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Leão Dehon

ANO COM O SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS

Volume II

Abril – Maio – Junho

Tradução do P. José Jacinto Ferreira de Farias MÊS DE


Onde haveríamos de encontrar tanta bondade, doçura, piedade, caridade? Vamos ter
com José constantemente, como à escola e à fonte das virtudes.
Colóquio com S. José.

MÊS DE MAIO
MÊS DE MARIA E DO ESPÍRIO SANTO
Duas meditações para o retiro do mês
I. VIDA DE PUREZA A EXEMPLO DE MARIA
26 In mense autem sexto missus est 6 No sexto mês, foi o anjo Gabriel
angelus Gabrihel a Deo in civitatem Galilaeae enviado, da parte de Deus, para uma cidade
cui nomen Nazareth 27 ad virginem da Galileia, chamada Nazaré, 27 a uma
desponsatam viro cui nomen erat Ioseph de virgem desposada com certo homem da casa
domo David et nomen virginis Maria (Lc 1, 26- de David, cujo nome era José; a virgem
27). chamava-se Maria (Lc 1, 26-27).
Primeiro Prelúdio. – Verei Maria ajoelhada e rezando nas disposições mais puras, quando o anjo
Gabriel vem visitá-la.
Segundo Prelúdio. – Pela virgindade de Maria, ó Jesus, apagai todas as manchas do meu
coração, purificai-me e conservai-me doravante na pureza.
PRIMEIRO PONTO: Da pureza. – A pureza tem as suas exigências, mesmo para as
pessoas do mundo. Elas não entrarão no Reino dos céus, se não conservarem a pureza segundo
o seu estado, ou se pelo menos não tiverem reparado as suas faltas pela penitência.
«Como é bela, diz o Livro da Sabedoria, a geração casta! A sua glória não há-de
perecer, será honrada por Deus e pelos homens» (Sab 4,1). O que provocava este grito de
admiração era a vista daqueles que, no meio deste mundo corrompido, seja qual for a sua
vocação, guardam o seu coração na inocência e na pureza.
Mas o apóstolo S. João é tomado de uma admiração ainda mais profunda, quando
contempla no céu aqueles que, não contentes por guardarem o seu coração puro de toda a
corrupção, permaneceram virgens. Exclama: «Tive uma visão: O Cordeiro estava de pé sobre o
monte Sião; e à volta dele havia cento e quarenta e quatro mil eleitos que cantavam um cântico
novo; e estes seguem o Cordeiro para onde quer que vá, porque são virgens» (Ap 14,1).
Para entrar no céu, é preciso, portanto, pertencer à geração dos castos, / 500 mas para
fazer parte no céu do coro íntimo do Salvador, é preciso ser do número das almas virgens.
Felizes as almas generosas e vigilantes que escutam o apelo do esposo divino: Ecce
sponsus venit, e se levantam logo para o seguirem! Dá-los-á entrar no festim nupcial.
Repousarão sobre o seu Coração.
SEGUNDO PONTO: O divino modelo das virgens. – Margarida Maria consolava-se a
ver na brancura da hóstia um símbolo da pureza eminente da divina Vítima. Jesus tinha querido
que o seu amor pela pureza fosse simbolizado pela brancura dos cordeiros que o representavam
na antiga lei. Quis assim que esta pureza fosse recordada pela brancura da hóstia.
«Esta brancura nos ensina, dizia ela, que é preciso ser uma vítima pura para ser imolada
a Jesus; uma vítima sem mancha para o possuir; uma vítima pura de corpo, de coração, de
intenção e de afecto».
Jesus não pode admitir uma vítima que não tenha esta pureza completa. Podemos
imaginar quanto Nosso Senhor deve desejar para nós a pureza de coração, de pensamento e de
intenção segundo as exigências da antiga lei relativamente à pureza e à brancura dos cordeiros
do sacrifício.
O bom Mestre servia-se ainda de uma outra comparação numa das suas conversas com a
Bem-aventurada: «Conserva em pureza o templo do Senhor, dizia-lhe, e Deus te assistirá com
uma especial presença de protecção e de amor». É o nosso coração que se torna o templo do
Senhor pela comunhão. Nosso Senhor quer permanecer neste templo por uma presença especial
de amor e de benevolência, mas quer para isso que este templo seja perfeitamente puro, isento
de toda a mancha e ornado com as melhores disposições.
Sabemos que longas e solenes cerimónias de consagração ordenou para o templo de
Jerusalém e que purificações a Igreja exige para a consagração dos nossos templos.
Quereria então Deus menos pureza nos nossos corações?
TERCEIRO PONTO: Meios a empregar para conservar a pureza. – Margarida Maria
ensina-os e deu o exemplo.
O primeiro é amar a vida de retiro e manter-se afastado do mundo. E por isso é preciso
evitar as conversas mundanas, as leituras perigosas ou inúteis. É preciso mesmo guardar-se do
amor excessivo da família, interessando-se, sobretudo pela oração, pela salvação dos teus.
O segundo meio é a penitência com uma vida mortificada. - «Ó meu Deus, dizia a Bem-
aventurada, destes-me a conhecer que o vosso Sagrado /501 Coração tendo-me gerado no
Calvário com tanta dor, a vida que aí me havíeis dado não podia alimentar-se senão pelo
alimento da cruz, a qual seria o meu manjar delicioso1». Amava o jejum e a disciplina, para pôr
a sua virgindade em segurança, como no meio de uma sebe de espinhos (Vol.1, 580).
Um terceiro meio é a devoção para com a Santíssima Virgem. É ela quem nos há-de
conservar na fidelidade ao seu divino Filho. «Um dia, diz a Bem-aventurada, o meu Salvador
disse-me: «Escolhi-te para minha esposa e prometemo-nos fidelidade… e depois coloquei-te em
depósito nas mãos da minha santa Mãe».
Finalmente, o meio mais eficaz é o amor pela Eucaristia e pelo Sagrado Coração.
«Desde que Jesus me prometeu salvaguardar a minha castidade, diz a Bem-aventurada, toda a
minha inclinação foi de ir para o Santíssimo Sacramento» (Sa vie, 304).
Resoluções. – A minha resolução será tomar estes quatro meios para guardar a pureza e
particularmente ligar-me a Jesus, o mais belo, o mais rico, o mais perfeito de todos os amigos
(Margarida Maria).
Colóquio com a Santíssima Virgem.

II. A MORTE DA SANTA VIRGEM


8 Adiuro vos filiae Hierusalem si 8 Conjuro-vos, ó filhas de Jerusalém, se
inveneritis dilectum meum ut nuntietis ei quia encontrardes o meu amado, que lhe direis? Que
amore langueo (Cant 5,8). desfaleço de amor (Cant 5,8).
Primeiro Prelúdio. – Ver em Jerusalém, no cenáculo, a incomparável Mãe de Deus, vivendo
perto do tabernáculo e já no céu, pelo desejo e pelo mérito. Como ela desfalecia de amor, estando os
apóstolos junto dela, a sua alma elevou-se ao céu, para junto do seu Bem-amado.
Segundo prelúdio. Que a minha alma morra com a morte dos justos (Num 3).
PRIMEIRO PONTO: A espera. – Porque é que o Salvador que tinha tanto afecto pela
sua santa Mãe, ao subir ao céu, não a levou consigo para a recompensar dos seus méritos e dos
seus sofrimentos incomparáveis?... Porque é que a deixou ainda durante vinte e três anos longe

1
Vie par elle même, 291.
de si, o seu único amor, e no meio das misérias desta vida?... Porquê? Por ela mesma, pela
Igreja e por nós. /502
Por ela mesma, a fim de que ela pudesse ainda acumular méritos inumeráveis e
embelezar definitivamente a sua coroa… Pela Igreja nascente, a fim de lhe deixar uma Mãe
para a educar, uma Mestra para a instruir, uma Rainha para a encorajar e a fortificar no meio das
perseguições dos Judeus e dos Gentios.
Maria sustém os apóstolos, descobre aos evangelistas os segredos da vida escondida do
seu Filho, anima os primeiros mártires, inspira às virgens e às viúvas os celestes atractivos da
pureza. É a alma dos trabalhadores evangelistas e dos novos convertidos, a regra dos bons
costumes, a inspiradora da piedade…
Mas porquê ainda este atraso? – Por nós; para que nos ensine a viver e a morrer bem;
para que nos apareça como um modelo perfeito e fiel do seu divino Filho, mais acessível à
nossa fraqueza e à nossa imitação do que o tipo sobre eminente do Deus-Mártir. Pura criatura,
mulher forte e viril por excelência, ela será o ideal e o exemplo da santidade até aos últimos dias
de uma longa vida. Não tem desencorajamento na mais dolorosa das separações, a do seu divino
Filho; mas de pé, sempre firme e intrépida, virgem, apóstolo, confessor, ela nos precede no
caminho real da oração, do trabalho, do sofrimento e do apostolado.
Onde é que me encontro neste caminho?... É a condição de uma boa morte.
SEGUNDO PONTO: As condições do triunfo. – A morte é o soldo do pecado (Rom 6).
A Virgem imaculada, Mãe de Deus, era digna de não morrer; mas o seu divino Filho, que se
tinha carregado com os pecados do mundo, morrera; Maria ia morrer para pagar o seu tributo à
natureza e para se unir ao sacrifício do seu divino Filho.
Em que condições morria para ir direita ao céu partilhar a glória do seu divino Filho?
Na disposição do mais perfeito abandono à vontade divina e do mais inteiro desapego das coisas
da terra.
Ela elevar-se-á ao céu como uma pomba toda branca de pureza, como uma chama toda
bruxuleante de amor. É assim que a tradição, desenvolvida pela piedade dos oradores sagrados,
nos representa este santo trespasse.
Chegada à idade de setenta e dois anos, Maria vivia na casa do Cenáculo. Rezava pela
propagação do Evangelho. O anjo Gabriel veio da parte do Senhor anunciar-lhe que o momento
da recompensa estava próximo. Como no dia da anunciação, ela pronuncia o seu Ecce ancilla!
Reitera o sacrifício da sua vida que fez tantas vezes. /503Deixa a suas duas túnicas aos fiéis que a
tinham assistido.
Nosso Senhor dispôs os acontecimentos para que os apóstolos estejam presentes. S.
Pedro oferece o sacrifício eucarístico e dá a comunhão a Maria.
Depois ela inclina-se sobre o seu leito e com o coração abrasado de amor repete as
últimas palavras do seu Filho: «Meu Deus, coloco a minha alma nas vossas mãos». A sua alma
desprende-se do seu corpo pela veemência do amor divino, para ser transportada no seio de
Deus para o lugar da felicidade eterna.
A minha vida encaminha-se para este fim? Qual é o meu desapego? Qual é o meu
fervor?
TERCEIRO PONTO: Quem se humilha será glorificado. – Aqui está o princípio da
glória de Maria. Ela foi totalmente humilde diante de Deus, e a humildade é a fonte de todas as
graças e da glória do céu.
A doutrina espiritual ensina-nos os graus da humildade: a obediência aos preceitos
divinos que é o grau mais elementar; a obediência aos conselhos, se a eles sou chamado; o amor
pelas humilhações, se quero seguir mais plenamente a Jesus, unir-me ao seu divino Coração e
contribuir com ele para a salvação das almas.
Maria foi a humildade mesma, e Deus olhou com amor e cumulou com as suas graças a
sua humilde serva.
Onde me encontro, a respeito dos preceitos, dos conselhos, das humilhações?
Resoluções. – Ó Maria, não posso seguir-vos até aos mais elevados cumes da virtude,
mas é preciso, no entanto, que eu caminho sobre os vossos passos, se quero ir para o céu. É
preciso que eu pratique o desapego, a pureza, a humildade. Peço-vos que me obtenhais esta
graça.
Colóquio com Maria no dia da sua morte.

01 de Maio
S. FILIPE E S.TIAGO
17 Quae autem desursum est sapientia 17 A sabedoria, porém, lá do alto é,
primum quidem pudica est deinde pacifica modesta primeiramente, pura; depois, pacífica, indulgente,
suadibilis plena misericordia et fructibus bonis non tratável, plena de misericórdia e de bons frutos,
iudicans sine simulatione 18 fructus autem iustitiae imparcial, sem fingimento. 18 Ora, é em paz que se
in pace seminatur facientibus pacem (Tg 3, 17-18). semeia o fruto da justiça, para os que promovem a
paz (Tg 3, 17-18).
Primeiro Prelúdio. S. Filipe e S. Tiago foram dois apóstolos bem caros a Nosso Senhor. S.
Tiago, descrevendo aqui a sabedoria cristã, pinta-nos o seu próprio coração.
Segundo Prelúdio. Santos apóstolos, obtende-me a amizade de Nosso Senhor.
PRIMEIRO PONTO. S. Filipe, o amigo familiar de Nosso Senhor. – S. Filipe, de
Betsaida, foi um dos primeiros discípulos de Nosso Senhor. Jesus, tendo-o encontrado desde os
primeiros dias da sua vida pública, diz-lhe: «Segue-me». Filipe seguiu-o imediatamente e levou-
o a um dos seus amigos, Natanael.
Filipe mereceu, pela sua simplicidade e pela sua rectidão, ser um dos discípulos mais
familiares de Nosso Senhor. Quando Jesus multiplicou os pães no deserto, foi a Filipe que
perguntou onde poderiam comprar pães para alimentarem uma multidão tão considerável.
Quando Nosso Senhor fez a sua entrada triunfal em Jerusalém, alguns dias antes da sua
Paixão, pagãos dirigiram-se a Filipe e disseram-lhe que gostavam de ver Jesus. Filipe falou
deles a André e os dois apresentaram estes pagãos ao Salvador.
No momento da última Ceia, Filipe pediu a Nosso Senhor para lhes mostrar o Pai. Jesus
respondeu-lhe: «Quem me vê, vê o meu Pai», porque o Pai e o Filho são um só.
S. Filipe morreu sobre a cruz na Frígia depois de vinte anos de apostolado. Eu também
posso obter a amizade familiar de Nosso Senhor, se trabalhar constantemente na minha união
com o Sagrado Coração. /506
SEGUNDO PONTO: S. Tiago, irmão do Senhor. – Chamavam-no Tiago, o justo, ou
Tiago, o menor, para o distinguirem de S. Tiago, o maior, irmão de S. João. Chamavam-no
também muitas vezes o irmão do Senhor, porque era parente de Nosso Senhor.
Diz-se que tinha no rosto traços impressionantes de semelhança com o divino Salvador.
Era o irmão de S. Judas que também foi apóstolo.
Depois do Pentecostes, foi nomeado bispo de Jerusalém. Era austero como S. João
Baptista e doce como o bom Mestre. Durante toda a sua vida, absteve-se de carne; não bebia
senão água e não usava sandálias. Tinha um manto grosseiro e uma só túnica. Passava longas
horas em oração e de joelhos.
Tomou a palavra no concílio de Jerusalém para pedir que não se inquietasse os Judeus
convertidos a respeito das práticas mosaicas e que não se obrigasse os pagãos a seguirem estas
práticas.
Era venerado de todos, mesmo de muitos Judeus. S. Pedro manda-o avisar a respeito a
sua libertação da prisão. S. Paulo vai visitá-lo.
O irmão do Senhor é para todos um conselheiro espiritual.
Confessou altamente a divindade de Nosso Senhor e o Sinédrio condenou-o à morte,
como tinha condenado Jesus. S. Tiago morreu como o seu bom Mestre pedindo pelos seus
algozes e dizendo a Deus: «Perdoai-lhes, Senhor, porque não sabem o que fazem».
Se quero que o meu apostolado seja fecundo, como o de S. Tiago, é preciso que eu
confesse Nosso Senhor não só com as minhas palavras, mas também pela prática de todas as
virtudes cristãs.
TERCEIRO PONTO: Conselhos de sabedoria. – S. Tiago deixou-nos a sua bela
epístola dirigida a todas as Igrejas.
Nela descreve, de um modo luminoso, a vida cristã, tal como a praticava diariamente.
Estabeleceu a necessidade das boas obras, recomenda a constância nas provações, a caridade
para com o próximo, o bom uso da língua. Fala do sacramento da extrema-unção, que se dá aos
doentes.
Resume toda a vida cristã sob o nome de sabedoria que vem do alto, como S. Paulo a
resumiu sob o nome de caridade.
«A sabedoria é casta, diz, é modesta, pacífica, dócil aos sábios conselhos, cheia de
misericórdia, dedicada às boas obras. Evita os juízos temerários, as mentiras, a duplicidade. É
sobretudo amiga da paz interior e do recolhimento que são a condição para escutar a voz de
Deus e para praticar a justiça na pureza de intenção». /507
Sim, é na paz interior, na união com o Sagrado Coração, que poderei praticar a vida de
amor e de reparação que Nosso Senhor espera de mim. A modéstia, o recolhimento e a
humildade vão preparar-me para isso.
Resoluções. – Admiro a amizade familiar de S. Filipe e de S. Tiago com Nosso Senhor,
mas esta amizade não me é interdita, ao contrário, ela é-me oferecida por Nosso Senhor. Não
apelou ele muito especialmente à devoção ao seu Sagrado Coração? É para fazer de mim um
amigo íntimo, um apóstolo, um discípulo amoroso e amado.
Colóquio com os dois santos apóstolos.

02 de Maio
DA UNIÃO AOS SANTOS CORAÇÕES DE JESUS E DE MARIA
SEGUNDO O R. P. EUDES
23 Et hoc est mandatum eius ut credamus 23 Ora, o seu mandamento é este: que
in nomine Filii eius Iesu Christi et diligamus creiamos em o nome de seu Filho, Jesus Cristo, e
alterutrum sicut dedit mandatum nobis 24 et qui nos amemos uns aos outros, segundo o
servat mandata eius in illo manet et ipse in eo et in mandamento que nos ordenou. 24 E aquele que
hoc scimus quoniam manet in nobis de Spiritu guarda os seus mandamentos permanece em Deus,
quem nobis dedit (1Jo 3, 23-24). e Deus, nele. E nisto conhecemos que ele
permanece em nós, pelo Espírito que nos deu (1Jo
3,23-24).
Primeiro Prelúdio. Jesus permanece em nós pelo Espírito Santo, mas quanto mais ainda em
Maria. Os Corações de Jesus e de Maria não fazem mais do que um só.
Segundo Prelúdio. – Permanecei no meu coração, ó Jesus, por Maria e em Maria.
PRIMEIRO PONTO: O Coração de Jesus é a fonte da nossa vida sobrenatural. – Jesus
comunica-nos a sua vida divina unindo-se a nós pela graça: «Eu sou a vida, diz, e vim para a
espalhar nas almas» (Jo 10, 10). - «Eu vivo e vós viveis da minha própria vida» (Jo 4, 19). -
«Quem tem o Filho de Deus em si, tem a vida» (Jo 5, 12).
É pelo seu Coração que Jesus nos comunica a sua vida divina. «Este Coração sagrado,
diz o Padre Eudes, é o princípio da vida não só do Homem-Deus, mas da mãe e dos filhos de
Deus. – O Coração espiritual de Jesus, isto é, a sua alma santíssima, unido à sua divindade, é o
princípio da sua vida espiritual e moral. – É também o princípio da vida da Mãe de Deus. O
Filho-Deus recebia de Maria a vida material e transmitia-lhe a vida espiritual e sobrenatural. – O
Coração de Jesus é também o princípio da vida sobrenatural de todos os filhos de Deus. Como é
a vida do chefe, é também a vida dos membros. Em Jesus, diz S. Tomás, está a plenitude da
graça ou da vida das almas. Ela está depositada no seu Coração, como num reservatório
universal, de onde ela corre para a humanidade a fim de a santificar». Nosso Senhor disse-nos
isso várias vezes: «Se alguém me ama, o meu Pai amá-lo-á, e nós viremos a ele, e faremos nele
a nossa morada» (Jo 14, 23). Jesus habita em nós pela sua graça, e o seu Coração une-se ao
nosso coração para aí se tornar o princípio vivo da vida espiritual e divina em nós (Père Eudes:
Le royaume de Jesus, et le coeur admirable de Marie). /509
SEGUNDO PONTO: Há graus nesta vida íntima. – Há graus sem número nesta união e
nesta vida espiritual. O simples estado de graça é o primeiro grau de união espiritual com o
Coração de Jesus no Espírito Santo, e é o grau essencial para a salvação.
«O Coração de Jesus, diz o Padre Eudes, vive naqueles que o amam friamente, que o
servem com moleza e negligentemente; mas é de uma vida imperfeita, lânguida e quase extinta.
Está vivo de uma vida mais nobre, mais vigorosa e mais perfeita naqueles que o amam e
que o servem com mais ardor; e estes corações, se são firmes e estáveis no seu amor, pertencem
ao número daqueles dos quais está escrito: «Vivent corda eorum in saeculum saeculi: os seus
corações viverão pelos séculos dos séculos (Sl 21).
«Há outros nos quais ele não está apenas vivo, mas onde reina. São aqueles que fizeram
morrer em si o amor-próprio e a vontade própria, e que não pretendem outra coisa neste mundo
e no outro senão agradarem a Deus, contentarem-no em tudo e cumprirem perfeita e
amorosamente a sua vontade adorável. Este Coração sagrado é o princípio de todos os seus
movimentos e de todos os seus actos; é absolutamente o senhor dos seus corações e neles de
tudo dispõe como lhe agrada» (Le Coeur admirable de Marie).
É a esta união perfeita que devemos tender, se quisermos ser agradáveis a Jesus e atrair
sobre nós os seus preciosos favores.
TERCEIRO PONTO: É por Maria e pelo seu Coração imaculado que o Coração de
Jesus se dá a nós. – Como foi por Eva que Adão nos transmitiu a morte, foi por Maria, pelo seu
Coração imaculado que o Coração de Jesus se deu a nós para nos comunicar a sua vida divina.
É, portanto, com razão, diz o P. Eudes, que a santa Igreja chama a santíssima Virgem «nossa
vida, vita nostra». O seu Coração é, com o seu divino Filho, a fonte da nossa vida temporal e
eterna, porque, pelos nossos pecados, nós merecemos ser privados tanto de uma como da outra,
e elas nos foram restituídas por intermédio do Coração da Mãe de graça e de misericórdia, que
nos deu o Coração de Jesus, nosso divino Redentor.
A santíssima Virgem assiste-nos interiormente, mas, pura criatura, não está
substancialmente em nós como o Verbo de Deus; no entanto, a graça que nos une real e
substancialmente ao coração do Verbo incarnado, une-nos também, mas espiritualmente, ao
Coração de Maria.
O Coração imaculado de Maria está unido tão intimamente quanto possível /510 ao
Coração do seu divino Filho, que nele vive e reina do modo mais perfeito. Quanto mais o nosso
coração estiver unido ao coração de Jesus, mais se aproxima também do Coração da santíssima
Virgem; quanto mais este Coração bendito nos ama, mais nos assiste e nos envolve com os seus
cuidados maternos.
Devemos ter por divisa: Tudo para o Coração de Jesus pelo Coração de Maria.
Resoluções. – Ó minha celeste Rainha, ó minha divina Mãe, vivei e reinai no meu
coração, para aí fazer viver e reinar o Coração de Jesus. Aniquilai no meu coração tudo o que
pode desagradar ao vosso divino Filho. Estabelecei nele o soberano império do seu Coração e
do vosso, para que estes dois corações, tão estreitamente unidos, nele reinem soberana e
eternamente para o puro amor de Deus e para a sua maior glória.
Colóquio com o santo Coração de Maria.

03 de Maio
A INVENÇÃO DA SANTA CRUZ
25 Erat autem hora tertia et crucifixerunt 25 Era a hora terceira quando o
eum 26 et erat titulus causae eius inscriptus rex crucificaram. 26 E, por cima, estava, em epígrafe, a
Iudaeorum 27 et cum eo crucifigunt duos latrones sua acusação: O REI DOS JUDEUS. 27 Com ele
unum a dextris et alium a sinistris eius (Mc 15, 25- crucificaram dois ladrões, um à sua direita, e outro
27). à sua esquerda (Mc 15, 25-27).
Primeiro Prelúdio. A cruz preciosa do bom Mestre foi erguida entre a de dois ladrões.
Segundo Prelúdio. Venero, Senhor, o instrumento da nossa redenção. Ensinai-me a compreender
o sentido da cruz.
PRIMEIRO PONTO: A tradição. – Estávamos em 326, Sta. Helena queria encontrar o
lugar da crucifixão e do sepulcro do Salvador. Mandou destruir os templos que os pagãos
tinham erguido lá em honra de Vénus e de Júpiter. Encontraram o sepulcro e as três cruzes que
tinham sido enterradas, segundo o costume, no lugar do suplício. Uma cura miraculosa fez
reconhecer a verdadeira Cruz. Sta. Helena mandou construir lá uma basílica e outra em Roma,
para receber uma parte da verdadeira Cruz. S. Cirilo de Jerusalém, S. Paulino, Sto. Ambrósio, S.
Crisóstomo e outros relatam estes factos.
Estava nos desígnios de Nosso Senhor fazer honrar a sua cruz, que foi o instrumento da
nossa redenção. Mostrou-a a Constantino como um sinal de vitória e revelou a sua madeira
sagrada a Sta. Helena. O culto público começava, Nosso Senhor queria dar-lhe a sua orientação
simbólica.
A cruz devia ser o sinal do cristão. Devia ser honrada sobre todos os nossos altares e
marcar com o seu sinal salutar todas as cerimónias do culto. Nosso Senhor conduz-nos como
quer pela sua doce providência. A cruz mal aparece nas catacumbas, torna-se o sinal universal
de todo o acto cristão no tempo de Constantino. É ela que nos pregará o amor de Nosso Senhor,
aguardando a revelação do Sagrado Coração.
SEGUNDO PONTO: A cruz ensina o amor de Nosso Senhor. – Esperando que Nosso
Senhor nos diga: «Eis o Coração que tanto amou os homens», dizia-nos por toda a liturgia: «Eis
a cruz sobre a qual o Coração do vosso Redentor foi partido por amor por vós». A cruz era o
nosso estandarte, a nossa salvaguarda, o nosso amuleto. Este sinal sagrado resume todo o
Evangelho. Fala aos iletrados como aos sábios. / 512 Diz a todos: «O Verbo de Deus incarnou.
Sofreu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado por vosso amor!».
A cruz tornou-se o sinal de todas as bênçãos. Repete-se frequentemente este sinal na
celebração da missa, na administração dos sacramentos e em todos os actos da vida cristã. É
uma oração em acção, é um sacramento que nos obtém graças.
A cruz fala às nossas almas e fala a Deus. A nós, ela diz: «Amai o vosso Salvador, servi
o vosso Deus, que morreu pela vossa salvação». A Deus diz: «Abençoai tudo o que está
marcado com este sinal redentor».
O anjo da justiça no Egipto poupou as casas marcadas com o sangue dos cordeiros,
porque estes cordeiros figuravam o Messias. Deus abençoa tudo o que está marcado com a cruz,
porque a cruz do Salvador foi o resgate de todas as nossas faltas e o preço de todas as graças.
Amemos a cruz, porque ela nos recorda todo o amor do Salvador. Amemos sobretudo o
Redentor que morreu por nós sobre a cruz.
A cruz e o Sagrado Coração são dois sinais sagrados, dois símbolos que nos conservam
a mesma linguagem. Ambos nos dizem: «Deus vos amou tanto, que entregou o seu Filho para
vos salvar!». O Filho de Deus amou-vos tanto que aceitou e mesmo escolheu e amou a cruz para
vos resgatar e para vos provar o seu amor!
TERCEIRO PONTO: A cruz prega a reparação. – A cruz tornou-se na linguagem cristã
sinónimo de sacrifício, de penitência, de reparação.
Se a cruz nos grita que Nosso Senhor nos amou, ela diz-nos também que sofreu por nós,
que expiou cruelmente os nossos pecados. Amou a cruz porque ela reparava a glória de seu Pai
e porque pagava as nossas dívidas. Ele carregou-se com os nossos pecados, mas quis todavia
reservar-nos a honra de o seguirmos neste caminho. Não nos aplica os frutos das suas
reparações a não ser que neles tomemos alguma parte. Quer que partilhemos as suas
disposições, os seus sentimentos. É preciso que tenhamos também o desejo, a vontade de
reparar a glória do seu Pai e de pagar as nossas dívidas. É preciso, portanto, que por trás da sua
grande e dolorosa cruz nós levemos a nossa pequena cruz: a cruz do labor quotidiano, da
penitência, da obediência, do desapego; a cruz da paciência nas provações da vida. «Aquele que
quiser vir atrás de mim e partilhar do meu reino, deve tomar a sua cruz e seguir-me». Aqui está
o resumo do Evangelho. Nosso Senhor pregou a penitência e enviou os seus apóstolos a pregá-
la em toda a terra. Não há outro caminho para ir ao céu. É preciso alguma coragem e boa
vontade. O reino dos /513 céus exige alguma força de alma e algum vigor da parte daqueles que o
querem conquistar: Regnum coelorum vim patitur.
Resoluções. – Salve, ó cruz, ó cruz redentora! Sois a minha glória, o meu resgate e toda
a minha riqueza. Não quero que o meu Jesus a leve sozinho. Renovo-me no vosso amor, todos
os dias nas horas da tarde, saudar-vos-ei e tomar-vos-ei com alegria sobre os meus ombros.
Colóquio com Jesus levando a sua cruz.
04 de Maio
EXCELÊNCIA E VANTAGENS DA UNIÃO
AOS SANTOS CORAÇÕES DE JESUS E DE MARIA
9 Sicut dilexit me Pater et ego dilexi vos 9 Como o Pai me amou, também eu vos
manete in dilectione mea 10 si praecepta mea amei; permanecei no meu amor. 10 Se guardardes
servaveritis manebitis in dilectione mea sicut et os meus mandamentos, permanecereis no meu
ego Patris mei praecepta servavi et maneo in eius amor; assim como também eu tenho guardado os
dilectione 11 haec locutus sum vobis ut gaudium mandamentos de meu Pai e no seu amor
meum in vobis sit et gaudium vestrum impleatur permaneço. 11 Tenho-vos dito estas coisas para que
(Jo 15,9-11). o meu gozo esteja em vós, e o vosso gozo seja
completo (Jo 15, 9-11).
Primeiro Prelúdio. Se permanecer unido a Nosso Senhor e fiel aos seus mandamentos, terei a
alegria e a paz da alma.
Segundo Prelúdio. Ó Maria, mantende-me unido ao divino Coração de Jesus, este é o meu desejo
mais ardente.
PRIMEIRO PONTO: Estar intimamente unido ao Coração de Jesus e de Maria pela
graça e pelo amor, isso é, aqui em baixo, a grandeza suprema. – Não estamos na terra senão
para aqui continuarmos a vida santa que Jesus aqui levou. No baptismo, fizemos profissão de
vivermos da sua vida, isto é, de o formarmos em nós, segundo a expressão de S. Paulo: Donec
formetur Christus in vobis (Gal 4, 19). Devemos apropriar-nos das suas virtudes, dos seus
sentimentos, do seu espírito, das suas disposições e inclinações totalmente divinas. A vida e o
reino de Jesus nos nossos corações divinizam-nos.
«Nosso Senhor, diz o P. Eudes, desce e habita em nós pela graça, a fim de nos
transformar em si mesmo. Agarra-nos interiormente pelas mãos todo-poderosas do Espírito
Santo, como uma pequena hóstia que quer consagrar, para a oferecer consigo à glória do seu Pai
celeste: sacrifício admirável, consagração deificante, preciosa e inefável elevação! Faz de nós
seres sobrenaturais; de terrestres, torna-nos celestes, e de pobres nadas, de pecadores indignos,
faz cristãos, santos, filhos de Deus» (P. EUDES, A vida interior).
Unidos ao Coração de Jesus, tornamo-nos membros vivos de Cristo. Participamos na
luz do sol da Verdade. O amor do seu Coração abrasa o nosso. Há algo de mais nobre, de mais
sublime do que esta vida?
SEGUNDO PONTO: O Coração de Jesus e de Maria vivendo e reinando nos nossos
corações são também a fonte de todas as riquezas. – É o mais precioso de todos os tesouros. «A
nossa alma, diz Sto. Ambrósio, é o verdadeiro paraíso terrestre deste / 515Coração sagrado. No
meio do Éden brotava a fonte de água viva que o fertilizava. Que fonte é esta, senão o Coração
sagrado de Jesus Cristo, fonte de vida eterna, jorrando no meio da alma cristã, para aí expandir
todas as espécies de bênçãos celestes, e a tornar fecunda em méritos e em frutos de virtudes»
(STO. AMBROSIO, De paradiso, 3, 12).
Fazer viver e reinar em nós este Coração sagrado, é a nossa grande e única tarefa.
1º É o meio de atingir o nosso fim. Somos feitos para esta união ao Coração de Jesus
pelo Coração de Maria e ao Coração de Deus pelo de Jesus. «Tudo é vosso, diz S. Paulo, vós
sois de Cristo, e Jesus Cristo é de Deus; é assim que Deus é tudo em todas as coisas» (1Cor 3,
15).
2º É o único meio de sermos agradáveis a Deus. Assim nós cumprimos o desejo que tem
o Pai eterno de ver o seu divino Filho viver e reinar nos nossos corações com a sua santa Mãe.
3º É o único meio que temos para glorificarmos a Deus de um modo digno dele. É
preciso que seja o Coração de Jesus quem o glorifique em nós e por nós: ut in omnibus
honorificetur Deus per Jesum Christum (1Pd 4, 11).
4º É o meio de cumprirmos os desejos de Jesus mesmo, de lhe sermos agradáveis e de
dele obtermos imensos favores. Não veio ele à terra para viver e reinar em nós e aí fazer o seu
Pai reinar? Nosso Senhor diz-nos através do seu fiel servidor, o P. Eudes: «Fazendo-me viver e
reinar no vossos corações com a minha santíssima Mãe, sereis os verdadeiros filhos do meu
Coração. O meu Coração e os meus olhos estarão sempre aplicados às vossas necessidades…».
5º Finalmente, pela vida do Coração de Jesus e de Maria em nós, entramos na
participação dos seus méritos, unimos as nossas obras às suas obras e enriquecemo-nos
infinitamente.
TERCEIRO PONTO: Fazer viver e reinar em nós o santíssimo Coração de Jesus e de
Maria, é enfim para nós a suprema felicidade. – Fomos criados para esta união e é somente lá
que o nosso coração pode encontrar a paz e o repouso.
«Permanecei em mim e eu em vós, diz-nos o divino Mestre, permanecei no meu amor»,
(isto é, no meu Coração); depois acrescenta logo: «Digo-vos isto para que a minha alegria esteja
em vós e a vossa alegria seja completa» (Jo 15, 4). Esta felicidade é uma participação na do
Verbo incarnado, na beatitude inefável de que goza desde sempre no seio do seu / 516 Pai. É uma
alegria que ninguém nos pode arrebatar. «Ninguém me pode tirar Jesus Cristo, dizia um santo
religioso àqueles que lhe perguntavam a razão da sua contínua alegria».
«No Coração de Jesus, dizia S. Lourenço Justiniano, encontra-se a paz interior, o
repouso inalterável, a felicidade tranquila, a viva alegria, a serenidade confiante, a sociedade do
amor, o encanto da contemplação e a suavidade do Espírito Santo. Aí está a porta do céu».
Esta união ao Sagrado Coração de Jesus e de Maria é o nosso paraíso vivo, «e este
paraíso, exclama S. Bernardo, é bem superior ao Éden dos nossos primeiros pais; é mais
delicioso, mais rico e mais suave».
A união a Jesus Cristo e a Maria é o céu, porque é o reino de Jesus e de Maria.
Gritemos todos, diz o P. Eudes: «Vivam Jesus e Maria nos nossos corações! Viva em
todos os corações o Coração amantíssimo de Jesus e de Maria».
Resoluções. - «Ó Coração sagrado, fonte de vida e de felicidade, que o meu coração
morra para toda a outra vida, que viva da vossa, que seja animado pelo vosso espírito, que seja
abrasado do vosso amor!
Ó Coração todo amável e todo amor, sede o coração do meu coração, a alma da minha
alma, o espírito do meu espírito, a vida da minha vida, o único princípio de todos os meus
pensamentos, palavras e acções, de todo o uso que eu fizer dos sentidos do meu corpo e das
faculdades da minha alma!».
Colóquio com o Coração de Jesus e de Maria.

05 de Maio
A PRÁTICA DA UNIÃO
AOS SANTOS CORAÇÕES DE JESUS E DE MARIA
5 Ego sum vitis vos palmites qui manet in 5 Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem
me et ego in eo hic fert fructum multum quia sine permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto;
me nihil potestis facere 6 si quis in me non porque sem mim nada podeis fazer. 6 Se alguém
manserit mittetur foras sicut palmes et aruit et não permanecer em mim, será lançado fora, à
colligent eos et in ignem mittunt et ardent 7 si semelhança do ramo, e secará; e o apanham,
manseritis in me et verba mea in vobis manserint lançam no fogo e o queimam. 7 Se permanecerdes
quodcumque volueritis petetis et fiet vobis (Jo 15, em mim, e as minhas palavras permanecerem em
5-7). vós, pedireis o que quiserdes, e vos será feito (Jo
15, 5-7).
Primeiro Prelúdio. Permanecer unido a Jesus e observar os seus mandamentos e conselhos, é a
fonte de toda a fecundidade espiritual.
Segundo Prelúdio. Senhor Jesus, conservai-me unido ao vosso Sagrado Coração e ao de Maria
que não faz senão um só com o vosso.
PRIMEIRO PONTO: As primeiras condições da união com o Sagrado Coração de
Jesus e de Maria são manter-nos em estado de graça e desapegarmo-nos das criaturas. – É no
baptismo que começa a união do nosso coração ao Sagrado Coração de Jesus e de Maria. Ora,
desde que temos o uso da razão, o nosso dever é aplicar-nos a conservar em nós esta união toda
celeste, e a desenvolvermos cada dia a vida e o reino deste Coração sagrado nas almas.
O primeiro meio é manter-nos em estado de graça pela fuga do pecado. «Permanecei em
mim e eu permanecerei em vós», diz-nos Nosso Senhor. Quando nos encontramos em estado de
graça, quando estamos em Jesus, Jesus está em nós, o seu Coração está unido ao coração da sua
mesquinha criatura.
Mas para que o Coração sagrado de Jesus e de Maria vivam e reinem plena e
perfeitamente em nós, é preciso banir tudo o resto. Devemos olhar o mundo e tudo o que ele
encerra como aniquilado para nós, e não mais ver as criaturas em si mesmas, mas unicamente
em Jesus e em Maria, de modo que nada mais haja no mundo para nós senão o divino Coração
de Jesus e de Maria e que nada mais tenhamos para a amar e contentar a não ser ele.
Quanto mais o nosso coração estiver desapegado dos nós mesmos e das criaturas, mais
o Coração de Jesus e de Maria em nós farão sentir a santa eficácia da sua presença. / 518
SEGUNDO PONTO: Viver da fé e alimentar em nós o fogo da caridade. – S. Paulo
ensina-nos que Jesus Cristo habita nos nossos corações pela fé: Christus habitare per fidem in
cordibus nostris (Ef 3). A fé é o primeiro desabrochar da graça numa alma, «Ela abre a porta do
nosso coração a Nosso Senhor, diz Sto. Ambrósio, e vem nele habitar».
Para formar em nós uma fé viva, habituemo-nos a observar o Coração de Jesus e de
Maria em tudo o que fazemos. Não tenhamos outro objectivo em vista nos nossos exercícios de
piedade. Esforcemo-nos por imitá-lo, recordemo-nos das suas virtudes e dos seus mistérios,
esforcemo-nos por nos revestirmos das suas divinas intenções, das suas disposições admiráveis.
Mas não é tudo, formar o Coração de Jesus e de Maria no nosso espírito pela fé, pela
recordação dos seus mistérios, pela imitação das suas virtudes; é preciso também formá-lo no
nosso coração pelo frequente exercício do seu amor.
«A fé planta Jesus Cristo em nós, diz S. Gregório Grande; mas somente a caridade,
somente a fidelidade do amor faz crescer esta árvore divina que, na terra do nosso coração,
produz abundantes frutos para o paraíso. Jesus introduz-se na alma pelo baptismo e pela graça
da fé, começa aí um trabalho de formação e de desenvolvimento semelhante ao da criança no
seio de sua mãe. Toma, destrói, absorve tudo o que vê em nós de corruptível, ut absorbeatur
quod mortale est a vita (2Cor 5), preenchendo pelo dom celeste da graça e preenchendo assim
ele mesmo os vazios que faz em nós; laborioso trabalho da vida cristã, da piedade e da
perfeição, que tem por objecto único a formação de Jesus em nós: donec formetur Christus in
nobis (Gal 4).
TERCEIRO PONTO: Comungar com fervor. – A comunhão eucarística, e, na sua falta,
a comunhão espiritual, acresce e fortifica a nossa união espiritual com o Coração de Jesus e de
Maria. Por este sacramento, diz S. Tomás, a graça cresce em nós e a vida espiritual aperfeiçoa-
se cada vez mais; porque a perfeição do homem consiste na intimidade da sua união com Deus.
A Eucaristia é instituída para concluir a obra dos outros sacramentos, pelos quais Nosso Senhor
nos comunica a sua virtude e a sua vida» (STh III, art.79 e 75)2.

2
É preciso conferir e corrigir esta referência que está incorrecta.
«Aqueles que fazem uma boa digestão corporal, diz S. Francisco de Sales, ressentem
um reforço em todo o seu corpo. Assim aqueles que recebem bem a santa comunhão, ressentem
que Jesus Cristo, que é o seu alimento, se expande e se comunica a todas as partes da sua alma e
do seu corpo. Purifica tudo, vivifica tudo. Ama no coração, / 519 entende no cérebro; anima no
peito; vê nos olhos; fala na língua e assim no resto. Faz tudo em tudo. E então nós vivemos, não
já nós mesmos, mas Jesus Cristo que vive em nós. Oh! Quando será? Quando será isto?... Mas
entretanto mostro-vos a que é que é preciso pretendermos, embora seja preciso contentarmo-nos
em atingir isso pouco a pouco. Mantenhamo-nos humildades e comunguemos corajosamente.»
(Cartas espirituais, 130).
Resoluções. – Sim, mantenhamo-nos humildes, isto é: desconfiados de nós mesmos,
obedientes a Nosso Senhor, à nossa regra, ao nosso director. E comunguemos corajosamente,
pela comunhão sacramental fervorosa, mas também pela comunhão espiritual nos mistérios de
Nosso Senhor, seguindo as horas do dia e conforme ao nosso regulamento de vida.
Colóquio com o Coração Sagrado de Jesus e de Maria.

06 de Maio
S. JOÃO, A SUA FORMAÇÃO, A SUA PROFISSÃO
20 Tunc accessit ad eum mater filiorum 20 Então, se chegou a ele a mulher de
Zebedaei cum filiis suis adorans et petens aliquid Zebedeu, com seus filhos, e, adorando-o, pediu-lhe
ab eo 21 qui dixit ei quid vis ait illi dic ut sedeant um favor. 21 Perguntou-lhe ele: Que queres? Ela
hii duo filii mei unus ad dexteram tuam et unus ad respondeu: Manda que, no teu reino, estes meus
sinistram in regno tuo 22 respondens autem Iesus dois filhos se assentem, um à tua direita, e o outro à
dixit nescitis quid petatis potestis bibere calicem tua esquerda. 22 Mas Jesus respondeu: Não sabeis
quem ego bibiturus sum dicunt ei possumus (Mt o que pedis. Podeis vós beber o cálice que eu estou
20, 20-22). para beber? Responderam-lhe: Podemos (Mt 20,
20).
Primeiro Prelúdio. A Igreja festeja hoje o martírio de S. João, mas ele foi em todo o seu
apostolado o modelo das vítimas do Coração de Jesus.
Segundo Prelúdio. Santo apóstolo, pedi para mim este espírito que recebestes no Cenáculo e ao
pé da cruz.
PRIMEIRO PONTO: Formação de S. João. A preparação para a sua profissão. –
Nosso Senhor formou S. João como o modelo dos sacerdotes perfeitos, das vítimas do seu
Coração, das vítimas do amor e da reparação. Tornou-se postulante quando pediu: «Mestre,
onde morais?» (Jo 1, 38). Foi recebido quando depois deixou o seu pai e as suas redes e seguiu
Nosso Senhor (Mt 4, 22). A tomada do hábito teve lugar na sala do festim no Cenáculo, na
última Ceia, quando foi revestido com o manto da dignidade sacerdotal e instruído sobre a
oferta do santo sacrifício da missa, a comemoração da última Ceia, da Paixão e da morte do
Salvador: Hoc facite in meam commemorationem.
Fez a profissão sobre o monte do Calvário, debaixo da cruz do Cordeiro vítima
expirante, ao lado de Maria, a mãe da vítima, que se tinha ela mesma tornado vítima e uma
vítima santa, a mais santa e a mais perfeita depois do Cordeiro divino.
Foi lá que a sua alma virginal se uniu para sempre ao Esposo das almas puras. Era o
primogénito da Igreja e representava-a. Foi na sua pessoa que os filhos da Igreja foram
adoptados por Maria como seus filhos e por Deus Pai como os irmãos e os co-herdeiros do seu
Filho único
SEGUNDO PONTO: S. João aprende com os exemplos e as palavras de Jesus as
virtudes que fazem as vítimas do Sagrado Coração: Obediência, paciência, caridade,
abandono, reparação /521. – S. João era o primogénito e o modelo das vítimas do Sagrado
Coração. O tempo entre a tomada do hábito e a sua profissão não foi longo. No entanto, passou
por um noviciado, por um tempo de prova, durante o qual aprendeu mais, avançou mais em
virtude e em perfeição, sofreu mais no seu coração e no seu espírito do que a razão humana
pode conceber. Lá aprendeu até onde vai o verdadeiro, santo e puro amor de Deus e que a
medida deste amor é amar sem medida.
Na noite da Ceia viu como Nosso Senhor se deu inteiramente no mistério da Eucaristia.
No dia seguinte, foi testemunha da oferta dolorosa da vítima sangrenta sobre a cruz. Pela sua
presença, pela sua fidelidade e constância, testemunhou abertamente que conhecia Nosso
Senhor, que era e queria permanecer seu discípulo. Nesta hora solene, fez no seu coração cheio
de amor, de reconhecimento, de compaixão e de zelo, as promessas mais santas para o futuro.
Tomou a resolução de nunca abandonar Jesus nem a sua doutrina. Depois recebeu em partilha o
Coração ferido de Jesus, o Coração sobre a cruz, envolvido com os espinhos da humilhação, do
ultraje, da dor, da ingratidão, da infidelidade e da cobardia dos seus discípulos, daqueles de
então e dos do futuro.
Viu como Nosso Senhor era ao mesmo tempo sacrificador e vítima, como deve ser todo
o verdadeiro sacerdote da nova lei.
TERCEIRO PONTO: As palavras que Nosso Senhor pronunciou sobre a cruz
ensinaram a S. João o que devem ser o amor e a imolação de uma vítima do Sagrado Coração.
- «Um Deus, perdoai-lhes, porque não sabem o que fazem». Estas palavras de um Deus
desprezado, ultrajado, crucificado pelas suas criaturas, são uma lição de doçura, de paciência, de
amor aos inimigos.
«Hoje ainda estarás comigo no paraíso». Esta palavra dita ao bom ladrão é ainda uma
lição de caridade, de misericórdia, de perdão.
«Mulher, eis o vosso filho. – Filho, eis a vossa mãe». É o testemunho de um amor
generoso, que tudo sacrifica, que de tudo se despoja e que nada reserva para si a não ser os
sofrimentos, a cruz e a morte.
«Tenho sede!». – Mas de que é que tinha sede? Da glória de seu Pai, do cumprimento
da sua vontade, da reparação, da redenção e da salvação das almas. Tinha sede dos sofrimentos
e dos ultrajes para reparar os nossos pecados. Tinha sede de ser conhecido e amado por nós,
sede de nos dar o seu coração. Pode a nossa sede ser diferente da sua? / 522 Não devemos nós
procurar extinguir a sua sede de amor e de reparação?
«Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes?». Uma vítima está pronta para tudo o
que Deus quiser enviar-lhe. Aceita mesmo o abandono aparente de Deus e persevera sem
desencorajamento.
«Tudo está consumado!». O amor de Nosso Senhor tinha dado tudo, tudo sofrido, tudo
realizado.
«Meu Deus, coloca a minha alma nas vossas mãos». Desde o seu Ecce venio, Nosso
Senhor cumpriu plenamente a vontade de seu Pai. Demo-nos também inteiramente no trabalho,
na obediência, no abandono por amor a Nosso Senhor.
Tais foram as regras dadas a S. João. Ele cumpriu-as até à sua consumação na sua
provação, no azeite ardente.
Resoluções. – Queremos, Senhor, tornarmo-nos como S. João, verdadeiras vítimas de
amor e de imolação em união com Maria. Queremos renovar fielmente estas resoluções e estas
disposições várias vezes por dia a fim de vivermos neste espírito que pedis de nós.
Colóquio com S. João.
07 de Maio
PEDIR A UNIÃO AO CORAÇÃO DEJESUS
E DEMARIA COM HUMILDADE E CONFIANÇA
16 Ego Iesus misi angelum meum 16 Eu, Jesus, enviei o meu anjo para vos
testificari vobis haec in ecclesiis ego sum radix et testificar estas coisas às igrejas. Eu sou a Raiz e a
genus David stella splendida et matutina 17 et Geração de David, a brilhante Estrela da manhã. 17
Spiritus et sponsa dicunt veni et qui audit dicat veni O Espírito e a noiva dizem: Vem! Aquele que
et qui sitit veniat qui vult accipiat aquam vitae ouve, diga: Vem! Aquele que tem sede venha, e
gratis (Ap 22, 17-17). quem quiser receba de graça a água da vida /Ap 22,
16-17).
Primeiro Prelúdio. Ouvi o vosso apelo, Senhor Jesus! Tenho sede, vinde, dai-me a água da vida.
Segundo Prelúdio. Peço-vos, Senhor, dai-me esta união convosco, que é a fonte da verdadeira
vida.
PRIMEIRO PONTO: Ó Coração de Jesus, vivendo no Coração de Maria, vinde e
reinai no coração dos vossos servos. – A obra da transformação do nosso coração no de Jesus e
de Maria ultrapassa incomparavelmente todas as forças humanas. Nós devemos, para o
conseguirmos, implorar com humildade e fervor o socorro da graça divina. Entreguemo-nos ao
poder do Pai e à graça do Espírito Santo, diz-nos o P. Eudes, e peçamos ao Coração adorável de
Jesus para se unir ao nosso. E comenta neste espírito a conhecida oração: «Ó Jesus, vivendo em
Maria». - «Ó Coração sagrado, viveis e reinais perfeitamente no Coração da vossa divina Mãe,
sois tudo e tudo operais nela; sois a sua vida, o seu coração, o seu espírito, o seu tesouro…Mas,
ó amabilíssimo Coração, tendes também um desejo imenso de viver e de reinar no coração dos
vossos filhos, e de lhes fazer viver convosco uma vida toda santa e toda celeste. Perdoai-me
todos os obstáculos que pus até agora ao cumprimento deste desejo, pelos meus pecados e pelas
minhas infidelidades sem número... De novo me dou e me sacrifico todo para vós, e não quero
mais respirar senão para trabalhar sem cessar para fazer com que vivais e reinais na minha alma
e em todas as almas que vos aprouver confiar-me. Quero aplicar nisso todos os meus
pensamentos, todas as minhas palavras e todas as minhas obras».
SEGUNDO PONTO: Vinde e vivei no espírito da vossa santidade, na plenitude do
vosso poder, na perfeição dos vossos caminhos. – Vinde, portanto, ó Coração todo
misericordioso, na plenitude da vossa virtude para destruir em mim tudo o que vos desagrada e
para aí operar tudo o que reclama a vossa glória. - /524 Vinde na santidade do vosso espírito,
para me desapegar das criaturas e me guiar santamente em todas as minhas acções. – Vinde na
pureza dos vossos caminhos, e conduzi-me nas rectas sendas do amor divino, sem permitir que
eu descaia para a direita ou para a esquerda, e sem nada deixar aos sentimentos nem às
inclinações do amor-próprio e da natureza corrompida! Vinde a mim para em mim imprimirdes
uma imagem perfeita da vossa vida e das vossas virtudes; fazei reinar no meu coração a vossa
humildade, a vossa doçura, a vossa caridade, a vossa paciência, a vossa obediência, a vossa
pureza, a vossa modéstia. – Vinde a mim na comunhão dos vossos mistérios divinos, para os
glorificardes e os continuardes na minha pessoa, e governardes-me e me santificardes pelo
espírito e pela graça destes adoráveis mistérios. Fazei que o meu ser e a minha vida sejam
inteiramente consagrados a honrar a vossa vida e todos os estados pelos quais quisestes passar
por nosso amor. Que todos os meus pensamentos, as minhas palavras e as minhas acções
prestem honra às vossas acções, às vossas palavras, aos vossos pensamentos. Que todos os meus
passos, os meus trabalhos e os meus sofrimentos dêem glória aos vossos. Que todas as potências
da minha alma, que todos os membros e sentidos do meu corpo sejam consagrados à honra das
potências da vossa alma, dos membros e dos sentidos do vosso corpo divino. Enfim, que tudo o
que está em mim esteja unicamente ocupado a vos amar, a vos adorar e a publicar os vossos
louvores…». Que eu me una aos vossos mistérios particularmente segundo as horas do dia pelo
costume dos meus piedosos encontros.
TERCEIRO PONTO: Dominai, Senhor, todo o poder adverso, pelo poder do vosso
Espírito e pela glória do vosso Pai. - «Sede o mestre, ó divino Coração, e dominai plenamente
sobre os meus inimigos e os vossos. Aniquilai o meu amor-próprio, o meu próprio espírito, o
meu orgulho, as minhas paixões, os meus sentimentos e todas as minhas inclinações perversas, a
fim de reinardes absolutamente no meu coração, de serdes tudo em mim e de aí operardes todas
as coisas. Revesti-me do vosso divino Espírito, deste espírito de amor que é o vosso Coração e o
do vosso Pai, de tal modo que não tenha eu outros pensamentos, outros sentimentos, outros
afectos nem outros quereres que não os vossos. Finalmente, dignai-vos amar-vos e glorificar-
vos vós mesmos em mim; amai e glorificai aí dignamente o vosso Pai celeste» (Reino de Jesus).
«Ó Virgem santa, vós que sois a nossa divina Mãe, fazei germinar e cultivai nos nossos
corações este divino fruto da vida, que foi o fruto das vossas castas entranhas. Obtende, por
vossa intercessão todo-poderosa, que nós não sejamos mais nada e que o Coração do vosso filho
seja tudo em nós, que ele seja o nosso ser, a nossa vida, o nosso espírito, a nossa luz, o nosso
amor, /525 a nossa força, o nosso tesouro, a nossa alegria, a nossa glória, o nosso tudo, para que,
lançando os olhos sobre as suas criaturas, o nosso Pai celeste não se aperceba de mais nada
senão de Jesus, o único objecto do seu amor e das suas complacências».
Resoluções. – Ó Maria, dai-nos o Coração de Jesus e o vosso, a fim de que os filhos não
tenham senão um só coração com o seu pai e a sua mãe; a fim de que os membros não tenham
outra vida senão a do seu divino Chefe; a fim de que nós possamos adorar, louvar, amar e servir
Deus com um coração puro, santo, imenso, digno da sua infinita majestade, Corde magno et
animo volenti; e que todas as nossas acções sejam cumpridas no espírito, no amor, na humildade
e em todas as outras disposições deste Coração incomparável.
Colóquio com o santo Coração de Maria.

08 de Maio
S. MIGUEL ARCANJO
7 Et factum est proelium in caelo 7 Houve peleja no céu. Miguel e os seus
Michahel et angeli eius proeliabantur cum dracone anjos pelejaram contra o dragão. Também
et draco pugnabat et angeli eius 8 et non valuerunt pelejaram o dragão e seus anjos; 8 todavia, não
neque locus inventus est eorum amplius in caelo 9 prevaleceram; nem mais se achou no céu o lugar
et proiectus est draco ille magnus serpens antiquus deles. 9 E foi expulso o grande dragão, a antiga
qui vocatur Diabolus et Satanas qui seducit serpente, que se chama diabo e Satanás, o sedutor
universum orbem proiectus est in terram et angeli de todo o mundo, sim, foi atirado para a terra, e,
eius cum illo missi sunt 10 et audivi vocem com ele, os seus anjos. 10 Então, ouvi grande voz
magnam in caelo dicentem nunc facta est salus et do céu, proclamando: Agora, veio a salvação, o
virtus et regnum Dei nostri et potestas Christi eius poder, o reino do nosso Deus e a autoridade do seu
(Ap 12, 7-10). Cristo (Ap 12, 7-10).
Primeiro Prelúdio. Foi por Deus e por Cristo que S. Miguel conduziu os seus anjos ao combate e
canta a vitória divina.
Segundo Prelúdio. Santo arcanjo, combatei por mim contra o inimigo do nosso Deus.
PRIMEIRO PONTO: Excelência e dignidade de S. Miguel e dos santos anjos. – Os
anjos são de uma outra natureza bem mais excelente do que a nossa. São puros espíritos. Os
seus conhecimentos são muito mais extensos do que os dos homens. S. Clemente de Alexandria
chama-os os primeiros nascidos de Deus. São, diz S. Sofrónio, as imagens vivas e
representativas da divindade.
São inumeráveis: «Quem poderia, diz Job, contar os soldados do exército celeste?» (Job
25, 3).
Foram criados num estado em que podiam merecer ou desmerecer; mas os que
perseveraram na justiça foram confirmados em graça e coroados de uma glória eterna. São o
ornamento da santa Sião.
Os Espíritos de que cada ordem celeste é composta têm perfeições que os caracterizam e
funções que lhes são próprias. Os Querubins representam e glorificam a omnisciência divina; os
Serafins são o amor infinito.
S. Miguel, o chefe dos Serafins e de todas as hierarquias é o corifeu do amor divino. É o
anjo do Sagrado Coração. É ele sem dúvida que oferece como um incenso todas as orações dos
justos e dos santos sobre o altar de ouro que está diante do trono de Deus: e este altar de ouro
não pode ser senão o Coração de Jesus, o único altar que é agradável a Deus.
SEGUNDO PONTO: As suas funções santas. – Os anjos vivem no céu, diante do trono
de Deus. Estão ocupados a contemplar as suas perfeições infinitas, inebriam-se na torrente de
delícias que produzem a visão e o amor da /527 sua inefável beleza. O seu emprego durante toda
a eternidade será de o adorarem sem cessar, de o louvarem, de o bendizerem e de glorificarem o
seu nome.
Entretêm-se entre si pela simples vontade que têm de se comunicarem os seus
pensamentos e os seus sentimentos.
Estão também encarregados da nossa guarda e protecção. Várias passagens da Sagrada
Escritura nos mostram que Deus emprega muitas vezes o seu ministério na execução dos
decretos da sua Providência a respeito de nós.
Os anjos das mais modestas hierarquias estão encarregados da nossa guarda quotidiana,
os arcanjos são enviados por Deus para executar os seus desígnios mais importantes.
Os anjos percebem a linguagem das nossas almas quando nos dirigimos a eles.
Conhecem o que nos diz respeito, interessam-se pela nossa felicidade. Podem agir sobre a nossa
imaginação e despertar em nós bons pensamentos. Conduzirão as nossas almas ao lugar da
glória, se morrermos na graça de Deus.
S. Miguel é o seu chefe. Era o Príncipe dos anjos fiéis que se opuseram a Lúcifer e aos
companheiros da sua revolta. O seu nome significa em hebreu: «Quem é semelhante a Deus?».
Era a sua divisa quando se levantou contra os anjos apóstatas e reprimiu a sua revolta. Continua
ainda a proteger-nos contra os seus assaltos. Invoquemo-lo com confiança, ele destacará para
nós tantos anjos quantos será necessário para combater Satanás e os outros espíritos maus.
TERCEIRO PONTO: S.Miguel é o protector da Igreja. – S. Miguel, chefe das milícias
celestes, é o porta-estandarte do céu, habens signum Dei vivi. O sinal tradicional do reino de
Jesus Cristo é a cruz; mas o sinal novo é o Sagrado Coração. Um e outro são os instrumentos e
os símbolos da Redenção.
Este santo arcanjo era já o protector da sinagoga e do povo de Deus, como nos ensinam
os profetas Daniel (c. 12) e Zacarias (c. 11). Tornou-se o protector da Igreja. S. João, no
Apocalipse, mostra-o muitas vezes a conduzir a luta contra os demónios que querem arrastar
para longe de Deus o povo fiel.
Várias vezes ao longo dos séculos S. Miguel manifestou a sua protecção aparecendo
sobre vários pontos da terra para socorrer a Igreja nos perigos prementes ou para pedir
santuários que seriam fontes de graças. A aparição em Roma sobre o castelo Sto. Ângelo é
célebre. Era em 590 no tempo do Papa S. Gregório Magno. / 528 Enquanto faziam uma procissão
de penitência em tempo de peste, S. Miguel foi visto sobre a Muralha de Adriano repondo a sua
espada na bainha, para significar que a cólera de Deus estava apaziguada.
A aparição no Monte S. Miguel na Normandia em 709 criou uma das belas
peregrinações de França.
A que festejamos no dia 8 de Maio é a aparição no Monte Gargan em Itália, no tempo
do Papa Gelásio, no ano 492. É também a festa do Padroado de S. Miguel, o ofício do dia o diz:
«Aquele, dizem as lições, que a sinagoga dos Judeus tinha por Padroeiro, a Igreja hoje venera-o
como Patrono e protector».
Resoluções. – Invocarei S. Miguel de manhã e à noite como meu protector e meu guia e
especialmente como o anjo do Sagrado Coração. Chamá-lo-ei em meu socorro nas tentações e
nas dificuldades. Pedir-lhe-ei todos os dias pela Igreja, especialmente nestes tempos difíceis.
Direi com atenção e fervor a oração a S. Miguel depois da santa missa.
Colóquio com o arcanjo S. Miguel.

09 de Maio
COLOCAR O CORAÇÃO DE JESUS E DE MARIA
COMO UM SELO SOBRE O NOSSO CORAÇÃO
6 Pone me ut signaculum super cor tuum 6 Põe-me como selo sobre o teu coração,
ut signaculum super brachium tuum quia fortis est como selo sobre o teu braço, porque o amor é forte
ut mors dilectio dura sicut inferus aemulatio como a morte, e duro como a sepultura, o ciúme; as
lampades eius lampades ignis atque flammarum 7 suas brasas são brasas de fogo, são veementes
aquae multae non poterunt extinguere caritatem nec labaredas. 7 As muitas águas não poderiam apagar
flumina obruent illam si dederit homo omnem o amor, nem os rios, afogá-lo; ainda que alguém
substantiam domus suae pro dilectione quasi nihil desse todos os bens da sua casa pelo amor, seria de
despicient eum (Cant 8, 6-7). todo desprezado (Cant 8, 6-7).

Primeiro Prelúdio. Como o amor é poderoso, sobretudo quando tem por objecto a beleza
infinita.
Segundo Prelúdio. Senhor, quero dar tudo por vosso amor e acho que isso não seja nada.
PRIMEIRO PONTO: O Coração sagrado de Jesus e de Maria é o templo do divino
amor. - «Colocai-me como um selo sobre o vosso coração e sobre o vosso braço, diz o Senhor à
esposa do Cântico». O selo real é a marca da autoridade suprema. Se os nossos requerimentos e
os nossos actos estiverem revestidos com o selo real, têm um poder indiscutível. O Esposo
divino permitiu a Maria, depois à Igreja e às almas que marcassem as suas obras com o selo do
seu Coração. Os nossos sacrifícios estão marcados com este selo, ou antes o Coração de Jesus é
o templo mesmo, e o altar dos nossos sacrifícios e o turíbulo onde ardem as nossas preces.
O Coração de Jesus é o Templo magnífico onde Deus recebe as adorações e os louvores
dignos dele.
O Coração de Maria é o segundo santuário do amor divino.
Nestes dois templos, que não fazem senão um só, oferecerei a Deus o culto de adoração
e de amor que lhe devo. Este Coração abençoado será adorador por mim. Serei adorador nele e
por ele. Será também o santuário e o órgão do meu amor. Jesus e Maria unirão o meu fraco
amor ao seu, e assim o meu amor apresentar-se-á munido do selo divino.
SEGUNDO PONTO: O Coração sagrado de Jesus e de Maria é o altar de ouro onde
os nossos corações devem ser oferecidos e imolados a Deus. – O Coração de Jesus e de Maria é
o altar de ouro onde o fogo sagrado do amor está aceso de dia e de noite. Sobre este altar, o
soberano sacerdote, Jesus, oferece-se a si mesmo, com a sua santíssima Mãe, e oferece também
todos os sacrifícios dos santos e dos justos. Oferecerei lá /530 os sacrifícios de acção de graças e
de expiação que devo ao meu Deus.
Devo dar graças à bondade divina pelos benefícios sem número que dele recebi e que
recebo continuamente da sua mão liberal. Hei-de ir buscar ao Coração de Jesus e de Maria tudo
o que me falta. Este Coração Sagrado que vive em mim presta a Deus contínuas acções de
graças por mim e por todas as criaturas, unir-me-ei a ele e oferecê-lo-ei a ele mesmo à soberana
Bondade.
Oferecerei também sobre o altar de ouro do Coração de Jesus todas as minhas
reparações pelos meus pecados e pelas minhas negligências inumeráveis. Como é que eu
poderia pagar esta dívida imensa, se não tivesse este meio providencial? Apresentarei ao meu
Deus que ofendi o Sagrado Coração de Jesus com o de sua santíssima Mãe; oferecerei todas as
dores, angústias e sofrimentos que estes Corações sagrados suportaram por minha causa. Unirei
as minhas lágrimas e a minha contrição à sua dor, e é por eles que hei-de pedir perdão ao Pai
eterno.
Se o Coração de Jesus e de Maria pagam as minhas dívidas e solicitam a minha graça, já
nada tenho a temer da justiça de Deus.
TERCEIRO PONTO: O Coração Sagrado de Jesus é o turíbulo de ouro do divino
amor. – Este turíbulo de ouro está cheio de perfumes que não são outros senão as orações dos
santos e dos justos. É lá que quero depositar todos os meus pedidos e as minhas súplicas. Sinto
muito a minha indignidade para encontrar em mim mesmo a confiança para ser atendido. Assim,
unir-me-ei ao Coração Sagrado de Jesus e de Maria. É por ele e com ele que hei-de pedir a Deus
as suas graças, para mim, para os meus familiares e amigos, para os meus benfeitores e para os
meus inimigos, para os pecadores da terra e pelas almas do purgatório. É por ele e com ele que
hei-de rezar pela santa Igreja, minha mãe, pelo soberano Pontífice, pelos Pastores das almas e
por todos os meus superiores, a fim de que Deus os cumule de luzes e de graças. Posso tudo
esperar e tudo obter rezando desta maneira. Tenho como garantia a palavra mesma do Salvador:
«Tudo o que pedirdes ao meu Pai em meu nome, ele vo-lo concederá (Jo 16, 23), se
permanecerdes em mim e as minhas palavras permanecerem em vós, pedireis o que quiserdes, e
ser-vos-á concedido» (Jo 15, 7). Quando nós rezamos em nome de Jesus e pelo seu Coração, é
ele que reza em nós, é a sua voz que se faz ouvir ao Pai celeste; as nossas orações confundem-se
com as suas; as suas orações absorvem as nossas e revestem-nas dos seus méritos, para os
apresentarem diante do trono da eterna Bondade. Ora, o que é que Deus poderia recusar à
oração do seu divino Filho? /531
Eis como, apesar da nossa fraqueza e da nossa miséria, temos o poder de pagar a Deus
todas as nossas dívidas e de comprarmos todas as graças (P. Eudes, resumido pelo P. Dauphin,
eudista).
Resoluções. – Assim, portanto, não me contentarei em amar a Deus de todo o meu
pobre coração de homem, é demasiado pouco e não é nada, mas amá-lo-ei de todo o meu grande
e divino Coração, isto é, de todo o Coração de Jesus, que me pertence pela graça divina. Com
ele, adorarei a Deus, agradecer-lhe-ei, far-lhe-ei reparação, rezar-lhe-ei por todas as minhas
necessidades. Pensarei nele na minha oração e muitas vezes durante o dia.
Colóquio com o Sagrado Coração de Jesus e de Maria.

10 de Maio
COLOCAR O CORAÇÃO DE JESUS E DEMARIA
COMO UM SELO SOBRE O NOSSO BRAÇO
5 Quae est ista quae ascendit de deserto 5 Quem é esta que sobe do deserto e vem
deliciis affluens et nixa super dilectum suum sub encostada ao seu amado? Debaixo da macieira te
arbore malo suscitavi te ibi corrupta est mater tua despertei, ali esteve tua mãe com dores; ali esteve
ibi violata est genetrix tua 6 pone me ut signaculum com dores aquela que te deu à luz. 6 Põe-me como
super cor tuum ut signaculum super brachium tuum selo sobre o teu coração, como selo sobre o teu
(Cant 8, 5-6). braço (Cant 8, 5-6).
Primeiro Prelúdio. Jesus resgatou a sua Igreja e as nossas almas sobre a cruz. Quer que nós
gravemos nos nossos corações a sua paixão e o seu amor.
Segundo Prelúdio. Quereis também, Senhor, que o meu braço e as minhas obras estejam ao
serviço do vosso amor. Estou resolvido, ajudai-me.
PRIMEIRO PRONTO: Fazer os nossos exercícios espirituais em união com o Sagrado
Coração de Jesus e de Maria. – Colocar o selo do Sagrado Coração de Jesus no nosso braço é
fazer todas as nossas acções no espírito deste santíssimo Coração. Para isso nada nos pode
ajudar melhor do que todas as deliciosas orações jaculatórias sugeridas pelo P. Eudes. Seria
necessário relê-las, aprendê-las e deixar-se penetrar por elas.
Ao despertar: «Viva Jesus e Maria no meu coração e que eu viva eternamente no
Coração sagrado de Jesus e de Maria! – Ó Coração bendito, dou-vos o meu coração, que ele vos
pertença inteiramente e para sempre, com tudo o que eu tenho, com tudo o que eu sou e com
tudo o que vos posso oferecer».
Antes da oração: «Ó Coração de Jesus e de Maria, vinde em minha ajuda, emprestai-me
os vossos sentimentos e o vosso fervor. – Que a minha oração suba até ao trono do Eterno,
como um incenso de agradável odor sobre o altar de ouro do Coração sagrado de Jesus e de
Maria».
Antes da Meditação: «Ó Coração ardente do meu Jesus, dou-vos o meu espírito e o meu
coração. Peço-vos que os possuais e os conduzais na oração segundo a vossa santa vontade».
SEGUNDO PONTO: Para as acções comuns da vida. – Antes do trabalho: «Ó Coração
amabilíssimo e amantíssimo de Jesus e de Maria, ofereço-vos esta acção em honra das que
fizestes neste mundo, e uno-me às santas intenções e às disposições perfeitas que trazíeis em
todos os vossos trabalhos. – Por vós este trabalho, ó Coração de Jesus e de Maria; fazei-o vós
mesmos comigo e dai-me a vossa santa bênção». /533
Antes da refeição: «Ó meu Salvador, ó minha divina Rainha, ofereço-vos esta refeição
em união com aquelas que haveis tomado na terra. – Que cada bocado seja um acto de louvor e
de amor à Santíssima Trindade».
Antes do recreio: «Ó Jesus, ofereço-vos o recreio que vou fazer em união com as santas
recreações e as divinas alegrias que tomastes durante a vossa vida mortal, com o vosso eterno
Pai, com a vossa santa Mãe, com os vossos anjos e os vossos santos. Uno-me às disposições do
vosso Coração sagrado e às de vossa divina Mãe».
Antes de conversar com o próximo: «Ó Jesus, ó Maria, que todas as minhas conversas
com os meus irmãos sejam consagradas a honrar as divinas conversas que tivestes na terra entre
vós e com os homens. Inspirai ao meu coração a humildade, a doçura, a modéstia, com as quais
conversastes neste mundo».
Nas idas e vindas: «Ó meu soberano Mestre, ó minha augusta Rainha, todas as minhas
viagens e todos os meus passos estejam unidos aos passos e às viagens que fizestes neste
mundo. – Ó Coração de Jesus e de Maria, fazei que todo o uso que eu fizer dos meus olhos, da
minha boca, das minhas mãos, dos meus pés e de todos os meus sentidos, proceda de vós e seja
animado do vosso santo amor».
Ao deitar: «Ó meu Deus, ofereço-vos o repouso que vou tomar em honra do repouso
que o meu Jesus e a sua divina Mãe tomaram neste mundo».
TERCEIRO PONTO: Na ocasião de diversos actos de virtude. – Fazendo um acto de
humildade: «Ó Coração amabilíssimo de Jesus e de Maria, ofereço-vos esta acção, esta
humilhação, em honra e em união com todas as humilhações que sofrestes vós mesmo sobre a
terra. Destruí o orgulho e a vaidade no meu coração, e fazei reinar nele a vossa santa
humildade».
Fazendo um acto de penitência e de mortificação: «Ó Coração adorável de Jesus, quero
suportar esta privação, esta penitência, pelo vosso puro amor e em união com as disposições
santas com as quais vós e a vossa divina Mãe suportastes aqui em baixo tantas mortificações e
sofrimentos».
Fazendo um acto de obediência: «Ó Coração obedientíssimo de Jesus e de Maria,
ofereço-vos esta acção em honra da perfeita obediência que praticastes para com os homens e
mesmo para com os vossos inimigos».
Fazendo um acto de caridade: «Ó Coração tão caridoso de Jesus e de Maria, ofereço-
vos esta acção em honra e em união com a vossa caridade sem limites». / 534
Tomando cuidado dos pobres: «O Coração tão compassivo de Jesus, ofereço-vos esta
acção em honra e em união ao amor com o qual descestes do céu para visitardes os pobres e
consolar os que sofrem».
É preciso, diz o santo P. Eudes, que tudo isso se faça naturalmente e que o hábito destas
santas práticas passe por assim dizer à nossa natureza.
Resoluções. – Ó Coração sagrado de Jesus e de Maria, pois que sois a regra e a vida dos
nossos corações, vivei e reinai em nós, a fim de que não tenhamos senão um coração com o
nosso divino Rei e a nossa augusta Rainha. Sede o coração do nosso coração e o princípio dos
nossos pensamentos, das nossas palavras e das nossas acções, a fim de que não mais vivamos
senão da vossa vida, e que não tenhamos outros sentimentos nem outras inclinações senão as
vossas.
Colóquio com o Coração sagrado de Jesus e de Maria.

11 de Maio
MEDITAÇÃO SOBRE AS VIRTUDES
DO CORAÇÃO DE JESUS E DE MARIA
28 Venite ad me omnes qui laboratis et 28 Vinde a mim, todos os que estais
onerati estis et ego reficiam vos 29 tollite iugum cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. 29
meum super vos et discite a me quia mitis sum et Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim,
humilis corde et invenietis requiem animabus porque sou manso e humilde de coração; e achareis
vestris 30 iugum enim meum suave est et onus descanso para a vossa alma. 30 Porque o meu jugo
meum leve est (Mt 11, 28-30). é suave, e o meu fardo é leve (Mt 11, 28-30).
Primeiro Prelúdio. Aprendei de mim que sou doce e humilde de coração, diz-nos o bom Mestre.
Ele ensina-nos a meditar sobre as suas virtudes.
Segundo Prelúdio. Quero, Senhor, considerar as vossas virtudes tão perfeitas para as imitar na
medida das minhas forças. Ajudai-me.
PRIMEIRO PONTO: Adoremos Nosso Senhor contemplando no seu Coração sagrado
a virtude de humildade e de doçura. – Damos aqui um modelo de meditação sobre as virtudes
de Nosso Senhor, fornecido pelo P. Eudes.
Meditamos sobre a virtude de humildade e de doçura. Pode aplicar-se o mesmo método
às outras virtudes do divino Coração de Jesus, à sua obediência, à sua pureza, à sua paciência, à
sua misericórdia, à sua caridade.
Consideremos com atenção como Nosso Senhor praticou esta virtude no seu interior e
no seu exterior, em Nazaré, na sua vida pública e na sua Paixão.
Pelo exercício desta virtude, prestou uma glória infinita ao seu Pai; - reparou
plenamente as ofensas que lhe tínhamos feito pelos pecados contrários a esta mesma virtude; -
libertou-nos das penas eternas que podíamos ter merecido por estes pecados; - ensinou-nos pelo
seu exemplo o modo de praticar esta virtude; - finalmente mereceu-nos a graça necessária e
conveniente para o fazer.
Demos-lhe graças por todos estes favores; - ofereçamo-nos a ele para efectuarmos os
desejos mais ardentes que ele tem de nos ver ornados com esta virtude; - rezemos-lhe para que
nos dê todas as graças de que temos necessidade para cumprirmos em nós os santos desejos do
seu Coração.
SEGUNDO PONTO: Adoremos o Filho de Deus, imprimindo, pela força da sua graça,
uma imagem perfeita desta virtude no Coração sagrado da sua santíssima Mãe. –
Consideremos como esta gloriosa Virgem cooperou cuidadosamente com o seu Filho para
formar no seu próprio Coração uma semelhança muito exacta desta virtude de doçura e de
humildade, aplicando-se a contemplar em Jesus, /536 para a retraçar em si por uma fiel imitação.
Vejamos como, para atingir este fim, a santa Virgem praticou esta virtude de humildade
e de doçura no seu interior e no seu exterior; - nos seus pensamentos, palavras e acções; - em
todos os lugares, em toda a ocasião, em todos os instantes da sua vida, indo sempre crescendo
de dia para dia na perfeição desta virtude; - como finalmente, por este meio, ela prestou uma
grandíssima glória a Deus, e nos pôs diante dos olhos um admirável modelo que nós mais nada
tínhamos a fazer senão segui-lo.
Demos graças ao Filho bem-amado de Maria, por ter assim imprimido no Coração da
sua divina Mãe uma tão maravilhosa semelhança das perfeições do seu próprio Coração.
Agradeçamos também à Mãe de Jesus por toda a glória que ela deu a Deus pela
imitação das virtudes do seu Filho, e especialmente da sua doçura e da sua humildade.
Ofereçamo-nos ao Filho e à Mãe para irmos pelo caminho que eles seguiram, e peçamos
a esta divina Mãe que nos obtenha do seu Filho as graças de que precisamos para o fazer.
TERCEIRO PONTO: Consideremos que, sendo a Mãe de Deus nossa Mãe, e nós sendo
seus filhos, embora infinitamente indignos, somos obrigados a sermos-lhe semelhantes. – Como
o Coração de Maria é um vivo retracto do Coração de Jesus, o nosso coração deve ser também
uma viva imagem do desta divina Mãe. Vejamos, portanto, se o nosso coração tem, sob o
aspecto da doçura e da humildade, alguma semelhança com o seu.
Examinemo-nos sobre as faltas que cometemos, durante toda a nossa vida, contra esta
virtude, e aí havemos de encontrar uma infinidade de motivos para nos confundirmos diante de
Deus, para lhe pedirmos perdão e para tomarmos a resolução de viver de um outro modo do que
aquele que temos feito até agora…
Peçamos à Virgem Maria para nos obter misericórdia, para nos obter as graças de que
temos necessidade para nos corrigirmos e para sermos mais fiéis no futuro no exercício desta
virtude.
Finalmente, ofereçamos e demos o nosso coração a Maria, Rainha de todas as virtudes;
peçamos para aniquilar em nós tudo o que é contrário à humildade e à doçura e de aí gravar uma
perfeita imagem de todas as virtudes do seu Coração e especialmente da sua humildade e da sua
doçura, para a maior glória do seu divino Filho e pela sua.
Ó Coração do Rei dos humildes, abismo de humildade, esmagai em mim tudo o que é
contrário a esta santa virtude e fazei que ela reine perfeitamente/ 537 no meu coração.
Ó Rainha dos corações humildes, fazei reinar no meu coração a humildade do vosso
Filho e a vossa, para que o coração dos filhos tenha alguma semelhança com o de sua Mãe tão
amável!
Resoluções. – O Virgem humilíssima, que tanta glória destes a Deus pela humildade do
vosso Coração, que grande desejo experimento de vos imitar nesta bela virtude! Ajudai-me,
tornai-me participante das vossas divinas luzes, a fim de que eu conheça os motivos infinitos
que tenho para me abaixar. Os meus pecados impõem-me um tão grande dever!
Colóquio com o Coração humilde e doce de Jesus e de Maria.
12 de Maio
CONSAGRAÇÃO E PÚBLICA RETRACTAÇÃO
AO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS E DE MARIA
3 Dixitque Dominus ad eum exaudivi 3 E o SENHOR lhe disse: Ouvi a tua
orationem tuam et deprecationem tuam qua oração e a tua súplica que fizeste perante mim;
deprecatus es coram me sanctificavi domum hanc santifiquei a casa que edificaste, a fim de pôr ali o
quam aedificasti ut ponerem nomen meum ibi in meu nome para sempre; os meus olhos e o meu
sempiternum et erunt oculi mei et cor meum ibi coração estarão ali todos os dias (1Rs 9, 3).
cunctis diebus (1Rs 9, 3)
Primeiro Prelúdio. Salomão consagrou a Deus o seu belo templo, consagrou-se também a Deus
com todo o seu povo e Deus promete velar sobre eles com a ternura do seu divino coração.
Segundo Prelúdio. Digamos com Salomão: Que o nosso coração esteja perfeitamente unido a
Deus, para que observemos todos os dias a sua vontade (1Rs 8,61).
PRIMEIRO PONTO: Consagração ao Sagrado Coração de Jesus e de Maria. – Ó
Jesus, meu misericordiosíssimo e adorabilíssimo Salvador, humildemente prostrado aos vossos
pés, unindo-me a todos os corações que vos amam no céu e sobre a terra, louvo-vos e adoro-vos
com todas as forças da minha alma. Escolho hoje o vosso divino Coração como Rei do meu
coração, e o de vossa santíssima Mãe para o meu refúgio em todas as minhas necessidades
espirituais e corporais. Ofereço-vos, dou-vos e consagro-vos o meu corpo, a minha alma e tudo
o que eu sou, desejando que todas as pancadas e todos os sentimentos do meu coração, todos os
meus pensamentos, as minhas palavras e as minhas acções, para o presente e para o futuro,
sejam tantos actos de adoração e de amor ao vosso Coração Sagrado, ó Jesus, quantos actos de
confiança e de louvor ao da vossa santa Mãe.
Ó meu Salvador, uni tão estreitamente o meu coração ao vosso Coração Sagrado e ao de
vossa divina Mãe, que não tenha outro sentimento, outra afeição ou outra vontade senão os
vossos, para a mais pura glória e o único contentamento do Filho e do Mãe e que, vivendo e
morrendo no exercício do puro amor destes divinos Corações, continue a amá-los e a glorificá-
los durante toda a eternidade (Extracto de um opúsculo do P. Eudes).
SEGUNDO PONTO: Pública retractação ao Coração de Jesus no Santíssimo
Sacramento. Ó Coração adorável de Jesus, quisestes, pelo excesso do mais prodigioso de todos
os amores, colocar-vos em estado de vítima no sacramento da Eucaristia, a fim de aí vos
oferecerdes continuamente ao vosso Pai, /539 em sacrifício de propiciação pelos nossos pecados.
Mas infelizmente, a maior parte dos homens não respondem às vossas ternuras senão pela
dureza, pelo esquecimento, pelo desprezo e pela ofensa.
Ah! Não é então justo que nós, tocados por tantas ingratidões criminosas, procuremos
repará-las com todo o nosso poder? É por isso que, ó divino Coração de Jesus, prostrados e
aniquilados diante de vós, vos fazemos hoje de tudo isso uma reparação sincera.
Perdão, ó Coração misericordiosíssimo, perdão por todas as injúrias, por todos os
desprezos e ultrajes que recebestes durante todo o decurso da vossa vida santa e da vossa
dolorosa paixão; perdão por todas as impiedades, por todas as irreverências, por todos os
sacrilégios que foram cometidos contra vós até a este dia no adorável sacramento da Eucaristia;
perdão por todas as nossas friezas, pela nossa insensibilidade e pelas nossas distracções sem
número na vossa divina presença.
Mas, ó Coração Sagrado, vós conheceis a nossa impotência: sede, portanto, vós mesmo,
com o santo Coração de Maria, o nosso reparador e o nosso mediador; apaziguai a cólera de
vosso Pai celeste que os nossos pecados irritaram contra nós; cobri os nossos defeitos com a
vossa ardente caridade, com a vossa humildade profunda, com a vossa doçura, com a vossa
paciência e com todas as vossas divinas virtudes (Manual dos filhos da Mãe admirável).
TERCEIRO PONTO: Consagração ao santíssimo Coração de Maria. – Prostrado
diante de vós, ó Mãe de misericórdia, honro o vosso Coração bendito com o mais profundo
respeito de que sou capaz; agradeço-vos pelos sentimentos de misericórdia e de amor com que
fostes tão frequentemente tocada à vista das minhas misérias; dou-vos graças por todos os
benefícios que recebi da vossa maternal bondade; uno-me a todas as almas puras que encontram
as suas delícias e a sua consolação em honrar-vos, em louvar-vos e em amar-vos. Elas
aprenderam do Espírito Santo que é por vós que devemos ir a Jesus Cristo e assim
desempenhar-nos perante ele de todos os nossos deveres.
Vós sereis, ó Coração todo amável, o meu refúgio nas minhas aflições, a minha
consolação nas minhas mágoas, o meu socorro em todas as minhas necessidades. Irei aprender
de vós a pureza, a humildade, a doçura e sobretudo o amor de Jesus. Pedirei estas virtudes pelos
vossos méritos, seguro de que elas não poderão ser-me recusadas.
Ouso apresentar-vos o meu pobre coração manchado por mil pecados, todo indigno
como é de vós; espero que não haveis de o desprezar. Fazei, / 540 pela vossa poderosa mediação,
que seja purificado e desapegado de todas as criaturas; penetrai-o com a dor dos seus pecados;
enchei-o com o amor do divino Coração de Jesus, vosso Filho, para que possa estar unido a vós
no céu e aí amar a Deus eternamente convosco.
Resolução. – Dou-vos e consagro-vos para sempre o meu coração, ó Jesus, ó Maria.
Tomai-o com todos os seus afectos; que não ame senão a vós, que não suspire senão por vós.
Lanço-o na fornalha do vosso Coração Sagrado, que é um só coração. É lá que quero fazer a
minha morada, viver e morrer de amor. Não, espero-o, nunca mais nada me separará do amor do
Coração de Jesus e de Maria.
Colóquio com o Coração Sagrado de Jesus e de Maria.

13 de Maio
DA DOCILIDADE À CONDUTA DO ESPÍRITO SANTO
16 Et ego rogabo Patrem et alium 16 E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro
paracletum dabit vobis ut maneat vobiscum in Consolador, a fim de que esteja para sempre
aeternum 17 Spiritum veritatis quem mundus non convosco, 17 o Espírito da verdade, que o mundo
potest accipere quia non videt eum nec scit eum não pode receber, porque não no vê, nem o
vos autem cognoscitis eum quia apud vos manebit conhece; vós o conheceis, porque ele habita
et in vobis erit (Jo 14,16-17). convosco e estará em vós (Jo 14, 16-17).
Primeiro Prelúdio. O mundo é demasiado agitado para escutar o Espírito Santo e reconhecer a
sua voz. É preciso para isso a calma da vida interior.
Segundo Prelúdio. Bom Mestre, suplico-vos que purifiqueis a minha alma para que ela escute a
voz do Espírito Santo.
PRIMEIRO PONTO: Em que consiste esta docilidade. Quando uma alma se abandona à
conduta do Espírito Santo, ele eleva-a pouco a pouco acima da vida natural e governa-a. No
princípio não sabe para onde vai, mas pouco a pouco a luz interior ilumina-a e faz-lhe ver todas
as suas acções e o governo de Deus nas suas acções, de modo que ela não tem quase nada a
fazer senão deixar que Deus faça nada, e por ela, o que lhe agradar; assim ela avança
maravilhosamente.
Nós temos uma figura da condução do Espírito Santo na que Deus teve a respeito dos
Israelitas ao saírem do Egipto, durante a sua viagem no deserto, para chegarem à terra da
promessa. Deu-lhes para os conduzir, durante o dia uma coluna de nuvem, durante a noite uma
coluna de fogo. Eles seguiam o movimento desta coluna e detinham-se quando ela parava. Não
a ultrapassavam, seguiam-na apenas, e nunca se afastavam dela. É assim que nos devemos
comportar a respeito do Espírito Santo.
É preciso para isso de muita calma, de recolhimento e de espírito de fé (P. Luís
Lallemant).
SEGUNDO PONTO: Os meios para chegar a esta docilidade. – Os principais meios
para chegar a esta docilidade são: 1. Obedecer fielmente às vontades de Deus que conhecemos
já. Mas há muitos que não conhecemos, porque estamos cheios de ignorância; mas Deus só nos
pedirá contas dos conhecimentos que nos terá dado; façamos um bom uso deles, ele dar-nos-á
novos. /542 Cumpramos aquilo que já nos deu a conhecer dos seus desígnios, e ele nos há-de
manifestar depois os outros.
2. Renovar muitas vezes o bom propósito de seguir em todas as coisas a vontade de
Deus, e consolidar-nos nesta resolução tanto quanto é possível. 3. Pedir sem cessar a luz e a
força do Espírito Santo para cumprir as vontades de Deus, ligar-nos ao Espírito Santo e
mantermo-nos agarrados a ele, como S. Paulo que dizia aos presbíteros de Éfeso: «Estando
ligado pelo Espírito Santo vou-me embora para Jerusalém»; sobretudo na mudança das acções
mais importantes pedir a Deus a luz do Espírito Santo, e protestar-lhe sinceramente que não
desejamos outra coisa senão fazer a sua vontade. Depois do que, se não nos der novas luzes,
começaremos a fazer o que estamos acostumados a fazer e o que nos parecer então melhor.
4. Observar exactamente os diversos movimentos da nossa alma. Por esta diligência,
chegaremos pouco a pouco a conhecer o que é de Deus e o que não é. O que vem de Deus,
numa alma submetida à graça, é ordinariamente pacífico e tranquilo. O que vem do demónio é
violento e traz consigo a perturbação e a ansiedade.
TERCEIRO PONTO: Que é fácil conhecer a condução do Espírito Santo. – 1. As luzes
e as inspirações do Espírito Santo, que são necessárias para fazer o bem e evitar o mal, não nos
faltam nunca, principalmente se estivermos em estado de graça.
2. Se formos fiéis a seguir a luz que nos é dada, irá crescendo sempre. Como é
encorajadora esta verdade!
3. Se cortamos com cuidado os pecados e as imperfeições, os quais, como tantas
nuvens, nos ocultam esta luz, veremos de dia para dia mais claro.
4. Não soframos nada senão que os nossos sentidos se extraviem e se manchem com
sensualidades, e Deus abrir-nos-á os sentidos interiores.
5. Não saiamos nunca, se possível, do nosso interior, e estejamos atentos ao que se
passa, observaremos os movimentos dos diferentes espíritos que nos fazem agir.
6. Descubramos todo o fundo do nosso coração ao nosso Superior ou ao nosso padre
espiritual. Uma alma que tem esta candura e esta simplicidade nunca deixa de ser favorecida
pela direcção do Espírito Santo.
7. Acrescentemos que é preciso desconfiar do demónio, que é o inimigo encarniçado do
Espírito Santo. Ele procura sempre desviar-nos da conduta do /543 Espírito Santo. Serve-se das
ocasiões que se apresentam, da recordação das coisas passadas, das novas que se esperam, dos
objectos que tocam aos sentidos, do nosso humor e das nossas paixões, fazendo jogar todos
estes recursos, ora um ora outro, para manter o nosso espírito e o nosso coração com alguma
bagatela, na qual nos detemos, ou por pensamentos ou reflexões inúteis ou por vãos desejos ou
vãos temores, ou por algum outro movimento de uma paixão não mortificada.
Tudo o que tira a paz e a tranquilidade do interior vem do demónio. As graças não só
santificam a alma, mas ainda a consolam e a enchem de paz e de doçura.
Resoluções. – Quero entregar-me doravante à condução do Espírito Santo. Quero a ela
entregar-me totalmente e sem reserva. Falai, Senhor, o vosso servo escuta. Não quero deter-me
mais com as bagatelas da vida. Sede o meu guia, o meu preceptor. Falai à minha alma, no seu
interior. Quero desviar-me das distracções e escutar-vos sempre. Senhor, que quereis que eu
faça?
Colóquio com o Espírito Santo.
14 de Maio
MOTIVOS QUE NOS LEVAM A ESTA DOCILIDADE
À CONDUÇÃO DO ESPÍRITO SANTO
25 Haec locutus sum vobis apud vos 25 Isto vos tenho dito, estando ainda
manens 26 paracletus autem Spiritus Sanctus convosco; 26 mas o Consolador, o Espírito Santo, a
quem mittet Pater in nomine meo ille vos docebit quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará
omnia et suggeret vobis omnia quaecumque todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos
dixero vobis (Jo 14, 25-26). tenho dito (Jo 14,25-26).
Primeiro Prelúdio. É Nosso Senhor mesmo que nos dirige pelo seu Espírito. Que loucura não
lhe estarmos atentos!
Segundo Prelúdio. Falai, Senhor, pelo vosso Espírito Santo. O vosso servo escuta.
PRIMEIRO PONTO: Que a perfeição e mesmo a salvação dependem da docilidade à
graça. – Os dois elementos da vida espiritual são a purificação do coração e a direcção do
Espírito Santo. Aqui estão os dois pólos de toda a espiritualidade. Por estas duas vias, chegamos
à perfeição segundo o grau de pureza que adquirimos, e a proporção de fidelidade que tivemos
em cooperar com os movimentos do Espírito Santo e em seguirmos a sua condução.
Toda a nossa perfeição depende desta fidelidade, e podemos dizer que o resumo da vida
espiritual consiste em notar as vias e os movimentos do Espírito de Deus na nossa alma, e em
fortificar a nossa vontade na resolução de os seguirmos, empregando para o efeito todos os
nossos exercícios e todos os nossos actos religiosos, a oração, a leitura, os sacramentos, a
prática das virtudes e das boas obras.
O fim ao qual devemos aspirar, depois que nos tivermos longamente exercitado na
pureza do coração, é estarmos de tal modo possuídos e governados pelo Espírito Santo, que seja
ele o único que conduza todas as nossas potências e todos os nossos sentidos, e que regule todos
os nossos movimentos interiores e exteriores como dirigia a santa humanidade do Salvador, e
que nos abandonemos inteiramente a ele por uma renúncia espiritual das nossas vontades e das
nossas próprias satisfações. Assim, não viveremos mais em nós mesmos, mas em Jesus Cristo e
segundo o seu Coração, por uma fiel correspondência às operações do seu divino Espírito, e por
uma perfeita submissão de todas as nossas rebeliões ao poder da sua graça.
SEGUNDO PONTO: Poucas pessoas alcançam as graças que Deus lhes destinou. – A
maior parte não tem coragem para se vencer nem fidelidade para bem / 545 administrar os dons de
Deus. Quando entramos no caminho da virtude, caminhamos no princípio na obscuridade, mas
se seguirmos constante e fielmente a graça, chegamos infalivelmente a uma grande luz quer
para nós quer para os outros. – Nós quereríamos ser santos num dia, e não temos a paciência de
esperar o curso normal da graça. Isto vem do nosso orgulho e da nossa cobardia. Limitemo-nos
a ser fiéis a cooperar nas graças que Deus nos apresenta; e ele não faltará em nos conduzir ao
cumprimento dos seus desígnios.
O principal ponto da vida espiritual consiste de tal modo em dispor-se à graça pela
pureza de coração, que duas pessoas que se consagram ao mesmo tempo ao serviço de Deus,
uma dando-se totalmente às boas obras, e a outra aplicando-se inteiramente a purificar o seu
coração e a arrancar o que nela se opõe à graça, esta chegará duas vezes mais cedo à perfeição
do que aquela.
Assim o nosso maior cuidado deve ser, não tanto o de lermos livros espirituais, mas sim
o de darmos muita atenção às inspirações divinas que bastam, com um pouco de leitura e com
sermos extremamente fiéis a correspondermos às graças que nos são oferecidas. – Devemos
ainda pedir muitas vezes a Deus que nos faça reparar antes da morte todas as perdas de graças
que provocámos, e que nos faça chegar ao cume dos méritos aonde desejava conduzir-nos
segundo a sua primeira intenção, que nós até agora frustrámos pelas nossas infidelidades: enfim
que ele nos perdoe os pecados de outros dos quais fomos a causa, e que repare também nos
outros as perdas de graças que sofreram por nossa falta (P. Luís Lallemant).
TERCEIRO PONTO: O mal é que muitas almas não seguem quase em tudo senão a
natureza e o sentido humano. A maior parte dos religiosos, mesmo bons e virtuosos, não
seguem, na sua conduta particular e na dos outros senão a razão e o bom senso: no que muitos
deles são excelentes. Esta regra é boa, mas não basta para a perfeição cristã.
Essas pessoas conduzem-se em geral pelo sentimento comum daqueles com os quais
vivem, e como estes são imperfeitos, mesmo se as suas vidas não são desregradas, porque o
número dos perfeitos é muito pequeno, nunca chegam aos sublimes caminhos do espírito: vivem
como o comum e a sua maneira de governar os outros é imperfeita. – O Espírito Santo espera
durante algum tempo que entrem no seu interior, e que observando aí as operações da graça e as
/546 da natureza, se disponham a seguir a sua condução: mas se abusam do tempo e do favor que
lhes oferece, abandona-os por fim a si mesmos, e deixa-os nesta obscuridade e nesta ignorância
do seu interior que afectaram, e na qual vivem doravante entre grandes perigos para a sua
salvação.
Poucas pessoas se mantêm constantemente nos caminhos de Deus. Muitos afastam-se
deles sem cessar: o Espírito Santo recorda-lhes pelas suas inspirações, mas como são indóceis,
cheios de si mesmos, agarrados aos seus sentimentos e aos seus sentidos, não se deixam
conduzir e não entram senão muito raramente na via dos desígnios de Deus. São surpreendidos
na morte, não tendo dado senão vinte passos, quando podiam ter dado mil.
Resoluções. – Suplico-vos, Senhor Jesus, que repareis, pelos méritos do vosso divino
Coração, todas as perdas de graças que sofri. Fazei-me chegar ao ponto aonde quereis conduzir-
me. Colocai-me sob a condução do Espírito Santo, como vós mesmo estáveis. Perdoai-me os
pecados dos outros dos quais fui a causa, e reparai também nos outros as perdas de graças que
sofreram por minha causa.
Colóquio com o Espírito Santo.

15 de Maio
EXCELÊNCIA DA GRAÇA DO ESPÍRITO SANTO
E A INJUSTIÇA DA OPOSIÇÃO QUE LHE É FEITA
10 Respondit Iesus et dixit ei si scires 10 Replicou-lhe Jesus: Se conheceras o
donum Dei et quis est qui dicit tibi da mihi bibere dom de Deus e quem é o que te pede: dá-me de
tu forsitan petisses ab eo et dedisset tibi aquam beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva. 11
vivam 11 dicit ei mulier Domine neque in quo Respondeu-lhe ela: Senhor, tu não tens com que a
haurias habes et puteus altus est unde ergo habes tirar, e o poço é fundo; onde, pois, tens a água
aquam vivam 12 numquid tu maior es patre nostro viva? 12 És tu, porventura, maior do que Jacob, o
Iacob qui dedit nobis puteum et ipse ex eo bibit et nosso pai, que nos deu o poço, do qual ele mesmo
filii eius et pecora eius 13 respondit Iesus et dixit ei bebeu, e, bem assim, seus filhos, e seu gado? 13
omnis qui bibit ex aqua hac sitiet iterum qui autem Afirmou-lhe Jesus: Quem beber desta água tornará
biberit ex aqua quam ego dabo ei non sitiet in a ter sede; 14 aquele, porém, que beber da água que
aeternum 14 sed aqua quam dabo ei fiet in eo fons eu lhe der nunca mais terá sede; pelo contrário, a
aquae salientis in vitam aeternam (Jo 4, 10-14) água que eu lhe der será nele uma fonte a jorrar
para a vida eterna (Jo 4, 10-14).
Primeiro Prelúdio. – Se as almas conhecessem o dom de Deus, estariam sedentas de graça, mas
são descuidadas.
Segundo Prelúdio. – Senhor, dai-me esta sede e esta água vivificantes.
PRIMEIRO PONTO: A excelência da graça. – Devemos receber cada inspiração como
uma palavra de Deus, que procede da sua sabedoria, da sua misericórdia, da sua bondade
infinita, e que pode operar em nós maravilhosos efeitos, se não lhe pusermos nenhum obstáculo.
Consideremos o que uma palavra de Deus pôde fazer; ela criou o céu e a terra, tirou
todas as coisas do nada tornando-as participantes no ser de Deus, porque não encontrou
resistência no nada. Ela operaria em nós algo de mais se não lhe resistíssemos. Tirar-nos-ia do
nada moral para a participação sobrenatural da santidade de Deus no estado da graça, e a
participação da felicidade de Deus no estado da glória; e por bagatelas, por algumas satisfações
do amor-próprio ou dos sentidos, impedimos estes grandes efeitos da palavra de Deus, das suas
inspirações e das impressões do seu Espírito. Depois disso, não havemos de confessar que a
sabedoria teve razão ao dizer que o número dos loucos é infinito?
As inspirações de Deus permanecem na superfície da nossa alma, por causa da oposição
que encontram em nós; mas penetram docemente nas almas que são possuídas por Deus e
enchem-nas desta admirável paz que acompanha sempre o Espírito de Deus.
SEGUNDO PONTO: Injustiça e loucura da oposição que lhe fazemos. – Uma das
nossas maiores infelicidades é que somos tão sensuais e tão vãos que não estimamos nem
gostamos senão daquilo que tem brilho e que lisonjeia os sentidos; e, no entanto, que a mínima
inspiração de Deus é uma coisa mais preciosa e mais excelente que o mundo inteiro todo, / 548
porque é de uma ordem sobrenatural, e porque custou o sangue e a vida de um Deus.
Que loucura! Somos insensíveis às inspirações de Deus, porque são espirituais e
infinitamente elevadas acima dos sentidos. Não fazemos disso grande caso, preferimos o
sucesso, as comodidades, as satisfações. Prodigiosa ilusão, da qual, no entanto, muitos não se
desenganam senão à hora da morte.
Nós cometemos duas grandes injustiças a respeito de Deus: a primeira, é a de retirar ao
Espírito Santo a direcção da nossa alma, que lhe pertence e de a usurparmos; a segunda é que, a
parte superior da nossa alma devendo pertencer totalmente a Deus, nós a enchemos de criaturas
a seu prejuízo: e em vez de a dilatarmos e de a purificarmos e de a santificarmos pela presença
de Deus, nós a rebaixamos ocupando-a com alguns miseráveis pequenos objectos de nada. Eis o
que nos impede de chegar à perfeição.
Resulta mesmo dos nossos hábitos de tibiez e de afeições naturais, que o Espírito Santo
se cala a nosso respeito. Deus recusa-nos os segredos das suas graças, porque prevê que se no-
las desse, nas disposições em que estamos, não nos serviriam de nada, estando a nossa vontade
ligada com mil laços que a impediriam de lhe consentir.
Quando alguém se encontra assim, é preciso que se ponha de novo a trabalhar na pureza
do seu coração, pela humildade, pela contrição e pelo desapego. Lá, não há que temer a ilusão
do demónio, porque ele nunca leva as almas a purificar-se.
TERCEIRO PONTO: Como o Espírito Santo é para nós um consolador. – Santo
Atanásio observa que o Espírito Santo não recebeu este nome no Antigo Testamento. A razão
disso está nestas palavras de Nosso Senhor: «Se eu não for, o Consolador não virá para vós; mas
se eu for, mandá-lo-ei a vós». É um dom do coração de Jesus glorificado. Era por isso que
Nosso Senhor dizia: «É-vos útil que eu me vá embora».
O Espírito Santo consola-nos primeiro na incerteza da nossa salvação. Encontramos
aqui tantos obstáculos! A nossa natureza é tão oposta ao bem! É esta incerteza que faz tremer os
santos. Mas nesta pena o Espírito Santo consola-nos, sendo o Espírito da adopção dos filhos de
Deus, e como diz S. Paulo, o penhor e a garantia da herança celeste. O Espírito Santo dá às
almas fervorosas e fiéis um testemunho interior de que elas pertencem a Deus e de que Deus
lhes pertence; e este testemunho /549 elimina o seu temor e faz a sua consolação.
O Espírito Santo consola-nos também nas tentações e nas aflições da vida. A unção que
espalha nas almas fortifica-as, adoça as suas mágoas e faz-lhes saborear o preço da cruz.
Consola-nos, finalmente, no exílio em que vivemos aqui em baixo, longe de Deus.
Desfalecemos, longe do nosso bem supremo. É um martírio que nos seria insuportável, sem as
consolações que o Espírito Santo nos dá de tempos a tempos.
Resoluções. – Seguir a condução do Espírito Santo, corresponder às inspirações divinas,
tal deve ser a minha ocupação constante e toda a minha vida. É pelo Espírito Santo que o
Sagrado Coração me fala e me conduz. Perdão, Senhor, por ter sido por tanto tempo surdo à
vossa voz! Não me abandoneis, voltai ainda para a minha pobre alma tão ingrata. Falai-lhe
fortemente e não a deixeis mais.
Colóquio com o Espírito Santo.

16 de Maio
OS DONS DO ESPÍRITO SANTO
2 Et requiescet super eum spiritus Domini 2 Repousará sobre ele o Espírito do
spiritus sapientiae et intellectus spiritus consilii et SENHOR, o Espírito de sabedoria e de
fortitudinis spiritus scientiae et pietatis 3 et replebit entendimento, o Espírito de conselho e de fortaleza,
eum spiritus timoris Domini non secundum o Espírito de conhecimento e de temor do
visionem oculorum iudicabit neque secundum SENHOR. 3 Deleitar-se-á no temor do SENHOR;
auditum aurium arguet (Is 11, 2-3). não julgará segundo a vista dos seus olhos, nem
repreenderá segundo o ouvir dos seus ouvidos (Is
11, 2-3).
Primeiro Prelúdio. Nosso Senhor prometeu-nos o seu Espírito, mas o seu Espírito tinha sido
descrito por Isaías, é rico em dons que elevam a alma acima da vida natural.
Segundo Preludio. Dai-me, Senhor, estes dons preciosos que brotam do vosso divino Coração.
PRIMEIRO PONTO: Dos dons do Espírito Santo em geral. – Os dons do Espírito Santo
são hábitos ou qualidades permanentes que Deus comunica à alma com a graça santificante e
com as virtudes infusas, para fortificar as potências naturais, e para as tornar maleáveis aos
movimentos do seu divino Espírito, e capazes de exercer os actos das virtudes mais difíceis e
mais nobres, que chamamos heróicas.
É o Coração de Jesus que é a sua fonte.
Os dons não subsistem na alma sem a caridade; e na proporção em que a graça cresce,
crescem eles também. Daí vem que eles são muito raros e não chegam a um alto grau de
excelência, porque não são suportados por uma fervorosa e perfeita caridade; os pecados veniais
e as mínimas imperfeições mantendo-os como que ligados, e impedindo-os de agir. O seu
progresso está em relação com o da oração.
Os dons do Espírito Santo, pela sua acção íntima, sem discursos, sem perplexidade,
mostram-nos o que é melhor, fazendo-nos vê-lo na luz de Deus, com mais ou menos evidência,
segundo o grau em que os possuímos.
Compara-se aqueles que se conduzem pelos dons do Espírito Santo a um navio que
voga a plenas velas, com o vento em popa; e aqueles que se conduzem pelas virtudes, e ainda
não pelos dons, a uma chalupa que se faz andar à força de remos, com muito mais trabalho e
barulho, e muito mais lentamente. /551
SEGUNDO PONTO: Do dom de sabedoria. – O dom de sabedoria é um conhecimento
saboroso de Deus, dos seus atributos, de Jesus Cristo, do seu Coração e dos seus mistérios. A
inteligência ajuda-nos somente a conceber a Deus e os seus atributos; mas a sabedoria
representa-nos Deus, a sua grandeza, a sua beleza, as suas perfeições, os seus mistérios como
infinitamente adoráveis e amáveis: e deste conhecimento resulta um gosto delicioso que se
estende mesmo algumas vezes até ao corpo, e que é maior ou menor conforme o estado de
perfeição e de pureza em que a alma se encontra.
S. Francisco estava tão cheio deste gosto de sabedoria que, ao pronunciar o nome de
Deus ou o nome de Jesus, sentia na sua boca e nos seus lábios um sabor mais doce mil vezes
que o mel e que o açúcar.
S. Bernardo diz-nos que o nome de Jesus é um mel nos seus lábios, uma harmonia nas
suas orelhas, uma doce fruição no seu coração. – É ao dom da sabedoria que pertencem
particularmente as doçuras e as consolações espirituais e as graças sensíveis.
No começo da vida espiritual, as coisas divinas são insípidas e temos dificuldade em
saboreá-las; mas depois elas tornam-se doces e tão saborosas que saboreamo-las com prazer, até
não termos senão desgosto por tudo o resto.
S. Bernardo diz: A sabedoria é o amor da virtude e o sabor do bem. Desde que alguém
lhe dê entrada numa alma, ela amortece os sentimentos da carne, purifica o entendimento, cura o
gosto corrompido do coração, dá à alma uma perfeita santidade, que a coloca em estado de
apreciar o sabor do bem e o da sabedoria mesma, que, de todos os bens, é o mais excelente e o
mais doce (P. Lallemant).
TERCEIRO PONTO: A sabedoria do mundo é loucura aos olhos de Deus. – A
sabedoria divina refere tudo ao nosso fim soberano, que é a glória de Deus. A sabedoria
humana, que é loucura, toma por fim e por primeiro princípio, ou a honra, ou o prazer, ou
qualquer outro bem temporal, nada mais apreciando senão isso e a isso referindo tudo, nada
mais procurando nem estimando do que isso e desprezando todo o resto.
O verdadeiro sábio, diz S. Tomás, julga bem das coisas que dizem respeito à sua
conduta, porque as julga em relação ao primeiro princípio e ao fim último, que é Deus; e o outro
julga mal porque não toma esta causa soberana por regra dos seus sentimentos e das suas
acções.
O mundo está cheio desta espécie de loucura. A maior parte dos homens têm o gosto
depravado, porque metem o seu fim, ao menos em prática, na criatura e não em Deus. Cada qual
tem algum objecto ao qual se prende /552 e ao qual refere tudo e isto é uma loucura.
O mundo chama loucura ao que é a verdadeira sabedoria diante de Deus. O Sagrado
Coração de Jesus amou a humildade, a pobreza, a cruz e a abjecção, como meios de reparar as
nossas faltas. As almas dotadas com o dom da sabedoria sentem um sabor delicioso nestes
objectos que Nosso Senhor amou, mas poucas almas têm os sentidos suficientemente apurados
para sentirem este odor e para apreciarem este sabor que são todos sobrenaturais.
Os santos correram atrás do odor destes perfumes. Os apóstolos estavam alegres por
levarem a cruz por Jesus.
Resoluções. – Senhor, dai-me esta água a beber, a água da vossa sabedoria, que brota do
vosso divino Coração. Tenho sede dela, desejo-a, peço-a. Dai-me esta sabedoria, quero
preparar-me para ela, tanto quanto está em mim, pela pureza do coração e pela vigilância. Quero
evitar o pecado venial e a tibieza, que vos afastam do meu coração. Perdoai-me o passado,
ajudai-me para o futuro.
Colóquio com o Sagrado Coração.

17 de Maio
OS DONS DO ESPÍRITO SANTO
A INTELIGÊNCIA EA CIÊNCIA
Quae Dei sunt nemo cognovit nisi Spiritus 11 Assim, também as coisas de Deus,
Dei 12 nos autem non spiritum mundi accepimus ninguém as conhece, senão o Espírito de Deus. 12
sed Spiritum qui ex Deo est ut sciamus quae a Deo Ora, nós não temos recebido o espírito do mundo, e
donata sunt nobis 13 quae et loquimur non in sim o Espírito que vem de Deus, para que
doctis humanae sapientiae verbis sed in doctrina conheçamos o que por Deus nos foi dado
Spiritus spiritalibus spiritalia conparantes 14 gratuitamente. 13 Disto também falamos, não em
animalis autem homo non percipit ea quae sunt palavras ensinadas pela sabedoria humana, mas
Spiritus Dei (1Cor 11, 11-14). ensinadas pelo Espírito, conferindo coisas
espirituais com espirituais. 14 Ora, o homem
natural não aceita as coisas do Espírito de Deus
(1Cor 11, 11-14).
Primeiro Prelúdio. S. Paulo, nos primeiros capítulos desta bela Epístola, ensina-nos globalmente
a excelência do espírito de inteligência e de ciência e a sua superioridade sobre a ciência humana.
Segundo Prelúdio. Dai-me, Senhor, esta inteligência e esta ciência, que me são tão necessárias
para a minha própria direcção e para ajudar as almas a irem até Deus.
PRIMEIRO PONTO: O dom de inteligência. – O dom de inteligência é uma luz que o
Espírito Santo dá para penetrar intimamente as verdades da fé; e esta penetração, diz S. Tomás,
deve fazer conceber uma verdadeira ideia e uma estima justa do fim último e de tudo o que a ele
se refere.
O objecto da nossa fé é Deus e os seus mistérios, com a nossa vida em Deus e as nossas
relações sobrenaturais com o próximo.
O que a fé nos faz simplesmente acreditar, o dom da inteligência no-lo faz penetrar mais
claramente. – Aqueles cujo ofício é instruir os outros, os pregadores, os directores, devem estar
cheios deste dom. É particularmente necessário para bem entendermos o sentido da Escritura
sagrada e as suas figuras alegóricas.
S. Jerónimo teve o dom da inteligência, particularmente para o sentido literal; S.
Gregório para o sentido moral; Sto. Ambrósio e Sto. Agostinho para o sentido alegórico.
S. Bernardo pela grande pureza do seu coração, saboreava o sentido moral mais
elevado, o sentido místico da Escritura.
Entremos nas disposições dos Santos para lermos com fruto a Sagrada Escritura.
SEGUNDO PONTO: O dom da ciência. – O dom de ciência é uma participação da
ciência de Deus, uma luz do Espírito Santo que ilumina a alma para conhecer as coisas humanas
em Deus e segundo a fé./554
Quando conhecemos Deus pelas criaturas e nos elevamos do conhecimento das causas
segundas para a causa primeira e universal, aqui está um acto da ciência.
A sabedoria discerne os espíritos por via de gosto e de experiência; e a ciência, por via
de conhecimento.
O dom de ciência faz-nos ver pronta e certamente tudo o que diz respeito à nossa
conduta e à dos outros. Faz-nos conhecer: 1. O estado da nossa alma, os nossos actos interiores,
os movimentos do nosso coração, as suas qualidades, os seus defeitos, os seus princípios, os
seus motivos, os seus fins, as suas intenções, os seus efeitos e consequências, as virtudes a
praticar, a ordem e o cuidado que nisso é necessário pôr.
2. O juízo que devemos ter das criaturas e o uso que delas devemos fazer para a vida
interior e sobrenatural; quanto eles são frágeis, vãs, de pouca duração, nocivas ou perigosas para
a salvação, e pouco capazes de nos tornarem felizes.
3. A maneira de conversar e de tratar com o próximo, em relação ao fim sobrenatural da
nossa criação. Um pregador conhece por este dom o que deve dizer aos seus auditores e como
os deve pressionar; um director conhece o estado das almas que tem sob a sua condução, as suas
necessidades espirituais, os remédios para os seus defeitos, os obstáculos que põem à sua
perfeição, a via mais segura e mais curta para as conduzir bem; como é preciso consolá-las ou
mortificá-las; o que Deus opera nelas e o que elas devem fazer da sua parte para cooperarem
com Deus e para cumprirem os seus desígnios. Um superior conhece de que modo deve
governar os seus inferiores.
TERCEIRO PONTO: Da necessidade que temos do dom de ciência e dos meios para o
adquirirmos. – Aqueles que participam no dom de ciência são os mais esclarecidos para o seu
próprio avanço e para a direcção das almas. Têm grandes luzes para a prática das virtudes.
Descobrem a sua perfeição. Vêm com um simples olhar se as acções são inspiradas de Deus e
conformes aos seus desígnios. Logo que se afastam por pouco que seja das vias de Deus,
apercebem-se disso. São esclarecidos sobre o que devem responder às almas escrupulosas, sobre
as exortações que devem fazer a religiosos e a religiosas.
Era por este dom que S. Vicente Ferrier pregava com tanto sucesso. Abandonava-se ao
Espírito Santo, quer para preparar os sermões quer para os pronunciar, e toda a gente sentia-se
tocada. /555
Todo o pregador deve tornar-se extremamente dependente do Espírito de Deus. A
principal preparação para o cargo é a oração e a pureza de coração. Deus faz-se algumas vezes
esperar, para vos provar; mas tende confiança, fazei o que é do vosso dever e ele virá, não
deixará de espalhar em vós as suas luzes. Sentireis os seus efeitos e vereis que ele há-de sugerir-
vos algum pensamento tocante.
Há uma ciência especial do Sagrado Coração (in quo sunt omnes thesauri sapientiae et
scientiae). Por esta ciência, aprendemos a reconhecer o simbolismo do Sagrado Coração na
natureza e na sua acção providencial no mundo. Lemos no Sagrado Coração o sentido dos seus
mistérios e apreciamos as suas virtudes para as imitarmos, os seus benefícios para lhe
agradecermos e a sua condução para a ela nos submetermos.
Resoluções. – Tenho uma imensa necessidade destes dois dons, de inteligência e de
ciência. Peço-os ao Coração de Jesus, que é a sua fonte, peço-as a Maria que é o seu canal. Mas
devo preparar-me para isso pela pureza do coração, pelo recolhimento, a oração, a união com
Nosso Senhor.
Colóquio com a Mãe da santa ciência, Mater agnitionis et sanctae spei.

18 de MAIO
OS DONS DO ESPÍRITO SANTO:
O DOM DE CONSELHO
12 Ego sapientia habito in consilio et 12 Eu, a Sabedoria, habito com a prudência
eruditis intersum cogitationibus 13 timor Domini e disponho de conhecimentos e de conselhos. 13 O
odit malum arrogantiam et superbiam et viam temor do SENHOR consiste em aborrecer o mal; a
pravam et os bilingue detestor 14 meum est soberba, a arrogância, o mau caminho e a boca
consilium et aequitas mea prudentia mea est perversa, eu os aborreço. 14 Meu é o conselho e a
fortitudo (Prov 8, 12-14). verdadeira sabedoria, eu sou o Entendimento, minha
é a fortaleza (Prov 8, 12-14).
Primeiro Prelúdio. A sabedoria vive de conselho, ama o conselho e nele se compraz.
Segundo Prelúdio. Divino Coração de Jesus, no qual habita toda a sabedoria, dai-me por Maria o
dom de conselho.
PRIMEIRO PONTO: Do dom de conselho. – O conselho é um acto de prudência, que
prescreve a escolha dos meios para chegar a um fim.
Assim o dom de conselho diz respeito à direcção das acções particulares. É uma luz pela
qual o Espírito Santo mostra o que é preciso fazer no tempo, no lugar e nas conjunturas nas
quais alguém se encontra. O que a fé, a sabedoria e a ciência ensinam em geral, o dom de
conselho aplica-o aos casos particulares. No que é fácil ver como nos é necessário para a prática
da virtude.
A conduta mais segura para a vida quotidiana é, portanto, a que se recebe do Espírito
Santo pelo dom de conselho, e não deveríamos seguir outro. Primeiro, porque seguindo-a,
estamos seguros de caminhar na via de Deus e da sua divina Providência; segundo, porque é o
meio de nunca errar, o Espírito Santo sendo a regra infalível tanto das nossas acções como dos
nossos conhecimentos; terceiro, porque esta dependência da direcção do Espírito Santo faz-nos
viver num grande repouso, sem inquietação e sem cuidado, como os filhos de um príncipe, que
não se preocupam a respeito da mesa, nem do seu sustento, repousando em tudo isto no cuidado
do príncipe seu pai.
A união habitual ao coração de Jesus mantém-nos na fonte do conselho como dos outros
dons.
SEGUNDO PONTO: Da necessidade que nós temos deste dom e dos meios para o
obtermos. – Estando muito misturados à vida activa, temos muita necessidade do dom do
conselho, mais ainda que os contemplativos, que não encontram as mesmas / 560 dificuldades; e
se este dom do Espírito Santo nos falta, nada faremos senão com muitas faltas, e toda a nossa
conduta será puramente humana. Não seguiremos senão as intenções do nosso espírito, que são
ordinariamente muito opostas ao espírito de Deus.
É preciso pedir de manhã ao Espírito Santo a sua assistência para todas as acções do dia,
reconhecendo humildemente a nossa ignorância e a nossa fraqueza, e protestando seguir a sua
condução com uma inteira docilidade de coração e de espírito.
Depois, no começo de cada acção, é preciso ainda pedir a luz do Espírito Santo para a
fazer bem, e no fim pedir perdão pelas faltas cometidas. Deste modo, mantemo-nos durante todo
o dia dependentes de Deus, o único que nos pode conduzir seguramente em todas as ocasiões
pelo seu conselho.
A pureza de coração é um excelente meio para obtermos o dom de conselho, bem como
os dons precedentes.
Uma pessoa de um bom juízo, que se estudasse constantemente na pureza de coração,
adquiriria uma prudência sobrenatural e uma destreza divina para manejar todas as espécies de
assuntos, teria uma abundância de luzes e de conhecimentos infusos para a condução das almas,
e encontraria mil santas indústrias para a execução dos empreendimentos que dizem respeito à
glória de Deus.
Os directores das almas e os superiores devem particularmente tirar da oração as luzes
que os conduzam nas funções dos seus cargos.
TERCEIRO PONTO: Dos defeitos opostos a este dom. – O vício oposto ao dom do
conselho é a precipitação, quando alguém age com demasiada prontidão e sem ter antes
considerado bem todas as coisas, quando alguém segue o movimento da sua actividade natural e
não se dá o vagar de consultar o Espírito Santo.
Este defeito torna-se um pecado, quando alguém a ele se abandona por negligência;
quando não toma tempo suficiente para pedir conselho ao Espírito Santo antes de agir, e quando
agindo se apressa de tal modo que não está em estado de receber a sua assistência, ou quando se
deixa arrastar pela impetuosidade de uma paixão, que obscurece a nossa inteligência.
A pressa é muito contrária ao dom de conselho. S. Francisco de Sales combate muitas
vezes este defeito nos seus escritos. A pressa obscurece o entendimento, perturba o coração e
alimenta o amor-próprio fazendo-nos tomar apoio em nós mesmos, no lugar no qual o dom de
conselho, /561iluminando o espírito, espalha no coração uma unção e uma paz totalmente opostas
a pressa e aos seus efeitos.
A temeridade é ainda muito contrária a este dom. É uma falta de atenção às luzes da
razão mesma e da graça, porque alguém confia demasiado em si mesmo.
A lentidão na execução é também um defeito contrário ao dom de conselho. É preciso
usar maturidade nas deliberações; mas quando uma vez a resolução tomada segundo a luz do
Espírito Santo, é preciso ir prontamente à execução, pelo movimento do mesmo Espírito.
Resoluções. – Senhor, tenho uma imensa necessidade deste dom do vosso Coração, o
conselho, e sinto que ele está à minha disposição; mas é preciso que eu esteja mais vigilante a
respeito da pureza do meu coração, da união convosco, da docilidade à vossa graça. Ajudai-me
por intercessão de Maria, a Mãe do bom Conselho.
Colóquio com a Mãe do Bom Conselho.
19 de Maio
OS DONS DO ESPÍRITO SANTO:
A PIEDADE
11 Apparuit enim gratia Dei salutaris omnibus 11 Porquanto a graça de Deus se manifestou
hominibus 12 erudiens nos ut abnegantes impietatem et salvadora a todos os homens, 12 educando-nos para que,
saecularia desideria sobrie et iuste et pie vivamus in hoc renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no
saeculo 13 expectantes beatam spem et adventum gloriae presente século, sensata, justa e piedosamente, 13 aguardando
magni Dei et salvatoris nostri Iesu Christi (Tit 2, 11-13). a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso
grande Deus e Salvador Cristo Jesus (Tit 2, 11-13).
Primeiro Prelúdio. O amável Salvador ensinou-nos a viver na piedade, dá-nos a graça pelo seu
Espírito.
Segundo Prelúdio. Ó Jesus, dai-nos algumas gotas da piedade do vosso divino Coração.
PRIMEIRO PONTO: O dom de piedade. – O dom de piedade é uma disposição habitual
que o Espírito Santo coloca na alma, para a excitar a uma afeição filial para com Deus.
A religião e a piedade levam-nos ambas ao culto e ao serviço de Deus; mas a religião
considera Deus como criador, e a piedade como Pai, no que esta é mais excelente do que a
outra.
A piedade para com Nosso Senhor e o seu divino Coração é ainda mais fácil e mais
doce.
A piedade estende-se não somente a Deus, mas ainda a tudo o que tem relação a ele,
como a Escritura Santa que contém a sua palavra, os bem-aventurados que o possuem na glória,
as almas sofredoras do purgatório, os homens que vivem na terra.
O dom de piedade dá-nos um espírito de filho para com os nossos superiores, um
espírito de pai para os nossos inferiores, um espírito de irmão para os nossos iguais, entranhas
de compaixão para aqueles que estão em necessidade e nas aflições e uma terna inclinação em
socorrê-los.
Na parte superior da alma, este comunica-nos uma grande unção e suavidade espirituais.
Na parte inferior, excita em nós movimentos de doçura e de devoção sensíveis. Daí vêem as
lágrimas dos santos e das pessoas piedosas, a doce atracção que as leva a Deus, a prontidão que
as leva a correr ao serviço de Deus, e a caridade que as leva a fazerem-se tudo por todos./563
SEGUNDO PONTO: O vício oposto ao dom da piedade. – É a dureza de coração, a
qual nasce do amor desregrado de nós mesmos, porque este amor faz que naturalmente nós não
sejamos sensíveis senão aos nossos próprios interesses e que nada nos toque senão por relação a
nós, que vejamos as ofensas de Deus sem lágrimas e as misérias do próximo sem compaixão; e
que não queremos de modo nenhum incomodar-nos para obrigarmos os outros; que não
podemos suportar os seus defeitos; que nos levantamos contra eles pelo menor assunto, e que
conservamos por eles no nosso coração sentimentos de azedume e de vingança, de ódio e de
antipatia.
Pelo contrário, quanto mais uma alma tem caridade ou amor de Deus, mais sensível é
aos interesses de Deus e aos do próximo.
Esta dureza é extrema nos ricos avarentos, nas pessoas voluptuosas, e naqueles que não
amolecem o seu coração pelos exercícios de piedade e pelo uso das coisas espirituais.
Encontra-se ainda muitas vezes nos sábios que não juntam a devoção com a ciência e
que, para se lisonjearem neste defeito, lhe chamam solidez de espírito; mas os verdadeiros
sábios foram os mais piedosos como um santo Agostinho, um S. Boaventura, um S. Bernardo.
Uma alma que não pode chorar os seus pecados, pelo menos com as lágrimas do
coração, tem muito ou de impiedade ou de impureza, ou de uma e da outra ao mesmo tempo,
como acontece normalmente àqueles que têm o coração endurecido (P. Lallemant).
O Coração de Jesus é o trono da piedade. Todos os dons do Espírito Santo aí residem
como na sua fonte, mas se fosse possível que um deles dominasse, seria o dom da piedade, do
mesmo modo que a sua misericórdia parece levar a melhor sobre a justiça.
TERCEIRO PONTO: Um perigo a evitar. – É uma grande infelicidade quando alguém
estima mais na religião os talentos naturais e adquiridos do que a piedade. Vereis às vezes
cristãos, padres ou religiosos, que farão muito mais caso de um espírito capaz de negócios, do
que destas devoções miúdas, que são, dizem eles, boas para mulheres, mas não o próprio de um
espírito sólido, chamando solidez de espírito esta dureza de coração tão oposta ao espírito de
piedade. Deveriam pensar que a devoção é um acto de religião, ou um fruto da religião e da
caridade, e, por conseguinte, que é preferível a todas as virtudes morais, vindo a religião
imediatamente depois das virtudes teologais e estando-lhes muitas vezes misturada.
Quando um homem grave e idoso exprime diante dos jovens este / 564 pensamento que
estima o talento e a ciência mais do que a piedade, isso prejudica extremamente estes jovens e
fica-lhes como um veneno do qual não se hão-de curar.
Isso pode destruir num momento todo o fruto do noviciado.
A beatitude que responde ao dom de piedade é a segunda: Bem-aventurados os que são
doces. A doçura suprime os impedimentos à piedade, as perturbações, os ardores e todos os
movimentos das paixões.
A devoção ao Coração de Jesus é a fonte mais fecunda da piedade. São as águas da
piedade e da caridade que vamos tirar ao Coração de Jesus. Nosso Senhor não nos recomendou
a paixão da ciência, mas a doçura e a piedade: «Quoniam non cognovi litteraturam, introibo in
potentias domini».
Resoluções. – Ó meu Salvador, dai-me algumas gotas da piedade que transborda do
vosso divino Coração. Vós superabundais de piedade filial para com o vosso Pai celeste e de
piedade fraternal para connosco, peço-vos um pouco deste dom: Da mihi bibere…
Colóquio com o Sagrado Coração.

20 de Maio
OS DONS DO ESPÍRITO SANTO:
A FORTALEZA
45 Tunc venit ad discipulos suos et dicit 45 Então, voltou para os discípulos e lhes
illis dormite iam et requiescite ecce adpropinquavit disse: Ainda dormis e repousais! Eis que é chegada
hora et Filius hominis traditur in manus peccatorum a hora, e o Filho do Homem está sendo entregue
46 surgite eamus ecce adpropinquavit qui me tradit nas mãos de pecadores. 46 Levantai-vos, vamos!
(Mt 26, 45-46). Eis que o traidor se aproxima (Mt 26, 45-46).
Primeiro Prelúdio. Que contraste entre a fraqueza dos apóstolos e a força de alma do Salvador!
É que eles não tinham recebido ainda o espírito de fortaleza.
Segundo Prelúdio. Deixai-me, Senhor, ir tirar ao vosso Coração a força que dele transborda.
PRIMEIRO PONTO: O dom de fortaleza. – A fortaleza é uma virtude que nos
consolida contra o medo e contra o horror das dificuldades, dos perigos e dos trabalhos que se
apresentam na execução dos nossos empreendimentos.
É o que o dom da fortaleza faz excelentemente: porque este dom é uma disposição
habitual que o Espírito Santo coloca na alma e no corpo para fazer e sofrer coisas
extraordinárias, para empreender acções difíceis, para expor-se aos perigos, para superar os
trabalhos mais rudes, para suportar as dores mais desagradáveis e isto constantemente e de um
modo heróico.
Este dom é necessário em algumas ocasiões em que alguém se vê exposto a perder os
bens, a honra ou a vida, pelo serviço de Deus. O Coração de Jesus assiste então poderosamente
com o dom do conselho e da fortaleza a uma alma fiel a qual, desconfiando de si mesma e tenho
conhecimento da sua fraqueza e do seu nada, implora o seu socorro e coloca nele a sua
confiança.
Temos grande necessidade deste dom por causa da dificuldade de alguns empregos aos
quais a obediência nos pode aplicar, como ir para as missões, ficar no trabalho das aulas, ou
permanecermos num lugar que nos parece menos favorável para a nossa saúde.
A ocasião de uma bela morte é tão preciosa que nenhum homem sábio deve perdê-la
quando ela se apresenta. Por este único acto de generosidade cristã, merecemos tanto quanto
durante todo resto da vida, se vivêssemos mais longamente e colocados fora de perigo. É uma
bela morte apanhar a doença ao serviço dos doentes, ir para as missões perigosas, consumir-se
pelo próprio rebanho, como fazem os superiores. Não / 566 saberíamos dizer quanto aqueles que
assim se expõem atraem de graças sobre as suas famílias religiosas.
SEGUNDO PONTO: Belos exemplos. – Foi por este espírito de força que Nosso
Senhor, na agonia do jardim, superou o medo da sua paixão e da sua morte, e levantando-se da
sua oração todo abrasado de zelo, disse aos seus discípulos: «Levantai-vos, vamos, está perto o
que me deve trair».
Era este espírito que faziam com que os santos não temessem nenhum perigo quando se
tratava de executar os desígnios de Deus e procurar a sua glória.
Um S. João Crisóstomo não temia senão o pecado. – S. Francisco Xavier, animado
deste espírito, enfrentava os exércitos de inimigos infiéis, as tempestades, os naufrágios, a
morte, imitando nisto o grande apóstolo S. Paulo, o modelo dos missionários.
Assim, devemos nós ser magnânimos e intrépidos no serviço de Deus, para avançarmos
na perfeição e para sermos capazes de fazer grandes coisas. Sem o dom da força, não se fazem
progressos notáveis na vida espiritual. A mortificação e a oração, que são os seus principais
exercícios, pedem uma generosa determinação para passar por cima de todas as dificuldades que
se encontram no caminho do espírito, tão oposto às nossas inclinações naturais.
Os mártires detêm o primeiro lugar entre os heróis do cristianismo, porque a força
manifesta-se melhor no sofrimento do que na acção.
A acção desenvolve e eleva a natureza, o sofrimento é-lhe totalmente contrário.
O belo espectáculo da força dos mártires conquistou para a Igreja toda a terra.
TERCEIRO PONTO: O vício contrário à força. – É a timidez ou o temor humano, e
uma certa cobardia natural que vem do amor da nossa própria excelência e das nossas
comodidades. Estas fraquezas detêm-nos nos nossos empreendimentos e fazem-nos fugir diante
da objecção ou da dor.
O respeito humano pára todas as nossas boas intenções e destrói a vida espiritual em
nós. Não saberíamos dizer todo o mal que nos faz.
Alguém terá o desígnio de falar das coisas espirituais, de guardar a regra do silêncio ou
outra regra qualquer, de fazer algum acto de mortificação; entretanto, se acontece encontrar-se
com este ou aquele, não terá a coragem de executar a sua boa resolução mesmo que saiba que
terá depois uma sensível pena por lhe ter faltado. Eis de um lado a nossa regra e o interesse de
Deus, e do outro, a satisfação de alguém, o receio de lhe / 567 desagradar. Balançamos estas duas
considerações, e a última leva a melhor. Que infidelidade! Que cobardia! É isto que fazemos
todos os dias. Haverá alguma coisa que melhor marque a nossa pouca virtude e o grande
império que o respeito humano tem sobre nós? É por isso que Deus nos abandona, nos retira as
suas graças, e nós caímos depois insensivelmente em grandes misérias.
É assim que a prudência humana impede muitas vezes o bem que os superiores podem
fazer. Escutam esta prudência antes que agir fortemente no espírito de fé.
Resoluções. – Bom Mestre, dai-me a graça de ter fome e sede de justiça. Animado por
esta sede e sustentado pela força do Espírito Santo, hei-de pôr-me em acção para fazer ou sofrer
grandes coisas, segundo a vossa divina vontade. Coração Sagrado de Jesus, fazei descer sobre o
meu coração alguns raios da vossa força.
Colóquio com o Sagrado Coração.

21 de Maio
OS DONS DO ESPÍRITO SANTO:
O TEMOR DE DEUS
Primeiro Prelúdio. O Conselho resume tudo: Teme a Deus e observa a sua lei.
Segundo Prelúdio. Senhor Jesus, quisestes que o vosso Coração estivesse cheio de temor filial,
comunica-o ao meu coração.
PRIMEIRO PONTO: O temor de Deus e os seus efeitos. – O dom do temor de Deus é
uma disposição habitual que o Espírito Santo coloca na alma para a manter no respeito diante da
majestade de Deus e na dependência e na submissão às suas vontades, afastando-a de tudo o que
pode desagradar a Deus.
Este dom é o fundamento e a base de todos os outros, porque o primeiro passo no
caminho de Deus é a fuga do mal, a qual pertence a este dom. O temor coloca sobre o caminho
da sabedoria, mas a sabedoria, por sua vez, aperfeiçoa o temor tornando-o filial e amoroso.
Nosso Senhor não tinha necessidade do temor, porque não tinha nada a temer, nem o
pecado, nem o juízo, mas quis estar cheio dele para depois o derramar nos nossos corações.
Os efeitos deste dom são inspirar à alma, primeiro uma contínua moderação, um santo
tremor ou um profundo aniquilamento diante de Deus; em segundo lugar, um extremo horror às
mais pequenas ofensas a Deus e uma constante resolução em evitar todas as suas ocasiões; em
terceiro lugar, uma humilde confusão por toda a falta em que se cai; em quarto lugar, uma
cuidadosa vigilância em refrear as inclinações desregradas do apetite, frequentes retornos sobre
si mesmo para reconhecer o estado do próprio interior e ver o que aí se passa relativamente ao
serviço de Deus.
SEGUNDO PONTO: A delicadeza de consciência. – É uma grande ilusão pensar-se,
como fazem alguns, que depois de terem feito uma confissão geral, / 569 não é necessário ser-se
tão escrupulosos para evitar depois os pecados mais leves, as mínimas imperfeições, os mais
pequenos desregramentos do coração, os primeiros movimentos. Aqueles que assim procedem a
respeito de si mesmos, por um secreto desespero de uma maior perfeição, inspiram
normalmente aos outros os mesmos sentimentos e mantêm esta conduta larga a respeito das
almas que dirigem, no que em extremo se enganam.
É necessário ter uma tal delicadeza de consciência, uma tão grande exactidão, que não
nos perdoemos a mínima falta e que combatamos, que cortemos mesmo os mínimos
desregramentos do coração. Deus merece que o sirvamos com esta perfeita fidelidade, e
apresenta-nos a sua graça para isso: devemos cooperar com ela.
Nunca chegaremos a uma perfeita pureza de coração, se não vigiarmos de tal modo
sobre todos os movimentos do nosso coração e sobre todos os nossos pensamentos, que não nos
escape quase nada de que não nos possamos dar contas a Deus, e que não tenda à sua glória; que
no espaço de oito dias, por exemplo, não fizéssemos muito poucas acções exteriores ou actos
interiores que não tenham a graça por princípio. Que se nós fizéssemos algumas outras, que isso
não seja senão por surpresa e por alguns momentos, estando a nossa vontade tão intimamente
ligada a Deus, que as reprima desde o instante em que as aperceba.
Desde que nos apercebamos que cometemos uma falta, é preciso imediatamente
arrependermo-nos dela e produzirmos um acto de contrição, com medo que este pecado não
impeça as graças seguintes, o que aconteceria se não fizéssemos penitência.
Não é preciso, no entanto, levar o espírito de temor até ao escrúpulo. O temor deve
permanecer filial e confiante.
TERCEIRO PONTO: O vício oposto. – É um espírito de orgulho e de independência,
que faz com que alguém não queira seguir senão as suas inclinações e não possa suportar
nenhum tipo de sujeição, que peque sem escrúpulos e que não tenha em conta pequenas faltas;
que apareça diante de Deus com pouco respeito, que despreze as suas inspirações, que
negligencie as ocasiões que se apresentam para praticar a virtude e que viva no relaxamento e na
tibieza.
Diz-se que um pensamento inútil, que uma palavra que se diz à toa, que uma acção que
se faz sem dirigir a sua intenção, é pouca coisa. Isto seria verdade se nós estivéssemos num
estado puramente natural; mas não fomos nós elevados a um estado sobrenatural que nos foi
adquirido pelo /570 sangue precioso de um Deus; e cada acção da nossa vida não tem as suas
consequências eternas, na posse ou na privação de um grau de glória? Provocamos todos os dias
pela nossa negligência perdas inconcebíveis.
O caminho da tibieza é infinitamente perigoso. Deus sofre durante um tempo os
pecados que cometemos sem escrúpulo; mas se perseveramos neles, acontece, por um justo
castigo da justiça divina, ou que caímos num pecado manifestamente mortal, ou que nos
encontramos envolvidos num qualquer negócio deplorável que Deus permite para nos corrigir.
Os juízos de Deus são severos. Tendo-nos chamado a uma alta perfeição e tendo-nos
esperado em vão, tira-nos as graças que nos havia dado e priva-nos daquelas que nos tinha
preparado.
Resoluções. – Senhor, penetrai o meu coração e os meus sentidos com o vosso santo
temor. Divino Coração de Jesus, vós transbordais com este temor, que não vos era necessário;
derramai-o abundantemente no meu coração. Perdoai-me todas as minhas faltas passadas a este
temor salutar. Curai-me da minha temeridade e da minha tibiez.
Colóquio com o Sagrado Coração.

22 de Maio
OS FRUTOS DO ESPÍRITO SANTO:
A CARIDADE
22 Fructus autem Spiritus est caritas 22 Mas o fruto do Espírito é: amor,
gaudium pax longanimitas bonitas benignitas 23 alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade,
fides modestia continentia adversus huiusmodi non fidelidade, 23 mansidão, domínio próprio. Contra
est lex (Gal 5, 22-23). estas coisas não há lei (Gal 5, 22-23).

Primeiro Prelúdio. O fruto principal do Espírito Santo é a caridade, que é espalhada nos nossos
corações pelo Espírito Santo (Rom 5, 5); mas esta caridade é pacífica, alegre, paciente e doce.
Segundo Prelúdio. Fazei descer, Senhor, do vosso Coração para o meu um raio da vossa
caridade.
PRIMEIRO PONTO: Os frutos do Espírito Santo em geral. – Acontece às virtudes o
que acontece às árvores. Como estas trazem frutos que, quando chegam à maturidade, já não
têm azedume, mas são doces e de um agradável sabor, do mesmo modo quando os actos de
virtude chegam a uma certa maturidade, fazem-se com prazer e encontra-se neles um gosto
delicioso. Então estes actos de virtude, inspirados pelo Espírito Santo, são chamados frutos do
Espírito Santo, e algumas virtudes produzem-nos com tal perfeição e tal suavidade, que são
chamados beatitudes.
Os que tendem à perfeição pela via das práticas e dos actos metódicos, sem se
abandonarem inteiramente à condução do Espírito Santo, nunca têm esta doçura e como esta
maturidade da virtude; sentem sempre dificuldade e repugnâncias; têm de combater sempre e
muitas vezes são vencidos e fazem faltas, ao passo que aqueles que caminham sob a direcção do
Espírito Santo na via do recolhimento simples, praticam o bem com um fervor e uma alegria
dignas do Espírito Santo.
Donde segue que as almas tíbias têm duas vezes mais dificuldade na prática da virtude
do que as fervorosas que nela se aplicam a valer com a alegria do Espírito Santo.
SEGUNDO PONTO: A caridade é o dom dos dons. – A caridade é como o único fruto
do Espírito Santo. S. Paulo diz aos Gálatas: «O fruto do Espírito é a caridade, a paz, a alegria,
etc.». Enumerando os doze frutos, reúne-os num só, porque não diz «os frutos do Espírito Santo
/572 são…», mas: «O fruto do Espírito Santo é a caridade, etc.». Ora eis o mistério deste modo
de falar: «A caridade de Deus foi espalhada nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi
dado» (Rom 5, 5).
A caridade é como o fruto único, que tem uma infinidade de excelentes propriedades,
que podem enumerar-se em seguida.
S. Paulo não quer, portanto, dizer outra coisa senão que o fruto do Espírito Santo é a
caridade, a qual é alegre, pacífica, paciente, benigna, boa, longânime, doce, fiel, modesta,
continente, casta; isto é, que o divino amor nos dá uma alegria interior com uma grande paz do
coração, que se conserva no meio das adversidades pela paciência, e que nos torna graciosos e
benignos em socorrer o próximo por uma bondade cordial para com ele, bondade que não é
variável e inconstante, mas longânime e sempre leal, e que é acompanhada de simplicidade, de
modéstia, de uma continência oposta a todos os excessos e de uma cuidadosa castidade.
Não é o mesmo dom de caridade, tão fecundo em frutos, que S. Paulo exalta ainda
quando diz aos Coríntios (1Cor 13): «A caridade é paciente, é benigna; não é invejosa,
malévola, orgulhosa, egoísta, irascível, isto é, ainda que é pacífica, doce, paciente e boa».
Sim, ela é bem o fruto por excelência do Espírito Santo.
TERCEIRO PONTO: As qualidades da caridade. – A caridade tem o primeiro lugar
entre os frutos do Espírito Santo, porque ela se assemelha mais ao Espírito Santo, que é o amor
pessoal. Ela é a primeira condição da santidade. Como o observa S. Paulo aos Coríntios: «Se eu
tivesse todos os talentos e muitas virtudes, se não tiver caridade, nada sou». É a caridade
sobretudo que Deus pede de nós. A caridade é a santidade.
O mínimo grau de caridade é preferível às riquezas, à ciência, ao poder.
É a caridade que produz a felicidade no céu. Se perdemos a ocasião de fazermos cada
dia actos de caridade, perdemos graus infinitos de felicidade no céu.
Peçamos ao Coração de Jesus que nos faça avançar na caridade.
Como virtude, torna-nos obedientes aos mandamentos de Deus, às suas vontades, aos
seus conselhos e inspirações. – Como dom, torna-nos dóceis e maleáveis às inspirações
interiores. Compreende todos os dons, é o seu laço e a sua força. – Como fruto, dá-nos um gosto
e um prazer extremo na prática da vida devota /573 que se manifesta por todos os frutos. – Como
beatitude faz-nos tomar gosto nos sacrifícios, nas humilhações pelo Reino do Salvador e pela
salvação das almas. Ela alimenta-se sobretudo da meditação da Paixão e do Sagrado Coração.
Resoluções. – Divino Coração de Jesus, dai-me um crescimento de caridade. Sei que o
vosso amor leva com ele os dons e os frutos do Espírito Santo. Nada recusais àqueles que vos
amam, dai-me a graça de vos amar terna e fielmente.
Colóquio com o Sagrado Coração.
23 de Maio
OS FRUTOS DO ESPÍRITO SANTO:
PAZ E ALEGRIA
17 Non est regnum Dei esca et potus sed 17 Porque o reino de Deus não é comida
iustitia et pax et gaudium in Spiritu Sancto 18 qui nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no
enim in hoc servit Christo placet Deo et probatus Espírito Santo. 18 Aquele que deste modo serve a
est hominibus 19 itaque quae pacis sunt sectemur et Cristo é agradável a Deus e aprovado pelos
quae aedificationis sunt in invicem (Rom 14, 17- homens. 19 Assim, pois, seguimos as coisas da paz
19). e também as da edificação de uns para com os
outros (Rom 14, 17-19).
Primeiro Prelúdio. A paz e a alegria do Espírito Santo são frutos preciosos para as comunidades
e para as almas.
Segundo Prelúdio. Se abundo em caridade para com Deus e pelas almas, a paz e a alegria
reinarão no meu coração.
PRIMEIRO PONTO: A santa alegria no serviço de Deus. – A caridade ou o amor
fervoroso faz com que possuamos Deus; a alegria nasce da posse de Deus, não sendo outra coisa
senão o repouso ou o contentamento que se encontra na fruição do bem que se possui.
Nosso Senhor mesmo nos disse todo o valor da santa alegria. Quando os seus discípulos
regressavam das suas viagens apostólicas e se felicitavam com os seus sucessos, e pelas curas
obtidas e pelas vitórias sobre os demónios, disse-lhes: «Sim, rejubilai e alegrai-vos, no entanto,
não por causa destes sucessos, mas porque vos tornastes filhos de Deus e os vossos nomes estão
escritos no céu»; e ele mesmo então abandonou-se a uma santa alegria – exultavit in spiritu
sancto – e exprimiu a sua alegria dizendo: «Obrigado, Pai, porque chamastes estas almas
simples a conhecer-vos e a alegrar-se em vós».
A amizade de Deus e a ordem que coloca na nossa alma a prática da virtude são fontes
de alegria pura e de contentamento sobrenatural.
SEGUNDO PONTO: A paz com Deus. – Não há senão Deus cuja posse nos fortalece
contra as perturbações e os temores, ao passo que a posse das criaturas causa mil apreensões e
mil inquietações. Quem possui Deus não é perturbado por nada, porque nada dos bens criados
pode bastar-nos, nem contentar-nos plenamente. Esvaziai o mar das suas águas e colocai lá
depois uma gota de água, enchereis este vazio imenso? Mesmo que Deus fizesse ao infinito
criaturas sempre mais perfeitas, elas não poderiam todas juntas encher a nossa alma: ela tem um
vazio que não pode /575ser preenchido senão por Deus.
É a posse de Deus que nos dá a paz da alma, mas reciprocamente é também a paz da
alma que favorece o reino de Deus em nós e que o torna plenamente senhor do nosso interior. É
preciso que a alma se mantenha na paz para viver na perfeita dependência que deve ter de Deus.
Pela graça santificante, Deus faz para si na alma como que uma cidadela onde ele está
entrincheirado. Pode sair com a alma para ir às obras, aos estudos, às conversas necessárias,
depois volta com ela para a paz da fortaleza. É assim que os santos estão tão unidos a Deus na
acção como na oração, e os mais deploráveis acidentes não os lançam na perturbação. Possuem
sempre a paz, porque possuem sempre o Deus da paz.
A paz com Deus é sobretudo assegurada pelas virtudes de obediência, de regularidade,
de mortificação. Quando a carne, a vontade própria e as concupiscências são mantidas na
submissão, as causas da perturbação são afastadas.
TERCEIRO PONTO: A paz com o próximo. – A falta da paz que devemos ter uns para
com os outros é a fonte de onde procede a maior parte dos sofrimentos que afligem o mundo. A
ambição, a avidez, a susceptibilidade, o desejo das honras e das preeminências arruínam as
almas destruindo a paz. O remédio está na caridade, que é doce, paciente, beneficente, que
rejeita o orgulho, a ambição, a cupidez.
Nosso Senhor deu-nos esta paz mostrando-nos o exemplo da caridade, da doçura, da
humildade e do sacrifício. Veio como o Príncipe da paz. Os anjos, ao seu nascimento, cantaram
o benefício da paz: Pax hominibus bonae voluntatis.
A paz está na união com os nossos irmãos, que Nosso Senhor tanto nos recomendou.
Esta união tem por tipo supremo a unidade na santa Trindade! Nosso Senhor, rezando por nós,
dizia ao seu Pai: «Fazei que eles sejam um como nós somos um; fazei que eles sejam um em
nós».
S. Paulo, para exprimir o seu amor pela união e pela paz dizia: «Fiz-me tudo por todos:
rio com os que riem e choro com os que choram» (Rom 12, 19). – Tanto quanto possais, dizia,
tende a paz com todos» (Rom 12, 18).
Não era a saudação quotidiana de Jesus: «Pax vobis, a paz esteja convosco!». /575
Resoluções. – Paz e alegria, é o fruto da consciência pura, o fruto do estado de graça, o
fruto da caridade e da habitação do Espírito Santo em nós. Velarei pela pureza da minha
consciência evitando o pecado venial, e se tiver a paz com Deus, tê-la-ei facilmente com o
próximo.
Colóquio com o Sagrado Coração.

26 de Maio
A VIGÍLIA DO PENTECOSTES
15 Si diligitis me mandata mea servate 16 15 Se me amais, guardareis os meus
et ego rogabo Patrem et alium paracletum dabit mandamentos. 16 E eu rogarei ao Pai, e ele vos
vobis ut maneat vobiscum in aeternum 17 Spiritum dará outro Consolador, a fim de que esteja para
veritatis quem mundus non potest accipere quia sempre convosco, 17 o Espírito da verdade, que o
non videt eum nec scit eum vos autem cognoscitis mundo não pode receber, porque não no vê, nem o
eum quia apud vos manebit et in vobis erit (Jo 14, conhece; vós o conheceis, porque ele habita
15-17). convosco e estará em vós (Jo 14, 15-17).
Primeiro Prelúdio. Nosso Senhor quer dar-nos amanhã o seu espírito de amor, o seu espírito de
força e de verdade, mas pede que os nossos corações estejam preparados.
Segundo Prelúdio. Ajudai-me, Senhor, a afastar os obstáculos: o pecado, a dissipação, o apego às
criaturas.
PRIMEIRO PONTO: O Espírito Santo vai trazer-nos a ciência, a força e o amor, mas
pede algumas disposições. – No seu discurso depois da Ceia, Nosso Senhor tinha anunciado
suficientemente aos seus apóstolos a sua paixão e a sua ressurreição. Mas não o compreendiam.
Explicou-lhes então longamente quais seriam os dons e os frutos do Espírito Santo que queria
enviar-lhes e quais eram as condições para bem o receberem. Estes conselhos aplicam-se a nós
hoje.
Unimo-nos a Nosso Senhor segundo os mistérios da liturgia. No Natal, nasceu em nós;
no tempo da sua Paixão, incorporou-nos aos seus sofrimentos e às suas reparações. Na Páscoa,
comunicou-nos a sua vida nova, desprendida da terra. Com a ascensão, formou-nos para a vida
celeste. Até lá, forma-se em nós: donec formetur Christus in vobis (Gal 4, 19).
Agora, é o Espírito Santo, que virá a nós com a sua luz, a sua força e o seu fogo divino.
O Espírito de verdade continuará e completará os ensinamentos de Nosso Senhor; - o Espírito
de força e de consolação encorajar-nos-á e fortalecer-nos-á nas provações da vida; - o Espírito
de amor unir-nos-á firmemente a Nosso Senhor e ao seu Pai. Mas pede-nos que nos preparemos
e que correspondamos a estas grandes graças.
«Observai os meus mandamentos», diz. Isto é, afastemos o pecado, o apego ao pecado,
mesmo venial; coloquemo-nos na disposição de observar todos os mandamentos. Afastemos
tudo o que nos /587 arraste ao pecado: a procura de nós mesmos, das nossas comodidades, das
nossas satisfações, da dissipação, a distracção.
O Espírito Santo virá às nossas almas para aí trazer e sustentar a vida, como a seiva vai
do corpo da vinha aos seus ramos; mas é preciso que os ramos estejam agarrados à vinha e
cuidadosamente podados para que dêem frutos.
SEGUNDO PONTO: A união a Nosso Senhor e o arrependimento. – Se o ramo não
estiver agarrado à vinha, morre. Os vinhateiros podam os ramos para que produzam mais fruto
(Jo 15). O vinhateiro é o Pai celeste. Todo o ramo que não der fruto em Nosso Senhor, podá-lo-
á e se permanece ainda estéril, cortá-lo-á, rejeitá-lo-á para longe de si; privado da graça, cairá na
morte espiritual. Todos aqueles que prometem fruto, podá-los-á assiduamente, purificá-los-á das
suas inclinações depravadas, para que produzam ainda mais fruto.
Quanto a nós, Nosso Senhor diz-nos como aos seus apóstolos: Já estais podados e
purificados pelas graças que os mistérios da minha vida e da minha ressurreição vos trouxeram;
mas para que esta preparação seja ainda mais perfeita, uni-vos intimamente a mim, permanecei
em mim, e eu permanecerei em vós e vos vivificarei pelo Espírito Santo que vos comunicarei e
que será a seiva da vossa alma. – Reforma de vida e união, isso não é tudo, é preciso ainda um
começo de amor efectivo e prático, para receber o espírito de amor. Foi àqueles que o amam que
Nosso Senhor prometeu o seu espírito: Si diligitis me, rogabo Patrem et alium Paraclitum dabit
vobis (Jo 14, 17).
TERCEIRO PONTO: O amor por Nosso Senhor. – É àqueles que vão ter com Nosso
Senhor com prontidão, confiança e amor, que dá o seu Espírito. As almas dissipadas não podem
recebê-lo: quem mundus non potest accipere. É àqueles que observam a sua lei com amor: Qui
habet mandata mea et servat ea, ille est qui diligit me. Excitemo-nos, então, hoje ao seu amor.
Recordemos o que fez por nós. «Como o seu Pai nos amou, ele também nos amou». Fez-se
homem por nós, deu a sua vida por nós; elevou-nos até uma união íntima com ele e trata-nos
como aos seus amigos mais caros. Respondamos ao seu amor com o nosso. O meio de
perseverar no seu amor é a obediência filial aos seus preceitos. «Se guardardes os meus
mandamentos, permanecereis no meu amor, como eu guardei os mandamentos do meu Pai e
permaneço /588 no seu amor». O amor sem as obras é uma ilusão. – E entre os seus preceitos,
Nosso Senhor recomenda-nos sobretudo a caridade pelo próximo, é o seu mandamento
preferido.
Examinemo-nos um pouco a nós mesmos. Conhecemos bastante o Espírito Santo, o que
ele é na adorável Trindade, os dons que traz, a necessidade que temos dele? Desejamo-lo com
um ardor que responde à necessidade que temos dele e às vantagens que podemos esperar da sua
vinda? Estamos preparados para o recebermos por um desejo sincero de cumprirmos toda a lei
com um amor filial?
Resolução. – Vinde, Espírito de amor, do Coração de Jesus, tenho sede de vos receber,
já não posso viver sem vós. Vinde, quero ser dócil. Escutarei o que me sugerirdes. Vinde e
perdoai-me as minhas resistências passadas. A minha regra e a união convosco, eis doravante a
minha vida.
Colóquio com Nosso Senhor.
27 de Maio
O DIA DO PENTECOSTES
9 Sicut dilexit me Pater et ego dilexi vos 9 Como o Pai me amou, também eu vos
manete in dilectione mea 10 si praecepta mea amei; permanecei no meu amor. 10 Se guardardes
servaveritis manebitis in dilectione mea sicut et os meus mandamentos, permanecereis no meu
ego Patris mei praecepta servavi et maneo in eius amor; assim como também eu tenho guardado os
dilectione 11 haec locutus sum vobis ut gaudium mandamentos de meu Pai e no seu amor
meum in vobis sit et gaudium vestrum impleatur permaneço. 11 Tenho-vos dito estas coisas para que
12 hoc est praeceptum meum ut diligatis invicem o meu gozo esteja em vós, e o vosso gozo seja
sicut dilexi vos 13 maiorem hac dilectionem nemo completo. 12 O meu mandamento é este: que vos
habet ut animam suam quis ponat pro amicis suis ameis uns aos outros, assim como eu vos amei. 13
14 vos amici mei estis si feceritis quae ego Ninguém tem maior amor do que este: de dar
praecipio vobis 15 iam non dico vos servos quia alguém a própria vida em favor dos seus amigos.
servus nescit quid facit dominus eius vos autem 14 Vós sois meus amigos, se fazeis o que eu vos
dixi amicos quia omnia quaecumque audivi a Patre mando. 15 Já não vos chamo servos, porque o
meo nota feci vobis (Jo 15,9-15). servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-
vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de
meu Pai vos tenho dado a conhecer (Jo 15, 9-15).
Primeiro Prelúdio. É o Espírito de amor que Nosso Senhor quer sobretudo nos dar hoje para que
cumpramos os seus mandamentos por amor.
Segundo Prelúdio. Senhor, dai-me o vosso amor, para que seja generoso no vosso serviço.
PRIMEIRO PONTO: Nosso Senhor serviu-se da comparação da vinha para nos
mostrar quanto devemos estar unidos a ele. – No momento da despedida de Nosso Senhor aos
seus apóstolos depois da Ceia, o seu Coração transbordava de amor. Explicou-lhes como queria
permanecer unido com eles pelo laço do amor. Serviu-se da comparação da vinha. «É preciso,
dizia, que sejais vivificados pelo Espírito Santo, que vos hei-de comunicar. Ele será como a
seiva da vossa alma. Sendo o Espírito do amor, unir-vos-á a mim e eu a vós. Aquele que não
permanecer em mim, que deixar de estar unido a mim pela caridade, será lançado fora como um
sarmento inútil. Perseverai no meu amor. Como é que não seríeis dedicados ao meu serviço,
depois do que fiz por vós? – Como o meu Pai me amou desde toda a eternidade, até colocar em
mim todas as suas complacências e a comunicar-me a sua divindade e o seu poder, assim vos
amei com um amor inefável; sacrifiquei-me por vós, tratei-vos como os meus amigos mais
caros.
Respondei, portanto, ao meu amor com o vosso; permanecei, perseverai neste amor,
como eu mesmo permaneço no amor do meu Pai. Guardai os mandamentos para permanecerdes
no meu amor, como eu mesmo guardei os mandamentos de meu Pai e permaneço no seu amor.
Se observardes estas coisas, a minha alegria permanecerá em vós, não a falsa alegria do mundo,
mas a alegria pura, celeste, inefável, que dou a saborear a toda a alma que me está intimamente
unida pelo amor.
SEGUNDO PONTO: Nosso Senhor amou-nos com um amor eterno e pede o amor em
troca. - Era assim que Nosso Senhor dispunha os seus discípulos /590 para receberem o seu
espírito de amor. Para nos dispormos nós mesmos, recordemo-nos do seu amor por nós. É
semelhante àquele que o uniu ao seu Pai: Sicut dilexit me Pater, et ego dilexi vos. Amou-nos
desde toda a eternidade, não teve em vista senão a nossa felicidade. O seu amor por nós foi
desinteressado até ao sacrifício absoluto de si mesmo. Consagrou a sua vida inteira à nossa
salvação. Morreu por nós sobre a cruz: Majorem hac dilectionem nemo habet.
O que nos pede é um amor recíproco pelo seu Pai e por ele, que foram os primeiros a
nos amar e que querem chamar-nos seus amigos: Vos autem dixi amicos.
O nosso amor deve modelar-se sobre o seu. O seu foi obediente à vontade do seu Pai, o
nosso deve manifestar-se por uma obediência inteira, absoluta, filial à lei divina. Amou-nos até
morrer por nós, devemos amá-lo até morrer, se for preciso, por ele ou pelos nossos irmãos que
são os seus. O nosso amor deve ser infatigável, dedicado e pronto a todos os sacrifícios.
O espírito de amor que nos dá hoje deve estabelecer-nos numa intimidade plena de
confiança com ele, e numa união poderosa e fecunda. Nada nos escondeu do que o seu Pai lhe
confiou. Iniciou-nos no conhecimento dos seus desígnios que têm todos por fim a felicidade dos
homens.
TERCEIRO PONTO: Os efeitos e as vantagens do Espírito de amor. – O Espírito Santo
é um laço de amor. Do mesmo modo que une Nosso Senhor ao seu Pai, une-nos a ele e quer
unir-nos entre nós. É o laço mais estreito. Fortifica em nós o amor, para o tornar obediente e
dedicado, da nossa parte, misericordioso e generoso da sua.
É um laço de amizade e de doce intimidade. É a fonte de toda a alegria pura e
verdadeira: Haec locutus sum vobis ut gaudium meum in vobis sit et gaudium vestrum
impleatur. É a fonte de vida, como a seiva para as árvores e torna-nos fecundos em frutos de
salvação.
Esta união abre-nos o Coração de Jesus e dispõe-o para nos conceder tudo o que lhe
pedirmos: Quodcumque volueritis, petetis et fiet vobis. Atrai sobre nós graças de salvação e de
bênção sobre os nossos trabalhos. Podemos conceber algo mais desejável do que esta união, do
que este amor?
Mas Nosso Senhor mesmo deseja dar-nos este amor, tem sede dos nossos corações, bate
à nossa porta. Não o façamos esperar. Fez tudo para obter de nós um amor terno e solícito.
Poderia encontrar /591 no nosso amor uma compensação pela ingratidão e pela indiferença de
muitas almas, disponhamo-nos então para recebermos plenamente o dom do seu amor.
Resoluções. – Senhor, dai-me hoje o vosso Espírito de amor, a fim de vos permanecer
unido doravante como o sarmento à vinha, para que vos sirva com fidelidade e com uma afeição
toda filial. Quero dar-vos amor por amor, e como um filho dedicado obedecer-vos por amor e
dar-me uma alegria e uma felicidade em fazer a vossa vontade.
Colóquio com Nosso Senhor.

27 de Maio
OS FRUTOS DO ESPÍRITO SANTO:
LONGANIMIDADE, DOÇURA, FIDELIDADE
68 Dixit ergo Iesus ad duodecim numquid 68 Então, perguntou Jesus aos doze:
et vos vultis abire 69 respondit ergo ei Simon Porventura, quereis também vós retirar-vos? 69
Petrus Domine ad quem ibimus verba vitae Respondeu-lhe Simão Pedro: Senhor, para quem
aeternae habes 70 et nos credidimus et cognovimus iremos? Tu tens as palavras da vida eterna; 70 e
quia tu es Christus Filius Dei (Jo 6, 68-70). nós temos crido e conhecido que tu és o Santo de
Deus (Jo 6,67-69).
Primeiro Prelúdio. S. Pedro é o modelo da fidelidade. A sua fé valeu-lhe o seu privilégio de
inerrância para ele e para os seus sucessores.
Segundo Prelúdio. Divino Coração de Jesus, dai-me a coragem, a doçura e a fé que são os frutos
do vosso espírito.
PRIMEIRO PONTO: A longanimidade ou a perseverança. – Ela impede o
aborrecimento que nasce da espera das graças ou das cruzes a levar ou do trabalho a cumprir.
Mantém-nos no zelo, alimenta o fogo sagrado. É uma disposição espiritual que corresponde à
coragem natural, à actividade, à resistência.
Às virgens loucas faltou-lhes longanimidade. Os apóstolos pensavam todos como S.
Pedro e S. Tomé: «Vamos com o Salvador a Jerusalém e morramos com ele, se for preciso».
Era uma generosidade superficial e faltou-lhes longanimidade.
S. Pedro esteve quase a desencorajar-se ainda em Roma. Queria ir-se embora, mas
Nosso Senhor veio colocar-lhe de novo no coração o fruto da longanimidade. – Jesus aparece:
«Para onde ides, Senhor?», pergunta-lhe S. Pedro. - «Vou a Roma para ser crucificado uma
segunda vez». – A palavra divina produz o seu fruto e é um fruto de longanimidade. S. Pedro
continuará a trabalhar em Roma sem fraqueza e sem desencorajamento, mesmo devendo ver os
seus trabalhos darem poucos resultados. Perseverará até à morte e a sua recompensa será a
fundação da Igreja romana.
SEGUNDO PONTO: - A doçura. - O Espírito de doçura é o verdadeiro espírito dos
discípulos de Jesus Cristo. Não é Deus todo amor? Deus Pai é o pai das misericórdias; Deus
filho nomeia-se a si mesmo um cordeiro; Deus Espírito Santo mostrou-se sob a forma de uma
pomba que é a doçura mesma.
Se houvesse alguma coisa melhor, Nosso Senhor no-la teria dito /593, mas dá-nos apenas
duas lições para nós aprendermos dele: a mansidão e a humildade de coração.
A doçura é como o perfume da vida de Nosso Senhor. Foi submetido a muitas
contradições, críticas, murmurações. Foi olhado como um impostor, como um sedicioso, um
samaritano, um possesso do demónio. Tomaram pedras para o apedrejarem. Tudo suportou com
doçura possuindo a sua alma na paz.
A doçura oferece um grande império sobre o coração dos homens. Felizes os homens
doces: possuirão a terra, isto é, serão os senhores dos corações e todas as vontades estarão nas
suas mãos.
O patriarca José, ao enviar os seus irmãos do Egipto a casa de seu pai, deu-lhes apenas
este aviso: «Não vos enfureçais pelo caminho». Sigamos o mesmo aviso. Esta vida não é senão
um encaminhamento para a vida bem-aventurada; não nos enfureçamos, portanto, no caminho
uns com os outros. Caminhemos com o grupo dos nossos irmãos e companheiros, docemente,
pacificamente e amavelmente.
É quando a alma está em estado de tranquilidade e sem motivo de cólera, que é preciso
fazer provisão de doçura e adquirir o hábito.
Mas para a vida de união com Nosso Senhor e de fidelidade às graças do Espírito Santo,
a doçura torna-se-nos natural, ela é um fruto da caridade que reina então nos nossos corações.
A caridade ardente faz-nos doces e pacientes. Vivamos, portanto, sob a doce influência
do Espírito Santo, que é o Espírito do Sagrado Coração.
TERCEIRO PONTO: A fé ou a fidelidade. – A fé, na qualidade de fruto do Espírito
Santo, é uma certa docilidade em acreditar tudo o que é da crença dos fiéis, com a firmeza de a
isso se apegar.
Para isso, é preciso na vontade uma piedosa afeição que inclina o entendimento a
acreditar naquilo que é proposto.
Os judeus, embora convencidos pelos milagres de Nosso Senhor, não acreditaram nele,
tendo o entendimento obscurecido pela malícia da sua vontade. Ora, o que aconteceu aos Judeus
para a substância da fé, acontece-nos muitas vezes para a perfeição da fé. Nós cremos, por
exemplo, na divindade de Nosso Senhor, mas não concluímos praticamente a necessidade de o
amarmos, de o visitarmos na Eucaristia e de vivermos sob a influência constante da sua graça.
Cremos no Espírito Santo, mas não sabemos colocar-nos praticamente sob a sua
condução. Com o espírito de fé, faríamos progressos constantes e rápidos em todas as virtudes.
Peçamos a Nosso Senhor /594 a fé penetrante e perfeita que nos fará viver como os anjos na
presença de Deus e no seu serviço.
Esta fé prática pode também chamar-se a fidelidade. Ela vem do coração e da vontade
mais do que do espírito. Ela é uma recompensa das almas simples e da pureza de coração que
afasta todo o pecado venial.
Resoluções. – Divino Coração de Jesus, dai-me esta fé simples, que sobrenaturaliza toda
a vida; esta fé simples que nos faz viver em Deus, na sua presença, no seu amor e sob a
condução constante do seu Espírito. Dai-me também a doçura da vossa graça e a longanimidade
das almas fortes. Venho, Senhor, para tirar estas águas salutares no vosso Coração, abri-mo.
Colóquio com o Sagrado Coração.

28 de Maio
OS FRUTOS DO ESPÍRITO SANTO:
MODÉSTIA, TEMPERANÇA, CASTIDADE
12 Nox praecessit dies autem adpropiavit 12 Vai alta a noite, e vem chegando o dia.
abiciamus ergo opera tenebrarum et induamur arma Deixemos, pois, as obras das trevas e revistamo-
lucis 13 sicut in die honeste ambulemus non in nos das armas da luz. 13 Andemos dignamente,
comesationibus et ebrietatibus non in cubilibus et como em pleno dia, não em orgias e bebedices, não
inpudicitiis non in contentione et aemulatione 14 em impudicícias e dissoluções, não em contendas e
sed induite Dominum Iesum Christum et carnis ciúmes; 14 mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo
curam ne feceritis in desideriis (Rom 13, 12-14). e nada disponhais para a carne no tocante às suas
concupiscências (Rom 13, 12-14).
Primeiro Prelúdio. Revistamo-nos de Jesus Cristo, do seu espírito de modéstia, de temperança,
de castidade. Será fácil, se o nosso coração estiver bem apaixonado de amor por ele.
Segundo Prelúdio. Dai-me, Senhor, estes frutos que amadurecem facilmente num coração fiel à
vossa graça e dócil à condução do vosso Espírito.
PRIMEIRO PONTO: A modéstia. – A virtude da modéstia regula todos os movimentos
do corpo, os gestos e as palavras. Enquanto fruto do Espírito Santo, ela faz isto sem esforço e
como naturalmente; e além disso compõe todos os movimentos interiores da alma, como na
presença de Deus.
O nosso espírito é móvel, inquieto, dissipado. A modéstia detém-no, modera-o, e coloca
a alma numa profunda paz, que a dispõe a tornar-se o lar e o reino de Deus; o dom de presença
de Deus é uma alta luz na qual a alma se vê diante de Deus e observa todos os seus movimentos
interiores, tudo o que se passa nela, mais claramente do que vemos as cores em pleno meio-dia.
A modéstia é-nos inteiramente necessária, por causa do que se lhe segue, que são o
recolhimento, a presença de Deus, a união com Deus; é a marca de um verdadeiro espírito
religioso.
SEGUNDO PONTO: A temperança. – As virtudes de temperança e de castidade dizem
respeito aos prazeres do corpo, reprimem as ilicitudes e moderam os que são permitidos. Aquela
refreia a afeição desordenada de beber e de comer e impede os excessos que aqui poderiam ser
cometidos. Esta regula ou suprime o uso dos prazeres da carne. / 596
Mas os frutos de temperança e de castidade desprendem de tal modo a alma do amor do
seu corpo que ela quase já não ressente mais as revoltas, contendo-o sem dificuldade na
submissão.
Deleitemo-nos a contemplar a temperança do divino Mestre. Vive em Nazaré a vida
mais modesta dos operários. Começa a sua vida pública com o jejum de quarenta dias. Várias
vezes durante a sua vida apostólica, não tem tempo para comer e não tem preocupação com isso.
Vemo-lo no poço de Jacob, absorvido pelo seu desígnio de converter a Samaritana. Os
seus apóstolos oferecem-lhe de comer. Responde: «Tenho uma refeição mais urgente a tomar, é
fazer a vontade de meu Pai».
Qual era o seu alimento habitual? Pão de cevada e peixe seco; era o que levava para a
refeição do Salvador e dos apóstolos, o rapaz cujas provisões foram multiplicadas na margem
do lado da Galileia.
Jesus partilhava as modestas refeições dos seus apóstolos. Depois da sua refeição,
prepara-lhe peixe, pão e mel (Lc 24).
Recomenda o jejum aos seus discípulos (Mt 6).
No calvário, recebe vinho misturado com fel para se dessedentar.
Manifesta em toda a parte este fruto da temperança que porá nos nossos corações, se os
prepararmos com a pureza de consciência e com o fervor.
TERCEIRO PONTO: A castidade. – O fruto de castidade torna o nosso coração
totalmente inclinado para o único amor de Nosso Senhor e totalmente desapegado dos afectos
terrestres.
A castidade é o lírio das virtudes; torna os homens quase iguais aos anjos. Chamam-na
honestidade, porque é honrosa; é chamada também a bela virtude. É um dos mais belos
ornamentos do céu. Dá-nos a facilidade de pertencermos totalmente a Deus, com o coração,
com o corpo e com o espírito.
S. Paulo diz-nos: «Observai a santidade sem a qual ninguém verá a Deus» (Heb 12,14).
Ora, pela santidade aqui entende-se a castidade, como o observam S. Jerónimo e S. João
Crisóstomo: «Ninguém verá a Deus sem a castidade e sem a pureza de coração». Felizes os que
têm o coração puro, porque verão a Deus, diz Nosso Senhor.
Mas a castidade é um dom de Deus. Ninguém pode ser casto se o Senhor não lhe fizer
esta graça. Rezemos, portanto, e peçamos esta bela virtude em espírito de humildade. É pela
oração que se obtém e que se conserva esta virtude.
O jejum e a mortificação podem ajudar, mas isso não seria suficiente sem uma oração
humilde. /597
Mantenhamo-nos sempre junto de Nosso Senhor e meditemos sobretudo nos mistérios
da Paixão. Eles têm uma influência particular para inspirar a castidade.
Amemos a santa Eucaristia, que é um fermento de virgindade.
E depois, Maria está lá, nossa Mãe puríssima, castíssima, sempre virgem e protectora
das virgens. Peçamos por Maria ao Coração de Jesus o fruto da pureza.
Resoluções. – Divino Coração de Jesus, que belos dons ofereceis às minhas orações: a
modéstia, a temperança, a castidade. Mas eu sei que para os receber é preciso dispor-me pela
pureza de coração, pela vida interior, pela união habitual convosco.
Emitte spiritum tuum et creabuntur, et renovabis faciem terrae.
Colóquio com o Sagrado Coração.
29 de Maio
DA VIGILÂNCIA SOBRE O NOSSO INTERIOR
16 Non cesso gratias agens pro vobis 16 Não cesso de dar graças por vós,
memoriam vestri faciens in orationibus meis 17 ut fazendo menção de vós nas minhas orações, 17
Deus Domini nostri Iesu Christi Pater gloriae det para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o
vobis spiritum sapientiae et revelationis in Pai da glória, vos conceda espírito de sabedoria e
agnitione eius 18 inluminatos oculos cordis vestri de revelação no pleno conhecimento dele, 18
ut sciatis quae sit spes vocationis eius (Ef 1, 16- iluminados os olhos do vosso coração, para
18). saberdes qual é a esperança do seu chamamento (Ef
1, 16-18).
Primeiro Prelúdio. Se estivermos recolhidos e vigilantes sobre o nosso interior, o Espírito Santo
guiar-nos-á no conhecimento e no amor do Sagrado Coração.
Segundo Prelúdio. Falai, Senhor, o vosso servo escuta.
PRIMEIRO PONTO: Da vigilância sobre o nosso interior para conhecer e corrigir as
suas desordens. – Permaneceremos embrulhados e como sepultados numa infinidade de faltas e
de imperfeições que nunca vemos e que não veremos senão na hora da morte, se não nos
exercitarmos no conhecimento dos movimentos do nosso interior, onde o demónio e a natureza
representam estranhos personagens, enquanto estamos totalmente absorvidos na balbúrdia das
ocupações exteriores.
A ruína das almas no caminho da perfeição vem da multiplicação dos pecados veniais,
donde se segue a diminuição das luzes e das inspirações divinas, das consolações espirituais e
dos outros socorros da graça, depois uma grande fraqueza em resistir aos ataques do inimigo, e
finalmente a queda em alguma falta pesada que nos faz abrir os olhos e ver que enquanto
pensávamos noutra coisa, o nosso coração nos traía, por falta de vigiarmos em guardá-lo e de
entrarmos nele muitas vezes para reconhecermos o que lá se passava (P. Lallemant).
SEGUNDO PONTO: O dano que resulta da falta de vigilância. – É esta ausência de
nós próprios e este desleixo em regular o nosso interior que são a causa de que os dons do
Espírito Santo estejam em nós quase sem efeito, e que graças sacramentais, que nos foram dadas
em virtude dos sacramentos que recebemos ou que frequentamos, permaneçam inúteis. Isto é
bem manifesto para os dons do Espírito Santo. Não sentimos como deveríamos a influência dos
dons de sabedoria e de piedade, que nos tornariam fervorosos como os santos.
A graça sobrenatural é um direito que cada sacramento nos adquire junto de Deus, para
recebermos dele alguns socorros que /599 mantêm em nós o efeito deste sacramento. Assim a
graça sacramental do baptismo dá-nos o direito de receber luzes e inspirações para levarmos
uma vida sobrenatural, como membros de Jesus Cristo, animados do seu espírito. A graça
sacramental da confirmação é um direito a recebermos força e constância, para combatermos
contra os nossos inimigos como soldados de Jesus Cristo. A graça sacramental da confissão é
um direito a recebermos um crescimento de pureza de coração. A da comunhão é um direito a
recebermos socorros eficazes para nos unirmos a Deus pelo fervor do seu amor.
Donde vem que a maior parte das vezes recebemos os sacramentos sem frutos ou pelo
menos sem que os frutos perseverem? É porque os nossos defeitos habituais, os nossos afectos
desregrados, os nossos apegos, as nossas paixões não mortificadas têm mais força do que a
graça sacramental. É sobretudo porque nós não entramos em nós mesmos para reconhecermos
os nossos defeitos, para os corrigirmos e para estarmos atentos aos movimentos da graça.
TERCEIRO PONTO: A vigilância é necessária para nos colocarmos sob a condução
do Espírito Santo. – Vigiando sobre o nosso interior, havemos de adquirir um grande
conhecimento de nós mesmos e havemos de discernir os diversos movimentos da natureza e da
graça.
Apenas pela atenção em vigiarmos sobre o nosso interior, fazemos excelentes actos de
virtude, colocamo-nos no estado de fervor e avançamos maravilhosamente na perfeição; como,
pelo contrário, negligenciando o nosso interior, fazemos perdas inconcebíveis.
Este exercício pode praticar-se em todo o tempo e em todo o lugar, nas nossas funções
exteriores e nas nossas doenças, e não há assunto tão embaraçante que não nos permita entrar
em nós mesmos de tempos em tempos, para observarmos e para endireitarmos os movimentos
do nosso coração.
Aqueles que abandonam o cuidado do seu interior sob o pretexto de zelo e de caridade
cometem uma infinidade de pecados veniais e caem na tibieza. Os seus trabalhos não produzem
senão muito poucos frutos, não sendo animados por esta força que vem do espírito interior nem
acompanhados pelas bênçãos que Deus dá aos homens de oração e de recolhimento. Não fazem
nada puramente por Deus, procuram-se em tudo e misturam sempre secretamente o seu próprio
interesse com a glória de Deus nos seus melhores empreendimentos.
Passam assim a sua vida nesta mistura de natureza e de graça, sem avançarem na
perfeição, com o espírito tão distraído e o coração tão duro como se não tivessem tido todo o
socorro dos exercícios da piedade /600 cristã e da vida religiosa.
Enfim a morte vem e tremem com razão ao pensamento dos juízos de Deus.
Resoluções. – Vigilate et orate. Vigiemos, Nosso Senhor recomendou-nos tanto. –
Videte, vigilate et orate. Vede, vigiai e rezai. Quero, portanto, observar o meu interior, vigiar e
manter-me sempre na disposição de fervor. Quero colocar-me assim no começo de cada acção.
Ó Maria, Mãe da perseverança, ajudai-me.
Colóquio com a santa Virgem.

30 de Maio
MARIA, RAINHA DO SANTO ROSÁRIO
10 Benedixerunt illam omnes una voce Todos a abençoaram dizendo juntos: Tu és
dicentes tu gloria Hierusalem tu laetitia Israhel tu a glória de Jerusalém, a alegria de Israel e a honra
honorificentia populi nostri 11 quia fecisti do nosso povo; porque tu agiste virilmente…E a
viriliter… ideo et manus Domini confortavit te et mão do Senhor te fortificou e por isso tu serás
ideo eris benedicta in aeternum 12 et dixit omnis bendita eternamente. E todo o povo disse: Seja!
populus fiat fiat (Judith 15,10). Seja! (Judith 15, 10-12).
Primeiro Prelúdio. Sim, Fiat! Fiat! Que Maria, como Judite, e mais do que Judite, seja bendita
eternamente, porque ela salvou o seu povo.
Segundo Prelúdio. Ó Maria, ofereço-vos todos os dias a coroa do rosário, dai-me em troca as
virtudes que me ensinam os mistérios desta coroa.
PRIMEIRO PONTO: Uma chuva de graças. – Leão XIII foi, como S. Pio V, o apóstolo
do Rosário. Dez vezes se dirigiu à Igreja inteira para lhe recomendar o Rosário por encíclicas
todas penetradas da piedade do seu coração para com Maria. É que ele viu a triste situação na
qual se encontra a Igreja. Comparou muitas vezes o nosso tempo ao séc. XII e os séculos de
hoje aos dos Albigenses, que queriam inverter e destruir toda a ordem social.
Maria veio em socorro da sociedade cristã no séc. XII. O meio que empregou foi o
Rosário cuja propaganda confiou a S. Domingos. A recitação do Rosário reintroduziu entre os
fiéis o hábito da oração e expandiu o conhecimento exacto dos mistérios de Nosso Senhor, com
os sentimentos que a meditação destes mistérios desperta nas almas. A paz voltou aos espíritos.
Era como uma chuva benfazeja caindo sobre um solo árido, segundo a expressão da Virgem
Maria mesma. Como S. Domingos se desolava a seus pés, perante as infelicidades do seu
tempo, a Virgem disse-lhe: «esta terra permanecerá estéril até que a chuva caia». Fê-lo
compreender que esta chuva era a devoção do Rosário e que ele devia expandi-la por toda a
parte.
A Santíssima Virgem ofereceu-nos de novo a salvação em Lourdes pedindo com
insistência a recitação do Rosário. Leão XIII respondeu ao desejo de Maria. Os milagres de cura
e de conversão multiplicam-se em Lourdes. O Rosário acabará também por curar a nossa pobre
sociedade e através dele dar-lhe o sentido cristão. /602
SEGUNDO PONTO: O Rosário afasta o demónio. – Citemos com S. Liguori um dos
belos milagres, operados por S. Domingos, graças à recitação do Rosário: S. Domingos pregava
em Carcassone. Levaram-lhe um Albigense caído no poder do demónio, por ter publicamente
atacado a devoção do Rosário. Tendo o santo, da parte de Deus, ordenado aos demónios que
declarassem se, nas suas pregações sobre o Rosário, tinha dito algo que fosse contra a verdade!
«Escutai, gritaram os demónios dando uivos, escutai, cristãos. Este homem, que é nosso
inimigo, não vos disse sobre Maria e o Rosário senão a verdade». Acrescentaram que não
podiam nada contra os servos da Santa Virgem; que na morte muitos pecadores se salvam,
porque invocam Maria. «Somos constrangidos, disseram ainda, a dar a conhecer que, entre
todos os que perseveram na devoção para com Maria e o Rosário, nenhum se perde; porque,
àqueles que estão em pecado mortal, Maria obtém, antes da sua morte, a graça de um verdadeiro
arrependimento». S. Domingos pôs-se logo a recitar o Rosário com o povo; e durante esse
tempo viram vários demónios saírem do corpo deste infeliz, até que finalmente, estando o
Rosário inteiramente recitado, este homem se encontrou perfeitamente liberto. No seguimento
deste milagre, muitos hereges se converteram.
O Rosário tem, portanto, o poder de afastar os demónios. Sejamos fiéis à sua recitação,
há-de obter-nos a protecção de Maria para nós e para toda a sociedade.
TERCEIRO PONTO: A coroa de Maria. – Recitar o rosário é tecer uma coroa de rosas
a Maria para ornar a sua fronte real. As saudações angélicas de que está composto são de facto
os louvores que mais agradam a Maria.
Como o doce perfume das rosas agrada, atrai e deleita, diz o bem-aventurado Alberto
Grande, assim os perfeitos louvores contidos nesta saudação, o odor tão suave de santidade e de
devoção que expande esta oração composta pelo anjo, tudo isso forma um cântico
soberanamente agradável a Maria e como uma coroa de rosas que orna a sua fronte e alegra o
seu Coração.
Oferecer a Maria este tributo de louvores, é recordar-lhe a honra que ela recebeu quando
foi coroada Rainha do céu, em recompensa da parte que tinha tomado nos mistérios de Nosso
Senhor. Nada pode agradar-lhe mais e nada pode assegurar-nos melhor a sua benevolência. /604
Recitemos, portanto, fielmente o Rosário ou pelo menos o terço. Meditemos
brevemente, quando o recitamos, nos mistérios da vida de Nosso Senhor. Formemos para cada
dezena uma intenção especial.
Os anais da Igreja relatam-nos as graças inumeráveis obtidas por esta devoção.
Resoluções. – O meu terço é um dos meus bons exercícios de cada dia, um dos mais
agradáveis a Maria, um dos mais fecundos em graças. Hei-de dizê-lo, portanto, fielmente e bem.
Hei-de oferecer cada dezena por uma intenção especial, mas haverá pelo menos uma dezena
cada dia pelas intenções do Papa, pela Igreja e pela Sociedade.
Colóquio com Nossa Senhora do Rosário.
31 de Maio
SOBRE AS RELAÇÕES DE MARIA
COM A DEVOÇÃO AO SAGRADO CORAÇÃO
24 Ego mater pulchrae dilectionis et Eu sou a mãe do belo amor, da
timoris et agnitionis et sanctae spei (Sirac 24,24). inteligência e da santa esperança (Sirac 24,24).
Primeiro Prelúdio. Como Mãe do Coração de Jesus e esposa do Espírito de verdade, Maria
coopera nas operações da graça. Ela tem uma ternura particular pelas almas consagradas ao Coração de
Jesus.
Segundo Prelúdio. Ó Maria, ajudai-nos a estabelecer o reino de amor do Coração de Jesus nas
nossas almas e nas dos nossos irmãos.
PRIMEIRO PONTO. O Coração de Jesus é todo amor e Maria é a Mãe do belo amor.
– Foi Jesus mesmo quem nos deu Maria por Mãe. Ela tem por missão conduzir-nos ao seu
Coração, ao seu amor.
A ternura que ela tem por nós ultrapassa a das mães mais amorosas. Acolhe sempre com
bondade aqueles que vão ter com ela. Ela apresenta incessantemente ao seu Filho as almas e os
corações dos seus fiéis servidores. Jesus ama aqueles que ela ama. Como é o mediador entre o
seu Pai e os homens, é a mediadora entre os homens e ele. Ele deu-lhe para isso todo o poder do
seu Coração. Dispõe dele como uma mãe pode dispor do coração do melhor dos filhos.
Dirijamo-nos, portanto, à Virgem Imaculada, peçamos-lhe a devoção ao Sagrado
Coração e havemos de obtê-la.
Jesus é a verdade e a vida, mas comunica-nos a vida espiritual pelo Espírito de verdade
e de amor. Maria é a esposa do Espírito Santo. Ela coopera a este duplo título de Mãe do
Sagrado Coração e de Esposa do Espírito Santo nas operações da graça. Ela é a porta do céu,
porque é a distribuidora das graças que a ele conduzem: Mater divinae gratiae.
SEGUNDO PONTO: Maria deseja o triunfo do amor de Jesus. Ela tem pressa em ver o
triunfo do amor de Nosso Senhor. As suas orações pedem a sua efusão. Deu aos apóstolos
cuidados maternos. Reserva aos apóstolos do Sagrado Coração a sua omnipotente protecção.
Devem desenvolver o amor por Maria, ao mesmo tempo que o amor pelo Sagrado Coração.
O mais poderoso meio para espalhar a devoção ao Sagrado Coração é dirigir-se a Maria.
Ela foi associada a todas as suas dores, a todos os sofrimentos de Nosso Senhor durante a sua
vida mortal. Tendo sido /605 associada à fundação da Igreja, está naturalmente associada à sua
renovação. Esta renovação deve fazer-se pelo amor de Nosso Senhor, Maria é a criatura que
mais o amou, ela é a mãe do seu Coração. É por ela que é preciso ir a ele, se quisermos ser
recebidos como filhos privilegiados; nas provações, nas dificuldades, é a ela que é preciso
recorrer. Ela será feliz ao interceder pelos amigos do Coração de seu Filho. É por ela que é
preciso pedir as graças de contemplação e de união.
TERCEIRO PONTO: Maria tem uma ternura particular pelos apóstolos do Sagrado
Coração, sacerdotes ou outros. – No Calvário, despojado de tudo, Nosso Senhor não tinha
nenhum bem para deixar a sua Mãe; mas deixou-lhe algo de melhor que bens temporais;
lançando um olhar de amor sobre S. João, disse a sua Mãe: «Mulher, eis o vosso filho». E Maria
aceitou com amor este filho novo. Para chegar a esta maternidade, ela tinha sofrido com Nosso
Senhor durante trinta e três anos, e agora esta maternidade era a sua consolação no meio das
dores extremas que ela suportava.
Na pessoa de João, todos os cristãos se tinham tornado seus filhos e particularmente os
sacerdotes. Os apóstolos do Sagrado Coração são-lhe particularmente caros. Ela alegra-se por
todo o amor que têm pelo seu divino Filho.
Como vão para ele para o amarem e torná-lo amado, o seu coração de mãe sente-se
tocado. Ela envolvê-los-á de uma ternura cheia de solicitude. Mas é preciso para isso que ela
encontre neles as virtudes que fizeram de S. João o discípulo preferido de Nosso Senhor. A
pureza de S. João era admirável e encantava particularmente o Coração de Jesus. João também
amava Maria, tinha por ela uma profunda veneração. Se os apóstolos do Sagrado Coração
querem que Maria seja sua mãe, que eles lhe testemunhem o seu afecto e a sua confiança. Ela
será a sua conselheira em todas as suas obras, a sua guia em todos os seus empreendimentos e
sobretudo a grande obreira da sua santificação. Para lhe testemunharmos esta confiança,
havemos de considerar que ela esteve misturada em todas as acções de Nosso Senhor: em
Belém, prodigaliza-lhe os seus cuidados; em Nazaré, está unida a todos os pormenores da sua
vida íntima e escondida; dá com ele o exemplo de todas as virtudes: a pureza, a humildade, a
calma inalterável da alma, a pobreza nobremente suportada; está associada também às dores da
sua Paixão: para o seguir no Calvário, é preciso aí acompanhar a sua mãe.
Resoluções. – Ó Maria, consagro-me a vós para sempre. Quero no começo de cada dia,
de cada acção, ir a vós /606 primeiro e por vós a Jesus. Aceitai-me como vosso servo, vosso
discípulo, vosso filho, vosso S. João. Conduzi-me ao Coração de Jesus e ao seu amor.
Colóquio com Maria.

MÊS DE JUNHO
MÊS DO SAGRADO CORAÇÃO E DO SANTÍSSIMO SACRAMENTO
Duas meditações para o retiro do mês
I.VIDA DE CARIDADE, A EXEMPLO DO SAGRADO CORAÇÃO
8 Qui non diligit non novit Deum quoniam 8 Aquele que não ama não conhece a
Deus caritas est 9 in hoc apparuit caritas Dei in Deus, pois Deus é amor. 9 Nisto se manifestou o
nobis quoniam Filium suum unigenitum misit Deus amor de Deus em nós: em haver Deus enviado o
in mundum ut vivamus per eum (1Jo 4, 8-9). seu Filho unigénito ao mundo, para vivermos por
meio dele (1Jo 4,8-9).
Primeiro Prelúdio. – Verei o Coração de Jesus no Santíssimo Sacramento, todo inflamado de
amor pelo seu Pai e todo radiante de amor pelas suas criaturas.
Segundo Prelúdio. – Divino Coração de Jesus, comunicai-me um pouco do vosso amor: infunde
amorem cordibus.
PRIMEIRO PONTO: Amar a Deus pelo Coração de Jesus. – O amor do Coração de
Jesus pelo seu Pai é o modelo do nosso amor. Jesus é o corifeu do amor das criaturas por Deus.
Há certamente o amor dos Anjos e de algumas boas almas, mas o que é isto para Deus? Jesus
veio e oferece ao seu Pai um amor digno dele. O seu Pai compraz-se neste amor, disse-o nas
margens do Jordão.
Jesus ama o seu Pai, é a sua vida. Amou-o na sua vida mortal, ama-o na Eucaristia e no
céu. Cumpre sempre o grande preceito: «Amarás o Senhor com todo o teu coração, com toda a
sua alma, com todas as tuas forças».
Entre os homens, Deus é tão pouco amado! Somos ingratos. Esquecemos aquele de
quem temos tudo: a vida, o perdão, a graça, a esperança do céu. E, no entanto, pede-nos o nosso
coração: Praebe, fili, cor tuum mihi. Incapazes de o amarmos bem por nós mesmos, amemo-lo
pelo Coração de Jesus. Este divino Coração pertence-nos, suprirá à nossa impotência. /608
Começarei, portanto, esta vida de amor em união com o Coração de Jesus. Amigo de
Deus, amarei tudo o que me aproxima dele: a oração, o recolhimento, a visita ao Santíssimo
Sacramento, a santa comunhão.

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