cos2 x = 1
i π πh
e uma vez que estamos em − , , resulta
2 2
p q p
cos x = 1 − sin x = 1 − [sin (arcsin y)]2 = 1 − y 2 .
2

Logo,
1
(arcsin y)0 = p , y ∈ ]−1, 1[ .
1 − y2
Na variável x, temos:
1
(arcsin x)0 = √ , x ∈ ]−1, 1[ .
1 − x2
Para uma função u(x) no argumento, temos:

u0 (x)
(arcsin u)0 (x) = q , x : u(x) ∈ ]−1, 1[ .
1 − [u(x)]2

Deixamos como tarefa para o leitor mostrar que:

−u0 (x)
(arccos u)0 (x) = q ,
2
1 − [u(x)]

e também que

u0 (x) −u0 (x)


(arctg u)0 (x) = e (arc cotg u) 0
(x) = .
1 + [u(x)]2 1 + [u(x)]2

1.4.3 Derivação Implı́cita


Regressemos ao problema do declive da recta tangente a uma curva. A sua resolução
reside, como vimos, no conceito de derivada de uma função num ponto do seu gráfico.
O que sucede quando a curva não corresponde ao gráfico de uma função explicitamente
definida? Tomemos, por exemplo, a circunferência de equação

x2 + y 2 = 25 (1.13)
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 67

e admitamos que se pretende determinar uma equação da recta tangente à circunferência


no ponto P do 1o quadrante de abcissa x = 3. Aquela equação não traduz y como função
explı́cta de x (repare que para cada x fixo obtemos dois valores de y), mas é fácil perceber
que dela resultam duas funções:
√ √
y = |− 25 − 2 ∨ 2
{z } x y = | 25{z− x}.
f (x) g(x)

Se substituirmos em (1.13) y por qualquer uma destas expressões obtemos uma identi-
dade. Por este motivo, diremos que a equação (1.13) define implicitamente as funções
f e g, contı́nuas em [−5, 5] (7 ). O problema colocado tem agora fácil resolução. Como o
ponto está no 1.o quadrante, para x = 3 vem y = 4 e uma equação da recta tangente à
circunferência é:
t: y − 4 = g 0 (3)(x − 3).
Como  
0 −x 3
g (3) = √ =− ,
25 − x2 x=3 4
temos
t: 3x + 4y = 25.

Figura 1.30: Circunferência x2 + y 2 = 25 e recta tangente no ponto (3, 4).

Sucede que nem sempre é possı́vel explicitar uma função y = f (x) a partir de uma
equação do tipo F (x, y) = 0. Como poderı́amos resolver nesse caso o problema da recta
tangente? A técnica da derivação implı́cita é a solução adequada. Sob certas condições
que serão apresentadas aquando do estudo do Cálculo Diferencial em Rn , uma equação
do tipo F (x, y) = 0 define implicitamente uma função y = f (x) numa vizinhança de um
ponto. Admitamos que estas condições são verificadas para a equação (1.13). Então

d  2 d
x + y2 =

[25]
dx dx
7
É possı́vel admitir que a mesma equação define implicitamente inúmeras outras funções descontı́nuas
em um ou mais pontos de [−5, 5] .
68 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

ou seja:
dy
2x + 2y = 0. (1.14)
dx
dy
Note que surge uma vez que, sendo y função de x, a equação inicial tem a forma
dx

x2 + [y (x)]2 = 25.

De (1.14) resulta
dy x
=− ,
dx y
desde que y 6= 0. Assim, para o ponto (3, 4) temos:

3
y 0 (3) = − ,
4
e a equação obtida é a mesma.
dy
Exemplo 24. 1. Obtenha sabendo que y é uma função definida implicitamente pela
dx
equação:
y 3 + y 2 − 5y − x2 = −4.
Resolução: Derivando implicitamente ambos os membros da equação, obtemos:

dy dy dy
3y 2 + 2y − 5 − 2x = 0.
dx dx dx
dy
Resolvendo esta equação em ordem a , vem:
dx
dy 2x
= 2 .
dx 3y + 2y − 5
Observe que a expressão deduzida para a derivada da função definida implicitamente
pela equação dada é apenas válida para pontos que pertencem a tal curva e tais que
3y 2 + 2y − 5 6= 0.
2. Obtenha o declive da recta tangente à elipse de equação

x2 + 4y 2 = 4
√ 
no ponto P 2, √12 .
Resolução: Derivando implicitamente ambos os membros da equação e resolvendo em
dy
ordem a , resulta:
dx
dy x
=− ,
dx 4y
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 69

√ 
2 2 1
Figura 1.31: Elipse x + 4y = 4 e recta tangente no ponto 2, 2 .

expressão válida para pontos da elipse tais que y 6= 0. No ponto dado, temos:
dy 1
(P ) = − .
dx 2
d2 y
3. Sendo x2 + y 2 = 25, obtenha 2 por derivação implı́cita.
dx
Resolução: Vimos já que, por derivação implı́cita, temos:
dy x
=− .
dx y
Derivando novamente, vem:
dy x2
y−x y +
d2 y dx = − y x2 + y 2 25
2
= − 2 2
= − 3
=− 3 .
dx y y y y
Mais uma vez, recordamos que as expressões deduzidas para a primeira e segunda deri-
vadas da função definida implicitamente são apenas válida para pontos que pertencem à
circunferência cuja equação é dada e tais que y 6= 0.

1.4.4 Diferenciais e Aproximação Linear de Funções


Neste ponto, iremos ver de que modo a derivada de uma função nos permite obter aproxi-
mações numéricas de uma função em pontes onde esta é diferenciável. Para tal, e recor-
dando a interpretação de derivada como declive da recta tangente em (c, f (c)), comece-
mos por observar que, junto do ponto de tangência, tal recta aproxima o gráfico de f .
De facto, como
f (c + ∆x) − f (c)
f 0 (c) = lim ,
∆x→0 ∆x
podemos dizer que
f (c + ∆x) − f (c)
f 0 (c) = + ε (x) (1.15)
∆x
onde
lim ε (x) = 0.
∆x→0
70 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Resolvendo (1.15) em ordem a f (c + ∆x), vem:

f (c + ∆x) − f (c) = f 0 (c)∆x − ε (x) ∆x

ou ainda:

f (c + ∆x) = f (c) + f 0 (c)∆x − ε (x) ∆x, onde lim ε (x) = 0.


∆x→0

Isto traduz que, para c + ∆x suficientemente próximo de c, f (c) + f 0 (c)∆x é uma boa
aproximação de f (c + ∆x), ou seja:

f (c + ∆x) ≈ f (c) + f 0 (c)∆x . (1.16)

Esta igualdade aproximada é conhecida por fórmula da aproximação incremental.


Tomando x = c + ∆x e reescrevendo (1.16), vem:

f (x) ≈ f (c) + f 0 (c) (x − c),


| {z }
P (x)

que traduz a aproximação de f (x) através de um polinómio do grau 1

P (x) = f (c) + f 0 (c) (x − c) .

A P (x) chamamos aproximação polinomial do primeiro grau, aproximação de 1a


ordem ou aproximação linear de f no ponto c (ou em torno do ponto c). (8 ) Note que
ele traduz a aproximação do gráfico de f por meio da recta tangente em (c, f (c)), pois
que a equação desta é
y − f (c) = f 0 (c) (x − c) .

Exercı́cio 14. Determine a aproximação linear da função f tal que f (x) = 1 + sin x no
ponto (0, 1).

8
Prova-se também que se

f (x) = f (x0 ) + m (x − x0 ) − ε (x) (x − x0 ) , onde lim ε (x) = 0,


∆x→0

então m = f 0 (x0 ).
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 71

Figura 1.32: Aproximação pela recta tangente de f no ponto (0, 1) (Exercı́cio 14.)

Mais adiante, apresentaremos aproximações através de polinómios de ordem superior.


Regressemos à aproximação ao gráfico de f mediante a recta tangente. Note que de
(1.16) resulta:
∆y ≈ f 0 (c)∆x,
onde
∆y = f (c + ∆x) − f (c)
representa a variação real sofrida pela função y = f (x) quando a variável independente
sofre uma variação de valor ∆x (ao passar de c para c + ∆x). A quantidade f 0 (c)∆x é
denotada por dy(c) e diz-se diferencial de y (no ponto c).

Como para a função identidade y = f (x) = x se tem

dy = dx = 1 × ∆x,

escreveremos mais frequentemente

dy = f 0 (x)dx.
72 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Definição 5 (diferencial de uma função). Seja f tal que y = f (x) uma função dife-
renciável num intervalo aberto contendo x. A diferencial de y é o seguinte valor real:

dy = f 0 (x)dx ,

onde dx traduz uma variação (não-nula) da variável independente.

Em virtude desta definição, para valores dx suficientemente pequenos temos:

∆y ≈ dy .

Exercı́cio 15. Compare os valores de ∆y e dy quando f (x) = x2 , c = 1 e dx = ∆x =


0.01.
As regras de diferenciação são muito semelhantes às de derivação. Por exemplo, se u
e v são duas funções diferenciáveis de x, temos:
 
d du dv
d [u v] = [u v] dx = v+u dx
dx dx dx
   
dv du
= u dx + v dx = u dv + v du.
dx dx
Assim, temos a seguinte tabela:

Multiplicação por uma constante d [α v] = α dv


Soma ou diferença d [u ± v] = du ± dv
Produto d [u v] = u dv + v du
h u i v du − u dv
Quociente d =
v v2
n n−1
Potência d [u ] = nu du

O conceito de diferencial pode ser utilizado para obter valores aproximados. De facto,
recordando a fórmula da aproximação incremental, tem-se

f (c + ∆x) ≈ f (c) + dy(c) = f (c) + f 0 (c)∆x.



Exemplo 25. Vamos calcular um valor aproximado de 16.5, √ recorrendo a diferenciais.
Para tal, começamos por tomar a função f tal que f (x) = x, a qual é diferenciável em
R+ , tendo-se:
1
f 0 (x) = √ .
2 x
Tomando c = 16 e ∆x = 0.5 na fórmula acima, temos:
1 1
f (16 + 0.5) ≈ f (16) + f 0 (16) × 0.5 = 4 + × = 4.0625.
8 2

Assim, 16.5 ≈ 4.0625.
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 73

Análise de Erros
Sempre que se fala de valores aproximados de um número é importante avaliarmos o erro
cometido nessa aproximação, pois aquele fornece-nos um grau de fiabilidade desta.
Doravante, designaremos por x um valor aproximado (v.a.) de um número real x, e
escreveremos
x≈x
para denotar tal facto. Se x > x, x dir-se-á um v.a. de x por excesso; se x < x, x dir-se-á
um v.a. de x por defeito. Assim, podemos dizer que 2.8 e 2.7 são v.a. de e (número de
Neper) por excesso e por defeito, respectivamente.
O erro do v.a. x para um valor x é dado por

∆x = x − x.

Por outro lado, à quantidade


ε = |∆x| = |x − x|
chamamos erro absoluto de x. Na prática, muitas vezes conhece-se apenas um majo-
rante para o erro absoluto, isto é, é-nos dito que L ∈ R+ é tal que

ε ≤ L. (1.17)

Nestas circunstâncias, o valor x que desejamos aproximar é tal que:

x − L ≤ x ≤ x + L.

Assim, x − L e x + L serão v.a. de x por defeito e por excesso, respectivamente.


Exemplo 26. Um majorante para o erro absoluto cometido quando tomamos π = 3.14
para aproximação de π é 0.01. De facto, como 3.14 < π < 3.15, temos:

|π − π| < 0, 01,

e podemos tomar L = 0.01. Contudo, poderı́amos tomar um majorante mais pequeno,


pois que
3.14 < π < 3.142,
ou seja:
|π − π| < 0.002.
Como é evidente, quando se fala de aproximações o objectivo é minimizar os valores
de L que satisfazem (1.15). Por vezes, a maneira como foi obtida a aproximação indica-
nos um majorante do erro absoluto.
Exemplo 27. O comprimento de um segmento de recta [AB] foi aproximado em 214 cm a
menos de 0.5 cm. Quer isto dizer que se l for o comprimento exacto de [AB], e tomarmos
l = 214cm, então

213.5 = 214 − 0.5 ≤ l ≤ 214 + 0.5 = 214.5.


74 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Observemos agora que é substancialmente diferente termos um erro de 1cm quando


estimamos o comprimento de uma ponte ou termos esse mesmo erro quando avaliamos o
comprimento de um lápis. Claramente, no segundo caso a qualidade da aproximação será
pior que no primeiro. Para distinguir os casos, introduzamos o conceito de erro relativo
do v.a. de um número.
Chamamos erro relativo do v.a. x de um número x ao quociente:

|∆x|
rx = .
|x|

Assim,
ε = rx |x|
Mais uma vez, dado que desconhecemos x com exactidão, o que nos surge na prática é
um majorante do erro relativo. Pelos mesmo motivo, nas definições acima, tomaremos |x|
no lugar de |x|. Assim, se L ∈ R+ for tal majorante,

|∆x|
rx ≤ L ⇐⇒ ≤ L ⇐⇒ |∆x| ≤ L |x|
|x|

O erro relativo exprime-se em percentagem quando multiplicamos rx por 100.

Exemplo 28. Os comprimentos de uma ponte e de um automóvel foram avaliados em 25m


e 2.5m, respectivamente, a menos de 1 cm. Calculemos a percentagem do erro relativo
cometido em cada um dos casos. Se x1 e x2 forem, respectivamente, os comprimentos da
ponte e do automóvel, então

24.99 ≤ x1 ≤ 25.01 e 2.49 ≤ x2 ≤ 2.51.

Assim, um majorante para a percentagem de erro cometida no primeiro caso é:


0.01
× 100 = 0.04%
25
enquanto no segundo caso temos:
0.01
× 100 = 0.4%,
2.5
ou seja, 10 vezes maior.
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 75

FOLHA DE EXERCÍCIOS E PROBLEMAS N.o 3



1. Sendo f (x) = x + 1, x ≥ 0, determine f 0 (x), por definição de derivada.

2. Considere a função f tal que


(
x2 + 4x + 2, x < −2
f (x) = .
1 − 4x − x2 , x ≥ −2

(a) Esboce o gráfico de f .


(b) A função é contı́nua no ponto de abcissa −2 ? Justifique.
(c) A função é diferenciável no ponto de abcissa −2 ? Justifique.

3. Para cada uma das funções dada, defina a função derivada.

1 1 sin θ
(a) f (s) = 4s4 − 5s2 (b) g(x) = x 2 − x− 2 (c) h(θ) = 3 cos θ −
4
√ 2
x +x−1
(d) f (x) = (3x2 + 7) (x2 − 2x + 3) (e) f (x) = x sin x (f) f (x) =
x2 − 1
1 x2
(g) f (x) = (h) y = (i) y = 3x2 sec x
4 − 3x2 cos x
sin x
(j) y = x cos x − sin x (k) y = (l) y = 2x − x2 tg x
x
 5
θ 1
(m) y = 1 − cos 2x + 2 cos2 x (n) h(θ) = 2
(o) f (x) = x +
(1 − θ)3 x
sec7 x sec5 x 3x cos (x − 1)
(p) y = − (q) f (x) = √ (r) y =
7 5 x2 + 1 x−1

4. Determine a derivada da função dada no ponto dado.



(a) f (x) = 3 x2 − 1, x=3
π
(b) y = cossec (3x) + cotg (3x) , x =
6
1 + sin x
(c) f (x) = , x=π
1 − sin x

5. Em cada uma das alı́neas, determine a segunda derivada da função dada.


1
(a) h(t) = 4 sin t − 5 cos t (b) y = + tg x (c) f (x) = cotg x
x
76 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

6. Determine equações das rectas tangente e normal ao gráfico da função dada no


ponto dado.
2x3 − 1 1 + sin x
(a) f (x) = 2
, (1, 1) (b) f (x) = −xtg x, (0, 0) (c) f (x) = , (π, 1)
x 1 − sin x
(d) y = 5x−2 , (2, 1) (e) y = log10 2x, (5, 1) (f) y = (1 + x)x , (0, 1)

7. Mostre que, em cada um dos casos, a função definida por y = f (x) satisfaz a
equação diferencial dada.
(a) y = 2 sin x + 3 cos x, equação: y 00 + y = 0
(b) y = ex (a cos 3x + b sin 3x), equação: y 00 − 2y 0 + 10y = 0

8. Defina em cada um dos casos a função derivada da função cuja expresssão é dada.
√ √
(a) f (x) = ln x (b) g(x) = x ln x (c) f (t) = t2 et
1 √ x2
(d) y = [a + bx − a ln (a + bx)] (e) y = e2x + e−2x (f) g(x) =
b2 ex
1
(g) f (x) = e−|x| (h) f (x) = arctg (x2 − 1) (i) y = x2x+1
2

(j) g(x) = log3 1 − x (k) y = tg (arcsin x) (l) y = 3x−1

(m) y = x arcsin2 x − 2x + 2 1 − x2 arcsin x (n) y = (ln x)x (o) y = xln x

9. Em cada um dos seguintes casos, α e θ representam parâmetros reais positivos.


Determine a derivada de cada famı́lia de funções cuja expressão é dada.
(a) f (x) = 2x
α2
(b) f (u) = 2θ2 u−3
y
y 2 e− θ 1
1−x
(c) g(y) = (d) h (x) = α α
−1 , com 0 < α < 1
2θ3

10. Considere a função custo total de produção, CT , definida por:


CT (Q) = 20 + 20Q + 0, 5Q2 .

(a) Identifique o custo fixo e o custo variável na função.


(b) Determine o custo médio e o custo marginal.

11. Um ponto desloca-se ao longo da curva y = x de tal forma que a ordenada au-
menta a uma taxa de variação (instantânea) de 2 unidades por segundo. Determine
a taxa de variação (instantânea) da abcissa nos seguintes casos.
1
(a) x = (b) x = 1 (c) x = 4
2
Sugestão: recorra à regra da cadeia na notação de Leibniz.
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 77

0
12. Em cada uma das alı́neas, determine (f −1 ) (a) para a função f e a ∈ R, dados.

π π 3
(a) f (x) = x3 + 2, a = −1 (b) f (x) = tg x, − ≤ x ≤ , a =
4 4 3
3 x
(c) f (x) = 1 − x , a = 9 (d) f (x) = e + x, a = 1

dy
13. Para cada uma das seguintes alı́neas, determine por meio de derivação implı́cita.
dx
 
√ 1
(a) x3 y 3 − y = x (b) xy = x − 2y (c) x = sec
y

dy
14. Para cada uma das seguintes alı́neas, determine por meio de derivação implı́cita
dx
e o valor da derivada no ponto indicado.

(a) x2 − y 3 = 0, (1, 1) (b) x3 + y 3 = 4xy + 1, (2, 1)


2
(c) tg(x + y) = x, (0, 0) (d) (x2 + y 2 ) = 4x2 y, (1, 1)
√ √  2
(e) 7x2 − 6 3xy + 13y 2 − 16 = 0, 3, 1 (f) 3 (x2 + y 2 ) = 100 (x2 − y 2 ) , (4, 2)

15. Utilizando derivação implı́cita:

x2 y 2
(a) determine uma equação da recta tangente à elipse + = 1 no ponto (1, 2).
2 8
x2 y2
(b) mostre que uma equação da recta tangente à elipse 2 + 2 = 1 no ponto
a b
x0 x y 0 y
(x0 , y0 ) é 2 + 2 = 1.
a b
d2 y
16. Dada a curva de equação x2 y 2 − 2x = 3, determine como função de x e de y.
dx2
17. Admita que a função f definida por y = f (x) é solução da seguinte equação
dy  y
=ky 1− , k, L : constantes positivas,
dx L
dita equação logı́stica. Sabendo que tal função é limitada (os seus valores estão em
]0, L[), mostre que o gráfico de f possui um ponto de inflexão. Determine-o.

18. Para cada uma das alı́neas seguintes, calcule a diferencial, dy.
x+1 √
(a) y = 3x2 − 4 (b) y = (c) y = 36 − x2
2x − 1

(d) y = x sin x (e) y = x (1 − cos x) (f) y = 1 − x2 arcsin x
78 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

19. Uma companhia descobre que a procura para o produto que vende é p = 75 − 14 x.
Se x muda de 7 para 8, compare os valores de ∆p e de dp. Proceda do mesmo
modo, agora para uma função procura dada por p = 75 − 41 x − x2 e explique as
diferenças obtidas.

20. Utilize diferenciais para estimar o valor de:



(a) 99.4 (b) (3.99)3 (c) tg (0.02)

21. Considere uma empresa com a seguinte função de produção F , tal que F (x) =
1√
2
x, onde x designa o número de unidades de trabalho. Suponha que a empresa
está a usar 100 unidades do factor trabalho.

(a) Calcule a produção actual.


(b) Calcule o acréscimo aproximado de produção com a contratação de um traba-
lhador adicional, recorrendo ao conceito de diferencial.
(c) Calcule o valor exacto do do acréscimo a que se refere a alı́nea anterior.
(d) Suponha que a empresa corta a sua força de produção em 4 trabalhadores.
i. Qual o decréscimo aproximado na produção?
ii. E qual o decréscimo exacto? Compare os resultados de i. e ii.

22. Esboce a região plana delimitada pela parábola de equação y = −x2 + 4x − 3 e


pelas suas rectas tangentes nos pontos (0, −3) e (3, 0) .

23. Determine uma equação da parábola y = ax2 + bx + c que passa pelo ponto (0, 1)
e que é tangente à recta y = x − 1 no ponto (1, 0).

24. (*) Determine as equações das rectas tangentes à curva y = x3 − 9x e que passam
pelo ponto (1, −9).

25. (*) Para a função h definida em 9. (d), discuta a forma da sua representação gráfica
em função dos valores admissı́veis para o parâmetro α.
Sugestão: Comece por concretizar α para alguns valores admissı́veis.
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 79

1.4.5 Aplicações das Derivadas


Apesar de termos já abordado algumas aplicações das derivadas, vamos agora apresentar
cinco outras. Começaremos com os chamados teoremas das funções regulares e as respec-
tivas interpretações geométricas. Depois abordaremos o levantamento de indeterminações,
apresentando ainda três novos tipos de formas indeterminadas. De seguida centraremos
o nosso estudo em três das caracterı́sticas principais do gráfico de uma função: a mono-
tonia, a concavidade e os extremos. Por último, apresentaremos um modo de aproximar
funções mediante polinómios de grau qualquer, ditos polinómios de Taylor.

Teoremas das Funções Regulares


Uma f.r.v.r. diz-se regular em [a, b] se for contı́nua em [a, b] e diferenciável no seu inte-
rior. Se a hipótese da continuidade de uma função num intervalo fechado já conduzia a
resultados importantes, vamos agora ver o que nos reserva a hipótese adicional da dife-
renciabilidade.
Comecemos pelo seguinte resultado que, como veremos, poderá relacionar-se com
extremos de funções regulares.
Teorema 13 (T. de Rolle). Seja f uma f.r.v.r. regular em [a, b] . Se f (a) = f (b), então
existe algum c ∈ ]a, b[ tal que
0
f (c) = 0.
A interpretação geométrica deste teorema é a seguinte: nas condições dadas, existe
pelo menos um ponto (c, f (c)) no Gf , com c ∈ ]a, b[, tal que a recta tangente ao Gf
nesse ponto é horizontal.
Note ainda que o ponto garantido pelo T. de Rolle poderá não ser um extremo (ver
noção de ponto estacionário e condição necessária para a existência de extremo).
0
Exemplo 29. Mostremos que a f.r.v.r. f (x) = x2 − 3x + 2 é tal que f (c) = 0 para algum
valor c entre os zeros da função. Note que

f (x) = 0 ⇐⇒ x = 1 ∨ x = 2.

Assim, como f é regular em [1, 2] (pois é polinomial) e f (1) = f (2), podemos concluir
0
que existe algum c em ]1, 2[ tal que f (c) = 0. Determine o ponto (c, f (c)) e indique o
que representa no Gf .
Duas consequências importantes deste resultado estão relacionadas com a restrição do
número de zeros de uma função regular. De facto, temos:
Corolário 2. Entre dois zeros de uma função f regular em [a, b] existe pelo menos um
zero da função f 0 .
Demonstração. Sejam c1 , c2 tais que f (c1 ) = f (c2 ) = 0, com c1 < c2 . Aplique-se o T.
de Rolle a f no intervalo [c1 , c2 ].
80 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Corolário 3. Seja f uma função regular em [a, b]. Entre dois zeros consecutivos de f 0
existe, no máximo, um zero da função f .
Demonstração. Sejam c1 , c2 tais que f 0 (c1 ) = f 0 (c2 ) = 0, com c1 < c2 . Admita que
existiam α, β ∈ [c1 , c2 ], α < β tais que f (α) = f (β) = 0. Por aplicação do T. de Rolle
a f no intervalo [α, β] chegar-se-ia à conclusão que existiria d ∈]α, β[⊂]c1 , c2 [ tal que
f 0 (d) = 0. Tal é absurdo, porque se supôs que os zeros de f 0 são consecutivos. Deste
modo, f apenas admitirá, no máximo, um zero em [c1 , c2 ].
Teorema 14 (T. do Valor Médio ou de Lagrange). Seja f uma f.r.v.r. regular em [a, b].
Então existe algum c ∈ ]a, b[ tal que

0 f (b) − f (a)
f (c) = .
b−a
Geometricamente, o teorema afirma a existência de uma recta tangente ao gráfico de f
paralela à recta que lhe é secante pelos pontos (a, f (a)) e (b, f (b)). Em termos de taxas
de variação, o Teorema do Valor Médio de Lagrange afirma que deve existir algum ponto
c em ]a, b[ para o qual a taxa de variação nesse ponto é igual à taxa de variação média no
intervalo [a, b].
Exemplo 30. Seja f uma f.r.v.r. definida por
4
f (x) = 5 − , x ∈ R\ {0} .
x
Encontremos todos os valores de c ∈ ]1, 4[ para os quais

0 f (4) − f (1)
f (c) = .
4−1
Note que a função dada é contı́nua e diferenciável no intervalo [1, 4], pois é contı́nua em
R\ {0} e
4
f 0 (x) = 2 , x ∈ R\ {0} .
x
Pelo Teorema de Lagrange, existe c ∈ ]1, 4[ tal que

0 f (4) − f (1)
f (c) = .
4−1
Ora, f (1) = 1 e f (4) = 4. Resolvendo a equação:
4 4−1
2
= ,
c 4−1
vem:
c = −2 ∨ c = 2.
Como −2 ∈
/ ]1, 4[, só pode ser c = 2.
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 81

Nota 18. Nas condições do Teorema de Lagrange, podemos dizer que existe algum c ∈
]a, b[ tal que
0
f (b) = f (a) + f (c) (b − a) ,
o que constitui uma forma alternativa para a conclusão do referido teorema.
Vamos agora apresentar algumas aplicações do T. de Lagrange. Na primeira referimos
uma maneira de calcular derivadas nos casos em que as fórmulas de derivação não se
podem aplicar.
Teorema 15. Seja f uma f.r.v.r. contı́nua em [a, b] e c ∈ ]a, b[ .
1. Se f é diferenciável em ]a, c[ e lim+ f 0 (x) existe, então f é derivável à direita em a e
x→a
tem-se:
fd0 (a) = lim+ f 0 (x) .
x→a
0
2. Se f é diferenciável em ]c, b[ e lim− f (x) existe, então f é derivável à esquerda em b
x→b
e tem-se:
fe0 (b) = lim− f 0 (x) .
x→b

3. Se f é diferenciável em ]a, c[ ∪ ]c, b[ e limf 0 (x) existe, então f é derivável em c e


x→c
tem-se:
f 0 (c) = limf 0 (x) .
x→c


Exercı́cio 16. 1. Mostre que para f (x) = 3
x se tem:

f 0 (0) = +∞.

2. Mostre que para g (x) = arcsin x se tem:

gd0 (−1) = +∞ e ge0 (1) = +∞ .

O seguinte teorema é também consequência do T. de Lagrange e permite-nos deter-


minar os intervalos em que uma função regular é constante.
Teorema 16. Sejam f e g duas funções regulares em [a, b]. Então:

(1) f é constante em [a, b] ⇐⇒ f 0 (x) = 0, ∀x ∈ ]a, b[ .


(2) f 0 (x) = g 0 (x), ∀x ∈ ]a, b[ ⇐⇒ ∃k∈R : f (x) = g(x) + k, ∀x ∈ [a, b] .

Exercı́cio 17. Mostre que


π
arcsin x = − arccos x, ∀x ∈ [−1, 1] .
2
Sugestão: considere a f.r.v.r. f tal que f (x) = arcsin x + arccos x e mostre que é cons-
tante em [−1, 1] .
82 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

O estudo da monotonia de uma f.r.v.r. está directamente ligado ao sinal da primeira


derivada, como se refere no seguinte resultado.

Teorema 17. Seja f uma f.r.v.r. regular em [a, b].


1. Se f 0 (x) > 0 em ]a, b[, então f é estritamente crescente em [a, b].
2. Se f 0 (x) ≥ 0 em ]a, b[, então f é crescente em [a, b].
3. Se f 0 (x) < 0 em ]a, b[, então f é estritamente decrescente em [a, b].
4. Se f 0 (x) ≤ 0 em ]a, b[, então f é decrescente em [a, b].

Nota 19. 1. As afirmações feitas em 1. e 3. do teorema anterior são válidas ainda que f 0
se anule num número finito de pontos em ]a, b[. Pense por exemplo no que acontece com
f (x) = x3 .
2. Este teorema fornece-nos ainda o seguinte critério de injetividade de uma função:

f é injectiva em [a, b]

se e só se uma das seguintes asserções se verifica:

f 0 (x) > 0, ∀x ∈ ]a, b[

ou
f 0 (x) < 0, ∀x ∈ ]a, b[ .
Este critério também se mantém ainda que f 0 se anule num número finito de pontos em
]a, b[.
3. As conclusões mantêm-se se as condições de continuidade e de diferenciabilidade
se verificarem em ]−∞, b] ou [a, +∞[ (diferenciabilidade no interior). Por outro lado,
também se mantêm se tivermos f 0 (x) = +∞ nos dois primeiros casos ou f 0 (x) = −∞
nos restantes dois casos.

Exemplo 31. 1. A função f tal que f (x) = 3 x é estritamente crescente em R. De facto,
f é contı́nua em R. Por outro lado,
1
f 0 (x) = √
3
> 0, ∀x ∈ R\ {0} .
3 x2
Como f 0 (0) = +∞, o teorema anterior permite-nos concluir o que se pretende.
2. A função g tal que g (x) = x − arctg x é estritamente crescente em [0, +∞[. Além
disso, como g (0) = 0, conclui-se que

x > arctg x, ∀x ∈ R+ .

Indeterminações
   
0 ∞
Vimos que as formas indeterminadas como , , (∞ × 0) e (∞ − ∞) surgem
0 ∞
no cálculo de limites e têm esse nome uma vez que não garantem a existência ou não de
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 83

limite, nem qual o seu valor. Analisámos também técnicas algébricas muito simples que
permitem levantar tais indeterminações (i.e., que permitem chegar à conclusão acerca da
existência de limite e do seu valor, no caso afirmativo). Contudo, nem sempre tais técnicas
são
  viáveis. Vamos apresentar um resultado que permite levantar indeterminações do tipo
0 ∞
e . Comecemos com um resultado auxiliar.
0 ∞
Teorema 18 (T. do valor médio alargado). Se f e g são duas funções regulares num
intervalo [a, b] então existe algum c ∈ ]a, b[ tal que

f 0 (c) f (b) − f (a)


0
= .
g (c) g (b) − g (a)

Observe que o Teorema de Lagrange é consequência deste, tomando g tal que g (x) =
x.

Teorema 19 (Regra de L’Hôpital). Sejam f e g duas f.r.v.r. diferenciáveis em ]a, b[


contendo c, excepto possivelmente em c. Assuma que g 0 (x) 6= 0 em
 ]a,
 b[, excepto eventu-
f (x) 0
almente em c. Se lim produz uma indeterminação do tipo , então
x→c g (x) 0

f (x) f 0 (x)
lim = lim 0
x→c g (x) x→c g (x)

desde que este limite exista ou seja infinito.


f (x)
Nota 20. Este resultado também se utiliza quando lim produz uma indeterminação
x→c g (x)
∞
do tipo . Além disso, também se aplica no cálculo de limites laterais e de limites no

infinito.
e2x − 1
Exemplo 32. Calculemos lim . Note que este limite conduz a uma indeterminação
  x→0 x
0
do tipo . Como as funções e2x − 1 e x satisfazem as condições do teorema em
0
qualquer intervalo contendo 0, e como

d 2x
[e − 1] 2e2x
lim dx = lim = 2,
x→0 d x→0 1
[x]
dx
a regra de L’Hôpital permite concluir que

e2x − 1 2e2x
lim = lim = 2.
x→0 x x→0 1
84 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Nota 21. 1. Note que a sequência de igualdades em que se aplica a referida regra só é
válida se o último dos limites existir ou for infinito.
2. É muito simples converter
  indeterminações do tipo (∞ × 0) e (∞ − ∞) em indetermi-
0  ∞ 
nações de um dos tipos ou . No primeiro caso trata-se de exprimir um produto
0 ∞
na forma de quociente. No segundo caso, a técnica da multiplicação e divisão pelo conju-
gado ou a redução ao mesmo denominador permitem, em geral, obter um quociente que
é de um dos tipos requeridos para aplicarmos a regra de L’Hôpital.
Exemplo 33. Mostre que
ln x x2
(a) lim =0 (b) lim
=0
x→+∞ x x→−∞ e−x


 
1 1 1
(c) lim e−x x = 0 (d) lim+ − =
x→+∞ x→1 ln x x − 1 2
ln x ∞
Resolução: (a) lim é uma indeterminação do tipo . Como
x→+∞ x ∞
d 1
dx
[ln x] x
lim d
= lim = 0,
x→+∞ [x] x→+∞ 1
dx
temos:
ln x
lim = 0.
x→+∞ x

(b), (c) e (d): a cargo do leitor.

Outras indeterminações surgem quando consideramos limites de funções exponenciais-


potência,
lim [f (x)]g(x) .
x→a
De facto, recordando que
h (x) = [f (x)]g(x) = eg(x) ln[f (x)] , (1.18)
é tarefa fácil perceber que as formas
(1∞ ) , (∞0 ) e (00 )
são também indeterminações (9 ). Estas resolvem-se levantando primeiramente a indeterminação
que resulta de
lim [g(x) ln [f (x)]]
x→a
e regressando depois a (1.18) para calcular lim h(x).
x→a
9
Em virtude do domı́nio de uma exponencial-potência, nos segundo e terceiro casos referimo-nos a
indeterminações do tipo
0 0
(+∞) e 0+ ,
se quisermos ser mais precisos.
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 85

Exemplo 34. Mostre que

 x 1
1
(a) lim 1+ =e (b) lim (ln x) x = 1 (c) lim+ (sin x)x = 1.
x→+∞ x x→+∞ x→0

1
Resolução: (b) lim (ln x) x é uma indeterminação do tipo (∞0 ). Como
x→+∞

 1
ln (ln x)
1 ln (ln x) x
(ln x) = e
x =e x ,

e dado que

ln (ln x) [ln (ln x)]0 1


x
lim = ! lim = lim = 0,
x→+∞ x ∞ x→+∞ (x)0 x→+∞ ln x
indet.

podemos concluir que


1
lim (ln x) x = e0 = 1.
x→+∞

(a) e (c): a cargo do leitor.

Gráficos
Analisados já alguns aspectos como o domı́nio, a continuidade, a paridade, as assı́ntotas
e a monotonia do gráfico de uma função, vamos agora abordar os restantes aspectos ne-
cessários para efectuar um adequado esboço gráfico de uma função: as concavidades e
os extremos locais de uma função. Em qualquer destes aspectos, o conceito de derivada
ocupa um papel decisivo.

Concavidade Seja f uma f.r.v.r. diferenciável num intervalo aberto I. O gráfico de f


diz-se:

1. convexo (estritamente convexo) em I sse à medida que se percorre o seu gráfico da


esquerda para a direita os declives das suas tangentes não diminuem (aumentam);

2. côncavo (estritamente côncavo) em I sse à medida que se percorre o seu gráfico da


esquerda para a direita os declives das suas tangentes não aumentam (diminuem).
(10 )

A visualização gráfica destes conceitos está expressa nas seguintes figuras.


10
A definição de gráfico convexo/côncavo num intervalo é mais complexa. Aqui tomámos como
definições condições necessárias e suficientes para que estas propriedades se verifiquem num dado intervalo.
86 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Teorema 20 (teste para a concavidade). Seja f 0 uma f.r.v.r. regular em [a, b].
1. Se f 00 (x) > 0 em ]a, b[, então o Gf é estritamente convexo em [a, b].
2. Se f 00 (x) ≥ 0 em ]a, b[, então o Gf é convexo em [a, b].
3. Se f 00 (x) < 0 em ]a, b[, então o Gf é estritamente côncavo em [a, b].
4. Se f 00 (x) ≤ 0 em ]a, b[, então o Gf é côncavo em [a, b].

Tal como acontecia a respeito da monotonia, podemos ter funções estritamente conve-
xas ou côncavas num intervalo e haver pontos em número finito para os quais a segunda
derivada se anule. Pense no exemplo da função f (x) = x4 , cuja primeira derivada,
f 0 (x) = 4x3 é regular. Note que, apesar de f 00 (0) = 0, a função é estritamente convexa
em ]−∞, 0] e em [0, +∞[, pois f 00 (x) = 12x2 > 0 em R\ {0}. Assim, f é estritamente
convexa em R.
Dada uma f.r.v.r. f definida num conjunto da forma D1 ∪ D2 onde D1 e D2 são dois
intervalos tais que
D1 ∩ D2 = {c} .
Dizemos que f tem um ponto de inflexão f (c) em c se e só se f é convexa (resp., côncava)
em D1 e côncava (resp., convexa) em D2 . Evidentemente, se (c, f (c)) é ponto de inflexão
e f 00 (c) existir então terá de ser
f 00 (c) = 0.
Contudo, f pode ter pontos de inflexão em pontos x onde f 00 (x) não exista ou seja infinita.

Exemplo 35. 1. A função f tal√que f (x) = x3 tem um ponto de inflexão na origem.


2. A função g tal que g(x) = 3 x tem um ponto de inflexão na origem, apesar de g 00 (0)
não existir.
1 2
Exercı́cio 18. Determine os pontos de inflexão da função h tal que h(x) = √ e−x .

Extremos de f.r.v.r. Vimos já (na secção 1) os conceitos de extremos locais (máximos
e mı́nimos) e de extremos absolutos de uma f.r.v.r. num conjunto. Se em casos simples,
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 87

como as funções quadráticas, temos ferramentas algébricas que nos permitem determi-
nar tais extremos, vamos agora aplicar o conceito de derivada não só a esses casos mas
também na determinação dos extremos locais de quaisquer f.r.v.r.
Uma f.r.v.r. atinge uma máximo (resp., mı́nimo) local em c ∈ Df se
∃δ>0 : f (x) ≤ f (c) , ∀x∈]c−δ,c+δ[
(resp., se ∃δ>0 : f (x) ≥ f (c) , ∀x∈]c−δ,c+δ[ ).
Como deve recordar, uma função pode ter extremos locais sem ter extremos absolutos.
Contudo, prova-se que se o máximo (resp., mı́nimo) absoluto de uma função existir, então
é o máximo (resp., mı́nimo) local de maior (resp., menor) valor. Assim, se uma f.r.v.r.
possui um máximo (resp., mı́nimo) um processo para o determinar consiste em obter
todos os máximos (resp., mı́nimos) locais e escolher aquele que tem maior (resp., menor)
valor. No caso de estarmos na presença de uma função côncava ou convexa este processo
é bastante simples.

Teorema 21. Se f é uma função de domı́nio I e é convexa (resp., côncava) em I, então


todo o mı́nimo (resp., máximo) local é absoluto.

O estudo da monotonia de uma função é o método mais eficaz para determinar os


extremos de uma função. De facto, se existir δ > 0 tal que f é estritamente crescente em
]c − δ, c] e estritamente decrescente em [c, c + δ[, então f (c) é máximo local. Condições
análogas se estabeleceriam para o caso da identificação de um mı́nimo local.
Vamos agora enunciar condições para a determinação dos extremos locais de uma
f.r.v.r. recorrendo às derivadas. Neste caso, é essencial determinar os pontos crı́ticos da
função.

Definição 6 (ponto crı́tico ou ponto estacionário). Seja f uma f.r.v.r. definida em c ∈ R.


Dizemos que f atinge em c um ponto crı́tico ou estacionário se f 0 (c) = 0.

Teorema 22 (condição necessária ou condição de estacionaridade). Se f atinge um


máximo ou mı́nimo local em x = c e f é diferenciável nesse ponto, então c é um ponto
crı́tico.

Observe que esta é uma condição necessária, mas não suficiente, para a existência
de extremos em pontos onde f é diferenciável. Quer isto dizer que, quando andamos à
procura de extremantes (i.e., maximizantes e minimizantes) de uma função em pontos
onde f é diferenciável devemos fazê-lo no conjunto dos valores que anulam f 0 . Contudo,
o facto de f 0 (c) = 0 não é suficiente para garantir que f (c) é extremo. Basta pensar no
seguinte contraexemplo.

Exemplo 36. O único ponto estacionário da função f tal que f (x) = x3 é x = 0.


Contudo, é fácil ver que em qualquer intervalo do tipo ]−δ, +δ[ , com δ > 0, verifica-se
que existem pontos com imagem positiva e outros com imagem negativa. Assim, f não
atinge um extremo em 0.
88 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Outro facto que importa destacar é que, para além dos pontos estacionários, f pode
atingir um extremo local em pontos onde a derivada não existe ou é infinita.
Exemplo 37. A f.r.v.r. f tal que f (x) = |x|, x ∈ R, diferenciável em R\ {0}, tem um
mı́nimo local (e absoluto) na origem.
Uma estratégia para determinar os extremos de uma função num intervalo fechado
[a, b] consiste em determinar os pontos crı́ticos de f no seu interior e os pontos onde
f 0 não está definida. Calculando depois f (a), f (b) e f (c) para cada ponto crı́tico ou
onde f não é diferenciável, a comparação desses valores dir-nos-á quais os casos em que
resultam extremos de f . Eventualmente, pode acontecer que alguns pontos crı́ticos não
sejam extremantes de f .
O seguinte resultado, dito teste da segunda derivada, apresenta uma condição su-
ficiente que permite decidir se um dado ponto crı́tico é ou não um extremante de uma
função.

Teorema 23 (Teste da 2.a derivada). Seja f uma f.r.v.r. diferenciável em [a, b] e admita
que c ∈ ]a, b[ é tal que f 0 (c) = 0. Admitamos que f é duplamente diferenciável em c.
(a) Se f 00 (c) > 0, então f (c) é um mı́nimo local.
(b) Se f 00 (c) < 0, então f (c) é um máximo local.
(c) Se f 00 (c) = 0, então o teste é inconclusivo.
Por último, deixamos aqui alguns problemas de optimização, i.e., de determinação de
máximos e mı́nimos.

3
Exemplo 38. Determinemos os extremos da f.r.v.r. f tal que f (x) = 2x + 3 x2 , x ∈ R.
Para tal, calculemos a primeira derivada de f :
2
f 0 (x) = 2 + √ , x ∈ R\ {0} .
3
x
Como
f 0 (x) = 0 ⇐⇒ x = −1,
apenas temos um ponto estacionário de f . Deste modo, f apenas poderá atingir extremos
neste ponto ou em x = 0, onde a derivada não existe. Façamos o quadro de monotonia
de f . Note que √
0
3
x+1
f (x) = 2 √ .
3
x

0
3
x+1
Assim, o sinal de f (x) é o do quociente √ . Temos pois o seguinte quadro:
3
x
x −∞ −1 0 +∞
√3
x+1 − 0 + + +
√3
x − − − 0 +
0
f (x) + 0 − N.D. +
Máx. local Mı́n. local
f (x) % & %
f (−1) = 1 f (0) = 0
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 89

Assim, f atinge um máximo local de valor 1 em x = −1 e um mı́nimo local de valor


nulo na origem. Note que os extremos locais encontrados não são absolutos. De facto,
prova-se que
lim f (x) = +∞ e lim f (x) = −∞.
x→+∞ x→−∞

Exemplo 39. O custo total, CT , de uma viagem (em euros) está repartido entre o custo do
combustı́vel e o pagamento do serviço do motorista. Sabe-se que o custo do combustı́vel
por hora, denotado por C, está relacionado com a velocidade do veı́culo (em Km/h)
através da seguinte função:
v2
C=
600
e que o motorista cobra
W = 5 (euros/h).
Qual a velocidade que minimiza o custo total num percurso de 110 Km ? Para responder
a este problema, observemos qua CT é função de v do seguinte modo:

CT (v) = C t + W t (1.19)

Mais, admitindo que o percurso é feito em movimento uniforme, é válida a seguinte


relação:
dist. = v × t.
Como dist. = 110, vem:
110
t= .
v
Substituindo C, W e t em (1.19), vem:

v 2 110
 
110 1 5
CT (v) = +5 = 110 v+ , v > 0.
600 v v 600 v

Ora,  
d CT (v) 1 5
= 110 − 2
dv 600 v
e
d CT (v) 1 5 √
= 0 ⇐⇒ = 2 ⇐⇒ v = ± 3000.
dv 600 v
Como v representa uma velocidade e admitimos que o movimento se faz no sentido con-
siderado positivo, vem: √
v = + 3000 ≈ 54.78 Km/h.
Um quadro de monotonia facilmente permitiria concluir que este ponto estacionário de
CT é minimizante. O mı́nimo valerá:
√ √
CT ( 3000) = CT ( 30 × 10) ≈ 20.083 (em euros).
90 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Esboço do gráfico de uma f.r.v.r. Para obter uma adequada representação gráfica de
uma f.r.v.r. há que ter em conta os diversos aspectos abordados até aqui, que resumiremos
de seguida.

(i) Domı́nio
(ii) Simetrias e periodicidade
(iii) Intervalos de continuidade e limites nos respectivos extremos
(iv) Assı́ntotas
(v) Primeira derivada, monotonia e quadro de variação
(vi) Indicação dos extremos e das intersecções com os eixos
(vii) Segunda derivada, concavidades e pontos de inflexão

Exemplo 40. Faça o estudo completo e um esboço do gráfico de f tal que


x
f (x) = √
3
.
x2 − 1
Resolução: Note que f é contı́nua em todo o seu domı́nio, sendo Df = R\ {−1, 1}. De
facto, isto sucede porque f se exprime através do quociente entre um polinómio e uma
raiz de ı́ndice ı́mpar que apenas se anula em {−1, 1}. Por outro lado,

f (−x) = −f (x) , ∀x,(−x)∈Df .

Assim, f é ı́mpar e o seu gráfico é simétrico relativamente à origem. Quanto aos limites
nos extremos do domı́nio, temos:
r
3 x3
lim f (x) = lim = +∞
x→+∞ x→+∞ x2 − 1
e
lim f (x) = −∞ e lim f (x) = +∞.
x→1− x→1+

Desde já se conclui que o gráfico de f não tem assı́ntotas horizontais na parte direita e
que x = 1 constitui assı́ntota vertical do gráfico de f . Dado que

f (x) 1
lim = lim √
3
= 0,
x→+∞ x x→+∞ x2 − 1

também não existem assı́ntotas oblı́quas na parte direita. Atendendo à simetria acima re-
ferida, podemos afirmar o mesmo quanto à parte esquerda do gráfico no que concerne às
assı́ntotas não verticais, acrescentando que x = −1 constitui também assı́ntota vertical
do gráfico de f . Calculemos agora a primeira derivada. Temos:

df x2 − 3
(x) = (...) = q .
dx 3 2 4
3 (x − 1)
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 91

Em R+
0 temos:
df √
(x) = 0 ⇐⇒ x= 3.
dx
df
A partir do sinal de (x) - o qual depende apenas do sinal de (x2 − 3), nos pontos onde
dx
a derivada está definida - temos o seguinte quadro de monotonia estendido a Df :
√ √
x −∞ − 3 −1 1 3 +∞
df
(x) + 0 − N.D. − N.D. − 0 +
dx
f (x) % M & N.D. & N.D. & m %
onde: √
√  − 3
M é máximo local valendo f − 3 = √ 3
;
√ 2
√  3
m é mı́nimo local valendo f 3 = √ 3
.
2
 √   √ 
Assim, f é decrescente em − 3, −1 , em ]−1, 1[ e em 1, 3 , sendo crescente nos
restantes subdomı́nios, atingindo extremos locais nos pontos acima indicados. Estudemos
agora as concavidades mediante o cálculo da segunda derivada:
d2 f 2x (9 − x2 )
(x) = (...) = q .
dx2 3 2 7
9 (x − 1)

Em R+
0 temos:
d2 f
(x) = 0 ⇐⇒ x = 0 ∨ x = 3.
dx2
Note que para x ∈ R+
0 \ {1}, temos:

d2 f
2
(x) ≥ 0 ⇐⇒ (2x (9 − x2 ) ≥ 0 ∧ (x2 − 1) > 0) ∨ (2x (9 − x2 ) ≤ 0 ∧ (x2 − 1) < 0)
dx
⇐⇒ x ∈ ]1, 3] .
A variação de sinal da segunda derivada é dada através do seguinte quadro, contendo
também a parte relativa a R−0.

x −∞ −3 −1 0 1 3 +∞
2
df
(x) + 0 − ND + 0 − ND + 0 −
dx2
f (x) ∪ P I1 ∩ ∪ P I2 ∩ ∪ P I3 ∩
Neste quadro ficam patentes três pontos de inflexão do gráfico de f :
x = −3
( (

x=0 x=3
P I1 : 3 P I2 : P I3 : 3 .
y = f (−3) = − y = f (0) = 0 y = f (3) =
2 2
92 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

x
Figura 1.33: Gráfico de f tal que f (x) = √
3
.
x2 − 1

ln x
Exemplo 41. Faça o estudo completo e um esboço do gráfico de g tal que g (x) = .
+
x
Resolução: Comecemos por notar que Dg = R e que g é contı́nua nesse conjunto (por
ser o quociente entre uma função contı́nua em R+ por uma função polinomial que apenas
se anula em x = 0). Além disso:

1
ln x (ln x)0
lim g(x) = lim = lim = lim x = 0
x→+∞ x→+∞ x ∞ ! x→+∞ (x)0 x→+∞ 1


e
ln x
lim+ g(x) = lim+ = −∞.
x→0 x→0 x
Assim, y = 0 e x = 0 são assı́ntotas horizontal e vertical, respectivamente, do gráfico de
g. A primeira derivada é dada por:

dg 1 − ln x
(x) = (...) = .
dx x2
Como
dg
(x) = 0 ⇐⇒ x = e,
dx
temos o seguinte quadro de monotonia:

x 0 e +∞
dg
(x) N.D. + 0 −
dx
Máx. local
g (x) % 1 &
g (e) =
e
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 93

Observe que, atendendo aos limites nos extremos de Dg , o máximo local é também abso-
luto. Quanto à segunda derivada, temos:

d2 g 2 ln x − 3
2
(x) = (...) = ,
dx x3
pelo que:
d2 g 3

2
(x) = 0 ⇐⇒ x = e2 .
dx
Eis a variação de sinal da segunda derivada, com as consequentes conclusões em termos
de concavidades:
3
x 0 e2 +∞
2
dg
(x) N.D. − 0 +
dx2
Pto. de infl.
g(x) ∩  3 3 3 ∪
g e 2 = e− 2
2

Assim, estamos em condições de apresentar um esboço do gráfico da função g.

ln x
Figura 1.34: Gráfico de g tal que g (x) = .
x

Exercı́cio 19. Aquando do estudo breve das funções trigonométricas inversas, pôde cons-
truir o gráfico de cada uma delas através da relação que se estabelece entra o gráfico
de uma função directa e o da respectiva inversa. Faça o estudo completo de cada uma
daquelas funções e confirme a forma dos respectivos gráficos.

Polinómios de Taylor/MacLaurin
Prometemos antes que, sob certas condições, é possı́vel aproximar funções mediante
polinómios de grau n, n > 1. Vamos agora definir tais polinómios e verificar que a
aproximação linear de uma função não é mais do que um caso particular, com n = 1.
1
Comecemos por observar o seguinte exemplo. Dada a f.r.v.r. f tal que f (x) = ,
1−x
pretende-se obter um polinómio, Pn (x), de grau n, tal que f (x) ≈ Pn (x). Recorde que,
94 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

dada uma progressão geométrica de razão x e 1.o termo 1, a soma dos seus (n + 1)
primeiros termos é dada por um polinómio Pn (x) tal que:

1 − xn+1 1 xn+1
Pn (x) = 1 + x + x2 + ... + xn = = − .
1−x 1−x 1−x
Daqui resulta que
1  xn+1 xn+1
= 1 + x + x2 + ... + xn + = Pn (x) + .
1−x 1−x 1−x
Esta igualdade permite-nos dizer que
1
f (x) = ≈ Pn (x) .
1−x
xn+1
desde que seja ”pequeno”. Mais: a aproximação será tanto melhor quanto mais
1−x
xn+1
pequeno for em valor absoluto. Coloca-se a questão de saber se esta é uma boa
1−x
xn+1
aproximação e se o termo suplementar é controlável.
1−x
Se a aproximação for boa, não restam dúvidas acerca da sua comodidade: trabalhar
com polinómios facilita as coisas em termos de continuidade, derivabilidade e (havemos
de o ver) integrabilidade. Além disso, a ser válido o desenvolvimento acima, podem-
se obter dele outros. De facto, a substituição de x por (−x2 ) naquele desenvolvimento
permite obter:
2n+2
1 2 4 n 2n n+1 x
= 1 − x + x + ... + (−1) x + (−1) .
1 + x2 1 + x2
1
Regressemos ao desenvolvimento de . Calculando Pn (x) para n = 0, 1, 2, 3, 4, 5,
1−x
1
vamos sobrepor em cada uma das seis figuras seguintes os gráficos de e de Pn (x).
1−x

Figura 1.35: Gf e gráficos de polinómios de diferentes graus.


1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 95

Pode verificar pela observação das figuras que os sucessivos polinómios Pn (x) vão
sendo cada vez melhores aproximações de f (x) mas apenas no intervalo ]−1, 1[. A res-
xn+1
posta para esta discrepância reside no termo suplementar . Note que
1−x

1 xn+1
− Pn (x) =
1−x 1−x

O limite desta diferença quando n −→ +∞ é nulo quando |x| < 1, e não existe quando
|x| > 1 nem quando x = −1 (para x = 1 a função nem sequer está definida). Assim, é
natural que as aproximações sejam cada vez melhores à medida que o grau do polinómio
aumenta, mas apenas em ]−1, 1[.
Que tipo de polinómios é possı́vel utilizar para aproximar uma dada função? A res-
posta a esta questão reside nos chamados polinómios de Taylor.

Definição 7 (Polinómio de Taylor/MacLaurin). Seja n um número natural qualquer e f


uma f.r.v.r. n vezes diferenciável num ponto x0 . Chamamos polinómio de Taylor de grau
n centrado em x0 (ou no ponto x0 ) ao polinómio seguinte:

f 00 (x0 ) f (n) (x0 )


Pn (x; x0 ) = f (x0 ) + f 0 (x0 ) (x − x0 ) + (x − x0 )2 + ... + (x − x0 )n .
2! n!
Caso se tenha x0 = 0, o polinómio dir-se-á de MacLaurin.

Observe que este polinómio tem as mesmas derivadas que f no ponto até à ordem
n (facto que deixaremos como exercı́cio). Quando se subentender qual o ponto x0 em
torno do qual se efectua o desenvolvimento, podemos omiti-lo na notação do polinómio,
escrevendo apenas Pn (x).

Exercı́cio 20. Mostre que o polinómio de MacLaurin de grau n da função f tal que
1
f (x) = é:
1−x
Pn (x; 0) = 1 + x + x2 + . . . + xn .

Exemplo 42. Para f (x) = ex , uma vez que f (k) (0) = 1, k = 0, 1, 2, ..., temos:
n
1 2 1 X 1
Pn (x; 0) = 1 + x + x + ... + xn = xk .
2! n! k=0
k!

1
Por outro lado, como também f (k) (−1) = , k = 0, 1, 2, ..., temos:
e
n
1 1 1 (x + 1)2 1 (x + 1)n 1 X (x + 1)k
Pn (x; −1) = + (x + 1) + + ... + = .
e e e 2! e n! e k=0 k!
96 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Exemplo 43. Para g(x) = sin x, temos:

g (0) = g 00 (0) = g (iv) (0) = ... = g (2k) (0) = 0

e
000 (v)
g 0 (0) = 1, g (0) = −1, g (0) = 1, ...
Deste modo, escreveremos:

1 3 1 g (n) (0) n
Pn (x; 0) = 0 + x + 0 − x + 0 + x5 + ... + x .
3! 5! n!
Daqui resulta que um polinómio de MacLaurin para esta função terá forçosamente grau
ı́mpar. De facto, suprimindo no desenvolvimento acima os termos de ordem par, escreve-
remos: n
X (−1)k 2k+1
P2n+1 (x; 0) = x .
k=0
(2k + 1)!

Exercı́cio 21. Mostre que para h(x) = cos x, temos:


n
X (−1)k
P2n (x; 0) = x2k .
k=0
(2k)!

Apresenta-se agora a chamada Fórmula de Taylor de grau n para f em torno de x0 :

f (x) = Pn (x; x0 ) + Rn (x; x0 ).

A quantidade Rn diz-se resto da fórmula de Taylor e dela depende a qualidade da


aproximação entre a função f e o seu polinómio de Taylor. Existem várias maneiras
de exprimir Rn . Optámos pelo chamado Resto de Lagrange de ordem n, que se define
como se segue:
f (n+1) (ξ)
Rn (x; x0 ) = (x − x0 )n+1
(n + 1)!
onde
ξ = x0 + θ (x − x0 ) , com 0 < θ < 1.
Dito de outro modo, ξ é um valor entre x0 e x. Note que:

|f (x) − Pn (x; x0 )| = |Rn (x; x0 )| ,

pelo que uma majoração de |Rn (x; x0 )| nos dá uma majoração do erro absoluto cometido
quando tomamos o polinómio de Taylor como aproximação de f (x).

Exemplo 44. Admitamos que


1 1 1
e≈2+ + + .
2! 3! 4!
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 97

Como encontrar uma majorante para o erro cometido nesta aproximação? Note que o
que está subjacente a esta aproximação é a fórmula de Taylor para ex em torno de x0 = 0
e para x = 1. De facto, pelo Exemplo 42. temos:
1 2 1 3 1 4
ex = P4 (x; 0) + R4 (x; x0 ) = 1 + x + x + x + x + R4 (x; 0),
2! 3! 3!
eξ 5
onde R4 (x; 0) = x , tal que ξ = θx, com 0 < θ < 1. Para x = 1, vem:
5!
1 1 1 eθ
e=1+1+ + + + .
2! 3! 4! 5!
Ora,
eθ e 3 1
|R4 (1, 0)| = < < = .
5! 5! 5! 40
1
Assim, a aproximação considerada para e é feita com erro inferior a.
40
Exemplo 45. A questão colocada no exemplo anterior pode ainda ser posta inversa-
mente: quantos termos deveremos considerar no polinómio de Taylor de modo que o erro
seja inferior a um dado L ? Trata-se de resolver a inequação

< L.
(n + 1)!
Para tal, e visto que 0 < θ < 1, é mais prático resolver
3
< L.
(n + 1)!
Admitamos, por exemplo, que se pretende aproximar e com erro inferior a 0.00001 (=
10−5 ). Quantos termos deveremos tomar no desenvolvimento do polinómio de MacLaurin
de ex com x = 1? Note que:
3
|Rn (1)| < 0.00001 ⇐⇒ < 10−5 .
(n + 1)!
Podemos resolver esta inequação através da construção de uma tabela:
3
n (n+1)!
1 1.5
2 0.5
3 0.125
4 0.025
5 0.004166667
6 0.000595238
7 7.44048E − 05
8 8.2672E − 06
98 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

O menor valor de n para o qual |Rn (1)| < 0.00001 é n = 8. Isto significa que
1 1 1 1
e≈1+ + + + ... + = 2.71827877,
1! 2! 3! 8!
com erro inferior a 10−5 .
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 99

1.4.6 Aplicações à Economia


Taxa instantânea de crescimento. Desconto e crescimento negativo.
Dada uma função V tal que y = V (t), a expressão
dy
dt V 0 (t)
ry ≡ = (1.20)
y V (t)
diz-se taxa proporcional de variação de y em relação a t. Note que se trata da taxa de
variação de y expressa em termos relativos (percentuais), i.e., expressa como uma razão
relativa ao próprio valor de y.
Quando a variável independente, t, denota o tempo (o que sucede em muitas aplicações
em Economia) é mais usual chamar a (1.20) taxa instantânea de crescimento ou sim-
plesmente taxa de crescimento:
dV
dt
(t)
Taxa de Crescimento de V ≡ rV ≡ . (1.21)
V (t)
Por exemplo, tomando V (t) = Aert , vem:
dV
dt
(t) rAert
Taxa de Crescimento de V = = = r. (1.22)
V (t) Aert
No contexto do juro composto (ver interpretação económica de e), a taxa instantânea de
crescimento corresponde, portanto, à taxa de juro (nominal) por perı́odo de composição.
V 0 (t)
Nota 22. Note que se y = V (t), então ry = = (ln[V (t)])0 .
V (t)
Num problema de juro composto, procura-se geralmente o valor futuro V (o principal
mais os juros) dado um valor presente A (principal inicial). Num problema de desconto
a situação é a inversa: dada uma soma V conhecida que deverá estar disponı́vel dentro de
um tempo t (em anos, por exemplo), qual o valor presente de A?
Supondo que estamos no caso contı́nuo da composição de juros, trata-se de considerar
a equação
V = Aert
(recorde (refcomposto) e resolvê-la em ordem a A. Vem:

A = V e−rt (1.23)

Deste modo, trata-se de, para um determinado número de anos, t, calcular A a partir
do valor futuro dado, V (sendo A e V funções de t). A expressão e−rt recebe o nome
de factor de desconto. Note que a taxa instantânea de crescimento de A é −r, que,
sendo negativa, recebe o nome de taxa de depreciação. Assim como o juro composto
é um exemplo de processo de crescimento, o processo de desconto ilustra o crescimento
negativo.
100 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Nota 23. A exposição acima feita baseia-se em processos de juros compostos e de des-
conto contı́nuos, por oposição a discretos (i.e., aqueles em que t assume valores em N
ou fracções destes). Para uma discussão sobre as abordagens discreta e contı́nua e suas
peculiaridades, consulte Chiang e Wainwright [4].

Segue-se um problema de optimização associado a um processo de desconto.

Exemplo 46. Admita que um dado comerciante de vinhos possui uma quantidade es-
pecı́fica de vinho que pretende vender no tempo presente (i.e., quando t = 0) por um
montante K (em e) ou, em alternativa, armazenar e depois vender por um preço mais
elevado. Estima-se que o valor crescente do vinho é dado por V tal que:

V (t) = Ke t , t ≥ 0.

Evidentemente, se o vinho for vendido agora, tem-se V (0) = K. O problema consiste em


determinar o instante t em que o comerciante deve vender o seu vinho de modo a maxi-
mizar o lucro, assumindo para simplificar que não há lugar a custos de armazenamento.
Uma vez que o custo do vinho foi já pago pelo comerciante (diz-se um custo submerso)
e sendo omitidos os custos de armazenamento, maximizar o lucro é maximizar a receita
de vendas. Há porém um detalhe que nos impede de simplesmente optimizar V (esta
não tem máximo). Cada valor de V (t) correspondente a um ponto especı́fico de t traduz
a soma (em euros) a receber em data diferente e, devido ao elemento juro envolvido,
não pode ser directamente comparado com o valor de V numa outra data. O modo de
ultrapassar este problema é descontar cada valor V para o seu valor presente equivalente
(o valor no tempo t = 0), pois só assim todos os valores de V estarão no mesmo nı́vel de
comparação. Trata-se então de fazer intervir um factor de desconto e−rt , onde r ∈]0, 1[
é a taxa de juro composto contı́nuo. Segundo acima se viu, sendo A(t) o valor presente
de V , tem-se: √ √
A(t) = V (t)e−rt = Ke t e−rt = Ke t−rt , t ≥ 0. (1.24)
Para maximizar A, tem-se:
  √  
dA 1 t−rt 1
(t) = K √ −r e = √ − r A(t), t > 0.
dt 2 t 2 t

Como A é diferenciável em R+ , os únicos candidatos a extremantes serão os pontos


estacionários. Tem-se:
dA 1
(t) = 0, t > 0 ⇐⇒ t = t∗ , com t∗ = 2 .
dt 4r
Falta confirmar que neste ponto A atinge um máximo. Recorrendo ao teste da segunda
derivada, tem-se:

d2 A
 
1 1 dA
2
(t) = − √ A(t) + √ −r (t).
dt 4 t 3 2 t dt
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 101

Por definição de ponto estacionário,


dA ∗
(t ) = 0,
dt
pelo que
d2 A ∗ 1
2
(t ) = − p A(t∗ ) < 0,
dt ∗
4 (t )3

uma vez A é sempre positiva. Assim, t∗ é maximizante. O lucro máximo será


1
A (t∗ ) = (. . .) = e 4r .

Função marginal e função elasticidade


As aplicações mais comuns da derivação à Economia dizem respeito às funções marginais.
Suponha que a receita obtida por uma dada empresa quando vende uma quantidade x
de um determinado bem é descrita pela função R. Simplificando as questões, admitiremos
que x varia de maneira contı́nua em algum subconjunto de R+ 0 e que R é aı́ diferenciável.
O rendimento marginal define-se como sendo R 0 (x) em cada ponto x onde R é
diferenciável. Da teoria dos diferenciais, sabemos que
∆R ≈ dR(x) ,
ou seja,
R(x + h) − R(x) ≈ hR 0 (x),
para valores de h suficientemente pequenos. Isto traduz que a variação do rendimento da
empresa quando a quantidade vendida passa de x para x + h pode ser aproximada pelo
produto hR 0 (x) para h suficientemente pequeno.
É importante obervar que, nestas circunstâncias, o rendimento marginal não é o mesmo
que ”a variação no rendimento quando a quantidade vendida aumenta unidade”e pode
não ser sequer aproximadamente igual a essa variação do rendimento. Isto acontece por-
que h = 1 pode não ser suficientemente pequeno para que a fórmula acima tenha sufici-
ente precisão.
De modo semelhante, podemos falar em outras funções marginais no contexto eco-
nómico. Assim, C 0 (x) é o custo marginal na produção de uma quantidade x, para uma
dada função custo C dependente do nı́vel de produção x. Por outro lado, se H(Y ) denotar
o nı́vel de importações quando o rendimento nacional é Y , então H 0 (Y ) é a propensão
marginal de importação.
Exemplo 47. 1. A função procura no mercado de um dado bem é definida por
x = 27 − 3p,
onde x é a quantidade vendida e p o preço unitário. O rendimento R, expresso como
função de x, é dado por
1 1
R(x) = px = (27 − x) x = 9x − x2 .
3 3
102 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

Assim, o rendimento marginal é dado por


2
R 0 (x) = 9 − x.
3

2. Admita que o consumo enquanto função do rendimento nacional, Y , é descrito por C


tal que
C = 10 + 0, 7Y − 0, 002Y 2 .
A propensão marginal do consumo é então

dC
(Y ) = 0, 7 − 0, 004Y.
dY

As funções marginais fornecem a taxa efectiva de resposta de uma variável em relação


a variações (infinitesimais) de outra variável (a variável independente): o valor de uma
função marginal dependerá portanto das unidades de medida escolhidas para cada variável
(dependente e independente). Em Economia, é frequentemente mais útil termos à mão
uma medida independente das unidades e de resultado proporcional.
A tı́tulo de exemplo, tome-se uma função procura, D, tal que q = D(p), e suponhamos
que o preço varia de p para p+∆p, induzindo uma variação da quantidade de q para q+∆q.
Assim sendo,
∆q
variação proporcional na quantidade procurada q p ∆q
= ∆p
= .
variação proporcional no preço p
q ∆p

À medida que ∆p → 0, esta razão aproxima-se de

p dq
.
q dp

Esta quantidade é conhecida por elasticidade da função procura no ponto (p, q). Para
dq
uma função procura usual, < 0, pelo que a elasticidade da procura é uma função
dp
negativa (11 ). Representada usualmente pela letra grega η (eta), temos então

p ∆q p dq pD0 (p)
η = lim = = .
∆p→0 q ∆p q dp D(p)

Exemplo 48. Admita que a função procura é dada por

q = 27 − 3p.
11
Alguns autores apontam apenas o valor absoluto da elasticidade.
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 103

dq
Então = −3 e a elasticidade da procura é dada por
dp
p dq 3p p
η= =− = .
q dp 27 − 3p p−9
Os valores admissı́veis de p estão em ]0, 9[, atendendo à função procura e à elasticidade.
A elasticidade da função procura é então negativa e depende do preço unitário, p. Por
outro lado,
p
|η| = = p , p ∈ ]0, 9[ .
p − 9 9 − p
Assim,
lim |η| = 0 e lim− |η| = +∞.
p→0+ p→9

A função elasticidade pode também ser escrita em função de q. De facto, recorrendo à


função procura inversa, temos
q − 27
p=−
3
e, portanto,
p dq q − 27
η= = .
q dp q
Pode-se generalizar o que foi feito na segunda parte do anterior exemplo para uma
função procura qualquer, nomeadamente quando esta é modelizada por uma função afim
genérica. Assim, se tivermos
q = a − bp,
onde a e b são constantes reais positivas, então
p dq bp bp q−a
η= =− =− = .
q dp q a − bp q
A elasticidade da função oferta define-se de maneira semelhante. De facto, se tivermos
q = S (p), então
p dq pS 0 (p)
elasticidade da oferta = = .
q dp S (p)
Neste caso, se se assumir como habitualmente que S é crescente, então a elasticidade da
oferta é função crecente do preço unitário.
Ainda no que diz respeito às funções elasticidade, admitamos que

q = f (p)

é uma função procura ou oferta num dado mercado de um bem. Reparemos que, pela
regra da cadeia,
dq
d dp 1 dq
[ln q] = = .
dp q q dp
104 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

p dq
Deste modo, a elasticidade que se define como pode ser expressa como
q dp
d
p [ln q] .
dp
Assim, ao calcularmos elasticidades é frequente tomarmos logaritmos antes de derivar-
mos. Eis um par de exemplos.
Exemplo 49. Suponhamos que a função procura de um determinado bem é dada por
q = ap−b , (1.25)
onde a e b são constantes reais positivas. Então
ln q = ln a − b ln p.
Derivando, ambos os membros em ordem a p, vem:
d b
[ln q] = − ,
dp p
e, por conseguinte,
d
η = p [ln q] = −b,
dp
ou seja, constante. De facto, as funções procura do tipo (1.25) são as únicas que condu-
zem a uma elasticidade constante. De modo semelhante, a única elasticidade da oferta
constante resultará de funções oferta da forma
q = apb .
Exemplo 50. Suponhamos que a função oferta numa indústria competitiva é dada por
q = 5 (p − 4)3 .
Então
ln q = ln 5 + 3 ln (p − 4)
e a elasticidade da função oferta é dada por
d 3p
p [ln q] = .
dp p−4
Esta função define-se apenas para p > 4, uma vez que se assume que a empresa apenas
entrará no mercado se o preço unitário for maior que 4. A elasticidade da procura tende
para +∞ à medida que p → 4+ , ao passo que decrescerá assintoticamente para 3 à
medida que p cresce, isto é, q = 3 é uma assı́ntota horizontal da parte direita do gráfico
da função elasticidade.
Exercı́cio 22. Suponha que a função oferta, S, numa indústria competitiva é dada por
q = S(p) tal que
q = Apa + Bpb ,
onde A, B, a e b são constantes reais positivas, com a > b. Determine a função elastici-
dade da oferta. Explique ainda o que acontece à elasticidade quando p → 0+ e quando
p → +∞.
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 105

FOLHA DE EXERCÍCIOS E PROBLEMAS N.o 4

1. Para cada uma das funções definidas nas seguintes alı́neas, explique porque o Teo-
rema do Valor Médio (T. de Lagrange) não se aplica à função f em [0, 6].

x ∈ R+

1  1 + x, 0 \ {1}
(a) f (x) = (b) f (x) = |x − 3| (c) f (x) =
x−3
3, x=1

2. Considere a função f tal que f (x) = x2 + 1.

(a) Esboce o gráfico de f .


(b) Determine uma equação da recta secante ao gráfico de f nos pontos de abcissa
−1 e 2 (denote-a por s).
(c) Recorrendo ao Teorema do Valor Médio, determine o ponto (c, f (c)) do gráfico
de f , com c ∈ ]−1, 2[, tal que a recta tangente ao gráfico de f nesse ponto é
paralela à recta s.
(d) No gráfico esboçado em (a), trace as rectas referidas em (b) e em (c).

3. Para cada uma das funções seguintes, determine se o Teorema do Valor Médio pode
ser aplicado no intervalo dado e, em caso afirmativo, determine todos os valores
f (b) − f (a)
c ∈]a, b[ tais que f 0 (c) = .
b−a
2
(a) f (x) = x 3 , x ∈ [0, 1] (b) f (x) = 2 sin x + sin 2x, x ∈ [0, π]

4. Uma companhia introduz um novo produto para o qual o número S de unidades


vendidas é:  
9
S (t) = 200 5 − ,
2+t
onde t é o tempo em meses.

(a) Determine a taxa de variação média de S (t) durante o primeiro ano.


(b) Em que mês S 0 (t) é igual à taxa de variação média durante o primeiro ano?

5. Seja p(x) = Ax2 + Bx + C. Mostre que para todo o intervalo [a, b], o valor c
garantido pelo Teorema do Valor Médio está no ponto médio do referido intervalo.
106 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

6. Para cada uma das seguintes funções, determine os respectivos intervalos de mono-
tonia.
x3
(a) f (x) = x2 − 6x + 8 (b) y = − 3x (c) f (x) = sin x + 2, 0 < x < 2π
4
1 √
(d) f (x) = (e) y = x 16 − x2 (f) f (x) = x − 2 cos x, 0 < x < 2π
x2
7. Para cada uma das seguintes funções, determine os respectivos intervalos de mono-
tonia e os eventuais extremos locais.
(a) f (x) = x2 − 6x (b) g(x) = −2x2 + 4x + 3 (c) h (x) = 2x3 + 3x2 − 12x
2 t5 − 5t 1
(d) f (t) = t (3 − t) (e) g(t) = (f) h(t) = t 3 + 1
5
2 1
(g) f (s) = (s − 1) 3 (h) g(s) = 5 − |s − 5| (i) h(s) = s +
s
u2 u2 − 2u + 1 θ
(j) f (u) = (k) g(u) = (l) h (θ) = + cos θ
u2 − 9 u+1 2
(m) f (θ) = sin θ + cos θ 2
(n) g (θ) = cos (2θ) (o) h (θ) = sin2 θ + sin θ
Nota: de (l) a (o), admita que θ ∈ ]0, 2π[ .
8. Identifique e levante as indeterminações no cálculo de cada um dos seguintes limi-
tes.
π
arctg x − cos x e2
x

(a) lim 4 (b) lim (c) lim


x→1 x−1 x→+∞ x x→+∞ x
 
1 2
(d) lim y tg (e) lim+ (ey + y) y (f) lim (1 + y)1/y
y→+∞ y y→0 y→+∞


 
10 3
(g) lim+ (ln t)t−1

(h) lim+ − 2 (i) lim t2 + 5t + 2 − t
t→1 t→0 t t t→+∞

9. Recorra à Regra de L’Hôpital para comparar as taxas de variação das funções f , g


e h tais que
f (x) = xm , g (x) = enx , e h (x) = (ln x)n , com m, n ∈ N,
quando x → +∞. Para tal, calcule
h (x) f (x)
(a) lim (b) lim .
x→+∞ f (x) x→+∞ g(x)

10. Mostre que as formas indeterminadas (00 ), (∞0 ) e (1∞ ) nem sempre têm valor 1
pelo cálculo de cada um dos seguintes limites.
ln 2 ln 2 ln 2
(a) lim+ x 1+ln x (b) lim x 1+ln x (c) lim (x + 1) x
.
x→0 x→+∞ x→0
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 107

11. Admita que é feito um depósito inicial de P (euros) numa conta a prazo cuja taxa
de juro anual é r, e suponha que os juros são compostos n vezes ao ano. A fórmula
para a quantia A (t) existente decorridos t anos após o depósito inicial é:
 r nt
A (t) = P 1 + .
n
Mostre que quando o número de composições por ano se torna tão grande quanto
se queira A (t) tende para P ert .
12. Suponha que o valor de determinada habitação será V (t) daqui a t anos. Se a taxa
de juro permanecer constante durante este perı́odo (i.e., de hoje a t anos), então o
valor presente da casa é dado por
P V (t) = V (t) e−rt .

t
Considerando V (t) = 10000e e r = 6%, determine o momento óptimo para a
venda da habitação.
13. Mostre que de todos os rectângulos de perı́metro fixo, P , o que tem área máxima é
um quadrado.
14. Faça o estudo completo e esboce o gráfico de cada uma das funções seguintes:
1 x 2 2
(a) f (x) = (e − e−x ) (b) g (x) = 1 − (c) h (x) = 1 +
2 e2x + 1 e2x − 1
 1
−e x ,  x<0
(d) f (x) = 1 (e) h(x) = |x3 − x2 − 2x|
ln 1+x 2 , x≥0

15. Relativamente à funções definidas no exercı́cio anterior, verifique se são invertı́veis


no respectivo domı́nio. Em caso afirmativo, defina a respectiva inversa.
16. Para cada uma das funções dadas, determine o polinómio de MacLaurin de grau n,
dado.
(a) f (x) = e−x , n = 3 (b) f (x) = e2x , n = 4 (c) f (x) = sin x, n = 5
1
(d) f (x) = xex , n = 4 (e) f (x) = ,n=4 (f) f (x) = sec x, n = 2
x+1
17. Para cada uma das funções dadas, determine o polinómio de Taylor de grau n = 4,
centrado em c = 1.
1 √
(a) f (x) = (b) f (x) = x (c) f (x) = ln x
x
18. Em cada uma das alı́neas, aproxime a função dada no valor de x dado, recorrendo
ao polinómio de Taylor/MacLaurin encontrado nos exercı́cios 20. e 21.
(a) f (x) = e−x , f 21

(b) f (x) = ln x, f (1, 2)
108 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

19. Recorra à Fórmula de Taylor para obter um majorante para o erro na aproximação
feita.
12 13 14 15 (0,4)3
(a) e ≈ 1 + 1 + 2!
+ 3!
+ 4!
+ 5!
(b) arctg (0, 4) ≈ 0, 4 − 3

20. Determine o grau do polinómio de MacLaurin necessário para que a aproximação


da função dada no valor de x indicado seja feita com erro inferior a 0.001.

(a) e0.6 (b) cos (0.1)

21. Determine o grau do polinómio de MacLaurin necessário para que o erro na aproximação
da função no valor indicado seja inferior a 0.0001.

(a) f (x) = ln (x + 1) , aproximar f (0.5) (b) f (x) = e−πx , aproximar f (1.3) .


1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 109

Apêndice 1.1 [Completamento do quadrado e dedução da fórmula


resolvente]
Seja a 6= 0 e consideremos a equação polinomial quadrática
ax2 + bx + c = 0,
onde a, b e c são constantes reais e c 6= 0. Recorrendo à técnica algébrica do completa-
mento do quadrado, temos:
     
2 2 b c 2 b c
ax + bx + c = a x + x + =a x +2 x+
a a 2a a
"    2  2 #
b b b c
= a x2 + 2 x+ − +
2a 2a 2a a
" 2 #
b b2 c
= a x+ − 2+ . (1.26)
2a 4a a

Assim,
2
b2

2 b c
ax + bx + c = 0 ⇐⇒ x + − 2 + =0
2a 4a a
√ √
b b2 − 4ac −b ± b2 − 4ac
⇐⇒ x + =± ⇐⇒ x = .
2a 2a 2a
Apêndice 1.2 [Funções algébricas e funções transcendentes]
Uma função algébrica (sobre os racionais) é toda aquela que satisfaz uma equação
polinomial cujos coeficientes são, eles próprios, polinómios com coeficientes racionais.
Assim, uma função algébrica na variável x é toda a solução y da equação
an (x) y n + an−1 (x) y n−1 + . . . + a1 (x) y + a0 (x) = 0, (1.27)
onde os ai (x) são polinómios com coeficientes racionais e an (x) é não identicamente
nulo. Caso não seja algébrica, uma função diz-se transcendente. (12 )
A tı́tulo de exemplo, é simples verificar que todo o polinómio p(x) com coeficientes
racionais é uma função algébrica. De facto, a equação
y − p (x) = 0
p (x)
tem por solução o referido polinómio. Por outro lado, toda a fração racional , onde
q (x)
os polinómios têm coeficientes racionais, é uma função algébrica, uma vez que é solução
de
q (x) y − p (x) = 0.
12
É também possı́vel uma classificação análoga para os númros reais, dividindo-os em algébricos e trans-
cendentes. De acordo com esta partição, π e e (por exemplo) serão transcendentes.
110 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R

como último exemplo, toda a raiz de ı́ndice n de um polinómio p (x) com coeficientes
racionais é uma função algébrica. De facto,
p p
y n − p(x) = 0 =⇒ y = n p (x) (y = ± n p (x), se n é par).

Como exemplos de funções transcendentes e que, por conseguinte, não surgem como
soluções de equações do tipo (1.27), temos as exponenciais, as logarı́tmicas e as trigo-
nométricas.
1.4. DERIVADAS E DIFERENCIAIS 111

Apêndice 1.3 [Classificação dos pontos de descontinuidade]


Admita que c é um ponto de descontinuidade de uma função f .

1. Se existe limf (x) = L ∈ R. Se c ∈


/ Df ou L 6= f (c) diremos que c é uma
x→c
descontinuidade removı́vel de f . Nestes casos, é possı́vel definir uma nova função
g tal que
f (x), se x ∈ Df \ {c}
(
g(x) = .
limf (x), se x = c
x→c

Esta diz-se prolongamento de f por continuidade no ponto c.

2. Se limf (x) = +∞ (ou −∞), diremos que c é um polo de f .


x→c

3. Se limf (x) não existe então ou os limites laterais são diferentes ou pelo menos um
x→c
deles não existe.

(a) Se os limites laterais existem, sendo portanto números reais, então c é uma
descontinuidade de 1.a espécie.
(b) Se algum dos limites laterais não existe ou for infinito, então c é uma descon-
tinuidade de 2.a espécie.
112 CAPÍTULO 1. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM R
Capı́tulo 2

Cálculo Diferencial de Funções


Definidas em Rn

Tendo apresentado os principais resultados e noções acerca do Cálculo Diferencial para


funções de uma variável real, vamos agora dedicar-nos ao estudo das funções reais de
várias variáveis reais. Daremos particular ênfase às funções de duas variáveis reais e, por
vezes, às de três variáveis. Vamos pois ver de que maneira serão generalizados conceitos
como os de limite, continuidade, derivabilidade, diferenciabilidade e optimização.

2.1 Domı́nios e Representações Gráficas


É frequente observarmos situações nas diversas ciências em que uma variável depende de
duas ou mais variáveis independentes. O mesmo sucede na Economia, em que, e.g., a
produção de um determinado bem depende do capital e do trabalho.
Iremos dedicar o nosso estudo a funções reais definidas em Rn , n = 2, 3, ..., onde

Rn = {(x1 , x2 , ..., xn ) : xi ∈ R, i = 1, ..., n} .

A definição inicial de função dada na secção 1 do Capı́tulo 1 tem a versão seguinte para
o caso de funções reais de n variáveis reais.
Definição 8. Seja D ⊂ Rn um conjunto de n-uplos ordenados de números reais. Se para
cada (x1 , x2 , ..., xn ) ∈ D corresponder um único número real w por meio de alguma
relação f tal que
w = f (x1 , x2 , ..., xn ) ,
diremos que f é uma função real de n variáveis reais. D diz-se domı́nio da função
e w diz-se imagem ou transformado de (x1 , x2 , ..., xn ) por meio de f . As variáveis
x1 , x2 , ..., xn dizem-se independentes e w diz-se variável dependente.
No caso de funções de duas ou de três variáveis reais, temos as seguintes notações:

z = f (x, y) e w = f (x, y, z) ,

113
114 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

respectivamente. No primeiro caso, o domı́nio é um subconjunto de pontos do plano R2 ;


no segundo caso, trata-se de um subconjunto do espaço R3 . Para um ponto (x, y, z) ∈ R3 ,
x e y continuam a ser a abcissa e a ordenada, respectivamente, sendo z a cota do referido
ponto.
Note que, quando falamos do espaço R3 , uma equação como por exemplo x = 0
representa não uma recta mas um plano: o plano Y OZ, definido pelos eixos dos Y Y e
dos ZZ. De modo análogo, a equação x2 + y 2 = 9 representa um cilindro de revolução
(subentende-se que z ∈ R é livre). Tenha também em conta que os três eixos coordenados
dividem agora o espaço tri-dimensional em oito octantes: no primeiro x > 0, y > 0,
z > 0; no segundo x > 0, y < 0, z > 0, etc.
p
x2 + y 2 − 9
Exemplo 51. 1. Seja f tal que f (x, y) = . Então
x
Df = (x, y) ∈ R2 : x 6= 0 ∧ x2 + y 2 ≥ 9 .


x
2. Dada a função g tal que g (x, y, z) = p , temos:
9 − x − y2 − z2
2

Dg = (x, y, z) ∈ R3 : x2 + y 2 + z 2 < 9 .



O gráfico de uma função real de n variáveis reais, f , é o seguinte conjunto:

Gf = (x1 , x2 , ..., xn , w) ∈ Rn+1 : (x1 , x2 , ..., xn ) ∈ Df ∧ w = f (x1 , x2 , ..., xn ) .




Trata-se pois dum conjunto de pontos no hiper-plano Rn+1 . No que concerne às funções
de duas variáveis reais, o gráfico de uma função é uma superfı́ce no espaço R3 , dada por:

Gf = (x, y, z) ∈ R3 : (x, y) ∈ Df ∧ z = f (x, y) .




Este é um objeto matemático visualizável, nomeadamente, através de um esboço à mão


ou através de ferramentas gráficas.
Nota 24. O estudante deverá nesta altura recordar os conceitos relativos a Geometria
Analı́tica no plano e no espaço. A propósito de curvas cónicas, tem ao seu dispor o
Apêndice 2.1. Pode ainda consultar a Secção 10.1 do vol. 2 de Cálculo (Larson et al,
[6]), sendo ainda aconselhável a leitura das Secções 1. a 6. do cap. 11 do mesmo volume.
p
Exemplo 52. Descreva o gráfico da função f tal que f (x, y) = 16 − 4x2 − y 2 .
Resolução: Notemos que

Df = (x, y) ∈ R2 : 4x2 + y 2 ≤ 16


Ou seja, trata-se da região plana delimitada pela elipse de equação


x2 y 2
+ = 1.
4 16
2.1. DOMÍNIOS E REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS 115

Como n p o
Gf = (x, y, z) ∈ R3 : (x, y) ∈ Df ∧ z = 16 − 4x2 − y 2 ,

podemos dizer que √


0≤z≤ 16 = 4.
p
Tomando a equação z = 16 − 4x2 − y 2 e elevando ao quadrado ambos os membros,
vem:
x2 y 2 z2
+ + = 1.
4 16 16
Desta superfı́cie, dita elipsóide, apenas estamos interessados na parte acima do plano
XOY . Com a ajuda de cortes com os planos coordenados ou paralelos a estes, podemos
esboçar o gráfico de f . 

A segunda forma de visualizar funções de duas variáveis reais é mediante as chamadas


curvas de nı́vel. Estas unem pontos do gráfico de f com a mesma cota. Assim, para cada
k ∈ R (ou mais exactamente no contra-domı́nio de f )

f (x, y) = k, (x, y) ∈ Df

diz-se curva de nı́vel de f . Representando num mesmo referencial ortonormado plano


as diversas curvas de nı́vel representativas de f obtemos uma visualização do gráfico
de f . As curvas de nı́vel recebem nome especı́fico consoante o contexto do problema:
isotérmicas, isobáricas, isoquantas, equipotenciais, etc.

Exemplo 53. Esboce as curvas de nı́vel da função f tal que f (x, y) = 3x2 . Complete a
análise, obtendo as interseções do Gf com planos verticais.
Resolução: Note que a superfı́cie correspondente ao gráfico de f tem equação

z = 3x2 .
116 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

As curvas de nı́vel de f resultam de

f (x, y) = k, k ≥ 0.

Ora, r
k
f (x, y) = k ⇔ 3x2 = k ⇔ x = ± .
3
q
k
Tomando C = ± 3
, trata-se pois de rectas do tipo

x = C, com C ∈ R,

as quais vemos representadas em (a) na figura seguinte. A interseção com planos verti-
cais paralelos a XOZ, i.e., planos de equação y = c, dá como resultado parábolas de
equação z = 3x2 . Por seu turno, as interseções com planos verticais paralelos a XOY ,
os quais têm equação x = c, dará como resultado rectas de equação z = 3c2 , ou seja,
z = c1 , com c1 ≥ 0. Em (b) ilustra-se tais intersecções. Finalmente, podemos obervar
em (c) o esboço da superfı́cie, através de uma ferramenta gráfica.

Esta superfı́cie recebe o nome de cilindro parabólico. 

No caso de uma função real de três variáveis reais, w = f (x, y, z), as equações da
forma
f (x, y, z) = k, (constante)
definem as chamadas superfı́cies de nı́vel da função f .
2.1. DOMÍNIOS E REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS 117

Deixamos aqui alguns exemplos de representações gráficas de funções obtidas recor-


rendo a ferramentas computacionais gráficas.
118 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

2.1.1 Alguns tipos de funções de duas variáveis


As funções que iremos descrever nesta sub-secção, todas elas com domı́nio R2 , são as
generalizações, para funções de duas variáveis, das funções lineares, afins, quadráticas
e polinomiais que conhecemos no caso das f.r.v.r. Sempre que possı́vel, exibiremos a
notação matricial para estas funções.

Funções lineares e funções afins em duas variáveis


Uma função L : R2 −→ R diz-se linear nas variáveis x e y se for da forma:

L (x, y) = lx + my,
 
onde l e m são constantes reais arbitrárias. Em notação matricial, se M = l m ∈
R1×2 , vem:  
  x
L (x, y) = l m = lx + my.
y

Nota 25. Uma função linear é também chamada uma transformação linear, uma vez que
satisfaz as propriedades

L ((x1 , y1 ) + (x2 , y2 )) = L (x1 , y1 ) + L (x2 , y2 )

e
L (α (x, y)) = αL (x, y) ,
para todos os (x1 , y1 ) , (x2 , y2 ) , (x, y) ∈ R2 , α ∈ R. 

Recorde que a equação geral do plano que contém o ponto (x0 , y0 , z0 ) e tem vector
normal ~n = (a, b, c) pode ser escrita na sua forma canónica do seguinte modo:

a (x − x0 ) + b (y − y0 ) + c (z − z0 ) = 0. (2.1)

Tal equação pode ainda ser escrita em duas outras notações: na forma de produto interno
e na forma matricial. Denotando h., .i o produto interno de vectores em R3 , (2.1) assume
a forma
h(x − x0 , y − y0 , z − z0 ), (a, b, c)i = 0, (2.2)
o que pode também ser expresso em termos matriciais na forma:

[x − x0 y − y0 z − z0 ] [a b c]T = 0. (2.3)

Deste modo, para uma função linear L, a superfı́cie z = L(x, y) = lx + my corres-


ponde a um plano:

z = L(x, y) = lx + my ⇔ lx + my − z = 0,
2.1. DOMÍNIOS E REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS 119

ou seja, o plano que passa na origem e tem (l, m, −1) como um vector normal. Nas suas
formas de produto interno e matricial, tem-se:

h(x, y, z), (l, m, −1)i = 0 ou ainda [x y z] [l m − 1]T = 0.

Por outro lado, uma função A : R2 −→ R diz-se afim nas variáveis x e y se for da
forma:
A (x, y) = lx + my + d,
sendo d, l e m constantes reais arbitrárias. Matricialmente, uma tal função pode exprimir-
se na forma  
  x
A (x, y) = l m + d = lx + my + d.
y
Também as funções afins são representadas graficamente por um plano:

z = A(x, y) = lx + my + d ⇔ lx + my − (z − d) = 0,

ou seja, o plano que contém o ponto (0, 0, d) e tem um vector normal (l, m, −1).
Na figura que se segue podemos observar representações gráficas de exemplos de cada
uma das funções, verificando-se que constituem planos não verticais. Nela se exibe ainda
um vector normal ao plano.

Exemplo 54. Esbocemos o gráfico e as curvas de nı́vel da função f tal que

f (x, y) = 2 − 2x − y.

Note-se que o gráfico desta função é o plano de equação

z = 2 − 2x − y ⇔ −2x − y − (z − 2) = 0.

Quaisquer três pontos não colineares (e.g., (0, 0, 2), (0, 2, 0) e (1, 0, 0)) permitem esboçar
o plano. Por outro lado, atribuindo valores a k em

f (x, y) = k
120 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

podemos traçar várias curvas de nı́vel. Na figura acima podemos ver a representação do
plano num referencial tridimensional e o gráfico de curvas de nı́vel para f .
A equação do plano assume ainda as formas
h(x, y, z − 2) , (−2, −1, −1)i = 0,
ou ainda
[x y z − 2] [−2 − 1 − 1]T = 0.


Formas quadráticas em duas variáveis


A generalização natural de uma função quadrática para o caso de funções de duas variáveis
são as chamadas formas quadráticas nas variáveis x e y, ou seja as funções Q : R2 −→ R
tais que
Q(x, y) = a11 x2 + 2a12 xy + a22 y 2 , a11 , a12 , a22 ∈ R. (2.4)
Este tipo de funções assume uma importância decisiva no cálculo de funções de duas
variáveis, nomeadamente, na determinação e classificação de extremos.
As curvas de nı́vel de uma forma quadrática assumem a forma
a11 x2 + 2a12 xy + a22 y 2 = k, k ∈ R,
o que geometricamente poderá corresponder a uma das seguintes secções cónicas (caso
não degenerado), uma elipse, uma circunferência ou uma hipérbole - ou ainda a um par
de rectas, um ponto ou o conjunto vazio (caso degenerado), dependendo dos valores de
a11 a12 , a22 e da cota k.
As formas quadráticas são de análise mais simples nos casos em que a12 = 0, ou seja,
quando
Q(x, y) = a11 x2 + a22 y 2 .
As curvas de nı́vel assumem nesse caso a forma
a11 x2 + a22 y 2 = k, k ∈ R, a11 , a22 não ambos nulos. (2.5)
Assim,
2.1. DOMÍNIOS E REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS 121

• Se a11 , a22 e k têm o mesmo sinal, (2.5) representa uma elipse (uma circunferência,
se além disso,a11 = a22 ).

• Se a11 e a22 têm o mesmo sinal, mas simétrico do sinal de k, então (2.5) não tem
solução;

• Se a11 e a22 têm sinais opostos, estamos na presença de uma hipérbole;

• Se algum dos coeficientes for nulo e o outro tiver o mesmo sinal de k, temos duas
rectas concorrentes.

Exemplo 55. Seja f tal que f (x, y) = x2 + 4y 2 . O traçado das curvas de nı́vel desta
função obtém-se mediante atribuição de diversos valores a k na equação

x2 + 4y 2 = k, k ∈ R.

Note-se que, atendendo ao primeiro membro, os valores negativos de k não são ad-
missı́veis. Por outro lado, quando k = 0 a curva de nı́vel reduz-se à origem. Finalmente,
para cada k > 0 as curvas de nı́vel que se obtêm são elipses, como a seguir se ilustra.

As secções obtidas por intersecção com os planos verticais y = c - paralelos ao plano


XOZ, portanto - são parábolas. De facto,

z = x2 + 4y 2
⇔ z = x2 + 4c2 .
y=c

Analogamente, as secções obtidas por intersecção com os planos verticais x = c - para-


lelos ao plano Y OZ, portanto - são também parábolas. Com efeito, temos

z = x2 + 4y 2
⇔ z = c2 + 4y 2 .
x=c
122 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Dado o tipo de intersecções obtidas, esta superfı́cie recebe o nome de paraboloide


elı́ptico. A equação geral de um paraboloide elı́ptico na posição canónica é dada por

x2 y 2
z= + 2 , com a, b ∈ R+ .
a2 b


Exemplo 56. Esboce as curvas de nı́vel da função f tal que f (x, y) = x2 − y 2 . Complete
a análise, obtendo as interseções do Gf com planos verticais.
Resolução: Tomando k = 0 em f (x, y) = k, temos:

f (x, y) = 0 ⇐⇒ x2 − y 2 = 0 ⇐⇒ y = x ∨ y = −x,

ou seja, as rectas bissetrizes dos quadrantes ı́mpares e pares, respectivamente. Para


k > 0, temos:
x2 y2
x2 − y 2 = k ⇐⇒ √ 2 − √ 2 = 1
k k
Trata-se de hipérboles cujos vértices estão na recta horizontal y = 0. De facto, para
k = 1 temos a hipérbole:
x2 − y 2 = 1,
de vértices (−1, 0) e (1, 0); para k = 2 temos a hipérbole:

x2 y 2
− = 1,
2 2
√  √ 
de vértices − 2, 0 e 2, 0 . Quando k < 0, temos igualmente hipérboles mas com
vértices em x = 0:
y2 x2
x2 − y 2 = k ⇐⇒ y 2 − x2 = c (com c = −k > 0) ⇐⇒ √ 2 − √ 2 = 1.
( c) ( c)
2.1. DOMÍNIOS E REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS 123

Assim, para k = −1 temos a hipérbole:


x2 − y 2 = −1 ⇐⇒ y 2 − x2 = 1,
de vértices (0, −1) e (0, 1); para k = −2 temos a hipérbole:
y 2 x2
− = 1,
2 2
√  √ 
de vértices 0, − 2 e 0, 2 . Esboçadas as curvas de nı́vel, eis uma perspectiva dos
planos horizontais e das curvas de nı́vel.

As secções obtidas por intersecções com eixos verticais de equações x = c e y = c são


parábolas. De facto,
 
z = x2 − y 2 z = x2 − y 2
⇔ z = c2 − y 2 e ⇔ z = x 2 − c2 .
x=c y=c
Na figura que se segue, ilustramos a superfı́cie assim como as secções acima deduzidas.

Dadas as curvas que se obtêm através das secções, esta superfı́cie recebe o nome de
paraboloide hiperbólico. A equação geral de um paraboloide hiperbólico na posição
canónica é dada por
x2 y 2
z = 2 − 2 , com a, b ∈ R+ .
a b

124 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Para representar uma forma quadrática recorrendo a matrizes, note que


  
2 2
 a11 a12 x
= X T AX.

Q (x, y) = a11 x + 2a12 xy + a22 y = x y
a12 a22 y

A matriz A é simétrica, uma vez que coincide com a sua transposta. (1 )


Exemplo 57. Considere as funções f e g tais que
f (x, y) = x2 − 2xy + y 2 e g(x, y) = 5x2 − 10xy − y 2 .
Note-se que em ambos os casos temos formas quadráticas. Vamos representá-las na
forma matricial. No caso de f , temos a11 = 1 = a22 e a12 = −1. Assim,
  
  1 −1 x
f (x, y) = x y
−1 1 y
−10
Por outro lado, em relação a g tem-se a11 = 5, a22 = −1 e a12 = 2
= −5. Assim,
  
  5 −5 x
g(x, y) = x y
−5 −1 y


Funções polinomiais
As funções lineares, as funções afins e as formas quadráticas são casos particulares de
funções polinomiais nas variáveis x e y.
Um monómio nas variáveis x e y é toda a função f : R2 −→ R tal que
f (x, y) = cxα1 y α2 , com c ∈ R, α1 , α2 ∈ N0 .
O monómio terá grau α1 + α2 , desde que c 6= 0.
Por sua vez, uma função polinomial nas variáveis x e y é toda aquela que se exprime
através de uma soma finita de monómios nessas variáveis, i.e., a função f : R2 −→ R tal
que X
f (x, y) = ck x α k y β k ,
k∈I

onde I é um conjunto finito, os escalares ck são reais e αk , βk ∈ N0 . O grau do polinómio


será o grau mais elevado de cada um dos monómios. Deste modo, por exemplo, um
polinómio (ou função polinomial) de grau 2 genérico é toda a função do tipo:
f (x, y) = a1 x2 + a2 xy + a3 y 2 + a4 x + a5 y + a6 ,
onde algum dos coeficientes a1 a2 ou a3 é não nulo.
Como é claro, todo o monómio é um polinómio.
1
Outras matrizes poderiam ser utilizadas para exprimir uma forma quadrática, mas esta é a ideal, por
possuir propriedades mais importantes.
2.1. DOMÍNIOS E REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS 125

Exemplo 58. Seguem-se vários exemplos de monómios e polinómios nas variáveis x e y.

• Uma função constante é um monómio de grau 0. O seu gráfico é um plano horizon-


tal.

• Um polinómio de grau 1 é toda a função afim ou linear nas variáveis x e y.

• Toda a forma quadrática é um polinómio de grau 2.

• A função f tal que f (x, y) = −4x2 y é um monómio de grau 3.

• A função g tal que g(x, y) = x2 + y é um polinómio de grau 2 que não é uma forma
quadrática.

2.1.2 Alguns tipos de funções de n variáveis


A generalização dos tipos de funções apresentadas na subsecção anterior para funções
de 3 ou mais variáveis é bastante simples. Enunciaremos tais generalizações sem mais
detalhes. No que se segue, n = 2, 3, . . ..
Uma função L : Rn −→ R diz-se linear nas variáveis x1 , . . . , xn se for da forma:

L (x1 , . . . , xn ) = α1 x1 + . . . + αn xn ,

onde os coeficientes αi , i = 1, . . . , n, são escalares reais. A sua representação matricial


será:
L (x1 , . . . , xn ) = [α1 . . . αn ][x1 . . . xn ]T .
Uma função A : Rn −→ R diz-se afim nas variáveis x1 , . . . , xn se for da forma:

A (x1 , . . . , xn ) = α1 x1 + . . . + αn xn + d.

A sua representação matricial será:

A (x1 , . . . , xn ) = [α1 . . . αn ][x1 . . . xn ]T + d.

Uma forma quadrática nas variáveis x1 , . . . , xn - também chamada forma quadrática


n-ária - é toda a função Q : Rn −→ R tal que:

Q (x1 , ..., xn ) = a11 x21 + a22 x22 + ... + ann x2n + 2a12 x1 x2 + 2a13 x1 x3 + ... + 2an−1 n xn−1 xn
  
a11 a12 · · · a1n x1
 a12 a22 · · · a2n   x2 
  
T

= x1 x2 · · · xn  .. .. .. ..   ..  = X AX.
 . . . .   . 
a1n a2n · · · ann xn
126 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Um monómio nas variáveis x1 , ..., xn é toda a função f : Rn −→ R tal que:

f (x1 , ..., xn ) = cxα1 1 . . . xαnn ,

onde c é um escalar real e os expoentes αi , i = 1, . . . , n são inteiros não negativos. O


grau do monómio será α1 + . . . + αn .
Por último, um polinómio nas variáveis x1 , ..., xn é toda a função f : Rn −→ R que
se exprime como soma finita de monómios naquelas variáveis, i.e., tal que
X
f (x1 , ..., xn ) = ck xα1 1 . . . xαnn ,
k∈I

onde os expoentes αi , i = 1, . . . , n são inteiros não negativos.

Exemplo 59. Seguem-se vários exemplos das funções acima generalizadas.

• As funções f e g tais que f (x, y, z) = 3x + 4y − 2z e g (x, y, z) = 3x + 4y − 2z + 5


são, respectivamente, linear e afim nas variáveis x, y, z.

• A função Q tal que Q (x1 , x2 , x3 ) = x21 + 2x22 + 3x23 + 4x1 x2 − 6x1 x3 + 8x2 x3 é
uma forma quadrática nas variáveis x1 , x2 , x3 . A sua escrita na forma matricial é:
  
1 2 −3 x 1
x1 x2 x3  2 2 4   x2  = X T AX.
 
Q (x1 , x2 , x3 ) =
−3 4 3 x3


2.2. LIMITE E CONTINUIDADE 127

2.2 Limite e Continuidade


Antes de generalizar as noções de limite e de continuidade, vamos começar por falar de
alguns conceitos topológicos: bola aberta, conjunto aberto, conjunto fechado, fronteira.
Fá-lo-emos para o caso mais geral, particularizando depois para o caso de subconjuntos
de R2 e de R3 .
Dados A = (a1 , a2 , ..., an ) , B = (b1 , b2 , ..., bn ) ∈ Rn , chamamos distância (euclidi-
ana) entre A e B ao número não negativo d (A, B) tal que
−→ q
d (A, B) = AB = (b1 − a1 )2 + (b2 − a2 )2 + ... + (bn − an )2

É simples verificar que, nos casos n = 2 e n = 3, temos as habituais distâncias entre


pontos do plano e entre pontos do espaço, respectivamente.(2 ) O espaço Rn munido desta
distância é também dito espaço euclidiano n-dimensional.
Chamamos bola aberta (ou vizinhança) de centro em A e raio r ao seguinte con-
junto:
Br (A) = Vr (A) = {X (x1 , x2 , ..., xn ) ∈ Rn : d (A, X) < r}
Um subconjunto S ⊂ Rn diz-se limitado se existir Br (A) que o contenha. No caso da
recta real, temos:
Br (A) = ]a1 − r, a1 + r[ ;
no caso do plano, temos:
 q 
2 2 2
Br (A) = (x, y) ∈ R : (x − a1 ) + (y − a2 ) < r ,

o que corresponde a um cı́rculo aberto (i.e., sem a circunferência que o delimita) de raio
r e centrado em A. O leitor saberá certamente definir e representar Br (A) para o caso
tridimensional.
Sendo S ⊂ Rn :
1. diz-se que A ∈ S é um ponto interior de S se ∃Br (A) : Br (A) ⊂ S;

2. diz-se que A ∈ Rn é um ponto exterior de S se ∃Br (A) : Br (A) ∩ S = ∅;


 
3. diz-se que A ∈ Rn é um ponto fronteiro de S se ∀Br (A) : Br (A) ∩ S =
6 ∅ ∧ Br (A) ∩ S C 6= ∅ ,
onde S C = Rn \S.
Notação 24.

int (S) = {A ∈ S : A é ponto interior de S} interior de S;


2
É possı́vel considerar distâncias diferentes da euclidiana. Por exemplo,

d (A, B) = |b1 − a1 | + |b2 − a2 | + ... + |bn − an | ,

cuja versão para n = 2 é a chamada distância do motorista de táxi.


128 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

ext (S) = {A ∈ Rn : A é ponto exterior de S} exterior de S;

f r (S) = {A ∈ Rn : A é ponto fronteiro de S} fronteira de S.

Note que int (S) ⊂ S, mas f r (S) pode conter pontos que não estão em S.
Seja S ⊂ Rn . S diz-se aberto se int (S) = S; S diz-se fechado se Sb = S, onde

Sb = S ∪ f r (S)

é dito o fecho de S. Observe que pode haver conjuntos que não são abertos nem fechados.
Com exceção de Rn e de ∅, que são simultaneamente abertos e fechados, se um conjunto
é aberto não pode ser fechado (e vice-versa).

Exercı́cio 23. Aborde todos os conceitos


p topológicos acima apresentados para o caso de
x2 + y 2 − 9
S = Df , onde f é tal que f (x, y) = .
x

Dadas duas funções f : D1 ⊂ Rn −→ R, e g : D2 ⊂ Rn −→ R tais que D1 ⊂ D2 , se

∀X∈D1 , f (X) = g(X)

diremos que f é a restrição de g a D1 e que g é a extensão de f a D2 .


Podemos agora apresentar a definição analı́tica de limite (dita definição ε − δ de
limite) para funções definidas em Rn .

Definição 9. Seja f : D ⊂ Rn −→ R uma função de n variáveis reais e A =


(a1 , a2 , ..., an ) um ponto de Rn não exterior a D. Diz-se que

lim f (X) = L ⇐⇒ ∀ε>0 , ∃δ>0 : [ 0 < d (A, X) < δ =⇒ |f (X) − L| < ε ]


X→A
2.2. LIMITE E CONTINUIDADE 129

Nota 26. 1. Dizer que lim f (X) = L significa que, à medida que X se aproxima de
X→A
A, o valor f (X) pode aproximar-se de L tanto quanto se deseje. Além disso, isto
acontece independentemente do caminho que se considere.

2. A versão desta definição para n = 2 é a que se segue:

lim f (x, y) = L ⇔
(x,y)→(a,b)
p
⇔ ∀ε>0 , ∃δ>0 : 0 < (x − a)2 + (y − b)2 < δ ⇒ |f (x, y) − L| < ε .

Deixaremos como exercı́cio a escrita da versão para n = 3.

3. Para que lim f (X) = L exista, não é necessário que A ∈ D. No entanto, é forçoso
X→A
que se verifique A ∈ D,
b não sendo portanto um ponto isolado.

4. Em
lim f (X) = lim f (x1 , x2 , . . . , xn )
X→A (x1 ,x2 ,...,xn )→(a1 ,a2 ,...,an )

as n coordenadas do ponto X convergem simultaneamente para as n coordenadas


de A.
Quando se utiliza a definição de limite para mostrar que este tem um determinado
valor é conveniente ter em conta as seguintes propriedades sobre módulos:

1. |a + b| ≤ |a| + |b| ; |a − b| ≤ |a| + |b| ;


2
2. a = a2 ;
√ √
3. |a| = a2 ≤ a2 + b2 .
130 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

x4 − y 4
Exemplo 60. Mostre que lim = 0, através da definição.
(x,y)→(0,0) x2 + y 2
Resolução: Pretende-se provar que
4
x − y4
 q 
2 2

∀ε>0 , ∃δ>0 : 0 < (x − 0) + (y − 0) < δ =⇒ 2 − 0 < ε .

x + y2

Seja então ε > 0 qualquer. Note que


4
x − y4 |x4 − y 4 | |x4 | |y 4 | x2 y2

2 2

x2 + y 2 − 0 = ≤ + = x + y ≤ x2 + y 2 .
x2 + y 2 x2 + y 2 x2 + y 2 x2 + y 2 x2 + y 2
q
O problema resume-se a encontrar δ > 0 tal que 0 < (x − 0)2 + (y − 0)2 < δ implique
x2 + y 2 < ε. Ora: p
x2 + y 2 < δ ⇐⇒ x2 + y 2 < δ 2 .

Assim, devemos escolher δ > 0 tal que δ 2 = ε, ou seja, δ = ε. 

A noção de limites laterais não faz sentido para funções definidas em Rn , n ≥ 2.


Note que para as f. r. de duas variáveis reais, por exemplo, existe uma infinidade de
caminhos que passam em A, pelo que cabe aqui estabelecer a relação entre os limites
segundo estes caminhos - ditos limites trajectoriais - e lim f (X) propriamente dito.
X−→A
Antes disso, falaremos dum tipo particular de limites que se obtêm quando a convergência
das coordenadas de X para as de A se faz sequencialmente.

Definição 10 (Limites iterados ou escalonados). Consideremos X −→ A do seguinte


modo: primeiramente, x1 → a1 , depois x2 → a2 ,... e, finalmente, xn → an . Obtemos o
seguinte limite:
lim ... lim lim f (x1 , x2 , . . . , xn )
xn →an x2 →a2 x1 →a1

Existem n! destes limites, ditos iterados ou escalonados.

Nota 27. 1. Quando existe lim f (X) = L, todos os limites iterados que existam têm
X→A
o mesmo valor L; no entanto, o facto de todos os limites iterados terem o mesmo
valor L não garante, de modo algum, a existência de limite. Contudo, nesses casos,
caso exista o limite o seu valor será forçosamente L.

2. Existindo dois limites iterados mas com valores diferentes, imediatamente se con-
clui a não existência de lim f (X).
X→A

x2
Exemplo 61. 1. Mostre que lim não existe.
(x,y)→(0,0) x2 + y 2

xy
2. Calcule os limites iterados de f (x, y) = na origem.
x2 + y2
2.2. LIMITE E CONTINUIDADE 131

xy
3. Que pode afirmar acerca de lim ?
(x,y)→(0,0) x2 + y 2
Resolução:
1. Note que:
x2 x2
lim lim = lim = lim 1 = 1
x→0 y→0 x2 + y 2 x→0 x2 x→0
e
x2 0
lim lim 2 2
= lim 2 = lim 0 = 0.
y→0 x→0 x + y y→0 y y→0

x2
Como os limites iterados deram valores distintos, não existe lim .
(x,y)→(0,0) x2 + y 2

2. É tarefa simples concluir que


xy xy
lim lim = lim lim = 0.
x→0 y→0 x2 + y 2 y→0 x→0 x2 + y 2

xy
3. Assim sendo, não podemos concluir nada acerca da existência de lim .
(x,y)→(0,0) x2 + y 2
No entanto, caso exista, tal limite terá de valer 0. 
Para verificarmos se lim f (X) existe ou não, podemos ainda considerar o cálculo de
X→A
limites segundo trajetórias passando pelo ponto A. A existência de lim f (X) implica
X→A
que o limite segundo qualquer destas trajetórias, caso exista, tenha esse mesmo valor.
Assim, se houver duas trajetórias, r e s, tais que
lim f (X) 6= lim f (X)
X→A X→A
X∈r X∈s
podemos concluir que lim f (X) não existe. No caso n = 2, as trajetórias mais comuns
X→A
são rectas passando pelo ponto A (a1 , a2 ), cujas equações são da forma
y = a2 + m (x − a1 ) .
Contudo, é possı́vel utilizar trajetórias não rectilı́neas (e.g. parábolas).
xy
Exemplo 62. Regressemos ao cálculo de lim . Consideremos a seguinte tra-
(x,y)→(0,0) x + y 2
2
jetória que passa na origem:
r = (x, y) ∈ R2 : y = x .


Então:
xy xx 1
lim = lim = .
(x,y)→(0,0) x2 + y 2 x→0 x2 + x2 2
(x,y)∈r

Como este valor é diferente de zero, a conclusão que havı́amos tirado do cálculo dos
xy
limites iterados permite deduzir que lim não existe. 
(x,y)→(0,0) x + y 2
2
132 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

xy 2
Exercı́cio 24. Seja h tal que h (x, y) = 2 4
, (x, y) ∈ R2 \ {(0, 0)}.
x +y

1. Mostre que os limites iterados de h na origem são nulos.

2. Seja rm = {(x, y) ∈ R2 : y = m x} uma recta genérica passando na origem. Mos-


tre que lim h (x, y) = 0, independentemente do declive m da recta rm .
(x,y)→(0,0)
(x,y)∈rm

3. Considere a seguinte parábola de vértice na origem s = {(x, y) ∈ R2 : x = y 2 }.


Calcule lim h (x, y) .
(x,y)→(0,0)
(x,y)∈s

4. Atendendo aos cálculos efetuados, que pode concluir acerca de lim h (x, y) ?
(x,y)→(0,0)

A prova de que um limite existe ou não através da definição é, como já se viu no
caso das f.r.v.r., trabalhosa e pressupõe a intuição de qual deve ser o limite (no caso de
existência). Por outro lado, os limites iterados e os trajetoriais apenas servem para mostrar
que um dado limite não existe ou que, existindo, terá de ter certo valor. Assim, vamos
referir algumas propriedades que permitem o cálculo de limites sem recorrer à definição,
generalizações de resultados já conhecidos para f.r.v.r.. Enunciá-las-emos para o caso
n = 2 e deixaremos como exercı́cio a escrita das versões para o caso geral.

Teorema 25 (Propriedades dos limites). Sejam α, c ∈ R e n ∈ N. Admita que as


funções f : D1 ⊂ R2 −→ R e g : D2 ⊂ R2 −→ R são tais que:

lim f (x, y) = L e lim g (x, y) = K.


(x,y)→(a1 ,a2 ) (x,y)→(a1 ,a2 )

Então:
1. lim α = α.
(x,y)→(a1 ,a2 )
2. lim [α f (x, y)] = α L.
(x,y)→(a1 ,a2 )
3. lim [f (x, y) ± g (x, y)] = L ± K.
(x,y)→(a1 ,a2 )
4. lim [f (x, y) g (x, y)] = L K.
(x,y)→(a1 ,a2 )  
f (x, y) L
5. lim = , desde que K 6= 0.
(x,y)→(a1 ,a2 ) g (x, y) K
n
6. lim [f (x, y)] = Ln , desde que n ∈ R+ .
(x,y)→(a1 ,a2 )
 p √
 lim
 (x,y)→(a
n
f (x, y) = n L ⇐= n ı́mpar
1 ,a2 )
7. p √

 lim n
f (x, y) = n L ⇐= n par e f (x, y) ≥ 0
(x,y)→(a1 ,a2 )
2.2. LIMITE E CONTINUIDADE 133

Teorema 26 ( Limite da função composta). Admita que as funções f : D1 ⊂ R2 −→ R


e h : D ⊂ R −→ R são tais que:

f (D1 ) ⊂ D e lim f (x, y) = L.


(x,y)→(a1 ,a2 )

Então:
lim (h ◦ f ) (x, y) = lim h [f (x, y)] = h(L).
(x,y)→(a1 ,a2 ) (x,y)→(a1 ,a2 )

Teorema 27 (Propriedades). Seja A(a1 , a2 ) um ponto do plano. Admita que f e g são


duas funções reais de duas variáveis reais definidas numa Br (A), excepto eventualmente
em A.

1. Dada uma f.r.v.r. f , tem-se:

lim f (x, y) = 0 ⇐⇒ lim |f (x, y)| = 0.


(x,y)→(a1 ,a2 ) (x,y)→(a1 ,a2 )

2. Se lim f (x, y) = 0 e g(x, y) é limitada (numa vizinhança de A) então:


(x,y)→(a1 ,a2 )

lim [f (x, y) · g (x, y)] = 0.


(x,y)→(a1 ,a2 )

x4 − y 4
Exercı́cio 25. 1. Mostre que lim = 0, recorrendo às propriedades acima
(x,y)→(0,0) x2 + y 2
enunciadas.

2. Generalize os limites notáveis enunciados aquando do estudo das f.r.v.r. agora para
o caso de funções de duas variáveis.
Como é evidente,
∞ astécnicas algébricas utilizadas quando surgem indeterminações
do tipo (∞ − ∞) e são ainda válidas no caso de limites de funções de n variáveis

reais. Contudo, a Regra de L’Hôpital não é generalizável. Por último, se a função for ”bem
comportada”, podemos calcular o limite num ponto substituindo cada uma das variáveis
de X pela respectiva coordenada de A: estamos a subentender que uma tal função é
contı́nua no ponto A, assunto que iremos tratar de seguida.
Definição 11 (Função contı́nua num ponto). Seja f : D ⊂ IRn −→ IR uma função
real de n variáveis reais e seja A ∈ D. Dizemos que f é contı́nua no ponto A se se ve-
rificarem as seguintes duas condições:

a) Existe lim f (X) = L ∈ R b) f (A) = L


X→A

Simbolicamente, f é contı́nua em A, se

∀ε>0 , ∃δ>0 : ∀X∈Df , [ d (A, X) < δ =⇒ |f (X) − f (A)| < ε ]


134 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Nota 28. Para que f seja contı́nua no ponto A é forçoso que A ∈ Df .


Definição 12. f diz-se contı́nua no conjunto C ⊂ Df se, e só se, for contı́nua em todos
os pontos de C.
Definição 13. Se uma função não é contı́nua num ponto, é descontı́nua nesse ponto. Diz-
se que a descontinuidade é não essencial ou removı́vel se existe lim f (X)= L ∈ IR,
X→A
mas
L 6= f (A) ou A ∈ / Df .
Nesse caso, alterando devidamente o valor da função, a função passa a ser contı́nua
nesse ponto.
Esta definição diz-nos que, no caso de haver uma descontinuidade removı́vel no ponto
A, é possı́vel definir o prolongamento de f por continuidade em A, como se segue:

se X ∈ Df \ {A}
(
f (X),
g (X) =
lim f (X), se X = A
X→A

Eis alguns exemplos de gráficos de funções com descontinuidades.

Seguem-se algumas generalizações de propriedades já nossas conhecidas.


Teorema 28. Toda a função polinomial em n variáveis é contı́nua em Rn .
Teorema 29 (Propriedades das funções contı́nuas). Sejam f : D ⊂ Rn −→ R e
g : D1 ⊂ Rn −→ R duas funções reais de n variáveis reais.

1. Se f e g são contı́nuas em A ∈ D ∩ D1 , então também o são as funções:


f p
f + g, f − g, f × g, (com g(A) 6= 0), n f (com f (A) ≥ 0, se n é par) e |f |
g
2.2. LIMITE E CONTINUIDADE 135

2. Seja h : D2 ⊂ R −→ R tal que f (D) ⊂ D2 . Se f é contı́nua em A e h é contı́nua


em f (A), então h ◦ f = h(f ) é contı́nua em A.

3. Se f é contı́nua em A (ponto não isolado de Df ) e f (A) 6= 0, então existe alguma


Bδ (A) na qual f mantém o mesmo sinal que toma em A.

4. (T. de Weierstrass) Se f é contı́nua num conjunto limitado e fechado, então atinge


nesse conjunto um máximo e um mı́nimo.

A propriedade 2. implica por exemplo que, se f : D ⊂ Rn −→ R é contı́nua num


ponto A e h : D2 ⊂ R −→ R é uma das f.r.v.r. elementares apresentadas no capı́tulo 1 tal
que h é contı́nua em f (A), então h ◦ f é contı́nua em A. Eis alguns exemplos de gráficos
de funções contı́nuas em R2 .

Exercı́cio 26. 1. Calcule, caso existam, cada um dos seguintes limites:

ex + ey x+y sin x2
(a) lim (b) lim 2 (c) lim
(x,y)→(0,0) sin y + cos x (x,y)→(1,1) (x − y) (x,y)→(0,0) x2 − y 2

2. Determine o domı́nio de continuidade das funções f , g e h tais que:

x2 y
 
2
 2xy , se (x, y) 6= (0, 0)
 
 6 −x2
, se y =
x 2 + y2 (y + x 2 )2
(a) f (x, y) = (b) g(x, y) =
 
se y = −x2
 0, se (x, y) = (0, 0) 0,

 xz + xy + yz
 , se (x, y, z) 6= (0, 0, 0)
(c) h(x, y, z) = x2 + y 2 + z 2

0, se (x, y, z) = (0, 0, 0)
136 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

FOLHA DE EXERCÍCIOS E PROBLEMAS N.o 5

DOMÍNIOS e REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS


1. Determine e represente graficamente o domı́nio de cada uma das funções definidas
pelas seguintes expressões. Calcule ainda o valor de cada uma delas nos pontos
indicados.
2 √ √ 
(a) f (x, y) = ; (1, 0), (−1, −1), − 2, 2
x2 + y 2
p
(b) f (x, y) = 4 − x2 − y 2 ; (0, 0), (0, 2), (1, 1)
p
(0, −1), 12 , 0 , (0, 3)

(c) f (x, y) = 3 9 − x2 − y 2 ;
 
x
(d) f (x, y) = ln ; (−4, −4), (2e, 2), (3e2 , 3)
y
(e) f (x, y) = e−|x+y| ; (a, −a), a ∈ R, (0, −1), (ln 2, 0)
 √ 
(0, 0), − 22 , 0 , 1, 21

(f) f (x, y) = arccos (x − y) ;
2y
(g) f (x, y) = p ; (−1, 2), (9, 1), (−3, 0)
3
y − x2

(0, 0), 12 , 0 , (2, 1)

(h) f (x, y) = 1 − ey2 −2x ;
p
(0, −1), 1e , 0 , (e−2 , e−2 )

(i) f (x, y) = − ln (x2 + y 2 );
p √ 
(j) f (x, y, z) = x2 + y 2 + z 2 − 4, (0, −2, 0) , (2, 0, 0) , 0, 0, 2 2
 
1
(k) f (x, y, z) = arccos [ln (x + y + z)] , (a, b, 1 − a − b) , 1, −1,
e

2. Seja C uma circunferência de raio r centrada na origem. Para a função definida em


1. (a) mostre que todos os pontos de C (com C ⊂ Df ) têm a mesma imagem. Idem
para as funções definidas em (b), (c) e (i).

3. Determine o contra-domı́nio de cada uma das funções f : D ⊂ IR2 → IR definida


por
2 p
(a) f (x, y) = 2 ; (b) f (x, y) = 4 − x2 − y 2 ;
x + y2

(c) f (x, y) = ln (xy) ; (d) f (x, y) = arctg ( x + y) .

x2 y
4. Considere a função f : D ⊂ IR2 → IR definida por f (x, y) = . Indique a
1−x
2.2. LIMITE E CONTINUIDADE 137

expressão designatória que define gi , i = 1, ..., 5 verificando a condição dada.


 
f (z, x) 1 2
(a) g1 (x, y) = f (x, x) f (y, y) (b) g2 (x, z) = (c) g3 (t) = f ,t
f (x, z) t
(d) g4 (x, y, z) = f [f (x, y) , f (z, z)] (e) g5 (z) = f (z, 10)

5. Descreva as curvas de nı́vel de cada uma das funções e esboce-as para os valores de
k dados.
p
(a) z = x + y, k = −1, 0, 2, 4 (b) z = 25 − x2 − y 2 , k = 0, 1, 2, 3, 4, 5
x 1 3
(c) f (x, y) = xy, k = 0, ±1, ±2 (d) f (x, y) = , k = ± , ±1, ± , ±2
x2 + y2 2 2

6. Faça corresponder cada uma das funções definidas pelas expressões de (i) a (vi) a
cada um dos gráficos de curvas de nı́vel de (a) a (f) e a cada um dos traçados de
superfı́cie de (g) a (l).

(i) z = (x + 2)2 + 2 (y − 3)2 (ii) z = 4x + 3y (iii) z = 10 − x2 − (y − 2)2


(iv) z = (3y − 5x)2 (v) z = 5 − (y + 2)2 (vi) z = 4 (x + 3)2 − y 2
138 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

7. Uma função de produção de Cobb-Douglas tem a expressão z = CLα K 1−α , onde


z designa o nı́vel de produção, L o número de unidades de trabalho e K o número
de unidades de capital. Mostre que tal função satisfaz a identidade
z  
L
ln = ln C + α ln .
K K
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 139

2.3 Derivadas Parciais e Diferenciais


O conceito de derivada de uma função de duas variáveis é mais complexo do que o de
uma função de uma só variável, uma vez que há agora a considerar duas variáveis que
variam (passe a redundância) independentemente uma da outra.

2.3.1 Definições, Interpretações e Exemplos


A noção mais simples de derivada de uma função de duas variáveis que iremos estudar
obtém-se quando fixamos uma das coordenadas considerando-a constante e calculamos
a derivada da função com respeito à outra. Falamos então de derivada parcial da função
dada.
Passemos à definição formal daquilo que dissemos.

Definição 14 (Derivadas Parciais). Sejam f : D ⊂ R2 −→ R uma função real de


duas variáveis reais e A = (a1 , a2 ) um ponto pertencente a um subconjunto aberto de
D. Chamamos derivada parcial de f em ordem a x no ponto A ao seguinte limite, caso
exista:
∂f f (a1 + h, a2 ) − f (a1 , a2 )
(a1 , a2 ) = lim .
∂x h→0 h
Por sua vez, chamamos derivada parcial de f em ordem a y no ponto A ao seguinte
limite, caso exista:
∂f f (a1 , a2 + k) − f (a1 , a2 )
(a1 , a2 ) = lim .
∂y k→0 k
Nota 29. 1. Como sucedia com as f.r.v.r., h e k são variáveis mudas: podemos utilizar
∂f ∂f
qualquer outro sı́mbolo e inclusive a mesma letra tanto em como em .
∂x ∂y
2. Outras notações possı́veis para as derivadas parciais são, respectivamente:

fx (a1 , a2 ) , fy (a1 , a2 ) , fx0 (a1 , a2 ) , fy0 (a1 , a2 ) , Dx f (a1 , a2 ) , Dy f (a1 , a2 ) .

Sendo z = f (x, y), utilizando a variável dependente em vez do nome da função,


são ainda possı́veis as notações
∂z ∂z
(a1 , a2 ) , (a1 , a2 ) ou zx (a1 , a2 ) , zy (a1 , a2 ) .
∂x ∂x

3. É importante distinguir entre ∂ e d na notação de Leibniz. O primeiro indica que


a derivada é parcial, o que subentende uma função de duas (ou mais) variáveis; o
segundo diz respeito a uma derivada (total) de uma função de uma só variável.

O cálculo de derivadas parciais é então bastante simples: basta derivar em relação a


uma das variáveis, tratando a outra como constante.
140 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Exemplo 63. 1. Se z = x2 y + y 3 x, então

∂z ∂z
(x, y) = 2xy + y 3 e (x, y) = x2 + 3y 2 x ,
∂x ∂y

ambas definidas em R2 .

2. Se f (x, y) = sin (xy + y 2 ), então

∂f ∂f
(x, y) = y cos xy + y 2 (x, y) = (x + 2y) cos xy + y 2
 
e ,
∂x ∂y

também ambas definidas em R2 .

3. Considere  2xy
 , se (x, y) 6= (0, 0)
g (x, y) = x2 + y2 .

0 , se (x, y) = (0, 0)
Para pontos (x, y) 6= (0, 0) temos:

∂g −2x2 y + 2y 3 ∂g 2x3 − 2xy 2


(x, y) = e (x, y) = .
∂x (x2 + y 2 )2 ∂y (x2 + y 2 )2

Na origem temos de recorrer às definições de derivadas parciais:

∂g g (0 + h, 0) − g (0, 0) ∂g g (0, 0 + k) − g (0, 0)


(0, 0) = lim =0e (0, 0) = lim = 0 .
∂x h→0 h ∂y k→0 k

Este último exemplo é sintomático da complexidade das relações que se estabelecem


entre continuidade e derivabilidade. Repare que a função g é descontı́nua na origem
2xy
(recorde que lim não existe). Contudo, existem as derivadas parciais de
(x,y)→(0,0) x + y 2
2
g na origem! Ou seja, ao contrário das f.r.v.r., para funções de duas ou mais variáveis
descontinuidade não implica que as derivadas parciais não existem.
Passemos à interpretação geométrica do conceito de derivada parcial. Para tal, con-
sidere a superfı́cie de equação z = f (x, y) e um ponto (x0 , y0 , z0 ) a ela pertencente, ou
seja, z0 = f (x0 , y0 ). Admita que a superfı́cie é intersetada pelo plano y = y0 .
Neste plano é possı́vel observar o gráfico da função z = f (x, y0 ). Ora, fx (x0 , y0 ) não é
mais do que o declive da recta tangente à curva de equação

z = f (x, y) ∧ y = y0

no ponto (x0 , y0 , f (x0 , y0 )). De facto, tal recta tem equação:

z − f (x0 , y0 ) = m (x − x0 ) ∧ y = y0 (2.6)
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 141

onde
f (x0 + h, y0 ) − f (x0 , y0 )
m = lim = fx (x0 , y0 ) .
h→0 h
Como recordará, este declive representa também a inclinação da curva de equação z =
f (x, y0 ) no ponto (x0 , y0 , z0 ) . Analogamente, considerando a intersecção da superfı́cie de
equação z = f (x, y) com o plano x = x0 , obtemos uma curva de equação z = f (x0 , y) .

O declive da recta tangente ao gráfico desta função no ponto dado é igual a fy (x0 , y0 ) .
Uma equação da referida recta será

z − f (x0 , y0 ) = fy (x0 , y0 ) (y − y0 ) ∧ x = x0 . (2.7)

Abusando um pouco da linguagem, podemos afirmar que fx (x0 , y0 ) e fy (x0 , y0 ) re-


142 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

presentam as inclinações da superfı́cie nas direcções do eixo dos xx e dos yy, respectiva-
mente, no ponto (x0 , y0 , z0 ).
Exemplo 64. A superfı́cie de equação z = f (x, y) onde
x2 25
f (x, y) = − − y 2 +
2 8
 
1
contém o ponto 12 , 1, 2 , uma vez que f

, 1 = 2. A inclinação da superfı́cie dada
2  
1
neste ponto e na direcção do eixo dos xx é fx , 1 e na direcção do eixo dos yy é
  2
1
fy , 1 . Ora,
2
fx (x, y) = −x e fy (x, y) = −2y.
Assim,    
1 1 1
fx ,1 = − e fy , 1 = −2.
2 2 2


A interpretação do conceito de derivada como taxa de variação tem também cabimento


no que concerne às derivadas parciais. Assim, fx (x0 , y0 ) representa a taxa de variação
de f em relação a x e no ponto (x0 , y0 ) , enquanto que fy (x0 , y0 ) representa a taxa de
variação de f em relação a y no ponto referido.
Note agora que as rectas tangentes (2.6) e (2.7), determinam um plano, dito plano tan-
gente à superfı́cie z = f (x, y) no ponto (x0 , y0 , f (x0 , y0 )), como se pode observar na
figura da página seguinte. Voltaremos a este assunto mais adiante.
∂f ∂f
Exercı́cio 27. Para cada uma das seguintes funções, defina as funções e .
∂x ∂y
 p xy
 
, se (x, y) 6= (0, 0)  2xy 2
2 2 , se (x, y) 6= (0, 0)
(a) f (x, y) = x +y (b) f (x, y) = x2 + y 2
 0, se (x, y) = (0, 0) 0, se (x, y) = (0, 0)

2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 143

Os conceitos de derivadas parciais são generalizáveis para funções de n variáveis re-


ais, n qualquer em N.

Definição 15 (Derivadas Parciais: caso geral). Sejam f : D ⊂ Rn −→ R uma função


real de n variáveis reais (n ≥ 2) e A = (a1 , ..., an ) um ponto pertencente a um subcon-
junto aberto de D. Chamamos derivada parcial de f em ordem a xi (i = 1, ..., n) no
ponto A ao seguinte limite, caso exista:

∂f f (a1 , ..., ai−1 , ai + h, ai+1 , ..., an ) − f (a1 , ..., an )


fxi (a1 , ..., an ) = (a1 , ..., an ) = lim .
∂xi h→0 h

Dada uma função f : D ⊂ IRn −→ IR, fixemos uma ordem i ∈ {1, ..., n}. Conside-
remos o conjunto  
∂f
Di = A ∈ D : (A) ∈ IR .
∂xi
Cada função
∂f
: Di ⊂ IRn −→ IR (i = 1, ..., n)
∂xi
tal que

∂f f (x1 , x2 , ..., xi + h, ..., xn ) − f (x1 , x2 , ..., xi , ..., xn )


(X) = lim , X ∈ Di ,
∂xi h→0 h
é dita função derivada parcial da função f em ordem a xi .

Derivadas de ordem superior

Dada uma função real de n variáveis reais f : D ⊂ IRn −→ IR, consideremos as suas
∂f ∂f
n funções derivadas parciais, . Se admite derivada parcial em ordem a x1 no
∂xi ∂x1
144 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

ponto A, esta denomina-se 2.a derivada parcial (ou derivada parcial de 2.a ordem) de f
em ordem a x1 , no ponto A e escrevemos:

∂ 2f
(A) ou fx001 (A) ou fx21 (A) .
∂x21
Assim,
∂f ∂f
2
  (a1 + h, a2 , ..., , ..., an ) − (a1 , a2 , ..., , ..., an )
∂ f ∂ ∂f ∂x1 ∂x1
2
(A) = (A) = lim .
∂x1 ∂x1 ∂x1 h→0 h
Analogamente, poderı́amos definir

∂ 2f ∂ 2f
   
∂ ∂f ∂ ∂f
(A) = (A) , ..., (A) = (A) .
∂x1 ∂x2 ∂x2 ∂x1 ∂x1 ∂xn ∂xn ∂x1
∂f
De um modo geral, para cada derivada parcial , podemos definir as seguintes derivadas
∂xi
parciais de 2a ordem:
∂ 2f
, derivadas quadradas
∂x2i
e
∂ 2f
(i 6= j) derivadas rectangulares ou mistas de 2.a ordem
∂xi ∂xj
Nota 30. 1. Este processo é generalizável de modo a obter-se as derivadas parciais
de 3.a ordem à custa das de 2.a ordem e, mais geralmente, de modo a obter-se as
derivadas parciais de ordem m a partir das de ordem (m − 1).

2. Podemos definir analogamente as funções 2.a derivada parcial, ..., k-ésima deri-
vada parcial.

3. Para n = 2 existem 2k derivadas parciais de ordem k.

4. Para n qualquer, existem nk derivadas parciais de ordem k.

Exemplo 65. Seja f tal que f (x, y) = 3xy 2 − 2y + 5x2 y 2 . Determine as derivadas
parciais de segunda ordem desta função e ainda fxy (−1, 2).
Resolução: Note que

fx (x, y) = 3y 2 + 10xy 2 e fy (x, y) = 6xy − 2 + 10x2 y.

Deste modo:

fxx (x, y) = 10y 2 , fxy (x, y) = 6y+20xy, fyx (x, y) = 6y+20xy e fyy (x, y) = 6x+10x2 .

Assim, fxy (−1, 2) = 12 − 40 = −28. 


2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 145

A igualdade entre as derivadas mistas acontece em certas circunstâncias.

Teorema 30 (T. de Schwarz). Sejam f : D ⊂ IR2 −→ IR e P0 = (x0 , y0 ) ∈ D. Se f é


tal que fx , fy , e fxy existem numa Bε (P0 ) e se fxy é contı́nua em P0 , então também existe
fyx (x0 , y0 ) e tem-se:
fxy (x0 , y0 ) = fyx (x0 , y0 ) .
Mais geralmente, se a continuidade de fxy for válida em Bε (P0 ), tem-se:

fxy (P ) = fyx (P ) ∀P ∈Bε (P0 ) .

Nota 31. 1. Este resultado também se generaliza, mutatis mutandis, para funções de
três ou mais variáveis. Mais: também pode aplicar-se a ordens de derivação supe-
rior (concluindo-se, por exemplo, que fxy2 = fy2 x , sob as hipóteses corresponden-
tes).

2. Esta é uma condição suficiente, i.e., o facto de termos

fxy (x0 , y0 ) = fyx (x0 , y0 )

não implica a continuidade das derivadas rectangulares.


∂ 2f ∂ 2f
Exercı́cio 28. Relativamente à função do Exercı́cio 27 (b), calcule (0, 0) e (0, 0),
∂x∂y ∂y∂x
caso existam.

Exercı́cio 29. Calcule as derivadas parciais de terceira ordem da função f tal que:

f (x, y, z) = y ex + x ln z.

A tı́tulo de exemplo de aplicação da notação de derivadas parciais, retomemos uma das


aplicações referidas na Secção 1.6. Recorde que, se R(x) denotar o rendimento obtido por
uma empresa pela venda de uma quantidade x de um determinado produto, o rendimento
marginal será então dado por R0 (x). Suponha agora que a empresa produz dois bens,
digamos X e Y , e que o seu rendimento pela venda de quantidades x e y, respectivamente,
de X e de Y , é dado por R(x, y), cujas derivadas parciais de primeira e segunda ordem
∂R
são funções contı́nuas. O rendimento marginal de X é dado por , enquanto que o
∂x
∂R
rendimento marginal de Y é dado por . Enquanto o primeiro traduz a taxa de variação
∂y
de R num ponto em relação a x (mantendo y constante), o segundo traduz a taxa de
variação de R num ponto em relação a y (mantendo x constante). À semelhança do que
fizemos com estas derivadas parciais, podemos atribuir significados às derivadas parciais
de segunda ordem. Assim, dizer que

∂ 2R
<0
∂x2
146 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

significa que o rendimento marginal de X é uma função decrescente da venda daquele


produto, mantendo fixas as vendas de Y . Por seu turno, dizer que

∂ 2R
 
∂ ∂R
= >0
∂y∂x ∂x ∂y

significa que à medida que aumentamos o volume de vendas de X, mantendo constante


o volume de vendas de Y , o rendimento marginal de Y cresce. Pelo T. de Schwarz, isto
sucede se e só se o incremento do volume de vendas de Y , mantendo constante o volume
de vendas de X, causa um aumento do rendimento marginal de X, uma vez que

∂ 2R ∂ 2R
= > 0.
∂x∂y ∂y∂x

Ainda a respeito das notações, retomemos o exemplo da função elasticidade da procura.


Recorde que se x designar a quantidade procurada e p o seu preço unitário, então a elas-
ticidade do preço de procura é definida por:
p dx
η= .
x dp
Suponhamos que agora temos duas mercadorias X1 e X2 e que a quantidade procurada de
cada produto depende de cada um dos seus preços. Denotemos por x1 e x2 as quantidades
procuradas e por p1 e p2 os repetivos preços unitários. Podemos então definir quatro tipos
de elasticidade:
p1 ∂x1 p2 ∂x2
e ,
x1 ∂p1 x2 ∂p2
ditas elasticidades próprias (do preço) da procura relativas a cada bem - e
p2 ∂x1 p1 ∂x2
e ,
x1 ∂p2 x2 ∂p1
ditas elasticidades cruzadas (do preço) da procura.

2.3.2 Equação do Plano Tangente à Superfı́cie z = f (x, y) num Ponto


Considere uma função f : D ⊂ IR2 −→ IR e um ponto P (x0 , y0 , z0 ) pertencente ao seu
gráfico. Denotando por P0 (x0 , y0 ) ∈ D, então z0 = f (x0 , y0 ) = f (P0 ). Admita ainda
que a superfı́cie z = f (x, y) - i.e., o gráfico de f - é tal que o plano tangente à superfı́cie
no ponto P é não vertical. Pretende-se determinar uma equação para tal plano, que
designaremos por Π.
Como sabe (ver (2.1)), a equação geral do plano que contém o ponto (x0 , y0 , z0 ) e tem
vector normal ~n = (u, v, w) tem a seguinte forma:

u (x − x0 ) + v (y − y0 ) + w (z − z0 ) = 0.
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 147

A hipótese de um plano tangente não vertical implica que w 6= 0- isto é, (u, v, w) é não
ortogonal ao eixo OZ. Assim, a equação do plano Π pode ser reescrita na forma:
u v
z − z0 = − (x − x0 ) − (y − y0 ) . (2.8)
w w
Determinemos as intersecções entre Π e cada uma das rectas que serviram para a
interpretação das derivadas parciais fx (P0 ) e fy (P0 ) (recorde (2.6) e (2.7)). No primeiro
caso, temos: (
z − z0 = − wu (x − x0 ) − wv (y − y0 )
.
z − z0 = fx (P0 ) (x − x0 ) ∧ y = y0
de onde resulta
u
− = fx (P0 ) .
w
No segundo caso, temos:
(
z − z0 = − wu (x − x0 ) − v
w
(y − y0 )
.
z − z0 = fy (P0 ) (y − y0 ) ∧ x = x0

de onde resulta
v
− = fy (P0 ) .
w
Assim sendo, de (2.8) resulta

Π: z − z0 = fx (P0 ) (x − x0 ) + fy (P0 ) (y − y0 ) . (2.9)

Esta pode ser escrita na forma de produto interno :

h(x − x0 , y − y0 , z − z0 ) , (fx (P0 ) , fy (P0 ) , −1)i = 0

ou, na forma de produto matricial:


  T
x − x0 y − y0 z − z0 fx (P0 ) fy (P0 ) −1 = 0.

Desta equação resulta, assim, que

(fx (P0 ) , fy (P0 ) , −1)

é um vector normal ao plano tangente e, por conseguinte, à superfı́cie no ponto P .

Nota 32. Embora (fx (P0 ) , fy (P0 ) , −1) e (−fx (P0 ) , −fy (P0 ) , 1) sejam ambos nor-
mais à superfı́cie, é conveniente utilizar o primeiro deles por razões que mais adiante se
tornarão óbvias.
148 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Exemplo 66. Escreva uma equação do plano tangente à superfı́cie de equação

z = x2 y + xy 3

no ponto (1, 2, z(1, 2)) e indique um vector normal a tal superfı́cie nesse ponto.
Resolução: Considere a função f tal que f (x, y) = x2 y + xy 3 . No ponto (1, 2) temos

z = f (1, 2) = 10.

Uma equação do plano tangente à superfı́cie dada no ponto (1, 2, 10) é:

Π: z − 10 = fx (1, 2) (x − 1) + fy (1, 2) (y − 2) .

Como
fx (1, 2) = 2xy + y 3 (1,2) = 12
 

e
fy (1, 2) = x2 + 3xy 2 (1,2) = 13,
 

temos:
Π: z − 10 = 12 (x − 1) + 13 (y − 2) .
Um vector normal à superfı́cie no ponto dado é (12, 13, −1) .
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 149

Caso das funções reais de três ou mais variáveis reais


Dada uma função
f : D ⊂ Rn −→ R,
o seu gráfico,

Gf = (x1 , x2 , . . . , xn , w) ∈ Rn+1 : (x1 , x2 , . . . , xn ) ∈ D e w = f (x1 , x2 , . . . , xn )




é dito uma hiper-superfı́cie em Rn+1 . Se W0 = f (P0 ), com P0 = (X1 , X2 , . . . , Xn )


então (X1 , X2 , . . . , Xn , W0 ) é um ponto de tal hiper-superfı́cie, e, por um raciocı́nio
análogo ao do caso das funções de duas variáveis,

w − W0 = fx1 (P0 ) (x1 − X1 ) + fx2 (P0 ) (x2 − X2 ) + ... + fxn (P0 ) (xn − Xn ) (2.10)

é a equação do hiper-plano tangente à hiper-superfı́cie

w = f (x1 , x2 , . . . , xn )

no ponto (X1 , X2 , . . . , Xn , W ). Reescrevendo (2.10) na forma de produto interno em


Rn+1 , temos:

h(fx1 (P0 ) , fx2 (P0 ) , ..., fxn (P0 ) , −1) , ((x1 − X1 ) , (x2 − X2 ) , ..., (xn − Xn ) , w − W )i = 0,

ou ainda

[fx1 (P0 ) fx2 (P0 ) ... fxn (P0 ) − 1] [x1 − X1 (x2 − X2 ) ... (xn − Xn ) w − W ]T = 0,

o que evidencia que




n = (fx1 (P0 ) , fx2 (P0 ) , ..., fxn (P0 ) , −1)

é um vector normal à hiper-superfı́cie no ponto (X1 , X2 , . . . , Xn , W0 ).

2.3.3 Vector Gradiente e Matriz Hessiana


Dada uma função f : D ⊂ IR2 −→ IR, podemos definir um vector cujas componentes
são as derivadas parciais em cada ponto (x, y) onde aquelas existam. Tal vector diz-se
gradiente da função f e representa-se por

∇f ,

podendo ainda ser representado por Df . Assim sendo, tem-se:


 
fx (x, y)
∇f (x, y) =
fy (x, y)
para cada ponto onde as derivadas parciais existam. Por seu turno, podemos definir a
chamada matriz hessiana de f , cujas entradas são as derivadas parciais de segunda ordem
150 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

de f em cada ponto onde estas existam, dispostas por uma certa ordem. A notação usual
é Hf , embora também surja por vezes a notação D2 f , tendo-se:
 
fx2 (x, y) fxy (x, y)
Hf (x, y) =
fyx (x, y) fy2 (x, y)
Caso se verifiquem as condições do T. de Schwarz, teremos a igualdade das derivadas
mistas e a matriz hessiana será simétrica.
Exemplo 67. Seja f tal que f (x, y) = xy 4 + x3 y 2 . Determine o vector gradiente e a
matriz hessiana de f num ponto genérico e no ponto (1, −1).
Resolução: Observe que:

fx (x, y) = y 4 + 3x2 y 2 e fy (x, y) = 4xy 3 + 2x3 y,

pelo que:  
y 4 + 3x2 y 2
∇f (x, y) = .
4xy 3 + 2x3 y
Por outro lado,

fxx (x, y) = 6xy 2 , fxy (x, y) = 4y 3 + 6x2 y = fyx (x, y) e fyy (x, y) = 12xy 2 + 2x3 ,

e assim  
6xy 2 4y 3 + 6x2 y
Hf (x, y) = .
4y 3 + 6x2 y 12xy 2 + 2x3
   
4 6 −10
No ponto (1, −1), temos: ∇f (1, −1) = e Hf (1, −1) = .
−6 −10 14
Vamos de seguida apresentar uma propriedade gráfica do vector gradiente. Para tal,
regressemos ao plano tangente, cuja equação é (2.9). Intersectemos a superfı́cie z =
f (x, y) e o seu plano tangente Π pelo plano horizontal z = z0 . Temos:
(
z − z0 = fx (x0 , y0 ) (x − x0 ) + fy (x0 , y0 ) (y − y0 )
z = z0
m
fx (x0 , y0 ) (x − x0 ) + fy (x0 , y0 ) (y − y0 ) = 0.
Esta é a equação de uma recta tangente à curva de nı́vel

f (x, y) = z0

no ponto (x0 , y0 ). A equação de tal recta pode ainda ser escrita na forma

h(x − x0 , y − y0 ) , (fx (x0 , y0 ) , fy (x0 , y0 ))i = 0

ou ainda:   T
x − x0 y − y0 fx (x0 , y0 ) fy (x0 , y0 ) = 0.
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 151

Recorde que o vector


 T
fx (x0 , y0 ) fy (x0 , y0 ) .
é o vector gradiente de f no ponto (x0 , y0 ), representado por ∇f (x0 , y0 ). Da igualdade
acima, segue-se de imediato que o vector

∇f (x0 , y0 ) = [fx (x0 , y0 ) fy (x0 , y0 )]T = fx (x0 , y0 ) →



e1 + fy (x0 , y0 ) →

e2

onde →

e1 = (1, 0) e →

e2 = (0, 1), é perpendicular à curva

f (x, y) = z0

no ponto (x0 , y0 ), como se ilustra na figura seguinte.

Nota 33. Observe que as componentes do vector gradiente são os declives das rectas
tangentes em (x0 , y0 ) nas direcções dos eixos dos xx e dos yy, respectivamente. Por outro
lado, o vector (fx (x0 , y0 ) , fy (x0 , y0 ) , −1) , normal à superfı́cie, está no plano vertical
passando por (x0 , y0 ) e com a direcção do vector gradiente.
Exemplo 68. Retomando o exemplo (66), determine o vector gradiente da função

z = x2 y + xy 3

no ponto (1, 2), e esboce-o geometricamente num plano contendo a curva de nı́vel z = 10
e a recta que lhe é tangente nesse ponto.
Resolução: Sendo f tal que f (x, y) = x2 y + xy 3 , temos:

= 12 →

e1 + 13 →

 T  T
∇f (1, 2) = fx (1, 2) fy (1, 2) = 12 13 e2 .

Este vector é normal à curva de nı́vel

x2 y + xy 3 = 10

no ponto (1, 2). Na figura seguinte encontra-se a curva de nı́vel f (x, y) = 10, a recta
tangente a essa curva (recta que resulta da intersecção de z = 10 com o plano tangente),
bem como o vector gradiente no ponto (1, 2).
152 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Caso das funções reais de três ou mais variáveis reais


A generalização dos conceitos de vector gradiente e matriz hessiana para o caso de
funções reais de n variáveis reais f : D ⊂ IRn −→ IR é natural. Trata-se, respecti-
vamente, do vector ∇f e da matriz Hf tais que
 
fx1 (x1 , . . . , xn )
∇f (x1 , . . . , xn ) = 
 .. 
. 
fxn (x1 , . . . , xn )
e  
fx21 (x1 , . . . , xn ) . . . fx1 xn (x1 , . . . , xn )
Hf (x1 , . . . , xn ) =  .. ... ..
.
 
. .
fxn x1 (x1 , . . . , xn ) . . . fx2n (x1 , . . . , xn )
Sobre a matriz hessiana, mantém-se a sua simetria caso estejam verificadas as condições
do T. de Schwarz.
Note também que a equação do hiper-plano tangente pode ser escrita na forma:
w − W = h(fx1 (P0 ) , fx2 (P0 ) , ..., fxn (P0 )) , ((x1 − X1 ) , (x2 − X2 ) , ..., (xn − Xn ))i ,
à custa do produto escalar em Rn . A intersecção do hiper-plano com o hiper-plano w = W
tem como resultado:
h(fx1 (P0 ) , fx2 (P0 ) , ..., fxn (P0 )) , ((x1 − X1 ) , (x2 − X2 ) , ..., (xn − Xn ))i = 0.
Esta é a equação do hiper-plano tangente em P0 à hiper-superfı́cie de nı́vel de equação:
f (x1 , x2 , . . . , xn ) = W. (2.11)
Assim,
5f (P0 ) = (fx1 , fx2 , ..., fxn )(P0 )
é o vector gradiente de f em P0 e é ortogonal ao hiper-plano tangente, bem como à hiper-
superfı́cie de nı́vel (2.11) no ponto P0 . Quando n = 3 isto ainda consegue visualizar-se,
como se ilustra na figura seguinte.
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 153

Exemplo 69. Consideremos a hiper-superfı́cie


u = x2 + y 2 + z 2 .
Determine a equação do hiper-plano tangente à hiper-superfı́cie dada no ponto (3, −1, 1)
e um vector normal a este hiper-plano no ponto dado.
Resolução: Seja u = f (x, y, z) = x2 + y 2 + z 2 . Então f (3, −1, 1) = 11 e
fx (3, −1, 1) = [2x](3,−1,1) = 6, fy (3, −1, 1) = [2y](3,−1,1) = −2 e fz (3, −1, 1) = [2z](3,−1,1) = 2.
Deste modo, a equação do hiperplano-tangente é:
u − 11 = 6 (x − 3) − 2 (y + 1) + 2 (z − 1)
e


n = (6, −2, 2, −1)
é um vector normal à hiper-superfı́cie no ponto dado. Quando fazemos u = 11, obtemos:
6 (x − 3) − 2 (y + 1) + 2 (z − 1) = 0
ou seja:
3x − y + z = 11,
que constitui uma equação do plano tangente à superfı́cie de nı́vel de equação
x2 + y 2 + z 2 = 11 no ponto (3, −1, 1). A normal a este plano é
∇f (3, −1, 1) = (6, −2, 2) .

Não devemos surpreender-nos com o facto de a direcção de 5f (3, −1, 1) ser a mesma
de (3, −1, 1), uma vez que a normal a uma esfera num ponto P tem a mesma direcção do
−−→
raio vector OP . 
Gradiente e matriz hessiana serão fundamentais na classificação de extremos de funções
de duas ou mais variáveis reais, como a seu tempo se verá.
154 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

2.3.4 Diferenciais e Aproximação Linear de Funções


Admita que para uma dada função f tal que z = f (x, y) e para um dado ponto P0 (x0 , y0 )
as variáveis independentes estão sujeitas a variações de valores dx = ∆x e dy = ∆y,
respectivamente. Então z sofrerá uma variação:
∆z = f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) − f (x0 , y0 ) .
Definição 16 (diferencial total). Nas condições do parágrafo introdutório, chamamos
diferencial total da variável dependente z (ou da função f ) à quantidade
∂f ∂f
dz = dx + dy = fx dx + fy dy.
∂x ∂y
No ponto P0 tem-se:
∂f ∂f
dz (P0 ) = (P0 ) dx + (P0 ) dy = fx (P0 ) dx + fy (P0 ) dy.
∂x ∂y
Deixamos como exercı́cio a extensão deste conceito para funções reais de mais do
que duas variáveis.
Exemplo 70. Seja z = 2x sin y − 3x2 y 2 . Determine dz.
Resolução: Observe que:
zx (x, y) = 2 sin y − 6xy 2 e zy (x, y) = 2x cos y − 6x2 y,
pelo que:
dz = 2 sin y − 6xy 2 dx + 2x cos y − 6x2 y dy.
 

No caso das funções reais de uma variável real, uma função dizia-se diferenciável
num ponto se tivesse derivada finita nesse ponto. Isto significava que podı́amos utilizar
dy = f 0 (x)dx como aproximação de ∆y para valores de dx suficientemente pequenos. O
conceito de diferenciabilidade para funções de duas variáveis reais é o que se segue.
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 155

Definição 17 (função diferenciável). Uma função z = f (x, y) diz-se diferenciável em


P0 (x0 , y0 ) se ∆z puder escrever-se na forma:

∆z = fx (P0 ) ∆x + fy (P0 ) ∆y + ε1 ∆x + ε2 ∆y,

onde lim εi (∆x, ∆y) = 0, i = 1, 2. A função é dita diferenciável numa região


(∆x,∆y)→(0,0)
R se for diferenciável em todos os pontos de R.

Exemplo 71. Mostre que f tal que f (x, y) = x2 + 3y é diferenciável em R2 .


Resolução: Seja (x0 , y0 ) um ponto qualquer. Observe que:

∆z = f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) − f (x0 , y0 ) = (...) = 2x0 ∆x + 3 ∆y + ∆x ∆x + 0 ∆y


= fx (x0 , y0 ) ∆x + fy (x0 , y0 ) ∆y + ε1 ∆x + ε2 ∆y.

Ora, tomando ε1 (∆x, ∆y) = ∆x e ε2 (∆x, ∆y) = 0, temos:

lim εi (∆x, ∆y) = 0.


(∆x,∆y)→(0,0)

Logo, f é diferenciável em todos os pontos do plano.

Que relação se estabelece entre diferenciabilidade, derivadas parciais e conti-


nuidade? Vimos já através de um exemplo que uma função pode ser descontı́nua e ter
derivadas parciais. A seguinte condição constitui uma condição suficiente de diferencia-
bilidade.

Teorema 31. Se as derivadas parciais fx e fy de uma função f de duas variáveis forem


contı́nuas numa região aberta R, então f é diferenciável em R.

Por este teorema podemos garantir que, por exemplo, as funções polinomiais nas
variáveis x e y são diferenciáveis em R2 . Por outro lado, se f for diferenciável num ponto
(x0 , y0 ), podemos escolher (x0 + ∆x, y0 + ∆y) suficientemente próximos de (x0 , y0 ) de
modo a tornar ε1 ∆x e ε2 ∆y desprezáveis.
156 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Dito de outro modo, para valores de ∆x e ∆y suficientemente pequenos, temos:

∆z ≈ dz. (2.12)

A figura anterior pretende ilustrar esta situação. Além disso, ela evidencia que dz repre-
senta a variação na altura do plano tangente à superfı́cie no ponto (x0 , y0 , f (x0 , y0 )).
Observe que a fórmula de aproximação incremental (2.12) é apenas outra forma de
exprimir a aproximação linear de f junto do ponto (x0 , y0 ), isto é, a aproximação através
de um polinómio de grau 1 em x e y. De facto, dela resulta:
∂f ∂f
f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) ≈ f (x0 , y0 ) + (x0 , y0 ) ∆x + (x0 , y0 ) ∆y.
∂x ∂y
Colocando x = x0 + ∆x e y = y0 + ∆y, tem-se:
∂f ∂f
f (x, y) ≈ f (x0 , y0 ) + (x0 , y0 ) (x − x0 ) + (x0 , y0 ) (y − y0 ) . (2.13)
∂x ∂y
O polinómio à direita de (2.13) representa a aproximação linear de f numa vizinhança
de (x0 , y0 ). Não é difı́cil perceber que o gráfico de tal polinómio é justamente o plano
tangente à superfı́cie z = f (x, y) no ponto (x0 , y0 , z0 ).

Exercı́cio 30. Utilize o conceito


p de diferencial de uma função de duas variáveis para
aproximar a variação de z = 4 − (x2 + y 2 ) quando (x, y) vai de (1, 1) para (1.01, 0.97).

Deixamos como exercı́cio a extensão destes conceitos para funções de três ou mais
variáveis.
No exemplo seguinte, majoramos o erro cometido quando utilizamos o conceito de
diferencial de uma função de três variáveis.

Exemplo 72. Admita que na medição das dimensões de uma caixa são cometidos erros
absolutos inferiores a 0, 1 mm. Suponha que as estimativas das dimensões são x =
50 cm, y = 20 cm e z = 15 cm. Determine um majorante do erro relativo cometido na
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 157

avaliação do volume da caixa quando recorre a dV .


Resolução: A função que iremos utilizar será V tal que
V (x, y, z) = xyz,
onde x, y, z representam as 3 dimensões da caixa. Ora,
dV = yz dx + xz dy + xy dz.
Para x = 50 cm, y = 20 cm e z = 15 cm, vem V (50, 20, 15) = 15000 cm3 . De acordo
com os dados,
|dx| ≤ 0.01 cm, |dy| ≤ 0.01 cm e |dz| ≤ 0.01 cm.
Logo,
|∆V | |dV | |yz dx + xz dy + xy dz| yz |dx| + xz |dy| + xy |dz|
≈ = ≤
V V V V
20 × 15 + 50 × 15 + 50 × 20 20, 5
≤ × 0.01 = ≈ 0.0014.
15 000 15 000
A percentagem do erro relativo é inferior a 0.14%.
A relação entre diferenciabilidade e continuidade é estabelecida no resultado que se
segue.
Teorema 32. Se f é função de duas variáveis diferenciável em (x0 , y0 ), então f é contı́nua
nesse ponto e as derivadas parciais fx (x0 , y0 ) e fy (x0 , y0 ) existem.
Por este teorema, a descontinuidade de uma função num ponto implica a não diferen-
ciabilidade da função nesse ponto. É o que sucede com a função g tal que
 2xy
 , se (x, y) 6= (0, 0)
g (x, y) = x2 + y 2

0 , se (x, y) = (0, 0)
(ver Exemplo 63. 3. da secção anterior). De facto, a descontinuidade desta função na
origem implica a sua não diferenciabilidade nesse ponto. Por outro lado, verificámos
que g possui derivadas parciais de primeira ordem na origem. Ou seja, a existência de
derivadas parciais num ponto não chega para garantir a diferenciabilidade nesse ponto.
Para finalizar esta secção, falta apenas referir que se podem calcular diferenciais de
ordem superior a 1. Por exemplo, a diferencial de ordem 2 de uma função z = f (x, y)
obtém-se do seguinte modo:
d2 z = d (dz)
     
∂f ∂f ∂ ∂f ∂f ∂ ∂f ∂f
= d dx + dy = dx + dy dx + dx + dy dy
∂x ∂y ∂x ∂x ∂y ∂y ∂x ∂y
 2
∂ 2f
 2
∂ 2f
 
∂ f ∂ f
= dx + dy dx + dx + 2 dy dy
∂x2 ∂y∂x ∂x∂y ∂y
2 2 2
∂ f 2 ∂ f ∂ f ∂ 2f
= 2
(dx) + dxdy + dxdy + 2
(dy)2 .
∂x ∂y∂x ∂x∂y ∂y
158 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Admitindo que se verificam as condições do T. de Schwarz, e escrevendo (dx)2 = dx2 e


(dy)2 = dy 2 , vem:

∂ 2f 2 ∂ 2f ∂ 2f 2
d2 z = dx + 2 dxdy + dy .
∂x2 ∂x∂y ∂y 2
Esta, pode ainda escrever-se na chamada forma de quadrado simbólico:
 (2)
2 ∂f ∂f
dz= dx + dy , (2.14)
∂x ∂y

onde o desenvolvimento deve ser entendido do seguinte modo: produtos entre quantidades
dx e dy são produtos normais; produtos de derivadas devem ser entendidos como ordens
de derivação.

Exercı́cio 31. A fórmula (2.14) pode ser generalizada para funções de três ou mais
variáveis. Obtenha tal generalização. Existe também uma fórmula para uma ordem de
diferenciação n, n ≥ 2 (sendo neste caso uma potência simbólica de grau n). Obtenha tal
fórmula para uma função de duas variáveis e expanda-a, recorrendo ao desenvolvimento
binomial de Newton n  
n
X n k n−k
(a + b) = a b ,
k=0
k
 
n
onde = Ckn .
k
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 159

2.3.5 Funções Homogéneas


Dada uma função real de n variáveis reais f : D ⊂ Rn −→ R, uma pergunta que se
pode colocar é a seguinte: o que acontece ao valor de f (x1 , . . . , xn ) quando x1 , . . . , xn
aumentam na mesma proporção? Em geral, a resposta dependerá dos valores para as
variáveis independentes de que partimos. Existe contudo uma classe de funções sobre as
quais sabemos dizer algo de mais definitivo.
Seja λ um parâmetro real. Diremos que a função f é homogénea com grau de ho-
mogeneidade r se se verificar

f (λx1 , . . . , λxn ) = λr f (x1 , . . . , xn ) (2.15)

para todo o λ ∈ R\ {0} e para todo o n-uplo (x1 , . . . , xn ) ∈ D e (λx1 , . . . , λxn ) ∈


D. Caso (2.15) apenas se verifique para λ ∈ R+ a função dir-se-á positivamente ho-
mogénea. Como é evidente, se f for homogénea, então f também é positivamente ho-
mogénea.
Exemplo 73. Estude a homogeneidade das funções f , g e h tais que
√ √
2 2 2 x+3 y
f (x, y) = ax + bxy + cy , g(x, y, z) = e h(x, y) = 4x2 + 3y + 1.
8y + 9z

Resolução: Note que

f (λx, λy) = a (λx)2 + b (λx) (λy) + c (λy)2 = λ2 ax2 + bxy + cy 2 = λ2 f (x, y),


para quaisquer λ ∈ R\ {0} (x, y) ∈ R2 e (λx, λy) ∈ R2 . Deste modo, f é homogénea de


grau 2.
No que concerne a g, observe que:
1
g (λx, λy, λz) = (. . .) = √ g (x, y, z) ,
λ
apenas para λ > 0. Assim, g é positivamente homogénea de grau − 21 .
Finalmente, verifica-se facilmente que, em geral,

h (λx, λy) 6= λr h(x, y),

pelo que h não será homogénea. 


Seguem-se algumas propriedades das funções homogéneas.
Teorema 33. Sejam f e g funções reais de n variáveis reais definidas em D.
1. Se f e g forem homogéneas de grau r em D, então f + g é ainda uma função ho-
mogénea de grau r em D.
2. Se f e g forem homogéneas de graus r1 e r2 , respectivamente, em D, então f × g é
ainda uma função homogénea de grau r1 +r2 em D.
160 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

3. Se f e g forem homogéneas de graus r1 e r2 , respectivamente, em D, e se g não se


anular em D, então fg é ainda uma função homogénea de grau r1 −r2 em D.
4. Se f for homogénea de grau p em D e se f q estiver definida em D, então f q é ho-
mogénea de grau p q, em D.
5. Se f for homogénea de grau r em D e se as derivadas parciais de ordem k existirem
nesse conjunto, então tais derivadas parciais são homogéneas de grau r − k.
Nota 34. Os resultados acima enunciados também se verificam se as funções forem posi-
tivamente homogéneas.
Exemplo 74. Retomando a função f do anterior exemplo, a propriedade 5. do resultado
acima garante-nos que fx e fy são homogéneas de grau 1 e as derivadas parciais de
segunda ordem de f serão homogéneas de grau 0.
Segue-se um importante resultado acerca de derivadas parciais de funções homogéneas.
Teorema 34 (T. de Euler). Seja f uma função real de n variáveis reais definida e dife-
renciável num conjunto aberto D.
1. Se f é homogénea de grau r em D, então f satisfaz a chamada identidade de Euler

x1 fx1 + . . . + xn fxn = rf (x1 , . . . , xn ) . (2.16)

2. Suponha que D é um conjunto verificando

(x1 , . . . , xn ) ∈ D ∧ λ > 0 ⇒ (λx1 , . . . , λxn ) ∈ D

Se (2.16) se verificar em D, então f é positivamente homogénea de grau r em D.

Note-se que, se estivermos no conjunto das funções cujas variáveis são positivas, a
verificação da identidade de Euler é equivalente à verificação da homogeneidade positiva
da função.

Vamos agora ver de que modo este resultado se relaciona com as chamadas funções
de produção, um dos exemplos clássicos de funções de duas variáveis utilizadas em Eco-
nomia.
Admita que a quantidade Q de um bem produzido por uma fábrica é função do capital,
K, e do trabalho, L, utilizados, de acordo com a relação

Q = F (K, L) .

As variáveis independentes são, neste contexto, conhecidas por factores de produção e


assume-se que são não-negativas; F é dita função de produção e cada valor de Q é dito
nı́vel de produção.
A produtividade média do capital é definida através de
Q F (K, L)
= .
K K
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 161

e a produtividade média do trabalho por

Q F (K, L)
= .
L L
∂F
Por seu turno, a produtividade marginal do capital é definida por e a produti-
∂K
∂F
vidade marginal do trabalho por meio de . Por vezes, estas produtividades são
∂L
∂Q ∂Q
também denotadas por e , respectivamente.
∂K ∂L
Tal como sucedia com as f.r.v.r., é frequentemente útil trabalhar com funções-elasticidade,
em vez de funções marginais. Assim, neste contexto,
K ∂Q L ∂Q
ηK = e ηL =
Q ∂K Q ∂L
dizem-se elasticidades da produção relativamente ao capital e ao trabalho, respectiva-
mente. Também à semelhança do que sucedia com as f.r.v.r., aproveitando a regra da
derivada da função logarı́tmica, temos:
∂ ∂
ηK = K [ln F (K, L)] e ηL = L [ln F (K, L)] .
∂K ∂L
Um caso particular das funções de produção diz respeito às chamadas funções de
produção de Cobb-Douglas, cuja forma geral é dada por

Q = AK α Lβ , onde α, β, A são constantes positivas.

Estas funções são homogéneas de grau α + β. De facto, se designarmos por F tal função,
temos:
F (λK, λL) = A (λK)α (λL)β = (. . .) = λα+β F (K, L) .
Isto significa que, multiplicando os factores de produção por λ, o nı́vel de produção é
mutliplicado por um factor λα+β .
Para as funções de Cobb-Douglas, as produtividades médias do capital e do trabalho
são dadas, respectivamente, por
Q Q
= AK α−1 Lβ e = AK α Lβ−1 .
K L
Por seu turno, as produtividades marginais do capital e do trabalho são dadas por
∂Q Q
= A αK α−1 Lβ = α

∂K K
e
∂Q Q
= A (βK α ) Lβ−1 = β
∂L L
162 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Exercı́cio 32. Calcule as elasticidades da produção relativamente ao capital e ao traba-


lho, respectivamente.
Diz-se que uma função de produção F tal que Q = F (K, L) apresenta rendimentos
∂F
decrescentes para o capital se for uma função decrescente de K, para qualquer L
∂K
dado. Uma condição suficiente para que tal aconteça é que

∂ 2F
< 0, ∀(K,L) .
∂K 2
∂F
De modo análogo, F apresentará rendimentos decrescentes para o trabalho se for
∂L
uma função decrescente de L, para qualquer K dado.
2
Exemplo 75. Dada a função F tal que Q = F (K, L) = 6 (KL) 3 , esta função apresenta
rendimentos decrescentes para cada um dos factores de produção. De facto,
∂F 1 2
= 4K − 3 L 3 ,
∂K
que é função decrescente em K para cada L dado. Deixamos ao leitor a parte dos
rendimentos relativos ao trabalho.
Suponha agora que é dada uma função de produção, F , de uma dada empresa ou
economia tal que Q = F (K, L). Dizemos que F apresenta rendimentos crescentes à
escala se
F (λK, λL) > λF (K, L)
para λ constante > 1.
Admita que F é homogénea de grau r. Então para quaisquer K, L, λ,
F (λK, λL)
= λr .
F (K, L)
Dado λ > 1, temos:
λr > λ ⇐⇒ r > 1.
Deste modo, uma função de produção que seja homogénea de grau r proporcionará ren-
dimentos crescentes à escala se e só se r > 1.
De modo semelhante, diremos que uma função de produção F apresenta rendimentos
decrescentes à escala se
F (λK, λL) < λF (K, L)
para λ > 1 e constante.
Em particular, uma função de produção F que seja homogénea de grau r apresentará
rendimentos decrescentes à escala se e só se r < 1. Um tal grau de homogeneidade
implica, por exemplo, que duplicando os factores de produção obteremos um nı́vel de
produção multiplicado por um factor 2r < 2.
2.3. DERIVADAS PARCIAIS E DIFERENCIAIS 163

Finalmente, uma função de produção F apresenta rendimentos constantes à escala


se a multiplicação dos factores de produção por um valor λ, constante positiva, origina
uma quantidade multiplicada exatamente por λ, i.e., se

F (λK, λL) = λF (K, L) .

Isto sucede para todo o λ > 0 e todos os os nı́veis dos factores de produção se e só se a
função de produção for homogénea de grau 1.

Exemplo 76. Considere a função de produção F tal que


h √ √ ic
F (K, L) = a K + b L , onde a, b, c são constantes reais positivas.

Neste caso, multiplicando ambos os factores por λ > 0, vem:


c
F (λK, λL) = (. . .) = λ 2 F (K, L).

A função F é pois homogénea de grau 2c . Esta apresentará:

(i) rendimentos decrescentes à escala se c < 2


(ii) rendimentos constantes à escala se c = 2
(iii) rendimentos crescentes à escala se c > 2
164 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

2.4 Derivada Direccional


Apresenta-se nesta secção um conceito mais geral de derivada para funções de duas ou
mais variáveis reais.

2.4.1 Caso das funções reais de duas variáveis reais


Seja f uma função real de duas variáveis reais diferenciável em (x0 , y0 ) e tal que z0 =
f (x0 , y0 ). Como se viu, as derivadas parciais podem ser interpretadas como os declives de
rectas tangentes à superfı́cie z = f (x, y) no ponto (x0 , y0 , z0 ) ao longo de duas direcções:
paralela ao eixo OX, no caso de fx (x0 , y0 ); paralela ao eixo OY , no caso de fy (x0 , y0 ).
À semelhança do que se viu no cálculo de limites, nada nos impede de considerar uma
situação em que se procura o declive de uma recta tangente àquela superfı́cie no referido
ponto, mas ao longo de outra qualquer direcção.
Consideraremos então a derivada ou taxa de variação (a qual será o declive de uma
recta tangente) na direcção de →
−u = (u1 , u2 ), um vector unitário arbitrário. Recordemos
que a equação vectorial de uma recta passando em P0 (x0 , y0 ) e com a direcção de → −
u são
(x, y) = (x0 , y0 ) + t (u1 , u2 ) , t∈R,
onde o parâmetro t é tal que |t| = d (P, P0 ), com P (x, y).
Definição 18. Chamamos derivada direccional de f no ponto P0 e na direcção de →

u ao
seguinte limite, caso exista
f ((x0 , y0 ) + t (u1 , u2 )) − f (x0 , y0 )
u (x0 , y0 ) = lim
f−
→ .
t→0 t
1. Outras notações possı́veis são: D− →

Nota 35. u f (x0 , y0 ) e f1 ((x0 , y0 ) , u ). Utiliza-

remos também amiúde f−u (P0 ) em vez de f−
→ u (x0 , y0 ) .

2. Atendendo ao significado de t na definição de derivada direccional, podemos dizer


u (P0 ) representa a taxa de variação de f no ponto P em relação à distância
que f−

no plano XOY , na direção e sentido de → −u.


Admita que k u k =6 1 e que se pretende calcular f− → (P ). u 0

Para tal, devemos começar por calcular os chamados cossenos directores de →



u:
 u1
 ξ1 = cos α = k→
 −uk
u2 , com ξ12 + ξ22 = 1
 ξ2 = cos β = sin α = →

k−
uk
2.4. DERIVADA DIRECCIONAL 165

Então →

v = ξ1 →
−e1 +ξ2 →

e2 ≡ (ξ1 , ξ2 ) é um vector unitário com a mesma direcção e o mesmo


sentido de u . Tem-se aliás:

−v =u b = vers (→ −u)
pelo que →
−u = k→ −u k→

v.
Nota 36. 1. Dados P (a1 , a2 ) e Q (b1 , b2 ) temos:
−→ −→ −→
a) P + P Q = Q e P Q = Q − P b)P Q = (b1 − a1 , b2 − a2 )

2. Os sinais dos cossenos directores, ξ1 e ξ2 , variam de acordo com os sinais do cos α


e do sin α, respectivamente, ao longo de [0, 2π[ .

3. Sendo ∆ uma direcção definida por → −u , há a considerar dois sentidos (→



u e −→

u


têm a mesma direcção). Assim, os cossenos directores de u são
u1 u2 u1 u2
(ξ1 = + →
− , ξ2 = + →
− ) ∨ (ξ1 = − →
− , ξ2 = − →
− )
kuk kuk kuk kuk

∂f ∂f
4. (P0 ) e (P0 ) são casos particulares de f−
u (P0 ) (respectivamente, para

∂x ∂y
(ξ1 , ξ2 ) = (1, 0) e (ξ1 , ξ2 ) = (0, 1)).

No caso de f ser diferenciável no ponto P0 , existem maneiras mais expeditas de


calcular esta derivada, sem recorrer ao limite que a define. Utilizaremos argumentos
geométricos para o fazer e veremos que estes estão relacionados com o gradiente de f no
ponto dado.
Comecemos por observar que f− u (P0 ) pode ser interpretado como o declive da recta

tangente à superfı́cie z = f (x, y) na direcção e sentido de → −u , com k→

u k = 1, i.e., da
recta tangente à curva z = f [(x0 , y0 ) + t (u1 , u2 )] , t ∈ R. Deste modo, o vector


v = (u1 , u2 , f−
u (P0 ))

está no plano tangente à superfı́cie no ponto (x0 , y0 , z0 ), com z0 = f (x0 , y0 ).


166 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Assim sendo, por definição de plano tangente,



v ⊥ (fx (P0 ) , fy (P0 ) , −1) ,

uma vez que este é o vector normal à superfı́cie no ponto (x0 , y0 , z0 ). Daqui resulta:

h(u1 , u2 , f−
u (P0 )) , (fx (P0 ) , fy (P0 ) , −1)i = 0,

ou seja:

u1 fx (P0 ) + u2 fy (P0 ) = f−
u (P0 ) ,

ou ainda:


u (P0 ) = h(u1 , u2 ) , (fx (P0 ) , fy (P0 ))i = h u , 5f (P0 )i .
f−

Deste modo, podemos afirmar que, se f é diferenciável em P0 , então a derivada direccio-


nal de f na direcção de um vector unitário é:



u = h u , 5f i .
f−

Uma questão natural que se pode colocar é a de saber qual a direcção e sentido que
se deve tomar de modo a que a taxa de crescimento da função num dado ponto seja
máxima. Isto é, para um dado ponto P0 qual o vector → −u que determina um máximo de
f−
→u (P 0 ) ?
Seja θ o ângulo entre os vectores →

u e 5f (P0 ). Então, admitindo que f é diferenciável
em P0 , temos:


− →

u (P0 ) = h u , 5f (P0 )i = k u k k5f (P0 )k cos θ = k5f (P0 )k cos θ.
f−

No diagrama seguinte estão representados os vectores gradiente e →



u num plano horizon-
tal.
2.4. DERIVADA DIRECCIONAL 167

Da relação acima, e uma vez que −1 ≤ cos θ ≤ 1, podemos dizer que

u (P0 ) ≤ k5f (P0 )k .


− k5f (P0 )k ≤ f−

O valor máximo, k5f (P0 )k , ocorre quando cos θ = 1, ou seja, quando θ = 0, isto é,
quando →
−u tem a direcção e o sentido do gradiente de f nesse ponto. Por seu turno, o valor
mı́nimo é simétrico do valor máximo, sendo atingido quando → −
u tem a mesma direcção
de 5f (P0 ) mas sentido contrário (uma vez que cos θ = −1 ⇔ θ = π).

Assim sendo, a taxa máxima de crescimento de f no ponto P0 dado atinge-se


quando tomamos a direção e o sentido do gradiente, valendo tal máximo k5f (P0 )k;
por seu turno, a taxa máxima de decrescimento atinge-se na direção do gradiente e
no sentido oposto ao do gradiente, valendo − k5f (P0 )k.

Exemplo 77. Consideremos a função

f (x, y) = x2 y + xy 3

do exemplo (66). Recorde que 5f (1, 2) = (12, 13).


168 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

1. Naquele ponto, qual a taxa de crescimento de f na direcção (e sentido) do vector




v = 3→−
e1 + 4 →

e2 (em relação à distância no plano XOY )?

2. Em que direção e sentido se obtém a taxa máxima de crescimento?

3. E qual é tal taxa máxima?

Resolução: Comecemos por observar que



k→
−v k = 32 + 42 = 5 6= 1.

Um vector unitário com a mesma direcção e sentido de →



v é o seu versor:
 

− →
− 1 → − 3 4 3− 4−
u = vers ( v ) = →− v = , = → e1 + → e2 .
kvk 5 5 5 5

Assim, atendendo à interpretação de derivada direccional de f , a resposta à questão 1. é


dada por
  

− 3 4 88
u (1, 2) = h u , 5f (1, 2)i =
f−
→ , , (12, 13) = ≈ 17.6.
5 5 5

Quanto à segunda questão, a direcção e sentido para os quais a taxa de crescimento de


f em (1, 2) é máxima são simplesmente os de 5f (1, 2) = (12, 13). Por fim, como ficou
demonstrado, a taxa de crescimento nesta direcção é:

k5f (1, 2)k = (...) = 313 ≈ 17.69.

A figura seguinte ilustra a situação descrita neste exemplo.


2.4. DERIVADA DIRECCIONAL 169

Exemplo 78. Considere uma função de produção de Cobb-Douglas genérica P , tal que

P (x, y) = Axα y β , x, y > 0,

onde x e y são os factores de produção e os parâmetros A, α e β são positivos. O


gradiente de P num ponto qualquer do domı́nio da função é:
T T
= (...) = Axα−1 y β−1 αy βx
 
∇P (x, y) = Px (x, y) Py (x, y) .

Este fornece-nos a direcção da taxa máxima de crescimento de P .


Admita que para uma determinada fábrica a produção diária é dada por:
1 1
P (x, y) = 100x 2 y 5 ,

unidades, onde x denota o capital investido (em milhares de euros) e y o número de


horas de laboração (em unidades de 10), para as quais a força de trabalho é empregue
diariamente. Se o fabricante deseja expandir a produção quando o capital investido é
30 e o número de unidades horárias diárias de laboração é de 24 (o que corresponde a
240h diárias de laboração distribuı́das pelos trabalhadores) ele deverá procurar saber a
que taxas deverá incrementar o capital e o trabalho por forma a obter um crescimento
máximo da produção. Tal é dado pela direcção (e sentido) de

5P (x, y) ,

ou seja, ao longo da direcção (αy, βx) . Deste modo, no ponto (30, 24) tal razão é:
αy 2
= (...) = .
βx 1
Por conseguinte, por forma a maximizar a taxa de produção, por cada 2000 euros de
investimento adicional ele deverá aumentar em 10h o total de horas de trabalho. 
É ainda possı́vel definir derivadas direccionais de ordem superior à primeira. De-
a derivada direccional de ordem k na direção de →

(k)
notando por f−→u
u , temos o seguinte
resultado:
Teorema 35. 1. Seja f : D ⊂ R2 −→ R, uma função duas vezes diferenciável em
int(D). Então, para cada ponto P0 ∈ int(D), a função f possui derivada di-
reccional de ordem 2 segundo qualquer direção →

u de cossenos directores ξ1 e ξ2 ,
tendo-se:
(2)
f−

u
(P0 ) = [fx (P0 ) ξ1 + fy (P0 ) ξ2 ](2) = fx2 (P0 ) (ξ1 )2 +2fxy (P0 ) ξ1 ξ2 +fy2 (P0 ) (ξ2 )2 .

2. Se f for m vezes diferenciável em int(D), temos:


m  
(m) (m)
X m
f−
→u
(P0 ) = [fx (P0 ) ξ1 + fy (P0 ) ξ2 ] = fxm−k yk (P0 ) (ξ1 )m−k (ξ2 )k .
k=0
k
170 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

2.4.2 Caso das funções reais de três ou mais variáveis reais


Considere uma função
f : D ⊂ Rn −→ R,
Seja →

u = (u1 , u2 , . . . , un ) um vector unitário e P0 = (X1 , X2 , . . . , Xn ) ∈ D. Chamamos
derivada direccional de f em P0 na direcção de → −
u ao seguinte limite, caso exista:

f (P0 + t →

u ) − f (P0 )
f−
u (P0 ) = lim
→ .
t→0 t
No caso de f ser diferenciável em P0 , temos igualmente:


u (P0 ) = h5f (P0 ) , u i .
f−

Os argumentos geométricos utilizados no caso n = 2 alargam-se de maneira análoga para


qualquer n por forma a demonstrar esta identidade. Assim, para uma função f : D ⊂
Rn −→ R, f− →

u (P0 ) traduz a taxa de variação de f no ponto P0 e na direcção de u .

Além disso, o vector

−v = (u1 , u2 , . . . , un , f−
u (P0 ))

pertence ao hiper-plano-tangente à hiper-superfı́cie

w = f (x1 , x2 , . . . , xn )

no ponto (X1 , X2 , . . . , Xn , f (P0 )). Logo, →



v é ortogonal ao vector normal à hiper-
superfı́cie neste ponto, o qual é dado por:


n = (fx1 (P0 ) , fx2 (P0 ) , ..., fxn (P0 ) , −1) .

De
h→

v ,→

ni = 0
resulta agora a identidade pretendida.
Em particular, a taxa máxima de crescimento de f no ponto P0 dado é atingida na
direção (e sentido) de 5f (P0 ), valendo k5f (P0 )k, enquanto que a taxa máxima de des-
crescimento de f em P0 se atinge na mesma direcção mas em sentido contrário, valendo
− k5f (P0 )k.
Exemplo 79. Para a função f tal que

f (x, y, z) = x2 + y 2 + z 2 ,


determine f− u (3, −1, 1) na direcção de w = (1, 1, 1) . Determine ainda a direcção que

origina uma taxa máxima de crescimento
√ de f no ponto (3, −1, 1) e o valor de tal taxa.


Resolução: Note que k w k = 3, pelo que
 

− →
− 1 1 1
u = vers ( w ) = w b= √ ,√ ,√ .
3 3 3
2.4. DERIVADA DIRECCIONAL 171

Como f é diferenciável em qualquer ponto de R3 , podemos dizer que


     
1 1 1 1 1 1
u (3, −1, 1) =
f−
→ 5f (3, −1, 1) , √ , √ , √ = (6, −2, 2) , √ , √ , √
3 3 3 3 3 3

= 2 3.

A taxa máxima de crescimento de f no ponto dado atinge-se na direção e sentido de


(6, −2, 2), valendo √
k5f (3, −1, 1)k = 2 11,
o que conclui o exemplo. 

Para funções com n variáveis, é também possı́vel definir derivadas direccionais de


(k)
ordem superior a 1, denotadas por f−→u
.

Exercı́cio 33. Generalize o teorema da subsecção anterior para o caso de uma função de
três variáveis.
172 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

FOLHA DE EXERCÍCIOS E PROBLEMAS N.o 6, Parte I

DERIVADAS PARCIAIS e DIFERENCIAIS


1. Para cada uma das funções definidas pelas seguintes expressões, defina as derivadas
parciais de primeira ordem.

(a) f (x, y) = e2xy (b) f (x, y) = ln(ex + ey ) (c) f (x, y) = x3 + y 2 sin(xy)


p x+y
(d) f (x, y) = x2 + y 2 (e) f (x, y) = (f) f (x, y, z) = x2 eyz + y ln z
x2 + y 2
2 +z 2 (h) f (x, y) = Cxα y 1−α , x, y ∈ R+
(g) f (x, y, z) = xx+y 0 (i) f (x, y) = ex sin y + cos (x − 3y)
C ∈ R+ , α ∈ ]0, 1[;

2. Para cada uma das funções definidas pelas seguintes expressões, calcule nos pontos onde
existem as derivadas parciais de segunda ordem.
   
x 1
(a) f (x, y) = x ln y (b) f (x, y) = arctg (c) f (x, y, z) = xy sin .
y z

3. Para as funções em 2. (a) e (c), determine o vector gradiente e a matriz hessiana.

4. Prove que:

∂2z ∂2z
(a) se z (x, y) = ln x2 + y 2 , então

+ = 0.
∂x2 ∂y 2
∂2u ∂2u
(b) se u (x, t) = arctg (2x − t), então + 2 = 0.
∂x2 ∂x∂t
1 ∂2w ∂2w ∂2w
(c) se w (x, y, z) = p , então + + = 0.
x2 + y 2 + z 2 ∂x2 ∂y 2 ∂z 2

5. Uma companhia fabrica dois tipos de fogões a lenha: um modelo independente e outro para
encaixar na lareira. A função de custo para produzir x independentes e y para encaixar na
lareira é:

C (x, y) = 32 xy + 175x + 205y + 1050.
 
∂C ∂C
(a) Calcule os custos marginais e quando x = 80 e y = 20.
∂x ∂y
(b) Quando é necessária uma produção adicional, que modelo de fogão resulta num cres-
cimento dos custos com taxa mais elevada? Como pode isto ser determinado a partir
do modelo?
2.4. DERIVADA DIRECCIONAL 173

6. Considere a seguinte função de produção de Cobb-Douglas:

f (K, L) = 200 K 0.3 L0.7 ,

onde L é o número de unidades de trabalho e K o número de unidades de capital.

(a) Prove que tal função é homogénea e indique o seu grau de homogeneidade. Interprete
esta propriedade.
∂f
(b) Calcule a produção marginal do trabalho, , quando L = 1000 e K = 500.
∂L
∂f
(c) Calcule a produção marginal do capital, , quando L = 1000 e K = 500.
∂K

7. O valor de um investimento de 1000 euros rendendo 10% de juros compostos anualmente é


 10
1 + 0, 10 (1 − R)
V (I, R) = 1000 ,
1+I

onde R é a taxa anual de inflação e I é a taxa de imposto para o investidor. Calcule


VI (0.03; 0.28) e VR (0.03; 0.28). Determine se é a taxa de imposto ou a taxa de inflação o
maior factor negativo no crescimento do valor do investimento.

8. Uma função de utilidade U = f (x, y) é a medida da utilidade (ou satisfação) obtida por
uma pessoa a partir do consumo de dois produtos, X e Y , sendo x e y as quantidades
consumidas de um e do outro produto. Admita que

U (x, y) = 2 ln x + 3 ln y.

(a) Determine a utilidade marginal do produto X.


(b) Determine a utilidade marginal do produto Y .
(c) Quando x = 2 e y = 3, uma pessoa deverá aumentar o consumo de X ou de Y ?
Explique o seu raciocı́nio.

9. Um monopolista vende quantidades x e y de dois produtos, X e Y , respectivamente. Os


preços unitários px e py aplicados a X e a Y são dados por:

px = 25 − 2x + y e py = 20 + x − y,

respectivamente. Determine a expressão do rendimento total e dos rendimentos marginais


de X e de Y . Como deveria proceder no caso de as funções-procura de X e de Y tivessem
sido dadas na forma directa?

10. Dois bens 1 e 2 têm funções-procura dadas por


1/2 1/2 −1/2
x1 = 8p−2
1 p2 e x2 = 4p1 p2 ,

onde xi e pi denotam, respectivamente, a quantidade procurada e o preço unitário do bem


i, i = 1, 2. Determine as elasticidades próprias e cruzadas do preço da procura.
174 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

2 +y 2
11. Verifique em que conjunto é diferenciável a função f tal que f (x, y) = ex .

12. (*) Mostre que g tal que g(x, y) = e−|x+y| é apenas diferenciável em R2 \r, onde

r = (x, y) ∈ R2 : x + y = 0 .


Sugestão: Calcule gx e gy num ponto genérico de r.

13. Mostre que a função f (x, y) = y 2 − 3xy + 2x é diferenciável em qualquer ponto de R2 e


em seguida calcule df (P ) e df (Q) , para P (2, 1) e Q (0, 0)

14. Calcule o valor de df (P ) dados P e para os acréscimos indicados.

(a) f (x, y) = x2 + y 2 − 2x + 4y, P (3, 1), dx = 0.1 e dy = −0.2.


 
2 x
(b) f (x, y) = x ln , P (2, 1), dx = 0.3 e dy = −0.3.
y

15. Utilizando diferenciais, obtenha valores aproximados de:



(a) 3.98 ln (1.07) (b) (1.02)3.01

16. A respeito da função indicada em 9., admita que o monopolista está a operar aos nı́veis de
venda de x = 5 e y = 6. Recorra aos diferenciais para obter uma aproximação da variação
do rendimento total nas seguintes situações:

(a) x aumenta 0.01 e y mantém-se constante; (b) x mantém-se constante e y aumenta 0.02;
(c) x aumenta 0.01 e y aumenta 0.02; (d) x aumenta 0.03 e y aumenta 0.01.

17. Seja dada a função de produção


KL
Q= .
K +L
Mostre que se trata de uma função homogénea. Determine a produtividade média e a pro-
dutividade marginal do trabalho e do capital. Verifique ainda a identidade de Euler para esta
função.

18. Para a função de produção de Cobb-Douglas

Q = AK α Lβ , A, α, β > 0,

determine os intervalos a que devem pertencer os parâmetros α, β de modo que a função


exiba rendimentos decrescentes relativamente a cada factor.

19. Uma função de produção do tipo


1
Q = A [δK γ + (1 − δ) Lγ ] γ

onde A, γ e δ são constantes tais que A > 0, γ < 1, γ 6= 0 e 0 < δ < 1, tem o nome de
função CES (função de produção com elasticidade de substituição constante).
2.4. DERIVADA DIRECCIONAL 175
 1−γ
Q
(a) Mostre que a produtividade marginal do capital é δAγ K e determine uma
expressão semelhante para a produtividade do trabalho.
(b) Mostre que esta função de produção apresenta rendimentos decrescentes à escala em
relação a cada factor de produção.
(c) Mostre que esta função de produção se reduz à do exercı́cio 17. quando se toma
A = 21 , γ = −1 e δ = 12 .

20. Seja F uma função de produção homogénea de grau 1, dada por Q = F (K, L).
Q K
(a) Mostre que L se pode escrever como função da razão L.
(b) Mostre que as produtividades marginais do capital e do trabalho podem ser expressas
com função K
L.
(c) O que acontece às produtividades marginais se passarmos do ponto (10, 10) para o
ponto (20, 20)?
176 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

FOLHA DE EXERCÍCIOS E PROBLEMAS N.o 6, Parte II


PLANO TANGENTE, GRADIENTE e DERIVADA
DIRECCIONAL
1. Para cada uma das funções dadas, calcule a derivada direccional da função no ponto
P dado e na direcção e sentido do vector dado.


− 1 →− √ −
(a) f (x, y) = 3x − 4xy + 5y, P (1, 2) , v = e1 + 3 → e2 ;
2
π  π 
(b) f (x, y) = y 2 − 4x; P (2, −2) , → −v = cos →
−e1 + sin →

e2 ;
6 6
(c) f (x, y) = x2 + y 2 , P (3, 4) , → −
v =3→ −
e1 − 4 →

p
e2 ;
−→
(d) f (x, y) = 1 + x2 y − 2xy 2 + y 3 , P (2, 1) , →−v = P Q com Q (6, 4) ;
(e) f (x, y, z) = x arctg(yz), P (2, 1, 1) , → −v =→ −
e +2→1

e −→ −
e ; 2 3
2 2
(f) f (x, y, z) = y z − xz − xyz; P (0, 1, −1) ; →

v = 2→

e1 − 2→

e2 − →

e3 .

2. Para cada uma das funções definidas pelas expressões seguintes:


x−y
(a) f (x, y) = x2 + 3y 2 ; (b) f (x, y) = ;
x+y
2
(c) f (x, y) = exy ; (d) f (x, y) = x2 y 5 .

indique:

(1) uma equação do plano tangente à superfı́cie z = f (x, y) no ponto (1, 1, f (1, 1)) ;
(2) um vector normal à curva de nı́vel f (x, y) = f (1, 1) no ponto (1, 1);
(3) a taxa de crescimento de f em (1, 1) na direcção e sentido de →−v = 3→−e1 + 4→−
e2 ;
(4) a direcção (e sentido) segundo a qual é máxima a taxa de crescimento de f em (1,1);
(5) o valor máximo da taxa de crescimento a que se refere (4)

3. Uma função de produção com elasticidade de substituição constante genérica é de-


finida como se segue:
1
P (x, y) = A αxβ + (1 − α)y β β


onde x e y designam os factores de produção e A, α e β são parâmetros tais que


A > 0, 0 < α < 1 e 0 < β < 1.

(a) Determine a equação do plano tangente à superfı́cie z = P (x, y) no ponto


(1, 1) .
2.4. DERIVADA DIRECCIONAL 177

(b) Determine a direção (e sentido) de mais rápido crescimento para f no ponto


dado e o valor máximo dessa taxa de crescimento.
(c) Considere a curva isoquanta P (x, y) = A. Determine a recta tangente a esta
curva no ponto (1, 1) e verifique que tal recta é ortogonal à direcção a que se
refere (b).

4. Seja f (x, y, z) = x2 y 2 z 3 .

(a) Determine 5f (x, y, z) .


(b) Determine uma equação do hiper-plano tangente à hiper-superfı́cie u = x2 y 2 z 3
no ponto tal que x = y = z = 1.
(c) Determine a equação da normal e do plano tangente à superfı́cie de nı́vel
x2 y 2 z 3 = 1 em (1, 1, 1) .
(d) Qual a taxa de crescimento de f na direção (e sentido) de (1, 2, 3) no ponto
(1, 1, 1)?
(e) Em que direção é máxima tal taxa e qual o seu valor?

5. Seja f (x, y, z) = sin (π + x + yz 2 ).

(a) Determine 5f (x, y, z) .


(b) Determine uma equação do hiper-plano tangente à hiper-superfı́cie u = x2 y 2 z 3
no ponto tal que x = y = z = 0.
(c) Determine a equação da normal e do plano tangente à superfı́cie de nı́vel
sin (π + x + yz 2 ) = 0 em (0, 0, 0) .
(d) Qual a taxa de crescimento de f na direção (e sentido) de (2, 1, 2) no ponto
(0, 0, 0)?
(e) Em que direção é máxima tal taxa e qual o seu valor?

(1, 1) (sendo →

v = 3→

e 1 + 4→

(2)
6. Para cada uma das funções de 2., determine f−

v
e2 ).


7. Seja f (x, y) = ln (1 + x2 + y 2 ) e d um vector paralelo à recta y = x. Determine
os pontos desta recta para os quais se verifica, respectivamente:
(2)
(a) f−
→ (P ) = 0;
d
(b) f−
→ (P ) = 0 .
d
178 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

2.5 Regras da Cadeia e Funções Implı́citas


Nesta secção vamos apenas focar os casos mais simples de composição de funções e das
correspondentes regras da cadeia (i.e., regras de derivação de funções compostas). Para o
caso mais geral terı́amos de falar de funções com valores vectoriais, as quais não fazem
parte do programa desta unidade curricular.

CASO I: uma variável independente

Sejam w = f (x, y), x = g(t) e y = h(t), onde f , g e h são funções diferenciáveis em


algum conjunto que permita a composição de funções. Então w é função diferenciável de
t e tem-se:
dw ∂w dx ∂w dy
= + .
dt ∂x dt ∂y dt
Caso queiramos explicitar os objetos onde são calculadas cada uma das derivadas,
temos:
dw ∂w dx ∂w dy
(t) = (x, y) (t) + (x, y) (t) .
dt ∂x dt ∂y dt

Exemplo 80. Admita que w = x2 y − y 2 , x = sin t e y = et . Então w é função de t por


intermédio de x e y. Assim, pela Regra da Cadeia, vem

dw ∂w dx ∂w dy
= 2xy cos t + x2 − 2y et

= +
dt ∂x dt ∂y dt
= 2e sin t cos t + sin2 t − 2et et = 2et sin t cos t + et sin2 t − 2e2t .
t


Note que este exercı́cio poderia ter sido resolvido sem recorrer à Regra da Cadeia. De
facto, conhecendo as expressões de w = f (x, y), x = g(t) e y = h(t), temos:

w (t) = x2 y − y 2 x=sin t, y=et = sin2 t et − e2t .


 

A derivação desta função de t daria o mesmo resultado que acima obtivemos.

Nem sempre é possı́vel explicitar w como função de t, nomeadamente, porque se des-


conhece a expressão designatória de uma das funções, f , g ou h. Daı́ também a utilidade
da Regra da Cadeia.
No caso geral em que w = f (x1 , x2 , ..., xn ) e cada uma das variáveis é função de uma
única variável independente, t, temos:
n
dw ∂w dx1 ∂w dx2 ∂w dxn X ∂w dxi
= + + ... + = .
dt ∂x1 dt ∂x2 dt ∂xn dt i=1
∂xi dt
2.5. REGRAS DA CADEIA E FUNÇÕES IMPLÍCITAS 179

CASO II: duas variáveis independentes

Sejam w = f (x, y), x = g(s, t) e y = h(s, t), tais que f é função diferenciável de x
e y, e g e h são funções diferenciáveis de s e t. Então w é função diferenciável de s e t,
tendo-se:
∂w ∂w ∂x ∂w ∂y ∂w ∂w ∂x ∂w ∂y
= + e = + .
∂s ∂x ∂s ∂y ∂s ∂t ∂x ∂t ∂y ∂t
s
Exemplo 81. Suponha que w = 2xy, x = s2 + t2 e y = . Então w é função de s e de t
t
por intermédio de x e de y. Tem-se assim:

∂w ∂w ∂x ∂w ∂y 1 s 1 6s2 + 2t2


= + = (2y) (2s) + (2x) = 4 s + 2 s2 + t2 =
∂s ∂x ∂s ∂y ∂s t t t t
2 3
∂w ∂w ∂x ∂w ∂y  s  2st − 2s
= + = (2y) (2t) + (2x) − 2 = (...) = .
∂t ∂x ∂t ∂y ∂t t t2

Mais uma vez, conhecendo todas as expressões (de f (x, y), g(s, t) e h(s, t)) seria possı́vel
explicitar w como função das variáveis finais, s e t. A partir daı́ poderı́amos derivar em
ordem a s e em ordem a t para obtermos as mesmas expressões. 

No seguinte exemplo desconhecemos a expressão de f , embora se conheçam as de g


e de h.

Exemplo 82. Seja w tal que w = f (x − y, y − x) . Prove que

∂w ∂w
+ = 0.
∂x ∂y

Resolução: Considere u = x−y e v = y−x. Então w = f (u, v) = f (u(x, y), v(x, y))
e temos:
∂w ∂f ∂u ∂f ∂v ∂f ∂f
= + = −
∂x ∂u ∂x ∂v ∂x ∂u ∂v
e também:
∂w ∂f ∂u ∂f ∂v ∂f ∂f
= + =− + .
∂y ∂u ∂y ∂v ∂y ∂u ∂v
Destes dois desenvolvimentos resulta de imediato a identidade pretendida. 

A extensão da Regra da Cadeia neste caso II para qualquer número de variáveis inde-
pendentes e intermédias é também possı́vel. Assim, para

w = f (x1 , x2 , ..., xn )

e
xi = gi (t1 , t2 , ..., tm ), i = 1, ..., n,
180 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

temos:
∂w ∂w ∂x1 ∂w ∂x2 ∂w ∂xn
= + + ... +
∂t1 ∂x1 ∂t1 ∂x2 ∂t1 ∂xn ∂t1
∂w ∂w ∂x1 ∂w ∂x2 ∂w ∂xn
= + + ... +
∂t2 ∂x1 ∂t2 ∂x2 ∂t2 ∂xn ∂t2 ,
.. .. ..
. . .
∂w ∂w ∂x1 ∂w ∂x2 ∂w ∂xn
= + + ... +
∂tn ∂x1 ∂tn ∂x2 ∂tn ∂xn ∂tn
onde se supõe que as funções f e gi , i = 1, ..., n são diferenciáveis.

Exemplo 83. Por vezes, considera-se que na função de produção de Cobb-Douglas o


parâmetro A não é constante, mas variável, representando os diversos nı́veis de tecno-
logia disponı́vel para a produção. Consideremos então a função de produção de Cobb-
Douglas da forma
Q = F (A, K, L) = AK α Lβ ,
onde 0 < α < 1 e 0 < β < 1 e as variáveis A, K, L são consideradas positivas. Se estas
variáveis forem consideradas funções do tempo, t, temos:

F (t) = F (A (t) , K (t) , L (t)) = A (t) K (t)α L (t)β .

Pela regra da cadeia,

dF ∂F dA ∂F dK ∂F dL
= + +
dt ∂A dt ∂K dt ∂L dt
α β dA α−1 β dK dL
= K L + αAK L + βAK α Lβ−1 .
dt dt dt
Dividindo ambos os membros por Q = F (t), vem

1 dF 1 dA 1 dK 1 dL
= +α +β .
F (t) dt A dt K dt L dt

Tendo em cnta a noção taxa (proporcional) de crescimento, esta igualdade tem a seguinte
interpretação:

taxa de crescimento taxa de cresc. taxa de cresc. taxa de cresc.


= +α +β 
da produção da tecnologia do capital do trabalho

As regras de derivação composta permitem-nos abordar o problema da derivação de


funções definidas implicitamente numa outra perspectiva. Estamos agora em condições
de enunciar em que condições uma equação do tipo F (x, y) = 0 define, implicitamente,
uma variável como função das restantes.
2.5. REGRAS DA CADEIA E FUNÇÕES IMPLÍCITAS 181

Teorema 36 (T. da existência de função implı́cita). Sejam D ⊂ R2 um conjunto aberto,


(x0 , y0 ) ∈ D e F : D ⊂ R2 −→ R uma função real de duas variáveis reais verificando:
1. F (x0 , y0 ) = 0;
∂F ∂F
2. e são funções contı́nuas em D;
∂x ∂y
∂F
3. (x0 , y0 ) 6= 0.
∂y
Então a equação F (x, y) = 0 define implicitamente y como função de x numa vizinhança
do ponto (x0 , y0 ), isto é,
F (x, y) = 0 ⇐⇒ y = f (x)
para alguma função diferenciável f , definida num intervalo contendo x0 , tendo-se:

y0 = f (x0 ) .

Além disso,
∂F
dy (x0 , y0 )
f 0 (x0 ) = (x0 ) = − ∂x . (2.17)
dx ∂F
(x0 , y0 )
∂y
Nota 37. A expressão da derivada de f , resulta da aplicação da regra da cadeia a ambos
os membros de F (x, y) = 0. De facto, de

F (x, y(x)) = 0 (2.18)

vem
∂F ∂F dy
+ = 0,
∂x ∂y dx
ou seja:
∂F
dy
= − ∂x ,
dx ∂F
∂y
∂F
desde que 6= 0. Para um ponto (x0 , y0 ) pertencente à curva de equação (2.18) obtém-
∂y
se (2.17).

Exercı́cio 34. Adapte o teorema anterior ao caso em que a equação F (x, y) = 0 define
implicitamente x como função de y numa vizinhança do ponto (x0 , y0 ).
dy
Exemplo 84. Obtenha através da regra da cadeia, sabendo que y é uma função
dx
definida implicitamente pela equação:

y 3 + y 2 − 5y − x2 = −4 .
182 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

d2 y 3
Obtenha de seguida 2 . ( )
dx
Resolução: A equação dada pode escrever-se na forma

F (x, y) = 0,

onde F (x, y) = y 3 + y 2 − 5y − x2 + 4. A derivação de ambos os membros em ordem a


x permite obter
∂F
dy (x, y) (−2x) 2x
(x) = − ∂x =− 2 = 2 ,
dx ∂F 3y + 2y − 5 3y + 2y − 5
(x, y)
∂y

desde que 3y 2 + 2y − 5 6= 0 e (x, y) satisfaça a equação dada. Uma vez que y = f (x)
está definida implicitamente, temos ainda:
 
2 dy dy
 2 (3y + 2y − 5) − 2x 6y +2
d2 y

d 2x dx dx
2
= 2
= 2
dx dx 3y + 2y − 5 (3y 2 + 2y − 5)
 
2 2x
2 (3y + 2y − 5) − 2x (6y + 2) 2
3y + 2y − 5
= 2 =
2
(3y + 2y − 5)
2
2 (3y 2 + 2y − 5) − 8x2 (3y + 1)
= (...) = ,
(3y 2 + 2y − 5)3
o que finaliza a resolução. 

Nota 38. Como pôde observar no exemplo anterior, a obtenção da segunda derivada
de f foi feita por derivação implı́cita. Existe uma expressão para a segunda derivada
envolvendo as derivadas parciais de segunda ordem de F que não apresentaremos (ver
[9]), por ser de difı́cil dedução (além de pouco valor prático).

Exercı́cio 35. Alargue o Teorema da existência da função implı́cita para equações do


tipo
F (x, y, z) = 0
e para o caso mais geral, onde a equação é da forma

F (x1 , ..., xn , w) = 0.

Generalize também as fórmulas de derivação parcial, repectivamente, para a função z =


f (x, y) e para w = f (x1 , ..., xn ) definidas implicitamente em cada caso.
3
Note que a primeira parte deste exemplo tinha já sido resolvida pela técnica de derivação implı́cita (ver
o Exemplo 24 1.), tratando-se agora de recorrer a outra técnica.
2.5. REGRAS DA CADEIA E FUNÇÕES IMPLÍCITAS 183

Admitamos agora que a equação

F (x, y, z) = 0

define implicitamente uma função de duas variáveis f tal que z = f (x, y). Então a
equação dada escreve-se na forma

F (x, y, f (x, y)) = 0

e um processo de derivação composta em ordem a x e em ordem a y permite obter, res-


pectivamente:

∂F ∂F
(x, y, z) (x, y, z)
∂z ∂z ∂y
(x, y) = − ∂x e (x, y) = − ,
∂x ∂F ∂y ∂F
(x, y, z) (x, y, z)
∂z ∂z
∂F
assumindo que (x, y, z) 6= 0 e (x, y, z) é um ponto da superfı́cie F (x, y, z) = 0.
∂z
À semelhança do que foi dito na nota anterior, se forem satisfeitas as condições cor-
respondentes a (i), (ii) e (iii) numa vizinhança de P0 (x0 , y0 , z0 ), então dizer que

F (x0 , y0 , z0 ) = 0

equivale a dizer que, para a função f definida implicitamente é válido que:

z0 = f (x0 , y0 ).

Exemplo 85. Admita que a equação

3x2 z − x2 y 2 + 2z 3 + 3yz − 5 = 0
∂z
define z = f (x, y) numa vizinhança do ponto P (0, 1, 1) . Obtenha os valores de (0, 1)
∂x
∂z
e de (0, 1) através da regra da cadeia.
∂y
Resolução: Começando por escrever a equação dada na forma

F (x, y, z) = 0,

com F (x, y, z) = 3x2 z − x2 y 2 + 2z 3 + 3yz − 5, a derivação composta em ordem a x e


em ordem a y da equação dada permite obter, respectivamente:
∂F
∂z (x, y, z) 2xy 2 − 6xz
(x, y) = − ∂x = 2
∂x ∂F 3x + 6z 2 + 3y
(x, y, z)
∂z
184 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

e
∂F
(x, y, z)
∂z ∂y 2x2 y − 3z
(x, y) = − = 2 .
∂y ∂F 3x + 6z 2 + 3y
(x, y, z)
∂z
É tarefa simples verificar que o ponto dado satisfaz a equação dada. Assim:

2xy 2 − 6xz 2x2 y − 3z


   
∂z ∂z 1
(0, 1) = 2 2
=0 e (0, 1) = 2 2
=− ,
∂x 3x + 6z + 3y (0,1,1) ∂y 3x + 6z + 3y (0,1,1) 3

o que conclui o exemplo. 

Nota 39. O anterior exemplo poderia ter sido resolvido também pela técnica de derivação
implı́cita de funções de duas variáveis reais. De facto, sendo z = z (x, y), a derivação
implı́cita de

3x2 [z (x, y)] − x2 y 2 + 2 [z (x, y)]3 + 3y [z (x, y)] − 5 = 0

em ordem a x conduz a:
∂z ∂z ∂z
6xz + 3x2 (x, y) − 2xy 2 + 6 [z (x, y)]2 (x, y) + 3y (x, y) = 0.
∂x ∂x ∂x
∂z
Resolvendo esta equação em ordem a (x, y) e escrevendo apenas z em vez de z (x, y) ,
∂x
vem:
∂z 2xy 2 − 6xz
(x, y) = 2 ,
∂x 3x + 6z 2 + 3y
o que coincide com a expressão já antes obtida. Um processo de derivação implı́cita em
∂z
relação a y iria permitir obter a mesma expressão para (x, y).
∂y
Exercı́cio 36. Relativamente à função definida implicitamente pela equação do Exemplo
85, obtenha a matriz Hz (0, 1) (ou seja, Hf (0, 1), onde z = f (x, y)).
2.5. REGRAS DA CADEIA E FUNÇÕES IMPLÍCITAS 185

FOLHA DE EXERCÍCIOS E PROBLEMAS N.o 7

REGRAS da CADEIA e FUNÇÕES IMPLÍCITAS


1. Supondo que as funções dadas são diferenciáveis, determine:
(
df x = sin t
(a) , se f (x, y) = 2x2 + 2y 2 , com
dt y = cos t
(
df x = g (t)
(b) , se f (x, y) = xy + 2x2 , com
dt y = h(t)
∂f ∂f 2
(c) e , se f (t) = et , com t = x ln y
∂x ∂y
 2
∂ 2z

∂z x = 2u − v
(d) + , se z = ln (x + y) , com
∂u ∂u∂v y = 2v − u
∂ 2g ∂ 2g
(e) + , sendo g (x, y) = x2 f (y)
∂x2 ∂y 2
∂ 2f ∂ 2f ∂ 2f p
(f) 2 + 2 + 2 , sendo f (r) = ln r, r = x2 + y 2 + z 2
∂x ∂y ∂z
(
x = r cos t ∂z ∂z
2. Dada a função z = x2 + y 2 , com , prove que + = 2r.
y = r sin t ∂r ∂t
y
3. Seja z = xy + f , com f diferenciável. Mostre que
x
∂z ∂z
x +y = 2xy.
∂x ∂y
p  p
4. Sendo F (x, y) = f x2 + y 2 , e r (x, y) = x2 + y 2 , demonstre que

∂ 2F ∂ 2F d2 f 1 df
2
+ 2
= 2
+ .
∂x ∂y dr r dr

∂ 2F ∂ 2F
5. Sabendo que F é tal que = = 0 e sendo dada z (x, y) = F (x2 − y 2 , y 2 ),
∂u∂v ∂v∂u
mostre que
x ∂ 2z ∂ 2z 1 ∂z
+ 2− = 0.
y ∂x∂y ∂x x ∂x
186 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

6. Sendo z (x, y) = f (x − ay) + g (x + ay), prove que


∂ 2z 2
2∂ z
= a .
∂y 2 ∂x2

∂f ∂f
7. (*) Admita que z = f (x, y) é uma função tal que = . Suponha que
∂x ∂y
(
x=u+v
y =u−v

∂z
(a) Mostre que (u, v) = 0.
∂v
(b) A partir de (a), mostre que f (x, y) = g (x + y), para alguma função g.

8. Mostre que cada uma das equações seguintes define y como função implı́cita de
dy d2 y
x numa vizinhança do ponto indicado. Determine ainda e na abcissa do
dx dx2
referido ponto.
(a) y = x + ey ; (1 − e, 1) (b) (xy)2 + xy = 2; (1, 1)
 p 
(c) ey − ex + xy = 0; (0, 0) (d) ln y + 1 + y 2 + x2 = 1; (1, 0)

9. Considere a equação (x + y) z = ln (xyz) .

(a) Mostre que a equação define z como função implı́cita de x e y no ponto


(1, −1, −1) .
∂z ∂ 2z
(b) Calcule (1, −1) e (1, −1) .
∂x ∂x∂y
(c) Calcule dz (1, −1) .

10. Mostre que a equação


x2 + 2y 2 + z 2 − 2xy + xz − z = 0
define z como função implı́cita de x e y numa vizinhança do ponto (0, 0, 1) . Deter-
mine z (0, 0) e dz (0, 0).
∂z ∂z
11. Determine as derivadas parciais de primeira ordem, e , das funções definidas
∂x ∂y
implicitamente pelas equações dadas em cada uma das alı́neas seguintes:
(a) x2 + 2y 2 + (z − 2)2 = 1 (b) (x − y) z 2 + x2 yz = 2
(c) z + ln (xyz) = 1 (d) ex + sin (y + z) − z = 0
2.5. REGRAS DA CADEIA E FUNÇÕES IMPLÍCITAS 187

12. (*) Mostre que, sendo y = y(x) definida implicitamente por


√ p
y 1 − x2 + x 1 − y 2 = 0,

se tem √ p
dy 1 − x2 + dx 1 − y 2 = 0.

13. (*) A equação


 
z z
F , = 0, F : função diferenciável, α: constante real
xα y α

define z como função implı́cita de x e y. Mostre que


∂z ∂z
x (x, y) + y (x, y) = αz.
∂x ∂y

14. Demonstre que, sendo z = z(x, y) definida implicitamente por

x2 + y 2 + z 2 = g(ax + by + cz),

(g: função diferenciável, a, b, c: constantes reais), se tem:


∂z ∂z
(cy − bz) (x, y) + (az − cx) (x, y) = bx − ay.
∂x ∂y
188 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

2.6 Extremos Livres de Funções Reais de n Variáveis Re-


ais
Vamos analisar nesta secção o problema da determinação de extremos livres de funções
reais de n variáveis reais. Falamos por conseguinte em extremos em pontos interiores
do domı́nio de uma função. Se os pontos estiverem na fronteira do domı́nio, então o
problema converte-se, regra geral, num problema de extremos condicionados, o qual será
abordado na próxima secção.
A presente secção está dividida em duas subsecções: determinação de pontos esta-
cionários e condições suficientes. Dentro de cada uma delas ainda distinguiremos dois
casos: para n = 2 e para n ≥ 3. Embora as técnicas utilizadas para n = 2 sejam genera-
lizáveis para qualquer n, convém detalhar alguns aspectos do modo como se processa tal
generalização.
A definição de extremo local é uma simples generalização da que demos na secção
inicial do Capı́tulo 1.

Definição 19. Seja f : D ⊂ Rn −→ R uma função real de n variáveis reais (n ≥ 1) e


P0 ∈ int (D). Diremos que f tem um máximo local (ou relativo) em P0 se

∃δ>0 : ∀Q ∈ Bδ (P0 ) , f (Q) ≤ f (P0 ).

Diremos que f tem um mı́nimo local (ou relativo) em P0 se

∃δ>0 : ∀Q ∈ Bδ (P0 ) , f (Q) ≥ f (P0 ).

Nota 40. 1. Os máximos/mı́nimos são os valores f (P0 ), os quais recebem também o


nome genérico de extremos (máximos ou mı́nimos) locais. Aos pontos onde os ex-
tremos são atingidos chamaremos extremantes (maximizantes ou minimizantes).

2. Se as relações expressas na definição se verificarem em todo o domı́nio da função


então passaremos a ter extremos globais ou absolutos. Uma função pode não ter
nem extremos globais nem extremos locais. Contudo, prova-se que se f é dife-
renciável em P0 e atinge um máximo/mı́nimo global nesse ponto, então P0 é um dos
maximizantes locais (analogamente, para o caso dos mı́nimos).

2.6.1 Pontos Estacionários


Tal como acontecia com as funções reais de uma só variável real, os extremos locais de
uma função de n variáveis reais apenas podem ocorrer em pontos onde a função não seja
diferenciável ou em pontos estacionários, conceito este que será definido no inı́cio da
seguinte subsecção.
2.6. EXTREMOS LIVRES DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS 189

Pontos estacionários de funções de duas variáveis


Definição 20. Para uma função f : D ⊂ R2 −→ R diferenciável, diremos que P0 ∈
int(D) é um ponto estacionário de f se e só se a superfı́cie z = f (x, y) possuir um
plano tangente horizontal em P0 .

Recordemos que uma equação do plano tangente à superfı́cie z = f (x, y) num ponto
P (x0 , y0 , z0 ) (com z0 = f (x0 , y0 )) é dada por:

z − z0 = fx (P0 ) (x − x0 ) + fy (P0 ) (y − y0 ) .

Ora, para que tal plano seja horizontal, é necessário que tenha por equação

z = z0 ,

o que equivale a dizer que P0 é ponto estacionário de f se e só se:


(
fx (P0 ) = 0
.
fy (P0 ) = 0

Deste modo, para determinar todos os pontos estacionários de f precisamos de resolver,


em int(D), o sistema de equações:
(
fx (x, y) = 0
. (2.19)
fy (x, y) = 0

Teorema 37. Seja f : D ⊂ R2 −→ R uma função diferenciável e P0 ∈ int(D). Se f


atinge um extremo local em P0 , então P0 é um ponto estacionário.
190 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Nota 41. As condições (2.19), ditas de estacionaridade ou de 1.a ordem, são ne-
cessárias, mas não suficientes. Quer isto dizer que não basta ser ponto estacionário
para que haja extremo num ponto. Contudo, para pontos onde f é diferenciável, apenas
devemos procurar extremantes em pontos estacionários.

Exemplo 86. Considere a função f : R2 −→ R definida por

f (x, y) = x2 y + xy 3 − xy,

diferenciável em todo o domı́nio (pois é função polinomial em duas variáveis). Determi-


nemos os seus pontos estacionários.
Resolução: Resolvamos o sistema:

(
fx (x, y) = 0
fy (x, y) = 0

No caso presente, este equivale a:

( (
2xy + y 3 − y = 0 y (2x + y 2 − 1) = 0
⇐⇒
x2 + 3xy 2 − x = 0 x (x + 3y 2 − 1) = 0

( ( ( (
y=0 y=0 2x + y 2 − 1 = 0 2x + y 2 − 1 = 0
⇐⇒ ∨ ∨ ∨
x=0 x + 3y 2 − 1 = 0 x=0 x + 3y 2 − 1 = 0

2 2
( ( ( ( ( (
x=0 x=1 x=0 x=0 x= 5
x= 5
⇔ (· · · ) ⇔ ∨ ∨ ∨ ∨ √ ∨ √ .
x=0 y=0 y = −1 y=1 5 5
y= 5
y=− 5

Temos pois seis pontos estacionários:

√ ! √ !
2 5 2 5
(0, 0) , (1, 0) , (0, −1) , (0, 1) , , e ,− .
5 5 5 5

Na figura seguinte, temos as curvas de nı́vel com os pontos estacionários representados,


bem como duas representações gráficas num referencial tridimensional, obtidas compu-
tacionalmente, sendo que a última delas inclui o plano z = 0.
2.6. EXTREMOS LIVRES DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS 191

A segunda representação é tridimensional e permite intuir facilmente que (0, 0) não é ex-
tremante: repare que f (0, 0) = 0 e que em qualquer Bδ ((0, 0)) existem pontos que têm
imagem positiva e outros com imagem negativa. 

Um ponto estacionário que não seja extremante diz-se ponto-sela. Assim, os pontos
estacionários das funções diferenciáveis classificam-se em três tipos:
(i) maximizantes; (ii) minimizantes; (iii) pontos-sela.
As figuras seguintes esquematizam o aspecto do gráfico e das curvas de nı́vel de uma
função em cada um deste tipo de pontos.

As curvas de nı́vel apenas podem fornecer indı́cios de que algo está a suceder na vizinhança
de um ponto (4 ). Nos casos em que existe um número infinito de pontos estacionários (e.g.,
4
Em última análise, o mesmo acontece com os gráficos obtidos por via computacional, dado que os
programas gráficos utilizam aritmética discreta e não contı́nua.
192 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

quando temos uma curva de pontos estacionários) dificilmente colheremos tais indı́cios.
É o que acontece com a função z = 3x2 , que tem uma infinidade de pontos estacionários
(a recta x = 0).
Uma consequência imediata da caracterização dos pontos estacionários dada por (2.19)
é que


5f (P0 ) = 0 = (0, 0)
para todo o ponto estacionário P0 . Além disso, para qualquer ponto estacionário P0
tem-se:


f−u (P0 ) = h5f (P0 ) , u i = 0,

o que traduz que a taxa de variação de f num ponto estacionário é nula em todas as
direções.

Pontos estacionários de funções de mais do que duas variáveis


Definição 21. Para uma função f : D ⊂ Rn −→ R diferenciável, diremos que P0 ∈
int(D) é um ponto estacionário de f se e só se a hiper-superfı́cie w = f (x1 , ..., xn )
possuir um hiper-plano tangente de equação

w = W0

em P0 (onde W0 = f (P0 )).

Atendendo à equação de um hiper-plano tangente, podemos dizer que P0 é um ponto


estacionário de f se e só se 
 fx1 (P0 ) = 0

.. . (2.20)
 .
 f (P ) = 0
xn 0
2.6. EXTREMOS LIVRES DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS 193

De modo análogo, para um ponto estacionário de f , podemos afirmar que




5f (P0 ) = 0 = (0, ..., 0)

e que a derivada direccional de f em P0 em qualquer das direções é nula.


Exemplo 87. Considere a função f : R3 −→ R definida por

f (x, y, z) = x2 + yz + 3z 3 + y 4 .

Determine os seus pontos estacionários.


Resolução: Como se trata de uma função diferenciável em R3 (pois é função polinomial
de três variáveis), para encontrarmos os pontos estacionários de f temos de resolver o
sistema: 
 fx (x, y, z) = 0
fy (x, y, z) = 0 ,
fz (x, y, z) = 0

ou seja:

 x=0
  
   25
 2x = 0  x=0

 1
y=−

z + 4y 3 = 0 ⇐⇒ (· · · ) ⇐⇒ y=0 ∨ 12 .
2 1
y + 9z = 0 z=0
    
1 5


 z = − 13


12
1
 
  52
1 1 5
, − 31 12

Logo, (0, 0, 0) e 0, − são os únicos pontos candidatos a extre-
12
mantes. 

2.6.2 Condições Suficientes


Na presente secção iremos enunciar métodos que nos permitam decidir se um ponto es-
tacionário é um extremante ou um ponto-sela. Para tal, iremos começar por introduzir
alguns conceitos de Álgebra Linear que fundamentem tal decisão.

Formas Quadráticas Revisitadas


Chamamos forma algébrica de grau r nas variáveis x1 , ..., xn a toda a aplicação
Q : Rn −→ R definida por:
X
Q (x1 , ..., xn ) = ai x1p1 xp22 ...xpnn (número finito de parcelas)
i

tal que
p1 + ... + pn = r.
194 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

As formas algébricas com r = 1, r = 2, r = 3, r = 4, etc, dizem-se, respectivamente,


lineares, quadráticas, cúbicas, de grau 4, etc. Podem ainda designar-se por unárias,
binárias, ternárias, etc, quanto ao número de variáveis.
O problema da classificação dos pontos estacionários está relacionado com o da classi-
ficação de formas quadráticas, i.e., como se viu na primeira secção deste capı́tulo, de
funções da forma
  
2 2
 a11 a12 x
= X T AX,

Q (x, y) = a11 x + 2a12 xy + a22 y = x y
a12 a22 y
no caso binário, ou da forma
Q (x1 , ..., xn ) = a11 x21 + a22 x22 + ... + ann x2n + 2a12 x1 x2 + ... + 2an−1 n xn−1 xn
  
a11 a12 · · · a1n x1
 a12 a22 · · · a2n   x2 
  
= X T AX

= x1 x2 · · · xn  .. .. ... . .
..   .. 
 
 . . 
a1n a2n · · · ann xn
no caso n-ário. Pode consultar este assunto mais em pormenor no Apêndice 2.2.

Extremos e Formas Quadráticas


Seja P0 um ponto estacionário de uma função f : D ⊂ Rn −→ R. Para decidir se P0
(k)
é extremante ou ponto-sela, devemos procurar a menor ordem k tal que f−

u
(P0 ) é não
identicamente nula, pois o sinal de
f (P ) − f (P0 )
numa vizinhança de P0 é o daquela derivada direccional (5 ). Se tal ordem for ı́mpar, isto
significa que tomando a direcção de → −u mas com sentidos opostos, obtemos sinais opostos
(k)
para f− →
u
(P 0 ) e, portanto, para f (P ) − f (P0 ). Logo, em tais casos não haverá extremo
local em P0 . Na maioria dos problemas de extremos locais, tem-se k = 2, e a decisão
sobre a existência de extremos está dependente do sinal da forma quadrática nas variáveis
ξ1 , ..., ξn
(2)  (2)
f−

u
(P0 ) = fx1 (P0 ) ξ1 + ... + fxn (P0 ) ξn ,
ou seja, da classificação da forma quadrática cuja matriz é Hf , a matriz hessiana de f :
 
fx21 fx1 x2 · · · fx1 xn
 1 2 fx22 · · · fx2 xn 
 fx x 
 . .. .. ..  ,
 .. . . . 
f x1 xn f x2 xn · · · fx2n (P0 )

já definida na Secção 2.3. Temos então:


5
Esta conclusão e outras que se seguirão estão relacionadas com o desenvolvimento de f em polinómio
de Taylor/McLaurin com derivadas direccionais, tema que não será apresentado por falta de tempo.
2.6. EXTREMOS LIVRES DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS 195

Caso n = 2: Sejam

f 2 fxy
∆ = ∆2 = x

∆1 = fx2 (P0 ) ; .
fxy fy2
(P0 )

1. Se ∆ < 0, então não há extremo local em P0 .

2. Se ∆ > 0, então há extremo local em P0 .

(a) se ∆1 > 0, f (P0 ) é mı́nimo local;


(b) se ∆1 < 0, f (P0 ) é máximo local;

3. Se ∆ = 0, então estamos na presença de um caso duvidoso. A decisão neste tipo


de casos requer uma análise local que permita deduzir qual o sinal de f (P )−f (P0 )
em pontos de Bε (P0 ) (há ainda resultados que permitem tirar partido das derivadas
direccionais de ordem superior, mas que não iremos aprofundar).

Nota 42. Quando do sistema relativo às condições de estacionaridade resulta uma linha
de pontos estacionários, então estamos na presença do caso duvidoso.

Caso n qualquer: Sejam


fx2 fx1 x2 · · · f x1 xn
1
1 2 fx22 · · ·

f x2 f x1 x2

fx x f x2 xn
∆1 = fx21 (P0 ) ; ∆2 = 1
;··· ∆n = ∆ = .

fx1 x2 fx22

.. .. .. ..

(P0 ) . . .

f x xn f x xn · · · fx2n
1 2 (P0 )

1. Se ∆p > 0, p = 1, 2, ..., n, então f (P0 ) é mı́nimo local.

2. Se (−1)p ∆p > 0, p = 1, 2, ..., n, então f (P0 ) é máximo local.

3. Se ∆ = 0 e ∆p ≥ 0, p = 1, 2, ..., n−1 ou (−1)p ∆p ≥ 0, então estamos na presença


de um caso duvidoso.

(2)
4. Nos restantes casos, f−

u
(P0 ) é forma quadrática não definida e, portanto, P0 é
ponto-sela.
196 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Exemplo 88. Retomemos o Exemplo 86. da subsecção anterior. Recordemos que os


pontos estacionários de f tal que

f (x, y) = x2 y + xy 3 − xy,
 √   √ 
são P1 (0, 0) , P2 (1, 0) , P3 (0, −1) , P4 (0, 1) , P5 5 , 5 e P6 5 , − 55 . Quais deles
2 5 2

são de facto extremantes?


Resolução: Havı́amos já determinado

fx (x, y) = 2xy + y 3 − y e fy (x, y) = x2 + 3xy 2 − x = 0.

Vamos determinar as derivadas de segunda ordem para cada um dos casos e determinar
o hessiano, determinante da matriz hessiana:
2

fx2 fxy 2y 2x + 3y − 1
∆ = ∆2 = = 2
.
fxy fy2 2x + 3y − 1 6xy

Os valores nos pontos estacionários surgem na seguinte tabela (P-S: ponto-sela)


 √   √ 
5
P1 (0, 0) P2 (1, 0) P3 (0, −1) P4 (0, 1) P5 5 , 5 2
P6 5 , − 55
2
√ √
2 5
f x2 0 0 −2 2 5
−255
2 2
fxy −1 −1 2 2 5 √ 5 √
12 5
fy 2 0 0 0 0 25
− 1225 5
4 4
∆ −1 −1 −4 −4 5 5
Menores ∆>0√ ∆>0 √
∆<0 ∆<0 ∆<0 ∆<0
principais ∆1 = 2 5 5 > 0 ∆1 = − 2 5 5 < 0
√ √
P1 P2 P3 P4 f (P5 ) = − 4255 f (P6 ) = 4255
Conclusão:
é P-S é P-S é P-S é P-S é mı́n. local é máx. local

Exemplo 89. Retomemos a função f : R3 −→ R definida por

f (x, y, z) = x2 + yz + 3z 3 + y 4 ,
  25   15 !
1 1
cujos pontos estacionários são P1 (0, 0, 0) e P2 0, − , − 31 . Quais de-
12 12
les são extremantes?
Resolução: Recorde que 
 fx (x, y, z) = 2x
fy (x, y, z) = z + 4y 3 ,
fz (x, y, z) = y + 9z 2

As derivadas de segunda ordem são:

fx2 (x, y, z) = 2, fxy (x, y, z) = 0 = fxz (x, y, z) , fyz (x, y, z) = 1, fy2 (x, y, z) = 12y 2
2.6. EXTREMOS LIVRES DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS 197

e
fz2 (x, y, z) = 18z.
Assim, a matriz hessiana é:  
2 0 0
 0 12y 2 1  .
0 1 18z
Temos então o seguinte quadro:
  25   15 !
1 1
P1 (0, 0, 0) P2 0, − , − 31
12 12
f x2 = 2 2 2
fxy = 0 = fxz 0 0
fyz = 1 1 1
3
fy2 = 12y 2 0 12 5
  15
1
fz2 = 18z 0 −6
12
∆1 = 2 > 0
∆1 = 2 > 0 2 0
= 2 × 12 35 > 0

2 0
∆2 = 3
0 12
5

∆2 = =0
0 0

2
0 0

3
Menores principais 2 0 0 0 12 5 1
∆3 = ∆ =

∆3 = ∆ = 0 0 1   15
1
0 1 0 0 1 −6
12
= −2 < 0 h 2
i
= 2 −6 × 12 5 −1 <0
P1 é P2 é
Conclusão:
ponto-sela ponto-sela

Asim, a função dada não tem extremos locais. 


Os casos de análise mais problemática surgem quando estamos na presença do caso
duvidoso (tanto que a maioria dos autores evita fazê-la), ficando pois por decidir se os
pontos estacionários são ou não extremantes. Com os resultados acima expostos não te-
mos ferramentas suficientes para decidir o que fazer perante um caso duvidoso. Todavia,
daremos três exemplos em que a abordagem da análise local se revela conclusiva. Relem-
bramos que, no caso n = 2, curvas de pontos estacionários são conjuntos de pontos que
estão no caso duvidoso.
2
Exemplo 90. Determine os extremos locais de f tal que f (x, y) = (x2 − 2x + y 2 − 2y) .
Resolução: O sistema 
 fx (x, y) = 0

fy (x, y) = 0

198 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

tem por soluções: (


x=1
∨ x2 − 2x + y 2 − 2y = 0.
y=1
No primeiro caso, uma análise das condições de segunda ordem permite concluir que
f (1, 1) = 4 é máximo local da função. No segundo caso, comecemos por observar que
se trata de uma linha de pontos estacionários. De facto, a técnica de completamento do
quadrado permite escrever a referida equação na forma:

(x − 1)2 + (y − 1)2 = 2,

que constitui uma circunferência de centro em (1, 1) e raio 2. De acordo com o que dis-
semos, nestes pontos verifica-se o caso duvidoso. Uma análise local permite concluir que
se trata de uma linha de minimizantes. De facto, para pontos (x0 , y0 ) da circunferência
temos: 2
f (x0 , y0 ) = x20 − 2x0 + y02 − 2y0 = 02 = 0.
Como
f (x, y) ≥ 0, ∀ (x, y) ∈ R2 ,
obtemos a conclusão pretendida. Além disso, podemos afirmar que os mı́nimos são glo-
bais. 

Exemplo 91. Determine os extremos locais de f tal que f (x, y) = xy (x + y − 1)2 .


Resolução: O sistema (
fx (x, y) = 0
fy (x, y) = 0
tem por soluções:
 1
 x=
(
x=0

4
∨ ∨ x + y = 1.
 y=1
 y=0
4


1 1 1
Uma análise das condições de segunda ordem permite concluir que f , = é
4 4 64
máximo local de f e que (0, 0) é um ponto-sela. Consideremos agora um ponto genérico

(a, b) ∈ r = (x, y) ∈ R2 : x + y = 1 .


Então f (a, b) = 0. Observe agora que o sinal de f é determinado pelo produto xy. Assim
sendo, é claro que o ponto (1, 0) pertencente a r é um ponto-sela. De facto, qualquer
Bε ((1, 0)) contém pontos do primeiro e quarto quadrantes não pertencentes a r. No
primeiro caso, tais pontos têm imagem positiva e no segundo caso têm imagem negativa.
Assim, a diferença [f (x, y) − f (1, 0)] não tem sinal constante e (1, 0) não é extremante.
Uma análise semelhante permite concluir que também (0, 1) é ponto-sela. Para pontos
2.6. EXTREMOS LIVRES DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS 199

(a, b) ∈ r com 0 < a < 1 existe sempre alguma Bε ((a, b)) totalmente contida no 1.o
quadrante. Assim, nessa vizinhança todos os pontos têm imagem não-negativa e

{(x, y) ∈ r : 0 < x < 1}

será linha de minimizantes locais. Uma análise semelhante irá permitir concluir que

{(x, y) ∈ r : x < 0 ∨ x > 1}

é linha de maximizantes locais. De facto, para estes pontos é sempre possı́vel encontrar
Bε ((a, b)) totalmente contida no 2.o ou 4.o quadrantes, nos quais f é não-positiva. 

No seguinte exemplo, analisaremos um caso duvidoso que ocorre num único ponto (e
não num conjunto infinito de pontos). Adoptaremos a mesma estratégia de análise local.

Exemplo 92. Determine os extremos locais de f tal que f (x, y) = x3 + y 2 .


Resolução: Determinemos os pontos estacionários de f .
( ( (
fx (x, y) = 0 3x2 = 0 x=0
⇐⇒ ⇐⇒ .
fy (x, y) = 0 2y = 0 y=0

Ora, a matriz hessiana de f em P (0, 0) é


   
6x 0 0 0
=
0 2 (P )
0 2

Temos pois:
∆ = ∆2 = 0,
o que constitui um caso duvidoso. Note que f (0, 0) = 0. Vejamos se em qualquer Bε (P )
f tem sinal constante. Considerando um ponto (δ, 0) distinto da origem, temos:

f (δ, 0) = δ 3 .

Ora, (
f (δ, 0) > 0, se δ > 0
,
f (δ, 0) < 0, se δ < 0

pelo que podemos concluir que em qualquer vizinhança de (0, 0), a diferença
[f (x, y) − f (0, 0)] não tem sinal constante. Logo, (0, 0) é ponto-sela. 

Para terminar esta secção, eis um exemplo em que os extremos da função existem sem
ser em pontos estacionários.
200 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Exemplo 93. Mostre que a função f tal que f (x, y) = e−|x+y| tem uma linha de maximi-
zantes em x + y = 0 .
Resolução: Note que a função f é contı́nua, tendo-se:
 −(x+y)
 e , se x + y ≥ 0
f (x, y) = e−|x+y| = .
 (x+y)
e , se x + y < 0

É imediato observar que f é diferenciável pelo menos em R2 \r, onde

r = (x, y) ∈ R2 : x + y = 0 .


Para os pontos de R2 \r as derivadas parciais nunca se anulam (como poderá verificar,


calculando fx e fy ). Ora, para (a, −a) ∈ r, temos:

f (a + h, −a) − f (a, −a) e−|h| − 1


fx (a, −a) = lim = lim
h−→0 h h−→0 h
Assim
e−|h| − 1 e−h − 1 e−h − 1
lim+ = lim+ = − lim+ = −1 (limite notável)
h−→0 h h−→0 h h−→0 −h
e
e−|h| − 1 eh − 1
lim− = lim− = 1 (limite notável).
h−→0 h h−→0 h
Deste modo, fx (a, −a) não existe (analogamente se conclui que fy (a, −a) não existe) e
f não é diferenciável em (a, −a). Note porém que

f (a, −a) = 1

e que
− |x + y| ≤ 0 =⇒ f (x, y) = e−|x+y| ≤ e0 = 1,
relação válida em todo o domı́nio, R2 . Assim, r é uma linha de maximizantes globais,
valendo 1 tal máximo. 
2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS201

2.7 Extremos Condicionados de Funções Reais de n Variáveis


Reais

Nesta secção estamos interessados em otimizar (i.e., maximizar ou minimizar) funções


sujeitas a restrições. Abordaremos um primeiro método - dito de substituição - bastante
simples, mas com as suas limitações. Posteriormente, apresentaremos o chamado método
dos multiplicadores de Lagrange.

2.7.1 Método de Substituição

Admitamos que pretendemos maximizar uma função f : R2 −→ R sujeita a uma restrição


do tipo (x, y) ∈ D, onde D é um conjunto não necessariamente aberto. Admitindo que
tal máximo existe, ele será atingido num ponto P0 ∈ int(D) ou P0 ∈ f r(D). No 1o caso,
P0 deverá ser procurado entre os pontos estacionários de f (trata-se de um problema de
extremos livres); no 2o caso, P0 pode não ser um ponto estacionário. Na figura seguinte
aparecem ilustradas as duas situações.

Suponhamos que são dadas f : R2 −→ R e g : R2 −→ R e pretendemos determinar

max f (x, y) sujeita à restrição g(x, y) = 0.


202 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

A maneira mais directa de o fazer é explicitar y como função de x a partir da equação de


ligação (i.e., de g(x, y) = 0). Se

y = h(x)

definir esta função, então os pontos da curva g(x, y) = 0 são da forma (x, h (x)).

O nosso problema reduz-se agora a determinar os máximos de

φ (x) = f (x, h (x)) ,

o que consiste num problema de extremos de uma f.r.v.r.


Se x0 é um ponto estacionário de φ, (x0 , h (x0 )) dir-se-á ponto estacionário com
restrição de f . O método acima descrito diz-se método de substituição.
2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS203

Exemplo 94. Mostre que o retângulo com área máxima, de dimensões x e y, e com
perı́metro fixo,
2x + 2y = L,
é um quadrado cujo comprimento do lado vale L4 .
Resolução: Pretende-se obter
máx A (x, y) ,
onde A (x, y) = xy (x, y > 0), sujeita a

2x + 2y = L.

Ora, desta equação vem


L
y= − x = h(x),
2
e substituindo em A(x, y), vem:
 
L
φ (x) = A (x, h(x)) = x −x .
2

Como esta função tem um máximo para x =L4 (prove-o,


 através do quadro de variação
L L
de φ e da sua primeira derivada), e como h = , podemos concluir que o ponto
4 4
L L

estacionário com restrição 4 , 4 de f seráum maximizante do problema, o que demons-
L2

L L
tra o pretendido. A área máxima valerá A , = . 
4 4 16

Uma idêntica abordagem pode ser utilizada quando temos f : R3 −→ R e g : R3 −→


R e pretendemos determinar
máx f (x, y, z)
sujeita à restrição
g(x, y, z) = 0.
204 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Resolvendo esta equação em ordem a z, virá:

z = h(x, y).

Estudarı́amos depois os pontos estacionários de

φ (x, y) = A (x, y, h(x, y)) .

Além disso, o mesmo método pode ser generalizado para os casos em que surgem
mais do que uma restrição. Por exemplo, suponhamos que são dadas f : R3 −→ R,
g1 : R3 −→ R e g2 : R3 −→ R e pretendemos

max f (x, y, z)

sujeita a (
g1 (x, y, z) = 0
.
g2 (x, y, z) = 0
Trata-se de começar por explicitar

y = h1 (x) e z = h2 (x),

para depois determinar os pontos estacionários de

φ (x) = f (x, h1 (x), h2 (x)) .

Como é natural, tudo o que tem sido dito até agora tem a sua versão correspondente
no caso de problemas de minimização.

Exemplo 95. Determine


min 3x2 − 2y 2


sujeita a (
x+y ≤2
. (2.21)
x−y ≤0

Resolução: Consideremos a função f (x, y) = 3x2 −2y 2 restringida aos pontos da região

D = (x, y) ∈ R2 : x + y ≤ 2 ∧ x − y ≤ 0 .


Esta diz-se região admissı́vel, e encontra-se esboçada na figura que se segue:


Admitindo que o mı́nimo existe, vamos considerar quatro tipos de pontos a analisar:

(i) pontos do tipo ξ1 ∈ int (D) ;


(ii) pontos do tipo ξ2 na recta x + y = 2 ;
(iii) pontos do tipo ξ3 na recta x − y = 0 ;
(iv) ponto ξ4 = (1, 1) .
2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS205

Figura 2.1: Região admissı́vel.

(i) Neste caso, ξ1 deverá ser um extremante livre. As condições de estacionaridade



 fx (x, y) = 0

fy (x, y) = 0

dão como resultado um único ponto estacionário, (0, 0), que teremos de rejeitar
por não pertencer a int (D) (apesar de estar na região admissı́vel).

(ii) Neste caso, pretendemos minimizar f sujeita a

x + y = 2.

Utilizando a técnica de substituição, como y = 2−x, vamos determinar os extremos


de
φ (x) = f (x, 2 − x) = x2 + 8x − 8.
Deste modo,
φ0 (x) = 2x + 8
e
φ0 (x) = 0 ⇐⇒ x = −4.
Um quadro de variação da monotonia facilmente confirmaria que φ atinge um
mı́nimo para x = −4. Da equação de ligação (a restrição x + y = 2) vem

y = 2 − (−4) = 6.

Assim, (−4, 6) é um ponto estacionário com restrição de f . Note que apenas será
minimizante para a única restrição utilizada, sendo no entanto um candidato a
minimizante do problema dado.
206 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

(iii) Agora, pretendemos minimizar f sujeita a


x − y = 0.
Desta equação de ligação resulta y = x. Pela técnica de substituição, vamos
determinar os extremos de
φ (x) = f (x, x) = x2 .
Sendo esta função representada por uma parábola, facilmente se deduz que (0, 0)
é o seu mı́nimo. Da equação de ligação resulta que também (0, 0) é um ponto
estacionário com restrição de f (observe que isto não contradiz o caso (i), no qual
apenas estávamos interessados nos pontos interiores a D). Temos pois mais um
candidato a minimizante do problema dado.
(iv) Na realidade, este ponto não precisa de ser analisado, uma vez que está incluı́do
quer no segundo quer no terceiro casos.
Por último, vamos calcular a imagem de cada um dos candidatos a minimizantes:
f (−4, 6) = −24 e f (0, 0) = 0 .
O mı́nimo é portanto −24, sendo atingido no ponto (−4, 6). 
Uma interpretação geométrica do problema é por vezes relevante para perceber ante-
cipadamente que a solução existe.
Exemplo 96. Quais os pontos (x, y) tais que x2 + y 2 = 5 que otimizam o valor de z em
x + 2y − z = 0 ?
Resolução: Reparemos que este problema se pode formular do seguinte modo:
”Quais os pontos (x, y) na circunferência x2 + y 2 = 5 que otimizam (maximizam e/ou
minimizam) a cota no plano x + 2y − z = 0 ?”
A cota no plano referido é dada por
z = x + 2y .
| {z }
=f (x,y)

Pretende-se pois otimizar (maximizar e minimizar) z = f (x, y) para pontos que satisfa-
zem φ(x, y) = 0, onde
φ(x, y) = x2 + y 2 − 5.
Note agora que
x2 + y 2 = 5, z ∈ IR
é a equação de um cilindro de revolução no espaço tridimensional. Como o plano
z = x + 2y não é vertical, há-de intersectar o cilindro em algum ponto de cota máxima
e noutro de cota mı́nima. Por conseguinte, o problema tem solução, quer no caso da
maximização quer no da minimização. A técnica de substituição
√ ainda seria viável neste
2 2
caso (repare que de x + y = 5 podemos explicitar y :y = ± 5 − x2 ). Não o faremos,
mas voltaremos a este problema mais adiante. 
2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS207

A respeito da existência de solução para um problema de otimização condicionada,


referimos uma generalização do Teorema de Weierstrass.
Teorema 38 (T. de Weierstrass). Toda a função f : D ⊂ Rn −→ R contı́nua num
conjunto limitado e fechado atinge nesse conjunto um máximo e um mı́nimo.
Nota 43. A função f definida por z = f (x, y) = x + 2y é contı́nua e x2 + y 2 = 5 é um
conjunto limitado e fechado (pois o seu complementar é aberto). Deste modo, o problema
do Exemplo 96. tem solução.

2.7.2 Método dos Multiplicadores de Lagrange


O método descrito na subsecção anterior tem o inconveniente de nem sempre ser pra-
ticável explicitar uma das variáveis em função das restantes a partir da equação de ligação.
Deparámos já com este problema aquando do estudo de funções implicitamente definidas.
Vamos agora apresentar um outro método adequado a estes e outros casos.
Na sua forma mais geral, um problema de extremos condicionados por restrições da-
das por equações formula-se do seguinte modo:

1
 φ (x1 , x2 , ..., xn ) = 0

otimizar z = f (x1 , x2 , ..., xn ) sujeita a .. .
.
 φm (x , x , ..., x ) = 0

1 2 n

Temos pois uma função-objetivo, f , com n variáveis, e m equações de ligação (m < n).
Consideraremos agora uma função auxiliar, dita função lagrangeana, definida como se
segue:
m
X
L (x1 , x2 , ..., xn ) = f (x1 , x2 , ..., xn ) + λj φj (x1 , x2 , ..., xn ) (função lagrangeana)
j=1

Nesta função, os parâmetros λj , j = 1, ..., m, dizem-se multiplicadores de Lagrange.


Começamos por determinar os pontos estacionários desta função, os quais resultam do
sistema:


∂L ∂f Pm ∂φj
+ λ = 0

= 0

 
 j


 ∂x 1


 ∂x1 j=1 ∂x1

 .. .. .. 
 .. .. ..
. . . . . .

 


 

 ∂L  ∂f m ∂φj condições de 1a ordem
= 0 ⇐⇒
P
+ λj = 0
 ∂xn  ∂xn j=1 ∂xn (condições necessárias)
1
φ = 0
 
1
 

 
 φ = 0

 .. .. .. 
 .. .. ..


 . . . 

 . . .
 φm = 0
 
 m
φ = 0

Note que neste sistema estão também presentes as equações de ligação. (6 )


6
Alguns autores fazem depender a função lagrangeana dos multiplicadores de Lagrange, caso em que,
derivando em ordem a cada um deles e igualando a zero, resultam as equações de ligação.
208 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Exemplo 97 (continuação). Sendo z = f (x, y) = x + 2y e φ (x, y) = x2 + y 2 − 5, a


função lagrangeana é:

L (x, y) =f (x, y) + λφ (x, y) = (x + 2y) + λ x2 + y 2 − 5 .




As condições de 1a ordem são:

∂L


 = 0 
 1 + 2λx = 0

 ∂x
∂L
= 0 ⇐⇒  2 + 2λy = 0 .
 2 ∂y2 x2 + y 2 = 5



x +y = 5

As soluções deste sistema são os pontos estacionários com restrição:

P (−1, −2)
( (
Q (1, 2)
1 ∨ 1 .
λ= λ=−
2 2
Mais uma vez, uma perspectiva geométrica facilmente nos confirma que P é minimizante
do problema e Q maximizante, sendo

zmin = (−1) + 2 × (−2) = −5 e zmax = 1 + 2 × 2 = 5

as cotas mı́nima e máxima. 

Para muitos autores, a análise acaba na determinação dos pontos estacionários. Estes
conduzirão a máximos ou mı́nimos, de acordo com a natureza do problema. Outros,
tomam tal decisão após cálculo das imagens nos pontos estacionários: o que tiver maior
imagem será um maximizante e o que tiver menor imagem será um minimizante. Há aqui
alguma falta de rigor matemático, pois, como sabe, nem sempre um ponto estacionário é
um extremante.
As ferramentas que até agora apresentámos permitem obter condições conclusivas
para classificação dos pontos estacionários com restrições. Como as noções de diferen-
cial e de derivada direccional de ordem superior não foram suficientemente exploradas
neste texto, optaremos por uma técnica - dita da matriz hessiana orlada - que tem o
inconveniente de nem sempre ser conclusiva para as condições de segunda ordem.
Regressemos de novo ao problema geral e adoptemos a seguinte notação:

∂φj
φji = , i = 1, ..., n; j = 1, ..., m
∂xi
.
2
∂ L
Lij = , i, j = 1, ..., n
∂xi ∂xj
2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS209

Chamamos matriz hessiana orlada de L à seguinte matriz quadrada de ordem (m + n) :


φ11 φ12 · · · φ1n
 
.. .. .
0 . . · · · ..
 
 m×m 
m m m
φ1 φ2 · · · φn 
 

H =  φ11 · · · φm L11 L12 · · · L1 n  matriz hessiana orlada.
 
1
 1 m
 φ2 · · · φ2 L21 L22 · · · L2 n 

 . . .. .. .. . . . .. 
 .. .. . . . . 
1 m
φn · · · φn Ln 1 Ln n · · · Ln n
Para cada um dos pontos estacionários com restrição e correspondentes multiplicado-
res de Lagrange, devemos calcular uma sequência de menores principais:

H m+1 , H m+2 , ..., H n = H
onde
φ11 φ12 ··· φ1m+1


.. .. ..

0m×m . . ··· .


φm φm ··· φm

1 2 m+1
H m+1 = φ11 ··· φm L11 L12 ··· L1 m+1

1
(ordem: m+(m+1)) φ12 ··· φm L21 L22 ··· L2 m+1

2 ,
.. .. .. .. .. ... ..

. . . . . .

φ1m+1 ··· φmm+1 Lm+1 1 Lm+1 2 ··· Lm+1 m+1


H m+2 , ..., H n = H
(ordem: m+(m+2)) (ordem: m+n))

As conclusões resultarão depois do seguinte teorema.


Teorema 39. Seja P um ponto estacionário com restrições de L.

1. Uma condição suficiente para que exista MÍNIMO de f em P é que



H m+1 , H m+2 , ..., H n = H

tenham todos o mesmo sinal de (−1)m .


2. Uma condição suficiente para que exista MÁXIMO de f em P é que

H m+1 , H m+2 , ..., H n = H

tenham sinal alternadamente positivo e negativo, começando em


H m+1 , com o sinal de (−1)m+1 .

210 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Nota 44. Sendo uma condição suficiente, este resultado pode ser inconclusivo. De facto,
pode acontecer que não se verifique nenhum dos pressupostos do teorema e exista extremo
no ponto estacionário em causa.

Exemplo 98 (conclusão). Regressemos ao problema do Exemplo 96. Vamos aplicar o


resultado acima para classificar os pontos estacionários com restrição
1 1
P (−1, −2) , λ = e Q (1, 2) , λ = − .
2 2
Como m = 1 e n = 2, temos m + 1 = 2 = n, pelo que, na sequência de menores
principais formados a partir da matriz hessiana orlada, há um único menor a considerar:

0 φx φ y


H 2 = H = φx Lx2 Lxy .

φy Lxy Ly2

Ora,

φx (x, y) = 2x, φy (x, y) = 2y, Lx2 (x, y) = 2λ = Ly2 (x, y) e Lxy (x, y) = 0 = Lyx .

pelo que a matriz hessiana orlada é:


 
0 2x 2y
H =  2x 2λ 0 
2y 0 2λ

Assim,

0 −2 −4 0 2 4

H
(P )
= −2 1 0 = −20 < 0 e H
(Q)
= 2 −1 0 = 20 > 0.

−4 0 1 4 0 −1

De acordo com o teorema, f (P ) e f (Q) são, respectivamente, mı́nimo e máximo do


problema com restrição. Os seus valores são, respectivamente, −5 e 5. 

Exercı́cio 37. Para cada um dos seguintes casos, construa a cadeia de menores e indique
as condições suficientes para a existência de extremo.

(i) n = 5 e m = 2 ; (ii) n = 4 e m = 1 ; (iii) n variáveis e uma restrição.

Exemplo 99. Extreme f tal que f (x, y, z) = 2x+y−2z, sujeita à restrição x2 +y 2 +z 2 =


9.
Resolução: A função lagrangeana é:

L (x, y, z) = f (x, y, z) + λφ (x, y, z) = (2x + y − 2z) + λ x2 + y 2 + z 2 − 9 .



2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS211

Os pontos estacionários com restrição resultam do sistema:


 

 L x (x, y, z) = 0 
 2 + 2λx = 0
Ly (x, y, z) = 0 1 + 2λy = 0
 
⇐⇒

 Lz (x, y, z) = 0 
 −2 + 2λz = 0
 2 2 2  2
x +y +z =9 x + y2 + z2 = 9

cujas soluções são:

1 1
P (−2, −1, 2) , λ = ∨ Q (2, 1, −2) , λ = − .
2 2
Como

Lx2 = Ly2 = Lz2 = 2λ, Lxy = Lxz = Lyz = 0, φx = 2x, φy = 2y, φz = 2z,

a matriz hessiana orlada é:


 
0 2x 2y 2z
 2x 2λ 0 0 
H=
 2y
.
0 2λ 0 
2z 0 0 2λ

Nos pontos P e Q temos:


   
0 −4 −2 4 0 4 2 −4
 −4 1 0 0   4 −1 0 0 
H(P ) =  −2
 e H(Q) =  .
0 1 0   2 0 −1 0 
4 0 0 1 −4 0 0 −1

Dado
que n = 3 e m = 1, na sequência de menores principais, há que calcular H 2 e
H 3 . Para os pontos P e Q, respectivamente, temos:

0 −4 −2


H 2 (P ) = −4 1 0 = −20 < 0,

−2 0 1

0 −4 −2 4

−4 1 0 0
H 3 (P ) = H = = −36 < 0
−2 0 1 0

4 0 0 1
e
0 4 2


H 2 (Q) = 4 −1 0 = 20 > 0,

2 0 −1
212 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

0
4 2 −4

H 3 (Q) = H = 4 −1 0 0

= −36 < 0.
2
0 −1 0
−4 0 0 −1
Atendendo à variação de sinais, P e Q são, respectivamente, minimizante e maximizante
do problema de extremos condicionados. Os valores mı́nimo e máximo são:

f (P ) = −9 e f (Q) = 9,

o que conclui o exemplo. 


2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS213

FOLHA DE EXERCÍCIOS E PROBLEMAS N.o 8


EXTREMOS LIVRES
1. Determine os extremos relativos das funções reais de duas variáveis reais definidas
pelas expressões seguintes.

(a) f (x, y) = x3 + y 3 − 3x − 12y + 20.


64 64
(b) f (x, y) = xy + + .
x y
(c) f (x, y) = 2y 3 + x2 y + x2 + 5y 2 .
(d) f (x, y) = x2 + y 3 − 6xy − 39y + 18x + 20.
(e) f (x, y) = −x3 + 4xy − 2y 2 + 1.
(f) f (x, y) = (x + y) e−(x +y ) .
2 2

(g) f (x, y) = (x2 + y 2 ) ex+y .


(h) f (x, y) = 2x3 + 6y 3 − 6xy 2 + 15y 2 (sugestão: calcule f (δ, 0) para analisar o
caso duvidoso).
(i) f (x, y) = x3 +y 3 −x2 y−xy 2 (sugestão: mostre que f (x, y) = (x + y) (x − y)2
e analise os casos duvidosos a partir desta expressão).
(j) f (x, y) = x4 − x2 y 2 − y 4 (sugestão: para o caso duvidoso, determine f (δ, 0)
e f (0, δ).

2. Determine os extremos relativos das funções reais de três variáveis reais definidas
pelas seguintes expressões.

(a) f (x, y, z) = xyz − 12 x2 − 2y 2 + 2z.


(b) f (x, y, z) = x2 + y 2 + z 2 − 6xy + 8xz − 10yz.
(c) f (x, y, z) = x4 + 2y 3 + 3z 2 + 20x − 18y + 12z.
(d) f (x, y, z) = −3x2 − y 3 − z 2 + 3xy + 2z.
 π
3. Mostre que a função definida por z = xex+sin y tem um mı́nimo relativo em −1, .
2
4. Suponha que uma empresa monopolista na produção e venda de três produtos tem
as seguintes funções de receita total (RT ) e custo total (CT ):

RT = R1 + R2 + R3 , onde Ri designa a receita do produto i, i = 1, 2, 3

CT = 20+15Q, onde Q = Q1 +Q2 +Q3 designa a quantidade do produto i, i = 1, 2, 3.


214 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Atendendo a que
R1 = 63Q1 − 4Q21 , R2 = 105Q2 − 5Q22 e R3 = 75Q3 − 6Q23 ,
verifique em que condições a empresa maximiza o seu lucro.

EXTREMOS CONDICIONADOS
1. Suponha que a utilidade total, U , de um consumidor obtida a partir dos bens X e Y
é dada pela função a seguir definida:
U (x, y) = (x + 2) (y + 1) ,
onde x e y designam, respectivamente, as quantidades x e y dos produtos X e Y .
Calcule o equilı́brio para o consumidor, atendendo a que este pretende maximizar a
sua utilidade sujeita à sua restrição de rendimento, dada por
2x + 5y = 51.

2. Considere que um determinado consumidor confere aos bens X e Y a utilidade


representada pela função U tal que
U (x, y) = xy + 2x,
onde x e y designam, respectivamente, as quantidades x e y dos produtos X e Y .
Atendendendo a que os preços unitários dos bens X e Y são, respectivamente, 4 e 2
e sabendo que o rendimento disponı́vel do consumidor é de 60 unidades monetárias,
como pode este optimizar a sua utilidade na compra dos referidos bens? Calcule os
respectivos valores e justifique a sua resposta.
3. Maximize a função f tal que f (x, y) = 60x − 3x2 − 2xy − 2y 2 + 40y, sujeita a
x ≥ 0, y ≥ 0 e x + y ≤ 8. (Nota: comece por esboçar a região admissı́vel).
x2 y 2
4. Determine os extremos da função definida por x2 +y 2 , sujeita à restrição + =
4 5
1. Dê uma interpretação geométrica do resultado.
5. Determine os extremos da função definida por z = 2xy ao longo da curva de
equação x2 + y 2 = 4.
6. Determine o ponto da superfı́cie z = x2 + y 2 que se encontra à distância mı́nima
do ponto (3, −6, 4).
7. Quais as dimensões do paralelepı́pedo retângulo de maior volume que pode inscrever-
se na esfera de equação x2 + y 2 + z 2 = 1 ?
8. Uma caixa rectangular, aberta no topo, deve ter um volume de 32 cm3 . Quais as
dimensões da caixa por forma a que a sua área total seja mı́nima?
9. Determine os extremos da função definida por z = 4x2 + y 2 , sujeita à restrição
4x2 + 2xy + y 2 = 3.
2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS215

Apêndice 2.1 [Secções cónicas]

Toda a equação da forma

Ax2 + Bxy + Cy 2 + Dx + Ey + F = 0, A, B, C, D, E, F ∈ R

representa uma secção cónica (ou, simplesmente, cónica), que é a intersecção entre um
duplo cone e um plano, como se ilustra nas figuras seguintes. As cónicas desempenham
um papel fundamental no estudo do comportamento de funções de uma e de duas variáveis
na vizinhança de um ponto genérico.

As figuras mostram que quando o plano não passa pelo vértice do cone há três cónicas
não degeneradas básicas: a parábola, a elipse e a hipérbole - e ainda a circunferência, a
qual pode ser vista como um caso particular da elipse.
Quando o plano passa no vértice do cone, a cónica assume uma das três formas de-
generadas seguintes: um ponto, um recta ou um par de rectas concorrentes.
216 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

A equação da cónica pode sempre ser transformada numa das três formas canónicas
(ou reduzidas), fazendo desaparecer o termo em xy mediante uma rotação do sistema de
eixos coordenados. Este processo é descrito por uma técnica da Álgebra Linear.
Quando nenhum dos coeficientes de x2 ou de y 2 se anula, uma translação dos eixos
pode eliminar então os termos de grau um em x e em y, originando uma das seguintes
formas
x2 y 2 x2 y 2
+ = 1 ou − 2 = 1,
a2 b2 a2 b
onde a e b são constantes reais positivas. Se algum dos coeficientes de x2 ou de y 2 se tiver
anulado, e digamos que tal sucedeu com o de y 2 , o termo de grau um na outra variável
pode ser eliminado através de uma translação, dando origem a uma equação da forma:

x2 = 4ay.

Para entender estes procedimentos em mais detalhe, consulte [2].


Cada uma das três cónicas básicas pode ser caracterizada geometricamente através
do caminho descrito por um ponto P genérico, de coordenadas (x, y), movendo-se de tal
modo que
PF
= ε, (2.22)
d(P, d)
onde F é um ponto fixo, dito foco da cónica, e d uma recta, dita directriz. A constante ε,
neste contexto, é conhecida por excentricidade da cónica.
Pela escolha conveniente da posição do foco e da directriz, podemos obter as cónicas
na posição canónica.
Caso (i): ε = 1. Escolha-se para d a recta de equação y = −a e F o ponto (0, a).
De (2.22) vem:
2
P F = [d(P, d)]2
⇔ x2 + (y − a)2 = (y + a)2
⇔ x2 + y 2 − 2ay + a2 = y 2 + 2ay + a2
⇔ x2 = 4ay.
A equação reduzida da parábola é pois

x2 = 4ay.
2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS217

a
Caso (ii): 0 < ε < 1. Escolha-se para d a recta de equação x = e F o ponto
ε
(aε, 0). Note que
a
q
d(P, d) = − x e P F = (x − aε)2 + y 2
ε
De (2.22) vem:
2 2
P F = ε2 [d(P,
 2 d)] 
2 2 2 a a 2
⇔ (x − aε) + y = ε −2 x+x
ε2 ε
⇔ x2 − 2aεx + a2 ε2 + y 2 = a2 − 2aεx + ε2 x2
⇔ x2 (1 − ε2 ) + y 2 = a2 (1 − ε2 )
x2 y2
⇔ + =1
a2 a2 (1 − ε2 )

Como 0 < ε < 1, b2 = a2 (1 − ε2 ) > 0, pelo que a equação assume a forma

x2 y 2
+ 2 = 1,
a2 b
que é a equação reduzida de uma elipse centrada na origem. Note que, como a figura
ilustra, por simetria existe uma par foco-directriz alternativo, dado por F 0 e d0 .

Por último, quando ε → 0, a elipse tende para a circunferência, pelo que esta pode ser
vista como uma cónica de excentricidade nula.
218 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

a
Caso (iii): ε > 1. Como no caso anterior, escolha-se para d a recta de equação x =
ε
e F o ponto (aε, 0). Note que a equação obtida será a mesma, i.e.,

x2 y2
+ = 1.
a2 a2 (1 − ε2 )

Contudo, como ε > 1, conclui-se que a2 (1 − ε2 ) < 0. Tome-se

b2 = a2 ε2 − 1 = −a2 1 − ε2 .
 

Então a equação assume a forma

x2 y 2
− 2 = 1,
a2 b
que consiste na equação reduzida da hipérbole. Rearranjando a equação, vem:

y2 b2 b2 b2
  
y b y b
− = − ⇔ − + = − .
x 2 a2 x2 x a x a x2

Isto significa que quando x → +∞ ou quando x → −∞ a hipérbole aproxima-se de:


  
y b y b
− + =0
x a x a

ou seja, das rectas de equação

b b
y = − x ∨ y = x,
a a
assı́ntotas oblı́quas da hipérbole.
2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS219

Deixamos por fim um quadro que resume as equações reduzidas das cónicas não de-
generadas e suas caracterı́sticas principais.
Cónica Equação reduzida Caracterı́sticas principais
vértice da parábola: (α, β)
eixo de simetria: x
= α
parábola y − β = k (x − α)2 , k 6= 0
para cima, se k > 0;
sentido da concavidade:
para baixo, se k < 0.
vértice da parábola: (α, β)
eixo de simetria: y=β
parábola x − α = k (y − β)2 , k 6= 0 
para a direita, se k > 0;
sentido da concavidade:
para a esquerda, se k < 0.
centro: (α, β)
(x − α)2 (y − β)2
elipse 2
+ = 1, a, b ∈ R+ vértices: (α − a, β) , (α + a, β) , (α, β − b) e (α, β + b)
a b2 eixos de simetria: x = α e y = β
centro: (α, β)
circunferência (x − α)2 + (y − β)2 = r2 , r ∈ R+
raio: r
centro: (α, β) vértices: (α − a, β) e (α + a, β)
(x − α)2 (y − β)2 eixos de simetria: x=αey =β
hipérbole − = 1, a, b ∈ R+
a2 b2 b
assı́ntotas oblı́quas: y − β = ± (x − α)
a
centro: (α, β) vértices: (α, β − b) e (α, β + b)
(y − β)2 (x − α)2 eixos de simetria: x=αey =β
hipérbole − = 1, a, b ∈ R+
b 2 a2 b
assı́ntotas oblı́quas: y − β = ± (x − α)
a

Figura 2.2: Parábolas com eixo de simetria vertical num plano XOY .

Figura 2.3: Parábolas com eixo de simetria horizontal num plano XOY .
220 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

Figura 2.4: Circunferência e elipse num plano XOY .

Figura 2.5: Hipérboles num plano XOY .


2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS221

Apêndice 2.2 [Classificação de formas quadráticas]


Chamamos forma algébrica de grau r nas variáveis x1 , ..., xn a toda a aplicação
Q : Rn −→ R definida por:
X
Q (x1 , ..., xn ) = ai xp11 xp22 ...xpnn (no finito de parcelas)
i

tal que
p1 + ... + pn = r.
As formas algébricas com r = 1, r = 2, r = 3, r = 4, etc, dizem-se, respectivamente,
lineares, quadráticas, cúbicas, de grau 4, etc. Podem ainda designar-se por unárias,
binárias, ternárias, etc, quanto ao número de variáveis.

Classificação de Formas Quadráticas

Caso n = 2: Admitamos que estamos na presença de uma forma quadrática binária, Q,


nas variáveis x e y. Então:
  
2 2
 a11 a12 x
= X T AX.

Q (x, y) = a11 x + 2a12 xy + a22 y = x y
a12 a22 y

A classificação de uma forma quadrática diz respeito ao sinal que Q (x, y) pode to-
mar consoante os valores de x e de y, e depende do determinante da matriz simétrica
A: ∆ = det A.

1. Se Q (x, y) > 0 excepto para x = y = 0, a forma é dita definida positiva.


Uma condição necessária e suficiente para que isto aconteça é que

∆ > 0 e a11 > 0.

2. Se Q (x, y) < 0 excepto para x = y = 0, a forma é dita definida negativa.


Uma condição necessária e suficiente para que isto aconteça é que

∆ > 0 e a11 < 0.

3. Se Q (x, y) ≥ 0, ∀x,y∈IR , a forma é dita semi-definida positiva. Uma condição


necessária e suficiente para que isto aconteça é que

∆ = 0 e a11 > 0.

4. Se Q (x, y) ≤ 0, ∀x,y∈IR , a forma é dita semi-definida negativa. Uma


condição necessária e suficiente para que isto aconteça é que

∆ = 0 e a11 < 0.
222 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN

5. Se Q (x, y) toma valores positivos, negativos e nulos consoante os valores que


dermos às variáveis, a forma é dita não definida. Uma condição necessária e
suficiente para que isto aconteça é que

∆<0.

Caso n qualquer: Admitamos agora que estamos na presença de uma forma quadrática
Q, nas variáveis x1 , ..., xn . Então:

Q (x1 , ..., xn ) = a11 x21 + a22 x22 + ... + ann x2n + 2a12 x1 x2 + ... + 2an−1 n xn−1 xn
  
a11 a12 · · · a1n x1
 a12 a22 · · · a2n   x2 
  
= X T AX

= x1 x2 · · · xn  .. .. ... . .
..   .. 
 
 . . 
a1n a2n · · · ann xn

Analogamente, a classificação de Q depende de ∆, determinante da matriz simétrica


A (mas não só). Comecemos por definir uma sequência de menores principais,
como se segue:

a11 a12 a13
a a
∆1 = a11 ; ∆2 = 11 12 ; ∆3 = a12 a22 a23 ;

a12 a22 a13 a23 a33
..
.
a11 a12 · · · a1n

a12 a22 · · · a2n
∆n = ∆ = .. .. .

.. . .
. . . .

a1n a2n · · · ann

1. Se Q (x1 , ..., xn ) > 0 excepto para x1 = ... = xn = 0, a forma é dita definida


positiva. Uma condição necessária e suficiente para que isto aconteça é que

∆p > 0, p = 1, 2, ..., n.

2. Se Q (x1 , ..., xn ) < 0 excepto para x1 = ... = xn = 0, a forma é dita definida


negativa. Uma condição necessária e suficiente para que isto aconteça é que

∆1 < 0, ∆2 > 0, ∆3 < 0, ..., (−1)p ∆p > 0, p = 1, 2, ..., n.

3. Se Q (x1 , ..., xn ) ≥ 0, ∀x1 ,...,xn ∈IR , a forma é dita semi-definida positiva.


Uma condição necessária e suficiente para que isto aconteça é que

∆ = 0 e ∆p ≥ 0, p = 1, 2, ..., n − 1.
2.7. EXTREMOS CONDICIONADOS DE FUNÇÕES REAIS DE N VARIÁVEIS REAIS223

4. Se Q (x1 , ..., xn ) ≤ 0, ∀x1 ,...,xn ∈IR , a forma é dita semi-definida negativa.


Uma condição necessária e suficiente para que isto aconteça é que

∆ = 0 e (−1)p ∆p ≥ 0, p = 1, 2, ..., n − 1.

5. Se Q (x1 , ..., xn ) toma valores positivos, negativos e nulos consoante os va-


lores que dermos às variáveis, a forma é dita não definida. Uma condição
necessária e suficiente para que isto aconteça é que a variação de sinais de ∆p
não esteja em nenhum dos casos anteriores.
224 CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL DE FUNÇÕES DEFINIDAS EM RN
Bibliografia

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